10
391 Artigo Original Câncer de Mama e Rede de Apoio Social em Toronto Artigo submetido em 19/4/13; aceito para publicação em 13/6/13 Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400 Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio Social a Mulheres Lusófonas com Câncer de Mama e que Vivem em Toronto, Canadá Exploring potentialities for the creation of a social support network for Portuguese- Speaking women with breast cancer and who live in Toronto, Canada Explorando Potencialidades para la creación de una Red de Apoyo Social a Mujeres de habla portuguesa que viven con cáncer de mama en Toronto, Canadá Margareth Santos Zanchetta 1 ; Christine Maheu 2 ; Wilson Galhego-Garcia 3 ; Lorena Baku 4 ; Sepali Guruge 5 ; Scott Secord 6 Resumo Introdução: Indicadores gerais de saúde tendem a alterarem-se devido à participação de indivíduos em redes sociais. Objetivo: Conhecer as ideias dos membros de comunidades lusófonas em Toronto, Canadá, sobre a possibilidade da criação de uma rede de apoio social a mulheres com câncer de mama. Método: Estudo etnográfico crítico com 19 participantes que opinaram sobre a construção de uma rede de apoio social, pontos positivos e negativos, bem como pessoas a serem convidadas a ajudar. As discussões foram transcritas, analisadas e codificadas com o auxílio do programa de análise qualitativa Atlas ti 6.0. Resultados: Os componentes fundamentais para a construção da rede de apoio social foram a desmistificação do câncer de mama e de sua prevenção, ênfase na educação em saúde, divulgação da necessidade de voluntários e apoio social direto às mulheres com câncer. Os pontos positivos seriam a participação de mulheres mais idosas como líderes, uso do ambiente escolar e das instituições religiosas para a divulgação. Os empecilhos encontrados foram o câncer de mama ser uma doença vivida pelas mulheres, o desconhecimento relativo à cura e à falta de sensibilização. Em relação à participação de lideranças comunitárias, houve sugestão de diplomatas, padres e pastores, diretores de escolas e empresários da área da comunicação. Conclusão: A criação da rede de apoio social deve considerar a sensibilidade cultural e a diversidade interna das comunidades lusófonas. A recomendação é de que líderes sociais e profissionais angolanos sejam convidados para delinear a estrutura da rede de apoio conforme seus traços culturais específicos. Palavras-chave: Neoplasias da Mama-etnologia; Rede Social; Apoio Social; Migração Internacional; Pesquisa Qualitativa 1 Professora-Adjunta, PhD, Daphne Cockwell School of Nursing, Faculty of Community Services, Ryerson University, Toronto, Ontário, Canadá. E-mails: [email protected]; [email protected]. 2 Professora-Adjunta, PhD, Ingram School of Nursing, McGill University, Montréal (Québec) & Butterfield/Drew Fellow, Breast Cancer Survivorship Program - Princess Margaret Hospital (Toronto). E-mail: [email protected]. 3 Doutor. Professor-Titular, Departamento of Ciências Básicas, Faculdade de Odontologia de Araçatuba. Universidade Estadual Paulista. Araçatuba (SP), Brasil. E-mail: [email protected]. 4 BScN, Assistente de Pesquisa, - Daphne Cockwell School of Nursing, Faculty of Community Services, Ryerson University, Toronto, Ontário, Canadá. E-mail: [email protected] 5 Professora-Adjunta, PhD, Daphne Cockwell School of Nursing, Diretora, Center for Global Health & Health Equity, Faculty of Community Services, Ryerson University, Toronto, Ontário, Canadá. E-mail: [email protected]. 6 Diretor, Person Centered Perspective, Canadian Partnership Against Cancer. MSW. E-mail: [email protected]. Correspondence address: Dra. Margareth Zanchetta. 350 Victoria St. Office POD 468E, Toronto, ON, Canada M2B 5K3. E-mails: [email protected]; [email protected].

Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

  • Upload
    vancong

  • View
    215

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

391

Artigo OriginalCâncer de Mama e Rede de Apoio Social em Toronto

Artigo submetido em 19/4/13; aceito para publicação em 13/6/13

Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400

Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio Social a Mulheres Lusófonas com Câncer de Mama e que Vivem em Toronto, Canadá Exploring potentialities for the creation of a social support network for Portuguese-Speaking women with breast cancer and who live in Toronto, CanadaExplorando Potencialidades para la creación de una Red de Apoyo Social a Mujeres de habla portuguesa que viven con cáncer de mama en Toronto, Canadá

Margareth Santos Zanchetta1; Christine Maheu2; Wilson Galhego-Garcia3; Lorena Baku4; Sepali Guruge5; Scott Secord6

ResumoIntrodução: indicadores gerais de saúde tendem a alterarem-se devido à participação de indivíduos em redes sociais. Objetivo: conhecer as ideias dos membros de comunidades lusófonas em toronto, canadá, sobre a possibilidade da criação de uma rede de apoio social a mulheres com câncer de mama. Método: estudo etnográfico crítico com 19 participantes que opinaram sobre a construção de uma rede de apoio social, pontos positivos e negativos, bem como pessoas a serem convidadas a ajudar. as discussões foram transcritas, analisadas e codificadas com o auxílio do programa de análise qualitativa atlas ti 6.0. Resultados: os componentes fundamentais para a construção da rede de apoio social foram a desmistificação do câncer de mama e de sua prevenção, ênfase na educação em saúde, divulgação da necessidade de voluntários e apoio social direto às mulheres com câncer. os pontos positivos seriam a participação de mulheres mais idosas como líderes, uso do ambiente escolar e das instituições religiosas para a divulgação. os empecilhos encontrados foram o câncer de mama ser uma doença vivida pelas mulheres, o desconhecimento relativo à cura e à falta de sensibilização. em relação à participação de lideranças comunitárias, houve sugestão de diplomatas, padres e pastores, diretores de escolas e empresários da área da comunicação. Conclusão: a criação da rede de apoio social deve considerar a sensibilidade cultural e a diversidade interna das comunidades lusófonas. a recomendação é de que líderes sociais e profissionais angolanos sejam convidados para delinear a estrutura da rede de apoio conforme seus traços culturais específicos. Palavras-chave: neoplasias da Mama-etnologia; rede social; apoio social; Migração internacional; Pesquisa Qualitativa

