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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI SAVANA LEÃO FACHONE DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE DISSERTAÇÃO DE MESTRADO MESTRADO EM DESIGN PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU SÃO PAULO, SETEMBRO /2012

DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER …ppgdesign.anhembi.br/wp-content/uploads/dissertacoes/83.pdf · 2.1 Design, artesanato e cultura material ... 2.3 Perspectivas do artesanato

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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI SAVANA LEÃO FACHONE

DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO MESTRADO EM DESIGN

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

SÃO PAULO, SETEMBRO /2012

UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI SAVANA LEÃO FACHONE

DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO MESTRADO EM DESIGN

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

SÃO PAULO, SETEMBRO /2012

UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI SAVANA LEÃO FACHONE

DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Design. Orientadora Profa. Dra. Márcia Merlo

São Paulo, setembro/2012

UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI SAVANA LEÃO FACHONE

DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Design. Examinador externo Paulo Roberto Monteiro de Araújo, Doutor, Universidade Presbiteriana Mackenzie Examinadora Interna Gisela Belluzzo de Campos, Doutora, Universidade Anhembi Morumbi Orientadora e presidente da banca Márcia Merlo, Doutora, Universidade Anhembi Morumbi

São Paulo, setembro/2012

Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem autorização do autor.

SAVANA LEÃO FACHONE

Mestranda em Design pela Universidade Anhembi Morumbi. Especialista em Artes Visuais pelo SENAC e graduada em Design de

Moda pela UNIC. Atua como pesquisadora em design e artesanato em Cuiabá – MT ([email protected])

F127d Fachone, Savana Leão

Design e artesanato: o sentido do fazer manual na

contemporaneidade / Savana Leão Fachone. – 2012.

113f. : il.

Orientador: Profa. Dra. Márcia Merlo.

Dissertação (Mestrado em Design) – Universidade

Anhembi Morumbi, São Paulo, 2012.

Bibliografia: f.103-113.

1.Design. 2. Artesanato. 3. Convergência. 4.Fazer manual. 5.

Contemporaneidade. I. Título.

CDD 741.6

DEDICATÓRIA

Ao meu marido, Flávio, por viabilizar a oportunidade de estudo e crescimento intelectual e por acompanhar tudo de perto, sempre dando apoio incondicional; Aos meus filhos, William e Júlia, pela torcida e força nos momentos difíceis, compreendendo os períodos de minha ausência; À minha mãe, Graça, pelos sábios conselhos e por ser minha inspiração diária;

Aos meus irmãos, Sidney, Deivy e Manoela, pela simples existência; À minha sogra, Ivone, por estar sempre por perto na minha ausência; À dona Eliete e dona Tereza, por dedicar parte da vida a cuidar do meu lar.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos aqueles que contribuíram para a realização deste trabalho, em particular: Aos grandes e eternos amigos que fiz no mestrado em especial, a Juliana Zanettini, Luci Sifuentes, Luisa Simão, Natalie Rodrigues, e Viviane de Moraes; Aos queridos professores do mestrado, Profa. Dra. Gisela Belluzo, Profa. Dra. Cristiane Mesquita, Profa. Dra. Kathia Castilho; À Dra. Ana Cristina C. Gonçalves, pelo apoio incondicional nos tempos difíceis; À minha orientadora, Prof. Dra. Marcia Merlo, pela paciência e dedicação; Ao artesão Osmar, pela simplicidade e entusiasmo; À Antonia, pela simpatia e cuidado

RESUMO Esta dissertação traz a análise de experiências que vinculam práticas de trabalho e vivências cotidianas, tendo por objeto de estudo o sentido do fazer artesanal na contemporaneidade. Para isso, dois distintos contextos de produção são abordados: o primeiro é o de um artesão ceramista pertencente à cidade de Cuiabá, Mato Grosso. O segundo diz respeito ao trabalho de um designer ceramista com ateliê na cidade de Nova Friburgo, Rio de Janeiro. O estudo traça um paralelo entre artesão e o designer, sinalizando os pontos convergência entre os campos do design e do artesanato, identificando relações híbridas (CANCLINI, 2008), no intuito de articular as informações oriundas de seus processos de produção e verificar questões relacionadas ao desenvolvimento de seus artefatos no processo de fabricação artesanal, a fim de conhecer e entender o sentido do fazer manual nos dias atuais.

Palavras-chave: 1.Design. 2. Artesanato. 3. Convergência. 4.Fazer manual. 5. Contemporaneidade

ABSTRACT This paper provides an analysis of experiences that link work practices and daily experiences, with the object of study is the sense of craftsmanship in contemporary times. for this, two different production contexts are discussed: the first is that of an artisan potter belonging to the city of Cuiabá, Mato Grosso. The second concerns the work of a designer with a studio potter in the city of Nova Friburgo, Rio de Janeiro. The study draws a parallel between artisan and designer, signaling the convergence points between the fields of design and craft, identifying relationships hybrid (Canclini, 2008) in order to articulate the information from their production processes and verify development issues of its artifacts and the steps taken during the process of manufacturing handcrafted in order to know and understand the meaning of craftsmanship today. Keywords: 1.Design. 2. Craft. 3. Convergence. 4. Craftsmanship. 5. Contemporaneidade.

(...) Não se deve tirar a conclusão de que minhas opiniões inspiram-se em nostalgia de uma época que não pode mais voltar. Pelo contrário, minhas opiniões sobre o trabalho estão dominadas pela nostalgia de uma época que ainda não existe.

Harry Braverman, Trabalho e Capital Monopolista: A degradação do trabalho no século 20, 1987

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................................. 13

Capítulo 1 – Design, Sentido do Trabalho e Contemporaneidade

1.1 Para pensar o trabalho.............................................................................................................. 1.2 Algumas considerações sobre a história do trabalho...............................................................

1.2.1 O design, o trabalho e o movimento Art and Crafts............................................... 1.3 O sentido do trabalho humano: algumas transformações........................................

1.3.1 A dimensão subjetiva do trabalho na contemporaneidade....................................

19

19 22 28 30 33

Capítulo 2 – Design e Artesanato: Domínios do Fazer Humano

2.1 Design, artesanato e cultura material......................................................................................... 2.2 Design e artesanato: aproximações e distanciamentos.............................................................. 2.3 Perspectivas do artesanato na sociedade contemporânea........................................................

Capítulo 3 – Design e Artesanato: O Fazer Manual na Contemporaneidade

3.1 Contexto cerâmico matogrossense: suas mudanças e ressignificações.................................... 3.1.1 O fazer cerâmico artesanal de Osmar Virgílio da Silva.......................................... 3.1.1.1 Primeiro encontro.................................................................................................. 3.1.1.2 Segundo encontro..................................................................................................

3.2 Percurso criativo do designer ceramista Gilberto Paim................................................................ 3.3 O fazer artesanal: uma questão de resistência?............................................................................

CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................................................................

REFERÊNCIAS....................................................................................................................................................

37

37 42 52

59

61 68 71 82 89 97

100 103

LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Quadro de Charles Pearce, 1896. Detalhe do trabalho 23 Figura 2: Trabalho humano 31 Figura 3: Os filtros do artista cuiabano Sebastião Silva 62 Figura 4: Cerâmica cuiabana 64 Figura 5: Índio Bororo em traje ritualístico 64 Figura 6: Santo São Gonçalo 64 Figura 7: Cerâmica São Gonçalo Beira Rio 66 Figura 8: Artesãs de São Gonçalo Beira Rio 66 Figura 9: Osmar e Mestre Vitalino 70 Figura 10: Fachada da casa do artesão Osmar 71 Figura 11: Fachada lateral direita da casa 72 Figura 12: Jogo de chá feito por Osmar 72 Figura 13: Sala da casa do artesão Osmar 73 Figura 14: Sala da casa do artesão Osmar 73 Figura 15: Oficina no fundo da casa do artesão 74 Figura 16: O artesão trabalhando a argila no torno 75 Figura 17: O artesão e suas tarefas domésticas 76 Figura 18: Mulher do artesão Osmar 76 Figura 19: Artesão Osmar no seu ofício 78 Figura 20: As mãos do artesão Osmar 79 Figura 21: Forno construído por Osmar 80 Figura 22: “Barro Vivo” Loja da família 81 Figura 23: Endereço da casa de Osmar 82 Figura 24: Osmar na frente da sua casa 83 Figura 25: “Milheiro de argila” 85 Figura 26: Explicando o novo processo 85 Figura 27: Quebrando o tijolo de argila não queimado 85 Figura 28: Mostrando o ponto da argila para o torno 86 Figura 29: Levantando a argila no torno 86 Figura 30: Modelando a argila no torno 87 Figura 31: Peças secando ao ar livre 87

Figura 32: Na fase da queima no forno que ele mesmo construiu

87

Figura 33: Osmar, sua filha caçula e seu violão 87 Figura 34: Gilberto Paim 90 Figura 35: Uma imagem da amostra em Heidelberg, na Alemanha.

91

Figura 36: Peças da coleção “A quatro mãos” 92 Figura 37: Interior do ateliê de Gilberto e Elizabeth, em Nova Friburgo

92

Figura 38: Gilberto e Elizabeth analisando as fotos da coleção 93 Figura 39: Gilberto amassando a argila branca de porcelana 93 Figura 40: Piões de porcelana, Gilberto Paim, 2006 94 Figura 41: Gilberto desenhando o objeto cerâmico 95 Figura 42: Esboço da peça de Paim 95 Figura 43: Umidificando a argila 95 Figura 44: Na modelagem da argila 95 Figura 45: Levantando a argila no torno 96 Figura 46: Medindo a circunferência 96 Figura 47: Usando uma de suas ferramentas 96 Figura 48: Encaixando a base da peça 96 Figura 49: Objetos de cerâmicas espalhados pela casa de Paim 96

13

INTRODUÇÃO

Esta dissertação traz a análise de experiências que vinculam

práticas de trabalho e vivências cotidianas, tendo por objeto de

estudo o sentido do fazer artesanal como forma de resistência na

contemporaneidade. Para isso, serão abordados dois contextos

distintos de produção: o primeiro é o de um artesão residente em

Cuiabá, Mato Grosso. O segundo diz respeito ao trabalho de um

designer ceramista, conhecido internacionalmente, que reside na

cidade de Nova Friburgo, Rio de Janeiro.

O estudo traça um paralelo entre artesão e designer,

sinalizando os pontos de convergência na questão do fazer

manual e os possíveis pontos de divergência entre os campos do

design e do artesanato. Identifica, também, relações híbridas

(CANCLINI, 2008), no intuito de articular as informações oriundas

do processo de produção de suas peças cerâmicas1, a fim de

conhecer e entender o sentido do fazer manual nos dias atuais.

Ao mesmo tempo, observa os saberes e fazeres que

integram o conjunto de habilidades para criação de artefatos

cerâmicos, gerando oportunidades de ocupação e renda para

alguns trabalhadores e modo de vida para outros. Analisa,

também, as condições nas quais ocorre a assimilação desse saber

por designers e outros profissionais, referenciando

favoravelmente sua própria criatividade e sua produtividade.

A pesquisa foi limitada a estas duas situações devido à

necessidade de compreender a produção cerâmica artesanal

contemporânea a partir dos contextos local e global,

considerando similitudes nos modos de produção e com histórias

marcadas pelo fazer artesanal, que, em ambos os casos, revelam-

se como fundamental “modelador” da pesquisa.

1 Quando falamos em cerâmica, o fazemos de forma concisa e a relacionamos

a objetos utilitários e artísticos, feitos artesanalmente.

14

No estudo do processo de produção da cerâmica artesanal

desenvolvida por Osmar Virgílio da Silva, artesão matogrossense,

esta pesquisa objetiva compreender como se dão as interações

entre sujeito artesão e artefato construído, e os passos

percorridos durante o processo de fabricação artesanal, a fim de

conhecer e entender sua concepção nos dias atuais.

Acreditamos que a atividade criativa do artesão e do

designer ceramista seguem metodologia projetual semelhante,

mas o caráter empírico do primeiro gera, por vezes,

discriminação.

Decerto que nenhuma escolha é aleatória e todas elas têm

sua razão de ser. O esclarecimento dos motivos que provocaram

a opção pelo tema provavelmente pode contribuir para um maior

conhecimento da trajetória desta pesquisadora, pois eles derivam

das experiências com artesãos durante a minha formação

acadêmica, além das escolhas profissionais que levaram minha

pesquisa na área de design para a discussão da relação com o

artesanato. Desde a graduação em Design de Moda, na

Universidade de Cuiabá, minha experiência tem sido trabalhar

com artesãos, mais especificamente com famílias artesãs.

No início, tive a oportunidade de me relacionar com

indivíduos e grupos que ainda trabalhavam e viviam sob lógicas

sociais e culturais diversas da cultura homogeneizante. Foi

quando percebi a relação entre homem e trabalho num universo

ideológico que envolvia os processos de produção manual.

A dinâmica utilizada nos trabalhos que desenvolvíamos

consistia em oficinas de artesanato organizadas pela instituição

de ensino e pelo poder público da cidade, numa parceria que

buscava a autossuficiência dos artesãos e das comunidades

artesanais locais através da comercialização de produtos. Esse

tipo de oficina funcionava como catalisador de ideias, pois não

havia regra ou forma única de realizar as atividades – o objetivo

era despertar o sentimento de cidadania, estimular a

conscientização ecológica e proporcionar alternativas para

geração de renda. Além da capacitação dos artesãos, as

atividades tinham o intuito de despertar a criatividade para

confecção de peças originais, viáveis e de baixo custo. Neste

15

sentido, pensava-se a reconfiguração do produto pelo design a

fim de facilitar a sua inserção no mercado, além de dar corpo ao

papel social dos futuros designers.

Essa experiência despertou meu olhar analítico sobre o

artesanato como importante recurso de desenvolvimento, em

razão do impacto econômico que produz em determinadas

regiões do país, pela demanda do mercado, a geração de

ocupação e renda e o aproveitamento equilibrado dos recursos

naturais. Ademais, a atividade ajuda a preservar as tradições

locais e a fortalecer o sentimento de pertencimento.

Portanto, esta investigação representa o desdobramento de

questões em torno do fazer artesanal como forma de resistência,

motivada por reflexões acerca do sentido deste trabalho nos

tempos atuais.

A realização de um trabalho que seja útil para a sociedade

ajuda a viabilizar desenvolvimento, valorização, reconhecimento

e, consequentemente, autorealização. Por outro lado, um

trabalho em choque com valores pessoais tem mais dificuldade

de obter reconhecimento – por muitos ou por muito tempo. É

mais costumeiramente improdutivo, rotineiro ou pouco

desafiador. A cerâmica é, sem dúvida, um tema relevante, como o

são todos aqueles que resultem numa obra e que envolvam um

criador.

O estímulo à promoção de atividades econômicas baseadas

no fazer manual ou em manufatura similar tem permitido a

inclusão produtiva de segmentos populacionais menos

favorecidos, particularmente aqueles retidos no conhecimento

informal – aprendido em relacionamentos primários e

intergeracionais –, e o ensino formal, da lógica da educação para

o mundo do trabalho (MARINHO, 2007).

A motivação também está na crença de que, com incentivo

e valorização, é possível inserir a produção artesanal no sistema

produtivo, fortalecendo o desenvolvimento local com valor

agregado a partir da associação dessa produção ao contexto

sociocultural. Favorece, por conseguinte, a aceitação do

artesanato no mundo contemporâneo como mercadoria

diferenciada e de produção não massificada.

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Assim, esta pesquisa orientou-se para a compreensão do

fazer manual na contemporaneidade como processo de

atribuição de significados, pautando a prática cerâmica do

artesão matogrossense Osmar Virgílio da Silva e do ceramista

carioca Gilberto Paim, assim como questões pertinentes à vida e

ao processo produtivo de ambos. Acreditamos que investigação

sobre o sentido do trabalho manual leva a indagar se ainda há

espaço na vida contemporânea para esse tipo de atividade e

quais as garantias de sua permanência.

Caminhos de Pesquisa

Na investigação empírica, feita no contexto do artesão

Osmar, adotou-se a abordagem qualitativa, que permite maior

aprofundamento. Esse caminho possibilitou registrar a história de

vida da família sob a forma de estudo de caso. Assim, buscou-se

estabelecer uma relação entre o que foi apresentado pelo artesão

e o que foi pesquisado em relação ao designer ceramista e os

contextos sociais em que se inserem, conseguindo reconstruir

experiências das trajetórias profissionais vinculadas à própria

história social.

Talvez a parte mais significativa deste projeto tenha sido a

coleta de depoimentos, que foram pontuados por sentimentos e

confissões a respeito do trabalho e da vida, com detalhes acerca

das tradições, crenças, manifestações culturais e práticas de

trabalho.

Ao analisar o processo de construção de artefatos e seu

significado para os atores sociais envolvidos, revelou-se como

essas pessoas constroem e transformam suas histórias, suas

relações sociais e o sistema de representação que as orienta por

diferentes planos da vida social.

Alguns dilemas surgiram, centrados nas dificuldades

teóricas e práticas que geralmente aparecem em torno das

metodologias e das interpretações do cotidiano enfrentadas por

pesquisadores que vivenciam a realidade da pesquisa de campo.

Os resultados dessa iniciativa foram organizados em três

capítulos:

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O primeiro capítulo aborda o mundo do trabalho até a

contemporaneidade, observando a reestruturação produtiva e

cultural facultada pelo processo de industrialização acelerado

durante o afloramento da idade moderna, além de discutir a

divisão do trabalho e o aparecimento da figura do designer.

No segundo capítulo, é destacado o referencial teórico

central para o desenvolvimento da pesquisa sobre Design e

Cultura Material. Ali, é debatido o conceito de design que vem a

constituir um referencial teórico para estruturar a pesquisa

proposta.

No terceiro capítulo, dois contextos são analisados: de um

lado, o de Osmar Virgílio da Silva, seu cotidiano, o espaço da

produção e o sentido que o artesão dá ao seu trabalho,

juntamente com o contexto sociocultural cuiabano; de outro

lado, a experiência de Gilberto Paim e as maneiras de construir

seus artefatos na possibilidade de verificar como se dão as trocas

culturais entre ambos.

18

CAPÍTULO 1

19

CAPÍTULO 1

DESIGN, SENTIDO DO TRABALHO E CONTEMPORANEIDADE

Os novos métodos de trabalho estão indissoluvelmente ligados a um determinado modo de viver, de pensar e sentir a vida; não é possível obter êxito num campo sem obter resultados tangíveis no outro. Antônio Gramsci, Maquiavel, a política e o Estado Moderno (1976).

1.1 Para pensar o Trabalho

O retorno a Karl Marx no bojo desta dissertação é

necessário para refletir acerca das questões concernentes ao

trabalho. Ainda mais quando se compreende o fazer artesanal

como uma prática laboriosa. Assim, encaramos que um dos

objetos de análise daquele teórico do século 19 continua regendo

o cotidiano contemporâneo, na esfera do trabalho humano na

sociedade capitalista. Suas ideias, cuja abordagem contribuiu para

desvendar a lógica dos processos sociais da época, também

denunciavam as contradições básicas desse sistema (BERMAN,

1998).

Em que pesem as mudanças e os problemas que afetam a

humanidade neste início do século 21, o pensamento do autor

alemão voltou à ordem do dia. Entretanto, esse retorno só fará

sentido se reconhecermos nessas mudanças novas pistas para a

análise dos desafios impostos pela contemporaneidade.

Têm sido cada vez mais frequentes as pesquisas

relacionadas às novas direções dos estudos de Marx, cujas

determinações estruturais têm recebido considerável atenção no

mundo acadêmico, embora ainda sejam objeto de intensas

disputas teóricas, segundo Alvaro Bianchi (2007), professor do

Departamento de Ciência Política do Instituto de Filosofia e Ciências

Humanas da UNICAMP (IFCH) e diretor do Centro de Estudos Marxistas

(CEMARX).

