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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
VIVIANE GOMES MEDEIROS
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE:
ANTEPROJETO DE ESTRUTURAÇÃO DE UM ESPAÇO PÚBLICO DE MÚLTIPLO
USO NO BAIRRO DE PONTA NEGRA
Natal
2015
VIVIANE GOMES MEDEIROS
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE:
ANTEPROJETO DE ESTRUTURAÇÃO DE UM ESPAÇO PÚBLICO DE MÚLTIPLO
USO NO BAIRRO DE PONTA NEGRA
Trabalho Final de Graduação
apresentado à banca examinadora da
Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, requisito para conclusão de
bacharelado em Arquitetura e Urbanismo.
Orientadora:Verônica Maria Fernandes de Lima
Natal
2015
VIVIANE GOMES MEDEIROS
Flexibilidade espacial e apropriação da cidade: anteprojeto de estruturação de um
espaço público de múltiplo uso no bairro de ponta negra
Trabalho Final de Graduação
apresentado à banca examinadora da
Universidade Federal do Rio Grande do
Norte no semestre de 2015.1, requisito
para conclusão de bacharelado em
Arquitetura e Urbanismo.
Aprovado em: ____ de junho de 2015
BANCA EXAMINADORA:
____________________________________________________
Professora Dra. Verônica Maria Fernandes de Lima – UFRN (Orientadora)
____________________________________________________
Professor Francisco da Rocha Bezerra Junior – UFRN
(Examinador interno)
____________________________________________________
Arquiteta e Urbanista Camila Furukava - UFRN
(Examinador externo)
Natal / RN
“Life in city space has a significant impact on how we perceive the space. A lifeless street is like an empty theater: something must be wrong with the production since there is no audience.” (Jan Gehl)
“A vida no espaço urbano tem um impacto significativo em como
nós percebemos o espaço. Uma rua sem vida é como um teatro vazio: deve ter algo errado com a produção, já que não há plateia.” (Tradução nossa a partir de Jan Gehl)
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer, nesse momento de final de curso, a todos que estiveram
comigo durante esses seis difíceis anos. Aos meus pais, por me apoiarem em todos os
momentos, e me estimularem a explorar e a buscar sempre melhorias. Aos amigos que
sempre estão lá, para as horas boas e ruins.
À todos os Arquitetônicos, amigos de curso (muito além de colegas), que me
acompanharam por todo esse tempo, aquela turma que entrou sorrateira, mas que logo
mostrou a todos que era diferente. Somos e continuaremos a ser uma turma unida o tempo
todo, e disso eu me orgulho muito. Um “obrigada” a mais para aquelas que têm me
acompanhado de perto no final desta jornada: Aninha, Mari, Rafinha, e Bárbara.
Também existem aqueles que nem sempre estiveram, mas que a partir do
momento que entraram na minha vida, só vieram a adicionar. Meu “muito obrigada” ao meu
namorado, Roberto, que só veio a me acrescentar coisas boas e que só me dá apoio até
quando as decisões tornam as coisas mais difíceis para ele mesmo. Para Verônica, minha
orientadora (do trabalho final e da bolsa de pesquisa), pelas oportunidades dadas e pelos
ensinamentos passados. Aos brasileiros que viveram cada momento comigo na Holanda:
obrigada pelo ano lindo vocês me proporcionaram.
Obrigada àqueles que deixaram ensinamentos marcados em mim por cada canto
que eu passei, com os chefes mais pacientes e gentis do mundo: Camila, Cândida,
Jacqueline, e Dixon.
Por fim, obrigada aos professores e à coordenação o curso de Arquitetura e
Urbanismo, por ter dado a oportunidade de fazer parte de um ambiente como o nosso
Galinheiro, cheio de vida, dedicação e comprometimento para fazer um lugar cada vez
melhor.
MEDEIROS, Viviane Gomes. Flexibilidade espacial e apropriação da cidade: anteprojeto de estruturação de um espaço público de múltiplo uso no bairro de Ponta Negra. Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Centro de Tecnologia – Curso de Arquitetura e Urbanismo. Natal/RN: 2015.
RESUMO
Em muitas cidades brasileiras, observa-se uma tendência à diminuição da
apropriação dos espaços públicos, a exemplo de praças, ruas, e largos. Diminui o número
de pessoas conversando em cadeiras nas calçadas e de crianças brincando nas ruas
quando este tipo de dinâmica urbana passa a ocorrer em novos ambientes de convivência
que possuem acessibilidade restrita, como os shopping centers e os condomínios, que
surgiram num contexto de sensação de insegurança no meio urbano. Soma-se a isto a má
distribuição dos espaços públicos existentes, a notar-se pelos resultados parciais da
pesquisa “Os sistemas de espaços livres públicos e a urbanidade”. Notou-se que enquanto
alguns distritos da cidade possuem equipamentos públicos de lazer dos quais se podem
fazer uso, existem áreas que sofrem com a insuficiência de espaços públicos, seja de lazer,
seja para contribuir com a complexa teia ecológica da urbe. Como resposta a esta
problemática, trabalha-se aqui sob a ótica da multifuncionalidade, tanto como forma de
retomar o uso dos espaços públicos ao convidar vários atores à ocupação e apropriação,
quanto como espaço de democracia onde a adaptação e a flexibilidade permitem que esta
diversidade de apropriações tome forma sem restringir o espaço do outro. É objetivo deste
trabalho estimular a apropriação dos espaços públicos através do desenvolvimento de uma
proposta adaptável, levando em consideração os diferentes tipos de usos apresentados pela
população local, tendo como elementos norteadores a multifuncionalidade e a flexibilidade,
unindo áreas outrora dispersas.
Palavras-chave: espaços livres; apropriação; multifuncionalidade.
MEDEIROS, Viviane Gomes. Spatial flexibility and city appropriateness: pre-project of a multifunctional public space in the district of Ponta Negra. Federal University of Rio Grande do Norte – Technology Center – Course of Architecture and Urbanism. Natal/RN: 2015.
ABSTRACT
In many Brazilian cities, there is a tendency to decrease appropriateness of public
spaces, such as squares and streets. The number of people chatting at the sidewalk
decreases, in the pace that this type of urban dynamic begins to happen in new
acquaintanceship places, like shopping malls and “condomínios”, which aroused in a context
of general feeling of public unsafety. According to the research “The system of open public
spaces and the urbanity” another factor is the poor distribution of public spaces, says the
research’s partial results. Therefore, on one hand, there are some districts that have plenty
of public spaces to enjoy, and in the other hand, some districts don’t have enough spaces,
whether to leisure or to have participation at the city’s complex ecological web. As a result, in
this paper, it is worked through the optics of multifunctional spaces, both as a way to retake
the use of public spaces by inviting various actors to occupy and appropriate, and as
democracy space where adaptability and flexibility allows diversity to take form without
restricting someone else’s space. It is this paper’s goal to stimulate public space
appropriateness through the development of an adaptable proposal, taking into consideration
the different kinds of usages practiced by the local community. The proposal must have as
guideline the multifunctionality and the adaptability, to rejoin areas once scattered.
Keywords: open spaces; appropriateness; multifunctionality.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Formas de apropriação e potenciais de uso........................................................ 24
Figura 2 - Compilação dos conceitos de flexibilidade e adaptabilidade ................................ 27
Figura 3 – Localização da cidade de Houston nos Estados Unidos ..................................... 35
Figura 4 – Mudanças provocadas pela inserção do Parque Discovery Green em um centro
urbano ocioso ...................................................................................................................... 36
Figura 5 – Leiaute geral do Parque Discovery Green .......................................................... 37
Figura 6 – Gateway Fountain e Mist Tree representando o lazer contemplativo e sensorial 38
Figura 7 – Obras dos artistas Margo Sawyer e Doug Hollis, respectivamente ..................... 38
Figura 8 – Permeabilidade e conectividade visual entre as partes do parque ...................... 39
Figura 9 – Leiaute geral do Parque Superkilen .................................................................... 41
Figura 10 – Vista do Parque Superkilen ............................................................................... 41
Figura 11 – Inserção da vegetação no Parque Superkilen ................................................... 42
Figura 12 – Criação de novas topografias e elevações ........................................................ 43
Figura 13 – Mobiliário urbano diferenciado e diversos tipos de apropriação ........................ 43
Figura 14 – Planta zoneada das diferentes áreas da Praça André de Albuquerque ............. 45
Figura 15 – Recomendações de Neufert e Ludwig para alturas de cercas vivas ................. 45
Figura 16 – Vista do parque Superkilen no período da noite com iluminação bem distribuída
............................................................................................................................................ 46
Figura 17 – Pisos desmontáveis em madeira e plástico, respectivamente ........................... 48
Figura 18 – Enzo, mobiliário urbano criado para ser multifuncional e móvel ....................... 48
Figura 19 – Strip Ease e Sinus, mobiliários urbanos de uso flexível .................................... 49
Figura 20 – Localização do bairro de Ponta Negra no município de Natal ........................... 51
Figura 21 – Mapas figura-fundo do crescimento do bairro de Ponta Negra .......................... 53
Figura 22 - Orla da Praia de Ponta Negra na década de 1930............................................. 54
Figura 23 - Início da ocupação da orla por grandes casas de veraneio ............................... 55
Figura 24 - Imagem aérea do Conjunto Ponta Negra na década de 1970 ........................... 56
Figura 25 - Setores das tipologias de ocupação urbana no bairro de Ponta Negra .............. 57
Figura 26 – Moradores por classe de rendimento ................................................................ 59
Figura 27 – Cobertura vegetal no bairro de Ponta Negra ..................................................... 60
Figura 28 – Espaços públicos de lazer no bairro de Ponta Negra ........................................ 61
Figura 29 – Legislação incidente sobre o bairro de Ponta Negra ......................................... 62
Figura 30 – Localização da área de estudo no bairro de Ponta Negra ................................. 63
Figura 31 – Equipamentos urbanos na área de estudo e adjacência ................................... 65
Figura 32 – Mapa de uso do solo na área de estudo ........................................................... 66
Figura 33 – Mapa de gabarito na área de estudo................................................................. 67
Figura 34 – Registro fotográfico das calçadas da Rua Manoel Rodrigues e Rua do Golfinho,
respectivamente .................................................................................................................. 71
Figura 35 – Visuais do espaço livre sem muros ou cerca .................................................... 71
Figura 36 – Visual interna do espaço livre murado .............................................................. 72
Figura 37 – Lagoa de captação e estação elevatória de esgotos da CAERN ...................... 73
Figura 38 – Mapa de situação e locação das áreas de intervenção ..................................... 69
Figura 39 – Equipamentos de drenagem urbana, de iluminação pública e vegetação como
empecilhos à livre circulação do pedestre............................................................................ 69
Figura 40 – Equipamentos urbanos e vegetação como obstáculos para o pedestre no
entorno da lagoa de captação e EEE da CAERN ................................................................ 70
Figura 41 - Mapeamento dos vestígios comportamentais observados ................................. 73
Figura 42 – Criação de trilha por erosão na vegetação ........................................................ 74
Figura 43 – Deposição através da colocação de uma placa indicativa de comportamento .. 74
Figura 44 - Mapa mental com elementos da natureza ......................................................... 78
Figura 45 - Morfologia urbana da via como linear, e mais elaborada, respectivamente. ...... 79
Figura 46 - Mapa síntese das entrevistas ............................................................................ 81
Figura 47 - Esquemas relacionando problemas encontrados e soluções propostas ............ 86
Figura 48 - Esquema de implantação do módulo de mobiliário urbano ................................ 90
Figura 49 - Perfil proposto para a Rua Curimatã .................................................................. 91
Figura 50 - Funcionograma criado a partir do programa de necessidades ........................... 92
Figura 51 - Primeira proposta de zoneamento ..................................................................... 93
Figura 52 - Primeira proposta de traçado (nomear espaços) ............................................... 94
Figura 53 - Curvas de nível no lote 4 ................................................................................... 97
Figura 54 - Piso drenante em concreto na cor grafite .......................................................... 98
Figura 55 - Mobiliário urbano sugerido para o Espaço Cultura e Ação ................................. 98
Figura 56 – Exemplo de playground temático sugerido ..................................................... 100
Figura 57 - Mobiliário sugerido para o Espaço Mobilidade e Informação ........................... 100
Figura 58 - Piso intertravado retangular vermelho ............................................................. 101
Figura 59 - Exemplo de estruturação sugerida para o espaço turismo ............................... 101
Figura 60 - Esquema de paginação no passeio que abrange os quatro lotes .................... 102
Figura 61 - Horta suspensa em concreto ........................................................................... 103
Figura 62 - Composição paisagística com pedras como forração ...................................... 103
Figura 63 - Exemplo de mobiliário sugerido para as demais áreas .................................... 104
Figura 64 - Sugestão de floreiras para guiar fluxos ............................................................ 104
Figura 65 - Posteamento sugerido para o interior dos lotes ............................................... 105
Figura 66 - Exemplo de poste para o passeio público ........................................................ 105
Figura 67 - Diversos modelos de balizadores para iluminação .......................................... 106
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 12
1 CONCEITOS E ABORDAGENS .......................................................................... 18
1.1 O ESPAÇO, O LUGAR E O PÚBLICO ................................................................. 18
1.2 FUNÇÕES NO ESPAÇO URBANO....................................................................... 21
1.3 APROPRIAÇÕES E SEUS MODOS ..................................................................... 23
1.4 MULTIFUNCIONALIDADE COMO UMA NECESSIDADE ...................................... 26
1.5 O (ESPAÇO) PÚBLICO NA CIDADE CONTEMPORÂNEA: ................................... 29
1.6 COMO AVALIAR O ESPAÇO? (METODOLOGIAS E SEUS COMPONENTES) .... 31
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................................... 32
3 ESTUDANDO ESPAÇOS MULTIFUNCIONAIS ..................................................... 35
3.1 PARQUE DISCOVERY GREEN ............................................................................. 35
3.2 PARQUE SUPERKILEN ......................................................................................... 40
3.3 DIMENSÕES DA MULTIFUNCIONALIDADE E DA APROPRIAÇÃO DO LUGAR .. 44
4 OBSERVANDO A REALIDADE LOCAL ................................................................ 51
4.1 O BAIRRO DE PONTA NEGRA .............................................................................. 51
4.1.1 Histórico da área ...................................................................................................... 52
4.1.2 Dados gerais sobre o bairro de Ponta Negra ........................................................... 58
4.2 SOBRE A ÁREA-DE-ESTUDO ................................................................................. 62
4.3 ÁREA-PROJETO E CARACTERÍSTICAS ................................................................ 68
4.3.1 Percursos e visuais ................................................................................................... 70
4.3.2 Leiaute atual e posição geográfica ............................................................................ 68
4.3.3 Apropriações sob o ponto de vista dos vestígios comportamentais ........................... 70
5 CONVERSANDO COM A COMUNIDADE ................................................................ 75
5.1 ENTREVISTAS ......................................................................................................... 76
5.2 O ENVOLVIMENTO DA COMPANHIA DE ÁGUAS E ESGOTO DO RIO GRANDE DO
NORTE - CAERN 82
6 REBATIMENTOS ...................................................................................................... 83
6.1 PARTIDO URBANÍSTICO .......................................................................................... 87
7 MEMORIAL DESCRITIVO ........................................................................................ 89
7.1 TRATAMENTO URBANÍSTICO DAS VIAS VISANDO A INTEGRAÇÃO FÍSICO-
TERRITORIAL DA PROPOSTA .......................................................................................... 89
7.2 ESTRUTURAÇÃO DE UM ESPAÇO PÚBLICO DE MÚLTIPLO USO ...................... 92
7.2.1 Evolução da proposta .............................................................................................. 92
7.2.2 Proposta final ........................................................................................................... 95
7.2.2.1 Espaço Cultura e Ação ............................................................................................. 98
7.2.2.2 Espaço Movimente-se .............................................................................................. 99
7.2.2.3 Espaço Mobilidade e Informação ........................................................................... 100
7.2.2.4 Espaço Turismo ..................................................................................................... 101
7.2.2.5 Espaço Bosque do Aprendizado ............................................................................ 102
7.2.2.6 Espaço Aventura e Natureza .................................................................................. 102
7.2.2.7 Demais áreas e considerações gerais .................................................................... 103
CONCLUSÃO ........................................................................................................ 107
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 109
APÊNDICE A ......................................................................................................... 114
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 12
INTRODUÇÃO
Em muitas cidades brasileiras, observa-se na atualidade uma tendência à
atenuação da apropriação dos espaços públicos pelo cidadão, a exemplo de praças, ruas, e
largos. Diminui o número de pessoas conversando em cadeiras nas calçadas, crianças
brincando nas ruas ou jogando futebol na quadra do bairro quando este tipo de dinâmica
urbana passa a ocorrer em ambientes murados e de acessibilidade restrita. Este fenômeno
já era apontado por Richard Sennett em 1976, em seu livro “O Declínio do Homem Público”,
no qual atribui o esvaziamento na vida pública à difusão do capitalismo e as transformações
trazidas pelo mesmo, como, por exemplo, a criação de novos espaços de convivência como
os shopping centers e os condomínios.
O homem se afasta cada vez mais da experiência urbana, como colocado por
Ângelo Serpa (2007), quando afirma que “caminhamos para a consagração do
individualismo como modo de vida ideal, em detrimento de um coletivo cada vez mais
decadente” (p.35). Apesar de concluir que o cerne da esfera pública não está reduzido ao
suporte físico oferecido pelos espaços urbanos, o autor coloca que os próprios usuários
erguem barreiras simbólicas, resultando em um espaço fragmentado pelos interesses dos
diversos grupos que ali frequentam, substituindo o compartilhamento do espaço pela divisão
e territorialização. Por sua vez, isso vem a restringir a acessibilidade que é a essência da
definição de espaço público. Segundo Eugênio Queiroga (2009), o espaço público é aquele
em que ocorre a construção da cidadania, do interesse público, e do bem público constituído
socialmente diante do conflito de interesses individuais ou de grupos. Logo, é o local onde
vários interesses atuam, um conjunto de necessidades se faz presente.
De forma mais prática e fisicamente evidente, Sun Alex (2011) argumenta sobre a
incorporação de modelos diretamente absorvidos de outras realidades sociais – como, por
exemplo, aspectos estéticos e funcionais do paisagismo moderno norte-americano nas
praças de São Paulo. Segundo o autor, “nem sempre resultaram em espaços mais
convidativos ou adaptáveis à presença da população [...] têm-se revelado fechadas para o
entorno e o convívio pretendidos” (p.17).
A partir dos estudos desenvolvidos pelo grupo de pesquisa Espaços
Contemporâneos do Habitat (do qual a presente autora faz parte), pôde-se constatar a
necessidade de investigação dos espaços públicos e suas apropriações na cidade de Natal.
Através da pesquisa denominada “Os sistemas de espaços livres públicos e a urbanidade –
um diagnóstico da situação dos espaços livres na cidade de Natal”, foi levantada a situação
de aproximadamente 500 espaços livres distribuídos por quinze bairros da cidade de Natal.
Destes, cerca de 45% são de livre acesso público, como praças, becos, largos, canteiros e
outros tipos de suporte aos sistemas de mobilidade urbana, orla marítima, lagoa de
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 13
captação, entre outros. Porém, reduz-se a 30% do total a quantidade de equipamentos em
que há permanência e desenvolvimento de atividades de lazer – praças, por exemplo -
quando excluídos aqueles espaços livres de uso específico ou dedicados a um só propósito
(canteiros, rotatórias, cemitérios, escadarias). A distribuição destes espaços se dá de forma
irregular pela cidade de Natal, o que significa que, enquanto alguns distritos da cidade
possuem vários equipamentos públicos de lazer – ainda que sua qualidade não seja
garantida, como, por exemplo, no bairro de Lagoa Nova - existem áreas que sofrem com a
insuficiência de espaços público, como o bairro de Nossa Sra. da Apresentação, na região
administrativa Norte.
A apropriação desses espaços pode ocorrer de variadas “formas, tipos,
temporalidades, escalas, pode ser lícita ou ilícita, positiva ou negativa, intensa ou episódica”
(Silvio Macedo et al, 2009, p.65). Essa multiplicidade de interesses que agem em um
espaço público indica a necessidade de uma multifuncionalidade do suporte físico para
agregar diferentes atividades e diversas possibilidades para aquele local. Ian Bentley et al.
(1985) coloca a “variedade” como uma qualidade chave em um espaço público. Esta
variedade pode ser de pessoas, que vêm ao espaço em variados momentos por variadas
razões. Pode ser também diversidade de formas e ocupações das construções ao redor do
espaço público. Porém, os autores enfatizam que o alicerce da multiplicidade no espaço
público é a diversidade de usos.
Como resposta a esta problemática, trabalha-se aqui sob a ótica da
multifuncionalidade, tanto como forma de retomar o uso dos espaços públicos ao convidar
vários atores à ocupação e apropriação, quanto como espaço de democracia onde a
adaptação e a flexibilidade permitem que esta diversidade de apropriações tome forma sem
restringir o espaço do outro. Este pensamento foi desenvolvido com base em referências
bibliográficas que colocam a multifuncionalidade como uma qualidade chave rumo à
espaços públicos bem sucedidos, mas principalmente, teve base naqueles conceitos de
espaço públicos em que a democracia e a acessibilidade são o cerne do significado.
De posse destas informações, resolveu-se desenvolver um trabalho final de
graduação que discutisse o tema tendo como foco um dos bairros de Natal: Ponta Negra.
Mais precisamente, decidiu-se por uma proposta a nível de anteprojeto de um espaço
público de acessibilidade generalizada e de caráter multifuncional, que poderia vir a
compensar a falta de espaços públicos de permanência em uma área carente do bairro – a
Vila de Ponta Negra, em uma tentativa de conciliar os diversos interesses. O objetivo
principal deste trabalho é o de elaborar um anteprojeto urbano de um espaço público que
tenha como elementos norteadores a multifuncionalidade e a flexibilidade, incentivando a
apropriação desses espaços por diversos atores e de diversas formas. Logo, o objeto de
estudo é uma amostra de espaços livres públicos de Natal e suas apropriações.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 14
O presente trabalho tem como objetivos específicos os seguintes: contribuir com a
reflexão sobre as condições dos espaços públicos de uso coletivo encontrados na cidade de
Natal; compreender e valorizar a tradição local para que possa haver rebatimento dos
hábitos da comunidade no projeto urbano; ressaltar a importância das questões de
multifuncionalidade, adaptabilidade e flexibilidade em um espaço público de uso coletivo; e
estimular a apropriação dos espaços públicos através do desenvolvimento de uma proposta
adaptável aos diferentes tipos de usos apresentados pela população local e que responda
aos desejos dos seus usuários.
Este tipo de intervenção urbana foi planejado para uma categoria específica de
espaços livres. De acordo com Magnoli (2006), nas áreas urbanas, os espaços livres
compreendem todo espaço não ocupado ou coberto por volume edificado, diretamente
associado ao entorno das edificações. Eles podem desempenhar funções de lazer, de
âmbito de relações sociais, de drenagem, de regulação climática, entre outros,
representando elementos estruturadores da cidade. Podem ser públicos, como as praças e
orlas marítimas, ou privados, como quintais e lotes de uso institucional, sendo o foco deste
trabalho nos espaços livres públicos.
