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FONTICA E FONOLOGIA
DEMERVAL DA HORA OLIVEIRA
APRESENTAO
Este captulo introduz uma viso acerca de Fontica e Fonologia, tendo como
objetivos:
- conceituar Fontica;
- explicar a natureza e produo dos sons vocais elementares da Lngua
Portuguesa;
- classificar, foneticamente, os sons da Lngua Portuguesa;- transcrever, fo-neticamente, palavras da Lngua Portuguesa;
- conceituar Fonologia;
- distinguir Fontica de Fonologia;
- apresentar os conceitos principais da Fonologia;
- elencar mltiplas possibilidades de aplicao dos estudos fonticos efonolgicos.
CONCEITOS BSICOS
- som
- letra
- fone
- fonema
- alofone
- arquifonema
- par mnimo
- distribuio complementar
- transcrio
INTRODUO
A Lingstica pode ser definida como o estudo cientfico da estrutura da lngua. Ela
rene estudos em diversos campos, dentre eles, a Sintaxe, a Morfologia, a Semntica,
que se preocupam com unidades maiores, e a Fonologia que se volta para as unidades
lingsticas menores. Ao lado da Fonologia, que visa ao estudo sistemtico dos sons,
temos a Fontica, que se volta para a produo, propagao e percepo dos sons.
Os estudos fonticos e fonolgicos tm sua origem em momentos distintos. Os
estudos fonticos foram preocupao dos estudiosos da lngua muito antes do sculo XX;
j a Fonologia tem sua origem com os estudos do Crculo de Praga, no incio do sculo
XX, por isso que muitos trabalhos realizados no incio daquele sculo no tem limites
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definidos. Embora tenham objetos de estudo diferenciados, estes dois campos de
estudo so interdependentes. Isso o que veremos ao explicitar um e outro.
FONTICA
O Domnio da Fontica
A Fontica o estudo sistemtico dos sons da fala, isto , trabalha com os sons
propriamente ditos, levando em considerao o modo como eles so produzidos,
percebidos e quais aspectos fsicos esto envolvidos na sua produo.
Uma classificao bsica para a Fontica situa-a em trs domnios:
1. Fontica Articulatriaestuda os sons do ponto de vista fisiolgico. Descreve
e classifica os sons. Assim, ao descrevermos a realizao de um som, por
exemplo [p], podemos afirmar que na sua articulao quase no houve
vibrao das cordas vocais, por isso ele no-vozeado, que o fluxo do ar
seguiu o caminho do trato vocal, no das fossas nasais, o que o caracteriza
como oral, e que houve obstruo pelos dois lbios, por isso ele oclusivo e
bilabial. Este o papel da Fontica Articulatria.
2. Fontica Acsticaleva em conta as propriedades fsicas do som, como os
sons da fala chegam ao aparelho auditivo. Quando realizamos qualquer som,
a sua propagao se d atravs de ondas sonoras at chegar ao ouvido do
interlocutor. A anlise desse som e sua propagao, realizada com o auxliode programas computacionais especficos, permite avaliar sua altura, sua
intensidade etc.
3. Fontica Auditivacentraliza seus estudos na percepo do aparelho auditivo.
Muitas vezes, nem sempre percebemos o mesmo som de forma idntica. S
uma anlise mais acurada permitir identifica-lo. Este tipo de estudo cabe
Fontica Auditiva, campo de pesquisa muito pouco explorado, principalmente
no Brasil.
Esses trs campos de estudos nem sempre so implementados concomitantemente.E um dos motivos para que isso no ocorra a falta de especializao, principalmente,
no que concerne aos estudos acsticos e auditivos. Por isso, sempre nos detemos na
parte articulatria, considerando ser esta a parte mais fcil de ser verificada, j que
diz respeito produo dos sons. Vale salientar, entretanto, que para fazermos um
estudo mais detalhado da produo de alguns sons, temos necessidade de recorrer a
estudos acsticos. Tais estudos, no passado, necessitavam de aparelhos bem
sofisticados, e, muitas vezes, de difcil acesso. Hoje, com um computador bem
equipado, e com softwares especficos, podemos realizar excelentes anlises
acsticas.
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Considerando as dificuldades apontadas, aqui nos deteremos na parte articulatriados sons, ou seja, na Fontica Articulatria, aquela que, como afirmamosanteriormente, est voltada para a produo dos sons, levando em conta seu modo
de articulao, ser ponto, seu carter vozeado ou no e ainda sua configurao nasalou oral. Para isso, iniciaremos apresentando como os sons se realizam.
Aparelho fonador
O ser humano no possui um rgo, ou sistema, que tenha como funo primriaa produo dos sons da fala. Utiliza-se de partes do corpo, como pulmes, traquia,laringe, epiglote, cordas vocais, glote, faringe, vu palatino, palato duro (ou cu da
boca), palato mole, lngua, dente, mandbula, lbios e cavidades nasal, cujas funesprimrias so de alimentao e respirao, ou seja, vitais ao ser humano.
Como se realiza o som? Para respondermos a essa pergunta, temos queentender o caminho que o fluxo de ar segue na respirao. Importante lembrarmosque os sons no se realizam no momento de inspirao, mas na expirao. Ooxignio, vital ao ser humano, chega at os pulmes pela traquia. Em seu caminhode volta, ainda ar, ele sofre a primeira deformao ao chegar laringe. na laringeque definimos dois tipos de sons.
O ar expelido pelos pulmes chega laringe e atravessa a glote, que fica naaltura do chamado pomo-de-ado ou gog. O ar, ento, chega abertura entre asduas pregas musculares das paredes superiores da laringe, conhecidas pelo nome decordas vocais (ou pregas vocais). O fluxo de ar pode encontr-las fechadas ou abertas,em virtude de estarem aproximadas ou afastadas. Caso estejam fechadas, o ar fora
sua passagem, fazendo-as vibrar e produzir os sons chamados de vozeados. Nosegundo caso, quando relaxadas, o ar escapa, com pouca vibrao das cordas,
produzindo sons chamados de no-vozeados.
Fig. 1: Cordas vocais
Todos os sons da fala humana, sejam vogais, consoantes ou semivogais (tambmdenominadas de glides) so produzidos no trato vocal, este pode ser consideradocomo um aparelho constitudo de cmaras, tubos e vlvulas, cuja funo pr o arem movimento e controlar seu fluxo.
A distino entre sonora e surda pode ser claramente percebida na pronnciade pares de consoantes como [p] ~ [b], [t] ~ [d], [k] ~ [g], dentre outras, que seopes apenas pelo trao de vozeamento. Enquanto [p,t,k] so classificadas comono-vozeadas, por terem pouca vibrao das cordas voais, [b,d,g] so classificadascomo vozeadas, por terem maior vibrao das cordas vocais.
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Veja na figura abaixo, os rgos envolvidos na realizao dos sons:
Figura 2. rgos envolvidos no processo de realizao dos sons
Vamos seguir o fluxo de ar depois de passar pela glote, que onde ficam ascordas vocais, definidoras da sonoridade ou no dos sons.
Quando sai da laringe, o ar vai para a faringe. A o fluxo de ar, j no mais ar,mas som, pode tomar duas direes: o trato vocal ou o nasal. Entre estes dois canaisfica a vula, rgo dotado de mobilidade capaz de obstruir, ou no, a passagem do arna cavidade nasal e, conseqentemente, determinar a natureza oral ou nasal de umsom.
Quando levantada, a vula impede o fluxo de ar pelas fossas nasais, resultando,
assim, na produo de sons orais, a exemplo de [p], [b] [a].
Quando a vula est abaixada, temos a realizaes de sons nasais, isto porqueo ar passa tanto pelo trato vocal como pelas fossas nasais. o que acontececom a realizao de sons como [m], [n].
ATIVIDADE
Tape seus ouvidos com as mos e realize os sons mencionados anteriormente.Identifique pela ressonncia os vozeados e os no-vozeados.
OBSERVAO
Como estamos tratando da Fontica, veja que os sons mencionados esto sempreentre colchetes[ ]. Isto no aconteceria se estivssemos tratando da Fonologia. Nessecaso, utilizaramos barras / /.
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Na Figura 3, podemos verificar onde se realizam os sons orais e nasais.
Figura 3: Cavidade oral e cavidade nasal
Depois da faringe, local onde o fluxo do ar vai definir sons orais e nasais,
passemos agora ao trato vocal. No trato vocal temos o conjunto de articuladores.
Tais articuladores, como vistos na Figura 4, podem ser classificados como ativos e
passivos.
Articuladores ativos so denominados aqueles articuladores como lbio superior,
lngua, palato mole, que, na realizao dos sons, se movimentam. Ao contrrio, o
lbio inferior e o palato duro so denominados de articuladores passivos.
Figura 4: Articuladores ativos e passivos
Os sons lingsticos ainda podem ser classificados quanto ao modo articulao
e quanto ao ponto de articulao. Utilizaremos apenas os sons realizados na Lngua
Portuguesa.
Quanto ao modo de articulao, temos:
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a) oclusivaou plosiva: o fluxo de ar encontra uma interrupo total, seja pelofechamento dos lbios, seja pela presso da lngua sob a arcada dentria ou sob o
palato duro etc. So elas: [p, b, t, d, k , g ].
b) fricativa: h um estreitamento da passagem do ar, que resulta em um rudosemelhante ao de uma frico. So fricativas: [f, v, s, z,S, , x].
c) africada: na realizao dessas consoantes, temos a soma da ocluso e dafrico. o que acontece na realizao de: [tS, d].
d) nasal: aquele som que, na sua realizao, parte do ar sai pelo trato vocal eparte pelas fossas nasais, a exemplo de [m, n,]
e) lateral: a lngua, ao tocar os alvolos, obstrui a passagem do ar nas viassuperiores, mas permite que o ar passe atravs das paredes laterais da boca. Solaterais: [l e ].
f) vibrante: caracteriza-se pelo movimento vibratrio e rpido da lngua,provocando, assim, breves interrupes na corrente de ar. Para a vibrante, temos:[r]. Palavras como caro, barato apresentam este som.
g) tepe:ao contrrio da vibrante, o tepe se caracteriza por apenas uma batidada ponta da lngua nos alvolos. o caso do []. Este som aquele sempre usadonos encontros consonantais em palavras como prato, fraco etc.
h) retroflexa: caracteriza-se pelo levantamento e encurvamento da ponta dalngua em direo ao palato duro: []. Este o erre encontrado comumente no falarde algumas comunidades de So Paulo, do Paran e tambm de Minas Gerais.
