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727 Educ. Real., Porto Alegre, v. 36, n. 3, p. 727-746, set./dez. 2011. Disponível em: <http://www.ufrgs.br/edu_realidade> O Dizer da Professora: para além da indignação Dóris Maria Luzzardi Fiss RESUMO – O Dizer da Professora: para além da indignação. O tema deste trabalho é a constituição heterogênea dos sujeitos e dos sentidos considerada a partir da análise discursiva de formulações produzidas por uma professora da rede pública estadual. O objetivo da análise é perceber que efeitos de sentido sobre a condição do ser professor e as diferentes relações estabelecidas nas práticas de que ele participa na escola e fora dela estão presentes nas formulações dos sujeitos, evidenciando seus deslocamentos de posição. Com este propósito, articulam-se noções de memória e acontecimento, entre-lugares, heterogeneidade e sujeito dividido. Conclui-se, a partir da análise, que o sujeito-professora é um sujeito processual que se constitui em função dos desloca- mentos que produz, um sujeito que se constitui nos e pelos processos que protagoniza, nas bordas intervalares da realidade, nos entre-lugares. Palavras-chave: Discurso Pedagógico. Análise de Discurso. Entre-lugares. Trabalho Docente. Heterogeneidade. ABSTRACT – The Teacher’s Voice: beyond outrage. The theme of this paper is the heterogeneous constitution of subjectivity and meaning, based on discursive analysis of formulations produced by a professor of public schools. The purpose of the analy- sis is to realize meaning effects on the condition of being a teacher and the different relationships that were established in the practices that he participates in school and beyond are present in the formulations of the subjects, showing its position shifts. For this purpose, were articulated notions of memory and event, between-places, hetero- geneity and divided subject. It is concluded from the analysis that the subject-teacher is a subject that is procedural in terms of displacement that produces a subject who is in and by processes who stars on the edges of reality interval in-between places. Keywords: Pedagogical Discourse. Discourse Analysis. Between-places. Teaching. Heterogeneity.

FISS, D.M.L. O Dizer Da Professora - Para Além Da Indignação

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O tema deste trabalhoé a constituição heterogênea dos sujeitos e dos sentidos considerada a partir da análisediscursiva de formulações produzidas por uma professora da rede pública estadual. Oobjetivo da análise é perceber que efeitos de sentido sobre a condição do ser professore as diferentes relações estabelecidas nas práticas de que ele participa na escola e foradela estão presentes nas formulações dos sujeitos, evidenciando seus deslocamentosde posição. Com este propósito, articulam-se noções de memória e acontecimento,entre-lugares, heterogeneidade e sujeito dividido. Conclui-se, a partir da análise, queo sujeito-professora é um sujeito processual que se constitui em função dos deslocamentosque produz, um sujeito que se constitui nos e pelos processos que protagoniza,nas bordas intervalares da realidade, nos entre-lugares.

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  • 727Educ. Real., Porto Alegre, v. 36, n. 3, p. 727-746, set./dez. 2011. Disponvel em:

    O Dizer da Professora: para alm da indignao

    Dris Maria Luzzardi Fiss

    RESUMO O Dizer da Professora: para alm da indignao. O tema deste trabalho a constituio heterognea dos sujeitos e dos sentidos considerada a partir da anlise discursiva de formulaes produzidas por uma professora da rede pblica estadual. O objetivo da anlise perceber que efeitos de sentido sobre a condio do ser professor e as diferentes relaes estabelecidas nas prticas de que ele participa na escola e fora dela esto presentes nas formulaes dos sujeitos, evidenciando seus deslocamentos de posio. Com este propsito, articulam-se noes de memria e acontecimento, entre-lugares, heterogeneidade e sujeito dividido. Conclui-se, a partir da anlise, que o sujeito-professora um sujeito processual que se constitui em funo dos desloca-mentos que produz, um sujeito que se constitui nos e pelos processos que protagoniza, nas bordas intervalares da realidade, nos entre-lugares.Palavras-chave: Discurso Pedaggico. Anlise de Discurso. Entre-lugares. Trabalho Docente. Heterogeneidade.ABSTRACT The Teachers Voice: beyond outrage. The theme of this paper is the heterogeneous constitution of subjectivity and meaning, based on discursive analysis of formulations produced by a professor of public schools. The purpose of the analy-sis is to realize meaning effects on the condition of being a teacher and the different relationships that were established in the practices that he participates in school and beyond are present in the formulations of the subjects, showing its position shifts. For this purpose, were articulated notions of memory and event, between-places, hetero-geneity and divided subject. It is concluded from the analysis that the subject-teacher is a subject that is procedural in terms of displacement that produces a subject who is in and by processes who stars on the edges of reality interval in-between places.Keywords: Pedagogical Discourse. Discourse Analysis. Between-places. Teaching. Heterogeneity.

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    Primeiras Palavras

    Neste artigo, apresenta-se um recorte de pesquisa que, organizada em dois momentos (1996 a 1998 perodo do Mestrado em Educao e, depois, 1999 a 2003 perodo do Doutorado em Educao), foi desenvolvida com a participao de trinta e seis professores de uma escola da rede pblica estadual de Porto Alegre (Rio Grande do Sul) e se subsidiou na Anlise de Discurso desde a perspectiva proposta por Michel Pcheux. No seu primeiro momento (1996 a 1998)1, tal estudo teve como objetivo analisar os processos de cons-truo da autoria2, bem como suas implicaes na produo das propostas de ao pedaggicas. Da anlise do discurso pedaggico realizada naquela poca derivaram algumas concluses3 referentes aos modos de constituio dos processos de autoria e mal-estar4. O desdobramento do estudo realizado no perodo do Mestrado em Educao provocou o direcionamento de minha ateno para um outro tema que foi, ento, objeto de trabalho no Doutorado em Educao (segundo momento da pesquisa): a constituio heterognea dos sujeitos e dos sentidos5.

    O artigo que, aqui, se apresenta resulta do esforo analtico empreendido neste segundo momento. Nosso propsito neste texto envolve a apresentao de recorte metodolgico do estudo produzido sobre a constituio heterognea do sujeito a partir de anlise discursiva de falas de uma professora. Estas falas foram obtidas, com o consentimento da professora, em reunio que ocorreu na escola onde a pesquisa se desenvolveu. O objetivo da anlise est amarrado ao foco do estudo e pode ser assim traduzido: perceber que efeitos de sentido sobre a condio do ser professor e as diferentes relaes estabelecidas nas prticas de que ele participa na escola e fora dela esto presentes nas formulaes dos sujeitos, evidenciando seus deslocamentos de posio.

    Com o intuito de sistematizar os procedimentos de anlise, as marcas lin-gusticas sobre as quais busco relaes interdiscursivas sero destacadas nas falas e abordadas a partir de dois movimentos inter-relacionados: primeiro, do ponto de vista sinttico, retomando-as do ponto de vista da anlise de discurso de terceira poca6 o que introduz a anlise do sentido-outro, do discurso-outro, dos interditos e no-ditos. Enfim, um tal processo termina por buscar dar visibilidade ao que se objetiva com a anlise a identificao de marcas de heterogeneidade e de efeitos de sentido articulados condio do ser professor e s negociaes que ele assume, de forma mais ou menos consciente.

