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Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Departamento de Odontologia Belo Horizonte 2010 AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA DE DOIS MÉTODOS DE DESCONTAMINAÇÃO DE ALICATES ORTODÔNTICOS CYBELLE LUÍSA DE SOUZA PEREIRA

CYBELLE LUÍSA DE SOUZA PEREIRA · Ao meu marido, Kdo, companheiro de sonhos e conquistas, por estar ao meu lado, lutando comigo. Obrigada pelo carinho, respeito, cumplicidade e paciência

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Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Departamento de Odontologia

Belo Horizonte

2010

AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA DE DOI S MÉTODOS DE DESCONTAMINAÇÃO

DE ALICATES ORTODÔNTICOS

CYBELLE LUÍSA DE SOUZA PEREIRA

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Cybelle Luísa de Souza Pereira

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Odontologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Odontologia, área de concentração: Ortodontia.

Orientador: Prof. Dr. Dauro Douglas Oliveira

Co-orientadora: Profa. Dra. Maria Eugênia Alvarez-Leite

Belo Horizonte

2010

AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA DE DOIS MÉTODOS DE DESCONTAMINAÇÃO

DE ALICATES ORTODÔNTICOS

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FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Pereira, Cybelle Luísa de Sousa P436a Avaliação da eficácia de dois métodos de descontaminação de alicates

ortodônticos / Cybelle Luísa de Sousa Pereira. Belo Horizonte, 2010. 69 f.: il. Orientador: Dauro Douglas Oliveira Co-orientadora: Maria Eugênia Alvarez Leite Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Programa de Pós-Graduação em Odontologia. 1. Instrumentos e aparelhos odontológicos - Esterilização. 2.

Descontaminação. 3. Controle biológico. I. Oliveira, Dauro Douglas. II. Leite, Maria Eugênia Alvarez III. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Odontologia. IV. Título.

CDU: 616.314-089.1

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FOLHA DE APROVAÇÃO

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Ao meu pai, porto seguro.

À minha mãe, inspiração.

Às minhas filhas Laura e Maitê, razões de viver.

Ao meu companheiro Ricardo, eterna paixão.

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AGRADECIMENTOS

À minha mãe, Malu, pelo apoio incondicional em todo e qualquer momento.

Sem você seria impossível concretizar esse sonho. Muito Obrigada!

Ao meu pai, Ozanam, que mesmo de longe esteve tão perto e em meus

sonhos disse: “Força, filha!”

Ao meu marido, Kdo, companheiro de sonhos e conquistas, por estar ao meu

lado, lutando comigo. Obrigada pelo carinho, respeito, cumplicidade e paciência.

Às minhas filhas, Laura e Maria Tereza, que me ensinam a todo o momento

os reais valores da vida. Agradeço cada sorriso, cada afago, cada lágrima, cada

gargalhada.

Aos meus irmãos, Fred e Marcus, aos Lauros, Marcinha, Tina, Aline e Keka,

meus sobrinhos (Pepê, Deco, Aninha, Felipe e Bê) e aos meus familiares que

torcem por mim e caminham comigo.

Ao anjo da minha vida, Ednéia, que cuida das minhas filhas, da minha casa e

de mim com um carinho sem fim. Muito Obrigada!

Aos amigos, especialmente à Diela, que entenderam minha ausência e me

deram colo sempre que precisei.

Ao meu orientador, professor, colega e amigo, Dauro Oliveira a quem tanto

admiro e de quem tanto me orgulho. Obrigada por acreditar em mim e conte sempre

comigo.

À minha co-orientadora, Maria Eugênia, que muito me ensinou e ensina,

tornando a pesquisa uma jornada prazerosa e enriquecedora. Fiquei muito feliz em

reencontrá-la. Não encontro palavras que possam agradecer seu esforço em me

ajudar.

Aos colegas e amigos do COP: Aninha, Rafa, Sarah, Brunos, Maria Rita,

Paula, Lelê, Dani, Fefê, Bella, Petrus, Raquel e especialmente à Dri, Flavinha e Taty

que fizeram essa caminhada valer mais a pena. Torço muito por todos vocês e

estejam certos que sempre estarei disposta a ajudá-los.

À Lari e ao Lucas por serem meus companheiros inseparáveis, amigos fiéis,

irmãos. Afirmo convicta que o melhor de todo esse período foi conhecer vocês.

Muito difícil imaginar como será sem vê-los todos os dias.

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Aos professores Armando Lima, Bernardo Souki, Ênio Mazzieiro, Flávio

Almeida, Hélio Brito, Heloísio Leite, Ildeu Andrade, José Eymard, José Maurício,

Júlio Brant e Tarcísio Junqueira por me ensinarem com dedicação, entusiasmo e

paciência. Vou sentir muita saudade.

Às alunas de iniciação científica, Laís Miagava e Suelen Nunes, que suavam

por mim e junto a mim no laboratório de Microbiologia. E aos já formados Raquel e

Fabrizio por realizarem as entrevistas com tanto empenho e esforço.

Aos alunos da graduação que orientei durante o meu estágio na disciplina de

Odontopediatria II. Obrigada pelo carinho que recebi e pela agradável convivência.

Ao FIP/PUC Minas e ao CNPq que financiaram as bolsas de iniciação

científica das alunas de graduação em Odontologia, Laís e Suelen, contribuindo

ainda mais para a valorização científica deste estudo.

Aos funcionários da PUC Minas Mariângela, Toninha, Vivi, Noeme, Zezé,

Chester, Luzia, Ana Paula, meninas da CME e da limpeza. E, especialmente, aos

amigos Lorraine, Diego e Alcides pela convivência harmônica e pela inigualável

ajuda.

Às companheiras de consultório Aline, Cris e Marcela por serem amigas e me

darem todo o suporte para trabalhar com alegria e qualidade.

Agradeço aos pacientes do COP e aos do meu consultório pela paciência e

confiança.

Por fim, mas não menos importante, agradeço a Deus pela oportunidade de

mais uma conquista, por tudo isso e por tudo mais.

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“Ser crítico é saber tirar a verdade do seu esconderijo,

de sua camuflagem. É saber ir além das aparências e do que é falso.

Ser crítico é assumir o ser humano, o ser consciente no meio social aparente,

das interpretações manipuladas. Sem medo de ser incompreendido, de incomodar,

de ser dissonante numa sociedade permissiva.”

FreFreFreFrederico Ozanamderico Ozanamderico Ozanamderico Ozanam

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APRESENTAÇÃO

Este trabalho se refere à dissertação apresentada ao Programa de Pós

Graduação em Odontologia do Departamento de Odontologia da Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais e representa requisito parcial para a

obtenção do grau de mestre em Ortodontia.

Os questionamentos que culminaram com a elaboração desta dissertação

surgiram das observações do orientador deste trabalho, Dr. Dauro Douglas Oliveira,

que ao retornar de seu Mestrado em Ortodontia na Marquette University (Milwaukee,

Wisconsin, USA) notou grande diferença entre a abordagem de biossegurança

realizada na Ortodontia Brasileira quando comparada à Americana. Associou-se a

isso o meu interesse em relação ao assunto abordado e o desejo em melhorar o

atual paradigma de controle de infecção cruzada em que se encontra a Ortodontia.

Durante minha graduação, fui aluna de iniciação científica e participei do

mestrado da co-orientadora deste trabalho, Dra. Maria Eugênia Alvarez-Leite,

pessoa fundamental no desenvolvimento e execução desta pesquisa. Naquele

tempo, foi avaliada a conduta dos cirurgiões-dentistas de Belo Horizonte diante dos

procedimentos de controle de infecção cruzada. Graduei-me na UFMG em

dezembro de 1995 e terminei a especialização em Odontopediatria em julho de

1999, na mesma faculdade. Trabalhei durante sete anos em consultório particular e

nos serviços públicos de Ibirité e Nova Lima. Durante essa caminhada posso dizer

que as mudanças de atitude em relação às condutas de controle de infecção iniciam

através da ética, autocrítica e bom senso do operador, porém ainda necessitam de

estímulos legislativos, científicos e técnicos para que realmente ocorram.

De acordo com as opções de formato contempladas pelo regulamento do

Programa, esta dissertação se baseia em dois artigos produzidos durante o curso,

respectivamente intitulados:

1. Conduta dos ortodontistas de Belo Horizonte em relação ao controle de

infecção cruzada.

2. Avaliação microbiológica de diferentes métodos de descontaminação

utilizados em alicates ortodônticos.

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O primeiro artigo relata a importância do controle de infecção nos consultórios

de Ortodontia, discorre sobre as legislações nacionais e internacionais que

regulamentam esse importante assunto. Apresenta os resultados das entrevistas

realizadas com 44 ortodontistas de Belo Horizonte em relação ao controle de

infecção que realizam, priorizando a descontaminação dos alicates ortodônticos.

No segundo artigo foi avaliada, pelo método de cultura microbiológica, a

eficácia dos métodos de descontaminação (vapor d’água saturado sob pressão-calor

úmido e álcool etílico 70% p/V) de alicates ortodônticos utilizados na clínica. Tais

avaliações basearam-se nos resultados obtidos com os questionários do primeiro

artigo. A partir deste estudo, observou-se a necessidade da realização de uma

avaliação in vitro. Até o atual momento, foi realizado estudo laboratorial preliminar e

seus resultados encontram-se descritos no quinto capítulo desta dissertação.

Além dos capítulos referentes aos artigos, esta dissertação traz as

considerações iniciais nas quais o tema a ser estudado é introduzido e os objetivos

do trabalho são descritos. Em seguida, apresentamos o estudo in vitro citado

anteriormente. Como a metodologia descrita nos artigos nem sempre pode ser bem

detalhada, acrescentamos um apêndice (APÊNDICE A) com a descrição minuciosa

da metodologia realizada. Ainda, as referências bibliográficas e os anexos deste

trabalho são apresentados ao final.

