Crises Da Meia Idad1

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    CRISES DA MEIA IDADE

    Uma das reas de investigao psicolgica com maior produo cientfica a que seocupa do estudo do desenvolvimento humano. Essa rea da psicologia busca o

    entendimento das mudanas que ocorrem com as pessoas no decorrer da vida e, paratanto, leva em considerao as diferenas e similaridades que caracterizam cada faixaetria. Nesses estudos, contudo, as caractersticas biolgicas de cada idade so vistascomo parte apenas de um processo que envolve tambm aspectos socioculturais epsicolgicos conscientes e inconscientes.

    Um desses perodos da vida humana estudados pela psicologia a meia-idade, quecorresponde ao tempo vivido entre os 40 e os 60 anos. comum associar-se esseperodo da vida com turbulncias emocionais, a famosa crise da meia-idade. O termocrise de meia-idade foi cunhado pelo psicanalista canadense Elliot Jaques, em 1965,e, em geral, usado para descrever um perodo de intensa insegurana que sentida por

    alguns indivduos quando ingressam na segunda metade da vida adulta. O gatilho para acrise seria a tomada de conscincia da passagem da prpria juventude e da iminncia davelhice. Assim, a emergncia da crise poderia ser desencadeada por eventos associadosaos processos de ruptura tpicos dessa faixa etria como casos extraconjugais,menopausa, morte dos pais, adoecimento, aposentadoria, sada dos filhos de casa, etc. Oresultado da vivncia desses momentos crticos pode ser um desejo urgente de fazermudanas significativas em aspectos essenciais da vida como na carreira, aparncia,relaes afetivas e outros.

    O conceito de crise da meia-idade, contudo, foi desafiado por um longo estudorealizado por pesquisadores da Fundao MacArthur, nos EUA, e cujos resultadosforam publicados em 1999. O estudo em questo atestou que menos de 10% dos norte-americanos tinha crises psicolgicas devido sua idade. Os autores apontam para o fatode que o tipo de personalidade do indivduo e sua histria de vida seriam os melhoresindicadores de crise na meia-idade em sua forma tradicional. Vrios pesquisadores,porm, reconhecem que os adultos de meia idade tendem a passar por experincias quepodem causar um perodo de estresse psicolgico ou depresso como a morte de entesqueridos ou retrocessos na carreira.

    Nesse sentido, autores como Margie E. Lachman defende a ideia de que no seriapropriamente a idade que produziria conflitos emocionais na meia-idade, mas eventosde vida que so mais recorrentes nessa fase, muito embora esses tambm ocorram em

    outros perodos do desenvolvimento humano.Ampliando-se a discusso sobre a crise da meia-idade para o nvel sociocultural,alguns estudos indicam que certas culturas podem ser mais sensveis a este fenmeno doque outras. H pouca evidncia, por exemplo, de que as pessoas sofram crises de meia-idade em comunidades indgenas. Na sociedade ocidental, ao contrrio, a cultura da

    juventude, que atribui aos jovens os melhores anos da existncia, os maiores encantos

    estticos e um maior nmero de possibilidades de viver a vida, contribuiria para osentimento de que a perspectiva da velhice representa grandes perdas fsicas, cognitivase emocionais. Talvez por isso, pelo fato de que no Ocidente a passagem do tempobiolgico suscite temores de ordem intelectual e afetiva, hoje mais psiclogosreconhecem que a meia-idade caracteriza-se como um momento de reflexo e

    reavaliao da prpria vida. Esse processo de reviso, entretanto, nem sempre

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    acompanhado por uma reviravolta psicolgica que desencadeie atitudes comumenteassociadas crise de meia idade.