    Enlaces Tericos

    Sobre a importncia da passagem pela lngua enquanto momento inerente ao processo analtico-discursivo o prprio Pcheux que, ao descrever os pro-cessos acionados na anlise do enunciado On a gagn, lembra que o enunciado

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    profundamente opaco: [...] sua materialidade lxico-sinttica [...] imerge esse enunciado em uma rede de relaes associativas implcitas parfrases, implicaes, comentrios, aluses etc. isto , em uma srie heterognea de enunciados, funcionando sob diferentes registros discursivos, e com uma esta-bilidade lgica varivel (Pcheux, 1997, p. 23). Portanto, sendo todo enunciado lxico-sintaticamente determinado, importante observar, a partir da anlise da materialidade lingustica e de suas relaes provveis com o interdiscurso, como os sentidos trabalham sobre os sentidos.

    Este conjunto de fatores, que faz parte da construo de uma abordagem relacionada noo de memria e acontecimento (Pcheux, 1997; 1999), de hibridismo cultural e entre-lugares (Bhabha, 1998), de heterogeneidade cons-titutiva e mostrada (Authier-Revuz, 1982), de constelao de poderes sociais (Santos, 1995a; 1995b) e de sujeito dividido (Lacan, 1988a; 1988b), conduz tambm a uma forma diferente de compreender os modos de constituio do sujeito e de produzir os dispositivos terico-analticos. H que se abrir mo das certezas relacionadas ao estabelecimento de sentidos fixos. E abrir mo do supostamente garantido buscar contemplar, em referncia ao professor, o que Santos (2000) designa como constelao de poderes que compem esse sujeito: o poder cultural, o poder poltico, o poder econmico, o poder religioso, o poder profissional, o poder local, o poder nacional, o poder transnacional, entre outros.

    Alm disso, abrir mo desse supostamente garantido transitar no limite e entre limites de sentidos o que remete problematizao, no interior/exterior do campo de significaes, de uma dialtica constitutiva do sujeito-professor: a dialtica da estabilizao/desestabilizao simblica dos professores nos limi-tes de diferentes paradigmas epistemolgicos e poltico-pedaggicos. Dito de outra forma, [...] os sentidos pr-construdos podem sofrer desestabilizao a partir de enunciaes novas, sob a interferncia dos sujeitos, na escola (Mutti, 2001, p. 162). A esse respeito Pcheux oferece contribuies interessantes, principalmente, em seus dois ltimos trabalhos Papel da memria e Discurso: estrutura ou acontecimento, produzidos em 1983. Lembra o autor que, em se tratando de estabilizao/desestabilizao dos sentidos,

    [...] a memria tende a absorver o acontecimento [...], mas o acontecimento discursivo, provocando interrupo, pode desmanchar essa regularizao e produzir retrospectivamente uma outra srie sob a primeira, desmascarar o aparecimento de uma nova srie que no estava constituda enquanto tal e que assim o produto do acontecimento; o acontecimento, no caso, desloca e desregula os implcitos associados ao sistema de regularizao anterior (Pcheux, 1999, p. 52).

    Portanto, mesmo sentidos supostamente fixos jogam nesse movimento que inclui tanto a regularizao do preexistente quanto a desregulao perturba-dora da rede de sentidos. Tais processos remetem, por sua vez, a [...] um real

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    constitutivamente estranho univocidade lgica (Pcheux, 1997, p. 43). Dito de outra forma, ao real da lngua, alngua preenchida por processos de equi-vocao ligados ao reviramento dos sentidos, a pontos em que a consistncia da representao lgica cessa, ao discurso-outro que marca [...] a insistncia do outro como lei do espao social e da memria histrica (Pcheux, 1997, p. 55).

    Incluir tais elementos na discusso no nega, de forma alguma, os efeitos da contradio na produo de efeitos de sentido pelos sujeitos. Inclu-los parece possibilitar, por outro lado, um movimento menos contido em e por dualismos, permitindo talvez o trabalho no interior/exterior dessa constela-o de poderes (Santos, 2000) que circulam socialmente. E tudo isto remete crescente presena de pessoas, coisas, fenmenos e lugares que parecem se situar em entre-lugares ou, como pontua Bhabha (1998, p. 20), em lugares deslizantes, em [...] momentos e processos que so produzidos na articulao de diferenas culturais.

    Abrindo um breve, mas necessrio, pargrafo, preciso destacar que, em se tratando de diferenas culturais e para alm do que nos coloca Bhabha em suas discusses e anlises, tal categoria desperta meu interesse pela sugesto de outros modos de interpretao do discurso pedaggico e, por extenso, do profissional do magistrio. Para o autor hindu-britnico, uma srie de proces-sos e fenmenos so articulados a este vasto campo de significao social que atende pelo nome de diferena cultural sujeitos divididos, movimentos sociais diferenciados, descontinuidades, desigualdades, minorias, rupturas, sujeitos agentes ativos de articulaes, imagem/contraimagem, polticas culturais, hibridismo cultural, entre outros. Este autor chega, inclusive, a construir um conceito de diferena cultural segundo o qual ela se constitui em [...] processo de identificao atravs do qual afirmaes da cultura ou sobre a cultura dife-renciam, discriminam e autorizam a produo de campos de fora, referncia, aplicabilidade e capacidade (Bhabha, 1998, p. 63).

    Ainda que todo este contexto terico no me passe despercebido, devo enfatizar que um tal interesse s se justifica se estiver estreitamente vinculado ao discurso pedaggico, pois as [...] diferenas culturais, que consistiriam numa fora capaz de alterar mais substancialmente a escola, costumam muitas vezes ser apagadas no seio da prpria instituio (Mutti, 2001, p. 13). E, ao buscar a identificao de marcas da heterogeneidade nos dizeres das professoras de uma escola pblica estadual, de uma maneira ou de outra, estarei tambm evidenciando os rastros que as tentativas(?) de apagamento das diferenas culturais deixam na lngua e nos sujeitos.

    Entre-lugares em Anlise: o sentido de crise do trabalho docente

    Buscarei situar o entre-lugares atravs da anlise de algumas formulaes7. H que se destacar que em todas as formulaes recortadas para esta anlise

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    est presente um sentido de profisso em crise, de magistrio em crise. Numa de nossas reunies, determinada professora dos Anos Finais do Ensino Fun-damental (doravante, referida como P.) declarou que:

    F1: No tem alternativa, infelizmente, porque eu acho que nunca vai dar um salrio digno para o nosso trabalho porque eles alegam que so muitos.

    F2: Ento quer dizer que ele no vai dar nunca uma coisa que a gente vai achar digna.

    F3: Como que vai falar em melhoria sem salrio?

    F4: Como que vai fazer cursos, comprar livros?

