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Cristiane Holzschuh Gonçalves CRIANÇAS INDÍGENAS: UM ESTUDO SOBRE FATORES DE PROTEÇÃO E RISCO PARA O DESENVOLVIMENTO.

Cristiane Holzschuh Gonçalves CRIANÇAS INDÍGENAS: UM

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Cristiane Holzschuh Gonçalves

CRIANÇAS INDÍGENAS: UM ESTUDO SOBRE

FATORES DE PROTEÇÃO E RISCO PARA O

DESENVOLVIMENTO.

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Santa Maria, RS

2008

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CRIANÇAS INDÍGENAS: um estudo sobre os fatores de proteção e risco para o

desenvolvimento

RESUMO

O presente estudo tem por objetivo, investigar os fatores de proteção e risco para o

desenvolvimento de crianças indígenas que transitam entre centros urbanos e

especificamente, conhecer o seu cotidiano, bem como seu processo de socialização e

vínculo. Para isso, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com três pais de

crianças indígenas da etnia Guarani que estão acampados na cidade de Santa Maria-RS.

Os resultados apontaram a existência de fatores de proteção para o desenvolvimento das

crianças como: fortes laços familiares; valorização pelos pais da importância do brincar;

transmissão e conservação dos aspectos culturais indígenas. Já os fatores de risco

encontrados foram: falta de espaço para plantar; renda econômica baixa e instável;

violência física como forma de educação; condições sanitárias precárias e falta de

acesso aos direitos da educação infantil indígena. Diante disso, faz-se necessário que as

políticas públicas existentes para essa população desenvolvam ações voltadas à

ampliação do espaço de terra das aldeias. A falta de espaço faz com que as famílias, ao

migrarem para áreas próximas aos centros urbanos, saiam da zona de proteção dos

órgãos públicos específicos para essa população, tornando-se, assim, mais vulneráveis.

PALAVRAS-CHAVE:crianças indígenas; fatores de proteção e risco; desenvolvimento.

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CRIANÇAS INDÍGENAS: um estudo sobre os fatores de proteção e risco para o desenvolvimento AUTORA: Cristiane Holzschuh Gonçalves

PROFESSORA ORIENTADORA: Monise Gomes Serpa BANCA DE EXAMINADORES: Clóvis Schimitt Souza e Luciane Najar Smeha

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1 INTRODUÇÃO

1.1. A situação indígena atual no Brasil

A situação da população indígena, no Brasil, mudou muito no decorrer da

história. Os índios passaram de donos da terra a seres sem-alma, que precisavam ser

doutrinados ou eliminados. Atualmente, a situação dos povos indígenas intercala-se

entre estas duas concepções sendo, muitas vezes, considerados como benefício

(turismo, preservadores da terra) e como problema (inimigos internos do Brasil na

luta da demarcação das áreas ou externos na disputa pela Amazônia) (COHN, 2001;

CUNHA, 1994 e PEREIRA, 2007).

Sendo assim, as políticas públicas direcionadas a esta população são confusas e

isso ocasiona carência de assistência à saúde, moradia, alimentação e educação.

Uma das questões que impede a construção de políticas públicas adequadas à

população indígena, é pela variedade da sua cultura e conseqüentemente das suas

necessidades (COHN, 2001).

A Fundação Nacional do Índio (FUNAI), que é responsável pela produção e

execução de políticas voltadas à população indígena, afirma que existem no Brasil

460 mil índios, distribuídos em 225 sociedades indígenas que, em sua maioria,

falam a própria língua, totalizando aproximadamente 180 línguas diferentes

(FUNAI, 2008).

Outras estatísticas demonstram que vivem, hoje, no Brasil, 600 mil índios,

incluindo os que vivem em centros urbanos, que não são de responsabilidade da

FUNAI. Esses dados demonstram que há uma parcela grande da população indígena

vivendo nos centros urbanos brasileiros e que não são amparadas pelas políticas

públicas da FUNAI. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística (IBGE) do censo de 2000, 52% da população indígena do Brasil vive nas

metrópoles. Tal realidade gera questionamentos, pois não se sabe se ela está na rua

por desejo próprio, por questões de falta de terra ou por um processo de mudanças

culturais (COHN, 2001; CUNHA, 1994; IBGE, 2002; PEREIRA, 2007 e STOCK,

2006).

Discutindo sobre as transformações da cultura indígena Cohn (2001, p.1) fala:

“É claro que devemos muito aos nossos índios, precisamos deixá-los em paz. A

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questão é como fazer isso.” Vargas (2002) apud Rabinovich (2005) afirma que para

encontrar soluções é preciso discutir a raiz da civilização e isso somente pode ser

feito com um diálogo intercultural, no qual se percebe a realidade dos outros grupos

humanos, transgredindo assim, a barreira do antropocentrismo.

1.2. Os índios no Rio Grande do Sul

De acordo com a Secretaria da Agricultura, o Estado do Rio Grande do Sul tem

uma população indígena de 23.924 pessoas (SEPLAG, 2008). As etnias mais

predominantes no Rio Grande do Sul são Kaingáng e Guarani (ISA, 2008).

O acesso dos índios à saúde teve uma melhora a partir de 1991 com a

implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) e a municipalização. A partir de

1992, a Equipe de Saúde do Índio (ESAI) repassou as responsabilidades de saúde da

FUNAI à FUNASA (Fundação Nacional de Atenção à Saúde) com o objetivo de

promover um trabalho mais preventivo e de atenção primária, sendo que a ESAI

ainda ficou como a responsável do Rio Grande do Sul pelos serviços de atenção

terciária (HÖKERBERG, DUCHIADE e BARCELLOS, 2001).

De acordo com os mesmos autores, os índios que habitam as áreas indígenas do

Rio Grande do Sul têm a vantagem de se concentrarem em áreas próximas entre si e

aos centros urbanos, o que facilita as trocas culturais e seu acesso à saúde. No

entanto, há dificuldade de relacionamento dos indígenas com os profissionais deste

serviço, fazendo-se necessário um maior conhecimento da realidade desta

população. Esta pesquisa, ao cumprir seus objetivos estará auxiliando no

conhecimento da realidade das populações indígenas, com isso, espera-se que as

equipes de saúde entendam os modos de vida indígenas e sua compreensão de saúde

se aproxime do contexto deles.

1.3. Teoria ecológica do desenvolvimento humano

A teoria ecológica tem os processos e as interações como foco principal para

entender o desenvolvimento dos sujeitos. Brofenbrenner, que foi quem desenvolveu

esta teoria, entende que o desenvolvimento humano deve ser entendido,

considerando-se a dimensão temporal, pois este ocorre ao longo do tempo: “O

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desenvolvimento consiste em um processo de interação recíproca entre a pessoa e o

seu contexto, através do tempo, sendo uma função das forças que emanam de

múltiplos contextos e de relações entre eles” (KOLLER, 2004, p.53).

De acordo com a autora supracitada, inicialmente, esta teoria foi criticada pela

demasiada ênfase dos aspectos contextuais sobre os aspectos pessoais do sujeito.

Brofenbrenner, percebendo que o desenvolvimento é um processo de interação

dinâmica de seus fatores, reformulou sua teoria, propondo que este deveria ser

analisado sobre quatro núcleos inter-relacionados: o Processo, a Pessoa, o Contexto

e o Tempo.

O Processo é o constructo fundamental desta teoria e tem como destaque os

processos proximais, os quais podem ser definidos como determinadas formas de

interação entre o organismo e o ambiente. Tal constructo é propulsor do

desenvolvimento, pois envolve, progressivamente, interações mais complexas ao

longo do tempo (KOLLER, 2004).

Segundo Alves et al (1999), o componente Pessoa envolve as características

determinadas biopsicologicamente e as que foram construídas a partir da interação

com o ambiente. Sendo assim, ela é produtora e produto do desenvolvimento.

Existem três grupos de características da Pessoa, que influenciam nos processos

proximais: a força, os recursos biopsicológicos e as demandas.

A força refere-se às disposições comportamentais ativas, geradoras ou

desorganizadas. As primeiras colocam os processos proximais em desenvolvimento

como a curiosidade, respostas à iniciativa de outros e senso de auto-eficácia; e as

disposições comportamentais desorganizadas servem como obstáculo ao

desenvolvimento dos processos proximais como a falta de atenção, apatia e

impulsividade, entre outros (ALVES et al, 1999).

Os autores ainda falam que os recursos biopsicológicos seriam outra

característica e envolvem as habilidades necessárias ao bom funcionamento dos

processos proximais. As competências servem como fator de proteção e propulsão

do desenvolvimento e as deficiências o limitam o que seria um fator de risco para o

desenvolvimento (KOLLER, 2004).

As demandas são aspectos que estimulam ou não a interação do organismo com

o ambiente. Elas podem favorecer ou desfavorecer o desenvolvimento dos processos

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proximais, como a atratividade da aparência física, o temperamento, etc (KOLLER,

2004).

O terceiro núcleo do modelo bioecológico do desenvolvimento é o Contexto, ele

compreende quatro níveis de interação: o microssistema, o mesosistema, o

exosistema e o macrossistema. O microssistema engloba, principalmente, as

relações interpessoais experienciadas face a face, ou seja, no ambiente imediato. É

nesse contexto que operam os processos proximais. O mesosistema pode ser

caracterizado pelos vínculos entre os microssistemas que a pessoa em

desenvolvimento freqüenta. Ele é ampliado cada vez que esta pessoa passa a

freqüentar novos ambientes. Já, o exossistema pode ser um ambiente no qual a

criança nunca participou diretamente, mas tem influência indireta sobre seu

desenvolvimento como o trabalho dos pais ou a comunidade em que a família

pertence. O último nível de interação é o macrossistema e este abrange as crenças,

ideologias, religiões, formas governamentais e subculturas presentes no cotidiano

dessa pessoa (BROFENBRENNER, 1996).

Tempo é o quarto componente do modelo bioecológico e permite analisar o

desenvolvimento sobre uma perspectiva histórica. Este componente compreende as

mudanças e continuidades ao longo da vida deste ser em desenvolvimento (ALVES

et al, 2002).

De acordo com Koller (2004), ele é analisado sobre três níveis. O microtempo

têm relação com a continuidade e descontinuidade nos episódios dos processos

proximais. O nível mesotempo faz menção à periodicidade do processo proximal

através de intervalos de tempos, já que os efeitos cumulativos destes processos

produzirão resultados marcantes no desenvolvimento. O macrotempo refere-se às

mudanças dentro da sociedade, através das gerações e como estes eventos afetam e

são afetados pelos processos proximais da pessoa em desenvolvimento. Todos os

processos proximais, fenômeno essencial do desenvolvimento, adquirem aspectos

psicológicos através da interação entre aspectos geneticamente determinados de

comportamento e os ambientes em que ocorrem.

A partir disso, pode-se questionar como acontecem os processos proximais das

crianças indígenas que transitam em centros urbanos, já que para esta teoria é

preciso certa linearidade de contexto e pessoas para que estes processos possam ter

seguimento. É possível se perguntar, também, sobre o núcleo Pessoa, quanto às

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características de personalidade destas crianças, já que são marginalizadas na maior

parte dos ambientes em que se encontram. Quanto à relação do núcleo Contexto e a

população da pesquisa, é possível questionar sobre a maneira como os sistemas

dessas crianças são compostos, já que seu ambiente de desenvolvimento muda

freqüentemente. Com isso, seus papéis como sujeitos, assim como o de sua família,

também mudam. Já que a teoria ecológica do desenvolvimento humano acredita que

“os processos proximais não podem funcionar efetivamente em ambientes instáveis

e imprevisíveis” (KOLLER, 2004, p.59), é interessante investigar como se

apresentam os aspectos do núcleo tempo, já que as crianças indígenas passam pelo

processo de transitar por vários ambientes urbanos.

1.4. Aspectos culturais indígenas e influência sobre o desenvolvimento humano

A maioria das pesquisas existentes sobre desenvolvimento humano, foi realizada

com a parcela urbana e de classe média da população. Essa parcela desenvolve-se

sobre influências culturais semelhantes. Sendo assim, não é difícil chegar a um

consenso teórico sobre o desenvolvimento desta população. Ao longo da história das

teorias do desenvolvimento humano, os pesquisadores perceberam que alguns

ambientes de desenvolvimento não eram semelhantes aos descritos nas pesquisas

iniciais e percebeu-se a importância da realização de pesquisas com seres humanos

de variadas culturas e ambientes de desenvolvimento (LORDELO, CARVALHO E

KOLLER, 2002; BROFENBRENNER, 1996; SILVA, MACEDO E NUNES, 2002).