O presente estudo traz à tona a valorização do sentido do

trabalho humano – discussão relevante em dias atuais.

20

Diversos estudiosos da área têm dedicado anos de pesquisa

e nos auxiliam com suas contribuições, como: Albornoz (1986-

2004), Astrada (1968), Braverman (1981-1987), Huberman,

(1976). Um dos aspectos que chama atenção é a existência de um

ponto comum entre esses autores: em suas análises, todos eles

tomam como referência a concepção de trabalho em Marx – uns

para questionar, outros para fundamentar suas posições.

A contribuição de Max não se restringe à análise das

relações de trabalho na sociedade capitalista, agregando

conceitos como: concreto e abstrato, morto e vivo, embora deixe

transparecer uma teoria antropológica do trabalho em vários de

seus textos (ALBORNOZ, 1986).

Max (2002) criticou o modelo de exploração do capitalismo,

que vê a força de trabalho apenas como mercadoria. Destacou

que só o trabalho gerava riqueza, e quem a produzia não tinha

direitos, portanto, a história do homem consolidou-se na dos

interesses opostos, subjacentes a toda relação social. A alta

centralidade das atividades laborais na vida das pessoas, como

autoconstrução do ser humano, surge nesta concepção histórica.

O trabalho foi, na realidade, o personagem central na teoria

marxista, não apenas com a emancipação da classe trabalhadora,

mas com a libertação do homem em relação ao trabalho

alienante e explorador. Essas referências oportunizam o

entendimento entre homens, o sentido e o valor do trabalho.

Na análise de Marx, encontramos o modo de produção

capitalista e suas relações de produção e de circulação ou, em

outras palavras, “a lei econômica do movimento da sociedade

moderna” (MARX, 2002, p. 18). Aqui, o teórico considera o

trabalho em sua significação mais ampla, como possibilidade de

transformação da realidade natural e social. Para ele, os homens

produzem seus meios de vida e estabelecem relações sociais

baseadas nas condições materiais de sua existência. O estudo de

qualquer sociedade pressupõe essas relações sociais como ponto

de partida. Para ele, o trabalho é um processo ontológico:

Trabalho é um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano, com sua própria ação, impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza. Defronta-se com a natureza como

21

uma de suas forças. [...] atuando ainda sobre a natureza externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza (MARX, 2002, p. 211).

Segundo Hobsbawn (1985) a base da teoria de Marx sobre o

desenvolvimento social e econômico é a análise do homem como

animal social que, ao realizar o trabalho, cria e reproduz sua

existência no cotidiano. Assim, percebe-se que a categoria acolhe

uma definição de homem como sendo aquele que, para ser,

necessita produzir os seus próprios meios de subsistência

material e simbólica.

Nesta análise, é premente levar em conta os efeitos do

desenvolvimento tecnológico mundial, considerando que o

processo de adaptação das técnicas de produção material para a

forma capitalista se deu sobre uma cultura de produção

artesanal. Os traços fundamentais desse ajustamento definiram e

caracterizaram o Design e, principalmente, sua importância e

responsabilidade dentro do contexto socioeconômico e na

interação entre homem e trabalho. As mudanças estruturais que

ocorreram e os fatos geradores daquele cenário, além das

interações sociais e culturais que marcaram sua eclosão, são

sentidas e analisadas até os nossos dias.

Nos limites desta pesquisa, optou-se por traçar um

panorama a partir da Revolução Industrial, onde o trabalho foi

substituído por um modelo que se aproximasse da lógica de

expansão do sistema capitalista, momento em que sociedade e

comunidade se organizavam e se transformavam

constantemente.

Com essa perspectiva, de um lado representando um dos

enclaves econômicos do mundo atual, e de outro, estabelecendo

diferentes padrões para a constituição de alianças produtivas nos

territórios, há que se entender melhor o trabalho humano e suas

formas de institucionalização.

Aceitando o desafio de refletir sobre essas questões, a

análise começou pela revisão dos conceitos básicos de trabalho, a

fim de embasar a reflexão proposta neste capítulo introdutório.

22

1.2 Algumas considerações sobre a história do trabalho

A história do trabalho acompanha a história da própria

humanidade, adquirindo diferentes significados conforme a

cultura, os valores, a visão e o espírito de cada época. Segundo

Martins (1994), desde as primeiras sociedades humanas até os

dias atuais, o trabalho assumiria os seguintes significados.

Embora, não acreditamos que tenha sido dessa forma, tão

categórica, colocamos na forma de tabela para melhor

visualização:

Na pré-história Uma atividade lúdica

Na Antiguidade Maldição divina

Nos primórdios do

Cristianismo

Forma de expiação do pecado

original; meio de compaixão

No Cristianismo da Idade

Média

Remédio para as tentações

Com a Reforma Luterana Direito e dever ou um meio para a

salvação

Na Revolução Industrial Expressão da criatividade humana

No início do século 20 A maior obsessão

Nos dias correntes Atividade em questionamento

No porvir Resgate de seu sentido original

Tabela 1: Na tabela, a época e o significado dado ao trabalho. Fonte: acervo pessoal

Na reflexão de Carlos Astrada (1968), a ascendência

etimológica da palavra “trabalho” em português, trabajar em

espanhol, como a do travailler francês e do travagliare italiano, é

o vocábulo latino tripaliare, do substantivo tripalium – aparelho

de tortura formado por três paus onde eram amarrados os

condenados, gladiadores e escravos romanos. O trabalho tinha

conotação negativa e sua definição original influenciou alguns

idiomas de acordo com o contexto histórico e social.

23

O sentido do trabalho estava relacionado aos valores

religiosos da época, era visto como uma ocupação para livrar o

indivíduo das possíveis tentações. Não propiciava satisfação aos

trabalhadores, era realizado para atender aos objetivos da Igreja.

Era considerado uma punição para o pecado e, a partir dele, era

possível a purificação do corpo e alma (ALBORNOZ, 1986).

Figura 1: Quadro de Charles Sprague Pearce, 1896. Detalhe do trabalho. Fonte: www.apropucc.org.br. Acesso: 20/05/2012

O significado de sofrimento e de punição relacionado ao

termo trabalho perpassou a história da civilização e, por muito

tempo, a palavra exprimiu uma experiência dolorosa de

padecimento, cativeiro, castigo, punição. Esta concepção atingia

o estatuto jurídico e político dos trabalhadores (BUENO, 1988).

A valorização positiva do trabalho emergiu na Europa, dada

à capacidade de produção e a concepção de vida e sociedade

vivenciadas na época. As organizações produtivas conhecidas na

sociedade eram as corporações de ofício, que regulavam o

trabalho artesanal. Essas corporações garantiam a atividade aos

trabalhadores, inibindo a concorrência e controlando a qualidade

dos produtos. Elas conseguiam assegurar o crescimento da vida

urbana por meio do desenvolvimento comercial para a

emancipação das cidades incipientes (CARDOSO, 2008).

Essa atividade se caracterizava pela espontaneidade, na

medida em que os artesãos eram livres para organizar seu

trabalho e tinham controle sobre todo o processo produtivo. Os

artesãos “eram donos do espaço físico da produção, das

matérias-primas, dos meios de produção e, por último, podemos

dizer que eram senhores da totalidade do processo de trabalho”

(FORTY, 2007, pp. 67-68). Não havia separação entre saber e

24

fazer, entre concepção e execução. Além de se reconhecer no

produto do seu trabalho, o artesão tinha acesso a ele.

Nas relações de produção, as corporações eram regidas por

uma hierarquia piramidal. O topo era ocupado pelo mestre

artesão, também proprietário das ferramentas, da matéria-prima

e dos produtos finais. A base era preenchida pelos aprendizes,

que, em troca de seu trabalho, recebiam do mestre moradia,

alimentação e vestuário (MACHADO, 2007).

Mestres e aprendizes exerciam seus ofícios em todas as

fases – da matéria-prima ao produto final. Dentro dessa

estrutura, não se realizava apenas uma atividade laboral;

desenvolviam-se habilidades que proporcionavam satisfação

pessoal (ALBORNOZ, 2004).

Com o passar do tempo, a introdução de novas tecnologias

aplicadas à produção e o aparecimento de ideologias ligadas ao

progresso individual e social, o conceito de trabalho alterou-se. A

ideia de tortura, maldição, castigo, deu lugar ao trabalho como

fonte de realização, como meio de dignificação do indivíduo.

Estabeleceram-se também mudanças significativas na estrutura

da sociedade, entre as quais a revolução agrícola e o surgimento

das cidades (CARDOSO, 2008).

Com o aparecimento dos grandes centros, uma mudança

importante ocorreu a partir da crescente migração do homem do

campo para a cidade, atraído pela imagem de dinamismo da vida

urbana e a possibilidade de ascensão social. Antes envolvidos

exclusivamente com os processos de produção agropecuária, os

recém-chegados passaram a se ocupar especialmente do

comércio e da indústria. Esse movimento se ampliou até a

transformação do sistema de produção na sociedade industrial,

em que o homem era essencialmente produtor (HUBERMAN,

1986).

Nesse âmbito, o trabalho fora incorporado à ideologia

burguesa como categoria universal e fundadora de toda a vida

social, como atividade natural de produção e troca de valores de

uso, necessária à reprodução material da vida em sociedade

(BAUMAN, 2001).

25

Entretanto, o marco das mudanças para os modelos de

organização do trabalho e as atividades humanas como os

conhecemos hoje foi a Revolução Industrial, na Inglaterra do

século 18, com mecanização dos meios de produção, oposição ao

modo artesanal – exclusivo, até então –, entre inúmeras

transformações agudas e definitivas. Este período de revolução

faz parte de um rol de mudanças ainda maior, conhecido como

Modernidade2, que transformou valores, rompendo com os

costumes tradicionais.

Essas mudanças dependeram muito menos de novas

máquinas do que se costuma imaginar. Antes de tudo, deveram-

se à organização do trabalho, à produção e à distribuição, ou seja,

mudanças de ordem social, muito mais do que tecnológica

(CARDOSO, 2008).

2 Segundo Berman (1986), a Modernidade compreende um tempo histórico

que pode ser dividido em três fases: a primeira vai do século 16 ao 18 e é marcada pelo período de transição; as pessoas iniciam a experiência com a vida moderna. A segunda fase, do final do século 18 ao início do 19, aflora os sentidos revolucionários nas pessoas, provocando mudanças nos meios sociais, pessoais e políticos. A grande mudança de valores, segundo o autor, acontece na terceira fase, e é marcada pela expansão da modernização no século 20.

A consciência comum em relação às técnicas do processo

produtivo diminuía, enquanto crescia a sua especialização. A

indústria buscava maior produtividade para atender à sociedade.

Dividir3 o trabalho e particularizar determinadas áreas do

processo de produção foi uma forma de aperfeiçoar o resultado

final (HUBERMAN, 1986).

A divisão do trabalho instituída nos processos de fabricação

industrial superava o modo de produção artesanal. Não só o

trabalho foi dividido, mas a vida também. Segundo Forty (2007):

A maior parte da produção e do comércio era realizada nas residências dos artesãos, comerciantes ou profissionais envolvidos, e compreendia-se a casa como um lugar que incorporava o trabalho às atividades habituais de

3 A expressão “divisão social do trabalho” é vista em estudos de diferentes

áreas do conhecimento humano, como economia, sociologia, antropologia, história etc. Porém, é empregado nesta dissertação no sentido utilizado por Marx (2002) para indicar o modo como o trabalho foi distribuído nas estruturas socioeconômicas, no que tange a formação da força de trabalho. Essa divisão se dá entre quem concede e quem executa o trabalho, isto é, entre os donos dos meios de produção e os donos da força de trabalho. Para Marx, essa divisão sempre existiu, é inerente ao trabalho humano e diz respeito às tarefas econômicas, políticas e culturais.

26

morar, comer, dormir e assim por diante (pp. 137-138).

A antiga relação individual do artesão com sua ferramenta

de trabalho ofuscou-se e os trabalhadores inseridos nas relações

de produção passaram a atuar frente às máquinas, divididos

hierarquicamente e organizados em unidades de produção. A

industrialização fragmentou o trabalho, dividindo-o em tarefas e

em responsabilidades. Isso possibilitou aos comerciantes exercer

o controle sobre o ritmo, o tempo e o volume da produção.

Braverman faz uma interessante atualização da análise de Marx:

Cada uma das fases do processo de trabalho é separada, tanto quanto possível, do conhecimento especializado e da formação, e reduzido a uma simples operação. Enquanto isso, as relativamente poucas pessoas que tiveram acesso ao conhecimento especializado e à formação, são libertadas, na medida do possível, das obrigações relacionadas com as operações simples. Deste modo, todo o processo de trabalho se enquadra numa estrutura que nos seus extremos polariza aqueles cujo tempo é infinitamente valioso, e aqueles cujo tempo quase nada vale. Inclusivamente, poder-se-ia designar isto como

a lei geral da divisão capitalista do trabalho. Esta não é a única força que atua sobre a organização do trabalho, mas é certamente a mais poderosa e a mais abrangente. Os seus resultados, mais ou menos conseguidos em todo o tipo de indústria e de ocupação, dão um forte testemunho da sua validade. Ela molda não apenas o trabalho, mas também as populações, pois a longo prazo leva à criação de uma força de trabalho massificada e desqualificada que é a característica principal das populações em países capitalistas desenvolvidos (BRAVERMAN, 1987, pp. 82-83).

O trabalho se separava do resultado, num processo

apontado, por Marx, como alienação (HUBERMAN, 1986). O que

caracterizava a alienação não era a divisão do trabalho em si, mas

a redução das tarefas produtivas em parcelas sem significado ou

sem relação com o produto final do trabalho. Vale lembrar que

este mesmo autor considerava o capitalismo um moderno

modelo de produção no que diz respeito à ampliação das forças

produtivas, mas, ao mesmo tempo, pobre porque que se apoiava

na exploração do trabalhador (BRAVERMAN, 1981).

27

O trabalho industrial impunha uma cultura própria, de

economia de gestos, de produzir mais no menor tempo possível,

de acumulação de bens (CARDOSO, 2008). Uma cultura que ia

contra a cultura do campo, onde o trabalho, ainda que longo e

cansativo, respeitava os ritmos naturais 4.

A expectativa que se tinha com a fragmentação era de que

as tarefas, quando reduzidas no tamanho e na complexidade,

dentro de um processo, proporcionavam melhor desempenho

quanto à quantidade produzida. Este aspecto diz respeito à

eficiência que se conseguia em termos de volume no final da

produção dos artefatos. O trabalhador deveria adequar-se aos

novos tempos. A quantidade e qualidade do trabalho produzido

não dependiam diretamente da capacidade do operário. Pela

primeira vez, o processo produtivo saía das mãos do artesão e

passava a ser de domínio das máquinas, ou seja:

4 O ritmo natural do tempo conhecido e vivido no campo era voltado para a

colheita e se resumia em dia e noite, ou ainda em estações do ano. A distribuição do tempo, no decorrer do dia, acontecia de maneira natural. Até mesmo os limites do corpo e da necessidade natural do trabalho, era o que determinava o inicio e o fim das tarefas (CAMARGO, 1986).

Com a sociedade industrial o trabalho torna-se público, isto é, sai da esfera doméstica. A vida passa a ser enquadrada pela obrigação/rotina da fábrica e ao escritório. Intensifica-se o trabalho humano, racionaliza-se, maximizam-se as tarefas pela especialização. Eficácia e rendimento máximo passam a ser as coordenadas fundamentais da sociedade produtiva (SEARA, 2003, p. 11).

O desenvolvimento prático do trabalho se acentuava no

sistema capitalista. O trabalho começava a perder seu caráter

humanizador e se transformava em um instrumento de

sobrevivência (ARRUDA, 2001), alterando valores substanciais

concernentes ao trabalho e seu significado.

Desse modo, a partir da análise de Forty (2007), que afirma

que a história do design também é a história das sociedades, as

explicações sobre suas mudanças devem apoiar-se, também, na

compreensão de como o design afetou os processos das

economias modernas e é afetado por eles 5.

5 Um episódio histórico importante sobre a divisão do trabalho humano e o

papel do designer foi o estabelecimento da Cerâmica Wedgwood, fundada na

28

1.2.1 O design, o trabalho e o movimento Arts and Crafts

Com o conjunto de mudanças que se seguiram, as grandes

fábricas, aos poucos, foram tomando o lugar de pequenas

oficinas artesanais. Isso eliminava a necessidade de empregar

trabalhadores com alto grau de capacidade técnica. Era

necessário apenas um “designer” 6, escolhido por suas

habilidades (CARDOSO, 2008).

É complexo falar de surgimento histórico para uma

atividade como o design, pois se trata de concepção de produtos

que satisfaçam as necessidades humanas. Entretanto,

observamos que a divisão do trabalho é considerada um dos

fatores de reconhecimento da prática projetual como atividade

Inglaterra em 1759 por Josiah Wedgwood. Por mais de dois séculos, a empresa estabeleceu um padrão em todo o mundo para as louças finas e cerâmicas decorativas (FORTY, 2007). 6 O termo designer é colocado entre aspas, por que na época não havia esta

denominação, sendo que a transformação dessa figura separado da experiência produtiva e habilitado a gerar projetos, fez parte de um longo processo histórico que teve seu início na organização das primeiras escolas de design no século 19 (CARDOSO, 2008).

dentro do processo produtivo. O historiador Forty (2007, p. 50)

expõe que:

Quando a manufatura foi dividida em processos realizados por diferentes trabalhadores, foi necessário adicionar mais um estágio, o da preparação de instruções para os vários operários: na verdade, um estágio de design.

Cardoso (2008) fala que os primeiros designers eram

aqueles trabalhadores promovidos por questão de habilidade,

que passariam para uma posição de controle e concepção em

relação às outras etapas da divisão:

Não era raro encontrar nas fábricas de cerâmica, os modeladores, responsáveis pela etapa de configuração de peças que seriam produzidas, que tinham o controle sobre os aspectos mais decisivos do processo produtivo. Eles recebiam mais que o artesão comum, entretanto, essa despesa era vista como vantagem, visto que o emprego de um profissional qualificado para elaborar o projeto era garantia de maior aceitação comercial das peças (CARDOSO, 2008, p. 31).

29

Assim, um dos aspectos mais interessantes da transição da

cultura artesanal para a cultura industrial foi o crescente uso de

projetos para uma produção em série. Mas, de acordo com

Margolin (2004, p. 43), "desde a Revolução Industrial, o

paradigma de design dominante tem sido o de desenhar para o

mercado”, para atender uma necessidade imediata por

profissionais capazes de adequar os desejos do consumidor e os

objetos anteriormente manufaturados aos novos processos

industriais de fabricação.

O que confirma o que Heskett (1998) diz sobre o poder

humano de controlar e dar forma ao seu ambiente a partir da

indústria mecanizada, alterando quantitativa e qualitativamente a

vida humana. E ainda, sobre o design ter surgido da tradição

artesanal, mas ter se desenvolvido de tal forma que se tornou

cada vez mais distante de sua origem. Durante seu

desenvolvimento, foi levado à atividade puramente artística, o

que "fez com que parecesse fútil e relegou-o à condição de mero

apêndice cultural" (FORTY, 2007, p.12).

Entretanto, à medida que esse sistema se desenvolvia, o

trabalho do designer passava a ser respeitado e influenciava o

desenvolvimento de inúmeros artefatos para a sociedade que

crescia aceleradamente. Esse profissional adquiria grande

importância para o mundo capitalista, trazendo implicações

significativas à cultura e à vida em sociedade (CARDOSO, 2008).

