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ANO XV / N ANO XV / N ANO XV / N ANO XV / N ANO XV / N 0 26 26 26 26 26 22 Introdução Na década de 1970, o Brasil esteve empe- nhado em um esforço nacional sem precedentes no sentido de acelerar o processo do seu desen- volvimento econômico-social, pela utilização ra- cional e adequada de suas terras e dos seus po- tenciais. Para tornar possível este mister, neces- sário se tornou criar condições de fixação do homem, de bases para seu empreendimento, de transportes para escoamento de seus produtos e dinâmica em suas comunicações; em síntese: in- terligação, estradas. Como um dos instrumen- tos dessa rápida aceleração de desenvolvimen- to, empenhou-se o governo da época em um gi- gantesco programa de ampliação das fronteiras econômicas, a ser obtida pela colonização de im- portante parte de seu território. Múltiplos fatores nortearam a definição dos traçados a implantar: nossa extensão territo- rial, de dimensões continentais; a distribuição ir- regular da população, concentrada então em ape- nas 500 quilômetros de faixa litorânea; a necessi- dade de vivificação de 15.700 quilômetros de fron- teiras com nove dos onze países da América do Sul; a disposição e as características de nosso rele- vo e de nossa hidrografia; a diversidade de recur- sos por explorar; e o estágio de produção e de con- sumo das áreas desses recursos. Na verdade, eles traduziram os imperativos geográficos, sociais e econômicos. Ao lado desses fatores geopolíticos e geográficos – condicionantes da malha viária – , alinhavam-se também determinantes de caráter político-estratégico. O governo do Presidente Médici instituíra, por meio do Decreto-Lei 1.106, de 16 de julho de 1970, o Plano de Integração Nacional - PIN. Seu principal objetivo era interligar o Brasil e pro- mover o desenvolvimento das regiões menos fa- vorecidas como o Norte e o Nordeste. Além de construção de importantes estradas na Amazô- nia, aquele plano previa outros investimentos de vulto como o voltado à indústria e à criação das primeiras centrais nucleares em Angra dos Reis, Uma estrada rasgando a floresta Cuiabá – Santarém Cuiabá – Santarém Cuiabá – Santarém Cuiabá – Santarém Cuiabá – Santarém: Cuiabá – Santarém Cuiabá – Santarém Cuiabá – Santarém Cuiabá – Santarém Cuiabá – Santarém: Coronel QEM Fernando de Castro Velloso A estrada BR-163 Cuiabá- Santarém foi concebida como parte do programa para inte- grar a Amazônia ao território brasileiro, no iní- cio dos anos 70. Teve como objetivo promover a expansão da agropecuária e a ocupação de gran- de vazio demográfico. Confiada a dois batalhões de Engenharia do Exército Brasileiro, em sua implantação atravessou a riqueza da biodiver- sidade da região – decorrente da coexistência de diferentes biomas – e três grandes bacias hidro- gráficas – rios Teles Pires-Tapajós, Rio Xingu e Rio Amazonas – que drenam a região. Neste trabalho apresentam-se aspectos ligados à sua locação e comenta-se a respeito de seu momento atual. Uma estrada rasgando a floresta

Cuiabá – Santarém Cuiabá – Santarém: Uma estrada …teiras com nove dos onze países da América do Sul; a disposição e as características de nosso rele- ... nhando em sentidos

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ANO XV / NANO XV / NANO XV / NANO XV / NANO XV / N00000 26 26 26 26 2622

Introdução

Na década de 1970, o Brasil esteve empe-nhado em um esforço nacional sem precedentesno sentido de acelerar o processo do seu desen-volvimento econômico-social, pela utilização ra-cional e adequada de suas terras e dos seus po-tenciais. Para tornar possível este mister, neces-sário se tornou criar condições de fixação dohomem, de bases para seu empreendimento, detransportes para escoamento de seus produtos edinâmica em suas comunicações; em síntese: in-

terligação, estradas. Como um dos instrumen-tos dessa rápida aceleração de desenvolvimen-to, empenhou-se o governo da época em um gi-gantesco programa de ampliação das fronteiraseconômicas, a ser obtida pela colonização de im-portante parte de seu território.

Múltiplos fatores nortearam a definiçãodos traçados a implantar: nossa extensão territo-rial, de dimensões continentais; a distribuição ir-regular da população, concentrada então em ape-nas 500 quilômetros de faixa litorânea; a necessi-dade de vivificação de 15.700 quilômetros de fron-teiras com nove dos onze países da América doSul; a disposição e as características de nosso rele-vo e de nossa hidrografia; a diversidade de recur-sos por explorar; e o estágio de produção e de con-sumo das áreas desses recursos. Na verdade, elestraduziram os imperativos geográficos, sociais eeconômicos. Ao lado desses fatores geopolíticos egeográficos – condicionantes da malha viária – ,alinhavam-se também determinantes de caráterpolítico-estratégico.

