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Gentil Lopes - Espaços Métricos

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Gentil Lopes - ESPAÇOS MÉTRICOS

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ESPACOS METRICOS

(com aplicacoes)

Gentil, o taumaturgo

1a edicao

Boa Vista-RREdicao do autor

2013

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Prefacio

Via de regra o que se faz em um prefacio e discorrer sobre o conteudoda obra. Nos dispensamos deste ofıcio em razao de que o leitor, se assim odesejar, pode apreciar o conteudo deste livro a partir do (extenso) sumario,dado logo a seguir. Aproveito esta oportunidade para alguns esclarecimentosa respeito da obra em si.

Iniciei a escrita deste livro ha doze anos atras, com varias interrupcoes.E um livro escrito a “uma maos”, sem nenhum apoio, inclusive institucional.Para um autor dos “grandes centros” nao e difıcil encontrar motivacao paraescrever uma obra uma vez que ele, de antemao, ja tem a certeza de que serapublicada. Ja para um autor de “periferia”, como e o meu caso, a teimosiae imprescindıvel. Com efeito, fiz duas tentativas anteriores para publicacaodeste livro, a primeira na propria editora de minha universidade (ufrr); aposum tempo consideravel de espera o diretor me informou que a editora aindaestava tentando captar recursos externos.

Numa segunda tentativa o submeti a editora da unb. Aproximadamenteum ano depois recebi uma carta com o parecer de um referee (arbitro).

O livro nao foi aceito para publicacao. Tres foram as acusacoes princi-pais contra a minha obra:

(i) Muito volumosa (espessa). O arbitro argumentou que eu poderiatransmitir o mesmo conteudo na metade do volume;

(ii) um numero excessivo de figuras;(iii) nas proprias palavras do referee: “Em diversos pontos do texto o

autor mistura aspectos de seu proprio entendimento filosofico e religioso coma materia especıfica deste topico da matematica.”

Pois bem, vou me permitir alguns comentarios a respeito das duas ten-tativas malogradas. Comecando pela primeira: posteriormente descobri quepara mim e muito mais facil “captar recursos externos ”, para publicar umlivro, do que para a editora de uma universidade. Com efeito, basta eu medirigir ao caixa eletronico do meu Banco e passar meu cartao: pronto!, orecurso externo cai direto em minhas maos.

De sorte que este ja e o quarto livro que publico − tomando dinheiroemprestado no Banco, reitero (consignacao em folha).

Quanto aos argumentos do referee, observo que: escrever um livro finonao seria difıcil, agora se resultaria em um livro didatico aı e uma outraestoria. Nao e o que se observa em relacao aos que se encontram no mer-cado, inclusive livros com poucas ou nenhuma figura − via de regra, livrosque desestimulam os estudantes. O que me parece e que uma grande partede autores (e editoras) ainda nao se deu conta de que o publico para oqual eles escrevem nao existe mais − em decorrencia do lastimavel estadoem que se encontra a educacao brasileira, estamos falando de qualidade.Muitos alunos, como se sabe, adentram as universidades com deficienciaate na matematica do ensino fundamental. Como ensinar a estes alunos a

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matematica abstrata das disciplinas do final da graduacao? Aqui e onde situoa utilidade das figuras; de sorte que nesta nova versao do livro decidir con-tinuar cometendo os mesmos dois primeiros pecados assinalados pelo referee;quanto ao terceiro, achei que ele, em parte, tinha razao, assim e que elimineias referencias religiosas e mantive da filosofia apenas o necessario.

Mudando de assunto, meu primeiro livro sobre matematica ([6]) foi publi-cado no ano 2000 − tambem as minhas expensas −, alguns anos depois esselivro chega as maos de um renomado matematico brasileiro (Prof. Ubiratan

D’Ambrosio) que tece − de livre e espontanea vontade, isto e, sem que eutenha solicitado − comentarios elogiosos ao mesmo. Tomei a liberdade dereproduzir aqui o email do professor Ubiratan por duas razoes principais.Primeiro porque nao creio que eu tenha piorado, como autor, nestes dozeanos decorridos; segundo, porque creio que muito do que ele fala a respeitodaquele livro se aplica ao presente. Ei-lo:From: Ubiratan D,Ambrosio <[email protected]>To: Gentil Lopes da SilvaSent: Saturday, November 06, 2004 10:46 AMSubject: Obrigado pelo livroCaro GentilMuito obrigado pelo livro que voce mandou pelo Chateau. Esta muito bom,interessante e cheio de provocacoes. Da oportunidade para os estudantesse iniciarem em pesquisas. Voce fala que o livro destina-se a alunos de2o e 3o graus. Eu diria que e tambem para a pos. Aritmetica continuasendo grande fonte de problemas de pesquisa que podem ser trabalhadoscom relativamente pouco da complicada linguagem, notacoes e resultadosque caracterizam muitas areas da matematica. Sao formulacoes simples quepodem ser trabalhados com pouca tecnica, exigindo imaginacao e criativi-dade. Vou recomendar aos meus alunos. Mas tive um problema. Nos sitesdas livrarias, o livro nao existe. E nem esta no site da Thesaurus. Recomen-dar um livro implica dizer como adquirir. O que voce diz? Siga em frentecom suas ideias. As suas reflexoes iniciais, a sua escolha de epıgrafes, e apropria capa, sao uma grande contribuicao para um novo pensar na urgenterenovacao da educacao em todos os nıveis. A sua trajetoria desde seus estu-dos, lecionando em condicoes precarias, e com as dificuldades para publicaro livro e um exemplo, muitıssimo frequente, do processo (certamente inten-cional) de desencorajar o florescimento dos criativos, e abrir o espaco paraos executores de ideias de outros.Uma curiosidade: voce sabia que o Edouard Lucas, que voce cita na pagina393, e quem fez a revisao tecnica para a publicacao postuma do livro “Melan-ges de Calcul Integral”, de Joaquim Gomes de Souza, o Souzinha, em 1882?O livro havia sido recusado por inumeras editoras enquanto ele estava vivo.Muito obrigado.Um abraco, Ubiratan

Gentil, O taumaturgo/Boa Vista-RR/30.10.2012

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Sumario

1 ESPACOS METRICOS 9

1.1 Introducao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

1.2 Definicao de espacos metricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

1.2.1 Exemplos de espacos metricos . . . . . . . . . . . . . . 14

1.2.2 Metricas sobre o R2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

1.2.3 Distancia entre funcoes . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

1.2.4 Espacos de Codigos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34

1.3 Distancia entre Ponto e Conjunto . . . . . . . . . . . . . . . . 45

1.4 Distancia entre conjuntos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51

1.5 Conjuntos limitados − Diametro . . . . . . . . . . . . . . . . 53

1.6 Exercıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58

• Apendice: Demonstracoes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64

2 CONSTRUCAO DE ESPACOS METRICOS 79

2.1 Metricas a Partir de Metricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79

2.2 Subespacos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81

2.3 Espacos vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82

2.4 Metricas Induzidas Por Funcoes . . . . . . . . . . . . . . . . . 93

2.5 Produto de espacos metricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95

2.6 Exercıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101

3 BOLAS ABERTAS 105

3.1 Definicao e Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105

3.1.1 Bolas na reta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106

3.1.2 Bolas na metrica “zero-um” . . . . . . . . . . . . . . . 107

3.1.3 Bolas no espaco quantico . . . . . . . . . . . . . . . . 108

3.1.4 Bolas no plano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111

3.1.5 Bolas no quadrado quantico . . . . . . . . . . . . . . . 113

• Topologia quantica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115

3.1.6 Bolas nos espacos de codigos . . . . . . . . . . . . . . 118

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3.1.7 Bolas nos espacos de funcoes . . . . . . . . . . . . . . 118

3.1.8 Bolas em subespacos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121

3.1.9 Bolas no espaco produto . . . . . . . . . . . . . . . . . 124

3.1.10 Proposicoes sobre Bolas . . . . . . . . . . . . . . . . . 125

3.1.11 Ponto isolado − Espacos discretos . . . . . . . . . . . 129

3.2 Exercıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 134

4 SEQUENCIAS EM ESPACOS METRICOS 137

4.1 Sequencias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137

4.1.1 Subsequencias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 140

4.2 Convergencia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 141

4.3 Sequencias num Espaco Produto . . . . . . . . . . . . . . . . 157

4.4 Sequencias em Espacos Vetoriais Normados . . . . . . . . . . 159

4.4.1 Sequencias na reta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 159

4.4.2 Sequencias em espacos normados . . . . . . . . . . . . 161

4.5 Quando eminentes matematicos cometem erros elementares . 167

4.6 Exercıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 178

5 A TOPOLOGIA DOS ESPACOS METRICOS 185

5.1 Ponto interior . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 186

5.2 Conjuntos abertos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 188

5.3 Ponto fronteira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 196

5.4 Conjuntos fechados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 201

5.5 Ponto aderente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 204

5.6 Densidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 216

5.7 Ponto de acumulacao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 219

• Apendice . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 223

� Representacos binarias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 227

5.8 Exercıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 233

6 FUNCOES CONTıNUAS 237

6.1 Isometria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 251

6.2 Propriedades das aplicacoes contınuas . . . . . . . . . . . . . 271

6.3 Continuidade Uniforme . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 288

6.4 Homeomorfismos − Espacos Homeomorfos . . . . . . . . . . . 294

6.5 Metricas Equivalentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 310

6.5.1 Normas Equivalentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 325

6.6 Exercıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 328

• Apendice: Limites em espacos metricos . . . . . . . . . . . . . . 337

7 ESPACOS METRICOS CONEXOS 349

7.1 Definicao e Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 349

7.2 Conexos na reta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 355

7.3 Conjuntos conexos por caminhos . . . . . . . . . . . . . . . . 364

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• Topologia quantica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3837.4 Espacos localmente conexos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3927.5 Componentes Conexas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3967.6 Exercıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 401

8 ESPACOS METRICOS COMPLETOS 4078.1 Espacos metricos completos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4168.2 Espacos de Banach . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4288.3 Espacos de Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4328.4 Completamento de Espacos Metricos . . . . . . . . . . . . . . 4448.5 Espacos topologicamente completos . . . . . . . . . . . . . . . 4568.6 Teorema do Ponto Fixo de Banach . . . . . . . . . . . . . . . 4678.7 Exercıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 473

9 ESPACOS METRICOS COMPACTOS 4759.1 Compacidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 477

9.1.1 Caracterizacao de compacidade . . . . . . . . . . . . . 4909.2 Produto Cartesiano de Conjuntos Compactos . . . . . . . . . 495

9.2.1 Compactos no Rn . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4969.3 Distancia Entre Conjuntos Compactos . . . . . . . . . . . . . 4979.4 Numero de Lebesgue Para Coberturas . . . . . . . . . . . . . 5009.5 Espacos Localmente Compactos . . . . . . . . . . . . . . . . . 5049.6 Representacoes decimais e Curva de Peano . . . . . . . . . . . 507

9.6.1 O Mito das ambiguidades nas representacoes decimais 5079.6.2 A curva de Peano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5169.6.3 O quadrado hipermagico . . . . . . . . . . . . . . . . . 528

9.7 A curva de Peano no cubo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5369.7.1 O cubo hipermagico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5399.7.2 O universo esculpido em um palito de fosforo . . . . . 544

9.8 Exercıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 549• Apendice: Produtos cartesianos infinitos . . . . . . . . . . . . . . 551

10 CONSULTAS 56310.1 Elementos de Logica & Demonstracoes . . . . . . . . . . . . . 563

10.1.1 Operacoes Logicas sobre Proposicoes . . . . . . . . . . 56410.1.2 Tecnicas (Engenharia) de Demonstracao . . . . . . . . 56810.1.3 Funcoes Proposicionais/Quantificadores . . . . . . . . 576

10.2 Conjuntos, Funcoes e Famılia de conjuntos . . . . . . . . . . . 58310.3 Topicos em Analise . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 600

10.3.1 Teoremas e Definicoes da Analise Real . . . . . . . . . 60310.3.2 Supremo e Infimo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60510.3.3 Espacos vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61510.3.4 Interregno: A Matematica como arte e engenharia . . 620

• Um desafio a quem interessar possa . . . . . . . . . . . . . . . . 621

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Resumo das Metricas

ConjuntoMetrica(Sımbolo)

Definicao Pag.

RUsualµ µ(x, y)= |x−y| 14

M“zero-um”

δδ(x, y)=

{1, se e so se x 6=y;0, se e so se x=y.

15

[ 0, 1 [ Quanticak

k(x, y) =min{|x−y|,1−|x−y|

}17

R2

Usual (Euclidiana)

D1D1(x, y)=

√(x1 − y1 )2 +(x2 − y2 )2 58

Da SomaD2

D2(x, y)= |x1 − y1 |+ |x2 − y2 | 22

Do MaximoD3

D3(x, y)=max{ |x1 − y1 |, |x2 − y2 | } 23

Mm×n(R)

Euclidiana

D1

D1(A,B)=√

(a11−b11 )2 +···+(amn−bmn )2 25

Da SomaD2

D2(A,B)= |a11−b11 |+···+ |amn−bmn |25

Do MaximoD3

D3(A,B)=max{|a11−b11 |, ... ,|amn−bmn |

}

25

C[ a, b ]

Da Integral

ΓΓ(f, g)=

∫ ba |f(x)−g(x)| dx 27

Do MaximoΥ

Υ(f, g)=max{ |f(x)−g(x)| : x∈ [ a, b ]} 28

B(X,R) Do SupΨ

Ψ(f, g)= sup{ |f(x)−g(x)| : x∈X} 32

ZN

Hammingσ

σ(x, y)= numero de posicoes em que x e ydiferem entre si.

37

roρ ρ(x, y) = |∑N

n=1 2n−1·(xn−yn )| 40

tauτ

τ(x, y) =maior posicao em que x e ydiferem entre si.

41

Z∞ niν ν(x, y) =

∑∞n=1

|xn−yn |2n 42

M1×M2

D1 D1(x, y)=√

d 2

1(x1 , y1) + d 2

2(x2 , y2)

95

D2D2(x, y)= d1 (x1 , y1 ) + d2 (x2 , y2 ) 95

D3 D3(x, y)=max { d1 (x1 , y1); d2 (x2 , y2 ) } 95

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Page 10: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Capıtulo 1ESPACOS METRICOS

A abstracao desobstrui o espırito, o

torna mais leve e dinamico.

(Gaston Bachelard)

1.1 Introducao

Na teoria dos espacos metricos busca-se a generalizacao de alguns dosconceitos estudados no Calculo e na Analise Real, especialmente aquelesonde intervem a nocao de distancia (conceitos topologicos).

A definicao de espacos metricos e uma abstracao fundamentada, quaseque totalmente, na experiencia com os numeros reais. Mas esta definicao esuficientemente flexıvel para incluir uma grande variedade de objetos, comoteremos oportunidade de constatar.

A citacao a seguir∗ ajudara o leitor a enxergar com mais naturalidade adefinicao (postulacional) de espacos metricos, dada logo mais:

Uma das contribuicoes definitivas do seculo dezenove foi o recon-hecimento de que a matematica nao e uma ciencia natural, mas umacriacao intelectual do homem. Bertrand Russel escreveu no Interna-tional Monthly em 1901: ‘O seculo dezenove, que se orgulha da invencaodo vapor e da evolucao, poderia derivar um tıtulo mais legıtimo a famada descoberta da matematica pura.’

Pelo fim do seculo era geralmente reconhecido mesmo por nao-matematicos que a matematica e pensamento postulacional, em que depremissas arbitrarias sao tiradas conclusoes validas. Que os postuladossejam ou nao verdadeiros num sentido cientıfico e indiferente.

∗Extraıda do livro: Curso Moderno de Filosofia/Denis Huisman e Andre Vergez.

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Page 11: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Medindo distancias

Se num conjunto arbitrario temos como medir a distancia entre dois ele-mentos quaisquer entao o conjunto juntamente com essa distancia resultano que em matematica conhecemos como um espaco metrico.

Dados dois pontos em um plano, como a seguir

A

B

a matematica admite nao apenas uma mas varias maneiras de se medir adistancia entre estes dois pontos.

Apenas para contextualizar tentaremos convencer o leitor de que surgemde maneira natural diferentes modos de se medir a distancia entre estespontos. De outro modo: em matematica (e tambem na fısica) nao existeuma unica maneira de se medir distancias. Em outras palavras, a reguavendida em nossas livrarias, ou as trenas vendidas em nosso comercio, naosao os unicos instrumentos de medida.

Vejamos um exemplo trivial do nosso dia-a-dia: o taxi. Suponhamosque alguem queira se deslocar (em um taxi) do ponto A ao ponto B −separados por uma esquina − e que o ponto B esteja a uma distancia dequatro unidades para a direita e tres unidades abaixo do ponto A, assim:

•A

•B

•A 4

•B

35

Pois bem, existem duas distancias entre os pontos A e B: a que e maisconveniente e justa para o taxista, 4+ 3 = 7; e a que seria mais convenientepara o passageiro (“em linha reta”): 5.

A distancia do taxi e tambem conhecida em matematica como metrica dasoma. A outra distancia (“em linha reta”) e a distancia usual ou euclidiana.

Se o leitor parar para refletir um pouco se dara conta de que vez ououtra, mesmo numa simples caminhada, teremos que optar (por vezes atepor uma questao de conveniencia) por uma ou outra destas duas metricas− como por exemplo, ao “cortar caminho”.

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Page 12: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Resumindo, entre os pontos A e B no plano a seguir

A

B

− Distancia usual (euclidiana)

A

B

− Distancia do taxi

mostramos dois modos de medir a distancia entre os mesmos. Na verdade,podemos ter muitas alternativas para medir a distancia entre dois pontosem um conjunto qualquer.

Um ponto importante a ser observado e que do ponto de vista da matema-tica, isto e, da logica, todas as metricas (distancias) gozam do mesmo status.Ou ainda, nao existe uma distancia mais ou menos verdadeira que outra,existe sim uma mais conveniente que outra para um determinado proposito.

Por oportuno, acontece − no que diz respeito as metricas − o mesmo queocorre no ambito das geometrias euclidiana e nao-euclidianas. A de Euclidesnao e nem mais nem menos verdadeira que as outras; pode ou nao ser a maisconveniente a determinados propositos; por exemplo, Einstein ao formularsua Teoria da Relatividade Geral teve que optar por uma das geometriasnao-euclidianas. (geometria riemanniana)

O que acontece e que a metrica (regua) usual, vista a seguir

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

INM

ETRO

e a mais conveniente para, por exemplo: o pedreiro, o carpinteiro, o en-genheiro civil, etc., porque esta e suficiente para resolver todos os seusproblemas de medida. Ja para o matematico e o fısico, estes profissionaistem necessidade de “outras reguas”, as quais nao se encontram no comercio,pois sao, por assim dizer, abstratas.

Um outro fato importante que o leitor deve ter em mente e que omatematico (ou o fısico) para resolver um dado problema que se lhe apre-senta pode, das duas uma: ou escolher uma dentre as varias distancias(reguas) ja existentes ou, caso seja necessario, podera ate criar uma nova.Se ele decidir criar uma nova regua esta deve satisfazer alguns criterios, sobpena de nao ser validada pela comunidade matematica.

Aqui so e necessario o leitor lembrar de que qualquer instrumento deafericao candidato a receber o selo do Inmetro tera que passar por umabateria rigorosa de testes.

11

Page 13: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Como dissemos, o matematico e o fısico lidam com outros tipos de reguaalem da usual. O mais importante: qualquer que seja a nova regua propostaesta deve, na comunidade dos matematicos, passar por uma bateria rigorosade testes. Ao todo deve ser testado um conjunto de cinco ıtens − cincocriterios logicos −, dados a seguir:

1.2 Definicao de espacos metricos

Definicao 1 (Espaco Metrico). Seja M 6= ∅ um conjunto qualquer. Consi-deremos uma aplicacao d : M ×M −→ R, que associa a cada par ordenado(x, y) ∈M ×M um numero real d(x, y) satisfazendo as seguintes condicoes(para quaisquer x, y e z em M):

(M1) d(x, y) ≥ 0 e d(x, y) = 0 ⇐⇒ x = y ;

(M2) d(x, y) = d(y, x) ;

(M3) d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y).

Nestas condicoes dizemos que d e uma metrica sobre M e que d(x, y) e adistancia do elemento x ao elemento y.

Podemos dizer tambem que uma aplicacao d : M×M −→ R satisfazendoas condicoes anteriores adquire status de metrica.

O par (M, d ) e o que entendemos por espaco metrico.

Nota: Chamamos a atencao do leitor para o fato de que espaco metrico euma “estrutura” e nao um conjunto, tanto e que o mesmo conjunto munidocom metricas distintas da origem a espacos metricos distintos, isto e:

d 6= d′ ⇒ (M, d ) 6= (M, d′ )

Doravante cada elemento de um espaco metrico sera referido como pontodesse espaco, independentemente de sua natureza.

A exigencia feita em (M1) e bastante intuitiva: uma distancia nunca enegativa; se a distancia entre dois pontos e nula entao, obrigatoriamente,estes pontos sao o mesmo (sao iguais), e; reciprocamente: a distancia de umponto para si mesmo deve ser nula.

A exigencia feita em (M2), tambem assaz intuitiva, foi tomada de empres-timo do dito popular que todos conhecemos: “fulano!! vem ca! E o fulanoresponde: vem ca tu, pois a distancia daqui pra la, e a mesma de la pra ca”.

Como se ve, qualquer um ja possui intuitivamente os rudimentos parainiciar-se nos espacos metricos.

sss

y

x

z

d(x, y) d(x, z)

d(z, y)

A exigencia feita em (M3), a menos intuitiva,e conhecida como desigualdade triangular e seinspira no fato de que na geometria elementarcada lado de um triangulo tem sempre medidamenor que a soma das medidas dos outros doislados.

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Page 14: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Alternativamente, pode ser util vermos um espaco metrico como umsistema de processamento de informacoes, onde temos:

(M, d)

hardware

software

O conjunto de instrucoes (software) e passado atraves da metrica.Observe que se no par (M, d) mudarmos apenas a metrica (algoritmo,

software) teremos um outro sistema de “processamento de informacoes”; umoutro espaco metrico que − na maioria das vezes − pouco tera a ver com oprimeiro.

A citacao a seguir ajudara o leitor a enxergar com mais naturalidade adefinicao de espacos metricos, dada anteriormente: (rodape p. 9)

As definicoes matematicas parecem opor-se radicalmente as definicoesempıricas porque os seres matematicos nao sao objetos que se descubramna natureza. As definicoes empıricas, no fundo, sao simples descricoesde coisas ja existentes . . . . O naturalista que define o passaro, nao o cria:descobre-o. Contrariamente, o cırculo nao designa um objeto existente,mas e a definicao do cırculo que o cria. Tambem poderıamos dizer que“se a definicao empırica nao passa de uma copia, a definicao matematicae um modelo”. A definicao matematica nao e descritiva e criadora. Arelacao entre o matematico e os seres matematicos e a mesma existenteentre um deus e suas criaturas. A definicao matematica e uma regraoperatoria. Nao e mesmo necessario que alguma coisa de concreto lhecorresponda (cf. o numero negativo, os “imaginarios”), basta, como dizLe Roy, que o conceito por ela proposto “forneca ao espırito materia deexercıcio efetivo e operatorio. (Grifo nosso)

Um aparte: E uma discussao pertinente a filosofia da matematica se osobjetos matematicos − a exemplo dos numeros − de fato existem; ou ainda,se podem ser encontrados na Natureza.

Gostaria de expor meu parecer a este respeito. No meu entendimento osobjetos matematicos sao abstracoes que nao encontram-se em parte algumada Natureza e, para existirem, necessitam do homem. Se um meteorito sechocasse com a terra e os homens − a exemplo dos dinossauros, por suposto− deixassem de existir, os numeros concomitantemente desapareceriam.

E afirmo mais: se na suposta hecatombe mencionada acima sobrevivessemapenas alguns homens “primitivos” e alguns livros de matematica, ainda as-sim os numeros deixariam de existir . . . por falta de um “instrumento” (cerebro,mente) apropriado que pudesse decodifica-los a partir dos livros. Uma analo-gia: se um bebe engatinhando numa sala encontra as pecas de um xadrezpara ele estas constituem-se em meros brinquedos − nao um jogo de xadrez(estrutura) propriamente.

13

Page 15: Gentil Lopes - Espaços Métricos

1.2.1 Exemplos de espacos metricos

1) A reta usual (oficial)Considere o conjunto R dos numeros reais. A seguinte funcao

d : R× R −→ R, dada por d(x, y) = |x− y|,

e uma metrica sobre R. Vamos provar isto:

(M1) d(x, y) ≥ 0 e d(x, y) = 0 ⇐⇒ x = y. Entao

d(x, y) ≥ 0 ⇐⇒ d(x, y) = |x− y| ≥ 0

e

d(x, y) = 0 ⇐⇒ |x− y| = 0

⇐⇒ x− y = 0

⇐⇒ x = y.

Observe que (M1) se desdobra em tres condicoes a serem provadas.

(M2) d(x, y) = d(y, x) ⇐⇒ |x− y| = |y − x|.(M3) d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y) ⇐⇒ |x− y| ≤ |x− z|+ |z − y|.

Vamos precisar da desigualdade triangular do modulo, isto e (p. 602)

|x+ y| ≤ |x|+ |y|

Para tanto vamos nos valer do seguinte artifıcio

x− y = (x− z) + (z − y)

Sendo assim, temos

|x− y| =∣∣(x− z) + (z − y)

∣∣ ≤ |x− z|+ |z − y|

Por exemplo

d(5, 3) = |5− 3| = 2 ; d(3

2, −1

)

=∣∣∣3

2− (−1)

∣∣∣ =

5

2.

Geometricamente, temos

Rssssd(5, 3)=|5−3|=2

⊢ ⊣-�d(

32,−1)=∣∣ 32−(−1)

∣∣=2,5

⊢ ⊣-�

q q q q q q q−1 0 1 2 3 4 5

14

Page 16: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2) A metrica “zero-um”

Uma importante metrica − aplicavel a qualquer conjunto − e dada aseguir:

Seja M um conjunto qualquer. Consideremos

d : M ×M −→ R

definida por

d(x, y) =

1, se e so se x 6= y;

0, se e so se x = y.

Vamos mostrar que d, assim definida, e uma metrica.De fato, esta aplicacao, da maneira como foi definida, claramente satis-

faz (M1) e (M2). Vamos mostrar que (M3) tambem e satisfeita:

Dados x e y em M temos duas alternativas, x = y ou x 6= y:

( i ) Se x = y entao d(x, y) = 0. Substituindo este resultado em (M3)devemos provar que

0 ≤ d(x, z) + d(z, y)

Como, pela definicao de d, d(x, z) ≥ 0 e d(z, y) ≥ 0, temos que esta de-sigualdade e trivialmente satisfeita.

( ii ) Se x 6= y entao ou x 6= z ou z 6= y (caso contrario, isto e, se x = z e

z = y entao x = y, contrariando a hipotese); sendo assim temos d(x, y) = 1 e oud(x, z) = 1 ou d(z, y) = 1. Em qualquer situacao a desigualdade

d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y)

1 ≤ d(x, z) + d(z, y)

estara satisfeita.Observe que esta prova nao depende da natureza dos elementos de M ,

o que implica que o par (M, d) e um espaco metrico independentemente dequem seja o conjunto M .• Por exemplo considere o conjunto das vogais A = { a, e, i, o, u }, entao

o par (A, d) e um espaco metrico onde, por exemplo, temos as seguintesdistancias

d(a, e) = 1 ; d(o, u) = 1 ; d(u, u) = 0.

uma vez que a 6= e, o 6= u e u = u.

Nota: Como neste livro trabalharemos com muitas metricas, vamos adotarsımbolos especiais para algumas e numerar (indexar) outras. Por exemploa metrica “zero-um” sera denotada por δ e a metrica usual sobre R por µ.

Novamente enfatizamos que os espacos metricos (R, µ) e (R, δ) saodistintos, inclusive por que para um mesmo par de pontos eles fornecemdistancias diferentes, por exemplo: µ(5, 3) = |5− 3| = 2 e δ(5, 3) = 1.

15

Page 17: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3) A Metrica Quantica

Quando o espırito se apresenta a cul-

tura cientıfica, nunca e jovem. Alias e

bem velho, porque tem a idade de seus

preconceitos. Aceder a ciencia e reju-

venescer espiritualmente, e aceitar uma

brusca mutacao que contradiz o passado.

(Gaston Bachelard)

Introducao: A metrica que estaremos apresentando agora nos per-mitira demonstrar, oportunamente, a plausibilidade matematica de algunsfenomenos contraintuitivos observados no ambito da fısica quantica.∗

O que e fısica quantica?

A fısica quantica (tambem conhecida como mecanica quantica e teoriaquantica) e principalmente o estudo do mundo microscopio. Nesse mundomuitas grandezas fısicas sao encontradas apenas em multiplos inteiros deuma quantidade elementar; quando uma grandeza apresenta essa propriedade,dizemos que e quantizada. A quantidade elementar associada a grandeza echamada quantum da grandeza (o plural e quanta).

Uma grandeza quantizada que esta presente no nosso dia-a-dia e o din-heiro. O dinheiro no Brasil e quantizado, ja que a moeda de menor valor e ade um centavo (R$ 0, 01), e os valores de todas as outras moedas e notas saoobrigatoriamente multiplos inteiros do centavo. Em outras palavras, o quan-tum de dinheiro em especie e R$ 0, 01, e todas as quantias maiores sao daforma n× (R$ 0, 01), onde n e um numero inteiro. Nao e possıvel, por exem-plo, pagar com dinheiro vivo uma quantia de R$ 0, 755 = 75, 5 × (R$ 0, 01).

Em 1905 Einstein propos que a radiacao eletromagnetica (ou, simples-mente, a luz) era quantizada; a quantidade elementar de luz e hoje chamadade foton. [. . . ]

O conceito de quantum de luz, ou foton, e muito mais sutil e miste-rioso do que Einstein imaginava. Na verdade, ate hoje nao e compreendidoperfeitamente.

Segundo Einstein, um quantum de luz de frequencia f tem uma energiadada por E = hf (energia do foton) onde h e a chamada constante dePlanck, que tem o valor

h = 6, 63 × 10−34 J · s

(Halliday&Resnick/Vol. 4)

∗Como por exemplo, o de que uma partıcula pode encontrar-se em muitos lugares aomesmo tempo; ou ainda: “eletrons que se movem de A para B sem nunca passar entreesses pontos”.

16

Page 18: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Consideremos o conjunto M = [ 0, 1 [ e a seguinte aplicacao

k : [ 0, 1 [× [ 0, 1 [−→ R

definida pork(x, y) = min

{|x− y|, 1− |x− y|

}

Deixamos como exercıcio ao leitor provar que k e uma metrica em [ 0, 1 [.

Como funciona a metrica quantica? Funciona de modo bem simples, naoe necessario nenhum manual de instrucao, veja: dados dois pontos x e y,ambos no intervalo [ 0, 1 [, entre chaves obteremos dois valores, escolhemoso menor deles como sendo a distancia entre os pontos x e y. Por exemplo,

k(0; 0, 4) = min{|0− 0, 4|, 1− |0− 0, 4|

}= min

{0, 4; 0, 6

}= 0, 4

k(0; 0, 6) = min{|0− 0, 6|, 1− |0− 0, 6|

}= min

{0, 6; 0, 4

}= 0, 4

k(0; 0, 8) = min{|0− 0, 8|, 1− |0− 0, 8|

}= min

{0, 8; 0, 2

}= 0, 2

Observe a localizacao geometrica destes pontos:

q0 1

21

t t t0, 4 0, 6 0, 8

Por oportuno, observe que,

k (0; 0, 4) = k (0; 0, 6) > k (0; 0, 8). (1.1)

E isto mesmo que o leitor testemunha!: os dois primeiros pontos (0, 4 e 0, 6)estao a uma mesma distancia da origem, e, como se nao bastasse, o terceiroponto (0, 8) esta mais proximo da origem que os dois primeiros . . . pasmem!

Poderıamos, com inteira razao, chama-la de “metrica maluca” ou ate,quem sabe, “metrica hipermaluca”.

No entanto, vejamos o que o eminente filosofo tem a nos dizer a esterespeito:

Tudo isso, que a primeira vista parece

excesso de irrazao, na verdade e o efeito

da finura e da extensao do espırito hu-

mano e o metodo para encontrar ver-

dades ate entao desconhecidas.

(Voltaire)

Oportunamente estaremos provando que, desta vez, o filosofo esta cobertode razao.

As palavras do filosofo me serviram, amiude, de apoio psicologico quando− a princıpio − me sentir tentado a desdenhar da “metrica maluca”!

17

Page 19: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Distancia de um ponto arbitrario a origem

Vamos necessitar da distancia de um ponto arbitrario x ∈ [ 0, 1 [ aorigem:

k(x, 0) = min{|x− 0|, 1− |x− 0|

}= min

{|x|, 1− |x|

}

Como 0 ≤ x < 1, temos |x| = x, logo, k(x, 0) = min{x, 1−x

}. Temos,

x ≤ 1− x ⇐⇒ x ≤ 1

2

Sendo assim, podemos escrever:

k(x, 0) =

x, se 0 ≤ x ≤ 12 ;

1− x, se 12 ≤ x < 1.

(1.2)

Esta equacao nos diz, simplesmente, que se x e um ponto na primeirametade do intervalo, entao sua distancia para a origem e igual “a ele proprio”.Se x e um ponto na metade direita do intervalo, entao sua distancia para aorigem e 1− x. Veja: k(x, 0) = min

{

x, 1− x}

sx q1

20 1

x1−x

sxq1

20 1

x1−x

A seguir esbocamos o grafico da funcao dada por (1.2):

q 112

q

q1

12

0x

k(x, 0)

sxq1

20 1

Este grafico nos mostra como varia a distancia de um ponto arbitrariox, do intervalo [ 0, 1 [, a origem.

Na figura a seguir acrescentamos ao grafico anterior (para efeito de com-paracao) a distancia usual, d(x, 0) = |x− 0|, restrita ao intervalo [ 0, 1 [ :

18

Page 20: Gentil Lopes - Espaços Métricos

q 112

q

q1

12

0

x

k(x, 0)

A partir do grafico de k(x, 0) (ou da equacao (1.2)) construımos a reguaoficial do universo

([ 0, 1 [, k

), assim:

0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 1

INM

ETRO

- Regua quantica

Nota: Observamos que a regua (“trena” ) acima e tao legıtima quanto ausual, vendida em nossas livrarias, tanto e que ja a homologamos junto aoInmetro.

O que confere status cientıfico a esta regua e justamente o fato de elasatisfazer a todas as condicoes para uma metrica. (p. 12)

Esta regua nos sera bastante util para destrinchar (e produzir) algunsparadoxos (patologias), inclusive na fısica quantica como ja mencionamos.

E mais: Pelo ao menos no ambito da topologia podemos assegurar aoscepticos que milagres existem sim!, como estaremos provando a seu tempo.Por oportuno, adiantamos uma surpreendente igualdade: 0, 999 . . . = 0.

Nota: Um espaco metrico e tambem um espaco topologico. (p. 280)

Retomando: a regua quantica nos fornece diretamente a distancia de umponto qualquer do intervalo [ 0, 1 [ para a origem 0, graficamente:

0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 1

INM

ETRO

0 1p p p14

12

34

19

Page 21: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vejamos como fica a patologia exibida anteriormente (p. 17) com o usoda regua anterior, veja:

0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 1

INM

ETRO

s s sA B C

րOrigem

Os pontos A e B encontram-se a mesma distancia da origem . . . Pasmem!

Podemos escrever:k(A, 0) = 0, 4 = k(B, 0)

E, o que e “pior”, o ponto C encontra-se mais proximo da origem quequalquer dos pontos A e B . . . pasmem !!

Podemos escrever:

k(C, 0) = 0, 2 < 0, 4 = k(A, 0) = k(B, 0) (1.3)

Advertencia: Aconselhamos ao estudante de topologia excessiva prudencia:Esta regua nao devera cair nas maos de profissionais nao devidamente ha-bilitados, ainda aqui vale recordar do mestre Jesus: (Mt 7 : 6)

Nao deiteis aos porcos as vossas perolas, para que nao suceda que eleslhes ponham os pes em cima, e tornando-se contra vos, vos despedacem.

Na figura a seguir colocamos as duas reguas − usual e quantica − ladoa lado para efeitos de comparacao, veja:

0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1

INM

ETRO

0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 1

INM

ETRO

Usual

Quantica

Nota: Reescalonamos (dividimos por 10) a regua usual, para efeitos decomparacao.

Observe que a regua quantica coincide com a regua usual so ate a metade,a partir daı as duas diferem radicalmente.

20

Page 22: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Tornando a regua quantica menos indigesta

Dissemos que a regua quantica mede a distancia, para a origem, dequalquer ponto do intervalo [ 0, 1 [. O leitor podera “digerir” melhor ofuncionamento desta regua se imaginar que ela produz uma curvatura noespaco, digo, no intervalo [ 0, 1 [. Imagine este intervalo feito de arameflexıvel, curve-o segundo um cırculo, assim:

1 0

pp

p

14

34

12

1 0

pp

p

14

34

12

sss

AB

C

Na figura da direita assinalamos os pontos A, B e C na relacao (1.3) (p. 20).Agora fica mais facil de entender por que d (C, 0) < d (A, 0) = d (B, 0).

Nota: A rigor a metrica quantica nao curva o intervalo unitario. Vejamosuma analogia:

Ao redor de um ima existe um campomagnetico que “curva o espaco” em sua volta.A presenca do campo altera a geometria − oumetrica − da regiao em volta do ima. Porem,o proprio ima nao e curvado.

De igual modo, a presenca da metrica k no universo [ 0, 1 [ e responsavelpela “geometria” da estrutura

([ 0, 1 [, k

), que e curva.

Podemos buscar uma outra analogia para oespaco quantico na teoria da relatividade geralde Einstein: segundo essa teoria o espaco e umaestrutura cujas propriedades dependem da pre-senca da materia.

Materia e energia em movimento curvamo espaco-tempo. Essa deformacao muitas vezese comparada a que ocorre em uma rede esticada quando nela se depositauma esfera macica e pesada.

q12

0 1ր“massa”

De modo analogo, como veremos oportuna-mente, a origem “0” do intervalo [ 0, 1 [ e quefaz o papel da massa e e responsavel pela cur-vatura do espaco topologico

([ 0, 1 [, k

).

21

Page 23: Gentil Lopes - Espaços Métricos

1.2.2 Metricas sobre o R2

Vamos agora definir algumas metricas sobre o conjunto R×R = R2 dospares ordenados de numeros reais.

4) O plano usual (oficial)

A funcao,

D1 : R2 × R2 −→ R,

dada por

D1(x, y) =√

(x1 − y1)2 + (x2 − y2)2

onde x = (x1 , x2) e y = (y1 , y2), e uma metrica sobre R2.

D1 e conhecida como metrica euclidiana ou usual do R2 e naturalmentese inspira na formula da distancia entre dois pontos da geometria analıtica.

No apendice provamos que D1 e de fato uma metrica sobre R2. (p. 68)

Exemplo: Calcular a distancia entre os pontos x = (1, 1) e y = (4, 5).

Solucao: Temos x = (x1 , x2) = (1, 1) e y = (y1 , y2) = (4, 5). Entao

D1(x, y) =√

(x1 − y1)2 + (x2 − y2)2

D1

((1, 1), (4, 5)

)=√

(1− 4)2 + (1− 5)2 = 5.

Geometricamente temos

R

R

p p p p

pp

pp

p

0

s

s

⊡(1, 1)

(4, 5)

s

sD1

D1e a medida da hipotenusa.

5) A metrica da soma (ou do taxi)

A funcao,

D2 : R2 × R2 −→ R,

dada por

D2(x, y) = |x1 − y1 |+ |x2 − y2 |onde x = (x1 , x2) e y = (y1 , y2) e uma metrica sobre R2.

D2 e conhecida como metrica da soma (ou do taxi).No apendice provamos que D2 e de fato uma metrica sobre R2. (p. 69)

Exemplo: Calcular a distancia entre os pontos x = (1, 1) e y = (4, 5).

22

Page 24: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Solucao: Temos x = (x1 , x2) = (1, 1) e y = (y1 , y2) = (4, 5), entao

D2(x, y) = |x1 − y1 |+ |x2 − y2 |D2

((1, 1), (4, 5)

)= |1− 4|+ |1− 5| = 7.

Geometricamente temos

R

R

p p p p

pp

pp

p

0

s

s

⊡(1, 1)

(4, 5)

s

sD2

D2e a soma das medidas

dos catetos.

6) A metrica do maximo

A funcao,D3 : R2 × R2 −→ R,

dada porD3(x, y) = max

{|x1 − y1 |, |x2 − y2 |

}

onde x = (x1 , x2) e y = (y1 , y2) e uma metrica sobre R2.

No apendice provamos que D3 e de fato uma metrica sobre R2. (p. 70)

Exemplo: Calcular a distancia entre os pontos x = (1, 1) e y = (4, 5).

Solucao: Temos x = (x1 , x2) = (1, 1) e y = (y1 , y2) = (4, 5), entao

D3(x, y) = max{|x1 − y1 |, |x2 − y2 |

}

D3

((1, 1), (4, 5)

)= max

{|1− 4|, |1− 5|

}

= max{ 3, 4 } = 4.

Geometricamente temos

R

R

p p p p

pp

pp

p

0

s

s

⊡(1, 1)

(4, 5)

s

sD3

D3e a medida do maior

dos catetos.

23

Page 25: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Como era de se esperar, os tres espacos nos fornecem diferentes distanciaspara um mesmo par de pontos. Para efeitos de comparacao, temos

R

R

p p p p

pp

pp

p

0

s

s

⊡(1, 1)

(4, 5)

R

R

p p p p

pp

pp

p

0

s

s

⊡(1, 1)

(4, 5)

R

R

p p p p

pp

pp

p

0

s

s

⊡(1, 1)

(4, 5)

As tres distancias vistas para o R2 sao facilmente generalizadas para oRn, do seguinte modo:

D1(x, y) =√

(x1 − y1)2 + · · · + (xn − yn)2 (1.4)

D2(x, y) = |x1 − y1 | + · · ·+ |xn − yn | (1.5)

D3(x, y) = max{|x1 − y1 |, . . . , |xn − yn |

}(1.6)

onde x = (x1 , x2 , . . . , xn) e y = (y1 , y2 , . . . , yn) ∈ Rn.

7) Distancia entre matrizes

Seja Mm×n(R) o conjunto das matrizes reais de ordem m por n.Para calcular a distancia entre duas matrizes lancaremos mao de um ar-tifıcio: Identificaremos uma matriz do conjunto Mm×n(R) com um ponto doconjunto Rm×n do seguinte modo

A =

a11 . . . a1n

a21 . . . a2n

. . . . . . . . . . . . . .am1 . . . amn

↔ a = (a11 , . . . , a1n , a21 , . . . , a2n , . . . , am1 , . . . , amn)

B =

b11 . . . b1nb21 . . . b2n. . . . . . . . . . . . .bm1 . . . bmn

↔ b = (b11 , . . . , b1n , b21 , . . . , b2n , . . . , bm1 , . . . , bmn)

Feito isto definiremos a distancia entre as matrizes A e B como sendo adistancia entre os respectivos pontos a e b.

24

Page 26: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Sendo assim temos as seguintes distancias entre matrizes

D1(A, B) =√

(a11 − b11)2 + · · ·+ (amn − bmn)2 (1.7)

D2(A, B) = |a11 − b11 |+ · · · + |amn − bmn | (1.8)

D3(A, B) = max{|a11 − b11 |, . . . , |amn − bmn |

}(1.9)

Exemplo: Calcule a distancia entre as matrizes

A =

[2 1 33 0 2

]

e B =

[0 2 13 4 5

]

Solucao: Temos

A =

[2 1 33 0 2

]

↔ a = (2, 1, 3, 3, 0, 2)

B =

[0 2 13 4 5

]

↔ b = (0, 2, 1, 3, 4, 5)

Ainda,

A−B =

[2 −1 20 −4 −3

]

↔ a− b = (2, −1, 2, 0, −4, −3)

Vamos calcular a distancia entre as matrizes A e B em cada um dosespacos metricos

(M2×3(R), D1

),(M2×3(R), D2

)e(M2×3(R), D3

)onde D1 ,

D2 e D3 sao dadas pelas equacoes (1.7), (1.8) e (1.9). Pois bem:

D1

(A, B

)=√

22 + (−1)2 + 22 + 02 + (−4)2 + (−3)2 =√34;

D2

(A, B

)= |2|+ | − 1|+ |2|+ |0| + | − 4|+ | − 3| = 12;

D3

(A, B

)= max

{|2|, | − 1|, |2|, |0|, | − 4|, | − 3|

}= 4.

A formula a seguirn = N(i− 1) + j (1.10)

nos permite transferir os elementos de uma matriz de ordem M × N paraum ponto de RM×N . (para a prova desta formula veja [6])

A formula nos diz em que coordenada n (do ponto) devemos guardar oelemento aij da matriz. Por exemplo, para a matriz

[a11 a12 a13

a21 a22 a23

]

de ordem 2× 3, procedemos assim:

25

Page 27: Gentil Lopes - Espaços Métricos

a11 ⇒ n = 3(1 − 1) + 1 = 1 ⇒ ( a11 , ? , ? , ? , ? , ? )

a12 ⇒ n = 3(1 − 1) + 2 = 2 ⇒ ( a11 , a12 , ? , ? , ? , ? )

a13 ⇒ n = 3(1 − 1) + 3 = 3 ⇒ ( a11 , a12 , a13 , ? , ? , ? )

a21 ⇒ n = 3(2 − 1) + 1 = 4 ⇒ ( a11 , a12 , a13 , a21 , ? , ? )

a22 ⇒ n = 3(2 − 1) + 2 = 5 ⇒ ( a11 , a12 , a13 , a21 , a22 , ? )

a23 ⇒ n = 3(2 − 1) + 3 = 6 ⇒ ( a11 , a12 , a13 , a21 , a22 , a23 )

Portanto:[a11 a12 a13

a21 a22 a23

]

( a11 , a12 , a13 , a21 , a22 , a23 )

A formula a seguir (tambem uma contribuicao minha):

i =⌊n−1N

⌋+ 1

j = n−N⌊n−1N

e a inversa da funcao dada em (1.10) e nos diz, caso desejemos, como trans-ferir de volta as coordenadas do ponto para a matriz.

N e o numero de colunas na matriz. ⌊ x ⌋ e chamado o maior inteiro quenao supera x (funcao piso).

Por exemplo, para a situacao anterior temos:

a5 ⇒

i =⌊

5−13

⌋+ 1 = 2

j = 5− 3⌊

5−13

⌋= 2

Ou seja, a quinta coordenada do ponto (n = 5) corresponde a posicao(i, j) = (2, 2) da matriz, assim:

(a1 , a2 , a3 , a4 , a5 , a6 , )

[− − −− − −

]

Em [6] mostramos aplicacoes destas formulas na computacao.

∗ ∗ ∗

Para muitos pensar e uma tarefa fastidiosa. Para mim, nos meusdias felizes, uma festa e uma orgia. (Nietzsche, F. Vontade de poder, XIV, 24)

26

Page 28: Gentil Lopes - Espaços Métricos

1.2.3 Distancia entre funcoes

− Espaco das funcoes reais contınuas definidas num intervalo fechado

8) O espaco(C[a, b], Γ

)

Seja C[a, b] o conjunto das funcoes reais contınuas definidas no intervalofechado [a, b]. Isto e

C[a, b] ={

f : [a, b] −→ R / f contınua}

A aplicacaoΓ: C[a, b]× C[a, b] −→ R

definida por

Γ(f, g) =

∫ b

a

∣∣f(x)− g(x)

∣∣ dx

e uma metrica sobre C[a, b]. Isto esta demonstrado no apendice. (p. 72)

Exemplos:

(a) Calcule a distancia entre as funcoes

f, g : [ 0, 1 ] −→ R

dadas por f(x) = 3x e g(x) = x.

Solucao:

Γ(f, g) =

∫ b

a

∣∣f(x)− g(x)

∣∣ dx

=

∫ 1

0|3x− x| dx = 1

Interpretacao geometrica: A distancia entre as funcoes f e g e dadapela area da regiao entre seus graficos; no caso a area do triangulo emdestaque na figura a seguir

x

y

0 q q

q

q

q

1 2

1

2

3

g

f

(0, 0)

(1, 1)

(1, 3)

27

Page 29: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Para efeito de verificacao, podemos calcular a area deste triangulo,subtraindo da area do triangulo sob o grafico de f a area do triangulosob o grafico de g, assim

1× 3

2− 1× 1

2= 1 = Γ(f, g).

(b) Calcule a distancia entre as funcoes

f, g : [−1, 1] −→ R

dadas por f(x) = x3 e g(x) = x.

Solucao:

Γ(f, g) =

∫ b

a

∣∣f(x)− g(x)

∣∣ dx

=

∫ 1

−1

∣∣x3 − x

∣∣ dx =

1

2.

Interpretacao geometrica: A distancia entre as funcoes f e g e dadapela area da regiao entre seus graficos:

x

y

−1 1

−1

1

������

f g

gf

⊢ ⊢

q

q

(−1,−1)

(1,1)

Vejamos uma outra distancia no conjunto C[a, b].9) O espaco

(C[a, b], Υ

)

Sabemos (da Analise∗) que toda funcao contınua definida em umintervalo fechado assume valores maximo e mınimo nesse intervalo.Sendo assim a aplicacao

Υ: C[a, b]× C[a, b] −→ R

dada por

Υ(f, g) = max{

|f(x)− g(x)| : x ∈ [ a, b ]}

(1.11)

estara bem definida. No apendice mostramos que Υ e uma outrametrica sobre C[a, b]. (p. 74)

∗Teorema de Weierstrass, [AR]1 (p. 603)

28

Page 30: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

(a) Calcule a distancia entre as funcoes

f, g : [ 0, 1 ] −→ R

dadas por f(x) = 3x e g(x) = x.

Solucao:

Υ(f, g) = max{

|f(x)− g(x)| : x ∈ [ a, b ]}

= max{|3x− x| : x ∈ [ 0, 1 ]

}

= max{2x : x ∈ [ 0, 1 ]

}= 2.

Porquanto

0 ≤ x ≤ 1 ⇒ 0 ≤ 2x ≤ 2 ⇒ 2x ∈ [ 0, 2 ]

Observe que os espacos (C,Γ) e (C,Υ) nos fornecem distanciasdiferentes para o mesmo par de pontos (f, g).

Interpretacao geometrica: A distancia Υ entre as funcoes fe g e o comprimento da maior corda vertical que se pode tracarligando o grafico de f ao grafico de g.

x

y

0 q q

q

q

q

1 2

1

2

3

g

f

←Υ(f,g)=2

(0,0)

(1,1)

(1,3)

���

���������

(b) Calcule a distancia entre as funcoes

f, g : [−1, 1 ] −→ R

dadas por f(x) = x3 e g(x) = x.

Solucao:

Υ(f, g) = max{|f(x)− g(x)| : x ∈ [ a, b ]

}

= max{|x3 − x| : x ∈ [−1, 1 ]

}

29

Page 31: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Esta ultima igualdade nos diz que devemos encontrar o maximo dafuncao dada por h(x) = |x3−x| para x percorrendo o intervalo [−1, 1 ].

Com o intuito de eliminar o modulo, obtemos a seguinte decom-posicao

h(x) =∣∣x3 − x

∣∣ =

x3 − x, se x ∈ [−1, 0 ];

−x3 + x, se x ∈ [ 0, 1 ].

Inicialmente vamos pesquisar no “ramo direito” da funcao; entao,h(x) = −x3 + x. Igualando a derivada desta funcao a zero, temos

h′(x) = −3x2 + 1 = 0 =⇒ x = ± 1√3

entao

h

(1√3

)

= −(

1√3

)3

+

(1√3

)

=2√3

9.

A outra alternativa nos conduz ao mesmo resultado, portanto

Υ(f, g) = max{

|x3 − x| : x ∈ [−1, 1 ]}

=2√3

9≈ 0, 38

Interpretacao geometrica: A distancia entre as funcoes f e g e ocomprimento da maior corda vertical que se pode tracar ligando ografico de f ao grafico de g.

x

y

−1 1

−1

1

f g

0⊢ ⊢

q

←−Υ(f, g)= 2√

39

√3

3

30

Page 32: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Funcoes Limitadas

Seja X um conjunto qualquer. Uma funcao f : X −→ R se dizlimitada quando existe k ∈ R tal que |f(x)| ≤ k para todo x ∈ X.

Exemplos

a) Um exemplo de funcao limitada em toda a reta (X = R) e afuncao seno, pois −1 ≤ senx ≤ 1, para todo x real.

R

y

q q q q q q

q

q

−1

1

−π −π2

0 π2

π 3π2

Uma funcao pode nao ser limitada em um domınio D, mas sim emum seu subconjunto D′ ⊂ D. E o que veremos agora.

b) Das funcoes abaixo

f : [−1, 1 ] −→ R e g : R −→ Rx 7−→ x x 7−→ x

apenas a primeira e limitada, uma vez que

−1 ≤ x ≤ 1 ⇒ −1 ≤ f(x) ≤ 1 ⇒ |f(x)| ≤ 1.

Por outro lado, nao existe k ∈ R de modo que |g(x)| = |x| ≤ kpara todo x ∈ R.

q

q

1−1

1

−1

x

f(x)

• f e limitada em seu domınio, g nao.

qq

q

q

1−1

1

−1

x

g(x)

Sejam f e g funcoes limitadas, isto e, existem constantes k1 , k2 ∈ R

tais que |f(x)| ≤ k1 e |g(x)| ≤ k2 , entao as funcoes f ± g sao aindalimitadas, devido a que |f(x)± g(x)| ≤ |f(x)|+ |g(x)| ≤ k1 + k2 .

31

Page 33: Gentil Lopes - Espaços Métricos

− Espaco das funcoes reais limitadas

10) O espaco(B(X, R), Ψ

)

Indiquemos por B(X, R) o conjunto das funcoes reais e limitadasde X em R.

A aplicacaoΨ: B(X, R)× B(X, R) −→ R

dada porΨ(f, g) = sup

{|f(x)− g(x)| : x ∈ X

}

esta bem definida. (devido ao axioma do supremo p. 612)

No apendice mostramos Ψ e uma metrica sobre B(X, R). (p. 74)

Exemplo: Calcule a distancia entre as funcoes

f, g : [ 0, 1 [−→ R

dadas por f(x) = 3x e g(x) = x.

Solucao:

Ψ(f, g) = sup{|f(x)− g(x)| : x ∈ [ 0, 1 [

}

= sup{|3x− x| : x ∈ [ 0, 1 [

}

= sup{2x : x ∈ [ 0, 1 [

}= 2,

Porquanto

0 ≤ x < 1 ⇒ 0 ≤ 2x < 2 ⇒ |f(x)− g(x)| = 2x ∈ [ 0, 2 [.

No grafico fica assim

x

y

0 q q

q

q

q

1 2

1

2

3

���

���������

g

f

(0,0)

(1,1)

(1,3)

←Ψ(f, g)=2

Observe que enquanto o par(B(X, R), Ψ

)e um espaco metrico ja nao

acontece o mesmo com o par(B(X, R), Υ

). (ver p. 28)

No caso do exemplo anterior as funcoes f e g nao tem maximo no con-junto X = [ 0, 1 [:

Υ(f, g) = max{|3x− 2x| : x ∈ [ 0, 1 [

}

= max{2x : x ∈ [ 0, 1 [

}

32

Page 34: Gentil Lopes - Espaços Métricos

porquanto, 0 ≤ x < 1 ⇒ 0 ≤ 2x < 2 ⇒ 2x ∈ [ 0, 2 [.

Isto e, a aplicacao Υ: B(X, R)× B(X, R) −→ R nao estara bem definida.

Porque o par(B(X, R), Γ

)nao e um espaco metrico

Mostraremos agora que Γ (p. 27) nao e uma metrica sobre B(X, R).Consideremos X = [ 0, 1 ] e as funcoes f, g ∈ B

([ 0, 1 ], R

), isto e,

f, g : [ 0, 1 ] −→ R; dadas por

f(x) = 1, ∀x ∈ [ 0, 1 ] e g(x) =

1, se x 6= 12

14 , se x = 1

2 .

Os graficos de f e g sao dados a seguir:

q

0 1x

1

f(x)

q 0x

g(x)

q

1

1

q q

q

q

12

r12

14

Observe que f e g diferem em um unico ponto. Portanto pelo teorema[AR]2 : (p. 603)

∫ 1

0f(x) dx =

∫ 1

0g(x) dx

logo,

∫ 1

0f(x) dx−

∫ 1

0g(x) dx = 0 ⇐⇒

∫ 1

0

(f(x)− g(x)

)dx = 0

observe que no intervalo dado f(x) ≥ g(x), isto e, f(x)−g(x) ≥ 0. Portantoneste intervalo |f(x)− g(x)| = f(x)− g(x), logo

Γ(f, g) =

∫ b

a|f(x)− g(x)| dx

=

∫ 1

0

(f(x)− g(x)

)dx = 0.

Resumindo: tomamos dois pontos, f 6= g ∈ B(X, R) e mostramos queΓ(f, g) = 0. O que fere (M1). (p. 12)

33

Page 35: Gentil Lopes - Espaços Métricos

1.2.4 Espacos de Codigos

Agora daremos um importante exemplo de espaco metrico, largamenteutilizado em Teoria da Informacao (transmissao de dados).

Codigos que contem tanto caracteres alfabeticos como numericos saonecessarios quando microcomputadores se comunicam com dispositivos comofax ou um terminal de vıdeo, ou ainda para transformar os caracteres de umteclado em linguagem de computador. Esses codigos sao chamados codigosalfanumericos.

O codigo alfanumerico mais comumente usado em sistemas de micro-computador e o

AMERICAN STANDARD Code for Information Interchange(Codigo Americano Padrao para Troca de Informacoes)

Uma listagem parcial do codigo ASCII e mostrada na tabela a seguir

Caracter ASCII Caracter ASCII

< 00111100

> 00111110

! 00100001∑

11100100

# 00100011

$ 00100100

% 00100101

& 00100110

( 00101000

) 00101001

∗ 00101010

[ 01011011

] 01011101

+ 00101011

− 00101101

/ 00101111

0 00110000

1 00110001

2 00110010

3 00110011

4 00110100

5 00110101

6 00110110

7 00110111

8 00111000

9 00111001

A 01000001

B 01000010

C 01000011

D 00100100

E 01000101

F 01000110

G 01000111

H 01001000

I 01001001

J 01001010

K 01001011

L 01001100

M 01001101

N 01001110

O 01001111

P 01010000

Q 01010001

R 01010010

S 01010011

T 01010100

U 01010101

V 01010110

W 01010111

X 01011000

Y 01011001

Z 01011010

− TABELA ASCII

34

Page 36: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A tıtulo de curiosidade a seguir vemos o diagrama de blocos de umacalculadora.

Teclado

Entrada

Display

Saida

+ 0 −

1 2 3

4 5 6

7 8 9

Codificador

ր001100010010101100110010

CPU

ր00110011

Decodificador

Na figura estamos simulando a soma 1+2 = 3. Ao digitarmos no teclado1+2 existe um circuito codificador que codifica estas informacoes em binariode acordo com a TABELA ASCII vista anteriormente, ou seja,

1 ↔ 00110001; + ↔ 00101011; 2 ↔ 00110010

Estes codigos binarios sao entregues a CPU que executa a soma pedida, oresultado e colocado na entrada de um circuito decodificador que decodifica ocodigo binario em sua entrada, e na saida temos o resultado na base decimal.

Definicao 2 (Codigo). Um codigo binario e um conjunto de vetores binarios(de mesmo comprimento) chamados vetores de codigo. O processo de con-versao de uma mensagem em vetores de codigo e chamado codificacao, e oprocesso inverso e chamado decodificacao.

A transmissao de dados codificados − via ondas eletromagneticas, podeser − esta sujeita a varias fontes de erros, desde erros de digitacao ateinterferencias eletromagneticas; os possıveis erros sao chamados de ruıdos.

A teoria dos codigos corretores de erro e um campo de pesquisa muitoativo atualmente, com aplicacoes em diversas areas tais como: matematica,engenharia, computacao e estatıstica.

Sinal SinalNovo

Informacaode

Fonte

Codificacao Canal

Ruıdo

Decodificacao Destinatario

35

Page 37: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Codigos binarios e Espacos metricos

O Nosso objetivo agora sera contruir alguns espacos metricos sobre oscodigos binarios.

Sequencias binarias de qualquer tamanho podem ser obtidas tomando-seo produto cartesiano do conjunto:

Z = { 0, 1 }

Por exemplo:

Z2 = { 0, 1 } × { 0, 1 } = { 00, 10, 01, 11 }

Z3 = { 0, 1 } × { 0, 1 } × { 0, 1 } = { 000, 100, 010, 110, 001, 101, 011, 111 }Temos:

Z2 = { 00, 10, 01, 11 }

Z3 = { 000, 100, 010, 110, 001, 101, 011, 111 }

Z4 = { 0000, 1000, 0100, 1100, 0010, 1010, 0110, 1110,0001, 1001, 0101, 1101, 0011, 1011, 0111, 1111 }

O numero de sequencias binarias no conjunto Zn e 2n; observe queos codigos (sequencias) do teclado de um computador (Tabela ASCII) per-tencem todos ao conjunto Z8, neste conjunto podemos codificar ate 28 = 256caracteres.

Nota: Por questoes didaticas estaremos preferencialmente dando enfase aoscodigos binarios de tamanho 4, entretanto o tamanho (comprimento) podeser arbitrario.

Vamos dispor os elementos de Z4 segundo uma tabela, assim:

0 0 0 0

1 0 0 0

0 1 0 0

1 1 0 0

0 0 1 0

1 0 1 0

0 1 1 0

1 1 1 0

0 0 0 1

1 0 0 1

0 1 0 1

1 1 0 1

0 0 1 1

1 0 1 1

0 1 1 1

1 1 1 1

Z4={0000, 1000, 0100, 1100, 0010, 1010, 0110, 1110,

0001, 1001, 0101, 1101, 0011, 1011, 0111, 1111}

36

Page 38: Gentil Lopes - Espaços Métricos

11) Distancia de Hamming∗

Na teoria da informacao a distancia de Hamming entre dois codigos demesmo comprimento e o numero de posicoes nas quais eles diferem entre si.

Mais precisamente: Tomemos dois pontos x, y ∈ Z4 e consideremos aseguinte aplicacao

σ : Z4 × Z4 −→ R

dada por

σ(x, y) = numero de posicoes em que x e y diferem entre si.

σ assim definida e uma metrica sobre Z4, e o que estaremos provando logomais.

Exemplos: Dados x = 1000, y = 0100 e z = 1111 em Z4, calcule adistancia entre x e y, e entre x e z.

Solucao: Temos,

x : 1 0 0 0 x : 1 0 0 0y : 0 1 0 0 z : 1 1 1 1

x e y diferem em duas posicoes, enquanto x e z diferem em tres posicoes,portanto

σ(1000, 0100) = 2 e σ(1000, 1111) = 3.

Considerando xi como sendo a i−esima entrada da sequencia x = x1 x2 x3 x4

de Z4 podemos, alternativamente, definir σ(x, y) como

σ(x, y) =

4∑

i=1

|xi − yi |

Forma esta mais apropriada para programacao (e demonstracoes).

Nota: Com um pouco de reflexao o leitor nao tera dificuldade em concluirque o somatorio acima conta o numero de posicoes em que as sequencias xe y diferem entre si. Observe a equivalencia entre as operaces:

(xi − yi) ≡ |xi − yi |

onde a operacao da esquerda verifica-se em Z (p. 84) e a da direita em R.

∗Richard W. Hamming (1915−1998) obteve seu Ph.D. em Matematica na Universidadede Illinois, em Urbana-Champaign, em 1942. De 1946 a 1976, trabalhou no Bell Labs,depois integrou-se ao corpo docente na US Naval Postgraduate School, em Monterey,California. Em 1950, publicou seu trabalho fundamental em codigos corretores de erros,dando uma construcao explıcita para os codigos de otimizacao que Claude Shannon tinhaprovado serem teoricamente possıveis, em 1948.

37

Page 39: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Calculemos a distancia entre as sequencias x = 1000 e y = 0100:

σ(1000, 0100

)=

4∑

i=1

|xi − yi |

= |x1 − y1 |+ |x2 − y2 |+ |x3 − y3 |+ |x4 − y4 |= |1− 0|+ |0− 1|+ |0− 0|+ |0− 0| = 2.

Mostremos que (Z4, σ) e um espaco metrico:

Prova: (M1) d(x, y) ≥ 0 e d(x, y) = 0 ⇐⇒ x = y.

Obviamente σ(x, y) ≥ 0. Se σ(x, y) = 0 entao, pela definicao de σ, x ey diferem em 0 posicoes, isto e x = y. Se x = y entao x e y coincidem emtodas as posicoes, isto e σ(x, y) = 0.

(M2) d(x, y) = d(y, x) :

Obviamente que o numero de posicoes em que x difere de y e igual aonumero de posicoes em que y difere de x, ou seja, σ(x, y) = σ(y, x).

(M3) d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y) :

Devemos mostrar que σ(x, y) ≤ σ(x, z) + σ(z, y). Isto e que

4∑

i=1

|xi − yi | ≤4∑

i=1

|xi − zi |+4∑

i=1

|zi − yi | (1.12)

Pois bem, usando a desigualdade triangular para numeros reais, podemosescrever:

|x1 − y1 | ≤ |x1 − z1 |+ |z1 − y1 |. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .|x4 − y4 | ≤ |x4 − z4 |+ |z4 − y4 |

Somando estas quatro desigualdades obtemos

|x1−y1 |+ · · ·+ |x4−y4 | ≤ |x1−z1 |+ · · ·+ |x4−z4 |+ |z1−y1 |+ · · ·+ |z4−y4 |

que e exatamente a desigualdade (1.12). �

A tıtulo de curiosidade, as sequencias em ZN sao os vertices de umhipercubo em dimensao N , por exemplo, para

Z3 = { 000, 100, 010, 110, 001, 101, 011, 111 }

100 110

000010

011001

101 111

38

Page 40: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Uma formula para gerar os codigos em ZN

E um prazer puro da alma espalhar pelo mundo o fruto de seus es-tudos e meditacoes, ainda sem outra remuneracao que a consciencia defazer bem. (Jose Bonifacio)

Ja nao conto mais o numero de formulas que deduzi (e/ou demonstrei)na matematica, confesso que, pela formula a seguir, tenho um carinho todoespecial∗.

xij =

1, se⌊

i−12j−1

⌋e ımpar;

0, se⌊

i−12j−1

⌋e par.

(1.13)

Esta formula nos permite gerar os codigos binarios (ou os vertices dohipercubo), onde: xij e o j−esimo bit do codigo i de ZN . Fixado N fazemos

i = 1, 2, . . . , 2N e j = 1, 2, . . . , N

Por exemplo, para N = 2, temos: i = 1, 2, 3, 4 e j = 1, 2. Entao

i = 1, j = 1 ⇒⌊

1−121−1

⌋= 0 ⇒ x11 = 0

i = 1, j = 2 ⇒⌊

1−122−1

⌋= 0 ⇒ x12 = 0

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

i = 2, j = 1 ⇒⌊

2−121−1

⌋= 1 ⇒ x11 = 1

i = 2, j = 2 ⇒⌊

2−122−1

⌋= 0 ⇒ x12 = 0

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

i = 3, j = 1 ⇒⌊

3−121−1

⌋= 2 ⇒ x11 = 0

i = 3, j = 2 ⇒⌊

3−122−1

⌋= 1 ⇒ x12 = 1

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

i = 4, j = 1 ⇒⌊

4−121−1

⌋= 3 ⇒ x11 = 1

i = 4, j = 2 ⇒⌊

4−122−1

⌋= 1 ⇒ x12 = 1

Sendo assim, temos:

Z2 = { 00︸︷︷︸

i=1

, 10︸︷︷︸

i=2

, 01︸︷︷︸

i=3

, 11︸︷︷︸

i=4

}

Os dois espacos metricos a seguir sao tambem contribuicoes minha.

∗Precisamente pelos detalhes tecnicos envolvidos em sua deducao e demonstracao.

39

Page 41: Gentil Lopes - Espaços Métricos

12) O espaco(Z4, ρ

)

Tomemos dois pontos x, y ∈ Z4 e consideremos a seguinte aplicacao

ρ : Z4 × Z4 −→ R

definida por

ρ(x, y) =

∣∣∣∣∣

4∑

i=1

2i−1 · (xi − yi)∣∣∣∣∣

ρ assim definida e uma metrica sobre Z4. (Apendice, p. 76)

Exemplos: Dados x = 1000, y = 0100 e z = 1111 em Z4, calcule adistancia entre x e y, e entre x e z.

Solucao: temos,

ρ(1000, 0100

)=

∣∣∣∣∣

4∑

i=1

2i−1 · (xi − yi)∣∣∣∣∣

=∣∣∣20 · (1− 0) + 21 · (0− 1) + 22 · (0− 0) + 23 · (0− 0)

∣∣∣ = 1.

Tambem

ρ(1000, 1111

)=∣∣∣20 · (1− 1) + 21 · (0− 1) + 22 · (0− 1) + 23 · (0− 1)

∣∣∣ = 14.

Compare com as distancias obtidas no espaco (Z4, σ). (p. 37)

Uma outra alternativa para se calcular a distancia ρ(x, y) e converter assequencias x e y da base binaria para a base 10 e usar a metrica µ.

Na tabela seguinte a ultima coluna e o correspondente em decimal dasequencia binaria.

20 21 22 23

0 0 0 0 0

1 0 0 0 1

0 1 0 0 2

1 1 0 0 3

0 0 1 0 4

1 0 1 0 5

0 1 1 0 6

1 1 1 0 7

0 0 0 1 8

1 0 0 1 9

0 1 0 1 10

1 1 0 1 11

0 0 1 1 12

1 0 1 1 13

0 1 1 1 14

1 1 1 1 15

Por exemplo:

ρ(1000, 0100)= |1−2|=1.

ρ(1000, 1111)= |1−15|=14.

40

Page 42: Gentil Lopes - Espaços Métricos

13) O espaco(ZN , τ

)

Tomemos dois pontos x, y ∈ ZN e consideremos a seguinte aplicacao

τ : ZN × ZN −→ R

definida por

τ(x, y) = max{i : xi 6= yi

}, 1 ≤ i ≤ N.

τ assim definida e uma metrica sobre ZN .

No apendice mostramos que τ satisfaz a desigualdade triangular. (p. 77)

Nota: max{i : xi 6= yi

}= maior posicao em que x e y diferem entre si.

Exemplos: Dados x = 1000, y = 0100 e z = 1111 em Z4, calcule adistancia entre x e y e entre x e z.

Solucao: Temos,

x : 1 0 0 0 x : 1 0 0 0y : 0 1 0 0 z : 1 1 1 1

Entao:

{i : xi 6= yi

}= {1, 2} ⇒ max

{1, 2

}= 2 ⇒ τ(x, y) = 2.

{i : xi 6= zi

}= {2, 3, 4} ⇒ max

{2, 3, 4

}= 4 ⇒ τ(x, z) = 4.

A tabela a seguir compara as distancias vistas nos tres espacos metricos:

(x, y)

(x, z)

σ

2

3

ρ

1

14

τ

2

4

x=10 0 0

y=01 0 0

z=11 1 1

Nota: No caso de duas sequencias iguais estamos assumindo que

max{ }

= 0

Esta igualdade pode ser provada por “vacuidade”, no sentido de que elajamais podera ser contraditada∗.

Alternativamente, poderiamos ter definido

τ(x, y) =

{

max{i : xi 6= yi

}, se x 6= y;

0, se x = y.

∗E semelhante a prova de que o conjuto vazio e subconjunto de qualquer conjunto.

41

Page 43: Gentil Lopes - Espaços Métricos

14) O espaco(Z∞, ν

)

Consideremos agora o produto cartesiano infinito

Z∞ = {0, 1} × {0, 1} × {0, 1} × · · ·

Os elementos deste conjunto sao sequencias infinitas x = x1 x2 x3 . . . de0′s e 1′s, como por exemplo

x =1010101010 . . .

y =1110101110 . . .

z =0011001100 . . .

Sendo

σ(x, y) =

N∑

n=1

|xn − yn |

uma metrica sobre ZN , poderiamos ser tentados a definir uma metrica sobreZ∞ assim

σ(x, y) =

∞∑

n=1

|xn − yn |

Acontece que neste caso temos uma soma infinita (serie) que pode naoresultar em um valor finito. Uma distancia e um numero real. Por exemplo,seja x = 111111 . . . e y = 000000 . . ., entao

x− y = (x1 − y1) (x2 − y2) (x3 − y3) . . .= (1− 0) (1 − 0) (1 − 0) (1 − 0) . . . = 111 1 . . .

portanto

σ(x, y) =∞∑

n=1

|xn − yn |

= |x1 − y1 |+ |x2 − y2 |+ |x3 − y3 |+ · · ·= 1 + 1 + 1 + 1 + · · ·

Esta serie nao converge.Para contornar esta situacao vamos introduzir um “fator de convergencia”

na serie anterior. Para mostrar que a aplicacao

ν : Z∞ × Z∞ −→ R

dada por

ν(x, y) =

∞∑

n=1

|xn − yn |2n

esta bem definida, devemos mostrar que esta serie e convergente.

42

Page 44: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Entao, observe que para quaisquer x, y em Z∞ vale 0 ≤ |xn − yn | ≤ 1.Dividindo esta dupla desiguladade por 2n, temos

0 ≤ |xn − yn |2n ≤ 1

2n

como a serie∑∞

n=112n

converge segue-se que a serie∑∞

n=1|xn−yn |

2ntambem

converge. Sendo assim ν esta bem definida.A proposito observe que

ν(x, y) =∞∑

n=1

|xn − yn |2n ≤

∞∑

n=1

1

2n = 1.

Resumindo: 0 ≤ ν(x, y) ≤ 1. Isto e, a distancia entre duas sequencias doespaco metrico

(Z∞, ν

)nunca excede a unidade.

Dos requisitos para uma metrica vamos mostrar que ν satisfaz a de-sigualdade triangular: A seguinte desigualdade

|xn − yn | ≤ |xn − zn |+ |zn − yn |

e valida para xn , yn e zn reais (e mais do que necessitamos). Dividindo adesigualdade anterior por 2n, temos

|xn − yn |2n ≤ |xn − zn |

2n +|zn − yn |

2n

por conseguinte

∞∑

n=1

|xn − yn |2n ≤

∞∑

n=1

|xn − zn |2n +

∞∑

n=1

|zn − yn |2n

isto e,ν(x, y) ≤ ν(x, z) + ν(z, y)

Exemplo: Calcule a distancia entre x = 111111 . . . e y = 010101 . . ..

Solucao:

x− y = (1− 0) (1 − 1) (1 − 0) (1 − 1) . . . = 101 0 1 0 . . . .

portanto

ν(x, y) =

∞∑

n=1

|xn − yn |2n =

1

21 +0

22 +1

23 +0

24 +1

25 +0

26 + · · ·

=1

2+

1

8+

1

32+ · · · =

12

1− 14

=2

3.

A proposicao seguinte assevera que se x e y sao duas sequencias de Z∞

coincidentes nas primeiras j posicoes, entao suas distancias nao excede 1

2j e

reciprocamente.

43

Page 45: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 1. Sejam x e y ∈ Z∞ e suponha xn = yn para n = 1, 2, . . . , j.Entao ν(x, y) ≤ 1

2j . Reciprocamente, se ν(x, y) < 1

2j entao xn = yn para

n ≤ j.Prova: (⇒) Se xn = yn para n ≤ j, entao

ν(x, y) =∞∑

n=1

|xn − yn |2n

=

j∑

n=1

|xn − yn |2n

︸ ︷︷ ︸

=0

+

∞∑

n=j+1

|xn − yn |2n

≤∞∑

n=j+1

1

2n =1

2j+1 +

1

2j+2 +

1

2j+3 + · · · = 1

2j

(⇐) (Tecnica (T-1), p. 570) Suponha xk6= y

kpara algum k ≤ j , entao

ν(x, y) =∞∑

n=1

|xn − yn |2n ≥

k∑

n=1

|xn − yn |2n ≥ 1

2k≥ 1

2j

Comentarios: A primeira das desigualdades acima e sempre valida(obvio, pois somar infinitos termos positivos resulta sempre maior ou igualao resultado da soma de uma quantidade finita destes mesmos termos ). A

segunda desigualdade se justifica pois a soma∑k

n=1|xn−yn |

2n e no mınimo

gual a 1

2k, pois para o ındice k temos x

k6= y

k, isto e |x

k− y

k| = 1. A ultima

desigualdade decorre de

j ≥ k ⇒ 2j ≥ 2k ⇒ 1

2j ≤

1

2k

A importancia deste resultado e que podemos decidir de imediato quandoou nao duas sequencias em Z∞ estao proximas uma da outra. Intuitiva-mente este resultado diz que duas sequencias em Z∞ estao proximas se suas“primeiras” entradas coincidem.

Para futuras referencias, mencionaremos uma generalizacao da desigual-dade triangular, para n pontos:

d(x1 , xn) ≤ d(x1 , x2) + d(x2 , x3) + · · · + d(xn−1 , xn) (1.14)

(M, d)

• •x1 xn

• • . . . •x2 x3 xn−1

Esta desigualdade pode ser estabelecida por inducao sobre n.

44

Page 46: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A seguinte desigualdade tambem nos sera util futuramente:

Proposicao 2. Seja (M, d) um espaco metrico. Se x, y e z sao pontosquaisquer em M , entao a seguinte desigualdade

∣∣d(x, y)− d(x, z)

∣∣ ≤ d(y, z)

e verdadeira.

Prova: Da desigualdade triangular temos

d(x, y)− d(x, z) ≤ d(z, y) (1.15)

Por outro lado a mesma desiguldade triangular pode ser expressa como

d(x, z) ≤ d(x, y) + d(y, z) ⇒ d(x, z)− d(x, y) ≤ d(y, z)

Combinando (1.15) com esta ultima desigualdade obtemos:

∣∣d(x, y)− d(x, z)

∣∣ ≤ d(y, z).

1.3 Distancia entre Ponto e Conjunto

Lembramos − da geometria analıtica − que a distancia de um pontop =

(x0 , y0

)a uma reta r : ax+ by + c = 0 e dada por

dpr =

∣∣∣∣

a x0 + b y0 + c√a2 + b2

∣∣∣∣

t⊡

p

dpr

r

0x

y

Este e um exemplo de distancia entre ponto e conjunto. Ainda aquitemos uma situacao suscetıvel de generalizacao no contexto dos espacosmetricos.

45

Page 47: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A tıtulo de exemplo, consideremos no espaco metrico (R, µ), o pontop = 1 e o conjunto X = [ 3, 5 ]. Veja:

Rt [ ]Xq q q q q q q−1 0 p=1 2 3 4 5

Desejamos calcular a distancia de p a X. Inicialmente vamos calcular oseguinte conjunto

{d( p, x) : x ∈ X

}

das distancias de p aos elementos de X. Observe,

Rt t↔x

d( p, x)

[ ]q q q q q q q−1 0 p=1 2 3 5

Entao,{d( p, x) : x ∈ X

}={d(1, x) : x ∈ [ 3, 5 ]

}

={|x− 1| : 3 ≤ x ≤ 5

}

Temos

3 ≤ x ≤ 5 ⇒ 2 ≤ x− 1 ≤ 4 ⇒ |x− 1| ∈ [ 2, 4 ]

Portanto{d( p, x) : x ∈ X

}= [ 2, 4 ]

Este e o conjunto de todas as distancias possıveis de p aos elementos de X.

Vamos tomar como distancia do ponto p = 1 ao conjunto X, que deno-taremos por d(1, X), a menor das distancias encontradas, isto e:

d(1, X) = min{d(1, x) : x ∈ X

}

= min [ 2, 4 ] = 2

No grafico fica assim:

Rt td(1, X)

X[ ]q q q q q q q−1 0 p=1 2 3 4 5

Colocamos a seguinte questao: e se tivessemos tomado o conjunto Xaberto a esquerda? Isto e, X =] 3, 5 ]. Neste caso terıamos obtido:

{d( p, x) : x ∈ X

}= ] 2, 4 ]

E este conjunto das distancias nao possui um menor elemento. Para osnossos propositos isto nao constitui um problema.

46

Page 48: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicao 3. Seja (M, d) um espaco metrico. Dados X ⊂ M (X 6= ∅) ep ∈ M , chama-se distancia de p ao conjunto X, e indica-se por d(p, X), oseguinte numero real nao negativo:

d(p, X) = inf{d( p, x) : x ∈ X

}

Observe d( p, X) assim definida existe pelo fato de que o conjunto{d( p, x) : x ∈ X

}

e limitado inferiormente por zero, pois 0 ≤ d( p, x), ∀x ∈ X.(prop. 146, p. 612)

Em particular, para o questionamento anterior, temos:

d(1, ] 3, 5 ]

)= inf

{d(x, 1): x ∈ ] 3, 5 ]

}

= inf{|x− 1| : 3 < x ≤ 5

}= inf ] 2, 4 ] = 2.

Rtd(1, X)

X] ]q q q q q q−1 0 p=1 2 3 4 5

Exemplos:

1) Seja M = R, p = 0 e seja

X ={ 1

n: n ∈ N

}={1,

1

2,1

3,1

4, . . .

}⊂ R.

• No espaco (R, δ), temos

d(p, X) = inf { d(p, x) : x ∈ X }

= inf{

δ(0, x) : x ∈ { 1n: n ∈ N }

}

= inf{δ(0,

1

n) : n ∈ N

}

= inf{δ(0, 1), δ(0,

1

2), δ(0,

1

2), . . .

}

= inf { 1, 1, 1, . . .} = 1.

• No espaco (R, µ), temos

d(p, X) = inf{d(p, x) : x ∈ X

}

= inf{

µ(0, x) : x ∈ { 1n: n ∈ N}

}

= inf{ ∣∣∣∣0− 1

n

∣∣∣∣: n ∈ N

}

= inf{ 1

n: n ∈ N

}

= 0.

Ver exemplo 2 (p. 610).

47

Page 49: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2) Uma Patologia

Seja M = [ 0, 1 [, seja X = [ 12 , 1 [⊂M e seja p = 0 ∈M . Veja,

M0 1

s0 1

21X

Temos (ver subespaco, p. 81)

d(0, X) = 1/2, no espaco([ 0, 1 [, µ

)

d(0, X) = 0, no espaco([ 0, 1 [, k

)

De fato,

d(0, X) = inf{d(0, x) : x ∈ X

}

= inf{µ(0, x) : x ∈ X }

= inf{|x− 0| : x ∈

[ 1

2, 1[ }

=1

2

Por outro lado,

d(0, X) = inf{d(0, x) : x ∈ X

}

= inf{k(0, x) : x ∈

[ 1

2, 1[ }

Temos (ver equacao (1.2), p. 18)

1

2≤ x < 1 ⇒ 0 < 1− x ≤ 1

2⇒ k(0, x) = 1− x ∈

]0,

1

2

]

Portanto,

d(0, X) = inf{k(0, x) : x ∈

[ 1

2, 1[ }

= inf]0,

1

2

]= 0.

Olhando para a figura abaixo

s0 1

21X

fica difıcil de “engolir” que a distancia do ponto 0 ao conjunto X seja nula.Ainda bem que os filosofos existem para as vezes nos trazer algum conforto.

(Voltaire, p. 17; Bachelard, p. 16)

48

Page 50: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3) Seja M = [ 0, 1 [× [ 0, 1 [ o quadrado unitario, X =[12 , 1

[×[12 , 1

[; e

p = (0, 0) ∈M . Vamos mostrar que,

d(0, X) =√2/2, no espaco

([ 0, 1 [× [ 0, 1 [, D1

)

d(0, X) = 1, no espaco([ 0, 1 [× [ 0, 1 [, D2

)

0 1

1

¬12

¬

12

p=0 1

1

s

←− X

De fato,

d(p, X) = inf{d(p, x) : x ∈ X

}

= inf{D1

((0, 0); (x, y)

): (x, y) ∈ X

}

= inf{√

(x− 0)2 + (y − 0)2 :1

2≤ x, y < 1

}

para encontrar d(p, X) vamos encontrar o ınfimo da funcao,

F (x, y) =√

x2 + y2 , para1

2≤ x, y < 1.

Entao,

1

2≤ x < 1 ⇒ 1

4≤ x2 < 1 e

1

2≤ y < 1 ⇒ 1

4≤ y2 < 1,

portanto,

1

2≤ x2 + y2 < 2 ⇒

√2

2≤√

x2 + y2 <√2

Conclusao: se 12 ≤ x, y < 1 implica que

F (x, y) =√

x2 + y2 ∈[√2

2,√2[

portanto,

d(p, X) = inf{√

x2 + y2 :1

2≤ x, y < 1

}

= inf[√2

2,√2[

=

√2

2

49

Page 51: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por outro lado,

d(p, X) = inf{d(p, x) : x ∈ X

}

= inf{D2

((0, 0); (x, y)

): (x, y) ∈ X

}

= inf{

|x− 0|+ |y − 0| : 12≤ x, y < 1

}

para encontrar d(p, X) vamos encontrar o ınfimo da funcao,

F (x, y) = |x|+ |y| , para1

2≤ x, y < 1.

Entao,

1

2≤ x < 1 e

1

2≤ y < 1 ⇒ 1 ≤ x+ y < 2

portanto, d(p, X) = inf [ 1, 2 [= 1.

Proposicao 3. Seja (M, d) um espaco metrico. Se X ⊂M (X 6= ∅) e p, qsao pontos fixados em M , tem-se

∣∣ d(p, X) − d(q, X)

∣∣ ≤ d(p, q)

Prova: Tomemos y ∈ X arbitrario. Temos

d(p, X) = inf{d(p, x) : x ∈ X

}≤ d(p, y),

uma vez que d(p, y) e um elemento do conjunto{d(p, x) : x ∈ X

}. Portanto

d(p, X) ≤ d(p, y) ≤ d(p, q) + d(q, y)

logo, d(p, X) − d(p, q) ≤ d(q, y). Como esta desigualdade vale para y ∈ Xarbitrario, segue que a constante (numero real) d(p, X) − d(p, q) e umacota inferior do conjunto

{d(q, x) : x ∈ X

}

comoinf{d(q, x) : x ∈ X

}= d(q, X)

e a maior de tais cotas, segue que

d(p, X)− d(p, q) ≤ d(q, X)

Esta desigualdade continua valida permutando-se p e q:

d(q, X)− d(q, p) ≤ d(p, X)

50

Page 52: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Destas desigualdades decorrem, respectivamente,

d(p, X) − d(q, X) ≤ d(p, q)

−d(p, q) ≤ d(p, X) − d(q, X)

donde

−d(p, q) ≤ d(p, X) − d(q, X) ≤ d(p, q)

isto e,∣∣ d(p, X) − d(q, X)

∣∣ ≤ d(p, q)

O proximo ıtem generaliza o anterior (Distancia entre ponto e conjunto).

1.4 Distancia entre conjuntos

A tıtulo de exemplo, consideremos no espaco metrico (R, µ) os conjuntosX = [ 1, 3 ] e Y = ] 5, 7 ]. Veja:

R[ ]X

] ]Y

q q q q q q q q q q−1 0 1 2 3 4 5 6 7 8

Desejamos calcular a distancia de X a Y . Inicialmente vamos calcularo seguinte conjunto

{d(x, y) : x ∈ X e y ∈ Y

}

das distancias dos pontos de X aos pontos de Y . Observe,

Rt↔x t

↔y

[ ] ] ]q q q q q q q q q q−1 0 1 3 4 5 7 8

d(x, y)

Entao,

{d(x, y) : x ∈ X e y ∈ Y

}={d(x, y) : x ∈ [ 1, 3 ] e y ∈ ] 5, 7 ]

}

={|x− y| : 1 ≤ x ≤ 3 e 5 < y ≤ 7

}

Temos

1 ≤ x ≤ 3 e 5 < y ≤ 7 ⇒ |x− y| ∈ ] 2, 6 ]

Portanto{d(x, y) : x ∈ X e y ∈ Y

}= ] 2, 6 ]

Este e o conjunto de todas as distancias possıveis entre os elementos deambos os conjuntos.

51

Page 53: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vamos tomar como distancia entre os conjuntosX e Y , que denotaremospor D(X, Y ), a “menor” das distancias encontradas, isto e:

D(X, Y ) = inf{d(x, y) : x ∈ X e y ∈ Y

}

= inf ] 2, 6 ] = 2

No grafico fica assim:

RX Y

D(X, Y )

[ ] ] ]q q q q q q q q q q−1 0 1 2 3 4 5 6 7 8

Definicao 4. Seja (M, d) um espaco metrico. Dados dois subconjuntos Xe Y do conjunto M , ambos nao vazios, chama-se distancia de X a Y , eindica-se por D(X, Y ), o numero real obtido da seguinte forma:

D(X, Y ) = inf{d(x, y) : x ∈ X e y ∈ Y

}

Alternativamente podemos escrever

D(X, Y ) = inf{d(x, y) : (x, y) ∈ X × Y

}

Exemplos:

1) No conjunto Z4, sejam X,Y ⊂ Z4 dados por

X ={0001, 0100, 1100

}

Y ={0101, 0011

}

No espaco metrico(Z4, σ

)temos o seguinte diagrama de distancias

X

Y

0001 0100 1100

0101

0011

1

1

1

3

2

4

portanto,

D(X, Y ) = inf{σ(x, y) : (x, y) ∈ X × Y

}

= inf { 1, 2, 3, 4 } = 1.

52

Page 54: Gentil Lopes - Espaços Métricos

isto eD(

{0001, 0100, 1100}; {0101, 0011})

= 1.

2) Seja M = R; sejam X = { 0 } e Y =

{1

n: n ∈ N

}

.

s⊢ rrrrrrrrrrr0 11

213

14

. . .R

• No espaco metrico (R, δ), temos

D(X, Y ) = inf

{

δ(x, y) : x ∈ { 0 } e y ∈{ 1

n: n ∈ N

}}

= inf

{

δ(0, 1), δ(0,

1

2

), δ(0,

1

3

), . . .

}

= inf { 1, 1, 1, . . .} = 1.

Portanto,

D(

{ 0 };{ 1

n: n ∈ N

})

= 1.

• No espaco metrico (R, µ), temos

D(X, Y ) = inf

{

|x− y| : x ∈ { 0 } e y ∈{ 1

n: n ∈ N

}}

= inf

{∣∣0− 1

n

∣∣ : n ∈ N

}

= inf

{1

n: n = 1, 2, . . .

}

= 0.

Observe que X ∩ Y = ∅ e, no entanto, D(X, Y ) = 0.

1.5 Conjuntos limitados − Diametro

Definicao 5 (Conjunto limitado). Seja (M, d) um espaco metrico e X umsubconjunto de M . Se existir uma constante c > 0 tal que d(x, y) ≤ c paraquaisquer x e y em X, dizemos que X e um conjunto limitado no espacometrico (M, d).

Exemplos:

1) R e limitado no espaco metrico (R, δ), pois δ(x, y) ≤ 1, ∀x, y ∈ R.

2) R nao e limitado no espaco metrico (R, µ), pois nao existe uma constantec > 0 de modo que, por exemplo, |x− 0| ≤ c, ∀x ∈ R.

53

Page 55: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3) O conjunto ZN das sequencias de comprimento N e limitado no espacometrico

(ZN , σ

), pois duas sequencias quaisquer, neste conjunto, diferem

em, no maximo, N posicoes:

σ(x, y) ≤ N, ∀x, y ∈ ZN .

A proposito as sequencias x = 000 . . . 0 e y = 111 . . . 1 diferem em Nposicoes.

4) O conjunto ZN e limitado no espaco metrico(ZN , ρ

), pois (p. 77)

ρ(x, y) ≤ 2N − 1, ∀x, y ∈ ZN

5) O conjunto Z∞ das sequencias de comprimento infinito, e limitado noespaco metrico (Z∞, ν), pois (p. 43)

ν(x, y) ≤ 1, ∀x, y ∈ Z∞

Se existir uma tal constante c > 0 de modo que d(x, y) ≤ c para quais-quer x e y em X entao o conjunto

{d(x, y) : x, y ∈ X

}e limitado superior-

mente e o seu supremo chama-se diametro de X e e denotado por diam (X).Sendo assim:

diam (X) = sup{d(x, y) : x, y ∈ X

}

Alternativamente podemos escrever

diam (X) = sup{d(x, y) : (x, y) ∈ X ×X

}

Se o conjunto X nao e limitado colocamos diam(X) =∞, por definicao.

Exemplos:

1) Seja M = R = X. No espaco metrico (R, δ) o diametro de R fica:

diam(R) = sup{δ(x, y) : x, y ∈ R

}

= sup { 0, 1 } = 1.

2) Seja M = [ 0, 1 [, temos:

diam(M) = 1, no espaco([ 0, 1 [, µ

)

diam(M) = 1/2, no espaco([ 0, 1 [, k

)

De fato,diam (M) = sup

{|x− y| : (x, y) ∈ [ 0, 1 [×[ 0, 1 [

}

Entao,0 ≤ x, y < 1 ⇒ 0 ≤ |x− y| < 1

Portanto,diam (M) = sup [ 0, 1 [= 1.

54

Page 56: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por outro lado,

diam (M) = sup{k(x, y) : (x, y) ∈ [ 0, 1 [× [ 0, 1 [

}

Observe que,

k(x, y) = min{|x− y|, 1− |x− y|

}=

|x− y|, se |x− y| ≤ 12 ;

1− |x− y|, se |x− y| ≥ 12 .

Entao, se

|x− y| ≤ 1

2⇒ k(x, y) = |x− y| ∈

[0,

1

2

]

Caso contrario

|x− y| ≥ 1/2 ⇒ 1

2≤ |x− y| < 1 ⇒ 0 < 1− |x− y| ≤ 1

2

sendo assim

k(x, y) = 1− |x− y| ∈]0,

1

2

]

Portanto

diam (M) = sup{k(x, y) : (x, y) ∈ [ 0, 1 [× [ 0, 1 [

}=

1

2

3) No espaco (Z∞, ν) temos

0 ≤ ν(x, y) ≤ 1 ⇒ ν(x, y) ∈ [ 0, 1 ].

Portanto,

diam (Z∞) = sup { ν(x, y) : (x, y) ∈ Z∞ × Z∞ }= sup [ 0, 1 ] = max [ 0, 1 ] = 1.

4) No espaco(ZN , σ

)temos que

σ(x, y) ∈{0, 1, 2, . . . , N

}

Portanto

diam(ZN)= sup

{σ(x, y) : (x, y) ∈ ZN × ZN

}

= sup { 0, 1, 2, . . . , N } = max { 0, 1, 2, . . . , N } = N.

Por exemplo, diam(Z4)= 4, corresponde a distancia entre os codigos

0 0 0 0 e 1 1 1 1.

5) No espaco(ZN , ρ

)temos que

ρ(x, y) ∈{0, 1, 2, . . . , 2N − 1

}

55

Page 57: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Portanto,

diam(ZN)= sup

{ρ(x, y) : (x, y) ∈ ZN × ZN

}

= sup{0, 1, 2, . . . , 2N − 1

}= 2N − 1.

Por exemplo, diam(Z4)= 24 − 1 = 15, corresponde a distancia entre os

codigos 0 0 0 0 e 1 1 1 1.

6) Diametro do disco unitario. Vamos calcular o diametro do seguinteconjunto

D ={x = (x1 , x2) ∈ R2 : x2

1+ x2

2≤ 1}

no espaco metrico(R2, D1

).

x1

x2

D

R

R

1

1

−1

−1

Seja p = (0, 0) e sejam x = (x1 , x2) ∈ D e y = (y1 , y2) ∈ D arbitrarios.Temos

D1(x, y) ≤ D1(x, p) +D1(p, y) ≤ 2

porquanto

D1(x, p) = D1

((x1 , x2), (0, 0)

)=√

(x1 − 0)2 + (x2 − 0)2 ≤ 1

D1(p, y) = D1

((0, 0), (y1 , y2)

)=√

(0− y1)2 + (0− y2)2 ≤ 1

Pois bem, 2 e uma cota superior do conjunto {D1(x, y) : x, y ∈ D} = K.Para mostrar que 2 = supK e suficiente, consoante o lema 10 (⇐) p. 606,para todo ε > 0 dado exibir x, y ∈ D tais que: 2− ε < D1(x, y).

Consideremos duas possibilidades:1a) ε ≥ 2, isto e, 2− ε ≤ 0. Neste caso quaisquer x e y em D nos serve umavez que D1(x, y) > 0.

2a) 0 < ε < 2. Neste caso temos 2 − ε > 0, pela propriedade arquimediana(p. 612) existe n = nε ∈ N de modo que n > 2−ε

ε . Vamos mostrar que, paraeste n, os pontos

x =( n

n+ 1, 0)

e y =(− n

n+ 1, 0)

satisfazem as duas seguintes exigencias:

a) x, y ∈ D, porquanto

(± n

n+ 1

)2+ 02 ≤ 1 ⇐⇒ n ≤ n+ 1

56

Page 58: Gentil Lopes - Espaços Métricos

b) 2− ε < D1(x, y), porquanto

D1(x, y) =

√(

nn+1 −

(− n

n+1

))2+ (0− 0)2 = 2n

n+1 e

2n

n+ 1> 2− ε ⇐⇒ n >

2− εε

Esta ultima desigualdade e verdadeira porque assim escolhemos, a priori, ovalor de n.

Deixamos como exercıcio ao leitor mostrar que

diam(D) = 2√2, na metrica D2 ,

diam(D) = 2, na metrica D3 .

E mais: os pontos x, y cujas distancias proporcionam o diametro, em cadacaso, sao extremidades das cordas nas figuras a seguir:

Ou seja: Na metrica euclidiana a equacao D1(x, y) = diam(D) e satis-feita por quaisquer pontos x, y extremos das cordas que passam pelo centrodo disco. Na metrica D2 a equacao D2(x, y) = diam(D) e satisfeita ape-nas pelos pontos x, y extremos das cordas que passam pelo centro segundoos angulos de 45◦ e 135◦. Na metrica D3 a equacao D3(x, y) = diam(D)e satisfeita apenas pelos pontos x, y extremos das cordas que passam pelocentro segundo os angulos de 0◦ e 90◦.

No caso da metrica D2 o diametro de D e como na figura a seguir:

(√2

2,√

22

)

(−

√2

2,−

√2

2

)

diam(D) =D2

((√

22,√

22);(−

√2

2,−

√2

2))

=∣

√2

2−(−

√2

2)∣

∣+∣

√2

2−(−

√2

2)∣

=2√2.

∗ ∗ ∗Dogmas sao prisoes, um espırito que

queira realizar belas obras, que tambem

queira os meios necessarios, tem de ser

cetico. Estar livre de toda forma de

crenca pertence a forca, ao poder de ver

sem algemas. (Nietzsche)

57

Page 59: Gentil Lopes - Espaços Métricos

1.6 Exercıcios

1) Quais das funcoes dadas a seguir sao metricas sobre R?

a ) d(x, y) = |x+ y|b ) d(x, y) = |x|+ |y|c ) d(x, y) = |x| − |y|d ) d(x, y) = (x− y)2e ) d(x, y) = 2 |x− y|

2) Quais das funcoes dadas a seguir sao metricas sobre R2?

a ) d(x, y) = |x1 − y1 |b ) d(x, y) = 2 |x1 − y1 |+ |x2 − y2 |c ) d(x, y) = |x1 + y1 |+ |x2 + y2 |d ) d(x, y) = |x1 − y1 | − |x2 − y2 |e ) d(x, y) = min

{|x1 − y1 |, |x2 − y2 |

}

Onde, x = (x1 , x2) e y = (y1 , y2).

3) Resolva, no intervalo [ 0, 1 [, as seguintes relacoes:

a ) k(x, 0) < 14

b ) k(x, 0) = 12

c ) k(x, 0) < 34

d ) k(x, 14) <

14

e ) k(x, 34) <

38

Faca um esboco geometrico de cada uma das solucoes.

4) No Bhagavad Gita∗ esta escrito: “Esta dentro e fora de todos os seres;e movente e tambem imovente; e tao sutil que e imperceptıvel; esta perto eao mesmo tempo distante.” (Bhagavad Gita-XIII-16)

Utilize as metricas µ e k para justificar essa ultima afirmativa. (p. 19)

5) Em que condicoes a tres metricas do R2 fornecem a mesma distancia?Isto e, resolva as equacoes:

D1(x, y) = D2(x, y) = D3(x, y)

∗ ∗ ∗Na geometria a circunferencia e definida como o lugar geometrico dos

pontos de um plano equidistantes de um ponto dado do mesmo plano. Oponto dado recebe o nome de centro da circunferencia, e a distancia comumde todos os pontos do lugar ao centro e denominado raio.

∗Escritura do hinduısmo.

58

Page 60: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6) Encontre, e esboce, a circunferencia de centro na origem e raio 1 em cadauma das metricas do R2. Isto e, faca um esboco do conjunto de pontos:

C((0, 0); 1

)={(x, y) ∈ R2 : Di

((x, y), (0, 0)

)= 1}

para i = 1, 2, 3.

Sugestao: No caso da metrica D3 podera ser util a seguinte equacao:

max{a, b} = a+ b+ |a− b|2

valida para a e b reais, como e facil provar.A tıtulo de curiosidade observe que |x| + |y| +

∣∣|x| − |y|

∣∣ = 2 e uma

equacao cartesiana (euclidiana) para o quadrado de lado 2.Faca um esboco geometrico dessa equacao.

7) Prove que cada uma das circunferencias obtidas no exercıcio anterior naoe uma circunferencia em cada uma das outras duas metricas.

8) Encontre a circunferencia de centro em p = 111 1 e raio r = 3 em cadaum dos espacos metricos (Z4, σ), (Z4, ρ) e (Z4, τ).

9) Encontre a circunferencia de centro em p = 0 e raio r = 34 no espaco

([ 0, 1 [, k

).

10) Encontre a circunferencia de centro em p = 14 e raio r = 1

5 no espaco([ 0, 1 [, k

).

11) (CESCEM - 71) Define-se a distancia entre duas matrizes A = ( aij ) eB = ( bij ) quadradas e de mesma ordem n pela formula:

d(A, B) = max |aij − bij |, i, j = 1, 2, 3, . . . , n.

Assim a distancia entre as matrizes

[1 23 4

]

e

[5 76 8

]

e :

a ) − 5 b ) − 3 c ) 0 d ) 3 e ) 5

12) Os livros texto apresentam a seguinte formula

d(A, B) =

m∑

i=1

n∑

j=1

(aij − bij )2

1/2

para o calculo da distancia entre as matrizes A = ( aij ) e B = ( bij ),retangulares de ordem m × n. Esta equacao e conhecida como distanciaeuclidiana. Calcule a distancia entre as matrizes

A =

[2 1 33 0 2

]

e B =

[0 2 13 4 5

]

59

Page 61: Gentil Lopes - Espaços Métricos

13) Mostre que a formula dada no exercıcio anterior conduz ao mesmo re-sultado que a formula (1.7) (p. 25), obtida a partir do nosso artifıcio.

14) A equacao (1.10) (p. 25) nos permite transferir uma matriz para umvetor, conforme exemplificado. A aplicacao definida abaixo,

f : N× { 1, 2, . . . , N } N

( i, j ) N (i−1)+j

onde N e um natural arbitrariamente fixado, e inversıvel. Mostre que suainversa e dada por

f−1 : N N× { 1, 2, . . . , N }n ( i, j )

com i e j dados por

i =⌊n−1N

⌋+ 1

j = n−N⌊n−1N

15) Calcule a distancia entre as funcoes

f, g : [−1, 1 ] −→ R

dadas por f(x) = |x| e g(x) = x2, nos espacos(C[a, b], Γ

)e(C[a, b], Υ

).

Em cada caso faca um esboco geometrico das respectivas distancias.

16) Calcule a distancia entre as funcoes

f, g : [ 0, 2π ] −→ R

dadas por f(x) = sinx e g(x) = cos x, nos espacos(C[a, b], Γ

)e(C[a, b], Υ

).

Em cada caso faca um esboco geometrico das respectivas distancias.

17) Consultando a Tabela ASCII (p. 34) calcule as seguintes distancias entreos caracteres do teclado de um computador:

a ) σ(A, D), σ(>, +), σ(#, %).

b ) ρ(A, D), ρ(>, +), ρ(#, %).

c ) τ(A, D), τ(>, +), τ(#, %).

18) Encontre a maior distancia que cada uma das metricas σ, ρ e τ podeassumir em Z4.

19) Encontre a maior distancia que cada uma das metricas σ, ρ e τ podeassumir em ZN .

20) Prove que a equacao (1.13) (p. 39) de fato gera os codigos em ZN .

60

Page 62: Gentil Lopes - Espaços Métricos

21) Considere M = R, calcule:

a ) d(p, Q), ∀ p ∈ R, no espaco (R, µ);

b ) d(p, Q), ∀ p ∈ R, no espaco (R, δ).

22) Considere em R a metrica usual. Justifique as seguintes desigualdades:

0 ≤ d(p, Z) ≤ 1

2, ∀ p ∈ R.

23) Seja M = [ 0, 1 [, seja X = [ 23 , 1 [⊂M e seja p = 0 ∈M .

M0 1

s0 2

31X

Prove que

d(0, X) = 2/3, no espaco([ 0, 1 [, µ

)

d(0, X) = 0, no espaco([ 0, 1 [, k

)

24) O resultado d(0, X) = 0, no exercıcio anterior, implica em que arbi-trariamente proximo da origem podemos encontrar um ponto do conjuntoX = [ 23 , 1 [. (ver lema 11, p. 609)

Para todo ε > 0 arbitrariamente fixado encontre x ∈ X satisfazendok(x, 0) < ε.

25) Seja M = R2, X = { (x, y) ∈ R2 : 3x + 4y − 12 = 0 } e p = (5, 4).Calcule, pela definicao, a distancia do ponto p ao conjunto X, nas tresmetricas do R2. Ademais, determine, em cada caso, o ponto q de X para oqual a distancia se verifica. Faca um esboco geometrico.

x

y

p p p p p p1 2 3 4 5 6

pp

pp

1

2

3

4

0

X

sp=(5, 4)

61

Page 63: Gentil Lopes - Espaços Métricos

26) Considere M = R, calcule:

a ) D(Q, R−Q), no espaco (R, µ);

b ) D(Q, R−Q), no espaco (R, δ).

27) Seja M = [ 0, 1 [, considere X = [ 0, 13 ] e Y = [ 23 , 1 [.

M0 1

0 13

23

1X Y

Prove que

D(X, Y ) = 1/3, no espaco([ 0, 1 [, µ

)

D(X, Y ) = 0, no espaco([ 0, 1 [, k

)

28) Com relacao ao exercıcio anterior, para todo ε > 0 arbitrariamente fixa-do encontre y ∈ Y satisfazendo d(y, X) < ε. (metrica k)

29) Calcule o diametro do quadrado unitario [ 0, 1 ]× [ 0, 1 ] para cada umadas metricas do R2. Indique, em cada caso, dois pontos do quadrado cujadistancia (entre esses pontos) seja o diametro.

30) Considere D o disco unitario do exemplo dado a pagina 56, mostre que

diam(D) = 2√2, na metrica D2 ,

diam(D) = 2, na metrica D3 .

31) Seja (M, d) um espaco metrico. Mostre que tambem sao metricas sobreM as funcoes definidas assim:

a ) d1(x, y) = min{ 1, d(x, y) };

b ) d2(x, y) =√

d(x, y);

c ) d3(x, y) =d(x, y)

1 + d(x, y).

32) Considere o espaco (R, µ). A partir deste obtemos o espaco (R, d3),onde

d3(x, y) =d(x, y)

1 + d(x, y)=

|x− y|1 + |x− y|

Mostre que em relacao a essa metrica o diametro de R e igual a 1.

33) Seja f : R −→ R uma funcao estritamente crescente; defina d : R×R −→R por d(x, y) = |f(x)− f(y)|, prove que d e uma metrica sobre R.

62

Page 64: Gentil Lopes - Espaços Métricos

34) Mostre que e uma metrica sobre ZN a funcao dada por

τ ′(x, y) =

1

min{i : xi 6= yi

} , se x 6= y;

0, se x 6= y.

35) Seja M = { ai : i ∈ N } um conjunto enumeravel tal que, i 6= j implicaai 6= aj . Prove que d : M ×M −→ R dada por

d(ai , aj ) =

1

i+ 1+

1

j + 1, se i 6= j;

0, se i = j.

e uma metrica sobre M .

36) Seja M = { 0, 2, 4, 6, 8, . . . } o conjunto dos pares. Mostre que

d(2, 4) ≤ d(2, 0) + d(0, 4)

para a metrica do exercıcio anterior.

37) Mostre que a formula para gerar os codigos binarios tambem pode serescrita assim: (eq. (1.13), p. 39)

xij =

1, se( i−12j−1

)e ımpar;

0, se( i−12j−1

)e par.

Estamos assumindo que

(m

n

)

=

m!

n! (m− n)! , se m ≥ n;

0 , se m < n.

38) A conhecida formula da analise combinatoria(nr

)= n !

r! (n−r)! nos forneceo numero de combinacoes dos n elementos de um conjunto, tomados r a r.Mas esta formula nao nos fornece as tais combinacoes.

Prove que a formula (1.13) serve a esse proposito. (p. 39)

Sugestao: Para n = 4, por exemplo, na tabela da pagina 36, convencioneque onde ocorre 1 o elemento entra na combinacao e que onde ocorre 0, naoentra. A prova devera ser feita para n arbitrario.

63

Page 65: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Apendice: Demonstracoes

1. Vamos provar que([ 0, 1 [, k

)e um espaco metrico. (p. 17)

Teorema 1 (Metrica Quantica). A aplicacao,

k : [ 0, 1 [×[ 0, 1 [−→ R

definida pork(x, y) = min

{|x− y|, 1− |x− y|

}

e uma metrica sobre M = [ 0, 1 [.

Prova: (M1) k(x, y) ≥ 0 e k(x, y) = 0 ⇐⇒ x = y ;

Temos

0 ≤ x < 1

0 ≤ y < 1⇒

0 ≤ x < 1

−1 < −y ≤ 0⇒ −1 < x−y < 1⇒ |x−y| < 1.

Sendo assim mostramos que k(x, y) ≥ 0.

Agora suponhamos,

k(x, y) = min{|x− y|, 1− |x− y|

}= 0

Ja vimos que |x−y| < 1, isto e, 1−|x−y| > 0. Entao se k(x, y) = 0so pode ser porque |x− y| = 0, isto e, x = y.

Reciprocamente, se x = y, resulta,

k(x, y) = min{|x− y|, 1− |x− y|

}= min

{|0|, 1− |0|

}= 0.

(M2) k(x, y) = k(y, x) ;

Temos

k(x, y) = min{|x−y|, 1−|x−y|

}= min

{|y−x|, 1−|y−x|

}= k(y, x).

(M3) k(x, y) ≤ k(x, z) + k(z, y).

Devemos mostrar que k(x, y) ≤ k(x, z) + k(z, y). Isto e,

min{|x− y|, 1− |x− y|

}≤ min

{|x− z|, 1− |x− z|

}(1.16)

+ min{|z − y|, 1− |z − y|

}

Vamos separar o nosso problema em oito possibilidades, conformetabela a seguir,

64

Page 66: Gentil Lopes - Espaços Métricos

k(x, y) k(x,z) k(z,y)

(P1)

(P2)

(P3)

(P4)

(P5)

(P6)

(P7)

(P8)

|x−y|

1−|x−y||x−y|1−|x−y|

|x−y|1−|x−y||x−y|

1−|x−y|

|x−z|

|x−z|1−|x−z|1−|x−z|

|x−z||x−z|1−|x−z|

1−|x−z|

|z−y|

|z−y||z−y||z−y|

1−|z−y|1−|z−y|1−|z−y|

1−|z−y|

Temos:

|x−y|≤ 1−|x−y| ⇔ |x−y| ≤ 12

1−|x−y| ≤ |x−y| ⇔ |x−y| ≥ 12

|x−z|≤ 1−|x−z| ⇔ |x−z|≤ 12

1−|x−z|≤ |x−z| ⇔ |x−z|≥ 12

|z−y|≤ 1−|z−y| ⇔ |z−y| ≤ 12

1−|z−y|≤ |z−y| ⇔ |z−y| ≥ 12

Entao:

(P1) Neste caso a desigualdade (1.16) reduz-se a

|x− y| ≤ |x− z|+ |z − y|

a qual e trivialmente satisfeita por tratar-se da desigualdade triangularpara numeros reais.

(P2) Neste caso a desigualdade (1.16) reduz-se a

1− |x− y| ≤ |x− z|+ |z − y|

Vamos mostrar a desigualdade equivalente

|x− y|+ |x− z|+ |z − y| ≥ 1 (1.17)

Observe que na possibilidade (P2) se verifica |x− y| ≥ 12 (∗).

Inicialmente vamos mostrar que nao podemos ter

|x− z|+ |z − y| < 1

2

De fato, se isto fosse possıvel teriamos (utilizando a desigualdadetriangular)

|x− y| ≤ |x− z|+ |z − y| < 1

2

contradizendo (∗). Sendo assim so pode ser |x− z|+ |z− y| ≥ 12 o que,

juntamente com (∗), nos fornece a desigualdade (1.17).

(P3) Neste caso a desigualdade (1.16) reduz-se a

|x− y| ≤ 1− |x− z|+ |z − y|

65

Page 67: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vamos mostrar a desigualdade equivalente

|x− y|+ |x− z| − |z − y| ≤ 1 (1.18)

Pois bem, pela desigualdade triangular podemos escrever

|x− z| ≤ |x− y|+ |y − z| ⇐⇒ |x− z| − |z − y| ≤ |x− y|

somando |x−y| a ambos os membros desta ultima desigualdade, obte-mos

|x−y|+|x−z|−|z−y| ≤ |x−y|+|x−y| ⇐⇒ |x−y|+|x−z|−|z−y| ≤ 2|x−y| ≤ 1.

Na ultima desigualdade usamos o fato de que na possibilidade (P3) severifica |x− y| ≤ 1

2 .

(P4) Neste caso a desigualdade (1.16) reduz-se a

1− |x− y| ≤ 1− |x− z|+ |z − y|

Esta desigualdade e equivalente a seguinte

|x− z| ≤ |x− y|+ |y − z|

a qual e sempre verdadeira por tratar-se da desigualdade triangularpara numeros reais.

(P5) Neste caso a desigualdade (1.16) reduz-se a

|x− y| ≤ |x− z|+ 1− |z − y|

Vamos mostrar a desigualdade equivalente

|x− y|+ |z − y| − |x− z| ≤ 1 (1.19)

Pois bem, pela desigualdade triangular podemos escrever

|z − y| ≤ |z − x|+ |x− y| ⇐⇒ |z − y| − |x− z| ≤ |x− y|

somando |x−y| a ambos os membros desta ultima desigualdade, obte-mos

|x−y|+|z−y|−|x−z| ≤ |x−y|+|x−y| ⇐⇒ |x−y|+|z−y|−|x−z| ≤ 2|x−y| ≤ 1.

Na ultima desigualdade usamos o fato de que na possibilidade (P5) severifica |x− y| ≤ 1

2 .

(P6) Neste caso a desigualdade (1.16) reduz-se a

1− |x− y| ≤ |x− z|+ 1− |z − y|

66

Page 68: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Esta desigualdade e equivalente a seguinte

|z − y| ≤ |z − x|+ |x− y|a qual e sempre verdadeira por tratar-se da desigualdade triangularpara numeros reais.

(P7) Neste caso a desigualdade (1.16) reduz-se a

|x− y| ≤ 1− |x− z|+ 1− |z − y|Vamos mostrar a desigualdade equivalente

|x− y|+ |x− z|+ |z − y| ≤ 2 (1.20)

Na possibilidade (P7) se verifica:

(i) |x− y| ≤ 1

2(ii) |x− z| ≥ 1

2(iii) |z − y| ≥ 1

2.

Se dividirmos o intervalo [ 0, 1 [ ao meio; por (ii) vemos que x e znao podem figurar na mesma metade do intervalo∗. Por (iii) aconteceo mesmo com respeito a z e y. Devemos ter a seguinte configuracao:

⊢ ⊢0 1

21

t t ty x z

A partir de (1.20) podemos escrever f(x, y, z) = |x−y|+|x−z|+|z−y|.Vamos mostrar que o maior valor que esta funcao pode assumir naoexcede 2. Tendo em conta a figura anterior temos que,

|x− y| = x− y, |x− z| = z − x, |z − y| = z − yNao faz mal supor x a direita de y. Logo, f(x, y, z) = 2(z− y), entao,{

0 ≤ y ≤ 12

12 ≤ z < 1

⇒ −1

2≤ −y ≤ 0 ⇒ 0 ≤ z−y < 1 ⇒ 0 ≤ 2(z−y) < 2.

Daqui inferimos que f(x, y, z) = |x − y| + |x − z| + |z − y| =2(z− y) < 2, donde concluimos que a desigualdade (1.20) sera sempreverdadeira.

(P8) Neste caso a desigualdade triangular k(x, y) ≤ k(x, z) + k(z, y)estara satisfeita por vacuidade ; o que significa que ela jamais poderaser contraditada. Com efeito, nunca encontraremos tres pontos x, ye z, no intervalo [ 0, 1 [, satisfazendo simultaneamente:

(i) |x− y| ≥ 1

2(ii) |x− z| ≥ 1

2(iii) |z − y| ≥ 1

2.

∗Exceto nos casos triviais x = y = 0 e z = 1/2, ou z = 0 e x = y = 1/2.

67

Page 69: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2.(Rn, D1

)e um espaco metrico.

Vamos mostrar que

D1

((x1 , . . . , xn); (y1 , . . . , yn)

)=√

(x1 − y1)2 + · · ·+ (xn − yn)2,

e uma metrica sobre Rn.(M1) : Claramente D1(x, y) ≥ 0. Tambem

D1

((x1 , . . . , xn); (y1 , . . . , yn)

)= 0, ⇔

(x1 − y1)2 + · · ·+ (xn − yn)2 = 0, ⇔

(x1 − y1)2 + · · ·+ (xn − yn)2 = 0, ⇔

(xi − yi)2 = 0 (1 ≤ i ≤ n), ⇔xi = yi (1 ≤ i ≤ n), ⇔

(x1 , . . . , xn) = (y1 , . . . , yn).

(M2) :

D1

((x1 , . . . , xn); (y1 , . . . , yn)

)=√

(x1 − y1)2 + · · ·+ (xn − yn)2

=√

(y1 − x1)2 + · · ·+ (yn − xn)

2

= D1

((y1 , . . . , yn); (x1 , . . . , xn)

)

(M3) : Para demonstrar a desigualdade triangular devemos, antes,estabelecer a desigualdade de Cauchy-Schwarz no Rn cujo enunciadoe o seguinte:

Se x1 , . . . , xn e y1 , . . . , yn sao numeros reais arbitrarios, entao

n∑

i=1

∣∣xiyi

∣∣ ≤

(n∑

i=1

x2i

)1/2

·(

n∑

i=1

y2i

)1/2

(1.21)

De fato, consideremos a desigualdade

(r − s)2 = r2 − 2rs+ s2 ≥ 0 ⇔ 2rs ≤ r2 + s2,

valida para quaisquer r, s ∈ R. Sendo assim, se fizermos

p =√

x21+ · · · + x2

ne q =

y21+ · · ·+ y2

n

sao verdadeiras as desigualdades

2 · |xi |p· |yi |q≤ x2

i

p2+y2i

q2(1 ≤ i ≤ n)

68

Page 70: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Somando em relacao ao ındice i teremos

2

p · q∑

|xiyi | ≤ 1 + 1

logo∑

|xiyi | ≤ p · q =√

x21+ · · ·+ x2

n·√

y21+ · · ·+ y2

n

que e a desigualdade de Cauchy-Schwarz.Agora estamos habilitados a demonstrar a desigualdade triangular.Sejam x =

(x1 , . . . , xn

), y =

(y1 , . . . , yn

)e z =

(z1 , . . . , zn

)

pontos do Rn. Entao:

[

D1

(x, y

)]2=

n∑

i=1

(xi − yi

)2=

n∑

i=1

(xi − zi + zi − yi

)2

=

n∑

i=1

(xi − zi

)2+ 2

n∑

i=1

(xi − zi

)(zi − yi

)+

n∑

i=1

(zi − yi

)2

≤n∑

i=1

(xi − zi

)2+ 2[ n∑

i=1

(xi − zi

)2]1/2·[ n∑

i=1

(zi − yi

)2]1/2

+n∑

i=1

(zi − yi

)2

=

√√√√

n∑

i=1

(xi − zi

)2+

√√√√

n∑

i=1

(zi − yi

)2

2

=[D1(x, z) +D1(z, y)

]2

Por conseguinte: D1(x, y) ≤ D1(x, z) +D1(z, y).

3.(Rn, D2

)e um espaco metrico. Vamos mostrar que

D2

((x1 , . . . , xn); (y1 , . . . , yn)

)= |x1 − y1 |+ · · ·+ |xn − yn |

e uma metrica sobre Rn.

(M1) : Claramente D2(x, y) ≥ 0. Tambem

D2

((x1 , . . . , xn); (y1 , . . . , yn)

)= 0, ⇔

|x1 − y1 |+ · · ·+ |xn − yn | = 0, ⇔|x1 − y1 | = 0, . . . , |xn − yn | = 0, ⇔

|xi − yi | = 0 (1 ≤ i ≤ n), ⇔xi = yi (1 ≤ i ≤ n), ⇔

(x1 , . . . , xn) = (y1 , . . . , yn).

69

Page 71: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(M2) :

D2

((x1 , . . . , xn); (y1 , . . . , yn)

)= |x1 − y1 |+ · · ·+ |xn − yn |= |y1 − x1 |+ · · ·+ |yn − xn |= D2

((y1 , . . . , yn); (x1 , . . . , xn)

)

(M3) : Sejam x =(x1 , . . . , xn

), y =

(y1 , . . . , yn

)e z =

(z1 , . . . , zn

)

pontos do Rn.

Devemos mostrar que

D2

(x, y

)≤ D2

(x, z

)+D2

(z, y

)

Ou ainda

|x1 − y1 |+ · · · + |xn − yn | ≤ |x1 − z1 |+ · · ·+ |xn − zn |+ |z1 − y1 |+ · · ·+ |zn − yn |

Temos

x1 − y1 = x1 − z1 + z1 − y1. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

xn − yn = xn − zn + zn − yndestas igualdades decorrem

|x1 − y1 | ≤ |x1 − z1 |+ |z1 − y1 |. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

|xn − yn | ≤ |xn − zn |+ |zn − yn |Somando estas n desigualdades decorre o resultado desejado. Por con-seguinte: D2(x, y) ≤ D2(x, z) +D2(z, y).

4.(Rn, D3

)e um espaco metrico. Vamos mostrar que

D3

((x1 , . . . , xn); (y1 , . . . , yn)

)= max

{|x1 − y1 |, . . . , |xn − yn |

}

e uma metrica sobre Rn.

(M1) : Claramente D3(x, y) ≥ 0. Tambem

D3

((x1 , . . . , xn); (y1 , . . . , yn)

)= 0, ⇔

max{|x1 − y1 |, . . . , |xn − yn |

}= 0, ⇔

|x1 − y1 | = 0, . . . , |xn − yn | = 0, ⇔|xi − yi | = 0 (1 ≤ i ≤ n), ⇔

xi = yi (1 ≤ i ≤ n), ⇔(x1 , . . . , xn) = (y1 , . . . , yn).

70

Page 72: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(M2) :

D2

((x1 , . . . , xn); (y1 , . . . , yn)

)= max{|x1 − y1 |, . . . , |xn − yn |

}

= max{|y1 − x1 |, . . . , |yn − xn |

}

= D3

((y1 , . . . , yn); (x1 , . . . , xn)

)

(M3) : Sejam x =(x1 , . . . , xn

), y =

(y1 , . . . , yn

)e z =

(z1 , . . . , zn

)

pontos do Rn.

Devemos mostrar que

D3

(x, y

)≤ D3

(x, z

)+D3

(z, y

)

Ou ainda

max{|x1 − y1 |, . . . , |xn − yn |

}≤ max

{|x1 − z1 |, . . . , |xn − zn |

}

+max{|z1 − y1 |, . . . , |zn − yn |

}

Observe que

max{ |x1 − y1 |, ..., |xn − yn | }= |xi − yi |, para algum 1≤ i≤n; (1.22)

max{ |x1 − z1 |, ..., |xn − zn | }= |xj − zj |, para algum 1≤ j≤n; (1.23)

max{ |z1 − y1 |, ..., |zn − yn | }= |zk − yk |, para algum 1≤ k≤n; (1.24)

Sendo assim devemos mostrar que

|xi − yi | ≤ |xj − zj |+ |zk − yk |

Temos

por (1.23) ⇒ |xi − zi | ≤ |xj − zj |

por (1.24) ⇒ |zi − yi | ≤ |zk − yk |

Sendo assim, resulta

|xi − yi | ≤ |xi − zi |+ |zi − yi |

≤ |xj − zj |+ |zk − yk |

Por conseguinte: D3(x, y) ≤ D3(x, z) +D3(z, y).

71

Page 73: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Relacoes entre as metricas do Rn

As metricas D1 , D2 e D3 , guardam entre si as seguintes relacoes:

D3(x, y) ≤ D1(x, y) ≤ D2(x, y) ≤ nD3(x, y)

De fato,

D3(x, y) = |xr − yr | para algum r (1 ≤ r ≤ n)

LogoD3(x, y) = |xr − yr | =

(xr − yr)2 ≤ D1(x, y)

Por outro lado[

D1(x, y)]2

= (x1 − y1)2 + · · ·+ (xn − yn)2

≤ |x1 − y1 |2 + · · ·+ |xn − yn |2

+ 2|x1 − y1 | · |x2 − y2 |+ · · ·+ 2|xn−1 − yn−1 | · |xn − yn |

=(|x1 − y1 |+ · · · + |xn − yn |

)2

=[

D2(x, y)]2

Portanto, D1(x, y) ≤ D2(x, y). Finalmente, supondo

|xr − yr | = max{|x1 − y1 |, . . . , |xn − yn |

}

entao|x1 − y1 | ≤ |xr − yr |, . . . , |xn − yn | ≤ |xr − yr |

portanto

D2(x, y) = |x1 − y1 |+ · · · + |xn − yn | ≤ n |xr − yr | = nD3(x, y).

5.(C[a, b], Γ

)e um espaco metrico.

(M1) d(x, y) ≥ 0 e d(x, y) = 0 ⇐⇒ x = y;

(M2) d(x, y) = d(y, x);

(M3) d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y).

(M1) : Temos Γ(f, g) ≥ 0.

De fato, como |f(x)− g(x)| ≥ 0, para todo x ∈ [a, b], temos:

∫ b

a|f(x)− g(x)| dx ≥ 0

(Ver teorema [AR]8, p. 604)

72

Page 74: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(M1) : Γ(f, g) = 0 ⇒ f = g.Suponha f 6= g, isto e, f(c) 6= g(c) para algum c ∈ [a, b]. Logo

|f(x)− g(x)| > 0, entao:

∫ b

a|f(x)− g(x)| dx > 0 ⇒ Γ(f, g) 6= 0

(Ver teorema [AR]9, p. 604)

Nota: Observe (hipotese do teorema [AR]9) a necessidade de f e g seremcontınuas. (M1) : f = g ⇒ Γ(f, g) = 0. Entao,

f = g ⇒ f(x) = g(x), ∀x ∈ [a, b]

logo, pelo teorema [AR]2 (p. 603):

If =

Ig ⇒

I

(f − g

)= 0

⇒ Γ(f, g) = 0.

Nota: Observe (hipotese do teorema [AR]2) que nao necessitamos da con-tinuidade de f e g, e nem de que sejam iguais em todos os pontos dointervalo.

(M2) : Temos Γ(f, g) = Γ(g, f).

De fato, isto e uma decorrencia imediata da igualdade

|f(x)− g(x)| = |g(x)− f(x)|.

(M3) : Temos Γ(f, g) ≤ Γ(f, h) + Γ(h, g).

De fato, isto e facil de provar tendo em conta que

f(x)− g(x) = f(x)− h(x) + h(x) − g(x)

logo,

|f(x)− g(x)| = |(f(x)− h(x)

)+(h(x) − g(x)

)|

≤ |f(x)− h(x)| + |h(x)− g(x)|

uma vez que f(x), g(x) e h(x) sao numeros reais. Sendo assim:

∫ b

a|f(x)− g(x)| dx ≤

∫ b

a|f(x)− h(x)| dx +

∫ b

a|h(x) − g(x)| dx

(Ver teorema [AR]8, p. 604)

73

Page 75: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6.(C[a, b], Υ

)e um espaco metrico.

(M1) : Nao apresenta dificuldade.(M2) : ıdem.(M3) : Devemos mostrar que

maxx∈ [ a, b ]

|f(x)− g(x)| ≤ maxx∈ [ a, b ]

|f(x)− h(x)| + maxx∈ [ a, b ]

|h(x) − g(x)|

Prova: Pelo teorema [AR]1 (p. 603):

∃x1 ∈ [ a, b ] : maxx∈ [ a, b ]

|f(x)− g(x)| = |f(x1)− g(x1)| (1.25)

∃x2 ∈ [ a, b ] : maxx∈ [ a, b ]

|f(x)− h(x)| = |f(x2)− h(x2)| (1.26)

∃x3 ∈ [ a, b ] : maxx∈ [ a, b ]

|h(x) − g(x)| = |h(x3)− g(x3)| (1.27)

sendo assim devemos mostrar que

|f(x1)− g(x1)| ≤ |f(x2)− h(x2)|+ |h(x3)− g(x3)|

De (1.26) temos

|f(x1)− h(x1)| ≤ |f(x2)− h(x2)| (1.28)

De (1.27) temos

|h(x1)− g(x1)| ≤ |h(x3)− g(x3)| (1.29)

Por outro lado, temos

|f(x1)− g(x1)| = |f(x1)− h(x1) + h(x1)− g(x1)|≤ |f(x1)− h(x1)|+ |h(x1)− g(x1)|

De (1.28) e (1.29) resulta:

|f(x1)− g(x1)| ≤ |f(x2)− h(x2)|+ |h(x3)− g(x3)|

7.(B(X,R), Ψ

)e um espaco metrico.

(M1) : Nao apresenta dificuldade.(M2) : ıdem.(M3) : Devemos mostrar que

supx∈X

|f(x)− g(x)| ≤ supx∈X

|f(x)− h(x)|+ supx∈X

|h(x)− g(x)|

74

Page 76: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Como f , g e h sao limitadas, existem M , N e P constantespositivas tais que

|f(x)− g(x)| ≤M , ∀x ∈ X.

|f(x)− h(x)| ≤ N , ∀x ∈ X.

|h(x) − g(x)| ≤ P , ∀x ∈ X.

Antes vamos provar a seguinte proposicao:

Se |f(x)− g(x)| ≤M , ∀x∈X entao supx∈X

|f(x) − g(x)| ≤ M. (1.30)

De fato, suponha, ao contrario, que L = supx∈X

|f(x)− g(x)| > M .

Tomemos ε = L−M > 0, pela definicao de sup (ver Lema 10, p. 606)

existe x0 ∈ X de modo que L− ε < |f(x0)− g(x0)| , isto e,

L− (L−M) < |f(x0)− g(x0)| ⇒ M < |f(x0)− g(x0)|

o que contraria a hipotese.

Pois bem, temos

|f(x)− g(x)| = |f(x)− h(x) + h(x) − g(x)|

< |f(x)− h(x)| + |h(x)− g(x)|

Mas,

|f(x)− h(x)| ≤ sup{|f(x)− h(x)| : x ∈ X

}

|h(x)− g(x)| ≤ sup{|h(x)− g(x)| : x ∈ X

}

logo,

|f(x)− g(x)| < supx∈X

|f(x)− h(x)|︸ ︷︷ ︸

constante

+ supx∈X

|h(x) − g(x)|︸ ︷︷ ︸

constante

Por (1.30), resulta

supx∈X

|f(x)− g(x)| ≤ supx∈X

|f(x)− h(x)| + supx∈X

|h(x) − g(x)|

Nota: Esta prova e igualmente valida para o espaco(C[ a, b ], Υ

).

75

Page 77: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Espacos de Codigos

• (Z4, ρ) e um espaco metrico (p. 40) :

(M1) d(x, y) ≥ 0 e d(x, y) = 0 ⇐⇒ x = y :

Obviamente ρ(x, y) ≥ 0. Se x = y entao xi = yi (i = 1, 2, 3, 4) e istoimplica ρ(x, y) = 0.

Se ρ(x, y) = 0 entao∣∣∣∣∣

4∑

i=1

2i−1 · (xi − yi)∣∣∣∣∣= 0 ⇒

4∑

i=1

2i−1 · (xi − yi) = 0.

isto e

1 · (x1 − y1) + 2 · (x2 − y2) + 4 · (x3 − y3) + 8 · (x4 − y4) = 0

Se fosse x1 6= y1 terıamos 1 · (x1 − y1) = ±1. O que nos levaria a

2 · (x2 − y2) + 4 · (x3 − y3) + 8 · (x4 − y4) = ∓1o que e, evidentemente, impossıvel. Portanto nos resta

2 · (x2 − y2) + 4 · (x3 − y3) + 8 · (x4 − y4) = 0

Dividindo esta equacao por 2, temos

1 · (x2 − y2) + 2 · (x3 − y3) + 4 · (x4 − y4) = 0

e o raciocınio se repete. Conclusao x = y. (M2) d(x, y) = d(y, x) :

ρ(x, y) =

∣∣∣∣∣

4∑

i=1

2i−1 · (xi − yi)∣∣∣∣∣

=

∣∣∣∣∣

4∑

i=1

2i−1 · (−1)(yi − xi)

∣∣∣∣∣

=

∣∣∣∣∣

4∑

i=1

2i−1 · (yi − xi)

∣∣∣∣∣= ρ(y, x)

(M3) d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y)Finalmente mostremos que ρ(x, y) ≤ ρ(x, z) + ρ(z, y). Entao

20(x1 − y1) + · · ·+ 23(x4 − y4) = 20(x1 − z1 + z1 − y1)

+ 21(x2 − z2 + z2 − y2)

+ 22(x3 − z3 + z3 − y3)

+ 23(x4 − z4 + z4 − y4).

76

Page 78: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Aplicando o modulo nesta equacao e usando a desigualdade triangular paranumeros reais, temos

∣∣20(x1 − y1) + · · · + 23(x4 − y4)

∣∣ =

∣∣∣20(x1 − z1 + z1 − y1) + · · ·

+ 23(x4 − z4 + z4 − y4)∣∣∣

=∣∣∣20(x1 − z1) + · · ·+ 23(x4 − z4)

+ 20(z1 − y1) + · · ·+ 23(z4 − y4)∣∣∣

≤∣∣∣20(x1 − z1) + · · ·+ 23(x4 − z4)

∣∣∣

+∣∣∣20(z1 − y1) + · · ·+ 23(z4 − y4)

∣∣∣.

Conclusao: ρ(x, y) ≤ ρ(x, z) + ρ(z, y).

A metrica ρ pode facilmente ser generalizada para ZN :

ρ(x, y) =

∣∣∣∣∣

N∑

i=1

2i−1 · (xi − yi)∣∣∣∣∣.

Vamos mostrar que ρ(x, y), assim definida, satisfaz a desigualdade

ρ(x, y) ≤ 2N − 1, ∀x, y ∈ ZN .

De fato, o maior valor que ρ(x, y) assume ocorre quando xi−yi = 1 (i =1, 2, . . . , N) − que corresponde a distancia entre os pontos x = 111 . . . 1

e y = 000 . . . 0 − Sendo assim temos 20+21+· · ·+2N−1 = 1·2N−12−1 = 2N−1.

• (p. 41) τ satisfaz a desigualdade triangular.

Das condicoes envolvidas na definicao de metrica mostraremos

(M3) d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y).

Prova: Primeiramente observe que τ pode ser escrita assim:

τ(x, y) = max{1 · |x1 − y1 |, 2 · |x2 − y2 |, . . . , n · |xn − yn |

}(1.31)

Pois bem, existem ındices i, j, k ∈ {1, 2, . . . , n} tais que

τ(x, y) = max{1 · |x1 − y1 |, . . . , n · |xn − yn |

}= i · |xi − yi | (1.32)

τ(x, z) = max{1 · |x1 − z1 |, . . . , n · |xn − zn |

}= j · |xj − zj | (1.33)

τ(z, y) = max{1 · |z1 − y1 |, . . . , n · |zn − yn |

}= k · |z

k− y

k| (1.34)

77

Page 79: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Sendo assim, devemos mostrar que

i · |xi − yi | ≤ j · |xj − zj |+ k · |zk− y

k| (1.35)

Temos

i · |xi − zi | ≤ j · |xj − zj |, por (1.33)

i · |zi − yi | ≤ k · |zk − yk |, por (1.34)

Pela desigualdade triangular para numeros reais, podemos escrever

|xi − yi | ≤ |xi − zi |+ |zi − yi |Portanto (O que prova (1.35) )

i · |xi − yi | ≤ i · |xi − zi |+ i · |zi − yi |≤ j · |xj − zj |+ k · |z

k− y

k|

Metodos dos Multiplicadores de Lagrange

Um metodo∗ para obter o maximo ou mınimo relativos de uma funcaoF (x, y, z) sujeita a condicao de vınculo φ(x, y, z) = 0 consiste na formacaoda funcao auxiliar G(x, y, z) ≡ F (x, y, z)+λφ(x, y, z), sujeita as condicoes

∂ G

∂ x=

∂ G

∂ y=

∂ G

∂ z= 0

que sao as condicoes necessarias para a existencia de maximo e mınimorelativos. O parametro λ, que e independente de x, y e z, chama-se multi-plicador de Lagrange.

Exemplo: Minimizar a funcao F (x, y) = (x − 5)2 + (y − 4)2 sujeita arestricao φ(x, y) = 3x+ 4y − 12 = 0. (exer. p. 61)

Solucao: Formemos a funcao auxiliar

G(x, y) = F (x, y) + λφ(x, y)

= (x− 5)2 + (y − 4)2 + λ (3x+ 4y − 12)

Entao

Gx(x, y) = 2(x− 5) + 3λ = 0

Gy(x, y) = 2(y − 4) + 4λ = 0

Eliminando o parametro λ destas equacoes chegamos 4x − 3y − 8 = 0.Juntando esta equacao com a restricao obtemos

{

3x + 4y = 12

4x − 3y = 8

Resolvendo esse sistema encontramos x = 6825 .