Quanto ao ponto de articulao, isto , o local onde os sons so articulados notrato oral temos os seguintes sons:
:laibaliB solepodurtsboraodmegassapa
onujalepodizudorpmosO.soiblsiod
]m,b,p[:sometsiaibalibomoC.soiblsod
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Com estas descries articulatrias, podemos classificar os sons da lngua
humana. Para unificar as transcries dos sons, uma vez que suas realizaes podem
variar de uma lngua para outra, foi criado o Alfabeto Fontico Internacional (IPA).
Este sistema, ao ser utilizado na transcrio fontica, tambm permite que qualquer
falante conhecedor de seus smbolos realize sons de quaisquer lnguas.
At aqui temos descrito como se realizam as consoantes. Passemos agora s
vogais. Uma pergunta vale a pena ser feita: o que torna uma vogal diferente de uma
consoante?
Enquanto as consoantes, em geral, so classificadas como vozeadas e no-
vozeadas, as vogais so sempre vozeadas. Uma outra diferena diz respeito posio
que a vogal ocupa na slaba. A Lngua Portuguesa, diferente de outras lnguas, como
o Ingls por exemplo, no admite consoante no ncleo silbico. Todas as slabas do
Portugus tm sempre uma vogal como seu ncleo. No Portugus, as consoantes
tS, d,S,
,
Labiodental: H sons que so produzidos
pela obstruo parcial do ar. Desta forma, o
som produzido pela aproximao do lbioinferior e a arcada dentria superior. So
labiodentais: [f, v].
Dental/Alveolar: os sons so produzidos
pelo toque da lngua na parte de trs dos
dentes superiores (dentais) ou nos alvolos
(alveolares). So elas: [t, d, s, z, l, n, r, R, ]
Palato-alveolar:so os sons produzidos coma lmina da lngua contra a parte anterior do
palato duro, logo depois dos alvolos. So
palato-alveolares: [ ]
Palatal: os sons que so produzidos com a
lmina da lngua tocando o palato duro. Como
em [ ].
Velar:Estreitamento da cavidade bucal entre
o dorso da lngua e o vu palatino (ou palato
mole). So velares: [k,g,x].
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ocupam sempre as margens da slaba. Na seo sobre as consoantes, isto est maisexplicitado.
Foneticamente, podemos classificar as vogais considerando trs parmetros:
a) a posio vertical da lngua;b) a posio horizontal da lngua;c) a posio dos lbios.
Quanto posio vertical da lngua, as vogais podem ser classificadas em:alta, mdia e baixa.
As vogais altas so aquelas que, em sua realizao, a lngua, seja em direo parte anterior da boca ou parte posterior atinge maior altura. Na Lngua Portuguesatemos as vogais [i] e [u].
As vogais mdias mantm, em sua realizao, como o prprio nome diz, a lnguanem na posio mais alta nem em repousa. o que ocorre quando realizamos as vogais[e], [], [o], [].
J a vogal baixa, na Lngua Portuguesa o [a], mantm, em sua realizao, a lnguaem posio de repouso.
No que concerne posio horizontal da lngua, temos a possibilidade de a lngua,na realizao das vogais, ir na direo anterior da boca ou na direo frontal, o que nos das vogais anteriores [i], [I], [e], []. Se a lngua fica em repouso, temos a vogal [a],classificada, sob essa perspectiva, como central. Se a lngua recua na direo posterior da
boca, temos as vogais [], [o], e [u], tambm denominadas de posteriores.Quanto posio dos lbios, temos as vogais arredondadas e as no-
arredondadas. Fcil verificar quais so elas. Basta observar a configurao dos lbios em
sua realizao. So arredonddasas, as vogais [], [o], e [u]; e, no-arredondadas, asvogais [e], [], [] e [a].
A disposio das vogais da Lngua Portuguesa nos d um sistema triangular de basepara cima.
A seguir, temos o Alfabeto Fontico Internacional, apresentando tanto as consoantescomo as vogais utilizadas nas diferentes lnguas do mundo.
Tabela 1: Alfabeto Fontico Internacional
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Os dois quadros representam as transcries das consoantes e das vogais.
Podemos observar que os fones da Lngua Portuguesa esto a representados,
mas, alm deles, existem muitos outros.
Transcrio fontica
Para analisarmos a lngua utilizada falada por um falante sob o ponto de vista fontico,
necessrio que faamos sua transcrio fontica. Para isto, uma possibilidade lanarmos
mo dos smbolos fonticos que constituem o IPA. Essa transcrio, algumas vezes, pode
variar, dependendo do sistema fontico que est sendo utilizado.
Temos dois tipos de transcrio fontica: um mais amplo e um mais restrito. No tipo
amplo, no levamos em conta aqueles aspectos considerados secundrios na produo
dos sons, a exemplo da palatalizao, da velarizao etc. Em geral, este tipo de
transcrio que mais utilizamos no dia-a-dia da sala de aula ou em pesquisas de carter
dialetal.
ATIVIDADE
Identifique na Tabela 1, quais os fones consonantais e voclicos que fazem parte da
Lngua Portuguesa falada em sua comunidade.
ATIVIDADE
Procure um falante de sua comunidade, grave sua fala e transcreva-a foneticamente,
utilizando o tipo de transcrio mais amplo.
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FONOLOGIA
A Fonologia est ligada aos sistemas e padres que os sons possuem. Todas as
lnguas do mundo tm seus prprios padres sonoros. Embora as lnguas compartilhemcertas propriedades bsicas improvvel encontrarmos duas lnguas que tenham o mesmo
padro sonoro, ou seja, nunca encontraremos duas lnguas que tenham o mesmo inventrio
de sons, a mesma ordem e que sofram os mesmos processos. Um fonlogo pode estudar
sistemas de sons os mais diversos possveis, como os encontrados nas lnguas africanas,
nas variedades do portugus brasileiro e de Portugal etc. Pode tambm trabalhar na soluo
ou amenizao de deficincias da fala.
Se compararmos os padres do Portugus e do Ingls, por exemplo, veremos
que essas duas lnguas tm padres sonoros diferentes, que as posies ocupadas por
algumas consoantes nas duas lnguas no so as mesmas, e assim por diante. O Portugus
no tem consoantes interdentais do tipo [] , [], encontradas no Ingls em palaveas
como three e that, respectivamente. As slabas do Portugus podem ter no seu final
apenas quatro consoantes /N/, /l/,/r/ e /S/, j o Ingls pode ter vrias outras consoantes,
como, por exemplo: /t/, /d/, /b/ etc.
Antes de ver os tipos de questes sobre o sistema de sons levantados por fonlogos,
precisamos observar, brevemente, as relaes entre fonologia e outros componentes da
lngua.
De modo bastante conceitual, podemos definir lngua como sendo um sistema de
smbolos arbitrrio e convencionado pelo qual os seres humanos se comunicam em um
nvel abstrato no h nada concreto ou material que confirme a existncia da nossa
lngua, pois tudo est na mente dos falantes. Os estudos lingsticos mais tradicionais se
ocupam de um desses trs componentes: a Semntica, a Sintaxe e a Fonologia. Ocomponente semntico da lngua envolve os significados das palavras e como estas se
combinam para formar sentidos de grupos de palavras. O componente sinttico diz respeito
aos grupos de palavras se combinam pala formar sentidos variados. O componente
fonolgico compreende a representao mental dos sons, ou seja, os fonemas.
Se voltarmos nossa ateno, agora, para o que foi dito quando tratamos da
Fontica, verificamos que os itens lexicais que constituem a lngua, podem ser agrupados
em dois conjuntos: de um lado, os fones, de outro, os fonemas. Isto, em se tratando da
lngua falada. Se considerarmos a lngua escrita, ao lado deles, temos as letras ou grafemas,
as formas grficas que representam os sons.
Assim, em um item lexical como poda, temos quatro fones [p d a], quatrofonemas /p d a/ e quatro letras p o d a. Nem sempre esta correspondncia to
sistemtica como no exemplo que acabamos de dar.
A palavra falada constituida de unidades mnimas de sons. Na escrita, essas
unidades so representadas atravs de letras, porm nem todas as letras representam um
som diferenciado na lngua, por isso no se deve confundir letra com fonemas. Enquanto
um elemento grfico, o outro acstico. Uma mesma letra pode representar sons
diferenciados, a exemplo a letra sque, na escrita, pode ter o som de [s](sela)ou[z]
(casa).
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Para conhecermos os fonemas de uma determinada lngua, precisamos, inicialmente,
fazer um levantamento dos fones que pertencem a esta lngua. Para isto, precisamos deixar
claro o que seja fonema e o que seja fone.
A noo de fonema est diretamente ligada noo de oposio. Nos itens lexicaistia e dia, observamos que eles so distintos pela oposio estabelecida entre os sons
[t] e [d]. Assim podemos afirmar que /t/ e /d/ so dois fonemas. Por outro lado, se tivermos
para o item lexical tia as realizaes [t] e [t], no podemos dizer que temos dois
fonemas, mas dois alofones de um mesmo fonema. Para termos uma oposio entre
fonemas necessrio que tenhamos alterao de significado.
Uma possibilidade de determinarmos o sistema fonolgico de uma lngua, ou seja,
definirmos o nmero de fonemas que ela tem, trabalharmos com o que chamamos de
par mnimo, ou seja, reunirmos itens lexicais que se diferenciem por apenas um elemento.Se reunirmos os itens lexicais [pala] e [bala], verificamos que eles se distinguem apenas
pelo [p] e pelo [b]. Logo podemos afirmar que /p/ e /b/ so dois fonemas, pois a alternncia
de um pelo outro implica, conseqentemente, o significado de cada um dos itens.
