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Física Nuclear
57
5. CAPÍTULO 10: RADIOATIVA NATURAL E AS LEIS DA TRANSFORMAÇÃO
RADIOATIVA
Foi a constatação de que alguns átomos emitiam partículas α e β que deu origem à idéia de que os á-
tomos são constituídos a partir de unidades menores, e ao conceito de estrutura atômica.
A importância da radioatividade depende em grande parte da habilidade em medir transformações ra-
dioativas com alta precisão, e descrevê-las quantitativamente por meio de uma teoria correta.
5.1. A BASE DA TEORIA DA DESINTEGRAÇÃO RADIOATIVA
O primeiro problema que vamos tratar é o da descrição quantitativa do crescimento e decaimento
radioativos.
Rutherford e Soddy (1902) estudaram quantitati-
vamente a razão de decaimento do 88Ra224
(tório
X) e a razão de recuperação da atividade do tó-
rio, e obtiveram as curvas mostradas na fig. 5.01.
A curva experimental de decaimento para o
88Ra224
era de natureza exponencial, i.e.,
( ) txox eAtA λ−= (5.01),
fig. 5.01: O decaimento da atividade do 88Ra224
(ThX) e a
recuperação da atividade do tório.
onde
Axo ≡ Atividade inicial do 88Ra224
;
Ax(t) ≡ Atividade após um tempo t;
λ ≡ constante de decaimento (característica da espécie radioativa particular).
José Wilson Vieira
58
A curva de recuperação do 90Th232
é
( ) ( )to eAtA λ−−= 1 (5.02).
Assim, um filho, no instante t, tem o número de átomos dado por
( ) toeNtN λ−= (5.03).
Derivando (5.03):
( ) Ndt
dNtA λ=−= (5.04).
(5.04) é a equação fundamental do decaimento radioativo e diz que o decréscimo por unidade de
tempo no número de átomos de um elemento radioativo, por causa da desintegração, é propor-
cional ao número de átomos que ainda não se desintegraram.
Suponhamos que Q átomos do filho são produzidos/segundo por uma dada massa do pai, e que haja
N átomos do filho presentes no instante t vindos diretamente do pai. A atividade líquida do filho é
NQdt
dNλ−= (5.05).
Q ≡ Razão de formação de átomos do filho a partir de átomos do pai;
λN ≡ Razão de desaparecimento de átomos do filho por causa da sua desintegração radioativa.
De (5.05): QNdt
dN=λ+ ∴
Multiplicando por teλ : ( ) t
tttt Qe
dt
NedQeNee
dt
dN λλ
λλλ =⇒=λ+ ⇒ ( ) dtQeNed tt λλ = ∴
Integrando: CeQ
Ne tt +λ
= λλ ⇒ tCeQ
N λ−+λ
= ∴
Em t = 0, não há átomos do filho, i.e., N = 0. ⇒ λ
−=⇒+λ
=Q
CCQ
0 ⇒
Física Nuclear
59
( ) ( )to
t eNeQ
N λ−λ− −=−λ
= 11 (5.06),
onde No = Q/λ.
A lei do decaimento exponencial foi deduzida por E. von Schweidler (1905), sem nenhuma hipótese
especial sobre a estrutura dos átomos radioativos ou sobre o mecanismo de desintegração, usando a-
penas as leis da probabilidade.
“A probabilidade p de que um átomo se desintegre num intervalo de tempo ∆t é independente da his-
tória do átomo e é a mesma para todos os átomos do mesmo tipo.”
• Assim, p depende apenas de ∆t e, para ∆t → 0, p ∝ ∆t. ⇒
tp ∆λ= (5.07).
• A probabilidade de que um dado átomo não se desintegre durante o curto intervalo ∆t é
tp ∆λ−=− 11 (5.08).
• Se o átomo sobreviveu neste intervalo, então a probabilidade de que ele não se desintegre num
segundo intervalo ∆t é novamente 1 – λ∆t. Assim, a probabilidade de que um dado átomo sobre-
viva tanto no primeiro quanto no segundo intervalos é (1 – λ∆t)2; para n de tais intervalos, a
probabilidade de sobrevivência é (1 – λ∆t)n.
• Se o tempo total é t = n∆t, a probabilidade de sobrevivência é
n
n
t
λ−1 .
• A probabilidade de que o átomo permaneça imutável após um tempo t (P) é o limite desta
quantidade, quando ∆∆∆∆t →→→→ 0 (ou n →→→→ ∞∞∞∞). Assim
o
tn
t N
Ne
n
tP ==
λ−= λ−
→∆1lim
0 (5.09),
onde usamos
n
n
x
n
xe
−=
∞→
− 1lim (5.10).
