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Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Gestão do Território, Área de especialização em Ambiente e Recursos Naturais, realizada sobre a orientação científica do Professor Doutor José Eduardo Ventura.

Dissertação apresentada para cumprimento dos … - Aquecimento global... · Apesar de o aumento de temperatura ser superior nos continentes do que nos oceanos, ... Também os glaciares

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Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do

grau de Mestre em Gestão do Território, Área de especialização em Ambiente e

Recursos Naturais, realizada sobre a orientação científica do Professor Doutor José

Eduardo Ventura.

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Declaro que esta Dissertação é o resultado da minha investigação pessoal e

independente. O seu conteúdo é original e todas as fontes consultadas estão

devidamente mencionadas no texto, nas notas e na bibliografia.

A candidata,

Lisboa, 12 de Outubro de 2012

Declaro que esta Dissertação se encontra em condições de ser apresentada a provas

públicas.

O Orientador,

Lisboa, 12 de Outubro de 2012

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Para os meus pais.

Para os meus avós.

Para a minha família.

Para o Zeus e para a Nala.

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Agradecimentos

Gostaria de agradecer em primeiro lugar ao Professor Doutor José Eduardo

Ventura por ter aceitado ser meu Orientador e me ter guiado por estes caminhos das

alterações climáticas onde inicialmente era uma mera curiosa. Desde as aulas de

Ambiente e Mudança Globais que me despertaram para a problemática das alterações

climáticas em Portugal, que desconhecia por completo até às conversas meramente

informais que aguçaram o meu interesse pela investigação na área do Ambiente.

Seguidamente à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (UNL), especialmente

ao departamento de Geografia e Planeamento Regional, que tão bem me receberam

me abriram os horizontes para uma área de conhecimento completamente novo.

Obrigado ao André Cunha pela ajuda fundamental que foi para a realização

desta dissertação e por se ter tornado o recurso primordial em qualquer dúvida.

Agradeço também a toda a minha família e amigos que de um modo ou outro

me moldaram naquilo que sou hoje.

Finalmente um grande obrigada aos meus pais por todo o apoio, compreensão

e incentivo à realização da dissertação em especial mas também de todo o percurso

académico.

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AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS NUMA PERSPETIVA DE AMEAÇA À SEGURANÇA

NACIONAL

Mariana C. Santos

Resumo

As alterações climáticas, mais conhecidas como “aquecimento global”, são o

fenómeno que irá influenciar de forma determinante o século XXI. A forma como

afecta as necessidades mais elementares do ser humano (água e alimento) será um

desafio para a nossa capacidade de existir em sociedade, onde os Estados

desempenharão um papel fundamental. Para além dos desafios que as alterações

climáticas nos colocam, enquanto indivíduos entre indivíduos, representam também

ameaças para os componentes basilares do Estado e para os objetivos para os quais

ele foi criado. Destes destaca-se a segurança sendo que esta não se resume

simplesmente às ameaças militares externas, como é tradicionalmente considerada. As

novas áreas da segurança que surgiram nos últimos anos como a segurança alimentar,

a segurança energética, entre outros vêm, no fundo, reavivar conceitos que foram

determinantes para o nascimento, crescimento e queda de civilizações na antiguidade.

Em Portugal as principais vulnerabilidades (aumento de temperatura e diminuição da

precipitação) vêm agravar características do clima português e colocar maior pressão

sobre o sector primário, base de qualquer Estado.

Palavras-chave: Alterações Climáticas; Segurança Ambiental; Segurança Nacional;

Ameaças Ambientais em Portugal.

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CLIMATE CHANGE AS A NATIONAL SECURITY THREAT

Mariana C. Santos

Abstract

Climate Change, commonly known as “global warming”, is the phenomenon that will

influence in the most significant way the 21st Century. The manner in which it affects

the most basic needs of the human being — namely drinking water and food — will be

a challenge for our capacity to exist as civilized societies, thus giving the State a

fundamental role due to its responsibility to protect its territorial integrity and

population. This means that “security” will increasingly become a concept that goes

beyond traditional conceptions of military might as the residues provoked by

environmental vulnerabilities overspill to basic concerns of the State. This is already

being acknowledged with the development of security concepts that, while being new

in the security lexicon, translate old threats that challenged and ultimately ended

preceding civilizations. In Portugal, its major environmental challenges—namely

temperature warming and diminishing rainfall—do nothing short of harming the

Portuguese climatic characteristics while putting pressure on the primary sector,

without which the State will become increasingly dependent on the outside to fulfill its

most basic needs.

Key-words: Climate Change; Environmental Security; National Security; Environmental

Threats in Portugal

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Índice de figures

Figura 1………………………………………………………………………………………………………………………..2

Figura 2………………………………………………………………………………………………………………………..3

Figura 3…………………………………………………………………………………………………………………………………..12

Figura 4…………………………………………………………………………………………………………………………………..17

Figura 5…………………………………………………………………………………………………………………………………..25

Figura 6…………………………………………………………………………………………………………………………………..32

Figura 7…………………………………………………………………………………………………………………………………..35

Figura 8………………………………………………………………………………………………………………………………..…83

Figura 9………………………………………………………………………………………………………………………………..…84

Figura 10…………………………………………………………………………………………………………………………………87

Figura 11…………………………………………………………………………………………………………………………………88

Figura 12………………………………………………………………………………………………………………………………..91

Figura 13………………………………………………………………………………………………………………………………..93

Figura 14……………………………………………………………………………………………………………………………..…98

Figura 15……………………………………………………………………………………………………………………………..…99

Quadro 1……………………………………………………………………………………………………………………………….….8

Quadro 2……………………………………………………………………………………………………………………………..……9

Quadro 3………………………………………………………………………………………………………………………………..89

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Índice

Agradecimentos

Resumo

Abstract

I - Introdução e Metodologia…………………………………………………………………………………….1

I.1 - Enquadramento metodológico, Pergunta de Partida e Hipóteses de Pesquisa………6

I.2 – Metodologia…………………………………………………………………………………………………………8

I-3 - Descrição dos Capítulos………………………………………………………………………………………21

Capítulo II - Alterações Climáticas e Aquecimento Global……………………………………..22

II.1 – O aquecimento global……………………………………………………………………………………….22

II.2 – As Alterações Climáticas do Passado…………………………………………………………………29

II.2.1 – Os Últimos 100 anos……………………………………………………………………………………….35

II.3 - Projeções para o século XXI………………………………………………………………………………..42

II.3.1 – Projeções para a Europa do século XXI……………………………………………………………49

II.3.2 – Projeções para o Portugal do século XXI…………………………………………………………52

II.4 – Impactos, Vulnerabilidade, Adaptação e Mitigação…………………………………………..55

II.4.1 – Impactos Económicos……………………………………………………………………………………..60

II.4.2 – Impactos Económicos na Europa…………………………………………………………………….65

Capítulo III – Segurança Nacional e Segurança Ambiental…………………….………………..67

III.1 – Segurança Nacional…………………………………………………………………………………………..67

III.2 – Segurança Ambiental………………………………………………………………………………………..75

Capítulo IV – Das vulnerabilidades às Ameaças: aplicação prática………………………….79

IV.1 – Aumento da temperatura média………………………………………………………………………81

IV.2 – Diminuição da precipitação média……………………………………………………………………86

Conclusão……………………………………………………………………………………………………………….94

Bibliografia…………………………………………………………………………………………………………102

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I - Introdução e Metodologia

A evolução e desenvolvimento do ser humano encontra-se intimamente

relacionada com o clima que o rodeia. Se, em certos períodos da História, as condições

climáticas favoreceram o desenvolvimento de sociedades, noutros períodos menos

favoráveis originaram a escalada de conflitos e, inclusive, a queda de civilizações

(Fagan, 2007).

É neste sentido que surgiu uma preocupação crescente com as recentes

alterações climáticas, ainda que pouco significativas, mas com a probabilidade de um

agravamento com implicações dramáticas para o Planeta e as sociedades humanas

durante o século XXI.

As últimas décadas do século XX e os primeiros anos do século XXI têm-se

revelado anormalmente quentes. Desde o início dos registos da temperatura,

aproximadamente há 150 anos, que não se observavam anos com temperaturas

médias globais tão elevadas. De facto, os 13 anos mais quentes ocorreram todos nos

últimos 15 anos, entre 1997 e 2011. Com uma temperatura média do planeta de 14°C

(calculada na análise do período 1961-1990), a década entre 2002-2011 registou o

maior aumento observado na temperatura média global (0.46°C) o que equivale a

2001-2010 como sendo o período de 10 anos com a temperatura média mais elevada

alguma vez registada (Houghton, 2011)8.

Para o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (ou

Intergovernmental Painel for Climate Change – IPCC), corpo científico criado para

investigar e avaliar as alterações climáticas de forma a providenciar um conhecimento

claro sobre a matéria e suporte científico à criação de medidas políticas, é

«inequívoco» o facto de o sistema climático mundial estar a aquecer devido à

observação do aumento da temperatura média global da atmosfera e dos oceanos, do

degelo e do aumento médio global do nível dos oceanos (Pachuri e Reisinger, 2007).

Apesar de o aumento de temperatura ser superior nos continentes do que nos

oceanos, observações indicam que estes têm vindo a absorver 80% do calor

adicionado ao sistema climático, tendo o nível médio dos oceanos subido a uma média

8 Para mais sobre este assunto ver World Meteorological Organization (WMO) (2011), Provisional

Statement on the Status of the Global Climate, disponível em: http://www.wmo.int/pages/mediacentre/press_releases/gcs_2011_en.html

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de 1.8mm por ano entre 1961-2003 e 3.1mm por ano quando analisado apenas o

período 1993-2003 (Pachuri e Reisinger, 2007). O aumento da temperatura nos

oceanos provoca a sua expansão térmica, ou seja uma menor densidade e

consequentemente um maior volume, o que tem contribuído para 57% do aumento do

nível dos oceanos, desde 1993. A diminuição dos glaciares e do gelo acumulado no

topo das montanhas contribui em cerca de 28%, sendo que o restante advém das

perdas de gelo nos pólos. De facto, desde 1978 que o Ártico tem vindo a perder cerca

de 2.7% da sua área, por década, uma vez que a temperatura na região tem vindo a

aumentar a um ritmo superior (dobro) à média global. Também os glaciares e zonas

cobertas com neve têm vindo a diminuir por todo o planeta (Pachuri e Reisinger,

2007).

O final do século XX e início do século XXI foi também palco de eventos

climáticos extremos mais frequentes e intensos, que, de acordo com o IPCC,

encontram-se diretamente relacionados com o aumento médio das temperaturas

(Figura 1). Estes fenómenos extremos, quando afetam as sociedades humanas, podem

acarretar um elevado grau de destruição com custos para as instituições existentes e,

por vezes com a perda de vidas humanas.

Figura 1 – Número de catástrofes naturais 1980-2011

Fonte: Munich RE (2012), Topics Geo: Natural Catastrophes

2011, Analyses, Assessments, Positions, disponível em:

http://www.munichre.com/publications/302-07225_en.pdf

Eventos Geofísicos:

Terramoto, Erupção

vulcânica;

Eventos Meteorológicos:

Tempestades tropicais,

tempestades de Inverno,

granizo, tornado, tempestade

local;

Eventos Hidrológicos:

Tempestade, cheias,

inundações repentinas,

deslizamento de terras;

Eventos Climatológicos:

Ondas de calor, ondas de frio,

incêndios, secas (tradução da

autora)

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Na realidade, as companhias de seguros estão cada vez mais alertas para esta

situação. As despesas crescentes com catástrofes relacionadas com o clima têm vindo

a levar as companhias ao limite à medida que diminuem os lucros, podendo mesmo

levar à falência, e/ou vêm o seu rating cortado (Brown, 2006). As perdas globais

devido a catástrofes registaram o valor mais elevado em 2011, ao atingirem 380 mil

milhões de dólares. Também as perdas seguradas atingiram o recorde de 105 mil

milhões de dólares, no mesmo ano (Figura 2). Ainda de acordo com a Swiss Re estas

perdas podem facilmente chegar aos 19% do PIB de alguns países em 2030 e fazer

retroceder anos de desenvolvimento, se não forem realizados investimentos em

medidas de adaptação e mitigação9.

Figura 2 – Perdas globais e perdas seguradas 1980-2011 (mil milhões de dólares)

Fonte: Munich RE (2012), Topics Geo: Natural Catastrophes 2011, Analyses, Assessments, Positions,

disponível em: http://www.munichre.com/publications/302-07225_en.pdf

O furacão Andrew, em 1992, foi uma chamada de atenção para esta

possibilidade, quando os custos da destruição de bens segurados ultrapassaram a

fasquia dos 20 biliões de dólares. Nos anos seguintes, vários furacões atingiram a

região do Golfo do México com estragos cada vez mais avultados, tendo sido o Katrina,

que atingiu Nova Orleães em 2005, o mais destruidor. Apesar de considerado um

furacão de Categoria 5, enfraqueceu para Categoria 3 quando atingiu a costa,

provocando uma tempestade com ondas que atingiram os 5m de altura, que destruiu

9 Swiss RE (2010), Weathering climate change, disponível em:

http://www.swissre.com/rethinking/climate/Weathering_climate_change.html

Perdas globais

Perdas seguradas

---- Tendência: perdas

globais

__ Tendência: perdas

seguradas (tradução da

autora)

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algumas barreiras de proteção, inundando 70%-80% da cidade. Mais de 1000 pessoas

morreram e os custos com bens segurados ascenderam aos 40 biliões de dólares, com

um total de perdas económicas estimado em mais de 100 biliões de dólares, ou seja,

aproximadamente 1% do PIB norte-americano. Foi também em 2005 que se bateram

os recordes nos EUA do maior número de furacões (13), do mais forte (Wilma) assim

como dos custos económicos e financeiros mais elevados na ordem dos 200 biliões de

dólares (Houghton, 2011).

As companhias que calculam os prémios dos seguros com base em dados

históricos passados, têm vindo a constatar, cada vez mais, que o passado já não é um

guia fiável para o futuro, investindo massivamente em estudos de projeções climáticas

(Brown, 2006).

Para além da região do Golfo do México, também a Europa tem vindo a ser

assolada por tempestades de vento ciclónicas cada vez mais destruidoras. Apesar de

serem comuns as baixas pressões no Atlântico Norte, onde se formam, a sua

capacidade de destruição tem vindo a aumentar, demonstrando a vulnerabilidade

destas regiões. As tempestades de vento na Europa atingem sobretudo a região

noroeste, ou seja a Irlanda e as Ilhas Britânicas, deslocando-se depois ao longo do Mar

Báltico e atingindo também a costa da Escandinávia. Noutras ocasiões, é também

frequente as tempestades passarem mais a sul e atingirem a França, os Países Baixos e

a Alemanha. As tempestades de vento têm vindo a ganhar relevância uma vez que

atualmente representam aproximadamente 80% de todas as perdas cobertas por

seguros na região noroeste da Europa e, em termos globais, as perdas apenas são

superadas pelas que se encontram relacionadas com a época de ciclones nos EUA. De

facto, estudos sugerem que, se as três maiores tempestades de vento ocorridas em

1999 – Anatol, Lothar e Martin – ocorressem actualmente, os custos relativamente aos

bens segurados rondariam os 10 biliões de euros (Munich Re, 2002; Swiss Re, 2000),

um valor que vai deixando de ser sustentável à medida que o período de retorno

diminui.

As alterações climáticas são, assim, um alerta para as sociedades actuais uma

vez que põem em causa a dimensão dos fenómenos climáticos extremos e o seu

período de retorno. Para além da perda de vidas humanas surge a questão da

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sustentabilidade das sociedades economicamente desenvolvidas quando estes

fenómenos, altamente destrutivos, possuem um menor período de retorno.

Fenómenos extremos como os tornados ou as tempestades de vento são

frequentemente agravados por precipitação intensa, que pode originar cheias e/ou

inundações. Por outro lado são também mais frequentes inundações derivadas de

tempestades com precipitação intensa acompanhada de storm surge, bem como uma

maior instabilidade nos períodos de monção. Estas situações têm sido responsáveis

por cheias frequentes nas regiões que dependem fortemente desde ciclo para a

produção agrícola, como a Índia e o Bangladesh (Lynnas, 2008).

Outro fenómeno que tem vindo a ocorrer com mais frequência e também se

encontra directamente relacionado com o aumento generalizado das temperaturas

são as ondas de calor. Estas são particularmente danosas para a vida humana,

nomeadamente para os grupos populacionais de risco (García-Herrera et al., 2010).

O aumento da frequência de fenómenos climáticos bem como de todas as

alterações originárias do aquecimento global são assim uma preocupação que não

pode ser ignorada independentemente de nos referirmos a países desenvolvidos ou

em vias de desenvolvimento. Se por um lado os países menos desenvolvidos possuem

menor capacidade de adaptação, por outro lado os danos nos países desenvolvidos

são superiores (Pittock, 2007). É esta capacidade de gerar elevados impactos

económicos e conflitos provenientes de um agravar da escassez de recursos (muitos

que já se encontram extremamente explorados e à beira do ponto de rutura) que tem

sido advogada pela maioria dos especialistas nas alterações climáticas para rotular o

fenómeno como um problema de segurança ambiental (Myers, 1994; Brown, 2006).

Além disso a securitização da temática possibilita a implementação de medidas de

adaptação e de mitigação que exigem um elevado financiamento bem como uma

mudança na estrutura económica das sociedades (sobretudo na mitigação) e que por

isso provocam resistência na classe política e nos demais sectores económicos

afetados (Stern, 2007; Helm and Hepburn, 2011).

É nesta lógica que analisamos o caso português desde as projeções e impactos

esperados, passando pela problemática da securitização até às consequências diretas

para o país e a segurança nacional.

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I.1 - Enquadramento metodológico, Pergunta de Partida e Hipóteses de

Pesquisa

A presente dissertação insere-se em dois campos de estudo distintos mas que

se integram perfeitamente e que fizeram parte da nossa formação. Desde logo a

Licenciatura em Ciência Política, no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas

(ISCSP) e, posteriormente, o Mestrado em Gestão do Território, na especialidade de

Ambiente e Recursos Naturais, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da

Universidade Nova de Lisboa.

Ainda que a paixão pelas questões ambientais esteja presente desde tenra

idade, o percurso académico acabou por desenvolver e aprofundar outra grande área

de interesse que é a Ciência Política. O desenvolvimento do presente projeto, na altura

ainda não concebido como tal, iniciou-se ainda nos primeiros anos de licenciatura,

mais especificamente com as disciplinas de Dinâmica das Civilizações e Geopolítica,

onde a importância dos recursos foi explanada claramente como objeto fundamental

no nascimento, desenvolvimento e queda das civilizações. O nosso grande interesse

pelo Ambiente levou-nos, sempre que possível, a manter-nos informados sobre

questões da área, nomeadamente e mais recentemente pelas alterações climáticas,

ainda que o conhecimento possuído apenas permitisse um vislumbre um tanto

simplista do problema do aquecimento global. Ainda assim, e quando no término da

licenciatura mas principalmente durante a frequência das aulas da disciplina de

Ambiente e Mudanças Globais, na parte letiva do mestrado, foi possível perceber a

real dimensão da problemática das alterações climáticas, surgiu-nos frequentemente a

questão, que acabou por se tornar a pergunta de partida: Se o clima vai mudar

radicalmente nos próximos 100 anos, afetando gravemente os recursos que dispomos, numa

sociedade cada vez mais consumista, como é que os líderes mundiais, especialmente dos

países desenvolvidos ainda não despertaram para a completa dimensão do problema, que

pode ser uma ameaça existencial à civilização ocidental como a conhecemos? Foi na

tentativa de dar resposta a esta questão que esta dissertação foi desenvolvida.

Devido à dimensão do problema e à diversidade de impactos que varia de

região para região, fazia todo o sentido centrarmo-nos em Portugal. Não só é a nossa

casa mas as alterações climáticas acabarão por afetar o dia-a-dia de todos nós e a

forma como nos relacionamos e estamos em sociedade. Além disso também o

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Mediterrâneo será uma das regiões mais afetadas pelas alterações climáticas, o que

implica necessariamente uma mudança acentuada no clima português e,

consequentemente, nas mais diversas atividades económicas e sociais.

Além dos motivos apresentados, outro estímulo adicional à realização desta

dissertação de Mestrado foi a ausência de trabalhos portugueses sobre Portugal, nesta

área. Com efeito, as pesquisas efetuadas sobre segurança ambiental e conflitos daí

derivados não foram muito além de publicações do Professor Doutor Viriato

Soromenho Marques e do Professor Doutor Luís Veiga da Cunha, que não refletem

aquilo que se pretende retratar com a presente dissertação. Enquanto o Professor

Viriato Soromenho Marques realiza uma abordagem mais teórica-conceptual do termo

segurança ambiental, o Professor Luís Veiga da Cunha reflete sobre o surgimento de

conflitos, nomeadamente sobre a água que é a sua área de especialização, que em

Portugal se traduz nos conflitos resultantes da partilha das bacias hidrográficas luso-

espanholas. No entanto os problemas derivados das alterações climáticas em Portugal

vão muito além da partilha das bacias hidrográficas, podendo originar conflitos sociais

também internos, pelo que a perspetiva sobre as alterações climáticas é de que estas

são uma ameaça à segurança nacional.

Assim, da pergunta de partida ainda algo vaga, nascem duas hipóteses de

pesquisa, específicas a Portugal, sendo que a confirmação da segunda depende

necessariamente da confirmação da primeira hipótese:

H.1 – As alterações climáticas terão um impacto profundo no clima português

H.2 - Portugal securitizou as alterações climáticas.

A linha de raciocínio seguida ao longo da dissertação para confirmar/rejeitar as

hipóteses é descrita seguidamente.

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I.2 - Metodologia

Na área das Relações Internacionais, os estudos de segurança podem centrar-

se em cinco níveis de análise diferentes, consoante a escala espacial da aplicação do

estudo (Buzan et al., 1998:5). O nível mais abrangente é o sistémico, seguido pelo

subsistémico, o das unidades políticas, o das subunidades e por fim o nível do

indivíduo (ver Quadro 1).

Quadro 1 - Níveis espaciais de análise nas Relações Internacionais

Níveis Espaciais Exemplos

Sistemas Internacionais Sistema Económico, Sistema Alimentar, Sistema Financeiro, entre outros. Cada um deles pode ser analisado saparadamente mas estão todos relacionados.

Subsistemas Internacionais Um bom exemplo é providenciado por regiões que possuem uma dinâmica social distinta. O critério pode ser geográfico (Europa) ou político (União Europeia).

Unidades Políticas Estados, Nações, Religiões organizadas, etc.

Subunidades Partidos Políticos, Grupos de Pressão, Grupos de Interesse, etc.

Fonte: Buzan et.al. (1998:36), adaptado pela autora

Quanto mais elevado o nível espacial no qual localizamos a nossa análise

tendencialmente maior será a sua abrangência mas menor será a sua profundidade no

que à captação de interações sociais diz respeito. Por exemplo, compreender as

prioridades e dinâmicas de segurança do Norte pouco ou nada nos diz sobre a

estratégia de Segurança Nacional de países específicos como Portugal ou a França.

O nível subsistémico surge precisamente para combater esta ineficácia

analítica, concentrando-se numa secção do sistema de modo a conseguir captar um

maior número de interações sociais entre unidades políticas. Este nível tende a

prender-se com interações que não saem duma determina delimitação regional

previamente definida, sejam elas económicas, ambientais e/ou políticas. Interações

entre Estados-membro da NATO ou da UE cabem nesta categoria.

O terceiro nível da análise prende-se com o exame das prioridades, princípios

e/ou comportamento de uma única unidade política, ou então com o estudo das suas

interações com um número restrito de outras unidades. Exemplificando, um estudo

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geopolítico sobre as prioridades securitárias da Alemanha localizar-se-ia claramente

neste nível. Extrapolações consequentes sobre as relações da Alemanha com a Polónia

ou com a Rússia também. Aqui é importante notar que a unidade política tende

preferencialmente a ser o Estado, mas que também pode ser a Religião, a Nação ou

outros coletivos com vocação política (Lara, 2010). De outro modo seria impossível

analisar em Relações Internacionais e Ciência Política a dinâmica entre os curdos e a

Turquia, ou os muçulmanos de etnia uyghur de Xinjiang e a China 10.

Sendo certo que mesmo dentro do Estado ocorrem interações sociais com

capacidade para influenciar ou até mesmo determinar os comportamentos daquele na

esfera internacional, surgiu como ótica relevante para os estudos em Ciência Política e

em Relações Internacionais o nível analítico da subunidade, que se prende com

instâncias inferiores à unidade política mas cujas interações enformam as prioridades

desta. Exemplos de subunidades políticas dentro de um Estado com sistema político

democrático variam de modo considerável, podendo ir de burocracias governamentais

a partidos e grupos de pressão.

Para uma melhor contextualização do conceito da segurança ambiental é

necessário perceber a dinâmica e evolução do conceito de segurança e quais as

principais teorias por detrás

Definimos o conceito de segurança como a gestão estratégica de ameaças

existenciais para a unidade política por um ator securitário (ver Quadro 2).

Quadro 2 - Atores e Objetos referentes: a contribuição dos Estudos Construtivistas Radicais

para os Estudos de Segurança

Descrição

Atores Securitários Atores que tentam securitizar ameaças existenciais percetíveis, ou objetos referes, normalmente através do discurso político

Atores Funcionais Atores que, de uma forma positiva ou negativa, afetam a dinâmica do setor, influenciando decisões na área da segurança.

Objetos Referentes O objeto que é existencialmente ameaçado e que portanto necessita de ser securitizado.

Fonte: Buzan et.al. (1998:36), adaptada pela autora.

10

Para mais sobre este assunto, ver David J. Singer (1961), “The Level of Analysis Problem in International Relations”, in World Politics, vol. 14, n. 1, disponível em http://sitemaker.umich.edu/jdsinger/files/the_level_of_analysis_problem_in_international_politics.pdf

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10

A dinâmica do conceito implica que este sofreu uma evolução nomeadamente

durante o século XX, em muito fruto do contexto histórico da época, do que é

segurança e do que é percecionado como ameaça.

