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Para Aristóteles o homem deveria ser correto virtuoso e ético A palavra ética é de origem grega derivada de ethos, que diz respeito ao costume, aos hábitos dos homens. Teria sido traduzida em latim por mos oumores (no plural), sendo essa a origem da palavra moral. Uma das possíveis definições de ética seria a de que é uma parte da filosofia (e também pertinente às ciências sociais) que lida com a compreensão das noções e dos princípios que sustentam as bases da moralidade social e da vida individual. Em outras palavras, trata-se de uma reflexão sobre o valor das ações sociais consideradas tanto no âmbito coletivo como no âmbito individual. O exercício de um pensamento crítico e reflexivo quanto aos valores e costumes vigentes tem início, na cultura ocidental, na Antiguidade Clássica com os primeiros grandes filósofos, a exemplo de Sócrates, Platão e Aristóteles. Questionadores que eram, propunham uma espécie de “estudo” sobre o que de fato poderia ser compreendido como valores universais a todos os homens, buscando dessa forma ser correto, virtuoso, ético. O pano de fundo ou o contexto histórico nos qual estavam inseridos tais filósofos era o de uma Grécia voltada para a preocupação com a pólis, com a política. A ética seria uma reflexão acerca da influência que o código moral estabelecido exerce sobre a nossa subjetividade, e acerca de como lidamos com essas prescrições de conduta, se aceitamos de forma integral ou não esses valores normativos e,

Ètica- Lorena

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Para Aristóteles o homem deveria ser correto virtuoso e ético

A palavra ética é de origem grega derivada de ethos, que diz

respeito ao costume, aos hábitos dos homens. Teria sido traduzida

em latim por mos oumores (no plural), sendo essa a origem da

palavra moral. Uma das possíveis definições de ética seria a de que

é uma parte da filosofia (e também pertinente às ciências sociais)

que lida com a compreensão das noções e dos princípios que

sustentam as bases da moralidade social e da vida individual. Em

outras palavras, trata-se de uma reflexão sobre o valor das ações

sociais consideradas tanto no âmbito coletivo como no âmbito

individual.

O exercício de um pensamento crítico e reflexivo quanto aos

valores e costumes vigentes tem início, na cultura ocidental, na

Antiguidade Clássica com os primeiros grandes filósofos, a exemplo

de Sócrates, Platão e Aristóteles. Questionadores que eram,

propunham uma espécie de “estudo” sobre o que de fato poderia

ser compreendido como valores universais a todos os homens,

buscando dessa forma ser correto, virtuoso, ético. O pano de fundo

ou o contexto histórico nos qual estavam inseridos tais filósofos era

o de uma Grécia voltada para a preocupação com a pólis, com a

política.

A ética seria uma reflexão acerca da influência que o código moral

estabelecido exerce sobre a nossa subjetividade, e acerca de como

lidamos com essas prescrições de conduta, se aceitamos de forma

integral ou não esses valores normativos e, dessa forma, até que

ponto nós damos o efetivo valor a tais valores.

Segundo alguns filósofos, nossas vontades e nossos desejos

poderiam ser vistos como um barco à deriva, o qual flutuaria

perdido no mar, o que sugere um caráter de inconstância. Essa

mesma inconstância tornaria a vida social impossível se nós não

tivéssemos alguns valores que permitissem nossa vida em comum,

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pois teríamos um verdadeiro caos.  Logo, é necessário educar

nossa vontade, recebendo uma educação (formação) racional, para

que dessa forma possamos escolher de forma acertada entre o

justo e o injusto, entre o certo e o errado.

Assim, a priori, podemos dizer que a ética se dá pela educação da

vontade. Segundo Marilena Chauí em seu livro Convite à Filosofia

(2008), a filosofia moral ou a disciplina denominada ética nasce

quando se passa a indagar o que são, de onde vêm e o que valem

os costumes. Isto é, nasce quando também se busca compreender

o caráter de cada pessoa, isto é, o senso moral e consciência moral

individuais. Segundo Chauí, podemos dizer que o Senso Moral é a

maneira como avaliamos nossa situação e a dos outros segundo

ideias como a de justiça, injustiça, bom e mau. Trata-se dos

sentimentos morais. Já com relação à Consciência Moral, Chauí

afirma que esta, por sua vez, não se trata apenas dos sentimentos

morais, mas se refere também a avaliações de conduta que nos

levam a tomar decisões por nós mesmos, a agir em conformidade

com elas e a responder por elas perante os outros. Isso significa ser

responsável pelas consequências de nossos atos.

Assim, tanto o senso moral como a consciência moral vão ajudar no

processo de educação de nossa vontade. O senso moral e a

consciência moral tem como pressuposto fundamental a ideia de

um agente moral, o qual é assumido por cada um de nós. Enquanto

agente moral, o indivíduo colocará em prática seu senso e

consciência, pois são importantes para a vida em grupo entre vários

outros agentes morais.

Logo, o agente moral deve colocar em prática sua autonomia

enquanto indivíduo, pois aquele que possui uma postura de

passividade apenas aceita influências de qualquer natureza. Assim,

consciência e responsabilidade são condições indispensáveis à vida

ética ou moralmente correta.

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Paulo Silvino Ribeiro

Colaborador Brasil Escola

Bacharel em Ciências Sociais pela UNICAMP - Universidade

Estadual de Campinas

Mestre em Sociologia pela UNESP - Universidade Estadual Paulista

"Júlio de Mesquita Filho"

Doutorando em Sociologia pela UNICAMP - Universidade Estadual

de Campinas

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Prof. José Roberto GoldimA seguir são apresentadas algumas idéias de diferentres autores sobre o que é Ética e as suas definições mais usuais.

        Ética é uma palavra de origem grega, com duas origens possíveis. A primeira é a palavra grega éthos, com e curto, que pode ser traduzida por costume, a segunda também se escreve éthos, porém com e longo, que significa propriedade do caráter. A primeira é a que serviu de base para a tradução latina Moral, enquanto que a segunda é a que, de alguma forma, orienta a utilização atual que damos a palavra Ética.

        Ética é a investigação geral sobre aquilo que é bom.

Moore GE. Princípios Éticos. São Paulo: Abril Cultural, 1975:4

 

        A Ética tem por objetivo facilitar a realização das pessoas. Que o ser humano chegue a realizar-se a sí mesmo como tal, isto é, como pessoa. (...) A Ética se ocupa e pretende a perfeição do ser humano.

Clotet J. Una introducción al tema de la ética. Psico 1986;12(1)84-92.

 

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        A Ética existe em todas as sociedades humanas, e, talvez, mesmo entre nossos parentes não-humanos mais próximos. Nós abandonamos o pressuposto de que a Ética é unicamente humana.         A Ética pode ser um conjunto de regras, princípios ou maneiras de pensar que guiam, ou chamam a si a autoridade de guiar, as ações de um grupo em particular (moralidade), ou é o estudo sistemático da argumentação sobre como nós devemos agir(filosofia moral).

Singer P. Ethics. Oxford: OUP, 1994:4-6.

        “Realmente os termos “ética” e “moral” não são particularmente apropriados para nos orientarmos. Cabe aqui uma observação sobre sua origem, talvez em primeiro lugar curiosa. Aristóteles tinha designado suas investigações teórico-morais - então denominadas como “éticas” - como investigações “sobre o ethos”, “sobre as propriedades do caráter”, porque a apresentação das propriedades do caráter, boas e más (das assim chamadas virtudes e vícios) era uma parte integrante essencial destas investigações. A procedência do termo “ética”, portanto, nada tem a ver com aquilo que entendemos por “ética”. No latim o termo grego éthicos foi então traduzido por moralis. Mores significa: usos e costumes. Isto novamente não corresponde, nem à nossa compreensão de ética, nem de moral. Além disso, ocorre aqui um erro de tradução. Pois na ética aristotélica não apenas ocorre o termo éthos (com 'e' longo), que significa propriedade de caráter, mas também o termo éthos (com 'e' curto) que significa costume, e é para este segundo termo que serve a tradução latina.”

Tugendhat E. Lições sobre Ética. Petrópolis: Vozes 1997:35.

Kierkegaard e Foucault diziam que a ética grega é uma estética, ou uma poética, preocupando-se com a arte de viver, com a elaboração de uma vida bela e boa.

