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UNIVERSIDADE POTIGUAR – UnPPRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO
NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA – NEaD
Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Livro-texto EaD
Natal/RN2010
P324a Paula, Deyvidson Giulliano Xavier de.
Aspectos jurídicos dos direitos humanos / Deyvidson Giulliano Xavier de Paula, Leonardo Nascimento Costa de Medeiros. – Natal: EdUnP, 2010.
220p. : il.
Ebook – Livro eletrônico disponível on-line. ISBN 978-85-61140-35-9
1. Direitos humanos. I. Medeiros, Leonardo Nascimento Costa de. II.Título.
RN/UnP/BCSF CDU 34:37
DIRIGENTES DA UNIVERSIDADE POTIGUAR – UnP
Reitoria
Sâmela Soraya Gomes de Oliveira
Pró-Reitoria de Graduação e Ação Comunitária
Sandra Amaral de Araújo
Pró-Reitoria de Pesquisa, Extensão e Pós-Graduação
Aarão Lyra
NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
DA UNIVERSIDADE POTIGUAR – UnP
Coordenação Geral
Barney Silveira ArrudaLuciana Lopes Xavier
Coordenação Pedagógica
Edilene Cândido da Silva
Coordenação de Produção
de Recursos Didáticos
Michelle Cristine Mazzetto Betti
Coordenação de Produção de Vídeos
Bruna Werner Gabriel
Coordenação de Logística
Helionara Lucena Nunes
Revisão de Linguagem
e Estrutura em EaD
Priscilla Carla Silveira MenezesThalyta Mabel Nobre BarbosaÚrsula Andréa de Araújo Silva
Apoio Acadêmico
Flávia Helena Miranda de Araújo Freire
Assistente Administrativo
Eliane Ferreira de SantanaGabriella Souza de Azevedo Gibson Marcelo Galvão de SousaGiselly Jordan Virginia Portella
Deyvidson Giulliano Xavier de PaulaLeonardo Nascimento Costa de Medeiros
Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
1ª edição
Natal/RN2010
EQUIPE DE PRODUÇÃO DE RECURSOS DIDÁTICOS
Organização
Luciana Lopes XavierMichelle Cristine Mazzetto Betti
Coordenação de Produção de Recursos Didáticos
Michelle Cristine Mazzetto Betti
Revisão de Linguagem e Estrutura em EaD
Priscilla Carla Silveira MenezesThalyta Mabel Nobre Barbosa
Ilustração do Mascote
Lucio Masaaki Matsuno
EQUIPE DE PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO
Delinea - Tecnologia Educacional
Coordenação Pedagógica
Margarete Lazzaris Kleis
Coordenação de Editoração
Charlie Anderson OlsenLarissa Kleis Pereira
Coordenação de Revisão Gramatical e Normativa
Michelle Christie Olsen
Revisão Gramatical e Normativa
Morgana do Carmo Andrade Barbieri
Coordenação de Diagramação
Alexandre Alves de Freitas Noronha
Diagramação
Gabriel Spira
Ilustrações
Alexandre Beck
DEYVIDSON GIULLIANO XAVIER DE PAULA
Sou Advogado, formado em Direito pela UFRN, com pós-
graduação em Direito Administrativo e Gestão Pública pela UnP. Desde
2007 sou Professor efetivo da Universidade Potiguar (UnP), onde
leciono as disciplinas como Ciência Política, Processo Constitucional,
Direito Eleitoral e Direito Administrativo I e II. Fora de sala de aula,
coordeno o projeto de extensão Voto Cidadão e oriento trabalhos
de conclusão de curso. Tenho experiência com EAD (educação
a distância), já tendo orientado mais de 100 (cem) Trabalhos de
Conclusão de Curso (TCC) de pós-graduação por meio do UnP Virtual.
Identifico-me bastante ao direcionar meus estudos e minha atuação
em sala de aula com as disciplinas relacionadas às Ciências Humanas,
como Ciência Política, Economia, Filosofia e Sociologia, e ao Direito
do Estado, como Direito Constitucional, Direito Eleitoral e Direito
Administrativo. Atualmente sou Coordenador do Eixo Temático
de Pesquisa e Extensão “Constituição, Cidadania e Efetivação
de Direitos”, Representante de Extensão do Curso de Direito e
Coordenador de Cursos de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito.
Minhas principais áreas de interesse são: Ciência Política, Cidadania,
Direitos Humanos, Direito Constitucional e Direito Administrativo.
LEONARDO NASCIMENTO COSTA DE MEDEIROS
Tenho bacharelado em Direito e obtive o diploma em 2002,
pela Universidade Potiguar. Sou especialista em Ministério Público,
Direito e Cidadania pela FESMP/RN. Ainda tenho especialização em
Direito e Processo Eleitoral pela UnP (Universidade Potiguar), e, por
fim, sou especialista em Direito Privado: Civil e Empresarial pela UnP
(Universidade Potiguar), tendo como curso de extensão de destaque o
English as Second Language pela University of California Riverside; UC
Ext. Atuo como colaborador da Revista de Estudos Jurídicos da UnP e
sou professor de Direito Constitucional e Eleitoral da UnP, bem como
Professor de Direito Constitucional do curso de Relações Internacionais
da UnP. Sou Sócio Fundador e coordenador geral do CEJEA/RN - Centro de
Estudos Jurídicos para Extensão e Aperfeiçoamento, além de Professor
de Direito do Estado deste Centro de Estudos. Faço Consultoria Jurídica
perante o Departamento de Direito da Faculdade Paschoal Dantas/SP,
sou membro do conselho editorial da Editora F3D - Livros Jurídicos. E,
por fim, atuo como Advogado em Natal/RN e em Brasília/DF.
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ASPECTOS JURÍDICOS DOS DIREITOS HUMANOS
Caro(a) aluno(a). Neste livro, você irá estudar os Aspectos
Jurídicos dos Direitos Humanos. O que isso significa? Que vamos
fazer um estudo superficial ou generalista sobre o tema Direitos
Humanos? Muito pelo contrário. Esta é uma disciplina, antes de
tudo, pensada não para alunos de qualquer curso, mas para alunos
do Curso de Direito.
Nesse sentido, será disciplina de caráter técnico-jurídico,
e não terá caráter geral. Por isso recebe a expressão “Aspectos
Jurídicos” antes do próprio advento da matéria autônoma tal
qual os Direitos Humanos.
Nesta disciplina, você entrará em contato com a Teoria Jurídica
sobre os Direitos Humanos, tendo essa matéria, em que pesem
grandes controvérsias históricas, políticas, filosóficas e sociológicas,
pouco mais de 50 anos de existência, consolidada no universo
das Ciências Humanas, ao passo que o primeiro documento sobre
Direito Humanos, a Magna Carta, de 1215, já tem quase 800 anos.
Propomos, assim, demonstrar que o tratamento jurídico da
disciplina Direitos Humanos é algo recente, e é este tratamento,
ou seja, os Aspectos Jurídicos, que estudaremos neste livro-texto.
Esse tratamento é o objeto de nossa disciplina. Por isso o seu
nome: Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos.
Ao estudar vários desses aspectos jurídicos, você irá
compreender questões geraissobre Direitos Humanos, como a sua
diferenciação com os chamados DireitosFundamentais, bem como
Direitos Fundamentais em espécie de ordem vertical,horizontal, e,
ainda, todas as suas características, funções e dimensões. Após esta
análise rica e detalhada, passearemos por textos históricos, desde a
Magna Carta de 1215, há pouco citada, até nossos dias.
Estudaremos os principais documentos vigentes no mundo,
com destaque para o que cria o Sistema Interamericano de proteção
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aos Direitos Humanos, assim como o modo pelo qual os referidos documentos
entram em vigor em nosso ordenamento jurídico.
No plano nacional, vamos analisar os direitos e garantias fundamentais
presentes na Constituição Federal de 1988, assim como a legislação brasileira
relativa aos Direitos Humanos. Por fim, vamos discutir as principais questões
que se colocam na atualidade sobre a matéria.
O estudo a ser analisado, debatido, pensado e discutido será
fundamental para lhe garantir formação humanística e senso crítico como
cidadão(ã) condizente com os valores da pessoa humana, e, ainda, receberão
as características fundamentais exigidas do Profissional do Direito. A disciplina
Aspetos Jurídicos dos Direitos Humanos, com certeza, lhe ajudará nesta jornada.
Capítulo 1 - Teoria geral dos direitos humanos fundamentais ............... 13
1.1 Contextualizando .......................................................................................................... 131.2 Conhecendo a teoria .................................................................................................... 14 1.2.1 Entre a história, a política e a constituição ................................................. 15 1.2.2 Um pouco de direitos humanos em outras ordens jurídicas .............. 17 1.2.3 Correlação entre constituição e direito (humano e internacional) ... 19 Constituição como fonte suprema e reitora de direitos .....................................................19 Direitos humanos (fundamentais): alguns exemplos ..........................................................20 1.2.4 Doutrinas relacionadas aos direitos humanos fundamentais ............ 23 Doutrina relativista ...........................................................................................................................23 A doutrina universalista ..................................................................................................................24 1.2.5 Características dos direitos humanos .......................................................... 26 Historicidade .......................................................................................................................................26 Universalidade ...................................................................................................................................27 Indisponibilidade ..............................................................................................................................27 Efetividade ...........................................................................................................................................27 Concorrência e colisão dos direitos fundamentais ...............................................................28 Impossibilidade de retrocesso .....................................................................................................29 1.2.6 Concepções frente à teoria geral dos direitos de resistência .............. 301.3 Aplicando a teoria na prática .................................................................................... 311.4 Para saber mais .............................................................................................................. 341.5 Relembrando .................................................................................................................. 351.6 Testando os seus conhecimentos ............................................................................ 36Onde encontrar ..................................................................................................................... 37
Capítulo 2 - Evolução histórica dos direitos humanos ............................ 39
2.1 Contextualizando .......................................................................................................... 392.2 Conhecendo a teoria .................................................................................................... 40 2.2.1 As declarações de direitos ............................................................................... 42 2.2.2 O caso Marbury x Madison (EUA , 1803) ..................................................... 54 2.2.3 Constituição mexicana (1917) ........................................................................ 55 2.2.4 Declaração dos direitos do povo trabalhador e explorado (1917) ... 56 2.2.5 Constituição de Weimar (1919) ...................................................................... 582.3 Aplicando a teoria na prática ..................................................................................... 592.4 Para saber mais .............................................................................................................. 632.5 Relembrando .................................................................................................................. 642.6 Testando os seus conhecimentos ............................................................................ 65Onde encontrar ..................................................................................................................... 67
Capítulo 3 - Proteção internacional e nacional dos direitos humanos .. 69
3.1 Contextualizando .......................................................................................................... 693.2 Conhecendo a teoria .................................................................................................... 70 3.2.1 Conceito e espécie de textos universais sobre direitos humanos ..... 74 3.2.2 A universalização dos direitos humanos fundamentais ....................... 76 3.2.3 Conceito de direitos humanos na perspectiva universal ..................... 80 3.2.4 As alterações constitucionais e as cláusulas pétreas .............................. 823.3 Aplicando a teoria na prática ..................................................................................... 883.4 Para saber mais .............................................................................................................. 90
SU
MÁ
RIO
SU
MÁ
RIO
3.5 Relembrando ........................................................................................................................................... 913.6 Testando os seus conhecimentos ..................................................................................................... 93Onde encontrar .............................................................................................................................................. 93
Capítulo 4 - Direitos e garantias fundamentais na constituição brasileira ............... 95
4.1 Contextualizando ................................................................................................................................... 954.2 Conhecendo a teoria ............................................................................................................................. 96 4.2.1 Direito à vida .................................................................................................................................. 97 4.2.2 O direito à igualdade ................................................................................................................102 4.2.3 O direito de liberdade ..............................................................................................................103 4.2.4 A dignidade da pessoa humana ...........................................................................................105 4.2.5 Direito de nacionalidade .........................................................................................................108 4.2.6 Direito de propriedade ............................................................................................................109 4.2.7 Direito ao devido processo legal ..........................................................................................110 4.2.8 Direitos políticos .........................................................................................................................111 4.2.9 Direito à educação, moradia, trabalho e à saúde e outros direitos
sociais fundamentais ................................................................................................................1124.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................1144.4 Para saber mais .....................................................................................................................................1164.5 Relembrando .........................................................................................................................................1174.6 Testando os seus conhecimentos ...................................................................................................118Onde encontrar ............................................................................................................................................119
Capítulo 5 - Direitos humanos na legislação brasileira .............................................121
5.1 Contextualizando .................................................................................................................................1215.2 Conhecendo a teoria ...........................................................................................................................122 5.2.1 O sistema nacional de proteção aos direitos humanos ...............................................122 5.2.2 O plano nacional de proteção de direitos humanos 3 – PNDH3 ..............................123 5.2.3 Leis anteriores ao PNDH3: legislação referente a direitos humanos .......................125 5.2.4 A convenção interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência
contra a mulher (a convenção de Belém do Pará) .........................................................129 5.2.5 A lei Maria da Penha ..................................................................................................................1315.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................1345.4 Para saber mais .....................................................................................................................................1365.5 Relembrando .........................................................................................................................................1375.6 Testando os seus conhecimentos ...................................................................................................138Onde encontrar ............................................................................................................................................139
Capítulo 6 - Análise dos principais documentos relativos aos direitos humanos ..141
6.1 Contextualizando .................................................................................................................................1416.2 Conhecendo a teoria ...........................................................................................................................142 6.2.1 ONU .................................................................................................................................................142 6.2.2 Declaração universal dos direitos humanos ....................................................................145 6.2.3 Pactos internacionais “juridicizantes” e a carta internacional de direitos ..............148 6.2.4 Pacto internacional dos direitos civis e políticos ............................................................149 6.2.5 Pacto internacional dos direitos econômicos, sociais e culturais .............................151 6.2.6 Estatuto de Roma e o tribunal penal internacional .......................................................153 6.2.7 Corte internacional de justiça ...............................................................................................157
6.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................1586.4 Para saber mais .....................................................................................................................................1616.5 Relembrando .........................................................................................................................................1626.6 Testando os seus conhecimentos ...................................................................................................164Onde encontrar ............................................................................................................................................167
Capítulo 7 - O sistema continental de proteção aos direitos humanos ...................169
7.1 Contextualizando .................................................................................................................................1697.2 Conhecendo a teoria ...........................................................................................................................170 7.2.1 Organização dos Estados Americanos (OEA) ...................................................................170 7.2.2 Convenção americana de direitos humanos ...................................................................173 7.2.3 Comissão interamericana de direitos humanos .............................................................176 7.2.4 Corte interamericana de direitos humanos ......................................................................1797.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................1807.4 Para saber mais .....................................................................................................................................1847.5 Relembrando .........................................................................................................................................1857.6 Testando os seus conhecimentos ...................................................................................................186Onde encontrar ............................................................................................................................................189
Capítulo 8 - Temas atuais de direitos humanos fundamentais ................................191
8.1 Contextualizando .................................................................................................................................1918.2 Conhecendo a teoria ...........................................................................................................................192 8.2.1 A derrocada da doutrina do separatismo, racismo e da discriminação .................197 8.2.2 Gerações/dimensões de direitos fundamentais .............................................................199 8.2.3 O Transconstitucionalismo .....................................................................................................201 8.2.4 A Dignidade da pessoa humana – como fundamento republicano e
norma reitora das demais normas constitucionais e infraconstitucionais ............2058.3 Aplicando a teoria na prática ............................................................................................................2108.4 Para saber mais .....................................................................................................................................2128.5 Relembrando .........................................................................................................................................2138.6 Testando os seus conhecimentos ...................................................................................................214Onde encontrar ............................................................................................................................................215
Referências .....................................................................................................................................................217
Capítulo 1
13Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
TEORIA GERAL DOS DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS
CAPÍTULO 11
1.1 Contextualizando
A evolução e o estudo dos Direitos Humanos, especialmente no mundo
atual, é assunto de grande relevância jurídica. Há tempos que a construção
de uma teoria geral dos direitos humanos e suas consequências jurídicas é
debatida em todos os meios acadêmicos, especialmente nas ciências humanas
e sociais.
Primeiro, em razão da proliferação desta disciplina em nível de graduação
e pós-graduação – lato e strictu sensu – mundo afora; segundo, por ser esta
disciplina admirável. Ela mantém acalorado debate acadêmico, desde os
iniciantes no estudo do Direito até os mais festejados doutrinadores de todos
os continentes.
Assim, por esses motivos, é imprescindível fazer com que você entenda,
desde já, o exato porquê da real importância do estudo dos Direitos Humanos,
o qual foi enaltecido e engrandecido ao passar dos séculos.
É impossível dissociar a teoria geral dos direitos humanos, sem a efetiva
inclusão, da historicidade e politicidade sobre o tema, bem como a concepção do
estudo de Direito Constitucional e Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Os Direitos Humanos se afirmaram historicamente e, hoje, não mais
se pode prescindir do estudo de qualquer direito sem antes pensarmos nas
consequências jurídicas, que versem sobre a temática. Isto porque elas são
ínsitas (inerentes) a qualquer cidadão, basta ser pessoa humana para receber,
gozar e usufruir de cada direito tido como tal. Demasiadamente necessário
será, para nós, estudarmos a feição jurídica desta disciplina.
Capítulo 1
14 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Ao final da leitura deste capítulo, você compreenderá uma teoria geral
dos direitos humanos fundamentais e, tendo este embasamento e estas
lições básicas, poderá compreender todo livro, capítulo por capítulo, tópico
por tópico, desde que visualize, desde agora, que os direitos aqui tratados
merecem mais do que especial atenção, pois, ao final desta leitura, você deverá
estar apto a:
• caracterizar direitos humanos;
• correlacionar a nossa Constituição e os direitos humanos em uma
perspectiva global;
• descrever as duas correntes que versam sobre direitos humanos;
• entender como se estrutura e se sistematiza o estudo dos direitos
humanos fundamentais;
• entender que os direitos humanos fundamentais devem ser
efetivamente aplicados no nosso cotidiano;
• estudar a matéria, tendo em vista que cada Direito possui uma carga
de valores que regem outros valores.
1.2 Conhecendo a teoria
Os Direitos Humanos, a rigor, não são tecnicamente um conjunto de
Direitos, de cunho retórico, ou seja, uma quantidade de direitos escritos em
códigos, decretos, leis, portarias, pactos, constituições ou simplesmente um
amontoado de palavras consolidadas em textos normativos, que possuem a
finalidade de harmonia entre os povos humanos.
Os direitos humanos fundamentais possuem uma alta relevância jurídica
no aspecto teórico, mas, sobretudo, no sentido de efetivação e aplicação
desses direitos no cotidiano, posto que não se pode negar que aludidos direitos
são carregados e dotados de valores históricos e políticos, pois nasceram em
meio a vários momentos tormentosos do passado, ao passo que eles vêm se
consolidando e concretizando ao passar dos tempos.
Não se pode negar, por óbvio, que os direitos humanos brotaram
nos mais variados textos legais, nacionais e internacionais, após muito
derramamento de sangue, várias guerras, batalhas, embates políticos,
discussões e padecimento, em épocas onde o Estado de Direito ou Estado
Democrático simplesmente não existia.
Capítulo 1
15Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Daí a necessidade da prévia compreensão de História, Política e
Constituição para o efetivo entendimento da disciplina ora estudada.
1.2.1 Entre a História, a Política e a Constituição
A história nada mais é do que um retrato do passado, cortado em vários
momentos. Cada um desses momentos reflete como a condição humana
evoluiu e regrediu em prol dos seres humanos. Assim sendo, em cada capítulo
da história, seja o mais antigo momento, até o mais recente, percebemos que
há variadas formas de lutas em prol da conquista de valores estritamente
ligados ao direito.
Fábio Konder Comparato (2010) escreveu “A afirmação histórica dos
direitos humanos” e, neste livro, asseverou que os direitos humanos são
encontrados na mitologia grega. Na obra, ele cita trechos do épico Prometeu
Acorrentado para assegurar sua narrativa.
Em outras obras sobre a matéria, inclinamo-nos a entender que
Pitágoras na Grécia, Confúcio na China, Zaratustra na Pérsia e Buda na Índia,
milênios atrás, já resguardavam direitos tidos como humanos, tendo em vista
todo o narrado por Comparato (2010) e, ainda, por terem sido o embrião, o
reconhecimento dos primeiros direitos inerentes à pessoa humana.
Em razão de uma maior proximidade desses direitos com o que se entende
como direito moderno, outros grandes especialistas na matéria transbordam
da teoria para a prática, também com elementos históricos e políticos. Para
estes, os direitos humanos fundamentais se afirmaram durante a evolução dos
povos, mas só se ratificam após o Holocausto em razão do nazismo, e logo
após com a criação da Organização das Nações Unidas, a ONU, em 1949.
O fato é que esses direitos são subjetivos e públicos, invioláveis, não
disponíveis e (quase) absolutos. Mesmo assim, são diuturnamente negados,
e quando algum direito tido como fundamental é violado, necessariamente
carece ser reposto. Por exemplo: é Direito Humano o direito à saúde.
Todos os humanos têm direito à saúde? Se afirmarmos que sim, estamos
diante da efetiva concretização da aplicação do direito humano fundamental
social, que está posto no papel (art. 6º, CRFB/88) na prática. Acaso se responda
que não, estamos diante da negativa do Estado em razão de direito à saúde,
Capítulo 1
16 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
portanto, fundamental, a algum ser humano. No caso disto acontecer, deve
o estudante de Direito estar preparado para fazer (obrigar) com que esse
mesmo Estado, que tenha negado o Direito, agora, na prática, através de uma
atuação como profissional, garanta a saúde usurpada do cidadão pelo Estado.
Mas por quê? Porque o direito à saúde é um Direito Humano. E se é
humano, como dito há pouco, é indisponível e quase absoluto. Portanto, eis
que, aqui, nascem as consequências e os aspectos jurídicos (do estudo) e da
matéria a ser satisfatoriamente debatida durante todo este livro-texto.
Os Direitos Humanos são a maior razão da existência do próprio Direito.
O direito, em verdade, é um conjunto de normas (leis, decretos...), princípios
(dotados de coercitividade normativa) e valores que regem uma sociedade.
Sua finalidade, inicialmente, é dar direitos aos cidadãos e, ao mesmo tempo,
impor deveres e obrigações a todos com o intuito do alcance da paz social.
Acaso todos vivamos em estado de paz, poderemos viver na magna
plenitude, sem dúvida alguma, todos os direitos humanos fundamentais.
Bobbio (2001) refere que, de início, necessitamos consolidar a Democracia,
ou seja, o governo do povo, onde a maioria, livre e igualmente, exerça o
poder soberano sobre o Estado; posteriormente, alcançada a Democracia,
habitaríamos o mundo em situação de paz social e esta, finalmente alcançada,
ensejaria, obrigatoriamente, o alcance do respeito aos Direitos Humanos.
Do ponto de vista acadêmico, não restam mais dúvidas que o estudo
desta disciplina é apaixonante, pois, desde muito tempo, ele envolve discussões
sobre sociologia, política, filosofia e religião.
Todavia, saiba que não basta apenas estudar dogmas acadêmicos, pois
precisamos conhecer a teoria para podermos fazer a imediata implementação
no dia a dia do que aprendemos na academia.
Não adianta estudar um direito fundamental como a presunção de não
culpabilidade - ou de inocência (art. 5, LXI, CF/88), e, na práxis do cotidiano,
negar ao cidadão, suspeito da prática de um crime – por exemplo, esta garantia
básica, a qual é reitora do grau de civilidade de um povo.
Capítulo 1
17Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Os direitos humanos ao longo dos anos e da história, como já dissemos,
foram se afirmando em cada nação. Isso é imperioso para a compreensão
global do tema, pois, cada povo, possui uma cultura específica, com valores e
crenças diferentes, além de outros aspectos que não necessariamente são os
mesmos que nós, povo brasileiro, possuímos.
1.2.2 Um pouco de direitos humanos em outras ordens jurídicas
Há no mundo uma série de ordens jurídicas. O Brasil possui um
ordenamento jurídico, a Espanha outro sistema, os países da Ásia outros.
Cada nação soberana – e cada valor moral e político de cada povo – é quem
determina a ordem jurídica daquela determinada região, claro e óbvio, como
você já aprendeu nos semestres passados, pautados pelo respeito à história
de cada povo.
Assim, temos que frisar que existem ordens jurídicas estatais e
internacionais. Nenhuma, do ponto de vista social, é melhor ou pior do que
as outras.
Analisemos um exemplo: No Brasil ainda se discute (com muito
preconceito, diga-se) acerca da opção sexual do cidadão, e, infelizmente,
prevalece a ideia – machista – de que apenas a heterossexualidade é o
“caminho correto e adequado” a ser seguido quanto à vida sexual.
Na Holanda – país no centro do velho continente - isto já não acontece.
É normal que casais homoafetivos – como não poderia deixar de ser – estejam
juntos em praças públicas, em eventos públicos, ou em situações outras que,
aqui no país, não ficariam confortáveis, tendo em vista o largo preconceito
que iriam sofrer.
A liberdade sexual, bem como a liberdade de culto, ou de crença e de
religião, assim como a liberdade de expressão e opinião, são direitos humanos.
Nos Estados Unidos da América, vários são os estados que aceitam o
casamento de pessoas do mesmo sexo. A belíssima cidade de San Francisco,
ao norte do estado da Califórnia, por exemplo, é famosa pelos encontros
aglomerados de pessoas e casais do mesmo sexo.
Capítulo 1
18 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
No Irã, em outro sentido, a cultura de liberdade sexual, assegurada
como direito humano, não é “aceita”. Este aludido direito não é “benquisto”
não por um motivo jurídico tão somente, mas também e principalmente por
questão religiosa, tendo em vista que as tradições daquela nação, os conceitos
e valores são muito diferentes dos nossos. Há, naquele país, verdadeira aversão
e homofobia declarada aos homossexuais.
A própria igreja católica sofre com a pedofilia de membros de seus
quadros (padres), mas, ao mesmo tempo, renega, por fins religiosos, a união
de pessoas do mesmo sexo.
Outra situação diferente da do Brasil, onde os direitos humanos existem
no papel, mas não são aplicados na prática, são os países menos vanguardistas
(aqueles países onde a sociedade/povo raciocina avante ao tempo), os quais se
diferenciam por questões de costumes. Nestes casos, os direitos humanos são
respeitados em função da livre e radical liberdade de expressão, de opinião e
de imprensa.
Na Coreia do Norte, partidas da seleção local de futebol não puderam
ser transmitidas ao vivo e em tempo real aos norte-coreanos na recente Copa
do Mundo da Fifa disputada em 2010, por ordem do próprio Governo do país,
pois lá não há liberdade para os veículos de comunicação. Ou seja, não há, na
prática, a concretização do direito humano, tal qual a liberdade de imprensa.
Não é correto censurar a imprensa, pois, ao fazê-lo, o Estado não
obedece aos pactos universais sobre Direitos Humanos, nos quais tanto a livre
manifestação do pensamento, da opinião, da expressão como a comunicação
e a informação por meio da mídia são asseguradas a todos, vedando-se apenas
o anonimato criminoso.
A Coreia do Norte não deixa de ser um país e uma nação soberana, mas
ela desrespeita, sistematicamente, os Direitos Humanos de cada cidadão que
naquela região habita.
Países com regimes políticos autoritários, como a Coreia do Norte,
Cuba, bem como várias nações africanas – Serra Leoa, Sudão, Egito etc.,
desobedecem diuturnamente à implementação de direitos fundamentais, ou
seja, desrespeitam os povos de seus países, pois não autorizam, na prática, a
ratificação de cada direito de resistência conquistado.
Capítulo 1
19Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Esta tendência autoritária, infelizmente viva em pleno novo
milênio, é nefasta não só àquelas sociedades, mas, também, aos povos
como um todo, pois onde existe negação de direitos humanos por fins
politicamente autoritários, ou seja, mandos e desmandos imperiosos, não
há o ideal de separação de poderes, postulado universal, que garante a
plenitude da Democracia.
Todo país que quer ser democrático precisa de uma Constituição. Após, ele precisa obedecer e respeitar o que está inserido no texto constitucional. Cada governo deverá obedecer a esses mandamentos da Lei Maior e, para que não haja abuso de poder, deverá existir uma descentralização do poder. Ou seja, o chefe de Estado será o presidente do poder Executivo,
mas não fará interferência alguma no poder Judiciário, nem, muito menos, no poder Legislativo.
SAIBA QUE
Assim nasce o ideal da Separação dos Poderes. Isto é, o estado terá o poder
descentralizado, impedindo que o governante seja soberano e não possa criar
a lei, julgá-la e executá-la por um único governante. Esta descentralização
nasceu no pensamento político de John Locke, influenciado por Aristóteles, e
foi aperfeiçoado no Espírito das Leis, de Montesquieu.
1.2.3 Correlação entre Constituição e Direito (humano e internacional)
Para você ter uma ideia da real dimensão da matéria aqui estudada,
necessitamos, sem titubeios, compreender o que se entende por
Constituição, direito constitucional e direito internacional dos direitos
humanos. Vamos lá?
Constituição como fonte suprema e reitora de Direitos
Só se pode falar em Estado de Direito se este possuir uma Constituição e,
ainda, e não menos importante, se esta for respeitada. A rigor, entre o golpe
dos militares de 1964 até a promulgação da Carta Magna de 1988, o Brasil
estava sob a égide de textos constitucionais.
Capítulo 1
20 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Antes da Revolução Golpista, o país vivia a carta de 1946, a qual
perdurou até a Constituição de 1967 e o remendo de 1969, mas não éramos
um estado de Direito, pois apesar de termos um texto constituinte, este
não era respeitado. Ou seja, houve ruptura entre o Estado de Direito e a
democracia em face do autoritarismo.
Nada adianta falar em Estado Democrático, portanto, constitucional, caso este não respeite os dogmas supralegais lá inseridos.
Dom Evaristo Arns (2007) organizou um compêndio, chamado
Brasil Nunca Mais, com a arquidiocese Paulista, para contar às gerações
do futuro o quão nefastas à República foram as atrocidades cometidas
durante aquele período.
Gaspari (2004), em estudo histórico primoroso, engrandeceu a literatura
ao trazer ao mundo a sua investigação sobre aquela época, onde o Brasil
existia como Estado Nação, possuía Constituição, mas negava todos os mais
singelos direitos fundamentais aos que aqui estavam.
Direitos Humanos (Fundamentais): Alguns exemplos
Você sabia que a liberdade de imprensa, de opinião, liberdades artísticas,
culturais, bem como públicas, liberdades políticas, garantia de Habeas Corpus,
foram rasgados no Brasil sob a bênção da legalidade?
Todas essas sagacidades se realizaram no país com os devaneios do AI-5,
assinado pelo presidente Costa e Silva e, após, cruelmente empreendidos sob
as graças do Estado, chefiado pelo presidente Garrastazu Médici, no período
que ficou marcado como anos de chumbo, ou seja, anos de assassinatos e
homicídios em massa, estupros, invasão de privacidade, escutas clandestinas e
prática de tortura.
A intimidade, a vida e a honra de seres humanos eram legislados,
julgados e executados por ordem de algum general em uma fração de
segundos. Toda uma gama de hediondez sem precedentes foi cometida
há pouco tempo em terra tupiniquim, tendo o Brasil Constituição formal,
escrita, mas nunca respeitada.
Capítulo 1
21Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Então, o que se entendia por Liberdade e Igualdade fora soterrado, ou
seja, negado aos seres humanos. E nunca é demais lembrar que todos esses
horrores aqui cometidos já haviam sido praticados contra a humanidade em
outras experiências. A 2ª Guerra Mundial, à época, não tinha completado o
trigésimo aniversário e, mesmo assim, a história de horror se repetia, pois
sempre que uma nação não garante a seu povo uma Constituição, nega-lhe,
ao mesmo instante, direitos humanos, como você já deve ter percebido.
Em que pese a discussão, vários doutrinadores e especialistas tendem a
conceituar os direitos humanos como sendo direitos fundamentais. Existe uma
pequena diferença doutrinária e técnica neste sentido
O correto seria a utilização da expressão direitos humanos ou direitos fundamentais?
REFLEXÃO
Tecnicamente, direitos fundamentais são direitos que cada nação escreve
na Constituição de seu país. Então, seriam direitos fundamentais todos aqueles
previstos no artigo 5º da Constituição Federal, no título II, que consagra as
garantias e os direitos individuais.
Noutro passo, os direitos humanos seriam todos os direitos ínsitos à
pessoa humana, não necessariamente escritos em nossa Constituição, mas sim,
em todos os tratados e pactos universais que versassem sobre Direitos Humanos.
Ainda há uma pequena parcela de doutrinadores, os quais entendem
existir uma terceira espécie de expressão, ao lado das duas já citadas, que
seriam os direitos do homem e cidadão. Eles seriam uma lição mais singela,
pois cada homem e cada cidadão teriam uma série de direitos apenas por
terem nascidos humanos, ou seja, basta nascer para já gozar dessas garantias.
Em que pese estes ensinamentos, cremos que é errônea a utilização
desta terceira conceituação, pois a mesma dá direito apenas ao Homem e
Capítulo 1
22 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
ao Cidadão, então, tecnicamente, o preconceito machista já fez a expressão
nascer de forma equivocada. Em seguida, fala o óbvio: Basta nascer humano
para receber o direito natural às garantias fundamentais.
Direitos Humanos – Direitos Fundamentais – Direitos do Homem e do Cidadão = Direitos Humanos Fundamentais
O correto, como alerta o eminente jurista Manoel Gonçalves Ferreira
Filho (2008), in Direitos Humanos Fundamentais, é a utilização da expressão
Direitos Humanos Fundamentais. Esta não carece de atecnia, não sofre de
discussões, as quais não versem exclusivamente sobre direitos ínsitos à pessoa
humana, e especialmente é atual e bem aceita entre todo o universo jurídico.
Quanto à matéria, é imperioso destacar as classificações acerca dos
direitos humanos fundamentais no universo interno e alienígena, ou seja, no
que tange ao estudo da disciplina no direito brasileiro, bem como nos pactos
e declarações universais.
Você precisa saber, de agora em diante, que as normas legais sobre
direitos humanos produzidos mundo afora causam efeitos jurídicos diretos
em nossa realidade jurisdicional.
Dos direitos humanos, o direito internacional é matéria imprescindível
para a análise do tema em debate, porque é evidente a presença dos tratados
universais sobre os direitos humanos fundamentais neste país, por força da
própria Constituição, notadamente quando esta os assevera em todos os
parágrafos do artigo 5º.
Neste dispositivo constitucional se assevera que o Brasil se sujeita à
jurisdição do Tribunal Penal Internacional. Assim sendo, eventuais textos
universais, que versem sobre direitos humanos fundamentais e aqui aprovados,
terão força de emenda constitucional.
Ainda, é importante que você saiba que os direitos e as garantias
individuais têm validade imediata, e, sobretudo, que o Brasil não exclui outros
direitos e princípios, que tratem destes direitos, desde que devidamente
reconhecidos, ainda que os mesmos não estejam positivados na CF/88.
Capítulo 1
23Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
O Brasil é um país altamente inclinado à afirmação dos direitos humanos,
apesar de estarmos longe desta concretização. Ao menos, decididamente, por
mandamento da Lei Maior, estamos diante de cristalina perseguição e respeito
soberano aos direitos humanos fundamentais.
Neste sentido, boa parte da doutrina entende que estas garantias
humanas se classificam a partir de uma visão dupla, ou seja, entre o relativismo
e universalismo cultural. Vamos conhecê-las?
1.2.4 Doutrinas relacionadas aos direitos humanos fundamentais
Você deve saber agora que, dentro de uma perspectiva inaugural frente à
teoria geral dos direitos fundamentais, encontramos duas correntes diferentes
quanto ao modo de entender os direitos humanos. São elas:
Doutrina Relativista
A corrente relativista entende que os costumes culturais de um povo
devem reger as normas que versam sobre direitos humanos e, se for o caso,
relativizar esses direitos. Daí dizermos que os direitos fundamentais são
direitos quase absolutos.
Imagine uma aldeia de índios, onde é cultura indígena sacrificar uma
criança recém-nascida em detrimento do direito fundamental à vida. Para
esta corrente relativista, o direito de viver será flexibilizado, pois a cultura
desta população indígena é o sacrifício da criança, por esta não ter nascido em
conformidade com o costume cultural ou moral daquela específica população,
como, por exemplo: nascer e não chorar, nascer prematuramente, nascer com
etnia diferente do pai etc.
Para a corrente relativista, não importa, a priori, o direito humano em si,
mas, sim, o que há de cultural e moral naquela particular localidade, tendo o
relativismo uma subdivisão: há, na sociedade, uma relatividade forte e fraca.
A forte se apresenta quando enxerga que o valor cultural é o princípio reitor e
condutor das normas daquela sociedade, sejam jurídicas ou morais.
Noutro olhar, para os relativistas, há, ainda, o relativismo fraco, que se
mostra quando a mesma sociedade possui valores culturais fracos em razão
das normas jurídicas ou morais que se afiguram naquela localidade.
Capítulo 1
24 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
A Doutrina Universalista
A visão universalista é majoritariamente aceita pela doutrina, bem como
por quase todos os textos humanistas, que se apresenta por meio da defesa
Global dos Direitos Humanos, como bem salienta Penteado Filho (2009). Ele
analisa esta corrente, consagrando que os direitos humanos fundamentais
são direitos universais, como assim ordena a Declaração Universal da ONU de
1948, devidamente ratificada pela Conferência de Viena de 1993, das quais o
Brasil, inclusive, é signatário.
Deste modo, o universalismo dos direitos humanos fundamentais se
norteia pela indivisibilidade e pela inter-relacionalidade. Os direitos, por
serem universais, são de todos os humanos, portanto, dos povos e indivisíveis,
e, ainda, se relacionam com sistemas globais de proteção aos direitos da
pessoa humana.
Ao pesar de todas estas circunstâncias teóricas, o estudo da matéria em
análise possui um núcleo, fundamento e epicentro do qual não se pode fugir.
O objeto do estudo dos direitos humanos fundamentais versa sobre
o que se entende por pessoa humana, ou seja, a inviolabilidade da pessoa
humana, a autonomia e a dignidade.
A própria Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, no artigo
1º, discorre taxativamente sobre o narrado, quando preleciona que: “Todas as
pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos [...].”
Assim sendo, a inviolabilidade da pessoa humana significa dizer que o
ser humano não pode ser incomodado em razão de outros seres humanos,
pois a vida é direito inviolável. Daí, por ser este direito indisponível, outro
cidadão, que cometa ou tente cometer crime de homicídio, deverá, em países
sérios e democráticos, ter o direito à liberdade privado.
A pessoa humana deve gozar de autonomia, ou seja, o homem é livre
sobre si próprio, desde que não venha a ferir a liberdade de outro ser humano
ou, por fim, o postulado nuclear de todas as mais atuais e apaixonadas
discussões acadêmicas, qual seja, a dignidade da pessoa humana.
Afinal, o que é dignidade da pessoa humana?
Capítulo 1
25Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Muito se discorre sobre o quesito e quase nunca se chega a um consenso.
Mas, a dignidade da pessoa humana é quem faz a dosimetria entre a liberdade
e a igualdade dos seres humanos.
Ser digno é viver em harmonia com o mínimo exigido pelos mais singelos
direitos escritos na Constituição ou em tratados universais. Ou seja, é direito
humano fundamental social (art. 6º, CF/88) o direito ao trabalho.
Então, se todos devemos receber tratamento digno, todos devemos
ter acesso ao trabalho. O Estado, ao negar empregos para seu povo, direito
eminentemente humano, art. 6º, CRFB/88, não só nega um salário, mas, sim,
um direito fundamental social.
Neste sentido, acaso esta negativa seja percebida na nação, pode-
se averiguar qual o grau de liberdade e igualdade entre os indivíduos da
mesma sociedade, pois, sem emprego, há ócio, há falta de dignidade, ou seja,
problemas com falta de educação, cultura, esporte, lazer, alimentação, boa
moradia etc.
Desrespeita-se, então, a Constituição Federal, quando se nega o direito
fundamental social ao trabalho, pois nasce indignidade ao obreiro, e a
própria carta de 1988, a qual tem a norma, como fundamento republicano,
que constitui o Estado, a dignidade da pessoa humana. Você entendeu
agora? Acaso se negue o trabalho, se mede o grau de liberdade e igualdade
do ser humano.
No Brasil, a conquista de um emprego dá-se de forma muito árdua.
Pode-se facilmente constatar que, apesar do nosso país ser um eminente
perseguidor dos Direitos Humanos Fundamentais, em razão das rupturas,
perante o estado democrático - há pouco tomado, não somos totalmente
livres e iguais, e, muitas vezes, não permitimos que irmãos nossos, brasileiros,
gozem da dignidade da pessoa humana.
O mesmo acontece com aquele que não teve acesso à educação, saúde,
esporte, lazer, trabalho e cometeu um crime. Este, agora, também não recebe
o direito humano de defesa, pois não bastava o Estado ter negado ao mesmo
todos os direitos sociais, também lhe negou um representante para que tivesse
exercido a ampla defesa perante o poder Judiciário que o condenou.
Capítulo 1
26 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Agora, este ser humano, que não teve como exercer seus direitos de
resistência, está privado de outro direito fundamental, a liberdade. Concorda?
Somente quem nunca pôs os pés em um presídio não possui a exata noção
do quanto indigno é estar preso neste modelo prisional brasileiro. Pessoas
comem e dormem em pé, encarceradas em locais infectos, sujos, carentes de
higiene, espaço, em verdadeiros campos de concentração, sujeitos à poeira, ao
calor e frio intenso, por mais tempo que deveriam, sem direito ao trabalho, à
reinserção na sociedade.
Onde está o postulado universal da dignidade da pessoa humana, que é
núcleo do estudo desta disciplina?
Cada vez que se comete crime de lesa humanidade se dá um passo
contra a própria democracia, pois, nos dias de hoje, tenta-se acabar com
liberdades políticas – como o direito de votar e ser votado; alcançado este
objetivo inicial, passam a relativizar as liberdades públicas, quando se tenta,
em plena consolidação dos direitos fundamentais, restringir o manuseio do
Habeas Corpus etc. Isto é caminho sem volta, uma ida ao retrocesso, que é
vedado expressamente pela CRFB/88. O autoritarismo, isto é, a ausência de
Estado Constitucional, bem como de direitos humanos fundamentais, se
consolida, como bem ensinou Arendt (2009), ou seja, ele sempre se inicia desta
forma: primeiro vão-se as liberdades políticas, logo após há o extermínio das
liberdades públicas.
1.2.5 Características dos direitos humanos
Os direitos humanos fundamentais também possuem uma sistematização
muito alardeada quanto às suas características. São elas:
Historicidade
Como anteriormente explicado, a compreensão dos direitos humanos
fundamentais e a construção de uma teoria geral dos aspectos jurídicos, que
envolvem a disciplina, necessitam de prévio olhar histórico sobre a afirmação
sobre cada direito humano fundamental conquistado.
Capítulo 1
27Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Universalidade
A universalidade já demonstrada retrata o caráter global dos direitos
humanos fundamentais, bem como o sistema de proteção e flexibilização
destes. Os mesmos são indisponíveis, não podendo ser negados
Imagine a situação em que alguém diz: “eu quero me matar”. Neste caso, devemos chamar as autoridades competentes e impedir, urgentemente, este ser humano de ceifar a própria vida, pois o direito à mesma é indisponível.
REFLEXÃO
Indisponibilidade
Dentro desta característica, encontram-se:
• imprescritibilidade: pois os institutos da decadência e da prescrição
não atingem direitos humanos fundamentais rechaçados;
• inalienabilidade: não se pode comprar ou vender este direito, tendo
em vista ser o mesmo indisponível;
• inviolabilidade: todos os direitos de resistência são direitos no mínimo
constitucionais, não sendo passíveis de ameaças em razão de leis
infraconstitucionais; e
• irrenunciabilidade: por óbvio, característica que deverá estar presente,
haja vista este tipo de direito não tolerar a renúncia
Efetividade
Quanto à efetividade, o país é obrigado a criar mecanismos que
tirem os direitos humanos fundamentais do papel, ou seja, de uma visão
simplesmente teórica, e os implemente, de imediato, efetivamente, na
prática do dia a dia.
Capítulo 1
28 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Concorrência e colisão dos direitos fundamentais
Os direitos humanos ainda podem concorrer e colidir. Concorrem quando
um ou mais direitos fundamentais são exercidos ao mesmo tempo.
Vamos a um exemplo: Tício foi acusado de um crime. Então, Tício receberá
tratamento humano. Ele será devidamente processado, para, somente após,
exercer a ampla defesa de ser julgado por autoridade competente. Enquanto
tudo isto ocorre, ele só será considerado culpado quando a sentença judicial,
devidamente fundamentada, que veio a condená-lo, não for mais passível de
reexame, ou seja, quando não couber mais nenhum outro recurso que possa
vir a inocentar Tício.
Acaso tudo isto tenha ocorrido, houve concorrência de direitos
fundamentais, pois Tício foi devidamente julgado por crime, em tese,
praticado; o Estado de Direito reinou soberano, assim como a Democracia e os
Direitos Humanos.
CONCEITOCONCEITO
A concorrência de direitos fundamentais é o exercício do direito ao devido processo legal + o direito de ampla defesa + a garantia fundamental de se presumir inocente até sentença penal condenatória irrecorrível (princípio da presunção de inocência).
Já a colisão de direitos fundamentais dar-se-á sempre, como Dimitri Dimoulis
e Leonardo Martins (2009, p. 170), in Teoria Geral dos Direitos Fundamentais,
aduzem:
há colisão de direitos fundamentais quando in concreto, o exercício de um direito fundamental por um titular obstaculiza, afeta ou restringe o exercício de um direito fundamental de um outro titular.
Neste mesmo sentido, grande pensador e eminente jurista alemão,
Robert Alexy (2009), corrobora com o que a doutrina nacional aduziu sobre o
conceito posto anteriormente.