    F5: Eu acho que ns ainda somos heronas: com tudo isso a, ns entramos em sala de aula, damos a nossa aula, fazemos tudo o que temos que fazer numa boa [...].

    F6: Tem horas que a gente se sente um lixo.

    Tomarei, para a anlise desenvolvida neste artigo, como marcas lingusticas, as palavras porque e como. Seguirei, como passos condutores da anlise, as duas etapas anteriormente anunciadas: o trabalho com elementos extrados da gramtica e com o funcionamento discursivo.

    1. Porque e os Sentidos de Caridade, Desigualdade e Desmobilizao

    Conforme a gramtica semntica de Mateus et al. (1989), a respeito da F1: No tem alternativa, infelizmente, porque8 eu acho que nunca vai dar um sa-lrio digno para o nosso trabalho porque eles alegam que so muitos, pode-se dizer que os enunciados exprimem uma relao de causalidade entre estados de coisas descritas na proposio antecedente (A) e na proposio consequente (B): A uma causa de B, isto , A uma condio suficiente de B e B uma consequncia possvel e provvel de A. Dito de outra forma: porque eu acho que nunca vai dar um salrio digno para o nosso trabalho causa de no tem alternativa, infelizmente (proposio consequente B); e porque eles alegam que so muitos causa de nunca vai dar um salrio digno para o nosso trabalho (proposio consequente B).

    Mateus et al. (1989, p. 298) classificam esta construo como condicional factual, pois as oraes exprimem uma dependncia semntica entre proposi-es, ainda que do ponto de vista sinttico e semntico cada uma das constru-es possa apresentar aspectos particulares. Desta forma, [...] as construes condicionais so semanticamente construes de subordinao, uma vez que exprimem um tipo de juno que conecta sequencialmente frases cujos conte-dos proposicionais mantm entre si uma relao hierrquica de dependncia semntica. Alm de condicionais, so factuais ou reais, porque o locutor as-sume que os contedos das proposies se verificam no mundo real. Porque se constitui, nos enunciados acima, em mecanismo de coeso gramatical frsica por subordinao de tipo condicional factual, tambm designado causal. Ele

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    pode ser assim classificado por remeter a um processo de sequenciao que assegura (ou torna recupervel) uma ligao lingustica significativa entre os elementos que ocorrem na superfcie textual.

    Se tais relaes forem transpostas para o ambiente discursivo, extrapola-remos a dimenso da materialidade lingustica, trabalhando com aquilo que escapa do fio do discurso e, em escapando, desafia a desentender e reentender sentidos incertos. Contudo, ao falar em processos de desentendimento e reen-tendimento no estou pressupondo uma possibilidade de mera substituio de um ncleo duro de sentidos por outro. Pelo contrrio, e buscando sustentao no prprio Michel Pcheux, desentender/reentender, ou mesmo desestabilizar/estabilizar, desestruturar/reestruturar, so processos inerentes s tarefas do analista de discurso porque inerentes prpria lngua. Como salienta o autor:

    [...] a ambiguidade e o equvoco constituem um fato estrutural incontornvel: o jogo das diferenas, alteraes e contradies no pode ser a concebido como o amolecimento de um ncleo duro lgico: A heterogeneidade constitutiva da lngua no se confunde com a manipulao ostentatria da heterogenei-dade mostrada (cf. a respeito os trabalhos de J. Authier sobre esse ponto [...]) (Pcheux, 1997, p. 50).

    No que diz respeito especificamente ao trabalho de anlise dos enuncia-dos supracitados, me inquieta o desafio que eles me propem por estarem diretamente relacionados a essa heterogeneidade constitutiva de sujeitos e de sentidos. Mas vejamos como se caracteriza o comportamento discursivo da conjuno porque em No tem alternativa, infelizmente, porque eu acho que nunca vai dar um salrio digno para o nosso trabalho porque eles alegam que so muitos. Em primeiro lugar, tal partcula no deve ser compreendida apenas como elemento que indica causa, ainda que num primeiro momento isto possa estar presente. Ressonncias de outros sentidos se fazem ouvir em tais dizeres. Quando a professora declara, de maneira enftica, No tem alternativa, infeliz-mente, buscando explicaes ou origens para uma tal ausncia de condies de possibilidade de avanos, parece-me que ela tenta explicar para si mesma um fenmeno que anterior presumida inexistncia de alternativas: as funes desmobilizadoras que os cdigos do trabalho foram adquirindo. Dito de outra forma, ela remete a questes vinculadas s relaes estabelecidas, ao longo do tempo, entre as polticas pblicas e os trabalhadores.

    Cattani (1992), ao discutir esta questo, lembra que os cdigos do trabalho, que deveriam traduzir as condies de enfrentamento e as conquistas de ambos os lados (patres e empregados), terminaram por adquirir funes desmobi-lizadoras. Por conseguinte, a concesso de benefcios tem se constitudo em ato de caridade mais do que em resultado do poder de barganha genuno dos sindicatos. Sentido de caridade indiciado na fala de P. quando afirma que nunca vai dar um salrio digno para o nosso trabalho. De alguma maneira, o sentido de caridade acompanha o sentido de desmobilizao: P. no reivindica verda-

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    deiramente um salrio digno (que talvez pudesse derivar da reconfigurao dos poderes exercidos pelo magistrio pblico estadual), ela clama, como se diria, por um salvador da ptria, enquanto aguarda a soluo de seus problemas.

    Vale ressalvar, igualmente, que tais sentidos de caridade e de desmobili-zao no tocam apenas na relao das professoras com as polticas pblicas. Eles tangenciam os vnculos identitrios estabelecidos entre as professoras e o sindicato. Ao evidenciarmos os sentidos de desmobilizao, no estamos remetendo a P. a responsabilidade exclusiva sobre uma tal atitude. Ao con-trrio, buscamos rastrear os efeitos, os ecos, as ressonncias discursivas de tais componentes. Com toda a certeza, efeitos desmobilizadores tm origem, tambm, na ausncia de centrais sindicais capazes de ampliar as reivindicaes para alm de interesses imediatos e corporativos, desafiando os trabalhadores a se deslocarem da posio secundria e subordinada que tm ocupado na mesa de negociaes.

    Santos (2000, p. 342) adverte que as experincias organizativas necessi-tam recuperar [...] a legitimidade e muitas vezes a autolegitimidade para, a partir dos espaos sociais, propor transformaes que s so eficazes se forem globais o que significa romper com a tutela paternalista tanto do Estado quanto dos sindicatos, ou seja, furar o discurso colonial e seus mecanismos de cristalizao dos esteretipos e do preconceito. Dito de outra forma,

    O definhamento da luta de classes ou, para sermos mais exactos, a derrota global do movimento operrio organizado significa, no que os objectivos desta luta estejam cumpridos provavelmente nunca estiveram to longe de o estar mas antes que eles s so obtveis dentro de um contexto mais amplo, civilizacional, em que efectivamente estiveram integrados na sua origem, mas que, a pouco e pouco, foi perdido (Santos, 2000, p. 341).

