Upload
pedro-junior
View
220
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
7/17/2019 FOUCAULT_PSCOLOGIA_1850_1950.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/foucaultpscologia18501950pdf 1/10
1. edição - 1999
o
Copyright
Éditions Gallimard, 1994
Traduzido de:
Dits et écriis
Cet ouvrage, publié dans lecadre du programme d'aide
Ia publication,
bénéficie du soutien du Ministérefrançais des Aifaires Etrangéres, de
l'Ambassade
de
France
au
Brésil et
de
Ia Maison
de
France
de
Rio
de
Janeiro.
Este livro. publicado no ãmbito do programa de participação à publicação.
contou com o apoio do Ministério francés das Relações Exteriores. da
Embaixada da França no Brasil e da Maison de France do RiodeJaneiro.
rot o da cap a: Jacques Robert
CIP-Br as ll . C atalogação-na-fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros. RJ.
F86p Foucault. Miche . 1926-1984
Problemauza ção do sujeito: psicologia, psiquiatria e pslcanálise/Michel
Foucault; tradução de Vera Lucia Avellar Ribeiro; organização Manoel Barros da
Molta. - Rio de Janeiro: Forense Universitária. 1999.
(Ditos e escritos; I)
Tradução de: Dit s et écrtts
ISBN 85-218-0251 -X
I . Sujeito (psicologia). 2. PslcanáUse. I. Motta. Manoel Barros da. lI. Titulo.
11 1 . Sêrie.
1)9·1586. CDD 150.195
CDU 159.964.24
Proibidaa r eprodução total ou parcial, bem como a reprodução de apostilas a partir
deste livro. de qualquer forma ou por qualquer meio eletrônico ou
mecânico,
inclusive
através de processos xerogréâccs. de folocópla e de gravação. s em permissão expressa do
Editor {Lei n ' 9 .610. de 19.02.981.
Reservados os direitos de propriedade desta edição pela;
EDITORA FORENSE UNIVERSITÁRIA LTDA.
Rio de Janeiro;
Rua do Rosário. 100- 20041-002 -Telefax; (21)509-3148/509-7395
~o Paulo;
Lnr/(oeleSão Francisco. 20- 01005-010 - Tels.: (11) 3104-2005 - Fax; 3107-0842
(' tlI{.II/; [email protected] http://www.editoras.com/forenseunlversitárla
hllJlI ('SSO no Brasil
J~ 1 11 1 1
(/I
Brazíl
Apresentação
Construída sob o signo do novo. a obra de Míchel Foucault
subverteu. transformou. modificou nossa relação com o saber e
a verdade. A relação da filosofia com a razão não é mais a mesma
depois da História da loucura. Nem podemos pensar da mesma
forma o estatuto da punição emnossas sociedades. Aintervenção
teórico-ativa deMichel Foucault introduziu também uma mudan-
ça nas relações de poder e saber da cultura contemporãnea. a
partir de sua matriz ocidental na medicina. na psiquiatria. nos
sistemas penais e na sexualidade. Pode-se dizer que ela colabora
para efetuar uma mutação de epísteme, para além do que alguns
chamam pós-estruturalismo ou pós-modernismo.
A edição francesa dos
Ditos
e
escritos
em 1994 pelas Edições
Gallimard desempenha um papel fundamental na difusão de uma
boa parte da obra do filósofo cujo acesso ao público era difícil, ou
em muitos casos impossível. Além de suas grandes obras, As
palavras e as coisas, História da loucura, Vigiar e punir,
O
nasci-
mento da clínica, Raymond Roussel e História da sexualidade.
Foucault multiplicou seus escritos e a ação de seus ditos. na
Europa. nas Américas. na Ásia e no Norte da África. Suas
intervenções foram das relações da loucura e da sociedade. feitas
no Japão. a reportagens sobre a revolução islãmica em Teerã. e
debates no Brasil sobre a penalidade e a política. Este trabalho
foi em parte realizado através de um grande número de textos.
intervenções. conferências. introduções. prefácios e artigos pu-
blicados numa vasta gama de países que vai doBrasil aos Estados
Unidos e ao Japão. As Edições Gallimard recolheram esses textos
em quatro volumes. com exceção dos livros. A edição francesa
pretendeu a exaustívídade, organizando a totalidade dos textos
publicados quando Michel Foucault vivia, embora seja provável
que alguma pequena lacuna exista neste trabalho. O testamento
de Foucault, por outro lado. excluía as publicações póstumas.
Daniel Defert e François Ewald realizaram. assim, um monumen-
tal trabalho de edição e estabelecimento dos textos. situando de
maneira nova as condições de sua publicação, controlaram as
circunstãncias das traduções, verificaram as citações e erros de
tipografia. Jacques Lagrange ocupou-se da bibliografia. Defert
7/17/2019 FOUCAULT_PSCOLOGIA_1850_1950.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/foucaultpscologia18501950pdf 2/10
957
A
Psicologia de 85 a 95
A psicologia de 1850 a 1950 . in Huisman (O.) e Weber (A.). Histoire de 1 11
philosophie européenne.
t. 11:
Tab1eau
de
philosophie
contemporaine. Paris. Líbrut
ríeFirchbacher. 1957.33, rue de Seine, ps. 591-606.
Introdução
Apsicologia doséculo XIXherdou da
Aujkldrung
a preocu paçao
de alinhar-se com as ciências da natureza e de encontrar no
homem o prolongamento das leis que regem os fenômenos natu
rais. Determinação de relações quantitativas. elaboração de leis
que se apresentam como funções matemáticas. colocação de
hipóteses explicativas. esforços através dos quaís a
psícología
tenta aplicar. não sem sacrifício. uma metodologia que os lógicos
acreditaram descobrir na gênese e no desenvolvimento das ciên
cias da natureza. Ora. foi o destino dessa psicologia. que se queria
conhecimento positivo. apoiar-se sempre sobre dois postüfados
filosóficos: que a verdade do homem está exaurida em seu ser
natural. e que o caminho de todo conhecimento científico deve
passar pela determinação de relações quantitativas, pela cons
-~
trução de hipóteses e pela verificação experimental
Toda a história da psicolo@ãafé o meããõãõS'éculo XX é a
história paradoxal das contradições entre esse projeto e esses
postulados; aoperseguir o ideal de rigor e deexatidão das ciências
da natureza. ela foi levada a renunciar aos seus postulados; ela
foi conduzida por uma preocupação de fidelidade objetiva em
reconhecer na realidade humana outra coisa que não um setor
da objetividade natural. e em utilizar para reconhecê-lo outros
métodos diferentes daqueles de que as ciências da natureza
poderiam lhe dar o modelo. Mas o projeto de rigorosa exatidão
que a levou. pouco a pouco. a abandonar seus postulados tor-
nou-se vazio de sentido quando esses postulados mesmos desa-
pareceram: a idéia de uma precisão objetiva e quase matemática
no domínio das ciências humanas não é mais conveniente se o
próprio homem não é mais da ordem da natureza. Portanto. é a
1957_ APsicologia de 1850 a 1950 123
l
renovação total que a psicologia obrigou a si própria no curso
k sua história; ao descobrir um novo
status
do homem. ela se
uupõs como ciência. um novo estilo.