Capítulo 1
29Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Um exemplo de colisão de direitos fundamentais é o direito fundamental
à privacidade em colisão com a liberdade de imprensa, isto é, quando o direito
de privacidade, da honra e da imagem choca-se com a garantia básica da
liberdade de imprensa, de opinião e de expressão.
Imaginem que Tício foi preso por homicídio. Como ser humano, Tício se
presume inocente. Logo, o único fato de ter sido preso, até agora, nada quer dizer.
Ele pode, por exemplo, ter matado em legítima defesa. Enquanto, contra ele, não
sobrevenha uma sentença penal condenatória não mais passível de recurso, o
mesmo é inocente. Como é inocente até o momento, o que deverá prevalecer?
O direito fundamental de Tício à imagem, à honra, intimidade e
privacidade? Ou o direito fundamental de determinado veículo de comunicação
em fotografá-lo, fazer manchete no jornal com a sua imagem? Ou fazer um
link ao vivo para toda a localidade? Bem como e ainda, poder expressar-se
com esses dizeres: Tício está preso, pois é suspeito da prática de homicídio, e
ele está na delegacia Y, ao vivo e a cores, algemado, para nossas câmeras.
Impossibilidade de Retrocesso
Por último, quanto às características dos direitos humanos fundamentais,
eis que a impossibilidade ou vedação ao retrocesso é soberana quanto a
direitos humanos fundamentais. Não se pode retroceder em matéria de
direitos inerentes à pessoa humana.
Exemplo prático, real e cristalino é o que reza o inciso IV, do § 4º, do art.
60 da Constituição Federal de 1988, quando este ordena que não será objeto
de deliberação pelo congresso nacional projeto de Emenda Constitucional,
tendente a abolir direito ou garantia fundamental. Ou seja, todo o artigo 5º
da constituição é protegido por este mandamento constitucional.
Mesmo que haja clamor público, isto é, vontade da própria sociedade
em enviar projeto ao Congresso, que vise, por meio de emenda Constitucional,
pleitear permissão normativa, que vislumbre a possibilidade de o Estado impor
uma pena de caráter perpétuo ou de morte, esta não será sequer passível
de deliberação – ou seja, discussão, pelos deputados federais e senadores da
República, pois nada que queira abolir direito e garantia individual poderá ser
alvo de deliberação por estes congressistas.
Capítulo 1
30 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Para fins de notas introdutórias, portanto, você deve saber que a
dogmática jurídica dos direitos humanos possui estrutura de estudo muito
clara. Em razão da compreensão sobre o tema, lembre-se que a dogmática é
o estudo de dogmas, que nada mais são do que opiniões, e, assim, temos o
estudo (dogmática jurídica) das opiniões (dos aspectos jurídicos) em razão dos
direitos humanos fundamentais.
Este estudo pode ser visto a partir deste prisma estrutural, com 3
concepções diversas. É sobre isso que falaremos a seguir.
1.2.6 Concepções frente à teoria geral dos direitos de resistência
Elucidaremos as 3 concepções frente à teoria geral dos direitos de
resistência, são elas, como leciona Dimoulis e Martins (2009): Parte Geral, Parte
Especial e Visão ou Teoria Jusfilosófica.
Inicialmente, prezado(a) aluno(a), eis que a Parte (ou teoria) Geral dos
Direitos Humanos Fundamentais se dá justamente quando da construção deste
primeiro capítulo. Ou seja, versa sobre a constituição aplicada e real de uma
teoria que venha a consolidar os direitos humanos no mundo físico.
Em seguida, no que toca à Parte Especial dessas garantias fundamentais,
estudamos cada um dos vários direitos humanos em espécie (por exemplo:
Direito à Vida, Liberdade, Igualdade, Devido Processo Legal, Nacionalidade
etc.) inseridos tanto na Constituição como em todos os textos normativos, ou
seja, legais, nacionais ou estrangeiros, que versem sobre o tema.
Por fim, a terceira concepção – Teoria Jusfilosófica - trata exclusivamente
da construção desses direitos por meio de entendimento doutrinário e
filosófico, albergando o que há de melhor nos livros, e, tanto quanto, nos mais
variados ensinamentos no que tange à filosofia, religião, história, sociologia,
política e demais ciências humanas e sociais.
Concluindo, é necessário, por demasia, esclarecer a você que apenas
o artigo 5º da CRFB/88 possui o título das Garantias e Direitos Individuais.
Mas o certo é que os direitos humanos fundamentais, em rigor, estão no
ordenamento jurídico brasileiro, inseridos no texto constitucional, a partir do
artigo 5° até o 17°, sem se excluir os demais direitos fundamentais, ao decorrer
de todo o texto constitucional, presentes.
Capítulo 1
31Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Por derradeiro, os direitos e garantias individuais gozam da proteção
da própria constituição, quando esta assevera, lá no inciso XI, do §º 4º, do
art. 60, da CRFB/88, que não será objeto de deliberação, ou seja, sequer será
possível debater, qualquer projeto de emenda constitucional que pense em
abolir direito e garantia fundamental.
Neste sentido, relembre-se, cada direito tido como tal é conhecido como
cláusula pétrea, imutável, da eternidade, pois tais cláusulas não podem ser
abolidas do sistema jurídico nacional.
Portanto, a própria Constituição, por expressa ordem da mesma, não
permite que haja supressão de direito tido como humano.
1.3 Aplicando a teoria na prática
Para fins de aplicação prática do que discorremos na seção anterior,
“Conhecendo a teoria”, trazemos um caso concreto, que passamos a chamar
de Hard Case – que são os casos que inauguram uma discussão inovadora, que
assim se deu (Texto 1):
TEXTO 1
Um pedreiro de Laranjal Paulista (SP) foi condenado por homicídio qualificado pelo Tribunal do Júri local e contestou sua sentença no Supremo. Alegou que permaneceu algemado durante todo o julgamento e que isso lhe causou constrangimento ilegal e poderia ter influenciado os jurados.
Contextualizando o caso concreto, eis que um brasileiro foi preso pela prática do crime de homicídio. Nesta situação, o mesmo teve contra si procedimento de investigação, em inquérito policial, e, logo após a conclusão deste inquérito, foi denunciado pelo Ministério Público pela prática do crime.
No poder Judiciário, teve direito a defesa por meio de advogado legalmente constituído e foi devidamente processado, pois todos os atos processuais em matéria de direito processual penal foram respeitados.
Primeiramente, a autoridade competente, ou seja, o juiz do caso proferiu uma primeira sentença, ou seja, pronunciou o Réu, que, no Brasil, manda o acusado (que é presumidamente inocente) de ter cometido algum crime contra a vida ao banco
Capítulo 1
32 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
dos Réus do Tribunal do Júri Popular, previsto pela Constituição Federal da República de 1988, e, apenas para fins de esclarecimento, além do homicídio, vão ao Tribunal do Júri, os acusados dos crimes de aborto, infanticídio e instigação ao suicídio. Neste sentido, o pedreiro foi a Júri, e lá, condenado. Depois da condenação, inconformado, foi até a Suprema Corte Brasileira, órgão de cúpula do Judiciário, para alegar que só fora condenado, pois, durante todo o Júri, mesmo com todas as provas colhidas, o excelente trabalho realizado pela Polícia e Ministério Público, com a anuência de seu advogado e defensor, ele ficou algemado.
Fonte: Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=116381>. Acesso em: 20 out. 2010.
Agora, fosse você um magistrado! O que você, com base nos direitos
humanos fundamentais, faria? Procure primeiro refletir sozinho, pois, a seguir,
veremos o que o Supremo Tribunal Federal decidiu neste caso.
Ao analisar o caso no Habeas Corpus (HC 91.952), os ministros da Corte
entenderam que faltou fundamentação por parte da presidência do Tribunal
do Júri para manter o réu preso. O STF então acolheu os argumentos da defesa
e anulou aquele julgamento, para que um novo fosse realizado.
O relator do HC, ministro Marco Aurélio, afirmou que o uso das algemas
sem necessidade, no caso do julgamento do pedreiro, pode ter levado os
jurados leigos a terem uma impressão equivocada do réu, de que se tratava de
um acusado de alta periculosidade, uma verdadeira fera. Para o ministro Eros
Grau, o uso de algemas é uma prática aviltante, que pode chegar a equivaler
à tortura, por violar a integridade física e psíquica do réu.
O ministro Marco Aurélio destacou o papel do Estado na preservação
da integridade física e moral das pessoas que estão sob custódia, ao salientar
que o preso um dia, mesmo condenado, voltará ao convívio dos concidadãos,
voltará à sociedade.
A partir desse julgamento, o Plenário do STF decidiu editar uma súmula
vinculante para deixar claro que o uso de algemas somente deve ocorrer em
casos excepcionalíssimos. Entenderam que o uso desnecessário das algemas fere
o princípio da dignidade humana, bem como direitos e garantias individuais
previstos no artigo 5º da Constituição Federal.
Em seu art. 5º, o Pacto de San José se refere a princípios da dignidade
humana em seus dois primeiros itens, a saber: Toda pessoa tem direito a que se
respeite a sua integridade física, psíquica e moral. E no segundo item: Ninguém
Capítulo 1
33Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou
degradantes. Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com o respeito
devido à dignidade inerente ao ser humano.
Tanto o tratado internacional quanto a Constituição brasileira se
referem à proibição do tratamento indigno do preso. No caso do Brasil, há
ainda previsão de respeito dos cidadãos submetidos à privação de liberdade
no artigo 474, parágrafo 3º, do Código de Processo Penal, inserido pela Lei
11.689/08.
O parágrafo 3º do dispositivo legal é explícito quanto à restrição ao
uso de algemas: Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o
período em que permanecer no plenário do Júri, salvo se absolutamente
necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia
da integridade física dos presentes.
Além de firmar restrições sobre o uso de algemas e de editar súmula
vinculante (Súmula Vinculante nº 11) sobre o tema, o Plenário do STF
também determinou o encaminhamento da decisão ao ministro da Justiça e
aos secretários de Segurança Pública dos 26 estados brasileiros e do Distrito
Federal. Após essa decisão, o STF passou a receber inúmeros processos de
habeas corpus e reclamações, que contestam o uso de algemas.
Súmula Vinculante 11/STF: Só é lícito o uso de algemas em casos de
resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria
ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por
escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da
autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem
prejuízo da responsabilidade civil do Estado. Habeas Corpus 91.952/SP. Rel. Min.
Marco Aurélio. Órgão julgador: Tribunal Pleno. Data do Julgamento 07/08/2008.
Assim, mesmo que devidamente processado, preso sem ilegalidade,
denunciado, com o direito humano e fundamental à ampla defesa, o pedreiro
foi constitucionalmente levado ao banco dos réus do Júri Popular e lá
condenado. Ele não foi condenado pelo juiz, mas, sim pelo povo, em razão das
provas que constavam nos autos do processo, além do trabalho do Ministério
Público. O pedreiro teve seu julgamento anulado, pois, durante o julgamento,
teve direito humano fundamental, tal qual a dignidade da pessoa humana,
violada. Um simples gesto - a abertura das algemas - não teria modificado o
Capítulo 1
34 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
posicionamento dos jurados quanto à condenação e teria respeitado o direito
fundamental à dignidade da pessoa humana. Como isto não ocorreu, por ser
direito indisponível, universal, fundamental e humano, o STF, protetor da
Constituição e dos Direitos e Garantias Fundamentais lá inseridos, corretamente,
anulou o julgamento que condenou, comprovadamente, o pedreiro homicida.
1.4 Para saber mais
Título: O que é isso, Companheiro?
Autor: Fernando Gabeira Editora: Companhia de Bolso Ano: 1979
Este livro foi escrito pelo deputado federal Fernando Gabeira, do partido Verde, após a anistia concedida em 1979, onde o mesmo faz um autorretrato de seu histórico político na luta em prol de democracia, constituição e direitos humanos fundamentais. Ele foi vítima do Estado Autoritário dos anos de chumbo, tendo sido brutalmente torturado pelos militares. Mesmo em um prisma de ordem democrática, o ocorrido com o autor deu-se há pouco mais de 40 anos, época não muito distante dos dias atuais. Vale a pena a leitura!
Filme: Testemunha de Acusação
Direção: Billy Wilder Ano: 1957
Este filme trata de pessoa que tem contra si todos os aspectos de um criminoso, mesmo tendo este alegado, desde o início, inocência. Neste caso, não se dá ao acusado o direito humano de presunção de inocência ou presunção de não culpa, bem como a garantia ao devido processo legal, além do contraditório e da ampla defesa.
Filme: O Conde de Monte Cristo
Direção: Kevin Reynolds Ano: 2002
Filme épico, o qual narra a trajetória de um cidadão que fora acusado injustamente de trair Napoleão Bonaparte, recebendo tratamento desumano, como assim se fazia com aqueles considerados traidores, sem dar ao Réu, a presunção de não culpa, assistência de advogado, comunicação imediata à autoridade judiciária, bem como à família, além de negar-lhe o devido processo legal, ampla defesa e contraditório.
Capítulo 1
35Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Filme: O Julgamento de Nuremberg
Direção: Yves Simoneau Ano: 2000
Trata-se do mais famoso caso contra os criminosos nazistas. É caso célebre em prol da afirmação histórica dos direitos humanos fundamentais, devendo ser visto, revisto e discutido eternamente.
Filme: A Vida dos Outros
Direção: Kevin Reynolds Ano: 2002
Filme que retrata a repressão imposta pelos comunistas da Alemanha oriental, onde a vida de todos era vigiada por grampos e escutas clandestinas, desrespeito claro ao direito de privacidade e intimidade.
1.5 Relembrando
Você deve lembrar agora dos principais pontos revelados em todo o
capítulo. São eles:
• os direitos humanos fundamentais possuem uma alta carga de
historicidade e politicidade, bem como se revestem de importância
perante os povos, pois se afirmaram historicamente em razão dos
horrores que várias sociedades tiveram ao padecer com a Alemanha
nazista de Hitler e, no Brasil, entre o período vivenciado após o golpe
militar de 1964;
• os direitos humanos fundamentais têm valor teórico no direito
interno e alienígena, pois eles têm aplicação imediata e devem
obrigatoriamente ser efetivados pelo Estado;
• os direitos humanos fundamentais gozam de: historicidade,
politicidade, indisponibilidade, a qual abrange também a
imprescritibilidade, inalienabilidade, inviolabilidade e irrenunciabilidade.
Neste sentido, há, além dessas, a característica da efetividade e da
concorrência e colisão de direitos fundamentais e impossibilidade
de retrocesso;
• há duas correntes que versam sobre os direitos humanos fundamentais:
a corrente relativista e defensores do universalismo cultural, os quais
defendem o caráter global e de inter-relacionalidade perante os
direitos humanos e os sistemas de proteção dessas garantias;
Capítulo 1
36 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• derradeiramente, os direitos humanos fundamentais possuem uma
conceituação divergente na doutrina. Uns utilizam a expressão direitos
humanos, outros direitos de resistência, outros direitos fundamentais,
e, há, ainda, aqueles que defendem a expressão direitos do homem e
do cidadão. Vimos que, em razão da efetiva colocação terminológica
mais próxima da realidade e aceita em meio a universo do direito,
optamos pela expressão direitos humanos fundamentais;
• por último, os direitos humanos fundamentais possuem uma
estruturação e sistematização quanto ao estudo, pois há a parte geral,
a parte especial e a teoria jusfilosófica.
1.6 Testando os seus conhecimentos
1) O que são direitos humanos e qual sua importância para a humanidade?
2) Qual o núcleo do estudo dos direitos humanos fundamentais?
3) Quais são as características desses direitos?
4) Fale sobre indignidade da pessoa humana.
5) Qual a relação entre política, história e direitos de resistência?
6) Conceitue, exponha a diferença e qual a expressão correta quanto ao uso
do que se intitula como direitos humanos, direitos fundamentais e direitos do
homem e do cidadão.
7) Por que os direitos humanos fundamentais não podem retroceder?
8) Discorra sobre as 3 concepções dos direitos humanos fundamentais.
9) Discorra sobre as teorias referentes ao relativismo e ao universalismo dos
direitos de resistência.
Capítulo 1
37Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Onde encontrar
ALEXY, R. Teoria geral dos direitos fundamentais. São Paulo. Malheiros, 2008.
ARNS, P. E. Brasil: nunca mais. 35. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.
BOBBIO, N. Teoria geral da filosofia política. 2. ed. São Paulo: Campus, 2001.
COMPARATO, F. K. A afirmação histórica dos direitos humanos. 7. ed. rev. e
atual. São Paulo: Saraiva, 2010.
DIMOULIS, D.; MARTINS, L. Teoria geral dos direitos fundamentais. 2. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
GASPARI, E. A ditadura envergonhada. São Paulo: Companhia das Letras,
2002.
______. A ditadura escancarada. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
______. A ditadura derrotada. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
______. A ditadura encurralada. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
MORAES, A. de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários
aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e
jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2006. (Temas jurídicos, 3).
PENTEADO FILHO, N. S. Direitos humanos. Ed. rev., atual. e ampl. Rio de
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009.
TAVARES, A. R. Direito constitucional brasileiro concretizado: hard cases e
soluções juridicamente adequadas. São Paulo: Método, 2006.
______. Direito constitucional brasileiro concretizado: hard cases e soluções
juridicamente adequadas. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. v. 2.
Capítulo 2
39Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS HUMANOS
CAPÍTULO 22
2.1 Contextualizando
Caro aluno, nesse capítulo, nós vamos passear pelo histórico dos direitos
humanos. Apresentaremos a você os principais documentos históricos relativos
à matéria. Analisaremos cada um deles, demonstrando como se deu a evolução
dos direitos humanos e a influência desses documentos, chamados, em sua
maioria, de cartas ou declarações, na atual estrutura normativa de proteção
aos direitos humanos.
Ao terminar este passeio histórico, é preciso que, ao final deste
capítulo, você:
• identifique os principais documentos históricos que tratam dos
Direitos Humanos, em especial quanto à importância, contexto
histórico, local, ano e contribuição para o direito na atualidade;
• entenda que a evolução dos direitos humanos é um processo histórico,
fruto de lutas e conquistas da humanidade contra arbitrariedades e
atos de poder que atentavam contra a dignidade humana;
• saiba que cada um desses documentos, não obstante a sua grande
importância, possui limitações, que são próprias do contexto e da
sociedade em que se formaram;
• identifique alguns institutos garantidores dos direitos humanos
fundamentais, que surgiram ao longo da história, tais como o Habeas
Corpus, o devido processo legal, a liberdade de expressão, dentre
outros que você conhecerá ao longo deste capítulo;
Capítulo 2
40 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• possa agrupar (ou classificar) esses documentos de acordo com as suas
características mais marcantes;
• reconheça a importância e a contribuição desses documentos históricos
para o ordenamento jurídico internacional e, especialmente, nacional.
2.2 Conhecendo a teoria
Como falamos acima, para que possamos conhecer os direitos humanos
é fundamental fazer um passeio pelo histórico dos mesmos. É preciso, porém,
mais do que apenas conhecer a história. É necessário que você reflita sobre a
mesma, de modo a compreender o tamanho do impacto que ela tem sobre
nós e sobre o direito atual.
Dentro dessa linha de raciocínio, é preciso que você entenda que os direitos
humanos fundamentais são o fruto da própria evolução da humanidade na
sua luta contra a opressão, pela liberdade e a favor da igualdade.
Isso mesmo. A história dos direitos humanos fundamentais é uma história
de lutas. Nelas estão incluídas muitas perdas e sacrifícios, mas, felizmente,
muitas conquistas.
É em um contexto histórico de lutas travadas por mulheres e homens
onde encontramos a origem dos direitos humanos fundamentais. Fica claro,
assim, que esses direitos não nascem de um fato histórico isolado. Pelo
contrário, eles são o fruto de um processo composto por várias fases, como os
antecedentes, o reconhecimento, as declarações, a positivação constitucional,
a generalização, e a universalização.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Assista ao filme O Patriota, dirigido por Mel Gibson, que retrata um pai que perdeu dois filhos e, mesmo assim, continuou a sua luta. Clichês à parte, o filme retrata a necessidade de colocarmos a defesa de uma ideia acima das perdas pessoais.
Capítulo 2
41Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Perceba que a evolução dos direitos humanos fundamentais está sempre
associada a lutas por liberdades. É uma luta de novas liberdades contra velhos
poderes, como foi, por exemplo, a luta dos barões ingleses contra o seu rei, a
partir da qual surgiu a Magna Carta, que você estudará no decorrer deste capítulo.
Veja o que afirma Ferreira Filho (1998, p. 15, grifo do autor) sobre isso:
a doutrina dos direitos fundamentais revelou uma grande capacidade de incorporar desafios. Sua primeira geração enfrentou o problema do arbítrio governamental, com as liberdades públicas, a segunda, o dos extremos desníveis sociais, com os direitos econômicos e sociais, a terceira, hoje, luta contra a deterioração da qualidade de vida humana e outras mazelas, com os direitos de solidariedade.
Você deve atentar ainda para o fato de que a evolução dos direitos
humanos fundamentais também está associada, em parte, ao sofrimento
físico e moral dos seres humanos. Temos, como um grande exemplo disso, o
movimento internacional a favor dos direitos humanos após os extremos e
atrocidades ocorridos na Segunda Guerra Mundial.
Diante de tudo que você leu até agora pare e reflita. Até onde você iria para defender um direito seu? E um direito que é de outros, além de seu? Reflita ainda sobre o sofrimento, as perdas de todos os que lutaram contra a Ditadura Militar no Brasil, por exemplo, para que pudéssemos ter alguns direitos hoje no Brasil e no mundo.
REFLEXÃO
Veja que, dentre as lutas empreendias para a evolução dos direitos
humanos fundamentais, destaca-se também a feita pela limitação de poder
político. A ideia de que o governo (e o governante) deve estar a favor dos seus
governados, e não o contrário, foi muito importante para o reconhecimento
de que os direitos relativos à pessoa humana devem ser respeitados por todos,
inclusive por um rei, por um presidente ou por outro indivíduo, que seja o
principal governante de um país.
Esperamos que você tenha compreendido, até agora, que a evolução dos
direitos humanos fundamentais envolve, dentre outras coisas:
Capítulo 2
42 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• defesa de liberdades;
• lutas contra opressão;
• perdas e sofrimentos por parte de mulheres e homens;
• limitação do poder político;
• situações extremas, como a Segunda Guerra Mundial;
• tudo isso dentro de um processo histórico, dinâmico, de evolução.
Assim sendo, é preciso entender, como diz Norberto Bobbio (1992) em
seu célebre livro A Era dos Direitos, que existe uma afirmação progressiva dos
direitos humanos. Os direitos do homem nascem de modo gradual, não todos
de uma vez e nem de uma vez por todos.
Norberto Bobbio (1909-2004), pensador italiano, é considerado um dos maiores pensadores do século XX. Jurista, filósofo, cientista político, professor e autor de vários livros, dentre os quais se destacam o Dicionário de Política e a Era dos Direitos, onde ele defende a teoria das gerações dos direitos fundamentais. Em 1984, ele foi nomeado Senador vitalício na Itália. Seus estudos sobre a democracia são de leitura imprescindível para os profissionais das ciências sociais.
BIOGRAFIA
2.2.1 As Declarações de Direitos
Para que você possa compreender essa progressiva afirmação dos direitos
humanos fundamentais, faz-se necessária a análise de alguns documentos
históricos, que tiveram importância fundamental. Esses documentos são
chamados declarações de direitos.
Mas por que é tão importante o estudo dessas declarações?
Podemos dizer que os direitos humanos fundamentais já existiam,
independentemente de qualquer texto expresso ou positivado em um
ordenamento jurídico, pois eles são inerentes da própria natureza do homem?
Sim. Com certeza, podemos. Como falam muitos: para ter direitos humanos,
basta ser humano.
Capítulo 2
43Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
No entanto, foi só a partir das referidas declarações que os direitos
humanos fundamentais passaram a ser formalmente reconhecidos. A
positivação, com a expressão dos direitos em um texto, fez com que os valores
relacionados à dignidade da pessoa humana ganhassem normatividade.
Para que fique claro: não é preciso um documento solene, uma declaração
de direitos para que os direitos humanos fundamentais passem a existir ou
que sejam reconhecidos. Mas eles ganham força e normatividade quando da
existência de um documento declarador.
Quanto à natureza da declaração, não confunda a mesma com a Constituição.
A declaração de direitos é anterior à Constituição. Nesse caso, a Constituição
consagra e legitima a força normativa dos direitos humanos fundamentais.
Sabendo da importância que têm essas declarações de direitos, passaremos
ao estudo sintético das mesmas, quais sejam: A Magna Carta, a Petition of
Rights, o Habeas Corpus Act, o Bill of Rights, a Declaração de Direitos do Bom
Povo da Virgínia e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
As quatro primeiras podem ser chamadas de declarações inglesas e tiveram
um papel fundamental para o fortalecimento da ideia de limitação de poder do
governante. Além disso, elas constituíram as origens da Monarquia Constitucional
Britânica, que é modelo para vários países parlamentares hoje no mundo.
A penúltima foi declarada nos Estados Unidos da América do Norte e a
última na França.
Quanto à Declaração Universal dos Direitos do Homem, adotada pela
ONU em 1948, pela sua importância no cenário atual e por se tratar de um
documento em vigência, ela será analisada melhor em capítulo posterior.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para uma leitura mais aprofundada dos documentos históricos trabalhados neste capítulo, nós indicamos a leitura do livro A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos, de Fábio Konder Comparato. Nesse livro, o autor faz uma análise minuciosa dos citados documentos.
Capítulo 2
44 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
a) A Magna Carta (1215)
Assinada em 15 de junho de 1215, a Carta Magna só se tornou definitiva
dez anos depois. Ela é considerada um marco na história constitucional, tanto
na Inglaterra como no resto do mundo, na medida em que foi um documento
que limitava os poderes do rei.
Ela surgiu a partir de conflitos entre o João sem Terra, rei da Inglaterra, e
os barões e burgueses, que estavam muito insatisfeitos com as arbitrariedades
cometidas por esse governante. Dessa forma, a Magna Carta Libertatum, esse é
o seu nome completo, ou, ainda, a Magna Carta das Liberdades da Inglaterra,
foi fruto de um acordo entre o rei e aqueles que estavam insatisfeitos com ele.
Ou seja, ela foi um instrumento de limitação de poder de um governante.
Um detalhe importante, esquecido por muitos, é que foi Henrique III,
filho e sucessor de João sem Terra, quem deu definitividade à mesma quando
atingiu a maioridade em 1225.
Com base no acordo feito, o rei reconheceu certas liberdades dos homens
livres ingleses, assim como direitos da igreja. Em troca, ele ganhou a lealdade
de seus súditos e diminuiu as revoltas existentes.
Um dos aspectos mais importantes que se deve destacar é o fato de que,
pela primeira vez na Europa Medieval, um rei assinou um documento que
limitava o seu próprio poder.
O nome Magna Carta é tão importante que, como você já viu em suas aulas presenciais, ele é utilizado até hoje com sinônimo de Constituição.
CURIOSIDADE
Como você pôde perceber, a Magna Carta tem uma importância histórica
fundamental. No entanto, é preciso que fique claro que ela não tem natureza
de Constituição no sentido que utilizamos hoje. Entenda as razões:
Capítulo 2
45Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
1) Ela foi outorgada pelo Governante e não promulgada por um corpo
soberano, representante do povo, que é o verdadeiro detentor do poder.
2) Ela garantiu direitos dos homens livres, que eram uma minoria, e não
de todos os homens, que eram a maioria. Nesse sentido, ela manteve
certos privilégios que já existiam.
Apesar disso, como dissemos, a doutrina reafirmou a sua contribuição
para o desenvolvimento do constitucionalismo e para a evolução dos direitos
humanos fundamentais, na medida em que expressou a ideia de limitação de
poderes, trazendo inclusive garantias contra abusos de poder.
Em seu texto, encontramos o que hoje é considerado um dos fundamentos
de um Estado Democrático de Direito: o princípio do devido processo legal.
Essa ideia está presente em seu item 39:
Nenhum homem livre será detido ou aprisionado, ou privado de seus direitos ou bens, ou declarado fora da lei, ou exilado, ou despojado, de algum modo, de sua condição; nem procederemos com força contra ele, ou mandaremos outros fazê-lo, a não ser mediante o legítimo julgamento de seus iguais e de acordo com a lei do país.
Além dessa, destacamos as seguintes disposições da Magna Carta:
a) proporcionalidade da pena à gravidade da transgressão cometida;
b) o exercício do poder tributário deve ter o consentimento dos súditos;
c) foi garantido o Direito à Justiça;
d) reconheceu-se o direito de liberdade de ir e vir;
e) ela estendeu as limitações impostas aos reis e a todos os senhores
feudais, assim como aos clérigos;
f) ela vedou a tomada de certos bens contra a vontade de seu dono.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Magna Carta, acesse: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/magna.htm/>. Leia o item 39 e encontre o dispositivo correspondente em nossa Constituição Federal.
Capítulo 2
46 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
b) A Petition of Rights (1628)
A Petição de Direitos (Petition of Rights) foi um documento dirigido ao
rei da Inglaterra, em 7 de junho de 1628, pelo membros do parlamento no qual
eles pediam, por isso o nome petição, o reconhecimento de certas liberdades
e direitos para os súditos.
Na verdade, os membros do parlamento pediam a observância e o
cumprimento das disposições presentes na Magna Carta e em outras disposições
normativas vigentes então na Inglaterra.
A petição foi aceita pelo rei e, em troca, ele recebeu recursos
financeiros que dependiam de aprovação do parlamento, ou seja,
podemos dizer que a Petition of Rights foi marcada por um acordo entre
o rei e o parlamento.
Além disso, destaca-se ainda, nesse documento, a preocupação dos
membros do parlamento no sentido de não serem cobrados tributos e
empréstimos indevidos dos homens livres.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Petition of Rights, acesse: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/pet1628.htm>. Leia o 3º parágrafo e encontre o dispositivo correspondente em nossa Constituição Federal.
c) O Habeas Corpus Act (1679)
A origem do instituto do Habeas Corpus está, para muitos, associada
à Magna Carta de 1215, quando ele tinha um sentido mais amplo, e não
somente associado à liberdade de locomoção, e se aproximava da ideia do
devido processo legal.
Com a edição do Habeas Corpus Act, em 1679, o mesmo aproximou-se
da ideia atual, sendo o mais importante instrumento de defesa do direito de
liberdade de ir e vir.
Capítulo 2
47Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
O Habeas Corpus se constituiu em uma garantia fundamental contra uma
das maiores atrocidades praticadas contra os direitos humanos fundamentais
– a prisão arbitrária ou ilegal. A possibilidade de um magistrado conceder a
liberdade para alguém que foi preso com o compromisso deste de comparecer
para responder pela acusação perante o juízo ou tribunal competente foi
prevista em seu texto.
A importância desse instituto para o direito atual é tão grande que
ele existe com o mesmo nome em nosso ordenamento jurídico, além de
ter inspirado outros remédios constitucionais como o Habeas Data e o
Mandado de Segurança.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Habeas Corpus Act, acesse: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/hc1679.htm>.
d) O Bill of Rights (1689)
A Declaração de Direitos (Bill of Rights) inglesa, de 13 de fevereiro de
1689, é fruto do processo histórico conhecido como a Revolução Gloriosa.
Atente para a nomenclatura desse documento, que difere da chamada
Petição de Direitos de 1628. Esta, não obstante ter resultado em um acordo,
teve inicialmente o caráter de pedido, ou seja, os membros do Parlamento
estavam pedindo algo. A Declaração de Direitos de 1689, como o próprio
nome diz, não traz um pedido para alguém. Pelo contrário, ela chegou
a trazer imposições, como a abdicação do rei Jaime II e a designação de
novos monarcas. Trata-se, portanto, de um documento que trouxe inovações
políticas e jurídicas.
O texto firmou a supremacia do parlamento frente à vontade do rei,
pondo fim à Monarquia Absolutista. Assim sendo, ele foi fundamental para a
instituição da separação de poderes (funções estatais) e, consequentemente,
da nascente monarquia constitucional britânica, assim como contribuiu para o
desenvolvimento da ideia de soberania popular.
Capítulo 2
48 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Além dessa, destacamos as seguintes disposições do Bill of Rights:
a) formalizou um sistema de divisão de poderes;
b) declarou que o parlamento tinha a responsabilidade de proteger os
súditos em relação ao rei;
c) afirmou que o funcionamento do parlamento não podia ficar sujeito
à vontade do rei;
d) fortaleceu a instituição do júri.
O Bill of Rights foi tão importante que até hoje ele permanece vigente
como um dos documentos constitucionais do Reino Unido da Grã-Bretanha e
da Irlanda do Norte.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo do Bill of Rights, acesse: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/decbill.htm>. Leia o item 4 e compare com o art. 150, I, da nossa Constituição Federal.
Você deve ter percebido que as declarações inglesas sempre tiveram
como destinatário o rei. A grande marca delas é a luta pela liberdade contra
a arbitrariedade do governante, defendendo sempre a ideia de limitação de
poder. Nesse sentido, elas trazem grandes contribuições para a evolução dos
direitos humanos fundamentais. No entanto, elas possuem limitações.
Não avance no texto. Pare e pense. Você é capaz de dizer o que falta nessas declarações?
DESAFIO
Elas não possuíam a estabilidade que a doutrina hoje julga necessária
para proteger os direitos humanos fundamentais. Essa estabilidade nós
Capítulo 2
49Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
encontramos, por exemplo, no art. 5º da nossa Constituição Federal, que é
cláusula pétrea, não podendo ser retirada mesmo que a grande maioria do
parlamento deseje fazer isso.
Percebeu a diferença?
Na Inglaterra, entre os séculos XIII e XVII, os membros do parlamento
defendiam os direitos humanos fundamentais, por meio da defesa de
liberdades e da limitação de poderes do rei. Nessa situação, a grande pergunta
é: Quem defenderia esses direitos se o Parlamento quisesse se voltar contra
eles? A resposta é essa mesma que você está pensando.
Não existia, na Inglaterra de então, um mecanismo, ou um documento
estável, que pudesse promover uma autoproteção dos direitos humanos
fundamentais. Nos dias de hoje, quem cumpre esse papel no Brasil, por exemplo,
e na maioria dos países que têm um Estado Democrático de Direito, é a própria
Constituição Federal, que diz em seu art. 60, § 4º - “Não será objeto de deliberação
a proposta de emenda tendente a abolir: IV - os direitos e garantias individuais”.
Perceba que a Constituição, dando normatividade e estabilidade aos
direitos humanos fundamentais, protege-os de todos, do Poder Executivo, da
sociedade civil, das empresas, dos indivíduos, do Poder Judiciário e, inclusive,
do próprio parlamento e de seus membros.
Você encontrará essa estabilidade e a vinculação ao parlamento a partir
das declarações surgidas no último quarto do século XVIII - a Declaração de
Direitos do Bom Povo da Virgínia e a Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão - que analisaremos a partir de agora.
e) Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia (1776)
Redigida em 16 de junho de 1776 pelos representantes do povo da
Virgínia (uma das treze colônias inglesas na América no Norte), ela foi a
primeira das declarações de direitos em sentido moderno.
Como se pode constatar pelo ano, ela foi redigida antes mesmo da
independência das treze colônias, que viriam a ser tornar os Estados Unidos
da América do Norte (EUA). Só por esse motivo, por seu vanguardismo e
ineditismo, ela já teria uma importância fundamental para a história. Mas ela foi
Capítulo 2
50 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
além, trouxe vários direitos, garantias, novidades e contribuições importantes,
que inspiraram várias outras declarações, tendo uma influência enorme nas
declarações que se seguiram, em especial nas das outras ex-colônias inglesas.
Veja, ela antecedeu não só a referida independência, mas também a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789), que é inclusive mais famosa do que ela. Assim sendo, podemos dizer que a declaração francesa foi influenciada pela declaração da Virgínia.
A declaração da Virgínia teve um objetivo fundamental, que consistia
na instituição de um governo democrático e de um sistema de limitação de
poderes, baseados na ideia da existência de direitos naturais inatos a toda
pessoa humana (direitos humanos fundamentais), que devem ser respeitados,
e no princípio de que todo poder emana do povo. Observe que a declaração
incorporou o princípio da soberania popular. Além disso, ela apresentou o
princípio da igualdade, ausente nas declarações inglesas, fato que consistiu
em uma grande novidade tanto do ponto de vista jurídico como filosófico.
Observe o que diz o seu art. 1º:
Todos os homens nascem igualmente livres e independentes, têm direitos certos, essenciais e naturais dos quais não podem, pôr nenhum contrato, privar nem despojar sua posteridade: tais são o direito de gozar a vida e a liberdade com os meios de adquirir e possuir propriedades, de procurar obter a felicidade e a segurança.
Além dessa, destacamos as seguintes disposições da declaração da Virgínia:
a) possibilidade de o povo reformar, alterar ou abolir um governo
inadequado ou contrário aos princípios previstos na declaração;
b) eleições periódicas;
c) proibição da suspensão ou execução de leis sem o consentimento dos
representantes do povo;
d) garantia do direito de defesa nos processos criminais;
e) vedação de fianças ou multas excessivas e de castigos cruéis;
f) instituição de júri (julgamento pelos pares na forma da lei);
g) direito de não produzir provas contra si mesmo;
h) liberdade de imprensa assegurada;
i) livre exercício de religião;
Capítulo 2
51Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
j) previu a soberania do governo criado na Virgínia.
Além de ter influenciado as declarações que se seguiram, em especial
nas das outras ex-colônias inglesas, a declaração da Virgínia foi determinante
na incorporação dos direitos humanos fundamentais Constituição
Americana de 1787, por meio das dez primeiras emendas. Por outro lado,
ela foi determinante na incorporação dos direitos humanos fundamentais à
Constituição Americana de 1787, por meio das dez primeiras emendas.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia, acesse: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/dec1776.htm>. Leia o art. 2º e compare com o parágrafo único do art. 1º da nossa Constituição Federal.
f) Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão (1789)
Promulgada pela Assembleia Nacional Francesa, em 26 de agosto de
1789, ainda em meio ao processo histórico conhecido como a Revolução
Francesa, a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão é a mais
conhecida das declarações de direitos. Ela é considerada o principal marco do
Constitucionalismo clássico (ou liberal).
Até a adoção da Declaração Universal dos Direitos do Homem, pela ONU, em 1948, a declaração francesa foi, por mais de 150 anos, o modelo de declaração de direitos por excelência, aquele a ser seguido. Por isso, ela é considerada um documento importantíssimo até hoje, quando falamos em direitos humanos fundamentais.
Ela foi formulada com caráter universalista e abstrato, diferenciando-se
das declarações inglesas e americanas por dedicar-se mais aos direitos dos
homens de um modo geral do que aos direitos específicos de indivíduos de
determinadas comunidades. Ou seja, as declarações inglesas e americanas se
preocuparam mais com questões de ordem prática e concreta. A declaração
francesa, por sua vez, colocou-se no campo da universalização das ideias. Você
pode ver isso muito claramente à medida que ela coloca que a sua finalidade
última é proteger os direitos do Homem.
Capítulo 2
52 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Quanto ao nome, que faz referência aos direitos do homem e aos direitos
do cidadão, a doutrina ensina que isso explicita o objetivo dos franceses de se
dirigir a todos os homens e não somente aos franceses. Além disso, continua
a doutrina, resta a ideia de que os direitos do homem são liberdades e os
direitos do cidadão são poderes.
Você deve saber ainda que a declaração francesa foi a que melhor
consagrou o princípio da igualdade, diferenciando-se assim das declarações
inglesas e sendo mais explícita que a declaração da Virgínia.
Podemos fazer esta afirmação porque a declaração francesa diz, em seu
art. 1º, que os homens nascem e ficam iguais. Veja que o sentido, segundo o
verbo ficam (permanecem, continuam), tenta deixar ainda mais clara a ideia
de igualdade.
Além dessa, destacamos as seguintes disposições da Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão:
a) soberania nacional;
b) liberdade para fazer tudo que não prejudique o outro;
c) princípio da legalidade;
d) afirmou que a lei é expressão da vontade geral;
e) tornou acessível ao povo os cargos públicos;
f) liberdade de ir e vir;
g) legalidade processual penal (devido processo legal penal);
h) legalidade e anterioridade da lei penal;
i) presunção de inocência;
j) liberdade de opinião, sendo os excessos passíveis de punição;
k) direito de propriedade.
Perceba as grandes contribuições trazidas pela declaração francesa,
muitas ainda presentes hoje em nosso direito.
Capítulo 2
53Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Como você sabe, a Revolução Francesa teve como lema: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Você é capaz de dizer o que esse lema tem a ver com os direitos humanos fundamentais?
DESAFIO
Em relação à proteção dos direitos humanos fundamentais, a declaração
francesa deu uma contribuição fundamental nesse sentido, ao colocar nas
mãos do Estado (associação política) a conservação (proteção) desses direitos,
conforme a disposição de seu art. 2º:
II - O fim de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis ao homem.
Além disso, ela dispôs, em seu art. 16, que é condição essencial para a
existência de uma Constituição a separação de poderes (funções estatais) e a
garantia de direitos:
XVI - Qualquer sociedade na qual a garantia dos direitos não está em segurança, nem a separação dos poderes determinada, não tem constituição.
Podemos afirmar que as duas disposições acima transcritas sintetizam as
principais formulações relativas ao constitucionalismo clássico:
a) limitação de poderes;
b) separação de funções estatais (poderes); e
c) constitucionalização de direitos humanos fundamentais.
Com base em tudo que foi exposto, você pode perceber e reconhecer a
importância da declaração francesa para todos nós.
Capítulo 2
54 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, acesse: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/dec1789.htm>.
2.2.2 O caso Marbury x Madison (EUA, 1803)
Este julgamento, um dos mais célebres e importantes para o direito,
constituiu o hard case, o verdadeiro paradigma, no que diz respeito ao controle
difuso de constitucionalidade. É um caso estudado por muitos no mundo todo.
Mas não foi só isso. Ele também teve uma contribuição muito importante
para o reconhecimento dos direitos humanos fundamentais. Nesse caso, a
Suprema Corte dos EUA firmou o entendimento da supremacia da Constituição
Federal sobre todas as outras espécies normativas, mesmo que elas tenham
sido criadas pelos legítimos representantes do povo no parlamento federal.
Vejamos a tradução para o português feita por Dimitri Dimoulis e
Leonardo Martins (2009, p. 24):
Constituem enfaticamente tarefa e dever do Poder Judiciário dizer o que é o direito. Aqueles que aplicam a norma aos casos concretos devem necessariamente expor e interpretar a norma [...]. Se uma lei contraria a Constituição, e tanto a lei como a Constituição forem aplicáveis ao caso concreto, então a corte deve decidir o caso conforme a lei, desconsiderando a Constituição, ou conforme a Constituição, desconsiderando a lei [...]. Se as cortes devem respeitar a Constituição e a Constituição é superior a qualquer ato originário do Legislativo, é a Constituição e não o ato ordinário que deve regular o caso no qual ambos se aplicam.
Observe que, com essa decisão, os juízes da Suprema Corte dos EUA
garantiram não só a supremacia da Constituição, mas também dos direitos humanos
fundamentais presentes em seu texto. Dessa forma, foi criado um mecanismo de
proteção dos direitos humanos fundamentais contra qualquer norma, elaborada
por qualquer órgão, que atente ou disponha contra tais direitos.
É importante que se leia a conclusão feita pelos mesmos Dimoulis e
Martins (2009, p. 24-25), sobre esse assunto:
Capítulo 2
55Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Isso constitui um importantíssimo passo na construção do constitucionalismo e da própria dogmática dos direitos fundamentais. Declarando-se competente para fiscalizar o respeito aos direitos fundamentais com o poder de afastar leis votadas pela maioria dos representantes do povo, o judiciário deixou claro que o legislador ordinário não tem poder de definir (e restringir) conforme sua decisão os direitos fundamentais. Pode e deve ser fiscalizado pelo judiciário, sendo suas decisões invalidadas em prol da proteção de indivíduos ou minorias.
Perceba que, a partir desse julgamento, os direitos humanos fundamentais
passaram a ser protegidos não só pela estabilidade e pela normatividade
garantida pela Constituição, mas também pelo mecanismo criado para a sua
proteção e, consequentemente, a proteção dos direitos nela previstos.
2.2.3 Constituição Mexicana (1917)
A grande importância da Constituição Mexicana, promulgada em 5 de
fevereiro de 1917, reside no fato de que ela foi a primeira a trazer em seu
texto uma grande lista de direitos sociais. Ela atribuiu a qualidade de direitos
fundamentais aos direitos trabalhistas.
Analisando o seu conteúdo, vemos que já no primeiro capítulo da mesma,
podemos encontrar direitos sociais semelhantes aos que encontramos nos art.
6º e 7º de nossa Constituição, por exemplo.
Isso foi uma grande novidade para a época, pois, na Europa Ocidental,
a ideia de que os direitos humanos devem ter um caráter social, com a
constitucionalização de direitos sociais, econômicos e culturais, só ganhou
força após a Primeira Guerra Mundial.
Na sequência da promulgação da Constituição Mexicana, surgiram a
Declaração dos Direitos do Povo trabalhador, em 1918, na nascente União
Soviética, e a Constituição de Weimar, na Alemanha, em 1919. Ambas foram
fortemente influenciadas pelo texto mexicano.
Além disso, a Constituição Mexicana de 1917 também antecedeu a criação
e a atuação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 1919. Vários
dos temas tratados na Conferência de Washington, quando foi criada a OIT,
já estavam previstos na mesma, tais como: limitação da jornada de trabalho,
proteção à maternidade e idade mínima para o trabalho nas indústrias.
Capítulo 2
56 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Como você pode perceber, pelo conteúdo disposto nela, a Constituição
Mexicana lançou bases importantes para a construção do chamado Estado
Social de Direito, na medida em que foi a primeira a se preocupar com o
trabalho e com os trabalhadores. Essa ideia está completamente interligada
com o princípio da dignidade da pessoa humana, conteúdo basilar dos
direitos humanos fundamentais.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Constituição Mexicana de 1917, acesse: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/mexico/const1917.htm>.