    Ao falar sobre um tal contexto civilizacional, Santos lembra os tempos (do incio do sculo XIX at a Comuna de Paris) em que os objetivos das aes organizadas implicavam, mais que uma luta de classes, uma luta civilizacional. Suas lutas no tinham por objetivo uma mera mudana nas relaes de produo, elas aspiravam a uma nova sociabilidade, transformao da educao e do con-sumo, emancipao da mulher. Apesar disso, o autor sublinha a importncia do movimento operrio pelas conquistas feitas, destacando, contudo, que a ne-gociao sindical e representao poltica dos movimentos, que foram decisivas para a melhoria das condies de vida dos trabalhadores, hoje tm contribudo para a naturalizao, trivializao e despolitizao das relaes de produo. Conforme o autor, [...] preciso alterar as estratgias e as prticas dos velhos movimentos sociais do operariado, dos partidos operrios e dos sindicatos (Santos, 2000, p. 272). Da mesma forma, preciso atentar para um fenmeno bastante comum em nossos tempos: as transformaes operadas no processo de trabalho tm feito definhar a unidade dos trabalhadores, promovendo a inte-grao individual e individualmente negociada dos trabalhadores na empresa.

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    Seria dizer que, dentre outros fatores que conduzem ao enfraquecimento das organizaes sindicais, essa fraqueza agravada pelo rebaixamento das taxas de sindicalizao em quase todos os pases o que provoca a [...] desintegrao poltica do movimento operrio (Santos, 2000, p. 254).

    Neste exato ponto, reencontramos Bhabha (1998). Uma pergunta, agora, torna-se inadivel: o que quer a professora? O que quer P.? O que quer o sujeito-professor? Creio que sua demanda no se vincula somente a salrio. Ela envolve mais do que isto: sua demanda refere-se dignidade articulada paradoxalmente a sentidos de caridade e a sentidos de desmobilizao. Ou seja, refere-se conquista de relativa autonomia que possibilite o exerccio de poderes ainda cativos de um discurso colonial, poderes que so de mltiplas ordens: econmica no momento em que destaca o elemento salrio; poltica quando, por apagamento, alude a algum que nunca vai dar o salrio; social quando deixa escapar sentidos de desmobilizao do magistrio (o dar o salrio surge como caridade, no como conquista do grupo social). Parece-me que P., na verdade, no alude a questo da opresso poltica como violao de uma essncia humana, mas como um conjunto de condies scio-histricas possi-bilitadoras de uma tal sobredeterminao de fora do sujeito-professor o que se materializa na ausncia de salrio que se constitui no enquanto principal ausncia, mas como mais uma das tantas ausncias que levam P. a declarar que, afinal de contas, no h alternativas.

    Bhabha (1998, p. 76) sugere que sempre em relao ao lugar do Outro que o desejo colonial articulado: o espao fantasmtico da posse, que nenhum sujeito pode ocupar sozinho ou de modo fixo e, portanto, permite o sonho da inverso dos papis. O Outro, categoria tomada por emprstimo a Lacan, parece se manifestar como este conjunto de poderes econmicos, polticos, sociais, sempre culturais, que atravessam os dizeres de P., provocando seus deslocamentos e evidenciando a ciso do sujeito e da enunciao entre ditos e no-ditos. Falar em um outro elptico que nunca vai dar o salrio digno no remete apenas a uma diviso do sujeito em categorias como senhor e escravo, no refere tambm a simples troca de lugares sociais, mas tende a se colocar como imagem duplicadora do sujeito em pelo menos dois lugares ao mesmo tempo. Entre tais lugares, porm, se configura uma inquietante distncia que termina por cristalizar os dispositivos acionados pelo discurso colonial (por exemplo, os sentidos de caridade e de desmobilizao). Dessa forma, o artifcio desse outro elptico, convenientemente apagado pelo silenciamento mesmo, se inscreve em P. que imagina estar fazendo a crtica, mas termina funcionando como porta-voz de um outro elptico que, bem ao gosto do discurso colonial, transforma a distncia entre senhor e escravo em um impossvel de ser apro-ximado.

    Na verdade, impossvel porque envolveria um necessrio redimensiona-mento dos sentidos de caridade e de desmobilizao ou, como destaca Sidney Tarrow (1997), a mobilizao das pessoas em torno de uma causa, de um pro-blema, de uma situao-limite que, de fato, as representasse em um contexto

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    de foras maior do que aquele possibilitado pelos problemas tpicos das aes coletivas (lideranas desorganizadas, grupos dispersos e desintegrados que, embora tentem, no conseguem sustentar aes responsveis). Em outras pala-vras, uma tal impossibilidade de conquistas e de resgates parece estar associada aos sentidos de incompetncia que, em Santos (1995a; 1995b; 1996; 2000), remetem a uma ausncia de aes articuladas a projetos que se configuram como contrarresposta perversidade imposta pelas polticas de desigualdade e excluso que caracterizam nossa sociedade.

    2. Como e os Sentidos de Incompetncia, Desigualdade e Excluso

    Cumpre buscar mais alguns subsdios para reflexo na anlise de outras duas formulaes:

    F3: Como que vai falar em melhoria sem salrio?

    F4: Como que vai fazer cursos, comprar livros? Nelas, a marca lingustica como. Mateus et al. (1989, p. 241) classificam

    esta partcula como morfema interrogativo com valor adverbial que pode assumir dois sentidos de modo ou instrumental. As autoras observam que as frases interrogativas so a expresso de um tipo de ato ilocutrio diretivo atravs do qual o locutor pede ao alocutrio que lhe fornea verbalmente uma informao de que no dispe, sendo algumas dessas construes pedidos indiretos de uma ao.

    Alm de dirigir a ateno para esta marca lingustica, parece relevante destacar um outro elemento dos enunciados: a forma elidida que sucede a ex-presso interrogativa como que em Como que vai falar em melhoria [...]? Como que vai fazer cursos, comprar livros [...]? Segundo Koch (2001), a forma elidida um tipo de forma referencial, ou seja, retoma referentes textuais que, nos enunciados, foram apagados. Supondo que, no primeiro enunciado, tenha se dado o apagamento de ele, presente no contexto anterior quando P. parecia fazer referncia a algum representante poltico no especificado; e, no segundo enunciado, de um ele que talvez corresponda aos prprios professores, lcito supor que se trata de uma elipse (processo articulado coeso textual) de formas remissivas no-referenciais livres, neste caso, os pronomes pessoais de 3a pessoa.