Através da pesquisa citada, estima-se que cerca de 15% dos espaços livres
públicos encontram-se em situação de inércia, sem investimentos para fins de estruturação,
parados no tempo, representando um desperdício de potencial para uso coletivo, sendo
geradores de insegurança para os habitantes das adjacências. Esta tipologia de espaço livre
público constitui rica base para o tipo de intervenção proposta: denomina-se como área
verde não-acondicionada. Entende-se por áreas verdes não acondicionadas os lotes com
uma estruturação básica, porém insuficiente, como o passeio em seu perímetro, ou como a
presença de vegetação - ainda que esta seja relativamente controlada, o que a diferencia de
terrenos baldios.
Ainda assim, são áreas sem condições de uso, pois não possuem mobiliário
urbano, nem acessibilidade. Muitas vezes estas áreas apresentam utilização ocasional pelos
habitantes, notada através de vestígios comportamentais como a trilhas abertas pela própria
população, e a deposição feita pela colocação de barreiras (como os pneus) para garantir
uma delimitação física de seu perímetro, o que denota um suposto cuidado pelos moradores
do entorno. Ainda que haja um ordenamento mínimo, estes espaços não possuem uma
estruturação cristalizada e restritiva como alguns dos espaços públicos já estabelecidos –
por exemplo as praças objeto de estudo de Sun Alex - oferecendo a oportunidade para uma
estruturação flexível.
Uma área com essas características foi escolhida para servir como suporte físico ao
projeto urbano proposto neste trabalho, e esta se localiza na Vila de Ponta Negra. Apesar de
estar localizada em um bairro que congrega as atividades turísticas de Natal, que recebe
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 15
investimentos de capital nacional e estrangeiro, é uma área singular, e se diferencia do seu
entorno tanto pelo seu traçado orgânico e informal, quanto ao manter a tradição de uma
parcela dos moradores que vivem da pesca e do artesanato. A vila é um local com carência
de oferta de espaços públicos de modo geral, em que estima-se que a maioria de seus
residentes apresentam uma baixa renda, e têm histórico de movimentos sociais urbanos. De
acordo com KELLER apud SERPA:
[...] nossas relações de vizinhança são condicionadas de uma forma determinante pela densidade populacional do local que habitamos, pelo nível econômico e pelo grau de cooperação de seus habitantes, bem como pela distância entre as unidades de habitação (KELLER apud SERPA, 2007, p.35).
Ainda sobre as relações de vizinhança, o autor coloca que “nos bairros populares, a
limitação de oportunidades, a pobreza e o isolamento relativos, a insegurança e o medo
acabam por fortalecê-las e torna-las parte fundamental da trama de relações familiares”, o
que vem a reforçar a escolha do universo de estudo como uma área em que a população
sobreviva com baixos rendimentos, mas que possui uma alta coesão social. Além disso, a
Vila de Ponta Negra também expressa sua rica atividade cultural através de eventos como
ensaios de grupos folclóricos, rodas de capoeira, e feiras gastronômicas e de artesanato, o
que ajuda a sustentar o discurso da necessidade de multifuncionalidade no espaço público,
pregado neste trabalho.
A inquietação de trabalhar com os espaços públicos - em teoria acessíveis a todos -
provém do conhecimento das inúmeras possibilidades para estes, seja aqueles espaços
utilizados por uma comunidade que mora nas redondezas, seja aquele espaço que atrai
pessoas de outras regiões da cidade. Em bibliografia utilizada durante intercâmbio
universitário, a autora do presente trabalho teve acesso à produção de Andre Viljoen,
Continuous Productive Urban Landscapes (2005), livro cujo autor aponta o importante
caráter multifuncional para estes espaços, com possibilidades como a agricultura urbana, o
transporte ativo, o comércio, o lazer, a interação social, entre outros. A flexibilidade e
adaptabilidade são características da sociedade contemporânea globalizada, com toda a
sua fluidez e conectividade. Este fato faz com que busque-se um suporte físico que não seja
rígido, cristalizado, mas que tenha a capacidade de aceitar e acomodar novos usos. Dentre
esses novos usos põe-se em destaque aqui os eventos itinerantes, como o Pluk de Nacht
em Amsterdam, e o Ecopraça em Natal.
Percebeu-se que estes não só alteram a dinâmica de uso dos espaços públicos,
mas também garantem esta flexibilidade no uso do espaço, por se tratar de estruturas
desmontáveis, e temporárias. Propor espaços flexíveis para que estas manifestações se
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 16
instalem da maneira mais eficaz possível se torna um objetivo deste trabalho, um
experimento na longa jornada de entendimento dos fenômenos atuais desse organismo tão
complexo e imprevisível chamado cidade.
O primeiro capítulo deste trabalho se destina à discussão e esclarecimento de
conceitos como o de espaço - desde o geográfico até o público – onde se realizou uma
diferenciação entre as funções que os espaços públicos podem ter e as apropriações que de
fato acontecem. No mesmo capítulo, encontra-se também uma breve explanação sobre o
significado de multifuncionalidade e alguns termos com semelhanças de definição
(adaptabilidade e flexibilidade, por exemplo), além de explorar no discurso de vários
diferentes autores a necessidade de flexibilidade e multifuncionalidade nos espaços
públicos. De forma a complementar o suporte teórico criado, demonstra-se de forma sucinta
as características da cidade contemporânea, incluindo a relação da sociedade com o
espaço público, em uma tentativa de aproximação da atualidade. Por último, têm-se a
definição de algumas variáveis de análise da qualidade do espaço público, colocadas pela
instituição internacionalmente reconhecida Project for Public Spaces (PPS), e por Bentley et
al. (1985).
A segunda seção se dedica à exposição e explicação das etapas que foram
cumpridas para que o trabalho tomasse uma forma final. Com base na definição de área-de-
estudo e áreas-projeto (Ferdinando Rodrigues, 1986), analisou-se a área pelo ponto de vista
do suporte físico (considerando atributos físicos e perceptivos), dos vestígios ambientais da
ação humana (com base em Pinheiro, Elali e Fernandes, 2008) e na noção de percepção
ambiental dos moradores da área estudada, trazida pelo discurso de Kevin Lynch (1997).
Esta abordagem parte do pressuposto de que nenhuma metodologia é completa por si só, e
sim complementar à outras.
Uma vez formado o suporte teórico necessário e definidas as etapas a seguir, foi
impreterível buscar na realidade exemplos de espaços de uso múltiplo, compondo os
estudos de referência, que podem ser encontrados no capítulo 3, juntamente com uma
seção que discute os materiais e técnicas que remetem ao elemento norteador buscado: a
multifuncionalidade. Para tanto, foram buscados espaços que tivessem características de
parques, com espaços pouco ligados a uma função específica, buscando propor a seus
usuários experiências diversificadas, seja através da organização de eventos, seja através
de uma arquitetura que busque refletir a diversidade do entorno.
A criação de um referencial teórico e empírico permite a passagem para a próxima
etapa: as análises do local, que podem ser vistas no capítulo 4. Esta seção busca a análise
em diversas escalas, abrangendo desde os dados gerais (posição na cidade, população e
sua composição) sobre o bairro de Ponta Negra, a sua consolidação territorial fragmentada
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 17
pelo tempo demonstrada através do histórico, até a escala da área-de-estudo e da área-
projeto.
Em uma tentativa de integrar os diversos atores que formam a comunidade em
questão no feitio do projeto, o capítulo 5 demonstra o resultado dos diálogos realizados
através de entrevistas e conversas informais. A comunidade foi entrevistada com base em
variáveis de análise da percepção ambiental. Já as instituições (representadas pela
Companhia de Águas e Esgoto do Rio Grande do Norte, e pela Agência Reguladora de
Serviços de Saneamento Básico no Município de Natal, ambas ligadas à gestão de águas e
resíduos) foram envolvidas para que pudessem dar sua contribuição como parceiras e
apoiadoras do projeto, além da CAERN ter posse de alguns lotes na área-projeto.
O capítulo 6 se caracteriza como um resumo de tudo o que foi visto até então, com
conclusões e ênfase no que foi aproveitado do conteúdo exposto para posterior rebatimento
no projeto. Com base nestas conclusões, neste capítulo são expostos também o partido
adotado, as diretrizes de intervenção, e o programa de necessidades.
Por fim, o último capítulo se dedica à descrição da proposta, apresentando algumas
etapas do seu desenvolvimentos (as mais relevantes para que se mostre como se alcançou
o resultado final). Vale salientar que a sua leitura deve ser feita de modo conjunto com as
pranchas de projeto urbano, em anexo a este trabalho.
Ainda encontram-se, após estes itens, as conclusões acerca do trabalho realizado,
as referências bibliográficas e o apêndice A, contendo o roteiro de perguntas utilizado
durante as entrevistas aos moradores da comunidade.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 18
1 CONCEITOS E ABORDAGENS
Para que seja possível a compreensão não só do problema, mas do
desenvolvimento geral desta pesquisa, faz-se necessária a apresentação de determinados
conceitos. Embora alguns pareçam alvos de senso e entendimento comum, podem ser mais
complexos em sua definição.
1.1 O ESPAÇO, O LUGAR E O PÚBLICO
O conceito de espaço, por exemplo, apresenta uma dificuldade de definição. De
acordo com David Harvey (1980), citado por Mônica Schlee et al. (2009, p.43) as diferentes
práticas humanas estabelecem conceitos de espaço diversos. Por exemplo, Saquet e Silva
definem o espaço geográfico com base nas obras de Milton Santos como “um híbrido
composto de formas-conteúdos, formas-funções, objetos-ações, processos e resultados,
sendo o fenômeno técnico uma das principais condições históricas de transformação do
espaço, juntamente com outros processos econômicos, culturais e políticos” (2008, p.39). O
filósofo francês Henri Lefebvre (1976), citado por Rhalf Braga (2004), enfatiza as diferenças
entre o espaço percebido (do corpo e da experiência corpórea), o espaço concebido (ou
espaço do poder dominante), e o espaço vivido (que une experiência e cultura, espaço de
representação). Desta maneira, a explicação do que vem a ser espaço varia, não só
tecnicamente, a depender de que contexto se enxergue, mas também com a relação pessoa
x espaço.
Para entender essa relação, é necessário saber o que difere um espaço de um
lugar. Andiara Lopes e Verônica Lima (2005) confrontam diferentes definições de lugar e
espaço em diferentes âmbitos (não só o da geografia ou o do urbanismo, mas também o da
filosofia, por exemplo), tendo como cerne os conceitos colocados por Tuan (1975). As
autoras, com base nos discursos estudados, atestam importantes características de um
lugar: aquele que é produto da experiência humana, dotado de valores, e que exige uma
relação temporal (vivência cotidiana das pessoas com o espaço, que o eleva a categoria de
lugar, como corroborado pela citação abaixo.
[...] o lugar aparece exatamente quando se definem as
particularidades desse espaço, que pouco a pouco vão se deixando perceber, trazendo-o para a dimensão do local, do reconhecível, à medida que o dotamos de valor e consequentemente de significado (LOPES E LIMA, 2005, p.4).
De acordo com Ana Fani Alessandrini Carlos (2007), um lugar possui identidade
que expressa sua relação com o entorno, com o cotidiano das pessoas, e com a história não
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 19
apenas local, mas mundial. As conclusões foram tiradas, como citado pela autora, a partir
das afirmações de Milton Santos (1995) de que existe um lugar visto “de fora” e um lugar
visto “de dentro”. Externamente, o lugar seria o resultado das transformações históricas
sobre ele, e internamente como o diálogo entre esse espaço e o usuário.
Um espaço pode ser visto isoladamente, enquanto o lugar só pode ser
reconhecido como tal pelo seu contexto. Por esses fatores é de vital importância fazer a
análise de espaços de acordo com seus contextos histórico e de suas imediações. Lugares
são restritos. São espaços amplamente vivenciados pelos seres humanos. Deseja-se que
hajam características amplamente difundidas na concepção daquele espaço na mente dos
habitantes e visitantes de um lugar, pois ainda que as relações pessoais de uso, interesse
ou conhecimento tornem cada lugar único para cada ser humano, há de existir um conceito
base para aquele espaço, a fim de que se torne um lugar de fato, e também para mostrar
que ele tem seus limites, e a partir de outra área se caracteriza diferentemente.
Ferdinando Rodrigues (1986) discursa sobre o espaço urbano, colocando-o como
“o espaço do confronto de interesses, do processo histórico da definição dos direitos do
indivíduo e da coletividade, permanentemente escrito e reescrito na arquitetura da cidade”
(p.14). Mais especificamente, tratamos neste trabalho dos espaços públicos, parte
estruturante do espaço urbano, e que se apoia na sua definição mais simples apresentada
por Carla Narciso (2013) como,
aquele espaço que, dentro do território urbano tradicional (especialmente nas cidades capitalistas, onde a presença do privado é predominante), sendo de senso comum e de posse colectiva, pertence ao poder público.
Ângelo Serpa (2007) compartilha com Jordi Borja (2003) e Hannah Arendt (2001) a
noção de que o espaço público denota o próprio mundo ou a cidade em si. Porém, este
primeiro refere-se também ao conceito de espaço público como sendo o espaço da ação
política. Já Arendt coloca o espaço público como resultado da ação humana, ou seja, das
relações sociais desencadeadas pelos indivíduos que o compõe, aproximando-se neste
ponto da definição de lugar.
O espaço público significa o próprio mundo, na medida em que é comum a todos nós e diferente do lugar que nos cabe dentro dele. Este mundo, contudo, não é idêntico à terra ou à natureza como espaço limitado para o movimento dos homens e condição geral da vida orgânica. Antes, tem a ver com o artefato humano, com o produto de mãos humanas, com os negócios realizados entre os que, juntos, habitam o mundo feito pelo homem (ARENDT apud LIMA, 2014, p.144).
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 20
Queiroga (2009) considera os espaços públicos como aqueles em que se verificam
ações da esfera pública, que envolvem a produção cultural, a construção da cidadania, do
interesse público, e do bem público constituído socialmente diante do conflito de interesses
individuais ou de grupos.
Para Antônio Lopes (1999), os espaços públicos consistem em “lugares de vida e
de sociabilização, e que, uma vez abertos a todos, representam áreas de liberdade e de
democracia”. A acessibilidade presente no discurso de Lopes é corroborada por Fátima
Matos (2010), que coloca a facilidade de acesso como função primeira que distingue o
espaço público do privado. Matos adiciona a dimensão da visibilidade como fator que pode
aumentar o caráter público do espaço, por diferenciá-lo do espaço da privacidade (que
frequentemente coincide com o privado).
Com base em todos os conceitos estudados, adotamos neste trabalho a premissa
de que, seja o espaço público destinado à ação política ou à produção cultural, o mesmo
tem intrínseca relação em seu significado com a coletividade e com o âmbito social,
fragmentando-se em tipos de acordo com a função que desempenha na cidade, como será
visto nas próximas seções.
Os espaços públicos fazem parte também do grupo de espaços livres, que são
definidos,
no contexto da estrutura urbana, como áreas parcialmente edificadas com nula ou mínima proporção de elementos construídos e/ou vegetação - avenidas, ruas, passeios, vielas, pátios, largos, etc – ou com presença efetiva de vegetação – parques, praças, jardins, etc – com funções primordiais de circulação, recreação, composição paisagística e de equilíbrio ambiental, além de tornarem viável a distribuição e execução dos serviços públicos, em geral. [...] São ainda denominados espaços livres, áreas incluídas na malha urbana ocupadas por maciços arbóreos cultivados, representados pelos quintais residenciais, como também pelas atuais áreas de condomínio fechado; áreas remanescentes de ecossistemas primitivos – matas, manguezais, lagoas, restingas, etc – além de praias fluviais e marítimas (CARNEIRO E MESQUITA, 2000,p.24).
Como exposto no discurso de Ana Rita Carneiro Liana Mesquita (2000), os espaços
livres podem ser empregados na circulação, na percepção da paisagem e dos volumes
edificados, como artifício para a interiorização do ar e da luz nas edificações, na
estruturação da morfologia urbana, na proteção de recursos naturais e culturais, ou ainda,
serem destinados para práticas recreativas. As funções que podem cumprir os espaços
livres, sejam eles públicos ou privados, serão exploradas na seção seguinte.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 21
1.2 FUNÇÕES NO ESPAÇO URBANO
São apresentas aqui diversas maneiras de categorização do espaço urbano
(público e privado, com evidente ênfase no primeiro) e de suas funções ou modos de
apropriação, visto que, segundo Rodrigues (1986, p.31), “qualquer modelo de classificação
de atividades poderá ser útil na reflexão sobre a flexibilidade de projetos de espaços de uso
coletivo e público em relação à multiplicidade de atividades no meio urbano”.
Existem autores que categorizam os espaços públicos simplesmente como locais
de circulação ou como locais de permanência e socialização. Este é o caso de Lamas
(2004) e de Matos (2010). Esta última categoriza os espaços públicos em espaços de
permanência – cuja função é definida por ações e comportamentos como brincar,
descansar, jogar – e circuitos – aqueles cuja função é a de promover a mobilidade de
pessoas ou veículos, como vias e calçadas. Em sua descrição dos elementos morfológicos
do espaço urbano, Lamas transita por diferentes escalas e perspectivas, mas de forma
semelhante a Matos, elege a rua e a praça para representar os espaços públicos, afirmando
que esta última “reúne a ênfase do desenho urbano como espaço colectivo de significação
importante” (p.102). O autor caracteriza a praça como o “lugar intencional do encontro, da
permanência, dos acontecimentos, de práticas sociais, de manifestações de vida urbana e
comunitária e de prestígio, e, consequentemente, de funções estruturantes” (Lamas, 2004,
p.102). Por sua vez, a rua ganha a definição de espaço de circulação, enquanto os largos e
terreiros seriam “vazios ou alargamentos da estrutura urbana e que com o tempo foram
apropriados e usados” (LAMAS, 2004, p.102).
Carneiro e Mesquita (2000) adicionam uma categoria à esta classificação: os
espaços de equilíbrio ambiental. Estes são predominantemente vegetados e cumprem “a
função de elevar a qualidade ambiental e visual das cidades, ajudando a melhorar as
condições higiênicas e de saúde pública” (p.26).
Os espaços que podem cumprir com esta atribuição podem ser as reservas
ecológicas, e as unidades de conservação, que geralmente são porções territoriais
generosas – o que não exclui, contudo, que pequenas glebas venham a contribuir para este
propósito. Estas mesmas autoras esclarecem um importante conceito no que diz respeito a
outra conhecida função que os espaços públicos podem assumir: o espaço de lazer.
Segundo Dumazedier (1976) apud Carneiro e Mesquita (2000, p.26), “lazer vem do latim
‘licere’, que quer dizer ser permitido, isto é, ser lícito escolher a maneira de aproveitar a
condição de tempo livre”. Deste modo, o significado de lazer – comumente confundido ou
tomado como sinônimo de recreação – é mais abrangente, englobando em seu significado
três categorias: a própria recreação, o descanso e o desenvolvimento da participação social.
De forma mais específica, as autoras expõem características de alguns espaços públicos,
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 22
ressaltando, entre outros aspectos, a função que desempenham, como pode ser visto de
forma compilada na tabela a seguir.
Tabela 1 - Definição funcional de alguns espaços livres públicos
Espaço livre Definição funcional
Unidade de
conservação
“estabelecer a continuidade com os demais conjuntos residuais do antigo
ecossistema através de corredores de proteção de vias rápidas, de
estabilização biológica de taludes e proteção de linhas d’água”
Campi universitários São espaços livres públicos vegetados e contendo edificações de caráter
educativo, incluindo mobiliário recreativo e áreas de contemplação.
Faixa de praia Pode conter equipamentos de esportes ou de lazer contemplativo
Parques
Função predominantemente de recreação composto pela paisagem natural
e edificações, destinadas a atividades recreativas, culturais e/ou
administrativas.
Praças Função de convívio social, inseridos na malha urbana como elemento
organizador da circulação e de amenização pública.
Pátios
Definidos a partir de elemento arquitetônico expressivo, exercem a função
de respiradouros, de propiciadores do encontro social e eventualmente
destinados a atividades lúdicas temporárias.
Largos “[...] com o fim de valorizar ou complementar alguma edificação como
mercado público, podendo ser destinados a atividades lúdicas temporárias”
Jardins
Espaços livres públicos de contemplação, contendo cobertura vegetal
representativa com a finalidade de melhoria climática, ambiental e de
valorização da paisagem.
Quadras polivalentes Espaços livres destinados à prática de jogos [...] quase sempre dispondo de
área circundante para o encontro e o estar.
Fonte: Editado de Carneiro e Mesquita (2000)
Já Macedo et al. (2011) agrupa de forma diferente os espaços livres de acordo com
a sua função, enquadrando-os em três tipos-padrão: de circulação, convívio, lazer e
recreação; de preservação ou conservação ambiental; e espaços livres relacionados a usos
específicos. Esta primeira categoria se compõe de calçadas, ruas, parques, praças, entre
outros, enquanto a segunda são dunas, mangues, vales, orlas, e restingas, por exemplo. Já
no último tipo de espaços livres públicos definido pelos autores, tem-se os espaços
dedicados às redes de infraestrutura, cemitérios, entre outros. Os próprios autores enfatizam
a importância de se ver estes espaços enquanto sistema, quando afirmam que “a
localização, a acessibilidade e a distribuição dos ELs constituem um complexo de conexões
com múltiplos papéis urbanos” (Macedo et al., 2011, p.3). São estes “ [...] atividades do ócio,
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 23
circulação urbana, conforto, conservação e requalificação ambiental, drenagem urbana,
imaginário e memória urbana, lazer e recreação, dentre outros” (Macedo et al, 2009, p.5).
De maneira geral, na cidade de Natal, pôde-se notar que os espaços livres sofrem
ainda com uma falta de atenção e de critérios que regulem a sua ocupação e utilização,
permanecendo à mercê da especulação imobiliária, atendendo mais aos interesses privados
do que aos públicos. Isto é dito porque, dos 507 espaços livres estudados na pesquisa
citada no início deste trabalho, 45% são lotes não construídos, e 5% foram ocupados por
empreendimentos residenciais em um curto espaço de tempo de 4 anos.
1.3 APROPRIAÇÕES E SEUS MODOS
Na seção anterior, apresentamos as funções que os espaços públicos podem
desempenhar na cidade. Porém, faz-se necessário conhecer as apropriações que
acontecem nesse espaço, pois de acordo com Eneida Mendonça (2007) - calcada nos
discursos de Nishikawa (1984) e Santos e Vogel (1985) – as apropriações são eventos
cotidianos que devem ser reconhecidos e utilizados para compreender a resposta do
usuário à utilização de um espaço “formalmente constituídos para finalidade específica”
(p.298). Esta resposta é colocada por Santos e Vogel (1985) apud Mendonça como uma
indicação de criatividade ou uma reação aos padrões formais impostos pelos planejadores
urbanos, servindo como uma espécie de mecanismo de defesa.
Nishikawa (1984) considera as apropriações como eventos cotidianos relacionados à própria vida urbana e devem ser reconhecidas, entre outros aspectos, como reveladoras de necessidade de reestruturações físicas, de modo a permitir a flexibilidade no uso do espaço (MENDONÇA, 2007, p.297).