2.2.4 Declaração dos Direitos do Povo trabalhador e explorado (1917)
Além das declarações até aqui estudadas, é preciso que você conheça
também a Declaração dos Direitos do Povo trabalhador e explorado. Fruto do
processo histórico conhecido como a Revolução Russa, ela foi promulgada em
3 de janeiro de 1918.
Sua importância destaca-se, pois ela foi a mais importante declaração
de direitos construída em uma linha completamente diferente da concepção
liberal, que norteou as declarações americana e francesa.
Em seu conteúdo, você poderá identificar três disposições que destoam
do movimento percorrido pelas declarações de direitos ocidentais até então,
assim como das que se sucederam ao longo do século XX.
São estas as disposições:
1) Declara abolida a propriedade privada e a possibilidade de exploração
do trabalho assalariado.
2) Estabelece um tratamento diferenciado dos titulares de direitos de
acordo com a classe social.
3) Estabelece um dever fundamental: trabalho obrigatório para todos.
Perceba as grandes diferenças existentes.
Capítulo 2
57Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Veja que nas linhas a, b, c, a seguir, nós colocamos as diferenças existentes,
comparando a declaração russa e as declarações ocidentais.
a) Enquanto as declarações clássicas (ou liberais) consagram o direito da
propriedade, a declaração russa (ou soviética, para alguns) veda esse
direito, abolindo a propriedade privada.
b) Nas declarações clássicas, identificamos autonomia da vontade, que
decorre do princípio da liberdade, para que se estabeleçam contratos.
Na declaração russa, um indivíduo não tem a liberdade de aceitar ser
explorado, pois isso é proibido.
c) O princípio da igualdade, no seu aspecto formal, fora consagrado nas
declarações americana e francesa, ao passo que a declaração russa
não tentou estabelecer essa igualdade formal. Pelo contrário, a classe
da burguesia, que fora protagonista das outras declarações, teve seus
direitos restringidos.
Essa disposição, que não aceita a igualdade formal, merece uma reflexão. Pare e pense sobre o seguinte. No processo da Revolução Francesa, por exemplo, assim como na independência dos Estados Unidos, todas as pessoas tinham direitos iguais? Ou esses foram movimentos utilizados pela burguesia para implementar suas vontades e seus direitos? Nesse sentido, será que há problema com a Declaração Russa, quando ela admite que não existe igualdade material? Reflita.
REFLEXÃO
Além disso, a Declaração Russa inovou ao criar, diferentemente das
declarações ocidentais, um dever fundamental: todos devem trabalhar. Já
se falava, na época, em direitos fundamentais. Mas a ideia de um dever foi
original e inovadora.
Capítulo 2
58 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
INTERAGINDOINTERAGINDO
Discuta com os seus colegas no ambiente virtual de aprendizagem se essa não é uma boa ideia para uma sociedade que pretenda ser justa e democrática: a instituição de trabalho obrigatório para todos.
Todas as novidades trazidas pela Declaração dos Direitos do Povo
trabalhador e explorado foram incorporadas pela Constituição Soviética de 10
de junho de 1918, ganhando, portanto, força normativa.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Declaração dos Direitos do Povo trabalhador e explorado, acesse: <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/his1918.htm>. Faça uma comparação entre o seu conteúdo e o conteúdo das declarações ocidentais.
2.2.5 Constituição de Weimar (1919)
Promulgada na Alemanha, em 11 de agosto de 1919, ela foi a primeira
constituição da república alemã. Elaborada no contexto histórico do fim da
primeira guerra mundial, ela foi a primeira constituição europeia a reconhecer
os direitos sociais como direitos fundamentais.
Como ela foi decorrente de um pacto social entre a burguesia e as demais
forças sociais e políticas da sociedade alemã, ela trouxe, em seu texto, vários
direitos que contemplavam ambos os lados. Nesse sentido, a Constituição de
Weimar dispunha tanto sobre liberdades clássicas como sobre direitos sociais.
A longa lista de direitos fundamentais era organizada em cinco títulos:
a) indivíduo;
b) ordem social;
c) religião e sociedades religiosas;
d) educação e formação escolar; e
e) ordem econômica.
Capítulo 2
59Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Observe, portanto, a diversidade de direitos previstos.
Com relação aos direitos sociais, a doutrina alemã chama a atenção
para o fato de que esses direitos careciam de efetividade, sendo, às
vezes, considerados apenas valores a serem seguidos.
Não obstante essa observação da doutrina, é fundamental destacar a
importância da Constituição de Weimar pelo papel inovador, quando previu
direitos sociais em seu texto, que ele desempenhou na Europa ocidental.
2.3 Aplicando a teoria na prática
Uma pergunta importante que todos os que estudam a evolução histórica
dos direitos humanos devem fazer é: Qual a importância desse estudo para
compreender o direito atual?
Longe de tentar dar uma resposta absoluta, podemos dizer que o melhor
seria demonstrar a importância desse estudo. Mas por quê?
Porque várias das regras e princípios presentes nesses documentos
históricos, cartas, petições ou declarações, estão presentes no ordenamento
jurídico de vários países ocidentais. Nesse grupo, incluímos o Brasil.
Diante disso, propomos que você leia cada um dos documentos aqui
estudados e compare com a nossa Constituição Federal. Primeiro, compare com
o art. 5º e depois com os demais artigos, entre o 1º e o 17°. Faça isso porque
são nesses artigos que você encontrará as maiores relações. Ao final, monte
um quadro comparativo, com duas colunas e várias linhas, colocando em uma
coluna o documento histórico analisado e na outra coluna os dispositivos da nossa
Constituição. Repita esse exercício com cada um dos documentos aqui estudados.
Vamos à resposta?
Não temos condições de apresentar aqui um quadro comparativo entre a
Constituição Federal e todos os documentos estudados. Resolvemos trabalhar
com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789). Ao final da
leitura, você poderá perceber o tamanho da influência e a contribuição desse
documento para a elaboração da nossa Constituição. Você verá que alguns
Capítulo 2
60 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
dispositivos foram praticamente copiados. Destacamos que isso não é falta
de capacidade de nosso constituinte originário, mas, sim, a confirmação de
que, quando tratamos de direitos humanos, existe um universalismo de ideias,
conforme vimos no capítulo anterior.
QUADRO COMPARATIVO
DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM
E DO CIDADÃO
A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA
DO BRASIL DE 1988
Art. 1º Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem se fundamentar na utilidade comum.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos:
Art. 2º A finalidade de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem. Esses direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos:
Art. 3º O princípio de toda a soberania reside, essencialmente, na nação. Nenhum corpo, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane expressamente.
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
Art. 4º A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo: assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei.
Art. 5º, II - Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
Art. 5º, IV - É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
Art. 5º, VI - É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias.
Art. 5º A lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade. Tudo que não é vedado pela lei não pode ser obstado e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não ordene.
Art. 5º, II - Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
Capítulo 2
61Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Art. 6º A lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou através de mandatários, para a sua formação. Ela deve ser a mesma para todos, seja para proteger, seja para punir. Todos os cidadãos são iguais a seus olhos e igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem outra distinção que não seja a das suas virtudes e dos seus talentos.
Art. 14º A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
Art. 15º É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: [...]
Art. 7º Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei e de acordo com as formas por esta prescritas. Os que solicitam, expedem, executam ou mandam executar ordens arbitrárias devem ser punidos; mas qualquer cidadão convocado ou detido em virtude da lei deve obedecer imediatamente, caso contrário torna-se culpado de resistência.
Art. 5º, LXI - Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
Art. 5º, LIV - Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.
Art. 8º A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias e ninguém pode ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada.
Art. 5º, XXXIX - Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.
Art. 9º Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei.
Art. 5º, LVII - Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
Art. 10º Ninguém pode ser molestado por suas opiniões , incluindo opiniões religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei.
Art. 5º, IV - É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
Art. 5º, VI - É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
Art. 5º, IX - É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
Art. 5º, XVI - Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente.
Capítulo 2
62 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Art. 11º A livre comunicação das ideias e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do homem; todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos previstos na lei.
Art. 5º, IV - É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
Art. 5º, V - É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
Art. 5º, VI - É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias.
Art. 15º A sociedade tem o direito de pedir contas a todo agente público pela sua administração.
Art. 5º, LXXIII - Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.
Art. 16º A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição.
4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
Art. 5º, XXXVI - A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
Art. 5º, XLI - A lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
Art. 2º - São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Art. 17º Como a propriedade é um direito inviolável e sagrado, ninguém dela pode ser privado, a não ser quando a necessidade pública legalmente comprovada o exigir e sob condição de justa e prévia indenização.
Art. 5º, XXII - É garantido o direito de propriedade;
Art. 5º, XXIV - A lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição.
Quadro 1 - Quadro comparativo entre a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão e a Constituição da República Federativa do Brasil Fonte: Disponível em: <http://www.dhnet.org.br> e <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 20 out. 2010, com adaptações.
Capítulo 2
63Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
2.4 Para saber mais
Filme: Robin Hood
Direção: Ridley Scott Ano: 2010
Este filme ambienta-se na Inglaterra medieval, entre o final do século XII e início do século XIII. Esta obra não se preocupa em mostrar as aventuras do mítico príncipe dos ladrões, mas, sim, como e em que contexto surgiu esse personagem. É justamente aí que reside o lado interessante do filme. Ele retrata os conflitos existentes entre os barões ingleses e o rei da Inglaterra, fazendo menções diretas ao documento conhecido como Magna Carta, o primeiro dos documentos históricos que você estudou aqui neste capítulo.
Título: A afi rmação histórica dos direitos humanos
Autor: Fábio Konder Comparato Editora: Saraiva Ano: 2010
Nesse livro, Fábio Konder faz uma apresentação detalhada das sucessivas etapas da evolução histórica dos direitos humanos, analisando vários documentos históricos relativos à matéria. Texto indispensável para o aprofundamento dos conhecimentos sobre a história dos direitos humanos.
Título: A Era dos Direitos
Autor: Norberto Bobbio Editora: Campos Ano: 1992
Esse é o livro em que o jurisfilosófo italiano apresenta ao mundo a teoria das gerações dos direitos fundamentais, elaborada por Karel Vasak. Além disso, ele faz uma importante análise sobre a evolução histórica dos direitos humanos.
2.5 Relembrando
A seguir, dispomos os principais tópicos sobre o que você aprendeu
neste capítulo:
• Magna Carta (1215): previu a obediência, por parte do rei, de um
corpo escrito de normas. Também dispunha sobre a necessidade de
um julgamento justo para o aprisionamento de alguém.
• Petition of Rights (1628): tinha como objetivo principal o cumprimento
da Magna Carta em troca de apoio do parlamento.
Capítulo 2
64 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• Habeas Corpus Act (1679): disciplinou um dos mais importantes
instrumentos de defesa de direitos, protegendo o direito de liberdade
de locomoção dos indivíduos.
• Bill of Rights (1689): determinou a supremacia do parlamento em relação
à vontade do rei, instituindo um regime de separação de poderes.
• Declarações inglesas: não obstante a grande contribuição dada, elas
possuíam limitações no que tange à proteção dos direitos humanos
fundamentais. Elas não tinham instrumentos que garantissem estabilidade
para a autoproteção desses direitos, porque careciam de força normativa.
• Declaração dos Direitos do Estado da Virgínia (1776): cumpriu um
papel fundamental na história ao tratar de direitos fundamentais hoje
utilizados em todo o mundo. Dispôs diretamente sobre a igualdade
entre os homens, além de tratar sobre o devido processo legal e sobre
a ideia de que todo o poder emana do povo.
• Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789): consagrou
expressamente os direitos à liberdade, propriedade, segurança,
resistência à opressão. Além disso, destacam-se, no texto, os princípios
da liberdade, da igualdade de todos perante a lei, da soberania
popular e da dignidade da pessoa humana.
• Caso Marbury X Madison: além do Hard Case do controle difuso da
constitucionalidade, também teve uma considerável importância na
afirmação dos direitos humanos fundamentais, porque fortaleceu a
Constituição frente a outras normas e poderes e, consequentemente,
fortaleceu os direitos nela previstos.
• Declaração dos Direitos do povo trabalhador e explorado (1917): teve
uma linha de pensamento bem diferente das declarações de direitos
ocidentais. Destaca-se a ideia de um dever fundamental: o trabalho
obrigatório para todos.
• Constituição Mexicana de 1917: foi a primeira a trazer em seu corpo a
positivação dos direitos sociais, obrigando, assim, o Estado a atuar no
sentido de sua prestação.
Capítulo 2
65Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• Constituição Alemã de 1919 (Constituição de Weimar): foi a primeira
na Europa Ocidental a trazer a positivação dos direitos sociais. Isso
foi reflexo das preocupações com as grandes desigualdades sociais
constatadas especialmente a partir da Primeira Guerra Mundial.
2.6 Testando os seus conhecimentos
1) Fazendo uma comparação entre a Declaração Universal dos Direitos do
Homem (1949) e sua antecessora, a Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão, de origem francesa (1789), pode-se constatar que as duas reconhecem:
a) O Estado como fonte dos direitos fundamentais.
b) A liberdade e a igualdade inerentes ao ser humano.
c) A existência dos direitos individuais e sociais.
d) A propriedade, individual ou coletiva.
e) O controle de constitucionalidade.
2) No que diz respeito aos documentos ingleses relativos à proteção de direitos
e limitação do poder do rei, assinale a alternativa que indica a correta ordem
cronológica dos referidos documentos.
I. Magna Carta
II. Habeas Corpus
III. Bill of Rights
IV. Petition of Rights
a) I, IV, III e II d) III, II, IV e I
b) I, IV, II e III e) I, II, III e IV
c) I, II, IV e III
3) Qual foi a primeira Constituição a positivar em seu texto os direitos sociais:
a) A Constituição Francesa de 1946.
b) A Constituição Mexicana de 1917.
c) A Constituição de Weimar (alemã) de 1919.
d) A Constituição Soviética de 1918.
e) A Constituição Brasileira de 1988.
Capítulo 2
66 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
4) Indique a disposição que se destaca, dentre as previstas na Declaração da
Virgínia em 1976, por se tratar de inovação em relação às declarações inglesas:
a) Limitação do poder do Estado.
b) Liberdade de locomoção dos indivíduos.
c) Igualdade dos homens.
d) Ideia de julgamento justo.
e) Controle de constitucionalidade.
5) Caracteriza a limitação das declarações inglesas no que diz respeito à
estabilidade necessária para a proteção dos direitos humanos:
a) Ausência de Constituição e força normativa.
b) Falta de legitimidade do parlamento.
c) Igualdade somente para homens livres.
d) Impossibilidade do rei em assumir acordos.
e) Divisão de poderes.
6) Estabeleça três pontos em comum presentes na Declaração da Virgínia (1976)
e na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de origem francesa (1789).
7) Descreva o cenário político, social e econômico que permitiu os avanços
existentes da Constituição de Weimar (Alemanha, 1919).
Onde encontrar
BOBBIO, N. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campos, 1992.
BONAVIDES, P. Curso de direito constitucional. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
COMPARATO, F. K. A afirmação histórica dos direitos humanos. 10. ed. São
Paulo: Saraiva, 2010.
CUNHA JUNIOR, D. da. Curso de direito constitucional. Salvador: JusPodivm,
2010.
DIMOULIS, D.; MARTINS, L. Teoria geral dos direitos fundamentais. 2. ed. São
Paulo: RT, 2009.
Capítulo 2
67Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
FERREIRA FILHO, M. G. Direitos humanos fundamentais. 2. ed. rev. e atual.
São Paulo: Saraiva, 1998.
MORAIS, A. de. Direitos humanos fundamentais. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2006.
NOVELINO, M. Direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Método, 2010.
PENTEADO FILHO, N. S. Manual de direitos humanos. 2. ed. São Paulo:
Método, 2010.
ROBIN Hood. Direção: Ridley Scott. [S. l.]: Universal Pictures, 2010. 1 DVD
(148 min.).
TRINDADE, A. A. C. T. Tratado de direito internacional dos direitos humanos.
Porto Alegre: Fabris, 2003. v. 3.
Capítulo 3
69Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
PROTEÇÃO INTERNACIONAL E NACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS
CAPÍTULO 33
3.1 Contextualizando
Neste capítulo, você poderá compreender, a partir do fenômeno da
universalização, como se dá a relação entre o direito internacional dos direitos
humanos, ou seja, a fusão entre o direito constitucional, direito internacional
e os direitos humanos fundamentais. Necessário por demasia entender este
tópico, pois não adiantará falar sobre direitos de resistência sem sabermos que
estes possuem proteção global, universal, e, assim sendo, internacional.
Neste prisma, é imperioso destacar que há uma dupla proteção quando
falamos em direitos fundamentais. Como assim? Dupla proteção? Esse direito,
inerente a cada ser humano, possui proteção interna, ou seja, em nosso
ordenamento jurídico, e, ainda, tutela (proteção) no direito alienígena, isto é,
outros que não sejam o nosso ordenamento. Assim sendo, o estudo desta matéria
deve obrigatoriamente compreender a existência da relação extremamente
imbricada entre o direito constitucional e o direito internacional; devendo,
assim, ser chamada de Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Como vimos logo no capítulo I deste livro, os direitos são humanos e
fundamentais. Portanto, eles são ínsitos à pessoa humana, ou seja, todos os
seres humanos, desde a fecundação, já são considerados sujeitos de direitos.
Direitos estes naturais, públicos e subjetivos. Também podemos chamar os
direitos humanos fundamentais de direitos de resistência, pois estes obrigam
o Estado a respeitar dogmas mundiais, que versem sobre este tipo de direito,
não podendo o Estado – seja ele qual for –, soterrar o direito fundamental. Mais
do que isto, vimos que os direitos de resistência são dotados de politicidade e
historicidade, por terem se afirmado ao longo de gerações e dimensões, em
função da árdua consolidação e efetivação destes direitos.
Capítulo 3
70 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Como é direito humano, ele é inerente aos seres humanos, ou seja, não
só pertencente aos cidadãos brasileiros, pois não somos a única pátria que
tutela esses direitos, mas, sim, eles são parte de um grande bloco de nações
soberanas que os protegem. Portanto, eles devem ser entendidos de modo
universal, como também estudamos no capítulo I desta disciplina.
Ao final deste capítulo, você deve ser capaz de:
• correlacionar direito constitucional, direito internacional e
direitos humanos;
• responder sobre a proteção de direitos humanos na ordem universal;
• compreender que o direito constitucional protege os direitos humanos
por meio do direito internacional dos direitos humanos;
• ter em mente que os direitos humanos fundamentais recebem
proteção tanto em nosso ordenamento jurídico, quanto nos demais
sistemas jurídicos de outros Estados soberanos.
3.2 Conhecendo a teoria
Os direitos humanos gozam de uma dupla proteção por terem um caráter
não relativo e, sim, global, internacional, ou seja, universal.
Daí necessário ser o estudo do fenômeno da internacionalização, bem
como a universalização da disciplina que ora estudamos. Como vimos nos dois
capítulos anteriores, ao longo da história dos povos, esses princípios foram se
consolidando de uma forma mais rápida, ou mais lenta, porém efetiva, em
cada nação soberana, ou Estado Constitucional de Direito.
Não se deve pensar em direito humano isoladamente, mas, sim, em
direitos fundamentais, os quais precisam ser efetivados na prática, a partir da
consolidação de cada um destes, frente a todo o planeta terra.
Cada nação, que se diz Estado Democrático, necessariamente precisa ter
uma Constituição que crie o Estado, ou seja, constitua este Estado, consolide
a administração Estatal. Esta deve impedir arbítrios que advenham do próprio
Estado Soberano, devendo, após e no mesmo sentido e finalidade, garantir os
direitos de resistência aos seres humanos.
Capítulo 3
71Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
No primeiro capítulo deste livro, estudamos a devida conceituação do
termo que devemos utilizar, assim sendo, optamos, como visto, pela expressão
direitos humanos fundamentais. Lembra-se?
LEMBRETELEMBRETE
Direitos Humanos + Direitos Fundamentais + Direitos do Homem e do Cidadão = Direitos Humanos Fundamentais.
Como também visto, os direitos humanos seriam o gênero, enquanto
os direitos fundamentais seriam a espécie individual inserida na legislação
infraconstitucional, bem como positivados na própria Carta Magna. Nós
dispensamos o termo Direitos do Homem e do Cidadão por dois motivos:
Atecnia, pois, a rigor, a expressão esquece das mulheres e, em um segundo
momento, porque este termo é naturalista. Ele garante ao homem e ao
cidadão direitos humanos desde o seu nascimento, ou seja, falando, nada mais
do que o óbvio. Portanto, ele deve ser rechaçado pelo profissional do Direito
por estar em desuso, bem como ser atécnico.
Poderíamos destacar inúmeras outras expressões que versam sobre
direitos humanos fundamentais. Todavia, como relembramos no capítulo
I, Ferreira Filho (2010) optou por esta nomenclatura e a doutrina em peso
acatou-a, pois, além de pôr fim a uma discussão inicialmente boba, é,
também, atual e amplamente aceita por todos os que se dedicam ao estudo
da matéria em tela.
Não podemos deixar de mencionar a expressão direitos de resistência
quando nos referimos à matéria aqui discutida.
Os direitos de resistência nascem justamente no sentido de dar ao
indivíduo humano, como visto no capítulo 1, direito de resistir ao arbítrio do
poder estatal: O Estado, e, quando falamos de Estado, não estamos a falar do
Rio Grande do Norte, Sul, São Paulo ou Amazonas etc., mas, sim,do Estado
Federal, da República Federativa do Brasil.
Capítulo 3
72 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Assim sendo, quando nos depararmos com o termo Estado, reportemo-nos ao Estado Federativo e não aos entes federados. Mais ainda, quando falarmos deste Estado, ao qual nos referimos, precisaremos necessariamente relembrar do mesmo tido como moderno, e não do absolutista do modelo hobbesiano. Isto mesmo, você deve lembrar agora das aulas de filosofia, sobretudo, quando estudou o grande pensador Thomas Hobbes, no clássico, o Leviatã.
SAIBA QUE
Está-se a falar em democracia-constitucional, que possui limite
geográfico, bem como povo (e população), além de poder político, que
organiza a administração pública, como assim é no Brasil, China, Canadá,
México, Islândia etc.
Estado = território, povo e poder político.
Neste desiderato, os direitos humanos fundamentais podem
perfeitamente ser intitulados como sendo direitos de resistência, quando
atribuem aos seus titulares (pessoa humana) o direito de resistir às tentações
do poder arbitrário deste Estado a que estamos nos referindo. É que deste
monstro Leviatã – o Estado – espera-se de tudo, menos o não uso do abuso do
poder (DIMOULIS; MARTINS, 2010).
Este ente não pode invadir a residência do indivíduo humano como bem
queira ou pretenda e na hora e momento que pleiteie, pois, ao fazê-lo, dá
ao titular o direito de resistir, pois a Constituição lista no inciso XI, do art. 5º,
título II, dos direitos e garantias fundamentais, que: a casa é asilo inviolável do
indivíduo, ninguém nela pode penetrar sem consentimento do morador, salvo
em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante
o dia, por determinação legal.
Temos, assim, direito fundamental em espécie, o qual pode ser chamado
de direito de resistência (negativo), o qual obriga o Estado a não penetrar na
casa do sujeito titular de direito fundamental sem o consentimento deste, a
não ser em casos estritamente enumerados, como descrito.
Capítulo 3
73Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Após breve explanação introdutória, precisamos nos ater ao que se
entende por internacionalização dos direitos humanos e a importância desta
matéria frente às Ciências Jurídicas e Sociais Aplicadas.
Em que pese a discussão também enfrentada no capítulo I, vimos que
o estudo entre historicidade e politicidade dão a real e necessária base
para a devida compreensão do tema. Outrora, podemos alegar que alguns
doutrinadores viram na Grécia antiga e, até mesmo, na mitologia grega, lapsos
de direitos humanos fundamentais.
Após o término do nazismo e das trevas ocasionadas por Adolf Hitler,
o direito internacional público ganhou ares antes não imaginados. Os povos
começaram a se comunicar e, avante o próprio tempo, começaram a trocar
informações e experiências, que viriam – pelo menos em tese – a ajudar a
consolidar nações antes renegadas.
Com este crescimento, os direitos de resistência ou direitos humanos
fundamentais chancelam um fenômeno jurídico e mundial, qual seja: a
internacionalização ou universalização do estudo desta dogmática jurídica
em específico.
Neste diapasão, não se pode mais admitir que uma nação soberana
consolide e dê efetividade aos direitos humanos enquanto outra nação
não legitime esta efetivação, posto que os direitos humanos não possuem
fronteiras, nem região, nação, sexo, cor, etnia etc.
Os direitos fundamentais existem onde existirem seres humanos e, se
assim o é, devem ser vistos, inicialmente, sob o prisma da proteção universal.
O universo possui humanos, então, os direitos humanos devem estar onde
cidadãos estiverem. Há humanos no Congo? Sim. Então, deverá haver direitos
humanos fundamentais para os indivíduos que no Congo habitem. Assim,
também deve ocorrer no Cambodja, no Zaire, em Borneo, em toda Europa,
Ásia, Américas e demais localidades.
O direito à vida, igualdade, liberdade, dentre todos os demais direitos
quase absolutos e indisponíveis, tais quais os direitos fundamentais, devem
ser protegidos universalmente, a partir de um prisma lógico e coerente,
onde todas as nações criaram a tendência universalista frente aos direitos
da pessoa humana.
Capítulo 3
74 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Ressaltemos, sempre, do ponto de vista histórico, os doutrinadores
que entendem que estes direitos nasceram há pouco tempo e lembram que
quaisquer direitos advindos da dignidade da pessoa humana, sobrevieram
após o movimento nazifascista. Esta prática histórica e espúria ocorreu na
Alemanha de Hitler e na Itália de Mussolini há pouco mais de 60 anos. No
Brasil, alguns historiadores narram que Getulio Vargas tinha ideais facistas,
mas, mesmo assim, os direitos fundamentais estão devidamente positivados
em nossa carta constitucional.
E, ainda, este fenômeno de proteção dá-se em razão da universalização,
ocorrendo aqui, bem como nos demais países e nações soberanas, que
almejam, verdadeiramente, serem tidos como democráticos. Não podemos
esquecer que o alcance da Democracia, vivida na essência de sua plenitude,
trará obrigatoriamente o respeito aos direitos humanos fundamentais, e,
portanto, a finalidade do estudo do próprio Direito será conquistada, isto é: o
alcance da paz social entre os povos.
Cada nação, em função de motivos culturais e de seus valores, os quais
podem ser morais, políticos, ideológicos, religiosos e históricos, possuem
determinado conjunto de normas e regras a ser seguido pela sociedade
interna, o que se pode chamar de ordenamento jurídico de cada país.
Portanto, nosso Direito não é o mesmo Direito da Argentina, dos EUA,
da Inglaterra, França, Estônia, Polônia, Croácia, Japão, nem de nenhum país
africano. Cada povo possui o seu próprio ordenamento jurídico de acordo com
os seus costumes, valores e cultura, ou seja, o peculiar e particular conjunto de
normas dotadas de coercitividade legal, que, também, pode ser intitulado de
sistema ou ordenamento jurídico.
DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS HUMANOS – DIREITO INTERNACIONAL.
3.2.1 Conceito e espécie de textos universais sobre direitos
humanos
Sabedores disso, nós precisamos entender que todos necessitam proteger
os direitos humanos fundamentais, apesar de cada nação possuir seu próprio
Capítulo 3
75Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
conjunto de normas sociais e jurídicas, que visem ao aprimoramento do
ideal de justiça e alcance de paz. Para tanto, nascem vários textos universais
sobre direitos humanos, os quais são chamados de acordos, tratados, pactos,
protocolos, resoluções, estatutos e concordatas universais.
Em cada um destes textos normativos, há a intensa participação
de países que compõem a ONU – Organização das Nações Unidas, para
a devida confecção e publicação de cada palavra inserida no respectivo
texto universal.
Isto não mais é senão a bênção do Estado, ou seja, do povo de cada
Estado, que tenha participado da elaboração do texto, que virou Pacto ou
Protocolo, por exemplo, afirmando que este texto universal será respeitado
em seu país e nação de origem.
DEFINIÇÃODEFINIÇÃO
Textos universais são os pactos, acordos, protocolos, tratados, estatutos e as concordatas.
Em assim sendo, o termo Acordo, como leciona Penteado Filho (2010),
é usado, geralmente, para caracterizar negociações bilaterais de natureza
política, econômica, comercial, cultural, científica e técnica.
Os Acordos universais deverão ser pactuados e assinados por países e
nações soberanas, como se realmente contrato fossem, ou entre nações
soberanas e organizações mundiais. Por exemplo: o Brasil confeccionou acordo
com a Organização Mundial de Saúde (OMS) em prol do combate à gripe
H1N1, popularmente conhecida como gripe suína.
Já o Tratado possui texto de natureza política, podendo ser bilateral
ou multilateral, devendo as nações dar relevância a este ato. Quanto às
Convenções, estas devem ser utilizadas para valorar ao máximo os atos
entre duas nações (apenas), ou seja, são atos universais bilaterais. As nações
devem possuir interesse geral no texto que se aprovará e que advém de
conferências internacionais.
Capítulo 3
76 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Ainda, quanto aos conceitos destes textos globais, temos os protocolos,
resoluções, estatutos e a concordata.
Os Protocolos designam acordos que não são dotados de formalidade,
como são os tratados, por exemplo. Mesmo assim, após uma conferência
mundial ou internacional, eles poderão servir como sendo a sua ata final.
As Resoluções, por sua vez, são apenas deliberações de âmbito interno ou
externo – alienígena.
Os Estatutos – como o de Roma – são leis que advêm dos princípios que
são formadores da base da estrutura de uma nação soberana, das associações
ou do povo e da população (sociedade).
Por derradeiro, encontramos o termo frente a texto universal intitulado
Concordata, que não é a concordata comercial ou empresarial, popularmente
conhecida no Brasil, mas, sim, a exata expressão que verse sobre textos universais,
que tenham como signatário, por um lado, obrigatoriamente, a Santa Sé.
3.2.2 A Universalização dos direitos humanos fundamentais
Antes de falarmos, porém, da dupla proteção dos direitos fundamentais
ínsitos à pessoa humana, será derradeiramente necessário textualizarmos os
pontos teóricos a serem aqui discutidos.
Do ponto de vista histórico, como vimos nos dois capítulos anteriores,
primeiro nasce a ideia de criação de uma teoria geral frente aos direitos
humanos fundamentais, hoje estudada, discutida e debatida por todos os mais
variados estudiosos e profissionais do Direito.
Logo após, vimos que a matéria carece da compreensão histórica do
tema para o elucidativo entendimento da temática. Então, neste sentido, no
capítulo 2 deste livro texto, nós vimos quais os textos históricos que versam
sobre direitos de resistência. Já, adentrando neste capítulo, vemos que cada
direito fundamental em espécie nasceu e se precedeu de um texto universal
como o Bill of Rights, o Habeas Corpus Act, a Declaração Universal de Direitos
Humanos e demais textos históricos.
Pois bem. Este estudo não só nasce como se perpetua nos ordenamentos
jurídicos dos povos, pois, como vimos, eles precisam de efetivação. Ou seja,
Capítulo 3
77Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
além de estarem escritos no ordenamento jurídico de cada Estado Democrático,
carecem ser efetivados no dia a dia e no cotidiano das pessoas.
Para o exato entendimento que queremos alcançar, você precisa saber
que isto é um fenômeno jurídico, chamado universalização dos direitos
humanos fundamentais. Tal universalização se dá a partir da história dos
povos, do sofrimento em inenarráveis embates políticos (daí esta disciplina ser
dotada de historicidade, bem como de politicidade), os quais precederam a
efetivação e a afirmação histórica dos direitos fundamentais.
O Brasil, por exemplo, logo no art. 4º, VIII, da CRFB/88, repudia o
racismo - discriminação simplesmente inaceitável em razão da cor da
pele, e aloca este direito no texto constitucional não por razões óbvias
tão somente, porém e também, pelo critério universalista de proteção aos
direitos humanos fundamentais.
É válido enaltecer a você, estudante, que, em 1926, foi assinado em
Genebra, a Convenção Universal sobre a Escravatura. Veja só: A história
(mais uma vez presente) prova que foi necessária a confecção de um
texto universal, in casu, desta Convenção, a qual propunha a abolição e a
erradicação da escravatura, bem como do tráfico de escravos em razão da
cor da pele do ser humano.
Não é demais lembrar que houve escravos no Brasil. Leiam: escravos,
escravas, crianças e idosos escravos, maltratados e humilhados.
Os escravos padeciam das piores desgraças do mundo apenas por terem
nascido com a pele escura, diferente do que a sociedade e os seus valores
regiam e/ou pleiteavam.
Neste sentido, nunca é demais relembrar que as pessoas eram postas em
verdadeiros campos de concentração (senzalas), tinham o direito humano e
fundamental de ir e vir expurgado, não podiam gozar do direito de expressão,
nem de opinião, não usufruíam de direitos políticos, pois não podiam votar e,
muito menos, serem votados.
No Brasil, assim como no resto do mundo, os sujeitos a um senhor não
possuíam acesso à escola, portanto, à educação, saúde, moradia, previdência,
boa alimentação, dignidade, liberdade, igualdade etc.
Capítulo 3
78 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Os donos de escravos estupravam suas escravas, e esposas negras dos
escravos eram obrigadas à luxúria de seus senhorios, e nada, absolutamente
nada no que tange a direitos humanos para esta população era respeitado,
em razão, unicamente, do racismo e da ordem escravocrata à época posta. Um
escárnio sem fim nem precedentes.
O francês Alexy de Tocqueville escreveu Democracia na América e,
fabulado com a democracia vivenciada nos idos do século XIX, nos Estados
Unidos da América, vislumbrou - na arte das Ciências Políticas – mesmo em
estado de graça com a democracia doméstica ianque, dois desastres ainda
vivos naquela nação: a tirania da maioria e a existência de escravos em pleno
ano de 1848.
Em assim sendo, depois deste passado tenebroso, nota-se claramente a
importância do texto constitucional vigente, sobretudo pelo que dispõe o art.
4º e incisos da Constituição Federal de 1988, quando esta ordena que:
Art. 4º. A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
[...] II - prevalência dos direitos humanos;
[...] VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo; [...]
(BRASIL, 2000, grifo nosso).
Averigua-se, então, que, neste país, por ordem Constitucional, e, em
função da força normativa da Constituição (HESSE, 1991) e, ainda, pelo
princípio da Supremacia Constitucional, há o repúdio ao racismo e qualquer
prática racista, por injúria racial ou aversão às pessoas em razão da cor da pele.
Ainda neste desiderato, podemos averiguar a comunhão entre
a Constituição Federal e o Direito Internacional, focada nas Relações
Internacionais, que regem a República brasileira, logo quando, no caput do
art. 4º, bem como no inciso primeiro deste artigo, aduz expressamente acerca
da prevalência dos direitos humanos.
Esses direitos, portanto, nascem e se autoproclamam logo no início
do texto constitucional, não podendo o direito internacional esquecer esta
Capítulo 3
79Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
disciplina (direito constitucional), pois uma está diametralmente ligada à
outra disciplina das Ciências Jurídicas.
Nasce, assim, o direito internacional dos direitos humanos, ou seja, a
dupla proteção universal em prol dos direitos negativos (de resistência), pois,
neste país, os direitos humanos prevalecem, por ordem da Carta Política,
devendo nossas Relações Internacionais ser regidas por estes mandamentos
supremos de nosso ordenamento jurídico.
Mais que isso, como vimos no capítulo 1 deste livro texto, os direitos
humanos fundamentais, por força do parágrafo 1º, do art. 5, da CRFB/88,
proclama que os direitos e as garantias fundamentais têm aplicação imediata,
não dependendo de norma infraconstitucional para serem efetivados.
Neste contexto, podemos averiguar a preocupação do poder constituinte
originário, no sentido de fazer valer, neste Estado, a ordem universal de
proteção e efetivação dos direitos humanos fundamentais.
Neste sentido, ainda temos que nos ater aos mandamentos dos demais
parágrafos que compõem o artigo 5º, da CF/88. São eles:
§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão (BRASIL, 2000).
Isto quer dizer que, além da ordem jurídica vigente, em razão do nosso
sistema jurisdicional e protecionista em prol dos direitos fundamentais, a
própria Carta Magna elege o art. 5º, do título II, da CRFB/88, como sendo
cláusula pétrea, ou seja, como visto no capítulo 1 deste livro-texto, cláusula
da eternidade.
Capítulo 3
80 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
LEMBRETELEMBRETE
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
[...] 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
[...] IV - os direitos e garantias individuais.
Vamos, então, partir do estudo até agora feito para conseguirmos
concretizar o estudo de nossa teoria frente à práxis de nosso dia a dia.
3.2.3 Conceito de direitos humanos na perspectiva universal
Os direitos humanos são direitos públicos e subjetivos. Por quê? São
públicos, posto que são de todos, ou seja, do coletivo, e subjetivos, pois
possibilitam aos titulares desses direitos obrigar o Estado a respeitá-los à
medida que este possui órgãos de administração pública, que estão vinculados
à tutela de direitos de resistência.
Parte da doutrina entende que os direitos humanos fundamentais,
inseridos no artigo 5º, da CF/88, são todos direitos individuais fundamentais
e em espécie. Já os direitos humanos são todos os direitos ínsitos aos seres
humanos, que não estão, como já vimos neste livro-texto, necessariamente na
norma constitucional ou na ordem jurídica infraconstitucional, mas, sim, em
todos os sistemas jurídicos internacionais e em textos universais.
Isto se diz, porque os direitos humanos, a partir da averiguação dos
horrores do holocausto, foram universalizados, sendo estes, então, direitos de
ordem global e universal, ou seja, de todos os humanos.
Desde a 2º Guerra Mundial e a queda do 3º Reich, além do advento da
ONU em 1949, todas as nações de Direito aderiram universalmente aos textos
que falam sobre direitos humanos.
Esta prevalência de direitos humanos, então, passou a ser considerada
tendência nas nações constitucionalistas do pós-guerra com o propósito, repetimos
e enaltecemos, de efetivar - o que se estuda na teoria - e implementar na prática dos
cidadãos mundo afora tudo que diz respeito aos direitos inerentes aos cidadãos.
Capítulo 3
81Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Para fazermos um estudo ainda mais técnico, precisamos falar um pouco de
poder constituinte, o qual pode ser originário ou derivado. O poder constituinte
originário, que formula, cria, confecciona e constitui um Estado por intermédio
de uma Constituição escrita e rígida, com um núcleo super rígido (cláusulas
pétreas), como a nossa, deve ser solene e formal necessariamente, tendo em
vista a necessária convocação de uma Assembleia Constituinte para tanto.
Após a promulgação do texto confeccionado nesta assembleia,
nasce a Constituição e tudo que nela está escrito foi posto pelo poder
constituinte originário.
A contrario sensu, ou seja, o que se escreve após a consolidação do texto
devidamente promulgado, a fim de alterar a Constituição, sobrevém tão
somente do poder constituinte derivado.
Quando o poder constituinte originário promulgou a Constituição
Federal de 1988, à Carta Cidadã restaram previstas três formas de alteração ao
texto Constitucional, a saber: Alteração do texto por Revisão Constitucional,
Emenda e por Mutação Constitucional, esta não prevista no texto.
Quanto à Revisão Constitucional, prevista no Art. 3º, da ADCT (Atos
das Disposições Transitórias Constitucionais), aduziu-se que: A revisão
constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação
da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso
Nacional, em sessão unicameral. O constituinte asseverou que poderia ser
feita uma única vez, após 5 anos da promulgação.
E assim foi feito, quando, em 1993, houve a primeira e última revisão
Constitucional. Então, não se pode fazer outra Revisão Constitucional? Não.
Por quê? Porque o próprio Poder Constituinte Originário já havia asseverado que só
poderia haver uma única revisão e esta deveria ser feita após 5 anos da promulgação.
Restou, então, a Mutação Constitucional, bem como as Emendas à Constituição.
Quanto à mutação constitucional, a qual brota da hermenêutica
constitucional, nada mais é do que uma modalidade de modificação do que
se extrai da leitura constitucional sem alteração de uma vírgula do texto
constitucional. Modifica-se a Constituição sem mexer no texto constitucional.
Cabe ao intérprete constitucional, ou seja, aos profissionais do Direito, interpretar
a Lei Fundamental do Brasil sem alterar o que lá está (e já foi) escrito.
Capítulo 3
82 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Por fim, existe outra forma prevista pela nossa Constituição,
que possibilita a alteração do texto constitucional. Ela vem sendo
sistematicamente utilizada em terra tupiniquim, muitas vezes, de forma
errada. São as Emendas Constitucionais.
Saiba que a Constituição dos Estados Unidos da América data de 1787. Ou seja, ela existe há mais de 220 anos e possui apenas 27 emendas. A nossa, que é a Carta Cidadã promulgada em 1988, possui apenas 22 anos de existência e 66 emendas, até a confecção deste livro-texto.
SAIBA QUE
Muito menos tempo de vigência e existência e quase o triplo do número
de emendas. Às vezes, e estas não são poucas, o texto constituinte originário
perde a sua essência apenas por anseios políticos e econômicos, quase
nunca jurídicos, tendo em vista que estas emendas constitucionais caberiam
perfeitamente nas normas infraconstitucionais.
Ainda, e por fim, cada vez que se emenda a Constituição, quem o faz é
o poder constituinte derivado.
3.2.4 As alterações constitucionais e as cláusulas pétreas
Por expresso mandamento constitucional, existe, como vimos, as formas
de alteração da constituição. Para tanto, é necessário observar o que pode ser
modificado em nossa Constituição, pois, como você já sabe, existem direitos
postos na Carta Política, tais quais os direitos humanos fundamentais, que não
poderão ser alterados no sentido de serem abolidos.
Assim sendo, nascem as cláusulas pétreas, as quais são direitos imutáveis.
Elas são devidamente protegidas pela Constituição Federal de 1988.
Vamos saber qual artigo, parágrafo e incisos têm a função de nos dizer
como se faz a alteração constitucional, e onde o legislador não pode mexer na
nossa Carta Cidadã?
Capítulo 3
83Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
O art. 60, da CRFB/88, ordena que:
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; II - do Presidente da República; III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. § 1º - A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio. § 2º - A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros. § 3º - A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem. § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais. § 5º - A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa (BRASIL, 2000).
Continuamos nossos estudos sobre os direitos humanos fundamentais,
especialmente sobre a relação de direito constitucional, direitos humanos
e direito internacional, ou seja, direito internacional dos direitos humanos.
Vemos que os textos universais tratando de direitos humanos, que não estejam
escritos e positivados no Brasil, devem adentrar em nosso ordenamento
jurídico por meio de Emenda Constitucional.
Os próprios § 3º e 4º, do art. 5º, da CF/88, foram inseridos na Lei
Fundamental por meio de Emenda Constitucional (EC 45/2004).
LEMBRETELEMBRETE
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.
Capítulo 3
84 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Neste prospecto, é necessário saber que o texto universal poderá adentrar
no ordenamento jurídico brasileiro com força de lei ordinária ou com status de
Emenda Constitucional.
Moraes (2006) aduz que esses instrumentos internacionais entram em
nosso ordenamento jurídico como normas infraconstitucionais, exceto nas
hipóteses do § 3º, do art. 5º, da CF/88 (2005, pag. 617).
Em sentido oposto, Piovesan (2009) assevera que quaisquer tratados de direitos
humanos ingressam no direito pátrio como se normas constitucionais fossem.
Como existe o princípio da máxima efetividade das normas constitucionais,
acaso textos universais que versem direitos humanos fundamentais adentrem
no sistema jurídico brasileiro, estes possuiriam força de norma constitucional.
Ou seja, apesar de terem nascido fora do Brasil, eles adentram em nosso
ordenamento como se textos constitucionais fossem, e não como leis
infraconstitucionais como referiu Moraes (2006).
Nasce uma divergência doutrinária entre os dois autores. Isto se dá, porque o
artigo 49, I, da CF/88, aduz que o Congresso Nacional poderá receber o Tratado, ou
a Convenção Internacional, como lei ordinária, enquanto o art. 5º, § 3º, da Carta
Política, alega que ele deverá ser recebido como mandamento constitucional.
Nós entendemos que Piovesan (2009) tem razão neste embate e
divergência doutrinária e acadêmica. Isto porque o §1º, do art. 5º, da CRFB/88,
é cristalino ao asseverar que as normas definidoras de direitos humanos têm
aplicação e efetivação imediata e, sendo assim, adentram com o status de
norma constitucional e não de lei federal.
Em nossa opinião, esta discussão acadêmica sobre a aceitação do tratado
com força ordinária ou constitucional está completamente defasada desde a
emenda 45/2004, por causa da inserção do § 3º, do art. 5º, da Constituição
Federal. O que há em debate, ainda, após este parágrafo, dá-se quando o
texto universal entra em conflito com a lei ordinária já existente em nosso
ordenamento jurídico e, ainda, quando as duas normas - tratado sobre direitos
humanos e leis ordinárias - entram em conflito.
Assim sendo, cabe(rá) ao Supremo Tribunal Federal, no caso concreto,
analisar a inconstitucionalidade de um ou de outro texto normativo.
Capítulo 3
85Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Acaso esta discussão verse sobre a recepção de tratado internacional,
que fale de direitos humanos em prol de norma constitucional, deverá este - o
qual não é constituição, nem faz parte (ainda) do ordenamento jurídico - ter
declarada a sua inconstitucionalidade.
Por derradeiro, Penteado Filho (2010, p. 38), alega que: “Destarte, tais
pactos universais, uma vez ratificados, produzem efeitos direitos, imediatos
e são exigíveis integralmente e de imediato ao Judiciário e demais poderes”.
Sendo assim, precisamos entender que a emenda 45/2004 acrescentou,
além dos § 3º e 4º, do art. 5º, da CF, o inciso V-A ao art. 109, que dá legitimidade
e competência à Justiça Federal para processar e julgar crimes contra os
direitos humanos, tirando da alçada da justiça comum esta competência, que
prevalecia no Brasil antes de 2004. Senão, vejamos:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
V-A - As causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo.
