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Cláudia Maria Barth Petter CONSTRUÇÃO COLETIVA DE UMA HORTA ESCOLAR: REPERCUSSÕES ENTRE OS ALUNOS PARTICIPANTES Porto Alegre 2004

construcao coletiva de uma horta escolar

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construcao coletiva de uma horta escolar

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  • Cludia Maria Barth Petter

    CONSTRUO COLETIVA DE UMA HORTA ESCOLAR:

    REPERCUSSES ENTRE OS ALUNOS

    PARTICIPANTES

    Porto Alegre

    2004

  • 2

    Cludia Maria Barth Petter

    CONSTRUO COLETIVA DE UMA HORTA ESCOLAR:

    REPERCUSSES ENTRE OS ALUNOS

    PARTICIPANTES

    Dissertao apresentada como requisito parcial para a

    obteno do grau de Mestre, pelo Programa de Ps-

    Graduao em Educao em Cincias e Matemtica,

    linha de pesquisa Educao em Cincias, na Pontifcia

    Universidade Catlica do Rio Grande do Sul.

    Orientadora Dr Regina Maria Rabello Borges.

    Porto Alegre

    2004

  • 3

    Cludia Maria Barth Petter

    CONSTRUO COLETIVA DE UMA HORTA ESCOLAR:

    REPERCUSSES ENTRE OS ALUNOS

    PARTICIPANTES

    Dissertao apresentada como requisito para a

    obteno do grau de Mestre, pelo Programa de Ps-

    Graduao em Educao em Cincias e Matemtica,

    linha de pesquisa Educao em Cincias, na Pontifcia

    Universidade Catlica do Rio Grande do Sul.

    Aprovada, em _________________________, pela banca examinadora. Banca examinadora: ______________________________________ Orientadora: Dr Regina Maria Rabello Borges _______________________________________ Dr. Roque Moraes _______________________________________ Dr. Joo Batista Siqueira Harres

  • 4

    Dedico este trabalho a meus pais Jos Roque Barth e Clair

    Miria Barth e ao meu marido Fabio Petter.

  • 5

    AGRADECIMENTO

    equipe diretiva da Escola Estadual de Ensino Fundamental Moinhos, aos

    colegas professores e aos funcionrios.

    minha orientadora prof Dr. Regina Maria Rabello Borges.

    Ao professor Dr. Roque Moraes.

    professora Dr. Valderez Marina do Rosrio Lima.

    Ao apoio da minha colega Mariel Hidalgo Flores.

    amiga Cristiane Antonia Hauschild Nicolini.

    Ao estmulo da professora Rosane Maria Cardoso.

    E em especial aos alunos da quinta, sexta, stima e oitava sries da Escola Moinhos,

    por acreditarem que seria possvel...

  • 6

    Cada pessoa, em sua existncia, pode ter duas atitudes: construir ou plantar. Os

    construtores podem demorar anos em suas tarefas, mas um dia terminam aquilo que

    estavam fazendo. Ento param, e ficam limitados por suas prprias paredes. A vida

    perde sentido quando a construo acaba. Os que plantam sofrem com as

    tempestades, as estaes e raramente descansam. Mas, ao contrrio de um edifcio, o

    jardim jamais pra de crescer. E, ao mesmo tempo em que exige a ateno do

    jardineiro, tambm permite que, para ele, a vida seja uma grande aventura.

    Paulo Coelho

  • 7

    Resumo

    Esta pesquisa foi realizada na Escola Estadual de Ensino Fundamental Moinhos,

    em Estrela, com alunos das sries finais (5a a 8a), com o objetivo de detectar como a

    construo coletiva de uma horta escolar poderia repercutir nos hbitos de higiene e

    sade dos alunos participantes. A partir de uma pesquisa prvia sobre os problemas

    mais significativos da comunidade de Moinhos, em que foi apontado o consumo de

    drogas como o maior problema, foi desencadeado um debate quanto utilizao

    produtiva e prazerosa do tempo livre, como forma de prevenir riscos de sua utilizao

    inadequada em situaes prejudiciais. Houve um consenso, que resultou na deciso de

    construo conjunta de uma horta escolar. A pesquisa, que envolveu a implementao

    e repercusses desse trabalho colaborativo, teve abordagem essencialmente

    qualitativa, conforme a metodologia de anlise textual. Entre as repercusses

    identificadas entre os alunos, quanto aos hbitos de higiene e sade, nos aspectos

    fsico, mental e social, destacam-se: mudanas na dieta alimentar, com incluso de

    hortalias nas refeies; construo de hortas em suas residncias; maior envolvimento

    em atividades escolares e extraclasse, especialmente em Cincias; participao mais

    ativa e diminuio da agressividade nas relaes interpessoais em sala de aula; maior

    compromisso com trabalhos em grupo. Alm disso, houve superao das expectativas,

    pelo envolvimento gradual de outros educadores e das demais turmas, o que resultou

    na extenso da proposta a toda comunidade escolar.

    Palavras-chave: horta escolar, higiene e sade, planejamento cooperativo,

    construo coletiva.

  • 8

    Abstract

    This research was accomplished at the State School of Basic Teaching Moinhos,

    in Estrela, with students of the final grades (fifth and eighth) with the aim of detecting

    how the collective construction of a school vegetable garden could rebound in the

    participants habits of hygiene and health. Starting from the previous research about the

    most significant problems of the community of Moinhos in that the consumption of drugs

    was pointed as the largest problem, a debate was triggered about a pleasant and

    productive use of the free time as to prevent from the hazards of its inadequate use into

    harmful situations. There was a consense upon that, which resulted in a joint

    construction of a vegetable garden. The research, which involved the implementation

    and backwash of this collaborative work, had one es-sentially qualitative approach,

    according to the mothodology and textual analysis. Among the feedback identified upon

    the habits of hygiene and health, in the fisic aspects, mental and social, appear changes

    in the nutritional habits, with the inclusion of vegetables in the diet; construction of

    vegetable gardens by the students at their homes; more involvement in extra-class

    school tasks; increased interest in the study of Sciences; more active taking part in the

    classroom; more engagement with group work and less agressivity. Furthernore, there

    was an overcoming of the expectations, due to the gradual involvement of the other

    groups and the teachers, which resulted in the extention of the proposal to the whole

    school community.

    Key Words: School Vegetable Garden, Hygiene and Health, Cooperative

    Planning, Collective Construction.

  • 9

    SUMRIO

    1 CONTEXTUALIZANDO A PESQUISA ............................................................. 11

    2 SADE, SISTEMA IMUNOLGICO E HIGIENE CORPORAL.................. ..........19

    3 OS ALIMENTOS E A HORTA ESCOLAR.............................................................24

    4 CONSTRUO COLETIVA DE UMA HORTA COMO FORMA DE PREVENO

    AO USO DE DROGAS .............................................................................................34

    5 FUNDAMENTOS EDUCACIONAIS.................................................................... 45

    6 METODOLOGIA DA PESQUISA................................................................... .....51

    7 ANALISANDO E INTERPRETANDO OS RESULTADOS DA

    PESQUISA..................................................................................................................... 58

    7.1. Pesquisa diagnstica..........................................................................................63

    7.2. Auto-Avaliao dos alunos..................................................................................65

    7.3. Avaliao dos resultados da pesquisa ...............................................................69

  • 10

    8 REPERCUSSES DA CONSTRUO DA HORTA NA VIDA DOS ALUNOS

    8.1. Sade do corpo e da mente............................................................................... 71

    8.2. Importncia de trabalho coletivo.........................................................................73

    8.3. Competncia na construo da horta.................................................................76

    8.4. Construo de uma horta fora do ambiente escolar...........................................80

    8.5. Economia familiar................................................................................................82

    9 CONSIDERAES FINAIS.................................................................................. 84

    Referncias.............................................................................................................. 90

    Apndices................................................................................................................ 93

    Anexo..................................................................................................................... 100

  • 11

    1 CONTEXTUALIZANDO A PESQUISA

    Antes de contextualizar esta pesquisa na comunidade em que foi realizada, vou

    tentar situ-la na minha vida.

    Consegui realizar um de meus projetos pessoais ao longo desta caminhada,

    sendo professora. Lembro-me quando pequena, as aulinhas ministradas por mim aos

    meus vizinhos, desde os cinco anos de idade.

    Sempre estive determinada a seguir a carreira de professora, aquela que se

    empenha para que seus educandos consigam aprender a aprender, aprender a

    conhecer, aprender a ser, aprender a fazer, como retrata Paulo Freire, em Os Quatro

    Saberes Necessrios Educao (FREIRE, 1996).

    Cabe, neste momento, registrar que leciono h cinco anos e tenho histrias para

    contar. Fico feliz, pois a cada ano que passa me sinto melhor como profissional do

    magistrio. O incio de um novo ano, novos alunos, uma expectativa agradvel. Por

    isto, fazer o Mestrado em Educao em Cincias e Matemtica veio em meu benefcio,

    como tambm em benefcio de meus alunos.

    Para realizar o projeto de ser professora, tive influncias positivas de professores

    do Ensino Fundamental, mas foi no Ensino Mdio, realizado no Centro de Formao e

    Aperfeioamento de Professores, em Estrela, que decidi prosseguir meu objetivo. Alm

    de decidir ser professora, tambm decidi ser biloga. A professora de Biologia e a de

    Metodologia da Cincia, durante o magistrio, tiveram importncia fundamental na

    minha escolha, pois as aulas eram dinmicas, prticas, atuais. Elas nos encantavam

    com formas simples de fazer a nossa turma aprender a aprender, aprender a fazer. Isto

  • 12

    me preparou para que, no incio de minha caminhada, eu estivesse preparada para

    colocar em prtica o que vivenciei.

    Escolhi prestar vestibular na UNIVATES, em Lajeado. Nessa instituio, alm de

    estudar e participar das atividades de campo propostas pelos professores (atividades

    realizadas nos finais de semana), tive a oportunidade de ir para o Cear pela

    Universidade Solidria. Foram meses de treinamento. Muitos alunos tinham se inscrito,

    foi preciso novamente selecionar, pois somente dez alunos poderiam participar.

    O trabalho realizado no Municpio de Jardim (CE) foi uma experincia incrvel

    para mim. Na parte da manh visitvamos as famlias nos stios (que aqui chamamos

    de bairro) e pela parte da tarde proferamos palestras, divididos em quatro grupos:

    sexualidade e sexo; lixo e seus problemas; doenas em geral; recreao com as

    crianas. Ficamos nesse local dezoito dias e pude constatar que muito bom viver no

    Rio Grande do Sul. Por isto, desde ento, estou investindo muito mais em meus

    projetos junto comunidade em que trabalho. A troca de experincias que tive no

    Cear serve muito para as minhas aulas, pois sempre que posso levo as fotos aos

    meus alunos para melhor relatar o que vi e o que aprendi com eles. Foi uma grande

    troca de experincias, lembrando que este trabalho um trabalho voluntrio. Citei

    apenas alguns aspectos que mais marcaram minha vida acadmica, e tenho certeza

    que continuarei nesta busca de aprender a aprender.