O ato de apropriar-se trata de um processo complexo “que pode ser coletivo ou não,
que se relaciona com poder e papéis sociais, envolvimento e afetividade com o espaço”, de
acordo com Verônica Lima (2014, p.111). Brackeleire apud LIMA (2014, p.111) aponta que
apropriar-se é definir uma área como sendo própria, enquanto Tuan (1983) aproxima o
sentido de apropriar-se ao sentido de lugar, envolvendo um investimento temporal, afetivo e
de valores. De acordo com Cintia Liberalino (baseada em Enric Pol, 1996):
Apropriamo-nos da cidade quando nos identificamos com ela, e a partir desta relação de identidade com o ambiente urbano, passamos a dar sentido de lugar ao que antes era apenas local, e assim, podemos atuar neste ambiente atribuindo uma nova imagem, ou seja, personalizando o espaço (LIBERALINO, 2007, p.42).
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 24
Daremos foco aqui nos diversos tipos de apropriação, descrevendo-os e
contemplando várias categorizações.
Silvio Macedo et al (2009) cita que “[...] a apropriação se reveste de variadas
formas, tipos, temporalidades, escalas, pode ser lícita ou ilícita, positiva ou negativa, intensa
ou episódica, depende de uma série de fatores que vão desde a atuação do poder público
até a topofilia1”. Através de um organograma contendo as formas de apropriação e
potenciais de uso, os mesmo autores mostram alguns dos usufrutos do espaço, tanto
público quanto privado (figura 1).
Figura 1 – Formas de apropriação e potenciais de uso
Fonte: Macedo et al., 2009
1 Topofilia é definida por Tuan (1980, p.106) como “o elo afetivo entre a pessoa e o lugar ou
ambiente físico”.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 25
Jan Gehl (1996) categoriza as atividades que podem ocorrer no espaço público nos
seguintes grupos: atividades necessárias, atividades opcionais e atividades sociais. Embora
categorizadas, possuem intensa influência no acontecimento umas das outras. O autor
coloca que o primeiro grupo de atividades se compõe de ações cotidianas, como ir para a
escola ou ao trabalho, comprar, aguardar transportes ou pessoas. Logo, a necessidade de
realização sobrepõe a influência do ambiente físico no seu acontecimento, além de
ocorrerem regularmente, desligadas de aspectos que condicionam a sua ocorrência. Já as
atividades opcionais são aquelas em que os participantes escolhem realizar, se as
condições forem próprias (principalmente as climáticas). Incluem o ato de caminhar, relaxar,
tomar banho de sol. Dependem, portanto, do clima (condição principal pelo próprio autor) e
do suporte físico do local onde são propostas. As atividades sociais dependem da presença
de outras pessoas, como brincar com outros, conversar, cumprimentar. Ocorrem de forma
espontânea, como resultado da atratividade dos outros dois tipos de atividades citadas.
Logo, não depende diretamente da qualidade do suporte físico, mas é influenciado por este.
O caráter destas atividades vai variar de acordo com a escala de abrangência do espaço
público: comunidades com ruas residenciais perto de escolas verão seus vizinhos com mais
frequência e possuem mais conhecimento do outro; em ruas no centro da cidade, por outro
lado, a atividade social se dá de forma mais superficial e se verá mais rostos
desconhecidos. Um dos pontos mais mencionado pelo autor, que realizou suas pesquisas
com uma abordagem de estudos de comportamento em vários espaços públicos da
Dinamarca, é que pessoas atraem pessoas, logo, os indivíduos irão onde outros estiverem.
Dando específica atenção à apropriação por parte da população de baixo poder
aquisitivo – característica da área em estudo neste trabalho - LIMA (2014) coloca que
A falta de espaço em suas edificações e de lugares voltados ao lazer dessa população faz com que ela se aproprie das áreas públicas, quer seja para divertir-se ou como extensão das suas casas para desempenhar afazeres domésticos; quer seja, como local de trabalho informal; ou ainda como acréscimos nas suas residências, através da apropriação indevida da área de uso comum (LIMA, 2014, p.149).
A autora também apresenta outro aspecto das apropriações do espaço público
mais voltado para a ocorrência de intervenções urbanas episódicas aqui representadas
pelas festividades.
Outra particularidade do nosso país ocorre em momentos festivos como Carnaval e o São João. Nessas ocasiões, em algumas metrópoles do Brasil, as Ruas e praças são tomadas por um grande número de pessoas de classes sociais diversas que se apropriam do espaço público para festejar e confraternizar-se, e expressar-se como cidadãos, de forma distinta do que ocorre no cotidiano (LIMA, 2014, p.151).
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 26
Deseja-se também nesta seção realizar uma diferenciação entre tipos específicos de
apropriação, no que diz respeito a usos contínuos versus usos sazonais, e ocupação ativa
versus ocupação passiva, que acredita-se que sejam conceitos diretamente relacionados.
De acordo com Stephen Carr et al (1992) no artigo “Needs in Public Space”, duas
necessidades apontadas são: a ocupação passiva e a ocupação ativa. A primeira não
envolve um engajamento físico, é mais relacionada à observação do que a expressão verbal
ou a atividades. Exemplos desta são: a observação de pessoas, a apreciação de artistas,
eventos culturais, esportivos. Pode ser ainda sazonal, dependente de terceiros, dado que se
realiza esporadicamente, ou pode ser contínua, quando o espaço público oferece uma
atraente paisagem, atributos físicos diferenciados, obras de arte, fazendo com que as
pessoas visitem de forma mais frequente. Entretanto, os autores discursam sobre a falta de
interesse que possa surgir se não houver incentivo à ocupação ativa. Já esta última
representa uma experiência mais direta com o lugar e com as pessoas nele. Atividades
como a prática de esportes, a interação com elementos naturais (como poder brincar com
barquinhos em uma fonte) e a manipulação de elementos (como uma escultura que pode
ser mudada conforme os seus usuários desejem), são ações que incentivam um uso mais
dinâmico. De acordo com os autores, este tipo de ocupação incentivaria mais o uso
contínuo, à medida que faria os usuários irem por conta própria participar e ocupar espaços
públicos, ao invés de depender de terceiros.
1.4 MULTIFUNCIONALIDADE COMO UMA NECESSIDADE
Nesta seção, é explicitada a necessidade por multifuncionalidade nos espaços
públicos entoada pelo discurso de diversos autores. Porém, antes de tudo, necessita-se
explicar o próprio conceito de multifuncionalidade ou polivalência, e outros significados
intrínsecos a este.
De acordo com o Dicionário Aurélio, multifuncional significa “aquilo que tem, ou
realiza, diversas funções”. Margarida Esteves (2013) relaciona a multifuncionalidade à
flexibilidade, mobilidade, adaptabilidade, citando uma gama de autores para o melhor
entendimento destes conceitos e suas relações (figura 2).
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 27
Figura 2 - Compilação dos conceitos de flexibilidade e adaptabilidade
Fonte: Esteves, 2013
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 28
A autora inicia e apura sua investigação no conceito de flexibilidade, que embora
seja simplesmente definido como a capacidade de ser transformado, também sugere a ideia
de liberdade, e aborda várias definições como a mobilidade, a evolução, entre outros. A
mobilidade e evolução, representam, respectivamente, uma rápida modificação dos
espaços, e a modificação do espaço a longo prazo, acompanhando transformações sociais.
O mais importante destes conceitos é trabalhado por Steven Groak (1992 apud ESTEVES)
que coloca que a adaptabilidade corresponde à “capacidade de responder a diferentes usos
sociais”. Esta descrição encaminha para a relação apontada por Herman Hertzberger (1991
apud ESTEVES, 2013) da inerente afinidade entre adaptabilidade e polivalência – diferentes
usos sociais – do qual a autora faz uso, ao final, para efeitos da construção do seu próprio
trabalho.
A adaptabilidade é uma característica da flexibilidade, tal como a
mobilidade, a elasticidade e a evolução, sendo que estas últimas requerem mudanças físicas no espaço, enquanto a adaptabilidade se relaciona com a polivalência e multifuncionalidade de usos, sem haver arranjos físicos. (ESTEVES, 2013, p.45)
De acordo com Bentley et al. (1985), Robustness é tida como uma característica do
espaço público que pode ser relacionada à multifuncionalidade, ou até mesmo a sua
adaptabilidade à novas situações e usos. Essa qualidade pode ser considerada desde a
escala do ambiente até às áreas externas, passando pela própria edificação. Os autores
relacionam todas as escalas apresentadas, apontando, por exemplo, como o conteúdo e a
fachada de prédios podem promover ou abalar a frequência de uso de um espaço público.
Lugares que podem ser utilizados para diferentes propósitos oferecem a seus usuários mais possibilidade de escolha do que locais cujo desenho os limita a uma única forma fixa de utilização (BENTLEY et al., 1985, p.56, tradução nossa)
Reforçando a necessidade por espaços multifuncionais, Pedro Brandão (2002)
citado por Inês Fernandes (2012), enfatiza que importantes critérios para espaços públicos
são a diversidade e adaptabilidade, afirmando que um espaço público deve estar preparado
para dar lugar a diversas e variadas atividades, adaptável a futuros usos ou usufrutos não
planejados.
A apropriação dos espaços livres pelo público no cotidiano está diretamente relacionada com a qualificação e gestão destes mesmos espaços. De um lado, o quanto se permite ou se possibilita a diversidade de usos, em função da não especialização destes espaços. De outro lado, a necessidade de espaços especializados que possam ser utilizados, de modo simultâneo ou alternado, por diversas faixas etárias e grupos sociais (MACEDO et al., 2009, p.63)
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 29
Do mesmo modo, Lopes (1999) critica a grande quantidade de espaços
cristalizados2 em Portugal, que não atendem às necessidades reais da comunidade,
resultado da falta de conhecimento das necessidades do cidadão quando do feitio do
projeto, atestando que
É preciso ter a coragem de redesenhar os espaços públicos urbanos destinados aos cidadãos, de descongelar muitos deles, insípidos e desajustados em pelo menos 20 ou 30 anos, de diferenciar os públicos e aceitar a diversidade das práticas, recreativas ou não, tolerando as diferentes perspectivas dos utilizadores do espaço citadino (LOPES, 1999).
O PPS também coloca a possibilidade de escolha de atividades como um ideal, ao
qual nomeia Power of ten. Sua descrição é dada pelos próprios autores da seguinte
maneira:
O cerne do Power of 10 é a ideia de que todo lugar excelente precisa oferecer pelo menos 10 coisas para fazer ou 10 razões para estar lá. Estas podem incluir: um lugar para sentar, locais de recreação, arte para ser tocada, música para ouvir, alimentos para comer, história para experimentar, e pessoas para conhecer. O ideal é que algumas destas atividades sejam peculiares daquele determinado local e que sejam interessantes o suficiente para manter as pessoas retornando ao local. (PPS, tradução nossa)
De forma mais específica, Matos (2010, p.21) coloca que o mobiliário urbano dos espaços
devem ser dimensionados e equipados de forma a apoiar as atividades a que se destinam
“devendo ser, cada vez mais, multifuncionais e concebidos de forma a poderem ser
readaptados a novos usos imprevistos, mas polivalentes”.
1.5 O (ESPAÇO) PÚBLICO NA CIDADE CONTEMPORÂNEA:
Afinal, como chegamos à atual situação de diminuição de uso dos espaços
públicos? O que acarretou isso? Quais são os novos espaços utilizados para recreação e
socialização, senão os espaços públicos como praças, parques, largos, entre outros? Para
Mark Gottdiener apud Yasminie Cerqueira (2013), a cidade contemporânea não apenas foi
ampliada, mas se transformou.
De acordo com Lima (2014), o processo de “internalização das atividades
comunitárias” se iniciou a partir da década de 70, impulsionado por diversos fatores. Um
deles é a busca pelo lucro, advinda do mercado imobiliário que vem a propor novos espaços
na urbe: ambientes segregados como condomínios e shopping centers, ambientes com a
2 O autor utiliza-se da palavra “cristalizado” para fazer referência àquilo que não tem
mudança, permanece no mesmo estado ou situação.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 30
promessa de conforto e segurança, mas que ferem o âmago do conceito do espaço público
– a acessibilidade generalizada e irrestrita. A autora atribui esse processo ainda à mudança
no paradigma de planejamento dos espaços livres públicos - que partiram de
intencionalmente planejados para a situação de áreas remanescentes do ambiente
construído – aliada à incorporação de princípios modernistas que “romperam com a maneira
tradicional de organizar as áreas livres brasileiras e passaram a estruturar as cidades, de
forma a ocasionar a delimitação imprecisa do espaço público por paredes de edifícios”
(LIMA, 2014, p.148).
Uma problemática presente no discurso de Lima e enfatizada por Cerqueira (2011)
é a exacerbada afinidade na relação, na cidade contemporânea, entre lazer e consumismo.
Essa prática é causa e consequência da criação desses espaços segregados e de
acessibilidade controlada, e não atinge só a eles, mas também ao espaço público em si, que
passa a ser fragmentado em pequenos espaços da mercantilização. Este é um dos pontos
explorados por Cerqueira – inspirada pela fala de Zygmunt Bauman – que conclui que “não
há como falar em espaço público na contemporaneidade sem mencionar a influência do
consumo nessa dinâmica” (CERQUEIRA, 2013, p.86). Sob esta perspectiva, a autora coloca
que, a partir do momento em que o espaço público é associado à atividade comercial, este
espaço se torna excludente e a acessibilidade universal (seja ela física, visual, ou simbólica)
passa a ser desconsiderada. Filtra-se e direciona-se os usuários deste local, abalando a
diversidade, e quanto a isto, a autora discursa que “o consumo representa um problema
para o espaço público urbano quando impõe barreiras ao convívio da diversidade,
pluralidade, o que fere a construção social desses espaços” (CERQUEIRA, 2013, p.87).
Desta forma, “o consumo passou a ditar projetos e formas no espaço e o lazer passou a
integrar o rol do consumo” (CERQUEIRA, 2013, p.89).
Outra questão levantada pela mesma autora, mas de conhecimento geral trata da
sensação de insegurança, causada pela violência urbana também presente no discurso de
Lima. Esta última atribui à violência urbana o fato das pessoas procurarem cada vez mais o
convívio em locais fechados, confortáveis e que passem a impressão de segurança.
Cerqueira coloca que “a criminalidade real e a sensação de insegurança enfraquecem as
relações sociais e espelham esse enfraquecimento na relação das pessoas com os
ambientes, tendo consequência direta na percepção da qualidade de vida [...]”
CERQUEIRA, 2013, p.96). A modificação dessas relações sociais advindas da sensação de
insegurança é capaz de modificar também o uso de determinado espaço, pois, de acordo
com a autora, para ser visto como inseguro, um local não precisa que tenham acontecidos
episódios de violência urbana realmente, mas somente o fato de passar esta impressão –
uma rua mal iluminada e deserta, por exemplo – pode causar o seu esvaziamento.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 31
Ainda no âmbito da modificação das relações sociais, enfatiza-se a informatização
e a incorporação da tecnologia ao modo de vida atual. Para Castells (apud Cerqueira, 2013),
o modo informacional é o que marca o modo de desenvolvimento do mundo
contemporâneo, e Cerqueira (2013, p.83) explana que “a incorporação da tecnologia ao
modo de vida urbano é uma realidade inegável, assim como sua influência no espaço, e
também nas transformações sociais e culturais”. Apesar disso, Carlos sugere que esta
modificação no estilo de vida do cidadão não anula o espaço, mas “impõe uma nova
perspectiva” para pensá-lo. Essas novas exigências geracionais – sendo um delas a
informatização do modo de vida atual – aliadas às “novas e crescentes necessidades da
população urbana, associada a mutações de ordem demográfica [...] repercute-se na
utilização e em novas procuras dos espaços públicos” (Matos, 2010, p.20). Apesar destes
fenômenos que vêm ocorrendo há pelo menos quatro décadas, LIMA (2014, p.149) afirma
que “pode-se ainda encontrar, principalmente nas áreas de concentração de população de
baixo poder aquisitivo, intensa vida nas ruas”.
1.6 COMO AVALIAR O ESPAÇO? (METODOLOGIAS E SEUS COMPONENTES)
Ao partir das definições apresentadas até o momento, apreende-se que o espaço é
formado por atributos físicos e ações sociais. Faz-se necessário entender os critérios para a
leitura e compreensão dos espaços públicos urbanos de forma mais nítida, para que esses
critérios possam ser citados de forma mais sucinta na metodologia, segundo capítulo deste
trabalho. Fernandes (2012), em sua tese “Requalificação do Espaço Público Urbano”, faz
um apanhado sobre os critérios de avaliação da qualidade do espaço público, de acordo
com diversos autores.
Um deles é a instituição Project for Public Spaces (PPS), que considera quatro
qualidades essenciais para o sucesso de um espaço: acessibilidade (espaço público de fácil
acesso e circulação, facilmente visto de todos os pontos, de fora pra dentro e de dentro pra
fora); possibilidade de realizar atividades (um espaço vazio não atrairá as pessoas); conforto
e imagem do espaço (não só segurança e limpeza, como também disponibilidade de lugares
para sentar); e possibilidade de socialização (diz respeito aos hábitos sociais, estado de
espírito, cautela com o local dos usuários presentes).
Bentley et al (1985) são autores do livro Responsive Environments, uma espécie de
manual para designers que define sete qualidades de um espaço – e demonstra aplicações
de cada um para todas as escalas, desde o ambiente até a cidade, passando pela
edificação e pelo espaço público. Estas são:
permeabilidade, vista como a capacidade da forma físico-espacial permitir a
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 32
integração e acessibilidade;
variedade, que diz respeito à gama de diferentes utilizações que um espaço
disponibiliza aos seus usuários;
legibilidade, como uma forma de facilidade de compreensão do espaço;
robustez como a capacidade de responder bem a diferentes usos;
riqueza, referindo-se à capacidade de escolha do usuário à diferentes
experiências sensoriais;
adequação visual, que diz respeito à um aspecto visual do lugar que
desperte no usuário a consciência acerca das escolhas disponíveis;
personalização, referente à medida em que as pessoas podem colocar sua
própria marca no local.
Os dois discursos demonstram similaridades entre as variáveis de análise
colocadas, mas vale salientar que o foco neste trabalho será na variável robustez (colocada
por Bentley et al.) e na possibilidade de realizar atividades (introduzida pelo PPS), apesar
dos outros critérios serem incorporados em segundo plano na análise do local de estudo.
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O objetivo principal deste trabalho é de elaborar projeto urbano de um espaço
público que tenha como elementos norteadores a multifuncionalidade e a flexibilidade,
incentivando a apropriação desses espaços por diversos atores e de diversas formas,
concebido com base na problemática apresentada na contextualização. Vicente Del Rio
(1990) afirma que apesar de existirem várias teorias e metodologias para o desenho urbano,
nenhuma delas apresenta-se de forma completa e suficiente por si própria, sendo todas
complementares. O mesmo posicionamento é adotado neste trabalho, e a seguir serão
explicados os caminhos de análise rumo ao produto final.
A escolha de um terreno se fez necessária para o feitio do projeto urbano que se
almeja, e foi feita com base na insuficiência de espaços públicos de permanência - entende-
se por estes os espaços públicos onde se desenvolvem atividades culturais, de lazer,
excetuando-se aquelas onde a função principal é de passagem ou de suporte ao sistema
viário, como canteiros e rotatórias. Além disso, buscou-se áreas com rica atividade cultural,
para que fosse valorizada a sua tradição através da proposição de um espaço de expressão.
Rodrigues (1986) define duas áreas quando do feitio de um projeto urbano: a área-
de-estudo e a área-projeto. A última diz respeito ao terreno que de fato irá ser estudado com
mais detalhes, enquanto a primeira abrange uma área com raio de 300 a 500 metros em
relação ao centro de gravidade física e funcional da área – considera-se o centro neste
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 33
estudo como a área-projeto. Sob esta óptica, será trabalhada a área-de-estudo com base
nos seguintes quesitos colocados pelo autor:
Uso do solo – De acordo com o próprio Rodrigues (1986, p.21), como
urbanista “cabe-nos identificar essas atividades, valorizando-as através da
reorganização ou previsão de seus variados “espaços-função” [...] com a
necessária flexibilidade de composição dos espaços coletivos e públicos”.
População – em termos de dimensão, composição (aspectos de gênero,
faixa etária, e poder aquisitivo da população habitante da região).
Além destes, as análises na área-de-estudo incluíram a busca pelo o histórico da
Vila de Ponta Negra, pois de acordo com Philippe Panerai (2006), “o estudo do crescimento
permite determinar aquelas lógicas inscritas profundamente no território que esclarecem as
razões de ser do assentamento atual”. Não sendo este o tema principal buscado neste
trabalho, a busca pela evolução histórica e territorial é breve e sucinta, tendo o objetivo de
evidenciar os locais de resistência ou mudança, identificando indícios da cultura local. Com o
intuito de compreender a relação entre os âmbitos público-privado, circulação-permanência,
relação entre cheios e vazios, a representação gráfica de figura-fundo é utilizada em vários
momentos.
As variáveis de análise colocadas pela instituição Project for Public Spaces (PPS) e
por Bentley et al. (1985) ajudaram a direcionar o olhar para o estudo da área-projeto, em que
foi dada mais atenção aos seguintes fatores de análise:
Possibilidade de chegada ao local, indicando as principais rotas dos meios de
transporte mais comuns na localidade, além das possíveis barreiras encontradas
para se chegar ao local;
Localização de estacionamentos e paradas de ônibus nas adjacências;
Acessibilidade também visual, percebendo as diferentes maneiras de se ver a área-
projeto;
Croquis do espaço, considerando ventilação e posicionamento do sol em relação ao
terreno.
De forma complementar, buscou-se compreender o comportamento apresentado
naquele local, ao apropriar-se de conceitos da psicologia ambiental que dizem respeito aos
vestígios ambientais da ação humana. Estes são “objeto de pesquisas que buscam
compreender a ocupação e uso de um local (cômodo, lote ou setor urbano) e inferir algumas
das relações pessoa-ambiente ali existentes...” (Pinheiro, Elali, e Fernandes, 2008, p.77). De
acordo com os autores, a técnica é de simples aplicação, não exigindo a utilização de
instrumentos sofisticados, e nem a sistematização de horários de observação. Ao invés
disso, enfatiza a importância do saber ver os resíduos e vestígios comportamentais no
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 34
ambiente, implicando em um conhecimento contextual (sociocultural) básico para interpretar
o que pode vir a significar os achados.
Os vestígios ambientais de comportamento são divididos em duas categorias: deposição (ou acumulação) e erosão [...] A deposição acontece quando algo é acrescentado ao ambiente, como no caso de grafito, lixo e latrinália [...] A erosão ocorre quando algo é retirado do ambiente, como no exemplo de caminhos informais criados pelos usuários em áreas cobertas por vegetação, indicados pelo seu desgaste ou ausência...” (Pinheiro, Elali, e Fernandes, 2008, p.80)
Sendo assim, as duas categorias de vestígios comportamentais citadas serão
observadas na área de estudo, a fim de obter um entendimento de como as pessoas se
utilizam (com maior ou menor intensidade) do espaço público estudado.
A análise técnica do espaço muitas vezes não é suficiente para se depreender as
reais necessidades da comunidade residente. Neste ponto, cabe enfatizar que “vai depender
em aprendermos a escutar as pessoas não-profissionais, compreender o que querem, como
eles vêem, e como realmente colaborar com eles...” (APPLEYARD apud DEL RIO, 1990).
