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Sessões de 26 e 27 de maio de 2015 Ano I – nº 6 SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS – ATA – NATUREZA – DIREITO DO BENEFICIÁRIO – LEI 8.666/1993, ART. 15, § 4º. “A ata de registro de preços caracteriza-se como um negócio jurídico em que são acordados entre as partes, Administração e licitante, apenas o objeto licitado e os respectivos preços ofertados. A formalização da ata gera apenas uma expectativa de direito ao signatário, não lhe conferindo nenhum direito subjetivo à contratação.” Fonte: Acórdão nº 1285/2015-Plenário, TC 018.901/2013-1, relator Ministro Benjamin Zymler, 27.5.2015. Dantas. Julgado em: 03.06.2015. O Sistema de Registro de Preços – SRP constitui-se em uma ferramenta auxiliar as licitações públicas. Atualmente regulamentado, no âmbito federal, pelo De- creto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2013, essa ferramenta já era prevista no Decreto-lei 2.300/1986 e mantida na própria Lei de Licitações. Essa ferramenta consiste na possibilidade de a Adminis- tração registrar o preço de determinado bem ou servi- ço, pelo prazo máximo de 12 meses, período no qual o fornecedor que assinou a Ata de Registro de Preços é obrigado a atender a demanda, pelo preço registrado, até o total do quantitativo previsto. Por outro lado, a Ad- ministração não se obriga a adquirir todo o quantitativo. Da utilização do SRP O Decreto regulamentador do SRP estipula a sua adoção quando: 1 a) houver necessidade de contratações frequentes, pela característica do bem ou serviço; b) for conveniente a entrega parcelada de objeto; c) o serviço for remunerado por unidade de medida ou regime de tarefa; d) não for possível definir previamente o quantita- tivo a ser demandado. 1 Art. 3º do Decreto nº 7.892/2013. Nessa análise, nos limitaremos a essa última hipótese: para as demandas onde a Administração Pública não con- segue precisamente determinar o quantitativo do objeto. Antes de mais nada, é imprescindível destacar que a in- definição do quantitativo não é absoluta, ou seja, não se enquadra na hipótese situações onde a Administração não consegue identificar se sua necessidade é 1 unidade ou de dez milhões de unidades. Exige-se da Administração que realize um estudo de for- ma a trazer o quantitativo mais preciso possível. Nessa situações onde, após esse estudo ainda for impossível de- finir precisamente o quantitativo, deve-se adotar o SRP. Como exemplos desses cenários, temos o caso de deter- minado órgão em Brasília, que registrou preço de umi- dificadores de ar para o período seco. Não era possível saber quantos servidores teriam necessidade no aparelho, pois as vezes tinha-se mais de um servidor sentado pró- ximo, que poderiam dividir o aparelho ou ainda aqueles que não quisessem. Contudo, o órgão sabia que a quanti- dade total não poderia exceder ao número de seus servi- dores. Assim, registrou o preço dos aparelhos no quanti- tativo total de seus servidores e demandou do fornecedor de acordo com a demanda dos servidores interessados. Outro exemplo mais usual é o registro de preços de peças de automóveis, para substituírem aquelas que porventu- Comentários aos principais julgados doTribunal de Contas da União –TCU

Comentários aos Julgados do TCU - nº 6

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Sexta edição do informativo que contém comentários e análises sobre as principais novidades na jurisprudência do Tribunal de Contas da União - TCU.

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Sessões de 26 e 27 de maio de 2015 Ano I – nº 6

SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS – ATA – NATUREZA – DIREITO DO BENEFICIÁRIO – LEI 8.666/1993, ART. 15, § 4º.

“A ata de registro de preços caracteriza-se como um negócio jurídico em que são acordados entre as partes, Administração e licitante, apenas o objeto licitado e os respectivos preços ofertados. A formalização da ata gera apenas uma expectativa de direito ao signatário, não lhe conferindo nenhum direito subjetivo à contratação.” Fonte: Acórdão nº 1285/2015-Plenário, TC 018.901/2013-1, relator Ministro Benjamin Zymler, 27.5.2015.Dantas. Julgado em: 03.06.2015.

O Sistema de Registro de Preços – SRP constitui-se em uma ferramenta auxiliar as licitações públicas.

