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LICENCIAMENTO AMBIENTAL E URBANÍSTICO PARA O PARCELAMENTO DO SOLO URBANO Rochelle Jelinek 1 1. Interpretação sistemática das normas: necessidade de compatibilização das normas urbanísticas e ambientais O fenômeno da ocupação desordenada das cidades, conjugado ao adensamento demográfico, à desigualdade social e fundiária, à exploração econômica desenfreada e à degradação ambiental, é uma realidade que torna evidente a insuficiência dos instrumentos de disciplina e fiscalização do uso do solo urbano que vêm sendo tradicionalmente utilizados, olvidando a proteção ambiental diante da pressão política e do conflito pontual entre crescimento das cidades e defesa do meio ambiente. Esse quadro não causa espécie, já que a relação entre o ser humano e o meio ambiente é paradoxal: às vezes reconhece-se a supremacia do interesse público na conservação do meio; outras, entende-se que a necessidade de crescimento econômico e geração de empregos compensam a degradação do meio ambiente urbano natural e construído. A irregularidade urbana, expressa pelos loteamentos clandestinos e irregulares e pelos assentamentos informais, que não respeitam leis nem limites físicos, territoriais nem ecológicos, às custas de péssimas condições de vida para a população, traz em seu bojo verdadeiro passivo ambiental que precisa ser enfrentado com políticas de prevenção e regularização, observando a tutela ambiental impregnada no texto constitucional 2 . 1 Promotora de Justiça-Ministério Público do RS, Especialista em Direito Ambiental pela Universidade Federal do RS-UFRGS, Mestranda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do RS-PUC/RS. 2 Uma vez estando no sistema jurídico vigente, as normas relativas a todos os ramos jurídicos – assim também as urbanísticas – não podem ser aplicadas sem levar em conta as normas ambientais impregnadas pela ideologia constitucional. Paulo José Leite Farias refere que a ideologia adotada na Constituição Federal de 1988 permite que se fale em Estado de Direito Ambiental, o que impregna todas as normas que se relacionam com o vasto leque do domínio normativo da expressão “ambiente”. FARIAS, Paulo José Leite. Competência federativa e proteção ambiental. Porto Alegre: Fabris, 1999, p.226. Além da consagração da necessidade de preservação ambiental no texto constitucional, com advento da Lei n.° 10.257/01 (Estatuto da Cidade), que regulamentou os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, a temática ambiental tornou-se obrigatória na fixação das exigências fundamentais de ordenação da cidade, não se podendo vislumbrar uma aplicação estrita das leis de parcelamento do solo urbano, sem estarem em consonância com a legislação de tutela ao meio ambiente. A título exemplificativo, tomem-se as seguintes diretrizes gerais mencionadas no estatuto: suas normas, de ordem pública e interesse social, regulam o uso da propriedade urbana em prol do equilíbrio ambiental (art. 1 o , par. único); a política urbana deve garantir o direito a cidades sustentáveis, que pressupõe o saneamento ambiental (art. 2 o , inc. I); o planejamento urbano deve evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente (art. 2 o , inc.IV); a política urbana deve promover a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, inclusive o cultural (art. 2 o , inc. XII); a política urbana deve ouvir a população nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído (art. 2 o , inc. XIII); na regularização fundiária e urbanização de favelas, a política urbana deverá considerar as normas ambientais (art. 2 o , inc. XIV); a ordenação do solo das cidades deve coibir o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infra-estrutura urbana, e evitar a poluição e a degradação ambiental (art. 2 o , inc. VI, ‘c’ e ‘g’).

Doutrinaparcel 19 Rochelle Jelinek

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  • LICENCIAMENTO AMBIENTAL E URBANSTICO PARA O PARCELAMENTO DO SOLO URBANO

    Rochelle Jelinek1

    1. Interpretao sistemtica das normas: necessidade de compatibilizao das normas urbansticas e ambientais

    O fenmeno da ocupao desordenada das cidades, conjugado ao

    adensamento demogrfico, desigualdade social e fundiria, explorao econmica desenfreada e degradao ambiental, uma realidade que torna evidente a insuficincia dos instrumentos de disciplina e fiscalizao do uso do solo urbano que vm sendo tradicionalmente utilizados, olvidando a proteo ambiental diante da presso poltica e do conflito pontual entre crescimento das cidades e defesa do meio ambiente. Esse quadro no causa espcie, j que a relao entre o ser humano e o meio ambiente paradoxal: s vezes reconhece-se a supremacia do interesse pblico na conservao do meio; outras, entende-se que a necessidade de crescimento econmico e gerao de empregos compensam a degradao do meio ambiente urbano natural e construdo.

    A irregularidade urbana, expressa pelos loteamentos clandestinos e irregulares e pelos assentamentos informais, que no respeitam leis nem limites fsicos, territoriais nem ecolgicos, s custas de pssimas condies de vida para a populao, traz em seu bojo verdadeiro passivo ambiental que precisa ser enfrentado com polticas de preveno e regularizao, observando a tutela ambiental impregnada no texto constitucional2.

    1 Promotora de Justia-Ministrio Pblico do RS, Especialista em Direito Ambiental pela Universidade Federal

    do RS-UFRGS, Mestranda em Direito pela Pontifcia Universidade Catlica do RS-PUC/RS. 2 Uma vez estando no sistema jurdico vigente, as normas relativas a todos os ramos jurdicos assim tambm as

    urbansticas no podem ser aplicadas sem levar em conta as normas ambientais impregnadas pela ideologia constitucional.

    Paulo Jos Leite Farias refere que a ideologia adotada na Constituio Federal de 1988 permite que se fale em Estado de Direito Ambiental, o que impregna todas as normas que se relacionam com o vasto leque do domnio normativo da expresso ambiente. FARIAS, Paulo Jos Leite. Competncia federativa e proteo ambiental. Porto Alegre: Fabris, 1999, p.226. Alm da consagrao da necessidade de preservao ambiental no texto constitucional, com advento da Lei n. 10.257/01 (Estatuto da Cidade), que regulamentou os arts. 182 e 183 da Constituio Federal, a temtica ambiental tornou-se obrigatria na fixao das exigncias fundamentais de ordenao da cidade, no se podendo vislumbrar uma aplicao estrita das leis de parcelamento do solo urbano, sem estarem em consonncia com a legislao de tutela ao meio ambiente. A ttulo exemplificativo, tomem-se as seguintes diretrizes gerais mencionadas no estatuto: suas normas, de ordem pblica e interesse social, regulam o uso da propriedade urbana em prol do equilbrio ambiental (art. 1o, par. nico); a poltica urbana deve garantir o direito a cidades sustentveis, que pressupe o saneamento ambiental (art. 2o, inc. I); o planejamento urbano deve evitar e corrigir as distores do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente (art. 2o, inc.IV); a poltica urbana deve promover a proteo, preservao e recuperao do meio ambiente natural e construdo, inclusive o cultural (art. 2o, inc. XII); a poltica urbana deve ouvir a populao nos processos de implantao de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construdo (art. 2o, inc. XIII); na regularizao fundiria e urbanizao de favelas, a poltica urbana dever considerar as normas ambientais (art. 2o, inc. XIV); a ordenao do solo das cidades deve coibir o parcelamento do solo, a edificao ou o uso excessivos ou inadequados em relao infra-estrutura urbana, e evitar a poluio e a degradao ambiental (art. 2o, inc. VI, c e g).

  • A Constituio Federal, com seu carter dirigente sobre o ordenamento infraconstitucional3, patenteou o reconhecimento do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo a obrigao dos Poderes Pblicos e da coletividade de defend-lo e preserv-lo, bem como a previso de sanes para as condutas ou atividades lesivas. A preservao e recuperao do meio ambiente natural e urbano passa a ser, portanto, base em que se assenta a poltica econmica e social do pas.

    De acordo com a diretriz imposta na Carta Magna, o Estado ou o particular que pretenda empreender deve evitar impactos que prejudiquem o ecossistema, a biodiversidade e o ordenamento das cidades e, por conseqncia, a qualidade de vida da populao, porque o desenvolvimento econmico, a livre iniciativa e a livre explorao econmica subentendem o uso sustentvel dos recursos naturais e o respeito aos limites do meio.

    Havendo uma violao do equilbrio global exigido, devem ser impostas as correes necessrias s externalidades negativas, mesmo que para isso os princpios da ordem econmica precisem ser relativizados, porque ilegtimo o direito de quem emprega meios de apropriao de bens que possam trazer prejuzos ou custos sociais. No se desenvolvendo a relao entre o sujeito e o bem na dinmica da satisfao social, no h proteo jurdica do pretendido direito.

    Nesse mesmo prisma o texto constitucional positivou a unio indissocivel entre a propriedade e a sua funo scio-ambiental, agregando ao direito (relao) de propriedade um dever jurdico de agir em vista do interesse coletivo. As caractersticas do domnio (uso, gozo e disposio), tampouco as limitaes ao exerccio do domnio, no so bastantes para conformar o contedo do legtimo exerccio da relao de propriedade. A funo scio-ambiental agregada relao de propriedade, cuja definio inseparvel do uso racional da propriedade e dos recursos ambientais que lhe so integrantes, institui um nus ao sujeito, que, ao extrair do bem resultados em seu interesse prprio, deve tambm concretizar fins de interesse social.

    Os princpios constitucionais4 so verdadeiros vetores reguladores da disciplina do parcelamento e ocupao do solo urbano, porque estabelecem a correlao entre explorao econmica, ordem social e desenvolvimento sustentvel, impondo uma interao das normas urbansticas e ambientais para proteo do meio ambiente urbano, natural e construdo.

    Com o advento do Estatuto da Cidade, que regulamentou o captulo da Constituio Federal sobre a poltica urbana e fixou diretrizes que pregam o direito a cidades sustentveis e o uso da propriedade urbana em prol do equilbrio ambiental, a temtica ambiental tornou-se obrigatria na ordenao do solo urbano.