O governo do Presidente Médici instituíra,por meio do Decreto-Lei 1.106, de 16 de julho de1970, o Plano de Integração Nacional - PIN. Seuprincipal objetivo era interligar o Brasil e pro-mover o desenvolvimento das regiões menos fa-vorecidas como o Norte e o Nordeste. Além deconstrução de importantes estradas na Amazô-nia, aquele plano previa outros investimentos devulto como o voltado à indústria e à criação dasprimeiras centrais nucleares em Angra dos Reis,

Uma estrada rasgando a florestaCuiabá – SantarémCuiabá – SantarémCuiabá – SantarémCuiabá – SantarémCuiabá – Santarém:Cuiabá – SantarémCuiabá – SantarémCuiabá – SantarémCuiabá – SantarémCuiabá – Santarém:

Coronel QEM

Fernando de Castro Velloso

A estrada BR-163 Cuiabá-Santarém foi concebida comoparte do programa para inte-

grar a Amazônia ao território brasileiro, no iní-cio dos anos 70. Teve como objetivo promover aexpansão da agropecuária e a ocupação de gran-de vazio demográfico. Confiada a dois batalhõesde Engenharia do Exército Brasileiro, em suaimplantação atravessou a riqueza da biodiver-sidade da região – decorrente da coexistência dediferentes biomas – e três grandes bacias hidro-gráficas – rios Teles Pires-Tapajós, Rio Xingu eRio Amazonas – que drenam a região. Nestetrabalho apresentam-se aspectos ligados à sualocação e comenta-se a respeito de seu momentoatual.

Uma estrada rasgando a floresta

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na cidade do Rio de Janeiro (Complexo NuclearAlmirante Álvaro Alberto), já então começan-do-se a pensar em formas alternativas de expan-dir nossa matriz energética. Nessa época, carac-terizada como “O Milagre Econômico”, o Brasilcrescia à razão de 12% ao ano.

O PIN previa que cem quilômetros emcada lado das estradas a serem construídas deve-riam ser utilizados para a colonização, objetivan-do assentar cerca de 500 mil pessoas, em uma metaambiciosa de constituição de agrovilas. Alicerça-dos nesses argumentos nasceram à época doisgrandes projetos rodoviários, constituídos de es-tradas de rodagem de caráter pioneiro: a Transa-mazônica, com cerca de 4.200 quilômetros decomprimento, ligando a cidade de Cabedelo, naParaíba, a Lábrea, no Amazonas, cortando seteestados brasileiros (Paraíba, Ceará, Piauí, Mara-nhão, Tocantins, Pará e Amazonas) e estabelecen-do ligação da região mais oriental da América doSul com a rede rodoviária peruana, chegandoassim do Atlântico ao Pacífico, após vencer amaior floresta tropical do mundo; e a Cuiabá–Santarém, eixo longitudinal com cerca de 1.700quilômetros, partindo do centro do país em di-reção ao norte, vencendo igualmente a FlorestaAmazônica e vasta região virgem do PlanaltoCentral, até encontrar a mais volumosa artériafluvial do mundo: o Rio Amazonas.

A construção da estrada Cuiabá-Santa-rém foi confiada a dois Batalhões de Engenhariado Exército, o 8o Batalhão de Engenharia deConstrução (8oBECnst) com sede em Santarém –PA e o 9o Batalhão de Engenharia de Construção(9oBECnst) com sede em Cuiabá – MT, pela assi-natura de convênio entre o então Ministério doExército e o Ministério dos Transportes.

Tendo recém concluído, em 1971, meucurso de engenharia no Instituto Militar de Enge-nharia e à época no posto de capitão, apresentei-me ao 9o BECnst, quartel que também estava dechegada à cidade (em 31 de janeiro de 1971, o 9o

BECnst instalara-se em Cuiabá). Como engenhei-ro de seu escritório técnico, foi-me proporciona-do o privilégio de ser designado o responsável pelaimplantação de 800 quilômetros da estrada – des-de Cuiabá, em Mato Grosso, até Cachimbo, noPará, trecho afeto àquele batalhão, com extensãoequivalente à soma de travessia de leste a oeste de

três ou de mais de três de alguns dos países da Eu-ropa. A tarefa – grandiosa – era de materializaçãotopográfica do traçado da estrada no terreno, apartir de anteprojeto aerofotogramétrico.

Meses depois , às 15 horas e 30 minutosdo dia 17 de julho de 1972, à altura do Km 672da futura estrada Cuiabá-Santarém, encontra-ram-se duas equipes de topografia que, cami-nhando em sentidos opostos, sobre a mesma di-reção, haviam-se empenhado na locação e nolevantamento do trecho derradeiro do eixo darodovia sob nossa responsabilidade. Com esseencontro, estavam totalmente concluídos os tra-balhos topográficos no trecho Cuiabá-Cachim-bo e, a menos de pequenos arremates, realiza-dos nos dias imediatos, jaziam, ligados por ter-ra, os dois extremos do trecho, num total de 800quilômetros. Fato da maior relevância, a con-clusão dos trabalhos topográficos eliminava to-talmente o desconhecido, ao longo da diretrizdo trecho afeto ao 9oBECnst. Vasculhara-se oterreno palmo a palmo; estavam descerradas ascortinas, decorrendo, dessa visão panorâmica,a possibilidade de planejar e operar decidida-mente, sem diversas conjecturas para variadashipóteses na sequência dos trabalhos de cons-trução da estrada.

Tenho imenso orgulho da referência queme foi concedida, à conclusão dos trabalhos, peloCel Eng QEMA José Meirelles, comandante do9o BECnst, em tributo a quem escrevo este artigo.