    J relatei o que mais me marcou durante minha vida acadmica e agora

    pretendo descrever como ela teve uma influncia positiva para minha atuao

    profissional. No incio do ano de 1997 me inscrevi para contrato emergencial em escola

    municipal, fui chamada e assumi, me sentindo muito feliz, pois esta seria minha primeira

    oportunidade de colocar algumas atividades em prtica. Na escola municipal realizei,

  • 13

    por dois anos, o Projeto de Recolhimento de Lixo e posterior venda. No primeiro ano,

    com o material arrecadado e vendido, conseguimos comprar uma pracinha para a

    escola e tambm oferecer uma viagem para as turmas vencedoras. J no segundo ano

    a coleta foi ainda melhor, a direo da escola e os professores resolveram premiar a

    todos com uma bela excurso.

    Passaram dois anos e fui chamada para ser professora no Magistrio Pblico

    Estadual, pelos concursos que havia realizado. Minha primeira nomeao, que emoo,

    mais um desafio em minha vida profissional. Lembro-me, como se fosse hoje, o

    primeiro ms em que dei aula na Escola Estadual de Ensino Fundamental Moinhos.

    Parecia tudo to difcil, os alunos estavam habituados a ler o captulo no livro e em

    seguida responder as questes propostas. Eu vim com uma proposta totalmente

    diferente para eles. O primeiro ms foi de adaptao e depois os assuntos foram

    fluindo. Determinadas colegas de trabalho diziam: eu nunca vi os alunos to animados

    para terem aula de Cincias. Ento, cada vez mais, fui aprofundando e exigindo deles

    aquilo que julgo importante, que fazer com que eles entendam como a natureza

    funciona, se organiza, para assim os alunos ajudarem na sua conservao, na sua

    preservao. Percebo que, ao longo dos cinco anos em que estou nesta escola, os

    alunos melhoraram muito, tanto no relacionamento interpessoal como na confiana na

    professora e na amiga que sou.

    Utilizo, quando posso, os filmes Os Desafios da Vida, dependendo, claro, do

    que estamos estudando. Eu sempre exijo relatrio do vdeo assistido e hoje, fazendo

    esta reflexo, percebo o quanto os alunos melhoraram na parte escrita. Eles prestam

    mais ateno em todos os detalhes apresentados pelo vdeo, que representa o assunto

    com o qual tratamos em sala de aula, ou seja, a compreenso da aula fica bem mais

  • 14

    fcil quando pode ser visualizada. Realizo tambm atividades de campo com os alunos:

    coleta para identificao, visita ao aterro sanitrio, visita ao Jardim Botnico (no

    esquecendo que todos estes trabalhos necessitam de relatrio, que s vezes

    individual e outras vezes coletivo); ou s vezes um simples passeio para curtir o

    ambiente. Sinto que meus alunos precisam ser ainda mais acompanhados por mim e

    sempre estou em busca de algo novo para trazer para eles. Por isto a importncia deste

    Mestrado. No livro Educar pela Pesquisa (DEMO, 2002) est escrito que no adianta

    entrar na sala de aula e dizer que agora vamos aprender pesquisando se eu no estiver

    preparada para isto e nem mesmo a minha escola. Assim, no decorrer destes dois

    anos, pude vivenciar o aprender a pesquisar e colocar isso presente em minha prtica,

    percebendo que no ser mais possvel retroceder e sim somente avanar cada vez

    mais.

    Meu propsito antes, durante e agora, no trmino desta dissertao, est

    relacionado com a necessidade que tenho de ir sempre em busca de algo mais. Tenho

    como objetivo melhorar minha prtica docente a cada momento, conhecer e aplicar

    novas metodologias de trabalho. Tenho necessidade de trocar experincias e construir

    novos conhecimentos, pois sei que a formao profissional permanente, no acaba

    com um simples diploma. Acredito que o trabalho de construo da horta escolar

    auxiliar a comunidade, na busca de uma vida mais digna e feliz. Tambm acredito na

    importncia de reconstruir, de reler a minha prtica, de estar sempre me reconstruindo

    como pessoa e como profissional.

    Escolhi o assunto Higiene e Sade por se tratar de um problema da comunidade

    escolar de Moinhos-Estrela. Os habitantes do bairro so pessoas simples. A maioria

    tem situao precria de habitao, emprego, alimentao. Eles tm casa pequena,

  • 15

    mas se vierem mais alguns parentes todos ficam naquele ambiente. Aos visitantes

    oferecido o que se tem naquele momento.

    Considero que fazer este trabalho com eles pode ser fundamental para que a

    situao de vida melhore e que os alunos sintam-se co-autores da mudana no bairro.

    Quando falo da importncia de participar em projetos comunitrios, sinto que os alunos

    se empolgam, percebo que na prtica isso tambm acontecer.

    Fazendo a leitura de alguns textos produzidos pelos alunos, percebi que a

    maioria deles frisa que a sade uma questo social, intimamente ligada qualidade

    de vida. Para se ter qualidade de vida preciso trabalhar, para conseguir ter uma casa,

    alimentos, roupas, e a situao de muitos moradores a falta de emprego. Muitos

    moram margem do Rio Taquari, ou seja, nas cheias a maioria perde tudo, ou por no

    ter tido tempo suficiente para retirar, ou por querer perder tudo para ganhar do poder

    pblico.

    Mesmo assim, acredito que seja fundamental trabalhar com atividades prticas

    com os alunos, e estas podem ser tanto dentro como fora da escola. Tento, sempre que

    possvel, fazer visitas ao bairro. Convido a turma, caminhamos e enquanto isto os

    alunos mostram onde moram. lindo ver os olhos brilhando ao mostrarem suas casas,

    e se algum parente estiver por ali, os alunos fazem a minha apresentao. Ou seja,

    eles sentem-se bem ao entender que eu me importo com o bem-estar deles.

    O bairro foi criado nos anos 80. Conheo pessoas que foram trazidas de vrios

    municpios aqui do Estado e ali depositadas, no sendo dadas a elas condies

    dignas de vida. Mesmo assim as famlias adaptaram-se, pois naquele perodo eram

    distribudos alimentos e cargas de areia para construo de casas. Concordo com

  • 16

    Demo (2000) quando afirma que o maior problema do ser humano no o passar fome

    e sim ser massa de manobra. o que vem ocorrendo em comunidades isoladas como

    a do bairro Moinhos, onde pessoas so iludidas com promessas de melhorias,

    principalmente na poca das eleies e depois observam que as mesmas no so

    cumpridas, pois o mais importante j foi adquirido, que o voto. Portanto, necessrio

    desconstruir a inconscincia da comunidade. Dessa forma ela poder fazer uma

    releitura da realidade em que est inserida, bem como intervir com autonomia para que

    assim progrida e seja capaz de mudar a situao em que vive.

    Hoje vejo o reflexo do passado, pois as pessoas so pacficas, acham que

    algum deve lhes dar tudo e no se sentem parte integrante do bairro. Por isso o meu

    interesse em incentiv-los a realizar mudanas pelo seu prprio esforo.

    As condies de moradia no bairro so preocupantes, pois existem muitas casas

    de madeira, de tamanho pequeno, no h espao para todos na casa. Isso ocorre mais

    para aqueles que no trabalham e esto desanimados quanto possibilidade de

    progredir. Percebo que muitas famlias j melhoraram a sua forma de entender e

    modificar o seu mundo, buscando mais condies de sade e higiene.

    A higiene est intimamente ligada sade, pois no adianta somente saber que

    se deve escovar os dentes trs vezes ao dia se em casa existe uma nica escova, que

    ser utilizada por mais de trs pessoas, e o creme dental est no final. O que fazer

    numa situao assim? Durante meus passeios no bairro, com os alunos, vejo certas

    casas por dentro e retorno s minhas aulas e me pergunto: o que estou fazendo aqui?

    Estou influenciando em algum aspecto nesta comunidade? Como estou influenciando,

    se no h recursos, espaos? O que meu aluno pensa quando estudamos que

    preciso cada um ter sua toalha de banho e tem, em sua casa, apenas uma toalha de

  • 17

    banho ou pano de cho? Vejo que quanto mais prxima trabalhar da realidade, mais

    influncias positivas poderei exercer sobre eles. Acredito que esse o caminho da

    mudana: trabalhar a realidade dos alunos, tentando fazer com que eles percebam que

    possvel melhorar, bem como a importncia do compromisso, das atitudes, para que

    possam superar as dificuldades e no precisem viver sempre assim.

    Uma forma de contribuir foi envolver os alunos nesta pesquisa.

    O meu objetivo, durante a construo de minha proposta, era identificar, entre eles,

    as repercusses da construo coletiva de uma horta escolar, a partir do problema:

    Que influncia a construo coletiva de uma horta escolar pode ter sobre os

    hbitos de higiene e sade dos alunos participantes?

    Conforme vou descrever, os resultados do trabalho foram significativos, sobretudo

    no aspecto nutricional, pois as verduras que agora esto sendo plantadas e colhidas na

    horta tm auxiliado no desenvolvimento fsico e mental dos alunos. A dieta alimentar

    dos alunos era pobre em vitaminas e sais minerais, com excesso de carboidratos.

    Sabe-se que a alimentao necessita estar em equilbrio, ou seja, de fundamental

    importncia ingerir protenas, glicdios, lipdios, vitaminas, gua e sais minerais nas

    refeies. Tal aspecto no ocorria em todas as famlias do Bairro Moinhos, onde se

    localiza a escola em que atuo. A partir desta construo que alguns alunos tm

    organizado o seu terreno abandonado para cultivar hortalias e dali retirar alimentos

    sem agrotxicos e muito saudveis para o bem-estar de suas famlias.

    A realizao desta pesquisa foi desafiadora. Atravs deste trabalho, permanecemos

    em constante movimento e foi possvel formar parcerias com instituies do municpio.

    Acredito que os alunos, e por meio deles a comunidade, estejam percebendo a

  • 18

    importncia de viver de forma saudvel e acreditando que o que se sonha pode se

    tornar real, se houver interesse, persistncia e muito amor.

    Passarei agora aos fundamentos tericos da dissertao, apresentados nos trs

    captulos seguintes, envolvendo: sade, sistema imunolgico e higiene corporal; os

    alimentos e a horta escolar; sade do corpo e da mente.