Logo, o fato de se comunicar e envolver a população que mora ou utiliza aquele
equipamento urbano e seu entorno é essencial. Para tanto, baseou-se na metodologia
proposta por Kevin Lynch (1997), que utiliza-se da entrevista e da construção de mapas
mentais como instrumentos de pesquisa para compreender a imagem da cidade. O autor
buscava evidenciar os pontos mais expressivos da cidade ou da localidade em estudo
(estivessem os respondentes cientes disto ou não), o significado de determinados locais, e
evocava as experiências sensoriais dos respondentes. O roteiro construído a partir desta
metodologia pode ser visto no apêndice A.
Para complementar o aporte teórico criado, foi necessário buscar conhecimento em
experiências empíricas, inseridas em um contexto complexo, aqui expostas através dos
estudos de referência. Visto que busca-se aqui o projeto de um espaço público
multifuncional, estes estudos passeiam pelas mais diversas escalas, averiguando o
elemento multiplicidade (ou a sua falta) como elemento central de análise. De maneira geral,
buscou-se analisar os seguintes critérios:
Localização, levando em consideração o contexto local onde o espaço público está
inserido, além das condições climáticas, um importante definidor de que tipo de
atividades ali se desenvolverão;
A autoria do projeto e uma noção da época desde a qual o espaço público está em
funcionamento e apto para uso público;
O partido arquitetônico e paisagístico;
Uma descrição geral dos espaços e usos;
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 35
Breve descrição de cores, texturas, visuais, buscando analisar aspectos como a
permeabilidade e acessibilidade (física, visual, simbólica) quando as informações
forem existentes.
3 ESTUDANDO ESPAÇOS MULTIFUNCIONAIS
3.1 PARQUE DISCOVERY GREEN
O Discovery Green é um parque localizado no centro de Houston, no Texas, nos
Estados Unidos (figura 3). Situado na Avenida de Las Americas, é cercado por
empreendimentos culturais e de serviço, como o Centro de Convenções George R. Brown e
o Hilton Americas Hotel, além do Toyota Center. Oficialmente aberto ao público no dia 13 de
abril de 2008, possui uma área de 47.700 m2. O projeto do parque foi liderado pela firma de
paisagismo Hargreaves Associates, com a participação da filial de Houston do escritório de
arquitetura Page Southerland Page e da paisagista local Lauren Griffith.
Figura 3 – Localização da cidade de Houston nos Estados Unidos
Fonte: http://www.world-guides.com/north-america/usa/texas/houston/houston_maps.html
Desde a década de 1990 até os dias atuais, os gestores de Houston buscam
maneiras de desenvolver a cidade, encontrando a solução em parcerias de investimento
público/privado a fim de revitalizar o centro da cidade, prática adotada também por cidades
como Pittsburgh, Orlando e Baltimore. Mais ou menos 70% das quadras do centro de
Houston foram reconstruídas, fornecendo aos usuários uma área com novas vistas e mais
qualidade ao lugar. Foi investido muito em infraestrutura, renovação de prédios, e expansão
do sistema de transportes. Aliado ao planejamento do parque, pensou-se na mobilidade não
só do centro onde está localizado, como também da cidade, integrando esta fração do
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 36
centro de Houston à todo o tecido urbano através do uso de VLT. Dois eixos foram criados –
um Norte-Sul e outro Leste-Oeste, conectando todos os equipamentos na área, e
aproximadamente 4 bilhões de dólares foram investidos em prédios no entorno – novo
edifício residencial com 345 apartamentos, torres empresariais e um possível hotel são
exemplos destes novos investimentos.
Uma das mudanças propostas partia da premissa de que o centro da cidade, área
predominantemente comercial, deve ser também um local para se morar, revitalizando o
tecido urbano com múltiplos usos. Antes da inserção do parque, vários dos equipamentos
de entretenimento do centro de Houston (ver figura 4) eram isolados entre si, cercados por
estacionamentos que atendiam aos três grandes equipamentos do entorno - o Centro de
Convenções George Brown, e as arenas de esportes Toyota Center e Minute Maid Park -
todos somente utilizados durante grandes eventos, o que gerava uma utilização episódica e
não cotidiana na área. O parque começara a ser planejado em 2004 na gestão do prefeito
William White, que junto a líderes cívicos garantiu o terreno a ser utilizado. Enquanto
arrecadavam investimentos públicos e privados, os gestores responsáveis pelo parque
buscaram referências pelo país de parques ativos e bem sucedidos, além de contatar a
entidade sem fins lucrativos PPS (Project for Public Spaces), que organizou workshops com
a comunidade para gerar um programa de necessidades de espaços e atividades. É
importante salientar que a participação da comunidade no processo de planejamento se deu
de forma contínua, durante o decorrer de todo o projeto.
Figura 4 – Mudanças provocadas pela inserção do Parque Discovery Green em um centro urbano ocioso
Fonte: http://www.archdaily.com/147437/discovery-green-hargreaves-associates/
Quanto às condições climáticas no local, sabe-se que o tempo em Houston é
instável, por causa de sua localização geográfica, em uma planície com poucos obstáculos
naturais contra ventos e massas de ar. No verão as temperaturas podem superar os 35 °C
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 37
(julho), já no inverno as temperaturas caem em média para 12 °C sendo que a mínima
atinge os 7°C (janeiro). Ocorre precipitação o ano inteiro, com mais frequência no verão do
que no inverno. Isto garante a mudança de caráter de usos do parque, que no inverno tem
atividades como a patinação no gelo no Kinder Lake, área identificada pelo número 5 no
leiaute geral do parque (figura 5).
Figura 5 – Leiaute geral do Parque Discovery Green
Fonte: http://www.discoverygreen.com/discovery-green-park-map
O partido paisagístico do parque parte da interseção entre dois passeios principais
(um deles já existente antes da implantação do equipamento urbano), com a distribuição das
edificações, gerando um equilíbrio entre o construído e não construído. Pode-se ver
algumas formas orgânicas, ainda que a ortogonalidade prevaleça. Já o seu partido
arquitetônico consiste em edificações horizontais com estrutura em metal, fechamentos em
vidro, e despida de ornamentos, uma arquitetura clean, cuja ornamentação fica por conta do
paisagismo. Estas abrigam usos como o restaurante The Grove, a lanchonete The Lake
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 38
House – no qual os dois, apesar de serem edificações destinadas ao serviço de
alimentação, servem pratos mais simples ou mais complexos, atraindo diferentes públicos –
além de uma filial da biblioteca pública de Houston, com salas de leitura e internet WiFi.
Quanto ao território livre de edificações, têm-se grandes gramados destinados aos
mais diversos tipos de uso, sendo um deles um gramado para piquenique, o Sarofim Picnic
Lawn. O lago de 4000 m², o Kinder Lake, é utilizado tanto durante o verão, quanto durante o
inverno. Estes espaços foram posicionados nas proximidades de palcos ou locais com a
possibilidade de montagem destes, de modo a facilitar a realização de eventos itinerantes,
como shows, feiras, concertos. Além disso, por todo o parque foram inseridas diversas
esculturas de caráter não só contemplativo, mas interativo. A Gateway Fountain – superfície
de granito levemente inclinada de onde jorram jatos d’água - e a Mist Tree – fonte de aço
inoxidável que brinca com névoa e água - (figura 6) são exemplo destas, que provocam
outras sensações no usuário, como o alívio do calor e a sensação de umidade.
Figura 6 – Gateway Fountain e Mist Tree representando o lazer contemplativo e sensorial
Fonte: http://www.archdaily.com/147437/discovery-green-hargreaves-associates/
Além disso, o local contém playground infantil, pistas de corrida (para pessoas e
para competições entre cães), além de diversas esculturas feitas por vários artistas
diferentes, utilizando de cores e materiais distintos, como pode ser visto na figura 7.
Figura 7 – Obras dos artistas Margo Sawyer e Doug Hollis, respectivamente
Fonte: http://www.archdaily.com/147437/discovery-green-hargreaves-associates/
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 39
O parque propõe uma forma diferente de vivenciar os espaços públicos pois nos
apresenta aspectos de atividade plena e pulsante. São espaços bem distribuídos e
permeáveis, com diversos eventos realizados pela direção do parque desde campeonatos
de video games até shows e aulas de ginástica. E nisso se dá sua forma, trabalhando cada
metro quadrado com ambientes ao ar livre e onde tudo se relaciona (figura 8), conectados
por todos os sentidos do corpo humano, diversificando a experiência de um lugar como o
Discovery Green. Do principal passeio, o Andrea and Bill White Promenade, tem-se uma
visão completa de todo os espaços adjacentes e de seus mobiliários urbanos, garantindo a
permeabilidade visual que convida o usuário a se apropriar destes espaços. A
permeabilidade e acessibilidade físicas ficam por conta das diversas possibilidades de
acesso, tanto por carro (com estacionamentos subterrâneos), quanto por transporte público
(linhas de VLT criadas para dar acesso e revitalizar a área), sugerindo também uma
acessibilidade universal relacionada à permeabilidade simbólica de que não existem
barreiras à utilização por pessoas de qualquer classe social, gênero ou raça.
Figura 8 – Permeabilidade e conectividade visual entre as partes do parque
Fonte: http://www.pps.org/projects/houstonpark
As texturas apresentadas pelo parque tem um aspecto singular de descoberta e
excitação devido à variedade presente em todos os aspectos, desde os revestimentos até o
mobiliário urbano, como pôde ser visto pelas figuras. Em todos os ângulos do projeto, os
materiais nos convidam a experimentar sempre um pouco mais, trabalhando sentidos que
estamos desacostumados a sentir. No geral, o projeto tem uma gama de cores bem vasta (a
ser representada tanto pelos elementos artificiais quanto pelos jardins com espécies
variadas formando variadas composições) e sempre o verde se faz presente como plano de
fundo cênico arquitetônico e paisagístico. A identidade urbanística do local foi formada a
partir de referências a símbolos locais, sejam pessoas que influenciaram a área, ou árvores
típicas da região. Isto é dito porque ao dar nome aos passeios e espaços do parque, foram
escolhidas referências significativas para a população, além de um dos principais passeios
do parque serem margeados por carvalhos centenários que foram preservados durante o
desenvolvimento do projeto. Soma-se a isto a já citada participação popular durante o
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 40
processo projetual, o que fez com que o espaço de fato tivesse características desejadas
pela população.
3.2 PARQUE SUPERKILEN
O Superkilen localiza-se em Copenhagen, na Dinamarca, ocupando uma área de
aproximadamente 30.000 m², e está em funcionamento desde o ano de 2012. O projeto
surgiu de uma parceria entre os escritórios Topotek 1, BIG, e Superflex, trabalhando em
conjunto nas diversas escalas (estruturação urbana, paisagismo e artes) para a prefeitura de
Copenhagen. O parque está inserido em um contexto de busca pelo destaque do distrito de
Nørrebro, uma área de imigrantes, portanto diversificada etnicamente, e onde se encontram
vários desafios sociais. O distrito passou por um processo de reestruturação na década de
1970, quando ocorreu a abertura de diversos espaços para grandes áreas verdes e foram
construídos apartamentos maiores e novos blocos residenciais. A intenção principal do
projeto foi de refletir no parque a diversidade da população que se utiliza daquele local,
intenção esta que é mais obviamente revelada pela presença de vários objetos de arte
vindos de diferentes locais (mais de 50 nacionalidades), como que para criar a noção de
globalidade.
O Superkilen é um parque que apoia a diversidade. É uma exposição mundial de mobiliário e objetos cotidianos de toda parte do mundo, incluindo bancos, postes, lixeiras e plantas – requisitos que todo parque contemporâneo deveria incluir e que os futuros usuários do parque ajudaram a escolher. (Archdaily, 2012, tradução nossa)
A cidade de Copenhagen possui um clima considerado “temperado marítimo”,
caracterizado por variação considerável de temperatura, e de direção e velocidade dos
ventos, cujas temperaturas mais baixas ocorrem no mês de Janeiro (média de 2ºC), e as
mais altas, em agosto – máximas de 20ºC. A incidência solar possui níveis relativamente
baixos, o que permitiu a não utilização de vegetação de grande porte para sombreamento,
garantindo certa permeabilidade visual.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 41
Figura 9 – Leiaute geral do Parque Superkilen
Fonte: http://www.archdaily.com/286223/superkilen-topotek-1-big-architects-superflex/
Figura 10 – Vista do Parque Superkilen
Fonte: http://tinyurl.com/lhq5ytb
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 42
O projeto inicia no encontro entre a Rua Nørrebroruten, e tem uma extensão de
aproximadamente 500 metros, dividido pelas ruas em três espaços: a Red Square, o Black
Market, e o Green Park, finalizando-se na rua Tagensvej (figura 9). Deste modo, permite
cortar caminho para acessar três grandes vias, e especial atenção foi dada ao modo como
se chega a este espaço público, levando em consideração os aspectos culturais locais: as
ciclovias foram reorganizadas para criar uma melhor rede de acessos, além da criação de
conexões entre as vizinhanças, juntamente à possível criação de uma linha de ônibus,
necessidade citada pelos usuários do bairro quando em entrevista. Estas modificações
fazem parte de um plano maior de tráfego, que incluem também a colocação de sinais e de
barreiras físicas redutoras de velocidade – como as lombadas, por exemplo.
De maneira geral, a relação entre cheios e vazios no parque pende mais para este
último, quando se nota poucas edificações, e mais superfícies livres, com pontuais
elementos artísticos e mobiliários urbanos representativos de diferentes nacionalidades. O
partido paisagístico do parque parte da horizontalidade e extensão, devido também às
condições morfológicas dos terrenos de intervenção, utilizando-se das cores – de forma
natural, explorando o verde da vegetação, ou de forma artificial, através da superfície
multicolorida da Red Square. A vegetação está inserida em espaços definidos e delimitados,
como cortes no pavimento cinza, como pode ser visto na figura 11.
Figura 11 – Inserção da vegetação no Parque Superkilen
Fonte: http://www.archdaily.com/286223/superkilen-topotek-1-big-architects-superflex/
O parque pode ser visto como um “jardim mundial”, devido à característica dos
jardins de transferir o sentimento de uma paisagem distante, como as ruínas gregas, os
jardins ingleses, ou as pedras japonesas, de modo que isto foi incorporado ao projeto
através da criação das visuais presentes na figura 12.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 43
Figura 12 – Criação de novas topografias e elevações
Fonte: http://tinyurl.com/lhq5ytb
A diversidade e multiplicidade de uso são vistas neste projeto, expressas através
dos diferentes espaços e suas diversas plásticas. Na Red Square, os autores do projeto
optaram por fazer uma praça aberta para ser utilizada em situação de eventos culturais
itinerantes, como concertos, feiras, utilizando-se de um piso liso em paginação em tons
vibrantes de vermelho e rosa. No Black Market, foram criadas ondulações no terreno (que
também podem ser vistas na figura 12), remetendo a um espaço mais lúdico e destinado a
pratica de atividades físicas e esportes, como skate, patins, onde o plano de fundo é
formado pela cor escura com linhas contínuas brancas. Já o Green Park é mais voltado para
a prática de corridas, caminhadas, passeios com animais, instigando o contato com a
natureza, com uma escolha de materiais mais simples, representadas por uma paginação
de piso mais neutra, deixando com que a vegetação se sobressaia. Apesar disto, trata-se de
espaços planos e de maneira geral, livres de obstáculos tanto à acessibilidade física,
quando à visualização dos caminhos, ocasionando uma boa legibilidade. Vale salientar que
os diferentes revestimentos e cores adotados para cada uma das áreas, assim como a
disposição do mobiliário e esculturas não definem o que será realizado em cada local - há
uma negação da visão “contemplativa” do espaço, onde só resta sentar e olhar: ao invés
disso, busca-se oferecer múltiplas formas de apropriação e relação com o mundo urbano.
Adiciona-se que o mobiliário urbano diferenciado (figura 13) convida a diversos usos.
Figura 13 – Mobiliário urbano diferenciado e diversos tipos de apropriação
Fonte:http://www.archdaily.com/286223/superkilen-topotek-1-big-architects-superflex/
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 44
3.3 DIMENSÕES DA MULTIFUNCIONALIDADE E DA APROPRIAÇÃO DO LUGAR
Nesta seção, trabalha-se sob a perspectiva da robustez, definida por Bentley et al
(1985) como a capacidade de responder bem a diferentes usos, onde o enfoque dado tem
relação com os elementos - construídos e naturais – e a forma como são utilizados,
permitindo mais ou menos modos de apropriações.
Como foi visto nas seções anteriores, um dos componentes da essência do espaço
público é a acessibilidade, seja ela física, visual ou simbólica. Logo, relacionando as duas
variáveis, podem-se deduzir alguns princípios que reduzem ou incrementam as
possibilidades de apropriação de um local. De acordo com o Manual de Procedimentos para
Intervenções em Praças (chamado aqui de MPIP, do ano de 2002), de autoria da Prefeitura
do Recife, o próprio ato de cercar o espaço público pode vir a dar a sensação de
aprisionamento ou de acessibilidade restrita, ainda que a intenção seja a de proteção.
É preciso evitar que grades e cercas afastem o usuário do espaço público ao dificultar-lhe o acesso. Do mesmo modo como se evitam batentes, mesmo baixinhos, em lojas de shoppings, pois podem funcionar, psicologicamente, como barreiras à entrada das pessoas, áreas gradeadas podem ter o mesmo efeito, ainda que, conscientemente, as pessoas não se deem conta disso (MPIP, 2002, p.42).
A existência de áreas em elevação, presentes também na citação acima, podem
funcionar como barreiras à apropriação. Em pesquisa realizada por Lucena e Medeiros
(2014) acerca da Praça André de Albuquerque, foram observados os modos de apropriação
em horários sistematizados, em dias típicos e atípicos, com relação ao suporte físico
oferecido (leiaute) e a legislação vigente na área. Percebeu-se que não havia utilização
alguma nos canteiros, que representam 42% do espaço total da praça, sendo elevados em
cerca de 15 cm do nível do passeio. Logo, a sua função puramente ecológica de evitar o
pisoteio sobre a vegetação pode ter sido intencional, porém a grande parcela do território
que ocupam estas áreas verdes acabam por reduzir as escolhas de atividades do usuário,
visto que muito do território restante constitui-se de espaço de passeio, sendo poucas áreas
abertas e sem obstáculos, como pode ser visto na figura 14. Porém, uma solução que
combina o elemento natural elevado e o ato de cercar o espaço público pode ser a cerca
viva, que na altura correta passa a fazer parte da paisagem, e ainda que componha uma
barreira física, pode permitir a permeabilidade visual, como pode ser visto na figura 15.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 45
Figura 14 – Planta zoneada das diferentes áreas da Praça André de Albuquerque
Fonte: Elaboração própria, 2014
Figura 15 – Recomendações de Neufert e Ludwig para alturas de cercas vivas
Fonte: Neufert e Ludwig, 1999
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 46
Um elemento que também pode influenciar bastante na permeabilidade visual é a
existência de edificações - ou elementos construídos de modo geral - que representem
obstáculos à visualização da área total do espaço público. Este foi um aprendizado advindo
dos estudos de referência realizados. Em ambos os parques, foi privilegiada uma
continuidade visual sem barre iras entre os extremos das áreas, seja a forma do espaço
público linear (parque Superkilen) ou retangular (Discovery Green). Em ambos os espaços,
as edificações ou elementos escultóricos tiram partido da horizontalidade e dos baixos
gabaritos, o que também contribui para que não se formem obstáculos à livre visualização
do território.
Vale salientar também a iluminação bem distribuída pela extensão dos parques
como um elemento que irá incentivar o uso daquele local para atividades no período da
noite – os estudos de referência demonstram eficácia na distribuição da iluminação pública,
como pode ser visto nas figuras 8 e 16. Este também foi um fator decisivo quando a
população usuária da Praça André de Albuquerque visitava o local: as zonas menos
utilizadas nesse turno foram aquelas cujos postes de iluminação pública estavam sem
funcionamento (Lucena e Medeiros, 2014). Sobre isto, MASCARÓ adiciona que,
a iluminação pública artificial tem uma importância fundamental para os espaços públicos. Sua inexistência ou insuficiência limita o uso desses espaços, dificultando a orientação e produzindo insegurança nas pessoas durante a noite (2005, p.196).
Figura 16 – Vista do parque Superkilen no período da noite com iluminação bem distribuída
Fonte: acervo pessoal de Maria Heloísa Alves, 2014
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 47
O tipo de pavimentação utilizada no espaço público também pode vir a interferir no
caráter multifuncional daquele espaço, visto que o MPIP (2002) coloca que um importante
critério de escolha do tipo de piso é “o uso ao qual se destinará cada uma das áreas
delimitadas pelo projeto [...] Assim, pisos excessivamente lisos, por exemplo, não se
adéquam a espaços destinados ao caminhar” (MPIP, 2002, p.48). O próprio manual coloca o
piso em pedra como um dos mais versáteis no sentido de poder ser aplicado em várias
áreas, como as de circulação intensa, ambientes de estar, ambientes onde se queira dar um
destaque decorativo, em pátios de eventos e em áreas que precisem de impermeabilização.
Apesar disto, destaca que não deva ser utilizado este tipo de piso em áreas de esportes, ou
em pistas de Cooper, ou ainda onde trafegam pessoas com mobilidade reduzida. Também o
piso em terra batida se destaca neste manual, não possuindo muitas restrições de
aplicação, exceto em calçadas ou em áreas que sofrem erosão e com baixa absorção de
água. Já Mascaró (2005), ao comentar sobre pavimentação de vias para pedestres, coloca o
pavimento de pedrisco como uma alternativa econômica, e este pode ser misturado com
cimento ou asfalto líquido para um melhor desempenho físico-mecânico, e a esta alternativa
podem ser adicionadas cores, conseguindo efeitos visuais variados. Quanto a este tipo de
revestimento, afirma que “pistas para atletismo ao ar livre geralmente são pavimentadas
com pedrisco, porque necessitam de certa flexibilidade [...] seu único inconveniente é
necessitar de manutenção permanente” (MASCARÓ, 2005, p.133). O autor também cita os
blocos articulados de concreto, enfatizando a sua boa aparência e resistência elevada,
existindo a possibilidade destes serem furados, com preenchimento em vegetação, evitando
a total impermeabilização do solo. Cabe salientar que no parque Superkilen, foram utilizadas
superfícies lisas, onde o efeito estético e de diferenciação de espaços fica a cargo das
pinturas, criando efeitos de cor e curvilíneos. Já no Discovery Green, uma grande parte do
território é coberta simplesmente por grama, pois faz parte do partido do local que o verde
componha o plano de fundo.
