Doenças respiratória

Embed Size (px)

Citation preview

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SULPrograma de Ps-graduao em Medicina Interna - Pneumologia

    As Doenas Respiratrias Ocupacionais Causadas pela Poeira na Armazenagem de Gros Vegetais

    Estudo epidemiolgico longitudinal controlado de trabalhadores de gros do Rio Grande do Sul e avaliao

    ambiental de seus locais de trabalho

    Tema de Dissertao de Doutorado

    Carlos Nunes Tietboehl Filho

    Orientador: Prof. Dr. Jos da Silva Moreira

    Porto Alegre, 2004

  • SUMRIO

    I. INTRODUO

    1.1. Os locais de trabalho1.1.1. Os riscos da exposio poeira de gros pag. 11.1.2. A histria da produo dos gros vegetais pag. 21.1.3. As estruturas de armazenagem pag. 51.1.4. As operaes de armazenagem pag. 61.1.5. A formao de poeira nas unidades de armazenagem pag. 71.1.6. As partculas inalveis dos gros pag. 121.1.7. Outros fatores de risco na armazenagem de gros pag. 151.1.8. As condies de trabalho pag. 171.1.9. Processos de avaliao do risco ambiental pag. 201.1.10. Medidas para o controle do risco ambiental pag. 21

    1.2. As doenas ocupacionais dos trabalhadores de gros pag. 241.2.1. Histrico sobre as pesquisas pag. 241.2.2. Obstruo aguda das vias areas pag. 261.2.3. Alveolite alrgica extrnseca pag. 291.2.4. A "febre dos gros" (grain fever) pag. 321.2.5. Outras manifestaes clnicas agudas pag. 331.2.6. Doena pulmonar obstrutiva crnica pag. 331.2.7. Fatores preditivos e fatores de confuso pag. 341.2.8. A contribuio da pesquisa pag. 36

    1.3. Investigao das doenas respiratrias ocupacionais1.3.1. Processos de rastreamento e vigilncia pag. 381.3.2. Questionrio de sintomas respiratrios pag. 381.3.3. Espirometria pag. 401.3.4. Raio-x de trax e outros testes diagnsticos pag. 41

    i

  • II. ESTUDO AMBIENTAL EM SILOS DE ARMAZENAGEM

    2.1. Objetivos pag. 432.2. Materiais e mtodos da avaliao ambiental pag. 432.3. Resultados pag. 542.4. Discusso pag. 59

    III. ESTUDO EPIDEMIOLGICO DOS TRABALHADORES DE GROS

    3.1. Propsitos e objetivos pag. 66

    3.2. Materiais e mtodos pag. 683.2.1. Instrumentos de avaliao pag. 683.2.2. A populao em dois cortes transversais pag. 70

    3.3. Resultados pg. 753.3.1. A classificao dos grupos de exposio pag. 753.3.2. A formao de uma coorte pag. 793.3.3. Caractersticas Gerais da Populao pag. 823.3.4. Fatores de confuso pag. 873.3.5. Manifestaes Clnicas pag. 923.3.6. Achados do Exame fsico pag. 1043.3.7. Alteraes na funo pulmonar pag. 108

    3.4. Discusso pag. 118

    IV. CONSIDERAES FINAIS pag. 123

    V. RECOMENDAES pag. 124

    BIBLIOGRAFIA pag. 125

    .

    ii

  • LISTA DE FIGURAS E TABELAS CONFORME APARECEM NO TEXTO

    FIGURA 1: Produo mundial de gros (1965 - 1998) pag. 4FIGURA 2: Produo de gros vegetais no Rio Grande do Sul (1978 - 1987) pag. 4FIGURA 3: Silo metlico de pequeno porte pag. 9FIGURA 4: Silo conjugado, composto por um silo elevado e um silo horizontal pag. 9FIGURA 5: Tipos de armazenagem no Rio Grande do Sul e no Brasil pag. 10FIGURA 6: Pontos de gerao de poeira durante os processos de armazenagem pag. 11FIGURA 7: Trabalhadores na armazenagem por regies do Brasil (1984) pag. 18FIGURA 8: Trabalhadores de armazenagem nos Estados do Brasil (1984) pag. 19FIGURA 9: Trabalhadores no setor de armazenagem - flutuao sazonal (1984) pag. 19FIGURA 10: Medida de controle da poeira - sistema de ventilao pag. 24FIGURA 11: Medida de controle da poeira - equipamentos de proteo pag. 24FIGURA 12: Silo elevado da CESA em Cruz Alta, RS pag. 46FIGURA 13: Silo conjugado da CESA em Cachoeira do Sul, RS pag. 47FIGURA 14: Plataforma flutuante do silo da CESA em Rio Grande, RS pag. 47FIGURA 15: Elevao da caamba do caminho para descarga de milho pag. 48FIGURA 16: Descarga de soja na moega pag. 48FIGURA 17: Gros de soja na grade do piso da moega pag. 49FIGURA 18: Ensacando gros, prximo peneira pag. 49FIGURA 19: Operando a fornalha do secador pag. 50FIGURA 20: Transilagem de farelo de soja pag. 50FIGURA 21: Correia transportadora pag. 51FIGURA 22: Expedio de gros para um navio pag. 51FIGURA 23: Componentes do cassete para coleta de poeira inalvel pag. 53FIGURA 24: Coletor gravimtrico em recebimento de soja em moega pag. 53TABELA 1: Concentraes de poeira inalvel- coleta gravimtrica pag. 56TABELA 2: Avaliao micolgica por exposio direta da placa de Petri pag. 58FIGURA 25: Coletor de Andersen em funcionamento na moega pag. 58TABELA 3: Espcies de fungos na poeira inalvel das moegas pag. 59FIGURA 26: Placas do coletor de Andersen com colnias de fungos pag. 59FIGURA 27: Rhizopus sp. identificado na poeira inalvel de milho pag. 60FIGURA 28: Localizao das quinze unidades de armazenagem visitadas pag. 73FIGURA 29: Participaes e abstenes no primeiro corte transversal pag. 74FIGURA 30: Causa de no comparecimento no primeiro corte transversal pag. 74FIGURA 31: Populao rastreada no estudo longitudinal pag. 75FIGURA 32: Causas de perda na corte no estudo longitudial pag. 75FIGURA 33: Operaes desenvolvidas em uma unidade de armazenagem pag. 78TABELA 4: Funes exercidas por grupo homogneo de exposio pag. 78FIGURA 34: Opinio dos trabalhadores sobre a exposio pag. 79TABELA 5: Comparao entre os perdidos e dos sobreviventes da coorte pag. 81TABELA 6: Distribuio da coorte nas 15 unidades de armazenagem pag. 82TABELA 7: Caractersticas antropomtricas pag. 85FIGURA 35: Idade dos indivduos da corte no segundo corte transversal pag. 86FIGURA 36: Tempo de exposio poeira no segundo corte transversal pag. 86FIGURA 37: Grupos tnicos na coorte pag. 87FIGURA 38: Escolaridade dos indivduos da coorte pag. 87TABELA 8: Caractersticas do hbito tabgico pag. 89FIGURA 39: Caractersticas do hbito tabgico pag. 90FIGURA 40: Relatos de doenas respiratrias prvias pag. 91

    iii

  • FIGURA 41: Exposio a outros agentes inalveis, antes do ingresso pag. 92FIGURA 42: Exposio a outros agentes inalveis, durante a atividade pag. 92TABELA 9: Sintomas apresentados pelos indivduos da coorte pag. 98FIGURA 43: Prevalncia de tosse, expectorao e bronquite crnica pag. 97FIGURA 44: Tosse conforme a categoria de hbito tabgico pag. 99FIGURA 45: Expectorao conforme hbito tabgico pag. 100FIGURA 46: Bronquite crnica conforme hbito tabgico pag. 100FIGURA 47: Tosse persistncia e tempo de durao pag. 101FIGURA 48: Expectorao persistncia e tempo de durao pag. 101FIGURA 49: Crises de chiado no peito e chiado com falta de ar pag. 101FIGURA 50: Graus de dispnia no primeiro corte transversal pag. 101FIGURA 51: Sintomas de irritao de mucosas nasal e conjuntival pag. 103FIGURA 52: Sintomas de febre e aperto no peito (constrio torcica) pag. 103TABELA 10: Sintomas apresentados pelos indivduos da coorte pag. 104TABELA 11: Achados no exame fsico pag. 107FIGURA 53: Achados de ausculta pulmonar pag. 108FIGURA 54: Estertores sibilantes detectados durante a expirao forada pag. 108TABELA 12: Alteraes na funo pulmonar pag. 112FIGURA 55: Percentual de VEF1 previsto pag. 113FIGURA 56: Percentual da CVF prevista pag. 114FIGURA 57: Prevalncia de VEF1 abaixo do normal pag. 115FIGURA 58: Prevalncia de CVF abaixo do normal pag. 114FIGURA 59: Queda de VEF1 nos dois cortes transversais pag. 116FIGURA 60: Queda da CVF nos dois cortes transversais pag. 116FIGURA 61: Tendncia linear do VEF1 com a idade pag. 117FIGURA 62: Tendncia linear da CVF com a idade pag. 118

    iv

  • DEDICATRIA

    Este projeto tornou-se possvel graas motivao e o estmulo que recebi antes e durante a sua elaborao de meus familiares diretos.

    Devo a eles algo que nunca conseguirei retribuir - as horas que dediquei a este trabalho - e que forosamente me afastaram dos agradveis momentos de lazer e convvio.

    Souberam acompanhar meu empenho com afeto, tolerncia, pacincia, compreenso e confiana.

    Porto Alegre, 01 de dezembro de 2004

    v

  • AGRADECIMENTOS

    Todos os trabalhadores de armazenagem foram solcitos e colaborativos ao participaram das entrevistas e avaliaes. Devo a eles um legado nico de conhecimentos que adquiri durante a execuo do projeto. Espero que essa publicao possa contribuir de alguma forma para a melhoria de suas condies de trabalho.

    Aos tcnicos, engenheiros, agrnomos, mdicos e demais funcionrios da CESA, que acolheram entusiasticamente a pesquisa em suas diversas etapas.

    Diversas pessoas apoiaram e contriburam para o desenvolvimento deste projeto atravs de consultorias, orientaes tcnicas, e apoio logstico, tanto como representantes competentes de suas instituies como pela iniciativa espontnea em colaborar.

