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CÂMARA DOS DEPUTADOS DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL COMISSÃO EXTERNA - INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER EVENTO: Audiência Pública N°: 0103/04 DATA: 2/3/2004 INÍCIO: 14h35min TÉRMINO: 19h56min DURAÇÃO: 05h21min TEMPO DE GRAVAÇÃO: 5h21min PÁGINAS: 113 QUARTOS: 64 DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO DANIEL TABAK - Ex-Diretor do Centro de Transplante de Medula Óssea do Instituto Nacional do Câncer. SUMÁRIO: Esclarecimentos sobre eventos que resultaram, de forma dramática, no afastamento do Dr. Daniel Tabak do Centro de Transplante de Medula Óssea do Instituto Nacional do Câncer. OBSERVAÇÕES Há oradores não identificados. Há intervenções inaudíveis.

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CÂMARA DOS DEPUTADOS

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

COMISSÃO EXTERNA - INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCEREVENTO: Audiência Pública N°: 0103/04 DATA: 2/3/2004INÍCIO: 14h35min TÉRMINO: 19h56min DURAÇÃO: 05h21minTEMPO DE GRAVAÇÃO: 5h21min PÁGINAS: 113 QUARTOS: 64

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO

DANIEL TABAK - Ex-Diretor do Centro de Transplante de Medula Óssea do Instituto Nacionaldo Câncer.

SUMÁRIO: Esclarecimentos sobre eventos que resultaram, de forma dramática, noafastamento do Dr. Daniel Tabak do Centro de Transplante de Medula Óssea do InstitutoNacional do Câncer.

OBSERVAÇÕES

Há oradores não identificados.Há intervenções inaudíveis.

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CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Externa - Instituto Nacional do CâncerNúmero: 0103/04 Data: 2/3/2004

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Boa-tarde a todos.

Declaro abertos os trabalhos da presente reunião de audiência pública.

Em virtude da aprovação do requerimento de autoria do Deputado Eduardo

Paes, esta Comissão reúne-se hoje para ouvir o Dr. Daniel Tabak acerca dos

motivos do seu pedido de demissão do cargo de Diretor do Centro de Transplante

de Medula Óssea do Instituto Nacional do Câncer.

Informo aos Srs. Parlamentares que o Dr. Jorge Solla, convidado da

audiência pública prevista para amanhã às 9h30min, mandou-nos um expediente

para informar que sua mãe está adoentada e se submeterá hoje ou amanhã a uma

cirurgia. Ele nos sugere ouvir, em seu lugar, o Dr. Ademar Arthur Chioro dos Reis,

que presidiu a Comissão Interventora no Instituto Nacional do Câncer em meados do

ano passado. Se V.Exas. estiverem de acordo, ouviremos amanhã o Dr. Ademar

Arthur Chioro dos Reis.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO - Sr. Presidente, peço a palavra

pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Tem V.Exa. a palavra.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO - Sr. Presidente, uma coisa não

elide a outra. Poderíamos ouvir amanhã o Dr. Ademar Arthur Chioro dos Reis, tendo

em vista a natural impossibilidade da presença do Dr. Jorge Solla, em razão da

doença de sua mãe. Eventualmente, se V.Exa. e os demais membros da Comissão

entendermos a necessidade de ouvi-lo mais tarde, iremos convidá-lo novamente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Se todos estiverem de

acordo, faremos assim. (Pausa.)

Informo que os requerimentos apresentados não poderão ser apreciados hoje

por tratar-se de reunião de audiência pública. Convocaremos reunião deliberativa

para amanhã, a ser realizada rapidamente antes do início da audiência pública com

o Dr. Ademar Arthur Chioro dos Reis, para votar os requerimentos.

A SRA. DEPUTADA MANINHA - Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Tem V.Exa. a palavra.

A SRA. DEPUTADA MANINHA – Sr. Presidente, desejo saber qual o tempo

determinado para as intervenções, enfim, qual metodologia será adotada nesta

audiência.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Em seguida, de acordo com

o Regimento Interno, vou passar a V.Exa. essa informação.

Convido para tomar assento à mesa o Dr. Daniel Tabak, ex-Diretor do Centro

de Transplante de Medula Óssea do Instituto Nacional do Câncer. (Pausa.)

Antes de passar a palavra ao expositor, peço a atenção aos presentes para

as normas estabelecidas no Regimento Interno da Casa.

O tempo concedido ao orador é de 20 minutos. Os Deputados interessados

em interpelá-lo deverão inscrever-se previamente com a secretária da Comissão.

Cada Deputado inscrito terá o prazo de 3 minutos para formular suas

considerações ou pedidos de esclarecimentos, dispondo o expositor de igual tempo

para a resposta, facultadas a réplica e a tréplica pelo mesmo prazo.

Esta reunião está sendo gravada para posterior transcrição das fitas; por isso,

solicito que falem ao microfone e declinem o nome quando não anunciado por esta

Presidência.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - Sr. Presidente, peço a palavra

pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - Sr. Presidente, dispomos

regimentalmente de 3 minutos para rápida exposição e questionamento, mas, tendo

em vista o menor número de Deputados, pergunto a V.Exa. se poderemos fazer

mais de uma rodada de perguntas.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Sem dúvida nenhuma. Não

vamos também ser tão rígidos no tempo. Essa é a norma regimental, mas

facultaremos a todos o direito de manifestação.

Dando início ao período de exposição, concedo a palavra ao Dr. Daniel

Tabak, ex-Diretor do Centro de Transplante de Medula Óssea do Instituto Nacional

do Câncer.

O SR. DANIEL TABAK - Em primeiro lugar, agradeço ao Presidente da

Comissão a oportunidade. Para mim, é uma honra estar aqui para prestar

esclarecimentos sobre eventos que resultaram, de forma traumática, no meu

afastamento do Instituto Nacional do Câncer.

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Como essas são questões básicas que envolvem aspectos do transplante de

medula óssea, peço permissão à Mesa para trazer informações referentes a alguns

aspectos específicos do transplante de medula óssea de fácil compreensão e que

obviamente dizem respeito às questões básicas do conhecimento para a

compreensão dos problemas.

Em primeiro lugar, vou fazer pequena retrospectiva histórica para que se

possa entender a seqüência dos fatos.

O primeiro evento que temos consciência de ter acontecido e resultou nessa

seqüência traumática foi uma nota publicada no jornal O Globo no dia 11 de janeiro.

O jornalista descreve o seguinte:

“Um hierarca do Ministério da Saúde, valendo-se

do nome de um grão-companheiro do Palácio do Planalto,

mandou que fosse furada a fila de exames para a

realização de transplantes de medula.”

Esse trabalho é coordenado pelo Centro de Transplante de Medula Óssea do

Instituto Nacional do Câncer, instituição séria e respeitada. Ao contrário do que

acontece com rins e fígados, as medulas transplantáveis podem ser buscadas em

bancos de doadores mundo afora. Para se descobrir a compatibilidade do doador

com a de um potencial receptor são necessárias baterias de exames que custam em

média 500 dólares. Há cerca de 500 pessoas na fila esperando esses exames, cerca

de 15% morrem na espera. O companheiro mandou que se apressassem os exames

de um paciente e, com isso, a pessoa beneficiada passou na frente de pelo menos

200 enfermos. Graças a essa interferência o doador já foi encontrado e, se tudo

correr bem, o transplante ocorrerá em breve. Com 10 milhões de dólares, o

companheiro do Planalto, cujo santo nome foi repetidamente pronunciado, poderia

cobrir todos os custos dos transplantes das 500 pessoas da fila; ela acabaria, sem

que fosse necessário furá-la.

Na semana seguinte, nota do mesmo jornalista descreve o seguinte:

“O Ministro da Saúde, Dr. Humberto Costa, fez

divulgar uma nota respondendo a uma informação aqui

publicada. A informação dizia:”

E repete aquela questão.

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A nota mencionada diz:

"O Ministério afirma que não existe denúncia formal

sobre irregularidades na fila de transplantes de medula

óssea. Se qualquer pessoa tiver indícios ou provas nesse

sentido, deve formalizá-los junto ao Ministério para que

sejam feitas investigações sérias e pormenorizadas sobre

o caso.

Depois da divulgação da nota, o médico Daniel

Tabak demitiu-se da direção do Centro de Transplantes

de Medula do Instituto Nacional do Câncer.”

Em razão dessa reportagem, baseado então nessa informação, passo a ler

minha nota de demissão, que foi encaminhada ao Diretor-Geral do Instituto

Nacional do Câncer:

“Sr. Diretor, atendendo a vossa solicitação no sentido de esclarecer os

motivos reais do meu pedido de afastamento da Direção do Centro de Transplantes

de Medula Óssea a partir de 5 de fevereiro de 2004 — o mês de janeiro era o meu

mês de férias —, gostaria de afirmar que ele foi precipitado pela nota publicada pelo

Sr. Laércio Portela no jornal O Globo em 13 de janeiro de 2004.

A nota afirma que o Ministério da Saúde desconhece qualquer tipo de

ingerência política ou de outra natureza que não seja técnica e de saúde pública na

definição das filas para exames e transplantes de órgãos e tecidos no País .

Em extenso relatório encaminhado a essa Direção em 19 de janeiro de 2004,

foi descrito o funcionamento do registro de doadores de medula óssea no período de

1998 a janeiro de 2004. Foram incluídos documentos que corroboram a ingerência

política no processo técnico que envolve o transplante de medula óssea no Brasil.

Os documentos 13 e 14 anexados ao relatório documentam o credenciamento

do Real Hospital Português, ocorrido em Recife, em 21 de outubro de 2003.

Segundo informações obtidas durante a visita ao Hospital em Recife, na

presença do Coordenador do Sistema Nacional de Transplantes, recebi a

informação da interferência direta de familiares junto ao Ministro Humberto Costa.

Apesar de todas as questões levantadas e extensamente documentadas,

verificamos o credenciamento do Hospital Português junto ao SUS, menos de 24

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horas após a minha visita e certamente sem tempo hábil para que o meu relatório

encaminhado à Direção-Geral do INC em 23 de outubro de 2003 pudesse ter sido

analisado.

O credenciamento de um hospital privado que havia obtido o material para

transplante por meios que contrariam totalmente a orientação do Ministério da

Saúde constitui uma incoerência, e as circunstâncias que determinaram o processo

devem ser avaliadas. Ao serem criadas condições especiais para que um

determinado paciente fosse transplantado, caracteriza-se uma ingerência nos

mecanismos estabelecidos, comprometendo-se a realização do procedimento de

uma maneira universal.

O segundo evento documentado no relatório diz respeito aos vários pedidos

de interferência no processo formal de encaminhamento dos exames de histo-

compatibilidade. A participação do coordenador do Sistema Nacional de

Transplantes está documentada na troca de mensagens eletrônicas entre o Dr.

Diogo Mendes e a Dra. Iracema Salatiel listadas sob o número 24 da lista de

anexos.

Um dos casos em questão refere-se à paciente Paula Tamer, cadastrada no

REDOME em 10 de novembro de 2003, sob o número 2.186. A determinação em

proceder à realização dos exames da referida paciente de forma enérgica, como

documentada na mensagem eletrônica de 23 de novembro de 2003, reflete um

tratamento diferenciado por parte do coordenador do Sistema Nacional de

Transplantes.

Essa preocupação está mais uma vez estampada na correspondência

enviada pelo coordenador do SNT ao Deputado Federal Dimas Ramalho. Em um

documento contendo 5 páginas, ele descreve a situação clínica da paciente com

detalhes. Arrisca-se, inclusive, em opinar sobre a estratégia a ser adotada diante da

identificação aos doadores e qual o melhor doador a ser utilizado. Embora não seja

especialista na área, propôs, inclusive, a realização de um transplante haploidêntico

a partir do pai da paciente no Brasil, caso fosse necessário.

É importante ressaltar que não existe registro de um transplante realizado no

Brasil. Durante uma reunião realizada no Instituto Nacional do Câncer, em 16 de

dezembro de 2003, na presença do Dr. José Gomes Temporão, Diretor-Geral do

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INCA, Dr. Artur Chioro, Diretor do Departamento de Atenção Especializada da

Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, Dr. Luiz Augusto Maltoni,

Diretor de Assistência ao INCA, Dr. Luiz Fernando Bouzas, Diretor-Substituto do

Centro de Transplante de Medula Óssea, Dra. Iracema Salatiel, Coordenadora do

REDOME, Dra. Beatriz Mc Dowell, Dr. Luiz Amorim, representante da ANVISA, e

outros funcionários do INCA e do Ministério da Saúde, o Dr. Diogo Mendes, ao ser

questionado sobre os motivos que determinaram a sua interferência no caso da

referida paciente, informou que assim agia por determinação direta do Presidente da

República em exercício.

Ao mencionar que esses critérios representavam para mim um novo padrão

de universalidade, fui informado pelo Dr. Arthur Chioro que esse era o ônus de ser

Governo e que para ser Governo era preciso ter jogo de cintura. Esses fatos

documentam uma perversão direta do processo técnico para a condução do

programa de transplantes de medula óssea no Brasil.

Diante da convocação apresentada pelo Ministério da Saúde, apresentei o

relatório anexo e o meu pedido de afastamento em 16 de janeiro de 2003, por não

concordar com a forma com a qual a política de transplantes vem sendo orientada

pelo Sistema Nacional de Transplantes.

É fundamental entendermos claramente o que é o REDOME, que estabelece

as questões fundamentais para o transplante de medula óssea no Brasil.

O relatório que se segue tem 12 páginas e mais 8 páginas de anexo. Seria

extremamente cansativo ler esse relatório por completo. Obviamente, ele está

disponível e pode ser acessado pelos interessados.

Irei frisar alguns aspectos mais importantes.

O REDOME foi criado em 1993 pelo Dr. José Roberto Ferezin Morais, que foi

o Coordenador do REDOME até o início de 2003, quando ele, infelizmente, foi

obrigado a se afastar por problemas de saúde.

Inicialmente localizado em São Paulo, foi transferido para o Rio de Janeiro em

setembro de 1998. Até aquele momento, a busca de doadores era feita de forma

não sistemática e favorecia apenas pacientes que dispunham de recursos

financeiros necessários para custear um programa conduzido basicamente pela

Universidade Federal do Paraná.

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Em outubro de 1998, o Ministério da Saúde publicou a Portaria nº 3.761, que

estabelece o INCA como responsável pela assessoria técnica prestada ao Ministério

da Saúde no âmbito dos transplantes de medula óssea.

No seu art. 2º, ela determina as incumbências da assessoria técnica, que são

elas: gerenciar o Cadastro Nacional de Doadores de Medula Óssea; sediar um

banco de sangue de cordão umbilical e coordenar o funcionamento dos outros

bancos com a mesma finalidade; coordenar a distribuição de medula óssea e

sangue de cordão umbilical, em articulação com as centrais de notificação, captação

e distribuição de órgãos; centralizar — ou seja, o objetivo, na verdade, era

concentrar — a consulta a bancos internacionais de doadores de medula óssea a

pacientes atendidos pelo SUS; elaborar protocolos de indicação e procedimentos

para as modalidades de transplantes; e desenvolver e operar o sistema de avaliação

de transplante de medula óssea.

Em outubro de 1999, o gabinete do Ministro da Saúde publicou a Portaria nº

1.217, que estabelecia o regulamento técnico para o transplante de medula óssea,

normas para o cadastramento, autorização das equipes e os valores para

ressarcimento junto ao SUS dos procedimentos referentes à busca de doadores de

medula óssea e outros precursores.

Determinou ainda, no seu art. 11, que todos os pagamentos desses

procedimentos aos organismos internacionais fossem realizados pela Fundação Ary

Frauzino, associada ao Instituto Nacional do Câncer. Dessa forma, ela seria

ressarcida pelos gastos realizados com os pagamentos dos procedimentos mediante

faturamento no Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde –

SAI/SUS, e que seriam custeadas com recursos do Fundo de Ações Estratégicas –

FAEC.

A mesma portaria, em seu art. 12, determinou o repasse de 500 mil reais

destinados a compor um valor global que viabilizaria o custeio inicial da metodologia

introduzida pela portaria. O Convênio nº 1.111/99, celebrado entre a FAF e o

Ministério no dia 25 de novembro de 1999, teve, portanto, como objetivo a

implantação de um sistema de financiamento de buscas, coleta e transporte de

precursores hematopoéticos para transplantes não consangüíneo. Digo não,

aparentado, mantendo os pacientes em busca ativa nos registros internacionais.

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Em 21 de dezembro de 2000 e 23 de março de 2001, foram celebrados 2

aditivos com repasses no montante de 500 mil reais para cada aditivo, com o intuito

de manter o programa e formar um fundo rotativo. Mais 2 convênios foram

celebrados — em maio de 2001 e setembro de 2002 —, totalizando o repasse de 2

milhões de reais.

Em março de 2003, o saldo do programa era de 415 milhões e 827 mil reais.

A preocupação com a escalada crescente de desembolsos, devida a uma demanda

crescente, foi apresentada à Direção-Geral do INCA.

As razões das dificuldades financeiras do programa foram relatadas desde

abril de 2002, a saber: inclusão de número crescente de pacientes, o não

ressarcimento pelo SUS à FAF dos valores efetivamente pagos antecipadamente,

pelos procedimentos reconhecidos pelo Ministério da Saúde nas portarias.

Em março de 2003, quando enviamos relatório atualizado com essas

informações à Direção-Geral do INCA, o Procedimento nº 3001203.1, dessa tabela,

busca e coleta de medula óssea, por exemplo, representava um custo para a

instituição de 70 mil reais, sendo ressarcidos pelo SUS o valor unitário de 48 mil

reais.

A tabela de valores de procedimento do SUS lista o valor dos procedimentos

em reais. Esses valores não foram atualizados, e a FAF paga os procedimentos de

forma antecipada em dólares americanos, valores esses que vêm sendo reajustados

anualmente na origem.

Vários novos procedimentos foram instituídos pelos registros internacionais e

não contemplados pelas tabelas originais criadas em 1998. São eles: taxa de

ativação, exames para identificação dos splites dos LES A e B, relatório de cordão,

envio de amostra de sangue para testes confirmatórios, transporte de medula óssea

por intermédio de courrier, pré-coleta de amostra para exames de doenças

infecciosas. Obviamente, todos esses procedimentos precisam ser pagos, e o são,

pela FAF, sem, no entanto, poder faturá-los. Ainda mais grave e contraditória é a

situação quando um doador é identificado no registro brasileiro de doadores de

medula óssea, ou seja, quando o doador é brasileiro.

De janeiro de 2000 a dezembro de 2003 foram realizados 10 transplantes de

medula óssea, utilizando esses doadores. Embora o custo associado a esse

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procedimento seja menor, as portarias publicadas previamente não contemplaram

essa possibilidade. Dessa forma, os custos envolvidos com a realização dos exames

dos doadores, transporte do doador para o centro de coleta, coleta de medula óssea

e retorno do doador ao seu local de origem são custeados diretamente pelo INCA,

sem possibilidade de ressarcimento.

Diante da impossibilidade de financiamento desses procedimentos pela

Fundação Ary Frauzino, porque não existem códigos específicos para esses

procedimentos, eles passaram a ser garantidos com recursos oriundos de doações

encaminhadas ao Centro de Transplante de Medula Óssea — CEMO, do Instituto

Nacional do Câncer.

A defasagem entre o faturamento pela FAF dos procedimentos aprovados e o

efetivo pagamento pelo SUS, muitas vezes ultrapassam 3 meses. Também é

importante mencionar que o Ministério da Saúde não remunera a FAF por gastos

com administração complexa.

A infra-estrutura do REDOME — é muito importante ressaltar — foi toda

estabelecida com recursos da instituição, quais sejam: manutenção de uma equipe

dedicada, porém com número limitado de funcionários para interagir com registros

internacionais e solicitantes nacionais, incluindo os laboratórios de

histocompatibilidade, os hemocentros que recrutam doadores, centrais regionais de

captação, onco-hematologistas, centros transplantadores.

Engloba atividades das mais variadas para o desenvolvimento de um trabalho

eficaz, como inclusão de pacientes e doadores no sistema, análise contínua das

tipificações HLA para o MED entre os pares, análise de pesquisa no REDOME,

inclusão de pacientes nos registros internacionais, análise dessas pesquisas, análise

das solicitações feitas por outros centros de transplantes sob a ótica das portarias,

organizar e acompanhar as listas de pacientes que aguardam os vários

procedimentos nas várias etapas, como estudo de HLA de baixa resolução, de alta

resolução e testes confirmatórios.

Para todas essas atividades, a equipe é — ou pelo menos era — constituída

pela Dra. Iracema Salatiel de Alencar, Imunogeneticista e Coordenadora; pela Dra.

Ítala Coelho Martins Ferreira, Assistente Social; pela Dra. Míriam Baron, Psicóloga,

que articula fluxo de doadores; e os responsáveis pela demanda administrativa

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Simone Cristina Pereira, Maria Regina Santana, Melita Araguari, Maria do Carmo

Leite, Patrícia Sena, incluindo ações que envolvem processos de inclusão no

sistema, solicitação de exames pendentes de HLA, controle de solicitações de

exames autorizados, controle de todos os invoices, pagamento dos invoices no

exterior, estatística mensal, controle de pagamentos e ação com a FAF, criação,

inclusive, de sistema informatizado para controle de dados pela ação direta da

divisão de informática do INCA, com apoio técnico da imunogenética.

Finalmente, a Coordenação das Atividades Clínicas e de Apoio Administrativo

ao REDOME diretamente pela direção do Centro de Transplante de Medula Óssea.

Como foram citados vários aspectos, e estamos em plena oportunidade para

disseminar alguns conhecimentos, de forma sumária, irei explicar o que significa

HLA. Por que é tão difícil encontrarmos um doador?

No caso de transplante de medula óssea, não doa quem quer, mas quem

pode. A razão disso se deve ao aspecto mais importante: exatamente a tipagem

HLA. A possibilidade de uma família vir a ter um doador é calculada por essa

fórmula.

O HLA é um sistema complexo de identificação do indivíduo, mais do que os

grupos sangüíneos. Existem grupos de características especiais de cada indivíduo

que caracterizam cada pessoa de forma especial. Há os antígenos chamados de

classe A e os de classe B e os chamados de classe TR, mas não vamos falar sobre

eles.

Os aspectos mencionados são os mais importantes, porque deles surgiu a

hipótese de haver um transplante haploidêntico. O que é um transplante

haploidêntico? É aquele em que o indivíduo partilha apenas metade dos antígenos,

é o tipo de transplante em que a doação é feita pelos pais. Os chamados

transplantes aparentados estão aqui representados entre esses 2 irmãos. Os

números são absolutamente idênticos, eles recebem os pares dos pais e, por uma

questão estatística, genética, de coincidência, esse irmão é igual a este. A chance é

de aproximadamente 25%. Numa família, quanto maior o número de irmãos, maior a

possibilidade, mas nada exclui a possibilidade de um único irmão ser idêntico àquele

indivíduo.

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Sabemos que habitualmente os pais só têm metade dos gens dos filhos. Por

exemplo, o pai é AB e o filho, no caso, é AB. A possibilidade de um pai ser igual ao

filho é muito pequena, mas talvez possível em casos em que exista

consangüinidade, ou seja, existe parentesco entre os pais. Hoje seria um absurdo

considerar, do ponto de vista técnico, que um transplante de pai seja aparentado.

Então, é muito fácil compreender que o transplante de pai, do ponto de vista familiar,

é obviamente alguém da família, mas certamente não é transplante aparentado.

O sistema HLA é extremamente complexo. Contudo, é fundamental mostrar a

complexidade desses exames que são feitos e a extensa fila de espera.

Quando fazemos exames mais avançados, as variações aumentam de forma

gigantesca, mostrando que é extremamente improvável encontrarmos um doador

compatível fora da família. Para isso crescer sobremaneira, precisamos de registro

de doadores voluntários.

Certamente os senhores não terão acesso a essas questões, mas vou passá-

las de forma genérica para mostrar que o fluxo do REDOME nunca foi uma caixa-

preta. Na verdade, nunca houve nenhum tipo de obstrução ao acesso à seqüência

de fluxos de encaminhamento de pacientes desde a feitura de exames até a

finalização do transplante. Todos eles estavam disponíveis para as pessoas que

podiam entender, ou seja, os médicos. Hoje podemos constatar que esse processo

é extremamente complicado. Em nenhum momento, repito, essas listas deixaram de

ter acesso permitido. Todos esses cadastros estão disponíveis, e essa fila é um

processo disponível aos médicos e sempre esteve acessível.

(Segue-se exibição de imagens.)

Essa é simplesmente a lista dos mais de 700 pacientes em que algum tipo de

exame ou de compatibilidade foi identificado. Só para efeito de identificação, esses

pacientes identificados com uma barra amarela são aqueles em que algum tipo de

exame de compatibilidade com um doador foi realizado, no entanto tiveram seus

exames paralisados por algum motivo. Nesse período, o principal motivo para a

paralisação de exames foi a falta de recursos.

Isso se estende até o número 120. Podemos ver claramente que todos esses

pacientes se encontram em alguma fase de evolução e, por alguma razão, tiveram

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o seu processo interrompido. Esses são os números que passaram rapidamente até

o 280.

Podemos entender a complexidade que tomou conta do processo quando o

nome da paciente nº 2.186, que tem um cadastro e se encontra entre as que foram

mencionadas, aparece com uma marca amarela mostrando que tinha exames

realizados e doadores identificados. (Pausa.) Como esses fluxogramas são

extensos, os detalharei no momento da discussão.

Ressalvo que todos esses gráficos foram produzidos pela Dra. Iracema

Salatiel, demitida na sexta-feira passada. Temos uma preocupação muito grande.

Diante de toda complexidade do sistema, da dificuldade de financiamento e na

medida em que doadores começaram a ser identificados no registro brasileiro, vale a

pena continuar pesquisando o registro internacional? Não dispomos de recursos, e o

processo custa caro.

A Dra. Iracema fez a seguinte análise, e esses dados são importantes para

termos consciência do que fez o REDOME nos últimos 3 anos. Em 2000, o Registro

tinha aproximadamente 12.000 doadores; em 2003, 35.000 doadores; e, no final de

dezembro de 2003, quase 50.000 doadores. A meu ver, isso não representa

exatamente baixa resolutividade.

Outro aspecto claramente evidenciado foi o fato de que, embora o número de

doadores estivesse crescendo, ele continuava representando parcela muito seletiva

da população brasileira. A maioria dos doadores continua localizada na Região Sul.

Já tínhamos conhecimento desses dados, que foram apontados há muito

tempo. Obviamente, há dificuldade de se recrutar pacientes de características

genéticas desejáveis de outra região do País.

É também importante ressaltar que o número de pacientes cadastrados só

aumentava. Em dezembro de 2003, chegamos à marca de 2.232 pacientes

cadastrados, entre eles mais de 700 já apresentavam algum tipo de exame de

compatibilidade feito, porém paralisados devido à dificuldade de recursos.

A Dra. Iracema, eu e outros pesquisadores procuramos, de alguma maneira,

identificar se esse custo era justificado. Esta é a análise do que aconteceu nos

últimos 3 anos: 161 pacientes com doador foram identificados. Se tomarmos como

base os registros internacionais, que possuem um total de 5 milhões de doadores, e

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dividirmos 161 por 5 milhões, teremos aproximadamente a possibilidade de

identificação do doador com aquela base e o número possível nos registros

internacionais de 0,03 doador para cada mil doadores cadastrados. Isso obviamente

só terá significado se compararmos, por exemplo, os 38 pacientes brasileiros

identificados com doador na base de 42 mil doadores e virmos que a possibilidade

de identificar alguém no cadastro brasileiro é 30 vezes maior.

Por que isso é importante? Porque já estava claro há muito tempo que

precisávamos expandir o cadastro brasileiro para aumentar as chances de os

brasileiros se identificarem e para diminuir custos. Se associarmos os custos da

busca aos exames de compatibilidade, avaliação de doadores, coleta de precursores

nos bancos internacionais, em 3 anos teremos gasto 2,5 milhões de dólares. Se

dividimos esse valor por 80 transplantes, obteremos 31 mil dólares, até chegar ao

transplante. Esse não é o custo do transplante, mas dos exames, da avaliação e da

vinda do material, em média. No caso do doador brasileiro, obviamente esse valor é

muito menor. No entanto, apesar de ele ser 2,3 vezes menor, no Brasil não temos

financiamento para isso. Na verdade, ele depende exclusivamente do Centro de

Transplante de Medula Óssea e de suas doações.

Esse é apenas um preâmbulo para chegarmos ao ponto fundamental. Vou-me

utilizar do Código de Ética Médica para justificar algumas questões levantadas, uma

vez que o aspecto mais importante descrito em todo esse processo de evolução

foram atividades que, de certa forma, não correspondem àquilo que se espera da

atividade médica, de um profissional que, no caso, representa a atividade primária

minha e da Dra. Iracema.

Se formos direto ao Capítulo I do Código de Ética, veremos que o art. 6º traz

o papel fundamental do médico:

“Art. 6º. O médico deve guardar absoluto respeito

pela vida humana, atuando sempre em benefício do

paciente. Jamais utilizará seus conhecimentos para gerar

sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser

humano, ou para permitir e acobertar tentativa contra sua

dignidade e integridade.”

Estabelece o art. 10º do Código de Ética Médica, de 1988:

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“Art. 10º. O trabalho do médico não pode ser

explorado por terceiros com objetivos de lucro, finalidade

política ou religiosa.”

Nesse sentido, chegamos, então, ao objeto primário da primeira crise que

surgiu, quando fomos convocados para avaliar uma situação que se criou no

Hospital Real Português, em Recife, em outubro de 2003.

Esse é o relatório, que vou reler, porque a questão fundamental que surgiu foi

a de que, diante de um fato que se estabeleceu de que um paciente foi identificado

em Recife como sendo sua necessidade um transplante de medula óssea naquele

hospital, o Instituto Nacional do Câncer foi instado a comparecer a Recife para

avaliar a situação que se estabelecia naquele local. Qual o problema que se

estabelecia? O hospital onde estava o paciente não era credenciado ou autorizado

para realização do procedimento.

Fui convocado para estar em Recife, e esse é o relatório da minha visita

realizada no dia 20 de outubro de 2003. Lembro-me que cheguei atrasado numa

reunião que havia se estabelecido, coordenada pelo Dr. Diogo Mendes, com a

presença do Dr. Maurício Ostronoff, Coordenador da Unidade; o Dr. Jorge Mendes,

Diretor Clínico do Hospital Português; o Dr. Kléber Matiasque, médico da unidade de

transplante; o Dr. Clemente Tagliari, Coordenador do Serviço de Hemoterapia; o Dr.

Josenberg Marins, Coordenador da Central de Pernambuco e a enfermeira Cristina.

