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e os desafios da Igreja
A cidade é uma teia de aranha tanto noseu interior como nas suas conexões comoutras cidades. Simboliza a grande obraconstrutora do ser humano, revelandos u a v e r d a d e i r a n a t u r e z a s o c i a l .
João Batista Libânio
O Documento de Aparecida vai nos
dizer que precisamos abrir nossa
visão a respeito do momento em que
vivemos pois, “vivemos não numa
época de mudanças mas, sim numa
m u d a n ç a d e é p o c a ” .
Apresentar os grandes centros urbanos não
é uma tarefa fácil, pois esta realidade é
muito complexa e muito inconstante.
Mas, sem compreender este fenômeno, não
conseguiremos entender nossa época e, tão
pouco, realizar um trabalho eficaz em
n o s s a s a ç õ e s e v a n g e l i z a d o r a s .
Pois, é o ritmo destas grandes cidades que
hoje marca a vida de todas as pessoas, é sua
forma de se organizar que hoje organiza a
vida das pessoas.
São nos grandes centros urbanos que estão
em grande parte as nossas paróquias, as
nossas capelas, a sede de nossas Dioceses e,
principalmente, o grande número de pessoas
a quem somos chamados a evangelizar.
1 – Espaço
Nos grandes centros urbanos deixa-se
de lado o espaço da sociedade arcaica
na sua tranquilidade imutável para
uma sociedade moderna agitada,
pulverizada, que geram os seguintes
fenômenos:
corte entre o espaço da moradia e dotrabalho;
mudança da relação entre o espaçopúblico e o espaço privado;
a afirmação da lógica do indivíduo;
passagem do espaço real para oespaço virtual;
surgimentos de novos tipos deviolência contra o ser humano;
as pessoas saem do espaço ondese é conhecido para o anonimato;
do espaço diluído para oconcentrado;
do espaço religioso público aoreligioso privado.
2 – Tempo No mundo rural o que ditava o ritmo dotempo na vida das pessoas era o sino daIgreja que batia de hora em hora, queavisava a morte de alguém, o casamento...Era também seguido o calendário religiosocom o dia do descanso respeitado, odomingo era sagrado.
Nos grande centros urbanos a crescenteindustrialização e a forte urbanização forame x i g i n d o , c a d a v e z m a i s , t u r n o s d e
t r aba lho in in t e r rup tos oup o r r e v e z a m e n t o , d e
maneira que já não sepode seguir o ritmo
d o c a l e n d á r i or e l i g i o s o .
Outro fator que sacrifica o tempo nos
grandes centros urbanos é a necessidade de
se aumentar os rendimentos econômicos
frente aos gastos maiores que a vida
u r b a n a e s t i m u l a .
I s s o f a z c o m q u e a s
pessoas troquem as horas
de lazer e descanso por
t r a b a l h o .
Toda essa mudança da relação com
o tempo se confirma com a sensação
d e a c e l e r a ç ã o d o t e m p o ,
na sensação da falta de tempo.
3 – LazerPara entendermos o lazer nos
g r a n d e s c e n t r o s u r b a n o s
precisamos destacar três palavras:
p r a z e r , l a z e r , c o n s u m o .
- Sociedade do prazer: a cidade vive sob o
impacto da ideologia do prazer com o lema
“faz-se o que se gosta; evita-se o que não se
gosta”. É a busca desenfreada da felicidade, no
sentido da satisfação das necessidades. Para
isto refuga-se toda renúncia, toda disciplina e
t o d o o l i m i t e a o g o z o .
- Sociedade do lazer: na cidade se vive a “tiraniado lazer”, que em vez de causar prazer, termina,por seu desregramento, gerando o oposto.Muito gozo; pouco prazer. O termo popular“ressaca” traduz bem esse dilaceramentointerno. Termina-se um dia de lazer maisc a n s a d o e d e “ r e s s a c a ” .
- Sociedade do consumo: cada vez mais nos
vemos mais cercados de objetos do que de
pessoas. Antes os objetos permaneciam e nós
passávamos. Hoje nós os vemos “nascer e
morrer”. Produz-se numa abundância tal que nos
vemos obrigados a consumir para estar na moda.
Antigamente se celebrava a construção de uma
Igreja, aliás as cidades cresciam em torno das
Igrejas. Hoje os “templos” que o povo celebra a
s u a c o n s t r u ç ã o s ã o o s s h o p p i n g s .
4 – Valores
A modernidade urbana apresenta
um horizonte de valores plural,
conflituoso, subjetivo, individualista,
f r a g m e n t á r i o .