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RESUMO

Objetivos : (1) identificar e avaliar os procedimentos utilizados na descontaminação

de alicates ortodônticos, pelos ortodontistas de Belo Horizonte; (2) testar, pelo

método de cultura microbiológica qualitativa e quantitativa, a ocorrência de

microrganismos viáveis na superfície dos alicates ortodônticos, antes e após os

processos de desinfecção química e esterilização pelo vapor d’água saturado sob

pressão; (3) estudar a eficácia da desinfecção química em alicates ortodônticos

utilizada pelos ortodontistas de Belo Horizonte. Métodos : (1ª Etapa – Entrevista)

Quarenta e quatro especialistas em Ortodontia, registrados no Conselho Federal de

Odontologia (CFO) e associados à Associação Brasileira de Ortodontia – seção

Minas Gerais (ABOR-MG) foram entrevistados sobre os procedimentos de controle

de infecção realizados em seus consultórios, com maior ênfase ao processo de

descontaminação de alicates. O método de descontaminação mais utilizado foi

avaliado na segunda etapa deste trabalho. (2ª Etapa – Coleta e Avaliação

Microbiológica) Vinte alicates ortodônticos removedores de banda foram utilizados

durante atendimento clínico de rotina e divididos em dois grupos, de acordo com o

método de descontaminação empregado. O grupo 1 (G1) foi submetido à lavagem

manual com água e sabão, secagem e fricção com álcool etílico 70% (p/V) por 15

segundos e o grupo 2 (G2) foi submetido à lavagem em cuba ultrassônica com

detergente enzimático, enxágue, secagem, lubrificação com silicone e esterilização

por vapor d’água saturado sob pressão (autoclavagem). Ambos os grupos foram

submetidos a testes microbiológicos em dois momentos distintos: t0 – 10 a 15

minutos após o uso e t1 – logo após a descontaminação. Foram realizadas análises

microbiológicas qualitativas e quantitativas de todas as amostras coletadas.

Resultados : (ARTIGO 1) Metade dos ortodontistas realizava desinfecção dos seus

alicates com álcool etílico 70% (p/V) e 45,5% realizavam esterilização pelo vapor

d’água saturado sob pressão (autoclavagem). Apenas 3 dos 44 entrevistados

realizavam a descontaminação da maneira adequada. (ARTIGO 2) Houve

diminuição do nível de contaminação inicial tanto em G1 quanto em G2. Entretanto

essa diferença foi significativamente maior quando o vapor d’água saturado sob

pressão foi empregado. Com a autoclavagem, os resultados foram homogêneos e

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garantiram a ausência de crescimento microbiano, nas condições testadas.

Conclusões : (1) o método de descontaminação mais utilizado entre os ortodontistas

de Belo Horizonte foi lavagem manual com água e sabão, seguida pela desinfecção

com álcool etílico 70% (p/V); (2) a desinfecção com álcool etílico 70% (p/V) reduz o

nível inicial de contaminação, mas parece não assegurar o controle de infecção

cruzada nos consultórios ortodônticos; (3) apenas a autoclavagem garante a

ausência total de microrganismos e, portanto, deve ser a opção de escolha para se

evitar infecções cruzadas.

Palavras-chave: Exposição a agentes biológicos. Ortodontia. Entrevista.

Esterilização. Descontaminação. Desinfecção. Microbiologia. Controle de infecções.

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ABSTRACT

Purposes : (1) Identify and evaluate the procedures used in the decontamination of

orthodontic pliers by Belo Horizonte’s orthodontists, (2) evaluate the extent of

bacterial contamination of orthodontic pliers and the efficacy of two different

decontamination techniques applied after clinical use, (3) evaluate the effectiveness

of chemical disinfection of orthodontic pliers. Methods : (Section 1 - Interview) Forty-

four orthodontists, registered in the Federal Council of Dentistry (CFO) and

associated with the Brazilian Association of Orthodontics – Minas Gerais Section

(ABOR-MG) were interviewed about the infection control procedures performed in

their offices, emphasizing the decontamination of pliers. (Step 2 - Microbiological

Evaluation) Twenty orthodontic pliers (band removers) were used during routine

clinical care and divided into two groups according to the decontamination method

used. Group 1 (G1): manual washing with soap and water, drying and 70% ethyl

alcohol friction for 15 seconds and Group 2 (G2): ultrasonic washing with enzymatic

detergent, rinsing, drying, silicone lubrication and steam sterilization. Both groups

were submitted to microbiological tests at two different times: t0 - 10 to 15 minutes

after use and t1 - after decontamination. Qualitative and quantitative tests of all

samples collected were made. Results : (Paper 1) Half of the orthodontists

performed disinfection of their pliers with 70% ethyl alcohol and 45.5% performed

sterilization. Only three of the 44 orthodontists were carrying out decontamination

entirely appropriate. (Paper 2) Initial contamination level reduced significantly with

70% ethyl alcohol and with steam sterilization, but this difference was significantly

higher in G2. Steam sterilization showed homogeneous results and ensured the

absence of microbial growth under the tested conditions. Conclusions : (1) the

preferred decontamination method used by Belo Horizonte’s orthodontists was soap

and water manual washing and disinfection with 70% ethyl alcohol; (2) disinfection

with 70% ethyl alcohol reduces the initial level of contamination, but does not

guarantee cross infection control, (4) only the steam sterilization ensures the total

absence of microrganisms.

Keywords : Exposure to biological agents. Orthodontics. Interview. Sterilization.

Decontamination. Disinfection. Microbiology. Infection control.

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LISTA DE ABREVIATURAS

ABOR-MG – Associação Brasileira de Ortodontistas – Secção Minas Gerais BHI – Brain Heart Infusion CEP – Comitê de Ética e Pesquisa CFO – Conselho Federal de Odontologia CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico DO-PUC Minas – Departamento de Odontologia da PUC Minas DP – Desvio padrão FIP – Fundo de Incentivo à Pesquisa HBV – vírus da Hepatite B ICBS-PUC Minas – Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde da PUC Minas p/V – peso em volume PUC Minas – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais UFC – Unidade Formadora de Colônias

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LISTA DE ARTIGOS

• Conduta dos ortodontistas de Belo Horizonte em relação ao controle de

infecção cruzada

• Avaliação da eficácia de dois métodos utilizados na prática clínica para a

descontaminação de alicates ortodônticos.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO----------------------------------------------------------------------- 15

2. OBJETIVOS--------------------------------------- ----------------------------------- 17

2.1. Objetivo Geral-------------------------------- ------------------------------ 17

2.2. Objetivos Específicos------------------------- --------------------------- 17

REFERÊNCIAS---------------------------------------------------------------------- 18

3. ARTIGO 1----------------------------------------------------------------------------- 22

4. ARTIGO 2----------------------------------------------------------------------------- 37

APÊNDICES----------------------------------------------------------------------------- 56

ANEXO------------------------------------------------------------------------------------ 69

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1. INTRODUÇÃO

A Ciência está em constante evolução e o que é apropriado e inovador nos

dias de hoje, poderá ser considerado inadequado ou ultrapassado amanhã. Na

Ortodontia, isso não é diferente e é notável o desenvolvimento de novas técnicas e

materiais nesse campo de estudo. Vários são os marcos dessa evolução e, entre

eles, podemos citar: o desenvolvimento do sistema adesivo na colagem de

bráquetes; a utilização de ligas metálicas, como as de níquel-titânio e titânio-

molibidênio; a ancoragem esquelética e o emprego de imagens tomográficas de

forma rotineira. A Epidemiologia e a Microbiologia também estão em constante

evolução; porém, parece ser mais fácil a adesão dos profissionais aos avanços

técnicos do que àqueles que se referem ao controle das doenças transmissíveis.

A contaminação cruzada se caracteriza pela transmissão de microrganismos

de uma pessoa para outra e, na Odontologia, ela pode ocorrer das seguintes

maneiras: (1) do paciente para a equipe; (2) da equipe para o paciente; (3) do

paciente para outro paciente. As vias de transmissão podem ser diretas, indiretas

(por meio de instrumentos ou superfícies) ou por via aérea (aerossol ou fluidos

respiratórios). Além disso, os microrganismos podem ser inoculados por: agulhas ou

pequenas punções; soluções de continuidade da pele e mucosas da boca, nariz e

olhos; lesões abertas, inalação ou ingestão. Portanto, as possibilidades de

ocorrência de infecção cruzada na prática odontológica são numerosas e todas

deveriam ser consideradas no momento de se implantar e implementar um

programa de prevenção e controle de infecção cruzada, em todos os campos da

atividade profissional.

Como essas possibilidades de infecção se manifestam nos consultórios de

Ortodontia? Será que os procedimentos ortodônticos representam menor risco de

contaminação por serem menos invasivos e mais rápidos do que os de outras

especialidades odontológicas? No campo da Ortodontia, mesmo uma avaliação

superficial da abrangência da atuação do profissional já dá sinais dos riscos

envolvidos. A prática clínica pode variar de simples consultas preventivas em

crianças, ao atendimento de pacientes recém submetidos a cirurgias ortognáticas

extensas, passando pela inserção rotineira de mini implantes.

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Os alicates ortodônticos podem ser utilizados diretamente na boca dos

pacientes, manipulados pelas mãos contaminadas ou entrar em contato com fios e

aparelhos ortodônticos contaminados. Sendo assim, são potenciais vias de

transmissão de microrganismos ou fontes de infecções cruzadas. A opção pela

biossegurança pressupõe, então, o reconhecimento dos riscos inerentes a cada área

e o conhecimento dos processos de controle recomendados e cientificamente

sustentados. Apesar de parecer lógica a implementação de medidas universais de

biossegurança nos consultórios ortodônticos, pouco se sabe sobre o comportamento

dos ortodontistas brasileiros em relação a essa questão. Esses profissionais estão

cientes dos riscos de infecção envolvidos em suas atividades clínicas? Quais são as

medidas empregadas de fato, para prevenir infecções cruzadas no dia a dia da

prática ortodôntica? Os procedimentos clínicos tidos como “menos invasivos”

justificariam a utilização de métodos de desinfecção em detrimento aos métodos de

esterilização?

Tentando responder a essas e outras perguntas, foi proposto este trabalho,

tomando, como amostra representativa da especialidade Ortodontia, profissionais

em exercício da clínica em Belo Horizonte.

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2. OBJETIVOS

2.1. Objetivo Geral:

• Avaliar os métodos de controle de infecção cruzada e sua real eficácia na

descontaminação dos alicates utilizados pelos ortodontistas de Belo

Horizonte.

2.2. Objetivos específicos:

• Identificar e avaliar os procedimentos utilizados na descontaminação de

alicates ortodônticos por ortodontistas de Belo Horizonte.

• Avaliar a eficácia destes procedimentos (métodos e técnicas) apurados, após

utilização in vivo.

• Avaliar, pelo método de cultura microbiológica, qualitativa e quantitativamente,

a ocorrência de microrganismos viáveis na superfície dos alicates

ortodônticos recém utilizados, antes e após os processos de desinfecção

química e esterilização pelo vapor d’água saturado sob pressão.

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Horizonte frente aos procedimentos de controle de infecção cruzada: uma

perspectiva epidemiológica. Dissertação (Mestrado em Microbiologia): Universidade

Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1996. 254f

3 Alvarez-Leite, ME. Níveis salivares de microrganismos do grupo Streptococcus

mutans, Lactobacillus spp. e Candida spp. em crianças infectadas pelo HIV e sua

relação com cárie dental e condição imunológica. Tese (Doutorado): Universidade

Federal de Minas Gerais, Instituto de Ciências Biológicas, Belo Horizonte, 2005.