Naquele momento, o Dr. Diogo procedia à recapitalização dos itens

constantes da documentação necessária para o credenciamento de um Centro de

Transplante. Quando ele finalizou a leitura dos quesitos, perguntei — vou sumarizar

para não me tornar cansativo — por que estávamos ali analisando todos os

aspectos específicos, já que aquele Centro estava autorizado para fazer o

transplante — e agora já sabemos — entre irmãos. Ele não estava autorizado para

fazer o programa entre os não aparentados, ou seja, quando um doador é

identificado fora da família.

O Dr. Diogo mencionou que nossa presença em Recife tinha por objetivo não

resolver a exceção, mas oferecer uma solução global que beneficiasse a população

como um todo. E lembrei ao Dr. Diogo que essa não era a minha interpretação, que

eu havia sido convocado para analisar o problema gerado por esse paciente, e o

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credenciamento do Hospital Português para transplantes não aparentados nunca

havia sido solicitado, ou seja, não havia pedido formal para que aquela unidade

fizesse transplantes não aparentados. A questão surgiu em virtude desse paciente.

Não vou esgotar o assunto porque a próxima página, na verdade, diz respeito

às questões básicas do tratamento. Essencialmente, era um paciente que

apresentava leucemia em fase avançada e realmente precisava de um transplante

de medula óssea para ter a chance de ser curado. Então, nesse sentido, foi iniciada

a busca de um doador, sendo que ela já havia sido feita em fevereiro de 2002, no

REDOME. No entanto, em todo o período de 2002 essa busca não foi eficaz, e, no

mês de janeiro de 2003, esse paciente se enquadrou naqueles processos

paralisados por falta de recursos. Durante o ano de 2003, a família ficou

extremamente angustiada porque, na verdade, aquele paciente precisava de um

procedimento.

Naquele momento, o médico da família, Dr. Ostronoff, por decisão própria,

tomou a iniciativa de consultar cadastros, registros individualmente na Europa, por

conta própria, e conseguiu identificar células de cordão umbilical para esse paciente

em um registro na Espanha. Diante disso, relatou sua angústia. Ele precisava

encontrar um doador e, como não havia recursos, ele fez uma consulta a esse

registro internacional, por intermédio de um brasileiro, Dr. Vanderson Rocha, e um

doador foi identificado.

É muito importante relatar que, embora esse doador houvesse sido

identificado, essas células não correspondiam exatamente às determinações das

portarias, porque, embora muito parecidas, não apresentavam compatibilidade a

nível de DRB1. Sabemos que esse aspecto é fundamental na tipagem HLA, embora

hoje tenhamos conhecimento de com que esse tipo de compatibilidade já se podem

realizar transplantes. Mas as portarias não foram respeitadas.

O Dr. Ostronoff, obviamente muito ansioso para identificar esse doador,

entrou em contato com a família do paciente, e ela resolveu arcar com os custos —

que foram de aproximadamente 20 mil euros — e tomou a iniciativa de adquirir, por

conta própria, aquele material.

Naquele instante, o Dr. Ostronoff fez uma referência, porque há algum tempo,

antes do seu próprio Centro ser consultado, antes mesmo de ele ser credenciado, já

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tinha o desejo de fazer o transplante. Como os pacientes eram privados, eu lhe

disse que naquela situação, embora o sistema não devesse funcionar daquela

forma, diante da urgência que se estabelecia em muitas situações, principalmente

nos transplantes autólogos, Centros não credenciados estavam realizando

transplantes. O Dr. Ostronoff tomou essa afirmativa e determinou então que

basicamente desse procedência à compra das células, imaginando que, de alguma

maneira, esse mesmo procedimento poderia ser feito no Hospital Português.

Estamos diante da seguinte situação: a família comprou as células, esse

paciente tem um seguro, como o Dr. Ostronoff mencionou, a Sul América Seguros, e

ele acreditou que poderia fazer o procedimento dessa maneira. Então, naquele

momento, perguntei a ele o seguinte: “Dr. Maurício, o senhor tem conhecimento

desse fato. O senhor, na verdade, adquiriu as células de uma forma irregular, porque

nós sabemos que a legislação não permite. O paciente tem uma seguradora que

reconhece que vai pagar o procedimento. Ela vai pagar, mesmo sabendo das

potenciais complicações”.

Temos de entender que transplante a partir de um doador não familiar é muito

complicado. Muitos pacientes fazem o procedimento e acabam num Centro de

Terapia Intensiva, ficam internados meses, acabam tendo infecções e vêm a falecer

6 meses depois do procedimento.

Perguntei também a ele: “Dr. Ostronoff, o senhor tem conhecimento e a

seguradora tem conhecimento de que ela vai arcar com os custos todos do

procedimento?” Principalmente porque os transplantes de medula óssea não são

regulamentados na área privada. Não existe regulamentação para área privada dos

transplantes de medula óssea. Todos nós sabemos que os únicos transplantes

regulamentados na área privada são de rim e córnea. Então, o arranjo é feito entre

os familiares e a seguradora para que algum tipo de pagamento seja feito.

O Dr. Ostronoff, questionado sobre o conhecimento da seguradora, sobre as

potenciais complicações, respondeu afirmativamente. Então, perguntei novamente a

ele o seguinte: “Se isso tudo está de acordo, por que o Ministério da Saúde foi

contactado?” Se tudo isso vai correr e o procedimento é absolutamente irregular — o

Ministério da Saúde não considera essas células como sendo adequadas —, a

seguradora não poderia estar pagando o procedimento. Ele me respondeu da

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seguinte maneira: “Mas eu não contactei o Ministério da Saúde! Quem contactou o

Ministério da Saúde foi o avô paterno do paciente, que havia contactado diretamente

o Ministro Humberto Costa”.

Na verdade, o único documento que foi encaminhado ao Ministério da Saúde

— o documento está disponível — foi o termo de consentimento informado, que

descreve as complicações associadas ao transplante e conta com a assinatura de

um responsável, ou seja, o único documento oficial do Ministério da Saúde de que

eu dispunha naquele momento era um termo de aceitação da família que

reconhecia, primeiro, aquele Centro não é credenciado; segundo, aquela equipe não

tem experiência — por que não tem experiência? Aquela equipe nunca havia feito

um transplante não aparentado —; terceiro, dessa maneira não havia nenhum

pedido de credenciamento daquele hospital.

Então, diante dessa situação, a discussão se seguiu durante muito tempo

sobre a necessidade de se fazer o credenciamento. E voltei a insistir que o motivo

pelo qual estávamos reunidos era para resolver o problema do menino. Então, o que

significa credenciamento?

Na verdade, um Centro credenciado passa a ser autorizado e reconhecido

pelo braço técnico e também passa a receber procedimentos pelos valores do SUS.

O valor principal do credenciamento é permitir que o transplante seja feito pelo SUS.

Diante disso, ressaltei que o mais importante seria resolver o problema do

menino. A solução que acreditava ser a mais adequada seria a realização do

procedimento no Hospital Português em caráter excepcional. O hospital faria o

procedimento, porque era inquestionável a justificativa do ponto de vista médico

humano e dessa equipe que vinha acompanhando o paciente há anos. A família

concordou com a alternativa, apesar de reconhecer que a experiência do Centro

com pacientes pediátricos era muito limitada. Naquela ocasião, segundo

informações do grupo, o Centro realizou 150 transplantes, mas apenas 20

pediátricos. Hoje, conhecemos as especificidades das crianças: se o quadro de

saúde delas complica, precisam ser cuidadas por intensivistas pediátricos; se as

complicações são distintas, precisam de acompanhamento especial.

É importante caracterizar que nesse quadro já havia a excepcionalidade,

porque coube aos pacientes arcar com os custos. Na realidade, não havia esse tipo

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de preocupação, porque a situação era especial: o paciente não seria transplantado

pelo sistema público e sim pelo privado, uma vez que o Hospital Português é um

sistema híbrido. Dessa maneira, não haveria perversão cronológica — já que ele

não estaria passando à frente de ninguém — para realização dos transplantes,

considerando não ter resultado em custos para a União e o material a ser

transplantado era específico para aquele paciente. Outra possibilidade seria

transferir o paciente para uma das unidades credenciadas.

Naquele momento, eu, que representava o braço técnico do Ministério da

Saúde, reconhecia que, em 20 de outubro de 2003, os únicos Centros credenciados

eram o INCA, a Universidade Federal do Paraná e a USP. A ordem cronológica seria

respeitada se ele fosse transferido. Mas, nesse caso, teria de me preocupar com

essa alternativa, porque a família já havia assinado um termo de consentimento para

o procedimento ser feito em Recife. Imaginem se o paciente viesse a falecer! Iria

atribuir-se que ele teria falecido por conta da transferência. É importante ressaltar

que o estado do paciente não era tão grave. Naquele dia, era um paciente

ambulatorial, caminhava, não estava internado. Ressaltei não ser adequado o

credenciamento do Centro antes de uma avaliação do impacto, porque naquele

momento não tínhamos dinheiro, não sabíamos quando o programa ia evoluir e o

Ministério da Saúde não havia definido nenhuma questão.

O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA – Dr. Tabak, não estou

entendendo algo. O Centro a que o senhor está se referindo é o de Pernambuco. Ele

já tinha realizado 150 transplantes?

O SR. DANIEL TABAK – A partir de doadores familiares.

O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA – De medula?

O SR. DANIEL TABAK – Comum.

O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA – De medula?

O SR. DANIEL TABAK – Transplantes de medula convencionais.

Estamos falando de transplantes a partir de um doador não-família.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Dr. Tabak, o senhor já está

perto de concluir?

O SR. DANIEL TABAK – Não. Peço desculpas, porque a questão é extensa.

Creio que essas informações são úteis. Se me permitirem, vou resumi-las.

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A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Sr. Presidente, peço a palavra

pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Tem V.Exa. a palavra.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Sr. Presidente, talvez essa

matéria não seja tão difícil para os médicos, mas para os que não o são, como eu,

por exemplo, considero da maior importância essas explicações, até porque esta

audiência não é uma audiência pública normal. É uma Comissão Externa com um

objetivo único. Se não o ouvirmos, não faz sentido esta Comissão.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Concordo com V.Exa.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA – Sr. Presidente, peço a palavra

pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA – Concordo em parte com a

Deputada, porque, evidentemente, respeitamos a qualidade da exposição do Dr.

Tabak. Mas não é objetivo desta Comissão compreender totalmente o sistema de

transplante de medula óssea. Na verdade, há uma acusação, que deu origem à

abertura desta Comissão, de que haveria suposta interferência política na indicação

de pacientes na fila de transplantes de medula óssea. É evidente que alguns

aprendizados são necessários para compreender critérios, que ela não pode

respeitar uma estrutura puramente cronológica. Mas o Dr. Tabak está falando há 50

minutos. Sabemos que o relógio é brutal conosco. Quando o Presidente nos chamar

para registrar a presença em plenário, a fim de iniciar a Ordem do Dia, os Deputados

que estão estudando o tema debatido perderão a oportunidade de questionar

algumas dúvidas.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Sr. Presidente, peço a palavra pela

ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Sr. Presidente, concordo com ambos

os Deputados que me antecederam. É fundamental compreendermos esse tema,

para que não pairem dúvidas em relação às acusações. A meu ver, o Dr. Daniel

Tabak, de certa forma, deu início a esse processo, possui muita responsabilidade,

deve mostrar a esta Comissão os documentos e continuar sua exposição.

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O SR. DANIEL TABAK – Sr. Presidente, procurarei ser sumário.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Sim.

A SRA. DEPUTADA MANINHA – Sr. Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Tem V.Exa. a palavra.

A SRA. DEPUTADA MANINHA – Sr. Presidente, faço apenas uma

ponderação, que, creio, resolve os questionamentos da Deputada Laura Carneiro e

do Deputado Henrique Fontana.

Todas as informações do Dr. Daniel Tabak são importantes, porém creio que

ele possa prestá-las de forma resumida, a fim de dispormos de tempo suficiente

para nossa argumentação.

O SR. DANIEL TABAK – Peço desculpas por ter-me estendido.

Como alguns desses aspectos são complexos, julguei interessante apresentá-

los.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Todos nós estamos

aprendendo muito.

O SR. DANIEL TABAK – Obrigado.

Continuando, o aspecto mais importante que desejo ressaltar são as

alternativas apresentadas: ou encaminhar esse paciente e o procedimento ser

realizado naquele hospital sem ser credenciado, porque sem planejamento e sem

orçamento o sistema seria onerado, ou transferi-lo para outra unidade. Propus que o

paciente fosse transplantado naquele hospital sem que ele fosse credenciado

daquela maneira.

No entanto, aconteceu algo distinto, curioso: a minha primeira visita àquele

hospital — essa foi a primeira anomalia — foi no dia 20 de outubro, e podemos ver

que essa Portaria nº 316 é do dia 21 de outubro de 2003. O Secretário de Atenção

Especializada do Ministério da Saúde, no uso de suas atribuições legais, resolveu

conceder, considerando a Portaria de 06 dezembro, que recredenciou o Hospital

Português, considerando a minha avaliação in loco, realizada dia 20 de outubro. Na

verdade, esse extenso relatório, produzido em 48 horas, só foi entregue ao Diretor-

Geral do INCA e protocolado no dia 23 de outubro. Surge aí a primeira questão

importante e por isso foi necessário tudo isso. Imaginem um relatório dessa

extensão, repito, produzido em 48 horas, entregue ao Diretor do INCA, protocolado

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no dia 23 de outubro. Na verdade, já era inútil porque a portaria autorizava o

procedimento a partir do dia 21 de outubro.

Sr. Presidente, essa foi a primeira incoerência que observei nesse sentido.

Essa questão é mais grave, porque, quando ela surgiu, exatamente entre as

noticiadas pela imprensa, o Dr. Arthur Chioro menciona — isso foi publicado na

revista Época — quando, um dia depois da vistoria do Tabak, uma portaria

credenciou o Real Hospital Português, o Dr. Chioro diz que o credenciamento saiu

antes do documento, porque o Dr. Tabak foi contactado por telefone e informou o

meu veredicto. Faltou dizer, na verdade — e considero importante —, que dia

liguei, a que horas liguei, ou quem ligou! Se ele me ligou, ou eu liguei, com quem eu

falei. Tenho certeza de que todas essas perguntas estão na cabeça dos senhores.

Obviamente, teremos oportunidade de conversar sobre o assunto, mas

deixarei isso para depois. Ficou claro exatamente isso. Então, em face dessa

questão — e esse é um dos aspectos mais importantes —, surgiu a primeira

denúncia.

Do que o Ministério respondeu em função disso, chegamos a este primeiro

aspecto: essa é a primeira nota oficial produzida pelo Ministério da Saúde referente

à questão. Ela diz o seguinte: “No caso do Real Hospital Português, a busca e a

identificação de medula compatível à realização do transplante foram integralmente

pagas com dinheiro da família. Durante o processo, o sistema público não foi

onerado e não houve prejuízo para os pacientes que estão na fila do SUS”.

Em relação à afirmação, devido a conhecimentos oficiais, isso foi negado. O

Real Hospital Português está autorizado a realizar transplante desde o ano 2000.

Em outubro do ano passado, o hospital recebeu autorização para realizar

transplantes não aparentados — a isso faz referência a nota. Porém, essa

autorização se limita a pacientes privados.

Isso me chamou a atenção. O credenciamento foi para pacientes privados.

Mas que instrução normativa do Ministério separa pacientes privados de públicos

para transplante de medula óssea? E mais, autorização semelhante foi concedida no

ano passado ao Hospital Albert Einstein, em São Paulo.

Fiquei muito preocupado. Na verdade, eu mesmo fiz o credenciamento do

Hospital Albert Einstein no ano anterior, 2002. Então, que instrução normativa

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autoriza o Albert Einstein a fazer transplantes não aparentados? Fui procurar e, na

verdade, uma portaria dá esse credenciamento ao Einstein.

Como funcionam as portarias do Ministério? Em uma das explicações, diz-se

que a Internet dá a elas transparência. Mas, se abrirmos a página da SAS, em

outubro de 2002, chegaremos à Portaria nº 745, que autoriza o Einstein a fazer

transplantes não aparentados. Porém, logo abaixo, há uma retificação. A Portaria nº

745 autoriza o Hospital Albert Einstein a realizar transplantes não aparentados e

também o HEMOPE.

Vendo isso, fiquei preocupado. Desde 14 de outubro de 2002 o hospital

HEMOPE estava credenciado para fazer transplantes não aparentados. Se assim

estava — e nem eu sabia —, por que o Real Hospital Português precisava ser

credenciado?

Chamou-me a atenção mais ainda a Portaria 745-RT, de 27 de novembro de

2003, que na verdade é retificadora. Diz ela: “Onde se lê Pernambuco. Medula

Óssea Alogênico/Autogênico Aparentado/Não Aparentado (...) leia-se Medula Óssea

Autogênico/ Alogênico Aparentado”.

Veja, o HEMOPE havia sido credenciado, no dia 14 de outubro de 2002, para

fazer transplantes não aparentados, junto com o Albert Einstein, e foi

descredenciado no dia 27 de novembro de 2003, mais de um ano depois. No

entanto, o Real Hospital Português, privado, foi credenciado menos de 24 horas

após a minha visita técnica. Isso, obviamente, só pôde ser identificado após a

publicação da nota oficial do Ministério da Saúde.

Com isso, encerra-se o problema levantado nesse caso. Mas a nota oficial

tem uma série de problemas, como se vê ao analisar o caso da paciente Paula

Tamer. Se os senhores se recordam, minha denúncia na verdade refere-se a um

tratamento diferenciado que foi dado ao Hospital Português, especificamente ao

caso dessa menina, uma paciente de 21 anos que tem leucemia mielóide aguda. A

doença foi identificada e tratada inicialmente em Ribeirão Preto e, naquela ocasião,

não se encontrou doador para ela. Os médicos, cientes da dificuldade de

identificação de um doador, iniciaram um processo na tentativa de encontrar outro

tipo de transplante.

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Por que isso é importante? Esses médicos resolveram fazer um transplante

experimental na paciente, e eles sabiam que esse transplante não podia ser feito no

Brasil. E por que experimental? Eles propuseram que o transplante fosse do pai para

a filha. Sabíamos que o transplante utilizando do pai — agora podemos entender, e

essa é a razão da minha explicação demorada — era haploidêntico. Esse foi um dos

aspectos levantados. Se esse termo à época fosse introduzido, teríamos muita

dificuldade de entender, mas não agora.

No entanto, a nota oficial do Ministério da Saúde, que foi publicada, rica em

detalhes, menciona que essa paciente, na verdade, havia sido encaminhada para

um transplante aparentado a pedido do Deputado Dimas Ramalho. Segundo a nota,

este Parlamentar encaminhou ao Ministério pedido da família da paciente para que

ela fosse submetida a transplante de medula óssea aparentado.

Bom, agora todos podemos entender que transplante de pai é familiar, mas

não é aparentado, para efeitos técnicos. Transplante haploidêntico é um

procedimento experimental e dele não existe registro no Brasil.

O que acontece quando alguém pede ao Ministério da Saúde para financiar

um tratamento no exterior? A resposta pode ser dada em 2 palavras: não pode.

Como sabemos disso e desde quando? Sabemos disso desde 1992. A Portaria nº

828, de 30 de julho de 1992, do Dr. Adib Jatene, diz: “E vedada a concessão de

auxílios financeiros por parte do Instituto Nacional de Assistência Médica para a

realização de transplante no exterior”.

Se isso é sabido desde 1992, por que havia necessidade de o Dr. Diogo

Mendes encaminhar explicação de 5 páginas ao Deputado Dimas Ramalho,

mostrando que o procedimento não poderia ser feito no exterior e que poderia ser

realizado no Brasil? Mas, a partir daquele momento, o Dr. Diogo Mendes inicia uma

série de correspondências eletrônicas em que procura desesperadamente provar

que aquela paciente é diferente de todos os outros pacientes. Há registro de troca

de correspondências entre ele e a Dra. Iracema, nos dias 10, 19, 21, 23, 24 e 27 de

novembro, em todas elas demonstrando interesse em efetuar, assustadoramente

rápido, o procedimento, como de fato ocorreu. O procedimento, que habitualmente

leva 9 meses, transcorreu em 10 dias. Isso porque — em última análise, fui eu que

autorizei todos esses exames — a ordem e a seqüência dos exames são

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determinadas pelas características genéticas. Se encontramos um possível doador,

eles correm rápido.

É muito simples: se o primeiro paciente da fila fosse um brasileiro, filho de

negros e japoneses, embora tivesse a mesma doença da Paula, ele ia ficar na fila

toda a vida. Nunca encontraríamos um doador compatível com ele. Se estivesse no

último lugar da fila um paciente, por exemplo, filho de italianos, e nós, consultando o

banco italiano, encontrássemos um doador compatível e ele fosse transplantado

hoje, alguém poderia, em sã consciência, dizer que de alguma maneira a fila foi

corrompida? É claro que não. É claro que fila cronológica não tem o mesmo

significado de uma fila de transplante de rim. É claro que o transplante de medula

óssea é totalmente diferente do transplante de rim. Nesse sentido, o caso da

paciente Paula é curioso.

Outro aspecto. A nota diz que não havia fura-fila, porque a paciente

continuava aguardando o transplante. É verdade. Ela continua aguardando até hoje,

por que, exatamente, eu não sei. Os exames finalísticos foram feitos no dia 3 de

dezembro. No momento em que se realizam os testes finais, aquele doador e aquele

receptor, a princípio, só aguardam leito. Então, para todos os efeitos, houve o

transplante, porque o doador já havia sido identificado. E, o mais importante, os

recursos haviam sido reservados para essa paciente desde o dia 3 de dezembro.

Tudo isso levou a uma série de postulações dentro do próprio Instituto

Nacional do Câncer, uma delas: que, na verdade, ganhávamos uma doação de

peso. De toda essa discussão que acabamos de ter sobre portarias, fluxo e como

isso acontecia, esse o principal problema. Outra coisa que conta nesse informe

INCA é que o Dr. Temporão menciona — os senhores não conseguem ler, mas eu

vou ler: “Desde que assumi a Direção-Geral do INCA, faço questão de me reunir não

só com as chefias, mas também com todos aqueles que têm contribuições a dar à

minha gestão”. Ele segue em frente: “Diante das denúncias do Diretor do CEMO,

fizemos o nosso papel, encaminhamos para o Ministério da Saúde”.

Para mim, é um pouco complicado entender. O Dr. Temporão participou de

todas essas reuniões e, portanto, tinha conhecimento de todas elas. A conclusão do

INCA é que havia falta de doadores. Mas como explicar que um paciente que tinha

doador identificado veio a falecer? Esse menino, na verdade, tinha um doador

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identificado desde novembro e deixou de ser transplantado, porque os exames não

conseguiam ser finalizados e as células deixaram de vir, apesar de o doador ter sido

identificado. O problema, no caso desse paciente, não era identificar um doador.

Finalmente, esse relatório comenta os vários aspectos do resultado da

comissão de sindicância. Segundo o relatório, o Ministro da Saúde vai solicitar ao

Ministro da Justiça abertura de inquérito para investigar a possibilidade de clínicas

particulares estarem realizando transplante de medula óssea sem conhecimento do

Ministério da Saúde.

Não sei por que não havia nada muito explícito sobre isso, mas há suspeitas

de que existem serviços operando à margem de qualquer autorização. Na verdade,

desconhecia o funcionamento das portarias. Ninguém no Brasil sabia que no Recife,

em outubro de 2003, havia 2 centros autorizados a fazer transplantes não

aparentados. Não sei se era a isso que o Ministro estava se referindo. Ele fala sobre

o tratamento diferenciado do coordenador e diz que se repreende a conduta da Dra.

Iracema e a minha conduta, porque acatamos a pressão. A sindicância mostra:

“...repreende a conduta da Dra. Iracema e do Dr. Daniel, responsáveis pela

autorização para que se proceda às pesquisas, e o fizeram de modo a reconhecer a

pressão do coordenador geral”. Ou seja, nós cedemos à pressão. Por isso, temos

que ser incriminados.

No entanto, curiosamente, existe aqui uma incoerência. Da mesma maneira

como cedemos à pressão, no caso do Real Hospital Português, a sindicância

apontou que a Secretaria de Atenção à Saúde atuou pressionada, mas o Secretário

não foi exonerado. A Dra. Iracema foi exonerada. O Dr. Daniel foi exonerado — na

verdade, ele mesmo pediu demissão —, mas o Secretário de Atenção à Saúde, que

atuou sob pressão — a pressão: as células já estavam lá —, não foi exonerado.

O relatório diz: “A sindicância frisa ainda que a capacidade do Real Hospital

Português para a realização do transplante não pode ser questionada e que não

houve furo de fila no caso em si”.

Imaginem agora se cada centro no Brasil tomasse a mesma decisão? Hoje

existem 12 pacientes com células de cordão umbilical já identificados, na fila. Vamos

imaginar que, desses, dois tivessem condição de comprar as células por conta

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própria, um em Ribeirão Preto e outro em Salvador. Agora iríamos credenciar os

centros de Ribeirão Preto e Salvador?

Cria-se, dessa maneira, um sistema em que aqueles que podem pagar têm

acesso e os que não podem não têm acesso. De qualquer maneira, o Erário não é

onerado. Mas devemos, por isso, concluir que esse é um sistema justo?

Obviamente, temos que discutir isso.

Existem alguns aspectos complicados, porque se fazem algumas

constatações gerenciais. Esta é a conclusão da coordenação: “Muitas das

constatações gerenciais realizadas pela sindicância já haviam sido diagnosticadas e

outras tantas apontadas pelo Ministério, principalmente no que diz respeito aos

problemas de centralização das ações de controle dos centros de medula óssea”.

Na verdade, passamos a ser criticados. Volto a ler: “O levantamento da

sindicância indicou que havia centralização excessiva no CEMO, sobreposição de

atribuições, baixa resolutividade e pouca transparência”.

Eles deveriam ser mais explícitos, porque todos esses dados estavam

definidos. Só não sei se a baixa transparência se refere ao fato de que havia centros

credenciados no Brasil e que nós desconhecíamos.

O aspecto mais peculiar da história: ao mesmo tempo em que a sindicância

aponta as dificuldades, ela se propõe a apresentar soluções. O Ministério anuncia de

repente as soluções definitivas. Diz que vai haver um aporte financeiro de 24

milhões, que vai resolver todos os exames, tudo vai ficar resolvido e, principalmente,

atribui — desculpem a confusão, estou terminando — grande parte do problema à

Fundação Ary Frausino, que foi quem viabilizou o sistema, era a responsável. Dessa

maneira, a Fundação deixa de ser a responsável pelo financiamento e agora um

novo sistema vai ser desenvolvido. Certamente, durante a discussão, poderemos

conversar sobre isso.

Por fim, o relatório menciona — não está claro aqui, mas está claro na nota

que foi publicada no jornal — que o Ministro também anunciou que a partir de maio

as informações sobre as buscas e os exames vão estar disponíveis na Internet.

Outra ação foi a da ampliação da busca de doadores através da busca de adesão

voluntária de pacientes “fidelizados”.

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O que lhes mostro é a nota comentada do jornal O Globo. Existe inclusive

uma referência curiosa: de que não só vão ser utilizados, para essa mudança, os

doadores, mas vai haver, conforme anunciou o Ministério, um aumento de número, e

vamos passar a ter 360 mil doadores.

Pergunto: onde surgiu esse número? O Brasil vai realmente inovar, vai incluir

como doadores de medula óssea doadores de rins e doadores freqüentes de

sangue, que somam 1 milhão no País?

Todas essas questões são relevantes do ponto de vista de definir que as

irregularidades aconteceram nos casos específicos, nas situações que até então não

haviam sido explicitadas, das portarias, que confundem o sistema público e o

privado, e nas situações específicas das soluções mais importante que foram

propostas, atribuindo ao serviço que era fornecido uma baixa transparência.

Sr. Presidente, muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Muito obrigado, Dr. Daniel

Tabak.

Vamos tratar de também aprofundar ao máximo que pudermos os debates,

dando oportunidade a todos os Parlamentares que queiram manifestar-se.

Obedecendo à ordem das inscrições, concedo a palavra ao Deputado

Eduardo Paes, autor do requerimento da audiência pública.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Sr. Presidente, Sras. e Srs.

Deputados, cumprimento o Dr. Daniel Tabak pela exposição. Todos nós que temos

alguma experiência em comissões, sejam elas externas, parlamentares de inquérito,

de apuração, especiais, isso ou aquilo, dificilmente temos a oportunidade e a

possibilidade de ouvir um depoimento com detalhes tão ricos como esse

apresentado agora, por mais tempo que isso tenha levado e por mais confuso que

possa parecer, principalmente para aqueles que não têm muita intimidade com o

caso. Aliás, parece-me que inclusive pessoas do próprio Ministério da Saúde têm

enorme dificuldade em entender como se dá a questão do transplante de medula.

Portanto, cumprimento o Dr. Daniel Tabak. Foi fundamental a quantidade de

documentos trazidos, para comprovação. É fundamental que todos tenhamos em

mente que estamos diante de alguns problemas. O primeiro deles, de ordem

estrutural, diz respeito ao transporte de medula e à situação em que vive o INCA.

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Independente das denúncias apresentadas, parece que o Instituto enfrenta

dificuldades.

Recordo que, no início da sua exposição, o Dr. Daniel Tabak deixou muito

claro que houve uma série de reuniões entre a direção do INCA, médicos e o

pessoal do Ministério da Saúde com o intuito de resolver problemas administrativos,

de repasse de recursos. Sabemos que essa foi uma situação muito presente,

principalmente durante o ano de 2003, em razão dos contingenciamentos e das

dificuldades para liberação de verbas. Em alguns momentos, até a Frente

Parlamentar, coordenada pelo Deputado Rafael Guerra, chamou-nos a atenção para

esse fato.

Apesar de esta ser uma Comissão Externa que busca identificar, apurar e

solucionar o que efetivamente aconteceu no caso específico que resultou na

demissão do Dr. Daniel Tabak e outros fatos que acontecem até hoje, na verdade

podemos avançar um pouco no sentido de ajudar o INCA, a fim de que ele disponha

dos recursos necessários para cumprir sua missão. Não podemos ficar aqui

esperando que notas oficiais divulgadas pelo Ministério da Saúde, sindicâncias e

relatórios divulgados tardiamente — parece-me que foram divulgados mais em razão

da audiência que se realizaria hoje —, venham dizer que vamos ter tanto de recurso

e que as coisas no INCA parecem não funcionar bem. Aliás, gostaria de lembrar que

esse problema estrutural tem origem em crise vivida pelo INCA em meados do ano

passado, fruto de nomeações políticas havidas naquela instituição, cuja importância

não preciso mencionar.

Bem, a primeira pergunta que faço ao Dr. Daniel Tabak: nesse processo, sem

me ater especificamente aos dois casos citados por ele e que geraram seu pedido

de demissão: V.Sa. tem como mensurar quantas pessoas deixaram de ser

transplantadas e, por conseqüência, quantos óbitos ocorreram no INCA, em razão

das dificuldades financeiras vividas por aquela instituição? Quantas vidas se

perderam, quantas pessoas deixaram de receber o transplante de medula por essas

dificuldades? Quantas reuniões aconteceram de pleitos ao Ministério da Saúde para

que esses recursos fossem liberados? Esse fator é fundamental para que possamos

entender esse primeiro aspecto.