    3 Nenhum tema no mbito jurdico pode ser analisado dissociado da constitucionalidade dirigente. O

    ordenamento jurdico composto por um conglomerado de normas que se interligam hierarquicamente, tal qual uma pirmide. A Constituio Federal se localiza no topo da pirmide, irradiando sua supremacia de modo a sujeitar as normas infraconstitucionais anteriores e posteriores aos seus princpios e comandos, sejam elas de ordem civil, urbanstica, administrativa, ambiental, penal, de natureza pblica ou privada.Sobre a Constituio dirigente: CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituio. Coimbra: Almedina, 1999.

    4 A violao de um princpio acarreta a quebra de todo o ordenamento jurdico vigente. Violar um princpio muito mais grave que transgredir uma norma qualquer.[...] a mais grave forma de ilegalidade ou de inconstitucionalidade conforme o escalo do princpios atingido, porque representa insurgncia contra todo o sistema, subverso de seus valores fundamentais, contumlia irremissvel a seu arcabouo lgico e corroso de sua estrutura mestra. MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Curso de direito administrativo. So Paulo: Malheiros, 1996, p. 546.

  • Assim, a necessidade de adequao do parcelamento do solo urbano a uma multidisciplinariedade de normas implica na observncia de restries no s urbansticas, mas tambm ambientais, j que a exegese de uma norma pressupe interpretar o sistema em em sua totalidade.5 2. Processo de licenciamento urbanstico e ambiental

    A necessidade de adequao do parcelamento do solo urbano s legislaes registrais, urbansticas e ambientais implica na realizao de uma srie de levantamento de dados, elaborao de estudos e projetos e de manifestaes dos rgos pblicos competentes, concedendo ou negando os requerimentos formulados pelo parcelador (ou regularizador do parcelamento clandestino ou irregular).

    O projeto de parcelamento resulta da conjuno de esforos tcnicos prprios da engenharia, da rea ambiental, do urbanismo e jurdicos. Por isso, deve atender s exigncias contidas nos diversos textos legais incidentes e s diretrizes definidas pelos rgos pblicos, de maneira a torn-lo vivel em termos tcnicos e jurdicos.

    Esse procedimento multidisciplinar exige compatibilizao nos mbitos ambiental e urbanstico, planejamento comum e integrao das polticas pblicas, que precisam ser harmonizados porque incidem sobre o mesmo objeto. No incomum uma licena urbanstica permitir a execuo de um loteamento sem, por exemplo, identificar os bens ambientais que podem modificar a localizao de vias, espaos pblicos e edificaes. A compatibilizao implica analisar o imvel com todas as suas interfaces, inclusive modificando a tipologia das edificaes para adequar a situao ambiental da rea. Assim, as licenas urbansticas e ambientais, que so analisadas e expedidas por intermdio de diferentes rgos6, exigem uma interao, respeitadas as competncias de cada rgo.7

    2.1. Etapas do procedimento de obteno de licenas ambientais e urbansticas

    Por se tratar de um procedimento jurdico e urbanstico, o empreendimento

    de parcelamento do solo ou sua regularizao deve ser desenvolvido em etapas,

    5 Interpretar o direito realizar uma sistematizao daquilo que aparece como fragmentrio e isolado. (...)

    Qualquer norma apenas se esclarece na totalidade das regras, dos valores e, sobretudo, dos princpios jurdicos. Isolada, por mais clareza que aparente ter seu enunciado, torna-se obscura e ininteligvel. Neste quadro, o intrprete deve descobrir o sentido do sistema (...) Ou a interpretao jurdica sistemtica ou no interpretao. FREITAS, Juarez. A interpretao sistemtica do direito. So Paulo: Malheiros, 2004, p.19-23. No mesmo sentido: PASQUALINI, Alexandre. Hermenutica e sistema jurdico: uma introduo interpretao sistemtica do direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.

    6 Com o advento da municipalizao do licenciamento ambiental (arts. 5o e 6o da Resoluo n. 237/97 do CONAMA), as licenas urbansticas e ambientais passaram a ser expedidas pelo mesmo ente federativo para as atividades e empreendimentos de impacto local ou delegadas pelo Estado (nos Municpios que j implementaram o licenciamento ambiental), mas a multidisciplinariedade envolve secretarias diversas. Nos locais em que ainda no houve a municipalizao, ou quando a atividade ou empreendimento nas situaes previstas nos arts. 4o e 5o da Resoluo do CONAMA n. 237/97, as licenas urbansticas so expedidas pelo Municpio e as ambientais pelo rgo licenciador estadual ou federal, conforme o caso.

    7 Sobre a questo: PRESTES, Vansca Buzelato. A necessidade de compatibilizao das licenas ambiental e urbanstica no processo da municipalizao do licenciamento ambiental. Revista de Direito Ambiental, So Paulo, v. 34, p. 84-96, abr./jun. 2004.

  • cuja ordem e sistemtica de implementao depende da situao de fato existente, dos atores envolvidos, das especificidades fsicas e sociais, da situao registral da rea, entre outros fatores. Algumas etapas podem ser dispensadas ou desdobradas por lei municipal, ou podem deixar de ser exigidas no caso concreto, em razo das peculiaridades.

    O procedimento deve iniciar com o levantamento topogrfico da rea, que dever ser encaminhado para avaliao da sua viabilidade urbanstica e fixao das diretrizes de uso do solo, que tm a funo de ordenao do territrio. Aps a manifestao do Poder Pblico sobre estas questes, deve suceder-se a avaliao da viabilidade ambiental do empreendimento pelo rgo ambiental competente, que, concluindo positivamente, conceder a licena prvia, que tem a funo de aprovar a localizao e concepo do empreendimento, atestar a viabilidade ambiental da gleba e estabelecer os requisitos bsicos condicionantes a serem atendidos nas prximas fases de sua implementao. Obtidas as diretrizes urbansticas e ambientais, segue-se a elaborao dos projetos urbanstico e tcnicos (abastecimento de gua, energia eltrica, esgoto, etc.), que devero ser aprovados pelo Municpio. Com a aprovao dos projetos e a obteno da licena ambiental de instalao8, que autoriza a instalao do empreendimento tendo em vista as especificaes constantes dos projetos aprovados, e, com base nestes, define as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, deve seguir-se o registro do empreendimento junto ao Registro de Imveis competente. Por ltimo, tem cabimento a licena urbanstica para construo das obras9.

    O fluxograma a seguir demonstra a seqncia de elaborao dos levantamentos, estudos e projetos, sua aprovao e concesso das licenas ambiental e urbanstica.

    Levantamento topogrfico e estudo preliminar de viabilidade urbanstica

    Fixao de diretrizes pelo Municpio

    EIA/RIMA (se necessrio)

    Licena prvia ambiental (LP)

    Elaborao dos projetos tcnicos e urbanstico

    8 A LI a licena a ser exigida pelo Registrador Pblico para o registro do empreendimento.

  • Diretrizes pelo Estado/anuncia prvia da autoridade metropolitana

    Aprovao dos projetos pelo Municpio e expedio da licena urbanstica

    Licena de instalao (LI)

    Execuo das obras exigidas para o registro imobilirio

    Registro do parcelamento no Registro de Imveis

    Execuo da obras remanescentes

    Licena ambiental de operao (LO)

    3. Licenciamento ambiental O licenciamento ambiental, de carter eminentemente de preveno e

    controle da degradao do meio ambiente, est previsto na Lei n. 6.938/81 como um dos instrumentos da Poltica Nacional do Meio Ambiente (art. 9o, inc. IV), necessrio para os casos de potencial ou efetiva degradao ambiental (art. 10).

    A Resoluo do CONAMA n. 237/97, que regulamentou o licenciamento ambiental, disps:

    Art. 2o A localizao, construo, instalao, ampliao, modificao e operao de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como os empreendimentos capazes, sob qualquer forma, de causar degradao ambiental, dependero de prvio licenciamento de rgo ambiental competente, sem prejuzo de outras licenas legalmente exigveis.10

    9 Para compatibilizar-se com a licena urbanstica para implantao (execuo das obras) no loteamento a

    partir da qual o parcelador tem direito a executar o projeto aprovado , deve a licena de instalao deve ser concedida antes deste. PRESTES, A necessidade de compatibilizao..., p. 94-95.

    10 A falta de licenciamento do rgo ambiental competente configura o delito do art. 60 da Lei 9.605/98: Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do territrio nacional, estabelecimentos, obras ou servios potencialmente poluidores, sem licena ou autorizao dos rgos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes. Nos parcelamentos

  • 1o Esto sujeitos ao licenciamento ambiental os empreendimentos e as atividades relacionadas no Anexo I, parte integrante desta Resoluo. Art. 8o O Poder Pblico, no exerccio de sua competncia de controle, expedir as seguintes licenas: I Licena prvia (LP): concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade aprovando sua localizao e concepo, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos bsicos condicionantes a serem atendidos nas prximas fases de sua implementao; II Licena de instalao (LI): autoriza a instalao do empreendimento ou atividade de acordo com as especificaes constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da qual constituem motivo determinante; III Licena de operao (LO): autoriza a operao da atividade ou empreendimento, aps a verificao do efetivo cumprimento do que consta das licenas anteriores, com as medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operao. Pargrafo nico As licenas ambientais podero ser expedidas isolada ou sucessivamente, de acordo com a natureza, caractersticas e fase do empreendimento ou atividade. (grifos nossos)

    O fundamento da exigncia do licenciamento ambiental reside na

    possibilidade, constitucionalmente outorgada, de o Poder Pblico impor condies ao exerccio do direito de propriedade e do direito ao livre empreendimento, a fim de que a funo scio-ambiental da propriedade seja observada (arts. 5, XXIII, 170, III e VI, e par. nico, 182, 2, e 186, II, todos da Constituio Federal).