1 Professora-adjunta, Phd, daphne cockwell school of nursing, Faculty of community services, ryerson university, toronto, ontário, canadá. E-mails: [email protected]; [email protected] Professora-adjunta, Phd, ingram school of nursing, McGill university, Montréal (Québec) & Butterfield/drew Fellow, Breast cancer survivorship Program - Princess Margaret Hospital (toronto). E-mail: [email protected] doutor. Professor-titular, departamento of ciências Básicas, Faculdade de odontologia de araçatuba. universidade estadual Paulista. araçatuba (sP), Brasil. E-mail: [email protected] Bscn, assistente de Pesquisa, - daphne cockwell school of nursing, Faculty of community services, ryerson university, toronto, ontário, canadá. E-mail: [email protected] Professora-adjunta, Phd, daphne cockwell school of nursing, diretora, center for Global Health & Health equity, Faculty of community services, ryerson university, toronto, ontário, canadá. E-mail: [email protected] diretor, Person centered Perspective, canadian Partnership against cancer. MsW. E-mail: [email protected]. Correspondence address: dra. Margareth Zanchetta. 350 Victoria st. office Pod 468e, toronto, on, canada M2B 5K3. E-mails: [email protected]; [email protected].

Page 2: Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

392

Zanchetta MS, Maheu C, Galhego-Garcia W, Baku L, Guruge S, Secord S

Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400

INTRODUÇÃO

indicadores gerais de saúde tendem a alterarem-se devido à participação de indivíduos em redes sociais1. esse fato ocorre em razão da disponibilidade de apoio e oportunidades para o compromisso e ligações sociais2-3. a existência e a consolidação dessas redes representam uma forma de capital social que conecta indivíduos, institucionaliza relações e cria coesão social por meio de solidariedade, respeito mútuo e afetividade3. a literatura internacional sobre o apoio social ao câncer de mama é vasta e diversificada4-5, assim como os estudos sobre o impacto do capital sociocultural sobre as ações de saúde preventivas e curativas por indivíduos e comunidades6-7, bem como seu acesso a serviços de saúde8.

no canadá, apesar da intensa publicidade, campanhas de educação à saúde, pressão política e discussão na sociedade; o câncer de mama permanece pouco discutido e entendido, principalmente nas famílias de minorias étnicas, em que as mulheres são frequentemente abandonadas (de todas as formas) por seus companheiros, cônjuges, parceiros(as), vivendo em isolamento social9. o abandono e a perda do apoio social informal compõem a estrutura de vida pós-imigração10, acrescidos às particularidades das mulheres pertencentes à minoria linguística e que vivem com câncer de mama. nesse sentido, a literatura mostra-se escassa sobre esse assunto.

nesse estudo, inúmeras variáveis presentes foram consideradas na realidade social das mulheres (por exemplo, ausência da família nuclear, restrita rede de amigos, limitada autonomia para contatar o sistema de saúde e de serviços sociais), que justificariam a criação de uma rede de apoio social. esse fenômeno está presente em comunidades lusófonas com distintos históricos de imigração ao canadá, ora por necessidades de razão econômica (no caso dos portugueses), ora por políticas e razões profissionais (no caso dos brasileiros e dos angolanos).

os portugueses (mesmo já na terceira geração) tendem a ser menos escolarizados, vivem em isolamento social e mantêm certo isolamento linguístico11. os brasileiros (segunda geração) tendem a ser mais escolarizados, proficientes em inglês, mantêm frequentes contatos com parentes no Brasil, utilizam a internet e outros meios de comunicação e vivenciam algumas situações de discriminação por portugueses12. os angolanos tendem a viver em solidão devido ao tipo de imigração individual, recusam sua identificação como refugiados políticos, mantêm fortes laços afetivos com angola, são conscientes da destruição de laços de confiança interpessoal, percebem gênero, raça e etnicidade como fatores de discriminação e também relatam discriminação por portugueses13.

este estudo foi realizado atendendo a uma solicitação feita por um centro universitário hospitalar de reabilitação

do câncer de mama, em parceria com uma associação filantrópica portuguesa de assistência à pessoa com câncer, que almejava a capacitação de voluntárias.

esse estudo teve como objetivo conhecer as ideias dos membros de comunidades lusófonas em toronto, canadá, sobre a possibilidade da criação de uma rede de apoio social a mulheres que vivem com câncer de mama, respondendo à seguinte questão de pesquisa: Qual é o potencial das comunidades lusófonas de toronto para criar e consolidar uma rede de apoio social às mulheres que vivem com câncer de mama?

MÉTODO

QUAdRo ConCeiTUAL o conceito de formas de capital proposto por

Bourdieu14 constituiu o quadro conceitual desse estudo. capital é definido como sendo um instrumento que habilita a energia social na definição de mudanças sociais, oportunidades, possibilidades e relações. esse pode apresentar-se nas formas econômicas, sociais e culturais. o capital cultural incorpora a personificação da cultura na mente do indivíduo e no seu modo de agir no mundo, implicando em cultivo, assimilação e incorporação. a transmissão doméstica do capital cultural tende a perpetuar sua existência, cuja forma de expressão é vinculada ao conceito de hábito (originalmente chamado de habitus), que representa as inclinações mentais que são inculcadas pela família e manifestadas de diferentes maneiras em cada indivíduo. Hábito é um sistema de inclinações duráveis que leva os indivíduos a perceberem, julgarem e comportarem-se no mundo. Hábito também define a coerência em diversas atividades desempenhadas nas múltiplas esferas de vida, o que explica eventos e padrões de comportamento segundo uma perspectiva de continuidade-descontinuidade.

outra forma de capital refere-se ao social, que se relaciona com a noção de rede. recursos reais ou potenciais e redes duráveis disponíveis para os indivíduos em suas conexões e obrigações sociais compõem o capital social. os relacionamentos e reconhecimentos mútuos, as trocas materiais e simbólicas, as influências de sobrenomes e as conexões em espaços sociais e geográficos são parte desse capital social. logo, essas enumerações e o capital cultural juntam-se ao capital econômico do indivíduo, conectam-se para posicioná-lo em um grupo que lhe oferece uma base para a solidariedade no seio de uma rede de relacionamentos, resultando em investimento de estratégias para assegurar benefícios coletivos. a) tipo de estudo: estudo etnográfico crítico15 com a exploração de valores sociais e culturais das comunidades lusófonas, bem como suas potencialidades de agir por meio de mecanismos e rede sociais para dar apoio à saúde16 e compreender suas ideologias culturais.

