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Detalhe da bandeira de São Benedito, na Cavalhada de Poconé, em 2006.
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Roberto Loureiro
Culturamato-grossense
Festas de santos e outras tradições
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Todos os direitos desta edição reservados à:
CARRIÓN E CARRACEDO LTDA. Av. Senador Metello, 3.773, Jardim Cuiabá • Cep: 78.030-005 – Cuiabá, MT, Brasil
Telefax: (65) 3624 5294 / 3052 8711 • www.entrelinhaseditora.com.br • e-mail: [email protected]
Impresso no Brasil
Editora Maria Teresa Carrión Carracedo
Design gráfico | Iconografia Maria Teresa Carrión Carracedo
Produção Gráfica Ricardo Miguel Carrión Carracedo
Suporte Administrativo Carlos Alberto Ozelame
Chefe de arte | Capa Helton Bastos
Tratamento de Imagens Maike Vanni | Ronaldo Guarim
Ilustração dos capítulos “Mitos” e “Lendas” Marcelo Velasco
Revisão Domingos Vieira de Assunção
Assistentes Walter Barbosa Galvão | Rosane da Silva Campos
Agradecimentos especiais aos que, de alguma forma, contribuíram com esta publicação
Elizabeth Perfeito da Silva Campos Corrêa da Costa | Ladrilhos Gaudi | Isabella Procópio Gomes Inês Maggy Procópio Gomes da Silva | Marly Pommot | Michelle Gahyva | Museu Histórico do Estado
Núcleo de Documentação e Informação Histórica Regional, NDIHR da UFMT | Nileide Souza Dourado
Antônio Siqueira
Franco Venâncio | Banco C&C
Helton Bastos | Banco C&C
José Medeiros
Laércio Miranda
Marcos Bergamasco
Mário Vilela
Mario Friedländer
Mayte | Banco C&C
Rafael Manzutti | Banco C&C
Ricardo Carracedo | Banco C&C
Roberto Loureiro
Silvio Vince Esgalha
ANI | Autor não identificado
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Fotografia
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Loureiro, RobertoCultura Mato-grossense : Festas de Santos e outras
tradições / Roberto Loureiro. -- Cuiabá, MT : Entrelinhas, 2006.
ISBN: 85-87226-53-3
1. Arte popular - Mato Grosso 2. Cultura Popular - Mato Grosso 3. Festas religiosas - Mato Grosso I. Título.
06-6425 CDD-394.2698172
Índices para catálogo sistemático:
1. Mato Grosso : Festas de Santos e tradições : Costumes 394.2698172
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Roberto Loureiro
Festas de Santos e outras tradições
Cuiabá, 2006
Festas de Santos e outras tradições
Culturamato-grossense
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Pajem mouro Fabrício, na Cavalhada de Poconé, em 2006.
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“Toda pessoa tem direito de partici-par livremente da vida cultural da co-munidade, de fruir das artes e de par-ticipar do progres-so científico e dos benefícios que dele advenham”. Art. 27 da Declaração
Universal dos Direitos Humanos.
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A todos que lidam com a cultura nativa do Estado: dos galãs e damas mascarados, curureiros, artesãos, cozinheiras e partícipes de festas de santos, pesquisadores e agentes culturais, pessoas que, de alguma forma, estiveram ou estão ligadas a este maravilhoso manancial de tradições, patrimônio de valor inestimável.
À minha família: pelo suporte e colaboração, que me permitiu concretizar este trabalho.
Ao Pe. José de Moura e Silva:pessoa que, com conhecimento do tema e paciência para responder a meus questionamentos, ajudou a estruturar, conceitualmente, o texto.
A Margarida Maria Silva Castro: por auxiliar de forma continuada na correção gramatical dos escritos.
À editora Entrelinhas: minha gratidão a Maria Teresa Carrión Carracedo e toda sua equipe, pelo respeito e carinho com que me trataram e pela dedicação e profissionalismo que demonstraram no aperfeiçoamento deste livro, apoio e esforço sem o que a obra não alcançaria a qualidade que tem.
