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CONCEPÇÕES E PRÁTICAS PEDAGÓGICA EM PROCESSOS
EMANCIPATÓRIOS DE UMA EDUCAÇÃO CRÍTICA
As concepções dos professores sobre processos emancipatórios e práticas pedagógicas
que contemplam diversidades educacionais brasileiras formam o viés da discussão desse
painel, que se insere no eixo temático 3, subeixo 2. Os artigos resultam de duas
pesquisas de doutorado e uma de mestrado desenvolvidas em um Programa de Mestrado
e Doutorado em Educação, e se inserem em um grupo de pesquisa que reflete
“Currículo, práticas pedagógicas e formação de professores”. O objetivo é apresentar
parte dos resultados alcançados nas investigações já concluídas como forma de discutir
a prática docente na educação brasileira. O primeiro artigo aborda a didática e a
preocupação com as questões sociais dos professores tendo como investigação: A
contribuição da escola para a superação das desigualdades sociais, segundo os
professores de uma escola pública com alto Ideb. O texto reflete a contribuição da
escola para a superação de desigualdades sociais, considerando para tanto, a didática
utilizada pelos professores. O segundo artigo analisa a compreensão dos professores da
educação especial que exercem a docência em Salas de Recursos Multifuncionais sobre
a in/exclusão do estudante com deficiência visual no processo de escolarização na
educação básica. A investigação evidencia que a inclusão representa um avanço
significativo nos processos educativos, pois proporciona uma maior interação e
mediação de toda a comunidade escolar, não somente dos professores que atuam na
educação especial. O terceiro artigo reflete as concepções de professores sobre a
problemática ambiental e a educação ambiental. Analisa-se qual educação ambiental é
compreendida pelos docentes e se a proposta contribui para a construção de um
currículo crítico. Os dados mostram uma prática docente voltada aos alunos e as suas
realidades, em consonância com processos emancipatórios que visam questões sociais,
culturais e políticas.
Palavras-chave: Desigualdades Socioambientais. In/Exclusão. Educação Ambiental.
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
10366ISSN 2177-336X
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A COMPREENSÃO DOS PROFESSORES SOBRE A IN/EXCLUSÃO DO
ESTUDANTE COM DEFICIÊNCIA VISUAL NO PROCESSO ESCOLAR
Claunice Maria Dorneles
Centro Universitário da Grande Dourados (UNIGRAN)
Resumo
Este trabalho tem como principal objetivo analisar a compreensão dos professores da
educação especial que exerce a docência nas Salas de Recursos Multifuncionais sobre a
in/exclusão do estudante com deficiência visual no processo de escolarização na
educação básica e na sua prática educativa, bem como, compreender os processos de
in/exclusão escolar. A abordagem metodológica adotada é qualitativa, fundamentada na
teoria crítica da educação, que diz respeito à ênfase na análise das condições de
regulação social, desigualdade e poder. O recorte temporal para pesquisa de campo está
compreendido entre 2007 a 2012. Os instrumentos de coleta de dados foram entrevistas
semiestruturadas e observações. A pesquisa de campo foi realizada em duas Salas de
Recursos Multifuncionais de escolas da rede pública, com quatro professores
participantes como sujeitos, sendo uma professora da rede municipal e três da rede
estadual. As análises dos dados nos guiaram para os seguintes resultados: admite-se que
no programa de implantação das Salas de Recursos Multifuncionais (tipo II) ainda
existem falhas, como o distanciamento entre o prescrito em lei e o que é apresentado
nessas Salas. Todavia, as políticas públicas voltadas para a inclusão dos estudantes com
deficiência visual representam um avanço significativo, pois proporcionam uma maior
interação e mediação de todos, não somente dos professores que atuam na educação
especial, como também toda a comunidade escolar. Os esforços no entendimento de que
a inclusão seja levada a cabo à procura de respostas para um desafio precisa ser
encarado. Percebe-se o entusiasmo dos professores da educação especial, no sentido de
convencer os professores do ensino regular, de que a inclusão não é fácil, mas também
não é impossível.
Palavras - chave: Deficiência visual. Compreensão de Professores. In/exclusão.
Considerações iniciais
Este artigo apresenta uma descrição e análise da palavra dos professores da
educação especial, articulada com o referencial teórico crítico da educação. Estão
presentes os elementos que dizem respeito a compreensão dos professores que exerce a
docência nas Salas de Recursos Multifuncionais sobre a in/exclusão do estudante com
deficiência visual no processo de escolarização na educação básica e a atuação desses
docentes. A abordagem metodológica adotada é qualitativa, fundamentada na teoria
crítica da educação, que busca expor o modo como as relações de poder e desigualdade
social, cultural. A perspectiva teórica que assumimos nos impele explicitar que a
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
10367ISSN 2177-336X
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inclusão e a exclusão são processos inseparáveis, pois em alguns momentos estamos
incluídos e em outros estamos excluídos.
Nesse entendimento, as autoras Lopes e Fabris (2013, p. 110 e 111) defendem
que “a in/exclusão deve ser a condição para pensarmos as nossas práticas educativas
escolares”, ou seja, “a inclusão e a exclusão não são opostas uma da outra,são faces da
mesma moeda”.
A contribuição dos teóricos que problematizaram o processo de in/exclusão
escolar, dos quais se destacam Freire (2011), Santos (2003) e Slee (2011), entre outros,
mantém-se uma dialógica entre as falas dos pesquisados e dos interlocutores citados na
busca das questões mais significativas para essa pesquisa, extraídas no processo de
estada no território dos e com os professores que foram sujeitos da pesquisa, dos quais
se obteve informações, dentre outras, sobre o convívio profissional junto a estudantes
com deficiência visual.
Diante do exposto, a educação com fundamento na teoria crítica “busca expor o
modo como as relações de poder e desigualdade (social, cultural, econômica...) [...] são
postas em questão na educação formal e informal das crianças e dos adultos.” (APPLE;
AU; GANDIN, 2011, p. 14). Por entender que a pesquisa é um ato político, a
metodologia precisa estar voltada para atender as ações dialógicas e transformadoras.
Os critérios utilizados para a seleção dos sujeitos da pesquisa foram os
seguintes: docentes da rede estadual e da rede municipal de ensino de Campo Grande,
capital do estado de Mato Grosso do Sul, que lecionam na Sala de Recursos
Multifuncionais (tipo II) que éum serviço de apoio educacional especializado da
educação especial instalado dentro dos mesmos espaços físicos das escolas do ensino
regular para atender à complementação para os estudantes com cegueira e/ou com baixa
visão. Trata-se de um total de 4 professores, com as seguintes formação docente: 1 em
Química e Física com mestrado em Química, 1 em Letra, 1 em Artes e 1 em
Matemática. Todos possui especialização em Educação Inclusiva e/ou curso de
formação em serviço em educação especial para atendimento à estudantes com
deficiência visual.
A compreensão desses professores está presentes nas suas falas, nas suas
práticas docentes e, sobretudo nas suas crenças e esperanças, no que tange a in/exclusão
dos estudantes com deficiência visual no processo de escolarização.
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Os professores das salas de recursos multifuncionais (tipo II): o processo de
in/exclusão escolar dos estudantes com deficiência visual
Os professores entrevistados expressam uma expectativa positiva em relação aos
seus estudantes com deficiência visual que frequentam a Sala de Recursos
Multifuncionais e estão incluídos no ensino regular, pois, segundo eles, a inclusão,
como tudo que é novo, causa angústia, entretanto dá a oportunidade da escola perceber
que todos são diferentes e que, para atender à diversidade presente no contexto
educacional, é preciso ser acolhedor, no sentido de potencializá-los numa relação
dialógica.
Vejamos o que dizem os professores entrevistados, que no decorrer desse texto,
as falas estão destacadas em itálico para diferenciá-las das citações bibliográficas:
Eu sei que estão falando que é uma enganação e tudo mais (referindo-
se à inclusão). Eu não vejo assim, eu acredito. Pode ser que está
lento! Mas a gente já vê muitos resultados. Vê assim, resultados em
relação aos própriosalunos. Não posso falar de uma maneira geral,
total, ao meu ver eu acho que está acontecendo inclusão (Professora
Eva).
Hoje, falando neste momento, eu acho que já melhorou bastante. Eu
acho que a inclusão está realmente acontecendo. Eu acho que a
inclusão está acontecendo realmente. [...] eu acho que está
acontecendo rapidamente, a meu ver (Professora Élida).
Eu confesso que percebo que está devagar ainda, mas eu vejo que é
assim, uma coisa significativa, positiva também. E que está
melhorando. Que a escola tem um olhar diferente sobre o aluno com
necessidade especial (Professor Dionísio, grifo nosso).
O que eu percebo é que hoje, a gente, na escola comum, a gente vê o
quanto tem dado certo a inclusão. Assim, o quanto é um movimento
que tem crescido e o quanto todos nós temos aprendido. E, assim, tem
falhas? Tem! Bastante ainda. Tem muita coisa para ser corrigida
(Professora Joana).
