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    Original: WAGNER, Roy. Are There Social Groups in the New Guinea Highlands?In: LEAF, Murray.Frontiers of Anthropology. Nova York: D. Van Nostrand Company,1974. pp. 95-122.

    Autor: Roy Wagner

    Traduo: Iracema Dulley

    Reviso tcnica: Ariel Rolim e Olivia Janequine

    EXISTEM GRUPOS SOCIAIS NAS TERRAS ALTAS DA NOVA GUIN?

    O estudo dos arranjos sociais do homem suas relaes com seus pares e como ele as

    concebe pertence, tradicionalmente, ao domnio da antropologia cultural. Isso no

    quer dizer que as relaes sociais e o que as pessoas pensam sobre elas no sejamimportantes para a arqueologia ou a antropologia fsica. Significa, simplesmente, que a

    sociedade e as relaes sociais e no a constituio fsica do homem ou o registro de

    seu desenvolvimento ao longo do tempo fazem parte do objeto bsico da antropologia

    cultural.

    A antropologia cultural definida de forma quase to ampla e vaga como o a

    antropologia em geral. Uma vez que a antropologia cultural pode incluir estudos a

    respeito de qualquer coisa, de poesia a aragem do solo, e de fato o faz, os antroplogos

    frequentemente demarcaram o estudo dos arranjos sociais como antropologia social, um

    subcampo particular da antropologia cultural. Essa designao tende a ser enganosa,

    pois sugere que a diferena entre a antropologia social e os outros aspectos da

    antropologia cultural principalmente de objeto. Na verdade no este o caso. A

    antropologia social tradicional se baseia em algumas suposies muito especiais sobre a

    importncia da sociedade suposies estas que no so necessariamente partilhadas

    por outros antroplogos culturais e inclui um amplo corpus terico desenvolvido com

    base nessas suposies. Que suposies so essas e se estamos corretos em separar o

    estudo da sociedade do restante da antropologia cultural o tema deste captulo. Para

    respond-lo, entretanto, teremos de deixar esse domnio ambguo e confuso das

    definies e examinar o desenvolvimento histrico dos conceitos envolvidos. Afinal, a

    nica justificativa para reconhecer um tipo particular de antropologia o fato de existir

    um corpus terico que nos permite praticar esse tipo de antropologia.

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    De modo a obtermos um conhecimento mais completo da antropologia social, devemos

    primeiramente tentar responder a algumas questes bsicas: qual o fundamento lgico

    da antropologia social, a antropologia da sociedade? De onde vieram suas suposies e

    as questes e respostas referentes a elas?

    O DESENVOLVIMENTO DA ANTROPOLOGIA SOCIAL

    Em muitos aspectos, as suposies da antropologia social so legado de mile

    Durkheim, o brilhante pensador social francs do final do sculo XIX e incio do sculo

    XX. Durkheim voltou-se para a vida moral e coletiva do homem as foras e

    influncias que mantm os seres humanos juntos, sua grupidade em todos os aspectos

    como um fenmeno a ser investigado cientificamente. Suas obras enfatizaram com

    tanta exclusividade a importncia bsica do social, dos aspectos coletivos e morais da

    vida humana, que fcil us-los como fundamento para o determinismo social ou

    acusar Durkheim de reificar a sociedade transform-la em coisa. Suas conquistas

    serviram de base para uma cincia da integrao social cujo foco a maneira pela qual

    as associaes humanas e a prpria sociedade, a mais permanente das associaes, se

    unem e o que as mantm juntas. Essa preocupao com a integrao foi a rocha sobre

    a qual a antropologia social se erigiu.

    Na esteira de Durkheim, o problema da sociedade foi assumido e desenvolvido por

    duas tradies nacionais distintas. Na Frana, os colaboradores e alunos de Durkheim

    fundaram, em torno do peridico de nome Anne Sociologique, um seminrio de

    teorizao. Muito desse trabalho, especialmente o do sobrinho de Durkheim, Marcel

    Mauss, preparou o terreno para o ulterior estruturalismo de Lvi-Strauss. Mas foi na

    Inglaterra e onde quer que a influncia de A. R. Radcliffe-Brown se tenha feito sentir

    no exterior que a teoria da descendncia teve seus primeiros e mais expressivos

    sucessos.

    Esses sucessos foram genericamente chamados de funcionalismo (embora o prprio

    Radcliffe-Brown tenha evitado esse rtulo), e ele forneceu o ncleo terico para a

    antropologia social clssica que se desenvolveu na Inglaterra nas dcadas de 1930, 1940

    e 1950. O funcionalismo se assentava na noo de que no importa o quo estranhas ou

    peculiares fossem as prticas e instituies de um povo, e a despeito de como vieram

    a ser dessa forma, a questo importante era como funcionavam. Ademais, emborahouvesse inmeras maneiras pelas quais elas pudessem funcionar ou no, havia sempre

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    uma funo mais ou menos central, a de manter a sociedade unida e os antroplogos

    sociais sempre insistiram que se tratava de uma questo poltica ou poltico-jural.

    A suposio poltico-jural foi a contribuio de uma tendncia britnica de

    pensamento muito secular e pragmtica ao problema original de Durkheim. E foiRadcliffe-Brown quem escolheu o domnio da jurisprudncia com suas distines

    refinadas e suas esmeradas adjudicaes de direitos como modelo para pensar as

    coletividades morais da sociedade. claro que as sociedades tribais do tipo estudado

    por Radcliffe-Brown, Evans-Pritchard, Fortes, Gluckman e outros antroplogos sociais

    no tinham poltica no sentido que atribumos ao termo, nem tampouco tinham leis,

    embora muitas delas possussem tribunais e entrassem em litgios. Ademais, a nfase

    nos direitos levou naturalmente a uma considerao dos direitos de herana e a umapreocupao com a propriedade, embora a propriedade em questo fosse, na maior

    parte dos casos, valorizada precisamente porque era passvel de ser trocada por pessoas,

    o que quase nunca ocorre com a propriedade em nossa sociedade.

    A antropologia social evoluiu gradativamente para uma espcie de jogo de fingimento

    heurstico: conceitos com ampla base de aceitao e compreenso na sociedade

    ocidental tais como poltica, lei, direitos e propriedade foram aplicados aos

    usos coletivos dos povos tribais com uma espcie de como se implcito. Contanto que

    os participantes do jogo mantivessem o como se em mente, seu uso dos conceitos

    ocidentais para traduzir os costumes nativos para o tipo de coerncia racional e legal

    que esperamos de nossas prprias instituies era aceito, ainda que ele colocasse os

    sujeitos nativos nos improvveis papis de advogados e juzes de peruca e transformasse

    sua existncia coletiva em uma cmica pardia do Banco da Inglaterra.

    No entanto, o jogo no poderia acontecer no vcuo. Tratava-se antes de mais nada de

    antropologia descritiva, e era necessrio avir-se com os costumes do povo descrito. Ora,

    disso que tratam todos os problemas e conceitos da antropologia social. Se os Bantu

    meridionais, os Nuer ou os Talensi no tinham leis propriamente ditas, ento usos

    coletivos anlogos teriam de ser encontrados para substitu-las. Na verdade,

    estabeleciam-se analogias com as regularidades (ou, como uma gerao posterior as

    chamaria, normas) que regem as relaes de parentesco, e o jogo se tornava um jogo

    de transformar o parentesco em jurisprudncia e economia corporativa o estudo dos

    sistemas de descendncia e das instituies formadas nas sociedades tribais pela

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    descendncia dos direitos e da propriedade. A antropologia social tornou-se a cincia

    dos grupos de descendncia, e os grupos de descendncia e sua constituio tornaram-se

    questes cruciais para dar conta da funo nuclear de integrao e manuteno da

    coeso da sociedade. Quanto maior a nfase com que os pesquisadores insistiam na

    importncia das definies, da racionalidade e de suas prprias concepes de direito e

    propriedade, mais os grupos se tornavam substanciais e claramente definidos. Eles se

    tornavam, em resumo, muito mais parecidos com os grupos conscientemente

    organizados, planejados e estruturados da sociedade ocidental a despeito da completa

    falta de evidncias de que os nativos realmente os pensassem daquele modo. Os

    grupos eram uma funo do nosso entendimento do que as pessoas estavam fazendo, e

    no do que elas mesmas faziam das coisas.

    A cincia dos grupos de descendncia submeteu-se ao mais rigoroso teste ao lidar com

    os modos como os usos nativos no correspondiam a suas expectativas tericas. Havia

    casos em que o uso do parentesco contradizia patentemente as expectativas do modelo

    institucional da sociedade. Nas sociedades tribais que a antropologia social escolheu

    como objeto de estudo, casos como esses no eram nem incomuns, nem triviais. O

    refinamento da chamada teoria da descendncia foi realizado por meio do esforo

    contnuo para lidar com contradies desse tipo. O incio disto fica evidente nos artigosclssicos de Radcliffe-Brown, reeditados emEstrutura e funo na sociedade primitiva.

