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Artigo para o Enanpur, sobre Praças
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Dinâmicas entre acessibilidade e segregação: caso das praças da cidade de
João Pessoa-PB
Resumo do trabalho: O espaço urbano pode ser entendido como um produto da dominação da
classe de mais alta renda. Os interesses espaciais da camada dominante comandam a estruturação
deste, e o utilizam como instrumento para a reprodução das relações de produção e de consumo.
Os percursos territoriais e a distribuição de infraestrutura urbana nas localizações destas classes
aumentam ainda mais a desigualdade socioespacial. Sendo estes deslocamentos e a adequação da
infraestrutura, e dos demais subsistemas que compõe o sistema urbano, às necessidades da classe
de mais alta renda, aspectos intrínsecos ao processo de segregação socioespacial. A partir desta
premissa, o objetivo do presente trabalho é analisar a relação entre acessibilidade e segregação na
produção de praças na cidade de João Pessoa. O método aplicado foi a Teoria da Sintaxe
Espacial, para quantificar o nível de acessibilidade nas vias próximas às praças, além do uso de
dados georreferenciadas para análise quantitativa e visual. Os resultados mostraram que a
produção de praças na cidade de João Pessoa segue uma lógica de localização em espaços
morfologicamente acessíveis, porém concentrados em localizações concentradas pela classe de
alta renda.
Palavras-chave: Praças, Acessibilidade, Segregação
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Introdução
As cidades podem ser entendidas como um espaço onde um aglomerado humano
exerce atividades diferenciadas. A localização destas atividades dentro da estrutura urbana e as
relações entre pessoas e grupos geram formas e processos espaciais determinados.
Os processos de produção do espaço urbano são repletos de diferenças econômicas,
distintos entre as grandes metrópoles brasileiras e disseminados entre as cidades médias e
pequenas em menor escala, e configuram as mais diversas formas de interação urbana.
Entre as imbricações dessas interações, está a instalação das atividades mais
dinâmicas e de pessoas de maiores recursos em áreas mais privilegiadas, seguindo a lógica da
conveniência e agregando valor a determinadas parcelas da cidade, criando sítios sociais muito
particulares. Este processo de estruturação interna do espaço urbano é dominado pelos interesses
de consumo das camadas mais altas e configura-se pela “apropriação diferenciadas dos frutos,
das vantagens e dos recursos do espaço urbano” pela classe dominante (Villaça, 2001, p. 328).
Entre as vantagens obtidas por estas classes está a otimização dos gastos tempo
despendidos nos deslocamentos, uma vez que, as camadas de alta renda procuram trazer ou
produzir no seu espaço equipamentos e melhorias nos subsistemas urbanos de acordo com suas
necessidades. Ressalta-se que estas camadas melhoram para si a acessibilidade às diversas
localizações urbanas em detrimento das classes menos abastadas.
Neste sentido, o termo “acessibilidade” pode assumir nuances diferentes dependendo
da área do conhecimento, mesmo sendo alvo de discussões e reflexões há quase dois séculos,
ainda é objeto de controvérsias e confusões, conforme afirma Cardoso (2007). Entretanto, para o
presente estudo, adota-se a definição de Silveira (2004, p. 33), para o qual a acessibilidade física
é vista como “a facilidade de atingir os destinos desejados, como a medida direta e positiva dos
efeitos de um sistema de transporte”, considerando-a como atributo do espaço urbano, bem como
uma questão de “atrito” resultante da relação entre a atratividade de um determinado “ponto” da
cidade e as dificuldades de acessá-lo.
Assim, acessibilidade representaria, também, “oportunidades urbanas” para os
citadinos, como possibilidades de ter acesso a diversas localizações na cidade e, assim, usufruir
dos serviços e equipamentos oferecidos pela urbe, bem como, dos espaços livres públicos.
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Estes espaços exercem importante papel na sociedade contemporânea, proporcionam
encontro e lazer, promovem a socialização dos indivíduos, organizam a infraestrutura da cidade,
configuram o desenho urbano, fortalecem a identidade local e estruturam áreas de proteção
ambiental. A acessibilidade aos espaços livres públicos seria, portanto, uma medida também de
inclusão social.