    Segue abaixo uma lista, em ordem alfabtica, que certamente no exaustiva:

    Berenice Ferrari Goelzer Organizao Mundial da Sade, GenebraClvis Gaudie-Ley Banco do Brasil, RSDonald Enarson International Union against Tuberculosis, ParisFernando Nunes Soares Companhia Estadual de Silos e Armazns, RSJos Alberto Schuh - Hospital de Beneficncia de Cachoeira do Sul, RSJos Carlos Celaro Companhia Estadual de Silos e Armazns, RSJosefa Sanchez Fundao de Cincia e Tecnologia, RSLuis Carlos Severo Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)Manoel Luis Soares Pitrez Companhia Estadual de Silos e Armazns, RSMarcos Krahe Edelweiss estudante de Medicina, UFRGSMargaret Rigsby Becklake MacGill University, MontrealMargaret Weidenbach-Gerbase Hospital da Universidade de GenebraMaria Lucia Schoferneker - Universidade Federal do Rio Grande do SulMario Bernardes Wagner - Universidade Federal do Rio Grande do SulMario Cardoso Companhia Estadual de Silos e Armazns, RSMarta Luiza Ost Frank pesquisadora e mdica do trabalhoMilton MacManis Servio Social da Indstria, RSMoira Chan-Yeung Universidade da Colmbia Britnica, VancouverNelson Gomes - Companhia Estadual de Silos e Armazns, RSPaulo Steger - Hospital Nossa Senhora Aparecida de Camaqu, RSRosa Finamor - Companhia Estadual de Silos e Armazns, RSVania Naomi Hirakata Hospital de Clnicas de Porto Alegre, RSVictor Flavio Petrillo Universidade Federal do Rio Grande do Sul

    O projeto recebeu o fundamental apoio material e financeiro das seguintes instituies:

    Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) Auxlio Pesquisa Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES)

    Bolsa de pesquisador Organizao Mundial da Sade, Genebra doao de materiais

    permanentes

    vi

  • RESUMO

    A poeira de gros de cereais composta por fragmentos proticos, microrganismos, material inorgnico e produtos qumicos que causam reaes irritativas, txicas, alergnicas e inflamatrias crnicas nas vias ares e pulmes.

    A exposio ocupacional poeira de gros est associada com alteraes respiratrias agudas e crnicas e com alteraes na funo pulmonar. Vrios estudos epidemiolgicos controlados em trabalhadores de armazenagem de gros demonstram uma prevalncia elevada de sintomas respiratrios e uma perda da funo pulmonar acentuada quando a exposio prolongada e intensa.

    Realizamos a coleta de amostras de poeira respirvel nas moegas de silos de grande porte que mostraram baixos nveis de concentrao. No foi analisado o teor de slica livre das amostras.

    As partculas da frao respiratria microbiologicamente contaminadas foram coletadas atravs de um amostrador de Andersen de seis estgios identificando espcies como Aspergillus, Penicilium e Mucor que podem causar patologi respiratria.

    Foi estudada uma coorte longitudinal de 195 trabalhadores de gros atravs de dois cortes transversais com um intervalo de aproximadamente nove anos entre eles.

    Os trabalhadores foram classificados em dois grupos, um de elevada exposio poeira (n=102) e outro de baixa exposio (n=93), conforme a atividade ocupacional que desempenhavam.

    Um questionrio de sintomas respiratrios e o teste espiromtrico foram aplicados de forma padronizada.

    Os indivduos que saram da coorte (n=99) durante o estudo no apresentavam por ocasio do primeiro corte transversal caractersticas diferentes dos que permaneceram (sobreviventes).

    Foi encontrada uma prevalncia aumentada de sintomas respiratrios e de baixos valores de VEF1 e CVF no grupo de alta exposio em comparao aos controles.

    O grupo de alta exposio apresentou tambm um declnio mais rpido da funo pulmonar durante o perodo da coorte independente do hbito tabgico.

    Recomenda-se atravs de programas de sade pblica a preveno primria e secundria dos efeitos respiratrios da exposio poeira de gros.

    vii

  • SUMMARY

    The cereal grain dust is composed by fractured grain kernels, microrganisms, inorganic matter and chemicals that induce irritant, toxical, allergenic and chronical inflammatory effects in the airways and the lungs.

    Grain dust exposure in occupational settings has been associated with both acute and chronic respiratory abnormalities. Several cross-sectional studies of grain elevator workers have shown a high prevalence of respiratory symptoms and pulmonary function loss.

    We did the sample collection of respirable dust in the receiving areas of grain elevators that showed low levels of respirable dust. The free silica content of those samples was not measured. The viable particles in the respiratory range were sampled by a six-stage Andersen sampler identifying fungi species potentially allergenic or pathogenic in the receiving areas of grain elevators.

    We studied a longitudinal cohort of 195 grain elevator workers by two cross-sectional surveys with a nine-year interval between them in 15 silos of Rio Grande do Sul, Brazil.

    Grain workers were classified in two populations: a highly exposed (n=102) and a low level exposed group (n=93) according to their job categories

    A questionnaire of respiratory symptoms and spirometry tests were applied in a standardized way.

    The individuals who dropped out (n=99) had not significantly different characteristics from the survivors at the end of the survey.

    We found more respiratory symptoms and low FEV1 and FVC values in the highly exposed group compared to the less exposed group. The highly exposed group had also a more rapid (annual) longitudinal decline of pulmonary function irrespective of smoking status

    The primary and secondary prevention of the respiratory effects of grain dust exposure are recommended.

    viii

  • PREFCIO

    A partir de dcada de 80, graas iniciativa pioneira do Professor Dr. Jos da Silva Moreira, o Curso de Ps-graduao em Pneumologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul passou a desenvolver linhas de pesquisa na investigao das doenas pulmonares ocupacionais.

    A meta comum desses projetos era a realizao de estudos epidemiolgicos e clnicos em trabalhadores do Rio Grande do Sul, identificando as pneumopatias ocupacionais associadas a fatores ambientais presentes nos locais de trabalho. At ento havia muito pouca investigao a esse respeito em nosso meio.

    Considerando-se as caractersticas do setor econmico do Rio Grande do Sul foram priorizados inicialmente os setores de minerao de carvo, da produo de cermica, da indstria txtil e da produo vegetal.

    O risco que a inalao de gases e poeiras presentes nesses setores de trabalho representa para os trabalhadores reconhecido pela Organizao Mundial da Sade.

    Dentro dessa perspectiva foi desenvolvido esse estudo, sobre os efeitos da exposio poeira em trabalhadores de armazenagem de gros de cereais de silos do Rio Grande do Sul.

    A primeira parte desse projeto foi delineado como como um estudo transversal controlado (TIETBOEHL, 1991). Em continuidade quele estudo inicial foi realizado, sobre a mesma populao de trabalhadores, um estudo longitudinal que ora apresentamos atravs desta monografia.

    O processo de produo dos gros vegetais, desde a lavoura at a sua industrializao, emprega um grande nmero de indivduos em diversas atividades. Dentro desse universo so os trabalhadores de armazenagem que esto mais expostos poeira, devido velocidade do processo e ao volume da massa de gros em movimento.

    Os trabalhadores rurais envolvidos com a semeadura, colheita e manipulao dos gros so em maior nmero, mas esto expostos a menores nveis de concentrao de poeira. O fato de estarem muito dispersos geograficamente dificulta o levantamento de dados epidemiolgicos.

    A dissertao apresentada a seguir o produto final de um estudo populacional de trabalhadores empregados na rede da Companhia Estadual de Silos e Armazns (CESA), que a empresa estatal de armazenagem do Rio Grande do Sul.

    A produo crescente de cereais e de soja e a carncia de informaes sobre a sade dos trabalhadores expostos poeira vegetal em nosso meio foram fatores que motivaram o empreendimento deste trabalho.

    Nos ltimos anos aumentou o nmero de publicaes internacionais sobre este assunto, mas ainda existem muitas controvrsias no que diz respeito aos fatores etiolgicos e patognicos das alteraes respiratrias agudas causadas pela poeira dos gros de cereais e leguminosas.

    Os efeitos crnicos dessa exposio foram reconhecidos smente nos litmos dez ou vinte anos, graas aos resultados obtidos atravs de alguns estudos longitudinais.

    A maioria desses estudos proveniente de paises do hemisfrio setentrional, principalmente Estados Unidos e Canad, onde as condies ecolgicas e climticas so distintas daquelas encontradas na zona subtropical da Amrica do Sul.

    A diversidade da microflora e microfauna dos gros vegetais e o perfil nutricional, social, econmico e cultural do trabalhador brasileiro fazem supor que em nosso meio a relao entre agente e hospedeiro apresente caractersticas diferentes.

    Alm disso, os nveis de concentrao de poeira de gros nas unidades de armazenagem do Brasil devem ser em mdia mais elevados do que no Canad e nos

    ix

  • Estados Unidos, pois aqui lamentavelmente so piores as condies de trabalho e no dispomos ainda dos recursos econmicos e tecnolgicos necessrios para controlar devidamente a qualidade do ar interno desses ambientes de trabalho.

    Portanto as informaes disponveis no so suficientes para caracterizar a situao de sade das populaes ocupacionalmente expostas poeira de gros no Brasil e novas pesquisas epidemiolgicas so necessrias.

    Este trabalho tem a ambio de propor um padro metodolgico para sistematizar o rastreamento das doenas respiratrias causadas por poeiras orgnicas e tambm definir indicadores a serem utilizados em programas de vigilncia ambiental e epidemiolgica.

    Prope tambm uma estratgia bsica para o reconhecimento, avaliao e controle da poeira nesses ambientes de trabalho e assim prevenir primariamente as doenas respiratrias a ela associadas.

    Especialmente o trabalho de campo no seu decorrer trouxe uma experincia nica e um aprendizado inestimvel, tanto pelo convvio com os trabalhadores durante a aplicao das entrevistas e dos testes como pela observao e avaliao dos processos e ambientes de trabalho.

    C. N. T. F.Dezembro, 2004

    x

  • 1

    I. INTRODUO

    1.1. Os locais de trabalho

    1.1.1. Os riscos da exposio poeira de gros

    O termo risco conceituado como a possibilidade de ocorrncia de perigo, de

    perda ou de qualquer evento desfavorvel. As duas origens etimolgicas do termo

    (FERREIRA, 1986), uma latina (ressecare = cortar) e a outra espanhola (risco =

    penhasco alto e escarpado) so sugestivas de seu significado.. Em Epidemiologia fica

    restrito possibilidade de um grupo de indivduos previamente sadios apresentarem

    manifestaes de doena quando expostos a um determinados fatores.

    Nos locais de trabalho os fatores de risco so representados por agentes fsicos,

    qumicos e biolgicos gerados durante os processos de produo.

    Os fatores de risco que causam doenas ocupacionais agudas em geral so

    associados mais facilmente aos seus efeitos pelo surgimento imediato das manifestaes

    clnicas durante ou logo aps a exposio, tornando evidente o nexo causal

    A exposio ocupacional poeira de gros de cereais pode desencadear desde

    uma simples sensao de desconforto, que desaparece com o afastamento da exposio,

    passando por episdios agudos de irritao nasal e conjuntival, crises de tosse,

    expectorao e sibilncia at chegar a alteraes crnicas irreversveis caracterizadas por

    sintomas respiratrios permanentes e obstruo das vias areas (CHAN-YEUNG, 1992).

    Nas manifestaes respiratrias crnicas, que incluem a bronquite crnica e a

    obstruo crnica das vias areas, difcil estabelecer a relao causa-efeito devido ao

    longo perodo de latncia que culmina com o surgimento de alteraes clnicas e

    funcionais aps vrio anos de exposio. A hiptese que a exposio prolongada

    poeira de gros causa obstruo crnica das vias areas s foi comprovada recentemente

    (CHAN-YEUNG, 1981; ENARSON, 1985).

    Esses riscos deveriam ser minimizados ou evitados atravs de programas

    preventivos e as alteraes clnicas rastreadas nas populaes expostas atravs de

    sistemas de vigilncia que as detectassem precocemente por testes diagnsticos

    realizados periodicamente (WINNER & BLANCHAR, 1981). Entretanto no cotidiano

    as coisas no acontecem dessa maneira, e o que se v com freqncia so as doenas

    ocupacionais levarem os trabalhadores acometidos a buscarem o atendimento na rede de

    sade, muitas vezes com episdios agudos severos ou com doena crnica j

    estabelecida.