1':laprecisou buscar novos princípioS e desvelar para si mesma
novo projeto: dupla tarefa que os psicólogos nem sempre
Cltllpreenderam com todo rigor. e que. com muita freqüência,
Ir'\ltaram rematar com a economia; uns. ainda que percebendo a
xlgência de novos projetos. permaneceram ligados aos antigos
pllncípios de método: as psicologias que tentaram analisar a
•.onduta, mas que para fazê-lo utilizaram os métodos das ciências
dói natureza o testemunham; outros não entenderam que a
n'novação dos métodos implicava a emergência de novos temas
d análise: assim. as psicologias descritivas. que permaneceram
ligadas aos velhos conceitos. A renovação radical da psicologia
•.orno ciência do homem não é. portanto. simplesmente um fato
histórico do qual podemos situar o desenrolar durante os últimos
•.•.m anos; ela ainda é uma tarefa incompleta a ser preenchida e.
, esse título. permanece na ordem do dia.
Foi igualmente no decorrer desses últimos cem anos que a
psicologia instaurou relações novas com a prática: educação.
medicina mental. organização de grupoS. Ela se apresentou como
seu fundamento racional e científico; a psicologia genética cons-
tituiu-se como o quadro de toda pedagogia possível. e a psicopa-
(ología ofereceu-se como reflexão sobre a prática psiquiátrica.
Inversamente. a psicologia se colocou como questão os problemas
suscitados por essas práticas: problema do sucesso e do fracasso
escolar. problema da inserção do doente na sociedade, problema
da adaptação do homem
à
sua profissão. Através desse laço
apertado e constante com a prática, através dessa reciprocidade
de suas trocas. a psicologia torna-se semelhante a todas as
ciências da natureza. Mas estas não respondem senão aos pro-
blemas colocados pelas dificuldades da prática. seus fracassos
temporários. as limitações provisórias de seu exercício. A psico-
logia. em con~artida. nasce neste-..2Qnto_o qual a prática do
homem encontra sua própria contradição; a psicologia do desen-
volvimento nasceu como uma reflexão sobre as interrupções do
desenvolvimento; a psicologia da adaptação. como uma análise
dos fenômenos de inadaptação; a da memória. da consciência. do
sentimento surgiu. primeiro. como uma psicologia do esqueci-
mento, do inconsciente e das perturbações afetivas. Sem forçar
um~tidão. po%-se dizer que a psicologia conten\poránea é,
eIQ..sua origem. uma análise do anormal. do patológico, do
conflituoso. uma reflexão sobre as contradições do homem consí=
7/17/2019 FOUCAULT_PSCOLOGIA_1850_1950.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/foucaultpscologia18501950pdf 3/10
124 Michel Foucault - Ditos e Escritos
1957 -
A Psicologia de
1850
a
1950
125
o mesmo. E se ela se transformou em uma psicologia do normal,
do adaptativo, do organizado, é de um modo segundo, como que'
por um esforço para dominar essas contradições.
O problema da psicologia contemporânea - que para ela pro
pria é um problema de vida ou de morte - é o de saber em que
medida ela consegue efetivamente dominar as contradições que'
a fizeram nascer, através desse abandono da objetividade'
naturalista, que parece ser sua outra caracteristica maior. A essu
pergunta a própria história da psicologia deve responder.
de Lavoísíer: fazem-se esforços para se manter em vista a reali-
dade humana definindo-a por sua natureza orgânica. tal como se
,\ conhece depois de Bíchat, Magendíe, Claude Bernard. O psi-
quísrno, tal como o organismo. é caracterizado por sua es-
pontaneidade. sua capacidade de adaptação e seus processos de
regulação internos.
Bain, a partir de um estudo dos ínstíntosê: Fechner, pela
málíse das relações entre estimulação e o efeito sensoríal+:
Wundt. retomando o problema da atividade específica dos ner-
vos>, todos ressaltaram esse tema essencial de que o aparelho
psíquico não funciona como um mecanismo. mas como um
ronjunto orgânico cujas reações são originais. e. conseqüente-
mente, irredutíveis às ações que os desencadeiam.
É
preciso.
portanto. como dizia Wundt. substituir o princípio da energia
material pelo princípio do acréscimo da energia espiritual. É
nesse sentido que foram empreendidas. no final do século XIX,
IS pesquisas experimentais dos limiares absolutos e diferenciais
da sensibilidade. os estudos sobre o tempo de reaçào e sobre as
ittvtdades
reflexas: em suma. toda essa constelação de estudos
pstcofísíológícos nos quais se buscava manifestar a inserção
orgânica do aparelho psíquico.
Foi a mesma inspiração orgânica que suscitou as pesquisas
obre as regulações internas do psiquismo: prazer e dor. ten-
Ilt-ncias. sentimentos. emoções. vontade. Para Baín, o prazer
resulta da harmonia das sensações; a dor, de suas contradições
onflítosv. É sob os fenõmenos conscientes que Ribot busca o
princípio dessas regulações que caracterizam a vida ativa e a vida
rfetíva:
em uma região onde o prazer e a dor ainda nem mesmo
uloram. há um inconsciente dinâmico que trabalha. que elabo-
ril
na sombra das combinações incoerentes ou adaptadas ; esta
'sobpersonalídade envolve em sua profundeza a origem da gran-
111 trindade afetíva, constituída pelo medo. pela raiva e pelo
dl'sejo; são os três instintos procedentes diretamente da vida
Illgãnica: instinto defensivo. instinto ofensivo. instinto nutrítívo?
o preconceito de natureza
Sob sua diversidade. as psicologias do final do século XIX
pOssuem esse traço comum. de tomar emprestado das ciência
da natureza seu estilo de objetividade e de buscar. em seu.
métodos. seu esquema de análise.
1 O modelo jisico-químico.
É
ele que serve de denominad01
comum a todas as psicologias da associação e da análise elemen
tar. Encontramo-Io definido com a maior clareza na
Logique
de'
J. S. Míll, e em seu
Preface to
James
Mill s Analysis1.
Os fenõm
nos do espírito. assim como os fenômenos materiais. exigem dua:
formas de pesquisa: a primeira tenta. a partir dos fatos, ter acesso
às leis mais gerais, segundo o princípio da universalização new
toníana: a segunda. tal como a análise química para os corp
compostos. reduz os fenômenos complexos em elementos sim
pIes. Assim. a psicologia terá por tarefa encontrar, nos fenômeno.
do pensamento mais abstrusos. os segmentos elementares que
os compõem; no princípio da percepção e do conhecimento do
matéria. ela encontrará a sensação ( a matéria pode ser defínídn
como uma possibilidade permanente de sensação ); no princípio
do espírito e do conhecimento que o espírito tem de si mesmo,
1 1
psicologia descobrirá o sentimento. Mas esses elementos. em
SUlI
relação e em seu agrupamento. são regidos pela lei absolutamen
t
geral da associação. já que ela é universal. mas somente as forma
de aplicação nos diversos tipos de fenômenos mentais
2
.
