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O glamoroso Fórum Econômico Mundial de Davos iniciou ontem e são previstas atividades até o próximo sábado. Todo ano os magnatas se juntam nos Alpes para de discutir seus interesses e promover a imagem de suas empresas, aproveitando é claro pra dar os já desacreditados discursos de que possuem algum compromisso com o mundo que lhes cerca. Enquanto isso, a desigualdade atinge níveis ainda mais alarmantes, as projeções da Oxfam – ONG especializada em estudos de riqueza e desigualdade – são de que em 2016 o 1% ultrapassará os 99% em riqueza absoluta, concentradíssima. Aqui no Brasil diversos analistas muito bem adestrados, defensores incondicionais da plutocracia, perdem tempo com críticas a presidenta por conta dela ter preferido a posse de seu colega e presidente da Bolívia, Evo Morales, ao Fórum dos privilegiados. Para discutir a conjuntura internacional e os dilemas da economia neste ano ainda em início, entrevistei o doutor em economia pela Unicamp, Flavio Lyra. O heterodoxo Lyra duvida da capacidade do Fórum de dar respostas concretas aos problemas socioeconômicos atuais, faz pesadas críticas a guinada conservadora da política econômica nacional e crê que ela acarretará em recessão e desemprego. Confira: Diante dos novos rumos que o ministro Joaquim Levy tem dado a economia, o Brasil se aproxima ou afasta do Fórum de Davos? Quais são as vantagens e desvantagens de se alinhar aos ditames ortodoxos? Tanto na teoria, quanto na prática o pensamento neoliberal está em profunda crise, pois já não consegue dar respostas minimamente convincentes para a grande e crescente concentração da riqueza e da renda no mundo e para a incapacidade das economias desenvolvidas de se manterem crescendo, haja vista a estagnação da Europa e do Japão e a, ainda, indefinida situação dos Estados Unidos. O Forum de Davos vai ter que dar muitas

Conjuntura Economica de Janeiro 2015

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Conjuntura economica

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O glamoroso Frum Econmico Mundial de Davos iniciou ontem e so previstas atividades at o prximo sbado. Todo ano os magnatas se juntam nos Alpes para de discutir seus interesses e promover a imagem de suas empresas, aproveitando claro pra dar os j desacreditados discursos de que possuem algum compromisso com o mundo que lhes cerca.

Enquanto isso, a desigualdade atinge nveis ainda mais alarmantes, as projees da Oxfam ONG especializada em estudos de riqueza e desigualdade so de que em 2016 o 1% ultrapassar os 99% em riqueza absoluta, concentradssima. Aqui no Brasil diversos analistas muito bem adestrados, defensores incondicionais da plutocracia, perdem tempo com crticas a presidenta por conta dela ter preferido a posse de seu colega e presidente da Bolvia, Evo Morales, ao Frum dos privilegiados.

Para discutir a conjuntura internacional e os dilemas da economia neste ano ainda em incio, entrevistei o doutor em economia pela Unicamp, Flavio Lyra. O heterodoxo Lyra duvida da capacidade do Frum de dar respostas concretas aos problemas socioeconmicos atuais, faz pesadas crticas a guinada conservadora da poltica econmica nacional e cr que ela acarretar em recesso e desemprego.

Confira:

Diante dos novos rumos que o ministro Joaquim Levy tem dado a economia, o Brasil se aproxima ou afasta do Frum de Davos? Quais so as vantagens e desvantagens de se alinhar aos ditames ortodoxos?

Tanto na teoria, quanto na prtica o pensamento neoliberal est em profunda crise, pois j no consegue dar respostas minimamente convincentes para a grande e crescente concentrao da riqueza e da renda no mundo e para a incapacidade das economias desenvolvidas de se manterem crescendo, haja vista a estagnao da Europa e do Japo e a, ainda, indefinida situao dos Estados Unidos. O Forum de Davos vai ter que dar muitas cambalhotas para tentar desvencilhar-se do contundente discurso de Thomas Piketty, em seu j famoso Capital no Sculo XXI, que mostra claramente a forte propenso concentrao da renda e da riqueza no mundo. Isto num contexto de estagnao econmica.

O ministro Joaquim Levy e os ortodoxos que o cercam, meteram-se numa grande arapuca, porquanto, escravos de um pensamento econmico em crise, esto sendo chamados a dar resposta a problemas para os quais no esto preparados, pois o desgastado discurso da austeridade fiscal est desmoralizado pela experincia recente da Europa. At parece que Dilma, agiu maquiavelicamente, ao entregar Levy a corda para ele se enforcar, pois no d para vislumbrar nenhuma chance de recuperar o crescimento da economia brasileira com um choque fiscal que v diminuir a demanda interna num momento de estagnao do comrcio internacional e de baixa competitividade da indstria brasileira. Quando a crise se aprofundar, Levy corre o risco de ser enxotado pela mesma elite que ainda est batendo palmas por sua designao para o comando da economia. uma questo de meses.