    A poeira gerada durante os processos de armazenagem de gros o principal

    fator de risco ocupacional para o sistema respiratrio existente nesses locais de trabalho.

    Embora existam os gases potencialmente txicos ou at mesmo letais nesses ambientes

    les esto presentes em nveis perigosos s em situaes determinadas.

    No decorrer dessa Introduo vamos analisar o binmio ambiente-efeito

    biolgico em alguns dos seus aspectos: as caractersticas da poeira de gros, os

    processos de trabalho em que se apresenta, e os efeitos deletrios da poeira sobre as

    sade dos trabalhadores. Em seguida descreveremos sucintamenete as estratgias,

    materiais e processos utilizados para caracterizar as condies de risco no local de

    trabalho e como control-lo. A metodologia de avaliao para detectar precocemente e

    monitorar essas manifestaes clnica sero comentadas.

    Finalmente, depois dessas colocaes introdutrias, relataremos dois estudos

    realizados concomitantemente em locais de trabalho de uma rede de armazenagem no

  • 2

    Rio Grande do Sul: uma avaliao ambiental da qualidade do ar em silos de

    armazenagem e um estudo epidemiolgico longitudinal em trabalhadores desses mesmos

    locais, buscando comprovar que a exposio prolongada poeira aumenta a prevalncia

    de sintomas respiratrios e de perda acentuada da funo pulmonar nos trabalhadores de

    armazenagem de gros.

    1.1.2. A histria da produo dos gros vegetais

    Os cereais so gramneas que produzem sementes comestveis sob a forma de

    gros que so utilizados em larga escala na alimentao humana e de animais. O arroz

    (Oryza sativa), o milho (Zea mays) e o trigo (Triticum sp.) so os mais consumidos no

    mercado mundial. Outros como o sorgo (Sorghum sp.) , o centeio (Lollium sp.), a aveia

    (Avena sp.) e a cevada (Hordeum vulgare) so utilizados em menor escala. Algumas

    leguminosas produzem sementes comestveis que so muito consumidas, como o feijo

    (Phaseolus sp.) e a soja (Glycine max).

    O cultivo de gros comestveis e a estocagem do excesso de produo permitiu o

    desenvolvimento das primeiras civilizaes da Antiguidade, e permanece at hoje como a

    principal fonte mundial de alimento.

    No perodo paleoltico as comunidades humanas primitivas coletavam

    diretamente do seu ambiente natural as sementes, frutas e razes para a sua subsistncia.

    Entre 40.000 e 10.000 a. C., a manufatura de instrumentos de pedra tambm tornou

    possvel a caa de animais de grande porte. No incio do perodo Neoltico o pastoreio e

    domesticao de alguns animais selvagens determinou o estabelecimento dessas

    comunidades em regies com pastagens perenes. H interrupo do hbito nomdico

    propiciou o cultivo da terra e a domesticao de algumas plantas silvestres comestveis.

    Com a agricultura surgiu nas regies do Sudoeste da sia e do Oriente Mdio

    entre 10.000 e 7.000 a.C., a moagem e panificao do trigo e da cevada.

    A partir de 6.000 a.C. a produo agrcola se estendeu pelo vale do Nilo e pela

    Mesopotmia e a partir de 2.000 a.C, na China e no norte da ndia. Surgem os primeiros

    sistemas de irrigao artificiais e as primeiras estruturas arquitetnicas para armazenar os

    excedentes da produo. A moagem dos cereais era praticada manualmente, com o uso

    de piles (CLARK, 1969) e posteriormente utilizando a trao animal. Essas tcnicas

    primitivas foram as primeiras fontes de exposio ocupacional poeira de cereais.

    Depois do sculo IV a.C. o cultivo do trigo e da aveia se difundiu na bacia do

    Mediterrneo e foram construdos os primeiros moinhos movidos energia hidrulica.

    Na Idade Mdia foram implementadas as tcnicas de moagem dos cereais empregando

    como fonte motriz a energia elica e hidrulica (GAMA, 1985).

    A partir do sculo XVI com o aumento da atividade mercantil e os novos

    descobrimentos martimos a atividade agrcola se expande geograficamente e a cultura de

    cereais introduzida na Amrica pelos colonizadores europeus. O milho j era cultivado

    pelas civilizaes pr-colombianas desde 3.000 a. C. na regio do Mxico, de onde se

    difundiu para o resto do continente americano, chegando no altiplano andino somente no

    sculo IX a.C.

    Nos sculos XVIII e XIX durante a Revoluo Industrial so criados novos

    artefatos mecnicos para cultivar, ceifar e trilhar os cereais, acionados inicialmente por

    dispositivos mecnicos e mais tarde pela mquina a vapor.

    O surgimento do motor a exploso desenvolve a agricultura cientfica do sculo

    XX. A produo de gros atinge nveis nunca antes alcanados, exigindo a ampliao da

    capacidade instalada de armazenagem.

  • 3

    O crescimento demogrfico fomentou ainda mais a produo mundial, e

    desenvolveu o mercado de importaes e exportaes. A partir da segunda metade do

    sculo XX a ONU implantou um programa internacional denominado "Revoluo

    Verde que substituiu os mtodos tradicionais de agricultura de base familiar por novas

    tcnicas agrcolas visando a monocultura e o aumento da produo por rea cultivada.

    Os principais cereais cultivados hoje em todo o mundo, por ordem de

    importncia, so o trigo, o arroz e o milho, seguidos da cevada e do sorgo. O trigo o

    cereal mais comercializado no mercado internacional, responsvel por 30 % da produo

    mundial de cereais.

    Algumas leguminosas tambm foram cultivadas extensivamente nos ltimos cem

    anos. A soja foi trazida para a Amrica em 1804 como pastagem para animais, mas em

    1930, foi introduzido um novo processo que eliminava o odor desagradvel do leo de

    soja, propiciando a sua industrializao em larga escala. A partir da dcada de 50, a soja

    tambm utilizada como matria prima na produo de cosmticos, tintas e vernizes.

    Os Estados Unidos, a URSS, o Canad, a Austrlia, a Argentina e, a partir da

    dcada de 90 tambm o Brasil, so grandes produtores mundiais de gros.

    A produo mundial de gros cresceu em torno de 30% entre 1972 e 1987 (de

    1.206 para 1.567 bilhes de toneladas) e continuou aumentando nos anos subseqentes

    (FIGURA 1). O estoque excedente de gros sofreu uma variao de 217 para 458

    milhes de toneladas entre 1972 e 1987, o que equivale a um aumento de 111 % da

    capacidade de estocagem em um perodo de 15 anos. Essas tendncias evidenciam a

    necessidade de ampliao contnua da capacidade instalada de armazenagem. E o

    recrutamento de mo-de-obra assalariada para os setores de armazenagem e

    industrializao de gros vegetais tambm aumenta (FAO, 1984).

    O crescimento do setor agrcola no Brasil foi tambm considervel pois a

    produo de gros entre 1980 e 1989 aumentou em torno de 80%, (FIGURA 2).

    passando de 35 para 63,5 milhes de toneladas (AGRICULTURA, 1989). A produo

    de gros continuou em franca ascenso de 1991 at o ano 2000, crescendo de 56,7

    milhes para 84 milhes de toneladas. Alcanou em 2003 um recorde de 110 milhes de

    toneladas, sendo que desse total 52 milhes eram devidos soja (CONAB, 2004).

    Apesar das oscilaes causadas por fatores climticos e financeiros, a produo

    da soja, milho, arroz e trigo tambm cresceu no Rio Grande do Sul significativamente a

    partir da dcada de 70 (DESAFIOS, 1987).

    Esse desenvolvimento agrcola repentino trouxe consigo problemas sociais e

    ecolgicos como o empobrecimento do pequeno agricultor, o uso abusivo de

    agrotxicos e a destruio de ecossistemas do nossas matas nativas e do nosso pampa.

    H hoje uma a recuperar a produo agrcola heterognea e auto-suficiente, baseada na

    agricultura familiar e visando ao consumo regional.

  • 4

    FIGURA 1: Produo mundial de gros (1965 - 1998)

    Fonte: Worldwatch Inst. & USDA

    FIGURA 2: Produo de gros vegetais

    no Rio Grande do Sul (1978 - 1987)

    1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987

    Anos

    0

    2

    4

    6

    8

    10

    12Milhes de ton

    Soja Feijo Cereais

  • 5

    Com o aumento da produo agrcola surgiram tambm novas tcnicas de

    armazenagem para preservar os gros por longos perodos e permitir a comercializao

    dos gros na entressafra..

    Embora haja uma desigualdade na distribuio de alimentos, principalmente nos

    pases pobres, essas novas tecnologias garantem o suprimento alimentar para a

    populao mundial em contnuo crescimento.

    No entanto, os cereais se por um lado suprem a carncia alimentar que trouxeram

    tais benefcios ao homem, tambm representam um risco para a sade dos indivduos que

    lidam com os mesmos em sua jornada de trabalho.

    Nos moinhos e nos silos, a movimentao intensa dos gros gera uma grande

    quantidade de poeira. As partculas de poeira comprometem a sade ao causarem uma

    agresso direta sobre a rea de superfcie corporal (pele e mucosas) que se manifesta

    atravs de reaes irritativas, alrgicas ou txicas.

    Quem visitar um silo graneleiro em pleno funcionamento ter em poucos minutos

    de exposio a pele e a roupa cobertas pela poeira, podendo de imediato apresentar

    eritema, prurido, lacrimejamento, ardncia ocular, coriza, espirros e prurido nasal. Em

    alguns indivduos mais suscetveis a poeira desencadeia crises de broncoconstrio ou

    tosse irritativa.

    Os efeitos da exposio poeira de gros podem ser agudos, sub-agudos ou

    crnicos. Essas manifestaes clnicas variam de tipo e intensidade conforme a

    susceptibilidade de cada hospedeiro, a composio da poeira inalada e a intensidade da

    exposio.

    Os mecanismos etiopatognicos destas reaes ainda so pouco conhecidos e so

    determinados pelas caractersticas qumicas dos constituintes da poeira e por sua

    propriedade de formar partculas microscpicas, passveis de serem inaladas, e

    penetrarem profundamente nas vias areas.

    1.1.3. As estruturas de armazenagem

    Para reconhecer os riscos ambientais no processo de trabalho da armazenagem de

    gros fundamental conhecer as caractersticas estruturais e a funcionalidade das

    unidades de armazenagem.

    O perodo da safra dura apenas dois a trs meses ao ano, enquanto a demanda de

    consumo ininterrupta. Os armazns e silos conservam o excesso da produo para ser

    distribudo durante a entressafra (PUZZI, 1977).

    Uma rede de armazenagem formada por uma infra-estrutura que viabiliza o

    fluxo de escoamento e distribuio dos gros desde unidades coletoras prximas s

    fontes de produo at unidades terminais de grande porte em centros urbanos e zonas

    porturias.

    As unidades de armazenagem so classificadas conforme a sua capacidade e a sua

    estrutura arquitetnica em trs tipos freqentemente encontrados no Rio Grande do Sul:

    1. Os silos de pequeno porte, de estrutura metlica, localizados nas reas rurais,

    prximos s lavouras (FIGURA 3).