296f.

4 ANVISA, Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Serviços Odontológicos:

prevenção e controle de riscos. Brasília: Ministério da Saúde, 2006. p. 156.

5 Belo Horizonte. Portaria SMSA/SUS-BH N 008/2006. Estabelece condições para

instalação e funcionamento de estabelecimentos de Assistência. [Acesso em 01 nov

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23 Minas Gerais. Resolução SES/MG nº 1559/2008 de 13 de Agosto de 2008. Aprova o

Regulamento Técnico que estabelece condições para a instalação e funcionamento

dos Estabelecimentos de Assistência Odontológica / EAO no Estado de Minas

Gerais. [Acesso em 01 nov 2010]. Disponível em:

www.saude.mg.gov.br/atos_normativos/legislacao-sanitaria/estabelecimentos-de-

saude/odontologia/odontologia

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22

3. ARTIGO 1

Título em Português

Conduta dos ortodontistas de Belo Horizonte em relação ao controle de infecção

cruzada.

Título em Inglês

Accomplishment with infection-control procedures among Belo Horizonte

orthodontists.

Resumo

O controle de infecção cruzada deveria ser uma das preocupações primárias dos

profissionais de saúde, entre eles os ortodontistas. Apesar disso, tal especialidade é

considerada uma das mais negligentes em relação a esse controle. As

características dos procedimentos ortodônticos, muitas vezes de curta duração e

geralmente pouco invasivos, são usadas para justificar cuidados menos rigorosos na

rotina clínica de muitos desses profissionais. Diante desse problema, foi realizada

entrevista com 44 ortodontistas de Belo Horizonte. Nas perguntas buscou-se dados

que caracterizassem os cuidados em relação ao controle de infecção realizado pelos

profissionais. Os resultados mostraram que 45,5% esterilizavam seus alicates e 50%

faziam desinfecção com álcool etílico 70% (p/V). Porém, 92,9% realizavam a

descontaminação de maneira inadequada. Entre os ortodontistas que desinfetavam

seus alicates, 86,4% afirmaram não realizar a esterilização por temerem que tal

procedimento danificasse o instrumento. De acordo com a literatura científica e a

legislação nacional e internacional, não existem justificativas para a não esterilização

dos alicates ortodônticos. Diante das respostas obtidas, observa-se a necessidade

de atualização dos conceitos relativos ao controle de infecção cruzada e adoção de

nova conduta de biossegurança na Ortodontia.

Abstract

Cross infection control should be one of the primary concerns of health professionals,

including orthodontists. However, this specialty is one of the most negligent in

relation to this control. The characteristics of orthodontic procedures, often of short

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duration and generally less invasive, are used to justify less stringent care in the

clinical routine. Therefore, orthodontists from Belo Horizonte were interviewed and

the results showed that 45.5% sterilized their pliers and 50% disinfected with alcohol

70%. Of those, 92.9% carry out decontamination improperly. Among orthodontists

that disinfected their pliers, 86.4% does not sterilize fearing that this procedure would

harm the plier. According to scientific literature and national and international

legislation, there is no excuses to not sterilize orthodontic pliers. Based on the

results, there was a need to update the concepts of orthodontists who need to adopt

new infection-control behavior.

Palavras-chave

Exposição a agentes biológicos. Ortodontia. Entrevista. Esterilização.

Descontaminação.

Keywords

Exposure to biological agents. Orthodontics. Interview. Sterilization.

Decontamination.

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24

Informações sobre os autores:

• Cybelle Luísa de Souza Pereira: Graduada em Odontologia pela UFMG,

Especialista em Odontopediatria pela UFMG, Mestranda em Ortodontia pela

PUC Minas.

Rua Rafael Magalhães, 245 - Bairro Santo Antônio

Belo Horizonte – MG – CEP: 30350-110

Telefones: (31) 3297-8683/ (31) 3377-0807/ (31) 8708-2856

e-mail: [email protected]

• Dauro Douglas Oliveira: Graduado em Odontologia pela UFMG, Mestre em

Ortodontia pela Marquette University (Milwaukee/EUA), Doutor em Ortodontia

pela UFRJ. Professor Adjunto III e Coordenador do Mestrado em Ortodontia da

PUC Minas.

• Maria Eugênia Alvarez-Leite: Graduada em Odontologia pela UFMG, Mestre e

Doutora em Ciências Biológicas (Microbiologia) pela UFMG. Professora Adjunto

III da PUC-Minas, Especialista em Saúde Coletiva, com ênfase em

Biossegurança e Controle de Infecção.

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INTRODUÇÃO

O controle de infecção deveria ser preocupação constante no consultório de

quaisquer profissionais de saúde, como, por exemplo, aqueles que atuam em

clínicas odontológicas e, consequentemente, os que prestam atendimento

ortodôntico. Apesar disso, os ortodontistas, muitas vezes, não tomam as devidas

precauções em relação a esse controle 1-6. As justificativas para tal descuido são

inúmeras, sendo que a curta duração dos atendimentos 4 e sua pouca invasividade 2;

4; 6; 7 são as mais comuns e levam a uma crença de que há menor risco de

contaminação cruzada na prática dessa especialidade odontológica.

Sabe-se que os cirurgiões dentistas pertencem ao grupo de risco para a

Hepatite B, apresentando uma incidência três vezes maior do que a população em

geral. Dentro desse grupo, foi relatado que os ortodontistas possuíam a segunda

maior incidência, sendo inferior apenas ao acometimento dos cirurgiões

bucomaxilofaciais 8. Apesar de ser um estudo antigo e de talvez não retratar a atual

incidência dessa doença no meio odontológico, esse é um bom exemplo da

vulnerabilidade dos ortodontistas à contaminação cruzada.

A prática da Ortodontia apresenta os mesmos riscos das outras áreas da

Odontologia e não existem justificativas que expliquem a possível negligência no

controle de infecção nos procedimentos ortodônticos, por mais rápidos e “não

invasivos” que eles sejam. É importante, ainda, salientar que, como os atendimentos

ortodônticos são muitas vezes mais rápidos do que os das outras especialidades

odontológicas, há maior rotatividade de pacientes nos consultórios de Ortodontia,

aumentando assim a probabilidade de se atender indivíduos com processos

infecciosos importantes.

Considerando-se os instrumentos potenciais causadores de infecção,

podemos classificá-los em 9: (1) críticos – instrumentos que penetram na mucosa e

precisam ser obrigatoriamente esterilizados; (2) semicríticos– instrumentos que

tocam a mucosa e devem ser esterilizados e (3) não críticos –

instrumentos/superfícies tocadas durante o atendimento e que devem ser

desinfetados. Atenção especial deve ser dada aos instrumentos semicríticos, como

os alicates ortodônticos. De acordo com a legislação nacional 10; 11 e internacional 12

em Odontologia, tais instrumentos devem ser preferencialmente esterilizados e, na

sua impossibilidade, desinfetantes de alta eficácia devem ser utilizados.

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Dessa forma, o controle de infecção não beneficiaria apenas os pacientes,

mas também o ortodontista e sua equipe. Além disso, ajudaria a valorizar a imagem

da clínica e contribuiria na educação e conscientização em relação aos meios de

proteção contra infecção cruzada, podendo ainda ser utilizado como ferramenta de

marketing na conquista de novos pacientes 13. Mesmo assim, pouco se sabe a

respeito dos cuidados realmente tomados pelos ortodontistas para se evitar a

ocorrência de infecção cruzada em seus consultórios. Essa carência de dados é

ainda maior quando se leva em consideração apenas a realidade brasileira.

Portanto, o objetivo deste trabalho foi avaliar a conduta dos ortodontistas de

Belo Horizonte em relação os aos procedimentos de controle de infecção adotados

em suas rotinas clínicas, dando ênfase ao procedimento de descontaminação

utilizado nos alicates ortodônticos.

METODOLOGIA

Setenta cirurgiões-dentistas, registrados como especialistas em Ortodontia no

Conselho Federal de Odontologia (CFO) foram selecionados aleatoriamente da lista

de membros ativos da Associação Brasileira de Ortodontia – seção Minas Gerais

(ABOR-MG) para participar desse estudo. Destes, 44 aceitaram ser entrevistados.

As entrevistas foram agendadas e realizadas por dois alunos de iniciação científica

do curso de graduação em Odontologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas

Gerais (PUC Minas). Esses alunos foram treinados e calibrados previamente,

obtendo-se altos níveis de concordância (teste Kappa) após checagem das

respostas dos dois questionários de um mesmo profissional, como anteriormente

realizado por Alvarez-Leite em 1996 14. Os profissionais entrevistados assinaram um

termo de livre consentimento garantindo a participação voluntária e não houve

identificação nos questionários que foram incinerados após a coleta dos dados.

A entrevista, realizada por meio de questionário com perguntas abertas semi-

estruturadas, continha os seguintes temas:

• Caracterização geral: formação acadêmica, tempo de exercício profissional,

característica do atendimento (em órgãos públicos, pacientes particulares,

indivíduos conveniados e em clínicas) e caracterização sócio-econômica dos

pacientes, segundo percepção do próprio ortodontista.

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• Métodos e técnicas de descontaminação de instrumental e controle de

infecção cruzada: recursos utilizados, freqüência de uso e de troca, bem

como técnicas de descontaminação realizadas em seus consultórios.

As análises das associações com o método e as variáveis do questionário

foram baseadas nos Testes Qui-quadrado de Pearson assintótico e exato com a

utilização do programa SPSS 17.0® (IBM®, Somers, NY, USA). Destaca-se que esse

estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUC Minas

(CEP – PUC Minas).

RESULTADOS

Inicialmente, a amostra do presente estudo era de 70 profissionais associados

à ABOR-MG, o que corresponderia a, aproximadamente, 35% dos profissionais de

Belo Horizonte registrados como especialistas em Ortodontia no CFO. Dos 70

profissionais selecionados, obteve-se o retorno de 44 e os outros 26 se recusaram a

responder ao questionário.

A idade média dos entrevistados foi de 42,74 anos (DP ±10,625); o tempo

médio de formação foi de 18,76 anos (DP ±10,422) e a caracterização demográfica

dos ortodontistas está ilustrada na tabela 1. Observou-se que a grande maioria dos

ortodontistas atende em consultório particular e caracteriza sua clientela como de

classe média alta e média baixa.