Valls ALM. in: Ética e Contemporaneidade

Álvaro L. M. VallsA ética é daquelas coisas qua todo mundo sabe o que são, mas quenão são fáceis de explicar, quando alguém pergunta.Tradicionalmente ela é entendida como um estudo ou umareflexão, científica ou filosófica, e eventualmente até teológica, sobreos costumes ou sobre as ações humanas. Mas também chamamos deética a própria vida, quando conforme aos costumes consideradoscorretos. A ética pode ser o estudo das ações ou dos costumes, e pode ser

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a própria realização de um tipo de comportamento.Enquanto uma reflexão científica, que tipo de ciência seria aética? Tratando de normas de comportamentos, deveria chamar-seuma ciência normativa. Tratando de costumes, pareceria uma ciênciadescritiva. Ou seria uma ciência de tipo mais especulativo, quetratasse, por exemplo, da questão fundamental da liberdade?7Que outra ciência estuda a liberdade humana, enquanto tal, e em suasrealizações práticas? Onde se situa o estudo que pergunta se existe a liberdade? E como ele deveria sar definida teoricamente, a como deveria servivida, praticamente? Ora, ligado ao problema da liberdade, aparecesempre o problema do bem e do mal, e o problema da consciência moral eda lei, e vários outros problemas deste tipo.Didaticamente, costuma-se separar os problemas teóricos da ética emdois campos: num, os problemas gerais e fundamentais (como liberdade,consciência, bem, valor, lei e outros); e no segundo, os problemaespecíficos, de aplicação concreta, como os problemas da éticaprofissional, da ética política, de ética sexual, de ética matrimonial, debioética, etc. É um procedimento didático ou acadâmico, pois na vida realeles não vêm assim separados.Mais adiante teremos de ver também como a ética se distingue deoutros ramos do saber, ou de outros estudos de comportamentos humanos,como o direito, a teologia, a estética, a psicologia, a história, a economia eoutros. Quando diferenciamos estes ramos do saber, não estamos dizendoque os problemas, na prática da vida, não sajam complexos e com váriasdimensões simultaneamente. Vejamos um exemplo. Subornar umfuncionário, é um problema apenas ético, apenas econômico, ou tem osdois aspectos?8As quetões da ética nos aparecem a cada dia. A partir do exemploacima, logo poderíamos nos perguntar se, num país capitalista, o princípiodo lucro poderia ou deveria situar-se acima ou abaixo das leis da ética. Eem épocas mais difíceis, muitas vezes nos perguntamos se uma lei injustade um Estado autoritário precisa ou não ser obedecida. E quando nósternos um "problema de consciência", quando estamos com um"sentimento de culpa", coisa que ocorre a todos, não se torna importantesaber se este sentimento corresponde de fato a uma culpa real? Cabe àreflexão ética perguntar se o homem pode realmente ser culpado, ou se oque existe é apenas um sentimento de um mal-estar sem fundamento.E as artes também levantam problemas para a ética. Por exemplo: opoder de sedução, de encantamento, da música, pode (ou deve) ser usadopara condicionar o comportamento das pessoas?E o mandamento evangélico do amor aos inimigos é válido como umaobrigado ética para todos? E quando, lendo um romance de Dostoievski, encontramos umpersonagem como Ivan, de Os Irmãos Karamazov, afirmando que "seDeus não existe tudo é permitido", devemos então concluir que isso é umaproposta de abolição da ética? Os problemas que acabamos de mencionar implicam todosalguma relação com outras disciplinas teóricas e práticas, mas são todosproblemas específicos da ética.Mas há uma outra questão, especificamente ética, que parece ser

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absolutamente fundamental. Os costumas mudam e o que ontem eraconsiderado errado hoje pode ser aceito, assim como o que é aceito entreos índios do Xingu pode ser rejeitado em outros lugares, do mesmo paísaté. A ética não seria então uma simples listagem das convenções sociaisprovisórias?Se fosse assim, o que seria um comportamento correto, em ética? Nãoseria nada mais do que um comportamento adequado aos costumesvigentes, e enquanto vigentes, isto é, enquanto estes costumes tivessemforça para coagir moralmente, o que aqui quer dizer, socialmente. Quem secomportasse de maneira discrepante, divergindo dos costumes aceitos erespeitados, estaria no erro, pelo menos enquanto a maioria da sociedadeainda não adotasse o comportamento ou o costume diferente. Quer dizer:esta ação seria errada apenas enquanto ela não fosse o tipo de um novocomportamento vigente.É claro que, de qualquer maneira, a ética tem pelo menos também umafunção descritiva: precisa procurar conhecer, apoiando-se em estudos deantropologia cultural e semelhantes, os costumes das diferentes épocas edos diferentes lugares. Mas ela não apenas retrata os costumes; apresentatambém algumas grandes teorias, que não se identificam totalmente com as formasde sabedoria que geralmente concentram os ideais de cada grupo humano.A ética tem sido também uma reflexão teórica, com uma validade maisuniversal, como ainda veremos.Quanto aos costumes, para partirmos do real e não do idealpropriamente dito, é preciso reconhecer desde logo uma séria restrição: ahumanidade só reteve por escrito depoimentos sobre as normas decomportamentos (e teorias) dos últimos milênios, embora os homens jáexistam há muito mais tempo. Como se comportavam eticamente oshomens das cavernas, há mais de trinta mil anos? Como era a sua éticasexual, que tipos de normas políticas vigoravam na pré-história? Éextremamente difícil dizê-lo.Quanto às grandes teorizações, há documentos importantíssimos pelomenos desde os gregos antigos, há uns dois mil e quinhentos anos. Mas éimportante então lembrar que as grandes teorias éticas gregas tambémtraziam a marca do tipo de organização social daquela sociedade. Taisreflexões não deixavam de brotar de uma certa experiência de um povo, e,num certo sentido, até de uma classe social. Tais enraizamentos sociaisnão desvalorizam as reflexões mais aprofundadas, mas sem dúvida ajudama compreender a distância entre as doutrinas éticas escritas pelos filósofos,de um lado, e os costumes reais do povo e das diferentes classes, por outrolado,12tanto no Egito quanto na Grécia, na índia, em Roma ou na Judéia.Em certos casos, só chegaremos a descobrir qual a ética vigente numaou noutra sociedade através de documentos não escritos ou mesmonão-filosóficos (pinturas, esculturas, tragédias e comédias, formulaçõesjurídicas, como as do Direito Romano, a políticas, como as leis de Espartaou Atenas, livros de medicina, relatórios históricos de expediçõesguerreiras e até os livros penitenciais dos bispos medievais).Como não se admirar diante da diversidade dos costumes,pesquisando, por exemplo, o que os gregos pensavam da pederastia, ou oscasos em que os romanos podiam abandonar uma criança recém-nascida,

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ou as relações entre o direito de propriedade e o "não cobiçar a mulher dopróximo" dos judeus antigos, ou a escala de valores que transparece noslivros penitenciais da Idade Média, quando o casamento com urnaprima em quinto grau constituía uma culpa mais grave do que o abusosexual de uma empregada do castelo, ou quando o concubinato, mesmodos padres, era uma forma de regulamentar eficazmente o direito daherança?O que acabamos de mencionar coloca a questão nos seguintes termos.Não são apenas os costumes que variam, mas também os valores que osacompanham, as próprias normas concretas, os próprios ideais, a própriasabedoria, de um povo a outro.13Mas alguém poderia argumentar que, embora só conheçamos asnormas éticas dos últimos milênios, certamente deve haver um princípioético supremo, que perpasse a pré-história e a história da humanidade. Nãoseria, quem sabe, o princípio que proíbe o incesto (sexo antre parentes)?Mas até esta norma tão antiga e tão importante carece de uma verdadeiraconcreção, de uma formulação bem determinada. Afinal, a definiçãoconcreta dos casos de incesto constantemente variou. Voltemos ao exemplo da Idade Média. Ao redor do ano 1000, a relaçãoincestuosa atingia até o sétimo grau. Casar com uma prima de até sétimograu era um crime e um pecado. Mas, se a quase totalidade era analfabeta,como conhecer bem a árvore genealógica? O costume então era bastantematreiro: os nobres se casavam sem perguntar pela genealogia, e só sepreocupavam com o incesto quando eventualmente desejassem dissolver ocasamento, anulando-o. Não era difícil, então, conseguir um monge letradoou mesmo testemunhas compradas, para demonstrar o impedimento eanular o casamento. Graças ao incesto, o nobre podia tentar varias vezes,até conseguir ganhar um filho homem, o que era, muitas vezes, a sua realpreocupação, por causa da linhagem, do nome e da herança.Se formos pesquisar estes costumes mais a fundo, descobriremos entãotalvez que, por trás das normas explícitas, havia outros valores mais altos,tais14como a linhagem, as alianças político-militares, e quem sabe até a pazsocial, dentro de uma estrutura baseada na luta, na competição e na guerra,por questões de honra, da religião ou de herança. Mas então temos de nosperguntar qual a importância desta regulamentacão ética para nós hoje,numa época de capitalismo avançado (ou mesmo salvagem), onde a grandemaioria se sustenta ou empobrece graças exclusivamente ao seu trabalhopessoal, à sua força de trabalho, independente de linhagem e de herança.Mesmo nos dias de hoje, numa mesma sociedade, não notamos nítidasdiferenças de costumes entre as classes da mais alta burguesia, a pequenaburguesia e o proletariado, para não falar dos camponeses ou agricultores?Mas não haveria, então, uma ética absoluta? Não teria, quem sabe, ocristianismo trazido esta ética absoluta, válida acima das fronteiras detempo e espaço? Será verdade que o cristianismo trouxe realmente umaúnica ética?Max Weber, pensador alemão do início do nosso século, mostra queesta ética não era, em todo o caso, simples, clara e acessível a todos. Poisos protestantes, principalmente os calvinistas, sempre valorizarameticamente muito mais o trabalho e a riqueza, enquanto os católicos davam