∗Devido ao matematico frances Jose Luis Lagrange (1736-1813)

78

Page 80: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Capıtulo 2CONSTRUCAO DE ESPACOS

METRICOS

O oposto de uma verdade e mentira,

mas o oposto de uma verdade profunda

pode muito bem ser outra verdade pro-

funda. (Niels Bohr)

Introducao

O objetivo precıpuo deste capıtulo e fornecer algumas tecnicas para aconstrucao de novos espacos metricos.

2.1 Metricas a Partir de Metricas

Mudanca de Escala

Dado um espaco metrico (M, d) a partir deste podemos obter um outroespaco (M, d′) tomando d′ = α d onde α e um numero real positivo.

Para que d′ seja de fato uma metrica, as seguintes condicoes devem sersatisfeitas:

(M1) d′(x, y) ≥ 0 e d′(x, y) = 0 ⇐⇒ x = y ;

(M2) d′(x, y) = d′(y, x) ;

(M3) d′(x, y) ≤ d′(x, z) + d′(z, y).

De fato, todas estas condicoes decorrem trivialmente da hipotese de qued e uma metrica e α > 0.

79

Page 81: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplo: Calcular a distancia entre os pontos x = 3 e y = 5 nos espacos(R, µ

)e(R, d′

), onde d′ = 1

2 µ.

Solucao: Temos

µ(5, 3) = |5− 3| = 2 e d′(5, 3) =1

2|5− 3| = 1.

Nota: Oportunamente estaremos mostrando em que sentido estas metricassao topologicamente equivalentes em R.

Manipulacoes algebricas

Dado um espaco metrico (M, d) existem muitas outras maneiras de seconstruir, a partir deste, outros espacos metricos. Para citar apenas tres:

1 ) d1(x, y) = min{ 1, d(x, y) } ;

2 ) d2(x, y) =√

d(x, y) ;

3 ) d3(x, y) =d(x, y)

1 + d(x, y).

Mostremos a primeira destas assertivas:

(M1) d1(x, y) ≥ 0 e d1(x, y) = 0 ⇐⇒ x = y.

De fato, d1(x, y) = min{ 1, d(x, y) } ≥ 0 porquanto, por hipotese, d emetrica.

d1(x, y) = 0 = min{ 1, d(x, y) } ⇔ d(x, y) = 0 ⇔ x = y.

(M2) d1(x, y) = d1(y, x).

d1(x, y) = min{ 1, d(x, y) } = min{ 1, d(y, x) } = d1(y, x)

(M3) d1(x, y) ≤ d1(x, z) + d1(z, y). Devemos mostrar que

min{ 1, d(x, y) } ≤ min{ 1, d(x, z) }+min{ 1, d(z, y) }Suponhamos o contrario:

min{ 1, d(x, y) } > min{ 1, d(x, z) }+min{ 1, d(z, y) }Em particular:

1 > min{ 1, d(x, z) }+min{ 1, d(z, y) } (⋆)

d(x, y) > min{ 1, d(x, z) }+min{ 1, d(z, y) } (⋆⋆)

Da desigualdade (⋆) concluimos que

min{ 1, d(x, z) } = d(x, z); min{ 1, d(z, y) } = d(z, y).

Levando estes resultados na desigualdade (⋆⋆) obtemos

d(x, y) > d(x, z) + d(z, y).

O que contradiz o fato de d ser uma metrica.

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Page 82: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

a ) Fixemos o espaco (R2, D2). Calcular a distancia entre os pontos x =(1, 1) e y = (4, 5) nos espacos (R2, d1), (R

2, d2) e (R2, d3).

Solucao: Temos

D2

((1, 1), (4, 5)

)= |1− 4|+ |1− 5| = 7.

Entao,

d1(x, y) = min{ 1, D2(x, y) } = min{ 1, 7 } = 1.

d2(x, y) =√

D2(x, y) =√7.

d3(x, y) =D2(x, y)

1 +D2(x, y)=

7

1 + 7=

7

8.

b ) Fixemos o espaco(Z4, σ

)(p. 37). Calcular a distancia entre os pontos

x = 1000 e y = 0100 nos espacos(Z4, d1

),(Z4, d2

)e(Z4, d3

).

Solucao: Temos σ(1000, 0100) = 2, portanto:

d1(x, y) = min{ 1, σ(x, y) } = min{ 1, 2 } = 1.

d2(x, y) =√

σ(x, y) =√2.

d3(x, y) =σ(x, y)

1 + σ(x, y)=

2

1 + 2=

2

3.

2.2 Subespacos

Dado um espaco metrico (M, d) podemos, a partir deste, obter tantosespacos quantos sao os subconjuntos (nao-vazios) deM . Se d : M×M −→ R

e uma metrica em M e N ⊂ M entao d′ = d∣∣N×N

: N ×N −→ R e metrica

em N . Em geral indica-se a metrica do subconjunto do mesmo modo que ametrica de M , isto e, faz-se d′ = d.

Definicao 6 (Subespaco). Se (M, d) e um espaco metrico e N ⊂M entaoo par (N, d) e chamado subespaco de (M, d).

(M, d)

(N, d)

A metrica do subespaco e chamada metrica induzida pela de (M, d).

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Page 83: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

a ) (N, µ), (Z, µ) e (Q, µ) sao subespacos de (R, µ).

b ) Consideremos o seguinte subconjunto do R2 :

R

R

1

1

−1

−1

S1

S1 ={(x, y) ∈ R2 : x2 + y2 = 1

}

S1 e o cırculo unitario. Sendo assim(S1, D1

),(S1, D2

)e(S1, D3

)sao subespacos

dos espacos(R2, D1

),(R2, D2

)e(R2, D3

),

respectivamente.

c ) No espaco(B(X, R), Ψ

)tomando X = [ a, b ] o espaco

(C[a, b], Υ

)

torna-se um subespaco do primeiro. (p. 32, 28)

d ) O par({

1, 12 ,

13 , . . .

}, µ)e um subespaco de (R, µ) e tambem de (Q, µ).

2.3 Espacos vetoriais

Importantes exemplos de espacos metricos podem ser obtidos a partirdos espacos vetoriais − objetos de estudos da algebra linear. Antes, a tıtulode revisao, vejamos o que seja: Um espaco vetorial nao e um conjunto massim uma estrutura, e, para construirmos uma de tais estruturas, iremos ne-cessitar de algumas ferramentas; mais precisamente de quatro ferramentas,quais sejam:

1a ) Um conjunto V ;

2a ) Um corpo∗ K;

3a ) Uma operacao, sobre os elementos de V , a qual chamaremos deadicao e denotaremos por + ; assim:

+ : V × V −→ V

(u, v) 7−→ u+ v

4a ) Uma operacao, entre um numero de K e um elemento de V , a qualchamaremos de multiplicacao por escalar e denotaremos por · ; assim:

· : K× V −→ V

(λ, u) 7−→ λ · u

Este e apenas o primeiro passo para a construcao da nossa estrutura. Umsegundo passo e que estas operacoes satisfacam alguns requisitos, a saber:

∗O leitor nao perdera nada de essencial imaginando K = Reais ou K = Complexos.

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Page 84: Gentil Lopes - Espaços Métricos

− Exigencias (axiomas) para a adicao:

Para quaisquer u, v e w, elementos de V , devemos ter:

A1) u+ v = v + u (Comutativa)

A2) (u+ v) + w = u+ (v + w) (Associativa)

A3) Existe em V um elemento, denotado por 0, detentor da seguintepropriedade:

u+ 0 = 0+ u = u; ∀u ∈ V. (Elemento neutro)

A4) Para todo elemento u de V existe um outro elemento de V , denotadopor −u, detentor da seguinte propriedade:

u+ (−u) = −u+ u = 0 (Elemento oposto)

− Exigencias (axiomas) para a multiplicacao:

Para quaisquer u e v em V e quaisquer λ e µ em K, devemos ter:

M1) λ · (µ · u ) = (λ · µ) · u (Associativa)

M2) (λ+ µ ) · u = λ · u+ µ · u (Distributiva)

M3) λ · (u+ v ) = λ · u+ λ · v (Distributiva)

M4) 1 · u = u (elemento neutro)

A tripla (V, +, · ) e o que entendemos por um espaco vetorial − supondoo corpo K fixado.

Ao construirmos uma estrutura de espaco vetorial sobre um conjuntoV , seus elementos adquirem o status de vetores, independetemente de suasnaturezas.

Nota: Na verdade, para simplificar a notacao e que, por vezes, utilizaremosV tanto para o espaco vetorial (a tripla designada acima) quanto para oconjunto subjacente a estrutura.

Por vezes tambem utilizaremos a notacao V = (V, +, · ), para enfatizarque V e a estrutura erigida sobre o conjunto V.

− Exemplos de Espacos Vetoriais

1 ) O espaco vetorial Rn. Seja o conjunto das n-uplas de numeros reais

Rn ={(x1 , x2 , . . . , xn) : xi ∈ R

}

Tomemos dois elementos u = (x1 , x2 , . . . , xn) e v = (y1 , y2 , . . . , yn)neste conjunto e um escalar λ em R e vamos definir a adicao e a multiplicacaopor escalar, assim:

u+ v = (x1 , x2 , . . . , xn) + (y1 , y2 , . . . , yn) = (x1 + y1 , x2 + y2 , . . . , xn + yn)

λu = (λx1 , λ x2 , . . . , λ xn)

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Page 85: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Nao e difıcil mostrar que a estrutura resultante,(Rn, +, ·

), e um espaco

vetorial.

2 ) O espaco vetorial Kn. O exemplo anterior ainda pode ser generalizado.Seja K um corpo arbitrario. A notacao Kn e utilizada para denotar oconjunto de todas as n-uplas de elementos de K:

Kn ={(x1 , x2 , . . . , xn) : xi ∈K

}

Dados dois pontos u = (x1 , x2 , . . . , xn) e v = (y1 , y2 , . . . , yn) nesteconjunto podemos tornar Kn um espaco vetorial sobre K com as seguintesdefinicoes:

(x1 , x2 , . . . , xn) = (y1 , y2 , . . . , yn) ⇔ x1 = y1 , x2 = y2 , . . . , xn = yn

Adicao entre pontos e multiplicacao por escalar, assim:

u+ v = (x1 , x2 , . . . , xn) + (y1 , y2 , . . . , yn) = (x1 + y1 , x2 + y2 , . . . , xn + yn)

λu = (λx1 , λ x2 , . . . , λ xn)

Estas operacoes sao ditas “ponto a ponto” e conferem aos pontos do“hiperespaco” Kn o status de vetores. Por exemplo, o vetor nulo em Kn euma n-upla de zeros,

0 = (0, 0, . . . , 0)

e o oposto do vetor u = (x1 , x2 , . . . , xn) e o vetor −u = (−x1 , −x2 , . . . ,−xn).

A seguir damos um importante exemplo do que foi visto.

3 ) O espaco vetorial Zn.

Operacoes em Z = { 0, 1 }Inicialmente vamos construir uma estrutura de corpo sobre o conjunto

Z = { 0, 1 }. Nesse conjunto vamos definir duas operacoes; a uma delaschamaremos de adicao e a outra chamaremos de multiplicacao − dadas nasseguintes tabuas:

+ 0 1

0

1

0 1

1 0

· 0 1

0

1

0 0

0 1

A isto se acrescenta que todo sımbolo

e ambivalente e ate mesmo polivalente,

no sentido de que ele pode significar

uma pluralidade de realidades diversas e

mesmo contraditorias.

(Leon Bonaventure)

E facil, nao obstante trabalhoso, provar que o sistema algebrico resul-tante Z = (Z, +, ·) e um corpo.

O elemento neutro da adicao e 0. O simetrico (oposto) de cada elementoencontramos na propria tabela de adicao. Veja:

0 + 0 = 0 ⇒ −0 = 0 e 1 + 1 = 0 ⇒ −1 = 1

Isto e, o oposto aditivo de cada elemento e o proprio.

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Page 86: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Tendo em conta o exemplo anterior resulta que para cada n ≥ 1, os sis-temas Zn sao espacos vetorias com as operacoes “ponto a ponto”. Portanto,no presente contexto uma sequencia binaria (codigo) adquire status de vetor− Daı a definicao 2. (p. 35)

Atente para o fato de que os escalares λ nao sao nem numeros reais enem numeros complexos, mas sim numeros do corpo Z = (Z, +, ·).

Ademais, o leitor nao se escandalize com a operacao 1 + 1 = 0, postoque, se servir de consolo, mesmo na fısica − supostamente mais aderente arealidade − nem sempre 1 + 1 = 2. Por exemplo, se adicionarmos duas ve-locidades iguais a 1, na fısica de Galileu teremos 1+1 = 2, ja na de Einsteinteremos 1 + 1 6= 2. (ver p. 104)

Nao ha mais, para os teoremas, verdade separada e, por assim dizeratomica: sua verdade e apenas sua integracao no sistema; e e por issoque teoremas incompatıveis entre si podem ser igualmente verdadeiros,contanto que os relacionemos com sistemas diferentes. (Blanche)

Normas em espacos vetoriais

O matematico, como o pintor ou o

poeta, e um desenhista. Se os seus de-

senhos sao mais duradouros que os deles,

e porque sao feitos com ideias.

(G.H. Hardy)

Introducao: O modulo de um numero real definido como (p. 600)

|x| ={

x, se x ≥ 0;

−x, se x < 0.(2.1)

pode ser interpretado geometricamente como a distancia de um numero(ponto) a origem, por exemplo:

|3| = 3, | − 2| = 2

Geometricamente, temos:

p p p p p p p R. . . . . .−3 −2 −1 0 1 2 3

|−2|=2 |3|=3

De um modo geral |x−y| e a distancia entre dois pontos da reta. Comoja vimos, um dos conceitos mais ferteis de toda a matematica e o de distanciaentre dois pontos, desejamos estender esse conceito para os espacos vetoriais;ou seja, desejamos calcular a distancia entre dois vetores.

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Page 87: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A definicao a seguir generaliza a funcao modulo para o contexto dosespacos vetoriais.

Definicao 7 (Norma). Seja V um espaco vetorial de dimensao finita. En-tende-se por norma sobre V uma aplicacao F que transforma cada vetoru ∈ V em um numero real (indicado por ‖u‖ ), chamado norma de u

F : V → R

u 7→ ‖u‖desde que as seguintes propriedades sejam satisfeitas para todos os vetoresu e v e todos os escalares λ:

(N1) ‖u‖ ≥ 0 e ‖u‖ = 0 ⇐⇒ u = 0 ;

(N2) ‖λu‖ = |λ| ‖u‖ ;(N3) ‖u+ v‖ ≤ ‖u‖+ ‖v‖.

Um espaco vetorial munido de uma norma e chamado de espaco vetorialnormado.

O postulado (N3) e conhecido como a desigualdade triangular da norma.

Exemplos:

1 ) Uma norma no espaco de codigos. Vamos definir a seguinte aplicacao

F : Zn → R

u 7→ ‖u‖onde,

‖u‖ =n∑

i=1

xi (2.2)

Por exemplo, para u = 1011 ∈ Z4, temos:

‖u‖ =4∑

i=1

xi = x1 + x2 + x3 + x4 ⇒ ‖1011‖ = 1 + 0 + 1 + 1 = 3

O somatorio (2.2) conta o numero de 1s presentes no vetor u.Uma observacao importante e a de que as adicoes que comparecem no

desenvolvimento do somatorio nao e a adicao em Z mas sim a de R.

Apenas a tıtulo de curiosidade, em Z terıamos: (tab. p. 84)

1 + 0 + 1 + 1 = 1

Deixaremos como exercıcio a prova de que a aplicacao definida em (2.2)de fato resulta em uma norma sobre Zn.

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Page 88: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2 ) Uma segunda norma no espaco de codigos.

Considere a seguinte aplicacao

F : Zn → R

u 7→ ‖u‖onde,

‖u‖ = max{1x1 , 2x2 , . . . , n xn

}(2.3)

Por exemplo, para u = 1011, temos

‖u‖ = max{1x1 , 2x2 , 3x3 , 4x4

}

= max{1 · 1, 2 · 0, 3 · 1, 4 · 1

}= 4

Vejamos um outro exemplo, seja u = 1010, entao

‖u‖ = max{1 · 1, 2 · 0, 3 · 1, 4 · 0

}= 3

A equacao (2.3) nos da a maior posicao onde ocorre um bit 1 no vetor u.

Deixaremos como exercıcio a prova de que a aplicacao assim definida euma norma em Zn.

3 ) A seguir listamos tres normas para o Rn :

‖u‖e =√

x21+ x2

2+ · · · + x2

n(2.4)

‖u‖s = |x1 |+ |x2 |+ · · ·+ |xn | (2.5)

‖u‖m = max{|x1 |, |x2 |, . . . , |xn |

}(2.6)

onde u = (x1 , x2 , . . . , xn) ∈ Rn. Deixamos como exercıcio a prova de que defato estas aplicacoes satisfazem a definicao de norma.

Na demonstracao de (N3) para a primeira das normas acima sugerimoso uso da desigualdade Cauchy-Schwarz, que sera provada logo mais. (p. 91)

Qualquer espaco vetorial normado V pode se tornar um espaco metricose considerarmos d : V × V −→ R, definida como:

d(u, v) = ‖u− v‖, ∀u, v ∈ V.

Prova: Devemos mostrar que d assim definida satisfaz a todas as exigenciaspara uma metrica. Primeiramente devemos mostrar que

(M1) d(u, v) = ‖u− v‖ ≥ 0 e d(u, v) = ‖u− v‖ = 0 ⇐⇒ u = v.

E uma decorrencia imediata de (N1).

(M2) d(u, v) = ‖u− v‖ = ‖(−1)(v − u)‖ = | − 1| ‖v − u‖ = d(v, u).

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Page 89: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(M3) Pela desigualdade triangular da norma podemos escrever

‖u− v‖ = ‖u− w + w − v‖ ≤ ‖u− w‖+ ‖w − v‖Logo,

‖u− v‖ ≤ ‖u− w‖ + ‖w − v‖ ⇒ d(u, v) ≤ d(u, w) + d(w, v).

Observe que agora podemos da uma interpretacao geometrica para anorma de um vetor, veja:

d(u, 0) = ‖u− 0‖ = ‖u‖Isto e, podemos dizer que a norma de um vetor u ∈ V e igual a sua distanciapara o vetor nulo (“origem”). Tal qual ocorre com a funcao modulo nos reais.

Por exemplo, para u = (1, 2) e 0 = (0, 0), vetores em R2, temos

d(u, 0) = ‖u− 0‖ =√

(1− 0)2 + (2− 0)2 =√5

Geometricamente, temos:

d(u, 0) = distancia 6= comprimento.

p p

pp

R

R

0s

su=(1, 2)←− vetor

տvetor

Observacao: Nos livros de algebra linear os autores definem o comprimentode um vetor u como sendo a sua norma, ‖u‖. Nao nos sentimos a vontadecom esta definicao uma vez que nao vemos sentido em se atribuir um “com-primento” a um vetor (a nao ser em casos especiais); um vetor − segundoentendemos − e um “ponto em um espaco” e um “ponto” nao tem compri-mento. Qual seria o comprimento de uma matriz? e de uma funcao?

Uma excessiva geometrizacao da algebra linear condiciona (induz) o es-tudante a confundir os vetores da matematica com os da fısica. Os vetoresda matematica nao possuem “nem modulo”, “nem direcao” e “nem sen-tido”.

Exemplos: A primeira norma exemplificada anteriormente no espaco decodigos, origina a distancia de Hamming vista no capıtulo anterior. (p. 37)

A segunda norma exemplificada no espaco de codigos, origina a distanciadada na pagina 41.

A tres normas exibidas para o espaco vetorial Rn originam as tresdistancias dadas na pagina 24.

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Page 90: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicao 8 (Produto Interno). Seja V um espaco vetorial de dimensaofinita sobre R. Entende-se por produto interno sobre V uma aplicacaoF que transforma cada par ordenado (u, v) ∈ V × V em um numero real(indicado por 〈u, v 〉), isto e:

F : V × V → R

(u, v) 7→ 〈u, v 〉

desde que as seguintes condicoes sejam satisfeitas:

( a ) 〈u+ v, w 〉 = 〈u, w 〉+ 〈 v, w 〉, ∀u, v, w ∈ V ;

( b ) 〈λu, v 〉 = λ 〈u, v〉, ∀λ ∈ R e ∀u, v ∈ V ;

( c ) 〈u, v 〉 = 〈 v, u 〉, ∀u, v ∈ V ;

( d ) 〈u, u 〉 > 0, ∀u 6= 0.

As primeiras duas condicoes nos diz que um produto interno e linearcom respeito a primeira variavel. A terceira condicao nos diz que o produtointerno e simetrico, a quarta condicao nos diz que o produto interno de umvetor nao nulo com ele mesmo e sempre positivo.

Definicao 9 (Espaco Euclidiano). Um espaco euclidiano e um espaco ve-torial sobre R munido de um produto interno.

Nota: Ao acrescentarmos (definirmos) um produto interno sobre umespaco vetorial podemos dizer que estamos enriquecendo essa estrutura; porexemplo, em funcao desse produto interno poderemos calcular a distancia eo angulo entre dois vetores. (p. 103)

Exemplo: Produto interno usual do Rn.

Se u = (x1 , x2 , . . . , xn) e v = (y1 , y2 , . . . , yn) sao arbitrarios em Rn ,entao:

(u, v) 7→ 〈u, v 〉 = x1 y1 + x2 y2 + · · ·+ xn yn

e um produto interno sobre o Rn. (exercıcio)

Propriedades do Produto Interno

Seja(V, 〈 ·, · 〉

)um espaco vetorial munido de um produto interno.

Valem as seguintes propriedades:

P1 ) 〈 0, u 〉 = 〈u, 0 〉 = 0, ∀u ∈ V .

Prova: Da teoria dos espacos vetoriais sabemos que 0u = 0, para todou ∈ V . Logo, 〈 0, u 〉 = 〈 0u, u 〉 = 0 〈u, u 〉 = 0.

↑( b )

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Page 91: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Como 〈u, 0 〉 = 〈 0, u 〉, entao 〈u, 0 〉 = 0. �

P2 ) 〈u, λ v 〉 = λ 〈u, v 〉, ∀λ ∈ R e ∀u, v ∈ V .

Prova: Temos:

〈u, λ v 〉 = 〈λ v, u 〉 = λ 〈 v, u 〉 = λ 〈u, v 〉↑( c )

↑( b )

↑( c )

P3 ) 〈u, v +w 〉 = 〈u, v 〉+ 〈u, w 〉, ∀u, v, w ∈ V .

Prova: Temos:

〈u, v + w 〉 = 〈 v + w, u 〉 = 〈 v, u 〉+ 〈w, u 〉 = 〈u, v 〉+ 〈u, w 〉↑( c )

↑( a )

↑( c )

P4 ) Dado um numero inteiro m ≥ 1, temos.

⟨ m∑

i=1

λi ui , v⟩

=

m∑

i=1

λi 〈ui , v 〉

Prova: Basta usar inducao juntamente com os axiomas ( a ) e ( b ) dadefinicao de produto interno. �

P5 ) Dado um numero inteiro n ≥ 1, temos.

u,

n∑

j=1

αj vj

=

n∑

j=1

αj 〈u, vj 〉

Prova: Basta usar inducao juntamente com as propriedades P2 e P3

demonstradas anteriormente. �

P6 ) Dados dois numeros inteiros m, n ≥ 1, temos.

⟨ m∑

i=1

λi ui ,n∑

j=1

αj vj

=m∑

i=1

n∑

j=1

λi αj 〈ui , vj 〉

Produto interno e norma

Vimos que a partir de uma norma obtemos uma distancia, agora veremosque a partir de um produto interno se pode obter uma norma. Com efeito,e suficiente tomar

‖u‖ =√

〈u, u 〉 (2.7)

Vamos provar que o lado direito desta equacao de fato satisfaz os postu-lados para uma norma.

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Page 92: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(N1) ‖u‖ ≥ 0 e ‖u‖ = 0 ⇐⇒ u = 0 .

Prova: De fato, da definicao de produto interno decorre que√

〈u, u 〉 ≥ 0.Por outro lado

(⇒ ) ‖u‖ =√

〈u, u 〉 = 0 ⇒ 〈u, u 〉 = 0 ⇒ u = 0.

A ultima implicacao se deve a que, pelo axioma ( d ) da definicao deproduto interno, se u 6= 0⇒ 〈u, u 〉 > 0, o que contradiz 〈u, u 〉 = 0.

(⇐ ) u = 0 ⇒ 〈 0, 0 〉 = 0 ⇒ ‖0‖ =√

〈 0, 0 〉 =√0 = 0.

(N2) ‖λu‖ = |λ| ‖u‖.Prova: Temos

‖λu‖ =√

〈λu, λ u 〉 =√

λ2 〈u, u 〉 = |λ|√

〈u, u 〉 = |λ| ‖u‖

(N3) ‖u+ v‖ ≤ ‖u‖+ ‖v‖.Para demonstrar a desigualdade triangular da norma iremos necessitar

antes demonstrar um lema:

Lema 1 (Desigualdade de Cauchy-Schwarz). Em qualquer espaco vetorialeuclidiano V vale a seguinte desigualdade

|〈u, v 〉| ≤ ‖u‖ ‖v‖, ∀u, v ∈ V. (2.8)

Prova: Faremos uso da seguinte identidade:

〈u− λ v, u− λ v 〉 = ‖u‖2 − 2λ 〈u, v 〉+ λ2 ‖v‖2 (2.9)

valida para quaisquer u, v ∈ V e para todo λ ∈ R. (exercıcio)

Se v = 0 a desigualdade (2.8) fica

|〈u, 0 〉| ≤ ‖u‖ ‖0‖ ⇒ |0| ≤ ‖u‖ 0 ⇒ 0 ≤ 0

e a desigualdade proposta resulta verdadeira.

Suponhamos agora v 6= 0. Como a identidade (2.9) vale para qualquerλ ∈ R, em particular vale para

λ =〈u, v 〉‖v‖2

91

Page 93: Gentil Lopes - Espaços Métricos

isto e,

〈u− λ v, u− λ v 〉 = ‖u‖2 − 2λ 〈u, v 〉+ λ2 ‖v‖2

= ‖u‖2 − 2〈u, v 〉‖v‖2 〈u, v 〉+

( 〈u, v 〉‖v‖2

)2‖v‖2

= ‖u‖2 − 2〈u, v 〉2‖v‖2 +

〈u, v 〉2‖v‖2

= ‖u‖2 − 〈u, v 〉2

‖v‖2

Devido a que 〈u− λ v, u− λ v 〉 ≥ 0, resulta que

‖u‖2 − 〈u, v 〉2

‖v‖2 ≥ 0

Logo,

‖u‖2 − 〈u, v 〉2

‖v‖2 ≥ 0 ⇒ 〈u, v 〉2 ≤ ‖u‖2 ‖v‖2

Extraindo a raiz quadrada de cada um dos membros desta ultima desigual-dade resulta:

|〈u, v 〉| ≤ ‖u‖ ‖v‖�

Agora vamos demonstrar a desigualdade triangular da norma:

‖u+ v‖2 = 〈u+ v, u+ v 〉 = 〈u, u 〉+ 〈u, v 〉+ 〈 v, u 〉+ 〈 v, v 〉

= ‖u‖2 + 2 〈u, v 〉+ ‖v‖2

Da desigualdade de Cauchy-Schwarz obtemos

2 |〈u, v 〉| ≤ 2 ‖u‖ ‖v‖somando ‖u‖2 + ‖v‖2 a ambos os membros desta desigualdade obtemos

‖u‖2 + 2 |〈u, v 〉|+ ‖v‖2 ≤ ‖u‖2 + 2 ‖u‖ ‖v‖ + ‖v‖2

Portanto‖u+ v‖2 ≤ ( ‖u‖ + ‖v‖ )2

Extraindo a raiz quadrada obtemos

‖u+ v‖ ≤ ‖u‖+ ‖v‖Sendo assim, mostramos que todo espaco vetorial com produto interno

e um espaco vetorial normado e, portanto, tambem um espaco metrico.

Todo produto interno origina uma norma, mas nem toda norma provemde um produto interno. Deixaremos o contraexemplo para os exercıcios.

92

Page 94: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2.4 Metricas Induzidas Por Funcoes

Seja (M, d) um espaco metrico e N um conjunto qualquer. Se existiruma aplicacao f : N −→M injetiva, entao o par (N, d′), onde

d′(x, y) = d(f(x), f(y)

)

e um espaco metrico.A distancia entre dois pontos quaisquer de N e definida como sendo a

distancia entre suas imagens respectivas. d′ e dita a metrica induzida por f .

rr

x

y

(N, d′)

rrf(x)

f(y)

←d′(x, y)

(M, d)

f

R

Provemos que d′ e de fato uma metrica. Temos

(M1) d′(x, y) = d(f(x), f(y)

)≥ 0

porquanto d e metrica. Ademais

d′(x, y) = d(f(x), f(y)

)= 0 ⇐⇒ f(x) = f(y) ⇐⇒ x = y.

A ultima equivalencia se verifica em funcao de que f e injetora.

(M2) d′(x, y) = d

(f(x), f(y)

)= d(f(y), f(x)

)= d′(y, x).

A desigualdade

(M3) d′(x, y) ≤ d′(x, z) + d′(z, y).

e verdadeira, porquanto

d(f(x), f(y)

)≤ d(f(x), f(z)

)+ d(f(z), f(y)

)

e verdadeira.

Exemplos:

a ) A partir da metrica µ vamos definir uma outra metrica sobre R com oauxılio da funcao injetiva

f : R −→ R

x 7−→ y = 2x

Sendo assim obtemos o espaco(R, d′), onde

d′(x, y) = d(f(x), f(y)

)

=∣∣f(x)− f(y)

∣∣

=∣∣2x − 2y

∣∣

93

Page 95: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por exemplo, a distancia entre −1 e 1, neste espaco, fica

d′(−1, 1) =∣∣2−1 − 21

∣∣ = 1, 5.

Geometricamente tudo se passa assim:

−→d′(−1, 1)

(R, d′)

(R, µ) y=2x

q10q−1

q1

q2

b ) Vamos construir uma metrica sobre R com o auxılio do espaco(R2, ‖·‖

)

e da aplicacao injetora

f : R −→ R2

x 7−→ 12 (x+ 1, x− 1)

Pois bem, obtemos o espaco (R, d′), onde

d′(x, y) = d(f(x), f(y)

)

=∥∥f(x)− f(y)

∥∥

=

∥∥∥∥

1

2(x+ 1, x− 1)− 1

2(y + 1, y − 1)

∥∥∥∥

=1

2

∥∥(x− y, x− y)

∥∥

Por exemplo, a distancia entre −1 e 1, neste espaco, fica

d′(−1, 1) = 1

2

∥∥(−1− 1, −1− 1)

∥∥ =

∥∥(−1, −1)

∥∥

Tendo em conta o exemplo 3 ) (p. 87), o espaco (R, d′) desdobra-se emtres outros espacos, sendo assim, temos:

No espaco(R, ‖ · ‖e

)=⇒ d′(−1, 1) =

(−1)2 + (−1)2 =√2

No espaco(R, ‖ · ‖s

)=⇒ d′(−1, 1) = | − 1|+ | − 1| = 2

No espaco(R, ‖ · ‖m

)=⇒ d′(−1, 1) = max

{| − 1|, | − 1|

}= 1

94

Page 96: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2.5 Produto de espacos metricos

Uma outra importante alternativa para se construir espacos metricos evia produto cartesiano.

Sejam (M1 , d1) e (M2 , d2) espacos metricos. A partir destes dois espacosvamos construir, por exemplo, tres outros espacos, do seguinte modo: Tome-mos dois pontos

x = (x1 , x2) ∈M1 ×M2 =M e y = (y1 , y2) ∈M1 ×M2 =M

e vamos definir tres funcoes

D1 , D2 , D3 : M ×M −→ R

dadas por

D1(x, y) =√

d 2

1(x1 , y1) + d 2

2(x2 , y2) (2.10)

D2(x, y) = d1(x1 , y1) + d2(x2 , y2)

D3(x, y) = max { d1(x1 , y1); d2(x2 , y2) }

Pode ser mostrado que (M, D1), (M, D2) e (M, D3) sao tambem espacosmetricos. (p. 100)

Observe que x1 , y1 ∈M1 e x2 , y2 ∈M2 de modo que d1(x1 , y1) e calcu-lado no espaco (M1 , d1) enquanto d2(x2 , y2) e calculado no espaco (M2 , d2),assim:

(M1 , d1 )

(M2 , d2 )

x1 y1

x2

y2

x

y

M1×M2

Observe ainda que nao ha necessidade de vınculo − afinidade − entreos elementos dos conjuntos M1 e M2 . Isto e, estes podem ser de naturezacompletamente arbitraria.

95

Page 97: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Com o objetivo de convencer o leitor do grau de arbitrariedade de queestamos falando, vamos dar um exemplo:

Sejam (M1 , d1) = (S4, σ) e (M2 , d2) =(M2×3(R), D1

). (p. 25)

Primeiramente observe que os elementos do conjunto

M = S4 ×M2×3(R)

sao pares ordenados (x1 , x2) onde x1 e uma sequencia e x2 e uma matriz.

Exemplo: Calcule no espaco (M, D1) a distancia entre os pontos x e ydados por

x = (x1 , x2) =(

1110,

[2 1 33 0 2

])

y = (y1 , y2) =(

1010,

[0 2 13 4 5

])

Solucao: Devemos calcular a seguinte distancia

D1(x, y) =√

d 2

1(x1 , y1) + d 2

2(x2 , y2)

=√

σ2(x1 , y1) + D2

1(x2 , y2)

Temos

x1 = 1110 , x2 =

[2 1 33 0 2

]

y1 = 1010 , y2 =

[0 2 13 4 5

]

Entao,σ(x1 , y1) = σ

(1110, 1010

)= 1

Ja vimos que D1(x2 , y2) =√34. Portanto, (p.25)

D1

((1110,

[2 1 33 0 2

]);(1010,

[0 2 13 4 5

]))

=

12 + (√34 )2 =

√35.

96

Page 98: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A generalizacao para um produto de n espacos metricos nao apresentadificuldade: Dados os espacos (M1 , d1), (M2 , d2), . . ., (Mn , dn), o produtocartesiano M = M1 ×M2 × · · · ×Mn e o conjunto das n−uplas ordenadasx = (x1 , x2 , . . . , xn), onde x1 ∈ M1 , x2 ∈M2 ,. . . , xn ∈Mn . As tres funcoesdadas abaixo:

D1(x, y) =√

d 2

1(x1 , y1) + · · ·+ d 2

n(xn , yn)

D2(x, y) = d1(x1 , y1) + · · · + dn(xn , yn)

D3(x, y) = max { d1(x1 , y1), . . . , dn(xn , yn) }

sao metricas sobre M .Para x, y ∈M arbitrarios, valem as seguintes desigualdades:

D3(x, y) ≤ D1(x, y) ≤ D2(x, y) ≤ n · D3(x, y)

Observe que quando M1 = M2 = · · · = Mn = R e d1 = d2 = · · · = dn = µ,entao D1 , D2 e D3 coincidem respectivamente com as metricas D1 , D2 e D3

dadas na pagina 24.

O quadrado quantico

Vejamos mais um exemplo de espaco produto. A partir do espaco metrico([ 0, 1 [, k

)podemos obter outros tres no quadrado [ 0, 1 [× [ 0, 1 [ :

[ 0, 1 [× [ 0, 1 [

0 1

1

0 1

1

sx=(x1 , x2 )

sy=(y1 , y2 )

assim:

D1(x, y) =

k2(x1 , y1) + k

2(x2 , y2) (2.11)

D2(x, y) = k(x1 , y1) + k(x2 , y2) (2.12)

D3(x, y) = max{k(x1 , y1); k(x2 , y2)

}(2.13)

97

Page 99: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Um objeto em varios lugares ao mesmo tempo

Um livro que trata inclusive de fısica quantica∗ afirma que uma partıculapode encontrar-se em muitos lugares ao mesmo tempo, veja:

O que a teoria quantica revelou e tao espantoso que mais parece ficcaocientıfica: as partıculas podem estar em dois ou mais lugares ao mesmotempo. (Uma experiencia muito recente mostrou que uma partıcula podeestar em ate 3 mil lugares!) O mesmo “objeto” pode aparentar ser umapartıcula, localizada em um lugar determinado, ou uma onda, espalhadapelo espaco e pelo tempo. (p. 55)

Provaremos que um objeto − mais precisamente, um ponto geometrico− pode encontrar-se em um numero arbitrario de lugares ao mesmo tempo.

Podemos concluir: se isso e possıvel para um ponto geometrico, que esem dimensao, com mais razao ainda podemos esperar que seja possıvel parauma partıcula quantica. Antes necessitaremos de uma definicao:

Diremos que um objeto p (um ponto) encontra-se em uma regiao R con-tida em um universo†, se e so se sua distancia para essa regiao for nula.

De posse desta definicao mostraremos agora que um ponto geometricopode encontrar-se em quatro lugares ao mesmo tempo. Com efeito, conside-remos no quadrado da esquerda

[ 0, 1 [ 2

0 1

1

0 13

23

1

13

23

1

s R1 R2

R3R4

a origem juntamente com as quatro regioes em destaque na figura da direita.

Afirmamos que a origem encontra-se em todas essas quatro regioes.

E mais: a distancia da origem para essas regioes e nula em qualquer dasmetricas produto.

Faremos a prova para a regiao R3 e deixaremos as outras por conta doleitor.

∗Quem somo nos? − A descoberta das infinitas possibilidades de alterar a realidadediaria. William Arntz, Betsy Chasse e Mark Vicente; traducao de Doralice Lima. Rio deJaneiro: Prestıgio Editorial, 2007.

†Para os nossos propositos sera suficiente considerar como universo o hipercubo [ 0, 1 [n.Ou seja o cubo unitario em qualquer dimensao: Intervalo, quadrado, cubo, etc.

98

Page 100: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Escolheremos a metrica D1 , entao: (p. 97)

d(p, X) = inf{d(p, x) : x ∈ X

}

= inf{D1

((0, 0); (x, y)

): (x, y) ∈ R3

}

= inf{√

k2(x, 0) + k

2(y, 0) :2

3≤ x, y < 1

}

Temos, (eq. (1.2), p. 18)

k(x, 0) = min{|x− 0|, 1− |x− 0|

}= min

{x, 1− x

}= 1− x

k(y, 0) = min{|y − 0|, 1− |y − 0|

}= min

{y, 1− y

}= 1− y

Portanto,

d((0, 0), R3 ) = inf

{√

(x− 1)2 + (y − 1)2 :2

3≤ x, y < 1

}

Para calcular essa distancia vamos encontrar o ınfimo da funcao,

F (x, y) =√

(x− 1)2 + (y − 1)2 , para2

3≤ x, y < 1.

Entao,

2

3≤ x < 1 ⇒ 0 < 1− x ≤ 1

3⇒ 0 < (1− x)2 ≤ 1

9

Analogamente, 0 < (1− y)2 ≤ 19 . Portanto,

0 < (1− x)2 + (1− y)2 ≤ 2

9⇒ 0 <

(1 − x)2 + (1− y)2 ≤√2

3

Conclusao: se 23 ≤ x, y < 1, implica que

F (x, y) =√

(x− 1)2 + (y − 1)2 ∈]

0,

√2

3

]

Portanto,

d((0, 0), R3 ) = inf

{√

(x− 1)2 + (y − 1)2 :2

3≤ x, y < 1

}

= inf]

0,

√2

3

]

= 0.

No proximo capıtulo estaremos justificando este resultado de uma outraperspectiva − mais proxima a realidade fısica.

Ademais, oportunamente estaremos provando matematicamente a plau-sibilidade de uma outra surpreendente (bizarra) afirmativa da fısica quantica:

“Eletrons que se movem de A para B sem nunca passar entre esses pontos.”

99

Page 101: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Apendice

Vamos mostrar, por exemplo, que D1 satisfaz a desiguldade triangular:(eq. (2.10), p. 95)

D1(x, y) ≤ D1(x, z) + D1(z, y)

Prova: De fato,

D 21

((x1 , x2), (y1 , y2)

)= d 2

1(x1 , y1) + d 2

2(x2 , y2)

como d1 e d2 sao metricas vale

d1(x1 , y1) ≤ d1(x1 , z1) + d1(z1 , y1) e d2(x2 , y2) ≤ d1(x2 , z2) + d1(z2 , y2)

Sendo assim, podemos escrever

D 21

(x, y

)= d 2

1(x1 , y1) + d 2

2(x2 , y2)

≤[d1(x1 , z1) + d1(z1 , y1)

]2+[d2(x2 , z2) + d2(z2 , y2)

]2

≤ d 21(x1 , z1) + 2 d1(x1 , z1) · d1(z1 , y1) + d 2

1(z1 , y1)

+ d 22(x2 , z2) + 2 d2(x2 , z2) · d2(z2 , y2) + d 2

2(z2 , y2)

Logo,

D 21

(x, y

)≤ D 2

1

(x, z

)+ 2

[d1(x1 , z1) · d1(z1 , y1) + d2(x2 , z2) · d2(z2 , y2)

]

+ D 21

(z, y

)(2.14)

Neste momento faremos uso da seguinte desigualdade

|a b + c d| ≤√

a2 + c2 ·√

b2 + d2

valida para a, b, c e d reais (como o leitor pode verificar facilmente). Entao

d1(x1 , z1) · d1(z1 , y1) + d2(x2 , z2) · d2(z2 , y2) ≤√

d2

1(x1 , z1) + d

2

2(x2 , z2)

·√

d2

1(z1 , y1) + d

2

2(z2 , y2)

= D1

(x, z

)· D1

(z, y

)

Sendo assim a desigualdade (2.14) pode ser escrita como

D 21

(x, y

)≤ D 2

1

(x, z

)+ 2D1

(x, z

)· D1

(z, y

)+D 2

1

(z, y

)

=(

D1

(x, z

)+ D1

(z, y

))2

Desta desigualdade − extraindo-se a raiz quadrada − decorre o resultadodesejado. �

100

Page 102: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2.6 Exercıcios

1) Seja (M, d) um espaco metrico. Mostre que tambem sao metricas sobreM as funcoes definidas assim:

a ) d2(x, y) =√

d(x, y);

b ) d3(x, y) =d(x, y)

1 + d(x, y).

Sugestao: Se a, b, c ≥ 0 temos a ≤ b+ c ⇐⇒ a

1 + a≤ b+ c

1 + b+ c.

2) Mostre que a funcao dada pela equacao (2.2) e uma norma em Zn.(p. 86)

3) Mostre que a funcao dada pela equacao (2.3) e uma norma em Zn.(p. 87)

4) Mostre que a funcao dada pela equacao (2.5) e uma norma em Rn.(p. 87)

5) Mostre que a funcao dada pela equacao (2.6) e uma norma em Rn.(p. 87)

6) O espaco(C[a, b], +, ·

).

Seja C[a, b] o conjunto das funcoes reais contınuas definidas no intervalofechado [ a, b ]. Isto e

C[a, b] ={

f : [ a, b ] −→ R / f contınua}

Sobre este conjunto defina duas operacoes assim: dados f, g ∈ C[a, b] eλ ∈ R ponha

(f + g)(t) = f(t) + g(t), ∀ t ∈ [ a, b ](λf)(t) = λf(t), ∀ t ∈ [ a, b ]

Prove que(C[a, b], +, ·

)e um espaco vetorial.

7) Mostre que a aplicacao

‖ · ‖ : C[a, b] −→ R

definida por‖f‖ = max

{|f(x)| : x ∈ [a, b]

}(2.15)

e uma norma sobre o espaco(C[a, b], +, ·

).

8) Calcule a norma do seguinte vetor:

f : [−1, 1 ] −→ R

x 7−→ x2 + 1

Interprete o resultado geometricamente.

101

Page 103: Gentil Lopes - Espaços Métricos

9) Mostre que a aplicacao

‖ · ‖ : C[a, b] −→ R

definida por

‖f‖ =∫ b

a|f(x)| dx

e uma outra norma sobre o espaco(C[a, b], +, ·

).

10) Calcule a norma do seguinte vetor:

f : [−1, 1 ] −→ R

x 7−→ x2 + 1

Interprete o resultado geometricamente.

11) Prove a seguinte identidade (eq. (2.9), p. 91)

〈u− λ v, u− λ v 〉 = ‖u‖2 − 2λ 〈u, v 〉+ λ2 ‖v‖2

12) Mostre que a desigualdade de Cauchy-Schwarz demonstrada para o Rn

(des. (1.21), p. 68) pode ser obtida como um caso especial da desigualdade emespacos vetoriais euclidianos (des. (2.8), p. 91).

13) Mostre que se uma norma provem de um produto interno entao vale aidentidade do paralelogramo: (eq. (2.7), p. 90)

‖u+ v‖2 + ‖u− v‖2 = 2(‖u‖2 + ‖v‖2

)

14) Prove que as normas dadas pelas equacoes (2.5) e (2.6) nao provem deum produto interno. (p. 87)

Sugestao: Tome, no caso especial do R2, os vetores u = (1, 0) e v = (0, 1)e mostre que eles nao satisfazem a identidade do paralelogramo.

15) Prove que a norma dada pela equacoes (2.15) nao provem de um produtointerno. (p. 101)

Sugestao: Tome os dois seguintes vetores

f : [ a, b ] −→ R, dado por f(x) = 1

g : [ a, b ] −→ R, dado por g(x) =x− ab− a

e mostre que eles nao satisfazem a identidade do paralelogramo.

16) Mostre que um produto interno pode ser obtido a partir de uma funcaonorma:

〈u, v 〉 = 1

4

(‖u+ v‖2 − ‖u− v‖2

)

102

Page 104: Gentil Lopes - Espaços Métricos

17) Angulo entre vetoresSabemos da trigonometria que −1 ≤ cos θ ≤ 1. Da desigualdade de

Cauchy-Schwarz, |〈u, v 〉| ≤ ‖u‖ ‖v‖, decorre:

−‖u‖ ‖v‖ ≤ 〈u, v 〉 ≤ ‖u‖ ‖v‖ ⇒ −1 ≤ 〈u, v 〉‖u‖ ‖v‖ ≤ 1.

Definimos o angulo entre dois vetores u e v, como:

cos θ =〈u, v 〉‖u‖ ‖v‖ , 0 ≤ θ ≤ π.

Calcule o angulo entre os vetores u =(

12 ,√32

)e v =

(−√32 , −1

2

)com

o produto interno usual do R2. (p. 89)

18) Na figura a seguir a distancia da origem para as quatro regioes e nula.

[ 0, 1 [2

0 1

1

0 13

23

1

13

23

1

s R1 R2

R3R4

Prove isto para as metricas Di , com i = 1, 2, 3. (p. 97)

19) O resultado d((0, 0), R3 ) = 0 obtido na p. 99 implica em que arbi-

trariamente proximo da origem podemos encontrar um ponto da regiao R3.

Para todo ε > 0 arbitrariamente fixado encontre um ponto (x, y) ∈ R3

satisfazendo D1

((0, 0); (x, y)

)< ε. (ver lema 11, p. 609)

20) Resolva, no quadrado [ 0, 1 [× [ 0, 1 [, a seguinte inequacao:

D1

((0, 0); (x, y)

)<

1

3Faca um esboco geometrico do conjunto solucao.

21) Resolva, no quadrado [ 0, 1 [× [ 0, 1 [, a seguinte inequacao:

D2

((0, 0); (x, y)

)<

1

3Faca um esboco geometrico do conjunto solucao.

22) Resolva, no quadrado [ 0, 1 [× [ 0, 1 [, a seguinte inequacao:

D3

((x, y); (

1

4,3

4))<

1

3

103

Page 105: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Esta pagina ficaria em branco (ociosa), decidi aproveita-la para justificara afirmativa que fiz na p. 85 de que na fısica de Einstein 1 + 1 6= 2.

Suponhamos um observador O fixo em relacao ao solo, e um vagaomovendo-se com velocidade v em relacao ao solo. Dentro do vagao ha umabola que se move com velocidade u.

∼≀

qO

· ·v

u

Sendo assim, Galileu nos diz que: V = v + u.Onde, V : velocidade da bola para o observador no solo.Einstein, respaldado em seu segundo postulado∗, corrigiu a adicao de

Galileu da seguinte forma:

V =v + u

1 +v · uc2

Onde c = 3 · 108 (m/s) e a velocidade da luz. Tomando u = v = 1 teremosque para Galileu 1 + 1 = 2, ja para Einstein 1 + 1 6= 2. De fato,

V =1 + 1

1 +1 · 1

(3 · 108)26= 2 (2.16)

Claro, os fısicos argumentariam que “para todos os fins praticos” 10−16 =0 e aı as duas adicoes coincidem. Primeiro que arredondamento e sempreuma opcao, nunca uma obrigacao. Segundo, nao trata-se de arredonda-mento, e uma questao conceitual. Por exemplo, “para todos os fins praticos”π = 3, 14159265359, entretanto conceitualmente o numero da esquerda e ir-racional e o da direita racional.

A fısica de Newton-Galileu nao e um caso particular da de Einstein.Observe que so existe uma maneira de obter 1 + 1 = 2 na fısica de

Einstein, devemos fazer 10−16 = 0, o que implicaria 1 = 0 (multiplicandopor 1016). Logo, estabelecemos (na fısica de Einstein):

Se 1 + 1 = 2 entao 1 = 0. Mas isto equivale a: Se 1 6= 0 entao 1 + 1 6= 2.

An passant, gostaria de deixar aqui um questionamento aos fısicos. Amatematica nos diz que a adicao de vetores obedece a regra do paralelogramo,dada por | ~V |2 = | ~u |2 + |~v |2 + 2 | ~u | · |~v | · cos θ. Esta equacao para θ = 0o

torna-se | ~V | = | ~u |+ |~v |. Tomando u = v = 1 teremos | ~V | = | 1 |+ | 1 | = 2,contrariando (2.16)!

Entao velocidade nao e um vetor na fısica de Einstein?∗A velocidade da luz no vacuo tem o mesmo valor c em qualquer referencial inercial,

independentemente da velocidade da fonte de luz.

104

Page 106: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Capıtulo 3BOLAS ABERTAS

Ha uma qualidade de extase que

nao e prazer; so vem esse extase quando

existe em nos mesmos aquela ordem

matematica, que e absoluta.

(Krishnamurti)

Introducao: Dada a importancia das bolas abertas para o estudo dosespacos metricos, resolvemos aborda-las em um capıtulo em separado.

E de fundamental importancia que o leitor compreenda bem este con-ceito, haja vista que muitas das definicoes em capıtulos subsequentes sao emfuncao do mesmo.

Que o estudante nao tenha a ilusao de ir muito longe na topologia semuma perfeita compreensao das bolas abertas.

3.1 Definicao e Exemplos

Definicao 10 (Bola Aberta). Seja (M, d) um espaco metrico. Considereum ponto fixado p ∈M . Dado r > 0 um numero real, a bola aberta de centrop e raio r, que indicaremos por B(p; r), e o seguinte subconjunto de M :

B(p; r) ={x ∈M : d(x, p) < r

}

Ou seja: a bola aberta de centro p e raio r > 0 e o conjunto formadopelos elementos de M que estao a uma distancia de p menor que r.

Observe que para encontrar uma bola aberta deveremos sempre resolvera inequacao

d(x, p) < r,

no conjunto universo U =M . Observe outrossim que quando x = p, teremos

d(p, p) = 0 < r ⇒ p ∈ B(p; r).

105

Page 107: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Conclusao: uma bola aberta nunca e vazia − pois o proprio centro semprepertence a mesma.

Observacao: A nosso criterio usaremos a notacao Bd(p; r) para explicitar a

metrica a qual a bola se refere.

Agora daremos varios exemplos de bolas em varios espacos metricos.

3.1.1 Bolas na reta

1) Considere M = R a reta real. Consideremos p = 3 ∈ R e r = 12 . Entao:

• No espaco (R, µ), temos

B(p; r) ={x ∈M : d(x, p) < r

}

B(3;

1

2

)={x ∈ R : µ(x, 3) <

1

2

}

={x ∈ R : |x− 3| < 1

2

}

={x ∈ R : − 1

2< x− 3 <

1

2

}

={x ∈ R : 3− 1

2< x < 3 +

1

2

}=] 5

2,7

2

[

A visualizacao geometrica e como a seguir

0⊣

1⊣

2⊣

3

s4⊣

52

72

Bµ (3;12)

Rs] [

De um modo geral, a bola aberta de centro p e raio r, no espaco metrico(R, µ), coincide com o intervalo aberto de mesmo centro e mesmo raio.Assim

B(p; r) ={x ∈ R : |x− p| < r

}

={x ∈ R : − r < x− p < r

}

={x ∈ R : p− r < x < p+ r

}=]p− r, p+ r

[

Bµ(p; r) =]p− r, p+ r

[

Geometricamente, temos

R

Bµ(p; r)

pr

p−r p+r

s] [

106

Page 108: Gentil Lopes - Espaços Métricos

• No espaco (R, δ), temos

B(p; r) ={x ∈M : d(x, p) < r

}

B(3;

1

2

)={x ∈ R : δ(x, 3) <

1

2

}

Nesta bola entram apenas os numeros reais que satisfazem a inequacao

δ(x, 3) <1

2

pela definicao de δ, temos (p. 15)

δ(x, 3) =

1, se e so se x 6= 3;

0, se e so se x = 3.

Portanto o unico numero real que satisfaz a exigencia δ(x, 3) < 12 e

x = 3, pois δ(3, 3) = 0 < 12 . Logo

B(3;

1

2

)={x ∈ R : δ(x, 3) <

1

2

}={3}.

Este e um exemplo de que na bola so consta o seu proprio centro.A geometria da situacao e a seguinte

0⊣

1⊣

2⊣

3⊣sBδ(3; 1

2)

R

3.1.2 Bolas na metrica “zero-um”

2) Vamos agora caracterizar a bola aberta no espaco metrico (M, δ), ondeM e um conjunto arbitrario.

Na definicao de bola aberta temos que r > 0. Vamos separar a nossaanalise em dois casos:

1o ) Suponhamos 0 < r ≤ 1. Considere p ∈ M , arbitrariamente fixado.Entao:

B(p; r) ={x ∈M : δ(x, p) < r ≤ 1

}

observe que se x 6= p entao δ(x, p) = 1, logo a desigualdade

δ(x 6= p, p) = 1 < r ≤ 1

nao e verdadeira. Isto e nenhum x 6= p pode fazer parte de uma bola com0 < r ≤ 1. Por conseguinte

Bδ(p; r) =

{p}, para 0 < r ≤ 1.

107

Page 109: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2o ) Suponhamos r > 1. Considere p ∈M , arbitrariamente fixado. Entao

B(p; r) ={x ∈M : δ(x, p) < r

}

Como 0 ≤ δ(x, p) ≤ 1, ou ainda δ(x, p) ∈ { 0, 1 }, a desigualdade

0 ≤ δ(x, p) ≤ 1 < r

estara sempre satisfeita para todo x ∈M . Por conseguinte

Bδ(p; r) =M, para r > 1.

Resumindo: A bola aberta no espaco metrico (M, δ) esta perfeitamentecaracterizada como

Bδ(p; r) =

{p}, se 0 < r ≤ 1;

M, se r > 1.(3.1)

Por exemplo, seja M = Z4. Considere p = 0101, entao

(0101; r

)=

{0101

}, se 0 < r ≤ 1;

Z4, se r > 1.

3.1.3 Bolas no espaco quantico

3) Bolas no Espaco([ 0, 1 [, k

)

− Vamos inicialmente, a tıtulo de exemplo, esbocar a bola de centro 0 eraio r = 1

4 no espaco([ 0, 1 [, k

). Entao:

Bk

(0;

1

4

)={x ∈ [ 0, 1 [ : k(x, 0) <

1

4

}

={x ∈ [ 0, 1 [ : min{ |x− 0|, 1− |x− 0| } < 1

4

}

Devemos resolver a inequacao

min{x, 1− x}<

1

4, para 0 ≤ x < 1.

Com o auxılio do grafico da funcao k(x, 0), na p. 18, chegamos aoseguinte resultado:

Bk

(0;

1

4

)={x ∈ [ 0, 1 [ : min{x, 1− x } < 1

4

}

=[0,

1

4

[∪] 3

4, 1[

108

Page 110: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Geometricamente a bola pedida fica assim:

014

34 1

Isto significa, enfatizamos, que estes sao os pontos do intervalo [ 0, 1 [cujas distancias para a origem sao menores que 1

4 = 0, 25.

Podemos confirmar isto com o auxılio da regua quantica, observe:

� � [ 0, 1 [

014

34 1

0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 1

INM

ETRO

− Vejamos ainda um outro exemplo. Esbocar a bola de centro 14 e raio

r = 38 no espaco

([ 0, 1 [, k

). Entao:

Bk

(1

4;3

8

)={x ∈ [ 0, 1 [ : k

(x,

1

4

)<

3

8

}

={

x ∈ [ 0, 1 [ : min{ ∣∣x− 1

4

∣∣, 1−

∣∣x− 1

4

∣∣}<

3

8

}

Devemos resolver a inequacao

min{ ∣∣x− 1

4

∣∣, 1−

∣∣x− 1

4

∣∣

}

<3

8, para 0 ≤ x < 1.

Inicialmente vamos tracar o grafico das funcoes dadas por

f(x) =∣∣x− 1

4

∣∣ e g(x) = 1−

∣∣x− 1

4

∣∣

Entao

x

|x|

pp 1−1

p

0

x

f(x) = |x− 14|

pp 1−1

p

14

0

109

Page 111: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Para obter o grafico da funcao g procedemos assim

x

− |x− 14|

pp 1−1

p

14

0

↑x

g(x)= 1− |x− 14|

pp 1

1

−1

p

14

0

Na figura a seguir (esquerda) superpomos os graficos de f e g:

xpp 1

1

−1

p

f(x)

g(x)

14

0x

h(x)

pp 1

1

−1p

34

14

0

Na figura da direita plotamos o grafico da funcao h dada por

h(x) = min{f(x), g(x)

}, 0 ≤ x < 1.

Ou seja, percorrendo o intervalo [ 0, 1 [ − na figura da esquerda − tomamosa parte do grafico que “esta por baixo”.

Para resolver a inequacao h(x) < 38 consideremos os graficos a seguir

x

h(x)

pp 1

1

−1 0 14

34

p

r= 38ց

x

h(x)= k(x, 14)

pp 1

1

−1 0 14

p

r= 38

58

78

Para obter as interseccoes no grafico a direita resolvemos as equacoes

f(x) =∣∣x− 1

4

∣∣ =

3

8e g(x) = 1−

∣∣x− 1

4

∣∣ =

3

8

110

Page 112: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Do ultimo grafico obtemos

Bk

( 1

4;3

8

)={

x ∈ [ 0, 1 [ : h(x) <3

8

}

=[0,

5

8

[∪] 7

8, 1[

Cujo esboco geometrico e como a seguir

t14

p12

58

78

0 1

Deixamos como exercıcio ao leitor provar que

Bk(0; r) =

[ 0, r [ ∪ ] 1− r, 1 [ , se 0 < r ≤ 12 ;

[ 0, 1 [ , se r > 12 .

(3.2)

Geometricamente, temos

0 1r 1−r

Bk(0; r < 1

2)

0 1r

Bk(0; r= 1

2)

0 1

Bk(0; r > 1

2)

Nota: A figura do centro poderia ter sido incluida na figura da esquerda.

3.1.4 Bolas no plano

4) Bolas nos Espacos (R2, Di)

− Vamos inicialmente, a tıtulo de exemplo, esbocar a bola de centro 0 eraio r = 1 no espaco (R2, D1). Entao:

B(p; r) ={x ∈M : d(x, p) < r

}

B((0, 0); 1

)={(x, y) ∈ R2 : D1

((x, y); (0, 0)

)< 1

}

={

(x, y) ∈ R2 :√

(x− 0)2 + (y − 0)2 < 1}

Sendo assim B((0, 0); 1

)e o conjunto dos pontos do plano cujas coor-

denadas satisfazem a desigualdade

(x− 0)2 + (y − 0)2 < 1,

111

Page 113: Gentil Lopes - Espaços Métricos

isto e, sao os pontos interiores a circunferencia de equacao: x2 + y2 = 1.

R

R

1

1

−1

−1

B((0, 0); 1)

R

R

0

sB((a, b); r)

p

q

a

b

r

Para um ponto p = (a, b) ∈ R2 arbitrario, a bola B((a, b

); r) e o conjunto

dos pontos interiores a circunferencia de equacao: (x− a)2 + (y − b)2 = r2.

− Agora vamos esbocar a bola de centro 0 e raio r = 1 no espaco (R2, D2).Entao:

B(p; r) ={x ∈M : d(x, p) < r

}

B((0, 0); 1

)={(x, y) ∈ R2 : D2

((x, y); (0, 0)

)< 1

}

={(x, y) ∈ R2 : |x− 0| + |y − 0| < 1

}

Sendo assim B((0, 0); 1

)e o conjunto dos pontos do plano cujas coor-

denadas satisfazem a desigualdade

|x− 0| + |y − 0| < 1

isto e, sao os pontos interiores a circunferencia de equacao: |x| + |y| = 1.

R

R

1

1

−1

−1

B((0, 0); 1)

R

R

0

s B((a, b); r)

p

q

a

b

r

Para um ponto p = (a, b) ∈ R2 arbitrario, a bola B((a, b

); r) e o conjunto

dos pontos interiores a circunferencia de equacao: |x− a| + |y − b| = r.

112

Page 114: Gentil Lopes - Espaços Métricos

− A bola de centro 0 e raio r = 1 no espaco (R2, D3) fica assim:

B(p; r) ={x ∈M : d(x, p) < r

}

B((0, 0); 1

)={(x, y) ∈ R2 : D3

((x, y); (0, 0)

)< 1

}

={(x, y) ∈ R2 : max {|x− 0|, |y − 0|} < 1

}

Sendo assim B((0, 0); 1

)e o conjunto dos pontos do plano cujas coor-

denadas satisfazem a desigualdade

max {|x− 0|, |y − 0|} < 1

sao os pontos interiores a circunferencia: max {|x|, |y|} = 1.

R

R

1

1

−1

−1

B((0, 0); 1)

R

R

0

B((a, b); r)s

p

q

a

b

r

Para um ponto p = (a, b) ∈ R2 arbitrario, a bola B((a, b

); r) e o conjunto

dos pontos interiores a circunferencia de equacao: max {|x−a|, |y− b|} = r.

3.1.5 Bolas no quadrado quantico

5) A tıtulo de exemplo construiremos agora a bola BD1

((0, 0); 1

4

)e deixare-

mos como exercıcio ao leitor a construcao desta mesma bola nas duas outrasmetricas. Temos, (eq. (2.11), p. 97)

BD1

((0, 0);

1

4

)={

(x, y) ∈ [ 0, 1 [×[ 0, 1 [ : D1

((x, y); (0, 0)

)<

1

4

}

Pertencem a esta bola todos os pontos do quadrado que satisfazem a de-sigualdade:

D1

((x, y); (0, 0)

)=

k2(x, 0) + k

2(y, 0) <1

4

Temos,

k(x, 0) = min{|x− 0|, 1− |x− 0|

}= min

{x, 1− x

}

k(y, 0) = min{|y − 0|, 1− |y − 0|

}= min

{y, 1− y

}

113

Page 115: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Estas equacoes desdobram-se em cada um dos “quadrantes” da seguinteforma: (eq. (1.2), p. 18)

0 1

1

¬

¬

12

12

k(x, 0)=x

k(y, 0)= y

k(x, 0)=1−xk(y, 0)= y

k(x, 0)=x

k(y, 0)= 1−yk(x, 0)=1−xk(y, 0)= 1−y

Sendo assim, temos:

I ) k(x, 0) = x, k(y, 0) = y ⇒√

(x− 0)2 + (y − 0)2 < 14

II ) k(x, 0) = 1− x, k(y, 0) = y ⇒√

(x− 1)2 + (y − 0)2 < 14

III ) k(x, 0) = 1− x, k(y, 0) = 1− y ⇒√

(x− 1)2 + (y − 1)2 < 14

IV ) k(x, 0) = x, k(y, 0) = 1− y ⇒√

(x− 0)2 + (y − 1)2 < 14

Tomando a intersecao de cada uma das respectivas circunferencias como quadrado unitario obtemos a bola aberta procurada, assim: (a direita)

0 12

1

1

¬

¬

12

14

14

34

(1, 1)(0, 1)

(1, 0)(0, 0)

34

=⇒

114

Page 116: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Topologia quantica

Tudo deve ser baseado em uma ideia

simples. Depois de a descobrirmos ela

sera tao irresistıvel, tao bela, que co-

mentaremos entre nos, sim, nao poderia

ser diferente. (John Wheeler, fısico)

As ondas de De Broglie

Em 1924 o fısico frances Louis De Broglie levantou a conjectura de que amateria, em certas circunstancias, poderia ter caracterısticas ondulatorias,o que foi confirmado experimentalmente em 1927 atraves dos experimentosde C. J. Davisson e L.H. Germer, dos Bell Telephone Laboratories.

Observamos que a conjectura de De Broglie foi decisiva para o estabele-cimento da fısica quantica e, por conseguinte, diretamente responsavel portodo o desenvolvimento tecnologico que ora desfrutamos. Por outro lado,a proposta de De Broglie teve tambem profundas repercussoes filosoficas.

Por exemplo, inspirado nas ondas de De Broglie associaremos a um pontogeometrico uma onda e daı derivaremos toda uma serie de consequenciasinteressantes.

Apenas para espicacar a curiosidade do leitor, afirmamos que na figuraa seguir

tt pP A

013

23 1

conseguimos mover o ponto P ate a posicao A, do outro lado, sem passarpelo hiato central − e sem abandonar o conjunto, constituido pelos doispedacos de reta. (p. 384)

Ondas geometricas

Dado um ponto p, no universo [ 0, 1 [n, e um numero r > 0, definiremosa onda associada ao ponto p (ou de centro em p) e raio r como:

O={x ∈ [ 0, 1 [n : d(x, p) < r

}

Leia-se: A onda de centro p e raio r > 0 e o conjunto de todos os pontosdo espaco (hipercubo) tais que suas distancias para p e menor que r.

115

Page 117: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Ou seja, uma onda e uma bola aberta, estamos apenas − inspirados nasondas de De Broglie − mudando a nomenclatura no presente contexto.

Definicao 11. Seja (M, d) um espaco metrico, R ⊂M uma regiao (subcon-junto) de M , e p um ponto de M. Dizemos que o ponto p encontra-se naregiao R se e so se sua distancia para esta regiao for nula.

Na pagina 48 mostramos que e nula a distancia da origem para o conjuntoX na figura a seguir:

s0 1

21X

De outro modo: A origem encontra-se nesta regiao. Agora estamos emcondicoes de ver este fenomeno de uma nova perspectiva. De fato, oportu-namente estaremos provando que “um ponto encontra-se em uma regiao se,e somente se, sua onda intercepta essa regiao”. (cor. 8, p. 211)

Mais precisamente (em sımbolos):

d(p, R) = 0 ⇐⇒ O(p; r) ∩R 6= ∅; ∀ r > 0.

Da equacao (3.2) (p. 111) concluimos que toda “Onda” de centro naorigem intercepta o conjunto X (ou regiao R) na figura anterior, veja:

s0 1

21R

O O

Esta e precisamente a razao pela qual o ponto encontra-se na regiao.

De igual modo, a razao pela qual a origem encontra-se presente nasquatro regioes da figura a seguir (esquerda) (p. 98)

0s R1 R2

R3R4

s sse que toda Onda de centro nela (fig. do centro) intercepta as quatro regioes(fig. a direita). Resumindo: Um ponto encontra-se em uma dada regiao se, esomente se, toda onda “gerada por esse ponto” − ou associada a esse ponto− intercepta a regiao.

116

Page 118: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Uma mao “leva a outra”

Os nossos resultados topologicos tornam plausıvelmatematicamente a afirmativa quantica de que umobjeto pode estar em varios lugares ao mesmo tempo.De fato, se isto pode se da com um ponto geometrico,que e sem dimensao, com mais razao ainda podemosconcordar que possa verificar-se com uma partıculaquantica (que e um “ente”).

Digo, nao temos porque duvidar desta afirmativa quantica uma vez quea matematica afirma o mesmo relativamente a um ponto geometrico − que,“pior ainda”, e indimensional.

Por outro lado, alguns poderiam manter uma postura reservada emrelacao aos nossos resultados, ou ate mesmo rejeita-los, com a justificativade que eles estao totalmente distantes da “realidade”.

Veja bem, toda a fundamentacao logica (matematica) para os nossos re-sultados recai no fato de que a origem associamos uma onda e, por contadesta, a mesma encontra-se “presente” nos quatro “cantos do mundo”. Ora,sendo assim essa conclusao nao esta “tao distante” da realidade uma vezque a fısica quantica nos assegura o mesmo em relacao a um objeto quantico:

“Uma experiencia muito recente mostrou que uma partıcula pode es-tar em ate 3 mil lugares! O mesmo ‘objeto’ pode aparentar ser umapartıcula, localizada em um lugar determinado, ou uma onda. (p. 98)

Se, por ventura, o leitor ainda sente dificuldade em compreender comouma Onda pode conectar objetos aparentemente distantes, vejamos umaanalogia. Na figura a seguir imagine que voce e o pontinho e que as regioesem destaque sejam tres televisoes, veja:

s↑

Voce

T.V.1 T.V.2

T.V.3

Pois bem, para que o leitor esteja conectado simultaneamente aos tres tele-visores basta ter em maos um controle remoto.

Observe que a sua “presenca” se faz sentir em varios lugares ao mesmotempo gracas a uma onda − desta vez eletromagnetica.

117

Page 119: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3.1.6 Bolas nos espacos de codigos

6) Consideremos o conjunto de sımbolos

S4 ={0000, 1000, 0100, 1100, 0010, 1010, 0110, 1110,

0001, 1001, 0101, 1101, 0011, 1011, 0111, 1111}

Seja p = 0101 e r = 2. No espaco(Z4, σ

), temos

B(p; r) ={x ∈M : d(x, p) < r

}

B(0101; 2

)={x ∈ Z4 : σ(x, 0101) < 2

}

x1 x2 x3 x4XX

XX

X

X

X

X

X

X

X

0 0 0 0

1 0 0 0

0 1 0 0

1 1 0 0

0 0 1 0

1 0 1 0

0 1 1 0

1 1 1 0

0 0 0 1

1 0 0 1

0 1 0 1

1 1 0 1

0 0 1 1

1 0 1 1

0 1 1 1

1 1 1 1

As sequencias de Z4 que pertencem a bolaprocurada sao aquelas que satisfazem a desigual-dade

σ(x, 0101) =4∑

n=1

|xn − pn | < 2

= |x1 − 0|+ |x2 − 1|+ |x3 − 0|+ |x4 − 1| < 2

Ou ainda, que satisfazem

x1 + |x2 − 1|+ x3 + |x4 − 1| < 2

Observe que nao podemos ter x2 = x4 = 0 oux1 = x3 = 1. Sendo assim obtemos

(0101; 2

)={0100, 0001, 0101, 1101, 0111

}

3.1.7 Bolas nos espacos de funcoes

7) • Bolas no espaco(C[a, b], Γ

). Consideremos a funcao

g : [ 0, 1 ] −→ R

x 7−→ 0

Isto e, g e a funcao identicamente nula (g ≡ 0).

Tomemos r = 12 . Vamos fazer algumas elucubracoes sobre a bola

B(g;

1

2

)={f ∈ C[ 0, 1 ] : Γ(f, g) < 1

2

}

={f ∈ C[ 0, 1 ] :

∫ 1

0|f(x)− g(x)| dx < 1

2

}

={f ∈ C[ 0, 1 ] :

∫ 1

0|f(x)− 0| dx < 1

2

}

118

Page 120: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Tem livre acesso a esta bola todas as funcoes contınuas, com domınio nointervalo [ 0, 1 ], que satisfazem a desigualdade

∫ 1

0|f(x)| dx < 1

2.

Ou ainda: pertencem a bola em questao todas as funcoes f , contınuas e comdomınio no intervalo [ 0, 1 ], cuja area sob o grafico de |f | nao excede 0, 5.

Exemplos:

a) Perguntamos: a funcao

f : [ 0, 1 ] −→ R

x 7−→ y = x2

pertence a bola BΓ

(0; 1

2

)?

Solucao:

Temos:

∫ 1

0x2 dx =

x3

3 0

1

=1

3<

1

2

x

f(x)

q10

q1

Resposta: Sim.

b) Perguntamos: a funcao

f : [ 0, 1 ] −→ R

x 7−→ y = sen x

pertence a bola BΓ

(0; 1

2

)?

Solucao:

Temos:

∫ 1

0senx dx = − cos x

0

1

= 1− cos 1

≈ 0, 46 < 12

x

f(x)

q10

q1

q π2

q π

Resposta: Sim.

119

Page 121: Gentil Lopes - Espaços Métricos

c) Perguntamos: a funcao

f : [ 0, 1 ] −→ R

x 7−→ y = cos x

pertence a bola BΓ

(0; 1

2

)?

Solucao:

Temos:

∫ 1

0cos x dx = sen x

0

1

= sen 1 ≈ 0, 84 > 12

x

f(x)

q 10

q1

q

π2

Resposta: Nao.

• Bolas no espaco(C[a, b], Υ

)

Consideremos a funcao:g : [ 0, 1 ] −→ R

x 7−→ 0

Tomemos r = 12 . Vamos fazer algumas elucubracoes sobre a bola

B(g;

1

2

)={f ∈ C[ 0, 1 ] : Υ(f, g) <

1

2

}

={f ∈ C[ 0, 1 ] : max{ |f(x)− g(x)| : x ∈ [ 0, 1 ] } < 1

2

}

={f ∈ C[ 0, 1 ] : max{ |f(x)| : x ∈ [ 0, 1 ] } < 1

2

}

Tem livre acesso a esta bola todas as funcoes contınuas, com domınio nointervalo [ 0, 1 ], que satisfazem a desigualdade

max{|f(x)| : x ∈ [ 0, 1 ]

}<

1

2

Isto equivale a

|f(x)| < 0, 5 ; ∀x ∈ [ 0, 1 ] ⇒ −1

2< f(x) <

1

2; ∀x ∈ [ 0, 1 ].

y

x

12

− 12

0

1

q

q

g=0

r

r

Isto e, pertencem a bola BΥ

(0; 1

2

)

todas as funcoes reais contınuas, comdomınio [ 0, 1 ], cujos graficos situam-sena faixa retangular ao lado.

120

Page 122: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De um modo geral e sempre possıvel “visualizarmos” as bolas no espaco(C[a, b], Υ

). Sendo

B(g; r) ={f ∈ C[a, b] : Υ(f, g) < r

}

={f ∈ C[a, b] : max {|f(x)− g(x)| : x ∈ [ a, b ] } < r

}

Temos a seguinte equivalencia

max { |f(x)− g(x)| : x ∈ [ a, b ] } < r ⇐⇒ |f(x)− g(x)| < r, ∀x ∈ [ a, b ].

Isto e, pertencem a bola B(g; r) todas as funcoes f ∈ C[a, b] tais que

g(x)− r < f(x) < g(x) + r ; a ≤ x ≤ b.

Lembramos que g ∈ C[a, b] e uma funcao a priori fixada. Pertencem abola B(g; r) as funcoes contınuas f : [ a, b ] −→ R cujos graficos situam-seentre os graficos de g − r e g + r. Geometricamente esta bola fica assim:

a b

g−r

g

g+r

f

0x

y

2r

3.1.8 Bolas em subespacos

Dado um espaco metrico (M, d) e um subconjunto N ⊂ M , o nossoobjetivo agora sera estudar as bolas abertas no subespaco (N, d).

Dado p ∈ N e r > 0 a bola de centro p e raio r no “espaco universo”(M, d) continuara a ser indicada por B(p; r), ou por B

d(p; r) quando houver

necessidade de explicitar a metrica. Enquanto a sub-bola, digo, a bola nosubespaco (N, d) sera indicada por B(p; r).

Por definicao temos

B(p; r) = {x ∈ N : d(p, x) < r }

SendoB(p; r) = {x ∈M : d(p, x) < r }

121

Page 123: Gentil Lopes - Espaços Métricos

deixamos como exercıcio ao aluno mostrar que a sub-bola de centro p e raior e igual a bola no “espaco universo” interceptada com o conjunto N :

B(p; r) = B(p; r) ∩N

Veremos agora que as bolas em um dado subespaco sao, amiude, total-mente diferentes daquelas no “espaco universo”.

Exemplos:

(1) Consideremos o espaco metrico(R, µ

). Seja N = { 0 } ∪ [ 1, 2 [. En-

contre − e esboce − no subespaco(N, µ

)as seguintes bolas:

a) B(0; 1

2

)b) B

(0; 3

2

)c) B

(1; 1

2

)(exercıcio)

Solucao:

a) Para encontrar B(0; 1

2

)temos duas alternativas: encontrando dire-

tamente da definicao ou calculando a bola no espaco universo e fazendo aintersecao com N . Vamos optar pela segunda alternativa.

Temos B(0; 1

2

)=]− 1

2 ,12

[, entao

B(0;

1

2

)= B

(0;

1

2

)∩N

=]− 1

2,1

2

[∩({ 0 } ∪ [ 1, 2 [

)={0}.

s [ [0 1 2

N

s0

] [−1

212

B(0; 12)

s0

B(0; 12)={ 0 }

b) Temos B(0; 3

2

)=]− 3

2 ,32

[, entao

B(0;

3

2

)= B

(0;

3

2

)∩N

=]− 3

2,3

2

[∩({ 0 } ∪ [ 1, 2 [

)={0}∪[1,

3

2

[.

s [ [0 1 2

N

s0

] [− 3

232

B(0; 32)

[1

[ 32

s0

B(0; 32)={ 0 }∪

[1, 3

2

[

122

Page 124: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(2) Considere o seguinte subconjunto de R2

N = S1 = { (x, y) ∈ R2 : x2 + y2 = 1 }

Faca um esboco − nos subespacos (S1, Di) (i = 1, 2, 3.) − das bolas

a) BD1

((1, 0); 1

2

)b) BD2

((0, 1); 3

4

)c) BD3

((1, 0); 3

4

)

Solucao: Nos subespacos (S1, Di) uma bola aberta consiste de um arcode cırculo, aberto nas extremidades, assim

a)

ւS1

rBD1((1, 0); 1

2)

−1

1

−1

0 R

R

ւrBD1((1, 0); 1

2)

0R

R

b)

ւ

S1r

BD2((0, 1); 3

4) ⇒

1−1

−1

0 R

R

ւr BD2((0, 1); 3

4)

0R

R

c)

ւS1

rBD3((1, 0); 3

4)

−1

1

−1

0R

R

ւrBD3((1, 0); 3

4)

0R

R

123

Page 125: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3.1.9 Bolas no espaco produto

Ja esbocamos (p. 113) a bola aberta no espaco(R2, D3

), onde

D3(x, y) = max{|x1 − y1 |, |x2 − y2 |

}

Alternativamente podemos escrever

BD3

((a, b); r

)=] a− r, a+ r [ × ] b− r, b+ r [

Isto e, BD3

((a, b); r

)e o produto cartesiano das bolas de centro a e raio r e

de centro b e raio r, ambas no espaco (R, µ ). Em sımbolos:

BD3

((a, b); r

)= Bµ(a; r)×Bµ(b; r)

Geometricamente temos

R

R

0 ] [a

a−r a+r

s

][

sbb−r

b+r

Este e um caso particular do seguinte resultado:

Proposicao 4. Sejam (M1 , d1), (M2 , d2), . . ., (Mn , dn) espacos metricose consideremos sobre M =M1 ×M2 × · · · ×Mn a metrica

D3(x, y) = max{d1(x1 , y1), . . . , dn(xn , yn)

}

onde x = (x1 , x2 , . . . , xn ) e y = ( y1 , y2 , . . . , yn ) sao ponto de M .Fixe um ponto p = (p1 , p2 , . . . , pn) ∈ M . Nestas condicoes a seguinte

identidade e valida

BD3(p; r) = B

d1(p1 ; r)×Bd2

(p2 ; r)× · · · ×Bdn(pn ; r)

Prova: Seja x = (x1 , x2 , . . . , xn ) um ponto arbitrario de M . Entao:

x ∈ BD3(p; r)⇐⇒ max

{d1(x1 , p1), . . . , dn(xn , pn)

}< r

⇐⇒ di(xi , pi) < r (i = 1, 2, . . . , n)

⇐⇒ xi ∈ Bdi( pi ; r) (i = 1, 2, . . . , n)

⇐⇒ x ∈ Bd1(p1 ; r)×Bd2

(p2 ; r)× · · · ×Bdn(pn ; r)

124

Page 126: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplo: Temos

BD3

((0, 0);

1

4

)= B

k

(0;

1

4

)×B

k

(0;

1

4

)

=([

0,1

4

[∪] 3

4, 1[ )

×([

0,1

4

[∪] 3

4, 1[ )

Geometricamente esta bola fica assim:

0 12

1

1

¬

¬12

14

14

34

34

=⇒ Bola

Seria bom o leitor rever o diagrama de bolas abertas a pagina 111.

Na esteira deste panorama o estudante, a tıtulo de treinamento, podetentar esbocar a seguinte bola aberta:

BD3

((1

4,3

4);

1

3

)

3.1.10 Proposicoes sobre Bolas

Provaremos − e interpretaremos − algumas propriedades das bolas aber-tas B(p; r) de um espaco metrico (M, d); generico.

(P1) Dadas B(p; r) e B(p; s), se s ≤ r, entao B(p; s) ⊂ B(p; r).

Isto e: Se duas bolas tem o mesmo centro, a de menor raio esta contidana outra.

Embora isto pareca trivial, em matematica devemos sempre desconfiardo obvio. Por exemplo, daqui a pouco mostraremos ao leitor que existembolas cujo raio e maior que o proprio diametro!

Prova: Seja x ∈ B( p; s) entao d(x, p) < s, logo

d(x, p) < s ≤ r ⇒ d(x, p) < r ⇒ x ∈ B(p; r).

Portanto B(p; s) ⊂ B(p; r). �

125

Page 127: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(P2) Dado q ∈ B(p; r), entao existe s > 0 tal que B(q; s) ⊂ B(p; r).Isto e: Escolhido um ponto qualquer de uma bola aberta, podemos tornareste ponto o centro de uma nova bola aberta contida na primeira.

Prova: Como q ∈ B(p; r) temos que d(p, q) < r. A figura da esquerda nos

r rp q

B(p; r)

r

d(p, q)

s r r rp q

x

B(p; r)

← B(q; s)

sugere escolher s = r − d(p, q) > 0. Mostremos que para esta escolha de sefetivamente se verifica B(q; s) ⊂ B(p; r). Seja x ∈ B(q; s), entao

d(x, q) < s = r − d(p, q) ⇒ d(x, q) + d(p, q) < r (3.3)

A desigualdade triangular nos autoriza escrever (fig. da direita)

d(x, p) ≤ d(x, q) + d(p, q)

nos valendo da desigualdade (3.3) decorre que d(x, p) < r, o que implicax ∈ B(p; r). Como x ∈ B(q; s) e arbitrario, segue que B(q; s) ⊂ B(p; r).�

(P3) Sejam B(p; r) e B(q; s) bolas que se interceptam. Para todo x ∈B(p; r) ∩B(q; s), existe t > 0 satisfazendo

B(x; t) ⊂ B(p; r) ∩B(q; s)

Isto e: Escolhido qualquer ponto na interseccao de duas bolas abertas,podemos centrar neste ponto uma terceira bola contida nesta intersecao.

Prova: Seja x ∈ B(p; r)∩B(q; s), entao x ∈ B(p; r) e x ∈ B(q; s). Devidoa propriedade (P2) existem t1 > 0 e t2 > 0 tais que

B(x; t1) ⊂ B(p; r) e B(x; t2) ⊂ B(q; s)

Daqui segue que

B(x; t1) ∩B(x; t2) ⊂ B(p; r) ∩B(q; s) (3.4)

Seja t = min {t1 , t2}, entao pela propriedade (P1), temos as inclusoes

B(x; t) ⊂ B(x; t1) e B(x; t) ⊂ B(x; t2)

portanto,B(x; t) ⊂ B(x; t1) ∩B(x; t2)

126

Page 128: Gentil Lopes - Espaços Métricos

de (3.4) concluımos que

B(x; t) ⊂ B(p; r) ∩B(q; s)

que e o resultado desejado. �

(P4) Sejam p 6= q pontos de um espaco (M, d). Entao podemos centrar emcada um destes pontos, bolas abertas disjuntas.Prova: Como p 6= q ⇒ d(p, q) > 0. Vamos tomar r = d(p, q) e mostrarque, por exemplo, as bolas B

(p; r2

)e B

(q; r2

)sao disjuntas.

(M, d)

rp rqr= d(p, q)⊢ ⊣

Suponha, ao contrario, que exista w ∈ B(p; r2

)∩ B

(q; r2

). Entao

d(w, p) < r2 e d(w, q) < r

2 . Donde, invocando a desigualdade triangular,temos

r = d(p, q) ≤ d(p, w) + d(w, q) <r

2+r

2= r.

Esta contradicao mostra que a nossa suposicao (qual seja: a de que existeum elemento na intersecao das bolas) e falsa. �

(P5) Sejam as bolas B(p; r) e B(q; s), se r + s ≤ d(p, q), entao

B(p; r) ∩ B(q; s) = ∅

Isto e: Se a soma dos raios e menor ou igual a distancia entre os centros,entao estas bolas precisam ser disjuntas.Prova: Suponha, contrariamente, que exista w ∈ B(p; r) ∩ B(q; s). Entaod(w, p) < r e d(w, q) < s. Donde, invocando a desigualdade triangular:

d(p, q) ≤ d(p, w) + d(w, q) < r + s ≤ d(p, q).

Esta contradicao mostra que a nossa suposicao (qual seja: a de que existeum elemento na intersecao das bolas) e falsa. �

(P6) O diametro de uma bola B(p; r) e menor ou igual a 2r.− Isto e, em qualquer espaco metrico a seguinte desigualdade sempre severifica

diam(B(p; r)

)≤ 2r.

Prova: Queremos mostrar que

diam(B(p; r)

)= sup

{d(x, y) : x, y ∈ B(p; r)

}≤ 2r.

127

Page 129: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Sejam x e y pontos arbitrarios de B(p; r), logo d(x, p) < r e d(y, p) < r,entao

d(x, y) ≤ d(x, p) + d(p, y) < r + r = 2r.

portanto, 2r e uma cota superior do conjunto

{d(x, y) : x, y ∈ B(p; r)

}

e, sendo sup{d(x, y) : x, y ∈ B(p; r)

}a menor de tais cotas, disto segue o

resultado desejado. �

Como corolario: toda bola aberta e um conjunto limitado. (p. 53)

Proposicao 5. Num espaco vetorial real(E, +, ·

), normado, com E 6= { 0 }

sempre vale a seguinte igualdade

diam(B(p; r)

)= 2r.

Prova: Qualquer que seja r > 0, temos tres possibilidades:

diam(B(p; r)

)> 2r ou diam

(B(p; r)

)= 2r ou diam

(B(p; r)

)< 2r

Pela propriedade (P6) descartamos a primeira possibilidade. Sendo

diam(B(p; r)

)= sup

{d(x, y) : x, y ∈ B(p; r)

}

para excluir a terceira das possibilidades acima, devemos mostrar que nen-hum numero s < 2r pode ser cota superior do conjunto

{d(x, y) : x, y ∈

B(p; r)}. Isto e, que 2r e efetivamente a menor de tais cotas. Ou ainda,

que2r = sup

{d(x, y) : x, y ∈ B(p; r)

}= diam

(B(p; r)

).

Para tanto e suficiente encontrar (construir) dois vetores x, y ∈ B(p; r) talque d(x, y) > s.

Tomemos 0 6= u ∈ E, vamos construir − a partir de u − os vetores x ey satisfazendo a desigualdade acima. Inicialmente obtemos os vetores u

‖u‖ e−u‖u‖ ambos de comprimento unitario. Como entre dois numeros reais sempreexiste um terceiro, vamos escolher um numero real ε satisfazendo s < ε < 2re multiplicar os dois vetores anteriores por ε/2. Com isto asseguramos queos novos vetores u

‖u‖ε2 e −u‖u‖

ε2 assim obtidos, tem comprimentos menores que

o raio r da bola. Para obter os vetores x e y aplicamos, aos dois ultimosvetores, a seguinte translacao:

p+u

‖u‖ε

2= x , p+

−u‖u‖

ε

2= y

Vamos mostrar que, de fato, estes vetores cairam dentro da bola:

‖x− p‖ = ‖y − p‖ =∥∥∥∥

±u‖u‖

ε

2

∥∥∥∥=‖ ± u‖‖u‖

ε

2=ε

2< r.

128

Page 130: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Resta mostrar que d(x, y) > s. Com efeito,

d(x, y) = ‖x− y‖ =∥∥∥∥

(

p+u

‖u‖ε

2

)

−(

p+−u‖u‖

ε

2

)∥∥∥∥=‖u‖‖u‖ε = ε > s.

3.1.11 Ponto isolado − Espacos discretos

Definicao 12 (Ponto Isolado). Seja um espaco metrico (M, d). Dado umponto p ∈ M , se existir r > 0 de modo que { p } = B(p; r), entao dizemosque p e um ponto isolado no espaco (M, d).

Isto significa que nao existe ponto x ∈ M satisfazendo a desigualdade0 < d(x, p) < r.

Ou ainda: p ∈ M e isolado no espaco (M, d) se nao existe ponto de Ma uma distancia de p menor que r.

Observacao: Para mostrar que um ponto p ∈ M nao e isolado noespaco (M, d): ∀ r > 0 dado, devemos exibir um outro ponto x = xr ∈ Mtal que xr ∈ B(p; r). Isto e, 0 < d(xr , p) < r.

Exemplos:

a ) No espaco (R, δ) todo numero real e isolado. De fato, ja vimos que

se 0 < r ≤ 1 ⇒ Bδ(p; r) = { p }, ∀ p ∈ R.

b ) No espaco (R, µ) nenhum numero real e isolado. De fato, neste espacoa bola aberta de centro p e raio r coincide com o intervalo aberto

Bµ(p; r) =] p− r, p+ r [

Por exemplo, o ponto xr = p+p+r2 = p + r

2 , satisfaz 0 < d(xr , p) < r,pois xr 6= p e

µ(xr , p) =∣∣∣(p+

r

2)− p

∣∣∣ =

r

2< r.

] [p−r p+r

p xr

Bµ(p; r)

Rs sc ) No espaco (Z, µ) todo ponto e isolado. De fato, dado p ∈ Z e r = 1

2 , porexemplo, temos

(p;

1

2

)={x ∈ Z : |x− p| < 1

2

}

={x ∈ Z : p− 1

2< x < p+

1

2

}= { p }.

129

Page 131: Gentil Lopes - Espaços Métricos

] [p−1 p+1

p− 12

p+ 12

pss s Z

Observe que um numero inteiro qualquer, e isolado no espaco (Z, µ) masnao no espaco (R, µ).

d ) O ponto p = 0101 e isolado em qualquer um dos espacos(Z4; σ, ρ, τ

).

De fato, isso se deve a que,

(0101; 1

)={x ∈ Z4 : σ(x, 0101) < 1

}= { 0101 }

(0101; 1

)={x ∈ Z4 : ρ(x, 0101) < 1

}= { 0101 }

(0101; 1

)={x ∈ Z4 : τ(x, 0101) < 1

}= { 0101 }

Observe que se x ∈ Z4, entao,

σ(x, 0101) ∈ { 0, 1, 2, 3, 4 }ρ(x, 0101) ∈ { 0, 1, 2, . . . , 9, 10 }τ(x, 0101) ∈ { 0, 1, 2, 3, 4 }

e ) Sendo X ={

1n : n ∈ N

}∪ { 0 }, todos os pontos de X, a excecao do 0,

sao isolados no espaco (X,µ).De fato, dado r > 0, podemos invocar a propriedade arquimediana para

mostrar que 0 nao e isolado: Escolhemos n = nr ∈ N de modo que 1nr

< r,portanto

µ( 1

nr

, 0)=∣∣∣1

nr

− 0∣∣∣ =

1

nr

< r.

Por outro lado, dado p = 1n ∈ X o ponto de X que esta mais proximo

de p e x = 1n+1 . s

1

s s s s0 1

n+11n

1n−1

· · · · · ·

Sendo,

µ(x, p) =∣∣∣

1

n+ 1− 1

n

∣∣∣ =

1

n(n+ 1)

basta escolher r = rn <1

n(n+1) para isolar p.

Resumindo: dado p = 1n ∈ X escolhemos r = rn < 1

n(n+1) e o ponto

mais proximo de p que e x = 1n+1 estara fora da bola B(p; rn), porquanto

r < µ(x, p) =1

n(n+ 1)

Vejamos um exemplo: Para isolar o ponto 13 ∈ X, e suficiente escolher

r <1

3(3 + 1)=

1

12

130

Page 132: Gentil Lopes - Espaços Métricos

s r] [ rrrrrrrrrr0 11

213

14

. . .

f ) Ao contrario dos espacos ZN , nos quais todos os pontos sao isolados, noespaco (Z∞, ν) nenhum ponto e isolado.

De fato, seja p = p1 p2 . . . ∈ Z∞, para todo r > 0 dado, devemos

exibir x = x1 x2 . . . ∈ Z∞ de modo que 0 < ν(x, y) < r.

Dado r > 0 escolhemos n ∈ N tal que 12n < r. Entao, de acordo com

a proposicao 1 (p. 44) se escolhermos x coincidindo com p nas n primeirasposicoes teremos ν(x, p) < r.

Para garantir ν(x, y) > 0, isto e, x 6= p basta escolher um termo de x,apos a posicao n, diferente do termo de mesma posicao de p. Por exemplo,o ponto

x = p1 . . . pn p(n+1)p(n+2)

p(n+3)

. . .

onde,

p(n+1)

=

1, se p(n+1)

= 0;

0, se p(n+1)

= 1.

satisfaz as exigencias mencionadas.Observe que a sequencia x coincide com a sequencia p em todas as

posicoes, exceto na de numero n+ 1. Sendo assim, temos

ν(x, p) =

∞∑

i=1

|xi − pi |2i =

1

2n+1 <1

2n < r

Resumindo: Dado p = ( pj ) ∈ Z∞ e r > 0, para mostrar que p nao eisolado, escolhemos j ∈ N tal que 1

2j < r e tomamos

x = (xn) ∈ Z∞ onde xj 6= pj e xn = pn , ∀n ∈ N− {j}.

Em espacos vetoriais reais, normados, nao existem pontos isolados. E oque nos garante a seguinte

Proposicao 6. Num espaco vetorial real(E, +, ·

), normado, com E 6= { 0 }

nao existem pontos isolados.

Prova: Dados, arbitrariamente, u ∈ E e r > 0 devemos exibir w =wr ∈ E de modo que 0 < d(u, wr) < r. Escolhamos em E qualquer vetorv 6= u e consideremos o segmento de reta (p. 617)

[u, v ] ={(1− t)u + t v : 0 ≤ t ≤ 1

}

131

Page 133: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Agora vamos determinar 0 < t ≤ 1 de tal modo que o vetor w = (1− t)u+ tvcaia dentro da bola B(u, r). Isto e tal que d(u, w) = ‖u− w‖ < r.

su w vt=0 t=? t=1

B(u, r)

(E, ‖ · ‖)

Entao,

w − u = (1− t)u+ t v − u= (−u+ v) t

logo

‖w − u‖ = ‖(−u+ v) t‖ = t ‖u− v‖ < r

portanto e suficiente escolher

0 < t <r

‖u− v‖

De modo mais preciso

0 < t < min

{r

‖u− v‖ , 1}

Nota: Observe que, por exemplo,(Zn, ‖ · ‖

)(p. 86) e um espaco vetorial

normado no qual todos os pontos sao isolados. Isto contradiz a proposicaoanterior?

Observe que a demonstracao anterior pode ser particularizada para umainfinidade de espacos metricos. Por exemplo, para os seguintes:

(Rn, Di) (i = 1, 2, 3.) (n = 1, 2, . . .)(C[a, b], Γ

);(C[a, b], Υ

);(B(X, R), Ψ

).

haja vista que a metrica de todos estes espacos sao oriundas de uma norma.

Definicao 13 (Espaco Discreto). Um espaco metrico e dito discreto quandotodos os seus pontos sao isolados.

132

Page 134: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Como exemplos de espacos discretos citamos:

(ZN , σ

);(ZN , ρ

);(ZN , τ

);(R, δ

);(Z, µ

);

({1,

1

2, . . . ,

1

n, . . .

}, µ

)

Observe que qualquer conjuntoM munido da metrica δ resulta em um espacometrico discreto. Daı esta ser tambem conhecida como metrica discreta.

Proposicao 7. Seja (M, d) um espaco metrico. Se M e finito entao (M, d)e discreto.

Prova: Seja M ={a1 , a2 , . . . , an

}. Escolhendo

r = min{d(ai , aj ) : ai , aj ∈M e i 6= j

}

nenhum aj ∈ M satisfaz d(ai , aj ) < r, a menos que j = i. PortantoB(ai , r) = { ai }. �

∗ ∗ ∗

www.profgentil.com

133

Page 135: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3.2 Exercıcios

1) Prove a seguinte identidade (p. 111)

Bk(0; r) =

[ 0, r [ ∪ ] 1− r, 1 [ , se 0 < r ≤ 12 ;

[ 0, 1 [ , se r > 12 .

2) Encontre, pela definicao, e faca um esboco geometrico da seguinte bolaaberta B

k

(38 ;

14

).

3) Encontre, pela definicao, e faca um esboco geometrico das seguintes bolasabertas:

a ) BD2

((0, 0); 1

4

)b ) B

D3

((0, 0); 1

4

)

4) Encontre e faca um esboco geometrico da seguinte bola aberta

BD3

((1

4,3

4

);1

3

)

5) Encontre as seguintes bolas abertas: Bρ

(0101; 2

)e Bτ

(0101; 2

).

6) Prove as seguintes igualdades:

(p; r

)=

{p}, se 0 < r ≤ 1;

ZN , se r > N.

(p; r

)=

{p}, se 0 < r ≤ 1;

ZN , se r > 2N − 1.

(p; r

)=

{p}, se 0 < r ≤ 1;

ZN , se r > N.

7) Considere o espaco metrico(R, µ

). Seja N = [ 1, 3 [. Encontre − e es-

boce − no subespaco(N, µ

)as seguintes bolas:

a) B(1; 1

)b) B

(2; 2

)c) B

(3; 1

)

8) No espaco(Z, µ

)encontre a bola B(n; r), onde n e um inteiro arbi-

trariamente fixado e 0 < r ≤ 1.

Depois conclua que todos os pontos de um espaco podem ser isolados semque a metrica seja a “zero-um”.

9) De exemplo de dois subconjuntos discretos X, Y ⊂ R tais X ∪ Y naoresulte discreto.

134

Page 136: Gentil Lopes - Espaços Métricos

10) Seja N = { (x, y) ∈ R2 : x ≥ 1 }, faca um esboco geometrico dasseguintes (sub)bolas abertas:

a ) BD1

((1, 1); 1

)b ) BD2

((1, 1); 1

)c ) BD3

((1, 1); 1

)

11) Seja N = { (x, y) ∈ R2 : y ≥ 1 }, faca um esboco geometrico dasseguintes (sub)bolas abertas:

a ) BD1

((−1, 1); 1

)b ) B

D2

((−1, 1); 1

)c ) B

D3

((−1, 1); 1

)

12) Considere o seguinte subconjunto de R2 : N ={(x, y) ∈ R2 : xy = 1

}.

Faca um esboco − nos subespacos (N, Di)(i = 1, 2) − das bolas abertas

a ) BD1

((1, 1); 1

2

)b ) B

D2

((−1,−1); 1

2

)

13) Seja (M1 , d1) =(Z4, σ

)e (M2 , d2) =

(M2(Z), δ

). Considere

M =M1 ×M2 = Z4 ×M2(Z)

Calcule no espaco(M, D3

)a bola de centro p = ( p1 , p2 ) =

(

0101,

[2 13 0

])

e raio r = 1.

14) Com respeito a propriedade (P6), de um exemplo de que a desigualdadediam

(B( p; r)

)< 2r efetivamente pode ocorrer. (p. 127)

15) De exemplo de uma (infinidade) de bolas com a seguinte propriedade:por mais que diminuamos o raio, ele permanece sempre maior que o diametro!

16) Considere o espaco(C[ 0, 1 ], Γ

)juntamente com a funcao

p : [ 0, 1 ] −→ R

t 7−→ t2

Seguindo os passos da demonstracao da proposicao 5 mostre quediam

(B( p; r)

)= 2r. (p. 128)

17) O exemplo 6) pode ser resolvido seguindo-se os passos da prova daproposicao 5, faca isto. (p. 56)

18) Considere o espaco(R2, ‖ · ‖e

), o ponto u = (1, 1) e o raio r = 0, 75.

Encontre um ponto wr satisfazendo as condicoes da prova da proposicao 6.Faca um esboco geometrico da sua solucao. (p. 87, p. 131)

19) Considere o espaco(R2, ‖ · ‖s

), o ponto u = (1, 1) e o raio r = 0, 75.

Encontre um ponto wr satisfazendo as condicoes da prova da proposicao 6.Faca um esboco geometrico da sua solucao. (p. 87, p. 131)

20) Considere o espaco(R2, ‖ · ‖m

), o ponto u = (1, 1) e o raio r = 0, 75.

Encontre um ponto wr satisfazendo as condicoes da prova da proposicao 6.Faca um esboco geometrico da sua solucao. (p. 87, p. 131)

135

Page 137: Gentil Lopes - Espaços Métricos

21) Mostre que no espaco(C[−1, 1 ], Γ

)o ponto u ∈ C[−1, 1 ] dado por

u : [−1, 1 ] −→ R

x 7−→ x2

nao e isolado.

22) A distancia da origem para as quatro regioes na figura da pagina 116 enula. Para cada bola aberta arbitrariamente fixada encontre um ponto emcada uma das regioes que pertenca a bola.

23) Seja (M, d) um espaco metrico e X ⊂M . Prove que

d(p, X) = 0 ⇐⇒ B(p; r) ∩X 6= ∅ , ∀ r > 0.

24) Considere os espacos(C[ 0, 1 ], Γ

)e(C[ 0, 1 ], Υ

), prove que

BΓ(0; r) 6⊂ B

Υ

(0;

1

2

), ∀ r > 0.

25) Prove que a bola de centro p e raio r no espaco([ 0, 1 [, k

), e como a

seguir:

Bk(p; r) =

] p − r, p+ r [, se 0 < r ≤ p;

[ 0, p+ r [ ∪ ] p− r + 1, 1 [, se p < r ≤ 12 ;

[ 0, 1 [, se r > 12 .

Bk(p; r) =

] p − r, p+ r [, se 0 < r < 1− p;

[ 0, p+ r − 1 [ ∪ ] p− r, 1 [, se 1− p ≤ r ≤ 12 ;

[ 0, 1 [, se r > 12 .

para 0 < p < 12 e 1

2 < p < 1, respectivamente.

O esboco das bolas no intervalo [ 0, 1 [ fica assim:

¬

0<r≤ p0 1

21

sp−rp

p+r

¬

p<r≤ 120 1

2 1

s p+r

p

p−r+1

¬

r> 120 1

2 1

sp

¬

0<r< 1−p0 1

21sp−rp

p+r

¬

1−p≤ r≤ 120 1

21sp+r−1p

p−r

¬

r> 120 1

2 1

sp

136

Page 138: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Capıtulo 4SEQUENCIAS EM ESPACOS

METRICOS

O mundo e construido como uma es-

trutura matematica, e nao material.

(Werner Heisenberg)

4.1 Sequencias

Para definir sequencias nao precisamos estar inseridos no contexto deespacos metricos. Com efeito, desde o ensino medio que passamos a lidarcom sequencias como, por exemplo, as progressoes aritmeticas e geometricas.Aqui a enfase sera dada a sequencias mais gerais que sequencias numericaspropriamente. Para os nossos propositos assumiremos como conjunto dosnumeros naturais: N = { 1, 2, 3, . . . }.

Definicao 14 (Sequencia). Seja M um conjunto nao vazio, com elemen-tos de natureza qualquer. Chamaremos de sequencia de termos em M , ouapenas sequencia em M a qualquer aplicacao

x : N −→Mn 7−→ x(n)

Para representar a sequencia x : N −→M usaremos uma das notacoes:

(x1 , x2 , x3 , . . .) ou (xn)n∈ Nou (xn).

A imagem de n ∈ N pela funcao x, isto e, x(n), sera abreviada por xn ; e o

n-esimo termo da sequencia.

137

Page 139: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) Seja a sequencia x : N −→ R dada por xn = 2n − 1. E a progressaoaritmetica (1, 3, 5, 7, . . .).

2) Uma sequencia em R2. Seja

x : N −→ R2

n 7−→(1 + (−1)n, 1− (−1)n

)

Ou ainda: xn =(1 + (−1)n, 1− (−1)n

).

Alternativamente: (xn) =((0, 2), (2, 0), (0, 2), (2, 0), . . .

).

3) Uma sequencia de matrizes. Seja x : N −→M2(R), dada por

xn =

1− 1n 0

0 1− 1n

A sequencia fica assim

([0 0

0 0

]

,

[12 0

0 12

]

,

[23 0

0 23

]

, . . .

)

4) Uma sequencia de funcoes. Seja

x : N −→ C[ 0, 1 ]n 7−→ xn

onde, xn(t) =t

n. Os termos da sequencia (x1 , x2 , x3 , . . .) sao funcoes

contınuas definidas no intervalo [ 0, 1 ], onde

x1(t) = t, x2(t) =t

2, x3(t) =

t

3, . . .

A seguir plotamos os tres primeiros termos da sequencia (xn)

t

x1 (t)

0 q

q

1

1

t

x2 (t)

0

12

q

q

1

1

t

x3 (t)

0

13

q

q

1

1

138

Page 140: Gentil Lopes - Espaços Métricos

• Um outro exemplo de sequencia no conjunto C[ 0, 1 ] podemos obterencontrando a equacao da reta no grafico

t

xn (t)

0 1n

q

q

1

1

Deste grafico deduzimos a seguinte equacao para o termo geral de (xn)

xn(t) =

1− nt , se 0 ≤ t ≤ 1n ;

0 , se 1n ≤ t ≤ 1.

A seguir plotamos os tres primeiros termos da sequencia (xn)

t

x1(t)

0 q

q

1

1

t

x2 (t)

0 12

q

q

1

1

t

x3(t)

0 13

q

q

1

1

5) Uma sequencia em Z∞. Considere a sequencia(δn)

n∈N , definida assim

δn = (δn1 , δn2 , δn3 , . . .) onde δnk

=

1, se n = k;

0, se n 6= k.

A seguir explicitamos os termos da sequencia (δn):

δ1 = (1, 0, 0, 0, 0, . . .)

δ2 = (0, 1, 0, 0, 0, . . .)

δ3 = (0, 0, 1, 0, 0, . . .)...δk= (0, 0, . . . , 0, 1, 0, 0, . . .)

... k-esima posicao139

Page 141: Gentil Lopes - Espaços Métricos

4.1.1 Subsequencias

Definicao 15 (Subsequencia). Dada uma sequencia x : N −→M e um sub-conjunto (infinito) N1 = {n1 < n2 < n3 < . . .} de N, a restricao

x∣∣∣N1

: N1 −→M

e chamada subsequencia de (xn).

Nota: E importante observar, na definicao acima, que os ındices noconjunto N1 devem cumprir dois requisitos: sao em numero infinito e emordem crescente.

Para representar uma subsequencia usaremos uma das notacoes a seguir

(xn1, xn2

, xn3, . . .) ou (xn)n∈N1

ou (xnk)

Exemplo:

Seja a sequencia em R dada por xn = 1−(−1)n2 , isto e, (1, 0, 1, 0, . . .).

Vamos obter duas subsequencias de (xn) escolhendo, por exemplo

N1 = { 1, 3, 5, 7, . . .} (ımpares)

N2 = { 2, 4, 6, 8, . . .} (pares)

entao

(xn

)

n∈N1= (1, 1, 1, 1, . . .)

(xn

)

n∈N2= (0, 0, 0, 0, . . .)

Como retirar um numero arbitrario de subsequencias de uma dadasequencia/Particao dos naturais

Vamos mostrar agora como retirar um numero arbitrario de subsequenciasde uma dada sequencia (xn). Em um outro contexto, mais tarde, iremos ne-cessitar do que veremos agora.

Se quisermos retirar duas subsequencias de uma dada sequencia podemosnos valer dos seguintes conjuntos de ındices:

N1 = { 1, 3, 5, 7, . . .}

N2 = { 2, 4, 6, 8, . . .}

Assim,

(x1 x2 x3 x4 x5 . . .)

(x1 x3 x5 x7 . . .)

(x2 x4 x6 x8 . . .)140

Page 142: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Se quisermos retirar tres subsequencias de uma dada sequencia podemosnos valer dos seguintes conjuntos de ındices:

N1 = { 1, 4, 7, 10, . . .}

N2 = { 2, 5, 8, 11, . . .}

N3 = { 3, 6, 9, 12, . . .}

Assim,

(x1 x2 x3 x4 x5 . . .)

(x1 x4 x7 x10 . . .)

(x2 x5 x8 x11 . . .)

(x3 x6 x9 x12 . . .)

E facil inferir a regra de construcao destes conjuntos. Observamos queestes conjuntos sao disjuntos, dois a dois, e que a reuniao dos mesmos resultano conjunto dos naturais. Resumimos estas duas observacoes dizendo queestes conjuntos (de ındices) formam uma particao dos naturais.

4.2 Convergencia

Para falar de convergencia de sequencias necessitamos de uma metrica.Tem interesse especial as chamadas sequencias convergentes. Intuiti-

vamente, uma sequencia (xn) e convergente se, a medida que o ındice naumenta, o termo xn vai-se tornando arbitrariamente proximo de um certonumero a, chamado o limite da sequencia. A proximidade entre xn e a emedida pela distancia d(xn , a) entre esses termos. Portanto, dizer que xn

vai se tornando arbitrariamente proximo de a equivale dizer que d(xn , a)torna-se arbitrariamente pequeno. Vejamos a definicao precisa de

Definicao 16 (Convergencia). Sejam (M, d) um espaco metrico e (xn) umasequencia em M . Diremos que (xn) converge para a ∈M quando, para todonumero ε > 0 dado arbitrariamente, existe n0 ∈ N tal que

∀n ≥ n0 ⇒ d(xn , a) < ε. (4.1)

Em palavras: uma sequencia (xn) converge para um ponto a ∈ M se, esomente se, fixado ε > 0, existe uma posicao n0 a partir da qual a distanciade qualquer termo da sequencia para o ponto a nao excede ε.

Uma sequencia que nao converge e dita divergente. A seguir escrevemos,em sımbolos, a definicao de convergencia e sua negacao: (p. 579)

∀ ε > 0 ∃n0 ∈ N : ∀n ≥ n0 ⇒ d(xn , a) < ε

∃ ε > 0 : ∀n0 ∈ N ∃n ≥ n0 ∧ d(xn , a) ≥ ε

(convergencia)

(divergencia)

141

Page 143: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Para indicar que (xn) converge para a, usaremos uma das notacoes:

limn→∞

xn = a ou limnxn = a ou limxn = a ou xn−→ a.

Ou ainda, xn−→da, quando quisermos enfatizar a metrica d em questao.

E importante observar na definicao 16 que, uma vez dado o ε > 0, essenumero permanece fixo e nao muda ate a determinacao do ındice n0 corres-pondente. Via de regra o ındice n0 depende − e funcao − do ε > 0 dado,razao pela qual algumas vezes escreveremos n0 = n0(ε).

Importante!

Deve ficar bem claro (transparente) para o leitor o papel desempenhadopelo numero ε e o ındice n0 , na definicao de convergencia. Com este intuitoobservemos o conteudo desta definicao de uma outra perspectiva: Supon-hamos que o leitor queira provar, a um seu − fictıcio − adversario, quelim xn = a. Pois bem, seu adversario fornecera a voce leitor os valores deε > 0. Para cada valor de ε − arbitrariamente fixado − voce tera quedevolver ao seu adversario um ındice n0 satisfazendo a condicao

∀n ≥ n0 ⇒ d(xn , a) < ε

Se o leitor conseguir executar esta facanha, para cada valor de ε que lhefor fornecido, entao tera provado que a sequencia converge para o ponto a.

Caracterizacao de convergencia via bolas abertas

Proposicao 8. Uma sequencia (xn) em M converge para a ∈ M se, esomente se, para toda bola B(a; ε) arbitrariamente fixada existe um n0 :

∀ n ≥ n0 ⇒ xn ∈ B(a; ε) (4.2)

Prova: E imediato pois: d(xn , a) < ε ⇐⇒ xn ∈ B(a; ε). �

Em palavras: Se a ∈ M e limite de (xn) entao existe um ındice n0 apartir do qual todos os termos da sequencia caem dentro da bola B(a; ε).Reciprocamente, se existe um ındice n0 a partir do qual todos os termos dasequencia caem dentro da bola B(a; ε) entao a ∈M e limite de (xn).

Daqui concluimos que se lim xn = a, entao a bola (de raio ε) centradaem a contem infinitos termos da sequencia (xn) : (xn0

, xn0+1 , xn0+2 , . . .).

ra

ε

s ss sss ssss ssss ra

ε

s sx5

x4s sx6 x3ssx7

x8

ss x1x2ss ssssn0(ε) = 9

x9

raε′

s sx5

x4s sx6 x3ssx7

x8

ss x1

x2ss ssssn0(ε

′) = 11

142

Page 144: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Na figura anterior, a direita, reduzimos o raio da bola (ε′ < ε) o que temcomo consequencia o aumento do ındice do primeiro termo a cair dentro danova bola.

Observacoes:

(i) Uma sequencia (xn) nao converge para a ∈ M quando existe uma bolacentrada em a fora da qual ficam infinitos termos da sequencia (xn).

(ii) A convergencia − ou divergencia − de uma sequencia depende tanto doconjunto M quanto da metrica d, como teremos oportunidade de ver.

Caracterizacao de convergencia via reta real

Podemos caracterizar a convergencia em um espaco metrico (M, d) qual-quer via convergencia no espaco (R, µ). Este e o conteudo da proxima im-portante

Proposicao 9. A sequencia (xn) converge para o ponto a em (M, d) se, esomente se, a sequencia∗

(d(xn , a)

)converge para 0 no espaco (R, µ).

Prova:

(=⇒) H: xn−→da ⇒ T: d(xn , a)−→

µ0.

De fato, para mostrar que(d(xn , a)

)converge para 0 em (R, µ), devemos

mostrar que ∀ ε > 0 dado existe n0 ∈ N tal que

∣∣d(xn , a)− 0

∣∣ < ε para todo n ≥ n0 . (4.3)

Por hipotese, xn−→da; logo ∀ ε > 0 dado existe n0 tal que d(xn , a) < ε

para todo n ≥ n0 .

Fixado ε > 0, tomamos este mesmo n0 e garantimos

∣∣d(xn , a)− 0

∣∣ = d(xn , a) < ε, ∀n ≥ n0

O que prova (4.3).

(⇐=) H: d(xn , a)−→µ

0 ⇒ T: xn−→da.

De fato, para mostrar que (xn) converge para a em (M, d) devemos,∀ ε > 0 dado, exibir um n0 tal que d(xn , a) < ε para todo n ≥ n0 .

Por hipotese, a sequencia(d(xn , a)

)converge para 0 no espaco (R, µ);

isto e, ∀ ε > 0 dado, existe um n0 tal que∣∣d(xn , a) − 0

∣∣ = d(xn , a) < ε,

para todo n ≥ n0 . Logo, o mesmo n0 − oriundo da hipotese − serve paracorroborar a tese. �

Teremos agora oportunidade de ilustrar o conteudo das duas proposicoesanteriores. (prop.’s 8 e 9)

∗Observe que(

d(xn , a))

e uma sequencia de numeros reais nao negativos.

143

Page 145: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) Em qualquer espaco metrico (M, d) uma sequencia (a, a, a, . . .) de ter-mos constantes converge para este termo.

De fato, dentro de qualquer bola B(a; ε) estao todos os termos da sequencia.

2) Seja M = R e xn = 1n ∈ R. A sequencia (xn) = (1, 1

2 ,13 , . . .) nao e con-

vergente no espaco (R, δ). No espaco (R, µ) esta sequencia converge para0. Isto e

xn −→ 0.µexn −→ cδ/

Onde c pode ser qualquer numero real.Inicialmente vamos mostrar a primeira destas afirmativas. Com efeito,

basta observar que todos os termos da sequencia (xn), a excecao possıvel deum deles, estao fora da bola B

δ

(c ; 1

)= { c } (p. 108).

Vamos mostrar agora que xn −→µ

0. Inicialmente centramos uma bolaBµ , de raio ε, em 0, assim

Bµ(0; ε) =]0− ε, 0 + ε

[=]− ε, +ε

[

Observe que

xn ∈ Bµ(0; ε) ⇐⇒ −ε < 1

n< ε.

Segundo a propriedade arquimediana, ∀ ε > 0 existe um n0(ε) ∈ N tal que1n0< ε. Tomamos − de emprestimo a Arquimedes − este n0 , resultando

∀n ≥ n0 ⇒1

n≤ 1

n0

< ε ⇒ xn ∈ Bµ(0; ε).

Facamos duas simulacoes para ilustrar esse resultado:

- Por exemplo, tomando ε = 13 , temos

1

n0

< ε =1

3⇐⇒ n0 > 3.

Ou seja, todos os termos da sequencia, a partir do quarto (inclusive), caemdentro da bola Bµ

(0; 1

3

). Veja a ilustracao a seguir

⊢ qqqqqqqqqqq0 1

x1x2x3x4···

⊢ qqqqqqqqqqq0 1

(xn)

x1x2x4···] [

−ε=− 13

ε= 13

n0=4ր

Agora vamos reduzir o valor do raio, por exemplo, ε = 320 , temos

1

n0

< ε =3

20⇐⇒ n0 >

20

3,

144

Page 146: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Ou seja, todos os termos da sequencia, a partir do setimo (inclusive), caemdentro da bola Bµ

(0; 3

20

). Veja a ilustracao a seguir

⊢ qqqqqqqqqqq (xn)

0 1

x1x2x3x4···

⊢ qqqqqqqqqqq0 1

x1x2x3x4···] [−ε ε= 3

20

n0=7

ց

3) Esse exemplo (proposicao) nos diz, de uma outra perspectiva, por que asequencia (xn) = (1, 1

2 ,13 , . . .) nao e convergente no espaco (R, δ).

Proposicao: Seja (M, d) um espaco discreto. Toda sequencia (xn) conver-gente em (M, d) deve ser constante a partir de um certo ındice.

Prova: De fato, suponha que xn −→ a ∈ M . Entao para todo ε > 0 dado,existe um ındice nε de modo que para todo n ≥ nε temos xn ∈ B(a; ε).

Como (M, d) e discreto, existe εa > 0 de modo que B(a; εa) = { a }.Logo, para este εa existe um ındice nεa de modo que

Se n ≥ nεa ⇒ xn ∈ B(a; εa) = { a } ⇒ xn = a.

Observe que esta e uma condicao necessaria (e tambem suficiente) paraque uma sequencia seja convergente em um espaco discreto.

4) Uma Patologia

Considere a sequencia dada por xn = 1− 1n ∈ [ 0, 1 [ , cujos termos estao

plotados na figura a seguir:

0 12

r r r r r r r rrrrrx1 x2 x3 x4. . .

O leitor diria que os termos desta sequencia aproximam-se de que numero?

Vamos mostrar que para os habitantes do universo([ 0, 1 [, k

), os ter-

mos da sequencia (xn) aproximam-se arbitrariamente de 0. De outro modo:Toda bola centrada em 0 contem todos os termos da sequencia, a partir deuma certa ordem. Desejamos provar que

limn→∞

(

1− 1

n

)

= 0.

Prova: De fato, dado ε > 0 devemos exibir um ındice n0(ε) de modo que

∀n ≥ n0 ⇒ xn ∈ Bk(0; ε).

145

Page 147: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Entao

xn ∈ Bk(0; ε) ⇐⇒ k(xn , 0) < ε

⇐⇒ min{|xn − 0|, 1− |xn − 0|

}< ε

⇐⇒ min{xn , 1− xn

}< ε

⇐⇒ min{

1− 1

n, 1−

(1− 1

n

) }

< ε

⇐⇒ min{

1− 1

n,1

n

}

< ε

Temos

min{

1− 1

n,1

n

}

=1

n, ∀n ≥ 2.

Portanto, e suficiente tomar 1n < ε, isto e, n > 1

ε ou ainda: n0(ε) >1ε . �

Facamos duas simulacoes para ilustrar esse resultado:

- Por exemplo, tomando ε = 14 , temos

n0(ε) >114

= 4 ⇒ n0 = 5.

Logo, todos os termos da sequencia, a partir do quinto (inclusive), caemdentro da bola B

k

(0; 1

4

). Veja a ilustracao a seguir

0 12

Bk(0; 1

4)

14

34

r r r r r r r rrrrrx1 x2 x3 x4. . .

Agora vamos reduzir o valor do raio, por exemplo, ε = 16 , temos

n0(ε) >116

= 6 ⇒ n0 = 7.

Ou seja, todos os termos da sequencia, a partir do setimo (inclusive), caemdentro da bola B

k

(0; 1

6

). Veja a ilustracao a seguir

0 12

Bk(0; 1

6)

16

56

r r r r r r r rrrrrx1 x2 x3 x4. . .

146

Page 148: Gentil Lopes - Espaços Métricos

5) Uma Patologia-2D

As quatro sequencias dadas a seguir

xn =(

1n+1

, 1− 1n+1

)→

zn =(

1n+1

, 1n+1

)→

← tn =(1− 1

n+1, 1− 1

n+1

)

← yn =(1− 1

n+1, 1n+1

)

0 1

1

rrrrr

x2

x3

r r rry2y3rrrr z2z3

r r rr

t2t3

pertencem todas as diagonais do quadrado unitario [ 0, 1 [×[ 0, 1 [. O centrodo quadrado

(12 ,

12

)e o primeiro termo de todas elas.

Deixamos como exercıcio ao leitor mostrar que

D1((0, 0); xn) = D1((0, 0); yn) = D1((0, 0); zn) = D1((0, 0); tn) =

√2

(n+ 1),

D2((0, 0); xn) = D2((0, 0); yn) = D2((0, 0); zn) = D2((0, 0); tn) =2

(n+ 1),

D3((0, 0); xn) = D3((0, 0); yn) = D3((0, 0); zn) = D3((0, 0); tn) =1

(n+ 1).

Pois bem, o leitor pode mostrar que qualquer uma destas sequenciasconverge para a origem do quadrado. (sugestao: prop. 9, p. 143)

Isto e, mostre que:

limn→∞

( 1

n+ 1, 1− 1

n+ 1

)

= (0, 0), limn→∞

(

1− 1

n+ 1,

1

n+ 1

)

= (0, 0)

limn→∞

( 1

n+ 1,

1

n+ 1

)

= (0, 0), limn→∞

(

1− 1

n+ 1, 1− 1

n+ 1

)

= (0, 0)

A bolas abertas cujos esbocos encontram-se nas p. 125, p. 114 nosajudam a compreender por que isto acontece.

6) Consideremos a sequencia (xn) de pontos do R2 dada por

xn =(

1− 1

n, 2− 2

n

)

Vamos mostrar (e ilustrar) que xn −→ (1, 2) nos espacos(R2, Di

).

Consideremos inicialmente a metrica euclidiana.

Prova: De fato, dado ε > 0 devemos exibir um ındice n0(ε) de modo que

∀n ≥ n0 ⇒ xn ∈ BD1

((1, 2); ε

).

147

Page 149: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Entao

xn ∈ BD1

((1, 2); ε

)⇐⇒ D1

((

1− 1

n, 2− 2

n

)

; (1, 2)

)

< ε

⇐⇒√(1− 1

n− 1)2

+(2− 2

n− 2)2< ε

⇐⇒√5

n< ε.

Logo, dado ε > 0 escolhemos um ındice n0(ε) satisfazendo a desigualdade

n0(ε) >√5ε e teremos

∀n ≥ n0 ⇒1

n≤ 1

n0

<

√5

n0

< ε ⇒ xn ∈ BD1

((1, 2); ε

).

Facamos duas simulacoes para ilustrar esse resultado:

- Por exemplo, tomando ε = 23 , temos

n0

(2

3

)>

√5

2/3=

3√5

2= 3, 354 . . . ⇒ n0 = 4.

Logo, todos os termos da sequencia, a partir do quarto (inclusive), caemdentro da bola BD1

((1, 2); 2

3

). Veja a ilustracao a seguir (fig. esquerda)

s(1, 2)

x

y

(0, 0) q

q

q

1

1

2

rx1

rx2rx3rx4rrrrrrrr

s

x

y

(0, 0) q

q

q

1

1

2

qx1

qx2qx3qx4qqqqqqqq

148

Page 150: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Agora vamos reduzir o valor do raio, por exemplo, ε = 13 ; logo

n0

(1

3

)>

√5

1/3= 3√5 = 6, 708 . . . ⇒ n0 = 7.

Logo, todos os termos da sequencia, a partir do setimo (inclusive), caemdentro da bola B

D1

((1, 2); 1

3

). Veja a figura anterior. (fig. direita)

• Consideremos agora o espaco(R2, D2

).

Prova: De fato, dado ε > 0 devemos exibir um ındice n0(ε) de modo que

∀n ≥ n0 ⇒ xn ∈ BD2

((1, 2); ε

).

Entao

xn ∈ BD2

((1, 2); ε

)⇐⇒ D2

((1− 1

n, 2− 2

n

); (1, 2)

)

< ε

⇐⇒∣∣1− 1

n− 1∣∣ +

∣∣2− 2

n− 2∣∣ < ε

⇐⇒ 3

n< ε.

Logo, dado ε > 0 escolhemos um ındice n0(ε) satisfazendo a desigualdaden0(ε) >

3ε e teremos

∀n ≥ n0 ⇒1

n≤ 1

n0

<3

n0

< ε ⇒ xn ∈ BD2

((1, 2); ε

).

Facamos duas simulacoes para ilustrar esse resultado:

- Por exemplo, tomando ε = 23 , temos

n0

(2

3

)>

3

2/3=

9

2= 4, 5 ⇒ n0 = 5.

Logo, todos os termos da sequencia, a partir do quinto (inclusive), caemdentro da bola BD2

((1, 2); 2

3

).

Agora vamos reduzir o valor do raio, por exemplo, ε = 13 ; entao

n0

(1

3

)>

3

1/3= 9 ⇒ n0 = 10.

Logo, todos os termos da sequencia, a partir do decimo (inclusive), caemdentro da bola B

D2

((1, 2); 1

3

).

149

Page 151: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A figura a seguir ilustra essas duas simulacoes

s(1, 2)

x

y

(0, 0) q

q

q

1

1

2

rx1

rx2rx3rx4rrrrrrrr

s

x

y

(0, 0) q

q

q

1

1

2

qx1

qx2qx3qx4qqqqqqqq

• Consideremos agora o espaco(R2, D3

).

Prova: De fato, dado ε > 0 devemos exibir um ındice n0(ε) de modo que

∀n ≥ n0 ⇒ xn ∈ BD3

((1, 2); ε

).

Entao

xn ∈ BD3

((1, 2); ε

)⇐⇒ D3

((1− 1

n, 2− 2

n

); (1, 2)

)

< ε

⇐⇒ max{∣∣1− 1

n− 1∣∣,∣∣2− 2

n− 2∣∣

}

< ε

⇐⇒ max{ 1

n,2

n

}< ε

⇐⇒ 2

n< ε.

Logo, dado ε > 0 escolhemos um ındice n0(ε) satisfazendo a desigualdaden0(ε) >

2ε e teremos

∀n ≥ n0 ⇒1

n≤ 1

n0

<2

n0

< ε ⇒ xn ∈ BD3

((1, 2); ε

).

Facamos duas simulacoes para ilustrar esse resultado:

- Por exemplo, tomando ε = 23 , temos

n0

(2

3

)>

2

2/3= 3 ⇒ n0 = 4.

150

Page 152: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Logo, todos os termos da sequencia, a partir do quarto (inclusive), caemdentro da bola BD3

((1, 2); 2

3

). Veja a ilustracao a seguir (fig. esquerda)

s(1, 2)

x

y

(0, 0) q

q

q

1

1

2

rx1

rx2rx3rx4rrrrrrrr

s

x

y

(0, 0) q

q

q

1

1

2

qx1

qx2qx3qx4qqqqqqqq

Agora vamos reduzir o valor do raio, por exemplo, ε = 13 ; logo

n0

(1

3

)>

2

1/3= 6 ⇒ n0 = 7.

Logo, todos os termos da sequencia, a partir do setimo (inclusive), caemdentro da bola B

D3

((1, 2); 1

3

). Veja a figura anterior. (fig. direita)

Na figura seguinte juntamos as tres bolas em um so grafico:

s(1, 2)

x

y

(0, 0) q

q

q

1

1

2

rx1

rx2rx3rx4rrrrrrrr

s

x

y

(0, 0) q

q

q

1

1

2

qx1

qx2qx3qx4qqqqqqqq

151

Page 153: Gentil Lopes - Espaços Métricos

7) Vamos mostrar que a sequencia de funcoes (xn), dada por (p. 139)

xn(t) =

1− nt , se 0 ≤ t ≤ 1n ;

0 , se 1n ≤ t ≤ 1.

converge para a funcao nula, no espaco(C[ 0, 1 ], Γ

), mas nao no espaco

(C[ 0, 1 ], Υ

). Isto e

xn −→ 0Γ e xn −→ 0Υ/

Vamos mostrar a convergencia de dois modos:Prova: (prop. 8, p. 142)

Vamos centrar uma bola, de raio ε arbitrario, na funcao nula:

BΓ(0; ε) =

{f ∈ C[ 0, 1 ] : Γ(f, 0) < ε

}

={

f ∈ C[ 0, 1 ] :∫ 1

0|f(x)− 0| dx < ε

}

Queremos obter n0 ∈ N de modo que

∀n ≥ n0 ⇒ Γ(xn , 0) < ε(ou ainda xn ∈ BΓ

(0; ε))

Temos

Γ(xn , 0) =

∫ 1

0|xn(t)| dt =

1

2n

Obs: Esta integral e dada pela area sob o grafico de xn(t). (p. 139)

Impondo,

1

2n< ε ⇒ n >

1

Portanto qualquer n0 maior que 12ε serve aos nossos propositos. �

Prova: (prop. 9, p. 143)

Mostremos que d(xn ,0) = Γ(xn ,0) −→µ

0. De fato,

Γ(xn ,0) =1

2n−→µ 0

Geometricamente esta convergencia significa que as areas (distancias)entre os graficos das funcoes xn e da funcao nula vao tendendo a zero, amedida que n cresce. Veja:

152

Page 154: Gentil Lopes - Espaços Métricos

t

x1 (t)

0 q

q

1

1

t

x2(t)

0 12

q

q

1

1

t

x3 (t)

0 13

q

q

1

1

Vamos mostrar a divergencia Pela proposicao 9 (p. 143)

Prova: Temos

Υ(xn ,0) = max{|xn(t)− 0| : t ∈ [ 0, 1 ]

}

= max{|xn(t)| : t ∈ [ 0, 1 ]

}

se 0 ≤ t ≤ 1n , entao

0 ≤ nt ≤ 1 ⇒ −1 ≤ −nt ≤ 0 ⇒ 0 ≤ 1− nt ≤ 1

⇒ xn(t) ∈ [ 0, 1 ].

e se 1n ≤ t ≤ 1 entao, por definicao, xn(t) = 0. Logo xn(t) = |xn(t)| ∈

[ 0, 1 ] para todo 0 ≤ t ≤ 1 e para todo n ∈ N.

Logo, para todo n natural temos

Υ(xn ,0) = max{|xn(t)| : t ∈ [ 0, 1 ]

}= max [ 0, 1 ] = 1.

Geometricamente Υ(xn ,0) representa o comprimento da maior cordaligando o grafico de xn ao grafico da funcao nula 0. No grafico seguinte

t

xn (t)

0

maior corda→

1n

q

q

1

1

Observamos que o comprimento da maior corda e 1, para todo n natural,isto e, Υ(xn ,0) = 1, ∀n ∈ N. Pois bem,

(d(xn , 0)

)=(Υ(xn , 0)

)= (1, 1, 1, . . .) −→µ 1.

Portanto a sequencia em questao nao converge para a funcao nula, no espaco(C[ 0, 1 ], Υ

). �

153

Page 155: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 10. Se uma sequencia(xn

)e convergente, entao existe uma

bola que contem todos os seus termos.

Prova: De fato, se xn −→ a ∈ M , entao para todo ε1 dado, existen0 ∈ N de modo que

d(xn , a) < ε1 , ∀n ≥ n0 .

tomemos

ε2 > max{d(xi , a) : i = 1, 2, . . . , n0 − 1

},

logo

d(xi , a) < ε2 , i = 1, 2, . . . , n0 − 1.

seja ε > max{ε1 , ε2}. Logo

d(xn , a) < ε1 < ε , ∀n ≥ n0 ,

d(xi , a) < ε2 < ε , i = 1, 2, . . . , n0 − 1.

Portanto todos os termos da sequencia cabem dentro da bola B(a; ε). �

Cabe aqui perguntar se uma sequencia pode convergir para dois pontosdistintos de um espaco metrico. Nos espacos topologicos − que sao genera-lizacoes dos espacos metricos − isto de fato pode acontecer. Mas nao nosespacos metricos especificamente. Isto e o que nos garante a proxima

Proposicao 11 (Unicidade do limite). Seja (xn) uma sequencia convergenteno espaco metrico (M, d). Entao e unico o limite dessa sequencia.

∗Prova: Temos

H1 : limnxn = p

⇒ T: p = q.H2 : lim

nxn = q

H1 ∧ T =⇒ H2

Suponha p 6= q. Pela propriedade (P4) (p. 127) podemos centrar em cadaum destes pontos, bolas abertas disjuntas. Como lim

nxn = p entao existe

um ındice n0 a partir do qual todos os termos da sequencia caem dentro dabola de centro p; por conseguinte nao podemos ter lim

nxn = q.

(prop. 8, p. 142).

∗Faremos uso da tecnica (T− 4) (p. 571).

154

Page 156: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 12. Seja (M, d) um espaco metrico e (xn) uma sequencia depontos em M .

Se limxn = a, entao toda subsequencia de (xn) tambem converge para a.

Prova: De fato, seja (xn)n∈ N1, onde N1 = {n1 < n2 < n3 < . . . }, uma

subsequencia de(xn

)

n∈N. Dado ε > 0 devemos exibir um ındice k ∈ N de

modo que

d(xnj, a) < ε, ∀nj ∈ N1 : nj ≥ k (4.4)

Como, por hipotese, (xn)n∈Nconverge para a, entao ∀ ε > 0 dado, existe um

ındice n0 ∈ N de modo que

d(xn , a) < ε, ∀n ≥ n0 (4.5)

como N1 ⊂ N e infinito, segue que existe um ındice k ∈ N1 tal que k ≥ n0 .

Entao, para todo ındice nj ∈ N1 tal que nj ≥ k ≥ n0 temos, por (4.5),que d(xnj

, a) < ε e, portanto, (4.4) estara satisfeita. �

Esta proposicao e de utilidade tanto para mostrar que uma sequencia con-verge quanto para mostrar que uma sequencia diverge.

Por exemplo as sequencias reais(zn)e(wn

)dadas por

zn =1

2ne wn =

1

n2

sao ambas convegentes para 0 no espaco (R, µ). De fato, temos que

(zn) = (xn)n∈N1

(wn) = (xn)n∈N2

onde

N1 = { 2, 4, 8, 16, 32, . . . }; N2 = { 1, 4, 9, 16, 25, . . . }.

e (xn) e a sequencia vista no exemplo 2. (p. 144)

Por outro lado, para mostrar que uma dada sequencia diverge e sufi-ciente exibir duas subsequencias convergindo para limites distintos (isto econsequencia das proposicoes 11 e 12).

Por exemplo a sequencia (1, −1, 1, −1, 1, −1, . . .) diverge, em todo espacometrico, visto que temos duas subsequencias

(x2n−1

)= (1, 1, 1, . . .) −→ 1 ,

(x2n

)= (−1, −1, −1, . . .) −→ −1.

convergindo para limites distintos.

155

Page 157: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Sequencias limitadas

Uma sequencia (x1 , x2 , x3 , . . .) pode ser vista como uma “lista” orde-nada infinita. Usaremos a seguinte notacao {x1 , x2 , x3 , . . . } para o conjuntode seus termos. Aqui a ordem dos termos nao interessa e este conjunto podeser finito, ao contrario da lista, que e sempre infinita.

Por exemplo, seja a sequencia (xn) dada por xn = (−1)n−1. Temos(xn

)= (1, −1, 1, −1, 1, −1, . . .)

{xn

}= {−1, 1 }

Uma sequencia foi definida como uma aplicacao x : N −→ M , por con-seguinte o conjunto dos termos da sequencia e a imagem direta de N pelaaplicacao, isto e, {xn} = x(N).

Definicao 17 (Sequencia limitada). Sejam (M, d) um espaco metrico e(xn) uma sequencia de pontos em M . A sequencia (xn) se diz limitada noespaco (M, d) quando o conjunto {xn } de seus termos e limitado.

Ou ainda (Ver definicao a p. 53):(xn

)e limitada no espaco (M,d) se existir

uma constante c > 0 tal que d(x, y) ≤ c para quaisquer x e y em {xn }.Exemplo: a sequencia (1, 2, 3, 4, . . .) e limitada no espaco (R, δ), mas naono espaco (R, µ).

Proposicao 13. Toda sequencia convergente e limitada.

Prova: Se uma sequencia e convergente entao existe uma bola no espacocontendo todos os seus termos, logo, pela proriedade (P6) (p. 127) das bolasabertas, concluimos que a sequencia e limitada. �

A recıproca da proposicao anterior nao vale. Isto e, uma sequencia limitadapode ou nao convergir. Por exemplo, a sequencia

(1, 12 ,

13 , . . .

)e limitada

nos espacos (R, µ) e (R, δ), mas e convergente apenas no primeiro destesespacos.

∗ ∗ ∗Renunciar a meta de compreender a “coisa em si”, de conhecer a

“verdade ultima”, de decifrar a essencia mais profunda do mundo, podeser um sofrimento psicologico para os entusiastas ingenuos, mas de fatofoi uma das mais frutıferas viradas no pensamento moderno. [. . .]

Atraves dos tempos, os matematicos tem considerado seus objetos,tais como numeros, pontos, etc., como coisas substanciais em si. Umavez que estas entidades sempre tinham desafiado tentativas de uma de-scricao adequada, manifestou-se corretamente nos matematicos do seculoXIX a conviccao de que a questao do significado destes objetos comocoisas substanciais nao fazia sentido dentro da Matematica, ou mesmoem geral.