Meus agradecimentos especiais a Marcionei de Miranda Prado, cujo incentivo foi fundamental para a concretização da obra.
Roberto Loureiro
Agradecimentos
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ÅDetalhe de ganzá, instrumento musical utilizado pelos tocadores de cururu e siriri.
Este é um livro que expõe paradoxos. Em suas páginas estão a sim-plicidade-complexidade, rusticidade-sofisticação de parte significativa da cultura popular mato-grossense, expressas em suas manifestações materiais e imateriais.
O autor chegou à editora com o seu livro em 2002, com o sonho de vê-lo publicado e divulgado nas escolas de todo Mato Grosso. Sua pre-ocupação, em sintonia com a da editora, era com a crescente desinfor-mação da nova geração, bombardeada pela mídia moderna e globali-zada, com cada vez menos espaço, tempo e oportunidade de vivência, aprendizado e fruição de sua cultura tradicional. Este fenômeno é ve-rificado principalmente nas áreas urbanas que, a partir da década de 1970, passaram a concentrar 80% da população do Estado, hoje com-posta por, aproximadamente, 45% de migrantes. Assim, é dificil res-ponder a perguntas fundamentais: quem somos? onde estamos? de onde viemos? para onde podemos ir?
O autor, Roberto Loureiro, elaborou um competente trabalho de síntese, tendo como eixo norteador o universo das festas de santos, com o valor e a profundidade de ser um dos atores que chama a outros, de genuína representatividade, e às suas vozes dá audição. Ele conhece bem o palco e a audiência. Eis a sua vantagem competitiva. Teve o cui-
dado extremo de traduzir e organizar as informações que rece-beu, com o zelo de um tradutor juramentado. Loureiro não
teve a pretensão de elaborar uma pesquisa acadêmi-
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Apresentação
ca. Escolheu fontes pelo critério de sua notória importância, e a comu-nicação objetiva. Quis e conseguiu ser sintético e didático. Apresenta aqui um rico panorama da cultura regional: festas de santos, danças e músicas regionais, festejos, mitos, lendas, artesanato, linguajar e culi-nária regionais.
A editora Entrelinhas, que, desde 2000, deu início às suas publi-cações didáticas de referência para a História, Geografia e Literatura mato-grossenses, agora acrescenta “Cultura mato-grossense: festas de santos e outras tradições”, para a qual desenvolveu ampla pesquisa e produção iconográfica, com o objetivo de seduzir e encantar, mas ten-do como filtro a realidade da cultura tradicional mato-grossense. Dire-cionamos o olhar seletivo para a significação, autenticidade e os ele-mentos tradicionais de cada tema, buscando representá-lo com a bele-za plástica que a fotografia e a ilustração, nas mãos de competentes di-retores de criação, fotógrafos, ilustradores, pesquisadores e produtores podem alcançar. Levamos quatro anos neste trabalho minucioso, que envolveu todos os colaboradores da editora em um mutirão entusias-mado pela cultura mato-grossense.
Nossa missão engloba a máxima de que a cultura nos singulariza no mundo. Todo cidadão tem o direito dela usufruir.
Relacionamos os ingredientes e o “modo de fazer” desta edição. O resultado da receita você está convidado a conhecer nas páginas que se seguem.
Maria Teresa Carrión CarracedoEditora
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ÅDetalhe da decoração com bandeirolas no local da festa de São Gonçalo e São João da festeira Apolônia de Siqueira, em Poconé (2006).