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O segundo vetor da exposição do Dr. Daniel Tabak é aquele que dá origem

ao seu pedido de demissão e que gera, Deputado Fernando Gabeira, todo esse

conjunto de fatores que se vêm desencadeando desde a demissão do Dr. Daniel

Tabak e têm como último acontecimento, último lance, o resultado da sindicância da

última semana. Ao que me parece — e creio que o próprio Dr. Daniel, em entrevista

ao jornal O Globo, fez essa afirmação —, ali condenou-se o estuprador e a vítima.

Buscou-se culpar aqueles que efetivamente eram culpados e aqueles que

simplesmente buscavam cumprir com suas obrigações.

Aliás, desculpem-me os demais companheiros e o Ministério da Saúde, é

absurdo que o Dr. Daniel Tabak, que se demitiu e denunciou as pressões políticas

para credenciamento de um lado, avanço na fila de outro, seja colocado nesse

inquérito como um daqueles servidores que teriam agido de forma pouco correta,

pouco ética, ao atender às ordens de seu superior.

A propósito, informo que já apresentei requerimento para que o Dr. Diogo

Mendes venha a esta Casa, mesmo exonerado, prestar esclarecimentos sobre

esses fatos. Aliás, a própria sindicância já apura isso.

Gostaria de perguntar objetivamente — e serei objetivo mesmo, porque

pressão política se exerce assim, de maneira muito clara —, porque o Dr. Daniel

Tabak já foi muito claro em sua exposição: como o nome do Ministro da Saúde foi

envolvido nesse processo de credenciamento do Real Hospital Português? Salvo

engano, é esse o nome do hospital.

Não posso crer que alguém no Ministério da Saúde vá dar a declaração de

que credenciou uma instituição de saúde através de um telefonema. A autorização

surge um dia depois da visita do Dr. Daniel Tabak àquela instituição, em

Pernambuco. Depois, mais tarde, descobre-se que para se credenciar essa

instituição privada para não aparentados — acho que é essa a expressão — se

descredenciou uma instituição pública que já estava credenciada no Recife.

Esta a segunda pergunta que deixo, nesse segundo vetor de ações políticas

mais concretas — é assim que se caracteriza pressão política, sim; é assim que se

caracteriza a responsabilidade do Sr. Ministro, autoridade máxima, no caso: de que

forma foi trazido o nome do Ministro da Saúde? O avô da criança que teria que

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passar pelo transplante teria contactado o Ministro? Gostaria de obter mais detalhes

a esse respeito.

Destaco agora algo que talvez devesse ter mencionado antes, ao início das

minhas considerações. Sr. Presidente, esse é um tema absolutamente difícil de se

tratar. É compreensível o desespero de uma família que tem alguém precisando de

transplante. Confesso que faria de tudo, ultrapassaria todos os limites — e cabe ao

Poder Público dar esses limites —, para que meu filho tivesse seus problemas de

saúde resolvidos.

Portanto, o tema é difícil. Estamos tratando de vidas humanas, estamos

falando de crianças que precisam fazer transplante, que estão entre a vida e a

morte. Essa é uma das maiores dificuldades dessa questão.

Quero entender um pouco mais, no caso do Real Hospital Português, como

se deu essa pressão política. Isto é absolutamente relevante, porque esses fatos

não podem repetir-se no Brasil.

Finalmente, Sr. Presidente, ainda quanto a esse segundo vetor de questões

mais circunstanciais, que de certa forma irritaram o Dr. Daniel Tabak e que

provocaram a sua demissão, gostaria de entender de que forma, no caso da

paciente Paula Tamer — salvo engano, é esse o nome —, se deu esse

envolvimento, essas pressões ao Dr. Diogo — parece-me que isso não foi referido

aqui, mas em algumas oportunidades já o teria sido —, que as teria recebido do

próprio Gabinete do Vice-Presidente da República, para que esse ou aquele

procedimento fosse alterado. V.Sa. disse que o procedimento em geral durava 9

meses. Nesse caso, durou 10 dias, por essas pressões.

Finalmente, Sr. Presidente, gostaria que o Dr. Daniel Tabak dissesse há

quanto tempo trabalha no INCA, há quanto tempo está no serviço público.

Hoje, por acaso, no avião, vindo do Rio de Janeiro, sentei-me ao lado do

Presidente da Academia Nacional de Medicina. Eu sentei-me na cadeira 3F, ele na

cadeira 3D. O Dr. Daniel Tabak entrou nesse mesmo avião. Quando ele passou, o

Presidente me disse: “Esse é o Dr. Daniel Tabak. É um absurdo o que está

acontecendo. É uma das maiores cabeças nessa área no Brasil; uma das pessoas

que mais entendem do tema e que deixa de coordenar, por essas pressões políticas,

uma área importante da saúde no Brasil”.

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Portanto, seria importante que S.Sa. falasse nesta Comissão um pouco sobre

o tempo em que trabalhou no INCA. Esse afastamento certamente não deve ser

algo fácil para ele. Imagino que na sua clínica particular ele inclusive tivesse

remuneração maior, sob o ponto de vista material, do que no INCA.

Eram esses os meus questionamentos, Sr. Presidente, sem prejuízo de voltar

a fazer outras indagações a partir das respostas dadas pelo Dr. Daniel Tabak.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Com a palavra o Dr. Tabak.

(Não identificado.) – Pela ordem, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Pois não.

(Não identificado.) – Sr. Presidente, gostaria de fazer uma sugestão. Não sei

se seria possível, mas gostaria que as perguntas fossem feitas em bloco de três,

para que todos tivessem oportunidade de perguntar e responder.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Da minha parte, acho que

talvez pudesse responder o Relator e, depois, falariam de três em três.

O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA – Presidente, quantos inscritos

há?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Há mais nove. Seriam três

blocos de três.

O SR. DANIEL TABAK – Bom, em primeiro lugar, quero agradecer ao Exmo.

Deputado Eduardo Paes as perguntas.

Vou ser bem objetivo, porque já me estendi nessa questão.

Em relação aos óbitos, é difícil descrever o número exato, porque nem

sempre os médicos que encaminham os pacientes são tão eficientes em manter o

registro adequado. Essa é uma das principais críticas quanto ao funcionamento do

órgão. Os médicos são instados a prestar informações a cada 3 meses; no entanto,

nem sempre mantêm o registro adequado, o que muitas vezes torna a análise dessa

informação difícil. Chegamos ao absurdo de, muitas vezes, identificar o doador e,

quando contactamos o médico para informá-lo de que o processo deve ser iniciado,

o paciente infelizmente faleceu.

Temos que reconhecer que o transplante de medula óssea não é

recomendado para patologias muito simples. A maioria dos pacientes em que esse

procedimento é adotado têm doenças gravíssimas, instáveis. De forma que esses

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pacientes vêm a falecer e nem sempre esses óbitos poderiam ser, vamos dizer,

evitados.

Mas o número: em dezembro de 2003, 89 pacientes haviam falecido na fila

enquanto aguardavam a realização de algum tipo de procedimento, exames ou o

próprio transplante. Muitos desses óbitos podem ter ocorrido, independente disso —

quero ser justo nessa questão —, porque muitos desses pacientes são graves. Não

podemos responsabilizar qualquer sistema pela totalidade dos óbitos, mas,

definitivamente, no caso daquele paciente Rodrigo, que mencionei, que tinha um

doador identificado e já estava tudo pronto para que as células viessem — no

entanto, as células não vieram —, definitivamente o sistema falhou, naquele

paciente, pelo menos.

Quando se fala em vida, no meu entender, basta uma. A quantificação não é

tão importante assim, porque não podemos medir vidas exatamente em números.

Para aquela família, aquele número foi tudo o que eles precisavam. Então, o número

não é exatamente importante, mas uma dimensão da quantificação.

Em relação ao número de reuniões, podemos dizer o seguinte: esse processo

se iniciou há muitos anos. Trabalho nessa área desde o seu desenvolvimento inicial

no INCA, em 1987. Assumi a direção desse Instituto e do Centro de Transplante de

Medula Óssea em janeiro de 1987, em substituição à sua fundadora, Dra. Mary

Evelin Flowers. Naquela época, 26 transplantes já haviam sido realizados. Em

dezembro de 2003, aproximávamo-nos de 900 transplantes. Ou seja, ao longo de 17

anos, quase 900 transplantes foram feitos, atendendo a uma demanda

principalmente de pacientes de classes mais humildes. Esses pacientes foram

atendidos de forma indiscriminada, tenham eles tido algum suporte de seguradora

ou não.

Sobre as importantes questões anunciadas, muitas delas foram apontadas ao

longo de todo esse período. Mas o ponto mais crítico é que todas elas haviam sido

indicadas durante o ano de 2003, principalmente — tivemos dificuldades ao longo de

vários anos — devido à crise do INCA. Nós sistematicamente apontamos isso. Os

recursos estavam-se esgotando. Em maio, o débito negativo da Fundação era de

quase 800 mil reais. À proximidade de julho, as buscas praticamente foram

interrompidas.

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A primeira reunião aconteceu no dia 13 de agosto de 2003, ou seja, 9 dias

antes da eclosão da crise — pode-se imaginar como isso repercutiu durante o

programa. No dia 3 de setembro houve a primeira liberação de recursos (1,5 milhão

de reais) para atender à demanda. Foi a única em todo o ano. A reunião seguinte

aconteceu no dia 4 de novembro de 2003 e a última, aquela em que as referidas

frases foram proferidas, em 16 de dezembro. Certamente, isso tornou difíceis as

possibilidades de viabilidade.

Se nos reportamos à ata da reunião de 13 de agosto, veremos que, da nossa

parte, todas as solicitações foram atendidas. Pediram-nos que um plano de metas

curto fosse promovido. Elas estavam prontas e foram apresentadas. O fundamental,

no entanto, era o financiamento, principalmente o dos pacientes com doador no

Brasil, como falei. Para isso, nenhuma solução foi encontrada. Aliás, uma saída foi

proposta: que os recursos viessem da própria Fundação, sem participação alguma

do Ministério. Isso criou uma situação difícil, porque o sistema de financiamento —

não vou fazer defesa incondicional dessa questão — estabelecido foi o que

viabilizou a continuidade do programa.

Quanto ao fato de se atribuir à Dra. Iracema e a mim as responsabilidades por

termos cedido a pressões, acho que ele nem merece atenção. Nós apenas

atendemos a uma determinação do Código de Ética de Médica: a de que o objetivo

principal do médico é proteger o paciente. Assim foi feito. Não importava se a

paciente tinha algum tipo de proteção ou apadrinhamento, o fato é que ela precisava

do tratamento, precisava dos exames. Dessa maneira, foram feitos. Se, de alguma

maneira, houve um apressamento, como se disse, isso só se deveu ao fato

fundamental de que não havia recursos. Se houvesse recursos para todos, não seria

necessária a intervenção; se houvesse recursos para todos, eu não precisaria pedir

demissão, tampouco haveria necessidade de a Dra. Iracema hoje ter sido exposta

da maneira como foi.

Acho absolutamente abominável a forma como a Dra. Iracema foi exposta.

Essa pessoa é funcionária padrão. Ela não tem clínica particular, não tem nenhuma

outra atividade; somente se dedica ao INCA. Ela é a responsável, desde a saída do

Dr. José Roberto, pela manutenção do sistema. Sem ela, o sistema está condenado

ao colapso; sem os meios de financiamento, o sistema está “colapsado”.

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Esperamos ansiosamente que, agora, sem a Dra. Iracema e sem a Fundação

Ary Frauzino, saibamos como negociar com os bancos no exterior, porque os

bancos de medula óssea não são sedes nem filiais de bancos como o Banco de

Boston ou o Citibank. Não fazemos contratos dessa maneira. Os bancos de medula

óssea trabalham com a credibilidade do sistema. São bancos que reconhecem os

profissionais técnicos capazes de estabelecer esse tipo de relacionamento.

Então, esperamos que essa credibilidade do sistema seja rapidamente

reconstituída, sob pena de outras mortes acontecerem.

Quanto à questão do Ministro, serei sumário: quem pode responder sobre

isso é o Dr. Ostronoff. Se a Comissão tem poderes, o Dr. Ostronoff deve ser argüído,

porque foi ele quem fez a afirmativa. Eu simplesmente relatei aquilo que me foi dito.

Quem mencionou o nome do Ministro foi o Dr. Ostronoff, na presença de pelo menos

outras 5 testemunhas.

Estou extremamente interessado em saber isso, porque não só o Dr.

Ostronoff negou aquela afirmativa como atribuiu a minha colocação a um desgaste

nervoso e desequilibrado. Isso, para mim, é extremamente grave, porque

exatamente nessa área não posso parecer desequilibrado para os meus pacientes.

Isso me agride diretamente. O Dr. Ostronoff tem que responder por isso e por que

atribuiu a mim um grau de desequilíbrio. Se existe algum tipo de desequilíbrio é ter

que cuidar de um sistema que não tem recursos e que, na verdade, precisa lidar

com uma situação limítrofe como essa. O sistema é que é desequilibrado.

Outra característica que me foi atribuída foi a de eu ter algum tipo de

antagonismo com o Nordeste. Acho melhor perguntar ao grupo do HEMOPE se há

algum tipo de antagonismo. Eu, na verdade, acho que não devo responder a essas

questões. Quanto ao Ministro, o Dr. Ostronoff é a melhor pessoa para responder

sobre isso.

No que se refere às pressões, essa é uma questão muito interessante. Não

sejamos ingênuos de imaginar que as pressões começaram a acontecer agora.

Pedidos de políticos sempre aconteceram — eu nunca neguei essa questão. Na

verdade, entendemos as angústias dos familiares. Eles não podem ser incriminados,

como V.Exa. mencionou, muito menos os pacientes, por, desesperadamente, sem

recursos, sem poder fazer os exames, recorrerem a quem estiver disponível. Os

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familiares fazem isso. Vamos entender que a fila dos exames é a fila do transplante.

Sem exame, não há transplante. Para poder fazê-los é preciso haver algum tipo de

liberação de recursos.

O que acontecia numa fase anterior, quando essas pressões eram exercidas

diretamente sobre mim? O que soubemos foi que, de repente, o Dr. Diogo tomou

para si essa atribuição e passou a fazer esse tipo de intermediação diretamente.

Não diria que ele a faria isoladamente. E, como podemos ver pelas trocas de

mensagens eletrônicas, todas elas eram copiadas para muitas pessoas, inclusive

para o próprio Dr. Chioro.

Então, o Dr. Chioro tinha conhecimento de todas as questões levantadas pelo

Dr. Diogo, porque todas as mensagens eram copiadas para ele. Como, então, se

procedia a essa questão? Vamos imaginar que, num determinado dia, eu recebesse

um telefonema do assessor de um Parlamentar comentando sobre uma questão, e o

telefonema transcorresse da seguinte maneira: Dr. Daniel...

(Não identificado) – Sr. Presidente, desculpe. A situação é difícil. Estou

constrangido com isso. Não quero que passe, em momento algum, a hipótese de

que o Dr. Daniel não possa fazer as colocações que necessita, mas de fato nós

tivemos uma primeira intervenção de uma hora e dez, tivemos um Parlamentar que

se manifestou durante 10 minutos, e agora temos uma resposta de 12 minutos. A

minha preocupação é que não tenhamos a possibilidade de ouvir os demais

Parlamentares que quiserem também fazer o uso da palavra.

O SR. DANIEL TABAK – Vou ser breve. Vou abrir mão de falar da história da

minha vida no INCA. Na verdade, acho isso desnecessário.

Só quero dizer que, se por acaso um Parlamentar — acho que isso é

instrutivo, até porque essa situação sempre existiu — ou qualquer pessoa, um

familiar de um paciente, desesperado, me comunicasse: “Dr. Daniel, gostaríamos,

por favor, que o senhor interviesse nesse processo extremamente prolongado da

fila”. Que resposta sempre era fornecida? E a resposta era sempre a mesma: “Sr.

Parlamentar, estou extremamente sensibilizado com sua preocupação com esse

paciente, o que demonstra que o senhor reconhece nossa luta, a minha luta. Eu, na

verdade, tenho outra proposta a lhe fazer. Que, ao invés de essa luta ser em prol de

um único paciente, vamos fazer esse requerimento em nome de 250 pacientes, que

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são esses aqui que eu tenho que administrar. Em nome desses 250 pacientes,

vamos unir as forças, vamos trabalhar no mesmo campo, o senhor na sua área de

influência, eu na minha; o senhor trabalhando para que mais recursos, mais

planejamento, mais orçamento, mais disposição, mais organização, que mais

disponibilidade seja dada para esse programa e eu garantindo que o melhor

tratamento para esse paciente sem padrinho, sem algum tipo de assistência, seja

feito”.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Vamos ouvir no próximo

bloco, então, a Deputada Laura Carneiro, o Deputado Henrique Fontana, a

Deputada Maria José Maninha.

Com a palavra a Deputada Laura Carneiro.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Sr. Presidente, obviamente, o Dr.

Daniel Tabak — e essa é uma percepção feminina — despendeu não só na

audiência de hoje, mas desde o dia em que pediu demissão, a mesma energia que

despendia na sua atividade. A sensação que me deu foi tão ou mais dolorosa que

para ele. Na verdade, é como se um filho por ele gerado e acariciado ele tivesse que

dar. Piorou quando ele — e o Deputado Eduardo Paes me cutucou na hora —,

falando sobre o Rodrigo, disse: “O sistema falhou”. E quando ele responde ao

Deputado Eduardo Paes, diz: “O pior é que, com a saída da Iracema, o sistema

acabou”.

Minha primeira pergunta é muito clara, muito simples: o senhor diria, Dr.

Daniel, que a partir não da saída de Daniel Tabak, mas daquela pessoa que gerou

um sistema de renome, e da saída da Dra. Iracema Salatiel, podemos dizer que

estamos zerados no que se refere a ter um sistema nacional de transplante de

medula óssea no Brasil, neste momento?

A segunda pergunta: o senhor, em determinado momento da sua primeira

fala, leu uma matéria da revista Época em que o Dr. Chioro havia colocado palavras

na sua boca, como o senhor disse. Efetivamente, o que aconteceu? A manifestação

da revista Época é verdadeira ou não? O que realmente aconteceu?

Como o senhor disse que o sistema não dispõe de recursos necessários,

como gostaríamos — e a identificação de doadores, no Brasil, custa 30 vezes

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menos do que a identificação nacional —, pergunto: se o senhor fosse Ministro da

Saúde, se tivesse poder, qual seria sua primeira medida emergencial para salvar o

sistema, que, segundo o senhor, faliu? Que numerário de recursos públicos do SUS

o senhor liberaria para essa captação de doadores nacionais?

Quarta pergunta: uma vez que o senhor manifestou preocupação com a

Fundação Ary Frauzino — e eu manifesto mais ainda, porque, para mim, ela é a

grande mantenedora do INCA, ou sempre foi; pelo menos é o que todos nesta Casa

temos aprendido; eu aprendi antes, já na Câmara Municipal do Rio de Janeiro —,

qual é a real situação dessa fundação hoje, no que se refere aos transplantes de

medula?

Última pergunta: O senhor disse que pressão política o senhor sempre

recebeu. Só que, desta vez, a pressão foi tão forte ou tão diferente das outras, que o

levou à demissão. Qual é essa diferença?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Com a palavra o Deputado

Henrique Fontana.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA – Sr. Presidente, quero também

cumprimentar o Dr. Daniel Tabak e dizer que, neste tempo que temos para

questioná-lo, pretendo aprender coisas e compreender os motivos desta crise que,

na minha opinião, tomou uma dimensão um tanto quanto exagerada para aquilo que

seriam os seus supostos motivos e, por isso mesmo, estou a procurar mais

esclarecimentos.

Quero dizer de público que, na minha opinião, por exemplo, o Vice-Presidente

da República José Alencar cometeu um erro de boa-fé. Sou médico e Parlamentar.

Fui Secretário de Saúde e diversas vezes por dia recebia pressões de familiares que

não conseguiam internação, não só no transplante de medula óssea, pois

infelizmente morrem pessoas, há muitos anos, neste País empobrecido, por não ter

financiamento universal para o Sistema Universal de Saúde. Em alguns casos há

maior dramaticidade, e com estes temos que ter maior responsabilidade, para não

criar pânico na sociedade. Mas continuam morrendo velhos, jovens, idosos e

crianças sem atendimento médico, por diversos motivos, hoje, no Brasil e em muitos

outros países do mundo, infelizmente. Nós que somos gestores sofremos essas

pressões.

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Quando a Deputada Laura Carneiro me pergunta o que eu faria se fosse

Ministro, respondo-lhe que iria querer fazer tudo, que iria garantir o atendimento a

todas as pessoas. Mas é errado dizer à população que o Ministro tem o poder de

definir tudo, porque ele também trabalha com os limites que o Orçamento Público

lhe impõe, assim como o Diretor de um Centro de Transplante de Medula trabalha

com os limites que o Orçamento lhe impõe, e assim por diante.

Como dizia, o Vice-Presidente José Alencar cometeu um erro de boa-fé,

porque, ao ser informado de um problema dramático de uma família, resolveu

despachar um ofício pedindo que se fizesse alguma coisa para resolver aquele

problema.

Portanto, pergunto ao Dr. Tabak: ao longo desses 17 anos — evidente que

não deve se lembrar —, quantos ofícios, telefonemas e e-mails o senhor recebeu de

políticos ou não, Governadores, Prefeitos, Ministros, Deputados, Vereadores, entre

outros, atrás de uma solução para um determinado problema? Foram muitos, o

senhor disse. Mas por que nos outros casos não houve esta acusação tão

contundente de que havia um objetivo de pressão político-partidária para furar a fila

do sistema de transplante?

Procurei ler e estudar algumas coisas e estou numa condição muito difícil,

porque não sou alguém da área. Sou médico geral comunitário. Mas questiono o

seguinte: o que aconteceu no caso do menino de Recife? Tenho informação de que

o laudo do senhor, credenciado dia tal e que não considero tão fantasticamente

grave como tentam apresentar, diz que o hospital tem condições de fazer o

transplante e foi credenciado para tanto. Desta forma, foi feita a cirurgia e salvou-se

a vida da criança. Como a medula e o cordão umbilical estavam disponíveis — não

sei os detalhes —, foi bom que se tenha autorizado rapidamente a realização

daquele transplante.

Qual é o furo? Qual é a pressão política? Como se acusa um Ministro, Dr.

Tabak? O que o senhor disse eu respeito muito, porque quem está na função do

senhor tem que ser respeitado, assim como quem é Deputado, pedreiro ou Ministro

tem que ser respeitado. Como se acusa o Ministro Humberto Costa de ter furado a

fila para fazer o transplante do menino em Pernambuco? Cadê a prova disso, a

conversa do doutor “tal” que falou com o familiar “x”? Onde está a prova de que o

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Ministro comandou um processo para prejudicar crianças que estavam aguardando

na fila e para beneficiar um suposto apadrinhado, como o senhor diz no seu artigo

do O Globo hoje, e que crianças estão morrendo porque não têm apadrinhamento?

O Ministro não é um apadrinhador de privilégios e não há nenhuma prova de

que ele tenha feito isso. Ele exerce o seu papel, na minha opinião, com enorme

responsabilidade. Portanto, o senhor também tem que ter responsabilidade com

aquilo que diz publicamente sobre a atuação do Ministro.

Tenho outras perguntas e dúvidas. Recebi a informação de que o senhor — e

não há nada de ilícito nisso — tem 2 ou 3 negócios privados na área de transplante

de medula ou de atendimento hematológico. É verdade? Responda a isso “sim” ou

“não”, para que eu possa prosseguir com o meu raciocínio. O senhor tem 2 ou 3

negócios privados na área de transplante de medula ou de tratamento

hematológico?

O SR. DANIEL TABAK – Eu sou oncologista, e o tratamento de várias

patologias na área oncológica implica, em determinadas situações, o transplante

autólogo como tratamento. Portanto, a minha área de atuação na área privada

reflete-se exclusivamente ao transplante autólogo para o tratamento de doenças

malignas.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA – Muito bem, vou apresentar um

dado, por exemplo, que faz parte da história e que infelizmente vai acontecer outras

vezes, a despeito de lutarmos por um sistema republicano e não querermos que isso

se repita.

No ano 2000, tenho informação, a pessoa que coordenava o REDOME, no

INCA, foi afastada do seu cargo por ter sido acusada à época de, ao receber uma

doadora voluntária de medula, encaminhá-la para fazer o exame de compatibilidade

num laboratório privado que, casualmente, pela informação que recebi, era de

propriedade deste coordenador do REDOME. Portanto, ele encaminha o paciente

para fazer o exame no seu laboratório privado, embora ocupe função pública

estratégica, porque controla todo o Sistema de Transplante de Medula Óssea do

País.

Fico pensando: será possível o convívio, com absoluta tranqüilidade e

transparência ética, com uma pessoa que exerça a função estratégica de determinar

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quem entra e quem não entra no REDOME e que, ao mesmo tempo, tenha um

laboratório privado que faz exames, o que a permite decidir pelo eventual

transplante ou não de uma pessoa? Eticamente, isso não é positivo, não é bom, não

é adequado.

Desta forma, explica-se como é difícil organizar uma lista de transplante de

medula e dar a ela transparência e aspectos republicanos.

Concordo que a lista para transplante de medula óssea é diferente da lista

para transplante de fígado e rim — compreendi isso há bastante tempo, quando

tratava de entender esse tema. Contudo, uma coisa é certa: esta lista tem que ser

republicana.

Até então, quem tinha o controle dessa lista? Quem determinava quem ia

entrar no REDOME ou não? Quem dizia que para um paciente ia demorar 9 meses

ou 15 dias, como eventualmente se fez? Se pressões houve no sentido não-

republicano dessa lista, é evidente que não compactuo com nenhuma delas.

Outra pergunta: ao longo dos últimos anos nos quais o senhor dirigiu este

setor, não sei em quais funções, pode ter havido erros na sua conduta?

Dr. Tabak, permita-me dizer que não se trata de levantar hipóteses e transferir

a culpa para a vítima. Não vamos partir do pressuposto de que um julgamento prévio

feito pelo senhor poderia determinar o que é verdade e o que é mentira.

Pode ou não pode ter havido erros? O senhor é humano ou não é?

O SR. DANIEL TABAK – Sim, claro que pode.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA – Então, tenho também que

questionar a forma como se organizou a lista de transplante de medula óssea ao

longo de todos esses anos. Por que ela não participava do Sistema Nacional de

Transplantes, respeitando sua especificidade, evidentemente? Eu não quero que ela

seja controlada do mesmo jeito que a lista de transplante de rim e fígado, mas por

que não estavam no Sistema Nacional de Transplante as listas do REDOME para

transplante de medula óssea, entre outras? Coloquem-se as cláusulas, diga-se que

o caso é urgente, é leucemia aguda e, portanto, não se pode respeitar o critério

cronológico, criem-se todos os mecanismos republicanos para esta lista e dê-se

transparência total a ela.

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Ainda ouvi o senhor dizer que na sua falta e na da Dra. Iracema o sistema

faliu. Então, o sistema foi muito mal dirigido ao longo desses anos, porque um

sistema desta complexidade não pode depender de 2 pessoas. Tanto poder não

pode estar na mão de 2 pessoas. Mais pessoas têm que saber manipular a lista, têm

que saber procurar medulas, têm que saber critérios de como buscar alternativas

para resolver problemas.

Dr. Tabak, na minha avaliação, ainda sem a profundidade que pretendo ter

até o final deste processo, há uma concentração de poder acima do adequado, não

de poder no sentido político, evidentemente, mas uma concentração acima do

adequado, quando se determina esta forma de organizar o sistema. Ou seja, o INCA

que faz o transplante é o mesmo que tem o CEMO e que controla todo o REDOME,

mas o Sistema Nacional de Transplantes não faz a supervisão geral e seria este o

órgão do País responsável por tal acompanhamento.

Um outro fato me chama a atenção: será que neste Brasil inteiro só havia 2

hospitais, até o final do ano passado, em condições de fazer transplante de medula

óssea entre não-aparentados? Por que tanta demora no credenciamento de outros

hospitais? Posso levantar a hipótese de que havia o objetivo também de

concentração, vamos dizer assim, de poder de decisão sobre este tema em alguns

lugares, como, por exemplo, no CEMO.

Provavelmente existiriam mecanismos para dar maior transparência a essas

listas. Aliás, este é um dos objetivos mais importantes a ser perseguido pelo

Ministério no momento. Então, insisto na pergunta: quem definia e como, nos últimos

10 anos, por exemplo, a entrada de alguém no REDOME. Em que ordem e qual

seria o grau de publicidade dessas decisões para que todos pudessem

acompanhar?

Faria ainda outro questionamento. Há um decreto, de 4 de fevereiro, que

revela corretamente o interesse público nos procedimentos de transplante. O art. 2º

diz o seguinte:

“A realização de transplante ou enxertos de tecidos,

órgãos ou partes do corpo humano só poderá ser

realizada por estabelecimento de saúde público ou

privado e por equipes médico-cirúrgicas de remoção e

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transplante previamente autorizadas pelo órgão de gestão

nacional do Sistema Único de Saúde”.

Eu pergunto ao senhor se, ao longo destes 17 anos, ou nos anos em que

exerceu este papel de direção do Sistema de Transplante de Medula, teve notícia de

algum local que tenha feito um transplante de medula óssea sem autorização do

Sistema Nacional de Transplantes, para que os leigos possam compreender o

porquê desta exigência. Certamente não ocorre em razão da burocracia, mas por

estar o paciente extremamente vulnerável nestas horas.

Sou médico, defendo a classe, mas não admito que se conte apenas

maravilhas sobre os profissionais, até porque existem situações dramáticas em que

uma pessoa está à beira da morte e é submetida, dentro do sistema privado, a uma

chantagem econômica brutal, sendo-lhe cobrado, por exemplo, 100, 200, 300 ou 500

mil reais para encontrar um doador de medula.

É por isso que existe a necessidade de controle público. Pergunto-lhe,

portanto: havia ou não?

O Deputado Eduardo Paes perguntou quantas pessoas morreram e eu lhe

pergunto se a dificuldade de recursos é verdadeira. Até estranhei quando li em um

artigo hoje o Ministro dizendo, diante de toda a crise — e se eu estivesse no lugar de

S.Exa. faria a mesma coisa — que falta dinheiro, mas é preciso aumentar o

Cadastro Nacional de Doadores.

Notei que o senhor critica a alegação da falta de 360 mil reais. Eu também

acho que não deve ser um número cabalístico, mas tenho a noção, não como

hematologista ou oncologista, de que 360 mil é melhor que 50 mil e pior que 500 mil.

