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O agregador do marketing. 28 Abril de 2011 www.briefing.pt Entrevista Tura Satana, a cadela que é directora criativa (informal) da Leo Burnett, ao colo de Miguel Simões “O poder das agências é enorme. Não é um poder monetário, mas também não era bom que a indústria publicitária fosse poderosa só porque tinha muito dinheiro. O importante é ser poderosa porque agrega muito valor ao negócio dos seus clientes”, afirma Miguel Simões, 43 anos, presidente das três agências (Publicis, Leo Burnett e Arc WW) do grupo Publicis no nosso país O poder das agências é enorme Miguel Simões, presidente do grupo Publicis em Portugal Briefing I A explosão das redes sociais está a matar a publicidade tradicional? Miguel Simões I Não. De forma alguma. Está abrir novas oportuni- dades para chegarmos às pesso- as de uma forma diferente e mais relevante. Ramon de Melo Briefing I A comunicação de mas- sas é uma coisa que já passou ou ainda é possível? MS I Não, não passou. O grande foco tem de estar na busca duma grande ideia e não em pensar- mos num filme muito bonito. Primeiro temos de pensar numa ideia focada nas pessoas, em melhorar e enriquecer a vida de- las. Em função dessa ideia, utili- zamos cada um dos meios para tirar o maior partido dela e assim aproximar a marca das pessoas, e vice-versa, criando um relacio- namento com elas. Catarina Caldeira Baguinho jornalista Jorge Fiel jornalista jf@briefing.pt

Entrevista com Miguel Simões

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Miguel Simões, presidente do grupo Publicis em Portugal

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Page 1: Entrevista com Miguel Simões

O agregador do marketing.28 Abril de 2011

www.briefing.ptEntrevista

Tura Satana, a cadela que é directora criativa (informal) da Leo Burnett, ao colo de Miguel Simões

“O poder das agências é enorme. Não é um poder monetário, mas também não era bom que a indústria publicitária fosse poderosa só porque tinha muito dinheiro. O importante é ser poderosa porque agrega muito valor ao negócio dos seus clientes”, afirma Miguel Simões, 43 anos, presidente das três agências (Publicis, Leo Burnett e Arc WW) do grupo Publicis no nosso país

O poder das agências é enormeMiguel Simões, presidente do grupo Publicis em Portugal

Briefing I A explosão das redes sociais está a matar a publicidade tradicional?Miguel Simões I Não. De forma alguma. Está abrir novas oportuni-dades para chegarmos às pesso-as de uma forma diferente e mais relevante.

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Briefing I A comunicação de mas-sas é uma coisa que já passou ou ainda é possível?MS I Não, não passou. O grande foco tem de estar na busca duma grande ideia e não em pensar-mos num filme muito bonito. Primeiro temos de pensar numa

ideia focada nas pessoas, em melhorar e enriquecer a vida de-las. Em função dessa ideia, utili-zamos cada um dos meios para tirar o maior partido dela e assim aproximar a marca das pessoas, e vice-versa, criando um relacio-namento com elas.

Catarina Caldeira Baguinhojornalista

Jorge Fieljornalista

[email protected]

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“As pessoas valorizam cada vez mais a

interacção e as redes sociais dão essa oportunidade às

marcas”

“A organização do pensamento é fundamental num momento em que

temos uma fragmentação dos media como nunca houve na história da

comunicação. Buscar uma grande ideia para uma marca é um processo difícil

mas é muito, muito aliciante e exigente”

“A explosão das redes sociais não está a

matar a publicidade tradicional. Está a abrir novas oportunidades para chegarmos às

pessoas de uma forma diferente e mais

relevante”

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Briefing I O importante é a ideia e não o meio?MS I A maneira de chegar também é muito importante. Mas a organiza-ção do pensamento é fundamental e prioritária num momento em que temos uma fragmentação dos me-dia como nunca houve na história da comunicação: Buscar uma grande ideia para uma marca é um proces-so difícil mas é muito, muito aliciante e exigente. A partir do momento em que chegamos a essa grande ideia, dispomos de um leque de ferramen-tas muito mais diversificado e com muito mais potencial que abre muito mais oportunidades e é muito mais desafiante.

