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 "Construindo Vidas na Palavra de Deus" Rua Kansas, 770 - Brooklin - CEP 04558-002 - São Paulo - SP 2014 editora batista regular

Comentário de Daniel - Leon Wood

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  • "Construindo Vidas na Palavra de Deus"

    Rua Kansas, 770 - Brooklin - CEP 04558-002 - So Paulo - SP2014

    editora batista regular

  • Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida, armazenada em sistema de processamento de dados ou transmitida em qualquer forma ou por qualquer meio eletrnico, mecnico, fotocpia, gravao ou qualquer outro exceto para citaes resumidas com o propsito de rever ou comentar, sem prvia autorizao dos Editores. Publicado no Brasil com a devida autorizao.

    Reviso: Simone Granconato; Thiago Andr MonteiroSuperviso de produo: Edimilson Lima dos Santos

    Diagramao / Capa: Edvaldo Cardoso Matos

    Primeira edio, 2014

    editora batista regularRua Kansas, 770 - Brooklin - CEP 04558-002 - So Paulo - SP

    Telefone: (11) 5041-9137 Site: www.editorabatistaregular.com.br

    A Commentary on Danielby Leon J. Wood

    Copyright 1973 by Leon J. Wood

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    W876c Wood, Leon James, 1918 1977 Comentrio de Daniel Leon Wood So Paulo: Editora Batista Regular, 2014 360 p. 16 x 23 cm.

    Ttulo original: A Commentary on Daniel ISBN: 978-85-7414-047-6

    1. Bblia Comentrio. 2. Antigo Testamento Daniel. I. Ttulo

    CRB004/2012 CDD: 224 CDU: 27-273

    ndice para catlogo sistemtico:1. Daniel : Antigo Testamento : Bblia : Religio 224

  • Prefcio ................................................................................................................ 6

    Abreviaes ......................................................................................................... 8

    Introduo .......................................................................................................... 9 A. Lugar na histria de Israel B. Daniel, o homem C. Lnguas e a diviso judaico-gentlica do livro D. O Autor do livro E. Propsito do livro F. Contexto histrico do livro G. O cativeiro de Daniel

    Captulo 1 ......................................................................................................... 26(Os nmeros que seguem cada subttulo indicam versculos)

    A. Nabucodonosor ataca Jerusalm (1-2) B. Introduo de Daniel, Hananias, Misael e Azarias (3-7) C. Daniel e seus companheiros recusam a comida do rei (8-16) D. A bno de Deus sobre os quatro jovens (17-21)

    Captulo 2 ......................................................................................................... 48 A. O sonho perturbador de Nabucodonosor (1-13) B. O sonho revelado a Daniel (14-30) C. O sonho e sua interpretao (31-45) D. Daniel honrado (46-49)

    Captulo 3 ......................................................................................................... 81 A. A ordem de Nabucodonosor (1-7) B. A coragem de Sadraque, Mesaque e Abede-Nego (8-18) C. O livramento milagroso (19-27) D. A reao louvvel de Nabucodonosor (28-30)

    Captulo 4 ....................................................................................................... 104 A. A introduo significativa (1-3) B. O segundo sonho de Nabucodonosor (4-8) C. O contedo do sonho (9-18) D. A interpretao do sonho (19-27) E. A insanidade de Nabucodonosor (28-33) F. Nabucodonosor honra o Altssimo (34-37)

  • Captulo 5 ....................................................................................................... 137 A. Uma festa mpia (1-4) B. A escrita milagrosa (5-9) C. Daniel chamado (10-16) D. A interpretao (17-28) E. O resultado (29-31)

    Captulo 6 ....................................................................................................... 163 A. O novo governo (1-3) B. Uma conspirao traioeira (4-9) C. Fidelidade e acusao (10-15) D. Sentena e livramento (16-23) E. Os resultados significativos (24-28)

    Captulo 7 ....................................................................................................... 189 A. O contexto geral (1-3) B. A prpria viso (4-14) C. A interpretao (15-28)

    Captulo 8 ....................................................................................................... 221 A. O contexto geral (1-2) B. A prpria viso (3-14) C. A viso interpretada (15-27)

    Captulo 9 ....................................................................................................... 247 A. O contexto geral (1-2) B. A orao de Daniel (3-19) C. A profecia das setenta semanas (20-27)

    Captulo 10 ..................................................................................................... 284 A. O contexto geral (1-3) B. A apario do mensageiro celestial (4-8) C. Palavras de explicao do mensageiro celeste (9-14) D. Daniel fortalecido para entender (10.1511.1)

    Captulo 11 ..................................................................................................... 301 A. A histria at a diviso do imprio de Alexandre (2-4) B. Os ptolomeus e selucidas at Antoco Epifnio (5-20) C. Antoco Epifnio (21-35) D. O Anticristo (36-45)

  • Captulo 12 ..................................................................................................... 338 A. A Grande Tribulao (1-3) B. Cronologia da Tribulao (4-13)

    Grficos Cronolgicos................................................................................. 354Bibliografia ..................................................................................................... 356

  • O livro de Daniel como um monumento a uma das personalidades marcantes do Antigo Testamento. Daniel, um executivo numa das grandes cortes do tempo antigo, obteve uma elevada posio em f e obedincia a Deus, mantendo um testemunho brilhante apesar da perversidade pag envolvente. Um estudo de suas experincias d exemplo e desafio contnuos para o cristo de qualquer poca. Deus honrou Daniel inspirando-o a escrever o livro que leva o seu nome, e lhe deu informaes importantes relativas ao futuro atravs de uma srie de vises. Por causa dessas informaes, o livro de Daniel tem sido chamado de contraparte, no Antigo Testamento, do livro de Apocalipse, no Novo Testamento. Ele fornece verdades centrais que nos ajudam entender grandes pores da profecia preditiva encontrada em outras partes das Escrituras.

    Numerosos comentrios de Daniel tm sido escritos, mas poucos em anos recentes. As obras usadas na redao desta exposio esto alistadas nas notas de rodap e/ou na bibliografia. Essas, se agrupam em quatro categorias. Algumas so liberais, representadas pelo volume monumental de James A. Montgomery. Outras so conservadoras, mas amilenistas em sua escatologia, representadas pelas timas obras de C. F. Keil, Albert Barnes, H. C. Leupold, e E. J. Young. Algumas so pr-milenistas, porm mais populares em estilo, representadas pelos estudos teis de A. C. Gaebelein e H. A. Ironside. Uma conservadora, pr-milenista, erudita, e de data recente: a de John Walvoord. O desejo do autor que esta ltima obra tivesse aparecido a tempo de us-la mais.

    A inteno deste livro prover um comentrio gramtico-histrico do ponto de vista pr-milenar, usando informao recentemente desco-berta por pesquisa arqueolgica e lingustica. Muito mais sobre o contexto histrico de Daniel conhecido hoje do que era h alguns anos. Especial-mente importante tem sido a leitura das Crnicas Babilnicas, nas quais se encontra a histria oficial da Babilnia do ponto de vista da corte real. Na Introduo faz-se um esforo especfico de correlacionar esta informao com a histria revelada no livro de Daniel.