Destaco a seguir – principalmente como ho-menagem a seu Comando, mas também como tes-temunho histórico –, alguns trechos do longo elo-gio que me foi consignado por ele “ (...) o Cap Vello-so realizou o trabalho histórico de coordenar todo otrabalho topográfico, no campo, da BR-163 – CUIA-BÁ-SANTARÉM (...), numa extensão de 800Km (...)conquistando, palmo a palmo, com persistência, en-tusiasmo e denodo, a floresta amazônica, lançandomão, para isso, de tudo que é capaz a mente huma-na, vontade, convicção, criatividade (...) paralela-mente às iniciativas de ordem técnica e logística, nasquais se incluem apoio aéreo, lançamento de supri-mentos em clareiras, navegação fluvial, evacuaçãoaeromédica (...). Foram dias memoráveis aquelesque marcaram o trabalho ingente das Frentes de

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Topografia, quando a Unidade, com o Cap Vellosocomo planejador e executor, procurava a todo custoimplantar no terreno o anteprojeto da LASA, ligan-do por terra Cuiabá a Cachimbo (...) fatos inesque-cíveis. A conquista das Frentes de Caiabi e Renato, aabertura da frente de Cachimbo, os incidentes comíndios, a malária, o lançamento de paraquedistas,numa operação aeroterrestre para a recuperação doCampo de Pouso de Teles Pires, que deu condiçõespara abertura da Frente de Renato, o avanço sempree sempre , apesar das chuvas e de todos os obstáculos,a subida e a descida da Serra do Cachimbo, a traves-sia dos rios, a alegria efusiante, enfim, do encontrodas turmas do sul e do norte, materializando a con-clusão dos trabalhos, a conquista do objetivo. Essesfatos passaram a fazer parte de nós mesmos, dada aintensidade com que foram gravados na nossa sensi-bilidade. O Cap Velloso deve se orgulhar de todosesses feitos pois poucos brasileiros terão o privilégiode poder contar a seus filhos o que foi essa jornadaépica da qual foi o principal protagonista (...).

Com a autoridade de ter participado in-tensamente da implantação desse trecho da BR-163 e por ter ouvido e lido, não poucas vezes, in-verdades ditas e escritas inclusive por alguns com,possivelmente, um mínimo conhecimento – ou quenem isso têm –, mas procuram pousar de heróisem entrevistas e “depoimentos”, destaco neste arti-go alguns aspectos esparsos sobre os trabalhos deimplantação de uma estrada rasgando a floresta,com a expectativa de transmitir conhecimento in-teressante e possivelmente de alguma utilidade.

Aspectos técnicos mais completos e detalhados

publiquei no número 647 da Revista “A Defesa Nacional”,

de Jan/Fev de 1973, sob o título “A Condução da Topogra-

fia na Selva” (pg 03/29).

O coronel JoséMeirelles, mineiro deConselheiro Lafaiete,foi Aspirante deEngenharia de 1946.Em 1950 casou-secom D. Zulmira, comquem teve oito filhos(Meirelles Filho, MariaCristina, MariaVirgínia, Maria Isabel,Maria Eliza, Totia -futura atriz detelenovelas – Rogérioe Maria Lúcia)

O 9o Batalhão deEngenharia de Construção

Com designação de 3o

Batalhão de Engenharia, acriação do 9o Batalhão de En-genharia de Construção re-monta a 26 de dezembro de1917. Instalado provisoria-

mente em São Gabriel, transferiu-se a seguirpara aquartelamento em Cachoeira do Sul e,em 1934, para Vacaria, recebendo então a mis-são de construir o trecho de 45 quilômetros derodovia entre Vacaria e Passo do Socorro. Em1935, foi transformado em 3o Batalhão de Sa-padores e, três anos após, em 3o Batalhão Ro-doviário, movimentando-se para Lagoa Ver-melha com a missão de construir o trecho derodovia Vacaria-Lagoa Vermelha-Passo Fundo,com 181 quilômetros, obra iniciada em 1938.

Em maio de 1947, foi transformado emComissão de Estradas de Rodagem No 7, empe-nhado, ainda, na missão de construção do tre-cho rodoviário Vacaria-Passo Fundo. Em 1950,extinta a CER 7, foi-lhe restabelecido efetivo de3o BRv e, de volta a Vacaria, foi-lhe confiada,ademais, a missão de continuar a infraestruturado Tronco Sul Ferroviário no trecho compreendi-do entre o Rio Pelotas e o Rio Saltinho, com 93quilômetros. Na década de 50, concluída a cons-trução do trecho da rodovia Vacaria-Lagoa Ver-melha, teve acrescida sua missão na ferrovia,com o recebimento do trecho entre o RioSaltinho e o Rio da Prata, com 37 quilômetros,até então sob responsabilidade do 1o BatalhãoFerroviário. Como consequência da proximi-dade do término das obras do Tronco PrincipalSul e tendo em vista atender a encargos na Ro-dovia BR-285, foi efetivada a mudança de suasede para a cidade de Carazinho.

Tendo em vista a necessidade de o Go-verno Federal executar o Plano de IntegraçãoNacional, foi o 3o Batalhão Rodoviário trans-formado em 9o Batalhão de Engenharia de Cons-trução (9o BECnst), com sede em Cuiabá-MT, afim de participar do referido plano, na constru-ção da rodovia Cuiabá-Santarém, no trechoCuiabá-Cachimbo e, adicionalmente de outros

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trabalhos, como a conservação de consideráveltrecho da BR-364, Cuiabá-Porto Velho. Dessemodo, instalou-se o 9o BECnst na capital mato-grossense, em 1971.