José Wilson Vieira
60
PROVA DE (5.10): Usando o binômio de Newton,
( ) ( ) ( )( )�+ε
−−+ε
−+ε+=ε+ 32
!3
21
!2
111
kkkkkkk
,
para o binômio de (5.10):
( ) ( )( )�+
−
−−+
−
−+
−+=
−
32
!3
21
!2
111
n
xnnn
n
xnn
n
xn
n
xn
( ) ( )( )�+
−−−
−+−=
32
!3
21
!2
11
n
xnnn
n
xnn
n
xn
( ) ( )( )
�+
−−
−
−
+−= 33
22
!3
21
!2
1
1 xn
nnn
xn
nn
x ∴
No limite n → ∞:
x
nexxx
n
x −
∞→=+−+−=
− �
32
!3
1
!2
111lim , C.Q.D.
A interpretação estatística de (5.09) é que, se existe inicialmente No átomos radioativos, então a fra-
ção de átomos que permanece imutável, i.e., não decaiu, após um tempo t, é t
o
eN
N λ−= , onde N é o
número de átomos que decaiu. te λ− , portanto, é a probabilidade de que o átomo sobreviva um in-
tervalo de tempo t.
A lei do decaimento radioativo é uma lei estatística e, portanto, λN é uma atividade média, sujeita a
flutuações é um dado t.
Física Nuclear
61
5.2. CURVA DE DECAIMENTO PARA UMA ESPÉCIE RADIOATIVA COMPOSTA
O exemplo da fig. 5.02 (gráfico monolog) é uma
mistura de duas atividades, uma com meia-vida
de 0,8 horas e a outra com meia-vida de 8 horas.
A curva para a atividade total é a soma das duas
linhas individuais, i.e.,
( ) ( ) ( ) tt eAeAtAtAtA 21
201021
λ−λ− +=+= (5.11).
fig. 5.02: Curva de decaimento composta. (a) Curva com-
posta. (b) Componente de t1/2 maior (8,0 horas). (c) Compo-
nente de t1/2 mais curta (0,8 horas).
5.3. TRANSFORMAÇÕES RADIOATIVAS SUCESSIVAS
Descobriu-se exponencialmente que os nuclídeos radioativos que ocorrem na natureza formam três
séries. Em cada série, o nuclídeo pai decai num filho, que decai num neto, e assim por diante, até
que se alcança um produto final estável. No estudo das séries radioativas, é importante saber o núme-
ro de átomos de cada membro da série como função do tempo.
José Wilson Vieira
62
5.3.1. SÉRIE ATÉ A TERCEIRA GERAÇÃO
Queremos encontrar N1, N2 e N3. Temos:
• O decai para o filho;
• O filho recebe do pai e perde para o neto;
• O neto recebe do filho e é estável.
Vamos resolver o seguinte sistema de equações diferenciais:
λ=
λ−λ=
λ−=
223
22112
111
Ndt
dN
NNdt
dN
Ndt
dN
(5.12).
A solução de (5.12a) é
( ) ( ) teNtN 1011
λ−= (5.13).
Substituindo (5.13) em (5.12b): ( ) 221122112 10 NeNNN
dt
dN t λ−λ=λ−λ= λ− ∴
Multiplicando por te 2λ:
( )( ) ( ) tttt etNeeNe
dt
tdN2212
22112 0
λλλ−λ λ−λ= ⇒
( )
( ) ( ) ( )ttt eNetNedt
tdN1222 01122
2 λ−λλλ λ=λ+ ⇒ ( )[ ]
( ) ( )tt
eNdt
etNd12
2
0112 λ−λ
λ
λ= ⇒
( )[ ] ( ) ( ) dteNetNd tt 122 0112
λ−λλ λ= ⇒ ( ) ( ) ( ) CeNetN tt +λ−λ
λ= λ−λλ 122 01
12
12 ⇒
( ) ( ) tt CeeNtN 2101
12
12
λ−λ− +λ−λ
λ= ∴
Física Nuclear
63
Condição inicial: ( ) ( )00 22 NtN == . ⇒ ( ) ( ) CNN +λ−λ
λ= 00 1
12
12 ⇒ ( ) ( )00 1
12
12 NNC
λ−λ
λ−= ⇒
( ) ( ) ( ) ( ) tt eNNeNtN 21 000 1
12
121
12
12
λ−λ−
λ−λ
λ−+
λ−λ
λ=
( ) ( ) ( ) ttt eNeNeN 221 000 1
12
121
12
1 λ−λ−λ−
λ−λ
λ−+
λ−λ
λ= ⇒
( ) ( )( ) ( ) ttt eNeeNtN 221 00 21
12
12
λ−λ−λ− +−λ−λ
λ= (5.14).