Dos Estudos Tradicionais de Segurança (ETS) a corrente do realismo foi talvez a

que mais influenciou o conceito (Walts, 1979; Mearsheimer, 2007). Para esta corrente

o Estado é o focus central, o ator por excelência do sistema internacional, onde o

Governo é percecionado como um agente (subunidade) e onde a temática única e

central na relação entre os Estados é a procura e a manutenção de poder de modo a

maximizarem a sua segurança e probabilidade de sobrevivência. No contexto da

Guerra Fria, o sistema internacional é percecionado como anárquico (ausência de uma

força supranacional no sistema internacional capaz de conter os agentes individuais -

Estados) onde a manutenção da paz e da segurança se deve a um equilíbrio de poderes

entre os EUA e a URSS.

Nesta lógica, as relações internacionais são tendencialmente anárquicas,

centrando-se numa luta constante pelo domínio do poder e dissociadas de qualquer

princípio ético e moral a ameaça existencial por excelência é a militar. Um segundo

conjunto de realistas (neorrealistas) desenvolveram-se mais para o final do século,

com um conceito menos restrito e onde integram novos pressupostos à corrente,

entre os quais o exercício do poder económico para além do militar como forma de

manutenção da segurança própria (Baldwin, 1997; Barnett, 2007; Mearsheimer, 2007).

Também no final do século XX surgiram um conjunto de teorias críticas ao

modelo realista (Booth, 1991; Booth, 1994; Booth, 1995; Buzan 1991). Os Estudos

Críticos encontram-se neste novo conjunto de teorias que procuram alargar o conceito

de segurança.

Esta corrente deriva maioritariamente das ideias desenvolvidas pela escola de

pensamento marxista que vêm o sistema internacional integrado no sistema capitalista

que tem como objetivo da acumulação de capital, nomeadamente no que diz respeito

às relações de dependência assimétrica (Wallerstein, 2004). Neste sentido o focus

encontra-se nas interações económicas e nos aspetos materialistas onde os governos

funcionam como agentes. As ameaças são militares mas sobretudo económicas, que se

traduziram no período do colonialismo, com a exportação de recursos brutos para as

metrópoles e importação de bens manufaturados e serviços mais caros, e durante o

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11

neo-colonialismo (Lara, 2000; Lara, 2011) com as relações de dependência económica

que se perpetuaram quando as ex-colónias foram integradas no sistema capitalista

enquanto provedoras de matérias-primas baratas. Para a Escola Crítica, ambas as

formas de dependência se traduziam em enormes fragilidades organizacionais dos

Estados mais fracos, que deste modo ficavam presos num eterno ciclo de incapacidade

material e de soberania fragmentada que naturalmente se traduziria em debilidades

de Segurança (Ayoob, 1995).

Outro paradigma das Relações Internacionais para a análise de problemas de

segurança deriva dos Estudos Construtivistas (Buzan et al., 1998).

O construtivismo nas relações internacionais advoga que aspetos significantes

do sistema internacional são histórica e socialmente contingentes, ou seja, estes

aspetos, em qualquer que seja o nível de análise, existem porque os atores principais

insistem na sua perpetuação no tempo e no espaço que eles existem e não porque são

consequências inevitáveis da natureza humana ou características essenciais da política

mundial.

Neste sentido a anarquia é um conceito “construído socialmente” pelos

agentes do sistema internacional. Do mesmo modo, a segurança acaba também ela

por ser uma construção história por via da praxis social, pelo que de modo a não

comprometer a sua objetividade científica o analista em estudos de segurança procura

não identificar as ameaças, só as perceções dos atores securitários.

Finalmente o paradigma da Segurança Humana, surgido no pós-Guerra Fria,

define o conceito mais abrangente de segurança, devendo esta centrar-se no último

nível de análise espacial, o do individuo. Em 1994, o relatório do Desenvolvimento

Humano realizado pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (UNDP,

1994) alargou o conceito de segurança global, passando este a integrar sete áreas

diferentes (segurança económica, alimentar, de saúde, da comunidade, pessoal e

política) e ambiental. Ainda assim existe um intenso debate dentro da Segurança

Humana entre uma visão mais abrangente vs restrita do conceito (MacFarlane e

Khong, 2006; Human Security Unit, 2009; Owen, 2004; Owen, 2005), para além de

bastantes problemas do ponto de vista metodológico, entre os quais a constante

dispersão do tema central para temas não relacionados com Segurança per si (Cunha,

2012).

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12

Figura 3. Enquadramento da dissertação

Figura da autora

Como mostra a Figura 1, a segurança ambiental como propomos estudá-la não

encaixa no sentido mais restrito da segurança, uma vez que este é estritamente militar

(Walt, 1991; Chipman, 1992), e também não a inserimos na segurança humana, que

devido ao seu grau de abrangência sectorial dificultaria a aferição da nossa hipótese

sem com isso acrescentar pertinência analítica ou rigor conceptual. Devido ao facto de

os grupos não serem estanques e todo este processo possuir uma dinâmica própria o

presente estudo utiliza características quer dos estudos críticos quer dos

construtivistas.

Ao nível da segurança internacional, o conceito de securitização, desenvolvido

pela Escola de Copenhaga, é aceite maioritariamente como conceito “conciliador”

entre os construtivistas e o realismo clássico. Ao invés de se focar somente nas

capacidade material dos atores, com particular destaque para o poderio militar, os

Estudos construtivistas defendem que o processo de securitização é um processo

dinâmico e faseado, durante um qual um ator securitário procura elevar por via

argumentativa ou pela força um determinado objeto de referência a problema de

segurança, que por isso deve ser defendido independentemente das normas que

regulam as relações dentro duma comunidade política.

Um dos exemplos mais claros deste processo foi a questão do 11 de Setembro,

que, em nome da segurança nacional e porque a questão do terrorismo foi altamente

Restrita Abrangente

Segurança

Humana

Estudos

Construtivistas

Estudos

Críticos

Realismo

Dissertação

SEGURANÇA

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securitizada, tomaram-se medidas extraordinárias, tanto nos EUA como na Europa,

que para muitos violam (excessivamente) as liberdades individuais.

A nosso ver, a segurança ambiental é uma questão de segurança nacional, uma

vez que as catástrofes naturais têm suficiente potencial destrutivo ou pelo menos

interruptivo para ameaçar a capacidade organizacional do Estado e, até, em último

caso, a sua soberania na zona afetada (Myers, 1993), para além de pôr em causa a

subsistência ou até mesmo a existência da população atingida, sendo que a população

é um dos elementos estruturante do próprio Estado (Moreira, 1963; Moreira, 1993).

Contudo, a Segurança Ambiental não tem vindo a ser consensualmente

reconhecida como um problema de segurança nacional, tanto na política interna como

externa (Deudney, 1990).

A existência de constantes alertas por parte de organizações científicas

credibilizadas (IPCC, 2007) das graves consequências para a condição humana de

ameaças à segurança ambiental a curto/médio/longo prazo, não possui

correspondência pelas entidades governamentais (na maioria dos casos) na aplicação

de medidas de mitigação e/ou de adaptação.

A temática já entrou na agenda política de diversos países e de organizações

internacionais como a ONU ou o Banco Mundial, sendo que os grupos (Greenpeace

por exemplo) (Buzan et al., 1998) que alertam para este problema advogam a

securitização do tema pois só desta forma é possível que as questões ambientais

ultrapassarem o debate criativo mas que peca pela morosidade na implementação de

medidas concretas e que ocorre na sociedade (Barnett, 2001).

No entanto existem vários problemas que não têm permitido a securitização da

segurança ambiental. A securitização ocorre, na maioria das vezes, como reação a uma

catástrofe. Muitas vezes e tirando ameaças convencionais à segurança, a atuação dos

Estados é uma reação a um evento dramático (Buzan et al., 1998).

O mesmo tem vindo a suceder com outras ameaças não-convencionais, que

não envolvem uma tensão armada entre dois ou mais Estados, ou dentro de um único

Estado. Até ao 11 de Setembro o terrorismo era considerado um problema de

segurança distante e localizado, com características semelhantes às do crime

organizado. A atual dimensão internacional só foi alcançada depois da catástrofe.

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Relativamente à segurança ambiental a mesma traduz-se num conjunto de

ameaças ambientais, distintas umas das outras e com manifestações diferentes

consoante a região geográfica, o que não só torna a agenda de segurança um pouco

dispersa como também, do ponto de vista metodológico, bastante complexa, porque o

ator securitário, para um determinado objeto de referência, pode ser uma fonte de

ameaça noutro. Tomemos como exemplo o caso do Japão: se o mesmo tem sido um

aliado no combate às alterações climáticas, com a assinatura do Protocolo de Quioto,

tem, por outro lado, sido um ator ativo no entrave à redução/eliminação da caça à

baleia (ainda que não ponha em causa o Estado e portanto seja um problema de

política, demonstra uma posição contraditória dentro dos problemas ambientais)

(Buzan and Weaver, 2003).

Outro problema que dificulta a securitização da segurança ambiental é a forma

como os problemas ambientais se formam e se manifestam, encontrando-se

associados à necessidade de uma catástrofe para que a temática seja securitizada.

Uma vez que alguns problemas ambientais vão-se formando lentamente (creeping

disaster) é difícil identificar quando começam e quando terminam, pelo que muitas

vezes só existe uma chamada de atenção para o problema quando já se atingiu o

ponto de não-retorno. A seca é por natureza um creeping disaster sendo difícil

monitorizar o progresso e quantificar os impactos11.

Desta forma definimos segurança ambiental como as ameaças existenciais que

provêm de catástrofes ambientais relacionadas com a (in)ação humana (Burton, 1993).

Sendo que aqui destacamos aquelas que põem em perigo a soberania do Estado, i.e., o

controlo administrativo dum território e duma população por um poder político

(Moreira, 1963).

Falamos de ameaças e não de vulnerabilidade devido sobretudo à

especificidade do primeiro conceito. Enquanto as ameaças, especificas à área da

Segurança, definem todos os fenómenos, internos ou externos, que põem em causa a

existência de uma determinada unidade política, a vulnerabilidade que se iniciou na

escola das catástrofes naturais e da segurança alimentar, segundo Adger (1999), é

11

Para mais informação sobre a seca enquanto um creeping disaster consultar: NASA, Drought: The creeping disaster, disponível em: http://earthobservatory.nasa.gov/Features/DroughtFacts/ e NOAA (2001), Drought: The creeping disaster, disponível em: http://www.noaanews.noaa.gov/stories/s600b.htm.

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transversal a todas as sociedades, sendo uma característica civilizacional, podendo

estar mais ou menos agravada consoante um conjunto de variáveis. De facto «there is

now fundamental evidence that vulnerability is a fundamental characteristic of all

human systems and that an external stress such as an extreme weather event exposes

rather than causes vulnerability» (Matthew, 2010: 36)12.

Ainda que os dois conceitos não sejam estanques e portanto exista uma

dinâmica entre eles, a vulnerabilidade é estrutural, sendo que o que varia é o tipo de

ameaça a que cada se coletivo encontra sujeito e a sua capacidade de resposta. As

ameaças agrupam-se maioritariamente em dois grupos, sendo que o critério

diferenciador é a previsibilidade: podem ser progressivas (Ex. onda de calor de 2003)

ou espontâneas (Ex. sismo no Japão em 2011).

Por outro lado as ameaças são sempre influenciadas pela componente humana,

seja pela ação ou pela inação. Em relação à inação temos como exemplo o sismo que

afetou gravemente o Haiti em 2010. A catástrofe é uma ameaça espontânea, não

sendo causada pela ação humana, mas tornou-se um prolema de segurança porque o

Estado não foi capaz de garantir a sua segurança, enquanto entidade soberana, nem a

dos seus cidadãos (componente fundamental da existência do Estado) isto é, o sismo

colapsou a capacidade organizativa do Estado. Já relativamente à ação humana,

inserem-se nesta categoria todas as catástrofes ambientais causadas pela mesma. É

exemplo a China através da construção excessiva de barragens em solos sismicamente

instáveis (Watts, 2010).

A distinção acima apresentada é simplesmente para formar referências

analíticas porque esta não é estática. Um problema de segurança ambiental causado

pela ação humana depressa se pode agravar devido à inação humana. Do nosso ponto

de vista, as alterações climáticas são um exemplo deste tipo, uma vez que já possuem

uma dinâmica própria. Ainda assim, o mesmo não tem servido para intensificar o

processo de securitização. Como já vimos, devido à natureza do problema das

alterações climáticas estas acabam por ter como entravas à sua securitização quase

todos aqueles apontados para a segurança ambiental:

12

O conceito de vulnerabilidade encontra-se mais aprofundado no ponto 1.4 – Impactos, Vulnerabilidade, Adaptação e Mitigação desta dissertação.

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A agenda de segurança é errática porque as manifestações das

alterações climáticas serão diferentes em todo o Mundo, não sendo

passível o consenso que se formou aquando das negociações para

acabar com as emissões de CFCs, que é frequentemente dado como

exemplo a seguir;

O aumento generalizado das temperaturas insere-se na definição de

um desastre do tipo progressivo (creeping), uma vez que não existe um

momento definidor a partir do qual as alterações climáticas deixam de

ser suportáveis pelas populações; quando o aumento generalizado das

temperaturas (e consequentemente todos os outros fenómenos

climáticos extremos) ultrapassarem este limite a capacidade de

mitigação encontrar-se-á muito limitada;

Finalmente a importância da securitização das alterações climáticas

prende-se com a dificuldade das mudanças que necessitam de ser

implementadas para inverter o processo; na nossa perceção as

abordagens sobre as mudanças para a diminuição das emissões de

dióxido de carbono são, económica e politicamente, muito simplistas

(Stern, 2007). A estrutura energética fóssil está enraizada nas

sociedades, sendo impossível realizar mudanças para linhas mais

sustentáveis, sem que isso acarrete consequências abruptas tanto

económicas como políticas (Fonseca, 2011).

De facto, a curto/médio prazo a maioria dos problemas ambientais afecta

apenas o estilo de vida das populações (condições socio-económicas), só se tornando

uma ameaça/problema de segurança quando afecta a integridade física dos indivíduos.

Quando a integridade física dos cidadãos se encontra estruturalmente em causa ou

quando o Estado não consegue securitizar determinadas vulnerabilidades de modo

permanente, passa a existir um problema de erosão da legitimidade política. Quando

os indivíduos deixam de reconhecer legitimidade política ao Estado transferem-na para

outros grupos, quer sejam legítimos ou ilegítimos, passando a existir um problema de

subversão indireta.

A subversão (direta) ocorre quando um grupo organizado tenta substituir de

forma violenta uma ordem política pré-existente. A subversão indireta ocorre quando

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essa substituição é despoletada por uma catástrofe natural que destrói/colapsa a

capacidade administrativa do Estado no local afetado (Lara, 2011).

Como é observável na maioria das vezes uma catástrofe natural não degenera

necessariamente num fenómeno de subversão indireta. Tendo como exemplo

novamente o Japão, que sistematicamente é atingido por sismos, o Estado securitizou

este tipo de catástrofes na sociedade civil de forma bastante eficaz, tanto que a ordem

política se mantém intacta independentemente dos inúmeros sismos e respetivas

consequências que têm afetado a região (ver Figura 4).

Figura 4 – Ameaças que derivam da Segurança Ambiental

Figura da autora

Para que ocorra uma subversão é necessário um conjunto de condições, entre

as quais, que o Estado falhe em responder e em manter a segurança da integridade

territorial do Estado bem como da sua capacidade organizativa, isto é, da sua

soberania e do seu aparelho administrativo (Lara, 2012) e que exista um ator

securitário rival que obtenha, por coação ou consentimento, a fidelidade política da

população (Cunha, 2012).

Quando estas duas condições se reúnem nasce um problema de subversão

interna que pode variar espacialmente do nível local ao nível nacional, e

temporalmente do nível temporário ao permanente, no qual o grupo que subverte se

organiza, adquire ideologia própria e procura subverter todo o aparelho do Estado.

Segurança Ambiental

Estado

Subversão Indirecta

Indivíduo

Existência Biofísica

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Assim, a dissertação centra-se ao nível de análise da unidade política em

Portugal, existindo ainda uma interação com o nível subsistémico pelo facto de o

Estado português se encontrar integrado numa região – União Europeia – com

características e particularidades específicas. Dizemos União Europeia e não Europa

porque a União Europeia é constituída por diversos membros e instituições com

carácter político (Patrício, 2007) que não correspondem na íntegra à região “Europa”

geograficamente definida.

Seguidamente, como a nossa análise se foca no Estado português,

consideramos o Governo de Portugal como ator securitário primordial devido às suas

funções representativas bem como ao seu papel na elaboração de estratégias.

Optámos por não fazer uma identificação de outros possíveis atores securitários —

como partidos ou grupos de pressão — precisamente porque a elaboração de uma

estratégia de securitização das alterações climáticas depende, em última análise,

exclusivamente do governo português enquanto representante de um Estado

soberano.

Por outro lado, dada a dimensão do problema das alterações climáticas e numa

tentativa de obter uma maior objetividade possível, centramo-nos especificamente

nas vulnerabilidades mais graves, que podem ameaçar a existência do Estado (por

exemplo, a perda de biodiversidade não ameaça a existência do Estado, mas o mesmo

já não acontece com a mudança dramática nos padrões de precipitação).

Especificamente no caso português referimo-nos ao aumento das temperaturas

(incluindo fenómenos extremos de calor) e à diminuição da precipitação.

Tendo em conta tudo o que acabou de ser explicado, e porque falamos

concretamente de uma dissertação de mestrado e não de doutoramento, infelizmente

não seria possível em tempo útil analisar todos pontos que poderiam interessar para

enriquecer a investigação, desde a identificação e análise de outras ameaças — como a

subida do nível dos oceanos — ou o impacto macroeconómico das mesmas. Contudo,

é possível estabelecer ligações entre eventos de seca extrema e, por exemplo, o seu

efeito no output agrícola.

Desde logo a dissertação assumiu um caráter maioritariamente teórico

procurando esclarecer e reafirmar a ligação entre alterações climáticas e segurança

ambiental. Para isso a pesquisa será realizada principalmente com recurso a fontes

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abertas primárias (ex: dados oficiais do Banco Mundial) e secundárias (bibliografia e

webgrafia). Numa primeira parte, para as alterações climáticas, recorremos aos

relatórios do IPCC e ao projeto SIAM II para suportar cientificamente as projeções para

o século XXI, recorrendo também a bibliografia adicional sobre a temática.

Numa segunda parte, sobre a segurança nacional e ambiental recorremos a

diversa bibliografia sobre a área e a relatórios oficiais que suportam a importância da

segurança ambiental no geral. Para o caso português procedemos a uma reunião e

análise de indicadores relevantes da estrutura agrícola nacional, procurando

estabelecer ligações pertinentes entre alterações climáticas particularmente

acutilantes para Portugal e o output agrícola obtido pelo sector primário português

numa linha temporal que vai, no máximo, de 1980 a 2010, atentando aos principais

períodos de seca.

Acresce dizer que aqui não nos debruçámos sobre as importações de bens

alimentares — mecanismo sempre disponível para atenuar vulnerabilidades

alimentares conjunturais ou estruturais dos Estados — porque o propósito da tese

reside em demonstrar o impacto das alterações climáticas na segurança alimentar e na

segurança nacional portuguesa e não tanto no modo como o Governo tem vindo a

lidar com diminuições súbitas do output do sector primário — que aliás são raras.

A aferição da securitização das condições ambientais portuguesas será feita

através de uma análise de conteúdo da Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações

Climáticas (ENAAC) que visará ver se esta: identificou instituições e/ou organismos

responsáveis pelo desenvolvimento e aplicação da estratégia; apontou orçamentos,

metas e objetivos concretos; definiu linhas temporais e vulnerabilidades aos quais o

Estado está sujeito.

Finalmente e ainda que a dissertação seja maioritariamente teórica é

fundamental que seja percetível a aplicabilidade da componente teórica pelo que na

terceira parte recorremos a dois exemplos concretos que ocorreram em Portugal (a

onda de calor de 2003 e a seca de 2005) e que derivam das principais vulnerabilidades

que o país se encontra sujeito, que já foram referidas. Estes exemplos procuram

demonstrar como um fenómeno climático pode escalar para um problema de

segurança ambiental. Para além disso, todo o processo da dissertação irá ser

submetido à figura de um painel de especialistas (Moreira, 1994) ao qual

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submeteremos perguntas específicas à respetiva área científica e cujas respostas

ajudarão a conferir a validade das hipóteses previamente mencionadas. Para mitigar o

perigo, sempre presente nesta forma metodológica, de ver a investigação guiada por

terceiros temperaremos as respostas destes com dados fácticos encontrados no

decurso da investigação bem como leituras pessoais sobre o problema em questão.

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I-3 - Descrição dos Capítulos

Assim sendo, a dissertação acabou por assumir o seguinte formato:

Os capítulos “introdutórios”, onde se inclui os “Agradecimentos”, o “Resumo”, o

“Índice de figuras” e o “Índice”;

O Capítulo I onde se insere a “Introdução”, o “Enquadramento Metodológico”

que inclui a pergunta de partida e as hipóteses de pesquisa e a “Metodologia” que

assume especial relevância dada a necessidade de uma forte ancoragem científica por

parte da dissertação, numa área ainda pouco ou nada explorada em Portugal, que é o

potencial das vulnerabilidades se transformarem em ameaças ao Estado;

Seguidamente, no Capítulo II “Alterações Climáticas e o Aquecimento Global”

realiza-se uma síntese do conhecimento científico mais atual, existente sobre o

fenómeno do aquecimento global. O Capítulo encontra-se subdividido em vários

subcapítulos que abrangem a explicação do fenómeno (pontos II.1, II.2 e II.2.1), as

projeções para a Europa e Portugal (pontos II.3, II.3.1 e II.3.2) e os impactos que serão

sentidos (pontos II.4 e II.4.1);

No Capítulo III “Segurança Nacional e Segurança Ambiental” introduz-se o

conceito de segurança nacional (III.1) e a evolução do mesmo ao longo dos diferentes

contextos históricos, para se perceber o surgimento do conceito de segurança

ambiental (III.2), bem como as dificuldades inerentes à operacionalização do conceito;

No Capítulo IV, “Das Vulnerabilidades às Ameaças: aplicação prática” são

identificadas as duas principais vulnerabilidades às quais Portugal se encontra sujeito e

é demonstrado como estas podem escalar para ameaças, onde existe uma quebra num

dos três componentes (Território, Povo e Poder político) e dos três fins do Estado

(Segurança, Justiça e Bem-estar económico e social), sendo por isso uma ameaça ao

Estado enquanto entidade soberana. Devido à impossibilidade de testar estas

hipóteses, recorremos a exemplos do passado para demonstrar onde se estabelece a

linha que separa uma vulnerabilidade de uma ameaça;

Finalmente é apresentada a Conclusão, onde são também enumerados alguns

dos mecanismos de adaptação/mitigação às alterações climáticas vigentes em Portugal

bem como uma reflexão crítica sobre a aplicabilidade e eficácia dos mesmos.

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Capítulo II - Alterações Climáticas e Aquecimento Global

II.1 – O aquecimento global

Apesar do termo “alterações climáticas” se encontrar amplamente difundido é

frequentemente utilizado como referência às recentes mudanças climáticas,

nomeadamente o aquecimento global. É, no entanto, preciso ter em conta que estas

foram frequentes ao longo de todo o período geológico da Terra. Representaram

períodos de transição entre as várias eras geológicas e determinaram toda a biologia

terrestre e oceânica existente. Para o IPCC, as alterações climáticas referem-se «to a

change in the state of the climate that can be identified (e.g. using statistical tests) by

changes in the mean and/or the variability of its properties, and that persists for an

extended period, typically decades or longer. It refers to any change in climate over

time, whether due to natural variability or as a result of human activity.» (Pachuri,

2007:30).

A temperatura no Planeta resulta por um equilíbrio entre a energia que entra

no sistema atmosfera – Terra e a que sai. A variação do sistema climático ocorre

quando existe um desequilíbrio devido a forças externas (forcings) naturais,

antropogénicas ou fruto de uma mudança na dinâmica interna do clima. Referimo-nos

a uma variação acentuada do clima, que se prolonga no tempo e pode ser mensurável,

como foi referido, e que difere da irregularidade natural do clima, fruto da dinâmica

interna do Planeta. Esta irregularidade natural inclui desde a simples mudança das

temperaturas de noite para as de dia, a fenómenos mais intensos como o El Niño, La

Niña, a NAO ou a Corrente do Atlântico Norte, que influenciam o clima de uma forma

periódica.

Os dois principais fatores externos naturais são as erupções vulcânicas e as

variações na radiação solar, sendo este último fundamental para providenciar a

energia que o sistema climático necessita. «There are three fundamental ways to

change the radiation balance of the Earth: 1) by changing the incoming solar radiation

(e.g., by changes in Earth’s orbit or in the Sun itself); 2) by changing the fraction of

solar radiation that is reflected (called ‘albedo’; e.g., by changes in cloud cover,

atmospheric particles or vegetation); and 3) by altering the longwave radiation from

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Earth back towards space (e.g., by changing greenhouse gas concentrations).» (Le

Treut, 2007:96). Por outro lado, o clima responde através de uma série de mecanismos

de resposta – feedback mechanisms – que podem agravar ou não (positivos ou

negativos) a mudança em curso. A persistência destas forças externas provocam uma

mudança na temperatura que se irá manter até o Planeta recuperar, de uma forma

natural, o seu equilíbrio energético (North, 2006).

Por outro lado, esta variação pode ter como causa fatores antropogénicos,

nomeadamente as emissões de gases com efeito de estufa, o que, de acordo com os

cientistas, tem estado na base do recente aquecimento global. A actividade humana

pode influenciar as alterações climáticas através de uma mudança na composição da

atmosfera. Os gases libertados de atividades como a indústria, os transportes e a

agricultura, entre outros, bem como as mudanças no uso do solo devido à

desflorestação, irrigação ou produção de culturas que alteram o albedo da superfície e

induzem mudanças no sistema climático (Bierbaum, 2010). A queima de combustíveis

fósseis como carvão, petróleo e gás natural juntamente com a desflorestação

generalizada, tem vindo a aumentar significativamente a emissão de dióxido de

carbono (CO2) nos últimos 200 anos, com especial incidência nos últimos 50 anos.

