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Revisão EXAME - Direito Penal Hertz ___________________________________________________________________________________________________________ direitoemsala.com 1 DEFINIÇÃO DE DIREITO PENAL Conjunto de normas jurídicas que têm por objeto a determinação de infrações de natureza penal e suas sanções correspondentes – penas e medidas de segurança” (Cezar Roberto Bitencourt) CONJUNTO DE NORMAS JURÍDICAS 1.1 Código Penal - Decreto Lei nº 2.848/1940 (Vigência 01/01/1942) 1.2 Parte Geral – Do artigo 1º até o artigo 120 (Lei 7.209/84). São descritos e explicitados os conceitos e as compreensões gerais sobre os seguintes aspectos: Aplicação da Lei Penal, Do Crime, Da Imputabilidade Penal, Do Concurso de Pessoas, Das Penas, Das Medidas de Segurança, Da Ação Penal, Da Extinção de Punibilidade 1.3 Parte Especial – Do artigo 121 até o artigo 361. É onde ocorre exatamente a tipificação do crime e a pena relativa; 1.4 Leis Penais Extravagantes (Peregrinas) – É aquela que se encontra fora do Código Penal e que possui a característica de apresentar contradições em relação a outras leis semelhantes. Código de Defesa do Consumidor, Estatuto da Criança e do Adolescente, Código de Trânsito Brasileiro, Estatuto do Desarmamento, Lei Antidrogas, Lei de Crimes Ambientais, etc. INFRAÇÕES DE NATUREZA PENAL ( LICP – Decreto Lei nº 3.914/41) 1 Crime – Infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa. 2 Contravenção Penal – Infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas. alternativa ou cumulativamente. CRIME CONTRAVENÇÃO Sanção cabível Reclusão e Detenção Prisão simples ou multa (Nunca vai para a penitenciária) Tentativa É punível Não é punível Extraterritorialidade SIM NÃO EXITE Competência Justiça Federal Justiça Estadual Só a Justiça Estadual Exceto Foro por prerrogativa Limite da pena 30 anos 5 anos Prisão preventiva Temporária CABE NÃO CABE

CRIME CONTRAVENÇÃO - …. O objeto da Ciência do Direito Penal é o conjunto de preceitos legais que se refere à conduta dos cidadãos, bem como às consequências jurídicas

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DEFINIÇÃO DE DIREITO PENAL

“Conjunto de normas jurídicas que têm por objeto a determinação de infrações de natureza penal e suas sanções correspondentes – penas e medidas de segurança” (Cezar Roberto Bitencourt)

CONJUNTO DE NORMAS JURÍDICAS

1.1 Código Penal - Decreto Lei nº 2.848/1940 (Vigência 01/01/1942)

1.2 Parte Geral – Do artigo 1º até o artigo 120 (Lei 7.209/84). São descritos e explicitados os conceitos e as compreensões gerais sobre os seguintes aspectos: Aplicação da Lei Penal, Do Crime, Da Imputabilidade Penal, Do Concurso de Pessoas, Das Penas, Das Medidas de Segurança, Da Ação Penal, Da Extinção de Punibilidade

1.3 Parte Especial – Do artigo 121 até o artigo 361. É onde ocorre exatamente a tipificação do crime e a pena relativa;

1.4 Leis Penais Extravagantes (Peregrinas) – É aquela que se encontra fora do Código Penal e que possui a característica de apresentar contradições em relação a outras leis semelhantes. Código de Defesa do Consumidor, Estatuto da Criança e do Adolescente, Código de Trânsito Brasileiro, Estatuto do Desarmamento, Lei Antidrogas, Lei de Crimes Ambientais, etc.

INFRAÇÕES DE NATUREZA PENAL ( LICP – Decreto Lei nº 3.914/41)

1 Crime – Infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa.

2 Contravenção Penal – Infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas. alternativa ou cumulativamente.

CRIME

CONTRAVENÇÃO

Sanção cabível Reclusão e Detenção Prisão simples ou multa

(Nunca vai para a penitenciária)

Tentativa É punível Não é punível

Extraterritorialidade SIM NÃO EXITE

Competência Justiça Federal Justiça Estadual

Só a Justiça Estadual Exceto Foro por prerrogativa

Limite da pena 30 anos 5 anos

Prisão preventiva

Temporária CABE NÃO CABE

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SANÇÕES CORRESPONDENTES

Penas e Medidas de Segurança - Segundo Cléber Masson, “sanção penal é a resposta estatal, no exercício do ius puniendi e após o devido processo legal, ao responsável pela prática de um crime ou de uma contravenção penal”, e se divide em duas espécies: penas e medidas de segurança.

1. Pena – Aplicável ao agente imputável (Privativas de liberdade, Restritivas de Direitos, Multa) 2. Medidas de Segurança – Aplicável ao inimputável (Internação em HCTP e Tratamento Ambulatorial)

O que é uma norma penal incriminadora? É o que define uma conduta como crime e determina sua pena.

FINALIDADE DO DIREITO PENAL

Proteção da sociedade e, mais precisamente, a defesa dos bens jurídicos fundamentais (vida, integridade física e mental, honra, liberdade, patrimônio, costumes, paz pública, etc) (Júlio Fabbrini Mirabete). O objeto da Ciência do Direito Penal é o conjunto de preceitos legais que se refere à conduta dos cidadãos, bem como às consequências jurídicas pelo não cumprimento de suas determinações.

CARACTERÍSTICAS DO DIREITO PENAL

O Direito Penal regula as relações do indivíduo com a sociedade. Por isso, não pertence ao Direito Privado, mas sim ao Público. Quando o sujeito pratica um delito, estabelece-se uma relação jurídica entre ele e o Estado.

O direito de punir (jus puniendi) é o direito que tem o Estado de atuar sobre os delinquentes na defesa da sociedade contra o crime. Esse direito é exclusivo do Estado, mesmo que a proposta de ação seja de um particular.

Tutela os bens jurídicos mais importantes (vida, liberdade, patrimônio, dignidade sexual, etc)

PRINCÍPIOS LIMITADORES DO PODER PUNITIVO DO ESTADO

O que significa princípio?

“Etimologicamente, princípio tem vários significados, entre os quais o de momento em que algo tem origem; causa primária, elemento predominante na constituição de um corpo orgânico; preceito, regra ou lei; fonte ou causa de uma ação. No sentido jurídico, não se poderia fugir de tais noções, de modo que o conceito de princípio indica uma ordenação, que se irradia e imanta os sistemas de normas, servindo de base para a interpretação, integração, conhecimento e aplicação do direito positivo.” Guilherme de Souza Nucci (Manual de Direito Penal)

Consequência da violação de um princípio — “Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa ingerência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia (injúria) irremissível (imperdoável) a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra”. (Celso Antônio Bandeira de Mello).

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Impõe limites à intervenção estatal no campo da aplicação da pena. Ingressaram nas legislações penais como garantia contra o absolutismo. Ganharam dimensão constitucional (Estão todos implícita ou explicitamente insertos na C.F).

1. Princípio da Legalidade ou Reserva Legal

A Constituição Federal consagrou o princípio no artigo 5º, inc. XXXIX: “não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Pelo Princípio da Legalidade a elaboração de normas incriminadoras é função exclusiva da lei (stricto sensu), isto é, nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena criminal pode ser aplicada sem que antes da ocorrência desse fato (anterioridade¹) exista uma LEI definindo-o como crime e cominando-lhe a sanção correspondente. O Estado não pode castigar um comportamento que não esteja descrito em suas leis, nem punir o cidadão quando inexistente a sanctio juris cominada ao delito. Ao mesmo tempo, da lei surge uma pretensão subjetiva em favor do delinquente, no sentido de não ser punido senão em decorrência da prática de ações e comissões por ela determinadas. Portanto, a lei penal é garantia da liberdade para todos. Finalmente, as leis penais asseguram também as pretensões punitivas e reparadoras da vítima, posto que nelas se consagra a responsabilidade penal e civil oriunda dos fatos puníveis. Damásio

Esse princípio é um fixador do conteúdo das normas penais incriminadoras, ou seja, os tipos penais, mormente os incriminadores, somente podem ser criados através de lei em sentido estrito, emanada do Poder Legislativo, respeitado o processo previsto na Constituição. Nucci.

Feuerbach, no início do século XIX, resumiu o princípio na fórmula latina: “Nullum crimen, nulla poena sine praevia lege”.

Portanto, o princípio da legalidade, no campo penal, corresponde a uma aspiração básica e fundamental do homem de ter uma proteção contra qualquer forma de tirania e arbítrio dos detentores do exercício do poder, capaz de lhe garantir a convivência em sociedade, sem o risco de ter a sua liberdade cerceada pelo Estado, a não ser nas hipóteses previamente estabelecidas em regras gerais, abstratas e impessoais. Capez

Ainda, para Capez, o princípio da legalidade é gênero que compreende duas espécies

1. Anterioridade da lei penal — exigindo que a lei esteja em vigor no momento da prática da infração penal (lei anterior e prévia cominação)

2. Reserva legal — reservando para o estrito campo da lei a existência do crime e sua correspondente pena (não há crime sem lei que o defina, nem pena sem cominação legal)

Assim, a regra do Código Penal, Art. 1º, Princípio Legalidade, compreende os princípios da reserva legal e da anterioridade “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Igualmente no 5º, XXXIX da Constituição Federal: “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.

¹Anterioridade: significa que é obrigatória a prévia existência de lei penal incriminadora para que alguém possa ser por um fato condenado, exigindo, também, prévia cominação de sanção para que alguém possa sofrê-la. Por outro lado, cumpre esclarecer que, apesar de a rubrica do art. 1.º mencionar apenas a anterioridade da lei penal, espelha, ainda, o princípio da legalidade ou da reserva legal, como se verá a seguir, na jurisprudência do STJ:

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“O Estatuto do Idoso, disciplinado pela Lei 10.741, de 1.º de outubro de 2003, ao inserir a expressão ‘ou maior de 60 anos’ ao §1º do art. 159 do Código Penal, previu uma nova hipótese qualificadora ao crime de extorsão mediante sequestro, incidente quando o sujeito passivo for idoso, que, por presunção legal, sofreria maior abalo psicológico, agravando o resultado, a justificar a penalização mais severa. Inaplicável a aludida qualificadora aos fatos imputados ao paciente, ocorridos em 09.07.2001, portanto, anteriores à vigência da Lei 10.741/2003, em observância ao princípio da irretroatividade da lei mais severa, previsto no art. 5.º, XL, da Constituição Federal, corolário dos princípios da legalidade e da anterioridade da lei penal, consagrados nos arts. 1.º do Código Penal e 5.º, XXXIX, da Constituição Federal, que constituem limitação ao poder de punir do Estado” (HC 246.613-RJ, 6.a T., rel. Assusete Magalhães, 23.10.2012, v.u.).

Para finalizar esse princípio achei interessante a definição desse princípio em seu aspecto jurídico, por Fernando Capez: Somente haverá crime quando existir perfeita correspondência entre a conduta praticada e a previsão legal. As normas penais incriminadoras não são proibitivas, mas descritivas; portanto, quem pratica um crime não age contra a lei, mas de acordo com ela, pois os delitos encontram-se pormenorizadamente descritos em modelos legais, chamados de tipos. Cabe, portanto, à lei a tarefa de definir e não proibir o crime (“não há crime sem lei anterior que o defina”), propiciando ao agente prévio e integral conhecimento das consequências penais da prática delituosa e evitando, assim, qualquer invasão arbitrária em seu direito de liberdade.