§ 5º Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal.
Tanto o inciso V-A, quanto o § 5º, do art. 109, da CF/88, foram trazidos pela
emenda 45/2004. Apesar de inicialmente trazer uma ideia de justiça federal,
por se tratar de norma constitucional, esta padece de efetividade na prática,
como relembra Penteado Filho (2010) ao mostrar o precedente do Superior
Tribunal de Justiça referente ao famoso caso da missionária Dorothy Stang:
Processo da 3ª Seção, IDC-1-PA, de relatoria do ministro Arnaldo Esteves Lima,
julgado em 08.06.2005. O relator negou pedido, portanto, indeferiu o pleito
de incidente de deslocamento feito pelo Procurador Geral da República, nos
termos do §5º, do art. 109, da CF/88, para que o processo contra os supostos
assassinos da missionária deixasse de ser de competência da justiça estadual
do Pará e, por grave violação de direitos humanos, fosse encaminhado a uma
das varas da Justiça Federal.
Capítulo 3
86 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
O ministro do Superior Tribunal de Justiça, Arnaldo Esteves Lima,
indeferiu o incidente de deslocamento, pois a justiça estadual do Pará já tinha
sido provocada para averiguar todos os indícios frente aos criminosos, e, ainda,
em respeito ao princípio do juiz natural – o qual torna prevento o juiz criminal
que fora o primeiro a ter contato com o processo, além da autonomia dos
Estados-membros. Este incidente de deslocamento de competência, que só o
chefe máximo do Ministério Público Federal pode fazer e somente ao Superior
Tribunal de Justiça, desde 2004 foi rotulado como Federalização das Causas
sobre Direitos Humanos, como bem lembra ilustre Penteado Filho (2010).
O mesmo doutrinador enaltece o que Saulo Ramos (2007), no excelente
O Código da Vida, alertou quanto aos crimes contra o meio ambiente, que
ocorrem em razão da inacreditável destruição provocada em função do
lucro, isto é, do egoísmo capitalista-liberal-normativista, tal qual ocorre na
Amazônia, sob a mais absurda e covarde não intervenção Estatal.
Somente no ano de 2010 uma área equivalente ao Estado de São Paulo foi
desmatada na Floresta Amazônica. Este crime de lesa humanidade ainda resta
impune, tendo em vista que o Estado brasileiro simplesmente não consegue se
aparelhar, por meio de equipamentos tecnológicos de ponta e de servidores
públicos treinados e capacitados, para enfrentar a destruição de nossa Floresta.
Todos os dias há desmatamento na selva amazônica e o Estado, com
passos muito lentos, não consegue, verdadeiramente, erradicar esta grave
violação dos direitos humanos fundamentais.
Ramos (2007), neste sentido, alertou que o descaso com a matança de
nossa floresta fez com que o Estado brasileiro fosse indiretamente responsável
pelo assassinato da freira americana. Isto porque a função da missionária era
justamente dar a real noção à sociedade local sobre a extrema importância do
meio ambiente por meio, especialmente, da floresta Amazônica, em relação à
saúde de todos os povos.
Como o Estado não protege a floresta, aqueles que lutam contra os assassinos
do meio ambiente estão, no mesmo sentido, expostos aos horrores que estes
facínoras podem, ao tempo que quiserem – frente à inércia no combate a este tipo de
crime – cometer contra aqueles que apenas tentam – manualmente – conscientizar
no sentido de lecionar que destruir florestas, desmatando-as literalmente, é negar
a efetividade do direito fundamental ao meio ambiente saudável.
Capítulo 3
87Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Em conclusão, o § 4º, do art. 5º, da Constituição Federal, expõe que: O
Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação
tenha manifestado adesão.
Sim, prezado(a) aluno(a), o Brasil se submete à jurisdição do Tribunal
Penal Internacional, o qual tem sede em Haia, na Holanda, desde o advento da
Emenda Constitucional nº 45, de 2004. Ou seja, caso o Estado brasileiro viole
frontalmente direitos humanos fundamentais, ele deverá ser denunciado e
sofrer sanção penal internacional.
O TPI – Tribunal Penal Internacional, funciona como jurisdição
universal. O Estatuto de Roma, do qual o Brasil é signatário, rege o TPI.
Os crimes são: crimes contra a humanidade, crimes de agressão e também
de genocídio. Hoje, o TPI está superlotado e com julgamentos atrasados.
A maioria versa sobre as atrocidades cometidas perante a Iugoslávia, hoje
extinta e separada pelas nações da Eslovênia, Croácia, Macedônia, Bósnia-
Herzegovina, Sérvia, Montenegro e, ainda, prestes a dar independência,
soberania e autonomia ao território do Kosovo, pela guerra civil e desastres
contra os povos daquela região, em detrimento de verdadeiros genocídios
e crimes contra a humanidade.
Neste sentido, duas são as considerações importantes a serem feitas: a) os
crimes sob processamento do Tribunal Penal Internacional são imprescritíveis
e b) o Brasil, que, por força constitucional, não é obrigado a entregar um
de seus nacionais, poderá entregar um brasileiro, sem afronta ao preceito
constitucional inserido no art. 5º, LI, da carta de 1988, também conhecida
como cláusula da não extradição.
Você tem que saber que não se pode confundir a extradição com a simples
entrega de determinado cidadão à jurisdição do Tribunal Penal Internacional.
Quando o país, em tese, entregar o cidadão brasileiro, nato ou
naturalizado, não o estará extraditando, mas, sim, entregando, pois se
entende por extradição o duelo entre duas nações soberanas. Este não é o
caso, posto que, neste sentido, o país estaria entregando um dos seus cidadãos
à jurisdição universal do TPI e não a outro Estado. O TPI garantirá o devido
processo legal, a ampla defesa, o contraditório e todos os demais direitos
humanos fundamentais públicos e subjetivos, materiais ou processuais ao ser
humano, que, em tese, cometeu crimes que ofendem o Estatuto de Roma. Ou
Capítulo 3
88 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
seja, pressupõe-se que este cidadão praticou abstratamente crime contra a
humanidade, foi responsável por genocídio (como no caso do ex-presidente
da Iugoslávia, Slobodan Milosevic) ou, ainda, por crimes de agressão.
Em nenhum destes casos se enquadra, por exemplo, o ex-presidente do
Iraque, Saddam Hussein, tendo em vista que os crimes supostamente praticados
ocorreram antes da vigência do Estatuto de Roma.
Derradeiramente, nem os indivíduos que possuem qualquer espécie de
imunidade, em razão da pessoa ou do cargo, como diplomatas, chanceleres,
oficiais, cônsules, deixarão de responder aos crimes de lesa humanidade
apostos no Estatuto de Roma, pois o art. 27 do aludido Estatuto prevê que
nenhuma imunidade está imune à jurisdição universal do TPI.
3.3 Aplicando a teoria na prática
Neste país, por força literal do texto constitucional, ninguém poderá
ser preso por dívida, ou seja, não poderá haver prisão civil, exceto por: i)
devedores voluntários de pensão alimentícia e ii) depositário infiel. Assim reza
a Constituição Federal, no art. 5º, LXVII, senão, vejamos: não haverá prisão
civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e
inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel.
Assim sendo, o texto constitucional deixa claro apenas estas duas
hipóteses quanto ao momento prisional por dívida! Isto é, ou o indivíduo é
devedor de pensão alimentícia, portanto, possui condições financeiras de arcar
com os alimentos da pessoa pela qual ele é responsável ou, simplesmente,
desapareceu com bem – material – que a Justiça Brasileira disse para ele
resguardar, tornando-se, depositário infiel.
Pois bem. Ocorre que o Brasil é signatário do pacto de San José da Costa
Rica, o qual, no § 7º, do art. 7º, proíbe a prisão civil por dívida, a não ser em uma
única hipótese, qual seja: o devedor voluntário de pensão alimentícia, ou seja,
aquele que pode pagar alimentos e não os paga por mero dissabor pessoal.
Assim sendo, há claro confronto entre a Constituição, a qual prevê prisão,
tanto para o devedor voluntário de pensão alimentícia, quanto para o que for
considerado como depositário infiel, em detrimento do Pacto de San José da
Capítulo 3
89Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Costa Rica, o qual prevê a prisão civil apenas para os devedores voluntários
de alimentos. O que deve prevalecer, neste caso? A Constituição Federal e seu
texto normativo? Ou o pacto universal, do qual o Brasil é signatário?
Procure refletir primeiro sozinho, tomando como base o exposto na seção
“Conhecendo a teoria”, pois, a seguir, começaremos a analisar estas questões.
Nos Recursos Extraordinários, em processos contra clientes, os bancos
Itaú e Bradesco questionavam decisões que entenderam que o contrato de
alienação fiduciária em garantia é insuscetível de ser equiparado ao contrato
de depósito de bem alheio (depositário infiel) para efeito de prisão civil.
O mesmo tema estava em discussão no HC 87585, em que Alberto de
Ribamar Costa questiona acórdão do STJ. Ele sustenta que, se for mantida a
decisão que decretou a sua prisão, “estará respondendo pela dívida através
de sua liberdade, o que não pode ser aceito no moderno Estado Democrático
de Direito, não havendo razoabilidade e utilidade da pena de prisão para os
fins do processo”.
Ele fundamentou seu pleito na impossibilidade de decretação da prisão
de depositário infiel, à luz da redação trazida pela Emenda Constitucional 45,
de 31 de dezembro de 2004. Esta Emenda tornou os tratados e convenções
internacionais sobre direitos humanos equivalentes à norma constitucional, a
qual tem aplicação imediata, referindo-se ao pacto de São José da Costa Rica,
do qual o Brasil é signatário.
Vejamos a decisão dos ministros do STF sobre esta tormenta (Texto 1):
TEXTO 1
Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, resolveu arquivar o Recurso Extraordinário (RE) 349703 e, ainda, por unanimidade, negou provimento ao RE 466343, os quais discutiam a prisão civil – ou seja, prisão em razão de dívidas - de determinado alienante fiduciário infiel.
O Plenário estendeu a proibição de prisão civil por dívida, prevista no artigo 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal (CF), à hipótese de infidelidade no depósito de bens e, pela simetria e, analogicamente também, à alienação fiduciária – que são aqueles empréstimos que fazem parte do cotidiano do brasileiro, que parcela em várias vezes a aquisição de automóveis.
Capítulo 3
90 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Assim, a jurisprudência da Corte foi aprimorada no sentido de que alegar que prisão civil por dívida é aplicável apenas ao responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia. O Tribunal entendeu que a segunda parte do dispositivo constitucional, que versa sobre o assunto, é de aplicação facultativa no que se refere ao devedor – excetuado o inadimplente com alimentos – e, também, ainda carente de lei que defina rito processual e prazos. Neste sentido, o ministro Celso de Mello disse que o Pacto de São José da Costa Rica sobre Direitos Humanos, ratificado por nossa república em 1992, proíbe, art. 7º, parágrafo 7º, prisão civil por dívida, excetuado o devedor voluntário de pensão alimentícia.
Também, em razão da Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, realizada em Viena (Áustria) em 1993, com participação ativa da delegação brasileira, preconizou o fim da prisão civil por dívida. Ficou bem marcada a interdependência entre democracia e o respeito dos direitos dos seres humanos, tendência que se vem consolidando no globo.
O STF, por meio do decano Celso de Mello, invocou o disposto no artigo 4º, inciso II, da Constituição, que preconiza a prevalência dos direitos humanos como princípio nas suas relações internacionais, para defender a tese de que os tratados e as convenções internacionais sobre direitos humanos, mesmo os firmados antes do advento da Constituição de 1988, devem ter o mesmo status dos dispositivos inscritos na Constituição Federal (CF). No entanto, tais tratados e convenções não podem contrariar o disposto na Constituição, somente complementá-la.
A Carta Política dispõe, no parágrafo 2º do artigo 5º, que os direitos e garantias nela expressos “não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.
Fonte: Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=100258>. Acesso em: 10 out. 2010, com adaptações.
Assim sendo, como você percebeu, concluímos no sentido de afirmar que
os direitos humanos fundamentais, além de universais e internacionalizados,
são aplicados efetivamente em nosso cotidiano sistematicamente e mais, até
mesmo por nossa Suprema Corte.
3.4 Para saber mais
Título: Tudo que é Sólido Desmancha no Ar
Autor: Marshall Berman Editora: Cia das Letras Ano: 2010
Esta obra é uma das mais geniais de todos os tempos. Trata-se de um relato histórico e literário, o qual versa sobre a investigação do espírito da sociedade e da cultura dos séculos XIX e XX.
Capítulo 3
91Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Título: Direitos Humanos e o Direito Constitucional
internacional
Autora: Flávia Piovesan Editora: Saraiva Ano: 2009
Trata-se de obra técnica, específica para os profissionais do Direito. Todavia, ela aborda o tema, como nenhuma outra publicação no país, de forma didática, mas não aquém do denso conteúdo informativo e jurídico, sendo referência para o mais completo entendimento da matéria versada neste capítulo.
Filme: Guerra ao Terror
Direção: Kathryn Bigelow Ano: 2009
Neste filme, vê-se o quão triste é o dia a dia dos militares na guerra do Iraque. Em razão da política de proteção ianque acerca do Terrorismo, o que se observa, em verdade, é a busca por riquezas outras. Esta política não está preocupada em combater o terror simplesmente, mas, sim, combater pessoas que enfrentam uma guerra contra fanáticos religiosos – o que, por si só, já fere o direito à tolerância, paz, cultura, aos valores morais, religiosos e éticos.
Neste filme, você percebe claramente o quão dispostos estão os militares ianques em cessar a guerra, e o quão predispostos estão todos os guerrilheiros do islã em não abolir a guerra imposta pelo imperialismo.
Filme: Ameaça Terrorista
Direção: Gregor Jordan Ano: 2010
Você tem a chance de aprender, ao assistir a este filme, o valor dos direitos humanos fundamentais, sobretudo observando o que acontece nos porões da ditadura norte-americana, por razão do medo. Lá (no porão) vale tudo por supostas verdade, inclusive, torturar, sem momento para começar, muito menos para terminar.
3.5 Relembrando
Você deve lembrar agora dos principais pontos revelados em todo o
capítulo. São eles:
• os direitos humanos fundamentais possuem dupla proteção frente
a eles mesmos ou seja, tanto no direito interno brasileiro como no
ordenamento externo ou alienígena;
• os direitos humanos fundamentais podem ser intitulados como direitos
de resistência (negativos), os quais possibilitam que os detentores
destes direitos obriguem o Estado a fazer ou deixar de fazer;
Capítulo 3
92 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• há uma relação mais do que siamesa entre o direito constitucional, os
direitos humanos e os direitos internacionais;
• os textos universais, que tratem sobre direitos humanos, podem
entrar no ordenamento jurídico brasileiro como lei ordinária, art. 49,
I, CF/88, ou com o status de norma constitucional, como ordena o § 3º,
do art. 5º, da Carta Magna, em que pese a divergência doutrinária, a
qual nos filiamos à opinião de Piovesan (2009);
• os textos universais podem ser: tratados, pactos, acordos, concordatas,
resoluções e convenções;
• há, no Brasil, três formas de alteração do texto legal. A revisão
constitucional – que não pode mais ocorrer, pois já foi feita em 1993,
e não pode mais tornar a acontecer por mandamento do poder
constituinte originário. As emendas constitucionais, que podem
alterar o texto normativo após as exigências contidas no art. 60 da
Constituição Federal. A mutação constitucional, que interpreta o
texto maior, sem alterá-lo, e, após analisado pelo intérprete, obriga-o
a aplicar a norma constitucional de forma maximizada;
• a historicidade também está presente no estudo deste capitulo, pois,
por intermédio desta, podemos observar que o Brasil dá prevalência
aos direitos humanos. Além disso, ele repudia a prática espúria e
injustificada do racismo, mesmo tendo havido ordem escravocrata em
terra brasilis. Depois do advento da Convenção de Genebra contra a
Escravatura, este documento universal ganhou adesão dos Estados,
que optaram pela democracia-constitucional;
• o Brasil se submete à jurisdição universal do Tribunal Penal Internacional,
com sede na cidade de Haia, Holanda, por força do texto constitucional,
alterado pelo poder constituinte derivado, com o advento da EC 45/2004.
Esta acrescentou o § 4º, do art. 5º, da CF/88, além de dar competência
à Justiça Federal para processar e julgar graves violações de direitos
humanos, através da federalização de causas sobre direitos humanos
fundamentais, por intermédio do inciso V-A, do art. 109 da CF/88, além
do §5º, do mesmo artigo constitucional.
Capítulo 3
93Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• O mesmo artigo constitucional não confere aos possuidores de
qualquer imunidade benesses quanto a esta condição em razão da
pessoa ou cargo para não se submeter à jurisdição do TPI. Isto porque
o art. 27 deste Estatuto veda qualquer possibilidade de prescrição de
crimes de lesa humanidade, ou não entrega do indivíduo que tenha
atentado contra o mesmo diploma universal.
3.6 Testando os seus conhecimentos
1) Qual a relação entre direito constitucional, direitos humanos e direitos
internacionais?
2) O Brasil pode entregar brasileiro ao TPI, sem ofender a cláusula de não
extradição, direito fundamental, inserido no art. 5º, LI, da carta de 1988?
3) O que se entende por dupla proteção dos direitos humanos fundamentais?
4) O que houve em prol dos direitos humanos no ano de 1926?
5) Sobre o que versam os parágrafos inseridos no art. 5º, da Lei Fundamental?
6) Discorra sobre o Tribunal Penal Internacional.
Onde encontrar
ÁVILA, H. Teoria dos princípios, da definição à aplicação dos princípios
jurídicos. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de
outubro de 1988. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2000.
DIMOULIS, D.; MARTINS, L. Teoria geral dos direitos fundamentais. 2. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
FERREIRA FILHO, M. G. Aspectos do direito constitucional contemporâneo -
2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
Capítulo 3
94 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
MORAES, A. de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários
aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e
jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2006. (Temas jurídicos, 3).
PENTEADO FILHO, N. S. Direitos humanos. Ed. rev., atual. e ampl. Rio de
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010.
PIOVESAN, F. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 9.
ed., rev., ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.
RAMOS, S. O código da Vida. São Paulo: Planeta, 2007.
SILVA, V. A. da S. Direitos fundamentais, conteúdo essencial, restrições e
eficácia. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
Capítulo 4
95Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA
CAPÍTULO 44
4.1 Contextualizando
Neste capítulo, vamos juntos compreender os direitos humanos
fundamentais em espécie, e não iremos mais tratar sobre uma teoria geral dos
direitos fundamentais, pois isso já foi feito nos capítulos passados.
Assim sendo, você terá que relembrar que os direitos humanos
fundamentais se afirmaram ao longo dos anos, e se perpetuam com o passar
do dia em nosso cotidiano.
Neste sentido, lembre-se que todos estes, derradeiramente, se fizeram
presentes em Constituições democráticas, a partir dos horrores constatados
no pós-guerra nazifascista e com a criação da ONU em 1949. Desde então, a
prevalência do conteúdo da dignidade da pessoa humana tornou-se postulado
universal frente ao estudo dos direitos humanos fundamentais, e, após a
averiguação nos capítulos passados sobre uma teoria geral, iremos, de agora
em diante, estudar os direitos em espécie, atinentes a esta disciplina.
No intuito de favorecer ainda mais a exata compreensão, iremos
colacionar o pensamento dos doutrinadores mais festejados sobre a matéria,
bem como trazer um esquema de julgados importantes, inclusive do Supremo
Tribunal Federal, que verse sobre esta temática, para que você perceba as
consequências da disciplina e os aspectos jurídicos, que brotam em razão de
cada direito humano fundamental em espécie em nossas vidas e que, por
vezes, deve ser garantido por intermédio do Poder Judiciário.
No final do capítulo, você deverá estar apto a:
Capítulo 4
96 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• conhecer os direitos e garantias fundamentais inseridos em nossa
Carta Magna;
• diagnosticar cada um dos problemas referentes aos mesmos;
• analisar pormenorizadamente cada aspecto jurídico a ser lido aqui,
pois, como já dissemos algumas vezes, estes direitos são estudados a
partir de uma teoria geral, para serem, imediatamente, implantados
efetivamente em nosso cotidiano, práxis e dia a dia.
4.2 Conhecendo a teoria
Caro(a) aluno(a), já estudamos e dissemos várias vezes nos capítulos
anteriores que os direitos que agora analisamos foram conquistados após
muito derramamento de sangue, embates políticos, ditaduras, genocídios,
crimes contra a ordem dos povos humanos etc. Lembra?
Neste sentido, valoramos o estudo a partir do prisma da constatação dos
direitos humanos fundamentais, por meio de uma teoria geral, e agora vamos
estudar a parte especial, ou seja, o direito humano em espécie, assim como se
faz no estudo de direito civil e penal, por exemplo, pois primeiro se estuda a
parte geral das disciplinas e depois a parte especial correspondente a cada uma.
Neste capítulo, precisamos enfrentar a parte especial, ou seja, a parte
em que se fala individualmente dos direitos humanos, os quais não só se
afirmaram ao longo dos anos, mas também brotaram veementemente de
forma positivada nas Constituições de nações democráticas, no pós-guerra,
pela figura da dignidade da pessoa humana.
Esta fez criar uma prévia noção de que o ser humano, além de gozar
de tais direitos, é titular de cada um destes, pois merece e deve receber
tratamento digno.
Difícil será conceituar dignidade da pessoa humana, pois muito mais fácil,
como veremos mais a frente, será dizer, personificar e conceituar o que é indigno.
Falar sobre dignidade é missão complexa em razão do subjetivismo, mas
não é arriscado demonstrar e conceituar a olho nu o que é verdadeiramente
indigno. Esta simples diferenciação facilita por demasia nosso estudo a
partir de agora.
Capítulo 4
97Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
4.2.1 Direito à vida
O direito à vida é o primordial e mais importante direito de todos os
direitos humanos fundamentais, pois só se pode ser pessoa humana, se vivos
estivermos. Ou seja, nada mais normal do que alegar que a vida é o direito
basilar de todos os demais direitos que serão estudados. Concorda?
Todavia, é necessário afirmarmos que não basta estar vivo. Todo ser
humano precisa gozar de vida digna, então, é óbvio alegar que, além da vida,
o ser humano carece necessariamente de outros direitos para que a sua vida
seja vivida na plenitude da dignidade.
Podemos inquirir onde está a felicidade de um homem ou mulher,
que está vivo, livre, mas sem trabalho, nem dinheiro para custear o sustento
próprio e de sua família que dele necessita? Qual a dignidade de um pai ao
ver seu filho com fome lhe pedir comida e o pai não ter como dar ao filho o
que ele está pedindo? Onde e quando uma mãe poderá enxergar dignidade
ao ver seu filho envolvido no narcotráfico e/ou sua filha, que mal chegou à
adolescência, aderindo ao mundo da prostituição ou do consumo de drogas?
Não há garantias quaisquer em estar simplesmente com o direito à vida
assegurado, sem, contudo, poder gozar plenamente de dignidade. O que
seria da vida se esta não pudesse ser digna? Nada, sustentamos. Viver sem
dignidade é o mesmo que não viver, posto que o indivíduo apenas sobrevive
e não é esta a função universal da proteção ao ser humano, por meio dos
direitos fundamentais, bem como pelo fundamento republicano da dignidade
da pessoa humana.
Ter o direito mais importante entre todos os direitos fundamentais não
é suficiente, pois vida sem liberdade, por exemplo, não traz ao ser humano
dignidade plena, e se este (o direito à vida) não estiver necessariamente
acompanhado de uma série de outros direitos em espécie, que visem dar
decência à vida do ser humano, não há lógica em falar apenas de vida, pois
basta lembrar os escravos que, apesar de terem o direito à vida protegido, não
gozavam de outros direitos inerentes à pessoa humana.
Que fique claro: A vida é o mais importante de todos os direitos, posto
que é necessário, logicamente, estar vivo para receber todo o extenso rol de
garantias humanas, como liberdade, igualdade, nacionalidade, propriedade etc.
Capítulo 4
98 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
O artigo 5º, logo no caput, ordena que: Todos são iguais perante a
lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.
Ou seja, partindo deste mandamento universal, fundamental e
constitucional, temos que: a) a vida é o mais importante de todos os direitos
fundamentais, e b) carece de ser protegido em comunhão com a dignidade da
pessoa humana, para ser tida como soberana, plena e efetiva.
Nas palavras do eminente Tavares (2010, p. 569), o direito à vida
é o mais básico de todos os direitos, no sentido de que surge como verdadeiro pré-requisito da existência dos demais direitos consagrados constitucionalmente. É, por isso, o direito humano mais consagrado. O conteúdo do direito à vida assume duas vertentes. Traduz-se, em primeiro lugar, no direito de permanecer existente e, em segundo lugar, no direito a um adequado nível de vida.
Neste sentido, o STF consagrou o direito à vida como sendo indissociável
ao direito de saúde, senão, vejamos o julgado a seguir (Texto 1):
TEXTO 1
E m e n t a: Paciente com HIV/AIDS - pessoa destituída de recursos financeiros - direito à vida e à saúde - fornecimento gratuito de medicamentos - dever constitucional do poder público (cf, arts. 5º, caput, e 196) - precedentes (stf) - recurso de agravo improvido. o direito à saúde representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. - O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. - O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ- LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL
Capítulo 4
99Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
INCONSEQÜENTE. - O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS A PESSOAS CARENTES. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF.
Fonte: Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/5665/Entre-a-vida-e-a-morte-o-direito-fundamental-a-saude-aviltado-As-tutelas-de-urgencia-como-salvaguarda>.
Você pode perceber, urgentemente, então, que a vida é pré-requisito dos
demais direitos fundamentais, portanto, é o direito primordial fundamental
humano e, consequentemente, que deve ser preservado sob todos os aspectos.
Acaloradas discussões nascem em decorrência do direito aqui estudado:
eutanásia; suicídio; aborto e aborto de feto anencéfalo - ou seja, feto que, se
vier ao mundo, não irá sobreviver; estado de necessidade e legítima defesa e,
por fim, a pena de morte em caso de guerra declarada.
a) Eutanásia
Mesmo que se entenda sofrida a enfermidade do paciente, mesmo com
vozes discordantes, por mandamento constitucional e entendimento soberano
de nossos tribunais superiores, a eutanásia, em terra brasilis, é considerada
homicídio. Existe o que se pode chamar de morte doce, ou seja, morte por
pena, mas não no Brasil. Tal homicídio será, nos termos da lei penal, deflagrado
para posterior punição, sem muitos arremedos.
Ainda, há que se falar que, em detrimento do expresso pedido pelo
enfermo em razão de sua doença incurável, nasce um direito fundamental,
direito à vida, em colisão expressa ao direito da morte digna, ou seja, do
postulado da dignidade da pessoa humano. Mesmo assim, este livro-texto
dispõe sobre aspectos jurídicos dos direitos humanos, e assim o sendo, repete-
se: a eutanásia neste país é crime de homicídio doloso, sujeito, o autor, às
complicações da legislação penal.
Capítulo 4
100 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
b) Suicídio
A vida é direito humano fundamental em espécie e, como já visto, o mais
importante de todos, sendo pré-requisito para a compreensão e existência dos
demais direitos fundamentais. Não há possibilidade de penalizar o ser humano
que comete suicídio, mas existe expressa previsão àqueles que induzirem,
instigarem ou ajudarem em qualquer circunstância o ser humano a praticar a
autodestruição de sua vida, conforme art. 122 do Código Penal.
c) Aborto e aborto de feto anencéfalo
O aborto é crime contra a vida, ou seja, leva a cidadã (ou o cidadão que
ajudou a praticar) ao Tribunal Soberano do Júri Popular. O art. 124 do Código
Penal reza que: “provocar aborto em si mesma ou consentir para que outrem
lhe provoque”.
Ainda, o art. 125, do mesmo Código Penal, aduz que: “provocar aborto com
o consentimento da gestante”, e, por fim, o art. 126, também qualifica o crime
quando assevera que: “provocar aborto com o consentimento da gestante”.
In casu, há a proteção da vida desde a concepção, tendo em vista o feto
ainda não ter nascido. Mas, mesmo assim, é proteção constitucional, pois não
se pode realizar aborto a não ser nas exatas condições que a lei permita. Ou
seja, pelo que dispõe o artigo 128 do Código Penal Brasileiro.
Como o art. 128 não admite outras exceções frente ao aborto, nasceu
questão de altíssima complexidade jurídica, social, filosófica e religiosa.
Estaria o caso da anencefalia dentro um rol implícito de excludentes de ilicitude perante o aborto e não tratado por referido artigo penal de forma clara, tendo em vista o código penal datar de 1940?
REFLEXÃO
Capítulo 4
101Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
A anencefalia corresponde ao feto que não pode gerar vida, por motivos
óbvios. Assim, indaga-se: devem ser punidos a gestante e o médico pela
prática do crime de aborto, mesmo tendo o aborto sido praticado em feto
anencéfalo? A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF,
de número 54, em trâmite no Supremo Tribunal Federal, está sendo analisada,
para, no plenário do STF, após amplo debate perante a sociedade, chegar-se a
uma conclusão.
Você precisa refletir sobre o assunto, pois há que ser observado que esta
discussão está em comunhão com outros direitos fundamentais, tais quais: o
principio da dignidade da mulher e, ainda, o direito à saúde, no sentido de afastar
qualquer espécie de aplicação de pena, pela prática de aborto em feto anencéfalo.
Mesmo assim e ainda, carece-se de uma resposta expressa da Suprema
Corte no sentido da declaração de constitucionalidade, ou não, da medida
aqui analisada.
d) Estado de necessidade e legítima defesa
Quanto ao estado de necessidade e legítima defesa, são necessários
alguns esclarecimentos. Não estamos fragilizando em nenhuma hipótese o
direito à vida, mas nenhum direito é soberano e absoluto, diga-se.
Nestas duas situações, falamos em hipóteses, desde que derradeiramente
comprovadas, que não há aplicação de pena por interrupção da vida de
outrem. Apenas alegamos que o Poder Público não podendo atuar no sentido
de resolver imediatamente o conflito entre dois seres humanos prestes a
perderem a vida; aquele que ficou vivo não pode ser apenado em nenhuma
circunstância, pois, ou praticou um homicídio não punível por estado de
absoluta necessidade, ou, simplesmente, matou para não morrer. Assim
sendo, não há que se falar em direito de matar, pois este direito não existe,
todavia pode-se discorrer acerca da impossibilidade do Estado aplicar pena,
pois aquele que matou, cometeu homicídio, ou seja, crime contra a vida de
outra pessoa, apenas para salvar a sua própria vida.
e) Pena de morte em caso de guerra declarada
Por derradeiro, quanto ao direito à vida, destacamos a hipótese de pena
de morte, que só pode ser enfrentada após a declaração de Estado de Guerra
Capítulo 4
102 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
pelo Presidente da República, com consentimento e referendo do Congresso
Nacional, por ataque à nossa Soberania, perante outros Estados.
Todavia, como o Brasil é país, em tese, pacífico, até hoje, não foi possível
identificar em quais causas devidamente comprovadas seria possível a aplicação
da pena capital, ou seja, de morte, e por quem esta seria julgada e, ainda, quem
seria o executor (carrasco) da pena; sendo assim, não nos deixando outra saída a
não ser conjecturar e refletir acerca, haja vista não existir um único precedente
que nos autorize a arriscar prognóstico completamente imprevisível.
4.2.2 O direito à igualdade
A clássica lição de Aristóteles conceitua liberdade como tratar os
iguais com igualdade e os desiguais com desigualdade. Aludida assertiva
carece de uma melhor explicação, pois, a priori, pode ser lida como conceito
discriminatório, mas não o é, muito pelo contrário.
É que as pessoas, pela própria natureza do ser humano, possuem a
característica da diferença. Todos nascemos livres e iguais e nos diferenciamos
no decorrer da vida.
Todavia, seria razoável equiparar homem ou mulher adultos com uma
criança indefesa ou com idosos? No mesmo sentido, seria possível alegar que
os índios são iguais à nossa sociedade? Ou, ainda, é possível alegar que uma
microempresa é igual a uma multinacional S/A? E os consumidores? São iguais
perante o vasto leque de instituições, que cobram por serviços ou venda de
bens? A todos os quesitos responde-se de forma negativa. Assim sendo, nasce a
afirmação quase que profética do pensador grego, pois é necessário, para que se
respeite o princípio da igualdade, tratar os iguais com igualdade e os desiguais,
com desigualdade, observando os preceitos constitucionais ínsitos a cada caso
concreto. Sendo assim, é necessário por demasia fazer com que você, estudante,
saiba que é preciso proteger determinadas classes com leis protecionistas as
quais em nada ferem o preceito fundamental e humano de igualdade.
Neste sentido, nas palavras de Penteado Filho (2009, p. 51): partiu-se,
então, da ideia de isonomia material ou substancial, segundo a qual todos
os homens seriam iguais em direitos e deveres, inviabilizada pelas diferenças
existentes entre eles.
Capítulo 4
103Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Em sequência, formulou-se o conceito de como devem ser tratados
igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas
desigualdades. Penteado Filho (2009, p. 51), então, assevera que: “[...] de outro
ângulo, a igualdade estaria violada se fossem cobrados impostos de alguém
pelo fato de ser gordo, ou se proibisse alguém de ingressar no serviço público
por ser negro”.
DEFINIÇÃODEFINIÇÃO
É este o sentido que tem a isonomia no mundo moderno. É vedar que a lei enlace uma consequência a um fato que não justifica tal ligação (BASTOS, 1999).
Assim, temos que o direito à igualdade insere-se no art. 5º, caput, da
Constituição Federal de 1988, com a seguinte redação: “Todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros
e aos estrangeiros residentes no País [...]”.
Por fim, há de se destacar que não só homens e mulheres são iguais
perante a lei, mas os estrangeiros, que residam ou não no país, também
são sujeitos de direitos tutelados (protegidos) pelo direito fundamental
de igualdade.
LEMBRETELEMBRETE
Só para lhe relembrar, asseveramos que o direito humano e fundamental inserido no caput do artigo 5, da CF/88, nasce sobre a premissa de igualdade formal e igualdade material, devendo você estar em sintonia com esta definição.
4.2.3 O direito de liberdade
A liberdade, direito de 1ª dimensão ou geração de direitos fundamentais,
não versa tão somente e apenas perante condutas voltadas ao direito penal,
como a maioria dos iniciantes ao estudo desta disciplina pressupõem.
Capítulo 4
104 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
O direito de ir e vir, ou seja, de locomoção, que desde já deve estar
claro agora para você, não versa apenas sobre prisão e processo penal. Ou
seja, X cometeu crime de estelionato, previsto no art. 171 do Código Penal,
com pena privativa de liberdade, que, no caso abstrato, corresponde a 5
anos de prisão, onde o apenado deve inicialmente cumpri-la em regime
fechado. Eis manifesta demonstração no que tange a fragilizar o direito
humano fundamental de liberdade.
Todavia, enaltece-se: este ser humano praticou ato ilícito, que, após
sentença irrecorrível, a lei permite privar o seu direito de ir e vir. Mesmo assim,
o direito de liberdade, consagrado na carta de 1988, versa sobre todos os tipos
de liberdade. Ou seja, liberdade de expressão, opinião, do livre pensamento,
associação, culto, crença, liberdades políticas etc., todos devidamente inseridos
nos incisos do art. 5°, da CRFB/88.
O direito de ir e vir não pode ser visto como simples ato de locomoção, ou seja, ele não versa somente sobre atos vinculados à matéria penal, muito pelo contrário, é bem mais extenso, e está ligado a toda liberdade do ser humano, no sentido deste poder expressar-se, associar-se, poder votar e ser votado, poder ir e vir em todo território nacional, poder escolher a profissão, permanecer ou não associado a sindicato etc.
SAIBA QUE
Neste diapasão, temos o direito de liberdade da pessoa física, como
locomoção, ir e vir e circulação, além da liberdade do pensamento, por meio da
opinião, crença, religião, liberdade de irrestrito acesso à informação, à liberdade
de imprensa, comunicação, bem como liberdades artísticas e culturais.
Além da liberdade de expressão, que se dá como coletiva, em associações,
sindicatos, profissionalmente falando, ou apenas por meio da liberdade de
expressão em razão de reuniões em praça pública, bem como e ainda, em
outras situações semelhantes, há a liberdade de ação profissional.
Capítulo 4
105Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
4.2.4 A dignidade da pessoa humana
Direitos humanos fundamentais são direitos públicos e subjetivos de
ordem material, os quais podem ser exercidos de forma processual, e que
vinculam o Estado ao indivíduo, em duas perspectivas, quanto à obrigação de
fazer e de não fazer.
Após o lembrete, posto que este conceito já foi dado a você, todo direito
humano, que é direito de resistência, obriga o Estado a vincular-se perante o
indivíduo com o propósito de: a) não atuar de forma arbitrária em prol do ser
humano, e b) garantir cada direito ínsito aos indivíduos.
Todo este extenso rol de direitos humanos fundamentais se perpetua
após longos anos de sofrimento e embates políticos. Eles se consolidam
diariamente por estarem positivados na CRFB/88, do art. 5° ao 17°, no titulo
II, por expresso mandamento constitucional e, ainda, por serem cláusulas
pétreas, ou seja, cláusulas da eternidade.
Importante trazer até você o texto inicial da Declaração Universal dos
Direitos Humanos (Texto 2), devendo o(a) aluno(a) ler cuidadosamente cada
linha a seguir:
TEXTO 2
Preâmbulo - Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do homem comum, Considerando essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo Estado de Direito, para que o homem não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra tirania e a opressão, Considerando essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações, Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla, Considerando que os Estados-Membros se comprometeram a desenvolver, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos humanos e liberdades fundamentais e a observância desses direitos e liberdades, considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais
Capítulo 4
106 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso, A Assembléia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Diretos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição”.
Fonte: Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm>.
E, ainda, logo no artigo 1º, este texto universal alega que todas as
pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de
razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito
de fraternidade.
Tudo isto só se dá nos dias atuais, em detrimento da dignidade da
pessoa humana, inerente ao ser humano. Após a consagração da paz pós-
holocausto nasce o postulado universal da dignidade da pessoa humana
em todos os textos universais referentes a direitos humanos. Assim sendo,
todo direito e garantia individual, inserida em nossa Carta Magna, brota
deste postulado universal.
É importante lembrar a você, caro(a) aluno(a), que a dignidade da
pessoa humana é fundamento republicano, ou seja, norma fundamental à
constituição do Estado de Direito brasileiro, posta logo no art. 1º, da CF/88,
III. Assim sendo, e confirmando com tudo que foi escrito neste livro-texto, a
dignidade da pessoa humana foi inserida pelo constituinte de 1988, não como
direito ou garantia fundamental, mas, mais que isto, como norma ou princípio
fundamental da própria Constituição, devendo todas as demais normas
constitucionais estar em estrita obediência a este princípio fundamental,
inciso III, art. 1º, CFRB/88.
Anteriormente, neste capítulo, dissemos ser missão impossível
conceituar o que se entende por dignidade da pessoa humana, pois todos
os mais respeitados e ilustres juristas, em especial os constitucionalistas, já
expressaram seus pontos de vista acerca desta conceituação. É impossível
falar quem está mais certo ou menos errado, e, sim, asseverar que todos
estão certos.
Capítulo 4
107Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
O que é digno para você, pode não ser para mim, mas não quer dizer,
tanto quanto, que seja indigno para uma terceira pessoa. Fácil, neste sentido,
é identificar indignidade. Difícil, então, conceituar dignidade. Partindo desta
lógica, sabe-se o que é indigno, pois o conceito de dignidade além de amplo
é muito abstrato e subjetivo.
Todavia, é imperioso aproximarmos você de um mínimo conceito voltado
para o seu conhecimento e, posteriormente, para lhe ajudar a dar a sua própria
definição no que tange à matéria.
Assim sendo, temos que todo ser humano, como ordenam os
mandamentos constitucionais e universais, deve receber tratamento digno,
condizente com a dignidade da pessoa humana. Esta expressão é o conjunto
dos mais mínimos direitos ínsitos à pessoa humana, que reveste seres
humanos de cuidados especiais, e os protege contra nocividades, atrocidades
e tratamento degradante. Tais indignidades devem ser afastadas em prol
de todos os direitos e garantias individuais ínsitas a cada pessoa humana,
para dignificar-lhe como cidadão(ã), no sentido de dar intensa condição de
nobreza social, a começar pela vida, liberdade e igualdade, e a garantia de
saúde, educação, trabalho e moradia condizente com a honradez de seu
tempo e época.
Assim, após conceituação, temos que alertar que a dignidade da pessoa
humana não é em si um direito humano em espécie, mas, sim, a fonte
primordial e basilar que garante o nascituro e a manutenção de cada direito
de resistência, fundamental e constitucional.
Sem a presença da premissa tida como dignidade da pessoa humana,
impossível seria a criação, manutenção e aprimoramento dos direitos
aqui estudados.
Em assim sendo, é importante demonstrar o quão imediata e efetiva é a
aplicação na prática do cotidiano do aspecto jurídico da dignidade da pessoa
humana, como a seguir relata a decisão do Supremo Tribunal Federal, vejamos
o Texto 3:
Capítulo 4
108 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
TEXTO 3
“Tráfico de entorpecentes. [...] Prisão em flagrante. Óbice ao apelo em liberdade. Inconstitucionalidade: necessidade de adequação do preceito veiculado pelo art. 44 da Lei 11.343/2006 e do art. 5º, XLII, aos arts. 1º, III, e 5º, LIV e LVII, da CF. [...] Apelação em liberdade negada sob o fundamento de que o art. 44 da Lei 11.343/2006 veda a liberdade provisória ao preso em flagrante por tráfico de entorpecentes. Entendimento respaldado na inafiançabilidade desse crime, estabelecida no art. 5º, XLIII, da CF. Afronta escancarada aos princípios da presunção de inocência, do devido processo legal e da dignidade da pessoa humana. Inexistência de antinomias na Constituição. Necessidade de adequação, a esses princípios, da norma infraconstitucional e da veiculada no art. 5º, XLIII, da CF. A regra estabelecida na Constituição, bem assim na legislação infraconstitucional, é a liberdade. A prisão faz exceção a essa regra, de modo que, a admitir-se que o art. 5º, XLIII, estabelece, além das restrições nele contidas, vedação à liberdade provisória, o conflito entre normas estaria instalado. A inafiançabilidade não pode e não deve – considerados os princípios da presunção de inocência, da dignidade da pessoa humana, da ampla defesa e do devido processo legal – constituir causa impeditiva da liberdade provisória. Não se nega a acentuada nocividade da conduta do traficante de entorpecentes. Nocividade aferível pelos malefícios provocados no que concerne à saúde pública, exposta a sociedade a danos concretos e a riscos iminentes. Não obstante, a regra consagrada no ordenamento jurídico brasileiro é a liberdade; a prisão, a exceção. A regra cede a ela em situações marcadas pela demonstração cabal da necessidade da segregação ante tempus. Impõe-se, porém, ao Juiz, nesse caso o dever de explicitar as razões pelas quais alguém deva ser preso cautelarmente, assim permanecendo.” (HC 101.505, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 15-12-2009, Segunda Turma, DJE de 12-2-2010.) No mesmo sentido: HC 100.742, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 3-11-2009, Segunda Turma, Informativo 566; HC 101.055, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 3-11-2009, Segunda Turma, DJE de 18-12-2009. Em sentido contrário: HC 93.229, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 1º-4-2008, Primeira Turma, DJE de 25-4-2008.
Fonte: Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp>.
4.2.5 Direito de nacionalidade
O direito à nacionalidade é direito fundamental em espécie. Há uma
diferença quanto à nacionalidade, pois esta poderá dar-se sob duas hipóteses,
sendo o indivíduo: a) nato e b) naturalizado.
O brasileiro nato nunca perderá a nacionalidade, por ser aludido
direito humano indisponível. Porém, existe a possibilidade do naturalizado
perder este elo entre o Estado que lhe concedeu secundariamente o direito
à nacionalidade.
Capítulo 4
109Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Esta preocupação se deu pelo constituinte originário de 1988 em razão
dos momentos de ruptura frente à democracia brasileira, sobretudo nos idos do
autoritarismo de 1964, ápice em 1968 com a edição do AI-5 (ato institucional,
nº 5), e aprimoramento da técnica de todo tipo de tortura, durante toda a
década de 1970. Assim, reza o inciso XLVII, do art. 5º, da CF/88 que: Não haverá
penas: d) de banimento;
Dá-se nacionalidade por meio do critério jus sanguinis, pelo sangue, ou
pelo jus solis, por indivíduo nascido em solo de determinada nação, e o Brasil
adota ambos os critérios para aferimento de nacionalidade.
Nem todos os Estados adotam os critérios de jus sanguinis e jus solis. A Alemanha, por exemplo, só admite o critério do sangue para aferimento de nacionalidade.
CURIOSIDADE
A nacionalidade é um vínculo jurídico e político, que faz um elo entre
o cidadão, indivíduo ou pessoa humana a determinado Estado. E, no Brasil,
por expresso mandamento constitucional, o brasileiro nato nunca perderá sua
nacionalidade, deixando o constituinte a possibilidade de perda deste vínculo
jurídico e político, em face tão somente dos brasileiros com nacionalidade
secundária, ou seja, os naturalizados.
Assim ordena o art. 5º, inciso LI, da CF/88, vejamos: nenhum brasileiro
será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado
antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, na forma da lei.
A simples leitura do inciso demonstra que só o naturalizado perderá a
nacionalidade brasileira, após sentença judicial com trânsito em julgado, ou
seja, irrecorrível, e por atividade nociva ao Estado brasileiro.
