Upload
vuongkhue
View
213
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
1
PROPOSTA PEDAGÓGICA PARA TRABALHAR OS MURAIS E GRAVURAS DE
POTY LAZZAROTTO.
Ana Rita Grando de Souza1
Bernadette Panek2
Resumo
Este artigo constitui-se no relato de experiência acerca da implementação, no CEAD
Poty Lazzarotto, do Projeto de Intervenção Pedagógica, desenvolvido durante minha
participação no PDE, cuja proposta foi abordar a biografia do artista paranaense
Poty Lazzarotto e sua produção artística, com análise de algumas de suas obras e
propostas de práticas artísticas em sala de aula. O texto apresenta a justificativa, a
metodologia e as estratégias de ação utilizadas para a implementação do projeto.
Palavras-chave: Poty Lazzarotto; mural; gravura.
1 Introdução
O presente artigo tem por base os trabalhos desenvolvidos durante o biênio
de 2010/2011 no Programa de Desenvolvimento da Educação/PDE, desenvolvido
pela Secretaria de Educação do Estado do Paraná. A proposta do programa é
1 Especialista em Fundamentos Estéticos da Arte Educação e Licenciatura em Educação Artística - habilitação
em Artes Plásticas pela Faculdade de Educação Musical do Paraná. Bacharel em Pintura pela Escola de Música
e Belas Artes do Paraná. Professora de Arte no CEAD Poty Lazzarotto. Participante do PDE/2009.
2 Professora orientadora do PDE. Doutora em História da Arte e Mestre em Poéticas Visuais pela Universidade
de São Paulo – ECA/USP. Especialista em História da Arte e Bacharel em Pintura pela Escola de Música e Belas
Artes do Paraná. Professora do Departamento de Desenho e Gravura e Coordenadora do Curso de
Especialização em História da Arte da EMBAP-Escola de Musica e Belas Artes do Paraná.
2
aproximar o professor da Educação Básica e as Instituições de Ensino Superior de
modo que o professor volte a ter contato com a pesquisa e as ideias discutidas nas
universidades e estas, por sua vez, possam conhecer mais de perto a realidade das
escolas públicas. A reaproximação destes dois pólos tem por fim implantar uma
cultura (prática) de ações cujo escopo é a melhoria da educação na rede estadual
de ensino.
Uma das exigências do PDE é que o professor participante do programa
desenvolva um projeto de intervenção pedagógica voltado para os alunos, outros
professores da rede ou para a comunidade escolar, propondo e aplicando ações
com o objetivo de suprir necessidades detectadas na relação ensino/aprendizagem
e em outras áreas do âmbito escolar. O projeto do qual este artigo se origina foi
aplicado no CEAD Poty Lazzarotto, escola voltada para a modalidade de Educação
de Jovens e Adultos/EJA. A principal característica dos alunos desta modalidade de
ensino que os diferencia dos alunos da modalidade de ensino regular é a idade: a
maioria dos alunos de EJA é adulta. Outro diferencial também é o tempo que o aluno
passa na escola. Este aluno dispõe de pouco tempo para dedicar aos estudos e o
divide entre o trabalho, a família e a escola. Por ser já adulto, geralmente acumula a
função de trabalhador e provedor da família. Por isso, a organização da EJA é
estruturada concentrando conteúdos e carga horária, de modo a permitir a
conclusão dos estudos em prazo mais curto.
O projeto partiu da constatação de que os alunos do CEAD Poty Lazzarotto
desconhecem o artista cujo nome a escola homenageia. Uma das razões de tal
desconhecimento talvez seja justamente a falta de informações: não há no espaço
escolar nenhum painel ou quadro explicativo acerca o assunto, com exceção do
período próximo ao aniversário de nascimento do artista. Também, devido a curta
permanência dos estudantes no ambiente escolar, professores e educandos são
levados a focarem-se nos conteúdos essenciais de cada disciplina, deixando de lado
outros aspectos, sendo um deles a própria história do estabelecimento de ensino.
Na biblioteca não há livros sobre o tema, pois as obras editadas a respeito do artista,
às quais a escola não teve acesso, na sua maioria, receberam patrocínios de
secretarias municipais e tiveram distribuição gratuita, porém restrita a alguns órgãos.
Diante disso, propôs-se no projeto o estudo da biografia e obra de Poty
Lazzarotto nas aulas da disciplina de Arte. Porém, a proposta trouxe junto de si
3
outras considerações, tais como: de que modo apresentar a obra e a biografia de
Poty para os alunos? A partir disto, como desenvolver atividades de prática artística
baseadas em suas obras? Como analisar as obras de Poty? Quais materiais usar?
Tais materiais estão ao alcance técnico e financeiro dos alunos?
Durante a elaboração do referido projeto entrou em cena outra exigência do
PDE, o Grupo de Trabalho em Rede/GTR, um ambiente virtual, com tutoria do
professor PDE, cuja proposta é socializar experiências, dúvidas e êxitos, em suma
conhecimentos da prática pedagógica, entre os professores da rede de ensino. No
GTR o professor PDE submete seu Projeto de Intervenção Pedagógica à análise
dos demais professores participantes do grupo e organiza leituras, discussões,
trocas de ideias e experiências, cuja finalidade é tanto o aprimoramento do projeto
de intervenção como o enriquecimento didático-pedagógico de todos os
participantes.