Briefing I O que quer dizer que a fragmentação dos meios e audi-ências é positiva para as marcas?MS I É uma oportunidade extraordi-nária para todos, marcas, agências, anunciantes…

Briefing I Já sabem como agir nas redes sociais?MS I As redes sociais são mais um meio. Se nos centrarmos em fazer uma campanha no Facebook ape-nas porque queremos, e trabalha-mos comunicando uma mensagem sobre os atributos do produto, não tem alcance. As pessoas valorizam cada vez mais a interacção e as re-des sociais dão essa oportunidade às marcas. Dou-vos um exemplo genial, muito falado em 2010. A Old Spice lançou um filme tradicional de 30 segundos, que gerou de tal for-ma buzz off e online, que a marca, numa semana, desenvolveu mais 50 filmes, criados, produzidos e colo-cados online a determinadas horas para responder de forma surpreen-dente às perguntas online das pes-soas. Briefing I São o Marketing e a Pu-blicidade que criam os comporta-mentos do consumidores, ou é o consumidor que é a base para o trabalho do Marketing e a Publici-dade?MS I Não gostamos de falar em con-sumidor, mas sim em pessoas. Isso é um pormenor muito importante. Quando olhamos para uma pessoa como consumidor, o nosso ponto de

partida é passar-lhe uma mensagem centrada no produto ou no preço. Entramos na era da oferta em que a diversidade é tal que nunca foi tão difícil diferenciar. Não chega comuni-car características ou preços, usan-do a forma para diferenciar. Há que ir mais além, interagir e surpreender. Respondendo à pergunta: as pesso-as são o epicentro da inspiração da publicidade, mas a criatividade tem o poder de transformar o comporta-mento humano.

Briefing I Há uma interacção…MS I Sim. E esse tem de ser o pon-to de partida do nosso pensamen-to. Há uma interacção, não há uma mensagem da marca que está num pedestal. Há 10 anos era assim, uma marca fazia um filme muito bonito, com um conceito muito interessante, passava-o em prime time, no inter-valo da novela, e tinha a capacidade e possibilidade de atingir toda a gen-te de forma muito eficaz. Hoje em dia, feliz ou infelizmente, é diferente – e muito mais desafiante.

Briefing I Há os anunciantes, os publicitários, os meios e as pes-soas. Não pode haver a tentação dos anunciantes tentarem fazer bypass e falarem directamente com as pessoas?MS I Não é um perigo. Felizmente, os clientes não são de ninguém, fe-lizmente. As pessoas não são de nin-guém. Os clientes, as pessoas são donos das suas opções de vida e de novo as marcas têm de enriquecer as suas vidas para crescer seu futu-ro. É uma oportunidade única.

Briefing I Ajudar os clientes a co-municar é o novo papel das agên-cias?MS I Exactamente. As agências que sabem pensar e trabalhar de forma diferenciadora são aquelas as que têm mais capacidade de ajudar os clientes a pensar, comunicar e a interagir com as pessoas – e não a passar mensagens apenas do pro-duto, características ou preço. Já lá vai o tempo em que bastava lançar um produto inovador, pô-lo nas lojas certas e dizer na televisão repetida-mente o porquê de as pessoas o de-verem comprar.

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Apanhado à má fila pela Leo Burnett num pequeno-almoço na Vela LatinaPERFIL

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“Hoje em dia não falamos em consumidor,

mas sim em pessoa. Isso é um pormenor muito importante”

Briefing I é raro usar a palavra pu-blicidade. é de propósito? MS I É verdade. Hoje em dia não uti-lizamos muito a palavra publicidade.

Briefing I Resumindo, o papel das agências é coordenar o uso de uma quantidade enor-me de disciplinas e meios para ajudar os clientes a interagir com as pessoas?MS I O que caracteriza a forma de pensar das melhores agên-cias do mundo é terem o foco no conhecimento do negócio dos clientes e o epicentro do pensa-

mento nas pessoas. Conhecendo o negócio e conhecendo as pes-soas, podemos a ajudar o cliente a interagir com elas. Nos últimos tempos, grande parte das ideias criadas na Leo Burnett a pensar nos clientes tinham uma compo-nente de publicidade, mas eram essencialmente ideias de pro-duto – desenvolver um produto novo, pensar num novo canal de distribuição…

Briefing I Costuma dizer-se que os momentos de crise estimu-lam a criatividade. Sente isso?

MS I Sim. É nestes momentos que o repto para pensar diferen-te ainda é mais interessante.

