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CAPÍTULO 3 DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL Ana Amélia Camarano* Solange Kanso** 1 INTRODUÇÃO Considera-se que o alongamento da vida ou das vidas é uma das conquistas sociais mais importantes do século XX. Na verdade, atingir idades avançadas não é um fato novo na História. O que existe de novo é o aumento da esperança de vida ao nascer, o que resulta em que mais pessoas atinjam idades avançadas. Por exemplo, em 1980, de 100 crianças brasileiras do sexo feminino, 22 completavam 80 anos. Em 2000, esse número dobrou (CAMARANO, 2004). A grande responsável por isso foi a queda da mortalidade em todas as idades. É uma conquista que merece ser comemorada. Mas nem todas as visões sobre esse fenômeno são de comemoração. 1 Isso se dá em parte pelo fato de que paralelamente à queda da mortalidade assiste-se no Brasil, desde o final dos anos 1960, a uma diminuição acentuada nos níveis de fecundidade. Duas conseqüências desses dois processos já se fazem notar: uma redução nas taxas de crescimento da população como um todo e mudanças expressivas na estrutura etária no sentido do envelhecimento. Isso significa uma alteração na proporção dos diversos grupos etários no total da população. Por exemplo, em 1940, a população idosa 2 representava 4,1% da população total bra- sileira e passou a representar 8,6% em 2000. Em números absolutos, esse contin- gente aumentou de 1,7 milhão para 14,5 milhões no mesmo período. Por outro * Coordenadora de População e Cidadania da Diretoria de Estudos Macroeconômicos do Ipea. ** Pesquisadora da Diretoria de Estudos Macroeconômicos do Ipea. 1. Para uma visão das várias perspectivas sobre a questão do envelhecimento populacional, ver, entre outros, Camarano e Pasinato (2004) e Llyod Sherlock (2004). 2. Aqui definida como pessoas com 60 anos ou mais, tal como estipulada na Política Nacional do Idoso e no Estatuto do Idoso. Cap03.pmd 23/3/2007, 15:40 95

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CAPÍTULO 3

DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕESPARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

Ana Amélia Camarano*

Solange Kanso**

1 INTRODUÇÃO

Considera-se que o alongamento da vida ou das vidas é uma das conquistas sociaismais importantes do século XX. Na verdade, atingir idades avançadas não é umfato novo na História. O que existe de novo é o aumento da esperança de vida aonascer, o que resulta em que mais pessoas atinjam idades avançadas. Por exemplo,em 1980, de 100 crianças brasileiras do sexo feminino, 22 completavam 80 anos.Em 2000, esse número dobrou (CAMARANO, 2004). A grande responsável por issofoi a queda da mortalidade em todas as idades. É uma conquista que merece sercomemorada. Mas nem todas as visões sobre esse fenômeno são de comemoração.1

Isso se dá em parte pelo fato de que paralelamente à queda da mortalidadeassiste-se no Brasil, desde o final dos anos 1960, a uma diminuição acentuada nosníveis de fecundidade. Duas conseqüências desses dois processos já se fazem notar:uma redução nas taxas de crescimento da população como um todo e mudançasexpressivas na estrutura etária no sentido do envelhecimento. Isso significa umaalteração na proporção dos diversos grupos etários no total da população. Porexemplo, em 1940, a população idosa2 representava 4,1% da população total bra-sileira e passou a representar 8,6% em 2000. Em números absolutos, esse contin-gente aumentou de 1,7 milhão para 14,5 milhões no mesmo período. Por outro

* Coordenadora de População e Cidadania da Diretoria de Estudos Macroeconômicos do Ipea.

** Pesquisadora da Diretoria de Estudos Macroeconômicos do Ipea.

1. Para uma visão das várias perspectivas sobre a questão do envelhecimento populacional, ver, entre outros, Camarano e Pasinato(2004) e Llyod Sherlock (2004).

2. Aqui definida como pessoas com 60 anos ou mais, tal como estipulada na Política Nacional do Idoso e no Estatuto do Idoso.

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96 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

lado, diminuiu a proporção da população jovem. Essa tendência acentuar-se-ánas próximas décadas.

Uma das preocupações apontadas na literatura com relação a esse processodiz respeito ao crescimento acentuado de um segmento populacional consideradoinativo ou dependente vis-à-vis a um encolhimento do segmento ativo ou produ-tivo. Preocupação semelhante fez parte da agenda de estudos acadêmicos eformuladores de políticas décadas atrás, quando o foco era a fecundidade elevadae a alta proporção de jovens. O resultado foi a difusão de políticas e práticasantinatalistas em quase todo o mundo. Na verdade, a preocupação de hoje é comessas crianças e jovens, baby boomers, que estão envelhecendo e se tornando oselderly boomers, sendo substituídos por coortes menores.

A alta fecundidade do passado, aliada à redução da mortalidade, resulta numcrescimento elevado desse contingente nos próximos 30 anos, ou seja, enquantodurar a “onda idosa”. Além disso, crescerá mais a população muito idosa, isto é, ade 80 anos e mais. Isso coloca várias questões na agenda. Neste capítulo, as per-guntas consideradas são: até quando a população idosa irá crescer a taxas elevadas?Haverá um limite para a redução da mortalidade nas idades avançadas? Comoesses processos demográficos afetarão a oferta potencial de contribuintes para osistema previdenciário e a demanda por benefícios previdenciários e/ou de assis-tência social por idade avançada e de pensões por morte?

O objetivo deste capítulo é analisar a dinâmica demográfica recente da po-pulação brasileira e formular um cenário prospectivo a respeito dos componentesdessa dinâmica. A partir dele, será elaborada uma projeção para a população emidade ativa, potencial contribuinte de um sistema de seguridade social, e para apopulação idosa, potencial beneficiária, desagregada por sexo e grupos qüinqüenaisde idade para o período 2000-2030. As informações utilizadas são provenientesdos Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000, do Sistema de Informação sobreMortalidade (SIM/Datasus) do Ministério da Saúde e do Ministério da PrevidênciaSocial (MPAS).

O capítulo está dividido em sete seções, sendo a primeira esta introdução.Na segunda, apresenta-se uma visão geral das tendências de crescimento da populaçãobrasileira e dos componentes desse crescimento (fecundidade, mortalidade e mi-grações internacionais). A terceira descreve as características e os movimentos dapopulação em idade ativa em direção ao mercado de trabalho. A quarta destaca adinâmica de crescimento da população idosa. Nesse caso, considerando-se que osidosos dos próximos 60 anos já nasceram, essa dinâmica vai depender fundamen-talmente da redução da mortalidade, em especial, nas idades avançadas. Levando-se

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97DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

isso em conta, a referida seção analisa as perspectivas de continuação da reduçãoda mortalidade nas idades avançadas, através de uma metodologia de causas demorte evitáveis. Nupcialidade é uma variável demográfica importante para o deli-neamento dos beneficiários da seguridade social, no caso, as pensões por morte.Dado isso, a quinta seção analisa as tendências da nupcialidade da populaçãobrasileira no período 1980-2000, através da sua composição e seus padrões. Asperspectivas de crescimento e a composição por sexo e idade da população emidade ativa e idosa entre 2000 e 2030 encontram-se na sexta seção. E por fim, sãotecidos alguns comentários tendo-se em vista as perspectivas de uma política derenda para os novos idosos do futuro.

2 A DINÂMICA DEMOGRÁFICA RECENTE

2.1 O ritmo de crescimento populacional e a estrutura etária

Já foi mostrado em outros trabalhos que a população brasileira atingiu as suasmaiores taxas de crescimento no período 1950-1970, em torno de 3,0% ao ano(a.a.).3 A partir daí, essas taxas passaram a experimentar um declínio acentuado,tendo alcançado 1,6% a.a. na década de 1990 (ver tabela 1). Esse declínio foiresultado da redução acentuada da fecundidade, iniciada na segunda metade dosanos 1960, conforme se pode ver no gráfico 1. Em 40 anos, a fecundidade dasmulheres brasileiras reduziu-se quase à metade, atingindo o nível de reposição4 noqüinqüênio 2000-2005. Nessas últimas décadas, a taxa de fecundidade passou deaproximadamente 6,0 filhos por mulher para 2,1. As perspectivas apontadas pela

3. Isto é, considerando-se o período em que existem dados, ver, por exemplo, Beltrão, Camarano e Kanso (2004) e Ipea (2006).

4. Uma população atinge o seu nível de reposição quando a fecundidade e a mortalidade alcançam valores que resultarão, no médioprazo, em uma taxa de crescimento igual a 0. Ou seja, a população simplesmente se repõe. Dadas as taxas de mortalidade vigentes napopulação brasileira, estimou-se que esse nível será alcançado quando a taxa de fecundidade total for igual a 2,14. Apesar de apopulação ainda estar crescendo, esse ritmo é decrescente. Os reflexos dessas medidas levam o tempo ou a duração de uma geração paraque a população apresente uma taxa de crescimento igual a 0.

TABELA 1

Taxas de crescimento observada e intrínseca da população brasileira(Em %)

Período Intrínseca total Observada população total Observada população idosa

1970-1980 2,05 2,48 4,30

1980-1990 0,98 1,93 3,66

1990-2000 0,70 1,63 3,44

Fonte: IBGE/Censos Demográficos de 1970, 1980, 1991 e 2000.

Elaboração: Ipea.

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98 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

taxa intrínseca de crescimento,5 na tabela 1, são de que, no médio prazo, a taxa decrescimento populacional tenderá a valores próximos a 0,5% a.a. Ou seja, a ten-dência de redução acelerada do crescimento populacional já está embutida nadinâmica atual da população brasileira.

O resultado final da dinâmica demográfica descrita anteriormente foi umcontingente populacional de 170 milhões de brasileiros detectados pelo CensoDemográfico de 2000 e o fato de o Brasil ter deixado de ser um país de jovens (vergráfico 2). A alta fecundidade observada nos anos de 1950 e 1960, período co-nhecido como baby boom, e a redução da mortalidade em todas as idades em

5. A taxa intrínseca é a taxa de crescimento que será observada caso a taxa de fecundidade total do qüinqüênio 1995-2000 se mantenhaconstante por aproximadamente 30 anos. Ela sinaliza a direção das taxas de crescimento.

GRÁFICO 1

Brasil: taxa de fecundidade total da população7

4

2

5

3

1

0

Fontes: IBGE/Censos Demográficos de 1980,1991 e 2000 e Pnad de 2005.Elaboração: Ipea.

1930-1935 1970-1975 2000-20051950-1955 1990-19951940-1945 1981-19861960-1965 1995-2000

6

GRÁFICO 2

Brasil: distribuição etária e por sexo da população

80 e +

65-69

45-4950-5455-59

70-74

60-64

40-4435-39

Fonte: IBGE/Censos Demográficos de 1950 e 2000.Elaboração: Ipea.

0,10 0,02 0,060,06 0,02 0,100,08 0,0 0,080,04 0,04

75-79

(Em anos)

30-34

20-2425-29

15-1910-14

5-90-4

Homens (1950) Homens (2000)Mulheres (1950) Mulheres (2000)

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99DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

curso no país desde esse período foram responsáveis pelo ritmo de crescimentorelativamente elevado dessa população vis-à-vis ao dos demais grupos etários. Essesprocessos alteraram a composição etária e contribuíram de forma significativapara o processo de envelhecimento populacional.

Sob o ponto de vista demográfico, o envelhecimento populacional é o resultadoda manutenção, por um período razoavelmente longo, de taxas de crescimento dapopulação idosa superiores às da população mais jovem. Isto implica uma mu-dança nos pesos dos diversos grupos etários no total da população. A proporçãoda população de 60 anos e mais no total da população brasileira passou de 4,1%em 1940 para 8,6% em 2000. No entanto, o processo do envelhecimento é muitomais amplo do que uma modificação de pesos de uma determinada população,dado que altera a vida dos indivíduos, as estruturas familiares e a demanda porpolíticas públicas, e afeta a distribuição de recursos na sociedade. No caso destetrabalho, a questão colocada é como a dinâmica demográfica recente pode afetara oferta de contribuintes e a demanda por benefícios da seguridade social.

O envelhecimento populacional é ocasionado sobretudo pela queda dafecundidade, que leva a uma redução na proporção da população jovem e a umconseqüente aumento na proporção da população idosa. Isso resulta num processoconhecido como envelhecimento pela base. A redução da mortalidade infantil acarretaum rejuvenescimento da população, dada uma sobrevivência maior das crianças.Por outro lado, a diminuição da mortalidade nas idades mais avançadas contribuipara que esse segmento populacional, que passou a ser mais representativo nototal da população, sobreviva por períodos mais longos, resultando no envelheci-mento pelo topo. Este altera a composição etária dentro do próprio grupo, ou seja,a população idosa também envelheceu (CAMARANO; KANSO; MELLO, 2004a). Em2000, a proporção da população “mais idosa”, de 80 anos e mais, representava12,6% do total da população idosa. Observa-se que o envelhecimento pelo topofoi mais expressivo entre as mulheres, dada a maior mortalidade masculina.