Aspectos básicos daestrada

O anteprojeto do segmento da BR-163 de

Cuiabá a Cachimbo foi elaborado com empregode aerofotogrametria. O método baseado na aná-lise estereoscópica de fotografias aéreas, por me-dições em aparelhos aerofotogramétricos restitui-dores, permite conduzir a análise das formas doterreno sempre do geral para o particular, emvirtude da grande amplitude de visão propor-cionada. Assim foram feitos estudos com equi-pamentos estereoscópicos de alta tecnologiapara caracterização dos problemas de ordemgeral, complementado-os por demais instru-mentos de informações geográficas, acarretan-do estudo pormenorizado do terreno e resul-tando em diversas linhas de ensaio que, apóscuidadoso exame, eram devidamente compara-das e julgadas, apresentando-se a solução maisconveniente para cada caso, na definição dosdiversos segmentos do traçado.

Desenvolvendo-se em terreno de topogra-fia caracteristicamente plana ou ondulada, típicada região que atravessa, enfrentando vegetaçãoque varia desde o cerrado, em seu subtrecho inicial,até a típica e majestosa vegetação amazônica, aRodovia Cuiabá-Santarém tem o rumo geral sul–norte acompanhando o vale do Rio Teles Pires eposteriormente do Rio Jamanxim, tendo semprepresente o projetista a preocupação de manter otraçado junto aos divisores de água e a salvo de pro-váveis inundações. Sua extensão total da ordem de1.700 quilômetros dos quais pouco menos da me-tade – cerca de 770 quilômetros – no estado de MatoGrosso. Ao 9o BEConst coube sua implantação atéCachimbo, já no estado do Pará, 30km à frente dalinha de fronteira entre os dois estados. Nesse per-curso, duas serras foram vencidas: a do Sinal, pelaqual passou à altura de 370 metros, e a de Cachim-bo, com elevação de 510 metros.

Na rede hidrográfica cortada, desta-cam–se os rios Verde, Teles Pires e Peixoto deAzevedo, respectivamente à altura dos quilô-

metros 348, 393 e 690, e os demais não represen-tam maiores problemas para transposição, sen-do os rios Arinos, Celeste, Braço Norte, Caiabi,Nandico, Arari Grande, Itapacurá e Cupari osque mereceram ainda alguma atenção especial;os 3 últimos já se encontram no trecho que estavaafeto ao 8o BECnst, sediado em Santarém, PA.

Seu traçado obedece em planta e perfil àscaracterísticas técnicas de rodovia de primeira clas-se em primeira implantação: plataforma de 8.60mem aterro e 10.60m em corte, pista de rolamentode 7 metros, revestimento primário de cascalho,rampa máxima de 9% e raio mínimo de 300 me-tros. Desmatamento numa faixa de 70m de largu-ra e destocamento e limpeza em faixa de 40m. Dis-pondo-se de estudos e anteprojeto já realizados,com base na fotografia aérea, os trabalhos de im-plantação da estrada obedecem, basicamente,à seguinte sequência: reconhecimento e trabalhostopográficos, projeto, desmatamento e limpeza,construção de obras de arte, trabalhos de terra-planagem, compactação e acabamento.

Estratégia do lançamentodas diversas frentes detopografia

Como é necessário fazer produzir todauma estrutura quase simultaneamente, tocando aobra globalmente desde o primeiro instante emque for possível esse emprego total, é essencial quese lancem diversas frentes de topografia, infraes-trutura básica de toda a obra a implantar. Dessemodo, pode-se assegurar, ao longo do trabalho,produção suficiente para manutenção de sua ne-cessária defasagem em relação às equipes de des-matamento, terraplenagem e obras de arte. O pla-no de lançamento das turmas de topografia naconstrução da Cuiabá-Santarém, no trecho afetoao 9o BECnst (Cuiabá-Cachimbo), previa:

– uma turma na região de Piúva (km 300)em direção ao Norte, apoiada em ligaçõesterrestres preexistentes;

– uma turma na região de Piúva emdireção ao Sul, retificando e remedindo osubtrecho da rodovia estadual (MT-114) quechegava àquele local;

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– uma turma na região do Rio Caiabi (km459), atingida primeiramente pelo Rio Telles Pires,que a estrada tangencia naquele ponto;

– uma turma na região do Rio Renato (km590) apoiada pelo campo de pouso recuperado aque já se fez referência;

– uma turma em Cachimbo (km 800), norumo Sul, a partir da Base Aérea da FAB, sediadanaquela região.

Para a abertura dessas diversas frentes, bemcomo para chegar até elas e, sempre que necessá-rio, delas sair durante o correr dos trabalhos, váriosexpedientes foram utilizados, a fim de tornar pos-sível o trânsito pela floresta, até então impenetra-da e com vegetação extremamente densa, fechadaem muitos segmentos, a ponto de a luz solar nela não penetrar: tratores agrícolas, navegação utili-

zando variados tipos de embarcação,longas caminhadas, aviões monomoto-res, paraquedas... E frequentemente so-brevoos com lançamentos de gêneros emateriais.

Campos de pouso alcançados porcurtos trajetos por terra ou por rio, mui-tas vezes foram o meio mais rápido e eco-nômico de se levar suprimentos e assistên-cia às equipes destacadas. O 9o BECnst, aolongo dos cerca de 800km que separamCuiabá de Cachimbo, construiu camposde pouso em Lucas, Rio Lira, Rio Caiabi,Rio Braço Sul e Rio Peixoto de Azevedo,tendo ainda utilizado sistematicamentequatro outros campos já existentes na re-gião, incluindo-se um que foi recuperado,às margens do Rio Telles Pires, e o da FABna Base Aérea de Cachimbo.