    Estes pronomes fornecem ao leitor/ouvinte instrues de conexo a respeito do elemento de referncia com o qual tal conexo deve ser estabelecida. Como sublinha Koch (2001, p. 37), [...] quando anafricos, tm por tarefa sinalizar que as indicaes referenciais das predicaes sobre o pronome devem ser colocadas em relao com as indicaes referenciais de um determinado grupo nominal do contexto precedente. No caso dos enunciados, ser necessrio recorrer s

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    outras falas de P. para ter certeza sobre quem so os referentes. Quando ela pergunta Como que vai falar em melhoria sem salrio? (F3), parece estar referindo, por apagamento, ao eles de eles alegam que so muitos (F1) e ao ele de ele no vai dar nunca uma coisa que a gente vai achar digna (F2) ou seja, ao grupo de representantes polticos a quem cumpriria viabilizar uma remunerao melhor. Quando questiona Como que vai fazer cursos, comprar livros? (F4), parece remeter ao ns de ns ainda somos heronas (F5) e ns entramos em sala de aula (F5), ao a gente de a gente se sente um lixo (F6) e uma coisa que a gente vai achar digna (F2) isto , ao grupo de professores.

    Pensando a partir da perspectiva discursiva, tanto os efeitos produzidos pela elipse quanto queles produzidos pelo ndice interrogativo parecem estar preenchendo uma espcie de espao esvaziado de esperanas sobre possibili-dades concretas de transformao da condio do professor da escola pblica estadual. As autoridades que poderiam atender as demandas do magistrio pblico esto encobertas por alguma espessa camada de distanciamento em relao ao cumprimento de suas responsabilidades no que concerne aos pro-fessores. A forma elidida empregada por P., de maneira talvez inconsciente, deixa escapar certo sentido de descomprometimento ou desaparecimento dos sujeitos supostamente responsveis pelo atendimento s reivindicaes.

    Por outro lado, impressiona que, ao retomar o referente grupo de profes-sores, P. tambm tenha feito uso de uma forma elidida. Isto provoca suspeitas de que P., tendo anteriormente referido a condio periclitante do magistrio pblico estadual, tenha tambm situado o grupo de professores num lugar de pouca representatividade, isto , de silenciamento em relao sociedade em geral. No entanto, apesar do duplo apagamento promovido nas falas de P. o dos representantes polticos e o dos sujeitos-professores, ela no se furta da construo de questionamentos que indiciam alguns dos motivos de sua aflio.

    A professora, na verdade, faz duas perguntas curtas, diretas, aparentemente simples. Contudo, os fios dessas questes se espalham por muitos problemas que, alis, j foram tangenciados ao longo deste trabalho. Cabe, agora, apro-fund-los. Ela diz: Como que vai falar em melhoria sem salrio? Como que vai fazer cursos, comprar livros?, remetendo, pois, a questes vinculadas ao bastante antigo mito da incompetncia do professor. Geraldi (1995), ao discutir sobre esse mito, traz elementos importantes para a discusso. Salienta o autor, por exemplo, que historicamente tm sido estabelecidas relaes que, por sua vez, comprometem a prpria formao dos professores. para isto que aponta a correlao feita entre a crise escolar, a desqualificao da escola pblica e a desqualificao dos professores o que tem se tentado resolver, de maneira precria, com cursos de reciclagem, treinamentos e atualizaes que visam sobretudo a suplncia de carncias, no a capacitao dos profissionais pelo domnio do conhecimento, das cincias e das tcnicas na rea de Educao.

    Emerge, pois, desta situao, j em si bastante catica, um outro aspecto paradoxal que P. menciona quando fala em melhoria sem salrio. Ressoam, das palavras da professora, sentidos de contradio tpicos do modo como o

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    professor da escola pblica tem sido compreendido no que diz respeito ao seu papel e s suas funes. O sistema escolar, primeiro, admite a competncia dos professores, tanto que lhes possibilita o estabelecimento de um vnculo de trabalho e coloca-os na posio de trabalhadores da educao aptos a exercer as funes atinentes a tal papel. Pouco depois, ataca esses profissionais de formas variadas que questionam a referida competncia. Seria dizer que, a partir de um certo momento difcil de precisar, deixa de trat-los como profissionais: exige cursos de reciclagem, impe uma relao de emprego em que os direitos do trabalhador no so respeitados, submete-os a condies de trabalho que no oportunizam, muitas vezes, a possibilidade de continuar estudando. Como lembra Geraldi (1995, p. 20),

    [...] um agente educacional, trabalhando num sistema que reproduz tambm pela inculcao da ideologia da incompetncia, no se pode ter como compe-tente. [...] Para o sistema escolar mais importante que seus prprios agentes [...] se tenham por incompetentes para melhor cumprirem o papel de inculcao da ideologia da incompetncia.

    O autor, bem verdade, radicaliza quando apresenta tais argumentos. No entanto, eles encerram consideraes coerentes com uma crise da escola pblica estadual que teve seu incio h muito tempo. Esta crise tem sido tratada com medidas paliativas que, na maioria das vezes, apresentam alternativas como a prtica de aparente formao em servio e os habituais cursos centrados, em geral, em questes relacionadas ao como ensinar as quais tendem a cristalizar ainda mais componentes de uma tradio tecnicista e instrumental do que deriva, de forma direta ou indireta, a expropriao do professor de seu salrio, de suas crenas e de suas identidades.

    P., ao fazer suas perguntas, deixa escapar sentidos de uma expropriao que no apenas econmica, tambm poltica, social, profissional. O uso de formas elididas para recuperar os referentes representantes polticos e sujeitos-professores no se deu por acaso, ainda que a professora possa no ter total conscincia do movimento produzido. Ao assumir o emprego dessas formas, ressoam em suas palavras sentidos relacionados diretamente a uma expropriao que, mascarada pelo mito da incompetncia, se articula a prticas construdas pelo sistema social (no apenas escolar) que perpetuam uma no devoluo da palavra ao outro (Freire, 1993a; 1993b; 1997) que, neste caso, o professor. Por extenso, a no devoluo da palavra ao sujeito-professor se combina com uma no escuta, presente tambm na escola, em situaes de interao com colegas, pais e alunos. Todos esses elementos se relacionam, por sua vez, aos valores do magistrio pblico estadual.

    Portanto, os sentidos de incompetncia, aos quais se ligam os sentidos de expropriao, no se definem somente a partir do pedaggico. Isto , no estamos falando, aqui, apenas sobre incompetncia pedaggica. Falamos sobre um conjunto de incompetncias sociais de que a pedaggica faz parte, mas no

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    tem carter exclusivo ou dominante. P. parece tambm no se preocupar apenas com a incompetncia pedaggica, ainda que ela seja preponderante em sua fala. P. menciona melhoria, cursos, livros ndices que fazem vibrar sentidos de incompetncia pedaggica. Todavia, o sem salrio provoca um reviramento dos sentidos na medida em que situa a questo num universo para alm daquele oferecido por sentidos de incompetncia restritos ao pedaggico; situa a questo no universo social mais amplo, a localizando sentidos de expropriao e de incompetncia para o exerccio de aes legitimadas pela sociedade.