14 Reminiscências
16 Pra começo de conversa
20 Festas de Santos 23 Festas Religiosas
25 Festas de Santos
27 A Festa do Divino em Cuiabá
36 Festas de Santos nas cidades
37 Festas de Santo de Irmandades
37 Festa de São Benedito, em Cuiabá
46 Festas de Santos de famílias
46 Festas juninas
55 Festas de Santos rurais
66 Reza ou ladainha
68 Danças e Músicas Regionais
70 Lundum
71 Batuque
73 Cururu
76 Dança do Congo
83 Chorado
84 Siriri
88 Boi-à-Serra
92 Dança de São Gonçalo
94 Dança dos Mascarados
100 Rasqueado
102 Curussé
104 Instrumentos musicais tradicionais
110 Festejos 112 Cavalhadas
120 Touradas
124 Folias de Santos
125 Folia do DivinoEspírito Santo
126 Folia de Reis
128 Procissões Fluviais
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130 Mitos 132 O Currupira
134 O Pé-de-garrafa
136 O Minhocão
138 O Boitatá
140 O Tibanaré
142 A Dama de Branco
144 Lendas 146 Cabeça de Pacu
148 A alavanca de Ouro
150 A Visão
152 Quem comeu minhapacuera me dá...
154 A Mina dos Martírios
156 A Mina dos Araés
158 Artesanato 161 Tecelagem
166 Cerâmica
172 Artefatos em madeirae fibras vegetais
176 Artesanato em couroe chifres
178 Seringados
180 Ladrilho hidráulico(mosaico)
186 Linguajar 190 Vocabulário
194 Culinária
228 Epílogo
230 Anexos 231 Origem de alguns santos
237 Cavalhada
238 Referências
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ÅO grupo de Dança do Chorado se apresenta em frente à Igreja da Matriz, após a missa solene da Irmandade de São Benedito – uma tradição nas ruas de Vila Bela da Santíssima Trindade.
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Nós outros que vivemos nestes sertões, acostumados a es-ses cansaços e essas liberdades, olhamos com uma certa supe-rioridade a fraqueza desses homens que ignoram as condições de nossa vida e lamentamos até que eles não gozem os nossos prazeres.
A civilização está nos batendo às portas, e com ela chegam a estrada de ferro, o trator, o avião, a violência, o funk e os computadores. A formosa sertaneja perdeu a beleza singular, o povo, a inocência, e os cerrados, os pequizeiros, as mangabei-ras, as seriemas e onças pintadas; e ai de nós! Em pouco tem-po se apagarão as últimas pegadas dos Pés-de-Garrafa e o can-to dos Tibanarés, substituídos pelo sulco dos arados e o ronco dos tratores. As plantações de exportação conheceram o Estado, de cujo encanto só a literatura lhes dará notícia; mas, coitados! Não comerão a paçoca do tropeiro, nem o tutano do osso de cor-redor que robustece o caboclo, não tomarão guaraná ralado à beira de um córrego de águas cristalinas, à sombra de um aco-pari, nem dançarão o cururu e o siriri em uma animada festa de santo, e atrás deles virá a economia de mercado para lhes aba-ter a carteira e a liberdade. Como é triste perceber que estamos perdendo tudo isso, não é?
Mas, infelizmente, é a civilização e não o pitoresco que dá força à sociedade e ao Estado. Os nossos descendentes ouvirão contar do nosso tempo e terão dó de nós. Logo nós, que éramos tão felizes.
(Texto inspirado em um artigo escrito por
um morador de Araçuaí e publicado
em um jornal de Teófilo Otoni, MG, 1907.)
Reminiscências
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[...] O Estado garantirá a todos o exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura e apoiará e incentivará a valorização e difusão das manifestações culturais.Constituição Federal, Seção II, Artigo 215.
ÅCururueiros fazem a louvação para a subida do mastro em festa de Nossa Senhora da Piedade e Santo Antônio, na comunidade Barreiro, aos pés das escarpas da Chapada dos Guimarães, no município de Cuiabá.
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Pra começo de conversa
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A idéia de escrever este livro surgiu durante a revisão de um texto sobre danças folclóricas do Estado, para a elaboração de uma cartilha destinada a estudantes. A diversidade de danças e músicas ali descritas, algumas das quais desconhecidas até então, mostrou-nos a necessidade de um mapeamento amplo e consistente sobre o assunto. A dificuldade de encontrar referên-cias bibliográficas com informações sobre o tema mostrou que, salvo raras exceções, os registros da cultura popular mato-gros-sense estão dispersos e apresentam-se mais como produção li-terária que informativa. Esta a razão de se buscar agregar, de forma sintética, em uma só publicação, um panorama da cultu-ra mato-grossense.
