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Eduardo Antunes Martins O débito cardíaco define-se como a quantidade de sangue que é ejetada pelo coração a cada minuto, sendo que também pode ser definida como a quantidade de sangue que flui pela circulação. Esse parâmetro fisiológico se correlaciona intimamente com o retorno venoso, que apresenta inúmeras correlações com diversos segmentos do organismo (sistema nervoso autônomo, musculatura lisa de vasos, áreas corticais, dentre outras). Essa relação obedece ao princípio máximo da circulação, que a define em última instância, o regime estacionário desse sistema (também podendo ser definido pela simples premissa “tudo que entra, sai de igual volume e semelhante maneira”). Objetivos: Valores normais para débito cardíaco, retorno venoso e índice cardíaco; Índice cardíaco; Lei de Frank-Starling; Efeito da resistência periférica total sobre débito cardíaco; Limites do DC; Papel do SNA no controle do DC; DC patologicamente aumentados ou diminuídos; Curvas do retorno venoso; Pressão média de enchimento circulatório; Gradiente de pressão para RV; Fisiologia UNIDADE III CAPÍTULO 3 DÉBITO CARDÍACO E RETORNO VENOSO

Débito Cardíaco e Retorno Venoso - Fisiologia

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Fisiologia Eduardo Antunes Martins

O débito cardíaco define-se como a quantidade de sangue que é ejetada pelo coração a cada minuto, sendo

que também pode ser definida como a quantidade de sangue que flui pela circulação. Esse parâmetro fisiológico se

correlaciona intimamente com o retorno venoso, que apresenta inúmeras correlações com diversos segmentos do

organismo (sistema nervoso autônomo, musculatura lisa de vasos, áreas corticais, dentre outras). Essa relação

obedece ao princípio máximo da circulação, que a define em última instância, o regime estacionário desse sistema

(também podendo ser definido pela simples premissa “tudo que entra, sai de igual volume e semelhante maneira”).

Objetivos:

Valores normais para débito cardíaco, retorno venoso e índice cardíaco;

Índice cardíaco;

Lei de Frank-Starling;

Efeito da resistência periférica total sobre débito cardíaco;

Limites do DC;

Papel do SNA no controle do DC;

DC patologicamente aumentados ou

diminuídos;

Curvas do retorno venoso;

Pressão média de enchimento

circulatório;

Gradiente de pressão para RV;

Fisiologia

UNIDADE III CAPÍTULO 3

DÉBITO CARDÍACO E

RETORNO VENOSO

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Fisiologia – Unidade III

MARTINS, Eduardo A. Página 1

O débito cardíaco (DC) é de extrema importância para o

correto funcionamento do organismo, ditando a distribuição de

metabólitos, energia e substâncias essenciais para todos os tecidos.

Ele pode variar por processos fisiológicos ou patológicos. Sua

variação fisiológica pode ser decorrente da variação dos seguintes

fatores: idade, nível de metabolismo basal, exercícios físicos e

dimensões do corpo (principalmente relacionado à área de superfície

da pele, sendo que ele pode ser expresso de acordo com esse

parâmetro, que é chamado de índice cardíaco, medindo o DC por

metro quadrado de superfície corporal). A idade e a massa corpórea

se relacionam com a diferenciação das necessidades sanguíneas

nos diferentes tecidos, principalmente em relação aos músculos

esqueléticos. Com o avanço da idade, ou do processo de engorda,

esse tipo de tecido é progressivamente substituído por outros que

necessitam de menor vascularização (principalmente pelo tecido

adiposo), diminuindo assim as necessidades teciduais e, por

conseguinte, o DC.

Controle do Débito Cardíaco pelo Retorno Venoso

Obedecendo ao princípio do regime estacionário, um

aumento no retorno venoso ao coração causará, dentro das limitações fisiológicas, um aumento concomitante do DC.

Esse princípio básico da dinâmica circulatória é definido pela lei de Frank-Starling. Sendo assim, percebe-se que na

grande maioria das vezes o retorno venoso é o principal fator controlador e limitante do débito que, sendo assim, se

relaciona indiretamente com as necessidades teciduais do organismo. A razão para esse mecanismo de ajuste de

forças se baseia no fato do tecido muscular cardíaco ser estriado, ou seja, apresentar complexos contráteis que se

modificam com a pressão externa e apresentam um nível ótimo de

ação, muito semelhante aos encontrados no músculo esquelético.