Foram apresentados os revestimentos fixos, permanentes temporalmente. Dado o
caráter multifuncional desta proposta, necessita-se conhecer também os revestimentos
modulares montáveis, como pisos plásticos ou decks de madeira modulares. Um destes é o
FlexDeck, piso desmontável com suporte de base plástica de alta resistência e madeira de
lei por cima, pronto para ser assentado em um contrapiso nivelado e drenado. O sistema
possui vários modelos, e conta com um sistema de encaixe que dispensa mão de obra
especializada para a instalação, sendo propício ao assentamento pela própria população. Já
o piso plástico modular pode ser aplicado como pallet, estrado ou piso, estando mais
protegido das intempéries do que o deck devido às propriedades dos materiais, permitir uma
maior gama de cores, além de ser guardado com mais facilidade por sua característica
flexível e dobrável, como pode ser visto na figura 17.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 48
Figura 17 – Pisos desmontáveis em madeira e plástico, respectivamente
Fonte: http://www.cobrire.com.br/deck-modular-de-madeira-mini-deck.htm
http://www.caixasplasticascuritiba.com.br/produto.php?cod_produto=2053243
Quanto ao mobiliário urbano, sabe-se que este pode ser feito em materiais como o
ferro, concreto, madeira, pedra natural, resina estruturada, entre outros, cada um com suas
recomendações e limitações. Porém, quando o enfoque se torna a multifuncionalidade, os
mobiliários contemporâneos tentam mixar funções, servindo a mais de um propósito com um
só elemento físico. O mobiliário urbano modular Enzo (figura 18), da MN*LS Creative
Consultancy é um exemplo desta situação: com uma geometria diferenciada, o Enzo é uma
evolução do Enzi, modelo anterior, melhorado quanto à resistência a danos e ao fogo, e
pode ser encontrado em vários modelos, cores e tamanhos. Trata-se de uma peça modular
que pode ser utilizada sozinha ou em conjunto, cuja menor peça pesa apenas 7kg,
apresentando facilidade de transporte.
Figura 18 – Enzo, mobiliário urbano criado para ser multifuncional e móvel
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 49
Fonte: http://www.enzis.at/portfolio/enzi/
Figura 19 – Strip Ease e Sinus, mobiliários urbanos de uso flexível
Fonte: http://www.designspotter.com/product/2010/07/Strip-Ease.html
http://dailydesignjoint.com/'Sinus'_urban_modular_element/11130
Além do Enzo, têm-se também o Strip Ease, e o Sinus, apresentado na figura 19.
Ambos são elementos metálicos com múltiplas funções, desempenhando o papel de banco,
de bicicletário, e que ainda permite a permeabilidade para o solo onde há vegetação. No
caso do Sinus, este tem uma característica de mudança conforma a estação: durante o
inverno, os pequenos furos em sua estrutura são cobertos por peças de silicone. Isto é feito
porque o metal tem a característica de incorporar a temperatura do entorno, e um banco
muito frio (ou muito quente) se torna desconfortável para seus usuários. Esta ação faz com
que o banco se adapte minimamente ao clima local.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 50
Por fim, como uma forma de concentrar os aprendizados obtidos a partir dos
estudos de referência, é apresentado um quadro resumo com as principais características
dos espaços estudados.
Tabela 2 – Quadro resumo dos estudos de referência
QUADRO RESUMO
ASPECTOS
OBSERVADOS
ESTUDOS DE REFERÊNCIA
DISCOVERY GREEN SUPERKILEN
LOCALIZAÇÃO Texas, Estados Unidos Copenhagen, Dinamarca
CONDIÇÕES
CLIMÁTICAS
Temperaturas entre 7ºC e 35ºC, com
estações bem definidas e precipitação o
ano inteiro.
Clima “temperado marítimo” com
temperaturas de 2ºC a 20ºC, com
incidência
ÁREA 47.700 m² 30.000 m²
OBJETIVO
Revitalizar o centro da cidade e utilizar
uma grande gleba ociosa em forma de
uma parceria público/privado, atraindo
novos investimentos.
Busca pelo destaque do distrito,
área de imigrantes com desafios
sociais. O objetivo foi de refletir a
diversidade da população do local.
AÇÕES EM
PARALELO
Resgate da conexão do centro da
cidade com as demais áreas através da
implantação de linhas de VLT em dois
eixos criados.
Reorganização das ciclovias e
criação de conexão entre as
vizinhanças através de uma nova
linha de ônibus
PARTIDO
PAISAGÍSTICO
Interseção entre os dois passeios
principais, sem concentração de corpo
edificado, gerando um equilíbrio entre o
natural e o construído. O plano de solo
é em sua maioria composto pela
vegetação.
Junção das artes, do urbanismo e do
paisagismo. Predomina a
horizontalidade , onde a cor e as
formas têm papel essencial. O verde
se insere em cortes no pavimento, ao
invés de plano de piso contínuo
PARTIDO
ARQUITETÔNICO
Edificações horizontais com estrutura
metálica e fechamento em vidro
Não houve a inserção de novas
edificações
USOS
Esportes, usos itinerantes (shows,
feiras), comercialização de alimentos,
educação ambiental, lazer
contemplativo e de permanência.
Atividades físicas e esportes, lazer
contemplativo e de permanência,
eventos culturais itinerantes.
OBSERVAÇÕES
GERAIS
Permeabilidade entre os espaços,
iluminação pública, baixa
impermeabilização do solo, densa
arborização, áreas polivalentes,
referência a símbolos locais.
Diversidade e uso de cores e
formas, alta impermeabilização do
solo, áreas polivalentes,
modificações na topografia,
mobiliário diferenciado.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 51
4 OBSERVANDO A REALIDADE LOCAL
4.1 O BAIRRO DE PONTA NEGRA
A área-de-estudo se localiza no bairro de Ponta Negra, região administrativa Sul de
Natal. O bairro limita-se a norte com o bairro de Capim Macio e Parque das Dunas, a Sul
com o município de Parnamirim, a Leste com o Oceano Atlântico, e a Oeste com o bairro de
Neópolis, possuindo ainda duas Zonas de Proteção Ambiental dentro de seu território (figura
20).
Figura 20 – Localização do bairro de Ponta Negra no município de Natal
Fonte: Elaboração própria, 2015
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 52
O bairro de Ponta Negra se apresenta atualmente como um atrativo turístico na
cidade, visto que a praia de mesmo nome é conhecida internacionalmente. Porém, este
bairro é complexo e diverso em sua constituição, pois abriga desde indivíduos com alto
poder aquisitivo, até famílias carentes vivendo em habitações como as favelas, além de
apresentar um traçado urbano diferenciado para cada área do bairro, consequência de uma
urbanização temporalmente fragmentada - como será apresentado na seção a seguir.
4.1.1 Histórico da área
Não se pode afirmar ao certo como se deu o início da ocupação do bairro de Ponta
Negra, embora seja certo que o núcleo dessa ocupação é a própria Vila de Ponta Negra, e
que é muito provável que quem tenha iniciado a ocupação dessa área tenham sido os
holandeses no século XVII. Ângelo Silva (2013) coloca três possibilidades, apesar de
apontar uma delas como a que tem mais aporte de evidências: a presença holandesa com o
intuito de ocupação e desenvolvimento da área; uma invasão militar dos holandeses
somente como uma tentativa de ataque à cidade (o autor aponta para a tese de Lois Martin
Garda como a autora deste discurso); ou o surgimento da Vila de Ponta Negra juntamente
com o nascimento da cidade de Natal, sem maiores explicações sobre o modo de ocupação,
hipótese esta colocada pela Tribuna do Norte após entrevista com os moradores mais
antigos. Esta primeira possibilidade é a mais aceita pelo autor pela quantidade de
evidências que reforçam a mesma, que não deixa de concordar com o fato de a vila ter sido
um dos primeiros núcleos habitacionais da cidade de Natal. Esta hipótese é corroborada
pelo antigo Instituto de Planejamento de Natal, e pelos documentos atuais da Prefeitura do
Natal, que coloca que “uma das primeiras referências históricas a Ponta Negra é a descrição
da ocupação holandesa, em 1633, na Cartografia do Rio Grande do Norte”. Em citação em
uma edição de 29 de agosto de 1999 da Tribuna do Norte (apud SILVA, 2013) também se
tem que “os holandeses também desembarcaram-na praia [...] Eles fizeram algumas
edificações em Ponta Negra, como o Preventório [...] Esse preventório viria a servir como
base durante a Primeira Guerra Mundial”.
Até a década de 1940, quando a ocupação da área realmente começou a tomar
forma, não há muitos indícios de adensamento na área (ver mapas de evolução da
ocupação territorial em Ponta Negra, figura 21).
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 53
Figura 21 – Mapas figura-fundo do crescimento do bairro de Ponta Negra
1920
1945
1978
1984
2006
2014
Fonte: Negreiros et al., 2014 com base em mapeamento do INPE
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 54
Há, porém, indicativos da construção de um fortim e de uma capela por volta de
1823, cuja intenção era a de impedir ataques inimigos. Outra importante mudança ocorreu
em 1923, quando houve a construção de uma estrada que ligava Ponta Negra a outras
áreas da cidade. Até o momento, essa população de aproximadamente 500 habitantes
originalmente vindos de outras cidades do Rio Grande do Norte (São José de Mipibu e Nísia
Floresta) sobrevivia da pesca, da renda e da agricultura de subsistência, levando a pé a sua
produção para ser vendida em Natal. Com a chegada da estrada, criou-se uma conexão
com o resto da cidade, e segundo Bruna Negreiros et al (2014), a criação da estrada (que
atualmente é conhecida como Rua Vereador Manoel Coringa de Lemos) “acelerou a
concentração dos imóveis ao redor da mesma”.
De acordo com documentos da Prefeitura de Natal, na década de 1940, “com a
influência norte-americana de banhos de mar, foram iniciadas construções de casas de
veraneio”, levando as famílias mais abastadas a verem a região de orla de Ponta Negra
como um local de lazer e entretenimento (figuras 22 e 23).
[...] a partir da construção das casas de veraneio, a Vila de Ponta Negra passou de espaço homogêneo a um local com características difusas, manifestas nas formas arquitetônicas, funções e distribuição de suas habitações, como também nas atividades de trabalho desencaixadas parcialmente da pesca, agricultura e pecuária” (SILVA, 2013, p.86).
Figura 22 - Orla da Praia de Ponta Negra na década de 1930
Fonte: UFRN, 2011
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 55
Figura 23 - Início da ocupação da orla por grandes casas de veraneio
Fonte: http://tinyurl.com/qe3w6vu
Silva (2013) coloca que em meados da década de 50, iniciam-se os conflitos por
causa do território que vinha sendo gradativamente ocupado. A falta de títulos de posse por
parte dos moradores da Vila põe em risco a estadia dos nativos, visto que uma influente
família envolvida com política se coloca como dona de grande parte do território da Vila de
Ponta Negra. Desta maneira, dois terços do território da Vila foram doados à Aeronáutica
para a construção da Barreira do Inferno. Isto afetou diretamente os – aproximadamente -
2000 moradores do local, que tinham como uma de suas atividades principais a agricultura,
e perderam as suas terras. Segundo Machado (1989) apud Silva (2006, p. 115):
Os moradores da Vila, dada a dificuldade de permaneceram auto-
suficientes, começaram a construir a construir barracas na orla marítima para vender peixes, caldos de peixes, água de coco, cervejas e comidas típicas. As mulheres, aproveitando o movimento das barracas, principalmente no período de férias, passavam a vender os seus trabalhos de rendas: toalhas de mesa, redes, guardanapos entre outros.
Já as décadas de 1970 e 1980 foram marcadas pela inserção de novos conjuntos
habitacionais – o Conjunto Ponta Negra em 1978; o Conjunto Alagamar, em 1979; o Natal
Sul em 1981; e o Serrambi em 1989 – de forma paralela ao crescimento da atividade
turística, como pode ser visto na figura 24. A nova forma de ocupação e o traçado regular
dos conjuntos inseridos vieram a fragmentar ainda mais o espaço do bairro de Ponta Negra,
dividindo-o e zoneando-o, como corroborado pelo discurso de Negreiros et al (2014, p.16),
quando afirmam que “com um traçado ortogonal e regular, os conjuntos habitacionais
simbolizavam a ascensão de Ponta Negra como um bairro privilegiado [...] contrastando
completamente com a tipologia da Vila”. Logo depois, Silva aponta as mudanças ocorridas
após a década de 1980.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 56
Após essa década, as características povoação, moradia, atividade pesqueira, e elaboração de renda (atividade artesanal das bordadeiras e rendeiras do local) foram sendo modificadas. Os atributos urbanos surgidos traduziram-se em um sistema de objetos imobiliários interligados funcionalmente, que contribuíram na redefinição das condições sociais distintas e percebidas, também, nas novas condições de trabalho e moradia local. (SILVA, 1980, p.78)
Figura 24 - Imagem aérea do Conjunto Ponta Negra na década de 1970
Fonte: http://tokdehistoria.wordpress.com
A permanência do bairro como ponto turístico, a construção da Via Costeira e o
adensamento na área levaram a mais mudanças, desta vez no caráter de uso do solo, que
passou a conter mais comércios e serviços (principalmente de hospedagem para atender ao
novo público que vinha de outras localidades). Isto passou a demandar uma maior atenção
à urbanização da área – pavimentação das ruas, sistema de energia elétrica, construção do
calçadão, entre outros. Negreiros et al (2014) afirma que a região possui atualmente cerca
de 10000 habitantes, apresentando uma taxa de crescimento elevado em relação a 1980,
quando tinha cerca de 2000 moradores. Os autores colocam que os conflitos pela terra
permanecem, e que o desenvolvimento urbanístico realizado – no qual em laudo pericial, a
Universidade Federal do Rio Grande do Norte e o próprio Silva atribuem à falta de legislação
- ameaça a tradição de uso e ocupação originais, enfatizando o embargo de várias obras
que tentam se estabelecer ali. É por esta falta de critérios legislativos que se luta atualmente
para a regulamentação da Área Especial de Interesse Social da Vila de Ponta Negra, em
busca do privilégio à coletividade, ao invés de beneficiar poucos que detém grandes glebas
à procura do lucro.
O resultado é então, como pode ser visto no laudo pericial da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte acerca da Zona de Proteção Ambiental 6: um bairro formado por
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 57
diferentes tipologias de tecido urbano, no qual a equipe representou em quatro setores
(figura 25). Um é definido pela própria vila, com uma configuração espacial orgânica,
consolidado a partir da década de 1940 e composto pelos pescadores, comerciantes,
trabalhadores informais. O segundo é resultado de um projeto de parcelamento do solo de
1960, feito primeiramente para ser residencial (casas de veraneio) e composto por classes
de média e alta renda, mas que com a evolução do turismo na área, muda seu caráter para
uso de serviço (majoritariamente de hospedagem). O terceiro setor é definido por uma
configuração ‘de natureza racional-funcionalista’ composta pelos conjuntos residenciais das
décadas de 1970 e 1980. Já o quarto setor apresentado se impulsionou a partir do ano 2000
e é marcado pela verticalização, estando distribuído em diferentes frações do bairro.
Figura 25 - Setores das tipologias de ocupação urbana no bairro de Ponta Negra
Fonte: UFRN, 2011
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 58
De acordo com Catarina Neverovsky (2005), no final da década de 1990 é definida
a Política Nacional de Turismo, através do Programa de Desenvolvimento do Nordeste. Este
programa visava a melhoria da infraestrutura em regiões com potencial turístico, e incluiu a
reforma e acessibilidade ao Aeroporto Augusto Severo e a construção de novos eixos
viários como, por exemplo, a Rota do Sol. No bairro de Ponta Negra em si, englobou obras
de pavimentação, saneamento, iluminação e construção do calçadão, obras finalizadas em
2000. Isto resultou no que a autora nomeia de “refuncionalização”, pois o caráter de uso da
área passou a ser de casas de veraneio para o desenvolvimento de edificações de uso
comercial, de serviço, e de notada vida noturna, como restaurantes e bares. Isto significou
também que esses investimentos “acabaram por intensificar uma corrente migratória, de
pequenos e médios empreendedores, e posteriormente de empreendedores internacionais
como redes hoteleiras, locadoras de carro, e outros” (NEVEROVSKY, 2005, p.29). Deste
modo, passam a vigorar “a intensa valorização do solo, a especulação imobiliária e os
investimentos estrangeiros”, segundo Camila Furukava (2009), que aponta a consequente
elevação do custo do metro quadrado na área, que em 2003 variava entre 800 e 1000 reais
“enquanto outras áreas estratégicas ao mercado imobiliário, como Petrópolis e Tirol,
apresentavam uma faixa de preço em torno de R$ 300,00 e R$ 500,00. De acordo
com a SINDUSCON, esse valor chegou, em 2006, à R$ 6.000,00” (FURUKAVA, 2009,
p.34). Outra consequência vista é a transformação da paisagem devido ao intenso processo
de verticalização e de ameaça de degradação de áreas ambientalmente frágeis, como o
cordão dunar e a orla marítima.
4.1.2 Dados gerais sobre o bairro de Ponta Negra
De acordo com o Anuário 2014 da Prefeitura do Natal, o bairro de Ponta Negra
possui uma área de 1382 hectares - sendo um dos maiores da cidade em extensão territorial
- onde residem aproximadamente 25 mil pessoas (com base no censo de 2010) resultando
em uma densidade habitacional de 18,12 habitantes/ha. Como visto pelo histórico descrito
na seção anterior, o bairro é feito de diferentes territórios que se estabeleceram em
diferentes momentos, vindo a se tornar unidade legislativa através da Lei nº 4.328, de 1993.
O bairro é composto, portanto, pela Vila de Ponta Negra, cerne de sua ocupação, além dos
conjuntos habitacionais Ponta Negra, Alagamar, entre outros. Ainda no Anuário 2014 da
cidade de Natal, consta que o bairro possui ao todo 35 loteamentos, dos quais 19 não estão
registrados em cartório, além de aglomerados subnormais, como a favela da Lagoinha, e a
do Pião.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 59
De acordo com dados de 2010 presentes no anuário 2013, 53,07% da população
residente no bairro é do sexo feminino, enquanto os homens representam 46.93% do total.
Na época, a faixa etária mais expressiva era dos 20 aos 39 anos, contemplando
aproximadamente 30% do total. Neste mesmo documento, é possível notar que o bairro é o
segundo colocado no que diz respeito à quantidade de imigrantes morando no local, a
maioria advindo da Europa e da América do Norte. Sabe-se que, de acordo com o Censo
Demográfico de 2000, aproximadamente 22% da população possuía um rendimento mensal
de 1 a 3 salários mínimos, embora as demais classes de rendimento possuam igualitária
distribuição, como pode ser visto na figura 26.
Figura 26 – Moradores por classe de rendimento
Fonte: Prefeitura de Natal
Apesar da atividade turística em Natal ter como polo concentrador a Praia de Ponta
Negra e o seu entorno, transformando o bairro, os dados com relação à infraestrutura básica
sugerem um descaso que gera negativas consequências ambientais: a rede de
esgotamento sanitário é insuficiente e incompleta para suportar a produção atual, pois
apenas 35% do bairro é saneado, fazendo com que muitos destes dejetos sejam lançados
diretamente no frágil ecossistema marinho. De acordo com dados da Prefeitura de Natal,
pôde-se notar que a produção de esgoto do bairro de Ponta Negra tem quantitativo similar à
de bairros como Nossa Senhora da Apresentação, na Zona Administrativa Norte, embora
sua população represente aproximadamente ¼ da população do bairro citado. A partir de
2006, foi notada e declarada a incapacidade da rede de esgotamento de suportar o
adensamento populacional (fixo ou rotatório, a exemplo dos turistas) da área, fazendo com
que se pensasse em estratégias para conter este adensamento, a exemplo do indeferimento
de licenças para novos empreendimentos.
Não só na produção de esgoto, mas na produção de lixo domiciliar, e no consumo
de água e energia o bairro se destaca pelos altos valores. A taxa de produção de lixo em
kg/habitante por dia chega a 35,82, dos quais estima-se que 97% é coletado pelo serviço
público de limpeza, enquanto aproximadamente 2% é jogado em terreno baldio ou
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 60
logradouro. O bairro também lidera o consumo de água da cidade juntamente com o bairro
de Tirol, tendo a sua maior parte destinada ao uso residencial. Já o consumo de energia
elétrica denota uma divisão mais visível entre os usos residencial e comercial,
inegavelmente presente na área desde o seu desenvolvimento enquanto área turística.
O mapa presente no anuário 2013 mostra uma ampla cobertura vegetal no bairro
de Ponta Negra (mais de 55% de seu território), como pode ser visto na figura 27.
Figura 27 – Cobertura vegetal no bairro de Ponta Negra
Fonte: SEMURB, 2012
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 61
Por outro lado, na pesquisa citada neste trabalho, em que há o mapeamento e
diagnóstico da situação dos espaços livres de Natal, apenas os espaços demarcados na
figura 28 são utilizados de forma pública para o lazer e outras funções. Nota-se que, dos
poucos existentes, a maioria se localiza na porção territorial referente ao conjunto Ponta
Negra. Nas proximidades do Morro do Careca e da Vila de Ponta Negra, passa a vigorar a
falta de espaços públicos de lazer.
Figura 28 – Espaços públicos de lazer no bairro de Ponta Negra
Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 62
De acordo com o Plano Diretor, o bairro como um todo é definido como Zona de
Adensamento Básico e Área de Operação Urbana. Especificamente, as seguintes zonas se
aplicam, todas com prescrições urbanísticas específicas, de acordo com a figura 29: Zona
de Proteção Ambiental, Zona Especial de Interesse Turístico e Área Especial de Interesse
Social. Porém, a área de estudo não é englobada por nenhuma das zonas citadas.
Figura 29 – Legislação incidente sobre o bairro de Ponta Negra
Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007
4.2 SOBRE A ÁREA-DE-ESTUDO
Como já citado, a área-de-estudo proposta em consonância com o discurso de
Rodrigues (1986) abarca um raio de 500 metros a partir dos lotes em que é proposta a
intervenção urbanística. A localização destes no bairro de Ponta Negra pode ser vista na
figura 30.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 63
Figura 30 – Localização da área de estudo no bairro de Ponta Negra
Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007
De acordo com Juan Luis Mascaró (2005), “o traçado urbano começa pela definição
de avenidas, ruas e caminhos para pedestres, necessários para tornar acessíveis as
diferentes partes do espaço a serem organizadas”. O traçado viário irá, portanto, definir a
forma das quadras, o tipo de tecido urbano gerado. Sabendo que se trata de um bairro cujo
tecido urbano foi estabelecido de forma fragmentada pelo tempo, é possível observar
trechos com quadras regulares cujo traçado tende a ortogonalidade, mas também quadras
de formas assimétricas, definidas por ruas tortuosas e sem continuidade.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 64
Dentro da delimitação territorial doravante denominada área de estudo estão
presentes os seguintes equipamentos urbanos (figura 31): um cemitério, uma delegacia,
uma escola, um posto de saúde, e duas praças. Dado que o posto de saúde é único para
toda a comunidade, sua localização é conhecida pela maioria dos moradores, e o mesmo
ocorre para o cemitério, ponto de referência para a comunidade. Além disso, também se
localiza no universo de estudo terri torial a Praça do Cruzeiro, que congrega várias funções
urbanas, desde âmbito de transporte até ponto de referência para orientação. Outros
equipamentos urbanos no entorno da área-de-estudo são escolas e equipamentos
desportivos como quadras poliesportivas e campos.
Quanto à disponibilidade de serviço de transporte público, apenas 5 linhas – de um
total de aproximadamente 84 linhas na cidade – passam pelo local, sendo estas as
seguintes: 26, 46, 54, 56 e 66. O verbo passar é utilizado ao invés de percorrer, pois o
itinerário destes ônibus consiste em margear o amplo território pela via principal (todos se
utilizam da Rua Vereador Manoel Sátiro, que posteriormente se torna Rua Vereador Coringa
de Lemos), sendo apenas uma linha (56) responsável por adentrar a Vila de Ponta Negra
com maior amplitude, como pode ser visto na figura 31. Nesta, pode ser observada a
sobreposição de trajetos que as linhas fazem, motivo pelo qual não pode ser visto a
trajetória da linha 66. Também podem ser vistas na mesma figura as paradas de ônibus, que
da mesma maneira se localizam às margens da definida área.
