Conflitos usos água Ceará

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CONFLITOS PELO USO DA GUA NO ESTADO DO CEAR: O ESTUDO DE CASO DO VALE DO RIO CARSMaria INS Teixeira Pinheiro; Jos NILSON B. Campos; TICIANA M. de Carvalho Studart; ARNALDO Pinheiro Silva Maria INS Teixeira PinheiroEng. Civil, Gerente de Monitoramento/Desenvolvimento Institucional da Secretaria dos Recursos Hdricos do Estado do Cear, SRH, Av. General Afonso A. Lima, S/N Centro Administrativo Cambeba, Edifcio SEDUC Bloco C 1 Andar, Fortaleza, Cear, Brasil, 60.819-900, (85) 3488.8555, [email protected]

Jos NILSON B. CamposEng. Civil, Professores do Departamento de Engenharia Hidrulica e Ambiental, UFC, Campus do Pici, Centro de Tecnologia, Bl. 713, Fortaleza, Cear, Brasil, 60.451-970, (85)3288.9623, [email protected]

TICIANA M. de Carvalho StudartEng. Civil, Professores do Departamento de Engenharia Hidrulica e Ambiental, UFC, Campus do Pici, Centro de Tecnologia, Bl. 713, Fortaleza, Cear, Brasil, 60.451-970, (85)3288.9623, [email protected]

ARNALDO Pinheiro SilvaEng Civil, Professor da Gerncia da Construo Civil do Centro Federal de Educao Tecnolgica do Cear, CEFET, Av. 13 de maio 2081, Benfica, Fortaleza, Cear, Brasil, 60.040-531, (85) 3288.3666, (85) 3278.6556, [email protected]

Resumo. A questo da gua tem sido objeto de preocupao em muitas partes do mundo. O Brasil concentra uma das maiores reservas de gua doce do planeta que representa um importante patrimnio natural do Pas. Em regies semi-ridas, como o Nordeste Brasileiro, a escassez da gua agrava substancialmente o problema, principalmente durante a estao seca. No Cear a situao no diferente - com o agravante de apresentar condies climticas e hidrolgicas prprias de climas semi-ridos - e podem ser identificados inmeros conflitos relacionados gua. O presente trabalho enfoca apenas um dentre os vrios conflitos pela gua identificados pelos autores o do Vale do Rio Cars, situado na Regio Hidrogrfica do Salgado, na poro sul do Estado O artigo tem como objetivo a descrio do histrico do conflito, dos atores envolvidos, do processo de negociao, capitaneado pela Secretaria dos Recursos Hdricos SRH e a Companhia de Gesto dos Recursos Hdricos COGERH, do Cear, e da situao atual (2004) encontrada no Vale dos Cars. Palavras chave: negociao, conflitos, Salgado, Cear.

1 - INTRODUO O Estado do Cear est compreendido na poro oriental do Nordeste brasileiro, ocupando uma rea de 143.484,40 km2, onde vivem aproximadamente 7,42 milhes de habitantes, e com uma densidade demogrfica de 51,7 habitantes por km2 (IBGE, Censo Demogrfico 2000). No Estado, as chuvas concentram-se no perodo de janeiro a junho, com poucas precipitaes durante o resto do ano. Esse regime climtico, associado a uma formao geolgica com predominncia de rochas cristalinas (setenta e cinco por cento do Territrio cearense composto de rochas cristalinas), resulta em rios intermitentes que normalmente escoam durante uma parte do ano em que ocorrem as chuvas. Nestas condies, o fornecimento de gua para os diversos usos provido por meio de reservatrios superficiais e, em menor escala, por poos perfurados. A COGERH, criada em 1993, tendo como uma das principais finalidades o gerenciamento das guas de domnio territorial do Estado do Cear, gerencia atualmente 123 audes pblicos (COGERH, fevereiro/2005), parte destes em convnio com o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS). A capacidade total de acumulao dos audes de 17,56 bilhes de metros cbicos, com vazo total liberada de 42 m3/s, sendo esses reservatrios responsveis pela perenizao de aproximadamente 2.000 km de rios intermitentes do Cear. Em anos normais, no perodo de outubro a novembro, quando mais intensa a liberao de gua dos audes, a vazo total varia de 45 a 50 m3/s, o que equivale a um volume mdio liberado de 123 milhes de metros cbicos por ms. Em poca de racionamento, a vazo total liberada chega a atingir aproximadamente 32 m3/s, equivalente a um volume de 83 milhes de metros cbicos por ms, como o ocorrido no ano de 2001, quando houve o racionamento de gua no vale do Jaguaribe. A COGERH, desde sua criao, vem desempenhando o seu papel de gestora de gua bruta no Estado, que tem por meta implementar um modelo de gerenciamento integrado, participativo e descentralizado. A Companhia uma instituio vinculada Secretaria dos Recursos Hdricos do Estado do Cear (SRH/CE) que desempenha as funes de coordenao, regulao e controle do gerenciamento das guas em todo o Estado. Os recursos hdricos, para o Estado do Cear, so fontes de desenvolvimento e a forma de gerenciamento poder comprometer as atividades socioeconmicas. Nesse contexto, cabe ao Governo Estadual, por meio da SRH/CE e COGERH, preservar as disponibilidades hdricas e gerenci-las, da melhor maneira, para que seu uso atenda s demandas instaladas e s futuras. 2 - CONTEXTUALIZAO DOS RECURSOS HDRICOS NO ESTADO DO CEAR A interveno do Estado no Setor de Recursos Hdricos remonta ao incio do sculo XX, com a presena de rgos federais atuando diferentemente nas diversas fases da histria econmica do Nordeste. A interveno, de modo geral, era ocasional e fazia-se de tal maneira a que atendesse eventos extraordinrios, principalmente aqueles relacionados ao fenmeno das secas que atingia os estados da regio. A ao governamental, especialmente no setor hdrico, esteve predominantemente a cargo de rgos federais, com objetivos gerais, atribudos poltica de irrigao do Nordeste, de combater, preventivamente, os efeitos das adversidades climticas e modernizar as atividades agropecurias da regio. Como resultado, h uma dissociao inevitvel entre os objetivos institucionais e as aes propostas nos programas, observando-se tambm que o planejamento se caracteriza pela desarticulao quase total dos rgos envolvidos nos programas. A execuo, geralmente desprovida