    Eles tratam do direito de um jovem bantu meridional de furtar comida e bens que

    pertencem a seu tio materno, geralmente membro de outro grupo de descendncia, e das

    peculiares relaes de jocosidade e evitao encontradas entre muitos povos tribais,

    nas quais os participantes se envolvem numa troa que parece violar a relao ou na

    evitao que aparentemente a nega. Radcliffe-Brown escolheu interpretar todos esses

    fenmenos em termos do que chamou de aliana ou associao. Em vista das tenses

    resultantes de interesses divergentes dos diferentes grupos que casavam entre si,

    inclusive demandas conflitantes a respeito de uma nica pessoa ou de expectativas

    desta, essas prticas inexplicavelmente antagnicas serviam para manter a ordem e a

    solidariedade social (integrar a sociedade) quando nada mais podia faz-lo. Nas

    palavras de Radcliffe-Brown:

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    A aliana pelo respeito extremo, pela evitao parcial ou completa, evita esse conflito

    mas conserva as partes unidas. A aliana pela jocosidade1 faz a mesma coisa, mas de

    modo diferente. (1973:131)

    O carter aparentemente anti-social do furto ou das relaes de jocosidade e evitaopoderia, assim, ser explicado pela necessidade de integrar os prprios grupos (ali-los)

    em um todo social mais amplo. Qualquer evidncia no sentido de que o uso do

    parentesco no tinha o efeito de promover a solidariedade entre os grupos poderia ser

    explicada como formadora da solidariedade como um todo atravs da aliana.

    A cincia dos grupos de descendncia se defendia contra as excees etnogrficas

    partindo do princpio de que a prpria sociedade era, ela mesma, apenas um grupo de

    descendncia maior e melhor, com suas prprias leis e modos de operao. No era

    preciso deixar de acreditar em grupos sociais ou em solidariedade; bastava admitir que a

    solidariedade s vezes era alcanada por meios indiretos. Foi esta engenhosa formulao

    de Radcliffe-Brown, que salvava a solidariedade do grupo das garras da irracionalidade

    frvola, que Meyer Fortes usou como fundamento para sua teoria da descendncia e da

    filiao. Para comear, se a descendncia que os antroplogos vinham usando como

    um tipo de fundamento legal para a constituio de grupos no era o nico princpio em

    operao, ento um princpio mais geral teria de ser encontrado. Este foi a filiao,

    um tipo de descendncia de mo dupla baseada nos vnculos de um indivduo tanto com

    o pai quanto com a me. A descendncia, realizada por meio da me ou do pai,

    correspondia ao que Fortes chamava de forma de filiao com maior peso social, ao

    passo que o outro tipo, que relacionava um indivduo s pessoas que estavam fora de

    seu grupo de descendncia, era denominado filiao complementar. A primeira

    fornecia aos grupos um fundamento jurdico ou poltico-jural, ao passo que a segunda

    proporcionava um meio para a aliana entre os grupos (embora fosse suplementada porelementos como o ritual).

    primeira vista, essa manobra estratgica de Fortes parece ter resolvido o dilema do

    antroplogo social de, ao mesmo tempo, dispor dos grupos de descendncia como

    instituies claramente delimitadas e, ao mesmo tempo, admitir os interesses da

    totalidade social mais ampla. Contudo, essa soluo custou alguma contradio interna,

    1 Na traduo de Estrutura e funo na sociedade primitiva, optou-se por traduzirjoking como

    brincadeira. Na presente traduo decidiu-se traduzir o termo como jocosidade, julgado maisadequado. Assim, o termo foi substitudo na citao, que no mais foi transcrita da traduo do livro deRadcliffe-Brown para o portugus. (N.T.)

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    pois a filiao tomava com uma mo o que oferecia com a outra. Ela afastou o centro de

    gravidade terica do franco racionalismo de Durkheim e Radcliffe-Brown de tal forma

    que quando os tericos da descendncia mais recentes, como Goody, quiseram

    estabelecer uma definio para grupo de descendncia corporado, foram obrigados a

    inventar conceitos como reivindicaes obscuras e direitos submersos para explicar

    o funcionamento da filiao complementar. Estes se referem s frgeis reivindicaes

    de propriedade ou direitos que um homem pode exercer no grupo de nascimento de sua

    me em virtude do fato de que sua me poderia ter sido um homem. Se sua me fosse

    um homem, ele estaria no grupo dela devido herana patrilinear de direitos (de ser

    membro desse grupo). Se as reivindicaes fossem claras, em vez de obscuras, e os

    direitos viessem tona, ento as fronteiras dos grupos corporados de descendncia, que

    eram estabelecidas exatamente por esse tipo de direitos e reivindicaes, seriam

    corrodas e comprometidas. E, se isso acontecesse, os antroplogos sociais teriam de

    admitir que os grupos, tal como eles os haviam concebido, no existiam.

    As reivindicaes obscuras e os direitos submersos eram simplesmente uma forma de

    dizer que as relaes (de aliana ou associao) entre os grupos simplesmente no

    eram to reais quanto os prprios grupos. Esse status obscuro peculiar era reservado

    para tudo o que realizava a mediao entre as fronteiras rgidas dos grupos e se moviaem seus interstcios inclusive o ritual (religio). (Todos sabiam que o ritual lidava

    com coisas sobrenaturais e sem substancialidade, como pessoas, gado e terras de

    famlia.) Assim, os antroplogos sociais tendiam a tornar seus grupos slidos e

    substanciais sacrificando a realidade e a substancialidade de tudo o mais.

    Mas o mundo obscuro e sem substancialidade dos direitos e reivindicaes que se

    moviam de forma inexplicvel entre os grupos ainda colocava um grande desafio

    cincia dos grupos de descendncia. O prprio carter intersticial e no substancialdesse mundo era provocador; assim, muito esforo terico foi dedicado a derivar algum

    tipo de justificativa da realidade do no substancial, o que, claro, tornou-o mais

    necessrio, mais provocador e mais importante. A solidariedade passou a ser explicada

    por meio do antagonismo, em vez de ser definida em contraposio a ele, e a sociedade

    acabou por ser entendida nos termos de uma anti-sociedade.

    A teoria dos rituais de rebelio de Gluckman, refletida em muitos aspectos da vida

    social africana, representou mais um passo nessa direo. Gluckman insistia em que a

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    dramatizao pblica institucionalizada de uma rebelio jocosa contra o governante,

    realizada com regularidade em algumas sociedades africanas, servia para reforar a

    posio desse governante. Ao estabelecer um tipo de falsa negao da autoridade

    dele, uma espcie de relao de jocosidade poltica coletiva, e ento superar a negao,

    a ordem social se convertia no que era ao fracassar em se converter no seu oposto. A

    importncia dessa teoria reside em seu emprego da contradio como base para a

    explicao. Embora firmemente comprometida com a integrao funcional da

    sociedade, ela assinala um deslocamento radical no centro terico da antropologia

    social.

    Com isso, abriu-se o caminho para uma antropologia social voltada em grande medida

    para o domnio do ritual e do nem l, nem c. Foi este o rumo tomado por doisantroplogos sociais modernos: Mary Douglas e Victor Turner. Em seu livro Pureza e

    perigo, Douglas ressaltou a posio central das situaes contraditrias ou paradoxais

    na sociedade humana e relacionou-as noo de poluio. Turner, na esteira de

    Gluckman, concentrou-se no processo ritual e na importncia da transio

    (liminaridade) entre estados sociais e rituais. Embora o social conserve sua

    proeminncia na obra de ambos, o crescente apoio dos autores no contraditrio remete a

    outra divergncia importante: em lugar da integrao funcional, suas explicaesrecorrem cada vez mais ao significado e conceitualizao como expressos nos

    smbolos.

    Se essa nfase na contradio e no nem l, nem c reduziu a cincia dos grupos de

    descendncia a uma espcie de absurdo em relao a sua posio anterior, o interesse

    pelos smbolos e pela conceitualizao nativa teve um efeito semelhante sobre o jogo

    heurstico de compreender os usos nativos como se fossem instituies ocidentais.

    Podemos concluir que a antropologia social foi instigada a se converter no seu opostopelas exigncias de lidar com seu objeto de estudo. Mas a essa altura seu oposto (no que

    diz respeito a suas principais nfases) j havia surgido na forma do estruturalismo

    lvi-straussiano e havia entabulado um debate contnuo e bastante bem-sucedido com a

    teoria da descendncia, sob a orientao de Edmund Leach e Rodney Needham.

    O estruturalismo de Claude Lvi-Strauss o oposto da antropologia social tradicional

    radcliffe-browniana: voltou-se para as oposies e contradies no interior da ordem

    social com o propsito de resolv-las como parte de sua explicao , e no para suas

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    regularidades legais e harmonias integradas. A obra de Lvi-Strauss emergiu de uma

    tradio diferente de antropologia, fundada pelos alunos e seguidores de Durkheim na

    Frana, que haviam desenvolvido um corpus terico sobre a sociedade em

    conformidade com as linhas conceitualistas da obra do prprio Durkheim, e no com a

    orientao legalista e materialista da antropologia social britnica. Eles escreveram

    sobre os temas da classificao primitiva, da organizao dualista, dos conceitos de eu

    e sociedade e das formas de troca de ddivas. Talvez a mais conhecida dessas obras seja

    o brilhanteEnsaio sobre a ddiva de Marcel Mauss, livro que, como o prprio Mauss,

    exerceu grande influncia sobre Lvi-Strauss.

    na troca de ddivas, ou reciprocidade, que o estruturalismo comea. Ou, antes, onde

    o funcionalismo acaba para os estruturalistas, pois a reciprocidade entre indivduos eentre grupos a resposta estruturalista questo funcionalista: O que integra a

    sociedade?. Ao supor a presena e importncia universal da reciprocidade, o

    estruturalismo elegeu como principal problema a maneira como a sociedade e suas

    partes so conceitualizadas. Assim, reverteu completamente a orientao do

    funcionalismo, que tomava por certo esse tipo de conceitualizao e voltava sua ateno

    para o problema da integrao.