Atualmente regulamentado, no âmbito federal, pelo De-creto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2013, essa ferramenta já era prevista no Decreto-lei 2.300/1986 e mantida na própria Lei de Licitações.

Essa ferramenta consiste na possibilidade de a Adminis-tração registrar o preço de determinado bem ou servi-ço, pelo prazo máximo de 12 meses, período no qual o fornecedor que assinou a Ata de Registro de Preços é obrigado a atender a demanda, pelo preço registrado, até o total do quantitativo previsto. Por outro lado, a Ad-ministração não se obriga a adquirir todo o quantitativo.

Da utilização do SRP

O Decreto regulamentador do SRP estipula a sua adoção quando:1

a) houver necessidade de contratações frequentes, pela característica do bem ou serviço;

b) for conveniente a entrega parcelada de objeto;

c) o serviço for remunerado por unidade de medida ou regime de tarefa;

d) não for possível definir previamente o quantita-tivo a ser demandado.

1 Art. 3º do Decreto nº 7.892/2013.

Nessa análise, nos limitaremos a essa última hipótese: para as demandas onde a Administração Pública não con-segue precisamente determinar o quantitativo do objeto.

Antes de mais nada, é imprescindível destacar que a in-definição do quantitativo não é absoluta, ou seja, não se enquadra na hipótese situações onde a Administração não consegue identificar se sua necessidade é 1 unidade ou de dez milhões de unidades.

Exige-se da Administração que realize um estudo de for-ma a trazer o quantitativo mais preciso possível. Nessa situações onde, após esse estudo ainda for impossível de-finir precisamente o quantitativo, deve-se adotar o SRP.

Como exemplos desses cenários, temos o caso de deter-minado órgão em Brasília, que registrou preço de umi-dificadores de ar para o período seco. Não era possível saber quantos servidores teriam necessidade no aparelho, pois as vezes tinha-se mais de um servidor sentado pró-ximo, que poderiam dividir o aparelho ou ainda aqueles que não quisessem. Contudo, o órgão sabia que a quanti-dade total não poderia exceder ao número de seus servi-dores. Assim, registrou o preço dos aparelhos no quanti-tativo total de seus servidores e demandou do fornecedor de acordo com a demanda dos servidores interessados.

Outro exemplo mais usual é o registro de preços de peças de automóveis, para substituírem aquelas que porventu-

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expedienteComentários aos principais julgados do Tribunal

de Contas da União - TCU

Produção: Jorge Ulisses Jacoby Fernandes Murilo Jacoby Fernandes

Diagramação e layout: Alveni LisboaOs artigos publicados neste informativo são de

responsabilidade exclusiva de seus autores.

trega, ou até superveniente vedação à venda para enti-dade não participante, pode ensejar reparação por justa expectativa do beneficiário da ARP.

Da observância à eficiência e ao interesse público

A ausência de compromisso da Administração em ad-quirir o quantitativo do objeto exige na utilização do SRP um cuidado ainda maior em relação à eficiência e ao interesse público.

Não pode o gestor público, por não estar obrigado a adquirir o objeto, ser displicente na utilização da SRP, como, por exemplo:

a) registrar um quantitativo absurdamente supe-rior ao efetivamente estimado para a demanda;

b) realizar o registro de preços que efetivamente não necessita;

c) prever quantitativo de entrega que torne inexe-quível a execução do objeto.

A ausência de dever, por parte da Administração, exige dos gestores que utilizam do SRP ainda mais responsa-bilidade e diligência.

Do quantitativo superior ao necessário

Um SRP onde o quantitativo registrado é muito superior ao efetivamente necessário acaba por prejudicar a Ad-ministração em médio prazo. Isso porque, o fornecedor ao cotar o preço de determinado item leva em conside-rações fatores como economia de escala, descontos na entrega de grande quantitativo de produtos. Assim, ao registrar o preço para 10 mil unidades de determinado

ra estraguem. Estudo de anos anteriores podem oferecer boas estimativas, entretanto, é impossível prever, preci-samente, quantas serão danificadas, até porque a frota de veículos de altera durante o ano.