de qualquer estratgia de ao integrada, apresenta-se na maioria das vezes com a superposio de esforos, produzindo conflitos nas execues. O planejamento, segundo Souza Filho (2001), uma atividade da administrao de gua e tem como foco a definio da Programao das Aes de Recursos Hdricos. No Estado do Cear, a programao destas aes est bem caracterizada em quatro fases, a saber: Voluntarista; do DNOCS; do DNOCS/SUDENE; e do Estado (atual). As trs primeiras fases tiveram como decisor a Unio, enquanto a quarta competiu ao prprio Governo Estadual. A primeira fase (Voluntarista) d-se no Imprio e caracteriza-se por misses enviadas pela Coroa e pela ausncia, no Nordeste, de organizao institucional que implementasse as aes propostas. Surge, porm, destas misses, a proposio de construir audes (com capacidade acima de um milho de metros cbicos) e so identificados locais barrveis, dando-se incio construo do aude Cedro, em Quixad, considerada a primeira grande obra pblica, concluda em 1906. As segunda e terceira fases foram contnuas e acclicas, constitudas por planos singulares e no permanentes compostos por sucesso de etapas, que visaram implementao de uma infraestrutura de recursos hdricos e a sua utilizao com aproveitamento agrcola. A fase do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) inicia-se com a criao da Inspectoria de Obras Contra as Secas (IOCS), em 1909, e prolonga-se at a criao da Superintendncia de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), em 1959, quando comea a fase DNOCS/SUDENE que surge com Celso Furtado, o primeiro superintendente da SUDENE, procurando relacionar o conhecimento do ambiente natural com as estruturas socioeconmicas. A fase atual pode ser caracterizada por uma transio entre a complementao da infra-estrutura hdrica e o planejamento. Embora algumas aes tenham sido desencadeadas a partir do final da dcada de 1970, o marco inicial desta fase foi a criao da SRH/CE, em 1993. Algumas datas importantes so mostradas a seguir: 1979 Seminrio realizado pela Assessoria de Recursos Hdricos do Governo do Estado, no qual surge a idia da criao de um Conselho Estadual de Recursos Hdricos e da elaborao de um Plano Estadual de Recursos Hdricos; 1983 instituio do Conselho de Recursos Hdricos do CearCRH/CE (Lei no 10.840); 1983 realizao do Plano Diretor de Recursos Hdricos (Plano Zero de Recursos Hdricos); 1987 criao da Secretaria dos Recursos Hdricos do Estado do Cear (SRH/CE) e da Superintendncia de Obras Hidrulicas (SOHIDRA); 1989-1992 elaborao do Plano Estadual de Recursos Hdricos (PLANERH); 1993 criao da Companhia de Gesto dos Recursos Hdricos do Cear (COGERH); 1994 assinatura de um contrato de financiamento com o Banco Mundial para implementao do Projeto de Desenvolvimento Urbano e Gesto de Recursos Hdricos (PROURB-RH); 1994 planejamento participativo da alocao de gua em bacias hidrogrficas; 1995 primeiro estudo de hierarquizao de obras hdricas; 1997-1999 elaborao dos planos de bacias hidrogrficas; 1998 hierarquizao das obras da gesto nas bacias dos rios Curu e Jaguaribe; 1998-1999 concluso da fase de planejamento do Projeto de Gerenciamento e Integrao dos Recursos Hdricos do Cear (PROGERIRH); e