2)O modelo orgânico. Não se busca mais definir o domínio psíco
lógicopor coordenadas tomadas da física de Newton ou da
químír-n
I (N.A.)Bain (A.).
The senses
and
the intellect.
Londres. Longman's,
1864 (Les
sens
et l·intelligence.
trad. E. Cazelles. Paris.
Baíllíêre, 1874
(N.E)).
I (N.A.)Fechner (T.G.). in Sachen
der Psychophysik.
Leípzíg. Breitkopf e Hârtel,
l877.
(N.A.)Wundt (W.).
C}rundzüge der PhysiolqJischen Psychologie.
Leípzíg. W.
Engelmann. 1874
(Eléments de psychologie physiologique.
trad. E. Rouvier.
Paris. Alcan, 2 vol., 2' ed.. 1886 (N.E)).
t, (N.A.)Bain (A.).Theemotions and the wül Londres. Parker. 1859 (Les émotions
I>tIa volonté. trad. P.-L. de Monnier. Paris. Alcan, 1885 (N.E.)).
(N.A.)Ribot (T.).
Lapsychologie des sentiments.
Paris. Alcan, 1897.
1. (N.A.)MiIl (J. S).
A system ofloqtc ratiocinative
and
inductive.
Londres.
Parkr-
1851. 2 vol. (Systéme de logique déductive et inductive. trad. L. Peisse. Parta
Ladrange. 1866.2vol. (N.E.))
PreJace toJames Mül'
s
analysis oJthe phenomel/II
of the
human
mind.,
Londres. Longman'g,
1869.
2. A frase está manifestamente truncada.
7/17/2019 FOUCAULT_PSCOLOGIA_1850_1950.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/foucaultpscologia18501950pdf 4/10
126 Michel Foucault - Ditos e Escritos
1957 - A Psicologia de 1850 a 1950 127
3) O modelo evolucionista. A origem das espécies esteve, na
metade do século XIX, no início de uma renovação considerável
nas ciências do homem; ela provocou o abandono do mito
newtoniano e assegurou sua substituição através de um mito
darwtníano . cujos temas imaginários ainda não desapareceram
totalmente do horizonte dos psicólogos.
É
essa mitologia gran
diosa que serve de cenário ao
Sustême
de
philosophie
de Spencer;
nele, os Príncipes
de
psychologie são precedidos dos Príncipes di:
bioloqie, e seguidos dos Príncipes
de
sociologie.
A
evolução do
indivíduo ali é descrita, ao mesmo tempo. como um processo d('
diferenciação - movimento horizontal de expansão para o
múltí
plo - e por um movimento de organização hierárquica - movírnen
to vertical de integração na unidade; assim procederam as es
pécíes no curso de sua evolução; assim procederão as sociedades
no curso de sua história; assim procede o indivíduo no curso
dr -
sua gênese psicológica, desde o
feelinq
indeferenciado até
(I
unidade múltipla do corihecímentoê.
Jackson, para a neurologia, Ribot, para a psicologia patológica.
retomaram os temas spencerianos. Jackson define a evolução
dar
estruturas nervosas através de três princípios: ela se faz do
simples ao complexo. do estável ao instável. do mais organizado
ao menos organizado; o que implica, em compensação, que
1 1
doença siga o caminho inverso ao da evolução. e que ela
SI
afronte. a princípio. com as estruturas mais instáveis e mal
recentes. para progredir rapidamente na direção das estrutura
mais sólidas e mais antigas; mas a doença é também
díssocíatívn
a supressão das estruturas superiores provoca uma desíntegn,
ção que descobre e libera as instãncias inferiores9. Ribot traru
feriu as análises neuropsiquiátricas de Jackson para os domínio
da personalidade. dos sentimentos. da vontade. da memória 10
nas amnésias. são as lembranças mais antigas e mais
estável
que permanecem. enquanto são varridas as mais recentes e
1 1
mais superficiais; nas alterações da vida afetíva, os sentimento
('goístas que são também os mais arcaicos reaparecem. assim
como surgem uma vez mais os automatismos. quando a vontade
cI(~smorona. ou as estruturas inconscientes da personalidade,
quando as formas lúcidas são obnubiladas.
A
importãncia do evolucionismo na psicologia deve-se. sem
dúvida. por ele ter sido o primeiro a mostrar que o fato psicológico
un o
tem sentido senão com relação a um futuro e a um passado;
que
seu conteúdo atual assenta-se sobre um fundo silencioso de
rsf ruturas anteriores que o carregam de toda uma história. mas
que
ele implica. ao mesmo tempo. um horizonte aberto sobre o
rvcntual.
O
evolucionismo mostrou que a vida psicológica tinha
lima orientação. Mas. para desligar a psicologia do preconceito
IlI' natureza. restava ainda mostrar que essa orientação não era
ipenas força que se desenvolve, mas significação que nasce.
Adescoberta do sentido
A
descoberta do sentido fez-se. no final do século
xrx.
por
r.nntnhos bem diversos, Mas eles parecem. no entanto. já perten-
( ( 1
a uma paisagem comum. e a mesma direção parece esboçar-
(': trata-se de deixar de lado as hipóteses demasiado amplas e
trais pelas quais se explica o homem como um setor determina-
do do mundo natural; trata-se de retomar um exame mais
Ilgoroso da realidade humana. ou seja. mais de acordo com sua
uu-dída.
mais fiel às suas características específicas. mais apro-
11
lado a tudo o ue o em. esca a às determinações de
untureza. Tomar o homem. não no nível desse denominaêlor
rumum que o assimila a todo ser vivente, mas no seu próprio
I
mvel,
nas condutas nas quais se exprime. na consciência em que
reconhece. na história pessoal através da qual ele se cons-
íuutu. ~
.Janet.U sem dúvida. permanece ainda bem próximo ao
evolu-
íouísmo
e aos seus preconceitos de natureza: a hierarquia das
u-ndêncías
que se estende das mais simples e das mais automá-
IIe ilS (tendência à reação imediata) até as mais complexas e as
ru.rts integradas (ações sociais). a noção de energia psíquica que
reparte entre essas tendências para ativá-Ias são temas que
1r'lllbram Jackson e Ribot. No entanto, Janet chegou a sair fora
8. (N.A.)Spencer (H.),
The principles ojpsychol.ogy.
Londres. Longrnan's,
1RH r.
(Principes
de
psych01ogfe.
trad. A. Espinas e Th. Ribot. Paris. Baíllíére, 2 vnl
2' ed.. 1875 (N.E.)).
9. (N.A.)Jackson. (J. H.). Croonian
lectures
on
the evolution
and
dissolution oj
t
nervous system.
in The
lancet.
29 de março. 5 e 12 de abril de 1884
( RIII
l'évolution et Ia dissolution du systême nerveux , trad.
A.
Partss,
Archlp,'
suisses
de
neurologfe et
de
psychiatrfe.
vol. VIII. 1921. n
Q
2. ps. 293-302;
VI II
IX. 1922. n
Q
1. ps. 131-152 (N.E.)).
10. (N.A.) Ribot (T.).
Les maladfes de Ia mémoire.
Paris,
Baíllíêre,
1878;
1 I
maladfes
de
la volonté.