«Every year these emissions currently add to the carbon already present in the

atmosphere a further 8000 million tonnes, much of which is likely to remain there for a

period of 100 years or more.» (Houghton, 2011:13).

O dióxido de carbono, o metano e o vapor de água existem naturalmente na

atmosfera, absorvendo a radiação proveniente do Sol e sobretudo a que é refletida

pela superfície da Terra. Sendo bons absorventes de radiação, aquecem a atmosfera

como uma estufa – daí a denominação “efeito de estufa” – aproximadamente 33°C

mais quente do que se não existissem estes gases e nuvens, mantendo o Planeta a

uma temperatura estável e criando a possibilidade de existência de vida na Terra

(Anderson, 2010). O crescente aumento de emissões de gases com efeito de estufa

(greenhouse gases - GHG) como o dióxido de carbono, o metano, mas também o óxido

de nitroso, entre outros, tem vindo a aumentar a capacidade da atmosfera de absorver

radiação, amplificando o efeito de estufa natural já existente (enhanced greenhouse

effect) e, consequentemente, aumentando as temperaturas globais. De facto, de

acordo com o IPCC «Most of the observed increase in global average temperatures

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since the mid-20th century is very likely due to the observed increase in anthropogenic

GHG concentrations. This is an advance since the TAR’s [Third Assessment Report, ou

seja terceiro relatório do IPCC] conclusion that “most of the observed warming over

the last 50 years is likely to have been due to the increase in GHG concentrations”.»

(Pachuri, 2007:10).

Do conjunto de gases com efeito de estufa abrangidos pelo protocolo de

Quioto que obriga os Estados a reduzir a sua emissão fazem parte: o dióxido de

carbono (CO2), o metano (CH4), o óxido de nitroso (N2O), os hidrofluorcarbonetos

(HFCs), os perfluorcarbonetos (PFCs) e o hexafluoreto de enxofre (SF6) (Houghton,

2011, Pittock, 2007).

O dióxido de carbono é de longe o mais importante gás emitido devido às

atividades humanas, tendo contribuído em cerca de 77% para o efeito de estufa de

origem antropogénica (IPCC, 2007). Como já foi referido existe naturalmente no

Planeta e é fundamental para o seu funcionamento através do ciclo do carbono: o CO2

é emitido para a atmosfera por nós, seres humanos, mas também pelos animais, no

simples ato de respirar ou pela decomposição de material orgânico; por outro lado é

absorvido pelos oceanos e também pelas plantas, que no processo da fotossíntese o

decompõem em oxigénio e carbono, libertando o oxigénio e produzindo compostos

orgânicos, num ciclo constante (Denman, 2007, Houghton, 2011)13. No entanto, desde

a Revolução Industrial que o ser humano tem vindo a destabilizar este mecanismo

natural, aumentando as emissões de CO2 devido sobretudo à queima de combustíveis

fósseis. Se por um lado existe um acréscimo no input de dióxido de carbono na

atmosfera, este não é acompanhado por um output do sistema. Trocas rápidas (entre

menos de um ano e algumas décadas) de CO2 apenas podem ocorrer entre a

atmosfera e a biosfera (plantas, animais e solo) ou as águas superficiais dos oceanos.

Relativamente às trocas com a biosfera o processo encontra-se bastante limitado dada

a atual pressão do ser humano sobre os sistemas naturais. Mesmo que se invertesse

esta situação, seriam necessárias áreas florestais enormes para conseguir colmatar o

atual volume de emissões, encontrando-se estas sempre dependentes da qualidade

dos solos, para fazer crescer estes organismos, e à probabilidade de rapidamente

13

Para mais informação sobre o ciclo do carbono consultar o Capítulo 7, do Volume I do relatório do IPCC (2007) disponível em: http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg1/ar4-wg1-chapter7.pdf

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25

serem destruídas devido a incêndios florestais, retornando o CO2 novamente à

atmosfera. Também a superfície do oceano absorve dióxido de carbono com rapidez.

No entanto o input de CO2 altera a sua composição química, tornando as águas

oceânicas superficiais mais ácidas e apenas processos com a duração de escalas de

tempo geológicas (milhares de anos) possibilitam que estas águas, carregadas de

dióxido de carbono, se envolvam com águas mais profundas. Este é depositado no

fundo dos oceanos onde a sua deposição em sedimentos constitui o único processo de

remoção natural e permanente do dióxido de carbono (Pittock, 2007).

Durante milhares de anos até meados do século XVIII, ao início da Revolução

Industrial, as variações naturais do dióxido de carbono na atmosfera situavam-se

dentro de um espectro de variação de 20 ppm (partes por milhão) de um valor médio

de 280 ppm (Brown, 2006). Desde este período que os valores têm vindo a aumentar

gradualmente, sendo este aumento mais acentuado a partir da segunda metade do

século XX. No presente os valores situam-se nos 391.80 ppm (2011)14 (ver Figura 5),

um aumento de 39% que é um valor inexistente nos últimos 800 000 anos da Terra,

quando esta, segundo indícios revelados por análises a núcleos de gelo, anéis de

árvores e medições geológicas, teria um clima bastante diferente do atual (Bierbaum,

2010).

Figura 5 – Concentração de CO2 na atmosfera no Observatório Mauna Loa (Hawai)

Fonte: U.S. Department of Commerce, National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA)

disponível em: http://www.esrl.noaa.gov/gmd/ccgg/trends/co2_data_mlo.html

14

U.S. Department of Commerce, National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) disponível em: http://www.esrl.noaa.gov/gmd/ccgg/trends/co2_data_mlo.html (consultado em Dezembro de 2011)

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26

Um clima tropical pode parecer uma visão apetecível para o ser humano

comum mas o excesso de calor em determinadas regiões até então temperadas, bem

como a inexistência de gelo nos polos e a consequente diminuição do albedo e subida

acentuada do nível dos oceanos, seria um cenário catastrófico num Planeta já

densamente povoado, com concentração de população nas faixas litorais e escassez de

recursos (Brown, 2011).

A duração do dióxido de carbono é outra característica do mesmo. Apesar de

não existir um consenso em relação à duração do CO2 na atmosfera, a maioria dos

estudos aponta para uma durabilidade na ordem dos 100 anos (Houghton, 2010). A

dificuldade de calcular este período encontra-se relacionada com a complexidade de

trocas do dióxido de carbono entre os vários sistemas (atmosfera, biosfera, oceanos).

A absorção de CO2 pela biosfera não varia relativamente à quantidade deste presente

na atmosfera (excluindo o reduzido efeito da fertilização do CO2). Como já foi referido,

o aumento apenas poderia ocorrer com um crescimento das áreas florestais. Por outro

lado, estas trocas influenciam a composição química dos oceanos que ao tornarem-se

mais ácidos (devido ao aumento da concentração de dióxido de carbono) vão

perdendo a capacidade de absorção de CO2 uma vez que se vão saturando. Os

investigadores calculam que entre 15% a 40% de CO2 irá manter-se na atmosfera

durante os próximos milhares de anos até que haja uma renovação das águas

superficiais saturadas, criando outra vez a capacidade para absorção de dióxido de

carbono. Assim, calcula-se que mesmo que existisse uma cessação total das emissões

de CO2 amanhã, os seus efeitos prolongar-se-iam durante os próximos 10 000 anos,

até o dióxido de carbono atingir a concentração presente no período pré-Revolução

Industrial (Archer, 2009).

O metano é também um gás com efeito de estufa, existente no meio natural

que tem observado um aumento significativo por via das emissões devido a fatores

antropogénicos. Como o dióxido de carbono calcula-se que o Planeta esteja preparado

para “lidar” com um certo volume de emissões geradas por fontes naturais, como os

terrenos pantanosos, as térmitas através do seu processo digestivo, os oceanos, rios e

estuários, os hidratos de metano presentes em zonas subaquáticas profundas ou em

zonas de sedimentação, no permafrost, as emissões produzidas por vulcões, fogos

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florestais, solos (em zonas tropicais quando desflorestadas) e animais selvagens

(Anderson, 2010).

No entanto, estas emissões têm vindo a aumentar, coincidindo com o

crescimento populacional gerado pela Revolução Industrial tal como aconteceu com o

CO2. Este fenómeno deve-se sobretudo ao crescimento do consumo de gás natural, de

que o metano é o principal componente, bem como o aumento das áreas pantanosas

destinadas à cultura do arroz, onde a decomposição anaeróbica de material orgânico

gera elevadas emissões de metano. Outras fontes de origem antropogénica resultam

da criação de gado, decomposição de material depositado em aterros ou lixeiras,

exploração de minas de carvão subterrâneas ou de superfície e emissões de metano

proveniente de estações de tratamento de águas residuais (Anderson, 2010).

Apesar de diminuta, quando comparada com o dióxido de carbono, a produção

de metano e a sua concentração na atmosfera (1,775 ppm em 2005 quando

comparadas com 380 ppm de dióxido de carbono), representa atualmente cerca de

14% do efeito de estufa devido ao facto deste gás ser 20 vezes mais eficaz que o CO2

na absorção de radiação. Por outro lado o metano dura cerca de 12 anos, ao fim dos

quais é destruído na atmosfera através de processos químicos. No entanto, este é um

dos gases que merece a atenção do IPCC e da Comunidade Internacional uma vez que,

apesar dos valores de metano na atmosfera serem os mais elevados dos últimos 650

000 anos, o ritmo das emissões tem vindo a decrescer desde os anos 80, sendo

praticamente nulo em 2005. A incerteza quanto ao futuro das emissões leva a que

sejam projetados cenários que abrangem desde a duplicação das emissões como um

decréscimo de 25% das mesmas (Houghton, 2011).

Existem ainda outros gases com efeito de estufa que, apesar da sua quantidade

diminuta encontram-se referenciados uma vez que a maioria tem vindo a aumentar ao

mesmo tempo que apresentam uma elevada durabilidade na atmosfera e eficácia em

termos de efeito de estufa. O óxido de nitroso é o mais importante destes gases

“menores” contribuindo em cerca de 7% para o atual efeito de estufa. A sua

concentração é de apenas 0.3 ppm na atmosfera mas tem vindo a aumentar o que se

torna uma preocupação visto que a sua duração na atmosfera é de 120 anos,

aproximadamente. O aumento das emissões deve-se sobretudo aos ecossistemas

naturais e à agricultura, nomeadamente associado ao uso crescente de fertilizantes

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mas também à indústria química e à queima de biomassa (Anderson, 2010). Ao grupo

dos halocarbons compreendem os clorofluorcarbonetos (CFCs),

hidroclorofluorcarbonetos (HCFCs) e hidrofluorcarbonetos (HFCs). Relativamente aos

CFCs, a descoberta da depleção da camada de ozono e o consequente alerta da

Comunidade Internacional veio a culminar na assinatura do Protocolo de Montreal em

1987, que determinou o fim da produção de CFCs em 2006. No entanto estes são

também gases com efeito de estufa com um efeito 5000 a 10000 vezes superior ao do

dióxido de carbono e uma durabilidade superior a 100 anos, irão causar impactos no

aquecimento global durante este século, ainda que a sua quantidade na atmosfera seja

diminuta (Houghton, 2011). Por serem também gases com efeito de estufa, os HCFCs

foram acrescentados ao Protocolo de Montreal através da emenda aprovada em

Copenhaga, em 1992, onde foi determinada a cessação da sua produção em 203015. Os

HFCs não foram abrangidos visto não contribuírem para a depleção da camada de

ozono. Foram no entanto abrangidos pelo Protocolo de Quioto (1997) dada a

probabilidade de acrescerem ao problema do aquecimento global ainda que a sua

duração esteja na casa das dezenas de anos ao invés de centenas. A preocupação foi

ainda estendida aos perfluorcarbonetos (PFCs) e ao hexafluoreto (SF6) de enxofre,

gases derivados da produção industrial que dada a sua elevada durabilidade (mais de

1000 anos) podem vir a contribuir para o aquecimento global, ainda que não num

futuro próximo (Houghton, 2011).

15

United Nations Environment Program , Ozone Secretariat, disponível em:http://ozone.unep.org/Ratification_status/copenhagen_amendment.shtml

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29

II.2 – As Alterações Climáticas do Passado

A capacidade que a paleoclimatologia nos oferece de “olhar para trás” no

tempo e perceber como o clima se comportou mediante a influência de uma

multiplicidade de fatores naturais é uma ferramenta fundamental para antecipar,

ainda que com algum grau de incerteza, os tempos que advêm.

Os registos diretos da medição da temperatura são relativamente recentes

remontando aos últimos 150 anos, que permitem uma caracterização mais

pormenorizada e específica para vários locais diferenciados. Estes registos

compreendem a medição da temperatura através de termómetros (ainda que pouco

rigorosos) aos quais se juntam relatos de eventos climáticos escritos na primeira

pessoa.

Mais para trás no tempo, a informação existente é mais parca, não nos

permitindo ter um relato específico de determinado incidente. Assim a caracterização

é feita em largos períodos temporais, utilizando várias fontes como os núcleos de gelo,

nomeadamente do Antártico e da Gronelândia, anéis de árvores, formações

sedimentares, entre outros.

Através da informação paleoclimática recolhida é possível reconstruir cenários

climáticos que demonstram as consequências no ambiente geradas por excessivas

quantidades de dióxido de carbono na atmosfera. De facto, apesar destes fenómenos

de aquecimento no passado possuírem uma origem natural começam a ser observados

pelos investigadores como analogias quase perfeitas do futuro que nos espera, caso as

emissões de CO2 continuem a aumentar de forma descontrolada.

Um destes episódios que começa agora a ser compreendido é o Máximo

Térmico do Paleocénico-Eocénico (Paleocene-Eocene Thermal Maximum - PETM). Este

súbito aquecimento ocorreu na transição do Paleoceno para o Eoceno, durante a Era

Terciária, há aproximadamente 56 milhões de anos ou seja 10 milhões de anos depois

da extinção dos dinossauros no Cretáceo (Jardine, 2011). É, no entanto, importante

perceber que o clima tinha vindo a aquecer desde o Cretácico, proliferando uma

grande diversidade de plantas e animais num planeta mais quente e tropical que o

atual. As regiões polares e a latitudes mais elevadas encontravam-se maioritariamente

livres de gelo, podendo as temperaturas do ar alcançar os 25°C e do oceano Ártico

23°C. «Alligators, which today are found in the warm tropics and subtropics, occuredd

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well within the Arctic Circle during the early Eocene.» (Jardine, 2011:2). Apesar de não

existir ainda uma explicação concreta para a origem deste aquecimento, todas as

hipóteses parecem apontar para uma libertação massiva de hidratos de metano (a

oxidação do metano origina CO2), contribuindo fortemente para um aumento do efeito

de estufa natural. Enquanto uma das hipóteses aponta para um desmoronamento

submarino de enormes proporções que destabilizou os compostos sedimentares no

fundo dos oceanos, libertando grandes quantidades de hidratos de metano, outra

hipótese, também bastante reiterada ultimamente, aponta para um conjunto de

vulcões submarinos na região da Gronelândia que, ao entrarem em erupção,

libertaram gases e basalto durante um vasto período de tempo. Este conjunto de

erupções submarinas destabilizou grandes quantidades de hidratos de metano que se

encontravam sob uma grande pressão. Calcula-se que aproximadamente 2000

gigatoneladas de carbono tenham sido libertadas para a atmosfera e oceanos durante

este período. As temperaturas nas regiões continentais aumentaram cerca de 5°C nas

latitudes mais elevadas e 3°C nas latitudes mais baixas. Do mesmo modo também nos

oceanos a temperatura das águas superficiais subiram 6°C em latitudes elevadas e 4°C

em latitudes baixas enquanto as águas profundas tiveram um aumento de 8°C nas

latitudes mais elevadas e 6°C nas latitudes mais baixas, perto do Equador (Jardine,

2011). Estas mudanças foram dramáticas para os ecossistemas existentes, originando

impactos regionais diversificados, como períodos de seca mais acentuados e expansão

dos desertos em certas regiões e aumento da precipitação noutras. No entanto, é

preciso lembrar que apesar de ser considerada uma mudança climática abrupta,

geologicamente falando, esta ocorreu durante um período entre 1000 a 10000 anos,

ou seja, um ritmo dez vezes mais lento que o aquecimento atual, possibilitando a

adaptação e a migração de algumas espécies. Do mesmo modo, também a

recuperação do clima depois do PETM demorou cerca de 100 000 anos, até que parte

do CO2 voltasse a ser novamente absorvido pela biosfera e oceanos, um presságio do

que o futuro nos pode reservar se libertarmos excessivas quantidades de dióxido de

carbono (Jardine, 2011).

Mais recentemente o período a meio do Plioceno, há aproximadamente 3

milhões de anos atrás, tem mostrado evidências das alterações passíveis de acontecer

no futuro próximo. «The mid-Pliocene is the last time in geological history when our

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31

planet’s climate was significantly warmer, for a prolonged period, than it is today.»

Haywood e Williams, 2005:138). Durante aproximadamente 300 000 anos (3.3 a 3

milhões de anos atrás) a temperatura média global encontrava-se 2°C a 3°C acima dos

valores pré-industriais; o CO2 entre 360 e 400 ppm e os oceanos 25m acima do nível

atual, um período quente que promoveu o desenvolvimento dos hominídeos (Lynnas,

2008)16. Análises de fósseis de microrganismos presentes nos sedimentos demonstram

um aumento de temperatura significativo na região dos polos (3°C a 5°C) e menos

acentuado nas regiões dos trópicos (1°C a 3°C). Uma vez que tanto os continentes

como as bacias dos oceanos já se encontravam na sua presente configuração

geográfica, incluindo o movimento da corrente do Golfo17, apenas uma subida dos

gases com efeito de estufa na atmosfera produziria um aumento generalizado das

temperaturas (Haywood e Williams, 2005). De acordo com os modelos climáticos esta

mudança de comportamento do clima a nível regional vem demonstrar o efeito de um

dos vários feedbacks positivos existentes: ao derreter grandes áreas do Ártico e da

Gronelândia, regiões que antes atuavam como espelhos gigantes refletores de

radiação solar, passaram a absorver a radiação, amplificando o aquecimento já

existente no Ártico (Haywood e Williams, 2005).

Ambos os períodos quentes que referimos são anteriores ao Quaternário (era

atual) tendo ocorrido há alguns milhões de anos atrás. Como é natural à medida que

recuamos mais no tempo, a informação torna-se cada vez mais escassa, o que só

demonstra uma necessidade crescente de investigação no passado para percebermos

o futuro. Atualmente existem modelos computorizados altamente complexos que são

capazes que recriar o clima existente durante esses períodos com bastante realismo,

sendo ótimos indicadores para perceber como o clima se pode comportar quando

algumas componentes deste se alteram.

Durante o Pleistocénico (Quaternário), a Terra arrefeceu e entrou num ciclo de

períodos glaciares intercalados por períodos mais quentes (interglaciares), resultado

16

Um dos primeiros fosseis de hominídeos, “Lucy”, foi descoberto em África tendo sido datado com 3 milhões de anos aproximadamente (Lynnas, 2008:108). 17

PETM – continentes tinham começado a separar-se e o Atlântico era bastante estreito, com uma largura semelhante à do Mediterrâneo atual. Meio do Plioceno – continentes no mesmo local que a atualidade; tinha acabado de se formar a ponte que liga a América do norte à América do sul cortando a ligação entre os oceanos pacífico e atlântico tornando este último mais salino (Haywood e Williams, 2005).

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de um dos fatores externos que pode influenciar o clima: a variação nos parâmetros da

órbita da Terra à volta do Sol (Jansen, 2007). As amostras recolhidas nos núcleos de

gelo demonstram uma alternância entre glacial-interglacial nos últimos 740 000 anos

devido à redução/aumento de insolação, sendo que os últimos 430 000 anos

encontrarem-se melhor documentados. Sabe-se hoje que se registaram períodos

glaciares de grande amplitude, com uma duração média de 100 000 anos, enquanto o

período interglacial durava entre 10 000 a 30 000 anos (no período até aos 430 000

anos) (Figura 6).

Figura 6 – Concentração de CO2 presente no núcleo de gelo de Vostok, Antártica

Fonte: Barnola et al., Historical Carbon Dioxide Record from the Vostok Ice Core, Carbon Dioxide

Information Analysis Center (CDIAC) disponível em: http://cdiac.ornl.gov/trends/co2/vostok.html

As alterações de ciclos resultaram numa variação bastante acentuada das

temperaturas. Durante os períodos glaciares, as temperaturas médias globais

encontrar-se-iam 3°C (trópicos) a 5°C (latitudes mais elevadas) abaixo das atuais,

agravadas mais 1°C a 2°C devido a poeiras na atmosfera e mudanças na vegetação,

com a camada de gelo do Ártico a atingir grande parte do Reino Unido e norte da

Alemanha. Por outro lado, durante os períodos interglaciares, nomeadamente na

última interglaciação, aproximadamente há 125 000 anos, o aumento de temperatura

era 2°C a 5°C superior à atual, no hemisfério Norte, o que implicou um recuo na

camada de gelo da Antárctica (Jansen, 2007) e um aumento no nível dos oceanos entre

4m a 6m. A relação do dióxido de carbono, nas constantes variações entre 180 e

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300ppm, com os períodos de glaciação e interglaciação não tem uma resposta

concreta. Apesar de se saber que a concentração de CO2 na atmosfera variava

consoante o ciclo, estas alterações só se manifestavam várias centenas de anos depois

de o período se iniciar. O maior grupo de hipóteses aponta para o oceano como

origem nas alterações da concentração de CO2, através de trocas dinâmicas constantes

entre «ocean circulation, marine biological activity, ocean-sediment interactions,

seawater carbonate chemistry and air-sea exchange. Most explanations propose

changes in oceanic processes as the cause for low glacial CO2 concentrations. The

ocean is by far the largest of the relatively fast-exchanging (<1 kyr) carbon reservoirs,

and terrestrial changes cannot explain the low glacial values because terrestrial

storage was also low at the Last Glacial Maximum» (Jansen, 2007:449). Qualquer que

tenha sido o impacto dos oceanos na composição da atmosfera, sabe-se que este

apenas veio amplificar as alterações geradas pela variação da órbita terrestre, visto

que esta por si só, também não teria capacidade de provocar as alterações observadas.

Provavelmente a variação da concentração de CO2 não é a causa da variação do clima

mas uma consequência.

A transição para o Holoceno acontece pouco depois do final da última grande

glaciação, há cerca de 10 000 anos. Ao contrário da instabilidade climática gerada

durante o Pleistocénico, o atual período interglacial estável, pouco usual, promoveu o

desenvolvimento da civilização humana, nomeadamente através da agricultura,

prática impossível ou quase impossível na era anterior, devido ao clima frio e seco em

quase todas as regiões (Richerson et al., 2001). O Holoceno, que dura até ao presente,

é caracterizado por uma estabilidade nas temperaturas, apesar de existir uma variação

natural do clima que se traduz em pequenas alterações regionais.

Destacam-se apenas dois períodos onde existiu uma mudança mais acentuada:

o Período Quente Medieval durante o século XI e XIV e a Pequena Idade do Gelo

associada ao período entre os séculos XV e XIX. «There has been much debate about

the extent of these particular periods that only affected part of the northern

hemisphere and are therefore more prominent in local records, for instance those from

central England.» (Houghton, 2011:81). Devido à falta de registos fiáveis sabe-se

apenas de relatos de aumento das temperaturas e da precipitação que se prolongam

por um período dentro dos séculos referidos para o Período Quente Medieval.

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Informação paleoclimática recolhida inicialmente revelava que este tinha sido o

período mais quente nos últimos 2000 anos, com um aumento de temperatura entre

1°C e 2°C. No entanto informação recente veio revelar que na realidade a temperatura

média era de 0.3°C inferior à atual, ou seja, o que foi um período anormalmente

quente face às temperaturas médias da época, é, quando comparado com as

temperaturas atuais, um período mais frio, o que só vem atestar o aumento de

temperatura atual face a alguns séculos atrás (Bradley et al., 2003). Por outro lado a

Pequena Idade do Gelo traduziu-se numa diminuição da temperatura média de 0.6°C

durante o período referido. Ainda que não exista consenso relativamente às datas de

início e término, este período observou invernos mais frios, expansão dos glaciares e

de fenómenos sociais dramáticos como fomes um pouco por toda a Europa (Mann,

2002). A falta de consenso afecta também a discussão sobre a origem destas

alterações apesar de a maioria apontar para o vulcanismo particularmente activo

durante a Pequena Idade do Gelo bem como mudanças na intensidade da radiação

solar (Houghton, 2011). Às forças externas ou internas que destabilizam o sistema

climático, este responde de forma a estabilizar novamente o clima, funcionando quase

como uma balança que se equilibra a ela própria.

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35

II.2.1 – Os Últimos 100 anos

Comparativamente às variações do clima que temos vindo a enunciar ao longo

dos vários períodos históricos, os últimos dois séculos, principalmente os últimos 100

anos são os melhores documentados do ponto de vista climatológico. Com o início das

medições das temperaturas em 1880 é possível estabelecer uma evolução do clima

nos últimos 130 anos, tendo como temperatura média global a média das

temperaturas compreendidas no período 1901-2000. Ainda que estas medições

inicialmente utilizassem meios mais arcaicos para a recolha de informação, os modelos

de projecção de climas actuais vieram confirmar a veracidade dos dados recolhidos.

De acordo com o IPCC «the total temperature increase from 1850 – 1899 to

2001 – 2005 is 0.76°C [0.57°C to 0.95°C]» (IPCC, 2007a:5), um aumento de temperatura

que não se regista pelo menos nos últimos 1300 anos. No entanto esta evolução não

foi uniforme, sendo comum dividir esta evolução em três períodos principais: 1880-

1940 – aquecimento; 1940-1970 – arrefecimento/estagnação; 1970 – 2010 –

aquecimento (Figura 7).