Obs. 1: como só há crime quando presente a perfeita correspondência entre o fato e a descrição legal, torna-se impossível sua existência sem lei que o descreva. Conclui-se que só há crime nas hipóteses taxativamente previstas em lei.

Obs. 2: as medidas de segurança não são penas, possuindo caráter essencialmente preventivo; no entanto, resta-lhes um certo caráter aflitivo, pelo que, diante da inexistência de norma expressa a respeito, sujeitam-se ao princípio da reserva legal e da anterioridade, ao contrário do que dispunha o art. 75 da antiga Parte Geral do Código Penal.

2. Princípio da Irretroatividade da Lei Penal

Inicialmente pode-se afirmar que, por esse princípio, a norma penal caminha para frente, mas está subordinada ao princípio da retroatividade da norma mais benéfica/benigna. Então, se aparecer uma norma que, de qualquer maneira possa beneficiar o gente boa, ainda que esteja condenado, terá que retroagir para beneficiá-lo. Desde o momento em que uma lei entra em vigor até que cesse sua vigência, deve reger todos os atos abrangidos pela sua destinação. Não alcança, assim, os fatos ocorridos antes ou depois dos dois limites extremos. O princípio da irretroatividade vige, entretanto, somente em relação à lei mais severa. O princípio da irretroatividade da lei penal ou princípio da retroatividade da lei penal benéfica - significa que a lei penal não retroagirá para abranger situações já consolidadas, sob o comando de nova legislação diferenciada. Logo, quando novas leis entram em vigor, devem envolver somente fatos concretizados sob a sua égide. Abre-se exceção à irretroatividade quando ingressamos no campo das leis penais benéficas. Estas podem voltar no tempo para favorecer o agente, ainda que o fato tenha sido decidido por sentença condenatória, com trânsito em julgado (art. 5.º, XL, CF - XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu; art. 2.º, parágrafo único, CP);

Exemplo: A pratica um crime sob a vigência da lei X, que comina pena de reclusão de 1 a 4 anos. Por ocasião do julgamento, passa a viger a lei Y, regulando o mesmo fato e impondo a pena de reclusão de 2 a 8 anos. Qual a lei a ser aplicada, a anterior, mais benéfica, ou a posterior, mais severa? A lei posterior não pode ser aplicada, em face do princípio da irretroatividade da lei mais severa. Deve ser aplicada a anterior, que passa a reger um fato praticado durante a sua vigência,

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mas após a sua derrogação. É possível, então, a aplicação de uma lei não obstante cessada a sua vigência? Sim, quando mais benéfica em face de outra, posterior. Essa qualidade da lei, pela qual tem eficácia mesmo depois de cessada a sua vigência, recebe o nome de ultra atividade.

B realiza uma conduta punível sob a vigência da lei X, que comina pena de 2 a 4 anos de reclusão. Na ocasião de ser proferida a sentença, passa a vigorar a lei Y, determinando, para o mesmo comportamento, a pena de reclusão de 1 a 4 anos. Qual a lei a ser observada, a anterior, mais severa, ou a posterior, mais benigna? Aplica-se a lei posterior, em face do princípio da retroatividade da lei mais benigna. A lei anterior, por ser mais severa, não possui ultra atividade.

Como se observa, a lei mais benigna prevalece sobre a mais severa, prolongando-se além do instante de sua revogação ou retroagindo ao tempo em que não tinha vigência. É ultra ativa (1.º caso) e retroativa (2.º). Essas duas qualidades da lex mitior recebem a denominação de extra atividade. Por sua vez, a lei mais severa não retroage nem possui eficácia além do momento de sua revogação. Não é retroativa nem ultra ativa. Essas qualidades negativas compõem o princípio da não extra atividade da lex gravior. Temos, assim: A lei mais benéfica possui extra atividade, que se constitui dos princípios da retroatividade e da ultra atividade. Em relação à lei mais severa, aplica-se o princípio da não extra atividade, que se compõe dos princípios da irretroatividade e da não ultra atividade.

Regra: a lei penal não pode retroagir; Exceção: a lei penal retroagirá quando trouxer algum benefício para o agente no caso concreto.

Diante disso, chega-se a duas conclusões:

Lei penal é irretroativa; Lei penal que beneficia o agente é retroativa.

CF, Art. 5º, XL - A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu

Código Penal Lei penal no tempo

Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

Favorecimento real

Art. 349 - Prestar a criminoso, fora dos casos de coautoria ou de receptação, auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime: Pena - detenção, de um a seis meses, e multa. Art. 349-A - Ingressar, promover, intermediar, auxiliar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar, sem autorização legal, em estabelecimento prisional. Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.

Exceção: no caso de lei posterior mais benéfica para o agente, esta deverá ser aplicada.

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3. Princípio da Insignificância

Qual a ideia desse princípio? O Direito Penal protege bens jurídicos mais importantes da convivência coletiva. Uma pessoa responde penalmente porque em algum momento ela atingiu algum bem jurídico. Quando se furta, estar-se agredindo o patrimônio, mas quando uma conduta não consegue tocar/atingir um bem jurídico com alguma relevância, essa conduta deve ser havida como atípica. Professor deu exemplo de alguém formalmente subtrair um apagador de quadro, crime de furto. Pergunta-se: Ele conseguiu tocar/atingir o patrimônio da Unip roubando simples apagador? Abalou a instituição de forma significativa? Não

Então, esse princípio significa que se a conduta não atingir, não bater de frente com um bem jurídico com alguma relevância, essa conduta deve ser vista como atípica, e sendo ela atípica, não houve crime. Mas não se pode levar somente o valor da coisa.

Importante: professor citou alguns pontos de jurisprudência do STF: São alguns parâmetros para poder aplicar o princípio: MARI

Mínima ofensiva idade da conduta Ausência / Inexistência de periculosidade social do ato Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento Inexpressividade da lesão jurídica provocada

Logo, não é somente o valor econômico da coisa que foi subtraída que vai determinar ou não a aplicação do princípio da insignificância. Se alguém mete o revólver na cara do outro e diz: “passa a carteira” o cara vai entregar a carteira e o ladrão vai embora, mas ao abrir a carteira percebe que só tem uma notinha dois reais. Nesse caso há a insignificância? Claro que não!!! Nesse caso não é significância porque não são apenas os dois reais, não é apenas o valor que está em jogo. Nessa situação não houve mínima ofensividade da conduta. Levar um revólver na cara não é ofensivo?? Também não se pode afirmar a não existência da periculosidade social, sendo que houve um revólver na cara do indivíduo. E o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento... é claro que é reprovável alguém tacar o revólver na cara do outro. E a última... inexpressividade da lesão provocada... Um revólver na cara provoca um estrago muito maior do que se possa imaginar, só quem já foi assaltado sabe disso.

Resumidamente o que é o princípio da insignificância? Tem a ver como uma conduta atípica, aquela conduta que não conseguiu agredir, de forma efetiva, um bem jurídico protegido, sendo que para isso acontecer é necessário levar em consideração esses 4 parâmetros, que são jurisprudenciais. Quem construiu o princípio foi a doutrina, mas quem aceitou foi a jurisprudência que o fez utilizando-se desses parâmetros, repetindo, mínima ofensividade da conduta do agente; nenhuma periculosidade social da ação; reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada. Finalizando... O princípio da insignificância significa ter como a atípica uma conduta humana criminosa que não consegue atingir, tocar de maneira expressiva um bem jurídico protegido, penalmente protegido

Ligado aos chamados “crimes de bagatela” (ou “delitos de lesão mínima”), recomenda que o Direito Penal, pela adequação típica, somente intervenha nos casos de lesão jurídica de certa gravidade, reconhecendo a atipicidade do fato nas hipóteses de perturbações jurídicas mais leves (pequeníssima relevância material). Hoje, adotada a teoria da imputação objetiva, que concede relevância à afetação jurídica como resultado normativo do crime, esse princípio apresenta enorme importância, permitindo que não ingressem no campo penal fatos de ofensividade mínima. Damásio de Jesus, 32ª Edição.

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Esse princípio tem sido adotado pela nossa jurisprudência nos casos:

furto de objeto material insignificante, lesão insignificante ao Fisco, maus-tratos de importância mínima, descaminho e dano de pequena monta, lesão corporal de extrema singeleza etc.

Claux Roxin (1964) criou a terminologia, defendendo que a tipicidade penal exige a ofensa de alguma gravidade ao bem jurídico tutelado. Devem ser tidas como atípicas as ações ou omissões que afetem infimamente (minimamente) um bem jurídico. Klaus Tiedmann chamou de princípio da bagatela, defendendo ser imperativa a efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal.

Para Guilherme de Souza Nucci, 17ª Edição:

Com relação à insignificância (crime de bagatela), ainda, sustenta-se que o direito penal, diante de seu caráter subsidiário, funcionando como ultima ratio no sistema punitivo, não se deve ocupar de bagatelas. Com efeito, essa postura decorre do princípio da intervenção mínima, que, no Estado Democrático de Direito, demanda mínima ofensividade ao bem tutelado para legitimar o braço punitivo estatal. O acolhimento da insignificância, no campo penal, gerando atipicidade material, deve respeitar três requisitos:

1. Consideração do valor do bem jurídico em termos concretos. Há de se avaliar o bem tutelado sob o ponto de vista da vítima, do agressor e da sociedade. Não se pode cultivar um Direito Penal elitista, preocupado apenas com a lesão a bens de valor economicamente superiores à média, pois essa posição afastaria a tutela estatal em relação aos mais pobres. Nem é preciso ressaltar os males advindos desse quadro, que, além de injusto, fomentaria divisão de classes sociais, incentivo para o exercício arbitrário das próprias razões e o descrédito no monopólio punitivo do Estado;

2. Consideração da lesão ao bem jurídico em visão global. O bem lesado precisa inserir-se num contexto maior, envolvendo o agente do delito, pois a prática de pequenas infrações, com frequência, pode ser tão danosa quanto um único crime de intensa gravidade. Diante disso, réus com maus antecedentes ou reincidentes não merecem a aplicação do princípio da insignificância;

3. Consideração particular aos bens jurídicos imateriais de expressivo valor social. Não basta o foco no valor individualizado do bem, nem a análise da pessoa do agente. Torna-se essencial captar a essência do bem tutelado, verificando a sua real abrangência e o interesse despertado para a sociedade. Não se pode, por exemplo, tratar a corrupção como algo irrelevante; quem se corrompe por pouco não comete delito de bagatela em face do interesse social relevante despertado pela conduta ilícita.

Atualmente, a jurisprudência nacional, partindo de exemplos extraídos do Supremo Tribunal Federal, em posição majoritária, aceita e aplica o princípio da insignificância, debatendo-se, somente, nos casos concretos, a sua conveniência.