Page 3: Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

393

Câncer de Mama e Rede de Apoio Social em Toronto

Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400

Angolanas Brasileiros Portuguesas

Mulher (M)Homem (H)

n=2------

n=12n=2

n=3-----

Idade 32-40 anosM=19-64 anosH=25-47anos

28-34 anos

Canadense nato -------------------- -------------------- n=1

Tempo de imigração 7-10 anosM=17 meses-18 anosH=5-8 anos

18-30 anos

EscolaridadeEnsino Médiocompleto

M=Ensino Médio incompleto / Ensino Superior completoH=Ensino Médio completo / Ensino Superior completo

Ensino Médio completo / Ensino Superior completo

Ocupação/ProfissãoComerciária, assistenteadministrativa

M=6 psicólogas, 1 educadora comunitária, 4 desempregadas e 1 estudanteH=trabalhadores da construção civil

Assistente administrativa

Tabela 1. Dados sociodemográficos dos participantes

b) População e amostra: imigrantes e/ou refugiados angolanos, brasileiros e portugueses vivendo na área metropolitana de toronto, canadá. anúncios em rádio, televisão, sites de consulados, cartas, cartazes, técnica de referência entre participantes e visitas a organizações comunitárias foram o método de recrutamento realizado em língua Portuguesa. a amostra não aleatória observou os seguintes critérios de seleção: (i) ser homem ou mulher imigrante e/ou refugiado; (ii) não ter recebido diagnóstico médico de câncer de mama; e (iii) ser capaz de verbalizar ideias e valores relativos à solidariedade social em suas comunidades de afiliação etnocultural. a amostra final foi composta por 19 participantes, cuja caracterização sociodemográfica apresenta-se na tabela 1. c) coleta de dados: realizada, exclusivamente em português, pela primeira autora, em outubro/dezembro de 2010. essa formou quatro grupos para a identificação da visão consensual do fenômeno do estudo, conduzidos às residências de dois participantes e à sede social de uma organização comunitária em finais de semana e em período noturno, devido ao esquema de trabalho dos participantes. um gravador áudio digital registrou as discussões. essas se referiam às seguintes perguntas: (i) o que se deve fazer para construir-se uma rede de apoio social para ajudar mulheres a viverem melhor durante e após o tratamento do câncer de mama? (ii) o que sua comunidade cultural

possui de positivo para ajudar os pesquisadores nessa tarefa? (iii) quem são as pessoas em sua comunidade cultural com quem os pesquisadores podem conversar ou convidar para essa ajuda? (iv) Que condições negativas podem ser encontradas em sua comunidade cultural para a realização dessa tarefa? d) Método de análise dos resultados: dois assistentes de pesquisa brasileiros, sediados em toronto, procederam à transcrição integral dos arquivos audiodigitais, assim como à codificação dos textos transcritos com o auxílio do programa de análise qualitativa atlas ti 6.0. a pesquisadora principal juntamente com assistentes realizaram a análise temática17 do relatório da codificação utilizando os seguintes procedimentos: i) definição de uma lista preliminar composta de 33 códigos; (ii) identificação de temas após leituras intensivas e repetidas do relatório de codificação; (iii) criação de um registro temático com reflexões sobre os conteúdos das discussões e tentativas de reagrupamentos temáticos; (iv) codificação dos textos transcritos com a utilização de seis temas pré-definidos; (v) refinamento dos títulos dos temas; e (vi) respostas à pergunta de pesquisa com o uso dos temas em seus títulos finais. e) Validação da interpretação final: voluntários pertencentes às comunidades estudadas corroboraram a descrição, análise e interpretação final dos resultados no ano de 2013.f ) considerações éticas: esse estudo foi aprovado por

Page 4: Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

394

Zanchetta MS, Maheu C, Galhego-Garcia W, Baku L, Guruge S, Secord S

Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400

Ryerson Research Ethics Board (reB-2009-221) e York University Ethics Board, Human Participants Review Sub-Committee (certificado nº 2009-157). os procedimentos de obtenção da assinatura do termo de consentimento esclarecido e o armazenamento de todo o material de pesquisa responderam aos procedimentos determinados pelo Canada Tri-Council Research Ethics Guidelines.

RESULTADOS*

dezenove homens e mulheres saudáveis, cujo perfil sociodemográfico está apresentado na tabela 1, discutiram sobre o capital social e cultural de suas comunidades quanto à factibilidade da criação de uma rede de apoio social para responder às necessidades de prevenção, assim como aquelas sociais, financeiras e emocionais das mulheres sobreviventes do câncer de mama. Poucos brasileiros (2 mulheres e 1 homem) relataram conhecimento ou experiência prévia com câncer de mama, sendo essas com a mídia, familiares ou relacionadas a atividades profissionais no Brasil ou no canadá:

(...) eu trabalhei três anos num projeto sobre o câncer de mama... na comunidade portuguesa... o que eu aprendi com elas, é que é um tabu e quando você tem, você se fecha porque você se sente envergonhada, se sente sozinha. o maior obstáculo é o suporte (Brasileira, 60 anos, 17 anos de imigração, educadora comunitária)

apenas três mulheres revelaram práticas preventivas consistentes, o que poderia ser também um dos objetivos futuros da ação educativa da rede de apoio social:

eu sinto como se eu não tivesse mama. como se isso totalmente fosse... não tivesse no meu corpo. Porque eu não preocupo com ele, eu não preocupo com ele, eu não trato e eu não estou e... aware ou informada, do grande risco que eu corro por não estar fazendo prevenção... então eu fiquei realmente surpresa com minha própria falta de informação, de cuidado com o meu corpo. (Brasileira, 49 anos, 23 anos de imigração, psicóloga).