Figura 7 – Anomalias da temperatura global anual

Fonte: NOAA, National Climate Data Center, disponível em http://www.ncdc.noaa.gov/cmb-

faq/anomalies.php

O final do século XIX e inícios do século XX é marcado por um aumento ligeiro

mas gradual da temperatura média global (no rescaldo da Pequena Idade do Gelo),

com acentuadas variações regionais. Este aumento acentuou-se particularmente entre

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1910 e 1940. Em apenas 30 anos a temperatura média global aumentou

aproximadamente 0.5°C (Hansen et al., 2001).

O período de arrefecimento que se seguiu, entre 1940 e 1970, é ainda pouco

compreendido pelos investigadores. A descida rápida mas ligeira das temperaturas

(0.2°C aproximadamente) entre 1940 e 1950 foi seguida de um período de

estabilização até 1970. Pensa-se que na origem desta anomalia estejam as elevadas

emissões de aerossóis que atingiram o pico durante este período e que anulam o

efeito dos gases com efeito de estufa (Hansen et al., 2001). Também a erupção do

Monte Agung na Indonésia em 1963, lançou grandes quantidades de partículas

refletoras da radiação para a atmosfera o que interferiu com a quantidade de radiação

absorvida pelo planeta (Hegerl, 2007). Outra possibilidade avançada foi um

enviesamento nas medições da temperatura dos oceanos visto que os dados revelam

um declínio apenas nos valores sobre os oceanos. Em terra as temperaturas

estabilizaram (Forest e Reynolds, 2008; Thompson et al., 2008).

No entanto, desde 1970 que as temperaturas têm vindo a aumentar a um ritmo

bastante mais acelerado que no início do século XX. «The rate of warming over the last

50 years is almost double that over the last 100 years» (Trenberth, 2007:237),

acompanhando o aumento nas emissões de dióxido de carbono, que se intensificaram

a partir da segunda metade do século XX. Calcula-se que o ritmo do aquecimento por

década aumentou de 0.07°C, nos últimos 100 anos, para 0.13°C, nos últimos 50 anos

(Trenberth, 2007). De facto, os 13 anos mais quentes, desde que existem registos,

ocorreram todos nos últimos 15 anos (1997-2011), sendo 2005 o ano mais quente

alguma vez registado, apesar de recentes notícias apontarem 2010 como o ano mais

quente de sempre18. Apesar do aumento de temperatura ser global, o ritmo do

aquecimento em terra é sensivelmente o dobro daquele observado nos oceanos

(desde 1979 que as temperaturas têm vindo a aumentar, por década, a um ritmo de

0.27°C nos continentes e 0.13°C nos oceanos) (Trenberth, 2007). Também o aumento

das temperaturas é mais acentuado nas latitudes mais elevadas, a norte, afetando

18

Ver Nicolau Ferreira (2012), “Atualização do registo mundial de temperaturas revela que 2010 foi o ano mais quente”, Público, disponível em http://ecosfera.publico.pt/noticia.aspx?id=1538584 (consultado em 23/05/2012).

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37

diversos sistemas biológicos e climáticos que, pela sua vulnerabilidade às alterações,

são uma importante fonte de alerta e informação (IPCC, 2007b).

O Ártico é um desses sistemas onde a temperatura aumentou

aproximadamente 3°C desde 1980 (Lemke, 2007). Os glaciares/coberturas de gelo são

altamente sensíveis às mudanças climáticas sendo uma variável fundamental nos

programas de monitorização do clima. Tornam-se tão ou mais importantes dado que

representam ¾ de toda a água potável existente no planeta, suportando sistemas de

agricultura, industriais, uso doméstico e sendo também uma importante componente

do turismo e da produção hidroelétrica (UNEP, 2009). O pico da cobertura de gelo

ocorreu há aproximadamente 21 000 anos, aquando da última idade do gelo (Last

Glacial Maximum), quando 1/3 da superfície terrestre encontrava-se coberta por gelo.

Desde então a criosfera global retrocedeu de uma forma geral, sendo pontuada por

alguns re-avanços intermitentes. O avanço máximo dos glaciares, no Holoceno,

ocorreu durante a Pequena Idade do Gelo. Seguidamente observou-se um retrocesso

significativo entre 1920 e 1940, uma estabilização/aumento entre 1940 e 1970 e

novamente um forte retrocesso a partir dos anos 70 (UNEP, 2009). Apesar de as

variações nos glaciares dependerem fortemente do clima/geografia do terreno bem

como das dimensões dos próprios glaciares (pequenos glaciares são bastante mais

susceptíveis a pequenas variações no clima do que os glaciares de maiores dimensões)

existe uma tendência global para a diminuição dos mesmos. De facto, só na última

década os glaciares perderam, em média, o equivalente a 60cm de água por ano e

desde 1980 até ao presente registou-se um declínio na espessura dos mesmos (mass

balance) de aproximadamente 12.5 metros19. Também a área coberta de neve durante

o final da Primavera (Março-Abril) no hemisfério Norte tem vindo a diminuir

significativamente a partir de meados dos anos 80, levando plantas de várias espécies

a brotar mais cedo, o que aumenta o período de desenvolvimento das mesmas20. Estas

alterações são assim coincidentes com as recentes alterações climáticas observadas,

derivadas da acumulação de gases com efeito de estufa na atmosfera. A estabilização

do retrocesso dos glaciares e inclusive ligeiro aumento nos anos 70 coincide com uma

19

Ver NOAA (2011), Climate Change: Glacier Mass Balance, disponível em:

http://www.climatewatch.noaa.gov/article/2011/climate-change-glacier-mass-balance 20

Ver NOAA (2011), Climate Change: Spring Snow Cover, disponível em: http://www.climatewatch.noaa.gov/article/2011/climate-change-spring-snow-cover

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38

diminuição na radiação solar incidente, juntamente com um aumento da poluição.

«Recent studies have shown that the atmosphere cleared up again in the mid 1980s,

probably as a result of the implementation of industrial filters and the breakdown of

industry in the former Soviet Union, which increased the amount of incoming solar

radiation and, as such, of glacier melting.» (UNEP, 2009:14).

O degelo afeta, não só comunidades inteiras que vivem na região Ártica e

dependem da especificidade daquele clima para sobreviverem mas, mais grave ainda,

as regiões costeiras um pouco por todo o mundo devido à subida do nível dos oceanos.

Desde a última grande glaciação (há 21 000 anos) que o nível dos oceanos aumentou

continuamente cerca de 120m, até estabilizar entre 2000 e 3000 anos atrás. Existem

indícios que demonstram que o nível médio dos oceanos aumentou a partir de meados

do século XIX e observações que demonstram que se intensificou ao longo do século

XX, especialmente na última década. O ritmo calculado para o todo o século XX é de

1.7mm por ano e no período de 1961-2003 de 1.8 mm por ano. No entanto, as

previsões não se afirmam promissoras uma vez que as medições realizadas no período

1993-2003 apontam para valores de 3mm por ano, com tendência para aumentar nas

décadas seguintes (Bindoff, 2007). É importante também, referir que uma parte

significativa da subida do nível dos oceanos deriva da expansão térmica dos mesmos

(quando a água aquece expande-se). Os oceanos têm vindo a aquecer, a

profundidades cada vez mais elevadas, alterando a composição química destes e

pondo em causa diversos sistemas bastantes sensíveis a pequenas alterações e que

estão na base da cadeia alimentar. No entanto, persistem incertezas quanto ao valor

do contributo para a média global da diminuição da criosfera um pouco por todo o

Mundo e da expansão térmica dos oceanos (Bindoff, 2007). Para além de pôr em causa

comunidades inteiras que dependem de cursos de água com origem em glaciares, a

situação é ainda mais grave quando se sabe que a fusão do gelo da Gronelândia

provocará uma subida de mais de sete metros do nível do mar (Lemke, 2007)21. O facto

de o aumento da temperatura registada no Ártico ser o dobro do aumento da

temperatura média global (2°C) até ao presente (AMAP, 2011; Trenberth, 2007), de

estudos recentes demonstrarem que o gelo é bastante mais sensível à variação

21

Esta situação não se aplica na Antárctica uma vez que dada a geografia daquela região não se prevê um degelo bastante acentuado como no Ártico, nos próximos séculos.

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39

térmica do que inicialmente se pensava e que o ritmo das alterações é bastante mais

acelerado do que os investigadores do IPCC previram em 2007 (Rahmstorf, 2010),

apontam para situações graves nas regiões costeiras um pouco por todo o Mundo

ainda antes do final do século XXI.

Também as alterações observadas na precipitação reforçam a ideia da

mudança climática à escala global. Mais do que um aumento da precipitação, regista-

se uma alteração nos padrões de precipitação bem como um acentuar da

variabilidade. De uma forma geral, a precipitação aumentou nas regiões do hemisfério

Norte, nas latitudes médias e elevadas, nomeadamente nas regiões centro/norte dos

EUA, Canadá, norte da Europa e centro/norte da Rússia. Ao invés, a diminuição da

precipitação ocorreu sensivelmente nas regiões dos trópicos, principalmente a partir

de 1976/1977 (Trenberth, 2007). Esta faixa inclui regiões como o México, o

Mediterrâneo, algumas zonas do sul da Ásia e, nomeadamente, as regiões do Sahel. A

bacia do Amazonas é a excepção uma vez que tem vindo a ficar mais húmida, o que

demonstra a vulnerabilidade dos padrões de precipitação relativamente ao

relevo/topografia do terreno e às massas de ar, sendo difícil estabelecer um padrão

uniforme. Mais claro é o aumento dos fenómenos de precipitação intensa. «It is likely

that there have been increases in the number of heavy precipitation events (…) within

many land regions, even in those where there has been a reduction in total

precipitation amount, consistent with a warming climate and observed significant

increasing amounts of water vapour in the atmosphere» (Trenberth, 2007:238).

O aquecimento da temperatura durante o século XX diverge das restantes

variações climáticas observadas. Os principais forcings do clima durante os últimos

2000 anos foram as variações na radiação solar, o vulcanismo e a emissão de aerossóis

e gases com efeito de estufa devido à atividade humana. «Greenhouse gases and

tropospheric aerosols varied little from A.D. 1 to around 1850. Volcanic eruptions and

solar fluctuations were likely the most strongly varying external forcings during this

period, but it is currently estimated that the temperature variations caused by these

forcings were much less pronounced than the warming due to greenhouse gas forcing

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40

since the mid-19th century.»22 . De facto os modelos de projecção do clima necessitam

da variável do aumento dos gases com efeito de estufa de origem antropogénica para

poderem simular a evolução do clima durante o século XX. Também o IPCC sublinha

que forcings naturais podem ter tido alguma influência no aquecimento do Planeta no

início do século XX mas que o mesmo não se revela na segunda metade desse século.

«Numerous experiments have been conducted using climate models to determine the

likely causes of the 20th-century climate change. These experiments indicate that

models cannot reproduce the rapid warming observed in recent decades when they

only take into account variations in solar output and volcanic activity. However (…)

models are able to simulate the observed 20th-century changes in temperature when

they include all of the most important external factors, including human influences

from sources such as greenhouse gases and natural external factors. (…) The human

influence on climate very likely dominates over all other causes of change in global

average surface temperature during the past half century»23.

A interferência do ser humano no ambiente, mais especificamente, no clima é,

na realidade, a história da sua evolução, ainda que de uma forma inconsciente grande

parte do tempo. Desde os primórdios que fenómenos como a utilização do fogo,

desflorestação, agricultura interferiram com o meio, não existindo durante séculos

uma manifestação concreta por parte do clima devido à reduzida dimensão das

populações humanas. No desenrolar da Revolução Industrial, a utilização intensiva de

combustíveis fósseis (inicialmente mais o carvão e só depois o petróleo) bem como a

explosão demográfica que se seguiu, vieram colocar a pressão do ser humano sobre o

Ambiente a níveis completamente diferentes. Como já foi referido, atualmente, os

combustíveis fósseis são utilizados em especial para gerar energia para alimentar a

indústria e os transportes, emitindo sobretudo dióxido de carbono, aquando da sua

combustão, que se tem vindo a acumular na atmosfera dada a longa duração deste

gás. Por outro lado, também o ritmo das emissões tem vindo a aumentar (IPCC,

2007b).

22

Board on Atmospheric Sciences and Climate (2006), Surface Temperature Reconstructions for the last 2,000 years, p.98, livro on-line disponível no site de The National Academies Press, Washington, D.C. http://books.nap.edu/openbook.php?record_id=11676&page=98 23

Board on Atmospheric Sciences and Climate (2006), Surface Temperature Reconstructions for the last 2,000 years, p.99, livro on-line disponível no site de The National Academies Press, Washington, D.C. http://books.nap.edu/openbook.php?record_id=11676&page=98

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41

Como é possível concluir da análise dos dados sobre a concentração de CO2

presente nos núcleos de gelo da Antárctica, nos últimos 400 000 anos a concentração

de dióxido de carbono na atmosfera oscilou consoante os períodos glaciares ou

interglaciários, nunca ultrapassando as 300ppm (Barnola et al., 1998)24. Mais

especificamente, os últimos 1000 anos foram pautados por uma estabilidade à volta

dos 280 ppm, com uma pequena quebra entre 1600 e 1750 (pequena idade do gelo), à

qual se seguiu um aumento consecutivo. Face aos valores de 1750 (Revolução

Industrial), de 280ppm, a concentração de CO2 na atmosfera aumentou

aproximadamente 40% até ao presente, tendo havido um agravamento do volume das

emissões na segunda metade do século XX.25. Como já foi referido, os valores actuais

encontram-se muito próximos dos 400ppm26, um valor que nunca se verificou durante

os últimos 650 000 anos (IPCC, 2007a).

24

Barnola et al., Historical Carbon Dioxide Record from the Vostok Ice Core, Carbon Dioxide Information Analysis Center (CDIAC) disponível em: http://cdiac.ornl.gov/trends/co2/vostok.html 25

Neftel et al., Historical Carbon Dioxide Record from the Siple Station Ice Core, Carbon Dioxide Information Analysis Center (CDIAC) dísponivel em: http://cdiac.ornl.gov/trends/co2/siple.html Etheridge et al., Historical CO2 Records from the Law Dome DE08, DE08-2, and DSS Ice Cores, Carbon Dioxide Information Analysis Center (CDIAC), disponível em: http://cdiac.ornl.gov/trends/co2/lawdome.html 26

Valores actualizados mensamente pelo NOAA, disponíveis em http://www.esrl.noaa.gov/gmd/ccgg/ trends/

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42

II.3 - Projeções para o século XXI

As alterações climáticas observadas durante o século XX e inícios do século XXI,

bem como a crescente pressão sobre os sistemas naturais devido ao contínuo

desenvolvimento civilizacional, tornam fundamental modelizar os cenários do clima

para o século XXI.

A complexidade do sistema climático, na relação entre os constituintes da

atmosfera com os oceanos e o albedo terrestre, apenas permite aos modelos

climáticos, também eles bastante complexos, antever o comportamento do clima num

futuro distante. Apesar de existir sempre um certo grau de incerteza nas projeções

realizadas, os modelos mais complexos são considerados bastante credíveis, uma vez

que têm por base princípios da física estabelecidos na comunidade científica. Na

realidade os modelos climáticos são «mathematical representations of the climate

system, expressed as computer codes and run on powerful computers.» (Randall,

2007:600) sendo extensivamente comparados com observações, sempre que possível,

e avaliados de forma a corresponderem à realidade. Outro fator de confiança advém

do fato de estes serem também utilizados para reproduzir climas e mudanças

climáticas do passado com sucesso.

Por sua vez, o aumento do conhecimento e compreensão do funcionamento de

alguns sistemas, por parte dos cientistas, desde os primeiros relatórios do IPCC, tem

possibilitado o aperfeiçoamento dos modelos. Ainda assim existem variáveis climáticas

onde os níveis de confiança são mais elevados (temperatura) e menos elevados

(precipitação). De facto as variáveis com maior incerteza encontram-se relacionadas

com as nuvens e a resposta destas às alterações climáticas, com o gelo do mar por

implicar um melhor conhecimento da relação entre a atmosfera e os oceanos e

finalmente com os padrões de precipitação por implicarem um conhecimento mais

específico da região, sendo de assinalar que cenários a uma escala maior são bastante

difíceis de realizar quando os modelos são projetados para funcionar à escala global

(mais pequena) (Randall, 2007). Para mudanças climáticas regionais mais específicas

são muitas vezes utilizados modelos menos complexos e portanto mais adequados a

cada tipo de realidade que têm servido de base a múltiplos estudos sobre as alterações

climáticas (Houghton, 2011). Outro fator de incerteza encontra-se relacionado com a

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43

duração das projeções: quanto mais alargada no tempo for, maior o seu grau de

incerteza.

Apesar destas limitações os modelos climáticos são considerados bastante

credíveis e robustos, tendo produzido resultados já comprovados ao longo dos anos.

No entanto o principal fator de incerteza advém do volume das emissões de CO2, que

se encontram diretamente relacionadas com diversos fatores que envolvem o

comportamento humano. Devido ao fato de não ser possivel prever a evolução da

sociedade global «what is being done is to explore likely future climates which arise

from a range of assumptions regarding human activities» (Houghton, 2011:138).

No ano 2000, o IPCC publicou um relatório especial sobre as emissões de gases

com efeito de estufa, para o século seguinte (SRES – Special Report on Emission

Scenarios), produzindo um total de 40 cenários futuros possíveis, agrupados em quatro

famílias principais – A1, A2, B1 e B2. Os cenários têm por base variáveis sobre o

crescimento populacional, o desenvolvimento social e económico, as principais fontes

de energia e desenvolvimento tecnológico:

«A família de cenários A1 descreve um futuro de rápido crescimento económico

mundial, reduzido crescimento populacional e rápida introdução de novas e

mais eficientes tecnologias. Os grandes temas subjacentes são a convergência

entre regiões, desenvolvimento das capacidades e aumento de interações

sociais e culturais, com uma substancial redução nas diferenças do rendimento

per capita ao nível regional. A família de cenários A1 desenvolve-se em quatro

grupos que descrevem direções alternativas para a mudança tecnológica e

sistema energético;

A família de cenários A2 descreve um Mundo bastante heterógeno. O principal

tema subjacente é a independência e a preservação das identidades locais. Os

padrões de fertilidade nas regiões convergem lentamente, o que resulta num

elevado crescimento populacional. O desenvolvimento económico é, numa

primeira fase, focado nas regiões sendo que o crescimento económico per

capita e as mudanças tecnológicas são mais fragmentadas e lentas do que

noutras famílias de cenários;

A família de cenários B1 descreve um Mundo convergente com o mesmo

reduzido crescimento populacional presente na família A1l, mas com mudanças

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rápidas nas estruturas económicas para uma economia de serviços e

informação, com uma redução na intensidade material e introdução de

tecnologias limpas e de uso eficiente dos recursos. O enfase centra-se em

soluções globais para a sustentabilidade económica, social e ambiental,

incluindo melhorias na equidade mas sem iniciativas ambientais adicionais;

A família de cenários B2 descreve um Mundo em que o enfase centra-se nas

soluções locais para uma sustentabilidade económica, social e ambiental. É um

Mundo com um crescimento populacional moderado, com níveis intermédios de

desenvolvimento económico e uma mais lenta e diversa evolução tecnológica

que nas família B1 e A1. Ao mesmo tempo o cenário é orientado para a

proteção ambiental e equidade social ao nível local e regional.»27

As projeções dos modelos climáticos para os cenários referidos apontam para um

aumento generalizado nas emissões de gases com efeito de estufa até ao final do

século. Para o dióxido de carbono, estima-se que a concentração possa oscilar entre as

550 e 1000ppm (abrangendo os vários cenários) (Houghton, 2011). Apenas as

partículas derivadas do óxido de nitroso apresentam uma redução a partir da segunda

metade do século XXI, devido ao aumento de políticas de proteção para os seres

humanos e o ambiente, da poluição atmosférica e da “chuva ácida”. É ainda

importante referir que se tivermos em conta que a margem de erro relativamente ao

resultado final dos cenários projetados pode variar entre -10% e +30%, depressa

chegamos à conclusão que, havendo uma alteração das condições, é

(consideravelmente) mais provável que o resultado final tenha sido subvalorizado do

que sobrevalorizado (Houghton, 2011).

Com base nos cenários projetados sobre as emissões de dióxido de carbono,

existe clara confiança de que o aumento de temperatura e as consequentes alterações

climáticas serão mais acentuadas do que as observadas durante o século XX (IPCC,

2007a). Relativamente à temperatura média global espera-se um aumento mínimo de

1.8°C (para o cenário com as emissões mais reduzidas) e um aumento máximo de 4.0°C

27

IPCC, “Emissions Scenerios”, disponível em: http://www.ipcc.ch/ipccreports/sres/ emission/index.php?idp=91#4.2.1. (Consultado em 23/03/2012, traduzido para português pela autora). Os quatro grupos são: A1C, A1G, A1T (predominantly non-fossil fuel) e A1B (balanced). Posteriormente os grupos A1C e A1G foram combinados num grupo de utilização intensiva de energias fósseis (fossil intensive), A1FI. Para mais informação sobre os diversos cenários criados sobre as projeções de dióxido de carbono, consultar o relatório SRES (Special Report on Emission Scenarios) no site do IPCC.

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(para o cenário com as emissões mais elevadas), que ocorrerá a um ritmo de 0.2°C por

década, pelo menos durante as próximas duas décadas seguintes (IPCC, 2007a).

Quando acrescentadas as incertezas, o aumento da temperatura poderá variar entre

1.1°C e 6.4°C.

O aumento de temperatura projetado poderá vir a ser agravado pelos

mecanismos de resposta (feedbacks mechanisms) das variáveis que interagem com o

clima. Apesar de existirem feedbacks negativos, como é o caso do efeito de fertilização

na vegetação, devido ao aumento da fotossíntese provocado pelo aumento de CO2 na

atmosfera, parece ser bastante provável que os feedbacks positivos irão anular e

inclusive ultrapassar em larga escala os primeiros (Scheffer et al., 2006). Existem

diversos feedbacks positivos:

Aumento da atividade bacterial na biologia terrestre, devido ao

aumento da temperatura, que realiza a decomposição de material

orgânico, libertando maiores quantidades de CO2 (Cox et al., 2000);

À medida que os oceanos aquecem observa-se uma diminuição dos

nutrientes provenientes das correntes frias, que causa uma diminuição

do plâncton existente e consequente diminuição da absorção do CO2

por parte deste. Esta situação leva a um aumento da concentração de

CO2 na atmosfera à medida que os oceanos aquecerem (Woods e

Barkmann, 1993);

Sendo o vapor de água um dos mais potentes gases com efeito de

estufa na atmosfera e que, na generalidade aumenta com temperaturas

mais elevadas, os estudos apontam para um efeito positivo sobre as

alterações climáticas, sendo este capaz de duplicar o aumento de

temperatura média global que ocorreria caso o vapor de água se

mantivesse fixo (Houghton, 2011);

O retrocesso do gelo por todo o mundo, que reflete até 70% da radiação

que lhe incide, aumenta a absorção da mesma, tanto em terra como nos

oceanos, agravando o aquecimento (Houghton, 2011).

A forma como certas variáveis irão reagir e qual a sua contribuição para o

aumento de temperatura (além do projetado inicialmente) é ainda alvo de relativa

incerteza, mas os modelos mais atuais apontam para uma subavaliação inicial da

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contribuição destes mecanismos (Denman, 2007). De facto «there is unanimous

agreement among the coupled climate carbon cycle models driven by emission

scenarios run so far that future climate change would reduce the efficiency of the Earth

system (land and ocean) to absorb anthropogenic CO2. As a result, an increasingly large

fraction of anthropogenic CO2 would stay airborne in the atmosphere under a warmer

climate» (Meehl, 2007:4), agravando assim o aquecimento projetado e as alterações

climáticas em curso. Os modelos que incluem as incertezas derivadas dos feedbacks

dos gases com efeitos de estufa demonstram um aumento dos limites superiores do

espectro do possível aumento de temperatura (do limite máximo previsto pelo IPCC de

5.8°C sobe para 7.7°C) e uma maior probabilidade para mais 2°C a 3°C de aumento

adicionais (devido apenas aos feedbacks) (Matthews e Keith, 2007).

Para além do aumento da temperatura média estão projetadas diversas

alterações no sistema climático. Relativamente à temperatura é bastante provável que

ocorra um aumento mais acelerado das temperaturas diurnas mínimas do que das

máximas, diminuindo a amplitude térmica diária. Dias mais quentes aumentam o risco

de secas e ondas de calor, mais intensas, mais frequentes e mais duradouras, como a

experienciada na Europa, durante o Verão de 2003 (Meehl, 2007). Encontra-se

também associada uma diminuição dos episódios frios, nomeadamente de dias frios

(noites onde a temperatura desce abaixo dos 0°C), em quase todas as regiões de

latitudes médias e elevadas, bem como uma diminuição da frequência de períodos

continuados de frio extremo (alguns dias a mais de uma semana) (Meehl, 2007).

Com a diminuição das condições para a queda de neve, espera-se um

retrocesso global da criosfera (tanto em extensão como em espessura): montes e

montanhas podem perder totalmente os seus glaciares durante o próximo século

(como já ocorreu no Kilimanjaro). É também esperado um retrocesso do gelo no Ártico

que, de acordo com estudos mais recentes, poderá ficar totalmente sem gelo durante

o Verão já daqui a trinta anos, suplantando as previsões do IPCC que previam que este

fenómeno ocorresse no final do século XXI (Wang e Overland, 2009).

O aumento da frequência, da intensidade e da duração de fenómenos

climáticos extremos não se aplica apenas a secas e ondas de calor. Ao mesmo tempo

que se prevê um aumento da evaporação e da concentração de vapor de água na

atmosfera devido ao clima mais quente, torna-se mais expectável uma mudança

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significativa nos padrões de precipitação do que um aumento real na precipitação

média global. De uma forma geral, regiões tropicais (que usufruem de um regime de

monção) e a latitudes mais elevadas podem esperar um aumento da precipitação,

associado a uma maior frequência de eventos de precipitação intensa, devido a uma

intensificação geral do ciclo hidrológico global resultante do aquecimento. Por outro

lado, as regiões subtropicais irão observar um declínio na precipitação média (até

20%), apesar de também observarem um aumento na frequência e intensidade dos

eventos de precipitação extrema, o que implica períodos mais longos entre os

episódios de precipitação (Meehl, 2007).