    O licenciamento ambiental reflete os princpios da supremacia do interesse pblico na proteo do meio ambiente em relao aos interesses privados, j que cuida de proteger o direito fundamental da pessoa humana ao equilbrio ecolgico, posto no art. 225, caput, da Constituio Federal. Dada a indisponibilidade deste direito, cabe ao Poder Pblico em defesa do meio ambiente intervir nas atividades privadas, condicionando o seu exerccio a determinadas obrigaes que busquem atingir um padro de desenvolvimento reputado sustentvel.

    Annelise Monteiro Steigleder11, tratando da plurifuncionalidade do licenciamento ambiental, destaca as principais funes desse instrumento. O

    clandestinos ou irregulares, a caracterizao deste delito incide em concurso material com o crime de parcelamento irregular do solo urbano (arts. 50 e 51 da Lei n. 6.766/79) e outros eventuais delitos ambientais decorrentes de extrao de vegetao nativa (ex: arts. 38, 39, 48, 50 da Lei n. 9.605/98), construo em solo no edificvel especialmente protegido (art. 64) e lanamento de resduos lquidos ou slidos (art. 54, 2o, inc. V).

    11 STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Aspectos controvertidos do licenciamento ambiental. Disponvel em: . Acesso em: 19 set. 2004.

  • licenciamento objetiva o controle de atividades potencialmente poluentes, procurando imprimir-lhes um padro de atuao sustentvel, de modo a prevenir danos ambientais. Nesse sentido, o licenciamento operacionaliza os princpios da precauo, da preveno e poluidor-pagador12, pois cuida de identificar os riscos e impactos inerentes a determinado empreendimento ou atividade, tais como a capacidade de gerar lquidos poluentes (despejo de efluentes), resduos slidos, emisses atmosfricas, rudos, etc., com vistas a informar o processo decisrio sobre a implementao destes e sobre a eleio das medidas preventivas mais adequadas para mitigar a degradao ambiental. Tambm funo importante do licenciamento ambiental a imposio de medidas mitigadoras e compensatrias para a degradao ambiental aqui entendida como perda das caractersticas essenciais do sistema ecolgico que est prestes a ser autorizada13, de modo a causar o menor impacto possvel ao meio ambiente. O licenciamento tambm exerce a funo de demarcar o limite de tolerncia dos impactos ambientais, traduzindo que um determinado nvel de degradao dever ser suportado, eis que inerente ao convvio em sociedade. A licena ambiental conter os nveis mximos de degradao considerados aceitveis para a atividade ou empreendimento14. O licenciamento tem a potencialidade de inserir determinada atividade em um contexto de programao e planificao do desenvolvimento econmico nacional, regional ou local, percebendo-se os fins pblicos e de composio preventiva de mltiplos interesses pblicos, privados e coletivos, relativamente s garantias do particular, que se manifesta de forma pregnante e urgente nos procedimentos diretamente incidentes sobre os direitos fundamentais15. Para que esta funo seja adequadamente observada, imprescindvel a existncia prvia de um zoneamento ambiental, definindo os usos do solo e suas potencialidades, de acordo com as caractersticas ambientais da regio e de um planejamento de desenvolvimento econmico e ambiental desta. Assim, o licenciamento ambiental torna-se instrumento voltado para o desenvolvimento sustentvel, procurando harmonizar o princpio da defesa do meio ambiente com os princpios da propriedade privada, da livre iniciativa e da explorao de atividades econmicas.

    12 A implementao do princpio do poluidor-pagador verifica-se a partir da vocao prioritariamente preventiva,

    posto que visa internalizao, no processo produtivo ou empreendedor, dos custos da preveno de danos ambientais. Da que o licenciamento condicionar o empreendimento ou atividade adoo de medidas e tecnologias adequadas preveno de riscos ambientais. Sobre os princpios da preveno, preveno e do poluidor-pagador, ver em MIRRA, lvaro Valery. Princpios fundamentais do direito ambiental. Revista de Direito Ambiental, So Paulo, v. 2, abr./jun. 1996.

    13 Determinado impacto ambiental ser autorizado pelos rgos competentes, mas no ser considerado dano juridicamente reparvel (pela via da responsabilizao civil), porque ser mitigado e compensado pelas obrigaes estabelecidas na licena. Trata-se da chamada responsabilizao ex-ante, efetuada na esfera administrativa, em que se pretende compensar danos ambientais que sero autorizados pelos rgos ambientais. Exemplo dessa possibilidade est previsto no Cdigo Florestal do Rio Grande do Sul, cujo art. 8 estabelece que, para cada rvore cortada, devero ser plantadas 15 mudas, preferencialmente da mesma espcie. No entanto, o descumprimento das condies da licena enseja a presuno absoluta de ocorrncia de dano reparvel, por fora do art. 3, inc. III, e, da lei n. 6.938/81.

    14 No parcelamento do solo urbano esse limite pode ser identificado, por exemplo, na aceitao de que o lanamento de esgoto domstico seja por meio de fossa sptica e sumidouro em que h deposio de resduos no solo ao invs de sistema de tratamento dos efluentes, especialmente em loteamentos ou assentamentos de baixa renda. Evidente que essa aceitao leva em considerao somente o empreendimento em anlise, considerado isoladamente, sem viso do todo. Os efeitos sinergticos devidos s vrias autorizaes isoladas para liberao dos poluentes permite a contnua poluio do solo e a possvel contaminao do lenol fretico.

    15 ANTUNES, Lus Filipe Colao. O procedimento administrativo de avaliao do impacto ambiental. Coimbra: Almedina, 1998, p. 198.

  • A natureza jurdica da licena ambiental controversa, permeada na dicotomia licena administrativa/autorizao administrativa16. Parte da doutrina sustenta que, apesar da denominao utilizada pela lei licena , o exame das caractersticas do ato revela que este tem natureza de autorizao administrativa, porque depende de critrio de avaliao a ser adotado pelo rgo ambiental competente para sua outorga, no garante ao empreendedor a efetiva realizao do seu intento (implantao de empreendimento ou explorao de atividade) e, se concedido, no assegura ao titular do interesse a manuteno do status quo vigente quando da sua expedio17. Em sentido contrrio, alguns doutrinadores sustentam que se trata de licena administrativa, pois configura uma anuncia da autoridade ambiental, quando reconhecido o direito do interessado, depois de verificado que o empreendimento ou atividade atendeu s condicionantes para sua localizao, instalao e operao18. dis Milar reconhece a natureza peculiar da licena ambiental, que se aproxima da licena administrativa, representando uma anuncia do Poder Pblico quanto ao exerccio dos direitos de propriedade e de explorao econmica, mas no idntica a esta espcie de licena, pois, apesar de ter prazo de validade estipulado, goza de carter de estabilidade e no poder ser suspensa por discricionariedade ou arbitrariedade, est sujeita reviso e suspenso em caso de interesse pblico superveniente e quando houver descumprimento dos requisitos preestabelecidos no processo de licenciamento19.

    Entende-se que todos os institutos de Direito Ambiental, entre eles o licenciamento, tm peculiaridades e um carter sui generis que no permitem enquadr-los em um instituto exato do Direito Administrativo, do Direito Civil, do Direito Registral, etc. Nessa esteira, impossvel reduzir a licena ambiental ao conceito de licena administrativa ou autorizao administrativa. O licenciamento ambiental pautado por uma principiologia prpria, outorgada pelos princpios da preveno, da precauo, do poluidor-pagador e do desenvolvimento sustentvel, cuja conseqncia a no-definitividade e a possibilidade de reviso pelo rgo ambiental, desde que o interesse pblico a justifique. Ademais, a complexidade do

    16 Para esclarecer a questo, cumpre diferenciar os atos administrativos de autorizao e licena, que pertencem

    categoria de atos administrativos negociais entre o Poder Pblico e o particular. A licena (ex: habite-se) ato administrativo vinculado, de carter regulamentativo e definitivo, envolve direitos subjetivos; uma vez satisfeitos os requisitos legais, no pode a concesso do direito via licena ser negada; uma vez concedida a licena, traz a presuno de definitividade; sua invalidao s pode ocorrer por ilegalidade ou abusividade do ato administrativo. A autorizao (ex: alvar de localizao e funcionamento) ato discricionrio e precrio, que envolve interesses e no gera direitos ao requerente; o Poder Pblico decide discricionariamente sobre a concesso do pleito do interessado e, por isso, no h direito subjetivo obteno ou continuidade da autorizao. Sobre o tema: MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. So Paulo: Malheiros, 1995, p.160-174.

    17 Esse posicionamento sustenta tratar-se de autorizao administrativa porque pressupe o monitoramento da atividade ou empreendimento e possibilita a reviso e a denegao da mesma pelo rgo pblico competente. Nesse sentido: MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 11. ed. So Paulo: Malheiros, 2003, p.202. RHODE, Geraldo Mario. Licena prvia LP e prtica de licenciamento ambiental no Brasil. Revista de Direito Ambiental, So Paulo, v.18, p.216-220, abr./jun. 2000. Tambm: PRESTES, A necessidade de compatibilizao... , p. 89-90. FREITAS, Vladimir Passos de. Direito administrativo e meio ambiente. 3.ed. Curitiba: Juru, p. 75. MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 1998, p.89.

    18 Nessa linha: FREIRE, William. Direito ambiental brasileiro. Rio de Janeiro: Aide, 1998, p. 70. ANTUNES, Lus Filipe Colao. O procedimento administrativo de avaliao do impacto ambiental. Coimbra: Almedina, 1998, p.102.

    19 MILAR, dis. Direito do ambiente: doutrina, prtica, jurisprudncia e glossrio. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

  • licenciamento ambiental, com suas sucessivas fases, enseja peculiaridades para cada uma das licenas concedidas (LP, LI ou LO)20.