    2. Os silos horizontais ou armazns graneleiros apresentam uma base

    retangular e uma capacidade de armazenagem entre cinco milhes e trinta milhes de

    toneladas.

    3. Os silos elevados so conjuntos de seis a oito estruturas cilndricas (clulas)

    alinhadas duas a duas, com capacidade entre cinco a oitenta milhes de toneladas.

  • 6

    4. As unidades mistas ou conjugadas so constitudas por um armazm

    graneleiro acoplado a um silo elevado (FIGURA 4).

    Em 1984 havia no Brasil 14.468 unidades de armazenagem(IBGE, 1986), das

    quais 2.513 (17,4%) estavam localizadas no Rio Grande do Sul (FIGURA 5). Em 1989

    a capacidade de armazenagem esttica do Rio Grande do Sul era de 16 milhes de

    toneladas, representando somente 37% da demanda de estocagem (EMPRESA, 1989).

    Como a produo agrcola continuou aumentando, este dficit se agravou nos ltimos

    anos em 2004 a capacidade atingiu somente 19,6 milhes de toneladas (CONAN,

    2004). Esse dficit s ser compensada pelo aumento da rede de armazenagem e pelo

    recrutamento de novos trabalhadores para o setor.

    Em torno de 5% da capacidade de armazenagem do Rio Grande do Sul pertence

    rede da Companhia Estadual de Silos e Armazns (CESA), que uma empresa estatal

    autrquica criada oficialmente pelo governo do Estado em 1952 para atender

    necessidade de escoamento da produo (DESMONTE, 1989). Foi a primeira rede de

    armazenagem estruturada no Rio Grande do Sul oferecendo reconhecida qualidade

    tcnica de armazenagem. Possui aproximadamente trinta unidades em diferentes

    municpios do Estado, perfazendo uma capacidade esttica total de aproximadamente

    750.000 toneladas. Os trabalhadores da rede da CESA e suas unidades de armazenagem

    foram avaliados no estudo cujos resultados sero relatados mais adiante.

    1.1.4. As operaes de armazenagem

    Uma srie de operaes so realizados nas unidades de armazenagem para

    conservar em bom estado os gros estocados. Os trabalhadores dos silos esto em

    contato direto e dirio com estas operaes, das quais participam com sua fora de

    trabalho.

    O conhecimento detalhado desses processos de trabalho auxilia na identificao

    das reas onde h maior risco de exposio poeira. Depois de localizados os pontos

    geradores de poeira sero aplicadas as medidas de controle para diminuir os nveis de

    concentrao de poeira.

    O ciclo de funcionamento de uma unidade de armazenagem de grande porte

    (FIGURA 6) inicia com o recebimento ou descarga dos gros nas unidades de

    armazenagem e termina com a sua expedio para consumo e industrializao. Durante o

    longo perodo da estocagem que dura de alguns meses at dois a trs anos, o produto

    passa por operaes intermedirias, como a limpeza, a secagem, o expurgo e a

    transilagem, que garantem a boa qualidade de sua conservao.

    O recebimento consiste na descarga dos gros em reas especficas chamadas

    de tremonhas ou moegas, depois de serem transportados em caminhes, trens ou navios.

    No piso das moegas existem grades de ferro onde a carga de gros despejada pela

    inclinao da caamba do caminho e pelo trabalho manual com o uso de ps. A massa

    de gros cai sobre uma esteira transportadora localizada no sub-solo sendo levada at a

    base do elevador e depoiis deslocada verticalmente at o topo do silo.

    Quando chegam na parte superior ou cabea do elevador os gros so lanados

    sobre outra correia transportadora e ento distribudos para as clulas ou enviados para

    outras operaes de armazenagem como a limpeza, a secagem ou o expurgo (PUZZI,

    1977).

    Outros sistemas transportadores so usados para deslocar ou remover a massa de

    gros no interior dos silos durante as operaes de armazenagem:

  • 7

    1. A rosca sem-fim um helicide montado sobre um eixo que ao girar desloca

    a massa de gros atravs de tubos que operam em posio inclinada.

    2. O transportador pneumtico impulsiona os gros atravs de um uma

    tubulao flexvel utilizando uma fora de suco ou de presso, sendo

    utilizado nas descargas de navios e vages

    3. A chamada operao de rechego utiliza tratores para distribuir a massa de

    gro em silos horizontais ou em pores de navios.

    Todas essas operaes de transporte ou deslocamento produzem grande

    quantidade de poeira pois geram uma movimentao intensa dos gros.

    Outras operaes de armazenagem tm como finalidade manter a massa de gros

    conservada durante o perodo de armazenagem.

    A limpeza um processo que diminui o teor de detritos provenientes da lavoura.

    realizada por equipamentos que utilizam peneiras com orifcios de diferentes

    dimetros, em contnuo movimento. Durante a limpeza existe formao de poeira devido

    ao atrito dos gros entre si e contra as estruturas metlicas da peneira.

    A secagem uma operao que visa diminuir o teor de umidade dos gros,

    impedindo o crescimento de microorganismos como bactrias, fungos, caros ou insetos

    que necessitam de umidade e substrato orgnico para proliferarem

    Os gros so lanados em uma cmara por onde circula uma corrente de ar

    aquecida, evaporando a gua contida no interstcio da massa de gros. Mtodos mais

    modernos introduziram a movimentao contnua da massa de gros, propiciando a

    formao de poeira. Quando a ventilao na rea de secagem deficiente, os operadores

    da fornalha usada para aquecer o sistema ficam tambm expostos aos gases e fumaa da

    queima do leo Diesel ou da lenha.

    O expurgo consiste na aplicao de um pesticida em estado gasoso, denominado

    genericamente como fumigante, sobre a massa de gros estocados. Visa o controle das

    pragas, principalmente os insetos, que causam prejuzos materiais ao infestarem a massa

    de gros. Como o processo esttico no h formao de poeira mas h risco de

    intoxicao pelo fumigante quando a tcnica de aplicao no segue as recomendaes

    de segurana.

    A transilagem a principal fonte de poeira nos silos durante o perodo da

    entressafra. Consiste na transferncia da massa de gros de uma clula para outra,

    assegurando a sua integridade pois essa movimentao elimina os focos de infestao e

    a proliferao de microrganismos que utilizam os gros como nutrientes.

    A expedio a operao final de armazenagem. Consiste no esvaziamento das

    clulas de armazenagem para carregar caminhes, vages de trem ou navios que iro

    distribuir os gros para o mercado consumidor. Assim como as outras operaes de

    armazenagem, a expedio envolve uma grande movimentao dos gros, gerando muita

    poeira durante a sua execuo.

    1.1.5. A formao de poeira nas unidades de armazenagem

    A elevada produo de poeira nos silos devida velocidade de processamento e

    atividade contnua dos processos de armazenagem.

    Segundo dados de 1980, a poeira gerada por operaes agrcolas nos Estados

    Unidos contribuiu com uma emisso de material particulado da ordem de 1.768.000

    toneladas por ano, das quais 1.700.000 toneladas (96%) foram geradas em silos de

    armazenagem (YOSHIDA & MAYBANK, 1980). Durante a dcada de setenta, a

  • 8

    produo agrcola foi considerada a terceira fonte de emisso de partculas nos Estados

    Unidos, sendo ultrapassada somente pela combusto de derivados do petrleo e pela

    extrao mineral.

    Alguns fatores tambm contribuir para tornar a exposio poeira mais

    prejudicial sade:

    1. Alguns cereais, como o trigo, fragmentam-se mais e aparentemente causam

    mais sintomas respiratrios do que outros tipos de gros.

    2. As condies precrias de estocagem favorecem a proliferao de bactrias,

    fungos, caros e insetos nos gros, gerando partculas contaminadas pelos seus

    fragmentos ou metablitos desses microorganismos.

    3. O nmero de processamentos anteriores determina maior grau de

    fragmentao dos gros, produzindo maior quantidade de poeira.

    4. A intensidade da atividade fsica exercida pelo trabalhador exposto aumenta a

    freqncia respiratria e o volume de ar corrente, expondo as vias areas a uma dose

    maior de agentes inalveis.

    Durante as operaes de armazenagem a poeira gerada em determinados locais,

    chamados pontos de transferncia, onde os gros em movimento sofrem algum tipo de

    resistncia. Isto acontece por exemplo quando a direo do fluxo de gros alterada ou

    quando este fluxo interrompido abruptamente. A poeira formada pelo atrito dos

    gros entre si ou pela abraso que sofrem ao se chocarem contra a estrutura dos

    equipamentos de armazenagem, como tubulaes, esteiras e componentes dos

    elevadores.

    Os principais pontos de transferncia so as reas de recebimento, as peneiras

    durante a limpeza dos gros e o topo dos elevadores, com os "canecos" do elevador

    despejando os gros nas correias transportadoras (FIGURA 6). Parte dessa poeira

    lanada para o ambiente externo atravs de um sistema de ventilao instalado na parte

    superior do silo. Dependendo do regime predominante dos ventos, as comunidades

    circunvizinhas sero tambm atingidas pela poeira.

    O ambiente confinado dos silos contribui para a elevao dos nveis de

    concentrao, que pioram quando a ventilao deficiente, os elevadores apresentam

    vazamento ou no h uma eficiente remoo da poeira depositada.

    Portanto a identificao dos pontos geradores de poeira na planta de um silo

    depende da observao dos processos de trabalho, das atividades ocupacionais

    desenvolvidas e do nmero de indivduos em cada cargo e funo, bem como dos turnos,

    periodicidade e rotatividade dessas funes.

  • 9

    FIGURA 3: Silo metlico de pequeno porte

    Fonte: PUZZI, 1977

    FIGURA 4: Silo conjugado, composto por um silo elevado e um silo

    horizontal ou armazm

    Fonte: PUZZI, 1977

  • 10

    FIGURA 5: Tipos de unidade de armazenagem

    no Rio Grande do Sul e no Brasil

    Fonte: IBGE, 1987.

    Brasil Rio Grande do Sul

  • 11

    FIGURA 6: Pontos de gerao de poeira durante os processos de

    armazenagem

    Fonte: CESA,1978.

  • 12

    1.1.6. As partculas inalveis dos gros

    A poeira total produzida durante a atividade de um silo equivale

    aproximadamente a 0,5% da massa dos gros movimentados. A frao de poeira

    inalvel estimada em 40% da poeira total, ou seja, 0,2% da massa total dos gros

    (YOSHIDA & MAYBANK, 1980). Portanto a movimentao de uma tonelada de gros

    produziria em torno de 20 kg de poeira inalvel.

    A poeira dos gros visualizada facilmente, fazendo supor que a poeira mais

    grosseira, visvel a olho nu, seja a causadora das manifetsaes respiratrias agudas. No

    entanto, essa suposio no tem fundamento na realidade. So as partculas invisveis a

    olho nu, com dimetro aerodinmico equivalente abaixo de dez m (micrmetros ou

    micra) que representam maior risco para os trabalhadores expostos por penetrarem

    profundamente nas vias areas, podendo atingir os espaos alveolares (NIOSH, 1977;

    WHO, 1984; COLACIOPPO, 1989).

