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EXTRATO DA 5ª REUNIÃO
Data: 14/12/2015 (17h30) Local: Faculdade de Direito da Puc-Campinas
Presentes Bárbara Faber; Débora Cristine; Eduardo Zamboni; Felipe Vivas;
Letícia Ferreira; Silvio Beltramelli
Módulo do Semestre Fundamentos do Materialismo Histórico Dialético
Leituras HARVEY, David. Para entender O Capital – Livro I. Trad. Rubens
Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013. p. 61-161.
_______. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens
da mudança cultural. Trad. Adail Ubirajara Sobral e Maria Stela
Gonçalves. 13 ed. São Paulo: Loyola, 2004, p. 122-184.
Deliberações
I. Registro: considerando a concentração de provas finais e a dificuldade da
conciliação das agendas, não houve, de comum acordo, a reunião prevista para
novembro de 2015, tendo, por isso, havido o acúmulo de leituras, a serem
discutidas, conjuntamente, no encontro de hoje. Pelo professor, neste
entretempo, foi indicada a seguinte leitura adicional: HARVEY, David. Condição
pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. Trad. Adail
Ubirajara Sobral e Maria Stela Gonçalves. 13 ed. São Paulo: Loyola, 2004, p.
122-184;
II. Em não tendo havido tempo hábil para a realização de um “Encontro Dialógico”,
abordando os principais assuntos discutidos neste módulo, com a finalidade de
dividir com os demais discentes interessados as reflexões havidas dentro do
GEDiSC, tal evento foi transferido para o início do próximo semestre letivo;
III. Fica confirmada, também para o início do próximo semestre letivo, a abertura
de processo seletivo para a ocupação de vagas em aberto do GEDiSC;
IV. Todos os integrantes do grupo presente manifestaram interesse de que o
próximo módulo semestral continue estudando a pertinência contemporânea
dos conceitos do materialismo histórico-dialético, contudo a partir de reflexões
sobre conflitos sociais atuais, relativos à violação da dignidade da pessoa
humana. A sugestão inicial, a ser ratificada, posteriormente, é de que o módulo
seja intitulado “Materialismo histórico-dialético aplicado”. Todos os presentes
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se prontificaram a sugerir referências bibliográficas que atendam ao objeto do
próximo módulo.
Síntese dos conceitos discutidos1
O objetivo de Marx no segundo capítulo é definir as condições socialmente
necessárias da troca capitalista de mercadorias e criar uma base sólida para a
consideração da forma dinheiro.
O argumento de Marx começa definindo a relação operativa entre a mercadoria e
aqueles que a levam para o mercado, uma vez que as mercadorias não vão sozinhas
para o mercado. Dentro do esquema do pensador alemão as pessoas que levam a
mercadoria até o mercado de troca devem se reconhecer mutuamente como
proprietários privados. Marx vê aí uma relação jurídica, e para ele a forma dessa
relação é o contrato, portanto é uma relação de manifestação de vontade onde é
refletida a relação econômica. Para Marx assim as pessoas se reconhecem como
pessoas, e só se reconhecem como pessoas por serem representantes das
mercadorias.
Harvey chama esse reconhecimento da outra pessoa apenas enquanto ela for
possuidora ou representante das mercadorias, de mascaras econômicas e isso para
Marx é a personificação das relações econômicas. Tal fato ganha importância pois
percebemos que Marx está preocupado com o papel que o indivíduo desempenha nas
relações econômicas, e não com o indivíduo em sí, por isso ele está sempre
analisando as relações (compradores x vendedores; devedores x credores;
capitalistas x trabalhadores). Deslocar o foco da investigação para as relações em vez
de focar nos indivíduos dá uma vantagem a Marx, pois assim ele consegue lidar com
as pessoas que assumem mais de uma posição nessas relações, ou que trocam de
posição nas relações econômicas.
Marx começa descrevendo as relações de troca de mercadorias baseada no
arcabouço político clássico, qual seja, os indivíduos detêm a propriedade privada das
mercadorias e as negociam de maneira não coercitiva, onde a equivalência nas trocas
1 Reprodução literal do ensaio apresentado ao grupo por Fernando H. R. Godoy.
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de mercadorias e as pessoas honram suas trocas (pacta sunt servanda), e esse é o
arcabouço teórico para o funcionamento dos mercados, segundo a teoria liberal.
Aqui Marx identifica que a mercadoria nasce já com a pretensão de ser trocada, o
possuidor quer cede-la e o comprador quer toma-la, ou nas palavras de Marx, Todas
as mercadorias são não-valores de uso para seus possuidores e valores de uso para
seus não possuidores, e o pensador alemão concluí que as mercadorias precisam
universalmente mudar de mão; e Marx introduz o trabalho no argumento “se o trabalho
é útil para outrem, ou seja, se seu produto satisfaz necessidades alheias, é algo que
só pode ser demonstrado na troca”.
Harvey salienta que o argumento de Marx é historicamente situado. (levantar a
discussão de como algumas vertentes do marxismo criticam os direitos humanos).