Percebe-se pelas entrevistas que a concretização das políticas que visam incluir é
de conhecimento dos professores, no que diz respeito à igualdade de acesso à educação
como um bem fundamental. De certo modo ela vem ressignificandoas práticas escolares
que, até então, eram voltadas para um modelo de um estudante ideal, uma educação
homogênea. Esse olhar da heterogenia “permite-nos mergulhar junto com o aluno no
processo de busca por significados, experimentando, tentando, errando e acertando”
(ACORSI, 2010, p. 190).
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A professora Joana disse:
Mas eles [referindo-se aos professores do ensino regular] não falam
mais como muitas vezes a gente ouvia falar criticando a inclusão.
Eles falam hoje angustiados, mas em querer ajudar. Em buscar um
caminho. Falam: Eu estou fazendo assim e não está dando certo. Aí,
eu tentei isso e está dando certo desse jeito (professora Joana).
Recorremos a Santiago, Akkari e Marques (2013), segundo as quais caminhar
rumo a uma educação inclusiva constitui o primeiro e decisivo passo rumo à
transformação tão sonhada e necessária. Para os autores, “trata-se de um desafio de
grande dimensão, mas de visibilidade plena e, por que não dizer, necessária”
(SANTIAGO; AKKARI; MARQUES, 2013, p. 112).
Como afirmam Orrico, Canejo e Fogli (2007), para propiciar o sucesso no
processo de inclusão dos estudantes com deficiência visual nas escolas regulares é
importante a viabilização de ações que possibilitem a remoção não apenas das barreiras
comunicacionais e arquitetônicas, mas também das barreiras atitudinais. Essas atitudes,
frequentemente são expressas por aqueles que, ao se depararem com uma pessoa cega,
não a cumprimentam, não lhe dirigem a palavra; portanto, não possibilitam que o
reconhecimento dapresença do outro. Quem coloca a pessoa com deficiência visual na
invisibilidade possivelmente não acredita na sua capacidade de aprender.
A professora Élida admite que no programa de implantação das Salas de
Recursos Multifuncionais (tipo II) ainda existem falhas, como o distanciamento entre o
prescrito em lei e o que é apresentado nessas Salas. Todavia, as políticas públicas
voltadas para a inclusão representam um avanço significativo, pois proporcionam uma
maior interação e mediação de todos, não somente os professores que atuam na
educação especial, como também toda a comunidade escolar, contribuindo para se
alcançar o sucesso na aprendizagem do estudante com deficiência visual.
Tem muita coisa para ser corrigida, em vista do que era, por exemplo,
aqui na escola. Eu estou aqui desde 2008, quando começou a
funcionar a Multifuncionais. Para o que é hoje, em 2012, que a gente
vê, desde os funcionários, como eles recebem esses alunos, como eles
conversam com essa família, a orientação pedagógica e os próprios
professores (Professora Élida).
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A professora Joana destaca as possibilidades de mediação que os recursos
didáticos adaptados abrem e como esses recursos passaram a ser mais solicitados tanto
da parte da escola como da parte dos estudantes.
Nas entrevistas, os professores da Sala de Recursos Multifuncionais (tipo II)
expressam que melhoraram as condições de atendimento em tempo hábil aos estudantes
com deficiência visual, uma vez que os recursos tecnológicos adequados estão
disponíveis nessas salas, o que favorece a adaptação dos recursos didáticos,
procedimento que conquistou credibilidade junto aos professores do ensino regular e
aos próprios estudantes, na busca pelo reconhecimento do direito à educação de
qualidade.
Sobre a demanda de recursos didáticos adaptados, a professora Joana explicita
que,
temos visto o resultado desse trabalho, porque em 2008, eu até
comentava com a minha colega, nós produzimos um quantitativo
mínimo de material, uma vez que fazemos adaptação, transcrição de
materiais, além dos atendimentos, produzimos jogos. Muitos materiais
são feitos aqui. [...]. Eu estava revendo o histórico para montar o
material, comparando: o que foi feito em 2008, 2009 e 2010. No ano
passado... é uma evolução muito grande. Isso é o resultado do
trabalho (Professora Joana).
A adaptação dos recursos didáticos para possibilitar a equidade do ensino é
defendida por Santiago, Akkari e Marques (2013). Para estes autores, a equiparação de
oportunidades implica todas as pessoas terem acesso aos serviços, nos quais a atitude de
não rejeitar, excluir ou discriminar qualquer pessoa por qualquer razão constitui um
objetivo. As condições digna de inclusão se trata de um “pilar que desafia a sociedade,
as instituições e as pessoas a criarem serviços, programas e desenvolverem atividades e
atitudes com o intuito de melhor atender às pessoas excluídas, resguardando sua
dignidade humana e o direito inalienável de cidadania de cada um” (SANTIAGO;
AKKARI; MARQUES, 2013, p. 109).
No cenário que estamos vivendo, há um interesse maior por parte dos meios de
comunicação no debate sobre a inclusão, como fala a professora Eva, que vê com
bastante otimismo a contribuição da mídia. De fato, os meios de comunicação exercem
papel significativo na sociedade.
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Uma coisa bacana que vem acontecendo e que ajuda esse processo de
inclusão é a mídia. As novelas, a televisão vem apresentando
programas que mostram informações sobre as pessoas com
deficiência. Isso ajuda na sensibilização das pessoas, a respeitarem
os cegos, por exemplo, no trânsito, sempre alguém aparece para
ajudar (Professora Eva).
Nesse sentido, a colaboração da mídia televisiva pode ser relevante, quando tem
a finalidade de trazer mais informações e contribuir para a quebra de preconceitos,
divulgando a potencialidade que as pessoas com deficiência visual têm.
Por outro lado, não podemos deixar de questionar (olhar de maneira crítica) a
restrição de recursos computacionais com interfaces de acesso amigável. Trata-se de
ampliadores e leitores de tela com síntese de voz que facilitam o acesso “aos ambientes
digitais para deficientes visuais [...] ampliadores de tela para aqueles que possuem perda
parcial da visão e recursos de áudio, tecla de atalho e impressora em braile para os
sujeitos cegos” (SOUZA; SANTAROSA, 2003, p. 3), bem como a programação
televisiva que facilite o acesso àinformação com audiodescrição para que as pessoas
com deficiência visual possam associar a palavra falada à própria descrição das
imagens.
Percebemos também que os personagens da televisão ou as mídias de
informação (computadores e internet) que atuam no papel de cegos ou de pessoas com
baixa visão são, em sua maioria representada por atores normovisuais, porque as
emissoras abrem pouco espaço para atores cegos atuarem nas telenovelas ou mesmo em
outras programações. Isso explicita um processo de in/exclusão, pois, ao mesmo tempo
em que esclarece sobre a potencialidade das pessoas com deficiência visual, também
pratica a exclusão.
De acordo Mota e Romeu Filho (2010) a audiodescrição é,
um recurso de acessibilidade que amplia o entendimento das pessoas
com deficiência visual [...] por meio [...] de mediação linguística, [...]
de tradução intersemiótica, que transforma o visual em verbal, abrindo
possibilidades de acesso à [...] inclusão cultural, social e escolar”
(MOTA; ROMEU FILHO, 2010, p. 5).
Para Soares (2009), os meios de comunicação têm grande peso na formação de
opiniões e na difusão de atitudes sobre os temas sociais. Os profissionais da mídia
poderão ajudar a diminuir preconceitos, haja vista têm a capacidade e o poder de
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divulgar e ampliar o trabalho das associações, escolas e instituições que se dedicam à
luta pela inclusão. Conseguir que esses profissionais desenvolvam um trabalho em favor
das pessoas com deficiência é uma tarefa complexa e penosa.
De maneira geral, os conhecimentos sobre a deficiência são muito pobres em
dados objetivos e em vivências pessoais, estando carregados de estereótipos e
preconceitos e requerendo mudanças substanciais (SOARES, 2009). Nesse sentido, os
meios de comunicação, sobretudo pelo seu alcance, ainda têm muito a avançar para
contribuir para uma potencialização das pessoas com deficiência visual.
Os esforços no entendimento de que a inclusão seja levada a cabo ficam
expressos, mais uma vez, nas falas dos professores Eva e Joana, que estão à procura de
respostas para um desafio que precisa ser encarado. Percebe-se o entusiasmo dessas
duas professoras, que se veem como responsáveis pela mobilização no sentido de
convencer os seus pares - professores do ensino regular -, de que a inclusão não é fácil,
mas que também não é impossível, o que as impulsiona a criar condições para que todos
se sintam menos ansiosos (se sintam assessorados) com a presença dos estudantes com
deficiência visual em suas salas de aula.
Mas vai caminhar, esperamos que melhore cada dia. Para isso
estamos trabalhando (Professora Eva).
Ainda temos muitas falhas, mas temos crescido bastante. Isso que é o
mais importante. Temos buscado acertar (Professora Joana).
Nesse sentido, Sanches (2011) afirma que, a inclusão é uma caminhada com
avanços e recuos, um fenômeno inacabado, que exige mudanças essenciais, tal como
ver o potencial de cada estudante:
No entendimento do autor citado, é necessário que haja uma reestruturação das
práticas de organização e funcionamento, de maneira que a escola possa responder à
diversidade de seus estudantes. Da mesma forma, é importante valorizar e
corresponsabilizar todos os envolvidos no processo educativo.