  • O autor prefere comentrios que seguem versculo por versculo e frase por frase. Um comentrio deste tipo deve tratar de cada questo significativa, ainda que seja para dizer muito pouco sobre ela ou mesmo para declarar que nenhuma resposta conhecida. Ele tambm aprecia comentrios que apresentam argumentao detalhada para pontos de vista tratados. Este procedimento visto como particularmente importante em Daniel, uma vez que posies escatolgicas, que desempenham um papel maior no ponto de vista de algum sobre o livro, diferem marcantemente. Ele tambm gosta de comentrios que gastam menos tempo refutando um escritor de oposio e d mais tempo apresentando evidncia positiva para a interpretao defendida. Um pouco de ateno deve ser dada, claro, a escritores oponentes, pois o ponto de vista prprio pode ser melhor visto em sua singularidade quando comparado a outro; no entanto, o esforo primordial deve ser analisar, no refutar. Essas consideraes tm fornecido orientaes na redao deste comentrio.

    A traduo usada a de Joo Ferreira de Almeida Revista e Atualizada, 2 edio. Algumas referncias s palavras originais foram consideradas inevitveis. Entretanto, a inteno foi dar explicao suficiente para que a pessoa que no tem conhecimento das lnguas originais possa seguir o pensamento sem dificuldade. O uso do pargrafo traz a seguinte lgica: inicia-se um pargrafo com cada versculo, e mais de um pargrafo usado para um nico versculo se o comentrio for extenso. A grafia Yahweh empregada, ao invs da mais comum Jeov para o nome (tetragrama) de Deus. Conforme explicado mais amplamente nos comentrios dos versculos 2 e 4 do captulo 9, essa grafia mostra a pronncia original do nome de modo mais preciso. O livro de Daniel emprega esse nome para Deus somente no captulo 9.

  • ANET Ancient Near Eastern Texts, James B. Pritchard, ed.ASV American Standard VersionBD Barnes' commentary on DanielBDB Hebrew Lexicon, Brown, Driver, BriggsDLD Daniel and the Latter Days, Robert D. CulverDM Darius the Mede, John C. WhitcombDP Daniel the Prophet, E. B. PuseyGD The Prophet Daniel, Arno C. GaebeleinIABD In and Around the Book of Daniel, Charles BoutflowerKDC Keil and Delitzsch commentariesKJV King James VersionLCD Lange's Commentary on Daniel, O. ZocklerLED Exposition of Daniel, Herbert C. LeupoldMICC Commentary on the Book of Daniel, James A. MontgomeryNB Nabonidus and Belshazzar, Raymond P. DoughertyNIP Nations in Prophecy, John F. WalvoordSD Studies in Daniel, Robert Dick WilsonSOTI A Survey of Old Testament Instroduction, Gleason L.Archer,Jr.TTC Things To Come, J. Dwight PentecostWD Daniel, The Key to Prophetic Revelation, John F. WalvoordYPD The Prophecy of Daniel, Edward J. Young

  • A. Lugar na Histria de Israel

    Os eventos histricos apresentados no livro de Daniel aconteceram num tempo difcil da existncia de Israel. Sob a mo de Deus, a nao is-raelita foi punida atravs do cativeiro. Quando as tribos de Israel se esta-beleceram, Deus lhes disse que prosperariam sob sua bno, se eles per-manecessem fiis a ele (Dt 28.1-14), mas que sofreriam punio dolorosa se fossem infiis (Dt 28.15-68). Essa ltima possibilidade foi o que aconteceu; e punio, pelas mos do inimigo, se seguiu j nos dias dos juzes (Jz 3-16). O tempo de Davi trouxe alvio temporrio, por causa de sua liderana em fidelidade. Mas Salomo, aps um bom comeo, desviou-se do Senhor, e os problemas surgiram, levando a uma separao completa dentro do reino, logo aps o seu reinado. Profetas foram usados para falar fortemente con-tra o pecado e apregoar advertncias de punio contnua e at cativeiro em uma terra estrangeira, mas sem sucesso. O cativeiro realmente veio para a diviso norte do reino, Israel, em 722 a.C, quando Samaria caiu sob o poder da Assria (2Rs 17.4-23); e tambm para a diviso sul, Jud, apenas um sculo depois, sob o poder dos babilnios.

    O golpe principal para Jud veio em 586 a.C, quando Jerusalm foi destruda e o pas se tornou provncia da Babilnia (2Rs 25.1-21). Onze anos antes (597), no entanto, uma primeira leva de israelitas foi conduzida ao cativeiro quando Jeoquim reinava, e cerca de 10 mil pessoas preeminentes foram levadas para Babilnia (2Rs 24.11-16). Oito anos antes, Daniel, seus trs amigos, e outros jovens judeus haviam sido levados fora (605). Seu cativeiro na Babilnia a ocasio de interesse central no livro de Daniel. Essa ocasio , s vezes, chamada de primeira fase, na srie de trs, do cativeiro judaico como um todo. Assim, Daniel j estava na Babilnia h oito anos quando os judeus do cativeiro de 597 chegaram, e h dezenove anos, quando os de 586 chegaram. Ele continuou a viver durante o perodo completo do cativeiro, e foi capaz de testemunhar o retorno a Jud de muitas das pessoas em 538/37 a.C.

  • 10 Comentrio de Daniel

    Vale notar que o tempo de Daniel marca o terceiro de quatro grandes perodos de milagres na histria das operaes de Deus com os homens. O primeiro perodo veio com Moiss e a libertao de Israel do Egito; o se-gundo, com os profetas notveis, Elias e Eliseu; e o quarto, com o advento de Cristo. Todas essas pocas foram caracterizadas por desenvolvimentos significativos, precisando de demonstrao de credenciais autnticas. O primeiro e o quarto foram ocasies do estabelecimento do Antigo e Novo Testamentos, respectivamente; e o primeiro e o terceiro, as duas pocas de cativeiro e libertao de um poder estrangeiro. O segundo perodo, quando Elias e Eliseu operaram milagres, foi o comeo de um ministrio proftico maior. Profetas haviam ministrado outrora, ainda que no numa base nacional, advertindo a nao, como um todo, da punio iminente por causa do pecado caso a correo no estivesse a caminho. Deus esta-va agora instituindo essa forma de ministrio, e ele queria que as pessoas reconhecessem que Elias e Eliseu, e aqueles que os sucederiam, fossem de fato, seus servos autorizados.