Marx ressalta que existe um valor latente na natureza das mercadorias, e esse valor
latente é o seu valor de troca e ele diz “na mesma medida em que se opera a
metamorfose dos produtos do trabalho em mercadorias, opera-se também a
metamorfose da mercadoria em dinheiro”.
Para Marx essa relação econômica reflete nas relações pessoais, onde temos
proprietários privados de coisas alienáveis, ou seja, temos pessoas independentes
umas das outras e coisas exteriores ao homem, isto é, livremente cambiáveis. E sendo
assim os operadores da troca não tem vínculo pessoal nenhum com as coisas que
possuem.
E segundo Marx essa relação de troca rompe com as relações anteriormente
existentes, esse rompimento das relações anteriores vai se dando com o tempo até
que a constante repetição da troca transforma-a num processo social regular. Isso
acontece quando há uma expansão geográfica e o valor das mercadorias se expande
em materialidade do trabalho humano em geral, e a forma dinheiro se encarna em
mercadoria que, por natureza, prestam-se a função social de um equivalente
universal, e para Marx esse primeiro equivalente universal são os metais preciosos.
O mais importante do argumento do equivalente universal para as trocas de
mercadorias é que o equivalente universal é uma maneira adequada de manifestação
do valor. Com isso, para Marx, a mercadoria-dinheiro possui uma dualidade, pois tanto
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é mercadoria no sentido ordinário de ser um produto do trabalho, quanto adquire um
valor de uso formal, que deriva de suas funções sociais especificas. Nessa função
social formal a forma-dinheiro é apenas o reflexo, concentrado numa única
mercadoria, das relações de todas as outras mercadorias.
Para Marx cada mercadoria é na verdade um signo, uma vez que como valor, ela é
tão somente um invólucro reificado do trabalho humano nela desprendido.
Para Marx a mercadoria-dinheiro não pode realizar seu valor específico sem a troca
de todas as outras mercadorias como equivalentes, ainda que para isso finja ser o
equivalente universal de todas as outras mercadorias.
Para Marx uma vez que exista dinheiro, as mercadorias encontram um meio de medir
seu próprio valor agindo como se o ouro fosse a encarnação imediata de todo trabalho.
E para Marx essa é a grande mágica: como o dinheiro passa a encarnar e equivaler
ao trabalho humano.
Neste Segundo Capitulo do Capital Marx também aceita as bases teorias do
capitalismo e do liberalismo só para poder provar que os mercados perfeitos e a mão
invisível do mercado só geram mais desigualdade social, dando mais riquezas para
os capitalistas e mais pobreza para os trabalhadores.
Chegamos então ao capitulo 3 de o Capital e até aqui ficou claro que a noção de
dinheiro elaborada por Marx está totalmente vinculada ao tratamento que Marx dá às
trocas de mercadorias. A disseminação da troca de mercadoria num ato social geral
conduziu ao surgimento de um equivalente universal, e esse equivalente universal é
a mercadoria-dinheiro. Aqui é valido que para Marx a mercadoria dinheiro encobre as
origens do valor no tempo de trabalho socialmente necessário, a mercadoria-dinheiro
traz uma nova forma de valor.
O dinheiro é um conceito unitário, mas interioriza funções duplas, que refletem a
dualidade do valor de uso e do valor de troca na própria mercadoria. Por um lado, o
dinheiro opera como uma medida de valor do tempo de trabalho socialmente
necessário. Para cumprir esse papel o dinheiro precisa possui qualidades especificas
capazes de fornecer um padrão preciso e eficiente de medida do valor. Por outro lado,
o dinheiro também tem a função de facilitar a expansão da troca, desse modo, ele
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funciona como um médio para movimentar uma variedade cada vez maior de
mercadorias de um lugar para o outro.
Começa-se o capitulo 3 de o capital dizendo que o ouro é uma ótima medida de valor,
porém seria surreal usar pequenas pepitas de ouro para pagar pelas mercadorias, e
mais surreal ainda seria levar pequenas quantidades de mercadorias para fazermos
as trocas por outras mercadorias. Portanto, conclui-se que apesar de o ouro ser uma
ótima medida de valor é um ineficiente meio de circulação.
Para Marx o dinheiro será medida de valor, mas também será um eficiente meio de
circulação, e no final existirá apenas um tipo de dinheiro (são as três características
do dinheiro). Marx ainda afirma que da tensão existente entre as características do
dinheiro é que surge uma outra forma de circulação que é o crédito, e com a criação
do crédito é que surge o CAPITAL. O dinheiro surge da relação de trocas e o capital
surge da tensão entre a característica do dinheiro ser medida de valor e de o dinheiro
ser meio de circulação. E esse é o objeto do capitulo 3 de O Capital.
O valor não é mensurável em si mesmo, antes requer uma representação e essa
representação é a mercadoria dinheiro, e a mercadoria dinheiro é a manifestação da
medida imanente de valor das mercadorias: o tempo de trabalho. O valor reside na
relação entre a mercadoria dinheiro como uma forma de manifestação do valor de
todas as mercadorias que são trocadas por ela. O valor das mercadorias é
irreconhecível sem sua forma de manifestação.