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um valor maior à abnegação, ao espírito de pobreza e de sacrifício. E adiversidade simultânea não é a única: maiores são as variações de umséculo para outro. 15No passado, houve épocas em que a pobreza e a castidade eram os valoresmais altos da escala ético-religlosa (geralmente em épocas em que seprevia para breve o fim do mundo). Isto explica os grandes movimentosmonacais, assim como, em contrapartida, nos permite entender por que, noséculo passado, o ideal do homem cristão enaltecia muito mais o burguêsculto, casado, com família grande e boas economias acumuladas, cultor davida urbana e social.Não seria exagerado dizer que o esforço de teorização no campo daética se debate com o problema da variação dos costumes. E os grandespensadores éticos sempre buscaram formulações que explicassem, a partirde alguns princípios mais universais, tanto a igualdade do gênero humanono que há de mais fundamental, quanto as próprias variações. Uma boateoria ética deveria atender a pretensão de universalidade, ainda quesimultaneamente capaz de explicar as variações de comportamento,características das diferentes formações culturais e históricas.Dois nomes merecem ser logo citados, como estrelas de primeiragrandeza desse firmamento: o grego antigo Sócrates (470-399 a.C.) e oalemão prussiano Kant (1724-1804).Sócrates, o filósofo que aparece nos Diálogos de Platão, usando ométodo da maiêutica (interrogar o interlocutor até que este chegue por simesmo à16verdade, sendo o filósofo uma espécie de "parteiro das idéias"), foicondenado a beber veneno. Mas por quê? A acusação era a de que eleseduzia a juventude, não honrava os deuses da cidade e desprezava as leisda polis (cidade-estado). Depois de dois milênios, ainda não sabemos sesua condenação foi justa. Pois Sócrates obedecia às leis, mas asquestionava em seus diálogos, procurando fundamentar racionalmente asua validade. Ele ousava, portanto, perguntar se estas leis eram justas. Emesmo que chegasse a uma conclusão positiva, o conservadorismo gregonão podia suportar este tipo de questionamento, pois as leis existiam paraserem obedecidas, e não para serem justificadas.Mas, embora os gregos não gostassem dos questionamentos socráticos,Sócrates foi chamado, muitos séculos depois, "o fundador da moral",porque a sua ética (e a palavra moral é sinônimo de ética, acentuandotalvez apenas o aspecto de interiorização das normas) não se baseavasimplesmente nos costumes do povo e dos ancestrais, assim como nas leisexteriores, mas sim na convicção pessoal, adquirida através de umprocesso de consulta ao seu "demônio interior" (como ele dizia), natentativa de compreender a justiça das leis.Parece mesmo que Sócrates abandonou até o estudo das ciências danatureza (as famosas cosmologias), para se ocupar exclusivamente consigo17mesmo e o seu agir. Sócrates seria então, para muitos, o primeiro grandepensador da subjetividade, o que, aliás, também transparecia por seucomportamento irônico. Pois a ironia (que alguns traduzem como umaignorância fingida, mas que deve ser muito mais do que isto) sempreestabelece uma diferença entre o que eu digo e o que eu quero dizer, eassim entre a formulação e o sentido das proposições – uma distância,

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portanto, entre o exterior e o interior.Ora, se este movimento de interiorizacão da reflexão e de valorizaçãoda subjetividade ou da personalidade começa com Sócrates, parece que eleculmina com Kant, lá pelo final do século XVIII.Kant buscava uma ética de validade universal, que se apoiasse apenasna igualdade fundamental entre os homens. Sua filosofia se volta sempre,em primeiro lugar, para o homem, e se chama filosofia transcendentalporque busca encontrar no homem as condições de possibilidade doconhecimento verdadeiro e do agir livre. No centro das questões éticas,aparece o dever, ou obrigação moral, uma necessidade diferente da natural,ou da matemática, pois necessidade para uma liberdade. O dever obrigamoralmente a consciência moral livre, a a vontade verdadeiramente boadeve agir sempre conforme o dever e por respeito ao dever.Partindo do pressuposto, típico do movimento iluminista queacompanhou a ascensão da burguesia, da igualdade básica entre oshomens,ÉTICA GREGA ANTIGAEntre os anos 500 e 300 a.C., aproximadamente, nós encontramos operíodo áureo do pensamento grego. É um período importante não só paraos gregos, ou para os antigos, mas um período onde surgiram muitas idéiase muitas definições e teorias que até hoje nos acompanham. Não sãoapenas três pensadores (Sócrates, Platão e Aristóteles) os responsáveis poresta fabulosa concentração de saber, e por esta incrível análise e reflexãosobre o agir do homem, mas talvez valha a pena esquematizar rapidamentealgumas das idéias dos dois últimos, para ternos uma imagem de como osproblemas éticos eram formulados naqueles tempos.A reflexão grega neste campo surgiu como uma pesquisa sobre anatureza do bem moral, na busca de um princípio absoluto da conduta. Elaprocede do contexto religioso, onde podemos encontrar o cordão umbilicalde muitas24idéias éticas, tais como as duas formulações mais conhecidas: "nada emexcesso" e "conhece-te a ti mesmo". O contexto em que tais idéiasnasceram está ligado ao santuário de Delfos do deus Apolo.O grande sistematizador, entre os discípulos de Sócrates, foi Platão(427-347 a.C.). Nos Diálogos que deixou escritos, ele parte da idéia de quetodos os homens buscam a felicidade. A maioria das doutrinas gregascolocava, realmente, a busca da felicidade no centro das preocupaçõeséticas. Mas não se deve pensar, daí, que Platão pregava um egoísmorasteiro. Pelo contrário, ao pesquisar as noções de prazer, sabedoria práticae virtude, colocava-se sempre a grande questão: onda está o Sumo Bem?Platão parece acreditar numa vida depois da morte e por isso prefere oascetismo ao prazer terreno. No diálogo República ele até condena a vidavoltada exclusivamente para os prazeres. Contando com a imortalidade daalma, sugerida no diálogo Fédon, e que é coerente com uma preexistênciada alma, ele espera a felicidade principalmente para depois da morte.Os homens deveriam procurar, então, durante esta vida, acontemplação das idéias, e principalmente da idéia mais importante, aidéia do Bem. Platão descreve, de uma maneira literariamente muitosedutora, como há uma espécie de “Eros filosófico” que atrai o homempara este exercício de