Porém, se o desenvolvimento tecnológico tornou possível a

passagem gradativa do trabalho manual para o trabalho

mecanizado; avanço nos índices de produtividade; redução de

custos e aumento dos lucros; a qualidade na criação e execução

dos produtos diminuiu, tornando apropriadas as ideias e

pensamentos do movimento conhecido como Arts and Crafts 7

(Artes e Ofícios).

Esse movimento surgiu na Inglaterra, na segunda metade

do século 19, com diversas organizações e oficinas voltadas para a

7 A herança do movimento pode ser aferida até hoje em todo o mundo, pela

propagação de estúdios de cerâmica, tecelagem, joalheria e outros, e pela organização de diversas escolas de artes e ofícios. In: Enciclopédia Itaú Cultural Artes Visuais. www.itaucultural.org.br. Acesso: Acesso: 25/03/2011.

30

produção de artefatos de vários tipos em linha artesanal ou

semiartesanal.

Os protagonistas John Ruskin e William Morris, além de

buscarem uma relação igualitária entre os trabalhadores

envolvidos na produção, objetivavam a integração entre projeto e

execução; a união entre o saber e o fazer; manutenção de

padrões elevados em termos de qualidade de materiais;

revalorização das artes e dos ofícios; renascimento do artista

artesão, acreditando ser possível um mundo cunhado pelas mãos

humanas por meio do trabalho, preservado no seu sentido maior

(BARATA, 2008), em contraposição à massificação industrial.

Ruskin pode ser considerado um dos pioneiros,

influenciando pensadores e projetistas com suas ideias e

conceitos, ampliando consideravelmente seus argumentos

durante todo o século 20. Ele se posicionava contra a divisão do

trabalho e a “mecanização” do ser humano, por acreditar que os

frutos da produção em série não justificavam a perda do “espírito

humano” (PINHEIRO, 2008).

1.3 O sentido do trabalho humano: algumas transformações

Pensar sobre o trabalho, hoje, é assumir uma postura

teórica sobre a sociedade atual. Todavia, acreditamos que as

mudanças expressivas por que passam as sociedades capitalistas,

desde as últimas décadas do século 20, não se ajustam à ideia de

ruptura com a sociedade dita moderna, do século passado. Assim,

podemos pensar em transformações e continuidades, pois, como

afirma Harvey (2000), “[...] há mais continuidade do que

diferença [...]” (p. 111) nos movimentos históricos em curso.

No início deste capítulo, foram apontadas as

transformações pelas quais passou e passa o mundo do trabalho,

que tem sido objeto de análise de diversas áreas do

conhecimento, como filosofia, psicologia, sociologia, antropologia

e outras. Considerando as transformações contemporâneas,

vários autores, como Antunes (1999), Morin (2001) e Tolfo (2005)

vêm investigando as implicações dessas mudanças e os sentidos e

significados atribuídos ao trabalho hoje.

31

Acreditamos, assim como Wanderley Codo (1999), que uma

vida cheia de sentido em todas as esferas do ser social somente

poderá efetivar-se por meio da destruição das barreiras

existentes entre tempo de trabalho e tempo de não trabalho.

Uma vida cheia de sentido fora do trabalho supõe uma vida

dotada de sentido dentro do trabalho. Quanto mais criativo e

completo for o trabalho, mais o homem cria-se a si mesmo.

Figura 2: Trabalho humano. Fonte: www.donizetimarcolino.blogspot.com.br. Acesso: 20/05/2012

De acordo com Morin (2001), há três circunstâncias

importantes pessoais em relação ao trabalho:

O sentido que uma pessoa encontra na função exercida;

O sentimento de responsabilidade em relação aos

resultados obtidos;

O conhecimento de seu desempenho no trabalho.

Muitos estudos sobre sentidos e significados do trabalho

vêm sendo realizados. Dentre as atuais pesquisas sobre o

assunto, destacam-se as de Hackman e Oldham (1976, apud

MORIN, 2001), que consideram um trabalho carregado de sentido

aquele se torna importante, útil e legítimo para quem o realiza.

Em relação às circunstâncias, os autores apresentam os seguintes

atributos ou dimensões principais do trabalho:

A identificação com o trabalho, ou seja, atividade não

alienante, na qual o trabalhador consiga identificar todo o

processo, desde sua concepção até sua finalização;

A multiplicidade de tarefas, trabalhos variados que

possibilitem o uso de várias competências humanas;

Autonomia, ou seja, o grau em que o trabalho permite

liberdade individual, independência, poder de decisão

32

para planejá-lo e determinar os procedimentos para sua

execução;

A significação do trabalho, ou seja, o cumprimento do

trabalho com impacto positivo na vida de outras pessoas

seja no contexto do próprio ambiente ou na sociedade.

Assim, acreditamos que para pensar o sentido do trabalho,

além de levantarmos questões sobre a sociedade e sua

organização, sobre o funcionamento da economia, das relações

laborais e de mercado, e questionar o modelo econômico

dominante, implica ainda discutir esses atributos.

No Brasil, muitos estudos sobre sentidos e significados do

trabalho também vêm sendo concretizados com base nas

investigações desenvolvidas pelo Meaning of Work – MOW

(TOLFO et al., 2005) – um grupo internacional de pesquisadores

que investiga a década de 1970 e o sentido e centralidade do

trabalho em diversos países.

Esses pesquisadores estabeleceram, a partir de estudos

empíricos, as seguintes dimensões: centralidade do trabalho

(importância atribuída a ele em determinado momento da vida

da pessoa), normas sociais sobre o trabalho (derivadas de valores

morais relacionados ao trabalho) e resultados valorizados do

trabalho (dimensão relacionada a motivações que levam a

trabalhar) (BLANCH, 2003; TOLFO & PICCININI, 2007).

Além da diversidade de pontos de vista teóricos, os estudos

empíricos nesse campo optam por usar ora a expressão sentidos,

ora significados do trabalho, às vezes como sinônimos, às vezes

como conceitos diferentes. Para tanto, aqui serão tomadas como

ponto de partida as seguintes concepções: os significados são

como construções elaboradas coletivamente em determinado

contexto histórico, econômico e social concreto. Já os sentidos

são uma produção pessoal decorrente da apreensão individual

dos significados coletivos nas experiências cotidianas. É

importante ressaltar as transformações pelas quais passam os

sentidos e os significados, uma vez que são construídos em uma

relação dialética com a realidade. Considerando essa relação, a

análise dos sentidos produzidos pelos sujeitos deve sempre

33

considerar seu vínculo com os significados produzidos

coletivamente e vice-versa. (TOLFO et al., 2005).

Apesar das diferenças, as duas abordagens compartilham a

compreensão sobre a indissociabilidade entre sujeito e realidade,

sendo os sentidos ou significados produzidos pelos sujeitos a

partir de suas experiências concretas.

Do mesmo modo, também é importante considerar a

articulação entre os processos identitários e de construção de

sentidos pelos sujeitos em seu cotidiano de trabalho. A seguir,

apresentamos uma breve discussão teórica sobre processos

identitários e suas relações com o trabalho contemporâneo,

como forma de subsidiar teoricamente as investigações

analisadas neste capítulo.

1.3.1 A dimensão subjetiva do trabalho na contemporaneidade

Consideramos importante assinalar que o contexto

produtivo contemporâneo vem passando por transformações

significativas, afetando tanto as relações concretas, como as

formas de ser dos sujeitos. Tais transformações apontam para a

necessidade de buscar estratégias de investigação capazes de

apreender as complexas relações entre as dimensões subjetivas e

objetivas do trabalho contemporâneo.

Neste tópico, procuramos abordar, brevemente, aspectos

relacionados ao trabalho e sua dimensão subjetiva, como forma

de obter um melhor embasamento teórico acerca das

especificidades desta atividade, requisito indispensável para uma

análise do problema de pesquisa e para o alcance dos objetivos

deste estudo.

O estudo de questões relativas à dimensão subjetiva dos

trabalhadores constitui-se em um importante campo de

investigação para as diversas disciplinas que analisam o homem

em suas relações de trabalho. Entre as categorias teóricas para o

estudo da dimensão subjetiva nesse campo está a identidade.

A categoria identidade tem sido objeto de análise de

diferentes estudiosos das ciências humanas, mas, desde as

34

últimas décadas do século 20, sua capacidade explicativa para os

fenômenos humanos vem sendo fortemente questionada. Tal

debate emerge no quadro das diversas crises que abalaram os

países capitalistas ocidentais (COUTINHO, 2009).

De acordo com Sennett (2007), a noção de identidade no

trabalho permeia a ideia de que, no capitalismo contemporâneo,

essa atividade reduz, em parte, as possibilidades de pessoas

desenvolverem experiências e construírem uma narrativa

coerente para suas vidas. Este modo de produção desgasta o

caráter do trabalhador, “[...], sobretudo aquelas qualidades de

caráter que ligam os seres humanos uns aos outros, e dão a cada

um deles um senso de identidade sustentável" (2001, p.27).

Em sua concepção, sob a lógica capitalista atual, este

mesmo autor questiona a natureza do trabalho, seus modos de

organização e, principalmente, as relações interpessoais que os

trabalhadores estabelecem no contexto laboral.

Como pode um ser humano desenvolver uma narrativa de identidade e história de vida numa sociedade composta de episódios e fragmentos? As condições da nova economia

alimentam, ao contrário, a experiência com a deriva no tempo, de lugar em lugar, de emprego em emprego (SENNETT, 2001, p. 27).

Neste sentido, compartilhamos do questionamento

formulado por Sennet (2001) e reconhecemos que as formas

atuais de relações do homem com o trabalho diminuem as

oportunidades de vínculos interpessoais com seu fazer e,

consequentemente, reduzem as possibilidades de identificação

com os outros e com o sua atividade laborativa.

É importante pontuar que o trabalho deve participar da

sociedade como um elemento de equilíbrio e de desenvolvimento

para o indivíduo e lhe assegurar a inserção nos diferentes grupos

existentes na sociedade. Quando o trabalho alcança esses

objetivos, o trabalhador experimenta a conhecida satisfação e sua

atividade passa a fazer sentido (ANTUNES, 1999).

A análise dessas experiências de pesquisa permitiu tecer

algumas considerações sobre as trajetórias identitárias de dois

sujeitos, analisados no capítulo 3 desta dissertação, enquanto

35

estratégia de investigação capaz de ressignificar o modo de

produção, a condição humana e as configurações do trabalho

manual contemporâneo.

36

CAPÍTULO 2

37

CAPÍTULO 2

DESIGN E ARTESANATO: DOMÍNIOS DO FAZER HUMANO

Artefatos, tal como palavras, são produtos da atividade motora humana, [...]. A forma resultante de qualquer artefato é a combinação de unidades estruturais – atributos – que produzem um objeto com uma função específica na cultura que o engendrou.

Berta Ribeiro, A linguagem Simbólica da Cultura Material (1986).

2.1 Design, artesanato e cultura material

Sabemos que a formação cultural de uma sociedade se dá

por meio da produção de seus bens e valores, “e que, através das

coordenadas de tempo e espaço, caracterizam as identidades de

seus membros” (CIPINIUK; PORTINARI; BOMFIM, 2008, p.61). O

artefato, por nascer dos saberes, dos costumes e das técnicas

acumuladas por gerações, é fruto desse processo, e se

desenvolve a partir do modo como o indivíduo absorve os

acontecimentos à sua volta. A cultura, especializada nos objetos

produzidos por essas expressões, é chamada de cultura material.

Partimos do pressuposto de que o design é um dos campos

fundamentais na representação desse mundo material.

Acreditamos que sua tarefa se realiza por meio do diálogo e

compreensão da trama cultural (BOMFIM, 1999). O artesanato se

apresenta como um dos principais delineadores do imaginário

desta mesma sociedade. Assim, o presente estudo propõe a

reflexão sobre o reencontro entre o projetar e o fazer, quando a

cisão entre as áreas torna-se cada vez mais insignificante, pelo

domínio do fazer humano.

A cultura envolve tanto as relações materiais como

imateriais de um grupo – corresponde ao intercâmbio entre o

homem e o conjunto que abrange sua existência, desde a

construção do seu espaço até a relação com os artefatos do

cotidiano. Essa afinidade se estabelece ao longo do tempo e não

é estática; acompanha as modificações da sociedade de forma

dinâmica e se transforma de acordo com as interações sociais.

38

A partir de Malinowski (1970), compreende-se que cada

cultura consiste em um todo coerente, um sistema equilibrado e

funcional, formado por elementos interdependentes e

harmonizados entre si, utilizados pelas pessoas como um meio de

atender suas necessidades. É um sistema simbólico, característica

fundamental de atribuir significados e sentidos à vida de forma

ordenada, coerente e estruturada Além do conjunto completo

dos instrumentos e bens de consumo, consiste nos códigos dos

grupos, nas ideias e costumes, quer seja de uma cultura

primitiva8, quer seja de uma cultura complexa. Sua existência se

dá pela interação, na qual atuam os indivíduos (MALINOWSKI,

1976).

Contudo, é importante ressaltar que este campo deve

examinar não o objeto material tomado em si mesmo, mas sim as

suas apropriações sociais, as técnicas envolvidas na sua

manipulação, a sua importância econômica e a sua necessidade

social e cultural.

8 O uso da expressão “cultura primitiva” segue a denominação de Malinowski

(1976), e não é o que referencia a visão de cultura desenvolvida nesta dissertação, a partir de Geertz (1973).

Segundo Cardoso (1998, p. 20), o termo Cultura Material

originou-se no século 19, no estudo de artefatos de povos

‘primitivos’. Hoje em dia, esse conceito ampliou-se para uma

“maneira de melhor entender os artefatos que produzimos e

consumimos, bem como a maneira em que estes se encaixam em

sistemas simbólicos e ideológicos mais amplos”. Até porque, os

objetos traduzem comportamentos, visões de mundo, valores

estéticos e estágios tecnológicos que possibilitam uma leitura da

cultura em que estão inseridos (SANTOS, 2004).

O conceito de cultura, como observamos, é dinâmico e

acolhe muitas leituras, conforme apontam os autores (LARAIA,

1986; ARANTES, 1990; SANTOS, 1997). Entretanto, não se

pretende, nesta pesquisa, enveredar pelas inúmeras

considerações dos antropólogos, historiadores e estudiosos no

assunto, embora sejam essenciais. Entre tantas definições

conceituais existentes, adotamos a de Geertz, que se dedica a

desenvolver uma Fenomenologia da Cultura. Tal método seria

utilizado para analisar e descrever sua estrutura significativa do

estudo da percepção dos indivíduos nela presentes. Para tanto, o

39

autor indica que o essencial é anotar e interpretar o discurso

social.

Geertz (1973, p. 15) diz: “acreditando, como Max Weber,

que o homem é um animal amarrado a teias de significados que

ele mesmo teceu, assume a cultura como sendo essas teias e sua

análise; portanto, não como uma ciência experimental em busca

de leis, mas como uma ciência interpretativa, à procura do

significado.” Motivado pela clássica sociologia de Weber, para

quem o homem só é capaz de viver em um mundo dotado de

sentido, o autor entende a cultura como sendo a produção desse

sentido, o conjunto de significados que ele constrói em suas

interações cotidianas e que constitui a base organizada

socialmente.

Na opinião do antropólogo Néstor Canclini (1983, p. 29), o termo cultura é:

Produção de fenômenos que contribuem, mediante a representação ou reelaboração simbólica das estruturas materiais, para a compreensão, reprodução ou transformação do sistema social, ou seja, a cultura diz respeito a todas as práticas e instituições dedicadas à

administração, renovação e reestruturação do sentido.

Canclini combate as conceituações de apego idealista e

afirma que, na sua tentativa de conceituar a cultura, não aposta

na identificação do cultural com o ideal, nem do material com o

social, nem sequer pondera a análise desses campos

separadamente. Para ele, a cultura está ligada ao processo de

desenvolvimento das sociedades humanas e acompanha o avanço

dos indivíduos e grupos sociais, expressando sua linguagem, seus

valores, sua identidade e por fim, seus artefatos. Nesse sentido,

assim como Canclini, acreditamos que “certos objetos e práticas

merecem ser especialmente valorizados porque representam

descobertas para o saber, inovações formais e sensíveis, ou

acontecimentos fundadores da história de um povo” (CANCLINI,

2003, p. 200).

Por interagir com múltiplas formas de representações

culturais, o artesanato se apresenta como um objeto oportuno de

estudo da cultura material, assim como o design, que fornece

40

inúmeras possibilidades de pesquisa, principalmente relacionado

a fatores socioeconômicos e culturais.

Para o historiador Rafael Cardoso (1998, pp. 17-19), “a

natureza essencial do trabalho do design não reside nem nos seus

processos e nem nos seus produtos, mas em uma conjunção

muito particular de ambos; mais precisamente, na maneira em

que os processos do design incidem sobre seus produtos,

investindo-os de significados alheios à sua natureza intrínseca”. E

continua, “do ponto de vista antropológico, o design é uma entre

diversas atividades projetuais, tais como as artes, o artesanato, a

arquitetura, a engenharia e outras que visam à objetivação no seu

sentido estrito, ou seja, dar existência concreta e autônoma a

ideias subjetivas”. O autor ainda defende o uso da palavra

artefato como resultado desse processo, pois o termo “[...] se

refere especificamente aos objetos produzidos pelo trabalho

humano, em contraposição aos objetos naturais ou acidentais”.

Na produção dos artefatos, uma série de fatores interfere,

desde os recursos naturais disponíveis para utilização como

matérias-primas; o desenvolvimento de técnicas adequadas; as

atividades envolvidas na exploração do ambiente e na adaptação

ecológica; a utilidade e finalidade prática dos objetos e

instrumentos desenvolvidos, até elementos de ordem simbólica,

ligados a concepções religiosas, estéticas e filosóficas do grupo.

Estes muitos fatores, ingredientes da fabricação, se articulam em

torno de conhecimentos precisos, compartilhados pelos membros

de cada grupo e adquiridos ao longo de muitas gerações que os

precederam.

Esses objetos explicam comportamentos, visões de mundo,

valores estéticos e a tecnologia empregada que permite uma

leitura da cultura em que estão inseridos. Bomfim (1995), ao

discorrer sobre o assunto, afirma que independente das funções

imediatas às quais se presta, ele é capaz de portar informações a

respeito do desenvolvimento de uma sociedade, como o

momento social, político e econômico. Elencamos alguns tipos de

mensagens impressas nos artefatos, segundo Bomfim (1995, pp.

88-89):

Sua própria composição (material, cor, textura, processo de

fabricação, tecnologia);

41

Funções práticas (para que é usado);

Modos de uso (intuídos por meio do aprendizado e da

memorização de estereótipos);

Valores estéticos (intuídos sensorialmente e interpretados

conforme juízo de gosto ou da norma vigente);

Signos de uma cultura visual instituída (uma figura

arredondada dá ares menos agressivos do que outra com

ângulos agudos);

Significados ideológicos (ideais políticos e religiosos).

Por tudo isto, é importante a compreensão do estudo da

cultura material de um determinado grupo social, posto que, por

meio dele, podem-se fazer ligações com as condições de sua

fabricação, ou seja, com os recursos naturais e materiais

utilizados, com a organização do trabalho, com o aprendizado e o

aprimoramento das técnicas, com os conhecimentos sobre os

meios e processos da transmissão deste saber dentro do grupo

onde é produzido.

O conhecimento de um artefato requer, em suma, que o

consideremos em seu contexto mais amplo e em sua qualidade

de sistema, analisando as dimensões e as significações que nele

estão materializadas, revelando aspectos relacionados com a

tecnologia, a história do grupo, dentre outros.

