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O FUTEBOL-ARTE ENTRA EM CAMPO Ciência 47 2013 NOVEMBRO APRESENTA A ALTA TECNOLOGIA AJUDA TIMES A IDENTIFICAR TALENTOS, A PREVER LESÕES, A MAPEAR CADA MOVIMENTO DO ADVERSÁRIO E, COM AJUDA DA BIOMEDICINA, A CONSTRUIR MÁQUINAS DE CARNE E OSSO. CONHEÇA A TRANSFORMAÇÃO CIENTÍFICA NOS CAMPOS DO BRASIL E DO MUNDO. FUTEBOL EXATO P.54 COBRANÇAS MATEMÁTICAS SIMULADOR DE JOGOS CAFÉ DOS CAMPEÕES MATERIAIS HI TECH DNA E LESÕES FALA, TOSTÃO! A P.55 P.56 P.57 P.58 P.60 P.61 GA268_47_61_MATCapafuteba.indd 46-47 23/10/2013 20:42:24

Futebol científico

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Page 1: Futebol científico

O FUTEBOL-arTEENTra EM CaMPOO FUTEBOL-arTEENTra EM CaMPOO FUTEBOL-arTEENTra EM CaMPO

Ciência

472013 • NOVEMBRO

aPrEsENTa

A AltA tecnologiA AjudA times A identificAr tAlentos, A prever lesões, A mApeAr cAdA movimento do

Adversário e, com AjudA dA biomedicinA, A construir máquinAs de cArne e osso. conheçA A trAnsformAção

científicA nos cAmpos do brAsil e do mundo.

FUTEBOL ExaTO P.54

COBraNças MaTEMáTiCas

siMULadOrdE jOgOs

CaFé dOs CaMPEõEs

MaTEriaishi TECh

dNa E LEsõEs

FaLa, TOsTãO!

AP.55

P.56

P.57

P.58

P.60 P.61

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NOVEMBRO • 201350 51NOVEMbrO • 2013

Duas traves, vários pés, uma bola. Metade para cada lado. O time que acertar mais vezes a esfera no retângulo adversário, vence. Na prática, convenhamos, é um jogo bem fácil. O que complica no futebol é a teoria. Desde que o primeiro grupo de amigos tentou organizar uma pelada, lá pelo meio do século 19, na Inglaterra, homens e mulheres quebram a cabeça para criar diferentes meios de compreender as ações no campo e vencer.

Hoje as tentativas de ler o jogo viraram questão de ciência. Clu-bes europeus que o digam. Verdadeiros laboratórios de medição estão sendo erguidos em suas sedes milionárias. Com auxílio de máquinas e sensores, profissionais estudam os detalhes que possam influenciar o desempenho dos atletas, da respiração ao jeito de pisar. O atual campeão da Copa dos Campeões da Europa, Bayern de Munique, conta com nada menos do que 22 pesquisadores — entre olheiros, estatísticos e médicos. Nos anos 80, a equipe não passava de 6.

Vindos de ambientes acadêmicos, esses profissionais atuam como máquinas de calcular. Podem antever lesões, saber co-mo cada atleta se portará no campo e até estudar os tecidos de camisa mais eficazes de acordo com a situação. Evitam ao máximo os danos do que comentaristas chamam de “caixinha de surpresas”. Em 2013 a procura por especialistas do tipo é tamanha que muitos deles estão abrindo suas próprias empresas de consultoria — e já ganham milhões.

Os principais torneios sugerem que o caminho do sucesso é por aí. Corinthians e Atlético Mineiro, os dois últimos a er-guerem o caneco da Libertadores da América, estão entre os sul-americanos que mais se dedicam às estatísticas; o atual elenco Barcelona, alvo de constantes estudos internos, é um dos mais vitoriosos das últimas décadas. Chelsea, Borussia Dortmund e Milan — que gasta 2,5 milhões de euros ao ano em pesquisas médicas — são outros que investem na tecnologia e estão na elite.

Para os cientistas que atuam no ramo, o futebol deve se tor-nar um polo de novas descobertas tecnológicas nos próximos anos. Diversos inventos que estão surgindo no campo poderão ser aplicados a outras áreas. É o caso das tecnologias micros-cópicas desenvolvidas para chuteiras de alta performance e dos tratamentos de lesões usando o DNA. Renderão, dizem, diversos produtos na área médica e de segurança. GALILEu detalha isso e mostra como será a modalidade a partir de agora.