Tabela 1 - Características dos especialistas em Ortodontia de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Fonte: dados da pesquisa

A tabela 2 refere-se aos métodos de descontaminação de alicates

ortodônticos. Observou-se que 50% dos ortodontistas de Belo Horizonte realizam a

Variáveis n Percentual (%)

Gênero Feminino Masculino

19 25

43,2% 56,8%

Titulação Mestres Doutores

14 02

31,8% 4,6%

Tipo de atendimento Clínica Consultório particular Convênio

11 42 21

25% 95,5% 47,7%

Características da clientela (percepção do ortodontista)

Classe alta Classe média alta Classe média baixa Classe baixa

07 37 27 03

15,9% 84,1% 61,4% 6,8%

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desinfecção dos alicates, sendo que 82% deles o fazem por meio de lavagem

manual com água e sabão, secagem e fricção com álcool etílico 70% (p/V), por

alguns segundos. A maioria deles justifica o não uso da autoclavagem por

possuírem número insuficiente de instrumentais e por acreditarem que a

esterilização danificaria os alicates. Dos profissionais que esterilizam seus alicates,

apenas 9 (45%) realizam lubrificação preventiva dos mesmos e 11 (55%) monitoram

o processo de esterilização por meio biológico.

Para se avaliar a qualidade dos processos de descontaminação, considerou-

se adequado: (1) esterilização 15; 16 – os alicates deveriam ser lavados, secados,

acondicionados e esterilizados em temperatura/tempo e pressão ideais (com ciclo de

secagem) conforme ilustrado na tabela 3; além disso, o monitoramento biológico

deveria ser realizado; (2) desinfecção 17; 18; 19 – os alicates deveriam ser lavados,

secos e desinfetados por fricção de álcool 70% por, no mínimo, um minuto (tabela

3). A qualidade dos processos utilizados era inadequada tanto considerando a

esterilização, quanto a desinfecção pela grande maioria dos entrevistados (92,8%)

(gráfico 1).

Tabela 2 - Características dos métodos de descontaminação dos alicates ortodônticos. Fonte: dados da pesquisa

Variáveis n Percentual (%)

Método utilizado Esterilização Desinfecção (álcool 70%) Outros

20 22 02

45,5% 50% 4,5%

DES

INFE

ÃO

(n=2

2)

Motivo de não usar a esterilização Desgaste do alicate Número insuficiente de alicates Desgaste + número insuficiente de alicates

17 03 02

77,3% 13,6% 9,1%

Lubrificação Sim Não

09 11

45% 55%

Monitora esterilização Sim Não Não respondeu

14 05 01

70% 25% 5%

ESTE

RIL

IZA

ÇÃ

O

(n=2

0)

Como monitora Meio biológico Fita autoclave Não responderam Não se aplica

11 01 02 06

55% 5% 10% 30%

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Temperatura Tempo Pressão

Autoclave gravitacional 15

121 a 127°C 15 a 40 minutos 1 a 2 atm

ESTE

RIL

IZA

ÇÃ

O

Autoclave pré-vácuo 16

132 a 134°C 3 a 6 minutos 1 a 2 atm

DES

INFE

ÃO

Álcool 70% 17; 18; 19

- Fricção de, no mínimo, 1 minuto (fricção por 30 seg., de 2 a 3 vezes)

-

Tabela 3 – Valores considerados padrões para uma esterilização adequada. Fonte: elaborado pela autora

Gráfico 1 – Qualidade dos métodos de descontaminação realizados pelos ortodontistas de Belo Horizonte. Fonte: dados da pesquisa

Na tabela 4 verifica-se que a única variável que possui correlação

estatisticamente significativa (p<0,05) com o método de descontaminação utilizado

foi o atendimento em clínicas ortodônticas. Ou seja, os ortodontistas que atendem

nesses estabelecimentos fazem mais desinfecção de alicates do que os que

atendem em consultórios particulares e pacientes conveniados.

DISCUSSÃO

Atualmente o tempo possui um valor maior e doá-lo a um entrevistador pode

ser uma tarefa não muito agradável. Talvez por isso, dos 70 contatos realizados,

obteve-se resposta positiva de 44 (62,85%) ortodontistas. Em outros estudos sobre

controle de infecção na Ortodontia, a taxa de adesão aos questionários também

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ficou próxima dos 70% 7; 20; 21. Esse índice pode ser considerado alto quando

comparado a pesquisas que obtiveram aproximadamente 40% de adesão 4; 22. O

atual estudo foi realizado por entrevista pessoal, enquanto o mais comum é a

realização de questionários enviados pelo correio. Isso pode ter aumentado a

aceitação; porém, se torna uma tarefa mais trabalhosa e demorada para os

pesquisadores, o que pode ter contribuído para a diminuição do tamanho da

amostra. Optou-se por esse tipo de entrevista pela necessidade não só de se

analisar a execução dos procedimentos de controle de infecção, como também a

adequação das técnicas e de se avaliar as condutas e opiniões dos ortodontistas.

Tal tipo de análise não seria possível com o uso de questionários enviados pelo

correio.

Tabela 4 – Correlação entre as variáveis com o método de descontaminação dos alicates ortodônticos. *qui-quadrado

Fonte: dados da pesquisa

Em relação aos métodos e técnicas de descontaminação dos alicates

ortodônticos, metade dos entrevistados relatou utilizar desinfecção a frio, 45,5% a

esterilização pelo vapor d’água sob pressão e 2 entrevistados (4,5%) usavam o

Esterilização n (%) Desinfecção n (%) Valor-p*

Gênero Feminino Masculino

07 (41,2%) 13 (52%)

10 (58,8%) 12 (48%)

0,491

Idade <40 anos ≥40 anos

08 (40%) 12 (54,5%)

12 (60%) 10 (45,5%)

0,346

Tempo de formação <15 anos ≥15 anos

09 (50%) 11 (45,8%)

09 (50%) 13 (54,2%)

0,789

Atendimento em clínica Sim Não

02 (18,2%) 18 (58,1%)

09 (81,8%) 13 (41,9%)

<0,05

Atendimento em consultório Sim Não

19 (47,5%) 01 (50%)

21 (52,5%) 01 (50%)

1,00

Atende convênio Sim Não

09 (47,4%) 11 (47,8%)

10 (52,6%) 12 (52,2%)

0,976

Mestrado Sim Não

08 (57,1%) 12 (42,9%)

06 (42,9%) 16 (57,1%)

0,382

Clientes de classe média alta Sim Não

16 (45,7%) 04 (57,1%)

19 (54,3%) 03 (42,9%)

0,691

Clientes de classe média baixa Sim Não

11 (42,3%) 09 (56,3%)

15 (57,7%) 07 (43,8%)

0,380

Qualidade do método Adequado Inadequado

01 (33,3%) 19 (48,7%)

02 (66,7%) 20 (51,3%)

1,00

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esterilizador com esferas de vidro. Esse resultado é bem semelhante aos estudos

conduzidos nos estados da Georgia e Califórnia (EUA) 4; 5, onde 38% 5 e 49% 4 dos

ortodontistas realizavam esterilização de seus alicates; porém, os estudos

americanos foram desenvolvidos quase duas décadas atrás. Os resultados desta

pesquisa são desencorajadores quando comparados à outra realizada em 1998 em

Illinois (EUA) 22, pois apenas 12% dos ortodontistas realizavam desinfecção de seus

alicates; os outros 88% realizavam esterilização. No presente trabalho, nenhum dos

ortodontistas entrevistados relatou utilizar forno de Pasteur (estufa) o que está de

acordo com a Portaria 008/2006 11 da Secretaria Municipal de Saúde de Belo

Horizonte, que não permite a utilização desse equipamento na esterilização dos

artigos odontológicos.

O presente trabalho sugere que, quando se trata de controle de infecção em

Ortodontia, a prática vigente no Brasil parece estar ainda bem atrasada em relação à

dos norte americanos. As atuais normas e legislações de vigilância sanitária

brasileira 10; 11 não refletem esse atraso e preconizam a esterilização de instrumentais

críticos e semicríticos. De acordo com as regras do Centro de Prevenção e Controle

de Doenças (Centers for Disease Control and Prevention – CDC) de 2003 12 e da

Resolução 1559 da Secretaria de Saúde do Estado de Minas Gerais 10, tanto os

instrumentais críticos como os semicríticos devem ser esterilizados. A desinfecção

de alto nível é aceita somente para os instrumentos semicríticos sensíveis ao calor.

Ainda há divergência na classificação dos desinfetantes alcoólicos, que podem ser

considerados desinfetantes de nível intermediário12 a de baixa eficácia17 e, portanto,

não devem ser utilizados na desinfecção dos alicates ortodônticos. Tais afirmações

são reforçadas no Manual de Prevenção e Controle de Riscos nos Serviços

Odontológicos, publicado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)

em 2006 23, que, em seu oitavo capítulo, diz: “Os artigos utilizados na cavidade bucal

exigem o máximo rigor no processamento, recomendando-se a sua esterilização por

autoclave. Isto pode ser justificado pelo fato de que o uso de desinfetantes não

assegura a eliminação de todos os patógenos, especialmente, os esporos

bacterianos.” Quais seriam as razões para essa baixa adesão às normas legais de

controle de infecção?

Entre os ortodontistas que não esterilizam seus alicates, 86% justificam essa

atitude devido à possibilidade de desgaste do seu instrumento. O uso do vapor

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d’água saturado sob pressão na esterilização dos alicates tem fundamentação

científica e não há evidências que justifiquem o medo dos ortodontistas em fazê-lo 24.

Não existe metal imune à corrosão 25 e, portanto, esse fenômeno ocorrerá em

qualquer processo de descontaminação utilizado, seja por agentes químicos, calor

seco ou calor úmido. Estudos 24-26 que comparam o efeito corrosivo de diferentes

métodos de descontaminação em alicates ortodônticos sugerem alguns

procedimentos fundamentais para se garantir maior durabilidade aos instrumentos:

(1) limpeza prévia do alicate (com remoção de toda matéria orgânica),

preferencialmente com ultrassom e água destilada; (2) secagem criteriosa da

articulação do alicate com ar pressurizado; (3) lubrificação da articulação com spray

de silicone; (4) no caso da autoclavagem, remoção dos alicates e demais

instrumentos, após o término do ciclo de secagem 24-26. Apesar disso, 55% dos

ortodontistas que esterilizam seus alicates não realizam lubrificação preventiva dos

mesmos.

Quando se considera a qualidade do processo de descontaminação, o

resultado observado é ainda mais desfavorável. Tanto em relação à esterilização

quanto à desinfecção, os ortodontistas não sabiam descrever ou descreviam de

maneira equivocada. Apenas três entrevistados realizavam este processo da

maneira adequada. Esses resultados refletem claramente a necessidade dos

profissionais se atualizarem regularmente no que se diz respeito ao controle de

infecção cruzada. Além disso, é necessário que toda a equipe esteja envolvida e

consciente sobre as normas de biossegurança e que as normas técnicas e

legislações sejam amplamente divulgadas e cobradas de maneira eficaz e eficiente

pelos órgãos governamentais responsáveis 27.