STF: Agravo regimental em habeas corpus. Furto. Insignificância. No julgamento conjunto dos HC 123.108, 123.533 e 123.734, o STF fixou orientação sobre a aplicação do princípio da insignificância aos casos de furto – Rel. Min. Roberto Barroso, Pleno, julgados em 3.8.2015. “Decidiu que, se a coisa subtraída é de valor ínfimo, (i) a reincidência, a reiteração delitiva e a presença das qualificadoras do art. 155, §4.º, devem ser levadas em consideração, podendo acarretar o afastamento da aplicação da insignificância; e (ii) nenhuma dessas circunstâncias determina, por si só, o afastamento da insignificância, cabendo ao juiz analisar se a aplicação de pena é necessária. Além disso, conclui que, (iii) uma vez aplicada pena privativa de liberdade

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inferior a quatro anos de reclusão ao reincidente, o juiz pode, se considerar suficiente, aplicar o regime inicial aberto, afastando a incidência do art. 33, §2.º, “c”, do CP. 3. As instâncias ordinárias têm margem larga para avaliação dos casos, concluindo pela aplicação ou não da sanção e, se houver condenação, fixando o regime. Essa atividade envolve análise do conjunto das circunstâncias e provas produzidas no caso concreto. Apenas em hipóteses excepcionais a via do habeas corpus será adequada a rever condenações. 4. Aplicação do princípio da insignificância. Subtração de aparelho celular, avaliado em R$ 72,00 (setenta e dois reais). Reincidência específica. O paciente registrava uma série de condenações e antecedentes, indicando que o furto em questão não fora uma ocorrência criminal isolada em sua vida. 5. Agravo regimental a que se nega provimento”

(HC 126174 AgR, 2.a T., rel. Gilmar Mendes, 26.04.2016, processo eletrônico DJe-092, divulg. 06.05.2016, public. 09.05.2016); “Em conclusão, a 2ª Turma, por maioria, denegou ordem de habeas corpus, ao reconhecer, na espécie, a inaplicabilidade do princípio da insignificância ante a reprovabilidade e ofensividade da conduta do agente. O paciente, condenado pela prática de furto simples tentado, alegava a inexpressividade do valor do bem. Apontou-se que o reconhecimento da insignificância não poderia levar em conta apenas a expressão econômica da lesão. Ressaltou-se que o paciente possuiria acentuada periculosidade e faria do crime o seu meio de vida, a apostar na impunidade. Frisou-se que seria nesse contexto que se deveria avaliar a censurabilidade da conduta e não apenas na importância econômica dos bens subtraídos. Vencidos os Ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello, que concediam a ordem. Asseveravam ser certo não bastar apenas o ínfimo valor das coisas furtadas. Consignavam, contudo, que, embora o paciente tivesse registro de inquéritos policiais e ações penais, não haveria condenação penal transitada em julgado. Pontuavam que esse fato não seria suficiente a atribuir ao paciente o caráter de agente criminoso ou de alguém que fizesse do crime prática reiterada e habitual, considerada a presunção constitucional de inocência que a todos beneficiaria”

(HC 114.340-ES, 2.a T., rel. Ricardo Lewandowski, 14.05.2013, m.v., Informativo 706). Verifique-se, em outros tribunais, a avaliação da bagatela, ora aplicando-se, ora negando-se a aplicação: STJ: “De acordo com a orientação traçada pelo Supremo Tribunal Federal, a aplicação do princípio da insignificância demanda a verificação da presença concomitante dos seguintes vetores:...

1. Mínima ofensividade da conduta do agente; 2. Ausência ou Nenhuma periculosidade social da ação; 3. Reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e; 4. Inexpressividade da lesão jurídica provocada.

...O princípio da insignificância é verdadeiro benefício na esfera penal, razão pela qual não há como deixar de se analisar o passado criminoso do agente, sob pena de se instigar a multiplicação de pequenos crimes pelo mesmo autor, os quais se tornariam inatingíveis pelo ordenamento penal. Imprescindível, no caso concreto, porquanto, de plano, aquele que é reincidente e possui maus antecedentes não faz jus a benesses jurídicas. Posta novamente em discussão a questão da possibilidade de aplicação do princípio da insignificância, mesmo diante da reincidência do réu, a Terceira Seção desta Corte, no julgamento do EREsp n. 221.999/RS (Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 11.11.2015, DJe 10.12.2015), estabeleceu a tese de que a reiteração criminosa¹ inviabiliza a aplicação do princípio da insignificância, ressalvada a possibilidade de, no caso concreto, as instâncias ordinárias verificarem que a medida é socialmente recomendável. Situação em que, a despeito de a tentativa de furto ter recaído sobre bem cujo valor correspondia a 8,84% (oito vírgula oitenta e quatro por cento) do valor do salário mínimo à época

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do fato, tanto o primeiro quanto o segundo grau de jurisdição refutaram a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância, diante da reincidência e do fato de que o delito não fora praticado em estado de necessidade, representando a conduta do réu ‘verdadeira alternativa de sobrevivência, (...) inadmissível, ainda mais para um cidadão de 40 anos de idade, saudável, residente em local onde há sobra de oferta de trabalho lícito, bem como onde também há assistência social capaz de suprir as necessidades básicas do cidadão – alimentação, local para dormir e banhar-se’”

¹ Sobre a reiteração criminosa inviabilizar a aplicação do princípio em questão, achei essa matéria de 2017 que mostra novas posições dos magistrados, veja.

(EREsp 1531049-RS, 3.a S., rel. Reynaldo Soares da Fonseca, 25.05.2016, v.u.); “O princípio da insignificância baseia-se na necessidade de lesão jurídica expressiva para a incidência do Direito Penal, afastando a tipicidade do delito em certas hipóteses em que, apesar de típica a conduta, ausente dano juridicamente relevante. Sobre o tema, de maneira meramente indicativa e não vinculante, a jurisprudência desta Corte, dentre outros critérios, aponta o parâmetro da décima parte do salário mínimo vigente ao tempo da infração penal, para aferição da relevância da lesão patrimonial” (HC 351.194-SP, 5.a T., rel. Ribeiro Dantas, 02.06.2016, DJe 13.06.2016); “De acordo com a jurisprudência deste Tribunal, o princípio da insignificância, envolvendo a ninharia do prejuízo e englobando a irrelevância da transgressão, impede que se dê vazão aos efeitos nefastos do procedimento penal. In casu, tendo sido a paciente denunciada por tentativa de furto, onde a res furtiva restou avaliada em R$ 2,65 (dois reais e sessenta e cinco centavos), correspondente a produtos de higiene pessoal, mais do que patente a desnecessidade da aplicação penal, em face do inexpressível ataque ao bem jurídico tutelado” (HC 28.796-SP, 5.a T., rel. José Arnaldo da Fonseca, 02.10.2003, v.u., Bol. AASP 2387). TJSP: “Apelação Criminal. Furto tentado. Res furtiva consistente em uma nota de R$ 50,00. Bem restituído à vítima. Análise das condições da vítima e da denunciada. Princípio da insignificância. Possibilidade. Absolvição. Apelo defensivo provido” (Ap. 990.10.111821-1, 16.a C., rel. Guilherme de Souza Nucci, 10.01.2012, v.u.).

No próximo caso, aceita-se a tese da insignificância, mas não se concede porque o bem é relevante para a vítima:

TJSP: “Furto privilegiado. Subtração de uma bolsa durante o intervalo da aula. Inaplicabilidade do princípio da insignificância. Conteúdo economicamente expressivo. Delito de bagatela não caracterizado. Relevância da lesão patrimonial para a vítima. Tipicidade material não afastada. Condenação mantida. Apelo defensivo não provido, rejeitada a preliminar de prescrição. (...) In casu, não se trata A. de pessoa provida de robustos recursos patrimoniais. Ao contrário, a ofendida certamente não possui elevado poder aquisitivo e teve seu patrimônio lesado com a subtração, o que se revela, inclusive, pelo fato de ser estudante, desempregada, possuir apenas 17 anos à data dos fatos, e estudar em escola estadual. É uma soma de fatores que permite concluir que tal valor não seria insignificante para a adolescente, podendo representar o pagamento do seu meio de transporte, ou de seu lanche no intervalo de aula, por pelo menos uma semana. (...) Acrescente-se, por fim, o transtorno causado pelo sumiço da bolsa da vítima, ainda que por um dia, pois continha documentos, como RG e CPF, a chave de sua residência e um celular no valor de R$ 120,00. É certo, também, que ela só obteve a devolução desses bens porque foi à casa de D. buscá-los, após ser informada por colegas de que ele havia sido visto nas imediações da escola na data dos fatos. Se não fosse isso, improvável que o agente devolvesse os pertences. Suficientemente expressiva, desse modo, a lesão ao patrimônio da vítima para que se reconheça a tipicidade material da conduta do acusado, inviabilizando-se, assim, o reconhecimento do ‘Princípio da

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Insignificância’ ou crime de bagatela” (Ap. 000398134.2010.8.26.0407, 16.a C., rel. Almeida Toledo, 10.01.2012, v.u.); “(...) A acusação que pesou contra o réu é a de que juntamente com seu irmão adolescente, L. G. A. O., teria obtido para si vantagem ilícita, no valor aproximado de R$ 180,00 (cento e oitenta reais), em prejuízo das vítimas E. J. B., L. T. T. N., J. R. M., L. C. B. D., dentre outras. (...) Com efeito, a suposta insignificância da conduta não pode ser utilizada para legitimar a falta de aplicação da lei, isto é, a impunidade, não podendo criar-se perigoso precedente de sempre se absolver o agente que vive de pequenos delitos patrimoniais, praticados diariamente contra vítimas diversas, pela suposta atipicidade que ensejaria a conduta insignificante.” (AP 990.09.041085-0, 16.a C., rel. Newton Neves, 22.03.2011, v.u.). TRF-4.a Região: “A introdução de oito caixas de uísque sem o pagamento dos tributos, promovida por servidores públicos para uso em um jantar de confraternização da classe, configura o crime de descaminho previsto no art. 334, caput, do Código Penal e, independentemente do valor da mercadoria, não pode ser algo considerado insignificante e, consequentemente, atípico” (Ap. 2001.04.01. 064921-2-PR, 7.a T., rel. Vladimir Freitas, 04.02.2003, v.u.). TJRS: “A aplicação do princípio da insignificância alcança a proposição de descriminalizar condutas que, inobstante formalmente típicas, não atingem de modo socialmente relevante os bens protegidos pelo Ordenamento Jurídico. Exigência de que o fato seja de mínima ofensividade e desprovido de periculosidade social, que possua reduzido grau de reprovabilidade e que a lesão provocada seja manifestamente inexpressiva. A causa supralegal de exclusão da tipicidade pelo princípio da insignificância não se subsume a fatos onde o valor dos bens patrimoniais atacados seja vultoso e o acusado ostente pretéritas incursões na seara delitiva. Caso em que os objetos do crime de furto foram avaliados em quantia que não pode ser entendida como irrisória e os denunciados apresentam pretéritas incursões na seara delitiva, a revelar que não se trata de conduta isolada em suas vidas. Análise conjunta destas vetoriais que afasta a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância” (Ap. Crim. 70060526720-RS, 8.a C. Crim., rel. Naele Ochoa Piazzeta, 13.05.2015, v.u.); “Inaplicabilidade do princípio da insignificância à espécie. Valor da res furtivae – avaliada em R$ 120,00 – que representa cerca de 23% do salário mínimo da época, R$ 510,00, que não pode, de forma alguma, ser tido como irrisório. Desvalor mais acentuado da conduta. Agente que não ostenta condições subjetivas favoráveis ao reconhecimento da benesse, registrando uma condenação definitiva, transitada em julgado posteriormente ao presente, por crime de receptação, cometido anteriormente, além de estar respondendo a mais dez processos por delitos contra o patrimônio, inclusive roubos majorados, anteriores e posteriores ao presente, não podendo, sua conduta, ser tida como indiferente ao Direito Penal. Propensão delitiva que deve ser contida, e não ignorada” (Ap. Crim. 70063014369-RS, 8.a C. Crim., rel. Fabianne Breton Baisch, 27.05.2015, v.u.); “Ora, o que distingue uma ação considerada de bagatela ou insignificante, de outra penalmente relevante e que merece a persecução criminal, é a soma de três fatores: o valor irrisório da coisa, ou coisas, atingidas; a irrelevância da ação do agente; a ausência de ambição de sua parte em atacar algo mais valioso ou que aparenta ser” cuidava-se de um furto de 21 abóboras, recuperadas depois pela vítima, considerado insignificante