Como já se mencionou, o envelhecimento ocorre porque a população idosaapresenta taxas de crescimento mais elevadas, se comparada a outros segmentospopulacionais. Registrou a sua maior taxa entre as décadas de 1970 e 1980, emtorno de 4,3% a.a., conforme se pode ver na tabela 1. Nos anos seguintes, o seuritmo foi ligeiramente menor, mas expressivamente maior do que o da populaçãobrasileira. A tendência de queda continuou ao longo do período considerado.

As perspectivas que se colocam para o médio prazo são a de continuação doprocesso de envelhecimento populacional. Os idosos dos próximos 30 anos jánasceram – e nasceram num regime de fecundidade elevada – e se beneficiaram,

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100 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

principalmente, da redução da mortalidade infanto-juvenil. As taxas de mortali-dade da população idosa vão desempenhar um papel importante na dinâmica decrescimento desse segmento e sobretudo da população “muito idosa”. Essas sãodependentes do avanço da tecnologia médica e do acesso aos serviços de saúde.

2.2 Mortalidade

Uma das maiores conquistas sociais das últimas décadas foi o aumento da espe-rança de vida às várias idades, como resultado da queda acentuada na mortalidadeobservada em todos os grupos etários; desde o período intra-uterino até as idadesmais avançadas. Além da redução nos seus níveis, a mortalidade apresentou mu-danças em seu padrão de causas, em que as doenças crônico-degenerativas, maisfreqüentes na população idosa, passaram a ter uma importância maior diante dascausas que afetavam a população infantil, tais como as infecto-parasitárias.

Para medir os níveis de mortalidade, costuma-se utilizar a esperança de vida aonascer. É um indicador sintético e apresenta o número de anos que se espera queum recém-nascido viva segundo as condições vigentes de mortalidade. A tabela 2apresenta os valores da esperança de vida ao nascer, aos 15 e aos 60 anos por sexoem 1980, 1991, 2000 e 2005. A esperança de vida ao nascer aumentou paraambos os sexos, em maior intensidade entre as mulheres. Estas apresentavam, em2005, um valor 6,3 anos mais elevado que o observado para a população masculina.Os diferenciais entre os sexos cresceram ao longo do período analisado, devido,principalmente, ao aumento da mortalidade da população adulta jovem masculinapor causas violentas. No período considerado, a esperança de vida ao nascer doshomens brasileiros passou de 59,2 anos para 68,3, e a das mulheres aumentou de65,5 para 74,6 anos.

TABELA 2

Esperança de vida ao nascer, aos 15 anos e aos 60 anos por sexo da população brasileira

E0 E15 E60Ano

Homens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres

1980 59,18 65,51 51,27 57,11 15,38 17,80

1991 63,38 71,49 52,59 60,05 16,73 19,81

2000 67,16 74,83 54,48 61,97 17,96 21,32

2005a

68,33 74,59 55,23 61,27 19,33 22,06

Fontes: IBGE/Censo Demográfico de 1980, 1991 e 2000 e Ministério da Saúde/SIM.

Elaboração: Ipea.a Projeção elaborada em Ipea (2006).

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101DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

O aumento da esperança de vida ocorreu para todas as idades. Alguns exemplospodem ser vistos na tabela 2, como a esperança de vida ao nascer, ao início da vidaativa, aos 16 anos e aos 60 anos. Pode-se observar ganhos em todos esses trêsmomentos da vida para ambos os sexos, mas que beneficiaram mais as mulheres.Em 2005, a esperança de vida feminina aos 16 anos foi maior que a masculina emaproximadamente seis anos; e aos 60 anos, em cerca de três anos.

A tabela 3 apresenta os valores das esperanças de vida ao nascer, aos 15 anose aos 60 anos por sexo para o Brasil e para alguns países. Todos os países conside-rados apresentam esperanças de vida mais altas que o Brasil. Com exceção daCosta Rica, as mulheres desses países experimentam valores superiores a 80 anos.Os maiores valores são encontrados no Japão, na Suécia e na Espanha. A diferençanos valores observados entre o Brasil e o Japão foi de 10,3 anos para os homens ede 11,0 anos para as mulheres. Mesmo na América Latina, as diferenças entre oBrasil e os dois países aqui mostrados são expressivas. Por exemplo, a populaçãomasculina da Costa Rica no período 1990-1995 tinha uma esperança de vida 4,6anos mais elevada que a brasileira. Entre as mulheres, a diferença foi de cerca detrês anos. Os diferenciais decrescem com a idade, mas mantêm a mesma direção.Pode-se verificar que aos 60 anos os valores da esperança de vida das mulheresbrasileiras e costarriquenhas são muito semelhantes. Por outro lado, é de 5,6 anoso diferencial nesse indicador entre as mulheres japonesas e as brasileiras.

A queda da mortalidade da população brasileira não se deu de forma homo-gênea entre os vários grupos etários e veio acompanhada por mudanças no processo

TABELA 3

Esperança de vida ao nascer, aos 15 anos e aos 60 anos por sexo: vários países

E0 E15 E60

Homens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres

Brasil (2005) 68,33 74,59 55,23 61,27 19,33 22,06

Japão (2004) 78,60 85,60 64,00 70,90 22,20 27,70

Espanha (2001-2002) 76,30 83,00 61,80 68,50 20,70 25,20

Suécia (2004) 78,40 82,70 63,70 68,00 21,40 24,80

Chile (2001-2002) 74,40 80,40 60,40 66,30 20,10 23,70

Costa Rica (1990-1995) 72,90 77,60 59,80 64,10 18,80 21,90

Fontes: United Nations (2004), IBGE/Censo Demográfico de 1980, 1991 e 2000 e Ministério da Saúde/SIM.

Elaboração: Ipea.

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102 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

de morbimortalidade. Já foi constatada em outros trabalhos (ver, por exemplo,BELTRÃO; CAMARANO; KANSO, 2004; IPEA, 2006) uma redução relativa mais expressivanas taxas de mortalidade do grupo etário de 1 a 4 anos, seguida da referente àpopulação menor de 1 ano e do grupo de 5 a 9 anos. Os únicos grupos etários quenão experimentaram queda foram aqueles compreendidos entre 15 e 24 anos paraa população masculina, cujas taxas aumentaram em decorrência do crescimentoda mortalidade por causas externas. Doenças como as infecto-parasitárias deixaram deser predominantes entre as causas de mortalidade, e doenças crônico-degenerativase violência passaram a ser as principais causas.

Dado o interesse deste trabalho pelos dois grupos populacionais – potenciaiscontribuintes e potenciais beneficiários –, a análise das causas de morte contem-plará os grupos etários de 15 a 59 anos e 60 anos e mais, desagregados por sexo. Asdiferenças entre os dois sexos nas taxas de mortalidade são parcialmente explicadaspelas causas de morte. O maior diferencial está no primeiro desses dois grupose se deve às taxas de mortalidade por causas violentas, seguidas pelas doençascardiovasculares.

A principal causa de morte da população em idade ativa do sexo masculinoforam as doenças cardiovasculares, seguidas pelas causas externas. As doenças doaparelho circulatório compreendem as isquêmicas e cerebrovasculares. Causasexternas incluem homicídios, acidentes de trânsito, de trabalho, entre outras. Em1980, os dois primeiros grupos de causas foram responsáveis por 21,0% e 16,5%,respectivamente, do total de óbitos desse grupo e, em 2000, cada uma delas poraproximadamente 19%. Como já se mencionou, o perfil de causas de morte ébastante afetado pelo perfil etário. As primeiras atingem mais a população emidades avançadas; e as segundas, o grupo mais jovem. Os gráficos 3 e 4 apresentam

GRÁFICO 3

Distribuição proporcional dos óbitos da população masculina de 16 anos e maispor determinadas causas90

60

40

70

50

30

20

Fonte: Ministério da Saúde/SIM.Elaboração: Ipea.

Homicídios (1980) Causas externas (1980)Doenças do aparelho circulatório (1980)

80

10

0

Homicídios (2000) Causas externas (2000)Doenças do aparelho circulatório (2000)

16 2420 2818 2622 30 32 4036 4434 4238 46 48 5652 6050 5854 62 64 66 68 767280

e +70 7874

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103DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

a distribuição proporcional dos óbitos por causas externas e doenças do aparelhocirculatório em relação ao total de óbitos por idade individual nos anos de 1980 e2000 para homens e mulheres, respectivamente. Entre os homens, foram destacadasas proporções de óbitos por homicídios.

Nos dois anos considerados para os homens, as principais causas de mortedo grupo populacional com idade entre 16 e 47 anos foram as causas externas,destacando-se os homicídios como a principal desse grupo. A maior proporção deóbitos por homicídios foi registrada entre as idades de 20 e 22 anos nos dois anosconsiderados. Em 1980, estes foram responsáveis por 21,3% dos óbitos desse grupode idade, e, em 2000, a referida proporção mais que dobrou – passou para 48,9%.A proporção de mortes por doenças do aparelho circulatório cresceu com a idadee passou a ser a mais importante causa de morte a partir dos 35 anos em 1980 e dos42 em 2000. Enquanto a proporção de óbitos por homicídios aumentou em todasas idades entre os dois anos considerados, a por doenças cardiovasculares diminuiu.

O padrão de mortalidade feminino é bastante diferente do masculino, con-forme mostra o gráfico 4. É menos afetado pelas causas externas, muito embora aproporção de óbitos por essa causa tenha crescido no período, devido ao aumentoda proporção de óbitos por homicídios (IPEA, 2006). Elas figuraram entre as cincoprincipais causas desse grupo populacional, mas as primeiras foram as doenças doaparelho circulatório. Entre estas, sobressaíram as mortes por doenças cerebrovasculares,diferentemente do verificado para os homens, mas em proporção declinante. Aproporção de mortes por essas causas se reduziu de 23,8% para 20,9% entre 1980e 2000 (IPEA, 2006). Tanto em 1980 quanto em 2000, as causas externas foram asmais importantes até os 36 anos, entre as duas consideradas.

GRÁFICO 4

Distribuição proporcional dos óbitos da população feminina de 16 anos e mais pordeterminadas causas90

60

40

70

50

30

20

80

10

0

Fonte: Ministério da Saúde/SIM.Elaboração: Ipea.

Causas externas (1980)Doenças do aparelho circulatório (1980)Causas externas (2000)Doenças do aparelho circulatório (2000)

16 2420 2818 2622 30 32 4036 4434 4238 46 48 5652 6050 5854 62 64 66 68 767280

e +70 7874

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104 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

2.3 Migrações internacionais

As migrações internacionais desempenharam um papel importante na dinâmicademográfica brasileira entre 1872 e 1930. A partir daí, os estudos demográficospassaram a considerar a população brasileira como fechada até os anos 1980. Osresultados do Censo Demográfico de 1991 sinalizaram para um saldo líquidomigratório negativo ocorrido na década de 1980. Esse movimento perdurou nosanos 1990.

Foi estimado um saldo líquido negativo de aproximadamente 1,9 milhão depessoas para a década de 1980 e de 700 mil para os anos 1990 (ver IPEA, 2006).Em termos de impacto no crescimento da população brasileira, o efeito provocadopor esse fluxo é muito pequeno: menos de 1% da população em 1990 e menos de0,5% em 2000. No entanto, as estimativas dizem respeito apenas aos grupos etáriosde 15 a 34 anos, pois as referentes às demais idades não foram consideradas esta-tisticamente significativas. Nos anos 1980, as mais elevadas taxas foram observadaspara o grupo etário de 20 a 24 anos tanto para homens quanto para mulheres. Essefluxo foi responsável por 5,0% da população masculina desse grupo de idade e3,5% do feminino. Na década de 1990, observaram-se um decréscimo nas taxasde todas as idades e um deslocamento do ponto de máximo para o grupo de 25 a29 anos. Nos anos 1980, predominaram os homens e, nos 1990, as mulheres. Oaumento da emigração feminina ocorreu, principalmente, nos fluxos dirigidospara a Europa. Apesar das dificuldades nas informações, Azevedo (2004), apudRios-Neto (2005) mostrou que os principais destinos dos emigrantes brasileirossão Estados Unidos, Paraguai e Japão. Cresceu o fluxo que se dirigia a Portugal,Espanha e Inglaterra.