2000 assinatura do contrato de financiamento com o Banco Mundial, do PROGERIRH (LOAN 4531-BR), celebrado entre o primeiro e o Estado. 2.1 Caracterizao Hidrolgica No Cear, as chuvas mais significativas iniciam-se em dezembro de cada ano e podem estender-se at junho ou julho, dependendo das condies ocenicas e atmosfricas atuantes. As chuvas que acontecem em dezembro e janeiro so chamadas chuvas de pr-estao e ocorrem mais intensamente na regio do Cariri. Em fevereiro de cada ano inicia-se a chamada quadra chuvosa do Estado do Cear, que se estende at maio. Nesse perodo, as chuvas so influenciadas, principalmente, pela presena da Zona de Convergncia Intertropical (ZCIT), considerada o principal sistema ocasionador da pluviometria no norte do Nordeste. A pluviosidade mdia anual no Estado de 870 mm; porm essa mdia varia de regio para regio, por exemplo: Litoral Norte, 1.015,5mm; Litoral de Pecm, 941,1mm; Litoral de Fortaleza, 1.223,1mm; Macio de Baturit, 1.152,1mm; Ibiapaba, 1.047,8mm; Jaguaribana, 841,0mm; Cariri 919,6mm; e Serto Central e Inhamuns, 746,5mm (Fonte: Banco de dados FUNCEME). Essa diferena de precipitao recebida de regio para regio denota a variabilidade espacial e temporal das chuvas no Estado do Cear. Alm da m distribuio das chuvas ao longo do ano, o regime pluvial apresenta expressiva irregularidade interanual. A ocorrncia de anos extremamente secos ou exageradamente chuvosos no rara. A flutuao irregular de anos de altas e baixas pluviosidades enseja dois problemas bastante conhecidos pelos cearenses: as secas, que alcanam o Estado como um todo e constituem um flagelo populao; as cheias, que atingem os habitantes das reas aluviais, principalmente s margens do rio Jaguaribe. Na ausncia de barragens, durante a estao seca, a fonte de gua para os habitantes da regio se restringe s guas dos aqferos aluvionais, que permanecem protegidas da intensa evaporao. A intermitncia dos rios do Estado no Cear fez com que os habitantes das microrregies construssem um grande nmero de pequenos audes para satisfazer as prprias necessidades em gua e as dos seus rebanhos. Esses pequenos audes, entretanto, apenas so capazes de promover uma regularizao anual e a grande maioria seca durante a ocorrncia de estiagens prolongadas. Somente possvel a regularizao interanual das guas superficiais a partir dos reservatrios de mdio e de grande porte, construdos, em sua maioria, pelo DNOCS. Em conseqncia, pode-se afirmar que o uso das guas superficiais do Estado, com ocorrncia acentuada durante a estao seca, est intimamente associado poltica de operao dos audes. 2.2 Aspectos Institucionais O Estado do Cear, desde a criao da SRH, vem-se estruturando e se capacitando para a gesto das suas guas, tendo estabelecido, em 1992, a sua Poltica Estadual de Recursos Hdricos e institudo o Sistema Integrado de Gesto de Recursos Hdricos (SIGERH). Ao ingressar numa rea desafiadora e nova como a dos recursos hdricos, permitiu-se o Governo Estadual conceber um modelo institucional que mais atendesse viso da gesto democrtica gil ento preconizada. Para enfrentar o desafio da disposio de gua adequada e suficiente para a populao, recorreu-se ao modelo administrativo implementado na Frana, que defendia a descentralizao da gesto, com o envolvimento dos usurios da gua. O modelo institucional construdo para a institucionalizao do setor de recursos hdricos, compatvel com o quadro das dificuldades, rejeitou a tradicional frmula do arranjo piramidal. Adotouse, preferencialmente, o esquema de rede, estabelecendo-se uma estrutura institucional prpria do