De (5.12c): ( )
( )tNdt
tdN22
3 λ= ∴
Usando (5.14): ( )
( )( ) ( )
+−
λ−λ
λλ= λ−λ−λ− ttt eNeeN
dt
tdN221 00 21
12
12
3 ⇒
( )( ) ( ) ( ) ttt eNeNeN
dt
tdN221 000 221
12
211
12
213 λ−λ−λ− λ+λ−λ
λλ−
λ−λ
λλ= ⇒
( ) ( ) ( ) ( ) dteNdteNdteNtdN ttt 221 000 221
12
211
12
213
λ−λ−λ− λ+λ−λ
λλ−
λ−λ
λλ= ⇒
( ) ( ) ( ) ( ) CeNeNeNtN ttt +
λ−λ+
λ−
λ−λ
λλ−
λ−
λ−λ
λλ= λ−λ−λ− 221
2
22
2
1
12
21
1
1
12
213
10
10
10 ⇒
( ) ( ) ( ) ( ) CeNeNeNtN ttt +−λ−λ
λ+
λ−λ
λ−= λ−λ−λ− 221 000 21
12
11
12
23 ⇒
( ) ( ) ( ) ( ) CeNeNNtN tt +λ−λ
λ−
−
λ−λ
λ= λ−λ− 12 000 1
12
221
12
13 ∴
Condição inicial: ( ) ( )00 33 NtN == ⇒ ( ) ( ) ( ) ( ) CNNNN +λ−λ
λ−−
λ−λ
λ= 0000 1
12
221
12
13 ⇒
( ) ( )( )
( )000 1
12
2123 NNNC
λ−λ
λ−λ−+= ⇒ ( ) ( ) ( )000 123 NNNC ++= ⇒
José Wilson Vieira
64
( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )000000 1231
12
221
12
13
12 NNNeNeNNtN tt +++λ−λ
λ−
−
λ−λ
λ= λ−λ− ⇒
( ) ( ) ( )( ) ( )
λ−λ
λ−
λ−λ
λ++−+= λ−λ−λ− ttt eeNeNNtN 122
12
2
12
11233 10100 (5.15).
Portanto:
( ) ( )
( ) ( )( ) ( )
( ) ( ) ( )( ) ( )
λ−λ
λ−
λ−λ
λ++−+=
+−λ−λ
λ=
=
λ−λ−λ−
λ−λ−λ−
λ−
ttt
ttt
t
eeNeNNtN
eNeeNtN
eNtN
122
221
1
12
2
12
11233
21
12
12
11
10100
00
0
(5.16).
A fig. 5.03 mostra as curvas de uma série radioativa com três membros com as seguintes característi-
cas:
• N1 = 100 átomos e N2 = N2 = 0;
• t1/2 = 1 h e t1/2 = 5 h ⇒ λ1 = 0,693 h–1 e λ2 = 0,139 h–1
⇒
( )
( ) ( )
( )
−−
−+=
−−
=
=
−−
−−
−
tt
tt
t
eetN
eetN
etN
693,0139,0
3
139,0693,0
2
693,0
1
693,0139,0
139,0
693,0139,0
693,01100
100693,0139,0
693,0
100
⇒
( )
( ) ( )( )
+−=
−=
=
−−
−−
−
tt
tt
t
eetN
eetN
etN
693,0139,0
3
693,0139,0
2
693,0
1
25125100
125
100
(5.17).
Física Nuclear
65
fig. 5.03: Uma série radioativa com três membros: só o pai (t1/2 = 1 h) está presente o iní-
cio; o filho tem t1/2 = 5 h, e o neto é estável.
5.3.2. SÉRIE COM n GERAÇÕES
O tratamento discutido acima pode ser estendido a uma cadeia de qualquer número de produtos ra-
dioativos. A formulação do problema envolve n equações diferenciais:
λ−λ=
λ−λ=
λ−λ=
λ−=
−− nnnnn NN
dt
dN
NNdt
dN
NNdt
dN
Ndt
dN
11
33223
22112
111
�
(5.18).
José Wilson Vieira
66
A solução deste sistema de equações, na hipótese de que, em t = 0, somente a substância pai está pre-
sente, foi deduzida por Bateman (1904). As condições iniciais são
( ) ( ) ( ) ( ) ( ) 0000,00;0 3211 ========== tNtNtNNtNt n� (5.19).