A importância das pesquisas realizadas com a população indígena vem ao

encontro disto. Além de a população indígena ser uma minoria racial e cultural,

existem diferenças culturais entre cada etnia e tribo indígena, o que amplia ainda

mais as diferenças de aspectos que influenciam o desenvolvimento humano e que

ainda não são conhecidas (PEREIRA, 2007; BICHARA, 2002; GOSSO, 2005).

A maioria dos índios, que viviam em aldeias indígenas, costumavam andar nus

ou com poucas vestimentas feitas de palha, cordões ou pele de animais. Outras

características culturais apresentadas pelos índios são que eles utilizam-se de plantas

para realizar curas, produzem artesanatos e cultivam a terra da onde tiram seus

alimentos. Moram em ocas construídas com madeira, folhas de bananeira e palha.

Essa é a idéia originária que se tem dos índios do Brasil. Porém, algumas dessas

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características têm sido modificadas ao longo da história, principalmente devido à

aproximação das aldeias dos centros urbanos (COHN, 2001; CUNHA, 1994;

PEREIRA, 2007).

Os índios brasileiros passaram e passam pelo fenômeno da aculturação. Segundo

Sarriera (2004), aculturação é um processo de mudança que acontece quando

pessoas de diferentes contextos culturais passam a conviver e, com isso, há uma

retroalimentação, onde uma cultura influencia a outra. No entanto, é comum que a

cultura minoritária (do índio) seja mais influenciada pela cultura majoritária (do

branco) do que o contrário. Isto é o que acontece quando a população indígena

(minoria) migra para os centros urbanos, ela é influenciada pela cultura capitalista

da maioria e perde muitas de suas características culturais.

Gosso (2005) realizou uma pesquisa com os índios !Kung e observou que estes

mantém os aspectos culturais arraigados. É interessante notar que os bebês !Kung

são carregados pelas mães em uma espécie de tipóia, junto ao corpo, enquanto estas

realizam seus trabalhos. Eles são amamentados conforme a demanda e são

acalentados não somente pelos pais, mas também pelos irmãos e por outros

membros da comunidade. Quando as crianças !Kung estão com aproximadamente

três anos de idade, há uma mudança no tratamento da criança; esta passa a ser

excluída e ignorada para que entenda que ninguém exerce domínio sobre os demais.

Este exemplo, chama a atenção ao ser comparado com a fase do egocentrismo.

De acordo com a teoria de Jean Piaget, é nessa fase que a criança começa a voltar

tudo para si. Poder-se-ia pensar na possibilidade que ao realizar a atitude de ignorar

a criança nesta idade, os !Kung tenham essa fase do desenvolvimento reduzida, o

que pode acarretar outras diferenciações ao longo do desenvolvimento (PIAGET,

1975).

Em pesquisa realizada com o povo Guarani/Kaiowá do Mato Grosso do Sul,

Pereira (2002) observou que as crianças indígenas dessas etnias recebem uma

educação que lhes permite descobrir e explorar o ambiente, podendo fazer isso no

seu ritmo agitado, que eles entendem ser natural das crianças, pois o mundo é cheio

de novidades e acreditam que “quando somos crianças, vivemos por toda parte”.

Esta concepção de infância parece diferente da concepção da civilização branca. O

grande aumento de encaminhamento das escolas para tratamento psicológico de

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Transtorno de Déficit de Atenção e Hipertatividade pode mostrar a diferença dessa

concepção (PEREIRA, 2002, P.170; JERUSALINSKY, 2006).

Estas características são alguns exemplos dos modos de tratar as crianças, que

influenciam o seu desenvolvimento e não são percebidos na maioria das crianças

participantes de pesquisas nesta área. Isso, pelo fato de serem tratadas de outra

maneira e estarem inseridas em outra cultura. As crianças indígenas podem

apresentar comportamentos e características diferenciadas e, por isso, a relevância

de se conhecer seu modo de vida.

1.5. Características gerais dos índios Guarani

A tribo Guarani é uma tribo de índios com características pacíficas e muito

ligadas à religiosidade. É uma das tribos mais populosas do Rio Grande do Sul.

Também, encontram-se índios Guarani em Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do

Sul e na Argentina (SCHADEN, 1962; STOCK, 2006; GRUBITS e DARRAULT-

HARRIS, 2003).

A tribo Guarani é dividida em três subgrupos: os Ñandéva, os Mbü’á e os

Kayová. As diferenças dos três grupos se dão, principalmente, por características

lingüísticas e por peculiaridades na cultura material e concepções religiosas, como

por exemplo, o mito do paraíso (SCHADEN, 1962).

A população Guarani do Brasil conta com 34.000 indivíduos, sendo entre 18.000

e 20.000 da tribo Kaiová, entre 8.000 e 10.000 Ñandéva e entre 5.000 a 6.000

Mbü’á, (ISA, 2008; PEREIRA, 2007).

A atividade econômica natural dos Guarani é a caça, a agricultura e a pesca mas,

atualmente, sentem a necessidade de ampliar suas atividades com a agropecuária e a

venda de artesanatos (SCHADEN, 1962; BARÃO, 2006).

Os índios Guarani têm fé no Deus Criador, chamado por eles de Ñanderú, o qual

deve mandá-los uma terra onde eles possam viver a sua cultura, chamada Terra Sem

Mal. A característica nômade desta tribo está muito relacionada à religiosidade, pois

eles estão numa constante busca pela yvy marã ey, ou Terra sem Mal (BARÃO,

2006).

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2 PROBLEMAS E OBJETIVOS

De acordo com Daronco (2008), desde o início do ano de 2008, 184 famílias

indígenas passaram pela cidade de Santa Maria com o objetivo de comercializar seus

artesanatos. Estas famílias se encontram em situações precárias de moradia, sem água

encanada, sem luz, morando em cabanas de lona e sem as mínimas condições sanitárias.

A maioria delas é composta por crianças que, na maior parte do dia, têm a rua

como lugar para brincar, aprender e relacionar-se. Estas famílias utilizam o centro da

cidade como espaço de convivência e sobrevivência, pedindo esmola ou tentando

vender produtos artesanais. Apesar desta população ser constante na cidade,

principalmente, nas épocas de Páscoa e Natal, não se sabe muito sobre ela. De onde

essas famílias vêm, para onde vão quando não estão aqui, onde moram, as crianças que

acompanham seus pais já estudaram ou estudam em alguma escola, como eles têm

acesso à assistência de saúde, eles mantém aspectos da cultura indígena?

Sendo uma minoria, a população indígena encontra-se marginalizada e está

sofrendo muitos processos de modificação de sua cultura. Será que estas modificações

afetam o desenvolvimento das crianças indígenas? Encontrando-se em um ambiente que

pode ser classificado como de risco, como as crianças indígenas se desenvolvem?

As pesquisas em Psicologia têm discutido as interfaces do desenvolvimento de

crianças que vivem em situações adversas. As famílias indígenas que foram estudadas,

nesta pesquisa, enfrentam muitas situações adversas, podendo, assim ser classificadas

como uma população vulnerável e que se encontram em situação de risco pessoal e

social (ALVES, et al., 1999; KOLLER, 2004).

A população indígena encontra dificuldades de inclusão nas políticas públicas e é

a partir do conhecimento desta realidade que se torna possível nortear o planejamento de

serviços adequados. Lordelo, Carvalho e Koller (2002) consideram que pesquisar a

diversidade de contextos é importante para a Psicologia do Desenvolvimento Humano,

ao mesmo tempo, pode contribuir para as políticas públicas, produzindo modelos de

intervenção adequados à população em questão.

Este trabalho utilizou-se da Teoria Ecológica do Desenvolvimento Humano para

analisar seus dados. Esta teoria se preocupa com as influências dos contextos nos quais

o sujeito está inserido, e dá ferramentas para a sua análise (BROFENBRENNER, 1996).

Partindo-se deste princípio, o foco desta pesquisa foi analisar a fala dos pais das

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crianças indígenas, que vivem entre centros urbanos, bem como analisar os fatores de

proteção e risco para seu desenvolvimento. Pretendeu-se, também, investigar o

cotidiano dessas crianças indígenas que habitam o centro da cidade de Santa Maria-RS e

também perceber como se estabelece o processo de socialização e vínculo das crianças

indígenas.

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3 MÉTODO

3.1. Delineamento

Este estudo é do tipo descritivo-exploratório de cunho qualitativo. Tem como

método o Estudo de Caso Múltiplo.

Uma pesquisa qualitativa, em Psicologia, se preocupa com os complexos

aspectos da subjetividade. Ela busca explicar processos que não são passíveis de serem

fragmentados em variáveis para a realização de uma experiência (REY, 2005). Flick

(2004) diz que a pesquisa qualitativa é muito importante para o estudo das relações

sociais, pois este tipo de pesquisa aprofunda o estudo e possibilita um conhecimento

maior sobre as novas formas de vida, o que é essencial para um mundo que cada vez

mais se pluraliza quanto aos padrões biográficos.

As pesquisas descritivas têm como finalidade a descrição de características de

uma determinada população e o estabelecimento de relações entre as variáveis

encontradas, sendo que, muitas vezes, vai além disso, determinando a natureza dessa

relação. Como afirma Gil (2002, p.42): “ As pesquisas descritivas são, juntamente com

as exploratórias, as que habitualmente realizam os pesquisadores sociais preocupados

com a atuação prática.”

O tipo de pesquisa exploratório tem como principal objetivo proporcionar uma

visão geral de um objeto de estudo, que é pouco conhecido. A obtenção deste

conhecimento, normalmente, é realizada com entrevistas não padronizadas e estudos de

caso (GIL, 1995).

Esta pesquisa realizou três estudos de caso, sendo entrevistadas três famílias

indígenas. Yin (2005) diz que o estudo de caso tem como objetivo investigar um

fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto, sendo que os limites entre o

fenômeno e o contexto não estão muito bem definidos. Esta estratégia também tem

como objetivo expandir teorias, “fazendo uma análise ‘generalizante’ e não

‘particularizante’” (YIN, 2005, p.30).

3.2. Participantes

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Os participantes da pesquisa foram três pais de crianças indígenas, que transitam

em centros urbanos. Estas famílias foram indicadas pela ex-funcionária da Secretaria de

Município de Assistência Social, Cidadania e Direitos Humanos (SMASC) de Santa

Maria, que tem um bom vínculo com as famílias indígenas da tribo Guarani, que moram

na cidade. Os critérios para a seleção dos participantes foram falar e entender a Língua

Portuguesa, ter filhos e se disponibilizar a participar da pesquisa.

O participante A tem 62 anos e está morando na cidade há seis meses. Sempre

foi casado com a mesma esposa e tem oito filhos. Sua ocupação é vender artesanatos e

sua renda mensal é de 50 reais.

O participante B tem 67 anos de idade e mora em Santa Maria há três meses.

Tem três filhos. Ele é aposentado, assim como sua esposa, e sua renda financeira é a da

aposentadoria. No entanto tem uma ocupação que é a plantação de milho, melancia e

mandioca, mas não as vende, somente planta para a sua família se alimentar com esses

produtos.

O participante C é o mais novo dos três. Tem 33 anos de idade e é filho do

participante A. Mora na cidade há nove meses, mas diz que desde os 15 anos de idade

acampa na cidade, por algum tempo, para vender artesanato que é a sua ocupação. Ele

vende o produto no centro da cidade. Sua renda mensal gira em torno de 130,00.

Todos os participantes são do sexo masculino, casados e analfabetos. Eles estão

acampados no mesmo local e se definem como pertencentes à tribo Guarani e têm como

religião a crença em Ñanderú-Tupã.

3.3. Instrumentos

O instrumento para coleta de dados foi uma entrevista semi-estruturada com os

pais de crianças indígenas (Apêndice A). Esta entrevista foi composta de perguntas que

tiveram como objetivo a obtenção de dados biosociodemográficos, sobre moradia,

costumes, família, desenvolvimento dos filhos, lazer, educação, saúde, cidadania e

projeto de vida das famílias entrevistadas.