sistema hdrico, compondo-se de quatro unidades: a SRH/CE, a SOHIDRA, a COGERH e a Fundao Cearense de Meteorologia e Recursos Hdricos FUNCEME, vigorando at o ano de 2002. Integra-se a esses, no processo operativo, um conjunto de organismos colegiados e de participao da sociedade civil, na qual se incluem o Conselho Estadual de Recursos Hdricos - CONERH, os Comits de Bacia Hidrogrfica - CBHs e as associaes de usurios de aude. Todas essas instituies e organismos so conduzidos a uma ao sinrgica por meio do SIGERH, tendo como rgo gestor a SRH. Nos ltimos dez anos, o Estado tem recebido significativo apoio financeiro do Banco Mundial, seja por meio do PROURB-RH/CE (19942002) ou do PROGERIRH/CE (2000 a atual), para a ampliao da infra-estrutura hdrica, para o aproveitamento integrado das disponibilidades, como tambm para o fortalecimento do arcabouo institucional e da capacidade gerencial do sistema. Com a instituio da Poltica Estadual de Recursos Hdricos, o usurio de guas passou a ser maior partcipe como decisor na gesto e no uso deste recurso natural. Anteriormente, a gesto era centralizada pelos rgos federais e estaduais, enquanto o uso da gua era praticado desordenadamente e de acordo com a convenincia do usurio. Segundo Campos et al. (2001), para que a gua possa ser utilizada e controlada em nveis satisfatrios de quantidade e de qualidade, seja pela gerao atual, seja pela futura, so necessrios mecanismos de planejamento e gerenciamento integrado, descentralizado e, sobretudo, participativo. Para implementao deste modelo, previsto em lei, e com vistas a possibilitar maior controle da quantidade e da distribuio de gua para atender a todas as necessidades da populao cearense, foram definidos alguns instrumentos legais: A outorga constitui o documento que assegura ao usurio o direito de usar gua em determinado local, retirando-a de determinada fonte hdrica, com uma vazo e um perodo determinado e para uma finalidade definida.. A licena para obras hdricas constitui o documento de autorizao execuo de qualquer obra ou servio de oferta hdrica (aude, adutora, canal, poo, etc.) que altere o regime, a quantidade ou a qualidade dos recursos hdricos. A cobrana pelo uso da gua bruta considerada um instrumento complementar da gesto, como forma de diminuir o desperdcio, aumentar a eficincia no uso da gua e como fonte arrecadora de fundos para custear as despesas com o gerenciamento, a operao e a manuteno da infra-estrutura hdrica. No gerenciamento dos recursos hdricos dado, ainda, destaque importante organizao dos usurios, como forma de garantir a participao destes na gesto das guas. O processo de apoio organizao dos usurios, segundo a COGERH (2002), desenvolvido levando em considerao trs nveis de atuao, com vrios graus de complexidade. Aude: o ncleo bsico de organizao dos usurios, onde pescadores, vazanteiros, irrigantes e at mesmo concessionrios de abastecimento de gua dos centros urbanos dependem de um mesmo reservatrio de gua e devem, portanto, decidir conjuntamente sobre sua utilizao. Neste nvel, apoiado o fortalecimento ou a constituio de associaes. Vale Perenizado: este nvel de organizao um pouco mais complexo de atuao, pois envolve um ou mais reservatrios e/ou trechos de rios perenizados, nos quais, usualmente, se encontram os grandes permetros pblicos irrigados, irrigantes privados, agroindstrias, indstrias e captao para abastecimento de vrias cidades, usurios estes que devem deliberar conjuntamente sobre a operao de um sistema perenizado. Bacia ou Regio Hidrogrfica: o nvel mais complexo dos trs, j que abrange toda a rea de uma regio hidrogrfica, a qual deve ser entendida como a unidade de planejamento e gesto, com todos os seus conflitos e potencialidades.

Uma vez consolidada a organizao dos dois nveis anteriores (aude e vale perenizado), sero constitudos os Comits de Bacia, visando concretizao da gesto participativa dos recursos hdricos. O Comit de Bacia, institudo por lei, aps articulao e discusso entre usurios da regio/bacia hidrogrfica, a instncia mais importante de participao e de integrao do planejamento e das aes na rea dos recursos hdricos. No Cear j foram criados sete comits, conforme apresentados na Tabela 1. Tabela 1 - Comits de Bacias Hidrogrficas Criados no Estado do Cear CBH CURU RMF BAIXO JAGUARIBE MDIO JAGUARIBE BANABUI ALTO JAGUARIBE SALGADO Acara rea de Atuao Regio Hidrogrfica do Rio Curu Regio Hidrogrfica da Regio Metropolitana de Fortaleza RMF Regio Hidrogrfica do Baixo Jaguaribe Regio Hidrogrfica do Mdio Jaguaribe Regio Hidrogrfica do Rio Banabuiu Regio Hidrogrfica do Alto Jaguaribe Regio Hidrogrfica do Rio Salgado Regio Hidrogrfica do Rio Acara Data Criao Instalao 07/1997 10/1997 01/2003 09/2003 03/1999 03/1999 11/2001 05/2002 05/2002 12/2004 04/1999 04/1999 02/2002 06/2002 07/2002 02/2005 Instrumento Legal Lei no 11.996/1992 Decreto no 26.902/2003 Decreto no 25.391/1999 Decreto no 25.391/1999 Decreto no 26.435/2001 Decreto no 26.603/2002 Decreto no 26.603/2002 Decreto no 27.643/2004