4.2.6 Direito de propriedade
Quanto a este direito, tanto quanto direito fundamental, restou
positivado em nossa Constituição Federal, também no art. 5º, inciso XXII,
Capítulo 4
110 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
aduzindo que: é garantido o direito de propriedade; desde que haja uma
contraprestação do ser humano detentor da posse do bem, vejamos o que
diz o XXIII, do aludido artigo constitucional: a propriedade atenderá a sua
função social. Ou seja, ela deve promover o bem-estar dos moradores, não ser
local de produção ou consumo de psicotrópicos, funcionar como residência
ou local de profissão, imóvel rural, lazer, cultura, desporto, religiosos, para
reuniões, devendo, ainda, arcar com os impostos rurais ou urbanos, para a
devida compreensão da função social.
4.2.7 Direito ao devido processo legal
Sempre falamos a você que os direitos humanos fundamentais são
direitos de ordem material, todavia, podendo ser também de ordem
processual. Aqui está o direito fundamental em espécie primordial no sentido
processual e não material.
Compreende-se pelo devido processo legal o direito de que, acaso
alguém seja acusado, por exemplo, da prática de um crime, não deixe de ser
devidamente e legalmente denunciado.
Isto é, caso o indivíduo tenha praticado algum crime ou se revele
contra ele suspeita de ter cometido tal ilícito, o Estado deverá processá-lo
de forma devida, garantindo-lhe, sempre, a prisão como exceção e nunca
como regra, nos exatos termos da lei que autorizar prisão cautelar, ou
provisória, e, ao mesmo tempo, garantido ao suspeito o direito à ampla
defesa e contraditório.
Não basta termos o direito de defesa como direito fundamental, pois
este direito só existe na plenitude se for amplo.
Daí a garantia intitulada ampla defesa, devendo a pessoa humana estar
ciente de todos os atos processuais, ser chamada a responder por todos, e
o Estado tem que lhe garantir, também, a oportunidade de que ela possa
defender-se em cada ato processual que alguém tente lhe impor e formar
sua culpa.
Capítulo 4
111Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
LEMBRETELEMBRETE
Lembre-se, prezado(a) aluno(a), que cada um de nós nos presumimos inocentes ou não culpados até sentença penal condenatória, irrecorrível, ou seja, aquela em que não cabe mais nenhum recurso.
Acaso este direito não seja respeitado, temos retrocesso constitucional
vedado pela CRFB/88, e qualquer ato neste sentido nos remete ao processo
de Kafka.
4.2.8 Direitos políticos
Após a revolução francesa de 1789, o ideal de liberdade, igualdade e
fraternidade, pelo instrumento de Rousseau, chamado o “Contrato Social”,
trouxe à tona o ideal político de votar e também ser votado.
Assim sendo, nasce como direito humano fundamental, apregoado
como direito pétreo e de resistência em nossa Constituição no título II, os
direitos políticos.
Neste sentido, o Estado e o indivíduo estão intrinsecamente ligados,
primeiramente pela obrigação de fazer do Estado, art. 225, da CF/88, quando
este está obrigado a garantir a nossas crianças o direito à educação, e, ainda,
na obrigação de não fazer, (art. 5º, XI, CF/88), que impede o Estado de adentrar
em nossa propriedade sem o nosso consentimento, a não ser em caso de
flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por
determinação judicial.
Assim, temos: a) Estado Prestacionista e b) Estado Protecionista. E, agora,
assume-se o condão de: c) Estado Garantidor dos Direitos Políticos, sendo
tão somente normas constitucionais e leis infraconstitucionais a mando da
Constituição, que versem sobre inelegibilidades.
É regra o direito de votar e ser votado, nos casos em que o indivíduo
consiga preencher os requisitos de elegibilidade constitucional e
legalmente necessários.
Capítulo 4
112 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
4.2.9 Direito à educação, moradia, trabalho e à saúde e outros
direitos sociais fundamentais
Estes direitos são chamados de direitos sociais fundamentais, por estarem
consagrados no art. 6º da Carta Política de 1988 (grifo nosso).
Vejamos a redação de aludido dispositivo constitucional:
São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Deve-se, então, ter em mente que ambos os direitos são sociais e estão
sob a proteção constitucional como sendo cláusulas pétreas.
LEMBRETELEMBRETE
Os direitos humanos fundamentais são os direitos que estão no título II da constituição federal, indo do art. 5º e todos os seus incisos, até o art. 17, sem esquecer-se de outros vários, que estão consagrados no próprio texto constitucional.
É o que se depreende da garantia da aplicação imediata e efetiva, por
meio do judiciário, de políticas públicas, que devem ser implementadas pelo
poder Executivo para garantir a efetividade dos direitos sociais fundamentais
inseridos no art. 6º da CF/88, como assim demonstra o julgado a seguir
colacionado, vejamos no Texto 4:
TEXTO 4
E M E N T A: RECURSO EXTRAORDINÁRIO - CRIANÇA DE ATÉ SEIS ANOS DE IDADE - ATENDIMENTO EM CRECHE E EM PRÉ-ESCOLA - EDUCAÇÃO INFANTIL - DIREITO ASSEGURADO PELO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 208, IV) - COMPREENSÃO GLOBAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO - DEVER JURÍDICO CUJA EXECUÇÃO SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO, NOTADAMENTE AO MUNICÍPIO (CF, ART. 211, § 2º) - RECURSO IMPROVIDO. - A educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que, deferida às crianças, a estas assegura, para efeito de seu desenvolvimento integral, e como primeira
Capítulo 4
113Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
etapa do processo de educação básica, o atendimento em creche e o acesso à pré-escola (CF, art. 208, IV). - Essa prerrogativa jurídica, em conseqüência, impõe, ao Estado, por efeito da alta significação social de que se reveste a educação infantil, a obrigação constitucional de criar condições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor das “crianças de zero a seis anos de idade” (CF, art. 208, IV), o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré-escola, sob pena de configurar-se inaceitável omissão governamental, apta a frustrar, injustamente, por inércia, o integral adimplemento, pelo Poder Público, de prestação estatal que lhe impôs o próprio texto da Constituição Federal. - A educação infantil, por qualificar-se como direito fundamental de toda criança, não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações meramente discricionárias da Administração Pública, nem se subordina a razões de puro pragmatismo governamental. - Os Municípios - que atuarão, prioritariamente, no ensino fundamental e na educação infantil (CF, art. 211, § 2º) - não poderão demitir-se do mandato constitucional, juridicamente vinculante, que lhes foi outorgado pelo art. 208, IV, da Lei Fundamental da República, e que representa fator de limitação da discricionariedade político-administrativa dos entes municipais, cujas opções, tratando-se do atendimento das crianças em creche (CF, art. 208, IV), não podem ser exercidas de modo a comprometer, com apoio em juízo de simples conveniência ou de mera oportunidade, a eficácia desse direito básico de índole social. - Embora resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, determinar, ainda que em bases excepcionais, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas pelos órgãos estatais inadimplentes, cuja omissão - por importar em descumprimento dos encargos político-jurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatório - mostra-se apta a comprometer a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional. A questão pertinente à “reserva do possível”.
Fonte: Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=RE-AgR.SCLA.+E+410715.NUME.&base=baseAcordaos>.
Este é o verdadeiro aspecto jurídico dos direitos fundamentais sociais.
Os mesmos, acaso negados pelo Estado, deverão ser imediatamente
implantados para ter-se eficácia pelo Poder Judiciário, pois além de direitos
humanos em espécie, são direitos coletivos, ou seja, de todos nós indisponíveis,
e obriga o Estado a proteger cada um destes, para concedê-lo à sociedade.
É mandamento constitucional e fundamental e não um favor. Assim,
o Estado está obrigado a implantar políticas públicas, que garantam esta
efetividade. Caso não o faça, incumbe ao judiciário resguardar o que está
inserido na Constituição Federal.
Capítulo 4
114 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
4.3 Aplicando a teoria na prática
O Brasil, confirmando o que foi até aqui debatido com você, possui como
fundamento republicano a dignidade da pessoa humana. Este fundamento
resguarda, inicialmente, o direito à vida como o mais fundamental de todos
os direitos.
Você já seria capaz de conceituar e mensurar o que se entende por
dignidade humana? Para refletirmos sobre isso, observe o seguinte caso:
Discutiu-se no STF sobre a constitucionalidade do art. 5º da Lei de
Biossegurança, a qual possibilitava a pesquisa para a cura de doenças, por meio
de nossos cientistas-pesquisadores, usando as células-tronco embrionárias in
vitru, isto é, congeladas em laboratório.
O que se queria saber era se a pesquisa ofendia o direito à vida e a
dignidade dos embriões congelados. An passant, você deve pensar, a priori,
ser discussão tola. Todavia, esta tormenta paralisou o país e a sessão que
julgou a ADI proposta transformou-se em caso célebre, verdadeira democracia
jurisdicional constitucional, a qual ganhou repercussão universal e já entrou
para os anais dos julgamentos históricos de todos os Tribunais Constitucionais,
em real espetáculo de democracia.
O debate sobre o tema sofreu enormes pressões e discussões por toda
a sociedade: mandatários eletivos, pesquisadores, entidades religiosas,
intelectuais, estudantes, pessoas acometidas por paralisia, leucemia, alzheimer,
câncer, cientistas, grande mídia, todos divergindo sobre o tema e, ainda houve,
em razão do debate de alto nível, a realização de várias audiências públicas
– até para instruírem os ministros do Supremo. Este julgamento paralisou
o país. De tão discutido, o julgamento inicial foi suspenso em razão de um
pedido de vista do processo. Tal pedido foi feito por um dos ministros do
Supremo Tribunal Federal, o saudoso Menezes de Direito, católico fervoroso,
de ideal opus dei – para que este pudesse, mesmo após tamanha repercussão,
com tranquilidade e serenidade, ler o processo e fazer voto definitivo na
sessão de julgamento posterior e definitiva.
Tudo em razão, no caso concreto, da busca pelo direito à vida e da dignidade
humana. Afinal, pesquisar embrião congelado em laboratório é constitucional?
Capítulo 4
115Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Reflita sozinho sobre esta questão, pois, a seguir, iremos apresentar o
desenrolar do caso à luz de nossa Suprema Corte.
O STF é composto por 11 ministros, e por um score apertadíssimo, 6x5, os
ministros proferiram acórdão no sentido de que não ofende o direito à vida e
a dignidade humana.
O texto do art. 5º, da Lei de Biossegurança Nacional, permite que
cientistas façam pesquisas para os males da humanidade a partir das células-
tronco em embriões congelados in vitro.
Assim, o Supremo Tribunal Federal decidiu que as pesquisas com células-
tronco embrionárias não violam o direito à vida, tampouco a dignidade da
pessoa humana. Esses argumentos foram utilizados pelo ex-procurador-geral
da República, Cláudio Fonteles, em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI
3510), ajuizada com o propósito de impedir essa linha de estudo científico. Para
seis ministros, portanto, a maioria da Corte, o artigo 5º da Lei de Biossegurança
não merece reparo.
Votaram nesse sentido os ministros Carlos Ayres Britto, relator da matéria,
Ellen Gracie, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Joaquim Barbosa, Marco Aurélio e
Celso de Mello. Os ministros Cezar Peluso e Gilmar Mendes também disseram
que a lei é constitucional, mas pretendiam que o Tribunal declarasse, em sua
decisão, a necessidade de que as pesquisas fossem rigorosamente fiscalizadas
do ponto de vista ético por um órgão central, no caso, a Comissão Nacional
de Ética em Pesquisa (CONEP). Essa questão foi alvo de um caloroso debate ao
final do julgamento e não foi acolhida pela Corte.
Outros três ministros disseram que as pesquisas podem ser feitas, mas
somente se os embriões ainda viáveis não forem destruídos para a retirada das
células-tronco. Esse foi o entendimento dos ministros Carlos Alberto Menezes
Direito, Ricardo Lewandowski e Eros Grau.
Carlos Ayres Britto votou pela total improcedência da ação. Fundamentou
seu voto em dispositivos da Constituição Federal, que garantem o direito à vida,
à saúde, ao planejamento familiar e à pesquisa científica. Destacou, também,
o espírito de sociedade fraternal, preconizado pela Constituição Federal, ao
defender a utilização de células-tronco embrionárias na pesquisa para curar
doenças. Carlos Britto qualificou a Lei de Biossegurança como um “perfeito”
Capítulo 4
116 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
e “bem concatenado bloco normativo”. Para este ministro, o zigoto (embrião
em estágio inicial) é a primeira fase do embrião humano, a célula-ovo ou
célula-mãe, mas representa uma realidade distinta da pessoa natural, porque
ainda não tem cérebro formado.
Contudo, prevê maior rigor na fiscalização dos procedimentos de
fertilização in vitro, para os embriões congelados há três anos ou mais, no trato
dos embriões considerados “inviáveis”, na autorização expressa dos genitores
dos embriões e na proibição de destruição dos embriões utilizados, exceto
os inviáveis. Para o ministro Menezes Direito, “as células-tronco embrionárias
são vida humana e qualquer destinação delas à finalidade diversa que a
reprodução humana viola o direito à vida”.
Outro ministro que votou em igual sentido, Gilmar Mendes, disse
que o Decreto 5.591/2005, que regulamenta a Lei de Biossegurança, não
supre essa lacuna, ao não criar, de forma expressa, as atribuições de um
legítimo comitê central de ética para controlar as pesquisas com células de
embriões humanos.
4.4 Para saber mais
Filme: O Homem que fazia chover
Direção: Francis Ford Coppola Ano: 1997
O filme demonstra a busca de justiça e direitos sociais de forma incessante pelo jovem advogado protagonizado por Matt Damon, e seu partner vivido pelo genial DeVito.
Filme: Justiça
Direção: Mariana Augusto Ramos Ano: 2004
Documentário nacional, que prioriza a inversão de valores na sociedade, enquanto esta alimenta ilusão quanto à impunidade. O filme-documentário mostra a realidade do interior dos presídios e do rigor do judiciário penal brasileiro, enaltecendo a monstruosidade com que são tratados os apenados por ilícito. Ele demonstra o que é vida sem liberdade, nem perspectiva ou dignidade.
Capítulo 4
117Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Filme: Hércules 56
Direção: Sílvio Da-Rin Ano: 2006
Documentário nacional, baseado em fatos e no livro “Hércules 56” de autoria de Sílvio Da-Rin, o qual conta a história de 15 prisioneiros políticos trocados pelo embaixador Charles Burke Elbrick, após o sequestro deste por militantes revolucionários nos anos de chumbo. Os 15 escolhidos foram banidos do país após chegarem ao México.
Título: Direitos fundamentais
Autor: Virgílio Afonso da Silva Editora: Malheiros Ano: 2010
Livro técnico de direito, que expõe o conteúdo jurídico dos direitos fundamentais e a sua estrutura.
4.5 Relembrando
Você deverá lembrar o que vimos neste capítulo:
• tratamos sobre direitos humanos em espécie e não mais os estudamos
por meio da teoria geral dos direitos fundamentais;
• a partir da construção do postulado universal da dignidade da
pessoa humana, cada um dos direitos fundamentais foram e estão
diariamente positivando-se em cartas Constitucionais democráticas e,
ainda, por intermédio da universalização da matéria aqui discutida;
• tratamos do direito à vida, bem como igualdade e liberdade.
Falamos sobre isonomia formal e material. Não podendo deixar
de lembrar que liberdade não versa apenas sobre o direito de
ir e vir, de deslocamento ou locomoção, mas, sim, liberdade em
sentido amplo, ou seja, religiosa, de reunião, associação, trabalho,
pensamente, expressão, opinião etc.;
• quanto ao direito de nacionalidade, trouxemos à tona critérios
como jus sanguinis e jus solis. Além disso, atentamos ao caso de
brasileiros natos e naturalizados, discorrendo que, aos primeiros, é
impossível a extradição. Já, aos segundos, a perda da naturalização
só se dará por intermédio de atividade nociva ao Estado,
devidamente comprovada e após sentença judicial com trânsito
em julgado, nos termos da CF/88 e leis infraconstitucionais;
Capítulo 4
118 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• é mais fácil conceituar o que seria indigno do que a dignidade da
pessoa humana;
• versamos sobre propriedade e, mais ainda, sobre a função social da
propriedade. Ambas estão nos incisos do art. 5º, da CF/88, ou seja, são
cláusulas pétreas;
• tratamos sobre direitos humanos fundamentais sociais, todos
enlaçados no art. 6º da Carta Magna;
• ainda, tratamos sobre direitos políticos, garantidos a partir da
Revolução Francesa, no que tange ao direito de votar e ser voltado.
4.6 Testando os seus conhecimentos
1) Quais são os direitos fundamentais em espécie?
2) De onde todos estes brotam e por quê?
3) Como conceituar a expressão dignidade da pessoa humana?
4) O que se entende pelo direito à vida?
5) A vida sem dignidade é objeto de proteção constitucional?
6) Como identificar os direitos sociais?
7) O que se entende por honra e imagem à luz da dignidade da pessoa humana?
8) O que significa o direito à liberdade?
9) Diferencie locomoção e o direito de ir e vir dos demais direitos de
liberdade. Exemplifique.
10) Discorra sobre direitos sociais fundamentais.
11) Enumere o rol de direitos sociais.
Capítulo 4
119Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
12) Discorra acerca da efetividade de políticas públicas por intermédio do
poder judiciário.
13) O que significa nacionalidade? Explique com riqueza de detalhes.
14) O que é vida?
15) O que é o aborto? Ainda, o que se entende por aborto em feto anencéfalo?
16) Suicídio é crime? Discorra.
17) Quais as hipóteses legais de aborto?
18) Quando o Estado permite a pena de morte?
19) Os direitos à saúde e à vida se entrelaçam? Por quê?
20) O ser humano se presume não culpado? Justifique.
21) Explique o que é Estado Prestacionista e Protecionista.
Onde encontrar
BASTOS, C. Curso de Direito Constitucional. 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
DIMOULIS, D.; MARTINS, L. Teoria geral dos direitos fundamentais. 2. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
MORAES, A. de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários
aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e
jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2006. (Temas jurídicos, 3).
PENTEADO FILHO, N. S. Direitos humanos. Ed. rev., atual. e ampl. Rio de
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009.
SILVA, V. A. da S. Direitos fundamentais, conteúdo essencial, restrições e
eficácia. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
TAVARES, A. R. Curso de Direito Constitucional. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
Capítulo 5
121Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
DIREITOS HUMANOS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
CAPÍTULO 55
5.1 Contextualizando
Prezado(a) aluno(a), neste capítulo, trataremos sobre as leis que estão
inseridas em nosso ordenamento jurídico. Ou seja, falaremos de legislação
brasileira referente aos direitos humanos fundamentais.
A rigor, relembre-se que, até agora, falamos de direitos humanos, direito
constitucional e direito internacional, e fizemos paralelo entre estas matérias
e os direitos fundamentais, sempre à luz de história, política e Constituição.
Pois bem. A partir de agora e até o final deste capítulo, você irá conhecer
normas jurídicas de proteção aos direitos humanos fundamentais, sendo todas
elas de ordem infraconstitucional, ou seja, criadas a partir da Constituição,
mas não inseridas no nosso texto constitucional.
Daremos ênfase à famosa Lei Maria da Penha; como esta foi criada, as
razões que fizeram a mesma nascer, bem como e, ainda, falaremos do Plano
Nacional de Direitos Humanos, que é gerenciado por uma secretaria de Estado,
um ministério, vinculado ao Poder executivo.
Ao final deste capítulo, você deverá estar apto a conhecer as principais
leis que versem sobre direitos humanos fundamentais em nosso ordenamento
jurídico, pois não iremos falar em direitos humanos no prisma internacional,
mas, sim interno, nosso, ou seja, criado por nosso Congresso Nacional.
Você terá que, ao longo do capítulo, ler os textos de lei citados e todos
os parágrafos e incisos destes, para poder compreender totalmente a matéria
aqui estudada.
Capítulo 5
122 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
É necessário, por demasia, que assim se proceda, para que você possa, ao
final deste, ter em mente a legislação brasileira, que é muito pouco conhecida,
até mesmo pelos principais juristas brasileiros.
5.2 Conhecendo a teoria
Nos últimos anos, as principais instituições políticas brasileiras, aquelas que
são o sustentáculo governamental, criaram a consciência de que é necessário o
comprometimento com a causa humanitária, a partir da ordem constitucional
vigente, no que tange à implementação de leis infraconstitucionais que deem
viabilidade, imediatidade e efetividade aos direitos humanos fundamentais.
Em razão da Conferência das Nações Unidas, ocorrida em Viena, em
1993, e em função da imensa pressão da sociedade, aliada ao clamor de grupos
de pressão especializados na matéria, o ex-presidente e sociólogo Fernando
Henrique Cardozo, em 1996, criou referido Programa de Proteção de Direitos
Humanos. Após isto, todas as instituições governamentais começaram a
entender e a propagar a intensa e séria discussão para dar efetividade aos
direitos fundamentais.
5.2.1 O Sistema Nacional de Proteção aos Direitos Humanos
Neste sentido, criou-se o Sistema Nacional de Proteção aos Direitos
Humanos (SNPDH). Esta secretaria do Governo está vinculada ao Ministério
da Justiça, membro do poder Executivo, chefiado, no caso extremo, pelo
presidente da República.
Atualmente, este programa foi aperfeiçoado e está em uma terceira fase
de implementação de direitos, bem como sob a vigília do Poder Judiciário, e,
especialmente, do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.
Houve toda esta preocupação e zelo, unicamente, por tudo que já
estudamos até aqui. Isto é, aprendemos a teoria para imediatamente (§1º,
do art. 5º, da CF/88) implementar e dar efetividade aos direitos inerentes
à pessoa humana.
Assim sendo, neste país, a ordem universal de dignidade da pessoa
humana adentra em nosso ordenamento jurídico por meio da Constituição
Capítulo 5
123Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Federal e esta, por seu turno, ordena a criação de leis infraconstitucionais para
a tutela (guarda/proteção) dos direitos humanos.
5.2.2 O Plano Nacional de Proteção de Direitos Humanos 3 – PNDH3
Após breve relato sobre as leis, evidenciamos a necessidade de você
estudar o PNDH3, ou seja, o Plano Nacional de Direitos Humanos 3, devidamente
aperfeiçoado pelos últimos 2 governos presidenciais, após a implantação do
Sistema de Proteção dos Direitos Humanos pelo presidente FHC, em 1996.
Assim sendo, o PNDH3 nasce em momento de afirmação histórica dos direitos
humanos dentro de nosso sistema brasileiro jurídico e, ainda, em total sintonia
com os rumos que consolidam os direitos fundamentais mundo afora.
A discussão é apaixonante, é prática, atual e efetiva. Claro que o Brasil está
longe de efetivar cada mínimo e mais ínsito direito humano fundamental ao
nosso povo. Isto porque ainda há altos índices de analfabetismo, impunidade
em razão do crime de colarinho branco, fome e miséria, ora estagnação, ora
crescimento dos índices de violência urbana, problemas com o narcotráfico,
PCC – Primeiro Comando da Capital, CV – Comando Vermelho, e demais entes
de criminalidade organizada, crianças ainda fora da escola, e tantos outros
problemas advindos do desrespeito soberano às Leis e à Constituição deste país.
Todavia, o avanço é notório. Em pouco mais de 2 décadas, o país não só
vislumbrou a importância dos direitos humanos, como também as sucessivas
medidas de implementação de aludidos direitos se confirmam diariamente
a partir do prisma universal da dignidade da pessoa humana, exigida como
sendo fundamento de nossa República.
Sempre discorremos ao longo deste livro-texto que não se deve teorizar
acerca de direitos fundamentais, pois estes possuem duas características-chave:
imediatidade e efetividade. Lembra-se?
Não se pode mais discorrer sobre direitos humanos apenas conversando
ou divagando sobre os mesmos, mas, sim, estudar a teoria para a imediata
implementação de cada um deles.
Várias são as leis infraconstitucionais, que criam punições a cada dia mais
severas pelo desrespeito aos direitos humanos fundamentais.
Capítulo 5
124 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Neste condão, nasce o PNDH3, por meio do decreto nº 7.037/2009,
visando à imediata interação democrática entre Estado e Sociedade Civil,
desenvolvimento e Direitos Humanos, à universalização de direitos em um
contexto de desigualdades, a dar segurança pública, acesso à justiça e combate
à violência, além de gerir educação e cultura em direitos humanos, acrescido,
por fim, do direito à memória e à verdade.
Não bastassem todas as leis que antevissem direitos humanos muito antes
da implementação do Sistema Nacional de Proteção aos Direitos Humanos, nascia,
também, em exata sintonia com a ordem internacional humanitária, e, ainda,
uma séria conscientização do povo de que direito humano é direito básico do
indivíduo, longe, muito longe de tratar apenas de aspectos minimamente penais.
Hoje, a doutrina geral e dominante é de proteção integral ao sistema de direitos fundamentais, e não mais por intermédio de simples grupos de pressões especializados em matéria de direito humano – como Organizações Não Governamentais e os movimentos como Green Peace, entre outros. Isto porque, nos dias atuais, a sociedade consegue compreender de
forma ampla, por meio de macrotemas, a dimensão da dignidade da pessoa humana, ao criar mecanismos legais internos, ou seja, em nosso ordenamento jurídico de proteção.
SAIBA QUE
Assim, o programa nasce, solidifica-se e cresce a cada dia, com algumas
diretrizes que devem ser destacadas. Inicialmente, a interação entre Estado e
sociedade deve ser observada, seja por meio de políticas públicas, por diálogo
plural e transversal, ou, ainda, por meio da ampliação do controle externo
dos órgãos públicos pela sociedade civil. Além disso, ela pode ocorrer pela
interação democrática e, por fim, por intermédio de interação, promoção,
fortalecimento e ampliação dos direitos humanos em conjunto com políticas
públicas e a nossa sociedade.
É direito humano o direito de integração com ampla margem de
divulgação e publicidade, dando-se por meio de participação direta do povo
em face da abertura de contas dos órgãos públicos, ou seja, do governo,
devendo este estar vinculado aos nossos interesses, e não o contrário.
Capítulo 5
125Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Aquém disto, pode-se dar interação realmente voltada à democracia por
meio da participação sistêmica e inclusiva de diretrizes em prol dos direitos
humanos, fortalecendo o debate e a fiscalização, além de ampliar este leque entre
nós, sociedade e Estado, para fins estritamente democráticos e humanitários.
Por derradeiro, reza ainda nosso sistema interno de proteção aos direitos
humanos, pela sinalização do direito à memória e à verdade, por meio da
abertura de registros militares da época da revolução golpista de 1964, a
qual trouxe ruptura democrática, e, ainda, com a edição e publicação o Ato
institucional de nº 05, o AI-5, que acabou, neste país, com o Congresso, com
a mídia, com as universidades, centros de estudos de sociologia, filosofia,
historia, bem como arte, cultura e, inclusive, com o próprio habeas corpus.
A Guerrilha do Araguaia, por exemplo, é prova viva de atrocidades cometidas pelos militares que presidiam nosso país, quando estes aniquilaram cerca de 100 brasileiros, os quais lutavam por ideais democráticos, ceifando de forma atroz a vida deles, e, até hoje, não
revelando o que foi feito com os corpos destas pessoas, que apenas reivindicavam por democracia, direitos humanos e paz.
CURIOSIDADE
Neste sentido, nasce em nossa legislação a primazia da realidade em prol
dos direitos fundamentais, não podendo estes ser simplesmente sepultados em
razão de prováveis acovardamentos advindos de pequena parte dos militares,
que esperam pelo esquecimento, quando é direito humano, e agora, em razão
de lei infraconstitucional, o direito à verdade e à memória.
5.2.3 Leis anteriores ao PNDH3: legislação referente a
Direitos Humanos
Sendo assim, cabe demonstrar a você as leis atinentes à proteção dos
direitos humanos em nosso ordenamento jurídico.
O Deputado Marcos Rolim (2000), em primoroso parecer sobre a temática,
nos traz valiosa contribuição ao comentar, ainda que brevemente, cada uma
delas, que são:
Capítulo 5
126 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Lei nº 9.437/97: a qual criminaliza o porte ilegal de armas e institui o
Sistema Nacional de Armas, Munições e Explosivos (SINARM).
Esta lei viabilizou o início de um sistema sobre cadastro de armas no país,
bem como a identificação das pessoas civis com o porte de armas. Também
obriga que a compra de cada arma seja imediatamente comunicada ao Sistema.
Lei nº 9.455/97: a qual define os crimes de tortura e dá outras providências.
Esta lei representou um passo importante para o fim da prática de
tortura no Brasil. Embora o Brasil tivesse ratificado todos os instrumentos
internacionais destinados a abolir este tratamento desumano, a prática da
tortura não era considerada crime. Com a criação do tipo penal, passa-se a
responsabilizar criminalmente a prática da tortura efetuada, principalmente,
por agentes públicos, na sua maioria policiais militares e civis.
Lei nº 9.714/98: a qual amplia as alternativas à pena de prisão para os
crimes de menor gravidade, por meio da imposição de restrições aos direitos
do condenado e prestações de serviços à comunidade.
Esta lei viabilizou que, aos delitos de menor potencial ofensivo, fossem
aplicadas, ao invés de penas restritivas de liberdade, simplesmente penas de
prestação de serviços à comunidade e restritivas de direitos. Esta inovação no
sistema brasileiro de penas trouxe um menor crescimento da população carcerária.
Lei 9.777/98: a qual define como crimes as condutas que favoreçam ou
configurem trabalho forçado.
Esta lei resultou de grandes esforços para que as condutas ilícitas de
trabalho forçado e escravo fossem consideradas crime. No entanto, até hoje,
são poucas as condenações neste tipo penal, tendo em vista que se torna difícil
caracterizar a intenção de manter o empregado em trabalho forçado.
Lei 9.883/99: a qual institui o Sistema Brasileiro de Inteligência e cria a
ABIN - Agência Brasileira de Inteligência, e dá outras providências.
Com esta lei, as atividades destinadas a compor o serviço de inteligência
foram disciplinadas e seus limites definidos.
Capítulo 5
127Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Lei 9.807/99: a qual estabelece normas para a organização e a manutenção
de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas.
Esta lei significou um avanço importante ao combate à impunidade,
uma vez que vítimas e testemunhas de crimes passaram a receber condições e
proteção de vida para denunciarem os responsáveis pelos graves delitos.
Lei 9.812/99: a qual estabelece penalidade mais severa aos cartórios e
tabelionatos que não quiserem cumprir com a gratuidade das certidões de
nascimento e de óbito.
A lei da gratuidade de registros civil é fundamental para os direitos
humanos. Muitos cartórios não vinham aplicando a gratuidade e foi preciso a
vigência desta lei para obrigar o sistema cartorial brasileiro a respeitá-la, sob
pena de cassação da concessão de funcionamento.
Decreto-Legislativo nº 89/98: o qual aprova a competência obrigatória
da Corte Interamericana de Direitos Humanos em todos os casos relativos à
interpretação ou à aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos para
fatos ocorridos a partir do reconhecimento daquele instrumental internacional.
Ainda neste sentido, Marcos Rolim (2000) enaltece o debate e fomenta a
discussão e o aprimoramento de nossos conhecimentos ao alegar que (Texto 1):
TEXTO 1
Na área da Criança e Adolescente, destacamos o Projeto de Lei 3.188/97, que acrescenta artigo à Lei 8.069 /90 – Estatuto da Criança e Adolescente - determinando o início imediato de investigação quando ocorrer desaparecimento de criança e adolescente (no prazo máximo de seis horas após a notificação), e o Projeto de Lei 3844/97, que dispõe sobre educação em direitos humanos e institui a Política Nacional de Educação em Direitos Humanos para o ensino fundamental e médio. No combate à violência e impunidade tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 861/99, que dispõe sobre o crime de abuso de autoridade pelo uso indevido de força ou arma de fogo, no exercício do poder de polícia.
Contra a discriminação e preconceito, ressaltamos o Projeto de Lei 1940/99, que inclui como crime o ato de discriminar pessoas em razão da sua orientação sexual.
Capítulo 5
128 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Apesar dos evidentes esforços para a institucionalização dos direitos humanos, com a criação de novas leis e novos organismos públicos, é forçoso reconhecer as crescentes violações aos direitos fundamentais. Elas se tornam mais agudas quando envolvem os direitos de crianças e adolescentes, presos e segmentos discriminados da sociedade, como negros, homossexuais, pessoas portadoras de distúrbio mental e portadores de deficiência. O retrato da infância e juventude no Brasil é funesto.
Apesar de termos uma das legislações mais avançadas no mundo destinada a garantir o direito às crianças e adolescentes, ainda não temos na prática ações governamentais e políticas sociais capazes de garantir esses direitos. Somos um país que coleciona trágicos indicadores no que se refere à violência contra crianças e adolescentes.
Cerca de 16% da população de crianças entre 10 e 14 anos estão no trabalho formal e informal, geralmente de forma insalubre, perigosa e sem direitos trabalhistas mínimos. Esse percentual cresce à medida que também aumenta a idade do jovem, indicando que a mão de obra infantil é considerada um subsídio complementar à renda e trabalho das famílias pobres.
O comércio e exploração sexual de crianças e adolescentes é também crescente no país, principalmente nas áreas mais pobres e de forte concentração do turismo. Na maioria das vezes, as redes de exploração sexual infanto-juvenil envolvem autoridades policiais, empresários, políticos e pessoas influentes, que têm certeza de que suas condutas ficarão impunes. As violações são também numerosas contra o adolescente infrator. Em lugar das adequadas medidas socioeducativas, previstas no Estatuto da Criança e Adolescente, ocorre na realidade a reclusão em estabelecimentos semelhantes às piores penitenciárias existentes.
Os jovens, em regra, ficam internados além do prazo legal. As instituições de internação, em quase todos os estados da Federação, oferecem triste espetáculo de violação sistemática dos princípios contidos na Constituição Federal e Estatuto da Criança e Adolescente.
Fonte: Rolim, 2000.
O eminente Dr. Marcos Rolim, após longos anos de vivência como
militante político e ativista em prol das causas humanitárias, continua,
asseverando que (Texto 2):
TEXTO 2
Os efeitos das internações em tais estabelecimentos são extremamente perversos na formação do caráter e da personalidade dos jovens, em nada contribuindo para que eles tenham mínimas condições de educação. O sistema penitenciário brasileiro também passa por uma profunda crise.
As rebeliões de presos, bem como as torturas e chacinas, provocadas por agentes do Estado, são frequentes nas penitenciárias. Geralmente, quem cumpre pena são justamente as pessoas condenadas por delitos de menor potencial ofensivo.
Capítulo 5
129Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
As prisões estão superlotadas, têm custos de manutenção excessivamente altos, são desumanas e incapazes de reeducar o transgressor e reintegrá-lo ao convívio social. Há também uma grande concentração de presos em delegacias de polícias (destinadas à detenção provisória aos não condenados), enfrentando todo o tipo de violação de direitos assegurados na legislação brasileira e em instrumentos internacionais de proteção.
A sociedade brasileira é extremamente violenta com os setores mais discriminados, como negros, mulheres, pobres, homossexuais etc. Os dados indicam ser crescente a existência de grupos de pessoas que se reúnem unicamente com o propósito de disseminar o ódio e o preconceito por etnia, sexo e cor, alguns deles utilizando inclusive a internet.
Fonte: Rolim, 2000.
Por fim, magistralmente, o ex-presidente da Comissão de Direitos
Humanos da Câmara dos Deputados, nos traz conclusão de verdadeira
importância técnica e prática. Vejamos no Texto 3:
TEXTO 3
Consideramos que a superação deste quadro de violência no Brasil passa principalmente pela implementação das seguintes diretrizes gerais, a comprometer as instituições públicas: i) Reforma nos modelos das instituições totais (presídios, manicômios e instituições de internação para adolescentes), adequando-as a paradigmas condizentes com os princípios, valores e leis de defesa dos direitos humanos; ii) Redefinição do Sistema Penal Brasileiro, com revisão do Código Penal Brasileiro, sistema penitenciário, penas e regras de processo penal; iii) Reestruturação e construção de um novo paradigma para as polícias; iv) Federalização dos crimes contra os direitos humanos; v) Incremento da eficácia do sistema judiciário, dotando suas instituições de maior credibilidade e capacidade de aplicação da lei; vi) Campanhas amplas destinadas a combater a violência e a esclarecer os direitos da cidadania.
Fonte: Rolim, 2000.
Isso sem falarmos em outras inúmeras leis que versam sobre a) aplicação,
b) proteção e c) imediatidade e efetividade, que promovem os direitos
humanos fundamentais no contexto de nossa ordem jurídica interna.
5.2.4 A convenção interamericana para prevenir, punir e erradicar
a violência contra a mulher (a convenção de Belém do Pará)
Em 1975, no México, tido como ano internacional das mulheres, ocorreu a
primeira Conferência Mundial sobre a Mulher e, esta, instigou a ONU a elaborar
Tratado Universal que garantisse, no plano internacional, obrigatoriamente,
Capítulo 5
130 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
os princípios da declaração sobre a Eliminação da Discriminação contra a
Mulher, de forma obrigatória. Assim sendo, em 1979, realizou-se a Convenção
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher.
A mulher sempre foi tratada desigualmente. Sempre. Por motivos e
razões morais, políticas, religiosas ou puramente discriminatórias. Neste
sentido, as nações unidas não mais podiam fechar os olhos para um direito
humano fundamental em espécie tal qual a igualdade. Mulheres e homens,
nunca foram iguais.
Mulheres já foram presas por terem traído. Assassinos escaparam ilesos do
assassinato de suas ex-esposas, invocando, perante o Tribunal Soberano do Júri
Popular, a legítima defesa da honra. Mulheres nunca receberam tratamento
isonômico no trabalho, nem gozaram dos mesmos direitos dos homens em
razão da profissão, dentre inúmeras outras situações. Mais que isto: o mundo
ainda hoje é dotado de valores machistas, e existem brutamontes, que ainda
pensam serem eles os verdadeiros donos de suas mulheres. Espancam, batem,
humilham, estupram...
Neste sentido, foi naquele ano que aconteceu a convenção que
versava sobre a abolição de qualquer prática discriminatória em detrimento
das mulheres. Infelizmente, o texto teve a participação de vários Estados-
Membros, todavia, com várias impugnações e outros tipos de reservas feitas
pelos Estados.
Sendo assim, após a Convenção de Viena, em 1993, ficou estipulado
no artigo 39 desta que a erradicação completa, em razão da desigualdade e
discriminação contra as mulheres, deveria ocorrer até o ano 2000.
Neste contexto, na cidade de Belém, capital do estado do Pará,
realizou-se a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
violência contra a Mulher.
CONCEITOCONCEITO
A Convenção é o nome que se dá aos textos que designam atos multilaterais universais, advindos de Conferências internacionais, e, ainda, que versem sobre assunto de interesse geral.
Capítulo 5
131Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Apesar de atualmente as formas de discriminação contra as mulheres não
serem tão explícitas quanto antes, ainda padecemos de dois problemas, que
você deve saber desde já: a) mulheres ainda são implicitamente discriminadas e
b) a violência doméstica, maior causa de exclusão e discriminação contra nossas
mulheres, nem de longe foi erradicada – infelizmente – do nosso dia a dia.
Neste sentido, a Convenção de Belém do Pará foi assinada em 9 de
junho de 1994, e é um texto interamericano, o qual trata de nossas mulheres
sul-americanas, e deve ser visto como texto-marco em prol da diminuição
(não, erradicação) contra tratamento desumano e degradante em relação às
mulheres. Assim sendo, é mais um texto universal, que trata sobre direitos
humanos fundamentais, e nos é especial por ter sido feito aqui em terra brasilis.
5.2.5 A Lei Maria da Penha
No intuito de avançar no processo de igualdade, ou seja, dar efetividade
ao direito humano de igualdade, nasceu legislação inerente às garantias
fundamentais da pessoa humana em nosso ordenamento jurídico, exatamente
em 7 de agosto de 2006.
O texto advindo do projeto de lei da Câmara nº 37 assevera que:
cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal.
Alguns destiladores de ódio alegaram inconstitucionalidade de referido
texto legal, pois, para eles, a disposição do caput, do art. 5º, da Constituição
Federal de 1988, aduz que “homens e mulheres são iguais perante a lei [...]”.
Todavia, este dispositivo de lei – em nosso ordenamento jurídico – é
supraconstitucional, ou seja, é mais do que constitucional, pois objetiva punir
com rigor outrem que agrida domesticamente a mulher, em relação conjugal,
ou seja, visando proteger, nos termos da CF/88, a família, como instituição
maior de construção de processo civilizatório. Não há, nem de longe, que falar
em inconstitucionalidade da norma. Concorda?
Capítulo 5
132 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Antonio Cruz/ABr
Figura 1 – Farmacêutica Maria da Penha que dá nome à leiFonte: Disponível em: <http://commons.wikimedia.org>.
A Lei Maria da Penha serve como alavanca para o recrudescimento do
Estado Democrático, pois visa abolir a agressão e a discriminação contra as
mulheres, assim como a Convenção de Belém do Pará, que precedeu a Cedaw
- Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination against
Women (Convenção para Eliminação de todas as Formas de Discriminação
contra as Mulheres).
LEMBRETELEMBRETE
Após termos estudado, no capitulo anterior, acerca do direito de igualdade, lembre-se de que devemos tratar os iguais igualmente e os desiguais desigualmente na medida de sua desigualdade.
Você deve ter em mente que toda legislação infraconstitucional sobre
direitos humanos fundamentais é mais um mecanismo em direito, que serve
para dar imediatidade e efetividade aos direitos fundamentais, nos exatos
termos constitucionais.
O direito de igualdade subdivide-se em isonomia formal e isonomia
material, como foi visto no capitulo passado. Todavia, mulheres em relação
conjugal, neste país, são historicamente vitimas de violência doméstica (muitas
vezes gratuita).
Capítulo 5
133Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Materialmente falando, a lei é avanço em prol do direito fundamental
de igualdade, tendo em vista que o preceito de isonomia material em
face das mulheres demonstra cristalinamente serem as mesmas desiguais
perante os homens.
Ou seja, é necessário acelerar o processo de efetivação dos direitos
humanos fundamentais, tal qual o direito de igualdade, para, imediatamente,
como norma definidora de garantia fundamental, ser aplicada na práxis (§1º,
art. 5º, da CF/88).
Sendo assim, em prol desta aceleração, somente a lei, o texto de lei, ou
dispositivo de lei, aqui no país – funcionando como legislação interna em
prol de direitos humanos, poderia fazer com que indivíduos que cometessem
qualquer espécie de violência doméstica, fossem efetivamente punidos. Isto
porque a lei, em que pese não ser a contenda e função essencial e inicial,
serve, também, para sancionar de forma coercitiva aqueles que desrespeitam
a ordem legal, bem como os mandamentos do Poder Judiciário, servindo
não só para punir, mas também como lei que altera os costumes e práticas,
que vão de encontro à ordem humanitária, trazendo à sociedade novos
valores culturais, para ensinar, verdadeiramente, que não se pode agredir
a família, sobretudo a mulher, por nenhum meio degradante, psíquico,
físico, moral, pessoal etc.
Após a publicação da Lei, o número de processos por violência doméstica
teve um aumento, mas não em razão de uma espécie de ato contra a lei, mas
sim, para demonstrar que a Lei vem funcionando. Agora, depois de 4 anos
de sua publicação, as mulheres começaram a denunciar formalmente seus
cônjuges pela prática, muitas vezes, de tortura, em meio ao seio familiar.
Neste diapasão, vê-se cristalinamente que, após pressões de grupos
internacionais em prol de causas humanas, especialmente que versassem
sobre mulheres, preconceito, discriminação e violência contra as mesmas, o
Brasil não só deu um avanço gritante em função da consolidação do Estado
de Direito (ou democrático) como, também, serviu de exemplo ao mundo,
no sentido de acelerar a aproximação frente ao direito de igualdade entre
homens e mulheres.
Neste turno, como assevera Fabrício da Mota Alves (2006):
Capítulo 5
134 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
A Lei Maria da Penha irá modificar profundamente as relações entre mulheres vítimas de violência doméstica e seus agressores, o processamento desses crimes, o atendimento policial a partir do momento em que a autoridade tomar conhecimento do fato e a assistência do Ministério Público nas ações judiciais.
Muito embora a iniciativa legislativa tenha sido do próprio Poder Executivo,
que o apresentou ao final de 2004, a proposta é fruto de anos de discussão entre o
Governo brasileiro e a sociedade internacional e também de um apelo de milhões
de mulheres brasileiras vítimas de discriminação por gênero, de agressões físicas e
psicológicas e de violência sexual, tanto dentro como fora do seio familiar.
Por derradeiro, temos que a legislação infraconstitucional atinente
aos direitos humanos fundamentais, advinda de nosso Congresso Nacional,
por meio do processo de efetivação de tais direitos na prática do cotidiano,
bem como pelo Sistema Nacional de Proteção de Direitos Humanos, e o
novo PNDH3 – Plano Nacional de Direitos Humanos 3, e, ainda, por novos
textos legais, que possuem natureza e conteúdo jurídico voltado aos direitos
fundamentais, exprime o crescimento e o amadurecimento do Brasil em função
da aproximação do Estado à Sociedade Civil. Esta última, a cada dia, está mais
convencida e sabedora de que as normas definidoras de direitos e garantias
fundamentais foram feitas para a pessoa humana.
Esta interação entre Estado e Sociedade, além de salutar e democrática,
é, sobretudo, e especialmente, necessária, pois vincula o Estado e todos os seus
órgãos ao indivíduo e dá maior publicidade aos direitos humanos, estes, sim,
verdadeira panaceia e futuro dos povos.
5.3 Aplicando a teoria na prática
Em 29 de maio de 1983, a biofarmacêutica Maria da Penha foi vítima de
violência praticada por seu ex-marido, que disparou contra ela durante o sono
e encobriu a verdade afirmando que houve uma tentativa de roubo.
A agressão – na verdade, uma tentativa de homicídio de seu ex-marido –
deixou sequelas permanentes: paraplegia nos membros inferiores. Duas semanas
depois de regressar do hospital, ainda durante o período de recuperação, Maria
da Penha sofreu um segundo atentado contra sua vida: seu ex-marido, sabendo
de sua condição, tentou eletrocutá-la enquanto ela se banhava.