    A noo de que o ingresso na meia-idade geraria uma crise de ordem psquicacomeou com seguidores da Psicanlise. Freud defendia que o medo da mortedesencadeado pelo envelhecimento exerceria forte influencia sobre os pensamentos dos

    indivduos. Tericos como Carl Jung e Erik Erikson ajudaram a identificar ascaractersticas psicolgicas dessa fase da vida, definindo conceitos e argumentos queajudam a explicar os comportamentos e as experincias tpicas de quem a vive. Maisrecentemente, os estudiosos do desenvolvimento adulto tm optado por uma abordagempositiva da meia-idade, buscando identificar os fatores fsicos, cognitivos e emocionaisque podem contribuir para o bem-estar objetivo e subjetivo de quem se depara com aperspectiva do envelhecimento. Dentre esses, o psiquiatra norte-americano GeorgeVaillant conduziu um dos estudos mais longevos sobre desenvolvimento humano dahistria da Psicologia. Durante 30 anos ele foi diretor de um projeto da Universidade deHarvard que acompanhou a vida de 824 pessoas durante seis dcadas. Os resultadosdesse estudo apontam vrios aspectos no estilo de vida de uma pessoa que podem

    contribuir para uma vivncia mais satisfatria das vrias fases da vida adulta. O que, emltima instncia, corrobora a ideia de que a meia-idade no seria necessariamente ummomento da vida gerador de transtornos psicolgicos capazes de desestabilizar algumcognitiva e emocionalmente.

    Por um lado, a viso da meia-idade defendida por autores como Jung coaduna-secom as pesquisas sobre o desenvolvimento adulto positivo. Por outro, h divergnciaconsidervel entre o postulado junguiano sobre a meia-idade e os resultados maisrecentes das pesquisas sobre desenvolvimento adulto. A teoria de Jung sobre a meia-idade sustenta que esta fase da vida a chave para a Individuao, um processo de autorealizao e de tomada de autoconscincia. Nessa perspectiva, a primeira metade davida seria marcada pela concentrao da energia psquica na realizao dos processosque nos garantem a sobrevivncia, por uma luta para definir nosso lugar no mundosocial. Na primeira metade da vida, portanto, tenderamos a canalizar nossos esforosfsicos, cognitivos e emocionais para o mundo externo: definindo profisso, adquirindobens, encontrando um parceiro para o estabelecimento de vnculo afetivo estvel,reproduzindo, etc. Ou seja, criando condies minimamente seguras para asobrevivncia.

    Na segunda metade da vida, tendo sido satisfeitas essas necessidades mais bsicasde sobrevivncia, nossa energia psquica se voltaria para o mundo interno. Essamudana de foco seria responsvel por uma crise de identidade, caracterizada pelareviso da prpria vida, crenas, atitudes e valores. O indivduo, ento, comea a se

    questionar internamente quanto validade das escolhas feitas at o momento para o seufuturo. Por exemplo, se j adquirimos alguns bens e no dependemos maisexclusivamente da atividade profissional para garantir comida e abrigo, comeamos aquestionar se a profisso exercida a que realmente gostaramos de ter pelos anos detrabalho que ainda restam. Se tivemos filhos, e eles j no dependem maisexclusivamente de nossa ateno e cuidado para estarem no mundo, comeamos a nosquestionar se o casamento que os gerou merece continuar, se ele traz real satisfao, se realmente o que queremos afetivamente Em funo desse processo de

    questionamento interno sobre a prpria vida, Jung via na meia-idade um evento crtico,muito embora no descrevesse a fase como crise de meia idade por si s. Para ele, aintegrao de pensamento, sensao, sentimento, ao e intuio requerida pelo

    processo de desenvolvimento psicolgico na meia-idade poderia, ao que parece, levar confuso sobre a prpria vida, seus objetivos e realizaes.

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    Em acordo com a viso de Carl Jung, Erik Erikson, que prope uma anlise dodesenvolvimento humano em oito estgios, postula que no stimo, que corresponde meia-idade, as pessoas lutam para encontrar um novo significado e propsito para suasvidas. Para Erikson, essa busca poderia levar ao que hoje chamamos de crise da meia -

    idade. De acordo com esses autores, a vivncia da meia-idade sempre se caracterizapela cobrana interna daquilo que deixamos de desenvolver ao longo da primeirametade da vida. Assim, se fomos materialistas e voltados para o acmulo de bens eriquezas, se colocamos a vida profissional acima de tudo na primeira metade da vida, nameia-idade nos voltaremos (ou sentiremos o impulso para nos voltarmos) para asquestes afetivas e espirituais. Se ao contrrio, tivermos sido sonhadores, idealistas enos esquecido que vivemos num mundo fsico no qual as contas precisam ser pagas,seremos cobrados por isso com a angstia da insegurana material diante do futuro. Ofato que nosso impulso psicolgico ser pela completude, pela retomada do quedeixamos de viver. A maneira saudvel e madura de lidar com isso seria resgatandonossas potencialidades negadas e adormecidas, tendo por objetivo a busca de auto

    realizao. Outra maneira de enfrentar as cobranas internas seria projetando as prpriaspotencialidades no vividas no mundo externo. Isso ocorre, por exemplo, quando sebusca relacionamentos com pessoas bem mais jovens ou opta-se por atividades ecomportamentos caractersticos da juventude. Obviamente, essa segunda estratgia noseria o melhor caminho para a vivncia de amadurecimento psicolgico oferecido pelameia-idade.