Afinal, futebol-ciência é coisa séria.

d

mAis ciEnciA, mEnoschutE

tExtO | Guilerme Pavarin e marco Zanni

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Page 3: Futebol científico

552013 • NOVEMBRONOVEMBRO • 201354

PELO jOgO ExaTO A REDE pARA cAçAR tAlEntos

“EsTaTísTiCas só FazEM sENTidO a LONgO PrazO”

Quando Guerrero marcou o gol do título do Mundial

Interclubes de 2012, os olheiros do Corinthians

ganharam um motivo de sobra para comemorar.

A cabeçada certeira, sabiam, não era golpe de

sorte. “Antes de contratá-lo, vimos por software que

ele tinha boa impulsão e excelente aproveitamento nas

finalizações”, diz Fernando Lázaro, o responsável pelo

departamento de inteligência corintiano.

Usando o Wyscout, um software com dados de 220

mil jogadores, Lázaro e seus auxiliares analisaram

retrospecto do atleta, seus pontos fortes — como o jogo

aéreo — e, depois de exame detalhado, pediram-no como

reforço. A avaliação de jogadores via DVD começava a dar

lugar à caça digital no futebol brasileiro.

Não é só o Corinthians. Atlético Mineiro, Grêmio,

Internacional e Botafogo também criaram recentemente

departamentos de análise de performance e de dados,

seguindo uma tendência europeia. Desde a última

temporada, grandes equipes como Juventus e Bayern de

Munique escavam jovens talentos por meio de programas

virtuais minuciosos. “Se um técnico quiser um meia jovem,

sul-americano, com média de gols superior a 0,5 e no

mínimo 10 assistências numa temporada, pode conseguir

por nossa plataforma em segundos”, diz o italiano Matteo

Campodonico, o CEO da Wyscout, empresa que fornece

serviço a mais de 400 clubes.

O uso de dados não para por aí. Na Inglaterra,

consultorias criam departamentos de estatística para

gerar relatórios sob encomenda. A função delas é cruzar

informações para criar padrões de comportamento.

Podem dizer, por exemplo, que atacantes com menos de

75 kg não atuam bem contra determinado adversário.

“tentamos ser o menos subjetivo possível”, diz David

Hastie, CEO da consultoria Onside Analysis.

Para o experiente olheiro Gary Gelade, que ajudou

a criar o centro estatístico do Chelsea e hoje presta

consultoria para Paris Saint Germain e Real Madrid, não é

mais possível competir em alto nível sem uma central de

análise de dados. “O desafio do futebol atual é entender

quais números são importantes ou não”, explica. Dentro

dos centros de treinamento, a situação também está,

digamos, mais matemática. Auxiliares técnicos combinam

informações de sites de estatística — como Footstats

— com vídeos e fotos de partidas e treinos. Se houver

um período de seca com um centrovante, a equipe tenta

descobrir o motivo pelo posicionamento, jeito de bater na

bola e movimentos. “Estamos sempre atrás de um insight,

um jeito de ordenar o caos”, afirma Gelade.

Autor do recém-lançado Os Números do Jogo

— Por que tudo o que você sabe sobre futebol

está errado? (Companhia das Letras), Chris

Anderson desmistifica o poder dos dados

* As estatísticas vão dominar o futebol?

Nossas vidas estão sendo colocadas em computadores. Empresas também são avaliadas pelo trabalho e desempenho. O futebol é como qualquer indústria. Cada vez mais veremos companhias coletando e vendendo informações. Bons olheiros tirarão vantagens disso. Mas o jogo con-tinuará sendo 50% sorte e 50% qualquer outra coisa...

* As análises não são mais importantes?

Estatísticas não são garantia de sucesso. Ajudam treinadores, sim. Mas é como di-go no livro: o acaso tem grande papel no futebol. Pode-se ganhar qualquer partida por sorte. Estatísticas mudam pouco os resultados. Só fazem sentido a longo pra-zo, quando há chance de corrigir erros. Em torneios curtos, como Copa do Mun-do, a aleatoriedade é mais importante.

* Em que falham os estatísticos?

Há muitos erros, sobretudo porque pes-soas não estão familiarizadas com o que as estatísticas significam. Talvez a falha mais comum seja levar em conta desem-penhos individuais de jogadores, como gols e passes, e desconsiderar o que pro-duziram para o time. Há dados que são invisíveis. Por isso é preciso compreender os dados no contexto do jogo.