TJRS: Embargos de Declaração 70007545148, 8.a C., Rosário do Sul, rel. Sylvio Baptista, 19.11.2003, v.u. “Furto simples tentado (art. 155, caput, c/c o art. 14, II, ambos do CP). O valor ínfimo da res furtiva, sem força para causar dano relevante ao patrimônio da vítima, não gera repercussão na seara penal, à míngua de efetiva lesão do bem jurídico tutelado (princípio da insignificância). Absolvição que se impunha com força no art. 386, III, do CPP. Sentença monocrática confirmada. Apelo improvido. (...) Nestes lindes, em reforço aos argumentos constantes da sentença recorrida, registro que o auto de avaliação direta (fl. 21/v.) dá conta que os bens subtraídos possuem o valor de R$ 60,86 (sessenta reais e oitenta e seis centavos).

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Ou seja, o valor das rei furtivae equivalia a 33,81% do salário mínimo vigente à época do fato (R$ 180,00). Logo, a conduta imputada à ré no processo é insignificante e não justifica a repressão penal, em virtude da sua desproporcionalidade em relação aos danos supostamente ocasionados pela conduta denunciada. Portanto, é plenamente aplicável ao caso o princípio da insignificância, ante a irrelevância da conduta da ré S. para o direito penal (delito de bagatela), à míngua de efetiva lesão ao bem jurídico tutelado, o que conduz a pretensão punitiva (imprópria) deduzida ao veredicto absolutório centrado no art. 386, III, do CPP” (Ap. 70.009.794.884 Caxias do Sul, 6.a C., rel. Aymoré Roque Pottes de Mello, 23.12.2004, v.u., Boletim AASP 2494, out. 2006). TJDF: “O pequeno valor da coisa furtada não constitui o único elemento exigido para a incidência do princípio da insignificância, pois se assim o fosse resultaria em um verdadeiro incentivo aos furtos de bens de pequeno valor. A aplicação desse princípio exige a incidência, cumulativa, dos requisitos da mínima ofensividade da conduta do agente, de nenhuma periculosidade social da ação, do reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e da inexpressividade da lesão jurídica provocada. Comprovadas a autoria e a materialidade e não preenchidos os requisitos firmados pela jurisprudência para a incidência, no caso concreto, do princípio da insignificância, não há de se falar em atipicidade da conduta, tampouco em absolvição” (A . 2007 01 1 117234-9-DF, 1.a T.C., rel. João Egmont, 26.11.2009, v.u.);

Obervações:

Primeiramente, oportuno lembrar que os crimes de menor potencial ofensivo são aqueles com pena máxima de 2 anos (até 2006 era de 1 ano), de competência dos Juizados Especiais Criminais, enquadrando-se no rito da Lei 9.099/95.

Os crimes de menor potencial ofensivo e as contravenções penais já foram devidamente valorados pelo legislador quanto à pena. Não se pode confundir pequeno valor (furto, artigo 155, § 2º, do CP) com valor ínfimo ou nulo que leva à atipicidade. O STF considera como crimes incompatíveis com o Princípio da Insignificância os crimes mediante violência ou grave ameaça à pessoa; Tráfico de Drogas; e Crimes de falsificação.

4. Princípio da Humanidade

Nenhuma pena pode atentar contra a incolumidade (não lesividade) da pessoa humana. Este princípio impede a adoção da pena capital (morte) e da prisão perpétua no Brasil, por serem penas eliminatórias do ser humano. A proibição de penas cruéis e infamantes, de torturas e maus-tratos nos interrogatórios policiais e a obrigação imposta ao Estado de dotar sua infra-estrutura carcerária de meios e recursos que impeçam a degradação e a dessocialização dos condenados decorrem do princípio da humanidade.

Para Fernando Capez: “a vedação constitucional da tortura e de tratamento desumano ou degradante a qualquer pessoa, a proibição da pena de morte, da prisão perpétua, de trabalhos forçados, de banimento e das penas cruéis, o respeito e proteção à figura do preso e ainda normas disciplinadoras da prisão processual, entre outros, impõem ao legislador e ao intérprete mecanismos de controle de tipos legais. Disso resulta ser inconstitucional a criação de um tipo ou a cominação de alguma pena que atente desnecessariamente contra a incolumidade física ou moral de alguém (atentar necessariamente significa restringir alguns direitos nos termos da Constituição e quando exigido para a proteção do bem jurídico). Do princípio da humanidade decorre a impossibilidade de a pena passar da pessoa do delinquente, ressalvados alguns dos efeitos extrapenais da condenação, como a obrigação de reparar o dano na esfera cível, que podem atingir os herdeiros do infrator até os limites da herança”.

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CF, Art. 5º XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis; XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado; XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;

5. Princípio da Intervenção Mínima

O Direito Penal, também conhecido como ultima ratio (última razão ou argumento), preconiza que a criminalização de uma conduta só se legitima se constituir meio necessário para a proteção de determinado bem jurídico. Porque se outras formas de sanção forem suficientes, como uma punição administrativa, uma multa ou indenização (civil, administrativa, comercial, etc) e revelarem-se suficientes, então sua criminalização é inadequada e não recomendável. Por isso o Direito Penal é a ultima ratio.

6. Princípio da Fragmentariedade

Como corolário (consequência) da intervenção mínima, a fragmentariedade busca selecionar fragmentos de antijuridicidade penalmente relevantes. (seletividade). Isso significa que podemos fazer “quase tudo”, menos aqueles pouquíssimos fragmentos juridicamente relevantes de conduta lesiva à convivência social, selecionados no texto penal, como por exemplo, matar, roubar, estuprar, furtar, etc.

7. Princípio da Proporcionalidade

A sanção penal deve ser sempre proporcional ao delito praticado. Este princípio é uma consagração do constitucionalismo moderno, embora já fosse reclamado por Cesare Beccaria (Dos Delitos e da Penas, 1764) A Constituição Federal brasileira recepcionou este princípio em vários dispositivos, tais como: exigência da individualização da pena; proibição de determinadas modalidades de sanções penais; admissão de maior rigor para crimes mais graves, previsão de crimes de menor potencial ofensivo. Na antiguidade, o talião já ensaiava o princípio da proporcionalidade.

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INTERPRETAÇÃO DAS LEIS PENAIS

O que é interpretar? É descobrir o real sentido e o verdadeiro alcance da norma jurídica.

INTERPRETAÇÃO EM MATÉRIA PENAL

1. Quanto ao Autor (fontes)

a) Autêntica: Também chamada de Interpretação Legal, é feita pelo próprio legislador, quando edita lei. Existem situações em que ele próprio prevê dificuldades de interpretações do próprio corpo da lei e esclarece seu conteúdo ou significado quando faz determinadas definições do tipo. 2 exemplos:

Violação de domicílio, 150 §§ 4º e 5º do CP, onde no próprio caput da lei, é explicado o conceito de casa.

Funcionário Público, 327 do CP

Violação de domicílio

Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências: Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.

§ 4º - A expressão "casa" compreende: essa interpretação (explicação) é autêntica pq parte do próprio texto. I - qualquer compartimento habitado; II - aposento ocupado de habitação coletiva III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade.

§ 5º - Não se compreendem na expressão "casa": I - hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva, enquanto aberta, salvo a restrição do n.º II do parágrafo anterior; II - taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero.

Funcionário público

Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. §1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.

b) Judicial: realizada por juízes e tribunais. (Busca a vontade da lei). Também denominada de Interpretação Jurisprudencial. Composta pelas autoridades que decidem em certos casos. A interpretação dos aplicadores é a única vinculante para todos. O administrador e o juiz decidirão se certa compreensão da lei por parte da doutrina e dos seus destinatários está correta ou deve ser modificada. Exemplo do ejaculador do ônibus. Interpretação de que não foi estupro e sim uma contravenção penal.

c) Doutrinária: é feita pelos escritores de direito, em seus comentários às leis. (communis opinio doctorum). Não possui força vinculante, mas influência as decisões em razão do prestígio da doutrina.

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2. Quanto aos Meios

a) Interpretação gramatical ou literal (filológica ou sintática): Num primeiro momento não tem como escapar da interpretação gramatical, mas o legislador não coloca na norma, palavras supérfluas, vulgares, futilidades nem banalidades, possui clareza para que seja compreendida. Agora uma interpretação completamente gramatical, sem atentar para termos técnicos, pode nos remeter a erro.

Busca o sentido literal do texto normativo.

Deve-se dar preferência à linguagem técnica;

A lei não tem palavras supérfluas;

As expressões contidas na lei têm conotação técnica e não vulgar.

b) Interpretação histórica: O intérprete volta ao passado, ao tempo em que foi editado o diploma que se quer interpretar, buscando os fundamentos de sua criação, o momento pelo qual atravessava a sociedade etc., para que se possa entender o motivo pelo qual houve a necessidade de modificação do ordenamento jurídico, facilitando, ainda, a interpretação de expressões contidas na lei. Professor usou um exemplo onde daqui a uns 30 anos, para que se possa entender o que aconteceu na Lei de Abuso de Autoridade em 2017 (ou 2018, pelo andar da carruagem), será necessária uma análise, interpretação histórica sobre essa época onde existiu a famosa Lava Jato, o Juiz Sérgio Moro... para que se possa entender o que foi que motivou a modificação daquela norma.

Veja esses trechos, extraídos do site Metrópoles...

Após deixar a proposta parada na Casa por quase seis meses, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criou uma comissão especial para analisar projeto de lei já aprovado pelo Senado que trata do abuso de autoridade...

O Projeto

O projeto do Senado altera a definição dos crimes de abuso de autoridade. O texto passa a abranger ações que podem ser cometidas por servidores públicos e membros dos três poderes da República, do Ministério Público, de tribunais e conselhos de contas e das Forças Armadas. A proposta prevê mais de 30 ações que podem ser consideradas abuso de autoridade, com penas que variam de seis meses a quatro anos de prisão. Além disso, as autoridades condenadas terão que indenizar a vítima. Em caso de reincidência, pode haver a inabilitação para exercício da função pública e até a perda do cargo.

“Precisamos, sim, discutir isso, mas sem dar privilégios”, afirmou o líder do PSD, Marcos Montes (MG). O deputado é favorável ao fim irrestrito do foro, mas disse que é preciso proteger autoridades da “banalização” das medidas cautelares. “Há um abuso nestas questões (cautelares)”, disse o líder do PTB, Jovair Arantes (GO).