Encontrar um par mnimo sempre a esperana dos fonlogos, mas nem sempre
isto acontece. Muitas vezes, temos que trabalhar com outras opes, uma delas considerar
o contraste, no em ambiente idntico, mas em ambiente anlogo, que o que acontece
em itens como sumir e zunir. Podemos observar que, neste caso, a diferena entre um
item e outro se d em mais de um segmento, tanto entre [s] e [z],como entre [m] e [n], mas
isto no impede de consider-los como fonemas.
Ao definirmos os fonemas de uma lngua, tambm definimos quais so seus alofones.
Se o par mnimo uma possibilidade de identificao dos fonemas, a distribuiocomplementar uma possibilidade de identificar os alofones de um fonema. Dizemos
REFLEXO:
Quando dois itens lexicais se distinguem pela troca de um nico som e essa troca
representa uma mudana de significado, estamos diante do que chamamos depares
mnimos. Caso a mudana de sons no acarrete alterao do sentido no teremos
pares mnimos, mas simplesmente um caso de variao (alofones). Desta forma pode-
se detectar fonemas ou constatar variao.
LEITURA
Para maiores detalhes sobre ambiente idntico e ambiente anlogo, sugerimos a
leitura:SILVA, Thas Cristfaro. Fontica e Fonologia do Portugus. So Paulo:
Contexto.
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que dois segmentos esto em distribuio complementar, quando um no pode ocupar omesmo lugar do outro.
Um exemplo bem simples para entendermos a distribuio complementar a
distribuio dos segmentos [s] e [] no falar paraibano. Se considerarmos os dados:
a. posteb. frascoc. espoletad. esfola
Verificamos que o /s/ s se realiza como [] antes de [t]; antes de [k], [p] e [f], elese realiza sempre como [s]. Assim, podemos dizer que [s] e [] esto em distribuiocomplementar, ou seja, o espao ocupado por um no pode ser ocupado pelo outro.
Neste caso, [s] [] so alofones de um mesmo fonema /s/.A possibilidade de utilizar um fonema para representar dois alofones, como no caso
acima, d quele fonema um status que foi designado pelos lingistas estruturalistas dearquifonema. Oarquifonema, assim, neutraliza as oposies.
Dois nveis de Fonologia
Ao classificarmos os componentes da fonologia das lnguas, podemos ressaltar,pelo menos, dois nveis: um nvel mais baixo, nele, encontramos todos os sons quefalamos e escutamos (a Produo do Discurso); j em um nvel mais alto, est a formulaode seqncias de sons que so baseados no conhecimento do sistema fonolgico que oouvinte e o falante possuem de uma determinada lngua (o Conhecimento Fonolgico). AFigura 5 ilustra esses dois nveis. O primeiro deles pode ser tambm chamado de nvelsubjacente; o segundo, nvel de superfcie.
O uso dos sons da fala em contexto e comunicao se d de modo to natural que preciso lembrar que esses componentes fonolgicosexistem e que precisamos conhecer
os elementos fonolgicos de uma lngua para que haja comunicao.
ATIVIDADE
A partir da noo de par mnimo, e com base em dados de sua comunidade,elabore o quadro de consoantes da Lngua Portuguesa. Faa o mesmo com asvogais.
LEITURA
Acerca dos pontos levantados, sugerimos a leitura:CMARA Jr. Joaquim Mattoso. Estrutura da Lngua Portuguesa. Petrpolis: Vozes.
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Figura 5: Dois nveis de Fonologia
Podemos ainda observar dois traos do conhecimento fonolgico essenciais para a
formao de uma lngua:
1- Um grupo de sons consistentes de sentido;
2- Regras de como esses sons devem ser usados para formar palavras.
Ao solicitarmos a tarefa, partimos do princpio dasregras simples de formao de palavras da Lngua Portuguesa,
fazendo o falante (o participante do jogo) agrupar as letras de
acordo com o que permitido na lngua. Por exemplo, observe
que no portugus no permitido um grupo de consoantes do
tipo bf, db, rd etc. dentro de uma slaba. No entanto,
seqncias do tipo br, fr, fl so facilmente aceitas.
ENTRADASSEMNTICAS,SINTTICAS EPRAGMTICAS
COMPONENTE FONOLGICO
CONHECIMENTO FONOLGICO(DISCURSO OCULTO)
PRODUO DO DISCURSO(DISCURSO IMPOSTO)
ANALISE A FRASE:
Vamos para casa agoraem uma verso de trs pra frenteRagoa Zaca rapa
mosva. Para a leitura de ambas as frases, voc faz o uso do nvel mais baixo, o da
produo do discurso. No entanto, para voc reconhecer como uma frase
fonologicamente aceita na Lngua Portuguesa, apenas a primeira ganha consistncia.
Em um jogo de formao de palavras, imagine que voc sorteou as seguintes le-
tras: R, B, A, F, O, L, C, I, D. Quantas palavras podem ser formadas a partir
dessas letras? liste algumas em seu caderno antes de prosseguir a leitura! lembre-
se de utilizar apenas as letras acima.
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RAZES PARA ESTUDAR FONTICA E FONOLOGIA
Existem muitas razes para estudarmos Fontica e Fonologia. Conseqentemente,
pessoas de muitas disciplinas diferentes se tornam envolvidas pelas pesquisas nesta rea.Vejamos algumas delas:
- Entendemos ser impossvel ensinar uma lngua estrangeira sem o conhecimentodo seu sistema fonolgico e sem o conhecimento de como os seus sons sorealizados. S de posse desse conhecimento que os professores podem alcanarseus objetivos.
- No ensino da lngua materna, se que isto seja possvel, os professores precisamentender como se d o processo de aquisio dos sons. importante saber, por
exemplo, que os sons no adquiridos ao mesmo tempo, que existe uma idadepara que determinados processos no aceitveis na norma sejam descartados eassim por diante.
- Nos tarefas clnicas dos fonoaudilogos, principalmente naquelas que dizemrespeito linguagem, de suma importncia o conhecimento tanto da Fonticacomo da Fonologia. Sem esse conhecimento, terapias podem tornar-se muitomais longas do que o necessrio.
- O conhecimento dos diferentes falares atrelado ao conhecimento da Fonologiada lngua poder ser utilizado para a compreenso dos processos variveis dalngua. Esse conhecimento pode ser utilizado para amenizar atitudes
preconceituosas em relao a diferentes formas de dizer a mesma coisa. Exemplosdessa natureza so muito comuns no Brasil. H quem acredite, por exemplo, queexiste uma regio que fale melhor Portugus do que outra. Acredito nisso denotadesconhecimento dos diferentes falares.
- Muito tem sito usado o conhecimento da Fontica e da Fonologia na identificaode voz, trabalho realizado com freqncia pela polcia tcnica que procuraidentificar envolvimento de pessoas culpadas em aes de infrao.
ATIVIDADE
Faa um levantamento de outras aplicaes dos estudos fonticos e fonolgicos.
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UNIDADE IVOGAIS
APRESENTAO
Este captulo introduz uma viso acerca das vogais da Lngua Portuguesa, considerando
sua tonicidade na palavra, tendo como objetivos:
- Classificar as vogais do portugus brasileiro;
- Apresentar as possibilidades de realizao das vogais na fala, seguindo os estudos
variacionistas;- Elencar os processos fonolgicos que acompanham na realizao das vogais em
suas diferentes possibilidades.
CONCEITOS BSICOS
- vogal tnica
- vogal pretnica
- vogal postnica
- neutralizao
- nasalidade fontica
- nasalidade fonolgica
- harmonia voclica
- assimilao
Aprendemos, desde a infncia, que existem cinco vogais no alfabeto na nossa
lngua. O estudo das vogais do portugus, no entanto, vai muito alm desses cinco smbolos
grficos usados para represent-las. A lngua oral apresenta, na verdade, sete fonemas
voclicos, que se comportam de maneira especfica, dependendo da sua posio em
relao ao acento tnico.
De acordo com modelo exposto por Cmara Jr. (2006), a Lngua Portuguesa do
Brasil apresenta um quadro de vogais que so definidas de acordo com a posio da
slaba a que pertencem, em relao tonicidade da palavra, e mutveis dependendo do
processo de neutralizao que sofrem.
Para caracterizar as vogais da nossa lngua em sua plenitude, podendo identificar
todas as suas variedades, a tonicidade das slabas da palavra a melhor opo, no sentido
de que a slaba tnica o contexto ideal para represent-las. Dessa forma, as vogais
classificam-se como no Quadro 1:
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Quadro 1: As vogais da Lngua Portuguesa segundo Cmara Jr.
Assim, quando temos um contexto de slaba tnica, os segmentos voclicospodem assumir essas sete representaes, sem apresentar variaes de um dialeto para
o outro.
Podemos observar, ento, que as vogais tnicas assumem
um quadro categrico, composto de sete vogais /i, e, , a, u, o, /
distribudas em todas as posies possveis.
Saindo da posio tnica, o quadro de vogais sofre uma
reduo, dependendo do processo de neutralizao de cada
posio. Vale lembrar que proeminncia da slaba que tem
representao na vogal, torna-se mais dbil medida que sai da
posio tnica. E importante salientar que entre as posiespretnica e postnica, a posio postnica mais dbil do que a pretnica.
As posies pretnica e postnica podem nos dar um outro quadro de vogais.
Em se tratando desta ltima, temos que considerar ainda a diferenciao entre as finais e
as no-finais.
Antes de passarmos para as vogais pretnicas, consideremos ainda o
comportamento das vogais tnicas em um contexto especfico: o de consoante nasal. A
presena de uma consoante desse tipo na slaba seguinte vogal tnica elimina as vogais
mdias de 1 grau, como podemos constatar nos exemplos em (2):
(2)
roiretnA lartneC roiretsoP
atlA i u
atlAaidM e o
axiaBaidM
axiaB a
sadadnoderra-oN sadadnoderrA
:/a/ ot]a[m
:/e/ od]e[m
:// ort][m
:/o/ orr]o[m
:// ot][m
:/i/ oc]i[m
:/u/ or]u[m
/a/ edadin]a[s
/e/ ahn]e[s
/o/ on]o[s
/i/ on]i[s
/u/ om]u[s
A slaba tnica a slaba mais proeminente da palavra. As slabas menos proeminentes se denominam
slabas tonas. Sendo assim, as slabas tonas antes da tnica se denominam pr-tnicas e as depois se
denominam ps-tnicas.