Os neoliberais mais espertos j esto preparando o discurso para se defenderem do fracasso do arrocho fiscal. Uns, como Monica de Bolle, j afirmam que preciso maior abertura da economia, outros esto dizendo que preciso realizar mais ajustes microeconmicos, sem o que a situao pode piorar. A verdade que j esto colocando os salva-vidas para quando o barco afundar.

Se os economistas heterodoxos nos chegam a parecer confusos, por vezes, os ortodoxos esto inteiramente perdidos, pois no sabem como conciliar os interesses do capital financeiro, aos quais so, indiscutivelmente, submissos e os interesses do capital produtivo crescentemente em dificuldades, face ao excesso de capacidade produtiva na economia internacional.

Como se explica o paradoxo entre o discurso de Dilma durante as campanhas e a prtica adotada aps a reeleio? Por que o governo deu uma guinada conservadora?

No vejo uma resposta simples. Minha hiptese que o grupo poltico que cerca a presidente percebeu que no havia clima poltico na sociedade para prosseguir com a orientao que vinha sendo adotada, embora se trate de uma orientao que procurava conciliar aspectos ortodoxos e heterodoxos da poltica econmica. Entregaram os anis com medo de entregar os dedos. Uma interpretao maquiavlica, entretanto, no est fora de cogitao: na suposio de que o arsenal de poltica econmica ortodoxa vai agravar a crise, caberia aguardar o momento propcio para retomar as polticas heterodoxas, sob as presses da sociedade, insatisfeita com o agravamento da crise. Trata-se esta, porm, de uma aposta arriscada, pois o agravamento da crise pode muito bem ser atribuvel gesto de Dilma que, supostamente, no permitiria realizar todos as reformas neoliberais consideradas necessrias.

A presidenta Dilma preteriu o Frum Econmico a fim de comparecer a posse do presidente boliviano, Evo Morales. O que indica essa atitude? Como podemos interpret-la?

D para supor a inteno de no se comprometer com a poltica econmica que est sendo colocada em prtica, por consider-la com grande probabilidade de fracassar.

Quais so as perspectivas para a economia brasileira em 2015? possvel retomar o crescimento ainda esse ano?

O quadro recessivo s vai aprofundar com o aumento dos juros, o corte dos gastos pblicos e a retrao do BNDES. A inflao vai acelerar-se. Mas, tudo isto faz parte do manual neoliberal, que visa atingir o emprego e os salrios, na esperana de melhorar a competitividade da produo industrial. Esperana v, a meu ver, pois a queda da demanda interna vai aumentar os custos unitrios.

A indstria brasileira ser beneficiada pela subida do dlar? A retrao tem chance de ser revertida?

Tenho dvidas que o dlar v se valorizar, principalmente agora que a Europa e o Japo vo afrouxar a poltica monetria para tentar sair da recesso. A recuperao da competitividade da indstria brasileira vai ter que ser buscada pelo aumento do investimento, a inovao tecnolgica e a reduo de custos dos servios, inclusive de infraestrutura.

Quais so os efeitos do ajuste econmico que est entrando em vigor?

Vai produzir recesso e gerar um clima de protestos e acirramento dos conflitos entre grupos e classes sociais. Lamentavelmente, o presidente da Fiesp continua pleiteando a reduo da carga tributria como a soluo dos problemas da indstria.

A ONG Oxfam, especializada em estudos de desigualdade e distribuio de riqueza, afirma que em 2016 o 1% acumular mais recursos que os 99% restantes da populao. Como chegamos a esse ponto? Quando o bolo finalmente ser distribudo?

Conforme mostra Thomas Piketty, em seu livro Capital no Sculo XX!, no h como ser diferente enquanto o crescimento da renda do capital se der a taxa mais alta do que a taxa de crescimento econmico. Mantidas as instituies atuais a renda do capital alcana 5% ao ano, e o crescimento econmico mdio, sequer se aproxima dessa taxa. As instituies na etapa atual do desenvolvimento capitalistas esto organizadas para privilegiar a valorizao do capital financeiro.].

Apesar de a desigualdade ser um tema cada vez mais pautado, pouco se v de medidas prticas para combat-la. O debate econmico precisa de mudanas? Que caminhos e ideias precisamos discutir mais?

No vejo sada para questo da desigualdade, sem mudanas polticas importantes que reforcem a participao da populao no poder e nas prprias organizaes econmicas. S o avano democrtico pode abrir espao para tais mudanas.

O Frum de Davos tem capacidade de enfrentar os dilemas da segunda maior crise do capitalismo? Porque?

Tenho serissimas dvidas! Davos apenas mais um instrumento de articulao dos interesses capitalistas, para reforar o poder das grandes corporaes internacionais no controle da economia mundial e no fortalecimento do capital privado internacional.