    A poca de Daniel exigia especialmente credenciais para que os pa-gos, entre os quais os judeus foram forados a viver, tivessem motivo para pensar de forma elevada a respeito do Deus de Israel, Yahweh. Isso foi significativo porque os fatores normais de avaliao levariam os pagos a pensar de modo contrrio, uma linha de raciocnio a ser explorada de modo mais extenso atualmente. As credenciais foram necessrias tambm ao prprio povo de Daniel. Eles precisavam ser encorajados e permanecer firmes em sua f, sob circunstncias difceis. Deve ser observado, alm dis-so, que a presena de Deus foi evidente no s em milagres de obras, mas tambm em milagres de palavras. Foi necessrio que o povo ouvisse de Deus, bem como testemunhasse o seu poder. As pessoas ao redor estavam dizendo que Deus havia deixado Israel de lado (Jr 33.24), e elas precisa-vam ouvir, de fato, que Deus realmente tinha em mente um futuro longo e atrativo para os israelitas. Atravs de Daniel, a informao bem-vinda foi revelada e registrada no seu livro, caracterizando-o como o livro que contm as predies mais explcitas de todo o Antigo Testamento.

    B. Daniel, o Homem

    Daniel se posiciona como um dos servos de Deus mais admirveis no Antigo Testamento. Seu nome significa Deus meu juiz ou Deus juiz, dependendo se o i do meio for considerado como um sufixo da primeira pessoa ou meramente um conectivo (yd compaginis). Pouco se sabe dos primeiros anos da vida de Daniel. Seus pais no so nomeados,

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    mas ele claramente era descendente real ou nobre (Dn 1.3)1, e seus pais devem ter sido pessoas piedosas a quem podemos atribuir sua marcante dedicao a Deus. Sua primeira casa foi provavelmente na capital, Jerusa-lm, e de l, ele foi levado cativo para Babilnia, junto com seus amigos mais prximos Hananias, Misael e Azarias. Cada um provavelmente no tinha mais que 15 anos de idade.

    O livro apresenta cinco eventos de destaque na vida de Daniel na Ba-bilnia. Primeiro, a deciso que ele e seus amigos tomaram de pedir comi-da diferente daquela que fora prescrita pelo rei Nabucodonosor (cap. 1). Isso veio quase imediatamente aps a chegada dos quatro na terra estran-geira. O segundo, ocorrido cerca de dois anos depois, relativo revelao de Daniel ao rei, do sonho que ele havia tido e a sua interpretao (cap. 2). O terceiro tem a ver com a interpretao de Daniel de um segundo sonho de Nabucodonosor, o qual provavelmente ocorreu trinta anos aps o pri-meiro. Esse evento refere-se ao perodo de 7 anos de insanidade de Nabu-codonosor, o qual considera-se melhor ter ocorrido prximo ao fim do seu reinado de 43 anos (cap. 4). O quarto foi a leitura da escrita milagrosa na parede do palcio de Belsazar. Esse evento ocorreu na vspera da queda da Babilnia sob os persas (539 a.C.), quando Daniel estava com pelo menos 80 anos de idade (cap. 5). O quinto, ocasio em que ele foi lanado na cova dos lees, veio provavelmente depois de trs anos da captura da Babilnia por Ciro (cap. 6). Nesse tempo, Daniel havia escolhido honrar a Deus ao invs de obedecer ao decreto inadequado e tolo do rei Dario. O regente persa considerou necessrio executar a punio designada no decreto as-sinado por ele, mesmo que artimanhas tenham sido usadas pelos inimigos de Daniel para convenc-lo a assinar. O episdio mencionado no diz res-peito a Daniel, mas sim aos seus trs amigos que se recusaram a se inclinar diante da esttua que Nabucodonosor mandara construir e foram lanados na fornalha ardente (cap. 3). Assim, todos os primeiros seis captulos do livro se referem principalmente a eventos histricos na vida de Daniel e/ou seus trs amigos.

    Interligados com esses eventos, esto quatro perodos de revelao, dados por Deus a Daniel. Eram eventos futuros envolvendo o povo de Deus. Os primeiros dois vieram nos primeiro e terceiro anos, respectiva-mente, do reino de Belsazar, quando Daniel tinha cerca de 64 a 66 anos; e os dois ltimos, nos primeiro e terceiro anos do reinado de Ciro, quando

    1 Josefo (Antiq. X,10,1) diz que Daniel e seus amigos foram todos parentes do Rei Zedequias.

    Introduo

  • 12 Comentrio de Daniel

    o profeta tinha cerca de 81 e 83 anos. Os primeiros trs perodos do rece-bimento das revelaes so registrados, respectivamente, nos captulos 7, 8 e 9, e o quarto, nos captulos 10, 11 e 12. Uma diviso bsica do livro sugerida pelo fato de que os primeiros seis captulos so principalmente histria, e os ltimos seis, profecia preditiva.

    Fora do seu prprio livro, Daniel mencionado cinco vezes nas Escri-turas: Ezequiel 14.14, 20; 28.3; Mateus 24.15; e Marcos 13.14. Nas primeiras referncias, Daniel associado a No e J como exemplo notvel de reti-do; na terceira, como um modelo de sabedoria, com quem o rei de Tiro no poderia esperar se medir.2 As duas referncias do Novo Testamento fornecem evidncia sobre a interpretao apropriada de um aspecto das revelaes de Daniel; pois Jesus identifica a abominao da desolao mencionada por Daniel (9.27; 12.11), que se cumprir no tempo da Grande Tribulao.

    As trs referncias de Ezequiel so importantes pelo que dizem do carter de Daniel.3 O prprio livro de Daniel o apresenta como homem de retido e sabedoria notveis, e as referncias de Ezequiel reforam signi-ficantemente essa apresentao. Para valorizar esse reforo, importante notar que Ezequiel foi contemporneo de Daniel, chegando como um ca-tivo Babilnia oito anos depois. Nessa poca, Daniel j alcanara a im-portante posio que obteve no governo, e Ezequiel, pode-se supor, teria investigado, na chegada, sobre o jovem judeu que subira to rapidamente a tal posio. Ele provavelmente pensou, no incio, que algum teria de servir aos modos pagos para fazer isso. Mas Ezequiel claramente desco-briu que foi diferente e ficou impressionado a ponto de mencionar Daniel, em paralelo com No e J, como um grande homem de retido. Este fato ainda mais marcante quando se reconhece que pessoas que vivem numa gerao anterior tendem a se destacar mais brilhantemente do que seus contemporneos. Tanto No quanto J viveram sculos antes de Ezequiel list-los com Daniel.

    2 A viso de alguns estudiosos de que o Daniel mencionado por Ezequiel tem que ser identificado com uma personagem semimitolgica da literatura pica de Ras Shamra deve ser rejeitada. impensvel que Ezequiel tenha comparado um pago, um perso-nagem adorador de Baal, com os dois baluartes histricos, No e J, especialmente no que se refere retido.

    3 As duas primeiras foram dadas seis anos aps Ezequiel ter chegado ao pas (Ez 8.1), e a outra, onze anos aps sua chegada (Ez 26.1), dando tempo suficiente para a investi-gao e concluso de Ezequiel.