Experiência muito singular foi vi-vida ao promover o aproveitamento deum campo de pouso, à altura do Rio Re-nato, 590km ao norte de Cuiabá, aban-donado havia cerca de 10 anos; estava játomado por pequenas árvores esparsas,além do mato crescido que o cobria qua-se totalmente. Foi necessário, para suarecuperação, o emprego de tropa aero-terrestre Parasar-FAB que, vinte dias de-pois de realizar o salto na região, entre-gou-o pronto para a utilização. Essecampo que – logo após recuperado, foiexaminado por técnicos especializados

O valente trator de lagartas, nosso herói que abria os caminhos parao progresso do projeto

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Sobrevoo com bimotorCESSNA , e um C-115(Búfalo) sendocarregado.

da FAB – foi considerado aprovado para aviõesde até média tonelagem. Assim, uma aeronaveC-115 (Búfalo da FAB) transportou até aquelaregião uma nova equipe de topografia e seu ma-terial, num peso total de 3.700kg. Houve, no en-tanto, embaraços que retiveram esse avião nocampo por alguns dias em virtude de fortes chu-vas, que diminuíram a resistência da pista, pro-vocando afundamento da sua bequilha.

Como regra geral, todos os campos que es-tavam sendo operados continuamente contavamcom equipes de conservação, dotadas de rádio,que cuidavam da manutenção e informavam, comsegurança, o estado da pista e as condições meteo-rológicas, principalmente no período das chuvas.Eram todos dotados de estoque de combustível ede sinalização básica de modo a oferecer seguran-ça às operações aéreas. Abaixo estão imagens desobrevoo com bimotor CESSNA e de um C-115(Búfalo) sendo carregado.

Procedimentos em face dapresença de índios

A inquietude gerada no espírito dos ho-

mens destacados na floresta – o número de tra-balhadores civis empregados no desmatamentocontava-se às dezenas, muitas dezenas... – cres-cia na proporção em que eram propaladas notí-cias sobre iminentes contatos com índios. A in-certeza sobre a inabitabilidade da região geravaintranquilidade, principalmente naqueles encar-regados de explorações mais à frente, absoluta-mente necessárias, independente do traçado pre-conizado pelo anteprojeto aerofotogramétrico.

Esse quadro, diagnosticado desde os pri-meiros meses de operação na floresta, atingiu seuclímax quando foram localizadas as aldeias dosíndios Kreen-akarore, sobre a linha prevista paraeixo da diretriz de Cuiabá – Santarém, distante,àquela altura, cerca de 100 quilômetros da fren-te da topografia que lhe ficava mais próxima.

Para evitar acontecimentos desagradáveisgerados por encontros menos amistosos que pu-dessem vir a ocorrer, o Exército, desde as primei-ras etapas dos trabalhos topográficos, ligou-se àFundação Nacional do Índio (FUNAI) que des-tacou, em atendimento, uma equipe de sertanis-tas com a finalidade de acompanhar os desloca-mentos de cada equipe de topografia.

Esta providência teve grande alcanceuma vez que restabeleceu a confiança nos ho-mens, tornando-se elemento responsável pelamanutenção de uma produção eficiente ao lon-go de todo o serviço. Porém, felizmente, até oRio Peixoto de Azevedo (Km 590) não foram lo-calizados senão pequenos grupos de índios per-feitamente acultuados – destacando-se os Caia-bis – com os quais os contatos foram sempreamistosos, sem qualquer problema.

Posteriormente, confirmada a presençados índios Kreen-akarore, de tradição hostil eainda não contatados, a FUNAI reforçou seu dis-positivo de apoio destacado para acompanharos trabalhos. Passaram, então, a conviver conos-co, nos acampamentos, os irmãos sertanistasCláudio Villas Bôas e Orlando Villas Bôas, per-manecendo durante bom tempo. Ambos perfei-tamente integrados a nosso grupo, participati-vos, cada qual com seu temperamento muito

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Operador de nivelamento, Aureliano Bispo de Oliveira, atingido aflechadas e transportado em helicóptero até a Base Aérea deCachimbo, onde foi operado.

típico: Cláudio sempre ponderado, circunspec-to, com fisionomia serena, tranquila, fechada; Or-lando costumeiramente às gargalhadas, delician-do-se com as histórias e os casos que não se cansa-va de contar à luz do fogo nos acampamentos ànoite. Os dois foram de utilidade muito grandena operação de contactar os Kreen-akarore, maistarde identificados como índios Panarás. Nuncahouve a mínima tentativa de qualquer dos doissertanistas em relação a sugerir alguma modifi-cação no organograma dos nossos trabalhos, nemem relação ao traçado da estrada, com eventualproposta para que se desviasse um metro sequerde nosso traçado tecnicamente estabelecido e quenunca foi objeto de discussão com terceiros. Qual-quer insinuação a esse respeito é mera aleivosia.

Eram recomendações básicas:– que as áreas desmatadas em volta dos

acampamentos fossem ampliadas a fim de facilitarvisão de maior alcance;

– que se andasse sempre em grupos, nuncadesacompanhados;

– que o acampamento fosse guardado porvigias durante toda a noite;

– que o porte de armas fosse restrito demodo a prevenir precipitações e usos indevidos;

– que se mantivesse grande estoque de fo-gos artificiais tipo “morteiros” cujos estampidospoderiam afugentar os índios, em caso de um cer-co, por exemplo.