Nesta perspectiva, o presente trabalho tem como objetivo estudar a relação entre a
localização dos espaços livres públicos e a acessibilidade na cidade de João Pessoa (PB), com
base na distribuição destes espaços na trama urbana, avaliar a possibilidade de acesso a estes
espaços pela população através de análises sintáticas.
A produção do espaço urbano: algumas notas
Para Corrêa (1999, p.11), o espaço urbano pode ser entendido como um “reflexo e
condicionante social, conjunto de símbolos e lutas”. Constituído por diferentes usos de terra
sobrepostos entre si, que definem áreas, como o centro da cidade, áreas industriais, áreas
residenciais, áreas de lazer e áreas de expansão. O presente autor, nesta direção, apresenta o
espaço urbano de uma cidade capitalista como fragmentos e afirma que cada uma dessas partes
mantém relações com as demais, através da circulação de decisões e investimentos de capital, de
rendimentos, da prática do poder e da ideologia.
Neste viés, Marx em seus estudos, mostrou “ser possível ligar, teoricamente, o
processo geral de crescimento econômico com o entendimento explícito de uma estrutura
emergente de relações espaciais” (Harvey, 2005, p.43).
Depreende-se, portanto, que as articulações que conformam o espaço urbano
representam os processos de reprodução das relações de produção. Porém, “a cidade é também o
local onde diversas classes sociais vivem e se reproduzem”, dessa forma, os conflitos sociais
também se inserem no contexto da produção do espaço urbano (Corrêa, 1999, p.9). Segundo
Alvarez (2013), as transformações ocorridas nas cidades nas últimas décadas sinalizam mudanças
estruturais na reprodução social, e o espaço constituí não apenas produto, mas também condição
e meio de reprodução do capital. Para a autora:
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A paisagem urbana revela desigualdades que são socioespaciais, porque
fundamentadas num processo contraditório de produção social do espaço, no qual
a valorização/circulação de capitais de diferentes níveis (locais, regionais e
globais) pressupõe a produção da cidade (da metrópole, do urbano) como
condição e meio de sua própria realização (Alvarez, 2013, p. 113).
Desse modo, entende-se que ao mesmo tempo em que o espaço é produzido em
conjunto com diversos atores sociais, sua apropriação é privada e o seu uso é subordinado à troca.
Esta possibilidade de capitalização da parte de mais valia como renda pelo proprietário da terra,
libera o capital imobilizado e configura a propriedade não apenas como patrimônio, mas também
como capital.
Nesta perspectiva, a compreensão do espaço urbano ultrapassa o sentido da
concentração-distribuição de atividades produtivas, serviços, equipamentos e infraestrutura
urbana, abrange também “a dimensão do uso, da presença e da possibilidade da apropriação”
(Alvarez, 2013, p.112).
Destarte, tais considerações nos convidam a fazer uma reflexão sobre a presença de
diferentes classes ou camadas sociais no espaço urbano e o modo como estas se apropriam e
modificam as formas espaciais que configuram a cidade.
A segregação socioespacial como um dos fundamentos da produção do espaço urbano
Segundo Côrrea, o conceito de segregação aparece na Escola de Chicago com Robert
Park e Roderick Mckenzie, este define a segregação como a concentração de tipos de população
dentro de um dado território, sendo entendida como um fenômeno natural, resultante da
competição entre os indivíduos. O autor, também, aponta que posteriormente ao conceito de áreas
naturais surge o conceito de áreas sociais, definido por Shevky e Bell como sendo áreas marcadas
pela uniformidade da população.
Castells (1983, p. 210), define a segregação espacial como “a tendência à organização
do espaço em zonas de forte homogeneidade social interna e com intensa disparidade social entre
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elas, sendo esta disparidade compreendida não só em termos de diferença, como também de
hierarquia”.
Desse modo, analisando os pressupostos acima, podemos identificar a diferenciação
das classes sociais como um elemento (trans)formador do espaço urbano, criando separações
simbólicas entre os diversos segmentos sociais.