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    H evidncias de outras boas qualidades de Daniel. Seus trs anos de educao na Babilnia que, sem dvida, se seguiram a um bom treinamen-to em Jerusalm, equiparam-no bem para sua vida de trabalho. Junte-se a isso uma habilidade natural para administrao, porque uma vez con-cedida uma alta posio na corte, ele l permaneceu. Posteriormente, ele alcanou uma posio entre os principais presidentes do governo persa de Dario. Esta honra foi claramente o resultado da bno especial de Deus, mas o Senhor regularmente usa meios naturais para executar sua vontade. Outra qualidade foi sua f admirvel em Deus. Enquanto ainda um jovem de 17 anos, ele e seus trs amigos tiveram f que Deus lhes revelaria o so-nho de Nabucodonosor, e os quatro se reuniram em orao para pedir isso a Deus (2.14-23).

    Em vista do tipo de pessoa que Daniel era e do grau em que Deus se agradou de faz-lo prosperar no governo estrangeiro, segue-se que Deus desejou realizar algo especfico atravs dele. Duas reas de trabalho se apresentam. A primeira refere-se a Daniel ser usado para manter a honra do Deus verdadeiro na terra pag, quando desenvolvimentos naturais tendem a fazer com que os babilnios pensem em Deus de maneira desonrosa. Os pagos avaliavam qualquer divindade pelo tamanho do pas cujas pessoas o adoravam, o grau de prosperidade daquele pas, e o tamanho e o sucesso do exrcito. Quando Jud foi levado cativo pela Babilnia, o seu Deus no se equiparou bem a esses padres. Para os babilnios, suas divindades pareciam mais fortes. Esta situao no agradou a Deus, e ele usou Daniel como seu instrumento especial para trazer uma mudana.4 Particularmente, atravs da interpretao de dois sonhos para Nabucodonosor, da leitura da escrita milagrosa na parede do palcio de Belsazar, e do livramento da cova dos lees no reinado de Dario, Deus usou Daniel para despertar adorao dos lbios desses regentes estrangeiros. (cf. Dn 2.46-49; 3.28-30 [que se refere tambm ao uso que Deus fez dos trs amigos]; 4.1-3, 34-37; 5.29; 6.25-27).

    A outra rea de trabalho se refere ao desenvolvimento por parte de Daniel do bem-estar dos judeus, enquanto eles estavam em cativeiro. Al-gum poderia naturalmente esperar que a sorte dos cativos fosse difcil e opressiva, mas esse no foi o caso para a maioria, dos judeus na Babilnia. H evidncias de que eles viviam numa boa rea rural do pas, tinham

    4 Da mesma forma, sculos antes, no Egito, Deus usou Jos e posteriormente Moiss. Os faras da poca foram levados a mudar seu pensamento a respeito do Deus de Israel (cf. x 5.2) como resultado da operao de Deus atravs desses dois homens.

    Introduo

  • 14 Comentrio de Daniel

    suas prprias casas, gozavam de liberdade de locomoo, continuaram com suas instituies de ancios, sacerdotes e profetas, experimentaram oportunidades de empregos e at mesmo se correspondiam com a terra natal.5 Provavelmente, o fator humano responsvel por essa condio sur-preendente foi a influncia de Daniel, que ocupava uma excelente posio no governo. A razo principal para que Deus permitisse que ele fosse le-vado cativo oito anos antes do cativeiro abrangendo o grupo grande de judeus pode muito bem ter sido para que Daniel alcanasse tal posio. Ento, Daniel pode ter tido muito a ver com a efetivao do retorno dos ca-tivos de Jud no devido tempo. Ele ainda vivia na poca do retorno deles, e conforme tem sido notado, tinha o posto mais alto do governo de Dario (6.2-3). E o fato de uma mudana de governo ter acontecido nessa poca, quando Daniel tinha mais de oitenta anos, comprova isso. A mo de Deus foi evidente na promoo de Daniel, sugerindo que Deus ainda tinha tra-balho para ele. Este trabalho poderia muito bem ter sido influenciar o rei Ciro na questo do decreto que permitiria o retorno para Jud.

    C. Lnguas e a Diviso Judaico-Gentlica do Livro

    O livro de Daniel singular no Antigo Testamento por ter uma exten-sa seo escrita em aramaico.6 O aramaico vai de 2.4 a 7.28, assim, menos da metade do livro foi escrita em hebraico. A razo para o uso do aramaico melhor vista em termos do assunto da seo onde encontrado. O mate-rial lida com assuntos pertencentes ao mundo gentio, com pouca referncia ao povo de Deus, os judeus, e, aparentemente, Deus viu que o aramaico, a lngua do mundo gentio da poca, era mais apropriado para registr-lo do que o hebraico, que era distintamente judeu.

    Esse fato sugere o pensamento de que existe outra diviso do livro alm da observada anteriormente. A primeira observou que os seis pri-meiros captulos so basicamente histria e os ltimos seis, profecia. Essa diviso deve permanecer, porque os assuntos nela apresentados claramen-te cabem nesse padro literrio. Mas o uso das duas lnguas aponta para uma diviso igualmente vlida, que tem a ver com a identidade do povo referido, em vez dos critrios literrios. Por falta de termos melhores, essas duas divises podem ser chamadas pelos nomes judaica e gentlica.

    5 Cf. L. Wood, A Survey of Israels History (Panorama da Histria de Israel) (Grand Rapids: Zondervan Publishing House, 1970), pp. 385-87 para discusso.

    6 Dois outros livros do Antigo Testamento apresentam sees mais curtas: Esdras 4.8-6.18; 7.12-26; e Jeremias 10.11.

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    O primeiro captulo do livro claramente se coloca na categoria judai-ca, porque aqui quatro jovens judeus so levados cativos de sua terra e co-locados numa posio onde devem decidir se vo permanecer fiis ao seu Deus ou no. O oitavo captulo tambm desse grupo, porque se refere opresso dos judeus por um regente mpio, Antoco Epifnio (chamado aqui de chifre pequeno), e pelo Anticristo muito depois, durante o tem-po da Grande Tribulao. O captulo 9 pertence ao mesmo grupo, porque se refere s sete semanas de anos na histria dos judeus, indo do tempo de Esdras at o do Anticristo (com um intervalo considervel entre a sexag-sima nona e a septuagsima semana). Ento, o dcimo, dcimo primeiro e dcimo segundo captulos devem tambm ser classificados, porque apre-sentam as opresses dos judeus efetuadas primeiro por Antoco Epifnio, e depois pelo Anticristo novamente.

    Os sete captulos interpostos, entretanto, colocam os assuntos perten-centes histria dos gentios em evidncia. O segundo e stimo captulos, que, respectivamente comea e termina a seo, so paralelos em contedo e mostram outra nfase ao apresentar o propsito geral da histria gen-tlica, seguindo o tempo de Daniel. O segundo captulo faz isso atravs do simbolismo da esttua do sonho de Nabucodonosor, que previa o sur-gimento e a queda de quatro imprios gentlicos sucessivos (Babilnico, Medo-Persa, Grego, Romano) e ento a destruio do ltimo, manifesto em forma restaurada, pelo surgimento do reino pr-milenar de Cristo. O stimo captulo apresenta informao semelhante, sob o simbolismo de quatro animais sucessivos, destacando os mesmos quatro imprios gentli-cos com um clmax vindo novamente no futuro reino dominante de Cristo.