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Na Lngua Portuguesa, na verdade, no temos vogais nasais, o que temos so
vogais orais seguidas de um arquifonema nasal. Logo, as vogais do Portugus so
nasalizadas.
No que concerne nasalizao das vogais, podemos estabelecer, seguindo aorientao de Cmara Jr., a distino entre nasalidade fontica e nasalidade fonolgica.
A nasalidade fontica aquela que no estabelece distino de significado, como
a que acontece em palavras como camelo, banana, que podem ser realizadas tanto
como [kmelU], [bnna] ou como [kamelU], [banna], respectivamente.
J a nasalidade fonolgica pressupes alterao de significado, a exemplo de
[ktU] e [katU]. Observe que a no- nasalizao da vogal [a], na segunda palavra, gerou
um outro item lexical com significado totalmente diferente do anterior.
Consideremos agora as vogais em posio tona. Segundo Cmara Jr., as sete
vogais tnicas se reduzem a cinco na posio pretnica (/a/, /o/, /e/, /u/, /i/), a quatro em
posio postnica no-final (/a/, /e/, /i/, /u/) e a trs na posio tona final (/a/, /i/, /u/).
Essa classificao foi feita com base no dialeto culto carioca. Sabemos, entretanto, que o
comportamento das vogais no portugus do Brasil apresenta-se de forma varivel, atestado
pelas inmeras pesquisas sociolingsticas realizadas no pas.
Sendo assim, compreendemos que o contexto das vogais tonas bastantecomplexo, no que concerne heterogeneidade existente na lngua. Para tanto, faremos
algumas consideraes sobre as vogais em posio tona, levando em conta os trabalhos
j realizados no pas sob a perspectiva variacionista. Comecemos pelas vogais pretnicas.
As vogais pretnicas
O sistema voclico do portugus reduzido, na posio pretnica, de sete para
cinco vogais. Assim, desaparece a oposio entre as mdias de 1 e 2 grau.
(3)
Essa supresso interpretada como um fenmeno de neutralizao, que consiste
numa na reduo de mais de um fonema em uma s unidade fonolgica. Essa classificao
de Mattoso, em favor das mdias de 2 grau no categrica, tendo em vista que as
vogais pretnicas da Lngua Portuguesa do Brasil apresentam um comportamento bastan-
ATIVIDADE
Faa um levantamento de palavras na lngua de sua comunidade que apresentem
variao no uso das vogais nasalisadas
satla /i/ /u/
saidm /e/ /o/
axiab /a/
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te varivel.
Como j atestava Antenor Nascentes (1953), aqui estabelecemos nossa linha que
delimita os dois grupos de falares brasileiros em relao s vogais pretnicas. Em geral,
afirma-se que, com relao posio pretnica, os dialetos das regies norte-nordestecaracterizam-se pela presena das vogais mdias abertas, mais do que as fechadas, na
posio pretnica (// e //) e os do sudeste-sul pelas vogais fechadas (/e/ e /o/), como
mostram os exemplosem (4):
(4)
Essa possibilidade, porm, no categrica. H uma possibilidade de variao
entre as pretnicas e a alternncia se d entre as mdias de segundo grau [e, o] e as altas
[i, u]. Tal fenmeno chamado de harmonizao voclica e diz respeito ao processo em
que as vogais pretnicas assimilam o trao de altura da vogal seguinte, tornando-se altas
como a vogal tnica, como podemos ver em (5):
(5)
Havamos dito que onde prevalecem para os falares do sul e do sudeste as vogais
mdias de segundo grau, para o nordeste, norte e centro-oeste prevalecem as mdias
de primeiro grau.
Esta disposio das vogais pretnicas no algo to tranqilo, principalmente
quando se trata da regio nordeste. Podemos encontrar nessa regio uma variao
muito grande. O certo, entretanto, que a realizao preferida por seus falantes a
mdia aberta, ao contrrio do sul e do sudeste que preferem as mdias de segundo
:etsedroN-etroN :etseduS-luS
arutr][ba arutr]e[ba
of][hc of]e[hc
odav][rtne odav]e[rtne
atnugr][p atnugr]e[p
ospal][c ospal]o[c
o][l][c o]e[l]o[c
odadl][s odadl]o[s
oar][ oar]o[
~airg]e[la airg]i[la
~adib]e[b adib]i[b
~odid]e[p odid]i[p
~aiug]e[rp aiug]i[rp
~atreb]o[csed atreb]u[csed
~ajur]o[c ajur]u[c
~red]o[p red]u[p
~rehl]o[c rehl]u[c
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grau.Vale salientar que essas representaes no so realizadas na escrita. As palavras
seguem a conveno do cdigo determinado na fala. importante, sobretudo, conhecer o
funcionamento varivel das vogais, uma vez que nossa realidade de ensino exige quetrabalhemos conscientemente ante a nossa lngua, no sentido de reconhecer as diferenase saber lidar com elas.
Vogais Postnicas
Quando se trata das vogais postnicas, a primeira considerao a ser feita queelas podem estar no meio da palavra (so as postnicas no-finais) ou no final (so as
postnicas finais). A sua caracterizao especfica, dependendo do contexto silbico emque ela estiver localizada.
Diferentes das pretnicas, as vogais postnicas, tanto em posio no-final como
final, apresentam uma configurao mais homognea de norte a sul. E os estudos sobreessa questo ainda no so muito numerosos.
Postnicas no-finais
J que estamos seguindo a classificao de Cmara Jr. (2006, p. 44), traremosabaixo o quadro das vogais postnicas no-finais descrito por ele:
(6)
Segundo esse autor, h neutralizao entre as vogais /u/ e /o/, mas no entre /e/ e/i/, como pode ser visto nos exemplos em (7):
ATIVIDADE E EXEMPLO
a) A partir do falar de sua comunidade, identifique as vogais presentes na posiopretnica. Considere:- o tipo de consoante que antecede e segue a vogal;- o tipo devogal que ocupa o centro da slaba tnica.b) Procure textos escritos de alunos doEnsino Fundamental e verifique a utilizao das vogais pretnicas mdias.
satla /i/ /u/
saidm /e/ //
axiab /a/
Vale salientar que vogais postnicas no-finais s aparecem em palavras proparoxtonas
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(7)
Outro fenmeno que pode ser observado no comportamento das vogais postnicas
no-finais o seu apagamento. Os estudos realizados sobre as postnicas no-finais
tm confirmado essa tendncia, j na passagem do Latim para o Portugus. Como constata
Amaral (2002, p. 101), a variao das proparoxtonas um fenmeno difundido em
todo territrio, no s na fala normal dos menos escolarizados como na fala
espontnea dos mais escolarizados, em determinadas situaes.
O apagamento das vogais, nesta posio, acaba sendo previsvel, isto porque a
ordem dos segmentos no ataque silbico1no pode contrariar o padro da lngua em
termos do Princpio de Seqenciamento de Soncia (cf. CLEMENTS, p.283-284), como
nos casos em (8):
(8)
Caso no ocorra o apagamento, outras alteraes podem ser encontradas, comonos exemplos em (9):
(9)
Observando o caso de relmpago, verificamos que, alm do apagamento da vogal
postnica, se d tambm a queda da consoante que a segue g, sua manuteno geraria
um ataque mal formado (com um encontro consonantal inexistente na lngua portuguesa).
Para evitar isso, o falante apaga a seqncia VC (Vogal Consoante). Se observarmos o
caso de estmago, podemos verificar que o falante efetua um processo bastante
interessante: ele apaga a vogal, mas mantm a consoante seguinte. Como a consoante
~or]e[mn or]i[mun*
~al]o[rep al]u[rep
~aracx arcix
~erovr ervra
~arachc arcahc
~arobv arbiv
~arepsv arpsev
alulp aluip
epicnrp epsnirp
odabs obas
ociltac ocitac
ogapmler opmaler
ogamtse obmotse
1
As noes sobre estrutura silbica sero explicitadas na seo que tratar das consoantes do Portugus.
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nasal que ocupa a posio do ataque uma labial, ele altera o trao dorsal da consoante
seguinte de dorsal para labial, resultando, assim um padro bem formado. Esses so
alguns dos processos que ocorrem na variao voclica do portugus.
Vamos agora conhecer o comportamento das postnicas finais.
Postnicas finais
O sistema voclico apresentado por Cmara Jr. o mais reduzido. Das sete vogais
em posio tnica, passamos a trs: /i, a, u/.
(10)
Considerando os estudos realizados no sul do Brasil, este quadro no se revela
categrico, e possvel encontrarmos, convivendo variavelmente, mdias de segundo
grau e altas. Tal variao atribuda, principalmente, ao tipo de colonizao.
(11)
Apesar de no termos estudos conclusivos em outras regies brasileiras, intuitivamente
podemos afirmar que existe um padro geral para as postnicas no-finais, com manuteno
das cinco vogais. Isso acontece quando temos a vogal postnica em slaba travada2. Em
geral, slabas travadas por segmento soante (nasal, lateral, vibrante) tendem a desfavorecer
a elevao da vogal, como em (12a), e slabas travadas por obstruinte coronal tendem a
favorecer sua elevao, como em (12b):
(12)
Acreditamos que, de norte a sul,os resultados sejam similares.
Essas explanaes representam uma proposta rumo organizao dos estudos
realizados no Brasil sobre o uso varivel das vogais em todas as suas posies na palavra.
satla /i/ /u/
saxiab
/a/
]e[tiel ]I[tiel
]e[tned ]I[tned
]o[tag ]U[tag]o[tsop ]U[tsop
)ar]e[trac~retrac
)bs]U[nem~sonem
redl r]e[dl
2
Slabas travadas so aquelas que tm a coda (posio final da slaba) preenchida.
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A compreenso da variabilidade que aparecem nas vogais apenas uma primeira etapa,
mas essencial para futuros estudos com vistas Lngua Portuguesa do Brasil e tambm
como forma de avaliar os processos da lngua em geral.