    A partir de Estruturas elementares do parentesco (Les Structures lementaires de la

    Parent) de Lvi-Strauss, publicado em 1949, o grupo social assumiu um aspecto novo

    e radicalmente diferente para alguns antroplogos. Foi descrito em termos conceituais

    (ideais) e simblicos, e no legais e materialistas. Ao invs de se basearem em vacas,

    complexos residenciais e direitos in rem e in personem, os grupos e a estrutura dos

    grupos se baseavam em dualidades cosmolgicas: direita versus esquerda, gua em

    contraposio a terra, o de cima em oposio ao de baixo, etc. Em vez de grupos reais,

    fsicos, concretos, havia unidades hipotticas reconstrudas de acordo com os papisassumidos na reciprocidade doadores de mulheres, receptores de mulheres,

    ciclos determinados por regras de casamento, e assim por diante constructos sociais

    do analista concebidos para fazer operar a ideologia nativa.

    Uma vez que se pretendia que esses constructos replicassem algo do esprito do

    nativo, em vez de algo a respeito do qual o pesquisador de campo pudesse esboar um

    mapa, como um complexo residencial, seria inexato cham-los de grupos no mesmo

    sentido dos constructos da antropologia social. Ainda assim, a despeito desse acrscimo

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    de sofisticao, os constructos no eram, em muitos aspectos, menos grupais do que

    os grupos de descendncia da antropologia britnica. A principal diferena era que

    esses grupos de descendncia existiam na imaginao do nativo, a despeito de sua

    aparncia concreta. Eram grupos de descendncia precisamente pelo mesmo motivo

    que as unidades bsicas de Radcliffe-Brown o eram porque Lvi-Strauss, como os

    antroplogos britnicos, considerava as relaes de parentesco como lcus da lei ou

    das regras nas sociedades tribais.

    Ao seu modo, entretanto, ele no comeou por regras de herana ou propriedade, mas

    pelo tabu do incesto, que considerou a regra de casamento arquetpica. desse tabu,

    segundo Lvi-Strauss, que o universo de regras que constitui a sociedade humana

    descende. Ora, foi desse tabu, com sua necessidade implcita de reciprocidade (J queno posso casar com minha irm, troc-la-ei por algum com quem possa me casar),

    que ele derivou o fundamento da descendncia: O aspecto positivo da proibio que

    ela inicia a organizao (Lvi-Strauss, 2003).

    A organizao revelou-se uma incorporao da descendncia em todas as suas formas

    e variedades tradicionais (patrilinear, matrilinear, e assim por diante), com a

    exceo de que era significativa em termos conceituais, e no materiais. E embora esse

    emprstimo da terminologia tradicional pudesse no ter sido necessrio para uma teoria

    que precisava dos grupos apenas como um tipo de quadro para ancorar relaes de

    reciprocidade, o estruturalismo necessitava de algum tipo de ordem e organizao, pois

    partilhava com o funcionalismo a viso de que uma cultura ou sociedade representa uma

    ordem sistmica de alguma espcie, um sistema.

    Tanto a antropologia social britnica quanto o estruturalismo lvi-straussiano elegem

    como tarefa a descoberta de algum tipo de ordem sistmica no interior da cultura

    estudada, uma ordem que identificam com a forma como essa cultura opera

    (funcionalismo) ou se articula conceitualmente (estruturalismo). Vimos que a

    antropologia social tentou primeiramente descobrir essa ordem no interior dos prprios

    dados, postulando a existncia de grupos de descendncia auto-evidentes e similares,

    mas gradualmente assumiu a posio de que os problemas bsicos eram de cunho

    conceitual e interpretativo. Em outras palavras, assim como o estruturalismo, passou a

    reconhecer a importncia de construir modelos do sistema nativo e averigu-los como

    um modo de explicao.

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    Esse procedimento implica observar algo e ento descrev-lo de forma sistmica, ou

    arquitetar um sistema e ento demonstrar que ele est l, ou se parece bastante com o

    que est l. Na prtica, geralmente inclui um pouco de ambos. Em qualquer dos casos,

    contudo, envolve a inveno e a projeo de uma ordem por parte do antroplogo,

    que funo de seu processo de entendimento. Assim, se escolhermos desafiar esse

    modo sistmico de explicao, podemos colocar a questo sobre se os grupos de

    descendncia e a parafernlia da ordem social a eles associada existem de fato

    independentemente da necessidade do antroplogo de explicar as coisas nesses termos.

    Existe algo sobre a sociedade tribal que requer sua decomposio em grupos? Ou a

    noo de grupos uma descrio vaga e inadequada de algo que poderia ser mais bem

    representado de outra forma?

    DESFIANDO A SUPOSIO DO COMO SE

    Nosso primeiro passo ao tentar responder a essas questes deve envolver uma avaliao

    franca do que buscamos. Afinal, se abordarmos a questo com a inteno explcita de

    encontrar grupos ou com uma suposio irrefletida de que grupos, de um tipo ou de

    outro, so essenciais para a vida e a cultura humana, ento nada nos impedir de

    encontr-los. Ora, se nosso objetivo for uma avaliao franca, devemos ter clareza sobre

    o que queremos dizer ou esperamos encontrar com grupos. Temos em mente os grupos

    corporados rgidos, empricos e materiais dos antroplogos sociais, as gradaes

    sociais inclusivas, flexveis e de base genealgica de um sistema de linhagens

    segmentares, ou os constructos totalmente conceituais dos estruturalistas? Antes de

    tudo, deveramos tentar responder questo crucial: por que, afinal, precisamos explicar

    as estruturas sociais por meio dos grupos?

    Vivemos em uma cultura na qual fundar, integrar, tornar-se membro e participar de

    grupos uma questo intencional e importante. As constituies de nossas naes

    baseiam-se em uma noo de contrato social, um ato ou evento consciente de alguma

    espcie que deu incio existncia da sociedade. Os cidados so membros desses

    colossais grupos de descendncia. Os que no so nascidos neles ou no interior dos

    seus territrios clnicos precisam ser naturalizados, assim como as crianas podem ser

    adotadas legalmente por pais de criao. Uma sociedade que enfatiza o dever do

    cidado de votar e manter-se vigilante aos interesses de seu pas sem dvida insiste na

    participao consciente. E ao tornar consciente a pertena e a participao na sociedade,

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    essa forma social particular tambm a torna problemtica. Os problemas de

    recrutamento, participao e corporativismo (economia) so nossos problemas, mas ns

    os levamos conosco quando visitamos outras culturas, junto com nossa escova de dentes

    e nossos romances favoritos.

    Naes, sociedades e grupos so a forma ou manifestaosocialda confiana na ordem,

    na organizao e na coerncia que perpassa toda nossa abordagem de um fazer e

    compreender coletivo como um pressuposto inconteste. A sugesto de que nossas ideias

    sobre ordem, organizao e coerncia podem estar abertas a uma reviso crtica ou, no

    plano social, de que os grupos podem no ser a questo mais importante, tomada por

    muitos como uma traio a nossa tica social e acadmica. Mas tudo que estamos

    fazendo desafiar o como se da antropologia sistmica, a atitude dos antroplogossociais britnicos e dos estruturalistas franceses, que diz: Vamos supor que os nativos

    so como ns para que possamos entend-los. E estamos desafiando essa suposio

    para evitar uma perspectiva antropolgica que inadvertidamente faz com que nossas

    prprias suposies culturais se tornem parte da forma como as coisas so, da forma

    como toda a humanidade pensa e age.

    Os antroplogos tm uma responsabilidade tica ao lidar com outros povos e mundos

    conceituais com base na igualdade e mutualidade. Quando um antroplogo resume a

    vida e a imaginao de seus sujeitos de pesquisa em um sistema determinista que ele

    mesmo arquiteta, capturando os pendores e inclinaes destes no interior das

    necessidades das economias, ecologias e lgicas prprias ao antroplogo, ele afirma a

    prioridade do seu modo de criatividade sobre o deles. Substitui a forma como os

    nativos fazem suas coletividades pelo seu prprio fazer (heurstico) dos grupos,

    ordens, organizaes e lgicas. E esse modo nativo defazera sociedade, e no suas

    curiosas semelhanas com nossas noes de grupos, economia ou coerncia, que movenosso interesse aqui. O entendimento dessa criatividadeper se a nica alternativa tica

    e terica aos esforos paternalistas que civilizariam os outros povos ao transformar os

    remanescentes de seus esforos criativos em grupos, gramticas, lgicas e economias

    hipotticas.