Quando ocorre aumento do retorno venoso há um aumento

concomitante da pressão exercida a parede atrial e,

consequentemente, ocorre uma distensão dessa região. Esse

movimento coloca as unidades contráteis em uma posição mais

favorável a contração (melhor contato entre a miosina e actina),

favorecendo assim um aumento na contratilidade cardíaca e a

expulsão de maior quantidade de volume sanguíneo.

Outro mecanismo relacionado com o estiramento atrial é o

desenvolvimento de vias reflexas e ativação do sistema nervoso

autônomo (SNA). A própria dilatação dessa cavidade já gera

modificações no nodo sinusal que aumentam a FC em 10 a 15%.

Adicionando-se a esse fato está o reflexo de Bainbridge: a detecção

da modificação das células musculares cardíacas por receptores na

parede atrial é transmitida pelos nervos simpáticos e parassimpáticos

para o centro vasomotor do encéfalo e, a seguir, envia estímulos que

aumentam a FC e a contratilidade cardíaca de forma acentuada, por

meio de nervos simpáticos e os vagos.

Na realidade o retorno venoso nem sempre é o fator limitante do DC, sendo que, em algumas situações,

geralmente patológicas, o próprio coração pode atuar como tal. O aumento muito grande no retorno venoso é a

principal causa desse fato, sendo que as fibras cardíacas se distendem de tal maneira que sua contratilidade fica

prejudicada, inibindo parcialmente a ação proposta pela lei de Frank-Starling. Outras situações possíveis podem ser:

lesão grave no miocárdio, dilatação ventricular, falta de oxigênio tecidual.

Retorno Venoso

O retorno venoso define-se como a quantidade de sangue proveniente do organismo que chega ao coração

no átrio direito (AD). Esse volume na realidade representa a soma de todos os fluxos sanguíneos locais, por todos os

Figura 1 – Relação inversa entre o avanço da idade e o DC.

Figura 2 – Gráfico que representa a relação entre a distensão e posição relativa do sarcômero (unidade contrátil) e a tensão efetivada pelo músculo.

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Cap. 3 - Débito Cardíaco e Retorno Venoso

MARTINS, Eduardo A. Página 2

segmentos teciduais individuais da circulação periférica. Sendo assim, o débito cardíaco é definido pela soma de

todo o controle tecidual individual.

Resistência Periférica Total (RPT) e o DC

O retorno venoso está intimamente ligado, dentre

outros fatores, com a resistência das paredes dos vasos

sanguíneos. Sendo assim, pode-se definir que o débito

cardíaco também se relaciona estreitamente com esse

parâmetro, o que de fato é verdade, sendo comprovado

matematicamente por uma das formas da lei de Ohm:

Como sabemos, a longo prazo a pressão se

mantém constante por ações renais (Unidade III, Cap. 2).

Esses órgãos realizam essa adequação através de

diversas maneiras, mas primariamente por meio da

regulação hídrica e de sal, modificando assim o volume

intravascular do organismo. Essa modificação altera

consequentemente o DC, pois é um dos componentes básicos do retorno venoso (quantidade de sangue total no

compartimento sanguíneo, diminuindo quando há o abaixamento desse volume, e vice-versa). Sendo assim a

pressão arterial a longo prazo será constante e referencial (100 mmHg) em detrimento de um aumento da resistência

vascular periférica (RVP) e do DC.

Figura 4 – Variadas condições que modificam a RVP e, por alterações primariamente renais, alteram de modo oposto do DC.