Do direito do fornecedor

Considerando que uma das hipóteses de utilização do SRP é justamente quando não se consegue precisar a demanda, a consequência natural é que o instrumento que formaliza essa relação, ou seja, a Ata de Registro de Preços - ARP, não gera a obrigação da Administração de efetivamente adquirir o quantitativo total dos bens ou serviços regis-trados. Havendo, portanto, mera expectativa de direito ao signatário da ARP. O fornecedor signatário da ARP é de-nominado na norma de beneficiário.

Diferente do contrato, que gera a obrigação da Adminis-tração adquirir o bem ou serviço do contrato e do for-necedor de entregar o bem ou serviços nas condições ali previstas, a ARP mantém a obrigação do fornecedor, re-duzindo aquela da Administração, conforme se verifica do art. 15, § 4º da Lei nº 8.666/1993 e do art. 16 do De-creto nº 7.892/2013.

Ou seja, em uma ARP de 100 cadeiras, por exemplo, a Administração pode adquirir uma, dez ou cem, sem que, em qualquer hipótese, surja o direito do fornecedor a res-sarcimento por prejuízos, pois a regra dessa disputa iso-nomicamente assentada para todos é de que não haverá garantia de quantidade a ser adquirida. Essa cláusula de imprevisibilidade é única que restringe direito do bene-ficiário, razão porque qualquer outra alteração realizada pela Administração, de forma unilateral, ou decorrente de ato do príncipe não pode prosperar no âmbito jurídico. Em havendo, por exemplo, mudança de endereço de en-

Dúvidas, críticas ou sugestões:http://www.jacoby.pro.br [email protected]

(61) 3366-1206Coordenação: Álvaro Luiz da Costa Júnior

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produto, quando sabe que sua necessidade é de aproxi-madamente 100 unidades, o gestor público abusa da con-fiança do particular na Administração. Por consequência, nas próximas licitações, os fornecedores vão cotar seus custos considerando um quantitativo muito pequeno, si-tuação que a Administração perderá a possível economia de escala.

A conduta de registrar quantitativo muito superior ao efetivamente necessário, desse modo, viola os princípios da eficiência e economicidade.

Ressalta-se, contudo, que é absolutamente razoável quando inexistir precisão na demanda, estipular um per-centual superior para ser registrado, de modo a se evi-tar aditivos a futuros contratos. Por exemplo, quando a estimativa de consumo de papel de um órgão é de 10 toneladas/ano, registrar 11 ou até 12 toneladas, não só é razoável, como incentivado para um gestor que se plane-je para o futuro.

Do registro desnecessário

Viola o princípio da eficiência e até da moralidade Admi-nistrativa, o gestor público que realiza uma licitação para registro de preços quando não necessita efetivamente do objeto.

Isso porque a licitação é um procedimento oneroso2, tanto para a Administração, quanto para o particular que dela participa.

Verifica-se, assim, vários indícios de irregularidade quando o gestor realiza um registro de preços e não ad-quire qualquer quantitativo da ARP.

Do quantitativo inexequível para entrega

Alguns órgãos públicos, ao realizar o SRP cotam, por uma questão de controle de almoxarifado valores uni-tários para itens que costumam entregar em “pacotes”, como, por exemplo, lápis e canetas. Nesses casos, con-clui-se a licitação com valores, como por exemplo, de R$ 0,09 (nove centavos) para uma caneta, mas as entre-gas ocorreram em caixas com 100 unidades.

2 Estudo técnico do Instituto Negócios Públicos sobre o custo de uma licitação. Disponível em: <http://www.jacoby.pro.br/novo/Info-graficos2014.pdf>.

Tal procedimento está em perfeita consonância com a boa gestão. O risco ocorre quando a licitação por valor unitário não especifica as questões de entrega. Nessa hi-pótese, pode ocorrer o absurdo de o gestor público soli-citar uma ou duas canetas a cada demanda. Se o prazo de entrega for curto, há a grande chance de que o fornece-dor tenha que se deslocar até o órgão para entregar ape-nas essas unidades, situação na qual o custo do produto é infinitamente inferior ao custo da entrega.

Portanto, é imprescindível, que, quando se realizar a lici-tação por custos unitários de objetos com valores muito baixos, se considere o quantitativo mínimo para a entre-ga, de forma a tornar exequível a execução do serviço.