Os professores de apoio especializado concebem um processo contínuo entre o
projeto de integração e a inclusão escolar. Isso porque, quando questionadas sobre o que
de fato acontece nas escolas com os estudantes com deficiência visual - aos quais elas
dão o apoio especializado -, a professora Élida, que atua por mais tempo nesse
atendimento, expressa que, devido à inclusão ser recente, as práticas escolares ainda
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vêm ao encontro da proposta da integração: É claro que tem coisa que... mas porque é
muito recente a inclusão. Porque antes era só integração (Professora Élida).
O professor Dionísio, que atua há menos de um ano na Sala de Recursos
Multifuncionais (tipo II) e no ensino regular, afirma que os estudantes com deficiência
visual enfrentam dificuldades quanto ao apoio pedagógico em sala de aula do ensino
regular, o que os leva a vivenciar a in/exclusão: Eu percebo assim, que pelas
reclamações que eu vejo dos meus alunos, com relação à questão da inclusão é do
apoio pedagógico (Professor Dionísio).
A falta de apoio pedagógico, entre outras questões, diz respeito ao
distanciamento entre os profissionais da Sala de Recursos Multifuncionais e os
professores da educação regular. Muitas vezes, o estudante que recorre à Sala de
Recursos Multifuncionais, mesmo tendo agendado, precisa esperar porque o professor
está atendendo a situações de emergênciaou adaptando o material didático. Além disso,
ainda são atendidos vários estudantes ao mesmo tempo com conteúdos diferentes; os
professores estão ocupados com a confecção de material escolar adaptado a cada
necessidade ou com atendimento à família dos estudantes. Esses fatores sobrecarregam
os professores da Sala de Recursos Multifuncionais que precisam caminhar passo a
passo com os do ensino regular.
A professora Joana diz que são importantes os momentos de trocas, ou seja, de
diálogo com os professores do ensino regular. Esses momentos dizem respeito ao
rompimento com “um modelo médico baseado na imperfeição sobre o qual a educação
especial foi construída e praticada” (SLEE, 2011, p. 205).
Ao questionarmos os professores do atendimento educacional especializado
sobre a caracterização da inclusão escolar, as suas respostas foram “recheadas” do
entendimento de inclusão mais amplo, o que não está equivocado, pois a escola é um
dos vários segmentos da inclusão social. Como expressam a professora Eva:
A inclusão escolar é você estar inserido em toda a sociedade. Não só
na escola, no meio social. Eu acho que é você interagir em todo meio
social que você tem direito. E eles estão procurando fazer uso do seu
direito, no ônibus, eles já estão fazendo. [...] Eu acho que todos estão
percebendo o que está acontecendo. Os próprios professores falam
que não têm experiências. Mas eles percebem também que é
conhecendo os alunos que eles vão se adaptando. Os resultados são
vistos, ao conversar com os professores sobre os alunos. Dá para
acontecer, dá para incluir, está acontecendo. Devagar, mas está. E
acessibilidade, já tem em alguns lugares que a gente vai. E aqueles
que não têm, eles estão adaptando. Estão fazendo o possível para
mudar essa história (Professora Eva).
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Também segundo a fala de Joana, esses estudantes eram orientados a ficarem
quietos num cantinho, para não serem vistos comoestudantes que “dão trabalho,
incomodam”, muito menos que fracassam na aprendizagem do conteúdo, haja vista que
essas eram algumas das razões para que o professor desse destaque à deficiência e
justificasse que estes estudantes não se ajustavam às exigências da escola. É isso que
percebemos na fala da professora Joana (grifos nossos):
Eu vejo assim: a inclusão é ele participar, é ele fazer as atividades, é
ele participar dos trabalhos em grupo, é ele participar em pesquisa.
É, na hora que o professor perguntar, levantar o dedinho e falar. Dar
uma oportunidade para ele também. Não como antigamente que
ficava jogado em um cantinho da sala, só escutando, esquecido, é
ele participar igual os outros alunos. Tanto na sala, como na escola
também com a acessibilidade.
Destaca-se nesse contexto, a importância das políticas públicas, pois, ainda que
o processo de inclusão seja lento, elas possibilitam uma cobrança por parte dos
estudantes e dos professores. Isso de alguma forma, pressiona o poder público a investir
na acessibilidade arquitetônica, que faz parte de um plano articulado que necessita de
diferentes intervenções, seja mediante os recursos didáticos, seja mediante as
adaptações de grande porte que possam favorecer o acesso e o direito dos estudantes de
ir e vir com independência, não somente na sala de aula, mas em todo o seu entorno. É
isso que podemos verificar na fala do professor Dionísio, quando afirma:
A inclusão escolar é você dar oportunidade àquelas pessoas que têm
uma certa necessidade especial de poder ter acesso ao conhecimento.
E poder também interagir com os colegas da escola (Professor
Dionísio).
Fernandes, Antunes e Glat (2007) ponderam sobre a importância das estratégias
pedagógicas em sala de aula, tais como: ler o que está sendo escrito no quadro, colocar
umsinalizador auditivo para localizar onde estão ocorrendo determinadas atividades, ter
bolas com guizo para a prática das atividades desportivas, entre outras. Elas favorecem
a participação e acentuam o sentimento de pertença dos estudantes com deficiência
visual junto aos demais estudantes.
Considerações finais
Ao analisar de como professores das Salas de Recursos Multifuncionais (tipo II),
compreendemcomo o processo de in/exclusão dos estudantes com deficiência visual
está sendo materializado na prática escolar,se percebe que os professoresacreditam que
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estes estudantes podem aprender tanto quanto os demais, desde que os recursos
pedagógicos sejam adequados para fazer jus às condições peculiares da ausência da
visão.
Também foram constatadas as condições de trabalho, dificultando a interlocução
com os professores do ensino regular. A demanda de atendimento e a política de não
ampliação do quantitativo de professores especializados têm dificultado o trabalho do
atendimento especializado para a independência de locomoção com o Ensino da
Orientação e Mobilidade, mais uma vez prejudicando o processo de inclusão.Os
professores creem que a presença do estudante com deficiência visual é algo que está
posto no interior da escola, sem volta.
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10377ISSN 2177-336X
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A DIDÁTICA E A CONCEPÇÃO DOS PROFESSORES SOBRE A
CONTRIBUIÇÃO DA ESCOLA PARA SUPERAÇÃO DAS DESGUALDEDES
SOCIAIS
Jucleides Silveira Pael Alcará (UCDB)
Resumo
O objetivo do artigo é analisar a concepção dos professores de uma escola pública com
alto IDEB sobre a contribuição da escola para a superação das desigualdades sociais,
considerando a relevância da didática estar aliada às questões sociais no processo
educativo. Considerando que a desigualdade social é um fenômeno que deve ser
versado no espaço escolar, a análise pauta-se no entendimento de que a desigualdade
social é fruto das relações sociais produzidas no contexto da sociedade capitalista e essa
desigualdade atravessa a educação básica e interfere no Índice do Desenvolvimento da
Educação Básica – IDEB. De acordo com os teóricos que pautam nossa discussão, a
educação de qualidade geralmente constitui privilégio para uma população com alto
poder aquisitivo, fato que resulta em consolidar uma educação antidemocrática. Daí a
relevância em conceber uma didática que se apresenta comprometida com as questões
socias e, esteja voltada para diminuição da desigualdade social. Os sujeitos da pesquisa
foram oito professores dos anos finais do Ensino Fundamental de uma instituição de
Educação Básica da Rede Pública de Ensino do Estado de Mato Grosso do Sul,
localizada no município de Campo Grande, que em 2011 obteve um alto IDEB. Esses
professores foram entrevistados e a análise das entrevistas mostrou que as concepções
dos professores denotam que as desigualdades interferem no processo educativo,
percebem que elas ocorrem em razão do sistema econômico capitalista, e ainda
concordam que a escola contribui para superar as desigualdades sociais. Contudo,
sinalizam a necessidade da família e governo estarem alinhados com a escola na
perspectiva de consolidar mudanças significativas na educação e na sociedade.
Palavras Chave: Desigualdade social. Didática. Escola Pública.
Considerações iniciais
Este artigo é resultado de um recorte da dissertação de mestrado junto ao
Programa de Pós-Graduação – Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade
Católica Dom Bosco e vincula-se ao Projeto Intitulado “Relações étnico-raciais, gênero
e desigualdade social no ensino fundamental do 6º ao 9º ano em escolas públicas
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estaduais de Campo Grande – MS”, do edital 049/2012/CAPES/INEP do Programa
Observatório em Educação. As investigações imprimidas levam-nos no decorrer do
texto a apropriar do referencial bibliográfico crítico capaz de desvelar a complexidade
que envolve o contexto da didática na educação, as desigualdades sociais e a análise da
concepção dos professores de uma escola pública com alto IDEB, sobre a contribuição
da escola para superação das desigualdades sociais, por aprendermos que a desigualdade
social é um fenômeno que deve ser considerado tanto na educação, quanto nas políticas
públicas direcionadas para a educação.