3.4. Procedimentos

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Com o objetivo de investigar se alguma instituição de Santa Maria é responsável

pela população indígena que transita na cidade, foi feito um contato com a Secretária de

Município de Assistência Social, Cidadania e Direitos Humanos (SMASC) de Santa

Maria. Segundo um profissional desta instituição, as famílias indígenas vêm de outras

cidades para vender seus artesanatos aqui, a fim de aumentar sua renda financeira. De

acordo com o funcionário contatado, nenhum órgão público do município se

responsabiliza pelas famílias indígenas. Contudo, a Prefeitura da cidade e a Diocese

ajudam a população doando cestas básicas e agasalhos ou de alguma outra forma,

quando a população indígena solicita.

Diante disso, buscou-se estabelecer os primeiros contatos diretamente com os

participantes. O centro comercial da cidade foi selecionado como espaço de coleta, por

concentrar um número significativo de famílias indígenas vendendo produtos artesanais.

Em um primeiro contato no local, constatou-se a existência de cinco grupos de famílias

indígenas. Este contato teve como objetivo estabelecer um vínculo inicial e investigar

alguns dados biosociodemográficos. Além disso, investigou-se se as famílias

apresentavam os critérios para a pesquisa como: freqüentar espaços urbanos,

permanecer na cidade em um mínimo de 15 dias, falar fluentemente a Língua

Portuguesa e ter filhos.

Numa segunda ida ao local, percebeu-se que as primeiras famílias contatadas

não se encontravam mais no lugar. No entanto, foi feito o contato com outra família,

mas esta não se adequava aos critérios da pesquisa por morar na cidade há cerca de dois

anos.

Foram realizadas outras tentativas de contato com as primeiras famílias.

Entretanto, essas não foram mais vistas nos lugares da cidade onde a população

indígena costuma vender seus artesanatos.

Através de reportagens publicadas em jornais locais (DARONCO, 2008; SOFIA,

2008) e de informações dadas pela SMASC e pelas primeiras famílias indígenas

contatadas, há um terreno baldio, perto da rodoviária da cidade, onde algumas famílias

indígenas invadiram e estabeleceram este espaço como acampamento. A pesquisadora

observou que havia barracas de lona neste local, mas, ao tentar entrar em contato com as

famílias novamente, não havia mais essas barracas, indicando que essas famílias

retornaram para as suas aldeias.

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Nos poucos contatos realizados com os índios no centro comercial da cidade,

percebeu-se que o local não era favorável para a realização das entrevistas, pela grande

quantidade de barulho e alto fluxo de pessoas. Frente a estas dificuldades, alguns órgãos

da Saúde e a FUNAI foram contatados a fim de buscar uma aproximação com os locais

de origem das famílias contatadas.

Assim, buscou-se a 4ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS), para verificar se

havia algum trabalho realizado por este órgão com a população indígena. De acordo

com um dos profissionais da 4ª CRS, esta instituição não realiza trabalhos direcionados

para este público. No entanto, a 15ª CRS possui, como área de abrangência, algumas

cidades, que contém aldeias indígenas.

A partir deste contato, confirmou-se que os profissionais de saúde da CRS

executam trabalhos em aldeias indígenas. A 15ª CRS proporcionou à pesquisadora o

contato com um dentista, que trabalha nas aldeias. Este, confirmou que trabalhava em

aldeias da tribo Guarani e Kaingáng e é contratado pela equipe de Estratégia de Saúde

da Família (ESF) desse local. O dentista ficou responsável de contatar com o secretário

de saúde da cidade para averiguar a possibilidade de realizar a pesquisa em uma dessas

aldeias. Em outro contato, o profissional informou que quem possibilitava isso eram as

lideranças indígenas, e ele se encontraria com o secretário para confirmar esta

informação.

O secretário da saúde da cidade confirmou que cabem as lideranças indígenas a

autorização para a realização da pesquisa e, por isso, entraria em contato com estas para

averiguar o interesse da comunidade em participar da pesquisa. Foram seguidas as

recomendações, e havia um empregado da FUNASA, assumindo a responsabilidade da

saúde da população indígena da cidade. Este, informou, que durante as campanhas

eleitorais, o contato com as comunidades indígenas estava inviabilizado por decisão dos

próprios índios. Foi respeitado esse prazo e a pesquisadora voltou a contatar com o

funcionário da FUNASA, após as eleições, a fim de averiguar se a liderança permitiria a

realização da pesquisa.

Neste retorno, o funcionário da FUNASA explicou que houve discussões e

brigas entre as aldeias indígenas e entre os índios e os “não-índios” (como nomeia

GRUBITS, DARRAULT-HARRIS e PEDROSO, 2005), e diz que o vínculo deles com

a população indígena, assim como das equipes de saúde que vão até as aldeias estava

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debilitado. Assim, seria complicado eles chegarem às lideranças indígenas e

conseguirem o contato da pesquisadora com a população.

O funcionário da FUNASA passou à pesquisadora o contato da FUNASA de

outra cidade, que é a sede que coordena a maioria das aldeias indígenas do Rio Grande

do Sul, por ser um centro entre elas. Foi colocada a proposta da pesquisa e a funcionária

relatou que, para ter a autorização para a realização desta, teria que ser falado com o

administrador, que estava viajando e voltaria em alguns dias. Então foi passado o

telefone da FUNAI da região para tentar agilizar o processo.

Entrando em contato com a FUNAI, uma funcionária da instituição relatou que

outra aldeia em uma cidade próxima também estava em conflito, mas que poderia ser

passado para outras aldeias próximas. Esta cidade seria a segunda opção da

pesquisadora. Isso, por já ter encontrado famílias indígenas desta cidade no primeiro

contato que realizou com as famílias em Santa Maria. Entretanto, a funcionária da

FUNAI relatou à pesquisadora que, para entrar em aldeia indígena, ela precisaria de

uma autorização da FUNAI, o que demoraria cerca de 30 dias para ser processada. Pelo

pouco tempo que a pesquisadora teria para concluir a pesquisa, esta hipótese foi

descartada.

No entanto, por colegas do curso, ficou-se sabendo de uma pessoa que tinha um

bom trânsito entre os índios da cidade, por ter trabalhado na Secretaria de Município de

Assistência Social, Cidadania e Direitos Humanos (SMASC). Então, foi dado um

telefonema a esta pessoa. Essa, lhe relatou que havia cerca de 10 famílias indígenas da

tribo Guarani, acampadas perto da cidade e se disponibilizou intermediar com as

famílias para saber se elas aceitariam participar da pesquisa. Após, dá o retorno à

pesquisadora.

As famílias aceitaram participar da pesquisa e foi agendando um dia para ir até o

acampamento e realizar as entrevistas. Quando a pesquisadora se encontrou com a ex-

funcionária da SMASC para irem até o acampamento, esta a relatou que um dos índios

havia telefonado para ela avisando que eles não estariam no acampamento, porque

estavam vendendo artesanatos em uma feira da cidade. Então, a pesquisadora foi até a

feira. A família que lá estava é uma família com quem a pesquisadora já havia feito um

primeiro contato no centro da cidade, mas não se enquadrava nos critérios da pesquisa

por morar na cidade e não ter um contexto transicional. Mas frente a aceitação deles em

participar da pesquisa e pouco tempo para tentar contato com outros índios, foi marcado

Page 19: Cristiane Holzschuh Gonçalves CRIANÇAS INDÍGENAS: UM

19

uma nova oportunidade, ou seja, onde a pesquisadora iria acompanhada desta pessoa

que tem um bom vínculo com eles, até o acampamento para realizar as entrevistas lá.

A pesquisadora e a ex-funcionária da SMASC foram até o acampamento dos

índios Guarani. A ex-funcionária apresentou a pesquisadora ás famílias que estavam ali

presentes e foi explicada a proposta da pesquisa. Diante da aceitação dos índios nesta

participação, foi entregue, lido e explicado, pela pesquisadora e pelos filhos dos

participantes, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Como os participantes

são analfabetos, o TCLE foi assinado com a impressão digital dos participantes.

Neste encontro, foram realizadas duas entrevistas com os participantes A e B.

Estas tiveram a duração de uma hora cada e foi agendado um novo dia para realizá-la

com outros participantes, e, ao mesmo tempo, já falavam com outras pessoas da família

dos entrevistados para ver se estas se disponibilizavam.

A idéia inicial era fazer a entrevista com três pais e três mães, abrangendo três

famílias diferentes. Apesar de um das mulheres ter se disponibilizado a participar da

pesquisa e as esposas de dois dos participantes terem falado algumas palavras em

Português com a pesquisadora, o participante C, que foi entrevistado no segundo dia de

contato no acampamento, relatou que nenhuma mulher falava Português, somente

Guarani. Essa divergência entre a observação de que as mulheres falam Português e a

afirmação do participante C, de que elas não falam, é permeada por questões culturais

da tribo Guarani, que será melhor explicada a seguir.

3.5 Procedimentos éticos

A pesquisa seguiu as determinações do Conselho Federal de Psicologia,

Resolução n.16/2000 (2000) e à Resolução n.196 (1996) do Conselho Nacional de

Saúde. A mesma foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Centro Universitário

Franciscano.

A pesquisadora apresentou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

(TCLE) (Apêndice B) e este foi lido e esclarecido para os participantes. As entrevistas

foram realizadas e gravadas após a concordância destes.

A identidade dos participantes foi mantida e, por isso, utilizou-se letras do

alfabeto para identificar os participantes. Para esse fim, também foram destruídas as

fitas onde foram gravadas as entrevistas após a transcrição destas.

Page 20: Cristiane Holzschuh Gonçalves CRIANÇAS INDÍGENAS: UM

20

Após a conclusão do trabalho, será realizada uma devolução dos resultados da

pesquisa para a Secretaria de Assistência Social, Cidadania e Direitos Humanos da

cidade de Santa Maria, a fim de subsidiar os projetos que estejam voltados à população

indígena, assim como para os participantes desta pesquisa.

3.6.Procedimentos para análise dos dados

As entrevistas foram transcritas e os dados separados em categorias, sendo

analisados conforme a técnica de análise de conteúdo de Bardin (BARDIN, 2004). A

análise de conteúdo é um conjunto de técnicas que contribuem para a análise das

informações da comunicação humana, tem como objetivo apurar as descrições de

conteúdo subjetivas, colocando-as em evidência com objetividade. Esta técnica permite

que o conteúdo seja codificado em unidades, o que facilita e aprofunda a sua análise. De

acordo com Bardin (2004, p.36): “(...) o que se procura estabelecer quando se realiza

uma análise, conscientemente ou não, é uma correspondência entre as estruturas

semânticas ou lingüísticas e as estruturas psicológicas ou sociológicas.”

As categorias foram divididas conforme os núcleos da Teoria Ecológica do

Desenvolvimento Humano (TEDH): Pessoa, Processo, Contexto e Tempo. O roteiro da

entrevista foi estruturado de acordo com a divisão de assuntos que facilitariam no

enquadre dentro dos núcleos da teoria.

Conforme as respostas dos participantes foram-se dividindo subcategorias que

tivessem relação com a fala dos participantes e com os núcleos da TEDH. Sendo assim,

o núcleo Pessoa foi subdividido na categoria Saúde/ Integralidade física; Recursos

Biopsicológicos ainda subdividido em Competências e Deficiências; Demandas, sendo

os últimos, os subnúcleos do núcleo Pessoa, segundo a TEDH.

O núcleo Processo foi dividido na subcategoria Brincadeiras. Este núcleo é a

base da TEDH, incluindo os processos proximais que possibilitam o desenvolvimento

humano. Sendo a brincadeira um dos fatores propulsores dos processos proximais,

dividiu-se esta categoria descrevendo as brincadeiras realizadas pelas crianças

observadas.

O núcleo Contexto, sendo muito amplo, foi dividido em várias subcategorias de

acordo com os diversos sistemas incluídos neste núcleo. O Microssistema, sendo o

Page 21: Cristiane Holzschuh Gonçalves CRIANÇAS INDÍGENAS: UM

21

sistema menos abrangente deste núcleo, foi subdivido em três, pois pode-se observar e

entender pelas falas dos participantes que seus filhos fazem parte de três

microssistemas: moradia, família e educação.