Embora o volume de emigrantes brasileiros não seja expressivo quando com-parado ao total da população brasileira, esse processo, além de ser seletivo quantoà idade, é também quanto ao nível educacional. Ou seja, pode estar implicandoperdas de contingentes de jovens brasileiros qualificados para países desenvolvidos,onde a população economicamente ativa (PEA) vem se reduzindo (RIOS-NETO,2005). Por outro lado, esses migrantes devem aportar uma contribuição expressiva,inclusive previdenciária, nos países onde estão residindo.

Outra questão a ser considerada diz respeito à geração de renda quando daperda de capacidade laboral desses emigrantes internacionais. As diferenças entreos sistemas previdenciários dos vários países impedem um consenso numa políticaque garanta proteção social efetiva aos migrantes, independentemente do local deresidência. Além de não carregarem sua história previdenciária, as regras são bas-tante dinâmicas e divergentes. Segundo Schwarzer e Passos (2004), os problemas

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105DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

são maiores nas regiões de fronteira, dado que os migrantes encontram-se emsituações diversas de residência, vínculos empregatícios, relações familiares etc.6

Sumarizando, a questão da imigração internacional é bastante complexa eenvolve questões relevantes como sistemas de previdência, direitos humanos,regulação governamental, família etc.

3 O SEGMENTO POPULACIONAL ATIVO

3.1 A população em idade ativa (PIA)

Em trabalho anterior, definiu-se como PIA a de 16 anos e mais (ver IPEA, 2006).Numa população fechada, o volume de entradas nessa categoria reflete, principal-mente, o número de nascimentos ocorridos 16 anos antes, descontada a mortali-dade nessas idades. Em geral, essa taxa a partir dos cinco anos de idade não éexpressiva. O número de nascimentos, por sua vez, depende das taxas defecundidade e do número de mulheres em idade reprodutiva no período corres-pondente. Isso explica por que as taxas de crescimento desse segmento populacionalainda são relativamente altas, apesar da tendência de queda nas duas últimas décadas.Uma variação nessa população no curto prazo é dada pela mortalidade, cujas taxassão geralmente muito baixas nessas idades, sobretudo entre as mulheres. O gráfico 5mostra que as taxas de mortalidade da população masculina de 16 a 24 anoscresceram entre 1980 e 2000, o que se deve à mortalidade por causas externas.Mostra, também, que a maior redução nas taxas de mortalidade ocorreu entre asmulheres, principalmente no grupo etário de 25 a 38 anos. No caso da populaçãomasculina, o maior decréscimo foi verificado entre o grupo maior de 40 anos.

Na tabela 4, encontram-se as taxas anuais de crescimento do segmentopopulacional em idade ativa desagregada em alguns subgrupos e comparadas àsda população idosa, também considerada ativa.7 Nos três períodos considerados,foi a população maior de 60 anos que mostrou a mais elevada taxa de crescimento.A menor de 15 anos apresentou o mais baixo ritmo de crescimento, sendo este,

6. Em relação a essa questão, o MPAS possui acordos internacionais com dez países, a saber: Argentina, Chile, Espanha, Grécia, Itália,Portugal, Cabo Verde, Luxemburgo, Paraguai e Uruguai. Esse tipo de acordo conserva os direitos dos contribuintes, como se a contribuiçãoprevidenciária fosse feita no país de origem. Os acordos garantem os direitos de seguridade social previstos nas legislações dos diversospaíses aos respectivos trabalhadores e seus dependentes legais que estejam residindo ou em trânsito nos países signatários. Os beneficiáriosque utilizam os acordos internacionais têm aposentadoria paga pelos dois países, proporcionalmente ao tempo contribuído: um períodopelo país de origem e o outro pelo país em que a pessoa exerceu alguma atividade profissional. Caso o trabalhador se desloque paraoutro país a trabalho, por tempo determinado, é concedido o Certificado de Deslocamento Temporário, que permite ao cidadão continuarcontribuindo para a previdência do país de origem (MPAS).

7. Isso se deve ao fato de o levantamento de informações oficiais não considerar um limite etário máximo para a participação nasatividades econômicas.

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106 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

inclusive, negativo no último período, dada a queda da fecundidade. Esse menorcrescimento já está afetando o crescimento dos vários grupos que compõem aPIA. Com exceção dos anos 1970, as taxas de crescimento da população de 40 a59 anos foram mais elevadas que as do grupo de 15 a 39 anos, tendência quedeverá se manter no médio prazo, o que resultará num envelhecimento da popu-lação em idade ativa;8 e no longo prazo, na sua redução.

Em suma, a questão que se coloca não é a do crescimento a taxas elevadas deum segmento considerado “dependente”, mas o fato de que este acontece numcontexto de crescimento reduzido da PIA. Do ponto de vista de um sistema deseguridade social, mais do que a PIA, o que importa é a população que está realmente

TABELA 4

Taxas de crescimento anuais da população brasileira segundo grupos etários

1970-1980 1980-1991 1991-2000

< 15 1,50 1,04 –0,16

15-39 3,09 2,20 1,91

40-59 2,84 2,59 3,47

60 e + 4,34 3,66 3,44

Total 2,48 1,93 1,63

Fonte: IBGE/Censos Demográficos de 1970, 1980, 1991 e 2000.

Elaboração: Ipea.

8. Além da pirâmide etária, outro indicador que ilustra esse processo é a idade média da PIA, que aumentou em 1,9 ano nos últimos 20anos. Em 1980 foi de 35,2 anos e passou para 37,1 anos em 2000 (ver IPEA, 2006).

GRÁFICO 5

Brasil: taxas específicas de mortalidade da população por sexo(Escala log)1,00

0,00

0,01

0,00

Fontes: IBGE/Censo Demográfico de 1980 e 2000 e Ministério da Saúde/SIM.Elaboração: Ipea.

0,10

Homens (2000)

Homens (1980)Mulheres (2000)Mulheres (1980)

16 2420 2818 2622 30 32 4036 4434 4238 46 48 5652 6050 5854 62 64 66 68 767280

e +70 7874

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107DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

participando do mercado de trabalho e do mercado formal de trabalho. Esta de-pende da primeira e, também, da dinâmica do mercado de trabalho. Pode-se dizerque no caso brasileiro, ao contrário dos europeus, a informalização do mercadode trabalho tem tido um impacto negativo mais expressivo na equaçãoprevidenciária do que a dinâmica demográfica. Além disso, a baixa formalizaçãocertamente comprometerá a possibilidade de aposentadoria para os idosos do fu-turo, haja vista as duas últimas reformas previdenciárias.

Entre os homens que tinham de 40 a 60 anos em 2005, 85,5% trabalhavame 45,5% contribuíam para a seguridade social. As proporções comparáveis paramulheres foram de 59,1% e 28,5%. Não se sabe por quanto tempo essas pessoasestão contribuindo, mas é difícil esperar que consigam contribuir por 30 anos (semulher) e 35 anos (se homem) para a aposentadoria por tempo de contribuição, ou15 anos para a aposentadoria por idade, como requer a Emenda Constitucional 20.As perspectivas quanto à possibilidade de uma aposentadoria para os idosos dospróximos 20 anos não são promissoras, e são menores ainda para as gerações quetêm hoje de 20 a 40 anos. Em 2005, aproximadamente 10% da população maiorde 65 anos recebiam o Beneficio de Prestação Continuada por Idade Avançada oua antiga Renda Mensal Vitalícia.9 Dado que 63,6% da população de 40 a 59 anosnão contribuía para a seguridade social naquele ano, a demanda por esse tipo debeneficio tende a crescer. Dificilmente a assistência social terá capacidade fiscalpara garantir renda para esse segmento elevado da população, hoje desempregadoe no setor informal, quando perder a sua capacidade laboral.

3.2 A população economicamente ativa e seus movimentos

O total da PEA é função da PIA e das taxas de atividade, ou seja, em quanto equando (idade) as pessoas efetivamente participam das atividades econômicas.Estas variam por sexo e idade. Em outras palavras, são determinadas pelas taxas deingresso e de saída do mercado de trabalho. Estas últimas podem ocorrer pormortes e por outras razões, como, por exemplo, a aposentadoria, e, no caso dasmulheres, o casamento ou a maternidade. Num contexto de baixo crescimentodemográfico, o crescimento da PEA pode ocorrer através do estímulo à entradamais cedo e/ou à saída mais tarde. No entanto, a tendência observada em quasetodo o mundo é contrária a essa (ver DURAND, 1975; OECD, 2006). As mudançasno mundo do trabalho estão requerendo cada vez mais mão-de-obra com escola-ridade elevada o que explica a entrada mais tarde. Por outro lado, os avanços natecnologia médica e o maior acesso aos serviços de saúde estão contribuindo para

9. Esses são benefícios de assistência social. Foram pagos aproximadamente 1,3 milhão (ver MPAS, 2005).

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108 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

um envelhecimento ativo e mais saudável. Ou seja, é difícil pensar numa anteci-pação da idade à entrada, mas é factível pensar no adiamento da idade à saída. Issosignifica não apenas alterar a idade mínima à aposentadoria, mas, também, me-lhorar as perspectivas de inserção profissional dos trabalhadores idosos.

O gráfico 6 apresenta as taxas de entrada e retiro por morte e retiro profissionalda população masculina brasileira entre 1980 e 2000.10 Observa-se uma reduçãonas taxas de entrada em todas as idades, com exceção das idades de 17 a 19 anos.Esse decréscimo se intensificou a partir dos 22 anos. Para 1980, assumiu-se que asentradas ocorreriam apenas até os 30 anos e, para 2000, até 31 anos. Além disso,foi visto que a entrada na PEA entre 1980 e 2000 passou a ocorrer mais tarde. Aidade média a esse evento aumentou de 16,0 para 16,6 anos (ver IPEA, 2006). Poroutro lado, as taxas de retiro profissional aumentaram entre 1980 e 2000 nasidades de 43 a 64 anos, mas não afetaram, de maneira geral, as idades médias àaposentadoria. Do total de fluxo de aposentados de 1980, aproximadamente 1/3tinha menos de 60 anos. Em 2000, essa proporção declinou para cerca de 30%,conforme mostra a tabela 5. Verifica-se entre os homens a maior proporção dosaposentados “precocemente”, o que pode estar relacionado ao tipo de aposenta-doria. A tabela 6 mostra que entre as mulheres encontra-se uma proporção maiselevada de aposentadorias por idade, de valor mais baixo, e entre os homens umaproporção mais elevada de beneficiários por tempo de contribuição, que são os devalores mais altos. Ressalta-se que nesse conjunto de benefícios não estão incluídosas aposentadorias do setor público e os benefícios de prestação continuada poridade avançada (assistência social).

10. Essas taxas foram obtidas por meio da metodologia de tabelas de vida ativa apresentadas em Ipea (2006).

GRÁFICO 6

Taxas de entrada e saída da população masculina nas atividades econômicas ao longodo ciclo de vida(Em %)

30

15

5

20

10

Fonte: Ipea (2006, p. 99).

25

Entradas (1980) Retiro (1980)Mortes (1980)Entradas (2000) Retiro (2000)Mortes (2000)

16 2420 2818 2622 30 32 4036 4434 4238 46 48 5652 6050 5854 62 64 66 68 767280

e +70 7874

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109DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

TABELA 5

Distribuição proporcional da população brasileira aposentada por idade segundo o sexo

1980 2000Idade

Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total

Até 60 35,73 28,64 33,07 30,87 28,25 29,69

60-64 12,47 13,46 12,84 16,91 17,69 17,26

65-69 20,11 18,10 19,36 17,47 17,94 17,68

70-74 15,47 16,61 15,90 15,53 15,34 15,45

75-79 9,98 12,81 11,04 10,10 9,99 10,05

80 e + 6,23 10,38 7,79 9,12 10,78 9,87

Fonte dos dados brutos: IBGE/Censo Demográfico de 1980 e 2000 e Pnads de 1981 e 2001.

Na tabela 6, encontram-se as idades médias quando da concessão dos bene-fícios mantidos em 1993 e 2003. Em geral, nos dois anos considerados, os homensse aposentavam mais cedo que as mulheres. A diferença foi de 2,9 anos em 1993e se reduziu para 2,3 em 2003. Isso reflete um efeito composição, pois as mulheres

TABELA 6

Distribuição proporcional dos benefícios e idade média à aposentadoriaa da populaçãobrasileira por tipo segundo o sexo

1993 2003

Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total

Distribuição proporcional

Tempo de contribuição 44,67 11,48 31,12 45,50 15,03 31,70

Idade 27,88 65,91 43,40 33,76 67,56 49,07

Invalidez 27,46 22,61 25,48 20,74 17,41 19,23

Total 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00

Idade média à aposentadoria

Tempo de contribuição 52,74 51,33 52,52 51,40 49,95 51,09

Idade 64,97 61,77 62,99 64,11 60,64 61,95

Invalidez 47,67 48,86 48,10 47,39 49,92 48,43

Totalb

54,79 57,68 55,97 54,86 57,17 55,90

Fonte: MPAS.a Foram contabilizados os benefícios mantidos (estoque) na data de seu início (posição em dezembro de 1993 e 2003).

b Inclui: aposentadoria por tempo de contribuição, por idade e por invalidez.