No GTR foram lançadas questões acerca da pertinência de abordar a obra
de Poty Lazzarotto na escola, as dificuldades encontradas pelos professores quando
desenvolvem o tema em sala de aula, possibilidades de atividades artísticas e
dificuldade de acesso a materiais bibliográficos e artísticos. As discussões
estabelecidas serviram para certificar-me de que muitas características e
necessidades apresentadas pelos alunos do CEAD Poty Lazzarotto eram
semelhantes às dos alunos e escolas dos demais professores do grupo. E que as
dificuldades encontradas por mim para trabalhar a obra de Poty na sala de aula
eram as mesmas encontradas pelos outros professores. O resultado das discussões
ajudou na elaboração do Projeto de Intervenção Pedagógica, retirando aspectos
desnecessários e focalizando naqueles mais essenciais. Assim, sugestões e
experiências destes colegas acabaram por ser acatadas e colocadas nas estratégias
de ação do projeto.
2 Metodologia
O primeiro passo foi estabelecer a construção de um Caderno Pedagógico
como forma de material didático a ser usado nas aulas de Arte (a produção do
material didático também é um dos requisitos do PDE). O referido caderno aborda
4
aspectos relevantes da biografia e formação artística de Poty Lazzarotto, voltando-
se principalmente para a sua produção em mural e gravura, as técnicas utilizadas e
propostas de análise de algumas de suas obras. Apresenta, também, o
desenvolvimento e técnicas das duas manifestações artísticas (gravura e mural)
através dos tempos, bem como propostas de atividades práticas com ambas. A
construção do Caderno Pedagógico foi fundamentada nos âmbitos de compreensão
propostos por FRANZ3, que serão apresentados mais adiante.
O passo seguinte foi a implementação do projeto na escola, para o que
utilizou-se o Caderno Pedagógico. Além do uso do referido material didático, a
implementação baseou-se na seguinte proposição: para o aluno adquirir uma
compreensão que lhe permita entender a arte como forma de expressão, de criação
e de conhecimento, é necessário estudar a arte de maneira abrangente. Por isso, o
trabalho desenvolvido na disciplina de Arte abarcou três momentos ao mesmo
tempo distintos e complementares: a análise da obra, a história da arte e o fazer
artístico.
O estudo da disciplina concentrado nesses três momentos está contemplado
nos Parâmetros Curriculares Nacionais/PCNs e nas Diretrizes Curriculares
Estaduais/DCEs, documento norteador para a Educação Básica elaborado pelo
Estado do Paraná. Porém os dois documentos, o nacional e o estadual, com ligeiros
redirecionamentos de nomenclatura e metodologia, na verdade, são derivados da
concepção de ensino de Arte desenvolvida aqui no Brasil por Ana Mae Barbosa.
Chamada inicialmente de Proposta Triangular4, essa concepção toma como base a
ideia dos três eixos: História da Arte (contextualização), leitura da obra (análise
estética e crítica) e produção (fazer artístico).
2.1 A História da Arte
O estudo das obras a partir da História da Arte permite não somente localizá-
las no tempo e no espaço, mas também entendê-las como produto da sociedade na
3 FRANZ, T. S. Educação para uma compreensão crítica da arte.
4 BARBOSA, A. M. A imagem no ensino da arte.
5
qual se originaram. Permite, também, estabelecer correlações entre obras, artistas,
épocas, culturas e estilos diferentes. Além de perceber a evolução das formas
visuais como produto da concepção de homem e de mundo própria de cada época.
“A história da arte ajuda as crianças a entender algo do lugar e tempo nos quais as
obras de arte são situadas. Nenhuma forma de arte existe no vácuo: parte do
significado de qualquer obra depende do entendimento de seu contexto.”
(BARBOSA, 1991, p. 37).
É possível estender a afirmação de Ana Mae Barbosa para estudantes de
outras faixas etárias. Entre os jovens e adultos percebe-se que a compreensão, e
até mesmo a aceitação, da obra é bastante dependente do conhecimento que
possuem a respeito do contexto no qual a obra foi criada. Essa compreensão pode
se tornar ainda mais efetiva quando o aluno consegue estabelecer relações entre o
seu próprio contexto e aquele da obra.
O estudo das obras de Poty Lazzaroto, a partir da História da Arte,
possibilitou estabelecer relações com estilos e movimentos artísticos anteriores ou
contemporâneos à sua obra e também enfocar a produção de Poty dentro da Arte
Brasileira e Paranaense. Além disso, a disciplina de Arte no CEAD Poty LAzzarotto
já vem organizando o estudo das manifestações artísticas sob um eixo cronológico.
2.2 A Análise da Obra de Arte
A análise da obra de arte, também chamada de leitura da obra, é entendida
aqui como importante via de acesso às obras artísticas e ao conhecimento em arte.
Existem várias concepções acerca da leitura de imagens. Uma das linhas
conceituais, tomando por base os princípios da semiótica, identifica os elementos da
estrutura da composição visual, ou seja, os aspectos plásticos e iconográficos.
Seguindo essa linha, a análise da obra pode ser dividida em crítica e estética.
A leitura da obra de arte para Ana Mae (1991, p. 37) “envolve análise crítica da
materialidade da obra e princípios estéticos ou semiológicos, ou gestálticos ou
iconográficos.” Ainda segundo a autora, essa análise crítica “..desenvolve a
6
habilidade de ver e não apenas olhar as qualidades que constituem o mundo visual,
um mundo que inclui e excede as obras de arte.” (1991, p. 37).