    Santos (1995a; 2000) associa tais sentidos de incompetncia a aspectos que ajudam a ampliar a discusso. Ele os relaciona, por exemplo, ao sexismo forma de hierarquizao tpica da modernidade capitalista que assenta tanto na distino entre espao pblico e privado quanto no papel da mulher na repro-duo da fora de trabalho na famlia e, mais tarde, em formas desvalorizadas de fora de trabalho. Falamos, pois, de uma sexizao da fora de trabalho controlada, na sociedade capitalista, pela integrao subordinada pelo trabalho. De alguma forma, a condio marginal da professora, que marca seu discurso pelo comentrio interrogativo melhoria sem salrio, remete a uma tal sexizao da fora de trabalho que se coaduna aos vrios sentidos de incompetncia e de expropriao j mencionados.

    Em um tal contexto, os programas de qualidade total na educao e as jor-nadas pedaggicas, to em moda na ltima dcada e ainda presentes nesta sob a forma de pretensos processos de formao continuada, cumprem importante papel no controle da integrao subordinada pelo trabalho. Eles funcionam, segundo Santos (1995a, p. 18), como [...] diferentes formas de substituio da segregao por reintegrao ou reinsero social atravs de programas de reeducao, de devoluo comunidade, de extenso da cidadania, no caso das mulheres, com acesso ao mercado de trabalho. Este autor tambm costura os sentidos de incompetncia aos processos de desmantelamento do espao pblico pelas alteraes constantes nos processos produtivos que, para significativas camadas de trabalhadores, tornam o trabalho duro, penoso e fragmentado, portanto, insuscetvel de ser motivo de autoestima ou gerador de identidade. De certa forma, Geraldi (1995), ao referir a ambiguidade do funcionamento do sistema escolar, tambm remete a tal problemtica, uma vez que o mesmo sistema que reconhece a habilitao do profissional tambm a questiona, retirando-lhe sua legitimidade e gerando um inequvoco desconforto na pro-fessora que, como P., mesmo percebendo certa positividade na melhoria, nos cursos e nos livros, se v impossibilitada de acessar a eles.

    Os sentidos de crise da escola surpreendem, agora, em funo da identifi-cao de um sistema escolar que se constitui a partir da pertena pela rejeio. Fato a que enviam as perguntas de P. as quais, misturando estarrecimento e indignao, no possibilitam evidenciar sentidos de pertencimento ao sistema escolar. Ela parece se constituir de forma deslocada, ou melhor, do interior da ambivalncia dos conflitos que aponta sua condio marginal, porquanto diz que no encontra respostas, sadas, alternativas. Enfim, parece no se reconhecer

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    em lugar algum do sistema escolar, ainda que nele permanea. Fica do que foi dito at agora, atravs da anlise discursiva de enunciados

    de P., que os sentidos de incompetncia neles evidenciados remetem a um campo bem maior do que o pedaggico, ou seja, eles no dizem respeito apenas a uma suposta insuficincia terica ou ausncia de reflexo mais elaborada sobre a prtica. Os sentidos de incompetncia incluem tais elementos bastante especficos da instituio escolar, mas remetem tambm a uma crise que no envolve apenas a educao. Tal crise se confirma em todas as instituies sociais, sendo a escola um campo privilegiado para sua evidenciao e para o acionamento de seus mecanismos tentaculares. Na verdade, ela tem se mani-festado de maneira muito severa junto aos professores da rede pblica estadual, promovendo a constituio de sujeitos socialmente incompetentes.

    Conforme Santos (1996, p. 21), [...] os mecanismos de poder tendem a alimentar-se da incompetncia social e, portanto, da objetivao dos grupos sociais oprimidos o que gera silenciamento em vez de comunicao, estra-nhamento em vez de solidariedade. Silenciamento e estranhamento possveis de evidenciar nas perguntas de P. pelo emprego de formas elididas e de uma palavra com valor adverbial, o como, reforado pelo que atravs do qual a professora parece confirmar essa sensao de estranheza relativa condio de servido ambgua do professor a professora desliza, com frequncia, por polaridades que, neste caso, podem ser representadas como competncia/incompetncia, cidadania/no-cidadania, profissionalismo/no-profissionalismo, incluso social/excluso social. E esses deslizamentos parecem remeter, por sua vez, possibilidade de constituio de entre-lugares de sentidos e de poderes, visto que P., exatamente por evidenciar sentidos de estranhamento e de inquietude, no se encontra totalmente acomodada situao nem parece concordar plenamente com ela. A professora quer respostas, porque talvez ainda pretenda compreen-der um pouco melhor o que est acontecendo com ela, com suas colegas, com a sociedade. Pereira (2001, p. 30) fala em misria de posio do magistrio quando se ocupa da ambiguidade que tem caracterizado o magistrio pblico estadual. Diz ele que os funcionrios pblicos [...] esto condenados ambi-guidade na abordagem de suas necessidades materiais e simblicas (Pereira, 2001, p. 30). Enquanto categoria dominada, relativamente profissionalizada, mal remunerada e em acentuado processo de pauperizao, suas reivindicaes se concentram em torno de questes salariais o que P. ressalta em seu sem salrio. Por outro lado, em decorrncia da condio de funcionrio estvel do Estado que faz parte de uma pseudonobreza estatutria em franco declnio, as demandas se traduzem como apelos direcionados a exigncias pelo respeito dignidade e funo social do magistrio, que estariam relacionadas aos interesses mais gerais da sociedade.

    Do dilogo que os professores tm estabelecido com instncias hierarqui-camente superiores a eles, entretanto, no esto ausentes o conflito e situaes demasiadamente tensionantes. Mesmo que no houvesse qualquer outro motivo para justificar isto, a prpria natureza deste dilogo j traz em si marcas de

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    ambiguidade: os professores ora pedem, ora so convocados a empreender grandes movimentos de luta, portanto, exigem. P., no momento em que socializa suas questes numa das reunies realizadas com as professoras, parece estar encenando, mais uma vez, esta ambiguidade: ela no afirma coisa alguma que remeta sua situao de estarrecimento e estranhamento, mas, ao produzir perguntas que deixam escapar esses sentidos, se coloca na posio de quem pede alternativas referentes tambm questo salarial e exige esclarecimentos concernentes ao resgate de certa dignidade na profisso atravs da qualificao.

    Est claro, pois, que as duas formulaes interrogativas de P. encerram grande riqueza de elementos para reflexo sobre a condio do ser professor hoje, a constituio de suas identidades, a crise do magistrio e do trabalho docente. Melhoria sem salrio, fazer cursos e comprar livros se apresentam como componentes da prpria histria da educao e, mais particularmente, do magistrio pblico estadual, da escola pblica. Deles se ouvem ressonncias de uma histria marcada por sentidos de incompetncia e de expropriao que tocam lugares de poder econmico, social, poltico e profissional.