Qualquer fator que cause uma diminuição crônica da RVP pode aumentar o DC depois da compensação

renal. Isso porque para manter a PA constante com a resistência diminuída o organismo aumenta o débito

(mecanismo compensatório facilmente visualizado em sua fórmula matemática). São exemplos de alterações:

Béberi: causada por insuficiência de tiamina (vitamina B1) na dieta. Sua deficiência causa diminuição

na capacidade tecidual em utilizar alguns nutrientes celulares, causando uma resposta local que

causa uma vasodilatação periférica grave;

Fístula arteriovenosa (derivação): quando isso ocorre há passagem de sangue diretamente da artéria

para a veia, diminuindo muito a resistência periférica total;

Hipertireoidismo: o metabolismo tecidual fica acentuado, causando maior utilização de nutrientes

pelas células e, com isso, uma vasodilatação geral (aumento do fluxo sanguíneo e diminuição da

RVP);

Figura 3 – Representação gráfica de como o metabolismo e necessidades teciduais (taxa de O2) influenciam no débito cardíaco.

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Fisiologia – Unidade III

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Anemia: a viscosidade do sangue se encontra reduzida, resultante da concentração baixa de

eritrócitos. Além disso, há distribuição diminuída de O2 para os tecidos, o que causa uma resposta

vasodilatadora e, consequentemente, a diminuição da RVP.

Já o DC baixo pode ser precipitado por fatores que podem ser divididos em dois grupos:

Redução acentuada da eficácia do bombeamento cardíaco: quando o coração se encontra

gravemente lesado ele não consegue gerar um fluxo sanguíneo adequado para todos os tecidos.

Quando este débito diminui muito os tecidos corporais começam a entrar em deficiência funcional, o

choque cardiogênico. São exemplos de fatores etiológicos:

o Bloqueio grave de vaso sanguíneo coronário e infarto;

o Cardiopatia valvar;

o Miocardite;

o Tamponamento cardíaco;

o Distúrbios metabólicos cardíacos.

Redução do retorno venoso:

o Volume sanguíneo diminuído (hemorragia): perda do volume intravascular gera uma

diminuição concomitante do enchimento do sistema vascular, em que este não consegue

apresentar pressões necessárias para realizar o retorno venoso;

o Dilatação venosa aguda (inativação súbita do simpático): vasos sanguíneos de capacitância,

em especial as veias, aumentam seu calibre acentuadamente, diminuindo o sangue que

retorna para o coração;

o Obstrução das veias maiores;

o Massa tecidual diminuída (avanço normal da idade/falta de exercícios físicos): a diminuição

do consumo de oxigênio acarreta também uma diminuição no fluxo sanguíneo e, com isso,

um abaixamento do retorno venoso;

o Diminuição da taxa metabólica dos tecidos (hipotireoidismo): mesma explicação que a

anterior, só que não ocorre perda tecidual concomitante.

Figura 5 – Débito cardíaco em diversas situações patológicas e fisiológicas. Perceber relação inversa entre o DC e a RVP para manter a PA normal e constante.

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Cap. 3 - Débito Cardíaco e Retorno Venoso

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Limitações do DC

Existem limites definidos para a quantidade de sangue que o coração é capaz de bombear, ou seja, da

quantidade da qual o DC pode aumentar. Esses fatos podem ser visualizados nas chamadas curvas do DC, de forma

quantitativa.

Na realidade a capacidade que o tecido muscular cardíaco possui para elevar o débito é muito variável e

dependente de muitos outros componentes. O DC normal de um

ser humano em repouso é de ~5 L/min. Esse valor, se o órgão

não for estimulado por qualquer tipo de outro estímulo especial,

pode chegar a 13 L/min, através de aumentos desencadeados

pelas alterações descritas com a Lei de Frank-Starling. Contudo

esse aumento pode ser muito maior (hipereficácia) ou muito

menor (hipoeficácia) dependendo das condições a que o coração

está sendo submetido (sendo que todos esses estados podem

ser analisados quantitativamente nas curvas apontadas no início

do texto).

Existem dois tipos de condições que podem gerar um

músculo cardíaco hipereficaz: estimulação nervosa (por meio da

ativação do SN simpático e inibição do parassimpático, que

levam a um aumento acentuado da FC e da força de

contratilidade), e hipertrofia do músculo cardíaco (aumento da

massa cardíaca, geralmente associado a uma alta estimulação,

como nos atletas, que possibilita aumentar a força contrátil). É

importante destacar a diferença entre hipertrofia e dilatação

cardíaca. A última ocorre por processos patológicos, sendo que

diminui a força contrátil do coração, mas aumenta o tamanho do

órgão (de forma acentuada e excessiva, causando essa

adaptação danosa).