Briefing I Há muita gente nes-te negócio que se queixa que os anunciantes arriscam pouco...MS I Eu costumo dizer que as gran-des ideias ultrapassam todas as bar-reiras.

Briefing I A publicidade já foi uma indústria muito rica e podero-sa. Agora as agências trabalham com orçamentos mais curtos e os clientes querem poupar e evi-

Pode dizer-se que Miguel foi apanhado à má fila pela Leo Burnett. Estava ele feliz da vida, há oito anos como director de marketing da VW/Siva, quando tropeçou num amigo do tempo em que ambos se divertiam a jogar no ZX Sprectrum e andavam na noite a dan-çar ao som de Lloyd Cole, U2, Fleetwood Mac e Ten Thousands Maniacs. Para porem a escrita em dia, logo marcaram logo um pequeno-almoço no Vela Latina. Aconte-ce que o amigo não apareceu sozinho. Levou a tiracolo Anthony Gibson, director-geral da Leo Burnett, recém-desembarcado no mer-cado português de publicidade através da compra de uma agência no Porto.Leo quê?, perguntou Miguel, no momento das apresentações, pouco antes de se aper-ceber que o inglês o queria recrutar porque precisava de alguém que percebesse de ma-rketing automóvel.Como estava satisfeito na VW, que consegui-ra elevar a líder de vendas e imagem no seu segmento (marcas generalistas), não achou grande graça à partida do amigo, declinou o convite, o mais amavelmente que pode.Julgava que tinha posto uma pedra no as-sunto, mas não. Uma semana volvida sobre o pequeno-almoço, estava ele a trabalhar na Siva quando o informaram da recepção que estavam lá dois senhores à procura dele.Gibson voltava à carga, sem aviso prévio, e

ele apesar de se sentir desconfortável com a visita inesperada, convidou-os para tomar café. Durante o encontro, o inglês da Leo Burnett expôs-lhe o seu projecto de uma for-ma tão sedutora que lhe deu a volta.“Eu sentia-me muito bem na Siva. Estava muito próximo da sede – ia duas vezes por mês à Alemanha – e as vendas corriam lin-damente. Mas ele conseguiu convencer-me de que ain-da podia ser mais feliz na Leo Burnett”, expli-ca Miguel, que tinha 33 anos quando mudou de campo dos clientes (a agência da Siva era a Young & Rubicam) para o dos publicitários.Debutou como director de contas, uma es-calada que em 10 anos o levou ao lugar mais alto da hierarquia do grupo Publicis em Por-tugal, que o acaba de nomear presidente das três agências do grupo (Publicis, Leo Burnett e Arc WW) que operam no país.Filho do matrimónio entre uma doméstica e o director-geral em Portugal da Champion (uma multinacional de amortecedores), Mi-

guel cresceu em Benfica (mo-rava a menos de cem metros da Luz, o que ajuda a explicar a sua obediência clubística) e começou por sonhar ser músi-co antes de decidir estudar Ma-rketing, à noite, no IPAM – en-quanto durante o dia começava a praticá-lo na Fiat.Como está bom de ver, o seu primeiro carro foi um Uno 45 S vermelho (matrícula JO-63-64). Demorou-se três anos na mar-

ca italiana, antes de se mudar para o BCI, onde manteve a pista do vermelho, já que trabalhou na mudança de imagem do azul BCI para o vermelho de Santander. Foi a sua última ocupação antes da VW/Siva.A adaptação à publicidade e à Leo não foi fácil – “vinha de métodos e formas de pen-sar muito diferentes” – mas acabou por ser venturosa. “A felicidade moveu quase todas as minhas decisões”, remata Miguel, 43 anos, que tem dois filhos (Zé Manel, 13 anos, e Beatriz, 12 anos), com quem faz surf na Costa da Ca-parica ou em Carcavelos (“eles são melhores que eu”, confessa), dois carros (um Merce-des e um Fiat 500 branco), vive em Lisboa, mas faz os fins-de-semana em Azeitão, onde tem Tor, um castro laboreiro, que aprecia a companhia de Tura Satana, a cadela adop-tada pela Leo Burnett e que desempenha informalmente a função de directora criativa da agência – ao ponto de já ter ido ao palco em Cannes.