* No que resultará a obsessão por dados?

Teremos mais pessoas trabalhando com tecnologia para melhorar o desempenho no campo, a venda de jogadores, o desen-volvimento e a recuperação de atletas. Acima dos especialistas que cuidarão dis-so, veremos diretores procurando tomar decisões com base mais na evidência e na ciência do que no instinto. Não está longe.

OLhEirOs FrEELaNCErs

EMPrEsas EsTaTísTiCas

Espalhados por diversas regiões, olheiros compilam dados de jogadores para empresas de estatísticas.a direção das

setas representa o fluxo de informações

Companhias pegam dados e criam padrões de informação. Podem sugerir, por exemplo, que zagas com média de 1,85m de altura sofrem menos gols. Os relatórios costumam ser encomendados.

4 8 1516 23

42

Compilam dados numa plataforma amigável. Clubes e federações pagam R$ 1,8 mil mensais ao Wyscout, por exemplo, para usar o sistema e procurar jogadores do perfil que desejam.

Catalogam informações dos jogadores do próprio clube. Especificam índices dos mais variados. Também avaliam os próximos adversários. As tabelas vão para o departamento de estatística.

São os chefes do departamento de estatística. Acompanham a rotina do clube e interpretam dados internos e externos dos jogadores para sugerir mudanças na equipe.

CONsULTOrias dE dadOs

TéCNiCO

aUxiLiarEs

COBraNças MaTEMáTiCasNem tudo nos pênaltis é sorte, psicologia ou loteria. Cientistas do

mundo todo buscam caminhos mais exatos para a melhor cobrança

— e para a defesa dos goleiros também. Eis algumas maneiras de

driblar as probabilidades no momento mais tenso da modalidade.

PÊNaLTi

nÃo encareCientistas da Exeter University, na Inglaterra, estudaram os movimentos dos olhos de 14 jogadores durante as cobranças. Aqueles que encararam o goleiro a caminho da batida erraram o dobro.

Tenha rePerTórioAté craques têm zona de conforto. Ao analisar centenas de cobranças oficiais, a Prozone Sports constatou que canhotos cobram 50% dos pênaltis no canto direito e por isso erram mais. Previsíveis.

ou malhe as coxas!Para diminuir o tempo de antecipação e poder "ler" o batedor, é preciso aumentar a potência do salto. Como? Fortalecendo os músculos inferiores — sobretudo as coxas. E se estique bem.

anTeciPe...Ao avaliar 110 cobranças, pesquisadores da Unicamp constataram que defesas ocorrem com antecipação de aproximadamente 1/4 de segundo antes do chute. É preciso sorte.

pARA o GolEIRo

pARA o BAtEDoR

onDE As BolAs EntRAm (ou não)fonte: dados da prozone sports analisando as principais disputas de pênalti desde 1998.

PerdidosPor ser o local menos favorável às defesas do goleiro, o canto superior é também onde há o maior número de falhas: 54,5% dos chutes errados — para fora ou em direção às traves — vêm de bolas altas.

concreTiZadosQuase metade dos gols (48,1%) é feita com chutes rasteiros. Por outro lado, é também a faixa onde os goleiros mais triunfam (veja ao lado): 71,4% das defesas são feitas na altura mais baixa.

defendidosGoleiros têm instinto de pular para o canto esquerdo. Quase um terço das defesas é feita nessa faixa. Não por coincidência, é o lado escolhido pelos canhotos, os que menos variam o lado do chute.

encha o PéNa Universidade de Liverpool, pesquisadores calcularam que o chute indefensável atinge um dos cantos superiores a 104 km/h — a tal "bomba".

BaTE-BOLa

Altura, idade, gols,

assistências, habilidades,

pontos fracos, aproveitamento

de passes e lances em vídeo são alguns dos

dados coletados.

CLUBE

EsTaTís-TiCas

aNaLisTas dE dadOs

Time

jOgadOrEs

jOgadOrEsdO CLUBE

É quem pede os relatórios e, claro, quem bate o martelo.