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25contemplação. Como o astrônomo contempla os astros, o filósofocontempla, através da arte da dialética, as idéias mais altas, principalrnenteas do Ser e do Bem. O Ser é imutável, e também o Bem. A partir desteBem superior, o homem deve procurar descobrir uma escala da bens, que oajudem a chegar ao absoluto.O sábio não é, então, um cientista teórico, mas um homem virtuoso ouqua busca a vida virtuosa e que assim consegue estabelecer, em sua vida, aordem, a harmonia e o equilíbrio que todos desejam. O sábio faz penetrarem sua vida e em seu ser a harmonia que vem do hábito de submeter-se àrazão. Dialética e virtude devem andar juntas, pois a dialética é o caminhoda contemplação das idéias e a virtude é esta adequação da vida pessoal àsidéias supremas.Mas a virtude também é uma purificação, através da qual o homemaprende a desprender-se do corpo com tudo o que este tem de terreno e desensível, e desprender-se do mundo do aqui e agora para contemplar omundo ideal, imutável e eterno. Aí está o Sumo Bem, para Platão. Aprática da virtude (areté) é por isso a coisa mais preciosa para o homem. Avirtude é a harmonia, a medida (métron) e a proporção, e a harmoniaindividual e social é assim uma imitação da ordem cósmica. (Cosmos jásignifica ordem, ao contrário de caos).O ideal buscado pelo homem virtuoso é a imitação ou assimilacão deDeus: aderir ao divino. A plebe, naturalmente, considera o filósofo umlouco,26por causa de sua hierarquia dos bens, invertida em relacão à dela. Mas osábio é exatamente aquele que busca assemelhar-se ao Deus, tanto quantolhe é possível humanamente. O diálogo das Leis afirma que "Deus é amedida de todas as coisas". E qual seria então a norma da virtude? É aprópria idéia do Bem, uma idéia perfeita e subsistente.Nas pesquisas efetuadas dialeticamente nos diversos diálogos, Platãovai organizando um quadro geral das diferentes virtudes. As principaisvirtudes são as seguintes:-- Justiça (dike), a virtude geral, que ordena e harmoniza, e assim nosassemelha ao invisível, divino, imortal e sabio;-- Prudência ou sabedoria (frônesis ou sofía) é a virtude própria da almaracional, a racionalidade como o divino no homem: orientar-se para osbensdivinos. Esta virtude, que para Platão equivale à vida filosófica como umamúsica mais elevada, é aquela que põe ordem, também, nos nossospensamentos;-- Fortaleza ou valor (andréia) é a que faz com que as paixões maisnobres predominem, e que o prazer se subordine ao dever;-- Temperança (sofrosine) é a virtude da serenidade, equivalente aoautodomínio, à harmonia individual.27Assim, o que mais caractariza a ética platônica é a idéia do Sumo Bem,da vida divina, da equivalência de contemplação filosófica e virtude, e davirtude como ordem a harmonia universal. A distância entre as virtudesintelectuais e morais é pequana, pois a vida prática se assemelha muito àprática teórica. Platão foi, além de grande filósofo, também um grande poeta ouliterato. A maioria de seus escritos tem a forma de diálogos, que são lidos

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com muito prazer e interesse intelectual e moral. Já o seu discípuloAristóteles, filósofo da mesma estatura de seu mestre, tem um outro estiloem seus escritos. Ele é muito mais um professor do que um poeta. Muitosde seus escritos são fragmentos ou notas para exposições aos discípulos.Mas tem também livros unitários.Aristóteles (384-322 a.C.), além de um grande pensador especulativoe profundo psicólogo, levava muito a sério (e mais do que Platão) aobservação empírica. Assim, enquanto Platão desenvolvia suaespeculação mais teórica, Aristóteles colecionava depoimentos sobre avida das pessoas e das diferentes cidades gregas. Isto não quer dizer queele fosse um empirista sem capacidade especulativa, mas mostra o seuesforço analítico e comparativo, quando ele se punha a comparar, porexemplo, mais de uma centena de constituições28políticas de cidades gregas. Seus livros explicitamente sobre questões de ética são a Ética aEudemo e a Ética a Nicômaco, mas ele escreveu também uma MagnaMoral e um pequeno tratado sobre as virtudes e os vícios.Ele também parte da correlacão entre o Ser e o Bem. Mais do quePlatão, porém, insiste sobre a variedade dos seres, e daí conclui que osbens (no plural em Aristóteles) também devem necessariamente variar.Pois para cada ser deve haver um bem, conforme a natureza ou a essênciado respectivo ser. De acordo com a respectiva natureza estará o seu bem,ou o que é bom para ele. Cada substância tem o seu ser e busca o seu bem:há um bem para o deus, um para o homem, um para a planta, etc. Quantomais complexo for o ser, mais complexo será também o respectivo bem. Assim, a questão platônica do Sumo Bem dá lugar, em Aristóteles, àpesquisa sobre os bens em concreto para o homem. É neste sentido que podemos dizer que a ética aristotélica é finalista eeudemonista, quer dizer, marcada pelos fins que devem ser alcançadospara que o homem atinja a felicidade (eudaimonía). Mas em que consiste o bem ou a felicidade para o homem? Qual omaior dos bens? Ora, Aristóteles não isola muito um bem supremo, poisele sabe que o homem, como um ser complexo, não precisa apenas domelhor dos bens, mas sim de vários bens, de tipos diferentes, tais comoamizade, saúde e 29até alguma riqueza. Sem um certo conjunto de tais bens, não há felicidadehumana. Mas é claro que há uma certa escala de bens, pois os bens são devárias classes, e uns melhores do que outros.Quais os melhores bens? As virtudes, a força, o poder, a riqueza, abeleza, a saúde ou os prazeres sensíveis?A resposta de Aristóteles parte do fato de que o homem tem o seu serno viver, no sentir e na razão. Ora, é esta última que caracterizaespecificamente o homem. Ele não poda apenas viver (e para isso osgregos consideravam fundamental uma boa respiração como base dasaúde), mas ele precisa viver racionalmente, isto é, viver de acordo com arazão.A razão, para não se deixar ela mesma desordenar, precisa da virtude,da vida virtuosa. Qual seria, então, a virtude mais alta, ainda que não aúnica necessária? O bem próprio do homem é a vida teórica ou teorética,dedicada ao estudo e à contemplação, a vida da inteligência.

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Convém lembrar aqui que afinal de contas esses grandes filósofosgregos viviam numa sociedade de classes, baseada no trabalho escravo, eque os filósofos em geral se dirigiam à aristocracia, isto é, àqueles quepodiam dedicar-se quase que exclusivamente à vida do pensamento, livresque estavam do trabalho duro e cotidiano. (E convém lembrar, igualmente,que uma observação como esta acima não explica toda a grandeconstrução teórica sobre a ética, de pensadores como Sócrates, Platão eAristóteles).

Espaço etica

A ética faz parte de uma das três grandes áreas da filosofia, mais especificamente , é o

estudo da ação - práxis. Ao lado do estudo sobre o "conhecimento" - como a ciência, ou

a lógica - e do estudo sobre o "valor" - seja ele artístico, moral, ou científico - o estudo

sobre a ação engloba a totalidade do saber e da cultura humana. Está presente no nosso

cotidiano o tempo todo, seja nas decisões familiares, políticas, ou no trabalho por

exemplo.

 

A palavra ética tem origem no termo grego ethos, que significava "bom costume",

"costume superior", ou "portador de caráter". Impulsionado pelo crescimento da

filosofia fora da antiga Grécia o conceito de ethos se proliferou pelas diversas

civilizações que mantiveram contato com sua cultura. A contribuição mais relevante se

deu com os filósofos latinos. Em Roma o termo grego foi traduzido como "mor-morus"

que também significava "costume mor" ou "costume superior". É dessa tradução latina

que surge a palavra "moral" em português.

 

No decorrer da história do pensamento a ética se tornou cada vez mais um assunto rico,

complexo e abrangente. Com a expansão da filosofia, e em especial o pensamento sobre

a ação, foi preciso distinguir os termos ética e moral. No século XX o filósofo espanhol

Adolfo Sánches Vásquez cria uma famosa diferenciação entre os dois conceitos. Para

ele o termo moral se refere a uma reflexão que a pessoa faz de sua própria ação. Já o

termo ética abrange o estudo dos discursos morais, bem como os critérios de escolha

para valorar e padronizar as condutas numa família, empresa ou sociedade.

 

Definir o que é um agir ético, moral, correto ou virtuoso é se inscrever numa disputa

social pela definição legítima da boa conduta. Da conduta verdadeira e necessária.

Avaliar a melhor maneira de agir pode ser visto de pontos de vista totalmente diversos.