O Decreto Estadual no 26.462, de 13 de dezembro de 2001, regulamenta e estabelecem diretrizes para a formao e funcionamento dos Comits de Bacias Hidrogrficas, rgos que constituem o Sistema Integrado de Gesto dos Recursos Hdricos do Estado. Aos Comits so conferidos poderes deliberativos sobre: a operao dos reservatrios e dos sistemas de vales perenizados; os critrios e normas para a outorga de uso dos recursos hdricos e de execuo de obras ou servios de oferta hdrica; sobre estimular a proteo e a preservao dos recursos hdricos e do meio ambiente contra aes que possam comprometer o uso mltiplo atual e futuro; a implantao da tarifa sobre o uso da gua bruta, assim como o destino dos recursos arrecadados com estas tarifas. Segundo a Secretaria dos Recursos Hdricos do Cear (1992), o Estado est dividido em 11 (onze) regies hidrogrficas, onde se d uma completa integrao entre os recursos hdricos e os bens naturais em geral. A Figura 1 mostra a diviso do Estado quanto s regies (bacias) hidrogrficas com seus respectivos municpios.

Figura 1 Regies Hidrogrficas do Estado do Cear

2.3 Conflitos de Uso da gua no Semi-rido Cearense A escassez da gua no semi-rido cearense no est ligada somente ausncia de chuva, haja vista que outros fatores so tambm importantes, tais como o solo raso e as altas taxas de evaporao. Estas condies adversas tm sido sempre um desafio para o desenvolvimento do Cear. No passado, os esforos para resolver esses problemas voltaram-se principalmente para a oferta, aumentando a disponibilidade de gua no intuito de atender as demandas crescentes. Diante das dificuldades de se agregar novas estruturas hdricas, seja do ponto de vista econmico e/ou ambiental, os conflitos pelas guas tendem a aumentar, em virtude da estagnao da oferta e do possvel crescimento da demanda. A partir da dcada de 1990 comearam as preocupaes acerca de como gerenciar as demandas dos usurios que ficam a montante do reservatrio, no seu entorno e a sua jusante, e tambm de como induzir programas que visassem conservao de gua ou diminuio do desperdcio. Obviamente, a soluo desses conflitos comea com uma boa base legal e institucional. Para disciplinar o uso dos recursos hdricos, preciso que haja todo um arcabouo institucional voltado para o gerenciamento. Pinheiro (2002) estudou vrios conflitos relacionados ao uso ou domnio dos recursos hdricos, definindo uma tipologia de conflitos de usos das guas. Os conflitos foram analisados segundo algumas caractersticas como: - durao, partes envolvidas, rea de abrangncia, objeto, descrio, instncia, instrumento legal referenciado, impacto ambiental, instituies envolvidas na mediao. Apresentam-se tambm o histrico e a situao atual dos conflitos. Porm, somente poucos desses conflitos esto suficientemente documentados, de modo a possibilitar um gerenciamento, que venha contribuir para uma negociao de conflito, de uso da gua, mais eficiente. Os estudos desenvolvidos, no que se refere aos conflitos de usos das guas, situados no Cear e em vrias regies hidrogrficas, concentram-se na tipificao de algumas caractersticas consideradas no delineamento da tipologia dos conflitos. Dentre os vrios conflitos de gua existentes no Cear, foram selecionados os doze mais significativos, haja vista sua diversidade. Tabela 2 - Conflitos Selecionados e Analisados Conflitos 1 Pacoti 2 Acarape do Meio 3 Palmcia 4 Lagoa do Tapuio 5 Thomaz Osterne/Manuel Balbino 6 Milh 7 Santa Catarina 8 Aude dos Ferreiras 9 Paracuru 10 Acara-Mirim 11 Nova Floresta 12 BanabuiFonte: Pinheiro (2000)

Municpio Pacoti Redeno Palmcia Aquiraz Crato/Caririau Milh Quixeramobim Aracati Paracuru Massap Jaguaribe Banabui

Regio Hidrogrfica Metropolitana Metropolitana Metropolitana Metropolitana Salgado Mdio Jaguaribe Banabui Baixo Jaguaribe Curu Acara Mdio Jaguaribe Banabui

Fonte Cartrio de Baturit COGERH; Sales (2000) CAGECE SRH SRH/COGERH SRH/FNS SRH/COGERH SRH CAGECE SRH/COGERH SRH/COGERH COGERH