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110 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

se aposentavam mais cedo, com exceção da categoria de aposentadoria por invalidez.Com exceção desse tipo de aposentadoria, a idade média à concessão dos demaistipos de benefícios se reduziu para ambos os sexos. A redução foi maior na idadeà aposentadoria por tempo de contribuição: em torno de 1,3 ano para ambos ossexos. Embora essa seja uma tendência verificada em quase todos os países daOrganização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) –Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD) –, ela ca-minha em direção contrária ao aumento da esperança de vida às idades avançadas.Um ponto a ser considerado é que ser aposentado no Brasil não significa, necessa-riamente, saída do mercado de trabalho. A legislação brasileira permite que oaposentado retorne a ao mercado sem qualquer restrição.

Até os 48 anos, as saídas da atividade econômica11 se deram principalmentepor morte (gráfico 6). A partir daí, as taxas por outros motivos, tais como aposen-tadoria, passaram a ser mais elevadas. Em 2000, essa mudança ocorreu aos 45anos. Isso pode ser explicado pela redução da mortalidade e pela maior coberturada seguridade social. A redução das idades médias à aposentadoria por idade etempo de contribuição corrobora esse resultado.

É fato reconhecido que o padrão de participação das mulheres na atividadeeconômica é bem diferente do dos homens, bem como o de mortalidade. A suadinâmica no período também foi diferenciada, como pode ser visto no gráfico 7.Apesar do nível de participação mais baixo, as taxas femininas de ingresso cresceramem todas as idades, e o período de ingresso se prolongou até os 34 anos, limite essebem mais elevado do que o estimado para 1980: 21 anos. Essas taxas sinalizampara uma continuação da tendência de crescimento da participação feminina.

Em 1980, desde os 21 anos as saídas por motivos outros que não morteforam mais freqüentes. Isso ocorreu mais tarde em 2000, a partir dos 38 anos. Emambos os anos, aconteceu mais cedo do que para os homens, o que está associadoà menor mortalidade feminina, especialmente no que diz respeito às causas externase às saídas precoces do mercado de trabalho pela nupcialidade e/ou fecundidade.Como foi observado para os homens, as taxas de saída por morte da populaçãofeminina diminuíram no período considerado, e as por retiro profissional aumen-taram. O aumento das taxas de saída ocorreu a partir dos 45 anos, o que estáassociado a uma saída mais tardia, e levou a um aumento do tempo passado pelasmulheres na atividade econômica. As mulheres que estavam no mercado de trabalhoem 1980 aí passavam aproximadamente 14,5 anos. Em 2000, esse tempo foi de

11. Nesse caso, está se falando de saídas, realmente. Ou seja, sem volta ao mercado de trabalho.

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111DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

25,3 anos, tempo esse também afetado pelo maior ingresso de mulheres no mer-cado de trabalho, conforme será visto na tabela 7. Essa maior participação femininaimplica repensar o sistema de pensões por morte, dado que o sistema vigenteassume a mulher como a cuidadora dos membros dependentes da família.

3.3 Aposentadoria por invalidez

Os dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) indicam um crescimentonas concessões dos benefícios por invalidez (acidentárias e previdenciárias) deaproximadamente 40% entre 1993 e 2004 para os trabalhadores da iniciativaprivada. Passaram a representar cerca de 20% do total das aposentadorias concedidasem 2004. Entre os servidores públicos da União, também foi observado um au-mento expressivo na proporção desse tipo de benefícios no conjunto de benefíciospagos. Entre 1994 e 2004, essa participação passou de 13,1% para 46,6%, apesardo declínio no número absoluto de 3,485 milhões para 3,401 milhões (TAFNER;PESSOA; MENDONÇA, 2006). As mulheres receberam 38% dos benefícios concedidospara os trabalhadores do setor privado e 45% dos concedidos aos do setor público.Esses dados sugerem, entre outros fatores, inadequação das condições de trabalho,bem como envelhecimento funcional precoce, que atinge mais os homens que asmulheres.

Em 2003, as principais doenças geradoras de concessões de benefícios porinvalidez no setor privado foram as do aparelho circulatório, segundo o MPAS. Estasforam responsáveis por 34% do total de concessões. A seguir, colocaram-se as doençasdo sistema osteomuscular, cuja proporção foi de 31%, e os transtornos mentais,que responderam por 15%. O número de benefícios por invalidez concedidos

GRÁFICO 7

Taxas de entrada e saída da população feminina nas atividades econômicasao longo do ciclo de vida(Em %)

Fonte: Ipea (2006, p.102).

Entradas (1980) Retiro (1980)Mortes (1980)

Entradas (2000) Retiro (2000)Mortes (2000)

30

15

5

20

10

25

16 2420 2818 2622 30 32 4036 4434 4238 46 48 5652 6050 5854 62 64 66 68 767280

e +70 7874

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112 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

devido a problemas relacionados ao sistema osteomuscular aumentou 46% entre2000 e 2003. Passou de 26.514 casos para 38.723.

Uma medida aproximada do impacto que algumas doenças podem exercerna retirada da força de trabalho foi obtida como uma razão entre o número depessoas aposentadas com idade compreendida entre 20 e 60 anos que experimen-tavam algumas das morbidades levantadas pela Pesquisa Nacional por Amostra deDomicílios (Pnad) de 1998 e 2003 e a PEA não-aposentada (ver IPEA, 2006). Essamedida pode ser considerada uma proxy da probabilidade de que, dado que oindivíduo contraiu certa doença, ele se retire da força de trabalho, via aposentadoria.Entre os homens, esse indicador passou de 7,0% para 8,1% entre 1998 e 2003 e,entre as mulheres, oscilou entre 8,3% e 8,5%. As principais doenças, entre aspesquisadas, que afetaram tanto homens como mulheres aposentados, foram asdo coração, as renais crônicas e as artrites. Com exceção dos problemas de colunae costas e das doenças renais crônicas reportados pelos homens, as demais proba-bilidades apresentaram redução no período considerado. Isso pode apontar parauma melhora das condições de saúde da população trabalhadora ou, pelo menos,para um melhor convívio e adaptação às limitações impostas pelas doenças crônicas.

Outra medida de impacto das aposentadorias precoces na saída da força detrabalho consiste na proporção de aposentados que não trabalhavam e reportaramsofrer de alguma das doenças crônicas em relação à PEA por sexo e idade, sendoapresentada no gráfico 8 (IPEA, 2006). Nos dois anos considerados, como esperado,a proporção cresceu com a idade. Em 2003, foi 12 vezes maior entre os trabalha-dores do sexo masculino com mais de 55 anos do que entre os de 40 a 44 anos.Foi, também, duas vezes maior entre as mulheres do que entre os homens, princi-palmente a partir dos 45 anos. Entre as mulheres de 45 a 49 anos, a proporção

GRÁFICO 8

Proporção de aposentados de 20 a 60 anos que reportam sofrer de doençascrônicas em relação à PEA(Em %)

Fonte: Ipea (2006, p.101).

20-24 40-4430-34 50-5425-29 45-4935-39 55-59

30

15

5

20

10

0

25

Mulheres (1998)Homens (1998)Mulheres (2003)Homens (2003)

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113DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

mencionada foi de 3,4% e passou para 27,4% entre as de 55 a 59 anos. Essasproporções decresceram entre 1998 e 2003, sugerindo melhoria nas condições desaúde.

Sintetizando, embora não se possa identificar uma tendência clara no com-portamento dos afastamentos precoces da PEA, foram observadas indicações dealgumas modificações no perfil da morbidade ocupacional. Apesar dos avançosda tecnologia médica e de um maior acesso aos serviços de saúde, transformaçõesno mercado de trabalho, nos processos produtivos e de prestação de serviços, amaior precarização das relações de trabalho, a entrada maciça das mulheres nasatividades econômicas, o envelhecimento populacional e, conseqüentemente, daPEA, podem resultar no envelhecimento precoce dos trabalhadores na ausênciade avanços na saúde ocupacional que permitam uma melhor adaptação destes àsnovas demandas do processo produtivo. Por outro lado, há que se considerar que,independentemente das condições de trabalho, cada categoria ocupacional expe-rimenta o seu timing de envelhecimento funcional, o que deve ser levado emconta quando se classificam as saídas em “precoces” ou não.

3.4 Aposentadoria de “fato” e de “direito” (quem realmente se aposentae quem continua no mercado de trabalho?)

Uma das tendências recentes em quase todo o mundo é a participação simultâneada população em mais de um evento, como, por exemplo, se aposentar e continuartrabalhando (MARTIN; PEARSON, 2005). Conforme se pode ver pelo gráfico 9, em1980, a partir dos 53 anos, observou-se que pelo menos 5% dos homens brasileirosparticipavam do mercado de trabalho e, ao mesmo tempo, eram aposentados,simultaneidade esta que cresceu com a idade até os 67 anos. Vinte anos mais

GRÁFICO 9

Brasil: proporção da população que trabalha e é aposentada por sexo e idade(Em %)

Fontes: IBGE/Censos Demográficos de 1980 e 2000e Pnads de 1981 e 2001. Elaboração: Ipea.

35

15

5

20

10

25

30

44 46 48 5652 6050 5854 62 64 66 68 7672 80 e +70 7442

PEA e é aposentado – Mulheres (1980)PEA e é aposentado – Homens (1980)PEA e é aposentado – Mulheres (2000)PEA e é aposentado – Homens (2000)

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114 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

tarde, essa simultaneidade começava aos 49 anos, ou seja, quatro anos mais cedo,dada a redução da idade de entrada na aposentadoria. Além disso, como já semencionou, a legislação brasileira permite que o aposentado retorne ao mercadode trabalho, a não ser nos casos de aposentadoria por invalidez. O gráfico mostra,também, que em 1980, não havia mulheres brasileiras que combinavam partici-pação no mercado de trabalho e aposentadoria. Já em 2000, essa combinação departicipação feminina seguiu o mesmo padrão da masculina de 1980. Iniciou-seaos 54 anos e se manteve acima de 5% até os 74 anos.12

3.5 Tempo passado na atividade econômica e na aposentadoria

O tempo (duração) que uma dada população passa na atividade econômica e nasituação de beneficiário da seguridade social pode ser medido pela metodologiade tabela de vida ativa.13 Essa duração é afetada pelas taxas de atividade e de mor-talidade e pela proporção de aposentados. O efeito da mortalidade sobre essestempos pode ser estimado aproximadamente pelo número (bruto ou líquido) deanos de vida ativa. O número bruto de anos só foi calculado para a participaçãono mercado de trabalho. Indica a permanência da população na atividade econômicana ausência da mortalidade, e o número líquido inclui o efeito dessa variável. Adiferença entre esses dois indicadores permite medir o efeito redutor da mortali-dade sobre a duração da vida ativa. A tabela 7 mostra esses indicadores.

12. Foi considerado um valor mínimo de 5%.

13. Isso foi feito em trabalho anterior. Ver IPEA, 2006.

TABELA 7

Brasil: duração da vida ativa e da aposentadoria segundo o sexo

Duração da vida

ativa aos 16 anos

Aos 16 anos Aos 50 anos

Bruto Líquido E16 Bruto-

líquido

E16-bruto E50 Duração da

aposentadoria

Proporção da aposen-

tadoria na E50 (%)

1980

Homens 46,68 39,51 49,26 7,17 2,58 22,15 17,41 78,62

Mulheres 14,63 13,78 55,92 0,85 41,28 25,62 6,68 26,07

2000

Homens 44,15 38,43 52,45 5,72 8,30 25,07 19,86 79,19

Mulheres 25,61 24,65 60,54 0,96 34,93 29,42 10,66 36,23

Fontes: IBGE/Censos Demográficos de 1980 e 2000 e Ministério da Saúde/SIM.

Elaboração: Ipea.

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115DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

Em 1980, na ausência da mortalidade, um homem aos 16 anos podia esperarpassar 46,7 anos na atividade econômica; e as mulheres, 14,6. Na prática, essaduração é menor pelo efeito redutor da mortalidade precoce, que acontece antesdo período estabelecido como o término da atividade econômica, tal como a idademínima para a aposentadoria. Essa redução foi bem maior para os homens, 7,1anos, do que para as mulheres, que foi de 0,8 ano. O fato de se ter estimado em39,5 anos o número líquido de anos que um homem passa na atividade econômicasugere baixa cobertura previdenciária e/ou o retorno do aposentado ao mercadode trabalho, dado que o tempo de trabalho (ou contribuição) exigido para que umhomem se aposentasse pela legislação previdenciária naquele ano era de 35 anos.A comparação entre a esperança de vida aos 16 anos e o número líquido de anosde vida ativa (coluna 5) permite inferir o tempo não dedicado à atividade econômica,motivado pelo retiro profissional ou ingresso tardio. As mulheres apresentaramum tempo muito maior da sua vida não dedicado à atividade econômica, 41,3anos. Por outro lado, esse tempo para os homens foi de 2,6 anos.