Porém, conforme aponta Villaça (2001), a segregação espacial não implica na
separação espacial das diferentes classes, não existe presença exclusiva. A segregação de uma
classe é determinada pela concentração desta em uma região mais do que em qualquer outra da
cidade.
De acordo com Corrêa (1999), as áreas sociais criadas pela segregação seguem certa
lógica espacial, não estão dispostas de modo aleatório. Estes padrões são identificados pelos
nomes daqueles que teorizaram sobre a distribuição espacial das classes nos fragmentos da
cidade: são denominados modelos de Kohl, Burgess e Hoyt. O primeiro modelo de segregação
foi formulado, possivelmente, em 1841 pelo geógrafo J.G. Kohl, e baseado na generalização da
distribuição dos grupos sociais nas cidades da Europa continental. Neste modelo, a elite
localizava-se junto ao centro, enquanto os pobres habitavam na periferia viviam.
Sobre a lógica desse modelo, é importante observar que:
A lógica deste padrão residia no fato de que, na metade do século XIX, assim
como anteriormente, a mobilidade intraurbana era muito limitada e a localização
junto ao centro da cidade constituía uma necessidade para a elite porque ali se
localizavam as mais importantes instituições urbanas: o governo, através do
palácio, a Igreja, as instituições financeiras e o comércio a longa distância. A
localização central da elite se devia, pois a uma questão de acessibilidade às
fontes de poder e prestígio (Corrêa, 1999, p. 68).
Segundo Ferrari (1991), em 1924, E. W. Burgess estabeleceu em a teoria das zonas
concêntricas. Tomando como objeto dados empíricos colhidos em Chicago, apresentava a
diferenciação interna do uso da terra conforme a hierarquia social. Burgess afirmava que a elite
deslocou-se para a periferia devido o aumento das camadas de menor renda no centro da cidade.
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Para tal, Burgess desenvolveu a noção de centralidade, na qual as atividades urbanas
tendem a se concentrar no centro da cidade, devido à “posição e os processos históricos de
aglomeração e da competição ao redor de tal centro” (Silva, 1993, p.35).
Sobre a teoria de Burgess, é importante destacar que:
Trata-se, portanto de uma evolução na qual a cidade descrita por Kohl passa,
com a fase industrial do capitalismo, para uma organização espacial de
segregação de acordo com o que foi descrito por Burgess. Ter-se-ia, assim, uma
sequencia evolutiva na organização espacial da cidade (Corrêa, 1999, p. 68 e
69).
Ainda nesta perspectiva dos estudos sobre áreas sociais criadas pela segregação, em
1939, H. Hoyt propõe um modelo onde a segregação não mais assumia uma configuração de
círculos entorno de um centro. Segundo Ferrari (1991), a referida teoria apresentava que as zonas
da cidade não eram concêntricas, que estas se estendiam em setores ao longo das vias, canais ou
vale, formando setores.
Para Corrêa (1999, p. 69), “a lógica do modelo de Hoyt está na tendência auto-
segrativa da população de alto status, que se expande ao longo de um eixo de circulação que corta
as melhores áreas da cidade, de onde pode exercer um efetivo controle de seu território”.
Estes direcionamentos, primeiramente se correlacionam com a atratividade do sítio
natural e a proximidade da região ocupada ao centro. Em seguida, com a solidificação da
estruturação urbana se têm a definição das áreas “convenientes” para a burguesia e sua direção de
deslocamento. Destaca-se que esta direção de deslocamento desvela o comportamento espacial da
população, e implica na transformação do espaço urbano, a partir das novas formas de
crescimento da cidade.
A maioria das cidades reflete às dimensões da pobreza e seu componente geográfico.
Nessas cidades, há a “conjugação de dois movimentos convergentes: a superposição de um sítio
social ao sítio natural e a disputa entre atividades ou pessoas por dada localização” (Santos, 1993,
p. 96).
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Esse processo de estruturação interna do espaço urbano é dominado pelos interesses
de consumo das camadas mais altas e esta dominação configura-se pela “apropriação
diferenciadas dos frutos, das vantagens e dos recursos do espaço urbano” (Villaça, 2001, p. 328).