3 - ESTUDO DE CASO: OS AUDES THOMAZ OSTERNE E MANUEL BALBINO - CE Neste trabalho ser abordado apenas o conflito THOMAZ OSTERNE E MANUEL BALBINO, considerado o caso de maior nmero de construo de obras hidrulicas ao longo do rio, abrangendo reas bem significativas ao longo do vale perenizado As partes envolvidas no conflito foram classificadas em: Sociedade Civil versus Indivduos Agrupados, segundo Pinheiro (2002), que definiu algumas caractersticas consideradas importantes quanto s tipologias de conflitos. 3.1 Histrico/Situao do Conflito Os esforos voltados para o disciplinamento do uso da gua no vale do Cars, perenizado pelos reservatrios Thomaz Osterne de Alencar e o aude pblico estadual Manuel Balbino, com a participao do Estado, por meio da SRH/CE e sua vinculada COGERH, tiveram incio em setembro de 1995, com solicitao de providncias no controle de utilizao das guas desses audes pblicos, enviada COGERH pela Associao Comercial do Crato. Logo depois, em 3 de outubro de 1995, o Ministrio do Meio Ambiente dos Recursos Hdricos e da Amaznica Legal solicita 2a Diretoria Regional da VII Regio do mesmo Ministrio providncias cabveis para solucionar o problema. Ainda, em outubro (10) do mesmo ano, os usurios do vale Cars, sentindo-se prejudicados com os desvios das guas por meio de barramentos e canais, banhando extensas reas, solicitam ao DNOCS providncias para resolver o problema. Entre os dias 16 e 17 de outubro de 1995, a COGERH realizou com a SOHIDRA e o DNOCS levantamento de todos os barramentos e derivaes que poderiam dificultar o uso racional da gua no trecho de perenizao do rio Cars e riacho dos Carneiros. Logo aps o levantamento, houve reunio envolvendo todos os usurios do Vale, tendo sido acordado o janelamento (abertura regular) das barragens, que esto prejudicando outros usurios a jusante, buscando maior eficincia no escoamento do rio. Em 14 de fevereiro de 1996, a SRH/CE, aps pareceres tcnico e jurdico, os quais sugerem que o processo seja submetido considerao e discernimento da douta Procuradoria Geral do Estado para, junto Procuradoria da Repblica, tomarem as providncias cabveis. O referido processo foi enviado Procuradoria Geral do Estado (25/4/1996). A SRH/CE, na tentativa de estabelecer o equilbrio entre os grandes e os pequenos usurios de gua, em maio de 1997, resolveu contratar uma empresa, por meio de licitao, objetivando a demolio das barragens localizadas nos vales do rio Cars e riacho dos Carneiros e a execuo de janelamento das barragens de alvenaria de pedras, melhorando assim a eficincia no escoamento de gua no rio e no riacho, permitindo que os reservatrios Thomaz Osterne e Manuel Balbino operassem com vazes mais compatveis com seus volumes: 300 l/s e 50 l/s, respectivamente. Em outubro de 1997, ocorreram novos problemas num trecho do rio Cars, sendo as denncias enviadas para a COGERH, por meio do escritrio da SOHIDRA no Cariri, havendo esta providenciado, mais uma vez, estudos de todo o trecho do rio Cars. Em agosto de 1998, ano de seca, os proprietrios situados s margens do rio Cars, em Juazeiro do Norte e Misso Velha, em dificuldades com a falta dgua no rio, se mobilizaram, com o apoio do vereador de Juazeiro do Norte, Jos Eraldo Oliveira Costa, na busca de solues. A Cmara Municipal de Juazeiro do Norte, com base nas denncias sobre a existncia de barramentos irregulares em algumas propriedades ao longo do riacho dos Carneiros, perenizado pelo reservatrio Manuel Balbino, solicitou COGERH vistoria tcnica sobre o problema. As constataes da COGERH, descritas no relatrio de Inspeo Operacional, foram enviadas Cmara Municipal de Juazeiro do Norte, bem como ao DECOM desse municpio, que tambm enviou COGERH a referida denncia. Estas barragens no vinham representando problema, mas, com a reduzida vazo operacional do aude, seus proprietrios passaram a fechar as comportas, provocando desperdcio com a derivao de gua para inundao de grandes reas de capim.