Alternativamente ao exposto, a Administração deve assumir o compromisso, na ARP ou no edital, que as aquisições só ocorrerão a partir de certo valor, como por exemplo, R$ 500,00, de modo a assegurar ao fornecedor os custos de entrega; também sugere que os itens sejam formados com valor superior a R$ 8.000,00, de modo a evitar adjudicação com preço ínfimo.

O licitante tem direito à possibilidade de adesão?

No caso concreto, o TCU considerou haver indícios de sobrepreço e vedou a adesão; diante do recurso do in-teressado não enfrentou a questão do prejuízo causado, limitando-se a declarar que ao tempo do julgamento do recursos e a validade da ARP estava vencida.

O mérito da discussão cingia-se a questão de que o TCU teria identificado indícios de que havia itens da ARP com valores superiores ao de mercado e determinara que não fossem autorizadas novas adesões à Ata. O fornecedor teria se insurgido, ao argumento de que vedar adesões à Ata após a licitação alteraria o equilíbrio econômico financeiro do objeto, principalmente em decorrência de meros indícios.

A questão é extremamente relevante e infelizmente não foi respondida pelo TCU: é direito adquirido do forne-cedor à manutenção da possibilidade de adesão a ARP?

Foi visto anteriormente que o fornecedor não tem direito adquirido ao quantitativo efetivamente demandado. No caso em tela, todavia, não se discute o direito do lici-tante ao quantitativo, mas à manutenção das regras da

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Autores do texto:• Jorge Ulisses Jacoby Fernandes• Murilo Q. M. Jacoby Fernandes

Acórdãos/Decisões referidos:• TCU. Acórdão nº 1285/2015-Plenário

Normas Referidas:• Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.

• Decreto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2013.

licitação. Pode, inclusive é prática comum, o licitante ter cotado seu preço considerando que teria um percentu-al determinado de adesões à ARP, situação que a eco-nomia escala lhe daria uma condição mais favorável na disputa. Obviamente que o fornecedor assumiu um risco calculado, ele poderá não obter o percentual estipulado de adesões e ter prejuízo, ou seja, ele não possui direito adquirido as efetivas adesões.

Contudo, suprimir essa possibilidade estaria afetando a equação econômica que ele utilizara para seus preços e esse risco não era previsível. Assim, entendemos que te-ria, sim, o fornecedor o direito adquirido à manutenção das condições da licitação.

As questões de mérito apontadas como suficientes para vedar adesões se não confirmadas ensejam violação à di-reito da manutenção das regras estabelecidas que em tese e potencialmente agregariam vantagens ao licitante.

Assim, por exemplo, se a Administração unilateralmente após a assinatura da ARP veda a adesão, inseriu no orde-namento jurídico cláusula que altera o regime da disputa e a justa expectativa do licitante. Do mesmo modo, se acusa o licitante de superfaturamento que não vem a ser comprovado, o direito deve ser recomposto, ampliando--se o prazo de vigência de modo a assegurar a possibili-dade de oferta a terceiros não participantes.

SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS – PRAZO DE VALIDADE DA ARP – CAUTELAR SUSPENSIVA

“Na contagem do prazo de validade da ata de registro de preços, computa-se o período em que vigorou medida cautelar suspensiva adotada pelo TCU. Ultrapassados doze meses (art. 12 do Decreto 7.892/13), a própria vantagem da contratação pode estar prejudicada, seja qual for o adquirente (gerenciador, participante ou “carona”). A proteção ao valor fundamental da licitação – obtenção da melhor proposta - se sobrepõe à expectativa do vencedor da licitação. “Fonte: Acórdão nº 1285/2015-Plenário, TC 018.901/2013-1, relator Ministro Benjamin Zymler, 27.5.2015.

O Sistema de Registro de Preços – SRP consiste em um instrumento auxiliar à licitação, previsto no art.

15 da Lei de Licitações e regulamentado pelo Decreto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2013.

Consiste no registro, pela Administração, de preço de determinado bem ou serviço, pelo prazo máximo de 12 meses, período no qual o fornecedor que assinou a Ata de Registro de Preços é obrigado a atender a demanda, pelo preço registrado, até o total do quantitativo previsto. Por outro lado, a Administração não se obriga a adquirir todo o quantitativo.