14,7% 6,9% 7,8%

6,9% 4,9% 10,7%

18,9% 12,8% 16,6%

0% 0% 0%

3,6% 3,6% 12,4%

17,8% 21,4% 32,2%

16,6% 22,3% 16,6%

5,5% 0% 11,2%

22,3% 0% 5,5%

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Page 4: Futebol científico

57NOVEMbrO • 2013NOVEMbrO • 201356

O aUxiLiar iNTELigENTE

PassEs dE LaBO-raTóriO

PraNChETas 3d

Nos arquivos do técnico Roy Hodgson,

da seleção inglesa, consta que, em 12

de agosto de 2010, seu capitão Steven

Gerrard tinha uma lesão na parte de

trás da coxa. três dias depois, começou o

treino de reabilitação e, após 72 horas, num

período de 47 minutos, já tinha corrido 4,7

quilômetros entre aquecimento, coletivo

e o famoso dois-toques. O treinador sabe

também que o meio-campista conseguiu dar

piques curtos a 29,5 km/h com frequência

cardíaca máxima de 175 batimentos por

minuto — tudo controlado, no limite do

permitido por seu corpo.

Quem aponta todos esses dados não

é um auxiliar superdotado. É um pequeno

sensor escondido por baixo das camisas

dos jogadores, o Viper Pod. Serve para

verificar se, no treino, o lateral correu o

suficiente para acompanhar o ponta-

esquerda, o zagueiro saltou o quanto

precisava, o camisa 10 não mancou com

a perna recém-curada e o atacante se

posicionou corretamente. Em tempo real,

por meio de sinais de rádio, o laptop de um

Criar imagens em três dimensões sempre

foi útil para os videogames. Agora é

a vez dos times se interessarem pela

tecnologia. A ideia é que, no futuro

próximo, técnicos usem os bonequinhos 3D

para desenhar táticas e visualizar o jogo

na sua totalidade, com réplicas fiéis dos

jogadores, em menor escala. Empresas

de captação dessas imagens já estão

surgindo no mercado. A Artec 3D, de

Luxemburgo, capturou imagens de toda

a seleção brasileira, de Julio Cesar a Fred.

O equipamento analisa texturas e formas

geométricas para encaixar um quadro no

outro, sem deixar rebarbas. Por enquanto, o

recurso está em fase experimental e deve

servir para fins estéticos — e para tV.

auxiliar técnico — este humano! — recebe

as informações organizadas em gráficos,

mapas de calor e até diagramas. "O futebol

está cada vez mais tático", diz Richard

Moffett, analista científico da fabricante

StAtSports. "Números organizados e fáceis

de se ler comprovam a intuição do técnico e

apontam coisas que ele nem imaginava."

Quinze times da primeira divisão inglesa

já usam a ferramenta. O Santos deverá

ser o primeiro do Brasil. Sandro Orlandelli,

responsável pelas análises de desempenho

do clube, visitou duas vezes a fabricante

na Irlanda para aprender o sistema.

"Pretendemos implantá-lo em 2014,

nos profissionais e no sub-20" , diz.

O investimento é alto. Cada unidade custa,

em média, R$ 7 mil.

Os pragmáticos alemães do Borussia

Dortmund estão usando um método de trei-

namento capaz de fazer inveja a Ivan Drago,

o boxeador russo fabricado em laboratório

no filme Rocky IV. Consiste numa gaiola de

14 metros quadrados com oito mecanismos

que lançam bolas para um jogador no centro.

Antes do disparo, soa um alarme que indica

para onde ele deve se virar. A bola chega até

seus pés a uma velocidade ajustável entre

60 e 120 km/h. Uma luz se acende num dos

72 alvos, e o atleta deve acertá-lo com até

dois toques, sem sair do círculo central.

As 300 bolas arremessadas em 15 minutos

ajudam a trabalhar velocidade e precisão no

passe, noção de espaço e visão periférica.

Segundo o criador da máquina, Christian

Guettler, um dia de trabalho intenso equivale

a uma semana de treinamento. Parece dar

resultado: no último Campeonato Alemão,

o Dortmund teve 81% de eficiência nos

passes, mesmo com seu estilo de jogo de

contra-ataque, que propicia um número

grande de erros. O clube que quiser montar

uma dessas terá de pagar bem caro: pelo

menos US$ 2,4 milhões.

