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12/06/2015 CENTRO DE ESTUDOS FUNDAMENTOS DO NOVO CPC 1 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 26ª PALESTRA PROJETO HORIZONTES DO CONHECIMENTO: FUNDAMENTOS DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DES. NEY WIEDEMANN NETO – Bom-dia a todos. Quero saudar a presença do Presidente do Tribunal de Justiça, que prestigia este evento, o Des. José Aquino Flôres de Camargo. Saudando-o, quero saudar a todos aqui presentes, magistrados, funcionários do Poder Judiciário e demais convidados. Quero agradecer a presença da Dra. Jaqueline Mielke, que muito nos honra tendo aceitado esse convite para fazer uma palestra sobre os Fundamentos do Novo Código de Processo Civil, assim dando retomada ao Projeto Horizontes do Conhecimento com as palestras, os eventos culturais do Centro de Estudos, que, nos próximos meses, dará ênfase à promoção de eventos, de palestras a respeito do Novo Código de Processo Civil. É importante esclarecer que esse tipo de evento não dispensa a necessidade de um aprofundamento, de uma formação mais intensa mediante curso de atualização. Inclusive, aproveito para divulgar o curso de atualização sobre o Novo CPC, que está sendo promovido pela Escola Superior da Magistratura, tendo como público-alvo os magistrados e os funcionários do Poder Judiciário. Curso este que terá sua aula inaugural no dia 2 de julho, com o Min. Paulo Sanseverino, e, a partir dali, toda sexta-feira seguinte haverá aulas, das 14h às 18h, sendo a própria Dra. Jaqueline Mielke uma das professoras deste curso de atualização na Escola Superior da Magistratura, que eu aproveito para fazer aqui a divulgação. Também um aviso, um esclarecimento de que o Tribunal de Justiça está também focado nas repercussões do Novo CPC, o impacto que isso terá na tramitação de nossos processos no 2º Grau. Já há duas

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26ª PALESTRA PROJETO HORIZONTES DO CONHECIMENTO:

FUNDAMENTOS DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

DES. NEY WIEDEMANN NETO – Bom-dia a todos. Quero

saudar a presença do Presidente do Tribunal de Justiça, que prestigia este

evento, o Des. José Aquino Flôres de Camargo. Saudando-o, quero saudar a

todos aqui presentes, magistrados, funcionários do Poder Judiciário e demais

convidados.

Quero agradecer a presença da Dra. Jaqueline Mielke, que

muito nos honra tendo aceitado esse convite para fazer uma palestra sobre os

Fundamentos do Novo Código de Processo Civil, assim dando retomada ao

Projeto Horizontes do Conhecimento com as palestras, os eventos culturais do

Centro de Estudos, que, nos próximos meses, dará ênfase à promoção de

eventos, de palestras a respeito do Novo Código de Processo Civil.

É importante esclarecer que esse tipo de evento não dispensa

a necessidade de um aprofundamento, de uma formação mais intensa

mediante curso de atualização. Inclusive, aproveito para divulgar o curso de

atualização sobre o Novo CPC, que está sendo promovido pela Escola

Superior da Magistratura, tendo como público-alvo os magistrados e os

funcionários do Poder Judiciário. Curso este que terá sua aula inaugural no dia

2 de julho, com o Min. Paulo Sanseverino, e, a partir dali, toda sexta-feira

seguinte haverá aulas, das 14h às 18h, sendo a própria Dra. Jaqueline Mielke

uma das professoras deste curso de atualização na Escola Superior da

Magistratura, que eu aproveito para fazer aqui a divulgação.

Também um aviso, um esclarecimento de que o Tribunal de

Justiça está também focado nas repercussões do Novo CPC, o impacto que

isso terá na tramitação de nossos processos no 2º Grau. Já há duas

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comissões formadas no âmbito do 1º Grau de Jurisdição, supervisionadas

pela Corregedoria da Justiça, e o nosso Presidente Aquino formou um grupo

de trabalho, que será instalado na semana que vem, focado no estudo do

impacto do Novo CPC nos processos de trabalho, na tramitação do processo

judicial no 2º Grau. Esse grupo será coordenado pelo Centro de Estudos, com

a colaboração do Des. Almir Porto da Rocha Filho, do Des. Voltaire e de

quatro Juízes-Assessores da Presidência – Juízes-Corregedores –, que são a

Dra. Maria Thereza Barbieri, o Dr. Leandro, o Dr. Luís Antonio Behrensdorf e o

Dr. Jerson Gubert. Esse grupo também contará com a contribuição de muitos

funcionários, que somarão esforços, especialmente do Departamento de

Informática, da Diretoria Processual e da Direção Judiciária.

Desde já, quero colocar à disposição o e-mail do Centro de

Estudos, que é de todos conhecido, para que os senhores possam enviar

sugestões, críticas, preocupações. Aqueles que trabalham aqui no Tribunal de

Justiça e que estão estudando o impacto do Novo CPC nos seus processos

de trabalho na Informática, na Processual, nas Secretarias de Câmara, enviem

para o e-mail do Centro de Estudos as suas sugestões e preocupações,

porque esse grupo de estudos que eu mencionei há pouco vai propor, entre

outras coisas, as alterações regimentais que serão necessárias para a

adequação desses processos de trabalho.

Então, com essas notícias iniciais, quero passar a palavra à

Profa. Dra. Jaqueline Mielke, que é doutora em Direito pela Unisinos,

advogada, professora em diversas instituições de ensino do Rio Grande do

Sul, na FMP, na Escola da Magistratura, inclusive tenho a honra e o privilégio

de ser seu colega de docência na Faculdade Inedi Cesuca, em Cachoeirinha,

onde ambos lecionamos na graduação.

Com essas informações, passo, desde logo, a palavra à Dra.

Jaqueline para a sua explanação, que está programada para durar em torno

de uma hora, para que os senhores tenham tempo e oportunidade de

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participar. A Profa. Jaqueline colocará a palavra à disposição depois de uma

hora, para que os senhores possam fazer perguntas e questionamentos.

Passo a palavra à Dra. Jaqueline.

DRA. JAQUELINE MIELKE – Bom-dia a todos. Eu gostaria

inicialmente de agradecer o convite do meu amigo Des. Ney para estar aqui

hoje pela manhã e rever tantos alunos, amigos na plateia, é sempre bom rever

vocês. Gostaria de cumprimentar o Des. Aquino, Presidente do Tribunal –

honra a sua presença na plateia –, a Dra. Maria Thereza, demais presentes,

magistrados, assessores.

Vamos conversar um pouco, então, nesta manhã, sobre o

Novo Código de Processo. Eu, quando conversava com o Des. Ney sobre qual

o tema, eu disse que, tendo em vista que falarei uma hora, parece-me que o

melhor caminho é falarmos dos fundamentos do Novo Código. Não

conseguiria, em uma hora, falar de execução – que é um mundo à parte –,

recursos, são muitas coisas. Então, parece-me que os fundamentos gerais do

Novo Código é o que temos de mais importante para vermos em uma hora.

Começo sempre a minha fala, quando trato do Novo Código,

dizendo que tenho uma visão bastante crítica desse novo sistema, até porque

a minha formação – para quem me conhece, eu estudei com o Professor

Ovídio Baptista da Silva praticamente 20 anos – é com base nele, que tem

uma sustentação bastante crítica do sistema jurídico, do funcionamento do

sistema. E o Professor Ovídio era um operador, era um advogado militante, e

eu sou uma advogada militante também.

O Novo Código veio com a promessa de resolver problemas

que temos no âmbito do Poder Judiciário; problemas que temos com relação à

morosidade, efetividade do processo, fundamentação de decisão judicial.

Então, ele veio com essa promessa. Quando ouvimos o Min. Fux, ele vem

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com essas promessas, como se fôssemos resolver os nossos problemas com

o Novo Código.

Eu sou bastante cética sobre essa questão da crise do Poder

Judiciário, problemas com morosidade do processo, efetividade da Justiça,

porque entendo que o Processo Civil não tem como resolver esses problemas.

Na verdade, são problemas estruturais, são problemas sociais, políticos e

econômicos, que o processo não tem como resolver. Mas ele tem como

minorar o problema, nós temos como amenizar o problema; resolver, não. O

Prof. Ovídio costumava dizer: “Jaque, nem em trezentos anos nós vamos

resolver isso”. Então, nós podemos minorar.

Na verdade, quando eu falo em problema – e aqui vou me

valer novamente do Prof. Ovídio – no Judiciário, vejo dois grandes problemas

que, se conseguíssemos resolver em parte, as coisas seriam bem melhores.

Primeiro, o grande volume do Judiciário envolve demandas que são ajuizadas

porque o Estado não cumpre o seu papel, o Estado não funciona, e aqui nós

temos uma Justiça Federal feita para o Estado, temos Varas da Fazenda

Pública sobrecarregadas, ou seja, se o Estado cumprisse o papel, nós

eliminaríamos inúmeras demandas.

O que ocorre atualmente? Temos o problema de judicialização

de políticas públicas, que geram inúmeras demandas, demandas repetidas,

muitas vezes, e que efetivamente acabam gerando uma sobrecarga dentro do

Judiciário, que é um problema que não é do Judiciário, mas do Estado. E

temos o problema das demandas repetitivas.

Se conseguíssemos resolver o problema do Estado e o

problema das repetitivas, a situação melhoraria bastante. Essa era uma visão

que o Prof. Ovídio tinha. Inclusive, em algumas de suas conferências, logo

antes de falecer, ele dizia: “O Estado não funciona, por isso que o Judiciário

não funciona”. Então, o problema não é do Judiciário. Não é. O problema é

maior. Qual é a minha preocupação? Ainda vem o Novo Código com essa

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promessa de resolver. Não vai. Muito pelo contrário. E aqui também, via de

regra, quando eu vou falar, as pessoas esperam que eu vá defender o Código,

esperam que eu vá elogiar o Código, porque sou advogada, advogada

militante. Por que esperam? Porque é um Código feito por advogados, mas,

sem dúvida alguma, advogados com medo de Juízes. É isso, o Código é isso.

Tentaram eliminar a criação judicial em vários dispositivos legais, mas não vão

eliminar nunca. Não vão eliminar nunca o que pretenderam, mas, quando

falam que o Código foi feito por advogados, concordo. Advogados que nunca

pisaram no Foro – esse é o problema –, advogados teóricos.

Tenho vários exemplos de mecanismos que foram colocados

e que refletem isso. Vou começar com um exemplo do Novo Código, que

alguns estão chamando de “embargos infringentes cover”, que são um

arremedo de embargos infringentes. Só um sonhador, um utópico, vai

imaginar que, no caso de um julgamento não unânime, por dois a um, que

haveria Desembargadores à disposição, naquele dia, para continuar um

julgamento e Desembargadores que vão se sentir confortáveis para votarem

em um processo que nem conhecimento têm. Então, só um sonhador para

imaginar que isso possa se realizar no dia a dia do Foro. Isso não existe.