Capítulo 5
135Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Entre a prática dessa dupla tentativa de homicídio e a prisão do criminoso
transcorreram nada menos que 19 anos e 6 meses, graças aos procedimentos
legais e instrumentos processuais brasileiros vigentes à época, que colaboraram
demasiadamente para a morosidade da Justiça.
Em razão desse fato, o Centro pela Justiça pelo Direito Internacional (CEJIL)
e o Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM),
juntamente com a vítima, formalizaram denúncia à Comissão Interamericana de
Direitos Humanos da OEA – órgão internacional responsável pelo arquivamento
de comunicações decorrentes de violação desses acordos internacionais.
Diante desta inércia do judiciário brasileiro, o que você, graduando(a)
de Direito, vislumbra como sendo atitude correta, uma vez que você já está
ciente que os direitos humanos fundamentais são protegidos (tutelados) e
aplicados (efetiva e imediatamente) pela ordem jurídica interna, bem como
global, internacional e universal? Reflita.
Eis a solução do caso.
Assim, diante da leniência brasileira com a morosidade do processamento
dos crimes domésticos contra a mulher, a Comissão da OEA publicou o Relatório
nº 54, de 2001, em que concluiu o seguinte:
[...] a República Federativa do Brasil é responsável da violação dos direitos às garantias judiciais e à proteção judicial, assegurados pelos artigos 8 e 25 da Convenção Americana em concordância com a obrigação geral de respeitar e garantir os direitos, prevista no artigo 1 do referido instrumento pela dilação injustificada e tramitação negligente deste caso de violência doméstica no Brasil. Que o Estado tomou algumas medidas destinadas a reduzir o alcance da violência doméstica e a tolerância estatal da mesma, embora essas medidas ainda não tenham conseguido reduzir consideravelmente o padrão de tolerância estatal, particularmente em virtude da falta de efetividade da ação policial e judicial no Brasil, com respeito à violência contra a mulher. Que o Estado violou os direitos e o cumprimento de seus deveres segundo o artigo 7 da Convenção de Belém do Pará em prejuízo da Senhora Fernandes, bem como em conexão com os artigos 8 e 25 da Convenção Americana e sua relação com o artigo 1 da Convenção, por seus próprios atos omissivos e tolerantes da violação infligida.
Capítulo 5
136 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Por fim, o Relatório recomendou a continuidade e o aprofundamento
do processo reformatório do sistema legislativo nacional, a fim de mitigar a
tolerância estatal à violência doméstica contra a mulher no Brasil e, em especial,
recomendou “simplificar os procedimentos judiciais penais a fim de que possa
ser reduzido o tempo processual, sem afetar os direitos e garantias do devido
processo” e “o estabelecimento de formas alternativas às judiciais, rápidas e
efetivas de solução de conflitos intrafamiliares, bem como de sensibilização
com respeito à sua gravidade e às conseqüências penais que gera”.
Fonte: Alves, 2006
5.4 Para saber mais
Título: Olga
Autor: Fernando de Morais Editora: Companhia das Letras Ano: 1993
Livro inspirado na história verídica de Olga Benário Prestes, esposa de Luís Carlos Prestes, assassinada na sala de gás nazista, após expulsão do país a mando de Getúlio Vargas. Olga destacou-se, avante seu tempo, por ser uma mulher que não temia ordens autoritárias, bem como por seus ideais políticos.
Título: Temas atuais de direitos humanos
Autor: Flávia Piovesan Editora: Saraiva Ano: 2010
Este clássico é a evolução de vários temas diferenciados, que envolvam direitos humanos. É a reunião de importantes casos sobre violação e solução de direitos fundamentais, sendo obra necessária para a devida compreensão global desta disciplina.
Título: Direitos humanos e o direito constitucional
internacional
Autor: Flávia Piovesan Editora: Saraiva Ano: 2009
Tese de doutorado da professora Flavia Piovesan, ela é a reunião do estudo de direito constitucional, direito internacional e direitos humanos em uma única obra. Referência mundo afora por ser bastante didática e tecnicamente irretocável.
Capítulo 5
137Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Título: A irmandade do crime. PCC-CV.
Autor: Carlos Amorim Editora: Saraiva Ano: 2003
Livro que trata como o degradante sistema prisional brasileiro aperfeiçoa a perpetuação de inúmeros ilícitos, com ênfase no tráfico de drogas, a partir da evolução do sistema carcerário desde presos políticos, os quais eram postos junto aos presos por crimes comuns, até os dias atuais.
Filme: Frida
Direção: Julie Taymor Ano: 2002
Frida Kahlo, artista cultuada nos dias atuais, pelo trabalho realizado na Cidade do México, foi casada com o pintor Diego Rivera. Contrapondo-se às escapulidas de seu marido, também possuidora de veia artística inconteste, fez história ao ter um romance com o revolucionário bolchevique Leon Trotski, e pela obra de arte em pinturas desenvolvidas ao longo de sua vida no México.
5.5 Relembrando
Neste capítulo, versamos sobre legislação brasileira de direitos humanos,
onde descobrimos que:
• esta legislação é infraconstitucional, ou seja, está abaixo da Carta
Magna, mas a mando dela, pois os direitos e as garantias fundamentais
têm aplicação imediata, além de efetiva, devendo o Estado, por meio
de suas leis, garantir esta proteção e funcionamento dos direitos
humanos fundamentais;
• há uma série de leis que versam sobre o aperfeiçoamento das bases
e instituições políticas, como direito da criança e adolescente, bem
como normas visando à punição por porte ilegal de armas, tanto
quanto a lei que define o crime de Tortura, além de texto legal, que
impõe penas alternativas, e a lei que protege vítimas e testemunhas,
dentre outras;
• a criação do Sistema Nacional de Proteção dos Direitos Humanos e a
sua implementação no país ocorreram em 1996, pelo ex-presidente
Fernando Henrique Cardozo, além da implantação do PNDH;
Capítulo 5
138 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• atualmente, o Plano Nacional dos Direitos Humanos está no seu
terceiro nível, e visa, dentre outros propósitos, trazer interação entre
Estado e Sociedade, por meio de diálogo plural e democrático, bem
como trazer à tona o direito à verdade e à memória;
• a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
Violência contra a Mulher – também conhecida como a Convenção
de Belém do Pará, foi assinada nesta cidade em 1994. Antes disso,
vimos a Convenção contra Todas as Formas de Discriminação contra as
Mulheres, assinada em 1979;
• a Lei Maria da Penha nasceu em 2006, por iniciativa do poder
Executivo, pressionado por entidades internacionais que protegem a
mulher contra preconceito, discriminação e violência doméstica.
5.6 Testando os seus conhecimentos
1) O que é uma Convenção?
2) O que é uma Conferência?
3) Qual foi o primeiro Texto Universal sobre Mulheres? Discorra.
4) O que significou o ano de 1975 para as mulheres?
5) O que é a Convenção Internacional contra todas as Formas de Discriminação
contra as mulheres?
6) O que foi a Convenção de Belém do Pará?
7) O que é legislação infraconstitucional?
8) Quais as principais leis que versam em nosso ordenamento jurídico sobre
direitos humanos?
9) O que é o SNPH?
10) O que é o PNDH3?
Capítulo 5
139Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
11) Discorra sobre o princípio da Igualdade, bem como isonomia formal e material.
12) Quem foi Maria da Penha? O que é a Lei Maria da Penha?
13) O que se entende por efetividade e imediatidade em prol dos direitos
humanos fundamentais?
14) Discorra sobre os principais pontos listados no PNDH3.
15) Aduza sobre o Sistema Nacional de Proteção aos Direitos Humanos.
16) Por que foi instituída a Convenção de Belém do Pará?
Onde encontrar
ALVES, F. da M. Lei Maria da Penha: das discussões à aprovação de uma
proposta concreta de combate à violência doméstica e familiar contra a
mulher. Revista Jus Navigandi, [S.l.], ago. 2006. Disponível em: <http://jus.uol.
com.br/revista/texto/8764/lei-maria-da-penha>. Acesso em: 10 out. 2010.
ARNS, P. E. Brasil: nunca mais. 35. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.
COMPARATO, F. K. A afirmação histórica dos direitos humanos. 7. ed. rev. e
atual. São Paulo: Saraiva, 2010.
MORAES, A. de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários
aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e
jurisprudência. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2006. (Temas jurídicos, 3).
PENTEADO FILHO, N. S. Direitos humanos. Ed. rev., atual. e ampl. Rio de
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009.
PIOVESAN, F. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 9. ed.
rev. ampl. e atual. São Paulo. Saraiva, 2009.
______. Temas Atuais de Direitos Humanos. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
Capítulo 5
140 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
ROLIM, M. Avanços e violações de direitos humanos no Brasil: um breve
balanço legislativo e político. 16 maio 2000. Disponível em: <http://www.
dhnet.org.br/4legis/br/cdhcf/rel_maryrobinson.html>. Acesso em: 10 out. 2010.
TAVARES, A. R. Direito constitucional brasileiro concretizado: hard cases e
soluções juridicamente adequadas. São Paulo: Método, 2006.
Capítulo 6
141Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
ANÁLISE DOS PRINCIPAIS DOCUMENTOS RELATIVOS AOS DIREITOS HUMANOS
CAPÍTULO 66
6.1 Contextualizando
Caro(a) aluno(a), neste capítulo você conhecerá o Sistema
Internacional de Proteção aos Direitos Humanos. Para isso, vamos fazer
um passeio pelos principais documentos internacionais, que protegem os
direitos humanos fundamentais.
No capítulo 2, você conheceu os documentos históricos, relacionados à
evolução dos direitos humanos fundamentais. A partir deste momento, neste
capítulo 6, você estudará os documentais atuais, que estão valendo hoje,
frutos de acordos internacionais, celebrados por países soberanos.
Os nomes são os mais diversos: tratados, convenções, protocolos, pactos,
acordos, cartas... O que importa para nós aqui é, na verdade, o conteúdo dos
documentos, qual seja: a proteção dos direitos humanos.
Ao terminar o passeio pelos principais documentos internacionais, é
preciso que, ao final deste capítulo, você consiga:
• reconhecer quais os principais documentos internacionais que visam
proteger os Direitos Humanos Internacionais;
• identificar, entre esses documentos, aqueles que compõem a chamada
Carta Internacional de Direitos Humanos;
• entender quais são as disposições mais relevantes presentes em cada
um desses documentos estudados;
Capítulo 6
142 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• compreender os papéis que são exercidos por Organismos
Internacionais na Proteção dos Direitos Humanos Fundamentais;
• diferenciar a Corte Internacional de Justiça do Tribunal Penal
Internacional, sabendo como surgiu cada um, suas composições,
competências e modo de funcionamento;
• identificar as hipóteses de aplicação do Estatuto de Roma e da atuação
do Tribunal Penal Internacional (ou Corte Penal Internacional). Ou
seja, quando alguém poderá estar sob a Jurisdição deste;
• compreender a dinâmica de funcionamento do Sistema Internacional
de Proteção aos Direitos Humanos.
6.2 Conhecendo a teoria
Os documentos, que serão estudados ao longo deste capítulo, são
acordos formalizados no âmbito da Organização das Nações Unidas. Não que
ela atue somente nessa área, ela atua em outras, como, por exemplo, conflitos
comerciais entre países. Mas a proteção dos direitos humanos é, com certeza,
um de seus principais objetivos.
Diante disso, antes de analisarmos os documentos da ONU, vamos
conhecer essa entidade?
6.2.1 ONU
A Organização das Nações Unidas (ONU), como é conhecida no Brasil,
também é chamada simplesmente de Nações Unidas ou United Nations (UN).
Ela foi oficialmente criada em 24 de outubro de 1945, fruto do documento
intitulado “Carta das Nações Unidas”. Esse documento foi assinado por 50
(cinquenta) países, que se reuniram entre os dias 25 de abril e 26 de junho
daquele ano, na cidade de São Francisco (EUA).
Capítulo 6
143Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Figura 1 – Bandeira da ONUFonte: Disponível em: <http://commons.wikimedia.org>.
A Carta das Nações Unidas foi ratificada pelo nosso país em 21 de
setembro de 1945, tendo sido aprovada no Brasil pelo Decreto-lei nº 7.935, de
04/09/1945, e promulgada pelo Decreto nº 18.841, de 22/10/1945.
A criação da ONU está diretamente associada aos crimes e atrocidades
cometidas contra a humanidade na 2ª Guerra Mundial. Além disso, ficou
comprovado o fracasso da então denominada “Liga das Nações” e de seu
modelo de funcionamento.
Enquanto a Liga nas Nações tinha como preocupação a existência de
meios para a arbitragem e regulação das guerras, a ONU se propôs, desde o
seu início, a buscar a Paz, evitar guerras e promover e defender os direitos
humanos e liberdades fundamentais.
Diante desse contexto, em especial diante da necessidade de se evitar
novas guerras e, consequentemente, novas violações aos direitos humanos, é
que surgiu a ONU.
Os principais objetivos da ONU, expostos na já citada Carta das Nações
Unidas, são:
a) cooperação internacional para a solução de problemas mundiais de
ordem social, econômica e cultural, incentivando o respeito pelos
direitos e liberdades individuais;
b) manutenção da paz e segurança internacionais, entre outras ações em
defesa dos direitos humanos e liberdades fundamentais para todos,
sem distinção de raça, sexo, língua ou religião.
Capítulo 6
144 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Carta das Nações Unidas, acesse o site <http://www.onu-brasil.org.br>. Veja a importância que é dada neste documento ao propósito de proteção aos direitos humanos.
É importante destacar que a Carta das Nações Unidas não define o que
são direitos humanos. No entanto, ela deu um passo fundamental para a
criação do atual sistema de proteção.
No âmbito da ONU, foram e são produzidos diversos documentos, que
visam proteger e a promover os direitos humanos. Esses documentos são
instrumentos jurídicos que, quando adotados pelos países, passam a ter força
normativa. Podemos afirmar que a ONU e seus diversos organismos, como,
por exemplo, a Comissão de Direitos Humanos e o Alto Comissariado para
Refugiados, junto com os documentos que serão aqui estudados, formam o
Sistema Internacional de Proteção aos Direitos Humanos.
ONU + Documentos Internacionais de Direitos Humanos + Organismos da ONU relacionados aos Direitos Humanos = SISTEMA INTERNACIONAL DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS.
Não estudaremos aqui esses organismos, pois não é objeto da nossa
disciplina. A única exceção será o Tribunal Penal Internacional (TPI), que será
estudado no fim do capítulo.
Deste ponto em diante, passaremos a analisar os principais documentos
que compõem o referido sistema. Vamos lá?
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para uma leitura mais aprofundada dos documentos trabalhados neste capítulo, indicamos o livro “Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional”, de Flávia Piovesan. Nesse livro, a autora faz uma análise minuciosa, que não podemos fazer aqui, dos citados documentos.
Capítulo 6
145Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
6.2.2 Declaração Universal dos Direitos Humanos
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ou Universal
Declaration of Human Rights (UDHR), em inglês, foi adotada e proclamada
pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, na
cidade de Paris, por meio da Resolução 217 A (III). Compareceram nessa
assembleia 56 (cinquenta e seis) países. Desses, 48 (quarenta e oito) votaram
a favor e 8 (oito) se abstiveram.
Atente, caro(a) aluno(a), para o fato de que nenhum país se colocou
contra a existência da Declaração Universal dos Direitos Humanos ou
contra seus termos. O que ocorreu foi que 8 (oito) se abstiveram, mas não
votaram contra.
Governo Federal dos Estados Unidos
Figura 2 – Eleanor Roosevelt com a Declaração Universal dos Direitos HumanosFonte: Disponível em: <http://commons.wikimedia.org>.
Isso foi muito importante, pois confirma que seu conteúdo é um conjunto
normativo e axiológico sobre o qual não pairam questionamentos. Dessa forma,
deu-se um passo fundamental na consolidação da teoria do universalismo
contra aqueles que, ainda, pregavam a existência de um relativismo cultural.
Podemos dizer que a Declaração Universal dos Direitos Humanos afirmou a
existência de uma ética universal.
Capítulo 6
146 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
LEMBRETELEMBRETE
Como você estudou no capítulo 3 deste livro-texto, a teoria do relativismo cultural defende que os direitos humanos não são universais, pois a ideia do que é ético, do que é certo, do que é legal pode variar de um País Soberano para
outro. A teoria universalista, que foi adotada na Declaração, afirma que existem determinados direitos, relacionados à dignidade da pessoa humana, que são universais, independentemente do país, religião, etnia, língua...
Nesse sentido, é importante destacar a pretensão expressa no próprio
nome do documento. É uma Declaração sobre direitos humanos, que pretende
ser universal e aceita por toda a humanidade.
Conforme vimos, a Declaração Universal não é um Tratado, assinado e
ratificado por vários países soberanos. Ela é, na verdade, uma resolução da
Organização das Nações Unidas.
Em virtude dessa natureza formal, existem duas posições doutrinárias
quanto à sua natureza jurídica material.
Uma primeira posição, majoritária na doutrina, afirma que ela é dotada
de juridicidade e tem força normativa. Ou seja, sua observância e cumprimento
são obrigatórios, tendo, dessa maneira, os países vinculados a ela o dever de
respeitar o seu conteúdo.
A outra posição, minoritária, defende que a Declaração Universal
dos Direitos Humanos não tem força normativa, sendo, tão somente, uma
recomendação aos países.
No texto da declaração estão dispostos os direitos civis e políticos
(associados ao ideal de liberdade e também conhecidos como direitos de 1ª
dimensão) e os direitos sociais, econômicos e culturais (associados ao ideal de
igualdade e também conhecidos como direitos de 2ª dimensão). Há, ainda,
disposição sobre a fraternidade (ideal associado aos direitos de 3ª dimensão)
como valor universal.
Capítulo 6
147Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
As polêmicas sobre a classificação dos direitos humanos fundamentais em dimensões ou gerações de direitos será objeto de estudo no último capítulo deste nosso livro-texto.
SAIBA QUE
A Declaração Universal dos Direitos Humanos é constituída por 7 (sete)
considerandos, um preâmbulo e 30 (trinta) artigos. É, ainda, dividida em
duas partes. A primeira, do art. I ao art. XXI, dispõe sobre os direitos civis e
políticos. A segunda, do art. XXI ao art. XXX, dispõe sobre os direitos sociais,
econômicos e culturais.
Ao trazer em um mesmo documento, lado a lado, os direitos civis e
políticos e os direitos sociais, econômicos e culturais, a Declaração apontou
para a ideia de indivisibilidade dos direitos humanos. Isso foi muito
importante, tendo em vista que, historicamente, esses direitos eram tratados
de maneira separada.
Essa concepção é reforçada por Teixeira (2008, p. 81):
Ao apresentar conjuntamente os direitos, conjugando os valores de liberdade e igualdade, a Declaração inaugura a concepção atual de que os direitos são indivisíveis, ou melhor, que a prática dos direitos civil e políticos é indissociável do exercício dos direitos econômicos, sociais e culturais.
Apesar de sua grande importância, a Declaração não trouxe em corpo
instrumentos para garantir, na prática, os direitos nela existentes. Isso foi
resolvido com a assinatura de dois Pactos Internacionais, que serão estudados
ainda neste capítulo.
Podemos concluir dizendo que a Declaração Universal dos Direitos
Humanos foi fundamental para a construção de um Sistema Internacional de
Proteção aos Direitos Humanos, para a afirmação da existência de uma ética
universal em defesa desses direitos, para a formalização dos modernos tratados
internacionais de direitos humanos e, por fim, para que fossem incorporados,
em diversos ordenamentos jurídicos nacionais, como ocorreu no Brasil, direitos
Capítulo 6
148 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
relacionados à dignidade da pessoa humana, na forma de Direitos e Garantias
Fundamentais, positivados em uma Constituição.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, acesse: <http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/lg_internacional.htm>. Compare os direitos presentes nela com os previstos no Título dos Direitos e Garantias Fundamentais em nossa Constituição Federal.
6.2.3 Pactos Internacionais “juridicizantes” e a Carta Internacional
de Direitos
Como dissemos anteriormente, a Declaração Universal dos Direitos
Humanos não trouxe no corpo de seu texto instrumentos que garantissem o
respeito e a promoção dos direitos previstos nela. Ou seja, faltava algo que, na
prática, fizesse valer o que estava escrito.
Além disso, mesmo com a posição majoritária atual, que defende que
ela tenha força normativa, muitos entendiam (e nesses muitos entram vários
países soberanos) que ela não teria força jurídica.
Nesse contexto, estamos falando do período logo após a proclamação
da Declaração, em que se defendeu a ideia de que ela deveria ser juridicizada.
Ou seja, deveriam ser criados instrumentos, a partir da assinatura de Tratados
Internacionais, que tornassem o conteúdo da Declaração (os direitos previstos
nela) obrigatório e vinculante.
Essa juridicização começou em 1949, logo após sua proclamação, e só
terminou em 1966, com a elaboração de dois tratados internacionais: o Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais.
Em ambos os Pactos se encontram direitos que estão dispostos na
Declaração Universal dos Direitos Humanos. A grande novidade nesses pactos é
que eles criaram instrumentos para a verificação e implementação dos direitos
previstos nos próprios pactos e na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Capítulo 6
149Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Para Flávia Piovesan (2010), que é acompanhada pela maioria da
doutrina, a Declaração Universal dos Direitos Humanos juntamente com os
dois Pactos Internacionais citados constituem a Carta Internacional de Direitos
Humanos (International Bill of Rights).
Declaração Universal dos Direitos Humanos + Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos + Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais = CARTA INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS.
6.2.4 Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos
Adotado pela Resolução 2.200-A (XXI) da Assembleia Geral da
Organização das Nações Unidas em 6 de dezembro de 1966, o Pacto entrou
em vigor somente em 26 de março de 1976, quase dez anos depois, quando
conseguiu o número mínimo de 35 (trinta e cinco) ratificações para que
pudesse começar a produzir efeitos.
Ele foi ratificado pelo nosso país em 24 de janeiro de 1992, tendo
sido aprovado no Brasil pelo Decreto Legislativo nº 226, de 12/12/1991, e
promulgado pelo Decreto nº 592, de 06/07/1992.
Esse Pacto apresenta um rol maior de direitos civis e políticos, sendo
assim mais amplo que a Declaração Universal. Os direitos previstos nele são
os relacionados à liberdade individual, à proteção do indivíduo contra ações
arbitrárias do Estado e à participação política.
Dentre esses direitos, podemos destacar:
a) direito à vida;
b) direito de não ser submetido à tortura ou a tratamentos cruéis,
desumanos ou degradantes;
c) direito de não ser escravizado, nem submetido à servidão;
d) direito à liberdade e à segurança pessoal e a não ser sujeito à prisão
ou à detenção arbitrárias;
e) direito a um julgamento justo;
f) direito à igualdade perante a lei;
g) direito à liberdade de movimento;
Capítulo 6
150 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
h) direito a liberdades de opinião e de expressão;
i) direito a liberdades de pensamento, consciência e religião;
j) direito a votar e ser votado.
Além disso, está previsto o dever do Estado-parte (País) em assegurar os
direitos nele listados.
A grande inovação desse Pacto foi criar instrumentos para a verificação
e a implementação de defesa e promoção dos direitos humanos. Na verdade,
foi justamente para isso que ele foi instituído.
São esses os instrumentos previstos no Pacto:
a) comitê de Direitos Humanos responsável, principalmente, para
verificar se os Países estão respeitando os direitos humanos
previstos no Pacto e na Declaração Universal. Ou seja, ele é um
órgão de monitoramento;
b) relatórios elaborados voluntariamente por cada país, informando
as medidas por ele tomadas para promover os direitos humanos.
Esses relatórios são submetidos ao Comitê de Direito Humanos;
c) possibilidade de um país fazer uma Comunicação ao Comitê,
alegando que outro país não está cumprindo as disposições do Pacto;
d) possibilidade de um cidadão fazer uma Comunicação ao Comitê,
alegando que um determinado país não está cumprindo as
disposições do Pacto. Essa possibilidade foi trazida pelo Protocolo
Adicional Facultativo ao Pacto, que o Brasil não assinou.
Por fim, é importante destacar que o próprio texto do Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos impõe que a sua observância e
aplicação, por parte dos Estados-Partes (países), é imediata. Afirmou-se a
teoria de que esses direitos não requerem progressiva implementação. Pelo
contrário, eles são autoaplicáveis e passíveis de cobrança imediata. Ou seja,
o país não pode se recusar a reconhecer esses direitos, nem pode demorar
a promover a sua aplicação.
Capítulo 6
151Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, acesse: <http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/lg_internacional.htm>. Compare os direitos presentes nele com os previstos no Título dos Direitos e Garantias Fundamentais em nossa Constituição Federal.
6.2.5 Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
Adotado pela Resolução 2.200-A (XXI) da Assembleia Geral da
Organização das Nações Unidas em 6 de dezembro de 1966, este Pacto entrou
em vigor somente em 26 de março de 1976, quase dez anos depois, quando
conseguiu o número mínimo de 35 (trinta e cinco) ratificações para que ele
pudesse começar a produzir efeitos.
Foi ratificado pelo nosso país em 24 de janeiro de 1992, tendo sido
aprovado no Brasil pelo Decreto Legislativo nº 226, de 12/12/1991, e promulgado
pelo Decreto nº 592, de 06/07/1992.
Como você pode ver pelas informações relativas à adoção desse pacto,
ele foi consequência do mesmo movimento no sentido de dar juridicidade e
força normativa à Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Apesar disso, e da ideia de indivisibilidade dos direitos humanos, foram
gerados dois tratados internacionais distintos.
Não avance no texto. Pare e pense um pouco: por que foram criados dois documentos e não um só para dar força normativa à Declaração Universal?
DESAFIO
Capítulo 6
152 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Chamamos para nos dar a resposta Piovesan (2010, p. 163):
Um dos maiores argumentos levantados pelos países ocidentais em defesa da elaboração de dois pactos distintos centrou-se nos diversos processos de implementação das duas categorias de direitos. Alegou-se que, enquanto os direitos civis e políticos eram auto-aplicáveis e passíveis de cobrança imediata, os direitos econômicos, sociais e culturais eram “programáticos” e demandavam realização progressiva. A existência de diferentes procedimentos de implementação viria a justificar a formulação de dois pactos diversos, já que, para os direitos civis e políticos, o melhor mecanismo seria a criação de um Comitê que apreciasse petições contento denúncia de violação de direitos – instrumento que se mostraria inadequado para a tutela dos direitos econômicos, sociais e culturais.
E foi esse o entendimento que prevaleceu. Após esse esclarecimento,
vejamos quais as principais disposições desse Pacto.
O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais trouxe,
também, um rol mais amplo de direitos, se comparado com os previstos na
Declaração Universal. Dentre esses, podemos destacar:
a) o ser humano livre, libertado do medo e da miséria, só poderá ser
atingido se forem criadas as condições que permitam a cada um
desfrutar direitos econômicos, sociais e culturais (trecho extraído
do preâmbulo);
b) direito ao trabalho;
c) direito à saúde física e mental;
d) direito à educação e à cultura;
e) direito a uma remuneração que assegure uma existência decente para
ele e sua família;
f) todos os Estados se comprometem a agir visando garantir
progressivamente o pleno exercício dos direitos reconhecidos no Pacto.
Capítulo 6
153Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Caro(a) aluno(a), leia atentamente as disposições expostas das letras “a” até “e”, citadas anteriormente, e depois leia a da letra “f”. Preste atenção ao termo “progressivamente”. Agora reflita: será que esse termo não pode ser utilizado, por governantes, como desculpa ou impedimento para não implementar esses direitos?
REFLEXÃO
Quanto a instrumentos para monitoramento da implementação dos
direitos econômicos, sociais e culturais por parte dos países, o único que existe é
a análise de relatórios, elaborados voluntariamente por cada país, informando
as medidas por ele tomadas para promover os direitos. Esses relatórios são
submetidos ao Conselho Econômico e Social da ONU.
Por fim, é importante que você saiba que já houve propostas para
aumentar os instrumentos de monitoramento da implementação dos direitos
econômicos, sociais e culturais. A Conferência de Viena de 1993 recomendou
que fosse direito de petição ao Pacto, permitindo, assim, que fossem feitas
denúncias sobre a não implementação de direitos. Recomendou também que
fossem estabelecidos indicadores, que pudessem verificar os avanços nas áreas
social, econômica e cultural.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, acesse: <http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/lg_internacional.htm>. Compare os direitos presentes nele com os previstos nos artigos 6º e 7º da Constituição Federal.
6.2.6 Estatuto de Roma e o Tribunal Penal Internacional
Esse documento foi aprovado na Conferência de Roma em 17 de julho
de 1998. Entrou em vigor em 1º de junho de 2002, depois de ter alcançado a
quantidade mínima de ratificações (era necessário que pelo menos 60 países
ratificassem o documento para ele entrar em vigor).
Capítulo 6
154 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
A partir do Estatuto de Roma foi criado o Tribunal Penal Internacional
(TPI), composto por 18 (dezoito) juízes, com sede em Haia (Holanda).
Foi ratificado pelo nosso país em 20 de junho de 2002, tendo sido
aprovado pelo Congresso Nacional no Decreto Legislativo nº 112, de
06/06/2002, e promulgado pelo Decreto nº 4.388, de 25/09/2002.
Além da ratificação, o Brasil, colocou expressamente na Constituição
Federal que se submete ao Tribunal Penal Internacional. Veja o atual conteúdo
do § 4º do Art. 5º, incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004: “O
Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação
tenha manifestado adesão.”
Com a criação do TPI, o Sistema Internacional de Proteção aos
Direitos Humanos passou a contar com um Tribunal Internacional
permanente, independente e com jurisdição internacional e complementar
aos tribunais nacionais.
O propósito de se criar um Tribunal Penal Internacional existe desde 1948
(praticamente na mesma época em que surgiu a ONU), quando foi adotada a
Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio. Infelizmente,
tivemos que esperar 50 anos para que a criação do mesmo fosse aprovada.
Antes desse Tribunal, que, como dissemos, é permanente, tivemos 4
(quatro) Tribunais Penais Internacionais ad hoc. Ou seja, criados para julgar
especificamente um acontecimento histórico, uma situação ou um conjunto
de pessoas.
Foram esses os Tribunais ad hoc:
• Tribunal de Nuremberg (1945-1946): criado pelo Acordo de Londres
para processar e julgar os crimes ligados ao Nazismo. Esse é o mais
conhecido de todos.
• Tribunal de Tóquio (1946): Semelhante ao Tribunal de Nuremberg, ele
foi criado para processar e julgar os japoneses considerados criminosos
da 2ª Guerra Mundial.
Capítulo 6
155Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• Tribunal da ex-Iugoslávia (Bósnia, 1993): Criado para processar e julgar
os crimes de guerra cometidos desde 1991 nas guerras ocorridas no
território da antiga Iugoslávia.
• Tribunal de Ruanda (1994): Criado para processar e julgar os crimes
cometidos na guerra civil de Ruanda.
As principais características desses tribunais é que os juízes foram
designados depois dos crimes ocorrerem, ferindo, assim, o princípio do
Juiz Natural, e que os crimes não estavam efetivamente estabelecidos
anteriormente, ferindo, assim, o princípio da legalidade.
Com o advento do TPI, esses problemas não existiram mais. Agora
nós temos uma norma, o Estatuto de Roma, que prevê quem julgará, quais
crimes serão julgados e quais são as condições para que o TPI passe a exercer
a sua jurisdição internacional. Ou seja, temos um sistema de justiça penal
internacional preestabelecido, permanente, independente e universal.
Como já vimos, os juízes são em número de 18 (dezoito). Eles possuem
mandatos de nove anos e são escolhidos pela Assembleia de Estados-Partes do
TPI. Existe ainda a promotoria, que é competente para propor ações penais.
É vedada a presença de dois membros de uma mesma nacionalidade na
composição do Tribunal.
Os crimes que são processados e julgados pelo TPI são os previstos no
Art. 5º do Estatuto de Roma, in verbis:
1. A competência do Tribunal restringir-se-á aos crimes mais graves, que afetam a comunidade internacional no seu conjunto. Nos termos do presente Estatuto, o Tribunal terá competência para julgar os seguintes crimes:
a) O crime de genocídio;b) Crimes contra a humanidade;c) Crimes de guerra;d) O crime de agressão.
As condições para que o caso seja levado a julgamento no TPI estão
previstas no Art. 17 do mesmo Estatuto (Texto 1):
Capítulo 6
156 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
TEXTO 1
Artigo 17
Questões Relativas à Admissibilidade
1. Tendo em consideração o décimo parágrafo do preâmbulo e o artigo 1o, o Tribunal decidirá sobre a não admissibilidade de um caso se:
a) O caso for objeto de inquérito ou de procedimento criminal por parte de um Estado que tenha jurisdição sobre o mesmo, salvo se este não tiver vontade de levar a cabo o inquérito ou o procedimento ou, não tenha capacidade para o fazer;
b) O caso tiver sido objeto de inquérito por um Estado com jurisdição sobre ele e tal Estado tenha decidido não dar seguimento ao procedimento criminal contra a pessoa em causa, a menos que esta decisão resulte do fato de esse Estado não ter vontade de proceder criminalmente ou da sua incapacidade real para o fazer;
c) A pessoa em causa já tiver sido julgada pela conduta a que se refere a denúncia, e não puder ser julgada pelo Tribunal em virtude do disposto no parágrafo 3o do artigo 20;
d) O caso não for suficientemente grave para justificar a ulterior intervenção do Tribunal.
2. A fim de determinar se há ou não vontade de agir num determinado caso, o Tribunal, tendo em consideração as garantias de um processo eqüitativo reconhecidas pelo direito internacional, verificará a existência de uma ou mais das seguintes circunstâncias:
a) O processo ter sido instaurado ou estar pendente ou a decisão ter sido proferida no Estado com o propósito de subtrair a pessoa em causa à sua responsabilidade criminal por crimes da competência do Tribunal, nos termos do disposto no artigo 5o;
b) Ter havido demora injustificada no processamento, a qual, dadas as circunstâncias, se mostra incompatível com a intenção de fazer responder a pessoa em causa perante a justiça;
c) O processo não ter sido ou não estar sendo conduzido de maneira independente ou imparcial, e ter estado ou estar sendo conduzido de uma maneira que, dadas as circunstâncias, seja incompatível com a intenção de levar a pessoa em causa perante a justiça;
3. A fim de determinar se há incapacidade de agir num determinado caso, o Tribunal verificará se o Estado, por colapso total ou substancial da respectiva administração da justiça ou por indisponibilidade desta, não estará em condições de fazer comparecer o acusado, de reunir os meios de prova e depoimentos necessários ou não estará, por outros motivos, em condições de concluir o processo.
Além dessas disposições, merecem destaque as disposições do Art. 13,
que preveem os meios para que a Jurisdição Internacional seja acionada,
quais sejam:
Capítulo 6
157Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• denúncia de um dos Estados-Partes (país);
• denúncia do Conselho de Segurança da ONU;
• iniciativa da Promotoria.
As penas estão previstas no Art. 77. Também podem ser impostas sanções
de natureza civil, conforme o Art. 75. Você pode constatar, analisando esses
artigos, que o TPI combina justiça retributiva com justiça reparativa.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo do Estatuto de Roma, acesse o site: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4388.htm>.
6.2.7 Corte Internacional de Justiça
A Corte Internacional de Justiça é o principal órgão judiciário da ONU.
Também é conhecida por Tribunal Internacional de Justiça, não devendo nunca
ser confundida com o Tribunal Penal Internacional, que vimos anteriormente.
A Corte tem sede em Haia (Holanda), sendo, por isso, também chamada de
Corte de Haia ou Tribunal de Haia.
Essa Corte foi criada junto com a própria ONU, em 1945, com base
no artigo 92 da Carta das Nações: “A Corte Internacional de Justiça será o
principal órgão judiciário das Nações Unidas. Funcionará de acordo com o
Estatuto anexo, que é baseado no Estatuto da Corte Permanente de Justiça
Internacional e faz parte integrante da presente Carta.”
Dentre as suas funções, destacam-se:
a) julgar os conflitos submetidos à Corte pelos Estados-Partes da ONU,
por Estados, que aderiram ao Estatuto da Corte, ou pelo Conselho de
Segurança da ONU;
b) emitir pareceres sobre questões jurídicas, solicitadas pela ONU ou por
algum de seus diversos organismos, conforme disposições previstas
em seu estatuto.
Capítulo 6
158 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Veja que fica claro que somente países e organismos internacionais podem
submeter questões à Corte. Assim sendo, indivíduos não podem submeter
questões, tampouco serem julgados. Essa é uma diferença importante em
relação ao Tribunal Penal Internacional, que julga indivíduos.
A Corte Internacional de Justiça é constituída por 15 (membros), eleitos
pela Assembleia Geral e pelo Conselho de Segurança da ONU. Estes são
escolhidos a partir de sua competência e não com base na nacionalidade.
No entanto, busca-se que, na composição da Corte, estejam representados
os principais sistemas jurídicos do mundo, sendo vedada a presença de dois
membros de uma mesma nacionalidade. Os membros possuem mandato
de nove anos, sendo permitida uma reeleição, não podendo, durante o seu
mandato, exercer outra atividade.
Atualmente existe um brasileiro, Antônio Augusto Cançado Trindade,
exercendo a função de Juiz (membro) da Corte Internacional de Justiça. Seu
mandato vai até 2018.
6.3 Aplicando a teoria na prática
Caro(a) aluno(a), um dos grandes entraves, apontado por especialistas,
para uma efetiva concretização da proteção internacional dos direitos humanos
era a inexistência de um órgão jurisdicional penal permanente. Nesse sentido,
sempre era colocado um questionamento do tipo: “Se um governante comete
um genocídio, um crime contra os direitos humanos, o que ocorre?”. Procure
refletir sozinho(a) sobre esta questão à luz do que vimos neste capítulo, pois,
a seguir, iremos analisá-la juntos.
Vamos lá? Essa questão passou a ter resposta de uns anos para cá com a
criação do TPI. Vejamos um caso que ilustra isso.
Em comunhão com o § 4º, do art. 5º, da CRFB/88, o Brasil se submete
à jurisdição do Tribunal Penal Internacional, como já vimos, o TPI, com sede
em Haia, na Holanda. Desde que entrou em vigor, no dia 1º de julho de 2002,
o Tribunal já recebeu mais de 500 denúncias provenientes de 66 países. A
Alemanha lidera com 93 acusações, seguida pelos Estados Unidos, com 70,
e França, com 58. O TPI foi criado após a ratificação do Estatuto de Roma.
Neste sentido, ele julga crimes de lesa humanidade, que violem frontalmente
Capítulo 6
159Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
e coletivamente os direitos humanos, como genocídios, massacres, captura
e escravização de crianças em razão de conflitos armados, dentre inúmeras
atrocidades cometidas contra os povos.
Neste sentido, o primeiro caso trazido a julgamento pelo TPI trata
exatamente do crime de recrutamento e utilização de crianças no conflito
armado que envolve a República Democrática do Congo - que de democrática
não tem nada.
O Tribunal trouxe ao banco dos réus, após denúncia do chefe da
promotoria do TPI - Luis Moreno Ocampo, a pessoa de Thomas Lubanga Dyilo,
um facínora, chefe militar congolês, também conhecido como Senhor da
Guerra, acusado de assolar a região, usando a exploração de crianças, em face
da guerra civil instaurada no Congo.
Segundo Sylvia Helena F. Steiner (2010, p. 1), Juíza brasileira junto
ao Tribunal Penal Internacional (TPI) desde 2003, presidente da Câmara
Preliminar I:
A utilização de crianças por todos os grupos armados envolvidos no conflito cresceu expressivamente, conforme acima mencionado, constata-se que em algumas regiões, como na República Democrática do Congo, o alistamento e recrutamento de crianças junto às forças armadas decresceu. No entanto, com a proliferação de grupos armados atuantes principalmente na região dos Kivus, a utilização de crianças por todos os grupos envolvidos no conflito cresceu expressivamente. Já na região de Ituri, na qual os líderes dos principais grupos rebeldes armados foram detidos e entregues ao Tribunal Penal Internacional, não foram constatados novos casos de recrutamento de crianças. Ainda assim, o informe de 2008 dava conta da existência de pelo menos 3.500 crianças-soldado em campos de batalha na República Democrática do Congo. Do informe consta ainda que, desde 2004, mais de 31 mil crianças haviam sido desmobilizadas e liberadas, tanto das forças armadas como de grupos rebeldes.
Assim sendo, a exploração de crianças para aperfeiçoamento de
atrocidades contra os direitos humanos necessita de punição severa
pelo Tribunal Internacional Penal, que deve responsabilizar ditadores
inescrupulosos, que se perpetuam no poder por intermédio do totalitarismo
e das trevas.
Este caso nos faz relembrar de dois outros assemelhados, que foram
transformados em filmes no cinema. O primeiro chama-se “Diamante de
Capítulo 6
160 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Sangue”, o qual relata a escravização de crianças em Serra Leoa, em razão do
tráfico de diamantes. O segundo, “O último Rei da Escócia”, conta os últimos
dias do ditador de Ruanda, personagem encarnado pelo gênio Forest Wkitaker.
A utilização de crianças para a prática de crimes, que violam os direitos
fundamentais e consolidam nações política e economicamente no atraso
universal contra os direitos humanos, faz com que a conduta do Senhor da
Guerra seja considerada como crime de guerra, nos termos do artigo 8º do
Estatuto de Roma.
A doutora Sylvia Helena F. Steiner (2010, p. 1) alegou ainda que:
Tendo atuado como juíza na fase preliminar do processo, que culminou com a decisão que enviou o acusado a julgamento, creio que posso tentar traduzir, em poucas palavras, o impacto que o recrutamento e utilização de crianças em conflitos armados produz sobre milhares de crianças em diversas partes do mundo. Essas condutas são consideradas pelo Estatuto de Roma como dentre as mais sérias violações a direitos fundamentais, e por isso previstas como crimes de guerra, que põem em risco a paz e a sobrevivência da humanidade.
Por derradeiro, a eminente professora doutora Sylvia Helena (2010, p. 1)
nos traz substancial ensinamento ao concluir que:
São considerados como conquistas fundamentais da comunidade internacional os primeiros passos dados no sentido de responsabilizar pessoalmente aqueles que recrutam e utilizam crianças como soldados. Nesse sentido, a exemplo, os procedimentos diante do Tribunal Penal Internacional, a condenação, em 2007, pela Corte Especial de Serra Leoa de quatro pessoas envolvidas em recrutamento forçado de crianças durante a guerra civil, a criação das Comissões de Verdade naquele país, no Timor Leste e mais recentemente na Libéria, todas elas investigando igualmente o recrutamento e utilização de crianças em conflitos armados.
Confirma-se assim, a meu ver, a idéia de que o ciclo de impunidade, que levou o mundo do pós-guerra à situação descrita por Chérif Bassiouni na introdução deste relato, começa a ser desafiado, ao menos no que diz respeito à proteção das crianças desta e das futuras gerações em situações de conflito armado. Estão colocados à disposição da comunidade internacional o necessário arcabouço legal, e instituições legais internacionais, regionais e locais de responsabilização individual. Resta a pressão da comunidade internacional para que tais instrumentos e instituições sejam efetivamente utilizados para acabar com essa forma dramática de vitimização de crianças.
Capítulo 6
161Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Por fim e conclusão, nasceu o Tribunal Penal Internacional, por meio do
Estatuto de Roma, o qual entrou em vigor em 1º de julho de 2002.
Essa data marca o início da jurisdição temporal do TPI. O Estatuto de
Roma é um tratado e conta, atualmente, com 110 Estados-Partes.
Sendo assim, mostra-se a aplicação e imediatidade da proteção
internacional dos direitos humanos fundamentais, para dar-lhes efetividade.
Eles possuem, inclusive, jurisdição penal internacional que visa coibir, prevenir,
punir e a erradicar a violência praticada por genocidas e ditadores, que insistem
em violar os direitos da pessoa humana.
6.4 Para saber mais
Site
URL: <www.onu-brasil.org.br>
Site das Nações Unidas (ONU) no Brasil. Todo feito em português, ele traz informações detalhadas sobre a atuação das Nações Unidas e de seus diversos organismos no Brasil e no Mundo. Além disso, você pode encontrar nesse site todos os documentos aqui estudados, além de muitos outros.
Filme: Hotel Ruanda
Direção: Terry George Ano: 2004
Este filme conta a história de Paul Rusesabagina, que era gerente do hotel Milles Collines, em Ruanda. No ano de 1994, um conflito étnico-político nesse país africano levou à morte cerca de um milhão de pessoas. Em meio a esse genocídio, Paul Rusesabagina transforma o Hotel em que ele era gerente em um verdadeiro campo de refugiados. É fundamental assistir esse filme para saber que, a partir desse conflito, a ONU instalou o Tribunal Penal Internacional para Ruanda, que foi um dos precedentes do atual e permanente Tribunal Penal Internacional criado pelo Estatuto de Roma.
Título: A afi rmação histórica dos direitos humanos
Autor: Fábio Konder Comparato Editora: Saraiva Ano: 2010
Nesse livro, Fábio Konder faz uma apresentação detalhada das sucessivas etapas da evolução histórica dos direitos humanos, analisando vários documentos históricos relativos à matéria. Texto indispensável para o aprofundamento dos conhecimentos sobre o histórico.
Capítulo 6
162 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Título: Direitos Humanos e o Direito Constitucional
Internacional
Autor: Flávia Piovesan Editora: Saraiva Ano: 2009
A autora desse livro é considerada por muitos a principal doutrinadora brasileira sobre Direito Humanos. Em seu livro, ela analisa, de maneira minuciosa, cada um dos documentos estudados aqui neste capítulo, além de outros, que não foram abordados. Traz ainda um apêndice com todos os documentos analisados na íntegra.