Sendo, segundo a TEDH, o Mesossitema um sistema formado pela interação de

microssistemas, as subdivisões incluídas na subcategoria Mesossitema têm na sua

denominação dois tópicos. Cada tópico indica um microssitema do qual a criança

indígena faz parte. Assim, as subdivisões da subcategoria Mesossistema são: trabalho

dos pais e família; escolaridade e tradições culturais e fatores do ambiente e

desenvolvimento infantil.

Na subcategoria Exossitema são analisadas as instituições que influenciam, de

alguma forma, a vida das crianças indígenas, apesar destas não terem um contato direto

com essas instituições. Segundo a TEDH o Exossistema é um ambiente do qual a

criança nunca participou diretamente, mas têm influência indireta sobre seu

desenvolvimento.

A subcategoria Macrossistema inclui grande quantidade de dados por abranger

questões amplas como ideologias, crenças e subculturas na qual a criança está inserida.

Sendo assim, esta subcategoria foi dividida em: cultura; contexto transicional e

cidadania.

A última categoria, sendo também o quarto núcleo da TEDH, é o Tempo. Nesta

categoria foi discutido o fator tempo sobre os processos proximais das crianças

indígenas observadas e quais as influências sobre este.

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22

4 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.1. Pessoa

4.1.1.-Saúde/ Integralidade física

Os participantes alegam que as doenças que sua família costuma ter são gripes e

resfriados. Um dos aspectos observados no comportamento das crianças foi o uso de

roupas não apropriadas para o tamanho e para a temperatura do dia, como pés descalços,

chinelo de dedo, roupas curtas e finas durante um dia frio e chuvoso. Este pode ser um

dado que indique um fator de risco para a saúde das crianças, pois a não adequação da

vestimenta para a temperatura propicia doenças como gripes e resfriados.

Para lidar com as doenças, os participantes relataram que procuram ervas para

fazer chás nas redondezas de onde moram. Schaden (1962) relata que é comum entre os

Guarani a atividade de extração de plantas para uso terapêutico e estes conhecem uma

ampla variedade destas, bem como o seu uso adequado.

Um dos participantes relatou que tem problemas de hipertensão. Ele foi

diagnosticado na aldeia em que morava anteriormente, onde havia uma equipe de saúde.

Para lidar com esse problema ele passou a fazer uso de medicamento anti-hipertensivo e

possui a Carteira de Controle da Pressão Arterial que contém dados sobre o tratamento

feito na aldeia. Porém, ao mudar-se para a cidade não foi possível continuar o

tratamento, pois não sabe onde ou como retirar a receita ou o medicamento.

O participante B relata se sentir cansado e isto o impede de fazer atividades

descritas por ele como prazerosas como pescar e caçar. Esta questão se configura como

um fator de risco para a saúde e bem-estar de B, assim como para o desenvolvimento de

seus filhos que não têm mais a companhia do pai para a realização destas atividades.

Dois dos participantes relataram nunca ter freqüentado um hospital, assim como

seus filhos. Porém, um outro participante explicou que busca o hospital quando não

melhora com o uso dos chás. Tal hábito foi aprendido na aldeia onde morou

anteriormente que era atendida por uma equipe de saúde responsável pelos índios.

Este dado é preocupante, porque mesmo estando saudáveis, as famílias dos

participantes A e C não têm acesso a nenhuma atividade de prevenção à saúde, o que se

configura como um fator de risco para a saúde e, conseqüentemente, para o

Page 23: Cristiane Holzschuh Gonçalves CRIANÇAS INDÍGENAS: UM

23

desenvolvimento de seus filhos. Hökerberg, Duchiade e Barcellos (2001) relatam que as

más condições de vida dos índios refletem no quadro epidemiológico, onde aparecem

óbitos por desnutrição e outras causas que poderiam ser evitados pela atenção primária à

saúde.

4.1.2.1. Recursos Biopsicológicos > Competências

Dentre as competências observadas nas crianças indígenas alvo desta pesquisa,

estão as altas habilidades motoras. Isto pôde ser observado quando um menino estava

brincando com uma faca, fazendo uma estrada no barro para brincar com seus carros de

brinquedo. De acordo com autores, as crianças têm a autonomia para brincarem como

quiserem e com o que quiserem, inclusive, com utensílios domésticos (BICHARA,

2002; SILVA, MACEDO e NUNES, 2002; MOISES e NASCIMENTO,2008).

Outra informação que confirma essas habilidades é o relato de um participante

de que a sua filha de 11 anos já está fazendo artesanatos. O tramar da palha para formar

o balaio é uma atividade complexa, exige uma boa coordenação motora e atenção,

habilidades que esta menina já tem, segundo o relato de C.

4.1.2.2 Recursos Biopsicológicos > Deficiências

Pelo relato do participante C, pôde-se entender que suas filhas são

envergonhadas e tem habilidades sociais restritas, pois segundo o pai: “Elas brincam só entre elas, assim.. Não brincam com mais ninguém porque elas mesmo que não quer, não quer”. (Participante C).

Esta fala de C pode dar indícios de um fator de risco para o desenvolvimento de

suas filhas no que se refere à socialização, pois elas só brincam com as irmãs, mas têm

vergonha de brincar com os parentes e outras crianças que estão na aldeia ou

acampamento.

Uma socialização restrita se configura como um fator de risco, pois pesquisas

mostram que estas crianças tendem a ter pouco envolvimento com suas mães e podem

desenvolver problemas de comportamento (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 2002;

CIA, PEREIRA, DEL PRETTE et al, 2007).

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24

Nesta fala do participante C, também, se percebe que os pais não estimulam à

mudança de comportamento das filhas neste sentido. Isto pode ser justificado, pela

concepção Guarani de que se deve respeitar a personalidade das crianças, o que pode

ocasionar a falta de estímulo e repreensão (SCHADEN, 1962).

4.1.3. Demandas

Comparando com o desenvolvimento dos filhos dos três participantes, as filhas

do participante C foram as que tiveram um desenvolvimento mais semelhante aos

padrões das pesquisas (SHAFFER, 2005; PAPALIA e OLDS, 2000). Segundo C, suas

filhas foram amamentadas até a idade de um ano e oito meses e caminharam com a

idade de um ano e três meses.

Tanto os filhos do participante A, como os de C falaram com a idade de três

anos, o que se difere da idade tendencial para a aquisição de tal habilidade segundo

Shaffer (2005). Talvez a criação em um ambiente bilíngüe tenha dificultado a

aprendizagem da linguagem destas crianças, apesar de os pais falarem com elas

somente na língua Guarani, pois segundo Hakuta (1988) apud Shaffer (2005) as

crianças bilíngües obtêm pontuações menores em testes de conhecimentos lingüísticos

do que crianças monolingües. Pesquisas atuais demonstram que as pesquisas realizadas

com crianças bilíngües na qual mostravam que estas obtinham baixo nível de

conhecimento sobre a linguagem assim como na inteligência geral, eram

comprometidas. A maioria destas pesquisas abrangiam uma população de baixas

condições econômicas e os testes não eram adaptados a esta população, sendo que a

causa para as baixas pontuações nos testes de linguagem poderiam ser devido a outros

fatores do contexto destas crianças que não o bilingüismo, o que pode ser o caso das

filhas de A e C. Os filhos do participante B falaram com a idade de 2 anos, o que está

de acordo com a idade tendencial para a obtenção desta habilidade (SHAFFER, 2005).

Quanto ao caminhar, os filhos dos participantes A e C adquiriram essa

habilidade conforme a idade tendencial, ou seja, entre um ano e um mês a dois anos e

três meses. Já os filhos do participante B se diferiram, pois caminharam por volta dos

três anos de idade.

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25

Os filhos dos participantes A e B tiveram um período de amamentação

prolongado, pois os filhos de A foram amamentados até os três anos de idade e os de B

até os quatro, sendo que o tempo recomendado é até os dois anos de idade (OMS,

2008). Algumas pesquisas com populações indígenas indicam que as crianças são

amamentadas conforme a demanda, não tendo um período indicado para a interrupção

da amamentação (GOSSO, 2005).

Entende-se, então, que o desenvolvimento das crianças indígenas quanto às

habilidades motoras, da linguagem e amamentação é diferenciado, comparado aos dados

das pesquisas descritas por Shaffer (2005). Esta distinção, pode se dar, pela diferença de

contextos das crianças indígenas e das crianças abrangidas nestas pesquisas, que em sua

maioria são realizadas com a parcela urbana e de classe média da população

(LORDELO, CARVALHO E KOLLER, 2002; SILVA, MACEDO E NUNES, 2002).

4.2. Processo

4.2.1. Brincadeira

Observou-se que algumas das brincadeiras das crianças envolvia o manuseio de

sementes para a elaboração de colares com os mais velhos. A função das crianças era

segurar as sementes, assoprá-las para tirar o farelo e as alcançar ao pai/ avô. Nesta

situação, as sementes se configuravam como um brinquedo, ao mesmo tempo em que

eram um treinamento e aprendizado de seu futuro trabalho.

Schaden (1962) fala que são raras as brincadeiras das crianças indígenas que

não reproduzem as atividades dos adultos. Sendo assim, é difícil distinguir a

brincadeira e o aprendizado. De acordo com Calderaro (2006, p. 2), a brincadeira

sempre tem o caráter de intencionalidade no cotidiano das sociedades indígenas, pois

esta se trata de um “rito de aprendizagem, útil e necessário para a convivência

harmônica com os demais membros da comunidade.” O ambiente familiar oferece a

autonomia necessária para a criança experimentar e aprimorar suas habilidades

(MOISES e NASCIMENTO, 2008). Cohn (2000, p.2) considera que a criança, ao

brincar por imitação dos adultos, aprende brincando as habilidades necessárias para

tornar-se um “ser social pleno”.

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26

Outra observação feita das brincadeiras mostrou que uma das crianças, com

aproximadamente nove anos de idade brincava no barro com carrinhos e caminhões de

plástico e construiu uma rampa com o auxílio de uma faca grande. A riqueza da

ludicidade da brincadeira é notável, e isso se configura como um fator de proteção para

o desenvolvimento, assim como produto de um desenvolvimento saudável até então.

Como afirma Santos (2004, p.9), o fato de a criança usar “elementos variados para

montar uma brincadeira pode reafirmar uma alta capacidade adaptativa para a

manutenção de um desenvolvimento saudável”. É comum a criança Guarani ser

caracterizada por notável nível de independência, o que pode ser um fator de proteção

para o desenvolvimento (SHADEN, 1962; SILVA, MACEDO E NUNES, 2002;

BICHARA, 2002; MOISES E NASCIMENTO, 2008; GOSSO, MORAIS E OTTA,

2006; COHN, 2000) . Bichara (2002) observou em sua pesquisa com índios Xocó em

Sergipe que a maioria das crianças costuma usar utensílios domésticos em suas

brincadeiras sem que haja restrições dos pais, pois isso não é considerado um fator de

risco na visão dos adultos.

Já com outras crianças, observou-se a brincadeira com carrinhos de plástico e

bola. De acordo com os pais, a maioria destes brinquedos foram doados a eles e outros

foram comprados pelos pais. Somente o participante B relatou que os filhos nunca

tiveram brinquedos comprados, mas eles fabricavam seus brinquedos na aldeia. Este

fato exemplifica a aculturação de algumas crianças que cresceram próximos aos centros

urbanos, diferente de crianças que cresceram em aldeia indígena (SILVA, MACEDO e

NUNES, 2002).

Todos os participantes relataram que costumam brincar com os filhos, o que se

configura como um fator de proteção para o desenvolvimento deles ( SHAFFER, 2005;

BROFENBRENNER, 1996; BOWLBY, 1998-2001). Entre as brincadeiras que

costumam ou costumavam fazer com seus filhos estão: bola, carregar nos ombros, “dar

susto” e “pega-pega”. Essas brincadeiras servem para ampliar a relação afetiva entre

pais e filhos e também são resultados desta. Brofenbrenner (1996) relata que a relação

afetiva positiva entre duas pessoas aumenta a probabilidade de aceleração do ritmo dos

processos desenvolvimentais. Assim a situação acima relatada se configura como um

fator de proteção para desenvolvimento das crianças.