Nas regiões tropicais, o aumento da energia proveniente do oceano com

temperaturas superficiais mais elevadas, irá resultar, nas regiões com condições

favoráveis à sua ocorrência, num aumento na frequência e na intensidade de ciclones

tropicais e, consequentemente, da velocidade máxima do vento que atingem (IPCC,

2007a).

Relativamente às projeções para a subida do nível dos oceanos, o IPCC estima

que estas possam variar entre 18 e 59 centímetros no final do século XXI (IPCC, 2007a).

O maior contributo para esta subida (mais de 50%) será a expansão térmica dos

oceanos que continuará a ocorrer durante este século. As restantes contribuições

provêm, de uma forma geral, do degelo global (Gronelândia e restantes glaciares à

escala global; já a Antártica não contribui para estes valores uma vez que não se prevê

o degelo desta, pelo menos durante este século) (Meehl, 2007).

A temática sobre a subida do nível dos oceanos no futuro tem suscitado a

atenção de diversos cientistas que têm vindo a discordar das projeções do IPCC

(Rahmstorf et al., 2007; Hansen, 2007; Christoffersen e Hambrey, 2006). Desde o

último relatório de 2007, vários estudos têm sido lançados a argumentar que a posição

do IPCC é demasiado “segura” e que uma subida de vários metros pode ocorrer até ao

final do século. Em causa encontra-se o fato de o IPCC não levar em conta os feedbacks

do ciclo do carbono e os efeitos plenos das mudanças do fluxo do gelo (IPCC, 2007a).

«There is enough information now, in my opinion, to make it a near certainty that IPCC

business-as-usual climate forcing scenarios would lead to a disastrous multi-meter sea

level rise on the century time scale» (Hansen, 2007:6). Especificamente, James Hansen

argumenta que se o degelo duplicar a cada década (devido principalmente ao ritmo do

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aumento das temperaturas no Ártico, superior à média global em 3°C a 6°C a mais em

2080), existe uma possibilidade séria de que o nível dos oceanos aumente um total de

5 metros até 2100, sendo que o gelo da Gronelândia desaparecerá totalmente dentro

de 140 anos (7 metros) (Hansen, 2007; Lynnas, 2008).

De fato, apesar de se projetar um aumento global das temperaturas, existirão

variações regionais que dependem das características físicas das regiões e da sua

interação com o sistema climático. Neste ponto, convém lembrar que as alterações

climáticas possuem um grande impacto ao nível regional, mesmo com uma variação

mínima ao nível global.

Assim, podemos concluir que um dos principais padrões a observar será um

aumento da temperatura superior nas regiões terrestres face à temperatura média

global prevista, devido à diminuição significativa da água disponível para evaporação e

consequente "arrefecimento” do clima, como acontece nos oceanos (onde o aumento

da temperatura se encontra abaixo da média global). Do mesmo modo, as regiões

costeiras (de uma forma geral) irão aquecer menos que as do interior. Outro factor

que influenciará fortemente a distribuição do clima é a latitude: «the amount of

projected warming generally increases from the tropics to the poles in the Northern

Hemisphere. Precipitation is more complex, but also has some latitude dependent

features. At latitudes adjacent to the polar regions, precipitation is projected to

increase, while decreases are projected in many regions adjacent to the tropics.»

(Christensen, 2007:865).

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II.3.1 – Projeções para a Europa do século XXI

Na Europa, as projeções para as mudanças climáticas irão seguir, de uma forma

geral, os padrões descritos previamente, acentuando as diferenças climáticas entre o

Norte e o Sul.

Relativamente à temperatura, os modelos projetados para o cenário A1B

apontam para um aumento no final do século XXI de 2.3°C a 5.3°C no modelo de

projeção regional para o norte da Europa (NEU) e 2.2°C a 5.1°C no modelo de projeção

regional para o sul da Europa (SEM). É também expectável que o aumento seja

superior no Norte da Europa durante o Inverno e na região do Mediterrâneo durante o

Verão (Christensen, 2007). Apesar da desaceleração da corrente de circulação

termohalina do Atlântico Norte prevista em 25%, no cenário A1B, durante o próximo

século (num espectro de 0% aos 50%), é projetado que o aumento da temperatura

será bastante superior, devido a um domínio dos efeitos do contínuo aumento dos

gases com efeito de estufa sobre as alterações na circulação oceânica (IPCC, 2007a).

Também a precipitação espelha o agravamento da divisão entre norte e sul.

Com base nos mesmos modelos será de esperar um aumento da precipitação na

região norte de 0 a 16% e uma diminuição no sul entre -4% a -27% (Christensen, 2007):

«the decrease in precipitation together with enhanced evaporation in spring and early

summer is very likely to lead to reduced summer soil moisture in the Mediterranean

region and parts of central Europe» (Christensen, 2007:876). De facto, a diminuição da

humidade no solo é o principal motivo para um aumento da variabilidade da

temperatura, nomeadamente a diferença entre as regiões costeiras e interiores

durante o Verão.

Às alterações na precipitação encontra-se diretamente associado o agravar dos

fenómenos extremos. O aumento generalizado de temperatura e da sua variabilidade,

juntamente com uma diminuição da precipitação e consequente diminuição de

humidade no solo implica um aumento na frequência, na intensidade e na duração das

ondas de calor (Christensen, 2007). Por oposição «in northern Europe and in central

Europe in winter, where time mean precipitation is simulated to increase, high

extremes of precipitation are very likely to increase in magnitude and frequency»

(Christensen, 2007:877). Especialmente na frequência, sendo previsto que os cindo

dias de maior precipitação, que ocorrem atualmente na Escandinávia, uma vez em oito

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50

a dezoito anos, passem a ocorrer de cinco em cinco anos no final do século. Do mesmo

modo também os fenómenos extremos de precipitação intensa na região do

Mediterrâneo revelam uma tendência para aumentar (devido ao aumento da

concentração de vapor de água na atmosfera relativo ao clima mais quente) ao mesmo

tempo que diminuem o número de dias de precipitação (Christensen, 2007). A

variação do aumento da frequência de dias chuvosos (no Inverno) na Europa central é

similar às mudanças nos fenómenos extremos de precipitação de curta duração

durante o Verão. Assim, apesar de se projetar uma diminuição da precipitação média,

aumento da temperatura e maior probabilidade de secas e ondas de calor para esta

época do ano, o tempo quente será pautado por um aumento dos fenómenos de

precipitação extrema de curta duração. O aumento da frequência da precipitação,

mais do que a intensidade, no norte da Europa, contrasta com o decréscimo dos dias

de precipitação no centro e sul da Europa e um aumento da duração dos períodos de

seca (Christensen, 2007).

A confiança nos modelos que projetam alterações nos padrões de vento ainda

permanece relativamente baixa. Ainda assim existe um maior número de estudos que

aponta para uma aumento da velocidade média e máxima do vento no norte da

Europa relativamente àqueles que apontam para um decréscimo. Estas variações

tendem a ser sazonais e encontram-se relacionadas com uma mudança nas pressões

atmosféricas, nomeadamente uma deslocação para Norte, o que implica um aumento

da atividade a norte e diminuição a sul, inclusive dos ciclones no Mediterrâneo

(Christensen, 2007).

Finalmente espera-se uma redução geral da criosfera por toda a Europa. No

seguimento do aumento das temperaturas e consequente redução da neve e do gelo

observado no século passado, espera-se um agravamento destes fenómenos durante o

próximo século. É bastante provável que se observe uma redução no período de queda

de neve entre um a três meses. Também a redução da espessura da neve e gelo irá

agravar-se, com uma diminuição prevista entre os 50% e 100%, ainda que esta varie

conforme a altitude e latitude: as regiões mais elevadas (acima dos 2000m ou no norte

da Escandinávia e norte-ocidental da Rússia) tendem a ser menos sensíveis às

alterações climáticas. O mar Báltico é outra região particularmente sensível onde se

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51

espera uma redução da sua cobertura de gelo entre os 60% e 70% no final do século

(Christensen, 2007).

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52

II.3.2 – Projeções para o Portugal do século XXI

Portugal segue a tendência das mudanças na região do Mediterrâneo já

descritas, ainda que exista uma grande variação ao nível nacional. É importante referir

que o continente situa-se na «zona de transição entre o anticiclone subtropical

(anticiclone dos Açores) e a zona das depressões subpolares, sendo o clima fortemente

influenciado pela proximidade ao oceano Atlântico» (Santos e Miranda, 2006:49). No

entanto, apesar das regiões mais interiores distarem apenas cerca de 220km da linha

costeira, algumas apresentam características climáticas do tipo continental. «Outro

dos fatores determinantes do clima é a orografia da região, com áreas significativas

das zonas Norte e Centro a ultrapassarem os 1000m de altitude» (Santos e Miranda,

2006:49). Estes fatores propiciam uma grande variação tanto ao nível da temperatura

como da precipitação: enquanto a região Noroeste (Minho) apresenta uma

precipitação média em alguns locais superior a 3000mm, uma das mais elevadas da

Europa, no interior do Alentejo a precipitação não ultrapassa, em média, os 500mm,

tornando o continente vulnerável a ambos os extremos climatológicos – cheias e secas

(Santos e Miranda, 2006).

A evolução do clima em Portugal continental e nas Regiões Autónomas dos

Açores e da Madeira, durante o século XX, encontram-se de acordo com a tendência

mundial observada: um período de aquecimento até 1945, seguido de um período de

estagnação/ligeiro arrefecimento até 1975 e novamente aumento de temperatura,

que se tem agravado nos últimos 20 anos. Os dados meteorológicos recolhidos

demonstram que enquanto o primeiro período de aquecimento foi pautado por um

aumento acentuado da temperatura média máxima, no período após 1975 o aumento

da temperatura média mínima foi superior ao aumento da temperatura média

máxima, estabelecendo uma tendência de diminuição da amplitude térmica que se

manteve até à atualidade. Ainda assim «desde a década de 1970, a temperatura média

subiu em todas as regiões de Portugal, a uma taxa de cerca de 0.5ºC/década, mais do

dobro da taxa de aquecimento observada para a temperatura média mundial» (Santos

e Miranda, 2006:47).

Relativamente à precipitação, observou-se uma tendência para a redução da

mesma nos últimos 20 anos, particularmente durante a Primavera, no mês de Março.

Esta redução é parcialmente compensada por ganhos nos meses de Inverno, o que

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pode indiciar uma mudança climática patente em cenários do aquecimento global que

apontam para uma redução do período de Inverno e uma antecipação da Primavera

(Santos e Miranda, 2006). A precipitação em Portugal e a Oeste da Península Ibérica

são fortemente influenciadas pela Oscilação do Atlântico Norte (NAO), um índice

climático que caracteriza a circulação atmosférica numa vasta área do hemisfério

Norte. As observações têm demonstrado que a NAO correlaciona-se negativamente

com a precipitação nestas regiões, nomeadamente durante o Inverno e Primavera,

pelo que um aumento neste índice, como se tem verificado nos últimos 20 anos,

implica uma diminuição da precipitação em Portugal (Santos e Miranda, 2006)28.

Como foi referido, as tendências climáticas aqui descritas e observadas no

último século, nomeadamente nos últimos vinte anos, tenderão a agravar-se durante o

século XXI, acarretando graves consequências para o país e para a sua população. As

projeções climáticas realizadas para Portugal no final do século XXI com base nos

cenários de emissões de CO2 presentes no relatório SRES (Special Report on Emission

Scenarios), calculam que a anomalia do aumento de temperatura deverá oscilar entre

+2°C e +8.6°C (abrangendo todos os cenários), sendo superior à estimativa global. Do

mesmo modo, a diminuição da precipitação tenderá a agravar-se quanto maior for o

aumento de temperatura. Os cenários mais pessimistas (família A – A2 e A1FI) que

projetam um maior aumento do dióxido de carbono estimam que a oscilação de

temperatura no Verão ocorrerá entre +4.5°C e +11.5°C, com uma diminuição da

precipitação até 60%. Durante o Inverno a temperatura também irá aumentar (+1.5°C

a 4°C), no entanto as previsões para a precipitação, ainda que sendo as mais incertas (-

25% a +20%), calculam, na sua maioria, um aumento da mesma, principalmente na

região Norte, que não será suficiente para colmatar as perdas nas restantes estações

do ano (Santos e Miranda, 2006). De facto tanto o Outono como a Primavera apontam

para um encurtar do período chuvoso com diminuições de precipitação até 55% e 40%

respetivamente, ao mesmo tempo que se prevê um aumento da temperatura entre

+2°C a +7°C para o Outono e +1°C a +5.5°C para a Primavera. Também os cenários da

família B (B1 e B2), ainda que sendo menos pessimistas, corroboram as tendências já

apresentadas. O aumento de temperatura situa-se entre +2°C e +7°C, também

28

Para mais informações sobre a caracterização do clima português e a sua evolução no último século, consultar projetos SIAM e SIAM II

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54

superior ao aumento projetado a nível global, sendo que se estima uma redução da

precipitação generalizada (até -25%), em todas as estações do ano, menos no Inverno

na região Norte (+20%) (Santos e Miranda, 2006).

Também nas regiões autónomas da Madeira e dos Açores espera-se um

aumento da temperatura (entre +1°C e +2°C), bastante menos acentuado que no

continente devido sobretudo à sua dimensão e localização. Já as anomalias previstas

na precipitação divergem devido à latitude onde se localizam as regiões. Enquanto nos

Açores prevê-se um aumento de 10% da precipitação no Inverno e uma diminuição até

20% na precipitação de Verão, o oposto acontece na Madeira: -20% no Inverno e +40%

no Verão (Santos e Miranda, 2006).

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II.4 – Impactos, Vulnerabilidade, Adaptação e Mitigação

A importância das alterações em curso decorre do facto de estas influenciarem

de uma forma maioritariamente negativa as fontes mais elementares de subsistência

do ser humano, principalmente a agricultura, as pescas e os recursos hídricos. A

complexidade do sistema climático e da sua interação com os oceanos e as regiões

terrestres implica que todos os organismos vivos e a maioria dos recursos necessários

à sua sobrevivência sejam afetados. O aumento da frequência das ondas de calor,

períodos de seca e/ou cheias nos últimos 10 anos, não provocaram só perdas humanas

e materiais mas também de colheitas, sendo que a evolução destas situações no futuro

tenderá a agravar-se.

No contexto das alterações climáticas, «an impact describes a specific change in

a system caused by its exposure to climate change. Impacts may be judged to be either

harmful or beneficial» (Schneider, 2007), sendo que é expectável que no curto e no

longo prazo, a maioria das alterações previstas tenham um impacto negativo (como já

foi referido no ponto 1.3 e 1.3.1). No entanto o grau do impacto varia consoante uma

série de variáveis desde a localização, o grau de vulnerabilidade existente, capacidade

de adaptação, tecnologia, recursos financeiros, etc, sendo a projeção para o século XXI

uma tarefa bastante complexa. Assim sendo a avaliação dos impactos é algo

contingente e dinâmico, que evolui consoante as alterações em algumas das variáveis

e que necessita de avaliação permanente de forma a calcular a situação presente

(Fussel e Klein, 2005)29.

Para além da complexidade da combinação das variáveis, um dos principais

obstáculos à avaliação dos impactos é necessariamente o grau de incerteza a que se

encontram sujeitos, sendo uma característica inerente ao conceito de risco, que

combina a magnitude dos impactos e a probabilidade da sua ocorrência. Estudos

recentes demonstram também que as projeções iniciais quanto aos custos inerentes

aos impactos são bastante mais incertas do que se previa inicialmente. Se com o

agravar das alterações climáticas, consequentes impactos e custo económicos, outras

variáveis como a adaptação e a mitigação irão alterar-se necessariamente (Schneider,

2007).

29

http://www.pik-potsdam.de/research/transdisciplinary-concepts-and-methods/projects/project-archive/favaia/pubs/fuessel_klein_2005.pdf

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A incerteza não advém apenas da (in)capacidade de prever as alterações

durante o século XXI. Os impactos projetados podem também variar bastante devido à

via de desenvolvimento assumido. «For example, there may be large differences in

regional population, income and technological development under alternative

scenarios, which are often a strong determinant of the level of vulnerability to climate

change» (IPCC, 2007c:20) (o número de indivíduos afetados no cenário A2 é

significativamente superior ainda que no volume das emissões não exista uma grande

variação). Neste sentido a vulnerabilidade assume-se como «the degree to which a

system is susceptible to, and unable to cope with, adverse effects of climate change,

including climate variability and extremes. Vulnerability is a function of the character,

magnitude, and rate of climate change and variation to which a system is exposed, its

sensitivity, and its adaptive capacity» (Schneider, 2007:782) .

Apesar de intimamente relacionados a avaliação de impactos difere da

avaliação da vulnerabilidade devido sobretudo à abrangência dos conceitos. Enquanto

inicialmente a avaliação era realizada muito com base nos impactos biofísicos, numa

escola que derivava da avaliação dos riscos de catástrofes naturais e da avaliação da

segurança alimentar, logo muito mais restritiva e específica, a evolução dos conceitos

e termos passou a considerar a avaliação das vulnerabilidades bastante mais adequada

às questões das alterações climáticas. A sua avaliação é bastante mais interdisciplinar e

abrangente compreendendo variáveis como a via de desenvolvimento, a exposição

física, a distribuição de recursos, stresses ambientais anteriores e instituições sociais e

políticas, sendo que a preocupação se concentra mais ao nível local, nas políticas de

adaptação no curto prazo30. De uma forma geral a vulnerabilidade depende, em parte,

de um conjunto de fatores físicos naturais (vulnerabilidade biofísica) como o ritmo e a

severidade das alterações climáticas e de um importante conjunto de variáveis sociais

(vulnerabilidade social)31 como fatores económicos, políticos, de governança entre

outros, que determinam quem é afetado, o que acaba por elevar o nível de incerteza

30

Para mais informações sobre a evolução dos conceitos de avaliação de impactos e de avaliação de vulnerabilidades consultar FÜSSEL, H.M. e KLEIN, R.J.T (2005), Climate Change Vulnerability Assessments: An Evolution of Conceptual Thinking, Climate Change, 1-29, disponível em http://www.pik-potsdam.de/research/transdisciplinary-concepts-and-methods/projects/project-archive/favaia/pubs/fuessel_klein_2005.pdf 31

Para mais informações sobre vulnerabilidade biofísica e social consultar BROOKS, Nick (2003), Vulnerability, risk and adaptation: A conceptual Framework, Tyndall Centre for Climate Change Research disponível em http://tyndall.ac.uk/sites/default/files/wp38.pdf

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face a uma avaliação específica dos impactos (Leary, 2006). Ainda assim a avaliação da

vulnerabilidade oferece a capacidade para formular uma moldura de políticas que se

focam em aspetos sociais como a redução da pobreza, diversificação de meios de

subsistência, proteção de recursos de propriedade comum e fortalecimento da ação

coletiva, que para além de fortalecerem os meios de subsistência perante as condições

atuais, reduzem a vulnerabilidade às alterações climáticas do futuro (Carter et al.,

2007).

A abrangência de variáveis que combinam para a determinação do grau de

vulnerabilidade implica que esta varie fortemente de região para região e inclusive

dentro das próprias comunidades. Até mesmo vulnerabilidades semelhantes

necessitarão de programas de adaptação diferentes que estejam de acordo as

estruturas políticas e sociais.

As regiões mais pobres e marginalizadas, nomeadamente em países em vias de

desenvolvimento, que têm como base modos de vida fortemente dependentes dos

recursos primários de subsistência, historicamente sempre se encontraram mais em

risco e atualmente são particularmente as que se encontram mais vulneráveis a

impactos das alterações climáticas (Adger et al., 2007). « A climate shock or stress has

the potential to do the most damage in a context in which natural systems are being

severely stressed and degraded by overuse and in which social, economic or

governance systems are in or near a state of failure and so not capable of effective

responses» (Leary, 2006:27). Consequências como a fome e o colapso dos sistemas de

subsistência podem agravar e aumentar a pobreza e a perda de vidas humanas através

da dispersão de doenças contagiosas.

Ainda assim, apesar de a vulnerabilidade ser superior nos países em

desenvolvimento, é preciso não esquecer que também os países desenvolvidos

enfrentam sérios desafios devido às alterações climáticas. Em primeiro lugar a maioria

destes países encontra-se localizado na região (hemisfério Norte) onde se irá observar

o maior aumento da temperatura bem como as maiores reduções na precipitação

(OECD, 2006). Seguidamente são estes Estados que possuem as maiores densidades

populacionais e de população urbana em zonas costeiras de risco, sendo que as

principais capitais, que albergam milhões de habitantes, são costeiras ou localizam-se

na foz dos rios. Muitas destas cidades foram ganhando terra aos rios/mar sendo

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bastante vulneráveis a tempestades já possuindo proteções contra estas. Sendo países

desenvolvidos outro desafio que também terão de enfrentar será o provável aumento

do volume de imigrantes/refugiados, que para além dos fatores base de migração que

leva todos os anos milhares de indivíduos a tentarem entrar nos países mais

desenvolvidos, acrescenta-se a depleção dos seus sistemas de subsistência devido às

alterações climáticas (Castles, 2010). De facto, o stress ambiental ao qual muitos

sistemas ambientais já se encontram sujeitos é comum em ambos os conjuntos de

países e é uma séria ameaça à existência das comunidades como as conhecemos. Se

por um lado, muitos destes sistemas já se encontram à beira da rutura, já com

impactos negativos nas populações que dependem deles, por outro lado, as alterações

climáticas tenderão a exacerbar a pressão negativa do ser humano sobre estes

recursos, podendo mesmo lança-los para um ponto de inflexão (UNEP, 2007). Esta

situação também aumenta a complexidade na avaliação de impactos uma vez que

torna-se mais difícil definir onde começam os efeitos das alterações climáticas.

A principal diferença entre países desenvolvidos e em desenvolvimento traduz-

se sobretudo na tecnologia disponível e na capacidade financeira para a aplicar em

medidas de adaptação e mitigação, que são fatores fundamentais da capacidade de

adaptação das sociedades. De facto, «efficient cooling systems, improved seeds,

desalination technologies, and other engineering solutions represent some of the

options that can lead to improved outcomes and increased coping under conditions of

climate change. In public health, for example, there have been successful applications

of seasonal forecasting and other technologies to adapt health provisions to

anticipated extreme events» (Adger et al., 2007:727). Tanto as tecnologias como as

inovações (desenvolvimento de novas tecnologias ou adaptação de métodos

desatualizados) são desenvolvidas através de investigação no sector público e privado

sendo um aspeto chave da capacidade de adaptação das sociedades. No entanto, na

maioria das vezes apenas são desenvolvidas como resposta a um tipo específico de

impacto, como o aumento das temperaturas ou a diminuição na precipitação.

Ainda assim, a tecnologia potencia a capacidade de adaptação das sociedades,

ou seja, «the ability or potential of a system to respond successfully to climate

variability and change, and includes adjustments in both behavior and in resources and

technologies» (Adger et al., 2007:727). Tem sido demonstrado que a capacidade de

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adaptação é fundamental para que as estratégias de medidas de adaptação tenham o

alcance e eficácia pretendidas na diminuição da magnitude das alterações climáticas,

através, sobretudo do aproveitamento das vantagens das oportunidades ou benefícios

criados por este fenómeno, como, por exemplo, o aumento da época agrícola e o

aumento potencial do turismo. Assim a capacidade de adaptação dos sistemas

humanos refere-se ao potencial do sistema de reduzir a sua vulnerabilidade social, que

é determinado por fatores como a pobreza, desigualdade, marginalização, direitos

alimentares, acesso a seguro e qualidade de habitação. A vulnerabilidade biofísica

apenas pode ser alterada através da mitigação, de forma a interferir com o clima,

sendo que ambos os conjuntos acabam por estar complexamente interligados (Brooks,

2003; Brooks et al., 2005).

Os estudos desenvolvidos sobre a capacidade de adaptação demonstram a

existência de dois tipos de indicadores: mais genéricos, como a educação, o

rendimento e a saúde e mais específicos, relativos a um impacto concreto como secas

e inundações, relacionado com uma instituição, conhecimento e tecnologia. De facto,

sendo a capacidade de adaptação inerente ao processo de adaptação, a aplicação

desta varia fortemente tanto no tempo como na escala: a aplicação de um programa

estratégico de adaptação ao nível nacional terá como requisito variáveis

necessariamente diferentes (e/ou mais abrangentes) do que um programa de

adaptação local, específico a um fenómeno climático extremo (Brooks, 2003; Brooks et

al., 2005). Voltaremos à adaptação mais à frente.

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60

II.4.1 – Impactos Económicos

Atualmente é quase certo a existência de um consenso científico em torno do

fenómeno das alterações climáticas, com origem antropogénica, bem como das

medidas necessárias para adaptar as populações às mudanças climáticas e

consequentemente reduzir a vulnerabilidade bem como a necessidade de mitigação

destes efeitos, ou seja, uma redução gradual nas emissões de CO2 com o objetivo de

não agravar as alterações a longo prazo. No entanto, o principal fator determinante da

aplicação destas medidas é o financeiro, o qual justifica a falta de acordo entre os

vários países ao nível nacional e internacional.

Neste sentido é importante tentar calcular os reais custos monetários dos

impactos das alterações climáticas e se compensa o largo investimento em medidas de

adaptação e mitigação. Vários estudos têm analisado esta temática, no entanto o

Relatório Stern, encomendado pelo ministério das finanças britânico em 2006 continua

a ser o mais significativo por ser o maior e o mais discutido sobre a matéria. A inovação

no relatório Stern (2007) deveu-se à inclusão de elementos que até então não tinham

sido incluídos devido ao grau de incerteza e de dificuldade de cálculo que os

caracterizava particularmente, as medidas de adaptação (e o seu custo), o dano

proveniente de fenómenos extremos e os impactos não económicos (Houghton, 2011).

De facto calcula-se que estes estudos tenham subavaliado os reais custos dos impactos

económicos uma vez que excluíam os impactos mais incertos mas potencialmente os

mais prejudiciais.