6.5 Relembrando
Neste capítulo, descobrimos que:
• o Sistema Internacional de Proteção aos Direitos Humanos é constituído
pela ONU, pelos seus organismos relacionados aos Direitos Humanos
e pelos Documentos Internacionais de Direitos Humanos;
• a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi fundamental para
a construção de um Sistema Internacional de Proteção aos Direitos
Humanos, para a afirmação da existência de uma ética universal em
defesa desses direitos, para a formalização dos modernos tratados
internacionais de direitos humanos e, por fim, para que fossem
incorporados, em diversos ordenamentos jurídicos nacionais, como
ocorreu no Brasil, direitos relacionados à dignidade da pessoa
humana na forma de Direitos e Garantias Fundamentais positivados
em uma Constituição;
• a Carta Internacional de Direitos Humanos (International Bill of
Rights) é constituída pela Declaração Universal dos Direitos Humanos
juntamente com o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e
com o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais;
• os referidos pactos internacionais foram criados para dar força
jurídica e normativa à Declaração Universal dos Direitos Humanos,
criando instrumentos para que fossem implementados os direitos
nela previstos;
• o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos trouxe um rol maior
de direitos civis e políticos, sendo, assim, mais amplo que a Declaração
Capítulo 6
163Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Universal. Os direitos previstos nele são os relacionados à liberdade
individual, à proteção do indivíduo contra ações arbitrárias do Estado
e à participação política;
• o Comitê de Direitos Humanos da ONU, instituído a partir do Pacto
Internacional dos Direitos Civis e Políticos, é o órgão responsável pelo
monitoramento da implementação dos direito humanos pelos países;
• o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais traz
um rol mais amplo de direitos, se comparado com os previstos na
Declaração Universal. No entanto, o próprio texto do pacto admite
que esses direitos devem ser implementados progressivamente;
• o Estatuto de Roma, que criou o Tribunal Penal Internacional, foi
aprovado na Conferência de Roma em 17 de julho de 1998. Nesse
estatuto estão previstas as hipóteses que levam um indivíduo a ser
julgado por esse Tribunal;
• antes do advento do Estatuto de Roma, existiram 4 (quatro) tribunais
penais internacionais. No entanto, esses não eram permanentes.
Apenas foram criados para processar e julgar crimes específicos;
• o Tribunal Penal Internacional (ou Corte Penal Internacional) é
um tribunal penal independente, permanente, sediado em Haia
(Holanda), com jurisdição internacional e complementar aos tribunais
nacionais, que tem como competência processar e julgar os crimes
previstos no Estatuto de Roma;
• a Corte Internacional de Justiça, também sediada em Haia (Holanda),
criada em 21 de setembro de 1945, é o principal órgão da ONU
responsável por resolução de conflitos.
Capítulo 6
164 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
6.6 Testando os seus conhecimentos
1) (Defensor Público/PI - 2009) Com relação aos mecanismos internacionais de
proteção e monitoramento dos direitos humanos, assinale a opção correta.
a) O Tribunal de Nuremberg não teve nenhum papel histórico na
internacionalização dos direitos humanos.
b) A ONU nasceu com diversos objetivos, como a manutenção da paz e
da segurança internacionais, entretanto, a proteção internacional dos
direitos humanos não estava incluída entre eles.
c) Quando foi adotada e proclamada por resolução da Assembleia Geral
das Nações Unidas, a UDHR, por não ter sido aceita por todos os países,
não teve importância histórica.
d) Além da UDHR de 1948, não há outros documentos relevantes no
âmbito da proteção internacional global dos direitos humanos.
e) O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966 previu novas
espécies de direitos humanos além daquelas previstas expressamente
na UDHR de 1948.
2) (Defensor Público/PI - 2009) Considere as situações hipotéticas abaixo
apresentadas.
I. João agrediu fisicamente sua secretária, ex-companheira,
machucando-a com um soco no rosto por se recusar a sair com ele.
II. Sebastião forçou sua esposa à prática de atos libidinosos, causando-
lhe enorme dor psicológica.
À luz da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar
a Violência contra a Mulher, Convenção de Belém do Pará, importante
ferramenta de promoção da emancipação das mulheres, assinale a opção
correta a respeito das situações descritas.
a) Ambas as situações enquadram-se na definição de violência contra
a mulher.
Capítulo 6
165Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
b) Na situação I, não ficou caracterizada violência contra a mulher, pois
a agressão se deu dentro do lar.
c) Na situação II, não se caracterizou violência contra a mulher, pois a
esposa tem obrigação conjugal de coabitação.
d) Nenhuma das situações caracteriza violência contra a mulher.
e) Na situação I, não há violência de gênero contra a mulher, mas, sim,
uma violência comum prevista na legislação penal nacional.
3) (Defensor Público/PI - 2009) A UDHR foi redigida à luz das atrocidades
cometidas durante a 2.ª Guerra Mundial. Nesse documento, marco da proteção
internacional dos direitos humanos, foi afirmado que:
a) O meio ambiente é um direito das presentes e futuras gerações.
b) O Fundo Monetário Internacional não deve conceder empréstimos
para países que usem mão de obra infantil.
c) Liberdade, igualdade e fraternidade são os três princípios axiológicos
fundamentais em matéria de direitos humanos.
d) Sanções econômicas deverão ser aplicadas pela ONU às nações que
não adotarem as recomendações da UDHR.
e) Deverá ocorrer intervenção humanitária pela ONU, caso as nações
não adotem as recomendações da UDHR.
4) (MPT-Ministério Público do Trabalho - 16º - 2009-2010) Assinale a
alternativa INCORRETA:
a) Dentre as disposições contidas no Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais, encontra-se o reconhecimento do
direito ao salário equitativo e a uma remuneração igual por trabalho
de igual valor, sem qualquer distinção.
b) A rejeição da perspectiva de mercantilização do trabalho foi incorporada
à Constituição da Organização Internacional do Trabalho pela chamada
Declaração de Filadélfia acerca dos fins e objetivos da OIT.
c) A internacionalização da proteção dos direitos humanos prescinde
de mecanismos de incorporação de conteúdos pelo direito interno
de cada país, na medida em que se reconheça a jurisdição das
Cortes Internacionais.
Capítulo 6
166 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
d) De acordo com o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos,
é dever dos Estados-Partes assegurar os direitos neles previstos,
inclusive protegendo os indivíduos contra a violação de seus direitos
perpetrada por entes privados.
e) NDA.
5) (Magistratura Federal/3.ª Região - 15º - 2010) A Declaração Universal dos Direitos
Humanos, fundada no reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros
da família humana, reconhece como direito inalienável do Homem, exceto:
a) O direito à instrução, sendo a instrução elementar obrigatória.
b) O direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família
saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação,
cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis.
c) O direito de proteção à minoria ética e religiosa, assim entendida
como os imigrantes residentes em determinado Estado.
d) O direito de participar livremente da vida cultural da comunidade.
e) NDA.
6) (MPT - 16º - 2009-2010) Assinale a alternativa INCORRETA:
a) Para os fins da Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de
Discriminação contra a Mulher, a expressão “discriminação contra
a mulher” significará toda distinção, exclusão ou restrição baseada
no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o
reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, ressalvado seu estado
civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos
humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico,
social, cultural e civil, ou qualquer outro campo.
b) A Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as formas
de Discriminação Racial estabelece que não serão consideradas
discriminação racial as medidas especiais tomadas com o único
objetivo de assegurar o progresso adequado de certos grupos raciais
ou étnicos ou de indivíduos que necessitem da proteção que possa ser
necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual gozo
ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais.
Capítulo 6
167Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
c) Para os efeitos da Convenção sobre os Direitos da Criança, entende-
se por criança todo ser humano menor de 18 anos de idade, salvo
se, em conformidade com a lei aplicável à criança, a maioridade seja
alcançada antes.
d) A Convenção Americana de Direitos Humanos impõe como garantia
judicial que: toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas
garantias e dentro de um prazo razoável, por um Juiz ou Tribunal
competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente
por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra
ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil,
trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.
e) NDA.
Onde encontrar
BOBBIO, N. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campos, 1992.
BRASIL. Casa Civil. Decreto 4.388. Cria o Estatuto de Roma. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4388.htm>. Acesso em:
29 set. 2010.
COMPARATO, F. K. A afirmação histórica dos direitos humanos. 10. ed. São
Paulo: Saraiva, 2010.
FERREIRA FILHO, M. G. Direitos humanos fundamentais. 2. ed., rev. e atual.
São Paulo: Saraiva, 1998.
HOTEL RUANDA. Direção: Terry George, Lions Gate Films, EUA/Itália/África
do Sul, 2004. 121 minutos.
PENTEADO FILHO, N. S. Manual de direitos humanos. 2. ed. São Paulo:
Método, 2010.
PIOVESAN, F. Direitos humanos e o direito constitucional Internacional. 11.
ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
Capítulo 6
168 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
STEINER, S. H. F. O Tribunal Penal Internacional (TPI) e Crianças em Situações
de Conflitos Armados. Revista Internacional de Direito e Cidadania. n. 8,
out/2010 a jan/2011. ISSN nº 1983-1811. Disponível em: <http://www.iedc.org.
br/REID/?CONT=00000153>. Acesso em: 29 set. 2010.
TEIXEIRA, C. N. Direito internacional: público, privado e dos direitos
humanos. 2. ed. São Paulo, 2008.
TRINDADE, A. A. C. T. Tratado de direito internacional dos direitos humanos
Vol. III. Porto Alegre: Fabris, 2003.
Capítulo 7
169Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
O SISTEMA CONTINENTAL DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS
CAPÍTULO 77
7.1 Contextualizando
Caro(a) aluno(a), no capítulo anterior, você estudou o Sistema
Internacional de Proteção aos Direitos Humanos, onde conheceu organismos
e documentos relativos à matéria.
Nesse capítulo, continuaremos estudando esse Sistema Internacional,
mas vamos abordar algo mais específico do mesmo: o Sistema Regional
Interamericano de proteção aos Direitos Humanos. Vamos analisar os principais
documentos e organismos que o compõem.
Será mais um passeio como outros aqui já feitos. Ao término desse
capítulo, é preciso que você:
• consiga reconhecer quais os principais documentos que compõem o
Sistema Regional de Proteção aos Direitos Humanos;
• compreenda os papéis que são exercidos e a dinâmica de funcionamento dos
Organismos e Instrumentos Regionais de Proteção aos Direitos Humanos;
• diferencie a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Corte
Interamericana de Direitos Humanos, sabendo qual a composição, o papel
e a atribuição de cada uma, seus modos de funcionamento, assim como a
relação que se estabelece entre elas na proteção dos direitos humanos no
âmbito do sistema regional;
• saiba quais são as disposições mais relevantes presentes em cada um
desses documentos estudados;
Capítulo 7
170 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• identifique quais são as hipóteses que podem levar os Estados a terem
suas condutas (ou omissões) analisadas pelos organismos regionais de
proteção aos direitos humanos.
7.2 Conhecendo a teoria
Os documentos que serão estudados ao longo deste capítulo são acordos
formalizados no âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA), que
foi fundada com o objetivo, dentre outros, de defender os interesses do
continente americano, buscando soluções pacíficas para o desenvolvimento
econômico, social e cultural.
Nessa perspectiva e considerando que a OEA surgiu logo após o advento
da ONU, a defesa e promoção dos direitos humanos no âmbito regional será
um dos seus objetivos.
Diante disso, antes de analisarmos os documentos da OEA, vamos
conhecer essa entidade.
7.2.1 Organização dos Estados Americanos (OEA)
A Organização dos Estados Americanos (OEA) foi oficialmente criada em
30 de abril de 1948, fruto do documento intitulado “Carta da Organização dos
Estados Americanos”, chamado também de “Carta de Bogotá”, em alusão ao
fato do mesmo ter sido assinado na capital da Colômbia, tendo sido assinada
por 21(vinte e um) países. A sede da OEA funciona em Washington (EUA).
Figuras 1 e 2 – Bandeira da OEA e sede da OEA em Washington, respectivamenteFonte: Disponível em: <http://commons.wikimedia.org>.
Capítulo 7
171Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
A Carta de Bogotá entrou em vigor no Brasil em 13 de dezembro de 1951,
tendo sido aprovada pelo Decreto Legislativo 64, de 7 de dezembro de 1951.
Diferentemente da ONU, que surgiu principalmente por causa da
preocupação com os direitos humanos, a OEA surgiu com suas preocupações
mais voltadas para as questões regionais. Isso não a impediu de constituir, no
âmbito regional, um importante Sistema Regional de Proteção aos Direitos
Humanos Fundamentais.
É importante destacar que a “Carta da Organização dos Estados
Americanos” passou por algumas atualizações, a partir de protocolos que
foram assinados pelos países-membros da OEA.
Os principias objetivos da OEA, expostos na já citada Carta, são:
a) garantir a paz e a segurança continentais;
b) promover e consolidar a democracia representativa, respeitado o
princípio da não intervenção;
c) prevenir as possíveis causas de dificuldades e assegurar a solução
pacífica das controvérsias que surjam entre seus membros;
d) organizar a ação solidária destes em caso de agressão;
e) procurar a solução dos problemas políticos, jurídicos e econômicos,
que surgirem entre os Estados-membros;
f) promover, por meio da ação cooperativa, seu desenvolvimento
econômico, social e cultural;
g) erradicar a pobreza crítica, que constitui um obstáculo ao pleno
desenvolvimento democrático dos povos do Hemisfério; e
h) alcançar uma efetiva limitação de armamentos convencionais, que
permita dedicar a maior soma de recursos ao desenvolvimento
econômico-social dos Estados-membros.
Capítulo 7
172 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Veja que a defesa e a promoção dos direitos humanos não são colocadas
como um objetivo diretamente, mas a leitura da Carta como um todo, que faz
referência à ONU, por exemplo, deixa clara a intenção da OEA em atuar nessa
área. Na Carta da Organização dos Estados, inclusive, está previsto a criação de
um Organismo para esse fim.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Carta da Organização dos Estados, acesse <http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/marcos/hdh_carta_oea_1948.pdf>. Identifique, na sua leitura, o Organismo referido no parágrafo anterior.
Essa suposta “pouca atenção” com a defesa e promoção dos direitos
humanos fundamentais será devidamente sanada com a edição de diversos
documentos relativos à matéria.
Dessa forma, no âmbito da OEA, também foram e são produzidos diversos
documentos, que visam proteger e promover os direitos humanos. Esses
documentos são instrumentos jurídicos que, quando adotados pelos países,
passam a ter força normativa e compõem junto com a OEA e seus diversos
organismos, em especial a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a
Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Sistema Regional Interamericano
de Proteção aos Direitos Humanos.
OEA
+
Documentos Interamericanos de Direitos Humanos
+
Organismos da OEA relacionados aos Direitos Humanos
=
Sistema Internacional de Proteção aos Direitos Humanos
Capítulo 7
173Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Ao longo deste capítulo, vamos estudar os principais documentos, assim
como os principais organismos que compõem esse sistema.
É importante destacar que o Sistema Regional de Proteção aos Direitos
Humanos, no âmbito da OEA, não concorre com o Sistema Global no âmbito
da ONU. Muito pelo contrário, eles se integram. O Sistema Regional, além
de complementar o Sistema Global, ainda tem vantagem de poder atuar
observando particularidades regionais. Justamente por isso que hoje nós temos
Sistemas Regionais de proteção aos direitos humanos em outros continentes e
não somente nas Américas.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Você pode conhecer os outros Sistemas Regionais de Proteção aos Direitos Humanos, acessando o site: <http://www.dhnet.org.br>.
7.2.2 Convenção Americana de Direitos Humanos
Também conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, a Convenção
Americana de Direitos Humanos é, sem a menor sombra de dúvidas, o
documento mais importante que integra o Sistema Regional Americano de
Proteção aos Direitos Humanos.
A Convenção Americana de Direitos Humanos foi adotada em 22 de
novembro de 1969 a partir da Conferência Especializada Interamericana sobre
Direitos Humanos realizada em San José, capital da Costa Rica. É esse último
fato que a faz ser, também corretamente, conhecida por Pacto de San José da
Costa Rica. Esse documento só entrou em vigor em 18 de julho de 1978 após o
depósito do décimo primeiro instrumento de ratificação.
A Convenção Americana de Direitos Humanos está em vigor em nosso
país desde 25 de setembro de 1993, tendo sido aprovada pelo Decreto
Legislativo 27 da mesma data e promulgada pelo Decreto 678 de 6 de
novembro de 1992.
Capítulo 7
174 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Fazendo a leitura da Convenção, podemos identificar, em especial, dos
artigos 3º ao 25, um rol de direitos bastante semelhantes com os encontrados
no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. Podemos concluir, assim,
que houve, em um primeiro momento, por parte dos países-membros da OEA,
uma maior preocupação com os chamados direitos de 1ª dimensão (ou geração).
As disposições visando à proteção dos direitos sociais, econômicos e
culturais resumiram-se à obrigação dos Estados em efetivá-los de maneira
progressiva, na forma do Art. 26 da Convenção:
Artigo 26º - Desenvolvimento progressivo
Os Estados Partes comprometem-se a adotar providências, tanto no âmbito interno como mediante cooperação internacional, especialmente econômica e técnica, a fim de conseguir progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios apropriados.
Tal fato ensejou a adoção posteriormente de um novo documento
relativo a esses direitos – o “Protocolo de San Salvador”.
A Convenção Americana de Direitos Humanos é dividida em duas partes.
Na primeira parte, que vai do Art. 1º ao 32, ela trata de direitos. Já na segunda
parte, a partir do Art. 33, ela dispõe sobre os Organismos que atuam na defesa
e na promoção dos direitos humanos fundamentais.
Dentre as várias disposições da Convenção Americana, podemos
destacar algumas:
a) reconhecimento da personalidade jurídica;
b) direito à vida desde a concepção;
c) integridade pessoal (com destaque para o tratamento digno que deve
ser dado aos presos);
d) proibição da escravidão e da servidão;
e) liberdade Pessoal (em diversos aspectos como locomoção, crença,
opinião, residência etc.);
f) irretroatividade de leis penais;
g) nacionalidade e participação no governo;
h) garantias judiciais e igualdade perante a lei.
Capítulo 7
175Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Outra disposição de destaque foi a que proibiu a prisão civil pode
dívida, prevista no item 7 do Art. 7º da Convenção: “Ninguém deve ser detido
por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária
competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar.”
Tal disposição gerou por muito tempo controvérsia, hoje já pacificada, acerca
das possibilidades de prisão civil em nosso ordenamento jurídico.
Além disso, proibiu a pena de morte para delitos políticos, assim como o
restabelecimento da mesma para os países que a tenham abolido.
No final da primeira parte, nos artigos 31 e 32, a Convenção traz dois
artigos que merecem atenção.
No artigo 31, ela não fecha do corpo do seu texto o rol de direitos
humanos fundamentais, que podem ser protegidos pelo Sistema Regional
Americano. Vejamos: “Artigo 31º - Reconhecimento de outros direitos.
Poderão ser incluídos no regime de proteção desta Convenção outros direitos
e liberdades que forem reconhecidos de acordo com os processos estabelecidos
nos artigos 69º e 70º”.
Já no artigo 32, ela traz duas concepções: a) de que os direitos são
limitados pelos direitos dos outros; b) de que todos possuem, além de seus
direitos, também deveres.
Veja o que diz o artigo: “Artigo 32º - Correlação entre deveres e
direitos. 1. Toda pessoa tem deveres para com a família, a comunidade e a
humanidade. 2. Os direitos de cada pessoa são limitados pelos direitos dos
demais, pela segurança de todos e pelas justas exigências do bem comum, em
uma sociedade democrática”.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para ler o conteúdo completo da Convenção Americana de Direitos Humanos, acesse: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/oea/oeasjose.htm>. Faça uma comparação entre o artigo 5º de nossa Constituição Federal e os artigos 3º ao 25 da Convenção.
Capítulo 7
176 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Por fim, precisamos ressaltar uma inovação trazida pela Convenção
Americana, que foi a criação de dois Organismos, que atuam da proteção dos
direitos humanos fundamentais: a Comissão Interamericana de Direitos Humanos
e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Esses organismos são fundamentais
dentro do Sistema Regional Americano, por isso, eles merecem a nossa análise.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Para uma leitura mais aprofundada da Convenção Americana de Direitos Humanos, indicamos a leitura do livro “Direito Penal: comentários à Convenção Americana de Direitos Humanos”, v. 4, de Luiz Flávio Gomes e Valério de Oliveira
Mazuolli. Nesta obra, os autores fazem uma análise minuciosa do citado documento, que não podemos fazer aqui.
7.2.3 Comissão Interamericana de Direitos Humanos
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos é um órgão autônomo
da Organização dos Estados Americanos, que tem como função principal
promover a observância e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão
consultivo da Organização em tal matéria. Essa é a definição trazida no Artigo
1º do Regulamento da Comissão. Sua sede é em Washington (EUA).
A Comissão está prevista tanto na Carta da Organização dos Estados
Americanos (Art. 53, alínea e Capítulo XV, Art. 106), quanto na Convenção
Americana de Direitos Humanos. No primeiro documento, praticamente só
existia a previsão da Comissão. Este ganhou força e atribuições expressas a
partir da Convenção Americana de Direitos Humanos.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos é composta por 7 (sete)
membros, eleitos a título pessoal, pela Assembleia Geral da Organização dos
Estados Americanos, de uma lista de candidatos propostos pelos governos dos
Estados-membros, dentre pessoas de alta autoridade moral e de reconhecido
saber em matéria de direitos humanos.
Os membros são eleitos para um mandato de 4 (quatro) anos, sendo permitida
uma recondução. Eles não precisam ser juristas. Uma vedação importante é a
impossibilidade de a Comissão possuir dois membros de um mesmo país.
Capítulo 7
177Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
EXPLORANDOEXPLORANDO
Conheça melhor o funcionamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, acessando o seu regulamento completo em <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/oea/regulamento_comissao_dh.pdf>.
As funções da Comissão Interamericana de Direitos Humanos estão
previstas no Art. 41 da Convenção Americana de Direitos Humanos. Dentre
esses, merece destaque a prevista na alínea f, pois trata das petições e outras
comunicações levadas à Comissão.
Essas petições e comunicações, na verdade, são denúncias, queixas,
reclamações (nesse caso, esses termos podem ser considerados sinônimos) de
casos de violação (ou suposta violação) de direitos humanos por parte de um
dos países-membros da OEA, que são levadas à apreciação da Comissão.
Quanto a esse assunto, é importante destacarmos determinados aspectos:
a) Legitimidade Ativa (ou Quem pode fazer uma comunicação ou
petição) – Qualquer cidadão de países-membros ou entidade não
governamental reconhecida por um dos países-membros.
b) Legitimidade Passiva (ou contra quem pode ser feita uma petição/
comunicação) – Qualquer país-membro.
c) Mérito (ou com base em que é feita a reclamação) – Violação (ou
suposta violação) dos direitos humanos por parte de um país-membro.
Veja que a Convenção Americana de Direitos Humanos trouxe uma
grande novidade, que foi a possibilidade de um cidadão comum levar um caso
de violação de direitos humanos por parte de um país-membro até a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos. Ou seja, uma pessoa pode fazer uma
denúncia contra o seu próprio país, caso este faça algo (ou deixe de fazer), que
atente contra os direitos humanos fundamentais. Tal possibilidade é bastante
relevante, pois ele coloca cada cidadão dos países-membros como fiscal da
defesa dos direitos humanos.
Capítulo 7
178 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
EXPLORANDOEXPLORANDO
Veja como fazer uma denúncia junto à Comissão Interamericana de Direitos humanos nesse link: <http://www.dhnet.org.br/dados/cartilhas/dh/mundo/oea/cartilhas/oea1/index.html>.
Para que uma petição/comunicação seja aceita, faz-se necessário que
certos requisitos de admissibilidade sejam observados. Eles estão previstos no
Artigo 46 de Convenção Americana.
Já o procedimento que deve ser seguido pela Comissão Interamericana
de Direitos Humanos está previsto no Art. 48 da Convenção.
Com base nesses artigos, você pode concluir que, quem faz o juízo de
admissibilidade de petição/comunicação, é a Comissão. Por sua vez, o juízo de
mérito é feito pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Ou seja, existe
todo um procedimento que deve ser seguido junto à Comissão para, depois
desse, o caso ser levado a julgamento na Corte Interamericana.
Ou seja, antes de um caso ser efetivamente julgado pela Corte
Interamericana, ele é analisado pela Comissão, que pode, basicamente:
a) arquivar a petição/comunicação;
b) solicitar informações ao país-membro denunciado;
c) aceitar ou não a petição/comunicação;
d) solucionar o conflito;
e) encaminhar o caso para a Corte Interamericana.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Veja vários casos que foram levados à apreciação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos nesse link: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/oea/peticoes/index.html>.
Capítulo 7
179Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
7.2.4 Corte Interamericana de Direitos Humanos
A Corte Interamericana de Direitos Humanos está prevista no Capítulo
VIII, que vai do Art. 52 ao Art. 69, da Convenção Americana de Direitos
Humano. Sua sede é em San José (Costa Rica).
Ela é composta por 7 (sete) juízes, nacionais dos Estados-membros da
Organização dos Estados Americanos, eleitos a título pessoal dentre juristas
da mais alta autoridade moral, de reconhecida competência em matéria de
direitos humanos, que reúnam as condições requeridas para o exercício das
mais elevadas funções judiciais, de acordo com a lei do Estado do qual sejam
nacionais, ou do Estado que os propuser como candidatos.
Seus membros são eleitos para um mandato de 6 (seis) anos, sendo
permitida uma recondução. Assim como na Comissão Interamericana, dois
juízes de um mesmo país-membro não podem fazer parte da corte.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Conheça melhor a estrutura e funcionamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos lendo o seu Estatuto em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/oea/ectidh.htm>.
Podemos dizer que a Corte Interamericana exerce um papel duplo. Veja.
Ela pode atuar como órgão consultivo, respondendo consultas de qualquer
membro da OEA e de organismos vinculados a ele. Pode, nesse papel, elaborar
pareceres, a pedido, versando sobre direitos humanos fundamentais. Por outro
lado, ela pode atuar como órgão jurisdicional, de forma contenciosa, quando
ela analisa e julga conflitos sobre violação de direitos humanos fundamentais.
Em relação ao seu papel de órgão jurisdicional, é preciso destacar que
somente os países-membros e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos
podem levar casos à apreciação da Corte. A possibilidade de um cidadão
comum levar um caso diretamente à Corte não existe. O que pode acontecer
é um cidadão levar um caso até a Comissão Interamericana e essa, depois de
fazer as devidas análises e cumprir o procedimento previsto na Convenção
Americana, encaminhar o caso até a Corte.
Capítulo 7
180 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Ao analisar um caso concreto, a Corte Interamericana pode decidir pela
absolvição ou condenação do país-membro denunciado. Havendo condenação,
seguirá o disposto no Art. 63, item 1, da Convenção Americana:
Art.63, 1. Quando decidir que houve violação de um direito ou liberdade protegidos nesta Convenção, a Corte determinará que se assegure ao prejudicado o gozo do seu direito ou liberdade violados. Determinará também, se isso for procedente, que sejam reparadas as consequências da medida ou situação que haja configurado a violação desses direitos, bem como o pagamento de indenização justa à parte lesada.
Finalizamos informando que o Brasil reconheceu a competência
jurisdicional da Corte Interamericana por meio do Decreto Legislativo 89, de 3
de dezembro de 1998.
7.3 Aplicando a teoria na prática
Uma pergunta que sempre é feita pelos alunos é como, efetivamente, são
aplicados os instrumentos internacionais de proteção aos direitos humanos?
Ou de maneira ainda mais precisa: como se dá uma condenação de um Estado
por um organismo internacional? Lembra-se do caso Maria da Penha que já
vimos em capítulo anterior? Esclareça estas questões, baseando-se neste caso.
Primeiro, procure resolver sozinho(a) e, a seguir iremos apresentar a solução.
Vamos lá? O caso Maria da Penha deu origem à lei 11.430/06, conhecida
como Lei Maria da Penha. É o caso que teve como vítima a cidadã brasileira
Maria da Penha Maia Fernandes.
Vamos relembrá-lo. Maria da Penha Maia Fernandes sofreu dois
atentados contra a sua vida. Os dois promovidos por seu, pasmem, marido,
M.A.H.V. O primeiro ocorreu no dia 29 de maio de 1983, quando ela levou
um tiro de escopeta. Em consequência desse atentado, ela ficou paraplégica.
Depois disso, seu marido tentou novamente matá-la. Dessa vez eletrocutada,
enquanto ela tomava banho.
Transcorridas as investigações, seu marido, M.A.H.V., foi apontado
como responsável. Após quase 8 (oito) anos do primeiro atentado, em 4
de maio de 1991, M.A.H.V. foi condenado a 8 (oito) anos de prisão. Após a
Capítulo 7
181Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
condenação, a defesa alegou que os quesitos respondidos pelos jurados foram
mal elaborados, prejudicando assim o julgamento. Com essa tese, a defesa
conseguiu a anulação do julgamento.
Como esse julgamento foi anulado, um segundo julgamento ocorreu
em 15 de março de 1996. Ou seja, quase 13 (treze) anos depois do primeiro
atentado. Nesse dia, M.A.H.V. foi condenado a dez anos e seis meses de
prisão. A defesa apelou da decisão, conseguindo fazer com que M.A.H.V.
ficasse em liberdade.
Somente em setembro de 2002, depois de dezenove anos do primeiro
atentado, M.A.H.V. começou finalmente a cumprir sua pena (de dez anos).
Esse é mais um caso de violência doméstica que ocorreu no Brasil. Mas
por que tanta repercussão? Vamos entender.
Em agosto de 1998, ou seja, antes do início do cumprimento da sentença,
diante do fato de que M.A.H.V. ainda se encontrava solto e da inexistência de
condenação definitiva, duas entidades não governamentais, o Centro pela Justiça e
Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino-Americano pelos Direitos da Mulher
(CLADEM), levaram o caso de Maria da Penha até a Comissão Interamericana de
Direitos Humanos. As duas entidades defenderam perante a Comissão que o Estado
Brasileiro descumpriu as disposições da Convenção Interamericana para Prevenir,
Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher na medida em que permitiu a violência
contra Maria da Penha e, principalmente, foi leniente da punição do culpado.
A apresentação do caso à Comissão Interamericana de Direitos Humanos
só foi possível em virtude do disposto no Art. 44 da Convenção Americana de
Direitos Humanos:
Art. 44. Qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou entidade não-governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados membros da Organização, pode apresentar à Comissão petições que contenham denúncias ou queixas de violação desta Convenção por um Estado-Parte.
Veja a importância da possibilidade de pessoas ou entidades apresentarem
casos de violação aos direitos humanos perante a Comissão Interamericana de
Direitos Humanos. Foi essa possibilidade que deu origem ao caso que é hoje
um paradigma na defesa dos direitos humanos.
Capítulo 7
182 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
O atentado duplo contra Maria da Penha se tornou o caso nº 12.051 da
OEA. O Brasil foi denunciado por violação das seguintes normas de proteção
aos direitos humanos:
• artigos 1º (Obrigação de respeitar os direitos), 8º (Garantias judiciais),
24 (Igualdade perante a lei) e 25 (Proteção judicial) da Convenção
Americana de Direitos Humanos;
• artigos II e XVIII da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem;
• artigos 3º, 4º, alíneas, a, b, c, d, e, f, g, 5º e 7º da Convenção de Belém
do Pará (Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
Violência contra a Mulher).
No caso Maria da Penha, os recursos da jurisdição interna ainda não
tinham sido todos esgotados. Isso é, em regra, uma condição para uma petição
(apresentação de um caso de violação) ser admitida, prevista no artigo 46 da
Convenção Americana de Direitos Humanos. No entanto, diante desse caso,
utilizou-se a exceção prevista no inciso 2, alínea c, que possibilita a admissão
da petição em caso de atraso injustificado do exercício da jurisdição interna.
Que foi exatamente o que ocorreu no caso em questão.
Foi nesse sentido o posicionamento da Comissão Interamericana de
Direitos Humanos:
[...] considera conveniente lembrar aqui o fato inconteste de que a justiça brasileira esteve mais de 15 anos sem proferir sentença definitiva neste caso e de que o processo se encontra, desde 1997, à espera da decisão do segundo recurso de apelação perante o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. A esse respeito, a Comissão considera, ademais, que houve atraso injustificado na tramitação da denúncia, atraso que se agrava pelo fato de que pode acarretar a prescrição do delito e, por conseguinte, a impunidade definitiva do perpetrador e a impossibilidade de ressarcimento da vítima [...].
Em 2001, em uma decisão inédita da Comissão Interamericana de Direitos
Humanos, o Brasil foi responsabilizado por negligência, omissão e tolerância
em relação à violência doméstica contra as mulheres. Foi o primeiro caso
concreto em que foi aplicada a Convenção de Belém do Pará.
Capítulo 7
183Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Em seu Informe nº 54, de 2001, a comissão recomendou ao Brasil, dentre
outras medidas:
a) A finalização do processamento penal do responsável da agressão.
b) Proceder a uma investigação a fim de determinar a responsabilidade pelas
irregularidades e atrasos injustificados no processo, bem como tomar as
medidas administrativas, legislativas e judiciárias correspondentes.
c) Sem prejuízo das ações, que possam ser instauradas contra o
responsável civil da agressão, a reparação simbólica e material pelas
violações sofridas por Penha por parte do Estado brasileiro por sua
falha em oferecer um recurso rápido e efetivo.
d) E a adoção de políticas públicas voltadas à prevenção, punição e
erradicação da violência contra a mulher.
O Brasil foi condenado a pagar uma indenização de 20 mil dólares em
favor de Maria da Penha Maia Fernandes.
M.A.H.V. cumpriu menos de um terço de sua pena em regime fechado.
Em 2004, ele foi posto no regime aberto.
Como consequência direta do caso Maria da Penha, o Brasil editou a Lei
11.430/06, que
Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências.
Capítulo 7
184 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
7.4 Para saber mais
Site: Organização dos Estados Americanos (OEA)
URL: <http://www.oas.org/pt/default.asp>
Com boa parte de seu conteúdo em português, este site traz informações detalhadas sobre a atuação da OEA e de seus diversos organismos. Além disso, você pode encontrar todos os documentos aqui estudados, além de muitos outros.
Título: Direito Penal. V. 4: comentários à Convenção Americana
de Direitos Humanos: Pacto de San José da Costa Rica
Autores: Luiz Flávio Gomes e Valério de Oliveira Mazuolli Editora: RT Ano: 2008
Este livro trata especificamente da Convenção Americana de Direitos Humanos. Faz uma análise minuciosa do documento, comentando cada um dos seus artigos. Além disso, os autores apresentam os principais casos, que foram analisados pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, e julgados pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Título: A afi rmação histórica dos direitos humanos
Autor: Fábio Konder Comparato Editora: Saraiva Ano: 2010
Nesse livro, Fávio Konder faz uma apresentação detalhada das sucessivas etapas da evolução histórica dos direitos humanos, analisando vários documentos históricos relativos à matéria. Texto indispensável para o aprofundamento dos conhecimentos sobre o histórico.
Título: Direitos Humanos e o Direito Constitucional
Internacional
Autor: Flávia Piovesan Editora: Saraiva Ano: 2010
A autora desse livro é considerada por muitos a principal doutrinadora brasileira sobre Direito Humanos. Em seu livro, ela analisa, de maneira minuciosa, cada um dos documentos estudados aqui nesse capítulo, além de outros que não foram abordados. Traz ainda um apêndice com todos os documentos analisados na íntegra.
Capítulo 7
185Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
7.5 Relembrando
Neste capítulo, você descobriu que:
• A Organização dos Estados Americanos(OEA) surgiu em 1948 sem ter,
diferente da ONU, o seu principal foco nos direitos humanos. Tal fato
não impede que ela cumpra um importante papel no âmbito regional
de proteção aos direitos humanos fundamentais.
• No âmbito da OEA, são constituídos organismos e editados documentos
que visam à proteção dos direitos humanos fundamentais. A esse
conjunto, damos o nome de Sistema Regional Americano de proteção
aos Direitos Humanos.
• Os sistemas regionais de proteção aos direitos humanos não concorrem
com o sistema global. Pelo contrário, eles o complementam e podem
atuar de maneira mais específica a partir de peculiaridades regionais.
• A Convenção Americana de Direitos Humanos, também conhecida
como Pacto de San José da Costa Rica, é o principal documento do
Sistema Regional Americano de proteção aos Direitos Humanos.
• O conteúdo da Convenção Americana de Direitos Humanos trata,
principalmente, de direitos civis e políticos. Em relação a esses, a
Convenção é ampla e detalhada. Já, quanto aos direitos sociais,
econômicos e culturais, a Convenção pouco dispõe.
• A Convenção Americana de Direitos Humanos prevê, em seu texto, a
criação e funcionamento dos dois principais Organismos do Sistema
Regional Americano de Proteção aos Direitos Humanos. Eles são a
Comissão Interamericana e a Corte Interamericana de Direitos Humanos.
• A Comissão Interamericana de Direitos Humanos é um órgão autônomo
da OEA, que tem como função principal promover a observância e a
defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da OEA
em tal matéria.
• Existe uma disposição sobre a Comissão Interamericana tanto na Carta
de Bogotá quanto na Convenção Americana de Direitos Humanos.
Capítulo 7
186 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
• A Comissão Interamericana é composta por 7 (sete) membros, eleitos para
mandatos de 4 (quatro) anos, e tem sua sede em Washington (EUA).
• Na Convenção Americana de Direitos Humanos estão previstos
vários procedimentos, que devem ser observados pela Comissão
Interamericana para quando ela apreciar um caso de (suposta)
violação dos direitos humanos.
• A partir da Convenção Americana, foi criada a possibilidade de um
cidadão comum levar um caso de (suposta) violação dos direitos
humanos à apreciação da Comissão Interamericana.
• Antes de um caso ser levado a julgamento da Corte Interamericana,
a Comissão Interamericana deve obedecer a vários procedimentos
previstos na Convenção Americana.
• A Corte Interamericana de Direitos Humanos é um órgão da OEA, que
possui um duplo papel. Ora ela atua como órgão consultivo, ora atua
como órgão jurisdicional, de forma contenciosa.
• A Corte Interamericana é composta por 7 (sete) membros, eleitos
para mandatos de 6 (quatro) anos, e ela tem a sua sede em San
José (Costa Rica).
7.6 Testando os seus conhecimentos
1) (Ministério Público do Trabalho - 16º - 2009-2010) Assinale a alternativa
INCORRETA:
a) No Caso Escher e Outros Vs. Brasil, a Corte Interamericana de Direitos
Humanos concluiu ter havido violação da Convenção Americana de
Direitos Humanos por parte do Estado Brasileiro, devido à transgressão
da proteção à honra, à vida privada e à reputação, pela interceptação,
gravação e divulgação das conversas telefônicas dos autores.
b) No Caso Escher e Outros Vs. Brasil, a Corte Interamericana de Direitos
Humanos rejeitou a arguição de violação, pelo Estado Brasileiro, do direito
à associação, previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos.
Capítulo 7
187Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
c) De acordo com a Convenção Americana de Direitos Humanos, em
nenhum caso pode a pena de morte ser aplicada a delitos políticos,
nem a delitos comuns conexos com delitos políticos.
d) A Convenção Americana de Direitos Humanos proclama que todas as
pessoas têm o direito de associar-se livremente com fins ideológicos,
religiosos, políticos, econômicos, trabalhistas, sociais, culturais,
desportivos ou de qualquer outra natureza.
e) Nenhuma das respostas.
2) (Defensor Público/PI - 2009) A Convenção Americana de Direitos Humanos
de 1969 (Pacto de San José da Costa Rica):
a) Reproduziu a maior parte das declarações de direitos constantes do
Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
b) Foi adotada sem ressalvas pelo Brasil desde o seu início.
c) Proíbe o restabelecimento da pena capital nos países que a
tenham abolido.
d) Não tratou do direito ao nome.
e) Indica a possibilidade de asilo no caso do cometimento de crimes
comuns, não vinculados à atividade política.
3) (Ministério Público do Trabalho - 16º - 2009-2010) Assinale a alternativa
CORRETA:
a) Nos termos da Convenção Americana, o indivíduo, a Comissão
Interamericana e os Estados-partes podem submeter um caso à Corte
Interamericana de Direitos Humanos.
b) De acordo com o Direito Internacional, a responsabilidade pelas
violações de direitos humanos, na hipótese do Brasil, é da União,
e das suas Unidades Federativas (Estados), os quais dispõem de
personalidade jurídica na ordem internacional.
Capítulo 7
188 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
c) Na hipótese de violação dos direitos humanos, é permitido ao
Procurador-Geral da República requerer ao Supremo Tribunal Federal
o deslocamento da competência do caso para instâncias federais, em
qualquer fase do processo.
d) É exclusivamente sobre a União que recai a responsabilidade
internacional na hipótese de violação de tratado de proteção de
direitos humanos.
e) Nenhuma das respostas.
4) (Ministério Público do Trabalho - 16º - 2009-2010) Assinale a alternativa
INCORRETA: Sobre os mecanismos de implementação dos Direitos Humanos
no âmbito da Organização dos Estados Americanos, pode-se afirmar:
a) Após a Segunda Guerra Mundial surgiu a necessidade de reorganizar
o sistema interamericano de relações, quando se realizou a primeira
Conferência Internacional de Estados Americanos.
b) Na Conferência de Bogotá, foi elaborada a Carta da Organização
dos Estados Americanos, tendo como principal função promover a
observância e a proteção dos direitos humanos na América.
c) O sistema interamericano de proteção dos direitos humanos tem como
principal instrumento a Convenção Americana de Direitos Humanos,
que estabelece a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a
Corte Interamericana.
d) A competência da Comissão Interamericana de Direitos Humanos
alcança todos os Estados-partes da Convenção Americana, em
relação aos direitos humanos nela consagrados. Alcança ainda todos
os Estados-membros da Organização dos Estados Americanos, em
relação aos direitos consagrados na Declaração Americana de 1948.
e) Nenhuma das respostas.
Capítulo 7
189Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Onde encontrar
BOBBIO, N. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campos, 1992.
COMPARATO, F. K. A afirmação histórica dos direitos humanos. 10. ed. São
Paulo: Saraiva, 2010.
GOMES, L. F.; MAZUOLLI, V. de O. Direito Penal: comentários à Convenção
Americana de Direitos Humanos: Pacto de San José da Costa Rica. v. 4. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
JAYME, F. G. Direitos humanos e sua efetivação pela corte interamericana de
direitos humanos. São Paulo: Del Rey, 2005.
PIOVESAN, F. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 11.
ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
TEIXEIRA, C. N. Direito Internacional: público, privado e dos direitos
humanos. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
TRINDADE, A. A. C. T. Tratado de direito internacional dos direitos humanos.
v. 3. Porto Alegre: Fabris, 2003.
Capítulo 8
191Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
TEMAS ATUAIS DE DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS
CAPÍTULO 88
8.1 Contextualizando
Neste capítulo, você terá contato com os mais atuais e diversos temas
relacionados aos nossos estudos. Aqui, debateremos sobre pontos de nosso
cotidiano, que ainda suscitem dúvidas, até mesmo dentre os mais conhecidos
doutrinadores, autoridades e especialistas de todo o planeta, que estudam os
direitos fundamentais.
Iremos, ainda, juntos, discorrer sobre os aspectos jurídicos destes
assuntos, os quais estão postos em discussão atualmente, para, ao fim, trazer
à tona a importância da efetivação, imediatidade e internacionalização dos
direitos humanos.
Você precisa compreender que, neste capítulo, estamos a lidar com temas
diversos, que simplesmente não possuem respostas ainda, ou estas foram
dadas, mas não são suficientemente positivas, e, por este motivo, continuam a
suscitar dúvidas e divagações sobre a temática.
Assim, neste capítulo, vamos falar sobre pontos, que envolvem o Plano
Nacional de Direitos Humanos 3 – o PNDH3 (já estudado e visto no capítulo
5), como o direito à verdade, além de temáticas contemporâneas na ótica
da melhor recomendação doutrinária e jurisprudencial, seja esta brasileira
ou estrangeira. Ainda, iremos nos debruçar em assuntos extremamente
relevantes, enlaçando-os com a visão do Supremo Tribunal Federal. E é aqui
que Hard cases, ou seja, casos que são de difícil solução, ou casos que iniciam
um grande debate e muitas discussões, se manifestam.
Assim sendo, razoável será elucidá-los sob a estrita observância
Capítulo 8
192 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
da aplicabilidade de nossas normas constitucionais, assim como normas
infraconstitucionais, bem como por intermédio do direito internacional de
proteção aos direitos humanos fundamentais.
Os assuntos são variados. Então, ao final deste capítulo, você deverá está
apto a:
• compreender que os temas são atuais;
• entender que as respostas para estes pontos são altamente importantes
para a efetiva compreensão de toda esta matéria;
• conhecer as gerações/dimensões de direitos fundamentais;
• definir o que se entende, finalmente, por dignidade da pessoa humana;
• saber definir o transconstitucionalismo;
• definir o conceito de Extradição.
8.2 Conhecendo a teoria
Para fins de conclusão deste livro-texto, desde já, você, aluno(a), deve
entender que os direitos humanos não possuem um condão de proteção
aos que eventualmente cometeram crimes, ou seja, não falamos de direitos
humanos apenas no aspecto penal. Também, estes direitos não são protetores
da impunidade, nem muito menos guardiões de supostas benesses em prol
dos que, em tese, cometeram algum erro. Não. Absolutamente não.
Os especialistas, os quais dedicam a vida em prol e à causa de estudos
e pesquisas sobre direitos humanos, vez por outra, deparam-se com a tola
discussão, a qual só serve para atrapalhar a afirmação e efetivação desta
matéria jurídica. Não raramente a sociedade se depara com algumas pessoas,
que propagam o terror e a violência como causa e ideologia própria, além
do conservadorismo e excessivo rigor exacerbado – que defendem absurdos
como a pena de morte, trabalhos forçados, penas de caráter cruel, prisões
perpétuas. Além disso, tais pessoas enaltecem a doutrina já experimentada
pela história e já derrotada, demasiadamente maldosa com a pessoa humana,
a qual se convencionou chamar direito penal do inimigo.