Líderes das dez maiores bancadas da Casa ouvidos pelo Estadão/Broadcast adotaram o discurso de defesa do fim irrestrito do foro como forma de acabar com o “privilégio” da classe política. Já o líder petista Carlos Zarattini (SP) avalia que a manutenção do foro para algumas autoridades dos três Poderes é importante para ter “alguma proteção”.

“Vou ter de instalar a comissão, né. Não tenho muita alternativa Vou ver o melhor momento”, afirmou Maia em entrevista ao chegar à Câmara, após reunião com a

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presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Carmen Lúcia, e o ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato na Corte.

“A princípio, a ideia é que possamos começar esse debate com calma, sem pressa”, acrescentou o parlamentar fluminense. O projeto de abuso de autoridade foi aprovado pelo plenário do Senado em 26 de abril e enviado para a Câmara, onde está parado desde então.

Maia disse que o abuso de autoridade e o fim do foro privilegiado são temas fundamentais para serem tratados pelo Congresso Nacional, mas que, na avaliação dele, “talvez não seja o momento” adequado para votá-los. Para o presidente da Câmara, há dois pesos e duas medidas nas discussões sobre o projeto.

“Da mesma forma que aprovar uma lei de abuso pode parecer vontade de acabar com a Lava Jato, nesse momento de criminalização da política, modificar o foro pode gerar ambiente de caça às bruxas muito grande. Se há legitimidade para um, há para o outro”, disse.

c) Interpretação lógico-sistêmica: busca-se situar a norma no conjunto geral do sistema que a engloba, para justificar sua razão de ser. O Código Penal em sua parte especial é toda sistematizada. Temos títulos, capítulos, artigos, incisos, etc.

Toda norma, quando incorporada ao ordenamento, deve ser devidamente harmonizada com o sistema que lhe é preexistente. Na função do método sistemático, a aplicação de uma regra não pode contradizer outra, igualmente vigente e harmônica com a Constituição; é função primordial do intérprete compatibilizá-las, delimitando o espaço de cada uma delas.

O art. 28 do CP, o qual, no §1º, isenta de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Pergunta-se, então, qual o conceito de embriaguez? Recorrendo ao método gramatical, verifica-se que se trata da intoxicação, aguda e transitória, provocada pelo álcool ou substâncias de efeitos análogos. Surge, daí, outra questão. As drogas ilícitas (substâncias psicoativas que causam dependência física ou psíquica) estão incluídas nesta definição? Uma resposta assistemática, ou seja, que não considera toda a legislação penal, certamente seria afirmativa. Ocorre, porém, que a intoxicação decorrente da ingestão de drogas ilícitas é tratada no art. 45 da Lei n. 11.343/2006, de tal modo que o art. 28 do CP, por exclusão, fica fora do alcance de tais situações.

3. Quanto aos Resultados

a) Declarativas: na interpretação declarativa o texto não é ampliado nem restringido, correspondendo exatamente a seu real significado. O intérprete apenas declara o que está contido na letra da lei. Não há maior explicação porque o texto em si já corresponde ao seu significado real.

Vicente Ráo preconizava que a interpretação declarativa “afirma a coincidência da norma com o sentido exato do preceito”.

Rogério GRECO cita, como exemplo... “o art. 141 , III, do Código Penal, o qual preceitua que as penas cominadas para os crimes de calúnia, difamação e injúria serão aumentadas de um terço se qualquer dos crimes for praticado na presença de várias pessoas. Interpretando o termo várias,

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chega-se à conclusão de que o Código exige, pelo menos, três pessoas. Isso porque quando a lei se contenta com apenas duas ela o diz expressamente, como no art. 146, §1º utiliza a expressão mais de três pessoas. Assim, a interpretação dada ao inciso III do art. 141 é meramente declaratória, pois não ampliamos nem restringimos seu alcance, mas simplesmente declaramos seu conteúdo real.”

b) Restritivas: o legislador exprimiu-se de forma ampliativa, foi além de seu pensamento, cumprindo ao intérprete restringir o alcance da norma. Porque ao se fazer uma leitura da norma, observa-se a forma com que o legislador faz parecer que é um pouco a mais. Parece mais do que efetivamente deve ser. Seguramente é menos que isso. Exemplo do cara que emite um cheque com a certeza de que está tudo certo em sua conta, mas por diversos débitos, normais em sua conta, de algumas taxas mensais, o cheque acaba por entrar sem fundos...

Estelionato Art. 171, §2º VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o pagamento.

Nesse caso pode ele ser julgado como estelionatário? Pergunta-se novamente: É justo, é razoável, era isso que o legislador queria? Então percebe-se que não é qualquer cheque que entre sem fundos que pode ser o emitente enquadrado no crime de estelionato.

Ex. Fraude por meio de cheque (art. 171§ 2º, VI). Não é a simples emissão de cheque sem fundos que caracteriza o crime, mas a fraude quando lhe for inerente.

c) Extensiva: destinada a corrigir uma fórmula legal demasiadamente estreita, cujo significado fica aquém da expressão literal. Se serve para o mar, se serve para o rio deve então servir para o lago... Atenção no 319-A sobre a falta, o erro que o legislador cometeu:

Art. 319-A. Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo.

O legislador mencionou “penitenciária”, mas sabe-se que ela é um dos estabelecimentos prisionais. A Lei de Execução Penal nomina diversos tipos de estabelecimentos prisionais em seu Título IV, onde são estabelecimento prisionais:

1. Penitenciária 2. Colônia Agrícola, Industrial ou Similar 3. Casa do Albergado 4. Centro de Observação 5. Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico 6. Cadeia Pública

Então percebemos que o erro do legislador foi em deixar de dizer: “Deixar o Diretor de ESTABELECIMENTO PRISIONAL e/ou agente público, de cumprir...” Perceba que nesse caso, onde cabe “penitenciária” tem que caber também, em uma interpretação extensiva, a Cadeia Pública, a Casa do Albergado, o Centro de Observação, etc.

O art. 260 do CP (Perigo de desastre ferroviário) inclui também o serviço de metrô. No art. 261 do CP deve ser incluída a navegação “lacustre” omitida pelo legislador. A bigamia do art. 235 inclui também a poligamia.

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Perigo de desastre ferroviário

Art. 260 - Impedir ou perturbar serviço de estrada de ferro:

I - destruindo, danificando ou desarranjando, total ou parcialmente, linha férrea, material rodante ou de tração, obra-de-arte ou instalação; II - colocando obstáculo na linha; III - transmitindo falso aviso acerca do movimento dos veículos ou interrompendo ou embaraçando o funcionamento de telégrafo, telefone ou radiotelegrafia; IV - praticando outro ato de que possa resultar desastre: Pena - reclusão, de dois a cinco anos, e multa.

Desastre ferroviário

§1º - Se do fato resulta desastre: Pena - reclusão, de quatro a doze anos e multa. §2º - No caso de culpa, ocorrendo desastre: Pena - detenção, de seis meses a dois anos. §3º - Para os efeitos deste artigo, entende-se por estrada de ferro qualquer via de comunicação em que circulem veículos de tração mecânica, em trilhos ou por meio de cabo aéreo.

Atentado contra a segurança de transporte marítimo, fluvial ou aéreo

Art. 261 - Expor a perigo embarcação ou aeronave, própria ou alheia, ou praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima, fluvial ou aérea: Pena - reclusão, de dois a cinco anos.

Interpretação Extensiva - Exemplificação

“CRIMINAL. RESP. REMIÇÃO. FREQUÊNCIA EM AULAS DE ALFABETIZAÇÃO. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DO ART. 126 DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. RECURSO DESPROVIDO. I. “A Lei de Execuções Penais previu a remição como maneira de abreviar, pelo trabalho, parte do tempo da condenação. II. A interpretação extensiva ou analógica do vocábulo 'trabalho‘, para abarcar também o estudo, longe de afrontar o caput do art. 126 da Lei de Execução Penal, lhe deu, antes, correta aplicação, considerando-se a necessidade de se ampliar, no presente caso, o sentido ou alcance da lei, uma vez que a atividade estudantil, tanto ou mais que a própria atividade laborativa, se adequa perfeitamente à finalidade do instituto. III. Sendo um dos objetivos da lei, ao instituir a remição, incentivar o bom comportamento do sentenciado e a sua readaptação ao convívio social, a interpretação extensiva se impõe in casu, se considerarmos que a educação formal é a mais eficaz forma de integração do indivíduo à sociedade. IV. Recurso desprovido.” Ante o exposto, CONCEDO a ordem para, cassando o acórdão impugnado, restabelecer a decisão proferida pelo Juízo das Execuções, concessiva do benefício da remição da pena em relação aos dias de estudo efetivamente cursados. É como voto. MINISTRA LAURITA VAZ Relatora. (REsp 445.942/RS, 5.ª Turma, Rel. Min. GILSON DIPP, DJ de 25/08/2003.)”

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ANALOGIA NO DIREITO PENAL

CONCEITO - Analogia consiste em aplicar a uma hipótese não prevista em lei, a disposição relativa a um caso semelhante. O alcance da analogia no direito penal é diferente

É forma de integração e não de interpretação do Direito Penal (analogia, costumes, princípios gerais de direito – LINDB);

Analogia é forma de auto integração da ordem legal para suprir lacunas, estendendo a aplicação da lei a casos que ela não regula e de que não cogita;

O Direito Penal, como regra, proíbe analogia em relação a normas penais incriminadoras.

FORMULAÇÃO DE DAMÁSIO EVANGELISTA DE JESUS

O legislador, através da lei A, regulou o fato B. O julgador precisa decidir o fato C. Procura e não encontra no direito positivo uma lei adequada a este fato. Percebe, porém, que há pontos de semelhança entre o fato B (regulado) e o fato C (não regulado). Então, através da analogia, aplica ao fato C a lei A.

A analogia pode ser dividida em:

Analogia in bonam partem (beneficia o sujeito)

Exemplo: o aborto sentimental (praticado por médico) previsto no artigo 128, II, do CP (gravidez decorrente de estupro) pode ser analogicamente praticado quando a gravidez resulta de atentado violento ao pudor. Uma mulher chega no médico e conta sua história de estupro solicitando a prática do aborto... O médico — ao perceber veracidade nos fatos — realiza a prática abortiva

O outro exemplo da união estável e mulher casada

Escusa absolutória nos crimes contra o patrimônio (união estável).

Analogia in malam partem (prejudica o sujeito)

Exemplo: o legislador não previu o furto de uso. Tentar incriminar alguém por esta conduta é tentar aplicar analogia em malam partem não admitida pela nosso Direito Penal.

Diferença entre Analogia e Interpretação Analógica

Analogia é forma de integração (auto integração) da lei, já a interpretação analógica é forma de interpretação. Após enumerar casuisticamente as hipóteses, o legislador usa fórmula genérica deixando para o intérprete definir a situação em um caso concreto.

Art. 121, § 2º, inciso III – com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso (traiçoeiro) ou cruel.

Art. 71 do CP (Crime Continuado)

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Interpretação Analógica - Exemplificação

Um exemplo de interpretação analógica é sobre o Art. 319-A: “Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo”. Enumerou duas hipóteses, “aparelho telefônico, de rádio” e depois foi para uma genérica, “ou similar”. Aqueles oktoks, encontrados em lojas de aparelhos eletrônicos, poderia ser facilmente, por analogia, o que o termo “ou similar” quer transmitir.