    Entre esses dois captulos, quatro captulos interpem-se, os quais re-tratam o poder gentlico em ao, com suas limitaes definidas diante do poderoso Deus. Os quatro captulos se dispem em dois pares, com respeito ao tipo de retrato que eles apresentam. O terceiro e sexto captulos apresentam o poder gentlico trazendo perseguio ao povo de Deus. O anterior conta como Nabucodonosor quis forar os trs amigos de Daniel a se inclinarem sua imagem, e o posterior descreve como os oficiais sob o rei Dario tentaram tirar a vida de Daniel por meio de uma conspirao traioeira. Ambas as ocasies envolvem punio injusta aplicada sobre os representantes de Deus, com o correspondente livramento sobrenatural efetuado em favor deles como recompensa por sua fidelidade. O quarto e o quinto captulos relatam as revelaes sobrenaturais de Deus dadas aos reis gentios e a necessidade em cada momento de um homem de Deus para interpret-las. O primeiro refere-se ao segundo sonho de Nabucodo-

    Introduo

  • 16 Comentrio de Daniel

    nosor, que permanece um enigma at que Daniel chega para dar seu sig-nificado; e o ltimo, a escrita milagrosa na parede do palcio de Belsazar, que novamente precisa da interpretao de Daniel, agora muito idoso. O primeiro par de captulos ilustra o fato de que o mundo tem trazido per-seguio ao povo de Deus h tempos e que Deus, por sua vez, concedeu proteo graciosa aos que eram fiis. O segundo ilustra a dependncia do mundo do Deus poderoso e a necessidade dos filhos de Deus dizerem s pessoas do mundo sobre a verdade de Deus, se eles tiverem de conhec-la.

    D. O Autor do Livro

    A erudio crtica moderna nega a autoria de Daniel deste livro. Eles creem que um escritor desconhecido escreveu-o cerca de 165 a.C. com o propsito de encorajar judeus desanimados que haviam sofrido recente-mente sob Antoco Epifnio. A principal razo para este ponto de vista que o livro apresenta a histria, pelo menos at o tempo de Antoco, com detalhes marcantes, e o pensamento liberal declara que tal material pode-ria ter sido escrito somente aps os eventos terem ocorrido. Aqueles que aceitam a ideia de revelao sobrenatural no tm esse problema.

    H razes para crer, contrrio a esse pensamento liberal, que o pr-prio Daniel foi mesmo o autor do livro.

    1. O livro diretamente apresenta Daniel como o autor de pelo menos a segunda metade dele, porque ele feito o recipiente das revelaes divinas dadas repetidamente, e ele, como o autor, fala regularmente na primeira pessoa nos captulos sete a doze. Tambm em 12.4, Daniel recebe a direo de preservar o livro, uma referncia a, pelo menos, uma poro substan-cial do livro, se no todo.

    2. Que Daniel deve ter escrito tambm a primeira metade supe-se pela unidade do livro, conforme demonstrado por vrias consideraes. (1) As duas metades do livro so interdependentes, o que visto, por exemplo, numa comparao da interpretao feita por Daniel do sonho de Nabucodonosor no captulo dois com as revelaes dadas diretamente atravs dele nos captulos sete at o doze. (2) A terminologia usada em 2.28; 4.2, 7, 10 da primeira metade semelhante usada em 7.1, 2, 15 da segunda. (3) A unidade que existe na apresentao de Daniel como uma pessoa no livro todo. (4) Todos os captulos combinam no propsito de mostrar a supremacia do Deus do cu sobre todas as naes e suas su-postas divindades. (5) A unidade literria do livro reconhecida at por importantes eruditos liberais, tais como Charles, Driver, Pfeiffer e Rowley.

    3. O autor mostra conhecimento marcante da histria babilnica

  • 17

    e incio da persa, o que seria verdadeiro de um contemporneo como Daniel. No quarto captulo, Nabucodonosor apresentado corretamente como o criador do imprio neobabilnico.7 No quinto captulo, Belsazar apresentado como corregente da Babilnia, um fato recentemente demonstrado pela pesquisa arqueolgica. No sexto captulo, Dario apresentado como regente da Babilnia, ainda que Ciro fosse o supremo rei da Prsia; sabe-se agora que Ciro apontou um Gubaru nesta capacidade, com quem Dario pode bem ser identificado.8 No segundo captulo (cf. vv. 12, 13, 46), mostra-se que Nabucodonosor foi capaz de mudar as leis babilnicas que ele previamente fizera (sabe-se agora que tal mudana foi possvel na Babilnia); j no sexto captulo (cf. vv. 8, 9, 12, 15), apresenta-se Dario no podendo fazer o mesmo (sabe-se agora que tal mudana era impossvel na Prsia).

    4. Fragmentos de manuscritos do livro foram achados na caverna I e na caverna IV de Wadi Qumran, e datam, pelo menos, do primeiro sculo, e provavelmente do segundo, a.C., o que faz com que a data de 165 a.C. para a composio do livro, como defendem os liberais, seja mais impro-vvel.

    5. O prprio Cristo falou de Daniel como tendo predito que a abo-minao da desolao se colocaria no santo lugar (Mt 24.15; Mc 13.14), e comum e corretamente aceito que ele se referiu ao que afirmado em Daniel 9.27 e 12.11.

    A erudio crtica moderna tambm apresenta numerosos argumen-tos para sua posio; mas eles podem ser respondidos sem dificuldade quando algum aceita a ideia bsica de revelao sobrenatural.

    1. Faz-se a afirmao de que em 1.21, o escritor refere-se data da morte de Daniel, e a suposio que nenhum autor poderia dizer isso de si mesmo. O autor declara, no entanto, somente que Daniel viveu at o primeiro ano de Ciro, sem indicar que ele morreu. Em 10.1, de fato, faz-se claro que ele no morreu naquele tempo, mas viveu pelo menos at o ter-ceiro ano de Ciro.9

    2. Faz-se a declarao de que o autor evita usar o nome Yahweh para Deus, e que isso pode ser esperado de um autor ps-exlico, mas no de

    7 Cf. R. H. Pfeiffer, Introduction to the Old Testament (Introduo ao Antigo Testamento) (New York: Harper and Brothers, 1941), pp. 758,59 para comentrio, como um liberal.

    8 Cf. J. Whitcomb, DM, uma obra dedicada a substanciar este ponto.9 Cf. discusso adicional no comentrio de 1.21.

    Introduo

  • 18 Comentrio de Daniel

    Daniel, que viveu antes de cessar a pronncia do nome (como de fato ocor-reu depois do exlio). No captulo nove, entretanto, o nome usado pelo menos sete vezes. Na mesma base, ento, isso argumenta contra uma auto-ria ps-exlica. Este raciocnio dos liberais no leva em conta o fato de que o emprego de nomes para Deus no Antigo Testamento depende do contexto de pensamento, cada nome carregando uma determinada conotao apro-priada ao texto.