Plural porque hoje está baseado emdiversas tradições culturais ereligiosas;
Conflituoso porque reflete posturasfundamentais divergentes dianteda vida, do ser humano, doTranscendente;
Subjetivo individualista porque as pessoas sejulgam no direito de elas mesmas tecerem seuuniverso de valores sem se sentiremobrigadas a alguma instância normativa;
Fragmentário porque esses valores nãonecessariamente vem de uma única tradição epodem até mesmo ser incompatíveis entre si.Não há interesse pela coerência lógica, masatende-se antes, em muitos casos, àconveniência pessoal.
5 – Outras características das CidadesPe. José Comblin se destacou no grande estudo dos
fenômenos das cidades. Ele nos apresenta também as
seguintes características dos grandes centros urbanos:
a liberdade, o supermercado de religiões, o dinamismo,
o s p e q u e n o s g r u p o s e a s a s s o c i a ç õ e s .
- A liberdade: o que leva as pessoas para
a cidade é o desejo de fazer sua vida
pessoalmente, é o desejo de liberdade,
de independência política, econômica,
f a m i l i a r e r e l i g i o s a .
- O supermercado de religiões: o fato é evidente!
Aparecem novas religiões a cada dia e as religiões
que viviam discretamente ganham publicidade,
como o espiritismo, a umbanda, o candomblé. A
cidade então se torna um grande “supermercado
de religiões” onde cada um escolhe uma ou mesmo
várias, sem se sentir constrangido nem pela
f a m í l i a , n e m p e l a v i z i n h a n ç a .
- O dinamismo: na cidade todos querem progredir.
Cada família quer melhorar a casa, todos querem seguir a
moda. Entende-se que é preciso mudar sempre. Isso tudo
segue a lógica do capitalismo neoliberal que penetrou em
todos os setores da vida e
constitui um estímulo
permanente à competição
para ter mais poder,
mais prazer,
mais liberdade.
Isso porque os desejos, nas
cidades aumentam a cada dia.
- Os pequenos grupos: com a fragmentação
da família tradicional, surgem nas cidades
os pequenos grupos que substituem a
família.
Percebemos isso de forma clara na
juventude: sua forma de se vestirem, suas
gírias...
- As associações: para agir na cidade, os
habitantes juntam-se para formar
associações. Estas sempre têm fins
limitados: são fins econômicos, políticos,
sociais, culturais, ecológicos, referem-se à
saúde, à segurança, às festas e assim por
diante.
5 - O conflito de gerações na evangelização
Na história da humanidade,percebiam-se transformações nasgerações a cada um quarto deséculo, desde quando, no séculoXVIII, se começou a catalogar eregistrar esse fato. Atualmente,essa percepção baixou para dezanos.
Assim são denominadas e catalogadas asgerações mais recentes:- Geração Perdida (1883 – 1900): período demuitas celebridades e de importantes obrasliterárias, com destaque à americana. O augedessa geração se deu em Paris e em grandeparte da Europa. Ela é conhecida como“perdida” porque seu colapso ocorreu com aPrimeira Guerra Mundial.
- Geração Grandiosa (1901 – 1924): são osfilhos dos sobreviventes da Primeira GuerraMundial. Os pais dessa geração tornaram-seimigrantes pelo mundo. É uma geraçãomarcada por pessoas extraordinariamenteinteligentes e bem sucedidas, como WalterElias Disney e Roberto Marinho, que foramempreendedores num momento caótico einstável.
- Geração Silenciosa (1925 – 1942): Essageração teve como foco a família. A mulhertinha que dedicar boa parte de sua vida a esseideal, abdicando, assim, de sua liberdade.Dedicava-se aos filhos, às funções da casa e aocuidado do marido. Também nesse período amulher conquistou direito ao voto, aescolarização e começou sua inserção nomercado de trabalho. As famílias eramnumerosas. O casamento era para sempre.
- Geração Baby Boomers (1946 – 1964):terminou a Segunda Guerra Mundial e houveuma grande explosão populacional,denominada Baby Boom. As pessoas querema paz, o amor e uma condição de vidapessoal e profissional que leve a uma boaestabilidade e nada de conflitos. Valorizam aexperiência e o saber e se preocupam com afamília para construir uma história sólida,estável e segura.
- Geração X (1965 – 1978): as pessoascomeçam a se preocupar com o uso dosrecursos tecnológicos gerados pela geraçãoanterior. Surge o movimento hippie e arevolução sexual com o objetivo de lutar pelapaz e pela liberdade. As pessoas se apegam atítulos, às posições e à hierarquia, e valorizama carreira profissional e os méritos. Nesseperíodo que começa a ideia de quem tem maisde 40 não está mais apto para o mercado detrabalho por serem consideradas velhas.