Chamam de “embargos infringentes cover”, porque é um arremedo dos

infringentes. Conseguiram criar um negócio pior do que os infringentes,

porque os infringentes não atrapalham em nada hoje, e até que o número de

infringentes não é tão grande assim. Criaram infringentes para qualquer

decisão não unânime, e ficou pior. Hoje o art. 530 restringe: apenas quando

houver modificação da decisão de mérito do 1º Grau ou no caso de

procedência não unânime de rescisória. No Novo Código, é para qualquer

julgamento não unânime, e, pior, cabe, inclusive, de decisões não unânimes,

em determinados casos, de agravo de instrumento. Então, foi ampliado o

caso, por isso o arremedo de infringentes que temos hoje. Para criar isso, só

quem nunca pisou no Foro, quem nunca fez uma petição de embargos

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infringentes sabe que não atrapalha em nada efetivamente. O que ocorre?

Esses reflexos, esse tipo de positivação, nós vamos encontrar em diversos

dispositivos legais.

E aqui eu vou aos fundamentos gerais do Novo Código. O que

norteou o Novo Código? Basicamente, o que se observa, em termos gerais?

Observa-se uma ideia de preservação muito forte, uma ideia de eliminação,

primeiro, do protagonismo judicial – é essa a expressão que eles utilizam –;

segundo, uma valorização do contraditório; terceiro, uma positivação e

valorização do princípio da colaboração – a colaboração vem muito forte.

O que vem muito forte ainda no Novo Código? A ideia da

fundamentação das decisões judiciais, que me parece que é uma expressão

do princípio do contraditório, e aquela ideia de eliminação do protagonismo

judicial que é sustentada. Observa-se também – que me parece que é a

melhor parte do Código que nós vamos ter, apesar de ter exageros também –

a introdução do que parte da doutrina fala em formalismo valorativo e outros

falam em princípio da instrumentalidade das formas, que efetivamente o

Dinamarco fala há muito tempo, e depois introduziram com a ideia de

formalismo valorativo. Parece-me a melhor parte, mas me parece também que

há alguns exageros do Novo Código, porque qualquer vício é perdoado.

Qualquer vício é perdoado dentro do novo sistema.

Então, na verdade, são os princípios vetores, os princípios

fundamentais que observamos existentes no Novo Código que estão por trás

dos dispositivos legais. Partindo-se desses princípios, o que observamos?

Ainda dentro do geral, para depois partirmos para as especificidades maiores.

Observa-se que é um grande problema no Brasil, porque legislamos o novo

com a sombra do velho. Digo que legislamos o novo com a sombra do velho e

que costumamos importar soluções de modelos de sistemas estrangeiros e

jogamos para dentro do Código, o que é outro problema.

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Esse movimento que tivemos no Brasil, essas ideias, são

movimentos mundiais de alteração da legislação processual civil. Não é uma

invenção nossa, novamente nós copiamos outros sistemas mundiais. Na

verdade, é isso. O que fizemos no Novo Código? Nós copiamos o de 73, o

adaptamos. É muito fácil vocês verificarem isso. Comprem esses Códigos que

comparam os dois – eu tenho sugerido para os meus alunos – e vocês verão a

cópia de vários artigos. Eles mudaram o que quiseram, copiaram o velho e

copiaram modelos de sistemas alienígenas, sem a devida adaptação à nossa

cultura.

Parece-me que, se pretendemos construir um Código novo,

um sistema novo, ou nós construímos tudo novo ou ficamos com o velho. Não

dá para fazer um arremedo, não dá para fazer cópia ou uma não adaptação à

nossa realidade cultural, à realidade que temos no Poder Judiciário. É

complicado isso. Nota-se que 60 a 70% desse Novo Código é o de 73

adaptado. Alguns têm um trauma: “Ah, muda tudo!” E eu digo: “Tem muita

colagem”, que, na verdade, tem que adaptar. Então, essa é outra grande

crítica que eu faço, em termos gerais, a esse Novo Código, que é a forma

como isso foi feito. Parece-me que essa colagem de um sistema antigo e essa

importação de modelos de sistemas estrangeiros sem a devida adaptação,

que está por trás da forma como tivemos esse Código redigido, são

complicadas. Feitas essas breves considerações, vou propriamente a pontos

específicos dentro do geral.

Conforme mencionei inicialmente, um dos princípios que

nortearam essa reforma foi o princípio do contraditório, muito forte. A ideia de

um contraditório efetivo passa a imperar dentro do Novo Código, vinculada à

ideia de colaboração, e não dá para esquecer que quem difundiu essa ideia,

sem dúvida alguma, aqui no Rio Grande do Sul, foi o Dr. Carlos Alberto Alvaro

de Oliveira. Essa ideia de um contraditório efetivo vinculado, atrelado à ideia

de colaboração das partes na melhor construção de uma decisão judicial, que

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vem de uma forma muito clara nos artigos iniciais do Novo Código, como no

art. 9º, parte da doutrina que acadêmicos defendem hoje, que diz respeito a

uma das aplicações maiores do Novo Código – e que eu critico – de que o

Juiz continua podendo se pronunciar, evidentemente, sobre questões de

ordem pública – pressupostos processuais, condições da ação, prescrição –,

de ofício. Entretanto, antes de se pronunciar de ofício, ele precisará dar vista

às partes. Então, é possível se pronunciar, mas, antes de se pronunciar de

ofício, deve ouvir as partes, de modo que seja implementado o contraditório

efetivo.

O que ocorre aqui? Essa questão me parece complicada

dentro da realidade forense atual que temos. Quem está no Foro todos os dias

sabe que há processos em que temos um despacho por ano pelo volume de

demandas. E qual vai ser o despacho? “Vista às partes para concordar ou não

sobre o que eu estou pensando”. Na verdade, é isso. Quando se sabe,

quando se forma a convicção sobre determinada questão, é difícil modificar.

Quando é dada vista às partes, via de regra, o Juiz já sabe intimamente o que

ele está pensando sobre o caso, sem dúvida alguma. E dar vista às partes

para questão processual, é processo. Se for questão de ordem pública,

efetivamente me parece um exagero, isso aqui vai trancar o procedimento.

Quando eu comento isso para alunos que não sabem nada de Direito, eles me

indagam: “Mas isso é celeridade?” Não é celeridade. Essa questão desse

contraditório efetivo, da colaboração das partes, eles poderiam talvez ter

introduzido para a prescrição, porque é mérito a prescrição. Mas me parece

que há um exagero em estender-se para qualquer questão processual. Isso

não é só para o Juiz de 1º Grau, mas para o Tribunal também.

Por exemplo, surge uma questão de ordem pública no 2º

Grau. Se surge durante o julgamento, tem que parar o julgamento. Pára o

julgamento para dar vista às partes, vão colocar em pauta sabe-se lá quando

o processo, com relação ao tempo. Mas é essa a ideia. Eles só

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excepcionaram essa ideia do art. 9º naquelas liminares concedidas inaudita

altera parte, daí seria um absurdo ter que ouvir sempre. Então, aqui o Código

excepciona expressamente no art. 9º, mas me parece, sem dúvida alguma,

um exagero. Obviamente que se busca uma melhor decisão judicial, mas

também não adianta uma melhor decisão judicial que vá ser prolatada daqui a

10 anos, 15 anos. Não tem condições. Vocês imaginem, para cada questão de

ordem pública, tem que dar vista às partes com base nessa ideia de

colaboração.

Na época que o Prof. Ovídio era vivo ainda, ele dizia – e já

defendiam isso, defendem isso há muitos anos e conseguiram colocar no

Código – que isso é tese para biblioteca, para compor livros de biblioteca, são

teses acadêmicas. Daí eu digo novamente: teses acadêmicas de pessoas que

nunca entraram num Foro, porque, se tivessem entrado no Foro, não teriam

dito isso, que era o que o Dr. Ovídio dizia sobre essa questão efetiva da

colaboração. Ele dizia: “É uma visão romântica de processo”. É uma visão

romântica que talvez seja compatível com o Judiciário que tivemos na década

de 70, mas não com o Judiciário que temos em 2015.

E a ideia de contraditório é outro problema que temos. O

processo tem que evoluir de acordo com os avanços sociais. A sociedade hoje

é uma, nós vivemos em uma sociedade massificada, com um grande número

de demandas. Então, essa visão romântica talvez se adapte lá atrás, mas não

hoje, em 2015. Evidentemente que o contraditório deve ser preservado, sem

dúvida alguma, mas me parece um exagero essa questão de contraditório

para questão processual, e não tenho a menor dúvida de que isso vai acabar

trancando o processo, o processo vai emperrar.

Outro princípio que está no Código – e já o encontramos

aplicado no Judiciário, pela jurisprudência, e que decorre do art. 422 do

Código Civil – é o princípio da boa-fé processual, que me parece importante

no sentido de que a conduta das partes deve ser norteada pela boa-fé, sem

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dúvida alguma. Então, o princípio da boa-fé, que hoje sustentamos a partir do

art. 422 do Código Civil, que decorre do venire contra factum proprium, está

presente no Novo Código. Parece-me importante, mas não temos nada de

novo aqui também. Não temos nada de novo na exata medida em que a

jurisprudência já aplica, só temos ele positivado. Então, existe, no Novo

Código, na parte inicial, uma valorização bastante grande dos princípios, os

princípios foram elencados de uma forma bastante clara.

Outro princípio que norteia o Novo Código é o princípio da

instrumentalidade das formas, que alguns preferem chamar de formalismo

valorativo, que, na minha opinião, tem o mesmo significado. Eles ficam

indignados quando eu digo isso e dizem: “Não, é outra coisa”. Mas me parece

que estão falando da mesma coisa. Procurou-se desformalizar os

procedimentos, o que me parece importante. Por exemplo, aquela ideia

absurda que temos hoje de recurso prematuro, recurso intempestivo, porque

interposto antes do prazo, termina de vez. Tiveram que colocar de uma forma

expressa – o que é um absurdo, mas no fim eu acabo sendo a favor que

escrevam isso – que recurso interposto antes do prazo é tempestivo. E dizem

mais ainda: não precisa ratificar. Então, acabou o recurso intempestivo, o que

me parece importante.

Também verificamos uma ideia de desformalização no tocante

ao exame dos requisitos de admissibilidade que, na minha opinião, tem um

certo exagero. O que temos com relação aos requisitos de admissibilidade no

Novo Código? Temos o art. 932, parágrafo único, do Novo Código, que digo

que, se houver algum problema de forma, via de regra, exceto a

tempestividade, tem segunda chance para sanar. Qualquer problema de

forma. Não recolheu o preparo? Não tem problema, intima para recolher em

dobro. Não juntou nenhuma peça no agravo de instrumento? Intima para

juntar as peças. Isto é um exagero: não juntar nenhuma peça. Há exageros na

jurisprudência, como exigir assinatura em cima da página ou quando é

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evidente que o agravo é tempestivo. Por exemplo, indeferimento de liminares

inaudita altera parte, a distribuição foi hoje, amanhã é o agravo disso; dizer

que não comprovou a tempestividade, quando é evidente a tempestividade.

Então, têm exageros, mas não juntar nenhuma peça de agravo me parece um

exagero no sentido da desformalização, mas a ideia é desformalizar.

Em resumo: erro de forma tem perdão – qualquer erro de

forma –, só a tempestividade que não tem. Ainda acho que até a

tempestividade, conforme o caso, irá ser perdoada também, que é o caso dos

feriados locais. Contam-se prazos em dias úteis no Novo Código: só dias

úteis; finais de semana não contamos, férias não contamos, feriados não

contamos. Como advogada, eu vou continuar contando do jeito que eu conto,

porque acho que é pior ficar contando dia útil, só que vocês efetivamente têm

que contar em dia útil, porque a regra geral é essa. Há uma norma que diz

que, se há feriado local, tem que haver a comprovação. Aí, se a parte não

comprovou o feriado local, é intempestivo, e acho que darão prazo para que

sanem o problema também. Então, até a tempestividade, conforme o caso –

na ideia do Código, que é perdoar problemas de forma –, acho que darão

oportunidade também. Existe uma completa desformalização nesse sentido.

Há ainda uma completa desformalização quando eles retiram

o juízo de admissibilidade do 1º Grau na apelação. Parece-me que não tinha

problema nenhum isso, porque quando as apelações não são admitidas pelos

Juízes de 1º Grau é porque têm problema. Então, me parece que isso não

atrapalhava em nada, só que retiraram – e daí é uma loucura o que fizeram –

o juízo de admissibilidade no REsp e no RExt. Tem advogado vibrando com

isso, mas é muito pior deixar a porta aberta para o STJ e para o STF, porque –

falo como advogada – já temos que pedir pelo amor de Deus para que leiam

nossos recursos em Brasília com a porta fechada, imaginem com a porta

aberta. Quem deve estar adorando isso são os advogados de Brasília, porque

interpor recurso especial e recurso extraordinário, se hoje já é complicado sem

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um acompanhamento em Brasília, fica impossível com esse Novo Código.

Isso é impossível, é insustentável. Isso não é bom, ao contrário do que muitos

dizem, porque vai generalizar.

Quando reclamam efetivamente do filtro que é feito pelos

tribunais de 2º Grau, pelos TJs e pelo TRF, que a maioria não sobe, na

verdade, a maioria não tem que subir mesmo, porque são recursos muito

restritos. Qual é o problema que o Prof. Ovídio levantava também? As

pessoas têm a ilusão – e os advogados não gostam quando eu falo isso – de

que um dia vão chegar à decisão correta e que essa decisão correta vai ser a

do STJ e a do STF. Ledo engano, porque às vezes é pior a decisão que temos

lá, e as pessoas recorrem, recorrem e recorrem com essa ilusão. Então, os

filtros são uma coisa boa, e a opinião não é só minha, têm outras pessoas que

eu tenho conversado – depois eu vou tocar na questão da fundamentação e

do art. 489 –, como o Lenio Streck, que é o pai do art. 489, que diz: “Isso aqui

não está bom, isso tem que ter um filtro. Não existe uma coisas dessas”.

Então, o filtro é importante, sem dúvida alguma.

Com relação a essa questão da admissibilidade no Recurso

Especial e Extraordinário, eu não sei se não mudam a norma antes de o

Código entrar em vigor, porque vai ser um caos para Brasília isso aqui. Essa

eliminação é coisa de advogado que não está no Foro, eliminaram porque os

advogados reclamam: “Ah tem o filtro, os nossos recursos ficam trancados”.

Então, é fruto dessa desformalização o acesso amplo, que não é acesso na

exata medida, porque certamente os recursos não serão analisados, os

recursos não serão lidos. Na verdade, a comunidade jurídica deveria se

conscientizar de que são recursos restritos.

E aqui, novamente vou-me valer do que o que o Prof. Ovídio

defendia, que é a eliminação de recursos, valorização da jurisdição de 1º

Grau, um acesso restrito ao STF e ao STJ, porque é insustentável, com o

número de demandas que temos. É insustentável uma briga de vizinhos

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chegar ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça, mas

isso é fruto dessa desformalização que temos, desformalização que não existe

só nos recursos. Quando eu falo na desformalização, gosto de falar dos

recursos, em que a vejo mais forte. Esse remendo que pode ser feito nos

recursos, esse perdão à forma é fortíssimo em todos os dispositivos. Esses

dois: não pagar preparo, ter o perdão de ser possível depois, e de não juntar

peça nenhuma no agravo de instrumento são exemplos marcantes dessa

desformalização.

Essa desformalização encontramos também, de uma forma

forte, na tutela provisória, e aqui já estou usando a expressão do Novo

Código, porque eles falam em tutela provisória. Tenho alguns amigos que

dizem ter calafrios quando escutam o nome, pela critica que é feita, toda uma

crítica teórica. Eu até não tenho grandes calafrios, eu falo de acordo como

está no Código, mas tem problema a expressão. Dentro da tutela provisória, o

que foi feito? E aqui, em parte, eu concordo com o que foi feito. Houve a

revogação do Livro III do Código. Não temos mais um livro específico para a

tutela cautelar. Acabou o Livro III, e, terminando o Livro III, foram revogadas

todas as cautelares nominadas. Esta parte é a que eu gosto, a da revogação

das nominadas.

O que ocorre? Esse tema relativo à tutela de urgência – que

hoje chamamos de tutela de urgência – sempre foi um dos temas mais

controvertidos no âmbito do processo. Temos, no Direito brasileiro, duas

vertentes com relação à tutela de urgência. Uma segue o Calamandrei, o

Calamandrei e o Carnelutti, e aqui no Rio Grande do Sul eu diria que, talvez, o

que melhor entendeu a teoria dele foi o Des. Galeno Lacerda, que tem uma

obra que reflete o pensamento desse autor, que escreveu como ninguém. De

outro lado, temos o Prof. Ovídio Batista da Silva, que não concordava com

nada do Calamandrei, que não concordava com nada do Livro III. O Prof.

Ovídio dizia: “Nunca me entenderam.” Toda a fama o Prof. Ovídio começou a

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conquistar quando ele fez o anteprojeto do art. 273, da tutela antecipada.

Então, é um ponto que a doutrina discute, discute, discute, mas uma coisa

todo mundo concorda: que as cautelares nominadas só têm problema. Se

vocês pegarem qualquer livro de tutela, um livro que aprofunde a matéria com

relação à tutela de urgência, vocês verão só críticas. E existe uma proposta do

Carnelutti, de 1928, dizendo que tinha que revogar tudo. Em 1928. Nós

revogamos em 2015. Na verdade, parece-me importante a revogação, mas eu

escuto de alguns: “Mas e agora eu não vou ter mais o arresto?” Grande coisa

o arresto, têm mecanismos muito melhores no Código do que o arresto. Nós

vamos continuar tendo o arresto, o sequestro, o arrolamento. Inclusive, tem

um artigo lá na tutela provisória que diz que é possível se buscar o

cumprimento do provimento na forma de arresto, arrolamento.

Na verdade, o que ficou melhor é que não vamos ter mais

requisitos específicos, é geral. Só dois requisitos: probabilidade do direito e

risco de dano irreparável. Acabou. Então, acabaram aqueles requisitos

rigorosos lá dos artigos 813 e 814 do arresto, artigos 821 e 822 do sequestro.

Terminaram. Então, é geral, e isso me pareceu bom, houve uma facilitação,

nós não ficamos discutindo a forma dessas cautelares nominadas.

Mas qual é o problema que eu vejo, ao contrário do que

muitos? Então, revogamos o Livro III e não temos mais cautelares nominadas,

não temos mais um livro próprio para tutela cautelar. Aí o que o Novo Código

faz? Cria um livro no Livro I, é o livro V. O Livro V da parte geral, que nominam

de tutela provisória. E o que é que eles colocam? Em onze artigos, eles

dividem essa tutela provisória em tutela de urgência e tutela de evidência. E

dentro da tutela de urgência, eles colocam a tutela de urgência cautelar e a

antecipada. Em onze artigos, eles fazem isso. O que nós temos em vários

artigos são resumidos a onze artigos. É evidente aqui a tentativa de

desformalizar, só que eles acabam gerando problema de novo, porque falta

teoria de base. E quem conhece a teoria de base da tutela de urgência,

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enxerga problema nessa desformalização, que veio para facilitar, mas vai

gerar problemas processuais.

Eu disse no início que eles quiseram eliminar a criação do Juiz

positivando. Eles tentaram imaginar, mas eles tentaram imaginar o que já

existe de problema; os problemas futuros, eles não conseguiram imaginar. E

aqui tem um problema. Na tutela, essa que eles chamam de tutela provisória,

eles mantêm a tutela cautelar e mantêm a tutela antecipada. A tutela

antecipada, em linhas gerais, eles dividem em incidente e antecedente. A

incidente é a que temos hoje, apenas tiraram o requisito da prova inequívoca,

que era fortemente criticado. Ficamos com a tutela antecipada com três

requisitos: a probabilidade do direito, o risco de dano irreparável e a

reversibilidade dos efeitos, porque eles continuam falando em reversibilidade

dos efeitos, porque vamos continuar aplicando a tutela antecipada, ainda que

os efeitos sejam irreversíveis, naqueles casos de demanda envolvendo saúde,

por exemplo. Certamente nós vamos continuar aplicando, flexibilizando

requisitos. Isso continua igual e continua sendo possível pedir tutela

antecipada na petição inicial, no curso do processo.

Então, as ações continuarão a ser feitas, se quisermos, do

mesmo modo, mas eles criaram uma coisa diferente, que é a antecedente,

importada de sistemas alienígenas, com forte inspiração no Direito francês, a

chamada estabilização da tutela antecipada. Quando eu falo em estabilização,

por todas as confusões que a estabilização pode gerar, as pessoas me dizem:

“Eu não vou querer esse negócio nunca”. O que é estabilização? Quando a

parte – está nos artigos 303 e 304 – ajuíza uma ação – eu vou sem bem

simplista com relação a isso aqui –, por exemplo, ela pretende a exclusão do

seu nome do SERASA e do SPC. Como é que fazemos hoje? Ajuíza-se a

ação, pede-se a liminar de exclusão e a procedência da ação com a

confirmação da liminar. Como é que poderemos fazer a ação à luz do Novo

Código? Se a parte quiser se valer dessa técnica, ela tem que avisar na

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petição inicial – está no art. 303, §5º –, tem que dizer: “Eu quero isso”. Se não

disser, posso fazer do mesmo jeito que sempre fiz. A parte, quando ajuizar a

ação, ela poderá, simplesmente, pedir a tutela antecipada e só colocar os

requisitos da tutela antecipada. Ela não precisa mais fazer uma petição inicial

completa, exaurindo fundamentos. Ela só coloca os requisitos, probabilidade,

risco de dano irreparável e pede a concessão da liminar. Se a liminar for

deferida, ela terá a oportunidade de aditar essa petição complementando com

o que falta, complementando fundamentos, juntando documentos. Se for

deferida a liminar e se o réu não agravar, haverá a extinção do processo,

termina o processo, estabilizando-se o provimento, ou seja, pedi para sair do

SERASA, estou fora do SERASA. Aí vem a questão: se o réu quiser me

colocar de novo no SERASA, depois da extinção, terá que ajuizar uma ação

para rever essa sentença. Foi isso que, em linhas muito simples, inventaram.

Isso aqui gera problema que não acaba mais.

Só para elencar um dos problemas que se cogita, que surge

nessa ação do SERASA, que é uma ação bem simples. Alguns me

perguntam: “O.k. é extinto. Mas se eu quiser pedir o dano moral?” Geralmente

vem com dano moral junto. Eu quero sair do SERASA e quero dano moral. Eu

não quero que seja extinto, porque, se for extinto, como é que vai ficar meu

dano moral? Eu digo: “Se tu quiseres o dano moral, lamento, mas não peça a

técnica. Se tu quiseres o dano moral, continues fazendo a ação do jeito que tu

sempre fizeste”. Na verdade, isso pode só valer a pena naqueles casos em

que eu não tenho cumulação de pedidos. Nas ações de fornecimento de

medicamentos, isso pode valer a pena.

Estava dando um curso para o Ministério Público, outro dia,

daí uma Promotora disse: “Bah, agora vai ficar horrível. O Estado é obrigado a

agravar de tudo”. O Estado terá que agravar de tudo, quando pedirem a

técnica, e o Tribunal ficará sobrecarregado com esses agravos. Se na inicial o

autor disser que quer a técnica, tem que interpor agravo de instrumento,

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senão a situação fica pior do que está. Então, isso foi criado – está no art. 304

–, mas têm – na manhã de hoje não vamos falar só de estabilização –

inúmeros outros problemas que isso vai gerar, e este é apenas um deles.

Então, digo para vocês que a tutela antecipada continua com ela é hoje, só

muda se a parte quiser se valer da técnica. Qual é o problema? Tem gente

confundindo tudo. As pessoas não se deram conta, acham que estabiliza

sempre, misturam tudo. Não é. O que tem do art. 273, que a gente faz hoje,

está em outros artigos. Se vocês olharem, só está a colagem do art. 273, e a

técnica, se quisermos usar, usaremos. Mas não é nenhuma alteração que vá

mudar tudo, não é difícil de compreender isso aqui, mas o chato é verificar

todos os problemas que a estabilização possa gerar sempre que for requerida.

O resto é igual.

Na tutela provisória, eles fizeram ainda outra coisa – que

também não é nenhuma novidade – para desformalizar e não se deram conta

de um detalhe. Hoje, nós continuamos tendo ação cautelar, e a ação principal

deve ser ajuizada num prazo de 30 dias a contar da efetivação das medidas,

nos termos do art. 806. Então, temos uma ação cautelar e uma ação principal.

O que o Código faz? Ele elimina a ação principal e fala em um pedido principal

nos próprios autos, o pedido principal é feito junto, tudo no mesmo

procedimento. Isso o Galeno Lacerda sustentava há 30 anos, não é nenhuma

novidade, nos livros dele vocês já vão encontrar isso. E há 30 anos, o Prof.

Ovídio já dizia que isso era um problema no processo, o de cumular.

Vou dar um exemplo da cumulação, um exemplo que não tem

como cumular, e que eles não se deram conta. Eu ajuízo uma cautelar com a

finalidade de apreender bem para assegurar o pagamento de um crédito, que

é o nosso arresto. Eu ajuízo um arresto com um nome que vai ter um nome de

cautelar. Tendo em vista esse princípio da desformalização que impera no

Código, se eu der o nome de arresto, parece-me que não tem problema

nenhum também. Ajuízo uma ação cautelar, que, na essência, é um arresto,

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só que eu sou credor de um crédito corporificado em um título, eu sou credor

de uma nota, e o meu crédito está corporificado em uma nota promissória.

Então, ajuizei o arresto. Qual é a minha ação principal? É uma ação de

execução de título extrajudicial. Qual é o problema? Eu não tenho como fazer

esse pedido nos mesmo autos, porque é execução, e ela é a ação. Como é

que eu vou pedir nos mesmo autos que o réu seja citado para pagar em três

dias? Aí vai embargar, e os embargos vão ficar em apenso nisso aqui? Então,

parece-me que eles não lembraram que existe execução para dizer que o

pedido é sempre nos próprios autos. Têm casos que não vamos conseguir

fazer o pedido nos próprios autos, que é o caso da execução. Não dá para

cumprir o que tem no Código.

Por outro lado, quando eles falam em cumulação de pedido

principal na própria ação, eles misturam lide cautelar com lide principal, que é

um problema que temos no Brasil, e a maioria da doutrina não enxerga que

temos uma lide cautelar com requisitos diversos de uma lide principal, ou seja,

a lide cautelar não é uma parte da lide principal. Ela tem pressupostos

distintos, e não enxergaram isso, não viram isso. Então, temos duas lides

distintas no mesmo processo em que a instrução vai ser conjunta, o que causa

tumulto, sem dúvida alguma. Essa era uma das grandes objeções que o Prof.

Ovídio também fazia à ideia de cumulação, por estarmos diante de lides

distintas.

Ainda um detalhe com relação à cautelar. Se vocês lerem, é

“recorta e cola” do art. 796 até o art. 812. A diferença é essa cumulação,

porque o resto é praticamente igual ao que se tem, não tem grande diferença.

Na tutela provisória, o que é o diferente? É a estabilização, que vai ser

utilizada se a parte requerer. Ali é que tem uma série de discussões que

podem ser levantadas; o resto é “recorta e cola” do que temos, não muda.

Então, não é tão assustador assim como muitos colocam; com uma leitura

atenta, se observa isso de uma forma muito clara.

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Outro ponto do Novo Código que tem gerado grandes

discussões – é o artigo da discórdia do novo Código – é o art. 489, que trata

da questão da fundamentação das decisões judiciais. Os advogados amam, e

os magistrados odeiam o art. 489, e a idéia deste artigo foi novamente a

eliminação do protagonismo judicial – que eles gostam muito de falar, e eu

estou usando exatamente as palavras daqueles que defendem o Código –, a

eliminação de decisões-surpresa dentro dos processos. Então, a ideia é a

eliminação efetivamente de alguns problemas que temos hoje, estabelecendo-

se, no art. 489, requisitos para que uma decisão seja fundamentada com

detalhes. Temos o art. 489 e temos os artigos 926 e 927, que são os artigos

da vinculação da decisão judicial a precedentes.

Em relação ao art. 489, temos ouvido falar que não temos

mais livre convencimento judicial, que os magistrados não são mais livres para

decidir. Eu ouvi isso, eu escuto isso. Eu digo que livre convencimento judicial

motivado – eu acho que existe uma distorção de quando falam disso – não

vamos eliminar nunca. Evidentemente que o Juiz vai ser livre para decidir, só

que é obvio que o Juiz é livre, mas tem que decidir de acordo, primeiro, com a

prova dos autos. Eu canso de fazer REsp por violação ao art. 131 e consigo

provimento. Então, isso já existe. Segundo, é obvio que o Juiz é livre, só que o

seu limite é a Constituição Federal. Ele não tem como ir além da Constituição,

dizer diferente da Constituição. Isso nós não vamos eliminar.

E aqui há um detalhe. A própria Constituição Federal

possibilita, muitas vezes, duas respostas, a partir do próprio texto

constitucional, e muitos falam em resposta adequada à Constituição. Então,

uma resposta adequada à Constituição nós podemos ter. Têm princípios

constitucionais que muitas vezes, no caso concreto, entram em choque. Têm

direitos que entram em choque, que o Juiz vai para um lado, e aqui não é

eliminado esse livre convencimento, não tem como eliminar o livre

convencimento. Quando eu falo em livre convencimento, obviamente livre

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convencimento motivado, uma decisão judicial vinculada, eu falo em

Constituição Federal, porque muitas vezes a legislação infraconstitucional tem

problemas. Se ela tem problemas, vamos à Constituição, por isso que eu falo

dessa vinculação à Constituição, que é a nossa lei maior. Evidentemente essa

vinculação existe, sempre existiu. Na verdade, o problema que existe de que

acabou o livre convencimento, que eu vejo, é o livre convencimento sem

motivação, este sim.

Então, enxergamos abusos. Tenho exemplos na Justiça do

Trabalho, onde isso acontece muito. Tem Juiz do Trabalho que diz que não

existe prescrição, e a prescrição está na Constituição. Isso o Novo Código

elimina, mas não tem como ir contra o que está na Constituição Federal. Na

verdade, o que o Novo Código coloca – eu vejo dessa forma – é o motivo de

acordo com a prova dos autos e que tem um limite, e o limite é a Constituição.

Isso não tem como eliminar. A questão é o livre convencimento sem

motivação nenhuma, daí é um ativismo, é invenção. É invenção dizer que

prescrição não existe, e é isso que se procura eliminar, esse livre

convencimento sem razão nenhuma, um livre convencimento que viola até a

Constituição, mas o livre convencimento motivado, de acordo com as normas

constitucionais, não vai mudar, não tem como.

Quando se fala desse assunto, vem, geralmente, o nome do

Lenio Streck, que foi o pai desse bendito art. 489, que é contra o ativismo

judicial. O próprio Lenio, quando fala, fala dessa interpretação adequada à

Constituição Federal. Ele fala isso nos livros dele. Então, esse livre

convencimento sem fundamento nenhum, essa invenção, é que não pode. Eu

tenho vários amigos Juízes que dizem: “Eu já faço isso aqui que tem no art.

489”. Muitos fazem, é obvio. Eu tenho iniciais que eu contesto que eu fico

irritada com o que fazem, tem tanto pedido absurdo que eu fico indignada com

o advogado da outra parte. Se eu fosse Juíza, eu ia ficar furiosa de ter que

rebater aquele monte de itens do pedido.

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Dou um exemplo. Eu não trabalho com massa, mas teve uma

ocasião em que eu fui surpreendida com o ajuizamento de trezentas

revisionais de contrato de loteamento contra um cliente meu que era

proprietário de loteamentos, e o advogado fez, como matriz daquelas

trezentas revisionais, revisionais de contrato bancário, que não tinha nada a

ver. Eu me irritava de olhar aquilo, imagina um Juiz, ficaria irritadíssimo

também. Esse tipo de coisa não teria problema nenhum de fundamentar: “Os

pedidos a, b, c e d são todos improcedentes porque se referem à revisional de

contrato bancário”.

Então, parece-me que o Judiciário vai ter que balizar isso,

vamos ter que ter precedentes, orientações. Têm situações que me parece ser

possível uma fundamentação em bloco. Eu tenho um pedido x que tem o

mesmo fundamento e eu vou poder dizer: “Rejeito os pedidos, porque o

fundamento é esse”. Não há problema nenhum.

Esse caso que eu vi, que me irritou, dessas trezentas

revisionais, que foram todas julgadas improcedentes, o meu cliente teve um

prejuízo de quatro milhões por causa desses processos, todos com AJG.

Então, na verdade, é possível, parece-me, essa fundamentação de que temos

que fundamentar, mas fundamentação que seja relevante para a procedência

do pedido. O artigo diz isso. Então, o que é irrelevante, em tese, ficaria até

descartado, ficaria excluído. Não me parece tão assustador assim esse art.

489, e têm muitos Juízes que já o aplicam, e me parece que é possível,

principalmente nessas ações com esses pedidos absurdos, essa

fundamentação em bloco, fundamentação com a mesma argumentação.

Na verdade, a jurisprudência vai acabar indo nessa linha, e

vocês, que decidem, é que vão acabar formando isso aqui e vão ter que lutar

por isso, mas não me parece o horror que muitos estão pregando. Então, o

livre convencimento não acabou, muitos daqueles que examinam processo já

fazem isso, e essas fundamentações em bloco me parece que têm que ser

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possíveis. Se a fundamentação é a mesma para todos os itens do pedido, não

vejo problema nenhum com relação a essa questão também.

No tocante a súmulas, vinculação a súmulas, via de regra,

quando eu falo para advogados, eles não concordam com relação à aplicação

de súmulas, principalmente em casos repetitivos, ação de massa. O que eu

digo em relação a isso? Com relação a elas, parece-me que existe uma

vinculação muito forte a precedentes que temos nos artigos 926, 927 e lá no

489, ou seja, se o magistrado não quiser aplicar a súmula, o.k., mas ele tem

que dizer que os casos que ensejaram a súmula não se enquadram naquele

caso específico. Ou, se ele efetivamente quiser aplicar a súmula, ele tem que

dizer: “Olha, se aplica por essa razão aqui”. Então, ele tem que fazer o devido

distinguishing, que estão comentando, para ver o que aplica. Nos meus

processos, eu faço o distinguishing desde que eu advogo, então eu sempre fiz

isso: “Se aplica, tem aqui o caso, é o caso”.

Com relação à aplicação de súmula e julgamentos em casos

repetitivos, me parece que não adianta lutar contra uma súmula sozinho,

decidindo contra: “O STJ diz dessa forma, só que eu não concordo com o STJ,

a minha ideia é essa”. E o Ministro Carlos Veloso, que foi Presidente do

Supremo Tribunal Federal, deu uma entrevista e disse: “São decisões por pura

vaidade, que não vão a lugar nenhum”, porque, se tem súmula, se tem

decisão em caso repetitivo, vai prevalecer a decisão no caso repetitivo, vai

prevalecer a decisão da súmula. Na verdade, aquela decisão isolada não vai

mudar toda a posição de uma Corte Superior, essa decisão isolada só acaba

gerando mais recurso, esse é o problema. Então, parece-me razoável a

vinculação, mas a maioria dos advogados é contra e dizem: “O Judiciário tem

que respirar, precisamos de novas interpretações. Precisamos renovar, então

não podemos ter essa força toda”. Nenhum Judiciário respira com esse

número de ação, não vai ser em uma decisão judicial isolada. Se querem que

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haja uma renovação, que introduzam outros mecanismos, mas não é esse o

mecanismo, não é decidindo de forma diferente.

Então, no caso de precedentes e no caso de repetitivos –

repetitivos também têm a vinculação – existe a vinculação e me parece

razoável, porque não vai ser o Juiz de 1º Grau, não vai ser o Desembargador

que vai mudar a posição de uma Corte Superior. Na verdade, essas

modificações exigem outros mecanismos, a movimentação tem que ser em

outro sentido, porque só acaba gerando isoladamente mais recursos.

Lamento. A súmula pode me prejudicar? Pode, mas vou fazer o quê? Não vou

mudar, não tem como. Então, na verdade, eu acho interessante a vinculação,

contrariando o que a maioria dos advogados dizem também com relação a

isso, mas infelizmente é dessa forma, temos que nos adaptar aos novos

tempos com relação a essa questão.

Isso com relação ao art. 489, que eu não poderia deixar de

falar, porque eu escuto falar tanto deste artigo, acho que é distorcido o que

alguns dizem e desconfio que até o próprio Lenio Streck duvide que dentro da

Constituição tu não possas ter mais que uma interpretação. Tu podes ter, sem

dúvida alguma, dentro do texto constitucional. O que se busca aqui é que se

fundamente. Se o Juiz quer decidir de determinada forma, o Juiz criativo tem

muito mais trabalho, a criação dá trabalho, mas evidentemente continuaremos

tendo criação, porque, se não admitirmos a criação, vamos voltar para um

positivismo puro, que é justamente o que se critica. Fala-se que o modelo

positivista é inadequado na nossa realidade contemporânea, porque a

legislação não consegue acompanhar os avanços sociais. Então, obviamente

que a interpretação existe, só que a questão é qual é a melhor interpretação.

Na verdade é isso, e eu digo: melhor interpretação e também interpretação

adequada ao texto constitucional, a Constituição é o limite, eu vejo dessa

forma. Não temos como conviver dentro de um modelo puramente positivista –

isso é impossível –, precisamos de interpretação – e são os magistrados que

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interpretam a legislação –, precisamos dos magistrados e não temos como

amarrá-los dizendo: “Agora vocês viraram máquinas, agora vocês viraram

computadores”. Não temos como transformar a decisão judicial em um

programa de computador, isso não existe, e Novo Código não diz isso em

momento algum. Na verdade, ele só exige que o magistrado decline as razões

e acabe não decidindo da forma como eu mencionei para vocês, como esses

Juízes do Trabalho, que negam vigência à Constituição, porque aí acabam

dizendo qualquer coisa. E o Supremo Tribunal Federal também, porque temos

muitas decisões dizendo o que a Constituição não diz, temos exemplos no

STF nesse sentido, e isso acaba gerando um perigo e comprometendo o

estado social e democrático de direito. Então, por isso essa ideia, essa

vinculação ao texto constitucional.

Há ainda dois últimos tópicos – daí eu já encerro para as

perguntas – do Novo Código, que me parecem importantes.

Eliminamos do Novo Código o rito ordinário e o rito sumário e

criamos um procedimento único, um procedimento comum, que é um misto

das normas do rito ordinário com o sumário, é uma mistura se vocês olharem.

Quem conhece bem o rito sumário e o rito ordinário vai ver as normas ali, é

um misto. Tentam também desformalizar, mas esse procedimento comum

introduz, no início do procedimento, uma audiência de tentativa de conciliação

e mediação, que, na minha opinião, é bastante válida, porque eu acho

importante a conciliação. Falo novamente como advogada e digo sempre que

a conciliação é tanto boa para o autor, quanto para o réu, elimina anos de

processo, elimina o desgaste de uma ação judicial, só que o Judiciário tem

que ter estrutura para isso, evidentemente que os Juízes não têm com fazer

tudo que é conciliação.

Aqui no Rio Grande do Sul já estão formando mediadores,

conciliadores, para que façam isso, só que não adianta introduzir uma

audiência de conciliação e mediação se quem vai presidir essa audiência não

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sabe conduzir. Já fiz inúmeras audiências na minha vida, e têm Juízes

maravilhosos com conciliação, têm Juízes muito bons nisso, mas tem uns que

não são bons na conciliação, tem Juiz que tenta, que tem paciência, porque

perde tempo, e ainda não é só uma audiência, são várias que poderão

ocorrer, e uma prolongando a outra; se não deu hoje, vamos tentar, vamos

continuar discutindo, então serão várias, talvez, audiências de conciliação.

Têm que ter paciência o conciliador e o mediador, terão que ter, sem dúvida

alguma, uma formação, tem toda uma técnica nessas conciliações, nessas

mediações, precisamos de pessoas preparadas.

O nosso Judiciário tem desenvolvido essa formação de

conciliadores e mediadores, mas no Brasil muitos não estão desenvolvendo

isso. Em Minas Gerais, teve um magistrado que disse: “No nosso Estado essa

audiência não vai acontecer, porque isso é impossível”. Ou seja, já estão

negando vigência ao Código. Então, se tivermos pessoas preparadas,

capacitadas, isso pode ser interessante, mas tem que ter formação, não é

qualquer um que pode fazer isso. Vejo isso na Magistratura, que efetivamente

têm alguns que são ótimos conciliadores e têm alguns que não são, não estão

nem preocupados com a conciliação. Então, deve haver aqui toda uma

formação, uma mudança de cultura no início do procedimento, que pode

auxiliar, sem dúvida alguma.

Por fim, ainda, outra novidade – isso que eu disse aqui:

princípio do contraditório, colaboração, fundamentação de decisão, disso a

academia fala há anos –, outro tópico que foi introduzido no Novo Código que

me parece o novo, o diferente – que eu não sei se vão aplicar também, eu

duvido, pelo menos quando já tem litígio instaurado –, que é o negócio jurídico

processual, artigos 190 e 191 do Novo Código. Isso me parece o novo.

As partes, no Novo Código de Processo, podem mudar o

procedimento, pactuar normas de procedimento diversas das que temos

previstas, estabelecendo um calendário processual. Podem negociar prazos,

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por exemplo. E tem um artigo do Novo Código que diz que até os prazos

peremptórios podem ser negociados, o que é diferente do que temos hoje.

Então, as partes podem estabelecer, por exemplo, um calendário processual:

“No nosso caso, o prazo da réplica não vai ser de 15 dias, mas vai ser de 30.

O prazo de recurso também, o prazo de recurso não vai ser de 15 dias, mas

vai ser de 30”. Então, por causa desse artigo que possibilita a negociação de

prazos peremptórios, é possível a negociação.

Parece-me possível a negociação de prova, a questão da

prova me parece uma das mais interessantes até de negociar. Eu negocio

quem vai ser o perito, negocio o prazo para quesitos, negocio o prazo para a

entrega de laudos por assistentes técnicos. É possível a negociação, o Código

não dá o limite para essa negociação. Será que é possível eu negociar: “As

partes abrem mão de o Juiz ter que ouvir as partes na questão de ordem

pública”? Será que pode negociar isso? Eu não vi ninguém falando disso, eles

só dizem que pode negociar, e já têm livros sobre isso.

Essa negociação não está sujeita à homologação do Juiz, o

Juiz não precisa concordar. Na verdade, haverá o controle das cláusulas que

poderão ser aplicadas ou não posteriormente. Então, estabelece o calendário,

vai seguindo o calendário, e esse controle desse calendário, do que for

negociado efetivamente, vai se dar durante a marcha do processo. O que eu

digo com relação a isso? Os livros e os artigos que já têm sobre isso – e esse

tema vem da Alemanha, da França, dos Estados Unidos, trouxeram de outros

países – dizem que as partes podem estabelecer o calendário naquela

audiência de conciliação e mediação, no início. Mas quando há litígio, não se

consegue fazer um acordo, vai ser muito difícil estabelecer um calendário

nessa audiência, porque depois que já houver o desencadeamento do

processo judicial, depois que já foi desencadeada a jurisdição, é muito difícil

que partes negociem calendário no início, quando há o contencioso.

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Onde me parece que isso possa ser interessante, que isso

possa acontecer? No âmbito extrajudicial, nos contratos, ou seja, eu firmo um

contrato, eu firmo um acordo extrajudicial. Como contém nos contratos, nós

não estabelecemos clausula de arbitragem? Então, podemos estabelecer um

rito, a criação de um rito, de uma marcha processual, no extrajudicial.

Aí tem um detalhe: essa negociação processual é possível

desde que uma das partes não seja vulnerável, hipossuficiente,

evidentemente, porque, se for vulnerável, não tem como, no caso de

vulnerabilidade, não é possível. Nos demais casos, sim.

Parece-me que no extrajudicial talvez seja a maior aplicação

prática disso, que é uma espécie de privatização da Justiça, nesses artigos

190 e 191. O resto dos artigos são teses acadêmicas, “recorta e cola” do

Código de 73.

Com isso, então, eu encerro, agradecendo mais uma vez a

atenção de todos vocês. Estou disponível para sanar eventuais dúvidas que

vocês tenham a respeito do Novo Código. Obrigada.

DES. NEY WIEDEMANN NETO – Correspondeu e superou as

expectativas a manifestação da Professora Dra. Jaqueline, a quem agradeço

muito.

Essa visão panorâmica, abrangente, no espaço de cerca de

uma hora e dez minutos, brindou-nos com reflexões críticas importantíssimas,

que me permitiram tomar uma série de notas valiosas para o nosso grupo de

estudos que se debruçará sobre esse tema.

Antes de colocar a palavra à disposição, permito-me alguns

breves comentários. A Profa. Jaqueline mantém viva a memória e dá

continuidade à obra do Prof. Ovídio, o que é extremamente importante e

gratificante, tendo, inclusive, publicado um livro póstumo. Foi póstumo, não é?

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DRA. JAQUELINE MIELKE – Foi o “A Epistemologia das

Ciências Culturais”, que ele terminou de escrever quando estava muito

doente, mas não deu tempo de publicar, e ele pediu para que eu

providenciasse a publicação do livro, mas foi ele que terminou.

DES. NEY WIEDEMANN NETO – Foi uma publicação post

mortem, embora o Prof. Ovídio tivesse finalizado o livro.

Eu tive a felicidade, o privilégio, na graduação da UFRGS, em

todos os semestres de Processo Civil, de ter sido aluno do Prof. Ovídio.

Depois eu ainda fiz uma pós-graduação em Processo Civil na PUC, no ano de

1989, e o Prof. Ovídio, naquela época, com os Professores Fábio Gomes e

Sérgio Roberto Porto, lecionava na PUC. Naquela ocasião ainda tive também

esse privilégio.

Não obstante, também tive outro privilégio de ter trabalhado

com o Prof. Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, aqui no Tribunal, na 6ª Câmara

Cível, quando ele integrava a Câmara, embora sabíamos que o Prof. Carlos

Alberto e o Prof. Ovídio tinham posicionamentos opostos em muitas questões

importantes, que hoje estão se materializando no Código. Às vezes, os

Códigos tardiamente consagram algumas ideias, e ambos já faleceram. Talvez

o Prof. Ovídio, se vivo fosse, ficasse muito chocado com esse Novo Código,

que colide com muitos princípios e fundamentos que ele defendia.

Eu queria fazer aqui uma breve anotação. Eu recebi esses

números do Min. Paulo de Tarso Sanseverino – uma curiosidade para a Profa.

Jaqueline –, eu encontrei o Ministro em um congresso, e ele me deu esses

números redondos. O STJ recebe, em média, por ano, o número de recursos

especiais que sobem é de 300 mil, e ele disse que a média nacional de

negativa de seguimento de recursos dos Tribunais de Justiça e Tribunais

Regionais Federais é de 50%. Então, o Min. Paulo fez um comentário comigo

de que a lógica do Novo Código significa que, por ano, os recursos especiais

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subiriam de 300 mil para 600 mil, já que a média nacional de negativa é de

50%.

Ele ainda me deu mais um dado curioso – são números

redondos, a Dra. Maria Tereza Barbieri deve conhecer esses números no

detalhe –, de que o Rio Grande do Sul é diferente, que os filtros são mais

criteriosos e rigorosos. Ele disse que 20% dos recursos especiais sobem e

80% não sobem, que no Rio Grande do Sul, nós temos mais critério para essa

admissibilidade.

Também tenho a informação de que, como esses recursos

têm que ser digitalizados, segundo estou informado, a demora do nosso

Tribunal para a digitalização, para o envio ao STJ, tem sido em torno de um

ano, e se todos os recursos tiverem que subir, se não houver esse filtro, o

departamento do Tribunal que digitaliza vai ter que quintuplicar a sua carga de

trabalho, e demoraria no mínimo dois anos para que um recurso fosse enviado

ao STJ pela necessidade da digitalização. Se eu estou falando um dado

incorreto, eu pediria que a Dra. Maria Tereza Barbieri complementasse,

porque tenho números muito grosseiros.

Quero comentar também, Profa. Jaqueline, que é uma grande

preocupação nossa – a minha leitura é do 2º Grau, o grupo de estudos que eu

vou me envolver para as mudanças do Regimento Interno é todo focado no 2º

Grau de Jurisdição – essa questão de quando um julgamento em curso tem

dois a um, e nós teremos que chamar mais dois Desembargadores. Isso

realmente é muito preocupante. Nós não temos como chamar mais dois no

curso daquela sessão. Tudo indica que será suspenso o julgamento daquele

processo, prosseguirá na sessão seguinte, com mais dois Colegas.

E o próprio Código prevê a possibilidade da renovação da

sustentação oral para que aqueles outros dois que serão convocados para

prosseguir também sejam brindados e agraciados com a sustentação oral

daqueles advogados que já haviam sustentado anteriormente para aqueles

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três. Às vezes, em razão das sustentações orais, os nossos julgamentos se

arrastam por horas, têm sessões de julgamentos que terminam à noite por

causa das sustentações orais. Imagina elas sendo renovadas, isso realmente

é um problema. Ainda no caso do nosso Tribunal, Profa. Jaqueline, a

composição atual é de quatro Desembargadores por Câmara, não cinco, com

a exceção de três Câmaras: a 23ª, a 24ª e a 25ª, e sempre tem um

Desembargador em licença prêmio, um Desembargador em férias, um

Desembargador doente, ou cargos vagos por remoção, por aposentadoria.

Teremos que convocar Desembargadores até mesmo de outras Câmaras para

compor, até que, no futuro, o Tribunal possa prover e nomear o quinto

membro para cada Câmara, mas mesmo assim haverá inúmeras dificuldades

quanto a isso.

Também essa questão da conciliação e da mediação, quer me

parecer que o Tribunal terá que se aparelhar com recursos humanos, o

Tribunal terá que ter funcionários capacitados e remunerados para essa etapa

inicial do processo, o que vai ter consequências, inclusive, orçamentárias.

Em relação àquela questão da mudança de rito e de prazo,

que o processo pode dispor, que as partes podem dispor de uma maneira

diferente, que foi a sua última colocação, o nosso grupo de estudos também

se preocupa com o nosso processo eletrônico, que está em fase de

implantação. Os sistemas de informática estão sendo desenvolvidos para o

processo eletrônico, e muitas etapas são customizadas e automatizadas.

Imagina se nós temos que alterar o processo eletrônico porque em

determinado processo as partes compuseram totalmente diferente o rito e os

prazos. Isso vai demandar até uma janela de informática para que

programadores possam mudar procedimentos e prazos, porque as partes

transigiram, e isso vai interferir no processo eletrônico. Não sendo processo

eletrônico, isso tem mais facilidade de controle pelo Escrivão e pelo Juiz, mas

no processo eletrônico vai ser algo complicado.

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Por último, um aspecto que talvez a Profa. Jaqueline não

tenha comentado, mas é, para nós, importante, que é a questão da avocação,

avocatória. Não é bem esse o termo da avocatória, mas aquela questão de

quando começa a se formar uma matéria repetitiva no 1º Grau, e o Tribunal,

percebendo, pode avocar aquele assunto e julgar no Tribunal, criando uma

interpretação que vai impor ao 1º Grau uma solução padronizada para ações

de massa, sem que tenha havido ainda o devido processo crítico de reflexão

sobre alguma demanda repetitiva que começou a se formar no 1º Grau. Isso

também, pra nós, é algo estranho, algo inusitado, porque a lógica atual do

sistema é que o 1º Grau examina primeiro as ações repetitivas, faz o

julgamento, e o Tribunal acaba – às vezes até naquelas ações populares,

ações civil públicas, aquelas ações coletivas de consumo – dando uma

uniformização, mas tendo um tempo maior de reflexão, de maturação. Depois,

o próprio STJ, no art. 543-C dos recursos repetitivos, dá a padronização final.

Isso aqui, para nós, é algo muito estranho, porque poderíamos atropelar o 1º

Grau.

Estas são essas considerações iniciais que eu queria colocar

para a Profa. Jaqueline, se tiver algum comentário sobre isso. Depois,

colocaremos a palavra à disposição.

DRA. JAQUELINE MIELKE – Com relação aos repetitivos, os

números que o Ministro te deu, eu pensei que fossem até maiores do que isso,

eu pensei que o que chegaria lá, com a abertura da porta, seriam muito mais

do que 600 mil, porque não dá pra fazer um cálculo linear disso, porque São

Paulo manda mais, São Paulo tem um número muito grande. Então, eu acho

que não é possível só dobrar pelos 50%, porque só São Paulo já deve ser

bem maior do que esse número aqui. Se eu fosse os Ministros, eu estaria

bastante preocupada com essa disposição.

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A questão que tu colocaste do processo eletrônico, com

relação ao negócio jurídico processual, é algo preocupante mesmo. O

processo eletrônico é feito para esse procedimento. Então, se mudar todo o

sistema, cria outro problema. Na verdade, é estranho eles não terem se

preocupado com isso, porque vemos no Código a positivação de muitos

procedimentos da Justiça Federal, e já temos o processo eletrônico há muito

tempo, e funciona de forma diferente a Justiça Federal, ela é diferente das

Justiças Estaduais. Então, foi uma preocupação que eles não tiveram e que é

pertinente com relação ao processo eletrônico.

No processo em papel, em tese, não teria o mesmo problema,

mas as Justiças Estaduais um dia chegarão ao nível da Federal também, um

dia vai ficar tudo eletrônico. Aí, como é que fica a negociação? Vão fazer um

programa específico para aquele negócio? Uma coisa estranha. Eu vou

contratar um programador para fazer um programa específico de um processo

eletrônico diferente? Então, parece-me interessante a preocupação que

efetivamente tu tiveste com relação a isso, com relação a essa adequação ao

eletrônico.

DES. NEY WIEDEMANN NETO – Teria algum comentário

sobre a avocatória ou não?

DRA. JAQUELINE MIELKE – Eu concordo contigo com

relação à avocatória. Realmente é um problema, mas a ideia é tentar resolver

o problema dos repetitivos também, é essa a ideia.

Eu sou uma grande crítica dos repetitivos, eu acho um horror

aquilo, os repetitivos são um festival de “recorta e cola”, ninguém lê processo,

o advogado não lê as petições, porque um recorta e cola do outro, aí o réu

contesta, só recorta e cola, as sentenças são todas iguais. Então, parece-me

que tem que ter esse tipo de mecanismo. Tudo que é mecanismo para reprimir

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repetitivo, para tentar adequar, eu sou a favor, porque é um caos, é terrível.

Para o advogado que trabalha com isso, é horrível; para o Juiz que trabalha

com isso, é terrível também; para o assessor que fica lá tendo que recortar e

colar decisão, também é horrível. Então, esses mecanismos me parecem

razoáveis.

DES. NEY WIEDEMANN NETO – Vamos, então, colocar a

palavra à disposição. A Dra. Maria Tereza vai contribuir.

DRA. MARIA TEREZA BARBIERI – Inicialmente, gostaria de

parabenizar o Des. Ney pela iniciativa, convite, retomando o Projeto

Horizontes do Conhecimento, um tema tão fundamental, vital para todos nós

operadores do Direito. Gostaria também de saudá-la pela brilhante exposição,

pelas suas reflexões, estudo em tão pouco tempo, vamos dizer assim, a partir

do Novo Código de Processo Civil, reflexões, análise percuciente que

compartilha conosco e assim também nos motiva e incentiva a prosseguirmos

no estudo, sempre aperfeiçoando, porque é o nosso dia a dia, o nosso

trabalho, o nosso dever de buscar sempre esse aprofundamento. Contamos

com a sua presença e participação em muitas outras oportunidades, com

certeza prosseguindo nesse estudo e nessas reflexões.

A partir da colocação do Des. Ney com relação aos nossos

recursos especiais e extraordinários, peço que toda a equipe da Assessoria

aqui presente me auxilie se faltarem alguma observação. Efetivamente, no

ano passado, o nosso relatório apontou que foram analisados

aproximadamente 120 mil recursos especiais e extraordinários no Estado do

Rio Grande do Sul. Em torno de 80% ou mais são recursos que têm

seguimento negado, denegado o próprio recurso em virtude de estar

enquadrado em paradigma na repercussão geral ou dos recursos repetitivos.

Com isso, o número que ascende às Cortes superiores é bem inferior, uma

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vez que, sendo denegado o recurso, porque se enquadra nos recursos

repetitivos, nos paradigmas da repercussão geral ou dos recursos repetitivos,

rende agravo regimental, e a decisão é nossa, aqui do próprio Tribunal,

conforme assim estabelece o nosso Regimento Interno.

Os recursos que tem negado seguimento, enfim, possível

agravo, art. 544 do Código de Processo Civil, são esses que constituem a

grande maioria dos recursos que se encontram junto ao serviço de formação

do processo digital. E o prazo é em torno de seis meses – não de um ano –,

porque há carência – e aqui os colegas podem corroborar essa informação –,

tanto de pessoal quando de recursos. Atualmente acredito que são três ou

quatro servidores que têm a sua designação com fé pública para esses

processos.

Então, há grande massa de agravos, porque a parte

remanesce inconformada com a decisão de negativa de admissibilidade do

seu recurso. Eles são digitalizados, são indexados, validados e certificados, ou

seja, todas as peças são identificadas e indexadas, e o Senhor Ministro-

Relator, após distribuído esse recurso digitalizado, via eletrônica, tem todas as

peças indexadas, desde a inicial, contestação, sentença, recursos e acórdão.

Enfim, é esse o trabalho que se faz, sempre com grande

esforço, e posso assegurar, com orgulho, que aqui no Estado do Rio Grande

do Sul o índice de erro é inferior a 0,00, alguma coisa assim, comparando,

então, com todo o restante dos recursos que são digitalizados no País.

Também gostaria de ressaltar que, em auxílio à prestação

jurisdicional e à efetividade, nós temos inserido no nosso planejamento

estratégico do Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul a gestão

estratégica das ações de massa. Esse é um trabalho que se faz aliado ao

Núcleo de Repercussão Geral e Recursos Repetitivos, instituído no Estado do

Rio Grande do Sul, no Poder Judiciário, no ano de 2012, a partir da Resolução

nº 160 do CNJ. Com isso, todas as demandas de massa têm um tratamento

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diferenciado; os recursos, com adesão dos colegas da jurisdição, ficam

suspensos, aguardando, então, a decisão na ação coletiva ou na ação civil

pública ou também, simultaneamente, ao recurso especial paradigmático.

Esse é o trabalho que se faz, antes mesmo do que já agora institui o Novo

Código de Processo Civil, é a prática que vamos aperfeiçoando.

Então, são esses os esclarecimentos, a partir da colocação do

Des. Ney, que penso pertinentes, convidando a todos, a partir dessas

reflexões, junto com a Profa. Dra. Jaqueline, a prosseguir nesses estudos e

reflexões sobre esse tema tão vital para todos nós operadores do Direito.

DES. NEY WIEDEMANN NETO – Muito obrigado.

Vamos às contribuições dos colegas.

PLATEIA – Estou fazendo pós-graduação na PUC do Novo

Código de Processo Civil, e, ouvindo a senhora falar – quando foi instituído o

Código de 73, que foi em 1º de janeiro, já em outubro foi feita uma nova lei

que acrescentou 94 novos artigos no Código de 73 –, a impressão que dá –

não sei se eu interpretei direito – é que esse nosso Novo Código, na verdade,

em termos práticos, já vai, ano que vem, sofrer alterações. Não sei se é isso.

DRA. JAQUELINE MIELKE – O que ocorre? O Código de 73,

quando entrou em vigor, já entrou em vigor com diversos artigos alterados.

Têm vários problemas esse Código atual, e um dos problemas que eu vejo é

essa questão da admissibilidade no REsp e no RExt, essa de tirar a

admissibilidade dos tribunais de origem. O que me parece? Isso aqui é uma

questão que afeta diretamente as Cortes superiores, se torna insustentável.

Então, eu acredito que possa haver um movimento muito forte para alterar

esse ponto específico, para voltar a ser como temos hoje. Eu digo que não se

deram conta quando efetivamente aprovaram dessa forma, parece que não se

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deram conta disso aqui, estão se dando conta agora. Então, acho, sim,

provável que tenhamos alterações. Talvez essa aqui seja uma delas, sem

dúvida alguma, pelos reflexos que vai trazer.

Não acredito que mude nada com relação ao contraditório,

acho que isso eles vão deixar, essa questão que tem que ouvir as partes

antes de o Juiz se pronunciar, até por questão de ordem pública, mas essa

questão específica, porque afeta as Cortes superiores, acho, sim, que

possamos ter alteração, como houve em 73; têm artigos que não entraram em

vigor. Então, acho que teremos alterações no curso deste ano e essa acho

que pode ser uma delas.

DES. NEY WIEDEMANN NETO – Nesse sentido, o próprio

Min. Paulo Sanseverino, quando tratamos desse assunto, me passou a

informação de que haveria um movimento do STJ postulando, no Congresso,

a alteração da lei antes de ela entrar em vigor. Já deve ter sido até

protocolado o anteprojeto de reforma do CPC. Talvez não tenha sido

divulgado, mas será apreciado exatamente por esse motivo da inviabilidade

prática.

DRA. JAQUELINE MIELKE – E em 73 aconteceu. Então, é

bem provável que ocorra. E esse é um ponto complicado, então, nesse ponto

específico, acho que haverá um movimento, mas é um exercício de

previsibilidade, porque é problemático isso aqui que colocaram.

PLATEIA – Uma dúvida, voltando ao início da palestra, em

relação às condições da ação, que agora não poderiam ser mais conhecidas

de ofício.

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DRA. JAQUELINE MIELKE – Não é isso. Elas podem ser

conhecidas de ofício, mas, antes de o magistrado conhecê-las de ofício, ele

tem que ouvir as partes. O Juiz apensou: “Acho que falta legitimação para

agir”. O Juiz se deu conta, o que ele tem que dizer? “Digam as partes sobre a

legitimidade ativa”. Pode ser de ofício, ele tem a iniciativa, só que ele tem que

ouvir antes.

PLATEIA – Mas o que eu quero chegar é assim: se for um

caso de um indeferimento de inicial, uma ilegitimidade ativa latente, o que o

Juiz vai ter que fazer?

DRA. JAQUELINE MIELKE – O que ocorre? O Código

excepcionou a improcedência liminar. A improcedência continua lá no art. 332,

ou seja, é possível a improcedência liminar do pedido sem a ouvida da outra

parte. Aí tu perguntas o indeferimento de uma petição inicial. Ora, se pode

julgar improcedente liminarmente o pedido, consequentemente deve-se

estender também para o indeferimento da liminar, parece-me, no início do

processo. Até porque, o que ocorre? Por que é possível a improcedência

liminar sem a ouvida da outra parte? Porque beneficia o réu. Então, na

verdade, o réu não tem prejuízo, e o indeferimento também me parece que

não vai implicar em prejuízo, nesse caso específico. Então, eu estenderia o

mesmo raciocínio que é feito para a improcedência liminar o art. 332 aqui.

Mas, digamos, aí chega no Tribunal, e o Tribunal: “É parte ilegítima” ou “Má

formação de litisconsórcio”, como têm situações em que há problema na

formação do litisconsórcio, litisconsórcio ativo com problema. Não dá

simplesmente para se pronunciar sem ouvir a parte.

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PKATEIA – E agora uma pergunta com um enfoque diferente.

De uma forma objetiva, a senhora acha que esse Novo CPC era necessário

mesmo ou não? Vai trazer grandes alterações?

DRA. JAQUELINE MIELKE – Eu sou bem cética quanto a

isso. Na verdade, um dos principais problemas que temos no processo é a

efetividade do processo, e eu nem cheguei a falar de execução, porque

execução é um mundo à parte. Sobre efetividade, não tem nada de novo aqui

praticamente. Se é para recortar e colar um Código velho, que fique com o

velho. O que ocorre? Que a gente não fique – eu diria – com discussões

novas de processo, porque vamos ter discussão de processo. Então, ficamos

em torno do marasmo do processo quando o mais importante não é o

processo, o mais importante é a realização do direito material da parte. Então,

parece-me que, se é para introduzir esse tipo de situação, era melhor ficar

como está.

Na verdade, tem todo um mercado por trás do Novo Código

de Processo. As pessoas escrevem livros, tem livro que não acaba mais que

escrevem sobre isso, aí têm palestras, cursos, tem um mercado atrás disso,

dessa questão de termos um Novo Código de Processo. Em linhas gerais, têm

pessoas que ganham muito dinheiro com o Novo Código de Processo.

Parece-me que não precisaríamos ter um código nesse modelo aqui, e eu digo

até que fundamentação de decisão judicial tem no art. 93, inc. IX, da

Constituição, tem um artigo da Constituição Federal que trata disso. Então, na

verdade, vamos discutir processo. Só isso. Eu digo: como é que eu vou dar o

bem da vida da parte, realizar o bem da vida? Não tem praticamente dentro do

Novo Código. Então, me parece que, se é para fazer dessa forma, é melhor

não fazer, sem dúvida alguma.

DES. NEY WIEDEMANN NETO – Mas está feito.

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DRA. JAQUELINE MIELKE – Está feito. Daí tem que extrair o

que tem de bom e o que tem de ruim. Na verdade, está feito, e nós não temos

alternativa.

PLATEIA – Em relação a procedimento, o Novo Código trata

algo sobre a transição de autos físicos para autos eletrônicos e

responsabilidade por essa transição?

DRA. JAQUELINE MIELKE – Não, não fala. E é um

problemão isso aqui na Justiça Federal, porque lá eles transformam os autos

físicos em eletrônicos e não avisam ninguém. Aí as partes são surpreendidas

com julgamentos e não sabem que tu tens que abrir o processo eletrônico – é

outro problema – para ver as intimações. Como a parte não sabe que foi

transformado, quando vê, os processos são julgados pelo TRF. Esta transição

é um problemão que temos: do físico para o eletrônico.

Na verdade, com relação ao eletrônico, eles colocaram

disposições que a jurisprudência já considera. Por exemplo: “Não se aplica o

prazo...” – 191 hoje, 229 amanhã – “...dobrado para litisconsortes para

diferentes procuradores no processo eletrônico”. Colocaram o artigo, mas

colocaram o artigo que a jurisprudência já pacificou lá no Federal com relação

a isso. Então, eles colocaram que já tem jurisprudência, mas essas questões

não, e é um problema.

Daí eu digo – eu não coloquei antes – que o Código novo já

nasce velho, porque a realidade é o processo eletrônico, e sobre processo

eletrônico não tem quase nada. O pouco que tem são essas conclusões de

acórdãos. O eletrônico é um mundo à parte, que praticamente não está

tratado no Novo Código. E a pergunta que tu fizeste é um problema que

temos, essa transição é um problema, porque eles não fizeram um Código

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voltado para o eletrônico, fizeram um Código ainda voltado para o papel, com

poucas referências ao eletrônico. Eles não conseguem imaginar muita coisa,

porque não estão no Foro todos os dias. Por isso que eles não imaginam. Aí o

que ocorre? Aí vêm os problemas. Então, pegaram jurisprudência, colocaram

a jurisprudência e não viram efetivamente essa questão, que é problemática,

mas é porque o Código não tratou praticamente dele.

PLATEIA – Eu gostaria de saber, na parte em que é possível

as partes convencionarem sobre os prazos peremptórios, se vai ser possível

elas, por exemplo, postularem o aumento dos prazos para recursos, por

exemplo.

DRA. JAQUELINE MIELKE – O Código não diz nada, só diz

que pode negociar, não diz como negociar. Tem um artigo que fala da

negociação dos prazos peremptórios, tem um dispositivo, tem artigos escritos

sobre isso, tem até um livro que saiu, de uma coletânea, que foi umas das

melhores coisas que eu li sobre o Novo Código, porque tem muita coisa ruim.

Eu estava comentando antes que, na verdade, são livros feitos só para a

venda que têm saído agora, porque é impossível comentar um Código em

dois, três meses. Isso não existe. É uma coletânea do Antônio de Passos, que

é bem interessante, são vários artigos, inclusive vários vindos do exterior,

vários artigos de autores estrangeiros sobre o tema, mas o Código não disse

nada.

O que tu podes pactuar? A questão que pode pactuar é que o

Judiciário vai acabar controlando isso. O que me parece? Qual é o limite que

existe aqui? Os princípios constitucionais para isso. O aumentar me parece,

em si, que não afetaria. Tu ampliarias a possibilidade do contraditório, da

ampla defesa. Tu poderias dizer: “Ah, não, mas, se eu aumento o prazo, isso

afeta o tempo de duração do processo”. Aí, de um lado, tu amplias o

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contraditório; do outro lado, tu aumentas o tempo de duração. Eu digo: não vai

ser tu aumentando um prazo de 15 para 20 dias que vai mudar o tempo do

processo, eu não vejo dessa forma. Não é o aumento de um prazo, que seja

mínimo, que vai fazer com que o processo leve mais tempo, têm outras

coisas, o processo demora por outras razões.

Então, me parece que aumento de prazo não haveria

problema nenhum, porque está mais do que assegurado o princípio do

contraditório, mas te digo que o Código não diz nada. Ele diz que pode

negociar. Aí o problema é: qual é o limite da negociação? Porque é muito

diferente falarmos, à luz do art. 73, que eu posso negociar prazo peremptório.

Eu levei um susto quando vi o artigo no Novo Código; tem um artigo – não

lembro agora o número dele – que diz que é possível, desde que as partes

ajustem isso. Então, na verdade, parece-me, dentro da tua pergunta

específica, que é possível, porque está assegurado o contraditório.

PLATEIA – Eu tenho uma pergunta quanto aos recursos. Pelo

que eu vi, por cima, o Código trata de uma maneira bem simplista que

despacho seria atacado por agravo e sentença por apelação, só que a gente

trabalha com falência e insolvência basicamente. Então, são sentenças

terminativas, e têm várias diligências no processo para cumprir em cartório.

Como ficaria essa questão? Uma sentença seria atacada por apelação mesmo

assim?

DRA. JAQUELINE MIELKE – O Código tenta eliminar de vez

esse problema. Qual é o problema que a gente tem hoje, que foi gerado a

partir de 2005? A partir de 2005, com a introdução do cumprimento de

sentença, o que tivemos? A sentença não necessariamente termina o

processo, porque o processo pode continuar com a execução. A partir da não

vinculação necessária, da definição de sentença à idéia de extinção do

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processo, ressuscitou uma tese velha do Prof. Ovídio, de que haveria

sentenças durante o processo, no curso do processo.

DES. NEY WIEDEMANN NETO – Sentenças parciais.

DRA. JAQUELINE MIELKE – Isso, as sentenças parciais e as

liminares.

Veio a tese das sentenças parciais – o Teori fala da tese, têm

julgados do Teori falando das sentenças parciais, vocês encontram o Marinoni

falando das sentenças parciais, a Teresa Arruda Alvim Wambier fala nas

sentenças parciais –, que não é de nenhum deles, mas do Ovídio, de 20, 30

anos atrás. Aí vem toda a discussão de qual é o recurso cabível, se fica

girando em torno daquela apelação por instrumento que inventaram. Então,

vem toda uma discussão se tem coisa julgada progressiva, se não tem coisa

julgada progressiva. Hoje se discute isso tudo.

O Novo Código liquida com isso aqui tudo. O que o Código fez

questão de dizer? E eles fizeram isso de propósito, para que não inventassem

mais. O Código, no art. 203, § 1º: “Sentença é o ato que encerra uma fase ou

extingue a execução”. Então, a sentença encerra a fase ou extingue a

execução. Tudo o que não extinguir fase, o que não extinguir execução, é

interlocutória. O Código diz e reforça isso no art. 356, que é a história das

parciais. O que o Código faz no art. 356? Hoje nós temos a tutela antecipada

da parcela incontroversa, o § 6º do art. 263, que a doutrina discute o que é

tutela antecipada da parcela incontroversa. É tutela antecipada ou é sentença

parcial? O que o Código faz? Ele introduz um julgamento parcial da lide

antecipada, porque, na verdde, tutela antecipada da parcela incontroversa é

muito mais julgamento parcial da lide antecipada do que tutela antecipada. O

que o Código diz com relação a isso? Ele diz julgamento parcial da lide

antecipada, para que não dissessem que é sentença parcial, para que não

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criassem a sentença parcial. Tem o § 3º e o § 5º, se eu não me engano, desse

art. 356, que dizem: “A decisão que antecipar a lide parcialmente é atacada

através do agravo de instrumento”. Ora, disseram isso para que não falassem

mais da apelação por instrumento, que efetivamente é considerada erro

grosseiro essa apelação por instrumento no Foro, mas diz expressamente que

é o agravo de istrumento no sentido de que, se é agravo de instrumento, é

interlocutória.

Então, qual foi a ideia aqui? O parágrafo diz o seguinte:

“Decisão proferida com base neste atrigo é impugnável por agravo de

instrumento”. Se é agravo de instrumento, é interlocutória, não é sentença

parcial. Então, na verdade, eles eliminam, eles tentam organizar isso aqui, ou

seja, se extinguir o processo ou uma fase do processo, é sentença. Tudo mais

o que houver no interior do processo, é interlocutória.

Em relação à tua pergunta com relação à falência, como tem

lei especial, se a legislação refere e nomina o provimento de determinada

forma, eu continuaria aplicando a lei especial, que é o que acabamos

visualizando efetivamente dentro da jurisprudência, mas, saindo da legislação

especial, que nós temos no Novo Código de Processo Civil, não deixa dúvida.

Eu digo que a tese que seria de sentença parcial, sentença liminar, isso não

existe mais, na minha opinião. O art. 356, § 5º, combinado com o art. 203, § 1º

e 2º, na minha opinião, são muito claros no sentido de que essa tese – e é

uma tese que processualista gosta muito – acabou. Não temos mais isso.

E nós trouxemos – ligando à tua pergunta, porque esse é um

tema bem interessante – ao Novo Código algo que hoje o STJ rechaça – e na

minha opinião está positivado aqui –, que é a coisa julgada progressiva. Coisa

julgada de capítulo de decisão. O art. 966, acho que o § 1º, que trata do

cabimento da rescisória, admite rescisória contra capítulo de sentença, e esse

art. 356, no § 3º, diz que transita em julgado essa decisão que julga

antecipadamente a lide parcial. Então, eles admitem coisa julgada de

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interlocutória, admitem coisa julgada de capítulo de uma sentença antes do

que outros. Isso aqui muda completamente – parece-me – competência para

ajuizar a rescisória. Se uma parte transita em julgado aqui, se outra parte

transita em julgado lá no STJ, nós vamos ajuizar duas rescisórias? É o que

parece, lendo isso que temos aqui, porque, na verdade, hoje, pela

jurisprudência do STJ, eles dizem que não tem coisa julgada progressiva. Eles

dizem isso, mas no STF há acórdãos dizendo que tem, há um acórdão, de

março de 2014, do Min. Marco Aurélio, dizendo que tem.

Então, o Novo Código adota a tese da coisa julgada

progressiva ao reconhecer que capítulos de uma sentença transitem em

julgado e ao reconhecer que essas interlocutórias de mérito possam transitar

em julgado, e me parece que isso vai mudar a jurisprudência quanto à

competência para processar e julgar a rescisória. Isso aqui muda.

DES. NEY WIEDEMANN NETO – Realmente a perguta foi

muito oportuna, porque essa palestra é sobre os fundamentos, mas nessas

perguntas vêm questões interessantíssimas, como esse aspecto que está

dando uma mudança de eixo no Brasil, dos capítulos da sentença e dos

trânsitos em julgado parciais, que muda até a contagem do prazo para a

rescisória e assim por diante. Mais um aspecto importante que essa pergunta

oportunizou.

Então, com isso, dou por encerrada esta reunião do Centro de

Estudos, mais uma vez agradecendo à Profa. Jaqueline.

(DEGRAVADO PELO DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA E

ESTENOTIPIA DO TJ/RS.)