Na verdade, é por meio de uma variedade de artefatos,

como nos mostra Ribeiro (1986), que os grupos humanos

assimilam o seu meio, utilizando-se dele e imprimindo nele sua

marca. Do mesmo modo, como o artefato é carregado das marcas

deixadas pela cultura daqueles que o fabricaram e as trocas

culturais entre os povos são uma constante na história da

humanidade, caberia, também, pesquisar os efeitos dessas

relações nas disposições à mudança ou na inovação em sua

produção.

Seguindo este entendimento e percebendo a importância

da produção artefactual (RIBEIRO, 1989), passamos para as

aproximações e os possíveis distanciamentos dos domínios do

fazer humano: o design e o artesanato.

42

2.2 Design e artesanato: aproximações e distanciamentos

Antes de embarcar na questão proposta, é importante

esclarecer que partimos do princípio de que pensar as

aproximações é mais enriquecedor que medir as distâncias

(BARBOSA, 2003). Então, apresentamos uma possibilidade de

interpretação para o tema: entender o artesanato como uma

forma de design.

Observamos que, na contemporaneidade, as fronteiras

entre as áreas do conhecimento humano se diluíram, mais ainda

aquelas em que, por natureza, tem múltiplos aspectos, como no

design e no artesanato (BORGES, 2011).

Diversos autores (BARDI, 1980; CANCLINI, 1983; CARDOSO,

2008; CARNIATTO, 2008; DIAS, 2007; FRANÇA, 2005;

MAGALHÃES, 1977; MARINHO, 1999; MARTINS, 1975)

discorreram sobre a prática e a técnica do artesanato. Aqui,

pensamos nele em conexão com o design, independente da

apropriação dos modos de fazer ou da finalidade produtiva,

acreditando ser mais interessante a análise da subjetivação dos

significados e sua materialização em objetos.

O artesanato de modo geral tanto pode ser entendido como

um modo de produção e de trabalho como uma forma de

manifestação cultural. Como um modo de produção, este

processo manual, na realidade é o trabalho do artesão, que para

sua realização “(...) põe em movimento as forças naturais

pertencentes a sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão,

a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua

própria vida” (MARX, 1983, p. 149). Neste caso, grande parte do

desenvolvimento do ser humano está associada a sua capacidade

física e mental de transformação de seu entorno.

No artesanato, podemos perceber características de outras

atividades cuja habilidade manual é fator decisivo para a

produção de artefatos como, por exemplo, a arte popular,

trabalhos manuais e outras manifestações culturais. Estabelecer

diferenças entre os campos citados acima tem sido uma

preocupação constante para profissionais que atuam nesses

programas, e também no meio acadêmico.

43

Esse conflito pode parecer, a princípio, irrelevante, mas sua

solução é essencial para uma atuação eficiente de programas de

apoio, desenvolvidos por instituições públicas e privadas9.

A necessidade de tais definições e conceitos visa orientar as

ações que podem ser realizadas por estas instituições. Porém,

como falamos anteriormente, pensar neste assunto de modo

homogêneo, pré-estabelecido e determinado, é no mínimo, ter

uma visão ingênua do sistema cultural vigente. Isso porque

conceituar a atividade artesanal, em qualquer período histórico

ou para qualquer finalidade, será sempre uma tarefa complexa.

No Seminário Internacional “Design Sem Fronteiras”,

realizado em Bogotá em 1996, do qual participou o Conselho

Mundial de Artesanato – WCC10, integrou a equipe técnica um

dos promotores do design e do artesanato no país, na época,

Eduardo Barroso Neto. No evento, ele propôs que artesanato

9 Um exemplo bem conhecido no Brasil é o Artesanato Solidário/ARTESOL, que

foi concebido em 1998 como um programa social, e a partir de 2002, tornou-se uma OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público). 10

Sigla em inglês do Conselho Mundial de Artesanato.

seria “toda atividade que produz objetos e artefatos realizados

manualmente, ou com a utilização de meios tradicionais ou

rudimentares, com habilidade, destreza, apuro técnico, engenho

e arte” (SEBRAE, 2004, p. 1-2).

Nesse sentido, o autor aponta que existem diferenças entre

atividades manuais e artesanato. Uma delas é que a primeira,

geralmente, é uma ocupação secundária, com o objetivo principal

de complementar a renda familiar, enquanto a segunda é a

atividade principal de quem o produz.

É interessante apresentar a definição de artesanato

adotada pela UNESCO/CCI em 1997:

Produtos artesanais são aqueles confeccionados por artesãos, seja totalmente a mão, com o uso de ferramentas ou até mesmo por meios mecânicos, desde que a contribuição direta manual do artesão permaneça como o componente mais substancial do produto acabado. Essas peças são produzidas sem restrição em termos de quantidade e com o uso de matérias primas de recursos sustentáveis. A natureza especial dos produtos artesanais deriva de suas características distintas, que podem ser utilitárias, estéticas, artísticas,

44

criativas, de caráter cultural e simbólicas e significativas do ponto de vista social 11.

O Sistema SEBRAE adota, segundo o Termo de Referência12,

alguns conceitos para melhor atuação dos seus programas de

apoio. As categorias são definidas de acordo com o processo de

produção, origem, uso e destino. O interesse não é fazer uma

extensa avaliação do uso de cada um desses conceitos, mas de tê-

los em mente, segundo a perspectiva explicitada pelos autores

referidos, para ajudar a compreender a dinâmica da temática

artesanal:

11 Definição adotada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a

Ciência e a Cultura no International Symposium on crafts and International Markets, Manila, Filipinas, outubro de 1997. 12

Este Termo de Referência, além de delinear em breve panorama conceitual da atividade, apresenta também um olhar sobre as tendências nacionais e internacionais de incentivo aos empresários na utilização do Design como uma ferramenta que possibilita a inclusão de micro e pequenas empresas, quanto ao ciclo de vida de produtos e serviços a elas relacionados. Entendemos que o universo do Design interage fortemente com o universo dos negócios e que ambos desenvolvem a partir da volatilidade do mundo contemporâneo frente às oportunidades de negócios, às mudanças comportamentais da humanidade. Assim, ressaltamos a importância dos questionamentos a respeito dos conceitos.

Arte popular: compreendida aqui como um conjunto de

atividades poéticas, musicais, plásticas e expressivas que

mostra o costume e o modo de vida de um grupo de

determinado lugar;

Artesanato: refere-se a toda atividade produtiva que

resulte em objetos e artefatos acabados, feitos

manualmente ou com a utilização de meios tradicionais ou

rudimentares, com habilidade, destreza, qualidade e

criatividade;

Trabalhos manuais: exigem destreza e habilidade, mas

empregam moldes e padrões predefinidos. Não são

resultantes de processo criativo efetivo. É muitas vezes,

uma ocupação secundária que utiliza o tempo disponível

das tarefas domésticas ou um passatempo;

Produtos típicos: são, em geral, produtos alimentícios

processados segundo métodos tradicionais, em pequena

escala, muitas vezes em família ou por um determinado

grupo;

Industrianato: refere-se aos produtos semi-industriais e

industriais em grande escala, com utilização de moldes e

45

formas, máquinas e equipamentos de reprodução, com

pessoas envolvidas e conhecedoras apenas de partes do

processo;

Artesanato indígena: diz respeito aos objetos produzidos

no seio de uma comunidade indígena, por seus próprios

integrantes. É, em sua maioria, resultante de uma

produção coletiva, incorporada ao cotidiano da vida tribal,

que prescinde da figura do artista ou do autor;

Artesanato tradicional: concebido aqui como um conjunto

de artefatos mais expressivos da cultura de um

determinado grupo, representativo de suas tradições,

porém incorporados à sua vida cotidiana. Sua produção é,

em geral, de origem familiar ou de pequenos grupos

vizinhos, o que possibilita e favorece a transferência de

conhecimentos sobre técnicas, processos e desenhos

originais. Sua importância e seu valor cultural decorrem

do fato de acompanhar histórias transmitidas de geração

em geração;

Artesanato de referência cultural: refere-se aos produtos

cuja característica é a incorporação de elementos culturais

tradicionais da região onde são produzidos. São, em geral,

resultantes de uma intervenção planejada de artistas e

designers, em parceria com os artesãos, com o objetivo de

diversificar os produtos, porém preservando seus traços

culturais mais representativos;

Artesanato conceitual: diz respeito aos objetos

produzidos a partir de um projeto deliberado de

afirmação de um estilo de vida ou afinidade cultural. A

inovação é o elemento principal que distingue este

artesanato das demais categorias. Por detrás desses

produtos, existe sempre uma proposta, muitas vezes

explicitada por meio dos sistemas de promoção utilizados,

sobretudo aqueles ligados ao movimento ecológico

(SEBRAE, 2004, p. 15).

Ao incorporar conceitos de definição tão duvidosa, o

artesanato traz em si uma herança de questionamentos. Na

verdade, essa abrangência, talvez incida em um dos maiores

obstáculos enfrentados pelos programas de fomento, por gerar

dúvidas a respeito do trabalho do artesão e do produto gerado

por ele.

46

De acordo com Saul Martins (1971), essa confusão ocorre

porque o uso da expressão artesanato é recente e, muitas vezes,

empresta o seu significado a atividades análogas, como já

mencionamos. Jorge Chiti (2003), por sua vez, diz que a intenção

de restringir a obra e a prática artesanal, que muitas vezes

discordam entre si ou se entrelaçam, vem da antropologia, do

folclore, da etnografia e da economia. O autor, depois de um

extenso estudo comparativo entre os diferentes tipos de

artesanatos, concluiu que eles têm em comum os seguintes

atributos:

Manualidade: as mãos podem até mesmo utilizar

ferramentas ou meio mecânicos, desde que a sua atuação

táctil seja imprescindível para o acabamento da peça.

Funcionalidade: objeto de uso prático no cotidiano,

inclusive, associado a religiosidade, decoração dentre

outras abordagens no campo simbólico;

Seriação: repetitividade das peças;

Intenção estética: o fator estético é intrínseco à prática

artesanal, embora não se deva igualar ao caráter

expressivo, emocional e cognitivo da obra de arte;

Acessibilidade e tangibilidade: as peças artesanais devem

ser acessíveis a ponto de facilitar a sua utilização e o seu

transporte manual;

Durabilidade: o autor insere esse aspecto para afirmar

que produtos comestíveis não podem ser considerados

artesanato;

Tipicidade: o artesanato se singulariza por estar

intimamente envolvido no universo de valores e

tradições;

Tridimensionalidade: a obra artesanal costuma ser

volumétrica (CHITI, 2003, p. 22).

A partir destas características, Chiti (2003) define o

artesanato como uma produção uniformizada desenvolvida em

ambiente doméstico ou não, que alia a capacidade criativa à

operacionalidade manual ou semimanual e que responde a uma

47

finalidade de uso prático e estético oferecido em mercados

reduzidos.

Já Baudrillard insere o artesanato na categoria de objetos

que respondem ao propósito do testemunho, da lembrança, ou

seja, das qualidades de ordem tradicional e simbólica apesar de

pertencerem à modernidade. “A fascinação pelo objeto artesanal

vem do fato de este ter passado pela mão de alguém cujo

trabalho ainda se acha nele inscrito: é a fascinação por aquilo que

foi criado [...]” (BAUDRILLARD, 2004, p.85).

Mas, para Canclini (1983), compreender a produção

artesanal requer observância, principalmente, da prática que a

origina em seu processo de criação, porque, dependendo da

realidade social de quem a constrói, tal atividade ganha sentidos

diferentes. Assim também entendemos.

O artesanato foi, durante muito tempo, negligenciado como

campo de atuação do design e, segundo Aloísio Magalhães13, só

13 Foi um dos que não impunham fronteiras rígidas entre o design e o

artesanato. Disponível em: www.mamam.art.br. Acesso em: 22/05/2010.

passaria a ser considerado quando o próprio designer atuasse

como um artesão (BRAGA, 2002) – papel esse importante na

história e na própria geração da tecnologia e do design, e que,

segundo o mesmo autor, o artesão seria qualificado como

produtor de um pré-design.14

O pressuposto de que a atividade artesanal e a projetual

são incompatíveis ainda está arraigado em nossa cultura. Tais

atividades parecem pertencer a mundos distintos, porque se o

design é conceitual, generalista, voltado para a inovação, e a

produção é seriada e uniforme; o artesanato é manual,

especializado, sobrevivente, e resistente de outros tempos,

voltado para a produção em pequena escala com suas variações e

irregularidades (PAIM, 2009).

Sabemos que, na atividade artesanal, também não pode

faltar projeto dirigido à produção em pequena escala, ao mesmo

14 A Bauhaus, uma das mais importantes escolas de design do mundo, por

exemplo, agregava ao ensino do design, o artesanato, por meio de oficinas. Sua vida foi curta, mas o suficiente para revolucionar o pensamento do século 20, no campo da arte, do design, da indústria e da economia. A finalidade do estudo era o conhecimento de todos os processos de produção, da matéria prima e principalmente das técnicas artesanais (BRAGA, 2002).

48

tempo elaborado e diversificado, para criação de novos produtos

na constante renovação de seu ofício. Uma atividade significativa

do fazer artesanal que, infelizmente, não costuma ser

considerada.

O design com a finalidade de conceber novos objetos e

sistemas (CARDOSO, 2008) pode ser definido como o processo de

formulação e justificação de uma proposta de ação capaz de levar

à realização de um produto que atenda a uma necessidade

humana, assim como o artesanato. Ambos utilizam métodos e

técnicas que influenciam a criatividade e a produtividade.

Contudo, a designer Heloísa Crocco (2000) chama nossa

atenção para o fato de que o artesão é um conhecedor nato dos

recursos materiais empregados nos artefatos e das tradições de

sua comunidade, destacando-se pela informalidade e o

empirismo no trabalho. Enquanto isso, os designers caracterizam-

se pela formação voltada para a lógica do mercado, tida como

fator fundamental para o desenvolvimento do produto industrial.

Verbo derivado do latim designare, o termo design abrange

significados de designar e de desenhar. “Trata-se de uma

atividade que gera projetos no sentido objetivo de planos,

esboços ou modelos”. Alguns autores optam por incluir na

discussão as diferenças entre arte, design e artesanato devido a

certa conotação que este adquiriu na pós-industrialização e o

status de mercadoria que possa ter alcançado. Essa ligação do

artesanato a produtos de mercado ocorreu, sobretudo, da divisão

que houve entre artista, artesão e trabalhador fabril nos tempos

da industrialização, já citado no capítulo anterior, onde o “artesão

passou a significar o trabalhador manual que desempenhava um

trabalho com instrumentos rudimentares” (QUEIROZ, 2004, p.15).

O design busca hoje encontrar suas singularidades,

renovando-se esteticamente e trazendo elementos da cultura do

país através de suas relações com as artes populares, de forma

que os produtos gerados por essas relações nos mostrem quem

somos e de que maneira podemos ter reconhecimento global por

meio de nossas produções locais.

49

Dorfles (1991) alega que a diferenciação entre design e

artesanato é fundamental e que há uma clara diferença entre

ambos. No entanto, esta visão não é tão aceita. Design, arte e

artesanato têm muito em comum, e hoje quando, o design já

atingiu certa maturidade, muitos designers começam a perceber

antigas relações com o fazer artesanal (CARDOSO, 2008). Neste

sentido, o artesanato se aproxima do design, do mesmo modo

que o artesão, diante de mudanças no seu mercado, tende a

adequar seu produto. Ou seja, diante das oportunidades, das

mudanças políticas e comerciais, o artesão também precisa

direcionar seu processo criativo. Assim como o designer.

É perfeitamente possível identificar semelhanças

indissociáveis entre as atividades do design e do artesanato.

Ambas surgem de uma necessidade social e mantêm forte vínculo

com o mercado. Tanto uma como a outra exercem papéis

essenciais à cultura material15, ainda que guardem diferenças

15 De acordo com Coelho (1997), a cultura, hoje é pensada mediante duas

vertentes. Uma idealista quando ela é analisada de acordo com a diversidade de comportamentos e atos sociais. Outra materialista, analisada de maneira ampla por meio da inserção de todas as construções de conhecimento. No

relacionadas à maneira como concebem os artefatos. Se o

primeiro pensa e constrói o objeto com as mãos, ou até mesmo

utilizando ferramentas e participando de todas as etapas da

produção, o segundo realiza um trabalho interdisciplinar no

desenvolvimento de produtos, em que as informações sobre o

processo de produção, tecnologias, materiais, distribuição,

somam-se nas especificações projetuais, que resultam, na maioria

das vezes, na produção por meio mecânico e seriado (DIAS,

2007).

Atualmente, diante de mudanças no mercado, o artesanato

se aproxima do design e tende a alterar seu produto de forma a

adequá-lo. Ou seja, o artesão, assim como o designer, direciona

seu processo criativo e utiliza o design, principalmente por meio

de programas de apoio ao artesanato, como forma de agregação

de valor cultural. Este artesanato que se apropria do design é

chamado por alguns autores de artesanato de referência cultural

ou artesanato contemporâneo (CARNIATTO, 2008).

entanto, conforme Canclini (1983), as duas vertentes não se encontram separadas, o que fortalece a ideia de retomarmos o debate acerca da cultura material nesta dissertação.

50

Rafael Cardoso, em artigo publicado em 1998, fala da

inserção do design no mundo material e fetichizado, no qual nota

a aproximação da arte com o artesanato. No entanto, coloca um

distanciamento na forma de produção:

O ato de projetar tem na sua essência um componente básico de criação, de artifício, que não difere substancialmente daquele mesmo elemento factício (no sentido de feitura) que está por trás do artesanato, da arte e até da magia [...]. O que distingue o design de grande parte do artesanato, da arte e – presumo eu – da magia, é que no design o fato material que se pretende gerar não é feito pelo mesmo indivíduo que deu início ao processo ao conceber a ideia [...]. Quero sugerir, portanto, que a atividade do design caracteriza-se mais como um exercício de processos mentais (artifício/engenho) do que de processos manuais (artes aplicadas ou plásticas, propriamente ditas) [...] (CARDOSO, 1998, p.30).

Para Bonsiepe (2011) o design perdeu a sua substância no

momento em que passou a cuidar das superficialidades,

colocando-se a serviço da beleza cosmética e de lucros fáceis do

mercado.

O trabalho artesanal surge no plano do fazer, no conhecer

técnicas e executar com as mãos o que é mais representativo no

cotidiano do artesão. Esse fazer manual e a liberdade para criar

artefatos são competências que foram, aos poucos, arrancadas

do homem moderno, com o advento da sociedade industrial.

Perante a máquina, a limitação do fazer humano foi recebida

positivamente, como resistência aos modos de produção

artesanal em que o tempo e a mão decidem as etapas do

processo.

O objeto artesanal “é definido por uma dupla condição:

primeiro, o fato de que seu processo de produção é, em essência,

manual. São as mãos que executam basicamente todo o trabalho.

Segundo: a liberdade do artesão para definir o ritmo da

produção, a matéria-prima e a tecnologia que irá empregar, a

forma que pretende dar ao objeto, o produto de sua criação, de

seu saber, de sua cultura” (LIMA, 2005, p. 2).

Essa questão do “saber fazer” e seus vários aspectos surge,

principalmente, nas comunidades, com os protagonistas desta

cultura material, a partir de um processo sucessivo de passagem

51

e transmissão de valores materializados no artefato. Mas existem

contextos de práticas artesanais que representam quase a mesma

lógica produtivo-industrial. Por isso, a ideia de definir o artesão

como detentor de saberes tradicionais enraizados ou perdidos

num passado distante oculta suas relações com a sociedade atual,

sua forma de ver, interpretar e sobreviver no mundo

(CARNIATTO, 2008), assim como definir o designer como

possuidor de conhecimentos específicos e capacitado para

gerenciar a produção esconde suas afinidades com o fazer

artesanal.