(Richard Courant/O que e Matematica?)

156

Page 158: Gentil Lopes - Espaços Métricos

4.3 Sequencias num Espaco Produto

Sejam (M1 , d1) e (M2 , d2) espacos metricos e as sequencias

(xn

)= (x1 , x2 , x3 , . . .),

(yn)= (y1 , y2 , y3 , . . .)

em M1 e M2 , respectivamente. O “produto cartesiano” destas sequencias

(xn

)×(yn)= (x1 , x2 , x3 , . . .)× (y1 , y2 , y3 , . . .)

=((x1 , y1), (x2 , y2), (x3 , y3), . . .

)

e uma sequencia no produto cartesiano M1 ×M2 =M .A convergencia (ou divergencia) da sequencia

((xn , yn)

)nos espacos

(M, Di) (i = 1, 2, 3.) e objeto da proxima

Proposicao 14. Uma sequencia((xn , yn)

)no produto M =M1 ×M2 con-

verge no espaco(M, Di

)(i = 1, 2, 3.) para (a, b) ∈ M1 ×M2 se, e somente

se, xn −→ a em (M1 , d1) e yn −→ b em (M2 , d2).

x1

y1 (x1 , y1)

x2

y2 (x2 , y2)

x3

y3 (x3 , y3)

···→

... . ..

ր↑

a

b (a, b)M

(M1 , d1 )

(M2 , d2 )

Prova: (=⇒)H: (xn , yn) −→ (a,b) T:

xn−→ a

yn−→ b

d1

d2

Di

Faremos a prova para a metrica

D3(x, y) = max{d1(x1 , y1); d2(x2 , y2)

}

Deixando como exercıcio a prova nas outras duas metricas.

157

Page 159: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Com efeito, seja ε > 0 dado, entao existe um ındice n0 tal que

n ≥ n0 ⇒ D3

((xn , yn); (a, b)

)= max

{d1(xn , a); d2(yn , b)

}< ε

portanto, para todo n ≥ n0 , temos

d1(xn , a) < ε e d2(yn , b) < ε

o que nos garante

xn−→d1 a e yn−→

d2 b

(⇐=)

T: (xn , yn ) −→ (a,b)H:

xn−→ a

yn−→ b

d1

d2

D3

Dado ε > 0, por hipotese, existem ındices n1 e n2 tais que

n ≥ n1 ⇒ d1(xn , a) < ε e n ≥ n2 ⇒ d2(yn , b) < ε

Considerando n0 = max{n1 , n2 }, temos

n ≥ n0 ⇒ d1(xn , a) < ε e d2(yn , b) < ε

⇒ max{d1(xn , a); d2(yn , b)

}< ε

⇒ D3

((xn , yn); (a, b)

)< ε.

Portanto (xn , yn)−→D3 (a, b). �

Exemplos:

(a) No espaco(R2, D1

)a sequencia

(xn , yn

)=(1n , 1), isto e

(

(1, 1),(1

2, 1),(1

3, 1), . . .

)

converge para o ponto (0, 1), pois

xn−→µ

0 e yn−→µ

1

Observacao: Na verdade temos (para i = 1, 2, 3.)

(xn , yn

)−→Di (0, 1).

(b) Nos espacos(R2, Di

)a sequencia

(xn , yn

)=(

1n , (−1)n

), isto e

(

(1, −1),(1

2, 1),(1

3,−1

), . . .

)

158

Page 160: Gentil Lopes - Espaços Métricos

nao converge. Com efeito,(yn)

= (−1, 1, −1, 1, . . .) nao converge em(R, µ

).

(c) Seja o espaco metrico(R2, Di

)e a sequencia de pontos do plano:

(xn , yn

)=

(

1− 1

n, 2− 2

n

)

, entao xn −→ (1, 2).

Isto se deve a quexn−→

µ1 e yn−→

µ2

Comparar com o exemplo 6, p. 147.

(d) Ver exemplo 5, p. 147.

4.4 Sequencias em Espacos Vetoriais Normados

4.4.1 Sequencias na reta

No espaco(R, µ

)sao importantes as chamadas sequencias monotonas

que sao classificadas como:

(a) Crescentes sao as sequencias (xn) tais que xn ≤ xn+1 , para todo ındicen. Em particular, quando xn < xn+1 , ∀n ∈ N, entao (xn) se diz estritamentecrescente.

Rr r r r r r rrrrrx1 x2 x3 x4 ···

(b) Decrescentes sao as sequencias (xn) tais que xn ≥ xn+1 , para todo ındicen. Em particular, quando xn > xn+1 , ∀n ∈ N, entao (xn) se diz estritamentedecrescente.

Rrrrrrrrrrrr x1x2x3x4···

Exemplos:

(i)(

1n

)

n∈N=(1, 1

2 ,13 , . . .

)e estritamente decrescente.

(ii)(1− 1

n

)

n∈N=(0, 1

2 ,23 , . . .

)e estritamente crescente.

(iii)(

2n+1−(−1)n4

)

n∈N

= (1, 1, 2, 2, 3, 3, . . .) e crescente.

(iv)(

1−(−1)n2

)

n∈N

= (1, 0, 1, 0, . . .) nao e monotona.

159

Page 161: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 15. Toda sequencia crescente cujo conjunto dos termos e lim-itado superiormente converge para o supremo desse conjunto.

Prova: Suponhamos (xn) uma sequencia em R satisfazendo:

(i) x1 ≤ x2 ≤ x3 ≤ · · ·(ii)

{xn

}limitado. Isto e, existe c > 0 de modo que

d(xi , xj ) ≤ c ; ∀xi , xj ∈{xn

}.

Respaldados na propriedade do supremo∗ facamos

sup{xn : n = 1, 2, 3, . . .

}= p

Afirmamos que limnxn = p. De fato, dado ε > 0, nao pode ocorrer xn ≤ p−ε

para todo ındice n pois isto implicaria numa cota superior − para o conjunto{xn

}−menor do que p (isto e, p nao seria supremo). Logo, existe um ındice

r de modo que p− ε < xr ≤ p. Como a sequencia e crescente, temos

x1 ≤ x2 ≤ · · · ≤ xr ≤ xr+1 ≤ xr+2 ≤ · · ·

logop− ε < xr ≤ xr+1 ≤ xr+2 ≤ · · ·

isto e,p− ε < xn < p+ ε, ∀n ≥ r.

Por conseguinten ≥ r ⇒ |xn − p| < ε

o que garante nossa tese: limnxn = p. �

Nota: De modo analogo prova-se que: “Toda sequencia decrescente cujoconjunto dos termos e limitado inferiormente converge para o ınfimo desseconjunto”.

Proposicao 16. (Conservacao do sinal)

(a) Se (xn) e uma sequencia em R com limnxn = p > 0, entao existem um

ındice r e uma constante c > 0 de modo que xn > c para todo n ≥ r.Isto e, se o limite de uma sequencia e um numero positivo entao, a partir

de uma certa ordem, todos os seus termos sao positivos.(b) Se lim

nxn = p < 0, entao existem um ındice r e uma constante c < 0 de

modo que xn < c para todo n ≥ r.

Prova: (a) Como limnxn = p, para todo ε > 0 existe um ındice n0 :

n ≥ n0 ⇒ |xn − p| < ε

∗Todo conjunto limitado superiormente tem supremo.

160

Page 162: Gentil Lopes - Espaços Métricos

seja, por exemplo, ε = p2 > 0 e r = n0 , entao

n ≥ r ⇒ |xn − p| <p

2⇒ −p

2< xn − p <

p

2

⇒ p

2< xn <

3p

2.

Tome c =p

2.

(b) A demonstracao deste caso e analoga, toma-se ε =|p|2. �

4.4.2 Sequencias em espacos normados

Consideraremos agora um espaco vetorial(E, +, ·

)normado. Lem-

bramos que a origem de E, denotadad por 0, e o elemento neutro da adicao(vetor nulo).

Proposicao 17. Seja(xn

)uma sequencia de pontos em um espaco vetorial

real(E, +, ·

), normado, que converge para p ∈ E. Entao existe uma bola

de centro na origem contendo todos os termos da sequencia.

Prova: Como limnxn = p, para todo ε > 0 dado, existe um ındice n0 de

modo que∀ n ≥ n0 ⇒ d(xn , p) = ‖xn − p‖ < ε (4.6)

Sendo‖xn‖ = ‖xn − p+ p‖ ≤ ‖xn − p‖+ ‖p‖

entao para todo n ≥ n0 tem-se

‖xn‖ ≤ ‖xn − p‖+ ‖p‖ < ‖p‖+ ε (4.7)

onde somamos ‖p‖ na desigualdade (4.6). Seja

λ > max{‖x1‖, ‖x2‖, . . . , ‖xn0−1‖, ‖p‖+ ε

}

Logo, usando (4.7), podemos escrever

‖xn − 0‖ = ‖xn‖ < λ, ∀n ∈ N.

Nota: Observe a diferenca entre esta proposicao e a proposicao 10 (p. 154).Aquela vale para espacos metricos em geral e a bola esta centrada no limiteda sequencia. Aqui a proposicao vale apenas para espacos vetoriais norma-dos e a bola esta centrada no vetor nulo.

161

Page 163: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vamos ilustrar a proposicao anterior para a sequencia (xn) vista no exem-plo 6 (p. 147). Temos

(

1− 1

n, 2− 2

n

)

−→ p = (1, 2).

Vamos fixar ε = 23 , no espaco

(R2, ‖ · ‖

D1

). Ja vimos que para ε = 2

3resulta n0 = 4. Escolhamos

λ > max

{

‖x1‖D1, ‖x2‖D1

, ‖x3‖D1, ‖p‖

D1+

2

3

}

onde

‖x1‖D1= ‖(0, 0)‖

D1=√

02 + 02 = 0

‖x2‖D1=

∥∥∥∥

(1

2, 1)∥∥∥∥

D1

=

√(1

2

)2+ 12 =

√5

2

‖x3‖D1=

∥∥∥∥

(2

3,4

3

)∥∥∥∥

D1

=

√(2

3

)2+(4

3

)2=

2√5

3

‖p‖D1

= ‖(1, 2)‖D1

=√

12 + 22 =√5.

Portanto

λ > max

{

0,

√5

2,2√5

3,√5 +

2

3

}

⇒ λ >√5 +

2

3= 2, 902 . . .

Na ilustracao seguinte tomamos λ = 2, 91

B(0, λ)

q(1, 2)

x

y

0qx1qx2qx3qx4qqqqqqqq

162

Page 164: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicao 18. Sejam(xn

)e(yn)sequencias em

(E, +, ·

). Chama-se soma

de(xn

)com

(yn)a sequencia

(xn

)+(yn)=(xn + yn

)=(x1 + y1 , x2 + y2 , . . .

)

Se(λn

)e uma sequencia de elementos em R. Chama-se produto de

(λn

)

com(xn

)a sequencia

(λn

)(xn

)=(λn xn

)=(λ1 x1 , λ2 x2 , λ3 x3 , . . .

)

Proposicao 18. Sejam(xn

)e(yn)sequencias em um espaco vetorial

(E, +, ·

)

normado. Se limnxn = p e lim

nyn = q, entao lim

n

(xn + yn

)= p+ q.

Prova: Dado ε > 0, por hipotese, existem ındices r e s tais que:

∀n ≥ r ⇒ ‖xn − p‖ < ε/2

∀n ≥ s ⇒ ‖yn − q‖ < ε/2

Seja t = max{ r, s }, entao

∀n ≥ t ⇒∥∥(xn + yn

)−(p+ q

)∥∥ ≤ ‖xn − p‖+ ‖yn − q‖ < ε

o que implica(xn + yn

)−→ p+ q. �

Proposicao 19. Se (xn) e uma sequencia convergente em um um espacovetorial

(E, +, ·

)normado, entao lim

n

(− xn

)= − lim

nxn .

Prova: Suponha limnxn = p, entao dado ε > 0 existe um ındice n0 :

∀n ≥ n0 ⇒ ‖xn − p‖ < ε

⇒ ‖(−1)(xn − p

)‖ < ε

⇒ ‖(− xn

)− (−p)‖ < ε

⇒ limn(−xn) = −p.

Corolario 1. Se (xn) e (yn) sao sequencias convergentes em (R, µ) e sexn ≤ yn , a partir de uma determinada posicao m, entao lim

nxn ≤ lim

nyn .

∗Prova:

H : xn ≤ yn , ∀n ≥ m.

T : limnxn ≤ lim

nyn

∗Faremos uso da tecnica (T− 1) (p. 570).

163

Page 165: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De fato, suponhamos que limnxn > lim

nyn e consideremos a sequencia

(xn − yn

). Entao

limn

(xn − yn

)= lim

nxn − lim

nyn > 0

pela proposicao 16 (p. 160) existe um ındice r de modo que xn − yn > 0 paratodo ındice n ≥ r. Escolhamos um ındice k > max{ r, m }, entao x

k> y

ko

que contradiz a hipotese. �

Proposicao 20. Seja (xn) uma sequencia de pontos de um espaco vetorial(E, +, ·

)normado que converge para um ponto p ∈ E. Se (λn) e uma

sequencia do espaco (R, µ) tal que limnλn = λ, entao lim

nλnxn = λ p.

Prova: Dado ε > 0, como limnλn = λ decorre que

(i) tomando c > ‖p‖, existe um ındice r de modo que

∀n ≥ r ⇒ |λn − λ| <ε

2c(4.8)

(ii) segundo a proposicao 17 (p. 161) existe k > 0, tal que |λn | < k, ∀n.Por outro lado, como lim

nxn = p, existe um ındice m de modo que

∀n ≥ m ⇒ ‖xn − p‖ <ε

2k(4.9)

Temos

∥∥λn xn − λ p

∥∥ =

∥∥λn xn − λn p+ λn p− λ p

∥∥

=∥∥λn

(xn − p

)+(λn − λ

)p∥∥

≤∥∥λn

(xn − p

) ∥∥+

∥∥(λn − λ

)p∥∥

=∣∣λn

∣∣ ·∥∥xn − p

∥∥+

∣∣λn − λ

∣∣ ·∥∥p∥∥

De (4.8) e (4.9) decorre

∣∣λn − λ

∣∣ ·∥∥p∥∥ <

ε

2c·∥∥p∥∥, ∀n ≥ r.

∣∣λn

∣∣ ·∥∥xn − p

∥∥ <

∣∣λn

∣∣ · ε

2k, ∀n ≥ m.

Entao, para n ≥ max{ r, m } sucede∣∣λn − λ

∣∣ ·∥∥p∥∥+

∣∣λn

∣∣ ·∥∥xn − p

∥∥ <

ε

2c·∥∥p∥∥+

∣∣λn

∣∣ · ε

2k

Por outro lado∣∣λn

∣∣ < k ⇒

∣∣λn

∣∣ · ε

2k< k · ε

2k=ε

2

164

Page 166: Gentil Lopes - Espaços Métricos

como c >∥∥p∥∥, isto e

∥∥p∥∥ < c ⇒ ε

2c·∥∥p∥∥ <

ε

2c· c = ε

2

Por conseguinte

∥∥λn xn − λ p

∥∥ ≤

∣∣λn

∣∣ ·∥∥xn − p

∥∥+

∣∣λn − λ

∣∣ ·∥∥p∥∥

2c·∥∥p∥∥+

∣∣λn

∣∣ · ε

2k

2+ε

2= ε.

Desta desigualdade decorre a tese. �

Lema 2. Seja (xn) uma sequencia em um espaco vetorial(E, +, ·

)nor-

mado. Se (xn) converge para p, entao (‖xn‖) converge para ‖p‖.

Prova: Na proposicao 3 (p. 50) tomando X = { 0 } ⊂ M = E, p = p eq = xn obtemos

∣∣ ‖p− 0‖ − ‖xn − 0‖

∣∣ ≤ ‖p− xn‖ ⇒

∣∣ ‖xn‖ − ‖p‖

∣∣ ≤ ‖xn − p‖

Por outro lado, dado ε > 0, por hipotese existe um ındice n0 de modo que‖xn − p‖ < ε, para todo n ≥ n0 . Portanto

∣∣ ‖xn‖ − ‖p‖

∣∣ ≤ ‖xn − p‖ < ε

para todo n ≥ n0 . �

Antes de passarmos a proxima proposicao vejamos um exemplo. Con-sideremos a sequencia

(xn

)do exemplo 6 (p. 147):

xn =(

1− 1

n, 2− 2

n

)

−→ p = (1, 2)

Temos

• No espaco(R2, ‖ · ‖

D1

):

∥∥xn

∥∥

D1

=

√(1− 1

n

)2+(2− 2

n

)2=√5(1− 1

n

)−→√5

Por outro lado

∥∥p∥∥

D1

=∥∥(1, 2)

∥∥

D1

=√

12 + 22 =√5.

Fica como exercıcio a verificacao nos espacos(R2, ‖ · ‖

D2

)e(R2, ‖ · ‖

D3

).

165

Page 167: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 21. Seja (λn) uma sequencia de pontos no espaco (R, µ) talque lim

nλn = λ 6= 0. Entao a sequencia

(βn

)definida por

βn =

0, se λn = 0;

1

λn

se λn 6= 0.

converge para1

λ.

Prova: Devemos mostrar que o quociente∣∣∣∣

1

λn

− 1

λ

∣∣∣∣=|λn − λ||λn | · |λ|

a partir de um certo ındice n0 , e menor que qualquer ε > 0 fixado.

De fato, como limnλn = λ segue, pelo lema anterior, que lim

n|λn | = |λ|.

Como, por hipotese

λ 6= 0 ⇒ limn|λn | = |λ| > 0.

Pela prop. 16 (p. 160) existem um ındice r e uma constante c > 0 de modoque

|λn | > c, ∀n ≥ r. (4.10)

Por outro lado, como limnλn = λ, dado ε > 0 arbitrario, existe um ındice m

de modo que|λn − λ| < c |λ| ε, ∀n ≥ m. (4.11)

De (4.10) temos

c

|λn |< 1 ⇒ c ε

|λn |< ε, ∀n ≥ r. (4.12)

De (4.11) temos

|λn − λ||λ| <

c |λ| ε|λ| = c ε, ∀n ≥ m.

logo|λn − λ||λn | · |λ|

<c ε

|λn |, ∀n ≥ m.

Considerando n0 ≥ max{ r, m } e usando (4.12) podemos escrever

|λn − λ||λn | · |λ|

< ε, ∀n ≥ n0 .

166

Page 168: Gentil Lopes - Espaços Métricos

4.5 Quando eminentes matematicos cometem er-ros elementares

E aquilo que nesse momento se reve-

lara aos povos, surpreendera a todos nao

por ser exotico mas pelo fato de poder ter

sempre estado oculto quando tera sido o

obvio. (O ındio/Caetano Veloso)

Introducao: Um dos resultados mais controversos de toda a matematicadiz respeito a igualdade

0, 999 . . . = 1 (4.13)

Na referencia∗ o autor faz uma analise das representacoes decimais ondelemos:

“Comecemos com o caso mais simples, que e tambem o mais intrigante.Trata-se da expressao decimal, ou seja, do numero real

α = 0, 999 . . . =9

10+

9

100+

9

1000+ · · ·

Afirmamos que α = 1”. (grifo nosso)

Na referencia† lemos:

“[· · · ] voce deve ter concluido que 0, 999 . . . = 1. Esse sinal de igual eigual mesmo! Nao se trata de aproximacao: 0, 999 . . . e 1 sao duas formasdiferentes de apresentar o mesmo numero”. (grifo nosso)

Nesta secao estarei defendendo a tese de que estes matematicos − equantos pensem assim − estao ingenuamente equivocados.

Com o auxılio da metrica quantica provaremos a surpreendente igualdade

0, 999 . . . = 0

E isto mesmo caro leitor! Nao, nao trata-se de um erro de digitacao.

A descoberta desta igualdade me forneceu mais municao − digo, me deumais confianca − para discordar dos matematicos quanto a interpretacao daigualdade (4.13).

Para seguir em frente iremos necessitar relembrar o conceito de

Series∗Lima, Elon Lages. et alii A Matematica do Ensino Medio Vol. 1. Rio de Janeiro:

SBM, 1997.†Brolezzi, Antonio Carlos/Monteiro, Martha Salerno, Matematica: Numeros para que?

Universidade de Sao Paulo, Publicacao eletronica.

167

Page 169: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Este tema ja comparece no ensino medio quando procuramos por exem-plo pela “soma infinita” (progressao geometrica)

1

2+

1

4+

1

8+ · · ·

que e dada pela formula da soma dos infinitos termos de uma progressaogeometrica: S∞ =

a11−q , valida sempre que −1 < q < 1. No caso da serie

anterior, temos,1

2+

1

4+

1

8+ · · · =

12

1− 12

= 1 (4.14)

Formalizando a “teoria das series”, temos: Seja (an) uma sequencia denumeros reais. A partir dela, formamos uma nova sequencia (sn) cujos ter-mos sao as somas:

s1 = a1

s2 = a1 + a2

s3 = a1 + a2 + a3

−−−−−−−−−−−−−−sn = a1 + a2 + a3 + · · ·+ an

Os termos da sequencia (sn) sao chamados somas parciais da serie infinita∑an . Se existir o limite,

lim sn = limn→∞

(a1 + a2 + a3 + · · ·+ an)

diremos que a serie∑an e convergente e, nesse caso, lim sn = ℓ e chamado

de soma da serie. Em sendo este o caso, escrevemos,

ℓ =∑

an =

∞∑

n=1

an = a1 + a2 + a3 + · · ·+ an + · · ·

Se a sequencia (sn), de somas parciais, nao convergir, diremos que a serie∑∞

n=1 an e divergente.

Resumindo: A soma de uma serie∑an e simplesmente o limite da

sequencia (sn) de somas parciais.

A equacao sn = 1− 110n e a sequencia de somas parciais da serie

9

10+

9

100+

9

1000+ · · · = 0, 999 . . . (4.15)

sn foi obtida da equacao Sn =a1 (qn − 1)

q−1 , soma dos n termos de uma P.G.

Nota: Podemos, sempre que for conveniente, identificar uma serie com umarepresentacao decimal, como acima.

168

Page 170: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Pois bem, a serie (4.15) converge para 1 na metrica usual, veja:

|sn − 1| =∣∣1− 1

10n− 1∣∣ =

1

10n→ 0

E converge para 0 na metrica quantica, observe: (eq. (1.2), p. 18)

k(sn , 0) = min{sn , 1− sn}

= min{

1− 1

10n, 1−

(1− 1

10n) }

= min{

1− 1

10n,

1

10n

}

=1

10n→ 0

Em resumo, provamos que:

0, 999 . . . = 1 (4.16)

0, 999 . . . = 0 (4.17)

[. . .] A isto se acrescenta que todo

sımbolo e ambivalente e ate mesmo po-

livalente, no sentido de que ele pode sig-

nificar uma pluralidade de realidades di-

versas e mesmo contraditorias.

(Leon Bonaventure)

Aceder a ciencia e rejuvenescer espiri-

tualmente, e aceitar uma brusca mutacao

que contradiz o passado.

(Gaston Bachelard)

Uma exegese de nossos resultados

Conviccoes sao prisoes, um espırito

que queira realizar belas obras, que

tambem queira os meios necessarios, tem

de ser cetico. Estar livre de toda forma

de crenca pertence a forca, ao poder de

ver sem algemas. (Nietzsche)

Antes de mais nada observe que a igualdade

9

10+

9

100+

9

1000+ · · · = 0

nao significa que “a soma de infinitas parcelas positivas e zero”; significatao somente que a sequencia de somas parciais, ( sn ), converge para 0 nametrica quantica, e so isto!

169

Page 171: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por outro lado, observe que nao podemos concluir apressadamente − apartir das equacoes (4.16) e (4.17) −, que 1 = 0, porquanto estes resultadospertencem a universos distintos:

0, 999 . . . = 1, em([ 0, 1 ], µ

)(4.18)

0, 999 . . . = 0, em([ 0, 1 [, k

)(4.19)

Nao ha mais, para os teoremas, verdade separada e, por assim dizer,atomica: sua verdade e apenas sua integracao no sistema; e e por issoque teoremas incompatıveis entre si podem igualmente ser verdadeiros,contanto que os relacionemos com sistemas diferentes. (Denis Huisman)

Um primeiro corolario que se segue deste resultado e que 0, 999 . . . naoe um numero haja vista que depende da topologia (metrica) adotada. Estaconclusao contraria a afirmativa do prof. Elon feita anteriormente.

Reiteramos: Um numero e um conceito algebrico, nao topologico; digo,nao pode variar com a topologia (metrica/distancia) adotada.

A conclusao e obvia: a “entidade” 0, 999 . . . so pode ser vista como umaserie∗ e nunca como um numero.

A igualdade (4.18) nos diz que a soma desta serie e 1 na metrica usual;similarmente, a igualdade (4.19) nos diz que a soma desta mesma serie e 0na metrica quantica.

Donde se conclui que o prof. comete o equıvoco de confundir a serie comseu limite.

Se 1 6= 0, entao 0, 999 . . . nao e um numero

Ficou provado que 0, 999 . . . nao e um numero, entretanto tentaremosconseguir cavar uma contradicao caso insistamos neste equıvoco (tomar aserie por um numero). Inicialmente observe que em nosso universo [ 0, 1 [nao estao definidas operacoes aritmeticas − adicao e multiplicacao −, razaopor que nao podemos sair operando a esmo. Entretanto, observando quese 0 ≤ x < 1 e 0 ≤ y < 1 entao 0 ≤ x · y < 1 significa que a operacao demultiplicacao (usual):

· : [ 0, 1 [× [ 0, 1 [−→ [ 0, 1 [

em nosso universo e uma operacao perfeitamente lıcita.

Vamos agora estabelecer mais um limite que sera util em nossos argu-mentos. Consideremos a seguinte sequencia de somas parciais

0, 1; 0, 11; 0, 111; . . . , βn , . . .

a expressao de βn e dada por, βn = 19 ·(1− 1

10n

).

∗Ou uma representacao decimal, ja que podemos identificar (fazer corresponder) umaserie com uma representacao decimal.

170

Page 172: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Esta sequencia converge para 1/9, tanto na metrica usual quanto naquantica. Sendo assim, temos:

0, 111 . . . =1

10+

1

100+

1

10n+ · · · = 1

9. (4.20)

O proximo teorema rompe um paradigma de alguns seculos:

Teorema 2 (Gentil/15.08.2008). Se 0, 999 . . . e um numero entao 1 = 0.

Prova: De fato, consideremos a igualdade,

0, 999 . . . =9

10+

9

100+

9

10n+ · · · = 0,

demonstrada anteriormente; sendo 0, 999 . . . por hipotese um numero, estaigualdade nos diz que este numero e igual a zero, vamos multiplica-lo por1/9, obtendo:

0, 111 . . . =1

10+

1

100+

1

10n+ · · · = 0.

Lembramos que esta igualdade (em funcao da hipotese) da-se no uni-verso [ 0, 1 [. Deste resultado e da equacao (4.20) concluimos que, 1

9 = 0,donde 1 = 0. �

Conclusao: O teorema acima mostra que e grave (gravıssimo∗) identi-ficar uma serie com seu limite.

Conclusao: Toda a celeuma que girou, ate hoje, em torno da igualdade0, 999 . . . = 1 se deve apenas ao equıvoco de se confundir uma serie com seulimite. Mesmo porque − como ja vimos − a serie em questao pode ter maisque um limite.

Por conta desta confusao os terraqueos, ate hoje (melhor dizendo, ate on-tem), nao compreenderam o verdadeiro significado de 0, 999 . . . = 1. Acredi-tavam que, por ser 0, 999 . . . um numero real, deveria situar-se em algumponto da reta real. O sımbolo 0, 999 . . . nao pode ser localizado em partealguma da reta.†

Insistindo mais um pouco: na p. 61 da obra ja citada − (rodape p. 167) − oautor afirma: (grifo nosso)

“A igualdade 1 = 0, 999 . . . costuma causar perplexidade aos menos ex-perientes. A unica maneira de dirimir o aparente paradoxo e esclarecer que osımbolo 0, 999 . . . na realidade significa o numero cujos valores aproximadossao 0, 9, 0, 99, 0, 999 etc. E, como vimos acima, esse numero e 1.”

Quando os proprios autores misturam os conceitos nao e de admirar queos menos experientes fiquem perplexos (desorientados, confusos).

∗Tao grave quanto dizer que 1 = 0.†E com razao pois ele encontra-se em um outro conjunto, das representacoes decimais

ou das series.

171

Page 173: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Estribados no teorema 2 damos a seguinte versao (parafrase) da assertivaanterior :

“A igualdade 1 = 0, 999 . . . costuma causar perplexidade aos menos ex-perientes. A unica maneira de dirimir o aparente paradoxo e esclarecer queo sımbolo 0, 999 . . . na realidade significa uma serie cujas reduzidas sao 0, 9,0, 99, 0, 999 etc., e cuja soma e 1.”

A proposito, podemos mostrar que a aplicacao (Exercıcio)

k : [ 0, 1/2 [× [ 0, 1/2 [ −→ R

dada pork(x, y) = min

{|x− y|, 1/2− |x− y|

}

e uma metrica; portanto o par([ 0, 1/2 [, k

)e um espaco metrico. Neste

espaco nao e difıcil provar a seguinte igualdade:

0, 4999 . . . = 0

• Podemos ainda mostrar que, que a aplicacao

k : [ 0, 1/3 [× [ 0, 1/3 [ −→ R

dada pork(x, y) = min

{|x− y|, 1/3− |x− y|

}

e uma metrica; portanto o par([ 0, 1/3 [, k

)e um espaco metrico. Neste

espaco nao e difıcil provar a seguinte igualdade: 0, 333 . . . = 0.

A igualdade 0, 999 . . . = 0 e a teoria da gravitacao de Einstein

Os que gozam de uma acuidade visualrazoavel nao terao dificuldade de enxergar queo paradigma quebrado pelo teorema 2 de certaforma e similar ao paradigma quebrado pelateoria da gravitacao de Einstein relativamentea de Newton. De fato, na teoria de Newton,por exemplo, sempre se acreditou que a luz sepropagava em linha reta (nao fazia curva) por conta de que esta teoria erafundamentada na geometria euclidiana; ja a de Einstein em uma “geometriacurva”: a massa introduz uma curvatura (distorcao) no espaco circunjacente.De igual modo, sempre se acreditou que 0, 999 . . . = 1 por conta de que estaigualdade esteve sempre atrelada a geometria, digo, metrica euclidiana (estanao curva o espaco); quando introduzimos uma metrica que curva o espaco,como e o caso da metrica k, aı se revelou a verdadeira natureza de 0, 999 . . .,curva-se tal como um raio de luz em uma nova geometria!

172

Page 174: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Conclusao: A miopia (catarata) que grassou durante todos estes seculos arespeito da igualdade 0, 999 . . . = 1 foi decorrencia de se ter acreditado que0, 999 . . . era independente da “geometria” (metrica) considerada; a igual-dade 0, 999 . . . = 0 desfaz este equıvoco.

A figura a seguir nos mostra, de uma outra perspectiva, como a con-vergencia da representacao 0, 999 . . . depende da geometria do espaco,

q 112

q

q1

12

0

x

d(x, 0)

↑αn=0,999...9

r

r

A proposito, na internet encontrei a seguinte “prova” de que 0, 999 . . . = 1:

“Tente escrever um numero x tal que 0, 999 . . . < x < 1, vera que e im-possıvel. Dado que nao existe um tal x em R entao 0, 999 . . . = 1.”

• No meu entendimento esta e uma “prova” por demais ingenua. Defato, nunca poderemos exibir um tal x simplesmente porque 0, 999 . . . naoe um numero, isto e, nao encontra-se na reta real. Para vermos a in-genuidade desta prova de um outro angulo (uma analogia), consideremosque a sequencia (pn) de polıgonos na figura a seguir,

. . . →

. . . →p3 p4 p5 . . . p11. . . σ

converge para o cırculo σ, isto e, limn→∞

pn = σ. Observe a analogia:

0, 9 ; 0, 99 ; 0, 999 ; 0, 9999 ; . . . ; αn ; · · · → 1

onde, αn = 0, 999 . . . 9 = 1− 110n . Temos,

limn→∞

αn = 1

Escrever este resultado da seguinte forma,

α∞ = 0, 999 . . . = 1

e apenas, e tao somente, uma notacao. E como se para o limite,

limn→∞

pn = σ

escrevessemos: p∞ = σ.

173

Page 175: Gentil Lopes - Espaços Métricos

E tao ingenuo pretender que um polıgono de infinitos lados seja iguala um cırculo quanto pretender que uma decimal com infinitas casas, nocaso 0, 999 . . ., seja um numero (= 1). Deveras, sao objetos de naturezasdistintas.

Entao, voltando a “prova” anterior, isto e, sobre a impossibilidade de seencontrar um numero x tal que 0, 999 . . . < x < 1; e a mesma coisa que sepretender provar que um polıgono de infinitos lados e um dado cırculo, pelaimpossibilidade de se encontrar um outro cırculo x entre ambos, assim:

p∞ < x < σ

No dia 20.10.2008, enviei a Revista Matematica Universitaria, umaversao compacta (13 p.) e “politicamente correta” deste trabalho, sob otıtulo “Se 1 6= 0 entao 0, 999 . . . nao e um numero”, para possıvel publicacao.Algum tempo depois recebi o seguinte email:

Gentil Lopes <[email protected]>

Matematica Universitaria1 mensagem

Eduardo Colli <[email protected]> 5 de dezembro de 2008 12:23

Para: [email protected]

Prezado Gentil,

mais uma vez agradecemos o interesse em publicar na MatematicaUniversitaria.

Em razao da firme conviccao do Corpo Editorial de que 0, 999 . . . eigual a 1 no corpo dos reais, e de que 0 e igual 1 no quociente de Rpor Z mas nao no corpo dos reais, lamentamos comunicar-lhe que seuartigo “Se 1 <> 0 entao 0.999 . . . nao e um numero” nao sera publicadona revista.

Quanto ao seu outro artigo, “Tracados 3−D. Um auxılio para o tracadode figuras no LaTeX”, os editores o examinaram e julgaram que nao seenquadra no perfil da revista.

Atenciosamente,

Eduardo ColliEditor-chefe da Matematica Universitaria

174

Page 176: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Acredito que o corpo editorial nao teve perspicacia suficiente para com-preender meu artigo. Pra comecar nao estou afirmando que 0, 999 . . . naoe igual a 1 “no corpo dos reais”, por sinal estabelecemos isto na equacao(4.16) (p. 169), o que estamos defendendo e que 0, 999 . . . pode ser tambemigual a 0, e daqui resulta uma nova perspectiva, uma nova otica, relati-vamente a interpretacao de tais igualdades. Por exemplo, os matematicos− falo aqui de matematicos profissionais∗ − confundem uma representacaodecimal (binaria, etc.) de um numero com o proprio numero − e nisto quenao estamos de acordo.

E como se, na informatica, os engenheiros confundissem a codificacao deum caracter com o proprio caracter, por exemplo, segundo a ja citada tabelaASCII, temos (p. 34)

A = 010 0 0 0 0 1

Nao obstante essa igualdade, uma coisa e o caracter e outra, bem distinta,e sua representacao (codificacao). De modo perfeitamente similar dar-se comrespeito as igualdades

0, 999 . . . = 1

0, 999 . . . = 0

No universo euclidiano (metrica usual) 0, 999 . . . e uma representacao(codificacao) para o numero 1; ja no universo quantico 0, 999 . . . e umacodificacao, desta vez, para 0 − mesmo porque 1 nao existe neste universo,digo em [ 0, 1 [.

∗ ∗ ∗

Ocorreu-me mais um argumento contra a “igualdade mesmo!” entre re-presentacoes e numeros reais.

Pergunto: como definir igualdade entre representacoes?

?a0 , a1a2 · · · an · · · = b0 , b1b2 · · · bn · · ·

Para definir esta igualdade vou me inspirar (copiar) a definicao de igual-dade entre sequencias (na verdade uma representacao e uma sequencia), qualseja:

a1a2 · · · an · · · = b1b2 · · · bn · · · ⇐⇒ ai = bi , ∀ i ∈ N

De igual modo, entre duas representacoes definimos:

a0 , a1a2 · · · an · · · = b0 , b1b2 · · · bn · · · ⇐⇒ ai = bi , ∀ i ∈ N ∪ { 0 } (4.21)

∗Como o Prof. Elon e o Corpo editorial da RMU.

175

Page 177: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Acho esta definicao bastante razoavel e, se algum matematico se opoea mesma, gostaria que me argumentasse suas razoes. Pois bem, vamosconsiderar as duas representacoes seguintes:

1, 0 0 0 · · ·0, 9 9 9 · · ·

Podemos escrever:

1, 0 0 0 · · · = 1 +0

10+

0

102+

0

103+ · · · = 1 (4.22)

Tambem,

0, 9 9 9 · · · = 9

10+

9

102+

9

103+ · · · = 1 (4.23)

Ora, se,

1, 0 0 0 · · · = 1 (mesmo!) (4.24)

e,

0, 9 9 9 · · · = 1 (mesmo!) (4.25)

e, usando o axioma de que duas quantidades iguais a uma terceira sao iguaisentre si, obtemos,

1, 0 0 0 · · · = 0, 9 9 9 · · · (mesmo!)

Tendo em conta nossa definicao em (4.21) concluimos que,

1 = 0 e 0 = 9 (mesmo!)

Conclusao: Os matematicos diriam que fui insensato em estabelecer a definicao(4.21).

Da minha perspectiva; digo, para tentar me livrar da pecha de insensato,vejo as coisas da seguinte forma: primeiro, mantenho a definicao (4.21), naovejo nenhuma estultıcie na mesma. Depois interpreto as (segundas) igual-dades em (4.22) e (4.23) como a convergencia de duas series para um mesmolimite.

Do exposto nao posso concluir (como o fazem os matematicos) que asigualdades (4.24) e (4.25) sao absolutas! digo, que 0, 9 9 9 · · · e 1 represen-tam o mesmo numero!

Nao, nao trata-se disto senhores matematicos, por favor parem um poucopra raciocinar!

Reitero: podemos adotar a definicao (4.21), entre representacoes, semnenhum sentimento de culpa, daı que 0, 9 9 9 · · · e 1, 0 0 0 · · · sao duas repre-sentacoes distintas, bem como as respectivas series em (4.22) e (4.23); agorao que estas series tem em comum e o mesmo limite: 1.

Adendo: A citacao a seguir encontrei, por acaso, no livro “O quee matematica? ”, de Richard Courant/Herbet Robbins da Editora CienciaModerna Ltda. (p. 76)

176

Page 178: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vamos dividir o intervalo unitario em duas metades, a segunda metadenovamente em duas partes iguais, a segunda metade destas em duas outraspartes iguais, e assim por diante, ate que os menores intervalos assim obtidostenham um comprimento de 2−n, onde n e escolhido arbitrariamente grande[. . .]. Entao, adicionando os comprimentos de todos os intervalos exceto oultimo, obtemos um comprimento total igual a

(3) sn =1

2+

1

4+

1

8+

1

16+ · · · + 1

2n.

Observamos que sn difere de 1 por (12 )n, e que esta diferenca torna-se ar-

bitrariamente pequena, ou “tende a zero” a medida que n aumenta in-definidamente. Nao faz qualquer sentido afirmar que a diferenca e zero se nfor infinito. O infinito entra somente no procedimento sem fim e nao comouma quantidade efetiva. Descrevemos o comportamento de sn dizendo quea soma sn aproxima-se do limite 1 a medida que n tende para o infinito,escrevendo

(4) 1 =1

2+

1

22+

1

23+

1

24+ . . . ,

onde temos, a direita uma serie infinita. Esta “igualdade” nao significaque tenhamos efetivamente de adicionar infinitos termos; trata-se apenas deuma expressao abreviada para o fato de que 1 e o limite da soma finita sna medida que n tende para o infinito (de forma alguma e infinito). Assim,a igualdade (4) com seu sımbolo incompleto “+ . . .” e meramente uma es-tenografia matematica para a afirmacao precisa

1 =limite a medida que n tende para o infinito da quantidade

(5) sn =1

2+

1

4+

1

8+

1

16+ · · · + 1

2n

Eu deveria logo dizer que discordo completamente daqueles que afir-mam que o campo da matematica incorpora eternamente uma perfeicaoestatica, e que as ideias matematicas nao sao humanas, nem mutaveis.Ao contrario, esses estudos de caso, essas historias intelectuais ilustramo fato de que a matematica esta constantemente em evolucao e mudanca,e que nossa perspectiva, mesmo nas questoes de matematica basica e maisaprofundada, se desloca, amiude, de maneira surpreendente e inesperada.Tudo o que ela necessita e de uma nova ideia! Voce precisa apenas es-tar inspirado e depois trabalhar feito louco para desenvolver sua novaconcepcao. De inıcio, as pessoas irao combate-lo, mas, se voce estivercerto, entao todos dirao, no fim de contas, que obviamente era o modode encarar o problema, e que sua contribuicao foi pequena ou nula! Decerta maneira, este e o maior dos cumprimentos.

(Gregory Chaitin/Metamat!/p. 30-Grifo nosso)

177

Page 179: Gentil Lopes - Espaços Métricos

4.6 Exercıcios

1) Num espaco metrico (M, d) uma sequencia estacionaria (xn) e aquelaque se repete a partir de um certo ındice r, assim:

(xn) = (x1 , . . . , xr , a, a, a, . . .)

Mostre que tais sequencias sao convergentes.

2) Seja (x1 , x2 , x3 , . . .) uma sequencia em (M, d). Se (x1 , x3 , x3 , . . .)−→ ae (x2 , x4 , x6 , . . .)−→ a, mostre que (x1 , x2 , x3 , . . .)−→ a.

3) Consideremos a sequencia (xn) de pontos do R2 dada por

xn =(

1 +1

n,(−1)nn

)

Mostre que esta sequencia e convergente − nas tres metricas do R2.

Para um raio ε = 13 encontre, para cada uma das bolas, o menor ındice

n0 a partir do qual todos os termos da sequencia caem dentro da respectivabola.

4) Consideremos a sequencia (xn) de pontos do R2 dada por

xn =(

(−1)n, (−1)n

n

)

discuta a convergencia de (xn).

5) Mostre, utilizando a prop. 9 (p. 143), que a sequencia (xn) = (1, 12 ,

13 , . . .)

nao e convergente no espaco (R, δ).

6) O Calculo, ou a Analise, nos dizem que

limn→∞

(

1− 1

n

)

= limn→∞

1 − limn→∞

1

n= 1 − 0 = 1

Aqui (p. 145), provamos que limn→∞

(

1− 1

n

)

= 0. Explique esse “paradoxo”.

7) Mostre que toda sequencia (xn) (0 ≤ xn < 1) que converge para o pontop (0 ≤ p < 1) no espaco

([ 0, 1 ], µ

), converge para o mesmo ponto no espaco

([ 0, 1 [, k

). Mostre que existem sequencias que convergem em [ 0, 1 [ mas

que nao convergem em [ 0, 1 ].

Sugestao: Mostre que a bola de centro p (0 ≤ p < 1) e raio r > 0 nametrica usual esta contida nesta mesma bola na metrica quantica . . .

8) Considere a sequencia de funcoes em C[ 0, 1 ] dada por xn(t) =1n , estude

sua convergencia nos espacos(C[ 0, 1 ], Γ

),(C[ 0, 1 ], Υ

). Interprete geo-

metricamente seus argumentos.

178

Page 180: Gentil Lopes - Espaços Métricos

9) Considere o conjunto B([ 0, 1 ], R) das funcoes reais limitadas de domınio[ 0, 1 ] e neste a sequencia (xn) dada por xn(t) = tn. Em Analise apren-demos que esta sequencia de funcoes contınuas converge simplesmente, oupontualmente, para a funcao descontınua x : [ 0, 1 ]−→ R dada por

x(t) =

{

0, se 0 ≤ t < 1;

1, se t = 1.

Mostre que esta convergencia nao se verifica no espaco(B([ 0, 1 ], R), Ψ

).

t

xn(t)

0

. . .

x1

x4

q

q 1

1

t

x(t)

0

sq

1

1

10) Prove a proposicao 11 (p. 154) utilizando a tecnica (T − 3) (p. 571).

Sugestao: Suponha, ao contrario, que limnxn = p e lim

nxn = q com p 6= q.

11) Para a sequencia (xn) vista no exemplo 6 (p. 147), encontre uma bola decentro na origem contendo todos os seus termos. (prop. 17, p. 161)

− nos espacos(R2, ‖ · ‖

D2

)e(R2, ‖ · ‖

D3

).

12) Prove a proposicao 14 (p. 157) nos espacos(M, D1

)e(M, D2

).

13) Mostre que a aplicacao k : [ 0, 1/2 [× [ 0, 1/2 [ −→ R, dada por

k(x, y) = min{|x− y|, 1/2 − |x− y|

}

e uma metrica sobre [ 0, 1/2 [. Ademais, prove que: 0, 4999 . . . = 0.

14) Considere a sequencia numerica dada por an = n√a, onde a > 0 e um

numero real. Prove que limn→∞

n√a = 1.

A sequencia a seguir: 2√a , 4√a , 8√a , . . . , 2n

√a , . . ., e uma subsequencia

da sequencia ( n√a ), portanto converge para 1.

Uma consequencia deste resultado e que se voce coloca qualquer numeroreal (positivo) em sua calculadora e vai apertando sucessivamente a tecla daraiz quadrada (

√) no final voce sempre obtera o numero 1 no visor.

179

Page 181: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A Contenda

A corrida que descreveremos a seguir deu-se ainda no tempo de Zenao(seculo V a.C.). Pois bem, a disputa acontecera na arena [ 0, 1 [× [ 0, 1 [ comquatro contendores: Aquiles (A), a tartaruga (T ), a lesma (L) e o bicho-preguica (P ). Os adversarios deverao posicionar-se inicialmente nos quatropontos assinalados no quadrado abaixo:

O=(0, 0)

1

(1, 1)1

rrr

rC

q 14

q 12

q 34

q14

q12

q34

O objetivo da disputa sera atingir o vertice O (inferior esquerdo), sendoque os participantes so poderao deslocar-se sobre as diagonais do quadrado.

Aquiles, por ser o mais inteligente dos animais, ate “racional” ele seconsidera, “manipula” (mancomunado com o arbitro) o sorteio das posicoesiniciais de modo que ira posicionar-se no centro do quadrado.

De formas que, para os animais “irracionais”, a escolha torna-se agorairrelevante; portanto a configuracao inicial da disputa fica assim:

O=(0, 0)

1

(1, 1)1

rrr

rA

P

TL

q 14

q 12

q 34

q14

q12

q34

Os tres animais irracionais desenvolverao a mesma velocidade V e Aquiles,num acordo de cavalheiros, decide desenvolver uma velocidade que e apenaso dobro de V . Vamos resumir as condicoes do pleito:

180

Page 182: Gentil Lopes - Espaços Métricos

1o ) Os adversarios so poderao deslocar-se sobre as diagonais do quadrado;

2o ) Deverao chegar no vertice O (inferior esquerdo do quadrado);

3o ) Aquiles, que encontra-se posicionado no centro do quadrado, desen-volvera “apenas” o dobro da velocidade de seus adversarios.

Pedimos ao leitor que reflita sobre as circunstancias (condicoes) estabele-cidas no pleito, e nos diga se “humanamente falando”, digo, racionalmente(logicamente) falando existe a menor chance de que algum dos “animaisirracionais” venca Aquiles.

O deslocamento de Aquiles se dara da seguinte forma: num primeiroestagio (“passo”) de seu movimento percorrera a metade da distancia C O(Centro-Origem). No segundo estagio, percorre a metade do que resta, e assimsucessivamente.

Pois bem, e dada a largada!!!O que, estarrecidos, embasbacados!, observamos?, veja:

O1

(1, 1)1

rrrr

r rrr

r r rr

rrrr

A

P

TL

q 14

q 12

q 34

q14

q12

q34

−Precisava ser tao irracional?

Pasmem! a tartaruga esta seguindo no sentido do vertice (1, 1), apreguica no sentido do vertice (1, 0) e a lesma no sentido do vertice (0, 1).

Que pena . . . os coitados devem ter ficado atordoados com o tiro delargada. So pode ser isto!

Bem, de qualquer forma precisamos preencher a sumula do resultadofinal: Aquiles em 1o lugar!?; quanto aos assim chamados irracionais temosduas alternativas, ou os desclassificamos de imediato, ou os classificamos deacordo com suas distancias finais para a meta, assim:

Animal Classif.

Aquiles 1o

Pregui. Desclas.

Lesma Desclas.

Tartar. Desclas.

Animal Classif. D.O.

Aquiles 1o 0

Pregui. 2o 1

Lesma 2o 1

Tartar. 3o√2

181

Page 183: Gentil Lopes - Espaços Métricos

. . . 26 seculos depois/A Justica tarda mas nao falha!

Os animais (ditos) irracionais protestaram contra o resultado anterioralegando que disputaram a corrida pela metrica quantica∗ e que esta in-justica seria prontamente reparada em seculos posteriores (profetizaram ateo dia da reparacao: 14.03.2006).

Ja sabıamos que as abelhas tem conhecimento de matematica univer-sitaria (Calculo, no mınimo), uma vez que conseguem construir seus alveolosde modo a armazenarem a maior quantidade de mel, com o mınimo gasto dematerial. Agora que lesma, tartaruga e bicho-preguica entendam de topolo-gia . . . ah! essa nao sabıamos, pagamos pra ver!.

Bem, ja que as abelhas conhecem de Calculo I, nao nos custa nadaaveriguar se lesma conhece de topologia. Apelando para a metrica quantica,vejamos o que podemos fazer.

Dados os criterios estabelecidos no pleito, podemos nos valer das seguintessequencias, para descrever o deslocamento dos quatro contendores:

ln =(

12n+1 , 1− 1

2n+1

)→

an =(

12n, 12n

)→

← tn =(1− 1

2n+1 , 1− 12n+1

)

← pn =(1− 1

2n+1 ,1

2n+1

)

O→meta

1

(1, 1)1

rrrr

r rrr

r r rr

rrrr

A

P

TL

q 14

q 12

q 34

q14

q12

q34

Ou ainda, facamos a seguinte identificacao:

A = { an : n ∈ N } ={ ( 1

2n,1

2n): n ∈ N

}

e

T = { tn : n ∈ N } ={(

1− 1

2n+1, 1− 1

2n+1

): n ∈ N

}

, etc.

Considere as duas seguintes definicoes:

Definicao 19 (Atingir a meta). Diremos que um contendor atinge a metaquando sua distancia (“final”) para a meta e nula.

∗Que nao era do conhecimento dos matematicos da epoca. An passant, apenas em1906 foi que o matematico Maurice Frechet, em sua tese de doutoramento, sugeriu umadefinicao geral e abstrata do conceito de distancia, sendo este o ponto de partida da teoriados espacos metricos.

182

Page 184: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicao 20 (Vencer). Numa porfia entre dois contendores A e B diremosque B vence A se B atinge a meta e se existe um instante de tempo a partirdo qual B estara sempre a frente de A.

Pois bem, voltemos aos exercıcios:

15) Mostre que, pela “regua quantica”, a tartaruga atinge a meta. Ouainda, mostre que:

d(O, T ) = inf{d(O, x) : x ∈ T

}

= inf{D1(O, tn) : tn ∈ T

}= 0

16) Mostre que todos os animais atingem a meta − por qualquer uma dasmetricas Di (i = 1, 2, 3). (p. 97)

17) Se todos os animais atingem a meta, quem vence a corrida? O referen-cial comum para saber quem esta a frente de quem, e o centro do quadrado;mostre que a tartaruga − e os outros animais − vence Aquiles; mais pre-cisamente mostre que:

D1(tn , C) > D1(an , C); ∀n ∈ N.

Isto e, a tartaruga sempre esteve a frente de Aquiles∗, por conseguinte edeclarada vencedora!!

Ufa! apos tanto tempo, finalmente podemos fazer justica. A nova sumulafica assim:

Animal Classif.

Tartar.

1oPregui.

Lesma

Aquiles Desclas.

Nota: Decidimos desclassificar o Aquiles porque ele roubou por ocasiaodo sorteio das posicoes iniciais.

∗ ∗ ∗

Uma teoria cientıfica nao e mais do que

um modelo do universo, ou de uma parte restrita

deste, e um conjunto de regras que relacionam

quantidades do modelo com as observacoes que

praticamos. Existe apenas na nossa mente e nao

tem nenhuma outra realidade, seja o que for que

signifique. (Stephen Hawking)

∗E nos nem desconfiavamos disto!

183

Page 185: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Caso unidimensional

Para observarmos o pleito (paradoxo) apenas entre Aquiles e a tar-taruga, basta fazer a projecao (“no eixo x”) do caso bidimensional.

Ao ser dado o tiro de largada Aquiles age como qualquer “racional”agiria, e segue em demanda de sua meta; a tartaruga (agora uma exımiae respeitada topologista), para estupefacao da plateia segue em sentidocontrario! . . . o arbitro da contenda queda-se embasbacado!!!

A metrica quantica e a etica

Pois bem, qual a distancia que Aquiles acreditava esta usurpando de seuadversario? Observe:

q12

q34

0 1q 14

∼≀•

y y ··· ········

0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 1

INM

ETRO

Ele acredita (pela “logica humana”) esta usurpando da pobre tartarugauma distancia igual a 1

4 = 0, 25 (que e a distancia em que ele se encontra afrente do quelonio).

Ora, perceba o caro leitor que e precisamente esta mesma distancia queele esta, a revelia, concedendo a tartaruga. Ademais, lembre-se de que ametrica quantica “transfere” a origem “0” para o outro vertice do intervalo.

De uma outra perspectiva: Observe que na configuracao inicial do pleitoa distancia de Aquiles para a meta, em qualquer das metricas e 0, 5; en-quanto que a distancia da tartaruga para a meta, na metrica quantica, e deapenas 0, 25.

∗ ∗ ∗

Naquela epoca [seculo XVIII], qualquer sistema geometrico que naoestivesse em absoluta concordancia com o de Euclides teria sido conside-rado um absurdo. Kant, o mais influente filosofo do perıodo, formulouesta atitude na afirmacao de que os axiomas de Euclides sao inerentesa mente humana e, portanto, tem uma validade objetiva para o espaco“ real”. Esta crenca nos axiomas da Geometria Euclidiana como ver-dades inalteradas, existindo no domınio da pura intuicao, era um dosdogmas basicos da filosofia de Kant.

(Richard Courant/O que e Matematica? (p. 267))

184

Page 186: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Capıtulo 5A TOPOLOGIA DOS ESPACOS

METRICOS

A matematica e um campo demasiadamente arduo e inospito

para agradar aqueles a quem nao oferece grandes recompen-

sas. Recompensas que sao da mesma ındole que as do artista.

. . . Acrescenta ainda que e no ato de criar que o matematico en-

contra sua culminancia e que “nenhuma quantidade de trabalho

ou correcao tecnica pode substituir este momento de criacao na

vida de um matematico, poeta ou musico”. (Norbert Wiener)

Introducao

Lembramos que um espaco metrico pode ser visto como um sistema deprocessamento de informacoes, onde temos:

(M, d)

hardware

software

O conjunto de instrucoes (software) e passado atraves da metrica. Por exem-plo, uma das instrucoes (programa) que ja vimos e como calcular uma bolaaberta no sistema (M, d).

Lembramos − dentro de nossa analogia − que um mesmo hardware (M )pode suportar softwares diversos.

Uma instrucao que incorporaremos agora em nosso sistema e como de-cidir se um ponto e ou nao interior a um conjunto.

185

Page 187: Gentil Lopes - Espaços Métricos

5.1 Ponto interior

Definicao 21 (Ponto Interior). Seja (M, d) um espaco metrico. ConsidereX ⊂M . Um ponto p ∈ X e chamado ponto interior de X se

∃ r > 0 : B(p; r) ⊂ XDe outro modo: um ponto p ∈ X e ponto interior de X se for possıvel

“centrar” neste ponto uma bola aberta que esteja contida em X.

Nota: Para provar que um ponto p ∈ X nao e ponto interior de Xdevemos mostrar que para todo r > 0, arbitrariamente fixado, B(p; r) 6⊂ X.Isto e: ∀ r > 0, devemos exibir x ∈ B(p; r) tal que x 6∈ X.

Em geral este x, que devemos exibir, depende − e funcao − do raio rdado, daı em algumas situacoes usarmos a notacao x = xr .

Importante!

Vamos chamar a atencao do leitor para um aspecto, embora trivial,importante: Na definicao de ponto interior intervem, de forma explıcita, abola aberta B(p; r) = {x ∈ M : d(p, x) < r }. E esta, como se ve, dependetanto da metrica d quanto do conjunto M . Portanto o fato de um ponto pser interior, ou nao, a um subconjunto X ⊂M vai depender essencialmenteda metrica d e do conjunto M , como nao poderia deixar de ser.

Ou ainda: um mesmo hardware (M ) pode nos responder de modo dis-tinto a depender do software ( d ).

Esta observacao se estende a outros tipos de pontos que serao vistosneste capıtulo.

Para ilustrar do que estamos falando vejamos um exemplo. Considere-mos M = R e X = [ 0, 1 ]. Temos que 0 e ponto interior de X na metricaδ, o que nao acontece na metrica µ. De fato,

Bδ(0; 1) = { 0 } ⊂ X e Bµ(0; r) =]− r, r [ 6⊂ X, ∀ r > 0

Exemplos:

1) Seja M = {a, b, c, . . . , x, y, z} e seja X = {a, e, i, o, u}. No espaco(M, δ) todo ponto p ∈ X e ponto interior de X. Por exemplo, seja a ∈ X er = 1, entao

Bδ(a; 1) = { a } ⊂ X

Generalizando este exemplo, temos

2) Seja M um conjunto qualquer e X ⊂ M . No espaco (M, δ) todo pontop ∈ X e ponto interior de X. De fato, ja vimos que (p. 108)

Bδ(p; r) =

{p}, se 0 < r ≤ 1;

M, se r > 1.

186

Page 188: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Isto significa que para “interiorizar” qualquer ponto p ∈ X, basta escolherr no intervalo 0 < r ≤ 1, pois B

δ(p; r) = { p } ⊂ X.

3) Sejam M = R e X = { 0 } ∪ [ 1, 2 [⊂ R.

R¬0

0 1 2

s [ [ X

Temos que 0 e 1 sao pontos interiores de X no espaco (R, δ), mas naono espaco (R, µ). O que faz essa diferenca e o “tipo” da bola aberta emcada um destes espacos.

− O conjunto dos pontos interiores de X sera indicado por X◦ou por X

◦d

quando desejarmos destacar a metrica. Isto e,

X◦

d={p ∈ X : ∃ r > 0, com B

d(p; r) ⊂ X

}

4) Sejam M = R e X = [ a, b ]. Deixamos como exercıcio mostrar que

X◦

µ = ] a, b [ e X◦

δ= [ a, b ].

5) Sejam M = R e X = {1, 12 , 13 , . . .}, temos que

X◦µ = ∅ e X

◦δ= X.

De fato, dado qualquer p ∈ X temos Bµ(p; r) = ] p − r, p + r [ . Sendoassim e impossıvel exibir r > 0 de modo que

Bµ(p; r) = ] p− r, p+ r [ ⊂ Xuma vez que todo intervalo aberto contem numeros irracionais. Por con-seguinte nenhum ponto p ∈ X pode ser ponto interior a X no espaco (R, µ).

Por outro lado, que X◦δ= X decorre do exemplo 2.

6) Seja M = [ 0, 1 [ e X = [ 0, 14 ] ∪ [ 34 , 1 [. E facil ver que 0 e ponto

interior de X no espaco ([ 0, 1 [, k) e tambem no espaco ([ 0, 1 [, µ).

0 12

0 1

M

X14

34

Observacao: Embora a notacao X◦

dnao enfatize a dependencia do interior

de X com respeito ao conjunto M , do qual X e subconjunto, isto estaimplıcito em

X◦

d={p ∈ X : ∃ r > 0, com B

d(p; r) ⊂ X

}

precisamente porque, Bd(p; r) = {x ∈M : d(p, x) < r }.

187

Page 189: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Uma notacao para enfatizar ambas as dependencias seria X◦

(M,d).

Por exemplo, segundo esta notacao temos

Q◦

(R,µ)= ∅ e Q

◦(Q,µ)

= Q.

A segunda das igualdades acima decorre do fato de que, na definicao deponto interior, tomando X =M , todo ponto p ∈ X e interior a X, uma vezque qualquer que seja r > 0 temos

B(p; r) = {x ∈M : d(x, p) < r } ⊂ X =M

Em outras palavras: Todo x ∈M e interior ao “conjunto universo” M .

A seguir estaremos enriquecendo nosso sistema de processamento de in-formacoes com mais uma instrucao.

5.2 Conjuntos abertos

Definicao 22 (Conjunto Aberto). Seja (M, d ) um espaco metrico e X ⊂M . Diremos que X e um conjunto aberto em (M, d) quando todo ponto deX for ponto interior de X.

Observe que pela definicao de ponto interior temos X◦ ⊂ X; quando a

inclusao contraria se verificar, isto e, quando X ⊂ X◦, isto e, X = X

◦, diremos

que X e aberto no espaco (M, d).Um conjunto deixa de ser aberto quando pelo ao menos um de seus pontos

nao e ponto interior.

Observacao: Quando quisermos mostrar que um subconjunto X ⊂ M eaberto devemos tomar um ponto x ∈ X arbitrario, e mostrar que este ponto eponto interior de X. Isto e, devemos exibir r > 0 de modo que B(x; r) ⊂ X.Via de regra, este r que buscamos depende − e funcao − do ponto x. Daıem algumas situacoes usarmos a notacao r = rx .

Exemplos:

1) O conjunto X =] a, +∞ [ e aberto no espaco (R, µ).

De fato, fixado arbitrariamente x ∈ X, temos que x > a, isto e x−a > 0.Mostremos que rx = x−a

3 satisfaz

Bµ(x; rx ) = ]x− rx , x+ rx [ ⊂ ] a, +∞ [

]]x

] [x−rx x+rx

a X

rx sDe fato, seja y ∈ ]x−rx , x+rx [, entao y > x−rx = x− x−a

3 = 2x+a3 > a;

portanto, com este raio temos Bµ(x; rx) ⊂ ] a, +∞ [ ; o que prova que todoponto x > a e ponto interior de X; por conseguinte X e aberto.

188

Page 190: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2) Seja M = R2, o conjunto X ={(x, y) ∈ R2 : x > 1

}e aberto em R2

com qualquer uma das metricas Di (i = 1, 2, 3).

Provaremos que X e aberto na metrica D1 e o leitor provara para asduas outras metricas.

De fato, dado (p, q) ∈ X arbitrario, devemos exibir uma bola de centroneste ponto e contida em X. Pois bem, pela definicao de X temos que p > 1;vamos tomar para o raio da bola procurada r = p − 1 > 0 e mostrar queB((p, q); r

)⊂ X.

X

R

R

0 1

r(p, q)r

X

R

R

0 1

r(p, q)r(x, y)

r= p−1

Seja (x, y) ∈ B((p, q); r = p − 1

)um ponto qualquer nesta bola e

mostremos que (x, y) ∈ X, isto e, que x > 1. Entao

(x, y) ∈ B((p, q); r

)⇒ D1

((x, y), (p, q)

)< r

⇒√

(x− p)2 + (y − q)2 < p− 1

⇒ |x− p| ≤√

(x− p)2 + (y − q)2 < p− 1

⇒ x > 1.

Sendo assim mostramos que qualquer ponto (p, q) ∈ X e ponto interiorde X, logo X e aberto.

3) Seja M um conjunto qualquer e X ⊂ M . No espaco (M, δ) todo pontop ∈ X e ponto interior de X (ex. 2, p. 186). Logo, todo subconjunto X ⊂ Me aberto no espaco (M, δ).

Mais geralmente: Um espaco (M, d) e discreto se, e somente se, todosos seus subconjuntos sao abertos.

Prova:

(=⇒) Se (M, d) e discreto e X ⊂M , entao X e aberto.

Com efeito, dado x ∈ X, x e isolado em (M, d). Portanto, existe rx > 0tal que B(x; rx) = {x} ⊂ X. Logo, x e ponto interior de X, portanto X eaberto.

189

Page 191: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(⇐=) Se todo subconjuntos X ⊂M e aberto, entao (M, d) e discreto.

De fato, em particular {x } e aberto para todo x ∈ M . Portanto existerx > 0 tal que B(x; rx) ⊂ {x }. Logo, B(x; rx) = {x }. Isto implica que todoponto x de M e isolado, isto e, (M, d) e discreto. �

4) O conjunto universo e um conjunto aberto: Vimos anteriormente que“todo ponto x ∈M e interior ao conjunto universo M”. Isto significa que oconjunto universo e aberto.

5) O conjunto vazio e um conjunto aberto: Para mostrar que um conjuntonao e aberto devemos exibir um ponto deste conjunto que nao e pontointerior. Como isto nao pode ser feito no caso do conjunto vazio, segue queo mesmo e aberto.

6) Uma bola aberta e um conjunto aberto: Vimos na propriedade (P2)das bolas abertas (p. 126) que “Escolhido um ponto qualquer de uma bolaaberta, podemos tornar este ponto, o centro de uma nova bola, contida naprimeira”. Isto e, todo ponto de uma bola aberta e um ponto interior destabola, por conseguinte uma bola aberta e um conjunto aberto; em qualquerespaco (M, d).

7) O conjunto { a } ⊂ M e aberto no espaco (M, d) se, e somente se, a eponto isolado deste espaco.

Prova:

(=⇒) Se { a } e aberto entao existe r > 0 de modo que B(a; r) ⊂ { a }, istoe, B(a; r) = { a }. Logo a e isolado neste espaco.

(⇐=) Se a e isolado, entao existe r > 0 tal que B(a; r) = { a }, isto eB(a; r) ⊂ { a }, logo, a e ponto interior de { a }. Portanto { a } e aberto. �

8) Q nao e aberto no espaco (R, µ).

De fato, nenhum ponto p ∈ Q e ponto interior de Q, porquanto

] p− r, p+ r [ 6⊂ Q; ∀ r > 0,

uma vez que em todo intervalo aberto encontramos numeros irracionais.

9) Uma observacao importante e a de que um conjunto pode nao ser abertoem um dado espaco metrico, mas pode ser em um seu subespaco.

Este fenomeno se deve a que a bola aberta no subespaco e, via de regra,diferente da bola aberta no espaco.

Por exemplo, consideremos o espaco (R, µ) e o seu subespaco (N, µ),onde N = [ 0, 2 ]. O conjunto X = [ 0, 1 [ nao e aberto no espaco (R, µ) massim no subespaco (N, µ). (exercıcio)

¬0

0

0

2[ ]

1

R

N

X

190

Page 192: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 22. Seja (M, d) um espaco metrico e X ⊂ M aberto. Sejap ∈ X. Nestas condicoes, o conjunto X − { p } e aberto.

Prova: Devemos mostrar que dado x ∈ X−{ p } arbitrario, existe r > 0de modo que B(x; r) ⊂ X − { p }.

Entao, seja x ∈ X − { p }, logo x ∈ X e x 6= p. Como, por hipotese, X eaberto, existe r > 0 tal que B(x; r) ⊂ X. Temos duas possibilidades:

(i) p 6∈ B(x; r) (ii) p ∈ B(x; r)

(i) Entao,

B(x; r) ⊂ X (5.1)

p 6∈ B(x; r) (5.2)

Vamos mostrar que estas duas condicoes, conjuntamente, implicam emque B(x; r) ⊂ X − { p }.

De fato, seja y ∈ B(x; r) entao, por (5.1), y ∈ X e, por (5.2), y 6= p, istoe, y 6∈ { p }, logo y ∈ X − { p }. Por conseguinte B(x; r) ⊂ X − { p }.

rx rpryr

(M, d)

X rx rr

(M,d)

X−{p}

(ii) Vejamos a segunda possibilidade: se p ∈ B(x; r) ⇒ d(x, p) < r e comox 6= p temos d(x, p) > 0, sendo assim podemos tomar 0 < r′ = d(x, p) < r,logo B(x; r′) ⊂ B(x; r) ⊂ X. Portanto, temos

B(x; r′) ⊂ X

p 6∈ B(x; r′)

rx rpr

(M, d)

X rx rr′(M,d)

X−{p}

Estas duas condicoes, conjuntamente, implicam B(x; r′) ⊂ X − { p }.Portanto, x e ponto interior de X − { p }; logo X − { p } e aberto. �

191

Page 193: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por inducao: Se X e aberto, entao X − { a1 , a2 , . . . , an } e aberto.Ou ainda: Se retirarmos uma quantidade finita de pontos de um conjuntoaberto, ele nao perde esta propriedade.Observe que se acrescentarmos um unico ponto a um conjunto aberto, estapropriedade se perde. Por exemplo X = ] 0, 1 [∪{ 1 } nao e aberto em (R, µ).

Proposicao 23. Seja (M, d ) um espaco metrico.

(i) M e ∅ sao abertos;

(ii) Se X1 , X2 , . . . ,Xn sao abertos, entao

X1 ∩X2 ∩ · · · ∩Xn e aberto;

(iii) Se {Xλ}λ∈L

e uma famılia arbitraria de abertos, entao

X =⋃

λ∈LX

λe aberto.

Prova:

(i) Ja foi visto anteriormente. (p. 190)

(ii) Seja X = X1 ∩ X2 ∩ · · · ∩ Xn . Se algum dos Xi for vazio, ou se doisquaisquer deles forem disjuntos, entao X sera vazio e, portanto, pelo ıtemanterior, aberto. Caso contrario X 6= ∅. Seja p ∈ X, mostremos que p eponto interior de X. Temos p ∈ X1 , . . . , p ∈ Xn . Como X1 , X2 , . . . , Xn

sao abertos existem numeros positivos r1 , r2 , . . . , rn tais que

B(p; r1) ⊂ X1 , B(p; r2) ⊂ X2 , . . . , B(p; rn) ⊂ Xn .

Tomando r = min {r1 , r2 , . . . , rn} temos pela propriedade (P1) (p. 125) :

B(p; r) ⊂ B(p; r1), B(p; r) ⊂ B(p; r2), . . . , B(p; r) ⊂ B(p; rn)

portanto, pela transitividade da inclusao, temos

B(p; r) ⊂ X1 , B(p; r) ⊂ X2 , . . . , B(p; r) ⊂ Xn

isto eB(p; r) ⊂ X1 ∩X2 ∩ · · · ∩Xn = X.

portanto p e ponto interior de X. Isto e, X e aberto.

(iii) Seja p ∈ X = ∪λ∈L

Xλ. Entao p ∈ Xλ′ para algum λ′ ∈ L. Como, porhipotese, este Xλ′ e aberto, existe r > 0 de modo que B(p; r) ⊂ Xλ′ . Logo

B(p; r) ⊂⋃

λ∈LXλ = X,

portanto p e ponto interior de X. Isto e, X e aberto. �

192

Page 194: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Observacao: A intersecao de uma famılia infinita de conjuntos abertospode nao ser um conjunto aberto.

Contraexemplo: Seja a famılia {Xn}n∈N, onde Xn =]− 1

n ,1n [ . No espaco

(R, µ), os Xn (n = 1, 2, . . .) sao bolas abertas e, portanto, conjuntos abertos.Mas

n∈N

Xn = { 0 },

nao e aberto neste espaco.

Corolario . Um subconjunto X ⊂ M e aberto se, e somente se, e umareuniao de bolas abertas.

Prova:

(=⇒) De fato, como X e aberto, entao para cada x ∈ X, existe uma bolaBx tal que x ∈ Bx ⊂ X. Tomando, na proposicao 138 (p. 599), X = A e

Bx = Gx obtemos X =⋃

x∈XBx . Isto mostra que todo aberto e uma reuniao

de bolas abertas.

(⇐=) Se X = ∪Bλe uma reuniao de bolas abertas , entao X e aberto, pelo

ıtem (iii) do teorema. �

Uma aplicacao trivial deste corolario e: No espaco (M, δ) todo X ⊂Me aberto. De fato, se X = ∅ e imediato. Se X 6= ∅, entao

X =⋃

x∈X{x } =

x∈XB

δ(x; 1)

o que prova que X e aberto.

Abertos em subespacos

Proposicao 24. Seja (M, d) um espaco e (N, d) um subespaco de (M, d).

Um subconjunto X ⊂ N e aberto (no subespaco) se, e somente se, existirum conjunto A, aberto em (M, d), tal que X = A ∩N.

Prova:

(=⇒) Se X ⊂ N e aberto em (N, d) entao existe um conjunto A, aberto em(M, d), tal que X = A ∩N.

Com efeito, como X e aberto em (N, d) entao, pelo corolario anterior,X pode ser escrito como uma reuniao de bolas abertas (em (N, d)), isto ede sub-bolas

X =⋃

x∈XB(x; rx)

193

Page 195: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Ja vimos que B(x; rx) = B(x; rx) ∩N , onde B(x; rx) e a bola aberta em(M, d). Portanto podemos escrever∗

X =⋃

x∈X

(B(x; rx) ∩N

)=( ⋃

x∈XB(x; rx)

)

∩N.

como a reuniao de uma famılia qualquer de abertos e um conjunto aberto,

podemos escrever⋃

x∈XB(x; rx) = A. Portanto, X = A ∩N .

(⇐=) Seja X ⊂ N . Suponha que exista A ⊂M , aberto em (M, d), de modoque X = A ∩N . Entao X e aberto no subespaco (N, d).

Com efeito, seja x ∈ X um ponto arbitrario de X. Devemos mostrar quex ∈ X

◦(N, d). Como, por hipotese, X = A∩N entao x ∈ A∩N , logo x ∈ A e

como A e aberto em (M, d) existe rx > 0 de modo que B(x; rx) ⊂ A. LogoB(x; rx) ∩N ⊂ A ∩N ; mas B(x; rx) ∩N = B(x; rx) ⇒ B(x; rx) ⊂ X.

Conclusao: Dado x ∈ X arbitrario, existe rx > 0 de modo que B(x; rx) ⊂ X,

isto e, x ∈ X◦(N, d). Disto concluımos que X, forcosamente, e aberto no

subespaco (N, d). �

Proposicao 25. Seja (M, d) um espaco metrico. Se N e aberto em (M, d)

e U ⊂ N entao U◦(N, d) = U

◦(M, d).

(M, d)

N

U

Prova:(⊂)De fato, dado p ∈ U

◦(N, d) entao existe um conjunto V , aberto em

(N, d), tal que p ∈ V ⊂ U . Entao, pela proposicao anterior, V = V1 ∩ Npara algum aberto V1 em (M, d). Como N e aberto em (M, d) temos que

V tambem e aberto em (M, d), portanto p ∈ U◦(M, d).

(⊃)Reciprocamente, dado q ∈ U

◦(M, d), existe W aberto em (M, d) com

q ∈W ⊂ U . Entao W ∩N e aberto em (N, d) e q ∈W ∩N ⊂ U , o que nos

da q ∈ U◦(N, d). �

∗ ∗ ∗

O que a matematica pontua, nao raro a natureza corrobora. (Gentil)

∗Ver proposicao 136 p. 598.

194

Page 196: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 26 (Abertos em produtos cartesianos). Sejam (M1 , d1) e (M2 , d2)espacos metricos. Consideremos X1 ⊂M1 e X2 ⊂M2 subconjuntos abertos.Entao X1×X2 e aberto no espaco (M, Di), onde i = 1, 2, 3 e M =M1×M2 .

Prova: Faremos a prova apenas para a metrica

D3(x, y) = max{d1(x1 , y1); d2(x2 , y2)

}

para as outras duas sai como consequencia da proposicao 68. (p. 319)

(M1 , d1 )

(M2 , d2 )

x=(x1 , x2)

x1

x2

X1×X2

X1

X2

(M,Di )

Seja x = (x1 , x2) ∈ X1 × X2 , mostremos que x e ponto interior desteproduto. De fato, x1 ∈ X1 e x2 ∈ X2 , portanto existem r1 , r2 > 0 de maneiraque B

d1(x1 ; r1) ⊂ X1 e B

d2(x2 ; r2) ⊂ X2 . Escolhemos r = min{r1 , r2}, logo

Bd1(x1 ; r) ⊂ X1 e B

d2(x2 ; r) ⊂ X2 e daı

Bd1(x1 ; r)×Bd2

(x2 ; r) ⊂ X1 ×X2

ja vimos que (p. 124)

BD3

((x1 , x2); r

)= B

d1(x1 ; r)×Bd2

(x2 ; r)

portanto,B

D3

((x1 , x2); r

)⊂ X1 ×X2

o que mostra que X1 ×X2 e aberto no espaco (M, D3). �

A seguir estaremos enriquecendo nosso sistema de processamento de in-formacoes com mais uma instrucao.

195

Page 197: Gentil Lopes - Espaços Métricos

5.3 Ponto fronteira

Definicao 23 (Ponto fronteira). Seja (M, d) um espaco metrico e X ⊂M .Um ponto p ∈ M e dito ponto fronteira de X se para todo r > 0 tivermosna bola B(p; r) algum ponto de X e tambem algum ponto do complementarde X.

Isto e: p ∈M e ponto fronteira de X se

B(p; r) ∩X 6= ∅ e B(p; r) ∩Xc 6= ∅ , ∀ r > 0.

Ao conjunto de todos os pontos de fronteira de X, chamamos fronteirade X e o indicamos por ∂X ou por ∂X

d, quando quisermos enfatizar a

metrica.

Exemplos:

1) A fronteira do quadrado aberto X ={(x, y) ∈ R2 : 0 < x, y < 1

}=

] 0, 1 [× ] 0, 1 [ em R2, com qualquer uma das metricas Di (i = 1, 2, 3) e oquadrado �, como o leitor pode provar rigorosamente.

R

R

տ∂X

R

R

տ∂X

R

R

տ∂X

2) Seja (M, d) um espaco discreto e X ⊂M . Entao ∂X = ∅.De fato, dado x ∈ M existe rx > 0 tal que B(x; rx) = {x }. Temos que

x ∈ X ou (exclusivo) x ∈ Xc, implicando

B(x; rx) ∩X = ∅ ou B(x; rx) ∩Xc = ∅.

3) Se X ={(x, y) ∈ R2 : x > 1

}, prove que ∂X =

{(x, y) ∈ R2 : x = 1

}.

X

R

R

0 1

X

R

R

0 1

տ∂X

r

196

Page 198: Gentil Lopes - Espaços Métricos

4) Considere M = [ 0, 1 [ , X =[12 , 1

[e o ponto p = 0. assim:

0 12

p=0s

M

X

Afirmamos que 0 e ponto fronteira de X − considerando a metricaquantica em M .

Por exemplo, observe como a bola de centro em p = 0 e raio r = 14

intercepta X e seu complementar.

0 12

sM

XXc

14

34

0 1B

k(0; 1

4)

Observe (na definicao de ponto fronteira) que para provar que um pontop ∈ M esta na fronteira de X nao e suficiente exibir uma bola (centradaem p) que intercepta X e seu complementar, isto deve se verificar para todabola centrada em p. No caso em questao, digo, para se convencer de que0 ∈ ∂Xk veja o diagrama de bolas abertas, B

k(0; r). (p. 111)

5) O exemplo anterior pode ser estendido para “duas dimensoes”, assim:Seja M = [ 0, 1 [× [ 0, 1 [ o quadrado unitario e X =

[12 , 1

[×[12 , 1

[⊂M ;

entao, 0 = (0, 0) e ponto fronteira de X se tomarmos em M qualquer umadas tres metricas quanticas. Na figura a seguir

0 1

1

Xc

0 1

1

X

0t

a esquerda vemos o complementar de X, na figura do centro vemos o con-junto X e seu ponto fronteira, 0; na figura da direita vemos que uma dasbolas de centro na origem de fato intercepta X e seu complementar.

197

Page 199: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 27. Seja (M, d) um espaco metrico e X ⊂M . Entao

∂X ∩X = ∅ ⇐⇒ X e aberto.

Prova:

(=⇒) Seja x ∈ X, tendo em conta a hipotese, temos que x 6∈ ∂X. Istosignifica que existe r > 0 tal que B(x; r) ∩Xc = ∅, portanto B(x; r) ⊂ X;o que mostra que x e ponto interior de X, por conseguinte X e aberto.

(⇐=) Dado x ∈ X existe r > 0 tal que B(x; r) ⊂ X, logo B(x; r)∩Xc = ∅,isto e, x 6∈ ∂X; portanto ∂X ∩X = ∅. �

Proposicao 28. Seja (M, d) um espaco metrico e X ⊂M . Entao, X−∂Xe um conjunto aberto.

Prova: Com efeito, seja x ∈ X−∂X, logo x ∈ X e x 6∈ ∂X, entao exister > 0 tal que B(x; r) ∩Xc = ∅; portanto B(x; r) ⊂ X.

Vamos mostrar que B(x; r) ⊂ X − ∂X. Para tanto e suficiente mostrarque para todo y ∈ B(x; r) ⇒ y 6∈ ∂X. Entao, seja y ∈ B(x; r), comoB(x; r) e um conjunto aberto existe r′ > 0 tal que B(y; r′) ⊂ B(x; r) ⇒B(y; r′)∩Xc = ∅ ⇒ y 6∈ ∂X. Portanto x e ponto interior de X −∂X, o quemostra que este conjunto e aberto. �

Observe, geometricamente, esta proposicao no caso do quadrado:

X ={(x, y) ∈ R2 : 0 ≤ x, y ≤ 1

}= [ 0, 1 ]× [ 0, 1 ]:

− =

R

RX ∂X

R

R

R

R

Proposicao 29. Seja (M, d) um espaco metrico, X ⊂M e p ∈M .

Se p ∈ ∂X ⇒ d(p, X) = 0.

Prova:

Seja p ∈ ∂X, para provar que d(p, X) = inf{d(p, x) : x ∈ X

}= 0, dado

ε > 0 arbitrario devemos exibir x ∈ X de modo que d(p, x) < ε.(lema 11, p. 609)

De fato, pela definicao de ponto fronteira, ∀ ε > 0 acontce B( p; ε)∩X 6= ∅,o que significa que ∀ ε > 0 existe x ∈ X tal que d(p, x) < ε. �

198

Page 200: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Observe que a recıproca da proposicao anterior nao vale.

Observacao: A partir das definicoes de ponto interior e ponto de fronteiraobservamos que:

se x ∈ ∂X = ∂Xc ⇒ x 6∈ ◦X e x 6∈

◦Xc

⇒ ∂X ∩ ◦X = ∅ e ∂X ∩

◦Xc = ∅.

Sendo (M, d) um espaco metrico, temos

B(p; r) ={x ∈M : d(x, p) < r

}

(B(p; r)

)c={x ∈M : d(x, p) ≥ r

}

Nota: A partir deste momento usaremos, onde acharmos conveniente, anotacao intX para o interior do conjunto X; isto e, estaremos trocando anotacao X

◦pela notacao intX.

Proposicao 30. Num espaco metrico (M, d) se ∂B(p; r) 6= ∅ entao

∂B(p; r) ={x ∈M : d(x, p) = r

}

Prova: De fato, se na indentidade ∂X ∩ X◦

= ∅ tomarmos X = B(p; r)concluiremos que nenhum ponto x ∈M que satisfaca d(x, p) < r pode estarna fronteira da bola. Portanto os pontos da fronteira (se existirem) satis-fazem d(x, p) ≥ r. Vamos inicialmente mostrar que todo ponto que satisfazd(x, p) > r pertence ao conjunto int

(B(p; r)

)c.

Seja q satisfazendo d(p, q) > r, devemos mostrar que existe s > 0 satis-fazendo

B(q; s) ⊂(B(p; r)

)c(5.3)

Tomemos s = d(p, q) − r > 0 e mostremos que a inclusao (5.3) estarasatisfeita. Entao, dado

x ∈ B(q; s) ⇒ d(x, q) < s = d(p, q)− r⇒ d(x, q) + r < d(p, q).

Devemos mostrar que x ∈(B(p; r)

)c, isto e, que d(x, p) > r.

spr

sq s

sxB(p; r)

(B(p; r)

)c

(M, d)

199

Page 201: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Pela desigualdade do triangulo, temos

d(p, q) ≤ d(q, x) + d(x, p)

logo

d(x, q) + r < d(p, q) ≤ d(q, x) + d(x, p) ⇒ r < d(x, p).

Por outro lado, se na identidade ∂X ∩ Xc◦= ∅ tomarmos X = B(p; r)

concluiremos que nenhum ponto x ∈M que satisfaca d(x, p) > r pode estarna fronteira da bola. Portanto, se a fronteira de uma bola aberta nao forvazia, teremos necessariamente

∂B(p; r) ={x ∈M : d(x, p) = r

}

Por exemplo, vamos determinar a fronteira de uma bola aberta no espaco(Q, µ),

∂B(p; r) ={x ∈ Q : |x− p| = r

}

={x ∈ Q : x = p± r

}

Portanto,

∂B(p; r) =

{ p − r, p+ r }, se r ∈ Q;

∅, se r 6∈ Q.

Corolario 2. Em um espaco vetorial(E, +, ·

)normado, com E 6= {0 } a

fronteira de uma bola aberta e sempre nao vazia.

Prova: Dada uma bola aberta B(p; r) e, tendo em conta a proposicaoanterior, e suficiente mostrar que existe um q ∈ E satisfazendo d(p, q) =‖p − q‖ = r. De fato, isto e verdade precisamente por estarmos em umespaco vetorial. Por exemplo o vetor

q = p+v

‖v‖r

onde v ∈ E e qualquer vetor nao nulo, satisfaz esta exigencia. �

R

R

0

rpB(p; r)

rR

R

0

rp∂B(p; r)

r

200

Page 202: Gentil Lopes - Espaços Métricos

5.4 Conjuntos fechados

Definicao 24 (Conjunto fechado). Seja (M, d) um espaco metrico. Umsubconjunto F ⊂ M se diz fechado no espaco (M, d) se, e somente se, seucomplementar F c =M − F e aberto em (M, d).

Esta definicao nos diz que os conjuntos fechados de um espaco metricosao os complementares dos conjuntos abertos deste espaco.

Ao contrario da linguagem ordinaria onde fechado e aberto sao antonimose excludentes, na topologia temos conjuntos que nao sao nem fechados e nemabertos e . . . o que e “pior” : existem conjuntos que sao ao mesmo tempoabertos e fechados.

Exemplos

1) F = [ a, b ] e fechado no espaco (R, µ) uma vez que

F c = [ a, b ]c = ]−∞, a [ ∪ ] b,+∞[

e a uniao de dois abertos, portanto aberto.

2) O conjunto A =] a, b ] ⊂ R nao e aberto e nem fehado no espaco (R, µ),uma vez que

Ac = ] a, b ]c = ]−∞, a ] ∪ ] b, +∞[

nao e aberto, pois a ∈ Ac nao e ponto interior de Ac.

3) Seja M = R e X = Q. Aqui temos um outro exemplo de conjunto quenao e aberto, nem fechado em (R, µ). Isto decorre do fato de que em todointervalo aberto temos numeros racionais e irracionais.

Observe que Q e ao mesmo tempo aberto e fechado no espaco (R, δ).Este e um caso especial do proximo exemplo.

4) Em um espaco (M, d) discreto, todo subconjunto F ⊂ M e aberto efechado ao mesmo tempo. De fato, vimos no exemplo 3 (p. 189) que todosubconjunto de M e aberto. Por outro lado, dado F ⊂ M , temos queF c =M −F , continua sendo um subconjunto deM e, portanto, aberto; porconseguinte F e fechado.

5) Vamos mostrar que o conjunto X = {1, 12 ,

13 , . . .} nao e fechado em

(R, µ). Para isto mostremos que o seu complementar nao e aberto. Vamosmostrar que 0 ∈ Xc nao e ponto interior de Xc. Temos Bµ(0; r) = ]− r, r [.Dado r > 0 escolhemos nr ∈ N de tal modo que 1

nr< r. Logo 1

nr∈ Bµ(0; r)

e 1nr6∈ Xc. Isto e, nenhuma bola centrada em 0 pode estar contida em Xc.

6) Num espaco metrico (M, d) todo conjunto finito { a1 , a2 , . . . , an } efechado. Em particular o conjunto unitario { a } ⊂M e fechado.

De fato, F c =M − { a1 , a2 , . . . , an } e aberto, pela proposicao 22. (p. 191)

7) O conjunto X = {x ∈ R : 0 ≤ x ≤ 1 } = [ 0, 1 ] e fechado no espaco(R, µ). Enquanto o conjunto Y = { (x, 0) ∈ R2 : 0 ≤ x ≤ 1 } = [ 0, 1 ]×{ 0 }e fechado no espaco (R2, D1). Esse e um caso especial do proximo resultado.

201

Page 203: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 31 (Fechados em produtos cartesianos). Sejam (M1 , d1) e(M2 , d2) espacos metricos. Consideremos F1 ⊂M1 e F2 ⊂M2 subconjuntosfechados. Entao F1 × F2 e fechado no espaco (M, Di), onde i = 1, 2, 3 eM =M1 ×M2.

Prova: Vamos mostrar que (F1 × F2)c e aberto. Para tanto e suficiente

mostrar a seguinte identidade (prop. 26, p. 195)

(F1 × F2)c =

(F c

1×M2

)∪(M1 × F c2

)

(M1 , d1 )

(M2 , d2 )

x=(x1 , x2)

x1

x2

F1×F2

F1

F2

(M,Di)

(⊂) Seja x = (x1 , x2) ∈ (F1 × F2)c, logo

(x1 , x2) 6∈ F1 × F2 ⇒ x1 6∈ F1 ou x2 6∈ F2

⇒ x1 ∈ F c1

ou x2 ∈ F c2

⇒ (x1 , x2) ∈ F c1 ×M2 ou (x1 , x2) ∈M1 × F c2logo

(x1 , x2) ∈(F c

1×M2

)∪(M1 × F c2

)

(⊃) Seja x = (x1 , x2) ∈(F c

1×M2

)∪(M1 × F c2

), logo

(x1 , x2) ∈ F c1 ×M2 ou (x1 , x2) ∈M1 × F c2logo

x1 ∈ F c1 e x2 ∈M2 ou x1 ∈M1 e x2 ∈ F c2entao

x1 6∈ F1 ou x2 6∈ F2 ⇒ (x1 , x2) 6∈ F1 × F2 ⇒ (x1 , x2) ∈ (F1 × F2)c

Pois bem, F1 e F2 sendo fechados, por hipotese, temos que F c1

e F c2sao

abertos. Pela proposicao 26 (p. 195) temos que F c1×M2 e M1 × F c

2sao

abertos, logo a uniao destes e aberto. Isto conclui a prova. �

202

Page 204: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 32. Seja (M, d) um espaco metrico.

(i) M e ∅ sao fechados;

(ii) Se F1 , F2 , . . . , Fn sao fechados, entao

F1 ∪ F2 ∪ · · · ∪ Fn e fechado;

(iii) Se {Fλ}λ∈L

e uma famılia arbitraria de fechados entao

F =⋂

λ∈LF

λe fechado.

Prova:

(i) Ja vimos que M e ∅ sao abertos, portanto M c = ∅ e ∅c = M saofechados.

(ii) Como cada Fi e fechado, entao cada F cie aberto e, pela prop. 23 (p.

192),

F c1∩ F c

2∩ · · · ∩ F c

ne aberto;

por conseguinte

(F c

1∩ F c

2∩ · · · ∩ F c

n

)c= F1 ∪ F2 ∪ · · · ∪ Fn .

e fechado.

(iii) Como cada Fλe fechado, entao F c

λe aberto e, pela prop. 23,

λ∈LF c

λ

e aberto, logo( ⋃

λ∈L

F cλ

)c=⋂

λ∈L

e fechado. �

Do ıtem (ii) acima, juntamente com o exemplo 6 (p. 201), concluımos quese acrescentarmos uma quantidade finita de pontos a um conjunto fechado,esta propriedade nao e perdida.

Obs: A uniao de uma famılia infinita de conjuntos fechados pode ou naoser um conjunto fechado.

Contraexemplo: Seja a famılia{Xn

}

n∈N, onde Xn = { 1

n }. Em qual-

quer espaco metrico os Xn(n = 1, 2, . . .) sao conjuntos fechados, por seremunitarios. Mas

n∈N

Xn ={1,

1

2,1

3, . . .

},

nao e fechado no espaco (R, µ) embora o seja no espaco (R, δ).

(Exemplos 5, p. 201 e 4, p. 201)

203

Page 205: Gentil Lopes - Espaços Métricos

5.5 Ponto aderente

Definicao 25 (Ponto aderente). Seja (M, d) um espaco metrico e X ⊂M .Um ponto p ∈M se diz ponto aderente ao conjunto X se

B(p; r) ∩X 6= ∅ , ∀ r > 0.

Isto e, se toda bola centrada em p intersecta X.O conjunto dos pontos aderentes a X chama-se fecho (ou aderencia) de

X e e indicado por X ou por Xd, quando quisermos enfatizar a metrica.

Na definicao anterior o ponto p ∈ M pode ou nao pertencer a X. Casop ∈ X entao trivialmente se verifica B(p; r)∩X 6= ∅, isto e, p ∈ X, portantoX ⊂ X. Ou ainda: todo ponto de um conjunto e aderente a este conjunto.

• Comparando as definicoes de ponto aderente e de fronteira,

B(p; r) ∩X 6= ∅ e B(p; r) ∩Xc 6= ∅︸ ︷︷ ︸

ponto fronteira

, ∀ r > 0

concluimos que todo ponto fronteira e tambem ponto aderente, a recıprocanao vale.

Para mostrar que p 6∈ X devemos exibir r > 0 tal que B(p; r) ∩X = ∅.Exemplos:

1) SejamM = R e X = ] a, b ], entao a ∈ R e ponto aderente a X no espaco(R, µ), mas nao no espaco (R, δ). Isto e

a ∈ Xµ e a 6∈ Xδ.

De fato, para provar que a ∈ Xµ basta ver que a ∈ ∂Xµ.

Por outro lado, por exemplo Bδ(a; 1) = { a }, logo B

δ(a; 1) ∩ X = ∅, o

que mostra que a 6∈ Xδ.

2) Seja M = R e X = Q. No espaco (R, µ) todo numero real e aderente aoconjunto Q. Isto ja nao acontece no espaco (R, δ). Isto e

Qµ = R e Qδ6= R.

De fato, dado x ∈ R, temos Bµ(x; r) = ]x− r, x+ r [ como temos numerosracionais em qualquer intervalo aberto, segue que Bµ(x; r) ∩ Q 6= ∅; sendoassim, x ∈ Qµ . Agora, por exemplo, B

δ(x; 1) = {x }. Se x for irracional,

obviamente Bδ(x; 1) ∩Q = ∅, o que mostra que x 6∈ Q

δ. Portanto

Qµ = R e Qδ= Q.

3) Seja M = R e X ={1, 1

2 ,13 , . . .

}. Entao 0 ∈ Xµ, mas 0 6∈ X

δ. De fato

Bδ(0; 1) = { 0 } ⇒ B

δ(0; 1) ∩X = ∅.

o que mostra que 0 6∈ Xδ.

204

Page 206: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por outro lado, Bµ(0; r) = ] − r, r [, dado r > 0 escolha n ∈ N tal que1n < r, entao

µ(0,1

n) =

∣∣∣1

n− 0∣∣∣ =

1

n< r ⇒ 1

n∈ Bµ(0; r)

isto e, Bµ(0; r) ∩X 6= ∅, isto mostra que 0 ∈ Xµ.

4) Se um espaco (M, d) e discreto entao os unicos pontos de aderencia deum subconjunto X ⊂M sao os seus proprios pontos.

De fato, se (M, d) e discreto, existe r > 0 tal que B(a; r) = { a }; e sea 6∈ X temos B(a; r) = { a } ∩X = ∅. Logo, a nao e aderente a X.

5) Considere M = [ 0, 1 [ , X =[12 , 1

[e o ponto p = 0, assim:

0 12

1

s X

Afirmamos que 0 e ponto aderente a X − considerando a metricaquantica em M . Com efeito, ja vimos que 0 e ponto fronteira. (p. 197)

Proposicao 33. Em todo espaco metrico sao validas as duas seguintes iden-tidades.

(i) Xc = X◦

c (ii) Xc = Xc◦

Nota: Estamos convencionando as seguintes notacoes:

X◦c = complementar do interior de X

Xc◦

= interior do complementar de X

Entao:

(i) O fecho do complementar e igual ao complementar do interior.

(ii) O complemento do fecho e igual ao interior do complementar.

Prova:

(i) seja x ∈ Xc ⇐⇒ ∀r > 0, B(x; r) ∩Xc 6= ∅⇐⇒ ∀r > 0, B(x; r) 6⊂ X

⇐⇒ x 6∈ ◦X ⇐⇒ x ∈ X

◦c .

(ii) seja x ∈ (X)c ⇐⇒ x 6∈ X ⇐⇒ ∃ r > 0: B(x; r) ∩X = ∅

⇐⇒ ∃ r > 0: B(x; r) ⊂ Xc ⇐⇒ x ∈ Xc◦.

205

Page 207: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 34. O fecho de qualquer conjunto, e sempre um conjunto fechado.

Prova: Isto e imediato, a partir da identidade Xc = Xc◦

. �

Proposicao 35. Seja (M, d) um espaco metrico. F ⊂ M e fechado se, esomente se, F = F .

Isto e: um conjunto e fechado se, e somente se, contem todos os seuspontos aderentes.

Prova:

(=⇒) Se F e fechado entao F = F . ((T-3), p. 571)

Com efeito, A inclusao F ⊂ F e sempre valida, resta mostrar que F ⊂ F .Suponha que nao. Entao existe p ∈ F tal que p 6∈ F ; logo p ∈ F c. Como,por hipotese, F e fechado, segue que F c e aberto. Portanto existe r > 0 talque B(p; r) ⊂ F c, o que implica B(p; r)∩F = ∅. Ora, mas isto contradiz ofato de que p ∈ F .(⇐=) Se F = F entao F e fechado.

Isto e imediato, a partir da proposicao 34. �

Comentario: Vimos (ex. 5, p. 201) que o conjunto X = {1, 12 ,

13 , . . .} nao e

fechado no espaco (R, µ); o teorema anterior (mais o exemplo 3, (p. 204))nos diz precisamente porque isto acontece: 0 ∈ X e 0 6∈ X.

Portanto X = { 0 } ∪ {1, 12 ,

13 , . . .} e fechado neste espaco.

A proxima proposicao relaciona o fecho de um conjunto no espaco como fecho deste conjunto em um subespaco.

Proposicao 36. Seja (N, d) um subespaco do espaco metrico (M, d). Dadoum subconjunto X ⊂ N a seguinte identidade e valida

X(N, d)

= X(M, d)

∩ N

(M, d)

(N, d)

X

Prova:(⊂)Seja p ∈ X

(N, d), isto implica em que

p ∈ N e ∀ ε > 0, B(p; ε) ∩X 6= ∅ (5.4)

Para mostrar que p ∈ X(M, d)

e suficiente mostrar que

∀ ǫ > 0, B(p, ǫ) ∩X 6= ∅

206

Page 208: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Pois bem, dado ǫ > 0, B(p; ǫ) ∩N e uma bola no subespaco (N, d), isto eB(p; ǫ) ∩ N = B(p; ǫ) portanto, invocando (5.4), podemos escrever

(B(p; ǫ) ∩N

)∩ X 6= ∅ ⇒ B(p; ǫ) ∩

(N ∩X

)6= ∅

como X ⊂ N ⇒ N ∩ X = X, portanto B(p; ǫ) ∩X 6= ∅.(⊃)Seja q ∈ X

(M, d)∩N . Para mostrar que q ∈ X

(N, d)basta mostrar que

∀ ε > 0, B(q; ε) ∩X 6= ∅

De fato, ∀ ε > 0, B(q; ε) = B(q; ε)∩N , onde B(q; ε) e uma bola em (M, d).Como, por hipotese, q ∈ X

(M, d)entao B(p; ε) ∩X 6= ∅. Por outro lado

X ⊂ N ⇒ X = X ∩N ⇒ B(q; ε) ∩(X ∩N

)6= ∅

⇒(B(q; ε) ∩N

)∩X 6= ∅ ⇒ B(q; ε) ∩X 6= ∅ ⇒ q ∈ X

(N, d).

Segundo a proposicao anterior para encontrarmos o fecho de um conjuntoX ⊂ N no subespaco (N, d) basta encontrar o fecho no espaco (M, d)e intersectar com N . Por exemplo, sejam (M, d) = (R, µ) a reta usual,N = [ 0, 1 [ e X =

]12 , 1

[

¬ ¬

¬

0

0

0

1

1

112

R

N

X

E facil ver que X(R, µ)

=[12 , 1

], sendo assim temos

X(N,µ)

= X(R,µ)

∩ N

=[ 1

2, 1]∩ [ 0, 1 [=

[ 1

2, 1[

Observe que[12 , 1

[= X

(N, µ)e um conjunto fechado no subespaco (N, µ)

embora nao o seja no espaco (R, µ). Uma questao para o leitor refletir: Oponto p = 1 e aderente a X no espaco (R, µ) mas nao no subespaco (N, µ),embora tenhamos B(1, ε) ∩X 6= ∅, ∀ε > 0. Como se explica isto?

O corolario a seguir nos nos diz por que os dois fechos no exemplo acimaresultaram diferentes

Corolario 3. Seja (N, d) um subespaco fechado do espaco (M, d), entaopara todo X ⊂ N , tem-se

X(N, d)

= X(M, d)

207

Page 209: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Temos as seguintes implicacoes

X ⊂ N ⇒ X ⊂ N = N ⇒ X ∩N = X.

Portanto†, da proposicao 36 concluimos

X(N, d)

= X(M, d)

∩N ⇒ X(N, d)

= X(M, d)

Corolario4. Os subconjuntos fechados do subespaco (N, d) sao as intersecoesF ∩N , onde F e fechado em (M, d).

Prova: Devemos mostrar que

1 o ) se F e fechado em (M, d) entao F ∩ N e fechado em (N, d). Defato,

F ∩N = F(M, d)

∩N = F(N, d)

logo F ∩N e fechado em (N, d).

2 o ) se X e um subconjunto fechado em (N, d) entao X = F ∩N paraalgum F fechado em (M, d). De fato,

X = X(N, d)

⇒ X = X(N, d)

= X(M, d)

∩N

= F ∩N

onde X(M, d)

= F e um fechado em (M, d). �

Proposicao 37. Em qualquer espaco metrico e valida a seguinte identidade

∂X = X ∩ Xc

Prova: De fato,

x ∈ ∂X ⇐⇒ ∀r > 0, B(x; r) ∩X 6= ∅ e B(x; r) ∩Xc 6= ∅⇐⇒ x ∈ X e x ∈ Xc

⇐⇒ x ∈ X ∩ Xc.

†Nota: X = X(M, d)

e N = N(M, d)

208

Page 210: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 38. Em qualquer espaco metrico (M, d) a aderencia (fecho) deum subconjunto X ⊂M e a reuniao do seu interior com sua fronteira.

Prova:

X◦ ∪ ∂X = X

◦ ∪(X ∩ Xc

)=(X◦ ∪ X

)∩(X◦ ∪ Xc

)

= X ∩(X◦ ∪ X

◦c)

= X ∩ M = X.

Observe, geometricamente, esta proposicao no caso do quadrado:

R

R

∪ =

X◦

∂X X

R

R

R

R

Observacao: A reuniao X◦ ∪ ∂X = X e disjunta; isto e, X

◦ ∩ ∂X = ∅,pelas proprias definicoes de ponto interior e ponto fronteira.

A identidade X ∪ ∂X = X tambem e valida, so que aqui nao temosuma uniao disjunta. Por exemplo para X = ] a, b ] no espaco (R, µ), temosX = [ a, b ] e ∂X = { a, b }.

Corolario 5. Seja (M, d) um espaco metrico e X ⊂M . A seguinte identi-dade se verifica

∂X = X − X◦

Prova: ∂X ∪ X◦= X ⇒ ∂X = X −X

◦. �

Observacao: Nao tente realizar o procedimento anterior sem antes certificar-se de que a reuniao envolvida e disjunta.

Observe, geometricamente, esta proposicao no caso do quadrado:

R

R

−=

X◦

∂X X

R

R

R

R

209

Page 211: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Corolario 6. Seja (M, d) um espaco metrico e seja X ⊂M . Entao

∂X = ∅ ⇐⇒ X e aberto e fechado.

Prova:

(⇒) Temos

X◦ ∪ ∂X = X ⇒ X

◦= X

⇒ X◦= X = X.

X = X ∪ ∂X ⇒ X = X

Portanto X e aberto e fechado.

(⇐) Se X e aberto e fechado entao X◦= X = X, levando este resultado na

identidade ∂X = X −X◦resulta ∂X = ∅. �

Corolario 7. Seja um espaco vetorial(E, +, ·

)normado com E 6= {0 }.

EntaoB(p; r) =

{x ∈M : d(x, p) ≤ r

}

Isto e, o fecho da bola aberta e a bola fechada.

Prova: E uma decorrencia imediata da identidade X = X◦ ∪ ∂X junta-

mente com a proposicao 30 (p. 199) e seu corolario 2 (p. 200). �

Esta afirmativa e falsa em um espaco nao normado. De fato, conside-remos o espaco (R, δ). Neste espaco temos B(0; 1) = { 0 }. Como B e umconjunto fechado resulta que B(0; 1) = B(0; 1). Por outro lado,

B[ 0; 1 ] = {x ∈ R : δ(x, 0) ≤ 1 } = R.

Proposicao 39. Em qualquer espaco metrico (M, d) a fronteira de umsubconjunto X ⊂M e um conjunto fechado.

Prova: De fato, para conjuntos A e B quaisquer vale A− B = A ∩Bc,logo ∂X = X −X

◦= X ∩ X

◦c . Vamos mostrar que (∂X)c e aberto, entao

(∂X)c =(X ∩ X

◦c )c= Xc ∪ X

= Xc◦ ∪ X

◦.

logo (∂X)c e um conjunto aberto, por ser a uniao de dois abertos; porconseguinte ∂X e um conjunto fechado. �

210

Page 212: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 40. Seja (M, d) um espaco metrico. Se p ∈ M e X ⊂ M ,entao d(p, X) = 0 se, e somente se, p ∈ X.

Prova:

(=⇒) Se d(p, X) = 0 entao p ∈ X. Com efeito, por hipotese

d(p, X) = inf { d(p, x) : x ∈ X } = 0 (5.5)

Isto e, 0 e a maior das cotas inferiores do conjunto { d(p, x) : x ∈ X }. Ouseja, qualquer r > 0 nao pode ser cota inferior deste conjunto. Logo, ∀ r > 0existe x ∈ X de modo que d(p, x) < r. Ou ainda: para todo r > 0, temosB(x; r) ∩X 6= ∅; o que mostra que p ∈ X .

(⇐=) Se p ∈ X entao d(p, X) = 0

Devemos mostrar que a igualdade (5.5) se verifica. Isto e, que 0 e amaior das cotas inferiores do conjunto { d(p, x) : x ∈ X }.

De outro modo: nenhum r > 0 pode ser cota inferior deste conjunto.Para isto devemos exibir x ∈ X tal que d(p, x) < r. Entao, por hipotese,p ∈ X , isto e, ∀ r > 0, temos B(p; r) ∩X 6= ∅. Logo, ∀ r > 0 existe x ∈ Xde modo que d(p, x) < r. Isto conclui a prova. �

Corolario 8. Seja (M, d) um espaco metrico, R ⊂M uma regiao de M , ep um ponto de M. Entao,

d(p, R) = 0 ⇐⇒ O(p; r) ∩R 6= ∅; ∀ r > 0.

Prova:

(⇒ ) De fato, pela proposicao 40 p ∈ R, logo, por definicao de pontoaderente, decorre a tese.

(⇐ ) Com efeito, da hipotese decorre que p ∈ R, portanto − ainda pelaproposicao 40 − temos d(p, R) = 0. �

Sendo assim, uma questao que resolvemos com a maior facilidade natopologia quantica e: pode um objeto “esta em varios lugares ao mesmotempo”? Respondemos que sim, e dizemos porque. (def. 11, p. 116)

Proposicao 41. Seja (M, d) um espaco metrico. Entao para todo subcon-junto X ⊂M se verifica a igualdade diam(X) = diam(X).

Prova: Temos

diam(X) = sup { d(x, y) : x, y ∈ X }

diam(X) = sup { d(x, y) : x, y ∈ X }

Por definicao de supremo temos

d(x, y) ≤ diam(X), ∀x, y ∈ X

d(x, y) ≤ diam(X), ∀x, y ∈ X

211

Page 213: Gentil Lopes - Espaços Métricos

e mais: diam(X) e diam(X) sao os menores numeros satisfazendo estasdesigualdades. Como

X ⊂ X ⇒ d(x, y) ≤ diam(X), ∀x, y ∈ X

mas como diam(X) e o menor numero satisfazendo esta desigualdade, segueque diam(X) ≤ diam(X).

Por outro lado, dado r > 0, para quaisquer x, y ∈ X temos B(x; r2)∩X 6=∅ e B(y; r2) ∩X 6= ∅, logo existem x′, y′ ∈ X tais que

d(x, x′) <r

2e d(y, y′) <

r

2

Da equacao (1.14), temos (p. 44)

d(x1 , x4) ≤ d(x1 , x2) + d(x2 , x3) + d(x3 , x4)

entao

d(x, y) ≤ d(x, x′) + d(x′, y′) + d(y′, y) < r + diam(X)

Isto mostra que r + diam(X) e uma cota superior do conjunto

{ d(x, y) : x, y ∈ X }

portanto diam(X) ≤ r + diam(X), isto e,

diam(X)− r ≤ diam(X).

Como esta desigualdade vale para todo r > 0, temos∗ que diam(X) ≤diam(X). Portanto diam(X) = diam(X). �

Observacao: Uma aplicacao desta proposicao e que, ao inves de calculardiam(X), podemos calcular diam(X). E qual a vantagem disto? Quando(X, d

)e compacto, sendo

d : X ×X −→ R

(x, y) 7−→ d(x, y)

contınua (ver (ii), p. 261), aplicamos o teorema de Weierstrass (p. 613). Tro-camos sup { d(x, y) : x, y ∈ X } por max { d(x, y) : x, y ∈ X } e teremos anossa disposicao as tecnicas de maximos e mınimos de funcoes reais. Ob-serve que, ainda segundo o teorema de Weierstrass, nas condicoes referidas,sempre existirao x′, y′ ∈ X de modo que d(x′, y′) = diam(X) = diam(X).

Proposicao 42. Seja (M, d) um espaco metrico e X ⊂ M . Se p ∈ X,entao existe uma sequencia (xn) de pontos de X tal que limxn = p.

∗Proposicao 148, p. 613.

212

Page 214: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Como p ∈ X , entao para cada r > 0 temos B(p; r) ∩ X 6= ∅.Em particular para r = 1

n , temos

B(p;

1

n

)∩X 6= ∅ , (n = 1, 2, . . .)

Daqui retiramos uma sequencia (x1 , x2 , . . . , xn , . . .) de pontos de X talque xn ∈ B( p; 1

n). Vamos mostrar que xn → p.

r prx1r=1

rx2r= 1

2r

(M, d)

X

rprx1 rx2 r

(M,d)

X

ր

Temos xn ∈ B(p; 1n)⇒ d(xn , p) <

1n , ou ainda 0 ≤ d(xn , p) <

1n . Entao

0 ≤ d(xn , p) <1

n⇒† lim 0 ≤ lim d(xn , p) ≤ lim

1

n

isto e, 0 ≤ lim d(xn , p) ≤ 0, entao

lim d(xn , p) = 0 ⇒‡ xn → p.

Exemplos:

1) Vimos no exemplo 3 (p. 204) que sendo M = R e X ={1, 1

2 ,13 , . . .

},

entao 0 ∈ Xµ, mas 0 6∈ Xδ. Pela proposicao anterior existe uma sequencia

de pontos de X que converge para 0. A sequencia dada por xn = 1n converge

para 0 (com a metrica µ), qualquer subsequencia sua tambem converge para0. Por outro lado, na metrica δ, nao existe sequencia de X convergindo para0 o que implica em que 0 6∈ X

δ.

2) Consideremos M = R e X = Q. Dado qualquer numero q irracionalexiste uma sequencia de racionais convergindo para q (na metrica usual).De fato, basta ter em conta o exemplo 2 (p. 204). Por exemplo,

(1; 1, 4; 1, 41; 1, 414; 1, 4142; . . .) →√2

Tambem,

4 ·(

1− 1

3+

1

5− 1

7+ · · ·

)

→ π

†corolario 1, p. 163.‡proposicao 9, p. 143.

213

Page 215: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3) Ja vimos no exemplo 5 (p. 205) que 0 e aderente ao conjunto X na figuraa seguir

0 12

1

s X

Logo, existe uma sequencia de pontos de X convergindo para 0.

Exiba uma sequencia cumprindo estas condicoes.

A recıproca da proposicao anterior tambem vale:

Proposicao 43. Seja (M, d) um espaco metrico e X ⊂ M . Se existe umasequencia (xn) de pontos de X tal que lim xn = p entao p ∈ X.

Prova: Com efeito, se limxn = p e xn ∈ X entao toda bola aberta decentro p intersecta X, portanto p ∈ X. (prop. 8, p. 142) �

Vejamos dois exemplos desta situacao:

1o ) Consideremos o seguinte subconjunto do plano R2

X ={(x, y) ∈ R2 : 0 ≤ x ≤ 1, y = x/n, n ∈ N

}

O conjunto X e formado dos pontos do segmento que liga a origem (0, 0)aos pontos (1, 1/n), n ∈ N. Vamos mostrar que todo ponto do conjunto

A ={(x, 0) ∈ R2 :

1

2≤ x ≤ 1

}

e ponto aderente a X.

(0, 0) q

q

1

1

...↓

− Conjunto X

(0, 0) qq

q

112

1

A

...↓

ra1ra2r

Fixado qualquer 12 ≤ x ≤ 1 a sequencia dada por an =

(x, xn

)de pontos

de X e tal que an → (x, 0) ∈ A, logo todo ponto de A e aderente a X.

214

Page 216: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2o ) Consideremos o seguinte subconjunto do plano R2 (metrica euclidiana).

X ={

(x, y) ∈ R2 : x > 0 e y = cos(1

x

) }

Vamos mostrar que todo ponto do conjunto

A ={(0, y) ∈ R2 : − 1 ≤ y ≤ 1

}= { 0 } × [−1, 1 ].

e ponto aderente a X.

A seguir vemos o conjunto X (grafico da funcao f(x) = cos(1/x))

x

f(x)

Xq

q

1

−1

0

De fato, fixado y ∈ [−1, 1 ] resolvendo a equacao

cos(1

x

)= y = cos

(cos−1(y)

)

obtemos a seguinte sequencia, xn = 12nπ+cos−1(y)

. A sequencia(xn , cos(

1xn

))

de pontos de X converge para o ponto (0, y) ∈ A e isto prova que todo pontode A e aderente a X. A tıtulo de exemplo consideremos y = 1/2, entao

xn =1

2nπ + cos−1(1/2)=

1

2nπ + π3

→ 0.

os pontos da sequencia(xn , cos(

1xn

))situam-se sobre a reta y = 1/2 e con-

vergem para o ponto(0, 1

2

)∈ A.

x

f(x)

X

րA

¬

¬

1

−1

qqqqj

215

Page 217: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Observe que toda bola centrada no ponto(0, 1

2

)intersecta o conjunto X.

Toda bola centrada neste ponto contem infinitos pontos de X. Por exemplopontos da sequencia

(xn , cos(

1xn

)).

Proposicao 44. Seja F ⊂ M . F e fechado se, e somente se, para todasequencia (xn) de pontos de F com limxn = a ∈M tivermos a ∈ F .

Prova:

(=⇒) Seja F fechado e (xn) uma sequencia de pontos de F com limxn =a ∈ M . Entao, pela proposicao 43 (p. 214) a ∈ F , como F e fechado temosque F = F , portanto a ∈ F .(⇐=) Suponhamos que toda sequencia convergente de pontos de F temlimite em F , e mostremos que F = F . Como F ⊂ F , basta mostrar queF ⊂ F . Seja a ∈ F . Pela proposicao 42 (p. 212) existe uma sequencia (xn)de pontos de F tal que limxn = p. Pela nossa hipotese, temos p ∈ F . LogoF ⊂ F . �

5.6 Densidade

Definicao 26 (Densidade). Dado um espaco metrico (M, d), um subcon-junto X ⊂M se diz denso em M se X =M.

Isto significa: fixados arbitrariamente um ponto p ∈M e um raio r > 0,B(p; r) ∩X 6= ∅. Ou seja, arbitrariamente proximo de p encontramos umponto de X.

Exemplos:

1) Seja M = R e X = Q. No exemplo 2 (p. 204) vimos que

Qµ = R , Qδ6= R.

portanto Q e denso em R no espaco (R, µ); mas nao no espaco (R, δ).

2) Seja M = C[a, b] e X = P onde P e o conjunto de polinomios.P e denso no espaco (C[a, b],Υ).Isto e o que nos diz o Teorema da aproximacao de Weierstrass:

“Dada uma funcao contınua f : [a, b]→ R, existe uma sequencia de polinomios(pn) tais que lim pn = f uniformemente em [a, b].” (ver [5] )

Logo, pela proposicao 43 (p. 214), temos f ∈ PΥ.

Nota: O corolario 3 (p. 207) nos permite inferir um resultado que sera uti-lizado posteriormente, a saber:

X e denso no subespaco (X, d ).

De fato, para que esta assertiva seja verdadeira e suficiente mostrar que

X(X, d)

= X = X(M, d)

Para tanto basta tomar N = X no corolario.

216

Page 218: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 45. Seja (M, d) um espaco metrico. Se X ⊂ M e denso emM , entao X ∩A 6= ∅, para todo aberto A 6= ∅ desse espaco.

Prova: Dado p ∈ A ⊂M , entao existe r > 0 de modo que B(p; r) ⊂ A.Como X = M , p e aderente a X. Logo, B(p; r) ∩X 6= ∅. Portanto existeq ∈ X e q ∈ B(p; r) ⊂ A, logo A ∩X 6= ∅. �

Importancia da densidade

A densidade nos permite aproximar − com precisao arbitraria − pontosde um conjunto M por pontos de um seu subconjunto (e o que nos diz aproposicao 42, p. 212). Perceba que isto nao e pouco. Por exemplo, porrazoes tecnicas, um computador nao opera com numeros reais, mas pelofato de que Qµ = R isto significa que podemos representar um numero realpor um racional com a precisao que desejarmos. Ainda mais: a mesmaproposicao nos assegura que existe uma sequencia de racionais convergindopara qualquer numero real.

Por exemplo, da conhecida identidade

π

4= 1− 1

3+

1

5− 1

7+ · · ·

obtemos a seguinte sequencia de numeros racionais convergindo para π

an = 4 ·n∑

i=1

(−1)i−12i− 1

A seguir exemplificamos como esta sequencia converge para π,

n an→π

......

......

1 4

2 2, 66667

800 3, 14034

1500 3, 14093

uma convergencia, como se ve, bastante lenta. Mas converge.Como mais um exemplo, a sequencia dada pela seguinte formula de

recorrencia

an+1 =1

N

[

(N − 1)an +c

aN−1

n

]

nos permite aproximar − com precisao arbitraria − a raizN−esima de c > 0,apartir de um valor inicial a0 > 0 qualquer.

Isto e, a partir de qualquer a0 > 0 dado, temos an → N√c

217

Page 219: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A seguir apresentamos duas tabelas que exemplificam a formula anterior.Em ambas adotamos a0 = 1.

n an→√2

0 1, 00000

1 1, 50000

2 1, 41667

3 1, 41422

4 1, 41421

5 1, 41421

n an→ 3√50 1, 00000

1 2, 33333

2 1, 86168

3 1, 72200

4 1, 71006

5 1, 70998

Os valores fornecidos pelo computador sao√2 = 1, 41421356237

3√5 = 1, 70997594668

Os circuitos aritmeticos de computadores realizam apenas a operacao desoma (as outras operacoes aritmeticas podem ser implementadas a partirde circuitos somadores). Como entao realizar calculos mais complicados,digamos...transcendentes?

A densidade de P no espaco das funcoes contınuas nos garante que paratoda funcao contınua existe um polinomio que a aproxima com precisaoarbitraria.

A tıtulo de exemplo, a sequencia de polinomios dada a seguir e umaaproximacao para a funcao seno

p1(x) = x

p2(x) = x− x3

6

p3(x) = x− x3

6+

x5

120

−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−

pn(x) = x− x3

6+

x5

120− . . . + (−1)n−1 x2n−1

(2n− 1)!

x= π12

pn(π12

)→ sen ( π12

)

p1(x) 0, 261799

p2(x) 0, 258809

p3(x) 0, 258819

A tabela ao lado mostra o calculo do senode 15o ( π12 rad): O terceiro polinomio, p3 , dasequencia ja nos fornece o valor correto comseis casas decimais. Confira

sen( π

12

)

=

2−√3

2= 0, 258819 . . .

218

Page 220: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Mais dois exemplos de densidade

No apendice (p. 223) mostramos mais dois exemplos de densidade:

1o) O conjunto das funcoes parcialmente lineares (ou funcoes poligonais) edenso no espaco

(C([0, 1]); Υ

).

Isto significa que qualquer funcao contınua pode ser aproximada (arbi-trariamente) por uma funcao poligonal.

2o) Seja D o conjunto das fracoes diadicas (fracoes cujos denominadores saopotencias de 2) no intervalo [ 0, 1 [, ou seja

D =

{1

2,1

4,3

4,1

8,3

8,5

8,7

8,1

16,3

16, . . . ,

13

16,15

16, . . .

}

D e denso em [ 0, 1 [.Isto significa que qualquer numero do intervalo [ 0, 1 [ (irracionais, por

exemplo) pode ser aproximado, com precisao arbitraria, por uma fracaodiadica.

5.7 Ponto de acumulacao

Definicao 27 (Ponto de acumulacao). Seja (M, d) um espaco metrico eX ⊂M . Um ponto p ∈M se diz ponto de acumulacao de X se, e somentese, para todo r > 0, se verifica

(B( p; r)− { p }

)∩X 6= ∅

Isto e, se toda “bola furada” (sem o centro) centrada em p intersecta X.

X sp

B(p; r)

(M,d)

X s B(p; r)−{ p }

(M, d)

O conjunto dos pontos de acumulacao deX e chamado conjunto derivadode X e e indicado por X ′ ou por X ′

dquando desejarmos enfatizar a metrica.

Observacoes:

(i) Dizer que p ∈ M nao e ponto de acumulacao de X, isto e, p 6∈ X ′,significa dizer que existe r > 0 tal que

(B( p; r)− { p }

)∩X = ∅

(ii) Se ∀ r > 0 tivermos(B(p; r)−{ p }

)∩X 6= ∅, com mais razao ainda

teremos B(p; r) ∩X 6= ∅, o que significa que todo ponto de acumulacao deX e tambem ponto aderente de X (ver definicao 25, p. 204). Isto e, a inclusaoX ′ ⊂ X sempre se verifica.

219

Page 221: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) Seja M = R e X ={1, 1

2 ,13 , . . .

}. Entao (Justifique)

X ′µ= { 0 } e X ′

δ= ∅.

Neste espaco podemos visualizar os elementos do conjunto X “acumu-lando-se” em torno de 0. Observe

| rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr0 11

213

14

15

···

A igualdade X ′δ= ∅ e um caso especial do exemplo seguinte

2) Se (M, d) e um espaco discreto e X ⊂M entao X ′ = ∅.Prova: Com efeito, dado p ∈M existe rp > 0 de modo que B(p; rp) = { p },logo B(p; rp)−{ p } = ∅, portanto

(B(p; rp)−{ p }

)∩X = ∅. Isto prova que

nenhum ponto de M pode ser ponto de acumulacao de X. �

Em particular considere o espaco (R, δ) e X = ] 0, 1 ]; 0 nao e pontoaderente a X, 1 e ponto aderente, mas nao ponto de acumulacao de X noespaco (R, δ). (ex. 1, p. 204)

3) Considere M = [ 0, 1 [ , X =[12 , 1

[e o ponto p = 0. assim:

0 12

1

s X

Afirmamos que 0 e ponto de acumulacao de X − considerando a metricaquantica em M . Para se convencer disto basta volver ao diagrama de bolasabertas B

k(0; r), a p. 111.

4) M = [ 0, 1 [× [ 0, 1 [ o quadrado unitario e X =[12 , 1

[×[12 , 1

[⊂M .

Deixamos como tarefa a justificativa de que 0 = (0, 0) e ponto de acu-mulacao de X se tomarmos em M qualquer uma das tres metricas Di .

0 1

1

0

X

0t

220

Page 222: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 46. Seja (M, d) um espaco metrico e X ⊂ M . A seguinteidentidade se verifica

X = X ∪X ′

Prova:

(⊂) Seja p ∈ X, logo para todo r > 0 temos B(p; r) ∩X 6= ∅. (⋆)

Temos duas alternativas: p ∈ X ou p 6∈ X. Se p ∈ X entao X ⊂ X ∪X ′.Se p 6∈ X entao de (⋆) concluımos que ∀ r > 0

(B(p; r)−{ p }

)∩X 6= ∅, isto

e, p ∈ X ′. Neste caso tambem temos X ⊂ X ∪X ′.(⊃) Ja vimos que X ⊂ X e X ′ ⊂ X , logo X ∪X ′ ⊂ X . O que demonstra aidentidade. �

Proposicao 47. Se p e um ponto de acumulacao de X ⊂ M , entao todabola aberta centrada em p contem infinitos pontos de X.

Prova: Seja B(p; r) uma bola aberta que contem p e somente umnumero finito de pontos de X diferentes de p (digamos a1 , a2 , . . . , an).

Precisamos mostrar que p nao e ponto de acumulacao de X. Para isto esuficiente exibir (construir) uma bola de centro p que nao contem quaisqueroutros pontos de X diferentes de p.

Com este intuito, escolhamos ε > 0 menor do que r e menor do que adistancia de p a qualquer dos pontos: a1 , a2 , . . . , an .

Entaoε < r ⇒ B(p; ε) ⊂ B(p; r) (5.6)

e mais:

ε < d(p, a1) a1 6∈ B(p; ε)

ε < d(p, a2) a2 6∈ B(p; ε)

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

ε < d(p, an) an 6∈ B(p; ε)

Entao a bola aberta B(p; ε) que contem p nao contem a1 , a2 , . . . , an ; e por(5.6) B(p; ε) nao contem quaisquer outros pontos de X diferentes de p. Estaultima conclusao contradiz o fato de que p e ponto de acumulacao de X. �

Proposicao 48. Seja (M, d) um espaco metrico. F ⊂ M e fechado se, esomente se, F ′ ⊂ F.

Prova:

(=⇒) Se F e fechado entao F ′ ⊂ F .Com efeito, ja vimos que (prop. 35, p. 206)

F ⊂M e fechado ⇐⇒ F = F (5.7)

Se F e fechado entao, por (5.7), F ⊂ F , mas como F ′ ⊂ F ⇒ F ′ ⊂ F ⊂ F.

221

Page 223: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(⇐=) Se F ′ ⊂ F entao F e fechado.

Com efeito, a inclusao F ⊂ F e sempre valida e como, por hipotese,F ′ ⊂ F , temos que F ′ ∪F ⊂ F ∪ F ⇒ F = F ′ ∪F ⊂ F . Portanto F = F e,novamente por (5.7), temos que F e fechado. �

∗ ∗ ∗A tabela a seguir resume os diversos pontos vistos:

Ponto Definicao Conjunto

Interior( p∈X ⊂M )

∃ r>0 : B( p; r)⊂X X ou intX◦

Isolado( p∈M )

∃ r>0 : B( p; r)={ p }

Fronteira( p∈M ) ∀ r>0 : B( p; r)∩X 6= ∅ e B( p; r)∩Xc 6= ∅ ∂ X ou frX

Aderente( p∈M ) ∀ r>0 : B( p; r)∩X 6= ∅ X (fecho)

Acumulacao( p∈M )

∀ r>0 :(B( p; r)−{ p }

)∩X 6= ∅ X′ (derivado)

222

Page 224: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Apendice:

Vejamos mais dois exemplos de densidade:

1o) O conjunto das funcoes parcialmente lineares (ou funcoes poligonais) edenso no espaco

(C([0, 1]); Υ

).

Seja f ∈ C[ 0, 1 ] e ε > 0 dado. Mostremos que ∃n0 ∈ N e pontos

p0 =(

0,ε · k0

5

)

, . . . , pi =( i

n0

,ε · ki

5

)

, . . . , pn0=(

1,ε · kn0

5

)

(onde k0 , . . . , ki , . . . , kn0sao inteiros) tais que, se g e a poligonal ligando os

pi , entao,Υ(f, g) = max

{|f(x)− g(x)| : x ∈ [ 0, 1 ]

}< ε

xi

yk

0 1/n0 2/n01

ε5

2 ε5

3 ε5

4 ε5

− ε5

− 2 ε5r r r r r r r r r rr r r r r r r r r rr r r r r r r r r rr r r r r r r r r rr r r r r r r r r rr r r r r r r r r rr r r r r r r r r rr r r r r r r r r r

f

g

ε5

1n0

Prova: f sendo contınua no intervalo I = [ 0, 1 ], e tambem uniforme-mente contınua neste mesmo intervalo (teorema [AR]10, p. 604) entao, pordefinicao de continuidade uniforme (ver p. 604), dado ε > 0 existe δ > 0de modo que

∀x, y ∈ [ 0, 1 ], |x− y| < δ ⇒ |f(x)− f(y)| < ε

5(5.8)

Para este δ > 0 existe n0 ∈ N tal que1

n0

< δ, logo se (5.8) e verdade, com

mais razao ainda e verdade que

∀x, y ∈ [ 0, 1 ], |x− y| ≤ 1

n0

< δ ⇒ |f(x)− f(y)| < ε

5(5.9)

Consideremos o seguinte subconjunto de I× R:

A ={

(xi , yk) : xi =i

n0

, yk=ε · k5

onde i = 0, 1, . . . , n0 ; k ∈ Z

}

Obs: A, na figura anterior, e a malha discreta.

223

Page 225: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Seja xi arbitrariamente fixado, temos que 5ε · f(xi) e um numero real e,

como tal, situa-se entre dois inteiros consecutivos, isto e, existe k ∈ Z demodo que

k ≤ 5

ε· f(xi) < k + 1

multiplicando esta desigualdade por ε/5 temos

ε · k5≤ f(xi) <

ε · k5

5

Facamos yk= ε · k/5. Conclusao: existe um ponto (xi , yk) ∈ A tal que

yk≤ f(xi) < y

k+ ε

5 . Ou ainda: fixado arbitrariamente uma abscissa xi

existe uma ordenada ykde modo que (ver grafico anterior)

0 ≤ f(xi)− yk <ε

5⇒ |f(xi)− yk | <

ε

5

Observe que

yk= g(xi) ⇒ |f(xi)− g(xi | <

ε

5Conclusao: Fixada qualquer abscissa xi sempre podemos obter uma or-

denada yk= g(xi) de tal modo que a distancia (vertical) entre f(xi) e g(xi)

e menor que ε/5. E mais: o ponto (xi , yk) ∈ A satisfazendo a desigualdadeanterior encontra-se abaixo do grafico de f . Isto pode ser constatado nografico anterior.

Vamos agora interromper por um momento nossa demonstracao paraexemplificar a conclusao anterior para a funcao dada por f(x) = x2+ 1

4 , porexemplo.

Dado ε > 0, existe δ > 0 tal que se x, y ∈ [ 0, 1 ] entao

|x− y| < δ ⇒ |f(x)− f(y)| < ε

⇒ |x2 − y2| < ε

⇒ |x+ y| · |x− y| < ε

Por outro lado

0 ≤ x, y ≤ 1 ⇒ 0 ≤ x+ y ≤ 2

⇒ 0 ≤ (x+ y)|x− y| ≤ 2|x− y|Dado ε > 0, tomando δ = ε

2 teremos

|x− y| < δ =ε

2⇒ 2|x− y| < ε

⇒ |x+ y||x− y| ≤ 2|x− y| < ε

⇒ |x2 − y2| < ε.

224

Page 226: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por exemplo, para ε = 1 temos: 1n0

< δ = ε2 ⇒ 1

n0< 1

2 . Vamos

escolher n0 = 4 (seria igualmente valido n0 = 3). Entao

A =

{

(xi , yk) : xi =i

4, y

k=

1 · k5

onde i = 0, 1, 2, 3, 4; k ∈ Z

}

A seguir fornecemos maiores detalhes:

5εf(x

i)xi f(xi ) k y

k= ε

5k f(xi )−yk

ε5

0,00

0,25

0,50

0,75

1,00

0,2500

0,3125

0,5000

0,8125

1,2500

1,2500

1,5625

2,5000

4,0625

6,2500

1

1

2

4

6

0,2

0,2

0,4

0,8

1,2

0,0500

0,1125

0,1000

0,0125

0,0500

0,2

0,2

0,2

0,2

0,2xi

yk

10 0,25 0,75

−0,4

−0,2

0,2

0,4

0,6

0,8

1,0

r r r r rr r r r rr r r r rr r r r rr r r r rr r r r rr r r r rr r r r rr r r r rr r r r r

f

g

ε=1 ; n0=4.

Vejamos mais um exemplo. Consideremos desta vez ε = 0, 5; entao

1

n0

< δ =ε

2⇒ 1

n0

<1

4

Vamos escolher n0 = 5. Entao

A =

{

(xi , yk) : xi =i

5, y

k=

0, 5 · k5

onde i = 0, 1, 2, 3, 4, 5; k ∈ Z

}

A seguir fornecemos maiores detalhes

5εf(xi )xi f(xi ) k y

k= ε

5k f(xi )−yk

ε5

0,0

0,2

0,4

0,6

0,8

1,0

0,25

0,29

0,41

0,61

0,89

1,25

2,5

2,9

4,1

6,1

8,9

12,5

2

2

4

6

8

12

0,2

0,2

0,4

0,6

0,8

1,2

0,05

0,09

0,01

0,01

0,09

0,05

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

0,1

xi

yk

10 0,2 0,6

−0,2

0,2

0,4

0,6

0,8

1,0

r r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r rr r r r r r

f

g

ε=0,5 ; n0=5.

225

Page 227: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Pois bem, voltando a demonstracao, temos

xi+1 − xi =i+ 1

n0

− i

n0

=1

n0

⇒ |xi+1 − xi | ≤1

n0

Portanto, de (5.9), temos∣∣f(xi+1)− f(xi)

∣∣ < ε/5. Sendo assim temos

∣∣g(xi+1)− g(xi)

∣∣ ≤ |f(xi)− g(xi)|+

∣∣f(xi+1)− f(xi)

∣∣

+∣∣g(xi+1)− f(xi+1)

∣∣

5+ε

5+ε

5=

5

Para qualquer ponto z ∈ [ 0, 1 ] existe xi satisfazendo xi ≤ z < xi+1 .Como o grafico de g entre xi e xi+1 e um segmento de reta, temos duas pos-sibilidades: g e nao-decrescente ou g e nao-crescente entre xi e xi+1 . Consi-deremos g nao-decrescente neste intervalo (para g nao-crescente o raciocınioe o mesmo e seremos conduzidos ao mesmo resultado), entao

xi ≤ z < xi+1 ⇒ g(xi) ≤ g(z) ≤ g(xi+1)

⇒ 0 ≤ g(z)− g(xi) ≤ g(xi+1)− g(xi)

⇒ 0 ≤ |g(z) − g(xi)| ≤∣∣g(xi+1)− g(xi)

∣∣ <

5

Tambem

xi ≤ z < xi+1 ⇒ 0 ≤ z − xi < xi+1 − xi =1

n0

⇒ |f(z)− f(xi)| <ε

5

Logo,

|f(z)− g(z)| ≤ |f(z)− f(xi)|+ |f(xi)− g(xi)|+ |g(xi)− g(z)|

5+

ε

5+

5= ε

Como z ∈ [ 0, 1 ] e arbitrario, segue que

max{|f(x)− g(x)| : x ∈ [ 0, 1 ]

}< ε ⇒ Υ(f, g) < ε.

226

Page 228: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Representacos binarias

2o) O nosso objetivo agora sera estabelecer um algoritmo que nos permitaescrever um numero x ∈ [ 0, 1 [ na base binaria.

Proposicao 49. SejaD o conjunto das fracoes diadicas∗ no intervalo [ 0, 1 [ :

D =

{1

2,1

4,3

4,1

8,3

8,5

8,7

8,1

16,3

16, . . . ,

13

16,15

16, . . .

}

D e denso em [ 0, 1 [ . (munido da metrica µ)

Prova: Seja x ∈ [ 0, 1 [; dado ε > 0 arbitrario devemos mostrar que nointervalo ]x− ε, x+ ε [ existe um ponto m/q ∈ D.

A desigualdade1

2n <1

nvale para todo n natural. Pela propriedade

arquimediana existe um natural n0 de modo que

1

n0

< ε ⇒ 1

2n0

<1

n0

< ε.

Tomando q = 2n0 , considere os intervalos

[

0,1

q

[

,[1

q,2

q

[

,[2

q,3

q

[

, . . . ,[q − 2

q,q − 1

q

[

,[q − 1

q, 1[

Como [ 0, 1 [ e a uniao dos intervalos acima, um deles, digamos[mq ,

m+1q

[

contem x, isto e, mq ≤ x < m+1q . Entao

m

q≤ x < m+ 1

q⇔ m

q≤ x < m

q+

1

q

Mas 1q < ε; logo

1

q< ε ⇒ m

q+

1

q<m

q+ ε

⇒ x <m

q+

1

q<m

q+ ε

⇒ x− ε < m

q.

Portantox− ε < m

q≤ x < x+ ε (5.10)

Ou seja, o intervalo aberto ]x−ε, x+ε [ contem o ponto mq que pertence

a D. Por conseguinte D e denso em [ 0, 1 [. �

∗Fracoes com numeradores inteiros e denominadores potencias de 2.

227

Page 229: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Esta proposicao garante que qualquer numero do intervalo [ 0, 1 [ podeser aproximado, com precisao arbitraria, por uma fracao diadica.

O teorema seguinte nos mostra como obter a representacao binaria dequalquer ponto do intervalo [ 0, 1 [ , com uma precisao arbitraria.

Teorema 3 (Gentil). Dado x ∈ [ 0, 1 [ e ε > 0 existem um natural n0 edigitos xi ∈ { 0, 1 } tais que

x =x1

21 +x2

22 + · · · +xn0−1

2n0−1 +

xn0

2n0

com erro menor que ε.