    Ao perguntar se existem grupos sociais nas terras altas da Nova Guin, no estou

    preocupado com quais tipos de grupos melhor descrevem os arranjos comunais locais,

    mas com a forma como as pessoas se criam socialmente l. As respostas a essa questo

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    podero ajudar-nos a dizer se os modelos do grupo corporado, do sistema de

    linhagens segmentares, ou da unidade conceitual estrutural tm qualquer relevncia

    particular para aquela situao, e podem nos revelar ainda mais. Temos inmeras

    maneiras de definir grupos com base na residncia, genealogia, poltica, economia, e

    assim por diante , assim como temos muitos tipos de definies para grupos

    inclusive os mencionados acima e os constructos marginais ou negativos (grupos que

    no so grupos) denominados parentela, quase-grupos e redes , mas

    praticamente no dispomos de nenhuma alternativa inteiramente satisfatria para o

    conceito de coletividade grupal. Pior ainda, no contamos com nenhum conjunto de

    critrios para determinar quando um conceito como este aplicvel e quando no .

    Como a noo de grupo nossa, o problema de encontrar critrios como esses cabe ans. Visto que no mago de nossa noo (e de nossos motivos para encontrar grupos)

    encontra-se um foco coletivo deliberado, um sentido de participao e conscincia

    comuns, nossos critrios devem enfatizar esse fator. Outras formas de agrupar as

    pessoas com base em suas semelhanas compartilhadas, sejam elas especificidades de

    residncia comum ou contgua, cooperao ou envolvimento econmico ou ecolgico,

    genealogia ou comportamento poltico podem facilmente se tornar dispositivos para

    criar grupos a partir de pessoas que, elas mesmas, nunca o fariam dessa forma (ou,talvez, no o fariam de forma alguma). Um povo possui grupos na medida em que, e

    segundo a forma como, concebe tais coisas; caso contrrio, o antroplogo simplesmente

    possui as pessoas ao impor sua ideia de grupos a elas.

    Como, ento, os povos das terras altas da Nova Guin criam sua socialidade? Quais so

    os fatos, tais como os nativos os fazem? Eles tm a sociedade como problema e

    uma soluo sistmica para ela, ou seus problemas so concebidos de forma totalmente

    diferente, relacionando-se apenas indiretamente ao agrupamento social? Podemosaprender a compreender ou simular sua criao dos fatos sociais sem transform-los

    em pees2 do nosso prprio jogo? Uma maneira de tentar responder a essas questes

    considerando um povo especfico de tantos pontos de vista quantos forem possveis,

    com certa ingenuidade, especialmente no que concerne a grupos e sistemas, da forma

    como um pesquisador de campo poderia abord-los. Consideremos dessa maneira os

    Daribi, povo do leste das terras altas da Nova Guin entre os quais fiz pesquisa de

    campo.2 Em ingls,pawn, que alm de peo poderia ser traduzido como penhor, garantia. (N.T.)

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    A SOCIALIDADE DARIBI

    Se pudssemos voltar no tempo e visitar Baianabo, o local onde vivi durante grande

    parte de meu primeiro perodo de campo (1963-1965), por volta de 1950, dez anos antes

    de o povo daribi ser pacificado pelo governo, l encontraramos roados e umpequeno povoado. Talvez vocs no reconhecessem os roados como tais, pois eles

    seriam do tipo coivara ou corte-e-queima, com troncos de rvores mortas e sem

    folhas ainda eretos ou jazendo onde haviam cado, cobertos pela folhagem de batata-

    doce (a base da alimentao). Ao redor haveria reas de floresta secundria: antigos

    roados em vrios estgios de recrescimento da floresta, e talvez tambm clareiras que

    vo sendo abertas para novos roados. Ao redor disso tudo, sobre um amplo planalto

    vulcnico cerca de mil metros acima do mar, encontra-se uma floresta tropical madura,repleta de rvores de tronco branco ou cinza com 1,50 m a 1,80 m de dimetro na base.

    Aqui vivem cerca de quatro ou cinco homens adultos com suas famlias. O mais velho

    um homem baixo, com cabelo embranquecendo, de nome Buruhw3. Perguntamos-lhe

    quem so suas pessoas de casa (uma expresso local); ele hesita, murmurando as

    pessoas de minha casa, e ento diz: Weriai. Em conversa com ele, descobrimos que

    nasceu num local chamado Waramaru. Ento sua irm se casou em Peria, um amplo

    complexo de casas e roados cerca de 1,5 km ao norte de onde estvamos; e ele se

    mudou para c, para Baianabo, para ficar perto dela.

    A impresso de que estvamos nos deparando com uma daquelas situaes geralmente

    conhecidas na antropologia social como um caso especial, mas na verdade esse tipo

    de histria pessoal comum entre os Daribi. Perguntamos aos outros homens sobre suas

    pessoas de casa e locais de nascimento e descobrimos que eles so Weriai ou

    Kurube, nascidos em Waramaru. Onde vivem os outros Weriai? Descobrimos que

    alguns vivem em uma casa bem prxima, muitos outros vivem em Waramaru, com o

    povo de Noru ou o povo de Sogo, e muitos outros vivem com um povo chamado

    Nekapo. Acabamos por descobrir que Waramaru fica a um bom dia de caminhada

    exigente a oeste, com muitos outros povos no meio, e que o povo de Nekapo vive a

    talvez meio dia de caminhada para alm desse ponto. Se os Weriai so de fato pessoas

    de casa, eles certamente esto espalhados por uma considervel nesga de paisagem; e

    3 Os termos daribi aqui citados foram escritos na ortografia latina padro, na qual cada vogal tem seu

    prprio som distintivo (por exemplo, o e pronunciado como o a em gate, o u como o oo em boot) eo r levemente vibrante. As palavras so, em geral, pronunciadas como o seriam em espanhol. Oapstrofo (como em mama) indica tom alto, e o cedilha (como em Buruhw) denota nasalizao.

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    se alguns vivem com os Peria, outros com os Sogo ou Nekapo, tambm parecem estar

    bem distribudos. isto um grupo, uma tribo, um cl no localizado? O que quer

    que possa ser, o que significa Kurube? Ser talvez um outro nome para Weriai? Mas

    antes de pegarmos nossos exemplares de Notes and Queries in Anthropology, o guia

    padro do pesquisador de campo em situaes como essa, para buscarmos uma

    definio adequada, deveramos nos lembrar de que estamos deliberadamente tentando

    no jogar o jogo heurstico de chamar socialidades desconhecidas de grupos para

    aliviar nosso senso explicativo. Uma definio padro, centrada nos grupos,

    simplesmente no ser suficiente, ao menos at que tenhamos aprendido mais sobre

    essas pessoas.

    Termos gerais como pessoas de casa e termos especficos como Weriai, Kurube eNoru fazem parte dos vastos meios sempre em expanso de que os Daribi se valem para

    estabelecer distines sociais. Os ltimos so chamados bidi wai, ancestrais homens,

    e caracteristicamente se baseiam nos nomes de ancestrais genealgicos, embora este

    nem sempre seja o caso. quase certo que Sogo, Weriai e Kurube so nomes de

    ancestrais reais (Kurube desenvolveu-se a partir de Kuru, que se diz ser outro nome

    do homem chamado Weriai); Noru e Nekapo provavelmente no o so. Mama Dibe

    e Huzhuku Dibe (Dibe claro e escuro, respectivamente) distinguem o povo Dibe,que vive prximo ao rio claro, dos que vivem no sop da montanha escura.

    Se estivssemos absolutamente empenhados em encontrar grupos, no haveria

    problema algum em supor que essas descries so descries ou definies de grupos

    concretos, definidos e empiricamente existentes. O fato de que alguns deles incluem

    outros poderia ser tomado como evidncia da existncia de um sistema de linhagens

    segmentares diz-se que os Weriai, Daie, Sizi e outros so Para, provenientes de

    certos filhos de um homem chamado Para, que os Kurube eram Weriai que viviam comos Sogo, que os Noruai eram Weriai que viviam com os Nekapo, e assim por diante.

    Isso resulta em um arranjo hierrquico de grupos que se tornam progressivamente mais

    inclusivos com base em clculo genealgico e padronizados em nveis aos quais

    correspondem rtulos, de modo que os Para podem ser considerados uma fratria, os

    Weriai um cl, os Kurube um subcl.

    A ordem hierrquica necessria a um modelo desse tipo certamente est l, implcita no

    fato de que se pode considerar que os termos se incluem, excluem ou contrastam uns

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    com os outros. Contudo, seria prudente considerar as distines a partir de seu valor de

    face, apenas como distines e no como grupos. Elas agrupam as pessoas apenas na

    medida em que as separam ou distinguem com base em algum critrio, e no podemos

    deduzir das distines conceituais uma correspondncia real entre os termos e os grupos

    de pessoas distintos e conscientemente percebidos.