    Sabemos, contudo, que esta histria j viveu momentos mais felizes, porm, muito breves. Entre 1891 e 1931, com escolas estatais republicanas, gratuitas e laicas, organizadas de acordo com o ideal positivista e liberal da poca e presas a uma tarefa essencialmente salvacionista, os movimentos migratrios da zona rural para a urbana provocaram o aumento no fluxo de matrculas e, por extenso, a organizao do ensino primrio e implantao das Escolas Normais ou Institutos de Educao para a formao de professores. De certa maneira, como sublinham Monlevade (2001) e Monlevade & Silva (2001), este movimento do governo republicano terminou por possibilitar a constituio profissional da categoria do magistrio, alm de conferir ao professor um lugar de muita importncia na sociedade a nobre funo de formar pessoas. No mesmo perodo, tambm os professores secundrios eram considerados como merecedores de reconhecimento diferenciado e seus salrios correspondiam ao salrio de juzes e promotores desde que se dedicassem exclusivamente ao colgio, como donos das disciplinas. Eram chamados, ento, de catedrticos.

    Esta onda de valorizao do magistrio ainda se prolongou por mais algum tempo. Como lembra Pereira (2001, p. 36),

    [...] l pelos anos da dcada de 1930, fausto que se esgotaria nos anos 50, [...] as normalistas tinham sendas abertas, possibilidades, embora limitadas, de ascenso profissional e no servio pblico em geral. Entretanto, as condies de trabalho eram to [...] speras [...] sobretudo para os agentes oriundos de famlias dotadas de reduzido capital social, incapazes, portanto, de arranjar pistolo para livrar seus herdeiros do estgio probatrio em alguma escola isolada e os salrios s eram atraentes em razo da reduzida demanda de bens e servios da poca.

    Um tempo curto, como mencionei anteriormente. Um captulo breve de uma histria to antiga quanto longa. Pereira (2001), Monlevade (2001) e Monlevade

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    & Silva (2001) enfatizam as mudanas agudas transcorridas a partir de 1930 no que concerne ao magistrio. Testemunhando a expanso desorganizada das escolas, as professoras foram foradas a assumir dupla ou tripla jornada de trabalho, com salrios que progressivamente definhavam face aos saltos inflacionrios que j surpreendiam o pas. A partir de 1960, as dificuldades assumiram a drstica forma de flagelo que se materializava em salrios sem-pre menores e desproporcionais em relao aos encargos da docncia, sempre maiores. Iniciou-se, pois, um perodo sem fim de degradao econmica, social e de nivelamento profissional do magistrio. Retornamos, assim, aos processos de sexismo e sexizao da fora de trabalho, integrao subordinada pelo trabalho, pertena por rejeio e incompetncia social propostos por Santos (1995), ao mito da incompetncia pedaggica discutido por Geraldi (1995) e misria de posio do magistrio problematizada por Pereira (2001).

    Retornamos, sobretudo, ao Como que vai falar em melhoria sem sal-rio? Como que vai fazer cursos, comprar livros?. Reencontramo-nos com P., com seu estarrecimento, com seu estranhamento, com os efeitos de sentido de expropriao e de incompetncia que escoam pelas suas palavras e tocam pontos de poder da ordem do social, do poltico, do econmico e do profissional.

    P., uma professora que, do interior da crise que, ao mesmo tempo, ques-tiona e congela suas referncias e valores, ousa perguntar, mais do que tudo, sobre processos invisveis de indistino e de nivelamento que tm condenado o magistrio a um mal-estar social crnico simplesmente porque o professor professor. Dito de outra forma, porque consumidor e produtor de bens culturais inferiores, os pedaggicos, que tm sido vulgarizados em funo de determinadas rotinas cristalizadas em diferentes instituies sociais e na prpria escola. Ademais, contribuem para a desvalorizao do magistrio, sua feminizao e proletarizao.

    Consideraes Finais

    Considerando os elementos evidenciados e os caminhos percorridos, chegado o momento de sintetizar as relaes depreendidas dos dizeres de P. Ao longo do trabalho analtico construdo busquei evidenciar sentidos ligados constituio heterognea das identidades do sujeito-professor aspecto a que retorno no momento em que busco compreender as relaes entre os lugares de sentidos e os lugares de poderes pelos quais circula P. Com um objetivo como este, alguns enunciados foram analisados e de tais anlises decorreu a evidenciao dos mltiplos sentidos que constituem o sujeito-professor. Foi possvel perceber que o sujeito-professor, representado por P., transita por diferentes pontos nas constelaes de sentidos e de poderes.

    Em suma, num trabalho como este evidenciei processos discursivos com a finalidade de neles surpreender os modos como os sentidos e os sujeitos neles se constituem, produzindo efeitos de sentido filiados a redes de poderes

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    diversas. Aps a construo da anlise, e tendo passado pelo porque e pelo como, alguns sentidos foram evidenciados para alm daqueles que estariam supostamente contidos nas palavras se desbanalizou os sentidos para alm da bipolarizao, abrindo caminho para uma perspectiva de interpretao que considera a heterogeneidade enquanto constitutiva dos sentidos e dos sujeitos (Authier-Revuz, 1982).

    Por extenso, foram identificados efeitos de sentido de doao, de busca de incluso, de expropriao de condies mnimas para o exerccio da cida-dania, de permisso, de exposio pblica, de desmobilizao, de caridade e de incompetncia tanto pedaggica quanto social, todos eles articulados a um ncleo que denominei sentidos de crise do magistrio ou sentidos de crise do trabalho docente. Eram, assim, identificados processos discursivos a partir dos quais foi possvel fazer a costura com os pontos das constelaes de sentidos e de poderes. Mais do que falar apenas sobre a produo de efeitos de sentido, falei sobre a associao entre esta produo e a filiao do sujeito-professor a vrias redes de sentidos que, uma vez indiciadas nas relaes de vaivm entre intradiscurso e interdiscurso, permitiram amarraes entre pontos da conste-lao de sentidos e pontos da constelao de poderes.

    Este trabalho analtico-discursivo fez com que se passasse a falar em memria social, memria profissional, memria de gnero em decorrncia da articulao entre pontos de sentidos (a condio de mulher me-esposa-professora-proletria, a condio de funcionria pblica, o ato pedaggico enquanto trabalho intelectual e caminho investigativo, o sujeito-aluno, as aes do sindicato, o plano de carreira, as polticas pblicas de educao) e pontos de poderes (poder de gnero, profissional, poltico, social, econmico). Alm disso, ele conduziu ao reconhecimento de um modo de funcionamento que permite cogitar sobre o quanto tais pontos de sentidos e de poder habitam o sujeito-professor e so por ele habitados, conduzindo a deslocamentos que fazem supor uma espcie de sujeito processual (Signorini, 2001), isto , sujeito que se constitui nos e pelos processos que protagoniza ou, como diria Bhabha (1998), um sujeito que se forma nas bordas intervalares da realidade, nos entre-lugares.