Durante o ms de novembro de 1999, atendendo requisio da Juza da 5a Vara da Comarca de Juazeiro do Norte, a COGERH realizou outra inspeo tcnica das irregularidades nos trechos perenizados do riacho dos Carneiros para instruir a ao judicial em trmite no Frum de Juazeiro do Norte. Segundo a COGERH, nos anos de 1999 e 2000, houve significativo avano nos processos da gesto de gua com a participao da sociedade na bacia do rio Salgado. Foram intensificadas as reunies com o objetivo de discutir as questes sobre o uso dos recursos hdricos, e criados o Conselho de Representantes da Bacia do Salgado e a Comisso dos Usurios dos audes em discusso. Em 2000, a COGERH designou um gerente para atuar na bacia do Salgado, dando mais agilidade abordagem das questes sobre gerenciamento dos recursos hdricos. Em julho/2000 foi realizada a reunio de operao dos audes Thomaz Osterne e Manuel Balbino, quando foram definidas as vazes mdias a serem liberadas pelos reservatrios durante o segundo semestre daquele ano: 300 l/s e 50 l/s, respectivamente, e discutidos outros temas. Com a constatao de que alguns barramentos estavam obstruindo o rio, a COGERH procedeu vistoria ao longo do rio Cars. O Conselho de Representantes dos dois audes promoveu reunies em agosto e setembro de 2000 para discutir medidas a fim de sanar o referido problema, produzindo um documento, o qual foi enviado Procuradoria da Repblica no Estado do Cear. Durante esse perodo, a COGERH conseguiu a abertura de algumas barragens por meio de dilogo com os proprietrios, contudo, dois deles foram resistentes desobstruo do rio. Em novembro de 2000, a COGERH solicitou apoio da EMATERCE para realizar nova vistoria ao longo do vale perenizado do rio Cars, acontecendo com a presena de representantes do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Juazeiro do Norte e da Comisso de Usurios dos audes em questo. Durante a visita tcnica, a COGERH realizou medidas de vazo em vrios pontos estratgicos do rio, para avaliar as perdas no escoamento. Conforme parecer da EMATERCE, os barramentos localizados durante a fiscalizao encontravam-se com suas aberturas livres, permitindo o escoamento normal da gua. A de um proprietrio que represava uma quantidade considervel de gua teve suas comportas abertas no dia da visita. A Procuradoria da Repblica no Estado do Cear solicita COGERH, em fevereiro de 2001, informaes sobre os fatos descritos pelo Conselho de Representantes da Bacia do Rio Salgado e pela Comisso de Usurios dos Audes Thomaz Osterne e Manuel Balbino, enviados Procuradoria em 27 de setembro de 2000. Trata-se de um pedido de providncias sobre o uso irregular das guas no vale do rio Cars, conforme processo SPU/SEAD-CE no 01.055.233-2. A COGERH, mais uma vez, descreveu todo o histrico da situao do conflito, informando na oportunidade que os rgos envolvidos na negociao tm a idia da complexidade do problema, sendo necessria uma ao conjunta de setores diversos para chegar-se a algum resultado positivo no uso disciplinado desses recursos naturais; destacou a dificuldade de se reverter as condies de desmatamento e assoreamento hoje encontradas, e principalmente de se mudar a mentalidade dos prprios usurios quanto ao emprego racional do solo e da gua. A COGERH considera fundamental o constante compromisso, no s dos rgos pblicos, mas, sobretudo dos prprios usurios dos vales, na fiscalizao das aes malficas para a perenizao dos vales, denunciando os fatos e cobrando a ao pblica. A Companhia encaminhou ao Ministrio Pblico Federal as informaes sobre o conflito, na expectativa de que o rgo solucione aquelas questes que fogem do alcance tcnico. Em maio de 2002, a SRH/CE informou que o Ministrio Pblico Federal ainda no tinha proposto nenhuma soluo, dando conta, ainda, de que os usurios dos vales perenizados no possuem a outorga, ficando difcil o dimensionamento das reas reais de irrigao, e que o modelo de irrigao usado precisa normalmente de muita gua, isto , o dimensionamento difcil entre a oferta versus demanda, necessitando fazer um trabalho com os usurios visando integrao do uso da gua.