    Quando recebe o pedido de licenciamento ambiental, o rgo competente est vinculado s normas constitucionais de desenvolvimento econmico em compatibilidade com a preservao do ambiente e sua manifestao sobre o pedido no implica discricionariedade administrativa no sentido de convenincia e oportunidade da instalao do empreendimento, mas sim discricionariedade tcnica atravs de parmetros tcnicos e cientficos objetivos. No h uma atuao livre da Administrao, mas o poder de tomar a deciso mais adequada ao fim pblico que a lei impe21.

    O parcelamento do solo para fins urbanos, sob qualquer de suas formas, considerado empreendimento potencialmente capaz de causar degradao ambiental e, como tal, est condicionado ao prvio licenciamento ambiental, conforme anexo I da Resoluo n. 237/1997 do CONAMA.

    O parcelamento do solo urbano exige licena prvia (LP), na fase de planejamento da implantao, alterao ou ampliao do empreendimento, para aprovar sua localizao, atestar a viabilidade ambiental e estabelecer condicionantes para as prximas fases; licena de instalao (LI) do empreendimento, que deve ser solicitada na fase anterior execuo das obras, para exame dos projetos tcnicos e urbanstico aprovados pelo Municpio, e, com base nestes, ser autorizado o incio das obras e estabelecidas condies, restries e medidas de controle ambiental; e licena de operao (LO), que deve ser solicitada quando do trmino das obras do empreendimento, para verificao da sua efetiva execuo de acordo com as condicionantes da LI, das eventuais medidas compensatrias estabelecidas e do regular funcionamento do sistema de disposio de guas servidas.

    A resoluo que regulamenta o licenciamento ambiental prescreve que as licenas podem ser expedidas isolada ou sucessivamente, de acordo com a natureza e caractersticas do empreendimento. Nesse espeque, a solicitao de qualquer uma das licenas deve estar de acordo com a fase em que se encontra o empreendimento: concepo, obra, operao ou ampliao22, mesmo que no tenha sido obtida a licena anterior prevista em lei.

    Destarte, para os parcelamentos clandestinos do solo ou assentamentos informais, a exigncia de LP, LI ou LO depender da fase de implantao e da situao ftica do parcelamento. Se o empreendimento j est implantado de fato, com construes e ocupao da rea pelos moradores, no h que ser exigida

    20 Nesse sentido: STEIGLEDER, Aspectos controvertidos.... 21 A discricionariedade tcnica um juzo efetuado de acordo com cnones cientficos e tcnicos, enquanto a

    discricionariedade administrativa se revela na liberdade de escolha. Na discricionariedade tcnica, a deciso do Poder Pblico feita com base em pressupostos, estudos ou critrios extrados de normas tcnicas. O interesse primrio a prosseguir coloca particulares vnculos e limites tambm atividade discricionria da Administrao Pblica que, perdendo o carter arbitral, se deve determinar de modo a conseguir a melhor realizao do interesse pblico. No procedimento de licenciamento ambiental, a discricionariedade tcnica refere-se a um momento cognitivo e implica juzos e no escolhas, com a particularidade desta operao se desenrolar luz do interesse pblico primrio (o ambiente) e no de qualquer interesse secundrio ou dos particulares. ANTUNES, O procedimento..., p. 234. Sobre a discricionariedade administrativa ambiental, ver mais em: KRELL, Andreas J. Discricionariedade administrativa e proteo ambiental: o controle dos conceitos jurdicos indeterminados e a competncia dos rgos ambientais: um estudo comparativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.

    22 Tendo em vista que as licenas ambientais estabelecem as condies para que o empreendimento cause o menor impacto possvel ao meio ambiente, qualquer alterao deve ser submetida ao licenciamento.

  • licena prvia e/ou licena de instalao. Como a prpria denominao indica, a funo destas eminentemente preventiva.

    J tendo havido impacto com a alterao e ocupao da gleba, ser necessria a elaborao de um diagnstico ambiental da rea e plano de controle ambiental, a serem submetidos apreciao do rgo ambiental competente, que poder exigir medidas restauradoras ou compensatrias e condicionantes outras (diversas das que constam dos termos de referncia que servem de base para a LP e para a LI), estabelecidas com base no diagnstico do impacto ambiental j causado pela implantao do empreendimento. Contudo, a manifestao do rgo ambiental para implantao do plano de controle e recuperao ambiental no ser, tecnicamente, LP, LI nem LO, mas sim autorizao para recuperao de rea degradada.

    O licenciamento ambiental deve ser precedido23 de um estudo prvio de impacto ambiental (EIA) e do seu respectivo relatrio (RIMA), quando o empreendimento for potencial ou efetivamente causador de significativa degradao ambiental (art. 225, 1o, inc. IV, da CF, e Resoluo n. 01/86 do CONAMA)24, para que os impactos possam ser avaliados e medidas de mitigao possam ser exigidas pelo rgo licenciador. Nos casos de parcelamento do solo urbano, a prvia realizao de EIA/RIMA somente ser necessria nas hipteses do art. 2o, inc. XV, da Resoluo n. 01/86 do CONAMA, para projetos urbansticos acima de 100ha ou em reas consideradas de relevante interesse ambiental a critrio dos rgos federal, estadual ou municipal competente25.

    O EIA/RIMA deve conter um diagnstico ambiental da rea de influncia do empreendimento, com as condies atuais inter-relacionadas dos meios fsico, biolgico e scio-econmico, demonstrar a compatibilidade do empreendimento com a legislao pertinente, caracterizar a atual ocupao, identificar as reas de vegetao nativa ou de interesse para a fauna, contemplar soluo para o saneamento, de modo a permitir a avaliao dos impactos resultantes da implantao do empreendimento. Deve, tambm, identificar os impactos que podero ocorrer em funo da implantao do empreendimento: conflitos de uso, remoo de cobertura vegetal, interferncia com estrutura existente, intensificao do trfego na rea, eroso, assoreamento, entre outras. Ainda, deve apresentar as medidas mitigadoras, compensatrias ou de controle ambiental considerando os

    23 O EIA deve ser elaborado em momento prvio ao licenciamento, antecedendo a licena prvia (LP).

    Suponhamos que a equipe tcnica do rgo licenciador considere inadequada a localizao do empreendimento, opinando pela utilizao de alternativa locacional existente no EIA. O deferimento da licena prvia, antes do exame do EIA/RIMA, seria incompatvel com a concluso do rgo licenciador. De qualquer sorte, nos casos em que exigvel o EIA/RIMA, no poder ser deferida qualquer licena ambiental (LP, LI ou LO) antes da apresentao e apreciao daquele. Do contrrio, o EIA se transformaria em farsa para encobrir um licenciamento irregular. O licenciamento ambiental deferido antes do julgamento do EIA/RIMA determina responsabilidade objetiva da Administrao pelos danos causados ao meio ambiente, nos termos do art. 37, 6o, da Constituio Federal. CAPELLI, Silvia. O estudo do impacto ambiental na realidade brasileira. In: BENJAMIN, Antnio Hermann (Coord.). Dano ambiental: preveno, reparao e represso. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p.163-164. As despesas com o EIA/RIMA so arcadas pelo interessado no empreendimento (art. 8o da Resoluo 01/86). Como providenciado pelo prprio interessado, pode ser tendencioso. Neste caso, o responsvel tcnico ser responsabilizado solidariamente.

    24 Sobre a questo, ver: MILAR, Direito do Ambiente... 25 A Resoluo 01/86 se refere SEMA, rgo federal que no mais existe; atualmente o licenciamento

    ambiental no mbito federal compete ao IBAMA (art. 4o da Resoluo do CONAMA n. 237/97).

  • impactos previstos, indicando os responsveis por sua implantao e o respectivo cronograma de execuo26.

    Em sede de EIA/RIMA se destacam os princpios da publicidade e da participao pblica, que tm como instrumento a audincia pblica, prevista no art. 11, 2o, da Resoluo n. 01/86 do CONAMA, cujos objetivos so a prestao de informaes sobre o projeto e seus impactos ambientais pela administrao pblica sociedade e a discusso do RIMA com a participao popular27. A ata da audincia serve de base, juntamente com o RIMA, para anlise e parecer final do licenciador quanto aprovao ou no do projeto. A Resoluo n. 09/87 do CONAMA regulamentou a audincia pblica, estabelecendo, em seu art. 2, as hipteses de convocao da referida audincia: quando o rgo ambiental julgar necessria, quando solicitada por entidade civil, quando solicitada pelo Ministrio Pblico e quando solicitada por cinqenta ou mais cidados. Em havendo solicitao de audincia pblica, se o rgo licenciador no realiz-la, a licena concedida no ter validade. Conclui-se, pois, que requisito formal essencial para a validade da licena. 3.1. Licena prvia

    Depois de atestada a viabilidade urbanstica do parcelamento e fixadas as

    diretrizes da ocupao do solo, deve ser providenciada a licena ambiental prvia (LP) junto ao rgo ambiental competente federal, estadual ou municipal, conforme o caso (arts. 4o, 5o e 6o da Resoluo do CONAMA n. 237/97), para aprovao da localizao do empreendimento, atestado da viabilidade ambiental da gleba e estipulao das condies para as prximas etapas do processo de parcelamento, de modo a evitar degradao do meio ambiente.

    Para avaliao e expedio da licena prvia, o rgo ambiental deve visitar o local para verificar as condies ambientais e identificar impactos efetivos ou potenciais da ocupao da rea.

    Nas hipteses do art. 2o, inc. XV, da Resoluo n. 01/86 do CONAMA - projetos urbansticos acima de 100ha ou em reas consideradas de relevante interesse ambiental a critrio dos rgos federal, estadual ou municipal competente -, dever ser exigido o estudo de impacto ambiental (EIA/RIMA) para embasar as exigncias, condies e restries que sero estipuladas para a implementao do parcelamento.