Paris. Baíllíére,1883;
Les maladfes
de
lapersonnalll,
Paris. Alcan. 1885.
11 (N.A.)Janet (P.),
Les obsessions et lapsychasténfe
(em col. com F. Raymond),
Paris. Alcan, 1903. 2vol.
Les névroses.
Paris. Flammarion. 1909. De
l'angoisse
'.I'extase.
Études
sur
les croyances et les sentiments.
Paris. Alcan. 1926.
Les
tlébuts de l'intelligence.
Paris. Flammarion. 1935.
7/17/2019 FOUCAULT_PSCOLOGIA_1850_1950.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/foucaultpscologia18501950pdf 5/10
128
Michel Foucault - Ditos e Escritos
desse quadro naturalista dando como tema à psicologia não 1 \
estruturas reconstituídas nem energias supostas, mas a condutu
real do indivíduo humano. Por conduta , Janet não entende estr
comportamento externo de que se esgota o sentido e a realidade,
confrontando-o com a situação que o provocou: é reflexo
O
reação, não conduta. Há conduta quando se trata de uma
reaçnn
submetida a uma regulação, quer dizer, cujo desenrolar depend
sem cessar do resultado que ela acaba de obter. Essa regulaçà«
pode ser interna e apresentar-se sob a forma de sentimento (1 1
esforço que faz recomeçar a ação para aproximá-Ia do sucesso;
11
alegria que a limita e a conclui no triunfo); ela pode ser externo
e tomar como ponto de referência a conduta do outro: a
condutu
é, então, reação à reação de um outro, adaptação à sua conduíu,
e ela exige, assim, um desdobramento cujo exemplo mais
tipku
é dado pela linguagem que se desenrola sempre como díálog t
eventual. A doença, então, não é nem um déficit nem UIlIII
regressão, mas um distúrbio dessas regulações, uma alteraçau
funcional do sentimento: disso é testemunha a linguagem l
psicastênico que não pode mais regular-se pelas normas
l
diálogo, mas prossegue em um monólogo sem auditor; testemu
nhas também são os escrúpulos dos obsessivos que não podem
concluir suas ações, porque perderam essa regulação que
1 1 1
permite iniciar e concluir uma conduta.
O surgímento das significações na conduta humana se
II
igualmente a partir da análise histórica. O homem , segundo
Dilthey, não aprende o que ele é ruminando sobre si mesmo, dI
o aprende pela história 12. Ora, o que a história lhe ensina é '1(11
ele não é um elemento segmentar dos processos naturais, nli1
uma atividade espiritual cujas produções depositaram-se suor
sivamente no tempo, como atos cristalizados, significações dOII1
vante silenciosas. Para reencontrar essa atividade originária, S('III
preciso endereçar-se às suas produções, fazer reviver seus S('II
tidos através de uma análise dos produtos do espírito destínur
1 1 1
a nos dar acesso a um apanhado sobre a gênese do
conjuul«
psicológico . Mas essa gênese não é nem um processo
mecãntcn
nem uma evolução biológica; ela é movimento próprio do espíru«
que é sempre sua própria origem e seu próprio termo. Portan
I11
não se trata de explicar o espírito por outra coisa do que por c l
próprio; mas, ao se colocar no interior de sua atividade, ao
tenun
12.(N.A.)Dilthey (w.l.
Ideen über eine beschreibende
und
zergliedernde PSIJI'/III
logie
(1894).n
Gesammelte Schriften.
Leípzíg, Teubner. 1924.t. V:
Die ge/\/II/I
Welt Ein1eitung
in
die Philosophie des Lebens.
ps. 129-240.
1957- A Psicologia de 1850a 1950 129
utncídír
com esse movimento no qual ele cria e se cria, é preciso,
IIh'Sde mais nada, compreendê-Io. Esse tema da compreensão,
IICsto à explicação, foiretomado pela fenomenologta que, seguin-
111lusserl, fez da descrição rigorosa do vivido o projeto de toda
IIIHofiatida como ciência. O tema da compreensão conservou
1111alidade; mas, em vez de fundamentá-Ia em uma metapsico-
Itlt- Ia do espírito, como Dilthey, a fenomenologia estabeleceu-a
ilIre uma análise do sentido imanente a toda experiência vivida.
ím, .Jaspers+ê pôde distinguir nos fenômenos patológicos os
IIICCSSOSrgânicos referidos à explicação causal, e as reações
11
os
desenvolvimentos da personalidade que envolvem uma
Ij,llllficação vivida de que o psiquiatra deve ter a tarefa de
11ipreender.
Mas nenhuma forma de psicologia deu mais importãncia à
Ij,llllficaçãodo que a psicanálise. Sem dúvida, ela ainda perma-
I , no pensamento de
Freud- .
ligada às suas origens
\llll1ralistas e aos preconceitos metafisicoS ou morais, que não
txarn de marcá-Ia. Sem dúvida, há na teoria dos instintos
1I1I llntode vida ou de expansão, instinto de morte ou de repeti-
11)o eco de um mito biológico do ser humano. Sem dúvida, na
IlI'cpção da doença como regressão a um estádio anterior do
IN.A.)Jaspers (K.l.
Allgemeine psychopathologie.
Berlim. J. Springer. 1913
(I'sychopathologie généra1e. trad. A. Kastler e J. Mendousse. Paris. Alcan, 3
1
cl ..
1933
(N.E.)).
IN.A.)Freud (S.). Die Traumdeutung. Viena. Franz Deuticke.
1900
(L'uuerpré-
III/lon des rêues. trad. D. Berger. Paris. PUF.
1967
(N.E.)). DreiAbhandlungen
IIrSexualtheorie. Viena. F. Deutícke,
1905
(Trois essais su Ia théorie sexuel1e.
t rnd. Ph. Koeppel. Paris. Gallimard. col. Connaissance de í'ínconsctent .
1987
IN.E)). Bruchstück einer Hysterie-Analyse .
Monatsschrifl:für Psychiatrie
und
NC'LLrologie,
t. XVIII. 1905.n
Q
4, outubro. ps. 285-310,e n
Q
5.novembro. ps.
408-467( Fragment d'une analyse d'hystérie [Doral . trad. M. Bonaparte e R.
M
Loewenstein.
Cinqps ; chanalyses,
Paris. PUF, 2
ed.. 1966.ps. 1-91(N.E.)).
/'olem
und
Tabu. Einige Ubereinstimmungen
in
See1en1ebender Wilden
und
der
Nc'urotiker, Viena. Hugo Heller,
1913
(Totem et tabou. Interprétation par Ia
l IIChanalyse de
Ia
uie socia1e des peup1es primitifs et des
néurosés. trad. S.
.tuukélévítch. Paris, Payot. col. Petíte Bibliothéque Payot , n
Q
77.1965(N.E.)).
Vorlesungen zur Einführung in die psychoanalyse. Viena. Hugo Heller.
1916-
IliI
7
(Introdudion àIapsychanalyse. trad. S. J ankélévitch, Paris. Payot.