Entre as vantagens obtidas por estas classes está a otimização dos gastos tempo
despendidos nos deslocamentos, uma vez que, as camadas de alta renda procuram trazer ou
produzir no seu espaço, equipamentos e melhorias de sistemas de acordo com suas necessidades.
Na medida em que essa vantagem se consolida, a região ocupada pelas classes mais altas torna-se
mais vantajosa e de difícil abandono pela camada dominante.
Nesta perspectiva, observa-se que a burguesia melhora para si a acessibilidade às
diversas localizações urbanas, especialmente ao centro, em detrimento das demais classes. Pode-
se identificar a adequação do sistema viário às necessidades dessa classe, visando uma
maior capacidade de acesso e a melhoria da mobilidade para os moradores da região.
Para Costa (2011), outra vantagem obtida pelas camadas mais altas está a atuação e
produção concreta do setor imobiliário, o qual viabiliza o acesso a áreas afastadas, pouco densas,
alimentado pelo grande capital financeiro, no vigente estágio do capitalismo mundial.
Assim, o tecido urbano apresenta inúmeras situações de descontinuidade funcional.
Sposito (2013) reforçando a ideia de que as relações entre centro e periferia não são mais
suficientes para a apreensão das lógicas espaciais.
A hierarquia funcional do sistema centro-periferia e as zonas sociais segregadas dão
lugar a estruturas descentralizadas. Substitui-se, assim, a setorização da estrutura urbana em
zonas pela fragmentação funcional.
Tais transformações no espaço urbano não negam a relação centro-periferia, pois as
novas estruturas urbanas se redefinem sobre as pretéritas. Desse modo, novas localidades são
criadas difusas no território, segmentadas socialmente e funcionalmente.
Assim, o fator distância e as relações sociais devem ser tidos como fundamentais para
se compreender como se inscreve o movimento de estruturação da cidade, uma vez que, “nas
cidades dispersas, a população está localizada distante do CBD (Central Business District),
principalmente em função dos altos custos de moradia próxima a ele” (Bertaud & Malpezzi apud
Ribeiro & Holanda, 2006, p.50).
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Como efeito da dispersão urbana e da especialização funcional tem-se, além dos altos
custos de moradia próxima ao CBD, o aumento das distâncias que se têm que percorrer, das
velocidades para se gastar o mesmo tempo de viagem, e consequentemente, da energia
consumida para qualquer contato ou troca, e a exigência da utilização de veículos particulares e
invalidade de todos os outros meios de transporte. Na visão de Rueda (2003), esta nova dinâmica
reforça a onda de motorização e causa um retrocesso na capacidade autônoma de se mover,
criando de um quebra-cabeça territorial, a partir da fragmentação da cidade.
Nesta perspectiva, observa-se que a burguesia melhora para si a acessibilidade às
diversas localizações urbanas, em detrimento das demais classes. Pode-se identificar, também, a
adequação do sistema viário às necessidades dessa classe, visando uma maior capacidade
de acesso e a melhoria da mobilidade para os moradores da região.
A produção dos espaços livres públicos
A produção dos espaços livres públicos está correlacionada diretamente “às formas de
propriedade, parcelamento do solo, possibilidades de renda e construção dos proprietários, tanto
no caso de desmembramento de glebas com criação de novos trechos de malha viária, quanto no
caso dos lotes por sobre os quais serão inseridas as construções”. (Custódio et al., 2011, p. 2)
Entretanto, além da disponibilidade de recursos e interesses dos atores sociais
evolvidos, esta produção depende de políticas públicas que as regularizam. Dentre as legislações
federais, pode-se citar a Lei Nº 6766, de 19 de dezembro de 1975, que dispões sobre o
parcelamento do solo urbano e dá outras providencias.