Nas entrevistas com pessoas que vivenciam o tema e com festeiros das comunidades tradicionais – que ainda detêm in-formações sobre o assunto –, ficou claro que elas também esta-vam perdendo parte importante desse conhecimento, o que nos despertou grande preocupação com a preservação desse patri-mônio, não só referente às músicas e danças tradicionais, obje-to inicial da pesquisa. Na verdade, é toda a cultura popular re-gional que está a requerer cuidados, para que não se perca em decorrência do processo de modernização e da recente ocupa-ção do território mato-grossense por migrantes das mais diver-sas regiões do país, detentores de outras tradições e costumes.
Preservar a identidade cultural mato-grossense significa lançar um olhar atento às tradicionais Festas de Santo. Segun-do teses de antropólogos culturais e outros estudiosos, elas for-mam o berço e sustentáculo de quase todas as manifestações folclóricas do país, além da sua grande contribuição na forma-ção da identidade brasileira, por serem capazes de estabelecer interfaces de mediação entre indivíduos, entre o homem e seus deuses, entre culturas diferentes, entre comunidades distintas e entre povo e Estado.
Uma vez que o processo de modernização é irreversível, “[...] estamos todos condenados à civilização. Ou progredimos ou de-saparecemos”, como disse Euclides da Cunha – seja lá o que for este progresso –, é esperado que o Estado e a sociedade, unidos, invistam em um processo de valorização dessas manifestações
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tradicionais, principalmente das Festas de Santos. Sem um pro-cesso de revitalização e adequação deste folclore tradicional, às novas realidades, como ocorreu no Nordeste, é previsivel que estas manifestações culturais continuem a desaparecer, como de fato já ocorreu com parte dela.
Felizmente, em Mato Grosso, parte significativa dos even-tos permanece viva, ainda que um pouco transfigurada, assim como muito da sua memória, notadamente em algumas cidades do interior e zona rural, principalmente na região da bacia do Alto Paraguai. Ainda há meios de resgatar informações a res-peito do tema, através dos seus atores, como vem acontecen-do com a preciosa contribuição de pesquisadores independentes e acadêmicos, de professores que desenvolvem dissertações de mestrado e teses de doutorado sobre a história e a cultura ma-to-grossenses.
A intenção desta publicação é registrar e divulgar informa-ções referentes à cultura popular mato-grossense para uma consulta rápida, aproveitando o fato de que, como cuiabanos, de tchapa-e-cruz, eu e minha família participamos de inúmeras festas de santos, eventos guardados em nossas lembranças. O registro dessas vivências, motivaram a concretização deste tra-balho.
Posto que a situação atual é de transformação destas mani-festações culturais, suficiente para impedir que o presente, as-sim como o passado recente, possa ser tomado como base de dados, estabelecemos, nas descrições deste livro, uma referên-cia temática, no espaço e no tempo, para ancorar o texto. A dé-cada-limite escolhida foi a de sessenta do século XX, período em que os dados e informações sobre o tema se mostraram consis-tentes e em que ainda se podia dizer que festas, danças, músi-cas e outras tradições regionais eram protagonistas da vida po-lítica, social e cultural da população, portanto, com característi-cas próprias e singulares, que lhe davam selo de autenticidade. Do início da colonização até os anos sessenta do século passa-do, o espaço considerado é o território atual do Estado de Mato Grosso, e o eixo temático da pesquisa são as Festas de Santo e todo o seu universo cultural, mítico e simbólico.
Detalhes de ambiente do Museu do Artesanato, que funciona no SESC Casa do Artesão.
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ÅChegada da procissão da Festa de São Benedito, em Cuiabá (2006). Dela estima-se que participaram 50 mil devotos. Esta foi a primeira festa após a entrega da grande restauração da Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, templo católico do século XVIII, no alto do morro da Prainha, onde surgiu o núcleo urbano de Cuiabá, em 1722.