Fatores que podem diminuir a eficiência da contração

cardíaca (coração hipoeficaz) são aqueles de diminuam

cronicamente sua capacidade de bombeamento sanguíneo. São

exemplos:

Aumento da PA a qual o coração deve bombear contra;

Inibição da excitação cardíaca;

Fatores patológicos de criem um ritmo ou uma

frequência anômala;

Obstrução coronariana;

Valvulopatia;

Cardiopatia isquêmica;

Miocardite;

Hipóxia cardíaca.

Papel do Sistema Nervoso no Controle do DC

Como já fora extensamente analisado, o sistema nervoso

autônomo (SNA) é o principal componente do controlo da PA a curto

prazo. Ele aumenta ou diminui a RVP de acordo com as necessidades

do organismo. Como ele atua principalmente na modificação da

resistência esse controle nervoso está intimamente correlacionado

com o DC, já que uma modificação na resistência periférica total causa

mudança oposta no débito. Isso pode ser comprovado por meio da

análise de um experimento com cães.

Nesse estudo um dos animais teve o controle pressórico do

SNA impedido. A seguir administrou-se dinitrofenol, um fármaco que

Figura 6 – Curvas do DC em estados hipereficaz, normal e hipoeficaz.

Figura 7 – Teste para comprovação da atuação do SNA no controle da PA por alterações no DC.

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gera uma intensa vasodilatação periférica generalizada. No cão que não teve seu sistema nervoso inativado ocorreu

grande aumento do DC, com pouquíssima modificação da PA (por meio dos mecanismos anteriormente descritos).

Já no outro ocorreu pequeno aumento do débito, mas em contrapartida uma imensa diminuição da pressão

demonstrando, assim, a importância do controle nervoso na PA e no DC.

De um ponto de vista mais prático, o mesmo efeito do fármaco utilizado no teste ocorre no exercício físico.

Durante essa ação o músculo esquelético aumenta muito seu metabolismo, demandando assim um fluxo sanguíneo

e quantidade metabólica muito maior do que o normal. Ocorre com isso uma vasodilatação, que teoricamente deveria

abaixar a PA. No entanto isso não ocorre (na realidade na grande maioria das vezes acontece o contrário) pela ação

do SNA que aumenta o DC acentuadamente para não ocorrer o aumento da pressão. Caso esse fato não ocorresse,

em cada exercício que o ser humano fizesse teríamos rapidamente uma queda pressórica e subsequentemente da

consciência.

Análise Quantitativa do DC

Para realizar a análise quantitativa do DC, que é muito útil para observar as mudanças no débito de acordo

com modificações diversas, deve-se ter em mente dois fatores relacionados à regulação desse processo: capacidade

de bombeamento cardíaco (curva de DC) e fatores que influenciam o fluxo sanguíneo de sangue das veias para o

coração (curvas de retorno venoso).

Curvas de Débito Cardíaco

O aspecto relacionado a esse tipo de gráfico foi comentado e analisado anteriormente (item “limitações do

DC”), sendo que ele pode ser translocado para esquerda ou direita de acordo com a pressão da cavidade em que se

encontra. A pressão cardíaca externa é a mesma que a da cavidade torácica, ou seja, -4 mmHg, podendo ser

modificada (desvio da curva do DC) por meio de um dos seguintes fatos:

Alterações cíclicas durante a respiração (variação para direita e esquerda);

Respiração contra pressão negativa (à esquerda);

Respiração com pressão positiva (à direita);

Abertura da caixa torácico (à direita);

Tamponamento cardíaco (à direita).

Figura 8 – Curvas do DC em diferentes níveis de pressão intrapleural e em diferentes graus de tamponamento.

Quando combinamos os gráficos que informam sobre as variações da pressão cardíaca externa e da eficácia

do coração como bomba temos a curva do DC como um todo. Com essas informações pode-se analisar a

capacidade momentânea do coração para bombear sangue por uma só curva do débito.