Por sua vez, a análise estética da obra de arte é realizada a partir de
elementos destituídos de materialidade. Como é o caso da beleza, da harmonia, do
equilíbrio e do conteúdo. É o arranjo dos elementos dentro da obra e o modo como
se apresentam ao olhar, que vai determinar sua qualidade artística. Elliot Eisner
apud BARBOSA (1991, p.37) afirma que “a estética esclarece as bases teóricas
para julgar a qualidade do que é visto.”
Outra linha conceitual, esta defendida por Terezinha Franz, compreende a
imagem não como uma representação estética, mas como uma representação
sociocultural. Preocupa-se em conhecer o significado das obras artísticas e da
cultura da qual procedem.
Por ser a obra de arte parte integrante das atividades culturais, tecnológicas e
da organização de um grupo social, Franz alerta para a necessidade de abordagens
que explorem os significados nela embutidos. Por isso, considera importante
ultrapassar o enfoque voltado apenas para a História da Arte “fechada em si mesma,
como se fosse um universo à parte”, sem estabelecer relações com a vida da
sociedade na qual a obra se originou (2003, p. 131). No seu entender, as obras
artísticas devem ser estudadas dentro do seu contexto, pois perdem sentido fora
dele. Ou seja, a obra de arte, como qualquer outro produto cultural, reflete as
necessidades e aspirações do seu criador e dos indivíduos da época em que foi
produzida. No caso de alguns murais de Poty Lazzarotto, estudá-los, requer
conhecer os aspectos da sociedade na época de sua criação e também os
interesses do grupo social que encomendou a obra, além dos objetivos do próprio
artista.
Franz, defendendo uma compreensão efetivamente crítica e abrangente da
arte, propõe um olhar cultural direcionado às obras de Artes Visuais por meio de
uma abordagem, uma espécie de sistema interpretativo, que compreenda cinco
âmbitos, chamados Âmbitos de Compreensão: histórico/antropológico,
estético/artístico, cultural/social, pedagógico e biográfico. “Os cinco âmbitos
interpretativos nunca estão separados na obra real, uma vez que nunca é
essencialmente estética, mas incorpora também outras ideias do mundo social e
7
cultural do artista”. (2003, p. 250). Tais âmbitos se definem a partir de perguntas que
são dirigidas à obra de modo a compreendê-la em toda sua complexidade. Para
melhor compreender o significado de cada um, optou-se por relacioná-los a seguir:
Âmbito Histórico/Antropológico (da obra) – é construído pelo olhar dirigido às
pessoas e seu modo de vida (as pessoas representadas na obra e aquelas
que exerceram influência direta da produção da obra). O conhecimento do
contexto histórico/político/social e cultural. O que a obra nos diz a respeito
da vida das pessoas e do que nela está representado.
Âmbito Estético/Artístico (da obra) – é o olhar preocupado com o
conhecimento da cultura artística que gerou a obra e a compreende como
um sistema de representação do universo visual: com códigos simbólicos e
referências culturais.
Âmbito biográfico (do observador) – de todos é talvez o mais subjetivo. É o
olhar que se estabelece a partir da relação entre a história pessoal do
observador e a obra. Como cada indivíduo relaciona a obra com sua vida
pessoal e a partir daí constrói seu entendimento do mundo e de si mesmo?
Como as experiências pessoais do observador intervêm na compreensão da
obra?
Âmbito Crítico/Social (momento histórico no qual a obra foi realizada e
momento da análise) – olhar reflexivo e crítico que o observador dirige à
sociedade, a sociedade representada na obra ou aquela na qual vive.
Âmbito Pedagógico (olhar do professor) – é o olhar do professor. “O olhar de
quem pensa em como ensinar e em como e o que aprender com esta obra”.
(Franz, 2003, p. 133).
Informações a respeito do período no qual a obra foi produzida, ou no qual o
artista viveu, são bem-vindas. Quando observamos uma produção cubista,
passamos a entender melhor as proposições do movimento quando temos algumas
informações acerca do período no qual foi realizada. Num período de grandes
mudanças na maneira de enxergar o mundo, pesquisadores como Darwin, Freud e
Eistein apresentaram uma nova forma de ver a vida, a psique humana e o universo.
Conhecer estas mudanças e relacioná-las ao Cubismo torna a compreensão deste
8
movimento artístico muito mais significativa. Uma análise que parta dessa
perspectiva pertence ao âmbito histórico/antropológico.
Estudar a formação artística e aspectos biográficos de Poty Lazzarotto
permitiu compor um perfil do artista, muito útil no momento de analisar suas obras.
Conhecendo a sua trajetória artística, passamos a compreender que o realismo
social presente em suas figuras não é fruto de um engajamento ideológico com
influência do Muralismo Mexicano ou dos Clubes de Gravura, como o de Porto
Alegre, estes sim de notável acento marxista. Um exame mais demorado das
primeiras obras de Poty permite-nos encontrar, ainda na primeira metade da década
de 40, a figuração e a temática de cunho socialista, ou seja, anteriormente ao artista
ter contato com esta forma de representação.
Também não podemos negar que a arte, como qualquer outro produto cultural,
é fruto das necessidades e aspirações dos homens da época em que é produzida.
Seguindo a perspectiva adotada por Pierre Francastel (1990, p. 11, citado por
FRANZ, 2003, p.131), a obra de arte “é um dos aspectos de um modo de expressão
convencional, correspondente a um certo estado de técnicas, a ciência e a ordem
social do mundo em um dado momento.” Basta lembrarmos de criações como as
igrejas góticas e as pinturas do Renascimento para termos um exemplo claro do que
significa o âmbito cultural/social. As catedrais do Período Gótico, com sua altura a
desafiar os limites humanos, só puderam ser erguidas devido às inovações das
técnicas construtivas que estavam então em desenvolvimento. O grau de
naturalismo alcançado pelas pinturas renascentistas é fruto das mudanças na ordem
social, econômica, científica e filosófica da época.