O que se observou entre 1980 e 2000 foi uma redução do número bruto elíquido de anos passados na atividade econômica pelos homens brasileiros a des-peito de um aumento de 3,2 anos na esperança de vida aos 16 anos. A redução namortalidade implicou uma diminuição de 1,4 ano no número de anos perdidosna atividade econômica por morte, mas esse tempo ainda continuava elevado, 5,7anos (ver tabela 7). Como se verá adiante, a mais alta mortalidade masculina,especialmente por causas externas, explica parte dessa perda. O inverso ocorreucom as mulheres. O seu tempo passado no mercado de trabalho aumentou em10,9 anos, enquanto a esperança de vida aos 16 anos cresceu em 4,6 anos.

Dada a importância da mortalidade por causas externas no tempo passadopelos homens brasileiros na atividade econômica e o fato de essas causas poderemser consideradas evitáveis,14 foram realizadas algumas simulações para mensurar oimpacto da sua redução nos indicadores estimados (ver IPEA, 2006). Consideraram-seas causas externas no seu conjunto, mas também foram levados em conta os ho-micídios e os acidentes de transporte, separadamente, pois, entre as causas externas,essas são as principais. O gráfico 10 apresenta os valores da esperança de vida aonascer e aos 16 anos, e o número líquido de anos passados na atividade econômicaobservado e simulado para o ano 2000. A eliminação dos óbitos por todas ascausas externas resultaria em uma elevação de 3,2 anos na esperança de vida ao nascermasculina e de 1,5 ano no tempo passado na atividade econômica. Excluindo-se os

14. Assume-se que estes são óbitos que, sob regras, estímulos, incentivos e punições diferenciadas, poderiam ser evitados se não na suatotalidade, pelo menos em grande parte.

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116 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

óbitos por homicídios do total de óbitos, verifica-se que estes contribuíram parauma perda de 1,4 ano na esperança de vida ao nascer e 0,7 ano no tempo passadona atividade econômica. Já a exclusão dos óbitos por acidentes de trânsito do totalde óbitos levou a uma redução de 0,4 ano na esperança de vida ao nascer e notempo passado na atividade econômica.

Outra medida apresentada na tabela 7 é uma estimativa do tempo que umtrabalhador aos 50 anos pode esperar passar na condição de aposentado. Ela écomparada à esperança de vida a essa idade. Pode-se observar que nos dois anosconsiderados, um homem aos 50 anos esperava passar aproximadamente 80% dotempo que ainda terá por viver na condição de aposentado. Em termos absolutos,significou um acréscimo de 2,4 anos entre 1980 e 2000. Isto se deveu à reduçãona idade de se aposentar, conforme se viu na tabela 6. Dada a ainda baixa partici-pação feminina no mercado de trabalho, o tempo despendido pelas mulheres,tanto absoluto quanto relativo, nessa condição era bem menor que o dos homens,embora crescente.

Como já se mencionou, o fato de um indivíduo estar aposentado não significaque ele não esteja trabalhando. Como se viu no gráfico 9, mais de 1/4 dos homensde 62 a 72 anos trabalhavam e estavam aposentados em 2000. Por outro lado, 1/3dos homens de 50 a 64 anos e 2/3 das mulheres não trabalhavam nem procuravamtrabalho nesse ano. Sem dúvida, tais valores refletem uma saída precoce do mercadode trabalho, mas são mais baixos que os observados para os países da OCDE (verOECD, 2006). Isto nos leva a perguntar que fatores determinam essa saída precoce,dado que a esperança de vida nas idades avançadas tem crescido muito e tem sidoacompanhada por melhorias nas condições de saúde.

GRÁFICO 10

Brasil: estimativas da esperança de vida simuladas para homens – 200070

65

60

45

35

50

40

30

25

20

Fonte: Ipea (2006, p. 105).

Aos 16 anosAo nascer Ativa aos 16 anos

55

Observada Eliminando as causas externas

Eliminando os homicídios Eliminando os acidentes de transporte

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117DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

No caso brasileiro, não se têm dúvidas de que a aposentadoria por tempo deserviço/contribuição contribui para isso. Por outro lado, há que se considerar,também, a existência de barreiras e preconceitos em relação ao trabalho do idoso.Segundo a OCDE, as dificuldades em manter o idoso no mercado de trabalhoadvém tanto do lado do empregador quanto do empregado. No primeiro caso,isso inclui, entre outros fatores, percepções negativas a respeito da capacidade dostrabalhadores idosos de se adaptarem às mudanças tecnológicas e organizacionaise os custos crescentes com a idade, independentemente da produtividade. Dolado dos empregados, estes podem sentir o seu capital humano depreciado, pornão receberem ajuda nem incentivo para treinamentos e atualizações. Wajnman,Oliveira e Oliveira (2004) verificaram que as maiores taxas de participação sãoencontradas entre os idosos de mais baixa escolaridade e os de mais alta.

4 A POPULAÇÃO IDOSA E SEUS MOVIMENTOS

4.1 Dinâmica de crescimento e composição por sexo

Como já se mencionou várias vezes neste livro, a população idosa é a que experi-menta as mais elevadas taxas de crescimento, o que tem gerado visões otimistas epessimistas a respeito das suas implicações econômicas e, em especial, sobre aprevidência social. Isso é verdade quando se compara esse grupo etário aos demais.Mas quando se observa a sua tendência temporal, verifica-se que essas taxas têmdecrescido, principalmente entre os idosos mais jovens. Ou seja, dentro da popu-lação idosa, o grupo que mais cresce é o constituído pelas pessoas de 80 anos emais, conforme se pode ver na tabela 8. Já foi observado, inclusive, um crescimen-to no número de centenários. O Censo Demográfico de 2000 encontrou cerca de24,5 mil pessoas com mais de 100 anos. Isso se deve principalmente à queda damortalidade na população idosa.

TABELA 8

Taxas de crescimento da população idosa brasileira(Em %)

Idade 1970-1980 1980-1991 1991-2000

60-64 3,15 3,66 2,65

65-69 5,24 2,88 2,87

70-74 5,03 3,33 4,22

75-79 7,10 4,05 3,64

80 e + 2,02 6,03 5,52

Fonte: IBGE/Censo Demográfico de 1970, 1980, 1991 e 2000.

Elaboração: Ipea.

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118 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

Também já foi comentado que os desafios acarretados pelo envelhecimentopopulacional não se devem apenas ao crescimento a taxas elevadas da populaçãoidosa, mas, também, ao menor crescimento da PIA. Isso implica uma redução narazão entre esses dois grupos populacionais. Por exemplo, em 1980, para cadaidoso, havia 9,2 pessoas com idade compreendida entre 15 e 59 anos. Em 2000,essa razão decresceu para 7,2. Ressalta-se que, na verdade, essa relação revela apenasa dinâmica demográfica. Para o caso da previdência social, a relação importante éentre contribuintes e beneficiários, que reflete a dinâmica demográfica e a domercado de trabalho. A sua queda foi relativamente bem maior: passou de 4,8para 2,8 contribuintes por beneficiário no período.

4.2 Mortalidade por causas evitáveis15

Considerando-se a população idosa como fechada, ou seja, não afetada pelosmovimentos migratórios, a dinâmica de seu crescimento será estabelecida pelamortalidade. Uma questão bastante atual na literatura diz respeito às perspectivasda continuação do aumento da esperança de vida. Vários cenários e projeções aesse respeito já foram desmentidos pela realidade. Encontra-se um consenso sobrea continuação da queda da mortalidade, mas sem especificações de até quando ecomo ela pode cair. Atualmente, valores de esperança de vida acima de 80 anossão observados no Japão, Austrália, Cingapura, Suíça e Suécia.16 Como já se viu, aesperança de vida ao nascer da população brasileira atingiu 70,9 anos em 2000,tendo aumentado oito anos entre 1980 e 2000. Em 2000, uma pessoa que atingiuos 60 anos poderia ainda esperar viver, em média, 19,7 anos, 1,7 a mais do que em1980. Objetiva-se nesta subseção avaliar até quanto a mortalidade da populaçãoidosa brasileira poderá cair e qual será o seu impacto sobre a esperança de vida aonascer e aos 60 anos e no ritmo de crescimento da população idosa.

Para responder a essa questão, o trabalho buscou identificar as causas demorte que podem ser evitadas de forma a contribuir para taxas de mortalidademais baixas e uma esperança de vida mais elevada. A título de exercício, foramrealizadas algumas simulações tentando medir os ganhos na esperança de vida aonascer e aos 60 anos da população brasileira se determinadas causas de mortefossem evitadas. A determinação das causas que poderiam ser evitadas se baseouem uma metodologia apresentada num estudo da Escuela Andaluza de Salud Pública(EASP, s.d.). Com a metodologia mencionada, foi possível calcular o número deanos perdidos na esperança de vida ao nascer e às várias idades devido a causas

15. Esta subseção está fortemente baseada em Camarano, Kanso e Mello (2004b).

16. Dados retirados do site US Census Bureau (www.census.gov) em 10/01/2007 referentes ao ano de 2006.

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119DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

consideradas evitáveis bem como as correspondentes taxas de mortalidade e ovolume populacional que poderia sobreviver às idades avançadas.

Pode-se observar no gráfico 11 que a proporção de óbitos brasileiros porcausas consideradas evitáveis era bastante elevada. Em 2000, aí se encontravamaproximadamente 75% dos óbitos brasileiros. Era mais elevada entre a populaçãonão-idosa do que entre a idosa e mais alta entre os homens do que entre as mulheresdevido ao impacto das mortes por causas externas. Quando apenas as mulheressão consideradas, verifica-se entre as idosas uma proporção mais elevada de mortesevitáveis. A elevada proporção de óbitos evitáveis significa a existência de umespaço considerável para a continuação da redução da mortalidade, para o aumentoda esperança de vida e para o crescimento da população idosa.

Utilizou-se a definição de causas evitáveis desenvolvida por Charlton.17 Foramidentificadas as causas de morte que são influenciadas pela qualidade no atendi-mento dos serviços de saúde e recursos utilizados. Tais causas foram dispostas nosseguintes grupos:

Grupo I: Causas evitáveis por meio da prevenção primária. Incluem as pato-logias que podem ser diagnosticadas primariamente, permitindo uma intervençãona prevenção, reduzindo a incidência da doença.

Grupo II: Causas evitáveis por meio de diagnóstico “precoce” e tratamentooportuno. São causas que requerem prevenção secundária.

Grupo III: Causas evitáveis por meio de melhorias nos tratamentos e cuidadosmédicos. Consideram as doenças suscetíveis de tratamentos e avanços na medicina.

17. Para mais detalhes, ver Camarano, Kanso e Mello (2004b).

GRÁFICO 11

Brasil: proporção de óbitos considerados evitáveis por sexo – 2000(Em %)

100

6050

30

8070

40

2010

Fontes: IBGE/Censo Demográfico de 2000 e Ministério da Saúde/SIM. Elaboração: Ipea.

População não-idosaPopulação idosa

90

0

Homens Mulheres

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120 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

A tabela 9 apresenta as taxas de mortalidade da população idosa brasileirageral e as decorrentes de causas consideradas evitáveis em 2000. Apresenta, também,os valores da esperança de vida ao nascer e aos 60 anos simulados, ou seja, os quepoderiam ser obtidos, caso a mortalidade pelas causas consideradas fosse eliminada.Entre essas causas, as maiores taxas de mortalidade para ambos os sexos foramencontradas no grupo III. Aí se encontram as causas que podem ser evitadas pormelhorias nos tratamentos e cuidados médicos.18 A importância desse grupo decausa de morte é crescente no tempo e atinge mais as mulheres (ver CAMARANO;KANSO; MELLO, 2004b). Em 2000, foi responsável por 42% dos óbitos masculinosdo contingente de idosos e 46% dos femininos. Conseqüentemente, a sua elimi-nação é a que provocaria o maior impacto na redução da mortalidade entre ascausas consideradas. Significaria um aumento de 7,2 anos na esperança de vida aonascer da população masculina e 8,4 da feminina e de 8,3 e 8,6 anos, respectiva-mente, na da população maior de 60 anos.