Crime de Ameaça

Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave...

Palavra “Eu vou ou te matar” Escrito “uma mensagem, e-mail, whatsapp” Gesto

...enumerou 3 coisas e depois veio a genérica “ou qualquer outro meio simbólico”

Homicídio simples

Art 121. Matar alguém:

§2° Se o homicídio é cometido: I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; "paga" ou "promessa" é torpeza e "ou por outro motivo", entende-se uma interpretação analógica

Crime continuado

Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

A ANALOGIA E SUA APLICAÇÃO IN BONAM PARTEM

Os problemas da interpretação, segundo Jiménez de Asúa, “foram postos embaixo do tapete jurídico diante do problema da analogia. Ela agitou as mansas águas dos velhos princípios e dos vetustos aforismos, e mesmo quando a repudiamos de plano em nossa disciplina, temos de agradecer-lhe a revisão das antigas máximas”. Ao mesmo tempo que o indivíduo é objeto de transformações, porque vive em um contexto em mutação, também é sujeito de transformações, porque é capaz de direcionar processos causais e provocar mudanças no mundo circundante. É nessa realidade, nesse fenômeno mutante e transformador que o direito deve espargir seus efeitos. O Direito Penal recolhe dessa realidade dinâmica apenas uma parte e, ao fazê-lo, normalmente não a abrange por completo, ou seja, toda a realidade que compõe a atividade humana e suas consequências.

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ATIVIDADE E EXTRA-ATIVIDADE DA LEI

ATIVIDADE EXTRA-ATIVIDADE

Diz respeito ao fato de que uma lei, desde sua entrada em vigor, deve reger todos os fatos por ela abrangidos, enquanto dure a sua vigência.

Refere-se à possibilidade de a uma lei reger situações ocorridas fora do seu período de vigência. A extra-atividade divide-se em:

Retroatividade Possibilita que uma lei novel

alcançar fatos ocorridos antes da sua vigência

Em matéria penal somente a lei mais benigna pode retroagir

Ultra-atividade Permite à lei já revogada regular fatos ocorridos

durante o período de sua vigência. Ela continua regulando fatos que já

aconteceram durante o período de sua vigência.

CONFLITOS DE LEIS PENAIS NO TEMPO

1. O princípio do tempus regit actum só tem aplicação integral em processo penal. 2. A lei nova deve sempre ser entendida como melhor que a lei anterior. 3. A lei mais benigna é retroativa e também ultra ativa.

Situações hipotéticas:

a) O crime se inicia na vigência de uma lei, mas tem a consumação em outro momento. (Homicídio, extorsão mediante sequestro, etc.) b) O crime é cometido na vigência de uma lei, mas a sentença se dá na vigência de outra (mais gravosa ou benigna) c) Durante a execução da pena sobrevém lei mais benigna.

Observação:

Como decorrência do princípio do nullum crimen, nulla poena sine praevia lege, há uma regra dominante: a da irretroatividade da lei penal, que deve se submeter ao da retroatividade da lei mais benigna.

Abolitio criminis: abolir o crime (no sentido de abolição, acabar, revogar) - Ocorre quando a lei nova deixa de considerar crime fato anteriormente tipificado como tal. Retroage para afastar as consequências jurídico-penais a que estariam sujeitos os autores de crimes. Atinge, inclusive, fatos já julgados definitivamente (situação transitada em julgado). (Art. 240 – Adultério; 220 – Rapto Consensual)

Art. 240 - Cometer adultério: (REVOGADO) Pena - detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses. §1º - Incorre na mesma pena o co-réu. §2º - A ação penal somente pode ser intentada pelo cônjuge ofendido, e dentro de 1 (um) mês após o conhecimento do fato. §3º - A ação penal não pode ser intentada: I - pelo cônjuge desquitado ; II - pelo cônjuge que consentiu no adultério ou o perdoou, expressa ou tacitamente. §4º - O juiz pode deixar de aplicar a pena:

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I - se havia cessado a vida em comum dos cônjuges; II - se o querelante havia praticado qualquer dos atos previstos no art. 317, do Código Civil.

Art. 220 - Se a raptada é maior de 14 (catorze) anos e menor de 21 (vinte e um), e o rapto se dá com seu consentimento: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos.

Novatio legis incriminadora: nova lei incriminadora - Ao contrário da abolitio criminis, considera crime fato anteriormente não incriminado. É irretroativa, não podendo alcançar condutas praticadas antes da sua vigência. (Art. 216-A – Assédio Sexual; 313-A - Inserção de dados falsos em sistema de informações) - não pode em hipótese alguma voltar-se para o passado.

Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função." Pena - detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. Parágrafo único. (VETADO) 2º A pena é aumentada em até um terço se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos.

Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.

Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações.

Novatio legis in pejus: nova lei em prejuízo - lei posterior, que de qualquer modo agravar a situação do sujeito, não retroagirá. Se houver um conflito entre duas leis, a anterior mais benigna, e a posterior mais severa, aplicar-se-á a mais benigna. A anterior será ultra ativa por ser mais benigna. (Art. 217-A – Estupro de vulnerável)

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. 2º (VETADO) 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: 4º Se da conduta resulta morte:

Novatio legis in mellius: nova lei para melhor - pode acontecer que uma lei nova, mesmo sem descriminalizar uma conduta, dê tratamento mais favorável ao sujeito. Mesmo que a sentença condenatória encontre-se em fase de execução, prevalecerá a lex mitior. Ela pode retroagir e substituir a anterior.

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Lei penal no tempo

Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Ninguém vai ser punido por fato que não é mais crime

Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado. Novatio legis in mellius

LEIS TEMPORÁRIAS OU EXCEPCIONAIS

Leis temporárias são as que possuem prazo prefixado de vigência. Exemplo: congelamento geral de preços, em que se publica lei punindo a conduta de quem descumprir o tabelamento. Essa lei já vem com data pré-fixada de validade.

Já as leis excepcionais têm vigência em situações de emergência. Exemplo: a publicação, em tempo de guerra, de lei punindo a conduta de quem acender as luzes. Leis dessa natureza são ultra ativas, alcançando fatos que ocorreram na sua vigência, mesmo depois de revogadas. Essa lei tem validade pelo tempo em que durar o acontecimento.

Leis temporárias e excepcionais são ultra ativas, isto é, continuam valendo mesmo após sua vigência. Toda lei temporária é uma lei excepcional e toda excepcional é temporária.

Lei excepcional ou temporária

Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração (temporária) ou cessadas as circunstâncias que a determinaram (excepcional), aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.

TEMPO DO CRIME TEORIAS ACERCA DO TEMPO DO CRIME

Teoria da atividade: adotada pelo Código Penal, considera o momento do crime, o momento da ação ou omissão, ainda que seja outro o momento do resultado. (Exemplificar com o adolescente infrator)

Teoria do resultado: considera-se praticado o crime no momento do resultado (no homicídio, quando falecer a vítima).

Teoria mista (ou da ubiquidade): o momento do crime tanto pode ser o da ação quanto o do resultado.

Súmula 711 do STF “A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência”.

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ITER CRIMINIS

Cogitação — Refere-se ao plano intelectual acerca da prática criminosa, com a visualização do resultado querido, essa fase é interna ao sujeito, está em sua mente, em sua cabeça, daí a expressão “interna”. Não se pune essa fase, pois não há como adentrar à cabeça do sujeito, salvo exceções que sejam explícitas em algum tipo, caracterizando pois um fato típico. Se escolhe os meios e a opção mais adequada, bem como a previsão do resultado. Tudo que vier a ir além da mente do sujeito será pois, externo.

Atos Preparatórios — Atos externos ao agente que passam da cogitação à ação objetiva, como a aquisição da arma para a prática de homicídio. Da mesma forma que a cogitação também não são puníveis. Contudo, há uma exceção no código penal brasileiro, a formação de Associação Criminosa (Art. 288), cuja reunião (em tese um ato preparatório) é punido como crime consumado, este crime é punido pois se entende que a quadrilha é uma ameaça à sociedade, mesmo que ela não exerça nenhum tipo de crime (furto, estelionato, sequestro, assassinato...), já é punida por ser quadrilha, o bem jurídico a ser tutelado aqui é o bem estar social. Há também um certo consenso na jurisprudência de que certos atos preparatórios devem ser punidos autonomamente como crime, por exemplo, as hipóteses de petrechos para a falsificação de moedas (Código Penal, Art. 291).

Atos de Execução — São aqueles dirigidos diretamente à prática do crime. No Brasil o Código Penal em seu artigo 14, inciso II (o crime se diz tentado quando iniciada a execução, esta não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente), adotou a teoria objetiva ou formal para tentar diferenciar atos executórios de atos preparatórios. Assim, exige-se que o autor tenha realizado de maneira efetiva uma parte da própria conduta típica, adentrando no núcleo do tipo. É punível como tentativa.

Consumação — É o momento no qual estão presentes todos os elementos da definição legal do crime.

CONFLITO APARENTE DE NORMAS

CONCEITO — É quando, a um mesmo fato supostamente podem ser aplicadas normas diferentes, da mesma ou de diversas leis penais, surge o que é denominado conflito ou concurso aparente de normas. (Júlio Fabbrini Mirabete)

Pressupostos:

1. Unidade de fato; 2. Pluralidade de normas que (aparentemente) identificam o mesmo fato delituoso.

Observação: impossibilidade jurídica de aplicação de mais de uma norma em virtude do princípio do non bis in idem.

PRINCÍPIOS ADOTADOS PARA A SOLUÇÃO DOS CONFLITOS

A) Princípio da Especialidade

Diz-se que uma norma penal incriminadora é especial em relação à outra, quando possui em sua definição legal todos os elementos típicos desta, e mais alguns, de natureza subjetiva ou objetiva, denominados especializantes. O confronto entre as duas normas pode se dá em abstrato.

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Exemplos:

1. Art. 121, parágrafo 2º, inciso V, (para assegurar a execução de outro crime). Esta norma é geral, em relação ao crime de latrocínio (art.157, § 3º, in fine, do CP), que norma especial.

2. O crime de infanticídio é especial em relação ao crime de homicídio, contém os elementos do homicídio e mais alguns (estado puerperal, próprio filho, etc).

O tipo fundamental no crime de furto é excluído pela figura privilegiada ou qualificada.

B) Princípio da subsidiariedade

Há relação de primariedade e subsidiariedade entre normas quando descrevem graus de violação do mesmo bem jurídico, de forma que a infração definida pela subsidiária, de menor gravidade que a principal, é anulada por esta. A conduta punível deve ser analisada em concreto para que se determine o preceito legal a que se enquadra.

1. Expressa ou explícita: quando a norma, em seu próprio texto, subordina a sua aplicação à não-aplicação de outra, de maior gravidade. Ex. art. 132, 239, 307, etc.

2. Tácita ou implícita: quando uma figura típica funciona como uma elementar ou circunstância legal específica de outra, de maior gravidade punitiva. Ex.: Ameaça constrangimento ilegal, constrangimento ilegal, aborto sem o consentimento da gestante, extorsão, estupro, etc. (Vis absoluta – força física) (vis compulsiva – ameaça)

Subsidiariedade Expressa ou explícita

Perigo para a vida ou saúde de outrem

Art. 132 - Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: Pena - detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave. (Expressamente subsidiária)

Parágrafo único. A pena é aumentada de um sexto a um terço se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais.