Ainda assim, um operador de nivelamen-to, Aureliano Bispo de Oliveira, foi atingido aflechadas no tórax e na perna, pelos ‘‘índios gi-gantes’’; felizmente sem maior gravidade, mascom ferimentos suficientes para acarretar suaremoção de helicóptero até a Base Aérea de Ca-chimbo, onde foi submetido a uma intervenção.

É oportuno salientar que, em nenhummomento, se molestou de qualquer forma algumíndio, e que, até mesmo a aproximação com os“índios gigantes”, hostis – muito arredios aosprimeiros contatos –, foi feita de maneira bas-tante pacífica, com troca paulatina e paciente depresentes, que eram principalmente penduradosem varais, para posterior recolhimento peloslados presenteados. Era comum recolhermos es-pigas “gigantes” de milho, arcos, flechas e bodur-nas ou tacapes. Esse “namoro” levou longo tem-

po, com os Panarás sempre se escondendo e ba-tendo em retirada. Uma foto de grande efeitoplástico que obtivemos mostra os “índios gi-gantes” atirando fechas em nosso avião, ao so-brevoarmos seu território. O contato mesmosó veio a acontecer algum tempo depois – cercade seis ou sete meses após a materialização detodo o traçado da estrada no terreno –, já napassagem de 1972 para 1973.

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Cidades que vimos nascer

Lucas do Rio VerdeEmpenhada na construção já com a uti-

lização de suas poderosas máquinas de terrapla-nagem sobre a linha previamente estaqueada, a2a Cia Eng /9o BECnst instalou seu acampamentoàs margens do Rio Verde no cerrado, a 350 quilô-metros ao norte de Cuiabá. Esse curso d’água,assim chamado pela bela cor esverdeada de suaságuas, nasce na Fazenda Santa Clara, no municí-pio de Santa Rita do Trivelato, é tranquilo, semquedas em seu percurso, apresentando apenas al-gumas corredeiras pequenas. Nenhum agrupa-

Índio Kreen-akarore“indios gigantes” emsua aldeia onde umdeles tenta atingir oavião com flechadas.Na foto o nome está escritoerradamente.

Foto à esquerda,“uma foto para afamília”.À direita, o valenteToyota atravessandoum rio.

mento populacional naquela região, onde foraminstaladas nossas primeiras barracas, bem sim-ples. Pouco tempo depois, a 2a Companhia ali jáse encontrava pronta, de modo completo, comsuas instalações funcionais em madeira, dandoforma a um perfeito aquartelamento, sob o Co-mando do então Capitão Enzo Martins Peri, fu-turo Comandante do Exército.

Constava, no entanto, à época, que aliseria o reduto de Francisco Lucas de Barros,desbravador de sertões, afeito à rudeza da sel-va, grande conhecedor da região, seringalis-ta, nos anos 50 e 60, na calha do Rio Verde,época em que a fazenda de Nova Ubiratã com-

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Transporte comum eúnico do povoribeirinho e tambémde trabalhadoresda obra.prava e beneficiava látex. Aquela então seria aregião do “Lucas do Rio Verde”, nome peloqual passamos a identificar a região sede da 2a

Companhia de Engenharia. E o seringalistaperpetuou-se na história ao ter seu nome em-prestado ao município que ali veio a nascer.Na verdade, parece que a denominação do lu-gar surgiu antes mesmo do acampamento do9o BECnst. Conta-se que a região, à nossa che-gada, já era conhecida como seringal do Lu-cas do Rio Verde. As obras de abertura da ro-dovia mobilizaram os primeiros colonizado-res para aquela região de cerrado.

Hoje, Lucas do Rio Verde figura entre os 10municípios com maior potencial de crescimentoeconômico e social do Brasil. A intenção da admi-nistração municipal é conquistar o terceiro lugarna economia estadual. Voltados para uma tendên-cia mundial que deseja e necessita viver de formasustentável, os projetos ambientais desenvolvidosno município são reconhecidos internacional-mente. O projeto Lucas do Rio Verde Legal – ousimplesmente Lucas Legal como ficou conhecidono país – tornou-se modelo na criação do MatoGrosso Legal.

Quatro décadas depois da instalação doacampamento do 9º BECnst às margens do Rio Ver-de, esta moderna, pujante e dinâmica cidade emnada lembra o primitivo vilarejo onde tudo era di-fícil e precário. Hoje, seus mais de 50 mil habitantestêm enorme orgulho de viver nesta sociedade queem tão pouco tempo se tornou um polo de desen-volvimento do estado e ficou conhecida por ter umdos melhores índices de Desenvolvimento Humano

(IDH) do país, conforme relatório da Organiza-ção das Nações Unidas (ONU).

Por oportuno, parece interessante citarque, sem dúvida, um dos destaques da cidade deLucas do Rio Verde no cenário nacional é seutime de futebol, o Luverdense.

A associação, denominada LuverdenseEsporte Clube, foi fundada em 2004. É hoje otime matogrossense mais bem posicionado nosCampeonatos Brasileiros, estando atualmentena Série B. Foi o primeiro campeão da CopaGovernador de Mato Grosso, levando o títuloem 2004, feito que repetiu em 2007 e 2011. Nomesmo ano ficou em nono na Série C (terceiradivisão) do Campeonato Brasileiro de Futebol.A campanha nacional de 2011 foi o início de que-bra de recordes de rivais de seu próprio estado:sagrou-se tricampeão invicto da Copa MT aoderrotar o tradicionalíssimo Operário de Vár-zea Grande e conquistou o acesso à Série B. Comisso, após 18 anos, recolocou Mato Grosso na2a Divisão Nacional. Em 2013, tornou-se o timematogrossense a chegar mais longe na históriada Copa do Brasil, ao vencer o Corinthians, en-tão campeão do mundo, em jogo pelas oitavasde final. Na oportunidade apareceu com desta-que no cenário nacional.