O segundo grupo de causas de morte em importância (grupo I) abrange asdoenças de prevenção primária, que poderiam ser evitadas por meio de um acom-panhamento que pudesse resultar em um diagnóstico precoce. Caso fossem essasas causas eliminadas, os homens alcançariam uma esperança de vida de 73,0 anose as mulheres de 78,3 (ver tabela 9). O impacto da redução dessas taxas seria bemmaior na população masculina, que apresentaria ganhos de 5,8 anos, comparadosaos 3,5 anos esperados para as mulheres. O menor impacto na esperança de vida

18. Nesse grupo de causas de morte encontram-se: tuberculose, enfermidades hipertensivas, cardiopatias e diabetes mellitus.

TABELA 9

Brasil: taxas de mortalidade da população idosa e esperança de vida ao nascerobservadas e simuladas segundo causas evitáveis – 2000(Por mil idosos)

Taxas

(por mil)

Esperança de vida ao nascer

(anos)

Esperança de vida aos 60 anos

(anos)Grupos de causas

de morteHomens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres

Eliminando grupo I 9,96 6,06 72,97 78,34 22,31 24,67

Eliminando grupo II 0,10 0,97 67,28 75,89 19,36 22,72

Eliminando grupo III 17,60 14,32 74,40 83,26 26,22 29,89

Eliminando total evitável 27,67 21,35 80,16 86,89 29,23 32,48

Total 41,10 31,47 67,16 74,83 17,96 21,32

Fontes: IBGE/Censos Demográficos de 1991 e 2000 e Ministério da Saúde/SIM.

Elaboração: Ipea.

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121DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

ao nascer seria observado caso se eliminassem as mortes do grupo II, as redutíveispor meio de diagnóstico “precoce” e tratamento oportuno. Estas são causas demorte que afetam mais a população feminina. A sua esperança de vida poderiaaumentar em 1,1 ano no caso da sua eliminação.

Se fossem eliminadas todas as causas evitáveis, o ganho na esperança de vidaao nascer e aos 60 anos seria elevado para ambos os sexos. A esperança de vidamasculina passaria de 67,2 anos para 80,2 anos, e a feminina, de 74,8 para 86,9anos de vida, ou seja, um ganho de aproximadamente 13,0 anos para homens e de12,1 para as mulheres. Já os ganhos na esperança aos 60 anos seriam de aproxima-damente 11 anos para ambos os sexos (ver tabela 9).19 Além de uma esperança devida mais elevada, pode-se esperar, também, uma redução de 0,9 ano nos diferenciaispor sexo, o que repercutirá na composição por sexo da população brasileira, emparticular, a idosa. Deve-se reconhecer que os altos valores obtidos na simulaçãopodem ser, em parte, resultados da interdependência entre as várias causas de morte.

O impacto que essa redução da mortalidade pode exercer no crescimento dapopulação idosa pode ser visualizado no gráfico 12 e na tabela 1 do apêndice.Assumiu-se que a redução da mortalidade obtida pela eliminação das causas evitáveispoderia ser alcançada em 30 anos. Se isso se verificar, a população idosa poderátriplicar nesse período. Poderá passar dos 14,5 milhões observados em 2000 para45,9 em 2030, como resultado, também, da alta fecundidade no passado.

19. Projeções recentes para os países da OCDE apontam para 2050 valores de esperança de vida de 83,3 anos para homens e 89,1 paramulheres. Ver Bongaarts (2006).

GRÁFICO 12

Brasil: população idosa projetada, eliminando as causas de morte consideradasevitáveis por sexo(Em milhões)

30

10

20

15

5

0

Fontes: IBGE/Censos Demográficos de 1970 a 2000 e Ministério da Saúde/SIM.Elaboração: Ipea.

2000 20102005 20302015 20252020

25

Homens Mulheres

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122 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

5 NUPCIALIDADE

A nupcialidade não é considerada uma variável estritamente demográfica, mas exerceum papel importante na dinâmica demográfica, pois afeta e é afetada pela reproduçãopopulacional (fecundidade), além de exercer influência na formação e na dissoluçãodos arranjos familiares. Por outro lado, igualmente importante é o seu impacto nodelineamento dos potenciais beneficiários da seguridade social; no caso, as pensõespor morte. Essa é a razão da inclusão da referida variável neste capítulo.

As mudanças sociais, econômicas e culturais afetam sobremaneira a nupcialidade.Cita-se, entre muitas, a entrada maciça das mulheres no mercado de trabalho,bem como o envelhecimento populacional. No caso brasileiro, pode-se dizer que essasmudanças se iniciaram nos anos 1970, e seus impactos na formação das uniõesconjugais já se fazem sentir. Estar separado, divorciado ou em união consensual ouainda recasar-se civilmente, o que antes era permitido apenas em caso de viuvez, sãosinais de mudanças nos comportamentos preestabelecidos da sociedade tradicional.De que maneira essas mudanças podem afetar a demanda por benefícios previdenciáriosé uma das perguntas desta seção, que analisa o padrão da nupcialidade da populaçãobrasileira e o seu calendário (idade à entrada nos eventos e duração).

5.1 Padrão da nupcialidade

A tabela 10 apresenta a distribuição da população brasileira de 15 anos e mais porestado conjugal e sexo. O estado conjugal predominante da população brasileira éo de casado. Nessa condição, se encontravam em 2000 57% da população brasi-leira, proporção esta que apresentou ligeira redução nos 20 anos analisados, devido,principalmente, à diminuição da proporção de mulheres casadas. Enquanto 58,3%

TABELA 10

Distribuição proporcional da população brasileira de 15 anos e mais por estado conjugalsegundo o sexo

1980 1991 2000

Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total

Casadoa 58,83 56,90 57,85 59,94 57,09 58,48 58,28 54,96 56,57

Solteiro 37,89 31,54 34,67 35,77 28,71 32,16 33,71 26,13 29,81

Sep./desq./div. 1,50 3,47 2,50 2,68 6,04 4,40 6,03 10,65 8,41

Viúvo 1,78 8,09 4,98 1,62 8,16 4,97 1,98 8,26 5,21

Total 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00

Fonte: IBGE/Censo Demográfico de 1980, 1991 e 2000.a Inclui união consensual.

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123DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

dos homens brasileiros eram casados, a proporção comparável para as mulheresfoi de 55,0%. O segundo estado conjugal mais importante foi o de solteiro, nestecaso mais expressivo entre os homens. Aí se encontravam, em 2000, 33,7% doshomens brasileiros e 26,1% das mulheres. Essa proporção também decresceu noperíodo considerado e de forma mais expressiva entre as mulheres.

A redução nas proporções mencionadas foi compensada por um aumentona proporção da população que se declarou separada, desquitada ou divorciada.Embora baixa, ela passou de 2,5% para 8,4%, ou seja, cresceu em mais de trêsvezes no período. O crescimento foi maior entre as mulheres. Enquanto em 19803,5% das mulheres estavam nessa condição, em 2000, encontravam-se aproxima-damente 11%. A variação comparável para os homens foi de 1,5% para 6,0%.Essa menor proporção comparada à das mulheres pode ser explicada por umadificuldade maior experimentada pelas mulheres para o recasamento. A proporçãoda população brasileira que se declarou viúva não se alterou no período e foi amais baixa entre os quatros estados conjugais considerados. Foi bem mais altaentre as mulheres comparativamente aos homens: 8,3% e 2,0% (ver tabela 10). Amaior mortalidade masculina, conjuntamente com normas e valores culturais quelevam ao casamento de homens com mulheres mais novas, dificulta o recasamentodas mulheres e explica essas diferenças nas proporções.

Um indicador comumente usado para medir a intensidade da nupcialidadeé a proporção de pessoas que chegam aos 50 anos sem nunca terem se casado.20

Essa medida não se alterou no período analisado e foi mais alta entre as mulheres.Entre os homens, foi de 6%; e entre as mulheres, de 9% (ver gráficos 13 e 15). Isso

20. Chamada de índice de celibato. Assume-se que as pessoas que chegaram a essa idade sem se casar não se casarão mais.

Solteiro (1980) Separado (1980)Casado/unido (1980)

Separado (2000)Solteiro (2000)Casado/unido (2000)

Viúvo (1980)

Viúvo (2000)

GRÁFICO 13

Brasil: proporção de homens por estado conjugal e idade individual(Em %)

90

60

30

0

Fonte: IBGE/Censos Demográficos de 1980 e 2000.Elaboração: Ipea.

20 5236 6828 6044 7622 5438 7030 6246 7824 5640 7232 644880

e +26 5842 7434 6650

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124 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

indica que não houve alterações no quantum da nupcialidade. Ou seja, a populaçãocontinuou se casando na mesma intensidade, mas os casamentos duraram menos.

Como a tabela 10 apresenta informações para a população de 15 anos e maise o estado conjugal é fortemente afetado pela idade, muitas das transformações nanupcialidade brasileira não ficam aparentes. Dado isso, o gráfico 13 mostra adistribuição proporcional da população masculina por estado conjugal e idadeindividual em 1980 e 2000. Nos dois anos considerados, até os 25 anos ser solteiroera o estado conjugal predominante dos homens. A partir dessa idade, o casamentofoi o status principal. Essa proporção cresceu até os 46 anos e ficou aproximada-mente constante até os 61 anos, atingindo valores em torno de 85% em 2000.Apesar de decrescente com a idade, aos 80 anos aproximadamente 80% dos homensestavam casados. Em relação a 1980, observou-se um decréscimo nos percentuaismencionados até os 72 anos, o que deve ser resultado do aumento do número de

GRÁFICO 14

Brasil: distribuição proporcional da população por estado conjugal segundosexo e idade(Em %)

Fontes: IBGE/Censo Demográfico de 2000.Elaboração: Ipea. Homens solteirosHomens casados

Mulheres solteirasMulheres casadas

Homens viúvos

Mulheres viúvas

Homens separados

Mulheres separadas

90

60

30

020 5236 6828 6044 7622 5438 7030 6246 7824 5640 7232 6448 8026 5842 7434 6650

Viúva (1980)Separada (1980)Casada/unida (1980)

Viúva (2000)Separada (2000)Solteira (2000)

Solteira (1980)

Casada/unida (2000)

GRÁFICO 15

Brasil: proporção de mulheres por estado conjugal e idade individual(Em %)

Fonte: IBGE/Censos Demográficos de 1980 e 2000.Elaboração: Ipea.

90

60

30

020 5236 6828 6044 7622 5438 7030 6246 7824 5640 7232 6448

80 e

+26 5842 7434 6650

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125DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

separações. Já a partir dos 72 anos, esse percentual aumentou concomitante àredução na proporção de viúvos. Ou seja, sugere que as separações são um fenô-meno recente e que ainda não atingiu a população muito idosa.

A proporção de viúvos aumentou com a idade, como esperado, e decresceuligeiramente no período. Em 2000, em torno de 30% dos homens de 80 anos emais eram viúvos, proporção essa que fora de 35% em 1980. A redução da mor-talidade nas idades adultas e avançadas deve ter contribuído para isso e resultouem um aumento na proporção de casados. Por outro lado, o aumento da proporçãode homens separados também leva a uma queda na proporção de viúvos. De quemaneira isso impacta a demanda por pensões por morte é algo que depende dosarranjos que foram feitos quando do processo de separação civil (desquite e/oudivórcio) e do fato de a mulher ter trabalhado/contribuído ou não para a seguridadesocial. Dado que está se falando de homens mais velhos, é possível que a maiorparte de suas esposas não tenha trabalhado na vida adulta, o que não deve tergerado o benefício de pensão por morte para esses homens quando da viuvez.Também, no caso das separações, esses não devem ter sido contemplados compensões alimentícias.

Segundo dados do MPAS, tanto em 2004 quanto em 2005, aproximadamente12% das pensões por morte foram pagas a homens. Por outro lado, entre os viúvosna população brasileira em 2000, 18,5% eram homens. O baixo número de homensrecebendo pensões por morte não deve, portanto, ser resultado apenas do baixonúmero de viúvos, mas, também, da sua inelegibilidade.

De maneira geral, o padrão de nupcialidade por idade das mulheres é seme-lhante ao dos homens, como se observa no gráfico 14. A variação está no timingdos eventos, como será visto na subseção seguinte. As mulheres se casam maiscedo, mas descasam mais cedo, seja pelas separações, seja pela viuvez. Entre oshomens desde os 25 anos, predominavam os casados. Estar casada foi o statuspredominante das mulheres entre 23 e 70 anos. A partir dessa idade, predominaramas viúvas. O status de separada ou de viúva é uma característica mais acentuadaentre as mulheres e crescente com a idade. Em 2000, a proporção de mulherescom mais de 60 anos nessa condição era aproximadamente quatro vezes maiorque a de homens.