    De acordo com a Psicologia do Desenvolvimento humano, toda fase da vida caracterizada por crises de identidade. So momentos em que nos vemos diante denovos desafios fsicos, cognitivos e emocionais, sendo que ainda no nos sentimosplenamente confiantes para enfrenta-los. As demandas que caracterizam a nova etapageram, ao mesmo tempo, insegurana e encantamento, nos faz querer avanar, mastememos faz-lo. Quase sempre, quando nos encontramos na fronteira entre duas fasesdistintas da vida, oscilamos entre o que nos caracterizou at ento e o que podemos serda para frente. Com a meia-idade, que se situa entre a adultez e a velhice, no seriadiferente. A meia-idade, contudo, no culminaria numa crise como a da adolescncia,quando ainda no sabemos o que somos e buscamos nos cones culturais e grupos depares uma identidade que nos diferencie da familiar. A crise da meia-idade, portanto,no seria uma luta entre ns e o mundo, uma luta entre ns e ns mesmos. umcaminho para dentro, para as profundezas do que somos e do que podemos ser. Ditoisso, parece mais fcil entender o porqu de Jung ter associado meia-idade ao processo

    de Individuao.Na perspectiva psicolgica da Individuao, a meia-idade e a emergncia de seusconflitos cognitivos e emocionais, a crise da meia-idade, ofereceria uma oportunidadenica de revisar a prpria vida. Tal reviso propiciaria o questionamento dos papeisdesempenhados durante toda a primeira metade da vida adulta e, consequentemente, aescolha consciente por mant-los, transform-los ou elimin-los. Assim, a meia-idadeabriria espao na vida de uma pessoa para que ela aprendesse a se olhar como mais doque a me/pai de fulano, ou a esposa/marido de cicrano(a), ou a filha(o) de beltrana(o),ou a(o) profissional disso ou daquilo. Seria a chance de resgatar outras personagensperdidas pelo caminho, de despojar-se dos papeis socialmente idealizados quepermitiram participar da luta pela sobrevivncia quando a grande tarefa da vida era

    emancipar-se dos cuidados parentais e atuar no mundo com independncia. Olhando poresse prisma, a crise da meia-idade no seria, como alegam seus crticos, um momento

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    de descontrole psicolgico, de atitudes impensadas e irresponsveis, de comportamentosbizarros. Ao contrrio disso, como atestam os estudiosos do desenvolvimento adultopositivo, a crise seria a condio cognitiva e emocional para a busca de conciliaoentre a vida j vivida e a que se deseja viver.

    Seja como for, o debate sobre se h ou no uma crise de meia-idade continua em

    curso, sendo atualizado por meio de estudos feitos em todo mundo, especialmente hojequando a expectativa de vida cresce e a populao de adultos e idosos cada vez maior.As pesquisas mais recentes tentam averiguar a possvel influencia de fatores objetivos esubjetivos nas experincias vividas pela maioria das pessoas durante a meia-idade.

    Eu mesma estudei o tema durante o mestrado, procurando saber se as experincias dameia-idade apontavam realmente para um processo de Individuao e, mais, se issofavorecia a vivncia de felicidade. Durante minha pesquisa, eu entrevistei e testei amaturidade psicolgica de mais de 100 pessoas entre 40 e 60 anos: casadas, solteiras,vivas, pobres, medianas, ricas, muito ricas, com segundo grau, com graduao, comdoutorado Os resultados que encontrei evidenciaram similaridades cognitivas e