Prova: Escolhamos n0 ∈ N de modo que 12n0

< ε. Facamos 2n0 = q.Tal como na proposicao 49 existe um natural m de modo que

m

q≤ x < m+ 1

q(5.11)

Desta equacao obtemos m, assim:

m

q≤ x < m+ 1

q⇒ m ≤ q · x < m+ 1 ⇒ m = ⌊q · x⌋.

De seguida obtemos o desenvolvimento binario do natural m, assim:

m = x1 · 2n0−1 + x2 · 2n0−2 + · · · + xn0−1 · 2n0−(n0−1) + xn0· 2n0−n0

Ou seja,

m = x1 · 2n0−1 + x2 · 2n0−2 + · · · + xn0−1 · 21 + xn0· 20 (5.12)

Dividindo a equacao anterior por 2n0 obtemos

m

2n0

=x1

21 +x2

22 + · · ·+xn0−1

2n0−1 +

xn0

2n0

(5.13)

Da equacao (5.11) vemos que (5.13) e um valor aproximado (menor ou igual)de x, isto e

m

2n0

=x1

21 +x2

22 + · · ·+xn0−1

2n0−1 +

xn0

2n0≃ x

e, pelo lema, temos que

|x− x| < ε, onde x =m

2n0. (5.14)

∗ ∗ ∗Justificativa de (5.12): Os digitos binarios no desenvolvimento de m

devem ser todos nulos a partir da potencia 2n0 (inclusive).

228

Page 230: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De fato, se tal nao acontecesse terıamos m ≥ 2n0 , o que e inconsistentecom m ≤ q · x, isto e, m ≤ 2n0 · x; pois sendo

x < 1 ⇒ 2n0 · x < 2n0 ⇒ m < 2n0 .

Questionamento: Os digitos (x1 x2 . . . xn0) estao corretos (e sao unicos)

para a fracao x = m

2n0

, mas esta e apenas uma aproximacao para x (isto e,

|x− x| < ε). Ate que ponto podemos confiar que estes sejam os n0 primeirosdigitos do desenvolvimento de x?.

Supondo que o desenvolvimento de x seja

x =x1

21 +x2

22 + · · ·+xn0−1

2n0−1 +

xn0

2n0

+xn0+1

2n0+1 +

xn0+2

2n0+2 + · · ·

para nos assegurar que os digitos (x1 x2 . . . xn0) estejam corretos para x,

devemos escolher∗ o menor natural n0 satisfazendo 12n0+1 < ε, isto e,

1

2(n0−1)+1

=1

2n0≥ ε

De fato, suponhamos que apenas o digito xn0esteja incorreto, sendo assim

|x− x| = 1

2n0

+xn0+1

2n0+1 + · · · ≥ ε

Isto contradiz (5.14).Se qualquer outro digito x

kcom k < n0 estiver incorreto, chegaremos a

mesma contradicao.

Conclusao: Escolhendo n0 o menor natural satisfazendo 12n0+1 < ε pode-

mos assegurar que os digitos x1 , x2 , . . . , xn0, no desenvolvimento binario de

x ∈ [ 0, 1 [, estao todos corretos.

Algoritmo

Os argumentos anteriores nos facultam um algoritmo para o desenvolvi-mento binario de um x ∈ [ 0, 1 [. Vejamos como atraves de um

Exemplo: Obter o desenvolvimento binario de x = 1/3 com uma pre-cisao ε = 0, 01.

Solucao: Vimos que devemos escolher o menor n0 satisfazendo 12n0+1 < ε,

entao

n0 + 1 > log1ε2 ⇒ n0 =

⌊log

1ε2

∗A propriedade arquimediana e o Princıpio da boa ordenacao, conjuntamente, nosgarantem que esta escolha sempre e possıvel.

229

Page 231: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Sendo assim,

n0 =⌊log

10,012

⌋= 6 ⇒ m =

26 · 13

= 21.

Observe que∣∣∣m

q− x∣∣∣ =

∣∣∣21

26 −1

3

∣∣∣ = 0, 005208 . . . < ε.

Agora desenvolvemos m = 21 na base binaria:

21 = 1 · 24 + 0 · 23 + 1 · 22 + 0 · 21 + 1 · 20

Dividindo a equacao anterior por q = 2n0 = 26, temos

21

26 =1

22 +0

23 +1

24 +0

25 +1

26

=0

21 +1

22 +0

23 +1

24 +0

25 +1

26

Conclusao: (010101)2 e o desenvolvimento binario de x = 1/3 com erromenor que um centesimo.

Para que possamos “automatizar” todo o processo anterior podemosadaptar a formula (1.13), assim: (p. 39)

xn =

1, se⌊

m

2n0−n

⌋e ımpar;

0, se⌊

m

2n0−n

⌋e par.

(n = 1, 2, . . . , n0)

Exemplo:

Considere o exemplo anterior em que n0 = 6 e m = 21. Entao:

n = 1 ⇒⌊

m

2n0−n

⌋=⌊

21

26−1

⌋= 0 ⇒ x1 = 0

n = 2 ⇒⌊

m

2n0−n

⌋=⌊

21

26−2

⌋= 1 ⇒ x2 = 1

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

n = 6 ⇒⌊

m

2n0−n

⌋=⌊

21

26−6

⌋= 21 ⇒ x6 = 1

Alternativamente, podemos escrever a formula anterior sob a seguintenotacao:

xn = MOD( ⌊ m

2n0−n

, 2)

(n = 1, 2, . . . , n0)

230

Page 232: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Leia-se:xn = resto da divisao de

⌊ m

2n0−n

por 2.

O programa a seguir (Calculadora HP 50g)

≪ → x ε

≪ pFLOOR(LOG(1/ε)/LOG(2)) p EVALpn0 p STO pFLOOR(2∧n0 ∗ x ) p EVAL pm p STO

1 n0 FOR npFLOOR(m/2∧(n0− n)) p EVAL

2 MOD

NEXT n0 →ARRY

≫≫

tem como dados de entrada x e a precisao ε, e sai com um vetor contendoo desenvolvimento binario de x − com precisao ε.

Por exemplo, para x = 13 e ε = 0, 01 o programa nos devolve [ 0 1 0 1 0 1 ].

Representacoes ternarias

O que foi feito para a base 2 pode ser repetido para a base 3.Dado ε > 0 escolhemos o menor n0 de modo que

1

3n0+1 < ε ⇒ n0 + 1 > log

1ε3 ⇒ n0 =

⌊log

1ε3

Obtido q = 3n0 , da equacao mq ≤ x < m+1

q obtemos m; assim:

m

q≤ x < m+ 1

q⇒ m ≤ q · x < m+ 1 ⇒ m = ⌊q · x⌋

Em seguida obtemos o desenvolvimento ternario de m ∈ N, ou seja

m = x1 · 3n0−1 + x2 · 3n0−2 + · · ·+ xn0−1 · 31 + xn0· 30

Dividindo a equacao anterior por 3n0 , temos

m

3n0

=x1

31 +x2

32 + · · ·+xn0−1

3n0−1 +

xn0

3n0≃ x

Ilustraremos o desenvolvimento em base 3 atraves de um exemplo.

231

Page 233: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplo:

Obter o desenvolvimento ternario de x = 2/7 com uma precisao ε = 0, 01.

Solucao:

n0 =⌊log

10,013

⌋= 4 ⇒ m =

34 · 27

= 23.

Observe que∣∣∣m

q− x∣∣∣ =

∣∣∣23

34 −

2

7

∣∣∣ = 0, 001764 . . . < 0, 01.

Agora desenvolvemos m = 23 na base 3, temos

23 = 2 · 32 + 1 · 31 + 2 · 30

Dividindo a equacao anterior por q = 3n0 = 34, temos

23

34 =2

32 +1

33 +2

34

=0

31 +

2

32 +

1

33 +

2

34

Conclusao: (0212)3 e o desenvolvimento na base 3 de x = 2/7 com erromenor que um centesimo.

Para que possamos “automatizar” todo o processo anterior fornecemosa seguinte formula:

xn = MOD( ⌊ m

3n0−n

, 3)

(n = 1, 2, . . . , n0)

Leia-se:xn = resto da divisao de

⌊ m

3n0−n

por 3.

O programa a seguir (Calculadora HP 50g)

≪ → x ε

≪ pFLOOR(LOG(1/ε)/LOG(3)) p EVALpn0 p STO pFLOOR(3∧n0 ∗ x ) p EVAL pmp STO

1 n0 FOR npFLOOR(m/3∧(n0− n)) p EVAL

3 MOD

NEXT n0 →ARRY

≫≫

tem como dados de entrada x e a precisao ε, e sai com um vetor contendoo desenvolvimento ternario de x − com precisao ε.

Por exemplo, para x = 1√2e ε = 0, 001 o programa nos devolve [ 2 0 1 0 0 2 ].

232

Page 234: Gentil Lopes - Espaços Métricos

5.8 Exercıcios

1) Seja M = R e X = Q. Encontre: Q◦

µ e Q◦

δ.

2) Considere o espaco (R, µ) e o seu subespaco (N, µ), onde N = [ 0, 2 ]. Oconjunto X = [ 0, 1 [ nao e aberto no espaco (R, µ), mostre que X e abertono subespaco (N, µ).

3) O conjunto X = ] 0, 1 [ e aberto no espaco (R, µ). Mostre que o conjuntoY = ] 0, 1 [×{ 0 } nao e aberto no espaco (R2, D1).

4) O conjunto X = ] −∞, +∞ [ e aberto no espaco (R, µ). Mostre que oconjunto Y = ] −∞, +∞ [×{ 0 } e fechado no espaco (R2, D1).

5) Seja M = R2, mostre que o conjunto X ={(x, y) ∈ R2 : x > 1

}e

aberto em R2 munido das metricas D2 e D3 .

6) Seja M = R e X =] a, b ]. No espaco (R, µ) b e ponto fronteira de X,mas nao ponto interior. No espaco (R, δ) sucede exatamente o contrario. Atabela seguinte resume nossas assercoes:

(R, µ) b ∈ ∂Xµ b 6∈ X◦µ

(R, δ) b 6∈ ∂Xδ b ∈ X◦δ

Deixamos ao leitor as justificativas.

7) Seja M = R e X = Q. Deixamos como exercıcio ao leitor a confirmacaoda tabela:

(R, µ)

(R, δ)

∅Q

Q◦∂QR

Aqui temos um exemplo de um conjunto que esta contido, propriamente,em sua fronteira: ∂Q = R.

8) Consideremos o espaco metrico([ 0, 1 ], µ

)e seja X = Q ∩ [ 0, 1 ]. En-

contre: ∂X.

9) Prove que em todo espaco metrico (M, d), o complementar de uma bolafechada e um conjunto aberto.

10) Considere a famılia {Xn}n∈N, onde Xn = ] − 1

n ,1n [ . No espaco (R, µ),

os Xn (n = 1, 2, . . .) sao conjuntos abertos. Prove que⋂

n∈NXn = { 0 }.

11) Mais geralmente: num espaco metrico (M, d) qualquer, fixado p ∈ M ,

fazendo Bn = B(p, 1

n

)(n = 1, 2, . . .), prove que

n∈NB(p,

1

n

)= { p }.

233

Page 235: Gentil Lopes - Espaços Métricos

− Ponto Exterior: Seja (M, d) um espaco metrico. Considere X ⊂ M .Um ponto p 6∈ X e chamado ponto exterior de X se existir r > 0, tal queB(p; r) ⊂ Xc. Ou seja, um ponto e exterior a um conjunto quando e interiordo complementar deste conjunto.

12) Considere M = [ 0, 1 [ , X =[12 , 1

[e o ponto p = 0. assim:

0 12

p=0s

M

X

a ) Mostre que 0 e um ponto exterior a X no espaco ([ 0, 1 [ , µ);

b ) Mostre que 0 nao e um ponto exterior a X no espaco ([ 0, 1 [ , k).

13) SejaM = [ 0, 1 [× [ 0, 1 [ o quadrado unitario e X =[12 , 1

[×[12 , 1

[⊂

M ; mostre que 0 = (0, 0) e ponto aderente de X se tomarmos em Mqualquer uma das tres metricas Di . Ademais, mostre que 0 = (0, 0) nao eum ponto exterior a X.

0 1

1

0

X

0t

14) Com respeito ao exercıcio anterior a proposicao 42 (p. 212) garante queexiste uma uma sequencia (xn) de pontos de X tal que limxn = 0. Encontreuma sequencia satisfazendo estas condicoes.

15) Utilize a identidade que comparece no corolario 5 (p. 209) para provarque a fronteira de X =

{1, 1

2 ,13 , . . .

}no espaco (R, µ) e ∂X = X ∪ { 0 }.

16) Seja M = R2, encontre a fronteira de X ={(x, y) ∈ R2 : x > 1

}em

cada uma das metricas do R2. Prove suas afirmativas.

17) Prove que toda bola fechada B[ p; r ] ={x ∈ M : d(x, p) ≤ r

}num

espaco metrico (M, d) e um conjunto fechado.

18) Dados X, Y ⊂M mostre que:

a ) X◦ ∪ Y

◦ ⊂ (X ∪ Y)◦

b ) X◦ ∩ Y

◦= (X ∩ Y)

De um exemplo em que se tenha X◦ ∪ Y

◦ 6= (X ∪ Y)◦

.

234

Page 236: Gentil Lopes - Espaços Métricos

19) Sejam X e Y subconjuntos de M . Mostre que:

a ) X ∪ Y = X ∪ Y ;

b ) X ∩ Y ⊂ X ∩ Y .

De um exemplo em que se tenha X ∩ Y 6= X ∩ Y .

20) Num espaco metrico (M, d) considere X ⊂M .

a ) Mostre que X e o menor fechado que contem X, isto e, se F e fechadoe X ⊂ F , entao X ⊂ F .b ) Mostre que X e a intersecao de todos os fechados de M que contem F .

21) Mostre que o conjunto X = { (x1 , . . . , xn) ∈ Rn : x1 > 0, . . . , xn > 0 }e aberto em relacao a qualquer das metricas do Rn.

22) Considere sobre M = R − {−1, 1 } a metrica induzida pela usual deR. Mostre que a bola fechada B[ 0; 1 ], em M , e um subconjunto aberto doespaco M .

23) Seja V um espaco vetorial sobre R. Um subespaco vetorial de V e umsubconjunto U ⊂ V tal que:

( i ) 0 ∈ U ;

( ii ) u, v ∈ U ⇒ u+ v ∈ U ;

( iii ) u ∈ U e λ ∈ R ⇒ λu ∈ U .

Se U e um subespaco vetorial do Rn tal que U 6= Rn mostre que U naoe aberto.

Sugestao: Mostre que qualquer bola aberta de centro no vetor 0 ∈ U contemn vetores nao nulos do tipo

(a1 , 0, . . . , 0), (0, a2 , 0, . . . , 0), . . . , (0, 0, . . . , an)

e portanto nao pode estar contida em U visto que U 6= Rn.

24) Mostre que sao fechados

a ) Z em R;

b ) F = { (x, y) ∈ R2 : xy = 1 } em R2;

c ) A = { (x, y) ∈ R2 : x, y ≥ 0 } em R2.

25) Achar o conjunto derivado de

a ) Z nos espacos (R, µ) e (R, δ);

b ) Q ∩ [ 0, 1 [ nos espacos ([ 0, 1 [, µ) e ([ 0, 1 [, k);

c ) (Q×Q) ∩ ([ 0, 1 [× [ 0, 1 [) nos espacos ([ 0, 1 [ 2, D1) e ([ 0, 1 [ 2, D1);

d ) Z×Q em R2.

26) Se um conjunto e seu complementar tem ambos interior vazio, mostreque a fronteira de cada um deles e o espaco inteiro.

235

Page 237: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Essa pagina ficaria em branco (“ociosa”) razao porque decidir aproveita-la para divulgar mais um resultado meu em matematica.

Uma Formula Inedita

Nos livros de Calculo I constam algumas formulas para se encontrar asoma de potencias dos n primeiros numeros naturais, por exemplo:

1 + 2 + 3 + · · · + n =n(n+ 1)

2

Ou ainda

12 + 22 + 32 + · · · + n2 =n(2n+ 1)(n + 1)

6

Ou ainda

13 + 23 + 33 + · · · + n3 =n2 (n+ 1)2

4(5.15)

Durante muitos anos − por decadas, talvez seculos − os matematicosestiveram a procura de uma formula unica que incluisse como caso especialas anteriores. . . Ninguem teve exito.

Coube a mim materializar essa aspiracao. Em 1997 demonstrei o seguinte:

Teorema 4 (Gentil/1997). Sendo m um natural arbitrariamente fixado, evalida a seguinte identidade:

1m + 2m + 3m + · · · + nm =

m∑

j=0

(n

j + 1

)

a(m−j)

Onde:

a(m−j)

=

j∑

k=0

(−1)k(j

k

)

(1− k + j)m

Prova: Ver [6]. �

Vejamos um exemplo de aplicacao desta formula (m = 3):

13 + 23 + 33 + · · · + n3 =

3∑

j=0

(n

j + 1

)

a(3−j)

=

(n

1

)

a3 +

(n

2

)

a2 +

(n

3

)

a1 +

(n

4

)

a0

Onde:

a(3−j)

=

j∑

k=0

(−1)k(j

k

)

(1− k + j)3; ( j = 0, 1, 2, 3. )

Substituindo e simplificando chegamos ao resultado (5.15).

236

Page 238: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Capıtulo 6FUNCOES CONTıNUAS

Eu penso que seria uma aproximacao relativamente boa da verdade

(que e demasiadamente complexa para permitir qualquer coisa melhor

que uma aproximacao) dizer que as ideias matematicas tem sua origem

em situacoes empıricas . . .Mas, uma vez concebidas, elas adquirem uma

identidade e crescimento proprios governados quase que inteiramente

por motivacoes esteticas. (John Von Newmann)

Introducao

Aqui generalizamos para o contexto dos espacos metricos o (importante)conceito de funcao contınua, estudado no Calculo e na Analise.

Prevendo possıveis “crises existenciais” pelas quais o leitor podera vira passar em mais este capıtulo e que julgamos oportuno lembrar:

“[. . .] e e por isto que resultados incompatıveis entre si podem ser igual-mente verdadeiros, contanto que os relacionemos com metricas distintas.”

(parafrase, p. 170)

Definicao 28 (Continuidade). Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos.Diz-se que a aplicacao f : (M, d1) −→ (N, d2) e contınua no ponto a ∈ Mquando, para todo ε > 0 dado arbitrariamente, pudermos exibir δ > 0 demodo que se

d1(x, a) < δ ⇒ d2

(f(x), f(a)

)< ε.

r raxδ

(M,d1 )

∃ δ>0

f

• Definicao de continuidade em um ponto a ∈M.

rr f(a)f(x)

ε

(N, d2 )

∀ ε>0

237

Page 239: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Diremos que f e contınua em M quando for contınua em todo ponto de M .

Caracterizacao de continuidade via bolas abertas

Uma definicao equivalente de continuidade e dada na seguinte

Proposicao 50. Uma funcao f : (M, d1) −→ (N, d2) e contınua no pontoa ∈M se, e somente se, dada arbitrariamente uma bola B

d2

(f(a); ε

)existe

uma bola Bd1(a; δ) de modo que

f(B

d1(a; δ)

)⊂ B

d2

(f(a); ε

)

a

x

δr r

(M, d1 )

f

∃ Bd1(a; δ)

rr f(a)f(x)

f(Bd1(a; δ) )= { f(x) : x ∈B

d1(a; δ) }

(N, d2 )

∀ Bd2(f(a); ε)

Resumindo: para mostrar que f : M −→ N e contınua em a ∈ Mprimeiramente devemos centrar em f(a) uma bola de raio ε. Em seguidadevemos procurar um raio δ > 0 de tal modo que a imagem, por f , de todoponto x ∈ B

d1(a; δ) caia dentro da bola B

d2

(f(a); ε

).

Descontinuidade

Quando uma funcao f nao e contınua no ponto a, dizemos que f e des-contınua nesse ponto. Isto significa que existe uma bola B

d2

(f(a); ε0

)com a

seguinte propriedade: para toda bola centrada em a, isto e, Bd1(a; δ), pode-

mos exibir um ponto xδ∈ B

d1(a; δ) tal que f(x

δ) 6∈ B

d2

(f(a); ε0

).

A seguir colocamos em sımbolos, tanto a continuidade quanto a descon-tinuidade em um ponto a ∈M :

∀ ∃ ∀ε>0 δ>0 x

(

x ∈ Bd1(a; δ) ⇒ f(x) ∈ B

d2

(f(a); ε

))

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ

(

xδ∈ B

d1(a; δ) ∧ f(x

δ) 6∈ B

d2

(f(a); ε0

))

(continuidade em a)

(descontinuidade em a)

Nota: ∧ e o sımbolo da conjuncao “e” . Para entender como esse sımboloaparece na negacao de continuidade veja corolario 49. (p. 579)

238

Page 240: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Importante!

Deve ficar bem claro (transparente) para o leitor o papel desempenhadopelos numeros ε e δ, na definicao de continuidade. Com este intuito ob-servemos o conteudo desta definicao de uma outra perspectiva: Suponhamosque voce queira provar, a um seu − fictıcio − adversario, que f e contınuaem um ponto a ∈ M . Pois bem, seu adversario fornecera a voce os valoresde ε > 0. Para cada valor de ε voce tera que devolver ao seu adversario umnumero δ > 0 satisfazendo a condicao

∀x ∈M com d1(x, a) < δ ⇒ d2

(f(x), f(a)

)< ε.

Se o leitor conseguir esta facanha, para cada valor de ε que lhe forfornecido, entao tera provado que f e contınua no ponto a.

O raio δ procurado, amiude e funcao do ε fornecido, o que justificara −por vezes − a notacao δ = δ(ε) = δε .

Generalizando

Por oportuno, nao apenas na definicao de continuidade, mas em qual-quer outra que aparecer “para todo” (∀ ) e seu adversario quem fixa (arbi-trariamente) um valor; ja aonde aparece “existe” (∃ ) e voce que devolve(exibe) a ele um valor (por exemplo, veja a definicao de convergencia de sequencias, p.

141).

Como ilustracao, vejamos a definicao de descontinuidade em um ponto:

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ

(

xδ∈ B

d1(a; δ) ∧ f(x

δ) 6∈ B

d2

(f(a); ε0

))

Neste caso se voce leitor quer provar a seu adversario que uma dadafuncao e descontınua num ponto a ∈ M , entao voce deve exibir a ele umε0 > 0 de sorte que: para todo δ > 0 que seu adversario fixar, voce deveexibir um ponto x

δdentro da bola de centro a e raio δ e tal que a imagem

deste ponto nao caia dentro da bola de centro f(a) e raio ε0 .

Aceder a ciencia e rejuvenescer espiri-

tualmente, e aceitar uma brusca mutacao

que contradiz o passado. (Bachelard)

A afirmativa, remanescente do Calculo, de que o grafico de uma funcaocontınua em um ponto nao apresenta “salto” neste ponto, deixa de valerna Topologia. Aqui veremos um importante exemplo de uma funcao cujografico apresenta um salto em um ponto e mesmo assim a funcao e contınua

239

Page 241: Gentil Lopes - Espaços Métricos

neste ponto. Por outro lado veremos um exemplo de uma funcao descontınuaem todo ponto e cujo grafico e “liso” em todo o domınio da funcao.

Exemplos e Contraexemplos:

1) Seja f : R −→ R dada por f(x) =

{

x, se x 6= 1;

2, se x = 1.

cujo grafico esta dado a seguir

r

x

f(x)

q

q

q

1

2

1

O o objetivo sera estudar a continuidade de f no ponto x = 1, emdiferentes espacos metricos. Vamos confirmar dois ıtens da seguinte tabela

f : (M, d1 )−→ (N, d2 ) x=1

C

D

C

D

1.1)

1.2)

1.3)

1.4)

(R, δ) (R, δ)

(R, µ) (R, δ)

(R, δ) (R, µ)

(R, µ) (R, µ)

onde: C significa contınua e D significa descontınua.

1.1) f : (R, δ) −→ (R, δ)

Aqui existe a possibilidade de confusao entre a metrica δ e o numeroreal δ > 0, razao porque quando os dois ocorrerem em um mesmo contextocolocaremos um ponto sobre o delta metrica: δ.

Para mostrar que f e contınua no ponto x = 1 vamos centrar uma bola− de raio ε arbitrario − em f(1) = 2. Temos

(f(1); ε

)=

{ f(1) }, se 0 < ε ≤ 1;

R, se ε > 1.

Devemos exibir δ > 0 de tal modo que a imagem de todo ponto dentroda bola B

δ(1; δ) caia dentro da bola B

δ(2; ε).

240

Page 242: Gentil Lopes - Espaços Métricos

E suficiente escolher δ = 12 . Pois

f(

(1;

1

2

))

= f({ 1 }) = { 2 } ⊂ Bδ

(f(1); ε

); ∀ ε > 0.

Isto mostra que f e contınua no ponto x = 1, considerando (R, δ) comoespaco de partida e de chegada de f .

Vejamos a estenografia da continuidade:

∀ ∃ ∀ε>0 δ>0 x

(

x ∈ Bd1(a; δ) ⇒ f(x) ∈ B

d2

(f(a); ε

))

δ= 12 B

δ(1; 1

2)= { 1 } f(1) =2 Bδ(f(1); ε>1)=R ou B

δ(f(1); ε≤1)= { 2 }

Agora vejamos a geometria da situacao:

r

x

f(x)

q

q

1

2

1

Bδ(1; 1

2)={ 1 }

Bδ(f(1); ε>1)=R ց

rտ

r

x

f(x)

q

1

2

1

r

Bδ(1; 1

2)={ 1 }

rտ

Bδ(f(1); ε≤ 1)= { 2 }

ց

1.2) f : (R, µ) −→ (R, δ)

Para mostrar que f e descontınua no ponto x = 1 vamos centrar umabola em f(1) = 2, de raio, por exemplo, ε0 = 1

2 . Vamos mostrar que,qualquer que seja δ > 0, na bola Bµ(1; δ) = ] 1− δ, 1+ δ [ encontraremos umponto x

δde modo que f(x

δ) 6∈ B

δ

(f(1); 1

2

)= {f(1)} = { 2 }.

Tomando, por exemplo, xδ= (1−δ)+1

2 = 1− δ2 , como δ 6= 0 ⇒ x

δ6= 1 ⇒

f(xδ) = x

δ= 1− δ

2 .Observe que,

f(xδ) ∈ B

δ

(f(1);

1

2

)= {2} ⇐⇒ 1− δ

2= 2 ⇐⇒ δ = −2.

Isto mostra a impossibilidade de que f(xδ) ∈ B

δ

(f(1); 1

2

), qualquer que seja

δ > 0. Portanto f e descontınua no ponto x = 1, considerando (R, µ) comoespaco de partida e (R, δ) como espaco de chegada de f .

241

Page 243: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vejamos a estenografia da descontinuidade:

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ

(

xδ∈ B

d1(a; δ) ∧ f(x

δ) 6∈ B

d2

(f(a); ε0

))

ε0 = 12

xδ=1− δ

2

Bµ(1; δ) = ] 1− δ, 1+ δ [

Bδ(f(1); 1

2)={ f(1) }={ 2 }

Agora vejamos a geometria da situacao:

r

x

f(x)

q

2

1

q1] [

Bδ(f(1); 1

2)= { 2 }

ց r

1−δ 1+δ

rտxδ

f(xδ)

A verificacao dos demais ıtens da tabela ficara como exercıcio.

2) A funcao f : (R, µ) −→ (R, δ) dada por f(x) = x (identidade) e des-contınua em cada ponto do seu domınio.

Vamos mostrar que f e descontınua no ponto x = 1 (em qualquer outroponto o raciocınio e o mesmo). Para mostrar que f e descontınua no pontox = 1 vamos centrar uma bola em f(1) = 1, de raio, por exemplo, ε0 = 1

2 :

(f(1);

1

2

)= { f(1) } = { 1 }.

Vamos mostrar que, qualquer que seja δ > 0, na bola Bµ(1; δ) =] 1−δ, 1+δ [encontraremos um ponto x

δde modo que f(x

δ) 6∈ B

δ

(f(1); 1

2

).

Vamos tomar xδ= (1−δ)+1

2 = 1− δ2 . Como δ 6= 0 ⇒ x

δ6= 1, logo

f(xδ) = x

δ6= 1 6∈ B

δ

(f(1);

1

2

)= { f(1) } = { 1 }.

Isto mostra a impossibilidade de que f(xδ) ∈ B

δ

(f(1); 1

2

), qualquer que seja

δ > 0, portanto f e descontınua no ponto x = 1.

Veja a estenografia:

242

Page 244: Gentil Lopes - Espaços Métricos

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ

(

xδ∈ B

d1(a; δ) ∧ f(x

δ) 6∈ B

d2

(f(a); ε0

))

ε0 = 12

xδ=1− δ

2

Bµ(1; δ) = ] 1− δ, 1+ δ [

Bδ(f(1); 1

2)={ f(1) }={ 1 }

Veja a geometria:

x

f(x)

1

q1

ցր

] [

Bδ(f(1); 1

2)={ 1 } rr1− δ 1+ δ

rտ

f(xδ)

3) A funcao f :([0, 1[,k

)−→

([0, 1[, µ

)dada por f(x) = x (identidade) e

descontınua na origem.

Para mostrar que f e descontınua no ponto x = 0 vamos centrar umabola em f(0) = 0, de raio, por exemplo, ε0 = 1

4 :

(f(0);

1

4

)=[0,

1

4

[

Vamos mostrar que, qualquer que seja δ > 0, na bola Bk(0; δ) encon-

traremos um ponto xδde modo que f(x

δ) 6∈ Bµ

(f(0); 1

4

).

O esboco da bola Bk(0; r), (p. 111), nos sugere o ponto x

δ. Por exemplo,

podemos tomar xδ= (1−δ)+1

2 = 1− δ2 . Observe que,

f(xδ) = x

δ= 1− δ

2≥ 1

4⇐⇒ δ ≤ 3

2.

Se δ > 32 , temos B

k(0; δ) = [ 0, 1 [, podemos tomar, por exemplo, x

δ= 1

2 .

Veja a estenografia:

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ

(

xδ∈ B

d1(a; δ) ∧ f(x

δ) 6∈ B

d2

(f(a); ε0

))

ε0 = 14 x

δ=1− δ

2

Bk(0; δ) = ] 0, δ [∪ ] 1− δ, 1 [

xδ Bµ ( f(0);

14)= [ 0, 1

4[

243

Page 245: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Veja a geometria (para δ < 12):

0 δ 12 1−δ 1

12

1

(f(0); 1

4

)

sxδ

f(xδ)

[

¬

¬

4) Seja f : (R, µ) −→ (R, µ) dada por f(x) =

{

1, se x ∈ Q;

0, caso contrario.

cujo grafico nao pode ser plotado. Vamos provar que f e descontınua emtodo ponto do seu domınio.

Para mostrar que f e descontınua no ponto a vamos centrar uma bolaem f(a), de raio, por exemplo, ε0 = 1:

(f(a); 1

)= ] f(a)− 1, f(a) + 1 [

Vamos mostrar que, qualquer que seja δ > 0, encontraremos na bolaBµ(a; δ) = ] a − δ, a + δ [ um ponto x

δde modo que f(x

δ) 6∈ Bµ

(f(a); 1

).

Consideremos duas possibilidades:

(i) a e racional.

Neste caso Bµ

(f(a); 1

)= ] f(a)− 1, f(a) + 1 [ = ] 0, 2 [.

Como em todo intervalo aberto ] a − δ, a + δ [ existem numeros racionais eirracionais em abundancia vamos escolher um x

δirracional, sendo assim

f(xδ) = 0 6∈ Bµ

(f(a); 1

)= ] 0, 2 [

Veja a estenografia:

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ

(

xδ∈ B

d1(a; δ) ∧ f(x

δ) 6∈ B

d2

(f(a); ε0

))

ε0 =1 xδirracional

Bµ(a; δ) = ] a−δ, a+δ [

0 Bµ ( f(a); 1 )= ] 0, 2 [

244

Page 246: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(ii) a e irracional.

Neste caso Bµ

(f(a); 1

)= ] f(a)− 1, f(a) + 1 [= ] − 1, 1 [.

Como em todo intervalo aberto ] a − δ, a+ δ [ existem numeros racionais eirracionais em abundancia vamos escolher um x

δracional, sendo assim

f(xδ) = 1 6∈ Bµ

(f(a); 1

)= ] − 1, 1 [

Veja a estenografia:

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ

(

xδ∈ B

d1(a; δ) ∧ f(x

δ) 6∈ B

d2

(f(a); ε0

))

ε0 =1 xδracional

Bµ(a; δ) = ] a−δ, a+δ [

1 Bµ ( f(a); 1 )= ]−1, 1 [

5) A funcao f : ([ 0, 1 ], µ) −→ ([ 0, 1 [, k) dada por

f(x) =

16 (1− 2x), se 0 ≤ x ≤ 1

2 ;

16 (7− 2x), se 1

2 < x ≤ 1.

(6.1)

cujo grafico esta plotado a seguir

x

f(x)

p p

pp

pp

pp

0 12

1

16

36

56

1 ◦

e contınua em todos os pontos do seu domınio. Vamos provar a continuidadede f no ponto “mais delicado” que e x = 1

2 . Pois bem, para todo ε > 0arbitrariamente fixado, escolhemos δ = δε do seguinte modo:

δ(ε) =

14 , se ε ≥ 1

6 ;

3ε, se ε < 16 .

245

Page 247: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Em funcao do formato das bolas abertas na metrica k vamos separar nossaanalise em dois casos:

1o ) Podemos separar ε ≥ 16 em dois subcasos, assim:

ε ≥ 1

6⇒

16 ≤ ε ≤ 1

2 ⇒ Bk(0; ε) = [ 0, ε [ ∪ ] 1− ε, 1 [

ε > 12 ⇒ B

k(0; ε) = [ 0, 1 [

(6.2)

Em qualquer situacao, δ = 14 , sendo assim:

(12 ; δ

)=]12 − δ, 1

2 + δ[=]12 − 1

4 ,12 +

14

[=]14 ,

34

[=

14

¬12

34

Agora devemos mostrar que se x ∈ Bµ

(12 ; δ

)entao f(x) ∈ B

k(0; ε).

Tomemos um x nesta bola e consideremos duas possibilidades:

(i) 14 < x ≤ 1

2 . Neste caso, temos:

14 < x ≤ 1

2 ⇔ −12 > −2x ≥ −1 ⇔ 1

2 > 1− 2x ≥ 0

⇔ 0 ≤ 1− 2x < 12

⇔ 0 ≤ 16 (1− 2x) < 1

12

⇒ 0 ≤ f(x) < 112 < 1

6 ≤ ε

⇒ 0 ≤ f(x) < ε

Portanto, a imagem de x cai na primeira parte da bola em (6.2).

(ii) 12 < x < 3

4 . Neste caso, temos:

12 < x < 3

4 ⇔ −1 > −2x > −32 ⇔ 6 > 7− 2x > 11

2

⇔ 112 < 7− 2x < 6

⇔ 1112 < 1

6(7− 2x) < 1

⇒ 1112 < f(x) < 1

Observe que 16 ≤ ε ≤ 1

2 ⇒ 12 ≤ 1− ε ≤ 5

6 . Sendo assim, temos

1− ε ≤ 56 < 11

12 < f(x) < 1 ⇒ 1− ε < f(x) < 1

Portanto, a imagem de x cai na segunda parte da bola em (6.2).

246

Page 248: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2o ) Agora consideremos 0 < ε < 16 . Sendo assim, temos:

Bk(0; ε) = [ 0, ε [ ∪ ] 1 − ε, 1 [ (6.3)

Neste caso tomamos δ = 3ε, obtendo:

(12 ; δ)=]12 − δ, 1

2 + δ[=]12 − 3ε, 1

2 + 3ε[=

12− 3ε

¬12

12+3ε

Agora devemos mostrar que se x ∈ Bµ

(12 ; δ

)entao f(x) ∈ B

k(0; ε).

Tomemos um x nesta bola e consideremos duas possibilidades:

(I) 12 − 3ε < x ≤ 1

2 . Neste caso, temos:

12 − 3ε < x ≤ 1

2 ⇔ −1 + 6ε > −2x ≥ −1

⇔ −1 ≤ −2x < −1 + 6ε

⇔ 0 ≤ 1− 2x < 6ε

⇔ 0 ≤ 16(1− 2x) < ε

⇔ 0 ≤ f(x) < ε

Portanto, a imagem de x cai na primeira parte da bola em (6.3).

(II) 12 < x < 1

2 + 3ε. Neste caso, temos:

12 < x < 1

2 + 3ε ⇔ −1 > −2x > −1 − 6ε

⇔ −1 − 6ε < −2x < −1

⇔ 6 − 6ε < 7 − 2x < 6

⇔ 1 − ε < 16(7− 2x) < 1

⇔ 1 − ε < f(x) < 1

Portanto, a imagem de x cai na segunda parte da bola em (6.3).

Com isto concluimos a prova de que f e contınua no ponto x = 12 .

∗ ∗ ∗

Nao ha mais, para os teoremas, verdade separada e, por assim dizer,atomica: sua verdade e apenas sua integracao no sistema; e e por issoque teoremas incompatıveis entre si podem igualmente ser verdadeiros,contanto que os relacionemos com sistemas diferentes. (Denis Huisman)

247

Page 249: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vejamos como fica a estenografia da continuidade:

∀ ∃ ∀ε>0 δ>0 x

(

x ∈ Bd1(a; δ) ⇒ f(x) ∈ B

d2

(f(a); ε

))

δ(ε) =

14 , se ε ≥ 1

6 ;

3ε, se ε < 16 .

Bµ (12; δ) =

]14 ,34 [, se ε ≥ 1

6 ;

]12 − 3ε, 12 + 3ε[, se ε < 1

6 .

Bk(0; ε)=

[0, ε[∪ ]1 − ε, 1[, se 0 < ε ≤ 12 ;

[0, 1[, se ε > 12 .

Para finalizar, facamos uma simulacao grafica para ε = 26 . Nesse caso a

estenografia fica:

∀ ∃ ∀ε= 2

6δ>0 x

(

x ∈ Bd1(a; δ) ⇒ f(x) ∈ B

d2

(f(a); ε

))

δ= 14

Bµ (12; δ) = ] 1

4, 34[

f(x)=

16 (1− 2x), se 1

4 < x ≤ 12 ;

16 (7− 2x), se 1

2 < x < 34 .

Bk(0; ε)=[0, 2

6[∪ ] 4

6, 1[

E a geometria fica:

x

f(x)

p p

pp

pp

pp

0 12

1

16

36

56

1 ◦

] [14

34

0

26

46

1

248

Page 250: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6) Seja a funcao f : Z∞ −→ [ 0, 1 ] dada por: (p. 42)

f((xn)

)=

∞∑

n=1

xn

2n

Exemplos:

(i) Calcule, por f , a imagem da sequencia (xn) = (011000 . . .).

Solucao:

f((xn)

)=

∞∑

n=1

xn

2n =0

21 +1

22 +1

23 +0

24 +0

25 + · · · = 1

4+

1

8=

3

8

(ii) Calcule, por f , a imagem da sequencia (xn) = (10101010 . . .).

Solucao:

f((xn)

)=

∞∑

n=1

xn

2n =1

21 +0

22 +1

23 +0

24 +1

25 +0

26 + · · ·

=1

21 +1

23 +1

25 + · · · =12

1− 122

=2

3.

Na p. 229 mostramos um algoritmo para converter um numero decimaldo intervalo [ 0, 1 ] para a base 2. A funcao f : Z∞ −→ [ 0, 1 ] faz o procedi-mento contrario.

Vamos provar que f :(Z∞, ν

)−→

([ 0, 1 ], µ

)e contınua.

Prova: Com efeito, seja a = (a1 a2 a3 . . .) ∈ Z∞, dado ε > 0 escolhemosn0 ∈ N tal que 1

2n0

< ε. Tomemos δ = 1

2n0

e consideremos a bola

Bν (a; δ) ={

x ∈ Z∞ : ν(x, a) <1

2n0

}

Vamos mostrar que se,

x ∈ Bν (a; δ) ⇒ f(x) ∈ Bµ

(f(a); ε

)=]f(a)− ε, f(a) + ε

[∩ [ 0, 1 ]

raδ

rx(Z∞, ν)

δ= 1

2n0

f

] f(a)− ε

] f(a) + εr f(a)rf(x)

0

1

249

Page 251: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Entao, seja x ∈ Bν (a; δ), logo ν(x, a) <1

2n0, pela proposicao 1 (p. 44)

xn = an ; n = 1, 2, . . . , n0 , portanto: ([AR] 4, p. 603 e [AR]5, p. 603)

|f(x)− f(a)| =∣∣∣∣∣

∞∑

n=1

xn

2n −∞∑

n=1

an

2n

∣∣∣∣∣=

∣∣∣∣∣

∞∑

n=1

xn − an

2n

∣∣∣∣∣≤∞∑

n=1

|xn − an |2n

=

n0∑

n=1

|xn − an |2n

︸ ︷︷ ︸

=0

+

∞∑

n=n0+1

|xn − an |2n

=

∞∑

n=n0+1

|xn − an |2n ≤ 1

2n0+1 +

1

2n0+2 + · · · = 1

2n0

< ε.

7) Considere a aplicacao f : Z∞ −→ Z∞ dada por

f(x1 x2 x3 x4 . . .) = x2 x3 x4 x5 . . .

Mostremos que f e contınua. Com efeito, Seja a = a1 a2 a3 . . . ∈ Z∞,dado ε > 0 escolhemos n0 ∈ N tal que 1

2n0< ε. Tomemos δ = 1

2n0+1 .

Se x = x1 x2 x3 x4 . . . satisfaz ν(x, a) < δ, entao pela proposicao 1 (p. 44)

xi = ai para i ≤ n + 1. Sendo assim as i−esimas entradas de f(x) e f(a)concordam para i ≤ n. Isto e, ν

(f(x), f(a)

)≤ 1

2n0< ε.

Proposicao 51. Seja f : (M, d1) −→ (N, d2) se (M, d1) e um espaco dis-creto entao f e contınua.

Prova: De fato, dado a ∈M e ε > 0 arbitrario, como (M, d1) e discretoentao a e isolado, logo existe δa > 0 de modo que B

d1(a; δa) = { a }, portanto:

f(B

d1(a; δa)

)= f

({ a }

)={f(a)

}⊂ B

d2

(f(a); ε

); ∀ ε > 0. �

raδa

(M, d1 )

∃ δa>0

fq qqqqq qqqq q qq q qq q q q

qrq f(a)ε

(N, d2 )

∀ ε>0

∀ ∃ ∀ε>0 δ>0 x

(

x ∈ Bd1(a; δ) ⇒ f(x) ∈ B

d2

(f(a); ε

))

δa Bd1(a; δa )={a} f(a) B

d2(f(a); ε)

250

Page 252: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6.1 Isometria

A palavra isometria literalmente significa “medidas iguais” ja que ederivada das raızes gregas isos (“igual”) e metron (“medida”).

Definicao 29 (Imersao isometrica). Uma funcaof : (M, d1) −→ (N, d2) echamada uma imersao isometrica quando preserva distancias, isto e, quandopara quaisquer x, y ∈M tivermos d2

(f(x), f(y)

)= d1(x, y).

x

y

→d1(x, y)

(M, d1 )

f

f(y)

f(x)

← d2 (f(x), f(y))

(N, d2 )

Toda imersao isometrica e contınua. De fato, dado a ∈ M e ε > 0arbitrario, e suficiente tomar δ = ε, pois

d1(x, a) < δ = ε =⇒ d2

(f(x), f(a)

)= d1(x, a) < ε.

Exemplos:

1)

0ss

s s)

s

)

Uma rotacao em torno daorigem preserva a distancia dosvetores − para a origem − etambem o angulo entre os ve-tores.

2)

0

ss

ss

)

)

Uma reflexao numa reta pelaorigem preserva a distancia dosvetores − para a origem − etambem o angulo entre os ve-tores.

251

Page 253: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3) Consideremos a rotacao de um ponto em torno da origem

R

R

0

s(x, y)R

R

0

s

θ

(x, y)

f(x, y)

Onde f(x, y) = (x cos θ− y sen θ, x sen θ+ y cos θ). Utilizando a distancia(norma) euclidiana, temos:

‖ f(x, y) ‖ =√

(x cos θ − y sen θ)2 + (x sen θ + y cos θ)2

=√

x2 (cos2 θ + sen 2θ) + y2 ( sen 2θ + cos2 θ)

=√

x2 + y2 = ‖ (x, y) ‖

4) Consideremos a aplicacao

f : (R, µ) −→ (R2, Di)

x (x, x)7−→

q0

R rx −→fR

R

r f(x)x

x

Considerando sobre R2 a metrica D3 resulta que f e imersao isometrica:

D3

(f(x), f(y)

)= D3

((x, x); (y, y)

)

= max{ |x− y|, |x− y| }= |x− y| = µ(x, y).

Geometricamente tudo se passa assim:

q0

(R, µ)

rr

x

y −→f→|x−y|

R

R

x

y

x y

|x−y|

|x−y|

252

Page 254: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Considerando sobreR2 a metricaD1 resulta que f nao e imersao isometrica.Vejamos um contraexemplo (x = 1, y = 2):

D1

(f(1), f(2)

)= D1

((1, 1); (2, 2)

)

=√

(1− 2)2 + (1− 2)2

=√2 6= 1 = µ(1, 2).

Veja geometricamente:

q0

(R, µ)

rr

1

2

−→f

R

R

1

2

1 2

rr

f(1)

f(2)

→D1

Considerando sobreR2 a metricaD2 resulta que f nao e imersao isometrica.Vejamos um contraexemplo (x = 1, y = 2):

D2

(f(1), f(2)

)= D2

((1, 1); (2, 2)

)

= |1− 2|+ |1− 2|= 2 6= 1 = µ(1, 2).

Geometricamente tudo se passa assim:

q0

(R, µ)

rr

1

2

−→f

R

R

1

2

1 2

rr

f(1)

f(2)

տD2

1

1

Uma imersao isometrica f : (M, d1) −→ (N, d2) e sempre uma aplicacaoinjetiva. De fato,

f(x) = f(y) ⇒ d2

(f(x), f(y)

)= 0 = d1(x, y) ⇒ x = y.

253

Page 255: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicao 30 (Isometria). Uma funcao f : (M, d1) −→ (N, d2) e chamadaisometria se ela for uma imersao isometrica sobrejetiva.

Se f e g sao isometrias entao a composta, g◦f , tambem e uma isometria,conforme mostra o diagrama a seguir.

(M, d1 )

x

yf

g◦fd2 (f(x), f(y)) = d1(x, y) e d3 (gf(x), gf(y)) = d2 (f(x), f(y)) ⇒ d3 (g◦f(x), g◦f(y)) = d1 (x, y)

f(x)

f(y)

(N, d2 )

g

gf(x)

gf(y)

(P, d3 )

Ademais, o diagrama a seguir mostra que a inversa de uma isometriaainda e uma isometria.

(M, d1 )

x

yf

f−1 ◦ f = IM

d2 (f(x), f(y)) = d1(x, y) d1 (f−1f(x), f−1f(y)) = d2 (f(x), f(y))

?

f(x)

f(y)

(N, d2 )

f−1

f−1f(x)

f−1f(y)

(M, d1 )

Exemplos:

1) Translacao

Num espaco vetorial(E, +, ·

)normado fixamos um vetor a ∈ E. A

aplicacao Ta : E −→ E dada por Ta(x) = x+ a, executa uma “translacao”no vetor x. Ta e uma isometria. De fato,

(i) Ta e uma imersao isometrica.

d(Ta(x), Ta(y)

)= ‖Ta(x)− Ta(y)‖= ‖(x+ a)− (y + a)‖ = ‖x− y‖ = d(x, y).

(ii) Ta e sobrejetiva. Dado y ∈ E devemos exibir x ∈ E de modo queTa(x) = y. Entao basta resolver a equacao x+ a = y. Logo, x = y − a e talque

Ta(x) = Ta(y − a) = (y − a) + a = y.

254

Page 256: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2) Rotacao. fθ(x, y) = (x cos θ− y sen θ, x sen θ+ y cos θ). Vimos anterior-

mente (p. 252) que a rotacao de um ponto em torno da origem e uma imersaoisometrica.

Para mostrar que fθe sobrejetiva dado (x′, y′) ∈ R2, encontremos um

par ordenado (x, y) ∈ R2 tal que fθ(x, y) = (x′, y′). Isto e, resolvamos o

seguinte sistema linear

{

x cos θ − y sen θ = x′

x sen θ + y cos θ = y′

Na forma matricial[

x′

y′

]

=

[

cos θ − sen θ

sen θ cos θ

] [

x

y

]

De outro modo:

x′ = x cos θ + y sen θ

y′ = −x sen θ + y cos θ

Ou ainda:

(x′, y′) =(x cos(−θ)− y sen (−θ), x sen (−θ) + y cos(−θ)

)

Conclua que dado (x′, y′) ∈ R2 para obter sua pre-imagem basta rotaciona-lo de θ graus no sentido negativo (horario).

3) Isometrias em(ZN , σ

)

Veremos agora uma famılia de isometrias no espaco de sımbolos.Se π e uma bijecao do conjunto {1, 2, . . . , n} nele proprio, tambem chamadade permutacao, a aplicacao permutacao de coordenadas

Γπ : ZN ZN

(x1 , x2 , ...,xn) (xπ(1)

, xπ(2)

, ...,xπ(n)

)

e uma isometria no espaco(ZN , σ

). O numero de bijecoes (permutacoes)

do conjunto {1, 2, . . . , n} nele proprio e n!.

Listamos a seguir todas as permutacoes do conjunto {1, 2, 3}:

(1 2 31 2 3

)

,

(1 2 31 3 2

)

,

(1 2 32 1 3

)

,

(1 2 32 3 1

)

,

(1 2 33 1 2

)

,

(1 2 33 2 1

)

.

Fixemos, a tıtulo de exemplo, uma destas permutacoes:

(1 2 32 3 1

)

= π.

Sendo assim, temos

255

Page 257: Gentil Lopes - Espaços Métricos

π(1) = 2, π(2) = 3, π(3) = 1.

Entao,

Γπ : Z3 Z3

(x1 , x2 , x3 ) (xπ(1)

, xπ(2)

, xπ(3)

)

A aplicacao Γπ executa a seguinte permutacao nos termos de uma sequenciade Z3:

(x1 , x2 , x3

) Γπ(x2 , x3 , x1

)(> )

Por exemplo,

Γπ

(101)= 011; Γπ

(010)= 100.

Veja como e facil mostrar que Γπ e uma isometria: Dados x =(x1 , x2 , x3

)∈

Z3 e y =(y1 , y2 , y3

)∈ Z3 mostremos que σ

(Γπ(x), Γπ (y)

)= σ(x, y).

Pois bem,

(x1 , x2 , x3

) Γπ(x2 , x3 , x1

)

(y1 , y2 , y3

) Γπ(y2 , y3 , y1

)

Temos

σ(x, y) =

3∑

n=1

∣∣xn − yn

∣∣ =

∣∣x1 − y1

∣∣+∣∣x2 − y2

∣∣+∣∣x3 − y3

∣∣

Por outro lado,

σ(Γπ (x), Γπ(y)

)=

3∑

n=1

∣∣x

π(n)− y

π(n)

∣∣ =

∣∣x

π(1)− y

π(1)

∣∣+∣∣x

π(2)− y

π(2)

∣∣+∣∣x

π(3)− y

π(3)

∣∣

=∣∣x2 − y2

∣∣+∣∣x3 − y3

∣∣+∣∣x1 − y1

∣∣

Portanto, σ(Γπ(x), Γπ (y)

)= σ(x, y).

A sobrejetividade de Γπ decorre do fato de que as permutacoes saobijecoes (isto e, tem inversa). Seja, por exemplo, y = 110 ∈ Z3, calculesua pre-imagem por Γπ . Isto e, encontre x ∈ Z3 tal que Γπ (x) = y.

Solucao: Basta calcular Γπ−1 ( y ), onde π

−1 =(

1 2 33 1 2

)

. Temos,

Γπ−1 ( y1 , y2 , y3 ) =

(yπ−1(1)

, yπ−1(2)

, yπ−1(3)

)= ( y3 , y1 , y2 )

Entao, Γπ−1 ( 110 ) = 011. Observe que Γπ( 011 ) = 110 (ver equacao (> )).

256

Page 258: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicao 31 (Contracao). Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos. Umaaplicacao f : M −→ N e chamada uma contracao quando existe uma cons-tante α, com 0 ≤ α < 1, tal que

d2

(f(x), f(y)

)≤ α d1(x, y) para quaisquer x, y ∈M.

Assim, numa contracao, a distancia entre as imagens de dois pontosquaisquer e menor que a distancia entre os respectivos pontos.

Exemplo: Considere o espaco normado(R2, ‖ · ‖

)e seja f : R2 −→ R2,

dada por f(p) = 12p. Entao f e uma contracao, pois

d2

(f(p), f(q)

)= ‖f(p)− f(q)‖ =

∥∥∥1

2p− 1

2q∥∥∥

=1

2‖p − q‖ = 1

2d1(p, q) < d1(p, q).

Por exemplo, seja p = (3, 3) e q = (4, 1), entao

f(3, 3) =1

2(3, 3) =

(3

2,3

2

)e f(4, 1) =

1

2(4, 1) =

(2,

1

2

).

Veja a geometria:

R

R

(0, 0) q1 q2 q3 q4

q1

q2

q3

q4

p

q

f(p)

f(q)

Exemplo: Na figura a seguir (esquerda)

257

Page 259: Gentil Lopes - Espaços Métricos

rotacionamos um quadrado (2 ) com θ = 30o em torno do seu centro, apli-cando uma contracao com parametro α = 0, 7321; fizemos 9 iteracoes (com-posicoes). Na figura da direita apenas mudamos os parametros para θ = 10o

e α = 0, 8632 com 18 iteracoes.

O “fator de contracao” α em funcao do angulo θ desejado e dado por:

α = ( sen θ + cos θ)−1

Toda contracao f e contınua. De fato, dado ε > 0, e suficiente tomarδε = ε/α, pois

d1(x, y) < δ ⇒ d2

(f(x), f(y)

)≤ α d1(x, y) < α · δ = ε.

Aplicacoes lipschitziana

Definicao 32 (Funcoes de Lipschitz). Sejam (M, d1) e (N, d2) espacosmetricos. Uma aplicacao f : M −→ N e uma funcao de Lipschitz∗ (oulipschitziana) quando existe uma constante c > 0 (chamada constante deLipschitz) satisfazendo

d2

(f(x), f(y)

)≤ c d1(x, y) para quaisquer x, y ∈M.

Toda funcao de Lipschitz e contınua.De fato, dado ε > 0 e suficiente tomar δ = ε

c e teremos

d1(x, y) < δ =ε

c=⇒ d2

(f(x), f(y)

)≤ c d1(x, y) < ε.

Exemplos:

1) Dado um espaco vetorial(E, +, ·

), normado, cada escalar λ 6= 0 deter-

mina uma homotetia hλ: (E, ‖.‖) −→ (E, ‖.‖) definida por h

λ(x) = λx, ∀x ∈

E. Escolhamos c > 0 tal que c ≥ |λ|. Para quaisquer x, y ∈ E, temos:

d2(hλ(x), h

λ(y)) = d2(λx, λ y) = ‖λx− λ y‖

= |λ| · ‖x− y‖ ≤ c ‖x− y‖ = c d1(x, y)

e portanto hλe lipschitziana e, por conseguinte, contınua.

2) Para as funcoes f : (R, µ) −→ (R, µ) a condicao de Lipschtiz significa

|f(x)− f(y)| ≤ c |x− y| =⇒ |f(x)− f(y)|/|x− y| ≤ c

ou seja, a inclinacao de qualquer secante ao grafico de f e, em valor absoluto,≤ c.

∗Rudolph Lipschitz (1832− 1903) foi professor em Bonn. Deu contribuicoes a algebra,a teoria dos numeros, a geometria diferencial e a analise.

258

Page 260: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Se uma funcao f : (I, µ) −→ (R, µ), definida em um intervalo I, temderivada limitada para todo x ∈ I − isto e existe c > 0 tal que |f ′(x)| ≤c, ∀x ∈ I − entao pelo teorema do valor medio ([AR]12, p. 604), dadosx, y ∈ I quaisquer, existe um ponto t entre x e y, tal que f(x) − f(y) =f ′(t)(x− y), portanto,

|f(x)− f(y)||x− y| = |f ′(t)| ≤ c =⇒ |f(x)− f(y)| ≤ c |x− y|.

Resumindo: toda funcao com derivada limitada em um intervalo e lips-chitziana. Por exemplo, das funcoes abaixo, apenas g e lipschitziana.

f : R −→ R

x 7−→ x2e g : [−1, 1 ] −→ R

x 7−→ x2

De fato, se f fosse de Lipschitz existiria c > 0 de modo que

|x2 − y2| ≤ c |x− y| =⇒ |x+ y| ≤ c, ∀x 6= y ∈ R

Isto, em particular, implicaria em R ser limitado. Esta inverdade provanossa assertiva.

Por outro lado, sendo |x| ≤ 1 e |y| ≤ 1 para todo x, y ∈ [−1, 1 ], temos|x+ y| ≤ |x|+ |y| ≤ 2, logo

|x2 − y2| = |x− y| · |x+ y| ≤ 2|x− y| ⇒ |f(x)− f(y)| ≤ 2|x− y|.

Isto mostra que f e de Lipschitz.Observe que g′(x) = 2x e como −1 ≤ x ≤ 1 temos

−2 ≤ 2x ≤ 2 =⇒ |2x| = |g′(x)| ≤ 2.

isto e, g possui derivada limitada no intervalo [−1, 1 ]. Veja:

x

g(x)

0 q1q−1

q1

x

g′(x)

0 q1q−1

q1

q2

q−1

q−2

259

Page 261: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3) Dados M1 , M2 , . . . , Mn , para cada i (i = 1, 2, . . . , n) fixado a funcao

pi : M1 × . . .×Mn −→Mi

(x1 ,... , xi , ..., xn) 7−→ xi

chama-se projecao i-esima.

A figura a seguir ilustra esta situacao para o caso de dois espacos metricos:

M1

M2 M1×M2

sx=(x1 , x2 )

p1

p2

s

s

րp1(x) = x1

րp2 (x)= x2

As projecoes sao exemplos de funcoes de Lipschitz.

De fato, sejam x = (x1 , . . . , xn) e y = (y1 , . . . , yn) pontos arbitrariosde M =M1 ×M2 × · · · ×Mn , entao (p. 97)

di(pi(x), pi(y)) = di(xi , yi) ≤ Dk(x, y) (k = 1, 2, 3.)

Portanto as funcoes pi sao lipschitzianas com constante de Lipschitz c = 1.

As aplicacoes lipschitzianas nas quais c = 1 sao tambem conhecidas comocontracoes fracas. Vejamos mais alguns exemplos de contracoes fracas:

(i) Num espaco vetorial(E, +, ·

)normado a adicao de vetores s : E×E −→

E definida por s(x, y) = x + y e uma contracao fraca (portanto e umaaplicacao contınua).

Vamos usar em E × E a metrica (p. 95)

D2

((x1 , x2); (y1 , y2)

)= d1(x1 , y1) + d2(x2 , y2)

= ‖x1 − y1‖+ ‖x2 − y2‖.

Com efeito, para quaisquer (x1 , x2), (y1 , y2) ∈M ×M , temos

d2

(s(x1 , x2); s(y1 , y2)

)= d2

(x1 + x2 ; y1 + y2

)

= ‖(x1 + x2)− (y1 + y2)‖ = ‖(x1 − y1) + (x2 − y2)‖≤ ‖x1 − y1‖+ ‖x2 − y2‖ = D2

((x1 , x2); (y1 , y2)

)

260

Page 262: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(ii) A propria metrica

d : M ×M −→ R

(x, y) 7−→ d(x, y)

e uma contracao fraca. De fato, Vamos usar em M ×M a metrica

D2

((x1 , x2); (y1 , y2)

)= d1(x1 , y1) + d2(x2 , y2)

= d(x1 , y1) + d(x2 , y2).

Com efeito, para quaisquer (x1 , x2), (y1 , y2) ∈M ×M , temos∣∣d(x1 , x2)− d(y1 , y2)

∣∣ =

∣∣d(x1 , x2)− d(x2 , y1) + d(x2 , y1)− d(y1 , y2)

∣∣

≤∣∣d(x2 , x1)− d(x2 , y1)

∣∣+∣∣d(y1 , x2)− d(y1 , y2)

∣∣

≤ d(x1 , y1) + d(x2 , y2) = D2

((x1 , x2); (y1 , y2)

).

Na ultima desigualdade fizemos uso da proposicao 2. (p. 45)

(iii) A norma

‖ · ‖ : E −→ R

x 7−→ ‖x‖

e uma contracao fraca.Com efeito, para quaisquer x, y ∈ E temos

∣∣ ‖x‖ − ‖y‖

∣∣ =

∣∣d(x, 0)− d(y, 0)

∣∣ ≤ d(x, y)

(iv) Seja (M, d) um espaco metrico. Fixemos A ⊂M . A funcao

f : M −→ (R, µ)

x 7−→ d(x, A)

e uma contracao fraca.Com efeito, para quaisquer x, y ∈M , temos: (prop. 3, p. 50)

∣∣ d(x, A)− d(y, A)

∣∣ ≤ d(x, y)

Em particular, tomando A = { a }, temos que a aplicacao

da : M −→ R

x 7−→ d(x, a)

e contınua.

(v) A aplicacao f : (R, µ) −→ (R, µ) dada por f(x) = |x| e uma contracaofraca. Com efeito, isto e uma consequencia imediata da desigualdade

∣∣|x| − |y|

∣∣ ≤ |x− y| , ∀x, y ∈ R.

261

Page 263: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Aplicacoes localmente lipschitziana

Uma aplicacao f : (M, d1) −→ (N, d2) se diz localmente lipschitziana se,para cada ponto a ∈ M , existe uma bola B

d1(a; r) ⊂ M de modo que a

restricao de f a essa bola e lipschtziana.

Uma aplicacao localmente lipschitziana e contınua. De fato, dado a ∈Mexiste uma bolaB

d1(a; r) de mameira que f restrita a essa bola e lipschtziana,

logo existe c > 0 tal que

d2

(f(x), f(y)

)≤ c d1(x, y), ∀x, y ∈ Bd1

(a; r).

Assim, dada uma bola Bd2

(f(a); ε

), com ε arbitrariamente fixado, escolhe-

mos δ > 0 de maneira que δ < r e δ < εc . Sendo assim temos:

d1(x, a) < δ

{

< r

< εc

⇒ d1(x, a) < r ⇒ x ∈ Bd1(a; r)

⇒ d2

(f(x), f(a)

)≤ c d1(x, a)⇒ d2

(f(x), f(a)

)< ε.

Agora vamos ver alguns exmplos de aplicacoes localmente lipschitzianas:

i) Seja f : (R, µ) −→ (R, µ) definida por f(x) = xn, onde n e um naturalarbitrariamente fixado.

Seja a ∈ R, consideremos a bola Bµ(a; r) = ] a − r, a + r [. Tendo emconta que toda bola aberta e um conjunto limitado, existe k ∈ R tal que

|x| ≤ k para todo x ∈ Bµ(a; r) = ] a− r, a+ r [ (6.4)

Devido ao teorema do valor medio, se x, y ∈ Bµ(a; r), x 6= y existe t ∈ R,situado entre x e y de modo que

f(x)− f(y) = f ′(t)(x− y) = n · tn−1(x− y)

Entao,

|f(x)− f(y)| = n · |t|n−1 · |x− y|, ∀x, y ∈ ] a− r, a+ r [

por (6.4), temos

|t| ≤ k ⇒ |t|n−1 ≤ kn−1 ⇒ n · |t|n−1 · |x− y| ≤ n · kn−1 · |x− y|

por conseguinte

|f(x)− f(y)| ≤ n · kn−1 · |x− y|, ∀x, y ∈ ] a− r, a+ r [

isto e, f e localmente lipschtziana com constante de Lipschitz c = nkn−1.Observe que a funcao f : R −→ R dada por f(x) = x2 nao e lipschitziana,mas sim localmente lipschitziana.

262

Page 264: Gentil Lopes - Espaços Métricos

ii) Seja f : (R∗, µ) −→ (R, µ) definida por f(x) =1

x, ∀x ∈ R∗.

Tomemos inicialmente a ∈ R∗ = ] − ∞, 0 [ ∪ ] 0, +∞ [ e a > 0. Como oconjunto ] 0, +∞ [ e aberto podemos centrar neste ponto uma bola abertaBµ(a; r) = ] a− r, a+ r [ ⊂ ] 0, +∞ [. Facamos a− r = s > 0, entao

∀x, y ∈ ] a− r, a+ r [ = ] s, s+ 2r [ ⇒ x > s > 0 e y > s > 0

⇒ |x| · |y| > s2 ⇒ 1

|x| · |y| <1

s2⇒ |x− y||x| · |y| <

|x− y|s2

.

0x

f(x)

] [r r rx a y

a−r a+r

→|f(x)−f(y)|

|x−y|s

Pois bem, ∀x, y ∈ ] a− r, a+ r [, temos

|f(x)− f(y)| =∣∣∣1

x− 1

y

∣∣∣ =|x− y||x| · |y| <

1

s2|x− y|.

Isto prova que f restrita a Bµ(a; r) e lipschitziana.

Para a < 0 o tratamento e analogo.

iii) Num espaco vetorial(E, +, ·

)normado, a multiplicacao por escalares

m : R× E −→ E(α, u) 7−→ αu

e localmente lipschitziana.

Provaremos nossa afirmativa usando sobre R× E a metrica

D3(x, y) = max{d1(x1 , y1), d2(x2 , y2)

}

263

Page 265: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Nota: Aqui d1 e metrica usual de R:

d1(x1 , y1) = |x1 − y1 | , ∀x1 , y1 ∈ R.

d2 e metrica de E:

d2(x2 , y2) = ‖x2 − y2‖ , ∀x2 , y2 ∈ E.Portanto,

D3(x, y) = max{|x1 − y1 |, ‖x2 − y2 ‖

}

onde x = (x1 , x2) ∈ R× E e y = (y1 , y2) ∈ R× E.

Prova: Seja a = (α, u) um ponto arbitrario de R × E, centremos nesteponto uma bola B

D3(a, r).

Primeiramente vamos mostrar que existe uma bola de centro na origem0 = (0, 0) ∈ R × E e raio conveniente s, de maneira que B

D3(a; r) ⊂

BD3(0; s).

Tomando s = D3(0, a) + r, vamos mostrar que BD3(a; r) ⊂ B

D3(0; s).

D3 (0, a)�BD3(0; s)

�B

D3(a; r)

a

r

0=(0, 0)r

"!# q

R

E

R×E

Com efeito, seja x = (β, v) ∈ BD3(a; r) um ponto arbitrario nesta bola;

logo D3(x, a) < r, ou ainda

D3

((β, v); (α, u)

)= max

{|β − α|, ‖u− v‖

}< r (6.5)

Devemos mostrar que x ∈ BD3(0; s) onde

s = D3(0, a) + r = D3

((0, 0); (α, u)

)+ r

= max{|0− α|, ‖0− u‖

}+ r

= max{|α|, ‖u‖

}+ r.

Para tanto basta mostrar que D3(x, 0) < s. Sendo

D3(x, 0) = D3

((β, v); (0, 0)

)

= max{|β − 0|, ‖v − 0‖

}

= max{|β|, ‖v‖

}.

264

Page 266: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Devemos mostrar que

max{|β|, ‖v‖

}< s = max

{|α|, ‖u‖

}+ r (6.6)

De (6.5) temos

|β − α| < r e ‖u− v‖ < r (6.7)

Por outro lado

‖v‖ = ‖v − u+ u‖ ≤ ‖u− v‖+ ‖u‖|β| = |β − α+ α| ≤ |α− β| + |α|

com auxılio de (6.7) escrevemos

‖v‖ ≤ ‖u− v‖+ ‖u‖ < ‖u‖+ r

|β| ≤ |α− β| + |α| < |α| + r

portanto,

{

‖v‖ < ‖u‖+ r

|β| < |α| + r=⇒ max

{|β|, ‖v‖

}< max

{|α|, ‖u‖

}+ r

E isto prova (6.6). Por conseguinte BD3(a; r) ⊂ B

D3(0; s).

Pois bem, dados dois pontos quaisquer (α, u) e (β, v) na bola BD3(a; r),

como estes pontos estao na bola BD3(0; s), valem as desigualdades

D3

((α, u); (0, 0)

)< s e D3

((β, v); (0, 0)

)< s

isto e

max{|α|, ‖u‖

}< s e max

{|β|, ‖v‖

}< s (6.8)

Agora calculemos a distancia entre as imagens, por m, destes pontos:

d2

(m(α, u); m(β, v)

)= d2(αu, βv) = ‖αu− βv‖

= ‖αu − βu+ βu− βv‖

= ‖(α − β)u+ β(u− v)‖

≤ |α− β| · ‖u‖+ |β| · ‖u− v‖ (6.9)

Sendo assim

‖αu− βv‖ ≤ |α− β| · ‖u‖+ |β| · ‖u− v‖

≤ 2max{|α− β| · ‖u‖, |β| · ‖u− v‖

}(6.10)

265

Page 267: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De (6.8) temos,

‖u‖ < s =⇒ |α− β| · ‖u‖ < s|α− β|

|β| < s =⇒ |β| · ‖u− v‖ < s‖u− v‖

Destas desigualdades inferimos que

max{|α− β| · ‖u‖, |β| · ‖u− v‖

}< max

{s |α− β|, s ‖u− v‖

}

Ou ainda,

2max{|α− β| · ‖u‖, |β| · ‖u− v‖

}< 2smax

{|α− β|, ‖u− v‖

}

= 2sD3

((α, u); (β, v)

)(6.11)

Portanto de (6.9), (6.10) e (6.11) concluimos que

d2

(m(α, u); m(β, v)

)< 2sD3

((α, u); (β, v)

)

Isto prova que m e localmente lipschitziana. �

Interregno cultural:

Uma das contribuicoes definitivas do seculo dezenove foi o reconheci-mento de que a matematica nao e uma ciencia natural, mas uma criacaointelectual do homem. Bertrand Russel escreveu no International

Monthly em 1901 :

O seculo dezenove, que se orgulha da invencao do vapor e da evolucao, poderia derivar

um tıtulo mais legıtimo a fama da descoberta da matematica pura.

[. . .] pelo fim do seculo era geralmente reconhecido mesmo por nao-matematicos que a matematica e pensamento postulacional, em que depremissas arbitrarias sao tiradas conclusoes validas. Que os postula-dos sejam ou nao verdadeiros num sentido cientıfico e indiferente; naverdade, as proprias palavras em que os postulados sao expressos saotermos nao-definidos. Isso levou Bertrand Russel a sua descricao damatematica, em 1901, como o assunto em que ninguem sabe do queesta falando, nem se o que esta dizendo e verdade. Dois anos depois,no inıcio de seus Principles of Mathematics, Russel formulou umadefinicao precisa da matematica:

A matematica pura e a classe de todas as proposicoes da forma “p implica q”, onde p e

q sao proposicoes contendo uma ou mais variaveis, as mesmas nas duas proposicoes e nem

p e nem q contem constantes exceto constantes logicas.

(Fonte: Boyer, p.440)

266

Page 268: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Caracterizacao de continuidade via convergencia de sequencias

Proposicao 52. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos.

Se f : M −→ N e contınua no ponto a ∈ M e (xn) e uma sequencia depontos de M convergindo para a entao f(xn)−→ f(a).

ra· · ·րrxn

· · ·rx3r

x2

rx1(M, d1 )

f

rf(a)

· · ·ցrf(xn )

· · ·rf(x3 )

rf(x2 )r

f(x1 )

(N, d2 )

Em resumo:

H:

H1 : f ≀ a

H2 : limxn = a=⇒ T: lim f(xn) = f(a)

Nota: A notacao f ≀ a significa: f e contınua no ponto a.

Prova: Para mostrar que a sequencia(f(xn)

)converge para o ponto f(a),

vamos centrar neste ponto uma bola Bd2

(f(a); ε

)de raio ε arbitrario. Deve-

mos exibir um ındice n0 ∈ N a partir do qual todos os termos da sequencia(f(xn)

)caem dentro da bola B

d2

(f(a); ε

). Isto e devemos exibir um ındice

n0 ∈ N tal quese n ≥ n0 ⇒ d2

(f(xn), f(a)

)< ε (6.12)

Como f e contınua em a ∈M , para o ε dado existe δε > 0 de modo que

se x ∈ Bd1(a; δε) ⇒ f(x) ∈ B

d2

(f(a); ε

)

isto ese d1(x, a) < δε ⇒ d2

(f(x), f(a)

)< ε. (6.13)

Por outro lado, como xn−→ a, para todo δ > 0 existe nδ∈ N tal que

se n ≥ nδ⇒ d1(xn , a) < δ

Daqui e de (6.13) concluimos que

se n ≥ n0 = nδ⇒ d1(xn , a) < δ = δε ⇒ d2

(f(xn), f(a)

)< ε.

Isto prova (6.12) �

De forma sugestiva, a proposicao anterior poderia ainda exprimir-sedizendo que a continuidade de f no ponto a equivale a possibilidade depermutar os sımbolos “lim” e “f ”:

lim f(xn) = f(limxn) (6.14)

267

Page 269: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 53. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos.Se f : M −→ N nao e contınua no ponto a ∈ M entao existe uma

sequencia xn−→ a tal que f(xn) 6−→f(a).

Em resumo:

H : f 6 ≀ a =⇒ T:

T1 : ∃ (xn) : limxn = a

T2 : f(xn) 6−→f(a)

Prova: Com efeito, nao sendo f contınua em a (p. 238), existe ε0 > 0 tal que,qualquer que seja δ > 0 havera pelo ao menos um ponto x

δ∈M verificando

ambas as condicoes:

xδ∈ B

d1(a; δ) e f(x

δ) 6∈ B

d2

(f(a); ε0

)

isto e

d1(xδ, a) < δ e f(x

δ) 6∈ B

d2

(f(a); ε0

)

Facamos δ =1

n; entao para todo n ∈ N existira xn ∈M tal que

d1(xn , a) <1

ne f(xn) 6∈ Bd2

(f(a); ε0

)

portanto f(xn) 6−→f(a); porem

0 ≤ d1(xn , a) <1

n⇒ lim 0 ≤ lim d1(xn , a) ≤ lim

1

n⇒ lim d1(xn , a) = 0 ⇒ xn−→ a.

Observe que a contrapositiva T −→ H da proposicao anterior e:

Proposicao 54. Se para toda sequencia (xn) com xn−→ a tivermos f(xn)−→f(a) entao f e contınua em a.

A recıproca da proposicao 53 tambem vale,

Proposicao 55. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos.Se existe uma sequencia xn−→ a tal que f(xn) 6−→f(a) entao f : M −→

N nao e contınua no ponto a ∈M .

Em resumo:

H:

H1 : ∃ (xn) : lim xn = a

H2 : f(xn) 6−→f(a)=⇒ T : f 6 ≀ a

268

Page 270: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Com efeito, se xn−→ a, entao

∀ δ > 0, ∃n0 ∈ N tal que n ≥ n0 ⇒ xn ∈ Bd1(a; δ) (6.15)

Por outro lado, como f(xn) 6−→f(a), entao (p. 141) existe ε0 > 0 tal que

∀n ∈ N, ∃n′ ≥ n de modo que f(xn′ ) 6∈ Bd2

(f(a); ε0

)

Em particular, para n = n0 existe n′ ≥ n = n0 tal que f(xn′ ) 6∈ Bd2

(f(a); ε0

)

mas por (6.15) temos que xn′ ∈ Bd1(a; δ).

Conclusao: ∃ ε0 tal que ∀ δ > 0 conseguimos um ponto xn′ ∈ Bd1(a; δ)

com f(xn′ ) 6∈ Bd2

(f(a); ε0

). Isto mostra que f nao e contınua em a. �

Esta proposicao pode ser de grande utilidade para mostrar que umafuncao f : M −→ N nao e contınua em um ponto a: Basta exibir umasequencia (xn) com xn −→ a ∈M tal que f(xn) 6−→ f(a).

Vejamos alguns exemplos do que estamos falando:

Exemplos:

1) Consideremos a funcao sinal de x (de (R, µ) em (R, µ))

f(x)= sign(x)=

1, se x > 0;

0, se x = 0;

−1, se x < 0.

Esta funcao e descontınua em x = 0. Com efeito, a sequencia (xn)dada por xn = 1

n converge para 0, por outro lado como f(xn) = 1, resulta(f(xn)

)= (1, 1, 1, . . .)→ 1 6= 0 = f(0).

s1

0

−1

x

sign(x)

1

0

−1

ւf(x1 )

x

sign(x)

rrrrrrx1x2

...

269

Page 271: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2) A funcao f :([ 0, 1 [, k

)−→

([ 0, 1 [, µ

)dada por f(x) = x (identidade)

e descontınua na origem. (ex. 3, p. 243)

De fato, tomando a sequencia xn = 1− 1n de pontos no domınio, temos

que xn −→ 0 no espaco([ 0, 1 [, k

); enquanto que f(xn) = xn nao converge

no espaco([ 0, 1 [, µ

).

¬¬rx1 rx2 rx3 ···r rrrrrrrx1

r

x2

r

x3 ···

rrrrrrr

0 12 1

f(x2 )=12

f(x3 )=23

...

23

1

([ 0, 1 [, k

)

3) Considere a funcao (de (R2, D1) em (R, µ))

f : R2 −→ R(x, y) 7−→ z=

{2, se y > 0;

1, se y≤ 0.

Esta funcao e descontınua no ponto a = (0, 0). De fato, a sequencia(0, 1

n) converge para (0, 0), por outro lado, temos f(0, 1n) = 2, isto e,

(f(0,

1

n))= (2, 2, 2, . . .)→ 2 6= 1 = f(0, 0)

sss

s

sf(a)=1

sx1sx2sx3aտ

x

y

z

2

semi-plano z=2

A funcao anterior e descontınua em todo ponto da forma (x, 0) (eixo x).

270

Page 272: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6.2 Propriedades das aplicacoes contınuas

Proposicao 56. A composicao de aplicacoes preserva a continuidade.Mais precisamente: se f : (M, d1) −→ (N, d2) e contınua no ponto a e

g : (N, d2) −→ (P, d3) e contınua no ponto f(a), entao g ◦ f : (M, d1) −→(P, d3) e contınua no ponto a.

Prova: Dado ε > 0, a continuidade de g no ponto f(a) nos asseguraδ′ > 0 de modo que se y ∈ N e

d2

(y, f(a)

)< δ′ ⇒ d3

(g(y), g(f(a))

)< ε

Por outro lado, para este δ′ a continuidade de f no ponto a nos asseguraδ > 0 de modo que se x ∈M e

d1(x, a) < δ ⇒ d2

(f(x), f(a)

)< δ′ ⇒ d3

(g(f(x)), g(f(a))

)< ε

raδ

(M, d1 )

x r f

g◦f

rf(a)δ′

y=f(x)r

(N, d2 )

ggf(x)r rgf(a)

ε

(P, d3 )

Corolario 9. A restricao de uma funcao contınua f : (M, d1) −→ (N, d2)a um subespaco (X, d1) de (M, d1) e tambem contınua.

Prova: Com efeito, sendo i : X ⊂M −→M a inclusao (i.e., i(x) = x):

(f∣∣X)(x) = f(x), ∀x ∈ X

= f(i(x)

), ∀x ∈ X

=(f ◦ i

)(x), ∀x ∈ X.

Portanto f∣∣X = f ◦ i, ∀x ∈ X. Como f e i sao contınuas entao f

∣∣X e

tambem contınua. �

Sejam (M, dM ) e (N1 , d1), (N2 , d2), . . . , (Nn , dn) espacos metricos e se-jam as aplicacoes f1 : M −→ N1 , f2 : M −→ N2 , . . . , fn : M −→ Nn .

A partir destas n aplicacoes construimos uma aplicacao f de M no pro-duto cartesiano N1 ×N2 × · · · ×Nn dada por

f : M −→ N1 × N2 × · · · ×Nn

x 7−→(f1(x), f2(x), . . . , fn(x)

)

271

Page 273: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 57. A aplicacao f : M −→ N1 ×N2 × · · · ×Nn definida por

f(x) =(f1(x), f2(x), . . . , fn(x)

), ∀x ∈M,

e contınua se, e somente se, suas coordenadas

f1 : M −→ N1 , . . . , fn : M −→ Nn

sao contınuas.

Prova: (=⇒) Vamos nos valer das funcoes projecoes (p. 260)

p1◦ f(x) = p1

(f1(x), f2(x), . . . , fn(x)

)= f1(x) ⇒ p1◦f = f1

· · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·pn◦ f(x) = pn

(f1(x), f2(x), . . . , fn(x)

)= fn(x) ⇒ pn◦f = fn .

Como f e cada projecao pi sao contınuas, segue que cada funcao coordenadafi tambem e contınua.

(⇐=) Para provar a recıproca usaremos em N1 × N2 × · · · × Nn a metricaD3 (p. 95). Sendo a um ponto arbitrario de M , dado ε > 0 existe para cadaındice i = 1, 2, . . . , n um numero δi > 0 de modo que

dM(x, a) < δi ⇒ di

(fi(x), fi(a)

)< ε.

Pondo δ = min{δ1 , δ2 , . . . , δn

}, temos

dM(x, a) < δ ⇒

d1

(f1(x), f1(a)

)< ε

· · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·dn

(fn(x), fn(a)

)< ε

Sendo assim, temos

dM(x, a) < δ ⇒ max

{d1

(f1(x), f1(a)

), . . . , dn

(fn(x), fn(a)

)}< ε

⇒ D3

(f(x), f(a)

)< ε.

raδ1

xr(M, d

M)

f1 rf1(a)ε

f1 (x)r (N1 , d1 )

· · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·

raδn

xr(M, d

M)

fn rfn(a)ε

fn (x)r (Nn , dn )

raδ

xr(M,d

M)

f

rf(a)ε

f(x)r

(N1×···×Nn ,D3 )

272

Page 274: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Corolario 10. Se as n funcoes

f1 : M1 −→ N1

x1 7−→ f1(x1)

, f2 : M2 −→ N2

x2 7−→ f2(x2)

, . . . , fn : Mn −→ Nn

xn 7−→ fn(xn)

sao contınuas, entao a funcao

f : M1 × . . .×Mn −→ N1 × . . .×Nn

x = (x1 , . . . , xn) 7−→(f1(x1), . . . , fn(xn)

)

tambem e contınua.

Prova: Considerando as projecoes i−esimas (i = 1, 2, . . . , n.)

pi : M1 × . . .×Mn −→Mi

(x1 ,... , xi , ..., xn) 7−→ xi

podemos escrever

f(x) =(f1(x1), f2(x2), . . . , fn(xn)

)

=(f1( p1(x1 , . . . , xn)︸ ︷︷ ︸

=x1

), . . . , fn( pn(x1 , . . . , xn)︸ ︷︷ ︸

= xn

))

=(f1◦ p1(x1 , . . . , xn), . . . , fn ◦ pn(x1 , . . . , xn)

)

Portanto f =(f1 ◦ p1 , f2 ◦ p2 , . . . , fn ◦ pn

). Isto e, as funcoes fi ◦ pi sao as

coordenadas de f . Sendo estas coordenadas funcoes contınuas − por seremexpressas como composicao de funcoes contınuas − segue que f tambem econtınua. �

Operacoes com Funcoes contınuas

(I) Soma. Dadas duas funcoes

f : A −→ B

x 7−→ f(x)

e g : A −→ B

x 7−→ g(x)

gostariamos de obter uma terceira funcao que seria a soma de f com g

f + g : A −→ B

x 7−→ f(x) + g(x)

Entao e evidente que no conjunto B devera ser possıvel somarmos doiselementos quaisquer. Sendo assim exigiremos que B esteja inserido em umaestrutura de espaco vetorial. Isto e, consideraremos um espaco vetorial(E, +, ·

)construıdo sobre B = E. E mais: para falarmos de continuidade

consideraremos(E, +, ·

)um espaco vetorial normado.

273

Page 275: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 58. Sejam (M, d) um espaco metrico;(E, +, ·

)um espaco

vetorial normado e f : M −→ E, g : M −→ E funcoes.Se f e g sao contınuas entao f + g : M −→ E e tambem contınua.

Prova: Com efeito, consideremos as duas seguintes “funcoes auxiliares”

h : M −→ E × Ex 7−→

(f(x), g(x)

)e s : E × E −→ E

(x, y) 7−→ x+ y

Vamos compor estas duas funcoes

M E × E Eh s

x 7−→(f(x), g(x)

)7−→ f(x) + g(x)

Isto e

s◦h : M −→ E

x 7−→ f(x) + g(x)

Observe

(s◦h)(x) = s(h(x)

)= s((f(x), g(x))

)= f(x) + g(x).

Conclusao: s ◦ h = f + g e contınua por ser expressa como composicao defuncoes contınuas.

Observacao: h e contınua devido a proposicao 57 (p. 272). A continuidadede s foi demonstrada no ıtem (i) (p. 260). �

(II) Multiplicacao. Dadas duas funcoes

f : A −→ B

x 7−→ f(x)

e g : A −→ B

x 7−→ g(x)

gostarıamos de obter uma terceira funcao que seria o produto de f com g

f · g : A −→ B

x 7−→ f(x) · g(x)

Entao e evidente que no conjunto B devera ser possıvel multiplicarmosdois elementos quaisquer. No presente contexto nao podemos tomar o con-junto B de um espaco vetorial arbitrario, uma vez que nesta estrutura naocontamos com produto de vetores. Nos contentaremos em tomar B = R.

Proposicao 59. Sejam (M, d) um espaco metrico; o espaco vetorial nor-mado (R, | · |) e f : M −→ R, g : M −→ R funcoes.

Se f e g sao contınuas entao f · g : M −→ R e tambem contınua.

274

Page 276: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Com efeito, consideremos as duas seguintes “funcoes auxiliares”

h : M −→ R× R

x 7−→(f(x), g(x)

)e m : R× R −→ R

(x, y) 7−→ x · y

Vamos compor estas duas funcoes

M R× R Rh m

x 7−→(f(x), g(x)

)7−→ f(x) · g(x)

Isto e

m◦h : M −→ R

x 7−→ f(x) · g(x)

Observe

(m◦h)(x) = m(h(x)

)= m

((f(x), g(x))

)= f(x) · g(x).

Conclusao: m ◦ h = f · g e contınua por ser expressa como composicao defuncoes contınuas.Observacao: A continuidade de m foi demonstrada no ıtem iii) (p. 263). �

Como um exemplo trivial de aplicacao desta proposicao concluımos quea funcao, de (R, µ) em (R, µ), dada por f(x) = x ·x = x2 e contınua, devidoa que a aplicacao identidade f(x) = x e contınua.

(III) Quociente. Dadas duas funcoes

f : A −→ R

x 7−→ f(x)

e g : A −→ R

x 7−→ g(x)

Se g(x) 6= 0, ∀x ∈ A, definimos a funcao quociente de f e g por

f

g: A −→ R

x 7−→ f(x)/g(x)

Proposicao 60. Sejam (M, d) um espaco metrico; o espaco vetorial nor-mado (R, | · |) e f : M −→ R, g : M −→ R funcoes.

Se f e g ( g(x) 6= 0, ∀x ∈ M) sao contınuas entao f/g : M −→ R etambem contınua.

Prova: Com efeito, consideremos as tres seguintes “funcoes auxiliares”

h : M −→ R×R∗

x 7−→(f(x), g(x)

)j : R× R∗ −→ R× R

(x, t) 7−→(x, 1

t

); ; m : R× R −→ R

(x, y) 7−→ x · y

275

Page 277: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vamos compor estas tres funcoes

M R× R∗ R× R Rh j m

x 7−→(f(x), g(x)

)7−→

(

f(x), 1g(x)

)

7−→ f(x) · 1g(x)

Isto e

m◦j◦h : M −→ R

x 7−→ f(x)g(x)

Observe

(m◦j◦h)(x) =(m◦j

)(h(x)

)=(m◦j

)((f(x), g(x))

)

= m(j((f(x), g(x)))

)= m

((f(x),

1

g(x)

))

= f(x) · 1

g(x)

Conclusao: m ◦ j ◦ h =f

ge contınua por ser expressa como composicao de

funcoes contınuas.

Observacao: A continuidade de j se deve ao corolario 10 (p. 273). A con-

tinuidade de t 7−→ 1

tfoi demonstrada no ıtem ii) (p. 263). �

Caracterizacao da continuidade das transformacoes lineares

Lembramos da algebra linear:

Definicao 33. Sejam U e V espacos vetoriais sobre R. Uma funcaoF : U → V e dita uma transformacao linear de U em V se, e somentese,

( i ) F (u1 + u2 ) = F (u1 ) + F (u2 ), ∀u1 , u2 ∈ U( ii ) F (λu ) = λF (u ), ∀λ ∈ R e ∀u ∈ U .

Proposicao 61. Sejam(E, +, ·, ‖ · ‖1

)e(F, +, ·, ‖ · ‖2

)espacos vetoriais

normados sobre R. Se T : E −→ F e uma transformacao linear , entao asseguintes afirmacoes sao equivalentes

(i) T e contınua;

(ii) T e contınua no ponto 0 ∈ E;

(iii) Existe k > 0 tal que ‖T (v)‖2 ≤ k‖v‖1 , para todo v ∈ E;

(iv) T e lipschitziana.

Prova: Devemos provar as seguintes implicacoes

(i) ⇒ (ii) ⇒ (iii) ⇒ (iv) ⇒ (i).

276

Page 278: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Com efeito, a implicacao (i) ⇒ (ii) vale por definicao. Provaremos que(ii) ⇒ (iii): Sendo T contınua em 0 para ε = 1, por exemplo, existe δ > 0de maneira que

d1(u, 0) = ‖u− 0‖1 < δ ⇒ d2

(T (u), T (0)

)= ‖T (u)− T (0)‖2 < ε = 1.

isto ese ‖u‖1 < δ ⇒ ‖T (u)‖2 < 1 (6.16)

Vamos escolher k > 0 de modo que1

k< δ. Assim, dado qualquer vetor

v 6= 0 de E, o vetor1

k

v

‖v‖1e tal que

∥∥∥∥

1

k

v

‖v‖1

∥∥∥∥1

=1

k

∥∥∥∥

v

‖v‖1

∥∥∥∥1

=1

k

‖v‖1‖v‖1

=1

k< δ

portanto, por (6.16), temos

∥∥∥∥T

(1

k

v

‖v‖1

)∥∥∥∥2

< 1

Da linearidade de T decorre∥∥∥∥

1

k‖v‖1T (v)

∥∥∥∥2

=1

k‖v‖1‖T (v)‖2 < 1

Donde:‖T (v)‖2 < k‖v‖1

Esta desigualdade vale para todo v 6= 0 de E. Se v = 0 vale a igualdade‖T (0)‖2 = k‖0‖1 , posto que

‖T (0)‖2 = ‖0‖2 = 0 e ‖0‖1 = 0.

Portanto a tese: ‖T (v)‖2 ≤ k‖v‖1 vale sem restricoes.

(iii) ⇒ (iv). Dados u, v ∈ E, temos

‖T (u)− T (v)‖2 = ‖T (u− v)‖2 ≤ k‖u− v‖1

Portanto T e de Lipschitz.

(iv) ⇒ (i). Toda aplicacao lipschitziana e contınua (p. 258). �

277

Page 279: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Corolario 11. Seja (Rn, ‖ · ‖1) onde ‖ · ‖1 e qualquer uma das normasusuais sobre Rn e seja

(E, +, ·, ‖ · ‖2

)um espaco vetorial normado qualquer,

entao toda aplicacao linear T : Rn −→ E e contınua.

Prova: Consideremos sobre Rn a base canonica {e1 , e2 , . . . , en}:e1 = (1, 0, 0, . . . , 0) , e2 = (0, 1, 0, . . . , 0) , . . . , en = (0, 0, 0, . . . , 1).

Podemos escrever qualquer vetor u ∈ Rn da seguinte forma

u = (x1 , . . . , xn) ∈ Rn ⇒ u = x1e1 + · · · + xnen .

Entao

‖T (u)‖2 =∥∥T (x1e1 + · · ·+ xnen)

∥∥

2

=∥∥x1T (e1) + · · · + xnT (en)

∥∥

2

≤∥∥x1T (e1)‖2 + · · ·+ ‖xnT (en)

∥∥

2

≤ |x1 | · ‖T (e1)‖2 + · · ·+ |xn | · ‖T (en)‖2 .Vamos fazer a substituicao

max{‖T (e1)‖2 , . . . , ‖T (en)‖2

}= k

Portanto

‖T (u)‖2 ≤ k(|x1 |+ · · · + |xn |

)

= k‖u‖1onde

‖u‖1 = ‖(x1 , . . . , xn)‖1 = |x1 |+ · · ·+ |xn |.Sendo assim a proposicao anterior nos assegura a continuidade de T . �

Nota: Veremos oportunamente em que sentido as normas usuais sobre Rn

sao equivalentes.

Um exame superficial da matematica pode dar uma impressao de queela e o resultado de esforcos individuais separados de muitos cientistasespalhados por continentes e epocas diversas. No entanto, a logica in-terna de seu desenvolvimento nos lembra muito mais o trabalho de umunico intelecto, desenvolvendo o seu pensamento sistematico e consis-tentemente, usando a variedade das individualidades humanas somentecomo um meio. Assemelha-se a uma orquestra executando uma sinfoniacomposta por alguem. Um tema passa de um instrumento a outro, equando chegou a hora de um dos participantes abandonar o tema, ele esubstituıdo por outro, que o executa com precisao irrepreensıvel . . .

(I.R. Shafarevich)

278

Page 280: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Caracterizacao de Continuidade Via Conjuntos Abertos

A proxima proposicao caracteriza a continuidade em funcao de abertos.

Proposicao 62. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos. Uma funcaof : M −→ N e contınua se, e somente se, para todo aberto Y ⊂ N tivermosf−1(Y ) aberto em M .

Prova:

(=⇒) Suponha, por hipotese, f contınua e Y ⊂ N aberto. Devemos mostrarque f−1(Y ) e aberto em M . De fato, considere a ∈ f−1(Y ), logo f(a) ∈ Y .Sendo Y aberto, existe ε > 0 tal que B

d2

(f(a); ε

)⊂ Y . Como f e contınua,

para este ε podemos obter δ > 0 de modo que f(B

d1(a; δ)

)⊂ B

d2

(f(a); ε

),

sendo assim (proposicao 134, p. 595),

f(B

d1(a; δ)

)⊂ Y ⇒ B

d1(a; δ) ⊂ f−1(Y ).

Isto prova que f−1(Y ) e aberto.

rδ a(M,d1 )

f−1(Y )

f rεf(a)

(N, d2 )

Y

(⇐=) Reciprocamente, suponha que a imagem inversa, por f , de todo abertoem N seja um aberto em M . Devemos mostrar que f e contınua em M . Defato, se para todo aberto Y ⊂ N tivermos f−1(Y ) aberto em M , entao dadoa ∈ M e ε > 0, tomemos Y = B

d2

(f(a); ε

). Entao f−1(Y ) e aberto. Como

a ∈ f−1(Y ) existe δ > 0 de modo que Bd1(a; δ) ⊂ f−1(Y ). Portanto

Bd1(a; δ) ⊂ f−1(Y ) ⇒ f

(B

d1(a; δ)

)⊂ Y = B

d2

(f(a); ε

).

Como a ∈M foi tomado arbitrariamente, temos f contınua em M .

rδ a(M,d1 )

f−1(Y )

f rεf(a)

(N, d2 )

Y

279

Page 281: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Interregno: Espacos topologicos

A proposicao 62 afirma que para se decidir se uma funcao f : M −→ Ne contınua ou nao basta conhecermos os abertos de M e N . E bem verdadeque − no contexto dos espacos metricos − necessitamos de uma metrica paradecidir se um conjunto e aberto ou nao. O estudo das funcoes contınuas ede grande interesse nao apenas na Analise mas na matematica em geral, daısurgiu a necessidade de se estudar (criar) novos espacos nos quais se abs-trai (dispensa) a nocao de metrica e onde se postula quem sao os abertos doespaco. Essa generalizacao pretendida deve incluir os espacos metricos comoum caso especial o que nos leva a tomar em consideracao as propriedadesdos conjuntos abertos destes espacos, fixadas na proposicao 23 (p. 192).

Os axiomas (postulados) que compoem a definicao de topologia que dare-mos a seguir foram pela primeira vez assim apresentados por Alexandroffe Hopf em 1935 e consagrados, a partir de 1940, pelos trabalhos do grupoBourbaki.

Definicao 34 (Espaco Topologico). Seja E 6= ∅ um conjunto qualquer. Umacolecao T de subconjuntos de E e chamada topologia sobre E se:

(T1) ∅ e E ∈ T ;(T2) Se X1 , X2 , . . . ,Xn ∈ T , entao X1 ∩X2 ∩ · · · ∩Xn ∈ T ;(T3) Se {X

λ}λ∈L

e uma famılia qualquer de conjuntos de T , entao

X =⋃

λ∈LX

λ∈ T .

Nestas condicoes dizemos que o par (E, T ) e um espaco topologico.

Exemplos:

1) Seja (M, d) um espaco metrico. A colecao T dos conjuntos abertosdesse espaco satisfaz os axiomas da definicao de espaco topologico conformeprovamos na proposicao 23 (p. 192).

Essa topologia, T , e conhecida como topologia induzida pela metrica dsobre M .

Um espaco topologico (E, T ) se diz metrizavel se existe uma metrica dsobre E tal que a colecao dos abertos de (E, d) coincide com T .

Duas metricas d1 e d2 sobre um conjunto M sao consideradas equiva-lentes se, e somente se, elas determinam a mesma topologia (colecao deabertos) em M .

2) Dado E 6= ∅, a colecao T = P(E) − de todos os subconjuntos de E −e obviamente uma topologia sobre E. Essa topologia e chamada topologiadiscreta sobre E.

Observe que (E, T ) e metrizavel pois a colecao dos abertos de (E, δ)coincide com P(E). (corol. , p. 193)

280

Page 282: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3) Dado E 6= ∅, a colecao T ={ ∅, E } e uma topologia sobre E.Esta e conhecida como topologia trivial ou caotica sobre E.

Estaremos retornando aos espacos topologicos nos exercıcios.

Retomando, vamos exemplificar a utilizacao da proposicao 62.

Exemplos:

1) Vimos no exemplo 2 (p. 242) que a funcao f : (R, µ) −→ (R, δ) dada porf(x) = x e descontınua em cada ponto do seu domınio. Mostremos isto como auxılio da proposicao 62. Consideremos c ∈ R, temos que { c } e abertoem (R, δ) enquanto (def. 77, p. 593)

f−1(Y ) ={x ∈ A : f(x) ∈ Y

}

={x ∈ R : f(x) ∈ { c }

}= { c }

nao e aberto em (R, µ).

(R,µ)

(R,δ)

rr

c

c

տf−1({c})={c} nao aberto

ց{c} aberto

2) Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos. Seja f : M −→ N qualquerfuncao. Se (M, d1) e discreto entao f e contınua.

De fato, sendo (M, d1) discreto todos os seus subconjuntos sao abertos.Isto e, f−1(Y ) e aberto em (M, d1) para qualquer Y ⊂ N . Isto mostra quef e contınua.

3) Seja f : (R, µ) −→ (R, µ) dada por f(x) =

{

1, se x ∈ Q;

0, caso contrario.

Vamos mostrar que f nao e contınua. (p. 244)

Seja, por exemplo, o aberto Y =]12 ,

32

[, entao

f−1(Y ) ={

x ∈ R : f(x) ∈]1

2,3

2

[ }

= Q

Isto e, a pre-imagem do aberto Y resultou em Q, que nao e aberto. Porconseguinte f nao e contınua.

281

Page 283: Gentil Lopes - Espaços Métricos

4) Seja M = [ 1, 2 ] ∪ { 3 }. Considere f : (M, µ) −→ (R, µ) dada por

f(x) =

{

1, se x ∈ [ 1, 2 ];

2, se x = 3.∴

M

R

0[ ]

q1

q2

1 2 3

r

s

Vamos mostrar que f e contınua em M . Inicialmente observe que

f(x) ∈ { 1, 2 }, ∀x ∈M.

Seja Y ⊂ R um aberto. Temos quatro possibilidades a considerar:

i) 1 6∈ Y e 2 6∈ Y ⇒ f−1(Y ) ={x ∈M : f(x) ∈ Y

}= ∅;

ii) 1 ∈ Y e 2 6∈ Y ⇒ f−1(Y ) = [ 1, 2 ];

iii) 1 6∈ Y e 2 ∈ Y ⇒ f−1(Y ) = { 3 };

iv) 1 ∈ Y e 2 ∈ Y ⇒ f−1(Y ) =M .

Temos que ∅ e M sao abertos, por outro lado

[ 1, 2 ] =M − { 3 } , { 3 } = B(3;

1

2

).

Deste modo a pre-imagem de todo aberto Y ⊂ R e um aberto em M , logof e contınua. (prop. 22, p. 191)

Alguns corolarios da proposicao 62

Corolario 12. Seja f : (M, d) −→ (R, µ) uma funcao real contınua. Oconjunto A = {x ∈M : f(x) > 0 } e aberto.

Prova: Temos que

f−1(] 0, +∞ [

)={x ∈M : f(x) ∈ ] 0, +∞ [

}= A.

Como a pre-imagem de um conjunto aberto por uma funcao contınua e umconjunto aberto, segue que A e aberto. �

Observe que Ac ={x ∈M : f(x) ≤ 0

}e fechado.

282

Page 284: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Corolario 13. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos e f, g : M −→ Nfuncoes contınuas. O conjunto

A ={x ∈M : f(x) 6= g(x)

}

e aberto em M.

Prova: Sendo

f : M −→ N

x 7−→ f(x)

e g : M −→ N

x 7−→ g(x)

funcoes contınuas, segue que a funcao (prop. 57, p. 272)

h : M N ×Nx 7−→ (f(x), g(x))

e contınua. Vamos construir a seguinte funcao auxiliar

M N ×N R

x 7−→(f(x), g(x)

)7−→ d2

(f(x), g(x)

)

h d2

Portanto a funcao auxiliar φ, dada por

φ = d2◦h : M −→ R

x 7−→ d2

(f(x), g(x)

)

e contınua, pois d2 e contınua. (ıtem (ii), p. 261)

Portanto, pelo corolario 12 (p. 282) o conjunto

A ={x ∈M : φ(x) > 0

}={x ∈M : φ(x) = d2

(f(x), g(x)

)> 0

}

={x ∈M : f(x) 6= g(x)

}

e aberto. �

Observacao: Observe que o conjunto

F = Ac =M −A ={x ∈M : f(x) = g(x)

}(6.17)

e fechado. Em particular, tomando g(x) = 0, o conjunto

R ={x ∈M : f(x) = 0

}

das raızes de uma funcao, e fechado.

Como mais uma aplicacao de (6.17) temos o seguinte

283

Page 285: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Corolario 14. Sejam f, g : M −→ N funcoes contınuas. Se f(x) = g(x)para todo ponto x pertencente a um subconjunto X ⊂M entao f(y) = g(y)para todo y ∈ X.

Isto e, se duas funcoes contınuas coincidem em um subconjunto, entaocoincidem tambem no fecho deste mesmo subconjunto.

Prova: De fato, o conjunto dos pontos x ∈ M para os quais f(x) = g(x) efechado e contem X, logo contem o fecho de X. �

Como consequencia deste corolario concluimos que se f, g : M −→ N saocontınuas e coincidem num subconjunto denso X ⊂M entao f = g.

Por exemplo, se f, g : I −→ R sao contınuas em um intervalo I e f(x) =g(x) para todo x ∈ I racional entao f(x) = g(x) para todo x ∈ R.

Como preliminar a demonstracao do proximo corolario faremos as seguintesconsideracoes:

DadosM1 eM2 conjuntos quaisquer, consideremos A1 ⊂M1 e A2 ⊂M2 .Sejam as projecoes

p1 : M1 ×M2 −→M1

(x1 , x2) 7−→ x1

e p2 : M1 ×M2 −→M2

(x1 , x2) 7−→ x2

Temos

p−11

(A1

)={x ∈M1 ×M2 : p1(x) ∈ A1

}

={(x1 , x2) ∈M1 ×M2 : p1

((x1 , x2)

)∈ A1

}

={(x1 , x2) ∈M1 ×M2 : x1 ∈ A1

}

Analogamente

p−12

(A2

)={(x1 , x2) ∈M1 ×M2 : x2 ∈ A2

}

Queremos provar a seguinte identidade

A1 ×A2 = p−11

(A1

)∩ p−1

2

(A2

)

De fato, temos

(x1 , x2) ∈ A1 ×A2 ⇐⇒ x1 ∈ A1 e x2 ∈ A2

⇐⇒ (x1 , x2) ∈ p−11

(A1

)e (x1 , x2) ∈ p−1

2

(A2

)

⇐⇒ (x1 , x2) ∈ p−11

(A1

)∩ p−1

2

(A2

).

O que foi feito aqui para dois conjuntos se estende sem dificuldades paran conjuntos.

Corolario 15. Sejam (M1 , d1) e (M2 , d2) espacos metricos. Entao o pro-duto A1 ×A2 , onde cada Ai ⊂Mi e um conjunto aberto (i = 1, 2.) e abertono espaco produto M1 ×M2 (em qualquer das metricas D

k(k = 1, 2, 3.))

284

Page 286: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: p−11

(A1

)e p−1

2

(A2

)sao conjuntos abertos devido a que as

projecoes sao contınuas; por conseguinte

A1 ×A2 = p−11

(A1

)∩ p−1

2

(A2

)

e aberto por ser a interseccao de dois conjuntos abertos. �

Por inducao o resultado anterior se estende a um numero finito qualquerde conjuntos. Para demonstrar o proximo corolario lembramos a seguinteidentidade (p. 594)

f−1(Ac)=(f−1(A)

)c

Corolario 16. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos. Uma funcaof : M −→ N e contınua se, e somente se, para todo Fechado F ⊂ N tivermosf−1(F ) fechado em M .

Prova:

(=⇒) Suponha, por hipotese, f contınua e F ⊂ N fechado. Devemos mostrarque f−1(F ) e fechado em M .

De fato, sendo F fechado, F c e aberto, logo pela proposicao 62 (p. 279)

f−1(F c) e aberto. Portanto(f−1(F c)

)ce fechado. Por conseguinte

(f−1(F c)

)c=((f−1(F ))c

)c= f−1(F )

e fechado.(⇐=) Reciprocamente, suponha que a imagem inversa, por f , de todofechado em N seja um fechado em M . Devemos mostrar que f e contınuaem M . De fato, considere A ⊂ N um aberto qualquer, entao Ac e fechado.Logo f−1(Ac) e fechado, portanto

(f−1(Ac)

)c=((f−1(A))c

)c= f−1(A)

e aberto, logo f e contınua. �

Corolario 17. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos. Se A e B saosubconjuntos fechados de M tais que M = A∪B e se f : M −→ N e tal queg = f

∣∣A e h = f

∣∣B sao contınuas, entao f tambem e contınua.

Prova: Seja P ⊂ N . Inicialmente mostremos a seguinte identidade

f−1(P ) = g−1(P ) ∪ h−1(P )

A B

g−1(P ) h−1(P )

(M,d1 )

f

h

g

(N, d2 )

P

285

Page 287: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A tıtulo de recordacao temos

f−1(P ) ={x ∈M : f(x) ∈ P

}

g−1(P ) ={x ∈ A : g(x) ∈ P

}

h−1(P ) ={x ∈ B : h(x) ∈ P

}

(⊂)Dado x ∈ f−1(P ) ⇒ x ∈ M = A ∪ B e f(x) ∈ P . Logo x ∈ A e

f(x) ∈ P ou x ∈ B e f(x) ∈ P . Se x ∈ A entao g(x) = f(x) ∈ P ou sex ∈ B entao h(x) = f(x) ∈ P , em qualquer dos casos x ∈ g−1(P ) ∪ h−1(P ).(⊃)Seja x ∈ g−1(P ) ∪ h−1(P ), portanto x ∈ g−1(P ) ou x ∈ h−1(P ) ⇒

x ∈ A e g(x) ∈ P ou x ∈ B e h(x) ∈ P . Se x ∈ A e g(x) ∈ P entao x ∈ Me f(x) = g(x) ∈ P ou se x ∈ B e h(x) ∈ P entao x ∈M e f(x) = h(x) ∈ Pem qualquer dos casos x ∈ f−1(P ).

Pois bem, se P e um subconjunto fechado de N entao pelo corolario 16,g−1(P ) e fechado em (A, d1), e portanto (corol. 3, p. 207) fechado em (M, d1).Analogamente, h−1(P ) e fechado em (M, d1).

Logo f−1(P ) = g−1(P )∪h−1(P ) e fechado em (M, d1). Logo, ainda nosvalendo do corolario 16, concluimos que f e contınua. �

Funcao Aberta

Dada uma aplicacao contınua f : (M, d1) −→ (N, d2) e um subconjuntoaberto A ⊂M , sua imagem direta f

(A)= { f(x) : x ∈ A } ⊂ N nao precisa

ser um conjunto aberto em (N, d2).Por exemplo, considere f : (M, d) −→ (R, µ) onde (M, d) e discreto;

entao todo subconjunto A ⊂M e aberto e f e contınua (prop. 51, p. 250). Emparticular

f({ a }

)={f(x) : x ∈ { a }

}={f(a)

}

nao e um conjunto aberto em (R, µ).

Definicao 35 (funcao aberta). Uma aplicacao f : (M, d1) −→ (N, d2)chama-se aberta quando para cada A ⊂ M aberto, sua imagem f

(A)e

um subconjunto aberto de (N, d2). Isto e, quando f transforma abertos emabertos.

Vimos que uma aplicacao contınua nao precisa ser aberta. Tambemuma aplicacao aberta nao precisa ser contınua. Por exemplo, consideref : (R, µ) −→ (R, δ) dada por f(x) = x, f e aberta∗ mas nao e contınua†.

O nosso objetivo agora sera mostrar que as funcoes projecao:

pi : M1 × . . .×Mn −→Mi

(x1 ,... , xi , ..., xn) 7−→ xi

sao abertas (i = 1, 2, . . . , n).

∗Exemplo 3), p. 189.†Exemplo 2), p. 242.

286

Page 288: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Das tres metricas usuais para o produto cartesiano trabalharemoscom a D3 , ja que, como sera demonstrado oportunamente (prop. 68, p. 319), osabertos de M = M1 × · · · ×Mn relativos a essas metricas sao os mesmos.Consideremos q = (q1 , . . . , qi , . . . , qn) ∈ M = M1 × · · · ×Mi × · · · ×Mn .Vamos mostrar inicialmente que

pi

(B

D3(q; r)

)= Bdi (qi ; r) (i = 1, . . . , n)

onde (prop. 4, p. 124)

BD3(q; r) = Bd1(q1 ; r)× · · · ×Bdi (qi ; r)× · · · ×Bdn (qn ; r)

eBdi (qi ; r) =

{xi ∈Mi : di(xi , qi) < r

}

Pois bem,

pi

(B

D3(q; r)

)={pi(x) : x ∈ BD3

(q; r)}

={pi

((x1 , . . . , xi , . . . , xn)

): (x1 , . . . , xi , . . . , xn) ∈ BD3

(q; r)}

={xi : D3

((x1 , . . . , xi , . . . , xn), (q1 , . . . , qi , . . . , qn)

)< r

}

={xi : di(xi , qi) < r, (i = 1, . . . , n)

}

= Bdi(qi ; r) (i = 1, . . . , n).

Sejam A ⊂M aberto e

qi ∈ pi(A) = { pi(x) : x ∈ A }

={pi

((x1 , . . . , xi , . . . , xn)

): (x1 , . . . , xi , . . . , xn) ∈ A

}

= {xi : (x1 , . . . , xi , . . . , xn) ∈ A }pi

(A)e o conjunto das i−esimas coordenadas dos pontos (x1 , . . . , xn) ∈ A.

Pois bem, como qi ∈ pi

(A), existe q = (q1 , . . . , qi , . . . , qn) ∈ A tal que

pi(q) = qi . Como A e aberto, existe r > 0 tal que BD3(q; r) ⊂ A.

Pela proposicao 132 (a) (p. 592), temos

BD3(q; r) ⊂ A ⇒ pi

(B

D3(q; r)

)⊂ pi(A)

⇒ Bdi (qi ; r) ⊂ pi(A)

e assim qi resulta ponto interior de pi(A), por conseguinte, pi(A) e abertoem (Mi , di). Portanto pi (i = 1, . . . , n) e uma funcao aberta. �

A

(M,D3)

r q pi

pi(A)

s� qi = pi(q)

(Mi , di )

287

Page 289: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6.3 Continuidade UniformeVamos lembrar o que significa dizer que uma funcao f : (M, d1) −→

(M, d2) seja contınua em todo o seu domınio. f e contınua em um pontoarbitrario y ∈ M quando: qualquer que seja ε > 0 dado, pudermos obterδ > 0 tal que x ∈ M , d1(x, y) < δ ⇒ d2(f(x), f(y)) < ε. Isto podetraduzir-se pela formula:

∀ ∀ ∃ ∀ε>0 y∈M δ>0 x∈M

(

x ∈ Bd1(y; δ) ⇒ f(x) ∈ B

d2

(f(y); ε

))

Ou, de outro modo:

∀ ∀ ∃ ∀ε>0 y∈M δ>0 x∈M

(d1(x, y) < δ ⇒ d2

(f(x), f(y)

)< ε)

Quando se tenta provar que uma dada funcao e contınua em um ponto apodem ocorrer quatro situacoes quanto a dependencia do δ procurado comrespeito ao ponto a no qual se analisa a continuidade e ao ε fornecido, veja:

δ = constante, δ = δ(ε), δ = δ(a), δ = δ(ε, a).

Ou seja: o δ pode ser constante; isto e, nao depender nem do ponto a enem do ε fornecido. No segundo caso, o δ procurado depende apenas do εfornecido e nao do particular ponto no qual se analisa a continuidade. Noterceiro caso ocorre a situacao contraria, o δ depende apenas do ponto a enao do ε fornecido. No quarto caso o δ encontrado depende de ambos.

As funcoes contınuas para as quais o δ encontrado nao depende do par-ticular ponto a onde se analisa a continuidade, gozam de certas propriedadesnao partilhadas por funcoes contınuas em geral; daı a necessidade de isolar-mos estas funcoes para estudos. E o que faremos agora atraves da seguinte

Definicao 36 (Continuidade uniforme). Sejam (M, d1) e (N, d2) espacosmetricos. Diz-se que uma aplicacao f : M −→ N e uniformemente contınuaquando, para todo ε > 0 dado arbitrariamente, pudermos exibir δ(ε) > 0 :

∀x, y ∈M, d1(x, y) < δ(ε) ⇒ d2

(f(x), f(y)

)< ε

A seguir escrevemos a definicao de continuidade uniforme juntamentecom sua negacao:

∀ε>0

∃δ>0

∀y∈M

∀x∈M

(d1(x, y) < δ ⇒ d2(f(x), f(y)) < ε

)

∃ε>0

∀δ>0

∃y∈M

∃x∈M

(d1(x, y) < δ ∧ d2(f(x), f(y)) ≥ ε

)

Comparando as duas continuidades temos:

288

Page 290: Gentil Lopes - Espaços Métricos

continuidade

∀ ∀ ∃ ∀ε>0 y∈M δ>0 x∈M

δ= δ(ε, y)

(d1(x, y) < δ ⇒ d2(f(x), f(y)) < ε

)

continuidade uniforme

∀ ∀∃ ∀ε>0 y∈Mδ>0 x∈M

δ = δ(ε)

(d1(x, y) < δ ⇒ d2(f(x), f(y)) < ε

)

Observe que a segunda formula “so” difere da primeira pela troca daposicao de dois quantificadores.

Proposicao 63. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos. Toda aplicacaolipschitziana e uniformemente contınua.

Prova: De fato, sendo: (p. 258)

d2(f(x), f(y)) ≤ c d1(x, y) para quaisquer x, y ∈Mentao dado ε > 0, tomamos δ(ε) = ε

c . Logo se

d1(x, y) < δ =ε

c⇒ c d1(x, y) < ε ⇒ d2(f(x), f(y)) ≤ c d1(x, y) < ε.

Em particular, sao uniformemente contınuas (p.’s 258-261): As homotetias,as funcoes reais com derivadas limitadas em um intervalo, as projecoes, ascontracoes.

Proposicao 64. Se f : (M, d1) −→ (N, d2) e g : (N, d2) −→ (P, d3) saoaplicacoes uniformemente contınuas entao g ◦ f : (M, d1) −→ (P, d3) etambem uniformemente contınua.

Prova: Dado ε > 0, sendo g uniformemente contınua existe δ′ > 0 :

∀ z, t ∈ N ; d2(z, t) < δ′ ⇒ d3

(g(z), g(t)

)< ε (6.18)

Como f e tambem uniformemente contınua, para este δ′ existe δ > 0 tal que

∀x, y ∈M ; d1(x, y) < δ ⇒ d2

(f(x), f(y)

)< δ′ (6.19)

De (6.18) e (6.19) concluimos que

∀x, y ∈M ; d1(x, y) < δ ⇒ d3

(g(f(x)), g(f(y))

)< ε

isto ed3

(g(f(x)), g(f(y))

)= d3

((g ◦ f)(x), (g ◦ f)(y)

)< ε

x

y

d1 (x, y)<δ

(M,d1 )

f

g◦f

f(x)

f(y)

d2 (f(x), f(y))<δ′

(N, d2 )

ggf(x)

gf(y)

d3 (gf(x), gf(y))<ε

(P, d3 )

289

Page 291: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 65. A aplicacao f : M −→ N1 ×N2 × · · · ×Nn definida porf(x) =

(f1(x), f2(x), . . . , fn(x)

), ∀x ∈M , e uniformemente contınua se, e

somente se, suas coordenadas f1 : M −→ N1 , . . . , fn : M −→ Nn sao uni-formemente contınuas.

Prova:

(=⇒) Vamos nos valer das funcoes projecoes

p1◦ f(x) = p1

(f1(x), f2(x), . . . , fn(x)

)= f1(x) ⇒ p1◦f = f1

· · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·pn ◦ f(x) = pn

(f1(x), f2(x), . . . , fn(x)

)= fn(x) ⇒ pn ◦f = fn .

Como f e cada projecao pi sao uniformemente contınuas, segue que cadafuncao coordenada fi tambem e uniformemente contınua.(⇐=) Para provar a recıproca usaremos em N1 ×N2 × · · · ×Nn a metrica

D3(x, y) = max{d1(x1 , y1), d2(x2 , y2), . . . , dn(xn , yn)

}

Suponha que cada fi e uniformemente contınua. Dado ε > 0 existe paracada ındice i = 1, 2, . . . , n um numero δi > 0 de modo que

∀x, y ∈M ; dM(x, a) < δi ⇒ di

(fi(x), fi(a)

)< ε.

Pondo δ = min{ δ1 , δ2 , . . . , δn }, temos

∀x, y ∈M ; dM(x, a) < δ ⇒

d1

(f1(x), f1(a)

)< ε

· · · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·dn

(fn(x), fn(a)

)< ε

Sendo assim, temos

∀x, y ∈M ; dM(x, a) < δ ⇒ max

{d1

(f1(x), f1(a)

), . . . , dn

(fn(x), fn(a)

)}< ε

⇒ D3

(f(x), f(a)

)< ε.

Proposicao 66. Seja (M, d) um espaco metrico e(E, +, ·

)um espaco ve-

torial normado. Se f, g : M −→ E sao aplicacoes uniformemente contınuasentao f + g : −→ E e tambem uniformemente contınua.

Prova: Exercıcio.

Nota: O produto de funcoes uniformemente contınuas pode nao ser uni-formemente contınuo. Por exemplo, a aplicacao f : (R, µ) −→ (R, µ) dadapor f(x) = x e uniformemente contınua, mas g : (R, µ) −→ (R, µ) dada porg(x) = f(x) · f(x) = x2 nao o e, conforme sera visto.

Toda funcao uniformemente contınua e contınua (prove isto!); mas arecıproca e falsa como veremos agora:

290

Page 292: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) A funcao f : (R, µ) −→ (R, µ) definida por f(x) = x2 e contınua(produto de funcoes contınuas). Mostraremos que f nao e uniformementecontınua.

Para mostrar que f nao e uniformemente contınua devemos exibir umε > 0 tal que, para todo δ > 0 possamos encontrar dois pontos x e y :

|x− y| < δ e |f(x)− f(y)| ≥ εTomemos qualquer ε ≤ 2. Dado δ > 0, pela propriedade arquimedianaexiste n ∈ N tal que 1

n < δ. Utilizando este n facamos x = n e y = n + 1n .

Entao |x− y| = 1n < δ e, no entanto

|f(x)− f(y)| =∣∣∣n2 −

(n+

1

n

)2∣∣∣ = 2 +

1

n2> ε

Veja a estenografia:

∃ε>0

∀δ>0

∃y∈M

∃x∈M

(d1(x, y) < δ ∧ d2(f(x), f(y)) ≥ ε

)

ε0 ≤ 2

yδ=n+ 1

n

xδ=n

|xδ− y

δ|<δ

|f(xδ)− f(y

δ)| ≥ ε0

Veja a geometria:

0x

f(x)

nn+ 1

n

|x−y|= 1n<δ

|f(x)−f(y)|=2+ 1n2 >ε

ց

x

Nota: f e localmente lipschitziana (p. 262), isto implica que em cada pontoa ∈ R existe uma bola ] a − r, a + r [ tal que a restricao de f a essa bola euniformemente contınua. Consideremos ainda f(x) = x2 desta vez sobre odomınio [ 0, b ], onde b e qualquer numero positivo. Dado ε > 0 escolhamosδ = ε/2b. Entao se x, y ∈ [ 0, b ] e |x− y| < δ, temos

∣∣f(x)− f(y)

∣∣ = |x2 − y2| = |x+ y| · |x− y|

≤ 2b |x− y| < 2b δ = ε.

291

Page 293: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Sendo assim f(x) = x2 e uniformmente contınua sobre [ 0, b ]. Este e umcaso especial da proposicao 119, pg. 503.

O exemplo acima mostra a dependencia da continuidade uniforme comrespeito ao domınio da funcao.

2) A funcao f : (R∗, µ) −→ (R, µ) definida por f(x) = sen ( 1x) e contınua elimitada, mas nao e uniformemente contınua. Para mostrar que f e contınuaconsideremos as funcoes g e h

g : R −→ R

x 7−→ senx

e h : R∗ −→ R

x 7−→ 1/x

compondo estas duas funcoes, temos

R∗ −→ R −→ R

x 7−→ 1x 7−→ sen ( 1x)

h g

Isto ef = g◦h : R∗ −→ R

x 7−→ sen ( 1x)

e contınua. Para mostrar que f nao e uniformemente contınua devemosexibir um ε > 0 tal que, para todo δ > 0 possamos encontrar dois pontos xe y tais que

|x− y| < δ e |f(x)− f(y)| ≥ εTomemos qualquer ε ≤ 2. Dado δ > 0, pela propriedade arquimediana

existe n ∈ N tal que

1

n< δ ⇒ 1

2n< δ ⇒ 1

12 + 2n

< δ

⇒ 1(32 + 2n

)·(12 + 2n

) < δ.

Utilizando o n de Arquimedes facamos

x =1

3π2 + 2nπ

e y =1

π2 + 2nπ

Entao

|x− y| =∣∣∣

13π2 + 2nπ

− 1π2 + 2nπ

∣∣∣ =

1(32 + 2n

)·(12 + 2n

) < δ

e, no entanto

|f(x)− f(y)| =∣∣∣ sen

(3π

2+ 2nπ

)− sen

2+ 2nπ

)∣∣∣ = | − 1− 1| = 2 ≥ ε.

292

Page 294: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Veja a estenografia:

∃ε>0

∀δ>0

∃y∈M

∃x∈M

(d1(x, y) < δ ∧ d2(f(x), f(y)) ≥ ε

)

ε0 ≤ 2

yδ= 1

π2 +2nπ

xδ= 1

3π2 +2nπ

|xδ− y

δ|<δ

|f(xδ)− f(y

δ)| ≥ ε0

• Agora daremos um exemplo de funcao uniformemente contınua masnao lipschitziana. Trata-se da funcao

f :([0,+∞[, µ

)−→

([0,+∞[, µ

)definida por f(x) =

√x.

Para mostrar que f e uniformemente contınua, para todo ε > 0 dadodevemos exibir δ(ε) > 0 tal que

|x− y| < δ(ε) ⇒∣∣√x−√y

∣∣ < ε

Antes vamos tabelecer uma desigualdade auxiliar: para a, b ≥ 0, temos

a+ b ≥ a− b e a+ b ≥ −(a− b) ⇒ |a+ b| ≥ |a− b|.portanto

∣∣√x−√y

∣∣ ≤

∣∣√x+√y∣∣ , ∀x, y ≥ 0, logo

∣∣√x−√y

∣∣ ·∣∣√x−√y

∣∣ ≤

∣∣√x−√y

∣∣ ·∣∣√x+√y∣∣

⇒∣∣√x−√y

∣∣2 ≤ |x− y|

⇒∣∣√x−√y

∣∣ ≤

|x− y|Entao, tomando δ(ε) = ε2, temos

|x− y| < δ = ε2 ⇒ ε =√ε2 >

|x− y| ≥∣∣√x−√y

∣∣

⇒∣∣√x−√y

∣∣ < ε.

Agora vamos mostrar que f nao e de Lipschitz. Para tanto (p. 258)

devemos provar que para qualquer c > 0, existem x, y ∈ [ 0, +∞ [, x 6= y,tal que

∣∣√x−√y

∣∣ > c |x− y|

sendo ∣∣√x−√y

∣∣

|x− y| =

∣∣√x−√y

∣∣

∣∣√x−√y

∣∣ ·∣∣√x+√y∣∣=

1√x+√y

basta tomar, por exemplo, x = 116c2

e y = 14c2

; posto que

1√x+√y=

1√

116c2

+√

14c2

=4c

3> c

293

Page 295: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6.4 Homeomorfismos − Espacos Homeomorfos

Na algebra, se existe uma bijecao entre dois grupos (G, ∗) e (J,△) quepreserva as operacoes, entao estes grupos sao ditos isomorfos e sao indis-tinguıveis sob o ponto de vista algebrico.

De modo analogo, em topologia se existe uma bijecao entre dois espacos(M, d1) e (N, d2) que preserva os abertos (isto e, abertos sao tranformadosem abertos), entao estes espacos sao ditos homeomorfos (ou topologicamenteequivalentes) e sao indistinguıveis sob o ponto de vista da topologia.

Vamos tornar estas consideracoes mais precisas: Inicialmente chamamosa atencao do leitor para o fato de que em topologia podemos ter uma bijecaocontınua, por exemplo a identidade: (prop. 51, p. 250)

i : (R, δ) −→ (R, µ)

x 7−→ x

cuja inversa (a qual tambem e a identidade) (ex. 2, p. 242)

i−1 : (R, µ) −→ (R, δ)

x 7−→ x

seja descontınua. Veja tambem o exemplo 3. (p. 243)

Vejamos um exemplo classico de bijecao contınua cuja inversa e des-contınua. Consideremos os subespacos ([ 0, 2π [, µ) de (R, µ) e (S1, D1)de (R2, D1), onde S

1 ={(x, y) ∈ R2 : x2 + y2 = 1

}e o cırculo unitario.

Consideremos a aplicacao

f : [ 0, 2π [−→ S1

t 7−→ (cos t, sin t)

f e contınua, pois suas cordenadas sao contınuas. Da trigonometria sabe-seque f e bijetiva. De forma sugestiva podemos dizer que f consiste em enrolar(em sentido anti-horario) o segmento [ 0, 2π [ sobre o cırculo unitario. P. ex.

f(t) = (cos t, sin t) ⇒

f(0) = (cos 0, sin 0) = (1, 0)

f(π2 ) = (cos π2 , sinπ2 ) = (0, 1)

[0 2π

f

(1, 0)

(0, 1)S1

294

Page 296: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vamos mostrar que f−1 e descontınua no ponto (1, 0) ∈ S1. Para istofaremos uso da proposicao 55 (p. 268). Considere a sequencia (sn) dada por

sn =(

cos(2π − 1

n

), sen

(2π − 1

n

))

Observe que (sn) e uma sequencia de pontos de S1, pois

cos2(2π − 1

n

)+ sen 2

(2π − 1

n

)= 1

E ainda: sn → (cos 2π, sen 2π) = (1, 0). Por outro lado

f−1(sn) = 2π − 1

n6→ 0 = f−1(1, 0)

Veja a geometria:

S1

r↑s1

r↑s2

rrrr(1, 0)f−1

[0 2πտr

f−1(1, 0)

rf−1(s1)

րrցf−1(s2) rrr

Definicao 37 (Homeomorfismo). Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos.Dizemos que uma aplicacao f : M −→ N e um homeomorfismo do espaco(M, d1) no espaco (N, d2) se, e somente se,

(a) f e bijetora;

(b) f e sua inversa f−1 sao ambas contınuas.

De imediato concluimos, respaldados na proposicao 62 (p. 279), que se fe um homeomorfismo entao todo aberto A ⊂ N e transformado por

f : (M, d1) −→ (N, d2)

em um aberto de M .

Reciprocamente, todo aberto A ⊂M e transformado por

f−1 : (N, d2) −→ (M, d1)

em um aberto de N . Dizemos entao que o homeomorfismo preserva (naodestroi) os conjuntos abertos destes espacos.

295

Page 297: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicao 38 (Espacos Homeomorfos). Dois espacos metricos (M, d1) e(N, d2) dizem-se homeomorfos ou topologicamente equivalentes se existe umhomeomorfismo f : M −→ N .

Exemplos:

1) A inversa de toda isometria e uma isometria, portanto toda isometria eum homeomorfismo; mas a recıproca e falsa, e o caso do exemplo a seguir:

2) Os espacos (R, µ) e(] − 1, 1 [, µ

)sao homeomorfos, pois

f : R −→ ] − 1, 1 [

x 7−→ x1+|x|

e f−1 : ] − 1, 1 [−→ R

x 7−→ x1−|x|

sao contınuas (a cargo do leitor). Observe,

0x

f(x)

1

−1

0x

f−1(x)

−1 1

e facil ver que f nao e isometria.

3)Provamos anteriormente que a aplicacao entre o intervalo [ 0, 2π [ e ocırculo unitario S1 dada por

f : [ 0, 2π [−→ S1

t 7−→ (cos t, sin t)

nao e um homeomorfismo. Agora vamos provar “o contrario”, que e simum homeomorfismo. Mais precisamente, a aplicacao dada por

f : ([ 0, 2π [, k) −→ (S1, D1)

t 7−→ (cos t, sin t)

e um homeomorfismo. Onde: k(x, y) = min{|x − y|, 2π − |x − y|

}, e uma

metrica em [ 0, 2π [, como o leitor pode conferir seguindo os passos da provadada para a metrica quantica. (p. 64)

296

Page 298: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Inicialmente observe que a sequencia contraexemplo dada anteriormente:

sn =(

cos(2π − 1

n

), sen

(2π − 1

n

))

no presente caso nao se aplica (digo, nao serve como contraexemplo), postoque: sn → (cos 2π, sen 2π) = (1, 0) e f−1(sn) = 2π − 1

n → 0 = f−1(1, 0).

S1

r↑s1

r↑s2

rrrr(1, 0)f−1

[0 2πտr

f−1(1, 0)

rf−1(s1)

րrցf−1(s2) rrr

Vamos provar que f−1 e contınua no ponto (1, 0) − a prova de que econtınua nos demais pontos do cırculo e deixada ao leitor.

Inicialmente exibimos a seguinte expressao para f−1 :

f−1(x, y) =

cos−1 x, se x ≥ 0, y ≥ 0;

sen−1 y + 2π, se x ≥ 0, y < 0.

Onde: cos−1 x = arc cos x e sen−1 x = arc senx. Exibimos a expressaopara f−1 (o leitor esta convidado a confirma-la) restrita apenas ao primeiroe quarto quadrantes − o suficiente para os nossos propositos.

Faremos uso da proposicao 54 (p. 268). Seja entao((xn , yn)

)uma

sequencia de pontos do cırculo tal que (xn , yn) → (1, 0). Pela proposicao14 (p. 157):

(xn , yn) → (1, 0) ⇐⇒ =⇒D1

µxn → 1

µyn → 0

µxn → 1−

µyn → 0−

−π2

π2

−1 1x

arc sen xπ

−1 0 1x

arc cos x

297

Page 299: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Entao

limkf−1(xn , yn) =

limk

cos−1(xn), se xn ≥ 0, yn ≥ 0;

limk

sen−1(yn) + 2π, se xn ≥ 0, yn < 0.(6.20)

Temos

xn → 1− ⇒ limµ

cos−1 (xn) = cos−1( limµxn) = cos−1(1−) = 0

µ

Na primeira igualdade acima estamos levando em conta que a funcao arccose contınua em todos os pontos do seu domınio, o que significa que podemosfazer uso da identidade (6.14) (p. 267).

Analogamente,

yn → 0− ⇒ limµ

(sen−1 (yn) + 2π

)= sen−1 (lim

µyn) + 2π → 2π

µ

Mais precisamente: limµ

(sen−1 (yn) + 2π

)→ 2π−.

Agora Faremos uso dos seguintes lemas: (ver analogos, p. 425)

Lema 3. Considere (xn) tal que 0 ≤ xn < 2π. Se (xn) converge para 2π noespaco

([ 0, 2π ], µ

), entao (xn) converge para 0 no espaco

([ 0, 2π [, k

).

Lema 4. Toda sequencia (xn) (0 ≤ xn < 2π) que converge para o pontop (0 ≤ p < 2π) no espaco

([ 0, 2π ], µ

), converge para o mesmo ponto no

espaco([ 0, 2π [, k

).

Sendo assim a equacao (6.20), fica:

limkf−1(xn , yn) =

0, se xn ≥ 0, yn ≥ 0;

0, se xn ≥ 0, yn < 0.

Conclusao: lim f−1(xn , yn) = 0 = f−1(1, 0). O que prova que f−1 econtınua no ponto (1, 0) ∈ S1.

Propriedades topologicas

Uma propriedade P , de conjuntos, e chamada topologica ou invariantetopologico se, sempre que um espaco metrico (M, d) goza de P , entao todoespaco homeomorfo a (M, d) tambem goza de P .

A Topologia e um ramo da geometria que lida apenas com as propriedadestopologicas de figuras (conjuntos de pontos).

Se P e uma propriedade topologica e sendo toda isometria um homeo-morfismo, entao P e preservada por isometrias; logo, toda propriedadetopologica e tambem uma propriedade metrica − que sao aquelas preser-vadas por isometrias − mas a recıproca nao se verifica, como veremos.

298

Page 300: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Como vimos no exemplo anterior a reta real R e homeomorfa ao intervaloaberto X = ] − 1, 1 [. Entao, “diametro” nao e um invariante topologico,pois X e R tem diametros diferentes. Tambem a propriedade de ser limitadonao e uma propriedade topologica, pois X e limitado enquanto R nao o e.

Temos um outro exemplo desta situacao ao considerarmos os conjuntos

N = { 1, 2, . . . , n, . . . } e M ={1,

1

2, . . . ,

1

n, . . .

}

ambos com a metrica µ. A aplicacao,

f : N −→Mn 7−→ 1

n

e um homeomorfismo, pois e uma bijecao e ambos os espacos (N, µ) e (M, µ)sao discretos; isto e f e f−1 sao contınuas; mas enquanto M e limitado, Nnao o e.

Mostraremos agora que ser discreto e uma propriedade topologica (por-tanto, metrica).

Seja f : (M, d1) −→ (N, d2) um homeomorfismo. Se (N, d2) e discretoentao (M, d1) tambem o e.

Com efeito, fixado arbitrariamente um ponto a ∈M ; sendo (N, d2) dis-creto entao f(a) e isolado, o que implica na existencia de um ε = ε

f(a)> 0 tal

que a bola Bd2(f(a); ε) = { f(a) } se reduz ao seu centro. Sendo f contınua,

existe δ = δ(ε, a) > 0 tal que se

x ∈ Bd1(a; δ) ⇒ f(x) ∈ B

d2(f(a); ε) = { f(a) },

e como f e injetiva conclui-se que na bola Bd1(a; δ) so existe o seu proprio

centro, isto e, Bd1(a; δ) = { a }. Com isto mostramos que a ∈ M e isolado;

como a foi tomado arbitrariamente segue que (M, d1) e discreto.• A estrutura topologica de um espaco metrico e determinada pela colecao

dos abertos desse espaco. Isto se deve a proposicao 23, p. 192.

4) Homeomorfismo entre bolas:

Duas bolas quaisquer em um espaco vetorial normado sao homeomorfas.Dadas duas bolas B(a; r) e B(b; s) em um espaco vetorial (E, +, ·),

normado, vamos mostrar que existe um homeomorfismo entre elas.

A aplicacao,

ϕ : E −→ E

x 7−→ b+ sr (x− a)

isto e, ϕ(x) = b + sr (x − a), e contınua por ser a composta das funcoes

contınuas: translacao, homotetia e translacao.

299

Page 301: Gentil Lopes - Espaços Métricos

E E E ET−a

h sr Tb

x 7−→ x− a 7−→ sr (x− a) 7−→ b+ s

r (x− a)

isto e

ϕ = Tb◦ h s

r◦ T−a

E injetiva, pois

ϕ(x) = ϕ(y) ⇒ b+s

r(x− a) = b+

s

r(y − a) ⇒ x = y

e sobrejetiva, pois dado y ∈ E, existe x ∈ E de modo que ϕ(x) = y:

ϕ(x) = b+s

r(x− a) = y ⇒ x = a+

r

s(y − b)

Observe que para este x, temos

ϕ(x) = b+s

r

((a+

r

s(y − b)

)− a)

= y

A inversa de ϕ e dada por

ϕ−1(x) = a+r

s(x− b)

que tambem e contınua, por ser composta por funcoes contınuas. Com istoprovamos que ϕ : E −→ E e um homeomorfismo.

Para mostrar que a restricao (corol. 9, p. 271)

ϕ′ = ϕ∣∣∣B(a; r)

: B(a; r) −→ B(b; s)

e um homeomorfismo e suficiente mostrar que e sobrejetiva; isto e, que dadoy ∈ B(b; s) existe x ∈ B(a; r) de modo que ϕ′(x) = y. Para tanto bastamostrar que x = a+ r

s(y− b) ∈ B(a; r), isto e que ‖x− a‖ < r. Com efeito,

‖x− a‖ =∥∥∥

((a+

r

s(y − b)

))

− a∥∥∥ =

r

s‖y − b‖

como

y ∈ B(b; s) ⇒ ‖y − b‖ < s ⇒ r

s‖y − b‖ < r

s· s ⇒ ‖x− a‖ < r.