Durante os anos de 2003 e 2004, a COGERH, por meio das reunies de operao dos audes Thomas Osterne e Manoel Balbino, vem discutindo como usar a gua dos Audes para obter ganho econmico otimizando o uso e a importncia da participao e a mudana de cultura com o intuito de soltar a gua e no prender. Destacando, ainda, a representao do Comit de Bacia, da parceria com as Instituies Estaduais e Federais, principalmente com o DNOCS e da necessidade de convivncia no semi-rido. Segundo informaes da COGERH, em janeiro de 2005, que aps a reunio de operao dos audes, ocorrida em 12/08/2004, na cidade de Crato/CE, a Comisso de usurios dos audes Thomas Osterne e Manoel Balbino solicitou, em 16 de setembro de 2004, a COGERH providncias quanto a abertura dos barramentos ao longo do vale, mais precisamente nas propriedades dos senhores Ivan Bezerra, Balbino e Francisco Antnio. Mais uma vez, os tcnicos da COGERH foram a rea, os quais detectaram a existncia de barramentos dificultando o escoamento natural do curso dgua e, que os referidos proprietrios no possuem licena para construo de obras hdricas, como tambm, o licenciamento ambiental e a outorga, previstos em lei. A COGERH solicitou a participao do Instituto Brasileiro de Recursos Naturais Renovveis - IBAMA, com o intuito amenizar ou solucionar o conflito. 3.2 Descrio do Conflito A Associao Comercial do Crato solicita COGERH imediatas providncias quanto ao controle de utilizao das guas do aude pblico federal Thomaz Osterne de Alencar, situado no municpio de Crato/CE. O que se tem verificado a abertura exagerada das comportas, desperdiando a pouca gua acumulada nos ltimos tempos, prejudicando, sobremaneira, principalmente o municpio de Crato. Ao mesmo tempo, os usurios do vale Cars, perenizado pelo reservatrio Thomaz Osterne de Alencar (volume de acumulao de 28,79 hm) e os usurios do riacho dos Carneiros, perenizado pelo reservatrio pblico estadual Manuel Balbino (volume de acumulao de 37,18 hm), situado no municpio de Caririau/CE, se sentem prejudicados com os desvios das guas por meio de barramentos e canais, banhando extensas reas (Processos: Administrativos no 95.032.342-0; no 95.092.152-1, no 95.146.228-8, no 01.055.233-2 e PGE no 0.275-96). A Tabela 3 apresenta a sntese do conflito analisado, conforme tipologia proposta por Pinheiro (2000), ou seja, classificando-o quanto durao, s partes envolvidas, rea de abrangncia, ao objeto do conflito, instncia do conflito e instituio envolvida na mediao do conflito. (Figura 2) Tabela 3 - Resumo do Conflito Thomaz Osterne e Manuel Balbino Durao Partes rea de Objeto Conflito do Envolvidas Abrangncia do Conflito no Conflito do Conflito Conflito Instituio Instncia do Envolvida na Conflito mediao do ConflitoSRH; COGERH; SOHIDRA; DNOCS; CBH do Mdio Jaguaribe; Procuradoria Geral do Estado e da Repblica; Ministrio Pblico e o Poder Judicirio do Cear.

Fonte

Thomaz Osterne e Manuel Balbino

5 anos e 5 meses (09/199502/2002)

SC x IA

Sistmica

CCOH Administrativo e Judicial

SRH e COGERH

Figura 2 Infogrfico do Vale do Rio Cars

4 - CONCLUSO A gua, ao longo da histria do homem, sempre foi motivo de disputa. A sua escassez, que se vem acentuando nos ltimos anos, particularmente em regies semi-ridas, leva a uma srie de preocupaes, pois poder aumentar conflitos entre seus usurios. No Cear no diferente e pode-se identificar inmeros conflitos relacionados gua. O presente trabalho enfocou apenas um dentre muitos o do vale dos Audes Thomaz Osterne e Manuel Balbino o de maior nmero de construo de obras hidrulicas ao longo do rio e que envolve grandes reas inundadas com plantio de capim. Em julho de 2002 foi instalado o Comit da Regio Hidrogrfica do Rio Salgado, contribuindo, assim, com o gerenciamento e o monitoramento do vale por meio de reunies com os usurios, com o intuito de elaborar o plano de operao e manuteno, objetivando amenizar os conflitos existentes. Neste tipo de conflito, a atuao dos gestores dos recursos hdricos torna-se muito importante, tendo-os que levarem em considerao para um bom desempenho do gerenciamento dos recursos hdricos, as seguintes atividades bsicas: operao e manuteno da infraestrutura hidrulica dos recursos hdricos; conhecimento hidrolgico da bacia; conscientizao ambiental; monitoramento quantitativo e qualitativo dos recursos hdricos; apoio organizao dos usurios dos recursos hdricos; alocao participativa dos recursos hdricos; e implantao dos instrumentos de gerenciamento dos recursos hdricos (licena, outorga e tarifa). A implantao dessas atividades bsicas contribuir para auxiliar na tomada de deciso dos gestores e partes envolvidas na conduo das solues dos conflitos de uso da gua, bem como o aprofundamento no conhecimento hidrolgico da bacia, visando a prevenir conflitos por meio do dilogo e da negociao. BIBLIOGRAFIA ALVES, R. F. F. et. alii. (2001). Experincia de Gesto de Recursos Hdricos. Braslia: Agncia Nacional de guas/Projeto Grfica: TDA Desenho e Arte Ltda. CAMPOS, J. N.; STUDART, Ticiana. M. C. (2001). Gesto de guas: princpios e prticas. Porto Alegre; ABRH. CEAR, Governo do Estado (1983). Plano de Diretor de Recursos Hdricos. Fortaleza: Secretaria de Planejamento e Coordenao. GARJULLI, R. (2001). Oficina Temtica: Gesto participativa dos recursos hdricos relatrio final. Aracaju: PROGUA/ANA.. PINHEIRO, M. I. T. (2002). Tipologia de Conflitos de Usos das guas: Estudos de Casos no Estado do Cear. Universidade Federal do Cear. Dissertao de Mestrado. SUDENE (1980). Plano de Aproveitamento Integrado dos Recursos Hdricos do Nordeste do Brasil Fase I Conflitos Inerentes aos Aproveitamentos. Texto, Recife, volume XIII, cap. 2, 1980.