    O dimetro aerodinmico equivalente definido como "o dimetro de uma

    partcula de formato esfrico e de densidade unitria que tem a mesma velocidade de

    sedimentao no ar que uma partcula de formato e densidade arbitrrios" (ABNT,

    1989).

    As partculas com dimetro acima de 50 m se depositam rapidamente

    acumulando-se sobre a superfcie dos pisos e dos equipamentos no interior do silo

    porque o seu peso maior que o oferecido pela resistncia das molculas de ar.

    As partculas com dimetro aerodinmico equivalente entre 10 m e 50 m j

    ficam em suspenso e podem ser inaladas, ficando a maior parte retida nas vias areas

    superiores, principalmente na nasofaringe. Aquelas abaixo de 10 m penetram nas vias

    areas inferiorers e so eliminadas por ao do tapete mucociliar ou se depositam nos

    alvolos. Principalmente aquelas com dimetro aproximado de 1 a 2 m apresentam

    maior deposio a nvel alveolar, mas essa propriedade diminui para as partculas com

    dimetro em torno de 0,5 m. As partculas com dimetros ainda menores voltam a

    apresentar maior deposio alveolar devido ao movimento Browniano (WHO, 1984).

    A maior parte das partculas de gros que atinge o compartimento alveolar so

    fagocitadas pelos macrfagos e transportadas at a zona de ao do tapete mucociliar.

    Em torno de 20 % delas migram dos alvolos para o espao intersticial, sendo que 5%

    so carreadas pela circulao sangunea e 15% pelo sistema de drenagem linftica. A

    maior parte das partculas absorvidas pelos linfticos (90 %), ficam retidas nos

    linfonodos regionais e somente 10 % atingem a circulao sangunea atravs do ducto

    linftico (BRAIN & MOSIER, 1980).

    Outro fator associado ao risco de inalar a poeira a intensidade da atividade

    fsica exercida pelo trabalhador exposto, que ao aumentar a freqncia respiratria e o

    volume de ar corrente, expe as vias areas a uma dose maior de agentes inalveis.

    Vrios estudos ambientais realizados em silos do Canad comprovaram que, em

    determinados pontos de transferncia, as concentraes observadas excediam em muito

    o limite de tolerncia previsto para a poeira de gros (LIAM FINN et al.,1980).

    Um estudo sobre as propriedades aerodinmicas da poeira de gros demonstrou

    que 75 % das partculas caam por ao da gravidade imediatamente aps a sua

    formao, enquanto 25% permaneciam em suspenso no ambiente dos silos (YOSHIDA

    & MAYBANK, 1980). Na rea de recebimento a frao de poeira inalvel foi de 44% da

    poeira total, elevando-se para 60% junto rea da balana (pesagem). Na rea prxima

    coifa do sistema de ventilao esta frao caiu para 32 %. O trigo foi o cereal que

  • 13

    apresentou maior frao de poeira inalvel, correspondendo a 50% da poeira total

    (YOSHIDA & MAYBANK, 1980).

    Os valores de concentrao de poeira total nas moegas variaram de 10 a 40

    mg/m3, mas alcanaram valores at 840 mg/m

    3 em alguns pontos internos do silo

    (YOSHIDA & MAYBANK, 1980). Foram encontrados valores de poeira total entre

    0,18 a 781 mg/m3 em 754 amostras coletadas em 17 silos (FARANT & MOORE, 1980).

    Nesses mesmos locais, a poeira inalvel variou de zero a 76,3 mg/m3. Havia nveis

    relativamente baixos de concentrao de poeira nas moegas em relao ao interior do

    silo devido ventilao natural existente nesses pontos localizados em reas semi-

    abertas, pois o deslocamento do ar por ao dos ventos determinava uma baixa captao

    das partculas pelo coletor gravimtrico.

    Na rea confinada dos tneis de recepo no sub-solo foram encontrados os

    nveis mais elevados de poeira total de gros, atingindo uma mdia de 109 mg/m3. Nas

    galerias dos andares superiores do silo, onde a circulao de pessoal maior e por mais

    tempo, podem ser encontradas concentraes em torno de 1.000 mg/m3, limiar em que o

    risco de exploses aumenta consideravelmente (FARANT & MOORE, 1980). Cerca de

    65 a 70 % da poeira de gros constituda de material puramente orgnico, sendo que

    esta a frao que apresenta maior risco de combusto.

    O sistema de ventilao elimina grande parte da poeira para o ambiente externo,

    mas no consegue suprimi-la totalmente do interior do silo, por maior que seja o seu

    poder de vazo.

    As partculas inalveis da poeira dos gros vegetais so constitudas por

    substncias potencialmente txicas, irritativas ou alergnicas para o sistema respiratrio

    (PEPYS & HUTCHCROFT, 1980; BRAIN & MOSIER, 1980). Apresentam uma

    constituio heterognea composta por uma variedade de substncias orgnicas e

    minerais, cujos componentes principais so:

    1. Fragmentos dos prprios gros e de outros resduos vegetais.

    2. Partculas de slica e traos de metais.

    3. Vrias espcies de fungos e bactrias, e suas toxinas.

    4. Fragmentos e dejetos de insetos e caros que colonizam os gros.

    5. Resduos de roedores e aves que se alimentam dos gros.

    6. Resduos qumicos de pesticidas e herbicidas.

    Atravs da microscopia eletrnica foram detectadas, em amostras de partculas

    inalveis de trigo e de cevada, fibras orgnicas com dimetro de 5 a 10 m e com 100 a

    200 m de comprimento, denominadas de tricomas, e que representam at 30% do total

    de partculas inalveis (YOSHIDA & MAYBANK, 1980).

    Foram tambm encontradas na poeira inalvel dos gros partculas de forma

    globular, que apresentam propriedades higroscpicas. Absorvem gua das mucosas

    respiratrias aumentando de volume depois de serem inaladas. So eliminadas com mais

    facilidade que as partculas no higroscpicas de igual tamanho (YOSHIDA &

    MAYBANK, 1980).

    As partculas no respirveis, por sua vez, formam na maioria resduos

    alongados, visveis microscopia tica e que so constitudos por glicoprotenas

    prprias da parede celular dos gros (DASHEK et al., 1986).

    Partculas de slica, principalmente cristais de quartzo, so provenientes

    provavelmente do solo de onde o gro foi colhido

  • 14

    Quanto maior o grau de limpeza dos gros armazenados, menor o contedo de

    slica. FARANT (1980) encontrou na poeira inalada de gros vindos da lavoura um

    contedo de quartzo de 6,5%. Com a operao de limpeza a mdia de concentrao de

    slica baixou para 2,1%.

    Foram tambm detectados na poeira de gros traos de metais como alumnio,

    titnio, mangans e vandio, mas em concentraes to pequenas que sua toxicidade

    para o homem pouco relevante. Estes resduos so originrios do solo, de pesticidas

    agrcolas ou dos equipamentos utilizados na colheita

    Estudos ambientais comprovaram que na poeira inalvel de gros existe uma

    variada microflora e microfauna de bactrias, fungos, Actinomicetos e caros

    microscpicos. Esses microrganismos so responsveis em grande parte por

    manifestaes de hipersensibilidade como conjuntivite, rinite, dermatite, obstruo aguda

    das vias areas e alveolite alrgica extrinseca prevalentes em trabalhadores expostos

    poeira orgnica.

    Os gros formam um substrato orgnico propcio ao crescimento desses

    microrganismos. Esta microflora sofre alteraes conforme o processo a que o gro

    submetido (colheita, armazenagem ou industrializao).

    A poeira formada durante o uso da colheitadeira mecnica pode ser inalada pelo

    manobrista do trator, ou pelo agricultor que utiliza uma ceifadeira manualmente. Essa

    poeira contm uma microflora de espcies saprfitas e fitopatognicas para os cereais

    que prpria da lavoura. Em amostras de poeira oriundas da colheita de cereais no

    Canad, a espcie de fungo que predominou foi Cladosporium sp (LACEY, 1980),

    seguidas de Alternaria sp., Verticillium sp., Epicoccum sp., Puccinia sp. e Ustillago sp.

    Habitualmente durante a estocagem h uma mudana qualitativa da microflora.

    As espcies que colonizam ou parasitam os gros antes da estocagem declinam e so

    substitudas por outras, em funo das condies de temperatura, ventilao e umidade

    do interior do silo.

    Em silos fechados e com pouca ventilao, mas secos, o crescimento de fungos e

    bactrias fica inibido. A presena de umidade nesses locais oferece condies para o

    crescimento de espcies anaerbicas, como as leveduras e o Penicillium roqueforti..

    Quando a ventilao aumenta, estas espcies so substitudas por Penicillium sp. e

    Aspergillus sp. e por outros microrganismos aerbicos (LACEY, 1980).

    A microflora em suspenso no ambiente dos silos , portanto, um reflexo das

    condies da armazenagem.

    Essas variaes da microflora dos gros estocados foram comprovadas atravs

    de estudos ambientais em diferentes regies.

    Em silos da Inglaterra, utilizados para a estocagem de cevada, foram encontrados

    na poeira em suspenso espcies de Penicillium sp., Aspergillus fumigatus, Absidia sp.,

    Mucor sp. e Actinomicetos como Humicola lanuginosa e Mycropolyspora faeni. Os

    Actinomicetos, devido a suas propriedades de termofilia e de anaerobiose proliferavam

    quando a temperatura era elevada e a movimentao mnima (LACEY,1980).

    Na poeira de gros em 31 silos de diferentes regies do Canad durante o

    recebimento foram encontrados esporos viveis de fungos em todas as coletas de

    poeira inalvel realizadas (FARANT & MOORE, 1980). Os mais freqentes foram os do

    gnero Ustillago, encontrado em 70% das amostras examinadas ao microscpio. Outras

    espcies como Aspergillus sp., Mucor sp. e Cladosporium sp. tambm predominaram

    com freqncia. Houve uma variao significativa na concentrao de esporos no ar de

  • 15

    0.11x 106 a 0,96x10

    9 esporos/m

    3. Os nveis mais elevados ocorreram em silos com

    sistemas de ventilao deficientes.

    Como vrias espcies de fungos so patognicas, alergnicas ou txicas para o

    homem, supe-se que diferentes espcies possam causar o mesmo sintoma respiratrio, e

    por outro lado o mesmo microorganismo possa causar diferentes sintomas respiratrios..

    Em alguns estudos, no entanto, a relao causal entre os sintomas clnicos e um

    agente foi confirmada.

    Muitos dos fungos identificados nos gros de cereais durante a colheita, como

    Alternaria sp., Cladosporium sp., Puccinia sp. e Ustillago sp., provocam reao de

    hipersensibilidade tipo I. Outras espcies, como Aspergillus sp. e Micropolyspora faeni,

    causam reao de hipersensibilidade tipo III (LACEY, 1980), ou mesmo infeco

    mictica, como Absidia corymbifera e Mucor pusillus. A presena de Actinomicetos

    termoflicos, como a M. faeni em gros estocados pode desencadear alveolite alrgica

    extrnseca quando seus esporos formam partculas com dimetro abaixo de 5 m.

    Em trabalhadores de cereais de uma comunidade rural das ilhas Orkney

    (Esccia), que apresentavam quadro clnico de asma ou de alveolite, foi identificado

    como provvel agente causal um caro do gnero Glycyphagus sp., atravs da realizao

    de testes imunolgicos (CUTHBERT et al, 1980).