O diametro de um conjunto e um invariante metrico − se mantem inal-terado por isometrias. Com a demonstracao anterior mais uma vez cons-tatamos que o diametro de um conjunto nao e um invariante topologico.

A transformacao∗,

ϕ : B(a; r) −→ B(b; s)

∗Voltamos a usar a notacao ϕ.

300

Page 302: Gentil Lopes - Espaços Métricos

transforma a primeira bola na segunda. De fato, ela pode ser desdobrada:

B(a; r) B(0; r) B(0; s) B(b; s)T−a

h sr Tb

x 7−→ x− a 7−→ sr (x− a) 7−→ b+ s

r (x− a)

Onde:

i) A transformacao T−a translada a bola B(a; r) para a origem;

ii) a transformacao hsr“expande” (caso r

s > 1) ou “contrai” (caso rs < 1)

a bola B(0; r) de modo que esta fique com o raio s;

iii) a transformacao Tb superpoe (via translacao) a bola B(0; s) a bolaB(b; s).

Exemplos:

1o) No espaco(R, | · |

)o homeomosfismo entre as bolas,

B(a; r) = Bµ(0; 1) = ] − 1, 1 [ e B(b; s) = Bµ(4; 2) = ] 2, 6 [

e dado por,

ϕ(x) = b+s

r(x− a)

= 4 +2

1(x− 0) = 2x+ 4

por exemplo, ϕ(12 ) = 2 · 12 + 4 = 5. No grafico fica assim,

] [−1

01

R

R

←− ϕ=2x+4

q1

2

q3

q4

q5

6

]

]

301

Page 303: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2o) No espaco(R2, ‖ · ‖

)o homeomosfismo entre as bolas,

B(a; r) = B((1, 1);

1

2

)e B(b; s) = B

((3, 2);

3

2

)(6.21)

e dado por,

ϕ(x) = b+s

r(x− a)

= (3, 2) +3212

(x− (1, 1)

)

Ou ainda,

ϕ((x, y)

)= (3, 2) + 3

((x, y)− (1, 1)

)

= (3x, 3y − 1)

A aplicacao ϕ transforma continuamente a primeira bola dada em (6.21)na segunda, assim: Na norma euclidiana, temos

R

R

q0

−→ϕ

q1

q1

q2

q2

R

R

r

0 q1

q1

q2

q2

q3 q4

q3

Na norma da soma, temos

R

R

q0

−→ϕ

q1

q1

q2

q2

R

R

r

0 q1

q1

q2

q2

q3 q4

q3

302

Page 304: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Na norma do maximo, temos

R

R

q0

−→ϕ

q1

q1

q2

q2

R

R

r

0 q1

q1

q2

q2

q3 q4

q3

Observe que a aplicacao ϕ−1 transforma continuamente a segunda boladada em (6.21) na primeira.

Em um espaco metrico arbitrario, duas bolas abertas podem nao serhomeomorfas. Por exemplo, tomemos

M ={

1,1

2, . . . ,

1

n, . . .

}

∪ { 0 }

com a metrica µ induzida da reta. Por exemplo, as bolas

Bµ(1;1

2) =

]

1− 1

2, 1 +

1

2

[

∩ M = { 1 } e Bµ(0; s) = ] 0− s, 0 + s [ ∩M

nao sao homeomorfas qualquer que seja s > 0, pois nao pode existir umabijecao entre um conjunto unitario e um conjunto infinito.

q qqqqqqqqqqqqqqqqqqqqqqqqqqqqqq0 11

213

14

15

... տBµ (1;

12)= { 1 }Bµ (0; s)= ]−s, s [ ∩M

] [↑⇀s

M

Nota: Observe, an passant, que a funcao modulo | · | : R −→ R e umanorma sobre o espaco vetorial (R, |·| ) enquanto que a mesma funcao restritaa M nao e uma norma sobre o par (M, | · |). De fato, M nao e um espacovetorial e norma so esta definida em espacos vetoriais. Estamos tentandodizer que nem sempre o modulo e uma norma, isto e, sao conceitos distintos.

(M, | · |) e um espaco metrico (ou um subespaco de (R, µ), como queira),mas nao normado, isto e sua metrica nao provem de uma norma.

Um outro exemplo de bolas abertas nao homeomorfas, temos nas bolasdadas por B

δ(0; 1) = { 0 } e B

δ(0; 2) = R no espaco (R, δ).

303

Page 305: Gentil Lopes - Espaços Métricos

5) Num espaco vetorial(E, +, ·

)normado, qualquer bola aberta e homeo-

morfa ao espaco inteiro. Este caso generaliza o exemplo 2 (p. 296). Tendoem conta que duas bolas quaisquer sao homeomorfas, e suficiente exibir umhomeomorfismo f : E −→ B(0; 1), onde aqui o homeomorfismo e seu inversosao dados por

f(x) =x

1 + ‖x‖ e f−1(x) =x

1− ‖x‖

5.1) Do exemplo anterior decorre que todo intervalo aberto limitado ] a, b [e homeomorfo ao espaco (R, µ) uma vez que neste espaco o intervalo ] a, b [e a bola aberta de centro no seu ponto medio e raio r = (b− a)/2 > 0.

Com efeito,

(a+ b

2; r)=]a+ b

2− r, a+ b

2+ r[

=]a+ b

2− b− a

2,a+ b

2+b− a2

[= ] a, b [.

5.2) Na verdade todo intervalo aberto da reta e homeomorfo a R. Defato, se o intervalo for do tipo ] a, +∞ [, podemos considerar o seguintehomeomorfismo,

f : R −→ ] a, +∞ [

x 7−→ y = a+ ex

e f−1 : ] a, +∞ [ −→ R

x 7−→ y = ln(x− a)

A seguir plotamos os graficos de f e f−1.

0R

] a,+∞ [f(x)= a+ex

a]

0

R

] a,+∞ [

f−1(x)= ln(x−a)

a]

304

Page 306: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Se o intervalo for do tipo ] − ∞, b [, podemos considerar o seguinte ohomeomorfismo

f : R −→ ] −∞, b [x 7−→ y = b− e−x

e f−1 : ] −∞, b [ −→ R

x 7−→ y = − ln(b− x)A seguir plotamos os graficos de f e f−1.

0R

]−∞, b [

f(x)= b−e−x

b ]

0

R

]−∞, b [

f−1(x) =− ln(b−x)

b[

6) Projecao estereografica. Sejam

S1 = { (x, y) ∈ R2 : x2 + y2 = 1 } e p = (0, 1).

Consideremos os seguintes subespacos,

(S1 − { p }, D1

)e (R× { 0 }, D1) de

(R2, D1

)

Vamos agora construir um homeomorfismo entre estes subespacos.A projecao estereografica: π : S1 − { p } −→ R × { 0 } e a aplicacao que

associa a cada ponto q = (xc , yc) ∈ S1 − { p } o ponto π(q) ∈ R × { 0 },obtido pela intersecao da semi-reta que liga p a q, com o eixo dos x.

R×{ 0 }(r)

S1

p

q

↑π(q)

s s

305

Page 307: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Para determinar analiticamente o ponto π(q) = (?, 0) devemos encontrara equacao da reta (r) que passa por p = (0, 1) e q = (xc , yc):

yr − 1 =1− yc0− xc

·(xr − 0

)⇒ yr = 1 +

yc − 1

xc

· xr

Fazendo yr = 0 encontramos,

xr =xc

1− yc⇒ π(q) =

( xc

1− yc, 0)

Portanto a aplicacao π e dada por,

π : S1 − { p } −→ R× { 0 }(x, y) 7−→

(x

1−y, 0)

Desejamos mostrar que π e um homeomorfismo. Mostremos inicialmenteque π e uma bijecao. Dado (a, 0) ∈ R × { 0 }, consideremos a reta (s) quepassa por (a, 0) e p = (0, 1).

bR×{ 0 }

(s)

S1

(a,0)

p

? ss

A equacao desta reta e y = 1 − x/a. Vamos verificar se existe algumponto da reta (s) em S1 − { p }. Resolvendo o sistema

x2 + y2 = 1

y = 1− xa

encontramos duas solucoes; uma e o ponto (0, 1) que nao pertence a S1−{ p }e a outra e o ponto v =

( 2a

a2 + 1,a2 − 1

a2 + 1

)que e o unico ponto de S1 − { p }

tal que π(v) = (a, 0). Isto mostra que π e sobrejetiva e injetiva.

Pelo que vimos acima, a funcao inversa de π e dada por

π−1 : R× { 0 } −→ S1 − { p }(x, 0) 7−→

(2x

x2+1, x

2−1x2+1

)

Vejamos porque π e π−1 sao contınuas. As funcoes,

306

Page 308: Gentil Lopes - Espaços Métricos

R2 −→ R

(x, y) 7−→ x

, R2 −→ R

(x, y) 7−→ 1

, R2 −→ R

(x, y) 7−→ y

sao contınuas. A primeira e a ultima por tratar-se de projecoes e a segundaporque e constante. Logo tambem e contınua a funcao,

R2 −→ R

(x, y) 7−→1−y

diferenca de funcoes contınuas. Portanto as funcoes,

R2 − {(0, 1)} −→ R

(x, y) 7−→ x

e R2 − {(0, 1)} −→ R

(x, y) 7−→1−y

sao contınuas (corol. p. 271). Portanto a funcao quociente,

R2 − {(0, 1)} −→ R

(x, y) 7−→ x1−y

tambem e contınua (prop. 60, p. 275). As funcoes

R2 −→ {0}(x, y) 7−→ 0

e R2 − {(0, 1)} −→ {0}(x, y) 7−→ 0

sao contınuas. Tomando M = R2−{ (0, 1) } na proposicao 57 (p. 272) temosque a funcao

f : R2 − {(0, 1)} −→ R× {0}(x, y) 7−→

(x

1−y, 0)

e contınua. Sendo π = f∣∣∣S1−{ p }

concluimos a continuidade de π. Para

mostrar a continuidade de π−1 voltemos a proposicao 57 com, M = R×{ 0 }e consideremos as funcoes

f1 : R× {0} −→ R

(x, 0) 7−→ 2xx2+1

e f2 : R× {0} −→ R

(x, 0) 7−→ x2−1x2+1

f1 e f2 sao contınuas devido a proposicao 60 (p. 275). Portanto

f : R× {0} −→ R× R

(x, 0) 7−→(

2xx2+1

,x2−1

x2+1

)

e contınua. Isto prova que π−1 : R× { 0 } −→ S1 − { p } e contınua.

307

Page 309: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Notas:

(i) Dada uma aplicacao f : (M, d1) −→ (N, d2), sendo (P, d2) um subespacotal que f(x) ∈ P para todo x ∈M , entao a aplicacao f

P: (M, d1) −→ (P, d2)

e contınua se, e somente se, f e contınua.

(ii) S1 − { p } e tambem homeomorfo a R uma vez que

R× {0} −→ R

(x, 0) 7−→ x

e um homeomorfismo, como o leitor pode comprovar.

7) O grafico de uma aplicacao contınua e homeomorfo ao domınio.

Seja f : M −→ N uma funcao contınua. O grafico de f e o subconjuntoG(f) ⊂M ×N do produto cartesiano M ×N , definido por

G(f) ={ (x, f(x)

): x ∈M

}

Vamos construir um homeomorfismo entre G(f) e M : As funcoes

f1 : M −→Mx 7−→ x

e f2 : M −→ Nx 7−→f(x)

sao contınuas. Portanto a funcao,

F : M −→M ×Nx 7−→

(f1 (x), f2 (x)

)e F : M −→M ×N

x 7−→(x, f(x)

)

e contınua. Logo, tendo em conta a nota (i) dada anteriormente, temos quea funcao,

FG(f)

: M −→ G(f)

x 7−→(x, f(x)

)

e contınua. Sua inversa,

F−1

G(f): G(f) −→M(x, f(x)

)7−→ x

e contınua, por ser a restricao ao grafico de f da primeira projecao, isto e,

F−1

G(f)= p

1

∣∣∣G(f)

308

Page 310: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(x, f(x))G(f)

xq

q

M

F−1

G(f)

FG(f)

Vejamos dois casos particulares desse homeomorfismo:

a) Considerando o cırculo unitario S1 ={(x, y) ∈ R2 : x2 + y2 = 1

}, o

seguinte subconjunto de S1

S1+={(x, y) ∈ S1 : y > 0

}

tambem conhecido como hemisferio norte, e homeomorfo a bola abertaBµ(0, 1) = ] − 1, +1 [ , uma vez que este hemisferio e o grafico da funcao,

f : R −→ R

x 7−→√1−x2 a a−1 1

S1

+

R

R

que e contınua porquanto pode ser expressa como composta de funcoescontınuas.

b) A reta R e homeomorfa a parabola P ={(x, f(x)

)∈ R2 : f(x) = x2

}

uma vez que esta parabola e o grafico da funcao

f : R −→ R

x 7−→ x2

R

R

(x, f(x))

xpp

309

Page 311: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6.5 Metricas Equivalentes

Neste ıtem vamos considerar duas metricas d1 e d2 sobre um mesmoconjunto M , o que dara origem a dois espacos metricos distintos: (M, d1) e(M, d2).

Iremos ver em que sentido estes dois espacos podem ser consideradosequivalentes.

Ja vimos no exemplo 2 (p. 242) que a aplicacao identidade,

i : (R, µ) −→ (R, δ)x 7−→ x

e descontınua. Tambem vimos no exemplo 3 (p. 243) que a aplicacao identi-dade,

i :([ 0, 1 [, k

)−→

([ 0, 1 [, µ

)

x 7−→ x

e descontınua. Isto da sentido a seguinte:

Definicao 39. Dadas duas metricas d1 e d2 sobre um mesmo conjuntoM , diremos que d1 e mais fina do que d2 e escrevemos d1 ≻ d2 quandoa aplicacao identidade

i12 : (M, d1) −→ (M, d2)

x 7−→ xfor contınua.

Exemplos:

1) Sendo que iµδ: (R, µ) −→ (R, δ) nao e contınua temos que µ 6≻ δ. Por

outro lado, sendo iδµ: (R, δ) −→ (R, µ) contınua segue que δ ≻ µ.

2) Tendo em conta que ikµ:([ 0, 1 [, k

)−→

([ 0, 1 [, µ

)nao e contınua re-

sulta que k 6≻ µ. Por outro lado, sendo iµk:([ 0, 1 [, µ

)−→

([ 0, 1 [, k

)

contınua segue que µ ≻ k.

A imagem direta de qualquer subconjunto A ⊂M pela aplicacao identi-dade i : M −→M e o proprio A:

i(A) = { i(x) : x ∈ A }= {x : x ∈ A } = A.

Em particular i(B(a; r)

)= B(a; r).

Tendo em conta a proposicao 50 (p. 238) deduzimos que se d1 ≻ d2 (istoe, se a identidade i12 e contınua) entao para todo a ∈ M e para toda bolaB

d2

(i12(a); r

)= B

d2

(a; r

)existe uma bola B

d1(a; s) de modo que

i12(B

d1(a; s)

)⊂ B

d2

(i12(a); r

)⇒ B

d1(a; s) ⊂ B

d2

(a; r

)

310

Page 312: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Ou ainda: Se d1 ≻ d2 entao dada qualquer bola Bd2(a; r) centrada em um

ponto a arbitrario, existe uma bola Bd1(a; s) de modo que: B

d1(a; s) ⊂

Bd2(a; r). No grafico fica assim:

(M, d1 )

ss a∃B

d1(a; s)

∃ s>0

i12

(M, d2 )

ssa

r

∀Bd2

(a; r)

∀ r>0

i12 (Bd1(a; s))=B

d1(a; s)⊂B

d2(a; r)

Reciprocamente, se para toda bola Bd2

(a; r

)existe uma bola B

d1(a; s)

de modo queB

d1(a; s) ⊂ B

d2

(a; r

)

isto ei12(B

d1(a; s)

)⊂ B

d2

(i12(a); r

)

entao (ainda pela proposicao 50) i12 e contınua, logo d1 ≻ d2 .

Em resumo:

d1 ≻ d2 ⇔ ∀Bd2

(a; r

), ∃B

d1(a; s) : B

d1(a; s) ⊂ B

d2

(a; r

)

Quando ocorrer d1 ≻ d2 e d2 ≻ d1 diremos que d1 e d2 sao equivalentes(ou topologicamente equivalentes) e escrevemos d1 ∼ d2 .

De outro modo: d1 e d2 sao equivalentes quando a aplicacao identidade,

i12 : (M, d1) −→ (M, d2)

for um homeomorfismo.

(i) Ja vimos que iδµ: (R, δ) −→ (R, µ) nao e um homeomorfismo porque

sua inversa i−1δµ

= iµδ

nao e contınua. Portanto µ e δ nao sao metricasequivalentes em R.

(ii) Ja vimos que iµk:([ 0, 1 [, µ

)−→

([ 0, 1 [, k

)nao e um homeomorfismo

porque sua inversa i−1µk

= ikµ

nao e contınua. Portanto k e µ nao saometricas equivalentes em [ 0, 1 [.

E facil mostrar que “d1 ∼ d2” e uma relacao de equivalencia em qualquercolecao de metricas em um conjunto M .

311

Page 313: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) Consideremos as metricas δ e µ sobre R.

δ ≻ µ, pois dados a ∈ R e r > 0, escolhemos s = 1 obtendo

Bδ(a; 1) = { a } ⊂ Bµ(a; r) =] a− r, a+ r [.

s] [ Ra

a−r a+r

Bδ(a; 1)

Para mostrar que µ 6≻ δ escolhemos Bδ(a; 1) = { a } e vemos que

Bµ(a; s) = ] a− s, a+ s [ 6⊂ Bδ(a; 1), ∀s > 0.

2) No conjunto Z4 as metricas σ e ρ sao equivalentes. De fato, e suficienteo leitor considerar o exercıcio 6, p. 134.

Os dois exemplos anteriores sao casos especiais do seguinte

3) Se o espaco (M, d1) e discreto (neste caso dizemos que a metrica d1 ediscreta) entao d1 ≻ d2 qualquer que seja a metrica d2 sobre M .

De fato, sendo (M, d1) discreto entao dado a ∈ M existe s = s(a) > 0de modo que B

d1(a; s) = { a } e, obviamente, { a } ⊂ B

d2(a; r) qualquer que

seja a metrica d2 e qualquer que seja o raio r > 0.

4) No conjunto N as metricas δ e µ sao equivalentes.

De fato, basta mostrar que µ ≻ δ, entao

Bµ(n; 1) = Bµ(n; 1) ∩ N

= ]n− 1, n+ 1 [ ∩ N

= {n } ⊂ Bδ(n; r), ∀ r > 0.

5) No conjunto R2 as metricas D1 , D2 e D3 sao duas a duas equivalentes.

Isto se deve ao fato de que dada uma bola B(a; r) em qualquer umadestas metricas, podemos “inscrever” nesta uma bola em qualquer uma dasoutras duas metricas. Por exemplo, conforme as figuras abaixo:

r r rr r

312

Page 314: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6) Seja C[ 0, 1 ] o conjunto de todas as funcoes contınuas reais definidas nointervalo I = [ 0, 1 ]. Considere as metricas Υ e Γ em C[ 0, 1 ] dadas por

Υ(f, g) = max{ |f(x)− g(x)| : x ∈ [ 0, 1 ] }

Γ(f, g) =

∫ 1

0|f(x)− g(x)| dx

Vamos mostrar que Υ ≻ Γ e que Γ 6≻ Υ.

Seja BΓ(p; r) uma bola aberta com centro p ∈ C[ 0, 1 ] e raio r > 0 dado.

Vamos tomar s = r e mostrar que,

BΥ(p; s) ⊂ B

Γ(p; r)

De fato, seja f ∈ BΥ(p; s), logo

Υ(f, p) = max{ |f(x)− p(x)| : x ∈ [ 0, 1 ] } < s

sendo,|f(x)− p(x)| ≤ max

x∈I{ |f(x)− p(x)| } < s (6.22)

temos,

∫ 1

0|f(x)− p(x)| dx ≤ max

x∈I{ |f(x)− p(x)| } < s ⇒ Γ(f, p) < s = r

⇒ f ∈ BΓ(p; r).

Sendo assim, Υ ≻ Γ.

Lembrete: Dada f : [ a, b ] −→ R, integravel, se m ≤ f(x) ≤ M para todo

x ∈ [ a, b ] entao m(b−a) ≤∫ ba f(x) dx ≤M(b−a). Na desigualdade (6.22),

temos M = maxx∈I{ |f(x)− p(x)| }.

Agora vamos mostrar que Γ 6≻ Υ. Para isto devemos exibir uma bolaB

Υ(p; r) centrada em um ponto p ∈ C[ 0, 1 ] de modo que

BΓ(p; s) 6⊂ B

Υ(p; r), ∀ s > 0.

Vamos escolher a funcao constante,

p : [ 0, 1 ] −→ R

x 7−→ 2

e o raio r = 1 e mostrar que

BΓ(p; s) 6⊂ B

Υ(p; 1), ∀ s > 0.

Para tanto e suficiente mostrar que qualquer que seja s > 0 podemosexibir uma funcao fs ∈ BΓ

(p; s) de modo que fs 6∈ BΥ(p; 1).

313

Page 315: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A bola aberta BΥ(p; 1) constitui-se de todas as funcoes g situadas entreas funcoes p− 1 e p+ 1, isto e: (p. 121)

p(x)− 1 < g(x) < p(x) + 1 ⇒ 1 < g(x) < 3, ∀x ∈ [ 0, 1 ]

0 1

¬

¬

¬

¬

¬

1

2

3

4

gx p

p−1

p+1

Bola aberta: BΥ(p; 1)

Dado s > 0 para escolher fs ∈ BΓ(p; s) consideremos duas possibilidades:

a) 0 < s < 3 b) s ≥ 3.

Se 0 < s < 3 consideremos fs a funcao que consiste no segmento de retaentre os pontos (0, 0) e (13s, 2) e no segmento de reta entre os pontos (13s, 2)e (1, 2). Isto e, fs esta definida assim:

fs(x) =

6x

s, se 0 ≤ x < s

3;

2, ses

3≤ x ≤ 1.

(grafico a esquerda abaixo). Se s ≥ 3 tomamos fs como sendo a funcao constantedada por fs(x) = 1, ∀x ∈ I. (grafico a direita abaixo)

0 1

¬

¬

¬

¬

¬

1

2

3

4

13s

x fs

0 1

¬

¬

¬

¬

¬

1

2

3

4

x p

x fs

Agora vamos mostrar que estas funcoes preenchem os dois requisitosmencionados anteriormente.

314

Page 316: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Para 0 < s < 3, temos

Γ(fs, p) =

∫ 1

0|fs(x)− g(x)| dx

=

∫ s3

0

∣∣6x

s− 2∣∣ dx+

∫ 1

s3

|2− 2| dx

=

∫ s3

0

(− 6x

s+ 2)dx =

s

3< s ⇒ fs ∈ BΓ

(p, s).

Observe que,

0 ≤ x < s

3⇒ 0 ≤ 6x < 2s ⇒ 0 ≤ 6x

s< 2

⇒ −2 ≤ 6x

s− 2 < 0 ⇒

∣∣6x

s− 2∣∣ = −

(6x

s− 2).

Calculando a distancia Υ entre fs e p, temos

Υ(fs, p) = max{ |fs(x)− p(x)| : x ∈ [ 0, 1 ] } = 2 (6.23)

⇒ fs 6∈ BΥ(p; 1).

Observe que, para

0 ≤ x < s

3⇒ −2 ≤ 6x

s− 2 < 0 ⇒ 0 < 2− 6x

s≤ 2

⇒ 0 <∣∣6x

s− 2∣∣ ≤ 2 ⇒ |fs(x)− p(x)| ∈ ] 0, 2 ]

Para

s

3≤ x ≤ 1 ⇒ |fs(x)− p(x)| = |2− 2| = 0.

Daı (6.23). Quando s ≥ 3 temos fs(x) = 1, portanto

Γ(fs, p) =

∫ 1

0|fs(x)− g(x)| dx

=

∫ 1

0|1− 2| dx = 1 < 3 ≤ s ⇒ fs ∈ BΓ

(p; s).

Ainda,

Υ(fs, p) = max{ |fs(x)− p(x)| : x ∈ [ 0, 1 ] }= max{ |1 − 2| : x ∈ [ 0, 1 ] } = 1 ⇒ fs 6∈ BΥ

(p; 1).

315

Page 317: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Observe que podemos concluir “a olho nu” que a funcao fs nao pertencea bola BΥ(p; 1); veja que seu grafico nao se encontra dentro das faixashorizontais p− 1 e p+ 1, na figura da p. 314.

Em particular concluimos que as metricas Υ e Γ nao sao equivalentesem C[ 0, 1 ].7) Seja (M, d) um espaco metrico. Com auxılio da metrica d vamos definiruma outra metrica, ν digamos, dada por

ν(x, y) = min{ 1, d(x, y) }.

Vamos mostrar que:

(i) para todo ε ∈ R tal que 0 < ε ≤ 1, temos Bd(a; ε) = Bν (a; ε);

(ii) d e ν sao equivalentes.

Entao:

(i) Vamos mostrar inicialmente que Bd(a; ε) ⊂ Bν (a; ε). Seja x ∈

Bd(a; ε), isto e, d(x, a) < ε, devemos mostrar que x ∈ Bν (a; ε), isto e, que

ν(x, a) = min{ 1, d(x, a) } < ε.

Resumindo (devemos mostrar que):

Se 0 < ε ≤ 1 e d(x, a) < ε entao min{ 1, d(x, a) } < ε.

Pois bem, juntando as hipoteses podemos escrever

d(x, a) < ε ≤ 1 ⇒ min{ 1, d(x, a) } = d(x, a) < ε.

Agora vamos mostrar que Bν (a; ε) ⊂ Bd(a; ε). Seja x ∈ Bν (a; ε), isto

e, ν(x, a) = min{ 1, d(x, a) } < ε, devemos mostrar que x ∈ Bd(a; ε), isto

e, que d(x, a) < ε.

Resumindo (devemos mostrar que):

Se 0 < ε ≤ 1 e min{ 1, d(x, a) } < ε entao d(x, a) < ε.

Pois bem, juntando as hipoteses podemos escrever

min{ 1, d(x, a) } < ε ≤ 1,

portanto

min{ 1, d(x, a) } = d(x, a) < ε.

Observe que nao pode ser min{ 1, d(x, a) } = 1 senao teriamos 1 < ε ≤ 1.

(ii) Para mostrar que d e ν sao equivalentes devemos mostrar que dadaB

d(a; ε) existe δ > 0 tal que Bν (a; δ) ⊂ B

d(a; ε) e vice-versa. Entao, pelo

ıtem anterior se 0 < ε ≤ 1 basta tomar δ = ε e teremos Bν (a; ε) = Bd(a; ε).

Portanto resta considerar ε > 1.

316

Page 318: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Seja ε > 1, queremos mostrar que existe δ > 0 tal que Bν (a; δ) ⊂B

d(a; ε).

Seja x ∈ Bν (a; δ), isto e, ν(x, a) = min{ 1, d(x, a) } < δ; queremosmostrar (com uma escolha apropriada de δ) que x ∈ B

d(a; ε), isto e, que

d(x, a) < ε. Isto e

Se ε > 1 e min{ 1, d(x, a) } < δ entao d(x, a) < ε.

Pois bem, observe que tomando δ = 1 teremos

Se ε > 1 e min{ 1, d(x, a) } < 1⇒ d(x, a) < 1

⇒ d(x, a) < 1 < ε

⇒ x ∈ Bd(a; ε).

Por outro lado, dado ε > 1 vamos mostrar que existe δ > 0 de modoque B

d(a; δ) ⊂ Bν (a; ε). Entao, seja x ∈ B

d(a; δ), devemos mostrar que

x ∈ Bν (a; ε). Isto e

Se ε > 1 e d(x, a) < δ entao min{ 1, d(x, a) } < ε.

Tomando δ = 1 teremos

Se ε > 1 e d(x, a) < 1⇒ min{ 1, d(x, a) } = d(x, a) < 1

⇒ min{ 1, d(x, a) } < ε

⇒ x ∈ Bν (a; ε).

8) Seja (M, d) um espaco metrico. Com auxılio da metrica d vamos definiruma outra metrica, ν digamos, dada por

ν(x, y) =d(x, y)

1 + d(x, y)

Vamos mostrar que d e ν sao equivalentes. Inicialmente mostremos quedados a ∈M e ε > 0 existe δ > 0 de modo que B

d(a; δ) ⊂ Bν (a; ε).

Tomando δ = ε, dado x ∈ Bd(a; δ = ε) vamos mostrar que x ∈ Bν (a; ε),

isto e que

d(x, a) < ε ⇒ ν(x, a) =d(x, a)

1 + d(x, a)< ε

Isto e imediato pois

d(x, a) < ε ⇒ d(x, a) < ε+ ε · d(x, a) ⇒ d(x, a)

1 + d(x, a)< ε.

Por outro lado, dado ε > 0, podemos tomar δε = ε1+ε e mostrar que

Bν (a; δε) ⊂ Bd(a; ε). Isto e, seja x ∈ Bν (a; δε) queremos mostrar que

d(x, a)

1 + d(x, a)<

ε

1 + ε⇒ d(x, a) < ε

317

Page 319: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Isto e verdade porquanto

d(x, y)

1 + d(x, y)<

ε

1 + ε⇔ d(x, a) + ε d(x, a) < ε+ ε d(x, a)

⇔ d(x, a) < ε.

Os dois ultimos exemplos mostram que toda metrica e equivalente a duas(pelo ao menos) metricas limitadas, uma vez que ν(x, y) ≤ 1.

Proposicao 67. Sejam d1 e d2 metricas num conjunto M . Se existir umaconstante α > 0 tal que d2(x, y) ≤ α d1(x, y) para todo x, y ∈ M entaod1 ≻ d2 .

Prova: Vamos mostrar que a aplicacao identidade

i12 : (M, d1) −→ (M, d2)

e contınua. De fato, dados a ∈M e ε > 0 e suficiente tomar δ = εα e entao

quando d1(x, a) < δ temos

d2

(i12(x), i12(a)

)= d2(x, a)

≤ αd1(x, a) < αδ = αε

α= ε

Isto mostra que i12 e contınua e, por conseguinte, d1 ≻ d2 . �

Corolario 18. Se existirem constantes α > 0 e β > 0 tais que

αd1(x, y) ≤ d2(x, y) ≤ β d1(x, y)

para quaisquer x, y ∈M , entao d1 ∼ d2 .

Prova: Pela proposicao anterior, se d2(x, y) ≤ β d1(x, y) decorre que d1 ≻d2 . Por outro lado, se α d1(x, y) ≤ d2(x, y) decorre d1(x, y) ≤ 1

α d2(x, y) e,novamente pela proposicao anterior, temos d2 ≻ d1 . Portanto d1 ∼ d2 . �

Nota: A recıproca deste corolario nao vale. Isto e, se duas metricas saoequivalentes nao implica que existam constantes α e β satisfazendo as de-sigualdades presentes no corolario.

Para mostrar isto considere M = R e d(x, y) = |x − y|. Seja ν(x, y) =|x−y|

1+|x−y| , ja vimos que ν ∼ d, no entanto nao existe uma constante β > 0 demodo que

d(x, y) ≤ β ν(x, y) , ∀x, y ∈ R.

Pois, caso contrario, terıamos

|x− y| ≤ β |x− y|1 + |x− y| ⇒ 1 + |x− y| ≤ β (x 6= y)

e isto implicaria em d ser uma metrica limitada, o que nao e verdade, comoja vimos.

318

Page 320: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos: As tres metricas usuais do Rn sao equivalentes (p. 72).

Dados os espacos (M1 , d1), (M2 , d2), . . ., (Mn , dn), o produto carte-siano M = M1 × M2 × · · · × Mn e o conjunto das n−uplas ordenadasx = (x1 , x2 , . . . , xn), onde x1 ∈M1 , x2 ∈M2 ,. . . , xn ∈Mn .

Para as tres metricas abaixo (p. 97)

D1(x, y) =√

d 2

1(x1 , y1) + · · ·+ d 2

n(xn , yn)

D2(x, y) = d1(x1 , y1) + · · · + dn(xn , yn)

D3(x, y) = max { d1(x1 , y1), . . . , dn(xn , yn) }

valem as seguintes desigualdades:

D3(x, y) ≤ D1(x, y) ≤ D2(x, y) ≤ n · D3(x, y) (6.24)

as quais provamos de modo inteiramente analogo ao do caso anterior. Por-tanto, estas metricas sao equivalentes.

Proposicao 68. Sejam d e d′ metricas equivalentes sobre M . Se A e acolecao dos conjuntos abertos de (M, d) e A′ e a colecao dos conjuntosabertos de (M, d′), entao A = A′.

Prova: Seja um aberto A ∈ A e considere a ∈ A um ponto arbitraria-mente fixado. Entao, por A ser aberto, existe ε > 0 tal que B

d(a; ε) ⊂ A.

Da equivalencia d ∼ d′ decorre que existe λ > 0 de maneira que Bd′ (a; λ) ⊂

Bd(a; ε). Sendo assim B

d′ (a; λ) ⊂ A o que mostra que A ∈ A′. PortantoA ⊂ A′. De maneira analoga se mostra que A′ ⊂ A, o que conclui a demons-tracao. �

Nota: O significado da proposicao anterior e que metricas equivalentes de-terminam a mesma estrutura topologica.

Segundo esta proposicao, para mostrar que duas metricas nao sao equiva-lentes basta exibir um conjunto aberto em uma delas e nao na outra. Ve-jamos um exemplo do que estamos falando: As metricas dos espacos (R, δ)e (R, µ) nao sao equivalentes. Com efeito, o conjunto ] 0, 1 ] e um aberto noprimeiro destes espacos, mas nao no segundo.

Julgamos oportuno tambem ressaltar que esta proposicao nao diz que osespacos (M, d) e (M, d′) tem a mesma colecao de bolas abertas; mas taosomente de conjuntos abertos.

r rPor exemplo, a figura a esquerda e

uma bola aberta no espaco(R2, D1

)mas

nao no espaco(R2, D2

)(neste espaco e

tao somente um conjunto aberto). Com afigura da direita sucede o contrario.

319

Page 321: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Teorema 5. Sejam (M, d1), (N, d2), (M, d′1) e (N, d′

2) espacos metricos.

Sendo d1 ∼ d′1 e d2 ∼ d′2 a aplicacao f : (M, d1) −→ (N, d2) e contınua se,e somente se, f : (M, d′

1) −→ (N, d′

2) e contınua.

Prova: (=⇒) Consideremos f : (M, d1) −→ (N, d2) contınua e mostre-mos que f : (M, d′

1) −→ (N, d′

2) e contınua. Para tanto e suficiente mostrar-

mos que: dados a ∈ M e ε > 0 existe δ > 0 de modo que f(B

d′1

(a; δ))⊂

Bd′2

(f(a); ε

). Pois bem,

©1 Como d2 ∼ d′2entao a identidade i

N: (N, d2) −→ (N, d′

2) e contınua.

Em particular e contınua no ponto f(a), o que significa que para a bolaB

d′2

(f(a); ε

)existe δ′ > 0 de modo que

iN(B

d2(f(a); δ′ )

)= B

d2(f(a); δ′ ) ⊂ B

d′2

(f(a); ε) (6.25)

©2 Como f : (M, d1) −→ (N, d2) e contınua (por hipotese), isto implica emque para a bola B

d2

(f(a); δ′

)existe uma bola B

d1

(a; δ′′

)de modo que

f(B

d1(a; δ′′ )

)⊂ B

d2(f(a); δ′ ) (6.26)

©3 Como d1 ∼ d′1entao a identidade iM : (M, d′

1) −→ (M, d1) e contınua,

o que significa que para a bola Bd1

(a; δ′′

)existe uma bola B

d′1

(a; δ

)tal que

iM

(B

d′1

(a, δ))= B

d′1

(a; δ) ⊂ Bd1(a; δ′′ )

Aplicando f no lado direito desta igualdade e invocando (6.26), temos

f(B

d′1

(a; δ))⊂ f

(B

d1(a; δ′′ )

)⇒ f

(B

d′1

(a; δ))⊂ B

d2(f(a); δ′ )

mas por (6.25) podemos escrever f(B

d′1

(a; δ))⊂ B

d′2

(f(a); ε

).

raδ′′

(M, d1 )

∃ δ′′>0

Bd1(a; δ′′)

f

©2rf(a)δ′

(N, d2 )

∃ δ′>0

Bd2(f(a); δ′)

raδ

(M, d′1)

∃ δ=?

Bd′1

(a; δ)

f

iM ©3

rf(a)ε

(N, d′2)

∀ ε)>0

Bd′2

(f(a); ε)

iN ©1

(⇐=) Analogo. �

320

Page 322: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Notas:

i) No teorema anterior, obviamente podemos ter os casos particulares:d1 = d′

1ou d2 = d′

2.

ii) Ao longo deste livro ja tivemos oportunidade de aplicar este teoremapor diversas vezes.

Homeomorfismos Uniformes

A funcao f : R+ −→ R+ dada por f(x) =√x e bijetora, uniformemente

contınua (p. 293) mas sua inversa, dada por x 7−→ x2, nao e uniformementecontınua (p. 291). Faz sentido a seguinte

Definicao 40 (Homeomorfismo Uniforme). Sejam (M, d1) e (N, d2) espacosmetricos. Uma aplicacao f : M −→ N e chamada homeomorfismo uniformese f e bijetora, e uniformemente contınua e sua inversa f−1 tambem e uni-formemente contınua.

Exemplo: Toda isometria f : M −→ N e um homeomorfismo uniformeporque e bijetora, lipschitziana (logo uniformemente contınua, p. 289) e suainversa e tambem uma isometria. Em particular as translacoes em um espacovetorial normado (p. 254) e as rotacoes no espaco euclidiano (p. 255) saohomeomorfismos uniformes.

Metricas Uniformemente Equivalentes

Definicao 41. Sejam d1 e d2 metricas sobre o mesmo conjuntoM . Dizemosque d1 e d2 sao uniformemente equivalentes se a identidade

i12 : (M, d1) −→ (M, d2)

e um homeomorfismo uniforme.

Notacao: d1 ≃ d2 para indicar que d1 e d2 sao uniformemente equivalentes.

Exemplos e Contraexemplos:

1) Sejam d1 e d2 metricas sobre M . Se existirem constantes α > 0 e β > 0tais que

αd1(x, y) ≤ d2(x, y) ≤ β d1(x, y), ∀x, y ∈Mentao as metricas d1 e d2 serao uniformemente equivalentes. De fato asdesigualdades

d1(x, y) ≤1

αd2(x, y) e d2(x, y) ≤ β d1(x, y), ∀x, y ∈M

provam respectivamente que as identidades

i12 : (M, d1) −→ (M, d2) e i21 : (M, d2) −→ (M, d1)

sao lipschitzianas (p. 258), logo, uniformemente contınuas (prop. 63, p. 289).

321

Page 323: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Em particular as tres metricas do espaco M1 ×M2 × · · · ×Mn =M saouniformemente equivalentes visto que vale (6.24) (p. 319).

2) Seja (M, d) um espaco metrico. A metrica dada por

ν(x, y) = min{ 1, d(x, y) }

e uniformemente equivalente a d. Para provar esta afirmacao basta mostrarque a aplicacao identidade i

dν: (M, d) −→ (M, ν) e um homeomosfismo

uniforme. Pois bem, como

ν(x, y) = min{ 1, d(x, y) } ≤ d(x, y)⇒ ν

(idν(x), i

dν(y))≤ d(x, y)

segue que a identidade idν: (M, d) −→ (M, ν) e lipschitziana e, portanto,

uniformemente contınua.

Agora vamos mostrar que a identidade

i−1dν

= iνd

: (M, ν) −→ (M, d)

e uniformemente contınua. Para isto dado ε > 0 devemos exibir δ = δ(ε) > 0de modo que

ν(x, y) < δ ⇒ d(iνd(x), i

νd(y))< ε

Vamos mostrar que δ dado por δ(ε) = min{ 1, ε } serve. Pois, bem de

ν(x, y) < δ = min{ 1, ε } ⇒

ν(x, y) < 1 (⋆)

ν(x, y) < ε (⋆⋆)

da definicao ν(x, y) = min{ 1, d(x, y) } e de (⋆) concluimos que devemoster ν(x, y) = d(x, y) e de (⋆⋆) devemos ter

d(x, y) < ε ⇒ d(x, y) = d(iνd(x), i

νd(y))< ε

Portanto de fato a escolha δ(ε) = min{ 1, ε } nos conduz ao resultadodesejado. Isto e, nos permitiu mostrar que a identidade i

νde uniformemente

contınua.

3) Seja (M, d) um espaco metrico. A metrica dada por

ν(x, y) =d(x, y)

1 + d(x, y)

e uniformemente equivalente a d. Para provar esta afirmacao basta mostrarque a aplicacao identidade i

dν: (M, d) −→ (M, ν) e um homeomosfismo

uniforme. Entao

ν(x, y) =d(x, y)

1 + d(x, y)≤ d(x, y) ⇒ ν

(idν(x), i

dν(y))≤ d(x, y)

Isto mostra que idν

e lipschitziana e, portanto, uniformemente contınua.

322

Page 324: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Agora vamos mostrar que a identidade

i−1dν

= iνd

: (M, ν) −→ (M, d)

e uniformemente contınua. Para isto dado ε > 0 devemos exibir δ = δ(ε) > 0de modo que

ν(x, y) < δ ⇒ d(iνd(x), i

νd(y))< ε

Vamos mostrar que δ dado por δ(ε) = ε1+ε serve. Pois bem,

ν(x, y) < δ =ε

1 + ε⇒ ν(x, y) =

d(x, y)

1 + d(x, y)<

ε

1 + ε

Temos que

d(x, y)

1 + d(x, y)<

ε

1 + ε⇔ d(x, y) + ε d(x, y) < ε+ ε d(x, y)

⇔ d(x, y) < ε

portanto ν(x, y) < δ ⇒ d(iνd(x), i

νd(y))< ε.

De fato a escolha δ(ε) = ε1+ε nos conduz ao resultado desejado. Isto e,

nos permitiu mostrar que a identidade iνd

e uniformemente contınua.

Os dois exemplos anteriores mostram que toda metrica possui pelo aomenos duas metricas limitadas que lhe sao uniformemente equivalentes.

4) Vejamos agora um exemplo de metricas equivalentes mas nao uniforme-mente equivalentes. Consideremos os espacos (M, µ) e (M, δ), onde

M ={1,

1

2,1

3, . . .

}e δ(x, y) =

{

1 se e so se, x 6= y;

0 se e so se, x = y.

e µ(x, y) = |x − y|. Os espacos (M, µ) e (M, δ) sao ambos discretos, logoas metricas µ e δ sao equivalentes (ex. 3, p. 312). No entanto a aplicacaoidentidade i : (M, µ) −→ (M, δ) nao e uniformemente contınua.

Para mostrar que i nao e uniformemente contınua devemos exibir umε > 0 tal que para todo δ > 0 possamos encontrar dois pontos x, y ∈M :

µ(x, y) < δ e δ(i(x), i(y)

)≥ ε

Pois bem, tome qualquer ε ≤ 1. Para todo δ > 0 existe n ∈ N tal que1

n(n+1) < δ. Vamos tomar x = 1n+1 e y = 1

n , entao

|x− y| = 1

n(n+ 1)< δ e δ

(i(x), i(y)

)= δ( 1

n+ 1,1

n

)= 1 ≥ ε.

323

Page 325: Gentil Lopes - Espaços Métricos

• A continuidade uniforme nao e uma propriedade topologica. (p. 298)

Isto e, uma funcao uniformemente contınua f : M −→ N pode perderesta propriedade caso troquemos a metrica de M e/ou a de N por outraequivalente. Vejamos um caso destes. Consideremos M , µ, δ como noexemplo anterior e verifiquemos o seguinte diagrama

f : (M, δ) −→ (R, µ)

f : (M, µ) −→ (R, µ)

l∼⇒ f e uniformemente contınua.

⇒ f nao e uniformemente contınua.

onde f e dada por f(1n

)= n. Vamos mostrar que f : (M, δ) −→ (R, µ) e

uniformemente contınua. Para todo ε > 0 dado devemos exibir δ > 0 demodo que se

δ(x, y) < δ ⇒ µ(f(x), f(y)

)< ε

Tomando δ = 1, temos que

se δ(x, y) < 1 ⇒ δ(x, y) = 0 ⇒ x = y ⇒ f(x) = f(y)

⇒ µ(f(x), f(y)

)= 0 < ε.

Agora vamos mostrar que f : (M, µ) −→ (R, µ) nao e uniformemente contınua.Para mostrar que f nao e uniformemente contınua devemos exibir um ε > 0tal que para todo δ > 0 possamos encontrar dois pontos x, y ∈M tais que

µ(x, y) < δ e µ(f(x), f(y)

)≥ ε

Pois bem, tome qualquer ε ≤ 1. Para todo δ > 0 existe n ∈ N tal que1

n(n+1) < δ. Vamos tomar x = 1n+1 e y = 1

n , entao

|x− y| = 1

n(n+ 1)< δ e µ

(f(x), f(y)

)= |(n + 1)− n| = 1 ≥ ε.

Neste exemplo a continuidade uniforme foi perdida ao trocarmos umametrica por outra equivalente − mas nao uniformemente equivalente − Per-guntamos: E se trocarmos uma metrica por outra que lhe seja uniforme-mente equivalente nao teriamos a continuidade uniforme preservada?

Isto de fato acontece:

Proposicao 69. Seja f : (M, d1) −→ (N, d2) uma funcao uniformementecontınua. A aplicacao f nao perde esta propriedade quando se substitui ametrica de M e/ou a de N por outra que lhe(s) seja(m) uniformementeequivalente(s).

Prova: Vamos conduzir a prova para o caso particular de substituirmosd1 por d′

1≃ d1 . As demais possibilidades sao tratadas de modo analogo.

Temos

324

Page 326: Gentil Lopes - Espaços Métricos

hipotese f : (M, d1) −→ (N, d2)

Tese f : (M, d′1) −→ (N, d2)

l≃(f e uniformemente contınua.)

(f e uniformemente contınua.)

Dado ε > 0 existe, por hipotese, ρ > 0 de modo que

d1(x, y) < ρ ⇒ d2

(f(x), f(y)

)< ε (6.27)

Como a identidadei : (M, d′

1) −→ (M, d1)

e uniformemente contınua, devido a que d′1≃ d1 , entao para o ρ > 0 acima

existe δ = δ(ρ) > 0 de modo que

d′1(x, y) < δ ⇒ d1

(i(x), i(y)

)= d1(x, y) < ρ

portanto, invocando (6.27), temos

d′1(x, y) < δ ⇒ d2

(f(x), f(y)

)< ε

o que garante a continuidade uniforme de

f : (M, d′1) −→ (N, d2)

6.5.1 Normas Equivalentes

Vamos Considerar duas normas distintas sobre um mesmo espaco vetorial(E, +, ·

). Para diferencia-las usaremos a notacao ‖ ‖1 para uma delas e

‖ ‖2 para a outra. Sendo assim d1 e d2 dadas por d1(x, y) = ‖x − y‖1 ed2(x, y) = ‖x− y‖2 serao as metricas induzidas sobre E por essas normas.

Definicao 42 (Normas Equivalentes). Duas normas sobre o mesmo espacovetorial

(E, +, ·

)dizem-se equivalentes se, e somente se, as metricas in-

duzidas por essas normas sobre E sao equivalentes.

Se ‖ ‖1 e ‖ ‖2 sao as normas consideradas e d1 e d2 as respectivas metricasinduzidas por essas normas, entao a equivalencia definida acima significa quedada uma bola B

d1

(p; r

), com p ∈ E, existe uma bola B

d2

(p; s

)tal que

Bd2

(p; s

)⊂ B

d1

(p; r

)

e, reciprocamente.Ja vimos que a existencia de numeros reais α > 0 e β > 0 tais que

α d1(x, y) ≤ d2(x, y) ≤ β d1(x, y)

e uma condicao suficiente para que as metricas d1 e d2 sejam equivalentes,mas esta condicao nao e necessaria. (ver nota pg. 318)

325

Page 327: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Veremos agora que esta condicao que e apenas suficiente para a equivalenciade metricas em geral, e tambem necessaria quando tais metricas provem denormas.

Proposicao 70. Duas normas ‖ ‖1 e ‖ ‖2 num espaco vetorial(E, +, ·

)

sao equivalentes se, e somente se, existem constantes α > 0 e β > 0 tais que

α ‖x‖1 ≤ ‖x‖2 ≤ β ‖x‖1

para qualquer x ∈ E.

Prova: (⇐=) Dados x, y ∈ E, por hipotese, temos

α ‖x− y‖1 ≤ ‖x− y‖2 ≤ β ‖x− y‖1

Ou seja, αd1(x, y) ≤ d2(x, y) ≤ β d1(x, y).

Sendo assim o corolario 18 (p. 318) nos assegura que d1 ∼ d2 o que, porsua vez implica − por definicao − que as normas sao equivalentes.

(=⇒) Por hipotese as normas dadas sao equivalentes. Portanto, dada a bolaB

d1

(0; 1

)existe uma bola B

d2

(0; r

)de modo que

Bd2

(0; r

)⊂ B

d1

(0; 1

)

Escolhendo um numero real α de modo que 0 < α < r, o vetor αx‖x‖2

, para

todo 0 6= x ∈ E, pertence a bola Bd2

(0; r

)pois

∥∥∥∥

αx

‖x‖2− 0

∥∥∥∥

2

=α‖x‖2‖x‖2

= α < r

portanto esse vetor tambem pertence a bola Bd1

(0; 1

), o que implica

∥∥∥∥

αx

‖x‖2− 0

∥∥∥∥

1

=α‖x‖1‖x‖2

< 1

Ou seja,α‖x‖1 < ‖x‖2

Por outro lado, dada a bola Bd2

(0; 1

)existe uma bola B

d1

(0; s

)tal que

Bd1

(0; s

)⊂ B

d2

(0; 1

)

Escolhamos um numero real β que satisfaca as desigualdades 0 < 1β < s.

Logo, para todo 0 6= x ∈ E, o vetor xβ‖x‖1

pertence a bola Bd1

(0; s

)pois

∥∥∥∥

x

β‖x‖1− 0

∥∥∥∥

1

=‖x‖1β‖x‖1

=1

β< s

326

Page 328: Gentil Lopes - Espaços Métricos

portanto esse vetor tambem pertence a bola Bd2

(0; 1

)o que implica

∥∥∥∥

x

β‖x‖1− 0

∥∥∥∥

2

=‖x‖2β‖x‖1

< 1

ou seja‖x‖2 < β‖x‖1

Sendo assim temosα ‖x‖1 < ‖x‖2 < β ‖x‖1

para todo vetor x 6= 0.Lembramos que

‖0‖1 = 0 = ‖0‖2isto implica em que

α ‖0‖1 = ‖0‖2 = β ‖0‖1o que implica na tese: existem numeros α > 0 e β > 0 tais que

α ‖x‖1 ≤ ‖x‖2 ≤ β ‖x‖1para qualquer x ∈ E. �

Interregno cultural:

A revolucao do espaco curvo teve uma influencia profunda em todasas areas da matematica. Desde o tempo de Euclides ate a epoca em queos trabalhos de Gauss e de Riemann foram descobertos postumamente,a matematica era principalmente pragmatica. A estrutura de Euclidesera interpretada como descrevendo o espaco fısico. A matematica era,num certo sentido, um tipo de fısica. Questoes sobre a consistencia dasteorias matematicas pareciam discutıveis − a demonstracao encontrava-se no mundo fısico. Mas, por volta de 1900, os matematicos tinhama opiniao de que os axiomas eram afirmacoes arbitrarias, sendo ape-nas a base de um sistema cujas consequencias deveriam ser investigadasnum tipo de jogo mental. Subitamente, os espacos matematicos eramconsiderados como estruturas logicas abstratas. A natureza do espacofısico tornou-se uma questao separada, uma questao de fısica, nao dematematica.

Para os matematicos, surgiu agora um novo tipo de questao: a demostrar a consistencia logica de suas estruturas. A ideia de demons-tracao, que tinha ficado em posicao secundaria durante os seculos re-centes de avancos em tecnicas de calculos, tornou-se novamente domi-nante.

(Leonard Mlodinow/A janela de Euclides)

327

Page 329: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6.6 Exercıcios

1) Verifique os ıtens 1.3) e 1.4) da tabela da p. 240, utilizando a definicaode continuidade ou uma de suas caracterizacoes equivalentes.

2) Mostre que a funcao afim f : (R, µ) −→ (R, µ) dada por f(x) = ax + be contınua. Mais que isto, e uniformemente contınua.

3) Mostre, pela definicao (ou alguma de suas caracterizacoes), que a funcaof : (R, µ) −→ (R, µ) dada por f(x) = x2 e contınua.

4) Mostre, pela definicao (ou alguma de suas caracterizacoes), que a funcaof : (R, µ) −→ (R, µ) dada por f(x) = x3 e contınua.

5) Seja f : (R, µ) −→ (R, µ) contınua em a e f(a) > 0. Prove que existeuma bola B(a; δ) tal que f(x) > 0, para todo x ∈ B(a; δ).

6) De exemplo de uma funcao definida em (R, µ) e que seja contınua emtodos os pontos, exceto em −1, 0, 1.7) De exemplo de uma funcao definida em (R, µ) e que seja contınua emtodos os pontos exceto nos inteiros.

8) Determine o conjunto dos pontos em que a funcao dada e contınua.

a ) f(x) =

{

x, se x ∈ Q;

−x, se x 6∈ Q.b ) f(x) =

{

x2 − 1, se x ∈ Q;

−x2 + 1, se x 6∈ Q.

9) Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos e seja f : M −→ N . Se a ∈Me para todo ε ∈ R tal que 0 < ε < 1 existe δ > 0 de modo que se

d1(x, a) < δ ⇒ d2

(f(x), f(a)

)< ε

mostre que f e contınua em a.

10) Mostre, pela definicao (ou alguma de suas caracterizacoes), que a funcaof : (R, µ) −→ (R, µ) dada por f(x) = |x| e contınua.

11) A funcao f : (R− { 0 }, µ) −→ (R, µ) definida por

f(x) =x

|x| ={

1, se x > 0;

−1, se x < 0.∴ -

6

R−{ 0 }

R

1

−1

e contınua em todo ponto do seu domınio. Prove isto!

328

Page 330: Gentil Lopes - Espaços Métricos

12) Mostre que f , do exercıcio anterior, nao e uniformemente contınua.

13) Mostre, pela definicao (ou alguma de suas caracterizacoes), que a funcao

f : (R∗+, µ) −→ (R, µ) dada por f(x) =1

xe contınua.

14) A funcao f :([0, 1], µ

)−→

([0, 1[,k

)dada por,

f(x) =

{

x, 0 ≤ x < 1;

0, x = 1.

s0 1

2 1

12

1

¬

¬

e contınua em todo ponto do seu domınio.

Por exemplo, mostre que f e contınua em x = 0 e x = 1.

15) Considere M ={1n : n ∈ N

}∪ { 0 } e a funcao f : (M, µ) −→ (R, µ)

definida por f(0) = 0 e f(1n

)= n. Estude a continuidade de f .

16) Seja f : (R, µ) −→ (R, µ) dada por

f(x) =

{

x+ 1, se x ∈ N;

x, se x 6∈ N.

Mostre que f e contınua nos pontos de R− N mas nao e contınua em N.

17) Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos e f, g : M −→ N funcoescontınuas. Se f(a) 6= g(a), para algum a ∈ M , mostre que existe uma bolaB(a; ε) tal que f(x) 6= g(y), para quaisquer x, y ∈ B(a; ε).

18) Sejam f, g : (R, µ) −→ (R, µ) funcoes contınuas tais que f(x) = g(x)para todo x ∈ Q. Prove que f = g.

Sugestao: Use o exercıcio anterior.

19) Considere f : (R, µ) −→ (R, µ) dada por

f(x) =

{

x, se x ∈ Q;

0, se x 6∈ Q.

mostre que f so e contınua no ponto 0.

Sugestao: Use a proposicao 52 (p. 267) e 55 (p. 268).

329

Page 331: Gentil Lopes - Espaços Métricos

20) Seja ν :(Z4, σ

)−→

(Z4, ρ

)

Onde x = x1 x2 x3 x4 7−→ y = y1 y2 y3 y4 e tal que

yi =

{

1, se xi = 0;

0, se xi = 1.

Por exemplo,ν(1010

)= 0101 ; ν

(1100

)= 0011.

Estude a continuidade de ν.

21) Mostre que a transformacao f : (R, µ) −→ ( ] − 1, 1 [, µ) dada por

f(x) =x

1 + |x| e um homeomorfismo.

22) A aplicacao f : (R, µ) −→ (R2, D1) dada por f(x) = (x, 0) leva a retano plano euclidiano.

Mostre que f e uma imersao isometrica. Mostre que se no espaco(R2, D1

)trocarmosD1 porD2 ou porD3 , f continua uma imersao isometrica.

23) A aplicacao f :(R2, D1

)−→

(R3, D1

)dada por f

((x1 , x2)

)= (x1 , x2 , 0)

leva o plano euclidiano no espaco euclidiano.

Mostre que f e uma imersao isometrica. Mostre que se no espaco(R2, D1

)trocarmosD1 porD2 ouD3 , f nao sera mais uma imersao isometrica.

Interprete geometricamente suas conclusoes.

24) Perguntamos se existe (ou nao) uma imersao isometrica:

ϕ : ( [ 0, 1 [, µ ) −→ ( [ 0, 1 [, k )

Se existe, exiba-a; se nao, prove!

25) A rotacao de um angulo θ em torno de um ponto e uma transformacaoque preserva a distancia; em sendo assim, a rotacao depende da metricaconsiderada. Por exemplo, a rotacao do ponto (1, 0) de 90o em torno daorigem nas tres metricas do R2, fica assim:

ss

(1,0)

(0,1) s(1,0)

(0,1)

ss

(1,0)

(0,1)

Mostre que a transformacao rotacao em qualquer uma destas metricasnao e uma isometria em qualquer uma das outras duas metricas.

330

Page 332: Gentil Lopes - Espaços Métricos

26) Uma isometria em(ZN , σ

)e(ZN , τ

).

Considere a aplicacao complementacao, assim definida

T : SN SN

(x1 , x2 , ...,xn) (x1 , x2 , ...,xn )

onde

xi =

{

1, se xi = 0;

0, se xi = 1.

Exemplos,

(1 1 0 1

) (0 0 1 0

)

(0 1 1 1

) (1 0 0 0

)T

T

Observe que

σ(1 1 0 1, 0 1 1 1

)= 2 ; σ

(0 0 1 0, 1 0 0 0

)= 2.

Por outro lado,

τ(1 1 0 1, 0 1 1 1

)= 3 ; τ

(0 0 1 0, 1 0 0 0

)= 3.

Isto e, ambas as distancias foram preservadas. Mostre que T e uma isome-tria. Perguntamos se T e isometria no espaco

(ZN , ρ

).

27) Seja f : (R, µ) −→ (R, µ) dada por f(x) =

{

1, se x ∈ Q;

0, caso contrario.

Mostre − utilizando as proposicoes 42 (p. 212) e 55 (p. 268) − que f e de-scontınua em todo ponto do seu domınio.

28) Mostre que a funcao f : R2 → R dada por

f(x, y) =

x · yx2 + y2

, se (x, y) 6= (0, 0);

1

2, se (x, y) = (0, 0).

nao e contınua no ponto (0, 0).

Sugestao: Considere a sequencia (xn , yn) =(1n ,

2n

).

29) Mostre que a funcao f : (R∗+, µ) −→ (R, µ) definida por f(x) = 1/x naoe uniformemente contınua.

331

Page 333: Gentil Lopes - Espaços Métricos

30) Mostre que a bijecao f : [ 0, 1 [ ∪{ 2 } −→ [ 0, 1 ] dada por

f(x) =

{

x, se x ∈ [ 0, 1 [ ;

1, se x = 2.

e contınua e sua inversa descontınua.

31) Seja f uma funcao definida em R e suponha que existe M > 0 tal que|f(x)− f(p)| ≤M |x− p| para todo x. Prove que f e contınua em p.

32) Estabeleca um homeomorfismo entre os quadrados a seguir

1−1

1

−1

R

R

|x|+ |y|=1

f =?

1−1

1

−1

R

R

max{ |x|, |y| }=1

Nota: Considere a metrica usual do R2.

Sugestao: Aplique uma rotacao seguida de uma homotetia.

R45o

h√2

33) Com respeito ao exercıcio anterior mostre que se (x, y) ∈ 3 entaof(x, y) ∈ 2, de acordo com a figura.

34) Estabeleca um homeomorfismo entre o quadrado e o triangulo da figura:

1−1

1

−1

R

R

|x|+ |y|=1

f =?

1−1

1

−1

R

R

332

Page 334: Gentil Lopes - Espaços Métricos

35) Estabeleca um homeomorfismo entre o quadrado e o cırculo da figura:

1−1

1

−1

R

R

|x|+ |y|=1

f =?

1−1

1

−1

R

R

Sugestao: Inicialmente obtenha uma relacao entre as coordenadas dospontos no cırculo (xc , yc) e as cordenadas dos pontos no quadrado (xq , yq):

1−1

1

−1

R

R

ycxc

=yqxq

Depois considere os sistemas:

x2c+ y2

c= 1

xcyc

=xqyq

e

|xq | + |yq | = 1

xcyc

=xqyq

Resolva o sistema da esquerda para xc , yc para encontrar

f : 3 −→©

dada por

f(x, y) =( x√

x2 + y2,

y√

x2 + y2

)

36) No exercıcio anterior resolva o sistema da direita para xq , yq para en-contrar

f−1 : © −→ 3

e, apos, confirme os seguintes diagramas:

333

Page 335: Gentil Lopes - Espaços Métricos

f f−1

f−1 ◦ f = I3

e

ff−1

f ◦ f−1 = I◦

Resumindo: concluimos que podemos transformar (homeomorfamente)qualquer uma das figura seguintes

nas outras tres. De modo sugestivo podemos considerar qualquer uma destasfiguras como construıda com um fio delgado, flexıvel e elastico. O fato deserem homeomorfas significa que podemos transforma-las entre si sem causara ruptura do fio.

37) Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos e seja f : M −→ N . Mostreque f e contınua se, e somente se, f(A ) ⊂ f(A), para todo A ⊂M .

38) Seja f : ] 0, +∞ [−→ R, assim definida:

f(x) =

{

0, se x e irracional;

1n , se x = m

n , com mdc(m, n) = 1.

Prove que f e contınua em todo irracional e descontınua em todo racional.

334

Page 336: Gentil Lopes - Espaços Métricos

39) Prove que a funcao f : ([ 0, 1 ], µ) −→ ([ 0, 1 [, k) dada por

f(x) =

23 + 1

3 x, se 0 ≤ x < 1;

0, se x = 1.

(6.28)

cujo grafico esta plotado a seguir

x

f(x)

p p

pp

0 12

1

13

23

1 ◦

s

e contınua.

40) Prove que a funcao f : ([ 0, 1 ], µ) −→ ([ 0, 1 [, k) dada por

f(x) =

1 − 13 x, se 0 < x ≤ 1;

0, se x = 0.

(6.29)

cujo grafico esta plotado a seguir

x

f(x)

p p

pp

0 12

1

13

23

1 ◦

s

e contınua.

335

Page 337: Gentil Lopes - Espaços Métricos

41) Suponha que f : R −→ R seja contınua e periodica (isto e, para alguma ∈ R, f(x) = f(x+ a), x ∈ R). Mostre que f e uniformemente contınua.

42) Suponha f definida e contınua em R e que f(x) = 0 para todo x racional.Prove que f(x) = 0 para todo x real.

43) Mostre que a metrica usual em R, µ(x, y) = |x−y|, nao e uniformementeequivalente a metrica d sobre R dada por d(x, y) =

{1, |x3 − y3|

}.

44) Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos e seja f : M −→ N um homeo-morfismo. Se x ∈ M e f(x) = y, mostre que M − {x } e N − { y } saohomeomorfos.

45) Considere E = { a, b, c, d }. Determine qual(is) das colecoes a seguirsao topologias sobre E: (p. 280)

a ) T 1 = { { a }, { a, b }, ∅, E }b ) T 2 = { { a }, { a, b }, { c, d }, { a, c, d }, ∅, E }c ) T 3 = { { a }, {b }, {d }, { a, b }, ∅, E }

46) Sejam E um conjunto infinito, mostre que o par (E, T ), ondeT = {X ⊂ E : X = ∅ ou E −X e finito }

e um espaco topologico.

Definicao 43. Sejam E e F espacos topologicos. Uma funcao f : E −→ Fsera dita contınua quando para todo aberto A ⊂ F tivermos f−1(A) abertoem E.

47) Sejam E = { a, b, c, d } e a aplicacao f : (E, T 2) −→ (E, T 1), dadapor f(x) = x, onde T 1 e T 2 sao como no exercıcio 45. Mostre que f econtınua, porem sua inversa nao.

48) Seja (E, T ) o espaco topologico definido no exercıcio 46, verifique se afuncao f : E −→ R dada por f(x) = x e contınua ou nao.

49) Considere o espaco topologico (N, T ), onde T e a topologia definidano exercıcio 46, verifique se a funcao f : N −→ N dada por f(n) = n2 econtınua ou nao.

Definicao 44. Seja (E, T ) um espaco topologico. Dizemos que uma sequencia(xn) de pontos de E converge para p ∈ E se, para todo aberto G que contemp, existe um ındice natural r tal que: xn ∈ G, ∀ ≥ r.

O ponto p chama-se limite da sequencia .

50) Ao contrario do que ocorre nos espacos metricos, num espaco topologicouma sequencia pode convergir para mais de um ponto.

Para um exemplo, considere o espaco (E, T ), onde E = { a, b, c, d }e T = { { a }, { c, d }, { a, c, d }, ∅, E } e a sequencia (a, a, a, . . .). Mostreque neste espaco essa sequencia converge para dois limites.

336

Page 338: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Apendice: Limites em espacos metricos

O conceito de limites de funcoes, estudado no Calculo e na Analise Real,e susceptıvel de generalizacao para espacos metricos arbitrarios, assim:

Definicao 45. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos, X ⊂M e a ∈Mum ponto de acumulacao de X. Dada uma funcao f : X −→ N , diremosque f tem limite b, em a, se, para todo ε > 0 dado, existir um δ > 0 tal que,para todo x ∈ X, a sentenca seguinte e verdadeira

0 < d1(x, a) < δ =⇒ d2

(f(x), b

)< ε

Tal numero b sera indicado por limx→ a

f(x) = b.

r rx δa

(M,d1 )

X

f rr bf(x)ε

(N, d2 )

A seguir colocamos, em sımbolos, a definicao de limite juntamente comsua negacao:

∀ ∃ ∀ε>0 δ>0 x∈X

; 0 < d1(x, a) < δ =⇒ d2

(f(x), b

)< ε

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ∈X

; 0 < d1(xδ , a) < δ ∧ d2

(f(x

δ), b)≥ ε0

( b e limite de f em a)

( b nao e limite de f em a)

Observacoes:

1a) So tem sentido indagarmos pelo limite de uma funcao f : X −→ N emum ponto a ∈M , quando este ponto e de acumulacao do domınio X de f . Oque significa que se X tiver pontos isolados, entao nao podemos perguntarpelo limite em tais pontos.

Se desejassemos considerar a mesma definicao no caso em que a 6∈ X ′

(isto e, para pontos isolados do domınio da funcao) entao todo numero realb seria limite de f(x) em a.

337

Page 339: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Para provar esta ultima afirmativa faremos uma exegese da definicao delimite, dada em sımbolos. De fato, se a 6∈ X ′ (isto e, se a e ponto isolado dodomınio de f) entao existe δ′ > 0 tal que

(X−{ a }

)∩ B

d1(a; δ) = ∅. Isto e,

0 < d1(x, a) < δ′, x ∈ X nao se verifica para nenhum ponto x do domınio.Isto quer dizer que, para o tal δ′, a sentenca

∀ ; 0 < d1(x, a) < δ′x∈X

e falsa. Esta sentenca pode ser reescrita assim:

∃δ>0

∀ ; 0 < d1(x, a) < δx∈X

Pois bem, sendo esta sentenca falsa, torna-se verdadeira a sentenca:

∃ ∀δ>0 x∈X

; 0 < d1(x, a) < δ =⇒ d2

(f(x), b

)< ε

p q p−→ q

V V V

V F F

F V V

F F V

independentemente do valor logico da sentencaq(x) : d2

(f(x), b

)< ε. Isto e, independentemente

do valor de b e de ε > 0. Portanto, sendo a sentenca:

∀ ∃ ∀ε>0 δ>0 x∈X

; 0 < d1(x, a) < δ =⇒ d2

(f(x), b

)< ε

verdadeira temos, por definicao, limx→ a

f(x) = b.

Portanto esta e a justificativa para exigirmos que a seja um ponto deacumulacao de X. Observe (prop. 47, p. 221) que sendo a um um pontode acumulacao de X, entao todo intervalo aberto centrado em a conteminfinitos pontos do domınio.

2a) Sendo a um ponto de acumulacao de X, a pode ou nao pertencer aodomınio X da funcao. Nos casos mais importantes de limite, tem-se a 6∈ X.

3a) Considerando um ponto a do domınio o valor b = limx→ a

f(x) (quando

existe) pode ser independente do valor que f assume em a, isto e, de f(a).Quando estivermos interessados no limite de f em a, basta olharmos

para os valores que f assume numa “pequena” bola aberta centrada em a;o conceito de limite e um conceito local.

4a) Suponhamos f definida em a. Oportunamente mostraremos que

f contınua em a ⇐⇒ limx→ a

f(x) = f(a).

Proposicao 71 (Unicidade do limite). Sejam (M, d1) e (N, d2) espacosmetricos, X ⊂ M e a ∈ X ′. Dada f : X −→ N , se lim

x→ af(x) = b e

limx→ a

f(x) = c, entao b = c.

338

Page 340: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Se limx→ a

f(x) = b e limx→ a

f(x) = c entao

dado ε > 0 existem δ1 > 0 e δ2 > 0 tais que

0 < d1(x, a) < δ1 =⇒ d2

(f(x), b

)<ε

2

0 < d1(x, a) < δ2 =⇒ d2

(f(x), c

)<ε

2

Seja δ = min{ δ1 , δ2 }. Entao, se x′ ∈ X − { a } temos

0 < d1(x′, a) < δ =⇒

d2

(f(x′), b

)< ε

2

d2

(f(x′), c

)< ε

2

Logo,

d2(b, c) ≤ d2

(b, f(x′)

)+ d2

(f(x′), c

)<ε

2+ε

2= ε

Como ε > 0 e arbitrario, concluimos que d2(b, c) = 0 e assim b = c. �

Exemplos:

1) Considere a aplicacao f : [ 0, 1[−→ [ 0, 1[ identidade f(x) = x.

Mostre que para:

a) f :([ 0, 1[, µ

)−→ ([ 0, 1[, k) temos que lim

x→0x = 0;

b) f :([ 0, 1[, k

)−→ ([ 0, 1[, µ) temos que lim

x→0x 6= 0.

Solucao:

a) Devemos mostrar que e verdadeira a sentenca

∀ ∃ ∀ε>0 δ>0 x∈X

; 0 < d1(x, a) < δ =⇒ d2

(f(x), b

)< ε

∀ ∃ ∀ε>0 δ>0 x∈[ 0, 1 [

; 0 < |x− 0| < δ =⇒ k(f(x), 0

)< ε

Tomando δ = min{ 12 , ε }, resulta que

0 < x < δ =⇒ k(f(x), 0

)= k

(x, 0

)= min{x, 1− x } = x < ε.

Isto prova que limx→ 0

x = 0.

339

Page 341: Gentil Lopes - Espaços Métricos

b) Devemos mostrar que e verdadeira a sentenca

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ∈X

; 0 < d1(xδ, a) < δ ∧ d2

(f(x

δ), b)≥ ε0

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ∈[ 0, 1 [

; 0 < k(xδ, 0) < δ ∧

∣∣f(x

δ)− 0

∣∣ ≥ ε0

Para mostrar que limx→ 0

x 6= 0 tomemos ε0 = 14 e mostremos que ∀ δ > 0,

∃xδ∈ [ 0, 1 [ com ; 0 < k(x

δ, 0) < δ e

∣∣f(x

δ)∣∣ ≥ 1

4 .

Sem perda de generalidade consideremos δ < 12 e escolhamos x

δ= (1−δ)+1

2 =

1− δ/2. Observe que k(xδ, 0) = min{x

δ, 1− x

δ} = 1− x

δ= δ

2 < δ e,

f(xδ) = x

δ= 1− δ

2≥ 1

4⇐⇒ δ ≤ 3

2.

Sendo assim mostramos que limx→ 0

x 6= 0. Veja a geometria (para δ < 12 ):

0 δ 12 1−δ 1

12

1

sxδ

f(xδ)

[

¬

¬

Deixamos como exercıcio ao leitor mostrar que limx→ 0

x nao existe.

340

Page 342: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2) Consideremos o espaco metrico ([ 0, 1[, k) e X = [ 12 , 1 [. Considere aaplicacao, f : X −→

([ 0, 1[, µ

)dada por f(x) = x. Mostre que lim

x→0x 6= 0.

Solucao: Inicialmente vejamos graficamente o que esta acontecendo:

12

10

12

1

¬

sx→

sf(x) ↑

Por curiosidade observe que se no espaco ([ 0, 1[, k) trocarmos de metrica,isto e, se substituirmos k por µ, resulta que 0 nao e um ponto de acumulacaode X, o que significa que nao faz sentido indagarmos pelo limite lim

x→0f(x).

Entretanto, em funcao do exemplo 3 (p. 220), estamos autorizados a perquiriro referido limite. Pois bem, devemos mostrar que e verdadeira a sentenca,

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ∈X

; 0 < d1(xδ, a) < δ ∧ d2

(f(x

δ), b)≥ ε0

∃ ∀ ∃ε0>0 δ>0 x

δ∈[ 1/2, 1 [

; 0 < k(xδ, 0) < δ ∧

∣∣f(x

δ)− 0

∣∣ ≥ ε0

A prova e similar a do exemplo anterior; aqui so observamos (grafica-mente) a razao do porque lim

x→0x 6= 0: e que, enquanto x aproxima-se de 0,

sua imagem afasta-se de 0.

Neste mesmo exemplo, deixamos como exercıcio ao leitor fechar o inter-valo unitario no contradomınio e mostrar que lim

x→0x = 1.

Proposicao 72. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos, X ⊂ M ea ∈ X. Seja uma funcao f : X −→ N . Se a ∈ X ′, f sera contınua em a, see somente se, lim

x→af(x) = f(a).

Prova: Se f e contınua no ponto a, entao dado ε > 0 existira δ > 0de modo que d2

(f(x), f(a)

)< ε para todo x ∈ X com d1(x, a) < δ. Em

particular, se x ∈ X e 0 < d1(x, a) < δ teremos d2

(f(x), f(a)

)< ε. Logo

limx→a

f(x) = f(a).

341

Page 343: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Reciprocamente, se limx→a

f(x) = f(a), dado ε > 0 existira δ > 0 de modo

que d2

(f(x), f(a)

)< ε para todo x ∈ X − {a} com d1(x, a) < δ. Como

porem, d2

(f(a), f(a)

)= 0 < ε, temos que x ∈ X com d1(x, a) < δ implica

em d2

(f(x), f(a)

)< ε. Logo f e contınua no ponto a. �

Proposicao 73. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos, X ⊂M e a ∈X ′. Dada uma funcao f : X −→ N teremos lim

x→af(x) = p, se e somente se,

para toda sequencia (xn) em X −{ a } com limnxn = a tivermos lim

nf(xn) =

p.

Comentario: O teorema afirma a equivalencia entre duas sentencas abertasP e Q, que sao:

P : limx→a

f(x) = p

Q : ∀ (xn) ; limnxn = a =⇒ lim

nf(xn) = p

Prova: (P =⇒ Q) Aplicaremos a tecnica (T-5): (p. 573)

Suponhamos limx→a

f(x) = p. Entao, para todo ε > 0 dado, existe um

δ > 0 tal que, para todo x ∈ X,

0 < d1(x, a) < δ =⇒ d2

(f(x), p

)< ε.

Se (xn) e uma sequencia em X − { a } com limnxn = a, para este δ > 0

existe um ındice n0 tal que

n ≥ n0 =⇒ 0 < d1(xn , a) < δ

Logo, para todo n ≥ n0 acontece d2

(f(xn), p

)< ε, e assim lim

nf(xn) = p.

(Q =⇒ P ) Provaremos a contrapositiva desta proposicao, isto e: P =⇒ Q.

Antes vejamos como ficam estas negacoes:

P : limx→a

f(x) 6= p

Q : ∃ (xn) ; limnxn = a ∧ lim

nf(xn) 6= p

Para entender a negacao de Q o aluno devera consultar o corol. 49 (p. 579).

Pois bem, vamos supor que limx→ a

f(x) 6= p. Neste caso existe um ε0 >

0 tal que para todo δ > 0 se pode obter um ponto xδ∈ X − { a } com

d1(xδ, a) < δ e d2

(f(x

δ), p)≥ ε. Em particular, tomando δ > 0 da forma

δ = 1/n, para cada n ∈ N, podemos obter xn ∈ X − { a } com d1(xn , a) <1/n e d2

(f(xn), p

)≥ ε. Logo a sequencia (xn) assim obtida cumpre lim

nxn =

a mas nao cumpre limnf(xn) = p. �

Destacamos o seguinte importante

342

Page 344: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Corolario 19. Se existe uma sequencia xn ∈ X − { a } com limnxn = a e

limnf(xn) 6= p, entao lim

x→af(x) 6= p.

Prova: De fato, e suficiente considerar a contrapositiva de (P =⇒ Q)(neste caso vale a recıproca de P =⇒ Q) �

Exemplos:

1) Considere as funcoes f e g dadas assim f(x) = g(x) = x2. Mostre que:

a) f :([ 0, 1], µ

)−→ ([ 0, 1[, k) temos que lim

x→ 0x2 = 0;

b) g :([ 0, 1[, k

)−→ ([ 0, 1], µ) temos que lim

x→ 0x2 6= 0.

Solucao:

a) Considere uma sequencia (xn) em X−{0} = [ 0, 1 ]−{ 0 } = ] 0, 1 ] demodo que µxn −→ 0, sendo assim µx2

n−→ 0, donde concluimos que∗

kx2

n−→ 0,

isto e, limnf(xn) = 0 e, pela proposicao 73, concluimos que

µ

limx→ 0

f(x) =µ

limx→ 0

x2 = 0.

b) Considere a sequencia (xn) em ] 0, 1 [ dada por xn = 1− 1n+1 , sendo

assim kxn −→ 0. Por outro lado, f(xn) =(1 − 1

n+1

)2 µ−→ 1. Sendolimnf(xn) 6= 0, pelo corolario 19, concluimos que

k

limx→ 0

f(x) =k

limx→ 0

x2 6= 0.

Deixamos como exercıcio ao leitor mostrar que o limitek

limx→ 0

x2 nao existe.

2) Mostraremos agora que nao existe o limite da funcao f dada por f(x) =sen 1

x no ponto 0. De fato, basta observar que a sequencia

xn =1

π2 + nπ

converge para zero e, no entanto,

f(xn) = sen(π

2+ nπ

)= (−1)n.

nao tem limite.

3) Considere M ={1n : n ∈ N

}∪ {0} e a funcao f : M −→ N∪ {0} definida

por f(0) = 0 e f(1n

)= n, faca um estudo de lim

x→af(x).

(Obs: considere a metrica µ no domınio e no contradomınio de f).

∗Ver corolario 31, p. 425.

343

Page 345: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Solucao: O conjunto M − { 0 } e discreto. Como o unico ponto deacumulacao do domınio de f e a = 0 significa que este e o unico pontoem que faz sentido a pesquisa de lim

x→af(x). Por outro lado, como f nao e

contınua no ponto 0, significa isto que limx→0

f(x) 6= f(0) = 0.

Observe que o fato de a funcao nao ser contınua em 0 (por que?), nospermite concluir que o limite nao e f(0), o que nao significa que nao possaser um outro numero; isto e, ate o presente momento nao podemos concluirque o limite em questao nao existe. Observe que

f(M − {0}

)= { 1, 2, 3, . . .} = N,

o que significa que se limx→0

f(x) existir, devera ser um numero natural n′.

x

f(x)

q

qn′

qnδ

[

[

n′+ 12

n′− 12

(0,0) 1n′

[

−→

B(0; δ)

. . . rrrrrrrr

r

r

r

( 1n′ , n′)

( 1nδ, n

δ)Vamos agora provar que qualquer que seja o

natural n′ = b, arbitrariamente fixado, nao temoslimx→0

f(x) = b. Faremos isto seguindo a negacao

de limite, dada anteriormente em sımbolos. Poisbem, consideremos ε0 = 1/2, para todo δ > 0 nabola B(0; δ) existem infinitos pontos (0 e pontode acumulacao), tomemos um natural n

δde modo

que 1nδ< δ e n

δ6= n′, entao 0 < | 1

nδ− 0 | < δ e

∣∣∣ f( 1

)− n′

∣∣∣ = |nδ

− n′| ≥ ε0

Portanto, nao existe limx→0

f(x).

4) Seja a funcao f :(Z∞, ν

)−→

([ 0, 1 ], µ

)dada por

f((xn)

)=

∞∑

n=1

xn

2n

Calcule limx→ 101010...

f(x).

Solucao: Primeiramente observe que(Z∞, ν

)nao tem pontos isolados,

ou ainda: todos os seus pontos sao de acumulacao, o que significa que pode-mos perguntar por lim

x→ af(x) em todo a ∈ Z∞.

Como f e contınua segue que (p. 249)

limx→ 101010...

f(x) = f(101010 . . .) =2

3.

344

Page 346: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Extensao de aplicacoes contınuas

Consideremos uma aplicacao f : X ⊂ Y −→ N . A aplicacao F : Y −→ Nchama-se uma extensao de f quando F (x) = f(x) para todo x ∈ X, isto e,quando F

∣∣X = f .

Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos, X ⊂ M e f : X −→ Ncontınua. Diremos que f se estende continuamente a M quando f pos-sui uma extensao F : M −→ N contınua. Para os nossos propositos, no quediz respeito a extensao de aplicacoes contınuas, nos restringiremos a umaaplicacao f : X −→ N definida em um subconjunto denso X ⊂ M . Nestecaso mostraremos que uma tal extensao e possıvel se existe, para cada pontoa ∈ M o limite lim

x→ af(x). Dentro deste contexto ha de se notar que nem

toda aplicacao contınua f : X −→ N pode ser estendida continuamente aoespaco inteiro. Por exemplo a aplicacao (contınua)

f : ] 0, 1 [−→ R

x 7−→ 1x(x−1)

nao possui extensao contınua a nenhum conjunto M contendo o intervalofechado [ 0, 1 ], isto se deve a que nao existem os limites lim

x→ 0f(x) e lim

x→ 1f(x).

Proposicao 74. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos, X ⊂M ef : X −→ N contınua. Se para todo a ∈ X − X existe lim

x→af(x), entao a

funcao F : X −→ N dada por

F (y) =

f(y), se y ∈ X;

limx→ y

f(x), se y ∈ X −X.

e contınua.

Prova: Como f e contınua em todo ponto a ∈ X, decorre que, seja qualfor a ∈ X , temos F (a) = lim

x→ af(x). Da definicao de limite resulta que dado

ε > 0, existe δ > 0 de modo que, para todo x ∈ X

0 < d1(x, a) < δ =⇒ d2

(f(x), F (a)

)<ε

2. (6.30)

Afirmamos que se y ∈ X e

d1(y, a) < δ =⇒ d2

(F (y), F (a)

)< ε (F e contınua em a.)

De fato, como y ∈ X segue que existe uma sequencia (xn) com xn ∈ Xde modo que lim

nxn = y.

345

Page 347: Gentil Lopes - Espaços Métricos

raδryδ1r

xm

Como xn → y, tomando um raio 0 < δ1 ≤ δ−d1(a, y), apartir de uma certa ordem n0 todos os termos da sequencia(xn) caem dentro da bola B(y; δ1) ⊂ B(a; δ). Escolhamosdentro desta bola um termo xm diferente de y e de a. Sendoassim temos 0 < d1(xm , y) < δ1 e 0 < d1(xm , a) < δ. Logo

d2

(F (y), F (a)

)≤ d2

(F (y), f(xm)

)+ d2

(f(xm), F (a)

)<ε

2+ε

2= ε.

Como afirmamos. �

Nota: (6.30) vale seja qual for a ∈ X, em particular vale para y ∈ X, daı

0 < d1(xm , y) < δ1 < δ =⇒ d2

(f(xm), F (y)

)<ε

2.

Proposicao 75. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos, com (N, d2)completo. Se X ⊂M e f : X −→ N e uniformemente contınua entao existelimx→a

f(x) para todo a ∈ X −X. (ou mais geralmente, para todo a ∈ X ′).

Prova: Para demonstrar esta proposicao provaremos que para todasequencia (xn) em X com lim

nxn = a, existe lim

nf(xn

)(prop. 73, p. 342).

Seja entao (xn) uma sequencia em X com limnxn = a. Entao (xn) e de

Cauchy (def. 53, p. 407). Dado ε > 0, a continuidade uniforme de f asseguraum δ > 0 tal que (p. 288)

∀x, y ∈ X, d1(x, y) < δ ⇒ d2

(f(x), f(y)

)< ε.

Sendo (xn) de Cauchy, para este δ > 0 existe um ındice n0 tal que d1(xn , xm) <δ sempre quem, n ≥ n0 . Assim, param, n ≥ n0 teremos d2

(f(xn), f(xm)

)<

ε, sendo assim(f(xn)

)resulta uma sequencia de Cauchy em (N, d2). Como

(N, d2) e completo, existe limnf(xn

)e, por conseguinte, existe lim

x→af(x). �

Proposicao 76. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos, com (N, d2)completo. Se X ⊂ M e denso toda aplicacao f : X −→ N uniformementecontınua, possui uma unica extensao contınua F : M −→ N dada por

F (y) =

f(y), se y ∈ X;

limx→ y

f(x), se y ∈M −X.

F e tambem uniformemente contınua.

Prova: Da proposicao 75 sabemos que para todo y ∈ X −X =M −Xexiste lim

x→ yf(x). Assim, F esta bem definida e a proposicao 74 nos assegura

a continuidade de F . Resta agora mostrar que F e uniformemente contınua.

346

Page 348: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Dado ε > 0, a continuidade uniforme de f nos assegura um δ = δ(ε) > 0 talque

∀x, y ∈ X, d1(x, y) < δ ⇒ d2

(f(x), f(y)

)<ε

2.

Afirmamos que este mesmo δ atende ao ε para a continuidade uniforme deF . De fato, Sejam u, v ∈ M com d1(u, v) < δ. Da densidade de X em(M, d1) obtemos sequencias (xn) e (yn) em X com lim

nxn = u e lim

nyn = v.

Entao, pela continuidade da funcao distancia resulta

d1(u, v) = d1

(limnxn , limn

yn)= lim

nd1

(xn , yn

)< δ

e portanto existe um ındice n0 de modo que d1

(xn , yn

)< δ para todo n ≥ n0 ,

o que fornece

d2

(f(xn), f(yn)

)<ε

2, ∀n ≥ n0 .

Logo,

d2

(F (u), F (v)

)= d2

(lim f(xn), lim f(yn)

)(6.31)

= limnd2

(f(xn), f(yn)

)

≤ ε

2< ε.

Isto prova que F e uniformemente contınua. Para provar que a extensao Fe unica basta recorrer ao corolario 14 (p. 284). �

Nota: A igualdade em (6.31) se justifica assim: como xn ∈ X e tendo emconta a definicao de F resulta que F (xn) = f(xn). Como F e contınua,obtem-se

limnF (xn) = lim

nf(xn) ⇒ F

(limnxn

)= lim

nf(xn)

⇒ F(u)= lim

nf(xn).

Analogamente se mostra que F(v)= lim

nf(yn).

Corolario 20. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos completos e umhomeomorfismo uniforme f : X −→ Y entre subespacos densos X ⊂ Me Y ⊂ N , f se estende, de modo unico, a um homeomorfismo uniformeF : M −→ N .

Prova: De fato, seja g : Y −→ X o inverso de f . Pela proposicao 76existem aplicacoes uniformemente contınuas F : M −→ N e G : N −→ Mextensoes de f e g respectivamente. As aplicacoes contınuas G◦F : M −→M e F ◦ G : N −→ N sao tais que

(G ◦ F

)(x) = x para todo x ∈ X e

(F ◦ G

)(y) = y para todo y ∈ Y . Como X ⊂ M e Y ⊂ N sao ambos

densos, segue que G ◦F = idM

e F ◦G = idN. Logo, G = F−1 e, portanto,

F e um homeomorfismo uniforme de M sobre N . �

347

Page 349: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Adendo:

F∣∣X = f ⇒ F (x) = f(x), ∀x ∈ X;

G∣∣Y = g ⇒ G(y) = g(y), ∀ y ∈ Y.

Logo,

(G ◦ F

)(x) = G

(F (x)

)= G

(f(x)

)= g(f(x)

)= x, ∀x ∈ X;

(F ◦G

)(Y ) = F

(G(y)

)= F

(g(y)

)= f

(g(y)

)= y, ∀ y ∈ Y.

Portanto, G ◦ F = idX, como X = M ; duas aplicacoes que coincidem em

um subconjunto denso sao iguais (ver corol. 14, p. 284), isto e, G ◦ F = idM. O

mesmo raciocınio se aplica ao caso F ◦G = idN.

∗ ∗ ∗

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348

Page 350: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Capıtulo 7ESPACOS METRICOS CONEXOS

E uma experiencia como nenhuma outra que eu possa descrever,

a melhor coisa que pode acontecer a um cientista, compreender que al-

guma coisa que ocorreu em sua mente corresponde exatamente a alguma

coisa que aconteceu na natureza. E surpreendente, todas as vezes que

ocorre. Ficamos espantados com o fato de que um construto de nossa

propria mente possa realmente materializar-se no mundo real que existe

la fora. Um grande choque, e uma alegria muito grande. (Leo Kadanoff, fısico)

7.1 Definicao e Exemplos

Introducao: A conexidade de um conjunto e mais um conceito daanalise real transplantado para a teoria dos espacos metricos. Como frisouacertadamente o eminente Von Newmann, na epıgrafe do capıtulo anterior,as ideias matematicas tem sua origem em situacoes empıricas, ou “euclidia-nas”, por assim dizer; mas, como o filho prodigo da parabola, abandonam acasa paterna e assumem uma identidade e crescimento proprios motivadosquase que inteiramente por “orgias esteticas”. Este e o caso do conceito deconexidade que surgiu da observacao de conjuntos formados de um “unicopedaco”; aqui, na topologia, veremos conjuntos constituidos de muitos −milhares de pedacos − “tao distantes entre si quanto se queira” e, mesmoassim, conexos − e, o que e “pior”, conexo por caminhos!

Ademais, no presente capıtulo estaremos dando respaldo matematico amais uma afirmativa abstrusa da fısica quantica, qual seja: a de que “eletronsse movem de A para B sem nunca passar entre esses pontos.”

Definicao 46 (Espaco desconexo). Um espaco metrico (M, d) se diz des-conexo quando existem dois conjuntos abertos A e B, ambos nao vazios, demaneira que

A ∩B = ∅ e A ∪B =M (7.1)

Diz-se entao que o par A e B constitui uma desconexao de M .

349

Page 351: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Um espaco conexo e um espaco que nao e desconexo. Portanto, dizerque M e conexo significa dizer que nao existe nenhuma desconexao de M .

As condicoes dadas em (7.1) nos dizem que A = Bc, o que significa queA tambem e fechado em M e ainda B = Ac o qual tambem e fechado emM . Em resumo, numa desconexao os conjuntos A e B sao simultaneamenteabertos e fechados em M .

Um subconjuntoX ⊂M se diz conexo quando o subespaco (X, d), onded e a metrica induzida sobre X pela metrica de M , e conexo.

Exemplos:

1) Em todo espaco metrico (M, d) um conjunto unitario { a } e conexo.

Com efeito, e impossıvel exibir dois abertos A 6= ∅ e B 6= ∅ tais queA ∩B = ∅ e A ∪B = { a }.2) O espaco (R, δ) e desconexo, enquanto o espaco (R, µ) e conexo.

Prova: Consideremos qualquer a ∈ R. Os conjuntos A = { a } eB = R− { a } sao abertos no espaco (R, δ). Sendo assim A e B constituemuma desconexao de R.

Para mostrar que o espaco (R, µ) e conexo procederemos por contradicao,supondo que existem A e B abertos de modo que

A 6= ∅, B 6= ∅; A ∩B = ∅; A ∪B = R.

Tomemos a ∈ A e b ∈ B e suponhamos a < b. Consideremos o conjunto

X ={x ∈ A : x < b

}

de todos os elementos de A situados a esquerda de b. Pois bem, temos quea ∈ X e que b e uma cota superior de X. Portanto sendo X um conjuntonao-vazio e limitado superiormente possui supremo, digamos c = supX.Como o supremo de um conjunto e a menor de suas cotas superiores resultaque c ≤ b (♯). Pela definicao de supremo, para todo ε > 0 existe x ∈ X(por conseguinte x ∈ A) tal que

c− ε < x ≤ c ∴ c− ε < x < c+ ε ∴ x ∈ ] c− ε, c+ ε [.

De outro modo,

∀ ε > 0 ⇒ Bµ(c; ε) ∩A 6= ∅ R¬c] [ց

x∈A

c−ε c+ε

sportanto c e ponto aderente de A (c ∈ A). Sendo A fechado temos que c ∈ A.Portanto c 6= b, e, considerando (♯), concluimos que c < b. Sendo A abertoc e ponto interior de A, logo existe ǫ > 0 de modo que ] c − ǫ, c + ǫ [ ⊂ A.Invocando a propriedade arquimediana podemos encontrar dois naturais n′

e n′′ satisfazendo 1n′ < ǫ e 1

n′′ < b− c.

350

Page 352: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vamos escolher n0 = max{n′, n′′ }, portanto n0 ≥ n′ e n0 ≥ n′′ do que

resulta1

n0

≤ 1

n′X

1

n0

≤ 1

n′′

portanto,

1n0≤ 1

n′ < ǫ ⇒ c+ 1n0< c+ ǫ (♭)

1n0≤ 1

n′′ < b− c ⇒ c+ 1n0< b (♮)

de (♭) concluimos que c + 1n0∈ ] c − ǫ, c + ǫ [ ⊂ A e, considerando (♮), con-

cluimos que c+ 1n0∈ X. Isto contradiz o fato de que c = supX. �

3) Os espacos (N, µ) e (M, µ), onde M ={1, 1

2 , . . . ,1n , . . .

}sao ambos

desconexos. Estes sao casos especiais da seguinte

Proposicao 77. Todo espaco (M, d) discreto (no qual M tem mais que umelemento) e desconexo.

Prova: De fato, em um espaco metrico (M, d) discreto, todo subconjuntode M e aberto. Sendo assim { a } e M − { a }, onde a ∈ M e arbitrario,constitue uma desconexao do espaco M . �

4) Q com a metrica µ induzida de R e desconexo. De fato, para exibir umadesconexao de Q tome α um irracional qualquer e considere os seguintessubconjuntos de Q

A = {x ∈ Q : x < α} e B = {x ∈ Q : x > α}

Vamos mostrar que A e B sao abertos no subespaco (Q, µ). Para tantoconsidere os seguintes subconjuntos de R

C = {x ∈ R : x < α} = ] −∞, α [ e D = {x ∈ R : x > α} = ]α, +∞ [

C e D sao abertos em (R, µ). Como A = Q ∩ C e B = Q ∩D segue que Ae B sao abertos (prop. 24, p. 193) no espaco (Q, µ). Alem do mais temos,

A ∩B = (Q ∩ C) ∩ (Q ∩D)

= Q ∩ (C ∩D)

= Q ∩ ∅ = ∅

tambem,

A ∪B = (Q ∩ C) ∪ (Q ∩D)

= Q ∩ (C ∪D)

= Q ∩ (R − {α }) = Q

Portanto A e B constituem uma desconexao de Q.

351

Page 353: Gentil Lopes - Espaços Métricos

5) Consideremos o subconjunto X = { (x, y) ∈ R2 : x y = 1 } do R2.

O subespaco (X, D1), onde D1 e a metrica usual do R2, e desconexo.

De fato, para exibir uma desconexao de X considere os seguintes sub-conjuntos

A = { (x, y) ∈ X : x > 0 } e B = { (x, y) ∈ X : x < 0 }

Vamos mostrar que A e B sao abertos no subespaco (X, D1). Para tantoconsidere os seguintes subconjuntos de R2

C = { (x, y) ∈ R2 : x, y > 0 } e D = { (x, y) ∈ R2 : x, y < 0 }

C e D sao abertos em (R2, D1).

R

R

0

X A

B

C

D

R

R

0

Como A = X∩C e B = X∩D segue que A e B sao abertos no subespaco(X, D1). Alem do mais temos,

A ∩B = (X ∩ C) ∩ (X ∩D)

= X ∩ (C ∩D)

= X ∩ ∅ = ∅

tambem

A ∪B = (X ∩ C) ∪ (X ∩D)

= X ∩ (C ∪D)

= X.

Portanto A e B constituem uma desconexao de X.

352

Page 354: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 78. A imagem de um conjunto conexo por uma aplicacaocontınua, f : M −→ N , e um conjunto conexo.

Prova: Vamos provar inicialmente para o caso particular em que f esobrejetora, isto e f(M) = N , eM e conexo. Procederemos por contradicao.Suponhamos que existam abertos A,B ⊂ N formando uma desconexao deN , isto e, tais que

A, B 6= ∅ , A ∩B = ∅ , A ∪B = N.

Sendo assim obtemos

f−1(A ∩B) = f−1(∅) ⇒ f−1(A) ∩ f−1(B) = ∅

f−1(A ∪B) = f−1(N) ⇒ f−1(A) ∪ f−1(B) =M

Destas igualdades concluimos que f−1(A) e f−1(B) formariam uma des-conexao (prop. 62, p. 279) de M , contrariando a hipotese de que o mesmo econexo.

Nota: De N = f(M) ⇒ f−1(N) = f−1(f(M)) = M esta ultimaigualdade so vale se f e sobrejetora.

O caso geral reduz-se a este uma vez que sendo f : M −→ N contınuae dado X ⊂ M conexo, entao f : X −→ f(X) e uma sobrejecao contınua oque implica na conexidade de f(X) pelo que acabamos de provar. �

Corolario 21. Se M e conexo e N e homeomorfo a M , entao N tambem econexo.

Portanto a conexidade e uma propriedade topologica. Dizemos: e uminvariante topologico.

Corolario 22. Seja (M, d) um espaco metrico conexo. Se d′ ∼ d entao oespaco (M, d′) tambem e conexo.

Prova: Se d ∼ d′ entao a aplicacao identidade i : (M, d) −→ (M, d′)e um homeomorfismo. Portanto o corolario anterior nos assegura que se(M, d) e conexo decorre que (M, d′) tambem e conexo. �

Proposicao 79. Seja (M, d) um espaco metrico. Se (X, d) e conexo entao(X, d) tambem o e. Em outras palavras: o fecho de um conjunto conexo econexo.

Prova: Vejamos inicialmente o caso particular em que X = M (isto e,X e denso em M). Procederemos por contradicao. Suponha que X = Mnao e conexo, entao existem A, B abertos nao vazios tais que

A ∩B = ∅ , A ∪B =M (7.2)

353

Page 355: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Temos que A ∩X e B ∩X sao abertos no subespaco (X, d) (prop. 24, p. 193)

alem do que sao nao-vazios (prop. 45, p. 217). Pretendemos mostrar que estesconjuntos formam uma desconexao de X∗. Isto e, que

{

(A ∩X) ∪ (B ∩X) = (A ∪B) ∩X = X

(A ∩X) ∩ (B ∩X) = (A ∩B) ∩X = ∅

Invocando (7.2), temos (A∪B)∩X =M ∩X = X; tambem (A∩B)∩X =∅ ∩X = ∅. Portanto temos uma negacao de nossa hipotese.

No caso geral, considerando X conexo queremos provar que X e conexo.Este caso reduz-se ao anterior uma vez que X e denso no subespaco (X, d)conforme nota da p. 216. �

Corolario 23. Se X ⊂ Y ⊂ X e X e conexo, entao Y e conexo.

Prova: De fato, o fecho de X no subespaco (Y, d) e†

X(Y, d)

= X(M, d)

∩ Y

como, por hipotese, Y ⊂ X(M, d)

segue que X(M, d)

∩ Y = Y , portanto

X(Y, d)

= Y logo X e denso no subespaco (Y, d) e portanto, sendo X conexo,

X(Y, d)

= Y e conexo. �

Um conexo com “dois pedacos”

Agora faremos uma aplicacao deste corolario para chegarmos a uma “sur-preendente” conclusao: a de que existem conjuntos conexos “formados demais de um pedaco”.

Para construirmos um tal conjunto consideremos o espaco (R2, D1). Seja

X ={(x, y) ∈ R2 : y = cos(1/x), x > 0

}

A funcao f dada por f(x) = cos(1/x) e contınua, pelo exemplo 7 (p. 308),concluimos que X e homeomorfo ao domınio ] 0, +∞ [ de f . Portanto X econexo. Seja ainda o seguinte subconjunto do R2

Y ={(0, y) ∈ R2 : − 1 ≤ y ≤ 1

}= { 0 } × [−1, 1 ].

Todo ponto y ∈ Y e aderente a X (ex. 2o, p. 215), Y e fechado (prop. 31, p. 202).Entao

y ∈ Y ⇒ y ∈ X ⇒ Y ⊂ X ⇒ Y = Y ⊂ X.

Entao para todo

Z ⊂ Y ⇒ Z ⊂ X ⇒ X ∪ Z ⊂ X ∪ X = X

⇒ X ∪ Z ⊂ X ⇒ X ⊂ X ∪ Z ⊂ X.∗Se o subespaco (X, d) nao e conexo entao X ⊂ M nao e conexo, por def. (p. 350).†proposicao 36 (p. 206)

354

Page 356: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Portanto, pelo corolario anterior, X ∪ Z e conexo.No caso particular em que Z = Y temos que o conjunto na figura a

seguir e conexo.

¬

y

1

0

−1

Observe que, nao obstante Y ∩X = ∅, toda bola centrada em qualquerponto de Y intersecta X, o que nao se configura no grafico por limitacoestecnicas. (p. 215)

7.2 Conexos na reta

Iremos agora caracterizar os conjuntos conexos da reta. Mostraremos quena reta usual de fato um conjunto e conexo se, e somente se, e constituido deum so “pedaco”− veremos, oportunamente, que para outras metricas istodeixa de ser verdade.

Proposicao 80. Um subconjunto da reta e conexo se, e somente se, e umintervalo.

Lembramos que os intervalos em R sao da seguinte forma:

] a, b [, ] a, b ], [ a, b [, [ a, b ]; intervalos limitados;

]−∞, a [, ]−∞, a ], ] a, +∞ [, [ a, +∞ [, ]−∞, +∞ [; intervalos ilimitados.

Um intervalo X pode caracterizar-se pela seguinte propriedade:

a, b ∈ X, a < x < b ⇒ x ∈ X.

Prova:(⇐=

)Todo intervalo aberto e conexo por ser homeomorfo a R. (p. 304)

Daqui e da proposicao 79 (p. 353) concluimos que todo intervalo fechadoou semi-fechado e conexo.(=⇒

)SuponhaX ⊂ R conexo e mostremos queX e um intervalo. Suponha

a, b ∈ X e que a < c < b.

355

Page 357: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Provaremos que c ∈ X. Com efeito, suponha contrariamente que c 6∈ X,facamos

A = X ∩ ] −∞, c [ e B = X ∩ ] c, +∞ [

Rs s sa c b

]−∞, c [

] c,+∞ [

--

[

]

A e B sao abertos (no subespaco (X, µ)) sao nao vazios porque a ∈ A eb ∈ B. Mostremos que A e B formam uma desconexao de X. Entao

A ∩B = (X ∩ ] −∞, c [ ) ∩ (X ∩ ] c, +∞ [ )

= X ∩ ( ] −∞, c [ ∩ ] c, +∞ [ )

= X ∩ ∅ = ∅.Tambem

A ∪B = (X ∩ ] −∞, c [ ) ∪ (X ∩ ] c, +∞ [ )

= X ∩ ( ] −∞, c [ ∪ ] c, +∞ [ )

= X ∩ (R− { c } )= X.

Observe que neste momento usamos a hipotese de que c 6∈ X, pois se fossec ∈ X terıamos

X ∩(R− { c }

)= X − { c } 6= X.

Conclusao: Se assumirmos que c 6∈ X entao resulta X desconexo, contra-riando a hipotese. Portanto X e um intervalo. �

Corolario24. Se (M, d) e um espaco metrico conexo e f : M −→ R e umafuncao contınua, entao f(M) e um intervalo.

Prova: De fato, tendo em conta a proposicao 78 (p. 353), f(M) e umsubconjunto conexo da reta e, portanto, um intervalo. �

Nota: No caso em que f e constante f(M) sera um intervalo degenerado dotipo [ a, a ].

A teoria dos numeros irracionais nao foi colocada em solo firme ateas obras de Georg Cantor e seu contemporaneo Richard Dedekind nofinal do seculo 19. Ainda assim, da Idade Media ate aquela epoca, amaioria dos matematicos e cientistas ignorou o fato de que os numerosirracionais pareciam nao existir e, felizmente, usaram-nos de qualquermaneira − embora de forma desajeitada. Aparentemente, a recompensapor se obter a resposta correta suplantou o desagrado de se trabalhar comnumeros que nao existiam. (Leonard Mlodinow/A janela de Euclides, p. 78)

356

Page 358: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Aplicacoes do Corolario 24:

1. Teorema do Valor Intermediario

Corolario 25. Seja (M, d) um espaco metrico conexo e f : M −→ R umafuncao contınua. Se y1 , y2 ∈ f(M) e y1 < y < y2, entao existe x ∈ M talque f(x) = y.

Prova: Como f e contınua, segue que f(M) ⊂ R e conexo. Daı f(M)e um intervalo e portanto y ∈ f(M) = { f(x) : x ∈ M }. Portanto existex ∈M de modo que f(x) = y. �

Em outras palavras: Se o domınio de uma funcao contınua e conexo,entao f toma todos os valores entre dois valores quaisquer de sua imagem.

A seguir ilustramos esta situacao para o caso especial em que M e umintervalo da reta.

R

R

0

f(x)

p p px1 x x2

y

y

y

y1

y

y2

⊢ ⊣� -M

f(M)

?

6

• Teorema do Valor Intermediario.

∗ ∗ ∗

Interregno: Uma palavrinha ao leitor

Talvez o leitor nao faca ideia do quao difıcil e a diagramacao (formatacao)de um livro, ainda mais de um livro cheio de figuras, como e o caso do pre-sente e, por outro lado, em acrescimo, muitas vezes ainda tenho que decidirquando − por razoes didaticas − devo forcar uma figura a ficar na mesmapagina da explanacao correspondente, como aconteceu na pagina seguinte.Algumas vezes, para nao deixar um espaco razoavel de uma pagina embranco, decidi inserir algumas informacoes matematicas uteis ao estudante,como aconteceu na pagina precedente.

Ademais, devo informar que o presente livro esta sendo escrito a “umamaos”− inclusive sem nenhum apoio institucional − e que nao sou diagra-mador profissional, tenho me esforcado bastante para fazer o melhor.

Definicao 47 (Ponto fixo). Um ponto fixo de uma aplicacao f : M −→ Me um ponto p ∈M tal que f(p) = p.

357

Page 359: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2. Teorema do Ponto fixo de Brower

Caso Particular: Dada uma funcao contınua f : [ a, b ] −→ [ a, b ], existec ∈ [ a, b ] de maneira que f(c) = c.

Prova: Com efeito, se f(a) = a ou f(b) = b nada a fazer. Suponhamosf(a) 6= a e f(b) 6= b. Sendo assim podemos escrever

a < f(a) < b e a < f(b) < b.

Consideremos a funcao auxiliar g : [ a, b ] −→ R dada por g(x) = x − f(x).Obviamente g e contınua (diferenca de duas funcoes contınuas) e ademais

g(a) = a− f(a) < 0 e g(b) = b− f(b) > 0.

R

x

g

0 a c b

?

6

g([ a, b ])

y

y

g(a)

g(b)

[ ]s

Sendo g(a) < 0 < g(b) segue − do teorema do valor intermediario − queexiste c ∈ [ a, b ] de modo que: g(c) = 0 ⇒ c− f(c) = 0 ⇒ f(c) = c. �

Geometricamente o significado do teorema do ponto fixo e que a retay = x intercepta o grafico de y = f(x) em pelo ao menos um ponto: (c, f(c)).

f(x)

x

f

0 c

f(c)

)45o

q

y

f(x)

x[ ]��������������]

]

0 ca b

a

b y=x

f(c)

q

y

358

Page 360: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) A funcao dada por f(x) = x2 tem dois pontos fixos: x = 0 e x = 1.

De fato,

f(x) = x2 = x⇒ x · (x− 1) = 0

⇒ x = 0, x = 1.

���������

x

f(x)

0 x=1

2) A funcao cosseno tem como ponto fixo x = 0, 739085133215 . . ., com pre-cisao suficiente para nao ser denunciado por qualquer calculadora cientıfica.

π2

π 3π2

2πx

1

−1

x

y = cos x y=x

���������

π

2= 1, 5707963268 . . .

π

5= 0, 628318530718 . . . e

π

4= 0, 785398163398 . . .

π

5< x <

π

4

Sugerimos ao leitor confirmar em uma calculadora cientıfica que

cos(0, 739085133215) = 0, 739085133215

Observacao: Sua calculadora deve estar no modo rad (radiano).

359

Page 361: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3) A funcao cossecante (csc) tambem tem o seu ponto fixo:

x = 1, 11415714087 . . .

Uma vez que

csc(1, 11415714087 . . .) =1

sen (1, 11415714087 . . .)

= 1, 11415714087 . . .

Nota: No proximo capıtulo aprenderemos como encontrar o ponto fixo deuma aplicacao.

Consideremos a seguinte aplicacao (p. 616)

f : [ 0, 1 ] −→ Rn

t 7−→ (1−t) a+tb

Isto e, f(t) = (1− t)a+ tb. Entao

f(t) = (1− t)a+ tb

= (1− t) (a1 , . . . , an) + t (b1 , . . . , bn)

=((1− t) a1 + t b1 , . . . , (1− t) an + t bn

)

As funcoes dadas a seguir

fi : [ 0, 1 ] −→ R (i = 1, 2, . . . , n)t 7−→ (1−t) a

i+t b

i

Isto e, fi(t) = −(ai − bi) t + ai sao funcoes contınuas, disto segue que f econtınua (prop. 57, p. 272).

Por outro lado

f([ 0, 1 ]

)={f(t) : t ∈ [ 0, 1 ]

}

={(1− t)a+ tb : t ∈ [ 0, 1 ]

}

= [a, b ].

De modo que o segmento [a, b ] e imagem do conexo [ 0, 1 ] pela aplicacaocontınua f . Portanto todo segmento de reta no Rn e conexo.

Observe que a reuniao de conjuntos conexos nao e necessariamente conexa.Por exemplo os conjuntos X = ] − ∞, 0 [ e Y = ] 0, ∞ [ sao conexos noespaco (R, µ), mas X ∪Y = ] −∞, 0 [ ∪ ] 0, ∞ [ nao e conexo neste espaco.Isto acontece porque X e Y sao disjuntos. E o que nos assegura a seguinte

360

Page 362: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 81. Seja(X

λ

)

λ∈Luma famılia arbitraria de conjuntos cone-

xos num espaco metrico (M, d). Se todos os Xλcontem um ponto comum

a ∈M , entao a reuniao X =⋃

λ∈LX

λtambem e conexa.

Prova: Para mostrar que o subespaco (X, d) e conexo procederemospor contradicao. Suponhamos que existam A e B abertos de modo que

A, B 6= ∅, A ∩B = ∅ e A ∪B = X.

Pois bem, o ponto a comum a todos os Xλpertence a A ou a B. Suponhamos

a ∈ A. Como B 6= ∅ e A ∩ B = ∅, existe b 6= a em X com b ∈ B. Esteponto b por sua vez devera estar, para algum µ ∈ L, no conjunto Xµ . Osconjuntos A ∩Xµ e B ∩Xµ sao abertos no subespaco (X, d) e sao ambosnao-vazios uma vez que a ∈ A ∩Xµ e b ∈ B ∩Xµ . Por outro lado temos

(A ∩Xµ

)∩(B ∩Xµ

)=(A ∩B

)∩Xµ = ∅

tambem

(A ∩Xµ

)∪(B ∩Xµ

)=(A ∪B

)∩Xµ

= X ∩Xµ = Xµ .

Portanto A∩Xµ e B ∩Xµ formam uma desconexao de Xµ , contrariando ahipotese de que todos os conjuntos da famılia

(X

λ

)

λ∈Lsao conexos. �

Corolario 26. Um espaco metrico (M, d) e conexo se, e somente se, doisquaisquer de seus pontos estiverem contidos em algum conexo X

ab⊂M .

Prova:

(=⇒) Dados a, b ∈ M e sendo M conexo por hipotese, fazemos M = Xab

ea proposicao esta provada.

(⇐=) Neste caso fixando a ∈ M podemos escrever M =⋃

b∈MX

ab. Como

a ∈ Xab

para todo b ∈M , a proposicao 81 nos assegura que M e conexo. �

Exemplos:

(i) Com o auxılio do corolario anterior podemos mostrar que o espaco(Rn, D1) e conexo. Com efeito, dados dois pontos quaisquer a, b ∈ Rn osegmento de reta [a, b ] e um conjunto conexo que contem a e b.

(ii) Com auxılio da proposicao 81 vamos construir mais um conjuntoconexo “formado de dois pedacos”: Consideremos o seguinte subconjuntodo plano R2

X ={(x, y) ∈ R2 : 0 ≤ x ≤ 1, y = x/n, n ∈ N

}

361

Page 363: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Este conjunto e formado dos pontos do segmento de reta que liga a origem(0, 0) aos pontos (1, 1/n), n ∈ N. De outro modo:

X =⋃

n∈NXn , onde Xn =

[(0, 0); (1,

1

n)]

Todo segmento Xn e conexo; ademais (0, 0) ∈ Xn , ∀n ∈ N; portanto pelaproposicao 81, X e conexo. Por outro lado considere o seguinte subconjunto:

Y ={(x, 0) ∈ R2 :

1

2≤ x ≤ 1

}=[ 1

2, 1]× { 0 }

Todo ponto y ∈ Y e aderente a X (p. 214) Y e fechado (prop. 31, p. 202). Entao

y ∈ Y ⇒ y ∈ X ⇒ Y ⊂ X ⇒ Y = Y ⊂ X.

Entao para todo

Z ⊂ Y ⇒ Z ⊂ X ⇒ X ∪ Z ⊂ X ∪ X = X

⇒ X ∪ Z ⊂ X ⇒ X ⊂ X ∪ Z ⊂ X.

Portanto, pelo corolario 23 (p. 354) X ∪ Z e conexo.

No caso particular em que Z = Y temos que o conjunto a seguir e conexo.

X1

X2

X3

...0 1

21

1

R

R

q

p p

...0

Veremos agora que a conexidade e preservada pelo produto cartesiano

∗ ∗ ∗

Como a teoria quantica, em que as leis da fısicas assumem novasformas bizarras, mas somente em domınios muito menores do que osencontrados na vida diaria, o espaco curvo pode existir, mas sendo taoproximo do euclidiano que, na escala da vida terrestre normal, nao detec-tamos a diferenca. E no entanto, como a teoria quantica, as implicacoesda curvatura para as teorias da fısica podem ser enormes.

(Leonard Mlodinow/A janela de Euclides, p. 111)

362

Page 364: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 82. Sejam (M1 , d1) e (M2 , d2) espacos metricos. Entao

M1 ×M2 e conexo, se e somente se, M1 e M2 sao conexos.

Prova: (=⇒) SuponhamosM1×M2 conexo. Consideremos as projecoes

p1 : M1 ×M2 −→M1

(x1 , x2) 7−→ x1

e p2 : M1 ×M2 −→M2

(x1 , x2) 7−→ x2

Temos

p1

(M1 ×M2

)={p1

((x1 , x2)

): (x1 , x2) ∈M1 ×M2

}

={x1 : (x1 , x2) ∈M1 ×M2

}=M1

Analogamente p2

(M1 ×M2

)=M2 . Como as projecoes sao contınuas temos

pela proposicao 78 (p. 353) que M1 e M2 sao conexos.

(⇐=) Reciprocamente, suponhamos M1 e M2 conexos e mostremos queM1 × M2 e conexo. A demonstracao consistira no seguinte: dados doispontos quaisquer a = (a1 , a2) e b = (b1 , b2) em M1 ×M2 mostraremos queexiste um conexo X

ab⊂M1 ×M2 que os contem e daı , pelo corolario 26 (p.

361), M1 ×M2 resultara conexo. Pois bem, inicialmente observemos que osconjuntosM1×{ b2 } e { a1 }×M2 sao conexos por serem homeomorfos aM1

e M2 , respectivamente. Por exemplo, a seguir temos dois homeomorfismos

f : M1 −→M1 × { b2 }x 7−→ (x, b2)

e g : M2 −→ { a1 } ×M2

x 7−→ (a1 , x)

Por outro lado temos que o ponto (a1 , b2) ∈(M1 × { b2 }

)∩({ a1 } ×M2

)

implicando em que Xab

=(M1 × { b2 }

)∪({ a1 } ×M2

)e um conexo que

contem a e b. (prop. 81, p. 361)

M1×M2

a1 b1

a2

b2

↓{ a1 }×M2

←M1×{ b2 }

M1

M2

s s

ss s

ss

(a1 , a2 )

(a1 , b2 ) (b1 , b2 )

363

Page 365: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Corolario 27. Sejam (M1 , d1), . . ., (Mn , dn) espacos metricos. Entao

M1 × . . . ×Mn e conexo se, e somente se, cada Mi (i = 1, 2, . . . , n) econexo. Em particular Rn = R× · · · × R e conexo.

7.3 Conjuntos conexos por caminhos

rConsidere o quadrado ao lado. Fixandoarbitrariamente dois pontos no mesmo,podemos unı-los por um traco contınuo. Deoutro modo, sentando a ponta de um lapisem um dos pontos podemos atingir o outrosem levantar a ponta.

O nome tecnico (matematico) do traco descrito pelo lapis e caminho eum objeto com tal propriedade, no caso o quadrado, e chamado de conjuntoconexo por caminhos.

Outra maneira de exprimir a conexidade de um espaco e dizer que sepode passar de um qualquer de seus pontos para outro por um movimentocontınuo, sem sair do espaco. Isto nos leva a nocao de espaco conexopor caminhos. (Elon Lages/[5])

Observe que podemos ate mutilar o quadrado de alguns modos, p. ex.

e mesmo assim ainda conseguimos ligar dois pontos quaisquer “sem levan-tar a ponta do lapis” − Ou seja, o quadrado nao perde a propriedade deconexidade por caminhos. Entretanto, isto nem sempre ocorre, veja:

s

sNa mutilacao ao lado retiramosa “terca” parte central do quadradooriginal. Agora acreditamos que oleitor nao podera ligar os pontos delados opostos por um traco contınuo;isto e, sem levantar a ponta do lapis(sem sair da regiao remanescente).

364

Page 366: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Esta foi a apresentacao intuitiva do conceito de conexidade. Vejamos oque seja, precisamente, um caminho.

Definicao 48 (Caminho em espacos metricos). Um caminho num espacometrico (M, d) e uma aplicacao contınua f : [ 0, 1 ] −→M . Os pontos f(0) ef(1) sao chamados ponto inicial e ponto final, respectivamente, do caminho.

Traduzindo essa definicao em um grafico, temos o seguinte:

0

1

f

(M, d)

p

q

O caminho e a transformacao (ou ainda, uma funcao; ou um algoritmo) fque vai do intervalo no conjuntoM −De ummodo equivalente: f transformaum ponto do intervalo em um ponto do conjunto M . Na figura temos umacurva (contınua) ligando os pontos p e q no conjunto M . Dizemos que estacurva e a imagem do intervalo pelo caminho f . Por simplificacao (abusode linguagem), por vezes estaremos considerando a propria curva como ocaminho. O ponto p e chamado de ponto inicial do caminho, e o ponto q echamado de ponto final; no sentido de que p e imagem, por f , do ponto 0 eq e imagem, por f , do ponto 1 do intervalo. Indicamos isto, assim:

f(0) = p e f(1) = q

Para consideracoes posteriores sera util termos em mente o seguinte:enquanto o “lapis” percorre o intervalo [ 0, 1 ] sua imagem, o caminho, vaisendo tracado no conjunto M , assim:

0

1

f

(M, d)

f(0)= p

f(1)= q

Reforcando: A ideia dessa figura e a seguinte: no inicio o lapis∗ apontapara a origem do intervalo, sua imagem e o ponto p, inicio do caminho;a medida que o lapis percorre o intervalo − no sentido do outro extremo− o caminho (curva) vai sendo descrito; quando o lapis atinge o extremosuperior do intervalo o caminho termina de ser tracado, isto e, estamos noponto λ(1) = q.

∗Representado na figura pela setinha:

365

Page 367: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Um exemplo de caminho em qualquer espaco metrico (M, d) e o caminhoconstante

f : [ 0, 1 ] −→M

t 7−→ c

onde c ∈M e arbitrariamente fixado.

Justaposicao de caminhos

Dados dois caminhos f, g : [ 0, 1 ] −→M tal que f(1) = g(0), definamosa aplicacao f ∨ g : [ 0, 1 ] −→M pondo

(f ∨ g

)(t) =

f(2t), se 0 ≤ t ≤ 12 ;

g(2t − 1), se 12 ≤ t ≤ 1.

(7.3)

Como f(2t) coincide com g(2t − 1) no ponto t = 12 , entao f ∨ g esta bem

definida. Ademais f ∨ g e contınua. (corol. 17, p. 285)

Portanto f∨g : [ 0, 1 ] −→M e um caminho (chamado caminho justaposto).

Exemplo: Sejam os caminhos

f : [ 0, 1 ] −→ R2

t 7−→ (2t, 2t+1)

e g : [ 0, 1 ] −→ R2

t 7−→ (2t+2, 6t2−5t+3)

Na figura seguinte temos um esboco dos caminhos f e g:

q q

q

q

q

0 1 2 R

R

1

2

3

f(0)

f(1)

0

1f

g

q q q q

q

q

q

q

0 1 2 3 4 R

R

1

2

3

4

rr

g(0)

g(1)

366

Page 368: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Sendo

f(t) = (2t, 2t+ 1) e g(t) = (2t+ 2, 6t2 − 5t+ 3)

Como

f(1) = (2 · 1, 2 · 1 + 1) = (2, 3)

g(0) = (2 · 0 + 2, 6 · 02 − 5 · 0 + 3) = (2, 3)

podemos justapor estes caminhos. Encontremos o caminho justaposto f ∨g:

f(2t) =(2(2t), 2(2t) + 1

)

= (4t, 4t+ 1)

ainda,

g(2t− 1) =(2(2t− 1) + 2, 6(2t− 1)2 − 5(2t − 1) + 3

)

= (4t, 24t2 − 34t+ 14)

Resumindo, temos

(f ∨ g)(t) =

(4t, 4t+ 1) , se 0 ≤ t ≤ 12 ;

(4t, 24t2 − 34t+ 14) , se 12 ≤ t ≤ 1.

A seguir mostramos um esboco deste caminho

q q q q

q

q

q

q

0 1 2 3 4 R

R

1

2

3

4 s(f∨g)( 12 )

(f∨g)(1)

(f∨g)(0)

0

1f∨g

• O caminho justaposto: f ∨ g.

367

Page 369: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicao 49 (Espacos conexos por caminhos). Um espaco metrico (M, d)se diz conexo por caminhos quando dois pontos quaisquer de M podem serligados por um caminho contido em M .

0

1

f

(M, d)

x= f(0)

y= f(1)

Dizemos que um subconjuntoX ⊂M e conexo por por caminhos quandoo subespaco (X, d) for conexo por caminhos.

Exemplos:

1) O espaco (R, µ) e conexo por caminhos pois fixados x, y ∈ R o caminho

f : [ 0, 1 ] −→ Rt 7−→ (1−t) x+ t y

∴ f(t) = (1−t) x+ t y

e tal que f(0) = x e f(1) = y. Veja:

s sx y

R

Generalizando o exemplo anterior

2) O espaco (Rn, Di), para i = 1, 2, 3 e conexo por caminhos, pois fixadosx, y ∈ Rn o caminho

f : [ 0, 1 ] −→ Rn

t 7−→ (1−t)x+ ty

e tal que f(0) = x e f(1) = y.

Definicao 50 (Conjuntos convexos). Seja(E, +, ·

)um espaco vetorial.

Um subconjunto X ⊂ E chama-se convexo quando sempre que

a, b ∈ X ⇒ [a, b ] ⊂ X,

ou seja, o segmento de reta que liga dois pontos quaisquer de X esta contidoem X. (p. 617)

368

Page 370: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por exemplo, dos conjuntos abaixo

Xa

b

Y

a b

Z

a b

apenas o conjunto X e convexo.

Todo subconjunto X ⊂ E convexo e conexo por caminhos porque, dadosquaisquer a, b ∈ X o caminho retilıneo

f : [ 0, 1 ] −→ Et 7−→ (1−t) a+ tb

e tal que f(0) = a e f(1) = b.

Exemplos de conjuntos convexos:

1) Um subespaco vetorial, X ⊂ E, e fechado para as operacoes do espaco(adicao e multiplicacao por escalar), daı e facil concluir que todo subespacovetorial e um conjunto convexo.

2) Toda bola aberta B(a; r) num espaco vetorial(E, +, ·

)normado.

Prova: Fixados x, y ∈ B(a; r), devemos provar que [x, y ] ⊂ B(a; r). Sejaentao z ∈ [x, y ] um vetor qualquer do segmento. Logo, existe 0 ≤ t′ ≤ 1de modo que z = (1− t′)x + t′ y. Por outro lado temos,

‖x− a‖ < r

‖y − a‖ < r⇒

|1− t′| ‖x − a‖ < |1− t′| r

|t′| ‖y − a‖ < |t′| r

Nota: Ao multiplicarmos as desigualdades da esquerda, e mantendo as de-sigualdades estritas a direita, estamos supondo t′ 6= 0 e t′ 6= 1 (casocontrario a prova e imediata). Temos:

‖z − a‖ = ‖(1− t′)x+ t′ y − a‖ = ‖(1 − t′)(x− a) + t′(y − a)‖≤ |1− t′| ‖x − a‖+ |t′| ‖y − a‖< |1− t′| r + |t′| r = (1− t′) r + t′ r = r.

portanto, z ∈ B(a; r) logo [x, y ] ⊂ B(a; r). �

3) Se X ⊂ Rn e um conjunto convexo, entao a aderencia de X e convexa.

De fato, sejam a, b ∈ X pontos de aderencia, logo existem sequencias(a

k

)e(b

k

)de pontos de X tais que (prop. 42, p. 212)

ak→ a e b

k→ b

369

Page 371: Gentil Lopes - Espaços Métricos

como X e convexo temos[a

k, b

k

]⊂ X. Para 0 ≤ t ≤ 1 fixado arbitraria-

mente, temos (prop’s. 18, 20; p’s. 163, 164)

(1− t)ak+ tb

k→ (1− t)a+ tb

Portanto pela prop. 43 (p. 214), temos (1− t)a+ tb ∈ X, isto e [a,b] ⊂ X.Vejamos um exemplo de uma famılia de conjuntos conexos por caminhos:

A esfera Sn={x ∈ Rn+1 : ‖x‖ = 1

}e conexa por caminhos.

De fato, dados x, y ∈ Sn consideremos duas possibilidades:1a) x 6= −y. Deixamos como exercıcio ao leitor provar a proposicao:

Se x 6= −y entao (1− t)x+ t y 6= 0

Pois bem, considerando f : [ 0, 1 ] −→ Sn dada por

f(t) =(1− t)x+ t y

‖(1− t)x+ t y‖

fica definido um caminho tal que f(0) = x e f(1) = y.

2a) x = −y. Neste caso tomamos um ponto z ∈ Sn − {x, y } do queobviamente resulta z 6= x e z 6= y, isto e, z 6= −x e z 6= −y. Devido ao casoanterior existe um caminho de x a z e um outro de z a y. Justapondo estescaminhos ligamos x a y.

Vamos concretizar o que foi visto atraves de alguns exemplos:

1. Sejam n = 1, x = (1, 0), y = (0, 1). Entao

f(t) =(1− t)x+ ty

‖(1 − t)x+ ty‖

=(1− t)(1, 0) + t(0, 1)

‖(1 − t)(1, 0) + t(0, 1)‖ =(1− t, t)‖(1− t, t)‖

1.1. Consideremos ‖(a, b)‖ = max{ |a|, |b| }. Entao

f(t) =(1− t, t)

max{|1− t|, |t|

}

=(1− t, t)

max{1− t, t

}

mas 1− t ≥ t ⇔ t ≤ 12 . Logo

f(t) =

(1−t, t)1−t , se 0 ≤ t ≤ 1

2 ;

(1−t, t)t , se 1

2 ≤ t ≤ 1.

370

Page 372: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Isto e,

f(t) =

(1, t

1−t), se 0 ≤ t ≤ 1

2 ;(1−tt , 1

), se 1

2 ≤ t ≤ 1.

Geometricamente, temos

(1, 0)

(0, 1)S1

R

R

0

1f

12y

1.2. Agora consideremos a norma euclidiana ‖(a, b)‖ =√a2 + b2. Entao

f(t) =(1− t, t)‖(1− t, t)‖

=(1− t, t)

(1− t)2 + t2

Logo

f(t) =

(1− t√

2t2 − 2t+ 1,

t√2t2 − 2t+ 1

)

Geometricamente, temos

(1, 0)

(0, 1)

S1

R

R

0

1f1

2y

371

Page 373: Gentil Lopes - Espaços Métricos

1.3. Agora consideremos ‖(a, b)‖ = |a|+ |b|. Entao

f(t) =(1− t, t)‖(1 − t, t)‖

=(1− t, t)|1− t|+ |t|

=(1− t, t)1− t+ t

= (1− t, t).

Geometricamente, temos

(1, 0)

(0, 1)

S1

R

R

0

1f1

2y

2. Seja (E, +, ·) um espaco vetorial normado, com dim E > 1. Para todoa ∈ E, E − { a } e conexo por caminhos.

De fato, sejam x, y ∈ E − { a }. Se [x, y ] ⊂ E − { a } este segmento dereta e um caminho em E−{ a } ligando x a y. Por outro lado, se a ∈ [x, y ],como dim E > 1, existe um ponto z nao alinhado com x e y. Entao ocaminho justaposto [x, z ] ∨ [ z, y ] liga x com y em E − { a }.

E−{a }

◦a

xy

E−{a }

◦ax

y

z

Todo conjunto conexo por caminhos e conexo. Este e o conteudo daproxima

Proposicao 83. Se o espaco metrico (M, d) e conexo por caminhos, entao(M, d) e tambem conexo.

372

Page 374: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Seja (M, d) conexo por caminhos. Dados a, b ∈ M existe umcaminho f : [ 0, 1 ] −→ M tal que f(0) = a e f(1) = b. Como f e contınuae [ 0, 1 ] e conexo, temos que f

([ 0, 1 ]

)={f(t) : t ∈ [ 0, 1 ]

}e um conjunto

conexo (prop. 78, p. 353) que contem a e b. Logo, pelo corolario 26 (p. 361) Me conexo. �

0

1

f

(M, d)

f(0)= a

f(1)= b

A proposicao recıproca da anterior nao e verdadeira. Vejamos um con-traexemplo:

Um espaco conexo, mas nao conexo por caminhos

Considere o espaco metrico (R2, D1) e o subespaco (X, D1), no qual

X ={(x, cos(

1

x)) ∈ R2 : x > 0

}∪ { (0, 0) }

E facil mostrar (basta adaptar o exemplo da p. 354) que X e conexo.Mostraremos que X nao e conexo por caminhos.

Para tanto mostraremos que todo caminho λ : [ 0, 1 ] −→ X com λ(0) =(0, 0) e constante. Sendo assim nao se pode obter um caminho ligando (0, 0)a qualquer outro ponto de X, o que garante nao ser X conexo por caminhos.

Com efeito, considerando um caminho λ : [ 0, 1 ] −→ X podemos escrever

λ(t) =(λ1(t), λ2(t)

), ∀ t ∈ [ 0, 1 ].

Onde λ1 e λ2 sao contınuas com

λ(0) =(λ1(0), λ2(0)

)= (0, 0) ⇒ λ1(0) = 0; λ2(0) = 0.

0

1 rt λ

X

rrrտտ

(λ1(t), λ2 (t))

λ1(t)

R

R

λ(0)=(0, 0)

Para nossa prova devemos considerar a primeira projecao, assim:

373

Page 375: Gentil Lopes - Espaços Métricos

p1 : X R

(λ1 (t), λ2 (t) ) λ1 (t)

Consideremos,A =

{t ∈ [ 0, 1 ] : λ1(t) = 0

}

0

1

λ1 r R

λ1(0) = 0

Desejamos provar que A = [ 0, 1 ]. Inicialmente observe que A e fechado∗

e nao-vazio, pois 0 ∈ A. Vamos mostrar que A e tambem aberto no sub-espaco ([ 0, 1 ], µ). Tomemos um ponto arbitrario t0 ∈ A e mostremos quet0 e ponto interior de A, isto e que que existe r > 0 tal que B(t0 ; r) ⊂ A.

A continuidade de λ : [ 0, 1 ] −→ X em t0 nos da uma bola aberta B(t0 ; δ)de modo que

∀ t ∈ B(t0 ; δ) ⇒ D1

(λ(t), λ(t0)

)< 1

como

t0 ∈ A ⇒ λ1(t0) = 0 ⇒ λ(t0) = (0, 0)

⇒ ∀ t ∈ B(t0 ; δ) ⇒ D1

(λ(t), (0, 0)

)< 1 (7.4)

Nota: Nao pode ser λ(t0) = (0, c) com c 6= 0 porquanto este ponto naopertence a X. Facamos uma mudanca de notacao:

B(t0 ; δ) = B(t0 ; δ) ∩ [ 0, 1 ]

= ] t0 − δ, t0 + δ [ ∩ [ 0, 1 ] = J

De modo que J (sub-bola) e um intervalo. Logo

λ1(J) = {λ1(t) : t ∈ J }

e um intervalo† contendo 0, uma vez que

t0 ∈ J e t0 ∈ A ⇒ λ1(t0) = 0.

Afirmamos que λ1(J) = { 0 }, isto e, que λ1(J) e um intervalo degenerado.De fato, se o contrario e que fosse verdade existiria, pela propriedade ar-quimediana, n ∈ N tal que 1

2πn ∈ λ1(J), entao existiria t ∈ J de modo que

∗Ver observacao a p. 283.†Proposicoes 80, 78; p’s. 355, 353.

374

Page 376: Gentil Lopes - Espaços Métricos

λ1(t) =1

2πn , o que acarretaria

λ(t) =( 1

2πn, cos(2πn)

)

=( 1

2πn, 1)

contrariando (7.4) . Portanto,

∀ t ∈ J ⇒ λ1(t) = 0 ⇒ J ⊂ A.

Isto prova que A e aberto no subespaco ([ 0, 1 ], µ).A sendo aberto e fechado decorre∗ que A = [ 0, 1 ]. Sendo assim λ(t) = 0

para todo t ∈ [ 0, 1 ]; isto e, nao pode haver nenhum caminho ligando 0 aqualquer outro ponto de X; logo, X e conexo mas nao conexo por caminhos.

Proposicao 84. A imagem de um conjunto conexo por caminhos atravesde uma aplicacao contınua e conexa por caminhos.

Prova: Sejam M conexo por caminhos e f : M −→ N contınua. Dadosp, q ∈ f(M) = { f(x) : x ∈M }, existem a, b ∈M tais que

f(a) = p e f(b) = q.

ComoM e conexo por caminhos existe um caminho g : [ 0, 1 ] −→M tal queg(0) = a e g(1) = b. Entao a aplicacao f ◦ g : [ 0, 1 ] −→ f(M) e contınua e,

(f ◦ g)(0) = f(g(0)

)= f(a) = p,

(f ◦ g)(1) = f(g(1)

)= f(b) = q.

M

rr

g(0) = a

b= g(1)

f◦g

0

1g

rr

p

q f(M)

N

f

Logo, f ◦ g e um caminho em f(M) ligando p a q. Portanto f(M) econexo por caminhos. �

Corolario28. Se M e N sao homeomorfos entao M e conexo por caminhosse, e somente se, N o for.

∗Se fosse A 6= [ 0, 1 ], teriamos Ac 6= ∅, seria tambem aberto e fechado, logo A e Ac

constituiriam uma desconexao do conexo [ 0, 1 ] o que e absurdo.

375

Page 377: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 85. Se M e N sao conexos por caminhos entao M × N etambem conexo por caminhos.

Prova:

Sejam x = (x1 , x2) e y = (y1 , y2) dois pontos arbitrarios em M × N .ComoM e N sao conexos por caminhos, existe um caminho f : [ 0, 1 ] −→Mcom f(0) = x1 e f(1) = y1 e um outro caminho g : [ 0, 1 ] −→ N comg(0) = x2 e g(1) = y2 . Com estes dois caminhos podemos construir aseguinte aplicacao

h : [ 0, 1 ] −→M ×Nt 7−→ (f(t), g(t))

Com o auxılio da proposicao 57 (p. 272) concluimos que h e contınua e,

h(0) =(f(0), g(0)

)= (x1 , x2) = x;

h(1) =(f(1), g(1)

)= (y1 , y2) = y.

Portanto h e um caminho ligando x a y e, por conseguinte, M ×N e conexopor caminhos.

M

N

x1 y1

x2

y2

x

y

M×N

0

1g

0

1h

0 1

f

376

Page 378: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 86. Seja(X

λ

)

λ∈Luma famılia arbitraria de conjuntos conexos

por caminhos, num espaco metrico (M, d). Se todos os Xλcontem um ponto

comum a ∈M , entao a reuniao X =⋃

λ∈LX

λtambem e conexa por caminhos.