  • 19

    2 SADE, SISTEMA IMUNOLGICO E HIGIENE CORPORAL

    Sade refere-se ao bem-estar fsico, social e emocional, conceito estabelecido

    pela Organizao Mundial da Sade (OMS). O bem-estar fsico est associado ao

    funcionamento harmonioso e integrado de todo o organismo, de tal modo que no o

    percebemos. Por exemplo, em geral, no nos damos conta da respirao. Isto s

    acontece quando o sistema respiratrio no est funcionando bem, devido a uma gripe

    ou outra disfuno. Deste modo o bom funcionamento do corpo humano envolve

    diferentes funes, responsveis tanto pela preservao da vida individual do ser como

    pela perpetuao da espcie. Entre as primeiras temos o sistema imunolgico, que,

    conforme Baggish, um conjunto intrincado de clulas, cuja misso identificar e

    destruir invasores estranhos antes que qualquer mal seja feito ao corpo (1998 p. 54).

    Cabe salientar que o sistema imunolgico, que tem a funo de reconhecer e destruir

    os vrus e bactrias que possam atac-lo, est diretamente relacionado a condies

    emocionais e afetivas. Por essa razo tem uma importncia especial nesta pesquisa e

    ser um pouco mais comentado a seguir.

    De acordo com Janeway (2000), os microrganismos que causam doenas no

    homem e nos animais penetram nos tecidos em diferentes locais. Essas invases so

    contidas inicialmente, em todos os vertebrados, por mecanismos de defesa inatos, que

    preexistem em todos os indivduos e atuam dentro de poucos minutos aps a infeco.

    Somente quando as defesas inatas forem ultrapassadas, enganadas, requerida uma

    resposta do sistema imunolgico, ou seja, o agente que pode prejudicar a sade. Sabe-

    se que as superfcies epiteliais do corpo servem como barreira aos microrganismos e

  • 20

    somente quando o micrbio ultrapassar essa barreira haver uma infeco, que poder

    ser uma patologia, ou seja, uma doena. Conforme Cobra (2001), isso pode acontecer

    devido falta de higiene do indivduo, ou devido a sua fraqueza imunolgica. Cada

    pessoa tem mais ou menos resistncia a determinada patologia, pois no somente o

    meio que interfere. Quanto aos agentes que causam doenas (vrus, bactrias, fungos,

    protozorios, vermes), cada um deles poder agir de forma diferente e cabe ao sistema

    imunolgico destru-los.

    Reafirmando o que disse Janeway (2000), as superfcies corporais so

    protegidas por epitlios, que proporcionam uma barreira fsica entre o meio interno e o

    mundo externo que contm os patgenos. Os epitlios compreendem a pele e os

    revestimentos das estruturas tubulares do corpo, como os tratos gastrintestinais,

    respiratrios e geniturinrios. Infeces ocorrem quando o microrganismo coloniza ou

    atravessa tais barreiras. A importncia dos epitlios bvia, pois quando a barreira

    rompida a infeco pode causar doena ou morte. Pessoas com defeito na secreo

    de muco ou inibio dos movimentos ciliares, em que as bactrias podem colonizar a

    superfcie do epitlio, podem desenvolver infeco. H, no corpo humano trs barreiras

    epiteliais:

    - Mecnicas: clulas epiteliais unidas por junes fortes; fluxo longitudinal de ar;

    movimento de muco pelos clios.

    - Qumicas: cidos graxos (pele); enzimas digestivas do trato gastrintestinal:

    lisozima (saliva, suor, lgrimas) e pepsina (intestino delgado); potencial de

    hidrognio do estmago.

  • 21

    - Microbiolgicas: a flora normal compete por nutrientes e por adesividade ao

    epitlio e pode produzir substncias antibacterianas.

    O que influi decisivamente na patologia humana a imunodeficincia, que ocorre

    quando um dos componentes do sistema imunolgico defeituoso. A causa mais

    comum a desnutrio, principalmente em pases sub-desenvolvidos, pois as pessoas

    desnutridas ficam mais expostas aos ataques dos microrganismos.

    Outro fator que interfere na sade e higiene dos humanos o convvio social,

    pois, conforme Goleman (1995), os hormnios liberados no estresse (adrenalina,

    noradrenalina, cortisol e prolactina) so todos liberados durante a estimulao do

    estresse. Cada um deles tem impacto sobre as clulas imunolgicas, o que facilita a

    entrada de doenas. Goleman afirma:

    Ajudar as pessoas a lidar melhor com sentimentos incmodos como a raiva, ansiedade, depresso, pessimismo e sensao de solido uma forma de prevenir doenas; (...) Muitos pacientes podem auferir imensos benefcios quando a assistncia clnica acompanhada de assistncia psicolgica.(GOLEMAN, 1995, p. 199).

    A relao entre aspectos psicolgicos e as condies imunolgicas do

    organismo, destacadas por Goleman, precisam ser enfatizadas nesta pesquisa. Mas

    importante tambm conhecer outros aspectos relacionados ao sistema imunolgico,

    como as condies de higiene corporal.

    O ser humano tem dois tipos de glndulas sudorparas: as glndulas crinas, que

    produzem apenas lquido refrescante para o corpo, e as glndulas apcrinas, cuja

    secreo transporta gorduras e protenas das clulas para o exterior do corpo. As

    glndulas sudorporas tm grande influncia em nosso organismo, pois as glndulas

  • 22

    crinas se distribuem por todo o corpo e se abrem para a superfcie. Elas respondem

    prontamente a tenses ou ao calor. O suor, por sua vez, produzido e filtrado no

    plasma, que composto de 99% gua e 1% outras substncias qumicas, como

    compostos de sdio, cloro, potssio, clcio, fsforo e cido rico. J as glndulas

    apcrinas, ao contrrio, concentram-se em certas reas peludas: nas axilas, na parte

    cabeluda da cabea e nas regies umbilical, pubiana e anal. O suor que produzem vaza

    para os folculos capilares (raiz dos cabelos) e no diretamente sobre a pele. Essa

    secreo das glndulas apcrinas alimento para as bactrias que esto na epiderme,

    e os produtos do metabolismo das gorduras e protenas secretadas, digeridas pelas

    bactrias, que produzem o cheiro do suor. Portanto, o banho dirio necessrio para

    tirar o acmulo das impurezas que o corpo secreta naturalmente.

    Alm do mencionado, a higiene corporal est ligada auto-estima, ou seja, devo

    me amar para que atravs do meu corpo possa demonstrar isto s pessoas.

    Se a pessoa no se valoriza, ento no se cuida; se no d trato a si mesma e se a sua prpria figura e os seus modos ofendem pela inadequao o sentimento de sociabilidade de seus semelhantes, cai por terra toda possibilidade de que seus gestos possam significar deferncia e respeito para com os outros... Manter o corpo asseado e perfumado, e as roupas limpas so o primeiro preceito a ser ensinado s crianas e jovem. Sabe-se que o cheiro do corpo pode afetar o ambiente social, como o caso do cheiro de suor, a bromidrose, (suor malcheiroso) e do mau hlito, ou pode afetar apenas o relacionamento entre duas pessoas, como o caso dos odores em partes ntimas. (COBRA, 2001, p.2).

    Portanto, os aspectos fsico, social e mental devem estar em harmonia para que

    o ser humano esteja saudvel e possa exercer bem suas atividades na sociedade.

    Concordo com a afirmao de Schaedler e Almeida (2001), quando afirmam

    que sade no est para a educao como um contedo a ser transmitido e ensinado nos espaos restritos e restritivos das salas de aula, pois ela precisa

  • 23

    fazer parte do dia-a-dia dos alunos, deve ser vivenciada sempre e no no momento que se pr estabelece na escola. A escola precisa ser um espao de inovao, de construo, de dilogo, de formao de pessoas crticas e para tanto ela precisa ser capaz de afetar-agenciar-produzir um novo significado para a sua funo. (Schaedler e Almeida, 2001, p. 59).

    Tenho convico de que, atravs de uma prtica pedaggica, como o trabalho

    com a sade transversalizando a educao, pode-se chamar reflexo, criao de

    um espao na escola, para que a comunidade escolar busque a reconstruo e a

    soluo de seus prprios problemas, atravs da unio, com envolvimento da

    coletividade.

    Outro aspecto a ressaltar a higiene alimentar desenvolvida na comunidade de

    Moinhos, pois a alimentao foi favorecida pelo trabalho coletivo na horta escolar que

    construmos. o que ser apresentado no prximo captulo desta dissertao.

  • 24

    3 OS ALIMENTOS E A HORTA ESCOLAR

    Os alimentos fornecem ao organismo as substncias necessrias ao seu

    sustento. Para isto ocorrer necessrio observar a qualidade e quantidade de

    alimentos ingeridos para que assim o nosso corpo se mantenha saudvel. necessrio

    observar a influncia que os mesmos exercem sobre as vrias funes orgnicas,

    especialmente as que se referem aos processos de absoro, metabolismo e excreo

    (EVANGELISTA, 2002).

    Os alimentos so divididos em grupos, e o corpo humano precisa de

    determinadas quantidades de cada grupo para se manter em equilbrio. Esses grupos

    so as protenas, glicdios ou carboidratos, lipdios ou gorduras, vitaminas, gua e sais

    minerais. Cada grupo exerce uma determinada funo no nosso corpo:

    - As Protenas ajudam a estruturar o corpo. Participam da formao e

    crescimento da estrutura corporal. Os alimentos mais comuns ricos em

    protenas so: carne, aves, peixe, ovos, leite, lentilha, feijo, soja, amendoim.

    - Os Glicdios fornecem energia, sendo o combustvel que faz funcionar os

    rgos e msculos construdos pelas protenas. Exemplos de alimentos que

    os contm: massas, pes, farinhas, mandioca, batata, arroz, trigo, beterraba,

    mel, banana.

    - Os Lipdios formam reservas de energia. Sustentam a pele e funcionam

    como isolantes trmicos, protegendo o organismo contra o frio e o calor.

  • 25

    Alguns exemplos de alimentos que compem este grupo: abacate,

    amendoim, manteiga, banha, castanha, outras gorduras.

    - As Vitaminas regulam e protegem o organismo. Atuam no metabolismo

    celular, evitando que excessos de gorduras se transformem em placas no

    nosso corpo. Principais fontes de vitaminas: verduras e frutas.

    - A gua e os sais minerais auxiliam na hidratao do corpo, aceleram o

    metabolismo e previnem a desidratao. J os sais minerais so de

    fundamental importncia para a formao dos ossos, dos dentes e do

    sangue. Exemplos: clcio e fsforo (leite, queijo, casca do ovo); ferro (fgado,

    rins, feijo, lentilha, carnes, ovos, verduras de folhas verde-escuras); iodo

    (peixes, sal iodado).

    Necessitamos ingerir um pouco de cada grupo, pois a falta de um nutriente em

    determinado rgo provocar uma srie de complicaes.