Compreendemos a relevância em problematizar a didática e a desigualdade
social no contexto educativo na perspectiva de defender que a qualidade social da
educação esteja voltada para o direito à cidadania e justiça social para todos os sujeitos
que procuram a escola. Desse modo, entendemos ser necessário levantar, questionar e
constatar elementos e fenômenos que impedem e/ou promovem a democratização da
educação.
Para consolidar a pesquisa com os professores utilizamos a abordagem
metodológica qualitativa configurada pela entrevista semiestruturada, considerando que
essa entrevista possibilita descrever os fenômenos sociais, assim como explicar e
entender o seu contexto, tanto numa dimensão específica quanto numa mais abrangente
(TRIVIÑOS, 2011).
No contexto das políticas educacionais delineadas pelo governo destaca-se o
Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB, que tem como propósito aferir
a qualidade do ensino por meio de metas projetadas para as escolas alcançarem. No
entanto, existem estudos com de teóricos Afonso (2010), Arroyo(2010), entre outros
que questionam a importância dessas políticas educacionais, por desconsiderarem o
contexto socioeconômico político e cultural dos sujeitos que estudam nas escolas
públicas, e que, na maioria das vezes mostram-se desconectadas com os interesses e
necessidades de aprendizagens dos alunos.
Reflexões teóricas sobre a didática e a preocupação com as questões sociais no
contexto educativo
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Os estudos e pesquisas demostram que a didática deve ser dialogada e
estruturada de acordo com as exigências da educação e sociedade no mundo
contemporâneo, no propósito de conceber uma sociedade democrática e, em
consequência, menos desigual. Desse modo, sabe-se que somente no decorrer dos anos
de 1980 colocam a questão da desigualdade social na disciplina, que, por excelência
trabalha com as relações espaço tempo da sala de aula.
Conforme expressa Candau (2011), antes desse período, a Didática era
refletida de maneira instrumental, com foco na disseminação de conteúdos que retratam
a ideologia conservadora, a qual desconsiderava a visão crítica. No entanto, no decorrer
dos anos 80, novos olhares passaram a caracterizar a Didática na educação, pois,
segundo Candau, “[...] a reflexão acadêmica em Didática no Brasil tem sido
especialmente fértil, viveu um período de ruptura de paradigmas, de buscas, de
desconstrução e reconstrução”. Isso, denotou maior produção teórica e relevância social.
Como participante dessa construção, Candau (2012) explicita que a crítica
que revela a instrumentalidade da Didática não tem o propósito de negar a Didática na
sua totalidade, pois “A prática pedagógica, exatamente por ser política, exige a
competência técnica. As dimensões política, técnica e humana da prática pedagógica se
exigem reciprocamente” (CANDAU, 2012, p. 23). Essa didática necessita ser
sistematizada. “Daí a necessidade de uma didática fundamental” (CANDAU,2012, p.
23). Pois, compreendendo a necessidade de contextualizar a prática pedagógica no
intuito de “repensar as dimensões técnicas e humana”, analisa os diferentes contextos
responsáveis por consolidar metodologias de acordo com o contexto da sociedade e
educação.
Nesta perspectiva, a reflexão didática parte do compromisso com a
transformação social, com a busca de práticas pedagógicas que tornem o
ensino de fato eficiente (não se deve ter medo da palavra) para a maioria da
população. Ensaia. Analisa. Experimenta. Rompe com uma prática
profissional individualista. Promove o trabalho em comum de professores e
especialistas. Busca as formas de aumentar a permanência das crianças na
escola. Discute a questão do currículo em sua interação com uma população
concreta e suas exigências, etc. (CANDAU, 1996, p. 20).
A autora observa que, além de fazer parte desse processo de mudanças, tem
participado de maneira enfática da análise das produções literárias e acadêmicas
apresentadas e publicadas em lugares em que se discute e vivencia a educação;
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consoante isso, vislumbra o avanço nos “estudos, nas pesquisas e nos trabalhos
realizados em Didática no nosso país na década de 80 [...]” (CANDAU 2011, p. 72).
Essa constatação reconhece componentes de diferentes naturezas, pois são evidenciadas
produções literárias que focam e delineiam diversos diálogos e raciocínios nesse espaço
de tempo.
Para propagar a Didática postulada por Candau acima, apoiamo-nos nas
palavras de Freire, que defende o método a seguir:
Os métodos da educação dialógica nos trazem à intimidade da sociedade, à
razão de ser de cada objeto de estudo. Através do diálogo crítico sobre um
texto ou um momento da sociedade, tentamos penetrá-lo, desvendá-lo, ver as
razões pelas quais ele é como é, o contexto político e histórico em que se
insere. Isto é para mim um ato de conhecimento e não uma mera
transferência de conhecimento, ou mera técnica para aprender [...]. (FREIRE
e SHOR, 2008, p. 24).
Para efetivar o método pedagógico anunciado na proposição de Freire e
Shor, é preciso investigar os elementos que compõem o contexto da sala de aula a fim
de compreender como a prática pedagógica articula o compromisso educativo
projetando-se na efetivação de uma didática comprometida com as questões sociais.
Silva (2010) contribui com algumas considerações ao explicitar que se faz necessário
estar atentos para apreender no contexto da prática educativa elementos que influenciam
a didática para que possamos identificar questões sociais, culturais na sociedade atual
que acaba por interferir “na maneira de ser e estar no mundo dos sujeitos envolvidos no
ato educativo; e teórico-metodológicas, construídas nos diferentes momentos da história
da educação e do ensino. (SILVA, 2009, p. 38)
Dada a premissa anterior, compreende-se que o espaço e tempo escolares
estão condicionados à capacidade de satisfazer as necessidades do sistema econômico;
daí o compromisso do professor em ir além das práticas pedagógicas que condicionam
os sujeitos na lógica do mercado e em ousar desvencilhar-se dessas amarras que
interferem na construção de uma prática fundamentada, contextualizada na direção da
transformação social. Para tanto, faz-se necessário conceber didáticas capaz de enunciar
práticas criativas e atrativas onde alunos e professores possam tornar-se sujeitos. Nesse
sentido, entendemos ser relevante para os professores conhecer e compreender a prática
social vivenciada pelos alunos, pois, desse modo, ambos constituem-se
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Protagonistas que analisam, problematizam, compreendem a prática
pedagógica, produzem e difundem conhecimentos. O professor é
protagonista, porque ele é quem faz a mediação do aluno com os objetos do
conhecimento. O aluno também é protagonista, porque é considerado como
sujeito da aprendizagem e, consequentemente, sua atividade cognitivo-afetiva
é fundamental para manter uma relação interativa com o objeto do
conhecimento. (VEIGA 2001, p. 147).
Para que as considerações explanadas acima se realizem,
O homem não pode ser compreendido fora de suas relações com o mundo, de
vez que é um „ser em situação‟, um ser do trabalho e da transformação do
mundo. [...] Nestas relações com o mundo, através de sua ação sobre ele, o
homem se encontra marcado pelos resultados de sua própria ação. Atuando,
transforma, cria uma realidade que, por sua vez, envolvendo-o, condiciona
sua forma de atuar. Não há, portanto, como dicotomizar o homem do mundo,
pois que não existe um sem o outro. (FREIRE, 1982, p. 28).
A concepção acima possibilita refletir sobre a relação entre professor e
aluno no cotidiano da sala de aula, pois aponta a necessidade desse espaço estar atento
aos fenômenos que ocupam o mundo, de modo que cada um dos sujeitos possa revelar
seus conhecimentos e, a partir deles, sistematizar novas aprendizagens com o intuito de
transformar a sociedade.
Cabe destacar que, nos anos 1990, houve novas mudanças na economia e,
em consequência, na educação, pois o projeto neoliberal se estabeleceu no contexto
mundial, refletindo, por meio do mundo globalizado, a exclusão social e cultural. Desse
modo, esta autora evoca que as necessidades impostas pela política neoliberal requer
refletir o contexto educativo, pois “[...] exige um balanço crítico do caminho realizado,
assim como a construção de novas categorias e práticas sociais que respondam aos
desafios do momento. Supõe ressituar o trabalho desenvolvido com um olhar diferente.”
(CANDAU, 2011, p. 72) Nesse intuito, a autora anuncia a necessidade de tecer algumas
indagações sobre a Didática e de perceber os “temas emergentes” (CANDAU, 2011, p.
72).
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Candau (2011, p. 72) atesta que chegou a pensar que a contraposição entre a
“[...] concepção instrumental e as diferentes abordagens críticas da Didática” já
estivesse superada, pois, como se sabe, a discussão sobre Didática vem se configurando
desde os anos 80. Contudo, Candau (2011) evoca que, no ano de 1996, ao ministrar o
curso de Didática para alunos de licenciatura de diversos cursos, a fim de interagir com
a concepção da Didática pelos acadêmicos, “fui-lhes perguntando o que esperavam
dessa disciplina [...]” (CANDAU, 2011, p. 75). A autora diz que os professores
declararam no decorrer da formação em serviço a utilização da didática instrumental na
perspectiva da prática pedagógica.