Marxistas, liberais, mulçumanos, psicanalistas, jornalistas e políticos agem e valoram as

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ações de maneira diferente. Porém todos eles lutam pela definição mais legitima de uma

"boa ação" ou da "ação correta".

 

Sem pretensões de impor uma definição legítima sobre a conduta moral, nós, do Espaço

Ética, deixaremos os filósofos falarem por eles mesmos. Elencamos o que cada um dos

principais pensadores têm a dizer sobre o assunto.

Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.) "Ética a Nicomacos"

 

A excelência moral se relaciona com as emoções e ações, e somente as emoções e ações

voluntárias são louvadas e censuradas, enquanto as involuntárias são perdoadas, e às

vezes inspiram piedade; logo, a distinção entre o voluntário e o involuntário parece

necessária aos estudiosos da natureza da excelência moral, e será útil também aos

legisladores com vistas à atribuição de honrarias e à aplicação de punições. (...)

 

Mas há algumas dúvidas quanto ás ações praticadas em conseqüência do medo de males

maiores com vistas a algum objetivo elevado[1097b] (por exemplo, um tirano que tendo

em seu poder os pais e filhos de uma pessoa, desse uma ordem ignóbil a esta, tendo em

vista que o não cumprimento acarretasse na morte dos reféns); é discutível se tais ações

são involuntárias ou voluntárias. (...) Tais ações, então, são mistas mas se assemelham

mais as voluntárias, pois são objeto de escolha no momento de serem praticadas, e a

finalidade de uma ação varia de acordo com a oportunidade, de tal forma que as

palavras "voluntário" e "involuntário" devem ser usadas com referência ao momento da

ação; com efeito, nos atos em questão as pessoas agem voluntariamente, portanto são

voluntárias, embora talvez sejam involuntárias de maneira geral, pois ninguém

escolheria qualquer destes atos por si mesmos.

Immanuel Kant (1724-1804)  "Fundamentação da Metafísica dos Costumes"

 

Neste mundo, e se houver um fora dele, nada é possível pensar eu que possa ser

considerado como bom sem limitação, a não ser uma só coisa: uma boa vontade.

Discernimento, argúcia de espírito, capacidade de julgar, e como quer que possam

chamar-se os demais talentos do espírito, ou ainda coragem, decisão constância de

propósito, como qualidades do temperamento, são sem dúvida, a muitos respeitos,

coisas boas e desejáveis; mas também podem tornar-se extremamente más e prejudiciais

se a vontade, que haja de fazer uso destes dons naturais, constituintes do caráter, não for

boa.

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(...)

Na constituição natural de um ser organizado para a vida, admitimos, por princípio, que

nele não haja nenhum órgão destinado à realização de um fim que não seja o mais

adequado e adaptado a este fim. Ora, se num ser dotado de razão e de vontade a

natureza tivesse por finalidade última sua conservação, seu bem-estar ou, em uma

palavra, sua felicidade, ela teria se equivocado ao escolher a razão para alcançá-la. Isto

porque, todas as ações que este ser deverá realizar nesse sentido, bem como a regra

completa de sua conduta, ser-lhe-iam indicadas com muito maior precisão pelo instinto.

(...)

Uma vez que despojei a vontade de todos os estímulos que lhe poderiam advir da

obediência a qualquer lei, nada mais resta do que a conformidade a uma lei universal

das ações em geral que possam servir de único princípio à vontade, isto é: devo

proceder sempre da mesma maneira que eu possa querer também que a minha máxima

se torne uma lei universal. Aqui é pois a simples conformidade a lei em geral, o que

serve de princípio à vontade, o também o que tem de lhe servir de princípio, para que o

dever não seja por toda parte uma vã ilusão e um conceito quimérico.; e com isto está

perfeitamente de acordo com a comum ação humana nos seus juízos práticos e também

sempre diante dos olhos este princípio.

Jeremy Bentham (1748 - 1832) "Uma Introdução aos Princípios da Moral"

 

Pode-se dizer que uma pessoa é partidária de uma ética utilitarista quando afirma que a

aprovação ou desaprovação de alguma conduta foi determinada pela tendência de tal

conduta a aumentar ou diminuir a felicidade da comunidade e a sua própria.

 

Augusto Comte (1798-1875) "Catecismo Positivista" NOVO

 

Sacerdote: - É verdade que o positivismo não reconhece a ninguém outro direito senão o

de sempre cumprir seu dever. Em termos mais corretos, nossa religião (positivista)

impõe a todos a obrigação de ajudar cada um a preencher sua própria função. A noção

de direito deve desaparecer do campo político, como a noção de causa do campo

filosófico. Porque ambas se reportam a vontades indiscutíveis. Assim, quaisquer direitos

supõem necessariamente uma fonte sobrenatural, única que pode subtraí-los á discussão

humana. (...)

O positivismo não admite nunca senão deveres de todos em relação a todos. Porque seu

ponto de vista sempre social não pode comportar nenhuma noção de direito,

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constantemente fundada na individualidade.  Em que fundamento humano deveria, pois,

se assentar a idéia de direito, que suporia racionalmente uma eficácia prévia? Quaisquer

que sejam nossos esforços, a mais longa vida bem empregada não nos permitirá nunca

devolver senão uma porção imperceptível do que recebemos. Não seria senão, contudo,

só depois de uma restituição completa que estaríamos dignamente autorizados a

reclamar a reciprocidade de novos serviços. Todo direito humano é, pois, tão absurdo

quanto imoral. Posto que não há mais direitos divinos, esta noção deve se apagar

completamente, como puramente relativa ao regime preliminar, e diretamente

incompatível com o estado final, que só admite deveres segundo as funções.

Simone de Beauvoir (1909 - 1986) "Moral da Ambigüidade"

 

Existir é fazer-se carência de ser, é lançar-se no mundo: pode-se considerar como sub-

humano os que se ocupam em paralisar esse movimento original; eles têm olhos e

ouvidos, mas fazem-se desde a infância cegos e surdos, sem desejo. Essa apatia

demonstra um medo fundamental diante da existência, diante dos riscos e da tensão que

ela implica; o sub-homem recusa essa paixãoque é a sua condição de homem, o

dilaceramento e o fracasso deste impulso em direção do ser que nunca alcança seu fim;

mas com isso, é a existência mesma que ele recusa.

(...) A má-fé do homem sério provém de que ele é obrigado, sem cessar, a renovar a

renegação dessa liberdade. Ele escolhe viver num mundo infantil, mas à criança, os

valores são realmente dados. O homem sério deve mascarar esse movimento através do

qual se dá os valores, tal como a mitômana, que lendo uma carta de amor, finge

esquecer que essa lhe foi enviada por si mesma.

 

* Esta lista de textos filosóficos sobre ética será atualizada periodicamente. Esta seção 

é editada por  Arthur Meucci   e, como todo espaço no portal, aceita sugestões. Todo

mês traremos um autor novo, e, semanalmente, incluiremos textos e livros filosóficos na

seção Suporte Filosófico

ÉTICA NA DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR

Carla Beatriz Rocha*Genilce C. Souza Correia**Verificou-se a influência do docente no ensino superior, na formação ética doaluno, demonstrada através de reflexões sobre a relação professor aluno, pelopapel político do docente na sociedade e do exemplo que este representa paraos alunos. Dentre as observações feitas destaca-se, pela importância, amaneira que o docente deve proceder em sua prática pedagógica e na interrelação com o aluno, uma vez que ele representa na sala de aula uma imagem