    Oliveira (1999) ressalta que a alimentao balanceada, incluindo frutas,

    verduras e legumes, a primeira etapa para a plena atividade cerebral, pois fornece a

    energia para a atividade fsica regular. A atividade fsica aumenta a oxigenao do

    sangue, o que fundamental para o funcionamento do crebro. Os exerccios mentais,

    como ler, estudar, refletir sobre uma notcia, planejar metas para o futuro, so formas

    de manter ativas as conexes cerebrais. Todos esses aspectos reforam a importncia

    de construir uma horta escolar em uma comunidade como a de Moinhos, para o

    benefcio do corpo e da mente dos educandos.

    Como esta pesquisa busca compreender as repercusses que a construo da

    horta exerce sobre os hbitos de higiene e sade dos alunos, considero fundamental

  • 26

    perceber se ocorreram mudanas nos seus hbitos alimentares, pois a sade mental e

    corprea est ligada alimentao equilibrada. Por isto, a necessidade de ingerir

    alimentos vegetais, como: cenoura, beterraba, pepino, alface e repolho, entre outros.

    Aqui cito aquelas que esto sendo cultivadas na horta escolar, objeto da presente

    pesquisa.

    Para cultivar essas hortalias necessrio que o solo seja adequado. O solo

    contm muitos organismos vivos por centmetro cbico. um ecossistema complexo,

    no qual as substncias essenciais para a vida transitam em ciclos, passando das

    plantas para os animais e destes para o esterco, para as bactrias do solo e de volta s

    plantas. As bactrias existentes no solo realizam vrias transformaes qumicas ,

    como o processo de fixao do nitrognio, que torna o nitrognio atmosfrico acessvel

    aos vegetais. J as minhocas contidas no solo revolvem a terra e a deixam mais solta e

    mais frtil para o cultivo devido a sua fabricao de hmus. Assim, todo o ciclo inicia

    novamente. Hoje se fala muito em agricultura orgnica e em agricultor orgnico, pois a

    quantidade excessiva de agrotxicos tem ocasionado problemas ambientais e

    alimentares, enquanto que o uso de esterco e de restos de vegetais devolve a matria

    orgnica ao solo para que o ciclo biolgico reinicie (CAPRA, 2002).

    O solo a base do trabalho orgnico.Vrios resduos so reintegrados ao solo,

    como esterco, restos de verduras e folhas, que so devolvidos aos canteiros para que

    sejam decompostos e transformados em nutrientes para as plantas.

    Essa fertilizao ativar a vida no solo. Os microorganismos, alm de

    transformarem a matria orgnica em alimento para as plantas, tornaro a terra porosa,

    solta, permevel gua e ao ar. O grande valor da horticultura orgnica promover

  • 27

    permanentemente o melhoramento do solo. Ao invs de mero suporte para a planta, o

    solo ser sua fonte de nutrio.

    Vale salientar algumas influncias dos produtos orgnicos:

    -Evitam problemas de sade causados pela ingesto de substncias qumicas txicas:

    pesquisas e estudos tm demonstrado que os agrotxicos so prejudiciais ao nosso

    organismo e os resduos que permanecem nos alimentos podem provocar reaes

    alrgicas, respiratrias, distrbios hormonais, problemas neurolgicos e at cncer.

    -Alimentos orgnicos so mais nutritivos: os solos ricos e balanceados com adubos

    naturais produzem alimentos com maior valor nutritivo. Ou seja, o uso de esterco de

    frango com serragem favorece o desenvolvimento das hortalias e permite o sabor

    natural dos alimentos.

    -Alimentos orgnicos so mais saborosos: o sabor e o aroma so mais intensos - em

    sua produo no h agrotxicos ou produtos qumicos que possam alter-los.

    -Protege futuras geraes de contaminao qumica: a intensa utilizao de produtos

    qumicos na produo de alimentos afeta o ar, o solo, a gua, os animais e as pessoas.

    A agricultura orgnica exclui o uso de fertilizantes, agrotxicos ou qualquer produto

    qumico; e tem como base de seu trabalho a preservao dos recursos naturais.

    -Evita a eroso do solo: atravs das tcnicas orgnicas, tais como rotao de culturas,

  • 28

    plantio consorciado, compostagem, o solo se mantm frtil e permanece produtivo ano

    aps ano.

    -Protege a qualidade da gua: o uso de agrotxicos utilizados nas plantaes prejudica

    a qualidade da gua, pois atravessam o solo e alcanam os lenis d'gua, poluindo

    rios e lagos. Enquanto o esterco fertiliza o solo, sem causar prejuzos ambientais.

    -Restaura a biodiversidade, protegendo a vida animal e vegetal: a agricultura orgnica

    respeita o equilbrio da natureza, criando ecossistemas saudveis. A vida silvestre,

    parte essencial do estabelecimento agrcola, preservada e reas naturais so

    conservadas.

    -Economiza energia: o cultivo orgnico dispensa os agrotxicos e adubos qumicos,

    utilizando intensamente a cobertura morta, a incorporao de matria orgnica ao solo

    e o trato manual dos canteiros.

    A conservao da matria orgnica importante para manter o solo em boas

    condies fsicas, pois contm a reserva integral de nitrognio, bem como quantidades

    significativas de outros nutrientes, como fsforo e enxofre.

    Os nutrientes mais necessrios para o crescimento correto das plantas so

    nitrognio, potssio, fsforo, ferro, clcio, enxofre e magnsio todos presentes na

    maioria dos solos em quantidades variveis. O conjunto horta um ecossistema

    complexo no qual as substncias essenciais para a vida transitam em ciclos, passando

    das plantas para os animais e destes para o esterco, para as bactrias do solo e de

  • 29

    volta s plantas. Cabe ressaltar a influncia da energia solar como combustvel natural

    que pe em movimento esses ciclos.

    A realizao desta pesquisa junto comunidade de Moinhos leva em

    considerao o que Kaufman (1998) comenta: as cidades esto cada vez mais longe do

    meio natural e os ciclos da natureza so longos, lentos e pouco cotidianos para a vida

    das pessoas. A horta escolar, em compensao, um espao onde ns - alunos e

    professora - compartilhamos as mesmas emoes ao capinar, fazer covas, plantar e

    colher. A horta um sistema, ou seja, um conjunto de elementos que se relacionam.

    preciso observar a reteno da gua pelo solo para averiguar se possvel plantar

    cenouras, por exemplo. Outro aspecto a observar a qualidade do solo, se rico em

    matria orgnica. Tambm necessrio plantar hortalias conforme a estao do ano,

    pois nem todas podem ser plantadas em qualquer poca. Ao longo da pesquisa, todos

    estes fatores foram analisados coletivamente para que assim pudssemos melhorar

    cada vez mais a horta de nossa escola.

    Alm de fatores fsico-qumicos-biolgicos que se integram com o trabalho em

    uma horta importante citar a autonomia e a solidariedade que vo sendo construdas

    com o grupo de educandos envolvidos neste processo. Conforme Kaufmann (1998), a

    horta um espao onde os alunos podem trabalhar de maneira espontnea, com

    autonomia, o que foi ocorrendo ao longo desta pesquisa.

    Outro aspecto a considerar que os alunos esto muito mais interessados em

    aprender assuntos relacionados com a horta escolar que ajudaram a construir. Por isto

    o grupo de professores est trabalhando e desenvolvendo unidades de aprendizagem,

    onde diversos contedos so envolvidos no processo. Junto a isto, concordo com Morin

    (2002) quando afirma que preciso trabalhar de forma integrada ao longo do processo

  • 30

    ensino-aprendizagem. Sabe-se que as disciplinas so compartimentadas, com isto

    difcil obter um resultado significativo tanto para o aluno como para o professor, por isto

    a necessidade de reconstruir, de entrar em sintonia com o contexto dos educandos, e

    uma possibilidade atravs de uma unidade de aprendizagem.

    A escola precisa inovar. Esta inovao pode assumir uma forma de pesquisa-

    ao, que conforme Perrenoud (2000) a oportunidade de ouvir todas as vozes da

    comunidade escolar e, nesta perspectiva, ir em busca de fatores que venham ao

    benefcio dos envolvidos. No necessrio criar novas leis para que o processo ocorra,

    fundamental que a comunidade crie novas prticas pedaggicas para evoluir. E como

    no trabalho de construo da horta as vrias vozes se envolveram, foi possvel

    investigar as repercusses de higiene e sade dos alunos participantes, bem como o

    envolvimento dos demais membros da comunidade escolar no processo. Isto mostra

    que possvel fazer um trabalho coletivo e de valorizao da vida.

    Perrenoud (2000) afirma a necessidade de dar sentido ao trabalho escolar, de

    incentivar os alunos a criarem e participarem de projetos vinculados aos seus

    interesses. A escola precisa estar aberta para a vida, tornar o dia-a-dia escolar mais

    ativo e participativo. Desta maneira, ser possvel contribuir para a construo do

    carter de nossos alunos, pois estaro formando sua cidadania, sendo mais

    cooperativos e humanos.Tambm sero pessoas sentimentais, que tero empatia ao

    que ocorre com o seu semelhante.

    Tiba (1998) destaca que a integrao da informao pode se transformar em

    conhecimento. No incio da pesquisa, o que significava para os alunos a reeducao

    alimentar, atravs de uma horta? Este era um dos problemas presentes no teste-piloto.

    No incio, parecia no significar nada, mas quando iniciamos debates sobre os

  • 31

    problemas da comunidade em funo da maior pontuao obtida pela drogatizao, foi

    constatada a dificuldade em sanar este problema, ento se iniciou o estudo do que vem

    a ser uma horta e como ela pode interferir na preveno ao uso de drogas. isto que

    Tiba (1998) trata como informao que se transforma em conhecimento, principalmente

    se estiver relacionada ao interesse dos participantes. Por isto integramos a construo

    da horta ao desenvolvimento de uma Unidade de Aprendizagem.

    A Unidade de Aprendizagem prope uma nova forma de planejar os contedos

    de ensino em nossas aulas. Ela possibilita que essa nova forma de ensino-

    aprendizagem seja mais significativa aos alunos, pois a partir das dvidas e ou certezas

    que a unidade dever ser construda. Conforme Gonzlez:

    La unidad didctica: s un conjunto de ideas en forma de hiptesis de trabajo. Est muy condicionada por la manera de pensar del equipo de profesores que la elabora. Busca organizar la prctica de la enseanza y el aprendizaje de manera eficiente. Puede ser disciplinar o transversal. (GONZLEZ, 1999 p.19)

    A unidade de aprendizagem tem como um dos objetivos interligar outras reas

    num mesmo estudo, ela uma nova forma de estruturar o currculo. Ou seja, para que

    ocorra com melhor desempenho interessante a participao de mais de um professor.