Fica encaixado numa espécie de cinta que os jogadores vestem

como funcIonA o VIpER poD

Tem GPS, acelerômetro, giroscópio, bússola, medidor de batimentos cardíacos e sistema de rádio para enviar as informações

Parâmetros são calculados 100 vezes por

segundo — 250 mil informações

verificadas por minuto

É possível saber o estilo de corrida do

jogador, como ele pisa no chão e se está começando

a se cansar

siMULa-dOrEs

NA gAiolA:

O meia

australiano

Mustafa Amini,

de 20 anos, em

regime de passes

na máquina

do Borussia

Dortmund

MaNUTENçãO das MáqUiNastratados como cientistas dos clubes, nutricionistas encaram

cardápios dos atletas como se fossem fórmulas químicas de alta

precisão. Em 2013, um dos maiores especialistas da área, o inglês

Don MacLaren, consultor de clubes como o Liverpool, atualizou o que

seria o cardápio para manter um atleta 100%. O principal é uma dieta

rígida de carboidratos somada a um trio de suplementos.

aLiMEN-TaçãO

QuANdo QuANto REsultAdo

Jantar antes do jogo

480 a 800 g Deve-se ingerir comidas ou bebidas de alto índice glicêmico para aumentar o armazenamento de energia para o dia seguinte.

Café da manhã no dia do jogo

80 a 240 g Se o jogo for às 16 horas, recomenda-se comer alimentos e bebidas com baixo índice glicêmico entre 9 e 10 da manhã.

Refeição pré-jogo

80 a 240 g Uma refeição similar ao café da manhã deve ser consumida de 3 a 4 horas antes da partida.

Durante o jogo

30 a 60 g Bebidas de alto índice glicêmico podem ajudar a precaver desconforto abdominal.

Pós-jogo 80 a 160 g Alimentos e bebidas com alto índice glicêmico devem ser consumidas por algumas horas para promover a ressíntese de glicogênio — a principal reserva de energia nas células.

Dia de treino geral

320 a 480 g Combinar carboidratos leves e pesados asseguram boa reserva para treinar. Se precisar perder gordura, recomenda-se menos de 320 g com baixo índice glicêmico e 160 g de proteína.

BEtA-AlAnInAQuantidade 3 a 6 g por dia administrada em doses iguais

Efeito: Faz crescer a produção de carnosina, aminoácido responsável por diminuir a fadiga causada por exercícios físicos intensos e melhora a performance durante tarefas de alta intensidade.

cAfEínA Quantidade: 2 a 4 mg por kg 60 minutos antes do treino.

Efeito: Intensifica a queima de gordura e espalha pelos músculos o glicogênio — que estoca energia. Também melhora o sistema nervoso central, que aumenta o tempo de reação.

quAntidAde ideAl de cArboidrAtos pArA um AtletA de 80 kg

cREAtInA Quantidade : 4 dias de 5 doses de 20 g; depois, de 3 a 5 g por dia.

Efeito: Aumenta o armazenamento de fosfocreatina que, por sua vez, melhora a capacidade de gerar energia. Há também ganho em potência nas corridas, em massa magra e na resistência.

Alimentos de alto índice glicêmico: bolos, biscoitos, pão branco, cereais, batata e chocolate.

Alimentos de baixo índice glicê-mico: leite, iogurte, aveia, sucos, espaguete, amendoim e feijão.

fonte: pesquisa do nutricionista don maclaren publicada e revista no livro Science and Soccer: Developing Elite Performers, editado por mark A. Williams

Pesa 50 g, o mesmo que duas pilhas AA

INFOGRáFICO | otávio silveira. FOTOS | divulgação

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Page 5: Futebol científico

alGodÃoFrequência cardíaca: 170 bpmMicroclima: 30,2 °CAs fibras encharcam e, quando secam, ficam bem geladas

fibras enchar-cadas

lAzIo2013/2014

mônAco2013/2014

RomA2012/2013

NOVEMBRO • 201358 59NOVEMbrO • 2013

BOLa TrEiNadOra

BaTaLha TérMiCa

calcanhar bem aPoiadoCom palmilha levemente côncava na parte de trás, o pé do jogador sofre impacto até 60% menor do que com as retas. O corpo usa a parte carnuda do calcanhar para amortecer os passos. E o calçado fica mais leve, pois precisa de menos material.