Os estudos variacionistas realizados e os que ainda sero implementados tambmtero aplicabilidade no ensino do Portugus, principalmente no nvel fundamental, aquele
em que muitas questes so silenciadas pela falta do conhecimento terico por parte dos
professores que poderia respond-las.
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UNIDADE II
DITONGO
Apresentao
Este captulo introduz uma viso acerca de Ditongo na Lngua Portuguesa, tendo
como objetivos:
- conceituar ditongo;
- classificar os ditongos da Lngua Portuguesa, com base na Gramtica Normativa
e na Lingstica;
- descrever o uso do ditongo na Lngua Portuguesa.
Conceitos bsicos:
- ditongo
- monotongao
- semivogal
- glide
- ditongo crescente
- ditongo decrescente
A noo de ditongo apresentada desde as sries iniciais no ensino de Lngua
Portuguesa. Esse termo comumente utilizado para designar um encontro voclico em
uma mesma slaba. A Gramtica Tradicional classifica os ditongos em crescente (quando
h uma semivogal, seguida de uma vogal) e decrescente (quando a vogal precedida da
semivogal).
Na Lingstica, os ditongos so tambm caracterizados como uma seqncia de
segmentos voclicos. Esses segmentos, no entanto, assumem qualidade diferente na
realizao, sendo uma das vogais da seqncia realizada como semivogal (tambm
conhecida como glide).
As semivogais so vogais assilbicas, ou seja, elas ocupam a margem do ncleosilbico, pois no apresentam proeminncia acentual para ser o centro da slaba, como as
vogais. O portugus apresenta dois segmentos que se caracterizam como semivogal: o [j],
que muitas vezes representado pelo [y], e o [w].
(1) le[j]te
bo[j]
pa[w]ta
m[w]
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Existe uma discusso em torno dessa questo: os glides devem ser considerados
segmentos voclicos ou segmentos consonantais? Assumindo aqui a explicao de Cmara
Jr. em seu livro Estrutura da Lngua Portuguesa, que usa como argumento o
comportamento do r na palavra, consideramos o glide como um segmento voclico,uma vez que em fronteira silbica, o r realizado como brando depois de vogal (ex.:
mora) e forte depois de consoante (ex.: honra). Nos casos de r depois de um ditongo,
este realizado como brando (ex: europeu), o que justifica o status voclico do glide.
Sendo assim, os ditongos definem-se pela presena de uma vogal mais um glide
numa seqncia. Vale salientar que esses dois segmentos fazem parte da mesma slaba,
diferindo, portanto, do que se conhece por hiato, que so duas vogais em seqncia, mas
que mantm a sua qualidade (ou seja, nenhuma das duas semivogal) e esto em slabas
distintas (ex.: pais [pajs]* x pas [pajs]**.
H tambm uma discusso sobre a existncia e classificao dos ditongos na
Lngua Portuguesa. Muitos lingistas (dentre eles Cmara Jr., Leda Bisol) consideram que
os verdadeiros ditongos so os decrescentes (formados por vogal + semivogal); eles
defendem que os ditongos crescentes (semivogal + vogal) no existem na origem das
palavras e, portanto, podem variar livremente com o hiato (ex.: [swar ~ suar]. H, no
portugus, somente um tipo de ditongo crescente que no alterna com hiato: aqueles
formados na seqncia de consoantes oclusivas /k/ ou /g/ mais a semivogal /w/, seguida
de /a/ ou /o/ (ex.: qual [kwaw].
Segundo Cmara Jr., os ditongos existentes na lngua portuguesa classificam-se
assim:
Ditongos decrescentes
/ai/: pai;/au/: pau;
/i/: papis (s diante de /s/);
/i/: lei;
/iu/: riu;
/i/: mi;
/i/: boi;
/u/: vou
/u/: sol
/ui/: fui
Ditongo crescente
/kw; gw (a, , , i, , )/ : ex.: qual [extrado de Cmara Jr (2006, p. 56)]
Alguns ditongos decrescentes, entretanto, sofrem variao e podem ser realizados
como uma nica vogal na fala, quando ocorre o processo de monotongao. A
monotongao diz respeito a um processo de reduo de um ditongo a um monotongo
(uma vogal que no muda de qualidade na sua realizao). Em outras palavras, ocorre
* Mesma slaba
** Slabas diferentes
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monotongao quando um ditongo (vogal + glide) realizado como uma vogal simples,
ou seja, a semivogal da seqncia apagada.
Esses ditongos decrescentes, capazes e sofrer reduo so classificados, na
literatura especfica, como ditongos leves; ao passo que os verdadeiros ditongos notornam-se monotongos.
Ditongos leves
Ex.: c[aj]xa ~ c[a]xa
f[ej]ra ~ f[e]ra
c[ow]ro ~ c[o]ro
Verdadeiros ditongos
Ex.: b[aj]rro ~ *b[a]rro
m[ej]go ~ *m[e]go
m[ej]ga ~ *m[e]ga
Para compreendermos a sistematizao da lngua imprescindvel que levemos em
considerao o seu real funcionamento. Neste sentido, verificamos que as pesquisas na
rea da Sociolingstica Variacionista tm dado uma grande contribuio para os estudos
da Lngua Portuguesa no Brasil, revelando o verdadeiro comportamento da lngua(gem)
usada efetivamente pelas pessoas em contexto concreto.
ATIVIDADE
A partir de dados da lngua falada em sua comunidade, verifique que ditongos podem
sofrer o processo de monotongao.
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UNIDADE IIICONSOANTES
APRESENTAO
Este captulo apresenta o sistema consonantal da Lngua Portuguesa, considerando
a consoante em sua posio na slaba. Tem como objetivos:
- descrever o sistema consonantal;
- identificar as consoantes que ocorrem como primeiro segmento de uma slabaCV;
- identificar as consoantes que ocorrem como segundo segmento de uma slaba CCV;
- identificar as consoantes que ocorrem na posio de coda do padro silbico CVC.
CONCEITOS BSICOS
- consoante
- padro silbico
- ataque
- coda
- ncleo
1 Introduo
As consoantes, como sabemos, so segmentos que tm como caractersticas
principais serem articuladas sempre com algum tipo de obstruo e ocuparem as margens
da slaba.
O nmero de consoantes da Lngua Portuguesa bem maior do que o nmero de
vogais, conseqentemente, na sua variabilidade, de se esperar que seja mais produtiva.
Em geral, o quadro de fonemas consonantais da Lngua Portuguesa constitudo
de 19 fonemas, como ilustra o quadro abaixo:
Quadro 2: Fonemas consonantais da Lngua Portuguesa do Brasil
Este quadro, entretanto, nem sempre categrico, como veremos a seguir.
edodoM
oalucitrA
oalucitrAedotnoP
laibaliB latnedoibaL .vlA/.tneD raloevlA-laP latalaP raleV
.ruS .noS .ruS .noS .ruS noS .ruS .noS .ruS .noS .ruS .noS
avisulcO /p/ /b/ /t/ /d/ /k/ /g/
avitacirF /f/ /v/ /s/ /z/ // // /x/
lasaN /m/ /n/ //
laretaL /l/ //
etnarbiV /r/
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Se, para elencarmos o nmero de vogais, observamos a sua posio de acordo
com a tonicidade da slaba na palavra, para as consoantes, vamos considerar a sua posio
na slaba, levando em conta, para isso, o padro silbico da lngua. Nossa lngua tem um
padro silbico relativamente simples, no permitindo mais do que duas consoantes nemna posio inicial (ataque) nem na posio final (coda).
. Assim, se a consoante ocupa o ataque silbico ou segunda posio de ataque
complexo, ter-se- um nmero de consoantes, que, por sua vez, ser alterado se a consoante
ocupa a posio de coda. Neste captulo, sero analisadas as consoantes nas trs posies,
considerando a variao existente.
Antes de descrevermos o sistema consonntico da Lngua Portuguesa,
apresentaremos alguns conceitos relacionados com a slaba, o que facilitar a compreenso
do que vir em seguida.
2 Sobre a slaba
Em Chomsky & Halle (1968), com a proposta denominada de The Sound Patterns
of English (SPE), foi defendido que uma representao fonolgica seja simplesmente uma
seqncia de feixe de traos no-ordenados, apresentada com um conjunto de smbolos
de fronteira que reflitam a composio morfolgica das palavras, e um sistema de colchetes
rotulados representando a organizao sinttica dessas palavras. Hoje, com o passar dos
anos e com os estudos que vm sendo desenvolvidos, sabe-se que fazer fonologia sem
slaba um erro.
Com o aparecimento da estrutura hierrquica, envolvendo no s a estrutura
silbica, mas tambm a estrutura prosdica mais alta, e a desconstruo do segmento em
termos de uma hierarquia das camadas de traos, a proposta do SPE foi substituda poruma viso sobre as representaes que favoreceram uma estrutura mais elaborada.
Interessante observar que o falante nativo, em geral, sabe algo sobre a estrutura
silbica das palavras em sua lngua, ou seja, eles podem identificar quantas slabas constituem
uma determinada palavra e at sabem onde cada uma delas comea e onde termina.
2.1 Organizao interna da slaba
Ao identificar o nmero de slabas, o falante est demonstrando seu conhecimento
acerca da arquitetura envolvida na sua realizao. De um ponto de vista fontico, cada
slaba tem um pico de sonoridade, isto , um segmento que mais sonoro do que outro.Logo, a sonoridade uma propriedade relativa. Em termos auditivos, o pico de sonoridade
mais proeminente do que os segmentos vizinhos, e forma o elemento silbico. No caso
do Portugus, por exemplo, as vogais so inerentemente mais sonoras do que as consoantes
e s elas constituem o pico silbico. H lnguas, como o Ingls, em que os segmentos com
sonoridade espontnea, como o /r/ e o /l/ podem ser o pico silbico.