O Estado deve tratar como inimigo aquele que age contra a lei, e,
não, como ser humano. Endurece-se ainda mais este tipo de discurso, a
cada momento em que a chamada grande mídia enaltece um caso de
Capítulo 8
193Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
violência, tragédia, corrupção eleitoral ou política, bem como dá ênfase a
determinados e isolados casos de desumanidade, em tese, ocasionados por
seres humanos.
Assim sendo, NUNES (2007, p. 4) ensina que
as constantes notícias veiculadas nos mais diversos meios de comunicação sobre as cenas de violência inquietam e amedrontam a sociedade, fazendo suscitar o sentimento de repulsa a esse tipo de comportamento e, de permeio, da falta de força do Estado para enfrentar a criminalidade. Esse estado de coisas dá margem a que cresça, na sociedade, movimento social insistindo no endurecimento do discurso e do plano de política criminal, mediante a adoção de normas criminais mais contundentes e que dêem realce à persecutio criminis.
Esta tendência, além de retrógrada, é tanto quanto conservadora e
perigosa, e age sob o manto da proteção constitucional, ou seja, só falam estas
bobagens, pois os direitos humanos fundamentais permitem que estes falem o
que pensam, sem que os mesmos sofram nenhuma represália ou sanção estatal.
É que os mesmos que criticam os direitos humanos gozam do direito
humano (percebam a contradição) de liberdade de opinião e expressão. É
muito importante que se diga isto aqui, pois, certas vezes, pessoas, que podem
ser chamadas de déspotas esclarecidas, falam que aqueles que reivindicam
a concretude e a afirmação de direitos da pessoa humana só o fazem para
os criminosos, pessoas que cometeram ilícitos hediondos, no sentido de dar
cama, colchão e chuveiro quente, dentro dos presídios. Como se o presídio,
neste país, fosse um hotel.
Somente quem não conhece a realidade fecha os olhos para esta triste
constatação, onde, em nosso país, por força constitucional, não deverá existir
pena com caráter cruel; onde a dignidade da pessoa humana é fundamento
republicano e atrocidades acontecem.
Estes fatos são cristalinamente desrespeitos às garantias fundamentais
da pessoa humana. Hoje, acontece com nosso visinho, amanhã, poderá ser
conosco. Enquanto o Estado permitir que existam crimes de lesa humanidade
como estes, nosso país estará fadado ao retrocesso. Dá-se passo contra os
direitos humanos, ou seja, abre-se espaço para as barbaridades. O que é um
perigo para a sociedade!
Capítulo 8
194 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Será que isto não é crueldade? Onde está a dignidade? O fato da
superpopulação carcerária é tema atualíssimo de direitos humanos.
Vários destes presos, simplesmente já cumpriram suas penas, ou
não foram julgados, e se já foram, já alcançaram a progressão de regime,
no caso, semiaberto, para poder cumprir o resto de sua pena trabalhando
diuturnamente e dormindo no presídio. Isto é forma de ressocialização,
fazendo com que quem tenha cometido um crime, reflita apenado e progrida
à sociedade, com o mínimo de dignidade.
Mas, é claro que os direitos da pessoa humana não têm nome, nem cor,
nem sexo, nem idade, nem camada social.
Os direitos humanos são públicos, como vimos no capitulo 1, por serem de
todos. Todos nós, seres humanos, temos direitos ínsitos a nós mesmos, apenas por
sermos seres humanos. Não podemos tratar seres humanos com atos desumanos –
até porque se presumem não culpados até sentença penal condenatória irrecorrível.
O Texto 1, a seguir, transcrito do livro “Brasil Nunca Mais” (ARNS, 2007,
p. 43), nos remete ao período nefasto da República, vejamos:
TEXTO 1
A tortura foi indiscriminadamente aplicada no Brasil, indiferente a idade, sexo, ou situação moral, física e psicológica em que se encontravam pessoas suspeitas de atividades subversivas. Não se tratava apenas de produzir, no corpo da vítima, uma dor que a fizesse entrar em conflito com o próprio espírito e pronunciar o discurso que, ao favorecer o desempenho do sistema repressivo, significasse sua sentença condenatória. Justificada pela urgência de se obter informações, a tortura visava imprimir à vítima a destruição moral pela ruptura dos limites emocionais que se assentam sobre relações efetivas de parentesco. Assim, crianças foram sacrificadas diante dos pais, mulheres grávidas tiveram seus filhos abortados, esposas sofreram para incriminar maridos.
O narrado no Texto 1 se dá sempre que há o desrespeito aos direitos
fundamentais, inerentes ao ser humano, ou seja, distante de uma ordem democrática.
A cada passo que se dá contra os rumos do governo “de muitos”, abre-se
espaço para atrocidades desta estirpe. Quando não se respeita, por exemplo,
a presunção de inocência, adentra-se nessa verdadeira esfera obscura de
crueldade humana.
Capítulo 8
195Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Este pensamento de desonestidade, deslealdade e avidez por lucro,
tratado por Maquiavel, em que pese o mesmo ser um dos grandes pensadores
do mundo, dá-se em razão da inexistência de um Estado-Humano, onde os
Homens, não regrados por um conjunto normativo de regras fundamentais,
ao serem instigados, praticavam, sem punição alguma, atrocidades dignas, no
mínimo, do contra-senso.
Que fique claro: os direitos fundamentais são todos os direitos que,
direta ou indiretamente, versem sobre pessoas.
O direito só existe para que haja paz social. Esta paz social será alcançada
por meio de um regime de governo chamado democracia e por respeito
soberano e absoluto aos direitos humanos fundamentais.
Como disse Fábio Konder Comparato, prefaciando obra de Friedrich
Müller (2003):
Voltamos, assim, à velha distinção aristotélica entre democracia pura e simples – em que a maioria do povo exerce o poder supremo no seu próprio interesse – e o regime político moderado, a democracia justa em que o bem comum predomina sobre todos os interesses particulares. Ora, o bem comum hoje, tem um só nome: são os direitos humanos, cujo fundamento é, justamente a igualdade absoluta de todos os homens, em sua comum condição de pessoa.
LEMBRETELEMBRETE
A ideia de que o povo é bom e que ele, por conseguinte, deve ser o titular da soberania política provém, sem dúvida, de Rousseau (Müller, 2003).
Só assim alcançaremos a pacificação social. Daí a necessidade de
movimentos de conciliação em todo território nacional, bem como, por meio
do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, a realização de mutirões para a soltura
de seres humanos, presos nestas condições desumanas.
Todavia, é importantíssimo mencionar que os direitos fundamentais
passam longe do aspecto penal. Não há isso, esta ideia falsa de diminuir
direitos humanos aos problemas penais é uma lenda ou mito, criada por uma
Capítulo 8
196 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
elite que desconhece os aspectos jurídicos de direitos humanos. Estes direitos
versam sobre saúde, educação, esporte, cultura, lazer, agricultura, moradia,
previdência social, proteção às nossas gestantes, proteção ao consumidor,
concessão de asilo político, direitos que versem sobre liberdade de religião,
opinião, crença e culto, associação etc.
Diminuir a afirmação histórica desses direitos fundamentais ao nível único
e exclusivo de aspectos de direito penal é típico dos que não estudam e nem
entendem a razão de existir dos direitos humanos. Assim sendo, é necessário
que se tenha em mente que todos os direitos são, de algum modo, voltados
para o bem-estar social, ou seja, para o coletivo, para o público, enfim, para
os seres humanos.
Determinado consumidor foi lesado por certo fornecedor de produtos.
Conforme a Constituição Federal, o Estado, na forma da lei, promoverá a defesa
do consumidor. Esta lei se chama CDC – Código de Defesa do Consumidor.
O que isto tem a ver com aspecto penal-prisional? Nada. A lei nasceu para
cumprir norma definidora de direitos fundamentais, posta no art. 5, inciso
XXXII, da CF/88.
Assim sendo, outro assunto atual, que versa sobre direitos humanos,
visa obrigar que prestadores e fornecedores de produtos e serviços, ao
resolverem enveredar nessa seara econômica, busquem a excelência e
qualidade profissional.
Não tem mais cabimento que nós, seres humanos, pagadores de
taxas altíssimas de impostos e tributos, tenhamos que permanecer em
estado de hipossuficiência perante os mais fortes em determinada relação
privada. Assim, cobranças indevidas, defeitos em produtos, inscrições
inexplicáveis em órgãos de restrições de créditos (SERASA, SPC, CCF etc.),
além de outras infindáveis reclamações, não são mais admitidos por nossos
órgãos jurisdicionais.
A questão, hoje, debruça-se sobre a doutrina que deve nortear nossos
magistrados, sobretudo no que concerne em conceder indenizações por danos
morais, nos casos merecidos, em patamares mais elevados em dinheiro.
Capítulo 8
197Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Não é de hoje que os juízes perderam o receio e condenam, diariamente, empresas fabricantes e fornecedoras de bens e serviços, pela péssima qualidade no atendimento, na fabricação ou, mesmo, na prestação de referidos serviços. Todavia, as condenações, apesar de diárias, são módicas: R$ 500, R$ 800, R$ 1.000,00. A tendência é a punição não educativa, mas, sim, punitiva.
Enquanto os valores referentes às condenações forem baixos, mais estimulam as empresas a continuar desrespeitando os consumidores. A partir do momento em que as empresas forem condenadas a pagarem, a título de indenização por danos morais, quantias bem mais elevadas, o caráter educativo dá ensejo ao aspecto punitivo.
SAIBA QUE
8.2.1 A derrocada da doutrina do separatismo, racismo e da
discriminação
Vivemos em um país, onde as pessoas, de Norte a Sul, são pacíficas,
convivem sem problemas com as diferenças culturais e morais, além de
religiosas. E isto não é fácil, pois basta observar o tamanho do Brasil.
Nosso país possui a dimensão de um continente. É uma nação,
geograficamente falando, muito grande, uma das maiores do mundo. E
com tanta diferença cultural e valores sociopolíticos e morais diversificados,
conseguimos nos entender sem grandes dificuldades.
Assim, o povo paraense se comunica com o povo potiguar, que fala com
os cariocas, paulistanos, estes com os capixabas, que tratam com os gaúchos,
e assim em diante, com respeito, decoro, em um ciclo de orgulho em sermos
brasileiros, irmãos, unidos e, ainda, em clima de total respeito, independente
de etnia, sexo, opção sexual, cor etc.
Recentemente, uma estudante do curso de Direito em determinada
Faculdade em São Paulo/SP, Mayara Petruso, por meio de clamorosa
manifestação, e, após outra colocação ainda mais infeliz, em um desses sites
de relacionamento, asseverou, acreditem, que: “Nordestino não é gente, faça
um favor a SP, mate um nordestino afogado”.
Capítulo 8
198 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Não satisfeita, ela continuou em outro site com estes dizeres: “AFUNDA
BRASIL, deem voto pros nordestinos e afundem o país de quem trabalhava pra
sustentar os vagabundos que fazem filho pra ganhar o bolsa 171”.
Essas duas frases foram escritas logo após a candidata do PT - Partido
dos Trabalhadores, Dilma Rousseff, ter sido eleita a primeira presidenta do
país, democraticamente, derrotando o candidato que era o preferido da
internauta, José Serra, do PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira, ex-
governador de São Paulo, Estado em que Mayara reside. Como dito, após estas
duas infelizes colocações, nasceu no país um clima fervoroso de verdadeira
demonização da estudante Mayara Petruso.
Esta, para piorar a situação, é estudante do curso de Direito e era
estagiária de um escritório de Advocacia de São Paulo. Logo após a repercussão
das bobagens que escreveu, foi demitida, e até seu pai veio a público, em
desabafo, para tentar atenuar a situação, vejamos:
A Justiça é lenta, mas ela chega. E quando chega, ela dói. Se ela errou, vai ter que pagar”. Ele frisou que não tem as mesmas opiniões da filha. “Eu não penso como ela. Tenho estima muito grande pelos nordestinos. Tenho muitos amigos nordestinos”, lamentou.
Fonte: Disponível em: <http://www.correio24horas.com.br/noticias/detalhes/detalhes-2/artigo/o-desabafo-do-pai-de-mayara-petruso-se-ela-errou-vai-ter-que-pagar/>. Acesso em: 11 nov. 2010.
O Brasil possui a lei contra o racismo, que assevera logo no art. 1º que: “Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Além disso, no art. 20, discorre que incorre no crime de racismo quem: “Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor,
etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa”.
SAIBA QUE
A estudante, além de ser endemonizada, virou motivo de chacotas e
piadas Brasil afora; foi demitida do estágio; imagina-se que a má-fama deva
imperar na Faculdade que frequenta(va). Além disto, ela foi formalmente
representada pela OAB/PE, pois, como estudante de Direito, já responde
Capítulo 8
199Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
por seus atos também à ordem dos Advogados, e, ainda, foi processada
criminalmente pelo Ministério Público Federal de São Paulo.
Tudo isto, “apenas”, pelo abuso do direito fundamental de expressão
e opinião. Esse é mais um alerta perante a afirmação e concretude dos
direitos humanos.
Todos nós somos responsáveis por nossas palavras e atitudes, seja no
mundo físico, ou virtual. Devemos combater o racismo, o preconceito, a
discriminação e qualquer outra espécie de crime contra os direitos inerentes
à pessoa humana, especialmente por estes terem brotado após muito
derramamento de sangue e padecimento, e agora se concretizaram e,
atualmente, existem para que sejam efetivados na prática de nosso cotidiano.
8.2.2 Gerações/Dimensões de Direitos Fundamentais
Os direitos humanos fundamentais há tempos vêm se consolidando (ou
afirmando) ao longo da história. Assim sendo, vários autores começaram a
definir direitos e garantias fundamentais por meio de gerações ou dimensões
de direitos fundamentais.
Antes de passarmos a estudá-las, será necessária uma breve colocação.
Vários autores (Pedro Lenza, Nestor Sampaio etc.) utilizam os termos
gerações e dimensões de direitos fundamentais no mesmo sentido. Em que
pese este fato, há relativa discordância na doutrina. Um não está mais certo
que o outro do ponto de vista gramatical, mas, sim, tecnicamente. É que o
termo geração pode dar a impressão ao leitor iniciante na matéria que a
geração seguinte teria acabado com a geração antecessora, enquanto no
plano das dimensões isto não ocorre. Assim sendo, acaso você leia geração
de direitos fundamentais ou dimensões desses direitos, não pense que uma
geração acabou com a que acabou de suceder. Não. Não se trata disto. É apenas
um termo. Para não adentrarmos por demasia neste quesito, utilizaremos a
expressão geração/dimensão de direitos fundamentais.
a) Primeira Geração/Dimensão de Direitos Fundamentais
No prisma histórico, os documentos universais relativos às liberdades,
como a Magna Carta de 1215, já estudada no capítulo 2 deste livro-texto, bem
Capítulo 8
200 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
como o Habeas Corpus Act. de 1679, além do Bill´s of Right de 1688, trazem
consigo uma primeira geração/dimensão de direitos humanos fundamentais.
Como todos esses direitos versam sobre liberdades, tais quais direitos
de liberdades públicas e direitos políticos, esta primeira geração/dimensão de
direitos, ínsitos à pessoa humana, estão destinados e associados diretamente
ao direito de Liberdade.
b) Segunda Geração/Dimensão de Direitos Fundamentais
Ao passar dos anos, em decorrência das relações sociais, sobretudo após
a queda do pensamento liberal de John Locke, e a ascensão da Revolução
Industrial, nasce e se acresce aos direitos de Liberdade (1ª geração/dimensão),
os direitos sociais, econômicos e culturais dos povos, especialmente no pós-
guerra, com a Constituição de Weimar de 1919, bem como, após a criação da
OIT – Organização Internacional do Trabalho da mesma data, uma segunda
geração ou dimensão de direitos fundamentais. São os direitos de igualdade.
c) Terceira Geração/Dimensão de Direitos Fundamentais
Nascem, no final do século XIX e primeira metade do século XX os direitos
metaindividuais, no que tange às decorrentes alterações nos âmbitos sociais,
seja do ponto de vista interno dos Estados, seja internacional, trazendo o valor
da solidariedade aos povos. Sendo assim, não havia mais como dissociar o
homem, pessoa humana, do Estado.
Nas palavras de Penteado Filho (2009, p. 23):
[...] profundas alterações sociais na comunidade internacional, causadas pela globalização da economia, avanços tecnológicos e científicos, como as viagens espaciais, a robótica, a Internet etc., tais direitos direcionam-se para a preservação da qualidade de vida, tutelando o meio ambiente, permitindo-se o progresso sem detrimento da paz e autodeterminação dos povos, constituindo-se em interesses metaindividuais (difusos), que transcendem o indivíduo ou grupos de indivíduos, onde representam os direitos de solidariedade, uma vez considerado o homem como inserido na sociedade, traduzidos, no valor da Fraternidade.
d) Quarta Geração/Dimensão de Direitos Fundamentais
Esta geração/dimensão destina-se aos direitos dos povos, contra a evolução
tecnológica, global, individual e liberal, ou seja, o lucro e egoísmo exacerbado.
Capítulo 8
201Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
O ministro Eros Grau (1991), devidamente citado por Piovesan (2009, p.
322-323) ensina-nos que:
[...] o modelo definitivo na ordem econômica na Constituição de 1988 é um modelo aberto que, a partir de uma interpretação dinâmica, é capaz de instrumentalizar as mudanças da realidade social, podendo ser descrito como modelo de bem-estar.
Nascem, assim, os direitos dos povos de resistir ao capitalismo, ao
neoliberalismo e às consequências nefastas que estes movimentos trazem para
a humanidade. Ou seja, os povos lutam (e/ou resistem) aos avanços de uma
minoria no sentido de proteger o bem comum tutelado, que são, justamente,
os direitos humanos para proteger e preservar a espécie.
Assim sendo, no país, a Lei de Biossegurança é exemplo de direito de
quarta geração/dimensão. Contudo, não para por aí, pois a humanidade
resiste para continuar a lutar por democracia, acesso à justiça, tecnologia, bem
como democracia constitucional e humanitária.
e) Quinta Geração/Dimensão de Direitos Fundamentais
Paulo Bonavides (2008), como sempre na vanguarda, apresenta esta
quinta geração/dimensão – inovando em face dos direitos fundamentais.
Em verdade, este movimento está vinculado em razão da paz permanente
entre os povos.
Direitos à paz constante, donde seres humanos não podem conflitar
entre si, nem muito menos Estados Soberanos versus Estados Soberanos, ou
não. Caso do Kosovo, por exemplo, ex-república iugoslava, que ainda não tem
autonomia e independência, mas já foi alvo de muitos conflitos convencionais.
Em assim sendo, esta última geração/dimensão apresentada é, em verdade,
um desdobramento da 3ª geração/dimensão de direitos fundamentais, pois esta,
como aquela, versa diretamente sobre solidariedade e fraternidade entre os povos.
8.2.3 O Transconstitucionalismo
O transconstitucionalismo ainda não pode ser chamado de sexta geração/
dimensão de direitos fundamentais inerentes à pessoa humana.
Capítulo 8
202 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Este conceito nasce com a teoria do Conselheiro Nacional de Justiça, Marcelo
Neves, como tese de pós-doutoramento pela Universidade de Bremen, Suíça.
Marcelo Neves, Conselheiro Nacional de Justiça, é livre docente em Friburgo, Suíça, além de professor do IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público) e professor da PUC/SP.
BIOGRAFIA
Nesta tese, Neves não fala em uma constituição universal, nem muito
menos global, ou, ainda, constituição europeia, constituição da comunidade
internacional ou constituições civis da sociedade mundial, mas, sim, no sentido
de fazer transbordar o direito constitucional interno, estatal e nosso, insistindo
na internacionalização das constituições democráticas.
Nesse mesmo sentido, Mark Tushnet (2008), citado pelo próprio Neves
(2009, p. 19), corrobora com o mesmo, quando alega que é “inevitável a
globalização do direito constitucional”.
No mesmo diapasão, Neves (2009, p. 19) lembra Canotilho (2006), quando
este se refere à expressão interconstitucionalidade, lembrando, o eminente
Conselheiro, todavia, que esta última expressão só refere-se ao modelo de
transconstitucionalismo dentro (e para a) Comunidade Europeia.
Neves (2009, p. 21-22) taxativamente esclarece essa nova concepção de
internacionalização do direito constitucional, quando ensina que
[...] não se trata, portanto, de constitucionalismo internacional, transnacional, supranacional, estatal ou local.
O conceito aponta exatamente para o desenvolvimento de problemas jurídicos que perpassam os diversos tipos de ordens jurídicas. Um problema transconstitucional implica uma questão que poderá envolver tribunais estatais, internacionais, supranacionais, e transnacionais (arbitrais), assim como instituições jurídicas locais nativas, na busca de sua solução.
Neste sentido, o transconstitucionalismo é um diálogo constitucional
entre diferentes constituições democráticas. A CRFB/88 conversa por meio de
uma ponte de transição com a constituição americana, a qual dialoga com a
chinesa, que falará com a belga, e assim em diante.
Conflitos que perpassam a ordem estatal, ou seja, litígios que começam
Capítulo 8
203Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
aqui e chegam até Portugal, por exemplo, deverão ser resolvidos. Todavia, as
ordens jurídicas entre Brasil e Portugal, como sabemos, são diferentes.
Então, por meio deste diálogo – ponte de transição, a discussão concreta
será tida como transconstitucional e resolvida com o melhor direito em razão
do indivíduo.
Acaso o direito lusitano, no caso concreto, seja mais favorável a
determinado cidadão do que o direito brasileiro, deve-se, então, para fins de
solução do caso, aplicar o direito que melhor verse sobre o caso concreto para
fins de resolução do conflito ou litígio.
Este permanente diálogo, por meio de pontes (transversais) de transição,
permitirá não só a inevitável internacionalização do direito constitucional de
cada nação democrática, mas, também, solidificará a jurisprudência que se
irá perfazer ao longo dos anos, trazendo tanto um conforto maior à pessoa
humana, como a segurança jurídica para o alcance da paz social.
O traficante Juan Carlos Abadía, colombiano, bilionário em razão dessas
atividades ilícitas e escusas, processado e condenado nos Estados Unidos
por tráfico internacional de drogas e responsável, segundo a justiça norte-
americana, por mais de 300 homicídios, dentre outros ilícitos, fora preso pela
Polícia Federal no Brasil, onde estava solto, vivendo a vida de luxo que o lucro
de sua atividade lhe proporcionou.
O traficante tinha a seu desfavor várias penas decretadas, inclusive de
caráter perpétuo e de morte pela justiça ianque, por todos os crimes que
haveria cometido. Logo que fora preso, eis que o Brasil recebeu pedido de
extradição do traficante, para que Abadía fosse encaminhado às autoridades
americanas para cumprir as suas diversas condenações.
Após analisar o pedido, por unanimidade de votos, a extradição para os
Estados Unidos do traficante colombiano foi deferida com um adendo. É que
o Supremo Tribunal Federal (STF) condicionou a decisão a um compromisso da
justiça norte-americana de comutar eventual pena de prisão perpétua ou de
morte em pena privativa de liberdade, com prazo máximo de 30 anos, pena
máxima prevista na legislação penal brasileira.
Capítulo 8
204 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
LEMBRETELEMBRETE
Extradição é o ato pelo qual um Estado-Nação Soberano entrega determinada pessoa humana, que está sendo acusada da prática de delito, ou já condenada por algum ilícito (que não seja político), para autoridades de outro Estado. Este
último deverá ser competente para processar o acusado, acaso já não tenha sido julgado, ou do contrário, processar e julgar tal indivíduo, que, em tese, é inocente até que este Estado impute culpa formal ao humano extraditado.
Este diálogo constitucional foi feito em prol do traficante, no
sentido cristalino, como vimos, da condição de extradição, desde que a
justiça americana garanta transformar qualquer pena mais gravosa em
pena máxima que nosso modelo constitucional permite, qual seja: 30 anos
de reclusão.
Assim sendo, valorando mais um tema atual de direito constitucional,
Neves (2009, p. 35) assevera que
é imprescindível que haja vínculos estruturais que possibilitem as interfluências entre diversos âmbitos autônomos de comunicação.
A esse respeito, Niklas Luhmann, com base na teoria biológica de Humberto Maturana e Francisco Varela, desenvolveu o conceito sociológico de acoplamento estrutural. Esse acoplamento serviria à promoção e filtragem de influências e instigações recíprocas entre sistemas autônomos diversos, de maneira duradoura, estável e concentrada, vinculando-os no plano de suas estruturas, sem que nenhum desses sistemas perca a sua respectiva autonomia.
Assim sendo, é perfeito o sistema de acoplamento suscitado, sobretudo
para garantir direitos fundamentais, pois, como as ordens (âmbitos)
jurídicas são diferentes, elas permanecem diversas, duradouras, estáveis,
concentradas – dentro de suas estruturas próprias – sem que nenhum
ordenamento perca autonomia.
Capítulo 8
205Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
8.2.4 A Dignidade da Pessoa Humana – como fundamento
republicano e norma reitora das demais normas constitucionais
e infraconstitucionais
Você já estudou, desde o capítulo 1, sobre a dignidade da pessoa humana.
Mas, afinal, o que é a dignidade da pessoa humana? O Brasil adota este
postulado universal como princípio fundamental ou fundamento republicano
e este está positivado no inciso III, do art. 1º, da Constituição Federal de 1988.
Isto quer dizer que, por ser princípio fundamental ou fundamento
republicano, é norma constitucional com núcleo fundamental. Portanto, todas
as demais normas constitucionais e infraconstitucionais, para existirem, serem
válidas e eficazes em nosso ordenamento jurídico, devem ser compatíveis
com este dispositivo estruturante. O mesmo baliza as demais normas legais
e constitucionais, não podendo nenhuma destas entrar em conflito com este
princípio fundamental.
LEMBRETELEMBRETE
A dignidade da pessoa humana, ainda que gere controvérsias na doutrina, não é absoluta – infelizmente, pois, em nosso país, ainda é permitida a pena de morte, no caso hipotético de guerra declarada, quando os direitos e garantias individuais ficariam suspensos, e aquele a ser apenado com morte seria fuzilado.
Não há como falarmos, precisamente, no conceito de dignidade, como
já visto, pois, por mais que todos nós nos esforcemos – e a melhor doutrina
já cuidou deste conceito –, não existe um único e verdadeiro significado para
a expressão, sobretudo do ponto de vista jurídico. Fácil é constatar o que é
indigno, ou seja, inicia-se a conceituação de dignidade pelo que podemos
entender, ver e compreender que seja indigno frente aos seres humanos.
De qualquer sorte, trazemos à tona casos verídicos, apresentados por Rizzatto
Nunes (2009, p. 1-5), para que você tenha a exata percepção do que é o desrespeito
flagrante aos direitos humanos fundamentais, sobretudo em razão da falta de
humanidade por parte de nossas autoridades, sejam elas legisladores, ou advindas
do poder executivo, ou, pasmem, do próprio poder judiciário (Texto 2).
Capítulo 8
206 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
TEXTO 2
1º exemplo: no dia 28 de julho de 1987, Artur James, policial pertencente a certo presídio americano, junto com outros dois colegas, pegou pelos braços Clarck Forest. Colocaram-no numa cadeira, amarraram-no e ligaram vários fios elétricos a seu corpo, inclusive na cabeça. Seu rosto na altura da vista, foi vedado por uma banda amarrada bem firme para que, com a descarga elétrica que ele iria sofrer, os olhos não pulassem fora. Alguns segundo depois submetaram-no a portentoso choque elétrico.
Uma boa platéia assistia ao evento para testemunhá-lo.
Depois de algum tempo de descarga elétrica, vários fios de sangue escorreram dos olhos de Clarck por detrás da banda. Era um sangue escuro, ocre, quase marrom, e grosso, como que derramando uma parte de sua essência vital. Um terrível cheiro de carne queimada invadiu a sala. Poucos segundos depois ele morreu.
2º exemplo: Antony Carton rodava com seu veículo pela High Way 720 num Estado americano, na noite de 18 de marco de 1993.
Um dos faróis do carro estava queimado. Por esse motivo ele foi parado pela Polícia Rodoviária. Abordado, dois policiais examinaram seus documentos e levaram-no preso.
Antony nada fizera, mas um homônimo cometera um crime e era procurado pela polícia. Ele disse isso aos guardas, mas não adiantou.
Enjaulado, foi-lhe oferecido um advogado. Passaram dias e por uma falha processual o advogado não conseguiu peticionar no prazo ao Juiz, requerendo a soltura de seu cliente (que era absolutamente inocente).
O Juiz não apreciou o pedido por excesso de prazo, mas percebeu que se tratava de homonímia. Disse, então, para o advogado recorrer.
Dias depois, no exato momento em que o Tribunal finalmente concedera liberdade a Antony. Ele se suicidava. Amarrando uma corda feita de tecido a uma grade do teto do refeitório, ele se enforcou. Um dia antes havia sido violentado em sua cela por outros dois prisioneiros.
3º exemplo: Antonio da Silva mora na cidade-satélite chamada Ceilândia, nos arredores de Brasília, Distrito Federal.
Numa tarde de abril de 2000, foi até um bosque perto de sua humilde casa e retirou um pequeno pedaço de casca de uma árvore para fazer chá.
É que sua esposa adoecera e todos ali na região tomam chá da casca daquela árvore, que é muito bom para a saúde.
Mas, para espanto e surpresa de Antonio, logo ao retirar a casca da árvore foi preso por um policial, pois desrespeitara a lei ambiental brasileira.
Foi encarcerado junto com vários presos perigosos.
Argüido pela imprensa sobre o porquê de ter arrancado a casca da árvore, mostrou-se atônito como num livro de Kafka. Mal pôde entender a pergunta. Que dirá do “direito”. Sempre tomara aquele chá, como todos os outros.
Capítulo 8
207Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Ficou mais de 15 dias preso.
4º exemplo: Jaider L.R.L., inválido, por intermédio de sua mãe, requereu o beneficio que lhe assegurava a Constituição Federal (art. 203, V), de um salário mínimo mensal, que à época era de R$ 120,00. A lei referida no texto diz que a pessoa inválida pode receber o benefício, desde que a renda “per capita” da família não exceda 25% do salário mínimo, ou, no caso, R$ 30,00.
Quando teve início o processo administrativo de Jaider junto ao INSS, seu pai recebia a “polpuda soma” de R$ 169,20 mensais. Com esses R$ 169,20 mensais o pai de Jaider “sustentava” cinco pessoas, incluindo ele próprio, inválido.
O posto do INSS, tão cioso de suas obrigações e prestador serviço público essencial, negou o pleito, pois, efetuado o cálculo previsto na lei, descobriu que 25% do salário do pai de Jaider montavam a – assombrosos – R$ 33,84, acima, portanto, do teto legal. Alias, muito acima: R$ 3,84!
A mãe de Jaider recorreu à 5ª Junta de Recursos do Distrito Federal e ganhou o Recurso.
Contudo, a Divisão de Recursos e Benefícios do Ministério da Previdência – olha aí nosso cioso serviço público... – recorreu a outra superior instância. A 2ª Coordenadoria de Consultoria Jurídica, por incrível que isto possa parecer, entendeu que: “A família do Autor [...] não é uma família miserável, ou seja, incapaz de prover a manutenção de pessoa portadora de deficiência...”(SIC).
5º exemplo: Dois cidadãos foram condenados a dois anos de reclusão por terem “subtraído” das águas de um bucólico açude do estado do Rio Grande do Sul 9 peixes tipo “Traíra”, avaliados em – espante-se – R$ 7.50!
Nunes (2009, p. 6), após citar, dentre outros, estes horrores contra a
dignidade da pessoa humana, conclui a breve exposição da problemática com
a seguinte indagação: “Agora, repetimos: Que mundo é este? E acrescentamos:
Que país é este? Que direito estamos aplicando?”.
Estes casos, como dito, são verídicos. Em nota de rodapé do livro de Nunes
(2009) ele apenas esclarece que alguns deles tiveram data e nomes alterados
– justamente para preservar e, conseguintemente, manter a dignidade desses
seres humanos, que padeceram com aludidas maldades institucionais.
É que o Brasil, como dito, engatinha no sentido da pacificação social
por intermédio dos direitos humanos. Acaso, como dito inúmeras vezes,
você, futuro profissional do direito, não entenda que a sua geração é que,
definitivamente, acabará com este desrespeito às nossas instituições, ou seja,
aos nossos irmãos mais pobres. Continuaremos sendo uma sociedade desigual,
donde uma minoria tem acesso a algo, enquanto esta mesma minoria sequer
pode ir às ruas, com receio de ser morta, assaltada, violentada, sofrer um
Capítulo 8
208 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
acidente e não ter acesso à saúde, sofrer abuso de autoridade de algum agente
de polícia ou magistrado, promotor etc.
O nosso país, para viver na plenitude democrática, necessita consolidar as
nossas instituições políticas (INSS, DETRAN, Cia de Águas e Esgotos, Secretarias
de Administração, Previdência, Tributação, Prefeituras, Correios, centros
administrativos dos Governos, entes diretos e indiretos da Administração Pública).
A única possibilidade de solidificação democrática de uma nação é recrudescer a
importância destes órgãos governamentais, para que estes, os quais são geridos
com a contribuição de nossas taxas, tributos e impostos, possam prestar, com
qualidade, de forma rápida e efetiva, nossos direitos. Se eles os fizerem, darão
a nós o direito humano de paz, e esta paz virá com dignidade.
Isto tudo acontece porque a Constituição manda que assim o seja. O
Estado não estará fazendo um favor ao impor o respeito ao postulado da
dignidade da pessoa humana. É obrigação, pois como você já sabe, esta
norma é fundamental. É princípio constitucional fundamental e fundamento
republicano, e está em consonância com a força normativa da constituição.
Konrad Hesse, jurista alemão, ex-juiz presidente da Corte Constitucional alemã (Bundesverfassungsgericht), escreveu, em 1959, a tese “A Força Normativa da Constituição” (original: Die Normative Kraft der Verfassung), em contraposição aos ensinamentos de Ferdinand Lassale para quem a Constituição não passaria de uma folha de papel.
SAIBA QUE
Muito entristece a nós professores, quando um aluno de Direito,
exclama – sem reversas, que: “Eu sou a favor da pena de morte!”. Não
porque esta discussão é velha, antiquada, impossível juridicamente e mais
do que provada que aludida “solução” não resolve nada, nunca resolveu,
nem nunca resolverá. Nem, muito menos, por não ter o aluno o direito
fundamental e humano de opinião e expressão. Mas, no caso do aluno(a)
de Direito, este é o que menos tem o próprio direito de expressar-se assim,
pois, presume-se que ele estude direito.
Capítulo 8
209Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Na verdade, não existe o Direito. Mas sim, Direitos. Direitos trabalhistas,
do consumidor, humanos etc. Cada norma legal, por meio da legalidade (Grau,
2008) é a única forma de proteção da pessoa humana.
O direito não condiz com a morte. Direito é vida. É dignidade.
É a luta pela preservação da espécie. Liberdade. Este é o bem comum
tutelado em todo o mundo, o qual atende por direitos humanos. Quando
determinado bacharelando em Direito afirma impropérios desta natureza,
crê-se que o mesmo não estuda; no máximo, frequenta uma Faculdade ou
Universidade. Se o direito não combina com a morte, imaginem com a
pena de morte. Apertar os botões, que matarão algum humano, não é
função de outro humano, muito menos do Estado, o qual deve proteger
a sociedade e os povos.
Você deve ter em mente que o princípio fundamental da pessoa
humana não versa sobre determinados aspectos penais. Muito pelo
contrário. A dignidade da pessoa humana nada mais é do que a pilastra de
uma nação séria e democrática no mais rigoroso sentido da expressão. O
Estado que respeita este postulado é amante das liberdades, do povo que
nele habita, amigo de nações vizinhas, prestador de ajuda humanitária.
Enfim, este Estado é protetor e guardião dele próprio, pois, no mundo
contemporâneo, aquele que serve o Estado e se beneficia deste, somente após
seu auxílio, é o verdadeiro ser humano do novo milênio.
As atualidades em face de direitos humanos não terminam por aqui.
Existem, ainda, milhares de casos pertinentes ao tema. O caso de extradição
de Cesare Battisti, a lei de Cotas Raciais para ingresso no ensino superior,
o próprio Estatuto da Igualdade Racial, o caso da iraniana condenada por
adultério a morrer por apedrejamento em pleno século XXI, a prisão de
Guantánamo, o Estatuto do Nascituro, dentre muitos outros, que você, desde
já, deve começar a pesquisar.
Capítulo 8
210 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
EXPLORANDOEXPLORANDO
Pesquise reportagens sobre os casos aqui apresentados em jornais online, tais como o do colombiano Abadía, e, sobretudo, leia sobre o verdadeiro desrespeito à pessoa humana no sistema carcerário brasileiro, por meio da
superpopulação de apenados, que vive em total desprezo perante a letargia da sociedade incrédula e especialmente das autoridades – cuja vigilância da lei teriam estes a obrigação funcional de garantir.
8.3 Aplicando a teoria na prática
Nessa seção, vamos trazer um caso curioso para que você entenda em
qual nível de direitos humanos, estritamente, em razão da dignidade da
pessoa humana, estamos a lidar, discutir, entender e debater.
Na França, existiu o famoso caso de Lançamento de Anão, importado
dos Estados Unidos e da Austrália; ou seja, pessoa humana portadora
de necessidades especiais (por deficiência física), sendo lançada em um
campeonato. O mais interessante é que este hard case teve de ir até o Comitê
de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, a ONU, para ser
definitivamente solucionado.
O lançamento de anões (em inglês: dwarf tossing, dwarf throwing ou,
em francês: lancer de nains) é uma brincadeira (ou esporte, para alguns), na
qual anões, vestindo roupas de proteção, são arremessados em direção a um
tapete acolchoado, vencendo aquele “competidor” que conseguir lançar o
anão na maior distância possível.
Pois bem. O certo é que, em uma cidade francesa chamada Morsang-sur-
Orge, a Prefeitura, utilizando seu poder de polícia, resolveu interditar um bar
onde era praticado o lançamento de anões, argumentando que aquela atividade
violava a ordem pública, pois era contrária à dignidade da pessoa humana.
Não se conformando com a decisão do Poder Público, o próprio anão
(Sr. Wackenheim) questionou a interdição, argumentando que necessitava
daquele trabalho para a sua sobrevivência. O anão argumentou que o direito
Capítulo 8
211Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
ao trabalho e à livre iniciativa também seriam valores protegidos pelo direito
francês e, portanto, tinha o direito de decidir como ganhar a vida.
Ressalve-se que o próprio anão, Manuel Wackenheim, solicitou que o
campeonato continuasse, pois, naquela determinada região francesa, era
comum o hábito de lançamento de anões, e mais, o mesmo se sentia feliz
ao ser arremessado, pois, perante a sociedade, ele era conhecido e sempre
lembrado pelo povo local.
Assim, seu apelo não foi só jurídico, no sentido de invocar contra a
autoridade francesa o direito ao trabalho, mas, também, a livre iniciativa e
valoração do trabalho social. Ele o fez, ainda, conclamando que seu direito à
honra teria sido violentado, tendo em vista que ele não estava padecendo ou
sofrendo, ou em situação indigna; ao contrário, era feliz com o trabalho que
desenvolvia, pois, além de tudo, era reconhecido e respeitado naquela região
como o “anão voador”.
Caso este hard case fosse levado até a sua decisão, o que você, como
magistrado, decidiria. Pense e reflita um pouco.
Vamos à solução?
Em outubro de 1995, o Conselho de Estado francês, órgão máximo da
jurisdição administrativa daquele país, decidiu, em grau de recurso, que o
poder público municipal estaria autorizado a interditar o estabelecimento
comercial que explorasse o lançamento de anão, pois aquele espetáculo
seria atentatório à dignidade da pessoa humana e, ao ferir a dignidade da
pessoa humana, violava também a ordem pública, fundamento do poder
de polícia municipal.
O Sr. Wackenheim, mais uma vez inconformado, recorreu ao Comitê de
Direitos Humanos da ONU, alegando que a decisão seria discriminatória e violava
o seu direito ao trabalho, pelos mesmos motivos anteriormente expendidos.
Finalmente, em setembro de 2002, o Comitê de Direitos Humanos da
ONU confirmou a decisão do Conselho de Estado francês, reconhecendo que
o lançamento de anão violaria a dignidade da pessoa humana e, portanto,
deveria ser proibido.
Capítulo 8
212 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Percebam que o comitê agiu de maneira correta, pois o valor da
dignidade da pessoa humana, como princípio e postulado universal
fundamental, é inerente à pessoa humana, pois a mesma é norma
indisponível. Assim sendo, ainda que o Manuel Wackenheim quisesse
ser atirado, sentisse-se bem sendo arremessado boteco adentro em
campeonatos de arremesso de anão, agiram corretamente as autoridades
francesas, pois ninguém pode abrir mão da dignidade ínsita à pessoa
humana, posto que não somos objetos de direito, mas, sim, sujeitos de
direito, protegidos pelo postulado indisponível da dignidade.
EXPLORANDOEXPLORANDO
Você deve ir ao site <http://d i r e i t o s f u n d a m e n t a i s . n e t / 2 0 0 7 / 0 8 / 1 4 /jurisprudenciando-casos-curiosos-julgamentos-pitorescos/> para averiguar como os anões eram arremessados durante os tais “campeonatos”.
8.4 Para saber mais
Título: A Força Normativa da Constituição
Autor: Konrad Hesse Editora: Sérgio Antônio Fabris Ano: 1991
Grande jurista alemão, ex-juiz presidente do Tribunal Constitucional Federal Alemão, nos relembra, em 30 páginas, que as normas constitucionais, sobretudo as que versem sobre os direitos humanos, possuem hierarquia perante outras normas não constitucionais.
Título: O STF e o Direito Internacional dos Direitos Humanos
Autor: Alberto do Amaral Junior e Liliana Lyra Jubilut Editora: Quartier Latin Ano: 2009
Livro em coautoria de vários especialistas e autoridades em prol da causa humanitária. Organizado por Alberto do Amaral Junior e Liliana Lyra Jubilut, que nos brindam com centenas de casos solucionados pelo STF em razão do direito internacional dos direitos fundamentais.
Capítulo 8
213Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
Título: Transconstitucionalismo
Autor: Marcelo Neves Editora: Martins Fontes Ano: 2009
Grande jurista pernambucano, professor emérito das mais renomadas escolas de Direito do país, no qual inova, trazendo à tona o modelo de diálogo entre as constituições democráticas de todos os povos, por meio de pontes de transição, à luz da sociologia do direito, lecionada por Niklas Luhmann.
Título: O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa
Humana, Doutrina e Jurisprudência
Autor: Rizzatto Nunes Editora: Saraiva Ano: 2009
O livro, bastante didático e bem resumido, traz, no seu bojo, casos de indignidade, estudo jurídico sobre a dignidade humana, além de um ensaio sobre a pena de morte, aliado a vários precedentes jurisprudenciais.
Site: dhnet – Direitos Humanos na Internet
URL: <http://www.dhnet.org.br>
Neste site, indispensável para a leitura e pesquisa sobre direitos humanos, você terá ainda mais contato com o PNDH3, bem como com o conteúdo deste, como o direito à verdade, e, ainda, com os mais novos casos, que versam sobre direitos fundamentais, como o Estatuto do Nascituro, Estatuto da Igualdade Racial, a iraniana que foi condenada à pena de morte por apedrejamento, por ter, em tese, cometido o “crime” de adultério.
8.5 Relembrando
Vamos, a seguir, abordar os principais aspectos vistos neste capítulo.
• Que os direitos humanos fundamentais não versam sobre o direito
processual penal e penal, tão somente. Neste ínterim, você precisará
entender para discutir que a pena de morte nunca resolveu nada,
nenhum problema dos povos, muito menos resolverá, sendo discussão
tola e infame daqueles que propagam o ódio por meio da doutrina
terrorista do direito penal do inimigo.
• Você precisa lembrar o caso Mayara Petruso, estudante de Direito, na
colocação clamorosa, a qual lembra a xenofobia hitlerista para saber que
Capítulo 8
214 Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
não há mais espaço para o separatismo, a não discriminação e abolição
de qualquer prática contrária aos direitos humanos fundamentais.
• Lembre-se do que falamos sobre gerações e dimensões de direitos
humanos fundamentais, pois esta discussão merece destaque, além
de você precisar saber que não há, do ponto de vista doutrinário,
diferenças técnicas e distinções jurídicas acerca desta atualidade.
Nesse mesmo passo, pare e pondere que a 5ª geração de direitos
fundamentais é uma 5ª dimensão, a qual advém diretamente da 3ª
geração/dimensão de direitos fundamentais.
• Lembre-se que o transconstitucionalismo não é geração/dimensão de
direitos humanos, mas, sim, um novo modelo de universalização de
direito constitucional interno, por meio de diálogo constitucional, bem
como por intermédio de pontes de transição, à luz dos ensinamentos
sociológicos de Luhmann, o qual inovou em acoplamentos estruturais,
na teoria dos chilenos Maturana e Varela.
• Relembre, também, que o direito não combina com a morte, quiçá
com a pena de morte. O direito é a base da pacificação social,
necessitando ser alçado à condição maior de vida e de dignidade da
pessoa humana.
• Você precisará lembrar como se dá a consolidação do estado democrático
por intermédio das instituições públicas, políticas e governamentais.
8.6 Testando os seus conhecimentos
1) Os direitos humanos versam sobre o direito processual penal e o penal? Explique.
2) Como se dá o repúdio ao separatismo e à discriminação no país?
3) Existe espaço para arbitrariedade de fornecedores de bens e prestadores de
serviços em detrimento dos consumidores? Aduza sobre o assunto.
4) O que são dimensões e gerações de direitos fundamentais? Quais são? Como
se dividem? Por quê? Quais os documentos universais que tratam sobre elas?
Capítulo 8
215Aspectos Jurídicos dos Direitos Humanos
5) Explique, com riqueza de detalhes, sobre o conceito de
transconstitucionalismo?
6) Afinal, o que é a dignidade da pessoa humana. Aduza e comente. Cite
exemplos. Fale sobre os exemplos explicitados por Rizzatto Nunes.
7) O que é o direito penal do inimigo?
8) Dignidade humana: Dogma absoluto? Comente.
Onde encontrar
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