Limitação do prazo de validade

Ao prever o SRP a Lei nº 8.666/1993 estipulou sua re-gulamentação mediante decreto, de modo a atender as particularidades regionais, e, ainda, que sua validade não seria superior a um ano.

Entendendo pela maior flexibilidade na regulamentação mediante decreto, o Decreto nº 3.931, de 19 de setembro de 2001, previa o prazo de validade da Ata de Registro de Preços – ARP em doze meses,1 mas previu a hipóte-1 Decreto nº 3.931/2001. Art. 4º. O prazo de validade da Ata de Reg-istro de Preço não poderá ser superior a um ano, computadas neste

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se de prorrogação excepcional por mais doze meses,2 na forma do art. 57, § 4º da Lei nº 8.666/1993.

Após muito debate, a jurisprudência do TCU se firmou no entendimento que não seria possível a prorrogação da ARP, totalizando período superior a doze meses.3

Objetivando atualizar a regulamentação sobre o SRP e se adequar as orientações do TCU, foi publicado novo decreto regulamentador,4 revogando-se o Decreto nº 3.931/2001.

No Decreto nº 7.892/2013, portanto, a vigência da ARP é de doze meses, incluídas eventuais prorrogações.5

Da suspensão da validade da ARP

No ordenamento jurídico atual, que também abarca os Tribunais de Contas, existem algumas espécies de provi-mentos provisórios que permitem a suspensão dos efeitos de determinado ato ou documento, de modo que se possa discutir o mérito da questão sem trazer prejuízo as partes.

Dentre essas temos como mais usuais as medidas caute-lares e pedidos liminares.6

Ocorre que tais decisões são provisórias, ou seja, podem ser revertidas a qualquer momento e não garantem que a decisão final de mérito será no mesmo sentido, pois baseiam-se em indícios.

Exemplos dessas decisões são: suspensão dos efeitos de determinada penalidade; suspensão de determinado contrato; suspensão da licitação; suspensão da Ata de Registro de Preços.

Entenda o caso

No caso em tela, o TCU determinou a suspensão da va-

as eventuais prorrogações.2 Decreto nº 3.931/2001. Art. 4º, §2º É admitida a prorrogação da vigência da Ata, nos termos do art. 57, § 4º, da Lei nº 8.666, de 1993, quando a proposta continuar se mostrando mais vantajosa, satisfei-tos os demais requisitos desta norma.3 TCU. Acórdão Nº 991/2008 – Plenário. TC nº 021.269/2006-6. Rel. Min. Marcos Vilaça. Data da sessão: 13/5/2009.4 Decreto nº 7.892/2013.5 Decreto nº 7.892/2013, art. 12. O prazo de validade da ata de reg-istro de preços não será superior a doze meses, incluídas eventuais prorrogações, conforme o inciso III do § 3º do art. 15 da Lei nº 8.666, de 1993.6 CPC. Art. 461, § 3 e art. 803.

lidade da ARP em decorrência de indícios de sobrepreço em determinados itens. Ao analisar o recurso do forne-cedor registrado na ARP, após alguns meses, entendeu prejudicado tal recurso, por entender que a Ata teria sua vigência encerrada.

Entendeu, assim, que “independe se a Ata restou-se sus-pensa por qualquer motivo - inclusive em face da medida cautelar prolatada. Ultrapassados doze meses, a própria vantagem da contratação pode estar prejudicada, seja qual for o adquirente (gerenciador, participante ou ‘caro-na’ do SRP). Tal proteção ao valor fundamental licitató-rio, obviamente, se sobrepõe à ‘expectativa’ do vencedor da licitação”.

O entendimento do TCU está correto?

A concessão de uma cautelar ou liminar visa evitar pre-juízos a uma das partes, até o final da análise do caso. No caso, o TCU suspendeu a ARP para evitar que a Admi-nistração adquirisse produtos com indício de sobrepreço.

Ao entender que o prazo de validade da ARP continua a contar menos com a sua suspensão, criou a figura da suspensão parcial da ARP, ou seja, a ARP está suspensa para sua utilização pelos interessados, mas não está sus-pensa para efeitos de prazo. Uma questão bem delicada do ponto de vista jurídico.