De acordo com o Relatório Stern (2007), tendo como ponto de partida um

cenário de aquecimento de 2°C a 3°C até ao fim do século (ou cenário BAU – business-

as-usual), «o custo das alterações climáticas poderia ser equivalente a uma perda

permanente da ordem de 0 a 3% da produção mundial global em comparação com o

que poderia ter sido alcançado num mundo sem alterações climáticas» (Stern, 2007:9).

Os países em desenvolvimento sofrerão quebras mais acentuadas. Com um

aquecimento entre os 5°C e 6°C calcula-se uma perda média de 5 a 10% do PIB global,

com os países em desenvolvimento a sofrerem custos mais significativos, além dos

10% do PIB. A questão da maior vulnerabilidade e maiores impactos nos países em

desenvolvimento é de facto bastante realçada no relatório. Não só estes países

possuem um menor grau de capacidade de adaptação devido ao atraso no

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desenvolvimento, como a agricultura sendo o sector mais vulnerável às alterações

climáticas, possui um peso significativo nas economias destes países e no modo de

sobrevivência dos seus habitantes. Além disso, muitas destas regiões já são, em média,

mais quentes que as mais desenvolvidas, sofrendo também de uma elevada

variabilidade na pluviosidade. Como a maioria possui graves problemas de acesso a

água potável, o aumento das temperaturas nestas regiões trará grandes custos e

poucos ou nenhuns benefícios, ao contrário do que acontece nas regiões

desenvolvidas do norte da Europa (Escandinávia, Rússia) e da América (Canadá), onde

um aumento entre 2°C e 3°C se traduz numa diminuição das mortes pelo frio e num

aumento da produção agrícola (a partir dos 3°C também se observa uma quebra na

produção) (Stern, 2007).

O cenário BAU implica uma redução média do consumo per capita global de 5%

agora e para sempre. No entanto, os custos agravam-se quando temos em conta três

fatores:

Primeiro, a inclusão dos ditos custos “não comerciais”, relacionados

com o ambiente e a saúde humana, aumentariam os impactos de 5% a

11%, ainda que existam aqui questões éticas difíceis de avaliar

monetariamente;

Seguidamente, algumas provas científicas mais recentes, admitem que o

sistema climático é mais sensível do que inicialmente se pensou e que

os feedbacks do sistema podem amplificar ainda mais o aumento de

temperatura já projetado. Assim os impactos no consumo global iriam

agravar-se de 11% para 14%, se já tivermos em conta os impactos não

comerciais;

Finalmente, com um aumento de temperatura entre os 5°C e os 6°C e

tendo em conta os impactos mais severos nas zonas mais

desfavorecidas do globo, a média dos custos dos impactos ao nível

global aumentaria mais um quarto, traduzindo-se numa redução no

consumo per capita na ordem dos 20% (Stern, 2007).

«Em resumo, as análises (...) sugerem que as alterações climáticas do cenário BAU

reduzirão (…) o consumo per capita entre 5 e 20%. Tendo em conta o aumento das

provas científicas de riscos maiores, a prevenção das possibilidades de catástrofes, e

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uma abordagem mais ampla às consequências do que aquelas implícitas em medidas

de redução da produção, é provável que a estimativa apropriada se encontre na parte

superior deste leque» (Stern, 2007:11).

É ainda importante lembrar que certos impactos possuem um valor intrínseco e

que não podem ser avaliados monetariamente. É o caso da perda de espécies e

biodiversidade, de vidas humanas bem como de tumultos sociais e conflitos, associado

à queda de regimes, devido a pressões sociais. Estas podem ter origem por exemplo no

aumento do número de refugiados, derivado não só mas sobretudo do aumento do

nível médio dos oceanos e a pressões nos mercados financeiros globais, como o

aumento do preço dos bens essenciais e instabilidade no sector das seguradoras (com

custos mais elevados e mais voláteis) devido ao aumento da frequência e intensidade

de fenómenos climáticos extremos (Houghton, 2011; Stern, 2007, Halsnæs et al.,

2007).

Como forma de evitar uma escalada da temperatura e das consequências mais

graves que daí podem advir, o relatório propõem uma articulação da mitigação e da

adaptação, tanto ao nível nacional como internacional, a começar no imediato. Ainda

assim, o ênfase é posto na mitigação ou «an anthropogenic intervention to reduce the

sources or enhance the sinks of greenhouse gases» (Klein et al., 2007:750), como forma

de estabilizar as emissões de dióxido de carbono no futuro próximo, uma vez que só

isso evitará danos mais graves. A mitigação diverge da adaptação uma vez que,

enquanto a primeira reduz todos os impactos, sejam eles positivos ou negativos, a

adaptação é mais seletiva, podendo optar por aproveitar as vantagens dos benefícios

e/ou reduzir os impactos negativos (Goklany, 2005). Divergem também na escala em

que são projetadas: enquanto a mitigação é aplicada ao nível regional/local mas possui

benefícios globais, necessitando para isso do empenho e convergência de uma série de

emissores de gases com efeito de estufa, para que ocorra uma mudança significativa

no sistema climático; a adaptação é aplicada ao nível do impacto específico que

ocorre, na melhor das hipóteses, a uma escala regional, sendo que a eficácia das

medidas varia consoante o contexto social, económico e político onde se aplica (Klein

et al., 2007). Ainda que seja difícil calcular monetariamente os benefícios da adaptação

(o que impede a comparação entre os vários métodos), o facto de produzir efeitos

imediatamente e rentabilizá-los ao longo do tempo (à medida que as alterações

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climáticas se intensificam), como a redução da vulnerabilidade das populações, tem

levado (recentemente) a uma maior motivação perante as ações de adaptação. De

facto, durante bastante tempo, o focus das comunidades internacionais esteve

centrado no combate às emissões de gases com efeito de estufa. Apenas quando a

comunidade internacional percebeu que certas alterações já se encontravam em curso

e portanto eram inevitáveis, o focus passou a centrar-se (excessivamente) na

adaptação em prol da mitigação (Dang, 2003). Também contribuiu para esta situação

uma defesa mais exacerbada da adaptação por parte dos atores privados, comunidade

civil, entre outros, que viram diretamente os seus interesses afetados. Pelo contrário,

devido à longa duração dos gases com efeito de estufa na atmosfera, os benefícios

produzidos pela mitigação são gerais e apenas terão efeito dentro de muitas décadas

Só muito recentemente investigadores têm apontado para uma sinergia entre a

adaptação e mitigação, adaptando-as à região a aplicar, como forma de alcançar um

desenvolvimento sustentável (Dang, 2003).

De uma forma geral, ambas as áreas se encontram intimamente relacionadas

com o desenvolvimento sustentável, a mitigação no longo termo e a adaptação no

curto termo. Além disso, a adaptação pode ser reativa (na resposta às alterações

climáticas) e/ou proactiva enquanto a mitigação apenas pode ser proactiva no sentido

de prevenir um maior agravamento das alterações climáticas nos próximos séculos

sendo que o sucesso e eficácia da sua implementação dependem de um conjunto de

fatores socioeconómicos, entre os quais os padrões de crescimento económico,

tecnologia, população, governança e politicas ambientais (Dang, 2003). No entanto,

ainda que possam complementar-se na procura de um desenvolvimento sustentável,

como já foi referido, também podem ocorrer conflitos entre as duas áreas

especificamente na opção de políticas nacionais. Por exemplo «installing air

conditioning systems in buildings is an adaptation option, but energy requirements can

increase GHG emissions, and thus climate change» (Halsnæs et al., 2007:142).

O Relatório Stern aponta para uma articulação entre a adaptação e a mitigação

ainda que ainda que as prioridades devam ser centradas na mitigação, uma vez que

apenas esta possibilita o combate claro às alterações climáticas e ao aumento da

temperatura a níveis onde não haja possibilidade sequer de adaptação. Assim, para

estabilizar as emissões de gases com efeito de estufa entre os 500 e 550 ppm os custos

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64

serão aproximadamente 1% do PIB global anualmente até 2050, com um leque entre -

2% e +5%, que refletem as incertezas na evolução de certas variáveis como a inovação

tecnológica, a eficácia e rapidez da aplicação de medidas a nível global. Esta situação

equivale a uma redução das emissões entre 60% e 80% dos níveis de 1990 até 2050,

partindo do princípio que a emissões estabilizariam nos próximos 10 a 20 anos, a partir

do qual baixariam entre 1% e 3% ao ano. A partir de 2050 as incertezas aumentam

devido em grande parte à reação do sistema climático, sendo que a margem de erro

das projeções dos impactos varia entre -4% e +15%. Além disso os custos não incluem

a despesa com a adaptação que até 2050 pode chegar a 0.5% do PIB global e que

tenderá a agravar-se consoante as alterações se intensifiquem (Stern, 2007).

Ainda assim, se parece existir uma grande probabilidade de os custos com

adaptação e mitigação ultrapassarem o 1% do PIB global anual, o investimento

compensará, em larga medida, os prejuízos à civilização proveniente das alterações

climáticas durante os próximos séculos. De facto, quanto mais rápido for a atuação,

maior a probabilidade de se evitar mudanças climáticas extremas, onde os impactos

são imprevisíveis.

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65

II.4.2 – Impactos Económicos na Europa

Os impactos económicos para a Europa serão bastante avultados, exercendo

uma maior pressão sobre o projeto europeu, à medida que aumenta o “gap” entre o

norte e o sul. Com um aumento de temperatura média entre 2.5°C e 5.5°C (cenário A2)

e 1°C a 4°C (cenário B2), o aumento será superior no Sul, como já foi referido

anteriormente, podendo haver aumentos de temperatura em partes de França e na

Península Ibérica, no Verão, que ultrapassem os 6°C (Alcamo et al., 2007:547). A

combinação de temperaturas mais elevadas e uma redução significativa da

precipitação média de Verão implicará também um reforço na ocorrência de ondas de

calor e secas no Mediterrâneo, que tenderão a iniciar-se mais cedo no ano e a

prolongar-se durante mais tempo (Beniston et al., 2007). Aumentos desta magnitude

associados a períodos mais frequentes e prolongados de calor intenso implicam

diretamente uma quebra na produção agrícola e um aumento no risco de incêndios

florestais para esta região (Olesen, 2002; Pausas, 2004; Maracchi, 2005; Pereira, 2005;

Pausas, 2012). A quebra da produção agrícola no Sul da Europa deve-se sobretudo ao

aumento da frequência de fenómenos climáticos extremos (longos períodos de calor

intenso, episódios de precipitação intensa), que contribuem para um aumento da

variabilidade da produção, sendo que, especificamente, no Sul da Europa observa-se

uma redução na produção agrícola média, ao mesmo tempo que aumenta a

necessidade de água por parte das culturas (Olesen, 2002; Giannokopoulos et al.,

2005; Audsley et al., 2006). O calor excessivo encontra-se também associado a um

aumento dos problemas de saúde (ex. da onda de calor europeia de 2003 que implicou

um excesso de 35 000 mortes), juntamente com uma maior procura de água, tanto

pela população como pela agricultura, no período em que ela é mais escassa.

De facto, a quebra da precipitação no Sul é mais um fator a acentuar aí os

impactos económicos. Com uma quebra na precipitação entre 30-45% em toda a bacia

do Mediterrâneo, podendo alcançar os 70% em algumas regiões, durante o Verão, a

capacidade de abastecimento das populações e das atividades agrícolas e inclusive

industriais ficará bastante mais limitada, agravando uma crescente disputa pelos

recursos. Uma menor disponibilidade hídrica das barragens implica uma menor

qualidade da água e uma diminuição na produção de eletricidade durante o Verão

precisamente no período onde de prevê um aumento do consumo de energia. Ao

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66

contrário da diminuição da precipitação anual, os fenómenos de precipitação intensa

têm tendência a aumentar, incrementando a probabilidade de inundações e cheias nas

regiões de planície, junto aos cursos de água, sendo que a maioria destas regiões

encontra-se densamente urbanizada (Alcamo et al., 2007).

Outra das principais vulnerabilidades que afecta a Europa é a subida do nível do

oceano e um aumento dos impactos nas regiões costeiras. Apesar da subida do nível

dos oceanos, a pressão humana sobre as zonas costeiras continua a aumentar, sendo

estas regiões densamente povoadas e urbanizadas. De facto, não só as principais

capitais europeias são cidades costeiras, como também é nestas regiões que se

desenrola uma intensa atividade económica através dos principais portos comerciais

ao nível mundial. As projeções apontam que até 1.6 milhões de europeus venham a

ser afetados todos os anos nas regiões costeiras devido, sobretudo, à subida do nível

dos oceanos (Alcamo et al., 2007).

Finalmente, as alterações climáticas poderão também afetar outras atividades

económicas como o turismo e a área das seguradoras. Relativamente ao turismo é

esperado uma diminuição dos turistas no Sul da Europa, à medida que estes rumam

mais para norte, para regiões com temperaturas mais amenas e onde o calor não seja

tão intenso. É também esperado instabilidade no sector das seguradoras e um

agravamento das apólices devido ao aumento na frequência e intensidade de

fenómenos extremos (Alcamo et al., 2007).

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67

Capítulo III – Segurança Nacional e Segurança Ambiental

III.1 – Segurança Nacional

O conceito de segurança ambiental deriva necessariamente da compreensão da

segurança, particularmente do conceito de segurança nacional, desenvolvido pela

disciplina das Relações Internacionais. Nesta lógica é por aqui que necessitamos de

começar.

A segurança é um conceito universal ainda que vago e pouco claro, apesar de

se encontrar na base da teoria política contemporânea. De acordo com o Shorter

Oxford Dictionary, segurança é: «1. the conditions of being protected from or not

exposed danger; safety. 2. freedom from doubt. Now chiefly, well founded confidence,

certainty. 3. freedom from care, anxiety or apprehension; a feeling of safety.» (Barnett,

2001; 23). Neste sentido o conceito de segurança encontra-se historicamente

relacionado com a proteção e a capacidade (da pessoa) de se sentir segura

relativamente a alguma contingência, sendo, portanto, algo intuitivamente desejável.

O risco é uma característica estrutural no conceito de segurança que possibilita

a caracterização da última de duas formas. Primeiro a segurança pode ser específica a

um risco particular. Esse risco responde à pergunta “o quê?” (what) na segurança. O “o

quê?” refere-se ao fenómeno que é securitizado, por exemplo, uma cheia.

Seguidamente, de forma a identificar os sujeitos afetados surge a pergunta “a quem?”

(who), que, de acordo com o nosso exemplo, seria toda a população, ainda que

existam regiões onde o risco de cheia é mais elevado e, portanto, onde as populações

se encontram mais ameaçadas (Barnett, 2001). Ainda que estas duas questões sejam o

mínimo para identificar um problema de segurança, existem outras questões que

ajudam a delimitar e a possuir um conhecimento mais profundo sobre o fenómeno.

Essas outras questões são: security for which values?, how much security?, by what

means?, at what cost?, in what time period? (Baldwin, 1997).

Por outro lado, a avaliação do risco e da vulnerabilidade é sempre uma questão

subjetiva e sujeita aos valores do especialista. «There is no purely objective basis upon

which to assess the probability of food shortages, military aggression, a nuclear reactor

accident, or rape. We can say, on the basis of evidence, that such events might in a

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general sense be more or less likely, and we can consider with some accuracy the

impact of such an event, but we cannot objectively quantify the risk per se.» (Barnett,

2001:25). Neste sentido, e porque não existe uma realidade concreta para o risco e

para a segurança, os indivíduos podem sentir-se seguros apesar de o risco ser elevado

e da mesma forma sentir-se inseguros quando o risco é baixo, o que justifica a

ambiguidade e a contestação do conceito apesar de a praxis permanecer igual (Buzan,

1991).

É ainda importante referir que quando um problema é rotulado como uma

questão de segurança — isto é, um interesse vital— este torna-se de imediato uma

prioridade do Estado que a ela aloca a sua capacidade de resposta, mesmo que

atropelando no processo liberdades e direitos individuais. A situação deixa de ser

solucionada pelas instituições convencionais e passa a requerer medidas

extraordinárias. «In the same way that the US is now engaged in a “war on drugs”,

suggesting a response of a kind equivalent to war, labeling a particular challenge a

security issue scripts that challenge as a threat to sovereignty, consequently excusing

the state from the normal checks on its behavior. This is a critically important aspect of

the use of security; it raises the stakes of certain problems and justifies drastic a

potentially unaccountable action.» (Barnnet, 2001:25). Para mais informação sobre

como um problema se transforma num problema de segurança consultar a

Metodologia.

As origens da segurança nacional, se olharmos para o modelo histórico

ocidental, remontam ao período medieval estendendo-se ao período renascentista. A

estruturação mais evidente do Estado moderno inicia-se a partir da finalidade da

segurança, garantido pelo sistema feudal medieval.

Teoricamente o processo seria iniciado através de um contrato informal,

segundo o qual era garantida a segurança aos constituintes da comunidade política

pela elite governante em troca do produto do trabalho e ajuda na guerra (Lara, 2007).

Com a proliferação destes reinos e principados por toda a Europa, durante o

Renascimento, e consequentes períodos de expansionismo e retração, o conceito de

segurança nacional começou a focar-se fortemente na defesa da integridade

territorial. Foi também durante este período que um dos primeiros textos realistas foi

redigido por Maquiavel, O Príncipe, que acaba por colocar um cunho teórico a uma

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contingência que só pela praxis histórica da época se foi formando: a da

monopolização militar do conceito de segurança.

A assinatura do Tratado de Vestefália em 1648 definiu os Estados como

entidades soberanas com capacidade militar e delimitados territorialmente por

fronteiras formais que teriam que ser protegidas a todo o custo, tornando-se a

segurança militarizada um princípio constitutivo do moderno Estado-Nação e

ganhando aqui uma legitimidade política para além de uma formulação teórica.

As origens dos estudos modernos de segurança remontam ao período entre as

duas grandes guerras. Depois do fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) a ênfase

dos estudos centrou-se na exportação de modelos democráticos, na arbitragem das

tensões que surgissem, na autodeterminação nacional, no desarmamento e na

segurança coletiva, de forma a promover a paz e a segurança internacional, focando-se

também nas convenções, tratados e organizações internacionais para além de na força

militar. Os estudos de segurança foram-se tornando cada vez mais complexos ao

ganharem uma componente jurídica e atentarem aos princípios ocidentais que se

foram disseminando, pelo que esta é uma diferença fundamental relativamente aos

ensaios e estudos sobre a segurança até 1940, sobretudo preocupados com a força

militar e o equilíbrio de poderes (Baldwin, 1996).

Mas o debate não cessaria aqui. O período do pós-Segunda Guerra Mundial,

principalmente durante o período da Guerra Fria é apelidado por muitos como a Era

Dourada dos estudos de segurança “realistas”. O ressurgimento do realismo, que

centra a segurança na autonomia do Estado-Nação e enfatiza o poder militar como

base do poder político na sociedade internacional, encontra-se muito associado ao

falhanço do paradigma mais liberal do período entre as duas guerras durante o qual foi

dada prioridade à cooperação e à democratização para que se evitasse outro grande

conflito (Idem).

O antagonismo crescente entre os EUA e a URSS ajuda também a explicar

porque é que os estudos de segurança passaram a ser dominados por considerações

relativamente ao uso da força e ao armamento nuclear, para além de se debruçarem

sobre temas habituais como o controlo de armas e a limitação da guerra, ainda que

intelectuais que definiram os estudos de segurança nos termos da força militar (Idem;

Ullman,1983) tenham notado uma tendência, durante este período, para enfatizar

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exageradamente os aspetos militares da segurança nacional. Ainda assim a corrente

dominante, constatando a anarquia do sistema internacional, colocava como o

objetivo primordial dos Estados o da própria sobrevivência, que seria melhor

assegurada através da maximização do poder militar.

«Interest in security studies did not revive immediately after de Vietnam War;

rather the lessened cold war tensions associated with détente allowed other issues,

such as economic interdependence, Third World poverty, and environmental issues, to

increase in salience. And the Arab oil embargo served as a sharp reminder that threats

to the American way of life emanated from nonmilitary sources, as well as from

military ones» (Baldwin, 1997:4). Apesar do surgimento de novas perspetivas sobre a

segurança nacional a componente militar continuou a dominar o panorama dos

estudos de segurança ao longo do século XX.

Deste modo existem diversas definições para o conceito de segurança nacional,

que vão desde uma perspetiva mais restrita a uma mais abrangente. As perspetivas

mais restritas, que dominaram o panorama durante a Guerra Fria, focam-se

essencialmente nas ameaças militares externas, excluindo ameaças ambientais e

outras vulnerabilidades não-militares, definindo portanto segurança nacional como

«the absence of a military threat or with the protection from external overthrow or

attack» (Haftendorn, 1991:4). De facto alguns intelectuais (Walt, 1991; Mearsheimer,

2007) continuam a argumentar que, independentemente do fim da Guerra Fria, os

problemas de segurança mantém-se sobretudo relacionados com a capacidade militar

dos Estados, não sendo por isso necessário reformular o conceito tradicional de

segurança nacional (Baldwin, 1996).

Por outro lado existem cada vez mais intelectuais que argumentam a

necessidade de alargar o conceito (Booth, 1991; Buzan, 1991), no sentido de abranger

ameaças internas e externas de carácter militar e não-militar, provenientes por isso de

vulnerabilidades não tradicionais. Para estes autores, definir a segurança nacional

apenas em termos militares é errado por projetar uma falsa imagem da realidade que

leva os Estados a ignorar outras ameaças, por vezes mais perigosas.

Nesta conceptualização alargada a definição de segurança mais reconhecida é

talvez a de Ullman (1983:133): «a threat to national security is an action or a sequence

of events that (1) threatens drastically and over a relatively brief span of time to

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degrade the quality of life for the inhabitants of a state, or (2) threatens significantly to

narrow the range of policy choices available to the government of a state or to private,

nongovernmental entities (persons, groups, corporations) within the state». Enquanto

a primeira parte da definição se refere a um conjunto de distúrbios desde guerras

externas, rebeliões internas, bloqueios e boicotes, a desastres “naturais” devastadores

como epidemias dizimadoras, cheias catastróficas ou massivas e persistentes secas, o

segundo ponto remete para ameaças aos valores exportados (neste caso pelos EUA) e

que podem indiretamente afetar o Estado (por exemplo, se vários Estados se fecharem

economicamente aos EUA isso pode significar uma ameaça à economia americana e,

consequentemente, à segurança nacional).

No entanto, há quem considere que o alargamento excessivo do conceito

dificulta a sua operacionalização. É o caso de Levy (1995:40), que tenta chegar a um

meio-termo: «A threat to national security is a situation in which some of the nation’s

most important values are drastically degraded by external action». Ainda assim o

conceito reflete bastante, talvez demasiado, a perspetiva norte-americana de que a

ameaça é sempre externa e consciente. Se tivermos em conta a perspetiva de Ullman

(1983) é fácil perceber que existem uma serie de ameaças, nomeadamente catástrofes

naturais, que não são causadas por nenhum agente nem tão pouco são premeditadas.

A tentativa de abranger o conceito de segurança nacional para incluir outras

formas de ameaça, especificamente a ambiental, é de facto um problema complexo

que acarreta uma série de dificuldades. Para além da dificuldade de operacionalização

do conceito como já foi referido, a tentativa de obtenção de um conceito de segurança

nacional mais abrangente e maioritariamente aceite é sempre condicionada pela

perspetiva do investigador/analista.

Sendo que a grande maioria dos estudos sobre segurança que vingaram na

Escola das Relações Internacionais são produzidos por norte-americanos, estes acabam

por refletir o que os seus autores consideram como ameaça aos EUA. É por isso que

erradamente se foi formando uma perspetiva segundo a qual a escassez de recursos é

sobretudo uma ameaça para os países em desenvolvimento, não sendo um problema

de segurança para os EUA e portanto não sendo considerado um problema de

segurança para os países desenvolvidos. A única vulnerabilidade equacionada como

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problema de segurança é a escassez crescente de petróleo — muito devido à

experiencia sofrida durante o embargo dos anos 70 (Levy, 1995).

No entanto a questão da escassez de recursos é um problema bastante

premente uma vez que pode levar a uma escalada de conflitos. No curto prazo e numa

primeira instância afetará os países com economias em desenvolvimento que tendem

a depender de commodities para formar modelos económicos de exportação que

estimulem a industrialização interna e a modernização da economia.

Homer-Dixon (1999), relembrando-nos que os recursos económicos são

escassos e finitos, diz-nos claramente que a sua sobre-exploração na prática acaba por

exercer uma marginalização ecológica para aquelas comunidades que não podem e/ou

não conseguem aceder-lhes. Isto por sua vez afetará crescentemente a vitalidade do

sistema económico internacional, aumentando ainda mais as fileiras dos

marginalizados.

Isto tem efeitos sobre a segurança, já que «environmental scarcities also

strengthen group identities based on ethnic, class or religious affiliations, a process

called social segmentation; strengthened identities intensify competition among

groups, reducing social trust and useful intergroup interaction» (Idem:178). Além disso,

em alguns países pobres, a escassez de recursos aumenta as vulnerabilidades internas

e externas Estado, estimulando o comportamento predatório da elite à medida que

diminuem as receitas provenientes da atividade económica, pondo em causa quer a

capacidade administrativa da comunidade política — que deixa de ter receita fiscal

para controlar efetivamente todo o seu território — quer a sua capacidade militar.

Por sua vez este processo agrava as diferenças sociais de riqueza e poder entre

os grupos ao mesmo tempo que enfraquece a capacidade administrativa e a

legitimidade do Estado (esta situação é ainda mais grave quando ocorre em regiões

onde o Estado já possui um controlo deficitário do território).

O enfraquecimento do Estado altera a balança social de poder a favor de

grupos subversivos (cujas identidades foram muitas vezes reforçadas pela

segmentação social) e aumenta as oportunidades para uma ação coletiva destes

grupos contra o Estado (Lara, 2012).

É ainda importante referir que o processo de escalada de um conflito é

bastante complexo e que ao fator ambiental encontram-se associados todo um

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conjunto características, específicas de um determinado momento que confluem para

uma situação de conflito: «It is true that environmental scarcity produces its effects

within extremely complex ecological-political systems. Furthermore, environmental

scarcity is not sufficient, by itself, to cause violence; when it does contribute to violence,

research shows, it always interacts with other political, economic, and social factors.