    3. Apresentam-se evidncias de que o livro de Daniel tem um estilo literrio semelhante ao dos livros apcrifos, cujas datas so muito poste-riores a Daniel. Pode-se responder que, embora a semelhana realmente exista, poderia muito bem ser porque os livros posteriores copiaram o es-tilo estabelecido antes por Daniel. Esta explicao encontra apoio na pos-sibilidade de que os escritores do perodo macabeu (do qual esses livros datam), tendo visto a correspondncia exata das predies de Daniel com a histria recentemente experimentada, teriam respeitado o livro grande-mente e teriam sido levados a seguir o padro do livro para seus prprios livros.

    4. Faz-se referncia frequente a algumas palavras persas e gregas no livro, afirmando-se que estas poderiam ter sido conhecidas apenas por um escritor que viveu aps o tempo de Daniel. O prprio Daniel, entretanto, escreveu nos tempos iniciais da Prsia e teria conhecido o vocabulrio per-sa; e as palavras gregas limitam-se ao nome de trs instrumentos musicais, que podem ter sido importados anteriormente, pela Babilnia. Descober-tas arqueolgicas mostram que havia comrcio considervel e intercmbio cultural nesse tempo entre os pases da regio, incluindo Grcia e Babil-nia. Tambm foi dito que o aramaico de Daniel ocidental e no o tipo usa-do na Babilnia no tempo de Daniel. Descobertas recentes de documentos aramaicos do quinto sculo, entretanto, mostraram que Daniel foi, como Esdras, escrito numa forma de aramaico imperial (Reichsaramisch), um dialeto oficial ou literrio que era corrente em todas as partes do Oriente Prximo.10

    10 Archer, SOTI, p. 376. Cf. E. M. Yamauchi, Greece and Babylon (Grcia e Babilnia) (Grand Rapids: Baker Book House, 1967), pp. 17-24; tambm R. D. Wilson, The Aramaic of Daniel, in Biblical and Theological Studies. (O Aramaico de Daniel em Estudos Bblicos e Teolgicos), p. 296, que afirma que, se Daniel tivesse vivido de-pois, muitas outras palavras gregas teriam aparecido no livro do que so de fato encontradas.

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    5. Faz-se objeo alegada teologia avanada do livro, especialmente com respeito aos anjos e ressurreio dos mortos. Diz-se que as ideias apresentadas foram desenvolvidas apenas por volta dos tempos dos macabeus. Esse argumento supe, no entanto, um tipo de evoluo no conceito teolgico contrrio s Escrituras. O povo de Deus chegou mesmo a entender tais conceitos em maior plenitude medida que Deus revelou mais a respeito deles, mas Deus dera muita informao sobre anjos e ressurreio, bem antes mesmo de Daniel (cf., sobre anjos Gn 19.1-22; 2Sm 24.16,17; 2Rs 19.35; J 1.6; 2.1; Sl 91.11; Zc 1.9,12-14 e, sobre ressurreio J 14.11-14; 19.25-27; Sl 16.10; 49.15; Is 25.8; 26.19; Os 13.14; Hb 11.17-19).

    6. Diz-se que o fato do livro de Daniel aparecer no Antigo Testamento com os escritos da terceira seo, em vez de com os profetas da segun-da, indica autoria posterior; supondo que o livro teria sido includo na se-gunda seo, se escrito antes de seo ser encerrada, e notando que a seo no foi encerrada at o terceiro sculo a.C., aps o qual somente a terceira seo continuou aberta. Outra razo possvel para a colocao do livro, entretanto, que Daniel, servindo numa posio secular como administra-dor no palcio, no foi classificado como um profeta; e somente os livros escritos por aqueles que vieram a ser colocados na seo dos profetas. Daniel chamado de profeta por Cristo em Mt 24.15 (Mc 13.14), mas isso deve-se s predies marcantes dadas atravs dele, no por causa de sua ocupao.

    7. Diz-se que o fato do escritor apcrifo, Jesus Sirach, no seu bem co-nhecido livro Eclesistico, captulo 44, no mencionar Daniel quando cita muitos outros heris bblicos, indica que ele desconhecia Daniel. Re-plicando, pode ser afirmado que esse escritor tambm no menciona certas outras figuras bblicas bem conhecidas tal como os juzes, exceto Samuel; e nem mesmo Esdras, que foi de fato mais prximo dele em tempo do que Daniel. No se sabe por que ele omitiu Daniel, mas isso no prova que ele no o conhecia.

    8. Um argumento construdo sobre erros histricos apontados no livro no usado com a mesma frequncia hoje como era anteriormente, porque descobertas arqueolgicas tm repetidamente demonstrado que tais erros no eram erros de modo nenhum. Por exemplo, dizia-se que o relacionamento pai-filho entre Nabucodonosor e Belsazar, conforme indicado em 5.2, 11, 13, 18, era impossvel, uma vez que os dois foram de diferentes dinastias, mas a possibilidade de que isso era verdadeiro atravs da me de Belsazar reconhecida agora. Mesmo que esse no fosse o caso, um texto assrio mostra que um sucessor real de um trono poderia

    Introduo

  • 20 Comentrio de Daniel

    ser normalmente chamado de filho de um predecessor mesmo que no houvesse uma ligao de sangue.11 Ou, novamente, foi alegado um erro na referncia a Belsazar como ltimo rei da Babilnia, quando a histria mostrou que foi Nabonido. Mas sabe-se agora que Nabonido deixou seu filho mais velho, Belsazar, como rei da Babilnia, enquanto ele prprio permanecia fora da capital por extensos perodos de tempo, fazendo de seu filho um corregente com este propsito. Outros problemas deste tipo poderiam ser acrescentados.12

    E. Propsito do Livro

    Quatro propsitos principais do livro so revelados pela natureza de seu contedo. Primeiro, o livro apresenta ilustraes desafiadoras do que significa a verdadeira dedicao a Deus e mostra o que Deus quer fazer atravs e por aqueles que so comprometidos com ele. Segundo, o livro re-trata o interesse de Deus e seu cuidado com o seu povo escolhido, mesmo quando os judeus esto sendo punidos pelo pecado. Isso mostrado na parte histrica pelos eventos descritos, e na parte preditiva pela natureza das profecias, nas quais os interesses judaicos so continuamente coloca-dos frente. Terceiro, o livro, dessa forma, trouxe para os judeus da poca uma base slida para o conforto. Embora estivessem sendo punidos numa terra estrangeira, puderam saber que Deus no os havia esquecido e que, de fato, tinha planos maravilhosos para eles em dias futuros; esses planos incluam especialmente a vinda de seu Messias libertador. Quarto, o livro paralelo ao livro de Apocalipse no Novo Testamento ao dar informaes sobre os ltimos dias. Estudos escatolgicos seriam grandemente empo-brecidos se o Antigo Testamento no inclusse o livro de Daniel.