A variação observada nos 20 anos considerados foi uma redução na proporçãode mulheres casadas entre 20 e 60 anos e um aumento a partir daí (ver gráfico 15).O aumento das separações, observado em todas as idades, explica o decréscimo, ea redução na mortalidade masculina explica o acréscimo. Esses dois fatores tambémlevaram a uma diminuição na proporção de viúvas. Em 2000, a proporção de

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126 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

mulheres separadas cresceu com a idade até os 42 anos e ficou constante até os 53anos, em torno de 15%. Isso significa aproximadamente 22% das mulheres casadase aponta para uma continuação da queda na proporção de viúvas no futuro próximo.Em que medida isso resultará numa diminuição na demanda por pensões pormorte, como já se mencionou, vai depender do acordo feito no momento daseparação judicial. Como se observa no gráfico 16, é crescente a proporção demulheres separadas na faixa etária de 40 a 59 anos que recebiam alguma renda dotrabalho. Entre as mulheres de 40 a 49 anos, essa proporção ultrapassou os 60%.Pode-se, portanto, esperar que uma parcela expressiva dessas mulheres receba pensãoalimentícia apenas para os filhos, o que implicará uma redução da pressão porbenefícios por viuvez se elas ou os seus ex-cônjuges não se recasarem.

5.2 Mudanças no calendário dos eventos

As mudanças no calendário dos eventos que marcam o processo de nupcialidadeforam mais intensas que no seu quantum. Aqui são consideradas as idades à entradana primeira união e na viuvez, bem como a duração desses eventos, e estão apre-sentadas na tabela 11. Normas e valores culturais fazem com que as mulheres secasem mais cedo que os homens porque se casam com homens mais velhos. Em1980, as mulheres se casavam em média aos 22,3 anos e os homens aos 25,1 anos.Essa idade aumentou em 0,6 ano para os homens e 0,3 para as mulheres. Comoresultado, a diferença entre os sexos na idade média ao casar aumentou de 2,7 para3,1 anos. Por outro lado, as pessoas passaram a experimentar o evento da viuvezmuito mais tarde. Entre os homens, a idade a esse evento passou de 71,2 anos em1980 para 72,8 em 2000. Entre as mulheres, a variação foi de 63,6 para 64,9 anos.Como resultado disso e também do aumento das separações, diminuiu ligeiramenteo tempo que as mulheres passavam na condição de viúvas, o que, certamente,

GRÁFICO 16

Brasil: proporção de mulheres separadas com algum rendimento do trabalho80

50

30

60

40

20

10

0

Fonte: IBGE/Censos Demográficos de 1980 e 2000.Elaboração: Ipea.

30-34 40-4435-39 45-49 55-5950-54 60 e +

1980 2000

70

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127DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

provocará uma redução do tempo durante o qual essas mulheres receberão o be-nefício. Como esperado, as mulheres ficam viúvas bem mais cedo que os homense passam muito mais tempo nessa condição e, portanto, recebendo o beneficio.

6 PERSPECTIVAS DE CRESCIMENTO E COMPOSIÇÃO POR SEXO E IDADEDA POPULAÇÃO EM IDADE ATIVA E POPULAÇÃO IDOSA NO PERÍODO2000- 2030

6.1 Os resultados para a população total

Apresentam-se a seguir os resultados de uma projeção populacional realizada paraos qüinqüênios compreendidos entre 2000 e 2030, desagregados por sexo e gruposqüinqüenais de idade. A projeção foi preparada para um trabalho anterior21 eutilizou-se o método dos componentes, que considera, separadamente, o com-portamento de cada uma das três variáveis demográficas: fecundidade, mortalidadee movimentos migratórios. Assumiu-se que a taxa de fecundidade total manteria asua tendência de queda, devendo atingir valores próximos a 1,5 no período 2025-2030. Quanto à mortalidade, a hipótese adotada pressupõe uma continuação dasua queda, inclusive da mortalidade adulta jovem.22 Espera-se que em 2030 apopulação masculina alcance uma esperança de vida de 76,5 anos, e a feminina,

21. Os resultados dessa projeção diferem ligeiramente dos apontados pela projeção do Ipea, pela incorporação dos resultados da Pnadde 2004 (ver IPEA, 2006).

22. Para mais detalhes sobre a metodologia, ver Beltrão, Camarano e Kanso (2004).

TABELA 11

Idade à entrada e duração no casamento e na viuvez da população brasileira

1980 1991 2000

Homens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres

Entrada

Casamento 25,07 22,31 25,53 22,50 25,70 22,64

Viuvez 71,16 63,58 71,41 64,25 72,78 64,92

Duração (anos)

Casamento 34,98 32,48 35,37 32,95 34,97 32,44

Viuvez 1,56 8,43 1,41 8,32 1,71 8,05

Vida 59,27 65,62 63,51 71,53 67,05 74,71

Fontes: IBGE/Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000 e Ministério da Saúde/SIM.

Elaboração: Ipea.

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128 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

de 85,3, valores estes semelhantes aos observados no Japão em 2000 e, também,semelhantes aos obtidos se as causas de morte evitáveis forem eliminadas.

Se as hipóteses traçadas se verificarem, a população brasileira se aproximaráde 225,3 milhões de pessoas em 2030 (ver gráfico 17). As hipóteses formuladasapontam para uma continuação da redução em curso na taxa de crescimento dapopulação total, que poderá atingir valores próximos a 0,5% a.a. no final doperíodo da projeção, como implícito na taxa intrínseca de crescimento. As trans-formações demográficas em curso e as projetadas, além de afetarem o ritmo decrescimento populacional, afetarão também, significativamente, a distribuiçãoetária. Tal efeito se dá de forma defasada, atingindo primeiro os grupos etários maisjovens da população e se estendendo aos demais. O resultado final pode ser visto nográfico 18, que compara as pirâmides etárias de 2000 e 2030. O envelhecimento

GRÁFICO 17

Brasil: população total e taxa de crescimento observada e projetada(População total, em milhões) (Taxa de crescimento, em %)

250

50

150

100

0

Fontes: IBGE/Censos Demográficos de 1970 a 2000e Ministério da Saúde/SIM. Elaboração: Ipea.

2000 20102005 20302015 20252020

Taxa de crescimento

200

1,6

1,4

1,2

1,0

0,8

0,6

0,4

0,2

0,0

População total

Mulheres (2000)

Mulheres (2030)

GRÁFICO 18

Brasil: distribuição proporcional da população por idade e sexo

20-24

5-90-4

80 e +75-79

65-6960-6455-59

40-44

50-54

35-39

45-49

30-34

15-19

25-29

10-14

70-74

Fontes: IBGE/Censos Demográficos de 1970 a 2000e Ministério da Saúde/SIM. Elaboração: Ipea.

6,0 2,0 2,0 4,04,0 0,0 6,0

Homens (2000)

Homens (2030)

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129DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

populacional já evidenciado no Brasil desde os anos 1980 deve-se acelerar, e deter-minados grupos etários poderão experimentar taxas negativas de crescimento.

6.2 Os resultados para a população em idade ativa e para a populaçãoidosa

No caso da PIA, aqui considerada como a de 16 anos e mais, o volume de entradasnessa categoria reflete principalmente o número de nascimentos ocorridos 16 anosantes, descontado o efeito da mortalidade. Estes, por sua vez, relacionam-se comas taxas de fecundidade e com o número de mulheres em idade reprodutiva noperíodo correspondente. Isso explica por que as taxas de crescimento ainda sãorelativamente altas para esse segmento populacional, em torno de 2,0% a.a. entre2000 e 2005, apesar de essas taxas apresentarem um comportamento decrescente.Para o qüinqüênio 2025-2030, projeta-se uma taxa de 0,9% a.a.

Além disso, a participação da PIA no total da população brasileira deverá crescer,podendo passar de 70% para 81%, e manterá o seu processo de envelhecimento.A participação do grupo jovem da PIA (15-29 anos) declinará substancialmente,sendo que, pelas hipóteses elaboradas, isso ocorrerá de forma mais acentuada a partirde 2010. No final do período da projeção, ela apresentará valores absolutos próximosaos observados em 2000; ou seja, crescerá e decrescerá. Espera-se que a participaçãoda PIA adulta (30-44 anos) se mantenha aproximadamente estável, com algumasoscilações ao longo do período considerado, e a PIA madura e a idosa deverãoexperimentar um aumento mais expressivo na sua participação. Isso colocará pressõesdiferenciadas no mercado de trabalho. Os empregos a serem gerados deverão seconcentrar na população maior de 45 anos. Espera-se que essa população absorvaaproximadamente 47% da futura PIA (ver gráfico 19).

GRÁFICO 19

Brasil: distribuição percentual da população em idade ativa, segundogrupos etários selecionados45

30

15

Fontes: IBGE/Censos Demográficos de 1970 a 2000 eMinistério da Saúde/SIM. Elaboração: Ipea.

2010 20302000 2020

30-4415-29 45-59 60 e +

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130 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

Como esperado, as maiores taxas de crescimento populacional deverão serexperimentadas pela população idosa. Nesse subgrupo, as mulheres deverão apre-sentar taxas de crescimento mais elevadas e, também, a população muito idosa,maior de 80 anos (ver tabela 12).23 Isso alterará a distribuição etária nesse segmento,

23. A tabela A.2 do apêndice apresenta a projeção dessa população em valores absolutos.

TABELA 12

Taxa de crescimento da população idosa brasileira por idade e sexo

2000-2005 2005-2010 2010-2015 2015-2020 2020-2025 2025-2030

Homens

55-59 4,42 3,41 3,44 2,78 1,14 1,22

60-64 1,88 4,46 3,53 3,54 2,86 1,23

65-69 2,91 1,97 4,63 3,68 3,66 2,98

70-74 2,05 3,12 2,18 4,83 3,85 3,82

75-79 3,69 2,39 3,36 2,41 5,05 4,04

80 e + 7,06 6,16 4,59 4,23 3,64 4,36

60 e + 3,01 3,61 3,70 3,77 3,59 2,96

65 e + 3,55 3,22 3,79 3,88 3,93 3,70

Mulheres

55-59 4,26 3,89 3,57 2,93 1,17 1,19

60-64 2,08 4,34 3,96 3,64 3,00 1,23

65-69 3,10 2,20 4,46 4,06 3,69 3,08

70-74 2,65 3,30 2,36 4,62 4,06 3,83

75-79 5,02 3,21 3,49 2,53 4,58 4,24

80 e + 6,15 5,99 4,90 4,46 3,84 4,29

60 e + 3,40 3,77 3,90 3,91 3,69 3,09

65 e + 3,96 3,54 3,88 4,03 3,97 3,79

Total

55-59 4,34 3,66 3,51 2,86 1,16 1,21

60-64 1,98 4,40 3,76 3,59 2,94 1,23

65-69 3,01 2,09 4,54 3,89 3,68 3,04

70-74 2,38 3,22 2,28 4,72 3,97 3,82

75-79 4,45 2,86 3,44 2,48 4,78 4,16

80 e + 6,52 6,06 4,77 4,37 3,76 4,32

60 e + 3,23 3,70 3,81 3,85 3,65 3,04

65 e + 3,78 3,40 3,84 3,97 3,95 3,75

Fontes: IBGE/Censo Demográfico de 1970 a 2000 e Ministério da Saúde/SIM.

Elaboração: Ipea.

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131DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

levando, também, ao seu envelhecimento (ver gráfico 20). No entanto, no seuconjunto, a tendência é de declínio das taxas de crescimento. Isso se deve, por umlado, ao fato de se considerar uma base populacional maior e, por outro, à entradanesse grupo de coortes menores, nascidas num regime de fecundidade mais baixa.Pode-se esperar, para o período 2025-2030, uma taxa de crescimento de 1,2% a.a.para a população de 60 a 64 anos e de 4,3% para a de 80 anos e mais. Ou seja, a“onda idosa” mostra sinais de que estaria passando.

A questão que se coloca diz respeito à ainda mais baixa taxa de crescimento dapopulação de 15 a 59 anos, de 0,3% a.a. nesse mesmo qüinqüênio. Isso significauma aceleração na redução já em curso da relação entre a população de 15 a 59anos e a de 60 anos e mais. Dos 7,2 observados em 2000, pode-se esperar que elase reduza para valores próximos a 3,5. Em que medida o crescimento desse grupopopulacional e o decréscimo dessa relação afetarão a demanda por benefíciosprevidenciários é algo que dependerá, também, da formalização da população ativa.