Depois Marx vai pensar como o preço é vinculado a mercadoria. Para ele o preço é
imaginário, pois não se tem ideia de qual é o valor da mercadoria antes de colocá-la
no mercado. Estabelece-se uma relação entre os preços imaginários, ideais, e os
preços efetivamente recebidos no mercado. O preço recebido deveria idealmente
indicar o valor verdadeiro, mas é apenas uma aparência, uma representação –
imperfeita – do valor.
Para Marx tratamos a mercadoria dinheiro sempre como algo dotado de um valor de
uso concreto, e suas próprias condições de produção influenciam o modo como o
valor é representado. Para Marx mesmo que toda mercadoria dinheiro provoque uma
medida oscilante de valor, sua inconstância não faz nenhuma diferença para os
valores relativos das mercadorias que são trocadas no mercado.
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Aqui nesse ponto nos é apresentado que o Estado tem a função de regular e organizar
o sistema monetário, mantendo-o efetivo e estável.
Para Marx as denominações monetárias desaparecem com todo o sinal da relação de
valor, ou seja com a relação com o tempo de trabalho socialmente necessário.
Portanto, a denominação monetária não é a mesma coisa que a mercadoria dinheiro.
Para Marx o preço é a denominação monetária do trabalho incorporado em uma
mercadoria. Para Marx pode haver uma incongruência quantitativa entre preço e
grandeza de valor, ou o desvio do preço em relação a grandeza de valor, para ele isso
é inerente a forma preço.
Marx conclui que o preço médio alcançado sempre oscilará de acordo com as
flutuações nas condições de oferta e demanda e é por esse mecanismo que ocorre
um equilíbrio do preço. E o que as flutuações nos preços produzem é uma
convergência no trabalho médio socialmente necessário para produzir uma
mercadoria.
Marx afirma que se podemos colocar uma etiqueta de preço numa coisa, então, em
princípio, podemos coloca-la em qualquer coisa, inclusive em coisas intangíveis, como
a honra e a consciência humanas. O sistema de preço pode atuar em qualquer
situação e causar incongruências quantitativas e qualitativas.
Para Marx o sistema de preço é, na verdade, uma aparência superficial que possuí
sua própria realidade objetiva, e esse sistema pode facilmente sair de controle. O
equilíbrio do preço é uma mera aparência do tempo de trabalho socialmente
necessário que gera o valor cristalizado em dinheiro.
Pensando no método dialético quer Marx apropriou de Hegel ele diz que as
contradições não são resolvidas, são interiorizadas e continuam se repetindo em um
movimento perpetuo ou em escala cada vez maior, é por isso que para Marx que as
contradições do dinheiro não são resolvidas.
Então Marx começa a analisar o metabolismo social por meio da troca. A troca faz
uma duplicação da mercadoria, em mercadoria e dinheiro. Estes quando em ação
movem-se em direções opostas a cada troca de mãos. Enquanto a troca de dinheiro
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facilita a movimentação das mercadorias, ocorre um fluxo oposto que cria a
possibilidade para o surgimento de formas antiéticas.
A troca é uma transação em que o valor sofre uma mudança de forma. Marx chama
essa cadeia de movimentos mercadoria em dinheiro e dinheiro em mercadoria de
relação M-D-M. Trata-se de uma dupla metamorfose do valor Mercadoria em dinheiro
e de dinheiro em mercadoria.
O lado M-D da troca (a venda) implica a mudança de forma de uma mercadoria
particular em seu equivalente universal, a mercadoria dinheiro. Um movimento do
particular para o universal. E para Marx existem vários obstáculos para a conversão
direta da mercadoria em equivalente universal.
Já o lado D-M da troca (a compra) é a transição do dinheiro para a mercadoria, ou
seja, do universal para o particular. E trocar dinheiro por mercadoria é muito mais fácil.
Nessa antítese que existe entre a compra e a venda Marx observa uma contradição
que existe na metamorfose das mercadorias tomadas em conjunto, isto é, na
circulação das mercadorias em geral.
A circulação de mercadoria é cada vez mais mediada pelo dinheiro. E a contradição
está no fato de que o dinheiro não desaparece, ele continua se movimentar.
E Marx argumenta que começo com a mercadoria, passo para o dinheiro mas não há
nada que me faça gastar imediatamente o dinheiro trocando o novamente por outra
mercadoria. A pessoa pode simplesmente guardar o dinheiro. E para Marx se todo
mundo tomasse a decisão de guardar seu dinheiro entraríamos em crise.
Marx observa que assim como o dinheiro de papel surge da função do dinheiro como
meio de circulação, também o dinheiro creditício possui suas raízes na função do
dinheiro como meio de pagamento.
Marx afirma que há apenas um dinheiro. Isso significa que de certo modo as
contradições entre o dinheiro como meio de circulação e como medida de valor
precisam de espaço para se mover, ou talvez devam ser resolvidas.
E Marx indica que a forma M-D-M pode ser vista como D-M-D, onde a obtenção do
dinheiro passa a ser um fim em si mesmo; é o que Marx chama de entesouramento.
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E Marx diz que isso pode acontecer pois temos um desejo apaixonado pelo poder do
dinheiro e porque temos uma necessidade social.
E para o pensador alemão o desejo de entesouramento é desmedido por natureza.