Simulação de casamento

Art. 239 - Simular casamento mediante engano de outra pessoa: Pena - detenção, de um a três anos, se o fato não constitui elemento de crime mais grave. (Expressamente subsidiária)

Falsa identidade

Art. 307 - Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave. (Expressamente subsidiária)

Para não esquecer: Toda vez que se deparar com uma norma em que em seu conteúdo apareça “se o fato não constitui crime mais grave” essa será a norma subsidiária.

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Subsidiariedade Tácita ou Implícita

Ameaça

Art. 147 - Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave: ou qualquer outro meio simbólico - interpretação analógica Pena - detenção, de 1 a 6 meses, ou multa.

Constrangimento ilegal

Art. 146 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda: Pena - detenção, de 3 meses a 1 ano, ou multa.

Estupro

Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: conjunção carnal significa penetração vaginal. A penetração anal significa ato libidinoso. É o coito vagínico, a introdução do pênis na vagina da mulher. É a intromissão do órgão genital masculino no interior da cavidade vaginal, ou seja, no órgão genital feminino.

Pena - reclusão, de 6 a 10 anos.

C) Princípio da consunção

Ocorre a relação consuntiva ou de absorção, quando um fato definido como crime é meio necessário ou fase de preparação ou execução de outro crime mais grave ou mais complexo.

O crime menos grave será absolvido pelo mais grave. Não tem jeito de chegar no homicídio sem passar pela lesão corporal. Exemplo da discussão no bar onde um cara A empurra um outro B que cai no chão (vias de fato), aí A taca-lhe pau e arranha o braço (lesão corporal leve), depois uma paulada mais forte e lhe quebra o braço (lesão corporal grave) e por fim, uma nova paulada na cabeça que leva B à morte (homicídio). Por qual o crime ele vai responde? Homicídio

Exemplos:

O furto em residência absorve o crime de violação de domicílio. O crime de homicídio absorve o de lesão corporal. O crime de lesão corporal absorve a contravenção penal de vias de fato.

Critério da absorção (consunção): quando o fato previsto por uma lei está previsto em outra de maior amplitude, aplica-se somente esta última (lex consumens derogat legi consumptae). Em outras palavras, quando a infração prevista na primeira norma constituir simples fase de realização da segunda infração, prevista em dispositivo diverso, deve-se aplicar apenas a última. Trata-se da hipótese do crime-meio e do crime-fim. Ocorre a consunção quando determinado tipo penal absorve o desvalor de outro, excluindo-se este da sua função punitiva. A consunção provoca o esvaziamento de uma das normas, que desaparece subsumida pela outra.

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Violação de domicílio com a finalidade de praticar furto a uma residência. A violação é mera fase de execução do delito patrimonial.

O crime de homicídio absorve o porte ilegal de arma, pois esta infração penal constitui-se simples meio para a eliminação da vítima.

Na jurisprudência:

STF: Princípio da consunção. Absorção do porte ilegal de arma pelo crime patrimonial. Recurso provido. “1. A posse de arma de fogo, logo após a execução de roubo com o seu emprego, não constitui crime autônomo previsto no art. 16, parágrafo único, IV, da Lei nº 10.826/2003, por se encontrar na linha de desdobramento do crime patrimonial. 2. Recurso provido para o fim de absolver o recorrente da imputação de porte ilegal de arma” (RHC 123399-RJ, 1a.T., rel. Dias Toffoli, 30.09.2014, v.u.). STJ: o estelionato absorve o falso, fase de execução do primeiro (ver, nesse caso, o disposto na Súmula 17 do Superior Tribunal de Justiça: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido”); “O delito de uso de documento falso, cuja pena em abstrato é mais grave, pode ser absorvido pelo crime-fim de descaminho, com menor pena comparativamente cominada, desde que etapa preparatória ou executória deste, onde se exaure sua potencialidade lesiva. Precedentes” (REsp 1378053-PR, 3.a S., rel. Nefi Cordeiro, 10.08.2016, v.u.).

TJRS: “No caso dos autos, consistindo o crime de uso de documento falso preparação para a prática do crime de estelionato, impositivo o reconhecimento do princípio da consunção” (Ap. Crim. 70064406929-RS, 7.a C. Crim., rel. José Conrado Kurtz de Souza, 11.06.2015, m.v.).

Sob outro ponto de vista:

TRF4: “À luz do princípio da consunção, quando um delito apresentar-se como meio para realização de outro, o crime-meio resta absorvido pelo crime-fim. Todavia, nas hipóteses em que o crime-meio estabelecer penas mais graves que o crime-fim, este restará absorvido por aquele” (Ap. Crim. 0001329-17.2005.404.7116-RS, 8.a T., v.u., rel. Artur César de Souza, 10.02.2011, v.u.).

A diferença fundamental entre o critério da consunção e o da subsidiariedade é que, na subsidiariedade, um tipo está contido dentro de outro (a lesão corporal está incluída necessariamente no crime de homicídio, pois ninguém consegue tirar a vida de outrem sem lesioná-lo), enquanto na consunção é o fato que está contido em outro de maior amplitude, permitindo uma única tipificação (o homicídio absorve o porte ilegal de arma porque a vítima perdeu a vida em razão dos tiros disparados pelo revólver do agente, o que demonstra estar o fato – portar ilegalmente uma arma – ínsito em outro de maior alcance – tirar a vida ferindo a integridade física de alguém). Ocorre que é possível matar alguém sem dar tiros, isto é, sem portar ilegalmente uma arma. Assim, a consunção envolve fatos que absorvem fatos, enquanto a subsidiariedade abrange tipos que, de algum modo, contêm outros.

Outro exemplo:

STJ: “Em razão do princípio da consunção, a lesão corporal culposa no trânsito (art. 303 do CTB) absorve o delito de dirigir sem habilitação (art. 309 do CTB), em face da menor lesividade do último” (HC 25.084-SP, 5. T., rel. Jorge Scartezzini, 18.05.2004, v.u., Bol. AASP 2.422).

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D) Princípio da alternatividade

A norma penal que prevê vários fatos alternativamente, como modalidade de um mesmo crime, só aplicável uma única vez, ainda que o agente tenha praticados todas as condutas sucessivamente. Ex: Induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio. Receptação (art. 180 do CP).

Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio

Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.

Receptação

Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996). Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

Petrechos para falsificação de moeda

Art. 291 - Fabricar, adquirir, fornecer, a título oneroso ou gratuito, possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda.

Matéria importante Para melhor entendimento no 3º semestre

CONCEITOS DE CRIME (Ausência de definição no CP). Crime é um fato típico antijurídico e culpável. Crime = Fato Típico e Antijurídico (teoria bipartida). Fato típico é um comportamento humano que corresponde a uma fonte incriminadora. Antijurídico é aquilo que contraria as leis. Todo fato típico é também antijurídico. o fato só deixa de ser antijurídico se presente. Também para a teoria bipartida a culpabilidade é um pressuposto para aplicação de pena. Só vai deixar de ser antijurídico se presente uma exclusão de

CONCEITO FORMAL DE CRIME (aspecto externo, nominal do fato) É o fato humano contrário à lei (Carmignani).

CONCEITO MATERIAL DE CRIME (conteúdo do fato) É a violação de um bem penalmente protegido (José Frederico Marques).

CONCEITO ANALÍTICO DE CRIME (características do crime) Do ponto de vista analítico, crime é o fato típico, antijurídico e culpável.

Teoria bipartida: Fato típico e antijurídico Teoria tripartida: Fato típico, antijurídico e culpável. Culpabilidade: é um juízo de reprovação da ordem jurídica em face de estar o homem ligado

a um fato típico e antijurídico. Funciona como condição de imposição da pena. o Professor deu exemplo com a música do Pablo: você foi a culpada desse amor se

acabar... você que destruiu a minha vida... você que machucou meu coração, me fez chorar e me deixou num beco sem saída... estou indo embora agora, a mala já está lá fora...

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CLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES

1. Crimes comuns e próprios 2. Crimes instantâneos e permanentes 3. Crimes comissivos, omissivos, comissivos por omissão e omissivos por comissão

1. Crimes comuns e próprios:

São considerados comuns os delitos que podem ser cometidos por qualquer pessoa (ex.: homicídio, roubo, falsificação);

São próprios os crimes que exigem sujeito ativo especial ou qualificado, isto é, somente podem ser praticados por determinadas pessoas.

As qualidades do sujeito ativo podem ser de fato, referentes à natureza humana ou à inserção social da pessoa (ex.: mulher no auto aborto; mãe no infanticídio; enfermidade no perigo de contágio venéreo), ou de direito, referentes à lei (ex.: funcionário público, testemunha no falso testemunho, perito na falsa perícia).

Os próprios podem ser subdivididos em puros e impuros.

Os puros dizem respeito aos delitos que, quando não forem cometidos pelo sujeito indicado no tipo penal, deixam de ser crime, caso a conduta se concretize por ato de outra pessoa (Advocacia Administrativa. Nesse caso, somente o funcionário pode praticar a conduta; se for outra pessoa, não haverá infração penal).

Os impuros referem-se aos delitos que, se não cometidos pelo agente indicado no tipo penal, transformam-se em figuras delituosas diversas (se a mãe mata o filho recém-nascido, após o parto, em estado puerperal, é infanticídio; caso um estranho mate o recém-nascido, sem qualquer participação da mãe, cuida-se de homicídio).

Dentro dos crimes próprios encontram-se, ainda, os crimes de mão própria, que exigem sujeito ativo qualificado, devendo este cometer direta e pessoalmente a conduta típica. Assim, neste último caso, não admitem coautoria, mas somente participação. Falso testemunho: somente a testemunha pode, diretamente, cometer o crime, apresentando-se ao juiz para depor e faltando com a verdade. Reingresso de estrangeiro expulso: somente a pessoa que foi expulsa pode cometê-lo, reingressando no território nacional.

Falso testemunho ou falsa perícia Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral: (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001) Pena - reclusão, de 2 a 4 anos, e multa.

Reingresso de estrangeiro expulso Art. 338 - Reingressar no território nacional o estrangeiro que dele foi expulso: Pena - reclusão, de 1 a 4 anos, sem prejuízo de nova expulsão após o cumprimento da pena.

O delito de mão própria somente tem significado se pudermos considerá-lo um crime próprio, vale dizer, cometido por sujeito ativo qualificado. “Há determinados tipos que são necessariamente concebidos, conforme seu conteúdo de ilícito, de tal modo que somente pode ser autor dos mesmos aquele que estiver em condições de realizar, pessoal e diretamente, a conduta proibida. (...) Os

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terceiros podem chegar a ser cúmplices dos delitos de mão própria, mas não podem ser autores, isto é, nem como coautores, nem como autores mediatos. (...) A participação nos delitos de mão própria (indução e cumplicidade) é possível de forma restrita, posto que o partícipe coopera na ação de outro, e, em consequência, não precisa ter a qualidade de autor” MAURA-CH.

No mesmo prisma, WELZEL cita como exemplos de delitos de mão própria somente os casos de crimes que são igualmente próprios, como o falso testemunho, o incesto (que não temos no Brasil), a deserção, entre outros. Conferir, também, a lição de NILO BA-TISTA: “Os crimes de mão própria não admitem coautoria nem autoria mediata na medida em que o seu conteúdo de injusto reside precisamente na pessoal e indeclinável realização da atividade proibida”.