A legislação apresentada na seção anterior se aplica na área da seguinte maneira:
Todo o bairro de Ponta Negra é considerado Zona de Adensamento Básico, definida
pela Lei Complementar nº 082/2007 (Plano Diretor de Natal) como “aquela onde se
aplica, estritamente, o coeficiente de aproveitamento básico” (Art.9º), sendo este de
1,2.
Todo o território do bairro também é definido como Área de Operação Urbana, que “é
aquela que, embora passível de adensamento, apresenta valores histórico-culturais
significativos para o patrimônio da cidade e que carecem de formas de recuperação
e revitalização”, de acordo com o artigo 24º do Capítulo III da mesma Lei.
Adiciona-se ainda a isto a própria definição do Plano Diretor sobre a Operação
Urbana, que coloca, através do inciso 2º do mesmo artigo que “entende-se por operação
urbana o conjunto integrado de intervenções e medidas a ser coordenado pelo Poder
público através de plano específico, com a participação da iniciativa privada e comunidade
local”.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 65
Figura 31 – Equipamentos urbanos na área de estudo e adjacência
Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007
Quanto ao uso do solo na área de estudo (figura 32), percebe-se a predominância
de edificações destinadas à oferta de serviços nas proximidades da orla marítima, e da
principal via de circulação que interliga as diversas partes do bairro, efeito que se reflete e
adentra a porção terrestre por mais duas ou três quadras. Isto se dá devido ao caráter
turístico já explanado. De maneira geral, o uso do solo hegemônico é o residencial, presente
por toda a área, com pontuais comerciais. Há ainda o uso institucional, representado pela
delegacia, escola, posto de saúde e igreja, e algumas edificações de uso misto. Nas
proximidades da área projeto, muitas das edificações de caráter de serviço são do setor de
hospedagem, representados por pousadas de médio porte.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 66
Figura 32 – Mapa de uso do solo na área de estudo
Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007
Quanto à altura das edificações expressa em pavimentos (figura 33), doravante
denominada de gabarito, nota-se ainda uma predominância de edificações de um só
pavimento, com situação semelhante ao uso do solo: nas proximidades da orla marítima e
na extremidade Sul da área de estudo, são vistos mais prédios (acima de 3 pavimentos) e
edificações de dois a três pavimentos. Pode-se notar que na adjacência das áreas de
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 67
intervenção a maioria das edificações é de um pavimento, sugerindo uma certa
permeabilidade visual.
Figura 33 – Mapa de gabarito na área de estudo
Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 68
4.3 ÁREA-PROJETO E CARACTERÍSTICAS
Esta seção trata sobre a área de projeto propriamente dita, considerando o leiaute
atual dos terrenos e sua posição geográfica, observando fatores do conforto ambiental,
como insolação e ventilação naturais. Procurou-se ver também as maneiras de chegada ao
local, atentando para as visuais que os terrenos oferecem, além da permeabilidade destes
percursos e quão convidativo este caminho se faz. Além disso, contém considerações sobre
A última parte desta seção apresenta os vestígios comportamentais observados no local
através de registros fotográficos, em uma tentativa de compreender como a população se
apropria atualmente da área não estruturada, de forma a refletir suas necessidades no
projeto proposto.
4.3.1 Leiaute atual e posição geográfica
Os quatro terrenos que compõe a área-projeto são adjacentes entre si, em posição
diagonal. O de número 1 no diagrama da figura 34 é de posse da Prefeitura de Natal,
utilizado como Lagoa de Captação de águas pluviais, além de uma pequena porção do seu
território ser de responsabilidade da Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do
Norte (CAERN), compondo-se de uma Estação Elevatória de Esgotos. O terreno de número
2 é de posse da CAERN, onde encontra-se um poço. Um terreno privativo é representado
pelo número 3 no diagrama, e uma área verde pública não-acondicionada (de uso público) é
representada pelo número 4. Todos, com exceção do número 4, são protegidos por muro ou
cerca. Apesar da proximidade, o traçado da área não garante uma conectividade direta
entre eles. A área verde não acondicionada possui 2.627 m², o terreno privativo tem 365 m²,
enquanto os terrenos da CAERN e da Prefeitura juntos somam 4.740 m² de área total,
considerando o território necessário para que os seus serviços sejam realizados, locais onde
haverá intervenção mínima pela proposta, totalizando aproximadamente 7.732 m².
Nota-se a presença de vegetação preexistente nas áreas, assim como edificações
que ocupam um território mínimo em um dos terrenos, e se destinam ao uso da CAERN. Em
três dos lotes (2, 3 e 4), a calçada é inexistente, embora haja um espaço reservado para o
seu feitio, limitado pelo meio-fio que a diferencia do espaço de circulação de veículos.
Apesar deste espaço ser destinado ao feitio do passeio público, muitos equipamentos
urbanos foram locados ali, a exemplo de bocas-de-lobo (destinados à drenagem urbana),
além de postes de iluminação e parte da própria vegetação, e compõem obstáculos à livre
circulação do pedestre, impedindo a função principal do passeio público, como pode ser
visto nas figuras 39 e 40.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 69
Figura 34 – Mapa de situação e locação das áreas de intervenção
Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007
Figura 35 – Equipamentos de drenagem urbana, de iluminação pública e vegetação como empecilhos
à livre circulação do pedestre
Fonte: acervo da autora, 2015
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 70
A mesma situação ocorre ao redor do lote 1, que apesar de apresentar uma certa
estruturação da calçada (pavimentada em paralelepípedos), possui em toda a sua extensão
barreiras à livre circulação do pedestre, como as lixeiras públicas, a vegetação e os postes.
Figura 36 – Equipamentos urbanos e vegetação como obstáculos para o pedestre no entorno da lagoa de captação e EEE da CAERN
4.3.2 Percursos e visuais
Dada a grande quantidade de espaços livres na área de estudo, percebe-se que
uma dificuldade encontrada nos percursos que levam à área de projeto é a falta de
estruturação das calçadas, que de maneira geral são deixadas a cargo do proprietário do
terreno. Logo, se não há ocupação, não há estruturação nestes locais. Outra consequência
é a falta de padronização para a construção destas, tanto em termos funcionais (diferentes
níveis de altura, causando desconforto físico para o usuário; largura variável e muitas vezes
insuficiente; mobiliário urbano predominando sobre o espaço do pedestre), quanto em
termos estéticos (sombreamento, embelezamento), o que poderia tornar o passeio
convidativo, incentivando o deslocamento não motorizado. A apropriação do espaço do
passeio público para a deposição de materiais também se torna um problema à medida que
força o pedestre a transitar pela rua, definido como o espaço do veículo motorizado.
Exemplos destas ocorrências podem ser vistos na figura 34 e se distribuem pelos diferentes
caminhos que podem ser percorridos para se chegar à área de estudo.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 71
Figura 37 – Registro fotográfico das calçadas da Rua Manoel Rodrigues e Rua do Golfinho,
respectivamente
Fonte: Google Street View, 2014 e acervo da autora, 2015
A sequência de imagens na figura 35 apresenta algumas visuais do espaço público
localizado na esquina da Rua Pedro Golfinho com a Rua Augusto Severo, visto a partir de
diversos ângulos. Trata-se de um espaço livre de edificações bem vegetado, sem muro ou
cerca que consistam em empecilhos à entrada do público.
Figura 38 – Visuais do espaço livre sem muros ou cerca
Fonte: acervo da autora, 2015
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 72
Fonte: acervo da autora, 2015
Já os lotes pertencentes à CAERN podem ser vistos nas figuras 36 e 37. Esta
primeira demonstra o interior do lote murado mais próximo do espaço livre acima. O acesso
visual a este pode ser feito pela Rua da Tilápia, através de um portão gradeado. Nota-se
novamente uma área arborizada, embora não densamente, no qual parte do território é
utilizado para que a companhia de águas e esgoto realize seus serviços para com a
sociedade. Já a figura 37 demonstra a visão da lagoa de captação e estação elevatória de
esgotos também de posse da CAERN, um grande território cercado com pequena porção
deste ocupada por edificações, como será visto na próxima parte desta seção.
Figura 39 – Visual interna do espaço livre murado
Fonte: acervo da autora, 2015
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 73
Figura 40 – Lagoa de captação e estação elevatória de esgotos da CAERN
Fonte: acervo da autora, 2015
4.3.3 Apropriações sob o ponto de vista dos vestígios comportamentais
Como já citado, as formas de observar os vestígios comportamentais humanos se
englobam em duas categorias: a deposição (quando algo é colocado) ou a erosão (quando
algo é retirado, como por exemplo, quando um novo caminho é criado devido ao tráfego). A
figura 41 demonstra a espacialização dos vestígios encontrados.
Figura 41 - Mapeamento dos vestígios comportamentais observados no lote 4
Fonte: elaboração própria, 2015
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 74
O mais evidente foi a trilha criada em meio à vegetação (figura 42), que foi visto
sendo utilizado em diferentes momentos durante as visitas in loco. Observou-se também a
deposição de lixo nas bordas do terreno que possuem passeio não estruturado paralelo à
estas.
Figura 42 – Criação de trilha por erosão na vegetação
Fonte: acervo da autora, 2015
Além disso, de outras maneiras é observada a deposição, através da colocação de
entulhos, ou pela colocação de uma placa – que pode ser vista na figura 43 – no qual este
útlimo sugere certo cuidado com o ambiente em questão. Ademais, o comportamento de
utilizar a área para descansar foi visto em uma ocasião de visita, embora a área não
disponha de bancos ou assentos de qualquer tipo.
Figura 43 – Deposição através da colocação de uma placa indicativa de comportamento
Fonte: acervo da autora, 2015
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 75
5 CONVERSANDO COM A COMUNIDADE
A primeira visita à Vila de Ponta Negra sob o escopo deste trabalho aconteceu no
dia 25 de fevereiro de 2015, no turno vespertino, e tratou-se de uma conversa informal com
Cíntia Fernanda de Lima e Maria das Neves Valentim, duas cidadãs de intensa atividade
social na comunidade. Esta primeira é Presidente do Conselho Comunitário, além de ser
também agente de saúde (o que implica em um maior conhecimento do território e da
comunidade), e ambas residem na Vila de Ponta Negra. Nesta conversa, foi explicado que a
vila tem um histórico, através do Gabinete de Gestão Integrada, de busca pela segurança
através de intervenções urbanas, sob uma perspectiva de prevenção. As próprias cidadãs
reconhecem a carência de espaços públicos para o usufruto da população da Vila de Ponta
Negra, que apesar da existência de diversos espaços livres, estes são de propriedade
privada ou encontram-se sem estruturação suficiente para que possam servir como espaço
de lazer (ver figura 28). Ao tomarem conhecimento das intenções deste trabalho final de
graduação, colocaram os seguintes pontos como necessidades do local:
espaços para que os grupos folclóricos locais – como, por exemplo, os Congos de
Calçola - possam ensaiar, guardar seus materiais, ter reuniões;
espaços de educação ambiental, em compatibilidade com a intenção da CAERN em
realizar tais programas;
uma biblioteca, citando o exemplo de uma biblioteca de rua existente em Brasília,
mantida pela companhia de águas e esgoto de lá;
um eco-ponto, um espaço intermediário na coleta de lixo, que coleta categorias de
resíduos não englobadas na coleta domiciliar;
valorização do convívio social e da expressão cultural da Vila de Ponta Negra
através da realização da feira de artesanato e gastronomia, de organização dos próprios
moradores;
necessidade de resgate de festividades tradicionais que uniam a comunidade
antigamente, como por exemplo o São João, originalmente chamado de Arraiá da
Florestina, que acontecia na Rua da Floresta. O caráter desta festividade era mais
voltado para a celebração da cultura, e se tornou predominantemente comercial, para
fins lucrativos.
Em discussão sobre outros projetos para espaços públicos na vila, foi colocado o
esforço para organizar uma horta comunitária, de interesse dos moradores, além da busca
por equipamentos urbanos como a academ ia da terceira idade. Uma das problemáticas
colocadas pelas moradoras diz respeito à um dos terrenos de intervenção: a lagoa de
captação de águas pluviais e EEE (estação elevatória de esgoto) da CAERN por vezes vaza
e alaga o entorno. Outra questão colocada foi a remoção da Favela do Alagamar no ano de
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 76
2004 da Rua Curimatã, embora posteriormente a área não tenha recebido mais
investimentos como o de pavimentação, tornando-se um local de difícil circulação,
alagamentos devido à chuva (aliado à falta de preparação do solo), e de deposição de lixo.
5.1 ENTREVISTAS
Baseadas no roteiro no apêndice A, as entrevistas foram conduzidas buscando
descobrir o significado da Vila de Ponta Negra para seus moradores, assim como seus
limites, pontos de referência, sensações, e como se dá o uso e a disponibilidade dos
espaços públicos. No total, 19 questionários foram respondidos, cujos resultados são
apresentados a seguir.
Tem-se que 89% das pessoas entrevistadas são do sexo feminino, com idade
predominante entre 35 e 55 anos, com apenas duas respondentes abaixo desta idade.
Apenas um dos entrevistados não reside na Vila de Ponta Negra, sendo esta uma agente de
saúde, uma usuária constante que percorre os caminhos da área, oferecendo uma valiosa
visão de quem visita regularmente. A maioria mora na vila há pelo menos 20 anos, apesar
de haver um equilíbrio entre aqueles que já nasceram lá (descendentes de moradores
originais) e aqueles que mudaram-se para lá, seja de fora do estado do RN ou não.
Quando perguntados o que a Vila de Ponta Negra simboliza, muitos colocaram a
vila como um local bonito, bom para se viver, ressaltando uma saudade dos tempos antigos,
e as modificações pela qual o território tem passado. É importante destacar que quatro dos
entrevistados não gostaram da colocação da comunidade nos termos de “Vila”, alegando
que o território todo é Ponta Negra, sem separação. Para a mesma questão, alguns ainda
remeteram à aspectos negativos, como violência, tráfico ou insegurança.
Quanto ao que é único e especial daquele local, a maioria das pessoas citou um ou
mais dos seguintes: relação com a natureza (representada pelo Morro do Careca pela
proximidade com a praia), a cultura local (tradição da renda, dos Congos), e o aspecto
interiorano (de calmaria, de convívio na rua, de conhecer a seus vizinhos). Apesar das
transformações decorrentes das novas construções na área, pode-se ver que a tradição
ainda é um elemento forte, em que os moradores reconhecem elementos da cultura local.
Diferentes limites foram colocados quando a pergunta tinha a ver com o “onde
inicia” e “onde acaba” a Vila de Ponta Negra. Alguns colocam que esta começa (limite a
Oeste) a partir da Rota do Sol, da Curva do Vento, da Praça do Cruzeiro, ou até mesmo do
shopping Cidade Jardim, mas concordam que esta se estende até o “pé do morro”.
Entretanto, quase 50% considera o Cemitério de Ponta Negra como o marco que delimita o
início deste território. Quanto ao outro sentido (Norte-Sul, que abrange uma faixa territorial e
outra marítima), cabe ressaltar que alguns entrevistados comentaram que a Rua Erivan
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 77
Franca (adjacente ao calçadão, à beira da praia) não faz parte do território delimitado como
Vila de Ponta Negra, fato este que se atribui a falta de conexão territorial, incompatibilidade
de uso do solo, e a diferença de níveis topográficos, pois sabe-se que não existem muitos
acessos diretamente desta parte de Ponta Negra em relação à praia (MEDEIROS et al,
2014). Já aqueles que alegaram que a Vila não deve ser separada - e sim parte de Ponta
Negra como um todo - não reconhecem sequer a existência de limites.
O que mais chama atenção dos entrevistados em relação a visuais, cheiros ou sons
geralmente também são elementos que remetem à natureza, como árvores (por sua idade
ou estética), assim como seus elementos (o som e o cheiro da folhagem, das flores, das
frutas), além da som e cheiro do mar (que desperta sentimentos de bem-estar em termos de
som agradável ou de ventilação). O segundo grupo mais citado tem a ver com a falta de
acessibilidade representada por calçadas estreitas, locais onde o carro prevalece sobre o
pedestre, e trânsito mais intenso, e são percursos realizados mais próximos da rua principal
por onde trafegam a maior parte das linhas de transporte público urbano (ver figura 31).
Remeteu-se ainda a transformação do bairro como um fator notável pela população, a
reparar nas novas edificações que surgem a cada dia. Isto também tem relação com o
sentimento de saudosismo que é o mais presente no discurso dos moradores, que têm
saudade da infância na vila quando esta era mais pacata, menos urbanizada, na época em
que haviam brincadeiras de rua, em que se percorria longas distâncias a pé. Poucas
pessoas citaram a sensações negativas, como a de insegurança, alegando que esta ocorre
mais no turno da noite.
Quanto à existência de espaços públicos para recreação e socialização, os
entrevistados alegaram que existem poucos direcionados a este propósito, apesar de
encontrarem-se em estado de abandono ou falta de estruturação. São estes: a praça do
Alagamar, a praia de Ponta Negra, e os citados campos de futebol (ABC e Botafogo). A
maior parte desconhece o local onde se pretende propor a intervenção urbanística, ainda
que este se localize nas proximidades de pontos de referência como a praça do Cruzeiro e o
único posto de saúde do bairro. Pela localização dada, julgam que este se enquadra “no
conjunto”, não fazendo parte da vila, embora esteja a duas quadras dos citados pontos de
referência, fato que se atribui à falta de conexão territorial ocasionada pelo traçado viário.
Aqueles que conhecem (aproximadamente cinco pessoas) dizem que a área é deserta e
“esquisita”, local onde ocorrem assaltos, e que evitam trafegar por lá.
Na última questão, os respondentes eram pedidos para desenhar um mapa
esquemático da Vila de Ponta Negra, como se estivessem descrevendo-a para um estranho.
Dos 19 questionários aplicados, 14 mapas foram criados, e ressaltam-se os seguintes
pontos:
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 78
de maneira geral, os pontos de referência citados se reafirmam como tal à medida
que estão presentes também nos mapas, como a praça da igreja/terminal de ônibus,
o Conselho Comunitário, a praça do Cruzeiro, o posto de saúde e o cemitério;
três dos entrevistados não possuem uma imagem mental elaborada em relação á
morfologia urbana da vila, cujos desenhos remetem à elementos naturais, como o
Morro do Careca, ou árvores e flores (figura 44);
Figura 44 - Mapa mental com elementos da natureza
Fonte: entrevistas aplicadas
seis dos respondentes lembram do formato da vila como linear, seguindo a extensão
da rua principal, onde se localizam vários dos pontos de referência citados, com
ligação direta entre si;
5 entrevistados elaboraram mais os mapas, considerando mais de uma quadra,
muitas vezes inserindo nomes de ruas ou outros pontos de referência menos
conhecidos (ou simplesmente menos citados), como escolas, a delegacia, mercados,
ou farmácias.
poucos apontaram a relação da Vila com a praia como, por exemplo, os pontos de
descida para pedestres.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 79
Figura 45 - Morfologia urbana da via como linear, e mais elaborada, respectivamente.
Fonte: entrevistas aplicadas
5.1.1 Considerações gerais
De maneira geral, alguns aspectos devem ser ressaltados em relação às entrevistas
realizadas, pois diferenciam a população e seu conhecimento sobre o local onde moram.
Um fator notável era que alguns dos moradores citavam a história da Vila e se referiam à
momentos específicos (as décadas de 1970 e 1980 quando houve a construção do
conjunto, ou até mesmo à época da doação de uma porção do terreno da Vila para se
transformar na Barreira do Inferno) e à pessoas públicas da política (atribuindo
acontecimentos a determinados mandatos políticos), confirmando a noção de que as
pessoas sabem a história do seu lugar.
Muitas pessoas mencionaram uma característica rural, de comunidade calma, onde
se pode colocar cadeiras nas calçadas e conversar. Três dos entrevistados estavam nesta
situação, e essa foi uma das respostas dadas quando indagado o que é especial e único em
relação à Vila de Ponta Negra. Isto se complementa pelo fato de se observar, durante o
tempo passado no local, o ato de cumprimentar os outros, de conhecer à seus vizinhos, à
quem passa.
Em duas questões distintas – “o significado da Vila de Ponta Negra” e “o que é único
em relação à vila” - o que foi respondido que simboliza a Vila de Ponta Negra é o fato de
“conhecer os moradores da comunidade”. Vale ressaltar também que pelas histórias
contadas em paralelo, subentende-se que os moradores da Vila têm o costume de percorrer
longas distâncias a pé (fator enraizado historicamente, como pode ser visto pelo histórico na
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 80
seção 3.1.1), mantendo o contato com a natureza. Isto é reforçado pelo fato de que, em
mais de metade das entrevistas, foram citadas espécies vegetais, seja através de árvores
antigas que chamam a atenção visualmente, pelo cheiro e pelo som das folhagens, ou por
frutas específicas que também remetem à história do lugar.
5.1.2 Mapa síntese das entrevistas
Como é sabido, a metodologia utilizada nesta etapa foi baseada nos escritos de
Kevin Lynch (1997). Para que possa ser apresentado um mapa síntese com as informações
recebidas, é essencial que se explique brevemente alguns conceitos utilizados por este para
compor o mapa em questão. O autor classifica o conteúdo da imagem da cidade em cinco
elementos:
Vias: Canais de circulação pelos quais os habitantes de uma cidade se locomovem,
observam e se relacionam;
Limites: ‘elementos lineares não usados ou entendidos como vias pelo observador’,
barreiras entre duas fases, que podem separar uma região da outra;
Territórios: regiões de uma cidade dotados de extensão bidimensional, com
elementos reconhecíveis aos olhos do observador, o que o distingue de outros;
Pontos nodais: Áreas de atração, ‘focos intensivos’ para os quais ou a partir dos
quais o observador se locomove, podendo ser conexões ou concentrações;
Marcos: são referências na paisagem, algo que se destaca do entorno. Podem ser
objetos físicos – com os obeliscos, por exemplo, edifícios, e até mesmo elementos
da paisagem natural, como um morro ou montanha.
Devido à escala da análise e a frequência de aparecimento, poderão ser
visualizados no mapa (figura 46) os seguintes elementos:limites, pontos nodais e marcos.
Não foram citados muitos pontos de referência. Acredita-se que isto se dá ao fato
dos vizinhos se conhecerem, pois a resposta dada era que os encontros acontecem nas
próprias casas. Os principais pontos nodais relacionados, por ordem de frequência, foram:
a praça da Igreja Católica, que também possui um terminal de ônibus e algumas
cigarreiras e bares, como a Tapiocaria da Vó. De acordo com os entrevistados, este
local costumava ser um ponto de encontro cultural, onde haviam shows e era o local
da boemia;
o centro de cultura de Ponta Negra;
a própria Praia de Ponta Negra;
a praça do Cruzeiro, que também reúne os usuários do transporte público por ter
uma parada de ônibus em sua área;
o Conselho Comunitário, onde ocorrem reuniões periódicas da comunidade.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 81
Ademais, o Morro do Careca foi o único a ser categorizado como marco, de acordo
com o diálogo com a comunidade.