A relação do artesão com o artefato é estabelecida

essencialmente pelas mãos. A mão é o instrumento que edifica,

modifica, aumenta ou diminui, incorpora sensações e emoções,

revela costumes, tradições, de modo que possamos observar

elementos tradutores da cultura local, a capacidade criativa e

diversas técnicas manuais que passam de geração em geração.

Lima (2005) se refere ao artesanato como:

Produtos do fazer humano em que o emprego de equipamentos e máquinas, quando e se ocorre, é subsidiário à vontade de seu criador

que, para fazê-lo, utiliza basicamente as mãos. Nesse sentido, diríamos que o objeto artesanal é definido por uma dupla condição: primeiro, o fato de que seu processo de produção é em essência manual. São as mãos que executam basicamente todo o trabalho. Segundo: a liberdade do artesão para definir o ritmo da produção, a matéria-prima e a tecnologia que irá empregar a forma que pretende dar ao objeto, produto de sua criação, de seu saber, de sua cultura (p. 13-14).

Para o artesão ou designer que lida com a matéria argila,

por exemplo, como veremos no capítulo 3, as experiências com o

processo de execução da peça são tão importantes quanto o

resultado. A significação está na transformação da massa

cerâmica, nas marcas do fazer e do processar gestos

transformadores deixados na matéria como intervenção de um

criador que agiu sobre o objeto. Isso está tanto para o artesão

como para o designer indistintamente.

52

2.3 Perspectivas do artesanato na sociedade contemporânea

O Brasil é um país onde boa parte da população possui

habilidades manuais, herdadas de culturas, como etnias

indígenas, africanas, afrodescendentes, afro-brasileiras e outros

imigrantes que vieram compor o povo brasileiro em sua

pluralidade cultural. Somando isto, a nossa riqueza e diversidade

de matérias primas, aliadas às necessidades de sobrevivência e à

criatividade na confecção de artefatos resultaram em um fazer

artesanal que se mostrou importante caminho para grupos

excluídos16, na busca por trabalho e renda (MINISTÉRIO DO

TRABALHO E EMPREGO).

Entretanto, os números das atividades artesanais

catalogadas são escassos e imprecisos. Cabe ressaltar aqui a

iniciativa do Programa do Artesanato Brasileiro (PAB) do

16 Em termos de Brasil, a temática torna-se ainda mais relevante, dada a

diversidade de condições de nossa população e da urgência em pensarmos soluções que deem conta de promover a cidadania. Programas de apoio ao artesanato e a geração de renda, tem tido, nos últimos anos, uma grande dimensão quer no campo da investigação quer no campo da aplicação, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego. Disponível em: www.mte.gov.br. Acesso em: 16/10/2011.

Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC),

lançado em 2004, que está promovendo, já há algum tempo, o

cadastramento dos artesãos brasileiros. "[...] o artesanato

brasileiro é um segmento da economia cujo crescimento possui

alto potencial de geração de trabalho e renda, de maneira

descentralizada" (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e

Comércio, 2004, p. 25).

O documento do Ministério da Cultura intitulado “Economia

da Cultura – um setor estratégico para o país”, escrito por Paula

Porta, afirma que a atividade cultural mais presente nos

municípios brasileiros é o artesanato, com 64,3% (KELLER, 2011).

De acordo com essa fonte de dados, o envolvimento da

cadeia produtiva, englobando o manejo da matéria-prima, a

produção, a divulgação e a comercialização do produto artesanal,

tanto no mercado interno quanto no internacional, demanda

ações governamentais, pois além dos benefícios da ocupação e

renda, também a preservação da cultura é um elemento

relevante.

53

Sem questionar, neste momento, a efetividade desses

programas de incentivo e modelos de organização produtiva

contemporânea, instalados no Brasil com maior força na última

década do século 20, este movimento tenta romper com a

predominância de métodos de trabalho, formas de gestão e de

relacionamentos, implantados a partir da Revolução Industrial

(MARINHO, 2006). Assim, pode-se vislumbrar uma possibilidade

de emancipação econômica, capaz de conjugar aspectos sociais,

econômicos, culturais e históricos.

Nessa perspectiva, um número cada vez maior de

programas específicos,17 de promoção dessa diversidade

artesanal, é criado, no Brasil, com objetivo de gerar

oportunidades, ocupação de mão de obra e geração de renda,

além de ser uma opção estratégica para reduzir a pressão social

causada pelo desemprego. Os programas objetivam tornar a

17 Um exemplo é o Programa SEBRAE de Artesanato que busca fomentar

o artesanato de forma geral e integrada por meio de projetos que capacitam artistas empreendedores e fomentam este mercado em cada estado do país. As ações promovidas enfatizam a identidade cultural das comunidades e suas habilidades, os resultados promovem melhoria da qualidade de vida e amplia a geração de renda na região. Disponível em: www.sebrae.com.br. Acesso em 16/10/2011.

produção artesanal uma das molas propulsoras da economia local

e preparar o artesão para o mercado competitivo.

No Estado de Mato Grosso, atualmente, cinco mil

profissionais estão cadastrados no Programa de Artesanato Mato-

grossense, como também no Sistema de Informações Cadastrais

dos Artesãos do Brasil (SICAB), do Ministério do

Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). O

programa, de responsabilidade da Secretaria de Estado de

Indústria, Comércio Minas e Energia (SICME) desde 2005,

desenvolve ações em todo o Estado por meio de assistência e

cooperação técnica, cadastramento de entidades não

governamentais, como associações e cooperativas,

cadastramento do artesão para emissão da Carteira de

Identidade do Artesão, capacitação, participação e divulgação em

feiras e eventos, regionais e nacionais 18, como é o caso do

artesão Osmar, estudado no capítulo 3.

18 Secretaria de Estado de Indústria, Comércio Minas e Energia. Disponível em:

www.sicme.mt.gov.br/. Acesso em16/10/2011.

54

O contexto atual, alicerçado na racionalidade econômica,

autoriza-se pensar na economia de forma multidimensional,

principalmente quando ressurgem com vigor os debates acerca

das alternativas de produção – nas quais estão incluídas algumas

experiências que renascem com força em todas as partes do

mundo, em especial nos países em desenvolvimento onde casos

bem sucedidos são tomados como exemplo a ser disseminados,

como respostas aos impactos exercidos pela globalização

competitiva e excludente e seus desdobramentos (MARINHO,

2006).

Algumas experiências, coordenadas pelo Estado de Mato

Grosso, têm sido bem-sucedidas por serem capazes de promover

a articulação da cadeia e dos seus agentes, de criar espaços

comuns de capacitação e comercialização de produtos e de

oferecer aos artesãos associados economia de escopo e de

escala. Uma experiência em espaços culturais deve ser destacada:

A Casa do Artesão19.

19 Funcionou como estabelecimento de ensino desde sua inauguração até o

ano de 1975, quando em 15 de maio do mesmo ano, passou a abrigar a Casa

Essas organizações, independente de sua magnitude,

desempenham papel importante para as comunidades locais, em

especial aquelas menos desenvolvidas e cuja população

apresenta menor poder aquisitivo. Trabalhar de forma

compartilhada acaba por proporcionar a pequenos produtores

artesãos maior chance de sobrevivência.

Diante dessa realidade, a valorização do artesanato trouxe à

tona a discussão de como o design, outro importante domínio do

fazer humano, poderia intervir para promover o resgate do

artesanato, abrindo novos mercados, sem quebrar o vinculo do

artesão com sua cultura. O papel do design nesse sentido é o de

redescobrir o fazer artesanal, orientar, identificar diferenciais,

planejar decisões e práticas que de fato possam contribuir para a

produção e comercialização dos produtos artesanais

nos mercados nacionais e internacionais (FRANÇA, 2005).

do Artesão. Em 15 de novembro de 1983, foi tombado pela Fundação Cultural de Mato Grosso, passando a fazer parte do Patrimônio Histórico e Artístico Estadual. Disponível em: www.cultura.mt.gov.br. Acesso em: 10/10/2011.

55

A utilização do design como ferramenta para a criação de

produtos artesanais com características próprias tem sido uma

das principais ações dos programas junto às comunidades

artesanais, por meio da contratação de consultores para atuar

junto a esses grupos de artesãos, com vistas a uma produção que

combine com a abordagem iconográfica e comprometida, e com

resgate da cultura regional, compondo uma coleção de acordo

com tendências e demandas de mercado.

Além desse caráter mercadológico, a contribuição do design

para o artesanato pode ser a de melhorar o produto, no sentido

de buscar novos desenhos, pesquisar novos materiais e, também,

gerar projetos que tragam soluções e inovações, ou mesmo

correções de falhas, em conjunto com o artesão, no processo de

criação e fabricação de artefatos.

As estratégias de desenvolvimento devem ser atualizadas

para lidar com as mudanças culturais, econômicas, sociais e

tecnológicas de grande alcance que estão transformando

rapidamente o nosso mundo.

Percebemos o design em constante renovação, mais ou

menos livre e mais expressivo, dentro deste novo cenário

mundial, uma vez que começa a ter como referência maior a

riqueza e a expressividade de suas manifestações culturais. A

experiência brasileira é interpretada como um laboratório

multicultural que antecipa localmente os efeitos da globalização

mundial. Este fato parece identificar o Brasil como tendo grandes

possibilidades de respostas junto às novas questões e aos novos

desafios do mundo globalizado, no âmbito do design e do

artesanato (DE MORAES, 2001).

É fato a importância do artesanato como meio de preservar

a cultura e as diferenças que caracterizam povos de todo o

mundo, e que estes são exatamente os aspectos que mais lhe

agregam valor. Contudo, acreditamos que seja mais importante

encontrar as características do artesanato de acordo com cada

região, identificar suas vantagens competitivas, sua unicidade,

seus processos e dinâmicas culturais, as redes de valor criadas e o

valor agregado de seus produtos, ainda que, em diferentes ritmos

e mudanças, tantas vezes conflitantes, apontem o contrário. O

poder reconhecido pela economia, principalmente do Brasil, para

56

movimentar e afetar a vida social e política tem sido central para

a consolidação de sua importância na sociedade.

Entender as relações e os caminhos encontrados pelo

design contemporâneo é uma forma de compreender

possibilidades, além daquelas inicialmente conhecidas. Questões

culturais e sociais estão cada vez mais presentes nestes contatos

e o design no Brasil está repleto de novas e boas possibilidades de

crescimento.

Infelizmente, ainda surgem enunciados que consagram os

produtos industriais da nossa época, enquanto os objetos de fora

desse campo são considerados produtos de baixa importância, ou

valor. Paradoxalmente, também se realizam estudos apontando

para o crescimento dessa produção informal. Tal crescimento não

é insignificante e hoje, equivale ao da produção industrial

(CIPINIUK, 2006). Os processos de globalização e as inovações

tecnológicas que o sustentam oferecem novas oportunidades.

Porém, parece aumentar os riscos de dominação, desigualdade e

exclusão.

A indústria moderna está presa a estruturas rígidas de

produção e concentra-se em uma produção massificada que

mecaniza todos os processos, apagando os vestígios do trabalho

humano. Em contrapartida, o artesão tem a liberdade de dar

qualidade e beleza aos produtos que confecciona de forma mais

artística, independente de uma tecnologia industrial – ao

contrário, dispondo muito mais de sua habilidade manual e

criativa.

Acerca da função do artesão na sociedade contemporânea,

D’Ávila (1983) propõe uma discussão a “desindustrialização” de

alguns setores industriais para abrir oportunidades de emprego

na área artesanal. Segundo o autor, alguns produtos como

sapatos, roupas, alimentos, móveis etc. podem ser produzidos de

maneira artesanal, o que diminuiria a importação de insumos,

bens de produção e energia. Nesse sentido, o artesanato deve ser

estimulado de maneira estratégica, em paralelo a outros sistemas

de produção.

Nos países em desenvolvimento, como o Brasil, a produção

informal, além de atender ao consumo local, promove a

57

manifestação da cultura. O artesanato significa, neste caso, uma

solução socioeconômica e educacional. Sendo as faculdades

mentais e as habilidades manuais inerentes ao homem e sendo o

artesanato diretamente ligado à sua natureza criativa, o

artesanato não “desaparecerá com o desenvolvimento enquanto

o homem tiver cérebro e mão” (D’ÁVILA, 1983, p. 169).

Embora essa perspectiva seja limitada para a compreensão

da complexidade do artesanato e do design contemporâneo,

especialmente em sua relação com as novas tecnologias, ela

contribui para a superação da ideia de oposição existente em

ambas as atividades, herança deixada pela sociedade moderna, e

que passa a existir como um movimento de resistência (PAIM,

2009).

58

CAPÍTULO 3

59

CAPÍTULO 3

DESIGN E RESISTÊNCIA: O FAZER ARTESANAL NA CONTEMPORANEIDADE

Diferentemente da máquina caracterizada pelo poder ilimitado e produção infinita, a mão humana é limitada em tamanho, força, habilidade, resistência e velocidade. Estes limites não apenas estabelecem a escala dos objetos artesanais, mas por serem limites partilhados por todos os humanos, artesãos ou não, nos oferecem um sentido de como nos relacionar com outras coisas no mundo, artificiais ou naturais. A mão fornece uma medida básica universal do que constitui o humano em termos de escala, proporção, forma e material; ela oferece um padrão para avaliar a qualidade e diferenciar a abundância do excesso. Assim, os artesanatos são um importante corretivo ou contrapeso à mentalidade institucional atualmente cada vez mais modelada pelo racionalismo mecânico-técnico-científico, que tanto contribui para o desencantamento do mundo e das coisas que estão nele; por desencanto entendo a eliminação da mágica e mesmo da maravilha do mundo pela contabilização de todas as ações e experiências em termos empíricos e racionais.

Howard Risatti, A Teoria do Artesanato (2007)

Neste último capítulo, apresentamos uma análise do fazer

artesanal na contemporaneidade, partindo do exame de dois

contextos distintos. Iniciaremos com a análise empírica a partir do

estudo de caso do artesão mato-grossense, Osmar Virgílio da

Silva. O estudo foi pautado na fala do artesão e também no olhar

do observador – a pesquisadora. Entre os procedimentos

adotados, destacam-se o levantamento bibliográfico e o registro

fotográfico. A teoria que sustenta a pesquisa provém dos estudos

culturais, por oferecer mais flexibilidade para tratar das relações

entre culturas (CANCLINI, 2008).

Na segunda parte, passamos à análise do trabalho de

Gilberto Paim, ceramista e pesquisador conhecido

internacionalmente, com trabalhos expostos desde 1980 e ateliê

na cidade de Nova Friburgo, RJ. Aqui, o estudo se baseia tanto em

obras e textos publicados pelo pesquisador (que se dedica ao

estudo do design e do artesanato), como, em vídeos sobre seus

trabalhos, em sites especializados e conversas via correio

eletrônico entre ele e a pesquisadora.

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O estudo traça um paralelo entre o artesão e o designer

ceramista, sinalizando os pontos de convergência entre os

campos do design e do artesanato, no intuito de articular as

informações a partir de seus processos de produção e verificar

questões relacionadas ao desenvolvimento de suas peças

cerâmicas. Acredita-se que o fazer manual do artesão segue uma

metodologia projetual semelhante à do designer, mas por ter um

caráter empírico é, por vezes, discriminado.

A pesquisa limitou-se a estas duas situações a fim de

compreender a produção cerâmica artesanal contemporânea em

dois contextos: um local e um global, embora com similitudes nos

modos de produção e com histórias marcadas pelo fazer

artesanal, que se revelam como fundamental “modelador” da

pesquisa.

Partimos da perspectiva teórica que percebe o trabalho

artesanal como parte da vida econômica contemporânea

(SANTOS & RODRIGUEZ, 2002). As nossas questões de pesquisa se

colocam dentro de diversas problemáticas, seja do artesanato na

sociedade contemporânea e suas relações com Estado e

mercado; seja da economia da cultura capitalista. Este ponto de

vista orienta nossa investigação e nos dá elementos para pensar o

enraizamento e o sentido do fazer artesanal.

Trata-se de conexões preliminares entre fatos observados

em uma experiência de campo e no levantamento documental e

bibliográfico. Questões sobre o sentido do fazer artesanal na

contemporaneidade. Aqui, o trabalho artesanal é compreendido

como forma de resistência.

Entretanto, para compreender essa produção artesanal de

maneira ampla, há que conhecer o entorno social onde está

inserida ou onde foi produzida. Segundo Canclini, é necessário

observar os contextos e “situá-los na lógica atual das relações

sociais” (2008, p. 212). Atendendo sua sugestão, percebemos a

forma como a atividade da cerâmica artesanal se reestrutura na

atualidade e no espaço em que se insere, nas dimensões social,

cultural e econômica, analisadas no percurso criativo do artesão

Osmar e do ceramista Paim.

O estudo do cotidiano (CERTEAU, 1996) também é

importante instrumento de pesquisa, trazendo à discussão a

61

concepção dos movimentos de resistência de alguns grupos

tradicionalmente constituídos ante as forças hegemônicas de

reprodução e de controle social da ordem capitalista dominante.

Vale lembrar que a história do artesanato confunde-se com

a história do homem (CHITI, 2003), pois a necessidade de produzir

bens de uso rotineiro e ornamentos são expressão da capacidade

criativa e do trabalho. Porém, no formato como é pensado,

produzido e consumido hoje, se assume como ferramenta

importante para o estudo da (re)formulação das relações

econômicas, políticas e sociais no setor.

3.1 Contexto cerâmico matogrossense: suas mudanças e ressignificações

Antes de mergulharmos nas pesquisas sobre o contexto

cerâmico matogrossense e suas mudanças, vale mencionar o

porquê da escolha. Tendo passado grande parte da minha vida

em Cuiabá, capital de Mato Grosso, convivi com artesãos, ouvi

suas histórias e suas experiências. Daí surgiu a ideia de estudar o

artesanato cerâmico enraizado neste contexto como trabalho e

criação, uma vez que a cerâmica justifica seu valor como veículo e

base material para a cultura e o conhecimento em toda época e

lugar (FRADE, 1999).

Consultando pesquisadores da região como, por exemplo,

ANDRADE, 2000; ARRUDA, 1989; JANUÁRIO, 1997; PALMA, 1986;

TOREZAN, 2000, percebe-se que a maioria dedicou-se ao estudo

da comunidade São Gonçalo Beira Rio, conhecida pela fabricação

da cerâmica artesanal. Então, essa pesquisa foi direcionada a

ceramistas artesãos de fora dali. E assim, somaram-se

inquietações antigas a respeito desse saber fazer à proximidade

do processo produtivo, delineando-se o objeto desse estudo.

Cuiabá, capital de Mato Grosso, é conhecida como "cidade

verde" por causa da grande arborização e está cercada por três

grandes ecossistemas: a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal. Além

de estar próxima à Chapada dos Guimarães, é considerada a

porta de entrada da Floresta Amazônica.

A cidade se conurba com o município de Várzea Grande.

Segundo o censo de 2010, a população é de 556.298 habitantes,

enquanto a população da conurbação ultrapassa os 800 mil. Já o

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colar metropolitano chega a um milhão de habitantes20,

formando uma pequena metrópole no centro da América do Sul.

Figura 3: As obras – os filtros – do artista cuiabano Sebastião Silva. Fonte: www.rmtonline.globo.com/noticias. Acesso: 28 de março de 2011

Cuiabá tem um histórico cultural marginalizado, distante do

panorama global, e por isso bem característico. A cultura africana

e indígena são as mais fortes influências, presentes em todas as

manifestações artísticas. A população apresenta peculiaridades

que acabam por conferir à região uma grande diversidade

20 Dados do censo 2010, publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística. Disponível em: www.censo2010.ibge.gov.br. Acesso em: março de 2011.

sociocultural, revelada nos modos e fazeres distintos da arte

local.