Curvas do Retorno Venoso

Três fatores principais afetam o retorno venoso da circulação sistêmica para o coração, sendo:

Pressão atrial duro: é a fora retrógrada sobre as veias para impedir o fluxo sanguíneo para o AD;

Pressão média de enchimento sistêmico: força o sangue sistêmico em direção ao coração;

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Resistência ao fluxo sanguíneo: entre os vasos periféricos e o AD.

A pressão média de enchimento sistêmico (Pes) é definida como 7 mmHg, sendo a pressão em que as

pressões arterial e venosa se equilibram quando todo o fluxo pela circulação sistêmica cessa. Isso pode ser obtido

quando o bombeamento cardíaco fica insuficiente, fazendo com que a pressão atrial se torne maior, aumentando a

força retrógrada que inibe o retorno venoso na Pes. Se a pressão atrial, por outro lado, diminuir (ou seja, ficar mais

negativa), caindo abaixo de zero, quase não ocorre modificação no retorno venoso. Mesmo que se diminua essa

pressão a – 50 mmHg, não há nenhuma modificação nesse retorno, pois ocorre o colapso das veias torácicas a partir

de ~(-2) mmHg, impedindo que qualquer fluxo adicional de sangue das veias periféricas.

Figura 9 – Curva de retorno venoso normal, se relacionando com a modificação da pressão atrial.

A pressão média de enchimento circulatório é definida

como a força exercida na parede atrial que é verificada quando o

fluxo sanguíneo cessa, sendo que todo a árvore venosa está

submetida a ela. Quanto maior o volume de sangue na circulação,

maior será essa pressão, já que o volume adicional distenderá

ainda mais as paredes musculares. Por suas características, a

estimulação ou inibição simpática também modificará a pressão de

enchimento circulatório. A estimulação simpática irá gerar uma

vasoconstrição intensa, diminuindo a capacidade do sistema e

elevando, para cada nível de volume sanguíneo, essa pressão de

enchimento. A inibição causa diminuição desse parâmetro, por

mecanismos inversos. Uma característica muito importante dessas

regulações é que as curvas que as representam são muito

íngremes, de forma que mesmo pequenas alterações na

capacidade venosa, causada pela modificação do estímulo

simpático, podem ter grandes efeitos na pressão média de

enchimento circulatório.

A Pes representa a pressão que impulsiona o sangue

venoso da periferia em direção ao coração. É a pressão com

grandes vasos pinçados excluindo pressão pulmonar, semelhante a

pressão de enchimento circulatório. Quanto maior a pressão média

de enchimento sistêmico, mais a curva de retorno venoso são

deslocadas para cima e para direita. Esse fato pode ser facilmente

visualizado por meio gráficos que representam as modificações do

retorno venoso de acordo com a pressão arterial (semelhante à Figura 9, só que com componentes adicionais).

Figura 10 – Efeito das alterações do volume sanguíneo total sobre a pressão média de enchimento circulatório. Perceber a inclinação acentuada das curvas.

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Figura 11 – Gráfico demonstrando a máxima relacionada ao retorno venoso: quanto maior o enchimento do sistema, mais fácil é o fluxo de sangue para o coração.

A resistência venosa é definida como aquela força que se opõem ao fluxo sanguíneo para o AD. Boa parte

está situada nas próprias veias, sendo que alguma é encontrada nas arteríolas e artérias (cerca de 1/3). Quando a

resistência venosa aumenta ocorre aumento do volume dentro das veias, mas sem aumento significativo da pressão

já que essas estruturas são muito distensíveis. Sendo assim, há uma drástica diminuição do retorno venoso para o

coração, fazendo com que o sangue se acumule no sistema de veias (principalmente as de grande calibre). Porém se

ocorrer um aumento na resistência das paredes dos vasos arteriais, que são muito menos distensíveis, acarretará

uma aguda elevação da PA, que por sua vez sobrepuja o aumento da resistência. Matematicamente, podemos definir

a resistência venosa como:

Onde:

RV = retorno venoso

Pes = pressão média de enchimento sistêmico

PAD = pressão atrial direita

RRV = resistência ao retorno venoso

Naturalmente o aumento ou a diminuição da resistência ao retorno venoso modificam diretamente esse

retorno. A diminuição desse parâmetro leva a um aumento, quase que na mesma intensidade, do retorno venoso,

sendo que o inverso ocorre quando ele aumenta (por exemplo, se ocorrer o aumento para 2X da RRV, ocorrerá uma

diminuição para cerca da metade no RV).

