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DESTILA9AO A hist6ria de uma aula pratica Ha cerca de doisanos, recebemos uma carta do Professor Jose Luiz Fernandes, professor de d€mcia com 0 Professor Jose Luiz e verificamos que Cifmcias da regiao de Piracicaba. no estado de Sao os resultados daquele intercambio poderiam ser Paulo. Essa carta acabou gerando um intercambio uteis a outros colegas. interessante entre nos e esse leitor sobre 0 tema da Por esse motivo. resolvemos publicar ascartas destilac;:ao. que trocamos. Na primeira, 0 professor nos conta Quando, recentemente, resolvemos incluir um suas tentativas (nao muito bem sucedidas) de ensi- artigo .sobre esse assunto na REVISTA DE ENSINO nar destilac;:ao aos seus alunos e nos solicita suges- DE CIENCIAS, lembramo-nos de nossa correspon- toes para 0 seu trabalho: Prezada equlpe da REVISTA DE ENSINO DE CIENC/AS SOU leitor e admirador da REVISTA DE ENSINO DE CIENCIAS e ja usei muitas ideias sugeridas por essa otima revista. Sou professor de ciencias e dou aulas nas 7"s e 8"s series do primeiro grau. Leciono ha quatro anos, sempre na mesma escola. Sempre achei que seria muito interessante ensinar ci{mcias atraves de atividades experimentais, mas isso nunca foi possivel. Um dos motivos e que a escola nao tem laboratorio. Tem uma sa/a onde so ha uma pia e uma mesa. Dizem que e 0 laboratorio, mas tambem serve de deposito. Asegunda razao e que eu quase nao tenho tempo para preparar as aulas. Alem disso, a escola que leciono nao tem material de laboratorio e nao tem dinheiro para comprar, pois e tudo muito caro. Finalmente, tem 0 problema da carga horaria que da para ensinar mais conteudos com aulas expositivas do que com aulas de laboratorio. Sempre percebi que alguns assuntos os alunos tem muita dificuldade de compreender nas aulas expositivas. Um deles e a desti/ar;;ao. Acho importante que os alunos desta regiao aprendam bastante sobre a desti/ar;;ao. Afina/, alem de fazer parte do programa como um dos mais importantes metodos de separar;;ao de misturas, esse e um processo muito utilizado nas usinas de alcool e de pinga da regiao. Mas, por mais que eu explique 0 que e um desti/ador, de pouco adianta. Dai entao, resolvi levar uma turma a uma fazenda onde havia um a/ambique. Os alunos gostaram muito de conhecer como se fabrica a pinga, mas nao conseguiram ver a desti/ar;;ao acontecendo. 0 a/ambique da fazenda era de cobre e todo fechado, logonao dava pra ver "por dentro ". Portanto, com a ida a fazenda nao resolvi 0 meu problema de como ensinar a desti/ar;;ao. Pelo contrario, os alunos fica ram ainda mais curiosos em saber como aquele fermentado mal cheiroso de garapa se transforma na limpida aguardente. Na volta da visita a fazenda, um aluno propos: Porque nos nao construimos urn a/ambique? Acontece que eu nao sei como montar um desti/ador com materiais baratos e faceis de a rranjar. Os livros trazem uns desenhos com condensadores e baloes que nos nao temos aqui na escola. Entao eu resolvi escrever para voces e pedir uma orientar;;ao. Agrader;;omuito a voces se puderem me ajudar. o pedido desse professor foi atendido pelo Prof. Anibal, da equipe da REVISTA DE ENSINO DE Jose Lulz CIENCIAS, que elaborou um pequeno roteiro para montagem de um "alambique".

DESTILA9AO Ahist6ria de uma aula pratica - CiênciaMão · uma aula pratica Ha cerca de dois anos, recebemos uma carta do Professor Jose Luiz Fernandes, professor de d€mcia com

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DESTILA9AO A hist6ria deuma aula pratica

Ha cerca de dois anos, recebemos uma cartado Professor Jose Luiz Fernandes, professor de d€mcia com 0 Professor Jose Luiz e verificamos queCifmcias da regiao de Piracicaba. no estado de Sao os resultados daquele intercambio poderiam serPaulo. Essa carta acabou gerando um intercambio uteis a outros colegas.interessante entre nos e esse leitor sobre 0 tema da Por esse motivo. resolvemos publicar as cartasdestilac;:ao. que trocamos. Na primeira, 0 professor nos conta