Ademais, o TCU pode ter trazido prejuízos ainda maio-res ao fornecedor e à própria Administração Pública. Ve-jamos: caso o TCU entendesse ao final do processo que não existiria sobrepreço nos itens em questão, a extinção da ARP resultaria no caso de a Administração não poder adquirir o objeto necessário ao atendimento do interesse público.

Isso porque toda licitação visa a obtenção de um objeto para atender a um interesse público, em geral materiais e serviços necessários ao funcionamento do órgão. Ter--se-ia inutilizado o instrumento por meio do qual a Ad-ministração poderia atender ao interesse público, apenas em decorrência de indícios que poderiam ter se demons-trado insubsistente.

O TCU tem demonstrado estar consciente dos prejuízos à Administração e a coletividade que a suspensão dos instrumentos pelos quais se busca o atendimento do inte-resse publico. Infelizmente, no caso em tela, nos parece que faltou a mesma sensibilidade.

Autores do texto:• Murilo Q. M. Jacoby Fernandes• Jorge Ulisses Jacoby Fernandes

Acórdãos/Decisões referidos:• TCU. Acórdão nº 1285/2015-Plenário

Normas Referidas:• Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.

• Decreto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2013.• Decreto nº 3.931, de 19 de setembro de 2001

(revogado).

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SRP – ADESÃO – EXCEÇÃO - JUSTIFICAR – ART. 22 DO DECRETO Nº 7.892/2013

“O órgão gerenciador do registro de preços deve justificar eventual previsão editalícia de adesão à ata por órgãos ou entidades não participantes (“caronas”) dos procedimentos iniciais. A adesão prevista no art. 22 do Decreto 7.892/13 é uma possibilidade anômala e excepcional, e não uma obrigatoriedade a constar necessariamente em todos os editais e contratos regidos pelo Sistema de Registro de Preços.”Fonte: Acórdão 1297/2015-Plenário, TC 003.377/2015-6, relator Ministro Bruno Dantas, 27.5.2015.

O Sistema de Registro de Preços – SRP é uma fer-ramenta auxiliar as licitações públicas, consistin-

do na possibilidade de a Administração registrar o pre-ço de determinado bem ou serviço, pelo prazo máximo de 12 meses, período no qual o fornecedor que assinou a Ata de Registro de Preços é obrigado a atender a de-manda, pelo preço registrado, até o total do quantita-tivo previsto. Por outro lado, a Administração não se obriga a adquirir todo o quantitativo.

Atualmente regulamentado pelo Decreto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2013, essa ferramenta já era prevista no Decreto--lei 2.300/1986 e mantida na própria Lei de Licitações.

Da adesão às Atas de Registro de Preços

Uma das grandes inovações trazidas quando da regu-lamentação do SRP, ainda no ano de 2001,1 foi a pos-sibilidade de outros órgãos que não participaram da licitação se utilizarem da Ata de Registro de Preços – ARP decorrente.

Para que se possa analisar esse instrumento - mais co-mumente conhecido como carona2 - é imprescindível considerar as seguintes questões:

a) a licitação deve sempre ser vista como um meio para o atendimento do interesse pú-blico, e não como um fim em si mesmo;

b) os órgãos da Administração em geral, tinham, e ainda tem, grande dificuldade para se orga-nizarem e fazerem uma licitação em conjunto se aproveitando da economia de escala;

1 Decreto nº 3.931, de 19 de setembro de 2001. Regulamenta o Sistema de Registro de Preços previsto no art. 15 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e dá outras providências.2 Atualmente previsto no art. 22 do Decreto 7.892/2013.

c) o aumento da eficiência da Administração Pública, como um todo, quando órgãos e en-tidades especializados se dispõe a servirem de referência para aquisições especializadas.

A ideia quando da inclusão da possibilidade do carona era, de uma forma transparente e impessoal, permitir que órgãos da Administração pudessem se aproveitar da eco-nomia de escala de uma licitação envolvendo diversos órgãos, sem onerá-los com a impraticável tarefa de efeti-vamente se juntarem em uma única licitação.