Nesse sentido, a autora conclui que essa investigação levou a perceber que
essa linha constitui “a visão dominante nas representações profissionais da área do papel
da Didática” (CANDAU,2011, p. 75). Isso mostra que a educação esquadrinhada ainda
preconiza práticas pedagógicas assentadas na Didática instrumental.
Essa Didática ainda se vê retratada na perda de autonomia dos professores,
mediante controles externos aos quais são submetidos programas e currículos e se
destinam a atender às necessidades da hegemonia econômica, pois um exemplo dessa
realidade pode-se constatar por meio dos exames e das formas de avaliação externa que
refletem o rigor desse controle (AFONSO, 2008).
Desse modo, apoiamo-nos em Candau (2012) ao ponderar a relevância da
pesquisa no propósito de desvelar caminhos para superar práticas pedagógicas que se
apoiam na Didática aprisionada no instrumentalismo. Seguindo esse raciocínio, é
preciso conhecer a representatividade da Didática para intervir no contexto da sala de
aula de maneira comprometida com as culturas e diferentes sujeitos que perpassam e
interagem no cotidiano escolar.
Em resumo, pelas explanações teóricas elencadas no decorrer do texto,
pode-se vislumbrar a urgência da academia e da instituição escolar trilharem o mesmo
caminho, no sentido de avançar, focalizar estudos e práticas pedagógicas que possam
aliar o universo da sala de aula, a Didática e as questões sociais no processo educativo.
Assim, a Didática precisa ser contextualizada e reconfigurada frente às transformações
que permeiam a sociedade e a educação e, nessa tendência, contribuir para a
materialização da democracia, formação de sujeitos críticos e emancipação social.
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A contribuição da escola para superação das desigualdades sociais: o que pensam
os professores
Consideramos relevante essa investigação para entender a concepção
dos/das professores/as sobre a contribuição da escola para a superação da desigualdade
social afinal, o trabalho docente é protagonista nos espaços educativos, principalmente
para a população menos favorecida socialmente, que tem nas escolas públicas a
esperança de obter uma formação que lhes possibilite o direito de vivenciar uma
cidadania de qualidade. Para versar sobre uma educação democrática, visando
consolidar uma educação com justiça social capaz de superar a desigualdade social,
cabe apreciar a seguinte asserção de Guimarães-Iossif (2009, p. 206):
O sonho de uma escola pública ética, que nos inspire e que nos emancipe, é
um sonho urgente e viável. Para existir, essa escola precisa de nossa defesa,
da nossa participação, da nossa luta. Defender a escola pública de qualidade
para as minorias sociais, étnicas e raciais é a defesa contra a pobreza, contra a
desigualdade e contra a negação da cultura e dos direitos dos povos
marginalizados no Brasil e no mundo.
Expressamos concordância com a assertiva da autora acima, pois é fato que
a escola pública já existe, mas é necessário cerrar fileiras para que a educação
disponibilizada nesses espaços traga novos significados que possam realmente
transformar a sociedade No entanto, apesar dos estudos e pesquisas que sinalizam os
princípios que deveriam delinear uma escola democrática e compromissada com a
superação da desigualdade social, sabemos da existência de muitos entraves que
precisam ser contestados, como, por exemplo, a hegemonia do capital econômico que
dita as regras para a educação, limitando sua autonomia.
Daí a relevância de perseguir coletivamente caminhos para consolidar uma
educação bem sucedida. Consoante esse raciocínio, Arroyo (2010) chama atenção para
as políticas propostas para a educação, pois seguem isoladas das fronteiras que
caracterizam as desigualdades, onde os sujeitos vivem e externam suas lutas. Seguindo
esse viés, somos convocados a apreciar a explanação de Arroyo, que denota sua
inquietude ressaltando que “As desigualdades escolares, educativas, continuam
pensando-se como as desigualdades produtoras de todas as desigualdades sociais,
econômicas, dos campos e periferias” (ARROYO, 2010, p. 1397).
Conforme os autores que estamos utilizando, a escola é uma das instâncias
sociais que pode contribuir com a construção de uma sociedade mais justa, mas a
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democratização econômica é imprescindível para a construção da justiça e a diminuição
das desigualdades. Desse modo, a educação, e no caso da nossa reflexão, a educação
escolar, sozinha, como já dizia Freire, não muda a sociedade, mas sem ela a sociedade
tampouco muda.
Partindo desse pressuposto, Arroyo (2010) ainda afirma que a confiança
depositada nas virtudes da democratização da educação básica se vê desacreditada até
pelo Estado que se encarrega de desenhar as políticas sociais, assim como para a
educação. Essas considerações evidenciam que as políticas do governo, apesar de
buscarem a superação da desigualdade social, não têm se mostrado eficazes, uma vez
que as desigualdades continuam existindo. Convergindo com esses princípios, o
professor José manifestou a sua descrença no sistema escolar como possibilidade para
superar as desigualdades sociais e, enfatizou a contribuição da escola na perspectiva de
treinar a população para receber baixos salários; além disso, de maneira crítica, sugere
ainda que talvez o objetivo do governo seja manter a população subjugada, evitando que
ocorra a superação das desigualdades.
[...] O sistema educacional do país como é, não. [...]Eu não acho que é culpa
do aluno, nem dos pais do aluno, nem do professor, menos ainda do
professor. Pra mim, é óbvio que não está explícito, não está no PCN, não está
em nenhuma política, mas a função da escola talvez realmente seja
marginalizá-los. Continuar deixando à margem para que não evoluam
intelectualmente, pra que não possam mexer nesse sistema. Para que não
consigam contribuir para uma mudança. Eu acho isso. Então, a culpa, talvez
o culpado seja o governo que tem que manter esse sistema, e a forma de
manter esse sistema é manter a sociedade dessa forma, calada, acrítica e
marginalizada. (PROFESSOR JOSÉ).
Diante das inquietações manifestadas no depoimento acima, concordamos
que “[...] a pedagogia que usamos deve ser capaz de inflacionar a capacidade humana de
lutar contra as forças dominantes, ao mesmo tempo rejeitando o desespero e a
capitulação do status quo. [...].” (McLAREN, 1997, p. 266-267). Nesse sentido, pode-se
compreender a relevância da pedagogia crítica, principalmente quando nos chama
atenção para o compromisso que deve conter no propósito de formar cidadãos imbuídos
de conhecimentos que lhes darão subsídio na luta pela superação das desigualdades
sociais que assolam a sociedade.
Chama-nos atenção, nesse sentido, o seguinte depoimento do professor
Lucas. Ao explanar a contribuição da escola na superação da desigualdade social,
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expressa que a escola tem a função de educar para a cidadania, o que levaria a superar a
“questão” da desigualdade social; contudo, quando aborda a formação para a vida, deixa
pairar a incerteza dessa cidadania. “Na verdade, hoje, a escola faz a função tanto de
formar alunos em termos de conhecimento e também como cidadão. [...] essa formação
de cidadania acaba influenciando cada dia para superar essa questão da desigualdade,
prepara para o emprego, entre aspas prepara pra vida.” (PROFESSOR LUCAS).
Não muito distante da concepção expressa pelo professor acima, o
depoimento do professor Antônio nomeia vários elementos que qualificam a escola
pública como um meio para superar as desigualdades sociais. No seu relato, externa
memórias que traduzem a relevância da escola para sua vida.
Eu penso e vou pegar uma realidade de vida da minha parte. Quando eu tinha
8 anos de idade, o meu pai ficou quebrado, falido. Se não fosse a escola
pública. [...] Eu creio que à medida que a gente agregar mais elementos para
a escola, por exemplo, nós deveríamos nas nossas escolas ter psicólogos [...]
Eu creio também que a questão do tempo integral é uma situação que nós
vamos ter que utilizar mais, [...]. Então, por isso que eu acredito que a escola
é um meio para superar essa desigualdade social. (PROFESSOR
ANTÔNIO).
O professor Antônio ainda defende a ampliação das escolas de tempo
integral ao enfatizar o valor da escola para superar as desigualdades. Já o relato da
professora Sílvia sobre a escola de tempo integral apresenta olhar crítico ao externar que
a inserção na instituição educativa não é suficiente para superar as desigualdades
sociais: “[...], ela [isto é, a escola de tempo integral] pode contribuir muito, sim, com
certeza. Agora, garantir, assegurar que seria uma solução total, isso não”.
O depoimento da professora Eliza denota otimismo quanto ao desempenho
da escola na superação das desigualdades sociais. “A escola está sempre contribuindo,
fazendo o máximo! [...]. Alunos que saíram daqui e estão em escolas particulares,
Ganharam bolsa, claro, por causa do desempenho deles”. (PROFESSORA ELIZA). O
relato da professora Eliza nos inquieta ao retratar o mérito como possibilidade para a
aquisição de bolsas nas escolas privadas. Desse modo, apoiamo-nos em Gentili para
discorrer sobre o direito à educação na sociedade. “O direito à educação torna-se assim
a quimera de um sistema que consagra a distribuição desigual dos benefícios
educacionais como o resultado natural de um mercado que premia e castiga os
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indivíduos em virtude de seus supostos méritos cognitivos [...]”. (GENTILI, 2009, p.