    Falar em entre-lugares, aqui, quer remeter a momentos que se constituem a partir de diferenas culturais as quais, embora muito especficas do universo pedaggico, so oriundas de diferentes instncias sociais. O sujeito se forma nos pontos de encontro entre elementos que so da ordem do poltico, do eco-nmico, do social, das relaes de gnero, do profissional. Tais elementos se constituem, por conseguinte, numa espcie de fronteira que dissolve a polari-zao: ao mesmo tempo em que ela estabelece um sentido em relao a outro (X em oposio a Y, por exemplo), d visibilidade a uma espcie de movimento de descascamento dos sentidos pelo qual a linguagem se hibridiza o sentido pode ser um, pode ser outro, pode ser nenhum, pode ser todos ao mesmo tempo. Bhabha (1998) desenvolve tal ideia quando nos fala da linguagem da diferena no mesmo, a linguagem que desestabiliza, rompe, fura fronteiras dicotmicas pelo apelo multiplicidade dos sentidos, ao seu descascamento. Segundo o autor,

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    Apesar dos esquemas de uso e aplicao que constituem um campo de estabilizao para a afirmativa, qualquer mudana nas condies de uso e reinvestimento da afirmativa, qualquer alterao em seu campo de experincia ou comprovao, ou, na verdade, qualquer diferena nos problemas a serem resolvidos, pode levar emergncia de uma nova afirmativa: a diferena do mesmo (Bhabha, 1998, p. 47).

    Esto articuladas a tais relaes e correlaes duas noes que aproximam os autores estudados aqui: a fala fundamentalmente heterognea e o sujeito dividido. Uma fala que, por ser heterognea, se desdobra, se reduplica e se recobre medida que o sujeito se desloca por entre polaridades, constituindo outros pontos de viso e outros modos de funcionamento. Enfim, medida que P., por exemplo, habita e habitada por pontos de poderes mltiplos que tocam o econmico, o social, o profissional, as relaes de gnero, o poltico, e pontos de sentidos tambm diversos e incertos a partir dos quais ela fala e falada em suas relaes com o sujeito-aluno, com a condio de ser mulher-me-esposa-professora-proletria-funcionria pblica, com as polticas pblicas de educao, com o plano de carreira, com o ato pedaggico enquanto trabalho intelectual e caminho investigativo e com as aes do sindicato.

    Recebido em fevereiro de 2011 e aprovado em agosto de 2011.

    Notas

    1 Referncias mais detalhadas ao primeiro momento desta pesquisa, que coincide com os estudos desenvolvidos durante a realizao do Mestrado em Educao (1996 a 1998), podem ser encontradas em dois artigos respectivamente: Os processos de construo da autoria e do mal-estar docente numa escola pblica estadual (Fiss, 1998) e A aprendizagem dos abraos ou o dizer a palavra: espaos de autoria e de dilogo (Fiss, 2000).

    2 Considerando os processos de autoria, identifiquei trs instncias constitutivas de tais processos, a saber: instncia de autoria plana, instncia de autoria intermediria e instncia de autoria redonda. A instncia de autoria plana constitui-se num momento em que esto presentes, de maneira mais preponderante, elementos como a proibio da interpretao e a recusa de quaisquer aspas interpretativas que deslocariam as categorizaes. Ocorre um estado de sujeio maior. Contudo, ao mesmo tempo em que so construdas grandes barreiras interpretao, neste momento, o convite ao deslocamento se coloca com maior fora. A instncia de autoria intermediria configura-se como o momento de mediao entre a plana e a redonda, em que sugerido certo equilbrio de foras entre formaes discursivas antagnicas, sendo muito difcil determinar a direo do discurso, isto , a dominncia de uma sobre a outra. J a instncia de autoria redonda refere momentos que vm acompanhados pelo desafio preponderante do abandono das certezas supostamente garantidas pelos sentidos institudos, portanto, pelo jogo com o imprevisvel, com o sentido outro, com o discurso outro o que termina por estabelecer um convite a percorrer vias de

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    maior resistncia ao institucionalizado.

    3 Ao analisar o discurso pedaggico a partir do que dizem as professoras sobre sua condio e as prticas que protagonizam, identifiquei sentidos instituintes e sentidos institudos tanto de permanncia quanto de ruptura do mal-estar, potencializando, pois, a abertura de espaos de produo de autoria motivo pelo qual tais categorias esto prximas uma da outra.

    4 Ainda que a discusso sobre o mal-estar no seja o enfoque deste artigo, cabe fazer algumas consideraes que dizem respeito a metamorfoses produzidas no meu modo de entendimento de uma tal concepo. No incio do estudo sobre mal-estar docente, em 1996, fiz corresponder a ele a concepo de degenerao da prtica docente (Esteve, 1992) o que lhe conferia um carter de negao da produo de sentidos outros pelas professoras e de impossibilidade de filiao a redes de sentidos ques-tionadoras dos efeitos, nem sempre positivos, da educao bancria. Seria dizer que associei mal-estar a prticas desenvolvidas pela educao bancria, reconhecendo, ento, a objetificao e a reificao do sujeito-professor. Conforme o convvio com as professoras da escola onde se desenvolveu a pesquisa ia se estreitando, atravs da participao em reunies, aulas, conselhos de classe, eventos e festas organizados pela instituio, tais ideias iam se tornando objeto de dvida e de novas reflexes. Nesse sentido, a anlise discursiva realizada e o aprofundamento na anlise das marcas lingusticas foram de importncia capital para a ressignificao do mal-estar no contexto pedaggico. Reconheci, em tal processo, elementos positivos que termi-navam por possibilitar ao sujeito-professor interrogar-se sobre suas aes, portanto, migrar para outros lugares de sentido, deslocar-se de uma posio para outra. Em resumo, deslizei de uma posio a qual falava sobre um mal-estar que, inicialmente, era compreendido como lugar do exlio para outra posio que permitiu evidenciar, nesse mesmo mal-estar, o lugar do xodo, a condio de possibilidade de autoria o que, paradoxalmente, o torna bem-vindo na escola.

    5 Foram publicados artigos nos quais possvel conferir o estudo desenvolvido no segundo momento da pesquisa, a saber: Heterogeneidades, falhas, derivas: uma possvel interlocuo entre anlise de discurso e psicanlise (Fiss, 2002), Identidades e processos: uma questo em aberto (Fiss, 2003), Territrios inquietos: os processos de subjetivao dos professores da rede pblica estadual (Fiss, 2005) e Identidades em processo: a constituio heterognea do sujeito-professor em anlise (Fiss, 2008). No artigo que, aqui, se apresenta, retomo parte da anlise produzida poca.

    6 Sobre as trs pocas da Anlise de Discurso, importante destacar o texto A anlise de discurso: trs pocas de Michel Pcheux (1983 in Gadet e Hak, 1997).

    7 As formulaes sero sempre referidas como F1, F2, F3, F4, F5 e F6.

    8 Nota de Reviso: a revista, normativamente, no emprega trechos sublinhados, no entanto, no presente caso foi feita a opo por manter o trecho sublinhado e seus correspondentes conforme o original.

    Referncias

    AUTHIER-REVUZ, Jaqueline. Htrognit Montre et Htrognit Constitutive:

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    Dris Maria Luzzardi Fiss possui Mestrado (1998) e Doutorado (2003) em Edu-cao pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professora Adjunta na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Temas de pesquisa: ensino, linguagem, anlise de discurso, aprendizagem, teorias do currculo, educao de jovens e adultos e formao docente.E-mail: [email protected]