Quando, recentemente, resolvemos incluir um suas tentativas (nao muito bem sucedidas) de ensi-artigo .sobre esse assunto na REVISTA DE ENSINO nar destilac;:ao aos seus alunos e nos solicita suges-DE CIENCIAS, lembramo-nos de nossa correspon- toes para 0 seu trabalho:

Prezada equlpe da REVISTA DE ENSINO DE CIENC/AS

SOU leitor e admirador da REVISTA DE ENSINO DE CIENCIAS e ja usei muitasideias sugeridas por essa otima revista.

Sou professor de ciencias e dou aulas nas 7"s e 8"s series do primeiro grau.Leciono ha quatro anos, sempre na mesma escola. Sempre achei que seria muitointeressante ensinar ci{mcias atraves de atividades experimentais, mas isso nuncafoi possivel. Um dos motivos e que a escola nao tem laboratorio. Tem uma sa/aonde so ha uma pia e uma mesa. Dizem que e 0 laboratorio, mas tambem serve dedeposito. A segunda razao e que eu quase nao tenho tempo para preparar as aulas.Alem disso, a escola que leciono nao tem material de laboratorio e nao temdinheiro para comprar, pois e tudo muito caro. Finalmente, tem 0 problema dacarga horaria que da para ensinar mais conteudos com aulas expositivas do quecom aulas de laboratorio.

Sempre percebi que alguns assuntos os alunos tem muita dificuldade decompreender nas aulas expositivas. Um deles e a desti/ar;;ao. Acho importante queos alunos desta regiao aprendam bastante sobre a desti/ar;;ao. Afina/, alem de fazerparte do programa como um dos mais importantes metodos de separar;;ao demisturas, esse e um processo muito utilizado nas usinas de alcool e de pinga daregiao. Mas, por mais que eu explique 0 que e um desti/ador, de pouco adianta. Daientao, resolvi levar uma turma a uma fazenda onde havia um a/ambique. Os alunosgostaram muito de conhecer como se fabrica a pinga, mas nao conseguiram ver adesti/ar;;ao acontecendo. 0 a/ambique da fazenda era de cobre e todo fechado,logo nao dava pra ver "por dentro ".

Portanto, com a ida a fazenda nao resolvi 0 meu problema de como ensinar adesti/ar;;ao. Pelo contrario, os alunos fica ram ainda mais curiosos em saber comoaquele fermentado mal cheiroso de garapa se transforma na limpida aguardente.Na volta da visita a fazenda, um aluno propos: Porque nos nao construimos urna/ambique?

Acontece que eu nao sei como montar um desti/ador com materiais baratos efaceis de a rranjar. Os livros trazem uns desenhos com condensadores e baloesque nos nao temos aqui na escola. Entao eu resolvi escrever para voces e pediruma orientar;;ao. Agrader;;o muito a voces se puderem me ajudar.

o pedido desse professor foi atendido peloProf. Anibal, da equipe da REVISTA DE ENSINO DE

Jose Lulz

CIENCIAS, que elaborou um pequeno roteiro paramontagem de um "alambique".

Material necessarlo1 lampada (queimada) de vidro transparente.1 m de tubo de plastico de 0,5 em de diametro.1 garrafa de plastico de 1,5 litro

(de agua mineral)borracha escolarArame.Peda<;:osde madeira.Cola ou massa epoxi.

construc;io1. Com um ferro quente (uma chave de fenda), fa<;:a

um furo, com 0 diametro da mangueira, nagarrafa, na posi<;:ao indicada na figura.

:::::=-2. Por esse furo, introduza a mangueira e vede 0 fu

ro com cola ou massa epoxi.3. Tor<;:aa mangueira, de maneira que ela fique en-

rolada como mostra a figura.Tenha cuidado para niodelxar a mangueira en-rolada com trechos ascendentes, isso dificultaraa destila<;:ao.

4. Segure a lampada com um pano grosse e, comuma chave de fenda, quebre 0 fundo da lampadae retire 0 filamento de metal e 0 seu suporte devidro. Voce tera, assim, um balao de vidro.

5. Corte uma borracha escolar de modo que ela sir-va de tampa para 0 balao. Fa<;:aum furo nestatampa com 0 diametro igual ao da mangueira.