De acordo com o art. 4º, entre os requisitos urbanísticos exigidos para loteamento,
esta existência de “áreas destinadas a sistema de circulação, implantação de equipamento urbano
e comunitário, bem como a espaços livres de uso público, [...] proporcionais à densidade de
ocupação prevista pelo plano diretor ou aprovada por lei municipal para a zona em que se
situem”. Dessa forma, destaca-se que é de responsabilidade municipal legislar sobre as áreas
destinadas a implantação de espaços livres públicos.
Ainda em seu art. 4º, a Lei Nº 6766 traz a seguinte observação sobre as condições que
devem ser atendidas pelos loteamentos, “a legislação municipal definirá, para cada zona em que
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se divida o território do Município, os usos permitidos e os índices urbanísticos de parcelamento
e ocupação do solo, que incluirão, obrigatoriamente, as áreas mínimas e máximas de lotes e os
coeficientes máximos de aproveitamento”.
Essa premissa possibilita que para cada zona da cidade, exista uma percentagem de
áreas públicas diferenciada, de acordo com as características, peculiaridades e interesses dos
atores envolvidos no loteamento e na futura ocupação.
Entretanto, conforme aponta Serpa (2004, p.1), a acessibilidade ao espaço público
da/na cidade contemporânea é hierárquica, desigual, “articula-se no processo de apropriação
espacial, definindo uma acessibilidade que é, sobretudo, simbólica”, é muitas vezes não
contempla as classes menos abastardas. Contrariando o conceito de espaço público, no qual estes
espaços são construídos pela diferença dos membros, e projetados a partir das relações que
envolvem igualdade de direito.
Categoricamente, pode-se classificar a acessibilidade em três escalas territoriais
interligadas: a macroacessibilidade, enquanto possibilidade de atravessamento da cidade como
um todo; a mesoacessibilidade, que seria um escala funcional intermediária de ligação entre
setores urbanos, ou mesmo intrassetorial (entre áreas do mesmo setor – bairros e vias principais
e/ou coletoras); e a microacessibilidade, definida como ligação direta a pontos locais da cidade
(Silveira, 2014). Interessa para o trabalho a macroacessibilidade, associada a uma análise global
da cidade, e a microacessibilidade, relacionada a uma analise na escala do pedestre.
Sob uma visão morfológica, Hillier et al. (1993) afirma que a configuração espacial
(nela incluída a localização de praças) indica, sem a necessidade de outros dados, a provável
distribuição geral de fluxos. Portanto, a configuração da tecitura urbana possui a propriedade de
privilegiar alguns espaços em relação a outros, no que diz respeito ao movimento de passagem.
Sendo assim, a malha urbana seria o principal gerador dos padrões de movimento e, como
consequência, de produção espacial. Este movimento, no cenário das cidades brasileiras, a
desigualdade de oportunidades urbanas, bem como a distribuição de espaços acessíveis, possui
relação com a apropriação espacial por parte da classe de alta renda, que se localizam nos espaços
mais acessíveis da cidade.
Sobre a área de estudo
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O município de João Pessoa possui uma área total de 211km², ocupa 0,3% da
superfície do Estado da Paraíba, com uma população de 723.515 habitantes, sendo que, desta,
mais de 99% reside na zona urbana, apresentando uma densidade demográfica de 3.421,28
habitantes por quilômetro quadrado (IBGE, 2010). Está localizado na porção oriental do Estado
(figura 01), entre 08°07’ de latitude sul e 34°52’ de longitude oeste (cf. infra, Figura 01).
É reconhecido por vários autores como Santos Júnior, Silva e Silveira (2013) e
Oliveira (2006) que a malha urbana de João Pessoa vem passando por um processo de dispersão.
A cidade viveu após a década de 1970 um rápido crescimento populacional, que promoveu uma
expansão urbana acelerada, principalmente na região sul do município. Nesse processo, baseado
no acúmulo de capital, bens, serviços, equipamentos e infraestrutura, a organização da cidade em
"fatias socioespaciais" torna a dinâmica espacial urbana desordenada sob o ponto de vista de uma
cidade mais equitativa. As parcelas mais pobres da população são, cada vez mais, afastadas dos
centros e subcentros da cidade, restringindo oportunidades e provocando segregação
socioespacial e espraiamento urbano (Santos Júnior, Silva e Silveira, 2013).