Prova: Com efeito, dados x, y ∈ X, existem µ, ν ∈ L tais que x ∈Xµ e y ∈ Xν . Existem, por hipotese, dois caminhos f : [ 0, 1 ] −→ Xµ eg : [ 0, 1 ] −→ Xν tais que f(0) = x, f(1) = a, g(0) = a e g(1) = y, ja queo ponto a pertence a todos os X

λ. Justapondo os caminhos f e g obtemos

um caminho ligando x a y.

f(0)= x

g(1) = y

f(1)= g(0) = a

XµXν

X

0

1f

0

1g

0 1

f∨g

Um conjunto com partes disjuntas e conexo por caminhos

Na p. 354 exibimos um conjunto, com partes disjuntas, e conexo, masnao conexo por caminhos (p. 373). Vamos agora construir uma famılia deconjuntos com partes disjuntas e, mesmo assim, conexos por caminhos.

Creio que o exemplo que estaremos exibindo aqui seja o primeiro na lite-ratura matematica − pelo ao menos nos tres livros sobre espacos metricosconstantes em nossas referencias nao consta nenhum exemplo do genero.

Para facilitar a exposicao, torna-la mais didatica, exibiremos nosso ob-jeto em um caso particular, o caso geral nao apresentara dificuldades.

Enunciaremos nosso resultado (“monstrinho”) na forma de um

Teorema 6 (Gentil/11.09.2008). Afirmamos que o conjunto a seguir

013

23 1

e conexo por caminhos − quando se considera a metrica quantica no inter-valo unitario.

377

Page 379: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Traduzindo em termos intuitivos, o que estamos afirmando e que dadosdois pontos quaisquer neste conjunto, como, por exemplo os pontos p e qvistos a seguir

013

23 1

sp

sq

podemos uni-los por um traco contınuo, sem abandonar o conjunto.

De outro modo: sentando a ponta de um lapis no primeiro ponto, p,podemos atingir o segundo ponto, q, sem levantar a ponta do lapis e semsair do conjunto.

Prova: Para nao complicar desnecessariamente a prova do nosso teoremaobservamos que, se os dois pontos dados no conjunto encontram-se de ummesmo lado, entao eles podem ser ligados “trivialmente”. (p. 368)

De formas que o problema maior e quando os pontos dados situam-seem lados opostos − e esse o caso que estaremos considerando. Observamosainda mais o seguinte, dados dois pontos p e q, como na figura anterior,ligaremos inicialmente (e trivialmente) o ponto p a origem, assim:

013

23 1

sp

sq

e, apos, ligaremos a origem a algum ponto “do outro lado”.

De formas que todo o nosso desafio se resume em ligar a origem a umponto qualquer do outro lado, veja:

s0

? 23 1

sq

Buscaremos um caminho inspirados na figura seguinte

0

1

λ

λ(0)

λ(1)

↑s0 2

3 1

Ou seja, λ(0) sera o inıcio do caminho e λ(1) o seu termino. Ou ainda,quando a ponta do lapis estiver na origem do intervalo, sua imagem estara na

378

Page 380: Gentil Lopes - Espaços Métricos

origem do conjunto. Quando a ponta do lapis estiver no topo do intervalo,sua imagem estara no ponto 2/3 do conjunto.

Nestas condicoes o grafico a seguir sera de grande auxılio:

t

λ(t)

0 1→pt

λ

s0

23

1

r

Desse grafico deduzimos a seguinte expressao para o caminho λ:

λ(t) =

0, t = 0;

1− 13 t, 0 < t ≤ 1.

(7.5)

Onde t e um parametro que indica a posicao da ponta do lapis no intervalo[ 0, 1 [ e λ(t) e a imagem da ponta no conjunto dado.

Facamos algumas simulacoes no sentido de entender graficamente o quese passa. Utilizando a equacao (7.5), calculamos:

t = 0 ⇒ λ(0) = 0

t = 14 ⇒ λ(14 ) = 1− 1

3 · 14 = 1112 = 0, 917

t = 12 ⇒ λ(12 ) = 1− 1

3 · 12 = 56 = 0, 833

t = 34 ⇒ λ(34 ) = 1− 1

3 · 34 = 34 = 0, 750

t = 1 ⇒ λ(1) = 1− 13 · 1 = 2

3 = 0, 667

Geometricamente, fica assim:

379

Page 381: Gentil Lopes - Espaços Métricos

0

1

λ

pp

p

14

12

34

λ(0) λ( 14)

λ( 12)λ(1)

λ( 34)

↑s0 2

3 1

Do exposto podemos concluir que quando o lapis aponta para a origemdo intervalo sua imagem encontra-se na origem do conjunto − inıcio docaminho. Se dermos qualquer deslocamento ao lapis − mesmo que um “in-finitesimo” − sua imagem comparece “instantaneamente” “do outro lado”do conjunto, e a medida que deslocamos o lapis o caminho vai sendo descrito:

0

1

λ

p

12

lapis

λ(0) λ(1)

↑s0 2

3 1

O que dissemos pode ainda ser visto no seguinte grafico, observe:

t

λ(t)

0 1→

s0

23

1

r

Para que o nosso extraordinario feito esteja devidamente (matematica-mente) consolidado, resta um porem. A definicao 48 (p. 365) exige que ocaminho λ seja contınuo. Em termos intuitivos, o tracado (imagem) do lapisdeve ser contınuo, isto e, nao deve apresentar nenhum “salto”. Aqui apenasmencionamos que o ponto “mais delicado” ocorre quando movemos o lapisda origem e sua imagem “salta” instantaneamente para o outro extremo dointervalo. Podemos questionar se esse “salto” se da de forma contınua. Aresposta e pela afirmativa, o que, a estas alturas e facil provar.

380

Page 382: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Mostramos anteriormente (p. 116) que a razao pela qual a origem podeestar em muitos lugares simultaneamente e o formato da onda centradanela. Essa continua sendo, precisamente, a razao pela qual o “salto” referidoanteriormente se da de modo contınuo (suave).

Acontece que os nossos olhos nos dizem que a origem na figura a seguir

s0

23 1

sq

encontra-se isolada da regiao a direita. Ora, mas isso e apenas uma ilusaode otica; digo, de logica, uma vez que na metrica quantica podemos dizerque, na verdade, a origem e aderente a regiao, em razao de que podemossempre exibir um ponto da regiao arbitrariamente proximo da origem.

Melhor dizendo, a distancia da origem para a regiao a direita e nula, emfuncao de que toda onda centrada nela, intercepta a regiao, observe umadelas:

s ) (O O

023 1

sq

Na figura a seguir

0

1

λ

p

12

lapis

λ(0) λ(1)

s0 2

3 1R

) (O O

toda Onda de centro na origem intercepta a regiao R a direita, por essarazao a distancia da origem para essa regiao e nula, o que significa quearbitrariamente proximo da origem encontramos um ponto da regiao; sendoassim, ao movermos a ponta do lapis, um infinitesimo que seja, sua imagemaparece “do outro lado” sem qualquer descontinuidade, isto e, de modocontınuo.

Lembramos que a equacao dada em (7.5) (p. 379) nos fornece, na regiao R,o ponto que e imagem da ponta do lapis em qualquer posicao do intervalo.

381

Page 383: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A maior dificuldade em relacao ao teorema 6 (p. 377) nao residiu tantoem sua demonstracao mas sim em sua descoberta. Tanto isso e verdadeque ate hoje nao encontramos na literatura um exemplo similar. A seguinteafirmacao de um matematico profissional

Outra maneira de exprimir a conexidade de um espaco e dizer que sepode passar de um qualquer de seus pontos para outro por um movimentocontınuo, sem sair do espaco. Isto nos leva a nocao de espaco conexopor caminhos, conceito mais particular e provido de mais significado in-tuitivo do que o conceito geral de espaco conexo. (Elon Lages)

e o que me faz dar credito ao que afirmo. O que devemos destacar naafirmacao acima − relativamente aos conjuntos conexos por caminhos − ea frase: “conceito mais particular e provido de mais significado intuitivo doque o conceito geral de espaco conexo”. A partir do nosso contraexemplo,isso deixa de ser verdade.

Observando o conjunto a seguir

013

23 1

ninguem diria que ele e conexo por caminhos e, e obvio, ninguem iria tentardemonstrar o contrario daquilo que “tem certeza” (que acredita).

E precisamente neste contexto que afirmo que a visao (fısica, corporea)pode nos cegar. Antes de demonstrar o teorema em questao, trabalhei exaus-tivamente durante dois dias tentando provar o contrario − isto e, que oconjunto acima nao e conexo por caminhos −, lembro que certa feita ateconsegui provar isto; para, posteriormente, detectar uma falha na minha“prova”. Em dado momento, num ato de desespero, tive que cerrar os“olhos” e tentar demonstrar o contrario do que eu acreditava − digo, doque meus olhos me davam a certeza:

“Cuidado com a visao! . . . ela pode nos cegar! ”

Por oportuno, um outro exemplo em que acredito que a visao estejacegando os cientistas e no que se refere a compreensao dos fenomenos “nao-locais” na fısica quantica. Daqui a pouco estaremos voltando a esse tema.

∗ ∗ ∗Schwarz viu algo na teoria das cordas que outros poucos viram, uma

beleza matematica essencial que ele sentiu que nao podia ter sido aciden-tal. A teoria era difıcil de ser desenvolvida, mas isso nao o desanimou.Ele estava tentando resolver um problema que confundiu Einstein e todomundo depois de Einstein − reconciliar a teoria quantica com a relativi-dade. A solucao nao poderia ser facil. (A janela de Euclides, p. 218)

382

Page 384: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Um conjunto conexo por caminhos em 2−DPor razoes analogas as da construcao anterior∗, podemos afirmar que o

conjunto a esquerda, na figura a seguir

r r sre conexo por caminhos. De outro modo: podemos ligar dois pontos quaisquerdesse conjunto por um traco contınuo totalmente contido no conjunto. Issoe possıvel devido ao formato da onda de centro na origem.

Topologia quantica

Deve estar ficando facil ver por que fısica e mistiscismo se cruzam.Coisas separadas mas sempre se tocando (nao-localidade); eletrons quese movem de A para B sem nunca passar entre esses pontos.

(Referencia no rodape p. 98)

Nosso objetivo agora sera referendar matematicamente a afirmativa dafısica quantica − ja comprovada em laboratorio − de que “eletrons se movemde A para B sem nunca passar entre esses pontos.”

Mais precisamente, provaremos que isto e possıvel para um ponto geome-trico e raciocinamos: se isto e possıvel para um ponto, que e indimensional,nao temos por que duvidar de que seja possıvel para uma entidade fısica.

Para trazer a citada assertiva quantica para o domınio da matematicaprecisamos de duas definicoes:

• (Transitar) Diremos que um objeto pode transitar entre duas (oumais) regioes se existe um caminho ligando este objeto a qualquer pontodestas regioes.

• (Transitar sem passar por pontos intermedios) Diremos que umobjeto transita (ou pode transitar) entre duas regioes disjuntas − sem pas-sar por pontos intermedios − quando existe um caminho ligando este pontoa qualquer outro ponto destas regioes e, caminho este, totalmente contidonestas regioes.

∗Ou via produto cartesiano, prop. 85, p. 376.

383

Page 385: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Se todos estamos de acordo com estas definicoes entao decorre, comoum corolario de nosso teorema, que: Um ponto quantico pode transitar entreduas regioes sem passar pelos pontos intermedios.∗

Como um exemplo, moveremos o ponto quantico p, na figura a seguir

ttp= 1

6

p56

A B

0 p= 16

13

23 1

de A para B, sem passar pelo hiato central.

A estrategia consistira no seguinte: Inicialmente ligaremos o ponto p aorigem e, em seguida, ligaremos a origem ao ponto q, como na figura:

ttp= 1

6

tpq= 5

6

A B

0 p= 16

13

23 1

Pois bem, dos graficos a seguir

t

f(t)

0 1→pt

f

0

16

1

t

g(t)

0 1→pt

g

s0

56

1

r

deduzimos as seguintes expressoes para os caminhos:

f(t) =1

6(1− t)

∗Estamos considerando como um ponto quantico um ponto do universo(

[ 0, 1[n, k)

, onde k e a metrica quantica na dimensao n correspondente.

384

Page 386: Gentil Lopes - Espaços Métricos

e

g(t) =

0, t = 0;

1− 16 t, 0 < t ≤ 1.

Justapondo estes caminhos, isto e, aplicando a equacao (7.3) (p. 366) aoscaminhos deduzidos anteriormente, obtemos:

λ(t) =

16 (1− 2t), se 0 ≤ t ≤ 1

2 ;

g(2t− 1) =

0, 2t− 1 = 0;

1− 16 (2t− 1), 0 < 2t− 1 ≤ 1.

, se 12 ≤ t ≤ 1.

onde fizemos λ = f ∨ g. Simplificando, obtemos:

λ(t) =

16 (1− 2t), se 0 ≤ t ≤ 1

2 ;

16 (7− 2t), se 1

2 < t ≤ 1.

(7.6)

O grafico de λ fica assim:

t

λ(t)

p p12

1

pp

pp

p

0

16

1

56

Esse grafico nos mostra que quando a ponta do lapis esta na origemdo intervalo unitario (t = 0) sua imagem aponta para o ponto p = 1

6 . Aomovermos o lapis, o caminho vai sendo tracado no sentido da origem (doconjunto), quando a ponta do lapis atinge a metade do intervalo, sua imagemencontra-se precisamente na origem do conjunto, veja isso graficamente

385

Page 387: Gentil Lopes - Espaços Métricos

0

1

λ

p

12

lapis

λ(0)λ( 12) λ(1)

s0 1

323 1

tp= 1

6

tq= 5

6

Ao movermos o lapis a partir da metade, por um infinitesimo que seja,sua imagem (o caminho) ja aparece do “outro lado” do conjunto; quando aponta do lapis alcanca o topo do intervalo, alcancamos o fim do caminho,ponto q.

A continuidade de λ no ponto “mais delicado” (t = 12) ja foi provada no

exemplo 5 (p. 245) − nos demais pontos deixamos por conta do estudante.

Nosso prodıgio apreciado de uma outra perspectiva

Vejamos uma outra perspectiva, perfeitamente valida, segundo a qualpodemos compreender como na figura a seguir

tp= 1

6

p56

A B

0 p= 16

13

23 1

conseguimos mover o ponto p de A para B, sem passar pelo hiato central.Ja vimos (ex. 3, p. 296) que o intervalo quantico e homeomorfo ao cırculo e,ademais, que a imagem de um conjunto conexo por uma aplicacao contınuae um conjunto conexo. (prop. 78, p. 353)

O que significa que, topologicamente falando, sao equivalentes a conexi-dade no intervalo e no cırculo, veja:

f

tp= 1

6

p56

A B

013

23 1 (1, 0)

tA

Bp

01

13

23

O homeomorfismo e dado por: f(t) = (cos 2π t, sen 2π t). Esta trans-formacao “enrola” (sentido anti-horario) o intervalo no cırculo unitario.

386

Page 388: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Interregno cultural: Nosso teorema e fenomenos nao-locais

Por exemplo: nenhum sinal pode ser transmitido mais depressa quea velocidade da luz. Mas, alem dessas conexoes locais, outro tipo deconexoes, nao-locais, veio recentemente a luz; conexoes que sao ins-tantaneas e que nao podem ser preditas, nos dias que correm, de umaforma precisa, matematica. (Capra, Fritjof. O Tao da fısica/p. 230)

Eu creio que nosso teorema pode contribuir para predizer “de uma formaprecisa, matematica” fenomenos nao-locais no domınio da fısica quantica.

Com efeito, estribados em nosso teorema conjecturamos que se no mundosubatomico da fısica quantica um objeto pode estar em varios lugares si-multaneamente e, ademais, pode transitar em varias regioes − disjuntas −sem passar por pontos intermedios, so pode ser em razao de que o micro-cosmo tal como o macrocosmo (da teoria da gravitacao de Einstein) e curvo!

Ou ainda: a geometria do submundo quantico nao e euclidiana (plana)mas sim curva, tal como a geometria de Einstein.

Pergunto: nao e precisamente isto que a teoria fısica das supercordasconjectura ao afirmar a respeito das “microdimensoes enroladas”?

E possıvel que aqui resida o quid que falta para a unificacao da teoriaquantica com a gravitacao: o universo subatomico e curvo, ou ainda: deveexistir uma unica geometria (metrica) que unifica ambos os domınios!

Penso que esta conjectura encontra respaldo em nosso teorema!

− Conjecturamos tambem da plausibilidade da metrica quantica se aplicarao microcosmo das partıculas quanticas.

Nosso universo e o segundo postulado de Einstein

Einstein, em 1905, publica numa revista cientıfica alema o trabalho in-titulado “Sobre a eletrodinamica dos corpos em movimento”, este trabalhose desenvolveu alicercado sobre dois postulados (afirmacoes aceitas comovalidas, sem necessidade de demonstracoes). O primeiro destes postuladosfoi chamado por Einstein de Princıpio da relatividade:

Postulado 1: As leis da fısica sao as mesmas para todos os referenciaisinercias∗. Nao existe um referencial absoluto.

Postulado 2: A velocidade da luz no vacuo tem o mesmo valor c em qual-quer referencial inercial, independentemente da velocidade da fonte de luz.

Este segundo postulado foi o mais difıcil de ser aceito, mesmo por fısicosfamosos, pois contraria nossa experiencia diaria (o “bom senso”).

∗Referenciais inerciais sao aqueles em que as leis de Newton sao validas.

387

Page 389: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Ainda decorre deste segundo postulado que nenhum sinal (informacao)pode ser transmitido com velocidade superior a da luz. Em fısica, uma“conexao local” e qualquer “conexao” entre dois pontos que obedece o se-gundo postulado de Einstein − isto e, que dar-se com velocidade nao superiora da luz.

Entretanto, recentemente foram observados − no domınio quantico −fenomenos fısicos que, aparentemente, se dao a uma velocidade instantanea;ou seja, a primeira vista, estes fenomenos (chamados “nao-locais”) parecemviolar o segundo postulado de Einstein.

Creio que com o auxılio do nosso teorema 6 (p. 377) podemos lancar umaluz nesta questao − ainda hoje controvertida, isto e, ainda nao satisfatoria-mente compreendida.

Vamos considerar, para efeitos de argumentacao, os dois universos seguintes:

U =([ 0, 1 [, k

)e E =

([ 0, 1 [, µ

)

Da experiencia obtida com o teorema 6 creio que o que nos impede decompreender satisfatoriamente a “nao-localidade” e que somos vıtimas deuma “mente euclidiana”, digo, amiude, estamos tentando ver (explicar) osfenomenos presos a um modelo “linear” de tempo e espaco.

Inicialmente vamos argumentar no sentido de mostrar que esta visao eu-clidiana, arraigada no psicologico (mente) dos cientistas, pode facilmenteinduzi-los ao erro; digo, podem − inadvertidamente − concluir que nosfenomenos nao-locais a informacao viaja com velocidade instantanea − vercitacao em epıgrafe. (Capra, p. 387)

De fato, retomemos nosso sistema analisado anteriormente (o qual repeti-mos aqui para comodidade do leitor):

r0 2

31

0

Aqui, no instante t = 0 a imagem da ponta do lapis encontra-se naorigem, 0, do sistema. Um “infinitesimo” de tempo depois esta mesmaimagem encontra-se no outro extremo do intervalo, assim:

←r0 2

31

0

Esse fenomeno∗ pode ser analisado de duas perspectivas:

∗A informacao (imagem da ponta do lapis) viaja da origem do conjunto ao extremo

388

Page 390: Gentil Lopes - Espaços Métricos

1a ) No universo euclidiano E .Inicialmente observe que o nosso espaco [ 0, 1 [ e normalizado (tem com-

primento unitario), o que significa que o comprimento “1”, pode significarum centımetro, um metro, um kilometro, um ano-luz, etc., nao importa.

Pois bem, no universo euclidiano† sendo a distancia entre a origem eo outro extremo do conjunto nao nula, a conclusao, naturalmente, e a deque a informacao viajou instantaneamente, contrariando assim o segundopostulado de Einstein.

2a ) No universo quantico U .Neste universo a interpretacao do fenomeno muda radicalmente. Com

efeito, pra comecar nao existe nenhuma distancia entre a origem e o extremodireito do conjunto (universo) − de fato a distancia e nula.

Sendo assim, neste universo, a informacao nao precisa viajar com veloci-dade instantanea, uma vez que nao deve cobrir nenhuma distancia.

Vimos, ademais, que a razao para que a referida distancia seja nula e quetoda Onda de centro na origem intercepta o extremo direito do intervalo,veja:

←r0 1) (︸ ︷︷ ︸

O0

Conclusao: Para salvar-mos o segundo postulado de Einstein devemosconcluir que o universo no qual se dao os fenomenos nao-locais − na fısicaquantica − nao e o euclidiano; digo, a metrica subjacente a esses fenomenosnao e a usual. Por conseguinte, conjecturamos que “toda aquela distancia”,entre as partes do sistema, que os cientistas veem nos fenomenos de acao adistancia, nao existe, e nula! Dos argumentos anteriores podemos concluirque esta distancia e nula porque existem ondas ligando as partes do sistema;ou seja, a distancia existe para a vista fısica mas, na verdade, inexiste porconta de que as partes do sistema estao conectadas por ondas.

“Cuidado com a visao! . . . ela pode nos cegar! ”

O universo U como modelo para o nosso Universo

Ja provamos que no universo quantico podemos justificar matematica-mente alguns fenomenos da fısica quantica. Animados por estes resultadose que ousamos propor nosso universo ( [ 0, 1 [, k ) como um modelo (isomor-fismo) para o nosso Universo (digo, nosso Universo de verdade!).

direito do intervalo [ 23, 1 [.

†Que e a distancia que, amiude, se tem em mente; ou ainda, e o que os nossos olhosvem “em toda parte”.

389

Page 391: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Argumentarei com um universo unidimensional, apenas por razoes dida-ticas, isto e, para facilitar minha exposicao e, concomitantemente, facilitar oentendimento do leitor − haja vista que meus argumentos podem facilmenteser transferidos para qualquer dimensao (hipercubo), digo, para o universo:U = ( [ 0, 1 [n, k ).

Retomando, inicialmente observo que nosso universo comporta ate omodelo teorico do Big Bang, assim:

U0 1

↑ ↑-Origem

-Singularidade

-Big Bang

-Fronteira-Expansao

Vejam algumas das propriedades do nosso universo:

− Limitado;

− Conexo por caminhos;

− Compacto†;

− “Curvo” (por conta de sua metrica, onda, topologia);

− Fronteira aberta;

− Em Expansao.

Nota: Com expansao, quero dizer que nosso universo (intervalo) podeser expandido (ou “dilatado”) a vontade e ainda assim mantera suas pro-priedades topologicas. Nosso universo esta “normalizado”.− Como ja vimos, em nosso universo podemos ate justificar fenomenos

nao-locais (“instantaneos”), da fısica quantica, por conta da onda de centrona origem, lembramos:

←r0 1) (︸ ︷︷ ︸

O0

Para fazer uma ponte, ou ainda, estabelecer um caminho entre nossomodelo teorico e nosso Universo e que terei que levantar uma conjectura,qual seja:

“No Big Bang (origem do nosso Universo) foi gerada uma Onda e estaonda conecta a origem com sua fronteira”.

Logo, por conta desta onda (“campo”) e que podemos explicar fenomenosnao-locais da fısica; igualmente como se da em nosso modelo teorico.

†A ser provado no capıtulo 9.

390

Page 392: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Observemos esta onda em nosso modelo bidimensional:

sO

s srAdmitindo essa Onda como um modelo para a “onda primordial” (digo,

a onda gerada no Big Bang) podemos dizer que a mesma e conexa porcaminhos, ou ainda: conecta (por caminhos) todo o Universo.

Insisto: Esta Onda (primordial) e quem transmite informacoes “instan-taneas” as diversas partes do nosso Universo que, volto a lembrar, e conexo!(por caminhos, justamente por conta desta Onda).

Observe que nosso modelo nos permite fazer algumas previsoes inte-ressantes (surpreendentes) tais como: suponhamos que em nosso Universosurjam alguns “buracos negros” (tuneis, hiatos, etc.) tais como,

[ 0, 1 [× [ 0, 1 [

0 1

1

0 1

1

Nao ha o menor problema pois todas as partes remanescentes continuaminteragindo entre si (continuam intercomunicantes); digo: a informacao podetransitar livremente entre os “pedacos” de nosso Universo; ou ainda: umobjeto (ponto) pode transitar livremente entre as partes. Isto se deve a quenosso Universo mutilado continua conexo por caminhos e, esta conexidadese deve a Onda, veja:

01

1

s

Para ver o Mundo em um Grao de Areia,

E um Ceu em uma Flor Selvagem,

Pegue o Infinito na Palma de sua mao,

E a Eternidade em uma hora.

(William Blake/Poeta)

Observe queconseguimos colo-car nosso Universo− isto e, umareplica dele − emuma casca de noz:[ 0, 1 [. Comodiria Stephen Hawking.

391

Page 393: Gentil Lopes - Espaços Métricos

7.4 Espacos localmente conexos

Definicao 51 (Espaco localmente conexo). Um espaco metrico (M, d) sediz localmente conexo, quando para todo p ∈M e todo aberto U contendo pexistir um aberto conexo V , tal que p ∈ V ⊂ U .

Exemplos:

1) O espaco (R, µ) e localmente conexo.

Com efeito, sejam p ∈ R e um aberto U tal que p ∈ U . Sendo assim, p eponto interior de U , o que significa que existe r > 0 tal que

B(p; r) = ] p− r, p+ r[ ⊂ U

Como todo intervalo aberto e conexo, podemos tomar V = ] p− r, p + r[, econcluir pela conexidade local de R.

Rp

p−r p+r

ցU

V

s] [

2) Considere o seguinte subconjunto do plano

N ={(x, y) ∈ R2 : x = 0 ou y = 0 ou y =

1

ncom n ∈ N

}

x=0

y=0

y=1

y= 12

Este e um exemplo de um conjunto conexo (por caminhos) mas naolocalmente conexo. Provaremos a segunda assertiva e deixaremos a primeiracomo exercıcio.

Com efeito, inicalmente fixemos um ponto p ∈M e um aberto contendop, assim:

p = (1, 0) ∈ U = B((1, 0); 1)

392

Page 394: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Lembramos que B((1, 0); 1) − a bola no subespaco (N, Di) − e a intersecao

da bolaB((1, 0); 1) no espaco (R2, Di) com o subconjuntoN . Considerando

a metrica usual, temos:

r(1, 0)

x=0

y=0

y=1

y= 12

Ou ainda:

r(1, 0)

↓y=0

y= 12

U = B((1, 0); 1

)

Seja V ⊂ U um aberto arbitrario contendo p = (1, 0). Provaremos quenenhum de tais abertos pode ser conexo. Pois bem, sendo V aberto exister > 0 tal que

B((1, 0); r) ⊂ V

Pela proposicao 24 (p. 193) existe um aberto A em (R2, D1) de modo queV = A ∩ U , digamos:

r(1, 0)

A

↓y=0

y= 12

U = B((1, 0); 1

)

393

Page 395: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Logo

r(1, 0)

{

V

Como dizıamos existe r > 0 tal que

B((1, 0); r) ⊂ V

B((1, 0); r)

r(1, 0)

{

V

r(1, 0)

{

↓B((1, 0); r)

Pela propriedade arquimediana existe um natural n0 tal que 1n0

< r,

sendo assim temos que

(1, 1n0

) ∈ B((1, 0); r) r(1, 0)

rւ (1, 1n0

){

↓B((1, 0); r)

Vamos considerar os seguintes subconjuntos

A = V ∩{(x, y) ∈ N : y >

1

n0 + 1

}e B = V ∩

{(x, y) ∈ N : y <

1

n0

}

r(1, 0)

{

V r(1, 0)

y= 1n0 + 1

↑A↓B

rւ (1, 1n0

)}

↓B((1, 0); r)

Observe que A e B sao nao-vazios porquanto,

(1,

1

n0

)∈ A e (1, 0) ∈ B

A e B sao abertos disjuntos em V e, ademais, V = A ∪B; logo o par A, Bconstitui uma desconexao de V , isto e V e desconexo e resulta que N nao elocalmente conexo.

394

Page 396: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Justificativa: Queremos justificar, com detalhes, a afirmativa feita ante-riormente de que A e B sao abertos em V . Primeiramente observamos quecada linha y = 1

n ∈ N e um conjunto aberto no subespaco (N, D1). Comefeito, fixemos uma de tais linhas; cada um de seus ponto e ponto interior,uma vez que podemos escolher r = 1

n − 1n+1 e obter

B(p; r) = B(p; r) ∩N ⊂{(x, y) ∈ N : y =

1

n

}

A figura a seguir ilustra a afirmacao para o caso particular n = 2 (linhay = 1

2).

sp

ւ B(p; 16)

x=0

y=0

y=1

y= 12

y= 13

Sendo assim, os conjuntos

{(x, y) ∈ N : y >

1

n0 + 1

}e

{(x, y) ∈ N : y <

1

n0

}

reunioes de tais retas (abertos) sao abertos em N . (prop. 23, p. 192)

Logo, tendo em conta “a volta” (⇐=) da prop. 24 (p. 193) A e B saoabertos no subespaco (V, D1).

Proposicao 87. Todo subespaco aberto de um espaco localmente conexo elocalmente conexo.

Prova: Seja (M, d) um espaco localmente conexo e A ⊂ M um aberto.Fixado um ponto p ∈ A e um aberto (em (A, d)) U contendo p, como

(prop. 25, p. 194)

U◦(A, d) = U

◦(M,d)

(M,d)

A

Usp

395

Page 397: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Logo, U e tambem um aberto em (M, d). Sendo M localmente conexoexiste um aberto conexo V (em (M, d)) contendo p tal que V ⊂ U ; logo V ⊂ Ae como

p ∈ V◦(M,d) = V

◦(A, d)

temos que o conexo V e tambem um aberto (em (A, d)) contendo p. Sendoassim, A e localmente conexo. �

(M, d)

A

UVsp

7.5 Componentes Conexas

Definicao 52 (Particao de um conjunto). Chama-se particao de um con-junto nao vazio A todo conjunto P cujos elementos sao subconjuntos naovazios de A, disjuntos dois a dois e cuja reuniao e A.

Em outros termos, particao de um conjunto nao vazio A e todo conjuntoP cujos elementos sao subconjuntos de A que satisfazem as tres seguintescondicoes:

(i)(∀X ∈ P

) (X 6= ∅

)

(ii)(∀X,Y ∈ P e X 6= Y

) (X ∩ Y = ∅

)

(iii)⋃

X∈PX = A

Cada elemento do conjunto P chama-se uma cela da particao. Todoelemento do conjunto A pertence a uma e somente uma cela da particao P.

Nosso objetivo agora sera mostrar a existencia de importante particaoem todo espaco metrico (M, d): ou este e conexo ou e formado de partesconexas, disjuntas entre si.

(M, d)

396

Page 398: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Seja (M, d) um espaco metrico e fixemos p ∈ M . Seja Ap ={Ai

}a

colecao dos subconjuntos conexos de M que contem p. Ap nao e vazia pois{ p } ∈ Ap (ex. 1, p. 350).

Consideremos ainda Cp =⋃

iAi e provemos que

(a) Cp e conexo;

(b) Se B e um conjunto conexo de M contendo p, entao B ⊂ Cp ;

(c) Cp e um conjunto conexo maximal de M(isto e, Cp e o maior subcon-junto conexo de M que contem p);

(d) Cp e um conjunto fechado.

De fato,

(a) Como cada Ai ∈ P contem p entao p ∈ ⋂iAi , e assim, pela proposicao

81 (p. 361) Cp =⋃

iAi e conexo.

(b) Se B e um subconjunto conexo de M contendo p, entao B ∈ Ap e,assim, B ⊂ Cp =

⋃{Ai : Ai ∈ Ap}.

(c) Seja Cp ⊂ D, sendo D conexo. Como

{ p } ∈ Ap ={Ai

}⇒ p ∈ Cp =

i

Ai ⇒ p ∈ D

logo, por (b), D ⊂ Cp ; isto e, Cp = D.

(d) De fato, o fecho Cp de Cp e conexo (proposicao 79, p. 353). Se Cp

nao fosse fechado, a inclusao Cp ⊂ Cp seria propria, contradizendo (c)acima. Portanto Cp = Cp .

Para cada p ∈M , Cp e chamada componente conexa de p.Os fatos basicos referentes as componentes conexas de um espaco (M, d)

acham-se englobados na seguinte

Proposicao 88. As componentes conexas de um espaco metrico (M, d)formam uma particao de M . Ademais, todo subconjunto conexo de M estacontido em alguma componente.

Prova:

(i)(∀Cp

) (Cp 6= ∅, pois p ∈ Cp

).

(ii)(∀Cp , ∀Cq ; p 6= q

) (Cp ∩Cq = ∅

)

Mostremos que componentes distintas sao disjuntas, ou, de modo equiva-lente, se Cp ∩Cq 6= ∅, entao Cp = Cq .

De fato, se existisse x ∈ Cp ∩ Cq , entao a reuniao Cp ∪ Cq tambem se-ria conexa e, pelo ıtem (c) provado anteriormente, Cp = Cp ∪ Cq , ou seja,

397

Page 399: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Cq ⊂ Cp . Analogamente se chegaria a que Cp ⊂ Cq e, por conseguinte,valeria a igualdade Cp = Cq .

(iii) Obviamente M =⋃{

Cp : p ∈M}.

Finalmente, se X e um subconjunto conexo nao-vazio de M , entao Xcontem um ponto p0 ∈ M e, assim, X ⊂ Cp0

, pelo ıtem (b) provado ante-

riormente. E, se X = ∅, entao X esta contido em toda componente. �

Exemplos:

a) Seja o espaco (M, µ) onde M = [ 0, 1 ] ∪ [ 2, 3 ].Consideremos, por exemplo, o ponto p = 0. Entao, A0 =

{Ai

}e a

colecao dos subconjuntos conexos de M que contem 0. Como todo subcon-junto conexo na reta e um intervalo, pertencem a A0 :

{ 0 }, Ai = [ 0, i [, 0 < i ≤ 1

Ai = [ 0, i ], 0 < i ≤ 1

Entao

C0 =⋃

0<i≤1

Ai = [ 0, i [ ∪ [ 0, i ] = [ 0, 1 ].

Observe que C0 = Cp , 0 ≤ p ≤ 1. De modo semelhante concluimos queC2 = [ 2, 3 ].

b) Se um espaco e conexo entao obviamente so ha uma componente conexa,que e o proprio espaco.

Em particular no espaco (R, µ), Cp = R, onde p ∈ R pode ser arbitraria-mente fixado.

c) As componentes conexas do espaco (R, δ) sao subconjuntos unitarios deR (ex. 2, p. 350).

De fato, se X ⊂ R e um subconjunto nao vazio e nao unitario, tomando-se p ∈ X os conjuntos

A = X − { p } 6= ∅ e B = {p}

sao abertos e, alem do mais, A ∩ B = ∅ e A ∪ B = X. Portanto X edesconexo. Por outro lado, todo subconjunto { p } ⊂ R e conexo.

d) As componentes conexas do espaco (Q, µ) dos numeros racionais saosubconjuntos unitarios de Q.

De fato, se X ⊂ Q e um subconjunto nao vazio e nao unitario, tomando-se p, q ∈ X de modo que p < q, seja α um numero racional entre p e q:p < α < q (lembre-se que Q e denso no espaco (R, µ)). Com raciocinioanalogo ao do exemplo 4 (p. 351) podemos mostrar que

A = ] −∞, α [ ∩X e B = ]α, +∞ [ ∩X

398

Page 400: Gentil Lopes - Espaços Métricos

formam uma desconexao de X. Como, por outro lado, todo subconjuntounitario de um espaco (M, d) e conexo, resulta que a colecao dos subcon-juntos unitarios de Q e a colecao das componentes deste espaco.

e) Generalizando o exemplo anterior mostraremos que as componentes conexasde todo espaco (M, d) com M enumeravel reduzem-se a um unico ponto.Em outras palavras: se (M, d) e um espaco conexo com mais de um pontoentao M nao pode ser enumeravel:

H1 : M e conexo;⇒ T: M nao e enumeravel.

H2 : M tem maisde um ponto.

Prova: Com efeito, fixemos a ∈M e consideremos a funcao

da : M −→ R

x 7−→ d(x, a)

(M, d)

rrrx

a

b

R

⊢0dard(x, a)

Ja vimos (p. 261) que da e contınua. Sendo M conexo entao

da(M) ={d(x, a) : x ∈M

}= J

e um intervalo. Como existe em M um ponto b 6= a, J contem os numeros0 = d(a, a) e d(a, b) > 0. Portanto J = da(M) nao e um intervalo de-generado, isto e, e nao enumeravel. Por conseguinte, M tambem nao eenumeravel. �

Vejamos esta proposicao sob outros angulos:

H1 ∧ T −→ H2

Isto e, se M e conexo e enumeravel entao M nao tem mais de um ponto.Logo, os unicos conjuntos conexos enumeraveis sao os unitarios.

H2 ∧ T −→ H1

Se M tem mais de um ponto e e enumeravel entao M nao e conexo.Daqui conclui-se que as componentes conexas de todo conjunto enu-

meravel sao conjuntos unitarios. De fato, se uma componente conexa tiverdois elementos, digamos { a, b }, como cada conjunto unitario e conexo entao

{ a, b } ∩ { a } 6= ∅

399

Page 401: Gentil Lopes - Espaços Métricos

a interseccao de duas componentes conexas nao seria vazia.Em particular as componentes conexas de M =

{0, 1, 1

2 ,13 , . . .

}sao os

conjuntos conexos

C0 = { 0 }, Cn ={ 1

n

}(n = 1, 2, 3, . . .)

Conjunto de Cantor

O conjunto de Cantor e construido assim: dividimos o intervalo [ 0, 1 ]em tres partes iguais e removemos o intervalo aberto do meio, (13 ,

13). Agora

ficamos com dois intervalos fechados, I11 e I12 ; em cada um destes intervalosrepetimos a mesma operacao, removendo os intervalos (abertos) do meio.Isto nos deixa com quatro intervalos fechados, I21 , I22 , I23 e I24 (veja figurasa seguir). Deste modo prosseguimos indefinidamente. O conjunto C deCantor e o conjunto dos pontos nao removidos.

0 1

013

23 1

013

19

29

23

79

89 1

013

19

227

127

29

727

827

23

1927

2027

79

89

2527

2627 1

Para referencia futura destacamos que o conjunto de Cantor e um sub-conjunto fechado do espaco ([ 0, 1 ], µ). De fato, como cada intervalo abertoretirado de [ 0, 1 ] e um conjunto aberto em (R, µ), e tambem em ([ 0, 1 ], µ)(prop. 24, p. 193) para construir o conjunto de Cantor foi retirado de [ 0, 1 ] umareuniao de conjuntos abertos, que e por sua vez um conjunto aberto (prop.

23, p. 192) tanto em (R, µ), como tambem em ([ 0, 1 ], µ). Logo, o conjuntode Cantor e complementar de um aberto, portanto fechado.

∗ ∗ ∗

A matematica e um meio de caracterizar ou expressar uma estru-tura. E o universo parece ter sido construido, em algum nıvel funda-mental, a partir da estrutura matematica. [. . .]

Qual foi a evidencia que convenceu os antigos gregos de que o mundoe compreensıvel? Em parte foi a beleza da matematica, especialmente ageometria e a teoria dos numeros e, em parte, a obra pitagorica sobrea fısica dos instrumentos de corda e os tons musicais e, na astronomia,as regularidades dos movimentos dos planetas, dos ceus estrelados e doseclipses. (Gregory Chaitin/Metamat!)

400

Page 402: Gentil Lopes - Espaços Métricos

7.6 Exercıcios

1) No espaco ([ 0, 1 [, µ) mostre que I = [ 0, 1 [−{ 12 } e desconexo.

2) No espaco ([ 0, 1 [, k) mostre que I = [ 0, 1 [−{ 12 } e conexo.

3) Mostre que X = [ 0, 1 ] ∪ [ 2, 3 ] e desconexo, com a metrica usual de R.

4) No espaco (R2, D1), mostre que S2 − { (0, 1) } e conexo.

Sugestao: Projecao estereografica.

5) Mostre que X e conexo se, e somente se, ∀A ⊂ X com ∅ 6= A 6= Xtivermos ∂A 66= ∅.6) Se u e v sao pontos distintos de S1, mostre que S1 − {u, v } e desconexo.

7) Mostre que o grafico de uma funcao contınua f : [ a, b ] −→ R e umsubconjunto conexo do R2.

8) Se um espaco metrico (M, d) possuir um subconjunto conexo e denso,mostre que M e conexo.

9) Sejam X e Y subconjuntos conexos de um espaco metrico (M, d) taisque X ∩ Y 6= ∅. Prove que X ∪ Y e conexo.

10) Sejam X e Y subconjuntos nao vazios de um espaco metrico (M, d)tais que (X ∩ Y ) ∪ (X ∩ Y ) = ∅. Prove que X ∪ Y e desconexo.

11) Seja (M, d) um espaco metrico tal que para quaisquer subconjuntos naovazios X, Y ⊂M , vale a relacao (X ∩ Y ) ∪ (X ∩ Y ) 6= ∅. Prove que M econexo.

12) Na figura a seguir desloque “quanticamente” o eletron da orbita A atea orbita B.

A B

ւeletron

013

23 1

Em resumo, encontrar um caminho ligando os pontos 13 e 2

3 − no sub-espaco quantico ([ 0, 1

3 ] ∪ [ 23 , 1 [, k).

Leio em uma publicacao eletronica∗ a respeito da hierarquia entrelacada:

De acordo com Doug Hofstadter, Fısico e pesquisador de inteligenciaartificial, em uma hierarquia entrelacada o nıvel superior (causa) gera einflui sobre o nıvel inferior (efeito) por meio de uma “descontinuidade”(um processo semelhante ao salto quantico, que nao pode ser explicadoem termos de mecanismos logicos).

∗Fısica E Consciencia No Pensamento De Mokiti Okada.

401

Page 403: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Aqui apenas observamos que em nosso universo, ([ 0, 1 [, k), o “saltoquantico” entre duas orbitas se da de modo contınuo (nao ha descontinuidade)e, ademais, pode ser explicado em termos de mecanismos logicos.

13) Na figura a seguir conduza o eletron da orbita A diretamente a orbitaC − sem passar pela orbita B.

A B C

s ¬ s0

14

12

34 1

Isto e, encontre um caminho ligando os pontos 14 e 3

4 , sem incluir oponto 1

2 .

14) Na figura a seguir (esquerda) desloque “quanticamente” o eletron atea posicao A.

s

s← eletron

rւA

s

s← eletron

rւA

0 23

1

23

1

Na figura da direita acrescentamos os detahes necessarios. Em resumo, oaluno devera encontrar um caminho − no subespaco quantico − ligando ospontos (13 ,

23) e (23 ,

13).

15) Prove que o conjunto (ex. 2, p. 392)

N ={(x, y) ∈ R2 : x = 0 ou y = 0 ou y =

1

ncomn ∈ N

}

e conexo por caminhos.

16) Considere os seguintes subconjuntos do plano R2 :

Y ={(x, y) ∈ R2 : y = 0 ou ou x =

1

ncomn ∈ N

}

e

X = Y ∪ { (0, 1) }

402

Page 404: Gentil Lopes - Espaços Métricos

¬0

r(0, 1)

y=0

x=1x= 12

Prove que X e conexo, mas nao conexo por caminhos.

17) Prove que todo espaco discreto e localmente conexo.

18) Prove que Q nao e localmente conexo.

19) Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos e seja f : M −→ N . Proveque se f e contınua e aberta (p. 286) e M e localmente conexo, entao f(M)e tambem localmente conexo.

20) Este exercıcio tem como objetivo reforcar a interpretacao de “fenomenosnao-locais” no universo quantico.

Pois bem, retomemos o sistema (unidimensional) analisado anterior-mente (o qual repetimos aqui para comodidade do leitor): (p. 378)

r0 2

31

0

Aqui, no instante t = 0 a imagem da ponta do lapis encontra-se naorigem, 0, do sistema X = { 0 } ∪ [ 23 , 1 [. Um “infinitesimo” de tempodepois esta mesma imagem encontra-se no outro extremo do intervalo, assim:

←r0 2

31

0

Conclusao: Em nosso universo o fenomeno da nao-localidade† se devea que a onda de centro em 0 tem uma contra-parte no outro extremo dosistema, veja:

†Digo, a imagem da ponta do lapis mover-se “instaneamente” de uma extremidade aoutra do sistema.

403

Page 405: Gentil Lopes - Espaços Métricos

←r0 1) (︸ ︷︷ ︸

Bk(0; r< 1

2)

0

Entao, esta onda que encontra-se de um extremo ao outro (de nossouniverso) e que carrega (transfere) a informacao.

Insistimos, e por causa desta onda que a informacao e transmitida demodo contınuo, digo a continuidade de λ se deve a esta bola, veja: (p. 111):

0

1

λ

s

23

ε

1−ε)

(

0

1

λ

s

23

ε

1−ε

)(

Na figura da esquerda a ponta do lapis aponta para a origem do intervalo( t = 0 ), sua imagem aponta para o 0 do conjunto (isto e, λ(0) = 0).

Na figura da direita movemos a ponta do lapis de um “infinitesimo” , acontinuidade de λ exige que a imagem da ponta (seta em vermelho) caiadentro da bola B

k(0; ε); ora, como a aplicacao λ e injetiva a imagem nao

pode cair na “parte inferior” da bola, entao tera que cair na “parte superior”,isto e, no outro extremo de X.

Prove que para

0 < t < δ ⇒ 1− ε < λ(t) < 1

e, ademais, prove, utilizando a proposicao 50 (p. 238), que λ (eq. 7.5, p. 379) econtınua.

Apendice

Apos minhas conjecturas, sobre a estrutura topologica do nosso Universo− derivadas da metrica quantica − me deparei com algumas informacoes naliteratura que vem da apoio a nossas afirmativas. Por exemplo:

1a ) No dia 18.09.2009 − aproximadamente um ano depois de minha conjec-tura (a pag. 390) − encontro uma confirmacao da mesma no livro “A MATRIZDIVINA”, de Gregg Braden, onde lemos:

404

Page 406: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Em segundo lugar, aparentemente esse campo surgiu juntamente coma criacao do universo − com o Big Bang, ou seja la o que tenhamosescolhido chamar de o “princıpio”. [. . .] E a natureza dessa conexaosempre presente que possibilita a nao-localidade das coisas que existemdentro da Matriz. (Braden, p. 72)

2a ) No dia 21 de fevereiro de 1870, William Kingdon Clifford apresentou umartigo para a Cambridge Philosophical Society (Sociedade Filofica de Cam-bridge), intitulado “Sobre a Teoria Espacial da Materia”. No seu artigo,Clifford proclamou ousadamente∗:

Na verdade, eu mantenho que: (1) as pequenas porcoes do espacosao de uma natureza analoga aos pequenos montes numa superfıcieque e, na media, plana, (2) a propriedade de ser curvo ou distor-cido e transmitida continuamente de uma porcao de espaco para outracomo uma onda; (3) esta variacao da curvatura do espaco e real-mente o que acontece naquele fenomeno que chamamos de movimentoda materia. . .

3a ) Trajetoria curva de eletrons e observada pela primeira vez

Quando partıculas carregadas, como os eletrons, viajam por um campomagnetico, a trajetoria fica curvada por esse campo, e acaba se tornando umcırculo. Quanto maior a forca do campo magnetico, menor o cırculo. Em1930, o fısico Lev Landau fez uma previsao matematica sobre o raio mınimopara estes cırculos, que agora leva o seu nome: “nıveis de Landau”.

Nao e possıvel fazer uma “fotografia” dos eletrons, e ate agora ninguemtinha uma confirmacao em laboratorio destes nıveis, mas isto mudou como trabalho do fısico Koichi Hashimoto, da Universidade Tohoku do Japao,e Rudolf Roemer da Universidade de Warwick, Inglaterra. Eles prenderamos eletrons na superfıcie de um material semicondutor, e usaram tecnicasde espectroscopia de escaneamento de tunelamento para encontrar os locaispossıveis onde os eletrons estavam.

Para cada pixel da imagem, eles tem meia hora de captura de dados,que foram obtidos permitindo que um eletron tentasse passar. Se a posicaorepresentasse um estado possıvel para o eletron, uma partıcula acabava porviajar para ela no processo conhecido como tunelamento, e era representadapor um pixel claro. Caso contrario, o pixel era escuro.

Com isto, uma imagem da orbita possıvel do eletron foi obtida, e a figuracriada se parece muito com os resultados previstos pelas simulacoes teoricas,confirmando a previsao de 1930.

(Fonte: Publicacao eletronica, LiveScience)

∗Extraıda da referencia: Mlodinow, Leonard. A Janela de Euclides/ p. 157. Traducaode Enezio de Almeida. Sao Paulo: Geracao Editorial, 2008.

405

Page 407: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Os fenomenos sao organizados pelo

nosso aparelho perceptivo e cognitivo,

sendo assim em parte dependentes do su-

jeito. (Immanuel Kant)

Diziamos na pagina 11: “nao existe uma distancia mais ou menos ver-dadeira que outra, existe sim uma mais conveniente que outra para um de-terminado proposito”. Pois bem, observe as imagens a seguir:

(JimenaNavarrete)

(IrinaAntonenko)

A “distancia” (aproximacao) de um microscopio observe como se veriao cabelo da Jimena Navarrete! a lıngua da Irina Antonenko! . . . horrıveis!

Lıngua humana Cılios

Conclusao: Pelo ao menos para os fins da reproducao humana, a “velhadistancia euclidiana” − com a qual a natureza nos dotou − e perfeita!

406

Page 408: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Capıtulo 8ESPACOS METRICOS

COMPLETOS

Sim, eu sou um matematico, porem estou realmente interessado em

tudo: o que e vida, o que e inteligencia, o que e consciencia, mas tambem

o que o universo contem de aleatoriedade, e se o espaco e o tempo sao

contınuos ou discretos. (Gregory Chaitin)

Introducao

Em Analise Real aprendemos que R e um corpo ordenado completo.Muitos resultados importantes, como por exemplo teoremas de existenciadependem da completeza de R. Como uma modesta amostra podemos provarque em R existe solucao para a equacao x2 = 2.

Desejamos estender para espacos metricos em geral o importante con-ceito de completeza. Na Analise aprendemos que R e completo porque nelevale a propriedade (ou axioma) do supremo: “Se A ⊂ R e nao-vazio emajorado, entao A tem supremo”. Acontece que para se definir supremo ne-cessitamos de uma ordem (p. 611), como num espaco metrico arbitrario naocontamos com uma ordenacao entre seus elementos segue que nao podemosusar o axioma do supremo para definir espaco metrico completo, tal comoocorre no corpo ordenado R.

A nao ser que exista uma outra caracterizacao de completeza suscetıvelde generalizacao para os espacos metricos. Felizmente existe uma tal carac-terizacao, via sequencias de Cauchy, portanto:

Definicao 53 (Sequencias de Cauchy). Seja (xn) uma sequencia num espacometrico (M, d). Diremos que (xn) e uma sequencia de Cauchy se dado ε > 0existir um ındice n0 tal que

∀m, n ≥ n0 ⇒ d(xm , xn) < ε.

407

Page 409: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A seguir escrevemos em sımbolos a definicao anterior e sua negacao:

∀ ∃ : ∀ (m,n≥n0 ) ⇒ d(xm , xn )<εε>0 n0 ∈N m,n∈N

∃ : ∀ ∃ (m,n≥n0 ) ∧ d(xm , xn)≥ εε>0 n0 ∈N m,n∈N

De imediato inferimos que se (N, d) e um subespaco de (M, d), umasequencia (xn) de pontos de N e de Cauchy em (N, d) se, e somente se, ede Cauchy em (M, d).

Proposicao 89. Se (xn) e uma sequencia convergente num espaco metrico(M, d) entao (xn) e de Cauchy.

Prova: Consideremos (xn) uma sequencia convergente em um espacometrico (M, d). Seja lim xn = a. Entao dado ε > 0 existe n0 tal qued(xn , a) <

ε2 para todo n ≥ n0 . Logo, para m,n ≥ n0 temos

d(xm , xn) ≤ d(xm , a) + d(a, xn) <ε

2+ε

2= ε

entao, m, n ≥ n0 =⇒ d(xm , xn) < ε. �

Sendo assim, obtivemos uma condicao sobre os termos da sequencia naqual nao intervem o limite a. Intuitivamente essa condicao nos mostra quese uma sequencia (xn) e convergente entao, para ındices suficientementegrandes, seus termos aproximam-se arbitrariamente um dos outros.

E o caso, por exemplo, da sequencia dada por xn = 1n , no espaco (R, µ).

⊢ rrrrrrrrrrr0 1

x1x2x3x4···

Aqui se faz oportuna a questao de saber se toda sequencia de Cauchyconverge. A resposta e pela negativa. Ha casos em que uma sequencia deCauchy em (M, d) nao converge por “culpa” do conjunto M e outras vezespor “culpa” da metrica d. Vamos exemplificar estas duas possibilidades:

(a) Consideremos a sequencia dada por xn = 1n e os espacos (R, µ)

e ( ] 0, 1 ], µ). Esta sequencia converge para 0 no primeiro destes espacos,portanto e de Cauchy − tanto no espaco quanto no subespaco. Se (xn) con-vergisse no espaco ( ] 0, 1 ], µ), entao iria convergir para um ponto 0 < p ≤ 1;sendo ] 0, 1 ] ⊂ R teriamos a unicidade do limite contraditada. Logo (xn)nao converge em ( ] 0, 1 ], µ).

(b) Consideremos a sequencia dada por xn = 1− 1n e os espacos ( [ 0, 1 [, k)

e ( [ 0, 1 [, µ). Esta sequencia converge para 0 no primeiro destes espacos,

408

Page 410: Gentil Lopes - Espaços Métricos

portanto e de Cauchy. A prova de que e de Cauchy no segundo destesespacos, e analoga a prova feita em (a). Se (xn) convergisse no espaco( [ 0, 1 [, µ), entao iria convergir para um ponto 0 ≤ p < 1; sendo [ 0, 1 [⊂ R

teriamos a unicidade do limite contraditada. Logo (xn) nao converge em( [ 0, 1 [, µ).

Proposicao 90. Sendo M um conjunto arbitrario, qualquer sequencia deCauchy converge no espaco (M, δ).

Prova: De fato, se (xn) e uma sequencia de Cauchy no espaco (M, δ),entao para ε = 1 existe um ındice n0 de maneira que:

∀m, n ≥ n0 ⇒ δ(xm , xn) < 1

Logo,

∀m, n ≥ n0 ⇒ xm = xn

ou seja, toda sequencia de Cauchy no espaco (M, δ) e constante a partir deuma certa ordem, portanto converge para o termo que se repete. �

Nota: Nao e verdade que sendo (M, d) discreto qualquer sequencia deCauchy seja convergente. Por exemplo, tome M = { 1

n : n ∈ N } com ametrica usual.

Vimos (prop. 17, p. 161) que se uma sequencia, em um espaco vetorialnormado, e convergente entao existe uma bola de centro no vetor nulo quecontem todos os termos da sequencia. Veremos agora que as sequencias deCauchy tambem gozam desta propriedade.

Proposicao 91. Seja (xn) uma sequencia de Cauchy em um espaco vetorial(E, +, ·

)normado. Entao existe uma bola de centro no vetor nulo que

contem todos os termos da sequencia.

Prova: Inicialmente observemos que

B(0; r) = {x ∈ E : d(x, 0) < r }= {x ∈ E : ‖x− 0‖ < r }= {x ∈ E : ‖x‖ < r }

Sendo assim devemos encontrar um raio r de tal modo que todos os termosda sequencia satisfacam: ‖xn‖ < r.

Por hipotese (xn) e de Cauchy, logo tomando ε = 1 existe um ındice n0

tal quem, n ≥ n0 ⇒ d(xn , xm) = ‖xn − xm‖ < 1.

Sendo ‖xn − xm‖ < 1, ∀ m, n ≥ n0 ; fixemos m = n0 , entao

‖xn − xn0‖ < 1, ∀ n ≥ n0 . (8.1)

409

Page 411: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Mas,

‖xn‖ = ‖xn − xn0+ xn0

‖ ≤ ‖xn − xn0‖+ ‖xn0

‖ (8.2)

De (8.1) temos,

∀ n ≥ n0 , ‖xn − xn0‖ < 1 ⇒ ‖xn − xn0

‖+ ‖xn0‖ < 1 + ‖xn0

este resultado em (8.2) resulta: ‖xn‖ < 1 + ‖xn0‖, ∀ n ≥ n0 .

Esta desigualdade esta a nos dizer que todos os termos da sequencia(xn), com ındices iguais ou superiores a n0 , estao dentro da bola de centrono vetor nulo e raio r′ = 1 + ‖xn0

‖. Para que possamos incluir os termosrestantes: x1 , x2 , . . . , xn0−1 , escolhamos qualquer

r > max{‖x1‖, ‖x2‖, . . . , ‖xn0−1‖, 1 + ‖xn0

‖}

(8.3)

Sendo assim temos,

‖x1‖ < r, ‖x2‖ < r, . . . , ‖xn0−1‖ < r

e

‖xn‖ < 1 + ‖xn0‖ < r, ∀ n ≥ n0 .

Portanto temos,

‖xn‖ < r, ∀ n ∈ N.

Sendo assim o raio escolhido em (8.3) consegue incluir todos os termos dasequencia (xn) em uma bola de centro no vetor nulo. �

Observe que a diferenca desta proposicao para aquela em que a sequenciaconverge (prop. 17, p. 161) e que na presente demonstracao nao intervem olimite da sequencia; ou ainda; nao exigimos que a sequencia seja convergente,Tao somente que seja de Cauchy.

Seria instrutivo concretizarmos a demonstracao anterior com um exem-plo especıfico. Consideremos o espaco vetorial normado

(R2, ‖ · ‖

)onde ‖(x, y)‖ = max{ |x|, |y| }

e a sequencia (xn) dada por xn =(1− 1

n , 2− 2n

). Esta sequencia e conver-

gente, portanto e de Cauchy.Seguindo os passos da demonstracao anterior vamos encontrar um raio r

que inclua todos os termos da sequencia em uma bola centrada no vetor nulo.Para ε = 1 a partir de que ındice n0 teremos d(xn , xm) = ‖xn − xm‖ < 1?

Sendo,

xn =(

1− 1

n, 2− 2

n

)

e xm =(

1− 1

m, 2− 2

m

)

410

Page 412: Gentil Lopes - Espaços Métricos

temos,

xn − xm =(

1− 1

n, 2− 2

n

)

−(

1− 1

m, 2− 2

m

)

=(

− 1

n+

1

m, − 2

n+

2

m

)

portanto,

‖xn − xm‖ = max{∣∣− 1

n+

1

m

∣∣,∣∣− 2

n+

2

m

∣∣

}

= max{∣∣− 1

n+

1

m

∣∣, 2

∣∣− 1

n+

1

m

∣∣

}

= 2∣∣ − 1

n+

1

m

∣∣.

Temos,∣∣∣1

m− 1

n

∣∣∣ ≤

∣∣∣1

m

∣∣∣+∣∣∣− 1

n

∣∣∣ =

1

m+

1

n

Agora se m, n ≥ n0 , teremos

1

m≤ 1

n0

,1

n≤ 1

n0

⇒ 1

m+

1

n≤ 2

n0

.

Vamos impor a restricao 4n0< 1. Sendo assim, temos

‖xn − xm‖ = 2∣∣− 1

n+

1

m

∣∣ ≤ 4

n0

< 1.

Portanto para quaisquer m, n ≥ n0 = 5 garantimos ‖xn − xm‖ < 1.

A desigualdade

‖xn‖ < 1 + ‖xn0‖, ∀ n ≥ n0

isto e,

‖xn‖ < 1 + ‖x5‖, ∀ n ≥ 5,

nos garante que todos os termos da sequencia, a partir do quinto, estao in-cluidos em uma bola de centro no vetor nulo e raio r′ = 1+‖x5‖. Calculemosa norma do vetor x5 :

x5 =(

1− 1

5, 2− 2

5

)

=(4

5,8

5

)

⇒ ‖x5‖ = max{4

5,8

5

}=

8

5.

411

Page 413: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Portanto,

‖xn‖ < 1 +8

5, ∀ n ≥ 5.

Agora tomemos qualquer

r > max{‖x1‖, ‖x2‖, . . . , ‖x4‖, 1 + ‖x5‖

}

Entao,x1 = (0, 0) ⇒ ‖x1‖ = 0

x2 =(12 , 1

)⇒ ‖x2‖ = 1

x3 =(23 ,

43

)⇒ ‖x3‖ = 4

3

x4 =(34 ,

64

)⇒ ‖x4‖ = 6

4

portanto,

r > max{

0, 1,4

3,6

4, 1 +

8

5

}

=13

5= 2, 6

Geometricamente temos,

q1

q2

(0,0)R

R

rq q

x1

x2

x3

qqqx4qqpqqqqqqp(1, 2)

→B((0,0); r)

Nota: A recıproca desta ultima proposicao nao vale: se todos os termosde uma sequencia estao incluidos em uma bola com centro na origem, naoimplica que a sequencia seja de Cauchy.

De fato, todos os termos da sequencia (1, −1, 1, −1, . . .) de pontos deR estao contidos na bola Bµ(0; 2) = ] − 2, 2 [, mas esta sequencia nao e deCauchy, uma vez que se tomarmos ε = 1, para qualquer ındice n0 , sempreexistirao ındices m,n ≥ n0 tais que d(xm , xn) = |xm − xn | = 2 > ε.

412

Page 414: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vimos (prop. 13, p. 156) que toda sequencia convergente e limitada. Naproposicao seguinte mostraremos que as sequencias de Cauchy tambem gozamdesta propriedade.

Proposicao 92. Toda sequencia de Cauchy e limitada.

Prova: Seja (xn) uma sequencia de Cauchy num espaco metrico (M, d).Entao para ε = 1, existe um ındice n0 tal que

∀ m, n ≥ n0 ⇒ d(xn , xm) < 1

fixemos m = n0 , entao

∀ n ≥ n0 ⇒ d(xn , xn0) < 1 ⇒ xn ∈ B(xn0

; 1).

Fazendo X = {x1 , x2 , . . . , xn0−1 }, temos

{x1 , x2 , . . . , xn , . . . } = X ∪ {xn0, xn0+1 , xn0+2 , . . . }

⊂ X ∪B(xn0; 1)

Como X e limitado por ser finito, resulta que X ∪ B(xn0; 1) e limitado.

Portanto o conjunto dos termos da sequencia e limitado. �

Proposicao 93. Seja (xn) uma sequencia de Cauchy em um espaco metrico(M, d). Se existe uma subsequencia de (xn) que converge para p ∈M , entaolimxn = p.

Prova: Seja (xn1, xn2

, . . .) uma subsequencia conforme o enunciado.Entao para todo ε > 0, existe um ındice n

ktal que:

∀ ni ≥ nk=⇒ d(xni

, p) <ε

2(8.4)

Por outro lado, sendo (xn) uma sequencia de Cauchy, existe um ındice n0

tal que:

∀ m, n ≥ n0 =⇒ d(xm , xn) <ε

2(8.5)

Consideremos um ponto xnjda subsequencia. A desigualdade

d(xn , p) ≤ d(xn , xnj) + d(xnj

, p)

e sempre valida. Gostarıamos que fosse

d(xn , p) ≤ d(xn , xnj) + d(xnj

, p) < ε

para isto e suficiente que tenhamos

d(xnj, p) <

ε

2e d(xn , xnj

) <ε

2(8.6)

413

Page 415: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por (8.4) devemos escolher nj ≥ nke por (8.5) devemos escolher n ≥ n0

e nj ≥ n0 . A fim de unificar os ındices facamos ν = max{n0 , nk}. Logo,

para nj ≥ ν e n ≥ ν teremos as desigualdades em (8.6) satisfeitas. Sendoassim, nao sem algum esforco, conseguimos um ındice ν de modo que

∀ n ≥ ν ⇒ d(xn , p) < ε.

Isto e suficiente para garantir a convergecia de (xn). �

Corolario . Se uma sequencia (xn) em um espaco metrico (M, d) contemduas subsequencias que convergem para pontos diferentes desse espaco, entaoa sequencia nao e de Cauchy.

A imagem de uma sequencia de Cauchy por uma aplicacao contınua podenao resultar em uma sequencia de Cauchy.

Vejamos dois contraexemplos:

(i) A funcao,

f : ] 0, 1 ]→ R, dada por f(x) =1

x

transforma a sequencia de Cauchy ( 1n) na sequencia(f(1/n)

)= (1, 2, 3, . . .)

que nao e de Cauchy.

(ii) A funcao,

g : ] 0, 1 ]→ R, dada por g(x) = cos(1

x

)

leva a sequencia de Cauchy ( 12nπ ) na sequencia

(g(1/2nπ)

)= (1, 1, 1, . . .)

que e de Cauchy.

Esta mesma funcao transforma a sequencia de Cauchy ( 1nπ ) na sequencia

(g(1/nπ)

)= (−1, 1, −1, . . .) que nao e de Cauchy.

Uma aplicacao uniformemente contınua transforma, necessariamente,sequencias de Cauchy em sequencias de Cauchy.

Proposicao 94. A imagem de uma sequencia de Cauchy por uma aplicacaouniformemente contınua e tambem uma sequencia de Cauchy.

Prova: Suponhamos f : (M, d1) −→ (N, d2) uniformemente contınua eseja (xn) uma sequencias de Cauchy em M . Dado ε > 0, existe entao δ > 0tal que: (def. 36, p. 288)

d1(x, y) < δ =⇒ d2

(f(x), f(y)

)< ε.

Por outro lado, para o δ em questao, existe um ındice n0 de modo que

m, n ≥ n0 =⇒ d1(xm , xn) < δ.

Por conseguinte

m, n ≥ n0 =⇒ d2

(f(xm), f(xn)

)< ε.

Isto mostra que a sequencia(f(xn)

)e de Cauchy. �

414

Page 416: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Corolario29. Se d e d′ sao metricas uniformemente equivalentes sobre M ,entao as sequencias de Cauchy de (M, d) e (M, d′) sao as mesmas.

Em particular os espacos produtos (M, D1), (M, D2) e (M, D3) tem asmesmas sequencias de Cauchy.

Prova: Seja (xn) uma sequencia de Cauchy de (M, d). Como i : (M, d) →(M, d′) (onde i indica a aplicacao identidade deM) e uniformemente contınua†,logo i

((xn)

)= (xn) e uma sequencia de Cauchy de (M, d′). Analogamente

se prova que toda sequencia de Cauchy de (M, d′) tambem e sequencia deCauchy de (M, d). �

Nota: A recıproca desta proposicao: “Se uma aplicacao transforma sequenciasde Cauchy em sequencias de Cauchy, entao esta aplicacao e uniformementecontınua” nao e verdadeira. Para mostrar isto consideremos a funcao f : R→R, dada por f(x) = x2. Esta funcao nao e uniformemente contınua, como javimos. Mas transforma sequencias de Cauchy em sequencias de Cauchy. Defato, se (xn) e uma sequencia de Cauchy em (R, µ), entao existe r > 0 talque |xn | < r, ∀n ∈ N (prop. 91, p. 409). Mas a restricao de f a bola ] − r, r [ euniformemente contınua (nota p. 291). Donde f

((xn)

)e sequencia de Cauchy.

Proposicao 95. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos. Uma sequencia((xn , yn)

)de pontos de M ×N e de Cauchy se, e somente se, as sequencias

(xn) em M e (yn) em N sao de Cauchy.

Prova: O enunciado refere-se a qualquer das metricas usuais (p. 95) emM × N , indistintas no que tange a convergencia. Usaremos a metrica domaximo.

(=⇒) Seja((xn , yn)

)de Cauchy em M × N , entao dado ε > 0 existe um

ındice n0 de modo que:

m, n ≥ n0 ⇒ D3

((xm , ym), (xn , yn)

)= max

{d1(xm , xn), d2(ym, yn)

}< ε

Segue que:d1(xm , xn) < ε e d2(ym , yn) < ε

para quaisquer m, n ≥ n0 ; e portanto (xn) e (yn) sao sequencias de Cauchy.

(⇐=) Sendo (xn) e (yn) sequencias de Cauchy, dado ε > 0 existem porhipotese ındices m0 e n0 tais que:

∀m, n ≥ m0 ⇒ d1(xm , xn) < ε e ∀m, n ≥ n0 ⇒ d2(ym , yn) < ε.

Considerando p0 = max{m0 , n0 } temos entao que:

∀m, n ≥ p0 ⇒ d1(xm , xn) < ε e d2(ym , yn) < ε

⇒ max{d1(xm , xn), d2(ym , yn)

}< ε

⇒ D3

((xm , ym), (xn , yn)

)< ε

Isto prova que a sequencia((xn , yn)

)e de Cauchy em M ×N . �

†definicoes 40 (p. 321) e 41 (p. 321).

415

Page 417: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A generalizacao deste resultado para um produto M =M1 × · · · ×Mn eimediata.

• A (outra) caracterizacao de completeza, em R, a qual nos referi-mos na Introducao, e que a propriedade do supremo implica em que todasequencia de Cauchy de R converge (como sera visto logo mais), a recıproca∗

e vista na construcao dos reais pelo metodo de Cantor, como o leitor poderaapreciar na referencia [9].

8.1 Espacos metricos completos

Definicao 54 (Espacos metricos completos). Um espaco metrico (M, d) echamado completo se toda sequencia de Cauchy desse espaco converge paraum ponto de M .

Vejamos exemplos de espacos metricos completos e nao completos:

Exemplos:

1) O espaco (Q, δ) e completo enquanto o espaco (Q, µ) nao o e.De fato, a “completeza” do espaco (Q, δ) e uma decorrencia imediata

da proposicao 90 (p. 409). Para mostrar que o espaco (Q, µ) nao e completopodemos nos valer do exemplo 2 (p. 204) juntamente com a proposicao 42(p. 212). Assim: Tomamos a ∈ R − Q entao existe uma sequencia (xn) deracionais convergindo para a irracional. Sendo (xn) convergente em (R, µ)entao e de Cauchy, inclusive em (Q, µ). Pela unicidade do limite (xn) naopode convergir para um racional. Portanto (Q, µ) nao e completo, ja queconseguimos uma sequencia de Cauchy em (Q, µ) que nao converge para umponto de Q.

Nota: De modo analogo podemos mostrar que o espaco metrico (M, δ), ondeM e qualquer conjunto nao vazio, e completo.

2) Veremos agora que o espaco (R, µ) e completo.

Prova: Consideremos (xn) uma sequencia de Cauchy em (R, µ). Devido aproposicao 91 (p. 409) existe k > 0 tal que |xn | < k para todo n natural. Deoutro modo

−k < xn < k, ∀n ∈ N. (8.7)

Por conta disto o conjunto {x1 , x2 , . . . } dos termos da sequencia e limitado,logo possui supremo e infımo. A partir da sequencia (xn) definamos umaoutra sequencia (yn) do seguinte modo:

∗Isto e, a convergencia de toda sequencia de Cauchy implica na propriedade dosupremo.

416

Page 418: Gentil Lopes - Espaços Métricos

y1 = inf{x1 , x2 , x3 , . . . }y2 = inf{x2 , x3 , x4 , . . . }y3 = inf{x3 , x4 , x5 , . . . }· · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·yn = inf{xn , xn+1 , xn+2 , . . . }· · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·

Todos estes numeros estao bem definidos. Observe, por exemplo que{x2 , x3 , x4 , . . . } ⊂ {x1 , x2 , x3 , . . . }, entao∗

inf{x1 , x2 , x3 , . . . } ≤ inf{x2 , x3 , . . . } ⇒ y1 ≤ y2 .

O que esta nova sequencia tem de essencial e o fato de ser monotona elimitada, isto e

y1 ≤ y2 ≤ · · · ≤ yn ≤ · · · < k

Observe que, por definicao, yn ≤ xn , ∀n ∈ N mas, por (8.7), podemosescrever

yn ≤ xn < k ⇒ yn < k, ∀n ∈ N.

Conclusao† : (yn) converge para p = sup { yn : n = 1, 2, . . .} que e um pontode R. Mostremos que limxn = p.

Dado ε > 0 existe um ındice r tal que:

n ≥ r ⇒ |yn − p| <ε

3

por outro lado (xn) sendo de Cauchy, existe um ındice s de modo que:

m, n ≥ s ⇒ |xm − xn | <ε

3

Agora vamos escolher um ındice t ≥ max{ r, s }. Tendo em conta que

yt = inf{xt , xt+1 , xt+2 , . . . }

yt e a maior cota inferior do conjunto {xt , xt+1 , xt+2 , . . .} o que implica emque yt +

ε3 nao e cota inferior deste conjunto. Por conseguinte existe um

ındice j ≥ t de modo que

yt ≤ xj < yt +ε

3⇔ 0 ≤ xj − yt <

ε

3⇒ |xj − yt | <

ε

3

∗Lembramos: Se A ⊂ B ⇒ inf B ≤ inf A (prop. 145, p. 611).†Ver proposicao 15, p. 160.

417

Page 419: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Do artifıcio, xn − p = (xn − xj ) + (xj − yt) + (yt − p) segue que

|xn − p| = |(xn − xj ) + (xj − yt) + (yt − p)|≤ |xn − xj |+ |xj − yt|+ |yt − p|

3+ε

3+ε

3= ε, ∀n ≥ t.

isto prova que lim xn = p. �

3) O conjunto P[ 0, 1 ] das funcoes polinomiais p : [ 0, 1 ] → R e um espacovetorial. Podemos considerar em P[ 0, 1 ] a norma

‖p‖ = max{ |p(t)| : 0 ≤ t ≤ 1 }

do que resulta a metrica d sobre P[ 0, 1 ] dada por

d(p, q) = max{ |p(t)− q(t)| : 0 ≤ t ≤ 1 }

O espaco metrico(P[ 0, 1 ], d

)nao e completo. De fato, demonstra-se (no

Calculo ou na Analise Real) que a sequencia (pn) de polinomios dada por

pn(t) = 1 + t+t2

2!+ · · ·+ tn

n!

converge uniformemente em ([ 0, 1 ], µ) para a funcao contınua

f : [ 0, 1 ]→ R, dada por f(t) = et

que nao e um polinomio. Como toda sequencia convergente e de Cauchysegue-se que (pn) e uma sequencia de Cauchy em

(P[ 0, 1 ], d

)que nao con-

verge para um ponto deste espaco.

4) O espaco de funcoes(C[ a, b ], Υ

)e completo enquanto o espaco

(C[ a, b ], Γ

)

nao e completo.

Prova:

(i) Temos de provar que, sendo (fn) uma sequencia de Cauchy em(C[ a, b ],Υ

),

existe uma funcao f ∈ C[ a, b ] para a qual a sequencia (fn) converge. Istoe, tal que ‖fn − f‖Υ → 0∗.

Por hipotese, para qualquer ε > 0 existe um ındice n0 de modo que paratodo m, n ≥ n0 temos

Υ(fm , fn) = max{|fm(x)− fn(x)| : x ∈ [ a, b ]

}<ε

2

Consequentemente para qualquer x ∈ [ a, b ] fixado,

|fm(x)− fn(x)| <ε

2(m, n ≥ n0). (8.8)

∗Prop. 9, p. 143.

418

Page 420: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Isto mostra que(f1(x), f2(x), . . . , fm(x), . . .

)e uma sequencia de Cauchy

de numeros reais∗. Visto que (R, µ) e completo, esta sequencia convergirapara um numero real (em geral dependente de x) que podemos designar porf(x), ficando assim bem definida uma funcao

f : [ a, b ]→ R dada por f(x) = limm→∞

fm(x), ∀x ∈ [ a, b ].

Vamos agora ver que f e contınua em [ a, b ] (isto e, que f ∈ C[ a, b ]) eque se tem de fato ‖fn − f‖Υ → 0, o que concluira a demonstracao.

Na desigualdade (8.8) vamos conservar n fixo (embora arbitrario, desdeque maior ou igual a n0) e x fixo (arbitrario em [ a, b ]) e tomar o limitequando m→ +∞:

limm→∞

|fm(x)− fn(x)| ≤ limm→∞

ε

2(n ≥ n0)

Logo ∣∣∣ limm→∞

(fm(x)− fn(x)

)∣∣∣ ≤ ε

2⇒ |f(x)− fn(x)| ≤

ε

2.

Deste modo mostramos que∣∣f(x)− fn(x)

∣∣ < ε, ∀n ≥ n0 .

Segue, da definicao de convergencia uniforme de uma sequencia de funcoes(p. 604), que a sequencia funcional (fn) converge uniformente para a funcaof . Isto e, a convergencia fn → f e uniforme. Portanto pelo [AR] 11 (p. 604)

concluimos que f e contınua, isto e, f ∈ C[a, b].Finalmente, da desigualdade: |f(x)− fn(x)| < ε, valida para qualquer

x ∈ [ a, b ] e qualquer n ≥ n0 , deduz-se que se verificara tambem, paran ≥ n0 , ([AR] 1, p. 603)

maxx∈ [ a, b ]

|f(x)− fn(x)| = ‖fn − f‖Υ < ε,

o que prova que ‖fn − f‖Υ → 0 se n → +∞, terminando esta parte dademonstracao.

(ii) Para mostrar que o espaco metrico(C[ 0, 1 ],Γ

)nao e completo devemos

exibir uma sequencia de Cauchy e provar que esta sequencia nao convergeneste espaco.

Consideremos a sequencia de funcoes (fn) cujo termo geral e dado por

fn(x) =

0, 0 ≤ x ≤ 12 ;

2n(x− 12),

12 ≤ x ≤ 1

2 +12n ;

1, 12 +

12n ≤ x ≤ 1.

∗Nota: (fn) e uma sequencia de funcoes enquanto, para x ∈ [ a, b ] fixado, (fn(x)) euma sequencia de numeros reais.

419

Page 421: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Na figura seguinte plotamos os tres primeiros termos desta sequencia:

x

f1 (x)

0 12

q

q

1

1

x

f2 (x)

0 12

34

12

q

q

1

1

x

f3 (x)

0 12

23

12

q

q

1

1

Vamos mostrar que a sequencia (fn) e de Cauchy. Para isto dado ε > 0devemos exibir um ındice n0 de modo que

∀m, n ≥ n0 ⇒ d(fm , fn) =

∫ 1

0|fm(x)− fn(x)| dx < ε

Do grafico seguinte (a direita)

x

fn (x)

0 12

an

12n

q

q

1

1

x0 1

2am an

12n

12m

fn

fm

q

q

1

1

concluimos que a distancia em questao e dada pela area do triangulo com-preendido entre os graficos de fn e fm e vale

A =B · h2

=

(12n − 1

2m

)· 1

2=

1

4·( 1

n− 1

m

)

onde estamos considerando m > n. Temos que an = 12 + 1

2n .Pois bem, queremos encontrar n0 de maneira que

m, n ≥ n0 ⇒1

4·( 1

n− 1

m

)

< ε

420

Page 422: Gentil Lopes - Espaços Métricos

temos,

m ≥ n0 , n ≥ n0 ⇒1

m≤ 1

n0

,1

n≤ 1

n0

⇒ 1

m+

1

n≤ 2

n0

⇒ 1

4·( 1

m+

1

n

)

≤ 1

4· 2

n0

por outro lado,

1

4·( 1

n− 1

m

)

<1

4·( 1

m+

1

n

)

≤ 1

2n0

< ε

A utima das desigualdades acima foi imposta.

Portanto dado ε > 0 escolhemos n0 >1

2ε. Senao vejamos:

m >1

2ε, n >

1

2ε⇒ 1

2m< ε,

1

2n< ε

⇒ 1

2m+

1

2n< 2ε

⇒ 1

4·( 1

m+

1

n

)

< ε

por outro lado,1

4·( 1

m− 1

n

)

<1

4·( 1

m+

1

n

)

< ε

Com isto concluimos a prova de que a sequencia (fn) de fato e de Cauchy.So nos resta mostrar que (fn) nao converge em

(C[ 0, 1 ],Γ

). Suponha,

por um momento, que f seja uma funcao em C[ 0, 1 ] tal que lim fn = f .Suponhamos ainda f(c) 6= 0 para algum 0 ≤ c ≤ 1

2 . Entao

∣∣fn(c)− f(c)

∣∣ =

∣∣f(c)

∣∣ > 0, para algum c ∈ [ 0,

1

2]

Logo ([AR] 9, p. 604)

d(fn , f) =

∫ 1

0|fn − f |

≥∫ 1

2

0|fn − f |

=

∫ 12

0|f | > 0

421

Page 423: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Para todo n. Passando ao limite, temos

limn→∞

d(fn , f) ≥ limn→∞

∫ 12

0|f | =

∫ 12

0|f | > 0

contrariando a hipotese de que lim fn = f . (prop. 9, p. 143)

Logo nao temos f(c) 6= 0 para algum 0 ≤ c ≤ 1/2. Ou ainda, f(x) = 0para todo 0 ≤ x ≤ 1/2. Esta e a primeira conclusao que tiramos a respeitode f = lim fn .

Agora suponhamos que para 12 < c ≤ 1 tivessemos f(c) 6= 1. Entao

|fn(c)− f(c)| = |1− f(c)| > 0 (8.9)

desde que n satisfaca,

1

2+

1

2n< c ≤ 1, isto e n >

1

2c− 1

Resumindo: Supondo que aconteca f(c) 6= 1 para algum 1/2 < c ≤ 1,consideramos apenas as fn a partir de n > 1

2c−1 , obtendo fn(c) = 1 e daı a

validade de (8.9) a partir de n > 12c−1 . Entao,

d(fn , f) =

∫ 1

0|fn − f |

≥∫ 1

12

|fn − f | =∫ 1

12

|1− f | > 0

Para todo n > 12c−1 . Passando ao limite, temos

limn→∞

d(fn , f) ≥ limn→∞

∫ 1

12

|1− f | =∫ 1

12

|1− f | > 0

contrariando a hipotese de que lim fn = f . Logo nao temos f(c) 6= 1 paraalgum 1

2 < c ≤ 1. Ou ainda, f(x) = 1 para todo 12 < x ≤ 1.

E a segunda conclusao que tiramos a respeito de f = lim fn . Resumindo,temos f : [ 0, 1 ]→ R, dada por

f(x) =

0, se 0 ≤ x ≤ 12 ;

1, se 12 < x ≤ 1.

0 12

1

1

x

f(x)

q q

q

o que e impossıvel para uma funcao contınua no espaco ([ 0, 1 ], µ). Istoprova que nao existe lim fn em

(C[ a, b ],Γ

). �

422

Page 424: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vimos que o espaco (Q, µ) nao e completo. A proxima proposicao nosmostra que isto acontece precisamente pelo fato deQ nao ser um subconjuntofechado em (R, µ). (ex. 3, p. 201)

Proposicao 96. Um subespaco fechado de um espaco metrico completoe completo. Recıprocamente, um subespaco completo de qualquer espacometrico e fechado.

Prova: (=⇒) Seja (xn) uma sequencia de Cauchy em (N, d) (N ⊂M).Como (M, d) e completo, (xn) converge em (M, d), isto e, existe a ∈ Mtal que limxn = a. Assim, temos que a ∈ N (pois N e fechado em (M, d)− (prop. 43, p. 214). Portanto (xn) e convergente em (N, d) e (N, d) resultacompleto.

(⇐=) Para mostrar que (N, d) e fechado em (M, d) e suficiente tomar umasequencia de pontos em N convergindo para um ponto a ∈ M e mostrarque a ∈ N (prop. 44, p. 216). E o que faremos: Seja (xn) uma sequencia depontos em N com lim xn = a ∈M . Entao pela proposicao 89 (p. 408) (xn) ede Cauchy. Sendo (N, d) completo, (xn) converge em (N, d). Isto e, existeb ∈ N tal que limxn = b. Pela unicidade do limite de uma sequencia temosb = a. Portanto a ∈ N . �

Assim, por exemplo, todo subespaco ([ a, b ], µ) e completo, por ser umsubespaco fechado de (R, µ) que e completo.

O produto cartesiano de espacos metricos completos e completo. Aproxima proposicao sustenta mais que isto.

Proposicao 97. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos. Entao o espaco(M ×N, D) e completo se, e somente se, (M, d1) e (N, d2) sao completos.

Prova: O enunciado refere-se a qualquer das metricas usuais (p. 95) em(M × N, D) uma vez que, conforme ja vimos (corol. 29, p. 415), determinamneste espaco as mesmas sequencias de Cauchy.

(=⇒) Seja (xn) uma sequencia de Cauchy em (M, d1), entao para caday ∈ N , a sequencia

((x1 , y); (x2 , y); . . .

)e de Cauchy no espaco (M×N, D3).

De fato, dado ε > 0, existe um ındice n0 tal que:

m, n ≥ n0 ⇒ D3

((xm , y); (xn , y)

)= max

{d1(xm , xn), d2(y, y)

}

= d1(xm , xn) < ε

Portanto,((xn , y)

)converge para um ponto (p, q) ∈ M × N e daı (xn)

converge para p ∈M (prop. 14, p. 157), logo (M, d1) resulta completo.

De maneira analoga se prova que (N, d2) e completo.

(⇐=) Seja((xn , yn)

)uma sequencia de Cauchy no espaco (M × N, D3),

entao (xn) e (yn) sao sequencias de Cauchy em (M, d1) e (N, d2), respecti-vamente (prop. 95, p. 415), e sendo completos estes espacos, existem p ∈ M e

423

Page 425: Gentil Lopes - Espaços Métricos

q ∈ N de maneira que limxn = p e lim yn = q. Portanto, novamente pelaproposicao 14 acima citada

lim(xn , yn) = ( p, q )

Isto prova que((xn , yn)

)e de Cauchy. �

Corolario30. Sejam (M1 , d1), (M2 , d2), . . . , (Mn , dn) espacos metricos com-pletos. Entao (M1 ×M2 × · · · ×Mn , D) e completo se, e somente se,(M1 , d1), (M2 , d2), . . . , (Mn , dn) sao completos.

Prova: Basta aplicar n− 1 vezes a proposicao 97. �

Exemplo: Ja vimos que o espaco (R, µ) e completo. Resulta daı que oespaco (Rn, Di) e completo.

Vamos mostrar agora que “ser completo” ou “nao ser completo” nao euma propriedade topologica (p. 298) mas sim metrica.

Vimos (ex. 2, p. 296) que os espacos (R, µ) e(] −1, 1 [, µ

)sao homeomor-

fos, porem (R, µ) e completo e(] − 1, 1 [, µ

)nao e. Logo “ser completo”

ou “nao ser completo” nao e uma propriedade topologica, visto que nao epreservada por homeomorfismos.

A proposicao a seguir mostra que esta e uma propriedade “metrica”, istoe, propriedade que e preservada por isometrias. (p. 254)

Proposicao 98. Se f : (M, d1) → (N, d2) e uma isometria entao (M, d1)e completo se, e somente se, (N, d2) o for.

Prova: Sejam (M, d1) completo e f : (M, d1)→ (N, d2) uma isometria.Dada uma sequencia de Cauchy (yn) em (N, d2), a sequencia dada porxn = f−1(yn) e tambem de Cauchy, pois

d1(xn , xm) = d2

(f(xn), f(xm)

)

= d2(yn , ym)

Sendo (M, d1) completo, (xn) converge. Seja a = limxn . Entao sendo fcontınua, da proposicao 52 (p. 267), podemos escrever

a = limxn ⇒ f(a) = f(limxn) ⇒ f(a) = lim f(xn)

= lim yn

Portanto (yn) e convergente e (N, d2) resulta completo. A outra parte dademonstracao e analoga. �

Nota: Um espaco pode ser conexo e nao ser completo. E o caso, por exem-plo, do espaco

(] 0, 1 ], µ

). Como ja vimos (prop. 80, p. 355) no espaco (R, µ)

todos os intervalos sao conexos. Como porem a sequencia (1, 1/2, 1/3, . . .)de pontos em ] 0, 1 ] e de Cauchy mas nao converge neste espaco, entao defato

(] 0, 1 ], µ

)nao e completo.

424

Page 426: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Tambem pode ocorrer de um espaco ser completo sem ser conexo: bastaconsiderar o espaco (M, δ), onde M e qualquer conjunto com pelo menosdois elementos. Em nota (p. 416) dissemos que (M, δ) e completo. Ja naproposicao 77 (p. 351) vimos que (M, δ) e desconexo.

O espaco([ 0, 1 [, k

)e completo

Para provar a proxima proposicao lancaremos mao do fato de que ointervalo fechado [ 0, 1 ] e completo. Antes necessitaremos dos seguinteslemas:

Lema 5. Considere (xn) tal que 0 ≤ xn < 1. Se (xn) converge para 1 noespaco

([ 0, 1 ], µ

), entao (xn) converge para 0 no espaco

([ 0, 1 [, k

).

Prova: Dado ε > 0, existe um ındice n0 de modo que

∀n ≥ n0 ⇒ xn ∈ Bµ

(1; ε).

Temos que Bµ

(1; ε)= ] 1− ε, 1 ]. Sendo assim (mostre)

(

(1; ε)− { 1 }

)

= ] 1− ε, 1 [ ⊂ Bk(0; ε)

portanto, kxn −→ 0. �

Nota: Nesta prova nao faz mal impor a restricao ε ≤ 1.

Lema 6. Considere 0 ≤ p < 1 e r > 0, entao Bµ

(p; r

)⊂ B

k(p; r).

Prova: Seja x ∈ Bµ

(p; r

)entao |x− p| < r. Temos duas possibilidades:

k(x, p) = min{|x− p|, 1− |x− p|

}= |x− p| < r

k(x, p) = min{|x− p|, 1− |x− p|

}= 1− |x− p| ≤ |x− p| < r

Em qualquer dos casos x ∈ Bk(p; r). �

Corolario31. Toda sequencia (xn) (0 ≤ xn < 1) que converge para o pontop (0 ≤ p < 1) no espaco

([ 0, 1 ], µ

), converge para o mesmo ponto no espaco

([ 0, 1 [, k

).

Em particular, toda sequencia, (xn) (0 ≤ xn < 1), de Cauchy no espaco[ 0, 1 ] tambem o e em [ 0, 1 [ ; mas a recıproca e falsa, como veremos.

425

Page 427: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 99 (Gentil/01.07.05). O espaco metrico([ 0, 1 [, k

)e completo.

Prova: Seja (xn) uma sequencia de Cauchy em([ 0, 1 [, k

). Isto implica:

∀ ∃ : ∀ (m,n≥n0 ) ⇒ k(xm , xn)=min{ |xm−xn |, 1−|xm− xn | }<εε>0 n0 ∈N

(8.10)

Temos duas alternativas:

1a) (xn) e de Cauchy em([ 0, 1 ], µ

). Neste caso, como este espaco e com-

pleto, (xn) converge:

Se µxn −→ 1, entao kxn −→ 0. Se µxn −→ p 6= 1, entao kxn −→ p.

2a) (xn) nao e de Cauchy em([ 0, 1 ], µ

).

Neste caso afirmamos que a sequencia converge para 0, isto e: kxn −→ 0.

De fato, se (xn) nao e de Cauchy em([ 0, 1 ], µ

), entao: (p. 408)

∃ : ∀ ∃ (m,n≥ k ) ∧ |xm −xn | ≥ ε0ε0>0 k∈N m,n∈N

(8.11)

Podemos acompanhar a prova pelo seguinte fluxograma:

∃ ε0 > 0 (fixo)Tome k : 1/k < ε

0

(8.11)

Tome

ε < 1k

(8.10)

∃n0 ∈ N, n0 = n0(ε)

Tome

k ≥ max{n0 , k }(8.11)

∃mi , ni ≥ k( 1−|xm

i−xn

i|<ε )

(xm1, xm2

, ... )

(xn1, xn2

, ... ) k >max{mi , ni }

Tome um novo

Na primeira iteracao ( i = 1 ) por (8.11) existe ε0 > 0 (este esta fixo)em seguida, pela propriedade arquimediana, escolhemos um ındice k tal que1k < ε0 . Aı entramos na segunda caixa do fluxograma, tomando ε < 1

k .Tome agora k ≥ max{n0 , k }; sendo assim, por (8.11), podemos escolherdois ındices, digamos: m1 , n1 ≥ k de modo que |xm1

− xn1| ≥ ε0 . A

desigualdade (8.10) e satisfeita por todos os ındices superiores a n0 , comoeste e o caso dos ındices m1 e n1 , temos que

k(xm1, xn1

) = min{|xm1

− xn1|, 1− |xm1

− xn1|}

< ε < ε0 ≤ |xm1− xn1

|

426

Page 428: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Esta desigualdade impoe que seja k(xm1, xn1

) = 1− |xm1− xn1

| < ε.

Observe que, 1−|xm1− xn1

| < |xm1− xn1

|, ou ainda, |xm1− xn1

| > 1/2;

sendo assim os dois termos patrocinados por (8.11) resultam, forcosamente,em lados opostos do intervalo (ou metades opostas).

Aqui termina a primeira iteracao. Iniciemos a segunda (i = 2); agoraescolhemos um novo ındice k satisfazendo k > max{m1 , n1 } e retornamosa (8.10).

Por razoes analogas ao do caso precedente concluimos que:

k(xm2, xn2

) = 1− |xm2− xn2

| < ε

Geometricamente tudo se passa assim:

0 114

12

34

p p pt tt txm1

xm2xn2

xn1

Nota: Nao faz mal escolhermos os ındices mj associados aos termos da es-querda e os ındices nj associados aos termos da direita.

Fazemos duas observacoes quanto ao fluxograma:

( i ) k ≥ max{n0 , k } garante que os ındices mi , ni ≥ k, patrocinados por(8.11), tambem satisfazem (8.10) o que vai garantir que 1− |xmi

−xni| < ε.

( ii ) k > max{mi , ni } ≥ k garante que a cada nova iteracao o novo k emaior que o k da iteracao anterior, o que garante sempre ε < 1

k < ε0 e,ademais, forca (atraves de ∃mi , ni ≥ k) que os ındices mi , ni sejam semprecrescentes (ver definicao de subsequencia).

Pois bem, por inducao, obtemos duas subsequencias (xmj), no primeiro

quarto do intervalo e (xnj), no ultimo quarto do intervalo, tais que

k(xmj, xnj

) = 1− |xmj− xnj

| < ε (8.12)

Como ε e arbitrariamente pequeno (tendo em conta que k e semprecrescente a cada iteracao) a desigualdade (8.12) impoe que a distancia (µ ):|xm

j− xn

j| aproxime-se arbitrariamente de 1; e isto forca os termos de ambas

as subsequencias a aproximarem-se, arbitrariamente, das extremidades dointervalo [ 0, 1 [. Lembrando da bola B

k(0; r):

0 1r 1−rB

k(0; r< 1

2)

concluimos que ambas as subsequencias (xmj) e (xn

j) convergem para 0.

Portanto, com o auxılio da prop. 93 (p. 413), temos kxn −→ 0 e([ 0, 1 [, k

)

resulta completo. �

427

Page 429: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Observe que esta prova caracteriza (nos diz quem sao e porque) todas assequencias (xn) do intervalo [ 0, 1 [ que convergem neste, mas nao convergemno intervalo [ 0, 1 ]: sao as sequencias que possuem uma subsequencia naprimeira metade do intervalo e outra na segunda metade. E mais: estassubsequencias aproximam-se indefinidamente das extremidades do intervalo,ou seja, uma converge para 0 e a outra para 1, no intervalo [ 0, 1 ], daı a razaoda sequencia (xn) nao convergir em [ 0, 1 ].

Podemos observar um caso destes escolhendo a sequencia (xn) dada por,

xn =

{1n , se n e par;

1− 1n , se n e ımpar.

cujos primeiros termos estao plotados a seguir:

0 1

. . . . . .s s ss ss sx1 x2 x3x4 x5x6 x7

Os termos de ındices pares convergem para 0 e os de ındices ımparestambem (na metrica k), portanto a sequencia converge para 0 e resulta deCauchy. O mesmo ja nao acontece com respeito a metrica µ.

Corolario 32. Os tres quadrados ( [ 0, 1 [× [ 0, 1 [ , Di ) sao completos.

8.2 Espacos de Banach

Definicao 55 (Espacos de Banach). Um espaco vetorial normado e com-pleto em relacao a metrica induzida por esta norma e chamado espaco deBanach.

Exemplos:

1) Exemplos de espacos de Banach sao (Rn, ‖ · ‖), (Rn, ‖ · ‖′) e (Rn, ‖ · ‖′′),onde, para x = (x1 , . . . , xn) ∈ Rn se tem

‖x‖ =(

n∑

i=1

|xi |2)1/2

=√

|x1 |2 + · · ·+ |xn |2

‖x‖′ =n∑

i=1

|xi | = |x1 |+ · · · + |xn |

‖x‖′′ = max1≤i≤n

|xi | = max{|x1 |, . . . , |xn |}

Ver corolario 30 (p. 424).

428

Page 430: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2) O espaco(C[ a, b ], ‖ · ‖

), onde

‖f‖ = max{ |f(x)| : x ∈ [ a, b ] }

e de Banach.

A completeza deste espaco foi mostrada no exemplo 4 (p. 418).

3) O espaco(C[ a, b ], ‖ · ‖

), onde

‖f‖ =∫ 1

0|f(x)| dx

nao e de Banach.

A incompleteza deste espaco foi mostrada no exemplo 4 (p. 418).

4) O espaco(B(X, R), ‖ · ‖

). A pagina 32 consideramos o conjunto

B(X, R) das funcoes limitadas de de X em R. Neste conjunto consideramosa metrica

Ψ(f, g) = sup{|f(x)− g(x)| : x ∈ X

}

a qual e proveniente da norma

‖f‖Ψ= sup

{|f(x)| : x ∈ X

}

Mostraremos agora que o espaco vetorial aqui descrito e um espaco deBanach.

Prova: Temos de provar que, sendo (fn) de Cauchy em(B(X, R), ‖ · ‖Ψ

),

existe uma funcao f ∈ B(X, R) para a qual (fn) converge, isto e, tal que‖fn − f‖Ψ → 0.

Por hipotese, para qualquer ε > 0 existe um ındice n0 de modo que paratodo m, n ≥ n0 temos

Ψ(fm, fn) = sup{|fm(x)− fn(x)| : x ∈ X

}<ε

2

Consequentemente para qualquer x ∈ X fixado,

∣∣fm(x)− fn(x)

∣∣ <

ε

2(m, n ≥ n0) (8.13)

Isto mostra que(f1(x), f2(x), . . . , fm(x), . . .

)e uma sequencia de Cauchy

de numeros reais. Visto que (R, µ) e completo, esta sequencia convergirapara um numero real (em geral dependente de x) que podemos designar porf(x), ficando assim bem definida uma funcao

f : X → R dada por f(x) = limm→∞

fm(x), ∀x ∈ X.

Vamos agora ver que f e limitada em X (isto e, que f ∈ B(X, R)) e quese tem de fato ‖fn − f‖Ψ → 0, o que concluira a demonstracao.

429

Page 431: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Na desigualdade (8.13) vamos conservar n fixo (embora arbitrario, desdeque maior do que n0) e x fixo (arbitrario em X) e tomar o limite quandom→ +∞:

limm→∞

|fm(x)− fn(x)| ≤ limm→∞

ε

2(n ≥ n0)

Logo, ∣∣∣ limm→∞

(fm(x)− fn(x)

)∣∣∣ ≤ ε

2⇒ |f(x)− fn(x)| ≤

ε

2.

Deste modo mostramos que

|f(x)− fn(x)| ≤ε

2< ε, ∀n ≥ n0 e ∀x ∈ X (8.14)

Em particular, ∣∣∣f(x)− fn0

(x)∣∣∣ < ε, ∀x ∈ X

sendo assim,

|f(x)| = |f(x)− fn0(x) + fn0

(x)|

≤ |f(x)− fn0(x)| + |fn0

(x)|

< ε+ |fn0(x)|

para todo x ∈ X. Como fn0(x) ∈ B(X, R), existe k tal que

|fn0(x)| ≤ k, ∀ x ∈ X.

Logo,|f(x)| < ε+ k, ∀ x ∈ X.

Isto mostra que f e limitada, ou seja f ∈ B(X, R). A desigualdade (8.14)nos diz que ε

2 e uma cota superior do conjunto

{|f(x)− fn(x)| : x ∈ X

}

para n ≥ n0 . Como o sup e a menor de tais cotas superiores segue que

sup{|f(x)− fn(x)| : x ∈ X

}≤ ε

2

logo,

‖fn − f‖Ψ = sup{|f(x)− fn(x)| : x ∈ X

}≤ ε

2< ε

o que prova que ‖fn − f‖Ψ → 0 se n→ +∞; terminando a demonstracao.�

Para o nosso proximo exemplo de espaco de Banach chamamos a atencaodo leitor para o fato de que estaremos considerando (simultaneamente) doisespacos metricos:

430

Page 432: Gentil Lopes - Espaços Métricos

i) (X, d ), onde X 6= ∅ e um conjunto qualquer e d e uma metrica sobre X;

ii)(B(X, R); ‖ · ‖

Ψ

), onde B(X, R) e o conjunto das funcoes f : X → R

limitadas e ‖ · ‖Ψ e a metrica (norma) dada por

‖f − g‖Ψ = sup{|f(x)− g(x)| : x ∈ X

}= Ψ(f, g)

Pois bem, dada uma funcao f ∈ B(X, R) esta pode ou nao ser contınua.Indicaremos por BC(X, R) o conjunto das funcoes limitadas e contınuasf : X → R.

Deixamos a cargo do leitor provar que BC(X, R) e um subespaco vetorialde B(X, R).5) No presente exemplo mostraremos que

(BC(X, R); ‖·‖Ψ

)e um subespaco

fechado de(B(X, R); ‖ · ‖Ψ

)e portanto um espaco metrico completo em

virtude da proposicao 96 (p. 423). Em outras palavras, mostraremos que(BC(X, R); ‖ · ‖

Ψ

)e tambem um espaco de Banach.

Prova: Para provar que(BC(X, R); ‖ · ‖

Ψ

)e um subespaco fechado de

(B(X, R); ‖ · ‖

Ψ

)− consoante a proposicao 44 (p. 216) − basta mostrar que

se (fn) e uma sequencia em BC(X, R) tal que lim fn = f ∈ B(X, R), entaof ∈ BC(X, R).

Para mostrar que f : (X, d )→ R e contınua, temos de provar que, fixa-do arbitrariamente um ponto a ∈ X e dado um numero ε > 0 existe δ > 0tal que, para

x ∈ X e d(x, a) < δ ⇒ |f(x)− f(a)| < ε.

Consideremos entao uma sequencia (fn) de funcoes contınuas e limitadas

fn : X → R, com lim fn = f ∈ B(X, R)

Sendo assim dado ε > 0 existe um ındice n0 de modo que

∀n ≥ n0 ⇒ d(fn , f) = ‖fn − f‖Ψ= sup

{|fn(x)− f(x)| : x ∈ X

}<ε

3

assim, escolhido um inteiro k ≥ n0 , ter-se-a

|fk(x)− f(x)| < ε

3, ∀x ∈ X.

Como fk: (X, d ) → R e, por hipotese, uma funcao contınua existira

δ > 0 tal que

|fk(x)− f

k(a)| < ε

3; ∀x ∈ X com d(x, a) < δ.

431

Page 433: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Logo, se x ∈ X e d(x, a) < δ teremos

|f(x)− f(a)| = |f(x)− fk(x) + f

k(x)− f

k(a) + f

k(a)− f(a)|

≤ |f(x)− fk(x)|+ |f

k(x)− f

k(a)|+ |f

k(a)− f(a)|

3+ε

3+ε

3= ε.

o que prova a continuidade de f , ou seja f ∈ BC(X, R). �

No exemplo 4 (p. 418) dissemos que o espaco de funcoes contınuas(C[ a, b ],Υ

)

e completo; isto e que(C[ a, b ], ‖ · ‖

Υ

)e um espaco de Banach. Esta con-

clusao sai como um caso particular do exemplo 5 acima desde que tomemos(X, d ) =

([ a, b ], µ

).

8.3 Espacos de Hilbert

Definicao 56 (Espacos de Hilbert). Um espaco de Hilbert e um espacovetorial com produto interno que e completo em relacao a metrica induzidapor este produto interno.

Os espacos de Hilbert sao de grande utilidade na formalizacao matematicada Mecanica Quantica.

Exemplos/contraexemplos:

1) Vimos no exemplo 1 (p. 428) que os espacos (Rn, ‖ · ‖), (Rn, ‖ · ‖′) e(Rn, ‖ · ‖′′), onde, para x = (x1 , . . . , xn) ∈ Rn temos

‖x‖ =( n∑

i=1

|xi |2)1/2

=√

|x1 |2 + · · · + |xn |2

‖x‖′ =n∑

i=1

|xi | = |x1 |+ · · ·+ |xn |

‖x‖′′ = max1≤ i≤n

|xi | = max{|x1 |, . . . , |xn |}

sao todos espacos de Banach. Destes apenas o primeiro e tambem um espacode Hilbert. Isto se deve a que apenas a primeira destas normas e oriundade um produto interno (prove isto!).

2) Vejamos mais um exemplo de um espaco que e de Banach mas nao deHilbert.

Mostramos no exemplo 4 (p. 418) que o espaco(C[ a, b ], ‖ · ‖

), onde

‖f‖ = max{ |f(x)| : x ∈ [ a, b ] }

432

Page 434: Gentil Lopes - Espaços Métricos

e de Banach. Por outro lado, esta norma nao e proveniente de um produtointerno.

3) O espaco(ℓ 2, +, ·

). Este espaco ja foi estudado (p. 615). Veremos agora

que o mesmo e um espaco de Hilbert.

Vamos definir a aplicacao

〈· , ·〉 : ℓ 2 × ℓ 2 −→ R(x, y) 7−→∑∞

n=1 xnyn

que e um produto interno em(ℓ 2, +, ·

). (Exercıcio/sugestao: ver [AR]4, p. 603).

O espaco vetorial(ℓ 2, +, ·

)e chamado: “O espaco das sequencias de

quadrado somavel ”. A norma em(ℓ 2, +, ·

)se define da maneira usual por

‖x‖ =√

〈x, x〉 =

√√√√

∞∑

n=1

x2n

e a metrica induzida por esta norma e

d(x, y) = ‖x− y‖ =

√√√√

∞∑

n=1

(xn − yn)2.

Proposicao 100. O espaco(ℓ 2, +, ·

), das sequencias de quadrado somavel

e um espaco de Hilbert.

Prova: Seja (xn) uma sequencia de Cauchy em ℓ 2. Digamos∗

x1 = (x11 , x12 , x13 , . . . , x1k, . . .)

x2 = (x21 , x22 , x23 , . . . , x2k, . . .)

x3 = (x31 , x32 , x33 , . . . , x3k, . . .)

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .xn = (xn1 , xn2 , xn3 , . . . , xnk

, . . .). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .xm = (xm1 , xm2 , xm3 , . . . , xmk

, . . .). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Sendo (xn) de Cauchy, dado ε > 0 existe um ındice n0 tal que

∀m, n ≥ n0 ⇒ d(xm , xn) < ε

∗Observe que uma sequencia (xn) de pontos no espaco ℓ 2, e uma “sequencia desequencias”. Isto e, cada termo da sequencia (xn) e, por sua vez, uma sequencia.

433

Page 435: Gentil Lopes - Espaços Métricos

isto e,∀m, n ≥ n0 ⇒ ‖xm − xn‖ < ε

Mas,

xm − xn = (xm1 , xm2 , xm3 , . . . , xmk, . . .)

− (xn1 , xn2 , xn3 , . . . , xnk, . . .)

= (xm1 − xn1 , xm2 − xn2 , . . . , xmk− x

nk, . . .)

Logo, para todo m, n ≥ n0

‖xm − xn‖ =

√√√√

∞∑

k=1

(xmk− x

nk)2 < ε (8.15)

Com mais razao ainda, para cada componente da sequencia (xm − xn) vale

(xmk− x

nk)2 < ε (k = 1, 2, . . .)

ou seja,|x

mk− x

nk| < ε (k = 1, 2, . . .)

Assim, para cada k fixado, a sequencia (xmk

)m∈N

e uma sequencia de Cauchy

em (R, µ). Esta sequencia converge visto que (R, µ) e completo.Para cada k ∈ N facamos,

ak= lim

m→∞x

mk

Usando estes limites colocamos,

(a1 , a2 , a3 , . . .) = a

Para um melhor entendimento observe a figura seguinte

x1 = (x11 , x12 , x13 , . . . , x1k, . . .)

x2 = (x21 , x22 , x23 , . . . , x2k, . . .)

x3 = (x31 , x32 , x33 , . . . , x3k, . . .)

......

......

...↓ ↓ ↓ ↓ ↓a = (a1 , a2 , a3 , . . . , ak

, . . .)

?

(xmk

)m∈N

Vamos agora ver que a ∈ ℓ 2 e que se tem de fato lim xn = a, o quetermina a demonstracao.

434

Page 436: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De (8.15) temos para todo m,n ≥ n0

j∑

k=1

(xmk− x

nk)2 < ε2 (j = 1, 2, . . .)

Nesta desigualdade podemos fazer m → ∞ conservando n fixo (emboraarbitrario, desde que maior ou igual a n0), entao,

limm→∞

j∑

k=1

(xmk− x

nk)2 ≤ lim

m→∞ε2

Logo,‡j∑

k=1

(

limm→∞

xmk− x

nk

)2≤ ε2

Portanto,j∑

k=1

(ak− x

nk)2 ≤ ε2 (∀n ≥ n0)

Agora podemos fazer j →∞, obtendo

∞∑

k=1

(ak− x

nk)2 ≤ ε2 (∀n ≥ n0) (8.16)

Sendo xn = (xn1 , xn2 , . . . , xnk, . . .) o n-esimo termo da sequencia de Cauchy

em ℓ 2 e a = (a1 , a2 , . . . , ak, . . .) a sequencia construıda anteriormente;

desta ultima desigualdade concluimos que a− xn ∈ ℓ 2 − para todo n ≥ n0

bem entendido. Portanto, para todo n ≥ n0 , temos

(a− xn) + xn = a ∈ ℓ 2

visto estarmos em um espaco vetorial. Finalmente de (8.16) obtemos, paratodo n ≥ n0 √

√√√

∞∑

k=1

(ak− x

nk)2 ≤ ε < 2ε

isto e, d(xn , a) < 2ε para todo n ≥ n0 , ou seja, limxn = a. Com istocompletamos a prova da completeza de ℓ 2. �

Para vermos que nem todo espaco vetorial com produto interno e umespaco de Hilbert, vamos considerar o espaco

(C[ 0, 1 ], 〈·, ·〉

), onde

〈f, g〉 =∫ 1

0f · g

‡Proposicao 18, (p. 163); Proposicao 20, (p. 164).

435

Page 437: Gentil Lopes - Espaços Métricos

entao,

‖f‖ =√

〈f, f〉 ⇒ ‖f‖ =√∫ 1

0f · f

Neste espaco temos,

d(f, g) = ‖f − g‖ =√∫ 1

0(f − g)2

O espaco(C[ 0, 1 ], d

)nao e um espaco de Hilbert.

Prova: Para provar esta assertiva consideremos a sequencia (fn) de funcoescujo termo geral e dado por (p. 419)

fn(x) =

0, 0 ≤ x ≤ 12 ;

2n(x− 12),

12 ≤ x ≤ 1

2 +12n ;

1, 12 + 1

2n ≤ x ≤ 1.

Inicialmente mostremos que (fn) e de Cauchy no espaco(C[ 0, 1 ], d

). Entao

d(fm , fn) =

√∫ 1

0(fm − fn)2

Temos (grafico p. 420)

∫ 1

0· =

∫ 12

0· +

∫ am

12

·+∫ an

am

· +∫ 1

an

·

onde,

an =1

2+

1

2ne am =

1

2+

1

2m

Mas,∫ 1

2

0· =

∫ 1

an

· = 0

Pois, nestes intervalos, fm = fn ⇒ (fm − fn)2 = 0. Logo,

∫ 1

0· =

∫ am

12

· +∫ an

am

·

Para 1/2 ≤ x ≤ am , temos

fm(x)− fn(x) = 2m(x− 1

2

)− 2n

(x− 1

2

)

= 2(m− n)(x− 1

2

)

436

Page 438: Gentil Lopes - Espaços Métricos

e para am ≤ x ≤ an , temos

fm(x)− fn(x) = 1− 2n(x− 1

2

).

Entao,

∫ am

12

(fm − fn)2 =∫ 1

2+ 1

2m

12

4(m− n)2(x− 1

2

)2=

(m− n)26m3

tambem,

∫ an

am

(fm − fn)2 =∫ 1

2+ 1

2n

12+ 1

2m

[1− 2n

(x− 1

2

)]2=

(m− n)36m3 · n

Donde,∫ 1

0· = (m− n)2

6m3+

(m− n)36m3 · n =

(m− n)26m2 · n

Sendo assim, temos

d(fm , fn) =

(m− n)26m2 · n (n ≤ m)

ou ainda,

d(fm , fn) =1√6· m− nm · √n (n ≤ m)

Temos,1√6· m− nm · √n <

1√6· m

m · √n < ε

onde a ultima das desigualdades e uma imposicao de nossa parte. Entao

√n >

1

ε ·√6⇒ n >

1

6ε2.

Portanto, dado ε > 0 escolhemos n0 > 1/(6ε2).Agora consideremos o caso em que n > m. Sendo d(fm , fn) = d(fn , fm)

podemos escrever

d(fm, fn) =

1√6· m−nm·√n , se n ≤ m;

1√6· n−mn·√m , se n > m.

Em resumo dado ε > 0 escolhemos n0 >1

6ε2e teremos

∀m, n ≥ n0 ⇒ d(fm, fn) < ε

Isto e, a sequencia (fn) e de Cauchy no espaco(C[ a, b ], 〈·, ·〉

).

437

Page 439: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vamos simular uma situacao. Por exemplo, seja ε = 0, 01, entao

n0 >1

6ε2⇒ n0 >

1

6 · 0, 012 = 1.666, 667

Vamos tomar, ainda como exemplo, m = 1667 e n = 1700, entao

d(fm , fn) =1√6· n−mn · √m =

1√6· 1700 − 1667

1700 ·√1667

≃ 1, 9 · 10−4 < ε.

Seja ainda, m = 1668 e n = 1667, entao

d(fm , fn) =1√6· m− nm · √n =

1√6· 1668 − 1667

1668 ·√1667

≃ 6, 0 · 10−6 < ε.

So nos resta mostrar que (fn) nao converge em(C[ 0, 1 ], 〈·, ·〉

). Suponha,

ao contrario, que f seja uma funcao em C[ 0, 1 ] tal que lim fn = f . Supon-hamos ainda f(c) 6= 0 para algum 0 ≤ c ≤ 1

2 . Entao,

|fn(c)− f(c)| = |f(c)| > 0 ⇒(f(c)

)2> 0 para algum c ∈

[0,

1

2

].

Logo,

d(fn , f) =

√∫ 1

0(fn − f)2

√∫ 1

2

0(fn − f)2

=

√∫ 1

2

0f2 > 0

Para todo n. Passando ao limite, temos

limn→∞

d(fn , f) ≥ limn→∞

√∫ 1

2

0f2 =

√∫ 1

2

0f2 > 0

contrariando a hipotese de que lim fn = f . Logo nao temos f(c) 6= 0 paraalgum 0 ≤ c ≤ 1/2. Ou ainda, f(x) = 0 para todo 0 ≤ x ≤ 1/2. Esta e aprimeira conclusao que tiramos a respeito de f = lim fn . Agora suponhamosf(c) 6= 1 para algum 1

2 < c ≤ 1, entao

|fn(c)− f(c)| = |1− f(c)| > 0 ⇒(1− f(c)

)2> 0 (8.17)

438

Page 440: Gentil Lopes - Espaços Métricos

desde que n satisfaca

1

2+

1

2n< c ≤ 1, isto e n >

1

2c− 1.

Resumindo: Supondo que aconteca f(c) 6= 1 para algum 1/2 < c ≤ 1,consideramos apenas as fn a partir de n > 1

2c−1 , obtendo fn(c) = 1 e daı a

validade de (8.17) a apartir de n > 12c−1 . Entao,

d(fn , f) =

√∫ 1

0(fn − f)2

≥√∫ 1

12

(fn − f)2 =

√∫ 1

12

(1− f)2 > 0

Para todo n > 12c−1 . Passando ao limite, temos

limn→∞

d(fn , f) ≥ limn→∞

√∫ 1

12

(1− f)2 =

√∫ 1

12

(1− f)2 > 0

contrariando a hipotese de que lim fn = f . Logo nao temos f(c) 6= 1 paraalgum 1

2 < c ≤ 1. Ou ainda, f(x) = 1 para todo 12 < x ≤ 1. E a

segunda conclusao que tiramos a respeito de f = lim fn . Resumindo, temosf : [ 0, 1 ]→ R, dada por

f(x) =

0, se 0 ≤ x ≤ 12 ;

1, se 12 < x ≤ 1.

0 12

1

1

x

f(x)

q q

q

o que e impossıvel para uma funcao contınua no espaco ([ 0, 1 ], µ). Istoprova que nao existe lim fn em

(C[ a, b ], 〈·, ·〉

). Por conseguinte este espaco

nao e de Hilbert. �

Vejamos mais um exemplo de espaco vetorial com produto interno e quenao e de Hilbert.Exemplo − Considere o conjunto C0 0 das sequencias reais que so possuemuma quantidade finita de termos nao nulos.

Consideremos o espaco(C0 0 , 〈·, ·〉

)onde (p. 615)

⟨(xn), (yn)

⟩=∞∑

n=1

xnyn

439

Page 441: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Neste espaco temos

‖(xn)‖ =√⟨(xn), (xn)

⟩⇒ ‖(xn)‖ =

√√√√

∞∑

n=1

xnxn

A distancia entre duas sequencias fica assim

d((xn), (yn)

)= ‖(xn)− (yn)‖ =

√√√√

∞∑

n=1

(xn − yn)2.

Consideremos em C0 0 a sequencia (xn), de termos

x1 = (x11 , x12 , x13 , . . . , x1k, . . .)

x2 = (x21 , x22 , x23 , . . . , x2k, . . .)

x3 = (x31 , x32 , x33 , . . . , x3k, . . .)

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .xn = (xn1 , xn2 , xn3 , . . . , xnk

, . . .). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

onde os termos xn de (xn) sao sequencias xn =(x

nk

)

k∈N com termos dadospor

xnk

=

12k−1 , se k ≤ n;0, se k > n.

(8.18)

A seguir explicitamos os termos de (xn):

x1 = (1, 0, 0, 0, 0, . . .)

x2 =(1, 1

2 , 0, 0, 0, . . .)

x3 =(1, 1

2 ,14 , 0, 0, . . .

)

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .xn =

(1, 1

2 ,14 , . . . ,

12n−2 ,

12n−1 , 0, 0, . . .

)

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .xm =

(1, 1

2 ,14 , . . . ,

12n−2 ,

12n−1 ,

12n , . . . ,

12m−2 ,

12m−1 , 0, . . .

)

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Em nossas argumentacoes iremos considerar n < m. Pois bem, mostremosque esta sequencia e de Cauchy. Isto e, dado ε > 0 devemos exibir um ındicen0 tal que

∀m, n ≥ n0 ⇒ d(xm , xn

)= ‖xm − xn‖ < ε

440

Page 442: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Temos,

xm − xn =

(

0, 0, . . . , 0,1

2n,

1

2n+1, . . . ,

1

2m−2,

1

2m−1, 0, 0, . . .

)

Logo,

d(xm , xn

)=

√√√√

m−1∑

i=n

(1

2i

)2

=

√√√√

m−1∑

i=n

1

4i

No radicando em questao temos a soma dos (m − 1 − n) + 1 termos daprogressao geometrica de primeiro termo a1 = 1

4n e razao q = 14 . Entao

Sm−n =

14n ·

((14

)m−n − 1)

14 − 1

=1

3·(

1

4n−1− 1

4m−1

)

Portanto,

d(xm , xn

)=

√3

3·√

1

4n−1− 1

4m−1

Facamos,√3

3·√

1

4n−1− 1

4m−1< ε ⇒ 1

4n−1− 1

4m−1< 3 ε2

Mas,1

4n−1− 1

4m−1<

1

4n−1< 3 ε2

onde a ultima desigualdade e uma imposicao de nossa parte. Logo,

4n−1 >1

3 ε2⇒

(2n−1

)2>

1

3 ε2

⇒ 2n−1 >1√3 ε⇒ n− 1 > log

1√3 ε

2 .

Portanto dado ε > 0 exibimos

n0 > 1− log√3·ε

2

e teremos nossas aspiracoes satisfeitas. Em resumo, dado ε > 0 escolhemosn0 como acima e teremos

∀m, n ≥ n0 ⇒ d(xm, xn

)< ε

onde,

d(xm , xn

)=

√33 ·√

14n−1 − 1

4m−1 , se n ≤ m;

√33 ·√

14m−1 − 1

4n−1 , se n > m.

441

Page 443: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Facamos uma simulacao. Por exemplo, seja ε = 0, 01, entao

n0 > 1− log√3·ε

2 ⇒ n0 > 1− log√3·0,01

2 = 6, 85.

Vamos tomar, ainda como exemplo, m = 10 e n = 7, entao

d(xm , xn

)=

√3

3·√

1

47−1− 1

410−1≃ 0, 00895 < ε

Seja ainda, m = 7 e n = 8, entao

d(xm , xn

)=

√3

3·√

1

47−1− 1

48−1≃ 0, 00781 < ε

Resta mostrar que (xn) nao converge no espaco(C0 0 , 〈·, ·〉

). Supon-

hamos, por absurdo, que exista um ponto p = (p1 , p2 , p3 , . . .) ∈ C0 0 tal quelim xn = p. Consideremos, ademais, a sequencia (δ

k) de pontos de C0 0 onde,

para todo k ∈ N, temos

δk= (δ

k1, δ

k2, δ

k3, . . .) onde δ

ki=

{

1, se k = i;

0, se k 6= i.

A seguir explicitamos os termos da sequencia (δk).

δ1 = (1, 0, 0, 0, 0, . . .)

δ2 = (0, 1, 0, 0, 0, . . .)

δ3 = (0, 0, 1, 0, 0, . . .)

...δk= (0, 0, . . . , 0, 1, 0, 0, . . .)

...

As sequencias δk(k = 1, 2, . . .) tem a seguinte propriedade − que nos

interessa de perto: dada uma sequencia (zn) ∈ C0 0 qualquer, o produto〈δ

k, (zn)〉 nos da uma “amostra” do termo de posicao k da sequencia (zn).

Veja:

δk= (0, 0, . . . , 0, 1, 0, 0, . . .)

(zn) = (z1 , z2 , . . . , zk , zk+1, . . .)

442

Page 444: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Entao,

〈δk, (zn)〉 =

∞∑

n=1

δknzn

= δk1z1 + δ

k2z2 + . . . + δ

kkzk+ δ

k(k+1)zk+1

+ . . .

= 0 · z1 + 0 · z2 + . . . + 1 · zk+ 0 · z

k+1+ . . . = z

k

Isto e,

〈δk, (zn)〉 = z

k(k = 1, 2, 3, . . .)

Sendo assim vamos pedir as sequencias δk(k = 1, 2, . . .) que nos mostrem

os termos da sequencia p = lim xn . Do seguinte modo∗

pk= 〈δ

k, p〉 = 〈δ

k, limnxn〉 = lim

n〈δ

k, xn〉

= limn→∞

xnk

onde xnk

e dado pela equacao (8.18) (p. 440) a qual repetimos aqui

xnk

=

12k−1 , se n ≥ k;0, se n < k.

Vamos calcular alguns destes limites. Temos,

p1 = limn→∞

xn1

onde,

xn1 =

121−1 , se n ≥ 1;

0, se n < 1.⇒(xn1

)= (1, 1, 1, . . .)→ 1

⇒ p1 = limn→∞

xn1 = 1.

Tambem,

p2 = limn→∞

xn2

onde,

xn2 =

122−1 , se n ≥ 2;

0, se n < 2.⇒(xn2

)= (0,

1

2,1

2, . . .)→ 1

2

⇒ p2 = limn→∞

xn2 =1

2.

∗O produto interno possui a propriedade: 〈limn

xn , limn

yn〉 = limn〈xn , yn〉.

443

Page 445: Gentil Lopes - Espaços Métricos

E de um modo geral, temos

xnk

=

12k−1 , se n ≥ k;0, se n < k.

⇒(x

nk

)= (0, . . . , 0,

1

2k−1,

1

2k−1, . . .)→ 1

2k−1

⇒ pk= lim

n→∞x

nk=

1

2k−1.

Portanto,

p =(p1 , p2 , p3 , . . .

)

=(1,

1

2,1

4, . . . ,

1

2k−1, . . .

)6∈ C0 0

logo a sequencia de Cauchy (xn) nao converge no espaco(C0 0 , 〈·, ·〉

).

8.4 Completamento de Espacos Metricos

O espaco (Q, µ) nao e completo como ja vimos. A construcao de (R, µ)a partir de (Q, µ) (ver [10], vol. 1 ou [9]) e o que denominamos de um“completamento” de (Q, µ). Veremos que todo espaco metrico pode ser“completado”. Ou, de modo mais preciso: a partir de qualquer espacometrico podemos construir um espaco metrico completo.

Definicao 57 (Completamento). Um completamento de um espaco metrico(M, d) e um par

((M , D); ϕ

), onde (M , D) e um espaco metrico completo,

ϕ : M → M e uma imersao isometrica (preserva distancia) e ϕ(M) e densoem (M, D) (isto e, ϕ(M) = M).

qq

y

x

(M, d)

�ϕ(M)=M

(M ,D)

qϕ(x)q ϕ(y)ϕ(M)

ϕ

• ( (M , D); ϕ) = Completamento de (M, d) / d(x, y) = D(ϕ(x), ϕ(y))

De inıcio observamos que por ϕ ser uma imersao isometrica entao elatransforma sequencias de Cauchy de M em sequencias de Cauchy de M .

(prop. 94, p. 414)

444

Page 446: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

Vamos, em um caso particular, justificar o porque da exigencia ϕ(M) = M .

1) Consideremos o espaco metrico (M, µ) ondeM =[0, 1

4

[este espaco nao

e completo. Vamos completa-lo. Primeiramente observemos que (M, µ)e um subespaco do espaco metrico completo ([ 0, 1 ], µ). Observe que aimersao isometrica ϕ(x) = x nos fornece:

ϕ(M) =M =[0,

1

4

[⊂[0,

1

4

]⊂[0,

1

2

]⊂[0,

3

4

]⊂ [ 0, 1 ]

Todos os quatro espacos,[0, 1

4

],[0, 1

2

],[0, 3

4

]e [ 0, 1 ] sao completos (por

serem subespacos fechados de um espaco completo).

Perguntamos: qual deles elegemos como completamento de M? Aqui,precisamente a condicao ϕ(M) = M nos manda escolher: M =

[0, 1

4

]como

o completamento de M . Esta condicao, como vimos, estabelece a unicidadedo completamento, num sentido que sera precisado oportunamente.

Observe, ademais que no caso em ϕ(M) ⊂ M esta mesma condicao nosdiz que o completamento de M e o “menor” fechado que contem M . Ouseja, basta juntar a

M seus pontos aderentes ou de fronteira (ja vimos que: X =◦X ∪ ∂X).

2) Consideremos os espacos (Q, µ) e (R, µ). Tomando ϕ : Q → R dadapor ϕ(x) = x temos que ϕ e uma imersao isometrica (preserva distancias)e ϕ(Q) = Q e denso no espaco metrico completo (R, µ). Logo (R, µ) e umcompletamento de (Q, µ).

3) Toda sequencia de Cauchy no espaco ( [ 0, 1 [, µ ) converge no espaco( [ 0, 1 [, k ) que e completo. Sendo assim seriamos tentados a imaginar queo segundo destes espacos e um completamento do primeiro. Acontece entre-tanto que pela definicao de completamento, uma condicao necessaria paratanto e que exista uma uma imersao isometrica:

ϕ : ( [ 0, 1 [, µ ) −→ ( [ 0, 1 [, k ) (8.19)

Afirmamos que nao existe uma tal imersao. De fato, suponha pelo contrarioque exista uma ϕ imersao isometrica; sendo assim devemos ter,

k(ϕ(x), ϕ(y) ) = |x− y|, ∀x, y ∈ [ 0, 1 [

Tomemos nesta igualdade y = 0 e x = xn = 1− 1n , assim:

k(ϕ(1− 1

n

), ϕ(0)

)=∣∣1− 1

n− 0∣∣

Tomemos o limite em ambos os membros,

lim k(ϕ(1− 1

n

), ϕ(0)

)= lim

∣∣1− 1

n

∣∣

445

Page 447: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Tendo em conta a continuidade da aplicacao k (eq. (6.14), p. 267), obtemos

k

(

limϕ(1− 1

n

), ϕ(0)

)

= 1

Como (xn) e uma sequencia de Cauchy no domınio segue-se que sua ima-gem

(ϕ(xn

) )e uma sequencia de Cauchy no contra-domınio. Como o con-

tradomınio e um espaco completo segue que esta sequencia tem um limitea ∈ [ 0, 1 [, portanto:

k(a, ϕ(0)

)= 1

Ora, este resultado contradiz o fato que 0 ≤ k(x, y) < 1, ∀x, y ∈ [ 0, 1 [.Portanto, nao existe nenhuma imersao isometrica da forma (8.19).

• A construcao (completamento) do exemplo 1 acima pode sempre serfeita no caso de dois espacos quaisquer (M, d) e (N, d) onde o primeiro eincompleto e o segundo completo (logo, fechado), e M ⊂ N . Isto e, bastatomar

ϕ : M −→ M =M ⊂ Nx 7−→ x

E quando o espaco incompleto (M, d) nao e subespaco de um espacocompleto, ainda assim podemos completa-lo? A resposta esta no conteudoda proxima proposicao.

Por oportuno, observe que na definicao de completamento nao exigimosque M ⊂ M .

Proposicao 101 (Existencia do completamento). Todo espaco metrico pos-sui um completamento.

Prova: Sejam (M, d) um espaco metrico e p um ponto fixado emM . In-voquemos em nosso auxılio o espaco

(BC(M, R); ‖·‖Ψ

)das funcoes contınuas

e limitadas f : M → R que e completo conforme vimos no exemplo 5 (p. 431).Vamos definir uma aplicacao:

σ : (M, d) −→ BC(M, R)a 7−→ fa

onde,

σ(a) = fa : M −→ Rx 7−→ d(x, a)−d(x, p)

Isto significa que a cada ponto a ∈M associamos a funcao fa ∈ BC(M, R)dada por fa(x) = d(x, a)− d(x, p).

446

Page 448: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(M, d) BC(M,R)

a rσ(a) = farp r

fa

(M, d) (R, µ)

a r r fa (x)=d(x, a)− d(x, p)x r

p r

Devemos mostrar que σ esta bem definida, isto e, que fa efetivamente eum elemento do conjunto BC(M, R). Ou ainda, que

fa : (M, d) −→ (R, µ), dada por fa(x) = d(x, a)− d(x, p)

de fato e contınua e limitada. Com efeito fa e contınua por ser a diferencaentre duas funcoes contınuas∗ e e limitada porque para todo x ∈M ocorre‡

|fa(x)| = |d(x, a)− d(x, p)| ≤ d(a, p)

Vamos mostrar que σ e uma imersao isometrica. Consideremos

Ma 7−→ σ(a) = fa ∈ BC(M, R)

Mb 7−→ σ(b) = fb∈ BC(M, R)

mostremos que

‖σ(a) − σ(b)‖Ψ= ‖fa − fb‖Ψ = d(a, b).

De fato,

‖fa − fb‖Ψ = sup{|fa(x)− fb(x)| : x ∈M

}

= sup{∣∣(d(x, a)− d(x, p)

)−(d(x, b)− d(x, p)

)∣∣ : x ∈M

}

= sup{∣∣d(x, a)− d(x, b)

∣∣ : x ∈M

}

∗Exemplo (iv), p. 261.‡Prop. 2, p. 45.

447

Page 449: Gentil Lopes - Espaços Métricos

mas,|d(x, a)− d(x, b)| ≤ d(a, b)

logo, d(a, b) e uma cota superior do conjunto { |d(x, a)− d(x, b)| : x ∈M }.Portanto,

sup{ |d(x, a)− d(x, b)| : x ∈M } ≤ d(a, b).pois sup e a menor das cotas superiores. Entao,

‖fa − fb‖Ψ ≤ d(a, b) (8.20)

Por outro lado, para x = b, temos

|fa(b)− fb(b)| =∣∣(d(b, a)− d(b, p)

)−(d(b, b)− d(b, p)

)∣∣

= |d(b, a)|= d(a, b).

Portanto,

d(a, b) = |fa(b)− fb(b)| ≤ supx∈M{ |fa(x)− fb(x)| }

= ‖fa − fb‖Ψlogo, (8.20) e esta ultima igualdade garantem que ‖fa − f

b‖Ψ = d(a, b).

Portanto,σ : (M, d) −→

(BC(M, R); ‖ · ‖

Ψ

)

e uma imersao isometrica.Porem nao ha garantia de que σ(M) seja denso em

(BC(M, R); ‖ · ‖

Ψ

)

razao porque tomamos

M = σ(M) ⊂ BC(M, R)

Assim (M, D) resulta completo por ser subespaco fechado do espaco metricocompleto

(BC(M, ,R); ‖ · ‖Ψ

).

Observe da inclusao anterior que a metrica do espaco (M, D) e a metricado espaco

(BC(M, R); ‖ · ‖

Ψ

)restrita ao fecho de σ(M). Isto e, D(fa , fb) =

‖fa − fb‖Ψ . Facamos,

ϕ : M −→ Ma 7−→ fa

Observe que as aplicacoes ϕ e σ tem o mesmo domınio, sao dadas pelamesma lei a 7→ fa, mas tem contradomımios diferentes: o de σ e BC(M, R)enquanto o de ϕ e σ(M) ⊂ BC(M, R). Temos,

σ(M) = {σ(a) : a ∈M } = { fa : a ∈M }ϕ(M) = {ϕ(a) : a ∈M } = { fa : a ∈M }

448

Page 450: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Logo,

ϕ(M) = σ(M) ⇒ ϕ(M) = σ(M) = M.

Por conseguinte((M, D); ϕ

)e um completamento de (M, d). �

Faremos agora algumas observacoes no sentido de esclarecer em que sen-tido devemos entender que o espaco (M, D) e um completamento do espaco(M, d):

1a)Nao temos M ⊂ M , porquanto os elementos de M e M tem na-

turezas distintas. Os elementos de M podem ser quaisquer, enquanto os deM sao sempre funcoes f : M → R contınuas e limitadas.

2a)Devido existir uma imersao isometrica entre (M, d) e (M, D)

(M, d

) (M, D

dados dois elementos quaisquer a, b ∈M temos duas opcoes para calcular adistancia entre os mesmos: ou diretamente atraves da metrica d ou indire-tamente, transferindo-os (metamorfoseando-os) atraves de ϕ, e calculandoa distancia entre as respectivas imagens ϕ(a) e ϕ(b) na metrica D uma vezque

d(a, b) = D(ϕ(a), ϕ(b)

)= D

(fa , fb

)= ‖fa − fb‖Ψ

3a)Dada uma sequencia de Cauchy (xn) em (M, d), como este espaco

nao e completo, esta sequencia nao tem obrigacao de convergir. Pela proposicao94 (p. 414) uma aplicacao uniformemente contınua transforma sequenciasde Cauchy em sequencias de Cauchy e sendo uma imersao isometrica umaaplicacao uniformemente contınua segue que

(ϕ(xn)

)e uma sequencia de

Cauchy no espaco metrico completo (M, D) e, por conseguinte, tem aobrigacao de convergir. Em resumo: embora uma sequencias de Cauchy(xn) nao convirja necessariamente em (M, d) (incompleto) sua sequenciaimagem necessariamente converge em (M , D).

Vamos concretizar o que dissemos acima atraves de algumas simulacoes.• Consideremos o espaco metrico

(] 0, 1 ], µ

)que nao e completo. Ja

vimos que uma completacao deste espaco e([ 0, 1 ], µ

). Agora obteremos

uma outra construcao (um outro completamento) seguindo os passos dademonstracao da proposicao 101. Entao, definimos

ϕ :(] 0, 1 ], µ

)−→ M ⊂ BC(M, R)

a 7−→ fa

onde,

ϕ(a) = fa : ] 0, 1 ] −→ R

x 7−→ |x−a|−|x−p|

O completamento de ( ] 0, 1 ], µ) e o par ( (M , D); ϕ), onde, M = ϕ( ] 0, 1 ] )

449

Page 451: Gentil Lopes - Espaços Métricos

e,D(fa , fb) = ‖fa − fb‖Ψ = d(a, b), ∀ a, b ∈ ] 0, 1 ]

Observe que,

ϕ( ] 0, 1 ] ) ={ϕ(a) : a ∈ ] 0, 1 ]

}= { fa : a ∈ ] 0, 1 ] }

Por exemplo, consideremos dois pontos a = 14 e b = 3

4 e calculemos adistancia entre eles tanto no espaco quanto no seu completamento. Temos

0

a= 14

12

b= 34

1

M

ϕ(

34

)

ϕ(

14

)

r

rr

r

f34

: ] 0, 1 ] −→ R

x 7−→ |x− 34|−|x−p|

f14

: ] 0, 1 ] −→ R

x 7−→ |x− 14|−|x−p|

• Vamos mostrar que:

d(1

4,3

4

)=∣∣1

4− 3

4

∣∣ =

1

2= d(f14

, f34

)=∥∥∥f1

4

− f34

∥∥∥Ψ

Temos,

f14

(x) =∣∣x− 1

4

∣∣− |x− p|

f34

(x) =∣∣x− 3

4

∣∣− |x− p|

Logo,

f14

(x)− f34

(x) =∣∣x− 1

4

∣∣−∣∣x− 3

4

∣∣

Observe que esta diferenca independe do ponto p fixado no intervalo] 0, 1 ]. Entao,

d(f14

, f34

)=∥∥∥f1

4

− f34

∥∥∥Ψ= sup

{∣∣f1

4

(x)− f34

(x)∣∣ : x ∈M

}

= sup

{∣∣∣

∣∣x− 1

4

∣∣−∣∣x− 3

4

∣∣

∣∣∣ : x ∈ ] 0, 1 ]

}

450

Page 452: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Temos,

∣∣x− 1

4

∣∣ =

x− 14 , se x ≥ 1

4 ;

−x+ 14 , se x ≤ 1

4 .

∣∣x− 3

4

∣∣ =

x− 34 , se x ≥ 3

4 ;

−x+ 34 , se x ≤ 3

4 .