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concreta da Universidade.Quando utilizamos em demasia certas expressões ou palavras, podemos tornartrivial o seu valor. Isso aconteceu com a palavra ética. Hoje, quando a ouvimos, nosarmamos com certa insensibilidade por acreditarmos que já entendemos o seu realsentido. Porém, nunca foi tão necessário reavermos o sentido de ética. Observamos que acrise pela qual, passa a humanidade é decorrente de um desnorteamento dos valoresmorais e éticos. Essa afirmação pode ser ilustrada ao observarmos a violência que noscerca, a rebeldia dos jovens, o desfacelamento da família, a propagação da corrupção,enfim, a dormência da sociedade em relação aos princípios morais.Ao exercermos a docência no ensino superior, necessitamos de um código deética. Essa necessidade advém do fato de que há uma inter-relação entre o docente e seusalunos, o que acarreta em um comprometimento na ação. Esta inter-relação promove adignificação da pessoa que age, bem como dos demais, resultando em uma correta açãosocial. A profissão docente se dá a serviço de todos e a seu próprio benefício,desenvolvida de maneira estável em conformidade com a própria vocação e em atenção àdignidade humana.Vasques (1995) afirma que ética é a ciência do comportamento moral dos homensem sociedade. Então, a ética pode ser um conjunto de regras, princípios ou maneiras de*Especialista em Docência do Ensino Superior e em Educação Matemática, graduada em Matemática,licenciatura. Professora de ensino médio no Colégio de Aplicação Mater Dei.** Especialista em Docência do Ensino Superior, graduada em Física e Matemática, Licenciatura.Professora no ensino superior do Instituto Superior de Educação Ibituruna, e do ensino médio nos colégiosTiradentes da Polícia Militar e Colégio de aplicação Mater DeiREVISTA EDUCARE ISEIB - MONTES CLAROS - MG V. 2 20062pensar que guiam a sociedade. A postura ética emerge da percepção de um fenômeno queocorre dentro de cada um de nós. Portanto, a função da ética é levar a sociedade a reagir,resgatando os valores morais básicos para orientação de seu comportamento e, assim,empreender um caminho de reconstrução para uma vida melhor. E qual seria o papel doprofessor universitário, enquanto formador de profissionais, no resgate dos valoreséticos? Primeiramente, o docente deve perceber que não se valoriza o que não seconhece. O professor universitário, antes de tudo, deve se debruçar sobre os estudosdesenvolvidos pela humanidade referentes ao tema. E comprometendo-se, peloconhecimento de ética, a repassar aos seus alunos e ilustrar com seu próprio exemplo,atitudes de conformidade com os princípios gerais de moral e ética. Assim surgem bonsprofessores, suas aulas tornam-se interdisciplinares, estimulam a criticidade, buscamintegrar ensino e pesquisa, transmitem o conhecimento científico de modo muito pessoal,didático e coerente com sua conduta.Para isso, o perfil do professor universitário não deve se restringir a apenas deter

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conhecimentos técnicos referentes à sua disciplina, pois ele, a todo momento, é tido comoreferencial de conduta para os seus discípulos. Portanto, é de fundamental importânciaque o docente se perceba como agente transformador, para poder, de forma consciente,intervir na formação dos alunos sob sua responsabilidade. É preocupante vermos algunsprofessores universitários com um discurso para a sala de aula e outro para a sua vidaextra classe. Essa postura contraditória desnorteia os alunos e sendo eles o futurofundamento da sociedade, esta se vê, repetidamente, sem a claridade fornecida pelosfirmes princípios éticos de conduta.A grande e infeliz verdade é que o professor já não se considera responsável pelamoral de seus alunos. Principalmente no Ensino Superior, eles chegam cidadãos comcaráter e personalidade praticamente acabados. São “filhos” da televisão, da liberação decostumes, da permissividade das mães que abdicaram das tarefas domésticas e nãoencontraram quem as substituísse; de pais assustados com o avanço do feminismo.Alguém deve ter coragem de dizer a esses jovens em que acreditar, redescobrindo asingeleza das coisas essenciais, o valor da família, da solidariedade, da lealdade, afinitude da vida e a sua celeridade, o destino de transcendência da humanidade, ocompromisso do contínuo aperfeiçoamento na breve aventura terrestre. Ainda é tempo doREVISTA EDUCARE ISEIB - MONTES CLAROS - MG V. 2 20063professor resgatar as qualidades de uma carreira que já teve concretamente reconhecida asua nobreza na hierarquia das profissões liberais. Basta aceitar que sua missão envolvemais do que possibilitar o conhecimento técnico. Para isso, é necessário que o professortenha características ligadas ao domínio afetivo, amando o ofício de ensinar. Algunsprofessores se tornam tão importantes para algumas pessoas que acabam por marcar suasvida de maneira indelével. É impressionante constatar a força da palavra do professorsobre a formação do educando. Do autêntico mestre se aguarda que transmita lições eprática do respeito, da moral, da amizade, da tolerância e da compreensão. Paradesincumbir-se de um compromisso de tamanha abrangência, não basta conhecer ética.Antes, é preciso acreditar na ética e viver eticamente.As faculdades, em geral, não estão educando para a vida, transmitem umconhecimento sem nenhuma associação com a realidade, e assim o aluno não extraiproveito para sua subsistência. A Universidade, a Reitoria, a Direção constituemrealidades abstratas para o aluno. A pessoa que, concretamente, ocupa o seu dia-a-dia é oprofessor. Este não pode deixar de se incumbir da responsabilidade de alertar o educandode todos os desafios que encontrará a partir da conclusão do curso. A relação que seestabelece entre professor e o aluno, é pessoal, palpável e duradoura. Conforme análisefeita pela comissão Jacques Delors no relatório para a UNESCO (2000), vemos aimportância dessa cordial relação:O professor deve estabelecer uma nova relação com quem está aprendendo;passar do papel de solista ao de acompanhante, tornando-se não mais alguémque transmite conhecimentos, mas aquele que ajuda os seus alunos aencontrar, organizar e gerir o saber, guiando, mas não modelando osespíritos, demonstrando grande firmeza quanto aos valores fundamentais quedevem orientar toda a vida.

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É sabido que nem sempre a situação de convívio do professor com seus alunos é aideal. É Nalini (1999) que afirma: os docentes têm um grande número de alunos, e umtempo muito reduzido para lidar com eles. Isso os impede de realizar um trabalho commaior proximidade com seus discípulos. Contudo, esses profissionais, conscientes de suacapacidade de intervenção, não podem abater-se diante dos empecilhos colocados pelauniversidade e pelo sistema como um todo. Antes, deve fomentar em seus discípulos agana por uma sociedade mais justa, mais humana. Esse propósito só será possível, se oREVISTA EDUCARE ISEIB - MONTES CLAROS - MG V. 2 20064docente permitir um canal de contato efetivo com o alunado. Tal caminho passa pelarelação professor / aluno, que é sempre fecunda quando existe entre eles cordialidade,estima, respeito às diferenças e quando contribui para um constante debate sobre atitudesvirtuosas, fomentando o surgimento dos princípios éticos nos discípulos. Veiga ( et.al.2002 ), em Pedagogia Universitária, defende a idéia de queA relação aluno-docente, se dialógica, pode ser uma alavanca na produção doconhecimento e aposta na convivência acadêmica entre os alunos dagraduação e pós-graduação como um ponto facilitador no contato com apesquisa, na troca de experiências e na abertura de perspectiva mútua. Se, porum lado, valoriza os conteúdos da área, entende como fundamentais asatitudes de respeito ao aluno, enfatizando as formas significativas demediações interpessoais.O docente adquire estas atitudes com exercício constante, com a tentativa diáriade acertar. Assim, caminha entre acertos e erros sempre adiante, tecendo uma relação deconfiança entre mestre e aluno. Essa ligação permitirá verificar, a cada situação, o que osalunos estão precisando, quais são os valores que ainda carecem conhecer e exercitar.Então, juntamente com o saber científico, o docente acena para os alunos o saber moral eético que lhes possibilitará tornarem-se profissionais respeitados e de conduta impecável.Muitas vezes o docente se confunde em práticas de “fazer o bem” com “fazerbem”, isso pode criar uma imagem do docente como um professor bonzinho. Que fiqueclaro: o saber fazer bem (a competência) do docente não implica que ele seja umeducador permissivo. É possível manter um grau de relacionamento promissor com oaluno sem, contudo, deixar fenecer o limite que deve haver nessa relação.Rios (1997) argumenta queA qualidade da educação tem sido constantemente prejudicada por educadorespreocupados em fazer o bem, sem questionar criticamente sua ação. Ou pelaconsideração da prática educativa apenas na dimensão moral, ou na visãoequivocada de um compromisso que se sustenta na afetividade, naespontaneidade. Isso precisa ser negado, quando procuramos umaconsistência para o desempenho do papel do educador na contribuição que dáa construção da sociedade.Lima (2002), em Pedagogia Universitária, acredita queREVISTA EDUCARE ISEIB - MONTES CLAROS - MG V. 2 20065O projeto de uma aula não é apenas uma manifestação do pensar a ação e doagir, ou seja, não é só movimento de idéias, mas idéias em movimento. A aula