As duas modalidades de aborto provocado por terceiro (arts. 125 e 126, CP) são espécies de crimes comuns, logo, jamais serão de mão própria, até pelo fato de ser perfeitamente possível que haja coautoria (duas parteiras realizam, em conjunto, o aborto da gestante), bem como é viável a autoria mediata (alguém utiliza pessoa inimputável ou induzida em erro para a realização do referido aborto). Se o crime pode ser cometido por interposta pessoa (autoria mediata) ou permite a realização em coautoria, deixou de ser de mão própria, qualidade da infração penal que somente aceita a participação (no falso testemunho, por exemplo, pode-se induzir alguém a mentir, mas nunca se poderá mentir em conjunto, pois depoimento não é jogral, nem tampouco pode a testemunha valer-se de terceiro para depor em seu lugar).

Portanto, para o surgimento do delito de mão própria é fundamental que o sujeito ativo detenha uma qualidade especial, que o tornará único e habilitado à realização da ação típica de forma direta e pessoal. A vedação à autoria mediata diz respeito ao sujeito ativo qualificado que, por deter especial condição, não consegue valer-se de terceira pessoa para o ato. Eventualmente, podemos conceber a hipótese de alguém, valendo-se de coação moral irresistível, obrigar uma testemunha a mentir. Responderia por falso testemunho como autor mediato. O cerne da questão, entretanto, é que a testemunha não tem condições de agir como autor mediato, isto é, valer-se ela de terceira pessoa para em seu lugar depor. Nesses termos é que afastamos a autoria mediata do cenário do crime de mão própria;

Crime omissivo próprio: há somente a omissão de um dever de agir, imposto normativamente, dispensando, via de regra, a investigação sobre a relação de causalidade naturalística (são delitos de mera conduta).

Crime omissivo impróprio: o dever de agir é para evitar um resultado concreto. Trata-se da análise que envolve um crime de resultado material, exigindo, consequentemente, a presença de nexo causal entre conduta omitida (esperada) e o resultado. Esse nexo, no entanto, para a maioria da doutrina, não é naturalístico (do nada não pode vir nada). Na verdade, o vínculo é jurídico, isto é, o sujeito não causou, mas como não o impediu é equiparado ao verdadeiro causador do resultado (é o nexo de não impedimento).

2. Crimes instantâneos e permanentes:

Delitos instantâneos são aqueles cuja consumação se dá com uma única conduta, que não produz um resultado prolongado no tempo. Assim, ainda que a ação possa ser arrastada no tempo, o resultado é instantâneo (ex.: homicídio, furto, roubo).

Delitos permanentes são os que se consumam com uma única conduta, embora a situação antijurídica gerada se prolongue no tempo até quando queira o agente. Exemplo disso é o sequestro ou cárcere privado. Com a ação de tirar a liberdade da vítima, o delito está

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consumado, embora, enquanto esteja está em cativeiro, por vontade do agente, continue o delito em franca realização.

Outros exemplos: extorsão mediante sequestro, porte ilegal de arma e de substância entorpecente.

Para a identificação do crime permanente, oferece a doutrina duas regras:

O bem jurídico afetado é imaterial (ex.: saúde pública, liberdade individual etc.); Normalmente é realizado em duas fases, a primeira, comissiva, e a segunda, omissiva

(sequestra-se a pessoa através de uma ação, mantendo-a no cativeiro por omissão).

Essas regras não são absolutas, comportando exceções. No crime de introdução de animais em propriedade alheia, causando prejuízo (art. 164, CP), podemos ter a forma permanente e há ofensa a bem jurídico material. Por outro lado, é possível cometer-se o crime na forma omissiva apenas (o carcereiro, que legalmente custodiava o preso, ao receber o alvará de soltura do juiz não o libera, praticando cárcere privado) ou só na forma comissiva (tortura exercida contra alguém através de vários atos).

O delito permanente admite prisão em flagrante enquanto não cessar a sua realização, além de não ser contada a prescrição até que finde a permanência:

STJ: “1. Em casos de crimes permanentes, não se faz sequer necessária a expedição de mandado de busca e apreensão, sendo lícito à autoridade policial ingressar no interior do domicílio, a qualquer hora do dia ou da noite, para fazer cessar a prática criminosa, como no caso em questão, apreendendo a substância entorpecente nele encontrada. 2. Por ser dispensada a expedição do mandado de busca e apreensão, também não há de se falar em sua nulidade, por descumprimento do disposto no art. 245, §7.º, do Código de Processo Penal” (HC 122937-MG, 5.a T., rel. Laurita Vaz, 19.03.2009, v.u.).

CPP, Art. 245. As buscas domiciliares serão executadas de dia, salvo se o morador consentir que se realizem à noite, e, antes de penetrarem na casa, os executores mostrarão e lerão o mandado ao morador, ou a quem o represente, intimando-o, em seguida, a abrir a porta.

§7º Finda a diligência, os executores lavrarão auto circunstanciado, assinando-o com duas testemunhas presenciais, sem prejuízo do disposto no §4º.

Os crimes instantâneos de efeitos permanentes inserem-se na categoria de crimes instantâneos (e não em uma classe à parte), que nada mais são do que os delitos instantâneos que têm a aparência de permanentes por causa do seu método de execução. A bigamia é exemplo disso. Ao contrair o segundo casamento, o agente torna-se bígamo, estado que perdura com o passar do tempo. Assim, parece ser um delito permanente, que continuaria a afrontar o casamento, mas, em verdade, é instantâneo. Outro exemplo é o crime de loteamento clandestino:

TJSP: “Loteamento irregular é crime instantâneo de efeitos permanentes – a prescrição começa do início do loteamento” (RSE 325.956-3, Atibaia, 5.a C., rel. Celso Limongi, 22.02.2001, v.u., JUBI 61/01).

E, também cuidando do loteamento clandestino, encontramos:

TJSP: “O crime é de consumação instantânea, ainda que da ação decorram efeitos permanentes, como no caso de abertura de ruas, placas de propaganda afixadas no local etc.

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A consumação se dá com a prática de dar início ao parcelamento, através de uma das diversas condutas já enumeradas, e independe da efetiva realização do projeto” (HC 342.363-3/1, Cunha, 1.a C. Extraordinária, rel. Xavier de Souza, 14.03.2001, v.u.).

Segue também:

STF: “1. No caso, a conduta assumida pelo impetrante, a despeito de produzir efeitos permanentes quanto ao beneficiário da falsificação da CTPS, materializou, instantaneamente, os elementos do tipo. Descaracterização da permanência delitiva. 2. Nos crimes instantâneos, a prescrição é de ser computada do dia em que o delito se consumou ou do dia em que cessou a atividade criminosa (no caso de tentativa). 3. Transcurso de lapso temporal superior ao prazo prescricional entre a data do fato e o recebimento da denúncia. Reconhecimento da prescrição retroativa. Ordem concedida para declarar extinta a punibilidade do impetrante” (HC 94.148-SC, 1.a T., rel. Carlos Britto, 03.06.2008, v.u., grifamos).

Há, ainda, outras espécies de crimes instantâneos, que possuem formas peculiares de consumação. É o caso dos delitos instantâneos de continuidade habitual, isto é, aqueles que se consumam através de uma única conduta provocadora de um resultado instantâneo, mas que exige, em seguida, para a configuração do tipo, a reiteração de outras condutas em formato habitual. Note-se o caso do art. 228 (favorecimento à prostituição): “Induzir ou atrair alguém à prostituição...”. A mera indução (dar a ideia) é a conduta do agente e o resultado não depende da sua vontade, configurando-se tão logo a pessoa se prostitua. Ainda que se possa falar em “resultado instantâneo”, pois o que se pune é apenas o favorecimento à prostituição, e não o comércio do próprio corpo, depende-se, para a perfeita configuração típica, de prova concreta da reiterada conduta da vítima, uma vez que prostituição implica habitualidade.

Vale mencionar o denominado crime eventualmente permanente, que é o delito instantâneo, como regra, mas que, em caráter excepcional, pode realizar-se de modo a lesionar o bem jurídico de maneira permanente. Exemplo disso é o Furto de energia elétrica. A figura do furto, prevista no art. 155, concretiza-se sempre instantaneamente, sem prolongar o momento consumativo, embora, como o legislador equiparou à coisa móvel, para efeito punitivo, a energia elétrica, permite-se, certamente, lesionar o bem jurídico (patrimônio), desviando a energia de modo incessante, causando prejuízo continuado à distribuidora de energia. Observação interessante, que merece registro, é feita por GIOVANNI GRISOLIA, no sentido de que muitos delitos, considerados instantâneos, podem transformar-se em permanentes, desde que a atividade possa se prorrogar no tempo. Tal situação ocorre porque cada fato-crime é composto por uma conduta conforme a vontade do agente. E cada conduta tem uma dimensão temporal, uma duração, que pode ser brevíssima ou pode estender-se longamente no tempo: tudo depende da natureza da atividade, do bem sobre o qual incide a conduta e da vontade do agente. Uma violência sexual pode estender-se mais ou menos no tempo, por exemplo (Il reato permanente);

3. crimes comissivos, omissivos, comissivos por omissão e omissivos por comissão:

Comissivos são os cometidos por intermédio de uma ação (estupro) Omissivos são praticados através de uma abstenção (omissão de socorro) Comissivos por omissão são os delitos de ação, excepcionalmente praticados por omissão,

restrita aos casos de quem tem o dever, a obrigação de impedir o resultado (Veja o §2º do art. 13 abaixo) nesse caso a omissão do agente equivale à ação/comissão.

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Omissivos por comissão são os cometidos, normalmente, através de uma abstenção, mas que podem ser, excepcionalmente, praticados pela ação de alguém (é o caso do agente que impede (ação) outrem, pelo emprego da força física, de socorrer pessoa ferida)

Código Penal

Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

Superveniência de causa independente

§1º - A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.

Relevância da omissão - (comissivos por omissão)

§2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:

a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; um bombeiro, um policial, um médico mesmo que esteja de folga. b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

CLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES EM FACE DO SUJEITO ATIVO

CRIME COMUM: pode ser praticado por qualquer pessoa. Exemplo: homicídio, furto, lesão corporal, dano, etc.

CRIME PRÓPRIO: exige qualidade especial do sujeito ativo. Exemplo: peculato, corrupção passiva, auto aborto (124, primeira parte). O sujeito ativo é único. Por exemplo nesse crime de omissão: “Art. 269 - Deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória...” o sujeito ativo é o médico (crime omissivo, doloso). Mas existem determinados crimes que não está explicitamente em seu texto quem é o sujeito ativo, em seu teor é possível identificar: “Art. 123. Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após...” O sujeito ativo é a mãe.

CRIME DE MÃO PRÓPRIA: só pode ser cometido pelo sujeito em pessoa. Exemplo: falso testemunho 342 CP, prevaricação, deserção 187 Código Penal Militar. Admite participação moral. Não é possível que o sujeito ativo transfira a conduta para um terceiro. Ele que tem que realizar. “Crime de falso testemunho - Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral...” “Crime de deserção - Art. 187. Ausentar-se o militar, sem licença, da unidade em que serve, ou do lugar em que deve permanecer, por mais de oito dias...”