1070).
As explanações da professora Laura delineiam diversos elementos que
considera relevantes para que a instituição escolar possa oferecer uma educação
comprometida com a igualdade dos sujeitos “Então, a gente trabalha muito a
afetividade, dialogando, mostrando o que é certo, o que é errado... [...]. A escola, ela faz
a diferença, sim. Precisamos do apoio da família, do governo, são os pilares, mas
também da escola.” LAURA (PRFESSORA).
Notadamente, o depoimento da professora Laura coloca em relevo a
afetividade como prioridade escolar tanto para superar metas educativas quanto para
contribuir com a superação da desigualdade social. Em relação à importância que a
professora Laura atribui à afetividade no espaço escolar, amparamo-nos em Freire
(2005, p. 29) ao afirmar que “ama-se na medida em que se busca comunicação”; assim,
aproximar-se dos diferentes sujeitos com suas trajetórias de vida traduz uma prática
educativa que pondera a humanização. Freire (2005, p. 29) ainda evoca de maneira
incisiva que “Quem não é capaz de amar os seres inacabados não pode educar. Não há
educação imposta, como não há amor imposto. Quem não ama não compreende o
próximo, não o respeita” (FREIRE, 2005, p. 29). Essa assertiva salienta a
responsabilidade da educação no sentido de materializar uma didática que conduz uma
aprendizagem de qualidade para os diferentes sujeitos que buscam a escola para
conquistar seu espaço na sociedade.
Nesse universo de depoimentos dos/das professores/as sobre a contribuição
da escola para superar as desigualdades sociais, percebemos que os relatos, na maioria
das vezes, procuraram revelar os caminhos que a escola deve percorrer para contribuir
com a superação das desigualdades. Nesse cenário, chamou-nos a atenção o fato de
alguns relatos evidenciarem a necessidade de outros elementos sociais estarem
alinhadas com a escola na perspectiva de consolidar mudanças na educação. Isso
significa que a educação isoladamente não pode produzir os resultados que muitos
esperam da escola. Nesse sentido, é possível atestar no diálogo do/da professor/a o olhar
crítico sobre as desigualdades que caracterizam o contexto da sociedade.
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Conclusão
Em resumo, pelas explanações teóricas elencadas no decorrer da pesquisa,
pode-se vislumbrar a urgência da academia e da instituição escolar trilharem o mesmo
caminho, no sentido de avançar, focalizar estudos e práticas pedagógicas que possam
aliar o universo da sala de aula, a Didática e as questões sociais no processo educativo.
Assim, a Didática precisa ser contextualizada e reconfigurada frente às transformações
que permeiam a sociedade e a educação e, nessa tendência, contribuir para a
materialização da democracia, formação de sujeitos críticos e emancipação social.
A análise que se dedicou em constatar as concepções dos/das professores/as
sobre a contribuição da escola para a superação das desigualdades sociais nos leva a
considerar, a diversidade de relatos dos/das professores/as. Assim, alguns concordam
que a escola contribui para superar as desigualdades, enquanto outros descrevem os
caminhos que a escola deve percorrer para superar as desigualdades. Algumas
concepções exprimem que a escola por si só não pode contribuir para o fim das
desigualdades, pois a educação está sistematizada conforme os interesses das políticas
que a direcionam de acordo com os propósitos capitalistas. Desse modo, a população
torna-se acrítica. Além disso, há relato que expressa a necessidade da família e governo
estarem alinhadas com a escola para consolidar mudanças na educação, o que denota
que a educação isoladamente não pode alcançar os resultados que muitos esperam da
escola. Nesse sentido, é possível atestar nas manifestações dos/das professores/as o
olhar crítico sobre as desigualdades que permeia o contexto da sociedade.
Os dados revelados na pesquisa confirmam a necessidade de as políticas do
governo direcionadas para a educação empreenderem um projeto educativo que
assegure a qualidade de aprendizagem para todos os/as alunos/as, independentemente
das suas condições socioeconômicas, políticas e culturais, pois a educação configura
uma das possibilidades para transformar a sociedade na perspectiva de consolidar ideais
e ações capazes de superar as desigualdades sociais.
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A PROBLEMÁTICA AMBIENTAL E A EDUCAÇÃO AMBIENTAL: O QUE
PENSAM OS PROFESSORES NA ESCOLA SUSTENTÁVEL
Suzete Rosana de Castro Wiziack (UFMS)
Resumo
O artigo apresenta parte dos resultados alcançados em uma pesquisa de doutorado em
Educação concluída em 2015 que visou: “compreender os limites e as possibilidades da
formação docente para a EA que priorize a dimensão crítica e a realidade
socioambiental da escola, para a construção de concepções críticas de educação e
currículo, que potencialize um quefazer comprometido com a justiça ambiental”. A
reflexão se dá em relação às concepções sobre a problemática ambiental e a Educação
Ambiental (EA) segundo professoras e professores envolvidos em um projeto
desenvolvido em uma escola pública de Campo Grande -MS, participante do Programa
Escolas Sustentáveis - “Processo de Formação Escolas Sustentáveis e Com Vida”, que é
realizado em várias regiões do Brasil, sob a coordenação do Ministério da Educação e
universidades federais. A investigação ancora-se nas teorizações críticas de educação,
tendo a pesquisa qualitativa como proposta de investigação, pela qual se utilizou como
instrumentos teórico-metodológicos entrevistas semiestruturadas com os sujeitos da
pesquisa (professores de diferentes áreas do conhecimento), observações no cotidiano
escolar e análise documental de propostas oficiais de formação de educadores
ambientais e de documentos da escola. As concepções dos professores revelam
intencionalidades, necessidades e formas de se alcançar uma educação ambiental
transformadora na escola. Os resultados evidenciam uma prática docente voltada aos
alunos e as suas realidades, em consonância com processos emancipatórios que visam
questões sociais, culturais e políticas.
1 Introdução
O artigo reflete as concepções sobre a problemática ambiental e a Educação
Ambiental de professores e professoras de diferentes áreas do conhecimento de uma
escola que desenvolve a Educação Ambiental e que foi partícipe do “Programa Escolas
Sustentáveis – Processos Formativos em Educação Ambiental”.
O texto apresenta parte dos resultados e reflexões realizados em pesquisa de
doutorado em educação, cujo objetivo geral foi: compreender os limites e as
possibilidades da formação docente para a EA, que priorize a dimensão crítica e a
realidade socioambiental da escola, para a construção de concepções críticas de
educação e currículo, que potencialize um quefazer comprometido com a justiça
ambiental.
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Desenvolvido por universidades federais e o Ministério da Educação, este
programa visa à formação de professores, gestores e alunos de escolas num tripé
teórico-metodológico de enfoque na gestão, no espaço e no currículo escolar.
Com base nisso, a investigação situa-se no universo da escola, considerando que
a mesma, participou do Programa Escolas Sustentáveis e deu prosseguimento as suas
ações, com um projeto de Educação Ambiental desenvolvido na instituição.
O Programa atende a implantação da Política de Educação Ambiental no Brasil e
das Diretrizes Nacionais para a Educação Ambiental, sendo dirigido especialmente à
formações de professores, gestores e alunos e visa a inserção da EA nos currículos das
escolas brasileiras. Realizado a partir de 2010, sob a coordenação da Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão/SECADI/MEC, o
programa em Mato Grosso do Sul está sob a coordenação da Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul.
Cabe mencionar que nos últimos anos no Brasil, a EA ganhou espaço nas
escolas e no Ministério da Educação, sobretudo nas ações de formação de professores,
referendada pelas legislações que amparam seu desenvolvimento, pelas pesquisas que
comprovam sua presença e pela importância que lhe é concedida nas escolas, sobretudo,
pelos educadores ambientais que aderem a essa proposta educativa.
Ainda cabe considerar que a EA na escola pressupõe considerá-la no campo
curricular dessa instituição, entre várias outras reivindicações presentes atualmente no
currículo das escolas brasileiras. Com o apoio de Arroyo (2011) e de outros
curriculistas, busca-se compreendê-la como um dos protagonismos escolares, que a leva
a um território em disputa, sobretudo pelas questões e normatizações advindas de fatos
postos na dinâmica social e nos processos de seus protagonismos vistos atualmente.
Na reflexão assume-se a perspectiva crítica de EA, compreendida como práxis
educativa e social, cujos valores e ações “possibilitem o entendimento das realidades de
vida e atuação lúcida e responsável de atores sociais individuais e coletivos no
ambiente” (LOUREIRO, 2011, p. 73).
Com esse sentido, a EA crítica deve incidir/superar “armadilhas paradigmáticas”
que nos impeçam compreender a problemática socioambiental e a EA, em seu caráter
político, social, econômico e culturas, além de propiciar/favorecer processos educativos,
nos quais “estejamos educando e educadores, nos formando e contribuindo, pelo
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27
exercício de uma cidadania ativa, na transformação da grave crise socioambiental que
vivenciamos todos (GUIMARÂES, 2004, p. 30-31).