1921
IN E.)). Jenseiis des Lustprinzips. Viena. lnternationaler psychoanalytischer
v-nsg, 1920( Au-delà du principe de platsír . trad. J. Laplanche e J.-B.
I'olllalis.
Essais de psychanalyse.
Paris. Payot. col. Petite Bibliothéque
1lIyol . nQ 44, 1981,ps. 41-115(N.E.)). Das
Ich
und das
Es.
Viena. Interna-
ttoualer psychoanalystischer Verlag.
1923
( Le moi et le ça , trad. J. La-
plllllche. Essais depsychanalyse. op. cit., ps.
219-275
(N.E.)). Neue Folge der
Vmlesungen
zur
Einführung
in
die psychoanalyse.
Viena. Internationaler
I'Nychoanalytischer Verlag.
1933
(Nouuel1es conférences d'introduction à Ia
. Ichanalyse.
trad. R.-M. Zeitlin. Paris, Gallimard. col. Connaissance de
I'Il1conscient . 1984(N.E.)).
7/17/2019 FOUCAULT_PSCOLOGIA_1850_1950.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/foucaultpscologia18501950pdf 6/10
130 Michel Foucault - Ditos e Escritos
1957 - A Psicologia de 1850 a 1950 131
desenvolvimento afetivo, reencontramos um velho tema spence-
riano e os fantasmas evolucionistas de que Freud não nos poupa.
mesmo em suas implicações sociológicas mais duvidosas. Mas a
própria história da psicanálise fez ver esses elementos retrógra-
dos. A importância histórica de Freud vem, sem dúvida, da
impureza mesma de seus conceitos: foi no interior do sistem
freudiano que se produziu essa reviravolta da psicologia; foi no
decorrer da reflexão freudiana que a análise causal transformou
se em gênese das significações, que a evolução cede seu lugar .
história, e que o apelo â natureza é substituído pela exigência de
analisar o meio cultural.
1 Para Freud, a análise psicológica não deve partir de uma
distribuição das condutas entre o voluntário e o involuntário. o
intencional e o automático, a conduta normalmente organtzad:
e o comportamento patológico e perturbado; não há diferença de
natureza entre o movimento voluntário de um homem são e
H
paralisia histérica. Para além de todas as diferenças manifestas.
essas duas condutas têm um sentido: a paralisia histérica tem ()
sentido da ação que ela recusa, assim como a ação intencional
tem o sentido da ação que ela projeta.
O
sentido é coextensivo ti
toda conduta. Alimesmo onde ele não aparece, na incoerência do
sonho. por exemplo. na absurdidade deum lapso, na interrupção
de um jogo de palavras, ele também está presente, mas de uni
modo oculto. E o próprio insensato é sempre uma astúcia do
sentido, uma forma para o sentido vir à tona testemunhando
contra ele próprio. A consciência e o inconsciente não são tanto
dois mundos justapostos; são, antes, duas modalidades de urnu
mesma significação. E a primeira tarefa terapêutica será, atravee
da interpretação dos sonhos e dos sintomas, modificar essn
modalidade do sentido.
2) Quais são essas significações imanentes
à
conduta, mas
vezes escondidas da consciência? São aquelas que a hístór í«
individual constituiu e cristalizou no passado em torno de aCOl1
tecimentos importantes: o traumatismo é um transtorno du
significações afetivas (odesmame, por exemplo, que transform.i
a mãe, objeto e princípio de todas as satisfações, em um objeto
que se recusa, em um princípio de frustrações); e quando essa
significações novas não ultrapassam e não integram as sígntíl
cações antigas, então o individuo fica fixado nesse conflito cio
passado e do presente, em uma ambigüidade entre o atual c 11
inatual, o imaginário e o real, o amor e o ódio, sinal maior dl
conduta neurótica.
O
segundo tema da terapêutica será, portal
10 .
a redescoberta dos conteúdos inatuais e das significações
passadas da conduta presente.
3) Por mais assombrada que ela seja pelo passado, a conduta
1
iao deixa de ter um sentido atual. Dizer que um sintoma reproduz
Imbolicamente um traumatismo arcaico implica que o passado
não invada totalmente o presente, mas que o presente se defenda
rontra sua reaparição.
O
presente está sempre em dialética com
u próprio passado; ele o recalca no inconsciente, ele separa
uas significações ambíguas; ele projeta sobre a atualidade do
mundo real os fantasmas da vida anterior; ele transpõe seus
temas para níveis de expressão reconhecidos vâlidos (éa sublí-
mação): em suma, ele eríge todo um conjunto de mecanismos de
defesa que a cura psicanalítica tem oencargo degirar reatualizan-
do as significações do passado pela transferência e pela ab-rea-
~'é·lO.
4) Mas qual é o conteúdo desse presente? Qual é seu peso ante
.1 massa latente do passado? Se ele não é vazio, ou instantâneo,
na medida em que ele é essencialmente a instância social, o
runjurrto de normas que, em um grupo, reconhece ou invalida tal
0\1
tal forma de conduta. A
díalétíca
do passado e do presente
u-flete o conflito entre as formas individuais de satisfação e as
normas sociais de conduta, ou ainda. como diz Freud, entre o id
o superego : o ego ,com os mecanismos de defesa, é o lugar
c le
seu conflito e o ponto onde a angústia faz irrupção na
r-xtstêncía. Notratamento psicanalítico, o papel do terapeuta é.
[ustamente, através de um jogo de satisfação e de frustração,
n-duzír a intensidade do conflito, flexibilizar a dominação do id
do superego , ampliar e abrandar os mecanismos de defesa;
< não tem o projeto mítico de suprimir o conflito, mas de
11 .msformar sua contradição neurótica em uma tensão normal.
Aolevar a seus limites extremos a análise do sentido, Freud
r l r - u sua orientação à psicologia moderna; se ele foi mais longe
11 IC Janet e que Jaspers, é por ter conferido um estatuto objetivo
i
significação; ele buscou reapreendê-Ia no nível dos símbolos
xpressívos, no próprio material do comportamento; ele lhe deu
inmo conteúdo uma história real. ou melhor, o afrontamento de
duas histórias reais: a do indivíduo, na seqüência de suas
r-xpertêncías vividas, e a da sociedade, nas estruturas pelas quais
1'\01e impõe ao indivíduo. Nessa medida. pode-se ultrapassar a
oposição .entre o subjetivo e o objetivo, entre o indivíduo e a
ucíedade. Um estudo objetivo das significações tornou-se pos-
ivel.
7/17/2019 FOUCAULT_PSCOLOGIA_1850_1950.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/foucaultpscologia18501950pdf 7/10
132 Michel Foucault - Ditos e EscIitos
1957- A Psicologia de 1850a 1950 133
o estudo das significações objetivas
nem processo causal; esse campo fenomenal define a objetivi-
dade pela pregnância e constância das figuras; e ele substitui o
processo causal por toda uma interação de forças entre o sujeito
(' o meio. O campo dinãmico do comportamento torna-se. assim.
()objeto maior da psicologia.