    Uma nova estrutura exige a participao ativa de todos, portanto a unidade de

    aprendizagem sobre a horta teve o interesse de envolver todo o conjunto escolar. Outro

    fator de fundamental importncia o que eu, como educadora, pretendia que meu

    aluno soubesse para ser usado nos seus problemas dirios, bem como com as relaes

    afetivas, pois: O significado essencial para os seres humanos.(CAPRA, 2002, p. 96).

  • 32

    A busca do significado um aspecto relevante no trabalho com os educandos.

    Cabe ao educador conhecer a realidade dos alunos, em seguida averiguar com os

    mesmos quais so os seus interesses junto a uma determinada disciplina. Fazendo isto

    o educador tornar o seu trabalho significativo, atraente e desafiador, pois o educando

    a pea fundamental para que o processo ensino-aprendizagem ocorra. Trabalhar

    desta forma uma possibilidade de o educando interpretar o seu entorno com as vrias

    experincias adquiridas durante as aulas. Buscar integrao tambm facilita o

    entendimento do aluno, pois, conforme Morin (2002), o compartimento das disciplinas

    gera no aluno atrofia mental, o que faz com que ele no compreenda, no interprete e

    nem influencie no contexto em que vive.

    Portanto, o trabalho de construo da horta veio ao encontro da seguinte

    afirmao: todo desenvolvimento verdadeiramente humano significa o

    desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das participaes comunitrias e

    do sentimento de pertencer espcie humana (MORIN, 2002. p. 55). isto que busco

    perceber e compreender as repercusses da construo desta horta nos hbitos de

    higiene e sade dos alunos e a isto se vincula cooperao, comprometimento,

    satisfao, empatia, trabalho coletivo e valorizao da vida. No se trata, portanto,

    apenas de higiene alimentar e de sade fsica, mas tambm de aspectos emocionais,

    comportamentais e sociais.

    Conforme Golemann (1995), aprendemos mais quando temos alguma coisa que

    nos interessa e sentimos prazer quando nos empenhamos nela. Assim tem sido no

    trabalho com a horta escolar, que relaciona-se necessria criao de comunidades

    sustentveis. importante fazer com que as pessoas percebam que fazem parte da

    biosfera e que vivam de acordo com ela, pois:

  • 33

    ... Em virtude das necessidades essenciais de respirar, comer e beber, estamos sempre inseridos nos processos cclicos da natureza. Nossa sade depende da pureza do ar que respiramos e da gua que bebemos, e depende da sade do solo a partir do qual so produzidos os nossos alimentos.(CAPRA, 2002, p.240).

    Concordo com Capra (2002), quando afirma que o ser humano no deve se

    preocupar em querer controlar a natureza e sim tentar aprender com ela, tendo-a como

    aliada e no como uma mercadoria onde a teia da vida s usada, explorada, poluda,

    sem lhe dar a devida importncia. Neste passo entra o trabalho coletivo da horta

    escolar, pois Freire (1996) j mencionava que a verdadeira aprendizagem constri e

    reconstri os educandos e educadores, tornando-os igualmente sujeitos do processo no

    qual esto inseridos. Com o trabalho na horta, acontece a interao entre sistemas

    vivos, com destaque aos humanos da comunidade escolar, na qual o respeito, a

    solidariedade, o estudo e a pesquisa tm sido fatores essenciais. algo realmente

    significativo, porque, segundo Capra,

    A alfabetizao ecolgica - a compreenso dos princpios de organizao que os ecossistemas desenvolveram para sustentar a vida - o primeiro passo no caminho da sustentabilidade. O segundo passo o projeto ecolgico. Precisamos aplicar nossos conhecimentos ecolgicos a uma reformulao fundamental de nossas tecnologias e instituies sociais, de modo a transpor o abismo que atualmente separa as criaes do ser humano dos sistemas ecologicamente sustentveis da natureza.(CAPRA, 2002, p.241).

    Esta pesquisa, desenvolvida na Escola de Moinhos, integra-se a um movimento

    de alfabetizao ecolgica por ser a nossa horta escolar um sistema ecologicamente

    sustentvel que construmos em integrao com a natureza. assim que o processo

    ocorre quando os humanos respeitam e valorizam o trato com a terra, sem para isto

    precisar destruir e sim cultivar, preservar e cuidar.

  • 34

    4 CONSTRUO COLETIVA DE UMA HORTA COMO FORMA DE PREVENO AO

    USO DE DROGAS

    interessante refletir por que os alunos no acreditavam que seria possvel fazer

    um trabalho de preveno s drogas na comunidade de Moinhos. Um aluno comentou

    que quem usa drogas o faz por opo e no por falta de conhecimento, o que foi

    aceito pelos demais. Desde ento, venho me questionando e lendo sobre isto.

    Conforme Sanvito (1991), a conscincia est constantemente mudando, os

    arranjos nervosos so continuamente diferentes devido aos impactos do cotidiano.

    Acredito que o comportamento humano vai sendo modificado, melhorado ou no devido

    aos contatos familiares e escolares, entre outros que o indivduo vai tendo ao longo de

    sua trajetria. Na escola em que foi realizada esta pesquisa, um dos desafios para os

    educadores fazer com que os alunos escutem as diversas opinies, respeitem uns

    aos outros. Durante a atividade da pesquisa diagnstica realizada com a comunidade

    escolar e aps divulgao do resultado da pesquisa, ocorreram muitos debates at que

    se decidiu o que encaminhar. Ao longo desta construo, os alunos perceberam que

    era necessrio argumentar para que outros confiassem e acreditassem no que estavam

    fazendo.

    Cada aluno pode observar que o meio tem influncia sobre ele, bem como ele

    exerce influncia tambm sobre o meio. Isto se relaciona, ainda que indiretamente, ao

    uso de drogas, sejam elas lcitas ou ilcitas. As drogas fazem com que o indivduo

    venha a fugir de suas responsabilidades perante a sociedade, podendo se tornar um

  • 35

    indivduo sem opinies, dependendo somente da quantidade e do tipo de droga que

    usa.

    Cabe pensar: que tipo de humanos vamos construir?

    Ento, volto a enfatizar as grandes melhorias que a construo coletiva da horta

    escolar teve perante os alunos mais agressivos, um dos quais afirmou: a horta mudou

    tudo na minha vida. No momento em que li esta frase, tive a confirmao de que

    possvel melhorar e crescer intelectualmente. O aluno que a escreveu era um dos

    alunos com maior problema de relacionamento com colegas de sua turma e com os

    professores. Mas, ao longo do trabalho, ele foi um dos destaques, pois ajudava em

    tudo, desde limpar o terreno at plantar as sementes. Conforme Boff:

    No busquemos o caminho da cura fora do ser humano. O ethos est no prprio ser humano, entendido em sua plenitude que inclui o infinito. Ele precisa voltar-se sobre si mesmo e redescobrir sua essncia que se encontra no cuidado. (BOFF, 1999. p. 191)

    A frase mencionada retrata muito bem o que ocorreu com os educandos da

    Escola Estadual de Moinhos, em Estrela/RS.

    Conforme Tiba (2002), a sade social est relacionada a trs tipos de

    comportamento, onde a tendncia a evoluo de uma fase para a outra, ou no,

    dependendo dos fatores externos que me influenciam. O primeiro comportamento seria

    o estilo vegetal, que significa esperar em vez de agir; o segundo comportamento seria o

    estilo animal, onde repito os mesmos erros, ajo impulsivamente, no assumo meus

    atos; e o terceiro seria o comportamento estilo humano, que integra cidadania, tica e

    carter no convvio com o outro. neste processo de estilo vegetal, animal e humano

    que percebo a evoluo dos meus educandos no processo de construo da horta

  • 36

    escolar, pois foi necessrio respeitar opinies, saber pedir desculpas, falar a verdade

    quanto ao desenvolvimento do trabalho e em especial tornar-se independente frente a

    problemas que surgiram na construo coletiva da horta, sabendo argumentar e guiar

    outros colegas. Outro fator abordado por Tiba (2002), a sade social est vinculada a

    saber o que posso fazer e o que no posso fazer. Aqui entra outro aspecto relevante:

    respeitar o outro com quem convivemos e ter limites perante os nossos atos. Desta

    forma, Tiba (2002) sugere que educandos e educadores parem, ouam, olhem, pensem

    e ajam, reafirmando o que Goleman (1995) retrata sobre a importncia de solucionar

    situaes no momento em que ocorrem e no permitir que o problema vire uma bola de

    neve que, quanto maior, mais estragos fsicos e emocionais poder ocasionar.

    Quando me refiro s mudanas que ocorreram com os alunos mais agressivos,

    durante o desenvolvimento desta pesquisa, lembro-me do que Golemann (1995) retrata

    em seu livro Inteligncia Emocional, ou seja, as trs aptides necessrias para a

    preveno de drogas: a emocional, a cognitiva e a comportamental.

    A aptido emocional se refere em especial ao controle dos sentimentos e dos

    impulsos. A cognitiva se refere tomada de decises usando sua autoconscincia,

    tendo empatia para entender tanto o sofrimento como a alegria do outro, no julgando

    sem antes entender as razes do outro. E a comportamental trata do saber ouvir,

    recebendo a crtica como algo a ser melhorado em nossas atitudes, no permitindo

    influncias negativas nas tomadas de decises pessoais. Essas aptides so

    estratgias que devem ser ingredientes para melhorar o nosso convvio com o grupo

    com o qual vivemos.

    Golemann (1995) deixa claro que precisamos ser pessoas ouvintes e

    questionadoras. No necessrio sempre ter uma resposta pronta dvida que surge,

  • 37

    pois muitas vezes a pessoa que realiza uma pergunta a faz, pois j tem uma resposta e

    somente quer receber o apoio do outro, por isto a necessidade de saber ouvir.

    Outro fator relevante retratado por Golemann (1995) o semforo emocional: no

    vermelho: pare, se acalme e pense antes de agir; no amarelo: diga o problema e como

    voc se sente, pense em solues; no verde: siga e tente o melhor plano. assim que

    percebo a caminhada desta pesquisa com meus alunos. Havia um tempo em que um

    simples olhar causava agresses fsicas, discusses entre turmas dentro e fora da

    escola. Ao longo desta pesquisa, que resultou na construo coletiva da horta escolar,

    percebo o quanto evoluram os pontos pare, observe, olhe, escute e aps sua anlise,

    tome a atitude que julgar melhor. Agora percebo o quanto a inteligncia emocional de

    meus educandos est evoluindo, pois reconhecem que no brigando e se agredindo

    que iro resolver seus problemas.