As manifestações artísticas são patrimônios incontestáveis

do local, cujas riquezas da fauna e flora ainda guiam o

imaginário21 popular. Frutas típicas da região saem dos quintais e

são vistas nas pinturas dos artistas cuiabanos. Os peixes,

capivaras, tuiuiús e onças pintadas refletem a beleza e

diversidade da região.

A economia, hoje, se baseia na agroindústria, com um

distrito industrial de infraestrutura recente. Cultivam-se lavouras

de subsistência e hortifrutigranjeiros. A presença das indústrias

frigoríficas, de laticínios e derivados e o crescente mercado do

21 O conceito de imaginário é amplo e não pretendemos apresentar um exaustivo estudo sobre o assunto. O que buscamos é fazer uma leitura que nos ajude a pensar Imaginário Popular. O conceito formulado por Gaston Bachelard (1884-1962) é utilizado nesta análise para pensar a cerâmica. Contudo, tomaremos como base a linha de pensamento do antropólogo Gilbert Durand (2004), que possui traços de natureza coletiva à medida que incorpora dimensões da vida social e da cultura e, também as reflexões sobre o imaginário do sociólogo Edgar Morin (1970).

63

turismo tem forte potencial de desenvolvimento, em função da

capacidade empreendedora local22.

A diversidade regional também se revela nas manifestações

culturais, com traços da cultura indígena e negra, em formato

folclórico e artesanal.

Segundo Lima (1975), o artesanato em Mato Grosso é

consequência da mistura de culturas ameríndias e européias, com

ênfase na cultura ibérica, guardando semelhanças e refletindo a

influência dos antepassados com características e aspectos

culturais típicos. Entretanto, um dos mais expressivos indicadores

desta diversidade encontra-se na cerâmica artesanal, favorecido

pela abundante disponibilidade de matéria prima na região.

Registros históricos comprovam que, em escavações nos

sítios arqueológicos, foram encontrados objetos cerâmicos de

22 Dados do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Urbano de Cuiabá.

Disponíveis em: www.cuiaba.mt.gov.br. Acesso em: março de 2011.

sociedades antigas23, semelhantes às peças produzidas em São

Gonçalo Beira Rio. Algumas características presentes na

fabricação dessas cerâmicas, como a estética, estilo e

acabamento, são as mesmas utilizadas na cerâmica

matogrossense (SYMANSKI, 2010).

A história urbana de Mato Grosso teve início em 1719. Seu

povoamento é decorrente da descoberta do ouro na região pelas

primeiras expedições de bandeirantes, que visavam capturar

índios24 para escravizá-los.

23 Os registros demonstram que indivíduos de diferentes regiões da África

utilizaram a cerâmica como veículo de expressão de identidades diversificadas. Através desse material, eles reproduziram memórias e representações de sua terra natal, reapropriando-se simbolicamente desses espaços (SYMANSKI, 2010). 24 Os Indígenas Bororo ou Coxiponé têm complexa organização social, rica cultura material e elaborada vida cerimonial. Tal sociedade localiza-se no estado de Mato Grosso, com população estimada em 914 indivíduos (BYINGTON 2006)

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Figura 4: Cerâmica cuiabana. Fonte: www.rotasedestinosdeviagem.blogspot.com.br

Acesso em: 06 de março de 2011

Figura 5:Índio Bororo em traje ritualístico. Fonte:www.flickr.com/photos/rodrigo_ono

Acesso: 28 de março de 2011

Segundo relatos de moradores da comunidade, um dos

primeiros ocupantes da área encontrou uma imagem de santo25

dentro do rio, que deu origem ao nome Arraial de São Gonçalo

Beira Rio, hoje bairro São Gonçalo Beira Rio (ROMANCINI, 2007).

Figura 6: Santo São Gonçalo. Fonte: www.benditosanto.blogspot.com.br Acesso em: 6 de março de 2011

25 São Gonçalo é um santo português de 1187. O culto foi permitido pelo papa

Júlio III, em 1551. Sua missão era zelar pela virtuosidade das mulheres e organizar danças nos dias de sábado até se casarem. A homenagem ao santo é feita, na região, como pagamento de promessa (MAGALHÃES, 1995).

65

Nas proximidades do povoado, foi construída, em 1914, a

Usina de São Gonçalo, para produção de açúcar e álcool – grande

responsável pelo crescimento do pequeno núcleo populacional.

Porém, a atividade não durou muito. Com o declínio da produção,

na década de 1930, a grande quantidade de argila acumulada às

margens do rio fez do artesanato de cerâmica o meio de vida de

grande parte da comunidade (ROMANCINI, 2007).

O crescimento industrial delineou outra realidade para o

artesanato, trazendo queda considerável no valor utilitário dos

artefatos de barro. Nas primeiras décadas do século 20, essa

atividade artesanal passou a sofrer grande influência dos

aspectos econômicos mundiais e das novas práticas de consumo.

Na década de 1970, a produção da cerâmica artesanal viveu um

dos períodos mais críticos (ROMANCINI, 2007). Nos anos de 1980,

o Brasil percebeu a necessidade da valorização dos aspectos

culturais do país, promovendo programas de qualificação

profissional e de melhoria da comercialização do produto

artesanal, além de um calendário nacional de eventos do setor. O

Programa do Artesanato Brasileiro foi criado nos anos 1990 no

âmbito do Ministério da Ação Social. Em 1995, o Ministério do

Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior assumiu sua

gestão. Atualmente, está sob a coordenação do Departamento de

Micro, Pequenas e Médias Empresas da Secretaria do

Desenvolvimento da Produção26.

A criação do Museu de Arte e Cultura Popular de Mato

Grosso, em 1974, visava, especialmente, valorizar a cerâmica

produzida em São Gonçalo Beira Rio27.

Com a abertura do mercado turístico na região e tendo que

atender a demanda local e externa, a produção precisava crescer

para enquadrar-se às exigências do novo mercado. Porém, o

tempo da produção artesanal, a escassez da argila, a falta de

organização dos artesãos e a busca por segurança no trabalho

26 O PAB cria ações que contribuem para o desenvolvimento e o

aproveitamento das vocações regionais e a geração de trabalho e renda. Disponível em: www.mdic.gov.br. Acesso em: 19/03/11. 27

No MACAP existem exposições periódicas das cerâmicas da comunidade São Gonçalo Beira Rio. Disponível em: www.rmtonline.globo.com. Acesso em: 19/03/11.

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assalariado ameaçavam a atividade cerâmica. Diante da nova

realidade econômica, social e cultural, os artesãos precisaram

repensar o processo de produção e, principalmente, a

comercialização dos produtos.

Figura 7: Cerâmica São Gonçalo Beira Rio. Fonte: www.mtonline.globo.com Acesso: 28 de março de 2011

Com as transformações na relação produção, circulação, e

consumo de peças cerâmicas, assim como as mudanças da

construção do seu valor simbólico, eles se viram forçados a

participar de associações que “garantiam” a sobrevivência e

manutenção de suas atividades28. Nessa perspectiva, o artesão,

antes anônimo e isolado em uma pequena localidade, passava a

interagir com “as indústrias culturais, o turismo, as relações

econômicas e políticas, o mercado nacional e transacional de

bens simbólicos” (CANCLINI, 2008, p. 245).

Figura 8: Artesãs de São Gonçalo Beira Rio. Fonte: www.turismorural.blogspot.com.br

Acesso em: 06 de março de 2011

28 É o caso das Cooperativas e Associações de Artesanato. A Associação dos

Artistas Plásticos e Artesãos do Vale do Araguaia – Valearte – de Barra do Garças, fica a 500 km de Cuiabá, Mato Grosso.

67

Nesse sentido, o modo do fazer cerâmico de São Gonçalo se

mantém, hoje, como herança, passada de mãe para filha, o que

evidencia a importância do papel desempenhado pelas mulheres.

O grupo doméstico é a estrutura fundamental tanto por ser a

unidade econômica de produção como por estabelecer a unidade

política. Além de contribuir para aumentar a renda familiar, essa

atividade estimula o convívio social entre os vizinhos,

fortalecendo os laços de solidariedade e reforçando o sentimento

de pertencimento. A divisão do trabalho é simples, uma vez que

tem como único critério o gênero. Entretanto, há casos de

presença masculina na produção – eles preparam o barro, ajudam

a dar acabamento, enformam e queimam as peças (PALMA,

1986).

Porém, em função dos “novos tempos”, os herdeiros deste

“saber fazer” rejeitam sua herança. Na maioria dos grupos, o

papel do produtor é exercido pelo mesmo indivíduo por mais de

uma geração (ROMANCINI, 2007).

Assim como Ricardo Gomes (2011), acreditamos que a

riqueza do artesanato brasileiro deriva da multiplicidade do fazer

artesanal. Esse fazer é diverso e rico, tanto pelas matérias primas

que emprega quanto pelas técnicas de produção, e também

devido às realidades vividas por aqueles que o produzem.

Considerando a importância de compreender como a

prática da cerâmica artesanal ocorre dentro deste cenário

contemporâneo, sujeito a constantes transformações sociais,

culturais e econômicas, segue-se a apresentação do primeiro

contexto, o do artesão Osmar, tomado para o estudo de caso. Sua

importância reside no fato de ser depositário de um passado que

traz à tona vestígios tradicionais desse saber fazer, além de

promover um debate em torno de questões relacionadas à

existência contemporânea da atividade. Com isso, estabeleci

algumas conexões, articulando a teoria aos seus depoimentos.

Essa pesquisa de campo, guiada pela curiosidade e intuição,

busca também provocar reflexões acerca das interferências e

apropriações verificadas no diálogo de alguns saberes que

confluem na contemporaneidade: design, arte e artesanato. Até

porque como assinala Sylvia P. Alegre (1985):

68

Toda discussão sobre fronteiras entre ‘arte’ e ‘artesanato’, entre‘artista’ e ‘artesão’, a partir do discurso dominante, carece de sentido dentro da perspectiva do indivíduo que exerce essa atividade, pois ele raramente separa a instância do trabalho manual ou mecânico (‘artesanal’) do trabalho intelectual e confere a ambos igual dignidade (p. 10).

Estas e outras questões me guiaram de um contexto micro,

de caráter local, para um macro, até porque as identidades

regionais, locais, colocam-se para o design como uma valiosa

fonte de matéria prima (RODRIGUES, 2005).

3.1.1 O fazer artesanal de Osmar Virgílio da Silva

A origem29 do fazer cerâmico está intimamente ligada ao

costume indígena e, provavelmente, africano, de fabricar

29 É importante mencionar que ao se colocar origem, não há nenhum intuito

purista na análise, pois não acreditamos nessa experiência. O que se quer dizer aqui é como foi contada a história e como este saber foi transmitido por gerações passadas.

cerâmicas utilitárias e decorativas para armazenar, cozinhar,

servir alimentos e para ornamentação. O próprio artesão Osmar,

frequentemente, se reportava à raiz negra e indígena quando se

referia ao seu fazer.

No campo científico, a cerâmica está ligada à mineralogia, à

arqueologia e às ciências antropológicas e tem diretas conexões

com a arte. Mas, se na arte, os quatro elementos solicitam o

devaneio do artista, no ofício, liga-se às forças físicas do artesão

que age sobre a matéria argila e dá forma ao objeto cerâmico

artesanal (BACHELARD 1991).

A produção de artefatos a partir de argilas consiste na

fusão de terras e rochas que, quando amassadas, tratadas com

água e colocadas em alta temperatura, secam, endurecem e se

transformam em cerâmica. Algumas peças são acromáticas;

69

outras têm coloração obtida com o uso do próprio barro em

estado líquido ou com pigmentos vegetais 30 para acabamento.

Na cultura da cerâmica, os significados na história de vida

dos artesãos e seu valor simbólico se caracterizam pelas práticas

sociais de trabalho e pela elaboração sociocultural que se trava

na própria comunidade, alimentando a significação e a práxis do

território.

Seu processo de confecção implica em profundo

conhecimento de tipos de argila e o modo correto de coleta e

armazenagem, além do domínio do processo de transformação

da matéria bruta, para dar forma ao objeto. Além de métodos de

trabalho e processo de produção, esses objetos revelam rituais de

vida, cuja natureza e significado procurei investigar.

Este subitem começa pela revelação de aspectos biográficos

desse artesão, suas escolhas pessoais e a trajetória profissional

30 Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmica para Revestimento,

Louças, Sanitárias e congêneres – ANFACER. Disponível em: www.anfacer.org.br. Acesso em: 19/03/11.

que o conduziram para a cerâmica artesanal, gerando o único

meio de subsistência de sua família. O motivo da escolha dele

como principal informante do estudo se deu a partir do

levantamento de dados sobre a cerâmica artesanal na região.

Quase todas as indicações convergiam para a comunidade

ribeirinha tradicional, São Gonçalo Beira Rio. Mas algumas nos

conduziram ao artesão Osmar.

Osmar Virgílio da Silva é artesão mato-grossense, tem 42

anos de idade, 22 de arte cerâmica. É casado com Lise e tem 3

filhos: a mais velha com 19, o do meio com 10 e a caçula com 2

anos de idade. Nasceu em Poxoréu, interior de Mato Grosso, mas

mora na capital, Cuiabá, há quase 20 anos. Seus pais são naturais

da cidade de Caruaru, Pernambuco.

Osmar não se insere no estatuto do artesão, razão mais

motivadora da investigação. Ele não tem tradição familiar no

artesanato; mantém-se na atividade há quase 22 anos; expõe

seus artefatos em feiras locais, geralmente como autor artesão,

representando sua empresa “Barro Vivo”; fez dezenas de cursos

técnicos na área; resvala no campo do Design quando ministra

70

oficinas para outros artesãos profissionais; tem inserções

midiáticas, já tendo concedido diversas entrevistas a jornais,

revistas e programas de televisão locais – eis algumas

características desse profissional que foge ao estereótipo de

artesão tradicional, mas nem está fora do artesanato e nem do

design.

Figura 9: Osmar e sua peça cerâmica. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011 e

Mestre Vitalino. Fonte: www.onordeste.com. Acesso: 16 de junho de 2011

É considerado o maior produtor individual de cerâmica

artesanal da região, e não participa da comunidade tradicional

local, nem de associações e cooperativas. Trabalha sozinho na

produção, com a ajuda dos filhos na pintura de pequenas peças e

da mulher na venda dos objetos cerâmicos, no espaço que aluga

no centro da cidade. Batizou seu empreendimento de “Barro

Vivo” (Figura: 23), em referência aos quatro elementos da

natureza: terra, água, ar e fogo.

Embora enraizado em uma cultura local, a memória do

artesão Osmar, ganha força no desenvolvimento das peças

cerâmicas, dando lugar ao cruzamento de várias referências

culturais. No seu trabalho, faz questão de buscar referências nas

culturas mato-grossense e nordestina. Seu “sonho”31 é seguir os

passos de Mestre Vitalino32, artesão nordestino que retratava seu

cotidiano em esculturas de barro.

Dito isto, cabe refletir sobre o processo criativo e produtivo

de peças cerâmicas artesanais do artesão Osmar, que esta

pesquisadora pode acompanhar em visitas a sua casa que, não

31 O trabalho do “sonhador que modela” é analisado por Bachelard (1948)

como decorrente do movimento entre vontade (força contra a matéria) e imaginação (imagens da intimidade).

32 Vitalino Pereira dos Santos. Parte de sua obra pode ser contemplada

no Museu do Louvre em Paris. No Brasil, o maior acervo está em Recife, Caruaru, onde ele morreu em 1963. Disponível em: www.itaucultural.org.br. Acesso em: 19/06/11.

71

por acaso, é também sua oficina, e a sua empresa “Barro Vivo”,

entre novembro de 2010 e junho de 2011.

3.1.1.1 Primeiro encontro

Nosso primeiro encontro foi em novembro de 2010, porém,

devido à quantidade de peças que teria de produzir,

encomendadas para as comemorações de final de ano, não

poderia dar a atenção merecida aos trabalhos de campo. Mesmo

assim, pedi para acompanhá-lo no seu dia a dia. Osmar se

mostrou atencioso e pronto a contribuir com a pesquisa.

A câmera nos levou ao cotidiano do artesão, mostrando

imagens de sua casa e de sua oficina cerâmica. Osmar me contava

como o barro chegou às suas mãos e como descobriu, por acaso,

o que queria fazer pelo resto da vida. Pude observar o movimento

da oficina e a rotina da família.

Quem chega à sua casa tem a atenção voltada para a

profusão de objetos cerâmicos em todos os cantos, que atestam

o valor da atividade no dia a dia da família, compreendida e

representada, principalmente, a partir deste ofício como

sentimento de pertencimento ao lugar, rico em “construções

identitárias e projeções simbólicas” 33.

Figura 10: Fachada da casa do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal.

Novembro de 2010

33 Expressão utilizada por Carvalho (2008) para indicar a construção da

identidade social que se processa no âmbito das projeções simbólicas articuladas pelas práticas do cotidiano, com exaltação das diferenças culturais dos grupos, apesar da força totalizante dos interesses econômicos decorrentes da globalização.

72

Todo seu saber artesanal, suas experiências com o barro,

suas técnicas, são empregados na produção de artefatos que ao

mesmo tempo são mediadores de relações sociais e serão

submetidos ao mercado.

Figura 11: Fachada lateral direita da casa. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010

Em seus trabalhos com carrancas, máscaras e figuras

humanas, observamos a inspiração em grafismos indígenas e

referências africanas. O artesão dedica-se, também, à pesquisa de

referências regionais para seus objetos em argila, como utensílios

domésticos e de decoração e nos ornamentos em potes,

moringas, vasos e filtros.

No entanto, a atividade nem sempre é desenvolvida ao

longo de todo o ano, estando sujeita a períodos sazonais, em

razão da disponibilidade de matéria-prima e também da

demanda.

Figura 12: Jogo de chá feito por Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010

Quando não há encomendas, Osmar cria novas peças, faz

misturas com novos produtos, executa novos tratamentos na

argila. Além disso, trabalha com reaproveitamento de materiais,

como a fachada da casa feita com refugo de pastilhas e azulejos

73

recolhidos de uma casa em reforma. Ele comenta que existem

materiais e ferramentas em sua oficina que foram retirados de

caçambas de entulho, recriadas e reaproveitadas.

O trabalho se orienta para a produção de objetos de uso

mais comum, seja em função utilitária, decorativa ou religiosa,

mas também existem objetos singulares, influenciados pelo

ambiente em que vive e pelo modo de vida da área cultural a que

pertence.

Figura 13: Sala da casa do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010

Na estante improvisada na sala da casa, ficam expostos os

artefatos cerâmicos produzidos e não comercializados,

misturados a objetos industrializados, como um constante

processo de hibridização cultural que nasce da velha tensão entre

tradicional e moderno (CANCLINI, 2008).

Para Osmar, falar de sua peça é quase como falar dele

mesmo. Podemos percebê-lo por meio dos seus objetos,

confirmando o que diz Albornoz (2004, p.63): “a produção do

objeto pelo homem é ao mesmo tempo um processo de

autoprodução (...)”.

Figura 14: Sala da casa do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2011

74

Ele se sente herdeiro de uma tradição34 que lhe dá

existência, mantendo-a por meio de repetições de modelos,

fazendo com que os artefatos persistam no fluxo do tempo. É por

meio dessas repetições, com variações imperceptíveis, que seu

trabalho se torna parte da tradição local.