Quanto maior o valor maior a chance de encontrar uma medula compatível.

Portanto, é positiva esta ação e merece elogio de todos. Sabendo da crise de

financiamento, diz-se que serão liberados 24 milhões de reais. Mas o senhor, até

ultrapassando um pouco o tema da oncologia e da Saúde — e eu o respeito, porque

todos podem fazer crítica político-partidária —, mistura o caso Waldomiro com os 24

milhões que o Ministro irá liberar, anúncio que houve antes de estourar o caso

Waldomiro. Diz-se, ainda, em meio à crise, que queremos aumentar a procura de

medulas no mundo inteiro, para ver se podemos fazer mais transplantes, salvar mais

vidas e para morrer menos gente.

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O senhor faz ainda a acusação que faz parte do “cobertor de bondades que

toma conta do Planalto no lastro do escândalo Waldomiro”. É um debate político-

partidário interessante aqui abordado, essas posições fazem parte do ambiente

democrático em que vivemos, mas merece aplauso a liberação de 24 milhões de

reais, quando historicamente a quantia era de 1 ou 2 milhões de reais. É algo que

deve ser aplaudido, porque se trata de medida justa e que ajuda a resolver um

problema. Então, por que atacá-la?

Pergunto-lhe: nos anos em que o senhor dirigiu o CEMO havia problemas de

financiamento ou não? Morriam pessoas que não conseguiam uma medula

compatível ou não? E não me refiro ao ano de 2003, mas aos últimos 10 anos.

Quantas pessoas infelizmente morreram porque não tiveram acesso e

compatibilidade para o transplante de medula?

Não vamos partidarizar esse assunto, mas dar-lhe o tratamento devido. Se

houve o erro de mandar 3 ou 4 e-mails, que se puna este erro, que não se mande

mais e que inclusive todos nós, Deputados, digamos a alguém que nos peça que

interfiramos na lista de transplante a mesma resposta que o senhor dá: as listas de

transplante têm critério de acesso e não é admissível que um Deputado possa dizer

que a pessoa “a” tem que ser atendida antes da pessoa “b”. O critério deve ser

republicano.

O Deputado não pode ficar dizendo que é correto fazer esse pedido. Não é

correto! O Deputado tem de dizer para o cidadão que existe um critério republicano

que organiza a lista, senão o cidadão pode ser levado à idéia de que tem de

procurar Deputados para furar a lista de transplantes e que o Deputado tem o poder

de resolver o problema do desespero que a pessoa está sentindo porque não vai ser

operada. Não pode ser assim.

Portanto, dentro dos limites de tempo e agradecendo ao Sr. Presidente a

tolerância, fico por aqui e talvez depois volte com outras questões.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Pela ordem, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Com a palavra o Deputado

Eduardo Paes.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Como fui citado pelo Deputado

Henrique Fontana, só queria fazer uma breve intervenção: considero absolutamente

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constrangedor o momento que estamos vivendo nesta Comissão. Estamos

apurando fatos graves denunciados por uma pessoa que é vítima deste processo e,

por uma estratégia que vem sendo utilizada pelo PT nesta Casa em diversas

oportunidades, nos escândalos...

(Intervenções inaudíveis.)

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA – Sr. Presidente, estamos

travando um debate político e vou querer regras para debater com o Deputado

Eduardo Paes.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Eu não estou citando o nome de

V.Exa.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA – Não se trata da questão de citar

ou não, V.Exa. está fazendo um debate político.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Quem está politizando o debate é

V.Exa. O que acontece, Sr. Presidente, é que não podemos transformar esta

estratégia “diversionista”, utilizada pelo PT contra tudo o que agride o Governo,

infelizmente não são poucas coisas, como regra nesta Casa.

Não podemos pegar uma pessoa como o Dr. Daniel Tabak, com sua história,

com seu passado, servidor público republicano, que estava no INCA antes do

Governo do PSDB e de qualquer outro partido, e transformá-lo — ele que é vítima

deste processo — em algoz. É uma questão fundamental, Sr. Presidente.

Portanto, estamos aqui apurando fatos sim, temos que corrigi-los, mas vamos

parar com esta estratégia nesta Casa. Se toda estratégia a ser utilizada pelo PT for

igual à verificada no caso Waldomiro, vai dar confusão.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA – Eu gostaria de fazer um

esclarecimento.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Seja breve, Deputado, para

podermos ouvir os outros Deputados.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA – Deputado Eduardo Paes,

permita-me citá-lo nominalmente, até para que eu possa me dirigir a V.Exa.

pessoalmente. Não se utilize do chamado legalismo regimental para solicitar o

direito à réplica. Como citou o meu nome, eu posso falar; como não citou, eu não

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posso falar. Acho essa atitude uma hipocrisia, pois nós sabemos quando um está

falando com o outro.

De fato, estou dizendo o seguinte a V.Exa.: não há nenhuma questão

“diversionista” aqui. Trata-se de uma avaliação política de V.Exa., enquanto a

intervenção que fiz foi própria de alguém que deseja compreender por que o sistema

de transplante de medula óssea tem um grau muito inferior de transparência em

comparação com o que eu entendo ser correto para que esta lista seja republicana.

Temo que o fato denunciado tenha ocorrido não só no caso do Vice-

Presidente José Alencar, que cometeu um erro — como já falei — de boa-fé.

Quero compreender como faremos para que eu, V.Exa., o Deputado Rafael

Guerra, todos aqui possamos ter acesso a uma transparência total sobre esta lista,

para que seja ela blindada contra qualquer possibilidade de interferência político-

partidária ou de médicos que estão dentro do sistema, até porque não existe só

interferência de políticos no sistema de saúde.

É fácil bater em políticos, mas também existe interferência de médicos. Sou

médico e político e sei que há situações em que médicos internam pacientes em

determinados hospitais e cobram por fora, garantindo depois uma internação pelo

SUS. Sei também que alguns médicos usam seu poder para furar a fila de entrada

no SUS. Isso também tem que ser dito, senão começaremos a fazer um debate

absolutamente circunscrito.

O SR. DANIEL TABAK – Isso acontece como rotina, Deputado Henrique

Fontana, na segunda porta dos hospitais públicos do Brasil. E ainda continua

acontecendo. A minha esperança era que, com o PT, isso acabasse. Conheço

vários petistas que se manifestavam contra. Inclusive eu, que não sou petista, mas

fui processado por essa razão. Essa é uma regra, não uma exceção.

(Não identificado) – Não depende de partido, mas de comportamento

médico.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Um minuto, Deputado. A

Deputada Maninha está inscrita e pede a palavra pela ordem.

Com a palavra o Dr. Francisco Gonçalves.

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O SR. DEPUTADO FERNANDO GONÇALVES - Sr. Presidente, pela ordem.

Muitos colegas reclamam do tempo excessivo para o uso da palavra. Quanto aos

dois últimos Deputados que se manifestaram, um gastou 13 minutos e outro 3.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Deputada Maninha, V.Exa.

tem a palavra.

A SRA. DEPUTADA MANINHA - Espero que, em virtude da punição aos dois

Deputados que me antecederam, também não seja cassado o meu tempo. (Risos.)

Sr. Presidente, quero trazer um assunto à discussão. Não se trata de discutir

quem é a vítima ou o algoz. O Dr. Tabak tem o respeito de todos nós, médicos ou

não, pois conhecemos sua capacidade técnica.

Não estamos discutindo o mérito, porque V.Sa. é especialista da área e

trabalha há anos nessa profissão. Estamos discutindo o que pode prejudicar o

usuário do Sistema Único de Saúde no que diz respeito ao transplante de medula

óssea.

Ouvimos atentamente o Dr. Daniel Tabak, cuja exposição, como disse a

Deputada Laura Carneiro, nos deixou mudos diante de todas as explicações. Entre

as suas explicações, temos que destacar os elementos deste debate. O primeiro

deles é a questão da pressão política; o segundo, a lista. Essa sim nos interessa,

esse é o elemento principal do debate.

Em relação à pressão política, Dr. Daniel, também fui administradora pública,

fui Secretária de Saúde, e sei que isso se dá no dia-a-dia da vida administrativa. A

pressão política surge desde o paciente que vai para a porta do seu escritório tentar

resolver um problema até a do político que o procura para que seja resolvido o

problema de alguém, seja um apadrinhado, seja um parente, ou quem quer que

seja.

Creio que dessa discussão não podemos tirar ilações. Da mesma forma que

V.Sa. faz suas interpretações, também outros poderão interpretar o seu

comportamento. V.Sa. disse, por exemplo, que demitiu Iracema porque ela foi

pressionada, ao mesmo tempo disse que foi pressionado e reconhece que houve

pressão. Por que não foi denunciada essa pressão no momento oportuno a quem o

chefiava? Por que a questão só foi tratada na imprensa, publicamente, criando toda

a celeuma?

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Quero, entretanto, deter-me naquilo que considero principal, a lista, que,

segundo ouvimos falar, tem sido guardada a 7 chaves. Essa lista foi solicitada pelo

Ministério da Saúde por diversas vezes, a primeira vez em 12.11.2003, à Sra.

Iracema Salatiel. Houve seguidas solicitações: em 28.01.2003, em 6.02.2003, em

março de 2003 e, finalmente, em 27.01.2004 a lista foi apresentada. Antes, não se

teve acesso a ela.

Mas V.Sa. disse claramente que nos 17 anos de gestão do CEMO, a Dra.

Iracema e mais uma médica tinham o controle e o domínio técnico da elaboração

dessa lista.

Da mesma forma que o Deputado Henrique Fontana, tenho a impressão de

que é muito pouca gente para exercer esse controle. Suponhamos que

desapareçam os três — e não é o que acontecerá —, quem dará continuidade a

essa lista?

Para nossa surpresa, a lista apresentada em 26.01.2004 é extremamente

confusa. A lista tem a seguinte situação: estrangeiros, 56; pessoas aguardando por

TMO - doador nacional, 18; pessoas aguardando por TMO - doador internacional,

23; transplantados halogênicos, não-aparentados, 138; transplantados autogênicos,

20; óbitos, 551; óbitos com doador identificado, 4; óbitos em busca, 90; óbitos com

doador familiar, 26; afastamento temporário, doador internacional, 192; afastamento

definitivo, 37; desconhecido, antigos, 217; busca ativa, 123; busca mantida ativa,

758; perfazendo um total de 2.252.

Em 26.01.2004, o REDOME registrava 2.252 receptores de medula óssea e

outros precursores hematopoéticos. Desses, 56 eram estrangeiros e outros 41 ainda

aguardavam. E aí vai a explicação de toda a lista.

Gostaria que V.Sa. esclarecesse alguns aspectos, tais como a permanência

de receptores com 55 anos ou mais na categoria “Manter Pesquisa de Doador”; a

origem de alguns doentes em consultórios médicos ou instituições não autorizadas

cadastrados para TMO, inclusive não-aparentado; a inclusão de doentes originados

do próprio INCA — órgão a que se vincula o REDOME —, classificados como

desconhecidos; a inclusão de doentes como originários do INCA, porém com

diagnósticos que não são de doença maligna, objeto de matrículas nesse instituto;

as indicações questionáveis para TMO não-aparentado — Doença de Hodgkin,

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miolema múltiplo, câncer de mama metastácico e outros; e as persistências em

outras categorias de casos identificados como de óbito.

V.Sa. referiu-se ao HEMOPE. Na verdade, aquela data de outubro de 2002 é

anterior à administração do atual Ministro da Saúde. Se o HEMOPE fosse realmente

autorizado a realizar transplantes em não-aparentados, por que o senhor não propôs

a opção de realizar ali o transplante?

Em nenhum momento o senhor cita o HEMOPE, apesar de haver no Brasil

tão poucas unidades autorizadas a realizar transplantes não-aparentados. Apesar de

V.Sa. ter comandado o sistema de transplante de medula óssea no País durante

quase 17 anos, foi V.Sa. quem assinou o relatório de vistoria do serviço de

transplante de medula óssea do HEMOPE, em 3 de outubro de 2002.

No caso da Paula Tammer, o senhor disse que foi pressionado a favorecê-la,

acelerando o processo de busca de doador compatível para a paciente. A comissão

de sindicância disse que realmente houve uma aceleração do processo de busca.

Isso quer dizer que V.Sa. e Dona Iracema Salatiel cometeram irregularidade

administrativa. Isso quer dizer que V.Sa. errou ou que V.Sa. aceitou a pressão e

cometeu irregularidade? Gostaria que esse ato ficasse caracterizado.

Em relação às filas, por que os pacientes, os médicos e o sistema nacional de

transplante não tinham acesso, como acontece com os demais transplantes, a

informações sobre as filas de medula óssea? Por que V.Sa., que coordenou o

sistema de transplante de medula óssea durante quase 17 anos, nunca organizou

essas filas? O que aconteceu? Queremos um esclarecimento sobre isso.

V.Sa. solicitou apenas 1,5 milhão de reais, no ano passado, para a realização

das buscas. Nos anos anteriores, a média foi de 1 milhão de reais por ano. Por que

V.Sa. não solicitou esses recursos em anos anteriores?

Por último, V.Sa. controlou durante quase 17 anos todo o sistema nacional de

transplante de medula óssea. O Deputado Henrique Fontana levantou um

questionamento e eu gostaria que houvesse um esclarecimento. Tenho a seu

respeito o mais alto conceito e não creio que se deva macular a imagem de

ninguém.

Este é o momento para que todas as nossas dúvidas possam ser sanadas.

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Por isso, pergunto: era V.Sa. quem decidia a busca nacional ou internacional

realizada por meio do sistema público e, ao mesmo tempo, atendia à iniciativa

privada? Esclareça, a fim de que não paire qualquer dúvida sobre essa questão:

como V.Sa. explica os graves problemas éticos e legais que isso poderia

representar?

Dr. Daniel Tabak, são essas questões que gostaríamos que nos

esclarecesse.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Sr. Presidente, peço a palavra

pela ordem.

A Deputada Maninha leu alguns dados que não temos. Solicito a S.Exa. que

nos passe uma cópia desses documentos, até para que os próximos Deputados

possam verificar os números da lista, porque não os temos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Seria bom. Vou pedir ao

secretário da Comissão que tome essa providência.

A SRA. DEPUTADA MANINHA – Só para esclarecer: esses dados constam

da lista apresentada pelo REDOME ao Ministério da Saúde.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Sim, mas V.Exa. há de convir que

não tenho isso. V.Exa. tem porque deve ter recebido do Ministério da Saúde. Como

não recebi, quero obter cópia.

A SRA. DEPUTADA MANINHA – É pública, Deputada, basta V.Exa. solicitar,

como fiz.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Claro, mas como V.Exa.já

solicitou...

A SRA. DEPUTADA MANINHA – Se V.Exa. tiver o interesse que tive, é só

solicitar.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Estou solicitando a V.Exa.

A SRA. DEPUTADA MANINHA - Não há problema. Mas é pública, vou

passar ao Deputado Rafael Guerra.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Maninha, eu estou solicitando a

V.Exa. Obrigada.

(Intervenção inaudível.)

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A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Que bom, então, por isso que eu

pedi.

(Intervenção inaudível.)

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Sr. Presidente, se é para fazer

grosseria, também sei fazer. Talvez, nesta Casa, eu seja a Deputada mais delicada,

mas sei ser grossa igualzinho a todo mundo aqui!

Então, quero ser muito clara, Deputada Maninha: V.Exa. não me conhece.

Sou delicada quando tenho que ser, mas sei ser grossa, se for necessário.

Então, V.Exa. tem essa documentação porque deve ter recebido da

assessoria do Governo; como não pertenço a ele, não a tenho. Talvez haja outros

documentos, pois V.Exa. preparou anteriormente as perguntas. Eu não preparei

pergunta não!

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Está bom, Deputada.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – V.Exa. vai me deixar falar. Como

dizia um Vereador do Rio de Janeiro, sentei o bumbum na cadeira quando começou

esta reunião, às 13 horas e 50 minutos, esperando que a reunião começasse às 14

horas. Copiei alguns trechos do debate e ouvi cada uma das palavras. Não vim com

nada prontinho de casa, muito menos trabalho feito por assessoria. Tudo foi feito por

mim.

Portanto, respeite-me, Deputada, porque eu respeito V.Exa.

A SRA. DEPUTADA MANINHA – Sr. Presidente, por favor.

O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA – Sr. Presidente, deixe-me fazer

uma intervenção?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Com a palavra Deputado

Fernando Gabeira.

O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA – Deputada, podemos superar

essa questão?

A SRA. DEPUTADA MANINHA - Sr. Presidente, gostaria de dizer que não

tenho a grosseria da Deputada Laura Carneiro; ao contrário, sou uma Deputada até

muito delicada. Gostaria de dizer que, da mesma forma que S.Exa. está aqui desde

às 14 horas, nós também. E mais: nós nos preparamos. Se a Deputada não se

preparou, é problema dela. Mas o documento está aqui e é público.

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Deputada, delicadamente, ele chegará às mãos de V.Exa. para que não haja

nenhum problema.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Está bom. Estamos

perdendo tempo com essa polêmica.

Na verdade, solicitamos o relatório da sindicância realizada pelo Ministério da

Saúde. Assim que chegar à Comissão, certamente será distribuído a todos os

Deputados. Ainda não chegou. Nós o pedimos há 2 semanas.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Está nas mãos da Comissão.

Para alguns já chegou.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Com a palavra o Dr. Daniel

Tabak.

(Não identificado) – Sr. Presidente, pela ordem. Faltou um interlocutor.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Foram 3, Deputado. É

porque todos 3 falaram durante muito tempo, então.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO - Eu fui concisa.

(Intervenção inaudível.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Com a palavra Dr. Daniel

Tabak.

O SR. DANIEL TABAK – Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria apenas

de organizar meu raciocínio, porque consegui anotar mais ou menos 30 perguntas

sobre essas questões. Para organizar as respostas, de quanto tempo disponho para

fazer minhas ponderações?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Regimentalmente, V.Sa.

teria 3 minutos para responder a cada Deputado; seriam ao todo 9 minutos. Mas

vamos agir como temos feito até agora. Fomos tolerantes com todos os que falaram

até o momento.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Exato, Sr. Presidente, o Dr. Daniel se

transformou aqui no algoz. A estratégia do Governo é atacar.

O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA – Sr. Presidente, pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA – Sr. Presidente, é importante

que sejamos tolerantes, mas poderíamos fazer um esforço coletivo em função de

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sermos mais objetivos, como, por exemplo, ouvindo a intervenção das pessoas.

Sinto que há redundância. Poderíamos cortar tais repetições e chegarmos ao ponto

de termos uma conclusão antes do início da Ordem do Dia. São 17 horas e 7

minutos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Devemos ser mais

objetivos. Vamos atender ao apelo do Deputado Fernando Gabeira no sentido de

sermos mais concisos.

(Não identificado) – Sr. Presidente, sugiro o tempo de 10 minutos para que o

Dr. Tabak possa dar resposta. Se S.Sa. responder cada Parlamentar no tempo de 3

minutos, vai demorar meia hora para concluir. Acredito que 10 minutos são

suficientes para um resumo.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – É isso mesmo.

O SR. DANIEL TABAK – Então, absolutamente, não farei nenhum tipo de

ataque pessoal. Gostaria de iniciar, na verdade, fazendo uma abordagem muito

interessante. Em todas essas ponderações, atribuíram-me poderes que não tenho.

Não sou o todo-poderoso, como citado aqui. Nunca tive nenhuma pretensão de ser.

Sou um simples médico que, ao longo desse período, procurei me dedicar, como

funcionário público, às minhas atribuições.

Nesse sentido, uma das principais atribuições a que me dediquei foi a de

construir um sistema que pudesse funcionar na minha ausência. Essa foi uma das

minhas maiores preocupações. Não tive o intuito de concentrar esse poder na minha

mão. Aliás, o que eu faria com essas listas?

Na verdade, todos esses pacientes foram transplantados no INCA. Não posso

imaginar que, em algumas dessas intervenções feitas aqui, exista qualquer

inferência — é bom deixar essa questão muito explícita — no sentido de que, em

algum momento e de alguma maneira, beneficiei-me particularmente disso.

Vou me recusar a aceitar esse tipo de provocação. De alguma maneira,

mesclei minha atividade privada com a minha função pública.

Tenho isso muito claro em minha mente. Essas questões foram plenamente

por mim separadas ao longo de todos esses anos. Não aceito esse tipo de

provocação. Não vou perder tempo com esse tipo de observação.

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Nesse sentido, em relação à questão do poder a mim supostamente

conferido, não o tenho. O sistema funciona hoje na minha ausência exatamente

porque existem pessoas capazes, do ponto de vista médico, de administrar o

manuseio dos pacientes. Sou um simples médico.

Cuido de pacientes ao longo de 17 anos. Transferi para essa equipe, que

muito me orgulho de ter construído, a capacidade de continuar controlando os

pacientes. No entanto, se, de uma hora para outra, retiramos não o médico, mas

uma técnica imunogeneticista — que é a única que coordena o sistema e o articula

com os registros internacionais —, colocamos esses programas imediatamente em

risco. Mais do que isso: quando retiramos subitamente a fonte de financiamento, que

é a Fundação Ary Frauzino, por meio da qual financiamos os contratos

internacionais, se estabelecemos esse corte, o sistema fica inviabilizado.

Então, tais alegações dizem respeito à questão da Fundação Ary Frauzino e

da Dra. Iracema.

Do ponto de vista do Dr. Chioro, respondendo à Deputada Laura Carneiro, é

óbvio que um relatório de 12 páginas não poderia ter sido passado pelo telefone. O

Dr. Chioro menciona que isso foi dado pelo telefone.

Então, como o Dr. Chioro provavelmente amanhã não vai se lembrar o

porquê, na verdade nunca conversei com ele ao telefone. Vou lembrar ao Dr. Sola,

que não vai estar aqui amanhã, como ocorreu esse processo. Tenho isso tudo muito

claro na minha mente.

Estive em Recife no dia 20. Na verdade, a sindicância foi publicada no dia 21;

dia 22 foi uma quarta-feira, dia em que apresentei o relatório preliminar ao Dr.

Temporão, em virtude de uma reunião que ele teria com o Ministro, ainda na quarta-

feira. O relatório preliminar foi entregue a S.Sas., ele viajou com o relatório e voltou a

Brasília com uma única ressalva. E o nome do Ministro estava grifado no relatório

preliminar.

Foi a única ressalva. Entendi isso como uma sugestão de que aquele nome

fosse retirado do processo, procedimento do qual não fiz parte.

O relatório foi protocolado no dia 23 e, portanto, as denúncias não seguiram

nenhum caminho sensacionalista. Sou um funcionário público e procuro atender às

normas, Deputada Maninha. Encaminhei ao meu superior hierárquico direto, Dr. Luiz

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Augusto Maltoni Júnior, e ao Dr. José Gomes Temporão, as minhas preocupações

quanto à situação em Recife. Não satisfeito com isso, no dia 24 de outubro, à tarde,

telefonei para o Dr. Sola para também expressar essa minha preocupação. Esse

telefonema foi dado de 2 maneiras: para o gabinete da Secretaria de Atenção à

Saúde e para o telefone celular pessoal do Dr. Sola.

Essas verificações obviamente foram feitas do meu celular.

Não tenho nenhuma dificuldade em fazer isso. No entanto, a conversa não

aconteceu nesse dia.

No dia seguinte, depois das 19 horas, o Dr. Sola me ligou. Não retornei a

ligação porque era uma sexta-feira e, como judeu que sou, estava na sinagoga e

não a respondi.

A ligação e a conversa só ocorreram com o Dr. Sola quando ele me ligou, no

dia 27, uma semana depois, às 3 horas da tarde. Ele queria saber qual o teor da

minha preocupação. Expressei a ele o seguinte: como esse centro vai ser

credenciado? Ficou claro obviamente que eu também desconhecia a situação do

HEMOPE.

O absurdo era o seguinte: eu, como braço técnico do Ministério da Saúde,

não tinha conhecimento de que o HEMOPE estava credenciado para transplante

não-aparentado. Ou seja, se eu não sabia, o Ministério também não. O Ministério só

tomou conhecimento quando se procurou desvendar algum tipo de alternativa para

justificar o credenciamento de um hospital privado, como se isso trouxesse uma

justificativa para alternativa de financiamento para o sistema de transplante.

Como mencionei em minha exposição, não há diferença entre o sistema

público e o privado. Então, na verdade, causou-me estranheza que o sistema

público tivesse sido descredenciado. Vamos imaginar que tivesse havido equívoco,

que todos havíamos errado.

Na verdade, houve erro de edição. A portaria estava equivocada. Se o

problema era ter uma questão legal, por que não fazer o transplante no HEMOPE?

A pergunta feita por V.Exa. é a seguinte: o que garante o credenciamento?

Não sei. Ninguém sabe, porque os critérios não foram estabelecidos. Quando fui

solicitado pelo Dr. Temporão para ir a Recife fazer uma avaliação, fiz relatório e

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questionário com 31 itens para tentar entender o que seria um centro para

transplante não-aparentado.

Apresentei esse relatório ao Dr. Diogo como sendo preliminar. Nenhuma

dessas questões foi levantada ou respondida. Eram questões estruturais, de

funcionamento. Todos os dados estão disponíveis. E não vou perder tempo

discutindo questões sobre funcionamento de um centro de transplante autológico, ou

de um centro de transplante aparentado e não-aparentado. Nenhuma dessas

questões foi respondida.

Ou seja, o fato de termos uma anomalia no credenciamento, por meio dessas

portarias, apesar de na minha apresentação na sindicância... Esse é o meu

depoimento. Gastei 5 horas da minha vida, no dia 4 de fevereiro, descrevendo todas

as nuanças do sistema de credenciamento, todas as portarias, mas, na nota oficial

da comissão de sindicância, não existe nenhuma referência ao fato de que o

HEMOPE estava credenciado. Eu denunciei isso. Eu descobri isso. E como? Através

da nota oficial do Ministério da Saúde. Ninguém no Brasil sabia disso. Nenhuma

pessoa no Brasil sabia disso, nem o pessoal do HEMOPE, nem o pessoal do

Hospital Albert Einstein. Ninguém sabia que havia esse nome escrito lá. Então, esta

é a resposta.

Em relação ao custeio ao Brasil, não vou ser ingênuo e imaginar que o único

problema que o nosso País precisa resolver é o do transplante da medula óssea.

Seria muita ingenuidade minha dizer que agora, se resolvêssemos um problema de

transplante de medula óssea, tínhamos resolvido o de transplante no Brasil.

Felizmente, não sou Ministro para resolver esse tipo de problema. A única

coisa que sei é que o programa precisa seguir de acordo com as normas

estabelecidas e que ele seja estabelecido de forma equânime e universal. As

questões levantadas nitidamente mostram que havia um tratamento diferenciado.

Aliás, a conclusão é da sindicância e não minha. Quem incriminou o Dr. Diogo foi a

sindicância, não fui eu.

Do ponto de vista da questão da boa-fé do Vice-Presidente, acho que S.Exa.

deveria ter percebido que os amigos dele são os brasileiros.

Então, quero acabar de uma vez por todas com essa questão partidária,

porque não quero levantar nenhuma aqui; a minha questão é técnica. Esse

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programa atende os brasileiros com recursos, sem recursos, com seguro e sem

seguro. O que não se admite é que, por alguma razão que não seja médica, os

pacientes tenham algum tipo de tratamento diferenciado.

Em relação ao Ministro, na verdade, eu esperava que, quando trazida a

público a questão, que eu fosse repreendido e que, de alguma maneira, alguém

demonstrasse indignação. Afinal de contas, sou um funcionário de longos anos na

instituição, trago uma questão grave como essa e, no entanto, o que o meu diretor

faz nesse sentido? Nada. O meu diretor não fez nada. Naquele momento, então, eu

imaginava que alguma coisa deveria estar ocorrendo. Respondi ao meu superior

hierárquico. O que eu deveria fazer naquele momento? Ir para imprensa fazer algum

tipo de escândalo?

Apresentei o relatório como deveria ser feito. Caberia ao meu diretor naquele

momento, ao meu superior, tomar as providências. Elas não foram tomadas. Pelo

visto, ele não acreditou que havia algum tipo de irregularidade.

Essas cobranças e essas mesmas perguntas poderão ser feitas ao Dr.

Temporão, quando S.Sa. comparecer a esta Comissão.

Muito bem. Em relação à diferença da situação de antes e depois, existe uma

grande diferença: antes a pressão era sobre mim. Apresentei os meus mecanismos

de homogeneização; o Dr. Diogo apresentou os dele. Quais são os mecanismos do

Dr. Diogo? Transferir cópias eletrônicas ao Brasil inteiro. Transferir ao ilustre

Deputado Dimas Ramalho informações sobre pancitopenia e transplante

haploidêntico.

Gastei do meu tempo 1 hora e meia para explicar o que era HLA. Imaginem o

que o Deputado Dimas Ramalho deve ter feito com a informação sobre transplante

haploidêntico. Ele certamente não deve ter imaginado o que isso poderia

representar.

No entanto, Dr. Diogo gastou 5 páginas em seu relatório. Imaginem: se temos

aqui 1 minuto para responder a cada pergunta, e o Dr. Diogo escreve 5 páginas de

relatório para uma paciente, imaginem quantas páginas teria de escrever para que

600 pacientes tivessem tratamento homogêneo?

Essas perguntas sobre homogeneidade devem ser feitas ao Dr. Diogo, não a

mim. O meu tratamento, sem dúvida nenhuma, sempre foi homogêneo.

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Do ponto de vista em relação ao número de óbitos, já respondi: uma vida não

tem preço. No momento em que perdemos uma vida, para mim isso é suficiente.

Sobre o grande problema do conflito, sei que, como oncologista, não devo ter

a pretensão de salvar todas as vidas, mas devo ter a certeza de que todos os

esforços necessários foram desempenhados. O que eu não consigo admitir — e que

na verdade repercutiu sobre minha capacidade de dormir — é que não só eu não

consigo influenciar nisso, mas agora alguém acima de mim, por razões que ele deve

explicar, comece a determinar como essa fila vai ser manuseada.

Sobre a questão da fila e sobre a caixa-preta, quero dizer o seguinte: também

talvez não tenha gasto tempo suficiente para explicar por que essas listas não eram

disponíveis. Na verdade, elas eram disponíveis. Para exemplificar, V.Exa.

mencionou as solicitações. Vou voltar um pouquinho mais no tempo. O Dr. Diogo é

extremamente eletrônico, ele gosta de mensagens eletrônicas. Então, deixa eu falar

sobre uma troca eletrônica de mensagens entre ele e a Dr. Iracema, que aconteceu

no início do ano, no começo de toda a situação.

No dia 28 de janeiro de 2003, o Dr. Diogo começa dizendo: “Boa tarde, Dra.

Iracema, conforme conversamos hoje, estou enviando uma série de

questionamentos que temos aqui no SNT sobre o REDOME. Sei que serei

repetitivo”. E aí ele continua e menciona: “As minhas dúvidas são: como é o

REDOME? Onde está o banco de dados? Onde se roda a lista?” Essa pergunta

ocorreu no dia 28 de janeiro. Eu estava de férias, mas, apesar disso, respondi à Dra.