2) Evolução
e
gênese. Essas estruturas de conjunto e as
significações que habitam nelas evoluem no decorrer do devir
Individual. Para certos psicólogos. como Gesell.I? a emergência
Ias estruturas se faz na conduta por uma maturação surda dos
('squemas fisiológicos. Para outros, como Kuo, ela se faz pela
coesão progressiva de condutas segmentares e adquiridas que.
pelaforça de iteração da facilitação, organizam-se em estereótipos
rais de condutas lê.
Entre essas duas formas extremas de interpretação, a psícolo-
~Iagenética, depois de Baldwin, busca levar em conta a matura-
çã o
e a aquisição, o desenvolvimento necessário e o progresso
ligado ás circunstâncias. Piaget
19
atribui o máximo ao desenvol-
vimento necessário das estruturas ao mesmo tempo biológicas e
lógicas; ele busca mostrar no desenvolvimento das primeiras -
desde as que são irreversivelmente orientadas e concretas até as
que são reversíveis e abstratas, desde a reação imediata
opera-
ção
técnica - um processo que refaz em sentido inverso a marcha
da história das ciências - desde a geometria euclidiana até o
cálculo vetorial e tensorial: o devir psicológico da criança não é
senão o inverso do devir histórico do espírito. Em contrapartida,
Wallon atribui o máximo ao meio, mostrando na individualidade
psicológica não um dado, mas um resultado, como o ponto de
Interferência entre os movimentos centrípetos da emoção. da
simpatia, da fusão afetiva, e os movimentos centrífugos
dsr
expe-
ríêncía
do outro e do reconhecimento de si. O pensamento não é,
portanto, o modelo lógico e já constituído da ação, mas é o ato
desdobrando-se em um meio que se constitui como pensamento,
••ravés da intermediação do rito, do símbolo e, finalmente, da
Esse estudo recobre um domínio do qual não podemos, aqui.
senão delimitar as regiões essenciais.
1) Elementos e
conjuntos O behaviorismo,15 inaugurado por
Watson, busca o sentido adaptativo das condutas a partir das
manifestações objetivas do comportamento. Sem fazer intervir a
experiência vivida, nem mesmo o estudo das estruturas nervosas
e de seus processos, deve ser possível, confrontando a análise das
estimulações com a das reações, reencontrar a unidade do com-
portamento. Watson propõe como axioma: Uma resposta é exe-
cutada ante todo estímulo efetivo e a resposta é imediata.
Portanto, todo comportamento deve explicar-se a partir de uma
constelação estimulante, sem apelar para entidades como o
instinto, a consciência, a liberdade; inversamente, a toda es-
timulação há que se buscar uma resposta, ao menos implícita.
como é o caso das reações vegetativas (as emoções), ou das
reações laríngeas silenciosas (opensamento). Para o behavíorís-
mo molecular, essa análise deve fazer-se por segmentos tão
elementares quanto possível; para o behavíorísmo molar, ela dev
seguir as articulações significativas dos conjuntos (concepção do
Siqn-Gestali: em Tolman). Mas, em todos os casos, o projeto do
behaviorismo é.na verdade, aquele definido por Boring: constituir
uma psicologia científica do meaning .
Reencontramos os mesmos problemas na psicologia da forma:
qual é o domínio de objetividade das condutas significativas? E
estudo dessas significações deverá ser feito de uma forma seg
mentar ou global? Na Gestalt-Theoríe, é o segundo problema qu
domina o primeiro, e comanda sua solução-ê, Wertheimer, Kõhler
e Koffka mostram que são as qualidades estruturais da es-
timulação que motivam, em seu aspecto geral, respostas como
percepção que articula o campo, a inteligência que o reestrutura,
a emoção que embaralha suas linhas.
É
preciso, portanto. aban-
donar a hipótese de uma ação imediata dos estímulos locais
definir a relação entre a constelação estimulante e a resposta.
através de um campo que não implique nem objetividade natural
. (N.A.)Gesell (A) e Ilg (F.).
The.f trst flve years oflife. A guide to the study ofihe
preschool child. Nova Iorque, Harper, 1940.The childfromflve to ten. Nova
Iorque, Harper, 1946(L'enfant de 5 à 10 ans. trad. N. Granjon e J. Lézine.
PUF. 1949(N.E.)). Gersell (A) e Amatruda (C.). The embryology of behavior:
the beginnings ofthe human mind. Nova Iorque, Harper, 1945(L'embryologie
ducomportement; les débuts de lapensée humaine. trad. P. Chauchard. Paris.
PUF.
1952
(N.E.)).
18. (N.A.)Kuo (Z.-Y.).Les
principesfondamentaux
du
comportement. 1941.
lU.
(N.A.)Piaget (J.), La représentation du mondechez l'erifant, Paris. Alcan. 1926.
La
naissance
de l'intelligence chez l'enfant.
Paris. Delachaux e Níestlé. 1936.
Lapsychologie de l'intelligence.
Pans,
A
Collin. n
Q
249.1947.
15.
(N
.A)
Watson (J.
B.). Behavior.
An introduction
to comparative psychology.
Nov
Iorque. Henry Holt.
1914.
Tolman (E.
C}, Purposiue behavior
in
animals and
men, Ed. R. Ellíott, Nova Iorque, The Century Psychology Seríes, 1932.
16.(N.A.) Kõhler (W.). Gestalt psychology. An introduction to new concepts Úl
modempsychology. Nova Iorque, H. Líveríght. 1929.Koffka (K.).PrincipIes C
gestalt psychology. Nova Iorque, Harcourt and Brace, 1935.Lewin (K.).
Principies of topologil;al psychology. Londres. Mac Graw-Hill, 1935.
7/17/2019 FOUCAULT_PSCOLOGIA_1850_1950.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/foucaultpscologia18501950pdf 8/10
134
Michel Foucault - Ditos e Escritos
representação-v. O devir psicológico não é o desenvolvimento d
estruturas inteiramente preparadas. ele é a preparação efetiva d
estruturas adultas; não se trata mais de evolução espontãnea,
mas de gênese ativa.
3) Performances e aptidões. Um outro problema colocado pel
existência dessas significações objetivas é o de suas manifes
tações,
seu afloramento no domínio da observação. Ele se dá sol
duas formas: a da performance, da realização. da Leistung. com
dizem os alemães. e a da expressão.
A psicologia tradicional era uma psicologia do virtual; a.
faculdades não se inscreviam nunca senão entre as possibilid
des abstratas. É atualmente no nível mesmo do real, e no quadro
por ele definido, que se buscam determinar as eventualidades do
comportamento. Disto surgiu o princípio do teste. devido a Cattcll
e a Binet, e definido como uma prova estandartizada cujo resul
tado é estimado por comparação estatistica entre os indivíduos 1 1
ele submetidos. Quanto às crianças retardadas. Binet e Simon
21
foram os primeiros a buscar definir o nível mental de UJII
indivíduo, em relação aos sujeitos de sua idade; o teste tomo.
então, a forma de uma escala de desenvolvimento. O ímens«
acaso dos testes mentais conduziu Spearman
22
a definir CO 1l0
critério de inteligência as únicas perfortnances que se podem
aferir sob a forma de testes: a inteligência seria um fator geral
que. em um grau mais ou menos elevado segundo a natureza d
prova. daria conta de uma parte das performances, em todos o
testes de aptidões. A determinação da importãncia do fator 9
11 1
tal ou tal prova se faz por uma elaboração estatística, um cálci 1111
de correlações que estão na origem da análise fatorial. Mais tartk
Thurstoneêê. Thomson e Vernon praticaram o método de análtuo
multifatorial, que também. através do mesmo método de
análl-«
estatística das perfortnances, busca determinar ao lado, ou eVl11
tualmente no lugar do
fator g.
fatores polimorfos (aptidão
verb.rl
20. (N.A.) Wallon (H.),
Les origines
du
caractêre chez l 'enjant:
les
prélud( ~ ,,.
sentiment
de
personnalité.