A pesquisa realizada aponta para a gravidade da situação, culminando no fato

de que, apesar de quase metade dos profissionais utilizarem o método de

esterilização para os alicates ortodônticos, apenas três realizavam-no de forma

adequada, independentemente de sua inserção no mercado de trabalho, tempo de

exercício profissional ou idade. Acrescenta-se a isso o resultado relativo ao

monitoramento biológico periódico. Esse procedimento é fator essencial para

garantir a qualidade da esterilização 28; 29; porém, parece ser realizado apenas pela

metade dos ortodontistas que autoclavam seus alicates.

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A qual preço as maloclusões estão sendo corrigidas? Promoção de saúde

passa certamente por boa oclusão, função adequada, estética facial e dentária, mas

primariamente pelo pressuposto de não se contaminar o paciente.

CONCLUSÕES

• As normas e legislações de vigilância sanitária brasileiras são bem claras e

estão de acordo com a literatura atual. Os dados apurados no presente trabalho

mostram que, apesar da clareza das normas e legislação de vigilância sanitária

vigentes no Brasil, em consonância com a literatura atual, 50% dos ortodontistas de

Belo Horizonte não trabalham de acordo com essas regulamentações, realizando a

desinfecção de seus alicates (artigos semicríticos a críticos) com desinfetante de

baixa/média eficácia (álcool 70%).

• Dos ortodontistas que realizam a desinfecção de seus alicates, 86%

acreditam que a esterilização irá danificar o instrumento.

• Entre os ortodontistas entrevistados, 92,8% realizam a descontaminação de

maneira inadequada.

• Os resultados obtidos permitem admitir que vários pacientes que frequentam

consultórios de Ortodontia, podem estar em risco de contrair doenças via

contaminação cruzada.

• As evidências que apontam, em nosso meio, o desconhecimento ou a

desconsideração do ortodontista quanto aos fundamentos do controle de infecção,

que devem nortear o exercício profissional na área de saúde, reforçam a relevância

do estudo e suscitam a necessidade de se aprofundar a contribuição da Academia

nesta linha de trabalho. Assim, devem ser estimulados estudos microbiológicos mais

amplos relacionados à prática ortodôntica. A disponibilização de dados convincentes

é essencial para a conscientização profissional quanto à delicadeza do problema e

para dar suporte mais objetivo à mudança de conduta, na perspectiva do controle de

infecções. Por outro lado, esses dados são, também, um alerta para o maior controle

e fiscalização por parte das autoridades sanitárias.

Agradecimento especial aos ex-alunos do Curso de Graduação em Odontologia da Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais, Raquel Freitas e Fabrízio Mendes, que muito se empenharam na

realização das entrevistas deste estudo.

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34

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4 ARTIGO 2

Título em Português

Avaliação da eficácia de dois métodos utilizados na prática clínica para a

descontaminação de alicates ortodônticos.

Título em Inglês

Microbiological evaluation of two decontamination methods used in orthodontic

pliers.

Resumo

Objetivo: Avaliar, por cultura microbiológica, a eficácia de dois métodos distintos de

descontaminação utilizados em alicates ortodônticos. Métodos: 20 alicates

ortodônticos removedores de banda foram utilizados durante atendimento clínico de

rotina e divididos em dois grupos, de acordo com o método de descontaminação

empregado. O grupo 1 (G1) foi submetido à lavagem manual com água e sabão,

secagem e fricção com álcool etílico 70% (p/V) por 15 segundos e o grupo 2 (G2) foi

submetido à lavagem em cuba ultrassônica com detergente enzimático, enxágue,

secagem, lubrificação com silicone e esterilização por vapor d’água saturado sob

pressão (autoclave). Ambos os grupos foram submetidos a testes microbiológicos

em dois momentos distintos: t0 – 10 a 15 minutos após o uso e t1 – logo após a

descontaminação. Foram realizadas análises microbiológicas qualitativas e

quantitativas de todas as amostras coletadas. Resultados: Tanto a desinfecção com

álcool etílico 70% (p/V), quanto a esterilização através da autoclave diminuíram

significativamente o nível inicial de contaminação, porém, essa diferença foi

significativamente maior em G2. A descontaminação utilizada em G2 apresentou

resultados homogêneos e garantiu a ausência de crescimento microbiano, nas

condições testadas. Conclusões: A lavagem seguida de desinfecção com álcool

etílico 70% (p/V) ou esterilização pelo vapor d’água sob pressão reduzem

significativamente a contaminação inicial dos alicates ortodônticos, porém, nas

condições testadas, apenas a autoclavagem garante a ausência total de

microrganismos viáveis e, portanto deve ser a opção de escolha para se evitar

infecções cruzadas.

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Abstract

Purpose: To evaluate the extent of bacterial contamination of orthodontic pliers and

the efficacy of two different decontamination techniques applied after clinical use.

Methods: 20 orthodontic pliers (band removers) were contaminated during routine

clinical care and divided into two groups according to the decontamination technique

applied. Group 1 (G1): manual washing with soap and water, drying and 70% ethyl

alcohol friction for a few seconds and Group 2 (G2): ultrasonic washing with

enzymatic detergent, rinsing, drying, silicone lubrification and steam sterilization.

Both groups were submitted to microbiological tests at two different times: t0 - 10 to

15 minutes after use and t1 - after decontamination. Qualitative and quantitative tests

of all samples collected were made. Results: Steam sterilization and 70% ethyl

alcohol disinfection significantly decreased the initial level of contamination, but this

difference was statistically higher in G2. Steam sterilization showed homogeneous

results and ensured the absence of microbial growth under the tested conditions.

Conclusions: Washing followed by disinfection with 70% ethyl alcohol or steam

sterilization significantly reduces the contamination of orthodontic pliers, but only the

autoclave ensures the total absence of microrganisms and therefore should be the

choice to avoid cross-infection.

Palavras-chave : Desinfecção. Esterilização. Microbiologia. Controle de infecções.

Ortodontia.

Keywords : Disinfection. Sterilization. Microbiology. Infection control. Orthodontics.

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Informações sobre os autores:

• Cybelle Luísa de Souza Pereira - Graduada em Odontologia pela UFMG,

Especialista em Odontopediatria pela UFMG, Mestranda em Ortodontia pela

PUC Minas.

Rua Rafael Magalhães, 245 - Bairro Santo Antônio

Belo Horizonte – MG – CEP: 30350-110

Telefones: (31) 3297-8683/ (31) 3377-0807/ (31) 8708-2856

e-mail: [email protected]

• Dauro Douglas Oliveira - Graduado em Odontologia pela UFMG, Mestre em

Ortodontia pela Marquette University (Milwaukee/EUA), Doutor em Ortodontia

pela UFRJ. Professor Adjunto III e Coordenador do Mestrado em Ortodontia da

PUC Minas.

• Maria Eugênia Alvarez-Leite - Graduada em Odontologia pela UFMG, Mestre e

Doutora em Ciências Biológicas (Microbiologia) pela UFMG. Professora Adjunto

III da PUC-Minas, Especialista em Saúde Coletiva, com ênfase em

Biossegurança e Controle de Infecção.

• Suelen Cristina Barbosa Nunes - Aluna de graduação do Curso de Odontologia

da PUC Minas. Bolsista iniciação científica FIP/PUC Minas – CNPq.

• Laís Mitie Rocha Miagava - Aluna de graduação do Curso de Odontologia da

PUC Minas. Bolsista iniciação científica FIP/PUC Minas – CNPq.

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INTRODUÇÃO

A ciência está em constante evolução. Todos os dias nos deparamos com

novas técnicas, novos materiais, novas descobertas biológicas e, em alguns casos,

até mesmo com mudanças de paradigmas. A Microbiologia e a Epidemiologia

também evoluem e a abordagem clínica atual, em relação ao controle de infecção é

muito diferente daquela de algumas décadas atrás. Não adotar as atuais medidas de

controle de infecção, utilizando justificativas antigas e já descartadas pela literatura

contemporânea, pode significar condutas que fogem à nossa obrigação moral, ética

e legal de oferecer tratamento aos pacientes com garantia de qualidade e promoção

de saúde.

Os ortodontistas, muitas vezes, não tomam as devidas precauções em

relação ao controle de infecção 1- 7. As justificativas mais comuns para tal descuido

são a rapidez dos atendimentos 4 e sua baixa invasividade 3; 4; 6; 7, que levam a uma

crença num menor risco de contaminação por parte desta especialidade da

Odontologia.

A contaminação cruzada é uma realidade e está bem documentada na

literatura 8. Ela pode ocorrer por contato direto (da equipe para o paciente e vice-

versa) e por contato indireto de paciente para paciente, por meio da equipe ou de

instrumentos e/ou superfícies. Considerando o grau de risco de infecção associado

ao seu uso, os instrumentos podem ser classificados em 9; 10: (1) artigos críticos:

utilizados em procedimentos de alto risco para infecção, pois penetram em tecido

conjuntivo ou ósseo; (2) artigos semicríticos: entram em contato com a membrana

mucosa íntegra e pele não íntegra e (3) artigos não críticos: entram em contato com

a pele íntegra.

De acordo com a legislação nacional e internacional em Odontologia 9-11, os

instrumentos reutilizáveis, sendo estes críticos, semicríticos ou não críticos, devem

ser esterilizados, desde que possível. O conceito de esterilização universal em

Odontologia, proposto por Miller 12, parte das evidências de que todos os

instrumentos utilizados na cavidade bucal do paciente são contaminados com saliva

e sangue, seja por contato direto ou indireto através de contato com as mãos

contaminadas. Além disso, artigos semicríticos podem penetrar, acidentalmente, em

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tecido mole 13. Os instrumentos não críticos podem ser desinfetados com

desinfetantes de nível intermediário 9; 10.

A esterilização tem sido descrita por vários autores como um processo pelo

qual há a destruição de todas as formas de vida e pode ser realizada por métodos

físicos ou químicos 9; 10; 14. A desinfecção elimina vários ou todos os microrganismos,

exceto esporos. Os desinfetantes químicos podem ser classificados de várias

formas. A classificação baseada na sugestão original de Spaulding, vastamente

mencionada na literatura, distingue três grupos por nível de atividade 15: (1)

desinfetantes de baixa eficácia, que apresentam ação antimicrobiana restrita,

inativam certos vírus (não destroem vírus não lipídicos) e bactérias na forma

vegetativa e não eliminam microrganismos resistentes como o bacilo da tuberculose

e endosporos bacterianos; (2) desinfetantes de nível intermediário, que eliminam

várias formas microbianas, entre elas o bacilo da tuberculose, mas não eliminam

endosporos bacterianos e sua ação sobre vírus hidrofílicos é variável; (3)

desinfetantes de alta eficácia, que eliminam, praticamente, todos os microrganismos,

exceto um pequeno número de esporos (figura 1).