Veja-se o caso dos murais de concreto de Poty. Quando o painel da fachada do
Teatro Guaíra “A Evolução das Artes Cênicas”, seu primeiro trabalho em concreto,
foi executado, os moldes ainda eram feitos em madeira. Este material, devido à
dificuldade de manipulação, determinou o corte das linhas. Usando-se a serra fita
para cortá-lo, obtinha-se cortes de linhas retas e perpendiculares, ficando as linhas
curvas restritas a contornos simples. Porém, em épocas posteriores, quando placas
de isopor começaram a ser comercializadas em variadas espessuras, os murais de
Poty ganharam linhas mais leves e arredondadas, planos com profundidades
maiores e figuras com mais detalhes. O material, leve e fácil de ser cortado e
manuseado, permitiu cortes em vários sentidos e direções.
9
Sendo assim, são inegáveis os condicionantes históricos, sociais, técnicos e
ideológicos presentes nas obras de arte. Contudo, estes condicionantes devem ser
entendidos sempre como elementos que fazem a experiência estética ser mais
completa e não a substituem.
No entanto, afirma Hernández (1997a:2000ª, citado por FRANZ, 2003, p.129),
“no estudo de uma pintura histórica brasileira, deve ser priorizado o processo de
interpretação mais que o da percepção.” Podemos aplicar esse processo também
aos painéis e gravuras de Poty que fazem referências a temas históricos ou sociais.
Nos murais, é o caso do “Monumento ao Tropeiro”, na cidade da Lapa, e do
“Monumento Comemorativo ao 1º Centenário da Emancipação Política do Estado do
Paraná”, na Praça Dezenove de Dezembro, na cidade de Curitiba. Na gravura, são
exemplos a estampa “Cangaceiros”, aquelas da série “Bahia” ou as da série
“Mangue”, cuja temática difere caso a caso. Fazer uma leitura das obras citadas
considerando-se apenas os valores estéticos resultaria numa análise incompleta.
Contudo, a técnica ou o suporte utilizado também tem muito a dizer sobre a
obra. Mesmo tratando de temas afins, o mural e a gravura estabelecem formas
diferentes de diálogo. Nos murais temos o quesito da monumentalidade. É antes a
grandeza do espaço e das formas a dialogar com o espectador. A gravura, na sua
essência, estabelece um contato mais íntimo, subjetivo, com aquele que a observa.
O mural grita, enquanto a gravura chama para uma conversa ao pé do ouvido.
2.3 O Fazer Artístico
O fazer artístico, é o terceiro eixo do tripé e não menos importante porque é o
exercício criativo. Nele, segundo Franz (2003, p.151) “podemos desenvolver
estratégias de compreensão da arte (e não apenas de expressar sentimentos,
intuitivamente)”. A prática artística traz experiências significativas e enriquecedoras
porque permite experimentar materiais e suportes variados e articular significados.
Possibilita estabelecer compreensões acerca das obras e dos processos criadores
utilizados pelos artistas estudados.
10
Isso justifica a opção de levar aos alunos propostas de atividades
relacionadas às técnicas utilizadas por Poty Lazzarotto. Porque conhecer e
experienciar a técnica utilizada pelo artista permite estabelecer uma compreensão a
respeito da obra e do processo criador que de outro modo não seria possível.
Durante a implementação do projeto, o fazer artístico sempre foi precedido pelo
estudo da biografia do artista, pela análise das suas obras, das épocas em que
foram produzidas, das técnicas e materiais empregados.
2.4 A Obra de Poty Lazzarotto
A produção artística de Poty dividiu-se em três modalidades das artes visuais:
a gravura, a ilustração e os murais, também chamados painéis. Em todas elas há
uma acentuada preferência pelo preto e branco, em detrimento da cor. A exceção é
a última fase, na década de 90, quando a cor explode em suas gravuras e painéis.
Nos trabalhos de gravura a linguagem é sempre figurativa. A temática
apresenta paisagens, santos, e se refere a pessoas comuns, ou mesmo próximas ao
artista, a trabalhadores, imigrantes e algumas prostitutas. Por volta da década de
1990, as gravuras passam a tratar de fatos e personagens relativos à história da
região, principalmente de Curitiba, constituindo quase um relato histórico.
A tônica da sua gravura, por vezes, é expressionista. Não pela deformação do
desenho, mas pelo forte contraste entre o claro e o escuro, pelos traços enérgicos e
fortes e pela atmosfera que consegue imprimir às cenas representadas. Noutras
vezes, se aproxima do realismo social. Alguns trabalhos se destacam pela economia
de linhas. Uns poucos traços são suficientes para resolver a composição e não há
contrastes de luz. As técnicas de gravura usadas por Poty foram a xilogravura,
litografia e a gravura em metal (água tinta, água forte, ponta seca, raspagem). Com
essas técnicas o artista alcançou resultados diversos: texturas aveludadas, negros
profundos, cinzas em variadas tonalidades, traços leves e rápidos de esboço, linhas
emaranhadas.
Fazendo desenhos para obras de escritores como Graciliano Ramos e
Guimarães Rosa, além do paranaense Dalton Trevisan, Poty Lazzarotto, destacou-
11
se também na ilustração. Para essa tarefa o artista se preparava fazendo leituras
prévias e reflexões sobre o texto a ser ilustrado. O desenho simples, de traço
desenvolto e preciso, vai compondo as cenas de acordo com a temática literária. Às
vezes, a simplicidade das formas cede espaço a figuras quase fantásticas, se essa
for a exigência do respectivo texto.