O órgão interessado em aderir determinada deveria, para tanto, demonstrar a vantagem em aderir à ARP, solicitar autorização ao órgão gerenciador e, na formalização do ato, se submeter ao controle da sociedade.

A título de exemplo, considere que o órgão A realiza uma licitação de 20 veículos, estilo pick-up, para a realização de transporte em áreas rurais. Nessa licitação, inclui no edital que aceitará adesões/caronas até o limite de cinco vezes o quantitativo registrado. Os fornecedores interes-sados, conhecendo a figura da adesão/carona cotarão seus preços não considerando o quantitativo de 20 veículos, mas sim, de 80, 90 ou até 120 veículos3. Após a licitação, o vencedor divulgará que possui uma ARP, por um preço excelente, para um veículo com tais características.

Todos se beneficiam:

a) o órgão A será beneficiado, pois comprará os veí-culos mais baratos;

b) os órgãos aderentes/carona serão beneficiados

3 Apesar de o total que ele poderá fornecer são 120 veículos (a quantidade demandada pelo órgão A, acrescido do quíntuplo dos eventuais caronas), por razões comerciais ele tende a colocar uma margem de lucro com certa razoabilidade.

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pois comprarão veículos baratos, sem os ônus de um procedimento licitatório, e ainda poderão verificar com o órgão A se os veículos entregues são de qualidade, antes mesmo de aderirem;

c) o fornecedor se beneficia pois vende mais veí-culos;

d) a sociedade se beneficia pela maior facilidade no controle dos valores da ARP: à cada nova adesão, um novo órgão deverá demonstrar a vantagem do preço da ARP; como as ARPs fi-cam disponibilizadas online, qualquer concor-rente pode impugnar a ARP, demonstrando que possui valores melhores.

Das vantagens da ARP

A possibilidade de adesão à ARP traz diversas vantagens para os órgãos da Administração, entre elas:

a) permite à Administração mais facilmente apro-veitar-se da economia de escala;

b) é um procedimento célere o que permite subs-tituir as dispensas de licitação, por valores4 e até por emergência,5 por um procedimento mais isonômico e transparente;

c) com as atuais tecnologias de informação é pos-sível dar permanente publicidade à ARP;

d) é possível utilizar da expertise de órgãos espe-cializados na elaboração do Termo de Referên-cia e na condução da licitação, beneficiando ou-tros órgãos e entidades;6

e) como diversos entes se aproveitam do mesmo processo licitatório, evita impessoalidades na avaliação e aplicação de sanções aos fornecedo-res;

f) divulga inovações, pois outros órgãos ficam co-4 Art. 24, incisos I e II da Lei nº 8.666/1993.5 Art. 24, inciso IV da Lei nº 8.666/1993.6 Outros órgãos podem se beneficiar daqueles órgãos que pos-suem laboratório internalizado para avaliação de amostras, como o Banco do Brasil, por exemplo. Ou ainda, de órgãos que possuam uma equipe mais especializada para avaliação de amostras, como o Instituto Nacional de Traumatologia Ortopédica, quando se almeja contratar próteses ortopédicas, por exemplo.

nhecendo as inovações incluídas em editais e termos de referências.

Das desvantagens da ARP

Opositores do SRP trazem as seguintes desvantagens à figura do carona:

a) o fornecedor vende muito mais bens do que efe-tivamente concorreu;

b) pode ocorrer uma concentração de mercado nas mãos dos vencedores das ARPs;

c) incentiva a venda de ARPs e outros comporta-mentos inidôneos;

d) a Administração aproveitaria melhor a economia de escala se realizasse uma licitação conjunta, através da figura da Intenção de Registro de Pre-ços - IRP.

Da falácia da IRP

A IRP consiste em uma ferramenta criada pelo novo De-creto de SRP, nº 7.892 de 23 de janeiro de 2013, onde previu-se que, antes de realizar uma licitação para SRP o órgão responsável deve divulgá-la para que outros ór-gãos interessados em participar, possam manifestar seu interesse.

Uma ideia excelente que permite à Administração Públi-ca utilizar-se das ferramentas de tecnologia da informa-ção para sua organização e planejamento.

Sua utilidade, todavia, está muito aquém do ideal, ou ainda do razoável.