E Marx diz que não há nada que não seja mensurável em dinheiro. Mas o dinheiro
também é ele próprio uma mercadoria, uma coisa externa, que pode se tornar a
propriedade privada de qualquer um. Assim a potência social se torna potência
privada de uma pessoa privada e isso desemboca na tendência do dinheiro de tornar
o trabalho privado um meio de expressão do trabalho social. Com isso ele descreve
como pessoas privadas podem se apropriar de equivalente universal para suas
próprias finalidades privadas e começa-se a aparecer a possibilidade de concentração
de poder privado e eventualmente de poder de classe em forma monetária.
O poder social que o dinheiro proporciona não tem limite. Mas Marx vê uma
contradição no entesouramento, pois há uma limitação quantitativa do entesourador.
Existe uma limitação quantitativa e uma ilimitação qualitativa. E a acumulação de
dinheiro como poder social é um traço essencial do modo de produção capitalista.
O modo de produção capitalista é baseado essencialmente baseado na acumulação
infinita e no crescimento ilimitado.
Então Marx passa a analisar as implicações do dinheiro que é usado como meio de
pagamento. E o problema surge das temporalidades cruzadas de diferentes tipos de
de produção de mercadorias. Isso cria um hiato temporal entre a troca de dinheiro e a
troca de mercadoria. As mercadorias circulam fiado e o dinheiro se converte em
moeda contábil, lançada em livro comercial. E isso gera uma nova relação social, a
relação entre credores e devedores, e Marx identifica uma relação de poder no interior
da relação entre credor e devedor.
Além de que a relação de crédito faz com que a formula passe a ser D-M-|D, pois se
recebe de volta mais dinheiro do que se emprestou. E essa é a forma do dinheiro
como CAPITAL. E há uma grande diferença entre a circulação de dinheiro como
mediador da troca de mercadorias e o dinheiro usado para conseguir mais dinheiro.
Nem todo dinheiro é capital. O capital surge quando o dinheiro é posto em circulação
com o intuito de conseguir mais dinheiro.
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E aqui Marx afirma que para quitar as suas dividas você precisa conseguir dinheiro
vivo. A súbita escassez do meio de circulação em certo momento histórico pode gerar
uma crise. E para Marx cada vez que há uma crise quem fica mais forte são os
banqueiros.
Assim Marx observa a monetização de tudo quanto as propagações do crédito e do
capital financeiro.
Como já foi dito para o sistema monetário funcionar é necessário que exista uma
organização e regulação pelo Estado. Porém, existe um mercado mundial e as
políticas monetárias nacionais não podem isentar os Estados dos efeitos disciplinares
que derivam das trocas de mercadorias realizadas nesse mercado mundial. E Marx
diz que a base metálica se tornou essencial para o capitalismo global.
Passemos então ao capitulo 4 de O Capital, o referido capitulo trata das noções de
capital e de força de trabalho.
O capital começa apresentando uma forma de escambo de troca de mercadoria
representada por M-M, depois surge uma unidade de medida universal que pauta
essas trocas, a chamada forma dinheiro, e a formula passa a ser M-D-M, mas por uma
séria de contradições existentes na forma dinheiro chegamos a formula D-M-D, onde
o dinheiro se torna finalidade e objeto da troca.
Para Marx no sistema M-D-M uma troca de valores equivalentes faz sentido, pois sua
finalidade é obter valores de uso. Porém quando chegamos ao sistema D-M-D a troca
equivalente parece ser absurda. Pois qual o sentido de passar por todos os riscos que
existem na troca para no final ficar com a mesma quantia de dinheiro? Para Marx esse
sistema só faz sentido se no final houver um aumento de valor, isto é, a formula correta
seria D-M-
Então nos surge a questão de onde vem esse mais valor? Para a teoria funcionar é
necessário que surja uma mercadoria capaz de produzir um valor maior do que ela
possui. E essa mercadoria é a força de trabalho.
O que é bem importante frisar do quarto capitulo de O Capital é que o capital é definido
como um processo, pois isso diferencia Marx das outras teorias econômicas. A teoria
econômica tradicional entende o capital apenas como um estoque de recursos. Para
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Marx o capital é o processo de colocar o dinheiro em circulação para gerar mais
dinheiro. Nem todo dinheiro é capital, capital é o dinheiro usado de certa maneira.
Marx conclui também que o valor de uso jamais pode ser considerado a finalidade
imediata do capitalista. O Capitalista apenas produz valor de uso para ganhar valor
de troca. E disso Marx conclui que o Capital é valor em movimento.
Como já foi dito anteriormente Marx começa a investigar como é possível a existência
de um mais valor, pois em trocas equivalentes não existe mais valor. Então ele parte
do pressuposto que as trocas que geram mais valor não são trocas equivalentes mas
sim trocas desiguais. E para chegar a resposta do que produz o mais valor Marx
pressupõe um sistema perfeito e fechado. E Marx argumenta que para poder extrair
valor do consumo de uma mercadoria, nosso possuidor de dinheiro teria de ter a sorte
de descobrir no mercado no interior da esfera da circulação, uma mercadoria cujo
próprio valor de uso possuísse a característica peculiar de ser fonte de valor e essa
mercadoria para Marx é a força de trabalho.