    emocionais tpicas do que se convencionou chamar crise da meia-idade em todos osentrevistados. Angstias, dvidas, incertezas e questionamentos se repetiam em cadadepoimento, em cada testagem, quase como num roteiro pr-estabelecido.Analisando os dados que coletei sobre a meia-idade, fica claro que: para algumaspessoas esse processo era vivido conscientemente, usado para promover transformaesna prpria vida, para buscar a realizao de sonhos abandonados, para resgatarinteresses negligenciados, para reinventar-se. Para outras, os conflitos eram subtradosda conscincia, amalgamados com a correria do dia-a-dia, ilustrados com as explicaesmiditicas sobre a insegurana gerada pelo estresse da vida contempornea. Nessaspessoas, a meia-idade nada mais era do que um espao temporal no qual se vivia arepetio de padres comportamentais alimentados em outros momentos da vida. Osquestionamentos sobre a prpria existncia sucumbiam ao peso das relaes afetivasassimtricas, do adoecimento de fundo psicossomtico, do ganho de peso, da depresso,das disfunes sexuais e de outros sintomas que pareciam sinalizar que o desconfortoquanto ao que era vivido exercia poder de estagnao. E a felicidade? A vivncia dafelicidade, como era de se esperar, apareceu como sendo mais constante para o primeirogrupo, para aqueles que ouviam os prprios questionamentos e tentavam responde-losmovendo-se em direo ao futuro, ainda que esse parecesse incrivelmente assustador.

    http://angelitascardua.wordpress.com/2011/09/27/crise-da-meia-idade-e-felicidade/

    A crise da meia idade, que tambm j foi chamada de idade do lobo e crise dos

    40, reflete uma importante etapa desenvolvimental do ser humano que o atingimento

    do pice da maturidade. Trata-se de uma fase da vida onde somos levados a avaliartanto a vida profissional quanto a vida afetiva, bem como nos deparamos, de fato, com airreversibilidade do tempo.

    Aos primeiros evidentes sinais de envelhecimento (o embranquecimento doscabelos, as rugas, a perda do vigor fsico, entre outros) passamos a questionar a vida emgeral. Perguntas feitas a si mesmo como o que fiz da minha vida passam a ser

    comuns, e a percepo do estreitamento do tempo como resto de vida leva-nos muitasvezes a uma angstia existencial, agravada por temas como aposentadoria e ninho vazio.

    http://angelitascardua.wordpress.com/2011/09/27/crise-da-meia-idade-e-felicidade/http://angelitascardua.wordpress.com/2011/09/27/crise-da-meia-idade-e-felicidade/http://angelitascardua.wordpress.com/2011/09/27/crise-da-meia-idade-e-felicidade/
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    Pode parecer um paradoxo, mas atingir o chamado apogeu da vida faz-nosdescobrir que o mesmo (a plenitude, o apogeu) tem um prazo, isto , vai acabar. Parafrente no h mais crescimento, mas finitude.

    Em algum momento entre os 35 e 45/50 anos muitos de ns percebem que nosomente a vida tem um fim, mas que mais da metade da vida j se passou. como se

    constatssemos que deixamos de crescer e comeamos a envelhecer. Na contabilidadeda vida temos um amontoado de sonhos frustrados e desejos no consumados,principalmente de que no fomos, e provavelmente no seremos jamais, to grandiosose notveis assim.

    Aquela antiga mxima beatnik viva intensamente e morra jovem no pode ser

    mais afirmada, afinal na meia idade podemos morrer de qualquer maneira, menosjovens, pois j no somos.

    Particularmente gosto do termo criado por Oldham ao se referir a esse momento devida: terceira individuao. Como diz Joan Raphael-Left (in Compndio de

    Psicoterapia de Oxford) na meia idade comea nos faltar a proteo parental entre onosso selfe o tmulo, isto , ou nossos pais e tios esto j bastantes velhos e frgeis ounossa gerao ser a prxima a morrer.Mas, ainda temos tempo de vida, ainda temos um tempo a ser vivido. O que fazer comele? Como aproveit-lo ao mximo? Como realizar ainda alguns sonhos frustrados ecomo melhor se auto-realizar? O sentido do self e da vida mudam.E exatamente sobre esta etapa da vida e suas mudanas, assim como seus efeitos, quea Revista Psique (Cincia & Vida) nos traz uma boa matria de capa sobre o assunto,enfocando a meia-idade masculina.