Environmental scarcity’s casual role can never be separated from these contextual

factors, which are often unique to the society in question» (Homer-Dixon, 1999:178).

Dados os motivos evidenciados, o aumento de conflitos irá afetar, no curto

prazo, países em desenvolvimento. Relativamente aos países desenvolvidos é difícil

equacionar qualquer tipo de projeção por a sua capacidade económica e integração no

comércio internacional lhes terem providenciado mecanismos de ajuste aos resíduos

económicos provocados pela competição crescente por recursos.

Dito isto, o que podemos contabilizar é que as alterações climáticas projetadas

nunca antes foram experienciadas por humanos, sendo que as previsões mais atuais

apontam para alterações mais graves do que aquelas inicialmente supostas. Neste

sentido, e devido às necessidades económicas e societais dos países desenvolvidos

(mais consumistas), é de calcular que terão maior dificuldade em adaptarem-se no

longo-prazo, pelo que é necessário não subestimar o impacto das alterações devido a

uma suposta capacidade económica superior. Os conflitos com origem na escassez dos

recursos (que no caso português bem pode ser a água ou mesmo os cereais, se o preço

destes continuar a aumentar no sistema alimentar internacional como32) irão

avolumar-se e tanto podem ocorrer em países em desenvolvimento como em países

desenvolvidos, o que implica a elevação de vulnerabilidades ambientais específicas

para cada Estado para um problema de segurança nacional (Ullman, 1983).

Também Mathews (1989) e Myers (1994) evidenciaram os perigos para a

humanidade de conflitos provenientes da escassez de recursos associado ao

crescimento exponencial da humanidade nas décadas seguintes. Para Mathews

(1989:166) o carater transnacional dos problemas ambientais cria um novo problema à

soberania dos Estados, obrigando a uma redefinição do conceito de segurança, devido

às ineficiências das instituições à época (logo após o fim da guerra fria) para lidar com

32

FAO (2012), “FAO Price Index”, disponível em http://www.fao.org/worldfoodsituation/wfs-home/foodpricesindex/en/

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os novos desafios, já que estes não só passam a ser transnacionais como os problemas

externos acarretam consequências no domínio da política interna, pelo que a divisão

clara entre as duas fica desfocada uma vez que «environmental decline occasionally

leads directly to conflict, especially when scarce water resources must be shared.

Generally, however, its impact on nations' security is felt in the downward pull on

economic performance and, therefore, on political stability. The underlying cause of

turmoil is often ignored; instead governments address the poverty and instability that

are its results»33.

O mesmo diz Myers (1994) que, para além de identificar vários problemas

ambientais — como a escassez alimentar, a depleção de reservas de pescado, escassez

de água, mudanças climáticas e desflorestação — como causas que contribuirão para o

aumento de conflitos no futuro, foca-se principalmente em explorar os trade-offs

financeiros entre os problemas ambientais e a segurança nacional. Para o autor se

parte da despesa financeira realizada no sector militar fosse ao invés canalizada para a

mitigação dos problemas ambientais identificados, muitos destes problemas já teriam

sido eliminados ou quase eliminados, argumentando assim que os recursos financeiros

aplicados no ambiente providenciam mais segurança do que aqueles aplicados no

sector militar.

No entanto é de perspetivar que não só este tipo de argumento é pouco eficaz

como até falacioso. Quando se projeta um aumento dos conflitos, inclusive da

possibilidade de refugiados ou de guerras, é necessária a intervenção militar, pelo que

esta particular combinação de questões (conflito e desmilitarização) é, do ponto de

vista analítico, incongruente e faz mais por mobilizar as instituições de segurança

nacional do que ameaça-las com um tipo de paz proveniente do ambiente (Barnett,

2001).

33

Para mais sobre este assunto, vide Jessica T. Mathews (1989), “Redifining Security” in Foreign Affairs, Council of Foreign Relations, disponível em http://www.polisci.ufl.edu/usfpinstitute/2010/ documents/readings/matthews1989.pdf

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III.2 – Segurança Ambiental

O conceito de segurança ambiental, desde o seu surgimento em meados dos

anos 70, tem vindo a desenvolver-se, tendo sido reconhecido em meados os anos 80

através de um capítulo no relatório Brundtland, elaborado pela Comissão Mundial

sobre Ambiente e Desenvolvimento (1987), que nos diz que «the environmental

problems of the poor will affect the rich as well in the not too distant future,

transmitted through political instability and turmoil»34 .

Ao longo dos anos 90 o conceito cresceu em importância e uma série de novos

estudos e avaliações científicas foram realizados. No entanto, eventos como a guerra

do Kuwait e o 11 de Setembro, no início dos aos 90 e no início do século XXI

respetivamente, retiraram os assuntos sobre a temática ambiental da agenda política

(principalmente nos EUA) durante alguns anos; as definições militares de segurança

ganharam proeminência uma vez mais (Myers, 2002; Dalby, 2012).

Apesar destes fenómenos, as preocupações com o ambiente não se

desvaneceram. Antes pelo contrário. Os indícios frequentes de alterações nas

temperaturas, degelo das calotes geladas e glaciares, mudanças nos padrões de

migração de diversas espécies, e o despoletar antecipado da Primavera em muitas

regiões do hemisfério Norte tornaram-se esmagadores e reavivaram de uma forma

mais premente as preocupações ambientais. Para Dalby (2012:29), «the security

implications of increased storms and the possible disruptions of major parts of modern

societies were unavoidable in the aftermath of Hurricane Katrina and the flooding of

New Orleans».

Em Abril de 2007 o Conselho de Segurança das Nações Unidas debateu a

questão das alterações climáticas admitindo finalmente o advento de graves

perturbações nas sociedades. Juntamente com filmes, documentários, relatórios

técnicos e uma mudança, ainda que relutante, na retórica da administração Bush e do

Governo Federal conservador do Canadá — que admitiram que o problema

necessitava de ser encarado — sugerem que as mudanças climáticas já não eram

passíveis de serem negadas. O ano de 2007 seria também aquele em que Al Gore e o

IPCC receberiam o prémio Nobel da Paz; o primeiro pelo tão premiado documentário,

34

Sobre este tema, ver UN (1987), “Report of the World Commission on Environment and Development: Our Common Future”, disponível em http://www.un-documents.net/wced-ocf.htm.

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“Uma Verdade Inconveniente”, que alerta para o crescente efeito de estufa,

proveniente das quantidades excessivas de dióxido de carbono libertadas e as

consequências para as gerações futuras e o IPCC pelo trabalho na divulgação científica

sobre as alterações climáticas, que se traduziram em quatro relatórios, o último dos

quais apresentado em 2007, cujos resultados atestam, de forma inequívoca, para a

influência dos fatores antropocêntricos na mudança do clima (Idem).

Os problemas sobre os quais se ocupa a segurança ambiental não são novos. De

facto, apesar de o primeiro conflito registado ter ocorrido há 4500 anos entre duas

cidades-Estado na antiga Mesopotâmia, o conceito de segurança ambiental tem

apenas algumas décadas, encontrando-se associado sobretudo, ao crescimento

explosivo da população a partir de meados do século XX.

O problema da água potável tem servido de exemplo-chave na segurança

ambiental: desde 1950 o fornecimento de água fresca por pessoa diminuiu cerca de

60% ao mesmo tempo que a população aumentou 150%; o consumo de água cresceu

em 180% prevendo-se um aumento adicional nas próximas duas décadas de 40%; no

mesmo período de tempo ocorreram mais de 450 disputas hostis relacionadas com a

água e em 37 dessas ocasiões os países rivais recorreram a fogo armado, rebentaram

uma barragem ou levaram a cabo outros tipos de ação violenta (Myers, 2002).

Atualmente pelo menos 261 dos maiores cursos de água do Mundo são

partilhados, sendo que 176 circulam entre dois países, 48 entre três países e 37 entre

quatro ou mais países. Enquanto as bacias hidrográficas destes mesmos cursos de água

representam mais de 45% da superfície terrestre e 60% do fornecimento de água

potável, ao mesmo tempo abastecem 40% da população mundial com água para uso

doméstico, agrícola, produção de energia, entre outros. Por outro lado três mil milhões

de pessoas (dois quintos da população dispersa em 80 países) sofrem de sérias

dificuldades no abastecimento de água e dois terços da água retirada de reservatórios

subterrâneos é utilizada para a produção de alimentos (Myers, 2002).

Estes números traduzem-se em situações concretas: o corte/desvio das

principais fontes de abastecimento de Israel e do Egipto, o rio Jordão e o Nilo, é uma

ameaça de tal maneira premente para as populações e para a legitimidade política dos

envolvidos que é suficiente para uma declaração de guerra entre os dois países. São

também conhecidos os conflitos existentes entre a Turquia, a Síria e o Iraque pelos rios

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Tigre e Eufrates; entre a Índia e o Paquistão pelo Indus; entre a Índia, o Bangladesh e o

Nepal pelo Ganges; o Brasil e a Argentina pelo Rio de La Plata e entre as nações que

partilham a bacia do rio Mekong (Myers, 2002).

Apesar do sector da água ser o mais associado a conflitos ambientais existem

outras questões com impactos alargados que também podem despoletar uma

escalada de violência, nomeadamente a desertificação. De facto, «by virtue of its

capacity to trigger famines, internal displacements and international migration,

desertification often serves as a recipe for political instability (Algeria, Chad), for

tensions between neighboring countries (Zimbabwe, Botswana), and even for armed

conflict. It is surely not coincidental that in the Sahel zone of Africa, not a single

government survived the droughts of the 1970s and 1980s, several fell twice over, and

few are moving toward still further collapse» (Idem:3).

Os exemplos descritos rementem-nos para a análise realizada por Homer-Dixon

(1999) sendo que:

1.º Nem todos os problemas ambientais se traduzem em conflitos, tal como

nem todos os conflitos derivam de problemas ambientais;

2.º Raramente os problemas ambientais podem ser descritos como os únicos

fatores que originam um conflito.

Outros fatores como políticas económicas deficientes, estruturas políticas

inflexíveis, regimes oligárquicos, governos opressivos, entre outros igualmente

adversos, na maioria das vezes, agravam problemas ambientais já existentes ao

mesmo tempo que estes fatores são também exacerbados pelos problemas

ambientais, num ciclo vicioso.

Assim, de acordo com tudo o que foi enunciado, a segurança ambiental pode

ser definida como «the relationship to established security of those environmental

factors – water, soil, vegetation, climate, and whatever others are prime components

of a nation’s environmental foundations – that ultimately underpin all our

socioeconomic activities and hence our political stability. Conversely, when these

environmental resources are degraded or otherwise depleted, so our security declines

too» (Idem:5).

Page 86: Dissertação apresentada para cumprimento dos … - Aquecimento global... · Apesar de o aumento de temperatura ser superior nos continentes do que nos oceanos, ... Também os glaciares

78

Apesar da evolução do conceito até à atualidade com um aumento no número

e na qualidade das análises realizadas, a segurança ambiental continua a ser deficiente

na capacidade de previsão, o que de certo modo é um entrave ao estabelecimento do

conceito enquanto parte integrante da segurança nacional. De igual maneira é

fundamental que, dada a complexidade do sistema ambiental, muitos destes

problemas necessitem de ser equacionados do ponto de vista coletivo, sendo que, por

exemplo, nenhum Estado é capaz de combater as alterações climáticas por si só.

Ainda assim a área da segurança ambiental evoluiu bastante, ao ponto de ser

frequentemente referida por Estados como os EUA, o Reino Unido, a Noruega, a Índia

a Austrália, e organizações internacionais como a ONU e até mesmo a NATO.

Infelizmente ainda não foi oficial e formalmente adotada por nenhuma dos Estados

identificados.

Page 87: Dissertação apresentada para cumprimento dos … - Aquecimento global... · Apesar de o aumento de temperatura ser superior nos continentes do que nos oceanos, ... Também os glaciares

79

Capítulo IV – Das vulnerabilidades às Ameaças: aplicação

prática

Não sendo possível testar a forma como algumas vulnerabilidades na região

Portugal, possam evoluir para ameaças, afetando a segurança do Estado português,

decidimos recorrer a exemplos do passado como forma de demonstrar a aplicabilidade

da teoria e de qual o limite entre uma vulnerabilidade grave e uma ameaça à

segurança nacional.

Uma ameaça à segurança define-se como uma ameaça existencial (Buzan,

1998), neste caso ao Estado, sendo por isso necessário definir aquilo que o constitui e

a razão da sua existência. O Estado, de acordo com a doutrina clássica da Ciência

Política, «é toda a população de nacionais fixa num território, onde existe uma

autoridade soberana que tem a missão de assegurar a satisfação das necessidades

coletivas, gerais e abstratas, de justiça, segurança e bem-estar material e espiritual»

(Lara, 2007:272). Neste sentido a entidade Estado é formado por três componentes

fundamentais, a saber:

a) «O povo, entendido como uma coletividade organizada, quase

personalizada, distinta, por valores, cultura e outras características

próprias, das demais coletividades semelhantes;

b) O território, entendido como o espaço geográfico específico, sobre o

qual a referida população organiza imediatamente a sua vida social;

c) O poder político que no caso e plenitude assume a expressão de

Soberania, referida como o poder – conjunto de meios capazes de coagir

a um determinado comportamento – que não tem igual na ordem

interna nem superior na ordem externa dessa relação população

território, e que se justifica pela necessidade de um respetiva

organização interna» (Lara, 2007: 272-273).

Sendo um conjunto de matérias e desempenhos que dão fundamento e razão à

própria existência do Estado, os fins do Estado ou as funções do Estado dividem-se em

três grupos: a Segurança, a Justiça e o Bem-estar económico e social. Para a Segurança,

já amplamente debatida no capítulo anterior, por considerarmos que apresenta um

bom complemento entre as ameaças externas e internas, não sendo excessivamente

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80

focada nas ameaças externas utilizaremos a definição de Lara (2007) que «diz respeito

à defesa externa do Estado e à garantia da ordem a nível interno, abrangendo as

pessoas singulares e coletivas que o constituam, ou que no seu âmbito atuem e ainda

aos valores estabelecidos» (Lara, 2007:343). A Justiça é entendida como «condição

indispensável para garantir a paz social, baseada em “relações de mútuo respeito e

equidade” segundo a doutrina do professor Marcello Caetano, e o Bem-estar material e

espiritual em referência às necessidades coletivas resultantes da Cultura e da

Economia.» (Lara, 2007:343)

Decidimos pegar em duas vulnerabilidades-chave, demonstrando as

consequências que podem gerar se as mesmas vulnerabilidades se agravarem. Por

uma questão de tempo e de dimensão do trabalho, a seleção das vulnerabilidades foi

realizada com base nas alterações mais dramáticas projetadas para Portugal, seja pela

maior probabilidade de ocorrência como pelo facto de serem as que afetam mais

diretamente a vida humana, a estabilidade social e, que consequentemente, se podem

transformar numa ameaça.

À luz das alterações climáticas projetadas para a região do Mediterrâneo, mais

especificamente para Portugal, identificamos duas vulnerabilidades-chave:

1. Aumento da temperatura média, associado a um aumento tanto no

número de dias como na frequência dos períodos de calor intenso

(ondas de calor) e secas;

2. Diminuição da precipitação média anual, com especial incidência na

Primavera e no Verão;

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81

IV.1 - Aumento da temperatura média

O aumento da temperatura média projetada para Portugal é um dos fatores

mais importantes porque, para além de ser o fator mais evidente e imediato, influi

sobre uma diversidade do número de variáveis, desde aumento dos problemas para a

saúde humana, quebra na produção agrícola, maior evaporação dos reservatórios de

água e consequente quebra na produção elétrica proveniente de barragens e na água

disponível para rega. Estas situações são tanto ou mais danosas quanto maior for o

aumento de temperatura, que pode ser experienciado através da ocorrência de ondas

de calor, fenómeno extremo que, de acordo com a Organização Meteorologia Mundial

(OMM) corresponde a um período de, pelo menos, seis dias consecutivos em que a

temperatura máxima diária é 5°C superior ao valor médio das temperaturas máximas

do período de referência, e que têm vindo a aumentar em frequência e magnitude e

que se projeta que continuem a intensificar-se durante o século XXI (IPCC, 2007;

Cunha, 2012).

Em 1995 uma onda de calor atingiu a região da cidade de Chicago, nos EUA,

provocando aproximadamente 700 mortos. Já em 2002, outra onda de calor atingiu a

Índia, provocando cerca de 1000 mortos (Brown, 2006). No entanto, a situação mais

grave ocorreu no Verão de 2003, em plena Europa: estima-se que tenha provocado

aproximadamente 40 000 mortos, apesar de os valores oscilarem entre os 25 000 e 70

000, sendo inclusive considerada a pior catástrofe natural a atingir a Europa nos

últimos 50 anos (D’lppoliti, 2010; Lynnas, 2008).

A combinação de fraca precipitação no Inverno e Primavera antecedentes e

consequente fraca humidade nos solos, anomalias no anticiclone dos Açores e

temperaturas dos oceanos invulgarmente elevadas geraram as condições ideias para

que esse Verão fosse particularmente seco e quente, atingindo o auge nas primeiras

duas semanas de Agosto. As temperaturas foram 5°C superiores à temperatura média

esperada, tendo sido registados recordes absolutos em Portugal (47,4°C na Amareleja),

Reino Unido (38,5°C em Kent) e Escócia (32,9° em Greycrook)35. O fenómeno teve o

seu impacto mais grave em França onde tanto os serviços de saúde como as

infraestruturas não se encontravam preparados para a ocorrência de uma catástrofe

35

Disponível no Instituto de Metereologia de Portugal em http://www.meteo.pt/pt/oclima/extremos/

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deste tipo (García-Herrera, 2010). O Ministério de Saúde Francês divulgou como

números oficiais 14,802 óbitos resultantes da onda de calor mas muitos mais

ocorreram nos Estados vizinhos que também acabaram por ser afetados. Em Portugal,

de acordo com um estudo realizado pela Direcção-Geral de Saúde e o Instituto

Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, estima-se que tenham ocorrido um excesso de

1953 óbitos (Calado, 2004).

Ainda que tenha ocorrido um excesso de quase dois mil óbitos no espaço de

uma semana não consideramos esse fato uma ameaça existencial ao Estado. Os

períodos mais quentes, tal como os períodos mais frios, são caracterizados

precisamente por um aumento do número de óbitos, nos grupos etários mais

vulneráveis.

No entanto a onda de calor de 2003 gerou consequências mais graves para o

Estado, enquanto entidade política soberana. O aumento das temperaturas provocou

também uma quebra na produção agrícola europeia, com particular incidência em

França e nos países do Sul da Europa (Portugal, Espanha e Itália), devido sobretudo ao

stress nas plantas provocado pelo calor extremo, que impede a polinização e o

desenvolvimento das mesmas. A quebra de produção foi particularmente sentida na

produção de cereais (mais de vinte e três milhões de toneladas) apesar de ter afetado

todo o sector agropecuário (produção de leguminosas, frutos, vinho, carne de vaca,

porco e aves). No conjunto, os prejuízos derivados do sector primário a que se somam

os resultantes dos incêndios, rondaram os 13 biliões de euros aproximadamente

(Lynnas, 2008).

A quebra na produção agrícola foi igualmente sentida em Portugal com especial

incidência na cultura de trigo cuja produção em 2003 sofreu uma redução de 55,8%

face ao ano de 2002. Também a cultura do arroz sofreu uma quebra de 10%. O

decréscimo na produção de cereais apenas de 10,4% foi compensado por exceções

como foi um aumento na produção de vinho (ao contrário do que ocorreu no resto da

Europa) e de centeio. As áreas de produção de frutos, vegetais, carne bovina, suína e

avícola também sofreram quebras (COPA-COGECA, 2003).

O mesmo período verificou os incêndios mais graves que ocorreram em

Portugal (Figura 8). «High temperatures and greater dry spell durations increase

vegetation flammability, and during the 2003 heatwave a record-breaking incidence of

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83

spatially extensive wildfires was observed in European countries with roughly 650,000

ha of forest burned across the continent. Fire extent (area burned), although not fire

incidence, was exceptional in Europe in 2003» (Parry et al., 2007:846). Em Portugal a

área ardida totalizou 471813,1 hectares, ou aproximadamente 5% da área florestal

sendo o valor mais elevado alguma vez registado. Quase 46 mil hectares ardidos eram

área agrícola36 o que não só contribuiu para que o impacto económico dos incêndios

excedesse um mil milhões de euros, como também para agravar as falhas na produção

agrícola (Bono, 2004; IPCC, 2007; Lynnas, 2008)37.

Figura 8 – Área Florestal total ardida (1980-2010)

Fonte: figura da autora com base nos dados sobre os incêndios florestais disponíveis no site do Instituto

da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF)

http://www.icnf.pt/florestas/dudf/estatisticas/estatistica-sgif

36

Dados estatísticos sobre os incêndios florestais disponível no site do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) http://www.icnf.pt/florestas/dudf/estatisticas/estatistica-sgif 37

Para mais informações sobre o surgimento, evolução e impactos da onda de calor de 2003 consultar PARRY et al. (eds.) (2007), Cross-chapter case studies in Climate Change 2007: Impacts, Adaptation and Vulnerability. Contribution of Working Group II to the Fourth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change disponível em http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg2/ar4-wg2-xccc.pdf e GARCÍA-HERRERA, R. et al. (2010), “A Review of the European Summer Heat Wave of 2003”, Critical Reviews in Environmental Science and Technology disponível em http://www.iac.ethz.ch/people/fischeer/docs/garcia_2010.pdf

0

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10

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Neste sentido podemos admitir que o episódio produziu uma ameaça

existencial significativa, que não foi sentida devido aos preços baixos dos cereais nos

mercados internacionais em 2003. Atualmente os preços encontram-se quase três

vezes superiores ao registado no ano da onda de calor, pelo que é possível projetar

que o impacto na população da quebra da produção agrícola, sobretudo num período

de crise grave, seria bastante mais acentuado (Figura 9).38

Figura 9 – FAO food price index

Fonte: FAO Food Price Index disponível em http://www.fao.org/worldfoodsituation/wfs-

home/foodpricesindex/en/

Para além dos óbitos que ocorreram (devido diretamente ao calor excessivo ou

durante os incêndios), a quebra na produção agrícola torna-se uma ameaça existencial

quando o país não produz o mínimo necessário para satisfazer o mercado interno e

necessita de recorrer aos mercados internacionais, colocando a entidade numa grave

situação de dependência face o exterior. Assim, o Estado não consegue cumprir um

dos seus fins, o bem-estar do povo, que é também um dos componentes fundamentais

38

FAO Food Price Index disponível em http://www.fao.org/worldfoodsituation/wfs-home/foodpricesindex/en/

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85

do mesmo. Na antiguidade várias civilizações prosperaram e caíram consoante a

existência de alimento suficiente ou não, pelo que na civilização moderna, ainda que

existam mecanismos que atenuam o efeito da falta de alimentos, o problema persiste.

No caso português, a integração no espaço europeu e todos os mecanismos existentes

possibilitam uma maior integração de Portugal nos mercados, pelo que a falta de

alimentos não é tão sentida. No entanto, em países menos desenvolvidos ou fora

destes sistemas de suporte, a falta de alimentos é bastante mais notória, com efeitos

mais rápidos e graves. Por exemplo a escalada de instabilidade originada pelo aumento

do preço dos alimentos nos mercados internacionais e falta de produção interna,

propiciou a revolução que ocorreu em 2011 no Egipto (Cunha, 2012). Também o chefe

de Estado de São Tomé e Príncipe veio apelar ao cultivo de todos os terrenos passíveis

de serem cultivados para evitar uma crise alimentar no ano que vem39.

39

Notícia “São Tomé e Príncipe: Governo prevê agravamento da situação alimentar no próximo ano”, Expresso, disponível em http://expresso.sapo.pt/sao-tome-e-principe-governo-preve-agravamento-da-situacao-alimentar-no-proximo-ano=f755143 (consultado em 22/09/2012)

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IV.2 – Diminuição da precipitação média anual

A diminuição da precipitação média anual projetada de -25% a -50%,

especialmente incidente nos meses da Primavera e do Verão, não só intensifica como

é intensificada pelo aumento da temperatura. Esta tendência, que já vem sendo

sentida ao longo dos últimos 20 anos, potencia períodos de seca, com períodos de

retorno mais reduzidos, sendo que as mais graves e incidentes ocorreram nos últimos

dez anos (Santos e Miranda, 2006)40.

Como seca entendemos que são «situações de escassez de água com longa

duração, que abrangem áreas extensas e com repercussões negativas significativas nas

atividades socioeconómicas e nos ecossistemas, podendo-se definir como situações

excecionais em que as disponibilidades hídricas são insuficientes para satisfazer as

necessidades de água de determinada região» (Santos, 1998:3). A seca é também um

fenómeno com contornos mal definidos, que se desenvolve lentamente no tempo e

que se traduz essencialmente numa acumulação de efeitos, sendo por isso passível de

só ser identificada (na maioria das vezes) após já estar instalada e através de uma

reavaliação retrospetiva (Santos, 1998). Em regra podemos definir a seca em quatro

grandes grupos: seca meteorológica (verifica-se quando a precipitação encontra-se

bastante abaixo dos valores normais esperados), seca hidrológica (quando os caudais

dos rios e os níveis dos aquíferos encontram-se abaixo do normal), seca agrícola

(quando a quantidade de água armazenada no solo é insuficiente para suprimir a

necessidade de desenvolvimento das plantas) e finalmente seca económica (verifica-se

quando o deficit de água provoca a falta de bens ou serviços, como a água para

consumo urbano-industrial, energia elétrica, alimentos, entre outros) (Cunha, 2012).

Tomamos como exemplo a seca de 2005 e de 2012.

A seca de 2005, que ocorreu no período de Novembro de 2004 a Fevereiro de

2006 «fez jus ao sentido mais abrangente das definições de seca para os climas

semidesérticos e mediterrânicos no que se relaciona com a da sua natureza inter

anual» (Rodrigues et al., 2006:2). A semelhança existente entre a pluviometria dos

primeiros quatro meses do ano hidrológico de 2005/2006 e do ano de 2003/2004

40

Secas em Portugal disponíveis no site do Instituto de Meteorologia http://www.meteo.pt/pt/areaeducativa/otempo.eoclima/seca.meteo/index.html?page=seca.pt.xml

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indica que a sua proximidade ao ano seco, faz com que esses três anos hidrológicos

compreendam um período inter anual de seca (Figura 10).