    Por exemplo, h problemas como: algum escondeu o lpis, o bon, algum

    olhou para mim, outro inventou uma fofoca e os envolvidos na confuso no

    conversaram e, sim, fizeram o que os fofoqueiros armaram. So problemas de

    adolescentes? Sim, sabe-se que pequenos desentendimentos ocorrem, em especial

    para chamar a ateno dos pais, dos professores. Por isso os educadores, alm de

    fazerem dilogos na sala de aula e usarem tcnicas para restabelecer relaes de

    carinho, afeto entre eles, tambm podem auxiliar na hora do recreio. A hora do recreio

    de fundamental importncia para o professor, pois pode buscar dilogo com aquele

    aluno que muitas vezes em sala de aula quieto demais, ou aquele que explosivo

    com seus colegas e professores.

    Outro fator que Golemann (1995) afirma que a hora tudo, ou seja, se ocorre

    um problema em sala de aula que tumultua, ningum mais presta ateno, sendo

  • 38

    necessrio, ento, estabelecer a confiana e parceria entre alunos e professor. Ele

    recomenda que se pare a aula, escute a todos os envolvidos e junto a eles crie

    estratgias para sanar o problema. Assim, numa prxima vez sabero resolver por si

    prprios a situao.

    Que situao? As drogas ilcitas foram as mais pontuadas entre os problemas

    da comunidade. Mas foi ouvido o aluno que disse: quem entra nesta por opo e

    que o melhor seria trabalhar naquilo que no se conhece e que somente teve dois

    votos, a horta. O dilogo que se estabeleceu e a deciso tomada em conjunto, bem

    como o envolvimento durante e fora das aulas de Cincias, vm ao encontro do saber

    ouvir, ter empatia, tolerar o que falam de negativo, tomar decises, ser comprometido.

    Outro aspecto observado ao longo desta pesquisa foi a possibilidade de ocupar o

    tempo ocioso dos alunos participantes, pois eles auxiliam no trabalho junto a horta no

    perodo da tarde tambm, evitando o contato com as drogas. Alm de ocupar o tempo

    ocioso, o trabalho proporcionou o aprendizado de algo desconhecido para os

    moradores deste bairro, que foi a construo da horta. O tempo ocioso e o convvio com

    pessoas viciadas podem ocasionar nos educandos muita angstia, medo de no ter

    nada de til para fazer, e como conseqncia imitar o erro dos outros.

    Alm disso, Golemann (1995) comenta que as pessoas que sofrem de

    perturbao emocional tm tendncia a serem usurias de alguma substncia que crie

    dependncia, sendo que existem duas situaes. Na primeira situao podemos

    encontrar pessoas ansiosas, revoltadas consigo e com os outros, pois estaria faltando o

    neurotransmissor chamado serotonina. A sua falta estaria ligada depresso e a falta

    de motivao. J o excesso de serotonina levaria a outro extremo: a agressividade. O

    comportamento agressivo em humanos costuma andar de mos dadas com o excesso

  • 39

    de serotonina e de noradrenalina no crebro. Para buscar o equilbrio, existem as

    drogas antidepressivas que afetam o sistema lmbico, auxiliando no equilbrio do ser

    humano novamente.

    Mas, na falta de serotonina, a pessoa poderia usar um certo tipo de droga como

    forma de fuga, para aliviar suas tenses e ansiedades. Como o prazer assim provocado

    tem pouca durao, isso estimularia a usar com mais freqncia a droga necessria

    para repor a sua falta.

    A segunda situao, seria a predisposio biolgica dependncia qumica, pois

    a serotonina, estando em falta, pode induzir a busca de uma determinada droga, que

    tende a viciar para sempre. Mas a produo de serotonina pelo organismo pode ser

    estimulada de outras formas, por atividades prazerosas.

    Ento, a sugesto de trabalhar na construo da horta surgiu como uma forma

    de preveno ao uso de drogas pela possibilidade de ocupar o tempo ocioso,

    oportunizando uma forma de prazer em construir algo com suas prprias mos.

    Entrariam neste momento, os aspectos abordados por Capra (2002) e Boff

    (1999), sobre os cuidados com a terra e a sua influncia no ethos, ou seja, o ser

    humano se integrando novamente vida, observando mais o mundo que o cerca e

    percebendo que capaz de construir. Isto se relaciona necessidade de existirem

    Fazendas de Recuperao para a reabilitao de adolescentes dependentes, pois

    nelas se usa o trato com a terra para aliviar tenses, como tambm oportunizar o

    equilbrio entre a pessoa e o ambiente.

    Aqui cabe ressaltar a higiene mental, pois a pessoa torna-se responsvel pelo

    cuidado com a semente que plantou e que ir germinar conforme o afeto a ela

    repassada, enfatizando, desta forma, um aspecto relevante que a valorizao da vida.

  • 40

    neste ponto que a escola entra, pois na realidade em que atuo, sobretudo ela, a

    escola, propicia momentos de prazer e aprendizado. Alm do trabalho na parte da

    manh junto construo da horta, alguns alunos auxiliam no perodo da tarde. Desta

    forma, ocupam o tempo ocioso e evitam seguir exemplos de pessoas que, ao invs de

    irem em busca do que fazer, ficam em bares do bairro bebendo e fumando, e isto um

    mau exemplo aos alunos. Portanto, a construo da horta uma forma de prevenir o

    uso de drogas, reafirmando o que Boff (1999) afirma, ou seja, que o contato com a vida,

    a auto-estima, a valorizao do trabalho que voc est construindo constituem formas

    relevantes de preveno. Neste aspecto, cabe ressaltar o que Golemann (1995) retrata

    como a necessidade de valorizar cada vez mais o eu dos alunos, ou seja, incentivar,

    elogiar todo o crescimento que o aluno vem demonstrando ao longo do processo, pois

    na escola que proporcionado o convvio entre os diferentes, e esta diferena que

    deve ser respeitada e valorizada como grupo que cresce, se desenvolve e compartilha.

    A pesquisa realizada transformadora e desafiadora, pois os contedos de

    Cincias so trabalhados junto com a construo da horta, o que faz terem significado

    para a vida do aluno. Reafirmando o que Capra (2002) comenta: o significado a

    essncia do humano. Todo o processo, desde o teste-piloto, o debate sobre o resultado

    obtido, a deciso tomada pelo grupo em construir uma horta como uma forma de

    preveno ao uso de drogas e a sua construo reforam o que foi afirmado,

    trabalhando com o que vem do grupo. Dando valor a cada idia construda

    coletivamente se tem um ensino-aprendizagem com significado. Este significado

    aquele que marca os alunos, tornando-os mais confiantes e participativos, pois

    percebem que so capazes de construir algo proveitoso para suas vidas, bem como

    respeitar as diferenas do grupo para caminharem juntos.

  • 41

    Para que a escola seja um lugar prazeroso, em que ocorra cumplicidade e

    solidariedade em relao s atitudes e ao ensino-aprendizagem significativo, Perrenoud

    (2000) salienta que preciso envolver os alunos em atividades de importncia e que

    tenham uma certa durao, garantindo, desta forma, o seu envolvimento em algo que

    para eles importante.

    Alm disso, necessrio que percebam que no podem ser imediatistas. O

    exemplo que trago da construo conjunta da horta, que exigiu pacincia e

    persistncia. E neste processo de esperar a semente germinar, de retirar o ino, os

    alunos observam as mudanas que ocorreram ao longo da pesquisa. Cabe a mim

    ressaltar-lhes os momentos fortes vivenciados, bem como as dificuldades enfrentadas,

    fazendo-os criticar para assim o coletivo progredir, avanar. Tambm Perrenoud (2000)

    comenta a importncia de ter um grupo que trabalhe em torno de um projeto comum, e

    isto vem ocorrendo desde o incio da pesquisa.

    Hoje, os alunos esto conscientes de que o trabalho de construo da horta

    escolar s foi possvel porque se envolveram integralmente no processo e, na medida

    em que foram percebendo que estava dando certo, outros, que no haviam ainda se

    envolvido, ingressaram e o grupo conseguiu receb-los e respeitar as diferenas.

    Perrenoud (2000) afirma que ouvir, opinar e chegar a um consenso algo difcil, mas

    que faz o educando junto a seus educadores se desenvolver e se tornar um ser crtico.

    A escola deve ser o centro de mudana, reorganizando a aprendizagem por

    completo.(DEMO, 2000. p. 45). nesta busca que a Escola Estadual de Ensino

    Fundamental Moinhos vem se estruturando, pois acredito que pelo educar pela

    pesquisa podemos melhorar o processo ensino-aprendizagem.

  • 42

    A presente pesquisa, que partiu dos problemas mais relevantes do bairro, gerou

    polmica, dilogo e construo. Nesta construo pode-se observar fatores individuais

    e grupais. Os fatores individuais se referem ao que Golemann (1995) tratou como

    aptides que, ao longo do trabalho, permitiram que houvesse a expresso dos

    sentimentos, o lidar com as diferenas pessoais em relao ao grupo; e as grupais

    retratam o comprometimento em realizar a construo da horta coletivamente, o saber

    ouvir a opinio dos colegas, a auto-estima que o grupo foi adquirindo ao longo do

    processo.

    Nesse processo, envolvendo a formao do carter, Golemann (1995) afirma

    como fator relevante o trabalho escolar, ou seja, a escola deve oportunizar esta

    construo, para que assim o indivduo possa viver em sociedade, avaliando,

    interpretando e interagindo com o mundo que o cerca, mas mantendo a sua

    personalidade, o seu argumento perante o contexto vivenciado. Outro fator, abordado

    por Capra (2002), diz respeito tica, ou seja, a minha conduta humana deriva de

    minha insero num determinado grupo. O grupo escolar pode e deve agir sobre as

    atitudes dos educandos, oportunizando momentos de dilogo, de construo, de

    discusso e de reconstruo, para que assim o indivduo no perca a sua identidade,

    mas que aprenda a valorizar e respeitar os outros nas suas diferenas. Acredito que

    desta forma que tornaremos os educandos mais preparados para a compreenso do

    meio em que vivem, s que, alm de compreender, eles tambm podem influenciar

    rumo mudana.

    Capra (2002) comenta a necessidade de se criar comunidades sustentveis.

    Assim, um trabalho vinculado com a necessidade e o interesse dos educandos provoca

    e estimula a comunidade escolar, fazendo com que mais pessoas abracem esta causa.

  • 43

    O grupo percebeu que possvel realizar um trabalho com o apoio de todos, desde que

    cada membro exera a sua funo.

    Todos esses pontos refletem o que ocorreu durante o andamento da pesquisa.

    Agora mais fcil e produtivo estabelecer dilogos com os alunos, pois eles

    conseguem argumentar quanto aos seus sentimentos, suas frustraes, suas alegrias e

    tambm justificar o porqu de no serem usurios de alguma droga.