eu faço meu check-up anual. eu não verifico meus seios todo mês, porque eu esqueço (angolana, 32 anos, 10 anos de imigração, comerciária).

se você for ver o monte de informação que a gente recebe por e-mail, se não fazer isso vai ter câncer e se

fazer isso vai ter câncer. chega uma hora que você não sabe (Brasileira, não identificada).

ao apresentar os resultados quanto ao potencial das comunidades estudadas para a criação e consolidação de tal rede de apoio social, é necessária a observação de que os resultados devem se relacionar a um contexto de vida de imigrantes, em que valores culturais, sociais, éticos, afetivos, políticos e religiosos ajustam-se ou se confrontam com uma nova realidade social. Há necessidades de ordem social e psicológica, fundamentalmente, devido à reconfiguração das redes sociais dos imigrantes nessa realidade. a) Componentes fundamentais para a construção da rede de apoio social

Para as angolanas, a criação de uma verdadeira atmosfera de comunidade entre os angolanos que vivem em toronto seria primordial, uma vez que suas relações interpessoais são deterioradas devido à experiência coletiva de imigração e refúgio político. Para a formação de laços de amizade e de conhecimento mútuo, é necessário o encorajamento e para a desmistificação do câncer de mama e de sua prevenção, é importante uma maior focalização nas ações educativas voltadas para a população. essas ações deveriam iniciar por meio de projetos de conscientização sobre o câncer de mama, principalmente nas escolas primárias; caminho mais factível para que as informações atinjam os lares angolanos. Houve a sugestão de três focos principais: oferecer ajuda nos serviços domésticos e no cuidado com as crianças, proporcionar serviço de acompanhamento ao hospital e viabilizar métodos de transporte alternativo para consultas médicas e outras necessidades diárias.

os brasileiros sugeriram a conscientização da comunidade ação inicial. a criação de uma semana de conscientização sobre o câncer de mama foi proposta e ainda o reforço no interior da rede, a ideia do compromisso a ser respeitado pelos voluntários. a educação em saúde foi sugerida por meio de ações específicas, tais como: (a) produção de panfletos educativos; (b) promoção de palestras realizadas por mulheres sobreviventes em igrejas e em atividades sociais da comunidade (inclusive os churrascos organizados pela comunidade); e (c) promoção de oficinas de trabalho sobre ações preventivas. a existência e a ação da rede de apoio social deveriam ser anunciadas em jornais e revistas da comunidade, a fim de enfatizar a disponibilidade de voluntários para a organização de encontros nos grupos de apoio e de convivência, além da divulgação pessoal da existência da rede em igrejas e outros locais de gregária. a seguir, os respondentes ponderaram o possível impacto dessas estratégias:

* Palavras em inglês foram mantidas para respeitar a forma original do discurso dos participantes.

Page 5: Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

395

Câncer de Mama e Rede de Apoio Social em Toronto

Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400

eu penso que.... ah... tem um certo mito, há uma certa restrição em torno dele, pra se falar. então eu penso que se nós entrássemos dentro da comunidade, tipo nós conhecemos igrejas que tem bastante brasileiros e fizer... olha, vamos dar um workshop num sábado de manhã com informação sobre certos assuntos e também sobre câncer (Brasileira, 49 anos, 23 anos de imigração, psicóloga).

Houve a sugestão da oferta de apoio social direto às mulheres que vivem com câncer de mama por meio da formação de grupo de convivência social; (b) visitas domiciliares às mulheres convalescentes; (c) apoio emocional, psicológico, logístico (cozinhar, limpar, fazer compras); (d) orientação sobre benefícios financeiros e sociais; (e) psicoterapia para casais; (f ) formação de grupos de ajuda para sobreviventes, liderados pelas mesmas; (g) formação de grupo específico para mulheres ainda em tratamento; (h) de grupos de apoio para filhos e maridos; e (i) apoio interpessoal por contato direto ou por telefone. o modo de se colocar em prática essa iniciativas está descrito a seguir:

durante um determinado horário no dia, todos os dias estar com alguém que tenha esse problema e estar com ela como companhia. Pessoalmente ou por telefone. tipo, vamos passear no shopping, passear, olhar vitrine, tomar um café ou ler um livro contigo, fazer artesanato (Brasileira, não identificada).

as portuguesas sugeriram que a publicidade no seio da comunidade portuguesa sobre a rede deveria incluir os homens pela disseminação de informação em clubes, cafés e bares. outra estratégia se relaciona à necessidade de ensinar à comunidade meios de envolvimento, de participação e de como oferecer ajuda, comentados a seguir:

eu acho que mesmo na comunidade, esses grupos, é muito difícil trazer os portugueses. Mas eu acho que tem que ter mais outreach, ir nas comunidades, nos cafés e nas ruas, onde têm muitos portugueses e buscá-los e dar informações para eles (Portuguesa, não identificada).

espalhar informação, tentar conhecer umas pessoas com esses mesmos problemas. Às vezes, a gente tem amigas, mães, tias, avós... Muitas não sabem como começar a se envolver (Brasileira, não identificada).

as angolanas e as brasileiras, assim como as portuguesas, enfatizaram a necessidade da rede em oferecer serviços de ajuda nas tarefas domésticas, juntamente com o auxílio

das mulheres e de seus familiares. a criação de grupos de apoio social, exclusivos para as mulheres, fora a sugestão específica das portuguesas para assegurar a oportunidade de superação da ideia de ser uma minoria; assim como a timidez em falar abertamente sobre experiências pessoais e o respeito ao traço cultural relacionado ao orgulho de mostrar-se a outrem.

eu acho que o service pode até ser o mesmo, mas na hora que formar um grupo, que separe. Porque quando junta as brasileiras e portuguesas, as brasileiras falam mais. e aí, as portuguesas falam menos e ficam mais tímidas. e as portuguesas precisam de mais espaço para se abrirem (Portuguesa, 28 anos, 18 anos de imigração, antropóloga).