Figura 15: Oficina no fundo da casa do artesão. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010

34 Entende-se tradição um conjunto de sistemas simbólicos que são passados

de geração a geração e que tem um caráter repetitivo. É considerada dinâmica

e não estática, uma orientação para o passado e uma maneira de organizar o

futuro. Coordena à ação que organiza temporal e espacialmente as relações

dentro da comunidade (GIDDENS, 1997).

Na oficina erguida no quintal da casa, como se fosse sua

extensão, observamos a produção de algumas peças cerâmicas.

Encontramos ali, na manufatura dos objetos do artesão, uma

mistura de técnicas reminiscentes e outras tecnologias, como o

torno elétrico.

O seu dia se organiza em torno desse fazer, uma vez que o

processo de produção é demorado e se estende ao longo de dias.

Consiste em extrair a argila de jazidas próximas à sua casa;

estocar em sacos úmidos para o equilíbrio do material orgânico;

compactar e dividir em bolas de argilas; modelar em torno

elétrico; secar à temperatura ambiente; e posteriormente

queimar em fornos intermitentes a uma temperatura de mais ou

menos 700ºC.

Os elementos naturais com que o artesão lida diariamente,

como terra, água, ar e fogo em seus diversos estados, são

complexos, mas Osmar parece dominá-los. Acreditamos, assim

como Bachelard (1991), que as realidades materiais oferecidas

pela natureza são convites para exercer nossas forças. O autor

afirma que:

75

(...) A realidade material nos instrui. De tanto manejar matérias muito diversas e bem individualizadas, podemos adquirir tipos de flexibilidade e de decisão. Não só nos tornamos destros na feitura das formas, mas também nos tornamos materialmente hábeis ao agir no ponto de equilíbrio de nossa força e da resistência da matéria (p.21).

Figura 16: O artesão trabalhando a argila no torno. Fonte: Acervo pessoal.

Novembro de 2010

No processo de construção do artefato cerâmico, as

atividades são muitas e necessitam não só de força física, mas de

força técnica. Enquanto ele produzia, conversávamos sobre seu

ofício e eu observava seu ritual.

As técnicas e habilidades artesanais são aprendidas de

diversas formas, sendo frequente o aprendizado pelo

compartilhamento de experiências entre artesãos: o artesão que

assume o papel de mestre domina e repassa técnicas tradicionais

ou modernas a interessados. Também há casos de ensinamento

por consultores ou instrutores. Os contatos são sempre diretos,

estabelecendo um caráter de pessoalidade na relação ensino-

aprendizagem. As fontes mais reconhecidas de referência para o

trabalho do artesão são a matéria-prima existente na localidade,

a arte e a simulação da sua realidade cotidiana e social.

As técnicas da olaria, ele aprendeu com dois mestres, por

meio da troca e soma de conhecimentos, que se mantém viva

como um saber intimamente ligado à sua história. Ele menciona

um mestre nordestino e outro matogrossense que criaram, a

partir do ofício, uma verdadeira escola, passando suas técnicas

76

artesanais aos filhos e aprendizes, se deixando observar durante a

construção do artefato. Osmar compartilha dessa prática. Além

de transmitir os ensinamentos para os filhos, procura ensinar

artesãos iniciantes.

Figura 17: O artesão e suas tarefas domésticas. Fonte: Acervo pessoal.

Novembro de 2010

Entretanto, os trabalhos na oficina se misturam com os

afazeres da casa e algumas tarefas domésticas acabam sob sua

responsabilidade. Tentando superar as condicionantes, era visível

o esforço de Osmar em organizar o tempo, com ânimo de tocar

tudo ao mesmo tempo. Enquanto a mulher tomava conta das

vendas de suas peças cerâmicas no centro da cidade e a filha mais

velha seguia sua vida em um trabalho fora de casa, encarava com

naturalidade e se mostrava bem disposto ao serviço. Contudo, a

importância deste fazer na vida do artesão parecia subverter a

ordem natural das coisas.

Figura 18: Mulher do artesão Osmar, Lise. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2011

O fazer artesanal, assim compreendido, por um lado

carrega em si um acúmulo de conhecimentos de ordem técnica e

material, necessários à sua concretização. Por outro, está

77

firmemente enraizado em um universo dos símbolos que

mobilizam o artesão na busca de significados (CRUZ, 2010).

Observando Osmar sentado em volta do torno35, observei

seu saber cerâmico ao moldar a argila, ao explicar cada fase do

processo, na obtenção do material, na sua preparação, na

modelagem, no processo de secagem, na queima, onde se atinge

a transformação da argila em cerâmica. Sobretudo, as falas

corporais, quando seu corpo debruça sobre seu ofício,

multiplicando possibilidades para que sua história persista no

tempo.

O espaço da produção das peças era bastante úmido, pois

durante todo o processo de beneficiamento e modelagem, água

era adicionada à argila. Ele usava uma lona como avental para

cobrir suas pernas e proteger as roupas da água que se soltava do

torno em movimento. Mas o barro estava impregnado em todo o

espaço.

35 É um equipamento movido por tração humana ou eletricidade. Em estrutura

de madeira com dois discos. Provavelmente uma das primeiras tecnologias desenvolvidas para a produção em grande escala (TORTORI, 2008).

Ao modelar o barro, suas ferramentas, anotações de

clientes, o aparelho de som e tudo a sua volta ganhava “cor de

barro”, alimentando a significação do cotidiano e a práxis de sua

atividade. Ele parecia gostar desse cenário e dizia que o que mais

o atraia era a possibilidade de trabalhar com as próprias mãos os

quatro elementos: água, terra, ar e fogo.

Sua fala era comovente e parecia querer provar sua paixão

pela cerâmica:

Osmar disse que trabalhou em uma olaria antes de se

decidir pelo artesanato. Lá, aprendeu o processo de produção da

cerâmica industrial. Disse que se sentia explorado e não tinha

prazer em trabalhar. O gesto repetido do fazer cerâmico, do

cumprir as fases no tratamento da argila, da tecnologia do torno,

das ferramentas improvisadas, na intenção de dar forma ao

informe, define um território que tem como primeira

característica uma “resistência” imediata e constante. No fazer

Eu tinha outra profissão, mas larguei tudo só pra fazer cerâmica... Disse que vou fazer cerâmica independente de qualquer coisa. Se não vender, eu vou fazer e quebrar...

78

artesanal de Osmar, a matéria dura, resistente e sem forma

tornava-se plástica, flexível e criativa, assim como em Bachelard

(1991). A partir do seu encontro com a água, um novo corpo se

forma e surgem novas possibilidades de interação.

O movimento de trabalho de Osmar contra a matéria

argila era intenso e apaixonado, parecia desafiar a força numa

atitude dinâmica e transformadora. Mas para o artesão, a

cerâmica é, antes de tudo, trabalho – tão complexo que

compreende um conhecimento amplo, que vai desde a matéria

prima até as questões de mercado. Este último, segundo ele,

ainda se apresenta como um grande desafio.

O gesto repetido do fazer cerâmico, do cumprir as fases no

tratamento da argila, da tecnologia do torno, das ferramentas

improvisadas, na intenção de dar forma ao informe, define um

território que tem como primeira característica uma “resistência”

imediata e constante. No fazer artesanal de Osmar, a matéria

dura, resistente e sem forma tornava-se plástica, flexível e

criativa, assim como em Bachelard (1991). A partir do seu

encontro com a água, um novo corpo se forma e surgem novas

possibilidades de interação.

Figura 19: Artesão Osmar no seu ofício. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2011

79

Figura 20: As mãos do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010

A mão do artesão foi descrita como uma importante

ferramenta, assim como em Bachelard (1991), para a realização

do seu trabalho. Calejada, com os dedos ressecados, unhas sujas

de barro, apresentava-se como configuração estética

manufatureira e um envolvimento físico integral, ou seja, de

corpo e espírito, na transformação da argila e “feitura” 36 do

objeto cerâmico.

36 Utilizamos o termo feitura empregado por Bachelard (1991), para

relacionarmos ao termo utilizado como tema deste capítulo – O fazer manual.

Para esse mesmo autor, a transformação acontece também

dentro do indivíduo, pois a matéria é oportunidade de realização

pessoal. E continua: “o artista do barro pratica sua arte sobre

uma matéria amorfa, submete essa matéria a certas restrições:

ele a despedaça e a modela, impondo-lhe limites” (p.53).

Depois de moldado e cortado na base até a forma de um

pequeno pote, a peça era colocada em uma bancada de madeira

improvisada, para “descanso” e secagem à sombra, dando corpo

a uma peça resistente. Segundo Osmar, o número de peças

deformadas e rachadas na fase da queima é menor nas

torneadas, pela ausência de arestas e vértices. Assim, formas

cônicas, cilíndricas, esféricas e ovais são recorrentes no universo

de uma boa produção cerâmica com o uso do torno (SILVA, 2008).

Neste primeiro encontro, não acompanhamos a fase da

queima, pois o forno, criado pelo próprio Osmar, estava ocupado:

...Tô queimando uma fornada... Tá aceso desde ontem e eu tô aqui cuidando...

80

Figura 21: Forno construído por Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010

Na fase da queima, as peças são “enfornadas”, isto é,

arrumadas dentro do forno e cobertas com cacos de cerâmicas

que ele reaproveita para conservar o calor. Quando submetidas

ao fogo em altas temperaturas, as peças adquirem a “resistência”

de mármore.

Mesmo com dificuldades comuns de uma atividade

considerada subalterna, com as limitações típicas de uma

produção artesanal, Osmar categorizou seu trabalho como um

“fazer divino”, reunindo nele atributos como resistência,

paciência, deleite, autonomia, liberdade. Ao definir assim seu

trabalho, o artesão coloca-o em um patamar no qual o deleitável

adquire qualidade de insurgência, funcionando como

possibilidade de resistência.

Minhas primeiras impressões a respeito do fazer artesanal

do “sonhador que modela”, parafraseando o filósofo francês

Gaston Bachelard (2001), ainda não se encontravam

amadurecidas, mas estavam arquivadas na memória, no caderno

de campo e, também, nas gravações do percurso da pesquisa,

para futuras consultas. Entretanto, ao ouvi-la, novamente,

percebi na fala do artesão, a tal autonomia de que ele tanto

falava:

...Eu produzo de tudo... Se eu chegar num lugar que tem barro, eu vô cavando buraco e dali eu já faço tijolo, daí tiro a segunda camada e já faço a telha e depois na terceira camada eu começo a fazer a cerâmica... Domino tudo da cerâmica.

81

Nessa definição polêmica, trabalho e modo de vida

parecem se alimentar de um processo particular, mesmo

participando da tão complexa relação – ser social e meio

ambiente, como se na essência criadora do modelar o barro,

fosse possível reinventar o sentido do trabalho na

contemporaneidade.

Figura 22: “Barro Vivo” Loja da família. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010

A atividade do artesão é um ofício, pois organiza e regula

seu cotidiano e lhe confere legitimidade social (PERELMUTTER,

2008). Sua oficina é regida por leis próprias e seu ritmo tem a ver

com as necessidades do seu contexto, mesmo que esteja inserido

num universo sociopolítico-econômico globalizado.

Embora o dia a dia do artesão não passe intacto às

influências do sistema capitalista vigente, a importância e o valor

que ele dá ao seu trabalho, têm a capacidade de externar a

riqueza do seu fazer artesanal e sua fração de contribuição social

na localidade. No entanto, trabalho como este pode ser

encontrado em diversas regiões do país ou do mundo, resistindo

aos apelos da massificação e produção em série, marcas da

sociedade industrial. Mas, em face das condições concretas

oferecidas pelo contexto no qual este trabalhador está inserido,

ele prova da essência criadora na arte e na vida.

Sua atividade artesanal não deixa de ter, em si, a

necessidade do comércio, assim como toda atividade análoga,

situação que, muitas vezes, permite a subalternidade social dos

artesãos trabalhadores frente ao lucro e ao acúmulo capitalista.

Porém, isso não dá mostras de que o artesão cede passivamente

sem qualquer resistência. Na realidade, ele integra o sistema

construindo sua inserção baseada em práticas sociais próprias de

82

valorização do seu trabalho, que se apoia em suas tradições, na

sua cultura e nos projetos de vida. Isto é uma forma de

resistência.

3.1.1.2 Segundo encontro

Nosso segundo encontro foi em junho de 2011. Osmar

mencionava importantes mudanças no seu processo produtivo.

Algumas eram visíveis já na entrada da casa. Parecia ter

conseguido realizar seu sonho de transformar a oficina, em um

lugar aberto ao público interessado em conhecer seu ofício.

Porém, a situação era paradoxal. Em uma das conversas, várias

dificuldades sobre o processo de produção da cerâmica vieram à

tona, dificuldades não mencionadas por ele no primeiro

encontro.

A preocupação era, especialmente, a respeito da extração

da matéria prima, que no início era feita nos barreiros próximos

de sua casa. No entanto, com o passar dos anos, o local se tornou

de difícil acesso pelo esgotamento dos depósitos naturais,

restando poucos pontos de retirada e um barro de má qualidade,

dizia Osmar. Hoje, a população que vive no entorno sofre as

consequências de um processo de urbanização acelerada e

excludente, que, entre outras coisas, aumentou os índices de

degradação e escassez do ecossistema local.

Figura 23: Endereço da casa de Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Sua prioridade não era mais o mencionado sonho e sim

desenvolver uma estratégia para assegurar a manutenção da sua

atividade. Isso implicava em adquirir argila garantindo matéria

prima suficiente para as necessidades da produção.

83

Osmar mencionou que adquiriu por um “bom preço”,

alguns meses antes da nossa segunda visita, argila proveniente de

uma olaria de cerâmica industrial da região, especializada na

fabricação de tijolos e telhas. Na verdade, consistia em um

“milheiro de argila”, ou seja, argila no formato de tijolos não

queimados. Ele mencionou que estava experimentando a ideia de

trabalhar com uma matéria prima já processada, mais

homogênea, limpa e preparada para modelagem, e não expôs

dificuldades de adaptação. Pelo contrário, em suas palavras,

tratava-se de “barro bom”, e passou a descrevê-lo:

Embora o artesão tivesse dificuldade de expressar todos os

seus motivos, a compra da matéria prima parecia, também, estar

ligada ao baixo preço final das peças e à grande concorrência na

tentativa de suprir necessidades básicas de sobrevivência. Assim,

na luta pela manutenção da atividade, o artesão buscou formas

alternativas de produção. O investimento feito foi a maneira

encontrada para dar continuidade ao ofício, sem que isso

acarretasse um “desvio do sentido” da atividade, ou seja, ele

ainda era produtor de cerâmica artesanal.

Figura 24: Osmar na frente da sua casa. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Era perceptível a melhora da situação econômica e social do

artesão, após a adequação no processo produtivo. A

...Ele é passado em vários maquinários... Tiram as impurezas que quebra a peça. É um barro super amassado e dá essa qualidade no trabalho. Se eu for fazer do barro in natura, com ele bruto, chegar e cavar lá no chão, peneirar, molhar, fazer as bolas dá muito trabalho, produz pouco.

84

disponibilidade da nova matéria prima ampliou os caminhos da

produção, viabilizando um aumento considerável e uma nova

linha de produtos dentro de padrões técnicos, o que possibilitou

sua inserção em alguns mercados antes inatingíveis. Segundo ele,

o prejuízo de peças quebradas, também diminuiu.

A manutenção do novo investimento é conseguida a partir

da venda de peças cerâmicas, em um processo constante,

impulsionado pelo aumento da produção e a necessidade de

recursos. Quando precisa investir, ele produz, vende, compra

matéria prima, produz novamente e comercializa, num ciclo

natural e necessário. Hoje, praticamente toda a argila utilizada na

produção advém de olarias industriais da região.

Entretanto, o trabalho do artesão ainda se faz de forma

individual, em sua oficina, no fundo da sua casa. Continua

obedecendo a um tempo que pode ser bastante extenso. Sua

jornada de trabalho está sujeita a muitas porosidades temporais.

Pode trabalhar por horas seguidas ou intercalar trabalho e

descanso, ou alternar com outras atividades, como tocar violão.

A questão do tempo parece ser uma característica

intrínseca dos objetos feitos à mão. Assim diz Sennett (2009):

A lentidão do tempo artesanal é fonte de satisfação: a prática se consolida, permitindo que o artesão se aposse da habilidade. A lentidão do tempo artesanal também permite o trabalho de reflexão e imaginação – o que não é facultado pela busca de trabalhos rápidos (p.328).

O tempo necessário para a realização da experiência

artesanal não pode ser medido pelo modelo tempo comum nas

organizações industriais. Heliana Marinho (2006) diz:

Há que se considerar que a produção de produtos artesanais, além de utilizar baixa tecnologia, surge de uma manifestação criativa, individual ou coletiva, estimulada por relações interpessoais. Tal processo produtivo sofre descontinuidade, pois é intercalado por outras atividades, realizadas simultaneamente, que trazem satisfação pessoal. O alto nível de envolvimento com o fazer, ou o executar o produto, talvez seja reflexo da linguagem simbólica e da materialização da experiência humana. Assim sendo, o tempo artesanal estabelece-se num cenário de conveniência e

85

de convivência, e não de segmentação e de seriação (p.130).

As imagens a seguir mostram, resumidamente, o novo

processo de produção:

Figura 25: “Milheiro de argila”. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Figura 26: Explicando o novo processo. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Figura 27: Quebrando o tijolo de argila não queimado. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

86

Figura 28: Mostrando o ponto da argila para o torno. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Figura 29: Levantando a argila no torno. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Figura 30: Modelando a argila no torno. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Figura 31: Peças secando ao ar livre. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

87

Figura 32: Na fase da queima no forno que ele mesmo construiu. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Figura 33: Osmar, sua filha caçula e seu violão. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011

Ao convidar Osmar para que falasse sobre o sentido do seu

trabalho, a expressão que mais ouvi foi autonomia e liberdade.

Entretanto, a maioria de suas descrições remetia a conceitos

amplos e interligados, por vezes confusos, mas as descrições de

vivências e experiências pessoais e profissionais possibilitaram

estabelecer algumas distinções.

Embora sua atividade possa ser percebida como regular ou

sistemática no sentido de sobrevivência profissional e não apenas

como um prazer vale indagar por quais critérios e valores Osmar

define seu trabalho como livre e autônomo. O fato de “trabalhar

por conta própria”, não sujeito a horário fixo ou rígido de

trabalho, em contraste com outras atividades que já exerceu,

talvez explique de certa forma. Além disso, ele diz ser “patrão

dele mesmo”, fator que para ele marca a diferença entre sua

atividade e a exercida por sua filha, que trabalha fora de casa.

Para o artesão, o trabalho que faz sentido, visto como

sendo capaz de satisfazê-lo e ser útil para a sociedade, aparece

como elemento fundamental em sua vida. Osmar sabe que o

sentido do ofício cerâmico está na intrínseca relação entre arte,

88

trabalho, existência e sobrevivência. Assim como, também, sabe

que seus valores e princípios são fundamentais à sua vida.

O valor a que me refiro, contido no trabalho, é elemento

de peso no domínio do seu ato produtivo. Todavia, tal

categorização não é algo que se limite ao mundo dos ceramistas,

visto que qualquer artesão a leva em sua arte, na condição de um

critério valioso, como revelado no estudo de Porto Alegre (1994):

A ética do trabalho, quando orientada pelo “espírito da arte”, envolve três aspectos particularmente importantes. Em primeiro lugar, o trabalho torna-se o centro de toda a vida do indivíduo [...] Em segundo lugar, o artista sente orgulho da profissão e da sua condição de autonomia. Finalmente, os diferentes valores convergem para uma síntese de relação com o trabalho e a obra produzida, que se expressa na reputação do mestre (p. 110).