H propostas diferenciadas sobre a representao fonolgica da slaba. Aqui ser
adotada a proposta de Selkirk (1982), segundo a qual, a slaba pode ter os seguintes
constituintes: h uma diviso principal da slaba em ataque3e rima, e a rima, por sua vez,
se divide em ncleo e coda, conforme o diagrama 1:
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Diagrama (1)
(=slaba)
Ataque Rima
Ncleo Coda
bvio que nem todas as slabas do Portugus preenchem todas as posies. Haquelas do tipo CV, como em c, em que apenas o ataque e o ncleo so preenchidos,a exemplo do que apresenta o diagrama 2:
Diagrama (2)
Ataque Rima
Ncleo Coda
c a
H algumas em que apenas o ncleo preenchido, a exemplo de a no diagrama 3:
Diagrama (3)
Ataque Rima
Ncleo Codaa
e ainda outras em que apenas o ncleo e a coda so preenchidas, como em ar, nodiagrama (4):
1Para Cmara Jr. (2002, p. 53), o ataque corresponde fase crescente da slaba e a coda corresponde decrescente. O ncleo o pice
da slaba.
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Diagrama (4)
Ataque Rima
Ncleo Coda
a r
Comum a todas elas o fato de o ncleo ser sempre preenchido por uma vogal,
como j foi mencionado anteriormente.
Alm disso, o Portugus apresenta tambm possibilidades de o ataque e a coda
serem complexos, o que significa serem ramificados, como em pra, em que o ataque
constitudo pelas consoantes p e r, como na slaba pra no diagrama (5):
Diagrama (5)
Ataque Rima
Ncleo Coda
p r a
e tambm tem a coda complexa, como mons da palavra mons.tro, em que n e s
ocupam tal posio, como mostra o diagrama 6:
Diagrama (6)
Ataque Rima
Ncleo Coda
m o n s
Vale chamar a ateno para o fato de o ataque e a coda complexos serem muito
pouco produtivos no PB, como vermos adiante.
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3. Fonottica4do PB
A estrutura fonottica das palavras pode ser entendida ao se pensar que os segmentos
esto organizados em unidades silbicas, e que as palavras podem conter vrias ocorrncias
diferentes ou semelhantes entre si. Algumas lnguas apresentam palavras que mostram
uma simples repetio de slabas CV, outras apresentam padres diferenciados. Entre
estas ltimas est a Lngua Portuguesa
3.1 Padres silbicos
Em seu estudo sobre a slaba na Lngua Portuguesa, Collischonn (2002)
apresenta um molde silbico que determina o nmero mximo e o nmero mnimo de
elementos permitidos, variando de um a cinco segmentos. Os padres silbicos so
preenchidos por vogais (V) e consoantes (C), como em (1):
(1)
Extrado de Collischon (2002, p. 110).
SUGESTO DE LEITURA
Como o objetivo deste captulo no discutir propriamente a slaba e seus constituintes,
analisando-os fonologicamente, para maior aprofundamento, sugerimos que sejam
lidos os seguintes textos:BISOL, Leda. A slaba e seus constituintes. In: NEVES,
Maria Helena de Moura. Gramtica do Portugus Falado. Vol. VII. So Paulo: Editora
da Unicamp, p. 701-742COLLISCHONN, Gisela. A slaba em portugus. In:
BISOL, Leda (org.).Introduo a estudos de fonologia do portugus brasileiro.
Porto Alegre: EDIPUCRS, 2002.
V
CV ra
CCV etnat.sni
VC c
CVC ral
CCVC ort.snom
VCC irt
CVCC srt
CCVCC etrop.snart
VV al.ua
VVC iel
VVCC uarg
CVVCC ort.sualc
4
Por Fonottica devemos entender a forma como os segmentos esto dispostos ou ordenados nos contextos.
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32
REVISO
O ataque silbico corresponde primeira posio na slaba. H quem o denomine
de aclive, como Cmara Jr. Este ataque pode ser preenchido por at duas consoantes,
no mais que isto.
Para a Lngua Portuguesa, como j afirmamos anteriormente, o que existe de comum
a todos os padres a presena do elemento V, que constitui o ncleo da slaba. A sua
esquerda, o ataque silbico, tem-se o preenchimento por at duas consoantes.
(2)
3.2 A posio de ataque
Ao se examinar o ataque, temos que levar em
considerao que ele pode ser preenchido por um
elemento (ataque simples) e por dois elementos (ataque
complexo).
O ataque simples pode ocorrer tanto em posio
inicial como em posio medial. Alguns segmentos,
dependendo da posio, so muito pouco produtivos.
Como o caso de // e // na posio inicial. Outros
se circunscrevem, a exemplo do /r/, a realizaes dedialetos especficos. Em (2), tem-se uma descrio das
possveis ocorrncias.
ATIVIDADE
Faa um levantamento de palavras da Lngua Portuguesa que preencha os padres
silbicos apresentados em (1) , identificando os mais e os menos produtivos.
5Variante comum nos falares do sul do Brasil, como atesta Monaretto (1992).
otnemgeS oisoP
laicini
oisoP
laidem
/p/ ac.ap ap.oc
/b/ ac.ob ob.ac
/t/ al.et et.op
/d/ ac.od ad.ac
/k/ ap.ac ac.ap
/g/ at.ag ag.or
/f/ og.of of.rag
/v/ ac.av ov.erf
/s/ oc.as as.roc
/z/ arb.ez as.ac
// am.ahc ahc.ram
// ac.aj at.ej.rog
/x/ ot.ar or.rac
/m/ at.am am.am
/n/ at.an an.am
// euq.ahn ahn.am
/l/ at.al al.af
// am.ahl ahl.af
/r/ ot.ar or.ac5
S
Z
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33
A observao das possibilidades na distribuio do ataque simples em incio de
palavra sinaliza que alguns segmentos so mais freqentes do que outros. Essa baixa
produtividade resulta mais de fatores histricos do que da inerente m-formao do incio
de palavras com esses segmentos. Se o segmento ou segmentos que evoluram para umfonema especfico era raro ou no ocorria em determinada posio no Latim, no de se
surpreender que o segmento resultante seja tambm raro na mesma posio.
Se olharmos (2), verificaremos que a posio do ataque preenchida por todas as
consoantes. Algo que merece ateno, entretanto, que a realizao dessas consoantes
nem sempre categrica, ou seja, nem sempre se realiza da mesma forma. Vejamos
alguns casos:
a) as consoantes oclusivas bilabiais /p,b/ tm realizao categrica, independente
de qual seja a posio da slaba, se inicial, medial ou final, e tambm da vogal que lhe
acompanha, como nos exemplos a seguir:
b) o mesmo no acontece com as oclusivas dentais /t,d/, que tm realizao
condicionada vogal que lhe segue, como nos exemplos:
Neste caso, podemos observar que, se as consoantes /t,d/ forem seguidas de /i/,
independente de qual seja a posio em que ocorram, teremos duas possibilidades de
realizaes:
[d]i.to ~ [d]i.to po.[d]i.do ~ po.[d]i.do
[t]i.ro ~ [tS]i.ro po.l.[t]i.co ~ po.l.[tS]i.co
o que no acontece com os demais casos.
ot.ap ab.atot.ab ap.at
el.ep et.ep.at
ob.eb ef.eb.at
o.op as.op.ar
ol.ob ol.ob.er
ed.up o.at.up.er
os.ip ot.ip.er
ef.ib ed.ib.ac
ot.at at.ar
at.ad ad.ad.or
l.et a c.et.ep a
al.ed al.ed.or
ar.ud ad.iz.ud.er
ot.id od.id.op
or.it oc.it.l.op
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Em se tratando do ataque complexo, a Lngua Portuguesa se configura de formabastante simples. Apenas as consoantes /r/ e /l/ podem ocupar a segunda posio doataque, independente de a slaba ocorrer em posio inicial ou medial, como podemos verem (3):
(3)
O fato de termos apenas duas consoantes podendo ocupar tal posio pode seruma das explicaes para a grande produtividade de substituies de uma pela outra,
principalmente, na fase de aquisio da lngua. No incomum, ouvirmos, por exemplo,praca em vez de placa.
ATIVIDADES
- Com base no exposto, verifique, a partir do falar de sua comunidade, o que acontececom as demais consoantes que ocupam a mesma posio na slaba, ou seja, o ataque.H ou no variao no uso?- comum, na escrita, e tambm na fala, a substituiode algumas consoantes nesta posio. Que consoantes esto envolvidas nessasubstituio? Procure sistematizar sua ocorrncia tanto na escrita como na fala.
/r/ /l/
otnemgeS oisoP
laicinIoisoPlaideM
otnemgeS oisoP
laicinIoisoPlaideM
/p/ ot.arp arp.moc /p/ ac..alp alp.ud
/b/ o.arb arb.ac /b/ oc.olb oc.ilb.p
/t/ og.art art.mE /t/ milt salt.a
/d/ ag.ord ord.auq /d/
/k/ om.orc erc.a /k/ or.alc am.alc.a
/g/ am.arg erg.it /g/ air.lg alg.is
/f/ oc.arf erf.an.ip.se /f/ ahc.elf od.alf.um.ac
ATIVIDADES
- A partir de um levantamento de palavras que apresentem ataque complexo, verifiquequais so as consoantes possveis na primeira posio, considerando como segundaconsoante tanto a lateral l como a vibrante r.- Faa um levantamento de palavras, a partir da observao do uso em suacomunidade, de palavras em que ocorrem a substituio de um /r/ por um /l/ e vice-versa. Verifique qual delas mais freqente.- Verifique se o mesmo ocorre na escrita de alunos em diferentes nveis de ensino.
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PARA REFLETIR
Por que no to incomum a substituio de uma consoante lquida /l/ por uma vi-brante /r/?
3.3 A posio de coda
Se no ataque simples, como vimos, possvel ocorrer qualquer segmento
consonantal, o mesmo no se pode afirmar sobre a coda simples, quer em posio medial
quer em posio final. Os padres silbicos VC e CVC s podem ter a coda preenchida
por uma dessas quatro consoantes /l, r, S, N/ ou por uma semivogal6, como atesta Cmara
Jr. (2002). Em (4) se ilustram as possveis ocorrncias.