Iracema da seguinte maneira, conforme mensagem que ela própria copiou: “Oi,

Iracema. Acho que todas as questões são pertinentes. Acho que seria melhor

agendarmos uma visita do Dr. Diogo ao REDOME, para que todos esses pontos

pudessem ser melhor esclarecidos. Poderíamos apresentar o documento, ou seja,

as listas e como é que funciona, ao final da visita”. Essa questão surgiu no dia 29 de

janeiro de 2003. Mas uma boa pergunta que V.Exa não teve oportunidade de fazer

foi a seguinte: afinal de contas, quando o Dr. Diogo começou a trabalhar? O Dr.

Diogo também é “produto” do outro Governo, pois já estava trabalhando desde abril

de 2002, ou seja, quando houve o equívoco de outubro de 2002, o Dr. Diogo já era o

responsável pelo SNT.

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Voltando à questão do Dr. Diogo, em abril de 2002, o Dr. Diogo já era

responsável pelo SNT e o REDOME já era uma coisa complicada.

Então, vamos imaginar o seguinte: se temos agora essa responsabilidade,

quando o Dr. Diogo deveria visitar o REDOME? Certamente, na primeira

oportunidade dele no Rio de Janeiro, imagino eu. De abril de 2002 até o final de

2003 ele esteve várias vezes no Rio.

Então, a minha pergunta é a seguinte: quando foi a primeira visita do

Coordenador do SNT ao REDOME? A senhora certamente não vai poder responder.

Mas eu posso. A primeira visita do Dr. Diogo ao REDOME aconteceu no dia 4 de

novembro de 2003, quando ele compareceu com o Dr. Chioro à segunda reunião do

ano, segunda reunião de 2003. O Dr. Diogo levou 18 meses da sua gestão para vir

ao REDOME e poder entender. Então, nós levamos aqui, resumidamente, uma hora

e meia para que essas pessoas pudessem entender o REDOME. Tenho certeza de

que todas elas hoje entendem o REDOME melhor que o Dr. Diogo.

Na verdade, eu levei uma hora e meia, mas eu não tenho uma hora e meia

para escrever e-mails. Pedi ao Dr. Diogo que viesse ao REDOME para entendê-lo,

mas ele só veio em novembro de 2003.

Naquela época, quando representantes do DATASUS estiveram no

REDOME, a surpresa foi dramática. Sabe qual foi a surpresa? É que, na verdade,

eles tinham pouca coisa a acrescentar. O sistema de informática desenvolvido

naquele órgão era muito melhor do que eles podiam imaginar. Todas as questões

que haviam solicitado estavam disponíveis. Filas e listas? Todas elas sempre

estiveram disponíveis. Agora a pergunta é a seguinte: está a fila disponível para o

paciente? Então, vou repetir o caso do menino que é filho de negro com japonês.

Como é que vou explicar para esse pai, sendo ele o primeiro da fila, que ele foi

transplantado antes do último, ou depois do último, ou que nunca vai ser

transplantado, porque ele nunca vai ter um doador.

Ou seja, a transparência da Internet não vai trazer tranqüilidade para as

famílias. O que vai trazer a tranqüilidade para as famílias é uma boa relação médico-

paciente.

O ilustre Deputado Henrique Fontana, médico que cuida da saúde da família,

sabe como é importante a relação médico-paciente e conhece profundamente a

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importância do contato com o indivíduo. Quem tranqüiliza a família não é a Internet,

mas o médico. É por isso que essas listas sempre estiveram disponíveis para o

médico.

No dia 27 de janeiro, pouco antes dessas questões, pessoalmente liguei para

70 médicos que tinham pacientes com doador identificado. Todas essas listas estão

aqui representadas, todos os contatos estão listados e contêm a evolução clínica

dos pacientes, origem, médico responsável, telefones e contatos. Eu pessoalmente

contactei, porque existem vários pacientes com doador identificado para os quais o

transplante não seria recomendado. É uma questão médica, não cronológica. A

questão cronológica da Internet é absolutamente cega. Como vimos, inclusive com a

questão sobre a transparência das portarias, a Internet não é blindada. Usando as

palavras do Deputado Henrique Fontana: a Iista da Internet não é blindada e vemos

esses absurdos! Tal como é o fato que eu, como braço técnico e representante do

Ministério da Saúde, não sabia quantos centros credenciados existiam no Brasil.

A conclusão é a seguinte: se eu soubesse disso antes da nota oficial do

Ministério, já teria pedido demissão há muito tempo. Não dá para agüentar, como

responsável técnico, o fato de que tal responsabilidade tinha deixado de ser minha.

Então, essa é uma responsabilidade de técnico e simplesmente não existia.

Em relação à Internet, vou fazer uma pergunta a V.Exa.: a retificação, como já

vimos, aconteceu em novembro; se quiséssemos transparência, quando a

retificação deveria estar listada na Internet? Em novembro de 2003 ou juntamente

com a portaria oficial, em outubro de 2002? Se procurarmos na lista de portaria da

SAES em novembro de 2003, não vamos encontrar a Portaria 745/RT, pois só

aparecerá em outubro de 2002.

Portanto, a Internet é transparente? Absolutamente. Com este sistema a

Internet é cega.

Quanto à questão levantada e que envolve pacientes privados, não me vou

deter, mas vou dar exemplo de como um indivíduo desorganizado trouxe mais

confusões para o sistema e para uma situação que até agora também não foi

enunciada.

Fui procurado em maio de 2003 por uma paciente em meu consultório

particular. Essa paciente de 19 anos tinha leucemia aguda e, usando a terminologia

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do Dr. Ostronoff, um seguro poderoso. Curiosamente, o mesmo seguro do menino

do Recife. Essa menina era segurada pela Sul América e foi tratada por um médico

no Hospital Albert Einstein chamado Dr. Jacques Tabacof. Foi submetida a um

transplante autólogo, porque o Einstein era credenciado, em 2002. No entanto, em

2003 a doença voltou. E agora, em abril de 2003, a única chance de ela sobreviver é

um transplante de um doador. O Dr. Jacques Tabacof a inscreveu no REDOME, em

abril de 2003. Por incrível que pareça, com esse número pequeno de doadores, em

um mês encontramos um doador. Então, agora, vamos entender a situação. Temos

uma paciente que é a número 70 da fila — atentem para o critério cronológico,

porque não se trata da lista de exames, a paciente é a número 70 de uma fila que

tem 69 outros pacientes com um doador identificado antes dela — e que precisa

fazer o transplante amanhã. Se ela vai ao meu consultório particular, tenho várias

alternativas. A primeira delas é usar o exemplo que o senhor falou: eu a levo para o

SUS, cobro um adicional e faço o transplante no INCA. Nunca pensei nisso! Nunca!

Ela não seria levada para o INCA por duas razões: primeiro, porque nenhum

paciente meu, atendido em minha clínica privada, passaria na frente de outros

pacientes; segundo, ela não seria levada para o INCA, porque o INCA estava em

processo de destruição. Estamos falando de maio de 2003. Como vou resolver esse

problema, que é médico. Primeira providência: a consulta dela no meu consultório foi

cancelada, para que esse processo ficasse totalmente transparente. Tenho aqui a

cópia da nota fiscal dessa consulta. O cheque foi devolvido e a nota fiscal anulada.

Está aqui e, se for necessário, posso deixar para que constem dos autos.

Uma segunda providência. Escrevi a seguinte carta para o Dr. Diogo, em

maio de 2003: “Prezado Dr. Diogo, diante da impossibilidade do nosso contato

pessoal no dia 21 de maio, como previsto, para tentar encontrar soluções para os

graves problemas que afligem e comprometem a realização dos transplantes no

Brasil, opto por relatar um problema individualizado e uma proposta de solução”.

Qualquer semelhança com o caso de Pernambuco é mera coincidência.

No dia 15 de maio fui procurado pela paciente Ivana Macedo — desculpem-

me, eu não queria citar o nome da paciente —, portadora de leucemia mielóide

aguda. A paciente foi diagnosticada em 2001 e apresentou várias recidivas. No dia

15 de abril de 2003, um doador no REDOME foi identificado. Trata-se de um doador,

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morador da cidade de Americana, no Estado de São Paulo, disposto a doar células.

A paciente é a septuagésima da fila. Nós precisamos de uma realização urgente,

porque a doença está avançando rapidamente e a doente não pode esperar. Esta é

a minha proposta: a paciente foi submetida a um transplante autogênico no Albert

Einstein e, durante a nossa visita, em abril de 2002, pudemos verificar a excelência

daquela Instituição, vários membros daquela equipe foram treinados no exterior e já

vivenciaram transplantes de medula óssea, como se fosse o Dr. Ostronoff. Desta

forma, proponho que o procedimento seja realizado naquela instituição credenciada

pelo Sistema Nacional de Transplante para realização de transplantes não-

aparentados.

Então, vejam bem: em maio de 2003, o gerente técnico do sistema também

não sabia que o Hospital Albert Einstein era credenciado para transplantes não-

aparentados. Quem arca com os custos da realização de exames pré-transplante —

isso é importante —, de transporte, hospedagem e aspiração de medula óssea é o

CEMO. Ora, quem poderia propor isso, senão uma única pessoa, o diretor do

CEMO? Porque esses recursos não existem nem no INCA, nem na FAF, nem em

lugar nenhum, mesmo no Ministério da Saúde. Trata-se de uma conta chamada

Conta Doação do CEMO.

Sabem quem foi prejudicado com isso? Os médicos. Os médicos deixaram de

participar de eventos, livros deixaram de ser adquiridos, para que um sistema

totalmente desorganizado, incapaz de financiar os transplantes a partir de um

doador no Brasil, como nós já havíamos mencionado há muito tempo, pudesse

funcionar para salvar esta paciente. Em nenhum momento se questionou se, de

alguma maneira, haveria uma excepcionalidade. É claro que havia uma

excepcionalidade.

“(...)Acredito ser esta a única possibilidade de resolvermos o problema do

paciente. Como você mencionou em nossa conversa telefônica, em 16 de março, às

21h00, precisamos de soluções paliativas enquanto aguardamos a reordenação do

transplante no Brasil. Hoje, 75 pacientes com doador aguardam um leito disponível

nas duas únicas unidades.”

Então, em relação aos centros, eu só sabia de duas únicas unidades em maio

de 2003.

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Agora, vejam a preocupação da Dra. Iracema, demitida agora. A Dra. Iracema

propõe que esta solução seja avaliada para os demais pacientes da fila. A Dra.

Iracema queria que essa solução fosse estudada para outros pacientes que

tivessem também seguros. Ela estava preocupada não somente com esta paciente,

mas com outros.

Vejamos agora a solução proposta pelo Dr. Diogo. O Dr. Diogo disse o

seguinte:

“Brasília, 16 de junho de 2003. Tendo em vista o

recebimento da carta encaminhada para a direção (...)

Considerando os vários fatos e que a paciente é a 70ª

paciente da fila; considerando que a instituição sugerida

pelo Dr. Tabak não realiza o procedimento pelo SUS; esta

coordenação informa que está autorizando a realização

na Fundação Zerbini.”

Fundação Zerbini? Mas em maio de 2003 não havia só dois centros

credenciados?!... Na verdade, não. O Dr. Diogo, em maio de 2003, sozinho, sem a

participação do braço técnico, pela Portaria nº 134, do dia 27, credenciou sozinho a

Fundação Zerbini e esta paciente foi transplantada lá.

Então, olhem só o absurdo: um centro público foi credenciado, mas a paciente

deveria ser tratada fora do sistema para não onerá-lo, como, aliás, foi proposto em

Pernambuco. E sabem quantos pacientes foram “by passados”? Foram “by

passados” 69 pacientes. Ou seja, o Dr. Diogo, voluntariamente, sem solicitar a

ninguém e sem pedido de ninguém, furou a fila de 69 pacientes!

Como que eu poderia saber disso? Nunca! Porque eu só vim a saber do

Einstein pela nota oficial do Ministério da Saúde, que obviamente foi útil, porque, na

verdade, se eu tomasse a minha decisão no dia 24 de novembro — o que só

ocorreu porque minha indignação subiu ao nível máximo, para poder me afastar do

sistema — ninguém saberia disso.

E por que minha indignação chegou ao nível máximo? Foram duas questões.

A segunda reunião do ano, como mencionei, aconteceu no dia 4 de novembro.

Naquele dia estávamos todos nós de novo reunidos lá no INCA: Dr. Diogo Menes,

Dr. Chioro, Dr. José Gomes Temporão, Dr. Luiz Antonio Maltoni, Dra. Iracema

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Salatiel, pessoal do DATASUS, pessoal da informática. Obviamente já havia sido

estabelecido que Pernambuco era um centro credenciado. Agora já estamos no dia

4 de novembro, o credenciamento chegou no dia 21 de outubro e, portanto, já

sabíamos que os centros estavam credenciados. Obviamente, agora é um fato: são

quatro centros credenciados. Na verdade, não eram quatro, mas cinco, porque o

Einstein também estava. Mas na minha cabeça eram quatro. Na reunião, então,

pergunto ao Dr. Chioro: Dr. Chioro, agora que nós temos quatro centros no Brasil, eu

quero saber o seguinte: quantos pacientes agora eu posso encaminhar para Recife?

Qual foi a resposta dele? No meio da turma — e há dez testemunhas pelo menos —

disse-me: "Dr. Daniel, o senhor sabe muito bem que a situação de Recife é uma

situação especial." A situação de Recife é uma situação especial?!

Felizmente o Dr. Chioro virá aqui amanhã e vai poder explicar isso. Eu vou

deixar essa questão para o Dr. Chioro responder amanhã.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - O meu sentimento, se me

permite, Dr. Daniel Tabak, é o seguinte: como a medula tinha sido encontrada, como

a criança tinha contra-indicação para ser transferida a outro centro, ela poderia

sofrer um óbito ou um revés se não fosse feita a cirurgia o mais rapidamente

possível. Eu não tenho o volume de informações que o senhor, mas, segundo minha

interpretação, foi tomada essa decisão para que ela pudesse fazer a cirurgia, o que

não prejudicou nenhum outro paciente do Brasil que estivesse esperando.

O SR. DANIEL TABAK – Eu acho que essa intervenção foi providencial, para

mostrar claramente que é preciso ter informações especiais para a gente poder

tomar as decisões. Nós não podemos, de forma extemporânea, sem conhecimento,

tomar essas decisões. A especificidade não estava no fato; por quê? A criança era

ambulatorial e poderia ter sido transferida. O fato de essa criança ter sido

transplantada, como mencionado, ocorreu porque o material seria perdido. O

material estava congelado. Então, eu lhe pergunto: quanto tempo esse material pode

ser mantido congelado?

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - Eu não sei, evidentemente, Dr.

Daniel Tabak. Agora, tenho informações de que a orientação médica era a de que a

criança não poderia ser transferida. Há uma controvérsia sobre esse assunto.

O SR. DANIEL TABAK – Então, veja só, é exatamente por isso...

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O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - Só foi feito o credenciamento

para que ela pudesse ser operada imediatamente. E a vida foi salva. Aliás, poderia

ter acontecido também um incidente grave se, neste conflito entre os dias, ela não

fosse operada e viesse eventualmente a sofrer com um desdobramento ruim.

O SR. DANIEL TABAK – Mais uma vez eu agradeço a V.Exa. a intervenção,

porque vamos esclarecer várias questões. É por isso que é importante falar sobre o

tempo do congelamento. Como que se fala do tempo em dias? Células congeladas

de cordão umbilical podem durar mais de 20 anos! É por isso que esses bancos

privados estão congelando as células, para permitir que essas crianças possam ser

salvas se um dia tiverem leucemia. Então, que história é essa de que o material ia

ser perdido? Quem ignora isso? É para isso que se necessita de um técnico. A

criança foi salva? Quem afirmou que a criança foi salva? A criança foi transplantada.

Se toda a criança transplantada fosse salva, eu seria o homem mais feliz do mundo

e teria acumulado ao longo da minha vida a maior felicidade. Infelizmente, o

transplante não salva mais que 30%. As chances de essa criança ser salva não

chegam a 15%. Ao final do procedimento, essa criança tinha a mesma doença de

antes. E isso nunca foi mencionado. E quem pode afirmar isso? É o técnico. Não é

um urologista. Não é um indivíduo sanitarista. Com todo o respeito pelas suas

especialidades, essa é uma área do hematologista.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - Permita-me uma pergunta. O

senhor está fazendo uma acusação de que a cirurgia foi feita pelos profissionais de

maneira inadequada? Ou eu não entendo mais nada.

O SR. DANIEL TABAK – Eu queria permitir...

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - Foi correta ou incorreta a

cirurgia?

O SR. DANIEL TABAK – A sua informação é cada vez mais elucidativa. Eu

quero lhe permitir cada vez mais apartes.

O SR. DEPUTADO HENRIQUE FONTANA - Eu não estou falando dos 20

anos do cordão. Eu estou falando do paciente.

O SR. DANIEL TABAK – Eu queria agradecer mais uma vez ao Deputado

essa oportunidade, porque está sendo mais elucidativa.

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É claro que a cirurgia estava recomendada. Dizer que a criança foi salva é

obviamente uma forma de tentar transformar essa situação em algo totalmente

diferente. Essa criança vai ser salva se, ao final de três anos, ela não tiver

evidências da recidiva da doença, se ela tiver sobrevivido ao transplante, se ela não

tiver tido as complicações.

Quem poderia afirmar isso? E, na verdade, afirmar que essa criança foi salva

porque o procedimento foi feito de uma forma urgente é absolutamente enganador.

Não foi esse o objetivo do Dr. Chioro.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - Sr. Presidente, quero formular

uma questão de ordem a V.Exa.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Pois não.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - Temos de fixar um prazo para

o expositor falar, porque daqui a pouco vai ter início, no plenário, a Ordem do Dia.

Acho também que ninguém veio aqui discutir questões técnicas com o Dr. Daniel

Tabak. Quero discutir, aí sim, o que me cabe. Então, se não fixarmos um tempo, a

Ordem do Dia vai começar e esta reunião terá de ser encerrada.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Por sinal, já começou. Não

houve votação ainda. Vamos continuar a reunião.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - Então, solicito a V.Exa. que

fixe um tempo para o expositor.

Acho que devem ser prestados alguns esclarecimentos sobre essa crise do

INCA, que, no meu entendimento, é muito mais profunda do que essa discussão

sobre o Centro de Transplantes. Ela provém de uma briga entre dois grupos. Por

isso, quero ter a oportunidade de falar.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Sem dúvida, e o Dr. Daniel

vai prestá-los, embora já tenha feito uma longa exposição.

O SR. DANIEL TABAK - Vou concluir, Sr. Presidente. Na verdade, tive a

oportunidade, nessas questões, de responder a maioria das perguntas e, a meu ver,

as mais importantes.

As filas sempre foram abertas. O convite sempre esteve presente para o Dr.

Diogo, ou qualquer um, ir ao REDOME. Não aceito a crítica de que era um sistema

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fechado. Não sou o superpoderoso da fila. Nunca fui nem sou insubstituível. Mas o

sistema, sem a Dra. Iracema Salatiel e sem financiamentos, fica inviabilizado.

Além disso, nunca houve nenhuma diferença em relação à parte pública e à

parte privada.

Em relação ao financiamento, o programa nunca teve orçamento. Pedimos,

sim, que o programa iniciado em 2003 fosse diferente de situações anteriores.

Infelizmente, isso não aconteceu.

Acho que posso parar por aqui.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Muito bem, Dr. Daniel

Tabak.

O nosso horário está ficando realmente apertado?

Deputada Angela Guadagnin.

A SRA. DEPUTADA ANGELA GUADAGNIN - Dr. Daniel Tabak, no seu

artigo, o senhor escreveu a expressão "falta de recursos" do mesmo jeito que o

senhor se referiu aqui à falta de recursos várias vezes. O senhor poderia nos

informar quanto foi repassado ao Ministério da Saúde nos últimos anos, em 2003,

em 2002, em 2001?

Outro ponto mencionado pelo senhor, na sua fala inicial, foi a "falta de

reajustes das tabelas". Escrevi aqui a frase dita pelo senhor.

Desde quando não foi feito esse reajuste?

Em relação a essa dificuldade na tabela de procedimentos e nos reajustes,

quem solicitava ao Ministério da Saúde o repasse desses recursos necessários?

Como é que eram feitos os repasses desses recursos? Faço estas perguntas porque

várias vezes o senhor se referiu à falta de recursos, mas não ficou claro quem fazia

a solicitação dos mesmos, desde quando esses recursos não tinham reajuste e

quais eram os valores repassados.

O senhor disse também que não houve pagamento para os doadores

nacionais, que os custos eram pagos com recursos do próprio Fundo e que o INCA

não pagava nem recebia do Ministério da Saúde os recursos para os doadores

nacionais. Quem assina essas portarias referidas pelo senhor e que não

contemplam o doador nacional?

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O senhor, em algum momento, apresentou denúncia de que não havia

recursos para os doadores nacionais?

Essa pergunta tem relação com os recursos mencionados pelo senhor,

incluídos no seu artigo, como se, em 2003, os pacientes não pudessem ter sido

operados, mesmo tendo sido salvos, como disse o Deputado Henrique Fontana. O

senhor mesmo questionou essa situação, porque só são considerados salvos depois

de três anos de sobrevida.

Outra pergunta: o senhor disse várias vezes que não é onipotente, que não é

dono da lista. Entretanto, durante outro momento de sua fala, na primeira fala —

anotei a primeira vez em que o senhor se reportou a isso —, o senhor se referiu aos

pacientes encaminhados à lista do REDOME. Como esses pacientes eram

encaminhados? Quem colocava o nome desses pacientes na lista do REDOME?

Quem determinava as pesquisas a serem feitas? E elas eram feitas em relação a

todos os pacientes que estavam na lista? Nessa última fala, o senhor mencionou a

demora. No entanto, em relação ao último paciente ao qual o senhor se referiu, foi

dito que em um mês foi achado um doador. Especificamente, essa paciente arranjou

um doador em um mês? Todos os outros pacientes que estavam na lista não

tiveram doadores? Não foram feitas pesquisas? Ou não houve recursos para esses

pacientes pesquisados? Por que o senhor não solicitou recursos específicos para

esses pacientes cujas pesquisas tinham sido feitas, podendo ser encontrados

doadores para eles?

Em relação ao seu artigo, o senhor cita a rapidez na liberação dos 24 milhões.

O Deputado Henrique Fontana também se reportou ao seu artigo. O senhor

apresenta um número aleatório. O senhor disse que esse número é aleatório. Por

que 360 mil é aleatório e um milhão não é? O senhor se baseou em quais números?

Alguns são aleatórios; outros não?

Seria o caso, então, se o Ministério vem propondo aumentar a lista de

doadores nacionais, de facilitar procedimentos e diminuir custos, conforme disse o

senhor?

Nesse período todo em que o senhor esteve à frente do CEMO foi realizada

alguma campanha? Foi adotada alguma atitude para aumentar o número de

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doadores, já que o senhor afirma que o número é pequeno para atender a essa

demanda por cirurgias?

Outros Deputados também se referiram à Dra. Iracema. Ela é ou não

imprescindível? Acho que, num sistema de saúde, todo mundo é necessário. O

senhor é necessário, assim como a Dra. Iracema, outros funcionários do CEMO e do

Ministério da Saúde. Mas a presença dela é imprescindível? Quer dizer, ela nunca

tira férias, não fica doente, não pode falhar nunca. O sistema vai deixar de funcionar

caso isso ocorra? E os pacientes da lista, então, se ela faltar, como é que ficam? Se

ela faltasse antes de sexta-feira, no período em que estivesse de férias ou doente?

Ela nunca teve um neném, nunca ficou doente, ou um filho dela nunca ficou doente?

Como é que ela poderia dar continuidade ao tratamento desses pacientes?

E essa relação de devoção a que o senhor se referiu, até com muita

veemência, o que eu entendo, de falar da sua vida nesse tempo todo? Refiro-me à

relação, como disse a Deputada Laura Carneiro, com o seu filho e todos os cuidados

que se deve ter. Nós até entendemos a sua empolgação, essa fala de forma mais

exacerbada da situação.

Em relação à fila, e o senhor disse que não é onipotente, que não era só o

senhor que determinava quem deveria fazer os exames, que isso era transparente.

Então, qual a razão de fornecer, no início de 2003, reiterada aqui algumas vezes,

essa informação.

O senhor disse claramente para nós todos que não era somente o senhor que

detinha esse conhecimento, que ele era público e que qualquer um podia acessá-lo.

E ninguém está falando de público de Internet, nem de paciente que é filho de negro

com japonês, que é o primeiro da fila. Ou seja, ele não vai entender por que quem

estava na fila depois dele vai... Estamos falando de um órgão do Ministério da

Saúde que, teoricamente, deveria ser o responsável pelos transplantes e que havia

solicitado essa informação várias vezes, e, pelo que pudemos entender, continuou

solicitando e não obteve respostas.

São indagações que anotei durante a exposição e que desejava fazer.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Com a palavra o Deputado

Neucimar Fraga.

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O SR. DEPUTADO NEUCIMAR FRAGA - Sr. Presidente, cumprimento

V.Exa. e os nobres colegas. Agradeço ao Sr. Daniel Tabak a participação neste

debate. Trata-se de assunto importante e algumas declarações feitas aqui por

alguns Parlamentares e pelo Dr. Tabak só vêm comprovar aquilo que já vínhamos

discutindo há 9 meses: as irregularidades no Sistema Nacional de Transplantes.

Desde março de 2003, vimos denunciando, na Comissão de Segurança, da qual faz

parte a Deputada Laura Carneiro, problemas que ocorrem no Sistema Nacional de

Transplantes. E eles não começaram em 2003; são problemas antigos, haja vista os

inúmeros processos abertos no Brasil, muitos parados em algumas cidades. Existem

denúncias da participação de médicos em irregularidades, como o desrespeito à fila

dos transplantes e o assassinato de pacientes para retirada de órgãos, além de

fraudes ao Sistema Único de Saúde, SUS, por algumas agências centrais de

transplantes.

Durante todo esse tempo, fomos contestados, inclusive no texto do Dr. Diogo,

no qual afirma que o Sistema Nacional de Transplantes funciona perfeitamente, sem

nenhuma irregularidade, sem nenhum problema. Fomos rebatidos também pelo

Ministro, que confia na palavra do Dr. Diogo, que já estava lá antes de S.Exa.

assumir a Pasta da Saúde. O Ministro não tem necessariamente obrigação de

conhecer tudo sobre transplantes e confiou em um profissional que já estava lá. A

imprensa também afirmou várias vezes que o Sistema Nacional de Transplantes

funcionava bem, que não havia irregularidades e que a população brasileira podia

ficar tranqüila.

Fomos contestados durante todo o ano. Alguns diziam que essas denúncias

de irregularidades no Sistema Nacional de Transplantes iriam atrapalhar as doações

de órgãos no País. Dizíamos o contrário; dizíamos que, a partir do momento em que

a população tivesse consciência de que o Sistema é sério e que presta assistência

de maneira competente, que os denunciados estão sendo investigados e punidos,

com certeza haveria mais segurança no processo de doação.

Tudo isso ficou comprovado, porque 2003 foi o ano em que o Sistema mais

sofreu denúncias e o número de doações não caiu no País; pelo contrário, aumentou

em 14%. Quer a população que os representantes da área de Saúde, as autoridades

brasileiras e nós, Parlamentares, tenhamos a responsabilidade de investigar

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qualquer denúncia que ocorra no Sistema. Discutimos aqui um problema tão sério e

que envolve muito dinheiro.

Segundo reportagem da revista Época, de 19 de janeiro, a salvação para

milhares de brasileiros que hoje estão na fila, aguardando para fazer exame, está

sendo jogada no lixo. A solução do problema de transplante de medula óssea no

Brasil está sendo jogada no lixo. Está aqui, na revista Época: “A salvação jogada no

lixo”.

Segundo ainda essa reportagem, temos no Brasil, conforme dados do IBGE,

cerca de 3 milhões e 500 mil registros de natalidade por ano. Sabemos também que

o sangue do cordão umbilical de milhões de crianças nascidas no Brasil poderiam

salvar milhares de vidas. Em vez de importarmos sangue de cordão umbilical,

poderíamos exportar, tendo em vista que a taxa de natalidade da União Européia é

bem menor que a nossa. No entanto, importamos esse produto somente de países

da União Européia.

Ou seja: jogamos a solução do problema na lata de lixo.

Vou ler pequeno trecho da reportagem:

“A cada nascimento, o mais nobre dos resíduos

biológicos vira lixo hospitalar na maioria da maternidades

brasileiras. O sangue encontrado no cordão umbilical e na

placenta é rico em células-tronco, capazes de repovoar a

medula óssea de quem sofre de leucemia. Verdadeiros

curingas orgânicos, essas células têm ainda o potencial

de se transformar no futuro em vários tecidos do

organismo. Celebradas pelos cientistas como a grande

promessa de cura de doenças nas próximas décadas, as

células-tronco são desprezadas no País por falta de

investimento em coleta e armazenagem. Paradoxal é que

o Brasil gasta milhares de dólares para importar de

bancos estrangeiros o sangue de cordão umbilical que

joga fora todos os dias.”

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Quero fazer uma pergunta ao Dr. Daniel Tabak, que está à frente do Sistema

há 17 anos. Não sei se partiu de S.Exa. a iniciativa, em 2001, de criar o primeiro

banco de dados de sangue de cordão umbilical no País. Desde então até 2003,

foram feitos 4 mil cadastros e aproveitados menos de 300 até hoje. Quero fazer essa

pergunta porque já surgem denúncias, também no Brasil, de que aqui não faltam

doadores; falta, sim, eficiência no sistema de transplantes para que as doações

disponíveis sejam aproveitadas e se salvem vidas no País. Encontramos esse

problema não só nos transplantes da medula óssea, mas em todo o sistema de

transplantes, seja de rim, seja de fígado, seja de coração, seja de pulmão. Só em

2002, aqui em Brasília, 98 corações estavam disponíveis para transplante e foram

jogados no lixo pela Rede Hospitalar do GDF. O coração que salvou Norton

Nascimento foi rejeitado pelos médicos que realizavam transplantes no Rio de

Janeiro, o que vem comprovar essas denúncias que vêm sendo apresentadas em

relação ao Sistema.

Ainda bem que o Ministro percebeu a necessidade de se ter no comando do

Sistema uma pessoa responsável, compromissada e conhecedora dos problemas.

Todos desejamos um Sistema Nacional de Transplantes capaz de realmente

proporcionar à população brasileira, principalmente àqueles que estão na fila, a

solução dos seus problemas.