E o pensador alemão define a força de trabalho como as capacidades, físicas e
mentais e humanas de incorporar valor as mercadorias. Para teoria marxiana é
essencial a ideia do trabalhador livre pois só assim ele poderá alienar a sua força de
trabalho. Outro pressuposto da teoria de Marx é que o trabalhador não pode trabalhar
para ele mesmo, pois ele está privado dos meios de produção. Assim o que lhes resta
é alienar a sua força de trabalho. E aqui Marx apresenta uma crítica à ideia de
liberdade burguesa.
A força de trabalho é uma mercadoria especial e diferente que tem a capacidade de
criar valor. E o capitalista usa essa força de trabalho que o trabalhador vende para
organizar a produção de mais valor. Aqui é valido lembrar que a venda da força de
trabalho funciona sobre a formula M-D-M, os trabalhadores põem sua força de
trabalho no mercado e a vendem em troca de dinheiro para conseguir as mercadorias
essenciais para a sua sobrevivência.
Então temos que o trabalhador está no circuito M-D-M e o capitalista no D-M-D. O
trabalhador está contente com a obtenção de valor de uso, mas o capitalista está
preocupado com a obtenção de mais valor.
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E Marx define que o valor da força de trabalho é fixado pelo valor de todas aquelas
mercadorias que são necessárias para reproduzir o trabalhador em certas condições
de vida. Então o valor da força de trabalho está ligado a necessidade, e isso diferencia
a força de trabalho de todas as outras mercadorias. Porém, Marx aceita que elementos
históricos, geográficos e morais influem na determinação do valor da força de trabalho.
Chegamos então ao capitulo 5 de o Capital. Neste capitulo Marx começa a sair do
mercado para entrar na esfera de trabalho. E para pensar o processo de trabalho Marx
recorre a dualidade existente na relação entre homem e natureza, existe um processo
entre o homem e a natureza onde o homem consegue regular seu metabolismo com
a natureza. Os seres humanos são agentes ativos em relação ao mundo que os
rodeia. Para Marx não podemos transformar o que está ao nosso redor sem
transformarmos a nós mesmos e vice e versa. E a dialética da transformação é
fundamental para entendermos a historia da evolução da sociedade.
Para Marx o que diferencia o homem dos outros animais é que o resultado obtido pelo
trabalho já está no início do processo previsto na cabeça, ou seja, o resultado já existia
idealmente.
Há sempre na atividade humana um momento ideal, um momento utópico.
Estes são os três elementos do processo do trabalho:
1) Força de trabalho;
2) Matéria-prima;
3) Meios de produção.
Bem voltemos ao nosso homem de dinheiro: depois de comprar a força de trabalho,
comprou também à matéria-prima, no caso algodão; os meios de trabalho, isto é, a
fábrica com todos os instrumentos e condições de trabalho, já perfeitamente
preparados. E agora, diz ele, saindo apressado do mercado: Mãos à obra!
Uma certa transformação parece ter-se dado na fisionomia dos personagens de nosso
drama. O homem do dinheiro toma a dianteira, na qualidade de capitalista, o
proprietário da força de trabalho segue-o, como seu trabalhador. Aquele, com a
aparência honrada, satisfeita e atarefada; o outro, tímido, hesitante, com a sensação
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de quem vendeu a própria pele, no mercado e que agora não pode mais esperar outra
coisa senão… ser esfolado.
Enfim chegam à fábrica. O capitalista se apressa em botar o seu operário para
trabalhar, entregando-lhe dez quilos de algodão. Antes que me esqueça, esse
operário é fiandeiro, produz fio de algodão.
É consumindo os seus três elementos: a força de trabalho, a matéria-prima e os meios
de trabalho, que o trabalho se realiza.
O consumo dos meios de trabalho calcula-se do seguinte modo: da soma do valor de
todos os meios de trabalho – o prédio, suas instalações, as ferramentas, o óleo, a
eletricidade, etc. – subtrai-se a soma do valor dos meios de trabalho consumidos no
processo de trabalho; dividindo-se o resultado dessa subtração pelo número de dias
que os meios de trabalho possam durar, temos o consumo diário dos meios de
trabalho.
Parece complicado, não? Vamos repetir isso, exemplificando com números:
Suponhamos que os meios de trabalho (a fábrica com suas instalações, máquinas,
ferramentas, etc.) devam durar 10 anos ou 3650 dias. Por todos esses meios de
trabalho, o capitalista desembolsou, por exemplo, R$ 1.460.00,00. Dividindo-se essa
quantia por 3650 dias, temos R$ 400,00, que corresponde ao consumo diário dos
meios de produção.
O nosso operário trabalhou durante toda uma jornada de 12 horas. Ao final dessa
jornada ele transformou os 10 quilos de algodão bruto em 10 quilos de fio; entregou-
os ao patrão e deixa a fábrica, retornando para a casa. No caminho, como todo o
operário, ele vai fazendo as contas, para saber quanto o seu patrão poderá ganhar
com aqueles dez quilos de fio.