Figura 46 - Mapa síntese das entrevistas
Fonte: Elaboração própria, 2015 com base em SEMURB/IDEMA, 2007
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 82
5.2 O ENVOLVIMENTO DA COMPANHIA DE ÁGUAS E ESGOTO DO RIO GRANDE DO
NORTE - CAERN
Como já apresentado, um dos lotes englobados pela área-projeto pertence à
Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (lote 2), e possui em seu território
um passeio de serviço, e um poço. Devido à aproximação desta proposta com a realidade
da comunidade, viu-se como essencial debater com esta instituição a possibilidade de
implantação do projeto, levando-se em consideração também que a posição geográfica do
lote o eleva à peça chave na formação de um sistema de espaços livres de pequena escala:
este se localiza de forma central entre os outros lotes, e é a única forma de conexão
possível atualmente, devido ao traçado existente na área.
A primeira visita à empresa aconteceu no dia 16 de abril, no turno da manhã, e o
contato foi feito com o Gerente do setor de Patrimônio da CAERN, João Carvalho. Nesta
visita, foi esclarecido que a lagoa de captação (lote 1) pertencia à prefeitura, e se destinava
à captação de águas pluviais, e que a CAERN só se utilizava de uma parcela deste território
para a operação de uma estação elevatória de esgoto. Percebe-se que o lote 2 encontra-se
em situação similar, mas que a posse é da CAERN, e que no território remanescente ao
redor do poço existente, não há utilização. De acordo com João Carvalho, a área restante é
uma reserva para futura expansão, e não pode ser ocupada por usos públicos. Foi
esclarecido nesta ocasião que a CAERN é uma empresa de capital misto, conhecida como
instituição pública, mas com funcionamento de empresa privada, motivo pelo qual a área é
patrimônio da empresa, e não pode funcionar em prol da coletividade. Apesar disto, existe a
sugestão de que eventos itinerantes – que se utilizassem do terreno por tempo determinado
– seriam bem aceitos.
Além disso, a instituição possui programas ambientais compatíveis com as
pretensões para a intervenção urbana proposta. Em conversa com Marineida de Oliveira,
educadora ambiental da CAERN, foram descritos os principais programas de educação
ambiental:
Agente do saneamento: capacitação dos agentes de saúde relacionando as
questões do saneamento básico com as práticas de saúde coletiva;
Água é vida: o público alvo é composto por professores, indicando como inserir na
didática o ensinamento de questões relacionadas à água, apontando uma
abordagem lúdica;
CAERN nas Escolas: se realiza no próprio terreno da CAERN central, onde se
localiza uma mini-estação que simula e explica para alunos do ensino fundamental o
que é e como são realizados os serviços prestados, além de tocar na temática de
preservação da água;
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 83
Gestão água: direcionado para empresas, no tocante à sensibilização quanto ao
consumo de água, buscando a preservação.
Devido à junção de terrenos que lidam diretamente com água na forma de
abastecimento (lote 2) ou de acumulação e tratamento (lote 1), a proposta pensada através
deste trabalho fornece terreno fértil para a realização de ações de educação ambiental junto
à CAERN, e a mesma representa uma possível apoiadora da proposta. Logo, a intervenção
no lote em questão foi minimizada, respeitando na medida do possível as condições
colocadas.
6 REBATIMENTOS
Nesta etapa, é necessário sumarizar o que foi visto, apontando os principais
quesitos que influenciaram nas decisões relacionadas à proposta de intervenção
urbanística.
É importante enfatizar o fato de que o bairro de Ponta Negra surgiu a partir da vila,
que antes de se transformar em área de segunda residência e de turismo, seus residentes
viviam da pesca, da renda e da agricultura de subsistência, nas quais as duas primeiras
tradições são mantidas até os dias atuais. Há uma tentativa de retomar esta última em
menor escala, expressa através da vontade dos moradores de implantarem um projeto de
horta comunitária.
Resultante de diferentes momentos de consolidação, a configuração urbana do
bairro, primeiramente marcada pelo traçado orgânico já instalado e base para o
desenvolvimento do bairro não foi apagada pela chegada de novas subáreas com traçados
ortogonais, e sim acrescentou a qualidade da diversidade a este traçado urbano.
Apesar do desenvolvimento turístico e dos investimentos que a área recebeu, pôde-
se ver que de aproximadamente 55% de cobertura vegetal existente no bairro, poucos são
os espaços que são aproveitados para a coletividade, que de fato receberam estruturação
para desempenhar importantes funções na cidade, como a de formar um cinturão verde,
desempenhando tarefas ecológicas e proporcionando mais conforto ao pedestre. Além de
serem poucos (ver figura 28), concentram-se fora da Vila de Ponta Negra, onde o número
de espaços deste tipo são ainda menores. Além disso, o massivo investimento no setor do
turismo se concentrou na região diretamente adjacente à orla, deixando de valorizar a
riqueza cultural e histórica que a origem do bairro de Ponta Negra – a vila – oferece. Então,
reforça-se a necessidade de um espaço que tire proveito das várias funções que pode
desempenhar, dado que a especulação imobiliária que age sobre o território elevou o preço
do m² em cerca de 10 vezes, em um curto período de 3 anos. De forma a corroborar isto, o
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 84
discurso da própria população aponta a falha distribuição dos espaços de lazer, deixando a
vila a mercê de poucos espaços para desempenhar diversas funções.
Pelo mesmo motivo, e devido à grande quantidade espaços livres privados, uma
abordagem de intervenção pode ser a de parcerias público-privado, como foi visto em um
dos estudos de referência (Parque Discovery Green), como forma de tornar disponíveis à
comunidade os terrenos que não estão cumprindo a função social da propriedade. Por outro
lado, aponta-se também a possibilidade de uso dos instrumentos de gestão e intervenção
urbanística presentes no Estatuto da Cidade para que essa função seja cumprida, usando
de instrumentos como o aumento progressivo do IPTU, etapa intermediária para que
aconteça a desapropriação, ou ainda a transferência de potencial construtivo, apesar deste
não ter ainda regulamentação definida para a cidade de Natal.
Apesar de sua extensa área, o bairro não possui infraestrutura para suportar
aumentos populacionais e suas consequências (impermeabilização do solo, alta produção
de dejetos, a exemplo da produção de lixo e de esgoto), o que ocasionou em 2006 a
suspensão das licenças para novas construções. Ainda assim, o rápido aumento
populacional e a rotatividade de pessoas na área resultaram numa infraestrutura que não
acompanha este desenvolvimento. No momento atual, essa produção de dejeto não tem
local de tratamento específico, e muitas vezes é lançada diretamente no ecossistema
marítimo. Deste modo, “[...] os recursos cênicos litorâneos [...] ao serem ocupados e
transformados, têm muitas vezes totalmente eliminadas as características que geraram sua
ocupação, com uma grande e definitiva perda de suas qualidades paisagísticas iniciais”
(MACEDO e PELLEGRINO, 1999).
Quanto à área-de-estudo, enfatiza-se que em um raio de 500 metros, pode-se notar
mudanças na tipologia das casas e do tecido urbano. Há a interseção entre ruas tortuosas -
cujas quadras em formato irregular comportam edificações menores - e ruas com um
traçado ortogonal, cujas quadras são subdivididas em lotes regulares que comportam
residências maiores. É relevante para a proposta perceber os equipamentos urbanos
existentes na área, a exemplo da escola e do posto de saúde. Este primeiro equipamento é
compatível com a proposta de um espaço público multifuncional, aliando estes dois usos
tanto pela viés do lazer, quanto pelo viés da educação ambiental. O posto de saúde possui
movimento intenso, pois é o único da área, e se localiza a aproximadamente 300 metros da
área-projeto. Porém, a falta de ligação entre as ruas faz com que as áreas não se conectem.
De aproximadamente 84 linhas que percorrem a cidade de Natal, viu-se que apenas 6
conectam a Vila de Ponta Negra ao resto da cidade, e 60% destas percorrem o mesmo
itinerário, utilizando-se da rua principal (Rua Manoel Coringa de Lemos) para alcançar as
proximidades do morro. Esta rua, além de não possuir infraestrutura adequada –
atualmente, esta apresenta largura insuficiente, curvas com raio inadequado para o tráfego
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 85
de veículos maiores como os ônibus - fica sobrecarregada por ser rota única de transporte
público.
Através do uso do solo, pode-se notar a presença do serviço hoteleiro na área-de-
estudo, apesar de que na área existem pousadas, um tipo de acomodação diferente dos
grandes hotéis que ocupam a orla. Ainda assim, o uso majoritário é o residencial, pois os
usos comerciais e de serviço se concentram mais nas proximidades da orla. O gabarito na
área é predominantemente térreo, não obstante a presença de alguns prédios de meia
altura ou com mais de 20 andares, com a paisagem composta predominantemente pelo
ambiente construído. No mais, a legislação aplicável na área define todo o território como
zona de adensamento básico (com coeficiente de aproveitamento de 1,2) e área de
operação urbana. Apesar de ter um coeficiente de aproveitamento mais baixo do que outros
bairros da cidade (geralmente entre 2 e 3,5), isto não se torna um problema quanto ao
conjunto construído pretendido, pois o caráter multifuncional pretendido diminui a
necessidade quantitativa de área construída. Além disso, o fato da área ser definida como
de uma operação urbana facilita a intenção real de implantação da proposta.
Já a área-projeto é definida por quatro lotes, dos quais apenas um é público, a área
a ter maior aprofundamento da proposta. Os demais possuem restrições quanto à sua
utilização, demonstrando a necessidade de uma intervenção em etapas, em que os espaços
possuam uma identidade, mas que a implantação de cada um possa ocorrer em momentos
separados, respeitando as condições de intervenção como colocada por cada um dos atores
com quem se teve contato.
De maneira geral, a chegada à área-projeto é conturbada, pois o mobiliário urbano
e a arborização – que em teoria deveriam ser parte do passeio público sem impedir a
passagem do pedestre – se tornam um obstáculo à livre circulação por estar mal
posicionado. O próprio terreno onde haverá um maior detalhamento da proposta não possui
atualmente estruturação alguma, exigindo um planejamento do início, e devido à situação do
entorno, intervenções pontuais em maior escala se fazem necessárias para que se obtenha
a noção de unidade para o conjunto. Apesar de não possuir estruturação, o terreno possui
vestígios comportamentais da ação humana, a exemplo da deposição de resíduos (lixo ou
material de construção), além da criação de trilhas por erosão e uso do espaço para
repouso.
Porém, foi somente ao falar com a população que se pode ter respostas
diretamente relacionadas às suas necessidades. No primeiro encontro, estas necessidades
já se tornaram evidentes, e ajudaram a compor o programa de necessidades. Ficou evidente
também nesta etapa do trabalho que os moradores da Vila de Ponta Negra cultivam uma
relação especial com o local, demonstrando conhecer seus momentos históricos e as
pessoas que os promoveram, ainda que os limites colocados para o início da vila sejam
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 86
fluidos. Outro fator que ficou evidente foi o reconhecimento e valorização da natureza,
alguns em busca desta, outros já acostumados com a sua presença, o que influencia na
relação entre o natural e o construído no feitio do projeto.
Apesar de conhecerem bem a área, muitos não têm familiaridade com a área-
projeto, e não possuem, portanto, relação com o local. Atribui-se isto à falta de
conectividade territorial, o que demanda também ações em maior escala para reconectar
áreas outrora relacionadas. De forma a relacionar os problemas encontrados com as
soluções propostas, os esquemas da figura 47 foram feitos:
Figura 47 - Esquemas relacionando problemas encontrados e soluções propostas
Fonte: elaboração própria, 2015
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 87
Logo, o programa de necessidades foi concebido com base nas soluções propostas
aos problemas encontrados, sob a perspectiva do efeito da intervenção urbanística tendo
rebatimento nos âmbitos social, cultural e educativo. Somado a isto, as necessidades
colocadas pela própria população foram a mais rica fonte de informações para que a
proposta fosse tecida. Este é composto pelos seguintes elementos:
Ecoponto;
Biblioteca;
Salas de educação ambiental;
Oficinas de capacitação profissional
Depósito para guarda de materiais;
Banheiros;
Espaço para ensaios e apresentações culturais;
Playground;
Horta comunitária;
Academia ao ar livre;
Parede de escalada;
Espaço turismo
Espaço para exposições itinerantes
Parada de ônibus.
É importante salientar que pelo caráter do projeto – da busca por espaços que
sirvam para mais de um propósito e que permitam vários usos – o programa de
necessidades foi composto com base naquelas atividades que podem se desenvolver no
local, não havendo a obrigação de fixar aquele uso em certo espaço definido. Neste ponto
jaz o desafio da composição projetual permissiva, cujas premissas utilizadas serão
abordadas na seção a seguir, juntamente ao memorial descritivo do projeto.
6.1 PARTIDO URBANÍSTICO
Tendo como base as análises realizadas no decorrer do trabalho, as considerações
presentes na seção anterior levaram à elaboração das seguintes premissas:
1 Integração territorial e social da área-de-estudo, atualmente sem conexão com os
principais pontos de referência (como a Praça do Cruzeiro, e o posto de saúde) e
vias do entorno (como a Rua Vereador Manoel Sátiro) através de ações que
concernem os âmbitos do desenho urbano, da mobilidade urbana e da aplicação de
instrumentos de gestão territorial:
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 88
a. Conexão entre espaços livres, disponibilizando para a população um espaço
público de qualidade e um percurso que atravessa e está no cerne da área-
de-estudo;
b. Tratamento urbanístico e paisagístico de determinados trechos que se
conectem com as principais rotas da área-de-estudo, aumentando o alcance
territorial desta área;
c. Possibilidade de futura integração dos novos percursos criados com rotas
cicláveis.
d. Redirecionamento de linhas de ônibus por um novo percurso, gerando uma
maior penetração na área-de-estudo;
e. Redução e controle da função de estacionamento em ruas que concentram
estabelecimentos de atratividade turística e vida noturna, visando a retomada
desta como um espaço para o pedestre, e prevendo a possível integração
com a nova rota de ônibus sugerida;
f. Aplicação de transferência de potencial construtivo no único lote de posse
privativa.
2 Estruturação de um espaço público que sirva como espaço de manifestação cultural,
de educação ambiental, e vários outros tipos de apropriação:
a. Manutenção da vegetação existente;
b. Proposição de novos percursos com continuidade pela paginação de piso e
pelo nível de altura;
c. Proposição de uma edificação que agregue ambientes de múltiplo uso, desde
espaços para exposição da produção da vila até salas de educação
ambiental e capacitação profissional;
d. Interferência mínima em lote de posse privativa, não sujeito à aplicação de
instrumentos de desapropriação – terreno de posse da CAERN para
operação de serviço de abastecimento de água.
3 Promoção da permeabilidade visual, da integração física e simbólica entre as partes,
e da implantação de mobiliário urbano sob a perspectiva da busca pela segurança
através de intervenções urbanas:
a. Substituição de muros por grades ou guarda-corpos em determinados
trechos;
b. Permissividade de novos percursos antes inexistentes;
c. Oferecimento de espaço para personalização do espaço público através da
grafitagem.
4 Valorização da cultura local: Adaptação dos elementos mais representativos nas
entrevistas e conversas informais para a linguagem plástica ou representativa.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 89
Logo, na elaboração da proposta buscou-se trabalhar com os interesses não só dos
moradores, mas também sob a perspectiva do turista que não conhece uma importante área
do desenvolvimento de Ponta Negra, valorizando também o uso do solo do entorno. Deste
modo, se torna mais fácil que o entorno imediato (composto também por pousadas de médio
porte) se envolva mais no feitio da intervenção urbana proposta. Além das apropriações
cotidianas, visa-se também o envolvimento com ações de educação ambiental, além de
promover espaço de manifestações da cultura popular e manifestações sociais.
7 MEMORIAL DESCRITIVO
7.1 TRATAMENTO URBANÍSTICO DAS VIAS VISANDO A INTEGRAÇÃO FÍSICO-
TERRITORIAL DA PROPOSTA
Como pode ser visto na prancha 01 do caderno de pranchas em anexo neste
trabalho, foram sugeridas algumas modificações no sistema viário da área-de-estudo para
fins de integração físico-territorial, retomando uma conexão que deveria existir de forma a
valorizar as outras partes de Ponta Negra fora a orla marítima. Uma destas modificações é a
estruturação de um trecho da Rua Curimatã, na adjacência imediata da área-projeto. Este
trecho abrigava uma favela, que foi removida em meados do ano de 2004, mas que nunca
recebeu a pavimentação devida após esta ação de remoção.
A proposta apresentada pode ser tomada como base e adaptada para a
reestruturação das demais ruas apontadas na prancha 01. É sugerido que a estruturação da
própria via seja feita em bloco intertravado, por este apresentar um baixo índice de
impermeabilização do solo, além do que o baixo movimento de veículos na área não implica
em um grande tráfego que venha a exigir uma estruturação mais resistente, porém mais
agressiva ambientalmente, como a cobertura asfáltica. O espaço reservado para a calçada
(já existente) foi alargado, para que pudesse ser implantada uma faixa de serviço (local
onde se localiza o mobiliário urbano sem que este se torne um obstáculo à livre circulação
do pedestre. Quando se pensa neste propósito juntamente ao fato de que as instituições e
empresas (de abastecimento de água, de energia, de drenagem urbana) geralmente
implantam este mobiliário sem um padrão pré-estabelecido de localização, têm-se a
seguinte idéia: criar um módulo que agregue o local da arborização (que gera
sombreamento), do recolhimento de resíduos sólidos, definindo uma faixa cujo alinhamento
definirá o limite da implantação de mobiliário como postes, por exemplo. A implantação do
módulo pode ser vista através das figuras 48 e 49.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 90
Figura 48 - Esquema de implantação do módulo de mobiliário urbano
Fonte: elaboração própria, 2015
1,2
0m
1
,70
m
6,0
0m
2
.90
m
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 91
Figura 49 - Perfil proposto para a Rua Curimatã
Fonte: elaboração própria, 2015
De acordo com o Manual de implantação de mobiliário urbano, feito pela Prefeitura
do Rio de Janeiro, a criação deste tipo de infraestrutura – chamada ilha de serviços –
proporciona não só conforto ao usuário, mas também redução nos custos de implantação e
manutenção por parte da gestão e das concessionárias devido ao agrupamento do
mobiliário.
Porém, enfatiza-se que o alargamento da calçada não resultou em uma perda para
a via, visto que sugere-se aqui que neste trecho de nova estruturação, a via promova o
escoamento de veículos em um só sentido, melhorando o fluxo de veículos maiores como
os ônibus (de acordo com a rota sugerida nesta mesma proposta), havendo ainda uma
reserva de espaço para uma futura incorporação de rota de bicicleta em ambos os sentidos.
Já na Rua Aristides Porpino Filho, se localizam diversos estabelecimentos de
atratividade turística e que movimentam a vida noturna, necessitando, além da
reestruturação, um maior controle do estacionamento na rua. Desta forma, a rua poderia ser
retomada como um espaço de convivência, onde haveria mais espaço para o pedestre do
que para o veículo motorizado. Uma opção pode ser a localização de estacionamentos em
um dos espaços livres do entorno, de onde sairia um transporte público de maior
capacidade de passageiros (como uma van, por exemplo) de onde haveria o embarque e
desembarque ao invés do estacionamento. Esta iniciativa não é inédita e já é
comprovadamente eficiente, presente em Recife, por exemplo. Vale salientar ainda que a
1,70m 1,20m 6,00m 2,90m
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 92
rua como um local para o pedestre em uma área de vida noturna tão movimentada pode ser
incorporada aos roteiros turísticos, fazendo parte da imagem da cidade.
7.2 ESTRUTURAÇÃO DE UM ESPAÇO PÚBLICO DE MÚLTIPLO USO
Do conjunto proposto, composto por quatro lotes, apenas um (lote 4) teve um maior
desenvolvimento das ideias pensadas para a área, dada a extensão da área-projeto. Porém,
o conjunto é apresentado de forma geral, com todos os usos atribuídos a cada um dos lotes.
Para a apresentação desta seção, algumas partes estarão presentes no corpo do trabalho
escrito, e aquelas que dizem respeito à representação gráfica serão apresentadas em forma
de pranchas arquitetônicas em anexo.
7.2.2 Evolução da proposta
A primeira etapa adotada no processo foi o zoneamento de acordo com o programa
de necessidades resultante das considerações apresentadas no início desta seção, tendo
em mente também as diretrizes de intervenção tecidas. Logo, a proposta de estruturação do
lote 4 acompanhou algumas das premissas adotadas para se obter a integração entre os
quatro lotes: a manutenção do mesmo nível de altura entre os passeios, a manutenção da
vegetação existente e a continuidade do passeio através de elementos em comum, como a
paginação de piso e o tratamento paisagístico.
Nesta primeira etapa, procurou-se relacionar os diferentes usos em toda a área (o
que resultou na composição de um funcionograma, que pode ser visto na figura 50), de
forma a criar áreas que agregassem funções similares.
Figura 50 – Funcionograma criado a partir do programa de necessidades
Fonte: elaboração própria, 2015
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 93
Desta forma, na primeira proposta do zoneamento, à lagoa de captação foram
atribuídos usos como em um espaço público alagável, a ser utilizado em época de estiagem
(figura 51).
Figura 51 - Primeira proposta de zoneamento
Fonte: elaboração própria, 2015
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 94
Esta contaria com uma pista para skate, quadra poliesportiva e áreas de
convivência, todos feitos em materiais com altos índices de permeabilidade, de forma a não
comprometer a função de drenagem da lagoa. Além disso, nesta área também foi proposta
a parede de escalada, e um passeio perimetral em deck de forma a viabilizar o passeio
público atualmente tomado pela arborização e pelo mobiliário urbano. Nos lotes 2 e 3, as
intervenções seriam menos impactantes – devido às limitações da área como colocado -
mas teriam a atribuição principal de conectar o todo, concentrando edificações pelo qual o
passeio principal que conecta os espaços passaria dentre elas. O lote 4 teria o ecoponto
como espaço central, relacionado diretamente ao uso de horta e compostagem, e ao espaço
zen, que poderia ser utilizado também como espaço de educação ambiental. Toda esta
porção do terreno estaria diretamente conectada com a edificação, cujo propósito seria o de
ter salas multiuso onde poderiam ocorrer aulas sobre educação ambiental e capacitação
profissional. Este zoneamento resultou em uma primeira proposta de traçado, que pode ser
vista na figura 52.
Figura 52 - Primeira proposta de traçado (nomear espaços)
Fonte: elaboração própria, 2015
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 95
Porém, nas primeiras tentativas foram identificados os seguintes conflitos:
Foi detectado, em conversas com moradores e com a ARSBAN (Agência
Reguladora do Saneamento Básico de Natal), que a lagoa de captação não tem
capacidade de vazão o suficiente para que a água captada seja levada para as
galerias, o que faz com que na maior parte do ano, a lagoa esteja cheia, portanto,
não sujeita a se portar como um espaço público alagável. Logo, os usos propostos
tiveram que ser realocados, ou adaptados aos outros espaços, visto que a lagoa de
captação era o lote de maior área.
A forma de locação do conjunto edificado não favorecia a conexão do passeio
existente, de forma que este sofresse a mínima intervenção, como colocado pela
instituição de posse do terreno;
No zoneamento do lote 4, o ecoponto foi posicionado de forma central, enquanto os
pátios para realização de eventos ficaram em segundo plano, de menor tamanho.