Suas imagens, singulares e expressivas, são eficientes em sintetizar o
significado dos textos. Prova dessa capacidade do artista são as estampas das
ilustrações quando apresentadas em salas de exposição. Basta olharmos para elas
e já nos vem à mente os episódios aos quais se referem. Guimarães Rosa,
reconhecendo o trabalho de ilustração feito por Poty para o seu livro “Sagarana”,
chamava-o de Potyrama. Rosa entendia que o ilustrador foi co-autor da obra, pois
mais do que ilustrar o texto escrito, traduziu-o em forma de imagens.
Nos murais, o artista explorou materiais como o azulejo, a madeira e o
concreto. Neles, era comum empregar diversos recursos da atividade de gravador.
Os trabalhos em madeira, chamados de madeira gravada, recebiam o mesmo
tratamento de uma superfície de matriz de xilogravura. Mas foi nas obras em
concreto, denominadas concreto aparente, que Poty desenvolveu técnicas bastante
particulares de tratamento do material e tornou-se um dos maiores nomes brasileiros
nesse meio de expressão artística. Em seus painéis de concreto, o volume é todo
trabalhado em negativo. O volume que se projeta à frente do painel montado na
parede foi trabalhado no molde como um vazio. Os moldes cheios produzem o efeito
contrário. O artista não tinha nenhuma dificuldade em trabalhar com essa inversão
de planos entre o molde e a parede. Na gravura em metal também acontece essa
mesma inversão. Outro tratamento da gravura dispensado ao painel em concreto foi
o sgrafitto, uma espécie de grafismo obtido com o auxílio de uma faca ou objeto
similar, enquanto o concreto ainda não está completamente solidificado.
Além da gravura, outra influência aparece nos murais: as histórias em
quadrinhos, desenhadas por Poty nos tempos de adolescente. Quando Adalice
Araújo se refere ao “princípio de narração contínua, típica da Idade Média” 5 ,
5
ARAÚJO, Adalice. Referêcia em Planejamento - Arte no Paraná I. p. 42
12
presentes nos murais do artista, está justamente se referindo à narrativa sequencial
e à economia de detalhes, presentes nas histórias em quadrinhos. Na organização
do espaço no painel há sempre uma estrutura narrativa. O artista entende o plano do
mural como um papel no qual será contada uma história. Assim, o espaço permite
uma narrativa. Além disso, a presença da figuração é constante, mesmo nos casos
em que são empregadas formas mais estilizadas.
Nos murais, como no restante da sua obra, as imagens podem apresentar um
caráter expressionista alternado ao realismo social, por vezes fazendo alusão ao
fantástico, mas, sobretudo nas obras em concreto, apresentam graus variados de
esquematização. A temática, por sua vez, é sempre histórica. Refere-se a fatos
passados ou que estão se desenvolvendo no período da produção do mural. O foco
de atenção é quase sempre a cidade de Curitiba ou o estado do Paraná, com seu
nativismo, por exemplo, ou ainda, os estágios da evolução científica ou cultural e
artística. Sendo a temática histórica predominante nos seus murais, propor uma
análise sobre a obra de Poty Lazzarotto, requer uma leitura que contemple não
somente os aspectos estéticos ou artísticos, mas também os fatores históricos
retratados na obra.
3 Estratégias de Ação
Para a implementação do projeto optou-se por trabalhar a gravura e o mural
em diferentes turmas, distribuídas entre o Ensino Fundamental e Médio e com
diferentes procedimentos técnicos. Mesmo com tal distinção, o ponto de partida
para todas as turmas sempre foi o mesmo: a história de vida e trajetória artística de
Poty Lazzarotto, seus primeiros anos, sua família, suas experiências, influências
recebidas, bolsas de estudo, viagens, principais técnicas utilizadas, suas obras de
maior expressão na ilustração, na gravura e nos murais. Para isso foram utilizados
vídeos e slides que seguiram o mesmo conteúdo e desenvolvimento do Caderno
Pedagógico.
O passo seguinte foi a focalização especificamente na produção gráfica, para
algumas turmas, ou na produção em mural para outras, com as técnicas
13
empregadas pelo artista em cada uma das linguagens. No caso das gravuras, foram
comparados os diferentes tratamentos recebidos pelas imagens em cada técnica
utilizada por Poty e as fases percorridas pela sua produção artística. O mesmo
ocorreu com os murais, cuja abordagem voltou-se para os resultados
proporcionados pelos materiais e procedimentos técnicos por ele adotados.
Nesse momento houve uma pausa no estudo acerca da obra de Poty para
localizar o desenvolvimento da gravura ou do mural – conforme a turma, desde a
Pré-história até os dias atuais, a evolução das técnicas e dos materiais empregados.
Também buscou-se a produção no Brasil e no Paraná em mural e gravura
concomitante ao período em que Poty também produzia. Para esta etapa,
novamente foi aplicado o conteúdo do Caderno Pedagógico, bem como suas
imagens, apresentadas em slides.
A gravura foi estudada a partir de sua conceituação, origem nas marcações
rupestres e vestígios deixados por antigas civilizações. Passou-se pelas diferentes
finalidades atribuídas à imagem impressa desde então - a multiplicação de imagens
simplesmente, a expressão de ideias e a expressão artística. Houve espaço para a
identificação da produção gráfica brasileira e paranaense e dos seus principais
expoentes. Também foram abordados o desenvolvimento das técnicas de gravura,
os resultados obtidos em cada uma e os materiais e equipamentos envolvidos.