    Outro ponto importante a considerar que ser usurio de drogas representa

    uma fuga de responsabilidades e uma certa indiferena com os outros e consigo

    mesmo, enquanto utilizar o tempo ocioso com o cuidado, o plantio e a limpeza da horta

    faz com que o amor e a ternura permitam superar pensamentos tristes. O aluno,

    trabalhando cooperativamente na horta escolar, a cada dia est sendo responsvel por

    mais uma semente que germinou, graas ao cuidado e ao afeto que a ela transmitiu.

    Por isto o trabalho junto horta vem reforar a importncia de estar em constante

    convvio com a natureza, sentindo-se assim parte integrante dela.

    fundamental buscar uma alternativa para melhorar a qualidade de vida. Capra

    (2002) sugere a alfabetizao ecolgica como uma das formas de manter nossa sade

    e o nosso bem-estar, afirmando que, ao tirar do solo o nosso sustento, gerando

    oportunidade de trabalho, isso d incio a uma era baseada no no que podemos

    extrair da natureza, mas no que podemos aprender com ela (CAPRA, 2002, p. 241).

    Percebe-se que a horta envolve uma pedagogia diferenciada cuja importncia

    a compreenso do que a vida, uma experincia de aprendizado no mundo real. Dessa

    forma poderemos criar comunidades sustentveis, aquelas que buscam alternativas

    para melhorar a qualidade de vida. Para isto ocorrer, a escola precisa ser o local de

    acolhida e de ambiente facilitador para reestruturar o currculo em busca do que

  • 44

    significativo. Considero como significativo o conhecimento relacionado a um

    aprendizado terico e prtico, que proporciona prazer por ser algo que vem ao encontro

    das necessidades locais.

  • 45

    5 FUNDAMENTOS EDUCACIONAIS

    O professor fez uma pergunta e pretende ter a sua resposta, necessrio,

    porm escutar o aluno. Ouvir toda a resposta que ele quer dar e no cortar a sua fala,

    isto demonstra a humildade do professor perante os alunos. neste questionar e ouvir

    a resposta que ocorre a vantagem de aprender sempre. O inverso tambm

    necessrio, ou seja, se o aluno faz uma pergunta, que pode no ter nada a ver com o

    assunto de aula, mas que gerou polmica no grupo, primordial que o professor

    responda, ou juntos busquem a resposta. isto que comento com o grupo de

    professores, sanar a dvida do aluno no momento. Aqui entra o que Tiba (1998)

    comenta, que necessrio o educador ter a humildade de dizer se no sabe a

    resposta, ou melhor, sugerir que juntos encontrem a resposta atravs da pesquisa.

    Na busca de melhoria da qualidade de ensino fundamental que o professor

    esteja bem consigo, nos fatores fsicos, financeiros e emocionais, para ir sempre em

    busca do melhor para o conjunto escolar. Como educador, deve compreender o aluno

    na fase de seu desenvolvimento, mas que exija o mximo deste aluno nas suas

    habilidades, pois no adianta entender a realidade do aluno e no fazer com que ele

    reaja, tente melhorar e tambm conhea a realidade do bairro, da situao que os

    alunos vivem. Tiba (1998) acredita que estes so fatores relevantes para que o

    educador-pesquisador consiga compreender a realidade e ajude a interferir em

    mudanas significativas para os alunos. neste processo que entra a construo

    coletiva da horta escolar, pois a pesquisa no surgiu ao acaso, foram necessrios cinco

    anos para conhecer e aceitar esta comunidade. Quando me refiro a aceitar, no se trata

  • 46

    de no querer ver mudanas, mas de respeitar sua forma de vida e junto com eles

    buscar outras alternativas, se assim eles entenderem serem necessrias para o seu

    benefcio.

    Respeitando o ambiente e a situao de vida dos educandos, o professor

    conquista seus alunos. Esta conquista leva-os a realizar trabalhos de sala de aula com

    mais prazer, e o prazer de ensinar o que sabem torna-os mais humanos. Por isto que o

    trabalho coletivo de construir a horta escolar deu certo, cada um realizou pesquisas,

    argumentou o que sabia e nesta troca que construmos o nosso caminho. Os alunos

    continuam engajados neste trabalho. Agora uma das metas atingir mais mes e pais.

    Conforme Tiba (1998) necessrio dizer pai e me, pois a estrutura familiar no

    sempre a mesma, ou seja, me, mas os outros trs filhos pertencem a outro pai, e

    vice-versa. neste meio que convivem os nossos alunos, por isto a necessidade de

    traz-los para a participao nas festas, na limpeza da horta, nas reunies, ou seja,

    faz-los pertencer escola e que todos juntos formemos um time afetivo e eficiente,

    conforme comenta Tiba (1998). Sabe-se que o envolvimento do pai ou da me na

    escola muda a atitude e o desempenho escolar do filho, pois o mesmo percebe o valor

    que seu pai ou me do escola, ao seu desenvolvimento como pessoa.

    Alm do mencionado, cabe citar que, na realidade escolar do bairro Moinhos,

    ocorre o Conselho de Classe Participativo, que conforme Freire (1996) um espao

    para a construo da autonomia dos educandos. Junto a isto entra a preocupao do

    grupo em trabalhar coletivamente, facilitando o processo ensino-aprendizagem, bem

    como unindo as disciplinas em um mesmo objetivo, trabalhando com focos de interesse

    dos alunos. isto que possibilita a construo do ser humano, como aquele que sabe

    respeitar os outros nas suas diferenas, que trabalha em equipe sem se esquivar, que

  • 47

    sabe ser humilde e aceita sugestes, mostrando que est construindo a sua

    personalidade e o seu carter, conseguindo compreender e melhorar o contexto em

    que vive.

    Concordo com Morin (2002): necessrio aprender a estar aqui no planeta

    Terra. Aprender a estar aqui significa: aprender a viver, a dividir, a comunicar com os

    humanos... Devemos, pois nos dedicar no s dominar, mas melhorar e compreender

    (MORIN, 2002 p. 76). o fator que torna ainda mais relevante o trabalho de construo

    da horta escolar, estar em harmonia com o que nos cerca, tirar da terra o nosso

    alimento, mas respeitando-o, sem colocar agrotxico. Ou seja, tiro proveito do que est

    no ambiente de forma respeitosa, valorizando a vida. Neste aspecto de respeito, Morin

    (2002) apresenta quatro tipos de conscincia para uma vida mais digna no planeta. A

    primeira se refere conscincia antropolgica, que reconhece o eu de cada ser. A

    segunda se refere conscincia ecolgica: se eu me aceito agora j posso e devo

    permitir habitar este planeta com outros e dividir com eles a biosfera, vivendo em

    harmonia. A terceira se refere conscincia cvica terrena: se eu aceito dividir a

    biosfera com meus semelhantes, devo agir de forma responsvel e solidria. E a ltima,

    a conscincia espiritual da condio humana, se refere ao exerccio do convvio em

    grupo, onde devemos criticar e compreender o porqu da crtica, o que gera respeito s

    diferenas e vem a formar o carter de cada ser envolvido. Percebo que uma se une

    outra, uma evoluo que ocorre com cada um de ns, em tempos diferentes ou no.

    neste processo de avanos e retrocessos que fomos construindo a horta escolar e

    observando como ela influenciou os alunos nos seus hbitos alimentares e higinicos.

    Mas a abrangncia desta pesquisa foi maior, pois houve melhoria no relacionamento

  • 48

    entre os educandos, bem como o melhor empenho nas tarefas escolares, tanto em

    nvel individual quanto coletivo.

    Os alunos interpretam o conhecimento tendo em vista suas vivncias. Dessa

    forma, para trabalhar na escola ou realizar uma pesquisa cientfica deve-se levar em

    considerao as mltiplas experincias dos envolvidos, pois elas interferem diretamente

    na interpretao dos resultados obtidos.

    Concordo com Feyerabend (1975), no existe uma verdade absoluta, portanto

    em sala de aula o ideal seria que mostrssemos aos alunos que o conhecimento hoje

    resultado de um caminho que j foi trilhado, mas amanh podero ocorrer novas

    construes, que possibilitem uma viso diferenciada.

    Outro aspecto a ser referenciado sobre as idias de Feyerabend (1975) que o

    autoritarismo do professor nas relaes escolares provoca uma limitao nas idias dos

    alunos, pois enquanto o docente apenas transmite o conhecimento dentro da sua

    concepo, o estudante recebe tudo pronto e acabado, sem possibilidade de construir

    sua prpria verso dos fatos, o que na maioria das vezes leva ao esquecimento da

    suposta aprendizagem. Portanto, importante que o professor procure trabalhar de

    forma mais integrada e receptiva s contribuies de seus alunos em sala de aula,

    dialogando, debatendo, procurando dar significado ao conhecimento, pois a

    aprendizagem depender da forma que o estudante percebe os fatos, que so

    diretamente influenciados pelos aspectos scio-culturais. Mas as pessoas necessitam

    estar abertas ao novo, terem criatividade para reestruturar formas e modelos j prontos.

    Trabalho numa escola estadual, localizada num bairro carente do municpio de

    Estrela. Nessa escola necessrio tomar atitudes, como tratar os alunos de forma

    especial, pois l cada um diferente. O grito que acalma um, pode ao mesmo tempo

  • 49

    irritar o outro. O que venho realizando na escola a conquista desse aluno para que

    ele goste de vir s minhas aulas, pois sabe que ser respeitado em suas diferenas e

    que o trabalho s ter um bom aproveitamento se ele participar ativamente.

    Morin (2002) fala muito da complexidade penso que meu ambiente de trabalho

    um local assim. A falta de ateno, a falta de carinho, a situao das drogas, da

    prostituio, das brigas, das fofocas torna o local desafiador. Desafiador, pois ns

    professores fomos formados para o ambiente que uma certa vez era dito correto. E

    hoje, o que correto? Sei que o conjunto de professores vem buscando formas para

    sanar essas faltas e fazer com que os alunos busquem caminhos diferentes e seguros.

    Outro aspecto relevante apontado por Morin (2002) que a educao oferecida

    pela escola deve visar compreenso humana, ou seja, ensinar a compreenso entre

    as pessoas como condio e garantia da solidariedade intelectual e moral da

    humanidade (MORIN, 2002, p. 93). Ele deixa claro que no basta entender e resolver

    problemas matemticos ou saber que as folhas realizam fotossntese, se o humano

    deixado de lado. preciso envolver o educando em pesquisas que tenham significado

    para ele, mas alm de significativas devem ser estmulo para garantir a melhoria nos

    aspectos fsicos, sociais e emocionais. A palavra compreender, conforme Morin (2002),

    significa apreender em conjunto, ou seja, o trabalho coletivo na construo da horta

    escolar demonstra que possvel abraar junto uma determinada causa ou objetivo,

    como foi a caso da presente pesquisa. Alm disso, Morin (2002) afirma que

    compreender permitir abraar-se em luta a um determinado objetivo, o que requer um

    processo interno de empatia, de identificao com os demais membros do grupo.