O número de átomos do n-ésimo membro da cadeia é
( ) tn
tttn
neCeCeCeCtN λ−λ−λ−λ− ++++= �321
321 (5.20),
onde
( )( ) ( )( )
( )( ) ( )( )
( )( ) ( )( )
λ−λλ−λλ−λ
λλλ=
λ−λλ−λλ−λ
λλλ=
λ−λλ−λλ−λ
λλλ=
−
−
−
−
0
0
0
1
121
121
1
22321
1212
1
11312
1211
NC
NC
NC
nnnn
nn
n
n
n
n
�
�
�
�
�
�
�
(5.21).
5.4. EQUILÍBRIO RADIOATIVO
O termo equilíbrio é geralmente usado para expressar a condição em que a derivada de uma função
em relação ao tempo é nula. Isto, aplicado a uma cadeia radioativa, significa que o número de áto-
mos da cadeia não está mudando. As condições de equilíbrio são
λ=λ
λ=λ
λ=λ
=λ−
−− nnnn NN
NN
NN
N
11
3322
2211
11 0
�
(5.22).
Estas condições não podem ser satisfeitas rigorosamente se o pai é uma substância radioativa porque
a primeira das equações (5.22) implica λ1 = 0, o que é uma contradição. Porém, se o pai decai lenta-
Física Nuclear
67
mente, se comparado com os demais membros da cadeia, é possível atingir um estado muito próximo
do equilíbrio, o equilíbrio secular, onde o pai tem t1/2 muito grande. A condição de equilíbrio secular
é
nnnn NNNNN λ=λ==λ=λ=λ −− 11332211 � (5.23),
ou, em termos das meias-vidas, Ti:
n
n
n
n
T
N
T
N
T
N
T
N
T
N=====
−
−
1
1
3
3
2
2
1
1� (5.24).
Vamos a um exemplo de equilíbrio secular. O pai tem vida longa (T1 ≈ ∞) e o filho tem vida curta.
⇒ λ1 ≈ 0 e λ1 << λ2 ⇒ 11 ≈λ− te . Também N1(t = 0) = N1(0) e N2(t = 0) = 0 (porção recém-purificada
do pai). De (5.16):
( ) ( )
( ) ( )( )
−λ
λ≈
≈
λ− teNtN
NtN
210
0
1
2
12
11
(5.25).
Reescrevendo (5.25b):
( ) ( )( )teNtN 2101122
λ−−λ≈λ (5.26).
(5.26) diz que a atividade do filho é uma função do tempo, em termos da atividade (constante) do pai.
A atividade total é
( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )( )teNtNNtAtAtA 2200 11221121
λ−−λ≈λ+λ≈+= (5.27).
Assim temos, para o pai, para o filho e para a amostra total:
( ) ( )
( ) ( )( )( ) ( )( )
−λ=
−λ=λ
λ=λ
λ−
λ−
ttotal
t
eNtA
eNtN
NtN
2
2
20
10
0
11
1122
1111
(5.28).
A fig. 5.04 as seguintes curvas:
José Wilson Vieira
68
• (a) Atividade do filho crescendo numa fra-
ção recém-purificada do pai;
• Atividade do pai (t1/2 → ∞);
• A atividade total de uma fração do pai ini-
cialmente pura;
• Decaimento de uma fração do filho recém-
isolada.
EQUILÍBRIO TRANSITÓRIO:
Quando λ1 < λ2, mas a meia-vida do pai é fini-
ta. Se o pai e o filho são separados de modo
fig. 5.04: Equilíbrio secular até 2a geração.
que o pai possa ser considerado como inicialmente puro, o número de átomos é dado por (5.16):
( ) ( )
( ) ( )( )
−λ−λ
λ=
=
λ−λ−
λ−
tt
t
eeNtN
eNtN
21
1
0
0
1
12
12
11
∴
Quando t se torna suficientemente grande, te 2λ− se torna desprezível comparado com
te 1λ−. Assim, te-
remos:
( ) ( )
( ) ( )
λ−λ
λ≈
=
λ−
λ−
t
t
eNtN
eNtN
1
1
0
0
1
12
12
11
(5.29).
O filho passará a decai com a mesma meia-vida do pai e
( )( ) 1
12
2
1
λ
λ−λ=
tN
tN (5.30).
Portanto:
Física Nuclear
69
( )( ) 2
12
2
1
λ
λ−λ=
tA
tA (5.31).
Conclusão: A atividade do filho é
maior do que a do pai por um fator
12
2
λ−λ
λ. A fig. 5.05 mostra as carac-
terísticas do equilíbrio transitório.
fig. 5.05
José Wilson Vieira
70
5.5. SÉRIES RADIOATIVAS NATURAIS
5.5.1. SÉRIE DO URÂNIO
tab. 01
Física Nuclear
71
5.5.2. SÉRIE DO ACTÍNIO
tab. 02
José Wilson Vieira
72
5.5.3. SÉRIE DO TÓRIO
tab. 03