Paris. Bolvln. 1934. De
l'acte
à
lapensée.
ES~II'
psychologie comparée.
Paris. Flammarlon. 1942.
2l. (N.A.)Binet (A.)e Simon (T.l. Méthode nouvelle pour le diagnostic du 1I1v,
intellectuel des anormaux , Année
psychologique.
t. XI. 1905. ps. 191 2/1,
22. (N.A.)Spearman (C. E.l. The
abtlitles ojman.
Their nature and measun' ,,,,'
Londres. MacMillan. 1927
(Les aptttudes de l'homme.
leur
nature
/'1 /
mesure. trad. F. Brachet. Paris. Conservatolre national des arts et ml ,
1936 (N.E.)).
23. (N.A.)Thurstone (L.l.The
vectorsojmind.
Chicago. UniversityofChicago 1,
1935. Thomson (G.l.
Thejactorial analysis ojhurnan ability.
Londres. Ulllv.,
slty ofLondon Press, 1939
(L'analysejactorielle
des
aptitudes humaines. ,, , , 0 1
P. Navílle, 3
ed., Paris. PUF. 1950 (N.E.)).
1957 - A Psicologia de 1850 a 1950 135
compreensão espacial. aptidão numérica). Em todo esse movi-
mento fatoríal, a objetividade das significações só é mantida e
~arantida pela fragilidade das relações estatísticas que alteram
sua necessidade e a despojam de todo conteúdo efetivo.
4) A expressão e o caráter. Em compensação, as psicologias da
expressão e do caráter esforçam-se em reapreender o conteúdo
das significações na forma da necessidade individual. Esse con-
teúdo
individual aflora, em primeiro lugar. em todos os fenõme-
nos da projeção e sobretudo na projeção sobre um estímulo pouco
diferenciado. de interpretações que lhe emprestam um sentido
Imaginário: é o princípio das provas de Rorschach e de Muway
(manchas de tinta. imagens de cenas humanas). Ele afIora igual-
mente nesses outros fenômenos de expressão constituídos pelos
[ulgamentos que se têm de si mesmo, ou ainda pela imagem que
nós damos a nós mesmos (é esse domínio que os questionários
It'Heymans ou de Woodworth exploram). Há, aproximadamente,
tantas características quantos métodos de investigação. Mas
deve-se notar o prestígio da grande oposição delineada por Bleu-
ler entre o tipo esquizóide (tendência ao fechamento sobre si
mesmo. ao autísmo, à ruptura de contato com a realidade) e o
-nráter ciclóide (tendência à expressão. à labilidade afetíva. ao
rontato permanente com o mundo exterior).
Tal como o mundo verbal e o universo imaginário, o corpo
nesmo detém um valor expressivo; esta idéia, desenvolvida por
lager, encontra sua validade tanto na estrutura geral do corpo
uanto em suas manifestações patológicas. O aspecto
morfológí-
)do organismo é posto por Kretschemer e Sheldon em relação
im a estrutura do caráter: o corpo simboliza com ela em uma
mídade na qual pode decifrar-se um estilo geral de reação
ícocorporal'v+. Pela via da análise simbólica na qual os sinais
orporaís são lidos como uma linguagem. a psicanálise mostrou
caráter expressivo do corpo e denunciou a origem psícogêntca
certas síndromes orgãnícas: sistematizando essa pesquisa,
Irxander
25
pôde mostrar a ligação de doenças como a híperten-
()ou a ulceração das vias digestivas com as estruturas
neuró-
írus que as provocam ou que se exprimem nelas.
(N.A.)Sheldon W. em col. com Stevens S. , The
varieties ojtemperamCIlL A
f}sychology oj constitutional
d fferences, Nova Iorque. Harper, 1942 .u S
tJwl('
lés
du
tempérament. Une psychologie des
dUférences
constitutionnelles. trnd.
A. Ombredane e
J.-J.
Grumbach. Paris. PUF, 1951 (N.E.)).
(N.A.)Alexander (F.).
Psychosomatic
medicine,
its principIes and applications.
Nova Iorque. Norton. 1950
(La médecine psychosomatique.
príncipes
et
ses applications.
trad. S. Horinson e E. Stern, Paris. Payot. 1951 (N.E.)).
7/17/2019 FOUCAULT_PSCOLOGIA_1850_1950.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/foucaultpscologia18501950pdf 9/10
136 Michel Foucault - Ditos e Escritos
5) Conduta e instituições. Expressas ou silenciosas. as sígnífl
cações objetivas das condutas individuais são ligadas por um laço
de essência à objetividade das significações sociais: as obras de
.Janet, de Freud, de Blondel
26
tentaram destacar esse elo. Con
duzír-se só pode ter sentido em um horizonte cultural que dà
ú
conduta sua norma (sob o aspecto do grupo). o tema. enfim. que
a orienta (sob as espécies da opinião e da atitude): estes são os
três grandes setores da psicologia social.
O estudo das instituições busca determinar as estruturas de
base de uma sociedade; isolar as condições econõmicas com sua
incidência direta sobre o desenvolvimento do indivíduo e sobre
as formas pedagógicas. no sentido amplo. que Kardiner
desígnn
como instituições primárias ; descrever a maneira como o ín
divíduo reage a essas instituições. como ele integra experíêncías,
como ele projeta enfim os temas maiores sob a forma do mito. d n
religião. das condutas tradicionais. das regras jurídicas e social
que se definem como instituições secundárías'v . Essa problr
mátíca definida com precisão por Kandiner està presente dI
maneira mais ou menos difusa em todos os estudos
antropolóat
cos, quer eles estudem as populações primitivas (M.Mead ('111
Sarnor, R.Benedict no NovoMéxico.Linton em Madagascar),
quct
se esforcem em desafiar eiras culturais mais desenvolvidas. com«
Linton em Plainville.
Os problemas do grupo concernern, ao mesmo tempo. ao jogll
de interação dos indivíduos que estão empresença direta uns cio
outros. e à experiência - vivida por cada um dos membros
(111
grupo - de sua situação própria no interior do conjunto. Morcun
focalizou métodos deanálise do grupo. pelos quais se determíru 1III
valências positivas ou negativas que unem eopõem os índívíduo
em uma constelação característica do grupo. Ele tentou. io('11I
síve, estabelecer. sob o nome de sociodrama. uma terapêutica
d)
grupos. que permitiria. assim como na análise individual.