6. Com madeira e arame, monte 0 suporte para 0destilador.

COMO FAZER FUNCIONAR 0 DESTILADOR1. Destape 0 balao do destilador (Iampada) e colo-

que 0 Ifquido a ser destilado no maximo ate ametade da altura do balao

2. Encha 0 condensador (garrafa de plastico) comagua fria.

3. Acenda a lamparina e aque<;:a 0 balao quecontem 0 Ifquido a ser destilado.

4. Regule a distancia da lamparina ao balao, achama da lamparina e 0 comprimento da man-gueira, a fim de obter uma destila<;:ao mais efi-ciente

Tempos depois, recebemos outra carta domesmo Professor. Foi muito estimulante para a

equipe da REVISTA DE ENSING DE CIENCIAS terrecebido est a segunda carta.

Recebi a sua carta com as explica90es para construir um alambique. NEWescrevi antes para agradecer porque queria con tar como foram as aulas sobredestila9ao. Foram tao boas que eu resolvi escrever para voces contando tudo.Pe90 a ajuda de voces para responder algumas perguntas que os alunos fizeram eeu nao sei responder.

Quero Ihe dizer que a sua ajuda foi muito importante e se nao for abusar voufazer isso muitas outras vezesporque no interior a diffcil encontrar orienta9ao paradar Ciencias com aulas praticas. Voces da REVISTA DE ENSINO DE CIENCIASpodem ajudar muito. Ja ajudam com a revista, mas nao sei se podem ajudar assimindividualmente. Eu tive sorte e agrade90 muito a voces.

Vou contar como foram as aulas sobre destila9ao. Mas antes de dar as aulas,eu construf eu mesmo 0 destilador e consegui fazer funcionar. Assim eu podiaorientar os alunos.

Pedi para os alunos trazerem de casa os materiais para a constru9ao dodestilador. Incluf, na lista, materiais para a constru9iio de uma lamparina: frascosde vidro com boca estreita, cordiio de algodiio, tampinhas de refrigerante.

Alam disso, pedi para os alunos trazerem um martelo, um alicate e um serrote.Numa aula expliquei como construir 0 destilador e os alunos come9aram a

constru9iio em grupos. Chamei a aten9ao para montarem primeiro as partes queprecisam de tempo para secar. Nessa mesma aula, eles prepararam a garapa paraa fermenta9ao, colocando a garapa em frascos de vidro com fermento de pao(aproximadamente 0,5 gllitro de garapa) e cobriram 0 frasco com algodao para naocafrem sujeiras na garapa e tambam para deixar sair 0 gas carbonico liberado nafermenta9iio. Isto foi 0 professor de 8iologia de uma outra escola que me ensinou.

Na aula seguinte, os alunos terminaram a constru<;ao do destilador e dalamparina. Depois filtraram, com algodao, 0 Ifquido fermentado e come9aram adestila<;ao. Foi um sucesso, embora alguns destiladores tenham apresentadoalguns problemas; num deles, a mangueira entupiu, possfvelmente com peda90sdo baga<;o da cana porque a filtra<;ao nao foi bem feita; um outro apresentouvazamento de vapor na rolha de borracha, em outro 0 Ifquido aquecido na lampadasubiu pela mangueira, talvez porque a chama da lamparina estava muito forte.Mas, mesmo os alunos que nao conseguiram nenhuma gota de Ifquido destiladofica ram satisfeitos em terem compreendido a destila<;ao apesar da frustra<;ao denao terem conseguido destilar.

Apos essa aula pratica, 0 interesse dos alunos pela destila<;ao foi enorme.Praticamente todos fizeram perguntas. Mas algumas delas eu nao conseguiresponder completamente e pe<;o a ajuda de voces da revista.

- Como se faz para ter uma pinga mais forte ou mais fraca?- Como se destila petroleo?- Porque 0 res to do mosto jogado nos rios a poluente ja que a um material

organico e natural?Apesar de eu nao saber responder todas as perguntas, os alunos fica ram

muito satisfeitos pois puderam tentar realizar e controlar uma destila<;ao. A partirdaf, aprenderam muito mais sobre esse assunto.

Depois da discussiio com os alunos, percebi que eu poderia ter exploradomelhor 0 experimento fazendo antes da pratica um roteiro com algumas questoespara chamar a aten<;ao dos alunos sobre certos pontos. Por exemplo:

- Qual a a fun<;iio do Ifquido refrigerante dentro da garrafa que serve decondensador?