Figura 1 – Ordem decrescente de resistência aos germicidas químicos Fonte: Modificado de Favero e Bond, 2001 15

Os alicates ortodônticos são instrumentos de uso contínuo na rotina de um

ortodontista. Existe uma variedade de tipos de alicates ortodônticos e, muitos deles

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são utilizados diretamente na cavidade bucal, sendo, então, considerados artigos

críticos ou semicríticos e que deveriam, portanto, ser esterilizados. No entanto,

vários ortodontistas realizam sua descontaminação por meio de lavagem manual e

fricção com álcool etílico 70%, por alguns (poucos) segundos 16. Isso torna

necessário verificar a eficácia dos métodos comumente utilizados pelos ortodontistas

na prevenção da infecção cruzada.

Hepatite B, herpes e aids são, certamente, algumas das mais graves doenças

que podem ser contraídas em um consultório ortodôntico. E é conhecida a alta

resistência do vírus da hepatite B (HBV) aos processos de esterilização e

desinfecção, assim como sua transmissibilidade salivar 17; 18. Considerando estes

fatos; as dúvidas em relação à efetividade dos processos de desinfecção em

instrumentos semicríticos, como os alicates ortodônticos; a escassez de trabalhos

que abordem este tema e; principalmente, o risco potencial de infecção cruzada, é

necessário e oportuno estudar tais questões de maneira mais criteriosa.

Desta forma, o objetivo deste trabalho foi avaliar, pelo método de cultura

microbiológica, a eficácia dos métodos de descontaminação (vapor d’água saturado

sob pressão/calor úmido e álcool etílico 70% p/V) de alicates ortodônticos utilizados

clinicamente.

METODOLOGIA

A amostra consistiu de 20 alicates removedores de banda (Orthopli Corp.,

Philadelphia, PA, USA) previamente lavados e esterilizados pelo vapor saturado sob

pressão (autoclave), antes de sua utilização em pacientes, divididos em 2 grupos.

Os espécimes foram obtidos após seu uso na remoção de quatro bandas

ortodônticas da cavidade oral dos pacientes da clínica de Ortodontia do

Departamento de Odontologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

(DO-PUC Minas). Em cada banda foram realizados 5 movimentos de retirada. Todos

os pacientes utilizavam aparelho ortodôntico fixo, não relataram possuir alterações

sistêmicas e não utilizavam nenhum tipo de medicamento, até 3 meses antes do

início do experimento.

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Processamento dos espécimes clínicos - avaliação mi crobiológica

quantitativa e qualitativa

Os procedimentos laboratoriais foram realizados no laboratório de

Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde da PUC Minas (ICBS –

PUC Minas). Durante os experimentos e coletas, todas as precauções de

biossegurança foram rigorosamente observadas e seguidas.

Os alicates eram transportados para o laboratório em embalagem de inox

estéril e hermeticamente fechada e seu processamento ocorria em tempo não

inferior a 10 minutos e não superior a 15 minutos.

A primeira coleta foi feita antes de qualquer processo de descontaminação

dos alicates. Neste momento, foi avaliado o nível de contaminação inicial (t0). Os

alicates foram então divididos em dois grupos e submetidos a diferentes tipos de

descontaminação. Após este procedimento, o mesmo processo de coleta foi repetido

(t1).

• Grupo 1 (G1): dez alicates removedores de banda foram submetidos à

lavagem manual com água e sabão, secagem e fricção com álcool etílico 70%

(p/V) (Indústria Farmacêutica Rioquímica Ltda., São José do Rio Preto, SP,

Brasil), em 3 movimentos padronizados em cada superfície da ponta do

alicate.

• Grupo 2 (G2): dez alicates removedores de banda foram submetidos à

lavagem mecânica em cuba ultrassônica (Alpha 3L Plus®, Ecel Indústria e

Comércio Ltda., Ribeirão Preto, SP, Brasil) durante 5 minutos, com detergente

enzimático (Enzi-tec®, Tecpon Indústria e Comércio de Produtos Químicos

Ltda., Cachoeirinha, RS, Brasil) e esterilização pelo vapor d’água sob

pressão, em autoclave convencional (Dabi Atlante Indústria Médico

Odontológica Ltda., Ribeirão Preto, SP, Brasil) durante 15 minutos, a 121°C e

1 atm. Antes da autoclavagem e logo após a secagem, os alicates foram

lubrificados com silicone.

Para a avaliação qualitativa e quantitativa, os espécimes foram processados,

em capela de fluxo laminar, por imersão da ponta ativa do alicate (aproximadamente

10 mm), com realização de movimentos de agitação, abertura e fechamento, durante

60 segundos em duas soluções:

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• 2,5 ml de solução de cloreto de sódio a 0,85%, submetidos à agitação

em vórtex, por 60 segundos para realização de diluições seriadas, para a

avaliação quantitativa.

• 5 ml de caldo Brain Heart Infusion (BHI) (Difco Laboratories, Detroit, MI,

USA) para a avaliação qualitativa;

Em seguida, procedimentos de diluições seriadas de 10-1 a 10-3 foram

executados. A partir de cada diluição obtida, alíquotas de 0,1 ml foram semeadas

em ágar BHI (Difco Laboratories, Detroit, MI, USA), em triplicata. As placas

(avaliação quantitativa) e caldo (avaliação qualitativa) foram incubados a 37ºC, em

condições de microaerofilia, por 72 horas 19. O mesmo procedimento foi realizado

após a descontaminação e neutralização dos alicates, com diluições seriadas de até

10-1 (figura 2).

Para o controle do teste qualitativo, foi utilizado, ainda, um controle negativo

(controle de contaminação do meio de cultura), no qual não foram inoculados

microrganismos.

Figura 2 – Sequência dos testes nos alicates ortodônticos. Fonte: elaborado pela autora

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Após o período de incubação e a partir dos crescimentos obtidos nas placas,

foram realizadas a contagem e a observação das características morfológicas dos

diferentes tipos coloniais presentes assim como as características morfotintoriais de

todas as amostras representativas, utilizando-se o método de coloração de Gram.

Esse estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da

PUC Minas (CAAE – 0270.0.213.000-09).

RESULTADOS Análise estatística

A normalidade foi verificada pelo teste de Shapiro Wilks e a avaliação dos

resultados do método qualitativo pelo teste de proporções Z. A avaliação estatística

dos dados quantitativos coletados foi realizada através do teste t e Wilcoxon.

Utilizou-se o programa SPSS 17.0® (IBM®, Somers, NY, USA).

Avaliação da eficácia dos métodos de descontaminaçã o empregados –

método qualitativo

A avaliação por meio da ausência ou presença de turvação dos meios (figura

3) evidenciou a presença de crescimento microbiano (resultado positivo), indicando

a presença de microrganismos viáveis em todos os 20 alicates em t0. Após a

descontaminação dos alicates (t1), observou-se (gráfico 1):

• G1 – todos os cultivos das espécimes provenientes deste grupo

apresentaram turvação (resultado positivo), indicando crescimento microbiano

e presença de microrganismos viáveis nos alicates.

• G2 – nenhum dos cultivos das espécimes provenientes deste grupo

apresentou turvação (resultado negativo), indicando ausência de

microrganismos viáveis nos alicates, nas condições testadas.

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Figura 3 – Avaliação qualitativa por meio da ausência ou presença de turvação dos meios. (A) ausência de turvação – contaminação negativa; (B) presença de turvação – contaminação positiva. Fonte: dados da pesquisa

Gráfico 1 – Avaliação qualitativa da contaminação inicial e final dos alicates ortodônticos após desinfecção álcool etílico 70%(p/V) e esterilização calor úmido (teste de proporções Z). Fonte: dados da pesquisa

Avaliação da eficácia dos métodos de descontaminaçã o empregados –

método quantitativo

Os resultados dos testes realizados estão ilustrados nos gráficos 2 e 3. Em t0

observou-se uma média de contaminação de 5,57±0,68 (log10 UFC/2,5ml). Após a

descontaminação, houve redução estatisticamente significativa do número de

colônias bacterianas em G1 e G2 (número de UFC). Porém, essa redução foi

significativamente maior em G2. Não foi observado crescimento bacteriano nas

condições testadas em qualquer das placas de BHI dos espécimes provenientes dos

alicates autoclavados, enquanto a desinfecção pelo álcool etílico 70% (p/V)

produziu, em média, uma redução de 3 log10 UFC (3,39±1,42 log10 UFC/2,5ml). Os

valores relativos à redução da contaminação dos alicates ortodônticos estão

ilustrados no gráfico 3.

A B

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0

2

4

6

t0t1

Log 1

0U

FC/2

,5m

l

t0=contaminação inicialt1=contaminação final

Avaliação quantitativa

Álcool (G1)

Autoclave (G2)

Gráfico 2 – Avaliação quantitativa da contaminação inicial e final dos alicates ortodônticos após desinfecção álcool etílico 70% e esterilização calor úmido (Teste t) Fonte: dados da pesquisa

Gráfico 3 – Redução da contaminação dos alicates ortodônticos obtida pela desinfecção por álcool etílico 70% e pela esterilização por calor úmido. (Teste Wilcoxon). Fonte: dados da pesquisa

DISCUSSÃO Os alicates ortodônticos são rotineiramente utilizados no tratamento clínico de

maloclusões e, na grande maioria das vezes, tais instrumentos entram em contato

direto com a mucosa bucal e saliva. Em algumas situações, e dependendo da

função do alicate, entram em contato indireto por meio das mãos/luvas, fios ou

aparelhos móveis contaminados. E, não raramente, podem entrar em contato direto

com sangue. Por estas características, devem ser classificados, no mínimo, como

artigos semicríticos 15.

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Na prática odontológica, os artigos semicríticos devem ser, preferencialmente,

esterilizados por agentes físicos. Entretanto, aceita-se desinfecção de alto nível nos

casos de artigos termolábeis, pois estes tendem a se decompor sob influência do

calor 9; 11; 15. Os alicates ortodônticos podem sofrer oxidação; porém, o efeito corrosivo

ocorrerá, em maior ou menor grau, quando submetido a qualquer método de

descontaminação utilizado (lavagem com água e sabão, desinfecção química, calor

úmido, calor seco) 20. Para minimizar esses efeitos, os instrumentos devem estar

isentos de toda matéria orgânica (preferencialmente removidos na lavagem com

água destilada), além de apresentar garantia de criteriosa secagem com ar

pressurizado e lubrificação da articulação do alicate. Nos casos de esterilização pelo

vapor d’água sob pressão, o respeito ao ciclo de secagem da autoclave antes da

remoção dos instrumentos também é essencial 20; 21.