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Festas de Santos
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Festas ReligiosasAs Festas Religiosas, em Mato Grosso, são importantes ma-
nifestações da cultura tradicional popular regional. Nelas mis-turam-se o laico e o sacro numa simbiose natural, em que dan-ças, rezas, culinária, músicas, brincadeiras e religiosidade se juntam para formar como que uma síntese, suporte e berço de muitas das diversões e crenças que embalam a população e que formam parte significativa do patrimônio cultural do Estado.
As festas tradicionais do povo mato-grossense guardam uma profunda ligação com a religião católica, posto que suas origens se situam na intensa religiosidade dos povos da Ida-de Média, e nas lendas, mitos e folguedos da época onde apare-cem. A essas raízes, que se confundem com a cultura colonia-lista portuguesa, foram sendo adicionados elementos das cul-turas espanhola – através dos povos da região abrangida pela bacia do rio Paraguai –, dos índios e negros, tais como rituais, instrumentos, mitos, lendas e danças, que se integraram paula-tinamente aos costumes populares, como o cururu, o siriri e o rasqueado, conseqüência da miscigenação desses povos. Soma-dos a esses componentes, influiu, ainda, no processo de confi-guração destas festas, o relativo isolamento da população ma-to-grossense dos grandes centros político-econômicos do país, principalmente da população do norte do antigo território de Mato Grosso. Esse isolamento permitiu que a criatividade do povo se exprimisse mais livremente, dando, assim, liberdade para engendrar instrumentos, rituais, danças e outras manifes-tações singulares, que vieram, finalmente, se consolidar no ar-ranjo da grande maioria desses festejos e na conformação de grande parte das manifestações culturais do Estado.
Uma festa é um excesso permitido, ou melhor, obrigatório, a ruptura solene de uma proibição.Sigmund Freud
ÉDevotos pedem esmola para a Festa do Divino, na vila de Diamantino, em janeiro de1828. O grupo também é conhecido como bando precatório do Divino. A bandeira é carregada pelo folião-mor.
Aquarela de Hércules Florence, 22,6 x 31,5 cm – janeiro de 1828. (in EXPEDIÇÃO, 1998, p. 348).
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Festas de SantosAs festas tradicionais mato-grossenses, devido às suas ori-
gens, estão, quase sempre, relacionadas com a homenagem a um santo.
Basicamente, estas festas nasceram, se desenvolveram e consolidaram-se de três formas, sempre com o apoio da Igre-ja e do Estado:
— As Festas de Santos das Irmandades, tendo como fulcro as irmandades religiosas e os templos católicos;
— as Festas de Santos de Famílias, motivadas por promes-sas ou veneração de um clã ou de um de seus membros a deter-minado Santo, e realizadas em residências particulares; e
— as Festas de Santos Rurais, eventos que ocorrem nas ca-sas ou capelas das zonas rurais ou suburbanas, como devoção a um Santo e forma de expressão dos sentimentos lúdicos dos homens do campo.
As Festas de Santos, em Mato Grosso, como em todo o país, são admiráveis instrumentos de mediação e síntese da cultura sagrada e profana regional. As mais importantes, historicamen-te, são as festas das Irmandades do Senhor Divino e São Bene-dito, com destaque para a “Festa do Espírito Santo”, como era conhecida em Cuiabá a Festa do Divino, cidade onde o evento atingiu seu maior esplendor. Os eventos que ocorrem nesta fes-ta, sacros e profanos, espelham a composição dos ritos de quase todas as Festas de Santo que ocorrem em Mato Grosso.
Assim, o relato de uma destas festas em Cuiabá, à época de sua maior pompa – fins do século XIX início do XX –, exempli-fica e ajuda a entender os rituais das demais festas de santo no Estado, facilitando a compreensão do assunto. Esta, a razão de começarmos o desenvolvimento dos temas com a descrição des-ta festa.
Havia vários sentidos nas funções aparentemente irrelevantes da festa, dando persistência a certas maneiras de pensar, de ver e de sentir.Rita Amaral
ÉSaída do Imperador e Imperatriz da festa do Divino, em 1923. Detalhe de foto de Raimundo Bastos, do acervo do Núcleo de Documentação e Informação Histórica Regional, NDIHR, da UFMT.
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