    Os termos so nomes, no so as coisas nomeadas. Eles diferenciam ao dizer: Estes so

    os do rio; aqueles so os da montanha, ou Estes so provenientes de Weriai; aqueles,

    de Daie, e so significativos no por causa da forma como descrevem algo, mas por

    causa da forma como o contrastam com os outros. Em sua brilhante anlise do

    totemismo, Lvi-Strauss conclui que No so as semelhanas, mas as diferenas

    que se assemelham (1975). Assim, embora Weriai signifique cegado em daribi eDaie signifique estar completamente cozido, nenhum dos dois tem significado literal;

    trata-se apenas de nomes, e nessa condio o contedo de um diferencia de forma to

    efetiva quanto o do outro.

    Como nomes usados para estabelecer distines, esses termos so muito flexveis.

    Para, por exemplo, uma contrao de pariga (caixa torcica) e s vezes usado

    como apelido que indica preguia (Ele chamado de costelas porque passa o dia todo

    deitado sobre elas). Seja por este motivo ou por algum outro, estabeleceu-se uma

    associao entre o nome e um homem que teria supostamente originado diversas

    linhagens de substncia paterna, um bidi wai comum. O nome pode ser usado para

    distinguir todas essas linhagens de outros complexos como Noru ou Dibe, para

    distinguiralgumas delas de partes da ltima (em Waramaru, Weriai chamava o povo de

    Sogo de Noru), ou para distinguir algumas das linhagens de Para de outras.

    Frequentemente se refere como Para queles que se autodenominam Sizi, Warai,

    Ogwanoma ou Siabe em contraposio aos Weriai, por exemplo, ou aos Daie, emboraos ltimos sejam, sob outros aspectos, to Para quanto eles mesmos.

    H bons motivos por trs dessas aparentes irregularidades. Por um lado, os Daribi

    tendem a usar termos os mais amplos e menos especficos possveis na maioria das

    situaes. Por outro lado, os Sizi, Warai e Ogwanoma ficaram para trs em Boromaru,

    lar tradicional dos Para, ao passo que as outras linhagens se mudaram para longe. Mas a

    despeito disso, dificilmente se pode dizer que os Para representam um grupo, pois

    impossvel, dada a abrangncia do uso do termo, determinar qual das aplicaes a

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    correta. Para um nome, no um grupo; uma forma de distinguir, de incluir e

    excluir; , pois, meramente um dispositivo para estabelecer fronteiras.

    Um dispositivo desse tipo pode ser usado de forma muito flexvel, estabelecendo ora

    esta distino, ora aquela, sem nunca se vincular a um elemento particular ou a umdomnio delimitado de definio. Esse uso amplo ou hiperblico dos termos pode

    ser mais bem exemplificado na distino daribi das cores. Quando se mostra aos Daribi

    um objeto verde, azul ou marrom escuro, eles o identificam como huzhuku; quando se

    lhes mostra algo que chamaramos de vermelho, escarlate, carmesim, ou mesmo

    marrom claro, eles designam o objeto como mama; nosso amarelo ou amarelo-

    esverdeado so sewa para eles. Contudo, ao falarem do fruto do pandano, cujas

    variedades vo em geral do escarlate ao rosa antigo, embora uma delas seja amarelo-mostarda, eles se referiro ao primeiro como huzhuku e ao ltimo como mama! As

    qualidades contrastantes dos termos (escuro/claro) revelam-se mais significativas nesse

    contexto do que os valores mais especficos (de cor).

    Quais so os efeitos sociais desse tipo de uso? Estabelecer fronteiras criando contrastes

    tem o efeito de eliciar4 grupos como um tipo de contexto geral para a expresso de

    algum, aludindo a eles indiretamente, e no os organizando ou participando deles de

    forma consciente. As coisas que ns imaginamos como grupos assumem uma

    qualidade contnua e praticamente invisvel, como nossa noo de tempo, que

    igualmente tentamos eliciar e impelir por meio das distines e dos contrastes

    arbitrrios de nossos relgios e calendrios5.

    A eliciao de coletividades sociais por meios indiretos mais do que um mero

    dispositivo retrico entre os Daribi; trata-se de um estilo ou modo criativo que perpassa

    toda a gama de suas atividades. Um homem que tenha sido ofendido, por exemplo,

    frequentemente se enfurece e grita, dando vazo a sua raiva deliberadamente at o limite

    e se ele provocar um oponente para que este lhe responda com fria, tanto melhor. Ele

    est tentando eliciar uma resposta coletiva em forma de conciliao, negociadores da

    4 Optamos por manter aqui o termo como existe em portugus, embora o termo elicitar, neologismocriado a partir do ingls to elicit, seja usado em disciplinas como a lingustica e tenha sido adotado natraduo recentemente publicada dA inveno da cultura. (N.T.)

    5 pouco surpreendente, luz disso, que Leach e outros tenham introduzido o conceito de tempo social

    ou genealgico como dispositivo explicativo. Mesmo as imagens escolhidas pelos melansios linhas em pidgin, cordas em muitos idiomas locais enfatizam a continuidade, e no a grupidadedescontnua.

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    paz que faro com que se entendam, apesar da injria sofrida, em prol do interesse geral

    (e para pr fim terrvel algazarra!).

    Os nomes simplesmente delineiam um modo de criatividade cujo aspecto mais srio, ao

    menos em termos nativos, o da troca de riquezas. Essa troca, por sua vez, deriva deum outro uso do contraste e da distino para eliciar relaes sociais nesse caso, a

    distino e o contraste mais bsicos: entre homens e mulheres. Os homens enfatizam

    sua masculinidade em oposio s mulheres, que em troca afirmam sua

    feminilidade, cada qual recebendo do outro uma resposta e um aspecto

    complementar de seu todo social. As mulheres so valorizadas por suas habilidades

    produtivas e reprodutivas, pela capacidade de realizar trabalho feminino e ter filhos,

    criatividade qual os homens respondem assumindo o controle sobre ela. O controle obtido pela negociao de trocas de mulheres (bem como de sua progenitura, seus

    produtos) por produtos e implementos da criatividade masculina os machados

    usados no roado, a carne (inclusive porcos), que se acredita aumentar o lquido

    espermtico, e as conchas de madreprola, que criam a imagem masculina assertiva. Na

    verdade, essas trocas constituem uma substituio da criatividade masculina por seu

    correlato feminino.

    Toda aquisio legtima de uma mulher e como todos os seres humanos nascem da

    criatividade feminina toda aquisio de uma pessoa ocorre necessariamente por meio

    desse tipo de troca. Consequentemente, todo Daribi possui pagebidi (pessoas no

    fundamento) que tm direito a receber riquezas masculinas em troca de sua proteo

    ou afiliao. Ospagebidi incluem os irmos e outros parentes prximos de uma mulher,

    bem como os parentes maternos prximos de um homem ou de uma jovem solteira.

    Deve-se pagar por todas as pessoas dessa forma, e todo ato de troca estabelece um

    contraste entre o masculino e o feminino.

    Figura 4.1 Preo da noiva daribi: conchas de madreprola, machados, faces,

    adereos de conchas e tecidos. (Masi, 1968)

    Assim, toda troca na qual uma mulher ou criana adquirida por um homem

    corresponde a um ato de diferenciao, uma separao da mulher de seus parentes ou da

    criana (e s vezes do adolescente) de seus parentes maternos, realizada por meio da

    concesso de riquezas masculinas. E assim como todos tm pagebidi, que devem serrecompensados dessa forma, todos tambm tm be bidi (pessoas de casa),

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    principalmente o marido ou os parentes paternos, que realizam a compensao. Essa

    distino, somada troca diferenciante por meio da qual realizada, em si a questo

    mais importante da vida social daribi. Num sentido importante, ela a vida social

    daribi, pois suas consequncias e implicaes so respeitadas a despeito de outros

    fatores e circunstncias. Os be bidi tm sempre de ser mantidos distintos dos pagebidi,

    de modo que mesmo se pessoas intimamente relacionadas decidissem se casar (como s

    vezes decidem), seus parentes mesmo que todos vivam na mesma casa (como s vezes

    vivem) teriam de se subdividir nessas duas categorias para a ocasio. Ademais, nesse

    ou em qualquer outro caso, os be bidi so terminantemente proibidos de partilhar

    qualquer poro da carne dada aos outros pelospagebidi.

    Figura 4.2 Noiva daribi em p ao lado de membros do grupo do noivo, em trajestradicionais: penas de casuar, conchas brancas, corpo e rosto enegrecidos com

    fuligem. (Masi, 1968)

    Os prprios Daribi dizem que se casam com as irms e filhas daqueles para os quais

    do carne, e no podem se casar entre aqueles com os quais comem (ou

    compartilham) carne. Assim, a distino explcita que se estabelece em qualquer troca

    entre os que compartilham carne ou outras riquezas e os que trocam carne ou

    riquezas. Cada ato ou distino desse tipo estabelece uma fronteira. Mas como o foco se

    volta para a prpria distino, essa fronteira , na verdade, mais significativa do que as

    coisas que ela diferencia. Pode acontecer, por exemplo, de algumas pessoas que

    anteriormente se identificavam umas com as outras desejarem casar entre si; isso ser

    tolerado, embora possa no ser coerente com as relaes anteriores, desde que uma

    diferenciao adequada e bem definida seja estabelecida entre elas.