(4)
Na Lngua Portuguesa, com exceo de /S/, todos os outros segmentos tm
sonoridade espontnea, ou seja, so soantes, o que leva a concluir que os obstruintes,
aqueles que no tm sonoridade espontnea por terem uma contraparte no-vozeada,
so extremamente raros nesta posio. Vocbulos que so incorporados Lngua
Portuguesa atravs de emprstimos, quando apresentam uma consoante na coda que noseja uma das mencionadas, acaba, a partir de um processo de ressilabificao,
desenvolvendo uma vogal, e o segmento que era coda torna-se ataque, como club >
clube, ou muitas vezes sofrendo processo de apagamento da consoante, a exemplo de
carnet > carn.
Em se tratando de coda complexa, as possibilidades no PB so ainda mais limitadas,
e, em final de vocbulo, elas, praticamente, no existem. Em posio medial, interessante
observar que a segunda posio ser sempre preenchida pelo segmento s, e, quando
em posio final pelo x [ks] como se v em (5):
(5)
Este tipo de padro silbico, como se v, muito pouco produtivo na Lngua
Portuguesa.
/l/ /r/ /S/ /N/
media l final media l fina l medial fi na l media l fina l
fa l. ta jor.nal car. ta tu.mor pas.ta mas cam.po nu.vem
6
Como o objetivo deste Captulo tratar das consoantes, no discutiremos o preenchimento da coda pela semivogal.
Posio medial
pers.pi.caz
trans.por.te
mons.tro
abs.tra.to
Posio final
t.rax
F.lix
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Fica evidente, a partir dos exemplos acima, que h uma unidade que o falante
nativo reconhece como uma slaba. Ele tem a capacidade de julgar se uma seqncia
arbitrria de segmentos pode ter ou no lugar em uma palavra na lngua. Uma organizao
silbica bem-formada ser atualizada pelo falante apenas se ela for possvel em umapalavra.
Na seo a seguir, discutiremos os quatro segmentos que ocupam a coda silbica
do tipo simples, nas posies medial e final, enfatizando o comportamento varivel de
cada uma delas em diferentes falares brasileiros.
3.3.1 A consoante lateral /l/
A consoante lateral em posio de coda tem como variantes as possibilidades: [w],
[] e [], como podemos ver em(6):
(6)
A variante semivocalizada [w], tanto em posio medial como em posio final, amais recorrente no Brasil. De norte a sul, possvel encontr-la, e sua utilizao independe
de sexo, idade ou escolaridade.
Vale observar que se ela for precedida pela vogal u, seu apagamento praticamente
categrico, devido impossibilidade de se ter um ditongo com vogal e semivogal com o
mesmo ponto *[uw], j que ambas so posteriores e altas.
A realizao semivocalizada da consoante lateral tem fortes implicaes na escrita.
Muito comum encontrar-se a substituio da lateral pela vogal u, principalmente em
posio final, pois temos na Lngua Portuguesa formas como degrau, vu etc.
Estudo realizado em grupos do ensino fundamental (HORA & JONES, 2003) mostra
que, principalmente com palavras novas, h uma forte tendncia substituio.Dois aspectos valem ressaltar: (a) os professores que atuam nas sries iniciais, em
sua maioria, ignoram o fato de que, se utilizarem o processo derivacional de formao de
palavras, podero facilitar a vida dos estudantes, como ilustra (7).
7
O uso do * (asterisco) indica formas no aceitas na Lngua Portuguesa.
(7)
laidemoisoP lanifoisoP
]w[ ][ ][ ]w[ ][ ][
oc.]w[ap oc.][ap oc.][ap* ]w[an.roj ][an.roj ][an.roj
at.]w[ed at.][ed at.][ed* ]w[ep.ap ][ep.ap ][ep.ap
ert.]w[ib ert.][ib ert.][ib* ]w[in.a ][in.a ][in.a
ag]w[of ag.][of ag.][of
ahc.]w[oc ahc.][oc ahc.][oc ]w[os ][os ][os
ap.]w[uc* 7 ap.][uc ap.][uc ]w[uz.a* ][uz.a ][uz.a
jornal
papel
anil
sol
azul
jornaleiro
papelaria
anilina
solar
azulado
*jornaueiro
*papeuaria
*aniuina
*souar
*azuuado
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(b) palavras com coda l, no PB, so muito mais produtivas do que com coda u.
A variante alveolar velarizada [ ] est muito associada varivel faixa etria. Estudos
realizados no Brasil (QUEDNAU, 1993; TASCA, 1999; SPIGA, 2004) mostram que,na regio sul, ela muito recorrente, principalmente nas comunidades do interior do estado.
Em estudo realizado por Hora (2005), na comunidade pessoense, h indcios de que sua
principal restrio a faixa etria, tendo a probabilidade de ser encontrada com mais
fora entre os falantes mais idosos, independente da posio, quer medial quer final.
O apagamento da lateral em posio de coda tem comportamento curioso,
dependendo da posio analisada e a vogal que antecede a lateral tem papel fundamental,
principalmente se for levado em conta resultado obtido em Joo Pessoa, que pode ser,
acredita-se, generalizado para o Nordeste.
Em posio medial (cf. 6), se a vogal que antecede a lateral for anterior, o
apagamento nunca dever ocorrer, uma vez que geraria ou uma palavra inexistente em PB
ou uma palavra com outro valor semntico. Se a vogal for posterior, h uma espcie de
gradao em direo elevao, medida que a vogal vai-se elevando o apagamento
torna-se mais previsvel. Ao chegar ao ltimo grau, que seria uma vogal alta, o apagamento
praticamente previsvel, devido impossibilidade de se ter um ditongo com formao do
tipo *[uw].
Em posio final, o apagamento da lateral pode ter outros condicionamentos. Sua
realizao est diretamente ligada escolarizao do falante. Em geral, falantes com menos
anos de escolarizao apagam mais, exceto quando a vogal antecedente u, com
realizao praticamente categrica entre todos os falantes, conforme dados obtidos em
Joo Pessoa (HORA, 2005).
Desta consoante e suas variantes, o que podemos concluir, no estgio atual daspesquisas realizadas no Brasil que a forma semivocalizada a mais forte entre os
falares, e as demais se circunscrevem ou faixa etria, no caso do [ ], ou escolaridade,
no caso do [].
ATIVIDADE
A partir da observao da fala em sua comunidade, considerando o sexo, a idade e
a escolaridade dos falantes, verifique como se d a realizao da lateral em posio
de coda. No se esquea de observar: - a posio na palavra, se medial ou final;- o
tipo de vogal que antecede a lateral
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4.2 Os rticos8
Os rticos, na Lngua Portuguesa e nas demais lnguas do mundo, tm um
comportamento extremamente varivel, apresentando uma multiplicidade de variantes,principalmente se em posio medial, como indica (8).
(8)
Estudos realizados acerca dos rticos no Brasil, que datam da primeira metade do
sculo XX, podem ser reunidos em dois grandes grupos: aqueles que no seguem uma
orientao variacionista, a exemplo de Mendona, 1936; Bueno, 1944; Marroquim, 1945;
Stavrou, 1947; Cunha, 1968; Cmara Jr., 1970; Leite de Vasconcelos, 1970; Pontes,
1973; Thomas, 1974; Amaral, 1976; Chaves de Mello, 1976; Silva Neto, 1976 e aque-
les que a seguem, como Votre 1978; Oliveira, 19839; Callou, Moraes e Leite, 1996;
Skeete, 1996; Monaretto, 1997.
Alguns destes trabalhos so relatos de observaes, principalmente os primeiros;
outros resultam de pesquisa sistemtica, seguindo uma metodologia variacionista, como
o caso dos estudos realizados por Oliveira (1983); Callou, Moraes e Leite (1996) e
Monaretto (1997).
Os problemas que envolvem a variao dos rticos, salientados nesses trabalhos,so mais abundantes do que aqueles voltados para seu apagamento. Alguns deles menci-
onam o aspecto estigmatizante que algumas variantes carregavam na primeira metade do
sculo XX, principalmente em estados da regio Nordeste .
Bueno (1944, p. 22-23) afirma que em vrios meses de observao nos estados da
Bahia, Alagoas, Pernambuco e na cidade do Rio de Janeiro, muitas pessoas, principal-
mente com nvel intelectual baixo, realizam o rtico com som aspirado.
Marroquim (1945, p. 43), descrevendo o Portugus dos estados de Alagoas e
Pernambuco, afirma que a articulao do rtico interno e inicial se apresenta como uma
leve vibrao da lnguana parte posterior da boca, com notada aspirao, podendo ser[R] ou [x]. Diferente de Bueno, para Marroquim esta pronncia encontrada entre letra-dos e iletrados e que a tentativa de realizar uma essa vibrao da lngua em posio
alveolar vista como pedantismo.
Oliveira (1983, p. 89) afirma que relatos sobre o apagamento do rtico esto mais
8Todas as variantes da vibrante so denominadas de rticos, incluindo a fricativa velar. Exceto, obviamente, a semivogal.
9Oliveira (1983) faz uma interessante reviso em seu trabalho, apresentando diversificadas posturas frente ao uso do rtico no
Portugus Brasileito. Sua consulta de fundamental importncia.
]r[ ]R[ ]x[ ][ ]h[ ][ edilg
oisoP
laideM
at.]r[acof.]r[ag
at.]R[acof.]R[ag
at.]x[acof.]x[ag
at.][acof.][ag
at.]h[acof]h[ag
at.][ac*of.][ag
at.]j[acof.]w[ag
oisoP
laniF
]r[am]r[at.nac
]R[am]R[at.nac
-nac]x[am]x[at.
][am][atnac]
]h[am]h[at.nac
][am][at.nac
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relacionados a sua posio de coda em final de palavra. H apenas trs deles que menci-
onam seu apagamento em posio interna.
O primeiro deles o de Juc-Filho (1937, p. 112), que afirma haver uma tendncia
no Portugus do Brasil ao apagamento de consoantes em final de slaba, mesmo quandoocorrem internamente. Os exemplos dados so: ca(r)naval, me(s)mo e ma(r)melada. Para
ele, a nasal condiciona o apagamento.
A segunda referncia encontrada em Chaves de Mello (1976, p. 57), para quem
o pagamento do rtico um processo que pode afetar at os erres que fecham uma slaba
na posio interna. Um de seus exemplos o nome de famlia Albuque(r)que.