Da mesma forma, o mural foi estudado desde sua conceituação e origens, a
contribuição de artistas modernistas europeus, o Muralismo Mexicano, os artistas
brasileiros de maior proeminência e as novas propostas de murais para os dias
atuais com uso de materiais inusitados. Uma atenção especial foi dada ao Grafite e
à importância que vem ocupando no espaço urbano. Também foram relacionadas e
descritas as técnicas de pintura parietal e de escultura aplicadas aos murais.
Em seguida, veio a análise, conforme a turma, das obras de gravura e em
mural de Poty, igualmente contidas no Caderno Pedagógico. As análises dos murais
foram apresentadas já prontas para os alunos, por meio da observação das imagens
em slides. Os estudantes mais jovens demonstraram melhor aceitação das análises
das obras, manifestando claro interesse pela organização narrativa presente nos
murais.
14
As obras de gravura, por sua vez, foram apresentadas de forma diferente:
cada aluno recebeu uma cópia de uma gravura de Poty com várias perguntas em
folha anexa, que deveriam ser respondidas por escrito. As perguntas se referiam ao
tema da obra, sua pertinência nos dias atuais, o tipo de tratamento recebido, a
organização dos elementos visuais. Também propunham relatos de experiências
semelhantes àquela mostrada na cena e dos pensamentos ou sentimentos
evocados pela imagem e solicitavam a citação de informações acerca do título,
época e técnicas empregadas. Essa análise deveria ser feita individualmente,
levando-se em conta as considerações pessoais de cada aluno e recorrendo ao
professor somente em último caso.
Pôde-se perceber que principalmente os alunos mais jovens tiveram maior
dificuldade em analisar as gravuras. Cenas de foguistas ou passageiros no interior
dos trens, de guarda-freios sobre eles, de matadouros de gado, pessoas fugindo de
um cão raivoso ou pessoas num velório, pareceram estranhas a eles e se mostraram
mais adequadas aos adultos, pois muitos destes já haviam vivenciado algumas das
situações representadas. Em relação a elas guardam sentimentos e lembranças que
afloram facilmente e permitem uma identificação rápida, espontânea e sincera ao
analisar as cenas.
Os estudantes mais maduros também demonstraram uma maior identificação
com a biografia de Poty. Ao conhecer aspectos da infância do artista, cuja família
lutava com dificuldades para comprar as revistas ilustradas que serviram de primeira
influência para o menino, o apoio paterno, o aprendizado das primeiras letras, os
anos escolares, as grandes oportunidades sempre aproveitadas e nunca
desperdiçadas, o aluno adulto de certa forma vibra pelo êxito alcançado pelo artista.
Posteriormente foi a etapa das práticas artísticas. Como o objetivo era o
conhecimento e a experimentação das técnicas usadas pelo artista, optou-se por
não usar a releitura de obras como processo criativo. Não tendo a obrigação de
partir da análise de nenhuma obra, cada aluno ficou à vontade para organizar sua
criação artística de acordo com o seu arbítrio e material utilizado.
Dentre as turmas envolvidas com o mural, a 8EFA e a COLEM-B optaram por
trabalhar a narrativa. Escolheram, então, um tema para representá-lo no painel e
desenvolveram-no empregando o princípio da narrativa contínua utilizado por Poty.
15
Uma delas, a COLEM-B, retratou a biografia do artista desde o seu nascimento, em
1924, até sua morte, em 1998, destacando os fatos mais importantes de sua vida e
obra. Este trabalho foi realizado em tinta azul sobre seis placas de papel duplex
branco dispostas lado a lado, de modo a compor uma faixa retangular em sentido
horizontal, de 70cmx300cm. Optou-se pelo figurativismo e pela pintura monocrômica
com aguada, como a utilizada no Monumento ao Centenário da Emancipação
Política do Estado do Paraná, na Praça Dezenove de Dezembro, em Curitiba. A
opção pelo tratamento da figura e pela cor obedeceu à mesma preocupação
apresentada por Poty quando executou a referida obra: dar ao painel a formalidade
que o tratamento do tema requer.
Por sua vez, a turma 8EF-A trabalhou com a evolução da comunicação
escrita, desde a Pré-História com suas pinturas rupestres, passando pelas estelas e
sinetes mesopotâmicos, hieróglifos e papiro egípcios, alfabeto grego, papel e escrita
pictográfica chineses, monges copistas e pergaminhos medievais, as primeiras
imagens em xilogravura do séc. XV, a impressão com tipos móveis de Gutemberg,
chegando até os dias atuais com o computador, internet, livros digitais, telefones
celulares e mensagens eletrônicas. Esta turma construiu o painel com módulos, à
semelhança de azulejos. Para os módulos utilizou-se caixas de leite longa-vida
revestidas com papel sulfite branco. Coladas lado a lado pelas faces mais estreitas,
formaram um painel retangular de 3 caixas de altura por 12 caixas de largura,
obtendo-se assim um painel de duas faces. As faces maiores ficaram livres para
receber os desenhos e compuseram o plano do painel onde desenvolveu-se a
narrativa sobre a evolução da comunicação escrita. Neste trabalho optou-se pela
policromia já que, no entender dos alunos, os sucessivos tempos históricos seriam
melhor evidenciados com o emprego, em cada um deles, de cores específicas e
distintas.
