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GÊNERO, RAÇA/ETNIA E SAÚDE: INTERFACES DOS SABERES E
PRÁTICAS DA ENFERMAGEM
Enfa. Maria das Graças Lima8
Em nome da BEMFAM, agradecemos o convite da comissão de temas da
72ª Semana Brasileira de Enfermagem e da 42ª Jornada Maranhense de Enfermagem
promovidas pela ABEN-MA. A escolha deste tema expressa o compromisso político,
cultural e científico da ABEN-MA com a categoria de enfermagem. Compartilhar desta
mesa com o ²Prof. Doutor Raimundo Augusto Martins Torres é um privilégio e a
certeza plena do enriquecimento do debate.
Para abordar sobre, raça/etnia e saúde, é necessário fazer algumas
considerações sobre as assimetrias econômicas, exclusões e vulnerabilidades que
aprofundam as desigualdades em um país que a ³taxa de analfabetismo em mulheres
negras é o dobro das brancas, o salário inicial pago aos homens em 2010 foi, em média,
R$ 113,3 maior que o vencimento pago às mulheres no ato da admissão no emprego.
Outro fator que leva às relações de gênero desiguais é a reprodução dos
estereótipos no nosso cotidiano, que limitam o desenvolvimento pleno tanto de
mulheres quanto de homens, tendem a aprofundar outras desigualdades, estabelece uma
discriminação de classe, raça, religião, idade, orientação sexual, deficiência, etc.
4Em uma perspectiva dos direitos humanos, a saúde é reconhecida como
o conjunto de condições integrais e coletivas de existência, influenciado por fatores
políticos, culturais, socioeconômicos e ambientais. Nesse sentido é impossível deixar de
considerar o avanço inegável da instituição da saúde como direito de todos (as) e dever
¹Enfermeira especialista em auditoria, planejamento em saúde pela Universidade Estácio de Sá- Laboro,Coordenadora Estadual do Programa de Saúde Sexual e Saúde Reprodutiva da BEMFAM no Estado do Maranhão.
²Professor doutor em educação brasileira pela Universidade Federal do Ceará – UFC. Docente do quadro efetivo da Universidade
Estadual do Ceará – UECE. ³Perspectiva da Eqüidade no Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal-MS eCadastro Geral de Empregados
e Desempregados (Caged),
4Saúde da População Negra no Brasil- Contribuições para promoção da equidade – Ministério da Saúde/Fundação Nacional de Sa
.Organizado pelos profs. Edgar Merchan Hamann e Pedro Luiz Tauil; coordenado pelo Departamento de Saúde Coletiva da
Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília e patrocínio do Ministério da Saúde e, junho de 2000.
www.saude.gov.br/sps/menu.htm#
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do Estado (artigo 196 da Constituição Federal), entretanto, a garantia legal ao acesso e
igualitário às ações e aos serviços de saúde não tem assegurado aos negros e indígena so
mesmo nível, qualidade de atenção e perfil de saúde apresentado pelos brancos.
Indígenas, negros e brancos ocupam lugares desiguais nas redes sociais e trazem
consigo experiências também desiguais ao nascer, viver, adoecer e morrer.
Estudo realizado por Leal e col (2005), revela que mulheres que não
tiveram acesso a anestesia durante o parto vaginal foi maior entre as negras em
maternidades do Rio de Janeiro.
5.Segundo Alves e Barbosa (2), concentra-se no Brasil “a maior população
negra (englobando pretos e pardos) fora da África e a segunda do mundo, superada
apenas pela da Nigéria.” Mais de 40% da população brasileira corresponde a afro-
descendentes. Em geral, esta fração da população, do ponto de vista econômico e social,
é mais pobre e menos instruída que o restante da população brasileira. Entre os afro-
descendentes, apenas 2% recebem mais de dez salários mínimos mensais (2). Grande
parte vive na periferia de centros urbanos, com moradias inadequadas, baixa cobertura
de saneamento básico, proporção elevada de analfabetismo, pouca qualificação
profissional e pouca perspectiva de ascensão social. É uma população marginalizada,
discriminada socialmente e mais vulnerável à violência e a doenças.
É possível, portanto, que, o ponto de vista das doenças com forte
determinação genética, a população brasileira afro-descendente possa manifestá-las com
características próprias, no entanto, as doenças ligadas à pobreza, como desnutrição,
verminoses, gastroenterites, tuberculose e outras infecções, alcoolismo, etc., são mais
incidentes na população negra e não por razões étnicas. O acesso a serviços de saúde é
mais difícil e o uso de meios diagnósticos e terapêuticos é mais precário, produzindo,
em geral, evolução e prognóstico piores para as doenças que afetam negros no Brasil.