    Alguns fungos produzem micotoxinas que apresentam patogenicidade

    comprovada para o homem e para animais de laboratrio. Muitas delas so

    hepatotxicas e algumas nefrotxicas. Outras, como a aflatoxina, produzida por algumas

    espcies de Aspergillus, so mutagnicas e carcinognicas (HAYES, 1980).

    Micotoxinas identificadas em partculas inalveis da poeira de milho so

    citotxicas para os fagcitos alveolares (SORENSON et al, 1986; BURG et al, 1981).

    PALMGREN & LEE (1986) encontraram concentraes aumentadas de aflatoxinas e

    de cido D-secalnico em partculas inalveis de gros contendo esporos de Aspergillus

    e Penicillium.

    A endotoxina de uma bactria gram-negativa, a Erwinia herbicola, pode causar

    doena broncopulmonar em trabalhadores de cereais (DUTKIEWICZ et al, 1985). Uma

    concentrao elevada de toxinas de bactrias gram-negativas foi tambm relatada na

    poeira inalvel do arroz, em comunidades rurais na China (OLENCHOCK et al, 1984).

    Mais pesquisas sero necessrias para determinar que doenas esses agentes

    biolgicos podem causar em diferentes situaes, considerando-se as peculiaridades

    sazonais e geogrficas de cada amostragem.

    1.1.7. Outros fatores de risco na armazenagem de gros

    Os agentes inalveis presentes nos ambientes de armazenagems se apresentam

    sob a forma de aerodispersides e gases. Os aerodispersides so partculas slidas ou

    lquidas em fase de disperso na atmosfera e que se depositam muito lentamente

    (CLARKE & PAVIA, 1988; MURRAY, 1988).

    Alm da poeira dos gros propriamente dita, que o principal aerodisperside

    presente nesses locais, existem outros produzidos ocasionalmente durante alguns

    processos de armazenagem.:

    Na operao de expurgo dos gros armazenados se formam nvoas ("mists")

    originadas dos fumigantes utilizados, que apreentam toxicidade elevada em altas

    condentraes e so irritantes das vias respiratrias em concentraes menores.. Os

    principais fumigantes empregados em nosso meio so:

  • 16

    1. O brometo de metila (CH3 -Br), comercializado sob a forma lquida se

    volatiliza quando em contato com a temperatura ambiente. Apresenta uma

    toxicidade elevada, causando neuropatias centrais e perifricas

    2. A fosfina (PH3) liberada atravs de uma reao qumica de hidrlise (AlP +

    3 H2O Al(OH)3 + PH3) em que o fosfeto de alumnio (AlP) sob a forma de

    tabletes entra em contato com o a umidade ambiental.

    3. O dissulfeto de carbono (CS2) e o tetracloreto de carbono (CCl4) so

    fumigantes com propriedades neurotxicas de uso infreqente (PETERS,

    1986).

    A fumaa formada por partculas slidas e lquidas muito finas, geradas pela

    combusto de material contendo carbono. Est presente nas reas de secagem dos silos

    pela queima de combustveis de derivados do petrleo ou de madeira para fornecer

    calor ao sistema.

    Alguns gases asfixiantes ou txicos so tambm encontrados no interior de

    unidades de armazenagem com inadequada ventilao. Resultam do metabolismo dos

    prprios gros e de outros seres vivos, como fungos e insetos, que proliferam nos locais

    de armazenagem. Os mais enconrrados so:

    1. O dixido de nitrognio (NO2) est presente em silos que receberam gros

    recm colhidos. Por um processo de fermentao anaerbica; os radicais

    nitrato (NO3-) contidos nos gros reagem com cidos orgnicos formando o

    NO2 que pode permanecer semanas no ambiente. Como apresenta baixa

    solubilidade em gua, o NO2 penetra at o nvel da zona respiratria do

    pulmo provocando uma reao inflamatria. A absoro sistmica pode

    causar hipotenso e meta-hemoglobinemia. Em concentraes elevadas

    provoca uma sndrome denominada "silo- filler's disease" ("doena dos

    enchedores de silos"). Logo aps a exposio surge tosse e dispnia intensa

    que pode levar ao edema agudo de pulmo. Depois de um perodo de 2 a 3

    semanas assintomtico, ou com grau mnimo de dispnia, o indivduo passa a

    apresentar febre, tosse, dispnia intensa e ocasionalmente cianose. Esse

    estgio evolui para a cura, para a obstruo crnica das vias areas por

    bronquiolite fibrosa obliterante ou para a morte por insuficincia respiratria

    (SUMMER & HAPPONIK, 1984).

    2. O gs carbnico (CO2) em altas concentraes diminui a presso parcial de

    O2 nos espaos alveolares, levando hipoxemia. Os gros apresentam

    atividade biolgica como qualquer outro ser vivo, absorvendo o O2 e

    eliminando o CO2 no seu processo respiratrio. As altas concentraes de

    CO2 em reas confinadas de silos repletos podem causar acidentes fatais por

    asfixia.

    3. A amnia (NH-4), o dissulfeto de hidrognio (H2S) e o metano (CH4) so

    outros gases txicos ou asfixiantes produzidos durante a decomposio de

    matria orgnica decorrente de condies inadequadas de armazenagem

    (COCKCROFT, 1981). Dependendo do grau de confinamento e dos nveis de

    concentrao no ambiente essa exposio pode levar a acidentes fatais.

    Para a preveno das intoxicaes agudas por esses gases imprescindvel que o

    trabalhador receba a orientao adequada, evitando as situaes de risco. Nos locais de

  • 17

    trabalho deve haver pessoas com treinamento bsico para atendimento de primeiros

    socorros que entrem prontamente em ao caso ocorra um acidente desse tipo.

    Alm dos aerodispersides e gases, as atividades ocupacionais desempenhadas no

    interior dos silos apresentam outors fatores de risco para a sade dos trabalhadores, tais

    como:

    O rudo intenso e contnuo dos silos que proveniente das peneiras e das

    correias transportadoras em movimento. Alm de alteraes psicolgicas e de conduta, a

    exposio prolongada ao rudo causa danos estrutura neurossensorial do ouvido

    interno, podendo levar perda irreversvel da audio.

    As fornalhas do secador podem causar calor excessivo. Alm do desconforto

    trmico, o calor provoca depleo salina e intermao. Causa tambm, a longo prazo,

    alteraes cardiovasculares, hepticas, renais e neurolgicas (ZENZ, 1975).

    O risco de acidentes traumticos est presente durante as operaes de

    armazenagem e decorre da falta de segurana no uso dos equipamentos mecnicos ou

    durante a descarga de caminhes e vages. A observao de algumas rotinas bsicas de

    preveno pode evitar esses acidentes.

    A poeira de gros ao atingir nveis elevados de concentrao (acima de 1 g/cm3)

    em reas pouco ventiladas dos silos pode causar graves exploses. Cerca de 65 a 70 %

    da poeira de gros constituda de material puramente orgnico que apresenta risco de

    combusto. Uma fonte de ignio casual, como uma fasca ou um fsforo aceso, deflagra

    a combusto da matria orgnica contida na poeira em suspenso e na depositada sobre

    as superfcies, propagando a exploso. Sinistros desse tipo podem causar extensos danos

    materiais, ferimentos graves e morte (ILO, 1980).

    Portanto, as possveis fontes de ignio na armazenagem devem ser eliminadas e

    a concentrao mantida abaixo do nvel de risco. O hbito tabgico sob esse aspecto

    um fator de risco ambiental a ser prevenido atravs de programas de controle do

    tabagismo dirigido aos trabalhadores.

    1.1.8. As condies de trabalho.

    Milhes de pessoas no mundo inteiro trabalham nos setores de colheita,

    armazenagem e industrializao. Essa populao constituda por ceifadores,

    colheitadores, pequenos agricultores, trabalhadores de silos e armazns, moageiros,

    estivadores porturios, martimos e operrios da indstria de transformao e depois

    dessa etapa, os ensacadores de farinha, os padeiros e confeiteiros, os criadores de

    animais que manipulam raes e outras atividades ocupacionais em que os gros

    vegetais ou seus derivados so empregados.

    No Canad, em 1977, aproximadamente 100.000 indivduos trabalhavam no setor

    de armazenagem e industrializao de cereais e quase 150.000 tinham contato com

    cereais na rea rural (YOSHIDA, 1980). Nessa mesma poca, cerca de 500.000

    trabalhadores estavam empregados no setor de armazenagem de gros nos Estados

    Unidos (DO PICO et al, 1977).

    Em dezembro de 1984 o nmero de trabalhadores empregados em carter

    permanente no setor de armazenagem no Brasil era de 90.000 (IBGE, 1986), dos quais

    38.617 (43%) estavam na regio Sul (FIGURA 7) e 18.083 (20 %) estavam no Rio

    Grande do Sul (FIGURA 8). Naquele ano, o Rio Grande do Sul foi o Estado da

    federao que empregou maior nmero de trabalhadores no setor, seguido de perto por

    So Paulo (17.559) e Paran (15.291). Parte desses indivduos trabalhava na

  • 18

    armazenagem de produtos embalados, onde a exposio poeira menor do que na

    estocagem a granel.

    No setor agrcola de produo existem espalhados pelo interior do pas milhes

    de trabalhadores rurais ocupacionalmente expostos poeira dos gros ou orgnica, e

    cujo nmero total difcil de estabelecer. Anualmente a populao de trabalhadores

    acrescida temporariamente por um contingente contratado durante o perodo da safra da

    soja e do trigo tanto no Rio Grande do Sul como no resto do pas, conforme mostra a

    FIGURA 9 (IBGE, 1984).. Na entressafra esses trabalhadores so dispensados.

    Fonte: IBGE, 1986.

    FIGURA 7: Trabalhadores na armazenagem

    por regies do Brasil (1984)

    n = 90.048

  • 19

    FIGURA 8: Trabalhadores de armazenagem nos Estados do Brasil

    (1984)

    Total = 89.968

    Fonte: IBGE, 1986.

    FIGURA 9 :Trabalhadores empregados no setor de armazenagem -

    flutuao sazonal (1984)

    Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

    Meses de 1984

    0

    20

    40

    60

    80

    100

    120

    Milhares

    Brasil Rio Grande do Sul

    Fonte: IBGE, 1986

  • 20

    Existem aproximadamente trinta e cinco tipos de funes exercidas pelos

    trabalhadores durante as operaes de armazenagem, entre elas as de operrio, varredor,

    eletricista, mecnico de mauteno e supervisores (FARANT, 1980). Com a rotatividade

    dos postos de trabalho muitos desses trabalhadores de silos exercem mais de uma

    funo. Uma unidade de armazenagem emprega de 15 a 50 homens cujas atividades de

    intensificam durante o perodo de safra, quando o funcionamento dos silos quase

    ininterrupto.

    As unidades de armazenagem devem adotar uma srie de medidas de rotina para

    prevenir os A Portaria 3.214 do Ministrio do Trabalho e Emprego (MTbE), de

    08/06/1988, estabelece em sua Norma Regulamentar n 5 (NR-5) que a preveno de

    acidentes e doenas ocupacionais. so da responsabilidade da chamada Comisso

    Internas de Preveno de Acidentes (CIPA). Em 1980, a CIPA da CESA publicou um

    manual de segurana para orientao e treinamento de seu pessoal (CESA, 1980).