Graficamente temos,

⊣ ⊣ ⊣ ⊣ ⊣0 1

412

34

1��@@

-�|x− 1

4 |= x− 14|x−1

4 |=−x+14

⊣ ⊣ ⊣ ⊣ ⊣0 1

412

34

1��@@

-�|x−3

4 |= x− 34|x− 3

4 |=−x+34

Destes graficos obtemos,

0 < x ≤ 14 ⇒

∣∣x− 1

4

∣∣−∣∣x− 3

4

∣∣ =

(− x+ 1

4

)−(− x+ 3

4

)= −1

2

14 ≤ x ≤ 3

4 ⇒∣∣x− 1

4

∣∣−∣∣x− 3

4

∣∣ =

(x− 1

4

)−(− x+ 3

4

)= 2x− 1

34 ≤ x ≤ 1 ⇒

∣∣x− 1

4

∣∣−∣∣x− 3

4

∣∣ =

(x− 1

4

)−(x− 3

4

)= 1

2

Entao,

supx∈ ]0, 1

4]

∣∣∣

∣∣x− 1

4

∣∣−∣∣x− 3

4

∣∣

∣∣∣ = sup

x∈ [ 34,1]

∣∣∣

∣∣x− 1

4

∣∣−∣∣x− 3

4

∣∣

∣∣∣ =

1

2

Por outro lado,

1

4≤ x ≤ 3

4⇔ 1

2≤ 2x ≤ 3

2⇔ −1

2≤ 2x− 1 ≤ 1

2

⇔ |2x− 1| ≤ 1

2

⇒∣∣f1

4

(x)− f34

(x)∣∣ ∈

[0,

1

2

]

Portanto,∥∥∥f1

4

− f34

∥∥∥Ψ= sup

{∣∣∣

∣∣x− 1

4

∣∣−∣∣x− 3

4

∣∣

∣∣∣ : x ∈ ] 0, 1 ]

}

=1

2

conforme haviamos previsto.

451

Page 453: Gentil Lopes - Espaços Métricos

• Consideremos em M = ] 0, 1 ] a sequencia (xn) dada por xn = 1/n.Esta sequencia e de Cauchy no espaco

(] 0, 1 ], µ

)mas nao converge neste

espaco. Vamos mostrar que a sequencia imagem(ϕ(xn)

)converge no espaco

(M, D

). Temos (fixando p = 1)

ϕ( 1n ) = f1n

: ] 0, 1 ] −→ R

x 7−→ |x− 1n|−|x−1|

logo

f1n

(x) =∣∣x− 1

n

∣∣− |x− 1|

Alternativamente f1n

(x) pode ser escrita como,

f1n

(x) =

1

n− 1, se 0 < x ≤ 1

n ;

2x− 1

n− 1, se 1

n ≤ x ≤ 1.

A seguir plotamos os tres primeiros termos desta sequencia juntamente como grafico da funcao f candidata ao limite da sequencia

(f1n

).

q

q

q

1

1

−1

x

f1(x)

qq

q

q

q

q

112

1

−1

x

f12

(x)

12

12

qq

q

q

q

q

1

1

−1

x

f13

(x)

12

12

qq

q

q

q

q

112

1

−1

x

f(x)

12

12

Observe que estas funcoes pertencem todas ao conjunto BC(] 0, 1 ], R

).

A sequencia(f1n

)e de Cauchy no espaco metrico completo (M , D) (por

ser a imagem de uma sequencia de Cauchy por uma imersao isometrica(ϕ)). Portanto ela converge neste espaco. Vamos mostrar que a seguinteconvergencia se verifica,

f1n

D(·, ·)=‖ · ‖Ψ f

onde f ∈ BC(] 0, 1 ], R

)e dada por f(x) = 2x−1. Pela prop. 9 (p. 143) e su-

ficiente mostrar que a sequencia numerica(d(f1

n

, f))=(Ψ(f1

n

, f))converge

para 0 no espaco (R, µ). De fato,

452

Page 454: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Ψ(f1n

, f) = sup{∣∣f1

n

(x)− f(x)∣∣ : 0 < x ≤ 1

}

onde

f1n

(x)− f(x) =

−2x+1

n, se 0 < x ≤ 1

n ;

− 1

n, se 1

n ≤ x ≤ 1.

A seguir vemos os graficos de h(x) = f1n

(x)− f(x) e |h(x)|.

qq

q

q

q

q

11n

1

−1

x

h(x)

1n

− 1n

qq

q

q

q

q

11n

1

−1

x

|h(x)|

1n

− 1n

Temos,

0 < x ≤ 1

n⇔ 0 < 2x ≤ 2

n⇔ − 2

n≤ −2x < 0

⇔ − 1

n≤ −2x+

1

n<

1

n⇒

∣∣− 2x+

1

n

∣∣ ≤ 1

n

⇔∣∣f1

n

(x)− f(x)∣∣ ∈[0,

1

n

].

Portanto,

Ψ(f1n

, f) = sup{∣∣f1

n

(x)− f(x)∣∣ : 0 < x ≤ 1

}

=1

n→ 0.

Na proposicao seguinte teremos a oportunidade de ver que, na definicaode completamento, a exigencia adicional ϕ(M) = M vai nos permitir fixar(amarrar) a unicidade do completamento.

Proposicao 102 (Unicidade do completamento). Consideremos dois com-pletamentos

((M,D1); ϕ

)e((M ,D2); ψ

)do mesmo espaco metrico (M,d),

entao existe uma isometria f : M → M tal que f ◦ ϕ = ψ.

Prova: Sejam (M,D1) e (M,D2) espacos metricos completos, ϕ : M →M e ψ : M → M imersoes isometricas tais que ϕ(M) = M e ψ(M) = M .Para construir a funcao f desejada observe que dado y ∈ M e sendo

453

Page 455: Gentil Lopes - Espaços Métricos

ϕ(M) = {ϕ(x) : x ∈ M } denso em M existe uma sequencia yn ∈ ϕ(M)de modo que lim yn = y (prop. 42, p. 212). Como yn ∈ ϕ(M) existe an ∈ Mcom yn = ϕ(an) de modo que: lim yn = limϕ

(an

)= y.

Como ϕ(an) converge em(M,D1

)entao e de Cauchy neste espaco.

Como ϕ e imersao isometrica segue que an e de Cauchy em (M,d). Porconseguinte

(ψ(an)

)e uma sequencia de Cauchy em

(M,D2

)visto que ψ

e tambem imersao isometrica. Como(M,D2

)e completo existe limψ(an)

neste espaco. Vamos definir entao f(y) = limψ(an)

(M,d) (M,D1 )

(M,D2)

ϕ

ψ

f

p q q q q qan

q q. . .տ q q q q q qyn=ϕ(an )

yϕ(M)

qqqq qqψ(an )

qց f(y)≡ limψ(an )

Devemos verificar se f esta bem definida. Isto e, que se (an) e (bn) saoduas sequencias em M com limϕ(an) = limϕ(bn) = y entao limψ(an) =limψ(bn). Entao

D2

(limψ(an), limψ(bn)

)= limD2

(ψ(an), ψ(bn)

)

= lim d(an , bn)

= limD1

(ϕ(an), ϕ(bn)

)

= D1

(limϕ(an), limϕ(bn)

)

= D1

(y, y

)

= 0.

Portanto limψ(an) = limψ(bn).Agora vamos mostrar que f e uma imersao isometrica. Dados x, y ∈ M ,

como ϕ(M) e denso em M existem sequencias xn , yn ∈ ϕ(M) tais quelim xn = x, lim yn = y. Por outro lado, existem sequencias (an) e (bn) emM tais que

ϕ(an) = xn ; ϕ(bn) = yn∗Proposicao 52, p. 267.

454

Page 456: Gentil Lopes - Espaços Métricos

de modo que

limϕ(an) = limxn = x,

limϕ(bn) = lim yn = y.

Entao

D2

(f(x), f(y)

)= D2

(limψ(an), limψ(bn)

)

= limD2

(ψ(an), ψ(bn)

)

= lim d(an , bn)

= limD1

(ϕ(an), ϕ(bn)

)

= D1

(limϕ(an), limϕ(bn)

)

= D1

(x, y

).

Devemos mostrar que f e sobrejetiva. Dado z ∈ M devemos construir umponto y ∈ M tal que f(y) = z. Pois bem, como ψ(M) = {ψ(x) : x ∈ M}e denso em (M , D2), isto e, ψ(M) = M entao para este z ∈ M existe umasequencia (yn) de pontos de ψ(M) tal que lim yn = z. Como yn ∈ ψ(M)existe an ∈M tal que yn = ψ(an). Portanto limψ(an) = z. Consideremos asequencia

(ϕ(an)

)em M . Sendo ψ e ϕ imersoes isometricas e

(ψ(an)

)uma

sequencia de Cauchy, entao a sequencia(ϕ(an)

)e tambem de Cauchy.

Porquanto se(ϕ(an)

)nao fosse de Cauchy e como ϕ e imersao isometrica

entao (an) tao pouco seria de Cauchy. Ora (an) nao sendo de Cauchy e ψsendo imersao isometrica entao

(ψ(an)

)nao seria de Cauchy. O que nao e

verdade pois esta sequencia converge.

Logo existe y ∈ M tal que y = limϕ(an). Da definicao de f segue que

f(y) = limψ(an) = z.

Portanto f e uma imersao isometrica sobrejetiva, isto e, uma isometria.Resta mostrar que f ◦ ϕ = ψ. Dado a ∈ M existe y = ϕ(a), tomemos

em M uma sequencia (an) com lim an = a. Entao

(f ◦ ϕ

)(a) = f

(ϕ(a)

)

= f(y)

= limψ(an)

= ψ(lim an)

= ψ(a).

455

Page 457: Gentil Lopes - Espaços Métricos

− A existencia da isometria f : M → M nos permite identificar os doiscompletamentos.

ϕ

Ψ

(M, d)

ra f

f−1

(M,D1)

rϕ(a)(M,D2 )

rf(ϕ(a))=Ψ(a)

8.5 Espacos topologicamente completos

Observe que os espacos (R, µ) e ( ] − 1, 1 [ ;µ) sao homeomorfos (ex. 2 p. 296)

nao obstante o primeiro ser completo e o segundo nao. Isto e possıvel pelofato de que “ser completo” ou “nao ser completo” nao e uma propriedadetopologica, visto que nao e preservada por homeomorfismos.

Consideremos dois espacos (M, d) e (N, D) homeomorfos. Se

h : (M, d) −→ (N, D)

e um homeomorfismo entao (p. 93)

d′(x, y) = D(h(x), h(y)

)(8.21)

e uma metrica em M equivalente∗ a d, tal que

h′ : (M, d′) −→ (N, D)

e uma isometria (devido a (8.21)). Logo (M, d′) resultara completo se(N, D) o for (prop. 98, p. 424). Como d′ ∼ d temos que

i : (M, d) −→ (M, d′)

e um homeomorfismo sendo que (M, d) pode nao ser completo mas (M, d′)sim. Isto e, sendo (M, d) um espaco nao completo pode existir uma metricad′, equivalente a d, que o torne completo. Por exemplo,

h :(] − 1, 1 [ , µ

)−→

(R, µ

)

dada por h(x) =x

1− |x| e um homeomorfismo. Fazendo

d′(x, y) = µ(h(x), h(y)

)

= |h(x)− h(y)|

=

∣∣∣∣

x

1− |x| −y

1− |y|

∣∣∣∣

∗No apendice (p. 471) mostramos que d′ ∼ d.

456

Page 458: Gentil Lopes - Espaços Métricos

temos que(] − 1, 1 [ , d′

)resulta um espaco metrico completo.

Observe, a tıtulo de curiosidade, que a sequencia dada por an = 1 − 1n

e de Cauchy no espaco(] − 1, 1 [ , µ

); sendo este um espaco nao completo

esta sequencia nao tem obrigacao de convergir. Ja no espaco(] −1, 1 [ , d′

),

que e completo, esta mesma sequencia nao e de Cauchy, nao tendo portantoobrigacao de convergir.

Das afirmacoes feitas vamos mostra que (an) nao e de Cauchy na metricad′. Para tanto devemos exibir ε > 0 de modo que para todo ındice n0 existamm ≥ n0 e n ≥ n0 tais que d′(am , an) ≥ ε (p. 408). De fato, consideremosε = 1/2 e dado n0 ∈ N tomemos m = n0 + 1 e n = n0 , entao

|m− n| = |(n0 + 1)− n0 | = 1,

portanto isto implica em que

|m− n| ≥ ε ⇒∣∣∣∣m(1− 1

m

)− n

(1− 1

n

)∣∣∣∣≥ ε

⇒∣∣∣∣∣

1− 1m

1−(1− 1

m

) − 1− 1n

1−(1− 1

n

)

∣∣∣∣∣≥ ε

⇒∣∣∣∣∣

1− 1m

1−∣∣1− 1

m

∣∣− 1− 1

n

1−∣∣1− 1

n

∣∣

∣∣∣∣∣≥ ε

⇒∣∣∣∣∣

am

1−∣∣am

∣∣− an

1−∣∣an

∣∣

∣∣∣∣∣≥ ε ⇒ d′(am , an) ≥ ε.

Proposicao 103. Todo subconjunto aberto de um espaco metrico completoe homeomorfo a um espaco metrico completo.

Prova: Seja A ⊂M aberto no espaco metrico completo (M, d).

A aplicacao,

ϕ : M −→ Rx 7−→ d(x, Ac)

e contınua (p. 261).

Como Ac e fechado temos (prop. 40, p. 211) ϕ(x) > 0 ⇔ x ∈ A. Portanto,podemos definir a funcao

f : A ⊂M −→ Rx 7−→ 1

ϕ(x)

Observe que f e contınua porque ϕ e contınua.

Vamos considerar as duas seguintes funcoes auxiliares

g : A× R −→ R(x, t) 7−→ t

ej : A× R −→ R

(x, t) 7−→ 1ϕ(x)

457

Page 459: Gentil Lopes - Espaços Métricos

g e contınua (projecao) e mostremos que j tambem e contınua. Para tantovamos considerar no produto A× R a metrica (p. 95)

D2(X, Y ) = d1(x1 , y1) + d2(x2 , y2)

= d(x, y) + |b− c|onde, X = (x, c) ∈ A× R e Y = (y, b) ∈ A× R.

� g -j

?

f

R R R

R

A

A×R

p px y

qb

qc

qt

s(y, b)s(x, c)s(x, t)

sf(x)

sf(y)

sg(x, t)

sj(x, t)

Vamos mostrar que j e contınua em um ponto arbitrario Y = (y, b).Dado ε > 0 devemos exibir δ > 0 de maneira que

D2(X, Y ) < δ ⇒ |j(X) − j(Y )| < ε

ou ainda,

d(x, y) + |b− c| < δ ⇒∣∣∣∣

1

ϕ(x)− 1

ϕ(y)

∣∣∣∣< ε (8.22)

Consideremos a continuidade de f no ponto y. Entao, dado ε > 0 existeδ′ > 0 de modo que

d(x, y) < δ′ ⇒ |f(x)− f(y)| =∣∣∣∣

1

ϕ(x)− 1

ϕ(y)

∣∣∣∣< ε

Logo,

d(x, y) + |b− c| < δ′ + |b− c| ⇒∣∣∣∣

1

ϕ(x)− 1

ϕ(y)

∣∣∣∣< ε

Portanto tomando δ = δ′+|b−c| teremos (8.22) satisfeita. Logo j e contınua.Com este resultado asseguramos que o conjunto

F ={(x, t) ∈ A×R : g(x, t) = j(x, t)

}

={

(x, t) ∈ A× R : t =1

ϕ(x)

}

458

Page 460: Gentil Lopes - Espaços Métricos

e fechado (ver observacao, p. 283). Como F ⊂ A × R ⊂ M × R, decorre que Fe um subespaco completo, por ser fechado em M ×R, que e completo (prop.

97, p. 423). Por outro lado o grafico de f e dado por

G(f) ={ (x, f(x)

): x ∈ A

}

={(

x,1

ϕ(x)

)

: x ∈ A}

={

(x, t) ∈ A× R : t =1

ϕ(x)

}

= F.

Como o grafico de uma aplicacao contınua e homeomorfo ao seu domıniosegue que o espaco completo F = G(f) e homeomorfo ao aberto A. �

O homeomorfismo em questao e dado por (ex. 7, p. 308)

h : (A, d) −→ (G(f), D2)

x 7−→ (x, f(x))

entao (eq. (8.21), p. 456)

d′(x, y) = D2

(h(x), h(y)

)(8.23)

e uma metrica em A equivalente a d, tal que

h′ : (A, d′) −→(G(f), D2

)

x 7−→ (x, f(x))

e uma isometria; sendo que (A, d′) e completo porque(G(f), D2

)o e.

Na igualdade (8.23) temos

h(x) =(x, f(x)

)=(

x,1

ϕ(x)

)

h(y) =(y, f(y)

)=(

y,1

ϕ(y)

)

entao,

D2

(h(x), h(y)

)= D2

((

x,1

ϕ(x)

)

;(

y,1

ϕ(y)

))

= d(x, y) +

∣∣∣∣

1

ϕ(x)− 1

ϕ(y)

∣∣∣∣

mas ϕ(x) = d(x, Ac), entao

d′(x, y) = d(x, y) +

∣∣∣∣

1

d(x, Ac)− 1

d(y, Ac)

∣∣∣∣

(8.24)

459

Page 461: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vamos concretizar a demonstracao da proposicao anterior com um exem-plo especıfico. Consideremos o subespaco (A, µ) do espaco metrico completo(R, µ), onde A = ] − 1, 1 [. Temos,

ϕ : R −→ Rx 7−→ d(x, Ac)

onde Ac =]−∞, 1 ]∪ [ 1,+∞ [

tambem,

f : ] − 1, 1 [ −→ Rx 7−→ 1

ϕ(x)

Vamos explicitar as aplicacoes ϕ e f . Consideremos um ponto x arbi-trariamente fixado em A. Entao,

d(x, Ac) = inf{d(x, y) : y ∈ Ac

}

= inf{|x− y| : y ≤ −1 ou y ≥ 1

}

Temos,

|x− y| =

x− y, se x ≥ y;

−x+ y, se x < y.

Consideremos quatro possibilidades:

(i) 0 ≤ x < 1 e y ≥ 1;

(ii) 0 ≤ x < 1 e y ≤ −1;(iii) −1 < x ≤ 0 e y ≥ 1;

(iv) −1 < x ≤ 0 e y ≤ −1.Entao,

(i) 0 ≤ x < 1 e y ≥ 1.

Como x < y ⇒ |x− y| = −x+ y. Como y ≥ 1 ⇒ −x+ y ≥ 1−x, isto e

|x− y| = −x+ y ≥ 1− x

portanto,

inf0≤ x<1

{|x− y| : y ≥ 1

}= 1− x

(ii) 0 ≤ x < 1 e y ≤ −1.Como x > y ⇒ |x− y| = x− y. Como y ≤ −1 ⇒ x− y ≥ 1+ x, isto e

|x− y| = x− y ≥ 1 + x

460

Page 462: Gentil Lopes - Espaços Métricos

portanto,

inf0≤ x<1

{|x− y| : y ≤ −1

}= 1 + x

mas,

1− x ≤ 1 + x ⇔ x ≥ 0

por conseguinte,

inf0≤x<1

{|x− y| : y ≤ −1 ou y ≥ 1

}= 1− x.

Com raciocınio analogo, nos casos (iii) e (iv) chegamos a

inf−1<x≤ 0

{|x− y| : y ≤ −1 ou y ≥ 1

}= 1 + x.

Geometricamente tudo se passa do seguinte modo:

r r◦ ◦

-[ 1,+∞ [

�]−∞,−1 ]

−1 1x 0 x

ւ d(x,Ac)= 1−xցx−(−1)= d(x, Ac)

q q q

Sendo assim temos,

ϕ(x) =

0, se x ≤ −1;1 + x, se −1 < x ≤ 0;

1− x, se 0 ≤ x < 1;

0, se x ≥ 1.

Logo,

f(x) =

1

1 + x, se −1 < x ≤ 0;

1

1− x , se 0 ≤ x < 1.

Temos,

G(f) ={ (x, f(x)

): x ∈ A

}

={ (x, f(x)

): − 1 < x < 1

}

={ (x,

1

1 + x

): − 1 < x ≤ 0

}⋃{(x,

1

1− x): 0 ≤ x < 1

}

A seguir vemos a geometria da situacao (grafico a esquerda)

461

Page 463: Gentil Lopes - Espaços Métricos

−→G(f)⊂R2

−1 10q −1 10q

r

r

↑d′

←−f(

12

)=2

←− f(

34

)=4

O homeomorfismo em questao e dado por

h :(] − 1, 1 [, µ

)−→ (G(f),D2)

x 7−→ (x, f(x))

Entao,

h(x) = (x, f(x)) =

(x, 1

1+x

)se −1 < x ≤ 0;

(x, 1

1−x)

se 0 ≤ x < 1.

O espaco ( ] − 1, 1 [, d′) resulta completo, onde

d′(x, y) = D2

(h(x), h(y)

)

= d(x, y) +

∣∣∣∣

1

ϕ(x)− 1

ϕ(y)

∣∣∣∣

= |x− y|+ |f(x)− f(y)|.

Por exemplo, tomemos em A = ] − 1, 1 [ , x = 12 e x = 3

4 entao

(eq. (8.24), p. 459)

d′(x, y) = |x− y|+ |f(x)− f(y)|

=∣∣1

2− 3

4

∣∣+∣∣f(1

2

)− f

(3

4

)∣∣

=1

4+ |2− 4| = 9

4= 2, 25.

462

Page 464: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por outro lado (aplicacao h′, p. 459)

1

27−→

(1

2, f(1

2

))

=

(1

2, 2

)

∈ G(f)

3

47−→

(3

4, f(3

4

))

=

(3

4, 4

)

∈ G(f)

Entao

D2

((1

2, f(

1

2));(3

4, f(

3

4)))

=∣∣1

2− 3

4

∣∣+∣∣2− 4

∣∣ =

1

4+ 2 =

9

4= 2, 25.

Ver grafico anterior (a direita).

Definicao 58. Definiremos um espaco metrico topologicamente completocomo um espaco metrico (M, d) que e homeomorfo a um espaco metricocompleto. Ou, de modo equivalente, tal que existe uma metrica d′, equiva-lente a d, de maneira que (M, d′) seja completo.

Propriedade das celas encaixantes

Diremos que uma sequencia de intervalos In, n ∈ N, e encaixante se acadeia de inclusoes:

I1 ⊃ I2 ⊃ · · · ⊃ In ⊃ In+1 ⊃ · · ·

se verifica. Uma sequencia de intervalos encaixantes nao tem necessaria-mente um ponto em comum. Por exemplo as sequencias dadas por,

In = [n, +∞ [ e Jn =]0,

1

n

[

sao encaixantes e, no entanto

∞⋂

n=1

In = ∅ e

∞⋂

n=1

Jn = ∅.

Uma propriedade importante do espaco (R, µ) e que toda sequencia en-caixante de intervalos fechados tem um ponto comum (Propriedade das CelasEncaixantes). Esta propriedade sera generalizada na proxima proposicao(lema). Antes disto vejamos um exemplo especıfico. Consideremos a sequencia(Fn) de conjuntos com termo geral dado por Fn =

[− 1

n ,1n

].

Neste caso temos uma sequencia encaixante F1 ⊃ F2 ⊃ · · · ⊃ Fn ⊃ · · ·

463

Page 465: Gentil Lopes - Espaços Métricos

de subconjuntos fechados em (R, µ). Calculemos o diametro de Fn (uma vezque este se fara presente na hipotese da proxima proposicao):

diamFn = sup{d(x, y) : x, y ∈ Fn

}

= sup{

|x− y| : x, y ∈[− 1

n,1

n

] }

Entao, − 1n ≤ x ≤ 1

n − 1n ≤ x ≤ 1

n=⇒

− 1n ≤ y ≤ 1

n − 1n ≤ −y ≤ 1

n

− 2n ≤ x− y ≤ 2

n ⇒ |x− y| ≤ 2n

⇒ |x− y| ∈[0, 2

n

]

+ :

Portanto,

diamFn = sup[0,

2

n

]=

2

n

R

][ ][][ y · · ·· · ·

diamF3=2/3

diamF2=1

diamF1=2

0 112

13−1 − 1

2− 1

3

Observe que,

limn→∞

diamFn = limn→∞

2

n= 0

E ainda,⋂∞n=1Fn = { 0 }.

Lema 7. Um espaco metrico (M, d) e completo se, e somente se, para todasequencia encaixante F1 ⊃ F2 ⊃ · · · ⊃ Fn ⊃ Fn+1 ⊃ · · · de subconjuntosfechados nao-vazios Fn ⊂M , com lim

n→∞diamFn = 0, existe um unico ponto

a ∈M tal que∞⋂

n=1

Fn = { a }.

Prova:

(=⇒) Seja (M, d) um espaco metrico completo e(Fn

)uma sequencia satis-

fazendo as hipoteses. Como os Fn sao nao vazios, para cada n ∈ N, es-colhamos um ponto xn ∈ Fn . Deste modo obtemos uma sequencia (xn) de

464

Page 466: Gentil Lopes - Espaços Métricos

pontos deM . Vamos mostrar que a sequencia assim construıda e de Cauchy.Dado ε > 0 como lim

n→∞diamFn = 0 existe um ındice n0 de modo que

∀n ≥ n0 ⇒ |diamFn − 0| < ε

Entao,

diamFn0= sup

{d(x, y) : x, y ∈ Fn0

}< ε

⇒ ∀x, y ∈ Fn0⇒ d(x, y) ≤ diamFn0

< ε (8.25)

Como os conjuntos Fn sao encaixados para i < j ⇒ Fi ⊃ Fj . Logo,

m ≥ n0 Fn0⊇ Fm

=⇒n ≥ n0 Fn0

⊇ Fn

como,

xm ∈ Fm

=⇒ xm , xn ∈ Fn0

xn ∈ Fn

logo sem, n ≥ n0 podemo garantir, por (8.25), que d(xm , xn) < ε. Portanto(xn) e de Cauchy.

Perceba que e a hipotese de que os diametros dos conjuntos Fn tornam-se arbitrariamente pequenos (isto e diamFn → 0) que nos garante queescolhendo um ponto em cada conjunto, estes pontos tornam-se, a partir deuma certa ordem, arbitrariamente proximos uns dos outros (que e a condicaopara que (xn) seja de Cauchy).

(M, d)

Fn rxnFm rxmFn0

F2

rx2· · ·

F1

rx1m,n≥n0

Como (M, d) e completo temos que limxn = a ∈M . Considerando quea sequencia (Fn) e encaixada e tendo em conta a prop. 43 (p. 214), temos:

465

Page 467: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(prop. 12, p. 155)

F1 contem (xn)n≥1 ⇒ limxn = a ∈ F1

F2 contem (xn)n≥2 ⇒ limxn = a ∈ F2

......

Fkcontem (xn)n≥k ⇒ lim xn = a ∈ F

k

onde k e um natural arbitrario. Conclusao:∞⋂

n=1

Fn = { a }.

E precisamente neste ponto que necessitamos da hipotese de que todos osFn sejam fechados. Pois se um deles, digamos Fj , nao fosse fechado poderia

ocorrer limxn = a 6∈ Fj e portanto a 6∈∞⋂

n=1

Fn .

Vamos mostrar que este e o unico ponto da interseccao. Suponha, ao

contrario, que b ∈∞⋂

n=1

Fn e b 6= a. Entao d(a, b) > 0, tomando ε = d(a, b) >

0, vejamos o que acontece: como a, b ∈ ⋂ Fn temos que

∀n; a, b ∈ Fn ⇒ ε = d(a, b) ≤ diamFn

⇒ ∀n, ε ≤ diamFn

o que iria contrariar (8.25) (p. 465).

(⇐=) Reciprocamente, consideremos que a interseccao de toda sequenciaencaixante de fechados nao vazios, cujos diametros tendem a zero, e umponto de M . Provemos que (M, d) e completo. De fato, seja (xn) umasequencia de Cauchy em (M, d), a partir desta sequencia construimos umasequencia (Xn) de conjuntos colocando Xn = {xn , xn+1 , . . . } para todo nnatural. Sendo assim X1 ⊃ X2 ⊃ · · · ⊃ Xn ⊃ Xn+1 ⊃ · · · , tendo em contaque se A ⊂ B ⇒ A ⊂ B temos que (Xn) e uma sequencia encaixante defechados nao-vazios. Ademais temos que

X1 ⊃ · · · ⊃ Xn ⊃ · · · ⇒ diamX1 ≥ · · · ≥ diamXn ≥ · · · ≥ 0

consequentemente(diamXn

)e uma sequencia decrescente de numeros reais,

limitada inferiormente por zero e, portanto, converge para zero (Nota p. 160).Tendo em conta ainda a proposicao 41 (p. 211) podemos escrever

0 = limn→∞

diamXn = limn→∞

diam Xn .

Logo, por hipotese, existe a ∈ M de modo que⋂

Xn = { a }. Em partic-ular a ∈ X1 logo (prop. 42, p. 212) existe uma sequencia (yn) de pontos deX1 = {x1 , x2 , x3 , . . . } com lim yn = a. Ora sendo assim (yn) e, na verdade,uma subsequencia de (xn) e como (xn) e de Cauchy segue (prop. 93, p. 413)

que a = limxn . �

466

Page 468: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) No espaco (R, µ) considere Fn= [n, +∞ [. Entao F

1⊃ F

2⊃ · · · , e

cada Fne fechado (complementar aberto) e nao vazio,

R· · ·x0 1 2 3 n′

xc

[ [ [ [F3

Fn′F2

F1

todavia⋂∞n=1 Fn

= ∅. Com efeito, tendo em vista que N e ilimitado superi-ormente, dado qualquer c ∈ R, existe n′ de modo que n′ > c, por conseguintec 6∈ F

n′ . Assim nenhum numero real pode pertencer a todos os Fn. Mas isto

nao contraria o lema 7 uma vez que os Fnnao cumprem lim

n→∞diamFn = 0.

2) No espaco([ 0, 1 [, µ

)considere F

n=[0, 1

n

[. Entao F

1⊃ F

2⊃ · · · , e

limn→∞

diamFn = 0 e ainda⋂∞n=1 Fn

= { 0 }. Mas([ 0, 1 [, µ

)nao e completo

(por exemplo a sequencia de termo geral xn = 1 − 1n e de Cauchy mas nao

converge).

Esta conclusao nao contraria o lema 7 uma vez que os Fnnao sao fecha-

dos no espaco([ 0, 1 [ , µ

).

8.6 Teorema do Ponto Fixo de Banach

O Teorema do Ponto Fixo de Contracoes em Espacos MetricosCompletos

Vimos (p. 358) que toda funcao contınua f : [ a, b ] → [ a, b ] admite umponto fixo, isto e, existe um ponto c ∈ [ a, b ] de modo que f(c) = c. Esteresultado e um caso especial de um famoso resultado de Topologia, conhecidocomo o Teorema do Ponto Fixo de Brower cujo enunciado e o seguinte:

Toda aplicacao contınua cujo domınio e o contradomınio sao iguais abola unitaria fechada

B[ 0; 1 ] ={u ∈ Rn : ‖u‖ ≤ 1

}= B ∴ f : B ⊂ Rn → B ⊂ Rn

tem um ponto fixo, isto e, um ponto p ∈ B[ 0; 1 ] tal que f(p) = p.Alem desse, existem outros teoremas sobre pontos fixos, como o teorema doponto fixo de Banach que estudaremos agora.

Proposicao 104 (Teorema do Ponto Fixo de Banach). Se (M, d) e umespaco metrico completo, entao toda contracao f : M →M tem precisamenteum unico ponto fixo.

467

Page 469: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Construiremos uma sequencia (xn) e mostraremos que ela ede Cauchy e, assim, converge no espaco completo (M, d). Em seguidamostraremos que o limite de (xn) e o unico ponto fixo de f . Esta e aideia da prova.

Inicialmente escolhemos qualquer ponto x0 ∈M e definimos uma sequenciarecursiva (xn) por

x1 = f(x0), x2 = f(x1), x3 = f(x2), . . . , xn+1 = f(xn), . . . (8.26)

Mostremos que (xn) e de Cauchy. Da definicao de contracao (p. 257) e de(8.26) podemos escrever

d(xm+1 , xm) = d(f(xm), f(xm−1)

)

≤ α d(xm , xm−1)

= α d(f(xm−1), f(xm−2)

)

≤ α2 d(xm−1 , xm−2)

= α2d(f(xm−2), f(xm−3)

)

≤ α3d(xm−2 , xm−3

)

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

≤ αm d(x1 , x0)

pela desigualdade triangular generalizada (p. 44)

M

• •xm xn

• • . . . •xm+1 xm+2 xn−1

obtemos (para n > m)

d(xm , xn) ≤ d(xm , xm+1) + d(xm+1 , xm+2) + · · ·+ d(xn−1 , xn)

≤(αm + αm+1 + · · ·+ αn−1

)d(x0 , x1)

= αm · 1− αn−m

1− α d(x0 , x1)

onde usamos a formula da soma dos termos de uma progressao geometrica.

Da desigualdade 0 < α < 1 decorre que∗ 1−αn−m < 1. Por conseguinte,

1− αn−m1− α <

1

1− α ⇒ αm · 1− αn−m

1− α d(x0 , x1) < αm · 1

1− α d(x0 , x1)

∗Se 0 < c < 1 e n ≥ m entao 0 < cn ≤ cm < 1.

468

Page 470: Gentil Lopes - Espaços Métricos

isto e

d(xm , xn) <αm

1− α d(x0 , x1) (n > m) (8.27)

Temos que 0 < α < 1 e d(x0 , x1) sao constantes (nao dependem de m),sendo assim podemos tornar o lado direito tao pequeno quanto desejarmos,bastando para isto tomar m suficientemente grande. Isto prova que (xn) ede Cauchy.

Sendo (M, d) completo, (xn) converge, digamos, xn → p. Mostraremosque o limite p e o ponto fixo da aplicacao f .

Da definicao de contracao e da desigualdade triangular

M•p

•xn

• f(p)

decorre que

d(p, f(p)

)≤ d(p, xn) + d

(xn , f(p)

)

= d(p, xn) + d(f(xn−1), f(p)

)

≤ d(p, xn) + α d(xn−1 , p)

podemos tornar esta ultima soma menor que qualquer ε > 0 prefixadoporquanto∗ xn → p. Sendo assim concluimos que d

(p, f(p)

)= 0, ou ainda,

p = f(p); isto e, p e um ponto fixo de f .p e o unico ponto fixo de f porque de f(p) = p e f(q) = q obtemos

d(p, q) = d(f(p), f(q)

)≤ α d(p, q)

portanto

d(p, q) · (1− α) ≤ 0 ⇒ d(p, q) ≤ 0

visto que α < 1. Por conseguinte, p = q e o teorema esta provado. �

Corolario 33 (Iteracoes, limite superior para o erro). Sob as condicoes daproposicao 104 a sequencia iterativa (8.26) com x0 ∈M arbitrario convergepara o unico ponto fixo p de f . O erro cometido ao se tomar o m−esimoiterado xm como um valor aproximado para o ponto fixo p tem como limitesuperior

d(xm , p) ≤αm

1− α d(x0 , x1) (8.28)

∗Proposicao 9, p. 143.

469

Page 471: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: E imediato da desigualdade (8.27) fazendo n→∞. �

Esta desigualdade pode ser usada para uma estimativa do numero deiteracoes necessario, para se atingir uma precisao a priori fixada.

Amiude acontece de uma aplicacao nao ser uma contracao no espacointeiro (M, d), mas sim em um seu subespaco (N, d). Contudo, se (N, d) efechado, ele e completo pela proposicao 96 (p. 423), sendo assim f tem umponto fixo p em N , e com uma escolha apropriada de x0 teremos xn → pcomo anteriormente. Um tıpico e util resultado deste genero e como segue

Corolario34. Seja f uma aplicacao de um espaco metrico completo (M, d)sobre si mesmo. Suponha que f e uma contracao sobre uma bola fechadaN =

{x ∈M : d(x, x0) ≤ r

}, isto e, f satisfaz d

(f(x), f(y)

)≤ α d(x, y) (α <

1) para todo x, y ∈ N . Ademais, assuma que

d(x0 , f(x0)

)< (1− α) r. (8.29)

Entao a sequencia iterativa (8.26) converge para um ponto p ∈ N . Este p eum ponto fixo de f e e o unico ponto fixo de f em N .

Prova: Tomando m = 0 na equacao (8.27) temos

d(x0 , xn) <1

1− α d(x0 , x1) (n > 0)

usando (8.29) chegamos a

d(x0 , xn) < r (n > 0)

consequentemente todos os termos da sequencia (xn) moram na bola N .Tambem p ∈ N visto que xn → p e N e fechado. A assercao do corolariosegue agora da prova do teorema de Banach. �

∗ ∗ ∗Nao creio que devo gastar anos estudando o trabalho dos outros,

decifrando um campo complicado para poder contribuir com um pequenoaporte meu. Prefiro dar largas passadas numa direcao totalmente nova,em que a imaginacao e, pelo menos, inicialmente, muito mais importantedo que a tecnica, porque suas tecnicas correspondentes tem ainda de serdesenvolvidas. [. . .]

Lembre-se que a matematica e uma livre criacao da mente humanae, como disse Cantor − o inventor da moderna teoria da infinitude,descrita por Wallace −, a essencia da matematica reside na liberdade,na liberdade de criar. A historia, porem, julga essas criacoes por suabeleza duradoura e pela extensao com que elas iluminam outras ideiasmatematicas ou o universo fısico, em suma, por sua “fertilidade”.

(Gregory Chaitin/Matematico e cientista da computacao)

470

Page 472: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Apendice:

Vamos mostrar que d′ ∼ d onde d′(x, y) = D(h(x), h(y)

). (p. 456)

Mostraremos inicialmente que a identidade i : (M, d)→ (M, d′) e contınua.Dados a ∈M e ε > 0 devemos mostrar que existe δ > 0 de modo que:

d(x, a) < δ ⇒ d′(i(x), i(a)

)< ε

isto e,

d(x, a) < δ ⇒ d′(x, a

)< ε (8.30)

rra x

(M, d)

rr i(a)i(x)

(M, d′)

i

Pois bem, como h e homeomorfismo (portanto contınua) para todo ε > 0dado existe δ > 0 tal que

d(x, a) < δ ⇒ D(h(x), h(a)

)< ε

rra x

(M, d)

rr h(a)h(x)

(N,D)

h

Portanto,

d(x, a) < δ ⇒ d′(x, a

)= D

(h(x), h(a)

)< ε.

Este δ nos serve em (8.30).Agora vamos mostrar que a identidade i : (M, d′)→ (M, d) e contınua.

Dados a ∈M e ε > 0 devemos mostrar que existe δ > 0 de modo que:

d′(x, a) < δ ⇒ d(i(x), i(a)

)< ε

isto e,

d′(x, a) < δ ⇒ d(x, a

)< ε

ou ainda,

d′(x, a) = D(h(x), h(a)

)< δ ⇒ d

(x, a

)< ε (8.31)

471

Page 473: Gentil Lopes - Espaços Métricos

rr

a

x

(M,d′)

rr i(a)i(x)

(M, d)

i

Pois bem, como h e homeomorfismo (portanto h−1 e contınua)

rr

a

x

(M,d)

rr h(a)h(x)

(N,D)

h

h−1

h−1 e contınua no ponto h(a), logo dado ε > 0 existe δ0 > 0 de modo que

(N,D)

rrh(x)δ0 h(a)

(M, d)

raεh−1(h(a))

h−1

D(h(x), h(a)

)< δ0 ⇒ d

(h−1

(h(x)

), h−1

(h(a)

))< ε

Ou ainda,

d′(x, a) = D(h(x), h(a)

)< δ0 ⇒ d(x, a) < ε.

Portanto em (8.31) e suficiente tomar δ = δ0 .

∗ ∗ ∗

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472

Page 474: Gentil Lopes - Espaços Métricos

8.7 Exercıcios

1) Verifique se as sequencias (xn) definidas abaixo sao sequencias de Cauchy:

a ) xn = 1n2 em (Q, µ);

b ) xn = 1n+1 em (Q, µ);

c ) xn = 1n2 em (] 0, 1 ], µ);

d ) xn = 1n2 em ([ 0, 1 [, k);

e ) xn = 1n2 em (] 0, 1 ], δ);

f ) xn = 1n+1 em (] 0, 1 ], δ);

g ) xn =

{n−1n se n e ımpar;

1n se n e par.

em ([ 0, 1 [, µ);

h ) xn =

{n−1n se n e ımpar;

1n se n e par.

em ([ 0, 1 [, k).

2) Sejam (xn) e (yn) sequencias num espaco (M, d) tais que

limn→∞

d(xn , yn) = 0

Mostre que xn e de Cauchy se, e somente se, yn o for.

3) Seja (xn) uma sequencia de Cauchy num espaco (M, δ). Mostre que (xn)e estacionaria.

4) De um exemplo de duas sequencias de Cauchy (xn) e (yn) com

limn→∞

d(xn , yn) = 1

tais que uma delas seja de Cauchy e a outra nao.

5) SejaV um espaco vetorial normado sobreR. Se (xn) e (yn) sao sequenciasde Cauchy em V e se λ ∈ R, prove que as sequencias (xn + yn) e (λxn)tambem sao sequencias de Cauchy em V.

6) Se (xn) e (yn) sao sequencias de Cauchy em R mostre que (xn yn) etambem uma sequencia de Cauchy em R.

7) Se (M, d) e um espaco metrico tal que M e finito, mostre que (M, d) ecompleto.

8) Mostre que o espaco (M, d) e completo, onde:

M ={

1,1

2,1

3, . . .

}

e d(x, y) =∣∣∣1

x− 1

y

∣∣∣

9) Mostre que o espaco (M, d) nao e completo, onde:

M ={

1,1

2,1

3, . . .

}

e d(x, y) = |x− y|

473

Page 475: Gentil Lopes - Espaços Métricos

10) Considere o espaco vetorial(C[0, 2], +, ·

), onde: (p. 101)

C[0, 2] = { f : [ 0, 2 ] −→ R / f contınua }

com o produto inerno 〈 f, g 〉 =∫ 20 f · g. Mostre que este nao e um espaco

de Hilbert.

Sugestao: Considere a sequencia fn : [ 0, 2 ] −→ R dada por

fn =

1 se x ≤ 1;

−nx+ n+ 1 se 1 < x < 1 + 1n ;

0 se x ≥ 1 + 1n .

11) Se X e Y sao subespacos completos de (M, d) mostre que X ∪ Y ecompleto.

12) Considere o seguinte subespaco de (R2, D1)

N ={

(x, y) ∈ R2 : x = 0 ou x =1

ne y = 0 ou y =

1

monde m, n ∈ N

}

Perguntamos se N e um subespaco completo ou nao.

13) Mostre que f : (R, µ) −→ (R, µ) definida por f(x) = 2 + x/3 e umacontracao e, ademais, encontre as sequencias definidas por fn(0) e fn(1),ache os respectivos limites.

14) Seja (M, d) um espaco metrico e (xn) e (yn) sequencias de Cauchy emM , mostre que d(xn , yn) converge.

15) Mostre que o conjunto M de todos os inteiros com a metrica d definidapor d(m, n) = |m− n| e um espaco metrico completo.

16) Mostre que o conjunto M de todos os inteiros positivos com a metricad definida por d(m, n) = |m−1 − n−1| nao e um espaco metrico completo.

17) Mostre que o subespacoN ⊂ C[ 0, 1 ] consistindo das funcoes f ∈ C[ 0, 1 ]tais que f(0) = f(1) e completo.

18) Mostre que que a sequencia (fn) dada por

fn(x) =

n, 0 ≤ x ≤ 1n2 ;

1√x, 1

n2 ≤ x ≤ 1.

e uma outra sequencia de Cauchy em(C[ 0, 1 ],Γ

). (p. 419)

19) Mostre que a sequencia do exercıcio anterior nao converge.

20) Se (M, d) e completo, mostre que (M, d ), onde d = d/(1 + d), e com-pleto.

474

Page 476: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Capıtulo 9ESPACOS METRICOS

COMPACTOS

Ate entao a ciencia se caracterizara por duas abordagens. “Aquelesque trataram de ciencia foram ou homens de experimento ou homens dedogma. Os homens de experimento sao como a formiga; apenas colhem eusam; os raciocinadores assemelham-se a aranhas, que fazem teias comsua propria substancia. Mas a abelha adota o meio-termo; colhe seu ma-terial das flores do jardim e do campo, mas o transforma e digere porum poder que lhe e proprio.” ( Paul Strathern/“O sonho de Mendeleiev”)

Mais um importante conceito que importaremos da analise real para ocontexto dos espacos metricos e o de conjunto compacto. Iniciamos pela

Definicao 59 (Cobertura). Sejam (M, d ) um espaco metrico e X ⊂ M .Uma cobertura de X e uma famılia C = {C

λ}λ∈L

de subconjuntos de M talque

X ⊂⋃

λ∈LC

λ

Se cada Cλfor um conjunto aberto em M , diremos que C e uma cobertura

aberta de X. Se existir L′ ⊂ L tal que

X ⊂⋃

λ∈L′C

λ

diremos que C′ = {Cλ}λ∈L′ , e uma subcobertura de C para X.

Quando L′ e um subconjunto proprio de L, diz-se que C′ e uma sub-cobertura propria de C. Quando o conjunto L e finito, diz-se que C e umasubcobertura finita.

475

Page 477: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) Sejam o espaco (R, µ) e X =[13 ,

23

], a famılia C = {C1 , C2 , C3 , C4 }:

C1 =]0,

2

4

[, C2 =

] 1

4,5

8

[, C3 =

] 2

4,3

4

[, C4 =

[ 2

4, 1[,

constitue uma cobertura de X. De fato,

[ 1

3,2

3

]⊂

λ∈L= { 1, 2, 3, 4 }C

λ

Veja a geometria

0 113

23

X

0 1q q q14

24

34

C2

C1

C3C4

Da cobertura C podemos retirar duas subcoberturas:

[1

3,2

3

]⊂

λ∈L′ = { 1, 4 }C

λ

e[ 1

3,2

3

]⊂

λ∈L′′ = { 2, 3 }C

λ

Observe que C nao e uma cobertura aberta, enquanto C′′ = {C2 , C3} euma subcobertura aberta.

2) Consideremos o espaco (X, µ), onde X ={

1n : n ∈ N

}∪ { 0 }.

No exemplo e (p. 130) vimos que todos os pontos de X, a excecao do 0,sao isolados. Isto significa que para cada ponto de X, a excecao do 0, existeum rn > 0 de modo que Bµ(

1n ; rn) = { 1

n }. Sendo assim

X ⊂⋃

n∈NBµ

( 1

n; rn)∪ { 0 }

Observe que a cobertura

C ={

( 1

n; rn)}

n∈N∪{{ 0 }

}

nao admite subcobertura propria. De fato, se omitirmos qualquer bola, ocentro da mesma fica “descoberto”. E mais: C so nao e uma coberturaaberta devido a que { 0 } nao e um conjunto aberto em (X, µ).

476

Page 478: Gentil Lopes - Espaços Métricos

9.1 Compacidade

Definicao 60 (Compacidade). Um espaco metrico (M, d ) sera dito com-pacto quando toda cobertura aberta de M possuir uma subcobertura finita.

Um subconjuntoK ⊂M sera dito compacto quando o subespaco (K, d )for compacto. Logo, K ⊂M e compacto quando de toda cobertura

K ⊂⋃

λ∈LA′

λ

por meio de abertos A′λem (K, d ) se pode extrair uma subcobertura finita.

Acontece que∗, para cada λ ∈ L, A′λ= A

λ∩ K, onde A

λe aberto em

(M, d ). Sendo assim,

K ⊂⋃

λ∈LA′

λ⇔ K ⊂

λ∈LA

λ∩K ⇔ K ⊂

λ∈LA

λ

Em resumo, o subconjunto K ⊂ M e compacto se, e somente se, de todacobertura K ⊂ ∪A

λ, por abertos A

λem (M, d ), se pode extrair uma sub-

cobertura finita K ⊂ Aλ1∪ · · · ∪A

λn.

Observe que, segundo a definicao, para demonstrar que um conjuntoM ecompacto, devemos considerar uma colecao arbitraria de abertos cuja uniaocontenha M e mostrar que M esta contido na uniao de alguma subcolecaofinita de tal colecao. Por outro lado, para mostrar que um conjunto Mnao e compacto, e suficiente exibir uma cobertura aberta que nao possa sersubstituıda por uma subcolecao finita que ainda cubra M .

Exemplos:

1) O subconjunto I = [ 0, 1 ] e compacto no espaco (R, µ) mas nao no espaco(R, δ).

Mostremos inicialmente a segunda destas assertivas. Ja vimos que todonumero real e isolado no espaco (R, δ). Por exemplo dado p ∈ [ 0, 1 ] temosB

δ(p; 1) = { p }. Portanto

[ 0, 1 ] ⊂⋃

p∈ IB

δ( p; 1)

e a cobertura aberta{B

δ(p; 1)

}

p∈ I

nao admite subcobertura finita.

A bem da verdade, se retirarmos uma unica bola desta colecao, a sub-famılia restante nao sera mais uma cobertura do intervalo [ 0, 1 ].

A primeira das assertivas anteriores sai como um caso especial da seguinte:

∗Ver proposicao 24, p. 193.

477

Page 479: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 105 (Teorema de Heine-Borel). Se F ⊂ R e fechado e limitadoe C =

{C

λ

}e uma cobertura aberta de F , entao existe uma subcobertura

finita de F .

Prova: Assumiremos que nenhum subconjunto finito de C cobre F emostraremos que isto leva a uma contradicao. De fato, visto que F e limi-tado, existe um numero c > 0 tal que F ⊂ [−c, c ]. Consideremos os doisintervalos [−c, 0 ] e [ 0, c ]; ao menos um desses intervalos deve conter umaparte de F que nao pode ser coberta por um numero finito de conjuntos deC (do contrario se C′ ⊂ C e finito e cobre a parte de F em [−c, 0 ] e C′′ ⊂ Ce finito e cobre a parte de F em [ 0, c ], entao C′ ∪ C′′ e finito e cobre F ,contradizendo nossa hipotese). Seja I0 um dos intervalos [−c, 0 ] ou [ 0, c ],aquele que tem a propriedade de conter a parte de F que nao pode sercoberta por um numero finito de subconjuntos de C. Agora vamos dividirI0 em dois intervalos fechados e de igual comprimento; ao menos um dessesintervalos deve conter uma parte de F que nao pode ser coberta por umnumero finito de conjuntos de C. Chamemos um tal intervalo de I1. Agora,dividamos I1 em dois intervalos fechados e de igual comprimento e seja I2um desses intervalos que tem a propriedade de conter a parte de F que naopode ser coberta por um numero finito de subconjuntos de C. Continuandoeste processo indefinidamente, obtemos uma sequencia de intervalos fecha-dos I0 ⊃ I1 ⊃ I2 ⊃ · · · ⊃ In ⊃ · · · com a propriedade de que o comprimentode Ik e c/2k e a parte de F em Ik nao pode ser coberta por um numerofinito de subconjuntos de C; isto para cada k = 0, 1, 2, 3, . . .. Pelo teoremados intervalos encaixados ([AR] 13, p. 604) existe um unico ponto µ comum acada um dos intervalos fechados Ik.

Mostremos que µ e um ponto de acumulacao de F . Seja ε > 0 arbitraria-mente fixado. Escolhamos um natural n de modo que c/2n < ε. Entao ocomprimento de In, isto e c/2n, e menor que ε, e tendo em conta que µ ∈ In,segue que In ⊂ B(µ; ε) (isto e, In ⊂ ]µ−ε, µ+ε [ ). Mas In contem infinitospontos de F (se F ∩ In fosse finito entao certamente deveria ser coberto porum numero finito de elementos de C, contrariando uma propriedade dos Ik),por conseguinte existe um x ∈ F com x 6= µ e |x− µ| < ε. Portanto µ e umponto de acumulacao de F . Sendo F fechado, resulta que µ ∈ F .

Agora, visto que C e uma cobertura aberta de F , existe um Cλ0∈ C

tal que µ ∈ Cλ0. Sendo C

λ0um conjunto aberto existe um ǫ > 0 tal que

B(µ; ǫ) ⊂ Cλ0. Como feito anteriormente, escolhamos um ındicem de modo

que Im ⊂ B(µ; ǫ). Entao Im ⊂ Cλ0; isto e, Im esta coberto por um numero

finito (no caso um unico) de conjuntos de C, e claramente a parte de F emIm esta coberto por um numero finito de conjuntos de C. Isto contradizuma das propriedades de construcao da sequencia (Ik) de intervalos fecha-dos. Por conseguinte nossa hipotese de que nenhum subconjunto finito de Ccobre F conduz a uma contradicao, e isto estabelece a proposicao. �

478

Page 480: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2) O conjunto Y ={

1n : n ∈ N

}={1, 1

2 ,13 , . . .

}nao e compacto no espaco

(R, µ). Para se convencer disto, basta o leitor rever exemplo 2. (p. 476)

3) O conjunto X ={

1n : n ∈ N

}∪ { 0 } =

{0, 1, 1

2 ,13 , . . .

}e compacto no

espaco (R, µ). De fato, seja C = {Cλ}λ∈L

uma cobertura aberta de X.Sendo assim 0 pertence a um dos membros desta colecao, digamos 0 ∈ C

λ0.

Existe um intervalo aberto centrado em 0 satisfazendo

0 ∈ ] 0− r, 0 + r [ ⊂ Cλ0

s rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr0 11

213

14

...] [−r r

X

Qualquer que seja o intervalo aberto centrado em 0, dentro do mesmoteremos infinitos termos de X e, fora do mesmo, teremos sempre um numerofinito de termos de X. Consequentemente quase todos os pontos de X(a excecao possıvel de um numero finito) pertencem ao aberto C

λ0. Por

conseguinte X e coberto por um numero finito de abertos da colecao C.4) Todo conjunto finito e compacto. De fato, seja

{x1 , x2 , . . . , xn } ⊂⋃

λ∈LA

λ

onde os Aλsao abertos. Pelas definicoes de inclusao e uniao de famılias de

subconjuntos (p. 597) existem λ1 , λ2 , . . . , λn ∈ L tais que

x1 ∈ Aλ1, x2 ∈ Aλ2

, . . . , xn ∈ Aλn.

Por conseguinte,

{x1 , x2 , . . . , xn } ⊂ Aλ1∪A

λ2∪ · · · ∪A

λn.

5) Um espaco discreto e compacto e finito e, reciprocamente.

Prova:

(⇒) Seja (M, d) um espaco discreto e compacto. Dado p ∈M existe rp > 0de modo que B(p; rp) = { p }. Por ser (M, d) compacto, da cobertura aberta

M ⊂⋃

p∈MB(p; rp)

podemos extrair uma subcobertura finita, o que prova que M e finito.

(⇐) Sai do exemplo 4 acima, juntamente com a proposicao 7 (p. 133). �

A contrapositiva da proposicao anterior fica assim:

T −→ H : Se M e infinito entao (M, d) ou nao e discreto ou nao ecompacto.

479

Page 481: Gentil Lopes - Espaços Métricos

6) Seja (M, d) um espaco metrico. Se K,L ⊂ M sao subconjuntos com-pactos, entao K ∪ L e compacto.

De fato, se K ∪ L ⊂ ⋃Aλ(cada A

λe aberto) decorre que K ⊂ A

λe

L ⊂ Aλ, daı

K ⊂ Aλ1∪ · · · ∪A

λne L ⊂ A

λ′1

∪ · · · ∪Aλ′m

Portanto,

K ∪ L ⊂ Aλ1∪ · · · ∪A

λn∪A

λ′1

∪ · · · ∪Aλ′m.

Por inducao, segue que a reuniao de um numero finito de compactos ecompacta. Agora, uma reuniao infinita de compactos pode nao ser com-pacta. De fato, todo conjunto e reuniao de seus pontos, os quais sao com-pactos. (ex. 4, p. 479)

Proposicao 106. Todo subconjunto fechado de um espaco metrico compactoe compacto. Reciprocamente, um subconjunto compacto de qualquer espacometrico e fechado.

Prova:

(⇒) Suponha ⊂M um subconjunto fechado do espaco compacto (M, d).Seja

⊂⋃

λ∈LA

λ

onde cada Aλe aberto. Sendo assim, podemos escrever

M ⊂( ⋃

λ∈LA

λ

)∪c

Como c e aberto e M e compacto, existem λ1 , . . . , λn ∈ L tais que

M ⊂ Aλ1∪ · · · ∪A

λn∪c

Como e c nao tem pontos em comum, segue que

⊂ Aλ1∪ · · · ∪A

λn

e resulta compacto.∗(⇐) Reciprocamente, suponha ⊂ M um subconjunto compacto de umespaco arbitrario (M, d).

Admitindo nao fechado em (M, d) deveremos mostrar que nao ecompacto. Para isto e suficiente exibir uma cobertura aberta que nao possaser substituıda por uma subcolecao finita que ainda cubra . Passemosa construcao de tal cobertura: sendo nao fechado decorre que 6= ¯ , e

∗Faremos uso da tecnica (T-1) (p. 570).

480

Page 482: Gentil Lopes - Espaços Métricos

como ⊂ ¯ resulta que existe x ∈ ¯ tal que x 6∈ , isto e, existe x ∈ ¯ −.Para cada n ∈ N facamos

An =M −B[x;

1

n

]

Vamos agora mostrar que(An

)

n∈Ne uma cobertura aberta de , isto e, que

⊂⋃

n∈NAn

Nota: Para ver que os An ={y ∈M : d(y, x) > 1

n

}sao abertos, ver o

exemplo (iv) (p. 261) no qual x = a e corolario 12 (p. 282).

De fato, seja y ∈ , como x 6∈ segue que x 6= y. Logo d(x, y) > 0.Portanto, nos valendo de Arquimedes, obtemos um ındice n0 ∈ N de modoque 1

n0< d(x, y). Sendo d(x, y) > 1

n0resulta que y 6∈ B

[x; 1

n0

], portanto

y ∈M −B[x; 1

n0

], isto e

y ∈⋃

n∈N

(

M −B[x;

1

n

])

⇒ ⊂⋃

n∈NAn .

(M,d)

sx

1

B[x; 1 ]

¯

(M,d)

sx

1

¯

sy

(M,d)

sx

¯

sy

B[ x; 1n0

]

Agora mostremos que nenhuma subcolecao finita de(An

)

n∈Ncobre :

De fato, como x ∈ ¯ , temos que

∀ ε > 0 ⇒ B(x; ε) ∩ 6= ∅.Isto e, toda bola aberta B

(x; 1

n

)⊂ B

[x; 1

n

]contem algum ponto de .

Logo, o ponto de que pertence a bola B[x; 1

n

]nao pertence ao conjunto

An = M − B[x; 1

n

]. Ou seja, para todo n natural (n = 1, 2, 3, . . .), An

nao contem algum ponto de . Esta conclusao, por si so, nao e suficientepara garantir que nenhuma subcolecao finita de

(An

)

n∈Ncubra (por que?).

Pois bem, temos queA1 ⊂ A2 ⊂ A3 ⊂ · · ·

Sendo An ⊂ An+1 a reuniao de qualquer colecao finita

An1∪An2

∪ · · · ∪Ank

e igual ao conjunto com maior ındice da colecao.

481

Page 483: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Tomando nj = max{n1 , . . . , nk}, temos que Anj

contem todos os con-

juntos da subcolecao finita. Mas, como ja vimos, An (n = 1, 2, 3, . . .) naocontem algum ponto de . Isto e, algum ponto de esta ausente de Anj

,

portanto nenhuma subcolecao finita pode cobrir . �

Exemplos:

1) O conjunto ={0, 1, 1

2 ,13 , . . .

}e compacto. De fato, e um sub-

conjuto fechado do compacto [ 0, 1 ] (ver Comentario, p. 206). Ver aindaexemplo 3, p. 479.

2) Vimos (p. 400) que o conjunto de Cantor e fechado no subespaco compacto([ 0, 1 ], µ), portanto este conjunto e compacto.

3) A proposicao anterior tambem nos diz porque o subconjunto ] 0, 1 [ naoe compacto no espaco (R, µ): porque nao e um subconjunto fechado.

Corolario 35 (A Intersecao de Compactos e Compacta). Seja (M, d ) umespaco metrico e

(K

λ

)

λ∈Luma famılia de subconjuntos compactos. Entao,

K =⋂

λ∈LK

λ

e compacto.

Prova: De fato, pela proposicao 106, cada Kλe fechado em (M, d ), logo,

pelo teorema 32 (p. 203), K e fechado em (M, d ) e, portanto em (Kλ, d )

(corol. 4, (p. 208)) novamente, pela proposicao 106, K resulta compacto. �

Proposicao 107 (Todo Compacto e Limitado). Seja (M, d ) um espacometrico. Se K ⊂M e compacto entao K e limitado.

Prova: Seja K ⊂M compacto. Para cada x ∈ K ponhamos Ax = B(x; 1).Entao

(Ax

)

x∈Ke uma cobertuta aberta de K. Sendo K compacto existem

x1 , x2 , . . . , xn ∈ K tais que K ⊂ Ax1∪ Ax2

∪ · · · ∪ Axn. Como cada Axi

elimitado, a reuniao finita ( (P6 ), p. 127)

Ax1∪Ax2

∪ · · · ∪Axn

tambem e limitada, resultando K limitado. �

Das duas ultimas proposicoes concluimos:

Proposicao 108 (Todo Compacto e Fechado e Limitado). Seja (M, d ) umespaco metrico. Se K ⊂M e compacto entao K e fechado e limitado.

A contrapositiva desta proposicao e a

Proposicao 109. Seja (M, d ) um espaco metrico. Se K ⊂ M nao efechado ou limitado entao K nao e compacto.

482

Page 484: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A recıproca da proposicao 108 nao vale em geral. Vejamos dois contra-exemplos:

a) Vejamos um exemplo de um subconjunto limitado e fechado, mas naocompacto: O subconjunto [ 0, 1 ] ⊂ R e limitado e fechado mas nao compactono espaco (R, δ). (ex. 1, p. 477)

b) Considere o espaco(ℓ 2, +, ·

)e os seguintes elementos de ℓ 2 :

δ1 = (1, 0, 0, 0, 0, . . .)

δ2 = (0, 1, 0, 0, 0, . . .)...δk= (0, 0, . . . , 0, 1, 0, 0, . . .)

...k-esima posicao.

Isto e, δn tem todas as coordenadas nulas, exceto a n-esima que vale 1.

Facamos = { δ1 , δ2 , δ3 , . . .}. Temos

δm = (0, 0, . . . , 0, 1, 0, 0, . . .)

δn = (0, 0, . . . , 0, 0, . . . , 0, 1, 0, . . .)

⇓δm − δn = (0, 0, . . . , 0, 1, 0, . . . , 0, −1, 0, . . .)

Sendo assim,

d(δm , δn) = ‖δm − δn‖ =

√√√√

∞∑

i=1

(δmi − δni)2

=√

02 + · · ·+ 02 + 12 + 02 + · · ·+ 02 + (−1)2 + · · ·

=√2.

Sempre que m 6= n. Sendo assim, temos

diam() = sup{d(x, y) : x, y ∈

}=√2

e resulta limitado.

Sendo (δn) uma sequencia de Cauchy em , dado ε > 0 arbitrario, existeum ındice n0 tal que

∀m, n ≥ n0 ⇒ d(δm , δn) < ε

483

Page 485: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De

d(δm , δn) =

{√2, se m 6= n;

0, se m = n.(9.1)

decorre que toda sequencia de Cauchy em e constante a partir de algumındice. Sendo assim, toda sequencia (δn) de pontos de que converge emℓ2 e constante a partir de algum ındice n0 , isto e

δn0= δn0+1 = δn0+2 = · · ·

e portanto limnδn = δn0

∈ . Logo e completo e, pela prop. 96 (p. 423),

fechado. Todavia nao e compacto pois a cobertura aberta

⊂∞⋃

k=1

B(δk; 1)

nao possui cobertura finita. Observe que

B(δk; 1) =

{δn ∈ : d(δn , δk) < 1

}= { δ

k},

devido a (9.1).

De outro modo: Observe que o subespaco metrico (, d) e infinito ediscreto, por conseguinte, nao pode ser compacto (ver a contrapositiva daproposicao dada no exemplo 5, p. 479).

Proposicao 110 (Imagem Contınua de compactos). A imagem de um con-junto compacto por uma aplicacao contınua e compacta.

Prova: Seja K ⊂ M um conjunto compacto e f : M → N contınua.Mostraremos que f(K) ⊂ N e compacto. Seja,

f(K) ⊂⋃

λ∈LA

λ

uma cobertura aberta de f(K). Como f e contınua, Bλ= f−1

(A

λ

)e aberto

para todo λ ∈ L (prop. 62, p. 279). Respaldados nas proposicoes 134 (p. 595) e140 (p. 599) (ıtem (iii)) podemos escrever

f(K) ⊂⋃

λ∈LA

λ⇔ K ⊂ f−1

( ⋃

λ∈LA

λ

)

⇒ K ⊂⋃

λ∈Lf−1(A

λ)

Portanto K ⊂ ∪Bλ. Como K e compacto, existem λ1 , . . . , λn tais que

K ⊂ Bλ1∪ · · · ∪B

λn.

Logo (prop.’s 132, p. 592 e 140, p. 599)

f(K) ⊂ f(B

λ1∪ · · · ∪B

λn

)

= f(B

λ1

)∪ · · · ∪ f

(B

λn

)

⊂ Aλ1∪ · · · ∪A

λn

sendo assim f(K) resulta compacto. �

484

Page 486: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Corolario36. Se (M, d) e (N, d) sao espacos metricos homeomorfos entao(M, d) e compacto se, e somente se, (N, d) o for.

Segue-se que a compacidade e um invariante topologico.

Corolario 37. O cırculo S1 ={(x, y) ∈ R2 : x2 + y2 = 1

}e compacto.

Prova: De fato, a funcao

f : R→ R2 dada por f(t) = (cos t, sin t)

e contınua, [ 0, 2π ] e compacto e, ademais, f([ 0, 2π ]

)= S1. �

Corolario38. Todo caminho f : [ 0, 1 ] −→M em um espaco espaco metricoe compacto, por ser a imagem do compacto [ 0, 1 ].

Em particular, num espaco vetorial normado, todo segmento de reta

[a, b ] ={x = (1− t)a+ tb ∈ E : 0 ≤ t ≤ 1

}

e um conjunto compacto por ser a imagem do compacto [ 0, 1 ] pela aplicacaocontınua dada por f(t) = (1− t)a+ tb. De fato,

f([ 0, 1 ]

)={f(t) : t ∈ [ 0, 1 ]

}

={(1− t)a + tb : t ∈ [ 0, 1 ]

}= [a, b ].

Corolario 39. Se (M, d) e compacto, toda aplicacao contınua f : M → Ne fechada, isto e,

F ⊂M fechado ⇒ f(F)⊂ N fechado.

Prova: De fato,

F ⊂M fechado ⇒ F compacto ⇒ f(F)

compacto

⇒ f(F)

fechado em (N, d′).

Corolario 40. Se (M, d) e compacto, toda bijecao contınua f : M → N eum homeomorfismo.

Prova: Por hipotese f : (M, d)→ (N, d′) e contınua. Devemos mostrarque g = f−1 : (N, d′) → (M, d) e contınua. De fato, seja F ⊂ M fechadoem (M, d). Como f : M → N e contınua implica que f

(F)⊂ N e fechado

em (N, d′), logo

g−1(F)= f

(F)⊂ N e fechado em (N, d′)

Sendo assim o corolario 16 (p. 285) nos assegura que g e contınua. �

Na p. 294 vimos exemplos de bijecoes contınuas com inversas descontınuas.O corolario anterior nos diz porque isto e possıvel: aquelas aplicacoes naotem domınio compacto.

Corolario41. Se (M, d) e compacto, entao toda aplicacao contınua f : M →N e limitada.

Prova: De fato, f(M)⊂ N , sendo compacto, e limitado. �

485

Page 487: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Funcoes Reais Contınuas com Domınio Compacto

Proposicao 111 (Weierstrass). Se (M, d) e compacto, entao toda funcaoreal contınua f : M → R e limitada e atinge valores maximo e mınimo emM . Isto e, existem α, β ∈M tais que

f(α) ≤ f(x) ≤ f(β), ∀x ∈M.

Prova: Que f e limitada ve-se pelo corolario 41 acima. Sendo M com-pacto, entao f(M) tambem o e, ja que f e contınua. Logo, f(M) e limitadoe fechado em (R, µ). Sendo assim, existem (ver quadro a p. 614)

ν = inf f(M) e µ = sup f(M)

Assim, dado ε > 0, existem y1 , y2 ∈ f(M) tais que:

ν ≤ y1 < ν + ε e µ− ε < y2 ≤ µ

Sendo assim,

ν ≤ y1 < ν + ε ⇒ ν − ε < ν ≤ y1 < ν + ε ⇒ y1 ∈ ] ν − ε, ν + ε [

e

µ− ε < y2 ≤ µ ⇒ µ− ε < y2 ≤ µ < µ+ ε ⇒ y2 ∈ ]µ − ε, µ+ ε [

o que implica] ν − ε, ν + ε [ ∩ f(M) 6= ∅

e]µ− ε, µ+ ε [ ∩ f(M) 6= ∅

Portanto, ν, µ ∈ f(M). Como porem f(M) = f(M), pois f(M) e fechado,entao ν, µ ∈ f(M) e, portanto, existem α, β ∈M tais que

f(α) = ν = inf f(M) e f(β) = µ = sup f(M).

∗ ∗ ∗

Se uma prova e “elegante” , se for o resultado de duzentos anos deenjoado polimento, ela sera tao inescrutavel como uma direta revelacaodivina, e sera impossıvel adivinhar como alguem poderia te-la descobertoou inventado. Ela nao lhe fornecera nenhum insight, nada, provavel-mente nada em absoluto. (Gregory Chaitin/Metamat!)

486

Page 488: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Comentarios sobre o Teorema de Weierstrass

1 o) A condicao de compacidade e essencial no teorema acima. Por exemplo,a funcao f : [ 0, 1 [→ R dada por f(x) = x + 1, e contınua em todo o seudomınio, mas nao tem maximo, embora tenha supremo que e 2. Este valornao e assumido pela funcao, isto e, nao existe x ∈ [ 0, 1 [ de modo quef(x) = x+ 1 = 2.

r

x

y

q

f(x)−→l

ցsup f(x)

0 1

2

1

Um outro exemplo e dado pela funcao contınua f dada por f(x) = 1/x,em x > 0, cuja imagem e o semi-eixo ] 0, +∞ [. A funcao nao tem maximonem mınimo. Se definida em um intervalo tipo [ a, +∞ [, onde a > 0, passa ater maximo igual a 1/a, mas continua sem mınimo. Esta funcao continuarasem mınimo mesmo se definida em um intervalo limitado tipo [ a, b [. Porem,em intervalos fechados (compactos) tipo [ a, b ] esta funcao tera maximo 1/ae tera mınimo 1/b. Estas situacoes estao ilustradas nas figuras seguintes.

x

f(x)

q

q q q

q

q

q

0 1 2 3

2

3

1

f : ] 0,+∞ [→R

nao tem maximonem mınimo

x

f(x)

q

q q q

q

q

q

0 1 2 3

2

1a

1

a[

f : [ a,+∞ [→R

tem maximo= 1/anao tem mınimo

x

f(x)

q

q q q

q

q

q

q

0 1 2 3

2

1a

1

1b

a[

f : [ a, b ]→R

tem maximo= 1/atem mınimo= 1/b

Por outro lado, uma funcao contınua f : X → R pode ter maximo emınimo em X, ou f(X) pode ser compacto, sem que X seja compacto. Porexemplo, f(x) = senx em X =] 0, 2π [, e tal que f(X) = [−1, 1 ], que ecompacto, +1 e o maximo de f e −1 e o seu mınimo.

487

Page 489: Gentil Lopes - Espaços Métricos

π2 π 3π

22π

1

−1

x

y=senx

2 o) Uma funcao f : [ a, b ] → R, com domınio compacto, se for des-contınua nao precisa assumir um valor maximo ou mınimo. Por exemplo,consideremos a funcao (descontınua) f : [ 0, 1 ]→ R definida assim

f(x) =

{

x, se x e irracional;

12 , se x e racional.

x

f(x)

¬

¬

12

1

¬0 1

A direita temos um esboco “grosseiro” do grafico de f . As duas linhaspontilhadas estao contidas no grafico de f e sao tais que, qualquer reta ver-tical − conduzida pelo domınio de f (qualquer reta x = c com 0 ≤ x ≤ 1) −intercepta o grafico em um unico ponto (isto e, contem um ponto da linhapontilhada inclinada (se c e irracional) ou contem um ponto da linha pon-tilhada horizontal (se c e racional)).

Pois bem, esta funcao assume valores tao proximos de 1 e de 0 quantoquisermos, se escolhermos um valor irracional para x suficientemente proximode 1 ou de 0. Entretanto, f(x) nunca pode ser igual a 0 ou 1, porquanto asequacoes f(x) = 0 e f(x) = 1, ∀x ∈ [ 0, 1 ], nao tem solucao.

Conjuntos Totalmente Limitados

Definicao 61 (Conjunto Totalmente Limitado). Seja (M, d) um espacometrico. Diremos que um subconjunto K ⊂ M e totalmente limitado se,para todo ε > 0 dado, existir um numero finito de pontos x1 , x2 , . . . , xn ∈ Kde maneira que

K ⊂ B(x1 ; ε) ∪B(x2 ; ε) ∪ · · · ∪B(xn ; ε).

488

Page 490: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Observacao: Todo conjunto totalmente limitado e limitado; nao valendo arecıproca.

Exemplos:

1) O subconjunto K = [ 0, 1 ] e totalmente limitado no espaco (R, µ), masnao no espaco (R, δ).

Inicialmente mostremos a segunda destas assertivas. De fato, temos

Bδ(x; 1) =

{x}, ∀x ∈ [ 0, 1 ].

De modo que e impossıvel selecionar n pontos em [ 0, 1 ] de modo que

[ 0, 1 ] ⊂n⋃

i=1

Bδ(xi ; 1).

Observe que [ 0, 1 ] e um subconjunto limitado em (R, δ). Deste modo,ser totalmente limitado e uma condicao mais forte do que ser limitado.

Mostremos agora que [ 0, 1 ] e totalmente limitado no espaco (R, µ).

De fato, dado ε > 0, escolhamos o menor natural n de modo que n ·ε > 1e facamos: x1 = 0, x2 = ε, x3 = 2 ε, . . . , xn = (n− 1) ε ≤ 1. Temos,

]x1 − ε, x1 + ε [ = ] − ε, ε []x2 − ε, x2 + ε [ = ] 0, 2ε [

]x3 − ε, x3 + ε [ = ] ε, 3ε [

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

]xn − ε, xn + ε [ = ]n · ε− 2ε, n · ε [

Sendo assim, [ 0, 1 ] ⊂ Bµ(x1 ; ε) ∪ Bµ(x2 ; ε) ∪ · · · ∪ Bµ(xn ; ε), o que provanossa assertiva.

2) Todo conjunto limitado em (R, µ) e totalmente limitado.

Prova: Para provar esta afirmacao e suficiente mostrar que todo intervalo[ a, b ] em (R, µ) e totalmente limitado. (Isto porque todo conjunto limitadoem (R, µ) esta contido em algum intervalo do tipo [ a, b ]). De fato, dadoε > 0 escolhamos o menor natural n de modo que n · ε > b− a e facamos

x1 = a

x2 = a+ ε

x3 = a+ 2 ε...

xk= a+ (k − 1) ε...

xn = a+ (n − 1) ε

489

Page 491: Gentil Lopes - Espaços Métricos

onde o n escolhido e tal que a+ (n− 1) ε ≤ b < a+ n ε. Entao,

[ a, b ] ⊂ Bµ(x1 ; ε) ∪Bµ(x2 ; ε) ∪ · · · ∪Bµ(xn ; ε)

3) Um outro exemplo de conjunto limitado, mas nao totalmente limitado,e o subconjunto = { δ1 , δ2 , δ3 , . . . } de ℓ2 visto na p. 483.

9.1.1 Caracterizacao de compacidade

Em geral, nao e facil provar que um conjunto e compacto, utilizandoapenas a definicao (ver por exemplo a proposicao 105, p. 478). A proposicaoseguinte nos fornece outras definicoes alternativas de compacidade.

Proposicao 112. Seja (M, d) um espaco metrico. As seguintes afirmacoessao equivalentes:

a) (M, d ) e compacto;

b) Todo subconjunto infinito de M possui um ponto de acumulacao;

c) Toda sequencia em M possui uma subsequencia convergente;

d) (M, d ) e completo e totalmente limitado.

Prova: Devemos mostrar que a) ⇒ b) ⇒ c) ⇒ d) ⇒ a). Entao

a) ⇒ b) Faremos uso da tecnica (T− 4) (p. 571). Facamos,

H1 : (M, d ) e compacto.⇒ T: X possui um ponto

de acumulacao.H2 : X ⊂M e infinito.

H1 ∧ T =⇒ H2

Suponhamos (M, d ) compacto e X ⊂M um subconjunto sem ponto deacumulacao. SendoX ′ = ∅ resulta que X = X∪X ′ = X, isto e, X e fechadoem (M, d ), donde, utilizando H1 , X e compacto. Afirmamos, ademais, queo subespaco (X, d ) e discreto. De fato, se isto nao fosse verdade existiriaum ponto p ∈ X nao isolado. Logo (ver observacao p. 129) para todor > 0 dado, existe um outro ponto x ∈ X tal que x ∈ B(p; r), isto e,0 < d(x, p) < r. Portanto,

(B(p; r)− { p }

)∩X 6= ∅ ⇒

(B(p; r)− { p }

)∩X 6= ∅

e p resultaria ponto de acumulacao de X, contrariando nossa hipotese.

490

Page 492: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Pois bem, (X, d ) compacto e discreto implica (ex. 5, p. 479) que X e finito.

b) ⇒ c) Seja (xn) uma sequencia em M . Se {xn : n ∈ N } e finito entaoexiste algum valor a que se repete infinitas vezes:

a = xn1= xn2

= · · · = xnk= · · ·

Portanto a subsequencia (xnk) converge para a. Se, porem, o conjunto

{x1 , x2 , . . . , xn , . . . } e infinito entao possui um ponto de acumulacao a.Tendo em conta a observacao (ii) (p. 219) e a proposicao 42 (p. 212), con-cluimos que existe uma sequencia de pontos de X = {x1 , x2 , . . . , xn , . . .}(isto e, uma subsequencia de (xn)) convergindo para a.

c) ⇒ d) Supondo c) como hipotese, temos que toda sequencia de Cauchyem M possui uma subsequencia convergente, logo (prop. 93, p. 413) e con-vergente. Sendo assim (M, d ) resulta completo. Ainda resta mostrar que(M, d ) e totalmente limitado: vamos mostrar que, para todo ε > 0 arbi-trariamente fixado, podemos incluir M numa reuniao de um numero finitode bolas de raio ε. De fato, dado ε > 0, escolhamos um ponto x1 ∈ M .Se acontece M ⊂ B(x1 ; ε), paramos aqui. Caso contrario, existe x2 ∈ Mde modo que d(x2 , x1) ≥ ε. Se acontece M ⊂ B(x1 ; ε) ∪ B(x2 ; ε), ter-minou. Caso contrario, existe x3 ∈ M de modo que d(x3 , x2) ≥ ε ed(x3 , x1) ≥ ε. Prosseguindo desta forma, ou chegamos a um n tal queM ⊂ B(x1 ; ε) ∪B(x2 ; ε) ∪ · · · ∪B(xn ; ε) ou entao obtemos uma sequencia(xn) satisfazendo d(xm , xn) ≥ ε para m 6= n quaisquer. Sendo assim,(xn) nao possui nenhuma subsequencia de Cauchy, ou ainda: nenhuma sub-sequencia convergente. O que contraria a hipotese, logo a segunda das alter-nativas propostas nao ocorre, por conseguinte (M, d ) e totalmente limitado.

d) ⇒ a) Seja (M, d ) completo e totalmente limitado. Suponhamos, por ab-surdo, que (M, d ) nao e compacto. Sendo assim existe uma cobertura abertaA = {A

λ}λ∈L

de M que nao admite subcobertura finita. Como (M, d ) etotalmente limitado, existe um numero finito de pontos x1 , x2 , . . . , xn emM tais que

M ⊂n⋃

i=1

B(xi ;

1

2

)⇒ M =

n⋃

i=1

[

M ∩B(xi ;

1

2

)]

.

Assim, M pode ser decomposto num numero finito de subconjuntos comdiametro menor ou igual a 1.

M ∩B(xi ;

12

)⊂B(xi ;

12

)⇒ diam

(

M ∩B(xi ;

12

))≤ diamB

(xi ;

12

)≤ 1.

Como (M, d ) nao e compacto pelo ao menos um desses conjuntos, digamos

M1 =M ∩B(x

k;1

2

),

(k ∈ { 1, 2, . . . , n }

)

491

Page 493: Gentil Lopes - Espaços Métricos

nao esta contido em reuniao finita alguma de elementos de A (ex. 6, p. 480).Como M1 e totalmente limitado, M1 pode ser decomposto num numerofinito de subconjuntos cada qual com diametro menor ou igual a 1

2 . Pelomenos um desses conjuntos, digamos,M2 , nao esta contido em reuniao finitaalguma de elementos de A. Prosseguindo dessa forma obtemos

M1 ⊃M2 ⊃M3 ⊃ · · ·Com Mn 6= ∅ para todo n, e diam Mn ≤ 1

n . Seja Mn o fecho de Mn em(M, d ), entao

M 1 ⊃M2 ⊃M3 ⊃ · · ·e uma cadeia de subconjuntos fechados do espaco completo (M, d ), comMn 6= ∅ para todo n e lim

ndiam Mn = 0. Logo, o lema 7 (p. 464) nos assegura

que existe p ∈M de modo que∞⋂

n=1

Mn = {p}.

Como p ∈M , existe Aλ′ em A tal que p ∈ A

λ′ .

Afirmamos:

Se limn

diamMn = 0 entao ∃n0 ∈ N tal que Mn0⊂ A

λ′

De fato, suponha que limn

diam Mn = 0 e que nao existe n0 ∈ N de modo

que Mn0⊂ A

λ′ . Logo, para todo n existe xn ∈ Mn de modo que xn 6∈ Aλ′ .Como p ∈ A

λ′ , entao para todo n natural xn 6= p. Logo

∀n ∈ N existe xn ∈Mn tal que d(xn , p) > 0 (9.2)

Por outro lado, para todo ε > 0, existe n0 ∈ N tal que∣∣diamMn − 0

∣∣ = diamMn < ε, ∀n ≥ n0 .

Logo,diamMn = sup

{d(x, y) : x, y ∈Mn

}< ε, ∀n ≥ n0 .

Entao,∀n ≥ n0 ⇒ d(x, y) < ε; x, y ∈Mn .

Respaldados na proposicao 148 (p. 613), podemos escrever

∀n ≥ n0 ⇒ d(x, y) = 0; x, y ∈Mn .

Mas esta conclusao contradiz (9.2).

Pois bem, existe um ındice n0 tal que

Mn0⊂ A

λ′ ⇒ Mn0⊂ A

λ′

Mas isto e uma contradicao uma vez que, como dissemos acima, os Mn

nao estao contidos em nenhuma reuniao finita de elementos da coberturaA = {A

λ}λ∈L

. �

492

Page 494: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicao 62 (Espacos Sequencialmente Compactos). Um espaco (M, d)e sequencialmente compacto se, e somente se, toda sequencia em M possuiuma subsequencia convergente.

A proposicao 112 (p. 490) nos assevera entao que todo espaco metricocompacto e sequencialmente compacto e, recıprocamente, todo espaco se-quencialmente compacto e compacto.

Todo espaco metrico compacto possui um subconjunto enumeravel edenso. Senao vejamos:

Proposicao 113. Seja (M, d) um espaco metrico compacto. Entao existeuma sequencia (yn) de pontos de M tal que o conjunto Y = { y1 , y2 , . . . } edenso em (M, d).

Prova: Como (M, d) e compacto, e totalmente limitado, logo (def. 61, p. 488)

para ε = 1, existem m1 pontos de M , digamos

x11 , x12 , x13 , . . . , x1m1

tais que,

B(x11 ; 1

)∪B

(x12 ; 1

)∪ · · · ∪B

(x1m1

; 1)⊃M

Para ε = 12 existem m2 pontos de M , digamos

x21 , x22 , x23 , . . . , x2m2

tais que,

B(x21 ;

1

2

)∪B

(x22 ;

1

2

)∪ · · · ∪B

(x2m2

;1

2

)⊃M

E assim sucessivamente, para ε = 1n existem, existem mn pontos de M ,

digamos

xn1 , xn2 , xn3 , . . . , xnmn

tais que,

B(xn1 ;

1

n

)∪B

(xn2 ;

1

n

)∪ · · · ∪B

(xnmn

;1

n

)⊃M

Vamos organizar as informacoes anteriores. Temos a seguinte sequenciadupla:

x11 x12 x13 . . . x1m1

x21 x22 x23 . . . x2m2

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

xn1 xn2 xn3 . . . xnmn

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

493

Page 495: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Observe que esta sequencia dupla, ao contrario do que parece, nao possui omesmo numero de colunas, mas e sempre limitada em colunas; digo: todasas linhas tem um numero finito de elementos.

Em correspondencia a esta sequencia dupla obtemos:

B(x11 ; 1

)∪B

(x12 ; 1

)∪ · · · ∪B

(x1m1

; 1)⊃M

B(x21 ;

12

)∪B

(x22 ;

12

)∪ · · · ∪B

(x2m2

; 12

)⊃M

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .B(xn1 ;

1n

)∪B

(xn2 ;

1n

)∪ · · · ∪B

(xnmn

; 1n

)⊃M

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Pois bem, a sequencia (yn) procurada e obtida ao “linearizarmos” a sequenciadupla anterior, da seguinte forma:

(x11 , . . . , x1m1

;x21 , . . . , x2m2; · · · ;xn1 , . . . , xnmn

; · · ·)

De fato, vamos provar que sendo

Y ={x11 , . . . , x1m1

; x21 , . . . , x2m2; · · · ;xn1 , . . . , xnmn

; · · ·}

temos Y = M . Dados p ∈ M e ε > 0 devemos mostrar que existe xij ∈ Ytal que xij ∈ B( p; ε). Entao, dado ε > 0 tomamos, de emprestimo aArquimedes, um natural n de modo que 1

n < ε. Como

B(xn1 ;

1

n

)∪B

(xn2 ;

1

n

)∪ · · · ∪B

(xnmn

;1

n

)⊃M

p pertence a uma destas bolas, digamos

p ∈ B(x

nk;1

n

), para algum k ∈ { 1, 2, . . . , mn }

portanto d(p, xnk) < 1

n < ε, isto e, xnk∈ B(p; ε). �

∗ ∗ ∗

As teorias matematicas, as boas, consistem na definicao de uns poucosnovos conceitos-chave e depois o fogo de artifıcio comeca: elas revelamnovos panoramas, abrem a porta a mundos inteiramente novos.[. . .] O fascinante e que, simples como sao os numeros inteiros e os pri-mos, ainda assim e facil propor questoes diretas e claras a seu respeitoque ninguem sabe como responder, e podemos dizer que nem mesmodaqui a dois mil anos, nem sequer os melhores matematicos do mundo,saberao! (Gregory Chaitin/Metamat!)

494

Page 496: Gentil Lopes - Espaços Métricos

9.2 Produto Cartesiano de Conjuntos Compactos

Proposicao 114 (Produto de Compactos). Sejam (M1 , d1) e (M2 , d2)espacos metricos. Consideremos sobre M1 ×M2 uma qualquer das metricasequivalentes D1, D2 ou D3. Entao M1 ×M2 e compacto se, e somente se,M1 e M2 o forem.

Prova: (⇒) Se M1 ×M2 e compacto entao M1 e M2 tambem o serao poissao imagens do compacto M1 ×M2 pelas funcoes contınuas (projecoes):

p1 : M1 ×M2 −→M1

(x1 , x2) 7−→ x1

e p2 : M1 ×M2 −→M2

(x1 , x2) 7−→ x2

Assim,

p1

(M1 ×M2

)={p1

((x1 , x2)

): (x1 , x2) ∈M1 ×M2

}

={x1 : (x1 , x2) ∈M1 ×M2

}=M1

Analogamente p2

(M1 ×M2

)=M2 .

(⇐) Para provar a recıproca mostraremos que se M1 e M2 sao compactosentao toda sequencia em M = M1 ×M2 possui uma subsequencia conver-gente. De fato, seja (zn) uma sequencia em M . Entao, zn = (xn , yn), sendo(xn) uma sequencia em M1 e (yn) uma sequencia em M2 . Como M1 e com-pacto, (xn) possui uma subsequencia convergente, isto e, existem N1 ⊂ N

infinito (p. 140) e a ∈ M1 tais que limn∈N1

xn = a. Como M2 e compacto,

a sequencia (yn)n∈N1possui uma subsequencia convergente, isto e, existem

N2 ⊂ N1 infinito e b ∈M2 tais que limn∈N2

yn = b. Observe que (xn)n∈N2e uma

subsequencia da subsequencia (xn)n∈N1, portanto pela proposicao 12 (p. 155)

temos limn∈N2

xn = a. Sendo assim, temos

limn∈N2

xn = a

limn∈N2

yn = b=⇒

prop. 14

(p. 157)

limn∈N2

(xn , yn

)= (a, b).

Entao(zn)

n∈ N2

e a subsequencia procurada. �

Corolario 42. Sejam (M1 , d1), (M2 , d2), . . ., (Mn , dn) espacos metricos.Entao, o produto M = M1 ×M2 × · · · ×Mn e compacto se, e somente se,cada Mi o for.

Prova: Basta aplicar n− 1 vezes a proposicao 114. �

495

Page 497: Gentil Lopes - Espaços Métricos

9.2.1 Compactos no Rn

Via de regra, nao e facil provar − pela definicao, ou uma de suas formasequivalentes − que um conjunto e compacto. Esta dificuldade deixa de exis-tir no caso de subconjuntos compactos do

(Rn, Di

). Na sequencia provamos

uma importante proposicao que caracteriza completamente os subconjuntoscompactos do

(Rn, Di

).

Vimos (prop. 108, p. 482) que todo subconjunto compacto de um espacometrico e fechado e limitado. Mas, devido ao exemplo 1 (p. 477), num espacometrico um conjunto pode ser fechado e limitado sem ser compacto. No casoporem dos espacos

(Rn, Di

)compacto e o mesmo que fechado e limitado.

Senao vejamos

Proposicao 115. Sejam os espacos metricos(Rn, Di

). Um subconjunto

K ⊂ Rn e compacto se, e somente se, K e fechado e limitado.

Prova: (⇒) Vale para qualquer espaco metrico.

(⇐) Um subconjunto K ⊂ Rn diz-se limitado quando existe um numeroreal c > 0 de modo que ‖x‖ ≤ c para todo x ∈ K. Isto e o mesmo que dizerque K esta contido na bola de centro na origem e raio c. Consideremossobre Rn a norma

x = (x1 , x2 , . . . , xn) 7−→ ‖x‖ = max{|x1 |, |x2 |, . . . , |xn |

}

Pois bem, sendo K limitado, para todo x ∈ K existe c > 0 de modo que

‖x‖ ≤ c ⇔ max{|x1 |, |x2 |, . . . , |xn |

}≤ c

|x1 | ≤ c|x2 | ≤ c...

|xn | ≤ c

x1 ∈ [−c, c ]x2 ∈ [−c, c ]...

xn ∈ [−c, c ]

⇔ x = (x1 , x2 , . . . , xn) ∈ [−c, c ]× · · · × [−c, c ]⇒ K ⊂ [−c, c ]× · · · × [−c, c ].

Como cada [−c, c ] e compacto em R, segue que o produto [−c, c ] ×· · · × [−c, c ] e compacto em

(Rn, Di

). Sendo assim K e um subconjunto

fechado em(Rn, Di

)que esta contido num compacto deste espaco. Donde,

tendo em conta a proposicao 106 (p. 480), K resulta compacto. �

496

Page 498: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Nota: Devido as desigualdades (p. 319)

D3(x, y) ≤ D1(x, y) ≤ D2(x, y) ≤ n · D3(x, y)

validas para as respectivas normas do Rn, se um subconjunto X ⊂ Rn elimitado em relacao a uma dessas normas o e tambem em relacao as outrasduas.

Proposicao 116. O espaco metrico([ 0, 1 [, k

)e compacto.

Prova: De fato, sendo o mesmo completo (prop. 99, p. 426) e suficientemostrar que e totalmente limitado. Sendo [ 0, 1 [ totalmente limitado noespaco (R, µ), segue que, dado ε > 0 arbitrario podemos, selecionar n pon-tos: x1 , x2 , x3 , . . . , xn em [ 0, 1 [ de sorte que

[ 0, 1 [⊂ Bµ(x1 ; ε) ∪Bµ(x2 ; ε) ∪ · · · ∪Bµ(xn ; ε)

Pelo lema 6 (p. 425) temos que Bµ

(xi ; ε

)⊂ B

k(xi ; ε), (i = 1, 2, . . . , n).

Portanto

[ 0, 1[⊂n⋃

i=1

(xi ; ε

)⊂

n⋃

i=1

Bk

(xi ; ε

)

Sendo([ 0, 1 [, k

)completo e totalmente limitado, resulta tambem com-

pacto. �

Apos esta prova concebemos uma outra mais direta. De fato, sendo(xn) uma sequencia arbitraria em [ 0, 1 [ podemos mostrar que esta possuiuma subsequencia convergente. Com efeito, (xn) e tambem uma sequenciano espaco compacto ([ 0, 1 ], µ) e, portanto, possui uma subsequencia (xn

k)

convergente. Sendo assim, (xnk) tambem converge no espaco

([0, 1[, k

).

Corolario . Os quadrados([ 0, 1 [× [ 0, 1 [, Di

)sao compactos.

9.3 Distancia Entre Conjuntos Compactos

Na p. 51 tivemos a oportunidade de calcular a distancia entre os sub-conjuntos X = [ 1, 3 ] e Y = ] 5, 7 ] no espaco (R, µ). Encontramos

D(

[ 1, 3 ]; ] 5, 7 ])

= 2.

Vamos calcular a distancia entre o ponto p = 3 ∈ X e o subconjunto Y :

d(p, Y ) = inf{d(p, y) : y ∈ Y

}

d(3, Y ) = inf{d(3, y) : y ∈ Y

}

= inf{|3− y| : 5 < y ≤ 7

}

497

Page 499: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Entao,

5 < y ≤ 7 ⇔ 2 < y − 3 ≤ 4 ⇔ 2 < |y − 3| ≤ 4

⇔ |y − 3| ∈ ] 2, 4 ]

⇔ d(1, Y ) = 2.

Resultando,

D(

[ 1, 3 ]; ] 5, 7 ])

= d(1; ] 3, 4 ]

)

Isto e, encontramos um ponto no conjunto X que proporciona a distanciaentreX e Y . Isto aconteceu em virtude de queX e compacto. Este fenomenopode ser generalizado para todos os espacos metricos. Este e o conteudo daproxima proposicao.

Proposicao 117. Seja (M, d) um espaco metrico e K ⊂M um subconjuntocompacto. Se X ⊂M , entao existe p ∈ K de modo que D(K, X) = d(p, X).

(M, d)

K Xsp ν

Prova: Antes devemos lembrar:

D(K, X) = inf{d(k, x) : k ∈ K e x ∈ X

}

d(p, X) = inf{d( p, x) : x ∈ X

}

Inicialmente observe que se p ∈ K entao

{d(p, x) : x ∈ X

}⊂{d(k, x) : k ∈ K e x ∈ X

}

portanto (prop. 145, p. 611)

inf{d(k, x) : k ∈ K e x ∈ X

}≤ inf

{d( p, x) : x ∈ X

}

isto e, d(p, X) ≥ D(K, X).Pois bem, seja ν = D(K, X) ≥ 0. Pela definicao de inf, ν e a maior das

cotas inferiores do conjunto{d(k, x) : k ∈ K e x ∈ X

}; portanto para

todo n natural, ν + 1n nao pode ser cota inferior deste conjunto. Isto e o

mesmo que afirmar (lema 11, p. 609) a existencia de kn ∈ K e xn ∈ X tais que

ν ≤ d(kn , xn

)< ν +

1

n

498

Page 500: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Consideremos a sequencia (x1 , x2 , . . . , xn , . . .) e seja A = {xn : n ∈ N }o conjunto dos seus termos. Existem duas alternativas:

(i) A e finito.Neste caso existe p ∈ K tal que xn = p a partir de uma certa posicao

n. Afirmamos que D(K, X) = d(p, X). De fato, suponha, ao contrario, qued(p, X) > D(K, X), sendo assim existe δ > 0 de modo que d(p, X) = ν+ δ,e escolhamos um numero natural m satisfazendo xm = p e 1

m < δ2 . Sendo

assim, temos

ν + δ = d(p, X) = d(xm , X) ≤ d(xm , ym) < ν +1

m< ν +

δ

2

o que e absurdo.

(ii) A e infinito.

Da compacidade de K resulta que existe uma subsequencia (xnk) de

(xn) tal que lim xnk= p ∈ K. Afirmamos que D(K, X) = d(p, X). De

fato, suponha, ao contrario, que d(p, X) > D(K, X), sendo assim existeδ > 0 de modo que d(p, X) = ν + δ. Da convergencia xn

k−→ p decorre

que a bola B(p; δ2

)contem infinitos termos da sequencia (xn). Escolhamos

xm ∈ B(p; δ2

)de modo que 1

m < δ2 . Sendo assim,

d(p, xm) + d(xm , ym) <δ

2+ ν +

1

m<δ

2+ ν +

δ

2

= ν + δ = d(p, X) ≤ d(p, ym).

Esta contradicao com a desigualdade triangular encerra a demonstracao.

(M,d)

K Xrp

rxm rymd(p, ym)≤ d(p, xm) + d(xm , ym)

Corolario 43. Seja (M, d) um espaco metrico e K ⊂ M um subconjuntocompacto. Se X ⊂ M e um subconjunto fechado tal que X ∩K = ∅, entaoD(K, X) > 0.

Prova: Faremos uso da tecnica (T− 4) (p. 571). Facamos

H1 : K compacto ∧ X fechado.⇒ T: D(K,X) > 0

H2 : K ∩X = ∅.

499

Page 501: Gentil Lopes - Espaços Métricos

H1 ∧ T =⇒ H2

Suponhamos K compacto, X fechado e D(K, X) = 0. Entao, pelaproposicao 117, existe um ponto p ∈ K satisfazendo d(p, X) = 0. Pelaproposicao 40 (p. 211) somos informados de que p ∈ X . Como p ∈ K eX = X, resulta p ∈ K ∩X, o que contradiz H2 . �

Mostraremos agora que a distancia entre dois subconjuntos compactos deum dado espaco metrico, pode ser expressa pela distancia entre dois pontos:um de cada desses subconjuntos.

Corolario 44. Seja (M, d) um espaco metrico e K, ⊂ M subconjuntoscompactos. Entao existem p ∈ K e q ∈ tais que D(K, ) = d(p, q).

Prova: Como K e compacto a proposicao 117 nos diz que existe umponto p ∈ K satisfazendoD(K, ) = d(p, ). Como e compacto a mesmaproposicao nos diz que existe um ponto q ∈ satisfazendo D

(, { p }

)=

d(q, { p }

). Tendo em conta que

D(, { p }

)= inf

{d(x, y) : x ∈ e y ∈ { p }

}

= inf{d(x, p) : x ∈

}= d(, p

)

e

d({ p }, q

)= inf

{d(x, q) : x ∈ { p }

}= inf

{d( p, q)

}= d(p, q)

decorre que D(K, ) = d(p, q). �

9.4 Numero de Lebesgue Para Coberturas

Proposicao 118. Seja (M, d) um espaco metrico compacto. Se A = {Aλ}λ∈L

e um recobrimento aberto de M , entao existem um numero real δ > 0 e umaberto Aν ∈ A tais que para todo x ∈M vale a inclusao B(x; δ) ⊂ Aν .

Comentario: O numero δ > 0 serve para todos os pontos x ∈M . O que podemudar de ponto para ponto de M e o elemento Aν da famılia A = {A

λ}λ∈L

.Ou ainda: o raio da bola B(x; δ) e o mesmo para todo x ∈ M . Agoradependendo do x ∈M , B(x; δ) vai estar contido num ou noutro Aν ∈ A.

A seguir destacamos, em sımbolos, a tese e sua negacao:

∃ ∀: ∃ (Aν ∈A ) ⇒ B(x; δ)⊂Aνδ>0 x∈M ν ∈L

∀ :∃ ∀ (Aν ∈A ) ∧ B(x; δ) 6⊂Aνδ>0 x∈M ν ∈L

500

Page 502: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Supondo falsa a tese, para todo δ > 0 existe x ∈ M de modo queB(x; δ) 6⊂ A

λ, para todo ındice λ ∈ L. Sendo assim, existe uma sequencia

(x1 , x2 , . . .) de pontos de M de modo que

B(x1 ; 1) 6⊂ Aλ, ∀λ ∈ L;

B(x2 ;

12

)6⊂ A

λ, ∀λ ∈ L;

B(x3 ;

13

)6⊂ A

λ, ∀λ ∈ L;

...

Quanto ao conjunto {xn : n ≥ 1 } dos termos da sequencia (xn) podemocorrer duas possibilidades:

(i) X = {x1 , x2 , . . . } e finito.

Neste caso existe p ∈ X tal que xn = p a partir de uma certa posicao n.Como p ∈ M ⊂ ∪A

λ, entao p ∈ Aν para algum ındice ν ∈ L, e como Aν e

aberto existe r > 0 de modo que

p ∈ B(p; r) ⊂ Aν

Escolhendo um ındice m tal que xm = p e 1m < r, teremos:

B(xm;

1

m

)⊂ B(p; r) ⊂ Aν

Isto contradiz o fato de que B(xm ;

1m

)6⊂ A

λpara todo A

λna cobertura A.

(ii) X = {x1 , x2 , . . . } e infinito.

Da compacidade de M resulta que existe uma subsequencia (xnk) de

(xn) tal que limxnk= p ∈ M . Como p ∈ M ⊂ ∪A

λ, entao p ∈ Aν para

algum ındice ν ∈ L, e como Aν e aberto existe r > 0 de modo que

p ∈ B(p; r) ⊂ Aν (9.3)

Como lim xnk= p existem (prop. 8, p. 142) infinitos pontos deX = {x1 , x2 , . . . }

na bola B(p; r2

), entao podemos escolher um ındice m de modo que

xm ∈ B(p;r

2

)e

1

m<r

2

Afirmamos,

B(xm ;

1

m

)⊂ B(p; r)

De fato, seja y ∈ B(xm ;

1m

), isto e, d(y, xm) <

1m , entao

d(y, p) ≤ d(y, xm) + d(xm , p)

<1

m+r

2< r

501

Page 503: Gentil Lopes - Espaços Métricos

o que garante y ∈ B(p; r). Utilizando (9.3) obtemos

B(xm ;

1

m

)⊂ B(p; r) ⊂ Aν .

Isto contradiz o fato de que B(xn ;

1n

)6⊂ A

λpara todo A

λna cobertura A.

Corolario 45. Seja (M, d) um espaco metrico compacto e A = {Aλ}λ∈L

um recobrimento aberto de M . Entao existe um numero real δ > 0 tal que,para todo subconjunto X de M , com diam X < δ, existe um aberto Aν ∈ Ade modo que X ⊂ Aν .

(M, d)

X

∃ δ> 0 : ∀X⊂M (diamX<δ) ⇒ ∃Aν∈A : X⊂Aν .

Prova: Pela proposicao 118 existe δ > 0 de modo que para todo x ∈M sepode obter um aberto Aν em A com B(x; δ) ⊂ Aν (⋆).

Sejam X ⊂M com diam X < δ e p ∈ X. Entao, de

diam(X) = sup{d(x, y) : x, y ∈ X

}< δ

decorre,

d(x, y) < δ, ∀x, y ∈ X.

Como p ∈ X, tomando y = p, obtemos

∀x ∈ X, d(x, p) < δ ⇒ X ⊂ B( p; δ)

Tendo em conta (⋆), resulta X ⊂ B( p; δ) ⊂ Aν . �

Devido ao corolario anterior faz sentido a seguinte:

Definicao 63 (Numero de Lebesgue de uma Cobertura). Seja (M, d) umespaco metrico compacto e A = {A

λ}λ∈L

uma cobertura aberta deM . Diz-seque um numero δ > 0 e um numero de Lebesgue para a cobertura A quandotodo subconjunto X ⊂ M com diametro menor do que δ esta contido emalgum Aν da cobertura.

Obviamente que se δ e um numero de Lebesgue de uma cobertura e0 < δ′ < δ, entao δ′ tambem e um numero de Lebesgue da mesma cobertura.

502

Page 504: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Compacidade e Continuidade Uniforme

Proposicao 119. Sejam (M, d1) e (N, d2) espacos metricos. Se (M, d1)e compacto entao toda aplicacao contınua f : M −→ N e uniformementecontınua.

Isto e, para todo ε > 0 dado arbitrariamente, existe δ(ε) > 0 tal que (p. 288)

∀x, y ∈M, d1(x, y) < δ(ε) ⇒ d2

(f(x), f(y)

)< ε.

Daremos duas provas desta proposicao:

1a) Prova: Como f : M −→ N e uma aplicacao contınua, dado ε > 0, paracada x ∈M existe em correspondencia um δ(x, ε) > 0 tal que

∀ y ∈M com d1(x, y) < δ(x, ε) ⇒ d2

(f(x), f(y)

)<

1

2ε (9.4)

A famılia de bolas abertas{

B(x;

1

2δ(x, ε)

): x ∈M

}

e uma cobertura aberta deM ; logo, existe uma subcobertura finita, digamos

{

B(x1 ;

1

2δ(x1 , ε)

), B(x2 ;

1

2δ(x2 , ε)

), . . . , B

(xn ;

1

2δ(xn , ε)

) }

Facamos, δ(ε) = min{

12 δ(x1 , ε),

12 δ(x2 , ε), . . . ,

12 δ(xn , ε)

}e sejam

x, y ∈M com d1(x, y) < δ(ε).

Para algum ındice k ∈ { 1, 2, . . . , n }, x ∈ B(x

k; 12 δ(xk

, ε)). Sendo assim,

d1(x, xk) < 1

2 δ(xk, ε).

Com o auxılio desta desigualdade obtemos duas outras:

(i) por (9.4): d2

(f(x), f(x

k))< 1

2 ε.

(ii)

d1(xk, y) ≤ d1(xk

, x) + d1(x, y)

<1

2δ(x

k, ε) + δ(ε),

como δ(ε) ≤ 12 δ(xk

, ε) obtemos d1(xk, y) < δ(x

k, ε). Por conseguinte (9.4)

nos fornece

d2

(f(x), f(y)

)≤ d2

(f(x), f(x

k))+ d2

(f(x

k), f(y))

)

<1

2ε+

1

2ε = ε

Isto prova que f e uniformemente contınua sobre M . �

503

Page 505: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2a) Prova: Como f : M −→ N e uma aplicacao contınua, dado ε > 0, paracada x ∈M existe uma bola aberta B

(x; δ(x, ε)

)de modo que

∀ y ∈ B(x; δ(x, ε)

)⇒ f(y) ∈ B

(f(x);

1

3ε)

(9.5)

A famılia de bolas abertas

A ={

B(x; δ(x, ε)

): x ∈M

}

e uma cobertura aberta deM ; logo − pela compacidade deM − existe umasubcobertura finita, digamos

B ={

B(x1 ; δ(x1 , ε)

), B(x2 ; δ(x2 , ε)

), . . . , B

(xn ; δ(xn , ε)

)}

e, pelo corol. 45 (p. 502), a cobertura B possui um numero de Lebesgue δ > 0.

Sejam agora x, y ∈M com d1(x, y) < δ. Como (comentario apos prop. 118, p.

500)

diam({x, y}

)= sup

{d1(x, y) : x, y ∈ {x, y }

}= d1(x, y) < δ

implica que {x, y } esta contido em um membro B(x

k; δ(x

k, ε))da cober-

tura B. Por conseguinte, por (9.5), temos

{y ∈ B

(x

k; δ(x

k, ε))

x ∈ B(x

k; δ(x

k, ε)) ⇒

{f(y) ∈ B

(f(x

k); 1

3 ε)

f(x) ∈ B(f(x

k); 1

3 ε)

Como

diam(

B(f(x

k);

1

3ε))

≤ 2 · 13ε ⇒ d2

(f(x), f(y)

)≤ 2 · 1

3ε < ε

Isto prova que f e uniformemente contınua sobre M . �

9.5 Espacos Localmente Compactos

Definicao 64 (Espacos localmente compactos). Um espaco metrico (M, d)e localmente compacto se, e somente se, cada ponto de M possui uma vi-zinhanca compacta.

De outro modo: Dizemos que um espaco metrico (M, d) e localmente com-pacto quando, para todo x ∈M , existe um compacto K, com x ∈ int K.

Um subconjunto N ⊂ M e localmente compacto quando o subespaco(N, d) o for.

504

Page 506: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) O espaco (R, µ) e localmente compacto. De fato, dado p ∈ R tomamosK = [ p − 1, p + 1 ] e temos p ∈ int K = ] p − 1, p + 1 [. Sendo K umsubconjunto fechado e limitado de (R, µ), K e compacto; portanto K e umavizinhanca compacta de p em (R, µ) e (R, µ) resulta localmente compacto.

Vemos assim, que um espaco localmente compacto nao e necessariamentecompacto. Por outro lado, como um espaco metrico e sempre uma vizi-nhanca de cada um de seus pontos, a recıproca e verdadeira.

2) Todo espaco (M, d) discreto e localmente compacto.

De fato, cada ponto e uma vizinhanca compacta de si mesmo. Veja osexemplos 4 (p. 479) e 4 (p. 201).

3) Os espacos(Rn, Di

)(i = 1, 2, 3.) sao localmente compactos.

De fato, dado p ∈ Rn, tomamos K = B[ p; 1 ] e temos p ∈ int K =B(p; 1). Sendo K um subconjunto fechado e limitado de

(Rn, Di

), K e

compacto; portanto K e uma vizinhanca compacta de p em(Rn, Di

)e

(Rn, Di

)resulta localmente compacto.

Proposicao 120. Seja (M, d) localmente compacto. Se F ⊂ M e fechadoentao F e localmente compacto.

Prova: Dado um ponto p ∈ F , como (M, d) e localmente compacto,existe um compacto K em (M, d) com p ∈ int K.

p ∈ int K ⇒ ∃ r > 0: B(p; r) ⊂ K⇒ ∃ r > 0: B(p; r) ∩ F ⊂ K ∩ F⇒ ∃ r > 0: B(p; r) ⊂ K ∩ F⇒ p ∈ int (K ∩ F ) (no subespaco (F, d)).

Vamos mostrar agora queK∩F e compacto. De fato, K sendo compacto,e fechado em (M, d). Portanto K ∩ F e fechado

(em (M, d)

)por ser a

interseccao de dois fechados. Isto e,

K ∩ F = (K ∩ F )(M,d)

Pelo corolario 3 (p. 207) podemos escrever

K ∩ F = (K ∩ F )(M,d)

= (K ∩ F )(K, d)

Logo, K ∩ F e um subconjunto fechado no subespaco compacto (K, d),portanto, compacto (prop. 106, p. 480). Em resumo: K ∩ F e uma vizinhancacompacta de p em F , sendo assim F resulta localmente compacto. �

505

Page 507: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 121. Seja f : (M, d1)→ (N, d2) aberta, contınua e sobrejetiva.Se (M, d1) e localmente compacto entao (N, d2) tambem o e.

Prova: De fato, seja q ∈ N , como f e sobrejetiva, existe p ∈M de modoque f(q) = p. Como (M, d1) e localmente compacto, existe uma vizinhancacompacta Kp de p em M . Entao p ∈ int Kp e Kp e compacto. Como fe aberta, resulta que f

(intKp

)e uma vizinhanca de p = f(q). Por outro

lado, a continuidade de f garante que f(Kp

)e compacto. Ou seja: f

(Kp

)e

vizinhanca compacta de p, resultando que (N, d2) e localmente compacto.

(M, d1 )

rp

Kp

f

(M,d2 )

r q= f(p)

f(Kp)

Proposicao 122. Sejam (M1 , d1), (M2 , d2), . . ., (Mn , dn) espaco metricose M =M1 ×M2 × · · ·×Mn. Entao M e localmente compacto se, e somentese, cada Mi e localmente compacto.

Prova:

(⇒) Seja M localmente compacto. Como as projecoes pi : M → Mi saocontınuas, abertas (p. 286) e sobrejetivas, a proposicao 121 nos assegura queos fatores Mi sao localmente compactos.

(⇐) Reciprocamente, suponhamos que cada Mi e localmente compacto.Entao dado x = (x1 , . . . , xi , . . . , xn) ∈ M , cada xi possui uma vizinhancacompacta Ki em Mi . Entao pelo corolario 42 (p. 495), a vizinhanca K =K1 × · · · ×Kn de x e compacta. Portanto, M resulta localmente compacto.

No decorrer dos anos percebi muitas vezes, na qualidade de fısico depoltrona, lugares em que os calculos fısicos divergem ate o infinito emdistancias extremamente pequenas. Os fısicos sao partidarios de que naose faca a pergunta errada, aquela que proporcione uma resposta infinita.Mas eu sou um matematico, e a cada vez eu me perguntava se a Naturezanao estava realmente tentando nos dizer algo, isto e, que numeros reais econtinuidade constituem uma impostura, e que distancias infinitesimal-mente pequenas nao existem![. . .] Portanto, como voce ve, ha muitas razoes para suspeitar de que nospoderıamos estar vivendo em um universo digital, de que Deus prefereser capaz de copiar coisas de modo exato quando e obrigado, mais do queobter o inevitavel aumento de ruıdo que acompanha o copiar analogico!

(Gregory Chaitin/Metamat!)

506

Page 508: Gentil Lopes - Espaços Métricos

9.6 Representacoes decimais e Curva de Peano

9.6.1 O Mito das ambiguidades nas representacoes decimais

Na presente secao pretendemos por fim as interminaveis pendengas sobreas representacoes decimais de reais do intervalo [ 0, 1 ] − bem como prepararterreno para um assunto posterior: Curva de Peano. Mostraremos, oportu-namente, que as supostas ambiguidades de algumas destas representacoes,tipo: 0, 5 = 1/2 = 0, 4999 . . . sao um mito.

O conceito do eter revelou-se um fantasma criado pela imaginacao dosfısicos do seculo XIX. Neste trabalho mostramos, igualmente, que repre-sentacoes tipo 0, 5 = 1/2 = 0, 4999 . . . nao tem “existencia real”; sao fantas-mas criados pela imaginacao dos matematicos.

Mostraremos que o esclarecimento desta questao − aqui a deixamos as-saz cristalina − vai simplificar, amiude, muitas construcoes matematicas; aexemplo da construcao da curva de Peano. Aqui mostraremos uma cons-trucao desta curva mais simples que as constantes na literatura.

Representacoes decimais

Existem duas alternativas para se definir as representacoes decimais: viaconvergencia de series e via bijecao entre conjuntos.

Para exemplificar a primeira alternativa: (ver [5]/p. 231)

“Antes de definir ϕ, lembremos que os numeros reais admitem naosomente uma expressao decimal como tambem, fixado qualquer numerob > 1, todo numero real possui uma expressao na base b. Em particular, se0 ≤ x ≤ 1, a expressao x = 0, x1x2 . . . xn . . . de x na base b significa que

x =x1

b+x2

b2+ · · ·+ xn

bn+ · · · ”

Ainda mais a frente, nesta mesma pagina, o autor escreve:“Para ver que ϕ e injetiva, basta lembrar que, assim como a representacaodecimal de um numero x ∈ [ 0, 1 ] e unica, exceto por ambiguidades do tipo0, 47999 . . . = 0, 48000 . . .”.

Vejamos mais um exemplo, segundo este autor 0, 011000 . . . e 0, 010111 . . .sao duas representacoes, na base 2, de 3

8 , porquanto

0

21 +1

22 +1

23 +0

24 +0

25 +0

26 +· · · =3

8=

0

21 +1

22 +0

23 +1

24 +1

25 +1

26 +· · · (9.6)

Definicao via bijecao

Construiremos agora uma representacao alternativa para os numerosreais. Vamos nos restringir aos reais do intervalo [ 0, 1 ] uma vez que qual-quer numero real situa-se entre dois inteiros consecutivos, isto e, dado x ∈ R

sucede que x ∈ [m, m+1 ] para algum inteiro m. Em suma, todo real podeser transladado para o intervalo [ 0, 1 ].

507

Page 509: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Tambem vamos nos restringir ao caso da base 2 − base binaria − umavez que o que faremos aqui com respeito a esta base pode ser repetido parauma outra base qualquer.

Para a construcao de uma representacao binaria − para os numeros reais− iremos necessitar do seguinte produto cartesiano:

{ 0, 1 }N = { 0, 1 } × { 0, 1 } × { 0, 1 } × · · ·

Este e o conjunto das sequencias infinitas de 0′s e 1′s.

Por exemplo, dois elementos deste conjunto sao:

1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 . . . e 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . .

Gostariamos de definir uma bijecao entre os conjuntos { 0, 1 }N e [ 0, 1 ],assim:

f :{0, 1

}N −→ [ 0, 1 ]

(xn) 7−→ ∑∞n=1

xn2n

Esta aplicacao esta bem definida uma vez que a serie em questao e ma-jorada pela serie

∑∞n=1

12n

cuja soma e 1 . Infelizmente f nao e injetivaporquanto,

f(x1 . . . xj000 . . .

)= f

(x1 . . . xj−1(xj − 1)111 . . .

)(9.7)

Como e facil verificar. Recıprocamente, supondo f(x) = f(y) e x 6= y vamosmostrar que x = x1 x2 x3 . . . e y = y1 y2 y3 . . . so podem ser da forma dasrepresentacoes que aparecem em (9.7).

Prova: De fato, seja j o primeiro ındice onde x difere de y; suponhamos,ademais, que xj = 1. Sendo assim podemos escrever

x = x1 x2 . . . xj−1 1xj+1 xj+2 . . .

y = x1 x2 . . . xj−1 0 yj+1 yj+2 . . .

Devemos mostrar que

f(x) = f(y) =⇒{

xj+1 = xj+2 = · · · = 0;

yj+1 = yj+2 = · · · = 1.

A igualdade∑∞

n=1xn2n

=∑∞

n=1yn2n

pode ser escrita assim

x1

21 +

x2

22 + · · ·+

xj−1

2j−1 +

1

2j +

xj+1

2j+1 + · · · =

x1

21 +

x2

22 + · · ·+

xj−1

2j−1 +

0

2j +

yj+1

2j+1 + · · ·

Logo,1

2j +xj+1

2j+1 + · · · = yj+1

2j+1 + · · ·

508

Page 510: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Ou ainda,

1

2j +

∞∑

n=j+1

xn

2n =

∞∑

n=j+1

yn2n

como

∞∑

n=j+1

yn2n ≤

1

2j , isto implica em que esta igualdade so podera ser satis-

feita em uma unica situacao; qual seja, aquela em que xn = 0, para n ≥ j+1e yn = 1, para n ≥ j + 1. �

Tendo em vista os argumentos anteriores, resulta injetiva a seguinteaplicacao

λ : B −→ [ 0, 1 ]

(xn) 7−→∑∞

n=1xn2n

onde B e o subconjunto de{0, 1

}Ncujos elementos nao tem todos os termos

iguais a 1, a partir de alguma posicao∗. Por exemplo:

0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . . ∈ B e 1 0 1 0 1 0 0 1 1 1 1 1 . . . 6∈ B

Mostraremos agora que λ e sobre [ 0, 1 [. Seja dado, arbitrariamente,um ponto x ∈ [ 0, 1 [ e mostremos que este e imagem, por λ, de algumasequencia binaria de B. De fato, dividamos o intervalo [ 0, 1 [ ao meio, assim

[ 0, 1 [=

1⋃

j=0

[ j

2,j + 1

2

[

=[0,

1

2

[∪[ 1

2, 1[

sendo assim, x pertence a um, e so um, desses subintervalos, digamos x ∈I1 =

[x12 ,

x1+12

[:

0 12

1p

0 12

1I1

sx

Apos o “corte” se x resulta no subintervalo da esquerda x1 = 0, se, noda direita x1 = 1. No caso da figura temos x1 = 1. A seguir dividamos este

subintervalo em dois outros, assim[x12 ,

x1+12

[

=

1⋃

j=0

[x1

2+j

22 ,x1

2+j + 1

22

[

.

Selecionemos x2 tal que x ∈ I2 =[x12 +

x222,x12 +

x2+1

22

[

.

∗Com a unica excecao feita para a sequencia 1 1 1 1 . . . a qual incluimos neste conjunto.

509

Page 511: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(parentesis:) Observe que o extremo esquerdo deste intervalo, no caso,x12 +

x222 nada mais e que a segunda soma parcial da serie

∑ xn2n (da definicao

de λ). Por exemplo, o extremo esquerdo de I3 seriax12 +

x222

+x323

, a terceirasoma parcial da referida serie.

0 12 1

x1 =0 x1 =1

I1sx

0 14

12 1

x2 =0 x2 =1

34

x2 =0 x2 =1

sx I2

No caso da figura x2 = 0. Dividindo o intervalo [ 0, 1 [ em quatro partesos dois primeiros digitos (x1 x2 . . .) da sequencia que pretendemos associara x, sao as “coordenadas” do ponto x de acordo com o diagrama a seguir:

0 14

12 1

34

0 0 0 1 1 0 1 1

x1 x2

0 00 11 01 1

Resumindo: x1 nos diz em qual metade do intervalo encontra-se x; x1 x2

nos diz em qual quarta parte do intervalo encontra-se x.

Este processo de divisoes sucessivas e continuado indefinidamente. Con-sideremos In o intervalo fechado com os mesmos extremos de In . Observeque ( In ) e uma sequencia de intervarlos que cumpre as hipoteses do teoremados intervalos encaixantes (p. 604), por conseguinte ∩∞n=1 In consiste em umunico ponto. Como x ∈ ∩∞n=1 In , resulta que a sequencia formada pelasextremidades esquerdas dos In converge para x, isto e,

∑∞n=1

xn2n

= x. Sendoassim tomamos a sequencia binaria (x1 x2 x3 . . .) para corresponder a x.

Resulta assim que λ e uma bijecao e, desta forma, podemos identificaros elementos de ambos os conjuntos: [ 0, 1 ] e B.

λ : B −→ [ 0, 1 ]

(xn) 7−→∑∞

n=1xn2n

510

Page 512: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicao de representacao binaria

λ sendo uma bijecao possui inversa λ−1 : [ 0, 1 ]→ B. A imagem de umx ∈ [ 0, 1 ] por λ−1 e o que chamamos de representacao binaria de x. Istoe, diremos, por definicao, que uma representacao binaria e um elemento deB. Sendo assim, por exemplo, 1 0 1 0 1 0 . . . e uma representacao binaria,enquanto 0 1 0 1 1 1 1 . . . nao. Dizemos que os numeros do intervalo [ 0, 1 ]sao codificados pelos elementos de B.

Mais uma alternativa para se definir representacao

O que aconteceria se, na construcao anterior, optarmos por abrir todosos subintervalos a esquerda?, por exemplo assim:

0 18

14

38

12

58

34

78

1

000 001 010 011 100 101 110 111x1 x2 x3

Observe que com esta escolha estamos optando pelas codificacoes:

x = 18 ⇒ x ∈

]0, 1

8

]⇒ 1

8 = 000 1 1 1 . . .

x = 14 ⇒ x ∈

]18 ,

14

]⇒ 1

4 = 001 1 1 1 . . .

x = 34 ⇒ x ∈

]58 ,

34

]⇒ 3

4 = 101 1 1 1 . . .

x = 78 ⇒ x ∈

]34 ,

78

]⇒ 7

8 = 110 1 1 1 . . .

Procedendo como na construcao anterior podemos mostrar que a aplicacao,

λ : B −→ ] 0, 1 ]

(xn) 7−→∑∞

n=1xn2n

resulta injetiva. Onde, B e o subconjunto de{0, 1

}Ncujos elementos nao

tem todos os termos iguais a 0, a partir de alguma posicao. Se incluirmosa sequencia 0 0 0 0 . . . em B podemos fechar o intervalo unitario a esquerda.Pelo teorema dos intervalos encaixantes, resulta que λ e tambem sobrejetiva,portanto,

λ : B −→ [ 0, 1 ]

(xn) 7−→∑∞

n=1xn2n

e uma bijecao. Deste modo, temos duas alternativas para definir repre-sentacoes (codificacoes) binarias. Por exemplo,

3

8= 0 1 1 0 0 0 . . . ou

3

8= 01 0 1 1 1 . . .

dependendo se optarmos pela bijecao λ ou λ, respectivamente.

511

Page 513: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Duplicidade × Ambiguidade

Ha que se fazer distincao entre duplicidade e ambiguidade nas repre-sentacoes binarias (ou decimais). Duplicidade significa, precisamente, quetemos duas opcoes para definir representacoes; ambiguidade significa quenao optamos, ficamos com as duas representacoes simultaneamente.

− Entendemos uma representacao (binaria no caso) como uma codi-ficacao dos elementos de um conjunto (no caso [ 0, 1 ]) pelos elementos deum outro conjunto (no caso B ou B), esta codificacao se da justamente viabijecao.

Importante! O leitor, com um pouco de reflexao, ha de concluir que aexistencia da representacao (bijecao) so sera possıvel se a opcao for feita(geometricamente significa que devemos optar por um dos diagramas: aber-tos a esquerda ou a direita) − caso contrario nao havera bijecao e, emdecorrencia, nao podera haver representacao. Ora, uma vez feita a opcao,as ambiguidades deixam de existir − tornam-se meros fantasmas a assom-brar criancinhas desavisadas.

Adendo: Vou insistir, de uma outra perspectiva, na diferenca entreambiguidade e duplicidade, desta vez me valendo de uma analogia com a in-formatica. Vejo a questao da representacao (decimal, binaria, . . . ) dos reaisalgo similar ao que acontece com a codificacao dos caracteres do teclado deum computador, que sao codificados pela tabela ASCII, por exemplo (p. 34):

A s< s

3 s...

α

α−1

Teclado { 0, 1 }8

s0 1 0 0 0 0 0 1s0 0 1 1 1 1 0 0s0 0 1 1 0 0 1 1

...

O fato de existirem varias possibilidades para a codificacao dos caracteresde um computador nao inviabiliza∗ a informatica; isto significa, tao somente,que devemos optar por uma dentre estas varias possibilidades.

Enfatizo: A diferenca entre ambas e que na ambiguidade − no que osmatematicos crem − um numero e codificado de dois modos distintos e naduplicidade, apenas de um modo − embora tenhamos duas alternativas anossa escolha.

∗E nem complica, como acontece na matematica com algumas construcoes que depen-dem de representacoes (codificacoes), a exemplo da Curva de Peano. Neste particular, osengenheiros de hardware foram mais inteligentes que os matematicos. Isto e, fixaram umadas − possıveis − codificacoes e pronto!

512

Page 514: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De outro modo: Ambiguidade seria, por exemplo, se a letra A tivesseduas codificacoes. No caso da informatica existe nao duplicidade mas multi-plicidade, uma vez que podemos codificar um caracter de inumeros modos.Mas o que acontece e que na informatica nao se ouve falar de ambiguidadena representacao de um caracter, simplesmente porque todos os fabricantesoptaram por uma unica codificacao; caso contrario a informatica se tornariainviavel: alguem digitaria a letra A em um email e o destinatario receberiaa letra B, por exemplo, uma verdadeira torre de babel.

Aproveitando este exemplo, observe que a eliminacao da ambiguidade(multiplicidade) traz vantagens, simplificacoes; e precisamente isto que es-tou defendendo que deva ocorrer na matematica no que diz respeito as repre-sentacoes que nada mais sao que codificacoes para os numeros reais.

Conclusao: Quando dizemos o “mito das ambiguidades” ou “fantasmas dasambiguidades” entendemos que as ambiguidades (fantasmas) de fato exis-tem apenas se adotamos a definicao de representacoes via convergencia deseries, caso contrario nao.

Com efeito, pela alternativa das bijecoes surge uma duplicidade (naoambiguidade), uma vez que optemos por uma das bijecao, λ ou λ, a repre-sentacao torna-se unica.

Por oportuno, na referencia [9]/p. 60 o autor define a representacao dosinteiros via bijecao. Na p. 62 lemos:

“A justificativa da validade da representacao acima se apoia no Teo-rema 7 que nos garante ser uma bijecao a funcao

Z+b −→ Z+

xn . . . x0 7−→ c0 + · · ·+ cn · bn

onde Z+b e o conjunto dos elementos da forma xn . . . x0 , com xn 6= 0 se n > 1

e onde para cada i, tem-se que ci e o inteiro correspondente ao sımbolo xi .”

De igual modo deve suceder na representacao dos reais; digo, se escol-hermos definir via bijecao entao somos forcados a optar entre duas bijecoespossıveis; caso nao optemos, insistimos, nao havera bijecao e, por con-seguinte, nao havera representacao; a nao ser via series como faz o autorja referido ( [5] ) mas aı surge o inconveniente das ambiguidades (fantas-mas). . . e uma questao de pura logica (inteligencia!).

Nossa perspectiva e a literatura

No que se segue vamos considerar, a exemplo das representacoes binarias,as seguintes representacoes (bijecoes) decimais:

λ : D −→ [ 0, 1 ]

(xn) 7−→∑∞

n=1xn10n

513

Page 515: Gentil Lopes - Espaços Métricos

onde D e o subconjunto de{0, 1, 2, . . . , 9

}Ncujos elementos nao tem todos

os termos iguais a 9, a partir de alguma posicao∗. Observe que, neste caso,.4999 . . . nao e a representacao decimal de 1

2 .

Tambem,

λ : D −→ [ 0, 1 ]

(xn) 7−→∑∞

n=1xn10

n

onde D e o subconjunto de{0, 1, 2, . . . , 9

}Ncujos elementos nao tem todos

os termos iguais a 0, a partir de alguma posicao†. Observe que, neste caso,.4999 . . . e a representacao decimal de 1

2 .

• No livro “Meu Professor de Matematica” (4a Edicao) o Prof. Elon LagesLima, trata das representacoes decimais. Vejamos, a luz de nossas consi-deracoes, a analise de alguns pontos considerados pelo autor (p. 162):

7.Duvidas sobre dızimas

. . . Duas das mais interessantes entre essas perguntas foram feitas porSun Hsien Ming, de Sao Paulo, SP.

Elas sao:

1a) Existe alguma fracao ordinaria tal que, dividindo-se o numerador pelodenominador, obtenha-se a dızima periodica 0, 999 . . .?

No nosso entendimento existe um equıvoco tanto na pergunta quantona resposta, precisamente devido ao mito de se cre que 0, 999 . . . seja umnumero. Com efeito, o Prof., argumenta: “Se a e b forem numeros naturaiscom a/b = 0, 999 . . .”

− Ja vimos (p. 167) que 0, 999 . . . e uma serie e nao um numero, por con-seguinte nao faz sentido a divisao de dois numeros resultar em uma serie;sao objetos (entes) de naturezas distintas.2a) O fato de a mesma fracao ordinaria poder ter duas representacoes deci-mais distintas (como 2/5 = 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . .) nao apresenta inconve-niente nem origina paradoxos?

Uma boa pergunta. No nosso entendimento achamos que o Prof. Elonusa de tergiversacao ao tentar responde-la, como o leitor pode verificar lendosua resposta no citado livro. No final da argumentacao lemos:

“Nenhuma dessas escolhas e muito natural.”

Nao sei o que o prof. entende por “muito natural”, porquanto do pontode vista da logica as duas sao igualmente naturais, basta que optemos poruma das bijecoes: λ ou λ.

∗Com a unica excecao feita para a sequencia (9 9 9 9. . . ) a qual foi incluıda nesteconjunto.

†Com a unica excecao feita para a sequencia (0 0 0 0. . . ) a qual foi incluıda nesteconjunto.

514

Page 516: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Em seguida: “Por isso me parece mais razoavel que nos resignemos coma falta de biunivocidade. Ha coisas piores no mundo.”

Este nao me parece um conselho muito sabio, embora em um ponto oProf. tenha razao, de fato ha coisas piores no mundo: as bombas sobrehiroshima e nagasaki, ou a proliferacao, em nosso paıs, de surrupiadores doscofres publico, por exemplo.

− Eu diria que nos nao devemos nos “resignar” com a falta de biunivo-cidade mas, sim, nos “rejubilar” pelo excesso; pelo contrario, existe excesso:existem duas aplicacoes biunivocas (λ e λ ).

De nossa perspectiva respondemos a Sun Hsien Ming: a dupla igual-dadade 2/5 = 0, 4000 . . . = 0, 3999 . . . e valida apenas do ponto de vista deconvergencia de series, do ponto de vista das representacoes decimais ela efalsa∗, nao tem sustentacao logica. O correto e,

2/5 = 0, 4000 . . . , se escolhermos λ,

ou,2/5 = 0, 3999 . . . , se escolhermos λ.

Infinito atual × Infinito potencial

A nossa exegese (sobre as representacoes) poderia ainda levar em contaa controversa questao dos infinitos potencial e atual, nao nos esten-deremos mais, apenas a este respeito citaremos a referencia†, na qual lemos:

“O prıncipe dos matematicos, Carl Friedrich Gauss (1777 − 1855), ex-pressando um sentimento compartilhado pela comunidade matematica desua epoca, escreveu, por exemplo: “Eu contesto o uso de um objeto infinitocomo um todo completo; em matematica, essa operacao e proibida; o infinitoe so um modo de dizer” .

Isto tem a ver com: (p. 173)

limn→∞

αn = 1 ⇔ α∞ = 0, 999 . . . = 1

limn→∞

pn = σ ⇔ p∞ = σ

Os infinitos, α∞ e p∞ , “sao apenas modos de dizer”. Ou ainda:

0, 999 . . . 9︸ ︷︷ ︸

infinito potencial

⇒ 0, 999 . . .︸ ︷︷ ︸

infinito atual

A passagem do infinito potencial para o infinito atual “e apenas um modode dizer. . . ” (p. 177)

∗Ver Importante! na pagina 512.†Scientific American - Edicao Especial - As diferentes faces do infinito/p. 18.

515

Page 517: Gentil Lopes - Espaços Métricos

9.6.2 A curva de Peano

A eliminacao dos fantasmas das ambiguidades nas representacoes binariasnos facultou, de imediato, tres vantagens:

1a ) Simplificacao numa das construcoes da curva de Peano. De fato, naconstrucao desta curva constante em [5] o autor se utiliza − para contornaras supostas ambiguidades − de duas bases de representacoes: a binaria e aternaria, alem do conjunto de Cantor. Em nossa construcao dispensamos abase tres e o conjunto de Cantor.

2a ) A construcao de uma nova patologia: o quadrado hipermagico, umaespecie de “inversa” da curva de Peano.

3a ) A construcao de uma curva de Peano inedita, desta vez no quadrado[ 0, 1 [× [ 0, 1 [.

O seculo XIX se iniciou com a descoberta de que curvas e funcoes naoprecisam ser do tipo bem comportado, o que ate entao se supunha. Peano∗

em 1890 mostrou ate que ponto a matematica podia insultar o senso co-mum quando, tratando do aprofundamento dos conceitos de continuidade edimensao, publica a sua famosa curva, proposta como cobrindo totalmenteuma superfıcie plana quadrangular.

A curva de Peano hoje possui aplicacoes em compressao de imagens digi-tais, aqui sugerimos uma aplicacao desta curva− em conexao com uma outrapatologia por nos construida − na teoria das supercordas, no que concernea transferencia de objetos entre dimensoes arbitrarias.

Definicao 65 (Curva de Peano). Chama-se curva de Peano num espacometrico (M, d) a uma aplicacao contınua χ : I→M tal que χ

(I)=M .

Por exemplo, de momento iremos construir a seguinte curva de Peano:

0

1

rr

χ

0 1

1 (1,1)

χ : [ 0, 1 ] −→ [ 0, 1 ]× [ 0, 1 ]

∗Giuseppe Peano (1858 − 1932), natural de Cuneo, Italia, foi professor da AcademiaMilitar de Turin, com grandes contribuicoes a Matematica. Seu nome e lembrado hojeem conexao com os axiomas de Peano dos quais dependem tantas construcoes rigorosasda algebra e da analise.

516

Page 518: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Uma construcao simplificada da curva de Peano

Inicialmente vamos definir a seguinte aplicacao

Ψ: [ 0, 1 ] −→ B

x 7−→ (xn)

0

1

x r rB

(xn )Ψ

Onde associamos a cada x ∈ [ 0, 1 ] sua representacao na base binaria.Ψ e uma bijecao. De fato, e injetiva porquanto se x 6= y, como a repre-

sentacao binaria e unica∗, resulta que (xn) 6= (yn), isto e, Ψ(x) 6= Ψ(y).E sobrejetiva, porquanto dado (xn) ∈ B esta e imagem, por Ψ, de

x =∑ xn

2n∈ [ 0, 1 ]. Portanto Ψ admite inversa: Ψ−1.

Para mostrar que a aplicacao

Ψ:([ 0, 1 ], µ

)−→

(B, ν

)

x 7−→ (xn)

e contınua, vamos mostrar inicialmente que sua inversa:

Ψ−1 :(B, ν

)−→

([ 0, 1 ], µ

)

(xn) 7−→ x

e contınua. Mas isto ja foi feito, tendo em conta o exemplo (ii) (p. 249) e ocorolario 9 (p. 271). Agora com o auxılio do corolario 40 (p. 485) concluimosque Ψ e contınua. Ou melhor: Ψ e um homeomorfismo.

No que segue necessitaremos dos seguintes conceitos

Multiplexacao e Demultiplexacao

Multiplexacao e o nome de uma operacao muito comum a nıvel de hard-ware em computacao e telefonia. Vejamos em que consiste: uma mensagemem computacao e codificada em uma sequencia de digitos binarios. Quandoduas ou mais mensagens necessitam trafegar em um unico canal − umaunica via − utiliza-se do recurso ilustrado na figura a seguir:

∗Uma vez feita a escolha da representacao esta passa a ser unica, como ja argumenta-mos. Por sinal vamos optar pela representacao λ, ver p. 511.

517

Page 519: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A

Z

...0 1 0 0 0 0 0 1 ... 0 1 0 0 0 0 0 1

...0 1 0 1 1 0 1 0 ... 0 1 0 1 1 0 1 0

... 0 0 1 1 0 0 1 0 1 0 0 0 1 0 0 1

∼ rցր ց

րTX RX

Na figura estamos transmitindo as letras A e Z (tabela ASCII). Natransmissao (TX) as duas sequencias binarias sao entrelacadas (multiple-xadas); isto e, a sequencia a ser transmitida, no unico canal, e formada peloprimeiro bit de A, seguido pelo primeiro bit de Z, seguidos pelo segundo bitde A, seguido pelo segundo bit de Z, e assim sucessivamente. Na recepcao(RX) dar-se-a o procedimento inverso (demultiplexacao).