A preocupação com as armadilhas paradigmáticas se justifica para autor, pois
em sua concepção, embora muitas vezes bem intencionados, os educadores ficam presos
a elas, tendendo a perpetuar a mesma tendência “reprodutora de uma realidade
estabelecida por uma racionalidade hegemônica.” (GUIMARÃES, 2006, p. 23).
Coerente com tal premissa, e reafirmando a EA como uma alternativa educativa
emancipatória e potencializadora do fazer político do professor, busca-se refletir um
quefazer docente, intrinsecamente relacionado às concepções e ações dos envolvidos
com a EA crítica, capaz de subverter tal tendência.
Nesse sentido, o quefazer remete às novas formas de pensar e agir dos sujeitos.
Este conceito, cunhado por Paulo Freire, refere-se à “leitura crítica do mundo”, que é
“um quefazer político-pedagógico indicotomizável do que envolve a organização dos
grupos e das classes populares para intervir na sociedade” (FREIRE, 2014, p. 47).
Com esse pressuposto, a EA visa a justiça ambiental, e esta compreendida como
a promoção de uma melhor qualidade de vida a todos os grupos sociais, livre de riscos
ambientais, com acesso às informações e aos recursos e bens ambientais. A justiça
ambiental ressignifica a problemática ambiental, pois a coloca se maneira nas arenas
onde os embates sociais ocorrem (ASCELRAD, 2010).
Com isso, a problemática ambiental e a EA mostram-se no caminho para a
problematização da realidade, de valores, atitudes e comportamentos capazes de rever
novos modos de vida, numa “postura anticapitalista”, conforme o dizer de Löwy (2005).
Dessa forma, a EA é atividade emancipatória que se ancora em um currículo
crítico, pelo qual as questões culturais, socioambientais e políticas se fazem presentes
nas práticas de ensino.
Portanto, busca-se refletir por meio das concepções de professores e professoras,
as potencialidades de se fazer presente na escola processos emancipatórios voltados às
questões socioambientais e a Educação Ambiental.
1.1 Questões teórico-metodológicas da pesquisa
Para realizar a investigação utilizou-se da abordagem qualitativa da pesquisa em
educação, como metodologia pertinente e coerente com o campo empírico que buscou-
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se compreender, sobretudo pela aproximação significativa do cotidiano da escola, da
vida real dos sujeitos (OLIVEIRA, 2010).
Como enfatizado, o campo empírico da pesquisa é o de uma escola localizada
em Campo Grande - MS. Os sujeitos da pesquisa são 10 professores dessa escola. No
entanto, neste trabalho, para efeito de reflexão realizada, colaboram 06 professores
participantes do processo investigativo.
Na produção e análise dos dados, o estudo de caso etnográfico, delineou a
investigação, segundo a perspectiva de André (2005, p. 19) considerando-a “um estudo
em profundidade de um fenômeno educacional, com ênfase na sua singularidade e
levando em conta os princípios e métodos da etnografia”.
Como procedimentos de investigação, além dos estudos teóricos, foram
realizadas entrevistas semi-estruturadas, observações na escola e análise de documentos.
Como apontado anteriormente, a seguir, apresenta-se alguns dos resultados alcançados
na compreensão dos professores sobre a Problemática Ambiental e a Educação
Ambiental.
2 A Compreensão sobre a Problemática Ambiental e a Educação
Ambiental, segundo os profissionais da Escola Investigada
Na fala dos profissionais da escola, sujeitos da pesquisa, a ideia de pertencimento
ao ambiente foi recorrente e a “localidade” mostra-se como o caminho para que se possa
compreender o ambiente, ou seja, na concepção dos professores, o que é próximo ao
aluno deve ser trabalhado pelo professor, porque permite a sua percepção. Vejamos a
seguir o dizem os professores.
O professor Geraldo se posiciona indicando a necessidade de o aluno perceber-se
inserido no ambiente:
A Educação Ambiental seria ter consciência de que estou
inserido em um ambiente, ter consciência de onde estou. Esse
ambiente depende de minhas ações, as minhas atitudes definem
esse ambiente. Não quero salvar a Amazônia [se] eu estou
longe desse ambiente, se eu não sentir que a Amazônia faz parte
do meu ambiente...
A Professora Carmem focaliza a escola e a cidade onde seus alunos vivem como
o eixo inspirador de sua prática pedagógica: “... eu parto desse princípio, o meio que a
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criança está inserida, eu parto desse ambiente, [por exemplo] do pátio da escola”. Ou
seja, a professora indica a necessidade de a escola enfocar o cotidiano vivenciado pelos
alunos na escola, sobretudo porque é nesse espaço que os problemas imediatos podem
ser resolvidos. Para a professora, a EA demanda o trabalho com valores necessários à
cidadania. Vejamos:
Você deve trabalhar vários valores com a EA, o valor enquanto
cidadão, enquanto pessoa, a relação com o dinheiro, pois as
pessoas estão muito voltadas para a economia, a EA está acima
do trabalho que tanto dizem para a gente fazer com a
tecnologia, porque a Educação ambiental é um problema de
todos, envolve o planeta (Profa. Carmem).
Sobre a problemática ambiental infere a professora:
A problemática ambiental, ela é muito importante, eu me
preocupo muito com o amanhã, então se as pessoas continuarem
a agir como se não estão vendo nada.... É preciso ter mais
pessoas envolvidas, um envolvendo o outro. Existe também
aquele profissional que se envolve só no seu saber. Eu às vezes
me assusto com o que está acontecendo com a camada de
ozônio. Porque cada vez mais está calor. As enchentes, a
poluição do ar. O que eu vejo acontecendo em São Paulo,
aquela cidade imensa. Campo Grande não tá longe disso, tem
muito carro nas ruas. Eu vejo um futuro muito preocupante. Eu
falo para meus amigos: e o problema do consumismo, a pessoa
não precisar e comprar. Sabe: a pessoa deve comprar o
necessário, as pessoas fecham os olhos para isto (Professora
Carmem).
Da mesma forma a Professora Eva aponta o meio próximo e seus problemas
como o conteúdo a ser trabalhado pelos docentes.
A problemática ambiental está aí, tá de bandeja. O professor
[para trabalhar a EA] primeiro ele tem que compreender o que
está em seu entorno, para depois ter uma visão global. A
questão dos resíduos sólidos, a questão da água, por exemplo,
ele precisa entender esse contextinho para entender o mundo
dele.
A Professora Helena chama a atenção de aspectos da regionalidade como forma
de valorização do ambiente e da apropriação social de seus recursos.
Sabe, se a gente não valoriza o que temos, começa a perder.
Acho que falta informação mesmo, do que nós temos, se você
não valoriza, vem o outro e aí... Taí a Amazônia, que é um fato.
Se a gente não valoriza o que tem, aquilo já não te pertence. [...]
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Hoje nós temos Bonito aqui, as pessoas ficam de olho. O tempo
todo, começam a investir, investir. Me preocupo com uma
política nacional, sabe, realmente que não seja interesse
meramente político, mas interesse pelo ser humano mesmo. Se
a gente não fizer, a começar pela informação, a começar pelas
escolas fundamentais (Professora Helena).
A professora refere-se ao um dos municípios do Mato Grosso do Sul, conhecido
mundialmente pelo turismo voltado às áreas naturais. No entanto, a forma como a
atividade turística em Bonito vem sendo desenvolvida, não tem permitido que a
população do estado tenha acesso aos seus bens e recursos. Dessa forma, a professora
chama a atenção para o acesso às “informações” necessárias à compreensão do
ambiente.
Tal questão remete à ideia de que é preciso conhecer para compreender e
proteger, o que pode remeter a uma visão de EA em que “nas relações inerentes aos
sistemas ditos naturais, se impõe um retorno à condição natural, o que se faz
frequentemente desconsiderando as demais formas de relações sociais e culturais”
(LOUREIRO, 2008, p. 6). Mas, neste caso, a professora indica a questão político-
econômica que permeia as formas de planejamento no Brasil.
Com isso, é possível transcender a localidade para observar outras questões que
remetem às escalas e às territorialidades, o que é muito interessante para a compreensão
da problemática ambiental, como o pano de fundo do tema meio ambiente na escola,
aspecto apontado pela Professora Fabiana que aponta: “Eu acho assim, [a questão
ambiental] ela veio por questões globais. Na parte política, a obrigatoriedade vem desse
contexto global. Mas a minha contextualização vem do contexto local. Para mim é meu
ambiente” (grifo nosso).
Sobre isto Porto Gonçalves (2014) entende que a sociedade exerce
permanentemente um diálogo com o seu território imediato, e esse diálogo inclui as
coisas naturais e artificiais, a herança social e a sociedade em seu movimento atual.