Tem TraçÃo?O atleta corre até 26% mais devagar com chuteira de campo sem travas. O chute também fica mais fraco, pela falta de estabilidade do pé de apoio. Ter poucas travas também não é o ideal. Quanto menos travas, menor a tração.

aTriTo mínimoA velocidade do chute pode cair até 1,2% se o atrito entre a bola e o pé for muito grande. Isso costuma ocorrer ao calçar chuteiras com borrachas duras e rugosas.

bom é descalçoSem tênis, o pé consegue flexionar por completo. Esse ângulo mais reto em relação à perna permite transferir mais energia para a bola — e o chute sai mais forte. Logo, quanto mais flexível for o calçado na dorsal do pé, melhor.

em nome da leveZaMateriais sintéticos permitem fazer calçados de menos de 160 gramas. Com eles, perde-se menos energia ao correr e aumenta a velocidade da "alavanca" no chute.

PoliamidaFrequência cardíaca: 158 bpmMicroclima: 31,5 °CSua textura irregular minimiza o efeito úmido colante

Até o equipamento mais simples de todos ganhou uma versão high tech para esses tempos de smartphones

e sensores sem fio. A pioneira smart_ball, da Adidas, quer ser uma nova ferramenta de treino. Capaz de

medir velocidade do chute, direção e altura, ela desenha uma parábola, que pode ir à tela do celular via

bluetooth. Um aplicativo exibe essas informações, mostra dicas de como melhorar e impõe desafios, como

chutar no ângulo — Zico não precisaria mais pendurar uma camisa no travessão para tentar acertá-la enquanto

treinasse cobranças de falta. também dá para armazenar os dados e descobrir quem bate na bola mais forte, por

exemplo. Depois de medir os chutes, o programa monta rankings que podem ser acessados pela internet.

A fórmula da camisa perfeita é simples: ela precisa

absorver a umidade do corpo e transportar o suor

para fora, onde ele poderá evaporar. Assim o tecido

não gruda na pele, nem fica gelado. Em busca do

melhor material, o fisiologista Turíbio Leite de Barros

conduziu um estudo na Unifesp. Dentro de labora-

tório climatizado a 25 ºC, com boa perda de calor,

pessoas correram com três tipos de camisa: algodão,

poliéster e poliamida. Mediram-se batimentos cardí-

acos (frequências altas indicam um grande esforço

no exercício) e microclima, temperatura entre a roupa

e o corpo (quanto mais quente, menos o organismo

precisa trabalhar para manter o equilíbrio térmico).

Em ambos os índices, deu poliamida. O motivo são

os furinhos, que diminuem o efeito colante. Como o

tecido não encharca, ele ainda fica mais leve.

PoliésTerFrequência cardíaca: 167 bpmMicroclima: 30,8 °CTem efeito colante — exige esforço para equilíbrio térmico

ChUTEs PrECisOs

Qualquer peladeiro sabe que

um chute de bico tem grande

chance de sair torto. Melhor

é bater com o peito do pé, ao

estilo Cristiano Ronaldo. A ciência

explica: quanto mais bem distribuída

a pressão da bola no calçado, mais

precisa e forte é a batida. "O ideal

seria ter pés de borracha, com a

mesma mobilidade nas articulações

e um amortecimento na sola",

explica Ewald Hennig, professor de

biomecânica da Universidade de

Essen, na Alemanha. tal flexibilidade

aumentaria a região de contato

entre o corpo e a bola. Como isso

ainda não é possível, as fabricantes

buscam limitar os movimentos

o mínimo possível e, de quebra,

oferecer proteção ao jogador.

Ao lado, mostramos os

elementos da chuteira ideal.

Todas as informações são

enviadas por bluetooth para o celular, que exibe e impõe desafios,

como chutar a determinada

altura e direção (e dá dicas de

como fazer isso, qual pé usar). O aplicativo mede

a velocidade de cada chute e monta um

ranking.

Estruturas de kevlar mantêm os sensores firmes, sem chacoalhar.

Bateria que alimenta os sensores.

Luzes indicativas de carga.

Os sensores medem velocidade, direção e altura do chute e detectam quais pontos da bola estão sofrendo pressão do pé — se você chutou de bico, peito, chapa ou trivela, por exemplo.

O círculo com o tamanho de uma bola de golfe abriga os sensores.

12 pontos de sustentação ficam grudados à parede interna da bola.

Base wireless para carregamento da bateria interna.