– Não sei exatamente quanto custa o fio – vai dizendo para si mesmo -, mas, de
qualquer modo, a conta está praticamente feita. O algodão cru, eu mesmo vi que ele
comprou no mercado: R$ 300,00 por quilo. Todas as suas ferramentas podem ter um
consumo, digamos de R$ 400,00 por dia. Bem:
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10 quilos de algodão R$ 3.000,00
Desgaste diário dos meios de produção R$ 400,00
Meu trabalho hoje R$ 100,00
Total da produção dos 10 quilos de algodão R$ 3.500,00
Ora, certamente, sobre o algodão ele não ganhou nada: pagou o seu justo preço, nem
um centavo a mais, nem um centavo a menos; do mesmo modo ele comprou minha
força de trabalho, pagando seu justo preço de R$ 100,00 por dia.
Então continua pensando nosso fiandeiro, ele só pode ganhar vendendo o fio acima
do seu valor. Não pode vir de outra coisa, ele nunca perderia tempo e energia,
gastando R$ 3.500,00, para depois vender tudo e receber os mesmíssimos R$
3.500,00. Oh! Como são os patrões! A nós trabalhadores, traquejados no mercado,
ele não tem como disfarçar… E esses patrões têm ainda a mania de bancarem os
honestos na frente dos trabalhadores… mas é um roubo vender uma mercadoria por
mais do que ela vale; venderá com peso falso, um quilo de novecentos gramas. Isto é
proibido por lei. É um roubo! As autoridades vão ter que fechar suas fabricas. Vai ser
bom! Em seu lugar, construiremos grandes fábricas públicas, onde nós produziremos
as mercadorias de que precisamos.
Assim fantasiando, o operário chega em casa. Após jantar, se enfia na cama e
adormece profundamente, sonhando com o desaparecimento dos capitalistas da face
da terra e com as grandes fábricas públicas.
Dorme pobre amigo, dorme, enquanto te resta uma esperança. Dorme em paz, que
os dias de desengano não tardarão a chegar. Mais cedo do que pensas, vais entender
por que os capitalistas podem perfeitamente vender sua mercadoria com lucro, sem
para isso precisar enganar a ninguém. Ele mesmo te mostrara como pode ser tornar
capitalista e mesmo um grande capitalista, sem perder um fio de honorabilidade.
Então, o teu sono não será mais tão tranquilo assim. Verás, em tuas noites, o capital,
como um pesadelo, que te oprime e ameaça sufocar-te. Com os olhos e terrorizados,
vais vê-lo crescer, como um monstro com cem dentes de vampiro penetrando nos
poros do teu corpo, para chupar o teu sangue. Tomando proporções desmesuradas e
gigantescas, de sombrio e terrível aspecto, com olhos e boca de fogo, vais vê-lo
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transformando suas garras em uma enorme tromba aspirante em que vão
desaparecendo milhares de seres humanos: homens, mulheres, crianças. De tua
fronte corre agora um suor de morte, porque o monstro está se aproximando, para
agarrar a ti, tua mulher e teus filhos. Mas teu último gemido será abafado pelo riso
apavorante do monstro, satisfeito em sua gula. Quanto mais prospero, mais
desumano…
Voltemos ao nosso homem do dinheiro.
Este burguês modelo de exatidão e ordem acertou as suas contas do dia; vejam como
ele calculou o preço dos seus dez quilos de fio:
Dez quilos de fio (R$ 300,00 por quilo) R$ 3.000,00
Desgaste diário dos meios de produção R$ 400,00
Mas, quanto ao terceiro elemento, que entrou na formação de sua mercadoria, que é
o salário pago ao operário, ele nada assinalou isto, porque conhece muito bem a
diferença que há entre preço da força de trabalho e o preço do produto da força de
trabalho.
O salário de uma jornada de trabalho representa o necessário para manter o operário
em 24 horas, mas não representa de fato o que o operário produziu em uma jornada
de trabalho. O nosso homem do dinheiro sabe perfeitamente que os R$ 100,00 de
salário que ele paga, representam a manutenção de seu operário por 24 horas e não
o que este produziu nas 12 horas de trabalho em sua fábrica. Ele sabe tudo isso,
exatamente como o agricultor sabe a diferença que existe entre o que é manutenção
de uma vaca com seus currais, alimentação, etc., e o que esta vaca produz em termos
de leite, queijo, manteiga, etc.
A força de trabalho tem uma propriedade singular de render mais do que custa e é por
isso que o homem do dinheiro vai buscá-la no mercado. E o operário não pode
reclamar, porque ele pagou o preço justo pela sua mercadoria. A lei das trocas foi
rigorosamente observada. Além do que, o operário não tem que se meter no uso que
o comprador fará de sua mercadoria, do mesmo modo que o dono do armazém nada
tem a ver com o uso que seu freguês dá às mercadorias que vende.
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Página atrás, supôs que em 6 horas de trabalho se produzem 15 gramas de prata,
equivalentes a R$ 100,00. Ora, se em 6 horas a força de trabalho produz um valor de
R$ 100,00, em 12 horas produzirá, portanto, um valor de R$ 200,00. Assim, o valor
dos 10 quilos de fio passa a ser calculado desse modo:
Dez quilos de fio (R$ 300,00 por quilo) R$ 3.000,00
Desgaste diário dos meios de produção R$ 400,00
Pelas 12 horas de trabalho da força de trabalho R$ 200,00
Total R$ 3.600,00
O homem do dinheiro, depois de ter gasto R$ 3.500,00, obteve uma mercadoria que
vale R$ 3.600,00. Consegui, portanto, embolsar R$ 100,00. O seu dinheiro deu cria;
pronto, resolvemos o problema: o capital acaba de nascer.