    Assim como no caso dos nomes, o contedo especfico (definitivo ou descritivo) das

    coisas referidas (as unidades sociais, as categorias be bidi e pagebidi)permanece

    implcito: o que se explicita a distino que as separa ou diferencia. Portanto, assim

    como se pode dizer que os nomes eliciam coletividades sociais no ato de distingui-las,

    pode-se considerar que as trocas que atribuem direitos sobre uma mulher ou criana

    eliciam casos especficos de be bidi e pagebidi. Em virtude das restries que

    necessariamente acompanham trocas desse tipo, toda troca criar, assim, suas prprias

    circunstncias sociais. Mesmo que no se parta dos grupos, uma vez que estes nunca

    so deliberadamente organizados, mas to-somente eliciados por meio do uso de nomes,

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    o resultado final so sempre punhados especficos de pessoas como be bidi epagebidi.

    Trata-se de uma sociedade automtica, que de repente se manifesta de forma concreta

    onde quer que as distines corretas sejam feitas. O que podemos desejar chamar de

    socialidade permanente existe como um contexto associativo que emana de uma

    ocasio ad hoc desse tipo para outra.

    Com exceo das restries correntes relativas partilha ou no das contnuas ddivas

    de carne que se seguem ao casamento e ao nascimento das crianas, os quais tendem a

    congelar as distines e categorias, os agrupamentos no so mais completamente

    coerentes entre si do que aqueles eliciados pela nomeao. Com base na sobreposio

    de restries ao compartilhamento, nodos de pessoas surgem em vrios graus de

    inclusividade informal que denomineizibi, cl e comunidade (Wagner, 1967). (Como seacredita que os fluidos reprodutivos masculinos so aumentados e se acumulam pelo

    consumo de carne, um pai e seus filhos so automaticamente compartilhadores de

    carne.) Contudo, isso no estabelece, de modo algum, uma hierarquia rgida, uma

    organizao para a partilha e troca adequada de carne. Um cl composto porzibi

    constitutivos, que tendem todos a cooperar na partilha e falar de sua associao mtua

    dessa forma, mas no incomum que seus membros se casem entre si e, portanto,

    troquem. Uma comunidade composta por cls que, na maioria das vezes, casaram, eportanto trocaram, entre si; contudo, eles se referem a sua associao como partilha de

    carne. A coerncia nem sempre mantida de um nvel nodal para outro; portanto,

    qualquer tentativa de compor o todo como um sistema ou ordem estar

    invariavelmente comprometida.

    Assim, zibi, cl e comunidade no so grupos no sentido de construes

    deliberadamente organizadas ou ideologicamente regulamentadas. Termos como cl e

    comunidade podem ser formas teis de se referir a esses agrupamentos associativos,contanto que tenhamos em mente que esses termos geralmente denotam associaes

    bastante no intencionais e no tentemos transform-los em representaes de nossas

    prprias corporaes e organismos conscientemente scio-polticos. Eles so a

    socialidade e a relao humana sem distines inerentes, e por isso que as pessoas

    precisam elas mesmas estabelecer distines, embora, claro, tambm eliciem a

    socialidade no ato de estabelec-las. Nesse aspecto, so o oposto de nossas formas

    ocidentais, em que as pessoas formam grupos por meio da participao deliberada e,assim, eliciam distines de classe e nacionalidade.

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    Nas sociedades tribais, um tanto quanto sem sentido perguntar-se onde esto os grupos

    em si, pois eles nunca se materializam de fato. O que vemos na forma de uma aldeia ou

    agrupamento comunal apenas uma aproximao bastante semelhante, uma

    representao ad hoc de uma abstrao, que dar conta da situao. A socialidade

    algo que se torna, no que se tornou, e sua eliciao se assemelha ao conceito de

    deficit spending6: as pessoas traam fronteiras, impelem e eliciam, e as relaes

    tomam conta de si mesmas.

    EFEITOS DO CONTATO COM O OCIDENTE

    Quando os homens brancos chegaram a Karimui pela primeira vez, sentiram-se

    fortemente impelidos a descobrir grupos. Eles eram administradores que se deparavam

    com a tarefa de construir uma interface entre as instituies dos nativos e as suas

    prprias com o propsito de decompor uma coleo de nomes e povoados distribuindo-

    os em grupos que pudessem servir como os elementos finais (locais) de uma cadeia

    poltica de comando. Eles eram herdeiros de uma tradio colonial autoconsciente, e

    muitos deles haviam frequentado cursos de cincia dos grupos de descendncia como

    parte de seu treinamento. Em suma, sabiam qual supostamente deveria ser a

    configurao da sociedade nativa. E eles tambm recebiam instrues explcitas sobre

    como lidar com os grupos: em cada (dito) grupo local, um lder, ou Tultul, era

    designado, e cada Tultul era encarregado de manter o livro da aldeia, no qual se

    registravam os dados do censo. Ao se depararem com um desnorteante caos de terras de

    famlia dispersas e nomes sobrepostos, reagiam da nica forma que sabiam criavam

    grupos.

    Para tanto, eles podem ter solicitado a ajuda das prprias pessoas, agrupando todas as

    que eram identificadas pelo mesmo nome (se no fossem muitas) e ignorando quaisquer

    contradies com as quais no conseguissem lidar, pois se contentavam em deixar que

    as fronteiras do grupo tomassem conta de si mesmas. Em todo caso, as pessoas, que at

    ento viviam em casas comunais de um ou dois andares (que abrigavam de duas a

    sessenta pessoas) dispersas entre os locais alternantes de seus roados, eram obrigadas a

    abandonar o padro tradicional e instalar-se em aldeias nucleadas. (Esse conceito era

    completamente novo para os Daribi, que ainda usam a palavra be, casa, para se

    referirem a esses complexos.) Uma reorganizao em aldeias desse tipo caracterstica

    6Deficitoramentrio sistemtico cujo objetivo estimular a atividade econmica. (N.T.)

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    da poltica e do controle administrativo em toda a Papua-Nova Guin. Vrias

    motivaes para isso j foram apontadas: diz-se que facilita a organizao das pessoas

    para o censo, por exemplo, e que mais salubre do que os arranjos aborgines. Mas na

    verdade ele apresenta uma vantagem predominante, que pe fim ambiguidade mais

    relevante do ponto de vista desses outsiders: torna os grupos visveis para pessoas que

    simplesmente no conseguem conceber a socialidade humana de nenhuma outra forma.

    Figura 4.3 Bebidi:Povo twa em sua sigibe, casa comunal de dois andares (1963). Os

    homens vivem no andar superior e as mulheres, no inferior.

    A maior parte das aldeias em Karimui foi formada em 1961-1962 (Russell et al.,

    1971:83), embora alguns desgarrados ainda vivessem de acordo com o padro

    tradicional at 1969. No final de 1963, quando cheguei pela primeira vez a Karimui, as

    aldeias eram parte caracterstica da paisagem local; os nativos de fato viviam nesses

    ncleos, a despeito de quem os tivesse feito. Mas seria este um motivo suficiente para

    consider-los grupos? A resposta a esta questo no fcil, e uma boa resposta requer

    que apreciemos as evidncias. Consideremos de perto o reassentamento do povo Weriai

    de Buruhw.

    Os oficiais de patrulha que encontraram os Weriai em meados da dcada de 1950provavelmente ficaram desnorteados com a disperso dessas pessoas. De modo a

    endireitar as coisas e acidentalmente aumentar o potencial de mo de obra local

    solicitaram que todos os Weriai mudassem para Baianabo. (A medida no foi to

    extrema quanto pode parecer; os Kurube alegaram que estavam se dirigindo

    lentamente para Baianabo de qualquer modo, e esse tipo de movimento em cmera

    lenta era, de fato, bastante caracterstico desses movimentos demogrficos.) Por volta

    de 1960, todos os Weriai de Waramaru, bem como vrios dos que haviam se assentado

    recentemente em um local chamado Suguai, haviam se unido ao povo de Buruhw em

    uma nica casa comunal de dois andares em Baianabo. Vrios outros Weriai de Nekapo

    haviam se mudado para casas semelhantes numa extenso de terra adjacente chamada

    Sonianedu.

    Fig. 4.4 Vista de Kurube (povoado C) em 1964. Embora as casas enfileiradas

    estejam se deteriorando, a grama foi cortada e a estrada escavada para esperar a

    visita do Oficial de Patrulha.

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    Pouco tempo depois, os Weriai foram instados pelo governo (fortemente premidos por

    uma misso fundamentalista) a construir fileiras de moradias para famlias nucleares em

    estilo ocidental, ou casas enfileiradas. Estas foram abandonadas em 1966 porque

    traziam aborrecimentos e colocavam a sade em risco, mas as pessoas nunca voltaram

    ocupao altamente concentrada em casas comunais que predominava antes do contato

    com o Ocidente. Assim, a aldeia, tal como surgiu em 1968, assumiu a forma de uma

    fileira esforada de casas, com ncleos de concentrao perceptveis, dispersas por

    quase um quilmetro ao longo de um caminho desimpedido conhecido localmente como

    a estrada do grande carro do governo (Fig. 4.5). Os ns ou povoados (designados de

    A a D na Fig. 4.5) provavelmente representam pessoas que compartilhariam a mesma

    casa comunal em condies pr-contato.

    Fig. 4.5Regio de Baianabo-Sonianedu, 1968.