Um exercício bastante simples e simplista, que é o de assumir a proporção detrabalhadores do sexo masculino de 45 a 59 anos em 2005 que contribuíam paraa seguridade social em 2025, como uma projeção da demanda por beneficioprevidenciário, resulta numa demanda de 4,1 milhões de pessoas.24 Isso significaum acréscimo de 600 mil em relação ao total de pessoas nessa faixa etária querecebiam o benefício em 2005. O grande ponto que se quer levantar é que ummontante aproximadamente igual a esse será constituído por pessoas que nãoestavam contribuindo em 2005. Pergunta-se: quais são as perspectivas de rendapara esses indivíduos? Isso exige que se olhe para outros ângulos da questão do

24. Excluídos os trabalhadores rurais e as pessoas que recebiam aposentadorias rurais.

GRÁFICO 20

Brasil: distribuição proporcional da população idosa por idade35

30

15

10

20

5

-2000 2010 20302020

25

Fontes: IBGE/Censos Demográficos de 1970 a 2000e Ministério da Saúde/SIM. Elaboração: Ipea. 65-6960-64 70-74 75-79 80 e +

Cap03.pmd 23/3/2007, 15:41131

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132 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

envelhecimento populacional e da sua relação com a demanda por benefícios daprevidência social.

7 COMENTÁRIOS FINAIS: E O FUTURO?

Não há dúvidas de que uma das maiores conquistas sociais da segunda metade doséculo XX em quase todo o mundo em desenvolvimento foi a redução da morta-lidade em todas as idades. Isso resultou no aumento da esperança de vida em todasas faixas etárias ou, mais precisamente, no fato de mais e mais pessoas atingirem asidades avançadas. Essa tendência acontece em paralelo à entrada no grupo etárioque se convencionou chamar de idoso de coortes populacionais nascidas numregime de fecundidade elevada e de redução da mortalidade. Ou seja, são os babyboomers que se beneficiaram da redução das taxas de mortalidade por doençasinfecto-contagiosas na primeira infância, da mortalidade materna, da mortalidadena meia-idade e nas idades adultas e avançadas, e estão se tornando os elderlyboomers. Uma das possibilidades tidas como certas que se podem vislumbrar parao futuro próximo é o crescimento, a taxas elevadas, do contingente de idososvivendo mais tempo.

O que se procurou chamar a atenção, neste capítulo, não foi apenas para ocrescimento acentuado de um segmento populacional considerado inativo oudependente, mas para o fato de isso ocorrer simultaneamente a um encolhimentodo segmento em idade ativa ou produtiva. Assim, refletir nas perspectivas de rendapara os idosos do futuro é pensar, entre outras coisas, no financiamento da previ-dência social. Trata-se de uma questão não equacionada. Do ponto de vista dofinanciamento, mais do que a PIA, o que na realidade importa é a população queestá realmente participando do mercado formal de trabalho. Esta depende daprimeira e, também, da dinâmica do mercado de trabalho. Ao contrário dos paísesdesenvolvidos, a baixa taxa de formalização parece ter um impacto maior na equaçãofiscal da previdência social, do lado das receitas, do que a dinâmica demográfica.

Além das mudanças demográficas, outras mudanças sociais e culturais estãoem curso, que afetam principalmente as mulheres. Estas vivenciaram os grandesganhos na escolaridade e entraram maciçamente no mercado de trabalho. Fizerama revolução na família, casaram-se, descasaram-se, recasaram ou não e casaramnovamente, tendo menos filhos. O não casar e o não ter filhos também passarama ser opções. O sistema de previdência vigente ainda se baseia no modelo de família,em que o homem é o provedor e a mulher a cuidadora. Essa estrutura tem levadoa que 12% das mulheres de 60 anos e mais recebessem em 2005 tanto o benefícioda aposentadoria, pelo seu trabalho, quanto a pensão por morte. Isso também

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133DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

pode acontecer para os homens, mas, dada a baixa proporção de viúvos, a referidaproporção não atingiu 2%.

As perspectivas que se colocam para o médio prazo são de uma certeza dacontinuação nos ganhos em anos vividos e no crescimento da população idosa,demandante de benefícios previdenciários. Por outro lado, predomina uma incer-teza quanto à possibilidade de renda para os idosos do futuro. É difícil acreditarque as tradicionais maneiras de financiar a seguridade social serão suficientes paralidar efetivamente com a população idosa do futuro num contexto de crescenteinformalização da economia. Não parece que as reformas recentes serão capazesde resolver o problema de financiamento do sistema e garantir a proteção socialpara eles. Parte expressiva da geração dos idosos do futuro já vivencia os efeitos daflexibilização do mercado de trabalho e do “engessamento” da previdência social,o que comprometerá a sua aposentadoria mais adiante. De um exercício simplesfeito neste trabalho, pode-se deduzir que dificilmente a assistência social poderágerar renda para esse segmento elevado da população, hoje desempregado e/ou nosetor informal, quando perder a sua capacidade laboral. Não há dúvidas de queum dos pontos centrais de uma política de previdência social continua sendo o deestimular o aumento da cobertura da atual força de trabalho, mas levando-se emconta a situação de retração do emprego e de informalização generalizada.

Embora o crescimento econômico seja uma condição necessária para a in-serção da PIA no sistema previdenciário, não parece ser suficiente. Mesmo que aeconomia passe a experimentar taxas de crescimento significativas e sustentadas epossa absorver contingentes populacionais relativamente maiores, pode-se esperarque ainda haverá uma proporção expressiva de trabalhadores com inserção precáriano mercado de trabalho (trabalhadores sazonais, autônomos, domésticos sem carteiraassinada etc.). Portanto, uma das alternativas sugeridas é uma forma de contribuiçãosazonal (única ao longo do ano), que seja compatível com o trabalho sazonal, porexemplo. Outra é a redução do percentual da contribuição do trabalho autônomo.25

Além disso, não se pode deixar de pensar na ampliação da rede de cobertura debenefícios não contributivos, financiados com impostos gerais, para aqueles quede maneira alguma conseguiram ou conseguirão um histórico de contribuições.

Do lado das despesas, outras estratégias podem ser pensadas. Considerando-seo aumento da esperança de vida nas idades avançadas, as melhorias nas condiçõesde saúde da população idosa e a recente preocupação com o “envelhecimento

25. Assume-se que 20% sobre 1 salário mínimo (SM) é um valor muito alto para os trabalhadores de baixa renda, o que funciona comoum desincentivo à contribuição. A Lei Complementar 123, sancionada em 12/02/2007, criou um regime especial de contribuiçãoprevidenciária com renda de até 1 SM, definindo alíquota de contribuição de 11%.

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saudável”, a manutenção do trabalho por um número maior de anos na ativa éuma alternativa a ser pensada. Isso pode ser atingido com o adiamento da idademínima à aposentadoria. Nos países da OCDE, cujas populações são maisenvelhecidas, foram empreendidas várias políticas voltadas para a redução dosdesincentivos para o trabalho e para o aumento da flexibilidade na decisão trabalho-aposentadoria. Acesso a trabalho em tempo parcial e desenvolvimento de arranjosde trabalho mais flexíveis são algumas das possibilidades já em prática (OECD,2006), o que de alguma forma foi contemplado nas duas últimas reformas, e comuma política de saúde ocupacional para reduzir as aposentadorias por invalidez.

A inserção crescente das mulheres nas atividades econômicas fará com que,num futuro próximo, mais mulheres passem a receber o benefício devido ao seutrabalho/contribuição. Isso pode resultar, de um lado, no crescimento da proporçãode mulheres recebendo duplo benefício. Por outro, as mudanças nos arranjos fa-miliares, especialmente na nupcialidade (separações), e essa maior inserção nomercado de trabalho podem resultar numa redução da demanda por pensões pormorte. Isso tudo aliado à queda da fecundidade, ou melhor, da maternidade, im-plica repensar a estruturação dos sistemas de previdência social. É algo que requeruma reflexão sobre as formas (tempo, alíquota) de contribuição, os tradicionaisbenefícios (duplo ou não), o valor das pensões por morte (igual ao benefício docônjuge ou não) e sua readaptação à nova realidade das famílias com mais de umprovedor, das mulheres que, mesmo casadas, não têm filhos etc. Não se podedeixar de considerar que o novo papel da mulher implica a redução da sua dispo-nibilidade para o cuidado dos membros vulneráveis e dependentes das famílias(crianças, idosos e portadores de deficiências), o que gerará demandas por novaspolíticas públicas.

Em síntese, não se pode ignorar que a demanda por benefícios da seguridadesocial, sejam contributivos ou não, tende a crescer no médio prazo e, na ausênciade mudanças, acentuará o desequilíbrio financeiro da previdência social,inviabilizando o seu atendimento. Por outro lado, não parece existir uma soluçãosimples, fácil e sem custos para essa questão. Tal solução deverá ser uma decisãopolítica que leve em conta as prioridades da sociedade, bem como os resultadosnão esperados da ampliação da cobertura da seguridade social pela Constituiçãode 1988 na redução da pobreza dos idosos e de suas famílias.26 O que se espera éque a prioridade seja dada ao bem-estar da população como um todo. E que agrande conquista social, que é o envelhecimento populacional, não traga embutidaa sua falência.

26. Para o assunto, ver Delgado e Cardoso (1999; 2004), Barros, Mendonça e Santos (1999), Beltrão, Camarano e Mello (2005) eCamarano (2004).

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135DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

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136 ANA AMÉLIA CAMARANO – SOLANGE KANSO

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APÊNDICE

TABELA A.1

Taxas de crescimento da população idosa brasileira projetada eliminando as causas demorte consideradas evitáveis por sexo

Período Homens Mulheres Total

2000-2005 3,06 3,35 3,22

2005-2010 3,75 3,79 3,78

2010-2015 4,03 4,08 4,06

2015-2020 4,24 4,22 4,23

2020-2025 4,25 4,20 4,22

2025-2030 3,95 3,92 3,93

Fontes: IBGE/Censo Demográfico de 1970 a 2000 e Ministério da Saúde/SIM.

Elaboração: Ipea.

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137DINÂMICA DA POPULAÇÃO BRASILEIRA E IMPLICAÇÕES PARA A PREVIDÊNCIA SOCIAL

TABELA A.2

População brasileira por idade e sexo

2000 2005 2010 2015 2020 2025 2030

Homens

55-59 2.585.244 3.210.020 3.796.789 4.495.411 5.155.044 5.456.540 5.797.951

60-64 2.153.209 2.363.061 2.939.174 1.242.381 4.158.749 4.789.462 5.090.228

65-69 1.639.325 1.891.844 2.085.621 2.614.881 3.132.045 3.749.488 4.342.273

70-74 1.229.329 1.360.309 1.585.929 1.766.547 2.236.904 2.701.986 3.258.978

75-79 780.571 935.783 1.052.965 1.242.381 1.399.730 1.791.120 2.183.668

80 e + 731.350 1.028.619 1.387.199 1.736.383 2.136.062 2.554.375 3.161.694

60 e + 6.533.784 7.579.616 9.050.888 10.855.647 13.063.489 15.586.430 18.036.842

65 e + 4.380.575 5.216.556 6.111.714 7.360.192 8.904.740 10.796.968 12.946.614

Mulheres

55-59 2.859.471 3.522.825 4.262.460 5.080.141 5.868.987 6.220.008 6.599.509

60-64 2.447.720 2.712.788 3.355.528 4.074.228 4.871.753 5.646.903 6.001.700

65-69 1.941.781 2.262.101 2.521.555 3.136.544 3.827.909 4.588.131 5.340.229

70-74 1.512.973 1.724.442 2.028.868 2.280.150 2.858.250 3.487.988 4.208.212

75-79 999.016 1.276.306 1.494.603 1.774.236 2.009.934 2.514.870 3.094.462

80 e + 1.100.755 1.483.689 1.984.125 2.520.124 3.135.227 3.784.723 4.669.658

60 e + 8.002.245 9.459.326 11.384.679 13.785.282 16.703.073 20.022.615 23.314.260

65 e + 5.554.525 6.746.538 8.029.151 9.711.054 11.831.320 14.375.712 17.312.560

Total

55-59 5.444.715 6.732.844 8.059.249 9.575.552 11.024.030 11.676.549 12.397.459

60-64 4.600.929 5.075.849 6.294.702 7.569.682 9.030.502 10.436.365 11.091.929

65-69 3.581.106 4.153.944 4.607.176 5.751.425 6.959.954 8.337.618 9.682.502

70-74 2.742.302 3.084.751 3.614.797 4.046.698 5.095.154 6.189.974 7.467.190

75-79 1.779.587 2.212.090 2.547.568 3.016.617 3.409.663 4.305.990 5.278.130

80 e + 1.832.105 2.512.309 3.371.324 4.256.507 5.271.289 6.339.098 7.831.351

60 e + 14.536.029 17.038.943 20.435.566 24.640.929 29.766.562 35.609.045 41.351.102

65 e + 9.935.100 11.963.094 14.140.864 17.071.246 20.736.060 25.172,680 30.259.173

Fontes: IBGE/Censo Demográfico de 1970 a 2000 e Ministério da Saúde/SIM.

Elaboração: Ipea.

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