    F. Contexto Histrico do Livro

    Os eventos apresentados no livro de Daniel so apenas uma parte de uma histria muito maior ocorrida naquela poca, e podem ser entendidas somente luz da histria completa. Com a publicao, em 1956, do livro de D. J. Wiseman, The Chronicles of Chaldean Kings" (As Crnicas dos Reis Caldeus), mais desta histria se tornou consideravelmente disponvel. Quatro textos novos dos registros babilnicos oficiais foram publicados nessa obra, e estes, com os textos publicados previamente, cobrem os anos 626595 e 556539 a.C.

    11 O rei Salmaneser III, no seu Obelisco Negro, fala de Je como filho de Onri; cf. ANET, p. 281.

    12 Para tratamento extenso de assuntos histricos, cf. Pusey, DP, 1891; ou Wilson, SD, 1917. Embora ambas sejam antigas, essas obras so muito valiosas.

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    Nnive, capital do imprio anterior, o assrio, caiu em 612 a.C. sob uma fora aliada de babilnios, medos e citas. A cidade foi devastada, mas alguns assrios, aparentemente sob a liderana do ltimo regente, Assur-uballit, escaparam para o ocidente. No outono do mesmo ano, esse grupo que escapou reivindicou soberania sobre toda a Assria a partir de um centro em Harran, cerca de 400 Km a oeste de Nnive. No ano seguinte, 611 a.C., Nabopolassar, rei da Babilnia, liderando somente as foras babilnicas, fez campanha nas proximidades de Harran, mas sem realmente lutar contra os prprios assrios. No ano seguinte, 610, os aliados se juntaram novamente aos babilnios, e os assrios, mesmo reforados por tropas egpcias, retiraram-se de Harran para o oeste, para o outro lado do Eufrates, enquanto os aliados entraram e saquearam Harran. Em 609, os assrios, aparentemente apoiados por mais tropas egpcias, atravessaram de novo o Eufrates numa tentativa de tomar Harran outra vez, mas fracassaram. O prprio Nabopolassar voltou seu interesse principal naquele ano para campanhas no nordeste de Harran, sugerindo que, possivelmente, Assur--uballit, aps seu fracasso em Harran, fugira para aquela direo. Pelo menos, As Crnicas no o mencionam em outro conflito depois dessa poca.

    Neste ponto, a histria bblica d alguma informao. Josias, bom rei de Jud, tentou impedir as tropas egpcias, sob Fara Neco, de ir em aux-lio dos assrios para a campanha de 609 a.C. Josias levou seu exrcito para Megido a fim de interceptar a grande potncia na passagem estratgica do Carmelo, mas foi derrotado e morto em sua tentativa (2Rs 23.28-30; 2Cr 35.20-24). Com essa medida, o rei judeu estava aparentemente buscando o favor babilnico, acreditando que o futuro de Jud estava com a potncia oriental. Fara Neco continuou ento rumo ao norte, aps essa derrota de Josias, para se juntar aos assrios no ataque mal-sucedido a Harran, acima citado.

    Aps 609 a.C., as foras assrias no desempenharam nenhuma fun-o importante na luta contnua. O Egito era agora o oponente principal da Babilnia, que tambm entrou plenamente na luta s a partir dessa poca. Por trs anos, os dois gigantes se contentaram meramente em empreender pequenas batalhas um contra o outro, sem se engajarem em uma guerra maior. Disputas menores ocorreram, com cidades estratgicas localizadas de um e de outro lado do Eufrates mudando de mos mais de uma vez, mas os exrcitos principais no se enfrentaram. Os babilnios empreen-deram grandes esforos para fortalecer sua posio na rea de Izalla, no nordeste. Vale a pena notar que o prncipe real, Nabucodonosor, ganhou

    Introduo

  • 22 Comentrio de Daniel

    proeminncia pela primeira vez nesses esforos, sendo mencionado como comandante de um dos exrcitos babilnicos na campanha de 607 a.C.

    Finalmente, em 605 a.C., a questo foi decidida na grande batalha de Carquemis. O idoso Nabopolassar permaneceu em casa neste ano, com as foras babilnicas sendo conduzidas pelo jovem e brilhante Nabuco-donosor. Ele conduziu suas tropas atravs do Eufrates nas proximidades de Carquemis e envolveu os egpcios numa luta corpo a corpo, aparente-mente tanto fora como dentro da cidade. Os egpcios foram decididamente derrotados, e Carquemis foi incendiada pelos babilnios. Os egpcios se retiraram para o sul de Hamate, mas os babilnios os pressionaram e mais uma vez derrotaram seu exrcito para que nenhum homem fugisse para seu prprio pas. O resultado foi que Nabucodonosor conquistou a rea total de Hatti, ou seja, toda a Sria e Palestina.13

    Essa vitria importante de Nabucodonosor ocorreu algum tempo aps o comeo do vigsimo primeiro ano de Nabopolassar, isto , aps o ms de Nis (abril) de 605 a.C. Ento, no oitavo dia do ms de Ab (15 de agosto) seguinte, Nabopolassar morreu, e Nabucodonosor achou necess-rio retornar rapidamente Babilnia, recebendo a coroa no primeiro dia do ms de Elul (6 de setembro). Aps algumas atividades iniciais como rei, entretanto, e aparentemente acreditando que os assuntos do governo esta-vam bem, ele retornou ao ocidente e continuou seu trabalho de subjugar a regio srio-palestina, at o ms de Sebat (Fevereiro), de 604 a.C. Naquele tempo, ele retornou capital para o Festival do Ano Novo, realizado no dia primeiro de Nis, mas marchou novamente para o ocidente no ms de Sivan (junho) para mais seis meses de campanha. A Crnica diz que nesse tempo, todos os reis da terra de Hatti vieram diante dele e ele recebeu pesado tributo deles.

    G. O Cativeiro de Daniel

    Comparando essa histria com a de Daniel, conforme registrado em seu livro, pode-se descobrir quando ele e seus companheiros foram leva-dos cativos de Jerusalm. Foi durante o vero de 605 a.C., algum tempo en-tre a batalha de Carquemis e o retorno de Nabucodonosor Babilnia para receber sua coroa. Os seguintes fatores so mencionados como evidncia disso:

    1. Essa ocasio no poderia ter precedido a vitria de Carquemis,

    13 Citaes das Crnicas, cf. Wiseman, The Chronicles of Chaldean Kings (As Crnicas dos Reis Caldeus). (Londres: Trustees of the British Museum, 1956), pp. 25,69.

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    porque os reis babilnicos que naquele tempo cercaram Jerusalm (Dn 1.1) no tinham nenhum acesso to distante a oeste como Jerusalm antes dessa vitria ter sido alcanada.