A JORNADA DE TRABALHO
Nem bem nasceu, o capital sente a necessidade imediata de alimento para se
desenvolver. E o capitalista, que vive somente para a vida do capital, preocupa-se
atentamente com as necessidades deste ser, tornando-se o seu coração e sua lama,
sabendo como alimentá-lo.
O primeiro meio empregado pelo capitalista em benefício do capital é o prolongamento
da jornada de trabalho. Obviamente, a jornada de trabalho tem seus próprios limites.
Antes de mais nada, um dia não tem mais de 24 horas. Dessas 24 horas, já se tem
que eliminarem umas tantas, pois o operário precisa satisfazer suas necessidades
físicas e espirituais: dormir, comer, descansar para criar nova força, ler, passear, etc.
Fala Marx: Mas estes limites são, por si mesmos, muito elásticos e deixam muito
espaço para manobra. Assim, encontramos jornadas de trabalho de 6, 10, 12, 14, 16
e 18 horas, ou seja, das mais variadas durações e o capitalista comprou a força de
trabalho pelo seu valor diário. Com isto, ele adquiriu o direito de fazer trabalhar,
durante todo um dia, o trabalhador que está a seu serviço. Mas o que é afinal um dia
de trabalho? Em todos os casos, é menor do que um dia natural. Mas, de quanto? O
capitalista tem sua própria maneira de ver a questão sobre o limite necessário da
jornada de trabalho. O tempo durante o qual o operário trabalha é o tempo durante o
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qual o capitalista consome sua força de trabalho, que ele comprou do seu operário.
Se o assalariado consome o tempo que tem disponível, para si mesmo, ele está
roubando o capitalista. O capitalista não se apoia em outra coisa que não seja a lei
das trocas das mercadorias. Ele, como todo comprador, procura tirar da mercadoria,
do seu valor de uso, o maior benefício possível. Mas eis que o operário levanta a voz
e diz:
“A mercadoria que te vendi se distingue de todas as outras mercadorias, porque o seu
uso cria valor, e um valor maior do que seu próprio custo. E é por isso que compraste.
O que para ti parece ser crescimento de capital, para mim é excesso de trabalho. Tu
e eu não conhecemos outra lei, que não seja a da troca das mercadorias. O consumo
da mercadoria não pertence ao vendedor, que a aliena, mas o comprador, que a
adquire. O uso de minha força de trabalho te pertence, pois. Mas com o preço diário
de sua venda, eu devo todos os dias poder reproduzi-la, para vendê-la de novo.
Tirando a idade e outras causas naturais de desgastes, preciso amanhã estar tão forte
e capaz como hoje, para retomar o meu trabalho com a mesmíssima força. Tu me
pregas constantemente o evangelho da “economia” e da “abstinência”. Taí! Quero ser
um administrador sábio e inteligente para economizar a minha única fortuna: minha
força de trabalho; devo abster-me, portanto, de qualquer esbanjamento. Quero,
diariamente, coloca-la em movimento, pô-la a trabalhar, enfim, gasta-la apenas
quando for compatível com sua duração normal e seu desenvolvimento natural. Além
do que, com um prolongamento na jornada de trabalho, podes em um só dia mobilizar
uma quantidade tão grande de minha força de trabalho que não vou repô-la nem com
três jornadas. O que ganhas em trabalho, eu perco em substancia. Presta, pois, muita
atenção: o emprego de minha força de trabalho e o seu desfrute são duas coisas
distintas, muito distintas. Se eu, como operário, vivo em média 30 anos, trabalhando
num ritmo médio razoável, e tu consomes a minha força de trabalho em dez anos, tu
não me pagas mais do que um terço de seu valor diário; portanto roubas de mim,
todos os dias, dois terços de minha mercadoria. Exijo, pois, uma jornada de trabalho
de duração normal, e a exijo sem apelar para seu coração, porque em negócios não
se põe sentimento. Tu podes ser um burguês modelo; até pertencer à Sociedade
Protetora dos Animais e, ainda por cima, exalar cheiros de santidade… Pouco importa
o que representas. És inteiramente estranho aos interesses do meu coração. Exijo a
jornada normal, porque quero o valor da minha mercadoria como qualquer outro
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vendedor. Come se vê, estamos entre limites muitos elásticos e a natureza mesma da
troca não impõe nenhum limite a jornada de trabalho. O capitalista mantém seu direito
como comprador, quando procura prolongar a jornada de trabalho o máximo possível
e tentando fazer de dois dias, um só. Por outro lado, a natureza especial da
mercadoria vendida exige que o seu consumo pelo comprador não seja ilimitado, e o
trabalhador mantém seu direito como vendedor, quando quer restringir a duração da
jornada de trabalho a uma duração normalmente determinada. Direito contra direito,
entre o capitalista e o trabalhador, de acordo com a lei de trocas das mercadorias, há
um empate. E, o que decide entre dois direitos iguais? A força.