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27

4.3. Contexto

4.3.1.1. Microssistema - Moradia

O espaço de moradia dos participantes é localizado na beira da estrada que

separa a cidade do município vizinho. É uma região industrial e possui um alto fluxo de

carros e caminhões. Há, aproximadamente, sete casas feitas com vários materiais, entre

eles, pedaços de madeira, taquara e lonas de plástico. As casas se situam próximas uma

da outra, separadas por cerca de cinco metros, sendo algumas maiores que as outras. A

maioria delas mede em torno de 3x4 metros e têm o teto baixo. De acordo com Schaden

(1962), a grande parte das casas dos índios Guarani têm poucos metros quadrados e é

reduzida na altura, sendo feita de pau a pique ou de estacas de bambu rachado.

O local é cercado por montanhas e vasto gramado verde. Nessa mata, os

participantes procuram material para fazerem os artesanatos, ervas medicinais quando

estão doentes e utilizam um pequeno espaço para plantar legumes como milho,

melancia e mandioca. No entanto, segundo um dos participante, eles não podem

explorar a área por não saberem a quem pertence todo o espaço. Porém, ele relatou que

uma parte do terreno, atrás do acampamento é de amigo seu, permitindo, assim, que ele

usufruísse do espaço na coleta de material para a construção da casa.

No acampamento não há energia elétrica, nem esgoto. Sobre o lixo, os

participantes relataram que não o colocam para a coleta do caminhão da prefeitura,

sendo que eles mesmos o queimam. O acesso à água é feito por um rio próximo ao

acampamento e por uma mangueira localizada na sua frente, disponibilizada pela

Diocese da cidade. É nesse local que eles fazem suas necessidades fisiológicas e higiene

pessoal. Em uma das visitas ao acampamento para a realização das entrevistas,

observou-se uma menina de aproximadamente sete anos de idade, atravessando a

estrada, segurando pela mão outras duas crianças menores. O fato de o “banheiro” se

localizar do outro lado da estrada se configura como um fator de risco, pois as crianças

precisam atravessar a estrada movimentada para chegar até lá, correndo o risco de sofrer

acidentes.

Nenhum dos participantes conhece o que há nas redondezas do acampamento.

Isto pode ser configurado como um fator de risco, pois eles não têm uma rede de apoio

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28

próximo à moradia, e quando necessitam algo precisam se deslocar até o cento da

cidade.

De acordo com o participante C, eles escolheram aquele lugar para morar por ser

próximo ao centro da cidade e facilitar a venda dos artesanatos. Um outro motivo foi

por haver um rio por perto onde podem pescar, assim como uma ampla área verde para

retirar materiais para o artesanato e podem caçar. Entretanto, o acampamento não se

localiza próximo ao centro da cidade, sendo necessário o uso do ônibus.

A questão do espaço para plantar e explorar a terra é considerada a mais

preocupante e a de maior risco, pois os participantes consideram a plantação algo muito

importante para eles e para o desenvolvimento saudável de seus filhos. Barão (2006,

p.200) explica que quando os índios Guarani estão acampados na beira da estrada, o

espaço e a ocupação ficam mais restritos, sendo que este local não se configura como

um “lugar para criar a família”. No entanto, a beira da estrada está na lógica de

ocupação territorial Guarani, mas como um local transitório, apenas para facilitar a

venda dos artesanatos da qual o lucro é necessário para sua subsistência.

4.3.1.2. Microssistema- Família

Schaden (1962) fala que as habitações indígenas restringem-se à família nuclear.

Tal fato foi observado nas famílias estudadas. Nelas, pais e seus filhos casados moram

separados com a sua família nuclear.

A família nuclear é constituída a partir do casamento, no qual eles saem da

moradia dos pais e passam a morar junto. Apenas um dos participantes conheceu a sua

esposa fora da aldeia que morava. A sua esposa foi para outra cidade com ele, deixando

a família dela de origem, o que não é de costume dos Guarani, pois segundo Grubits,

Darrault-Harris e Pedroso (2005, p.368): “A filha casada, fica perto da mãe”. Vejamos: “É, quando eu tinha 16 anos. Eu foi na... Eu saí da minha mãe e foi em Argentina. É pra procurar né? (risos) Procurar casar né? E aí conheci ela. Eu casei com ela, até hoje. Daí ela veio embora pra cá e não voltou mais pra lá.”(Participante A).

Os três participantes casaram com mulheres da tribo Guarani. De acordo com

Schaden (1962), os índios Guarani são encontrados especialmente nos Estados de

Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul e na parte setentrional da Argentina.

O participante C relatou que eles não comemoram o casamento com festa,

somente passam a morar em outra casa com a esposa, após o pedido do noivo para o pai

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29

da noiva e a permissão dele. O participante A sempre foi casado com a mesma esposa e

tem oito filhos, ou quatro casais, como ele relatou. Alguns de seus filhos que são

casados, ficaram no acampamento onde morava anteriormente e outros três, que são

casados vieram juntamente com ele, assim como seu filho pequeno de três anos de

idade.

O participante B tem três filhos, sendo que o mais novo tem 13 anos.

Atualmente, ele mora com a esposa, o filho mais velho e o filho mais novo. Porém, o do

meio ficou no acampamento onde morava anteriormente.

O participante C mora com a esposa e três filhas, uma de 11 anos, outra de sete e

outra de quatro anos. Ele tem um bom contato com a maioria dos irmãos, pois alguns

ficaram morando nas cidades onde já morou anteriormente. Convive com o pai e a mãe

e eles também auxiliam na educação de suas filhas.

Os pais dos participantes A e B já faleceram. No entanto, o participante B

relatou que sua mãe auxiliava na criação de seus filhos quando era viva. De acordo com

outros estudos, as crianças indígenas tendem a ter influência na sua educação de

qualquer membro da família (COHN, 2000- 2005; SCHADEN, 1962; SILVA,

MACEDO e NUNES, 2002; BRADT, 1995).

Durante a realização das entrevistas, foi possível observar a interação entre os

familiares. Uma menina observada segurava um bebê recém-nascido no colo, trazendo-

o para a avó. Logo em seguida, a avó o amamentou com mamadeira, pois segundo o

participante, ele não consegue mamar no seio de sua mãe. É comum entre os índios as

crianças tomarem conta umas das outras, não necessitando a presença de adultos. Mas,

quando o bebê é de colo, pela necessidade de amamentá-lo, a ausência dos adultos não

dura por muito tempo (BICHARA, 2002; NUNES, 2002).

Os participantes A e C, ao falarem sobre um momento feliz de suas vidas,

disseram recordar os momentos com a família. O participante A contou que ele e a sua

família ficaram muito felizes quando o seu primeiro filho nasceu. Tal fato pode indicar

um fator de proteção para o desenvolvimento das crianças, por estas terem sido bem

aceitas pela família, pois como afirma Bradt (1995) uma criança se desenvolve melhor

quando a família é mais receptiva a ela. Somente o participante B relatou ter se sentido

feliz e um pouco assustado. De acordo com autores, é comum que a transformação

repentina de papel social e de identidade, que a paternidade traz, seja um pouco

assustadora (MALDONADO, 1996; BRADT, 1995).

Page 30: Cristiane Holzschuh Gonçalves CRIANÇAS INDÍGENAS: UM

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O parto das esposas dos três participantes foram todos normais, realizados

dentro da casa que habitavam e com o auxilio das irmãs, sogras ou mães dos

participantes. As mulheres mais velhas da tribo Guarani, muitas vezes, são as parteiras

da comunidade e praticam a “medicina natural”, servindo assim como “guardiã das

tradições”. Isto pode se configurar como um fator de proteção, pois esta é uma das

características da cultura Guarani e sendo assim eles mantém aspectos da sua cultura

(GRUBITS, DARRAUL-HARRIS e PEDROSO, 2005, p.368). Na cultura não-índia

isto pode ser considerado um fator preocupante, no sentido de aumentar os riscos de

saúde para a mãe e para o bebê caso aconteça alguma complicação e não haja a

assistência adequada.

4.3.1.3. Microssistema-Educação

Segundo os participantes, os pais e as mães têm o mesmo papel na educação dos

filhos. Os três participantes relataram que ensinam os filhos a trabalhar e fazer

artesanato para os ajudarem. Isto pode se configurar como um fator de proteção no

sentido que eles estimulam os filhos a seguirem seu exemplo e permitem que seus filhos

aprendam as tradições de sua cultura. Tal procedimento evita o processo aculturativo

que pode trazer conseqüências prejudiciais ao desenvolvimento das crianças pela

discrepância dos valores introjetados por elas (SARRIERA, 2004). Entretanto, alguns

autores não consideram a aculturação um fator de risco, justificando que este é um

processo inevitável e que não aumenta o risco da perda da cultura indígena, sendo que

esta não se perde, somente se re-constitue adquirindo uma identidade diferenciada

(COHN, 2001; CUNHA, 1994)

Os pais começam a ensinar os seus filhos quando eles estão entre as idades de 8

a 10 anos. Sendo também nesta idade o aprendizado da Língua Portuguesa. Na cultura

não-indígena, é nessa faixa-etária que as crianças passam a freqüentar a escola e ter

acesso a um aprendizado formal. Mesmo não relatando o porquê do início dos

ensinamentos se darem nesta fase, pode-se entender que os participantes têm uma noção

de que as capacidades e habilidades das crianças mudam a partir dessa idade. Segundo

Piaget (1975), nesta fase a criança é capaz de cooperar, adquire uma nova lógica de

pensamento que a permite refletir e passa a estruturar a realidade pela própria razão,

Page 31: Cristiane Holzschuh Gonçalves CRIANÇAS INDÍGENAS: UM

31

estando assim, aberta a novos ensinamentos e com grande habilidade para captá-los com

rapidez. Vejamos o que um dos participantes diz: “Quando são muito pequenos, muito pequenininho assim, só sabe brinca, né? Não sabe, não quer, fazer nada. Ensino. Assim, quando ta grande assim, né? Desde 8,9 anos O que eu mandava assim, fazer as coisas pra mim, ou vão lá... Só brinca até os 7, 8 anos, aí já sabe trabalhar já. . Nessa idade já sabe fazer, o que mandar tem que fazer. Sabe trabalhar, fazer alguma coisa, ajuda pai e mãe, né?”(Participante A)

Nesta fala, observa-se um fator de proteção, pois o participante demonstra ter a

noção de que criança deve brincar. A brincadeira ajuda a desenvolver o equilíbrio, o

controle, a coordenação dos olhos, o domínio do corpo, juntamente com a coordenação

motora, que levam a criança a ter sentimentos de confiança e valor pessoal

(BROFENBRENNER, 1996; MOYLES, 2002; PIAGET, 1975).

Outro fator de proteção seria a interação entre pais e filhos e os ensinamentos.

Ao realizar essa atividade, há o fortalecimento da relação pai-filho, assim como do

vínculo entre esses. A realização de uma atividade conjunta se configura como uma

aprendizagem, pois a criança tende a treinar a atividade quando não está na presença do

pai, o que a faz avançar nas suas habilidades e favorecer o desenvolvimento de seus

processos proximais (BROFENBRENNER, 1996).

Dentre as coisas que os participantes consideram erradas para uma criança fazer

estão: brincar de uma maneira que a outra criança não gosta; bater nos outros; roubar;

mentir e mexer em objetos como artesanatos para a venda que os pais não deixam

mexer. O participante A relatou que já viu seus filhos fazerem o que ele considera

errado, como bater nos irmãos ou amigos. Diante disso, ele alerta verbalmente os filhos

assim como C. E caso isso não funcione, A utiliza um galho de árvore para bater neles.

Esta maneira de educar se configura como um fator de risco, pois a violência física pode

causar danos psicológicos e físicos, que podem prejudicar o desenvolvimento infantil

(GUERRA, 2001; HUTZ, 2005). A atitude do participante ao repreender os filhos, vai

de encontro às tradições Guarani e pode-se pensar que este foi um aspecto introjetado

por ele no processo aculturativo, pois de acordo com Schaden (1962), os Guarani

respeitam a personalidade e a vontade individual das crianças, o que torna praticamente

impossível o processo repreensivo na educação destas.