E dizer-se que tudo começou comnossa barraca de lona, primeira instalaçãoda 2a Cia às margens do Rio Verde...

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Cidade SinopNo início dos trabalhos topográficos

para construção da estrada Cuiabá-Santarém, o9o BECnst foi procurado pelo empresário ÊnioPipino, dono da empresa SINOP – Sociedade Imo-biliária do Noroeste do Paraná, solicitando-nosapoio. Estava dando início a trabalho de coloni-zação e a projeto de assentamento de famílias nonorte de Mato Grosso, a partir de sua exitosa em-presa estabelecida no Paraná. Ele e João PedroMoreira de Carvalho haviam fundado, em 1948,a Sociedade Imobiliária Noroeste do Paraná, comsede na cidade de Maringá-PR, com objetivo decolonização e implantação de cidades, empresamais conhecida como Sinop Terras S/A. Em 1954,Ênio Pipino já fundara várias cidades. Agora, aSinop Terras estava empenhada em criar a GlebaCeleste, dividida em lotes – embriões de cidades –, no interior de Mato Grosso.

A principal cidade chamar-se-ia SINOP,como de fato veio a acontecer. Contou, então,com a ajuda solicitada ao Exército em seu esforçode alcançar a região pretendida, a 500km aonorte de Cuiabá, às margens de onde iria passara futura Cuiabá-Santarém. Prestamos-lhe apoioem seu esforço, ajudando-o principalmente emseu deslocamento com cerca de 400 homens emáquinas pelos trechos de floresta. E entãoinstalou-se de forma vitoriosa em seu destino,graças a seu grande espírito empreendedor.

A abertura das primeiras ruas de Sinopteve início em maio de 1972, sendo a cidade Verainaugurada em 27 de juho de 1972; logo as pri-meiras famílias de pioneiros chegavam à cidade.Até então a viagem do interior do Paraná atéSinop demorava 7 dias. Mas, apesar dessa gran-de dificuldade, o fluxo migratório na direção oes-te, que acompanhava o adentramento da fron-teira agrícola no norte de Mato Grosso, cresciacada vez mais. A fundação da cidade Sinop veio aacontecer somente em 14 de setembro de 1974.No dia 24 de julho de 1976, o então governadorJosé Garcia Neto assinou a Lei 3.754/76, elevan-do Sinop à categoria de distrito do municípiode Chapada dos Guimarães. Em 17 de dezem-bro de 1979, o governador Frederico Camposassinou a Lei 4.156/79, que elevou Sinop à cate-goria de município. A colonização inicialmentese deu por paranaenses, mas logo, num fenôme-

no de explosão populacional, se estendeu aosbrasileiros de todas as regiões do país, princi-palmente do Sul, Nordeste e Norte do Brasil.Hoje, a principal atividade econômica é a pres-tação de serviços, com grande destaque tambémpara o setor pecuário (bovinos e suínos), culti-vo de algodão e cereais (soja, milho e arroz) eindústria madeireira. São mais de 10 mil em-presas instaladas e consolidadas em Sinop dasquais 1.401 pertencem à indústria. As quatrocidades criadas pelo projeto agrícola de GlebaCeleste tiveram desenvolvimento desigual.Sinop desenvolveu-se muito, enquanto as ou-tras, Vera, Santa Carmem e Cláudia não acom-panharam esse crescimento. A situação privile-giada de Sinop, única no norte do estado efeti-vamente às margens da Cuiabá-Santarém, foifator importante para sua transformação emcentro comercial, inserida dentro do processode desenvolvimento regional e não apenas lo-cal. Sinop é a quarta maior cidade do estado;sua população que, pelo censo do Instituto Bra-sileiro de Geografia e Estatística (IBGE), era depouco mais de 110 mil habitantes, já era superiora 126 mil habitantes em 2014 o que a coloca em224o lugar no Brasil, 114o lugar entre os municí-pios interioranos e 4o lugar no estado. Possuiárea de 3.942km² e é conhecida como a Capitaldo Nortão, sendo atualmente polo de referên-cia em todo o norte matogrossense.

Portanto, em quarenta anos, Sinop tor-nou-se uma das mais importantes cidades doMato Grosso.

A Cuiabá-Santarém hojeA Cuiabá-Santarém é componente da BR-

163, rodovia que interliga os estados do Rio Gran-de do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grossodo Sul, Mato Grosso e Pará. É, portanto, corre-dor de integração nacional. Na sua extensão in-tegral dentro da malha rodoviária brasileira éuma rodovia longitudinal com 3.470km de ex-tensão, ligando Tenente Portela, no Rio Grandedo Sul, a Santarém, no Pará. De Tenente Portela-RS até Cascavel-PR possui pista simples e acosta-mento reduzido, trecho em fase de alargamento.