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Figura 01: localização da cidade de João Pessoa-PB
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Embora, os espaços livres públicos sejam condicionadas por legislação municipal,
conforme apontado anteriormente, o Plano diretor da cidade de João Pessoa (1992) e Código de
urbanismo (2001) não os abordam em suas diretrizes.
Sobre estes espaços, o Código de obras da cidade de João Pessoa (2001) apresenta
apenas a diferenciação entre parques e praças, porém, não se adentra aos aspectos relacionados,
por exemplo, às áreas míninas e à sua proporcionalidade ao número de habitantes da zona em que
se situam. O capitulo V, das definições, art. 39, traz a seguinte redação:
PARQUE - o jardim de dimensões avantajadas, entrecortados de
avenidas, ruas ou caminhos e destinado a recreio. [...] PRAÇA - É o
logradouro de caráter monumental para onde convergem outras vias e
destinado ao tráfego ou estacionamento (João Pessoa, 2001).
Neste cenário, pode-se observar a inexistência de orientações plausíveis sobre a
implantação desses espaços, bem como, o direcionamento de políticas que busquem possibilitar
uma melhor distribuição dos espaços livres públicos na malha urbana da cidade, uma vez que, a
legislação municipal refere-se as estes logradouros apenas como pontos de convergência de vias e
áreas destinas a estacionamento.
Metodologia
O método aplicado neste trabalho é a Sintaxe Espacial. Também chamada de Análise
Sintática do Espaço, foi desenvolvida no final da década de 1970, sendo concretizada no livro
The Social Logic of Space (Hillier e Hanson, 1984). A teoria busca analisar a relação entre o
espaço construído e as práticas sociais, a partir de uma visão sistêmica, na qual um determinado
objeto (praças, ruas, entre outros) relaciona-se com o sistema (p.ex., uma cidade, uma metrópole)
como um todo.
Dentro da Sintaxe Espacial, os dados serão abordados a partir de mapas de
segmentos. Desenvolvido por Turner (2001), o mapa de segmento difere do mapa axial
tradicional por considerar que o caminho mais curto é aquele que minimiza o ângulo entre os
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pontos de origem e destino, diferente do mapa axial, cujo menor percurso é aquele onde há a
menor mudança de direção e, portanto, retrata melhor movimento natural das pessoas que o mapa
axial.
As medidas sintáticas empregadas foram Integração e Escolha. De acordo com Hillier
(2009), esta medida analisa a facilidade de alcançar determinado segmento partindo de todos os
outros. A escolha (Choice) refere-se à probabilidade de se passar por um segmento, considerando
todas as possibilidades de origem-destino). As medidas foram analisas em duas escalas: global,
que considera a análise sistêmica, ou seja, valores em relação ao sistema como um todo, e de raio
de 1km, que é o raio de influência dos parque vizinhança e parques de bairro, conforme
Cavalheiro e Del Picchia (1992, p. 32). Ressalta que para o estudo proposto, as praças foram
equiparadas a estas categorias de espaços livres públicos e escolhidas como objetos de análise.
Resultados e discussões
Em relação à integração destes espaços com a malha urbana da cidade, considerando
dados globais, pode-se observar que o maior quantitativo de praças concentra-se na região central
da mancha urbana. Esta situação está atrelada aos aspectos históricos de crescimento da cidade,
no qual seu eixo de expansão inicial delimitado pelo sentido oeste-leste, e na localização das
classes de mais alta renda ao longo deste corredor. Ao todo, das 189 praças, 154 estão localizadas
nos espaços mais integrados (e com maior renda),com valores de integração entre 0,76 e 1,05, o
que equivale a 81,48% do total das praças. O setor sul de João Pessoa, caracterizado por ser
morfologicamente mais segregado e com presença maior da população de baixa renda, possui
apenas 15 praças nos espaços mais integrados (ou 9,74% das praças na região mais integrada), o
que mostra uma clara relação entre a produção de espaços livres, a acessibilidade e o acúmulo de
capital.