- 0 comprimento da mangueira interfere na destila<;ao? Como?- A temperatura do Ifquido refrigerante no condensador a importante na

destila<;iio?- A distancia entre a lamparina e a lampada influencia na destila<;ao?- Este destilador consegue destilar outros Ifquidos?Finalmente, quero novamente agradecer a equipe da revista em ter me ajuda-

do neitas aulas'e espero que esta carta sirva de incentivo para voces continuaremrealizando este trabalho que eu considero muito importante para nos professores.

Jose Lu/z

Procuramos atender ao nosso leitor enviando-Iheas respostas aquelas perguntas:

Prezado amigo

Achamos excelente 0 seu trabalho.Realmente a pratica experimental possibilita a compreensao de mui-

tos assuntos e estimula 0 interesse dos alunos para aprofundarem mais osseus conhecimentos.

Estamos enviando a voce as respostas que voce pediu em sua ultimacarta e tomamos a liberdade de sugerir mais algumas atividades interes-santes para os seus alunos realizarem.

Para aumentar 0 teor alcoolico da pinga e necessario aumentar aaltura da coluna de destila9ao. No caso do aparelho montado com alampada, seria necessario aumentar a altura da mangueira por onde passao vapor.

Para destilar petroleo e necessario controlar a varia9ao de temperatu-ra e a altura da coluna de destila9ao. No caso do aparelho montado, naoseria possivel destilar 0 petroleo pois os liquidos e vapores dissolveriam 0plastico da mangueira. Seria preciso outro tipo de mangueira; de vidro porexemplo. Nas destilarias industriais, os tubos saD de metal.

Quanto ao mosto que resta da destila9ao e que e jogado nos rios,apesar de ser material organico e natural, causa serios problemas ambien-tais, pois a fermenta9ao deste material consome todo 0 oxigenio dissolvi-do na agua, 0 que causa a morte de todos os seres vivos nos rios.

Considerando que a regiao em que voce trabalha tem sua economiabaseada principalmente na produ9ao de a9ucar, alcool e pinga, sugerimosque amplie um pouco mais 0 assunto. Seus alunos podem realizar variostipos de pesquisas na comunidade para colherem os dados necessarios.Por exemplo:

- Um grupo pode entrevistar velhos moradores da regiao para desco-brir como era 0 Rio Piracicaba, que beneficios a industria canavieiratrouxe para a regiao, que maleficios ela acarretou, etc. Pessoas de idadesaD uma fonte inesgotavel de informa90es.

- Dutro grupo pode tentar juntar fotos da regiao que mostrem astransforma90es por que ela passou.

- Dutro grupo pode entrevistar um tecnico da usina para descobrircomo e 0 processo de produ9ao da pinga e do alcool em detalhes etambem como se produz 0 a9ucar.

- Dutro grupo pode fazer pesquisas em jornais locais para levan tardenuncias relativas a polui9ao e noticias sobre providencias para evita-Iaou reduzi-Ia.

6s proprios alunos poderao propor outras atividades.

Desejamos sucesso em seu trabalho e esperamos continuar nossacor respondencia.

Um abra90.Nelson

o professor Jose Luiz e um dos varios profes-sores que nos escrevem solicitando sugestoes parao trabalho em sala de aula. Mas e 0 primeiro queestabelece um intercambio de ideias com a nossaequipe. E essa troca foi boa para ambos os lados.

De nossa parte, e sempre importante saberate que ponto as sugestoes que of ere cern os SaDviaveis nas condi<;:oes de nossas escolas, e adequa-das aos alunos. Alem disso, as solicita<;:oes dosprofessores sempre constituem uma boa orienta-

<;:aopara a escolha dos temas a serem abordadosem nossa revista.

Por essas razoes, solicitamos mais uma vez aoprofessor-Ieitor que nos escreva sempre que preci-sar de sugestoes para 0 desenvolvimento de deter-minados ternas em sala de aula. Estamos dispostosa auxiliar, tanto no que se refere a parte experie~mental, como na sele<;:ao de textos e estrategias deensino.

o interesse do professor e 0 nosso maior estl-mulo.

Equipe da Revlsta de Enslno de Clinelas.