    2. Nem poderia ter sido depois do retorno de Nabucodonosor Babi-lnia para receber a coroa por exemplo, durante os meses seguintes de 605 a.C., quando ele voltou para continuar a subjugar o ocidente porque Daniel 1.1 menciona a data como o terceiro ano de Jeoaquim; e este ano no poderia ir alm do ms de Tishri (Outubro), 605 a.C., como mostra-do a seguir. A partir de 2 Reis 23.28-37 (2Cr 36.1-5), sabe-se que Jeoaquim comeou a reinar no outono de 609 (seguindo o reinado de trs meses de Jeoacaz, que havia sucedido imediatamente a Josias, morto por Fara Neco em Megido, em julho de 609), o que significa que seu ano inicial, chamado ano de acesso (no sistema de ano-acesso ento em uso), terminaria no ms de Tishri (primeiro ms do ano civil), de 608 a.C., fazendo seu primeiro ano oficial ser estendido at Tishri, de 607, seu segundo at Tishri, de 606, e seu terceiro at Tishri, de 605.

    3. Corroborando esses dois limites cronolgicos, est a meno em Jeremias 46.2 de que a batalha de Carquemis, que tinha de preceder o cati-veiro de Daniel conforme observado, ocorreu no quarto ano de Jeoaquim. A explicao do que parece uma discrepncia com a meno de Daniel do terceiro ano de Jeoaquim, mostra que o nico perodo que poderia ser corretamente designado tanto como o terceiro ano de Jeoaquim quanto o seu quarto ano, foram os seis meses entre os meses de Nis e Tishri, de 605 a.C. Os hebreus mantinham dois calendrios, um religioso comeando com Nis na primavera, e um civil comeando com Tishri no outono.14 As-sim, um evento ocorrendo entre Nis e Tishri seria datado com um ano de diferena, dependendo de qual sistema de calendrio fosse usado. Somen-te entre os meses de Nis e Tishri de 605 a.C., seriam corretas as indicaes de data tanto de Daniel 1.1 quanto de Jeremias 46.2.

    Admite-se que trs meses (de junho a agosto)15 no dariam muito tempo a Nabucodonosor varrer o sul at Jerusalm e cerc-la conforme indicado em Daniel 1.1 (cf. 2Rs 24.1; 2Cr 36.6-7). Alguns aspectos podem ser indicados, entretanto, que do evidncia adicional de que foi isso

    14 Cf. Thiele, The Mysterious Numbers of the Hebrew Kings (Os Nmeros Misteriosos dos Reis Hebreus), rev. ed. (Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Pub. Co., 1965), pp. 16f., 165-66.

    15 A Batalha de Carquemis provavelmente no ocorreu antes de maio de 605 a.C. e possivelmente no at o incio de junho.

    Introduo

  • 24 Comentrio de Daniel

    que de fato aconteceu. Primeiro, a Crnica Babilnica afirma que, como resultado da vitria de Carquemis, Nabucodonosor conquistou toda a rea do pas de Hatti16 Isto , sem dvida, uma referncia importncia do seu papel, mas conclui-se que Nabucodonosor teria querido tornar real essa conquista o mais breve possvel. tambm claro que o rei babilnico realmente permaneceu no ocidente aps a vitria at ser chamado para casa a fim de receber a coroa, e certamente teria aproveitado bem esse tempo. Alm disso, que ele, de fato, agiu assim demonstrado pelo seu retorno imediato ao ocidente para continuar a conquista aps a coroao, tanto no outono seguinte quanto no vero. O fato dele querer retornar to cedo mostra que ele tinha sido interrompido no que vinha fazendo. Quarto, que Nabucodonosor tinha, de fato, levado alguns cativos, incluindo judeus, do recm-conquistado ocidente, no tempo da morte de seu pai, indicado por uma citao de Berossus;17 afirmando que Nabucodonosor entregou os cativos que ele havia feito entre os judeus, fencios e srios, e entre as naes pertencentes ao Egito, a alguns de seus amigos a fim de que pudesse se apressar e voltar rapidamente para sua capital.

    Em vista dessas consideraes, pode-se concluir que aps a derrota dos egpcios em Carquemis e Hamate sob Nabucodonosor, ele realmente se dirigiu rumo ao sul para consolidar a conquista de cidades-chave na Sria e Palestina. Provavelmente ele perseguiu guerreiros egpcios at certa distncia, procurando trazer a mais completa destruio possvel ao inimigo, e ento se voltou para promover a submisso dos habitantes locais. Jerusalm pode muito bem ter sido uma das cidades atingidas, uma vez que Josias tinha tentado ajudar Babilnia havia apenas quatro anos em Megido. Ainda que Daniel 1.1 fale a respeito do cerco da cidade, isso provavelmente significa apenas que ele exigiu sua submisso. Vale notar que nenhuma batalha sugerida nem por Daniel 1.1-2; 2 Reis 24.1 nem por 2 Crnicas 36.6-7. Jeoaquim, ento rei, cuja poltica pode ter sido diferente daquela do amvel Josias, aparentemente resistiu no incio, porque 2 Crnicas fala dele sendo preso; mas deve ter sido libertado posteriormente, pois nenhuma mudana de regente foi imposta pelo conquistador babilnico. Nabucodonosor, porm, realmente tomou os utenslios sagrados do Templo, assim como numerosos cativos, entre os

    16 A prpria terminologia de Nabucodonosor, cf. Thomas, ed., Documents From Old Tes-tament Times (Documentos dos Tempos do Antigo Testamento), (New York: Harpers & Brothers, 1958), p. 79.

    17 Citado por Josefo, Contra Apion, I, 19; Antiq. X, 11, 1.

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    quais foram escolhidos principalmente jovens, incluindo Daniel, Ananias, Misael e Azarias.

    O propsito em tomar estes jovens, contudo, no era punir,18 mas lev--los Babilnia para que, dentre eles, no devido tempo, pessoal qualificado para o governo pudesse ser selecionado (Dn 1.4). Nabucodonosor foi um dos mais capazes regentes antigos, e poderia esperar-se que ele quisesse os maiores talentos que seu novo imprio pudesse fornecer no seu regime. Poderia esperar-se tambm que ele quisesse que tais jovens fossem tomados de todas as cidades que ele conquistou, e no somente Jerusalm. Sem dvida, a brevidade do tempo antes de ser chamado de volta Babilnia naquele primeiro vero no lhe permitiu reunir outros ali, mas ele teria acrescentado mais jovens ao nmero em suas campanhas sucessivas de retorno. De fato, mesmo o grupo de Daniel aparentemente no chegou Babilnia antes da coroao, se o relato de Berossus, mencionado acima, est correto. Provavelmente Nabucodonosor escolheu-os durante seu retorno no outono seguinte; o que, se for assim, significa que Daniel chegou Babilnia ao mesmo tempo que aqueles que foram trazidos de outras cidades, na primavera do ano de acesso de Nabucodonosor, ou seja, 604 a.C.

    18 Nabucodonosor pode ter pensado deles como refns, servindo para advertir o povo em casa contra revolta.

    Introduo