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www.briefing.pt Entrevista

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“Quando olhamos para uma pessoa

como consumidor, o nosso ponto de partida

é passar-lhe uma mensagem centrada no

produto ou no preço. Com a fragmentação

dos media e a multidão de mensagens a

serem comunicadas, o epicentro passou a estar nas pessoas”

“Os clientes não são de ninguém. As pessoas

não são de ninguém. Os clientes, as pessoas são

donas do seu futuro. é uma oportunidade

única”

“Há 10 anos uma marca fazia um filme muito bonito, com um conceito muito

interessante, passava-o em prime time, e tinha a capacidade e possibilidade

de atingir toda a gente de forma muito eficaz. Hoje em dia, feliz ou infelizmente,

é diferente e muito mais desafiante”

tar ao máximo o desperdício. Os clientes estão mais exigentes? MS I Seja em que época for, o des-perdício não deve existir. Dito isto é verdade que os orçamentos são mais curtos e os clientes mais exi-gentes com as agências, o que é natural porque os negócios são mais exigentes. As agências só têm de reagir e ser ainda mais exigentes perante a busca de melhores ideias para ajudarem os clientes a cons-truir marcas que sejam um poderoso íman de atracção das pessoas. Nes-te sentido, acho que hoje o poder das agências é enorme. Não é um poder monetário, mas também não era bom que a indústria publicitária fosse poderosa só porque tinha mui-to dinheiro. O importante é ser pode-rosa porque agrega muito valor ao negócio dos seus clientes.

Briefing I Está dizer que a agên-cia é agora mais uma consultora do tipo da Deloitte, Accenture ou Mckinsey e já tem pouco a ver com o que era uma agência de publicidade no século XX?MS I Sem fazer comparações com outras entidades, eu diria que a agência é um dos únicos parceiros e aliados que pode ajudar o cliente a fazer crescer vendas e receitas. A agência está geneticamente ligada ao centro de geração de receita.

Briefing I Isso implica reunir, in-terna ou externamente, compe-tências numa série de disciplinas, como a organização de eventos, relações públicas, comunicação, design, branding…?MS I Dependendo dos seus objecti-vos de posicionamento e de modelo de negócio, as agências têm de de-cidir quais são as áreas em que vão recorrer a outsourcing e as áreas em que querem ter controlo, autonomia e tentar ser as melhores

Briefing I Há agências a mais? Acha que o mercado dá para to-dos? MS I O mercado o dirá. Briefing I Não está preocupado?MS I Não estou preocupado com isso. Estou muito, muito centrado em ajudar os nossos clientes. Esse é o nosso foco. Agora se há muitas ou

poucas agências, o mercado o dirá. Há agências que abrem todas as semanas, há agências que fecham todos os meses. É a lei do mercado. Acho que nunca há agências a mais ou agências a menos. Há sempre as agências que o mercado proporcio-na que haja em cada momento.

Briefing I Se estivesse agora numa reunião de new business com um potencial cliente, o que lhe diria para ele o contratar?MS I No caso da Leo Burnett dir-lhe-ia que é a agência mais criativa do país e que se envolve no negócio do cliente por forma a ajudá-lo a pen-sar ideias capazes de transformar o comportamento das pessoas a favor das suas marcas.

Briefing I O maior trunfo é a cria-tividade?MS I Sim, é. Por isso é que, indepen-dentemente de ser a Leo Burnett, Publicis ou Arc WW, é fundamental ter as pessoas felizes. Só assim se consegue fazer um bom trabalho. A felicidade é o princípio de tudo.

Briefing I Nos Estados Unidos o investimento publicitário recupe-rou da queda de 2009 e cresceu 6,5%, no ano passado, enquanto em Portugal continuou a cair, re-cuando mais 2,5%. O problema é do país, não é da indústria? MS I Sim. Pode dizer-se que é um problema do país.

Briefing I Mas não acha uma boa notícia a recuperação norte-ame-ricana?MS I Boa notícia era vermos sinais de podermos aqui ir por esse cami-nho.