Isso porque, em regra, o sistema da IRP é disponibiliza-do por pregoeiros e consultado por pregoeiros, que ra-ramente possuem competência para definir cronogramas para as aquisições de seus respectivos órgãos. Uma lici-tação em conjunto com mais de um órgão ocorre apenas em duas hipóteses:

a) na hipótese casuística de que um pregoeiro de um órgão da Administração tenha acabado de re-ceber um processo para elaborar seu edital e veja a IRP de outro órgão; ou

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b) quando os órgãos da Administração se organi-zam e comunicam antes da elaboração do termo de referência para futura licitação.

Tem-se, portanto, que apesar de uma grande inovação, a eficiência da IRP está muito abaixo do esperado e apenas será aprimorada quando a Administração começar a se-guir cronogramas de aquisição.

Dos comportamentos inidôneos na ARP

É comum aduzirem como um ponto de risco da figura do carona a questão da venda de ARP. Ora, considerando os paradigmas principiológicos das contratações públi-cas, não há qualquer óbice ou vedação de que o fornece-dor detentor de uma ARP com bons preços, divulgue tal “produto” para outros órgãos e entidades. Pelo contrário, faz parte da prática comercial do fornecedor buscar ou-tros compradores de seu produto.

A questão toma contornos ilícitos quando à oferta de va-lores aos servidores públicos envolvidos, conduta usu-almente conhecido como “suborno”. Caso o fornecedor ofereça dinheiro, ou outra forma de contraprestação ao servidor público, para que este pratique uma ilegalidade, estamos em frente a uma situação onde haverá prejuízo à Administração.

Por óbvio que nestas situações a figura do controle in-terno deve ser apta a identificar as ilegalidades que o servidor favorecido pretende praticar, como, por exem-plo, aderir a uma ARP não vantajosa. Para aqueles que pontuam que o fornecedor também pode oferecer van-tagem ao jurídico, necessário apontar que nas hipóteses de corrupção intrínseca do sistema, esse comportamento pode ocorrer em uma adesão à ARP, como também pode ocorre em uma licitação direcionada ou dispensa ilegal de licitação.

Outro comportamento inidôneo que pode ocorrer nas adesões à ARP é o servidor responsável pela ARP exigir

do fornecedor um benefício para permitir a adesão por outro órgão. Nesse caso, o regulamento do SRP realmen-te pecou ao prever a anuência do órgão gerenciador da ARP, quando poderia indicar expressamente as hipóteses nas quais o gerenciador da ARP pudesse indeferir a ade-são, transformando o ato que hoje é discricionário em vinculado.

Da concentração de mercado

Quanto ao risco de concentração de mercado pelo deten-tor da ARP, a própria regulamentação do tema já trouxe uma excelente solução: limitação a adesões até o limite de cinco vezes o quantitativo registrado.

Do mesmo modo, tem-se que o concorrente pode ofere-cer preço mais baixo, tornando a ARP não mais vantajo-sa e portanto inviabilizando futuras adesões.

Do posicionamento do TCU

No caso em tela, o Ministro Relator se pautou pelo en-tendimento de que a adesão à ARP se configura em uma situação de risco para a Administração e não de benefí-cio. Para tanto, trouxe alguns dos argumentos trazidos nesta análise como: concentração de mercado e risco da conduta de venda de ARP.

Demonstrou-se, infelizmente, a intenção do TCU de vol-tar a analisar a constitucionalidade da figura do carona, deixando de considerar os inúmeros avanços no tocante a eficiência do serviço público em decorrência desse ins-trumento.

Concluiu, portanto, indicando que para que o edital pre-veja a possibilidade de adesão deve haver justificativa no processo, quando, no nosso entendimento, a situação oposta deveria ser justificada: quando a Administração não se interessar em aproveitar a economia de escala e incentivar a capilaridade no controle da ARP pelos ór-gãos caronas, dever-se-ia exigir justificativa no processo.

Autores do texto:• Murilo Q. M. Jacoby Fernandes• Jorge Ulisses Jacoby Fernandes

Acórdãos/Decisões referidos:• TCU. Acórdão nº 1297/2015-Plenário

Normas Referidas:• Decreto nº 3.931, de 21 de setembro de 2001. • Decreto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2013.

• Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.