    A Norma Regulamentar n 15 (NR 15) do Ministrio do Trabalho e Emprego

    que regulamenta as atividades e operaes consideradas insalubres, no cita a exposio

    poeira de gros como atividade de risco. A NR 16, que qualifica as atividades e

    operaes perigosas, tambm no alude atividade em silos de armazenagem de gros

    como sujeita ao risco de exploses.

    A recente Portaria 86 de 04/03/2005, que aprova a Norma Regulamentadora n

    31 (NR 31) regulamenta o planejamento e o desenvolvimento de atividades de

    segurana, sade e meio ambiente no trabalho em agricultura. De acordo com a NR 31,

    cabe aos empregadores garantir adequadas condies de trabalho, realizar avaliaes dos

    riscos, analisar causas de acidentes e doenas com participao da Comisso Interna de

    Preveno de Acidentes no Trabalho Rural (Cipatr). Essa nova regulamentao cria pela

    primeira vez a perspectiva de um amparo legal para a preveno dos riscos ocupacionais

    na rea rural, e por ilao no setor de armazenagem de gros.

    1.1.9. Processos de avaliao do risco ambiental

    A coleta de material particulado nos ambientes de trabalho permite avaliar a

    concentrao dos contaminantes inalados determinando se existe risco dos trabalhadores

    expostos de adquirirem doenas pulmonares ocupacionais.

    A maioria dos equipamentos para coleta de aerossis inalveis simulam o

    processo aerodinmico de penetrao e deposio das partculas nas vias areas, sendo

    formados basicamente por um sistema coletor, uma bomba de suco, um medidor de

    fluxo e uma fonte de energia para ativar o seu funcionamento.

    O mtodo de avaliao ambiental pode ser individual ou "de rea", conforme se

    queira avaliar a exposio de um trabalhador ou de uma determinado ponto da planta

    industrial.

    . A anlise realizada no material coletado se classifica como quantitativa, quando

    estima a concentrao ou o nmero de partculas por volume de ar, ou qualitativa,

    quando analisa o contedo do material coletado.

    Cada um destes enfoques de avaliao requer estratgias e procedimentos

    diversos quanto tcnica de coleta e de anlise laboratorial. Entretanto o seu objetivo

    comum orientar a implantao ou implementao de medidas de controle que

    minimizem o impacto da exposio, reduzindo os nveis de concentrao de poeira

    inalvel ou eliminando os contaminantes nela contidos (WHO, 1980).

  • 21

    A avaliao ambiental tambm utilizada para monitorar a eficcia das medidas

    de controle depois de implantadas.

    Discutiremos a seguir alguns aspectos relativos smente metodologia de

    avaliao que empregamos para caracterizara poeira inalvel em silos no Rio Grande do

    Sul.

    As avaliaes quantitativas compreendem a medio dos nvies de de

    concentrao que depois so comparados a padres de normalidade estipulados para

    cada contaminante, denominados limites de tolerncia. O limite de tolerncia "a

    concentrao de substncia no ar sob a qual se acredita que a maioria dos trabalhadores

    possam ser expostos repetidamente dia aps dia durante toda a sua vida laboral, sem

    apresentarem efeitos adversos sade" (ABNT, 1989). Quando os limites de tolerncia

    se mantm abaixo do limite de tolerncia diminui significativamente o risco de dano

    causado pela exposio ao contaminante.

    O coletor gravimtrico um amostrador quantitativo de aerodispersides que

    que consiste basicamente num cassete contendo um filtro de membrana de PVC

    acoplado a um dispositivo pr-coletor conectado a uma bomba aspirativa de fluxo

    contnuo. Para fins de amostragem, a "poeira respirvel" definida operacionalmente

    como a frao de material particulado que fica retido no filtro do sistema coletor. Foi

    projetado originalmentte para coletar amostras individuais de trabalhadores durante a

    jornada de trabalho, porm pode ser utilizado como coletor de rea desde que mantido

    num ponto fixo na altura das narinas dos trabalhadores. Utilizamos esse critrio para

    realizar a avaliao quantitativa da poeira inalvel nos silos da CESA.

    O sistema pr-coletor retm a poeira no respirvel (acima de 10 m de

    dimetro), possibilitando que o sistema coletor absorva smente a poro respirvel de

    poeira.

    Atravs do princpio aerodinmico do ciclone separa a poeira no respirvel da

    poeira total no sistema pr=coletor. O ar entra no pr-coletor movimentando-se em

    espiral, induzindo as partculas no respirveis a se depositarem por ao da gravidade.

    As partculas com dimetro menor do que 5 m (respirveis), se deslocam no

    sentido da aspirao contnua da bomba, penetram no sistema coletor e so retidas no

    filtro de membrana instalado no cassete. Depois de concludo o tempo de amostragem, o

    filtro retirado e as partculas inalveis que contm so analisadas qualitativa e

    quantitativamente.

    Para caracterizar o risco de exposio adequadamente deve ser realizada uma

    amostragem de coletas e calculada uma concentrao mdia ponderada pelo tempo

    (MPT), que o somatrio dos produtos das concentraes de cada amostra pelo seu

    tempo de durao (Ci x Ti), sobre o somatrio do tempo de durao das amostras (Ti);

    conforme a equao MPT = (Ci x Ti)/ Ti (COLACIOPPO, 1989).

    O coletor microbiolgico de Andersen um amostrador de rea que serve

    tanto para a anlise qualitativa como quantitativa da amostra. Seleciona partculas

    inalveis biologicamente viveis, conforme o seu dimetro aerodinmico, pela

    impactao sobre a superfcie de um meio de cultura.. Consiste numa torre cilndrica,

    com 20 cm de altura por 10 cm de dimetro conectada a uma bomba de aspirao

    contnua. Possui 3 ou 6 estgios de classificao cada um contendo um disco de

    metal`com 400 orifcios, montado sobre uma placa de Petri com o meio de cultura

    especfico para o agente a ser pesquisado. Os orifcios propiciam a seleo das partculas

    conforme o seu dimetro, simulando a deposio nas vias areas. As partculas contendo

    microrganismos viveis formam colnias que so posteriormente cultivadas em

  • 22

    laboratrio. O coletor de Andersen permite tambm uma estimativa aproximada do

    nmero de partcula s viveis por mm3 de ar ambienta.

    Utilizamos o coletor de Andersen de 6 estgios empregando o meio de

    Saboureaud a 5% na avaliao qualitativa dos esporos de fungos na poeira de gros em

    silos do Rio Grande do Sul, confore ser relatado mais adiante.

    Os gases no ambiente so detectados atravs de sistemas de coleta diferentes dos

    utilizados para os aerossis e no sero abordados no presente trabalho.

    1.1.10. Medidas para o controle do risco ambiental

    Para manter os nveis de concentrao de poeira abaixo do limite de tolerncia

    previsto e diminuir a populao de agentes biolgicos inalveis necessria a utilizao

    das chamadas medidas de controle do risco ambiental.

    Alguns mtodos de controle aplicveis ao problema da poeira nos silos so:

    1) O enclausuramento dos pontos de transferncia, evitando a propagao da

    poeira para o ambiente de trabalho.

    2) A captao da poeira pelos sistemas de ventilao.

    3) A varredura e remoo manuteno sistemtica da poeira depositada

    4) A utilizao de mscaras ou equipamentos de proteo individual.

    Entre esses o mais utilizado o sistema de ventilao. Constitudo por uma coifa

    e um exaustor, o ar interior aspirado pelo sistema e lanado para o exterior. As

    partculas em suspenso ficam retidas no fundo de um recipiente em forma de cone

    invertido denominado ciclone, de onde o resduo removido (FIGURA 10).

    O sistema de ventilao quando devidamente aplicado s fontes de emisso, nas

    moegas, nas peneiras da operao e no topo do elevador reduz significativamente os

    nveis de concentrao de poeira (HALTER, 1980).

    Entretanto h limitaes operacionais e financeiras na instalao desses

    equipamentos de controle em estruturas j existentes. Os custos elevados de construo

    e manuteno muitas vezes inviabilizam o projeto. O ideal seria planejar essas medidas na

    planta ou lay-out do projeto de construo das unidades de armazenagem.

    Portanto, o objetivo de diminuir a concentrao da poeira at nveis abaixo do

    limite de tolerncia previsto s atingido parcialmente na medida em que as solues

    adotadas na prtica devem atender uma relao custo-benefcio conveniente.

    Os equipamentos de proteo individual (EPIs) do sistema respiratrio so

    tambm denominados de mscaras e devem ser utilizados como recurso complementar

    s medidas de controle ambiental, quando essas depois de implementadas no foram

    suficientes para diminuir a concentrao de poeira a um nvel aceitvel.

    Os EPIs respiratrios so encontradas comercialmente sob a forma de dois

    modelos bsicos. A mais comum a mscara facial de borracha que recobre a boca e as

    narinas do trabalhador. Devem ficar perfeitamente ajustadas face para evitar a entrada

    de ar por espaos laterais. A admisso do ar feita atravs de um ou dois cartuchos que

    contm filtros onde ficam retidos os contaminantes inalveis. Uma vlvula de entrada e

    outra de sada regulam a inalao e exalao do ar. Os filtros devem ser trocados

    periodicamente, antes de atingirem um ponto de saturao (FIGURA 11).

    Um modelo mais complexo constitudo por um elmo, que recobre toda a

    cabea do trabalhador, conectado ou no a um sistema externo de suprimento de ar. A

  • 23

    intensidade da exposio ou o tipo de particula no ambiente vo determinar qual o tipo

    de EPI mais adequado a cada situao ocupacional.

    Apesar das recomendaes preconizadas pela Norma Regulamentar n 5 do

    MTbE, o uso do EPI pouco valorizado.

    Os EPIs so pouco aceitos pelo trabalhadores porque aumentam o esforo

    respiratrio quando os filtros saturados no so renovados. Alm disso so incmodos,

    quando o calor intenso, sendo assim removidas ou no utilizadas pelos trabalhadores.

    Por outro lado, a sua manuteno traz um nus pouco aceito pelos empregadores. Os

    EPIs precisam atender as exigncias de controle de qualidade, conferidas pelo Governo

    Federal atravs de um Certificado de Aprovao.

    A execuo das medidas de controle so eficazes smente quando amparadas por

    programas de preveno de riscos ambientais com normas de vigilncia que vigorem a

    nvel nacional ou regional (OMS, 1973). A nvel da empresa essa vigilncia consiste na

    execuo de procedimentos para o reconhecimento e avaliao do risco, o

    monitoramento da qualidade das medidas de controle adotadas e a organizao de

    Servios de Segurana e Medicina do Trabalho.

  • 24

    FIGURA 10: Medida coletiva de controle da poeira ambiental

    Sistema de ventilao

    Fonte: NIOSH, 1981

    FIGURA 11: Medida individual de controle da poeira ambiental

    Equipamentos de proteo

    Fonte: NIOSH, 1981

  • 25

    1.2. As doenas ocupacionais dos trabalhadores de gros

    1.2.1. Histrico sobre as pesquisas

    Bernardino Ramazzini em sua famosa obra intitulada "De Morbis Artificum

    Diatriba" foi quem mencionou pela primeira vez a doena dos trabalhadores de gros.