- Geração Y (1979 – 1992): na década de 1970,cria-se a internet. Novos paradigmas, novosvalores, novas vontades começam a surgir. Aspessoas dessa geração vivem a RevoluçãoTecnológica. A globalização e a diversidade fazemparte do cotidiano das pessoas. Essa geraçãopassou a ser mais egoísta, a viver de forma maisindividualizada e a fazer várias coisas ao mesmotempo. Um desejo de se viver novas experiências econquistar uma ascensão profissional rápida. Sãojovens querem mudar o mundo mas ainda mramcom seus pais.
- Geração Z (1993 – 2010): é formada porjovens contemporâneos, ligados a realidadevirtual desde o início de seu aprendizado.Apresentam um perfil mais imediatista, queremtudo para agora e não tem paciência com osmais velhos. Essa geração consomeinformações, tecnologia e cultura. Estãoatentos e antenados a tudo que pode ser bome também ruim. Querem a paz, nada deconflito. Sabem aproveitar todos os benefícios.
Tem poder mais crítico e realizam muitascoisas com bem menos dificuldades. Tornam-se pessoas dispersas e hiperativas. Pensam demaneira diferente. As pessoas dessa geraçãoconversam normalmente, mas o cérebro delasconta de um até três pulando o dois.
- Geração Touch (2010 ...): É a geração quetem o mundo na ponta dos dedos. A geraçãodos aplicativos. Os dedos passam a ser aextensão do pensamento. Carregam no bolsoas amizades, a escola, o trabalho e uma fonteinesgotável de conhecimento.
De acordo com o censo do IBGE de 2010,quando a população do Brasil era de190.755.799, as gerações tradicionalistascorrespondiam a 8%, os Baby Boomers a 19%, aGeração X a 22%, a Geração Y a 36% e aGeração Z a 15%.Se fizermos uma pesquisa em nossasParóquias com certeza iremos nos deparar comessa realidade.
Exteriormente a Igreja enfrenta o
p e r i g o d a e v a s ã o e s o t é r i c a
descomprometida, que tende a
regressar às l imitações de uma
religião meramente cósmica e natural.
O problema das correntes filosóficas do
niilismo, do relativismo, do ecletismo e
do pragmatismo utilitarista que geram
um mundo sem valores, sem esperança,
sem fé, sem um amor comprometido
com o próximo.
O problema da alienação de uma
sociedade onde “é proibido pensar, é
proibido questionar!”, onde se deve
a p e n a s a c e i t a r a s m e n t i r a s
apresentadas como verdade por
a q u e l e s q u e e s t ã o n o p o d e r .
Os desafios das religiões intimistas,
descompromissadas com a história,
com os problemas sociais, políticos,
e c o n ô m i c o s . . .
Os problemas que surgem do pluralismo
cultural: a cultura de massa, a necessidade do
estar atualizado mais do que do saber, a
cultura globalizada, a cultura do real e do
virtual, o problema da solidão, a desagregação
dos valores, da família, da educação, da antiga
tradição com seus dogmas e crenças.
Os problemas que surgem com o
mundo do trabalho: o desemprego
que gera a fome, a misér ia , o
aumento da violência, do roubo, do
h o m i c í d i o , d o s u i c í d i o . . .
Aliados aos problemas externos temos
os desafios internos que a Igreja tenta
superar: estrutural e de ação pastoral.
1 – Estrutura A divisão administrativa de nossas dioceses e
paróquias correspondem ainda ao mundo ruralantigo. A cidade é para ela um mundodesconhecido.
A Igreja não dispõe de estruturas para elaborarrespostas aos desafios à Evangelização. A vidaparoquial não é feita para assumir os problemasdo trabalho, de moradia, de convivência, dedesorganização social da cidade, menos aindapara assumir os problemas dos grandes setoresculturais.
2 – Ação Pastoral O desperdício de recursos humanos por
causa da não valorização dos leigos e leigasem sua competência e capacidade detrabalho.
A quantidade de tempo desperdiçadopor ministros ordenados na realizaçãode trabalhos que não são de suacompetência.
Todo esse processo gera em nossas Paróquiase Dioceses duas realidades:
- leigos e leigas ainda com sua atuaçãomeramente reduzidas a assistentes dospadres e totalmente dependentes deles;
- membros do clero sempre sobrecarregadosporque fazem tudo sozinhos e querendo seresponsabilizar por todos os trabalhosnecessários ao bom andamento dacomunidade eclesial, incluindo as atividadesde ordem temporal.
Muito obrigado!! !Pe Wagner Aparecido Scarponi