    A licena prvia ato que no gera direitos para o requerente, mesmo que este tenha despendido recursos com o planejamento do empreendimento. Trata-se, ainda, de fase de estudos e avaliaes, em que no h engajamento definitivo da Administrao Pblica com o pedido. Est-se em fase de declarao de viabilidade, e no constitutiva de direitos.

    A licena prvia tem as seguintes funes: fornecer as condies de contorno do projeto, conceder certido ambiental negativa quanto a impedimentos de ordem legal (leia-se adequao da proposta a planos de desenvolvimento

    26 Sobre procedimento, pressupostos, elaborao e custeio, responsabilidade da equipe, diretrizes e contedo

    mnimo do EIA/RIMA, ver: MILAR, dis; BENJAMIN, Antnio Hermann. Estudo prvio de impacto ambiental: teoria, prtica e legislao. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.

    27 A realizao de audincias pblicas para discusso dos EIA/RIMA assegura o cumprimento da diretriz prevista no art. 2, inc. II, e art. 43, do Estatuto da Cidade, que prev a gesto democrtica por meio da participao popular na formulao, execuo e acompanhamento de planos programas e projetos de desenvolvimento urbano.

  • regional, planos de uso do solo, planos diretores, como por ex. gerenciamento costeiro e de bacias hidrogrficas), conter exigncias bsicas e primordiais de aceitabilidade do plano do empreendimento28.

    O rgo ambiental, no exerccio da discricionariedade tcnica, pode indeferir o pedido de licena prvia inobstante a viabilidade urbanstica atestada pelo Municpio em razo de impedimentos legais ou tcnicos. No sistema de licenciamento ambiental brasileiro est colocada a possibilidade de uma deciso negativa por parte do Poder Pblico sobre um empreendimento que no atente para as mnimas condies de viabilidade, sustentabilidade ou adequao ambiental. Por outro lado, o rgo ambiental no est autorizado a indeferir o pedido de licena prvia por motivo de oportunidade ou convenincia, se o parcelador reunir as condies legais e tcnicas para o empreendimento e se o EIA nos casos em que exigido for favorvel.

    3.2.Licena de instalao

    A licena de instalao (LI) a que autoriza a implantao do loteamento ou

    desmembramento de acordo com os projetos tcnicos e urbanstico aprovados pelo Municpio e estabelece condies, restries e medidas de controle ambiental.

    O Registrador Pblico, para proceder ao registro do parcelamento regular, deve exigir a apresentao da LI, que o ato que define a conformao fsica do empreendimento localizao dos lotes, ruas, delimitao das reas institucionais, etc. A LP no se presta para tanto, porquanto apenas dispe sobre a adequao da gleba ao empreendimento proposto. Exigir a LI depois do registro pode ter conseqncias fatais para o meio ambiente. Poderia ocorrer, por exemplo, de o Municpio aprovar um projeto para construo de moradias unifamiliares ou plurifamiliares com sistema de esgotamento sanitrio por fossa sptica, filtro anaerbio e valas de infiltrao sem extravasar para a rede pluvial, este ser registrado no Registro de Imveis e, posteriormente, a LI dispor que este sistema de esgotamento primrio somente adequado e suficiente para moradias unifamiliares. Neste caso, seria necessria a alterao do projeto urbanstico com previso de outro sistema de esgotamento, nova aprovao, novo registro, nova licena ambiental. Ou, caso fosse implementado o empreendimento de acordo com o projeto aprovado pelo Municpio, em desacordo com a LI, as edificaes plurifamiliares levadas a efeito produziriam esgoto em quantidades muito superiores capacidade de absoro do sistema, podendo acarretar contaminao do solo e poluio do lenol fretico. Fica, assim, latente a necessidade de compatibilizao do procedimento urbanstico com os aspectos ambientais, j que todos so facetas do mesmo empreendimento.

    A concesso de licena prvia (LP) no gera direito posterior obteno da licena de instalao (LI) pelo interessado. Aquela contm exigncias bsicas e primordiais de aceitabilidade do plano do empreendimento, que, se no forem atendidas, ou se surgir impedimento de ordem legal ou administrativa (alterao dos planos de desenvolvimento regional, por ex.), poder no ser concedida a licena de instalao.

    As licenas ambientais dependem de critrios discricionrios tcnicos de avaliao a serem adotados pelo rgo ambiental competente e, por isto, a

    28 RHODE, Geraldo Mario. Licena prvia: LP e prtica de licenciamento ambiental no Brasil. Revista de

    Direito Ambiental, So Paulo, v.18, p.213-229, abr./jun. 2000, p. 221.

  • concesso da LI no assegura ao titular do interesse a manuteno do status quo vigente quando da sua expedio, ou seja, pode ser revogada, desde que de acordo com as normas de Direito Administrativo, ou podem ser alteradas as condies e restries dentro do prazo de vigncia da LI, caso o rgo ambiental identifique leso sade pblica ou ao ambiente que justifique a alterao ou revogao29. Hely Lopes Meirelles pontua que, obtida a licena e iniciada a obra, h direito adquirido sua continuidade30. Rodrigo Bernardes Braga anota que, uma vez licenciado o projeto e iniciadas as obras de acordo com o licenciamento, a Administrao Pblica j no pode, imotivadamente, revogar o ato, nem se justifica recorrer ao poder de polcia administrativo conferido autoridade ambiental, porquanto o interesse pblico superveniente, nesse caso, autoriza apenas a desapropriao do bem, com pagamento de prvia e justa indenizao31.

    3.3 Licena de operao

    A licena de operao a que autoriza o funcionamento do empreendimento e deve ser solicitada quando do trmino das obras, para verificao da sua execuo de acordo com as condicionantes da licena de instalao, controle de eventuais medidas compensatrias exigidas e monitoramento do regular funcionamento do sistema de disposio de guas servidas e da destinao dos resduos slidos.

    O licenciamento ambiental um procedimento complexo, que visa dizer sobre a adequao do empreendimento, em suas vrias fases de planejamento e execuo. Como no h renovao da LI32, a verificao do cumprimento desta deve se dar quando do procedimento para concesso da LO.

    Como a LO no se reduz condio de autorizao administrativa, nem de licena administrativa, pode a Administrao Pblica impor novas condies mais adequadas necessidade de conservao da qualidade ambiental, impondo ao empreendedor, inclusive, que diante da evoluo de tecnologias, adote novas prticas antipoluentes. As modificaes incidentes sobre as condicionantes e medidas de controle e adequao devero ser exigidas quando da renovao da LO, cujo prazo deve ser maior que os estipulados para licenas de operao de indstrias, j que no se est tratando de atividade, e sim de empreendimento. Enquanto a licena de operao estiver vigente, a eventual modificao de padres ambientais no pode ser obrigatria para aquele que est regularmente licenciado segundo os padres vigentes poca da concesso da LO. Mas, encerrado o prazo de validade, os novos padres sero imediatamente exigveis.

    A LO ato vinculado, que reconhece direito preexistente, desde que o titular cumpra as condies estipuladas para o exerccio do direito ao empreendimento ou atividade. Esta licena goza de estabilidade temporal pelo prazo de sua vigncia, sendo que, neste nterim, no pode ser revogada, salvo em hiptese de supervenincia de riscos para a sade ou para o meio ambiente (art. 19 da Resoluo n. 237/97 do CONAMA). Nestas hipteses, tendo havido violao das condies e restries da licena, caso de cassao da LO. Se a hiptese de

    29 BAPTISTA, Fernando; LIMA, Andr. Licenciamento ambiental e a Resoluo CONAMA 237/97. Revista de

    Direito Ambiental, So Paulo, v.12, p. 254-255, out./dez. 1998. 30 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de construir. So Paulo: Malheiros, 2000, p.168. 31 BRAGA, Rodrigo Bernardes. Parcelamento do solo urbano: doutrina, legislao e jurisprudncia de acordo

    com o novo Cdigo Civil. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2004, p. 59. 32 Quando da renovao de uma licena verificado o cumprimento das suas condies e restries.

  • inadequao de quaisquer condicionantes ou normas legais, cabe a revogao da licena. Se houve omisso ou falsa descrio de informaes relevantes que subsidiaram a expedio da licena, cabe a anulao da mesma. Se trata-se de hiptese de supervenincia de graves riscos ambientais e de sade, caso de revogao da licena33.

    4. Procedimento administrativo urbanstico

    O procedimento para obteno do licenciamento urbanstico (para o

    parcelamento do solo ou sua regularizao) se desenvolve em vrias etapas e engloba uma srie de providncias pelo parcelador e de atos do Poder Pblico, como se passa a examinar.

    4.1. Levantamento topogrfico e diretrizes para o uso do solo

    Diz o art. 6o da Lei n. 6.766/79 que antes da elaborao do projeto de loteamento34 o interessado dever solicitar ao Municpio que defina as diretrizes para uso do solo, traado dos lotes, do sistema virio, dos espaos livres e das reas reservadas para equipamento urbano e comunitrio, apresentando, para este fim, requerimento e planta do imvel contendo, pelo menos:

    I as divisas da gleba a ser loteada35; II as curvas de nvel distncia adequada, quando exigidas por lei estadual ou municipal36; III a localizao dos cursos dgua, bosques e construes existentes37;

    33 Para o enfrentamento das hipteses previstas no art. 19 da Resoluo 237/97, Jos Afonso da Silva faz a

    diferenciao das conseqncias: A anulao constitui controle de legalidade [...]. A revogao ato de controle de mrito. Dar-se- quando sobrevier motivo de interesse pblico que desaconselhe a realizao da obra licenciada, tal como: a) mudana das circunstncias, seja por haver desaparecido as que motivaram sua outorga ou por sobrevirem outras que, se existisse antes teriam justificado sua denegao; b) adoo de novos critrios de apreciao, em que a incompatibilidade da atividade licenciada deriva de uma modificao posterior que a Administrao introduziu no ordenamento jurdico urbanstico, quer aprovando novo plano diretor, quer modificando o existente, quer aprovando nova lei de zoneamento ou modificando a existente, com efeitos negativos para a manuteno da licena e do direito reconhecido ao particular com sua outorga; c) erro na sua outorga: o erro que supe a equivocada apreciao de circunstncias reais no um erro de fato que em todo momento poderia ser sanado pela Administrao mas um erro de classificao, de valorao, de interpretao, quer dizer, um erro de direito. O erro, no entanto, pode gerar uma ilegalidade na outorga da licena, caso em que seu desfazimento dever ser feito por anulao e no por revogao [...]. E a cassao vincula-se ao problema da ilegalidade, mas no da legalidade da licena em si, mas de posterior descumprimento das exigncias dela. D-se, pois, a cassao da licena quando ocorrer descumprimento: (a) do projeto, em partes essenciais, durante sua execuo; (b) da lei ou regulamento que rege a execuo da obra; (c) das exigncias do alvar de licena. SILVA, Jos Afonso da. Direito urbanstico brasileiro. 2. ed. So Paulo: Malheiros, 2000, p. 403-404.