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A partir de Cascavel em direção norte, a rodoviadá acesso para Ponta Porã, Porto Murtinho (aces-sos para o Paraguai) e Corumbá (acesso para aBolívia). Na continuação, a Cuiabá-Santarém,com 1.780 quilômetros, atravessa uma das regiõesmais ricas do País em recursos naturais e potencialeconômico, sendo marcada pela presença de im-portantes biomas brasileiros, como a FlorestaAmazônica e o Cerrado, e áreas de transição en-tre eles, além de bacias hidrográficas importan-tes, como a do Amazonas, do Xingu e Teles Pires-Tapajós. No lado norte do Amazonas, está o fimda rodovia e, logo após o entroncamento com aBR-210, está seu segmento de chegada, com 233quilômetros, um dos trechos rodoviários mais iso-lados do Brasil.

Inúmeros projetos de colonização foramdesenvolvidos ao longo da rodovia, atraindo mi-lhares de migrantes vindos, principalmente, daRegião Sul do país. Com isso, houve intensa reor-ganização do espaço ao longo da rodovia. Du-rante a construção já havia cerca de 2.000 ho-mens trabalhando, entre civis e militares. A par-tir do início das obras, pessoas de todas as regiõespassaram a chegar em busca de oportunidadesnaquelas terras, consideradas um novo eldorado.

Não havia, algumas vezes, controle efe-tivo sobre as terras que seriam colonizadas, oca-sionando ocupações desordenadas por possei-ros e grileiros. Por outro lado, alguns daquelesprojetos de colonização resultaram na criaçãode novos municípios no estado. Em 1970, havia

Cuiabá – Santarém,

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Documento, datado de 26 de junho de 1972, assinado por IzidoroSardis, Procurador da Sinop Colonizadora, dirigido ao CapVelloso: “Sentimo-nos imensamente honrados (...) a fim deconvidá-lo para participar das solenidades alusivas àsinaugurações que levaremos a efeito na Gleba Celeste, ondeimplantaremos o primeiro núcleo de colonização da BR-163(Cuiabá-Santarém), com o nome de CIDADE VERA (...). Asinaugurações realizar-se-ão no dia 27 de julho (...). Queremoscontar com a sua honrosa presença (...) início de uma grandecruzada que firmará o conceito do Eminente Presidente Médici(...). As festividades contarão com a presença de Ministros deEstado, Governador, Autoridades Civis, Militares e Eclesiásticase ainda membros do Congresso (...).

no Mato Grosso 34 municípios e, em 1990, eles jáeram 95, a maioria criados a partir daqueles pro-jetos de colonização. Entre as várias cidades pro-gressistas surgidas, destacam-se Sorriso (1986),Nova Mutum (1988) e Tapurah (1988).

A Rodovia Cuiabá-Santarém está hojeem grande parte pavimentada. Segundo infor-mações do site www.canalrural.com.br, o Minis-tro dos Transportes, Antonio Carlos Rodrigues,afirmou em 13 de janeiro de 2015 que o trechoda BR-163 ainda por asfaltar, situado no estadodo Pará, no total de 136 quilômetros, deverá es-tar concluído até 2016. O ministro fez a declara-ção em Brasília, durante o lançamento do Planode Escoamento da Safra 2014/2015, prevendoações integradas dos Ministérios da Agricultura,

Portos e Transportes. Têm sido observados atra-sos em relação à execução desses trabalhos, mas éde se esperar que até o ano 2017 a pavimentaçãoesteja realmente concluída. Trechos importan-tes, como o perímetro urbano de Sinop já foraminclusive duplicados. Nesse local, por exemplo,ao longo de 30 quilômetros, a estrada recebeuviaduto, iluminação e vias marginais. Essas obrastransformaram a entrada da cidade. O percursoficou tranquilo e feito com maior segurança, alémde ter sido, em muito, melhorado o visual.

Há efetivamente um esforço nacional paraa conclusão a curto prazo dos trabalhos de pavi-mentação da Cuiabá-Santarém, o que acarretará,certamente, queda nos preços do frete, um dos prin-cipais anseios dos produtores do estado.

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ConclusãoCom acertos e erros, como sói acontecer,

a Cuiabá-Santarém cumpre seus desígnios de in-terligar o Brasil, promover o desenvolvimento deregiões menos favorecidas e assentar famílias.

Quatro décadas após sua implantação bá-sica, vai-se dotando finalmente do aparelhamentonecessário a proporcionar tráfego seguro e de qua-lidade, de modo a contribuir crescentemente aoprogresso do país. Quando a história da cons-trução dessa rodovia for escrita, suas páginas

contarão a saga de militares e civis do 9o Batalhãode Engenharia de Construção (9o BECnst), deCuiabá, e do 8o Batalhão de Engenharia de Cons-trução (8o BECnst), de Santarém, Unidades donosso glorioso Exército Brasileiro.

Cel QEM Fernando de Castro Velloso

Oficial do Exército da Arma de Engenharia - AMANEngenheiro Civil e Militar - IMEMestre em Ciências em Engenharia de Sistemas - IMEEspecialização em Hardware e Software nos EEUU - IBMPós-graduado em Língua Portuguesa - UCBPresidente da Associação da Turma Duque de Caxias -AMAN/1962

Referências– Velloso, Fernando de Castro. Integração, desenvolvimento,segurança. 9º BECnst. Cuiabá, 1972.– Velloso, Fernando de Castro. A condução da topografia naselva. A Defesa Nacional, 647. Rio de Janeiro, 03-29__________.– Jornal O Globo, Edições diversas. Rio de Janeiro, 2010-2015.

Hasteamento do Pavilhão Nacional no acampamento Monumento emhomenagem aostrabalhadores quemorreram durante asobras da BR-163