Em primeiro lugar, vale salientar que com esta distribuição, os espaços que
poderiam ser complementares (como forma de expandir a área disponível à eventos
de diversos tamanhos) ficam fragmentados devido à localização de um ecoponto
entre eles. Além disso, este é um tipo de uso que pode vir a gerar certo incômodo
aos demais usuários, por tratar de resíduos da atividade humana (lixo domicilar,
entulho, óleo de cozinha), não sendo o ideal que este seja alocado de forma central
em um espaço público onde outras atividades poderiam ser realizadas.
A taxa de impermeabilização do solo em uma área verde estava muito alta, a notar-
se pela quantidade de áreas pavimentadas na figura 52.
7.2.3 Proposta final
Considerando os conflitos colocados, uma nova distribuição dos espaços levou à
proposta atual (ver pranchas 02, 03 e 04).
Uma das premissas adotadas que marcam a diferença entre a primeira e a última
proposta é a largura dos passeios. Pensa-se que, se o espaço há de ser multifuncional, que
seus passeios também possuam largura útil para que sejam utilizados de diferentes
maneiras, não só como espaço de circulação. Logo, o espaço nesta proposta é bem menos
subdividido e mais conectado.
Como um dos propósitos do projeto é o oferecimento de um espaço robusto e
flexível, pátios sem estruturação fixa são os espaços-chave desta proposta. Porém, a
vontade de manter a vegetação existente diferencia as possibilidades de uso para estes
espaços. No espaço denominado bosque do aprendizado, existe uma densa vegetação ao
redor deste cuja copa se inicia a aproximadamente 3 metros, fazendo com que este seja um
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 96
espaço sombreado e com um plano de teto (copa das árvores) bem próximo do observador.
Deste modo, destina-se o mesmo à atividades de relaxamento – como a prática de ioga e
meditação – ou à atividades em grupo – como aulas coletivas de dança ou alguma outra
modalidade fitness. Por sua proximidade com o espaço de compostagem e com o ecoponto,
pode também ter função de espaço de educação ambiental, pois também é propósito deste
espaço ceder lugares onde a prática se alie a teoria no processo ensino-aprendizagem. Por
outro lado, o espaço cultura e ação tem um caráter de receber eventos itinerantes, como
feiras gastronômicas ou de artesanato, além de eventos como ensaios de grupos de dança
culturais – como os Congos de Calçola da própria vila de Ponta Negra – abrigando também
as apresentações. Isto é dito porque, por não haver arborização na área, o largo fica
disponível para a montagem de tendas, de palcos ou de barracas, sem limitação de altura.
Este espaço foi pensado para ser ampliado em caso de necessidade, podendo utilizar-se da
faixa de rua elevada – seria o caso de interromper o fluxo de veículo por algumas horas – ou
do próprio passeio na adjacência para realizar eventos maiores.
O ecoponto foi posicionado no limite do terreno, ainda que preserve a sua conexão
com a rua – para permitir a entrada de veículos que venham despejar resíduos – com a área
de compostagem – relacionando a temática do lixo como algo reciclável – e com a parada
de ônibus, cuja rotatividade de pessoas ajudaria a promover o conhecimento sobre este
equipamento tão importante, porém pouco conhecido. Ao locar o ecoponto em um espaço
público que lida com a temática de educação ambiental, busca-se mudar a própria intenção
de uso do equipamento: ao invés de somente receber materiais que não são contemplados
pela coleta domiciliar, a ideia é que estes materiais possam servir de matéria prima para a
produção artesanal, dando um destino produtivo para o que antes seria somente objeto de
despejo.
Atribui-se as aulas sobre educação ambiental ao conjunto edificado a ser projetado,
que contaria com salas de aula multiuso – para o propósito supracitado e para oficinas de
capacitação profissional – depósito para guarda de materiais (incluindo os que seriam
utilizados para ensaios, apresentações, estruturação do espaço adjacente), banheiros, e
espaços para exposições. A este espaço foi dado o nome de Espaço de Múltiplo Uso Dona
Maria Rendeira, fazendo referência a uma das pessoas mais antigas na comunidade, que
perpetua uma tradição local que nunca foi abandonada durante o tempo.
Já o espaço movimente-se e espaço aventura e natureza foram pensados como um
lugar de atividades para a família, visto que são espaços adjacentes que englobam
atividades como a escalada na parede, o cultivo de temperos e vegetais na horta, o
playground e a academia ao ar livre. Pela variedade de atividades oferecidas, pode entreter
os que desejam se ocupar, e ao mesmo tempo, oferece espaços de permanência com
bancos para aqueles que preferem observar o desenrolar dos exercícios oferecidos.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 97
No novo espaço público, reserva-se também o espaço do turismo, como forma de
compatibilizar o novo local com um uso do solo frequente na área-de-estudo. O espaço
contém não só caráter informativo, mas também se situa adjacente ao largo projetado para
manifestações da cultura local, como ensaios e apresentações, externando mais esta
cultura para o turista que atualmente, na maioria das vezes, só desfruta da praia, não
conhecendo as ricas manifestações culturais que ocorrem no interior da Vila.
O lote topográfico tem baixa inclinação (aproximadamente 5%, como pode ser visto
na figura 53), o que permitiu um passeio contínuo sem batentes ou escadas, nem rampas,
fator desejado não somente para ajudar o percurso de pessoas com dificuldade de
locomoção, mas do visitante de uma forma geral. É importante salientar que os perfis
apresentados nas pranchas de desenho técnico são perfis esquemáticos, considerando a
implantação ideal da proposta. Ainda assim, a projeção da topografia do terreno – conforme
as curvas de nível do material obtido – é colocada quando necessário. É valido dizer ainda
que esta topografia já foi modificada por ações anteriores a esta proposta, se tornando mais
suave, como pode ser visto pelas fotografias presentes neste trabalho. Porém, a projeção
apresentada parte da base de dados mais atualizada, sendo propícia a sua utilização como
referência futura, quando necessários o desenvolvimento e a adaptação da proposta.
Figura 53 - Curvas de nível no lote 4
Fonte: elaboração própria, 2015
Para valorizar e fazer referência à característica de espontaneidade na qual o
tecido urbano obteve expansão, foi dado preferência às curvas ao invés da ortogonalidade,
embora as primeiras encontrem a segunda no trecho da lagoa de captação, retratando toda
a mistura do tecido urbano de Ponta Negra.
Feita uma descrição geral dos espaços criados, as ideias específicas para cada um
deles são descritas a seguir, relacionando também materiais e mobiliário urbano.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 98
7.2.3.1 Espaço Cultura e Ação
Por ser uma espécie de largo destinado ao recebimento de atividades itinerantes –
como apresentações culturais, ensaios, feiras – a pavimentação desta área deve ser mais
resistente, pois enfrentará tráfego intenso e cargas maiores. Outro fator a se considerar é
que este espaço é o ponto mais baixo do terreno (ver figura 53), para onde a água seria
direcionada. A soma desses fatores exige uma pavimentação resistente, com um alto
coeficiente de atrito (para não se tornarem escorregadios quando molhados), ainda que não
impermeabilize o solo totalmente (também ressalta-se a importância de um eficiente sistema
de drenagem). Recomenda-se, portanto, o uso do piso drenante de concreto, pois possui
características semelhantes às desejadas, enfatizando-se o seu alto coeficiente de
infiltração da água. A textura pode ser vista na figura 53, e o piso drenante vem em placas
de 40 cm x 40 cm, formando uma superfície contínua se assentado com peças lado a lado.
Figura 54 - Piso drenante em concreto na cor grafite
Fonte: http://tinyurl.com/nh8usnt
Ainda devido ao caráter de múltiplo uso deste espaço, recomenda-se que o
mobiliário seja passível de ser mudado de lugar, ainda que pesado o suficiente para que não
seja apropriado e levado por quem desejar. Foi escolhido então o carretel de madeira (figura
55), também conhecido como “bobina de madeira” para ser utilizado como mesa, tanto
como uma forma de reutilizar algo que iria virar resíduo, quanto pela possibilidade do
mesmo se tornar um elemento do mobiliário resistente. Este possui tamanhos padrão,
pesando de 35 a 690 kg. Recomenda-se que seja lixado e pintado com verniz ou esmalte.
Já as cadeiras que ficam ao redor da mesa teriam estética similar às apresentadas na figura
55, resguardadas as adaptações ergonômicas necessárias para ser compatível com a altura
da mesa. Recomenda-se que estas sejam feitas em um material pesado e resistente às
intempéries, tal como o material do Enzo (figura 18).
Figura 55 - Mobiliário urbano sugerido para o Espaço Cultura e Ação
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 99
Fonte: http://tinyurl.com/og85tyb
7.2.3.2 Espaço Movimente-se
Este espaço é composto pelo playground e pela academia ao ar livre. Esta última é
assim nomeada neste trabalho porque a vontade de implantá-la não partiu da classe da
terceira idade, e sim de mulheres da comunidade, na idade predominante das entrevistas
(de 35 a 55 anos). Porém, os equipamentos seriam os padronizados para uma academia da
terceira idade (ATI), com uso por diversas classes de idade. Esta área seria revestida em
piso emborrachado para áreas externas, na cor bege.
O playground foi estruturado de forma a fazer referência a um símbolo da história
da Vila de Ponta Negra: o barco (figura 56). A criação de um playground temático pode ser
mais proveitosa por dar a este ambiente uma unidade visual, e um símbolo conhecido pela
comunidade pode se tornar mais atrativo. A base do espaço seria a cobertura em areia fina,
simulando a típica caixa de areia de playgrounds, evitando o risco de machucados em caso
de queda das crianças. O píer criado (ver prancha 03) também faz referência à elementos
da praia, e pode ser utilizado na parte de cima como escorregador, ou na parte de baixo,
com altura de 1,20 m. Por sua proximidade com o espaço Cultura e Ação, pode ser utilizado
como espaço da plateia durante a realização de eventos. O playground seria feito em
madeira de demolição tratada para resistir às condições climáticas.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 100
Figura 56 – Exemplo de playground temático sugerido
Fonte: http://revista.zapimoveis.com.br/leve-um-playground-para-dentro-da-sua-casa/
7.2.3.3 Espaço Mobilidade e Informação
Este espaço agrega duas áreas divididas pelo passeio público. Através da
colocação de uma baia de embarque e desembarque, dá-se a oportunidade de acesso para
pessoas com dificuldade de locomoção, e também é um espaço que pode ser utilizado na
ocasião de necessidade de ampliação do espaço pela montagem de estruturas efêmeras,
retomando a rua como um espaço de democracia.
Além disso, do outro lado do passeio são sugeridos os mobiliários presentes na
figura 57, como o banco que margeia as árvores existentes e o bicicletário.
Figura 57 - Mobiliário sugerido para o Espaço Mobilidade e Informação
Fonte: http://mateussz.blogspot.com.br/2009/01/banco-piano.html
Fonte: http://tinyurl.com/nqo4oyo
Reserva-se aí o espaço necessário para futura inserção de abrigos para parada de
ônibus, onde pretende-se recomenda-se o uso de totens informativos sobre as linhas de
ônibus, e informações sobre o local. O abrigo poderia ser feito de concreto e madeira, e
sugere-se que este contenha paradas com nomes que remetam à cultura local, para ajudar
também na orientação das pessoas que não estão familiarizadas com o bairro.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 101
Este espaço também se localiza no início do passeio que conecta todo o lote
longitudinalmente. Propõe-se que este percurso seja pavimentado em piso intertravado na
cor vermelha, com posicionamento como demonstrado na figura 58, estruturação também
proposta para o passeio público no perímetro do espaço proposto, garantindo continuidade
visual.
Figura 58 - Piso intertravado retangular vermelho
Fonte: http://tinyurl.com/nf864rb
7.2.3.4 Espaço Turismo
O espaço do turismo tem uma função compatível com o uso do solo da região,
formado por diversas pousadas. Serviria para prover informações básicas de
direcionamento, e ainda cumpriria o propósito de valorização e divulgação da cultura local
para o turista. Este foi pensado para ser, ao invés de uma barreira – como uma cabine de
informações ou um veículo - uma escultura, um ponto focal, onde seriam escritos na
vegetação ou nas floreiras poemas sobre o bairro de Ponta Negra, fatos da história do bairro
ou direcionamentos, função normalmente atribuída às placas. Exemplos do descrito podem
ser vistos na figura 59.
Figura 59 - Exemplo de estruturação sugerida para o espaço turismo
Fonte: https://www.pinterest.com/pin/117586240247182444/
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 102
7.2.3.5 Espaço Bosque do Aprendizado
Esta área funciona ao mesmo tempo como passeio e como espaço de
permanência, possuindo uma largura maior do que passeios comuns. Resulta, quando
interseccionada com o passeio longitudinal, em duas áreas diferentes, mas de
características similares: local sombreado, e com vegetação imponente e distribuída ao
redor. Compõe o percurso que se estende até a lagoa de captação, integrando a área-
projeto. Sua pavimentação deve ser feita em piso intertravado retangular em diversas cores,
como nos croquis da figura 59. Quanto ao encontro com o deck proposto para a lagoa de
captação, sugere-se que este tenha estética similar: dispondo diferentes cores de piso
intertravado em tons terrosos, e com o deck em diferentes cores (nos mesmos tons), de
acordo com a figura 60. A última imagem na figura é um deck plástico que simula a
aparência da madeira, porém possui uma resistência maior à água (levando em
consideração a sua implantação na lagoa de captação). Estes espaços possuem
estruturação mínima, a considerar os bancos formando áreas de permanência à sombra das
copas das árvores.
Figura 60 - Esquema de paginação no passeio que abrange os quatro lotes
Fonte: https://tecparpavimentos.wordpress.com/tag/piso-intertravado/page/3/
http://www.lulusoso.com/products/Deck-Tile-Plastic.html
7.2.3.6 Espaço Aventura e Natureza
Composto pela horta comunitária e pela parede de escalada, este espaço possui
pavimentação mista. Neste último uso, considera-se mais seguro utilizar uma vegetação de
forração para incrementar a segurança da atividade realizada, no caso de quedas, além de
ajudar a manter o solo permeável nesta área. O muro seria trabalhado com réguas de
madeira de demolição e teria uma planta trepadeira (cuja espécie vegetal não teria
espinhos) subindo no mesmo sentido daqueles que se aventurarem nesse exercício.
Já na área da horta, deseja-se ter canteiros elevados para cultivo, proporcionando
mais conforto a seus utilizadores. É desejável que a estrutura desta horta seja em concreto
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 103
pintado de diversas cores (preferencialmente tons de azul e vermelho, cores do grupo
cultural Congos de Calçola, da Vila de Ponta Negra), e que seu desenho permita a utilização
por parte de cadeirantes, como mostrado na figura 61. Por este mesmo motivo, o piso deve
ser pavimentado em piso drenante, ao invés de vegetação.
Figura 61 - Horta suspensa em concreto
Fonte: http://jornaltribunadonorte.net/noticias/alunos-da-apae-sao-protagonistas-na-sociedade/
7.2.3.7 Demais áreas e considerações gerais
De maneira geral, não houve inserção de novos tipos de vegetação diretamente no
solo, a não ser em forma de horta e floreiras, todos presentes em elementos móveis, como
vasos, jarros, caixotes de feira – em consonância com o caráter mutável e adaptável do
projeto. Nos canteiros, preconiza-se uma forração em seixo rolado, ou em brita, para efeitos
estéticos, formando composições paisagísticas, como pode ser visto na figura 62.
Figura 62 - Composição paisagística com pedras como forração
Fonte: http://freitaspedrasdecorativas.com.br/website/?page_id=173
O mobiliário nas demais áreas tira proveito do concreto e da madeira como um
conjunto, a exemplo da figura 63, e é preferível que sua forma acompanhe o traçado curvo
dos canteiros. Porém, na área de permanência central, preferiu-se a organização dos
bancos de forma a criar uma espécie de sala de estar, com a ressalva de que os bancos
localizados próximos à passagem de pessoas não tenham encosto, sendo escolha do
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 104
usuário sentar-se de costas ou de frente para o passeio. O mobiliário fixo poderia ser
também feito de troncos de madeira de demolição, como também é demonstrado na figura
62.
Figura 63 - Exemplo de mobiliário sugerido para as demais áreas
Fonte: https://www.pinterest.com/pin/479140847832758223/
Acervo pessoal de Verônica Lima
Vale salientar ainda que, visto que existe um favorecimento do pedestre quanto ao
nível do passeio de forma contínua, exigindo uma área de elevação do nível da rua para
igualar-se, recomenda-se o uso de grandes floreiras (figura 64) situadas em locais de
conexão com a rua, evitando que o veículo reivindique este espaço para si. É preferível que
estas não sejam de material cerâmico para evitar a depredação, e sim em concreto ou em
madeira.
Figura 64 - Sugestão de floreiras para guiar fluxos
Fonte: Acervo pessoal de Verônica Lima
Por fim, considera-se a iluminação no espaço público proposto com diferentes
sugestões, a depender da massa vegetativa e do grau de intervenção. No interior do lote, é
preferível que se tenha postes como o da figura 65, cuja baixa altura (em relação ao poste
convencional de calçada) permite a iluminação por debaixo das copas das árvores.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 105
Figura 65 - Posteamento sugerido para o interior dos lotes
No passeio público, considera-se postes com duas pétalas em diferentes alturas, de
preferência cumprindo também a função de orientação através da colocação de placas,
como pode ser visto na figura 66.
Figura 66 - Exemplo de poste para o passeio público
Fonte: http://www.mapenergia.com.br/content/gravia
Ainda, no terreno da CAERN e em alguns pontos de vegetação densa, recomenda-
se a utilização de balizadores como demonstrado na figura 67, cujos modelos tem uma
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 106
altura de aproximadamente 50 cm. Para efeitos estéticos, estes teriam suas bases pintadas
na cor vermelha.
Figura 67 - Diversos modelos de balizadores para iluminação
Fonte: http://www.aecweb.com.br/emp/p/vit-iluminacao_3602_1
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 107
CONCLUSÃO
Este trabalho teve um propósito de provocar na uma reflexão acerca do elemento
norteador da proposta: a multifuncionalidade, vista sob a ótica de apropriação da cidade.
Através do esclarecimento dos conceitos, viu-se que a definição em comum de espaço
público na fala de diversos autores tem a ver com acessibilidade, seja física ou simbólica.
Logo, vê-se na possibilidade de prover um espaço multifuncional uma oportunidade para pôr
em prática o ato de “permitir”. Permitir passar, permitir utilizar, não restringir, o que se
relaciona diretamente com o sentido de acessibilidade. Porém, isto não implica que este
seja um modelo melhor do que os outros, pois a herança cultural de traçados e formas -
sejam em forma de jardins suspensos, praças monumentais – existe, necessitando de
adaptação para a realidade local, sendo a falta desta a maior crítica tecida no uso de
modelos “importados”.
Por conseguinte, pelo teor de realidade presente na proposta – visto que a
comunidade tem interesse em implantá-la - a futura arquiteta e urbanista pôde se aproximar
dos possíveis obstáculos que aparecem no caminho de toda intervenção urbana, a exemplo
da resistência das partes envolvidas em novas ideias, ou em ceder seus territórios em prol
da coletividade, além da limitação imposta pelos materiais existentes em detrimento da
localização do espaço público proposto. Além disso, as preocupações que atingem todos
aqueles que se propõem a projetar para espaço público também se fizeram presente no
decorrer desta proposta, como a possibilidade de depredação, ou até mesmo a apropriação
indevida, exposta aqui pela possibilidade de se trabalhar com um mobiliário flexível e
transportável, mas que precise ainda de algo que o prenda naquele local.
Devido às peculiaridades da cidade contemporânea – a exemplo da convivência em
novos espaços de acessibilidade restrita, causa e consequência da sensação de
insegurança no meio urbano – encara-se como um desafio qualquer projeto que se
proponha a retomar a cidade e convide seus moradores a apropriar-se dela. Logo, o
trabalho foi visto como um exercício de projeto, onde havia a liberdade de projetar, de expor
ideias, de se utilizar da criatividade, mas com certa cautela, levando em consideração todos
os fatores que um arquiteto e urbanista deve pesar quando no feitio de um projeto: o
aspecto social, cultural, econômico, a ergonomia, as características plásticas de um
material, assim como as de durabilidade e manutenção.
Esse desafio se torna maior ainda quando o projeto é feito para um bairro tão
distinto quanto Ponta Negra, levando em consideração a quantidade de atores que
convivem no bairro – sejam moradores, sejam hóspedes de alta rotatividade – e
principalmente, levando em consideração a morfologia urbana de um bairro que consolidou
cada uma das suas partes em diversos momentos, e carrega o ônus e o bônus de ser um
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 108
bairro ícone de turismo, que faz parte da imagem da cidade de Natal e do estado do Rio
Grande do Norte. Desafios à parte, o desenvolvimento do trabalho foi muito proveitoso para
a autora, pois além de se constituir de exercício projetual, demonstrou dificuldades e
limitações do modo de trabalho a serem exploradas buscando melhorias na vida
profissional.
No final, o anteprojeto proposto permaneceu sendo nomeado como “espaço
público” de fato porque percebeu-se que cada um dos tipos de espaços públicos explorados
– praças, parques, pátios, jardins - carregam um estigma e uma função, um modelo espacial
pré-definido, o que acaba por limitar as suas contribuições como parte da infraestrutura da
cidade.
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 109
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FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 114
APÊNDICE A
Roteiro para entrevista
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE TECNOLOGIA – DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA
TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO
PESQUISA ACERCA DA VILA DE PONTA NEGRA COM VISTAS À ELABORAÇÃO
DE PROJETO URBANÍSTICO DE UM ESPAÇO PÚBLICO MULTIFUNCIONAL
VIVIANE GOMES MEDEIROS
1. Nome:__________________________________________________________
2. Gênero:
a. Feminino b. Masculino
3. Faixa de idade:
a. Menos de 15 anos b. 15-25 anos c. 25-35 anos
d. 35-45 anos e.45-55 anos f. Mais de 55 anos
4. Reside na Vila de Ponta Negra? Em que local?
5. Há quanto tempo reside na Vila de Ponta Negra? Seus pais residiram/residem
na Vila?
6. O que vem a mente quando você ouve a expressão “Vila de Ponta Negra”? O
que a Vila simboliza para você?
7. Quais são os limites da Vila para você? Em que ponto esta começa e em que
ponto acaba?
8. Para você, o que é especial em relação à Vila? O que é único e particular desta
área?
9. Descreva as direções completas de um dos caminhos que você normalmente
faz pelo território da Vila (indo trabalhar, indo à escola ou à casa de um amigo).
Favor incluir o que atrai a sua visão, se existe algo que aguça a audição, ou o
seu olfato.
10. Você sente alguma emoção específica no tocante as diferentes partes desse
caminho? (ex: traz lembranças, ansiedade, medo ou insegurança?)
FLEXIBILIDADE ESPACIAL E APROPRIAÇÃO DA CIDADE 115
11. Onde você costuma encontrar seus amigos ou parentes na Vila de Ponta
Negra? Existe algum ponto de encontro?
12. Quais são os espaços geralmente usados para atividades de recreação (jogar
bola, conversar com os amigos, brincar com crianças)?
13. Você conhece a área verde próxima ao terreno da CAERN, localizada na Rua
do Golfinho? Qual a sua opinião sobre a área? O que aquela área lembra, o
que significa para você?
13. Desenhe um mapa esquemático da Vila de Ponta Negra, como se estivesse
fazendo uma rápida descrição para um estranho.