Outras três turmas, a COLEM-A, a 2EM-A e a 2EM-B, baseando-se nos
murais de concreto de Poty, utilizaram isopor para construir os painéis. Nestes,
procurou-se trabalhar com os planos positivos e negativos que avançam ou recuam
em direção à base do painel. Pela já natural complexidade de lidar com os recuos e
avanços das formas tridimensionais, optou-se neste trabalho, por usar formas livres
e geometrizadas por entender que a geometrização facilitaria a identificação e
resolução dos planos. Pelo mesmo objetivo deixou-se de lado o princípio da
16
narrativa, aspecto sempre presente nos murais do artista. Para a atividade as turmas
foram divididas em grupos de 7 a 9 participantes. Sobre placas de isopor e fazendo
uso de pedaços do material descartado e recolhido do lixo, os alunos decidiram em
grupo a organização da composição visual, cujas formas foram fixadas com cola
quente. Esta cola possibilitou a sobreposição de várias camadas de material,
permitindo alcançar variados graus de volume.
O isopor não foi empregado como molde, tal como Poty o utilizava, e sim
constituiu o próprio mural. Depois da fixação de todas as placas, formas e
sobreposições, bastou apenas o painel receber duas demãos de tinta para estar
concluído. Para a pintura foi utilizada tinta PVA na cor de concreto aparente. A
escolha da cor e da tinta, fosca, se mostrou acertada porque além de dar
acabamento, também contribuiu para transmitir a sensação de peso. Quando fixados
na parede, os painéis faziam alusão a composições em pedra ou cimento e não
mais ao isopor.
As atividades de gravura se dividiram em três tipos, conforme a idade dos
alunos. Os alunos mais velhos, da turma COLEM-B trabalharam com neolite, um
emborrachado encontrado nas casas de artigo para sapateiros, utilizado como
substituto do linóleo em função do preço (o linóleo chega a custar quinze vezes
mais). Porém, o neolite oferece certa resistência ao corte, o que exige goivas bem
afiadas. Com a preocupação de evitar acidentes, houve o cuidado de restringir o
material somente aos estudantes mais velhos. Por este motivo e também pelo
tamanho reduzido da turma, a COLEM-B foi escolhida. Os alunos foram orientados a
usar corretamente o material de modo a proteger as mãos. Um destes alunos
adultos, por não possuir um dos braços, recebeu uma placa de bandeja de isopor,
que foi fixada à mesa com fita aderente. Assim, pode trabalhar a matriz apenas com
uma das mãos, já que o isopor não oferece resistência e se deixa sulcar com
facilidade.
Nas turmas 1EM-A, 1EM-B e 1Em-C, de alunos mais jovens, adolescentes na
verdade, foi trabalhada a gravura a partir de bandejas de isopor. Pela facilidade com
que se consegue sulcar e amassar o isopor, não há necessidade de utilizar as
goivas. Qualquer material pontiagudo, como a ponta de um lápis ou caneta pode
fazer o serviço. Mas estas turmas também tiveram a oportunidade de experimentar
as goivas. Para isso, porém, a opção voltou-se para as borrachas escolares, dessas
17
brancas bem comuns. Como não oferecem resistência ao corte, os alunos puderam
trabalhar nelas com goivas não muito afiadas de modo a não oferecer maiores
perigos. Mesmo assim, as recomendações a respeito do manuseio do material foram
apresentadas e seguidas com cuidado. No entanto, utilizando a borracha escolar,
mesmo aquela de tamanho maior, a matriz funcionou mais como um carimbo, o que
remeteu à lembrança de um dos antigos usos das matrizes de madeira, quando
ainda não se falava em xilogravura: as estampas empregadas na impressão de
cartas de baralho.
A impressão das imagens foi executada utilizando-se materiais bastante
alternativos: rolos de espuma, pincéis, colher de bambu e tintas de baixo custo, à
base d’água - tinta guache e uma tinta de confecção caseira6 . Esta última, na
verdade, revelou-se mais apropriada que o guache para o uso na gravura escolar,
pois além de apresentar melhor capacidade de cobertura, sua limpeza é um pouco
mais fácil. Também as cópias impressas apresentam uma qualidade relativamente
melhor, já que permite uma textura não tão fosca e áspera. Concluída a impressão
das cópias, chegou o momento das anotações referentes ao número de tiragem,
título da gravura e assinatura. Os alunos foram orientados acerca das convenções
existentes sobre as informações colocadas em cada cópia e dos lugares destinados
a elas.
Como a proposta inicial era a de conhecer o material de gravura, mesmo que
alternativo, e experimentar a técnica, também aqui não houve preocupação de
direcionar previamente o processo criativo ou a composição visual. Assim, livres
para brincar e conhecer as possibilidades do material, os alunos produziram
matrizes cujas prosaicas composições indicam que a atividade foi recebida com
agrado e realizada com prazer. Também com prazer e surpresa foram realizadas as
cópias. O entintar das matrizes, o preparo da cama para receber a matriz e o papel
no qual a imagem seria impressa, o ato de pressionar o papel sobre a matriz, todos
foram realizados com notável entusiasmo. Principalmente entre os alunos já adultos
percebeu-se uma grande carga de expectativa presente na realização das cópias. A
6
Extraída da página <http://xilomovel.blogspot.com/>, acesso em 26/10/2010.
18
cada cópia concluída, talvez estivessem dizendo a si próprios –“Eu consegui. Eu
também sou capaz de fazer isso.”