Já, o participante C, relata que o modo de ensinar as filhas a não fazerem mais o

que considera errado, é falar para que não façam mais isso e diz que elas sempre

obedecem. Apesar desse participante ser filho da outra família estudada (família A), a

maneira de educar os filhos se difere. Entretanto, deve-se levar em consideração que C

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32

só tem filhas mulheres. Nesse grupo observado, as mulheres tendem a ser submissas aos

homens, o que pode ter, como conseqüência, a maior obediência das filhas mulheres do

que dos filhos homens (GRUBITS, DARRAULT-HARRIS e PEDROSO, 2005).

Na fala do participante A, notou-se certa relação de poder entre ele e os filhos,

na qual ele manda os filhos fazerem algo para ele, como alcançar coisas e ajudar os pais

nas tarefas da casa. Brofenbrenner (1996) explica que é importante para uma criança

aprender a lidar com relações de poder, pois estas também se configuram como uma

aprendizagem, que contribui para seu desenvolvimento cognitivo e social.

O participante B relatou que os filhos nunca fizeram algo errado, pois sempre

estão perto de adultos. Isso, no entanto, pode se configurar como um fator de proteção,

pois mostra que as crianças estão sempre sobre um cuidado adulto, mas pode se

configurar como um fator de risco, pois pode desencadear um vínculo dependente, o

que prejudica a autonomia da criança e, conseqüentemente, seu pleno desenvolvimento

(BROFENBRENNER, 1996; BOWLBY, 2001).

4.3.2.1 Mesossistema > Trabalho dos pais e família.

Mesmo esta categoria tendo sido classificada como mesossistema, o que

subentende a interelação entre dois microssitemas, é importante ressaltar que esta

distinção não é muito nítida nas famílias observadas. Nelas, o trabalho dos pais e a

família, muitas vezes, ocupam o mesmo espaço e são facilmente confundidos, não

chegando a classificarem como microssitemas diferentes.

Com a exceção do participante B, que é aposentado, os demais têm a ocupação

com a produção de artesanato como: balaios de palha, bichos esculpidos em madeira e

colares de sementes. Eles expõem alguns artesanatos que produzem na entrada do

acampamento, mas o principal local de venda é no centro da cidade.

São as mulheres que costumam ir ao centro vender os artesanatos, algumas

vezes acompanhadas de um dos homens do acampamento e de seus filhos. Os homens,

principalmente, os mais velhos, costumam ficar em casa, produzindo os artesanatos ou

procurando material para fazê-los.

Todos os participantes disseram gostar de seu trabalho. O participante C disse

que o que mais gosta de fazer são as esculturas de bichos em madeira, por vendê-las

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33

mais. Alguns animais esculpidos por eles são: tatu, cobra, capivara, onça e coruja. A

coruja foi, relatada como a preferida por ela trazer sorte.

O fato de todos os participantes gostarem do trabalho que fazem ou faziam,

pode ser considerado um fator de proteção para as crianças, pois estas também estão

presentes no ambiente de trabalho dos pais. A insatisfação no trabalho dos pais pode

levar a um ambiente estressor em casa, o que se configura como um fator de

vulnerabilidade. Já no contexto observado, a relação dos pais com o trabalho se

configurou como um fator de proteção para o desenvolvimento das crianças

(SELIGMANN-SILVA, 1994).

O participante B é aposentado, assim como sua mulher, então a renda dele é

estável, o que se configura como um fator de proteção para o desenvolvimento de seus

filhos. Já os outros participantes também têm como ocupação fazer artesanato, que

vendem no centro da cidade. O participante C disse que a renda mensal gira em torno de

130,00.

Pôde-se perceber tanto pela fala do participante C, quanto pela fala do

participante A, que a renda financeira é instável e insuficiente para sustentar a família,

configurando-se como um fator de risco para o desenvolvimento de seus filhos. A renda

precária tem efeito na qualidade de vida dos participantes, pois ambos falaram que

gostariam de comprar mais alimentos como frutas, legumes e carne, mas não o fazem

porque esses produtos são muito caros.

O participante C relatou que desde a adolescência trabalhava em fazendas

vizinhas ao acampamento ou aldeia onde morava. Dentre as atividades que fazia estava

carregar e cortar lenha, plantar e capinar. Ao falar sobre seu trabalho, C contou: “ Do meu trabalho eu gosto. Melhor é bichinho. Que tão levando mais

também.” Pela fala do participante C, percebe-se que o seu maior gosto é produzir o

artesanato que vende mais. Schaden (1962) diz que muitos Guarani encontram-se

aculturados economicamente, impulsionados pela necessidade de se obter dinheiro para

comprar coisas que a cultura Guarani não consegue fornecer. Pela falta de terra para

plantar e conseguir a sua alimentação, o Guarani precisa de dinheiro para comprá-la.

Sendo assim, aceita muitas ofertas de trabalho que, até então, eram desconhecidas para

ele, como: “trabalho remunerado em fazendas e propriedades próximas; exploração da

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natureza ambiente com intuito comercial (...); vendas de produtos agrícolas e

expedições de mendicância aos centros urbanos” (SCHADEN, 1962 p.62).

4.3.2.2. Mesossistema > Escolaridade e Tradições culturais.

Todos os três participantes são analfabetos, não sabendo ler e escrever nem em

Português nem em Guarani ou Mbü’á. Os filhos do participante B estudaram em escolas

indígenas na aldeia que moravam anteriormente e sabem ler e escrever em Português e

em Mbü’á, que é o nome da língua que eles falam.

Somente um dos participantes relatou que deseja que seus filhos aprendam a ler

e a escrever, além de trabalhar fazendo artesanato. Também sempre desejou que os

filhos estudassem tanto Português como Mbü’á. Este desejo do participante B se

configura como um fator de proteção, tanto pelo desejo de manter a cultura, quanto por

considerar que a aprendizagem do Português é importante para a autonomia deles.

O aprendizado de outra língua, atualmente, se configura como fator de proteção

para o desenvolvimento das crianças, pois estão cada vez mais próximas dos centros

urbanos. Com isso, há a necessidade de que falem Português para serem mais

autônomos, e poder reivindicar seus direitos e, de acordo com um dos participantes,

para poderem comprar as coisas que precisam no cento da cidade.

Apesar de a Constituição Federal do Brasil, aprovada em 1988, propor a

educação intercultural e bilíngüe para as crianças indígenas do Brasil, somente os filhos

do participante B estudaram nessas escolas, sendo que os filhos dos participantes A e C

não usufruíram desse direito. De acordo com Campos : (...) o acesso à educação escolar do ‘branco’ é reconhecido como imprescindível para a formação da consciência a respeito de suas próprias culturas, de seus direitos, além de ser reconhecido como um instrumento de defesa frente ás ameaças encetadas por parte de grupos sociais integrantes da sociedade brasileira, (...) (CAMPOS, 2008, p.6).

As filhas do participante C estudaram em escola por pouco tempo, mas ele não

soube dizer qual tipo de escola. Além disso, em nenhum momento ele citou que achava

importante que elas estudassem. De acordo com C, na cultura Guarani as mulheres não

falam português. Porém, nos contatos realizados com as mulheres, foi possível perceber

que algumas mulheres falam fluentemente o Português.

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Pelo projeto da pesquisa, objetivava-se ter como participantes três pais e três

mães de crianças indígenas, mas isso não foi possível por estas não falarem Português,

segundo o participante C. De acordo com a ex-funcionária da SMASC, mesmo ela

tendo vários anos de contato com os Guarani, consegue falar pouco com as mulheres,

pois estas são caladas e os homens tendem a responder por elas. Assim, o fato de as

filhas do participante C não estudarem pode ser configurado como um fator de proteção,

já que não rompe uma tradição da cultura Guarani.

Segundo alguns autores, as mulheres Guarani costumam ficar em casa, enquanto

o homem vai ao centro da cidade em busca de sustento. Com isso, o homem vai

formando uma identidade de homem da cidade e as mulheres têm o papel de guardiãs da

cultura, mantendo os costumes e tradições e passando-os aos filhos. Nas entrevistas, não

foi observada essa distinção de papéis, pois segundo os participantes, tanto homem

quanto mulher tem o mesmo papel na educação dos filhos. Como foi relatado pelos

participantes, quem mais costuma ir ao centro da cidade para vender artesanato são as

mulheres e não os homens, o que difere da observação dos autores (GRUBITS e

DARRAULT-HARRIS, 2003; GRUBITS, DARRAULT-HARRIS e PEDROSO, 2005).

Possivelmente, a forma que esses índios Guarani encontraram de manter sua

cultura e de colocar a mulher como guardiã desta, foi a impossibilidade de estas falarem

com não-índios, ou falarem o menos possível de Português, mantendo, assim, a língua e

as tradições Guarani. Entretanto isso é contraditório, pois são as mulheres que vão com

maior freqüência ao centro para vender artesanato, mas falam pouco Português, sabendo

somente o necessário para realizar a venda.

4.3.2.3. Mesossitema > Fatores do ambiente e desenvolvimento infantil

De acordo com os participantes A e C, o lugar onde estão acampados não é o

ideal para criarem seus filhos. Neste local, os participantes têm acesso á água; estão

cercados por grande quantidade de árvores, o que lhes permite tirar o material para seus

artesanatos e os remédios para passar suas dores. E ainda podem caçar e pescar.

Entretanto, não há espaço suficiente para plantar. Ao ser perguntado o que não gosta na

sua vida, atualmente, o participante A disse: “Assim de... Não tem pra criança, pra viver, assim. Pra viver criança tem que ter planta boa, melancia, batata, mandioca, milho, assim. A criança gosta também de milho verde, assim..”(Participante A)

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A questão da terra configura-se como um fator de risco para o desenvolvimento

das crianças, pois de acordo com o participante A, nesse acampamento, as crianças não

estão nas condições ideais de vida como eles a consideram. Segundo Schaden (1962),

para o Guarani, a preocupação com o desenvolvimento da criança diz respeito ao seu

bem-estar físico e o seu crescimento, o que pode ser entendido pela fala de A.

Segundo o participante A, quando os seus filhos o acompanham no centro da

cidade pedem os brinquedos que vêem nas lojas e ele compra. Já, o participante C diz

que suas filhas não pedem para ter brinquedos, mas diz que elas brincam com os

brinquedos dos tios e primos e têm alguns brinquedos que foram doados como

carrinhos de plástico e bola. Essa situação é mais um sinal do processo aculturativo que

enfrentam estas crianças indígenas que passaram a brincar com os brinquedos comuns

entre as crianças urbanas.

4.3.3.1 Exossitema

Entendendo como exossistema um conjunto de fatores que influenciam o

ambiente do sujeito diretamente, mesmo este não fazendo parte dele, elegeu-se algumas

instituições que podem influenciar no ambiente dessas crianças indígenas

(BROFENBRENNER, 1996). A Fundação Nacional do Índio- FUNAI e a Fundação

Nacional de Atenção à Saúde- FUNASA, podem ser algumas dessas instituições.

Apesar de, atualmente, estas instituições não se responsabilizarem por índios que não

estão morando em reservas indígenas, alguns dos participantes já moraram nessas

reservas e foram atendidos por esses serviços. Segundo o participante C, eles esperam

que essas instituições venham a se responsabilizar por eles novamente e diz estar

esperando por uma demarcação de terra.

Pelo o que foi observado na fala do participante C, a Diocese da cidade tem

influência sobre o ambiente de seus filhos. De acordo com o participante, esta

instituição os ajuda, dando roupas, brinquedos e alimentos para eles. Além disso, a

igreja os auxilia a aumentar sua renda, pois os avisam sobre feiras que acontecem na

cidade para que possam obter mais lucro com a venda de seus artesanatos. A influência

da Diocese da cidade, também, foi observada a partir de uma reportagem, que afirma

que a Diocese, juntamente com a Secretaria de Município de Assistência Social,

Cidadania e Direitos Humanos (SMASC) da cidade, juntos têm um projeto de construir

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uma casa do índio para abrigar os índios que transitam pela cidade (DARONCO,

2008). Sendo assim, a SMASC e a Prefeitura da cidade (da qual esta secretaria faz

parte) também tem influência sobre o ambiente das crianças indígenas pesquisadas,

assim como o Ministério Público Federal, que, segundo Daronco (2008), se

responsabiliza por estas famílias.