Pergunto: durante todo esse tempo, por que o Sistema Nacional de

Transplantes e o Ministério da Saúde não foram motivados a aproveitar esses

materiais disponíveis no Brasil? Por que não foram utilizados esses cerca de 3

milhões e meio de registros de natalidade por ano para salvar vidas, tendo em vista,

segundo a mesma reportagem, que, com apenas 12 mil cadastros, teríamos

condições de resolver todo o problema de compatibilidade existente no País? Por

que, durante todo esse tempo, o Sistema Nacional de Transplantes não tomou

essas providências? Por que o Sistema, sabendo da dificuldade de encontrar

doadores, não incentivou o aproveitamento desse material?

Sabemos que, em 2001, o INCA criou um sistema. Ou seja, cadastrou 4 mil,

mas apenas 300 estão disponíveis para serem objeto de pesquisa e, em seguida,

disponibilizados para doação e transplante de medula óssea.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Obrigado, Deputado. Passo

a palavra ao terceiro inscrito, Deputado Fernando Gabeira. Vamos fechar mais um

bloco com três Deputados. Faltam ainda cinco inscritos.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - O senhor poderia dar a ordem

desses 5 inscritos, só para termos uma idéia?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Alguns saíram para ir ao

plenário, mas a ordem dos Deputados é a seguinte: Serafim Venzon; Dr. Rosinha,

que não está presente no momento, mas assistiu à audiência toda; Dr. Pinotti; Dr.

Francisco Gonçalves e Dr. Alexandre Cardoso. São 5 médicos agora, no último

bloco.

Com a palavra o Deputado Fernando Gabeira.

O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA - Como não sou médico, Sr.

Presidente, vou falar sobre política. Vejo com muita tristeza esse processo que está

acontecendo no Brasil. Acho que faz parte de uma ruína em que o Brasil começa

rapidamente a entrar. E ela, para mim, não é a queda do Produto Interno Bruto, nem

a ruína moral que o Dr. Fábio Comparato menciona, mas o domínio de uma visão

burocrática que realmente vai trazer para o Brasil graves conseqüências.

A primeira crise no INCA foi resultado disso, e o Dr. Tabak não está sendo

visado neste momento apenas por isso. O Dr. Tabak já teve um problema com o

Governo. E que problema foi esse? Em determinado momento, o Governo decidiu

colocar seus aliados na direção do Instituto Nacional do Câncer. Não vou discutir a

legitimidade dessa medida.

O Presidente Lula foi eleito com 53 milhões de votos e decidiu que ia colocar

suas equipes e o fez. Deveria antes, mesmo quando se decide desfazer

rapidamente a memória de uma instituição, ou a excelência dela, submeter sua

equipe ao crivo do julgamento dos que a estão examinando. Quer dizer: o

Presidente Lula tem todo o direito de colocar quem quiser onde quiser, mas quem

ele coloca em determinado lugar tem que se submeter à crítica e ao exame das

pessoas que estão avaliando.

Quem o Presidente Lula, ou o Ministro da Saúde, colocou no INCA? Um

homem extraordinário na Presidência, Dr. Jamil Haddad, mas que não trabalhava

especificamente nesse campo. É um grande médico. Acho que isso demonstra um

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problema da Esquerda: existe uma superavaliação do potencial do quadro político,

achamos que o quadro político colocado em qualquer circunstância pode resolver o

problema. Isso não é verdade, porque muitas vezes é necessário que o quadro

político tenha capacidade específica de dirigir determinado lugar. Então, foi um

desastre. E ele não parou aí. Foi escolhida para dirigir a parte financeira, se não me

engano, a parte de compras do INCA, uma pessoa que já tinha tido problemas. A

suposição é de que, sem que o Presidente soubesse, já se estava instalando ali um

esquema extremamente perigoso. Ele não se realizou, mas trouxe alguns

problemas, como o atraso das compras, que não foram regulares, como pudemos

observar pelos jornais.

O Dr. Tabak, pelo que acompanhei nos jornais, foi o líder do movimento, ou

um dos líderes do movimento, no Hospital do Câncer, que combateram essa

perspectiva. Ele foi imediatamente considerado adversário político. Houve

continuidade nesse processo, e a divergência política entre o Dr. Tabak e o

Ministério da Saúde se arrastou pelo tempo.

Pelo ocorrido aqui, poderíamos raciocinar: se é verdade que o Vice-

Presidente, José Alencar, não cometeu um erro muito grave, também é verdade que

a Dra. Iracema Salatiel e o Dr. Tabak não cometeram erro muito grave; no entanto,

eles foram afastados. E foram afastados por quê? Não importa se ele tem 17 anos

de trabalho, se é considerado um dos mais competentes do Brasil nessa área; não

importa se a Dra. Iracema é funcionária pública exemplar, que se dedica

completamente: eles foram afastados porque não foram obedientes. É isso!

Precisamos começar a trabalhar no Brasil com pessoas não obedientes. Temos que

aprender isso, porque senão será um desastre: uma burocracia terrível colocando

pessoas obedientes e medíocres em todos os pontos, transformando este País

numa tristeza, como vem ocorrendo ao longo deste Governo. Então, essa é a

questão fundamental.

Por que não há uma pessoa no Governo para falar assim: “Vamos solucionar

essa crise, vamos fazer com que o Vice-Presidente recupere seu prestígio, porque

não cometeu erro muito grave, mas vamos também, guardadas as proporções,

manter os quadros fundamentais, quadros que são memória, conhecimento e

horizonte para nós”. Mas ninguém fala nada. Por quê? Primeiro, porque alguns

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querem disputar o lugar; segundo, porque, não interessa, tem que colocar pessoas

obedientes, que falem tudo o que eles querem. O resultado é o desastre.

Constatamos esse desastre na Câmara dos Deputados, onde o Governo,

para se impor, tem que, evidentemente, trabalhar com setores que não trabalharia

no passado e precisa utilizar todos os métodos no passado.

Então, é preciso que um raio de política caia neste Governo, que alguma

coisa caia neste Governo, que eles digam: “Não, vamos superar esse fato, sem

sacrificar o Vice-Presidente, que, evidentemente, não precisa ser sacrificado, nem

os bons funcionários, nem o Instituto Nacional do Câncer, nem o Sistema Nacional

de Transplantes”. Isso não é impossível.

Assistimos aqui — e vejo a bancada do Governo organizada para fazer

perguntas, para questionar — ainda a um confronto, porque dizem: “O senhor tem

uma clínica privada? O senhor...” Quando o Dr. Tabak fez a denúncia, a Deputada

Maninha — que diz que não levanta denúncias contra ninguém — foi aos jornais

dizer que ele tinha uma clínica privada. Foi a primeira coisa que ela fez.

Essa tática eu conheço desde menino, porque eu vi, eu leio desde menino, eu

conheço a história da burocracia e do estalinismo. Essa é a tática mais comum, ou

seja, culpar a vítima e imediatamente partir para cima dela. É isso a que estamos

assistindo. Por que o Governo ao invés de tentar buscar as pequenas

desonestidades do Dr. Tabak, ou qualquer pequena desonestidade de qualquer

pessoa, não diz: “vamos resolver esse problema politicamente”? Mas o que nós

temos é uma mediocridade muito grande, um Ministro incapaz de chegar e dizer

“vou resolver esse problema, chama o Dr. Tabak, chama a Dra. Iracema”. Ele

poderia dizer: “Qual é o problema? Vamos resolver.” Mantém os dois, mantém o

sistema, melhora o sistema, estabelece um controle do Governo maior sobre o

sistema sem nenhuma perda.

Estamos vendo o Governo sangrar. Pensa que está atacando o Dr. Tabak,

mas ele sangra. Alguém precisa dizer: “Gente, vamos voltar...” Eu já não posso mais

fazer isso, porque, em boa hora, abandonei este Governo. Mas alguém de dentro do

Governo tem de dizer que eles precisam ter um pouco mais de bom senso, que eles

precisam deixar de lado essa loucura burocrática, essa vontade de assumir todos os

cargos, de prestar serviço ao Governo de qualquer maneira. Isso tem de ser

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superado, porque transformaram um partido maravilhoso, base da história política

moderna do Brasil, em um conjunto de pessoas que abaixam a cabeça. Isso é uma

pena. É uma pena a que estamos assistindo.

Acho que deveríamos, em primeiro lugar, por meio de todas as perguntas,

superar o problema e tentar fazer com que esta Comissão Especial não se

transforme em uma comissão de denúncias contra o Ministro, contra o Vice-

Presidente, ou contra o Dr. Tabak. Creio que deveríamos oferecer, em nome da

Comissão, com a ajuda dos companheiros do Governo, uma proposta para o

sistema funcionar bem, aproveitando os quadros existentes.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Muito bem, Deputado

Fernando Gabeira. Creio que realmente a intenção desta Comissão é apurar os

fatos e contribuir com lucidez. E, como sempre, a sua intervenção foi importante.

Só para emendar o que disse o Deputado aqui, quero dizer que geneticistas

em nosso País são poucos e os dispostos a dedicar sua vida inteiramente à causa

pública ou ao INCA são muito menos ainda. Então, só reforçando o que disse o

Deputado Fernando Gabeira, realmente temos de valorizar esses profissionais,

esses servidores públicos.

Passo a palavra ao Dr. Tabak, para responder as três intervenções.

Antes, porém, quero avisar que não queremos interromper a reunião, até

porque ela está ficando cada vez mais produtiva. Contudo, durante votação nominal

no plenário, qualquer Deputado poderá votar.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES - V.Exa. não poderia suspender por

uns 10 minutos esta reunião?

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - O rodízio é melhor, Deputado

Eduardo Paes. Pela experiência, o rodízio é melhor.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - É melhor o rodízio. Eu, por

exemplo, vou justificar depois minha ausência em plenário.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - Sr. Presidente, como foi

citado o Dr. Jamil Haddad, vou solicitar a V.Exa. cópia do inquérito que corre na

Polícia Federal sobre os desvios no INCA antes da posse dele. Além disso, que os

funcionários citados nos dois processos fossem chamados aqui, a fim de sabermos

a quem eles são ligados — tudo antes da posse do Dr. Jamil Haddad. Ou seja,

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saber se, no inquérito da Polícia Federal, há dois funcionários do INCA envolvidos e

denunciados antes da posse do Dr. Jamil Haddad.

Depois, vou apresentar um requerimento sobre a Fundação Ary Frauzino.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - V.Exa. vai trazer o

requerimento oportunamente.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - Quero saber se, na Polícia

Federal, no Rio de Janeiro, existe algum processo sobre desvio de recursos no

INCA, antes da posse do Dr. Jamil Haddad, se há funcionários daquele Instituto

envolvidos, e saber a quem eles estão ligados.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Vamos fazer, embora seja

uma comissão externa.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - É importante saber se antes

da posse do Dr. Jamil Haddad existia isso.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Lógico, somos uma

Comissão Especial e temos autoridade para solicitar essas informações.

O SR. DEPUTADO NEUCIMAR FRAGA - Sr. Presidente, pela ordem. Tendo

em vista que a Deputada não está presente, retirou-se para votar, quero solicitar, se

possível, que a minha pergunta seja respondida logo, deixando a dela para depois,

porque, em seguida, irei votar também.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Perfeitamente. V.Exa. está

muito envolvido com a situação dos transplantes. Aliás, com muita razão, pois estão

surgindo fatos que justificam plenamente essa preocupação. Assim, a sua pergunta

poderá ser respondida de imediato. Claro, a critério do Dr. Tabak, mas acho que

S.Sa. vai querer responder primeiro a sua pergunta.

Com a palavra o Dr. Tabak.

O SR. DANIEL TABAK - Agradeço ao Deputado Neucimar Fraga por ter

abordado os bancos de células de cordão umbilical. Essa questão é extremamente

importante, porque a vinda e a introdução das células de cordão umbilical trazem

uma nova variável — infelizmente a Deputada Angela não está presente, mas vou

mencionar isso posteriormente — para definir o número de doadores.

Novamente são questões técnicas, mas a possibilidade da utilização das

células de cordão umbilical é muito maior não só pela disponibilidade desse material,

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muito mais imediata que a dos próprios doadores, mas também pela própria

caracterização delas. Considerando que as células de cordão umbilical são mais

imaturas, elas, na verdade, podem ser utilizadas por um número maior de pessoas.

Então, a compatibilidade das células de cordão umbilical é potencialmente muito

maior. Assim, ao definir o número de doadores, se não considerarmos as células de

cordão umbilical, o número talvez seja menor. Vou entrar na questão dos números

quando a Deputada Angela voltar.

Como disse, as células de cordão umbilical são desperdiçadas. Somente em

julho do ano passado foram regulamentados pela ANVISA o processo e a

normatização de funcionamento dos bancos de células de cordão umbilical.

Infelizmente, no Brasil, já se criou uma situação de dicotomia, ou seja, foram criados

bancos públicos e privados. Pior ainda, o único banco público em funcionamento é o

do INCA. A situação é ainda mais curiosa porque os bancos privados somente

congelam células para aquelas gestantes. Então, a pergunta é a seguinte: por que

uma gestante teria células de cordão umbilical congeladas para os seus filhos? Qual

a possibilidade de esse material vir a ser utilizado por ela mesma?

Se utilizarmos os dados de 1999 da Sociedade Americana de Pediatria,

verificaremos que os números e a possibilidade de utilização variam de 1 para 20 mil

a 1 para 200 mil. Na verdade, a estratégia dos bancos de células de cordão umbilical

de congelar esse material pela módica quantia de 4 mil reais pelo procedimento,

mais 300 reais anuais para manutenção, de alguma maneira se reflete em uma

propaganda enganosa, porque a possibilidade de ela vir a utilizar tal material é muito

pequena. No entanto, o funcionamento desses bancos já foi autorizado e está

garantido.

(Não identificado) - Foi autorizado pelo SUS?

O SR. DANIEL TABAK - Não, os bancos privados são normatizados para

funcionar...

(Não identificado) - Pelo Ministério da Saúde?

O SR. DANIEL TABAK - A ANVISA é um órgão do Ministério da Saúde.

Obviamente, só vai congelar as células quem tiver 4 mil reais, e quem estiver

“pensando”, entre aspas, no futuro.

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Muito bem, a verdade é a seguinte: para que servem essas células

congeladas? Vimos — e não tive tempo para dar essas explicações — que o

transplante de medula óssea cura principalmente quando as células são de uma

outra pessoa; quando as células são da mesma pessoa, as chances de curabilidade

são muito pequenas. Então, na verdade, para que guardar células para tratar

leucemia?

E tem mais um detalhe. Hoje, existem estudos que mostram que crianças que

desenvolvem leucemia 10 anos depois do nascimento, no momento do nascimento,

já têm células pré-leucêmicas. Então, imaginem que coisa absurda congelar células

que, na verdade, daqui a 10 anos, serão células doentes!

Então, para que serve o congelamento? Se as células forem utilizadas no

banco público, elas potencialmente podem ser usadas hoje. Assim, é claro que

existe a necessidade de se regulamentar os bancos hoje. Claro, porque elas criam

uma nítida alternativa para os doadores. Então, investir em bancos públicos de

doadores de células de cordão umbilical faz todo sentido. Já em bancos privados,

não. Curiosamente, existem os seguintes bancos privados: um, no Hospital

Português; um, no Rio de Janeiro; um, em São Paulo, em formação. O único banco

público existente é o do INCA, que atende a duas maternidades. Na verdade, não

conseguimos realizar tudo. Imaginem coletarmos células em todo o Brasil. Seria

ótimo se todo o potencial, se todos os poderes fossem atribuídos a nós. Ficaríamos

extremamente felizes de atender número maior de pacientes; infelizmente, não os

temos, o nosso sistema é engessado.

O SR. DEPUTADO NEUCIMAR FRAGA - Dr. Daniel Tabak, em quanto

conseguiríamos diminuir o custo desse sistema? Ou seja, em vez de importarmos,

ter o nosso próprio banco de sangue de cordão umbilical?

O SR. DANIEL TABAK - Apesar de importante, não temos essa informação.

É certo que o custo real desse programa será muito alto. Garantir tanques grandes

de nitrogênio para preservar células em número crescente seria muito difícil. É claro

que todo esse processo já foi analisado, os números de cada unidade já foram

feitos; precisaríamos apenas de uma grande equipe de economistas, projetistas e

planejadores para definir essa questão. Não tenho nenhuma pretensão, porque seria

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extremamente perigoso, de lhes apresentar um número. Será necessária análise

detalhada de pessoas que entendem do assunto. É claro que a questão é pertinente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Dr. Daniel Tabak, V.Sa. está

dizendo que a indicação de guardar células umbilicais para transplante autológico é

muito pequena. Ela seria útil se houvesse o banco de sangue, mas para usá-la em

geral, no banco de doadores?

O SR. DANIEL TABAK - Exatamente. Corremos o risco, inclusive, caso se

fortaleça a idéia da iniciativa privada, de alguém, um dia, chegar com um tipo de

requerimento com o seguinte argumento: se é bom para o privado, é bom para

todos. Neste caso, cada um teria o seu sangue congelado ao nascer. Isso

inviabilizaria o sistema não só porque não o teríamos como financiar, mas porque

nunca mais teríamos células de cordão umbilical para tratar leucemia, que é o que

mais nos interessa.

Além disso, a grande questão a ser levantada será: realmente, daqui a 20

anos ainda estaremos usando esse sistema? Não precisa ser nenhum gênio para

imaginar que, felizmente, daqui a 20 anos, não estaremos discutindo transplante de

medula óssea como imaginamos, com lista de espera, etc. Certamente, teremos

alternativas muito mais inteligentes. Esperamos estar discutindo, sim, mas,

certamente, de forma diferente.

O SR. DEPUTADO NEUCIMAR FRAGA - Sr. Presidente, peço licença para

me retirar, a fim de participar de votação.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Fique à vontade,

Excelência.

O SR. DEPUTADO SERAFIM VENZON - Sr. Presidente, Deputado Rafael

Guerra, permita-me, com um aparte, cumprimentar o Dr. Daniel Tabak.

Tive a sorte de ser inserido na lista dos bandidos célebres do País, ao lado do

Vice-Presidente da República, justamente por ter tentado, na ignorância ou na

inocência, ser solidário a todos que me pedem alguma coisa não só na área da

Saúde, mas na do Ministério das Cidades, na do Ministério da Justiça, na do

Ministério da Previdência. Naturalmente, como é do conhecimento de V.Sa., foi o

que ocorreu com uma das pacientes, a catarinense de 13 anos, que fará o

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transplante no dia 13 de março, citada nessas denúncias: tínhamos a intenção de

ajudar.

Entendo, Sr. Coordenador, que, quando precisa haver a interferência de

alguém — e isso em qualquer situação não apenas na Saúde, mas principalmente

nessa área —, quando alguém ajuda é porque o sistema não funciona por si só e

precisa da nossa interferência.

No caso da moça catarinense, o que senti, da parte do Ministério, foi um

sentimento de solidariedade e profissionalismo, principalmente de alguns de seus

funcionários, dos quais não me lembro os nomes no momento, e da Dra. Iracema —

não a conheço nem de vista —, que foi extremamente carinhosa com o caso que lhe

foi apresentado, dando-lhe uma solução não de pressa, porque se tratava de um

diagnóstico feito em junho de 2003 e autorizado o pagamento do procedimento pelo

Ministério em janeiro de 2004. Ou seja, não estava pulando a fila, pelo que entendi.

Aliás, no caso de transplante, é difícil o cidadão comum imaginar uma fila.

Geralmente se reporta às filas que conhece: do mercado, do cinema, dos bancos.

Trata-se, no caso, de fila de transplante. Quando se desrespeita as filas que citei

anteriormente, imagino que, com muita razão, as pessoas devem ficar muito

indignadas. No caso de transplantes é diferente. Por outro lado, surge a seguinte

situação: onde a família do paciente e o próprio paciente devem buscar a segurança,

a confiança de que não estão sendo ultrapassados, se o transplante é algo

complexo? O próprio Dr. Daniel Tabak deu a resposta. Disse que eles terão que

confiar no seu médico. E, mais, que esse médico não chame o seu paciente por um

número — número 2, número 3, número 4 —, mas pelo nome. É assim que imagino

devam ser tratados os pacientes de transplante.

De tanto discutir e perceber a deficiência do sistema brasileiro de

transplantes, também descobri, não sei se equivocadamente, que o Brasil é o

segundo País do mundo em transplantes. Conclui-se, então, que, se aqui vai mal,

deve haver lugar em que a situação é pior. O transplante, no âmbito da medicina,

está engatinhando, apesar de observarmos grandes resultados de transplantes de

rim, de pâncreas, de medula, de coração e outros órgãos. A televisão sempre nos

mostra os 30%, 40% que dão certo, nunca nos mostra as guerras perdidas, as

mortes. Então, não se pode fazer guerra em transplantes, afirmando-se que essa é a

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única alternativa, já que, muitas vezes, aquele ato cirúrgico significará o final da vida

do paciente.

Precisamos encontrar um jeito de melhorar o sistema de saúde como um

todo, principalmente na área de transplantes. Quando falamos em lista de pacientes

de transplantes, aproximadamente 58 mil, sabemos que o procedimento é caro,

bem mais caro do que muitos outros. Se de um lado custa muito dinheiro, devemos

analisar mais as prioridades, não só do Governo Federal, mas dos governos

estaduais e municipais.

Por que é muito difícil a Saúde tornar-se prioridade? Até compreendo o

problema da fila de transplantes e a sua demora. Difícil é compreender a fila da

hérnia. Por exemplo, um paciente diz que precisa ser operado para ser admitido por

uma empresa para receber um salário de 1.500 reais; caso não seja operado, não

será admitido. Se alguém me procura para reclamar que precisa desse tipo de

cirurgia, é porque ela não está sendo realizada.

E quantos pacientes precisam operar o tornozelo, o joelho, a mão, e essas

cirurgias ortopédicas não acontecem? Há uma fila de transplantes multiplicada por

10, 20, que não é oriunda deste Governo, mas de vários, que nunca foi resolvida.

Será que a Saúde não se tornará prioridade neste Governo? Poderíamos resolver o

problema das filas caso fosse apenas de dinheiro. Com menos de 1 bilhão de reais,

certamente, faríamos todos os transplantes, não só de medula, mas de fígado, rim,

coração etc. Até parece muito dinheiro.

Este ano, os membros desta Comissão participaram das reuniões vestidos de

branco com a intenção de salvar 3 bilhões e 600 mil reais destinados à área de

saúde. É que, por interpretação da Advocacia-Geral da União, 3 bilhões e meio

deveriam ser destinados à Saúde. Essa quantia que salvamos seria suficiente para

resolver o problema de dinheiro dos transplantes e ainda sobrariam 2 bilhões e 600

mil reais. Houve quem comparasse essa questão ao avião do Presidente. Entendo

que o Presidente deva viajar em avião seguro, mas o Brasil comprar 12 aviões de

guerra ao preço de 2 bilhões e 400 milhões de reais, o equivalente a três vezes o

recurso necessário para a realização de todos os transplantes? Caso não

investíssemos tudo isso em transplantes, o quanto não poderíamos fazer em outras

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áreas, realizando cirurgias que melhorariam a qualidade de vida e dariam condições

de trabalho para muita gente?

Dr. Daniel, Sras. e Srs. Deputados, o transplante virou discussão nacional. O

Jornal Nacional, da Rede Globo, veiculou essa matéria durante quatro dias por 10

minutos. Não há quem não tenha ouvido falar de transplante. Até o piloto, em

viagem aérea, pediu aos passageiros que revejam seus conceitos de transplante.

Ou seja, todo o Brasil ouviu falar dessa questão. E as pessoas não conhecem

pessoas que precisam de transplante, mas quando precisam fazer exame de

glicemia no posto de saúde, para controlar a diabete, só conseguem marcar consulta

para o outro mês. Ou seja, nem sabem se o transplante funciona em outro lugar,

mas querem operar a hérnia e não conseguem. E assim por diante. Portanto, este é

o grande momento de o Brasil discutir com a sociedade a “priorização” da Saúde.

O que o Ministro Humberto Costa faz com aquela verba destinada à Saúde é

um milagre. Não sei como S.Exa. consegue estimular as equipes médicas de todo o

Brasil a manterem o atendimento por valores insignificantes. Paga-se apenas 200,

300 reais por cirurgia. Ainda assim, muitas cirurgias não estão sendo feitas devido à

limitação de AIHs, à falta de orçamento. Temos que conseguir não apenas 3 bilhões

e 600 milhões de reais a mais, mas 10, 12, 15 bilhões para resolver não só o

problema dos transplantes, mas de diversos procedimentos cirúrgicos.

Todos nós precisamos rever o Orçamento, mas cabe ao Governo eleger a

prioridade, usar a mídia para anunciar que não está fazendo estradas, mas que está

operando mil, 2 mil pessoas, para justificar gastos. Realmente deve haver essa

justificativa da parte do Governo.

Prezado Dr. Daniel Tabak, parabéns a V.Sa. pelo trabalho realizado à frente

dessa coordenação.

Tenho certeza de que, sobre essa questão, ressalvadas as já abordadas pelo

Dr. Tabak, pela Dra. Iracema e outros, que imaginam estar sendo incompreendidos

por muita gente, todo o Brasil tirará bons frutos da situação gerada na área da

saúde.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Informo que a Deputada

Angela Guadagnin retornou à Comissão.

Com a palavra o Dr. Daniel Tabak.

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O SR. DANIEL TABAK - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, aproveito a

oportunidade para reintroduzir várias indagações levantadas aqui.

Todo esse processo foi desencadeado porque o sistema foi desestruturado

durante o ano de 2003. Obviamente, as dificuldades já haviam sido levantadas há

muito tempo. Não tenho nenhum tipo de pretensão de afirmar, seria ingenuidade

minha, que o sistema era perfeito. Como mencionei anteriormente, o sistema foi

desenvolvido em 1998, quando vários conhecimentos foram adquiridos. Naquela

época, não imaginávamos identificar doadores crescentes no Brasil — e esses

dados não foram levados em consideração como deveriam. Neste sentido, a

legislação precisa ser aprimorada. E até que tentamos aprimorá-la, mas surgiram

dificuldades.

Mais uma vez, apenas para demonstrar que não tive, em nenhum momento,

o objetivo de parcializar essa questão, volto a dizer que o problema no âmbito da

medicina não é partidário. E, usando novamente a imagem do piloto, ninguém, ao

entrar em um avião, perguntará, primeiramente, a que partido ele pertence. Pensará

apenas se é competente para pilotar. Portanto, a questão fundamental não é saber

se faltavam recursos antes de 2003 ou quem estava à frente do Ministério. Na

verdade, faltou recurso e enfrentamos dificuldades.

O que realmente aconteceu de grave — isto sim deve ser discutido — foi que,

ao longo de 2003, final de 2002, apareceu um indivíduo que se mostrou

absolutamente incompetente para gerenciar o sistema: o Dr. Diogo Mendes. Ele

desconhecia os credenciamentos, especialmente o da USP, em São Paulo; não

soube orientar, sob o ponto de vista do HEMOPE; não soube coordenar, sob o ponto

de vista do Hospital Português. Na verdade, não agiu sozinho, trabalhou

subordinado a outros indivíduos. Imagino que não navegava sem nenhum tipo de

orientação.

Devido às irregularidades, que chegaram a níveis insuportáveis, acabei

apresentando o meu pedido de demissão.

Respondo às indagações da Deputada Angela Guadagnin, que foi muito

delicada, e volto à primeira questão, a dos recursos. De onde surgiu esse número?

Na verdade, fomos nós mesmos que o apontamos. Observem V.Exas., ao se

lembrarem daquela primeira projeção, que estipulamos o seguinte cálculo: para

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chegarmos ao valor de 30 mil dólares, até a identificação, nos baseamos na divisão

dos recursos de 2 milhões e meio de dólares pelo número de pacientes

identificados. O nosso trabalho, juntamente com o da Dra. Iracema, permitiu que

chegássemos a uma base aproximada de quanto custaria a identificação de cada

paciente. Se multiplicarmos 600 mil dólares por 30 mil dólares, chegaremos à

quantia de 450 mil reais.

Acredito que o Ministério tenha usado essa base de cálculo. A questão

fundamental não é se isso é pouco ou muito — e sabemos que nunca é suficiente —

, mas, por que no ano passado foram liberados 1 milhão, e logo após as denúncias

foram liberados 24 milhões? Considero essa uma ótima quantidade. Concordo com

o Deputado Henrique Fontana: 24 milhões é bem melhor que 1 milhão e meio. No

entanto, não posso falar o mesmo sobre o número de doadores. De onde se tirou

esse número? Trata-se de um número fantasioso.

A questão não é se precisamos de 50 mil ou de 350 mil reais. Realmente

mencionei aquele número no artigo. Por quê? Não sei. Se a Dra. Iracema e eu não

tivéssemos perdido tanto tempo procurando recursos, teríamos feito coisa muito

mais inteligente. Sabem V.Exas. o que imaginávamos antes de começarmos a

perder tempo: qual o tamanho do registro brasileiro que precisamos ter? Custa

dinheiro identificar doador, tipar, mandar amostras, coordenar todo esse trabalho.

Para isso, usemos a seguinte referência: os registros internacionais têm entre 5 e 8

milhões de doadores. Se tivermos acesso aos registros dos Estados Unidos, no

MNDP, por exemplo, e dissermos que vamos continuar fazendo campanha para

recrutar anglo-saxões, com certeza acharão graça, porque, na verdade, não há

muita vantagem em recrutar o maior número de doadores já identificados. O que

eles querem são as chamadas minorias étnicas: mestiços, hispânicos, negros e afro-

americanos, que representam, aproximadamente, menos de 10% dos registros

internacionais, sem falar nos orientais. Sem dúvida nenhuma, eles querem a

representatividade do Brasil. Na verdade, representamos um potencial não só para o

Brasil, mas para o mundo, porque no transplante de medula óssea fazemos parte da

comunidade, do mundo globalizado.

Se custa tanto para identificar no exterior — na verdade estamos identificando

no Brasil —, qual o número de doadores no Brasil de que precisamos? Partindo-se

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dessa premissa, se conseguirmos identificar a freqüência dos aplótipos — material

genético herdado em bloco do pai ou da mãe — na população de pacientes e de

doadores, pensaremos que talvez algum geneticista consiga fazer esse cálculo. E

não serei eu quem fará isso, porque não tenho a menor idéia. Baseado nisso,

contactei um dos maiores geneticistas do Brasil, o Dr. Sérgio Danilo Pena, que tem

feito estudos sobre a freqüência das populações no Brasil. O Dr. Pena ficou

extremamente interessado nessa freqüência. Quis saber, principalmente, por que

achamos tantos no Brasil. Em vez de perdermos tempo com essas bobagens de

receber e ficar trocando e-mails, gastaríamos melhor o nosso tempo e a nossa

utilidade ao fazer esse estudo, extremamente importante não só para o Brasil, mas

para todo o mundo. Realmente perdemos tempo e deixamos de fazer um estudo

importante e definidor. Ele seria extremamente útil.

A SRA. DEPUTADA ANGELA GUADAGNIN - Um instante, Dr. Daniel Tabak.