    Editada em sua verso completa em 1713, em Pdua, essa obra faz um inventrio de 52

    captulos das doenas relacionadas com os ofcios dos operrios e artesos da Itlia do

    sculo XVII.. Em seu captulo XXIII, intitulado "As Doenas dos Peneiradores e

    Medidores de Cereais", descreve as doenas respiratrias dos trabalhadores que

    manipulavam cereais no porto de Veneza (RAMAZZINI, 1985):

    Depois do relato pioneiro de Ramazzini, Thackrah em 1832 observou tosse,

    expectorao e dispnia em moedores de milho (WILLIAMS et al., 1980). Entre 1920 e

    1939, pelo menos cinco autores norte-americanos relacionaram a manipulao da farinha

    de trigo com casos de asma e de outras manifestaes de alergia em padeiros e

    trabalhadores de moinhos (DUKE et al., 1935; SHERIDAN et al., 1980).

    Em 1941 foi realizado o primeiro estudo epidemiolgico em uma populao de

    216 trabalhadores de silos, evidenciando uma prevalncia de tosse em 27 %, e de

    expectorao em 19 % dos examinados. O raio-x de trax mostrou fibrose pulmonar em

    2,3% desses casos (SMITH, 1941) e em 20% de uma populao de estivadores

    porturios que carregavam gros (DUNNER, 1946). A brpsia do pulmo de um

    trabalhador de moinho com fibrose pulmonar evidenciou apresena de granulomas

    contendo poeira de trigo (VON RUTNER & STOFER, 1954).

    No h comprovao que a slica livre da poeira de gros cause pneumoconiose.

    Um nico caso suspeito de silicose foi relatado em um trabalhador que descarregava

    cereais em um tnel de estrada de ferro. Entretanto no foi realizada nenhuma

    investigao histopatolgica para a confirmao diagnstica (HEATLEY et al., 1944).

    Nas dcadas seguintes diversos estudos clnicos e epidemiolgicos associaram a

    exposio poeira de gros com episdios de broncoconstrio (WEIL et al., 1964;

    COWAN et al., 1968) ou confirmaram uma prevalncia aumentada de tosse e

    expectorao e dispnia em trabalhadores de silos em pequenas unidades de

    armazenagem (SIEMENS, 1969) e em grandes silos verticais, relevando o papel do

    tabagismo e da alergia (WILLIAMS et al., 1964; KLEINFELD, 1968; TSE et al., 1973;

    BECKLAKE, 1977; DO PICO et al., 1977).

    Em 1977 foi realizado em Saskatchewan, Canad, um Simpsio Internacional que

    sintetizou todo o conhecimento adquirido at ento sobre a poeira de gros e seus

    efeitos sobre a sade dos trabalhadores. Os estudos clnicos existentes tentavam associar

    reaes de hipersensibilidade com os alergenos que compe a poeira de gros e

    esclarecer os mecanismos etiopatognicos que intermediavam estas reaes

    (BECKLAKE, 1977). A maioria dos estudos epidemiolgicos publicados at 1977 eram

    transversais no controlados. Somente dois estudos haviam considerado grupos no

    expostos como controles (BECKLAKE, 1977; BRODER et al., 1979) e nenhum inclura

    uma avaliao ambiental concomitante que permitisse estabelecer uma relao dose-

    resposta (BECKLAKE, 1980). As pesquisas delineadas depois desse Simpsio

    buscaram esclarecer algumas questes levantadas como validao da amostragem da

    populao (estudos controlados) e a caracterizao dos efeitos biolgicos a longo prazo

    (estudos longitudinais).

    Um estudo transversal controlado comparou as variveis respiratrias de 441

    trabalhadores de silos com as de 180 funcionrios pblicos no expostos, encontrando

  • 26

    uma leve diminuio das variveis respiratrias dos expostos em relao aos controles

    (BRODER et al.,1979).

    Outros estudos transversais controlados (CHAN-YEUNG et al., 1980; DO PICO

    et al., 1984; YACH, 1985) conseguiram comprovar que havia maior prevalncia de

    sintomas e alteraes funcionais nos expostos.

    Um estudo longitudinal controlado no Canad (CHAN-YEUNG et al., 1980),

    comparou os parmetros respiratrios com os nveis de concentrao de poeira total

    obtidas atravs de coletores individuais. Havia uma relao significativa entre a razo de

    chance ("odds ratio") de ser um "caso" de pneumopatia ocupacional e o grau de

    exposio associado (ENARSON et al., 1985). Outro estudo que incluiu uma avaliao

    ambiental evidenciou uma relao dose-resposta entre os nveis de concentrao medidos

    no ambiente e as diminuies dos fluxos espiromtricos observados durante uma jornada

    de trabalho (COREY et al., 1982).

    O Canad e os EUA so os pases que mais realizaram estudos epidemiolgicos

    em trabalhadores de armazenagem de cereais. Outros pases como a Austrlia, a frica

    do Sul, a URSS, a Romnia, a Lbia, o Egito, a Malsia e Argentina tambm

    apresentaram relatos. Nos pases em desenvolvimento so encontradas as maiores

    prevalncias de sintomas e alteraes da funo pulmonar nos trabalhadores expostos

    devido a deficincias na adoo de medidas de controle ambiental (CHAN-YEUNG,

    1992). O estudo epidemiolgico que relatamos no presente trabalho a nica

    investigao epidemiolgica sobre os efeitos da exposio poeira de gros realizado no

    Brasil.

    Estudos epidemiolgicos em trabalhadores rurais tambm comprovaram que os

    mesmos apresentam mais alteraes respiratrias do que a populao em geral.

    Trabalhadores rurais ingleses referiam dispnia durante a colheita de cereais

    provavelmente relacionada a uma reao de hipersensibilidade tipo I a esporos de fungos

    identificados na poeira inalvel (DARKE et al., 1976). Uma relao entre a exposio e

    sintomas respiratrios crnicos e alteraes de funo pulmonar tambm foi constatado

    em trabalhadores rurais no Canad (WARREN, 1980). Entretanto essa correlao no

    foi confirmada em outro grupo de 1982 trabalhadores agrcolas tambm do Canad

    (MANFREDA et al., 1989).

    A exposio poeira de derivados de cereais tambm gera doenas respiratrias

    em suinocultores e avicultores que lidam com raes para animais constituda de

    cereais (HEEDERIK et al., 1994) e em trabalhadores de moinhos, padeiros e

    confeiteiros que manipulam a farinha (FONN et al.,1993; MASSIN et al.,1995), assim

    como naqueles empregados na indstria de transformao dos gros, como a

    moagem e a extrao de leos vegetais (KIKHORN et al., 2000; TALIN et al.I, 2003).

    As comunidades prximas das reas onde h processamento de gros tambm

    podem ser atingidas manifestando sintomas (PONT et al., 1997; WHITE et al., 1997).

    Portanto a exposio poeira de gros um risco ambiental que compromete a sade de

    milhes de indivduos no mundo inteiro em diversas situaes ocupacionais e ambientais

    (CHAN-YEUNG et al., 1992).

    Paralelamente aos estudos epidemiolgicos, vrios estudos experimentais

    pesquisaram os efeitos biolgicos da poeira de gros, concentrando-se na investigao

    dos mecanismos patognicos desencadeados pelos diversos componentes da poeira de

    gros. As reaes inflamatrias das vias areas e a broncoconstrio so mediadas por

    processos celulares e humorais. As clulas envolvidas so os macrfagos alveolares, os

    leuccitos polimorfonucleares, os mastcitos, os basfilos, os eosinfilos e os linfcitos

  • 27

    (ARMANIOUS, 1981; BRODER & Mc AVOY, 1981; OLENCHOCK, 1980). As

    imunoglobulinas e o complemento desempenham um papel ainda pouco compreendido

    (COOPER et al., 1986).

    A seguir relataremos os tipos de manifestaes clnicas associados a exposio a

    poeira de cereais cujas caractersticas foram definidas a partir de estudos clnicos,

    experimentais e epidemiolgicos.

    1.2.2. Obstruo aguda das vias areas

    As poeiras orgnicas podem causar sintomas respiratrios agudos caracterizados

    por episdios parcial ou totalmente reversveis de sibilncia, dispnia e tosse com pouca

    expectorao. Este quadro clnico foi convencionalmente denominado de "asma

    ocupacional". Pode surgir de forma imediata, no momento da exposio, ou iniciar

    algumas horas aps ela ter cessado. Pode tambm se repetir diversas vezes aps um

    primeiro episdio agudo, independentemente muitas vezes do indivduo permanecer ou

    no exposto (BECKLAKE, 1980).

    A prevalncia de asma brnquica na populao mundial estimada em 2 a 5%

    mas varia conforme a rea geogrfica e os fatores desencadeantes de cada ambiente. Os

    novos processos industriais geram no ambiente de trabalho a cada ano um nmero

    crescente de contaminantes que atuam como fatores causais da asma ocupacional

    (DOSMAN et al., 1981).

    Com o afastamento da fonte de exposio muitos pacientes com asma

    ocupacional experimentam melhora importante dos sintomas, no entanto

    aproximadamente a metade dos indivduos permanecem com sintomas apesar do

    afastamento, necessitando o uso de medicao broncodilatadora (CHAN-YEUNG,

    1982).

    Na asma ocupacional o tempo entre a exposio e o incio dos sintomas na

    maioria das vezes um fator indicativo do nexo causal. Quando os sintomas respiratrios

    surgem durante a exposio, o prprio trabalhador percebe esta relao. Porm em

    muitos casos a relao causal no to bvia pois a reao pode surgir horas aps a

    exposio (PEPYS & HUTCHCROFT, 1975; CHAN-YEUNG, 1979). Nestes casos o

    paciente ou o prprio mdico muitas vezes no reconhece de imediato a relao de

    causa-efeito

    Testes de broncoprovocao especficos utilizando extratos de poeira de cereais

    por via inalatria ou manipulao direta dos gros foram empregados em alguns estudos

    clnicos (WARREN et al., 1974;) induzindo reaes em alguns trabalhadores

    (WARREN et al., 1974; CHAN-YEUNG et al., 1979; NEWMAN TAYLOR &

    DAVIES, 1981; DO PICO et al., 1982). Foram observados dois padres de resposta:

    alguns indivduos apresentaram uma reao de broncoespasmo imediata, nica, logo

    aps a inalao, seguida por uma remisso espontnea. Outros indivduos posteriormente

    apresentaram uma reao tardia, que se manifestava 6 a 8 horas aps o teste, durando

    no mais do que 24 horas e configurando a assim chamada reao bifsica. Em alguns

    casos a reao asmtica tardia era acompanhada de febre, leucocitose e mal estar.

    Em trabalhadores de cereais sintomticos afastados da atividade durante um

    tempo prolongado constatou-se a diminuio dos sintomas respiratrios. Com o retorno

    ao trabalho havia um recrudescimento dos sintomas e uma reduo significativa dos

    fluxos areos na espirometria demonstrando que os efeitos agudos da exposio poeira

    de gros so parcialmente reversveis. (BRODER & MINTZ, 1980).

  • 28

    Outro estudo avaliou os indivduos expostos poeira de cereais em duas

    ocasies: primeiro imediatamente aps serem admitidos e, novamente, dois mese