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constitui, também, o desvelar do novo, do imprevisto, que surge na própriaação e que faz da aula um ato de criação e expressão de valores científicos,estéticos e éticos do professor, dos alunos, de um tempo, de uma cultura.O trabalho docente ético é aquele que é realizado conforme o que definimos, e seuresultado traz benefícios para o docente e para toda a sociedade. Por isso, devemos buscara maior perfeição possível e a dignificação humana. Ao trabalharmos como docentes deensino superior, na formação de profissionais, exercemos uma responsabilidade, que éindividual e, ao mesmo tempo, social, pois, ao fazê-lo, somos geradores de sereshumanos, que trazem consigo diversas conseqüências e resultados, os quais poderão serbenéficos ou maléficos.Devemos levar em consideração, e jamais esquecermos, que nas mãos doprofessor universitário está a responsabilidade de formar médicos, arquitetos, psicólogos,pedagogos, advogados e uma lista imensa de outros profissionais, e ainda novosprofessores. Algumas vezes nos incomoda o continuísmo que vemos na falta de ânimodos docentes em contribuir efetivamente para a formação desses profissionais. Essecírculo só terá fim quando o professor de hoje entender que está em suas mãos a chancede provocar uma mudança nos valores éticos nesses novos profissionais. Cremos que essaconscientização se faz ainda mais necessária quando se trata de alunos da área deeducação, que estão na universidade para se tornarem professores. Como esperar umanova geração de educadores com postura ética, de atitudes louváveis de solidariedade, dehumanidade, justiça, se, às vezes, o exemplo que têm na faculdade não condiz com esseanseio? É urgente a necessidade dos docentes do ensino superior atentarem para essepoder que detêm, o que possibilitará que contribuam na construção de professoresdetentores de conhecimento técnico e praticantes de ações corretas. Não é sem razão que,para ter acesso a esse território protegido e às vezes desconhecido, afirmamos que odocente precisa se mostrar como alguém realmente interessado em que o aprendizadoaconteça, usando o diálogo como fonte de entendimento, que vai se construíndoprocessualmente. Professor- educador, que ajuda a dar à luz aquilo que o estudante já trazdentro de si e que precisa apenas de mediações intencionalmente planejadas para que aconstrução do conhecimento se suceda e cresça tal qual uma espiral infindável.REVISTA EDUCARE ISEIB - MONTES CLAROS - MG V. 2 20066O que possibilita ao docente um provável caminho de exercício de sua profissão,norteado pela ética, é a reflexão. O papel da reflexão é crucial como instrumentopromotor do auto-desenvolvimento, pois é a reflexão que permite aos professores odesenvolvimento consciente e informado de revelações sobre sua prática, atingindo umamaior competência profissional e ética. Essa reflexão constante sobre a prática docenteassume uma real importância quando verificamos que o papel do professor universitário,hoje em dia, não é apenas informar ou transmitir o saber, mas também formar e educar.Os professores funcionam como um ponto de referência para os alunos, assumindo,assim, um papel realmente de educadores. A dinâmica de mudança, que se tornapremente e urgente, terá de ser pautada na reflexão e no diálogo, no qual os alunos, nasua grande maioria, não apenas alguns, serão induzidos e, em certa medida, forçados a

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aprender a pensar, a desenvolver elevadas capacidades de criticar suas ações, o que lhespossibilita fazer frente aos problemas que a vida lhes irá certamente colocar, dos modosmais variados e imprevistos.Conforme afirmativa de Rios (1997)É preciso pensar que o educador ético e competente é um educadorcomprometido com a construção de uma sociedade justa, democrática, na qualsaber e poder tenham equivalência enquanto elementos de interferência noreal e na organização de relações de solidariedade, e não de dominação entreos homens. Uma visão clara, abrangente e profunda do papel que desempenhana sociedade permite ao educador uma atuação mais completa e coerente. Aatitude crítica do docente sobre os meios e os fins de sua atuação o ajudará acaminhar mais seguramente na direção de seus objetivos.Ao docente compete construir condições favoráveis para que a aprendizagemaconteça de maneira totalizadora - científica e ética - e, para tal, toda a criatividade é bemvinda, mesmo quando implique algumas transgressões ou reinterpretações das regras dojogo. Afinal, essas foram feitas por homens e serão mudadas por homens que rejeitem ainexorabilidade das coisas. O exemplo de condutas éticas pelo docente, concebido embases que valorizem o alcance de competências e habilidades de alta complexidade,muito poderá ser útil aos futuros egressos da universidade. Dessa maneira, o alunodesenvolve a capacidade de processar leituras do mundo, devidamente circunstanciadas,em que se exercite a abstração, a reflexão, a dúvida sem culpa, em que os erros possamREVISTA EDUCARE ISEIB - MONTES CLAROS - MG V. 2 20067também ser festejados, porque são necessários à vida, que se transforma e nos seduzdiariamente. Arroyo (2000), com propriedade, reafirma a beleza da docência:Trabalhar na educação é tratar de um dos ofícios mais perenes da formaçãohumana, cujas práticas se orientam por saberes e artes aprendidas desde oberço da história cultural e social, e sensibilidades desenvolvidas ao longo dostempos. Saberes teóricos, provenientes do conhecimento e da experiência, mastambém, saberes ligados à percepção, à emoção e à ética, uma vez que oobjeto do trabalho docente são seres humanos.A contribuição dos professores é premente para preparar os jovens, não só paraencarar o futuro com confiança, mas para construí-lo de maneira determinada eresponsável. Os professores do ensino superior têm um papel determinante na formaçãode atitudes éticas positivas no alunado. A comissão Jacques Delors, no relatório para aUNESCO ( 2000), atribue a grande força dos professores no exemplo que dão,manifestando sua curiosidade e sua abertura de espírito, e mostrando-se prontos asujeitar as suas hipóteses à prova dos fatos e até a reconhecer os próprios erros.Rios (1997) observa que freqüentemente se percebe que os próprios educadoresnão têm clareza da dimensão política de seu trabalho. Somente pela reflexão contínua daprática docente é que poderemos enxergar a firmeza de nossos próprios conceitos éticos,e assim articulá-los a nossa ação diária. E desta forma o docente poderá permanentementetransformar o processo social, o sistema educativo, procurando sempre um significadomaior para o seu trabalho e para a vida. Castanho (2002) chama atenção para o fato deque o professor é o principal ator na situação universitária, é um sujeito histórico, vivenum contexto social e político que deve ser levado em conta para que se entendam suasações. E prossegue afirmando que urge pensar numa nova forma de ensinar e aprender,que inclua a ousadia de inovar as práticas de sala de aula, de trilhar caminhos inseguros,

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expondo-se, correndo riscos, não se apegando ao poder docente, com medo de dividi-locom os alunos e também de desvencilhar-se da racionalidade única e pôr em ação outrashabilidades que não as cognitivas apenas. Pensar-se como participante do desvelamentodo mundo e da construção de regras para viver com mais sabedoria e com mais prazer.Numa síntese, Nalini (1999) indica sabiamente alguns passos ao docente para umaprática norteada pela ética: constantemente realizar um exame de consciência, rever suaescala de valores, pautar-se pelos valores reais, aferir objetivamente a observância dessesREVISTA EDUCARE ISEIB - MONTES CLAROS - MG V. 2 20068valores, não transigir com os deslizes éticos, estudar ética e reconhecer a urgência noretorno à vida ética.Todas estas reflexões podem ser insuficientes para salvar o mundo. Mas, comcerteza, o seu mundo estará salvo, aquele espaço físico e temporal em que se desenvolvea sua personalidade, e em cuja transformação qualitativa depende exclusivamente de suavontade. Vontade exercida pari passu, e que influenciará a mudança do mundo daspessoas ao seu redor. Todo longo caminhar inicia-se com o primeiro passo...REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Nilda (org.). Formação de professores - Pensar e fazer. 6 ed. São Paulo:Cortez, 2001. (coleção questões de nossa época.) ARROYO,M. G. Ofício de mestre - Imagens e auto imagens. Petrópolis, RJ:Vozes, 2000. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. 12 ed. São Paulo: Brasiliense,1984. ( coleção primeiros passos) CASTANHO, Maria Eugênia L.M.; VEIGA, Ilma Passos A. (Orgs.). PedagogiaUniversitária - A aula em foco. 3ed. Campinas, SP: Papirus, 2002. DEMO, Pedro. Conhecimento Moderno - Sobre ética e intervenção doconhecimento. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997. FRANÇA, Júnia Lessa. Manual para normalização de publicações técnicocientíficas. 5 ed. Belo Horizonte, MG: UFMG, 2001. NALINI, José Renato. Ética geral e profissional. 2 ed. São Paulo: RT Didáticos,1999. RODRIGUES, Carla e SOUZA, Hebert de. Ética e cidadania. São Paulo:Moderna, 1994 ( coleção polêmica) RIOS, Terezinha Azerêdo. Ética e competência. 6 ed. São Paulo: Cortez,1997.(coleção questões de nossa época) UNESCO. Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO daComissão Internacional sobre educação para o século XXI. 4 ed. São Paulo:Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO, 2000. VÁZQUES, Adolfo Sánchez. Ética. 15 ed. RioFrancisca Ilnar de Sousa Francisco Tarciso Leite Marta Guimarães D ´Afonsêca. Ética: pressuposto da responsabilidade socialConforme Chauí (2004, p. 1) a palavra ética vem de ethos e significa índole, caráter e aética se refere à “educação do caráter dos indivíduos em vista da felicidade”, da vida livre e justa;a moral vem de mores e “refere-se ao comportamento normativo cujas normas foram definidasexternamente ao indivíduo, pela sociedade”.A ética, desde os gregos como Sócrates, Platão e Aristóteles, era discutida no sentido de