    Roado

    Floresta secundria

    E. Bosia

    E. Tobaia

    Estrada do governo

    As prprias pessoas no possuem termos gerais para esses povoados. Embora possam se

    referir a eles como be, essa palavra mais frequentemente usada em conexo com as

    casas propriamente ditas e seu uso , portanto, ambguo. Ademais, embora as pessoas

    com frequncia se refiram ao povoado A como beKilibali, a B como beNoruai e a C

    ou D (ou a ambos) como be Kurube, qualquer um desses nomes pode ser usado em

    referncia aldeia ou ao complexo como um todo. Por vezes o termo Weriai aplicado

    a todo o complexo, mas isso raramente ocorre no interior da prpria aldeia. mais

    comum que no se faa referncia alguma ao complexo como um todo. Em seu interior,

    termos como Kilibali, Noruai e Kurube podem ser usados para traar distines, embora

    eles caracteristicamente no deem conta do fluxo reduzido, mas perceptvel, de pessoas

    que transitam de um povoado a outro. De fato, os povoados C e D, formados pela

    diviso de um povoado maior a partir de 1966, ainda no encontraram meios verbais

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    efetivos para se diferenciar: os membros de cada um deles chamam seu prprio povoado

    de Kurube e improvisam um nome para o outro na hora

    Uma vista de olhos sobre a real distribuio das casas (Fig. 4.6) mostra que os prprios

    nodos no so muito definidos. Em primeiro lugar, vrias pessoas que, de outro modo,poderiam viver em A e B passam a maior parte de seu tempo em casas menores

    localizadas em seus roados. Mas, mesmo no mapa, verifica-se a curiosa anomalia da

    casa marcada com um X. Ela parece estar situada exatamente no meio, entre C e D.

    Existe um bom motivo para isso. Dos dois homens que moram nela com suas famlias,

    um tem uma relao prxima com as pessoas de D, mas obteve sua mulher roubando-a

    do homem mais poderoso de D. Se falarmos em grupos definidos, fica difcil decidir

    qual afiliao atribuir a essas pessoas, mas felizmente, para eles ao menos, o problemanunca se coloca.

    Figura 4.6 Casas e povoados em Baianabo-Sonianedu, 1968.

    Casa nativa, com n de habitantes

    Edifcio da misso, etc.

    Esses povoados aculturados no so grupos mais literal e deliberadamente

    constitudos do que os povoados mais dispersos que existiam antes do controle do

    governo. Eles se misturam como uma socialidade contnua que parece clamar pelas

    distines que efetivamente a eliciam. Trata-se de uma socialidade adaptada maneira

    como os nativos lidam com ela (que , de fato, uma forma de cri-la), a qual surgir em

    qualquer lugar ou momento em que as pessoas escolherem lidar com ela assim. Se essa

    forma particular de socialidade parece de alguma forma adaptada noo de sociedade

    do homem branco, isso ocorre apenas porque as pessoas elas mesmas foram fortemente

    coagidas a causar essa impresso. Elas tambm tm o hbito de vestir roupas de estilo

    ocidental, o que comeou em parte porque outsiders desejavam que se vestissem como

    ocidentais. Isso no quer dizer, contudo, que elas usem suas roupas da forma como os

    ocidentais o fazem, que as tratem como os ocidentais as tratam, ou que pensem sobre

    elas como eles pensam.

    Entretanto, se considerarmos as pessoas de uma certa forma, ignorando ou no

    enxergando as diferenas significativas, elas parecero ocidentais. Analogamente, seconsiderarmos sua vida social de uma certa forma, veremos essas aldeias, grupos,

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    corporaes ou sistemas jurais. No obstante, porque a socialidade nativa no resulta de

    agrupamento, mas antes produto de eliciao indireta, ela assume uma aparncia

    distinta a cada mudana de perspectiva do observador. Examinamos o traado real das

    casas concretas e descobrimos que ele apenas vagamente representativo do

    agrupamento. Se escolhermos diferenciar os povoados com base nas distines

    nativas usuais (Tabela 4.1), descobrimos que cerca de 80% dos residentes podem ser

    atribudos beWeriai cerca de 40% para Noruai e 40% para Kurube (sem considerar

    o fato de que os ltimos na verdade compreendem dois nodos, ou be). Mas se, ao invs

    disso, realizamos uma investigao da ancestralidade paterna dos chefes masculinos das

    unidades residenciais (lembrando que eles so automaticamente partilhadores de

    carne com seus descendentes e, portanto, com seus prprios pais), encontramos uma

    situao bastante distinta (Tabela 4.2). Nesse aspecto, apenas cerca de metade das

    pessoas so be bidi Weriai, e Noruai e Kurube perfazem, cada um, cerca de 25% do

    total, ao passo que a maior parte do restante no nem mesmo identificada como Para.

    Tabela 4.1Identidades coletivas em Baianabo-Sonianedu (1968) com base no local de

    residncia

    Termos de referncia Nmero de pessoas Porcentagem do total

    Kilibali

    povoado A 33 14,1

    em casas no roado 13 5,6

    Total 46 19,7

    Weriai

    Noruai

    povoado B 83 35,4

    em casas no roado 13 5,6

    Total 96 41,0

    Kurube

    povoado C 42 17,8

    povoado D 37 15,8

    casa X 13 5,6

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    Total 92 39,2

    Total 188 80,2

    Total geral 234 99,9

    Tabela 4.2 Identidades coletivas em Baianabo-Sonianedu (1968) com base na

    identificao genealgica do chefe masculino da unidade residencial

    Termos de referncia Nmero de pessoas Porcentagem do total

    Para

    Weriai

    Kurube 60 25,7

    Noruai 59 25,2

    Total 119 50,9

    Yao 4 1,7

    Total 123 52,6

    Nekapo

    Kilibali 67 28,6

    Noru

    Dogwaro-Hagani 28 11,9

    Sogo 10 4,3

    Total 38 16,2

    Masi

    Yasa Masi 3 1,3

    Maina 3 1,3

    Total 6 2,6

    Total geral 234 100,0

    Essas discrepncias so o resultado direto de uma abordagem ingnua e literal de

    fenmenos que so indiretamente eliciados por seus criadores. Embora documentados

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    de forma precisa, eles esto sujeitos a um certo equvoco de enfoque respostas

    corretas para o problema errado. Se levados ateno de um nativo, certamente no o

    inquietariam muito. Ainda que a residncia e o compartilhamento da carne com os be

    bidi de algum sejam questes de importncia crucial para os Daribi, no so utilizadas

    como programa para a formao deliberada de grupos no fazem parte de um esforo

    sistemtico para construir uma sociedade e no apresentaro os tipos de coerncia que

    esperamos ao supor isso.

    Discrepncias desse tipo aparecem reiteradas vezes na literatura antropolgica sobre as

    terras altas da Nova Guin e, como a maior parte dos estudiosos da rea compartilhava

    uma f na necessidade dos grupos, as discrepncias so frequentemente apresentadas

    como evidncias de um problema importante. Como os habitantes das terras altas noparecem prestar muita ateno aos supostos dogmas da descendncia, diz-se que so

    pragmatistas, ou se supe que os dogmas reais so os da residncia (de Lepervanche,

    1967). Contudo, parece que foram os antroplogos, e no os nativos (a julgar pelos

    registros estatsticos), que trouxeram os dogmas tona. A alternativa abordagem do

    dogma foi a suposio da estrutura frouxa, grupos com certa margem estratgica

    ou flexvel em suas organizaes (Pouwer, 1960) em resumo, um outro arranjo para

    possuir seus grupos teoricamente e com-los pragmaticamente

    7

    . Outros foram maislonge e sugeriram que a ao dos melansios tem um fundamento de improvisao

    (Held, 1961; Wagner, 1972), ou postularam uma concepo da prpria sociedade como

    fluxo (Watson, 1970), como fiz aqui.

    claro que se administradores capazes e experientes, munidos de um mandado das

    Naes Unidas e fuzis de 7,7 mm, no foram capazes de reorganizar essas pessoas em

    grupos claramente delimitados ao modo ocidental, estaramos pedindo demais aos

    acadmicos ao esperar que eles o faam com caneta, tinta e definies. O problema estmal colocado se imaginamos o agrupamento (ou seja, a construo deliberada da

    sociedade) como tarefa do nativo quando ela , na verdade, nossa prpria tarefa.

    nosso trabalho, e no do nativo, dar conta das discrepncias, uma vez que no se trata de

    discrepncias para ele. tambm nosso trabalho explicar por que elas deveriam ser

    consideradas como discrepantes, ou como irrelevantes, pois ao determinar quais sero

    7 O trecho faz referncia a um provrbio em ingls sobre a impossibilidade de se ter tudo: You cant havethe cake and eat it too literalmente: No se pode ter o bolo e com-lo ao mesmo tempo. (N.T.)

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    nossas suposies e problemas iniciais, tambm determinamos que tipos de evidncias

    sero relevantes e admissveis.