H

V

fibras encharcadas

baixa absorção de umidade

secagem rápida

fibras encharcadas

baixa absorção de umidade

secagem rápidafibras

encharcadas

baixa absorção de umidade

secagem rápida

baixa absorção de umidade

secagem rápida

sEm chIp Após anos de

discussão e

testes, a Fifa

decidiu que vai

usar na Copa

um sistema de

14 câmeras que

filmam a posi-

ção da bola em

3D. Elas serão

direcionadas

aos dois gols e

avisarão ao ár-

bitro, por meio

de um sinal em

seu relógio, que

a pelota ultra-

passou a linha

fatal. Nada de

chip, portanto.

O GoalControl

já foi usado na

última Copa

das Confe-

derações e,

apesar de não

ter acontecido

nenhum lance

polêmico, apon-

tou o centro

de campo 68

vezes, confir-

mando que os

gols do torneio

foram legais.

O método ven-

ceu outros dois

na concorrên-

cia: um deles

se baseava

em campos

magnéticos,

e o outro em

sensores com-

binados com

câmeras, como

se usa hoje

no tênis.

INFOGRáFICO | otávio silveira. FOTOS | divulgação

MaTEriaisEsPOrTivOs

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Page 6: Futebol científico

NOVEMBRO • 201360

Cor dos olhos, forma das unhas, estilo

das sobrancelhas. A maioria dos

cerca de 20 mil genes que definem as

características físicas dos humanos

não tem nada a ver com o fato de você ser

craque ou perna de pau. Mas pelo menos

200 fazem diferença na sua capacidade

atlética e habilidade futebolística. Um deles

em especial tem recebido muita atenção

da comunidade científica que estuda o

desempenho de atletas: aquele que codifica

a produção da proteína alfa actinina 3

(ACtN3). Se um jogador de futebol tiver esse

elemento em seu DNA, maiores serão sua

explosão muscular e proteção contra lesões.

O fisiologista do Cruzeiro, Eduardo

Pimenta, importou do Real Madrid um

método para balancear o treino dos atletas

de acordo com a presença da ACtN3 em

seus organismos. Segundo a pesquisa dele,

indivíduos que produzem essa proteína

em grande quantidade possuem músculos

capazes de gerar força rapidamente — são

aqueles atacantes velozes. Por sua vez, os

jogadores que não fabricam ACtN3 têm

fibras musculares menos elásticas, capazes

A ciência faz bem ao futebol. Não se pode achar, como muitos cronistas defendem, que ela prejudica o espetá-culo, que é inútil. É uma ilusão crer no futebol como algo irracional, fruto apenas do imponderável, da improvi-sação. Assim como é irreal acreditar que se trata de um

jogo igual ao vôlei, em que se pode ensaiar os movimentos e repeti-los à exaustão numa partida. Não: trata-se de um jogo complexo, um conjunto de acasos e de fatores exatos.

Quem melhor entendeu a importância da ciência no futebol foi a seleção brasileira dos anos 70. Muito se diz que era o time do futebol da arte, do improviso. Poucos dizem que foi, ao mesmo tempo, a equipe que trouxe um boom científico para o esporte. Nossa preparação para a Copa teve 21 dias de pesquisas. Enquanto nos adaptávamos à altitude mexicana, tínhamos acompanhamento médico, aparelhos que mediam pulsação, métodos pioneiros de preparação física.

Com o triunfo brasileiro, iniciou- se uma febre de medições. Em vez de melhorar, o futebol piorou. Depois de anos, percebeu-se que não adiantava ter estrutura tecnológica se no elenco houvesse jogadores medianos. O talen-to é a base do futebol. Muito por isso hoje há uma cultura de que os atletas devem jogar no limite, entre o esplen-dor e a exaustão. Corre-se muito mais. Os atletas estão sempre na academia, fortalecendo-se. Recebem apoios de

fisiologistas, de nutricionistas, terapeutas, de cientistas em geral. São verdadeiras máquinas.

O único descaso é com a psicologia. Quase não se vê tal acompanhamento no futebol. Faltam pessoas que possam ajudar o jogador a lidar com emoções, responsabilidades, torcida, público e a imprensa. Deveriam ser profissionais tão valorizados quanto preparadores físicos. Mas como não é possível medir os dados da mente, não interessa ao futebol.

A tecnologia deixa de ser positiva quando fica muito depen-dente dos dados exatos e o treinador perde a habilidade de observar. Ciência, por definição, é o método de observação. Há muitos detalhes que escapam dos números. Técnicos de-vem analisar suas equipes levando em conta detalhes fora da matemática. Futebol não se aprende nos livros, nas planilhas. Nem por isso devemos descartar esse apoio.