eu acho assim uma clínica só para portuguesas. não tendo outras culturas. Porque muitas vezes, não podemos contar com os nossos maridos ou os nossos filhos, porque a gente tem um orgulho. Mas de uma forma que sente-se uma mulher e sentir-se como uma mulher portuguesa, não dá (Portuguesa, não identificada).

eu acho também, muitas vezes, em grupos têm mais brasileiras do que portuguesas. tem uma ou duas portuguesas e o resto é brasileiras, às vezes, elas não falam abertamente. elas se sentem uma minoria e não se abrem muito (Portuguesa, não identificada).

b) Fatores positivos para a construção da rede de apoio social

Para as angolonas, um importante fator do capital cultural angolano é o respeito aos idosos, visto como pessoas com credibilidade para ensinar questões de saúde. logo, seria importante a mobilização de mulheres mais idosas para esse tipo de trabalho, a fim de que elas atuassem como líderes dos serviços na rede de apoio social. além disso, houve um reforço da ideia da credibilidade que a escola detém como fonte informal de informação em saúde com grande penetração e aceitação pela família angolana. os brasileiros destacaram os fatores de capital cultural com ênfase na forte solidariedade social, nos traços de bom humor, no prazer em compartilhar situações de gregária e na característica de ser uma cultura emotiva e afetiva, assim como o elevado valor atribuído à família e aos amigos. a seguir, um comentário sobre a peculiar disposição e essência do ajudar:

sou professora de belly dance e faço alguns workshops só para diversão, para aumentar a autoestima e lidar com o corpo. eu adoro ensinar, então alguma coisa tipo inglês básico, para a pessoa se sentir mais

Page 6: Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

396

Zanchetta MS, Maheu C, Galhego-Garcia W, Baku L, Guruge S, Secord S

Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400

confortável para se expressar na rua (Brasileira, não identificada).

as instituições religiosas e de recreação permitiram a identificação de um capital social, que traz novos significados à família, como sendo aquela composta por pessoas unidas pela mesma fé, assim como por amigos. esse se torna um fator relevante na confirmação de uma consciência coletiva do estado de isolamento social vivido pelas mulheres que possuem ou sobrevivem ao câncer de mama. as portuguesas ainda enfatizaram que esse capital social se expressa como valores da comunidade com significados atribuídos à família e aos amigos. o valor central da cultura portuguesa está no elevado apreço à família, resultando em união familiar e na responsabilidade de cuidados, compartilhada por familiares de várias gerações. c) Possíveis empecilhos na construção da rede de apoio social

durante a discussão de possíveis empecilhos para a construção da rede de apoio social, as angolanas reforçaram a influência de fatos políticos recentes, em angola, causando na comunidade em toronto certa destruição da coesão social. esses estariam relacionados à falta de solidariedade, de respeito mútuo e de laços emocionais, assim como à falta de educação quanto às relações interpessoais. segundo tais participantes, um senso reduzido de autoestima coletiva persiste entre angolanos e coexiste com uma percepção discriminatória por parte dos membros da comunidade portuguesa. o contato com membros da comunidade brasileira dá-se de modo mais igualitário e espontâneo. os tabus sobre o câncer em geral (incluindo uma visão mística do mesmo) e a noção de que o câncer de mama é doença de experiência feminina estão entre os maiores empecilhos culturais. logo, não há participação, nem opinião masculina sobre o assunto, o que gera descrença e desinformação sobre os procedimentos de detecção da doença.

os brasileiros enumeraram os empecilhos culturais, como o tabu sobre a doença, o desconhecimento ou pouco conhecimento relativo à possibilidade de cura, concomitante a informações conflituosas sobre a doença e uma restrita consciência coletiva sobre prevenção e diagnóstico precoce. empecilhos sociais para a valorização da ação da rede por brasileiros estariam relacionados ao fato de os mesmos não se sentirem sensibilizados ou afetados pela doença. outro empecilho social seria a provável dificuldade de aceitação do trabalho de voluntários entre igrejas na divulgação da existência da rede, e ainda os horários de trabalho diversificados dos brasileiros que exigiriam uma maior flexibilidade no funcionamento da rede para acomodar a disponibilidade de voluntários, assim como a utilização de serviços pela população-alvo. as brasileiras criticaram o fato de existir uma liderança religiosa majoritariamente

masculina nas igrejas locais, que possivelmente seria pouco sensível ao câncer de mama. alguns modos de interação social entre brasileiros deveriam ser vistos como empecilhos, portanto como alvos de ações de conscientização para futuras mudanças de práticas sociais: o receio de pedir ajuda e a possível recusa em participar da rede alegando sobrecarga de trabalho.

eu acho que na comunidade brasileira é bastante acentuada e, na comunidade portuguesa, várias famílias também é assim. eu tenho várias amigas portuguesas, mas elas não conseguem pedir ajuda. elas me ajudam e ajudam todo mundo e se você não descobre que elas estão precisando de ajuda, elas não pedem (Brasileira, não identificada).

as portuguesas esclareceram a noção de orgulho como sendo um traço de seu capital cultural de mulheres dotadas de certo orgulho e senso de autonomia. logo, decidem não pedir ajuda a estranhos. o reforço provido pelo contexto da experiência solitária do câncer de mama seria acrescido ao tabu sobre a doença associado à falta de conhecimento e de desvalorização da doença. outro fator cultural merece destaque, a atitude masculina em não se envolver em assuntos de saúde da mulher resultando na recusa dos maridos em participar de grupos de apoio, em que, frequentemente, ocorre a verbalização de experiências pessoais e familiares. d) Possível participação de lideranças comunitárias na construção da rede de apoio social

Houve sugestão unânime da participação e colaboração na rede de diplomatas, representantes de cada consulado, por possuírem conhecimento administrativo, liderança social e representatividade cultural. em relação às lideranças religiosas, angolanas e brasileiras indicaram padres e pastores, enquanto as portuguesas citaram as esposas dos pastores. outra liderança, segundo as angolanas, seriam os diretores de escolas. outras pessoas importantes, de acordo com a maioria, seriam os empresários da área da comunicação (em especial os da televisão, rádio, jornais e revistas portuguesas); os editores de jornais e revistas; assim como os profissionais de comunicação e jornalismo. as entrevistadas frisaram uma maior necessidade de veiculação de matérias sobre câncer de mama:

eu não tenho noção nem ideia, porque é um assunto que nunca foi abordado. nunca tinha visto nos jornais da comunidade brasileira, nem na rádio da língua Portuguesa falando sobre isso (Brasileiro, 47 anos, 8 anos como imigrante, administrador, trabalhador na construção civil).