Briefing I Os preços de tabela em Portugal são uma ficção. Isso não é mau para a credibilidade do ne-gócio? Não faria sentido os meios adoptarem uma política de preços mais transparente? Ou isso não o preocupa?MS I Não, não me preocupa. Não é uma situação particular deste sec-tor. Ficaria preocupado se houvesse um monopólio ou se não houvesse competitividade no mercado. Os preços de tabela estão definidos,

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“Já lá vai o tempo em que bastava lançar um produto inovador, pô-lo nas lojas certas e dizer na televisão repetidamente o porquê de as pessoas o deverem comprar”

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“Para fazer um bom trabalho é fundamental que as pessoas estejam felizes. A felicidade é o

princípio de tudo”

“A agência está geneticamente ligada ao centro de geração de receita – é um dos

únicos parceiros e aliados que pode ajudar o cliente a fazer crescer

vendas e receitas”

cada um pratica os descontos que entende. Toda a gente sabe, o mer-cado é competitivo. Não vejo nisso um problema.

Briefing I Nos EUA o investimento publicitário online já é superior ao feito na imprensa. é uma tendên-cia que não tardará a chegar cá?MS I Sim, é uma tendência. O in-vestimento online tendencialmente continuará a subir. Se alguma vez vai ultrapassar o realizado nos meios tradicionais? Não sei. Mas também esse não é o foco. Temos de estar centrados em utilizar o mais ajusta-do aos objectivos de negócio dos clientes, em colaboração com a sua agência de meios.

Briefing I Mas como analisa o fe-nómeno digital?MS I O digital tendencialmente subi-rá de forma exponencial nos próxi-mos anos. Até onde chegará? Não faço nenhum prognóstico, por uma razão: porque será uma consequên-cia do que pensarmos e fizermos…

Briefing I O meio digital oferece mais possibilidades para a criativi-dade se espraiar do que os meios tradicionais? MS I Depende do projecto, depende da marca. Mas genericamente, sim. Mas depende do objectivo do cliente e da marca. Vou dar um exemplo: o poder do ponto de venda, hoje em dia, é determinante no processo de escolha de decisão de uma marca. Portanto, não posso responder taxa-tivamente que sim a essa pergunta. Há casos em que sim, há casos em que não.

Briefing I A base do vosso traba-lho é marca, ideia, pessoas?MS I É esse o triângulo. Pessoa, marca e ideia. É por aí.

Briefing I A fragmentação das au-diências não dificulta o vosso tra-balho?MS I Não. A fragmentação dos media torna o trabalho mais exi-gente mas mais desafiante e di-vertido também. Abre novas opor-tunidades ao nosso processo de pensamento para chegarmos de uma forma mais surpreendente às

pessoas. É mais uma variável da forma.

Briefing I Sente que é credível e suficiente a informação disponível sobre as audiências dos diversos meios?MS I Penso que é suficiente. Há muito debate sobre a credibilidade dessa informação, mas estão espe-cialistas a trabalhar nisso. E há muito a fazer nessa área.

Briefing I Acaba se ser nomeado presidente das três agências por-tuguesas do grupo Publicis. Em que é que isso vai mudar a sua vida e o modo de agir das agên-cias? Elas já actuavam como um grupo?MS I Não, não actuavam e vão conti-nuar da mesma forma. O que mudou foi a minha rotina e o meu trabalho. Mas eu gosto de mudanças.

Briefing I O que é que mudou?MS I Agora ando, a toda a hora, de um lado para o outro. E tenho a pos-sibilidade de trabalhar com clientes e pessoas diferentes, com uma agên-cia com um posicionamento, foco e prioridades diferentes. Uma coisa não muda: a independência de cada uma das agências, que vão ter a equipas autónomas a liderá-las, quer em termos criativos quer em termos de negócio propriamente dito.

Briefing I Se tivesse de apresentar num minuto cada uma das três agências o que diria? MS I A Leo Burnett é a agência mais criativa do país e persegue o caminho de crescimento e da con-solidação da reputação que temos de ser os mais criativos e muito fo-cados em ajudar os clientes. A Pu-blicis está numa mudança de ciclo. Neste momento vai estar 100 por cento focada em ajudar e fazer um bom trabalho para os seus clien-tes actuais. Em 2011, não vai fazer new business. O objectivo para este ano não é crescer mas estar mais próxima dos clientes, conhecer o negócio deles para ser ainda mais eficazes a ajudá-los. Há muito para conhecer e aprender, para juntos pensarmos soluções geradoras de resultados, centrados nas pessoas.