Na etapa final da implementação ocorreram visitas a obras murais de Poty
Lazzarotto (o “Monumento ao Centenário da Emancipação Política do Paraná”,
painel situado à Praça 19 de Dezembro, e o painel “A evolução das Artes Cênicas”,
situado na fachada do Teatro Guaíra) e ao Museu de Gravura, localizado no Solar
do Barão. Optou-se por deixar as visitas às obras para uma etapa posterior a análise
de obras do artista e as atividades com experimentação de técnicas e materiais por
entender que depois de ter assimilado todas as informações precedentes, os alunos
poderiam então melhor absorver o contato com as obras e estabelecer com elas
relações mais duradouras, compreendendo todo o aparato técnico existente por trás
delas.
4 Conclusão
Os resultados desta implementação tiveram vários desdobramentos. Os
alunos souberam aproveitar os momentos das aulas participando das práticas
artísticas, da descoberta de técnicas e materiais com os quais não haviam tido
contato anterior, além das análises das obras. A possibilidade de compreender a
narrativa de alguns painéis, como “A Evolução das Artes Cênicas” da fachada do
Teatro Guaíra e “Alegoria ao Paraná” da fachada do Palácio Iguaçu, ambos em
Curitiba, que até então julgavam indecifráveis, foi recebida com entusiasmo.
Porém, principalmente para os alunos adultos, aqueles que compõem o maior
percentual dos matriculados na EJA, houve um diferencial. Para eles, conhecer
aspectos da vida de Poty Lazzarotto, assumiu uma dimensão que ultrapassou o
simples fato de adquirir mais um conhecimento sobre a biografia de um artista ou
alguns aspectos da história do Paraná e do Brasil. Na verdade, significou uma
experiência mais ampla.
A identificação com certos detalhes da biografia do artista como a origem
humilde, a vida num bairro operário e a labuta da família para sobreviver, mesmo
que de modo modesto, parece fazer eco com a história de vida de muitos deles. Ao
19
mesmo tempo, chamou atenção dos estudantes os esforços realizados pela família
para dar ao jovem Poty as condições necessárias ao seu desenvolvimento artístico,
a influência do pai sobre a vida do menino e as oportunidades que este sempre
soube aproveitar. A experiência de alguns anos com Educação de Jovens e Adultos
permite sugerir que tais aspectos foram percebidos e colocados em evidência
porque os estudantes dessa faixa etária compreendem o quanto as oportunidades
perdidas em etapas anteriores de sua vida, hoje lhes fazem falta.
Embora a maioria dos estudantes da EJA apresente uma característica
bastante comum no seu currículo - um histórico de tentativas frustradas em concluir
seus estudos no ensino regular, a diferença de faixa etária mostrou ser fator de
maior preponderância em relação ao foco de interesse demonstrado pelos alunos:
os mais jovens mostraram-se mais interessados nas análises dos murais, ainda que
apresentadas já prontas, do que na análise das gravuras, cuja análise partiu da
construção individual de cada aluno antes de serem apresentadas as observações
do professor. Já os alunos adultos, mostraram grande interesse pela análise dos
murais, mas, principalmente, pelo estudo da biografia do artista, fato que mesmo
sendo apreciado pelos adolescentes, não se mostrou tão marcante ao seu olhar.
Os estudantes adultos também sentiram-se mais atraídos pela análise das
gravuras, quando comparados aos mais jovens. Relevante notar que a relação com
a obra gravada diferia de acordo com a idade do leitor da imagem. Enquanto os
adolescentes fixavam-se nos aspectos formais e gráficos, fazendo uma leitura
objetiva, os adultos buscavam entender os aspectos subjetivos embutidos no
conteúdo da obra, atribuindo-lhes um significado a partir das experiências já vividas.
Pela forma como os alunos se envolveram com os conteúdos e o modo como
se empenharam em desenvolver as atividades, percebo que consideraram o assunto
significativo para seu aprendizado. Contudo, ao fim da implementação deste projeto,
espero que os estudantes levem para suas futuras experiências estéticas as
relações estabelecidas com as obras analisadas e os processos artísticos realizados
nas aulas de Arte.
A pesquisa acerca de Poty Lazzarotto, mesmo que longa e exaustiva, porém
prazerosa e profícua, materializou-se num Caderno Pedagógico, intitulado “Poty -
Murais e Gravuras”. O caderno apresenta textos acompanhados de uma série de
20
imagens sobre a biografia do artista, formação e produção artística, análise de obras
e história do mural e da gravura através dos tempos. Este material está agora
disponível na biblioteca da Escola para as pesquisas dos alunos. Também tem sido
utilizado pelos filhos ou parentes de alunos do CEAD para pesquisas sobre Poty
solicitadas pelas suas escolas, numa amostra de que nem sempre é fácil para os
estudantes encontrarem material de pesquisa sobre o artista.
Referências
ARAÚJO, Adalice. Referêcia em Planejamento – Arte no Paraná I. Curitiba: Secretaria de Estado do Planejamento, 1976.
BARBOSA, A. M. A imagem no ensino da arte. São Paulo: Perspectiva, 1991.
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – área de linguagens, códigos e suas tecnologias. Secretaria de Educação Básica. Brasília, 2000, 71 p. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/14_24.pdf>. Acesso em 15/03/2010.
DASILVA, O. Poty, o artista gráfico. Curitiba: Fundação Cultural de Curitiba
FRANZ, T. S. Educação para uma compreensão crítica da arte. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2003.
PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares de Arte para a Educação Básica. Departamento de Educação Básica. Curitiba, 2008.
XAVIER, V.; LAZZAROTTO, P. Trilhos, trilhas e traços. Curitiba: Fundação Cultural de Curitiba, 1994.