de acordo com os brasileiros, o objetivo da mobilização dos representantes das comunidades consultadas

Page 7: Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

397

Câncer de Mama e Rede de Apoio Social em Toronto

Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400

inseridos profissionalmente na sociedade de toronto seria promover agentes facilitadores para contra-agirem sobre o isolamento linguístico e social de famílias menos escolarizadas e não inseridas no mercado de trabalho. a pouca quantidade de informação em saúde disponível em português, a ausência de práticas preventivas entre as mulheres, a cultura do silêncio sobre câncer explicada pelo tabu, os desníveis educacionais das comunidades limitam, consideravelmente, uma visão crítica sobre a informação em saúde pelos usuários.

os resultados mostraram um perfil comprometido do usuário autônomo e responsável em relação aos serviços sociais e de saúde. isso ocorre devido à falta de conhecimentos, à incipiente ação dos poucos veículos de comunicação pertencente às comunidades; no que diz respeito à veiculação de material informativo sobre prevenção e tratamento do câncer de mama de fácil acesso a todos. os dados coletados também revelaram a falta de visão coletiva quanto à possibilidade de uma mobilização popular para a criação da rede de apoio, que parece depender da ação de líderes religiosos, profissionais e de representação diplomática. os autores refletiram quanto à insignificante prática e à recente cultura de trabalho filantrópico nas comunidades consultadas, apesar de seus fortes valores de solidariedade social, amizade e ajuda mútua no seio das famílias e dos círculos de amizade.

DIScUSSÃO

a construção de uma rede de informação e de apoio social deveria ser sensível às múltiplas expressões de afiliação etnocultural que resultam em negociação de identidade entre grupos sociais desiguais18 norteadas por seu capital cultural e social14. reconhecer, afirmar ou atestar uma identidade etnocultural depende de interações entre grupos que se diferenciam mutuamente19 e que ergueram barreiras naturais devido a relações (superficiais ou instáveis) nas comunidades consultadas. a maneira de cada uma dessas comunidades de estabeleceram tais interações é entendida como práticas de habitus14, influenciadas pelo passado compartilhado de colonização e de instabilidade política. as barreiras às futuras ações de apoio social seriam a aproximação entre pessoas e o contato com pessoas do interior e do exterior de círculos sociais20, que resultariam da confiança generalizada (atribuída a organizações oficiais ou comunitárias de reconhecida credibilidade) ou particularizada (atribuída a líderes sociais ou profissionais). essa confiança poderia ser sustentada por ações altruísticas que seriam acolhidas por essas, que vivem socialmente isoladas com a potencialidade de ações de reciprocidade a outras mulheres, quando essas se tornassem voluntárias na rede. assim, confiança e reciprocidade confirmar-se-iam como atributos maiores do apoio social6. Mesmo sendo entre pessoas estranhas,

confiança e reciprocidade expressam-se em um contexto circunscrito, específico e temporal, onde a ausência de familiaridade entre as pessoas que possuem traços culturais e orientações individuais permitiria reconhecer a confiança como resultado de um aprendizado social21.

uma vez atuando na rede de apoio social, as ações seriam suficientemente sustentadas pela valorização da ideia de presença compartilhada (por pessoa, telefone ou virtual), com intensos atos de troca, proporcionando um poder naturalmente legitimado à liberdade de dar e oferecer; representando assim o capital social dessas pessoas. Por exemplo, mulheres lusófonas, que vivem em toronto com câncer de mama, revelaram a ausência de serviços de apoio social provido por organizações sociais e de saúde. essa ausência deve-se à inadequação de serviços para mulheres mais jovens, falta de serviços oferecidos em português extensivo aos familiares22. Para essas mulheres, a presença de alguém capaz de ajudá-las a encontrar recursos seria uma forma de ter o capital social mobilizado por meio dos serviços oferecidos pela rede de apoio social, que responderiam pela vulnerabilidade de gênero (mulheres em isolamento sociolinguístico, do contexto histórico (imigração e refúgio), da posição social (escolaridade e domínio de língua estrangeira) e do espaço social (pouca inserção na sociedade local)23.

no entanto, os autores chamam a atenção para a limitação central deste estudo, que se relaciona ao princípio metodológico de diversificação na composição de uma amostra qualitativa para assegurar o contraste interno e a diversificação intragrupo24. isso não foi respondido devido ao número mínimo de participantes portugueses e insuficiente de angolanos.

Mesmo assim, a ampla cobertura de iniciativas oficiais (e.g., campanhas de prevenção do câncer de mama, mistificação de formas de tratamento), vinculada a um interesse popular sobre o tema na internet25, e às iniciativas populares desenvolvidas no Brasil (por exemplo, filantropia social em câncer) também influenciariam as ações dessa rede. a veiculação, por meio da internet e da televisão, das notícias dos feitos populares como movimento alternativo, demonstraria a autonomia e o empoderamento popular, em resposta às urgentes necessidades sociais e econômicas dessa clientela, provocando uma mudança de atitudes a distância. as mulheres lusófonas, que vivem com câncer de mama em toronto, ao assistirem a telenovelas brasileiras que veiculam histórias de portadores de câncer comparam-se com seus personagens22. isso indica que a disponibilidade de acesso à informação faz com que as mensagens educativas ultrapassem fronteiras geográficas e atinjam virtualmente populações lusófonas, que contam com as mesmas para instrumentalizarem-se frente às dificuldades nas sociedades de acolhimento pós-imigração. campanhas educativas devem contrabalançar os constrangimentos gerados pela mistificação e depreciação