Sobre a perda de tempo a que V.Exa. se refere, de receber e mandar e-mails, por

que esse projeto não foi feito anteriormente, já que V.Sa. disse que ele está lá desde

1987, 1989?

O SR. DANIEL TABAK - Deputada Angela Guadagnin, agradeço pelo aparte,

mas tenho de lembrá-la que o transplante não-aparentado no Brasil começou em

1988. Portanto, não nos refiramos à minha história anterior, porque naquela época

era só transplante de famílias. A história do transplante de não-aparentado no Brasil

é muito mais recente.

É extensa a documentação sobre a troca de mensagens de angústia dos que

antecederam a Dra. Iracema e o Dr. José Roberto no sentido de saberem como

esses recursos poderiam ser melhor utilizados. Elaboramos as portarias e

identificamos os problemas. É claro que havia problemas anteriores. Seria

ingenuidade dizer que tudo começou em 2003. É bobagem perder tempo com isso.

Para que perder tempo com a relação temporal? O processo é um aprendizado

contínuo. O transplante de medula óssea é modificado a cada dia. Todos os dias

aprendemos. Não tem nada a ver com Governo ou com partidos, mas com

tecnologia, com conhecimento. Não podemos nos afastar da questão fundamental.

A SRA. DEPUTADA ANGELA GUADAGNIN - Desculpe-me, Dr. Daniel

Tabak, V.Sa. está correto ao dizer que não devemos perder tempo com isso, que

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isso é contínuo. Digo isso em razão da pressão que V.Sa. sofreu, chegando ao

ponto de não conseguir trabalhar mais.

O SR. DANIEL TABAK - Claro.

A SRA. DEPUTADA ANGELA GUADAGNIN - Foi dito dessa forma porque,

se ao longo desses anos todos também não havia recurso, não havia fila, não se

pagava ao doador nacional, também não se sabia quantos deles eram necessários.

Se todas essas coisas que V.Sa. cita não foram feitas, foi por isso, de repente, que

extrapolou sua capacidade-limite de agüentar a pressão nesse momento.

O SR. DANIEL TABAK – Mais uma vez, agradeço a V.Exa., nobre Deputada.

Uma das questões mais importantes em relação a isso é exatamente essa questão

da pressão. Já expliquei anteriormente, mas serei enfático, porque esse realmente

foi o maior problema. O grande obstáculo em relação à questão anterior foi, como

mencionei, a pressão. Somos o País da diarréia, da fome, da desnutrição, e não

tenho nenhuma pretensão de dizer que o transplante de medula óssea é mais

importante que tudo isso, porque morte é igual, morre-se, independentemente da

causa. Temos de resolver o problema da fome, da miséria, da desnutrição, que

matam igualmente.

Agora, o transplante de medula óssea passou a ser um problema mais grave

porque a forma de pressão mudou. Antes, conforme mencionei, a pressão era sobre

minha pessoa. Eu tinha uma estratégia muito simples para resolver essa questão:

quando eu era solicitado, a resposta era sempre igual, a pressão se diluía e acabava

o problema. A pressão começou a acontecer quando passou a ser absorvida

diretamente pelo Ministério da Saúde.

O que o Ministério da Saúde e o SNT deveriam ter feito quando pedidos como

esses, mencionados pelo Deputado Venzon, foram feitos? Não deveriam ter

repassado dessa maneira, deveriam obedecer a hierarquia. O Dr. Diogo não deveria

ter interagido diretamente com o Deputado Venzon, deveria ter entendido que o

sistema não é para ser administrado dessa maneira, com pressão direta sobre a

Dra. Iracema. Essa pressão deveria ser passada à frente, seguindo conduta

hierárquica. Na verdade, a Dra. Iracema solicitou ao Dr. Diogo ene vezes que

encaminhasse os pedidos ao Dr. Daniel, até porque sou eu quem assina, ela não

assina nada.

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Vamos chegar de novo à questão fundamental, no sentido de que a culpa é

da vítima. Claro que sou culpado. Mas sou o culpado de tentar salvar uma vida

humana. Nos casos das meninas Paula Tamer e Fantini, para mim pouco importa

quem fez o pedido, importa é que elas têm de ser salvas e que os valores

disponíveis são esses. Na verdade, se um doador for identificado para ela, a fim de

salvá-la, tudo bem. O problema é que esse tipo de pressão deveria ficar longe do

técnico, nunca deveria ter sido exercida. O problema não foi a pressão exercida em

favor dessa paciente, mas é que essa pressão não foi exercida em favor dos outros

pacientes. Ou seja, tudo é relativo. A questão fundamental não é essa.

É muito fácil entender o motivo pelo qual tudo isso extravasou? Desde o

momento em que me demiti, se eu dormia pesado no meio desse tumulto, passei a

dormir muito melhor, porque o meu fantasma foi embora. À noite, o meu fantasma

era o seguinte: eu sou o responsável por esse problema. Portanto, na verdade, sou

eu quem assina as sentenças dos que vão viver e dos que vão morrer.

E essa pressão se tornou intolerável. Mas mais intolerável era conviver com a

idéia de que a pressão se exercia não por decisão minha, mas pela decisão de

outra pessoa, de um indivíduo que não entendia nada do sistema. Agora, passei a

ser o responsável pelo Rodrigo, aquele menino gordinho que apareceu naquelas

imagens. Mas ele morreu. Na verdade, a pressão não foi exercida em nome dele.

Era só isso.

Problemas de falta de recursos sempre existiram. Mas querer trazer — por

isso surgiu a questão do artigo — o cobertor de bondade, a que me referi

anteriormente, é exatamente no sentido da rapidez com que esses recursos

surgiram depois que as denúncias foram feitas. Eles deveriam ter aparecido antes,

porque, na verdade, já tinha muito tempo que o problema havia sido apresentado.

Pensemos o seguinte: quais seriam as melhores pessoas para apresentar as

dificuldades do sistema: o Dr. Diogo, que na verdade tem de cuidar dos transplantes

de rim, fígado, pâncreas, córnea, coração, ou o Dr. Daniel e a Dra. Iracema, que têm

capacidade muito menor, mas que só têm de cuidar da medula óssea? Eles passam

o dia inteiro cuidando disso, vivem totalmente os problemas, não têm a divisão do

Dr. Diogo ou do Dr. Chioro, portanto só têm de cuidar disso.

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Além do mais, a Portaria de 1988, a lei diz que a responsabilidade é nossa.

Centralizar é uma determinação. Portanto, estávamos cumprindo a lei. Se queremos

mudá-la, então que a mudemos. Até lá, nós a cumpriremos. Exatamente porque a lei

não foi cumprida é que isso aconteceu.

As irregularidades aconteceram porque houve pressão, porque houve

interferência política, porque houve credenciamento equivocado, porque houve, na

verdade, falta de transparência do Ministério ao dizer que um centro público foi

descredenciado e ninguém sabia que havia um centro público credenciado e

ninguém sabia que havia um centro privado credenciado, ninguém sabia.

A SRA. DEPUTADA ANGELA GUADAGNIN – Em relação... Desculpe ficar

interrompendo.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO – Se ficarmos na polêmica não

falaremos.

A SRA. DEPUTADA ANGELA GUADAGNIN – V.Exa. tem toda razão, eu só

vou ...

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO – Gostaria que o Presidente

usasse a Presidência porque senão ficaremos ...

O SR. DANIEL TABAK – Só queria chegar a duas questões fundamentais em

relação ao fato de a Dra. Iracema não ser substituída.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - É importante respeitar o

tempo do expositor senão as questões não vão avançar. Sr. Presidente, seria

conveniente que fixássemos um limite para isso.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Estamos ensejando ao

Dr. Tabak toda a liberdade para se expor e se defender. Mas peço que conclua.

O SR. DANIEL TABAK – Pois não. Então, em relação ao fato de a Dra.

Iracema ser insubstituível, é claro que a Dra. Iracema criou mecanismos para que

pudesse ser substituída durante um período. A questão não é ela ser substituída ou

substituível. A questão fundamental é: sendo ela extremamente importante, é

conveniente para o sistema, que já tem tão pouca gente, dispensá-la porque foi

culpada de ser a vítima?

O problema não é ela ser insubstituível, o problema é: por que mandá-la

embora? Essa é a diferença. Por isso a indignação. Não é porque ela é

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insubstituível. É claro que ela tem mecanismos, nós temos mecanismo de funcionar

no período de férias, no período em que ela se ausenta. Ela não é casada e não tem

filhos.

Em relação a campanha de doadores, é extremamente importante. É claro

que houve campanhas, a primeira em 2000, quando houve a novela Laços de

Família, quando houve o primeiro boom no número de doadores. Depois houve uma

situação extremamente importante: uma paciente de Caxambu precisava de um

doador, a família mobilizou-se e recrutou 15 mil dos 50 mil doadores.

É isso que devia ser exposto, a solidariedade. O Ministério da Saúde, em vez

de fazer campanha com números falsos, com números dos quais não sabemos a

origem — qual a origem de 360 mil, em vez de 1 milhão? —, deveria estimular a

solidariedade humana, que já foi comprovada.

A minha crítica em relação a esses números é que eles não têm fundamento.

De onde surgiram os 360 mil? Qual foi o imunogeneticista que fez o estudo?

Nenhum. Então, os números que surgem são uma afronta aos trabalhos dos

técnicos. Só por isso. Então, a afirmação foi feita no artigo como técnico, como

responsável por essa área. Acho que é uma afronta utilizar números sem nenhum

significado.

É basicamente isso.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Muito bem. Com a palavra

o Deputado Dr. Rosinha.

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados,

vou usar tom de voz mais baixo que o do nosso convidado, até porque faz parte da

minha personalidade, e a força do argumento não está no tom da voz, é bom

sempre lembrarmos disso, nem no seu nível. Não está no tom da voz, é bom

sabermos disso.

Sou servidor público de carreira também e sei que a argumentação nunca

está no grito. A questão que se expõe, e foi dito mais de uma vez, é que ao longo

dos últimos anos houve dificuldades econômicas na área de transplantes de medula.

Dificuldades relatadas e ditas mais de uma vez tornaram-se públicas muito

recentemente. E é lógico que, ao se tornarem públicas, saem do campo técnico e

vão para o político. O que se deve discutir é a questão política e não a técnica.

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Temos de deixar isso registrado. Até porque, quanto aos recursos, o montante

mencionado, 24 milhões, está na peça orçamentária. E não foi incluído depois da

crise, não. Está na peça orçamentária, foi aprovado. Este é o primeiro orçamento

enviado pelo Governo Lula para esta Casa. O orçamento anterior não foi aprovado

por este Governo. Então, a denúncia que está sendo feita refere-se ao Governo

anterior. Deve-se lembrar dessa questão, se não tinha orçamento. E realmente não

tinha. E a responsabilidade de organizar a peça orçamentária, ao que eu saiba, vem

sempre de baixo para cima. Quem é responsável por uma área vê, planeja e vê as

necessidades. E alguém comandou essa área por 17 anos. É interessante dizer que,

se há falha, não é só de agora, é anterior no que diz respeito a planejamento e

orçamento.

O Dr. Daniel Tabak, respondendo a pergunta do Deputado Henrique Fontana,

disse que não aceitaria provocação na hora de perguntar sobre a questão das

empresas. Parece-me que há três empresas no nome do Sr. Daniel Tabak.

A Lei nº 8.080, a Lei Orgânica da Saúde, não permite ao dono de empresa

ocupar cargo público. Isso está bastante claro. No entanto, o Dr. Daniel Tabak não

se desfez dessas empresas. É lógico que pode não ter ocorrido nada, que pode ter

agido com honestidade. É claro que isso deve ter ocorrido. Mas a Lei nº 8.080 não

permite, como disse, ao dono de empresa ocupar cargo público. Na listagem que

veio a público, remetida pelo Ministério da Saúde, constam 19 pacientes que estão

sendo atendidos numa das clínicas do Dr. Daniel Tabak.

O SR. DANIEL TABAK – De pacientes que foram encaminhados?

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Sim.

O SR. DANIEL TABAK – Eles foram transplantados?

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Estou dizendo que estavam na lista.

O SR. DANIEL TABAK – Quero saber se eles foram transplantados.

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Não sou eu que estou sendo

interrogado.

O SR. DANIEL TABAK – Bom, gostaria de saber.

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Não sou eu que estou aqui para

responder a pergunta nenhuma.

O SR. DANIEL TABAK – Vou responder.

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O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Não estou aqui para responder

nenhuma pergunta.

O SR. DANIEL TABAK – Então, responderei brevemente.

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Só estou dizendo que existe.

O senhor também disse que com a sua saída e a da Dra. Iracema acaba o

setor. Se acaba é porque não se prepararam mais técnicos, houve erro de quem

fazia a gerência do setor.

Houve outra crítica, não sei por que razão, gostaria de saber, quando o

Ministério da Saúde revisou a portaria que diz respeito ao HEMOPE. Não sei qual o

motivo da crítica, se o que se estava fazendo era uma correção. E se o HEMOPE

estava autorizado a fazer transplantes e o senhor alega que não sabia, não custa

lembrar que o senhor fazia parte do corpo técnico que fez o credenciamento, a

autorização, que se deu em 2002 e não em 2003. É importante esclarecer isso.

Como é que em 2002 é autorizado um atendimento por um hospital sem o

conhecimento do corpo técnico?

Lamentamos a morte do garoto Rodrigo. É interessante saber quem era o

responsável pelo setor e qual foi a falha do responsável, porque estava na lista,

houve uma morte que foi usada aqui. Quem respondia pela área naquela ocasião e

qual a responsabilidade dessa pessoa? Porque a impressão que se tem é de

negligência, omissão, qualquer coisa assim.

O senhor disse que a fila foi furada e que ficaram para trás 69 pacientes.

Novamente não entendi, porque a fila não é para ser obedecida linearmente, há

vários critérios a serem atendidos. Que fila foi furada?

E sobre o processo de destruição do sistema. O senhor disse que se deu em

maio de 2003. Quem respondia pelo sistema em maio de 2003, quando houve a sua

destruição? Foi dito e está nas notas taquigráficas.

E, por último, a questão do Hospital Português. O Deputado Henrique

Fontana perguntou e fez o aparte, e o senhor começou a fazer perguntas ao

Deputado Henrique Fontana, que respondeu que a informação que tinha é que

aquela criança necessitava de transplante com urgência e por isso o fato ocorreu.

Tenho em mãos aqui um relatório que em uma das linhas diz:

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“Ressaltemos, mais uma vez, que o paciente está

inscrito no REDOME, desde janeiro de 2002, e que o

retardo na realização do transplante resultará em um risco

ainda maior de insucesso. Vejo com grande preocupação

essa alternativa, considerando o risco elevadíssimo de

morte associada a esse procedimento em qualquer centro

no mundo, quando se refere a esse paciente”.

Esse relatório foi assinado pelo senhor. Então, não entendi por que aquela

reação em relação ao Deputado Henrique Fontana nos seus questionamentos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Com a palavra o

Deputado Dr. Francisco.

O SR. DEPUTADO DR. FRANCISCO GONÇALVES - Sr. Presidente, boa

noite a todos colegas, cumprimento especialmente o Dr. Daniel Tabak e o

parabenizo pela belíssima exposição, que, cronologicamente, nos mostrou o que é

necessário para nós. Esta é uma Comissão Externa destinada a apurar denúncias

referentes à interferência na fila de transplantes. E isso o senhor comprovou

adequadamente. Isso é muito interessante.

Todo político, sem exceção, posso afirmar ao senhor, envia ofícios, pedidos

originados de seu gabinete solicitando atenção a determinados casos, mas não quer

dizer que seja um pedido de interferência formal, que deve ser aceito,

definitivamente. Quem está no exercício de cargo de chefia é justamente para

absorver os pedidos e dar-lhes a devida resposta, não, necessariamente, a resposta

que espera o político.

Na qualidade de médico ginecologista e obstetra, fico pensando em tudo isso.

Estou na Comissão de Saúde e acho tudo muito interessante. Brigamos durante

todo o ano para reajustar os honorários médicos, as tabelas hospitalares> Os

hospitais enfrentam, na sua grande maioria, principalmente OS hospitais públicos,

filantrópicos e universitários, situação pré-falimentar.

Será que não O Ministério da Saúde não está sendo comunicado dessa

situação? Será que é só o momento? Os hospitais estão com sérios problemas

financeiros. Costuma-se dizer que é problema de gestão. Se fosse apenas um

hospital, poderia ser, mas em todo o Brasil os hospitais passam por sérias

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dificuldades. É o caso das Santas Casas. Eu, que sou ginecologista, quantas filas

vejo de mulheres, mulheres com câncer que não conseguem ser operadas. Isso não

é privilégio de Minas Gerais ou de minha cidade, está ocorrendo em vários Estados.

Há pouco eu conversava com o Deputado Dr. Pinotti sobre as filas para

atendimento de urgência. Sabemos que faltam recursos. Os pedidos são feitos, mas

os recursos não vêm. A tabela de honorários deve ser avaliada e reajustada.

Recentemente tivemos um episódio sob comando do Presidente da nossa

Frente Parlamentar, também Presidente esta Comissão, o Deputado Rafael Guerra.

O Ministério da Saúde entendeu que deveria passar 4,5 bilhões de reais para o

Programa Fome Zero, que também é uma questão de saúde. A saúde já está em

situação precária, difícil e ainda queriam desviar recursos do setor. Graças à

sensibilidade do Governo, esse recurso voltou na sua totalidade para a Saúde.

Então, a PEC nº 29 foi respeitada.

Na condição de funcionário público, V.Sa., Dr. Daniel, tem o direito de

trabalhar em outra organização, porque funcionário público não tem condições, com

seus rendimentos, sequer de tratar de sua família. Isso não é crime, é prioridade. É

o meu entendimento.

Acho que V.Sa. se comportou muito bem. Parabéns pelo que foi dito aqui.

Não quero fazer perguntas, quero ver solução. Como disse o Deputado Fernando

Gabeira, essa discussão nefasta não levará a lugar nenhum. Sabemos muito bem

que ninguém é insubstituível, mas, por exemplo, quando se tira a estrela de um time

de futebol, a produção do time cai. Isso é notório.

É isso o que queremos: entendimento, discernimento, solidariedade. A nossa

população precisa dessa solidariedade, de melhores condições de vida e de saúde.

Quantos casos de corrupção presenciamos ou sabemos terem sido cometidos?

Tudo isso é grave, mas o caminho é o de sempre debatermos, discutirmos,

dialogarmos para podermos encontrar a solução adequada.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Com a palavra o

Deputado Alexandre Cardoso.

Convido o Presidente, Deputado Rafael Guerra, para tomar assento à Mesa.

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O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - Sr. Presidente, quero louvar o

ato de criação desta Comissão e ressaltar a importância de sermos técnicos.

Dr. Daniel, vivi dentro de alguns hospitais do Rio de Janeiro e sei que não há

lugar que tenha mais política do que dentro de hospital. Vou dar-lhe um exemplo. Na

Fundação Ari Frauzino existe um cargo vitalício, ocupado por uma pessoa pela qual

tenho profundo respeito, instituído por decisão política. Não por decisão técnica, foi

por decisão política que o único cargo vitalício da Fundação Ari Frauzino foi

preenchido.

Existem no INCA duas personalidades internacionais na área de oncologia: o

Dr. Marcos Moraes e o Dr. Jacó, pessoas excepcionais. E houve uma certa disputa

política na criação da Fundação Ari Frauzino e na busca de solução, encontrada

com a criação de um cargo vitalício e de um cargo de diretor.

Dr. Daniel, serei extremamente preciso nas minhas perguntas. Em 1999, foi

firmado o Convênio nº 111 — até 1998, tínhamos uma conotação, em 1999,

começamos a ter outra. Esse convênio permitiu que a Fundação Ari Frauzino fizesse

o pagamento de algumas ações. Gostaria de identificar, se possível, os pacientes e

os médicos dessas pessoas que foram transplantadas e de saber se esses

pacientes tiveram alguma relação médica privada.

Vou repetir a pergunta: em 1999, a Fundação Ari Frauzino recebeu os

primeiros 500 mil reais do Convênio nº 111, do mesmo ano. Aí começou a fazer o

ressarcimento de algumas ações. Quero saber a relação dos pacientes que tiveram

essas ações e os nomes dos médicos

e se esses médicos, de alguma forma, mantiveram relação de clientela privada com

esses pacientes.

A segunda pergunta é fundamental. Uma vez que a questão chegou ao

âmbito da opinião pública, vamos dissecá-la. Caro Deputado Rafael Guerra, ao

levantar aqui a questão de uma personalidade da vida pública nacional, chamada

Jamil Haddad, sinto-me na obrigação de solicitar o envio dos inquéritos preliminares

relativos a sua atuação no INCA a esta Comissão. Quero saber se uma das pessoas

citadas no inquérito era chefe de compras no INCA, antes da posse dele, e por

quem essa pessoa foi indicada para ocupar a chefia do Setor de Aquisições do

INCA. Quem a indicou?

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É importante discutir essas questões porque estamos em uma Casa política e

principalmente pelo fato de algumas pessoas dizerem que o INCA começou a ser

desmontado em 2003, que o Ministério da Saúde usou números fantasiosos. Temos

responsabilidade pelas afirmações feitas nesta Casa. Se o Ministério da Saúde usou

números fantasiosos, temos de puni-lo. Caso contrário, quem fez tal afirmação, no

meu entendimento, deve responder penalmente por isso.

A taquigrafia é uma peça processual. Portanto, quero receber informações a

respeito de todas as despesas da Fundação Ary Frauzino de maio de 1999 para cá,

informando os pagamentos de pessoal e a qualquer título, em razão do respeito que

tenho à direção daquela fundação.

Sr. Presidente, quero saber do Dr. Daniel Tabak, nessa relação de

pagamentos realizados pela Fundação Ary Frauzino, após o primeiro convênio, o

Convênio nº 111, de 1999, se ele conhece algum profissional que foi médico desses

pacientes ou se teve alguma relação com esses pacientes que foram transplantados

fora do INCA, com pagamento pela fundação. E se o Dr. Daniel conhece os

inquéritos que correm na Polícia Federal antes da posse do Dr. Jamil Haddad, que

levantam desvios no setor de compras do INCA. Quero saber se ele conhece as

pessoas que foram indiciadas. E, em caso afirmativo, quem indicou essas pessoas

para ocuparem esses cargos no INCA. Se não conhecer, basta dizer “não”.

A outra é dirigida à Mesa: gostaria de obter informações a respeito das

receitas e despesas da Fundação Ary Frauzino após 25 de novembro de 1999.

Era o que tinha a dizer.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Naturalmente, no que

depender da Comissão, V.Exa. será atendido. Temos o maior apreço e

reconhecimento ao trabalho do Dr. Jamil Haddad, ex-Ministro da Saúde.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO - Mas ficou uma dúvida em

relação à intervenção de uma pessoa que prezo, que é o Deputado Fernando

Gabeira, e à afirmação do Dr. Daniel Tabak de que o INCA começou a ser

desmontado — essa afirmação está registrada nas notas taquigráficas — em 2003.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Mas o ex-Ministro Jamil

Haddad não deve assumir a paternidade desse desmonte.

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O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO – Mas é importante deixar

essas questões transparentes para todos nós. É uma das funções desta Comissão.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Vamos fazer o possível

para atendê-lo. Ressalto que temos o maior apreço pelo ex-Ministro Jamil Haddad

em razão do seu passado na área da saúde pública. Certamente é um homem

simples e humilde, que não se locupletou de recursos públicos em momento algum.

A instituição é complexa.

Passo a palavra ao Dr. Daniel Tabak.

O SR. DANIEL TABAK – Agradeço inicialmente ao Deputado Dr. Francisco

Gonçalves a intervenção. Vou responder, primeiro, às perguntas do Deputado

Alexandre Cardoso, até porque elas são mais fáceis e simples de se responder, pois

as respostas vão ser, como disse S.Exa., “não”, “não”.

Não vou fazer aqui a defesa incondicional da Fundação Ary Frauzino, até

porque ela não é sujeito nessa questão das irregularidades. Desconheço essas

questões das nuanças, meu assunto é médico e não está relacionado à

administração da Fundação Ary Frauzino. No entanto, tenho de fazer algumas

considerações em defesa da Fundação.

A Fundação Ary Frauzino permitiu a viabilização desse sistema. Vidas foram

salvas e hoje existem mais de 1.500 funcionários, quando o sistema anterior a ele,

na verdade, não permitia a contratação por meio do sistema público. Se não fosse a

fundação o INCA teria acabado. A idéia, então, da Fundação foi boa, porque

viabilizou tudo.

Se existem nuanças, outras pessoas vão poder se dedicar a isso.

Desconheço processos e as questões das compras. Na verdade, sou usuário das

vantagens trazidas com a criação da Fundação, que garantiu ao INCA a situação em

que se encontra hoje. Desconheço a questão das intervenções médicas e de

pacientes que tenham sido beneficiados na fila de transplante, até porque posso

afirmar, com certeza, que o tratamento sempre foi homogêneo. O único tratamento

que os pacientes recebiam era baseado nos critérios médicos. O critério de entrada

dos pacientes sempre foi esse, nunca houve nenhum outro tipo de critério para

entrada em qualquer centro, seja no INCA, de acordo com nossa orientação, seja

nos outros centros.

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O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO – Quero saber se o senhor

conhece algum médico que teve relação particular com algumas dessas pessoas

que foram transplantadas pela Fundação Ary Frauzino.

O SR. DANIELTABAK – Vou me colocar na berlinda, por exemplo.

O SR. DEPUTADO ALEXANDRE CARDOSO – Conhece um?

O SR. DANIEL TABAK – Quando pacientes vinham ao meu consultório —

vou responder a V.Exa., antecipando a pergunta do Deputado Dr. Rosinha. Sou um

oncologista e hematologista e todos os dias recebo pacientes em meu consultório.

Por isso existem 19 pacientes na lista, o que é pouco, considerando o número de

referências que recebo. Não foram 19 pacientes meus transplantados. Na verdade,

minha conduta foi bem diferente.

Se observamos a média — e posso trazer os documentos dos pacientes que

foram transplantados, pacientes que me procuraram no consultório —, ela nunca foi

inferior a 6 meses. Vou citar 2 exemplos de pacientes que me procuraram no

consultório. Pacientes que precisavam da urgência, não foram transplantados no Rio

de Janeiro, mas em São Paulo, porque nunca furaria a fila em nome de pacientes,

muito menos os meus.

Na realidade, esses 19 pacientes me procuraram no consultório, mas muitos

pacientes me procuram no INCA. Minha secretária tem a seguinte orientação: se

forem pacientes para transplante, a indicação não é ir ao consultório do Dr. Daniel,

mas ao INCA, porque no consultório do Dr. Daniel não existe indicação para

transplante a partir de um doador. O que o Dr. Daniel faz no consultório é outro tipo

de procedimento.

Portanto, respondendo ao Deputado Alexandre Cardoso, eu desconheço. É

possível que algum paciente tenha ido ao meu escritório e aguardado. Posso ter até

recomendado um transplante autólogo em algum paciente, pode até ter sido um dos

meus pacientes, mas os critérios utilizados, obviamente, não tiveram nada a ver com

o fato de ele ter ido ao meu consultório.

Em relação à pergunta do Deputado Dr. Rosinha, em primeiro lugar, sou uma

pessoa humilde e reconheço quando cometo algum equívoco. Peço desculpas a

V.Exas. por ter elevado a voz, até porque elevar a voz é uma manifestação de minha

intranqüilidade diante das questões de vida e morte. A fila do transplante não é um

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nome nem um número, atrás do nome existe uma vida. E vivi todos esses dramas. O

Rodrigo pode ser um retrato aqui, mas, na verdade, quando vivo esses pacientes,

vivo como minha própria vida. Essa é a minha angústia. É exatamente por isso que

a minha voz se eleva. Então, se me excedi, e obviamente não seria o lugar, peço

desculpas a V.Exas.

Concordo plenamente que esta é uma Casa política. Em razão disso, a

política de saúde deve ser discutida. E como consta do meu documento, nem aqui

nem em nenhum lugar se admite fazer política com saúde. É diferente. Política de

saúde é definir quantos transplantes vamos fazer, os centros que serão

credenciados, o orçamento na área da saúde, como vamos exercer isso. Isso é

política de saúde.

Interferir na fila, credenciar de uma forma pouco clara, descredenciar de

forma menos clara ainda, é fazer com que pacientes que, na verdade, estavam lá,

levassem a pecha de que furaram a fila sem mesmo ter pedido isso. Isso é bagunça.

O termo geral que deveria ser aplicado é diferente do que aconteceu.

A falta de recursos de 2003 para cá transformou o sistema numa bagunça. Na

verdade, foi garantida por um grupo de pessoas que, reconheço, colocou o Ministro

da Saúde numa situação terrível. Essas pessoas que não entendiam nada fizeram o

maior desserviço ao Ministro da Saúde, porque ninguém pode imaginar que o

Ministro possa cobrir todas essas áreas. Ele tentou se cercar das melhores pessoas.

Em lugar disso, houve um urologista que não entendeu nada e confundiu

tudo, trouxe 2 pessoas, como o Dr. Sólon e o Dr. Chioro, que se contradizem nas

notas oficiais, relatam fatos, atribuem-me palavras que não proferi e trazem, mais

uma vez, uma questão que se tornou um aspecto extremamente comum no

Ministério da Saúde: o desvio do foco e a truculência.

Diria truculência de novo. Não deveria mencionar essa questão das

empresas. Na verdade, não é o foco da questão, mas vou trazê-la. A questão da Lei

nº 8.112, de 1990, é muito antiga. Vamos nos referir novamente à questão do INCA

no ano passado. Se essa lei existia, e eu pedi demissão em agosto, por que fui

reindicado em setembro se eu tinha problemas com as empresas? Na verdade, eu

nunca deveria ter sido indicado. A Portaria do Gabinete da Casa Civil, de junho de

2003, que se refere à questão do sócio-gerente, certamente já deveria ter-me

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atingido. Se eu era um inviabilizado, porque era um empresário da saúde, nunca

deveria ter sido indicado para ser novamente o Diretor depois de ter pedido

demissão. No entanto, fui indicado.

Primeiro equívoco: não tenho 3 empresas. Uma delas já nem existe mais. Eu

não tenho empresas, sou pessoa jurídica. Pessoa jurídica é um meio que, na

verdade, todos os profissionais desenvolveram para tentar sobreviver à carga

tributária, que torna a vida absolutamente impossível.

O que se tentou fazer, na verdade, com a questão das empresas foi, da

mesma maneira, adotar a mesma estratégia que se tentou adotar com a Dra.

Iracema. Foi vil. O que se tentou fazer comigo foi a mesma coisa que se tentou fazer

com a Dra. Iracema. O que se tentou fazer? Desacreditar o acusante, aquele que

apontou todas essas irregularidades que, na verdade, tiveram um aspecto muito

positivo.