    34 Para o desmembramento no h a fase de fixao de diretrizes prevista nos arts. 6o e 7o da Lei n. 6.766/79 (que se aplicam apenas aos loteamentos), de modo que o interessado encaminhar diretamente o projeto de desmembramento para apreciao pelo Poder Pblico Municipal, nos termos do art. 10 da lei. Nada impede, entretanto, que haja previso, na legislao municipal, da fase de diretrizes (no que couber) para as hipteses de desmembramento.

    35 A indicao das divisas da gleba compreende os limites naturais e artificiais, para que se possa ter uma idia global da rea.

    36 Essa exigncia diz com a indicao dos desnivelamentos e das particularidades encontradas na rea a ser parcelada, tais como declives, para os fins de identificao de eventuais restries do art. 3o, par. nico, inc. III e IV, da Lei n. 6.766/79.

  • IV a indicao dos arruamentos contguos a todo o permetro, localizao das vias de comunicao, das reas livres, dos equipamentos urbanos e comunitrios existentes no local ou em suas adjacncias, com as respectivas distncias da rea a ser loteada; V o tipo de uso predominante a que o loteamento se destina38; VI as caractersticas, dimenses e localizao das zonas de uso contguas39.

    O trabalho deve iniciar com o levantamento cadastral e topogrfico ou

    planialtimtrico da rea a ser parcelada, que dever conter planta da situao do imvel e especificar os itens referidos no art. 6o da Lei 6.766/79, alm de outros que eventualmente forem exigidos por lei municipal, tais como indicao de existncia de bens ambientais e localizao de edificaes existentes na rea.

    A delimitao, dimenso e divisas da rea devem ser confrontadas com os dados constantes da matrcula imobiliria, para verificar se existem eventuais diferenas. Constatada alguma diferena, dever ser consultado o Registro de Imveis competente, a fim de verificar se a retificao da matrcula poder ser feita atravs de procedimento administrativo ou se caso de procedimento judicial. De qualquer modo, a retificao da matrcula dever preceder elaborao dos projetos tcnicos.

    Aps, ento, o parcelador dever encaminhar ao Municpio o anteprojeto, sob a forma de requerimento instrudo com o levantamento topogrfico, para exame da viabilidade urbanstica do empreendimento e fixao das diretrizes de uso do solo urbano.

    Da, trs hipteses podero sobrevir em relao manifestao do Poder Pblico no que tange ao requerimento de fixao das diretrizes: a) o Poder Pblico aceita todas as intenes do parcelador, propiciando a imediata elaborao do projeto propriamente dito; b) o Municpio no aceita totalmente a proposta do parcelador e indica a ele quais as retificaes que tero de ser feitas no anteprojeto para serem atendidas as regras de uso urbanstico da rea; c) impossibilidade de o empreendimento ser aprovado, em razo de inadequar-se aos planos do Poder Pblico para a zona onde est localizado o imvel que seria objeto de parcelamento40.

    37 A exigncia feita em funo da fixao das reas non aedificandi que sero exigidas pelo Poder Pblico para

    cumprimento do Cdigo Florestal e outras normas ambientais e dos arts. 3o, inc. V, 4o, inc. III, e 5o da Lei n. 6.766/79.

    38 Essa indicao propicia que o Poder Pblico decida se o empreendimento adequado ou no ao local onde seria instalado, podendo fazer restries totais ou parciais de parcelamentos em zonas onde exista interesse de estimular ou desestimular a expanso. Pode, por ex., evitar que seja instalado distrito industrial em zona urbana de destino eminentemente residencial, assim como poder obstar loteamentos destinados moradia das pessoas em reas prximas a concentraes industriais, onde a qualidade de vida, em funo da poluio sonora, atmosfrica, seja inadequada.

    39 Para o mesmo fim mencionado na nota anterior, ter o interessado de descrever a localizao prxima de conglomerados urbanos, locais de preservao ecolgica, de concentrao industrial, locais onde existem servios comunitrios, entre outros.

    40 COUTO, Srgio A. Frazo do. Manual prtico e terico do parcelamento urbano. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 103.

  • Ao Poder Pblico cumprir definir, na sua manifestao, os seguintes tpicos elencados no art. 7o da Lei n. 6.766/79, de acordo com as diretrizes de planejamento de uso do solo estadual e municipal:

    I as ruas ou estradas existentes ou projetadas, que compem o sistema virio da cidade e do municpio, relacionadas com o loteamento pretendido e a serem respeitadas; II o traado bsico do sistema virio principal; III a localizao aproximada dos terrenos destinados a equipamentos urbanos e comunitrios e das reas livres de uso pblico; IV as faixas sanitrias do terreno necessrias ao escoamento das guas pluviais e as faixas no edificveis; V a zona ou zonas de uso predominante da rea, com indicao dos usos compatveis.

    O Poder Pblico deve, pois, definir os fins a que poder ser destinado o

    loteamento - uso industrial, comercial, de moradias, misto; restries urbansticas para o local - especialmente no tocante s edificaes (unifamiliares ou multifamiliares); dimenses e localizao dos lotes; percentual e localizao das reas pblicas; dimenses e forma de traado das vias de circulao do sistema virio interno, bem como a conexo com as vias oficiais j existentes ou projetadas; definio das reas non aedificandi, o que dever ser minuciosamente explicado em resposta anexa s retificaes feitas nas plantas.

    A lei no fixou prazo para que o Poder Pblico se pronuncie a respeito das diretrizes, sem o que no poder prosseguir o planejamento do empreendimento com a elaborao dos projetos. Impende legislao municipal fixar prazo para tanto. E se no houver previso legislativa ou, inobstante a previso legal, o Poder Pblico quedar inerte sem manifestao? Entende-se que o parcelador poder utilizar-se analogicamente do prazo de 90 dias previsto no art. 15, 2o, da Lei n. 6.766/9 e, expirado in albis, poder impetrar mandado de segurana visando ao pronunciamento do Poder Pblico41.

    Em alguns Municpios, o plano diretor prev um desdobramento dessa etapa do processo, de modo que o parcelador apresenta o requerimento instrudo com a planta da situao do imvel, solicitando ao Municpio declarao que diga as condies para ocupao do solo (regime de ocupao, forma do traado virio, localizao dos equipamentos urbanos e comunitrios, restries administrativas e reas no edificveis). Aps a obteno desta declarao, deve ser realizado o estudo preliminar de viabilidade urbanstica, elaborado sobre o levantamento planialtimtrico, que ento encaminhado para aprovao pelo Municpio. Somente aps esta aprovao o parcelador encaminha a licena ambiental prvia e a elaborao dos projetos propriamente ditos.

    41 A teoria do silncio administrativo surgiu face necessidade de se combater certos abusos da Administrao,

    sobretudo nas ocasies da total inao a propsito das solicitaes dos particulares. O desempenho da funo administrativa no compatvel com posies de desdm para com os administrados, posto ser legtimo o direito destes terem suas demandas e recursos efetivamente apreciados. Opera-se o silncio administrativo nas hipteses em que o Poder Pblico tem o dever legal de agir e, simplesmente, no age. A inrcia da Administrao, retardando ato ou fato que deva praticar, abuso de poder, que enseja correo judicial. Nesse sentido: MEIRELLES, Direito administrativo..., p. 98. COSTA, Jos Marcelo Ferreira. Licenas urbansticas. Belo Horizonte: Forum, 2004, p. 138.

  • Nos Municpios com menos de 50.000 habitantes, essa fase de consulta e fixao de diretrizes poder ser dispensada por lei (art. 8o da Lei n. 6.766/79), de modo que o parcelador apresentar, diretamente, os projetos propriamente ditos.

    As diretrizes indicadas pelo Poder Pblico, que devero ser seguidas quando da elaborao dos projetos tcnicos e urbanstico, vigoraro pelo prazo mximo de 4 anos (art. 7o, par. nico, da Lei n. 6.766/79), o que significa dizer que o parcelador teria esse prazo para elaborar o projeto do loteamento propriamente dito, de acordo com as diretrizes fixadas. E se houver alterao na legislao municipal (do zoneamento, por exemplo) no curso desse prazo? Haveria direito adquirido do loteador em ver aprovado o projeto de loteamento elaborado de acordo com as diretrizes fixadas? Ou o Municpio pode exigir, na fase de exame e aprovao do projeto a observncia da nova legislao, eventualmente surgida? Entende-se que o ato administrativo do Poder Pblico que fixa diretrizes tem carter discricionrio, que envolve interesses e no direitos, inexistindo engajamento definitivo com o pedido do interessado, no gerando direitos ao parcelador42. Assim, perfilhamo-nos ao entendimento de Toshio Mukai e outros43, que sustenta no haver direito adquirido do parcelador. Se, entre a data da expedio das diretrizes e a da aprovao do projeto do loteamento houver alterao da legislao que venha a influir nas diretrizes, estas tero de ser alteradas para adequarem-se lei nova. Entretanto, aps a aprovao do projeto definitivo, concesso da licena urbanstica e o incio da execuo das obras44, se houver alterao da legislao que tenha reflexos nas diretrizes de uso do solo, no poder atingir a licena j concedida porque j gerou ao interessado o direito adquirido de construir.