E continua:

O aprendizado pode ser longo, a feitura do objeto pode requerer um domínio de técnicas e linguagem de materiais impossíveis de ser adquirido por meio de um conhecimento rápido

e superficial. No domínio progressivo da arte está embutida toda habilidade e toda a criatividade do artista. O reconhecimento desse difícil processo por parte dos outros se reveste por isso de fundamental importância para o artista, pois do que o valor de troca, mais do que valor de uso, o objeto encerra e contém um valor moral do trabalho realizado (Ibid., p. 112).

Acredito que a relação estabelecida entre o artesão e seu

trabalho é algo que permeia todos os aspectos de sua existência.

A escolha da atividade artesanal parece se impor como uma

espécie de missão que se une a um desejo de transformar o

cotidiano com sua própria mão. O trabalho artesanal pode

melhorar o relacionamento entre as pessoas, favorecendo a

reciprocidade e o fortalecimento dos elos socioculturais. A

comunicação é estimulada pelo espaço em que as atividades são

desenvolvidas, permitindo a aproximação e o aumento dos

vínculos afetivos.

Nesse sentido, o artesão é, portanto, um poeta que pensa

com as mãos. Se por um lado ele domina os conhecimentos

89

técnicos, por outro ele se entrega a devaneios e busca uma

experiência nova na antiga arte de trabalhar o barro, matéria que

ele conhece bem (BACHELARD, 1988).

Assim, é no fazer artesanal que o trabalho ainda parece

guardar conexões com seu sentido original, em que todos os

rituais que envolvem preparação e realização compreendem uma

síntese entre técnica, arte e vontade (BACHELARD, 1991),

explicado pelo artesão como um anseio maior que se apossa dele.

Quanto a isso, Octavio Paz comenta que “o objeto artesanal nos

entra logo pelos sentidos, vivendo em cumplicidade conosco”

(PAZ, 1991, p. 50).

Embora revele acreditar em virtudes humanas e declare ser

construtor de uma vida com sentido, mais gratificante e menos

sofredora, o artesão trabalha para obtenção do proveito

econômico para a sobrevivência. O que o diferencia dos outros

trabalhadores é o fato de atuar em relações sociais afetivas e

afirmar ter preocupações com a comunidade, o território e o

meio ambiente; buscando a sobrevivência e a inserção produtiva

mais solidária, mesmo que trabalhe só (HABERMAS, 1973).

Passamos agora à análise do trabalho do ceramista, Gilberto

Paim, no intuito de verificar, também, as diversas questões

relacionadas aos referenciais de sua pesquisa e ao

desenvolvimento de suas peças cerâmicas.

3.2 Percurso criativo do ceramista Gilberto Paim

O presente subcapítulo traz o percurso criativo do

ceramista Gilberto Paim, com o propósito de analisar o processo

de criação e produção de suas peças cerâmicas, que envolve

planejamento; esboço da peça (Figura); estudo dos estilos;

conceitos, formas, texturas, cores e grafismos; e segue na

confecção do artefato cerâmico de forma artesanal.

O objetivo é a possibilidade de considerá-lo inserido no

fazer artesanal contemporâneo, assim como se tentou inserir no

design o trabalho do artesão exposto anteriormente – dois

contextos distintos e distantes que se unem pelo interesse

comum nas possibilidades de criação e produção oferecidas pela

cerâmica. Esses contextos são analisados com a finalidade de

90

pensar as cisões estabelecidas entre o artesanato e o design,

formadas por um pensamento tradicional, com características

positivistas, acreditando que as fronteiras entre esses campos são

cada vez mais tênues (ANTUNES, 2009).

Nesse sentido, dei início a uma série de buscas que

revelaram tanto as singularidades de cada área quanto a

contaminação mútua. Assim, utilizamos alguns textos que

descrevem o trabalho do ceramista, por exemplo, o da jornalista

e professora de História do Design na Faculdade de Campinas –

FACAMP, Ethel Leon. Alguns textos do próprio Paim sobre a

temática também são analisados, visando instigar a reflexão

teórica e prática sobre essa relação. Reflexões pertinentes ao

contemporâneo complexo no qual estamos imersos.

Paim, além de ceramista, pesquisador e curador

independente, é doutor em Literatura Comparada pela UERJ (em

convênio com a École des Hautes Études en Sciences Sociales, de

Paris) e autor de: “A cerâmica e a Horla (1991)”, “Beleza sob

suspeita (2000)” e artigos publicados em periódicos

especializados nacionais e estrangeiros.

Figura 34: Gilberto Paim. Fonte: www.casacomdesign.com.br Acesso em: 20/11/11

Nova Friburgo, na região serrana do Rio de Janeiro, a 150

km da capital, foi o lugar que Paim escolheu para morar e

trabalhar. Junto com sua esposa, Elizabeth Fonseca, transforma a

argila branca de porcelana – uma escolha do casal – em peças

91

cerâmicas, numa busca por equilíbrio e simplicidade. Juntos

produzem objetos cerâmicos desde 1980.

Figura 35: Uma imagem da amostra em Heidelberg, na Alemanha. Fonte: www.casacomdesign.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011

Já expuseram seus trabalhos em importantes mostras,

dentro e fora do Brasil 37.

Figura 36: Peças da coleção “A quatro mãos”. Disponível em: www.gilbertoeelizabeth.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011

37 Cerâmica Contemporânea, Paço das Artes, SP, 1983; Wilson & Gough, Londres, 1990; A Cerâmica e o Horla, individual no MAM RJ, 1991; A Nova Presença da Cerâmica, Paço Imperial, RJ, 1993; Artesãos do Brasil, Fundação Armando Álvares Penteado, SP, 2000; Cerâmica Brasileira, Construção de uma Linguagem, Centro Brasileiro Britânico, SP, 2000; Mestres da Cerâmica, Espaço Cultural dos Correios, RJ, 2001. No Rio de Janeiro e em São Paulo, suas peças são expostas regularmente nas lojas Interni. Desde o início de 2004, os dois ceramistas são representados pelas galerias Espasso de Nova York e Los Angeles. Já expuseram duas vezes na galeria Marianne Heller, em Heidelberg, considerada uma das melhores em cerâmica no mundo.

92

Seus artefatos parecem resgatar técnicas tradicionais,

caracterizados pela simplicidade das formas e exploração sensível

da superfície que aliado às novas tecnologias, parece combinar a

uma experiência urbana do ceramista, adaptando objetos às

necessidades dos dias atuais (LEON, 2007).

Figura 37: Interior do ateliê de Gilberto e Elizabeth, em Nova Friburgo. Fonte: www.casacomdesign.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011

No ateliê, Paim desenvolve pesquisas técnicas e estéticas,

ideias e experiências, que resultam nas mais variadas formas

cerâmicas.

O casal parece não pensar na produção a partir do

mercado, assim, percebemos certo controle na produção e na

gestão do tempo. Também parece não haver interesse na

produção seriada, o que, de certo modo, caminha no sentido do

ofício artesanal que os dois exercem. No entanto, preferem a

tecnologia de um forno elétrico no processo da queima das

peças, mas não dispensam as mãos no trabalho com a argila.

Figura 38: Gilberto e Elizabeth analisando as fotos da coleção. Fonte: www.vimeo.com. Acesso em: 07 de outubro de 2011

Sua atividade cotidiana parece partilhar de um universo em

que o trabalho garante a reprodução material, mas também

93

satisfaz o espírito, assim como para o artesão Osmar. Parece ser

pensada e praticada como no passado, transmitindo as

experiências para as gerações futuras, de acordo com o universo

paciente e meticuloso da atividade manual da cerâmica. A

imagem38 abaixo transmite essa atmosfera.

Figura 39: Gilberto amassando a argila branca de porcelana. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011

Suas referências parecem conceber a cultura material de

forma mais livre. Seus objetos combinam aspectos artesanais e

38 Imagem retirada do vídeo de Nina Paim, intitulado: Gilberto Paim & Elizabeth Fonseca – Julho de 2011. Disponível em: www.vimeo.com. Acesso em: 07 de outubro de 2011.

industriais e parecem demonstrar “a luta contra a tirania do

monótono” 39, num modo singular de projetar, modelar e

produzir.

Figura 40: Piões de porcelana, Gilberto Paim, 2006. Foto: Rômulo Fialdini Fonte: www.vitruvius.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011

39 Título do texto da Jornalista Ethel Leon, especializada em Design, docente em História do Design e História do Design Brasileiro na Faculdade de Campinas – FACAMP. É autora do livro Design Brasileiro Quem Fez, Quem Faz, Memória do Design Brasileiro, 2005, Editora SENAC-SP.

94

A cerâmica de Paim parece ter mais afinidade com o

artesanato do que com o a concepção de design conhecida

atualmente. Segundo Leon (2007), ele vivem numa espécie de

ponto de contato entre os dois mundos. O do fazer manual que

segue teimosamente frente ao mundo industrializado. Repetindo

velhas formas de confecção da peça, numa espécie de reverência

aos mestres da cerâmica, independente de serem mãos de um

artesão ou de um designer.

Todos esses elementos certamente emolduraram a

produção material que conhecemos hoje. E o trabalho ou o fazer

que professa este caminho apresenta-se como um “reduto da

poesia” – o resultado são “poemas físicos”, cada vez mais

necessários na contemporaneidade. Os objetos de Paim nos

fazem reencontrar esse sentido tão distante, e ao mesmo tempo

tão próximo de nosso cotidiano (LEON, 2007).

Seguem algumas imagens do processo produtivo do fazer

artesanal de Paim:

Figura 41: Gilberto desenhando o objeto cerâmico. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011

Figura 42: Esboço da peça de Paim. Fonte: www.vimeo.com. Acesso em: 07 de outubro de 2011

95

Figura 43: Umidificando a argila. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011

Figura 44: Na modelagem da argila. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011

Figura 45: Levantando a argila no torno. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011

Figura 46: Medindo a circunferência. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011

96

Figura 47: Usando uma de suas ferramentas. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011

Figura 48: Encaixando a base da peça. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011

Figura 49: Objetos de cerâmica espalhados pela casa de Paim. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011

Paim (2009) diz que embora os produtos industriais sejam

dominantes, os objetos artesanais continuam presentes e muitos

deles são feitos por artesãos contemporâneos, com formação

universitária em design ou não. Porém, esses artesanatos

modernos40 são percebidos com dificuldade no Brasil – razão para

nos debruçarmos sobre o tema cuja discussão parece distante,

mas surge comumente.

40 Expressão utilizada por Paim ao se referir ao artesanato contemporâneo.

97

3.3 O fazer manual: uma questão de resistência?

Ao contrário dos países em que o design e a arte se

desenvolveram a partir da memória artesanal, como Itália, Japão

e países escandinavos, essas atividades seguem caminhos

opostos no Brasil (BORGES, 2011). Na maioria das vezes, a arte

está em condição de superioridade, seguida pelo design e por

último o artesanato – renegado, ligado a tradições e desprovido

de criatividade.

Numa perspectiva histórica, como vimos no primeiro

capítulo desta dissertação, o desenvolvimento de produtos até a

era da industrialização era caracterizado pelo fazer artesanal.

Hoje, esses exemplos de produção, são alternativos e surgem

como formas de estimular o surgimento de estruturas não

convencionais de participação econômica, que fomentam a

adesão de grupos e elementos ainda não absorvidos pelas

correntes dominantes na geração de ocupação e renda

(MARINHO, 2006).

O fazer cerâmico artesanal dos casos analisados não se

caracteriza apenas pela fixação de uns poucos traços de

identificação entre eles. Motivados pelo acesso e pelo uso, tanto

dos métodos projetuais quanto das disponibilidades técnicas e

materiais, o artesão Osmar Virgílio e o ceramista Gilberto Paim

não apenas incorporaram ao seu trabalho as referências

artesanais como também, a partir dessas referências, recriaram

um modo particular de vida e trabalho. A engenhosidade

presente em suas atividades conjuga domínio de técnicas,

conhecimento da matéria prima, projeto e acima de tudo,

resignação. Isso é um ato de resistência?

A resistência, conforme interpretação de Coelho (1997) está

nos meios utilizados por comunidades na preservação das suas

tradições e identidade. Ela ocorre no embate simbólico com a

cultura dominante. No caso, a luta seria contra os aspectos que

caracterizam o trabalho e suas relações e as formas de produção

no mundo atual.

O trabalho e os sentidos que a ele são atribuídos na

sociedade contemporânea fazem jus a uma importante reflexão.

98

Ele continua como elemento central na vida da maioria dos

indivíduos, mas na dimensão social, adquire maior amplitude, por

parecer um elemento que deve contribuir para o

desenvolvimento não só de um grupo, mas da coletividade

(ANTUNES, 1999).

O trabalho é uma experiência social de resistência. Assim,

Cattani (1996) considera:

(...) as facetas essenciais do processo de socialização da construção identitária, das formas de dominação e de resistência; enfim, da dinâmica contraditória da economia de mercado, têm sua origem nas situações laborais e nas relações sociais estruturadas na atividade produtiva (p.39).

Desse modo, o fazer artesanal tem encontrado meios para

resistir ao achatamento da sociedade capitalista. Para alguns

artesãos e designers, isso se torna visível não só em seus

produtos, mas também em seu estilo de vida e trabalho, e em

suas relações sociais e de sobrevivência.

Maria Imbrizi (2005) ressalta:

[...] não só em função das condições oferecidas no espaço de trabalho, mas fundamentalmente porque o processo de formação percorrido pelo indivíduo nas várias esferas da socialização está tomado por valores vinculados à racionalidade do equivalente: o homem é formado para igualar-se aos outros; os espaços oferecidos para a participação e discussão de ideias são falsos. [...] Perde-se, então, a oportunidade desses espaços como possibilidades de avanço das relações entre os homens, que sob a ótica da tecnologia, tendem a ser calculados e mensurados segundo critérios de utilidade e lucro (p. 23).

Os dois casos representam os valores dos produtores com

suas próprias visões de mundo, influenciados pelo ambiente e

modo de vida próprio da área cultural a que pertencem. O fazer

artesanal se apresenta, por meio de realizações, como um ritual,

onde vida e trabalho se misturam e se organizam. Isto é, a vida

aparece na riqueza do ato produtivo e o trabalho incorpora um

modo de ser, estar e sentir o mundo (RAMALHO, 2010).

99

A questão aqui defendida é a de que o fazer manual não

representa mera estratégia de sobrevivência de grupos marginais

ao sistema. São esquemas de produção que transcenderam e se

mantêm vivos, paralelos ao processo de industrialização.

Matturana (2001) fala em forma de “emulação” ou de

“resiliência”41 frente ao modelo de produção econômica

dominante no mundo contemporâneo, surgindo como opção

amadurecida para o desenvolvimento local e territorial.

Entretanto, percebe-se que essas peculiaridades conquistadas

com o trabalho artesanal só são possíveis quando o artesão ou o

designer consegue ligar-se à fantasia de realizar um trabalho que

tenha expressão forte o bastante, como um ato de resistência,

41 Em ecologia, este conceito aplica-se à capacidade de um ecossistema

retornar a seu estado de equilíbrio dinâmico após sofrer alteração ou agressão. A resiliência "é a medida da capacidade de um ecossistema absorver tensões ambientais sem mudar seu estado ecológico, perceptivelmente, para um estado diferente" (Zedler & Cooper, 1980). O termo, apesar de guardar uma discussão a respeito de sua definição, vem sendo consensualmente utilizado como a capacidade humana para enfrentar, vencer e ser fortalecido ou transformado por experiências de adversidade. Disponível em: www.redeambiente.org.br. Acesso em: 12 de maio de 2012.

frente à técnica e à lógica da produtividade, para não submeter-

se ao ritmo da máquina.

100

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do sistema econômico vigente, deparamos com uma

sociedade sobrepujada pelo capital, na qual prevalece, em boa

medida, um pensamento que estimula os trabalhadores a

deixarem de ver o trabalho como uma parte prazerosa da vida,

encarando-o somente como meio de sobrevivência e acumulação

de riquezas.

Por outro lado, contrapondo as imposições do mundo do

trabalho, observamos a possibilidade de realização humana pelo

fazer (trabalho) artesanal, como forma de resistência a esse

sistema, recorrendo a processos de criação/produção de

artefatos e refletindo no modo de vida e trabalho objetivados

neste fazer.

Nesse sentido, a presente investigação percorreu trajetórias

articuladas no campo teórico e empírico sobre o sentido do

trabalho artesanal na contemporaneidade. A sistematização do

referencial teórico e a consulta a autores fundamentados nessa

perspectiva foi empreendida com a finalidade de subsidiar a

análise do processo de investigação.

Por isso, dois diferentes contextos de produção de cerâmica

artesanal foram abordados: o primeiro, do artesão Osmar, que

mora em Cuiabá, Mato Grosso e o segundo, do ceramista Paim,

de Nova Friburgo, Rio de Janeiro.

Como parte do método de investigação, foi realizado

levantamento das condições da produção e do fazer artesanal,

em visitas aos locais de produção e venda dos produtos

artesanais.

O resgate das atividades artesanais apresenta uma

estrutura bem-sucedida, que renova processos laborais do

passado e contribui para infinitas possibilidades de ser e estar no

mundo, sobretudo quando tece sua análise sobre o fazer

artesanal como forma de resistência. Por isso, é importante que

esses grupos produtivos se destaquem, na contemporaneidade,

quando crenças e valores são (re)discutidos, para romperem com

as certezas que vigoraram na sociedade.

101

O modo de produção artesanal compõe uma estrutura

econômica muito particular dentro do sistema que impera na

sociedade atual, funcionando como um dispositivo social

diferenciado e essencial para a vida humana.

Nessa perspectiva, há que perceber melhor qual o lugar da

produção artesanal e qual o papel do design na

contemporaneidade, pois é importante pontuar que o trabalho

artesanal participa do processo de pertencimento de

determinado grupo social e também mantém os saberes e fazeres

locais, fortalecendo elos culturais e sociais.

O design não existe se não houver a criação e a tecnologia.

Evidentemente estas questões são permeadas pela ação

projetual. Uma das implicações da criação é a produção de algo,

um objeto, seja ele material ou imaterial. Esse objeto só toma

corpo, é materializado, torna-se realidade por meio da produção.

A produção só se realiza por meio do fazer (trabalho) e da

tecnologia.

Neste sentido, cabe a nós designers conhecer e levantar

discussões culturais locais. Pois hoje, as condições de produção

da cultura industrial e seus referenciais mercadológicos são

isolados do conhecimento dos processos da cultura artesanal.

Desse modo, é na análise dos aspectos que caracterizam

as relações e as formas de produção que encontramos meios de

denunciar como as possibilidades de diferenciação do indivíduo

vêm sendo logradas pela racionalidade tecnológica, o que aponta

para a linha de pensamento de Certeau (1994) que entende que o

homem não é sujeito passivo à ordem dominante e resiste a ela,

reinventando o seu cotidiano à sua maneira e segundo seus fins.

Assim, a reflexão sobre fazeres que guardam alguma

forma de resistência às imposições sociais de dominação,

como o artesanato, em especial o artesanato cerâmico, em

contraposição às tendências que os tornam cada vez mais

estreitos e subvertidos aos valores da indústria – a

produtividade e o lucro –, constitui-se como um importante

momento do conhecimento e da intervenção do campo do

design.

No entanto, talvez o que se deva ainda considerar como

possível resistência no fazer artesanal seja o fato de que os

102

artesãos insistem nesse ofício, mesmo sofrendo os efeitos de

expropriação e desumanização do mundo do trabalho, em

concorrência direta com produtos industriais. Ou melhor,

resistem nessa forma de trabalho, que ao menos mantém

vestígios de humanidade.

103

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