4.3.4.1 Macrossistema > Cultura

Durante a realização das entrevistas, observaram-se animais mortos dentro das

casas, nas árvores e no chão. O participante C relatou que foi ele quem caçou os animais

vistos ali, pois eles costumam comê-los. Os animais mortos perto das crianças podem

ser configurados como um fator de risco para a saúde, pois podem transmitir algumas

doenças. No entanto, a caça faz parte da cultura indígena e seria um fator positivo para o

desenvolvimento dessas crianças pelo fato de seus pais manterem a sua cultura

(SCHADEN, 1962).

Ao ser pedido que o participante B contasse algum momento feliz de sua vida,

este respondeu que ficava feliz quando pescava e caçava. Schaden (1962) ilustra a

resposta de B dizendo que o Guarani não é capaz de conceber sua vida sem a caça e a

pesca. Além da valorização da caça e da pesca, o plantio também foi muito valorizado

por todos os participantes, sendo a possibilidade de ter mais espaço para plantar o único

aspecto que mudariam em suas vidas.

Os três participantes relataram que os alimentos que suas famílias comem são

arroz, feijão e farinha de trigo, de milho e mandioca. Relataram que comem estes

alimentos por serem os mais baratos para comprar, sendo que frutas, legumes e carnes,

por serem considerados muito caros, comem raramente. Eles relataram que gostam

muito de milho, melancia e mandioca e que gostariam de plantar esses por serem

considerados mais saudáveis para as suas crianças. A fala dos participantes em relação

à alimentação demonstra que esses mantém a cultura Guarani, pois o tipo de alimento

que eles costumam comer estão de acordo com a sua cultura, conforme relata Schaden

(1962).

Em dias de festa como na comemoração do Dia do índio, aniversários ou Natal,

eles fazem algumas comidas especiais, que não costumam comer normalmente como

carne, galinha, milho, batata e comprar refrigerante. De acordo com Schaden (1962), os

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alimentos mais consumidos pelos índios Guaranis são mandioca, milho, feijão, farinha

de milho e de mandioca. A necessidade e o desejo de se plantar esses alimentos está

ligada a uma questão cultural, pois segundo o autor supracitado, o milho está associado

ao mundo sobrenatural e a mandioca, batata e feijão estão relacionados às cerimônias

Guarani.

O participante B relatou que, em dias de festa, eles costumam beber “pinga e

cerveja”. Mesmo não tendo observado nenhuma situação envolvendo o uso de álcool

abusivo, tal fato deve ser analisado já que a questão do alcoolismo é muito freqüente

entre as populações indígenas. Se o uso de bebida alcoólica por esta comunidade for

abusivo, isto se configura como um fator de risco para o desenvolvimento das crianças,

pelas várias conseqüências que o alcoolismo pode trazer, como: violência entre os

familiares, acidentes, quedas, atropelamentos, diminuição de habilidade para o

trabalho, assim como as diversas co-morbidades decorrentes disso (cirrose, hipertensão

arterial, etc.) (GRUBITS e GUIMARÃES, 2007).

O nome dos participantes são nomes comuns entre a cultura não-índígena. E

seus sobrenomes também não continham elementos lingüísticos diferenciados. No

entanto, ao observar o participante C chamar uma das filhas por um nome que não

coincidia com o que havia falado, foi perguntado se eles costumavam se chamar por

outro nome quando estavam entre eles. Ele relatou que usam o nome na língua

Guarani, que é dado pelos pais, mas enviado por Ñanderú-Tupã. Porém, quando estão

com brancos por perto, se chamam pelo nome que está em sua carteira de identidade,

que é um nome em Português. Foi perguntado o nome do participante e seu significado

e este relatou que o significado de seu nome, assim como do nome de seus familiares,

tinham relação com Ñanderú.

Ao perguntar aos participantes se estes cantam ou ensinam músicas a seus

filhos, a maioria disse que já ensinou. O participante A relatou que ensinava música a

seus filhos mais velhos e esses, depois, ensinam aos mais novos. Disse que eles

ensinam somente música na Língua Guarani e que elas falam sobre Ñanderú. Vejamos: “Música? É Ñanderú. E Ñambotã Mbaraká: É tocar violão. E aí cantam né?”(Participante A)

O mbaraká é um chocalho de cuia com o qual os homens marcam o compasso

das danças religiosas, enquanto as mulheres usam o takuapú, ou seja, um bastão de

ritmo (SCHADEN, 1962). O participante B disse que ensinou músicas tanto em

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Português quanto em Mbü’á para seus filhos. Estas músicas falam sobre natureza, sobre

a tradição Guarani e sobre a importância dos velhos.

Com esta pergunta, ficou mais evidente a aculturação que sofre a família do

participante C, pois este diz que para que suas filhas aprendessem mais as músicas da

cultura Guarani, comprou um cd de músicas Guarani que havia na aldeia onde morava

anteriormente em Porto Alegre. O participante C também falou que eles não costumam

dançar ou cantar, pois não têm violão e para dançar precisam ter violão para tocar as

músicas. Segundo Schaden (1962), o violão faz parte dos rituais Guarani, apesar de

índios tocarem o instrumento de forma primitiva e diferente da maneira tocada pelos

não-índios. A carência deste instrumento está afetando a prática de sua cultura, o que

pode aumentar seu nível de aculturação e isto pode se configurar como um fator de risco

para o desenvolvimento das crianças.

Quando foi perguntado sobre as características de sua tribo, os participantes

tiveram dificuldade em responder e fizeram isso comparando a índios de outras tribos

ou aos não-índios. O participante A foi o único que explicou o que é ser branco, fazendo

um paradoxo com o que é ser índio. Ele também relatou que o branco é a pessoa para

quem ele pede as coisas quando precisa, o que pode demonstrar que este tenha uma

visão de que o branco é assistencialista e que esta é a cultura dominante, o que pode ser

configurado como um fator de risco, pois sendo assim a sua cultura perde valor. Este

relatou que da cultura do branco ele gosta de algumas coisas, mas gosta mais da sua

cultura. Disse que o que não gosta em ser índio é a questão da diferença da língua, pois

fala que as pessoas não o entendem quando ele fala sua língua.Vejamos: “Dos Kaingáng. É diferente. A língua que é diferente. Os artesanatos dos Kaingáng e do Guarani é diferente. Tudo é diferente. Sim, os desenho é diferente. Tudo é diferente, né? Por causo... ah o branco é muito diferente. Os brancos nunca vai mora assim... embaixo da barraca assim. Não mora assim. Agora o Guarani e os Kaingáng sim. Os Kaingáng é parecido com os Guarani. Mas os Kaingáng querem andá como os branco, usa qualquer.. queria pagar casa. Agora, os Guarani não. Eu não, eu quero viver só assim mesmo. Quero morar sempre assim né?(Participante A)

Como foi relatado por todos os participantes, a tribo Guarani é muito diferente

da tribo Kaingáng e a comparação entre essas duas talvez seja feita por serem essas as

duas tribos mais comuns no Rio Grande do Sul. Stock (2006) ao comparar essas duas

etnias diz que o Guarani tem uma tradição pacífica e repleta de religiosidade, já os

Kaingáng são hostis, tanto entre si, quanto com outros grupos. Para Schaden (1962), a

atitude dos Guarani frente aos outros grupos, principalmente, os Kaingáng, é ou de

medo ou de ridicularizarão destes.

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O participante B define que ser índio e ser Guarani é saber e gostar de pescar e

caçar e por poder fazer isso é que gosta de ser Guarani. O participante C relatou que

também gosta de ser Guarani, mas diz que seu cunhado saberia explicar melhor o que é

ser Guarani, o que mostra o seu pouco conhecimento sobre a própria cultura. Entretanto,

C atrela a sua indianidade à Deus ou Ñanderú.

Tanto o participante B quanto o participante C relataram não saber o que é ser

branco. No entanto o participante B relatou que o que gosta da cultura branca é o direito

à aposentadoria, que é algo que usufrui e lhe traz benefícios. Este participante ainda

relatou que o que não gosta da cultura branca é que o branco rouba e mata. Já o

participante C relatou não gostar de nada da cultura branca. Porém, relatou que compra

CDs para as filhas e usa celular que são aparelhos inventados pelos brancos.

Nos dados relatados, a definição sobre a cultura branca mostrou-se de forma

ambígua, ora entendida como ameaçadora, ora sendo protetiva. Os aspectos entendidos

como positivos da cultura estão relacionados à ideologia capitalista. A aproximação

com a cultura branca fez com que os índios se apropriassem da lógica de mercado,

fazendo uso dos aparelhos utilizados pelo cidadão urbano.

Para se divertir os participantes relataram que costumam conversar com os

familiares. O participante A diz:

“Fica só... contando causo, conversa assim com todo mundo aí” (Participante A).

A fala de A pode indicar que este tem uma boa socialização o que pode servir de

exemplo para que os filhos tenham uma boa socialização também (CIA, PEREIRA,

DEL PRETTE et al, 2007). O participante B diz que costuma contar piada e cantar para

se distrair e faz isso, normalmente, com a sua esposa e filhos. Já, o participante C diz

que o que mais o distrai é o convívio com as crianças, o que indica um fator de proteção

para o desenvolvimento dessas, pois essas têm um papel importante na vida dos pais.

4.3.4.2. Macrossistema > Contexto Transicional

Os três participantes disseram que têm fé em Deus, o qual chamam de Ñanderú,

e, segundo o participante C, Ñanderú-Tupã. Todos os participantes tiveram dificuldade

em responder e entender a pergunta sobre o que Ñanderú faz ou significa para ele. O

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participante A não soube responder, já o B disse que canta para Nãnderú e o

participante C, disse: “È que é..., nós tamu vivendo assim, como se diz... não... Se eu não acredito assim, o Deus não...,eu não teria assim, achado um lugar, o meu lugar pra plantar as coisas e se eu não acredito não tem, é o Deus mesmo que manda”.(Participante C)

Esta fala do participante C é sobre o sentido da terra para os Guarani, dizendo

que o lugar onde eles moram é também escolhido por Ñanderú. Nenhum dos

participantes mora na cidade por mais de nove meses, ou seja, eles são nômades e as

crianças vivem em contextos transicionais. Ao ser perguntado sobre quanto tempo

estava na cidade, o participante B respondeu: “ Três meses. Vamos ficar aqui por mais um ano. (...) gostamos daqui, mas depois tem que mudar”.(Participante B)

Na fala de B, percebe-se a característica nômade desta população. Sua família é

a que apresenta um contexto transicional mais acentuado, comparado aos outros

participantes. Isso se explica pelo fato deste participante pertencer ao subgrupo Mbü’á,

da tribo Guarani, que conforme Schaden (1962) é o grupo mais nômade dos três grupos

de Guarani.

Todos os três participantes se caracterizaram como índios Guarani, no entanto

somente o participante B disse que o nome de sua língua não é simplesmente Guarani,

como afirmaram os outros participantes, mas Mbü’á, o que o caracteriza como

pertencente a essa subdivisão. Moises e Nascimento (2008) relatam que o grupo

Ñandeva é o grupo que se autodenomina de Guarani, podendo-se entender que os

participantes A e C, possivelmente fazem parte desse grupo.

O aspecto transicional do Guarani é uma questão cultural e espiritual, pois são

“errantes em busca sem fim da Terra Sem Mal” (BRANDÃO, 1990, p.1). Barão (2006)

relata que os Guarani buscam o Mbyárekómeme, que seria o lugar onde eles sentem que

vivem a sua cultura. Sonho de um líder da aldeia ou de alguém da família que seria

enviado por Ñanderú, tragédias ocorridas com alguém da família, morte, acidente ou

doença, seriam fatores que levam os Guarani, principalmente os Mby’á a abandonar a

casa e estar sempre em movimento.

Segundo Grubits e Darrault-Harris (2003) o lugar de moradia para os Guarani é

um ato criativo dos deuses. Sua terra serve como lugar estruturante da organização

social, onde o Guarani concretiza o seu modo de viver e dialoga com as divindades.

4.3.4.3. Macrossistema > Cidadania

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42

O participante B foi o único que relatou ter votado nas últimas eleições, assim

como sua esposa. O participante A não votou nestas eleições por ter perdido sua

Carteira de Identidade, o que impossibilitaria a computação de seu voto. Já o

participante C, mesmo tendo 33 anos de idade, nunca votou, nem sua esposa. Este dado

indica que eles podem ser negligentes com a questão da cidadania por não se sentirem

incluídos nas políticas públicas, sendo este um dado real, já que esperam a demarcação

de área indígena para que possam morar legalmente.