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FaLa, TOsTãO

em depoimento A gAlileu, o médico e ex-crAque dA seleção de 70 defende o uso moderAdo dAs ciênciAs exAtAs — e diz que é preciso mAis psicologiA no futebol

“há MUiTOs dETaLhEs qUE EsCaPaM dOs NúMErOs”

rECUPEraM-sE BOLEirOs

Após os jogos, o músculo do atleta apresenta microlesões, as quais provocam inflamação. A inflamação gera calor, que é detectado pelo termógrafo. Quanto mais vermelho, mais quente e, logo, mais inflamado.Se após esforço a região acusar 1 ºC acima, indica propensão a lesão. Diferenças de cor entre as duas pernas também.

26,8 °C

51%são intermediários — nem tão rápidos, nem tão resistentes. Eles produzem ACTN3, mas em nível moderado.

7%dos atletas são resistentes, pois não fabricam ACTN3. Correm grandes distâncias. Bom para volantes e laterais.

42% são velozes, capazes de produzir ACTN3 em grande volume. Ótimo para atacantes.

atleta descansado. Então, 24 horas antes

de cada partida, repete-se a fotografia

para checar a variação de calor. As regiões

em vermelho vivo indicam inflamações.

"Antes de o jogador perceber ferimentos,

conseguimos prevê-los pela temperatura e

trabalhar para aquecer ou esfriar a região

com alterações", afirma Altamiro Bottino,

fisiologista do clube. Pimenta também

está aplicando a tecnologia no Cruzeiro e,

por coincidência ou não, os dois clubes

não tiveram lesões em setembro,

mês em que costumam ter de seis a oito

jogadores machucados.

Na Europa, alguns métodos de medicina

alternativa também têm ganhado força. O

belga Frédéric Van Burm é uma referência

em osteopatia aplicada ao esporte. Por

meio de testes físicos e mentais, ele avalia

o funcionamento dos órgãos internos, das

articulações do crânio e do conjunto de

músculos e ossos. "É um diagnóstico que

busca relacionar eventuais problemas entre

si", diz. No tratamento, ele usa técnicas

como estiramento e pressão manual em

determinados pontos do corpo. três anos

atrás, ele começou a trabalhar no Zulte

Waregem, atual vice-campeão belga de

futebol. De uma pré-temporada para outra,

diminuiu o número de lesões de 11 para

duas. Mais impressionante: a quantidade

de medicamentos usados pelos jogadores

caiu 90%. Este ano, ele foi contratado pela

seleção de seu país e também se tornou

consultor do New York Knicks, da NBA.

MaPa dE LEsõEs

gENEs PrEMiadOscomo o elenco do cruzeiro é dividido segundo o Actn3

utilizAndo A termogrAfiA, é possível sAber se um jogAdor está Apto pArA A pArtidA ou se precisA descAnsAr

de suportar exercícios por longos períodos.

São os laterais e volantes que aguentam

subir ao ataque e depois voltar para a

marcação. Existem ainda os intermediários,

com ACtN3 em níveis baixos.

Pimenta notou que, quatro horas após os

exercícios, atletas que produzem a proteína

costumam apresentar grandes quantidades

da enzima Creatina kinase (CK) no sangue, um

dos maiores indicadores de dano muscular.

Já os que fabricam, com mesmo tempo de

repouso, têm o volume da CK normalizado

e menor risco de lesão mesmo em carga

intensa de treinamento. Conclusão: não é

coincidência que jogadores como Bernard e

Neymar se machuquem tão pouco. Quanto

aos outros, que não têm a bênção da

proteína da velocidade, é melhor não abusar

nos treinos de explosão.

"O estudo permite trabalhar para que

velocistas fiquem mais rápidos e aumentar

a resistência dos demais", diz Pimenta. No

período de teste, na categoria de base

do Cruzeiro, as lesões do grupo

diminuíram em 15% num ano.

Como prever?Ao conhecer o genótipo dos atletas, os

preparadores físicos conseguem criar planos

de treino específicos para cada um. Mas

não é a única técnica que tem mudado a

maneira de distribuir as cargas de exercício.

O Botafogo adotou há pouco a termografia.

Uma câmera identifica a temperatura de

cada músculo em situação ideal, com o

35,4 °C

LEsõEs

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