    CONCLUSO

    Para muitas pessoas, bem mais fcil supor a existncia de grupos do que tentar

    compreender as sutilezas de como os nativos conceitualizam sua socialidade. Os

    grupos e a sociedade formam uma espcie de idioma taquigrfico moderno para

    certos fenmenos sociais eles existem como parte do objeto de estudo, como

    fatos, para quem acredita neles ou precisa deles. Entretanto, a questo de se esses

    fatos existem onde quer que tenham sido postulados, se o social existe ao nvel

    objetivo dos fenmenos, uma questo de qual teoria decidimos seguir. Estamos

    habituados a confundiras formas como estudamos os fenmenos, as teorias por meio

    das quais os entendemos, com os prprios fenmenos. Assim, falamos sobre a qumica

    do corpo, a biologia da reproduo humana, a ecologia de uma floresta, falamos

    sobre o mundo segundo os modos como viemos a conhec-lo (o que bem

    compreensvel).

    Os modelos so modos de fazer (ou, como a linguagem da cincia preferiria, de

    descobrir) os vrios nveis fenomnicos ao criar as caractersticas segundo as quaisos percebemos a cincia dos grupos de descendncia um conjunto de modelos para

    transformar a interao social em grupos de descendncia. O analista pode ter certas

    predisposies a respeito de como gostaria de elaborar, dessa forma, o mundo de sua

    investigao, ou pode desejar tentar trabalhar em vrios nveis, mas uma vez que se

    tenha comprometido com um certo modelo, suas concluses esto em certa medida

    predeterminadas.

    A questo dos grupos sociais e sua realidade pode ou no ser significativa,dependendo do tipo de antropologia em que se est interessado. Mas as implicaes do

    que o antroplogo faz quando supe a existncia e a necessidade dos grupos so

    questes essenciais a serem consideradas por todos os antroplogos. Elas sugerem que

    ns somos to criadores quanto os povos que estudamos, e precisamos prestar ateno

    tanto nossa criatividade quanto criatividade deles. Dito de modo um pouco diferente,

    a suposio da criatividade coloca o antroplogo em igualdade de condies com seus

    sujeitos de pesquisa; tambm o nativo um antroplogo, com sua prpria hiptesede pesquisa sobre seu modo de vida. E a despeito de como desejamos compor esse

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    modo de vida, temos de avir-nos com a teoria do prprio nativo por uma questo de

    dever profissional e tico.

    Esse tipo de cincia, que lida com um sujeito de pesquisa pertencente mesma ordem

    de existncia fenomnica que suas prprias hipteses e concluses, comparativamentetardia. Quando finalmente surgiu, todas as disciplinas mais bem estabelecidas j haviam

    desenvolvido uma noo de cincia fundamentada na natureza determinada de seu

    objeto. A ideia da natureza como sistema mecanicista (ou comportamental) de

    constituio precisa, determinada e uniforme tornou possvel conceber uma cincia

    exata cuja tarefa era conhecer ou prever essa ordem. Isso forneceu aos cientistas um

    ideal de certeza absoluta que permaneceu praticamente inabalado pela teoria da

    relatividade de Einstein ou pelo princpio da incerteza de Heisenberg, pois noobstante o quo indeterminada a natureza possa ser, em ltima instncia, sua incerteza e

    relatividade puderam ser medidas com exatido e transformadas em um princpio.

    Considerar (acreditar, provar, verificar) que o modelo idntico (ou quase isso) ao

    objeto de estudo equivale ao estilo de fazer a realidade fenomnica sob a impresso

    de que ela est sendo descoberta ou prevista.

    Mas uma antropologia que se comprometa a considerar toda operao cultural (seja

    ao ou experincia, seja a sua prpria ou a de seus sujeitos de pesquisa) como um ato

    de criatividade no pode se dar ao luxo de atribuir valor de realidade a qualquer uma

    delas. Pois precisamente essa deciso que impede que as operaes culturais sejam

    consideradas atos relativos e criativos. Se o antroplogo est sujeito a falhas, o nativo

    no pode ser infalvel; se o nativo pode falhar, ento a antropologia de fato tem pouco a

    ganhar com a adoo de uma ideologia determinista.

    LEITURAS ESCOLHIDAS

    Glasse, M. e Meggitt, M. J. (eds.).Pigs, Pearlshells, and Women: Marriage in the New

    Guinea Highlands. Englewood Cliffs, N. J.: Prentice-Hall, 1969.

    Coletnea com onze artigos curtos sobre o casamento em vrias sociedades das terras

    altas, com introduo de Mervyn Meggitt. A obra convida a comparaes tericas e

    etnogrficas entre os diferentes pontos de vista e sociedades representados.

    Leach, E. R.Repensando a antropologia. So Paulo: Editora Perspectiva, 2001.

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    Esta coletnea de ensaios provocadores pode parecer difcil para o iniciante, mas uma

    excelente maneira de experimentar em primeira mo o impacto que Leach e seus

    colegas estruturalistas tiveram sobre o mundo da antropologia social britnica.

    Comeando com uma introduo geral de grande utilidade, Leach se estende

    consideravelmente, discutindo sua interpretao estrutural de alguns problemas

    funcionalistas clssicos, e conclui com uma incurso pela antropologia simblica.

    Lvi-Strauss, C.Antropologia estrutural. So Paulo: Cosac & Naify, 2008.

    Coletnea de artigos sobre uma ampla gama de assuntos, subdividida em sees que

    correspondem a Linguagem e Parentesco, Estrutura Social, Magia e Religio, Arte e

    Problemas de Mtodo e Ensino. A obra apresenta Lvi-Strauss em sua faceta mais

    acessvel e compreensvel, e seus ensaios investem grande esforo em explicar alguns

    dos mais difceis aspectos e implicaes de seu modo de teorizao. Um leitor

    interessado pode desejar complementar este livro com Claude Lvi-Strauss, de Edmund

    Leach, Nova York: Viking Press, 1970, Modern Masters Series, tentativa mais

    ambiciosa de apresentar a linha de argumento terico de Lvi-Strauss de forma mais

    sistemtica (embora com frequncia fortemente enviesada).

    Mauss, Marcel. Ensaio sobre a ddiva. In: Sociologia e antropologia. So Paulo:Cosac & Naify, 2005.

    Clssico da antropologia que exerceu profunda influncia sobre o pensamento moderno,

    esta obra extremamente legvel e abunda em exemplos etnogrficos. O leitor pode

    desejar complementar este livro com um tratamento mais moderno do tema: On the

    Sociology of Primitive Exchange, de Marshall D. Sahlins, in ASA Monograph No. 1:

    The Relevance of Models for Social Anthropology, M. Banton (ed.). Nova York:

    Frederick A. Praeger, 1965.

    Radcliffe-Brown, A. R. Estrutura e funo na sociedade primitiva. Petrpolis: Editora

    Vozes, 1973.

    Este clssico da antropologia social rene vrias das abordagens de seu autor, que teve

    papel proeminente no desenvolvimento de uma cincia funcional dos grupos de

    descendncia. Muito do que est implcito em outros escritos dos antroplogos sociais

    britnicos remonta aos ensaios contidos nesse volume.

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    Schneider, David M. Some Muddles in the Models: Or, How the System Really

    Works in ASA Monograph No. 1: The Relevance of Models for Social Anthropology,

    M. Banton (ed.). Nova York: Frederick A. Praeger, 1965.

    Uma anlise e esclarecimento de dois corpora tericos predominantes na antropologiasocial a teoria da descendncia e a teoria da aliana , com particular ateno s

    diferenas conceituais cruciais que os dividem. Embora bastante sofisticada, a

    exposio clara e vigorosa o suficiente para recompensar uma leitura atenta e

    cuidadosa com alguns verdadeiros insights sobre uma crise terica significativa.

    BIBLIOGRAFIA

    De Lepervanche, M. Descent, Residence, and Leadership in the New GuineaHighlands. In: Oceania, 38 (2), pp. 134-158, 1967.

    Douglas, Mary.Pureza e perigo. Lisboa: Edies 70, 1991.

    Held, G. J. De Papoea. Cultuurimprovisator. Gravenhage: Bandung: N. V. Uitgeverij

    W. van Hoeve, 1951.

    Radcliffe-Brown, A. R. Estrutura e funo na sociedade primitiva. Petrpolis: Editora

    Vozes, 1973.

    Lvi-Strauss, Claude. Totemismo hoje. Petrpolis: Editora Vozes, 1975.

    ________.As estruturas elementares do parentesco. Petrpolis: Editora Vozes, 2003.

    Pouwer, J. Loosely Structured Societies in Netherlands New Guinea. In: Bijdragen

    tot de taal-, land-, en Volkenkunde, 116, pp. 109-118, 1960.

    Russell, D. A. et al. Blood Groups and Salivary ABH Secretion of Inhabitants of theKarimui Plateau and Adjoining Areas of the New Guinea Highlands. In: Human

    Biology in Oceania, I, 2, 1971.

    Wagner, Roy. The Curse of Souw: Principles of Daribi Clan Definition and Alliance in

    New Guinea. Chicago: University of Chicago Press, 1967.

    ________. Habu: The Innovation of Meaning in Daribi Religion. Chicago: University

    of Chicago Press, 1972.

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    Watson, J. B. Society as Organized Flow. In: Southwestern Journal of Anthropology,

    26(1), pp. 107-124, 1970.