Indica o pesquisador que a percepção do local é uma forma de empoderamento de povos
e comunidades. Entretanto, o pesquisador faz um alerta para o fato de que existem
contradições nos discursos veiculados pelas grandes potências, sobretudo em relação à
ênfase dada ao nacionalismo em que:
... chegou-se a falar do fim das regiões e a condenar-se a escala
nacional, sobretudo quando inspirava movimentos políticos de
caráter nacionalista, sobretudo quando protagonizados desde a
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América Latina, a Ásia e a África, muito embora esse espírito
nacional e mesmo nacionalista seja extremamente forte e
alimentado entre os estadunidenses, os franceses e os ingleses
para nos restringir a países onde, com frequência, se fazem as
maiores críticas aos nacionalismos quando emanados da
periferia do sistema mundo. Enfim, parece que o nacionalismo
só é válido quando invocado pelas grandes potências coloniais
(PORTO GONÇALVES, 2014, p.7).
Considerando fundamentais tais questões para a compreensão da problemática
ambiental faz muito sentido o que diz a Professora Helena e também a que apresenta a
professora a Professora Fabiana. Vejamos:
Eu acho assim, [a questão ambiental] ela veio por questões
globais. Na parte política, a obrigatoriedade vem desse contexto
global. Mas a minha contextualização vem do contexto local.
Para mim é meu ambiente (grifo nosso).
Em sua fala, a professora evidencia a compreensão de questões globais, sobretudo
o enfoque político da questão ambiental, mostrando que, em seu trabalho parte do
contexto local a abordagem educativa.
Mas ainda em relação a essa compreensão, o professor Antonio chama a atenção
para o perigo das simplificações que são realizadas no tratamento dos problemas
ambientais, o que em sua concepção, torna comprometido o seu tratamento na escola,
aspecto que dificulta uma Educação Ambiental articulada com a cidadania.
Entende-se que essa forma de compreensão, coaduna com uma educação
ambiental crítica, para além de uma concepção bancária/comportamentalista de EA,
conforme o que aponta Freire (2000) e Guimarães (2004, 2006).
A problemática ambiental nos dias atuais? Ela é uma
problemática que de certa forma, acaba sendo lembrada
somente... vou colocar assim, (risos) por umas poucas pessoas,
por uma minoria que acaba lembrando dessa problemática e a
grande mídia... E, a classe política que deveria tomar a frente...
alguns utilizam ela na verdade até mesmo no palanque. Isso é
nível mundial é uma questão que é responsabilidade de todos,
não é só a classe política, volto a dizer, que deveria tomar a
frente, que tem condições de resolver certos problemas que não
resolve, mais uma questão de todos, questão de consciência, de
cada um fazer sua parte. Campanhas publicitárias pequenas às
vezes as pessoas acham que fazem diferença, como aquela do
fazer xixi no banho, acham que aquilo vai fazer uma diferença
enorme na sociedade, mas não faz, acaba virando uma piada. Às
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vezes uma coisa que era para ser interessante, ah vamos
economizar água, faça xixi no banho, por exemplo, vira uma
piada, então é uma coisa que precisa ser melhor tratada.
Inclusive na escola, principalmente na escola, pois é como eu
disse no começo, aqui da escola é que saem os cidadãos de
amanhã (Prof. Antonio).
De forma correlata, o Prof.Geraldo alude ao modo de produção capitalista e
consequentemente, ao modo de vida inerente ao seu modelo como obstáculo para a
resolução da problemática ambiental e o desenvolvimento da EA. Vejamos:
A Problemática ambiental? Vejo sem solução numa sociedade
que queima combustível fóssil, em que estou me envenenando
todos os dias. Se eu tenho combustível fóssil, porque vou gastar
dinheiro com energia limpa. O Lixo? Há fica muito caro o
aproveitamento do pneu, se eu tenho. Então, enquanto esse
troço não acabar. Pode ser que eu tenha uma tomada de
consciência coletiva. Mas todo mundo quer ser classe
dominante (Prof. Geraldo).
O professor evidencia uma central questão presente na reflexão da problemática
ambiental e da EA, aspecto referendados pela ecologia política, conforme aponta
Loureiro (2012, p. 29), ou seja, “[...] a atenção nos modos que agentes sociais, nos
processos econômicos, culturais e político-institucionais disputam e compartilham
recursos naturais e em qual contexto ecológico tais relações se estabelecem.
Segundo Loureiro, [...] os limites presentes nas relações materiais estabelecidas
com a natureza e que são denunciados pela crise ambiental, apontam para a existência
alienada, destrutiva e acumuladora da riqueza. No dizer do pesquisador, a Ecologia
política advinda desse movimento mostra que “só é possível sustentar certo padrão de
vida para alguns em detrimento do péssimo padrão de vida para outros e com base no
uso abusivo da natureza” (LOUREIRO, 2012, p. 19-20).
Para o autor, numa “aliança teórica”, a EA crítica, a justiça ambiental e a
ecologia política representam, “em seus campos particulares, oportunidades de
enfrentamento contra-hegemônico da realidade socioambiental” (LOUREIRO;
LAYRARGUES, 2013, p. 68).
Porto Gonçalves (2012) indica que a crítica à escala nacional contribuiu para
esvaziar o profundo sentido político das escalas local e regional. Infere que o
slogan Agir Localmente e Pensar Globalmente convidou as comunidades para
privilegiarem as ações locais. No entanto, muitas vezes, as comunidades ao privilegiar
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somente a escala local se fragilizou politicamente, sobretudo diante de grandes
corporações que agem em todas as escalas (global, nacional, regional e local).
Dessa forma, o pesquisador chama a atenção às dimensões políticas que precisam
ser compreendidas em todas as escolas, processo que atualmente se relaciona com a
globalização.
Para Milton Santos (2000),
[...] os lugares tornam-se um dado essencial do processo
produtivo, em todas as suas instâncias, e passam a ter um papel
que não tinham antes. A globalização revaloriza os lugares e os
lugares – de acordo com o que podem oferecer às empresas –
potencializam a globalização na forma em que está aí,
privilegiando a competitividade. Entre o território tal como ele é
e a globalização tal como ela é, cria-se uma relação de
causalidade em benefício dos atores mais poderosos, dando ao
espaço geográfico um papel inédito na dinâmica social
(SANTOS, M., 2000, p. 22-23).
Com esse sentido, afirmam os pesquisadores que a noção de território pressupõe
a noção das territorialidades, estas se afirmam nas relações sociais e culturais e estão
imbricadas por relações de poder.
Evidentemente, uma problemática tão complexa exige conscientização e ação
coletiva que extrapola a escola enquanto uma instituição e não poderá sofrer
simplificações. Ao perceberem isto, os professores aludem a questão ambiental e sua
abordagem crítica na escola como um caminho para se desenvolver a EA.
A questão apontada pelos professores, em nosso entendimento, deve ser parte
de qualquer formação docente em EA, tanto a inicial, como a continuada. Saber como
trabalhar didaticamente o tema é inerente às práticas pedagógicas do professor e os
professores entendem a importância disso e aludem a sua necessidade. Os professores e
as professoras, além de apontarem à complexidade da questão ambiental, se mostram
abertos e próximos ao debate ambiental e à Educação Ambiental como uma ação
importante a ser efetivada na escola. Compreende-se que tais professores e a escola se
encontram em etapa interessante para ampliar a reflexão que permitirá o
prosseguimento de ações de formação e de prática docente críticas.
Considerações finais
Com as concepções dos professores apreende-se revelações que permitem
compreender fendas da realidade social e escolar, o que explicita questões presentes na
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cultura escolar, que em nosso entendimento, se forem conhecidas pelos profissionais
dessa instituição e transformadas em reflexão e ação, podem contribuir ou mesmo
manifestar-se como formas do quefazer em EA.
Sabemos com Sacristán (2000, p. 89) que:
“ [...] o currículo é também o projeto cultural que a escola torna
possível. Não é que qualquer fator que incida no currículo deva
ser considerado como um componente estrito do mesmo, mas
que, ao considerá-lo como a cultura que a escola torna possível,
os determinantes escolares se convertem algumas vezes em
fontes de estímulos educativos diretos e, em qualquer caso,
moduladores das propostas curriculares.
Se a escola e seus professores considerarem isto como um processo de reflexão e
ação, esta instituição e seus profissionais poderão encontrar mais estímulos para que, de
fato, se promova mudanças mais abrangentes na gestão e no currículo escolar, de modo
a atingir a escola como um todo, pois no conjunto de nossa investigação vimos um fazer
ainda a ser realizado para esse alcance.
As análises realizadas sobre a problemática ambiental e as concepções e da EA
denotam de forma propositiva, sua potencialidade no currículo revelado pelos
profissionais da escola.
A potência disso é que se quer transformar a prática. Mas isto não significa
dizer, com o apoio de Loureiro, que o ato educativo seja suficiente para gerar um o
processo e um sujeito ético (2012). O que tem centralidade nessa reflexão é a
possibilidade de uma práxis educativa ancorada na atividade consciente das professoras
e dos professores.
Por meio de suas concepções, os professores indicam a necessidade de uma
contínua reflexão que aprofunde a compreensão da EA no ambiente escolar, portanto,
em direção à práxis manifestada na indissociabilidade entre teoria-prática. Isto, de fato,
poderá permitir a permanente reflexão das condições de vida, e das condições postas na
prática concreta na escola.
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