    4.2. Projetos tcnicos e urbanstico

    Com base nos traados na planta e nas diretrizes fixadas pelos rgos

    competentes, o parcelador ter os dados necessrios para elaborao do projeto de loteamento propriamente dito, que se constitui de um complexo tcnico-jurdico que ser apresentado ao Municpio para aprovao.

    A parte tcnica do projeto urbanstico integrada por plantas, mapas e memorial descritivo, indicando a subdiviso das quadras em lotes, o traado dos lotes, o sistema de vias internas de circulao, logradouros pblicos, faixas non aedificandi, reas de preservao permanente, reas de livre uso comum, reas de equipamentos urbanos45 e comunitrios (art. 9o, 1o e 2o, da Lei n. 6.766/79)46.

    42 Licena ato administrativo vinculado, de carter regulamentativo e definitivo, envolve direitos subjetivos,

    que, se preenchidos, no podem ser negados. Uma vez concedida, tem presuno de definitividade. Autorizao ato discricionrio e precrio, que envolve interesses, que podem ser negados pelo Poder Pblico e, por isso, no geram direitos ao requerente.

    43 MUKAI, Toshio; ALVES, Alaor Caff; LOMAR, Paulo Jos Vilella. Loteamentos e desmembramentos urbanos. 2. ed. So Paulo: Sugestes Literrias, 1987, p. 39.

    44 Anota-se que o Supremo Tribunal Federal entende que, em caso de supervenincia de lei nova, s h manuteno do direito de construir nas condies previstas na licena expedida de acordo com a lei anterior se a construo tiver sido iniciada.

    45 A definio da infra-estrutura a ser projetada ser sempre aquela exigida pelos Poderes Pblicos e as que forem do interesse do empreendedor.

    46 Sobre detalhes na elaborao do projeto urbanstico: AMADEI, Vicente Celeste; AMADEI, Vicente de Abreu. Como lotear uma gleba: o parcelamento do solo urbano em seus aspectos essenciais (loteamento e desmembramento). Campinas: Millenium, 2002, p. 95-107. Tambm COUTO; Manual terico..., p. 121-137.

  • O projeto do loteamento deve prever tambm a infra-estrutura que far parte do empreendimento (rede de distribuio de gua47, rede de coleta de esgoto48, rede de distribuio de energia eltrica49, sistema de drenagem superficial, sistema de coleta e destinao de lixo e periodicidade), identificando os responsveis por sua implementao e operao, acompanhado dos respectivos projetos tcnicos.

    O projeto do loteamento deve conter, ainda, o cronograma de execuo de obras, com durao mxima de quatro anos50.

    A parte jurdica constituir-se- de documentos e certides que comprovam a cadeia dominial e a propriedade da gleba a ser parcelada e a inexistncia de nus reais e fiscais sobre ela (art. 9o, caput, da Lei n. 6.766/79).

    Pela via regular, o parcelamento do solo s pode ser promovido por quem detenha a titularidade da gleba, ou por quem tenha poderes outorgados pelo proprietrio do imvel para faz-lo, da a exigncia do ttulo de propriedade (certido atualizada da matrcula)51. Se o pretenso parcelador no possui o domnio do imvel, dever, antes de tudo, buscar essa providncia administrativa ou judicialmente, para registr-lo em seu nome52.

    4.3. Diretrizes pelo Estado e anuncia prvia da autoridade metropolitana

    A Lei n. 6.766/79 previa, anteriormente, a anuncia prvia dos Estados

    para a aprovao dos loteamentos e desmembramentos pelos Municpios nas hipteses elencadas no art. 13, par. nico (imveis localizados em rea limtrofe de Municpios, em mais de um Municpio, em reas de interesse especial, tais como as de proteo de mananciais, em rea superior a 1.000.000m2). A modificao do referido artigo pela Lei n. 9.785/99 excluiu essa anuncia prvia, dizendo que ao Estado caber disciplinar a aprovao pelos Municpios dos loteamentos e desmembramentos naquelas condies, o que significa dizer que, querendo, o Estado pode estabelecer diretrizes a serem seguidas na aprovao dos projetos de

    47 Existem trs alternativas para o sistema de abastecimento de gua potvel: por rede pblica (devendo projeto

    identificar o ponto de ligao na rede pblica e explicitar a responsabilidade pela implantao da rede interna e sua interligao, se pelo empreendedor, pelo Poder Pblico ou concessionria); por sistema isolado (captao de poos artesianos, aduo, tratamento, reserva e distribuio da gua); ou por poos individuais perfurados em cada lote. Em caso de perfurao de poos, deve o empreendedor elaborar estudo hidro-geolgico para avaliao da possibilidade de captao e qualidade da gua e obter a respectiva autorizao ou outorga junto ao rgo competente. O abastecimento atravs de poos individuais somente permitido se no houver possibilidade de abastecimento por rede pblica e se o tamanho dos lotes permitir a localizao do poo a uma distncia mnima de 30m de qualquer sumidouro.

    48 Para o equacionamento da questo do esgoto sanitrio tambm existem trs alternativas: interligao na rede pblica; sistema isolado (constitudo por rede coletora, estao de tratamento e unidades de afastamento e disposio final dos efluentes); sistema individual para cada lote (fossa sptica, filtro anaerbio e unidade de infiltrao/sumidouros ou valas de infiltrao para lanamento dos efluentes).

    49 Os elementos essenciais para a elaborao do projeto tcnico de abastecimento de energia eltrica so elaborados pelas empresas de distribuio de energia.

    50 Em se tratando de desmembramento, o processo simplificado. O projeto dever conter apenas a indicao das vias existentes e dos loteamentos prximos, o uso predominante do local e a diviso dos lotes pretendida na rea (art. 10 da Lei n. 6.766/79), salvo outras exigncias constantes em lei municipal. Quanto aos documentos jurdicos, basta a apresentao do ttulo de propriedade, dispensadas as certides negativas.

    51A existncia de nus reais gravados sobre o imvel no impede o parcelamento do solo pelo proprietrio, desde que no memorial descritivo seja mencionada esta circunstncia e o credor do direito real, por instrumento pblico, estabelea a liberao do gravame para os trechos que constituiro as reas pblicas e estipule as condies para liberao dos lotes, na medida em que seus preos forem quitados pelos adquirentes.

    52 A providncia judicial, dependendo do caso concreto, poder ser ao de usucapio, adjudicao compulsria, extino de condomnio, entre outras.

  • parcelamentos naqueles casos especficos previstos no caput do art. 13. O pargrafo nico do art. 13, contudo, manteve a anuncia prvia da autoridade metropolitana para os parcelamentos localizados em Municpio integrante de regio metropolitana.

    Atualmente, a manifestao do Estado ou da autoridade metropolitana diversa em cada Estado-membro da federao.53

    4.4 Licena urbanstica

    As primeiras licenas urbansticas foram denominadas licenas de

    construo e controlavam a esttica de um projeto e a acomodao s normas de poltica da construo individualmente. Posteriormente, ocorreu uma transformao da natureza das licenas, momento em que passaram a ser denominadas licenas urbansticas54, porque passaram a impor deveres e condicionar permanentemente o exerccio destes55. Tais licenas constituem uma forma de controlar e dar cumprimento ordem urbanstica.

    A licena urbanstica tem caractersticas prprias, entre as quais se ressalta que ato vinculado o que a diferencia, na sua natureza administrativa, do licenciamento (autorizao) ambiental. Disto resulta que, nas hipteses em que o particular-interessado preencher os requisitos previstos na legislao, no haver margem de apreciao subjetiva (discricionria) do Poder Pblico.56

    As licenas urbansticas, alm de servirem ao levantamento das barreiras impostas pela lei ao exerccio de certos direitos, aos quais sem a prescrio estatal seriam proibidos ou impedidos, constituem um instrumento de controle do uso e ocupao do solo, exercido pelo Poder Pblico, ensejando medida preventiva voltada a evitar abusos.

    O procedimento para obteno da licena urbanstica para parcelar o solo abarca etapas de requerimento, instruo, deciso e recursal.

    A instaurao do procedimento ocorre com o requerimento para fixao das diretrizes pelo Poder Pblico ou, nos casos em que esta etapa dispensada pela legislao municipal, pelo requerimento de apreciao do projeto e dos demais 53No Estado do Rio Grande do Sul, o art. 27 da Lei Estadual n. 10.116/94 dispe que o Estado examinar,

    obrigatoriamente, antes da aprovao pelos Municpios, os projetos de parcelamento do solo destinados a fins urbanos, anuindo ou no com sua execuo, nas mesmas hipteses mencionadas no art. 13 da Lei n. 6.766/79, acrescentando, ainda, os empreendimentos que se destinarem a distrito industrial. No Municpio de Porto Alegre, que licenciador pleno, o rgo metropolitano-METROPLAN participa do Conselho Municipal de Planejamento Urbano e aprovao do projeto de parcelamento por esse rgo colegiado presume a anuncia prvia da autoridade metropolitana. No Estado de So Paulo, todos os projetos habitacionais so analisados pelo GRAPROHAB-Grupo de Anlise e Aprovao de Projetos Habitacionais (Decreto Estadual n. 33.499/91), que rene todas as secretarias estaduais (de habitao, meio ambiente, da sade), rgos e empresas concessionrias de servios pblicos que atuam na aprovao e licenciamento de loteamentos, com o objetivo de centralizar e agilizar o trmite dos projetos habitacionais apresentados para apreciao no mbito do Estado.