Como se emprega essa força, que hoje é toda do capital e para o capital, nos dirão os
fatos que agora exporemos. O que vamos contar neste livro são quase todos os
episódios do capital na Inglaterra. Em primeiro lugar, porque foi lá o país em que a
produção capitalista chegou ao máximo desenvolvimento (obs. este livro foi escrito
em 1878); e em segundo lugar, porque somente na Inglaterra encontramos um
material adequado de documentos, falando das condições de trabalho e recolhidos
por obra de comissões governamentais, instituídas para este fim. Os modestos limites
deste manual não nos permitem, entretanto, reproduzir mais do que uma
pequeníssima parte do rico material recolhido na obra de Marx. Eis aqui alguns dados
de uma pesquisa feita entre 1860 e 1863, na indústria de cerâmica:
W. Wood, de nove anos, tinha 7 anos e meio quando começou a trabalhar. Wood
trabalhava todos os dias da semana, das 6 da manhã até às 9 da noite, ou seja, 15
horas por dia. J. Murray, de 12 anos, trabalhava numa fábrica, trazendo as formas e
girando uma roda. Ele começava a trabalhar às seis da manhã, às vezes, às quatro;
seu trabalho era prolongado de tal modo, que muitas vezes entrava pela manhã
seguinte adentro. E isto em companhia de outros 8 ou 9 meninos que eram tratados
do mesmo modo do que ele.
O médico Charles Parsons assim escreveu a um comissário do governo: “Falo com
base em minhas observações pessoais e não sobre dados estatísticos. Não posso
esconder minha revolta ao ver o estado destas pobres crianças, cuja saúde é
sacrificada por um trabalho excessivo, para satisfazer a cobiça dos seus pais e de
seus patrões.”
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Ele enumera ainda vários casos de doenças e conclui a relação com a causa principal:
as longas horas de trabalho. Nas fábricas de fósforos, a metade dos trabalhadores
era de crianças com menos de 13 anos e adolescentes com menos de 18 anos.
Somente a parte mais pobre da população cede seus filhos a esta indústria tão
insalubre e imunda. Entre as vítimas interrogadas pelo comissário White, 270 não
tinham mais que 18 anos; 40 tinham menos de 10 anos; 12 tinham 8 anos e 5 tinham
apenas 6 anos. A jornada de trabalho nessas fábricas variava entre 12, 14 e 15 horas.
Eles trabalhavam durante a noite e comiam nas poucas horas incertas, quase sempre
no mesmo local de produção, tudo empestado pelo fósforo.
Nas fabricas de tapete, nas épocas de grande movimento, como nos meses que
antecedem o Natal, o trabalho durava, quase sem interrupção, das 6 da manhã, até
às 22 horas. No inverno de 1862, de 19 meninas, 6 contraíram doenças por causa do
excesso de trabalho. Para mantê-las acordadas durante o trabalho, era necessário
estar sempre gritando e sacudindo-as. As mesmas viviam tão cansadas, que não
podiam manter os olhos abertos. Um operário depôs à Comissão de Inquérito nestes
termos:
“Este meu garoto, quando tinha 7 anos de idade, eu o levava nas costas, por causa
da neve, da casa para a fábrica, da fábrica para a casa. Meu garoto trabalhava
normalmente 16 horas por dia. Muitas vezes, tive de me ajoelhar para alimentá-lo,
enquanto ele estava na máquina, porque nem podia abandona-la, nem desligá-la.”
Pelos fins de junho de 1863, os jornais de Londres destacavam em suas manchetes
a morte de uma costureira de 20 anos, por excesso de trabalho. Ela morrera nas
dependências da manufatura em que trabalhava. A jornada de trabalho nessa
manufatura era de 16 horas e meia por dia. Entretanto, por causa de um baile no
palácio do governo, para quem a empresa executava encomendas, suas operárias
tiveram que trabalhar 26 horas e meia, sem parar. Eram cerca de 60 moças que
trabalhavam em péssimas condições, espremidas no reduzido espaço da oficina. A
modista das manchetes do dia seguinte, além disso, dormia em um quarto muito
estreito e sem ventilação. Ela morrera antes de concluir sua jornada de trabalho. O
médico chegou tarde demais. Em seu laudo, além de observar as condições de
trabalho das costureiras, assinalou a causa mortis: excesso de trabalho. Em uma das
regiões mais populosas de Londres, morriam anualmente, 31 entre cada 1000
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serralheiros. E o que pode ter a natureza humana contra essa profissão? Nada! Mas
o excesso de trabalho tornou-a destrutiva para o homem. Assim, o capital tortura o
trabalho, o qual depois de muito sofrer, procura finalmente, defender-se. Os
trabalhadores se organizam e exigem que o Estado determine a duração para a
jornada de trabalho. E o que se pode esperar disso? Resposta fácil, considerando que
a lei é feita e aplicada pelos mesmos capitalistas: os operários deveram estar sempre
atentos às medidas tomadas pelos patrões e unidos para protegerem suas vidas.