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Edição vídeo desta entrevista

em www.briefing.pt

“O que caracteriza a forma de pensar das melhores agências

do mundo é terem o foco no conhecimento

do negócio dos clientes e o epicentro do pensamento nas

pessoas. Conhecendo o negócio e conhecendo as pessoas, podemos

a ajudar o cliente a interagir com elas”

“O digital tendencialmente subirá de forma exponencial nos próximos anos. Até onde chegará? Não faço nenhum

prognóstico, por uma razão: porque não é muito relevante para

nós nem para os clientes”

“A base do nosso trabalho é o triângulo Pessoa, Marca e Ideia”

Briefing I E a Arc WW? MS I A Arc WW é uma agência de activação, com expertise muito pro-fundo na área digital e em ponto de venda, em shopper marketing, e está cada vez mais a desenvolver os seus skills de design e que tem um potencial incrível de novo. Porque este é epicentro de qualquer agên-cia a ajudar os seus clientes, maio-ritariamente na activação do seu canal comercial. O poder dos canais comerciais dos nossos clientes é importantíssimo para influenciar a escolhas das marcas pelas pesso-as. Quem muitas vezes decide se a marca A está ou não a ter visibilidade no ponto de venda para que o con-sumidor a possa escolher, é o trade. O mercado, os clientes precisam de ajuda em terem alguém com experti-se que os ajude a activar as pessoas que têm esse poder no canal, seja a nível de grossistas, seja a nível dos próprios retalhistas, para preferirem as marcas dos nossos clientes em detrimento de outras. Ou para lhes darem mais visibilidade, ou para fa-zer proactivamente às pessoas uma recomendação de venda. Este servi-ço é único e muito importante para ajudar os clientes nesta fase. Está no epicentro da conversão de venda em receita.

Briefing I A ideia dominante é de que as marcas que estão no meio estão tramadas. Está bom para as marcas globais e líderes, que con-seguem manter uma relação de cumplicidade com os seus consu-midores. As que estão no meio es-tão tramadas porque as pessoas ou compram a marca porque têm carinho ou então optam pelo pre-ço. é esta a tendência?MS I É. Uma marca que apenas con-segue ter um bom produto ao melhor preço já não consegue atrair as pes-soas de forma consistente, porque há outras igualmente competitivas. Portanto, há que pensar e ajudar os clientes a construírem a sua marca, blindando-a muito mais a factores como o preço. Isso não significa que ela não tenha de ser competiti-va também no preço. Significa que tem de ir além disso. A palavra cum-plicidade é muito importante, pois tem intrínseca a criação de uma re-

lação da pessoa com a marca. Esse é o factor mais importante e que vai vencer outros factores do marketing mix. Fãs de uma marca estão predis-postos a pagar algo mais, os clientes não, esses mudam. Briefing I Como é o Miguel como consumidor?MS I Como sou? Sou como todos os outros…

Briefing I Vai às compras? Vai ao supermercado?MS I Vou. Ainda ontem fui. Sou fã de marcas frescas, interessantes e que têm a capacidade de me sur-preender. E como toda gente, quan-do chega ao momento de decisão, não hesito em comprar a marca que admiro, mesmo que o preço seja um pouco mais alto.

Briefing I é sensível a promoções?MS I Sou sensível e atento a pro-moções. Sempre fui uma pessoa curiosa. A trabalhar em publicidade ainda sou mais curioso. As promo-ções também podem e devem ser ideias que enriquecem a nossa vida. Estou a lembrar-me de um exem-plo muito interessante relacionado com a tragédia do Japão. Algumas empresas Telecom internacionais, nomeadamente a austríaca, mais do que comunicarem demonstra-ram às pessoas que têm um com-promisso para melhorarem a vida delas, oferecendo a possibilidade de falarem gratuitamente para o Japão. Quanto é que isto custa a uma Telecom? Nada. Mas tem um valor enorme para as pessoas, que pensam: “Esta marca entende-me, sabe que nestes momentos é im-portante estar em contacto com as pessoas que amamos”. É um momento muito delicado e a marca está atenta. A marca está lá. A mar-ca enriquece a vida das pessoas. Uma atitude destas, mais do que uma campanha com a mensagem “temos o melhor plano de tarifário” tem muito mais potencial para gerar essa cumplicidade do que repetir a mensagem “temos o melhor preço”. É uma ideia boa e simples. Muito simples. Mas, coincidência ou não, as melhores ideias são, normalmen-te, muito simples.