    54 O gnero licenas urbansticas comporta vrias espcies, entre elas licena para parcelar o solo, licena edilcia (para edificar ou demolir), licena para habitar e licena para funcionamento e localizao.

    55 SILVA, Direito urbanstico..., p.390-391. 56 A licena administrativa permeia uma relao jurdica estvel, uma situao de carter definitivo e no

    precrio, onde ulteriores consideraes sobre alterabilidade da relao jurdica firmada no se pem em debate. Sobre o tema: COSTA, Licenas urbansticas, p. 69. FIGUEIREDO, Lcia Valle. Disciplina urbanstica da propriedade. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1980, p. 58. SILVA, Direito urbanstico..., p.391. GASPARINI, Digenes. O municpio e o parcelamento do solo. 2. ed. So Paulo: Saraiva, 1988, p. 78-87. Hely Lopes Meirelles anota que a recusa da licena para lotear, quando o projeto ou plano estiver em ordem, ilegal e abusiva. O direito de construir. So Paulo: Malheiros, 2000, p. 163.

  • documentos apresentados (ttulo de propriedade, memorial descritivo, peas grficas, plantas, etc.).

    A instruo a etapa em que so averiguados todos os atos e fatos jurdicos condutores deciso. Nesta fase, caso os documentos apresentados pelo particular sejam insuficientes ou incorretos, ou quando o Poder Pblico constatar a imprescindibilidade de alguma diligncia ou complementao de documentao exigida por lei ou esclarecimentos, devero ser objeto de comunicados (comunique-se) para que as falhas sejam sanadas.57

    Encerrada a instruo, o Poder Pblico manifesta-se sobre a possibilidade de levar a cabo o parcelamento (ou regularizao deste), exarando a deciso de aprovao ou rejeio dos projetos e, em caso de aprovao, expede a competente licena urbanstica, atravs de alvar.

    O art. 15 da Lei n. 6.766/79 remete lei municipal a definio do prazo para que um projeto de parcelamento seja aprovado ou rejeitado. O 2 estabelece que, nos Municpios cuja legislao seja omissa, o prazo de 90 dias para a aprovao ou rejeio do projeto. O 1 do mesmo artigo diz que, transcorrido o prazo (da legislao municipal ou, na falta deste, do 2 retromencionado) sem a manifestao do Poder Pblico, o projeto ser considerado rejeitado, assegurada a indenizao por eventuais danos derivados da omisso. Na esteira da teoria do silncio administrativo, entende-se que o desempenho da funo administrativa no compatvel com essa omisso j que o Poder Pblico tem o dever de se pronunciar , posto ser legtimo o direito do interessado de ter seu requerimento efetivamente apreciado e, se for o caso, apontadas as razes da rejeio58. Essa omisso do Poder Pblico enseja mandado de segurana, para corrigir a falha abusiva da Administrao.59

    A licena urbanstica para parcelar no pode ser concedida sem que o parcelador assine o termo de compromisso, em que constar o prazo total para execuo das obras (abertura de vias, demarcao e diviso de lotes e execuo da infra-estrutura), que no poder ser superior a quatro anos (art. 9 da Lei n. 6.766/79). Como garantia das obrigaes assumidas, no termo de compromisso, o parcelador prestar cauo de bens ou fiana junto a estabelecimento de crdito que a juzo do Municpio sejam suficientes para cobrir os custos do empreendimento60. Somente depois de assinado o termo de compromisso e a escritura de cauo, o Municpio expedir o alvar.

    Do deferimento da licena urbanstica emerge, em tese, o direito de construir conforme o projeto aprovado61. Ocorre o desencadeamento de dois atos 57 COSTA, Licenas urbansticas, p. 135-136. 58 Sendo o ato administrativo de aprovao ou rejeio do projeto uma licena e, como tal, ato vinculado, a

    rejeio s pode ocorrer por no cumprimento das determinaes legais pertinentes ou das diretrizes fixadas pelo Poder Pblico.

    59 Essa teoria tem o escopo de combater certos abusos da Administrao, sobretudo nas ocasies da total inao a propsito das solicitaes dos particulares. A inrcia da Administrao, quando deveria agir, abuso de poder, que enseja correo judicial. Tambm a rejeio do projeto quando este est de acordo com a legislao e as diretrizes passvel de correo via mandado de segurana. Nesse sentido: MEIRELLES, Direito administrativo..., p. 98. COSTA, Licenas Urbansticas, p. 138. BRAGA, Parcelamento do solo urbano, p. 48.

    60 Quando da no-implementao das obrigaes assumidas pelo parcelador, o Municpio est obrigado, por lei, a implement-las, podendo promover a ao competente para adjudicar ao seu patrimnio os bens caucionados ou receber a quantia afianada. Se o parcelador executa integralmente o empreendimento, o Municpio libera os bens caucionados ou a fiana prestada aps o termo de verificao que atesta a implementao das obras.

    61 Nesse sentido: PRESTES, A necessidade de compatibilizao..., p. 88. FIGUEIREDO, Disciplina urbanstica..., p. 58.

  • administrativos consecutivos: a aprovao do projeto e a licena propriamente dita, que o gerador do direito subjetivo execuo do parcelamento, nos moldes do projeto. Contudo, em se tratando do parcelamento do solo urbano, esse direito subjetivo no emerge com a licena urbanstica por si s, pois necessria a compatibilizao com a licena ambiental de instalao (LI). Para emergir o direito de implantar o parcelamento, devem ser obtidas ambas as licenas: urbanstica e ambiental.

    Aprovado o projeto de parcelamento (ou regularizao deste) pelo Municpio, deve ser submetido pelo interessado ao Registro de Imveis, no prazo decadencial de 180 (cento e oitenta) dias, para registro na matrcula imobiliria respectiva.62

    Desde a aprovao dos projetos, vige a inalterabilidade de destinao das reas institucionais pelo parcelador63, salvo a hiptese de caducidade da licena (se no registrado o parcelamento no prazo legal) ou desistncia do interessado em efetivar o empreendimento (art. 17 da Lei n. 6.766/79)64.

    6. Concluses articuladas

    1. Os princpios constitucionais impem uma interpretao sistemtica das normas urbansticas e ambientais para proteo do meio ambiente urbano, natural e construdo, implicando na necessidade de compatibilizao das normas que regem o uso e ocupao do solo urbano.

    2. Tendo em vista que o licenciamento ambiental busca identificar eventuais

    impedimentos legais, riscos e impactos do empreendimento, com vistas a eleger as medidas preventivas e compensatrias adequadas de modo a causar o menos impacto possvel ao meio ambiente, pode ser negado em razo de impedimentos legais ou tcnicos (inviabilidade ambiental), inobstante a viabilidade urbanstica atestada pelo Municpio.

    3. lcito ao Poder Pblico a no-aprovao do empreendimento e a

    conseqente no-concesso do licenciamento urbanstico, em razo de impedimentos de ordem tcnica ou por inadequar-se a planos de desenvolvimento para a zona em que est localizado o imvel que seria objeto de parcelamento, tendo em vista a organizao e a sustentabilidade da cidade.

    4. A solicitao de qualquer uma das licenas ambientais (LP, LI ou LO)

    deve estar de acordo com a fase em que se encontra o empreendimento: concepo, obra, operao ou ampliao, mesmo que no tenha sido obtida a licena anterior prevista em lei.

    62 No se pretende esgotar as questes de registros pblicos, que no dizem com o objetivo deste trabalho, que a

    a integrao das normas urbansticas e ambientais que regulam o parcelamento do solo urbano. As questes registrrias esto exaustivamente abordadas em outras obras, entre elas: COUTO, Manual terico..., p. 174-249. BRAGA, Parcelamento..., p. 61-67. SILVA, Parcelamento..., p. 63-71. AMADEI; AMADEI, Como lotear uma gleba, p. 129-239. MUKAI, et al, Loteamentos..., p. 81-125.

    63 Desde a destinao dos espaos livres pelo loteador estes tornam-se pblicos (concurso voluntrio). 64 Em casos de loteamentos irregulares executados sem prvia aprovao, a destinao das reas pblicas no poder

    ser alterada sem aplicao das sanes cveis, administrativas e criminais. Neste caso, o loteador dever ressarcir o Municpio em valor pecunirio ou em rea equivalente, no dobro da diferena entre o total das reas pblicas exigidas e as efetivamente destinadas (art. 43 da lei n. 6.766/79).

  • 5. Nos parcelamentos regulares, para o registro imobilirio do parcelamento do solo urbano deve ser exigida a licena ambiental de instalao, e no a simples licena prvia.

    6. No parcelamento do solo urbano necessria a obteno da licena ambiental de operao, que servir para verificar o cumprimento das condicionantes estabelecidas nas licenas anteriores.

    7. Para os parcelamentos clandestinos ou irregulares do solo, se j existem

    construes e ocupao da rea, no h que ser exigida licena prvia e/ou licena de instalao,que tm funo eminentemente preventiva.

    8. J tendo havido impacto com a alterao e ocupao irregular da gleba,

    ser necessria a elaborao de um diagnstico ambiental da rea e plano de controle ambiental, a serem submetidos apreciao do rgo ambiental competente, que poder exigir medidas restauradoras ou compensatrias e condicionantes. Contudo, a manifestao do rgo ambiental para implantao do plano de controle e recuperao ambiental no ser, tecnicamente, LP, LI nem LO, mas sim autorizao para recuperao de rea degradada.

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    2.1. Etapas do procedimento de obteno de licenas ambienta3. Licenciamento ambiental3.1. Licena prvia3.2.Licena de instalao3.3 Licena de operao

    4. Procedimento administrativo urbanstico4.1. Levantamento topogrfico e diretrizes para o uso do sol4.2. Projetos tcnicos e urbanstico4.3. Diretrizes pelo Estado e anuncia prvia da autoridade 4.4 Licena urbanstica