Ao serem perguntados sobre o que pensam do centro da cidade, todos afirmaram

gostar de ir até lá e que nunca sentiram nenhum preconceito, assim como nenhuma

pessoa os tratou mal. C ainda diz que sente que as pessoas gostam muito do seu

trabalho. Esta percepção deles pode se configurar como um fator de proteção para o

desenvolvimento das crianças, pois ao sentirem-se bem-quistos pela população, sentem-

se valorizados e transmitem isso para os filhos, que, possivelmente, também percebem

esta valorização por freqüentarem o ambiente de trabalho dos pais.

4.4. Tempo

Mesmo as crianças observadas, atualmente, apresentarem um bom

desenvolvimento quanto à capacidade motora e de ludicidade, elas tiveram um

desenvolvimento diferenciado do tempo padrão, nos seus anos iniciais. De acordo com

o relato dos pais, a maioria das crianças caminhou com a idade de dois a três anos de

idade, sendo a idade tendencial para o surgimento do caminhar entre um ano e um mês a

dois anos e três meses. Na fala a maioria das crianças analisadas também não

coincidiram com a idade tendencial. Pois, segundo o relato dos pais, elas falaram com a

idade entre dois a três anos de idade, sendo a idade tendencial de obtenção desta

habilidade a idade entre um ano e meio a dois anos de idade (SHAFFER, 2005).

Há a probabilidade, de que, estas diferenças nas idades de obtenção de

habilidades no desenvolvimento das crianças, além de outros fatores, tenham como

causa a instabilidade do ambiente devido ao contexto transicional no qual estão

inseridas. A teoria ecológica do desenvolvimento acredita que um ambiente instável e

imprevisível pode causar a não efetividade completa dos processos proximais,

retardando alguns aspectos do desenvolvimento (KOLLER, 2004).

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na realização desta pesquisa, foram observados diversos fatores de proteção e

de risco para o desenvolvimento das crianças indígenas. O mais significativo deles é a

boa relação afetiva que as crianças têm com seus pais e familiares. Isto foi observado

nas trocas de carinho, nos ensinamentos da produção dos artesanatos, nas brincadeiras,

nos relatos de momentos de lazer compartilhados, na ênfase dada pelos pais às relações

familiares.

Mesmo as famílias entrevistadas encontrando-se, de certa forma, aculturadas,

elas mantém alguns aspectos da sua cultura. A língua é um deles, sendo que o

Português somente é ensinado quando as famílias consideram a criança apta para

aprender e já introjetou grande parte dos valores da cultura Guarani.

A produção dos artesanatos e o ensinamento do modo de fazê-lo, também, é

um fator presente. Este processo possibilita a aprendizagem de muitos outros valores,

assim como o aprimoramento da motricidade fina e criatividade das crianças que

também aproveitam este momento para brincar e se relacionar com a família.

Não é muito fácil distinguir os momentos de brincadeira das crianças, dos

momentos de aprendizagem da cultura e das habilidades que os pais consideram

importantes (SCHADEN, 1962; CALDERARO, 2006; MOISES e NASCIMENTO,

2008; COHN, 2000; BICHARA, 2002). Nos poucos momentos nos quais aparece esta

distinção, há grande influência da cultura não-indígena, pois foi observado o uso de

brinquedos de plástico industrializado.

Entre os fatores de risco para o desenvolvimento das crianças Guarani, pode-se

citar a renda econômica baixa e instável, os aspectos aculturativos, a violência física

como forma de educação, a falta de alimentos saudáveis, as condições higiênicas e

sanitárias precárias, a falta de acesso aos direitos da educação infantil. Quando as

famílias moravam em aldeias indígenas elas eram incluídas em políticas públicas, da

FUNAI e FUNASA. Entretanto, segundo os participantes essas políticas não eram

adequadas, pois não disponibilizavam o espaço necessário para todas as famílias

plantarem para a sua subsistência. A falta de espaço para estas famílias plantar e

praticar os seus costumes também impossibilita a auto-sustentabilidade delas no espaço

da aldeia. Tal fato faz com que as famílias busquem outras formas de sustento como a

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venda de artesanato e o trabalho remunerado (SCHADEN, 1962; COIMBRA e

SANTOS, 2000;BARÃO, 2006).

Para que ocorram as vendas, é preciso que estas famílias se aproximem dos

centros urbanos. Ao deixarem a aldeia, as famílias saem da área protegida pela FUNAI

e FUNASA, ficando, assim, desassistidas pelas políticas públicas. Além desse aspecto,

ao se aproximarem dos centros urbanos, essas famílias passam a conviver com os

problemas inerentes a população socioeconomicamente vulnerabilizada. O somatório

destes fatores deixa as famílias mais vulneráveis e aumenta os fatores de risco para o

desenvolvimento das crianças indígenas.

Entre as limitações do estudo, considera-se que a não participação das mães nas

entrevistas mostrou uma visão parcial da família. Outra limitação foi o não

conhecimento da pesquisadora da Língua Guarani e a pouca fluência dos participantes

na Língua Portuguesa. Isso fez com que o conteúdo das respostas ficasse restrito as

palavras conhecidas em português pelos participantes, dificultando a análise do

conteúdo.

Espera-se que esse trabalho possa contribuir para a criação e reformulação de

políticas públicas voltadas a esta população a fim de potencializar os fatores de

proteção e minimizar os fatores de risco para o desenvolvimento das crianças

indígenas. Para isso, faz-se necessário conhecer os aspectos singulares da cultura e da

realidade de cada tribo indígena e, com isso, os índios possam ser ouvidos e tratados

como sujeitos de direitos.

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REFERÊNCIAS

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APÊNDICE A- Roteiro da entrevista

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Entrevista semi-estruturada

1-Dados biosóciodemográficos:

Nome:

Idade:

Escolaridade:

Ocupação:

Composição familiar:

Renda:

Religião:

2- Moradia:

-Onde você mora?

-Como é a sua casa?

-O que tem por perto?

- Você costuma freqüentar os lugares da redondeza?

-O que mais gosta?

-Tem luz, água, esgoto, coleta de lixo?

3-Família:

-Os seus pais são vivos? Tem contato com eles?

-Qual é a cidade de origem da sua família?

-Alguma vez sua família morou em aldeia indígena?

-Como é realizado o casamento e formada a família para vocês?

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-Como é o nome dos seus filhos? Quem os escolhe? O que significam?

3-Educação:

-O que você espera que o seu filho seja quando ele crescer?

-Existe algo que você considera errado para uma criança fazer? O quê?

-Se o seu filho faz alguma coisa que considera errado, como ele é ensinado a não fazer mais isso?

-Há punição quando os filhos fazem algo que consideram errado? Como é essa punição?

-O que você considera importante para a educação do seu filho?

-Quando seus filhos os acompanham nos centros urbanos, eles pedem para ter algo que vêem nas lojas?

-Qual é o seu papel (pai/mãe) na vida de seu filho?

-Alguém da família lhe ajuda na educação dos seus filhos? Como?

4-Costumes:

-As roupas que vocês usam são compradas por vocês, doadas ou fabricada por vocês?

-O que sua família costuma comer?

-Canta cantigas para os filhos? Como são essas cantigas? Onde aprendeu? Quem ensinou?

-Você tem alguma religião? No que acredita?

-Que datas vocês costumam comemorar? Como é esta comemoração?

-Faz parte de alguma tribo/etnia? Qual?

-Quais as características dos índios dessa tribo/etnia?

-Qual a língua originária dessa tribo/ etnia? Sempre falou português? Se não, como aprendeu?

-Para você, o que é ser índio?

-O que você gosta da cultura indígena? E o que não gosta?

-O que é ser branco?

-O que gosta da cultura branca? E o que não gosta?

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5-Desenvolvimento:

-Como você reagiu quando soube que seria pai/mãe? Como reagiram os demais familiares?

-Como foi o parto?

-Até que idade seus filhos foram amamentados?

-Com que idade os seus filhos falaram?

-Com que idade eles caminharam?

-Freqüentam ou freqüentaram a escola? Onde? Que tipo de escola?

6-Lazer:

-O que costumam fazer para se divertir?

-Os pais costumam brincar com os filhos? De quê?

-Quais as brincadeiras que seus filhos costumam fazer?

-Eles têm brinquedo? Como são esses brinquedos? São comprados ou produzidos por alguém da família?

-Com quem os seus filhos brincam?

7-Saúde e cidadania:

-Sua família costuma ficar doente? Que tipo de doença? O que fazem quando isso acontece?

-Você vota?

-O que vocês pensam do trabalho que fazem?

-O que vocês pensam sobre o centro da cidade?

-Onde seus filhos ficam enquanto trabalham? O que eles fazem?

-Você se considera índio (a)?

-Você considera que sofre algum tipo de preconceito?

9- Projeto de vida:

- O que você mais gosta na sua vida? O que menos gosta?

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-O que mudaria?

-Conte-me um evento bom da sua vida.

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APÊNDICE B- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

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Termo de Consentimento livre e esclarecido

Pesquisa: Crianças indígenas: um estudo sobre fatores de proteção e risco para o

desenvolvimento.

Pesquisadora responsável: Cristiane Holzschuh Gonçalves

Orientadora: Monise Gomes Serpa

1- O que é esta pesquisa: Você está sendo convidada a participar desta pesquisa,

que tem como objetivo identificar os fatores de risco e proteção para o desenvolvimento

de crianças indígenas que transitam entre espaços urbanos a partir da fala de suas

famílias.

2- Quem participa da pesquisa: 3 pais e 3 mães de crianças indígenas que trabalhem

no centro da cidade de Santa Maria, que falem fluentemente Português e permaneçam na

cidade pelo mínimo de 15 dias.

3- Envolvimento na pesquisa: Depois que você entender a finalidade da pesquisa,

solicitamos a sua autorização para que a pesquisadora possa entrevistá-la. As entrevistas

acontecerão no local onde as famílias trabalham. Estão previstos mais de um contato com

cada participante, sendo, no mínimo, três entrevistas, de uma hora cada. Como se trata de

um tema que pode trazer lembranças e sentimentos desconfortáveis, durante a entrevista

você terá espaço para falar livremente sobre o que quiser. Você tem a liberdade para não

falar e de se recusar a participar em qualquer fase da pesquisa, sem qualquer prejuízo para

você.

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4- Sobre as entrevistas: A primeira entrevista será realizada no primeiro contato e

se sua família permanecer na cidade pelo mínimo de 15 dias, serão realizadas as outras

entrevistas, cujo dia e horário será marcado neste primeiro contato. Serão feitas

perguntas sobre a sua vida, moradia, família, educação, costumes, desenvolvimento dos

seus filhos, lazer, saúde e cidadania e projeto de vida.

5-Confidencialidade: Todas as informações coletadas nesse estudo são

estritamente confidenciais. A sua identificação será preservada em todas as etapas desse

estudo. As gravações e os relatos de pesquisa serão identificados por um código

numérico, escolhido de forma aleatória, para que as suas informações permaneçam em

sigilo. Os dados coletados serão arquivados no Centro Universitário Franciscano-

UNIFRA.

6-Benefícios: Ao participar desta pesquisa você estará contribuindo com

informações importantes sobre a realidade dos índios no Rio Grande do Sul. Espera-se

que essas informações sejam utilizadas em benefício das famílias indígenas que transitam

em centros urbanos.

7-Pagamento: Você não terá nenhum tipo de despesa por participar desta pesquisa,

bem como nada será pago por sua participação.

8-Contato com os pesquisadores: Caso queria entrar em contato conosco, o telefone

da pesquisadora é (55) 3217-1903 ou (55) 99137009 e da orientadora desta pesquisa é

(51)-84686419.

Após estes acontecimentos, solicitamos o seu consentimento de forma livre para

participar desta pesquisa. Portanto, preencha os itens que seguem:

CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

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Tendo em vista os itens acima apresentados, eu, de forma livre e esclarecida,

Manifesto meu interesse em participar da pesquisa.

__________________________________________ Data: ___/___/____

Assinatura da participante da pesquisa

_____________________________ ______________________________

Cristiane Holzschuh Gonçalves Profª. Monise Gomes Serpa