Caso fossem termolábeis, os alicates, por se tratarem de artigos semicríticos,

deveriam, então, ser desinfetados com agentes químicos de alto nível 9-11; 15. Essas

soluções são germicidas capazes de inativar todas as formas microbianas, com

exceção de alguns endosporos bacterianos 15. Os alcoóis são considerados

desinfetantes de nível intermediário, podendo inativar bactérias na forma vegetativa

(incluindo o bacilo da tuberculose), vírus lipídicos e alguns hidrofílicos, mas não

conseguem inativar endosporos bacterianos 15. Essa classificação pode ser

questionada, pois ainda existem divergências na literatura. Rutala, em 200422,

classificou os álcoois como desinfetantes de baixa eficácia, o que tornou o seu uso

ainda mais crítico (não eliminam microrganismos resistentes, como o bacilo da

tuberculose).

Apesar do consenso da literatura e dos órgãos normativos quanto à definição

e classificação dos desinfetantes e dos processos de escolha para artigos

semicríticos, o presente trabalho optou pela avaliação do álcool etílico 70%, pois ele

ainda é o desinfetante de escolha de muitos ortodontistas no Brasil. Segundo estudo

realizado em Belo Horizonte 16, a maioria dos ortodontistas descontamina seus

alicates ortodônticos através da lavagem manual com água e sabão, secagem e

fricção (por poucos segundos) com álcool etílico 70% (p/V). Nesta perspectiva, esse

estudo avaliou a eficácia dos processos realizados por vários ortodontistas

brasileiros, procurando retratar a realidade do atendimento clínico, no que se refere

ao controle de infecção cruzada.

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Nos procedimentos clínicos deste estudo e durante a remoção das bandas,

observou-se a presença de sangue visível em 17 alicates e, em três desses,

observou-se contaminação por exsudato purulento. Dessa maneira, o alicate

removedor de banda poderia ser considerado artigo crítico em várias circunstâncias

e, ainda assim, a literatura mostra que alguns ortodontistas continuam realizando

somente sua desinfecção 16 com desinfetante de baixa eficácia22.

Avaliação microbiológica qualitativa

A avaliação da turvação do meio de cultura mostra a presença ou a ausência

de crescimento microbiano, caracterizando um resultado positivo ou negativo 1. No

presente trabalho avaliou-se, qualitativamente, a eficácia da descontaminação

utilizada nos alicates ortodônticos, ficando evidente a diferença observada entre a

esterilização pelo vapor d’água saturado sob pressão e a desinfecção com álcool

etílico 70% (p/V). Após os processos de descontaminação, (t2) os resultados

encontrados nos dois grupos foram absolutamente contrários. Todos os meios de

cultura com espécimes provenientes dos alicates autoclavados se mantiveram

límpidos, indicando ausência de crescimento microbiano, nas condições testadas.

Por outro lado, todos os tubos com os meios provenientes dos alicates desinfetados

apresentaram algum nível de turvação, revelando a presença de microrganismos

residuais.

A partir destes tubos em que houve crescimento microbiano após

descontaminação (G1), foram avaliadas as características morfotintoriais dos

microrganismos recuperados e os resultados apontaram para a presença de cocos e

bastonetes Gram-positivos; esses, por sua vez, se configuram como parte

significativa da microbiota de biofilmes dentários da cavidade bucal 23. As condições

assépticas rigorosas em que foi feito o experimento, aliadas a essas características

encontradas das bactérias, reafirmam a hipótese de que a turvação do meio de

cultura foi decorrente da ineficácia da desinfecção, e não de uma eventual

contaminação externa no processamento.

Avaliação microbiológica quantitativa

Após o uso em procedimentos clínicos dos alicates removedores de banda,

observou-se contaminação em todos os alicates testados, com contagem microbiana

média em torno de 105 UFC/ml. Por se tratar de estudo in vivo, poder-se-ia esperar

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diferenças entre os níveis de contaminação inicial, porém essa diferença não foi

estatisticamente significativa. Um estudo semelhante 24 obteve contaminação inicial

média de 101,5 UFC/ml e, em 5 dos 20 alicates testados, não foi detectada

contaminação (avaliação quantitativa). Isso pode ser resultado do método realizado

na recuperação e no processamento dos espécimes e do tipo de alicate avaliado

(Weingart e corte distal). Ademais, no presente estudo, a presença de secreção

purulenta e sangue em 17 dos 20 alicates testados poderiam explicar, em parte,

essa maior recuperação de microrganismos.

O resultado do estudo quantitativo mostrou que ambos os procedimentos de

descontaminação diminuem, de maneira estatisticamente significativa (p<0,05), os

níveis iniciais da carga microbiana. Porém, ao compararmos essa redução entre G1

e G2, observou-se uma diminuição da contaminação inicial estatisticamente superior

quando a autoclavagem foi realizada. Esse resultado corrobora estudos científicos

semelhantes que utilizaram outros agentes desinfetantes 1; 24; 25, além do álcool etílico

70%.

No gráfico 3, observa-se grande diferença entre a variação dos valores

mínimos e máximos entre G1 e G2. A variação observada em G2 é consequência

direta da variação da contaminação inicial (t0), pois em todas as amostras desse

grupo o resultado em t1 foi igual a zero. Essa mesma justificativa não explica a

grande variabilidade dos valores observados em G1. A desinfecção com álcool

etílico 70% (p/V) não ocorre de maneira homogênea e pode variar de acordo com os

grupos microbianos presentes nas superfícies e com o tamanho da carga microbiana

inicial 26. Vieira e colaboradores 27 avaliaram a eficácia de 4 desinfetantes químicos

em corpos de prova e observaram a viabilidade de microrganismos do grupo S.

mutans por até 60 minutos de imersão em álcool etílico 70%. Os autores apontaram

a condição crítica que esta solução pode proporcionar em processos de

desinfecção, provavelmente pela formação de grumos bacterianos (aglutinações de

células microbianas) que, no caso do experimento, podem ter aumentado a

viabilidade dessas bactérias mesmo após 60 minutos de imersão em solução

alcoólica.

O presente estudo aponta para a fragilidade dos processos de desinfecção

dos alicates ortodônticos pelo álcool etílico 70% (p/V) na prática clínica. A grande

variabilidade de G1 (gráfico 3) pode ter ocorrido não só pelos fatores citados

anteriormente, mas também pela dificuldade de limpeza do instrumental. A formação

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de um biofilme aderido, especialmente onde há reentrâncias (ponta ativa e

articulações) dificulta o acesso de agentes químicos e físicos, pois estes

microrganismos co-agregados podem expressar características que os tornam mais

resistentes aos métodos de limpeza e desinfecção 27-29. Muitas razões podem

contribuir para a diminuição da sensibilidade das bactérias em um biofilme a um

agente antimicrobiano: redução da difusão do desinfetante às células do interior do

biofilme; produção de enzimas e substâncias neutralizantes químicas e alterações

genéticas nas células microbianas são algumas delas 27-29.

Neste trabalho, a lavagem e a desinfecção dos artigos foram executadas por

uma única pessoa e, ainda assim, os resultados mostraram que houve grande

variabilidade na redução microbiana. No dia a dia da prática ortodôntica, a lavagem

manual é o procedimento mais frequente e, nem sempre, os requisitos de uma

limpeza adequada são obedecidos. Além disto, deve-se considerar as condições de

armazenamento da solução desinfetante, a execução da desinfecção propriamente

dita, a falta de possibilidade de monitoramento e o seu armazenamento. Tudo isso

corrobora a hipótese de que essa variabilidade de crescimento microbiano

observada após desinfecção poderia ser ainda maior em condições clínicas da rotina

ortodôntica.

Como dados microbiológicos, deve-se registrar que, por limitações técnicas,

este experimento avaliou somente a ocorrência de bactérias em condições de

microaerofilia e, possivelmente, se as condições de incubação estivessem se

estendido também em anaerobiose os resultados poderiam ter sido ainda mais

significativos, pela predominância de microrganismos anaeróbios na cavidade

bucal30.

CONCLUSÕES

• A desinfecção com álcool etílico a 70% (p/V) e a esterilização pelo vapor

d’água sob pressão reduziram, significativamente, os níveis de contaminação inicial

em alicates ortodônticos; porém, apenas a autoclavagem apresentou resultados

homogêneos e pode garantir a ausência de crescimento microbiano, nas condições

testadas.

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• A lavagem manual seguida por desinfecção com álcool etílico a 70% (p/V)

diminui a carga microbiana inicial dos alicates ortodônticos, mas parece não

assegurar a eliminação total de microrganismos viáveis presentes.

• A eficácia do processo avaliado de desinfecção dos alicates ortodônticos é

dependente do tamanho da carga e dos grupos microbianos envolvidos, mas

também de fatores como a limpeza prévia, o armazenamento da solução utilizada,

bem como sua concentração e tempo de ação. Estas condições resultam em grande

variabilidade no fator de redução microbiana e podem impedir o monitoramento e

controle do processo de descontaminação.

• Para garantir a qualidade do atendimento ortodôntico, baseado na promoção

da saúde e controle de infecção cruzada, faz-se necessário seguir as normas

técnicas e legislativas que preconizam a esterilização de artigos semicríticos e

críticos.

Esse estudo recebeu auxílio do FIP/PUC Minas que, junto ao CNPQ, financiaram as bolsas de iniciação

científica das alunas de graduação em Odontologia. Sem o trabalho e auxílio dessas alunas a realização desse

estudo não seria possível.

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APÊNDICES

APÊNDICE A – Metodologia detalhada

1. Entrevistas com os profissionais de Ortodontia

A forma de condução de trabalho se encaixa nos modelo da pesquisa

documental. Esse tipo de pesquisa, dentre outras, pode ser realizado por meio de

questionário (enviado via correio, p.ex.) ou de entrevista. Optou-se por essa última

forma na tentativa de minimizar os problemas relacionados à não devolução dos

questionários, o que acarretaria em risco de se ter grande número de pessoas não

respondentes e, por conseguinte, grande perda de dados. Dessa forma, na pesquisa

buscou-se obter maior controle quantitativo da amostragem proposta (Alvarez-Leite,

1996).

a. Calibração dos entrevistadores

Dois alunos de iniciação científica da graduação em Odontologia da PUC

Minas foram submetidos a um treinamento, no qual a pesquisadora discorreu sobre

os objetivos e a metodologia da pesquisa, o conteúdo do questionário e a conduta

dos entrevistadores no momento das entrevistas. As possíveis dificuldades e

dúvidas foram levantadas e discutidas nestas ocasiões.

Em seguida, como forma de treinamento e para maior intimidade com o

instrumento metodológico, os monitores entrevistaram uns aos outros.