O terceiro relato fornecido por Marroquim (1945, p.90), onde a possibilidade de
ocorrer supresa x surpresasugere o apagamento do rtico interno.
Em se tratando do apagamento do rtico, em linhas gerais, Oliveira (1983, p. 93) afirma:
a) o apagamento muito mais freqente e saliente em posio de final de palavra do que
no interior da palavra; b) sua ausncia em final de palavra mais comum em verbos do
que em no-verbos; c) de acordo com alguns relatos, o apagamento est relacionado a
falantes de classe mais baixa e considerado um vulgarismo; d) o apagamento um
processo varivel, sujeito a condicionamento fonolgico.
Ainda em relao ao apagamento do rtico em posio de coda, Oliveira (1983, p.
99-100), analisando dados de Belo Horizonte, constata que, dos fatores lingsticos , o
mais saliente o contexto fonolgico seguinte, que pode ser vogal, consoante ou pausa.
A consoante, favorecendo o apagamento, e a vogal favorecendo a ocorrncia do tepe
sempre em final de palavra, j que, no interior do vocbulo, vogal e pausa no so contex-
tos possveis. Para as consoantes, foram considerados o ponto, o modo e o vozeamento.,
ressaltando que o ponto mais favorvel o labial, o modo o plosivo e, para o vozeamento,
consoantes vozeadas so mais favorveis.Callou et al. (1996) analisam ocorrncias do /r/ em cinco capitais brasileiras (Porto
Alegre, So Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Recife Projeto NURC10) em posio
posvoclica no interior e no final da palavra. Os resultados globais demonstram que o
indce de apagamento maior na posio final de palavra do que em posio interna.
Monaretto (1997), utilizando dados que dizem respeito regio Sul do Brasil, e
isolando a posio posvoclica, observa que o apagamento em posio final muito mais
forte do que em posio medial, o que corrobora os resultados encontrados por Callou et
al. Comparando os dialetos do Sul do Brasil com o do Rio de Janeiro, Monaretto afirma
que os dialetos do Sul podem distinguir-se por duas variantes: a vibrante simples (tepe) e
a vibrande mltipla.Os estudos realizados at ento levam a concluir que, na Lngua Portuguesa, s h
um contraste significativo, aquele que se percebe emcaro x carroou em pares semelhan-
tes. Tal contraste se d entre vogais e s entre vogais. Em outras posies, temos casos
de variao condicionada ou uma neutralizao obrigatria em favor de um fone ou outro,
dependendo da regio.
10Projeto da Norma Urbana Culta que tem como objetivo descrever, a partir do falar de universitrios das cinco capitais brasileiras
mencionadas, a norma culta utilizada no Brasil. Este Projeto tem como principal resultado os volumes da Gramtica do Portugus
Falado, sob a coordenao geral do Prof. Ataliba Teixeira de Castilho.
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A partir das inmeras descries realizadas no que concerne aos rticos, as anli-
ses nem sempre so concordantes, mas, consensualmente, a posio intervoclica onde
se d o contraste entre o tepe e a fricativa velar.
E considerando essa variabilidade, notamos que h um comportamento diferencia-do quando se observa a posio que ele vai ocupar.
Um fato curioso que no Nordeste, por exemplo, em posio medial, o zero [O]
s se manifesta antes de fricativa, como nos casos em (9)
(9)
J em posio final, a variante [] a mais produtiva de todas, como se constata
nos exemplos em (10):
(10)
Ao considerarmos as posies em que ocorrem os rticos, verificamos que, nos
verbos, o apagamento no final, bastante produtivo, o que no acontece nos nomes,
principalmente na regio sul do Brasil.
Em posio final, quando o rtico seguido por uma vogal, em geral, h um pro-
cesso de ressilabificao, e a ele deixa de ser coda para ser ataque da slaba resultante,
como em mar abaixo > ma.ra.bai.xo
ATIVIDADES
- A partir de dados de sua comunidade, verifique quais os rticos so mais utiliza-
dos. No deixe de considerar: - a sua posio na palavra; - a categoria gramatical
da palavra;- Com base no levantamento, estruture um quadro de suas ocorrncias,
avaliando os mais e os menos recorrentes
][am
][omut
)ovitinifni(][atnac
)ovitinifni(][itrap )ovitinifni(][es
a][of
aez][v
of][ag
ajev][ec
ahc][amatej][og
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4.3 As fricativas
Naposio de coda, as fricativas encontradas so aquelas classificadas com o
trao coronal, semelhantes aos rticos, tm sido objeto de inmeros estudos no Brasil etambm em diferentes regies. As suas variantes mais produtivas so: [s], [S], [z], [Z],
[h], [O].
Em (11), so apresentados os contextos em que elas podem ocorrer:
(11)
Os trabalhos j realizados sobre o PB permitem que se esboce uma distribuio
para as variantes da fricativa coronal entre diferentes falares.
O que se observa, quando se trata da posio medial, que dessas seis variantes,
as mais produtivas so as duas alveolares [s,z] e as duas palato-alveolares [S,Z]. As
alveolares ocorrem na maioria dos falares brasileiros. O estudo de Callou, Moraes e Leite
(1994), utilizando dados do NURC, mostra que no Rio Grande do Sul, So Paulo eSalvador h preferncia por elas, ao contrrio do Rio de Janeiro e Recife. Hora (2000),
em estudo realizado sobre o falar paraibano, observa que, na Paraba, h preferncia
tambm pelas formas alveolares. Ele observa, entretanto, que as palato-alveolares tambm
so possveis, dependendo do contexto fonolgico seguinte. As variantes palato-alveolares
tero alta probabilidade de ocorrer se o contexto fonolgico seguinte for uma oclusiva
dental, como ilustra (12):
(12)
Quando se trata da posio final de palavra, em geral, a opo sempre pelas
fricativas coronais desvozeadas [s,S]. Tambm nessa posio, a preferncia por uma ou
outra mantm a mesma tendncia observada no contexto de posio medial.
setnairaV laidemoisoP lanifoisoP
]s[ ac.]s[ac ]s[ip.l
][ ac.][ac ][ip.l
]z[ ed.]z[ed ses.em.]z[ed
][ ed.][ed ses.em.][ed
]h[ ed.]h[ed ses.em.]h[ed
][ om.][em ][ip.l
S S S
Z Z Z
O O O
ac.]s[ac et.][el
ap.]s[ar at.][ef
.ar.ef.]s[e ot.][uc
om.]z[em ed.][ed
am.]z[er o.id.][ir.uj
al.av.]z[er rad.rob.][nart
S
S
S
Z
Z
Z
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4.4 As nasais
As nasais, na posio de coda, podem ser representadas pelas letras m e n.
Fonologicamente, elas so representadas pelo arquifonema nasla /N/.
Na Lngua Portuguesa, verificamos que a nasal, nesta posio, sempre assimila otraa de ponto da consoante que lhe segue. Vejamos os exemplos em 13:
(13)
Em 13a, como a consoante seguinte uma oclusiva bilabial, a nasal bilabial; em
13b, temos como consoante seguinte, uma alveolar, logo a nasal uma alveolar; em 13, a
nasal assimila o trao de ponto velar da consoante seguinte e em 13d, o trao labiodental.
A encontramos a explicao para termos sempre a letra m antes de p e b, fato que
nem sempre os professores encontram explicao.
Ainda em relao ao uso da nasal, constatamos que h momentos em que elarealizada e h momentos em que ela apagada. Em geral, seu apagamento no muito
produtivo, sendo restrito aos itens lexicais com a terminaes em e am, como podemos
ver em14.
ATIVIDADES
- Com base em dados de fala de sua comunidades, verifique o uso das fricativascoronais, considerando sua posio na palavra;
- A partir da distino entre alveolares e palato-alveolares, investigue se um dos usos
mais aceito do que outro.
SUGESTO DE LEITURA
Mais informaes sobre as fricativas coronais podem ser encontradas em:
HORA, Dermeval da. Fricativas coronais: anlise variacionista. In: RONCARATI,
Cludia; ABRAADO, Jussara. Portugus brasileiro: contato lingstico,heterogeneidade e histria. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2003, p. 69-89.
13a cam..po
rom.bo
13b can.to
ron.da
13c ron.ca
pon.ga
13d cn.fora
en.vio
(14) Posio Finaljar.dim
a.tum
ba.tom
on.tem
ca.ta.ram
fa.lam
or.f
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Os exemplos mostram que o condicionamento ao acento um dos determinante
para o apagamento ou no da nasal. Ele se d em palavras com proeminncia acentual na
penltima slaba e principalmente se a vogal nasalizada anterior e mdia, como em .
Se o acento tnico estiver presente na ltima slaba, no h tendncia ao apagamento, aexemplo de , etc. Palavras como batom, atum, jardim no
favorecem o apagamento. Comparando-as s anteriores o que se conclui que, primeiro,
as motivaes para a manuteno do trao nasal nessas palavras a tonicidade, visto que
todas elas so oxtonas; segundo, no se tem ditongo nasal, diferente do que acontece
com as terminadas em -em.
Tambm deve-se observar que a terminao am restrita aos verbos e que
podemos encontrar com freqncia o apagamento da consoante, implicando no elevao
da vogal baixa, a exemplo de: cantaram ~ cantaru.
A coda na Lngua Portuguesa, preenchida pelas consoantes /l. r, S, N/, como vimos,
tem uma multiplicidade de variantes, mas possvel de serem identificadas. Os estudos
realizados at o momento j permitem que se tenha um perfil de cada uma delas de acordo
com o contexto social em que se inserem e tambm de acordo com sua fonottica.
Podemos afirmar que a Lngua Portuguesa, como outras lnguas do mundo, tem
uma forte tendncia ao apagamento da coda e os comentrios aqui apresentados ratificam
essa tendncia.
REFLEXO
Ser que o fato de a consoantes nasal estar localizada na coda ou no ataque tem
implicaes para a variao na lngua? Busque evidncias que possam justificar sua
resposta.
ATIVIDADE
Com base em dados de sua comunidade, sistematize o uso da consoante nasal. No
esquea de levar em conta alguns fatores condicionadores, como, por exemplo, otipo de vogal que a antecede.
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