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que o homem deveria se colocar acima das questões econômicas, valorizando a natureza e a suasensibilidade. Assim, a questão moral consistia na purificação do homem, propondo suadesvinculação do mundo material. Na ética cristã tentava-se recuperar a razão pela fé do homemem Deus; assim toda felicidade recaia sobre a valoração da moral de Deus. Na Modernidade,entre os séculos XVI e XIX, a igreja vai perdendo poder por conta das relações capitalistas e dodesenvolvimento científico que valorizava a razão científica. Nos séculos XVIII e XIX surge umaconfiança absoluta na razão, considerada o único critério de verdade pois esta seria responsávelpela realização do homem e pelo seu progresso individual e social.O século XIX caracteriza-se como momento de crise para a filosofia e, portanto, a éticaque surge é de tendência antropocêntrica. Mais tarde, a ciência abalada em suas convicções pelatecnologia levou o homem a segundo plano. Chauí (2004) assim reconhece que os homens selibertaram de seus medos quando apostaram no conhecimento da ciência como fonte delibertação de crenças, afugentando-o principalmente do medo da morte; porém, explica a autora,que esta mesma ciência e tecnologia contemporâneas quando submetida à lógica neoliberal e àideologia pós-moderna, parece haver se tornado o contrário do que se tinha como expectativa deevolução para o homem, seu espírito humanista.Srour (2000) apresenta duas vertentes clássicas da ética: a ética da convicção, vertentes doprincípio e da esperança (ações baseadas em códigos e regulamentos), de Kant, e a ética daresponsabilidade – em que assume-se riscos de decisões pautadas em interesses própriosbuscando alcançar resultados compensadores - dirigida pelas vertentes utilitarista ou dafinalidade. Estas podem levar a tendência de comportamentos oportunistas por não seguir-se porpadrões aceitos e pré-definidos além de desconsiderar valores culturais. Representa, conformeSrour (2005), a ética dos homens de negócios, dos políticos etc.Os debates gerados na sociedade acerca da RS baseiam-se na cobrança do que cabe àsorganizações fazerem na intenção de se conseguir delas uma atuação capaz de reverter a situaçãode exclusão social dos cidadãos. Para tanto, relembrando Coutinho (2002) e Barbosa (2003)quanto ao aspecto cultural, é relevante imprimir a ética no sentido de não só vencer a cultura do“jeitinho brasileiro”, mas permitir criar oportunidade para uma sociedade mais justa e solidária,visto que o agir deve estar fundamentado na reflexão sobre o outro. Pela contribuição de Chauí(2004), a ética tem a função de educar o caráter das pessoas para que se possa conviver em

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espaços grupais; ainda assim ela pressupõe um sujeito livre e racional, pois ele é por si só, capazde eleger valores e respeitá-los.Nas organizações, conforme indica Carvalho (1999), a ética pressupõe elemento deregulação dessas instituições em diferentes culturas, sendo considerada fundamental para obterqualidade nas relações humanas, além de se revelar como indicador de estágio dedesenvolvimento organizacional. Navran (2000) alerta ainda para o fato de que a prescrição doscódigos deve ser suficientemente clara para que os funcionários tenham uma compreensão exatadas expectativas e exigências estabelecidas.Por volta dos anos 70, a ética passa a fazer parte do currículo nas faculdades deadministração e negócios, principalmente. Esses efeitos chegaram no Brasil em 1992, com asugestão do MEC de se implantar como disciplina da graduação nos cursos de Administração.Recentemente eventos internacionais vêm acontecendo e acentuando a discussão, não só noBrasil, mas na América Latina por conta da iniciativa do BID. Em 2003, foi realizada umaconferência no Estado de Minas Gerais em que se discutiu como se poderia trabalhar de formaeficaz enfrentando desafios éticos da região. A resposta veio em defesa de alianças estratégicas,da troca de experiências internacionais exemplares de ética aplicada, do capital social, da RS daempresa, de valores éticos como a transparência, inserindo também o próprio sistema educativo.4. Instituições de ensino superior: responsabilidade social e éticaAs IES no exercício de suas funções precípuas, ensino, pesquisa e extensão,independentemente de sua organização acadêmica ou administrativa, exercem função públicacredenciada ou autorizada pelo Estado. Costuma-se atribuir a função social às instituiçõespúblicas quando a própria Constituição Federal do Brasil e a Lei de Diretrizes e Bases nãodiscriminam quando da determinação de suas funções. Depreende-se, portanto, que a RS cabetanto as IES públicas como privadas em razão de dever social como qualquer outra organização,e, mais ainda, por coadunar-se com seu papel social na sociedade fortalecido com a criação dodepartamento de extensão. Este foi criado em 1968, pela Lei 5.540 que declara:[...] as universidades e os estabelecimentos de ensino superior estenderão àcomunidade, sob a forma de cursos e serviços especiais, as atividades de ensino e osresultados da pesquisa que lhe são inerentes” e através da extensão proporcionarão aoscorpos discentes oportunidades de participação em programas de melhoria dascondições de vida da comunidade e no processo geral do desenvolvimento.Destaca Capra (2002) que dentre o conjunto de organizações que precisam sofrer

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reformulação estão as organizações universitárias, visto que elas têm um papel fundamental nasociedade que é o de preparar profissionais que irão lidar com mudanças necessárias à adaptaçãoe à sobrevivência da organização. Além disso, tem o dever de proporcionar ao estudante umavisão integrada para que ele possa se inserir no contexto social e tanto a instituição como odiscente, futuro profissional, devem intervir provocando mudanças que venham beneficiar asociedade ou parte dela.A educação de forma geral, não só na formação dos discentes, deve seguir-se, conformeSequeiros (2000), pela ética da solidariedade, dado que esta constrói, progressivamente, umaconsciência nova na criança, no jovem e no adulto, levando a uma modificação de valoreshabituais e, por conseqüência das práticas sociais. No entanto, na realidade, Vallaeys (2003)destaca que os valores dominantes das universidades de hoje são o individualismo, a posse, acompetência e a dominação. Complementa Chauí (2004) que algumas características da visãoinstrumental se fazem presentes no ambiente universitário e relaciona dentre outras o: a) reforçoda perda da identidade e autonomia dos professores, o que traduz-se no abandono da ética daliberdade e b) reforço da submissão à ideologia pós-moderna, de forma que sujeita as pesquisasuniversitárias ao mercado da moda, do que é descartável, significando abandono da ética daracionalidade consciente e da RS.Calderón (2005) ressalta que, na década de 90 houve um crescimento rápido do númerode IES no mercado o que fez com que estas instituições atuassem com ênfase mercadológica,expondo em suas mensagens publicitárias os compromissos sociais desempenhados. Com isto,Curado (2003) expunha que as IES seguiam a tendência de fortalecimento da imagem por meioda divulgação de práticas de RS; destacando ele ainda mais dois enfoques: a RS tratada comonegócio ou cidadania, em que a IES extrapola as questões mercadológicas assumindo função deutilidade pública, se aproximando do entendimento de RS trabalhado por Passos (2004