1111 1
esclarecimento e uma atualização dos temas afetivos latentes. clll'
conflitos ou das ambivalências cujas relações manifestas
1 ' 1
subentendidas. e que tornaría possível. por essa via. uma
1('(1
daptação mútua. e uma restruturação afetiva do grup028.
26.
(N.A.)Blondel (c.). IntroductiDn à Ia psychologie collective. Paris, A. Colhi 11
102. 1927.
27. (N.A.) Kardiner (A.) com Linton (R.), Du Bois (C.) e West (J.l. Psychol//lI I
froniiers oj society.
Nova Iorque, Columbia University Press. 1945.
8. (N.A.)Moreno (J. L.). Whoshallsurvive? FOundationojsociometry, Nova IOqll
acon Press, 1934 (Fondements de
Ia sociDmétrie,
trad. Lesage e Maucm p
POliA,
PUF. 1954 (N.E.)).
1957 - A Psicologia de 1850 a 1950 137
A análise das opiniões e das atitudes busca determinar os
fenômenos coletivos que servem de contexto às condutas afetivas
do indivíduo. assim como às suas operações intelectuais de
percepção. de julgamento e de memória. Essas pesquisas são
quantitativas antes de serem estruturais e se apóiam sempre
sobre a elaboração de dados estatísticos: mede-se. assim, a
extensão de uma opinião através de investigações feitas sobre um
~rupo representativo de uma população em seu conjunto. ou
ainda a força de uma atitude em um grupo de indivíduos. através
do apego comparado que ele manifesta com relação a tal ou tal
opinião. O caráter coletivo dessas opiniões. dessas atitudes per-
mite extrair a noção de estereótipo. espécie de opinião generalí-
da e cristalizada que provoca. em função de atitudes prees-
rnbelecídas. reações sempre ídêntícas-ê.
o fundamento das significações objetivas
Todas essas análises designificações objetivas situam-se entre
IIS dois tempos de uma oposição: totalidade ou elemento; gênese
tnteltgível
ou evolução biológica; performance atual ou aptidão
pc'rmanente e implícita; manifestações expressivas momentáneas
11\1
constáncia de um caráter latente; instituição social ou con-
chitas individuais: temas contraditórios cuja distáncia constitui
, dimensão própria da psicologia. Mas cabe à psicologia ultrapas-
li 10s. ou deve ela se contentar de descrevê-los como formas
uipírícas, concretas. objetivas. de uma ambigüidade que é a
marca do destino do homem? Diante desses limites. deve a
pslcología liquidar-se como ciência objetiva e desviar-se em uma
r-llexãofílosófíca que contesta sua validade? Ou ela deve buscar
clc'scobrir fundamentos que. se não suprimem a contradição.
pc'rmitem ao menos dar conta dela?
Os esforços mais recentes da psicologia vão nessa direção e.
IllI'sar da diversidade de sua inspiração. pode-se resumir sua
Ignlficação histórica deste modo: a psicologia não mais busca
[unvar sua possibilidade por sua existência, mas fundamentá-Ia
I partir de sua essência. e ela não mais busca suprimir. nem
un-srno atenuar suas contradições. mas sim justificá-Ias.
1\
cibernética está longe. assim parece. de um semelhante pro-
to, Sua positividade parece afastá-Ia de toda especulação. e se
I (N.A.)Cantril (H.). Gauging public opinion. Princeton University Press. 1947.
Allport (G. W.) e Postman (L.). The psychology oj rumor. Nova Iorque. Henry
Ilolt.
1947. Stoetzel (J.).
Théorie
de
l'opinion.
Paris. PUF. 1943.
7/17/2019 FOUCAULT_PSCOLOGIA_1850_1950.pdf
http://slidepdf.com/reader/full/foucaultpscologia18501950pdf 10/10
138 Michel FoucauIt - Ditos e Escritos
1957 - A Psicologia de 1850 a 1950 139
ela toma por objeto a conduta humana, é para encontrar nela,
um só tempo, o fato neurológico dos circuitos em
Jeedback
os
fenômenos fisicos da auto-regulação e a teoria estatística
da
ínforrnaçãoôv,
Mas, ao descobrir nas reações humanas os
processos mesmos dos servomecanismos, a cibernética não r,
torna a um determinismo clássico: sob a estrutura formal da,
estimações estatísticas, ela deixa espaço às ambigüidades
dos
fenômenos psicológicos e justifica, do seu ponto de vista,
ai
formas sempre aproximadas e sempre equívocas do conhecI
mento que podemos ter.
Em um outro sentido, a ultrapassagem da psicologia se faz em
direção a uma antropologia que tende a uma análise da exístênctn
humana em suas estruturas fundamentais. Reapreender o ho
mem como existência no mundo e caracterizar cada homem pelo
estilo próprio a essa existência é, para L.
Bínswanger,
para
J
I
Kung, atingir, mais além da psicologia, o fundamento que lhe dI
sua possibilidade e dá conta de suas ambigüidades: a
psícologtn
aparece como uma análise empírica da maneira segundo a qual
a existência humana seoferece no mundo; mas eladeve assentar
s7:'0~ a análise existencial da maneira segundo a qual eSSlI
ealidade\humana se temporaliza, se espacializa e, fínalmentc.
\. projeta
tftn
mundo: então, as contradições da psicologia, ou II
àmbigttldade das significações que ela descreve, terão encontrado
sua razão de ser, sua necessidade e, ao mesmo tempo,
sun
contingência, na liberdade fundamental de uma existência qut
escapa, com todo o direito, à causalidade psícológícaô
l.
Porém, a interrogação fundamenta permanece. Nós mo,
tramos, no início, que a psicologia científica nasceu das contra
díções encontradas pelo homem em sua prática, e que, por ouI
lado, o desenvolvimento dessa ciência consistiu em um
lenln
abandono do positivismo que a alinhava, no começo, com
1 1
ciências da natureza. Esse abandono e a análise nova das siglll
ficações objetivas puderam resolver as contradições que o mot I
varam? Não parece, uma vez que nas formas atuais da
psícolouln
reencontramos essas contradições sob o aspecto de uma arnhí
güidade que se descreve como coextensiva à existência humana
Nem o esforço em direção à determinação de uma
causalídadr
estatística, nem a reflexão antropológica sobre a existência poderu
ultrapassá-Ias realmente, quando muito, podem esquivar-se de-
las, quer dizer, encontrá-Ias finalmente transpostas e travestidas.
O futuro da psicologia não estaria, doravante, no levar a sério
r-ssas
contradições, cuja experiência, justamente, fez nascer a
psicologia? Por conseguinte, não haveria desde então psicologia
possível senão pela análise das condições de existência do homem
'0
pela retomada do que há de mais humano no homem, quer dizer,
ua história.
30. (N.A.)Wiener (N.).
Cybemetics
or
control and communication
in
the
animal
1111
the
machine. Paris. Hermann. 1948. WaIter (W.
G.l .
The living
brain. Nova
1111
que, Norton. 1953
(Lecerveau vivant,
Paris, Delachaux e NiestIé, 1954 (N.KII
31. (N.A.) Binswanger (L.),
Grundformen
und
Erkennmis
des
menschlichen
1111
seins,
Zurique. Max Niehans, 1942.