A mortalidade proporcional segundo idade (em anos) e raça/cor - Brasil,
2005, confirma a realidade acima exposta raça/cor: branca, 27,8%; preta 41,4%;
amarela 20,4%; parda 39,5% e indígena 25,0%.(SIM/SUS/MS).
É importante destacar que o racismo influencia como fator determinante
na produção das diversas violências, mas há um agravamento da violência quando é
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mulher e é negra, que se dá dentro das comunidades onde está a maioria da população
negra – palafitas, ocupações, bairros populares, favelas, comunidades rurais quilombola,
desassistida das políticas públicas. Podemos ilustrar esta realidade apresentando os
dados Casos de Violência Sexual,registrados pelo VIVA por raça/cor e sexo, Brasil
2006-2007. Cor Branca: 38% Masculino e 32% Feminino, enquanto Parda e Preta: 52%
Masculino e 55% Feminino, Amarela, < 1% Masculino e 1% Feminino, Indígena: 0%
Masculino e 1% feminino.
Em novembro de 2006 é materializado um marco político importante,
fruto da luta do movimento afro brasileiro, o reconhecimento da desigualdade
étnico-racial na saúde, com aprovação pelo Conselho Nacional de Saúde da Política
Nacional de Saúde Integral da População Negral - PNSIPN com objetivo geral de
promover a eqüidade em saúde da população negra, priorizando o combate ao
racismo e a discriminação nas instituições e serviços do SUS e objetivos específicos
de promover a eqüidade em saúde da população negra, priorizando o combate ao
racismo e a discriminação nas instituições e serviços do SUS;. reduzir os
indicadores de morbi-mortalidade por: hipertensão arterial, diabetes mellitus,
doença falciforme, hiv/aids, tuberculose, hanseníase, câncer de colo uterino e de
mama, transtornos mentais.(Brasil,2007)
Esta política coloca na ordem do dia um grande desafio para o
desenvolvimento pleno e resolutivo; com a derrubada de práticas do racismo
institucional com o estabelecimento de ferramentas capazes de promover uma re-
significação de uma cultura não discriminatória que contribuam para um modelo
de gestão democrática que assegure o direito universal.
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A eficácia do cuidado em saúde varia de acordo com as condições
socioeconômicas do sujeito, o lugar onde ele vive, a qualidade dos equipamentos sociais
que ele tem acesso, a sensibilidade, a humanização e compromisso da equipe de
profissionais pelos quais ele é atendido
9 6 Saúde da População Negra no Brasil- Contribuições para promoção da equidade – Ministério da Saúde/Fundação Nacional de
Saúde.
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De acordo com os dados registrados por Perpétuo (2000) em relação à
baixa qualidade do tratamento oferecido às mulheres negras, os dados da Pesquisa
Nacional de Demografia e Saúde – 1996 – evidenciam as diferenças raciais presentes no
cuidado oferecido às mulheres na área de saúde sexual e saúde reprodutiva. A não
realização de consultas ginecológicas completas, a ausência de consultas de pré-natal, o
número de consultas abaixo do preconizado e o não oferecimento do exame
ginecológico pós parto estiveram estatisticamente associados à variável cor da pele,
mesmo após ajuste e controle por nível de escolaridade e renda.
Na mesma pesquisa nacional, observou-se que, das mulheres entrevistadas
que tiveram filho(s) nos 5 (cinco) anos anteriores à realização da Pesquisa (n=3.025), as
negras apresentaram menores probabilidades de realizar a primeira consulta em período
igual ou inferior ao quarto mês de gravidez e maiores probabilidades de não terem
recebido assistência médica durante todo o período gravídico. A chance de pelo menos
um dos filhos dessas mulheres ter nascido em casa foi 3,73 vezes a chance observada
para as brancas.
Esta situação coloca o cuidado de enfermagem como dispositivo
técnico-assistencial que permite refletir e mudar os modos de operar este cuidado, em
uma perspectiva crítica de empoderamento dos sujeitos, possibilitando a
conscientização das pessoas em relação aos direitos constitucionais.
É importante, enquanto prática da enfermagem, identificar o racismo e
suas conseqüências sobre as mulheres negras; manejar os agravos prevalentes:
promoção de saúde, proteção, recuperação e reabilitação e acolhimento.