    Ento Morin (2002) comenta que, se soubermos compreender certas atitudes

    antes de conden-las, estaremos caminhando na busca da melhoria da qualidade de

  • 50

    vida e das relaes interpessoais. Para Morin (2002), existem duas formas de se

    conseguir que as pessoas apreendam a compreender: o bem pensar, em que permito

    que outro me ensine, me ajude; e a introspeco, em que no necessito ser juiz perante

    o que me foi dito, pois eu tambm necessito de compreenso. Estas duas formas

    mostram que quando julgo posso tambm ser julgado pelo outro. E tambm que no h

    necessidade de sempre entender o que foi feito por algum, pois o mesmo posso vir a

    fazer no caso de uma necessidade. Este um dos princpios abordados por Morin

    (2002) para a educao do futuro, a habilidade de compreender.

    Outro aspecto abordado por Morin (2002) que como no conhecemos as

    chaves que abririam as portas de um futuro melhor, aqui e agora que devemos

    melhorar o contexto que nos cerca. Cada dia deve ser nico e especial na busca

    constante da felicidade.

  • 51

    6 METODOLOGIA DA PESQUISA

    importante destacar que existem pressupostos da pesquisa-ao envolvidos

    nesta pesquisa. Conforme Thiollent (2002), um dos aspectos principais a

    oportunidade de participar. Os participantes se tornaram responsveis por solucionar ou

    amenizar determinada situao. A pesquisadora e os educandos tiveram uma relao

    participativa, ou seja, um apoiou o outro em busca do melhor para a comunidade

    escolar. Com o tempo, os educandos pesquisadores se tornaram mais ativos e unidos

    para sanar outros problemas da sua realidade. Mas, embora apresente alguns

    pressupostos de pesquisa-ao, pois foi construda em conjunto com os alunos e

    possibilitou mudanas na sua realidade, no se caracteriza plenamente como tal

    porque os alunos no participaram do processo de anlise dos depoimentos.

    A presente pesquisa apresenta uma abordagem qualitativa/construtiva, podendo

    ser entendida como processo integrado de aprender, comunicar e interferir.

    A pesquisa com abordagem qualitativa, segundo Minayo (1998), pretende

    aprofundar os significados das aes e relaes entre os seres humanos, ou seja, tem

    como objetivo central compreender os atos, as atitudes, as melhorias ou no do pblico

    que est sendo investigado. Ela tambm deixa claro que uma pesquisa somente tem

    valor quando significativa para o pesquisador e o pblico alvo. Isto ocorreu junto

    construo da horta, pois todo processo de averiguar o problema, enfrent-lo e

    compreend-lo exigiu o envolvimento de toda a comunidade escolar. Outro fator

    relevante que a pesquisa qualitativa trabalha com a vivncia, e tambm com a

    compreenso dos atos dos envolvidos. atravs do dia-a-dia que o pesquisador

    consegue observar avanos e retrocessos tanto em si como no pblico envolvido na

  • 52

    pesquisa, esta abertura que d consistncia a uma pesquisa com abordagem

    qualitativa.

    Para que a observao de avanos e retrocessos no fosse perdida, foi

    necessrio utilizar um dirio de bordo para fazer os registros dirios desta construo

    coletiva da horta escolar. O dirio de bordo tambm pode servir como instrumento de

    pesquisa, num enfoque mais claro do que a pesquisadora observou e analisou. Nele

    encontram-se as anotaes do que foi ocorrendo em todo o processo.

    Conforme Alves-Mazotti (2001), a pesquisa qualitativa no envolve regras

    precisas para a sua realizao. Nesse tipo de abordagem, no se define o estudo a

    priori. Assim, nesta pesquisa, a realidade a ser investigada iniciou a partir da escolha,

    pelos alunos participantes, de um dos assuntos-problema que sugeri na pesquisa

    diagnstica. Esses alunos (sujeitos da pesquisa), conforme j mencionei, correspondem

    a uma das minhas turmas de sexta srie na escola.

    A coleta de informaes ocorreu do ms de junho de 2002 at o ms de maro

    de 2003. O tempo para a coleta de dados foi suficiente. Como j havia descrito, todas

    as turmas da manh auxiliaram no processo de construo da horta, mas, como eram

    mais de 95 alunos, no conseguiria realizar a pesquisa com todos, por isto optei pelo

    trabalho apenas com a sexta srie, composta por 25 alunos e que no presente ano

    esto na stima. Sendo que em 2003 somente 17 alunos daquela turma esto nesta

    srie, os demais so alunos novos na escola. importante registrar que os alunos que

    no fazem mais parte desta turma foram para outra cidade, outros comearam a

    estudar a noite, outros pararam de estudar. Este um dos aspectos que prejudicam o

    bairro, muitos no conseguem emprego e mudam para outra cidade, voltando para

  • 53

    casa de parentes; outros, pela falta de incentivo de seus pais, abandonam a escola; e

    outros, que precisam ajudar nas finanas, param de estudar.

    Conforme os instrumentos para coleta de dados que utilizei, a pesquisa foi

    estruturada em trs momentos:

    - o primeiro momento foi a pesquisa diagnstica para averiguar o maior problema da

    comunidade;

    - o segundo foi uma auto-avaliao escrita pelos alunos quanto ao trabalho em

    andamento;

    - o terceiro foi a obteno de depoimentos escritos pelos alunos sobre as

    repercusses desse trabalho participativo em suas vidas.

    Como metodologia de anlise, optei pela Anlise de Contedo. Para fazer a

    Anlise de Contedo a partir dos instrumentos de pesquisa aplicados segui as

    recomendaes de Moraes (1999): no primeiro momento faz-se a leitura do todo de

    cada texto, em seguida divide-se o todo em partes. Isto se chama unitarizao. Depois

    de ter dividido o todo em partes, as idias semelhantes so agrupadas. Isto constitui a

    categorizao, agrupar as idias semelhantes que foram unitarizadas. Conforme

    Moraes (1999), com base no processo de categorizao que se pode compreender e

    explicar o que estamos investigando. Desta forma as respostas fornecidas so

    reinterpretadas, para atingir desta forma a compreenso do que foi mencionado.

    nessa perspectiva que os depoimentos realizados junto aos alunos foram

    unitarizados. Aps ler e organizar todos os depoimentos, realizei o processo de

    unitarizao, fragmentando o texto e assim identificando e destacando os aspectos a

  • 54

    serem submetidos categorizao. Em seguida organizei as unidades semelhantes

    em grupos, ou categorias.

    Na Anlise de Contedo, os processos de unitarizao e categorizao

    encaminham a uma produo que pode ser descritiva, e depois interpretativa. Na

    presente dissertao resolvi fazer a descrio e a interpretao ao mesmo tempo,

    integrando subsdios tericos e comentrios meus descrio de cada categoria.

    Alm de compreender o que foi escrito precisei criar subsdios para averiguar o

    desenvolvimento textual dos envolvidos, pois em minha pesquisa utilizei trs momentos

    de coleta de dados, sendo que a segunda e a terceira parte da coleta exigiram, alm da

    releitura, uma nova interpretao a partir do processo que foi desenvolvido ao longo de

    dois anos. Outro fator relevante que, como pesquisadora e participante, no sou

    neutra no processo, por isto no seria possvel fugir do contexto de descrever e

    interpretar com o meu olhar.

    Portanto, o mtodo de anlise pelo qual a presente pesquisa foi estruturada

    seguiu a seguinte ordem: preparao dos instrumentos de pesquisa, unitarizao das

    informaes coletadas, categorizao das unidades de significado e, aps, descrio e

    interpretao.

    Trabalhei com categorias emergentes, que surgiram dos depoimentos, ou seja, a

    construo das categorias foi um desafio, pois trabalhei com o que o aluno escreveu ao

    longo do processo e no com categorias elaboradas por mim, onde o envolvido deveria

    se encaixar ou no no que j estaria pr-definido.

    Por ser uma pesquisa qualitativa, para cada categoria foi produzido um texto em

    que tentei expressar as idias mais relevantes. Para tanto utilizei, sempre que

    necessrio, citaes dos educandos. J a interpretao ocorreu paralelamente

  • 55

    descrio, pois ao mesmo tempo estou colocando as idias referidas pelos educandos

    e fazendo a devida interpretao sobre os aspectos relevantes abordados por eles sob

    o meu ponto de vista.

    Outro aspecto importante, abordado por Alves-Mazotti (2001), que uma

    pesquisa qualitativa, que visa compreenso de fenmenos ou de diferentes situaes,

    no pode se eximir de contribuir para a formao do conhecimento, ou seja, na

    realidade em que esta pesquisa foi desenvolvida, o conhecimento parte integrante e

    significativa de todo o processo de anlise, bem como da construo conjunta da horta.

    Cabe ressaltar que a pesquisa qualitativa exige a observao dos fatos, dos

    comportamentos, do ambiente em que a investigao ocorre, por isto Alves-Mazzotti

    (2001) destaca que a pesquisadora precisa ser participante, se expressar com o que

    v, sente e observa, enquanto procura entender o que o outro est sentindo ou

    desejando naquele momento. Ento, a valorizao do humano um ponto relevante

    para que a pesquisa se desenvolva de forma a abranger sentimentos, empatia,

    cooperao, confiana entre pesquisadora e pesquisados, segundo aquela autora.

    Considero que isto aconteceu ao longo desta pesquisa.

    Agora, relatarei como todo o processo ocorreu nos anos de 2002 e 2003.

    1) Pesquisa diagnstica abril

    2) Debate sobre o resultado maio

    3) Incio das atividades na horta junho

    4) Trabalho na horta julho, agosto

    Registro do que foi ocorrendo em cada ida a horta

    Se chovia a turma realizava trabalho de pesquisa relacionado com

    Botnica ou Zoologia (dependendo do assunto de interesse dos alunos)

  • 56

    Setembro, outubro e novembro no foi possvel trabalhar na horta devido

    a chuva

    5) Setembro foi aplicado o segundo instrumento de pesquisa

    6) Maro de 2003 foi aplicado o terceiro instrumento de pesquisa

    7) Trabalho com os alunos do turno da manh abril a julho

    8) Incio dos trabalhos com os alunos do turno da tarde com o auxlio de alguns

    alunos do turno da manh agosto

    9) Trabalho coletivo com os professores de pr at oitava srie referente ao

    trabalho desenvolvido na horta. Citarei o que o grupo trabalhou, sendo

    respeitados o nvel escolar dos educandos (conforme faixa etria e srie):

    Religio: pensamentos e sentimentos sadios;

    Educao fsica: funcionamento do corpo, preveno de acidentes e

    hbitos saudveis;

    Matemtica: unidade de medida, comprimento, rea, volume e equaes

    de 1 Grau;

    Portugus: relatrios e receitas usando as verduras cultivadas;

    Histria