Page 8: Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

398

Zanchetta MS, Maheu C, Galhego-Garcia W, Baku L, Guruge S, Secord S

Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400

do apoio social, enfatizando-o como uma necessidade provável ou real das pessoas que vivem com câncer. os impactos futuros da implementação da rede de apoio social devem ser objeto de estudos de métodos mistos de avaliação de serviços (por exemplo, satisfação de usuários, impactos diretos e indiretos sobre a qualidade de vida, uso adequado de serviços médicos, resolutividade de problemas da ordem de cuidados primários de saúde), inclusive por estudos culturais e sociais25 sobre a busca de informações preventivas na internet.

a relevância desse estudo se concentra não apenas na documentação pioneira sobre a visão conjunta de comunidades lusófonas, mas também na incitação à reflexão nos criadores de material educativo sobre o câncer de mama que extrapolam a população nacional, seja no Brasil ou em Portugal. importante assinalar que aspectos novos relacionados a este estudo virão a partir da disseminação de sua publicação, que, em língua Portuguesa, servirá como documento de ação política entre membros das comunidades, das autoridades planejadoras de programas de câncer (por exemplo, Cancer Care Ontario) e de programas comunitários de promoção da saúde (por exemplo, Toronto Public Health). Por ora, nossa equipe tem oferecido assistência a outros pesquisadores que planejam estudos sobre o mesmo tema com populações chinesas e hispânicas.

cONcLUSÃO

a criação da rede de apoio social deve considerar a sensibilidade cultural e a diversidade interna das comunidades lusófonas. embora compartilhando o mesmo idioma, as trajetórias sociais são distintas, bem como ocorre a variação da disponibilidade para ajudar e ser ajudado. entretanto, devido à escassez de evidências empíricas sobre a comunidade angolana, mas ciente do isolamento social e do forte misticismo relacionado ao câncer de mama22, a recomendação é de que líderes sociais e profissionais angolanos sejam convidados para delinear a estrutura da rede de apoio conforme seus traços culturais específicos.

concluímos que a criação da rede de apoio social necessite fundamentalmente de uma ampla disseminação de informações a respeito do potencial a ser mobilizado por cada uma das comunidades lusófonas. outro aspecto crucial parece ser a identificação de líderes sociais para inspirar membros de suas comunidades a se engajarem nas ações da rede. além da oferta de serviços e de apoio social, faz-se necessário que os integrantes voluntários da rede possuam conhecimento instrumental para lidar com os impactos a longo prazo em decorrência da imigração, tais como a solidão e o isolamento social. embora tendo como alvo primário as mulheres experimentando o câncer de mama em suas diversas fases, não se pode esquecer

da importância de oferecer contínuo apoio para filhos e os companheiros/esposos, estes em especial, devido à socialização de gênero que os levam à relutância em envolver-se com temas de saúde feminina. Finalmente, antevemos a possibilidade de ter os profissionais de saúde como consultores na área de marketing social para atingir as mais diversas subpopulações de mulheres imigrantes lusófonas, e suas descendentes.

AGRADEcIMENTOS

sinceros agradecimentos à st. christopher community House (toronto, canadá) pelo apoio à realização dos grupos focais, assim como a um colaborador angolano que ajudou na apresentação do estudo à sua comunidade. aos participantes deste estudo, que gentilmente cederam seu tempo livre nos finais de semana e à noite para contribuírem neste trabalho. Finalmente, o agradecimento a Gustavo Baffico Paiva pelas traduções em espanhol.

cONTRIBUIÇÕES

Margareth santos Zanchetta trabalhou na concepção do estudo, coleta e análise de dados e redação do artigo. christine Maheu trabalhou na concepção do estudo, coleta e análise dos dados, bem como contribuiu na revisão crítica do artigo. Wilson Galhego-Garcia trabalhou na redação e revisão crítica do artigo. lorena Baku trabalhou na análise dos dados e na redação do artigo. sepali Guruge e scott secord trabalharam na concepção do estudo e análise de dados.

fINANcIAMENTO

este estudo foi financiado pelo centre for urban Health (university of toronto), York university e canadian nursing Foundation.

PARcEIROS cOMUNITÁRIOS

st. stephen’s community House e associação “ame e Viva a Vida” - serviços e cuidados em câncer (toronto, canadá).

Declaração de Conflito de Interesses: Nada a Declarar.

REfERêNcIAS

1. Berkman LF, Glass T. Social integration, social networks, social support, and health. In: Berman LF, Kawachi I, editors. Social epidemiology. New York: Oxford University Press; 2000. p 137-142.

2. Smith KP, Christakis NA. Social networks and health. Annu Rev Sociol. 2008; 34:405-29. doi: 10.1146/annurev.soc.34.040507.134601.

Page 9: Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

399

Câncer de Mama e Rede de Apoio Social em Toronto

Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400

3. Kawachi I, Berkman L. Social cohesion, social capital, and health. In: Kawachi I, Berkman L. Social epidemiology. New York: Oxford University Press; 2000. p.174-190.

4. Gass JS, Weitzen S, Clark M, Dizon DS. Defining social support systems for women with breast cancer. Am J. Surg 2008; 194(4):501-3.

5. Skeels MM, Unruh KT, Powell C, Pratt W. Catalyzing social support for breast cancer patients. CHI Conf Proc. [Internet]. 2010 [acesso 2013 Jan 20]:173-182. Disponível em http://faculty.washington.edu/wpratt/Publications/pap1135-Skeels.pdf

6. Abbott S, Freeth D. Social capital and health: Starting to make sense of the role of generalized trust and reciprocity. J Soc Psychol 2008; 13(7):874-883.

7. Eriksson M. Social capital and health: Implications for health promotion. Glob Health Action. 2011; 4:5611. doi: 10.3402/gha.v4i0.5611.

8. Derose KP, Varda D M. Social capital and health care access: a systematic review. Med Care Res Ver. 2009; 66(3):272-306. Epub 2009 Jan 27.

9. Wilkinson S. Breast cancer: Lived experience and feminist action. In: Morrow M, Hankivsky O, Varcoe O, editors. Women’s health in Canada: critical perspectives on theory and policy. Toronto: University of Toronto Press; 2007. p. 408-433.