Com relação aos valores de integração na escala de 1 km, vê-se que as praças estão
posicionadas em espaços com potencial de interação na escala do pedestre, com concentração em
dois principais polos: o centro antigo da cidade e ao sul da rodovia federal BR-230, região esta
com predomínio de conjuntos habitacionais populares. Neste cenário, 131 praças estão inseridas
em espaços com integração entre 0,63 e 1,18 (bem integradas), o que representa 69,31% do total
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de praças. No entanto, 27 delas estão em área de classe de baixa renda, o que representa 20,61%
de todas as praças melhor integradas (cf. infra, Figura 02 a 07).
81%
19%
Integração Global das Praças de João Pessoa
Integradas
Segregadas
Figura 02: Divisão das Praças, por Integração Global
90%
10%
Divisão das Praças Integradas, por classe social
Alta Renda
Baixa Renda
Figura 03: Praças Integradas, por classe social
14
69%
31%
Divisão das Praças, por integração de raio 1km
Integradas
Segregadas
Figura 04: Divisão das praças, por integração de raio 1km
79%
21%
Praças Integradas no Raio 1km, por classe social
Alta Renda
Baixa Renda
Figura 05: Praças Integradas em raio de 1km, por classe social
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Figura 06: Integração Global de João Pessoa, com a sobreposição das Praças
16
Figura 07: Integração de raio de 1km de João Pessoa, com a sobreposição das Praças
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A medida de Escolha global também mostra, espacialmente, que as praças da cidade
estão localizadas nas ruas com potencial de serem escolhidas como rota principal, ou seja, foram
produzidas em percursos potencialmente utilizados para trajetos macroespaciais. Como não há
vias principais no setor sul da cidade, as praças desta região também localizadas em espaços com
menor potencial global. Percebe-se, desta forma, como as praças se articulam com o sistema
vário, numa relação biunívoca.
A medida de escolha com raio de 1km repete o resultado da medida de integração de
1km: as praças estão em eixos com potencial de escolha ara percursos curtos, independente da
região da cidade e da classe social. Percebe-se, então, que estes elementos se conformam melhor
na escala microespacial na cidade. As áreas estruturadas pelas praças possuem importante função,
tanto global como loca, nos deslocamentos das pessoas (cf. infra, 08 e 09).
18
Figura 08: Escolha Global de João Pessoa, com a sobreposição das Praças
19
Figura 09: Escolha de raio 1km de João Pessoa, com a sobreposição das Praças
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Considerações finais
A avaliação da acessibilidade aos espaços livres públicos a partir da localização das
praças na malha urbana – para isso fazendo uso de ferramentas de Sistemas de Informações
Geográficas e técnicas de analises sintáticas por meio do método de Sintaxe espacial – mostrou
ser uma maneira muito conclusiva de se identificar o acesso a estas áreas. No entanto, reconhece-
se suas limitações, uma vez que, nessa análise, não foram consideradas as mudanças dos padrões
sociais e de uso do espaço público ao longo das última décadas.
Mesmo assim, os produtos cartográficos construídos e utilizados para esta análise
mostraram-se eficientes, como ferramenta de aproximação e de baixo custo. Foi possível, com o
trabalho, ter uma noção de como as praças estão distribuídas na trama da cidade e, logo, quais
áreas abrangem o maior/menor quantitativo destas, e correlacionando as localizações com uma
presença maior/menor da população de alta renda e a possibilidade de acesso.
A análise dos produtos cartográficos gerados na pesquisa evidencia a existência de
predominância desta categoria de espaços públicos nas áreas onde estão concertadas a população
de alta renda. Entretanto, na escala de 1 km, observou-se que independe da localização relativa
na cidade, as praças estão posicionadas em espaços com potencial de interação na escala do
pedestre, possibilitando assim o acesso a estes espaços pela população que reside na zona onde
estão inseridas.
Por fim, destaca-se que a localização das praças na trama urbana segue as diretrizes
apresentadas no código de obras do município, uma vez que, estes espaços livres públicos, em
sua maioria, estão inseridos em pontos de convergências de vias e em ruas com potencial de
serem escolhidas como rota principal.
Referências
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