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Aspectos importantes no cuidado a anticoncepção: ser portadora de
Anemia Falciforme não constitui em indicação para a esterilização. Os métodos para
contracepção são: barreira (preservativo masculino e feminino), contraceptivo oral
progestagênio, injetável à base de medroxiprogesterna, Dispositivo Intra-Uterino –
(8incluso nos Critérios Médicos de elegibilidade – categoria 2), o uso de contraceptivos
10 7
Manual de Diagnóstico e Tratamento de Doenças Falcêmicas, do Ministério da Saúde
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orais combinados – (incluso nos Critérios Médico de Elegibilidade – categoria 2) e
Anticoncepção de Emergência – levonorgestrel.
Aspectos importantes no cuidado ao pré-natal de pacientes com anemia
falciforme: deve ser feito de modo mais apurado e com acompanhamento de um
hematologista. A anamnese inclui atenção especial às crises antes, durante e após as
gestações pregressas, a fim de se observar o curso da anemia antes desta gestação e,
principalmente, o comportamento observado em gestação anterior.
Os exames laboratoriais incluem hemograma completo com contagem
de reticulócitos, eletroforese de hemoglobina, ferro sérico, avaliação hepática e renal.
As pacientes devem receber suplemento de ácido fólico diariamente.
Gestante, com orientação sobre os riscos, identificação precoce de
sintomas e cuidados na hipertensão arterial e na diabetes mellitus - enfatizar a
necessidade da triagem neonatal para hemoglobinopatias, que inclui o diagnóstico da
anemia falciforme.
É fundamental garantir que seja aferida a pressão arterial de todas as
gestantes em todas as consultas de pré-natal. Atenção especial deve ser dada para
qualquer alteração nos níveis pressóricos das gestantes negras, com o devido
acompanhamento e encaminhamento para serviços de alto-risco, quando detectadas
alterações significativas.
Garantir a realização de dois exames de glicemia de rotina, conforme
preconiza o Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento.
Investigar se no município há comunidades quilombolas. Incluí-las
nas ações de saúde em uma abordagem adequada às suas necessidades considerando a
sua realidade.
Cuidados com os recém-nascidos: devem ser submetidos à triagem
neonatal, atentando especialmente para a anemia falciforme, e dispor de serviço para
atenção precoce aos portadores desta hemoglobinopatia, conforme preconiza o
Programa de Anemia Falciforme, criado em 2000 pelo Ministério da Saúde e cuja
operacionalização está a cargo dos estados e municípios.
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Alguns avanços importantes na implantação POLÍTICA NACIONAL
DE SAÚDE INTEGRAL DA POPULAÇÃO NEGRA: a introdução do quesito cor nos
sistemas de informação em saúde, tanto no Sistema de Acompanhamento do Programa
de Humanização no Pré-natal como no Sistema de Informação do câncer do colo do
útero, o que permitirá análises mais precisas da situação de saúde das mulheres negras.
A Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doença
Falciforme e outras Hemoglobinopatias enfatiza as especificidades das mulheres em
idade fértil e no ciclo gravídico-puerperal. A anemia falciforme foi incluída no
conteúdo programático dos Seminários de Atenção Obstétrica e Neonatal Humanizada
Baseada em Evidências Científicas, que devem ser implementados nos estados e
municípios para a qualificação da atenção ao parto prestada pelos profissionais de
saúde às mulheres negras.
Os principais desafios: A produção de material sobre saúde das mulheres
negras e a inserção de temas relacionados com esta população na formação/capacitação
de profissionais de saúde, alinhadas com a vontade política do governo de eliminar
quaisquer formas de discriminação por conta das diferenças de raça/cor. Expandir a
Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme e outras
Hemoglobinopatias, por intermédio do apoio à capacitação de gestores estaduais e
municipais, elaboração e distribuição de material informativo e educativo sobre
gravidez da mulher com anemia falciforme. Incluir o debate sobre o racismo no
processo de organização das Redes de Atenção Integral à Saúde das Mulheres em
Situação de Violência Doméstica e Sexual.
Muito Obrigada!
BIBLIOGRAFIA:
Organizado pelos profs. Edgar Merchan Hamann e Pedro Luiz Tauil; coordenado pelo
Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de
Brasília e patrocínio do Ministério da Saúde e, junho de 2000.
www.saude.gov.br/sps/menu.htm#
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Saúde da População Negra no Brasil- Contribuições para promoção da equidade – Ministério
da Saúde/Fundação Nacional de Saúde
OLIVEIRA, Fátima. Uma contribuição ao debate sobre raça/etnia e saúde. Sexualidade, gênero
e sociedade. Números 15 e 16. Edição Especial
Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal Atenção à Saúde das
Mulheres Negras, Brasil,2006
Costa, N F Pinto, Almeida, Mônica de -Normas Técnicas em Anticoncepção –BEMFAM,2007