Com esse “truque” milhares de pessoas, em localidades distantes, podemse comunicar utilizando-se de um unico canal − suas mensagens (voz, ima-gem, musica, email, etc.) sao codificadas em sequencias binarias.

• Agora vamos definir uma aplicacao (η), assim:

η : B {0, 1}N × {0, 1}N

(xn)(η1(xn), η2(xn)

)

B {0, 1}N

{0, 1}N

q(xn )

q:η

(η1 ,η2 )

Onde ηi : B −→ {0, 1}N (i = 1, 2) sao dadas por

η1((xn)

)= η1(x1x2x3 . . .) = x1 x3 x5 . . .

η2((xn)

)= η2(x1x2x3 . . .) = x2 x4 x6 . . .

Isto e, η1 toma de(xn

)sua subsequencia de ındices ımpares e η2 toma

de(xn

)sua subsequencia de ındices pares:

x1 x2 x3 x4 x5 . . .

x1 x3 x5 x7 . . .

x2 x4 x6 x8 . . .

η1

η2

Ou seja, a aplicacao η demultiplexa a sequencia(xn

).

518

Page 520: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A aplicacao η e injetiva porquanto

η(xn) = η(yn) ⇒(η1(xn), η2(xn)

)=(η1(yn), η2(yn)

)

⇒(x1 x3 x5 . . . , x2 x4 x6 . . .

)=(y1 y3 y5 . . . , y2 y4 y6 . . .

)

⇒ x1 x3 x5 . . . = y1 y3 y5 . . . e x2 x4 x6 . . . = y2 y4 y6 . . .

⇒ (xn) = (yn).

A aplicacao η nao e sobrejetiva. De fato, por exemplo o ponto

(0 1 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 1 . . .) ∈ {0, 1}N × {0, 1}N

nao e imagem de nenhum ponto do domınio (por que?).

Vamos agora envidar esforcos para mostrar que η e contınua. Antesmostraremos que e contınua a seguinte restricao de η:

α : B′ −→ B′ × B′ (9.8)

onde B′ ⊂ B, e tal que:

(xn) ∈ B′ ⇐⇒ suas subsequencias de ındices ımpares e pares pertencem a B.

No apendice (p. 560) mostramos que B′ e compacto e denso.A aplicacao α e uma bijecao. De fato, e injetiva porquanto

α(xn) = α(yn) ⇒(α1(xn), α2(xn)

)=(α1(yn), α2(yn)

)

⇒(x1 x3 x5 . . . , x2 x4 x6 . . .

)=(y1 y3 y5 . . . , y2 y4 y6 . . .

)

⇒ x1 x3 x5 . . . = y1 y3 y5 . . . e x2 x4 x6 . . . = y2 y4 y6 . . .

⇒ (xn) = (yn).

E sobrejetiva porquanto dado (x1 x2 x3 . . . , y1 y2 y3 . . .) ∈ B′×B′ este pontoe imagem, por α, da sequencia x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . ., como e facil verificar.

A inversa da aplicacao α e:

α−1 : B′ × B′ B′

(x1 x2 x3 . . . , y1 y2 y3 . . .) x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . .

De outro modo,

x = x1 x2 x3 x4 . . .

y = y1 y2 y3 y4 . . .

x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . .α−1

A aplicacao α−1

faz uma multiplexagem das sequencias(xn

)e(yn).

519

Page 521: Gentil Lopes - Espaços Métricos

• Para mostrar que a aplicacao

α : B′ B′ × B′

(xn)(α1(xn), α2(xn)

)

e contınua vamos mostrar que sua inversa, α−1, e contınua:

Utilizaremos no produto B′ × B′ a metrica

D3(x, y) = max { d1(x1 , y1); d2(x2 , y2) }

Pois bem, dados a ∈ B′ × B′ e ε > 0 devemos exibir δ > 0 de modo que, se

x ∈ BD3

(a; δ

)=⇒ α−1(x) ∈ Bν

(α−1(a); ε

)

Ou, de modo equivalente

D3(x, a) < δ =⇒ ν(α−1(x), α−1(a)

)< ε

Observe que

a = (a1 a2 a3 . . . , b1 b2 b3 . . .) ⇒ α−1(a) = a1 b1 a2 b2 a3 b3 . . .

x = (x1 x2 x3 . . . , y1 y2 y3 . . .) ⇒ α−1(x) = x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . .

Temos

D3(x, a) < δ ⇐⇒ max

{ ∞∑

n=1

|xn − an |2n ,

∞∑

n=1

|yn − bn |2n ,

}

< δ

Tambem

ν(α−1(x), α−1(a)

)< ε ⇐⇒

∞∑

n=1

|xn − an |22n−1 +

∞∑

n=1

|yn − bn |22n < ε

Observe que∞∑

n=1

|xn − an |22n−1 <

∞∑

n=1

|xn − an |2n < δ

e, de igual modo∞∑

n=1

|yn − bn |22n <

∞∑

n=1

|yn − bn |2n < δ

Somando estas desigualdades vemos que e suficiente tomar 2 δ = ε, isto e,δ = ε

2 . Pois bem, com o auxılio do corolario 40 (p. 485) concluimos que α econtınua.

Sendo α : B′ −→ B′ × B′ contınua, ou melhor ainda, um homeomorfismouniforme entre subespacos densos B′ ⊂ {0, 1}N e B′×B′ ⊂ {0, 1}N×{0, 1}N, α se estende, de modo unico, a um homeomorfismo uniforme:

520

Page 522: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(corol. 20, p. 347)

F : {0, 1}N −→ {0, 1}N × {0, 1}N

Portanto a restricao de F :

η : B −→ {0, 1}N × {0, 1}N

e contınua.

• Agora vamos definir a aplicacao ξ:

ξ : {0, 1}N × {0, 1}N I× I((xn), (yn)

)(x, y)

onde,

(x, y) =( ∞∑

n=1

xn

2n ,

∞∑

n=1

yn2n

)

{0, 1}N

{0, 1}N

r(xn )

(yn )

r (x, y)�

ξ

0 1

1 (1,1)

A aplicacao ξ nao e uma bijecao. De fato, ξ nao e injetiva (por que?).

ξ e sobrejetiva porquanto dado (x, y) =(∑ xn

2n,∑ yn

2n)∈ I×I este ponto

e imagem, por ξ, do ponto((xn), (yn)

)∈ {0, 1}N × {0, 1}N .

Para mostrar que a aplicacao ξ e contınua, utilizaremos a metrica domaximo em ambos os produtos cartesianos. Com efeito, dados a ∈ {0, 1}N×{0, 1}N e ε > 0, devemos exibir δ > 0 de modo que se

D3(x, a) < δ ⇒ D3

(ξ(x), ξ(a)

)< ε

Observe que,

a = (a1 a2 a3 . . . , b1 b2 b3 . . .) ⇒ ξ(a) = (∑ an

2n,∑ bn

2n)

x = (x1 x2 x3 . . . , y1 y2 y3 . . .) ⇒ ξ(x) =(∑ xn

2n,∑ yn

2n)

Entao,

D3

(ξ(x), ξ(a)

)< ε ⇐⇒ max

{∣∣∣

∑ xn

2n −∑ an

2n

∣∣∣,∣∣∣

∑ yn2n −

∑ bn2n

∣∣∣

}

< ε

521

Page 523: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Resumindo temos que determinar δ > 0 de modo que

max{

∑ |xn − an |2n ,

∑ |yn − bn |2n

}

<δ ⇒ max{∣∣∑ xn

2n −

∑ an2n

∣∣,∣∣∑ yn

2n −

∑ bn2n

∣∣}

Observando que

∣∣∣

∑ xn

2n −∑ an

2n

∣∣∣ =

∣∣∣

∑ xn − an

2n

∣∣∣ ≤

∑ |xn − an |2n < δ

∣∣∣

∑ yn2n −

∑ bn2n

∣∣∣ =

∣∣∣

∑ yn − bn2n

∣∣∣ ≤

∑ |yn − bn |2n < δ

ve-se que e suficiente tomar δ = ε.

Compondo as aplicacoes anteriores, temos a seguinte curva de Peano:

0

1

z s sBΨ{ 0, 1 }N

{ 0, 1 }Nη1

η2s

η sξ(x, y)

0

1

1

• Curva de Peano simplificada

A composicao destas varias transformacoes e a transformacao procurada.Resumindo, temos

0

1

z rr

χ

0 1

1 (1,1)

onde

χ : I −→ I× I

z 7−→ (x, y)

e tal que

χ = ξ ◦ η ◦Ψ ⇒ χ(z) =(ξ ◦ η ◦Ψ

)(z) =

(ξ ◦ η

)(Ψ(z)

)

= ξ(η(Ψ(z))

)

Para efeito dos exemplos a seguir continuaremos com a codificacao λ (p. 511).

522

Page 524: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) Calcule a imagem, por χ, de z = 0, 8.

Solucao (acompanhe pela figura, p. 522): Desenvolvendo 0, 8 na base 2,temos

0, 8 = 11 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .

entao Ψ(0, 8) = 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .. Aplicamos η a sequencia anterior:

1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .

1 0 1 0 1 0 1 01 . . .

1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . .

η1

η2

Temos(η1 , η2

)∈ {0, 1}N×{0, 1}N. Agora aplicamos ξ ao ponto

(η1 , η2

):

ξ((η1 , η2)

)= (x, y), onde

x = y =1

21 +0

22 +1

23 +0

24 + · · · = 2

3

Portanto χ(0, 8) =(23 ,

23

).

2) Calcule a imagem, por χ, de z = 0, 3.

Solucao: Desenvolvendo 0, 3 na base 2, temos

0, 3 = 01 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .

Entao Ψ(0, 3) = 0 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .. Aplicamos η a sequencia anterior:

0 1 0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .

0 0 1 0 1 0 1 0 1 . . .

1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . .

η1

η2

Agora aplicamos ξ ao ponto(η1 , η2

): ξ((η1 , η2)

)= (x, y), onde

x =0

21 +0

22 +1

23 +0

24 +1

25 +0

26 + · · · = 1

6

y =1

21 +0

22 +1

23 +0

24 +1

25 +0

26 + · · · = 2

3

523

Page 525: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Portanto χ(0, 3) =(16 ,

23

). A geometria da situacao fica

r0

1

¬

r0,3

12

0,8

-

6

0

1

1

(1,1)

¬ ¬16

13

23

¬

¬13

23r r:

:

χ

χ

3) Calcule a imagem, por χ, de z = 512 .

Solucao: Desenvolvendo 5/12 na base 2, obtemos

5

12= 01 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .

Entao Ψ(5/12) = 0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . ..

Aplicamos η a sequencia anterior:

0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .

0 1 1 1 1 1 1 1 1 . . .

1 0 0 0 0 0 0 0 0 . . .

η1

η2

Agora aplicamos ξ ao ponto(η1 , η2

): ξ((η1 , η2)

)= (x, y), onde

x =0

21 +

1

22 +

1

23 +

1

24 +

1

25 +

1

26 + · · · = 1

2

y =1

21 +0

22 +0

23 +0

24 +0

25 +0

26 + · · · = 1

2

Portanto χ(

512

)=(12 ,

12

).

Pontos duplos e triplos no quadrado

Ja vimos que na transformacao a seguir

0 1

1

s0

1

524

Page 526: Gentil Lopes - Espaços Métricos

os pontos do intervalo cobrem toda a superfıcie do quadrado (sobrejetora).Como a aplicacao nao e injetiva, concluimos que existem posicoes no quadradoque recebem mais de um ponto do intervalo. Nosso objetivo agora sera de-scobrir esses pontos.

Exemplo: Quais pontos do intervalo chegam no ponto(14 ,

12

)?

Solucao: Tendo em conta a figura na p. 522: da figura a seguir

s(a, b)12

14{ 0, 1 }N

{ 0, 1 }N

s( 14, 12)

concluimos que a e b sao sequencias que devem convergir para 1/4 e 1/2,respectivamente. Tendo em conta que

12 = 100 0 0 . . . 1

4 = 010 0 0 . . .

12 = 011 1 1 . . . 1

4 = 001 1 1 . . .

Interregno: Estas igualdades devem ser entendidas no sentido de con-vergencia e nao de codificacao (representacoes). Se bem que as duas primeirassao tambem codificacoes − por pertencerem a B.

Essa distincao, sou eu quem esta criando, os matematicos nao fazem taldiferenca − confudem tudo∗ −, daı uma das razoes, segundo creio, pelasquais eles nunca atinaram, nao apenas com essa construcao que ora desen-volvo, como tambem com a “inversa” (“volta”) da curva de Peano, queestaremos construindo logo mais.

Pois bem, sendo assim, temos as seguintes possibilidades para o par(a, b):

(0 1 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 . . .)

(0 1 0 0 0 . . . , 0 1 1 1 1 . . .)

(0 0 1 1 1 . . . , 1 0 0 0 0 . . .)

(0 0 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 1 . . .)

14

↓12

Multiplexando cada um destes pares de sequencias, obtemos:

∗Ainda por conta dos fantasmas das ambiguidades.

525

Page 527: Gentil Lopes - Espaços Métricos

0 1 0 0 0 0 . . .

1 0 0 0 0 0 . . .0 1 1 0 0 0 0 0 . . .

0 1 0 0 0 0 . . .

0 1 1 1 1 1 . . .0 0 1 1 0 1 0 1 . . .

0 0 1 1 1 1 . . .

1 0 0 0 0 0 . . .0 1 0 0 1 0 1 0 . . .

6∈ B0 0 1 1 1 1 . . .

0 1 1 1 1 1 . . .0 0 0 1 1 1 1 1 . . .

A ultima sequencia nao pertence ao conjunto das codificacoes − podeser ignorada. Convertendo as outras tres para decimal, obtemos:

0 1 1 0 0 0 0 0 . . . =3

8, 0 0 1 1 0 1 0 1 . . . =

10

48, 0 1 0 0 1 0 1 0 . . . =

7

24

Portanto estes sao os tres pontos do intervalo que serao guardados naposicao

(14 ,

12

)do quadrado. Isto e,

χ( 3

8

)

= χ( 10

48

)

= χ( 7

24

)

=(1

4,1

2

)

Ou ainda, uniformizando os denominadores

χ( 18

48

)

= χ( 10

48

)

= χ( 14

48

)

=(1

4,1

2

)

Imaginando o intervalo como sendo uma das arestas do quadrado, temos

s( 14, 12)

λsssχ( 10

48)=χ( 14

48)=χ( 18

48)=( 1

4, 12)

Observe que um outro modo de interpretar χ e que ela transfere ospontos da aresta do quadrado, para o proprio quadrado, de modo que todaa superfıcie do quadrado e coberta e, como se nao bastasse, podemos ter atetres pontos da aresta transferidos para uma mesma posicao do quadrado.Exemplo:

526

Page 528: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Encontrar os pontos do intervalo que sao levados no ponto(12 ,

34

).

Solucao: Da experiencia adquirida no exemplo anterior, podemos escrever:

(12 ,

34

)

VV: (1 0 0 0 0 . . . , 1 1 0 0 0 . . .) −→ 1 1 0 1 0 0 0 0 0 . . .

VF: (1 0 0 0 0 . . . , 1 0 1 1 1 . . .) −→ 1 1 0 0 0 1 0 1 0 . . .

FV: (0 1 1 1 1 . . . , 1 1 0 0 0 . . .) −→ 0 1 1 1 1 0 1 0 1 . . .

FF: (0 1 1 1 1 . . . , 1 0 1 1 1 . . .) −→ 0 1 1 0 1 1 1 1 1 . . . 6∈ B

Onde: V significa a verdadeira codificacao (da fracao) em binario e F afalsa (apenas no sentido de convergencia).

As sequencias apos cada seta foram obtidas pela multiplexacao das sequen-cias em cada par ordenado.

Sendo assim temos:

0

1

ր3948

Ψ η

B

1 1 0 1 0 0 0 0 0...

{ 0, 1 }N

{ 0, 1 }N

(1 0 0 0 0..., 1 1 0 0 0...)

ξ

( 12, 34)

concluimos que λ(3948

)=(12 ,

34

). Da alternativa seguinte

0

1

ր3748

Ψ η

B

1 1 0 0 0 1 0 1 0...

{ 0, 1 }N

{ 0, 1 }N

(1 0 0 0 0..., 1 0 1 1 1...)

ξ

( 12, 34)

concluimos que λ(3748

)=(12 ,

34

). Da alternativa seguinte

0

1

2348

Ψ η

B

0 1 1 1 1 0 1 0 1...

{ 0, 1 }N

{ 0, 1 }N

(0 1 1 1 1..., 1 1 0 0 0...)

ξ

( 12, 34)

concluimos que λ(2348

)=(12 ,

34

).

527

Page 529: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A multiplexacao na ultima alternativa (FF ) nao resulta em B, portantonao e considerada. Resumindo, temos

s( 12 , 34 )

χ

s ssλ( 23

48)=λ( 37

48)=λ( 39

48)=( 1

2, 34)

Seja (x, y) um ponto do quadrado. Com um pouco de reflexao o leitorchegara as seguintes conclusoes:

1a) Se ambas as coordenadas, x e y, forem fracoes diadicas entao, neste pontosao colocados tres pontos da aresta do quadrado. De outro modo: a curvapassa tres vezes por pontos com ambas as coordenadas fracoes diadicas;

2a) Se ambas as coordenadas, x e y, nao forem fracoes diadicas entao, nesteponto e colocado apenas um ponto da aresta do quadrado. De outro modo:a curva passa uma unica vez em pontos com ambas as coordenadas naodiadicas;

3a) Se apenas uma das coordenadas, x ou y, e uma fracao diadica entao,neste ponto e colocado dois pontos da aresta do quadrado. De outro modo:a curva passa duas vezes em pontos com apenas uma coordenada fracaodiadica;

Uma quarta propriedade, menos evidente, e a que segue

4a) O conjunto dos pontos duplos e triplos e infinito enumeravel e denso noquadrado.

Infinito enumeravel significa que podemos “conta-los ”, assim como con-tamos os Naturais:

N : 1, 2, 3, 4, 5, . . .

Denso significa que: fixado qualquer ponto no quadrado; arbitraria-mente proximo − ou tao proximo quanto se queira − deste ponto fixadoexistira um ponto duplo ou triplo.

9.6.3 O quadrado hipermagico

A seguir construiremos um objeto matematico (tao patologico quanto acurva de Peano) o qual, em conjunto com a curva de Peano, nos permitira“transitar entre dimensoes arbitrarias”.

Definicao 66 (Quadrado hipermagico). Chama-se quadrado hipermagiconum espaco metrico

(M, d

), com M um quadrado (unitario), a uma apli-

cacao contınua ϕ : M → I injetiva e nao sobrejetora. I e um intervalounitario.

528

Page 530: Gentil Lopes - Espaços Métricos

O que ha de paradoxal no quadrado hipermagico e que conseguimostransferir todos os pontos do quadrado para sua aresta inferior (ou qualqueroutra), sem sobrepor um ponto a outro e ainda sobram infinitos buracos(lacunas) na aresta! − como estaremos mostrando.

O quadrado hiper-magico resume-se na composicao das aplicacoes mostradasna figura a seguir:

0 1

1(1,1)

qx

y

B

B

B

0

1r r rzh

g

f

• Quadrado hipermagico

Onde a aplicacao

h : I× I −→ B× B

(x, y) 7−→((xn ), (yn ))

e um homeomorfismo. A aplicacao

g : B× B B((xn ), (yn )

) 7−→ x1 y1 x2 y2 x3 y3 ...

e contınua por ser a extensao contınua de α : B′ × B′ −→ B′ ((9.8), p. 519).

A aplicacao g executa uma multiplexagem das sequencias (xn) e (yn).

Vamos mostrar que g e injetiva mostrando que g(x) = g(y) ⇒ x = y.De fato, sejam as sequencias: (xn) = g(x) = g(y) = (yn).

(xn) e (yn) sao imagens, por g, dos pares de sequencias

x = (u1 u2 u3 . . . , v1 v2 v3 . . .) 7−→ u1 v1 u2 v2 u3 v3 . . . = x1 x2 x3 . . .

y = (z1 z2 z3 . . . , t1 t2 t3 . . .) 7−→ z1 t1 z2 t2 z3 t3 . . . = y1 y2 y3 . . .

g

g

Como (xn) = (yn) segue que

u1 = z1 , u2 = z2 , u3 = z3 , . . . ⇒ (un) = (zn)

v1 = t1 , v2 = t2 , v3 = t3 , . . . ⇒ (vn) = (tn)

portanto x = y. Esta aplicacao nao e sobrejetora, por exemplo o ponto( 0 1 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .) ∈ B nao e imagem, por g, de nenhum ponto deB× B.

529

Page 531: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De fato, suponha, ao contrario, que isto aconteca; isto e que exista umponto

((xn), (yn)

)∈ B×B tal que g

((xn), (yn)

)= 011 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .,

sendo assim resulta

x1 y1 x2 y2 x3 y3 . . . = 011 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .

entao,

x1 = 0, x2 = 1, x3 = 1, x4 = 1, . . . ⇒ (xn) = (0 1 1 1 1 . . .)

y1 = 1, y2 = 0, y3 = 0, y4 = 0, . . . ⇒ (yn) = (1 0 0 0 0 . . .)

Logo,((xn), (yn)

)=((0 1 1 1 1 . . .), (1 0 0 0 0 . . .)

)∈ B× B,

o que contradiz a construcao (definicao) de B.

Definimos a aplicacao f como f = Ψ−1 (p. 517), resultando assim que fe um homeomorfismo. Resumindo, temos

0 1

1 (1,1)

r0

1

zrϕ

onde

ϕ : I× I −→ I

(x, y) 7−→ z

e tal que

ϕ = f ◦ g ◦ h ⇒ ϕ(x, y) =(f ◦ g ◦ h

)(x, y)

= (f ◦ g)(h(x, y)

)

= f(g(h(x, y)

))

Vejamos agora, atraves de exemplos, como essa transformacao atua.

Exemplos:

1) Como um primeiro exemplo, vamos transferir o centro do quadrado parao intervalo. O centro do quadrado e dado pelo par ordenado

(12 ,

12

).

Solucao:

A transformacao h obtem a representacao binaria de um ponto do quadrado(codifica-o), ou seja

h(1

2,1

2

)

= (1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . .)

530

Page 532: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A transformacao g faz uma multiplexacao (entrelacamento) destas duassequencias, veja:

g

1 0 0 0 0 0 . . .

1 0 0 0 0 0 . . .

1 1 0 0 0 0 0 0 . . .

A transformacao f converte esta ultima sequencia em um numero dointervalo (decodifica), assim:

f(1 1 0 0 0 0 0 0 . . .) =1

21 +1

22 +0

23 +0

24 +0

25 + · · · = 3

4

Finalmente, γ(12 ,

12

)= 3

4 . Vamos resumir o que aconteceu:

0 1

1

( 12 , 1

2)sx

y

B

B

B

0

1s1000...

1000...

s11000... sh gf

34

2) Como mais um exemplo, vamos transferir o ponto(13 ,

13

)para o intervalo.

Solucao: Aplicando a transformacao h a este ponto obtemos

h(1

3,1

3

)

= (0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . . , 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .)

Aplicando g a este ponto obtemos:

g

0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .

0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .

0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .

Entregando esta ultima sequencia a f , obtemos

f(0 0 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 . . .) =0

21 +0

22 +1

23 +1

24 +0

25 +0

26 +1

27 +1

28 + · · ·

=

(1

23 +1

27 +1

211 + · · ·)

+

(1

24 +1

28 +1

212 + · · ·)

=2

15+

1

15=

1

5

531

Page 533: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Portanto γ(13 ,

13

)= 1

5 . Geometricamente, temos

0 1

1

s( 13 , 1

3)

x

y

B

B

B

0

1s0101...

0101...

s00110011...s

hg

f

15

Como encontrar buracos na aresta do quadrado

Mostraremos agora como encontrar pontos no intervalo que nao sao ima-gens, por ϕ, de pontos do quadrado − e o que chamo de buracos no intervalo(ou posicoes ociosas). Inicialmente consideremos, por exemplo, a sequenciaν dada assim

0 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .

Essa sequencia pertence a B. A multiplexagem a seguir

0 1 1 1 1 1 1 . . .

0 0 0 0 0 0 0 . . .0 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . . ∈ B

mostra que a sequencia ν nao e imagem, por g, de nenhum ponto do espacoB× B, observe

0 1

1B

B

B

0

1

01111... 6∈ B

00000...

sν00101010...

f(ν) = 16

h g f

Logo, nenhum ponto de B× B chega na sequencia ν.Isso implica em dizer que a imagem, por f , de ν, nao sera ocupada por

nenhum ponto do quadrado. Digo, f(ν), nao sera imagem, por ϕ, de nenhumponto do quadrado.

Para encontrar o buraco no intervalo, calculamos:

532

Page 534: Gentil Lopes - Espaços Métricos

f(0 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .) =0

21 +0

22 +1

23 +0

24 +1

25 +0

26 +1

27 +0

28 + · · ·

=1

23 +1

25 +1

27 + · · · = 1

6

O diagrama a seguir sugere como construir uma quantidade infinita deburacos no intervalo:

0 1 1 1 1 1 1 . . .

0 0 0 0 0 0 0 . . .0 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . . ∈ B

0 0 1 1 1 1 1 . . .

0 0 0 0 0 0 0 . . .0 0 0 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . . ∈ B

0 0 0 1 1 1 1 . . .

0 0 0 0 0 0 0 . . .0 0 0 0 0 0 1 0 1 0 1 0 . . . ∈ B

Os pontos a direita nao sao imagens, por g, de pontos de B × B, porconseguinte suas imagens, por f , sao vazios (buracos) em [ 0, 1 ].

Vamos mostrar como, de modo geral, podemos encontrar um buraco nointervalo.

Pois bem, tome no quadrado um ponto (x, y) no qual apenas uma dascoordenadas e fracao diadica. Sendo assim, temos as seguintes possibilidades(combinacoes):

(x, y) :

V : B× B

F : { 0, 1 }N × B, se x e diadica;

F : B× { 0, 1 }N, se y e diadica.

onde: A Verdadeira codificacao do ponto (x, y) esta no espaco B × B, e afalsa codificacao em { 0, 1 }N × B, caso x seja a fraccao diadica e no espacoB× { 0, 1 }N se y for a fraccao diadica.

Pois bem, a codificacao verdadeira vai para um ponto da aresta (ou dointervalo) e a falsa “vai” para um buraco.

Esclarecendo melhor: Dado (x, y) no quadrado, no qual x ou (exclusivo)y e fracao diadica temos, para este ponto, uma codificacao legitima (xn , yn)

533

Page 535: Gentil Lopes - Espaços Métricos

e uma espuria (x′n, y′

n). Temos que (x′

n) ou (y′

n) (dependendo de quem seja

fracao diadica se x ou se y) tem todos os termos iguais a 1 a partir de algumaposicao, enquanto que a outra sequencia, nao sendo oriunda de uma fracaodiadica, tem um 0 e tambem um 1 em posicoes arbitrariamente grandes.Logo ao se multiplexar (x′

n, y′

n) resulta um ponto em B e a este um buraco

na aresta.

Se no par (x, y) tivermos duas cordenadas diadicas, teremos as seguintespossibilidades:

(x, y) :

V V : B× B gera ponto

V F : B× { 0, 1 }N gera buraco

F V : { 0, 1 }N × B gera buraco

F F : { 0, 1 }N × { 0, 1 }N ⇒ 6∈ B

Seja (x, y) um ponto do quadrado. Com um pouco de reflexao o leitorchegara as seguintes conclusoes:

1a) Se ambas as coordenadas, x e y, forem fracoes diadicas entao este pontovai para um ponto da aresta e “gera” dois buracos;

2a) Se ambas as coordenadas, x e y, nao forem fracoes diadicas entao esteponto vai para um ponto do intervalo e nao “gera”nenhum buraco;

3a) Se apenas uma das coordenadas, x ou y, e uma fracao diadica entao esteponto vai para um ponto do intervalo e “gera” um buraco.

Uma quarta propriedade, menos evidente, e a que segue

4a) O conjunto dos buracos e infinito enumeravel e denso no intervalo.

Exemplo: Vamos considerar o ponto(

14 ,

12

), do quadrado.

Como visto anteriormente, temos

V V : (0 1 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 . . .)

V F : (0 1 0 0 0 . . . , 0 1 1 1 1 . . .)

FV : (0 0 1 1 1 . . . , 1 0 0 0 0 . . .)

FF : (0 0 1 1 1 . . . , 0 1 1 1 1 . . .)

14

↓12

Multiplexando cada um destes pares de sequencias, obtemos:

534

Page 536: Gentil Lopes - Espaços Métricos

0 1 0 0 0 0 . . .

1 0 0 0 0 0 . . .0 1 1 0 0 0 0 0 . . .

V :

V : gera ponto

0 1 0 0 0 0 . . .

0 1 1 1 1 1 . . .0 0 1 1 0 1 0 1 . . .

V :

F : gera buraco

0 0 1 1 1 1 . . .

1 0 0 0 0 0 . . .0 1 0 0 1 0 1 0 . . .

F :

V : gera buraco

6∈ B0 0 1 1 1 1 . . .

0 1 1 1 1 1 . . .0 0 0 1 1 1 1 1 . . .

F :

F :

Volvendo ao exemplo dado na pagina 525:

0 1 1 0 0 0 0 0 . . . =3

8, 0 0 1 1 0 1 0 1 . . . =

10

48, 0 1 0 0 1 0 1 0 . . . =

7

24

Entao

ϕ( 1

4,1

2

)=

3

8

Os outros dois sao buracos. Imaginando o intervalo como sendo uma dasarestas do quadrado, temos (veja fig., p. 526)

s( 14, 12)

ϕs

ϕ(

14, 12

)= 3

8= 18

48 ponto

1048

buraco

1448 buraco

Observe que um outro modo de interpretar ϕ e que ela transfere todosos pontos do quadrado para uma de suas arestas, sem sobrepor um ponto aoutro e, “o que e pior”, ainda sobram lugares vazios na aresta . . . Pasmem!

Vamos agora provar que o conjunto destes buracos e denso na aresta doquadrado (ou ainda, no intervalo [ 0, 1 ]).

Consideremos B′′ ⊂ B o complementar de B′ em B. Isto e,

x1 x2 x3 x4 . . . ∈ B′′ ⇐⇒ x1 x3 x5 . . . 6∈ B ou x2 x4 x6 . . . 6∈ B

535

Page 537: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Provemos que B′′ e denso em B. De fato, seja ε > 0 e a ∈ B dados. Devemosmostrar que existe p ∈ B′′ de modo que ν(p, a) < ε. Pois bem, escolhamosj tal que 1

2j < ε e tomemos pn = an para n = 1, 2, . . . , j; e para n ≥ j + 1

tomemos os termos com ındices ımpares iguais a 1 e os termos com ındicespares iguais a 0. Sendo assim p ∈ B′′ e ν(p, a) ≤ 1

2j < ε. Como e facil inferir

a cada ponto de B′′ corresponde um “lugar ocioso” na aresta.

9.7 A curva de Peano no cubo

De modo inteiramente analogo, podemos construir uma curva de Peanoχ entre o intervalo unitario e o cubo unitario [ 0, 1 ]3, assim:

0

1

p s sB�

��

��

{ 0, 1 }N

{ 0, 1 }N

{ 0, 1 }N

sη1

η2

η3

η0 1

1

1

ξ

• Curva de Peano no Cubo

Nesta figura η faz uma demultiplexagem de uma sequencia(xn

)∈ B.

Isto e, η toma uma sequencia(xn

)e a separa em tres subsequencias

η((xn)

)=(η1(xn), η2(xn), η3(xn)

)

Entao podemos tomar:

η1(x1 x2 x3 . . . ) = x1 x4 x7 x10 . . .

η2(x1 x2 x3 . . . ) = x2 x5 x8 x11 . . .

η3(x1 x2 x3 . . . ) = x3 x6 x9 x12 . . .

Veja,

x1 x2 x3 x4 x5 . . .

x1 x4 x7 x10 . . .

x2 x5 x8 x11 . . .

x3 x6 x9 x12 . . .

536

Page 538: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:

1) Calcule a imagem, por χ, de p = 0, 5.

Solucao: Desenvolvendo 0, 5 na base 2, temos 1 0 0 0 0 . . . = 12 .

Entao Ψ(0, 5) = 1 0 0 0 0 0 0 . . .. Agora aplicamos η a sequencia anterior:

η1(1 0 0 0 0 0 0 0 0 . . .) = 1 0 0 0 0 0 0 . . .

η2(1 0 0 0 0 0 0 0 0 . . .) = 0 0 0 0 0 0 0 . . .

η3(1 0 0 0 0 0 0 0 0 . . .) = 0 0 0 0 0 0 0 . . .

Agora aplicamos ξ ao ponto(η1 , η2 , η3

), entao ξ

((η1 , η2 , η3)

)= (x, y, z),

obtendo λ(12

)=(12 , 0, 0

).

2) Calcule a imagem, por χ, de p = 2/3.

Solucao: Desenvolvendo 2/3 na base 2, obtemos 23 = 101 0 1 0 1 0 1 0 . . ..

Entao Ψ(2/3) = 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 . . .. Aplicamos η a sequencia anterior:

η1(1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . .) = 1 0 1 0 1 0 1 . . .

η2(1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . .) = 0 1 0 1 0 1 0 . . .

η3(1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . .) = 1 0 1 0 1 0 1 . . .

Agora aplicamos ξ ao ponto(η1 , η2 , η3

), entao, ξ

((η1 , η2 , η3)

)= (x, y, z),

obtendo χ(23

)=(23 ,

13 ,

23

). Graficamente, temos

0

1

ss12

χ

1

1

1

x

y

z

3) Encontre todos os pontos do intervalo que sao transferidos, por χ, parao centro do cubo. Isto e, resolva, para p, a equacao χ(p) =

(12 ,

12 ,

12

).

Solucao: Temos as seguintes alternativas:

537

Page 539: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(12 ,

12 ,

12

)→

VVV: (1 0 0 0..., 1 0 0 0..., 1 0 0 0...)→ 1 1 1 0 0 0 0 0 0... = 4956

VVF: (1 0 0 0..., 1 0 0 0..., 0 1 1 1... )→ 1 1 0 0 0 1 0 0 1... = 4356

VFV: (1 0 0 0..., 0 1 1 1..., 1 0 0 0... )→ 1 0 1 0 1 0 0 1 0... = 3756

VFF: (1 0 0 0..., 0 1 1 1..., 0 1 1 1... )→ 1 0 0 0 1 1 0 1 1... = 3156

FVV: (0 1 1 1..., 1 0 0 0..., 1 0 0 0... )→ 0 1 1 1 0 0 1 0 0... = 2556

FVF: (0 1 1 1..., 1 0 0 0..., 0 1 1 1... )→ 0 1 0 1 0 1 1 0 1... = 1956

FFV: (0 1 1 1..., 0 1 1 1..., 1 0 0 0... )→ 0 0 1 1 1 0 1 1 0... = 1356

FFF: (0 1 1 1..., 0 1 1 1..., 0 1 1 1... )→ 0 0 0 1 1 1 1 1 1... = 756

Nota: As sequencias apos a seta foram obtidas via multiplexacao dastres sequencias a esquerda. Os digitos na cor vermelha, em cada sequencia,representam o perıodo; isto e, sao os tres digitos que se repetem em seguida.

Para ilustrar a finalidade do diagrama acima consideremos, por exemplo,a segunda das combinacoes (VVF), assim:

0

14356s s

↑1 1 0 0 0 1 0 0 1...

(1 0 0 0..., 1 0 0 0..., 0 1 1 1... )

B

Ψ�

��

��

{ 0, 1 }N

{ 0, 1 }N

{ 0, 1 }N

sη1

η2

η3

η0 1

1

1

ξ

Deste diagrama concluimos que, χ(4356

)=(12 ,

12 ,

12

).

Das combinacoes anteriores apenas uma (FFF) nao pertence a B, por-tanto nao e oriunda da codificacao de nenhum ponto do intervalo [ 0, 1 [,sendo assim temos:

χ(49

56

)= χ

(43

56

)= χ

(37

56

)= χ

(31

56

)= χ

(25

56

)= χ

(19

56

)= χ

(13

56

)=(1

2,1

2,1

2

)

Podemos imaginar o intervalo unitario como sendo uma das arestas docubo unitario. Na figura seguinte plotamos os sete pontos da aresta que saotransferidos para o centro do cubo

538

Page 540: Gentil Lopes - Espaços Métricos

χ

x

y

z

Observe que em duas dimensoes (quadrado) tres pontos da aresta saotransferidos para o centro do quadrado. Em tres dimensoes (cubo) setepontos da arestas sao transferidos para o centro do cubo.

Seja (x, y, z) um ponto do cubo. Com um pouco de reflexao o leitorchegara as seguintes conclusoes:

1a) Se as tres coordenadas, x, y e z, forem fracoes diadicas entao, neste pontosao colocados sete pontos da aresta do cubo (digo, do intervalo unitario).

2a) Se apenas duas coordenadas forem fracoes diadicas entao, neste pontosao colocados quatro pontos da aresta do cubo.

3a) Se apenas uma coordenada for fracao diadica entao, neste ponto saocolocados dois pontos da aresta do cubo.

4a) Se nenhuma das coordenadas e diadica entao, neste ponto e colocadoum unico ponto da aresta do quadrado.

5a) O conjunto dos pontos multiplos e infinito enumeravel e denso no cubo.

9.7.1 O cubo hipermagico

A exemplo do que foi feito para o quadrado tambem podemos trans-ferir todos os pontos do cubo para uma de suas arestas. Sendo que estatransformacao cumpre as mesmas condicoes que a do quadrado: e contınua,injetiva e nao sobrejetiva.

0 1

1

1

��

���

B

B B

B

sη1

η2

η3

hg

f

s0

1ps

• Cubo hipermagico

539

Page 541: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Chamaremos de γ a composta de todas estas transformacoes.

Exemplos:

1) Calcule γ(0, 0, 12

).

Solucao: Temos 12 = 100 0 0 0 0 0 . . .. Logo,

h(0, 0,

1

2

)= (0 0 0 0 0 0 . . . , 0 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . .)

Agora aplicamos g ao ponto anterior.

Observacao: Dadas tres sequencias(xn

),(yn)e(zn), g faz uma mul-

tiplexagem das mesmas, isto e

x1 x2 x3 x4 . . .

y1 y2 y3 y4 . . .

z1 z2 z3 z4 . . .

x1 y1 z1 x2 y2 z2 x3 y3 z3 x4 y4 z4 . . .

Portanto

0 0 0 0 0 0 . . .

0 0 0 0 0 0 . . .

1 0 0 0 0 0 . . .

0 0 1 0 0 0 0 0 0 . . .

Isto e,

g(0 0 0 0 0 0 . . . , 0 0 0 0 0 0 . . . 1 0 0 0 0 0 . . .) = 0 0 1 0 0 0 0 0 0 . . .

Ou ainda,

g(0 0 0 0 0 0 . . . , 0 0 0 0 0 0 . . . 1 0 0 0 0 0 . . .) = 0 0 1 0 0 0 0 . . .

Agora, aplicamos f a sequencia anterior, obtendo

f(0 0 1 0 0 0 0 0 0 . . .) =0

21 +0

22 +1

23 +0

24 +0

25 +0

26 + · · · = 1

8

Portanto, γ(0, 0, 12

)= 1

8 .

2) Calcule γ(12 ,

12 ,

12

).

Solucao: Temos 12 = 100 0 0 0 0 0 . . .. Logo

h(1

2,1

2,1

2

)

= (1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . .)

Agora aplicamos g ao ponto anterior, obtendo

g((1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . . , 1 0 0 0 0 0 . . .)

)= 11 1 0 0 0 0 0 0 . . .

540

Page 542: Gentil Lopes - Espaços Métricos

- Agora aplicamos, a sequencia anterior, f . Entao,

f(1 1 1 0 0 0 0 0 0 . . .

)=

1

21 +1

22 +1

23 +0

24 +0

25 + · · · = 1

2+

1

4+

1

8=

7

8.

Portanto, γ(12 ,

12 ,

12

)= 7

8 . Graficamente, temos

0

1

ss18

78

γ

0 1

1

1

x

y

z

Deste exemplo e do exemplo 3 (p. 537) concluimos que o centro do cubovai para o ponto 7/8 e gera seis buracos na aresta do cubo (ou no intervalounitario).

Observe que paradoxal: A exemplo do que ocorreu no quadrado aquitambem conseguimos, por γ, transferir o cubo para uma de suas arestas, coma “agravante” de que agora “mais” buracos serao gerados na aresta. Porexemplo um ponto (x, y) ∈ [ 0, 1 [2 com ambas as coordenadas diadicas geradois buracos na aresta do quadrado; por outro lado um ponto (x, y, z) ∈[ 0, 1 [3 com duas coordenadas diadicas gera quatro buracos na aresta docubo e com tres coordenadas diadicas gera seis buracos. Resumindo: esta-mos transferindo para a aresta um “volume” maior de pontos enquanto onumero de lugares vazios na aresta aumenta.

Naturalmente que, o que foi feito para o quadrado e o cubo, se estendesem dificuldade ao “hipercubo”.

Buracos na aresta do cubo:

O centro do cubo vai, por γ, para o ponto 7/8 ∈ [ 0, 1 ] e “gera” (“reserva”)seis buracos no intervalo. Para esclarecer esta assertiva observe o diagrama:

(12 ,

12 ,

12

)→

VVV: (1 0 0 0..., 1 0 0 0..., 1 0 0 0...)→ 1 1 1 0 0 0 0 0 0... = 4956

VVF: (1 0 0 0..., 1 0 0 0..., 0 1 1 1... )→ 1 1 0 0 0 1 0 0 1... = 4356

VFV: (1 0 0 0..., 0 1 1 1..., 1 0 0 0... )→ 1 0 1 0 1 0 0 1 0... = 3756

VFF: (1 0 0 0..., 0 1 1 1..., 0 1 1 1... )→ 1 0 0 0 1 1 0 1 1... = 3156

FVV: (0 1 1 1..., 1 0 0 0..., 1 0 0 0... )→ 0 1 1 1 0 0 1 0 0... = 2556

FVF: (0 1 1 1..., 1 0 0 0..., 0 1 1 1... )→ 0 1 0 1 0 1 1 0 1... = 1956

FFV: (0 1 1 1..., 0 1 1 1..., 1 0 0 0... )→ 0 0 1 1 1 0 1 1 0... = 1356

FFF: (0 1 1 1..., 0 1 1 1..., 0 1 1 1... )→ 0 0 0 1 1 1 1 1 1... = 756

541

Page 543: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por exemplo, a pseudo codificacao V V F “gera” um buraco no espacoB3 e este, por sua vez, gera um buraco em B: 1 1 0 0 0 1 0 0 1 . . ., que, porsua vez, gera um outro buraco em [ 0, 1 [: 43/56.

0 1

1

1

��

���

B

B B

B

η1

η2

η3

h g f

(1 0 0 0 ..., 1 0 0 0 ..., 0 1 1 1 ...)

0

14356

Nos seis pontos seguintes:

43/56 = 0, 7679; 37/56 = 0, 6607; 31/56 = 0, 5536; 25/56 = 0, 4464;

19/56 = 0, 3393; 13/56 = 0, 2321.

localizam-se os buracos na aresta do cubo (ou no intervalo unitario),veja:

γ

x

y

Na figura da esquerda plotamos a imagem do centro do cubo, bem comoos buracos “reservados” na aresta − pelo centro. Na figura da direita repeti-mos, para efeitos de comparacao, a figura da pagina 539.

Possıveis aplicacoes

Estive a imaginar possıveis aplicacoes praticas para estas aplicacoes:

1a) Na Fısica: a Teoria das Supercordas e consistente em 10 dimensoes.O problema e saber como um Universo a dez dimensoes pode ser reduzido atres dimensoes (espaciais). Nossa sugestao (conjectura) e que as dimensoesextras foram multiplexadas.

542

Page 544: Gentil Lopes - Espaços Métricos

-Inserindo dimensoes arbitrarias dentro de dimensoes arbitrarias

As aplicacoes χ e ϕ, conjuntamente, nos permitem inserir dimensoesarbitrarias “dentro” de dimensoes arbitrarias. Por exemplo para inserir umcubo a dez dimensoes em um cubo a tres dimensoes proceda assim:

[ 0, 1 [10−→ [ 0, 1 [−→ [ 0, 1 [3ϕ χ

Para inserir um cubo a tres dimensoes em um cubo a 10 dimensoes procedaassim:

[ 0, 1 [10←− [ 0, 1 [←− [ 0, 1 [3ϕχ

2a) Na informatica: Se tivermos um “volume” de informacoes (dados) atransmitir, podemos compactar estes dados em uma dimensao, em seguidatransmitir e, no receptor, recupera-los, assim [ 0, 1 [3−→ [ 0, 1 [−→ [ 0, 1 [3.

Uma Curva de Peano inedita(A curva de Peano e o quadrado hipermagico na metrica quantica)

A construcao da curva de Peano nos permite inferir que a compacidadedo espaco ([ 0, 1 [, k) nos faculta a construcao da seguinte curva:

χk: [ 0, 1 [−→ [ 0, 1 [× [ 0, 1 [

0 1

1 (1,1)rχ

k

0

1

r

Observamos que, por ser a metrica µ mais fina que a metrica k, istoimplica em que

Ψ−1 :(B, ν

)−→

([ 0, 1 [, k

)

(xn) 7−→ x

permanece contınua. A mesma observacao vale para a nova ξ.Nota: Neste caso continuamos usando a mesma notacao para as funcoes“intermediarias”.

A construcao desta curva segue os mesmos passos da anterior.Bem, a mudanca radical de uma curva para a outra fica por conta dos

aspectos topologicos, como nao poderia deixar de ser.

Observamos que a definicao de curva de Peano dada na literatura deveser alterada ligeiramente para incluir a possibilidade do intervalo [ 0, 1 [. Adefinicao corrente − excluindo o intervalo [ 0, 1 [ −, a mim so prova que osmatematicos jamais cogitaram da possibilidade de uma tal curva ser cons-truida a partir do intervalo [ 0, 1 [.

543

Page 545: Gentil Lopes - Espaços Métricos

O universo e um computador quantico

Do que o universo e feito? Materia? Materia escura? Energia? Vi-bracoes? De acordo com um fısico chamado Vlatko Vedral, nosso universoe feito de informacao.

Segundo o fısico, se quebrarmos o universo em pedacos cada vez menoreso que sobraria no final sao bits.

Numa escala minuscula, o universo seria controlado pelas malucas leisda fısica quantica. (Fonte: New Scientist)

O eminente filosofo Leibniz esta de acordo com o fısico, veja:

[. . .] Sim, de fato ele [Leibniz] percebeu no bit 0 e no bit 1 o podercombinatorio para criar o universo inteiro, que e exatamente o que acon-tece nos modernos computadores digitais eletronicos e no restante denossa tecnologia de informacao digital: CDS, DVDS, cameras digitais,PCS. . . Tudo isso e 0’s e 1’s, e esta e a nossa imagem do mundo! Vocecombina apenas 0’s e 1’s e voce consegue tudo. [. . .]

A despeito da crıtica de Laplace, a visao de Leibniz, pela qual o mundoe criado a partir dos 0’s e 1’s, recusa-se a sair de cena. De fato, elacomecou a inspirar alguns fısicos contemporaneos, que provavelmentenunca ouviram falar de Leibniz. (Gregory Chaitin/Metamat!/p.’s 99-101)

9.7.2 O universo esculpido em um palito de fosforo

Para ver o Mundo em um Grao de Areia,

E um Ceu em uma Flor Selvagem,

Pegue o Infinito na Palma de sua mao,

E a Eternidade em uma hora.

(William Blake/Poeta)

Blake viu o mundo em um grao de

areia; Hawking viu o universo em uma

casca de noz, eu vejo Tudo em um palito

de fosforo − e ainda por cima carcomido

pelas tracas. (Gentil)

Em meu livro O Tao da Matematica, publicado em 2011, a partir deuma experiencia mıstico-matematica − e de forma independente − defendoa mesma tese que Leibniz e Vedral.

Blake viu o Mundo em um grao de areia, Hawking viu o Universo emuma casca de noz, eu vejo o Todo em um palito de fosforo. . . e como senao bastasse todo pinicado.

Com uma diferenca significativa: enquanto as visoes do poeta e do cien-tista resultaram de intuicoes, a nossa resultara de uma esmerada construcaomatematica.

A proposito, eu estava precisando da imagem de um palito de fosforopara ilustrar uma figura e fui busca-la na internet. Fiquei surpreso coma quantidade de informacoes disponıveis para “palito de fosforo ”. Muitasdelas relacionadas a obras de arte produzidas com palitos.

544

Page 546: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Em uma delas lemos:

Impressionantes esculturas feitas com

palitos de fosforos, pelo escoces David

Mach, porem estas esculturas estao em

perigo constante, qualquer descuido e

uma faısca elas podem se transformar em

cinzas. Para fazer a escultura de Elvis

Presley, ele utilizou 50 mil fosforos, gas-

tando 500 horas de trabalho.

O matematico, como o pintor ou o

poeta, e um desenhista. Se os seus de-

senhos sao mais duradouros que os deles,

e porque sao feitos com ideias.

(G.H. Hardy)

Estarei construindo agora uma portentosa estrutura de engenharia-mate-matica (uma obra de arte) tambem com “palitos de fosforo”.

Na verdade, necessitarei de um unico palito! . . . e muita imaginacao.

A obra que estarei executando, nesse unico palito, tenho certeza que ja-mais foi imaginada (construida) por homem algum − incluindo-se aqui osde todos os seculos passados. Pois bem:

“Estarei esculpindo todo o Universo em um unico palito de fosforo”

E isso mesmo que o leitor ouviu! De outro modo: guardarei (armazenarei)todo o Universo dentro de um unico palito de fosforo, inclusive, e claro, aescultura do escoces David Mach com 50 mil palitos. Como se nao bastasse,ainda prometo mais um pouco: nao utilizarei todo o palito!

Com efeito, Segundo Leibniz, Vedral e Gentil, todo o Universo pode seridentificado com o conjunto { 0, 1 }N, entao inserindo este Universo∗ emum palito de fosforo, teremos feito uma imersao de Todo o nosso Universomanifesto em um palito de fosforo.

Por oportuno! lembrei-me de que podemos convocar mais um fısico depeso para juntar-se ao nosso time − e, se necessario, mais o matematicoChaitin (p. 506):

Tudo deve ser baseado em uma

ideia simples. Depois de a descobrirmos

ela sera tao irresistıvel, tao bela, que co-

mentaremos entre nos, sim, nao poderia

ser diferente. (John Wheeler, fısico)

[. . .] cada todo − cada partıcula, cada campo de forca, ate mesmoo proprio continuo espaco-temporal − deriva inteiramente suas funcoes,seu significado, sua propria existencia −, mesmo que, em determinadoscontextos, isto ocorra de forma indireta −, das [. . .] respostas a questoes“sim” ou “nao”, das escolhas binarias, dos bits. (John Weeler)

∗E um conjunto de infinitas combinacoes, possibilidades.

545

Page 547: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De fato, trata-se de operar a passagem do mundo sensıvel ao mundointeligıvel, e esse movimento e um doloroso e difıcil movimento de alfor-ria. Exige etapas pelas quais a alma se esforca progressivamente por seelevar em direcao as Ideias. (Simone Manon/ Platao, p. 108)

Antes, reuniremos em um conjunto, que denotaremos por B, todas assequencias do universo { 0, 1 }N cujos elementos tem todos os termos iguaisa 1 a partir de alguma posicao†. Por exemplo

0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 0 1 . . . 6∈ B

1 0 1 0 1 0 0 1 1 1 1 1 . . . ∈ B

Observe que pelas definicoes de B (p. 509) e B podemos escrever:

{ 0, 1 }N = B ∪ B

Pois bem, nosso desiderato se cumpre atraves da seguinte transformacao:

{ 0, 1 }N

B

B

t

tχ ϕ

t

0

1

0

1

t

t• O Universo em um palito de fosforo

Entao, dado arbitrariamente um ponto (xn) em { 0, 1 }N, para transferı-lo para o palito de fosforo − intervalo a direita − procedemos assim: seo referido ponto encontra-se no conjunto das codificacoes (isto e, em B)transferimo-lo para o primeiro intervalo,∗ caso contrario − isto e, se (xn)mora em B − transferimo-lo para a aresta inferior do quadrado,† o quesignifica que esse ponto tera como imagem um ponto na aresta, (x, 0), ondex e uma fracao diadica. Como ja vimos, o ponto (x, 0) e transferido, porϕ, para o intervalo e gera um buraco. E precisamente este buraco queescolhemos para imagem do ponto (xn), fixado em { 0, 1 }N, no caso em B.

†Excecao feita a sequencia 1 1 1 1 . . . ja incluida em B, p. 509.∗Em seguida aplicamos χ e, apos, aplicamos ϕ − com certeza ele chega la!†Isto pode ser feito pela aplicacao (xn) → (

∑∞i=1

xi

2i , 0) ∈ [ 0, 1 [2.

546

Page 548: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Ora, como um intervalo e sem dimensao − e um palito de fosforo possuidimensao − concluimos que podemos colocar o intervalo dentro do palito,daı que nossa construcao pode ser vista, assim:

{ 0, 1 }N G

Resumindo: pela transformacao, chamamemo-la de G, inserimos todoo universo em um palito de fosforo e, “o que e pior”, nao o ocupamosinteiramente, digo sobram posicoes vazias (buracos) − de fato, infinitas −no intervalo unitario.

O Universo como um grande Vazio

Estive elucubrando: como pode ser que consigamos inserir um hipercuboem uma de suas arestas∗ e ainda sobra espaco?

O espanto se da pelo fato de estarmos condicionados a imaginar umponto como tendo dimensao (“uma bolinha”), se atentarmos para o fato deque, na realidade, um ponto e indimensional, concluiremos que um inter-valo, um quadrado, um cubo, etc., nao tem dimensao, melhor dizendo, naoocupam nenhum espaco, isto e, sao Vazios!!

Contraditorio? A nova ciencia explica: a base da existencia e, aomesmo tempo, plena de possibilidades, sim, mas as possibilidades naosao “coisas”, e por isso tambem podem ser chamadas de nada.

(Amit Goswami)

Ora, entao ao inserir todo o Universo { 0, 1 }N em algo vazio (e ainda so-brando espaco) so podemos concluir que o proprio Universo { 0, 1 }N e vazio!

E importante entender que houve apenas uma pessoa, Gautama Buda,que usou o nada, o vazio, para a experiencia suprema. [. . .] Ele chamouo supremo de nada, de vazio, suniata, zero. (Osho)

O poeta inicia sua prece

Ponteando em cordas e lamentos

Escrevendo seus novos mandamentos

Na fronteira de um mundo alucinado

Cavalgando em martelo agalopado

E viajando com loucos pensamentos

(Cancao Agalopada/Ze Ramalho)

∗Sem sobrepor um ponto a outro.

547

Page 549: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Para concluir a respeito de nossa construcao, observe que interessante:os matematicos estabeleceram uma bijecao entre os dois conjuntos a seguir

B ↔ [ 0, 1 ]

Essa bijecao so foi possıvel por que os elementos do conjunto B foramexcluidos do universo { 0, 1 }N. Sendo assim, podemos ver essa bijecao como

{ 0, 1 }N − B ↔ [ 0, 1 ]

Em nossa construcao fizemos a seguinte imersao

{ 0, 1 }N −→ [ 0, 1 ]G

uma aplicacao injetiva e nao sobrejetiva.

∗ ∗ ∗Adendo: A volta da curva de Peano eu a construi no ano de 2006;

sendo assim, uma questao pertinente e a seguinte: dada a importancia dacurva de Peano e de se presumir que a sua volta seja de algum interesse(relevancia) para a matematica e quica em outras areas como por exem-plo a computacao†; pergunto: por que transcorreram nada menos que 126(= 2006 − 1890) anos entre as duas concepcoes?

Segundo entendo, esta demora se deu em funcao de uma questao basica,nao devidademente compreendida (assimilada) pelos matematicos: nova-mente a questao das supostas ambiguidades.

Reitero: o fato dos matematicos terem acreditado durante seculos − in-clusive, ate hoje acreditam − na existencia de tais espectros e, precisamente,o que os impediu de atinar com a referida construcao.

Ha muitos anos atras, estudando a tal construcao, comecei a desconfiarde que ela poderia ser consideravelmente simplificada se nao houvessem asambiguidades nas representacoes, foi a partir daı que comecei a focar nestetema. E de fato, ao exorcizar estes fantasmas, consegui a construcao aquidesenvolvida.

Na epoca em que estudei a construcao que consta no livro do Prof. Eloncomecei a suspeitar de que ela pudesse estar errada, ja que leva em contaas supostas ambiguidades e, para mim, as ambiguidades constituem-se numerro de logica, uma vez que, como ja frisei, uma representacao e uma codi-ficacao e, como tal, exige-se unicidade.

Uma bijecao entre conjuntos identifica elementos, ja um isomorfismo,entre estruturas, identifica um pouco mais: numeros, digamos.

†Encontrei na internet um artigo tecnico aplicando a curva de Peano na computacao,justamente em compactacao de dados.

548

Page 550: Gentil Lopes - Espaços Métricos

9.8 Exercıcios

1) No espaco (R, µ) considere o subconjunto X = {x ∈ R : x ≥ 0 }. Mostreque a famılia C = {Cn}n∈N

, onde Cn = ] − 1, n [, e uma cobertura X.

2) No espaco (R, µ) considere o subconjunto X = ] 0, 1 [, prove que

] 0, 1 [⊂∞⋃

n=3

] 1

n, 1− 1

n

[

3) Considere o espaco metrico (R, µ). As seguintes afirmacoes sao ver-dadeiras, justifique-as:

a) Q nao e compacto;

b){1, 1

2 ,23 ,

34 , . . .

}e compacto;

c) B = { 2 } ∪ [ 3, 4 ] e compacto;

d) Z nao e compacto;

e) [ 1, 2 ] ∩Q nao e compacto.

f) R nao e compacto.

4) Considere num espaco metrico (M, d) uma sequencia (xn) que convergepara a ∈M . Prove que A = { a } ∪ {x1 , x2 , x3 , . . . } e compacto.

5) Considere (V, +, ·) um espaco vetorial normado. Se A ⊂ V e um sub-conjunto compacto e p ∈ V mostre que

Ap = {x+ p : x ∈ A }e compacto.

6) Prove que: Um espaco discreto e compacto e finito e, reciprocamente. Soque utilizando a tecnica (T− 4).

7) O intervalo ] 0, 1 [ nao e um subconjunto compacto de (R, µ).

Prove que da cobertura aberta C ={Cn

}

n≥ 3, onde Cn =

]1n , 1 − 1

n

[,

nao podemos extrair uma subcobertura finita.

8) O intervalo [ 0, +∞ [ nao e um subconjunto compacto de (R, µ).

Prove que da cobertura aberta C ={Cn

}

n∈N, onde Cn = ]− 1, n [, nao

podemos extrair uma subcobertura finita.

9) Exiba uma cobertura aberta de A = { (x, y) ∈ R2 : y > x } que naoadmite subcobertura finita.

10) Sejam A e B subconjuntos de um espaco metrico tais que A e compactoe B e fechado. Prove que A ∩B e compacto.

11) Sejam A e B subconjuntos compactos do espaco (M, d), prove queA ∩B e A ∩B tambem sao compactos.

549

Page 551: Gentil Lopes - Espaços Métricos

12) Se (M, d) e compacto e d′ ∼ d, mostre que d′ e limitada.

13) Utilizando a proposicao 110 (p. 484) e o exemplo 14 (p. 329) prove que oespaco

([0, 1[, k

)e compacto.

14) Mostre que se A e B sao subconjuntos nao-vazios de um espaco (M, d),compacto, e sendo d(A, B) = 0 entao existe p ∈ ∂A ∩ ∂B.

15) Seja (M, d) um espaco metrico compacto. Se d′ e uma metrica sobreM tal que d′(x, y) ≤ k d(x, y), ∀x, y ∈ M , onde k > 0 e uma constantedada, prove que (M, d′) tambem e compacto.

16) Seja (M, d) um espaco metrico. Se A ⊂ M e compacto, mostre quetodo subconjunto infinito B ⊂ A tem um ponto de acumulacao em A.

Sugestao: Suponha B ⊂ A infinito, de modo que B′ ∩A = ∅. Daı, ∀x ∈ A,existe B(x; rx) tal que B(x; rx) ∩ B = ∅ ou B(x; rx) ∩ B = {x }. Emseguida, use o fato de que

(B(x; rx)

)

x∈A e uma cobertura aberta de A quee compacto.

17) Seja (M, d) um espaco metrico. SeK ⊂M (K 6= ∅) e compacto, mostreque existe uma funcao contınua f : M −→ R tal que

K = {x ∈M : f(x) = 0 }.Sugestao: Considere a funcao dada por x −→ d(x, K).

18) Seja A um subconjunto compacto de um um espaco metrico (M, d).Prove que A tambem e compacto.

Sugestao: Para toda sequencia (xn) em A existe uma sequencia (yn) em Ade modo que d(xn , yn) < λ

n , para qualquer λ > 0 fixado “a priori”. Se(yni

) converge para um ponto de A, mostre que (xni) converge em A.

19) Considere a seguinte curva de Peano

0

1

z s sBΨ{ 0, 1 }N

{ 0, 1 }Nη1

η2s

η sξ(x, y)

0

1

1

• Curva de Peano quantica

Localize no quadrado a imagem dos pontos z = 0, 5 e z = 0, 6.

Nota: Observe que neste caso temos uma unica alternativa para codificaros pontos do intervalo [ 0, 1 [; aqui, com mais razao ainda, nao existe “am-biguidade”.

20) Considerando o “Universo em um palito de fosforo” (p. 546), localize(insira, guarde), no palito, o caracter # (sustenido) do teclado.

550

Page 552: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Apendice: Produtos cartesianos infinitos

Considere uma famılia enumeravel de espacos metricos:

(M1 , d1), (M2 , d2), (M3 , d3), . . . , (Mi , di), . . .

o produto cartesiano M = M1 ×M2 ×M3 × · · · =∞∏

i=1

Mi e o conjunto de

todas as sequencias x = (x1 , x2 , . . . , xi , . . .) onde xi ∈ Mi para cada i ∈ N.Os pontos xi sao chamados as coordenadas do ponto x = (xi)i∈N

. Para cadaındice i, a i−esima projecao

pi : M Mi

x = (xi) 7−→ xi

associa a cada ponto x = (xi) do produto cartesiano M sua i−esima coor-denada. A figura a seguir ilustra esta situacao para o caso de dois espacosmetricos:

M1

M2

M1×M2

s x=(x1 , x2)

p1

p2

s

s

րp1 (x)=x1

րp2(x)=x2

Desejamos definir uma metrica no produto cartesianoM , chamadametricaproduto, da qual exigiremos a seguinte propriedade: uma aplicacao

f : M −→∞∏

i=1

Ni

sera contınua se, e somente se, cada uma de suas coordenadas pi◦f : M → Ni

for contınua.Inicialmente assumiremos as seguintes hipoteses sobre os espacos metricos

(Mi , di): Existe, para cada ındice i, uma constante ci > 0 de modo que aserie

∑∞i=1 ci e convergente e, ademais, di(xi , yi) ≤ ci , ∀xi , yi ∈Mi . Sendo

assim, definiremos a metrica produto em M =∏∞i=1Mi , pondo, para quais-

quer dois pontos x = (xi), y = (yi) em M :

d(x, y) =∞∑

i=1

di(xi , yi)

551

Page 553: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Com o auxılio das hipoteses feitas sobre os espacos (Mi , di), o leitorpode mostrar que d, como definida acima, de fato satisfaz os axiomas quedefinem uma metrica. O par (M, d) e chamado o espaco metrico produtodos espacos (Mi , di).

• Vamos abrir um parenteses aqui para particularizar o que foi feitoacima para o espaco que nos interessa mais de perto:

Consideremos o conjunto M = { 0, 1 } munido da metrica d0(x, y) =|x − y|. Observe que d0(x, y) = |x − y| ≤ 1. Para cada i ∈ N definiremos:di(xi , yi) =

1

2i|xi−yi |. Sendo assim, para cada i ∈ N, di(xi , yi) ≤ 1

2i. Deste

modo obtemos os seguintes espacos metricos:

(M1 , d1), onde M1 = {0, 1} e d1(x1 , y1) =|x1−y1 |

2

(M2 , d2), onde M2 = {0, 1} e d2(x2 , y2) =|x2−y2 |

22

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

(Mi , di), onde Mi = {0, 1} e di(xi , yi) =|xi−yi |

2i

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Como estas metricas satisfazem as hipoteses assumidas para os espacos(Mi , di) significa que no produto:

M =∞∏

i=1

Mi =M1 ×M2 ×M3 × · · ·

= {0, 1} × {0, 1} × {0, 1} × · · · = {0, 1}∞

a metrica produto fica:

d(x, y) =∞∑

i=1

di(xi , yi) =∞∑

i=1

|xi − yi |2i

Coincidindo, portanto, com a metrica “usual” deste espaco. •As projecoes pi : (M, d) → (Mi , di) sao contracoes fracas (p. 260, caso

finito) e, deste modo, sao aplicacoes contınuas. Sendo assim, se tomarmosum aberto Ai ⊂ Mi , sua imagem invresa p−1

i

(Ai

)resulta um subconjunto

aberto no espaco produto (M, d) (prop. 62, p. 279).

Temos: (p. 593)

p−1i

(Ai

)={

x ∈M =∏

Mi : pi(x) = xi ∈ Ai

}

=M1 × · · · ×Mi−1 ×Ai ×Mi+1 ×Mi+2 × · · ·o conjunto acima e chamado a “fatia aberta de largura Ai”.

Vamos simular uma situacao destas: Suponhamos M1 = M2 = [ 0, 1 ] econsideremos os abertos

A1 =]1

3,2

3

[

∈M1 ; A2 =]2

3, 1[

∈M2 .

552

Page 554: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Entao,

p−11

(A1

)={x ∈M1 ×M2 : p1(x) = x1 ∈ A1

}

={

x = (x1 , x2) ∈ [ 0, 1 ]× [ 0, 1 ] : p1(x) = x1 ∈]1

3,2

3

[ }

=]1

3,2

3

[× [ 0, 1 ].

De modo similar obtemos p−12

(A2

)= [ 0, 1 ] ×

]23 , 1

[. No grafico estas

fatias abertas ficam assim:

M1×M2

0

1

1

p−11 (A1 )

p−12 (A2 )

Tomando A1 ⊂ M1 , A2 ⊂ M2 , . . . , An ⊂ Mn abertos nos respectivosfatores, o conjunto

A = p−11

(A1

)∩ p−1

2

(A2

)∩ · · · ∩ p−1

n

(An

)

= A1 ×A2 × · · · ×An ×∏

i>n

Mi

e aberto no espaco produto (M, d) por ser a intersecao de um numero finitode abertos. Os conjuntos A do tipo acima sao chamados abertos basicos doproduto cartesiano M =

∏Mi .

Vejamos agora uma importante propriedade dos abertos basicos:

Proposicao 123. Todo subconjunto aberto A ⊂∞∏

i=1

Mi pode ser escrito

como uma reuniao de abertos basicos.

Prova: SendoA aberto, por hipotese, para todo x = (x1 , x2 , . . . , xi , . . .) ∈A existe r > 0 de modo que B(x; r) ⊂ A. Como a serie

∑ci e convergente

entao, pelo criterio de Cauchy, existe uma ordem n0 tal que∑

i>n0

ci <r

2.

Para cada i = 1, 2, . . . n0 , facamos Ai = B(xi ; r/2n0) a bola de centro xi eraio r/2n0 . Vamos mostrar agora que o aberto basico

Ax = A1 ×A2 × · · · ×An0×∏

i>n0

Mi

= B(x1 ; r/2n0)×B(x2 ; r/2n0)× · · · ×B(xn0; r/2n0)×

i>n0

Mi

esta contido em B(x; r) e portanto em A.

553

Page 555: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De fato, seja

y = (yi) ∈ Ax ⇒ d1(x1 , y1) <r

2n0

, . . . , dn0(xn0

, xn0) <

r

2n0

⇒ d(x, y) =∑

i≤n0

di(xi , yi) +∑

i>n0

di(xi , yi) <r

2+r

2= r,

porquanto,∑

i>n0

di(xi , yi) ≤∑

i>n0

ci <r

2.

Sendo assim, para cada x ∈ A, temos um aberto basico Ax tal que x ∈ Ax ⊂A. Logo (prop. 138, p. 599), temos que A =

x∈AAx. �

Corolario 46. As projecoes pi : M →Mi sao aplicacoes abertas do produtoM =

∏Mi .

Prova: Seja A = A1 ×A2 ×· · ·×An ×∏

i>nMi um aberto basico, entao

pi(A) =

Ai , se i ≤ n;

Mi , se i > n.

Portanto pi(A) e aberto em (Mi , di). Dado um aberto qualquer A ⊂ M ,temos A = ∪Ax, reuniao de abertos basicos. Logo,

pi(A) = pi

(⋃

x

Ax)=⋃

x

pi(Ax)

e uma reuniao de abertos, por conseguinte, resulta um aberto em (Mi , di).�

Na prova da proxima proposicao faremos uso da seguinte identidadeentre imagens inversas: Consideremos as seguintes aplicacoes: f : A → B eg : B → C. Se Z ⊂ C, entao (g ◦ f)−1(Z) = f−1

(g−1(Z)

).

rxf−1(g−1(Z))ր

A

rg(f(x))

Z

C

rf(x)g−1(Z)

B

f g

g◦f

Provemos esta identidade, assim:

x ∈ f−1(g−1(Z)

)⇔ f(x) ∈ g−1(Z) ⇔ g

(f(x)

)∈ Z

⇔(g ◦ f

)(x) ∈ Z ⇔ x ∈ (g ◦ f)−1(Z).

554

Page 556: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 124. Uma aplicacao f : N → ∏∞i=1Mi e contınua se, e so-

mente se, cada uma de suas coordenadas fi = pi ◦ f : N →Mi e contınua.

Prova:

(⇒) Se f e contınua, entao para todo ındice i, fi = pi ◦ f e contınua por sercomposta de aplicacoes contınuas.

(⇐) Suponhamos agora cada fi contınua. Seja A = A1 × A2 × · · · × An ×∏

i>nMi um aberto basico, entao A = p−11

(A1

)∩ p−1

2

(A2

)∩ · · · ∩ p−1

n

(An

),

sendo assim

f−1(A)= f−1

(

p−11

(A1

)∩ p−1

2

(A2

)∩ · · · ∩ p−1

n

(An

))

= f−1(p−11

(A1))∩ f−1

(p−12

(A2))∩ · · · ∩ f−1

(p−1n

(An))

=(p1 ◦ f

)−1(A1) ∩

(p2 ◦ f

)−1(A2) ∩ · · · ∩

(pn ◦ f

)−1(An)

= f−11

(A1) ∩ f−12(A2) ∩ · · · ∩ f−1n

(An)

Pela prop. 62 (p. 279) cada f−1i

(Ai) e um aberto, portanto f−1(A)e aberto

em N , por ser interseccao de abertos. Pela prop. 123, dado um aberto A

arbitrario em∏Mi , este pode ser escrito como reuniao de abertos basicos:

A = ∪Ax. Portanto f−1(A)= f−1

(∪Ax

)= ∪xf−1(Ax); f−1

(A)sendo uma

reuniao de abertos e aberto; logo, pela mesma prop. 62 concluimos que f econtınua. �

Demonstraremos um importante corolario da proposicao anterior, masantes necessitaremos de um lema.

Consideremos o subconjunto N ={0, 1, 1

2 , . . . ,1n , . . .

}⊂ R e o sube-

spaco (N, µ). Dada uma sequencia (xn) em um espaco metrico (M, d), eum ponto a ∈M , definiremos uma aplicacao f : N →M , assim: f

(1n

)= xn

e f(0) = a.

(N, µ)

s

ss...s...

s11213

1n

0

(M,d)

ss...s...

s

s

x1

x2

x3

xn=f(1n)

a=f(0)

f

Lema 8. f : N →M e contınua se, e somente se, limnxn = a.

Prova: (⇒) Suponhamos f contınua e mostremos que limnxn = a. De

fato, f sendo contınua em 0 implica que para toda bola centrada em f(0):

555

Page 557: Gentil Lopes - Espaços Métricos

B(f(0); ε

)= B

(a; ε

), existe um δ > 0 de modo que:

x ∈ B(0; δ) ⇒ f(x) ∈ B(a; ε

)

∣∣1

n− 0∣∣ < δ ⇒ f

( 1

n

)= xn ∈ B

(a; ε

)

n >1

δ⇒ xn ∈ B

(a; ε

).

Isto significa que se escolhermos um ındice n0 > 1/δ, todos os termos dasequencia com ındices superiores a este caem dentro da bola de centro a eraio ε, isto garante que lim

nxn = a.

(⇐) Suponhamos que limnxn = a e mostremos que f e contınua. Com efeito,

e suficiente mostrar que f e contınua em 0 uma vez que todos os outrospontos de N sao isolados. Para mostar que f e contınua em 0 centremos emf(0) uma bola de raio ε arbitrario: B

(f(0); ε

)= B

(a; ε

). Como lim

nxn = a

existe um ındice n0 de modo que:

∀n ≥ n0 ⇒ xn ∈ B(a; ε

).

Pondo δ = 1n0

, resulta

1

n< δ ⇒ n >

1

δ= n0 ⇒ xn ∈ B

(a; ε

).

Isto prova que f e contınua em 0. �

Corolario 47. Uma sequencia (xn) no produto M =∞∏

i=1

Mi converge para

o limite a = (a1 , a2 , . . . , ai , . . .) ∈ M se, e somente se, para cada i ∈ N,a sequencia (x1i , x2i , . . . , xni , . . .) = (xni)n∈N

, converge em Mi para o limiteai . Ou ainda,

limn→∞

xn = a ⇐⇒ limn→∞

xni = ai , ∀ i ∈ N.

Prova: (⇒) Se limnxn = a, entao lim

nxni = ai , ∀ i ∈ N.

Inicialmente observe que uma sequencia (xn) em M se escreve assim:

x1 = x11 x12 x13 . . . x1i . . .

x2 = x21 x22 x23 . . . x2i . . .

x3 = x31 x32 x33 . . . x3i . . .

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

xn = xn1 xn2 xn3 . . . xni . . .

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

556

Page 558: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Considerando, como no lema 8, N ={0, 1, 1

2 , . . . ,1n , . . .

}vamos definir

a seguinte aplicacao:

f : N −→M =∏

Mi , dada por

f(1n

)= xn = (xn1 xn2 xn3 . . . xni . . .)

f(0) = a = (a1 a2 a3 . . . ai . . .)

Observe que as funcoes coordenadas fi = pi ◦ f : N → Mi de f sao dadaspor

fi

( 1

n

)

=(pi ◦ f

)( 1

n

)

= pi

(

f( 1

n

))

= pi(xn) = xni

fi(0) =(pi ◦ f

)(0) = pi

(f(0)

)= pi(a) = ai .

Pois bem, pelo lema 8 se limnxn = a entao f e contınua e, pela prop. 124,

cada fi e contınua, sendo assim, novamente pelo lema 8 temos que limnxni =

ai .

(⇐) Se limnxni = ai , entao lim

nxn = a.

De fato, se limnxni = ai , entao pelo lema 8 cada fi = pi ◦ f : N → Mi

e contınua logo, pela prop. 124 tem-se que f : N −→ M =∏Mi resulta

contınua, portanto − novamente pelo lema 8 − limnxn = a. �

O diagrama seguinte pode ser util para eventuais esclarecimentos:

x1 = x11 x12 x13 . . . x1i . . .

x2 = x21 x22 x23 . . . x2i . . .

x3 = x31 x32 x33 . . . x3i . . .

· · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·xn = xn1 xn2 xn3 . . . xni . . .

f(1)−→

f( 12)−→

f( 13)−→

f( 1n)−→↓ ↓ ↓ ↓ ↓a = ( a1 a2 a3 . . . ai . . .)

l(xni )n∈N

←− fi(1n)

Proposicao 125. (Teorema de Cantor-Tychonov)

O espaco (M, d)=( ∞∏

i=1

Mi , d)

e compacto se, e somente se, cada espaco

fator (Mi , di) (i = 1, 2, 3, . . .) e compacto.

Prova: (⇒) Se (M, d) e compacto, entao (Mi , di) e compacto.

557

Page 559: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De fato, seja(xni

)

n∈N uma sequencia arbitraria em Mi , assim:

i = 1 : x11 x21 x31 . . . xn1 . . . ∈M1

i = 2 : x12 x22 x32 . . . xn2 . . . ∈M2

i = 3 : x13 x23 x33 . . . xn3 . . . ∈M3

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Mostremos que(xni

)

n∈N possui uma subsequencia convergente. Comefeito, tomando a transposta da matriz anterior, obtemos:

x1 = x11 x12 x13 . . . x1i . . .

x2 = x21 x22 x23 . . . x2i . . .

x3 = x31 x32 x33 . . . x3i . . .

· · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·xn = xn1 xn2 xn3 . . . xni . . .

↓ ↓ ↓ ↓ ↓a = ( a1 a2 a3 . . . ai . . .)

l(xni )∈Mi· · ·

l(xn1 )∈M1

Obtemos uma sequencia (xn)n∈Nem M e, como este e compacto, esta

sequencia possui uma subsequencia (xn)n∈N1convergindo para um ponto

a = (a1 , . . . , ai , . . .) ∈ M . Pelo corolario 47 (p. 556), temos que (xni)n∈N1

converge em Mi para o limite ai .

(⇐) Se (Mi , di) e compacto, entao (M, d) e compacto.

Pela proposicao 112 (p. 490) e suficiente provar que dada uma sequenciaarbitraria (xn) em M , esta possui uma subsequencia convergente para umponto a ∈ M . Inicialmente obseve que (xn) pode ser escrita na seguintedisposicao matricial:

x1 = x11 x12 x13 . . . x1i . . .

x2 = x21 x22 x23 . . . x2i . . .

x3 = x31 x32 x33 . . . x3i . . .

· · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · · ·xn = xn1 xn2 xn3 . . . xni . . .

↓ ↓ ↓ ↓ ↓a = ( a1 a2 a3 . . . ai . . .)

l(xni )∈Mi· · ·

l(xn1 )∈M1

558

Page 560: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A estrategia da prova sera a seguinte: obteremos um subconjunto infinitoN∗ ⊂ N tal que existe lim

n∈N∗xni = ai ∈ Mi (i = 1, 2, 3, . . .). Entao fazemos

a = (a1 , a2 , . . . , ai , . . .) ∈M e teremos, pelo corolario 47, limn∈N∗

xn = a ∈M .

De fato, sendo M1 compacto, a sequencia (x11 , x21 , x31 , . . . , xn1 , . . .) emM1 possui uma subsequencia convergente. Logo, existem N1 ⊂ N infinito ea1 ∈M1 tais que lim

n∈N1

xn1 = a1 .

Observe que no diagrama anterior nao temos a sequencia (xn1)n∈Ncon-

vergindo para a1 , mas sim uma sua subsequencia: (xn1)n∈N1.

Pois bem, sendoM2 compacto, a sequencia (xn2)n∈N1em M2 possui uma

subsequencia convergente. Logo, existem N2 ⊂ N1 infinito e a2 ∈ M2 taisque lim

n∈N2

xn2 = a2 . Prosseguindo deste modo, obtemos uma sequencia de

conjuntos infinitos:

N ⊃ N1 ⊃ N2 ⊃ N3 ⊃ · · · ⊃ Ni ⊃ · · · (9.9)

e um ponto a = (a1 , a2 , . . . , ai , . . .) ∈M , com limn∈Ni

xni = ai (i = 1, 2, 3, . . .).

Observe que quando definimos subsequencia (p. 140) exigimos uma “or-denacao” no conjunto de ındices, como por exemplo:

N1 = {n1 < n2 < n3 < . . .}

Vamos construir o conjunto N∗ assim: Tomamos emprestado de N1 o seuprimeiro ındice n1 : N∗ = {n1 . . .}. Como N2 e infinito existe um ındicen2 ∈ N2 tal que n2 > n1 ; tomemos emprestado de N2 este ındice: N∗ ={n1 < n2 . . .}. Como N3 e infinito existe um ındice n3 ∈ N3 tal que n3 > n2 ;tomemos emprestado de N3 este ındice: N∗ = {n1 < n2 < n3 . . .}. E assimprosseguimos tomando emprestado ni ∈ Ni tal que:

N∗ ={n1 < n2 < n3 < · · · < ni−1 < ni < · · ·

}

Tendo em conta a cadeia de inclusoes (9.9), obtemos

{n1 < n2 < n3 < · · · < ni−1 < ni < · · ·

}⊂ N1

{n2 < n3 < n4 < · · · < ni−1 < ni < · · ·

}⊂ N2

{n3 < n4 < n5 < · · · < ni−1 < ni < · · ·

}⊂ N3

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Sendo assim, para cada ındice i, a sequencia(xni

)

n∈N∗ e, a partir do seu

i-esimo elemento, uma subsequencia da subsequencia(xni

)

n∈Nie, portanto,

converge para o mesmo limite ai ∈Mi , isto e, limn∈N∗

xni = ai , e isto completa

a prova. �

Corolario 48. O espaco({ 0, 1 }N, ν

)e compacto.

559

Page 561: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Apendice B:(B′, ν

)e compacto e denso (p. 519)

Consideremos o subconjunto B′ ⊂ B, onde

(xn) ∈ B′ ⇐⇒ suas subsequencias de ındices ımpares e pares pertencem a B.

Lema 9 (Gentil/03.05.05). O subespaco(B′, ν

)e compacto.

Prova: Vamos mostrar inicialmente que(B′, ν

)e fechado. Mostraremos

que B′ ⊂ B′. De fato, Considere p ∈ B′ e tal que p 6∈ B′. Entao existe umındice k de modo que p tem, em sua subsequencia de ındices ımpares (oupares − vamos supor ımpares), todos os termos iguais a 1 a partir de 2k−1,assim

p = p1 p2 p3 . . . pn . . .

p1 p3 p5 . . . p2k−11 1 1 . . . 6∈ B

p2 p4 p6 . . . p2n . . .

Como p ∈ B′ existe uma sequencia (xn) de pontos de B′ de modo quelim xn = p. Observe que os termos de (xn) sao da forma:

x1 = x11 x12 x13 . . . x1i . . .

x2 = x21 x22 x23 . . . x2i , . . .

x3 = x31 x32 x33 . . . x3i . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .xn = xn1 xn2 xn3 . . . xni . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Como xn ∈ B′ existem ındices i, arbitrariamente grandes, onde vamos en-contrar um 0 na posicao 2i− 1 de xn , assim

xn = xn1 xn2 . . . xn(2i−2)0 x

n(2i). . .

xn1 . . . xn(2i−3)0x

n(2i+1). . .

xn2 xn4 . . . xn(2i−2). . .

Escolhamos um ındice i de modo que 2i−1 > 2k−1. Tomando ε > 2i−1,teremos 1

2ε <1

22i−1 . Como limxn = p, significa que existe um ındice n0 , a

partir do qual se verifica ν(xn , p) <12ε <

122i−1 . Isto significa que xn deve

coincidir com p ate a posicao 2i − 1 (no mınimo) o que e absurdo. Sendoassim, B′ resulta fechado. Por outro lado o conjunto

{0, 1}N = {0, 1} × {0, 1} × {0, 1} × · · ·

e compacto. Sendo assim,(B′, ν

)resulta compacto, por ser um subconjunto

fechado de um compacto. �

560

Page 562: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Podemos mostrar tambem que B′ e denso em B. De fato, seja ε > 0 e a ∈B dados. Devemos mostrar que existe p ∈ B′ de modo que ν(p, a) < ε. Poisbem, escolhamos j tal que 1

2j < ε e tomemos pn = an para n = 1, 2, . . . , j;

facamos pn = 0 para n ≥ j + 1. Sendo assim p ∈ B′ e ν(p, a) ≤ 1

2j < ε.

∗ ∗ ∗

ր

Que o meu pensamento quis

aproximar-se dos problemas do espırito

pela via de uma diversa experimentacao

de carater abstrato, especulativo, resul-

tante das conclusoes de processos logicos

da mais moderna fısico-matematica.

(Pietro Ubaldi/Ascensoes Humanas)

Se quisermos procurar “Deus” na

fısica, o vacuo e o melhor lugar onde faze-

lo. Enquanto estado basico subjacente

de tudo que existe, o vacuo tem todas as

caracterısticas do Deus imanente ou da

divindade de que falam os mısticos.

(Danah Zohar/fısica e filosofa)

(Universo)

0 0 0 = { }

1 0 00 1 0

1 1 0

0 0 1

1 0 1

0 1 11 1 1

+

Assim como um dia a explosao aconteceu e milhoes de coisas nasce-ram a partir do nada, da mesma maneira, quando a implosao acontece,formas e nomes desaparecem, e novamente o nada nasce daı. O cırculoesta completo. (Osho/Buda, p. 112)

0 0 0

1 0 0...

...

0 1 0

1 1 0

0 0 1

1 0 1

0 1 1

1 1 1

No Nada as possibilidades contraditorias

sao simultaneas, e por isso se anulam reci-

procamente. O Nada e, assim, a totalidade

simultanea das possibilidades contraditorias.

(Marcelo Malheiros/filosofo)

561

Page 563: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Plotando Pontos no Espaco

Esta pagina ficaria em branco (ociosa) decidi aproveita-la para compar-tilhar mais um trabalho meu. E um algoritmo para plotagem de pontos noespaco − o qual sera de utilidade aos usuarios do processador de texto LATEX,no qual este livro foi escrito. Por exemplo, as figuras no espaco que com-parecem neste livro − como as deste capıtulo (“cubos”) − foram tracadascom o auxılio do presente algoritmo.

Deducao do meu algoritmo

Me coloquei o seguinte problema: Como plotar um ponto (x, y, z), doespaco tridimensional, em uma superfıcie bidimensional (a tela do computa-dor ou uma folha de papel, por exemplo)?

Para resolver meu desafio devo construir a seguinte transformacao

T : R3 → R2

x

y

z

t

(X, Y )≡ (x, y, z)

տx

y

z

t

(X, Y )≡ (x, y, z)

Observe que o ponto a ser plotado e “o mesmo” nas duas figuras. Digo,para plotar o ponto de coordenadas (x, y, z) “no espaco” basta plotar oponto de coordenadas (X, Y ) no plano.

Pois bem, so nos resta agora relacionar as “coordenadas virtuais” X eY com as coordenadas reais x, y e z. Isto pode ser feito a partir da figurada direita, da qual destacamos o seguinte triangulo (ver seta):

z−Y

y−X

x

sen θ =y −Xx

⇒ X = y − x · sen θ

cos θ =z − Yx

⇒ Y = z − x · cos θ

Entao, o “menor algoritmo do mundo” para o tracado de superfıcies, e:

(x, y, z) ≡ (X, Y ) = ( y − x · sen θ, z − x · cos θ )

Nota: θ e um angulo, fixado, entre o eixo x e o eixo z (negativo).

562

Page 564: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Capıtulo 10CONSULTAS

Nao sem algum denodo, e ate deleite,

tenho tentado cultivar em meu espırito

uma pequena nesga de iconoclastia.

Fui programado para detectar fis-

sura nas estruturas. (Gentil)

Introducao:

O objetivo deste capıtulo e estabelecer alguns resultados (prerequisitos)para fins de consultas e referencias.

10.1 Elementos de Logica & Demonstracoes

Nesta seccao recordaremos, de modo resumido, alguns conceitos da LogicaMatematica. De inıcio tecemos algumas consideracoes sobre alguns sımbolos,objetivando transferi-los da Logica para o contexto da Matematica. Posteri-ormente estabeleceremos algumas tecnicas de demonstracoes matematicas.

Proposicao:

Chamamos conceito primitivo aquele conceito que aceitamos sem definicao.E o que acontece, por exemplo, com o conceito de proposicao. Portanto, naoo definiremos. Nao obstante, nada impede que conhecamos suas qualidades,tendo em conta que proposicao e uma sentenca declarativa, afirmativa e quedeve exprimir um pensamento de sentido completo; via de regra sendo escritana linguagem usual ou na forma simbolica. Por exemplo, sao proposicoes:

1) senπ

2= 1.

2) π < 2√2.

563

Page 565: Gentil Lopes - Espaços Métricos

3) Todo quadrado e um retangulo.

4) Todo retangulo e um quadrado.

Dizemos que o valor logico de uma proposicao e a verdade (V ) se aproposicao e verdadeira; e a falsidade (F ) se a proposicao e falsa.

Por exemplo, para as proposicoes anteriores,temos

1) V 2) F 3) V 4) F

10.1.1 Operacoes Logicas sobre Proposicoes

Faremos um resumo das operacoes do calculo proposicional tambemchamadas operacoes logicas. Os principais operadores (conectivos) logicossao os seguintes:

∨ Disjuncao (“ou”)∧ Conjuncao (“e”)¯ Negacao−→ Condicional (“se...entao”)←→ Bicondicional (“se e somente se”)

cujas tabelas-verdade sao dadas a seguir (estas tabelas definem os respectivosoperadores):

p q p∨q

V V V

V F V

F V V

F F F

p q p∧q

V V V

V F F

F V F

F F F

p p

V F

F V

p q p−→ q

V V V

V F F

F V V

F F V

p q p←→ q

V V V

V F F

F V F

F F V

p p q p∨q

V F V V

V F F F

F V V V

F V F V

Acrescentamos a tabela-verdade da proposicao p ∨ q a qual nos sera degrande utilidade.

Vamos agora enunciar uma relacao entre proposicoes, que se distinguedos operadores, porque nao cria nova proposicao.

Definicao 67 (Implicacao Logica). Diz-se que uma proposicao p implicalogicamente ou apenas implica uma proposicao q, se e somente se, natabela de p e q, nao ocorre V F em nenhuma linha, com V na coluna de p eF na coluna de q.

564

Page 566: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplo: Da tabela a seguir inferimos que a proposicao q nao implica naproposicao p ∧ q, ao passo que a proposicao p ∧ q implica na proposicao q.

p q p∧q

V V V

V F F

F V F

F F F

q

V

F

V

F

Indica-se que a proposicao p implica a proposicao q com a notacao: p =⇒ q.

Nota: Os sımbolos −→ e =⇒ nao devem ser confundidos, pois p −→ qe uma proposicao enquanto p =⇒ q nao e proposicao. Isto e analogo ao queacontece com o sinal + e o sinal < na Aritmetica: 2 + 5 e um numero e2 < 5 nao e um numero.

A escolha do conectivo (palavra) “se p entao q” para a proposicaop −→ q, a nosso ver, foi infeliz. De fato, isto induz a que se conclua que aproposicao q se deduz ou e uma consequencia da proposicao p. Isto naose da, por exemplo:

5 e um numero ımpar −→√2 e irracional

(Se 5 e um numero ımpar entao√2 e irracional)

e uma proposicao verdadeira (ver tabela-verdade do condicional). Obviamenteque√2 ser irracional nao e consequencia de 5 ser um numero ımpar.

Ao contrario do que acontece na Logica, em Matematica nao compareceo operador logico −→, mas apenas =⇒ com os seguintes significados parap =⇒ q:

1) Se p, entao q;

2) Se p for verdadeira, entao q e verdadeira;

3) p implica q;

4) q e implicada por p;

5) q segue de p;

6) p e uma condicao suficiente para q;

7) q e uma condicao necessaria para p;

8) E impossıvel termos p verdadeira e q falsa simultaneamente,

dentre outros significados possıveis.Neste momento temos uma importante observacao a fazer:

Dos ıtens 1) e 3) vemos que a matematica funde (confunde) os sımbolos −→e =⇒.

565

Page 567: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Como sempre, nestes casos, o “galho quebra” do lado do mais fraco: oaluno que tera que distinguir no contexto matematico se o sımbolo =⇒ estase referindo a ele proprio ou ao condicional −→.

Chama-se tautologia toda proposicao composta cuja ultima coluna dasua tabela verdade encerra somente a letra V (verdade).

Proposicao 126. A proposicao p implica a proposicao q (isto e, p =⇒ q)se, e somente se, a condicional p −→ q e tautologica.

Prova:

p q p−→ q

V V V

V F F

F V V

F F V

(i) Se p implica q, entao, nao ocorreque os valores logicos simultaneos destas duasproposicoes sejam respectivamente V e F , e porconseguinte na ultima coluna da tabela-verdadeda condicional p −→ q consta somente a letra V ,logo, esta condicional e tautologica.

(ii) Reciprocamente, se a condicional p −→ q e tautologica, entao naoocorre que os valores logicos simultaneos das proposicoes p e q sejam respec-tivamente V e F , e por conseguinte p implica q. �

Uma diferenca basica entre proposicao e teorema e que enquanto e lıcitose cogitar do valor logico de uma proposicao (isto e, uma proposicao podeser verdadeira ou falsa) o mesmo nao acontece com um teorema, que sempree verdadeiro. Nao se demonstra teoremas, mas sim proposicoes. Uma vezdemonstrada a veracidade de uma proposicao: p −→ q, esta adquire statusde teorema: p =⇒ q.

p q p−→ q

V V V

V F F

F V V

F F V

Em matematica, para demonstrar-se a vali-dade de uma proposicao p −→ q assumimos ahipotese p como sendo verdadeira. Sendo assimpodemos nos restringir as duas primeiras linhasda tabela verdade do condicional −→.

Uma vez assumido p verdadeira se con-seguirmos demonstrar a veracidade de q entao podemos riscar a segundalinha da tabela verdade do condicional. Apos isto a proposicao p −→ qresulta tautologica e, por conseguinte,

p =⇒ q

Isto e, a proposicao p −→ q tornou-se o teorema p =⇒ q.

Definicao 68 (Equivalencia Logica). Diz-se que uma proposicao p e logi-camente equivalente ou apenas equivalente a uma proposicao q, se astabelas-verdade destas duas proposicoes sao iguais.

566

Page 568: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Indica-se que a proposicao p e equivalente a proposicao q com a notacao:

p ⇐⇒ q

Os sımbolos ←→ e ⇐⇒ nao devem ser confundidos, pois p←→ q e umaproposicao enquanto p⇐⇒ q nao e proposicao.

Os argumentos arrolados anteriormente a respeito dos sımbolos −→ e=⇒ podem ser adaptados para os sımbolos ←→ e ⇐⇒.

A seguir listamos varias maneiras de se formular p ⇐⇒ q em palavras∗:

1) Se p, entao q e recıprocamente;

2) Se q, entao p e recıprocamente;

3) q e verdadeira se, somente se, p for verdadeira;

4) p implica q e recıprocamente;

5) p e uma condicao necessaria e suficiente para q;

6) q e uma condicao necessaria e suficiente para p;

7) p e q sao proposicoes equivalentes.

Dos ıtens 1) e 4) acima, vemos que a matematica (con) funde os sımbolos←→ e ⇐⇒.

Proposicao 127. A proposicao p e equivalente a proposicao q (isto e,p ⇐⇒ q) se, e somente se, a bicondicional p ←→ q e tautologica.

Prova: (i) Se p e equivalente a q, entao, tem tabelas-verdade iguais, epor conseguinte o valor logico da bicondicional p ←→ q e sempre V , istoe, esta bicondicional e tautologica (ver tabela-verdade da bicondicional, p.564).

(ii) Recıprocamente, se a bicondicional p ←→ q e tautologica, entao, aultima coluna da sua tabela-verdade encerra somente a letra V , e por con-seguinte os valores logicos respectivos das proposicoes p e q sao ambos V ouambos F , isto e, estas duas proposicoes sao equivalentes. �

Portanto, a toda equivalencia logica corresponde uma bicondicional tau-tologica e vice-versa.

∗ ∗ ∗

Tomemos entao um espaco sem materia, “vazio”. A fısica quanticamostra que, mesmo neste caso, flutuacoes de energia existem. O nada temuma energia associada. Sendo assim, partıculas podem surgir dessas flu-tuacoes, materia brotando do nada. (Marcelo Gleiser/Fısico)

∗Isto na Matematica, nao na Logica.

567

Page 569: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Equivalencias Notaveis

A seguir listamos algumas equivalencias entre proposicoes, as quais po-dem ser demonstradas com o auxılio das respectivas tabelas-verdade.

1) ¯p⇐⇒ p (Dupla Negacao)

2) Leis Idempotentes

a) p ∨ p⇐⇒ p

b) p ∧ p⇐⇒ p

3) Leis Comutativas

a) p ∨ q ⇐⇒ q ∨ pb) p ∧ p⇐⇒ q ∧ p

4) Leis Associativas

a) p ∨ (q ∨ r)⇐⇒ (p ∨ q) ∨ rb) p ∧ (q ∧ r)⇐⇒ (p ∧ q) ∧ r

5) Leis de De Morgan∗

a) ( p ∨ q ) ⇐⇒ p ∧ q

b) ( p ∧ q ) ⇐⇒ p ∨ q

6) Leis Distributivas

a) p ∧ ( q ∨ r ) ⇐⇒ (p ∧ q) ∨ (p ∧ r)b) p ∨ ( q ∧ r ) ⇐⇒ (p ∨ q) ∧ (p ∨ r)

10.1.2 Tecnicas (Engenharia) de Demonstracao

Os problemas em matematica dividem-se em duas classes:

Determinacao: calcule, encontre, ache, determine,. . .

Demonstracao: mostre, prove, demonstre,. . .

Costumo mesmo dizer que a matematica comeca com os problemas dosegundo tipo. De fato, a resolucao da maioria dos problemas do primeirotipo sao algoritmicas (mecanicas); enquanto os problemas do segundo tipoexigem muito de criatividade (engenhosidade).

Um outro criterio que utilizo para distinguir nao-matematica (algoritmo)

∗Augustus De Morgan (1806 − 1873) lecionou no University College, Londres. Foimatematico e logico, e contribuiu para preparar o caminho da Logica matematica moderna.

568

Page 570: Gentil Lopes - Espaços Métricos

de matematica, e que a nao-matematica e susceptıvel de programacao − aexemplo dos poderosos softwares algebricos − enquanto que a matematicaem si (demostracoes) nao.

Ademais, estou propenso a acreditar que podemos ver a maioria dos “ob-jetos” como consistindo de materia e espırito. Para contextualizar minhatese vejamos alguns exemplos:

1o ) Um computador consiste de hardware e software, o hardware e aparte material e o software e o espırito do computador.

2o ) Uma celula e composta de materia (e o que os biologos enxergamao microscopio) e espırito (software que comanda suas atividades) que osbiologos nao enxergam ao microscopio.

3o ) Os numeros inteiros, sao compostos de materia:

Z = { . . . ,−3, −2, −1, 0, 1, 2, 3, . . . }

e espırito, que sao seus axiomas de manipulacao da materia (sımbolos) taiscomo: comutatividade, associatividade, elemento neutro, elemento oposto,Princıpio da Boa Ordem, etc.

De igual modo, a matematica possui uma parte material (sımbolos) euma parte espiritual (conceitos, ideias), o que se estar a manipular∗ por aıe apenas o corpo (cadaver) da matematica, seu espırito fica de fora.

− Para se lidar com o espırito da matematica (viva) torna-se indis-pensavel o conhecimento de algumas tecnicas de demonstracao.

1. Proposicoes Aparentadas

p −→ q : Direta

q −→ p : Recıproca

p −→ q : Contraria

q −→ p : Contrapositiva (contra-recıproca)

2. Equivalencia Entre Proposicoes Aparentadas

2.1 A proposicao direta equivale a contra-recıproca.

p −→ q ⇐⇒ q −→ p

∗Por aı a que me refiro e a matematica praticada ate o ensino medio e em algumascadeiras da universidade, e uma matematica mecanica, morta. O fato de voce manusearo controle remoto de sua televisao nao significa que voce compreende como ele funciona.De igual modo, muitos manipulam a matematica sem compreender como ela funciona, euma matematica sem vida, sem espırito!

569

Page 571: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Para provar isto faremos uso da seguinte identidade:

p −→ q = p ∨ q

Esta identidade pode ser obtida das respectivas tabelas-verdade.Prova:

(i) p −→ q = p ∨ q(ii) q −→ p = ¯q ∨ p

= p ∨ q

Isto significa que as proposicoes p −→ q e q −→ p assumemsempre os mesmos valores logicos; isto e, ou sao ambas ver-dadeiras (V ) ou sao ambas falsas (F ).

Sendo assim acabamos de estabelecer nossa primeira tecnicade demonstracao indireta:

(T-1) O teorema direto equivale ao contra-recıproco†

H =⇒ T ⇐⇒ T =⇒ H

Enunciemos nossa segunda tecnica de demonstracao indireta:

(T-2) Anexacao a hipotese da negacao da tese

H =⇒ T ⇐⇒(H ∧ T

)=⇒ T

Prova: Provemos a seguinte equivalencia:

p −→ q ⇐⇒(p ∧ q

)−→ q

De fato,

(i) p −→ q = p ∨ q.

(ii) p ∧ q −→ q = (p ∧ q) ∨ q= ( p ∨ ¯q ) ∨ q= p ∨ q ∨ q= p ∨ q.

†H : Hipotese, T : Tese, H: Negacao da hipotese, T : Negacao da tese.

570

Page 572: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(T-3) Reducao ao absurdo

H =⇒ T ⇐⇒(H ∧ T

)=⇒ f

Onde: f e uma proposicao de valor logico falso (e qualquer con-tradicao).

Prova: Provemos a seguinte equivalencia:

p −→ q ⇐⇒(p ∧ q

)−→ f

De fato,

(i) p −→ q = p ∨ q.

(ii) p ∧ q −→ f = (p ∧ q) ∨ f

= (p ∧ q)= p ∨ ¯q

= p ∨ q.

Nota: Na tabela-verdade da proposicao p ∨ q vemos que quandoo valor logico de q e F , prevalece o valor logico de p. Estamosdizendo que p ∨ f = p.

Resumindo: Para utilizar esta tecnica em uma demonstracao,devemos anexar a Hipotese a negacao da Tese e devemos exibir,ao final, alguma contradicao (algum absurdo).

Uma Equivalencia Notavel

Uma das equivalencias mais utilizadas em demonstracoes matematicase a que segue

(T-4) Teorema com hipotese composta (∧)Se a hipotese de um teorema e formada pela conjuncao de

duas outras, e valida a seguinte equivalencia

(H1 ∧H2

)=⇒ T ⇐⇒

(H1 ∧ T

)=⇒ H2

Isto e, junta-se a uma das hipoteses a negacao da tese edemonstra-se a negacao da outra hipotese.

Prova: Provemos a seguinte equivalencia

p ∧ q −→ r ⇐⇒ p ∧ r −→ q

571

Page 573: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De fato,

p ∧ q −→ r = (p ∧ q) ∨ r= (p ∨ q) ∨ r= p ∨ q ∨ r.

Por outro lado,

p ∧ r −→ q = (p ∧ r) ∨ q= (p ∨ ¯r) ∨ q= p ∨ r ∨ q.

Vejamos alguns exemplos de aplicacao desta equivalencia:

1o) Teoria dos numeros: Se a divide b e a nao divide c entao b nao divide c.

H1 : a|b⇒ T: b 6 | c.

H2 : a 6 | c

H1 ∧ T =⇒ H2

Prova: Para algum n1 e algum n2 inteiros, resulta

H1 :b

a= n1

=⇒ c

b=

c

a · n1

= n2

T :c

b= n2

Observe quec

a= n1 · n2 ≡ H2

2o) Em Analise: Se a ≤ b e b ≤ a entao a = b.

H1 : a ≤ b⇒ T: a = b.

H2 : b ≤ a

H1 ∧ T =⇒ H2

572

Page 574: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Suponha a ≤ b e a 6= b, entao a < b. �

3o) Em Analise:

Se n ∈ N, x ∈ R, e n < x < n+ 1, entao x 6∈ N.

H1 : x > n⇒ T: x 6∈ N.

H2 : x < n+ 1

H1 ∧ T =⇒ H2

Prova: Se x > n e x ∈ N entao x ≥ n+ 1. �

4o) Em Teologia (Unicidade de Deus)Suponhamos que existam dois Deuses D e D′:

H1 : D e Deus⇒ T: D = D′

H2 : D′ e Deus

Prova: H1 ∧ T : Suponhamos que D e Deus e que D 6= D′. Entaoexiste algum atributo em D nao partilhado por D′, por conseguinteD′ nao e Deus, o que contraria H2 . �

Sugestao: Quando voce estudante encontrar-se frente a um teorematipo

H1 ∧H2 =⇒ T

e, apos bater o desespero (ou antes mesmo), tente demonstrar o equi-valente

H1 ∧ T =⇒ H2

(T-5) O seguinte teorema nao e raro em matematica:

H1 ⇐⇒(H2 =⇒ T

)

E um teorema, tipo “se e somente se”, isto e

H1 =⇒(H2 =⇒ T

)

H1 ⇐=(H2 =⇒ T

)

Entao

(i) H1 =⇒(H2 =⇒ T

)

Observemos que a tese do teorema acima e um outro teorema.

573

Page 575: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Isto significa que assumindo H1 devemos demonstrar H2 =⇒ T . Istoe, devemos mostrar que H2 acarreta T . Ainda,

H1 ∧H2 =⇒ T

Esta conclusao pode ser provada assim:

H1 −→(H2 −→ T

)= H1 ∨

(H2 −→ T

)

= H1 ∨(H2 ∨ T

)

= (H1 ∧H2) ∨ T= H1 ∧H2 −→ T.

Portanto subsiste a seguinte equivalencia

H1 =⇒(H2 =⇒ T

)⇐⇒

(H1 ∧H2 =⇒ T

)

(ii)(H2 =⇒ T

)=⇒ H1

Consideremos a contrapositiva: H1 =⇒(H2 =⇒ T

). Entao,

H1 −→(H2 −→ T

)= H1 −→

(H2 ∨ T

)

= H1 −→ H2 ∧ T

Portanto subsiste a seguinte equivalencia

((H2 =⇒ T ) =⇒ H1

)⇐⇒

(H1 =⇒ H2 ∧ T

)

(T-6) Teorema com hipotese composta (∨)Se a hipotese de um teorema e formada pela disjuncao de duas

outras, e valida a seguinte equivalencia

(H1 ∨H2

)=⇒ T ⇐⇒

(H1 =⇒ T

)∧(H2 =⇒ T

)

Prova: Provemos a seguinte equivalencia

p ∨ q −→ r ⇐⇒(p −→ r

)∧(q −→ r

)

De fato,

p ∨ q −→ r = (p ∨ q) ∨ r= (p ∧ q) ∨ r=(p ∨ r

)∧(q ∨ r

)

=(p −→ r

)∧(q −→ r

)

574

Page 576: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(T-7) Teorema com tese composta (∨)Se a tese de um teorema e formada pela disjuncao de duas outras,

e valida a seguinte equivalencia

H =⇒(T1 ∨ T2

)⇐⇒

(H ∧ T1 =⇒ T2

)

Prova: Provemos a seguinte equivalencia

p −→ ( q ∨ r ) ⇐⇒ ( p ∧ q ) −→ r

De fato,

p −→ ( q ∨ r ) = p ∨ ( q ∨ r )= ( p ∨ q ) ∨ r

= ( p ∧ q ) ∨ r= ( p ∧ q ) −→ r

Vejamos um exemplo de aplicacao desta tecnica em espacos vetorias.

Proposicao: Uma igualdade λu = 0, com λ ∈ R e u ∈ V , so e possıvel seλ = 0 ou u = 0.

Prova: Inicialmente vamos reescrever a proposicao da seguinte forma:

H : λu = 0 ⇒

T1 : λ = 0

ou

T2 : u = 0

Temos,H ∧ T1 : λu = 0 e λ 6= 0.

Sendo assim existe o numero real λ−1, multiplicando λu = 0 por λ−1,obtemos

λ−1 (λu ) = λ−1 0 ⇒ (λ−1 · λ )u = 0 ⇒ 1u = 0 ⇒ u = 0

575

Page 577: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Resumo das Tecnicas de Demonstrac~oes

(T-1) H ⇒ T ⇐⇒ T ⇒ H

(T-2) H ⇒ T ⇐⇒(H ∧ T

)⇒ T

(T-3) H ⇒ T ⇐⇒(H ∧ T

)⇒ f (f =absurdo)

(T-4)(H1 ∧H2

)⇒ T ⇐⇒

(H1 ∧ T

)⇒ H2

Gentil

(T-5) H1 ⇐⇒(H2 ⇒ T

)

H1 =⇒(H2 ⇒ T

)⇐⇒

(H1 ∧H2 ⇒ T

)

H1 ⇐=(H2 ⇒ T

)⇐⇒

(H1 ⇒ H2 ∧ T

)

(T-6)(H1 ∨H2

)⇒ T ⇐⇒

(H1 ⇒ T

)∧(H2 ⇒ T

)

(T-7) H ⇒(T1 ∨ T2

)⇐⇒

(H ∧ T1

)⇒ T2

(T-8) H ⇒ T ⇐⇒(H ∧ T

)⇒ H

Dois outros recursos uteis para a formulacao de definicoes em matematicasao dados a seguir.

10.1.3 Funcoes Proposicionais/Quantificadores

Consideremos as proposicoes:

p : x+ 6 < 10, V ( p ) =?

q : 2 + 6 < 10, V ( q ) = 1

A proposicao q, como se ve, e verdadeira, ao passo que nada podemosafirmar sobre o valor logico de p : V (p) =?; que somente sera conhecidoquando x for substituido por um numero bem determinado. Neste caso,dizemos que a proposicao p e uma funcao proposicional ( f.p. ) ou ainda,uma sentenca aberta. Na funcao proposicional

p(x) : x+ 6 < 10

o sımbolo x e chamado de variavel.Chamamos conjunto universo da variavel ao conjunto das possibilidades

que podem substituir a variavel na sentenca. Denotaremos este conjuntopor U. Cada elemento de U chama-se valor da variavel. Algumas vezes oconjunto universo U e imposto pelo contexto e outras vezes pode ser escol-hido livremente pelo agente de estudo em questao.

576

Page 578: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplos:1o) Consideremos a funcao proposicional p dada por

p(x) : x+ 6 < 10

Podemos escolher para o conjunto dos valores da variavel, por exemplo, umdos seguintes conjuntos:

N, Z, Q, R ou { 0, 2, 4, 6, . . . }

2o) Consideremos a funcao proposicional p dada por

p(x) : 1 ≤ x2 − 1

x+ 1< 3

Neste caso ainda temos uma certa liberdade na escolha do conjunto universoU, sendo que em qualquer escolha nao deve constar o numero x = −1. Porexemplo, duas escolhas possıveis sao U = N e U = Z− {−1 }.

Conjunto-verdade (da sentenca aberta) e o conjunto dos valores davariavel para os quais a sentenca torna-se verdadeira. Denotaremos esteconjunto por V:

V ={x ∈ U : V

(p(x)

)= V

}

Quantificador universal

Usaremos o sımbolo “∀ ” , chamado quantificador universal, para ex-primir o fato de que “para todo x em um dado conjunto, a proposicao p(x)e verdadeira”. Uma proposicao do tipo “Para todo x; p(x)” e simbolica-mente escrita como: ∀x ; p(x).

Quantificador existencial

No caso de proposicoes que envolvem expressoes do tipo “Existe”, “Hapelo menos um”, “para ao menos um” e “Algum”, usaremos o sımbolo “∃ ”,chamado quantificador existencial, para exprimir o fato de que para pelo aomenos um elemento de um dado conjunto a proposicao p(x) e verdadeira.Uma proposicao do tipo “Existe x tal que p(x)” pode ser escrita simbolica-mente como: ∃x ; p(x).

Valores logicos de sentencas quantificadas

A sentenca ∀x ; p(x) e verdadeira se, e somente se, o conjunto-verdadede p(x) e o conjunto universo forem iguais, isto e, V = U (ou se, substituindode x por cada um dos elementos u do conjunto universo, p(u) e verdadeira)e, falsa quando V 6= U.

Na tabela a seguir damos alguns exemplos do que acabamos de definir:

577

Page 579: Gentil Lopes - Espaços Métricos

∀x ; p(x) U V V (∀ x ; p(x))

∀x ; x2−4=0

∀x ; x2−4=0

∀x ; x≤ 0

∀x ; x≤ 0

∀x ;√x2=x

∀x ;√x2=|x|

∀x ; x2−1x+1

=x−1

∀x ; x2−1x+1

=x−1

{−2, 2 }{−2, 0, 2 }Z

Z−

R

R

R−{−1 }

N

{−2, 2 }{−2, 2 }Z−

Z−

R+

R

R−{−1 }

N

V

F

F

V

F

V

V

V

A sentenca ∃x ; p(x) e verdadeira se, e somente se, o conjunto-verdadede p(x) e nao-vazio, ou seja, V 6= ∅ e, falsa quando V = ∅.

Na tabela a seguir damos alguns exemplos do que acabamos de definir:

∃x ; p(x) U V V (∃ x ; p(x))

∃x ; x2−4=0

∃x ; x2+1=0

∃x ; x2+1=0

∃x ; x< 0

∃x ; (−1)·x 6=−x

∃x ;√x2 6= x

∃x ; |x|=x

∃x ; |x|=−x

{−2, 3 }R

C

C

R

R

{−1,−2 }

{−1, 2 }

{−2 }∅{−i, i }∅

∅R−∗

{−1 }

V

F

V

F

F

V

F

V

Negacao de sentencas quantificadas

Ja tivemos oportunidade de assinalar a diferenca entre a atividade matema-tica (engenhosidade) e a atividade algoritmica (mecanica); pois bem, parafazer-se matematica (isto e demonstracoes) o que ha de mais importante saoas definicoes e, juntamente com estas, suas negacoes; daı a importancia danegacao de sentencas quantificadas.

Proposicao 128 (Negacao de ∀x ; p(x)). A seguinte equivalencia e valida:

∀x ; p(x) ⇐⇒ ∃x ; p(x) (10.1)

Prova: Mostraremos que as proposicoes ∀x ; p(x) e ∃x ; p(x) sao equiv-alentes mostrando que elas concordam em seus valores logicos, isto e,

V(

∀x ; p(x))

= V(

∃x ; p(x))

578

Page 580: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De fato, suponha que ∀x ; p(x) e verdadeira. Entao, ∀x ; p(x) e falsa e,deste modo, existe u ∈ U de modo que

p(u) e falsa.

Entao, para este elemento

p(u) e verdadeira.

Sendo assim,

∃x ; p(x) e verdadeira.

Suponha agora que ∀x ; p(x) e falsa. Entao, ∀x; p(x) e verdadeira e,deste modo, para todo u ∈ U, tem-se

p(u) e verdadeira.

Entao, para todo u ∈ U, tem-se

p(u) e falsa.

Sendo assim,

∃x ; p(x) e falsa.

Um importante corolario e o que vem dado a seguir:

Corolario 49. A seguinte equivalencia e valida:

∀x ; p(x) −→ q(x) ⇐⇒ ∃x ; p(x) ∧ q(x)

Prova: De fato,

∀x ; p −→ q = ∃x ; p −→ q = ∃x ; p ∨ q = ∃x ; p ∧ q.

Deixamos como exercıcio a prova da

Proposicao 129 (Negacao de ∃x ; p(x)). A seguinte equivalencia e valida:

∃x ; p(x) ⇐⇒ ∀x ; p(x) (10.2)

Valores logicos de sentencas quantificadas de duas variaveis

Seja p(x, y) uma sentenca aberta (ou funcao proposicional) com duasvariaveis. Inicialmente observamos que, nao necessariamente, as variaveisenvolvidas tem o mesmo conjunto universo. Na “pratica” e frequente queestes conjuntos sejam distintos. Assim e que os denotaremos por: Ux e Uy.

579

Page 581: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por exemplo, para a sentenca

p(x, y) :x2 − 1

x+ 1+y2 − 1

y − 1< 0

os respectivos conjuntos universos sao necessariamente distintos, podendoser, por exemplo:

Ux = R− {−1 } e Uy = R− { 1 }.

Obs: Quando em um dado contexto citarmos apenas um conjunto universo,significa que este e o mesmo para as duas variaveis, isto e, Ux = Uy.

a) A sentenca ∀x ∀ y ; p(x, y). A sentenca

∀x ∀ y ; p(x, y)

e verdadeira se, e somente se, para toda substituicao de x por elementos ade Ux e y por elementos b de Uy,

p(a, b) e verdadeira.Exemplo: A sentenca

∀x ∀ y ; x · y = y · x,e verdadeira com os conjuntos universo Ux = N e Uy = Z; mas nao comos conjuntos universo Ux = M2(N)= conjunto das matrizes quadradas deordem 2, com elementos naturais e Uy = M2(Z)= conjunto das matrizesquadradas de ordem 2, com elementos inteiros. Por exemplo, para

x =

[1 00 2

]

, y =

[0 −11 0

]

,

temos x · y 6= y · x.Exemplo: A sentenca

∀x ∀ y ; x2 < y,com os conjuntos universoUx = {−1, 0, 1 } eUy = { 1, 2 } e falsa, porquantosubstituindo x por −1 e y por 1, a sentenca (−1)2 < 1 resulta falsa.

b) A sentenca ∃x ∃ y ; p(x, y). A sentenca

∃x ∃ y ; p(x, y)

e verdadeira se, e somente se,p(a, b) e verdadeira.

para alguma substituicao de x por um elemento a deUx e y por um elementob de Uy.

Exemplo: A sentenca∃x ∃ y ; x · y = y · x,

580

Page 582: Gentil Lopes - Espaços Métricos

e verdadeira com os conjuntos universo Ux = M2(N) e Uy = M2(Z). Porexemplo

x =

[1 00 1

]

, y =

[0 −11 0

]

,

sao tais que x · y = y · x.Exemplo: A sentenca

∃x ∃ y ; x2 < y,com o conjunto universo {−1, 0, 1 } e verdadeira, porquanto substituindo xpor 0 e y por 1, a sentenca 02 < 1 resulta verdadeira.

Exemplo: A sentenca

∃x ∃ y ; xy=√2,

com o conjunto universo Z e falsa.

c) A sentenca ∀x ∃ y ; p(x, y). A sentenca

∀x ∃ y ; p(x, y)

e verdadeira se, e somente se, para toda substituicao de x por elementos ade Ux, a sentenca (de uma unica variavel)

∃ y ; p(a, y) e verdadeira.

Exemplo: A sentenca

∀x ∃ y ; x+ y = 0e verdadeira com o conjunto universo {−1, 0, 1 }, porquanto

∃ y; −1 + y = 0 (V ; y = 1 )

∃ y; 0 + y = 0 (V ; y = 0 )

∃ y; 1 + y = 0 (V ; y = −1 )

Exemplo: A sentenca

∀x ∃ y ; y < xe falsa com o conjunto universo { 0, 1, 2 }. Note que:

∃ y; y < 2 (V ; y = 0, ou 1 )

∃ y; y < 1 (V ; y = 0 )

∃ y; y < 0 (F ; V = ∅ )

d) A sentenca ∃ y ∀x ; p(x, y). A sentenca

∃ y ∀x ; p(x, y)

e verdadeira se, e somente se, a sentenca (de uma unica variavel)

∀x ; p(x, b)e verdadeira para alguma substituicao de y por um elemento b do conjuntouniverso Uy.

581

Page 583: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Exemplo: A sentenca

∃ y ∀x ; |x|+ |y| = 1e verdadeira com os conjuntos universo Uy = {−1, 0, 1 } eUx = {−i, i, −1, 1 },porquanto a sentenca

∀x ; |x|+ |0| = 1e verdadeira.

Exemplo: A sentenca

∃ y ∀x ; y > xe falsa com o conjunto universo {−1, 0, 1 }, porquanto cada uma das sen-tencas

∀x; −1 > x

∀x; 0 > x

∀x; 1 > x

e falsa.

Exemplo: A sentenca

∃ y ∀x ; y ≥ xe verdadeira com o conjunto universo {−1, 0, 1 }. Note que:

∀x; −1 ≥ x (F ; x = 0, ou 1)

∀x; 0 ≥ x (F ; x = 1 )

∀x; 1 ≥ x (V ; y = 1 )

Negacao de sentencas quantificadas de duas variaveis

Observe que, por definicao,

∀x ∃ y ; p(x, y) = ∀x ;(∃ y ; p(x, y)

)

Por conseguinte,

∀x ∃ y ; p(x, y) = ∀x ;(∃ y ; p(x, y)

)

= ∃x ;(∃ y ; p(x, y)

)

= ∃x∀ y ; p(x, y)

Isto e,

∀x ∃ y ; p(x, y) = ∃x∀ y ; p(x, y)

Similarmente,

∃x ∀ y ; p(x, y) = ∃x ;(∀ y ; p(x, y)

)

582

Page 584: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Por conseguinte,

∃x ∀ y ; p(x, y) = ∃x ;(∀ y ; p(x, y)

)

= ∀x ;(∀ y ; p(x, y)

)

= ∀x∃ y ; p(x, y)

Isto e,

∃x ∀ y ; p(x, y) = ∀x∃ y ; p(x, y)

10.2 Conjuntos, Funcoes e Famılia de conjuntos

O objetivo desta secao sera um breve resumo de funcoes e famılia deconjuntos para futuras referencias.

Conjunto, Elementos

O conceito de conjunto comparece em todos os ramos da Matematica.Intuitivamente, um conjuto e qualquer colecao bem definida de objetos.

Os conjuntos sao designados por letras latinas maiusculas:

A, B, C, . . . , X, Y, Z.

Os objetos que constituem um conjunto chamam-se elementos do conjuntoe serao designados por letras latinas minusculas:

a, b, c, . . . , x, y, z.

A afirmacao “p e elemento de A” ou, de modo equivalente, “p pertencea A”, escreve-se

p ∈ AA negacao de p ∈ A escreve-se p 6∈ A.

Sao duas as principais maneiras de se especificar - descrever - um dadoconjunto. A primeira consiste em enumerar (evidentemente quando isto epossıvel) seus elementos entre chaves e separados por vırgula. Por exemplo,

A = { 1, 2, 3, 4, 5 }

A segunda consiste em dar (sem ambiguidade) uma propriedade− proposicao− caracterizando todos os seus elementos. Por exemplo,

B = {x : x e uma vogal }

(le-se: “B e o conjunto dos elementos x tais que x e uma vogal.”)Como mais um exemplo,

C = {x : x e um numero natural par }

583

Page 585: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Subconjuntos

Um conjunto A e dito subconjunto de B, escrevendo-se

A ⊂ B ou B ⊃ A

se, e somente se, todo elemento de A e tambem elemento deB. Em Sımbolos,

A ⊂ B ⇐⇒ ∀x ∈ A ⇒ x ∈ B.

Nota: A 6⊂ B quando existe um elemento em A que nao pertence a B.Por exemplo, consideremos os conjuntos

A = { 1, 3, 5, 7, . . . }, B = { 2, 3, 5, 7, . . . }C = { 4n − 1: n ∈ N } = { 3, 7, 11, . . . }

Temos C ⊂ A, porquanto todo elemento de C e um numero ımpar; poroutro lado B 6⊂ A, porquanto 2 ∈ B e 2 6∈ A.

Observe que, segundo a definicao de subconjunto, o conjunto dos numerosreais nao e subconjunto do conjunto dos numeros complexos. Isto e,

R 6⊂ C.

Isto porque os elementos de C sao pares ordenados de numeros reais. Deoutro modo: os elementos destes conjuntos sao de naturezas distintas. Porexemplo,

(1, 3), (−1, 2), (3, 0) ∈ C;√2, 3, π ∈ R.

Reiteramos: Nao ha um unico numero real que tambem seja um numerocomplexo.

Igualdade de Conjuntos

Definicao 69. Dois conjuntos A e B sao iguais se, e somente se,

A ⊂ B e B ⊂ A.

Das definicoes dadas ate aqui decorre o seguinte

Teorema 7. Se A, B e C sao conjuntos quaisquer, entao

(i) A ⊂ A;(ii) se A ⊂ B e B ⊂ A =⇒ A = B;(iii) se A ⊂ B e B ⊂ C =⇒ A ⊂ C.

584

Page 586: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Importante!

Uma observacao importante − e oportuna −: quando devemos mostrarque dois conjuntos A e B sao iguais, esta prova deve ser feita em duas eta-pas: primeiro provamos que A ⊂ B e, para isto, devemos tomar um elementoarbitrario em A e mostrar que este elemento tambem esta em B; segundo,provamos que B ⊂ A, desta vez tomamos um elemento arbitrario de B emostramos que este elemento tambem esta em A.

Conjunto Vazio e Conjunto Universo

Para que possamos criar uma “algebra” de conjuntos − o que faremoslogo mais − e conveniente introduzir o conceito de conjunto vazio, comosendo o conjunto desprovido de qualquer elemento. Este conjunto e deno-tado pelo sımbolo ∅.

Em toda aplicacao da Teoria dos Conjuntos, todos os elementos e sub-conjuntos em consideracao estao em um conjunto fixo. Este conjunto fixochama-se conjunto universo, e designa-lo-emos pela letra U .

Amiude, a solucao de um problema depende do conjunto universo fixado.Por exemplo, para conjunto solucao da equacao 3x = 2, temos:

Se U = N ⇒ S = ∅Se U = Z ⇒ S = ∅Se U = Q ⇒ S = { 2/3 }Se U = R ⇒ S = { 2/3 }

Para conjunto solucao da equacao 2x3 − x2 + 2x− 1 = 0, temos:

Se U = N ⇒ S = ∅Se U = Z ⇒ S = ∅Se U = Q ⇒ S = { 1/2 }Se U = R ⇒ S = { 1/2 }Se U = C ⇒ S = {−i, i, 1/2 }

Operacoes com conjuntos

Introduziremos agora alguns metodos de construcao de novos conjuntos,a partir de conjuntos dados.

Definicao 70 (Uniao). Sejam A e B subconjuntos de um dado conjuntoU . A uniao de A com B e o subconjunto de U , indicado por A ∪B, assimdeterminado:

A ∪B ={x ∈ U : x ∈ A ou x ∈ B

}

585

Page 587: Gentil Lopes - Espaços Métricos

A operacao de uniao goza das seguintes propriedades:

N A ∪ (B ∪ C) = (A ∪B) ∪ C (associativa)N A ∪B = B ∪A (comutativa)N A ∪ ∅ = A (elemento neutro)N A ∪ U = U (Identidade)N A ∪A = A (Idempotencia)

Definicao 71 (Interseccao). Sejam A e B subconjuntos de um dado con-junto U . A interseccao de A com B e o subconjunto de U , indicado porA ∩B, assim determinado:

A ∩B ={x ∈ U : x ∈ A e x ∈ B

}

A operacao de interseccao goza das seguintes propriedades:

N A ∩ (B ∩ C) = (A ∩B) ∩ C (associativa)N A ∩B = B ∩A (comutativa)N A ∩ ∅ = ∅ (absorcao)N A ∩ U = A (Identidade)N A ∩A = A (Idempotencia)

As operacoes de uniao e interseccao estao relacionadas atraves das pro-priedades distributivas:

N A ∩ (B ∪ C) = (A ∩B) ∪ (A ∩ C)N A ∪ (B ∩ C) = (A ∪B) ∩ (A ∪ C)

Definicao 72 (Complementacao). Para cada subconjunto A ⊂ U , indica-se por ∁

AU e chama-se complementar de A em relacao a U , o seguinte

subconjunto de U :

∁AU = {x ∈ U : x 6∈ A }

Nota: Quando, em um determinado contexto, o conjunto U estiver fix-ado, a notacao ∁

AU sera simplificada para Ac.

Definicao 73 (Diferenca). Sejam A e B subconjuntos de um dado conjuntoU . A diferenca entre A e B e o subconjunto de U , indicado por A − B,assim determinado:

A−B = {x ∈ U : x ∈ A e x 6∈ B }

586

Page 588: Gentil Lopes - Espaços Métricos

E facil comprovar a seguinte identidade

A−B = A ∩Bc

A seguir relacionamos algumas propriedades envolvendo as operacoes decomplementacao e diferenca (para subconjuntos de um dado conjunto U):

N ∅c = U e U c = ∅

N(Ac)c

= A

N A ∩Ac = ∅ e A ∪Ac = U

N(A ∪B

)c= Ac ∩Bc ;

(A ∩B

)c= Ac ∪Bc

N A ∩ (B − C) = (A ∩B)− (A ∩ C)

N Se A ⊂ B, entao ∁AB = Ac ∩B.

Proposicao 130. Os conjuntos A ∩B e A−B sao disjuntos e

A = (A ∩B) ∪ (A−B)

Prova: Suponhamos que exista x ∈ A∩B e x ∈ A−B. A primeira assercaonos diz que x ∈ A e x ∈ B, o que contradiz a segunda. Logo, os conjuntossao disjuntos.

(⊂) Inicialmente mostremos que (ver Importante, p. 585)

A ⊂ (A ∩B) ∪ (A−B)

De fato, Seja x ∈ A, entao ou x ∈ B ou x 6∈ B. No primeiro caso, x ∈ Ae x ∈ B sendo assim x ∈ A ∩ B. No segundo caso, x ∈ A e x 6∈ B sendoassim x ∈ A−B. Em qualquer dos casos temos nossa tese comprovada.

(⊂) Resta mostrar que

(A ∩B) ∪ (A−B) ⊂ A

De fato, seja y ∈ (A ∩B) ∪ (A−B), entao ou y ∈ A ∩B ou y ∈ A−B.Em qualquer dos casos temos nossa tese comprovada. �

Proposicao 131. Se A, B e C sao conjuntos quaisquer, entao

A− (B ∩ C) = (A−B) ∪ (A− C)

A− (B ∪ C) = (A−B) ∩ (A− C)

Prova: Provaremos a primeira identidade, deixando a segunda como ex-ercıcio.

(⊂) Inicialmente mostremos que

A− (B ∩C) ⊂ (A−B) ∪ (A− C)

587

Page 589: Gentil Lopes - Espaços Métricos

De fato, seja x ∈ A − (B ∩ C), entao x ∈ A e x 6∈ B ∩ C; logo x ∈ A ex 6∈ B ou x 6∈ C, por conseguinte x ∈ A − B ou x ∈ A − C. Em qualquerdos casos temos nossa tese comprovada.

(⊂) Resta mostrar que

(A−B) ∪ (A− C) ⊂ A− (B ∩C)

De fato, seja y ∈ (A−B) ∪ (A−C), entao ou y ∈ A−B ou y ∈ A−C.Sendo assim y ∈ A e y 6∈ B ou y ∈ A e y 6∈ C; logo y ∈ A e y 6∈ B ∩ C, doque decorre nossa tese. �

Produto Cartesiano de Conjuntos

Daremos agora mais um metodo de construcao de conjuntos, a partir deconjuntos dados: O produto cartesiano∗.

Definicao 74 (Produto Cartesiano). Sejam A e B dois conjuntos naovazios. O produto (cartesiano) de A e B, denotado por A × B, e o con-junto de todos os pares ordenados (a, b), com a ∈ A e b ∈ B, isto e:

A×B = { (a, b) : a ∈ A e b ∈ B }

Nota: Esta definicao e um tanto informal, ja que nao definimos a priori oque vem a ser um “par ordenado”. A propriedade fundamental destes entese a que segue:

(a, b) = (c, d) ⇐⇒ a = c e b = d.

O produto de um conjunto A por si proprio, isto e, A×A, representa-sepor A2. Por exemplo,

R× R = R2 ={(a, b) : a ∈ R e b ∈ R

}

R

R

(0, 0)

r(a, b)

a

b

O produto de tres conjuntos A, B e C − nao vazios − se define como

A×B × C =(A×B

)× C

={(a, b, c) : a ∈ A, b ∈ B e c ∈ C

}

∗Rene Descartes (1596 − 1650), criador da geometria analıtica, foi um nobre frances,soldado, matematico, e um dos maiores filosofos de todos os tempos.

588

Page 590: Gentil Lopes - Espaços Métricos

O produto de n conjuntos A1 , A2 , . . . , An e definido, por inducao, comosegue:

A1 ×A2 × · · · ×An =(A1 ×A2 × · · · ×An−1

)×An

={(x1 , x2 , . . . , xn) : x1 ∈ A1 , . . . , xn ∈ An

}

Sejam E1 , E2 , . . . , En conjuntos quaisquer. Para cada ındice i (1 ≤ i ≤ n)sejam Ai e Bi subconjuntos quaisquer de Ei . Colocamos, por definicao:

A1 ×A2 × · · · ×An = ∅ ⇐⇒ ∃ i ∈ { 1, 2, . . . , n } : Ai = ∅.

Se Ai 6= ∅ (i = 1, 2, . . . , n), deixamos como exercıcio ao leitor mostrar que

(i) A1 × · · · ×An ⊂ B1 × . . .×Bn ⇐⇒ A1 ⊂ B1 , . . . , An ⊂ Bn .

(ii)(A1 × · · · ×An

)∩(B1 × . . .×Bn

)= (A1 ∩B1)× · · · × (An ∩Bn).

Funcoes/Aplicacoes/Transformacoes

O conceito de funcao e de fundamental importancia uma vez que com-parece − implıcita ou explıcitamente − em todos os ramos da ciencia.Praticamente todas as equacoes algebricas que comparecem na Fısica, Bi-ologia, Quımica, Economia, Eletricidade, etc.; podem ser estudadas dentrodo contexto de funcoes. Por exemplo:

1. Na Fısica

(i) PV = NRT

(ii) S = S0 + v0t+12t

2

(iii) m =m0

1−(

vc

)2

(iv) E = mc2

2. Na Eletricidade

(i) R = ρℓ

πr2

(ii) f0 =1

2π√LC

3. Em Comunicacao

f(t) =

0, t < 0;

A(1− e−t/RC

), 0 < t < τ ;

A(1− e−τ/RC

)e−(t−τ)/RC , t > τ.

589

Page 591: Gentil Lopes - Espaços Métricos

O conceito de funcao − como o entendemos hoje − veio evoluindo aolongo do tempo, sendo formalizado durante o seculo XIX. Na epoca deEuler†, funcao significava, em geral, aquelas que podiam ser expressas poruma equacao entre x e y, tais como:

y = x3 − 2x2 + 5.

Por exemplo a equacao dada por (sinal de x)

sign(x)=

1, se x > 0;

0, se x = 0;

−1, se x < 0.

s1

−1

R

R

bem como aquela dada no ıtem 3. (Comunicacao) nao representavam funcoes.Como vemos, a exigencia de que uma funcao seja dada por uma equacao

e bastante restritiva.Com a necessidade crescente − e premente − de resolver-se problemas

de outras areas − Fısica por exemplo − e que surgiu a necessidade de seampliar o conceito de funcao de modo a incluir uma classe bem maior detais entes.

Definicao 75 (Transformacao). Dados dois conjuntos A e B, ambos naovazios, uma transformac~ao de A em B e uma lei pela qual a cada elementode A associa-se um unico elemento de B. Se f indica essa lei e x representaum elemento generico de A, entao o (unico) elemento de B associado a x erepresentado por f(x) (lemos “f de x”) e se denomina imagem de x por f .

A

tx f

B

tf(x)†Leonard Euler (1707− 1783), natural de Basileia, Suıca, estudou com Joao Bernoulli.

Residiu muitos anos em Sao Petersburgo (hoje Leningrado), mas sua estada ali foi inter-rompida por um perıodo de 25 anos em Berlim. Nao obstante ter sido pai de treze filhose apesar de ter ficado cego, escreveu cerca de oitocentos “papers” e livros, tendo dadocontribuicoes fundamentais a todos os ramos da matematica.

590

Page 592: Gentil Lopes - Espaços Métricos

O conjunto A e chamado de domınio e o conjunto B de contradomınioda transformacao f .

Alternativamente, podemos representar uma transformacao f de A emB, assim:

f : A −→ Bx 7−→ f(x)

Nota: Os termos func~ao e aplicac~ao sao sinonimos da palavra trans-formacao, embora alguns autores prefiram reservar a palavra “funcao” parase referir a aplicacoes de valores reais ou complexos.Imagem de um Conjunto Via Transformacao

Sejam f : A → B uma transformacao e X ⊂ A. Vamos reunir em ummesmo subconjunto de B todos os elementos que sao imagem, por f , doselementos de X. Formalizando, temos

Definicao 76 (Imagem de Conjunto). Consideremos uma transformacaof : A → B. Dado um subconjunto X ⊂ A, chama-se imagem de X por f , eindica-se por f(X), o seguinte subconjunto de B:

f(X) ={f(x) : x ∈ X

}

sx sx′

A

fX

B

sf(x)

f(X)sf(x′)

Se X = A, entao f(A) recebe o nome de imagem de f e a notacao seraIm f . Portanto,

Im f = { f(x) : x ∈ A } (10.3)

Exemplos:

1) Consideremos a funcao f : R −→ R dada por f(x) = x2.Seja X = {−2, −1, 0, 1, 2 }. Entao

f(X) = { f(x) : x ∈ X }= { f(−2), f(−1), f(0), f(1), f(2) }= { 4, 1, 0, 1, 4 }= { 0, 1, 4 }

591

Page 593: Gentil Lopes - Espaços Métricos

2) Consideremos a funcao f : R −→ R dada por f(x) = sign(x) (p. 590).Sendo assim temos, por exemplo

X = { 0 } ⇒ f(X) = { f(x) : x ∈ { 0 } } = { 0 }Y = [−2, −1 ] ⇒ f(Y ) = { f(x) : x ∈ [−2, −1 ] } = {−1 }Z = [−1, 1 ] ⇒ f(Z) = { f(x) : x ∈ [−1, 1 ] } = {−1, 0, 1 }W = [ 1, 2 ] ⇒ f(W ) = { f(x) : x ∈ [ 1, 2 ] } = { 1 }

Qualidades de Uma Transformacao

Uma transformacao F : U → V se diz injetora se, para quaisquer x, y ∈ U ,

x 6= y =⇒ f(x) 6= f(y).

ou, de modo equivalente∗

f(x) = f(y) =⇒ x = y.

Uma transformacao F : U → V se diz sobrejetora se Im(f) = B; isto e

∀ y ∈ B, ∃x ∈ A : f(x) = y.

Uma aplicacao f : A −→ B ao mesmo tempo injetora e sobrejetorachama-se bijetora.

Propriedades das Imagens Diretas

Proposicao 132. Seja f : A −→ B, e sejam X, Y ⊂ A. Temos:

(a) Se X ⊂ Y , entao f(X) ⊂ f(Y ).

(b) f(X ∪ Y ) = f(X) ∪ f(Y ).

(c) f(X ∩ Y ) ⊂ f(X) ∩ f(Y ).

(d) f(∅) = ∅.(e) f(X − Y ) ⊂ f(X).

Prova: (ver Importante, p. 585)

(a) