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Disciplina de Zootecnia de Ovinos Universidade Federal da Grande Dourados Faculdade de Ciências Agrárias Autores: JOSÉ CARLOS DA SILVEIRA OSÓRIO Professor Visitante Nacional Sênior – UFGD/CAPES, Bolsista do CNPQ MARIA TERESA MOREIRA OSÓRIO Professora Visitante Nacional Sênior – UFGD/CAPES, Bolsista do CNPQ FERNANDO MIRANDA DE VARGAS JUNIOR Professor Adjunto da UFGD, Bolsista do CNPq ESTUDO DA LÃ 2013

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Disciplina de Zootecnia de Ovinos Universidade Federal da Grande Dourados Faculdade de Ciências Agrárias

Autores: JOSÉ CARLOS DA SILVEIRA OSÓRIO Professor Visitante Nacional Sênior – UFGD/CAPES, Bolsista do CNPQ

MARIA TERESA MOREIRA OSÓRIO Professora Visitante Nacional Sênior – UFGD/CAPES, Bolsista do CNPQ

FERNANDO MIRANDA DE VARGAS JUNIOR Professor Adjunto da UFGD, Bolsista do CNPq

ESTUDO DA LÃ

2013

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ESTUDO DA LÃ

3.1. Introdução. Definição e origem da lã.

3.2. Estrutura da pele e da fibra de lã.

3.3. Formação e crescimento da fibra de lã.

3.4. Propriedades da fibra de lã.

3.5. Classificação comercial da lã.

3.6. Fatores que influem na produção de lã.

3.7. Considerações e conclusões.

PERGUNTAS:

1. O que é lã?

2. Quais a camadas que formam a fibra de lã?

3. O que é suarda e qual a sua função?

4. O que é higroscopicidade da lã e qual o seu índice médio?

5. Quais as características da lã de maior importância na classificação comercial

brasileira?

6. Quais os fatores que influem na produção de lã?

17. Qual a importância de avaliar a lã?

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3.1. Introdução. Origem e definição da lã.

As informações que a seguir disponibilizamos foram retiradas, basicamente dos livros:

“La Lana” (Barriola, 1966), “Criação de Ovinos” (Vieira, 1967), “Praderas e Lanares.

Producción Ovina en Alto Nivel” (Minola e Goyenechea, sem data), “Producción Ovina”

(Ensminger, 1973), “Apuntes de Lanares y Lanas” (SUL, 1987), “Praderas & Lanares.

Tecnologia Ovina Sudamericana” (Minola e Elissondo, 1990), “Produção de Ovinos no

Brasil” (Selaive e Osório, 2013) cujas compilações não seguidas das referidas citações, a cada

momento, para evitar o truncamento do assunto e as inúmeras citações. As demais obras

citadas esporadicamente terão a identificação no texto.

Salienta-se aos estudantes, para quem foi destinado este material, que o estudo da lã é

bastante complexo e que o que a seguir fica exposto é somente indicativo básico em

fundamentações necessárias para os que desejam saber sobre esta finalidade produtiva tão

importante no contexto da ovinocultura.

Desde a pré-história, os povos usavam a pele dos ovinos como abrigo e proteção.

Estudos científicos indicam que a domesticação dos animais e as formas primitivas de

agricultura começaram entre 10.000 e 6.000 A.C. ou inclusive um pouco antes, visto que

ossos ovinos provenientes dessa época foram encontrados em distintas partes do mundo.

Sendo que, os primeiros tecidos de lã foram encontrados no Egito entre 4.000 e 3.500 anos

A.C.; provavelmente, o clima seco dessa região permitiu sua preservação (SUL, 1987).

A lã tem uma utilização destacada pelo homem das mais variadas, desde a forma de

abrigo, também como medicinal até como adornos de alto requinte. Como abrigo é destacado

a sua utilização por recém-nascidos e idosos, em função de sua eficiente propriedade de

termoreguladora. Como adornos é, igualmente, encontrada nas mais destacadas galerias de

arte sob as mais variadas formas de beleza e preciosidade. Entretanto, possui a lã finalidades

medicinais, como a utilização de lipídios internos da lã, que possuem um alto conteúdo em

ceramidas que são extratos naturais com uma composição similar à do estrato córneo humano,

que são utilizadas em produtos para o tratamento e cuidado da pele. Estes lipídios formulados

como lipossomas reforçam o efeito protetor e melhoram a hidratação da pela sadia,

acelerando a reparação da função protetora da pele lesionada (CSIC BIO022, 2008; CSIC

BIO023, 2008).

Assim, por sua diversidade de utilização a lã pode ter mais de uma definição, em

função do segmento da sociedade, mas, de forma incontestável pela bibliografia, pode-se

definir lã como sendo uma fibra de origem animal com a função de proteção. Mas,

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também, sabe-se que quimicamente a fibra de lã é uma proteína chamada queratina, formada

por compostos mais simples (aminoácidos), unidos entre si formando longas cadeias

(polipeptídeos); também, pode-se dizer que é uma fibra de origem animal, constituída de

cadeias de aminoácidos ligadas por átomos de enxofre.

Para um melhor entendimento da fibra de lã e da biologia de suas propriedades é

necessário não tão somente o conhecimento do folículo produtor de lã e da estrutura da fibra,

como, também, da pele; já que o folículo é um órgão desta.

3.2. Estrutura da pele e da fibra de lã.

A pele está formada por três camadas principais: epiderme, mesoderma (reta mucosa)

e endoderma (cútis vera).

No ovino a epiderme apresenta pequena espessura, representando somente 5% da

espessura total da pele. A epiderme é um tecido epitelial, poliestratificado e compreende as

seguintes capas, a partir da superfície da pele: estrato córneo, estrato lúcido, capa granulosa,

estrato espinhoso e capa basal ou germinativa.

A epiderme é constituída de células achatadas que são constantemente desprendidas

pelo atrito e substituídas por novas células da camada córnea.

O mesoderma, também é formado por três camadas de células diferentes: granulosas,

irregulares e colunares.

O endoderma ou cútis vera é formado por um tecido chamado córion, na parte superior

do qual se encontra a camada papilar. Essas papilas contendo corpúsculos táteis ligados a

fibras nervosas estão intimamente relacionadas com o sentido do tato.

Embaixo do córion existe uma camada de tecido gorduroso no qual se vêem

numerosas células adiposas reunidas em forma de cachos, que são as glândulas sebáceas.

Portanto, abaixo do endoderma encontram-se apêndices de diferentes espécies e

funções: glândulas sudoríparas (aspecto de novelo), sebáceas e folículos pilosos. As glândulas

sebáceas estão localizadas, em número de duas, de cada lado do folículo piloso, no qual

abrem o seu canal excretor.

A mistura da secreção da glândula sudorípara (suor) com a gordura das glândulas

sebáceas forma a suarda, que tem a função de lubrificação e proteção da pele e da fibra

de lã.

A glândula sebácea tem dois lóbulos na secção horizontal da pele, em forma de cacho

e seu conduto excretor verte seu conteúdo na parte superior do folículo, antes que a fibra faça

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seu aparecimento na superfície da pele. A secreção desta glândula está formada por uma

mistura de esteróides (alcoholes de alto peso molecular) com ácidos graxos. Quimicamente

esta secreção é uma cera, portanto insolúvel em água e solúvel em solventes orgânicos. Sua

ação é impedir o feltramento (entrecruzamento das fibras de lã), atuar como repelente da água

e proteger a fibra de lã.

A “lanolina” cosmética é a forma derivada da primeira purificação e branqueamento

da suarda, recuperada dos diferentes procedimentos de lavado da lã.

A secreção sebácea é continua e não se encontra sob controle neurohumoral, como

ocorre com a sudorípara.

A excreção da glândula sudorípara desemboca na pele, no pescoço do folículo piloso

verte seu conteúdo, acima da glândula sebácea. A glândula sudorípara segrega sais de potássio

de vários ácidos graxos que são solúveis em água. O suor protege a fibra dos raios

ultravioletas da luz solar.

O folículo piloso tem por função formar as células que vão constituir a lã, cabelo ou

pêlo. Portanto, o elemento básico da produção de lã é o folículo piloso. Este é uma

invaginação ou depressão da epiderme, com um bulbo ativo em sua base, dentro do qual

ocorrem as divisões celulares.

O folículo piloso apresenta a forma de garrafa e tem a mesma constituição celular da

pele, com a única diferença de que a epiderme se acha na parte interna do bulbo, ao passo que

a endoderme se encontra na parte externa. Esta disposição pode ser comparada ao dedo de

luva que foi invertido.

Como foi dito anteriormente, o folículo é uma estrutura da pele, mais concretamente

da epiderme e se forma por meio da invaginação da capa basal ou germinativa da epiderme

que penetra profundamente na dermis (Figura 1).

Dois tipos básicos de folículos estão presentes na pele dos ovinos e embora sua forma,

estrutura e função sejam similares, eles diferem em suas estruturas acessórias e no momento

da iniciação na pele; estes dois tipos básicos de folículos são chamados de primários e

secundários. Como o nome indica, os folículos primários aparecem primeiro na pele, surgem

no período fetal, 40 dias após a fecundação e se desenvolvem, inicialmente, na linha superior

do corpo, da cabeça até a cauda e na parte posterior, seguindo a direção da barriga e membros.

Ao atingir 90 dias o feto já tem o corpo todo com um tipo de folículo que se apresenta em

grupos de três (tríades). Esses folículos, chamados primários, dão origem aos pêlos ou fibras

ordinárias de crescimentos irregulares e de estruturas diferentes da lã. Os folículos primários

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possuem um músculo erector da fibra, denominado “erector pili” que tem a função o

mecanismo de controle do calor, termorregulador, na superfície da pele.

Entre os 80 e 90 dias de vida intrauterina se verifica o aparecimento de folículos

menores, em torno das tríades de folículos primários e que são chamados de folículos

secundários; dos quais se origina a lã propriamente dita.

Figura 1. Corte da pele. Fonte: Lyne (1966), in Williams (1976).

Os folículos secundários diferenciam-se dos primários por:

Formação no feto aos 80-90 dias, enquanto que os primários são aos 40 dias.

Não possuem glândulas sudoríparas.

Não possuem músculo erecto.

A glândula sebácea é muito menor (unilobulada) e em alguns casos não existe.

O número de folículos secundários é variável, sendo influenciado por fatores

hereditários relacionados com a raça; com o aperfeiçoamento desta, com individualidade, com

a nutrição recebida pelo feto através da ovelha. Em média oscila entre 5 a 30 em torno de cada

tríada de folículos primários e esse número é determinado no momento de nascer o cordeiro, e

por sua vez determinará a quantidade de lã que o ovino poderá produzir e a pureza dela,

representada pela maior ou menor percentagem de pêlo em relação à lã pura.

As grandes diferenças em densidade de fibras no corpo de um ovino (número de

folículos por unidade de área) que ocorrem entre raças, são bem conhecidas; foi comprovado

que a densidade de folículos primários não significativamente diferente entre as distintas

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raças, e que a maior parte da diferença que ocorre entre raças é provocada pelas diferenças no

número de folículos secundários.

A população de folículos secundários se expressa habitualmente com referência a

população de folículos primários. Na Tabela 1, apresenta-se a relação folículo

secundário/primário (S/P) e a densidade folicular em algumas raças (Carter, 1955 citado por

Minola & Goyenechea, sem data).

Tabela 1. Densidade folicular em borregas de 1 ano. Fonte: Carter (1955) citado por Minola &

Goyenechea.

RAÇA FOLÍCULOS/mm2 RELAÇÃO S/P

Merino fino 71 25

Merino médio 64 22

Merino grosso 57 20

Ideal 50 13

Corriedale 28 10

Romney Marsh 22 6

Lincoln 14 5

A fibra de lã, em sua estrutura, apresenta três camadas (Figura 2):

Cutícula,

Cortícula (cortesa) e

Medula (que pode não aparecer).

Figura 2. Corte transversal da fibra de lã.

A primeira camada da fibra de lã, externa, é chamada de cutícula (Figura 3) e é

constituída por uma substância córnea denominada ceratina, apresentando células em forma

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de escamas de peixe ou de um telhado, sobrepostas umas as outras. A superposição das

células da cutícula é própria da lã.

O brilho da lã está na dependência dessas escamas; as fibras mais grossas com escamas

maiores e em menor quantidade, refletem mais facilmente a luz, parecendo por isso mais

lustrosas. O contrário ocorre com as lãs finas que absorvem a luz, perdendo o brilho.

A suavidade ao tato se deve também ao maior número de escamas por centímetro,

independente da maior presença de suarda.

Também é a cutícula responsável pela resistência e poder feltrante.

Cada célula escamosa consta de três capas: epicutícula, exocutícula e endocutícula.

A epicutícula é muito resistente aos agentes químicos e impede a entrada de corantes

durante o processo de tingir. Porém, por ser sensível aos tratamentos mecânicos, desaparece

durante o lavado e cardado.

A exo e endocutícula são suceptíveis aos ataques enzimáticos.

A capa cortical, também denominada de corteza, constitui o corpo da fibra (90%),

está protegida pela cutícula, é formada por células fusiformes e longas, cabendo a estas dar a

fibra a resistência, elasticidade e extensibilidade próprias da lã. As células corticais (Figura 4)

estão paralelas ao eixo da fibra de lã e estão formadas por fibrilas orientadas

longitudinalmente, conhecidas como macrofibrilas. As macrofibrilas estão rodeadas por uma

substancia cementante denominada matriz.

Figura 3. Estrutura cuticular de uma fibra de lã Merina. Fonte: Minola & Goyenechea, sem data.

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Figura 4. Esquema de uma célula cortical.

Cada macrofibrila está constituída por uma serie de microfibrilas de 8 Ä (Ä =

amstrong = milésima parte de 1 micra = milésima parte de 1 mm) de diâmetro, que por sua

vez estão formados por 11 protofibrilas de aproximadamente 2 Ä de diâmetro.

As protofibrilas estão integradas por 3 corpos moleculares helicoidais, denominados

de hélices alfa e estas estão formadas pela unidade básica das proteínas, os aminoácidos

(Figura 5).

Figura 5. Protofibrila.

CÉLULA CORTICAL formada por

MACROFIBRILAS constituída por uma serie de MICROFIBRILAS que estão formadas por 11 PROTOFIBRILAS estão integradas por 3 corpos moleculares helicoidais, chamados de HÉLICES ALFA estas estão formadas pela unidade básica das proteínas, os AMINOÁCIDOS (na fibra de lã foram individualizados 19 aminoácidos).

HELICE ALFA

Cadeias polipeptidas helicoidaes torcidas em grupo de três.

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A camada mais interna da fibra de lã, terceira camada, denominada medula, pode

aparecer ou não, pouco freqüente em lãs finas (<35micras).

A medula é formada por células superpostas de tamanho e forma irregulares, muitas

vezes poligonais, apresentando estrutura semelhantes com o favo de mel, contendo ainda ar,

no seu interior.

O aparecimento de medula na fibra de lã ocorre durante o processo de queratinização,

quando pode ocorrer que as células da camada cortical percam líquido e fiquem cheias de ar,

conservando ou não as membranas. No caso de rompimento das membranas, a medula

aparece como um canal oco no centro da fibra.

A medulação é uma característica indesejável, desvaloriza a lã, devido a que a

presença de ar dentro da fibra, provoca refração da luz, produzindo dificuldades no processo

de tingir, aparecendo as fibras meduladas como mais claras. Ao serem trabalhadas na

indústria não absorvem as tintas e dão certs aspereza ao tecido, o que muito o deprecia.

Ao longo da fibra e/ou nas fibras a medula pode apresentar-se de quatro maneiras

(Figura 6): (a)- continua (ocupa quase toda a fibra, é própria do pêlo morto, kemp),

(b)- descontinua (se estende sem interrupção ao longo da fibra, é característica dos pelos),

(c)- interrompida (é muito estreita e interrompida em alguns segmentos da fibra), e

(d)- fragmentada (presente só em alguns segmentos da fibra).

As fibras de lã que contém medula são chamadas de fibras heterotípicas.

(a) . (b) (c) (d)

(kemp) . (pêlo)...................(lã).......................(lã)

Figura 6. Tipos de medula (Widman, 1954; citado por Yates, 1967).

A lã grossa conhecida com o nome de “lã de cachorro”, que se observa na perna de

muitos ovinos, é quase toda ela formada por pêlos e fibras meduladas; isso é um defeito

grandemente transmissível por herança, devendo ser evitado a reprodução dos animais que o

apresentarem.

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Na Tabela 2, apresentam-se os distintos tipos de fibras que podem aparecer sobre a

pele do ovino e as principais características de cada uma dessas fibras e da lã não medulada.

Tabela 2. Tipos de fibra e suas principais características.

LÃ HETEROTÍPICA PELO KEMP

Sem medulação Medulação

descontínua

Medulação contínua

de espessura variável

Fortemente medulado

Superfície escamosa Superfície escamosa Superfície lisa Superfície lisa

Crescimento contínuo Crescimento contínuo Crescimento contínuo Crescimento

descontínuo

Diâmetro <40 micras Diâmetro <50 micras Diâmetro >50 micras Diâmetro >80 micras

Forma cilíndrica Forma cilíndrica. Se

encontram

normalmente em

velos de lã mediana e

grosa, raramente em

lãs finas.

Forma cilíndrica. Se

encontra geralmente

nos garrões dos

animais pouco

selecionados

(“Chilla”)

Forma aguzada em

ambos extremos

(fusiforme). Rígidas e

brancas. Encontradas

em cordeiros.

3.3. Formação e crescimento da fibra de lã.

A fibra de lã se forma no interior do folículo piloso e a proliferação celular no interior

do folículo começa aproximadamente durante o terceiro mês de vida fetal, emergindo a fibra

de lã sobre a superfície cutânea uns dias mais tarde.

A iniciação folicular começa aproximadamente aos 50-65 (SUL, 1987) ou, segundo

Minola & Goyenechea e Viera (1967), aos 40-50 dias de idade fetal, no caso dos folículos

primários, e mais ou menos aos 90 dias de idade fetal no caso dos folículos secundários.

Na Figura 7 se mostra o desenvolvimento progressivo de um folículo primário, e a

idade fetal aproximada em cada etapa. Cabendo destacar que transcorrem 35 e 40 dias entre a

iniciação do folículo e a aparição da fibra de lã na superfície da pele.

Os folículos primários se desenvolvem, inicialmente, na linha superior do corpo, da

cabeça até a cauda e na parte posterior, seguindo a direção da barriga e membros. Ao atingir

90 dias o feto já tem o corpo todo com um tipo de folículo, que se apresenta em grupos de três

(tríades). Esses folículos são chamados primários e dão origem a pêlos ou fibras ordinárias de

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crescimento irregular e de estrutura diferente da lã, que é característica dos ovinos inferiores,

sem seleção, cujo velo tem maior predominância de pêlos. Estas fibras ordinárias dos

folículos primários estão presentes em raças melhoradas e podem ser observadas nos

cordeiros, durante os primeiros dias de nascidos e vão caindo até desaparecerem.

Figura 7. Desenvolvimento do folículo primário. Fonte: Lyne (1966), citado por WILLIAMS

(1976).

Os folículos primários dão origem a pêlos que, não têm crescimento continuo e caem

periodicamente, mas podem dar origem também a fibras que, ao contrário, crescem

indefinidamente, mas que não possuem a pureza da lã.

É a partir dos 90 dias do período fetal do cordeiro, que se verifica o aparecimento de

folículos menores, entorno das tríades de folículos primários e que são denominados de

folículos secundários, dos quais se origina a lã propriamente dita. O número desses folículos é

variável, sendo influenciado por fatores hereditários relacionados com a raça; com o

Glândula sebácea

Músculo erector

Glândula sebácea

Glândula sudorípara

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aperfeiçoamento desta, com individualidade, com a nutrição recebida do feto através da

ovelha. Em média oscila entre 5 a 30 folículos secundários entorno de cada tríade de folículos

primários e esse número é determinado no momento de nascer o cordeiro, e por sua vez

determinará a quantidade de lã que o ovino adulto poderá produzir e a pureza dela,

representada pela maior ou menor percentagem de pêlos em relação à lã pura.

No momento do parto o cordeiro tem sua dotação completa de folículos (primários e

secundários), embora não todos serão funcionais.

A maturação folicular, ou seja, o começo da atividade dos folículos inicia no caso dos

primários aos 100-110 dias de vida fetal e no caso dos secundários aos 120-130 dias,

continuando até o primeiro ano de vida extrauterina.

Portanto, a alimentação durante este período tem um papel fundamental sobre a

produção de lã.

Os ovinos primitivos apresentavam uma cobertura muito diferente das que possuem as

raças atuais; tinham dois tipos de fibras diferentes. Uma representada por pêlos longos e

grossos e outra por uma lã muito fina, curta e ondulada (felpa) ou “lanilha”, entremeada na

base da anterior (Figura 8). Este tipo de cobertura em duas capas, ainda se encontra não só em

variedades selvagens, como também em algumas raças como a Karakul, Black face, Crioula,

etc..., que não sofreram uma seleção nesse sentido.

Neste tipo de velo o pêlo impede a penetração da água da chuva e a “lanilha” basal

atua como isolante térmico (Figura 8).

Figura 8. Esquema da dupla cobertura dos animais de velos primitivos. Fonte: Minola

& Goyenechea.

Pêlos longos e grossos

Lanilha curta e fina

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Parece interessante salientar que o desenvolvimento relativo destas duas capas varia

com as condições climáticas sob as quais vivem os animais; pois, a função principal da lã é

propicia abrigo e conforto ao próprio animal.

Entretanto, mediante seleção continua ao longo dos anos o homem transformou a

produção de lã dos ovinos que servia exclusivamente de abrigo (pêlo e lã) em uma produção

econômica (lã) de excelente qualidade e em muito maior quantidade.

Nas raças, selecionadas para produção de lã, o crescimento contínuo das fibras

excedem em muito as necessidades de conservação da temperatura corporal e, passa a ser uma

carga insuportável para o animal se não for retirada através da tosquia. Entretanto, a melhora

sistemática das características das fibras de lã é uma necessidade constante porque: ainda não

conseguimos um padrão quantitativo e qualitativo, nas lãs dos ovinos criados no Brasil

(especialmente Rio Grande do Sul), nos níveis de outros Países produtores como Austrália,

Nova Zelândia, Uruguai e Argentina e, porquê, mesmo nesses Países citados, as pesquisas e

os programas de melhoramento continuam para atender um mercado consumidor cada vez

mais exigente e/ou que apresenta mudanças.

3.4. Propriedades da fibra de lã.

Enquanto as fibras vegetais têm como princípio básico da sua composição química a

celulose, que é um hidrato de carbono, a lã, como as fibras de origem animal, é formada por

um composto protéico, denominado ceratina que é representada pela fórmula

C42H157O15N5S15.

Comparando-se a fórmula química da lã com a do algodão e da sêda que são as

seguintes:

Algodão C6H10O5

Seda C24H38O8N8

Lã C42H157O15N5S15

Verifica-se que a diferença está no elemento Nitrogênio (N) presente nas fibras de origem

animal e na presença do enxofre (S) que só se verifica na lã.

A composição química da lã é a seguinte:

Carbono 52 %, Oxigênio 22 a 25 %, Nitrogênio 16 a 17 %,

Hidrogênio 7 % e Enxofre 3 a 4 %.

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A seguir, de forma resumida, serão apresentadas as principais propriedades da fibra de

lã.

Diâmetro é a espessura da fibra de lã, também se utiliza o termo finura da fibra de

lã; normalmente, diâmetro para quando a determinação é realizada de maneira objetiva

(microscópio, Air Flow, ...) e finura para quando a determinação é subjetiva (visual).

O diâmetro de cada fibra oscila entre 10 e 60 micros (milésimos de milímetro) e varia

de acordo com a raça (Merino mais fina e Lincoln mais grossa), variedade, indivíduo, idade,

sexo, região do corpo (paleta é mais fina, costilhar é intermediária e a perna é a mais grossa),

alimentação, meio ambiente, etc... ; estudo realizado por Whiteley (1975) mostra que a maior

variação do diâmetro das fibras de lã está dentro da própria mecha (Tabela 3).

Tabela 3. Componentes da variação do diâmetro das fibras no Merino. % da variação total.

LÃ NORMAL LÃ DÉBIL

DENTRO DE MECHA Ao longo da fibra 16 % 43 %

Entre fibras na mecha 64 % 43 %

ENTRE MECHAS

DENTRO DO VELO

4 % 3 %

ENTRE VELOS 16 % 11 %

Na realidade a variação de diâmetro das fibras de lã que mais interessa do ponto de

vista do processamento textil é a que ocorre ao longo da fibra e não entre as fibras. Uma vez

que fibras com marcadas diferenças de diâmetro ao longo da fibra rompem mais no cardado e

penteado que fibras uniformes, produzindo tops de fibras mais curtas.

No que se refere ao processamento textil, o diâmetro das fibras de lã é a característica

mais importante, já que determina a utilização final da lã. Estimativas mostram que o

diâmetro apresenta uma importância relativa de 80% no preço da lã.

Lãs mais finas são utilizadas para fabricação de artigos de vestuário, suaves e de

grande qualidade. As lãs com finuras medianas são empregadas para confecção de tecidos

medianos e pesados. As lãs mais grossas se destinam a almofadas.

A principal razão para explicar a grande importância do diâmetro médio das fibras de

lã, é sua influência sobre o limite de fio, o qual expressa a grossura mínima que deve ter o fio

fabricado.

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Considerando que se precisa um mínimo de 40-50 fibras na secção transversal do fio,

para fabricar um fio de boa qualidade, quanto mais finas forem as fibras, mais finos podem

ser os fios produzidos por elas. Isto representa uma maior flexibilidade e a possibilidade de

utilização para um maior número de produtos. Enquanto que com fibras de lã grossas só se

pode fabricar fios grossos; com lãs finas se podem produzir tanto fios finos como grossos.

Em um fio de determinada grossura, se as fibras são mais finas, haverá um maior

número destas, o que resulta em uma maior regularidade do fio, maior resistência e maior

suavidade.

Comprimento depois da finura, a propriedade mais importante é o comprimento da

fibra; representa 15-20% do preço e do comprimento da fibra depende o destino que será dado

a lã durante o processo industrial.

As lãs de maior comprimento, mínimo de 7 cm, dependendo da máquina, são

destinadas ao processo de penteado e as mais curtas ao cardado. Portanto, o comprimento é

muito importante na classificação das lãs e é determinante da qualidade desta.

Um conjunto de fibra, forma a mecha e, normalmente o que se verifica é o

comprimento médio da mecha; que varia de acordo com a nutrição, raça, região do corpo,

sanidade, de indivíduo para indivíduo, etc...

Resistência é o esforço a tração que pode suportar uma fibra ou conjunto de fibras

“mecha”. Na prática a resistência é determinada tomando com os dedos as extremidades e

estirando fortemente e, de forma mais precisa, através de aparelho, dinamômetro.

Normalmente, as lãs de maior diâmetro são mais resistentes.

Sua importância está diretamente relacionada com o comprimento de mecha e, influi

sobre a resistência: a sanidade, alimentação, etc.

Por exemplo, uma fibra de lã de 30 micra de diâmetro, tem uma resistência a tração de

16 gramas. A mesma fibra, mas debilitada, resiste a 11 gramas. Há um mínimo de resistência

necessário para que a lã possa ser trabalhada na industria; esse mínimo era de 8,5 gramas,

para lãs de 30 micra. Hoje com o avanço tecnológico das máquinas e dependendo do destino

da lã, os valores devem ser diferentes.

Elasticidade é a propriedade da lã de quando é solta, depois de estirada, voltar ao

comprimento natural. Quanto mais fina a lã, maior é a sua elasticidade.

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Flexibilidade é a propriedade da lã de ser torcida sem prejudicar sua estrutura.

Higroscopicidade é a propriedade da lã de absorver água da atmosfera. A lã é

capaz de absorver até 50% (Minola & Goyenechea) ou 40% (Vieira, 1967) ou 1/3 (SUL,

1987) do seu próprio peso sem que se produza escorrimento. Porém, em condições normais, o

índice higroscopicidade da lã é de 16 a 18%.

Cor A industria interessa que a lã seja o mais branca possível; mas, a cor após o

lavado é que é importante.

Resistência ao fogo a lã apresenta resistência natural ao fogo; incendeia a

temperaturas relativamente elevadas e apresenta uma tendência limitada a produzir chama;

costuma-se dizer que a lã não é incandescente.

Feltramento ou poder feltrante, é a capacidade das fibras de lã se entremearem

umas as outras.

3.5. Classificação comercial da lã.

Como foi visto, há uma diferença entre as fibras de lã produzidas pelos ovinos, que

por fatores intrínsicos ou extrínsicos ao animal e, por outro lado, o destino dessa lã é dado por

suas características as mais variadas utilidades, desde penteado ou cardado pela industria até

verdadeiras obras de arte em trabalhos manuais. Assim, há uma necessidade de uma avaliação

da lã e procurar juntar o parecido com o parecido de acordo com as características do

mercado.

No Brasil (Decreto-lei nº7.197 de 27 de dezembro de 1944, alterado pelo Decreto-lei

nº1.017 de 27 de dezembro de 1949), a lã é classificada comercialmente de acordo com a

sua origem, finura e qualidade. Normalmente, no mercado internacional há uma relação

com a Classificação Inglesa ou Escala de Bradford, que corresponde ao rendimento teórico

que ela pode produzir em fio, baseado na sua finura média e consiste em número que expressa

a quantidades de meadas de lã, com 560 jardas de extensão de fio que se pode obter com uma

libra de lã lavada. Assim, quando se diz que uma lã é 80´s, significa que uma libra de lã

lavada desse têxtil produzirá 80 x 560 = 44.800 jardas de fio. Sendo 1 jarda = 0,911 metros e

18

1 kg = 2,2046 libras, logo 1 kg de lã lavada 80´s deve produzir teoricamente 76.000 metros de

fio.

Quanto a origem a lã é classificada em nove categorias: lã de velo, lã de borrego, lã de

retosa, lã de pelêgo, lã de desborde, lã de pata e barriga, lã de capacho, lã de campo e lã preta

ou moura. No livro de Vieira, consta uma 10ª categoria que é “resíduo de lã”.

Lã de velo é aquela produzida nas diversas regiões do corpo de um ovino, com

exceção das patas e barriga durante o período de 12 meses. Quanto a finura a lã de velo é

classificada em Merina (22 micra, ou 64´s a 70´s), Amerinada (22,1 a 23,4 micra ou 60´s a

64´s), Prima A (23,5 a 24,9 micra ou 60´s), Prima B (25 a 26,4 micra ou 58´s), Cruzas finas 1

(26,5 a 27,8 micra ou 56´s) e 2 (27,9 a 30,9 micra ou 50´s), Cruza média 3 (31 a 32,6 micra ou

48´s), Cruzas grossas 4 (32,7 a 34,3 micra ou 46´s) e 5 (34,4 a 36,1 micra ou 44´s) Cruza 6

(36,2 micra ou 36 a 40´s) e Crioula.

Dentro de cada finura, a lã de velo é dividida de acordo com a sua qualidade em cinco

tipos: Supra, Especial, Boa, Corrente e Mista.

A determinação da qualidade da lã, comercialmente, é subjetiva e visual; mas, leva em

consideração, principalmente, o comprimento médio das mechas de um velo e, também

considera a uniformidade do diâmetro das fibras no velo, a resistência das fibras, a cor e a

limpeza do velo. Não entraremos nos detalhes das características referentes a qualidade, mas,

recomendamos sua leitura no livro de “Criação de Ovinos” do professor Geraldo Velloso

Nunes Vieira.

Lã de borrego é aquela produzida pela primeira tosquia de ovino que ainda não

alcançou a idade de um ano, com mechas pouco consistentes e sem ligação entre si,

evidenciando na extremidade superior as pontas retorcidas, característica que a torna

inconfundível. A lã de borrego compreende duas classes de acordo com a finura: Fina (de

merina a prima b) e Cruza (mais grossas que cruza1).

Lã de retosa é a que procede da tosquia dos animais antes de completo o período

de 12 meses de crescimento; normalmente, metade do comprimento; é constituída de mechas

soltas e apresenta semelhança com a lã de borrego, diferenciando-se apenas pela terminação

da ponta que não é retorcida. Nesta categoria existem duas classes: Fina (de merina a prima b)

e Cruzas (mais grossas que cruza 1).

Lã de pelego é a lã obtida pela tosquia das peles de ovinos mortos para consumo.

Pode ser cortada ou extraída por processo químico. Esta categoria comporta duas classes

19

segundo o processo de extração: tosquia, quando obtida mecanicamente e curtume, quando

obtida pelo processo químico, usado nos curtumes.

Cada uma dessas classes pode ser dividida em três tipos: curta (menos de 3 meses de

crescimento), quarto de lã (3 a 6 meses de crescimento) e meia lã (seis ou mais meses de

crescimento).

Lã de desborde é a lã que resulta do trabalho de classificação e limpeza das outras

lãs nas mesas de classificação; portanto, como não poderia deixar de ser, já que devido a sua

origem compõe-se de pedaços de quase todas as classes e tipos de lãs, é muito heterogênea.

Porém, comercialmente de maior valor que as lãs procedentes das patas e barriga do ovino.

Lã de pata e barriga também denominada de lã de garreio, que é aquela produzida

nas pernas, barrigas e cabeças (embora a quantidade de lã desta última região seja pouca) dos

ovinos e que tem por características fibras geralmente crespas, sem formar mechas, porém,

entrelaçadas, com finura, comprimento e coloração muito variáveis, suarda misturada com

impurezas que lhe emprestam aspecto desagradável. Apresenta pêlos e “kemps” misturados

com fibras de lã.

Lã de capacho é a lã de velo cujas fibras sofreram feltramento intenso, tornando

impossível a divisão do velo nas suas diferentes partes. Normalmente, utiliza-se de máquina

especial para que possa ser aproveitada pela industria. Esta classe é dividida em dois tipos:

fino e grosso.

Lã de campo é a proveniente de animais encontrados mortos e cuja lã sofreu ação

das intempérias. Caracteriza-se pela cor branco-escura, com tons esverdeados.

Lã preta ou moura é a que provém de ovinos pretos, pardos ou mouros e,

compreende duas classes: fina (finura entre as lãs merinas e prima b, ou seja, diâmetro inferior

a 58´s) e grossa (lãs mais grossas, acima de cruza 1, ou seja, diâmetro de 56´s a 40´s na

classificação inglesa ou escala de Bradford).

Resíduos de lã também denominada por aparas ou ponta de mesa, é uma lã

heterogênea desprendida naturalmente dos velos, durante a operação de classificação. Em

muitas cooperativas fazia parte da lã de desborde.

Comercialmente, são classificadas em separado as lãs que apresentam defeitos, como:

lã com sarna, lã manchada ou queimada, lã epidêmica, lã com semente, lã terrosa, lã arenosa,

lã rosada, cujas descrições estão no próprio nome.

20

3.6. Produção de lã.

A produção de lã está relacionada a raça, que é fator limitante da quantidade e

qualidade. Igualmente, o clima influi na produção e qualidade da lã.

A partir do século XVIII já se encontram referências sobre a existência de ovinos no

Rio Grande do Sul, onde se produz a quase totalidade da lã.

Conforme descrito no livro do Dr. Geraldo Velloso Nunes Vieira, em 1797 a base do

rebanho ovino do Rio Grande do Sul era da raça Crioula, de lã grossa, destinada a pelego,

ponchos e artigos mais grosseiros; mas, nessa época, iniciou-se a introdução da raça Merina,

que cruzada com as ovelhas Crioulas, então existentes, melhorava a qualidade da lã. A

produção de lã, além da melhora qualitativa, teve melhora quantitativa significante, nessa

época, uma vez que, de 1797 para 1859, passou de 17.000 para 800.000 ovinos no rebanho

gaúcho.

No início do século XX, com o início da exportação de carne pelos países vizinhos do

Prata, a raça Merina que vinha sendo usada como melhoradora dos rebanhos crioulos passou a

ser, em parte, substituída por raças inglesas de maior porte, como a Lincoln, Romney Marsh e

outras como as chamadas "Cara Negra", em forma de cruzamentos alternados com o Merino.

A valorização da lã, decorrente da guerra de 1914, influiu no interesse pela criação de

ovinos com aptidões para lã e carne. O rebanho no Rio Grande do Sul, de 2.317.000 cabeças

em 1905 (Vieira, 1967) evoluiu para 12.157.357 (Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística – IBGE) em 1970, diminuindo para 10.696.237 (IBGE) em 1980, permanecendo

estável 10.808.410 (Universidade Católica de Pelotas - Instituto Técnico de Pesquisa e

Assessoria – UCPEL-ITEPA) em 1985, começando leve decréscimo 9.298.181 (UCPEL-

ITEPA) em 1995, acentuado decréscimo 4.812.477 em 2000 e 3.326.585 em 2006 (IBGE).

Quanto à produção de lã, em 2007 e 2008 foram tosquiados no Brasil, respectivamente,

3.795.780 e 3.938.338 ovinos, com acréscimo de 3,76% e uma produção de lã de 11.160.341

21

e 11.642.072 kg, correspondendo a um aumento de 4,32% (Equipe FarmPoint, com dados do

IBGE, em 23/11/2009).

O efetivo de ovinos no Brasil é de 16,812 milhões de cabeças e em crescimento. A

região Sul tem participação significativa na formação desse rebanho, sendo o maior estado

produtor o Rio Grande do Sul com 23,5% do efetivo, composto por ovinos lanados e o

segundo maior produtor de ovinos a Bahia, com 18% do efetivo, composto por animais

deslanados.

A produção de lã concentra-se em poucos Estados produtores, sendo o Rio Grande do

Sul o maior produtor, com 91,6% do total nacional. A seguir, vem o Paraná, com 4,6%, e

Santa Catarina, com 2,3%.

Certamente, tanto o rebanho como a produção de lã dos Estados do Sul estão muito

aquém dos tempos passados, assim como a qualidade dessa lã; mas tudo indica ser o começo

de uma retomada para a ovinocultura. Corroborado por estudos de mercado que indicam que

as raças laneiras e as raças mistas concentram grande parte do rebanho mundial, o que torna a

lã um dos principais produtos derivados da ovinocultura, e que as tendências para o mercado

ovino são promissoras (Viana, 2008), sendo a ovinocultura uma atividade rentável a médio

prazo e a comercialização da lã apresenta parcela significativa da receita total (Viana e

Silveira, 2009).

Na evolução da ovinocultura destaca-se a criação do Serviço de Peles e Lã (1938), a

fundação da Associação Rio-grandense de Criadores de Ovinos (ARCO, 1942), a

classificação oficial da lã (1944), as três primeira cooperativas de lã (1945). Para atender a

classificação de lã, foram criadas 22 cooperativas no Rio Grande do Sul e uma em Lages

(SC). Foi implantada a Laneira Brasileira S.A. (1950) e a Federação das Cooperativas de Lãs

em 1952.

22

Em 1975 foi criado o Laboratório de Lãs no Departamento de Zootecnia da Faculdade de

Agronomia Eliseu Maciel da Universidade Federal de Pelotas e, em 1977, o Programa de

Melhoramento Genético dos Ovinos (PROMOVI) para seleção por peso de velo limpo e

qualidade da lã, por meio de medidas objetivas (diâmetro das fibras, comprimento de mecha,

medulação, peso corporal); e este programa em 1978 passou para a Associação Brasileira de

Criadores de Ovinos (ARCO) com o apoio do Ministério da Agricultura e implementação de

quatro laboratórios para avaliação da lã (na Universidade Federal de Pelotas e de Santa Maria,

em Uruguaiana e Bagé).

O valor da lã compensava a manutenção de capões (machos adultos castrados) com a

finalidade de produção de lã com mais qualidade, cujo percentual desta categoria no rebanho

do Rio Grande do Sul, na década de 1970, era de 21,6%, segundo levantamento do efetivo da

população ovina, executado em janeiro de 1975, quando a população era de 11.908.563

ovinos distribuídos entre 39.594 criadores (Rio Grande do Sul, 1975).

A produção de lã cresceu em quantidade e qualidade até o início da década de 1990,

quando começou seu decréscimo em função de modificações ocorridas nos mercados

externos, com a crescente interdependência da economia e a falta de proteção ao produto lã

(Nocchi, 2001). Vale destacar também como desencadeante da crise da lã, a colocação do

estoque de lã pela Austrália, a abertura da China (deixando de ser o grande importador) e a

introdução das fibras sintéticas.

Mas, cabe salientar, que a entrada dos fios sintéticos no mercado das fibras têxteis,

com preços altamente competitivos aos produtos naturais, provocou um reestudo nas fontes

de produção de lãs, tanto em nível de setor primário como secundário, evidenciando a

necessidade de um aprimoramento do rebanho ovino com vistas ao aumento da produtividade

e a melhoria da qualidade das lãs. No aspecto qualidade, os fios sintéticos atuaram

estimulando a produção de melhores lãs, pela utilização das lãs de melhor qualidade na

23

mescla do fio sintético e lã para confecção de tecidos e, no mercado, o fio sintético agiu como

elemento regulador do preço das lãs finas, evitando mudanças bruscas na cotação desse tipo

de produto (Rio Grande do Sul, 1975).

Mas a produção de lã, longe de ser uma exploração deficitária, tem boas perspectivas

na ovinocultura brasileira (especialmente do Rio Grande do Sul) como salientou o presidente

do Secretariado Uruguayo de la Lana (SUL), Gerardo García Pinto, por ocasião de sua

conferência e participação na mesa redonda da FENOVINOS (2009), promovida pela

Associação de Veterinários da Zona Sul e Associação Rural de Pelotas, oportunidade em que

colocou o presidente do SUL que todos os anos o Laboratório de lãs é ampliado em função da

demanda e da importância e boa valorização que vem acontecendo com a lã.

Estudo realizado sobre o comportamento dos preços dos produtos derivados da

ovinocultura no Rio Grande do Sul, no período de 1973 a 2005 (Viana e Souza, 2007), mostra

que a lã apresentou uma queda acentuada de preço no período em comparação com a carne

ovina, e após a crise do setor, entre o final da década de 1980 e início da década de 1990, os

preços apresentaram um comportamento mais estável, sem grandes variações e, dizem os

autores, que após 1995 a ovinocultura passa por uma recuperação de preços em termos reais e

por uma estabilização nos mercados, o que aumenta a rentabilidade e reduz os riscos dessa

atividade. Assim, com melhores remunerações e menores riscos, a produção ovina voltou a

ser uma boa alternativa aos pecuaristas nos últimos anos.

Em outro estudo (Viana e Silveira, 2009), ficou evidenciado que a ovinocultura é uma

atividade rentável a médio prazo e essa rentabilidade é determinada pelo saldo positivo da

renda operacional agrícola. Salientam os autores que a carne se tornou o principal produto de

comercialização da ovinocultura nos últimos anos, mas os dados das análises mostram que a

carne participa, em média, com 54% da renda bruta total e a lã com 46%; demonstrando esses

24

dados a importância da lã no sistema produtivo de raças mistas, gerando receitas significativas

e contribuindo para os resultados econômicos positivos da exploração.

Em reportagem sobre economia, Vitor Abdala salienta que em 2011 o Brasil produziu

11,8 toneladas de lã, sendo 1,4% maior do que o ano anterior e o preço valorizado em 35,9%

(http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2012-10-18/producao-de-la-cresceu-14-e-de-

casulos-de-bicho-da-seda-teve-queda-de-118). Publicações recentes na revista cabra e ovelha

(edições números 69 e 75 de 2012) a revalorização da lã enfim chegou

(http://www.cabraeovelha.com.br/website/Edicoes.php?e=69&c=692&d=0 e

http://www.cabraeovelha.com.br/website/Edicoes.php?e=75&c=758&d=0).

Portanto, pode-se e deve-se explorar a carne e lã, ainda mais que não existe

antagonismo entre a produção de carne e lã. Animais mais pesados terão maior peso de velo

(lã), e, velos mais pesados apresentam maior comprimento de fibras (característica

relacionada à qualidade da lã). Por outro lado, pode-se manter o diâmetro das fibras dentro

dos padrões das raças. Corrobora com a expectativa positiva para a criação ovina e produção

de lã, a tese levantada pelo Dr. Saturnino Epaminondas de Arruda, em 1908, e as perspectivas

e oportunidades de um agronegócio rentável para a ovinocultura em geral e para lã,

particularmente (Osório et al., 2008).

3.7. Fatores que influem na produção de lã.

Existem fatores intrínsicos ao animal ou ambientais internos como a idade, o sexo, o

efeito materno e o comportamento reprodutivo e os fatores extrínsicos ao animal ou

ambientais externos como o clima a nutrição e a sanidade.

Idade a máxima produção de lã esta entre o segundo e terceiro ano de vida do

animal e, a partir do terceiro ano diminui entre 2 e 4% ao ano (SUL, 1987). Assim, quando a

base da finalidade produtiva é a lã ou quando esta representa um ingresso significativo em

uma propriedade, deve-se evitar a permanência de animais velhos no rebanho. Como também,

quando a seleção é realizada por peso de velo, em ovelhas ou animais de diferentes idades, há

necessidade de utilizar fatores de correção, para que a potencialidade genética possa ser

devidamente comparada (Osório, 1979).

Sexo os carneiros produzem mais lã que os capões e estes mais que as ovelhas.

25

Efeito materno os animais filhos de borregas ou nascidos como gêmeos produzem,

ao chegar a idade adulta, entre 5 e 10% menos de lã que os filhos de ovelhas adultas e de

partos simples. Essa diferença deve-se ao menor número de folículos secundários formados

durante a gestação e a menor quantidade de leite que recebe os filhos de borregas e de partos

múltiplos, o que influiria na maturação dos folículos secundários.

Portanto, ao realizar seleção o efeito destes fatores devem ser retirados.

Comportamento reprodutivo tanto a gestação como a lactação, apresentam um

efeito negativo sobre a produção de lã em ovelhas; normalmente, as ovelhas falhadas

produzem entre 4 e 12% mais de lã que as que gestaram um cordeiro, e estas por sua vez

produzem de 4 a 12% mais de lã que as que gestaram gêmeos, dependendo do nível de

alimentação no último terço da gestação. Por sua vez a lactação reduz o peso de velo em 5 –

8%. Estima-se que o efeito total da gestação + lactação seja de 10 a 14%, na redução da

produção de lã, em condições de uma boa alimentação e de 20 a 25%, quando a alimentação é

pobre (SUL, 1987).

A reprodução não somente afeta a quantidade de lã, mas, também a qualidade desta,

como mostram os trabalhos de Brown et al. (1966) e Osório (1979), com a raça Ideal, nas

condições do Rio Grande do Sul. Neste último artigo, verificou-se diminuição do

comprimento das fibras.

O efeito da reprodução ao diminuir a atividade folicular, pode levar a um

estrangulamento das fibras, ocasionando uma diminuição na resistência das mesmas.

Clima influi indiretamente sobre a produção de lã, através do seu efeito sobre a

quantidade e qualidade dos pastos consumidos pelos animais, especialmente para as

condições extensivas com alimentação a base de campo nativo, caso do Rio Grande do Sul.

Estudo realizado com ovelhas vazias da raça Romney Marsh, na Nova Zelândia, nas

mesmas condições nutritivas durante todo o ano, mostra um efeito no crescimento da lã ao

longo do ano.

Nutrição influi sobre a produção de lã, uma vez que é determinante do número de

folículos, que vai originar o número total de fibras e do tamanho das fibras, ou seja, o

comprimento e diâmetro das fibras.

A partir dos 40 dias de vida fetal inicia-se a formação dos folículos e a maturação

destes vai até 1 ano de vida extra-uterina. Portanto, para que a formação e maturação dos

folículos, que vão originar a fibra de lã, não seja comprometida é importante uma boa

alimentação nesse período.

26

Em um ovino adulto a nutrição está diretamente relacionada com o diâmetro das fibras

e o comprimento destas, portanto, com a quantidade e qualidade da lã.

O professor Jorge Lopez, na Sétima Parte, Capítulos XXII, XXIII e XXIV, do livro

Criação de Ovinos, de autoria do professor Geraldo Velloso Nunes Vieira, aborda com

riquezas de detalhes o efeito da alimentação sobre a produção de lã; recomenda-se sua leitura,

aos que forem trabalhar com esse tema.

3.7. Considerações e conclusões.

A lã sempre teve importante utilização pelo homem.

O conhecimento da formação, maturação, estrutura da pele e da fibra de lã e de suas

propriedades são básicos para uma avaliação da qualidade desse produto; assim como, para

incrementar a produção quanti-qualitativa da lã em ovinos é necessário não somente esses

princípios como também conhecer os fatores que influem sobre essa finalidade produtiva dos

ovinos.

A produção e qualidade da lã estão diretamente relacionadas com a formação e

maturação dos folículos primários e secundários da fibra de lã.

É importante uma avaliação comercial das lãs produzidas para que ocorra uma

remuneração justa.

O sistema de classificação comercial das lãs mostrou ser um método idôneo e

eficiente; mas, em função das mudanças ocorridas, deverá sofrer uma adaptação e uma

revisão sistemática para se adequar às condições e exigências do mercado e a realidade da

cadeia produtiva. Possivelmente, uma avaliação mais detalhada na origem.

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