Posteriormente, cada uma aplicou o questionário a quatro ortodontistas vinculados à

prática educacional, de tal forma que, ao final do processo, esses profissionais foram

entrevistados duas vezes por monitores diferentes. As entrevistas foram anotadas e

gravadas.

Foi obtido um alto nível de concordância (teste kappa). Esse resultado foi

avaliado através da checagem das respostas dos dois questionários de um mesmo

profissional. A similaridade das respostas indicou os níveis de homogeneidade e

concordância na maneira de se conduzir a entrevista (Alvarez-Leite, 1996).

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b. Abordagem e condução das entrevistas

Setenta profissionais, registrados como especialistas em Ortodontia no

Conselho Federal de Odontologia (CFO) foram selecionados aleatoriamente da lista

de membros ativos da Associação Brasileira de Ortodontia – seção Minas Gerais

(ABOR-MG). Após essa seleção, foram enviadas cartas registradas (APÊNDICE B)

esclarecendo o motivo deste estudo. Para facilitar o acesso aos profissionais, os

consultórios deveriam se localizar dentro de Belo Horizonte. Desses profissionais,

apenas 44 aceitaram participar do estudo e assinaram termo de livre consentimento

(APÊNDICE C). As entrevistas foram agendadas via contato telefônico. É importante

ressaltar que não houve identificação nos questionários e que os mesmos foram

incinerados após a coleta dos dados.

A entrevista, realizada por meio de questionário com perguntas abertas semi-

estruturadas, continha os seguintes temas (APÊNDICE D):

• Caracterização geral: formação acadêmica, tempo de exercício profissional,

característica do atendimento (em órgãos públicos, pacientes particulares,

indivíduos conveniados ou em clínicas) e caracterização sócio-econômica dos

pacientes, segundo percepção do próprio ortodontista.

• Métodos e técnicas de descontaminação de instrumental e controle de

infecção cruzada: recursos utilizados, frequência de uso e de troca, bem

como técnicas de descontaminação realizadas em seus consultórios.

As análises das associações com o método e as variáveis do questionário

foram baseadas nos Testes Qui-quadrado de Pearson assintótico (valores maiores

que 5) e exato (valores entre 1 e 5). Foi utilizado o programa SPSS 17.0® (IBM®,

Somers, NY, USA).

2. Avaliação microbiológica da eficácia dos métodos de desinfecção

e esterilização dos alicates ortodônticos

A amostra consistiu de 20 alicates removedores de banda (Orthopli Corp.

Philadelphia, PA, USA) previamente lavados e esterilizados pelo vapor saturado sob

pressão (autoclave), antes de sua utilização em pacientes e divididos em 2 grupos.

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Os espécimes foram obtidos na remoção de quatro bandas ortodônticas da

cavidade oral dos pacientes da clínica de Ortodontia do Departamento de

Odontologia da PUC Minas (DO-PUC Minas). Os pacientes que participaram do

estudo assinaram termo de livre consentimento por escrito (APÊNDICE E). Em cada

banda foram realizados 5 movimentos de retirada: nos dentes inferiores três

movimentos na face vestibular (mesial, central e distal) e dois movimentos na face

lingual (mesial e distal) e nos dentes superiores três movimentos na face palatina

(mesial, central e distal) e dois movimentos na face vestibular (mesial e distal).

Todos os pacientes utilizavam aparelho ortodôntico fixo, não relataram possuir

alterações sistêmicas e não utilizavam nenhum tipo de medicamento até 3 meses

antes do início do experimento.

a. Processamento dos espécimes clínicos – avaliação

microbiológica quantitativa e qualitativa

Os procedimentos laboratoriais foram realizados no laboratório de

Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde da PUC Minas (ICBS –

PUC Minas). Durante os experimentos e coletas todas as precauções de

biossegurança foram rigorosamente observadas e seguidas.

Os alicates eram transportados para o laboratório em embalagem de inox

estéril e hermeticamente fechada e seu processamento ocorria em tempo não

inferior a 10 minutos e não superior a 15 minutos.

A primeira coleta foi feita antes de qualquer processo de descontaminação

dos alicates. Neste momento, foi avaliado o nível de contaminação inicial (t0). Os

alicates foram, então, divididos em dois grupos e submetidos a diferentes tipos de

descontaminação. Após este procedimento, o mesmo processo de coleta foi repetido

(t1).

• Grupo 1 (G1): dez alicates removedores de banda foram submetidos à

lavagem manual com água e sabão, secagem e fricção com álcool etílico 70%

(p/V) (Indústria Farmacêutica Rioquímica Ltda., São José do Rio Preto, SP,

Brasil), em 3 movimentos padronizados em cada superfície da ponta do

alicate (aproximadamente 15 segundos).

• Grupo 2 (G2): dez alicates removedores de banda foram submetidos à

lavagem mecânica em cuba ultrassônica (Alpha 3L Plus®, Ecel Indústria e

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Comércio Ltda., Ribeirão Preto, SP, Brasil) durante 5 minutos, com detergente

enzimático (Enzi-tec®, Tecpon Indústria e Comércio de Produtos Químicos

Ltda., Cachoeirinha, RS, Brasil) e esterilização pelo vapor d’água sob

pressão, em autoclave convencional (Dabi Atlante Indústria Médico

Odontológica Ltda., Ribeirão Preto, SP, Brasil) durante 15 minutos, a 121°C e

1 atm. Antes da autoclavagem e logo após a secagem, os alicates foram

lubrificados com silicone.

Para a avaliação microbiológica qualitativa e quantitativa, os espécimes foram

processados, em capela de fluxo laminar, através de imersão da ponta ativa do

alicate (aproximadamente 10 mm) com realização de movimentos de agitação,

abertura e fechamento, durante 60 segundos, em duas soluções:

• 2,5 ml de solução de cloreto de sódio a 0,85%, submetidos à agitação

em vórtex, por 60 segundos, para realização de diluições seriadas, para a

avaliação quantitativa.

• 5 ml de caldo Brain Heart Infusion (BHI) (Difco Laboratories, Detroit, MI,

USA) para a avaliação qualitativa;

Em seguida, procedimentos de diluições seriadas de 10-1 a 10-3 foram

executados. A partir de cada diluição obtida, alíquotas de 0,1 ml foram semeadas

com alça de Drigalski em ágar BHI (Difco Laboratories, Detroit, MI, USA), em

triplicata. As placas (avaliação quantitativa) e caldo (avaliação qualitativa) foram

incubados a 37ºC, em condições de microaerofilia, por 72 horas. O mesmo

procedimento foi realizado após a descontaminação e neutralização dos alicates,

com diluições seriadas até 10-1, nos casos de desinfecção com álcool etílico 70%

(p/V) e, com o espécime original, nos casos dos alicates esterilizados (figura 1).

Para o controle do teste qualitativo, foi utilizado controle negativo (controle de

contaminação do meio), no qual não foram inoculados microrganismos.

Após o período de incubação e a partir dos crescimentos obtidos nas placas,

foram realizadas a contagem e a observação das características dos tipos morfo-

coloniais presentes. As características morfotintoriais de todas as colônias

representativas foram observadas pelo método de coloração de Gram.

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Figura 1 – Sequência dos testes nos alicates ortodônticos: in-vivo. Fonte : elaborado pela autora

A normalidade foi verificada pelo teste de Shapiro Wilks. As comparações das

análises qualitativas das porcentagens positivas entre t0 e t1 foram realizadas pelo

teste de proporções Z. A avaliação estatística dos dados quantitativos coletados foi

realizada através do teste t para amostras independentes (t0 álcool 70% e autoclave)

e Wilcoxon (comparação entre Log10 t0-t1 de G1 e G2). Utilizou-se o programa SPSS

17.0® (IBM®, Somers, NY, USA).

Este estudo recebeu auxílio do FIP/PUC Minas que, junto ao CNPQ, financiou as bolsas de

iniciação científica das alunas de graduação em Odontologia. Sem o trabalho e auxílio dessas alunas

a realização desse estudo não seria possível.

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APÊNDICE B – Carta enviada aos profissionais da ABORMG selecionados para

realização da entrevista

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APÊNDICE C – Termo de consentimento livre e esclarecido aos ortodontistas

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APÊNDICE D – Questionário aplicado aos ortodontistas

QUESTIONÁRIO APLICADO COMO INSTRUMENTO METODOLÓGICO DA

PESQUISA

Controle de infecção cruzada via alicates ortodônticos

Sexo:____ Idade: ______

CARACTERIZAÇÃO GERAL

1- Em qual faculdade se formou? (local, ano)

________________________________________________________

2- Cursou alguma pós-graduação ou especialização em Ortodontia?

___________________________________________________________

3- É registrado como especialista no CRO?

________________________________________________________

4- Tempo de exercício profissional: ________________________________________________________

5- A sua prática profissional é caracterizada como: Mista ___ Privado___

Consultório Particular: ___ Convênios/ Credenciamentos ___

Clínica Assalariada/Porcentagem: ___ Serviço Público ___

6- A sua clientela é melhor caracterizada como:

Classe alta ___ Classe média alta ___

Classe média baixa ___ Classe baixa ___

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Métodos e Técnicas de Descontaminação de Instrumental

7-Como você processa seus alicates ortodônticos de corte e de amarrilho após sua utilização?

___ lavagem, secagem, acondicionamento e esterilização

___ pré embebição, lavagem, secagem, acondicionamento e esterilização.

___ outra sequência:_____________________________________________

____________________________________________________________

Quais os métodos de esterilização que você utiliza na sua prática para alicates ortodônticos de corte e de amarrilho? (Especificar tempo, temperatura, tipo e pressão)

Calor Seco (estufa): Tempo Temperatura Tipo

Calor Úmido: Tempo Temperatura Tipo Pressão

- Ciclo de secagem: Fechada ____ Aberta____ - Utilização de lubrificantes para (1) prevenir ou (2) remover a oxidação? 1- Sim___ Não___ 2- Sim___ Não___

Esterilizantes Químicos (qual?): ____________________________________ Tempo Concentração

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Esterilizador de micro partícula: ___________________________________

Tempo Temperatura Tipo

8- Por que você utiliza, ou não o calor úmido (autoclave)? Justifique a opção por este método. _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 9- Com relação aos alicates ortodônticos, com que frequência são esterilizados/ desinfetados? (a cada troca de paciente, a cada turno?) ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Alicates ortodônticos:

Método Tipo Temperatura Tempo Alicate para remover banda

Alicate Weingart Alicate para colocar separador de dente

Alicate para corte distal

Alicate para corte amarrilho

Alicate 139 Alicate para confecção de banda

10- Os métodos de esterilização são monitorados? De que forma? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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APÊNDICE E - Termo de consentimento livre e esclarecido aos pacientes

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ANEXO

ANEXO A – Parecer Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade

Católica