10. Guruge S, Humphreys J. Barriers that affect abused immigrant women’s access to and use of formal social supports. Can J Nurs Res. 2009; 41(3): 64-84.

11. Noivo E. Inside three generations of Portuguese-Canadians. Montreal: McGill-Queen's Press; 1997.

12. Magalhães L, Gastaldo D, Martinelli G, Hentges A, Dowbor T P. The many faces of brazilian immigrants in Ontario. Toronto: Brazil-Angola Community Information Centre; 2009.

13. Reis DC, da Rosa VP, Kenedy RA. Transformações da identidade das imigrantes angolanas em Toronto: Um estudo preliminar. Antropol. 2007;10:207-25.

14. Bourdieu P. The forms of capital. In: Richardson JE. The handbook of theory: Research for the sociology of education. New York: Greenwood Press; 1986. p. 241-258.

15. Cook KE. Using critical ethnography to explore issues in health promotion. Qual Health Res. 2005; 15(1):129-38.

16. Fontana A, Frey JH. The interview: from neutral stance to political involvement. In: Denzin NK, Lincoln YS, editors. The SAGE handbook of qualitative research. 3th ed. California: Sage publications; 2005. p.361-376.

17. Paillé P, Mucchielli A. L‘analyse Qualitative en Sciences Humaines et Sociales. 2ème éd. Paris: Armand Colin; 2008.

18. Pires A. Echantillonnage et recherche qualitative: Essai théorique et méthodologique. Montréal: La recherche qualitative: Enjeux épistémologiques et méthodologiques; 1997.

19. Barth F. Ethnic groups and boundaries: The social organization of culture difference. Boston: Little Brown and Company; 1969.

20. Cuche D. La notion de culture dans les sciences sociale. Paris: La Découverte; 1996.

21. Patulny RV, Svendsen GLH. Exploring the social capital grid: bonding, bridging, qualitative, quantitative. Int J Sociol Soc Policy. 2007; 27(1-2):32-51.

22. Torche F, Valenzuela E. Trust and reciprocity: a theoretical distinction of the sources of social capital. Eur J Soc Theory. 2011; 14(2):181-98.

23. Guruge S, Maheu C, Zanchetta MS, Fernandez F, Baku L. Social support for breast cancer management among Portuguese speaking immigrant women. Can J Nurs Res. 2011; 43(4):48–66.

24. Thieme S, Siegmann KA. Coping with women`s backs- Social capital-vulnerability links through a gender lens. Curr Sociol 2010; 58(5):715-37.

25. Vasconcelos-Silva PR, Castiel LD, Griep RH, Zanchetta M. Cancer prevention campaigns and Internet access: promoting health or disease? J Epidemiol Community Health. 2008; 62(10): 876-81.

Page 10: Explorando Potencialidades para a Criação de Rede de Apoio

400

Zanchetta MS, Maheu C, Galhego-Garcia W, Baku L, Guruge S, Secord S

Revista Brasileira de Cancerologia 2013; 59(3): 391-400

AbstractIntroduction: Health indicators tend to be altered due to the participation of people in social networks. Objective: to find out ideas of individuals belonging to Portuguese speaking communities in toronto, canada, about the possibility of creating a social support network for women experiencing breast cancer. Method: nineteen participants of the present ethnographic and critical study answered to questions, providing their opinions regarding to the social support network and its positive and negative aspects. also, the participants suggested other possible individuals who could participate and help in the creation of such network. discussions were transcribed, analysed and coded using qualitative software called atlas ti 6.0. Results: The main components for the creation of the social support network were: the demystification of breast cancer and its prevention, emphasis in health education, dissemination of the need of volunteers and a direct social support to those women. The positive aspects were the participation of oldest women as social leaders and the utilization of schools and religious institutions for publicity. negative aspects that were perceived as barriers are: the belief that breast cancer is a disease lived by women, the lack of knowledge about its cure and rehabilitation, as well as a collective sensitiveness to it. also, about the participation of community leaders, the suggestions were: diplomats, priests and pastors, schools directors and communication entrepreneurs. Conclusion: The creation of the social support network should consider the cultural sensitiveness and the inner diversity of the consulted Portuguese speaking communities. due to the insufficient number of angolan participants to sustain a major analysis, a special recommendation was that angolan social leaders and professionals should be invited to design the structure of such network according to their specific cultural traits. Key words: Breast neoplasms-ethnology; networking social; social support; emigration and immigration; Qualitative resource

ResumenIntroducción: indicadores generales de la salud propensos a cambios debido a la participación de individuos en redes sociales. Objetivo: conocer las ideas de los miembros de la comunidad de habla portuguesa en toronto, canadá; sobre la posibilidad de creación de una red de apoyo social para las mujeres que viven con cáncer de mama. Método: estudio etnográfico crítico con 19 participantes que opinaron sobre la construcción de una red de apoyo social, puntos negativos y positivos, así como personas que pueden ser invitadas a ayudar. las discusiones han sido transcriptas, analizadas y codificadas con la ayuda del programa de análisis cualitativa atlas ti 6.0. Resultados: los componentes fundamentales para la construcción de una red de apoyo han sido la desmitificación del cáncer de mama y de su prevención, énfasis en la educación en salud, divulgación de la necesidad de voluntarios y apoyo social directo a las mujeres con cáncer. los puntos positivos serían la participación de mujeres más mayores como líderes, uso del entorno escolar y de las instituciones religiosas para la divulgación. los impedimentos encontrados fueron que el cáncer de mama es una enfermedad vivida por las mujeres, el desconocimiento relativo a la curación y la falta de sensibilización. en relación a la participación de líderes de cada comunidad, hubo sugerencias de diplomáticos, curas y pastores, directores de escuelas y empresarios del área de la comunicación. Conclusión: la creación de la red de apoyo social debe considerar la sensibilidad cultural y la diversidad interna de las comunidades de habla portuguesa. la recomendación es que líderes sociales y profesionales angoleños sean invitados para crear la estructura de la red de apoyo según sus rasgos culturales específicos. Palabras clave: neoplasias de la Mama-etnología; red social; apoyo social; Migración internacional; investigación cualitativo