Figura 10 - Variação da pluviometria ponderada no território continental desde o

Outono de 2003

Fonte: RODRIGUES, Rui, Cláudia Brandão, Ana Rita Lopes e Miguel Nunes (2006), Caracterização do

Período de Quatro Meses do início do ano hidrológico de 2005/2006 e seu Enquadramento na severidade

da Seca decorrente do ano hidrológico de 2004/2005, Instituto da Água — Direção de Serviços de

Recursos Hídricos, Lisboa, disponível em

http://snirh.inag.pt/snirh/download/relatorios/SECA2006_Jan.pdf

Depois de o ano hidrológico de 2003/2004 ter estado ligeiramente abaixo da

média, a excessiva precipitação em Outubro de 2004 fez crer que o Inverno de

2004/2005 iria compensar os efeitos ligeiros a moderados de seca que haviam sido

sentidos. No entanto, os meses seguintes de Novembro a Setembro, a precipitação

esteve quase a 75% abaixo do que seria esperado para cada mês (Figura 11, Tabela 3).

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Figura 11 – Evolução da seca

Fonte: Mapas disponíveis no site do Instituto da Água (INAG) disponíveis em

http://snirh.inag.pt/snirh/_dadossintese/precipitacao/mapas_resumo/entrada.php?periodo=2000%2F2

011&mes=-1&ano=2004&tp_mapa=mensal

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Tabela 3 – Distribuição da precipitação

Meses Registada (mm) Média (mm)

Outubro 159.4 92.5

Novembro 19.9 118

Dezembro 43.8 129.8

Janeiro 7 126.8

Fevereiro 18.7 112.2

Março 52.6 93.5

Abril 32.8 74.7

Maio 32 68.5

Junho 5.6 32.7

Julho 8.3 10.3

Agosto 3.4 11.6

Setembro 14 41.8

Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados fornecidos pelo INAG disponíveis em

http://snirh.inag.pt/snirh/_dadossintese/precipitacao/mapas_resumo/entrada.php?periodo=2000%2F2

011&mes=-1&ano=2004&tp_mapa=mensal

A diminuição da precipitação originou um conjunto de efeitos sendo que o

sector mais afetado foi a agricultura. Verificaram-se quebras generalizadas e bastante

acentuadas na produção agrícola nomeadamente a cerealífera que sofreu uma

redução de mais de 30%, face ao ano anterior, com excepção apenas para o trigo mole

(Quadro 3).

Quadro 3 - Terra Arável, Terra Agrícola, Produção de Cereais e Índice de Produção

Pecuária em Portugal, 1990-2010

Terra Arável (% da Área

Territorial Total)

Terra Agrícola (% da Área

Territorial Total)

Produção de Cereais (kg

por hectare)

Índice de Produção Pecuária (2004-

2006=100)

1990 25.6 43.3 1877.7 84.89

1991¹ 25.2 42.8 2160.5 87.51

1992¹ 24.9 42.4 1779.0 89.74

1993¹ 24.5 43.3 2033.4 91.6

1994¹ 24.0 43.2 2398.7 90.4

1995¹ 23.5 42.9 1993.8 92.52

1996 21.9 40.8 2498.2 93.68

1997 20.6 39.1 2220.8 96.31

1998¹ 20.8 41.2 3135.3 99.3

1999¹ 18,7 42.2 2829.3 101.0

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2000 17.8 41.9 2780.7 101.4

2001 17.4 41.5 2632.3 99.7

2002 17.6 42.0 2905.7 101.7

2003 16.8 41.7 2629.2 97.1

2004 16.8 41.7 2945.5 99.8

2005¹ 13.8 41.6 2027.4 102.1

2006 13.8 41.2 3122.6 98.1

2007 12.3 40.2 3463.3 100.9

2008 12.8 40.8 3597.8 107.3

2009 12.3 40.3 3473.2 105.9

2010 — — 3462.9 107.8 Quadro da autora, a partir de dados do Banco Mundial disponíveis em http://data.worldbank.org/country/portugal. Notas elaboradas a partir de constatações do Instituto de Meteorologia de Portugal, disponíveis na íntegra em http://www.meteo.pt/pt/area educativa/otempo.eoclima/seca.meteo. Nota:¹A constatação de secas (de gravidade espacial variável) no território português tem vindo a aumentar desde a década de 90, sendo que na década de 80 apenas uma afetou o território nacional entre 1980 e 1981. Acresce dizer que é difícil distinguir aquelas que derivam do sistema climático mediterrâneo das que decorrem diretamente das alterações climáticas. Contudo, secas como a de 2005 e respetivos efeitos na produção de cereais por hectare tenderão a repetir-se mais vezes de acordo com o IPCC. A colocação do Índice de Produção Pecuária é exclusivamente por uma questão de transparência metodológica, para uma melhor constatação da situação do setor primário.

A quebra na produção de arroz rondou os 50% no Alentejo e no Algarve não se

chegou a realizar a cultura. Os prados, as pastagens e as culturas forrageiras também

foram fortemente afetadas pela escassez hídrica: em Junho os pastos já se

encontravam na sua maioria esgotados o que obrigou à compra extra de alimento para

a manutenção dos animais. A escassez de água em pequenas lagoas, poços e furos

obrigou ao transporte frequente de água em tanques para os animais. Houve também

quebra na produção de girassol (89%), grão-de-bico (64%), feijão (29%) e melão (15%)

e uma redução na área de produção de tomate de 8%. Relativamente à batata, a de

regadio sofreu uma quebra média de 17% enquanto a de sequeiro rondou os 40%

(Comissão para a seca 2005) (Figura 12).

Relativamente às fruteiras observou-se uma diminuição na produção da maçã

(17%), da pera (28%) e do figo (36%), com excepção para a laranja que aumentou em

7%. No entanto é preciso salientar que «nas zonas em que se verificou falta de água

para rega, a produção registou decréscimos acentuados. Os prejuízos sofridos

decorreram essencialmente da desvalorização dos frutos, devida aos pequenos calibres

que apresentavam e à sua deficiente qualidade, o que obrigou ao seu escoamento para

a indústria de transformação» (Comissão para a seca 2005:28).

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Figura 12 – Variação da produção em relação ao ano anterior (data de referência 31

de Dezembro de 2005)

Fonte: Comissão para a seca 2005, Relatório de Balanço, disponível em

http://www.inag.pt/inag2004/port/divulga/actualidades/seca/relatorioBalanco.pdf

A quebra na produção agrícola foi acompanhada por um aumento da tensão

entre agricultores e populações à medida que as reservas hídricas iam diminuindo. Por

exemplo em Fevereiro ficou decidido que a água da albufeira do Arade seria destinada

ao consumo doméstico e não à exploração de citrinos. Do mesmo modo também a

albufeira do Roxo, que abastece Beja e Aljustrel, foi alvo de restrições para a atividade

agrícola41. Este fenómeno obrigou ao aumento do abastecimento de populações

através dos bombeiros: no período entre 1 de Janeiro e final de Setembro de 2005

foram registados 18452 abastecimentos, uma média de 60 por dia que aumentou para

uma centena durante o Verão (Comissão para a seca 2005).

A escassez de pluviosidade implicou também que a vegetação ficasse seca mais

cedo no ano, o que acabou por contribuir para uma elevada época de incêndios. É de

41

Notícia de Roberto Dores (2005), Falta de água pode afetar um milhão de portugueses, Diário de Notícias, disponível em http://www.dn.pt/inicio/interior.aspx?content_id=609622 (consultada a 24/09/2012)

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92

referir que da totalidade de área ardida ronda os 347 mil hectares, sendo que 7642,5

mil hectares compõem a área agrícola ardida42.

De acordo com o relatório produzido sobre a seca pela Comissão para a seca

2005, os impactos que geraram mais custos financeiros devem-se à necessidade da

importação de combustíveis fósseis para a produção de energia necessária para

compensar a quebra na produção de eletricidade nas barragens devido à diminuta

disponibilidade hídrica. O custo foi de 133.5 milhões de euros, com a possibilidade de

terem atingido os 182 milhões de euros43. Seguem-se os prejuízos de 39 milhões de

euros provenientes da agricultura, suportados na totalidade pelo Ministério da

Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas. Estes encargos traduzem-se: nas

bonificações dos juros das linhas de crédito (7 milhões de euros), em cereais de

intervenção (5 milhões de euros), ajuda aos produtores de pecuária em regime

extensivo (15 milhões de euros) e isenção de pagamento à segurança social (12

milhões de euros). Os impactos sentiram-se também nas atividades empresariais

ligadas dependentes de recursos primários, sobretudo no caso da indústria da pasta de

papel, onde a perda de crescimento do eucaliptal equivale a 25% do crescimento

potencial ao ano, ou seja, 30 milhões de euros. Foram também gastos 23.210 milhões

de euros com os municípios, sobretudo para garantir a quantidade e a qualidade de

abastecimento de água às populações. Finalmente os custos do combate aos incêndios

florestais (8.760 milhões de euros), os prejuízos na indústria dos adubos (2.250

milhões de euros), campanhas de informação e sensibilização para a poupança de água

(697.864 euros) e extração de biomassa (285.800 euros) contribuíram para um

prejuízo total da seca de 286 205 800 euros (Comissão para a seca 2005).

Assim, passados apenas dois anos da onda de calor de 2003, Portugal sofre uma

quebra acentuada na produção agrícola interna. Ainda que o calor tenha sido mais

intenso durante as duas semanas do início de Agosto que compõem o período da onda

de calor de 2003, a agricultura, e o país no geral ressentiu-se mais devido à falta de

precipitação de 2005, pelo que se põe uma nova ameaça ao Estado: até quando o

Estado será capaz de suportar estes prejuízos, atendendo ao facto de serem mais

42

Dados estatísticos sobre os incêndios florestais disponível no site do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) http://www.icnf.pt/florestas/dudf/estatisticas/estatistica-sgif 43

O relatório de balanço foi produzido antes do final da seca

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93

frequentes (apesar de nos encontrarmos apenas na primeira década do século XXI) e

cada vez mais onerosos?

A seca de 2005 foi apontada como a mais grave nos últimos 60 anos (Comissão

para a seca 2005) e quase se repetiu em 2012, menos de dez anos de retorno. De

facto, o volume de precipitação disponível aponta para uma seca grave, quase tão

grave como a de 2005. Ainda que não seja possível fazer uma análise completa, o

último relatório de acompanhamento da seca, produzido em Abril de 2012 registou, tal

como em 2005, uma quebra na produção agrícola acentuada, a partir do qual se

calculou um atenuar/ligeira melhoria da seca devido a alguma precipitação ocorrida no

mês de Abril44(Figura 13).

Figura 13 – Percentagem do território afetado pela seca meteorológica

Fonte: Acompanhamento e Avaliação dos Impactos da seca de 2012, 5º Relatório, disponível em

http://www.portugal.gov.pt/media/608161/20120528_relat_rio_seca.pdf

44

Dados da precipitação disponíveis no site do Instituto da Água (INAG) http://snirh.inag.pt/snirh/_dadossintese/precipitacao/mapas_resumo/entrada.php?periodo=2000%2F2011&mes=-1&ano=2011&tp_mapa=mensal

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94

Conclusão

Com base no que foi desenvolvido ao longo desta dissertação podemos concluir

que o problema das alterações climáticas é grave e que os acontecimentos extremos

que ocorreram durante a primeira década do século XXI fazem temer o pior nos

próximos 25 a 50 anos. De facto o conhecimento científico produzido sobre as

alterações climáticas nos últimos vinte anos é abundante o que se traduz numa solidez

do seu reconhecimento (salvo raras exceções) e que é necessário tomar medidas para

mitigar e adaptar às mudanças climáticas. Especificamente em Portugal, localizando-se

no Mediterrâneo, uma das regiões mais afetadas, espera-se um aumento da

temperatura média entre 2ºC e 8,6ºC, que no Verão se agrava entre 4,5ºC e 11,5ºC,

com uma diminuição da precipitação que pode chegar até aos 60% (nos cenários mais

pessimistas), o que justifica a confirmação da primeira hipótese:

H.1 – As alterações climáticas terão um impacto profundo no clima português.

Mais grave do que isso, as alterações climáticas têm efeitos sobre a segurança

alimentar em Portugal. Como é possível observar no quadro X em 2005 registou-se

uma quebra na produção de cereais de aproximadamente 1/3 face ao ano de 2004, ou

seja, fez recuar a produção uma década. Também houve uma depressão no output de

cereais em 2003, mesmo que não tenha sido tão significativa.

Apesar de tudo, mesmo tendo em conta a variabilidade da produção de cereais,

é possível estabelecer uma tendência positiva de aumento gradual da produção de

cereais por hectare ao longo dos vinte anos em análise. No entanto é também verdade

que, de acordo com as projeções do IPCC e do projeto SIAM II, estes fenómenos

extremos de calor e de seca vão ser mais frequentes na região do Mediterrâneo e em

Portugal. Assim, é de assinalar que ainda que a produção de cereais tenha recuperado

no ano seguinte, o mesmo não se verificou na percentagem de terra arável, onde a

quebra de três pontos percentuais agravou a tendência de decréscimo da mesma. A

ocorrência destas depressões súbitas na produção de cereais tenderá a exigir mais da

capacidade de resposta do Estado à medida que se tornarem mais frequentes e

intensas, podendo, no limite, gerar um ponto de rutura onde o Estado não consegue

dar resposta às necessidades alimentares da população, até porque o sector primário

português, para além de estar sujeito a uma diminuição constante de terra arável, é

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altamente ineficiente45, já que empregava 10,9% da população ativa em 2010 e

representava apenas 2,4% do PIB no mesmo ano segundo dados oficiais do Banco

Mundial.

É possível ficar com uma noção dos impactos concretos no abastecimento de

água às populações e na produção alimentar à luz dos dois fenómenos extremos

analisados. Além disso, os anos de 2003 e 2005 registaram também os valores mais

elevados de área ardida com consequentes recordes na perda de vidas humanas em

incêndios e de bens materiais.

No entanto, prevalece uma falta de sensibilidade para com as implicações

políticas e económicas da aplicação dessas medidas (Stern, 2007). Sem pôr em causa

que essas mesmas medidas são necessárias, a aplicação encontra-se muito

dependente do funcionamento da democracia e da lógica da luta pelo poder,

contribuindo para estas dificuldades a desinformação que ainda persiste por parte da

opinião pública.

Por outro lado a segurança ambiental, no panorama internacional, ainda não

foi securitizada apesar de atualmente já ser referida várias vezes como um problema

de ameaça à segurança nacional, devido em parte pela persistência de alguns

paradigmas do conceito tradicional de segurança e pela despesa adicional que acresce

ao Estado (Buzan et al., 1998).

Além disso o conceito de segurança ambiental é também muito perspetivado

numa ameaça à segurança do ser humano (individualmente considerado), derivado do

facto de ter surgido para a temática da segurança juntamente com uma panóplia de

outras vulnerabilidades ao indivíduo como a pobreza, questões de equidade social,

democracia, entre outras. No entanto, a nosso ver, a segurança ambiental é primordial

a todos estes tipos de ameaças porque não é possível tornar os sujeitos menos

vulneráveis aos efeitos colaterais provocados pelas alterações climáticas (aumento da

desigualdade, persistência da desigualdade, da falta de equidade, entre outros) sem

estratégias concretas de mitigação e/ou adaptação, sendo que como vimos Portugal

não se encontra no leque de países beneficiado pelas mudanças no sistema climático.

45

Para mais considerações sobre o sector primário português visto por um dos seus principais parceiros comerciais, ver Agriculture and Agri-Food Canada (2012), “Agri-Food Past, Present and Future Report:Portugal”, disponível em http://www.ats-sea.agr.gc.ca/eur/4076-eng.htm (consultado em 11/10/2012).

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96

Entretanto, a insegurança dos indivíduos tenderá a repercutir-se no

funcionamento do Estado. Sem existência da segurança ambiental não é possível

garantir a segurança do Estado. Os frequentes desastres naturais são prova da

constante limitação do Estado, enquanto entidade soberana e possuidor de uma

estrutura organizativa interna, e que, no caso português das alterações climáticas, se

traduz numa mudança das variáveis fundamentais para a produção de bens primários

(água potável e alimento).

Há por isso um risco elevado de se verem postos em causa quer o controlo

administrativo e permanente do território — que se vê, mesmo que

momentaneamente, interrompido em caso de catástrofe — quer a sobrevivência física

das populações afetadas. E se é verdade que quer a população quer o território são

elementos estruturais de qualquer Estado, lembramos também que entre os seus fins

encontramos precisamente a responsabilidade de manter quer a integridade do

primeiro, quer o bem-estar do segundo.

Em Portugal, depois dos episódios de 2003 e 2005, os relatórios preliminares da

seca de 2012 apontam para prejuízos semelhantes àqueles observados nos dois

fenómenos extremos anteriores, sendo que o procedimento habitual do Estado

persiste, ou seja, o Estado português continua a assumir os prejuízos das catástrofes a

posteriori.

Os pareceres divulgados através de relatórios — nomeadamente os referentes

à seca de 2005 — apenas apelam para um conjunto de medidas de articulação da

resposta a estes eventos extremos, não sendo vinculativos. O entendimento oficial do

fenómeno da seca, enquanto problema sério com tendência a agravar-se com as

alterações climáticas apenas chegou em 2010 com a aprovação da Estratégia Nacional

de Adaptação às Alterações Climáticas (ENAAC). De facto em Portugal, deu-se

prioridade à mitigação em prol da adaptação, uma vez que o Programa Nacional para

as Alterações Climáticas (PNAC), que apenas diz respeito à redução da emissão de

gases com efeito de estufa, foi aprovada inicialmente em Conselho de Ministros em

Julho de 2004 (foi acrescentada uma resolução em 2006), enquanto a ENAAC apenas

foi aprovada em Abril de 2010.

Ora, não pondo em causa a necessidade de mitigação das emissões pelo seu

contributo para as alterações climáticas e para cumprimento das metas estabelecidas

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pela UE e pelo protocolo de Quioto, é algo evidente que o contributo de Portugal para

o conjunto de emissões globais é muito diminuto comparativamente com os impactos

que irá sofrer. Sendo assim seria imperioso pensar antes de mais numa adaptação às

alterações climáticas que implicaria alterações profundas em vários sectores,

principalmente na estrutura agrícola nacional de modo a compensar os efeitos

potencialmente depressivos sobre a produção de cereais, sendo útil lembrar que

Portugal já importa 75% dos cereais que consome46.

De facto, para além de a adaptação ter sido relegada para segundo plano, a

ENAAC não contribuiu para que fosse criada uma verdadeira estratégia de adaptação

para Portugal, face às alterações climáticas, ou seja, não securitizou a temática em

Portugal, o que nos permite rejeitar a segunda hipótese: H.2 - Portugal securitizou as

alterações climáticas.

Como foi explicitado na Metodologia, para analisar se a ENAAC cumpriu ou não

o seu objetivo de securitização das alterações climáticas em Portugal, seguiu-se três

etapas:

1. Identificar instituições e/ou organismos responsáveis pelo

desenvolvimento e aplicação da Estratégia;

2. Apontar orçamentos, metas e objetivos concretos;

3. Definir linhas temporais e vulnerabilidades aos quais o Estado

encontra-se sujeito.

Em linha com o ponto 1, encontrámos toda uma moldura de

instituições/organismos envolvidos no processo (ver Figura X). A Estratégia fica a cargo

de um Grupo de Coordenação que dirige os trabalhos dos Grupos Setoriais. O Grupo

de Coordenação é composto pelos coordenadores dos grupos sectoriais, por um

representante do Ministério dos Negócios Estrangeiros, um representante de cada

Região Autónoma e um representante da Associação Nacional de Municípios

Portugueses. Por sua vez os Grupos Setoriais criados em cada área têm como objetivo

identificar as vulnerabilidades e as necessárias medidas de adaptação.

46

Notícia do jornal Expresso, consultada a 5 de Outubro de 2012, disponível em http://expresso.sapo.pt/preco-do-pao-pode-aumentar=f672094

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98

Figura 14 – Organograma para o desenvolvimento e aplicação da Estratégia

Fonte: Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas, disponível em: http://www.anmp.pt/files/dpeas/2010/pactoautarcas/p02/ENAAC.pdf

Em Setembro de 2010, a Ministra do Ambiente e do Ordenamento do

Território, através de despacho ministerial, designa os nove coordenadores dos nove

grupos sectoriais mais oito elementos para o Grupo de Coordenação47. Da pesquisa

efetuada, além do site oficial da ENAAC48, a investigação chega a um beco sem saída,

uma vez que a partir daqui mais nenhum dado relevante é publicitado nem tão pouco

tornado público, dando a sensação que ou o governo ou as instituições responsáveis

perderam interesse em prosseguir o processo de efetiva securitização.

Também não foi encontrado nenhum relatório intercalar das atividades dos

grupos setoriais, bem como nenhum relatório final dos mesmos grupos. De facto, de

acordo com a mesma Estratégia no mês vinte e um (depois da aprovação da ENAAC)

deveriam ser apresentados os relatórios dos grupos sectoriais, no mês vinte e quatro o

relatório de progresso e de implementação juntamente com uma proposta para novos

trabalhos de implementação (ver Figura X). Nenhum dos relatórios nem a proposta se

47

Despacho ministerial consultado a 13 de Setembro de 2012, disponível em: http://dre.pt/pdf2sdip/2010/09/189000000/4848648486.pdf 48

Site oficial da ENAAC: http://adaptacao.clima.pt/home

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encontram disponíveis, sendo que a autora tem altas dúvidas que tenham chegado

sequer a ser elaborados.

Figura 15 – Cronograma geral

Fonte: Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas, disponível em: http://www.anmp.pt/files/dpeas/2010/pactoautarcas/p02/ENAAC.pdf

Além da falta de cumprimento das únicas metas determinadas, a inexistência

de um orçamento é a nosso ver uma das falhas substanciais na Estratégia, por a nossa

experiência na área da Ciência Política nos dizer que sem verba não há verbo. No

ponto que diz respeito ao financiamento da estratégia apenas é determinado que os

grupos setoriais deverão identificar “linhas de financiamento”. Ora, não só a

adaptação e/ou a mitigação exigem financiamento para serem implementadas, como

o próprio Ministério das Finanças não foi incluído na ENAAC, sendo um dos grandes

vazios institucionais do planeamento, ainda para mais num contexto no qual este

Ministério voltou a assumir uma enorme preponderância no delineamento das ações

governamentais desde a tomada de posse do ministro Victor Gaspar.

A Estratégia falha igualmente na determinação de objetivos concretos. De

acordo com a própria estes centram-se em quatro pontos essenciais, com especial

ênfase para o segundo:

1.º Informação e conhecimento;

2.º Redução da vulnerabilidade e aumento da capacidade de resposta;

3.º Participar, sensibilizar e divulgar;

4.º Cooperar a nível internacional.

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100

No entanto, a própria Estratégia em si não só não identifica as vulnerabilidades

específicas como não determina qualquer medida para as combater. Essa função

ficaria a cargo dos grupos sectoriais. Assim não só não aponta quaisquer orçamentos e

objetivos concretos como as únicas metas e/ou linhas temporais que deveriam ser

cumpridas seriam os prazos de entrega dos dois relatórios e da proposta, que aliás não

foram cumpridos.

Os resultados da nossa investigação acabam por ser corroborados pelos dois

pareceres realizados pelo Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente

(grupo GEOTA) e pelo Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento

Sustentável (CNADS) enquanto a Estratégia esteve sujeita a consulta pública (que

ocorreu até 4 de Setembro de 2009). Para além das diversas críticas direcionadas às

áreas dos grupos sectoriais e à clara falta de «linhas orçamentais específicas (…), não

sendo possível avaliar, de todo, qual a sua viabilidade» (GEOTA, 2009:3), o grupo

GEOTA conclui que «se demonstra aqui a falta de coragem para assumir medidas

eficazes, mas contrárias à política corrente» (GEOTA, 2009:4). Do mesmo modo,

também o parecer realizado pelo CNADS identifica algumas dúvidas e preocupações

relativas à metodologia uma vez que «uma estratégia implica um plano de ação para

atingir objetivos determinados, estabelecendo opções, alternativas e prioridades. Esta

porém não é a metodologia seguida na ENAAC» (CNADS, 2009:3). Além disto,

considera uma falha a não inclusão de Ministérios de «especial relevância» como os

«Ministérios das Finanças, da Educação e da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior»

bem como a falta de financiamento para a Estratégia (CNADS, 2009), indo também

aqui ao encontro das nossas conclusões.

Se o tema fosse securitizado um conjunto de medidas de adaptação concretas

teria uma aplicação imediata, mesmo que em prejuízo das atividades económicas (e

não só) de alguns indivíduos no curto-médio prazo.

Quanto à determinação dos resultados da ENAAC no médio-longo prazo seria

necessário dar continuidade à pesquisa iniciada por nós com esta dissertação de

mestrado através de uma tese de doutoramento. Além de abranger áreas bastante

diversas, o período de vigência da ENAAC (sensivelmente dois anos) é curto para se

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traduzir em mudanças e produzir resultados concretos, caso esta fosse analisada neste

preciso momento.

No entanto, a perceção que passa com base nos relatórios preliminares da seca

de 2012 é a de que se evoluiu muito pouco desde os anos de 2003/2005, situação para

a qual deve ter contribuído a crise atual, que originou uma deterioração da capacidade

económica para a aplicação na prevenção bem como ter provocado uma deslocação

de prioridades por parte da elite governante. De facto, o atual clima económico e

financeiro ganha proeminência um pouco por todo o Mundo mas principalmente em

Portugal, relegando para um plano muito inferior a problemática das alterações

climáticas.

Além do mais, a falta de securitização do tema determina, especialmente num

momento em que os recursos financeiros são bastante escassos e que é necessário

efetuar cortes de despesa pública, que uma das áreas mais afetadas seja o Ambiente,

uma vez que não é considerado uma necessidade primária para o Estado… na nossa

opinião, por enquanto.

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