Quando tudo estiver esclarecido e, fundamentalmente, quando a verdade

sobre a questão das empresas estiver esclarecida definitivamente, vou ser um

homem realizado. Por quê? Primeiro, o sistema não depende do Dr. Tabak. O

sistema vai funcionar sem o Dr. Tabak. Há hoje mais de 30 centros que fazem

transplantes no Brasil. Hoje, após apontar as irregularidades, surgiu dinheiro, vão

surgir mais leitos. Houve uma campanha gigantesca sobre transplante.

Tive a oportunidade, hoje, dia 2 de março, de, na Câmara dos Deputados,

poder apresentar aos Deputados o que é transplante de medula óssea. Fiz

campanha de doação. Sou o homem mais realizado. Consegui, em menos de 1 mês

e meio, fazer o que não consegui fazer em 6 anos.

Na verdade, o sistema não precisa mais do Dr. Tabak. Todas as questões

que apontei vão ser utilizadas na reunião de consenso que o Ministério vai utilizar

daqui a pouco. Nem preciso estar presente lá.

O Dr. Tabak treinou mais de 20 pessoas no seu centro, que vão tocar os

doentes, porque elas são as sementes que o Dr. Tabak criou. O Dr. Tabak é um

homem muito feliz. Ele não tinha a pretensão de continuar lá para sempre, até

porque o centro precisa ser renovado. Ninguém tem a idéia de que eu ia ficar lá para

sempre, fazendo sempre as mesmas coisas. Agora, as previsões são muito

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melhores. Jovens inovadores vão crescer, vão se desenvolver com uma energia

fantástica.

Na verdade, o sistema não precisa de mim. Dei só mais uma vez a partida.

Sou um homem realizado.

Há uma questão fundamental. Não sou um mercenário da saúde nem

empresário da saúde. Essa lei deveria funcionar para evitar que as pessoas

tivessem conflito de interesse.

Há algum tempo me veio um exemplo que acho totalmente pertinente. O que

acontece com essa lei? Vamos imaginar que eu seja realmente o grande todo-

poderoso que se diz: eu controlo, eu evito, eu desvio, eu faço tudo com transplante

de medula óssea no Rio de Janeiro ou talvez no Brasil, mas eu tenho um problema.

O problema é que no final de semana adoro colocar gasolina no carro. Eu gosto de

colocar gasolina. O que fiz? Comprei um posto de gasolina. Agora, sou dono de um

posto de gasolina. Pela lei, não posso. Não posso ser dono de um posto de gasolina

e ser dono de um transplante no Rio. Não posso ser dono do posto de gasolina.

Posto de gasolina não tem nada a ver com transplante, mas não pode.

Vamos ver a seguinte situação. Sou o todo-poderoso do transplante no Rio, a

mesma pessoa, mas agora vou ser esperto. Em vez de ter posto de gasolina, vou

montar uma empresa privada e todo paciente que tiver seguro privado e que vier ao

INCA vou desviar para a minha empresa. Todo paciente que tiver SUS e vier me

procurar, porque eu sou o todo-poderoso, vou levar para o SUS, mas vou ver se

consigo tirar um trocadinho. Tudo bem, mas a lei disse que não posso ser sócio-

gerente, mas posso ser sócio. Posso ser sócio com 99,99% das ações. Por que não

faço isso? Não faço porque não é decente, não tem nada a ver com a lei. Decência

não tem nada a ver com a lei.

É claro que tenho a minha atividade, como o Deputado Fernando mencionou.

Sou um profissional liberal, sou titulado a isso. Na verdade, essa é a minha

capacidade de trabalhar. Tenho essa capacidade de trabalhar, que é bastante

grande.

Vamos pensar, até, que as minhas empresas desviem. Vamos trabalhar com

números. Ao longo de 17 anos, quantos transplantes o INCA fez? Eu disse quase

900. Agora vamos dizer o seguinte: o Dr. Tabak é um empresário. Quantos

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transplantes as empresas do Dr. Tabak fizeram em 17 anos? Menos de 15. Dr.

Tabak é um empresário, mas é uma droga de empresário. Essa é a conclusão. O Dr.

Tabak, como empresário, é péssimo. Na verdade, foi exatamente o que aconteceu,

a empresa de transplante do Dr. Tabak faliu, teve de fechar por falta de

funcionamento.

Quero colocar um ponto final na história das empresas, porque, de certa

maneira, acabou acontecendo uma outra coisa. Mais uma vez, em rede nacional,

estamos fazendo propaganda das minhas empresas. Não quero fazer propaganda

das minhas empresas, não preciso de propaganda das minhas empresas. Nunca fiz,

nunca gastei um centavo em propaganda e não quero começar. Chega de

propaganda gratuita das minhas empresas.

Vamos falar sobre o que interessa, que é o foco da questão, que são as

irregularidades, o descalabro que foi o processo, que foi a normatização equivocada,

que foi esse indivíduo que causou tumulto no sistema, que na verdade levou esse

descalabro para o setor do HEMOPE.

Vamos voltar ao HEMOPE. É claro que ninguém sabia sobre o

credenciamento do HEMOPE. Vamos saber se não há critério para saber como

funciona o aparentado e o não aparentado. Se os normatizadores sabiam do

HEMOPE, por que eles não fizeram lá? É o mesmo médico. Qual é a diferença de

se fazer um transplante de um aparentado no HEMOPE ou no Hospital Português?

Para que fazer o credenciamento? Essa pergunta tem de ser feita ao Dr. Chioro e ao

Dr. Sola. Não vou responder.

Temos de entender por que o centro privado foi credenciado se o público

existia. Se ele não estava qualificado, com é que se qualifica? O que estou trazendo

é que o sistema é uma bagunça. Na verdade, descobri que o sistema era uma

bagunça. Só descobri que era uma bagunça devido à nota do Ministério da Saúde.

Estou dizendo que graças ao Ministério da Saúde hoje o Brasil inteiro sabe

que o sistema é uma bagunça. Se não fosse o Ministério da Saúde com as suas

notas esclarecedoras, ninguém saberia que o sistema é uma bagunça. As notas

continuariam escondidas, em datas escondidas na “transparência”, entre aspas, da

Internet, na Portaria 745-RT, que nunca foi anunciada.

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O que quero saber — porque nunca vi o relatório oficial — é por que na

Comissão de Sindicância do INCA falei exatamente a mesma coisa e no relatório

oficial da Comissão nenhuma dessas questões foi elucidada? A única coisa que a

Comissão pôde dizer foi que a Iracema é bandida. É inacreditável, o sistema é uma

bagunça e a culpada é a Iracema. Essa é que é a questão fundamental.

Não só se perdeu a oportunidade de reconhecer as falhas, de realmente dizer

que o Dr. Diogo é uma bagunça, perdeu-se a oportunidade de dizer que os

indivíduos subordinados colocaram o Ministro numa situação terrível. O Dr.

Temporão teve toda a oportunidade do mundo de denunciar tudo isso, os diretores

tiveram a oportunidade de me dar as mãos e denunciar junto comigo, e nada disso

aconteceu. Teve alguém de trazer essa questão para a imprensa — graças a Deus

— para garantir que esse sistema volte a ter credibilidade.

Na verdade só houve uma pessoa que se preocupou em escrever para os

centros internacionais e pedir que, por favor, acreditassem em nós. E foi exatamente

isso o que fiz. Uma semana depois dessa crise, escrevi para mais de 100 centros no

exterior para pedir que, por favor, continuassem acreditando na gente, porque

mesmo sem o Dr. Tabak o sistema vai funcionar. Pedi-lhes um voto de crédito para o

Brasil, porque o Brasil tem outros indivíduos.

Nesse sentido, quero enfatizar que foi graças a esses indivíduos pontuais que

ficou caracterizado que o sistema é uma bagunça. Tentamos garantir, com os

poucos recursos de que dispúnhamos, que pacientes fossem salvos. Dos pacientes

transplantados, 98 foram transplantados sem onerar em um centavo o bolso desses

pacientes — do interior do Piauí, do interior de São Paulo, sem padrinhos, sem que

fosse feito nenhum tipo de esforço, só acreditando no sistema. Desses pacientes,

40% hoje estão vivos há mais de 2 anos, sem usar nenhum subterfúgio de dizer que

uma semana depois do transplante o paciente foi salvo. Hoje a sociedade não é

idiota, a sociedade brasileira sabe entender que o sistema que foi apresentado e que

foi confundido se tornou uma bagunça.

Finalmente, quero dizer que, graças às pessoas que ao longo desse período

todo se preocuparam, temos um sistema que funciona. É verdade que a

resolutividade, como o Ministério disse, é baixa, mas é muito difícil trabalhar com

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falta de dinheiro, com falta de pessoal. O que esperamos é que esses investimentos

surjam, que os técnicos voltem a proliferar, porque vamos continuar a cobrança.

Não preciso voltar a ser diretor do INCA para continuar a cobrar, porque a

minha ligação não tem nada a ver com rótulo, não preciso de nenhum rótulo para

poder continuar a defender os pacientes. O meu objetivo é garantir que os

pacientes, de forma equânime, continuem recebendo o mesmo tratamento que

receberam antes de essa bagunça ter sido instituída no sistema nacional de

transplantes.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Sr. Presidente, peço a palavra pela

ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Não sei se há mais Deputados

inscritos, penso que se encerrou a lista.

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Sr. Presidente, gostaria de fazer uso da

palavra para uma réplica.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO – Antes de V.Exa. encerrar, Sr.

Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Deputada Laura

Carneiro, o Deputado Dr. Rosinha irá fazer uso da réplica, é regimental.

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Quero fazer uma afirmação e continuar

tirando dúvidas porque S.Sa. não me respondeu. Não disse, em nenhum momento,

que os pacientes do Dr. Tabak furavam a fila. A outra coisa é que é necessário

esclarecer que a Lei 8.080 não diz aquilo que foi interpretado pelo nobre Deputado

Dr. Francisco. Não sei qual deles que disse “eu posso trabalhar no setor público e no

setor privado. O que eu não posso é ter empresa e ocupar cargo de confiança”.

Então, é diferente. Eu posso ter a empresa e ser funcionário público, eu só não

posso é ocupar cargo de confiança.

Eu perguntei, e não ficou claro, quem era o responsável quando da morte

desse menino, o Rodrigo. Isso foi mencionado mais de uma vez.

E a destruição do sistema em maio de 2003. Ora, não se rompe um sistema

da noite para o dia. Se houve destruição, também tem de haver responsabilidade.

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Por último, a questão do HEMOPE, que não estava qualificado para o

transplante não-aparentado. É isso?

O SR. DANIEL TABAK – Eu posso responder todas as perguntas juntas?

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Pode. Porque eu perguntei sobre a razão

de se ter retificado a portaria. A portaria que estava sendo retificada era para corrigir

erro.

(Intervenção fora do microfone.)

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Não, aí é que está a questão:

“Relatório de vistoria no serviço de transplante de

medula óssea do HEMOPE, em Recife, Pernambuco.

De acordo com a vistoria realizada no dia 11 de

setembro de 2002, em conjunto com o Dr. Francisco

Diogo Mendes, constatamos que o referido Centro

encontra-se habilitado para credenciamento para

realização de transplantes autogênico e alogênico.

Rio de Janeiro, 3 de janeiro de 2002.

Dr. Daniel G. Tabak – Diretor do Centro.”

A partir daí, vem a primeira portaria, que estava errada, do ano de 2002. A

portaria baixada pelo atual Ministério foi para corrigir, justamente em cima do

relatório feito pelo próprio Dr. Tabak.

Essas questões têm de ficar claras. E é isso o que eu quero.

O SR. DANIEL TABAK – Vou começar pela última, que é a mais fácil.

É claro que havia um erro, mas não era só no HEMOPE, era no Einstein

também. Ou seja, o Dr. Diogo...

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E por que não foi denunciado por V.Sa.,

uma vez que o erro perdurou durante todo esse tempo?

O SR. DANIEL TABAK – Porque eu precisei da nota oficial do Ministério para

saber. Eu não tenho o hábito de ler portarias. Eu só passei a ler...

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Em 2002 estava errada.

O SR. DANIEL TABAK – Claro que estava errada.

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - E o senhor só denuncia em 2003. Isso

demonstra que é um jogo. É o jogo que ele quer. Por que não denunciou lá atrás?

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O SR. DANIEL TABAK – Deputado Dr. Rosinha...

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA – Porque ele não diz que estava corrigindo

um erro, que estava repondo a verdade...

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES - Pela ordem, Sr. Presidente...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Deixe que ele

responda...

O SR. DANIEL TABAK – Eu faço questão...

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Dr. Daniel, por favor. Pela ordem, Sr.

Presidente. Eu acho que não é nem justo com o servidor público Daniel Tabak

estabelecer um debate essencialmente político: fala isso, fala aquilo. Acho que o Dr.

Daniel deve ter a oportunidade, assim que o Dr. Rosinha encerrar sua manifestação,

de responder às suas perguntas. Quer dizer, foi em 2002, no Governo do PSDB, que

isso aconteceu, e se descobriu em 2003, no Governo do PT.

O SR. DANIEL TABAK – Eu gostaria de responder mais uma vez.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Brevemente, Dr. Tabak.

O SR. DANIEL TABAK – Eu quero agradecer, porque, na verdade, essa é

uma das grandes benesses dessa auditoria. As respostas do Ministério, a nota

oficial do Ministério foi que permitiu que a comunidade inteira do Brasil conhecesse a

bagunça. Se eu tivesse conhecimento disso antes, eu já teria pedido demissão. Eu

só pude saber disso...

(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)

O SR. DANIEL TABAK – O problema não é o tempo da bagunça, porque, na

verdade, em 2002, o responsável já era o Dr. Diogo. Eu não tenho hábito de ler

portarias. Passei a ter depois que me demonstraram que na verdade todas elas

estavam erradas.

Se me disserem que hoje existem outros 10 centros credenciados, eu até

acredito, porque, na verdade, eu vou ter de percorrer todas as portarias. Então, na

verdade, elas não foram apontadas porque delas ninguém sabia.

Quanto à qualificação do Centro, a pergunta, de novo, foi exatamente por

isso. Como é que se qualifica um centro para fazer transplante em um aparentado?

Não existe critério algum? O que diferencia um centro não-aparentado de um

aparentado? Não sabemos. Os dois únicos centros credenciados foram

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estabelecidos para iniciar o programa — o INCA e Curitiba. Os centros mais antigos,

com os mais experientes.

Depois do Dr. Diogo, surge o credenciamento de São Paulo, cujos critérios só

o Dr. Diogo sabia, e o erro do HEMOPE, sem dúvida alguma.

Mas se o problema era a excepcionalidade, porque não tratar no HEMOPE?

O médico era o mesmo. Se o problema era somente o rótulo, tanto faz ser no

HEMOPE como no Hospital Português, vamos deixar de ser ingênuos. Nem o

Ministério sabia disso, só tomou conhecimento quando procurou uma explicação

para o sistema privado. Eles precisavam de uma explicação para justificar um

sistema privado separado do público, que não existe. O sistema é o mesmo.

Na verdade, ao credenciar o sistema privado, do Hospital Português, quem

vai ter de responder por isso é o Dr. Sola, que o credenciou em menos de 24 horas.

Quem vai ter de responder por isso é o Dr. Chioro, que disse que a situação lá era

especial, quem vai ter de responder pelo descredenciamento para corrigir um erro é,

na verdade, quem assinou aquela portaria que não está assinada. Quem vai ter de

explicar a situação do Einstein? Talvez o Dr. Diogo explique que também foi um

equívoco. O Dr. Diogo também tem de explicar por que credenciou sozinho o

Hospital de São Paulo, a Fundação Zerbini, sem chamar o INCA, que é o braço

técnico.

Só quero enfatizar, mais uma vez, que essas pessoas, os três, o Dr. Diogo, o

Dr. Chioro e o Dr. Sola, transformaram o sistema numa bagunça e fragilizaram um

Ministro da Saúde, que, na verdade, foi vítima, como a Dra. Iracema, da

incompetência dos seus auxiliares.

O Ministro da Saúde tem o Brasil inteiro para cuidar, tem de cuidar da saúde

da família, da AIDS, da falta de medicamento e do transplante também, mas delegou

responsabilidade da alta complexidade a esse trio, que, na verdade, fez essa

bagunça no sistema.

Então, da mesma maneira como se cobrou responsabilidade da Dra. Iracema,

tem de se cobrar responsabilidade dessas três pessoas que criaram esse sistema,

confundiram o sistema. A única contribuição que eles fizeram foi, com suas notas

brilhantes publicadas na imprensa, garantir que hoje todo mundo, inclusive a

imprensa, tenha informação e fatos novos, porque senão, imaginem, hoje todos

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estaríamos frustrados, não estaríamos falando nada de novo, estaríamos falando

aqui sobre pressão, sobre que houve pressão de Deputado ou Vice-Presidente. Isso

já é velho.

O que é novo hoje para a imprensa, o que é novo hoje para o Brasil é saber

que o sistema era uma bagunça, que as portarias de funcionamento com as quais

nos preocupamos não funcionaram e que esses indivíduos, na verdade, fragilizaram

o próprio Ministro da Saúde.

São esses indivíduos que têm de ser responsabilizados pelo fato de que hoje

o Ministério na Saúde é, na verdade, um sistema que, como escrevi hoje pela

manhã, não pode ser considerado normatizador, porque ele não sabe onde está

pisando. Este é o problema. As pessoas que assessoram o Ministro não sabem o

que fizeram ao longo desse período.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Geraldo Resende) – Deputado Eduardo

Paes, V.Exa. tem a palavra.

O SR. DEPUTADO EDUARDO PAES – Sr. Presidente, para encerrar, quero

fazer algumas ponderações, falar em meu nome e, acredito, de alguns Deputados

que se sintam representados por mim.

Agradeço ao Dr. Daniel pela exposição cheia de comprovações. Imagino que,

como disse a Deputada Laura Carneiro, ele deve ter passado o Carnaval inteiro se

preparando para aqui estar, em demonstração de respeito a esta Casa política.

Muitas vezes as pessoas vêm aqui e soltam qualquer besteira. Aliás, o Ministro já foi

convidado duas vezes para comparecer ao Senado, a requerimento da Senadora

Lúcia Vânia, e não compareceu, desmarcou, obviamente por motivo de força maior.

Na verdade, quero aqui, em meu nome e, tenho certeza, de alguns Deputados desta

Casa que fazem coro comigo, pedir desculpas ao Dr. Daniel Tabak, não só ao

homem, mas ao profissional da medicina, ao servidor público, porque é lamentável

que um homem que toma a atitude de denunciar esse descaso.... O que mais me

assusta é que desde o início, em momento algum, o Dr. Tabak disse que foi esse ou

aquele governo. O Dr. Diogo, por exemplo, foi nomeado em 2002, ainda era o

governo do PSDB, um profissional incompetente, como tantos outros que devem ter

sido nomeados durante nosso governo. Pelo menos tentamos buscá-los, vamos

identificar e retirá-los, assim como tantos outros que devem ter sido nomeados

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durante o nosso Governo, mas pelo menos tentamos identificá-los, retirá-los e

manter os bons profissionais. Ninguém é infalível.

Assusta-me, Deputados Rafael Guerra e Laura Carneiro — e há pouco disse

isso no plenário — a estratégia utilizada nesta Casa. Para os mais cultos, a

estratégia é chamada de stalinista. Querem criar um constrangimento terrível para

aquele que tem posição contrária. Infelizmente, na minha opinião, isso aconteceu de

forma orquestrada e ensaiada até pelas perguntas feitas. O Dr. Daniel Tabak foi

vítima disso, mas mostrou coragem, competência e capacidade de enfrentar as

perguntas. Não são todas as pessoas que se intimidam perante esta Casa, os

Deputados e as câmeras. Ele manteve posição firme, apontou até falhas que não

pôde perceber.

Faço coro com o Deputado Fernando Gabeira, que chamou atenção para a

estratégia stalinista. Deputado de partido de oposição, espero que a base do

Governo continue utilizando essa estratégia, porque o resultado será este que

estamos vendo. A outra crise continua quente por causa dessa estratégia.

Preocupa-nos os servidores públicos que porventura se indignem com algo e

queiram discutir. Após assistirem a esta reunião, talvez se intimidem perante essa

estratégia. Espero que isso não ocorra, que venham a esta Casa dizer a verdade e

apontar os erros dos Governos anteriores.

O Dr. Daniel Tabak trabalhou no Centro de Transplante por 17 anos, passou

pelos Governos Sarney, Collor, Itamar, enfim, os que apóiam ou não o Governo

Lula. Ele é um servidor público.

A situação é esclarecedora. Os servidores públicos profissionais vêem o

tratamento que recebiam e o que recebem. E veja que se pensou que os servidores

teriam mais espaço neste Governo. É lamentável que isso aconteça.

Não falo em nome dos demais Parlamentares, mas tenho certeza de que

muitos se sentiriam representados por mim. Peço desculpas por eventuais

agressões ou suspeitas desnecessárias que levantaram contra o servidor público,

Dr. Daniel Tabak, um dos melhores especialistas de sua área. Aproveito para

parabenizá-lo pelo trabalho reconhecido internacionalmente. Tenho certeza de que

ele busca se esforçar no que faz, que estudou muito e perdeu muitas noites de sono

se preparando, por isso a sua competência.

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Vamos seguir em frente e tentar melhorar esse sistema, que tem erros, não

só neste Governo, mas em Governos anteriores.

A SRA. DEPUTADA ANGELA GUADAGNIN - Sr. Presidente, agradeço ao

Dr. Daniel Tabak por ter vindo a esta Comissão.

Quero fazer duas observações. Conforme o Deputado acabou de dizer, o

Ministro se prontificou a vir a esta Casa e ao Senado Federal. No entanto, na data

marcada, houve enchentes no Nordeste, e S.Exa. teve de averiguar a situação. Por

isso, comunicou ao Senado Federal que não poderia comparecer, mas se prontificou

a vir em outra data. No entanto, não foi marcada outra data, ou seja, não houve duas

convocações. O Ministro se prontificou a vir a esta Casa, mas, repito, não veio em

decorrência de enchentes no Nordeste. É importante que o registro seja feito nos

Anais da Câmara dos Deputados.

No início dos trabalhos desta reunião foi lida correspondência do Dr. Jorge

Solla, informando que amanhã não poderia comparecer à reunião, mas que o Dr.

Ademar Artur Chioro dos Reis viria em seu lugar. Entrei em contato com o Ministério

para ver a possibilidade de o Sr. Ademar Arthur Chioro dos Reis vir a esta Casa

mais cedo, mas ele respondeu-me que não seria possível.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - A secretária dele ligou e

confirmou o horário entre 9h30min e 10 horas.

A SRA. DEPUTADA ANGELA GUADAGNIN - Então, devo ter entendido

errado. Desculpe-me, fiz essa observação porque entendi que ele poderia vir às

14h30min.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Com a palavra a Deputada

Laura Carneiro.

A SRA. DEPUTADA LAURA CARNEIRO - Sr. Presidente, em nome do PFL,

agradeço ao Dr. Daniel Tabak as quase 6 horas que estivemos nesta reunião,

principalmente por uma frase que talvez muitos não tenham percebido, pois sei da

sua importância em função do que aprendi hoje.

Ressalto o que disse o Deputado Eduardo Paes sobre a sensação de

vergonha. Sentei-me ao seu lado e falei da minha incapacidade de poder dizer

algumas coisas que deveriam ter sido ditas em certos momentos da reunião.

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Agradeço ao Dr. Daniel Tabak por ter-se dado ao trabalho, depois da crise,

sem ser funcionário pago, sem nenhum cargo comissionado para isso, de enviar e-

mail para os 100 centros internacionais de transplantes de medula. Provavelmente,

a sua atitude fará com que muitas vidas sejam salvas.

Na sua primeira fala, o Dr. Daniel Tabak nos mostrou a fotografia do Rodrigo.

E o Deputado Eduardo Paes me perguntou: “Laura, você balançou?” Eu balancei

porque o Rodrigo tem 8 anos, e eu tenho uma filha de 7 anos de idade. Fico

imaginando o que deve ser para uma mãe perder um filho naquelas condições.

Ser humano, mãe e mulher, agradeço-lhe os seus 17 anos no sistema. Não

fique preocupado. Como bem disse, talvez este mês e meio tenha sido uma grande

contribuição para o futuro, quem sabe até maior do que a dada nesses 17 anos.

A tendência da política é sempre defender com todas as possibilidades que

encontramos, às vezes até de maneira grosseira, as nossas posições ideológicas, e

acabamos confundindo mil coisas. De maneira geral, o senhor deu uma lição a esta

Casa, a todos os Deputados, independente da cor partidária. É muito mais comum

do que incomum ver grandes servidores, grandes profissionais, pessoas que

entendem que a técnica é mais importante que a política quando se trata de saúde

pública, de vida.

Parabéns, Dr. Daniel Tabak, em meu nome, em nome do meu partido e em

nome de muitas mulheres que o ouviram e têm a certeza de que o senhor contribuiu

para que, se um dia um de seus filhos passar pelo que passou o Rodrigo, elas não

sofram o que sofreu a mãe do menino.

Muito obrigada.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Com a palavra o Deputado

Dr. Rosinha.

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Sr. Presidente, agradecemos a presença

ao Dr. Daniel Tabak. Ao contrário do que foi insinuado em discursos anteriores, em

nenhum momento quisemos desqualificá-lo tecnicamente.

Realizamos um debate político, o que se dará sempre nesta Casa.

Rechaçamos a adjetivação de qualquer estratégia seja de quem for. Não temos de

adjetivar nenhuma estratégia. Poderíamos citar a estratégia do Governo passado,

quando houve algo muito mais grave do que ocorreu neste debate.

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Há anos existem mazelas neste País, falta de financiamento e destruição do

Estado brasileiro e dos direitos dos servidores. Impor a culpa a este Governo é

esconder-se das responsabilidades da história recente do País.

Insinuaram que o não-comparecimento do Ministro da Saúde à Câmara dos

Deputados na data marcada é um erro. Estou aqui há 5 anos. No primeiro mandato,

de todas as vezes que convidamos o Ministro da Saúde para vir a esta Casa, ele

compareceu uma única vez. No entanto, no primeiro ano do nosso Governo, o

Ministro Humberto Costa veio 4 vezes a esta Casa: 3 vezes à Comissão de

Seguridade Social e Família e uma à Comissão de Fiscalização Financeira e

Controle.

Não dá para desqualificar, irresponsavelmente, o Ministro da Saúde só

porque esta reunião está sendo televisionada. Não iria argumentar mais nada, mas

não posso deixar que fique na memória de quem está nos assistindo que isso seja

verdade. O Ministro Humberto Costa se oferece para prestar quaisquer

esclarecimentos sem haver a necessidade de convite. Ele estará presente todas as

vezes que for necessário debatermos.

Quanto ao caso do menino Rodrigo, até agora não sei quem foi o responsável

pela morte. Fiz essa pergunta duas vezes. A reunião será encerrada e não vou

saber quem comandava aquela área e quem são os responsáveis.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) - Com a palavra o Dr. Daniel

Tabak.

O SR. DANIEL TABAK - Quero responder à pergunta do Deputado Dr.

Rosinha. Foram muitas perguntas e não quero deixar isso passar em branco. Vim

aqui voluntariamente e não vou sair daqui enquanto houver alguma dúvida.

Não tenho problema com o tempo. Tenho toda a disponibilidade. Se

quisermos ficar aqui por mais 5 horas, para mim não haverá nenhum problema.

O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA - Sr. Presidente, por acaso o Dr. Daniel

Tabak está insinuando que temos problema com o tempo? Esse tipo de insinuação

não será aceita.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Deputado, ele apenas se

coloca à disposição da Casa.

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O SR. DANIEL TABAK – Quanto à responsabilidade do paciente Rodrigo,

deve ser apurada a causa fundamental. Não será preciso convocar a Polícia

Federal. A responsabilidade é da falta de recursos.

Quem estava comandando? Não sou comandante! Não ordeno, pois não

tenho recursos. Sou técnico e funcionário que obedece aos comandos que me são

investidos. Os recursos vêm de cima. Não adianta responsabilizar o Dr. Tabak pela

baixa resolutividade, pois ele não é o todo-poderoso. Os responsáveis pelos

recursos devem ser responsabilizados por isso.

Não poderia deixar de agradecer esta oportunidade. Foi um período extenso,

exigiu demanda importante para que todos os pontos fossem esclarecidos, mas em

nenhum momento tive tanta disponibilidade de tempo para que todas essas

questões pudessem ser finalmente esclarecidas. Não houve nenhum ponto que não

fosse abordado.

Agradeço mais uma vez à Comissão a oportunidade de prestar esses

esclarecimentos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Rafael Guerra) – Dr. Daniel Tabak, segundo

me disseram, tenho de ser Coordenador e Relator desta Comissão, mas o relatório

será feito certamente em conjunto com todos os companheiros, até porque seria

muito trabalho fazer sozinho tudo isso: presidir, coordenar, agendar e fazer o

relatório.

Peço a V.Sa. que nos forneça cópia da extensa documentação que trouxe,

apesar de estar tudo gravado em fita e vídeo. A TV Câmara certamente vai transmitir

esta audiência pública, embora eu não possa agora dizer a data. Então, temos todas

essas informações, mas a documentação que nos puder fornecer será muito

importante.

Agradeço a V.Sa. a disposição de estar aqui até agora. Já estamos falando

há praticamente 6 horas sobre transplantes de medula óssea no Brasil, do Centro de

Transplante, do REDOME, etc.

Quando surgiu o assunto, médico e professor universitário até pouco tempo

em exercício da profissão, procurei naturalmente referências. As que obtive de sua

pessoa foram sempre extremamente elogiosas, e V.Sa. até as superou aqui, com

sua exaltação, entusiasmo e disposição em esclarecer os assuntos, aceitando todo

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o tipo de questionamento e observação. V.Sa. deu contribuição à democracia e à

saúde do nosso País. O setor público precisa de servidores competentes, o que

V.Sa. demonstrou ser.

Tenha a certeza de que, no que depender da nossa Casa, de todos os

Deputados presentes, de diferentes partidos, vamos procurar fazer o melhor, não

simplesmente para estabelecer uma política de caça às bruxas, mas para contribuir

para a melhoria do sistema de transplante no País.

A TV Câmara vai reprisar a reunião hoje às 22 horas; portanto, se tiver

curiosidade, V.Sa. poderá assistir à apresentação.

Agradeço a presença a V.Sa., aos Parlamentares, aos assessores, aos

convidados, à imprensa e aos demais presentes.

O Dr. Ademar Arthur Chioro dos Reis me ligou agora para dizer que enfrenta

dificuldades para vir às 9h30min.

Então, convoco reunião para amanhã, às 14h30min. Faremos um pouco

antes uma reunião deliberativa para votar requerimentos; em seguida, realizaremos

a audiência pública com o Dr. Ademar Arthur Chioro dos Reis.

Está encerrada a presente reunião.