Figura 12 – Relação entre a modificação entre a RRV e o próprio RV. Perceber que são relações inversamente proporcionais e de forma concomitante (ou seja, se um aumenta em 2X o outro diminui pela metade).

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Em um indivíduo normal a circulação, como antes já

comentado, é um regime estacionário. Sendo assim, o coração e a

circulação devem atuar em conjunto. Isso significa que o RV deve

ser igual ao DC e a PAD é a mesma para o coração e para a

circulação sistêmica. Pode-se prever o débito e a pressão atrial

seguindo-se os seguintes passos:

1. Determinar a capacidade momentânea do

bombeamento cardíaco;

2. Determinar o estado momentâneo do fluxo da

circulação sistêmica para o coração;

3. Equiparar essas curvas, uma em relação à outra.

O ponto de encontro dessas curvas, chamado de ponto de

equilíbrio, descreve corretamente o DC, PAD e o RV em uma

circulação referencial e sem estímulos extrínsecos.

Um débito cardíaco aumentado, pelo aumento do volume

sanguíneo, dura por apenas alguns minutos, em decorrência dos

efeitos compensatórios da circulação: ocorre aumento da pressão

capilar, aumentando-se a pressão hidrostática da microcirculação e com isso favorecendo maior passagem de

líquidos para o interstício (diminuição do volume sanguíneo); distensão venosa, em decorrência da elevada pressão

exercida às suas paredes, sendo que essas estruturas atuam como reservatórios sanguíneos; o excesso do fluxo

ativa os mecanismos de autorrelação teciduais, fazendo com que a resistência ao retorno venoso aumente.

A estimulação simpática afeta o coração e a circulação agudamente (ações de curta duração), sendo que

realiza as seguintes ações: aumento da potência da bomba cardíaca; aumento da pressão média de enchimento

sistêmico; e aumenta a resistência ao retorno venoso. Na realidade, diferentes graus de estimulação causam

diferentes respostas, ou seja, apresenta uma relação dose-efeito. Sendo assim a inibição da estimulação simpática

também afeta essas estruturas, fazendo com que a pressão média de enchimento sistêmico cai para ~4 mmHg e a

eficácia da bomba cardíaca diminua para cerca de 80% do normal.

Figura 14 – Relação entre a estimulação/inibição da estimulação simpática no gráfico representado pela Figura 13 (em vermelho no caso mostrado).

Finalmente, a abertura de grandes fístulas arteriovenosas também modifica acentuadamente o gráfico da

Figura 13. Essa modificação pode ser dividida em quatro fases:

A: representa a situação referencial;

B: imediatamente após a abertura da fístula. Ocorre grande diminuição da RRV, com aumento

discreto na curva do DC, pela redução aguda da PA;

C: aproximadamente 1 minuto depois. Os reflexos nervosos começam a atuar, reestabelecendo uma

pressão arterial muito perto da normal. Ocorre aumento da pressão média de enchimento sistêmico

Figura 13 – Representação do ponto de equilíbrio, que no gráfico é representado por A (referencial), sendo o ponto B um estado em que a Pes está elevada.

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(constrição de artérias e veias), e a elevação posterior da curva do DC (excitação nervosa simpática

do coração);

D: efeito após várias semanas. O volume de sangue aumenta em decorrência da ligeira redução da

PA e pela estimulação simpática ter reduzido o débito renal de urina. Ocorre ainda aumento da carga

de trabalho cardíaco e, com isso, hipertrofia do músculo do coração fazendo com que o DC aumente

ainda mais.

Figura 15 – Análise do efeito, no coração e na circulação, da abertura de uma grande fístula arteriovenosa. Os pontos representam as fases descritas.

Referências

GUYTON, A.C., HALL, J.E Tratado De Fisiologia Médica 12. Ed. Rj . Guanabara Koogan, 2012.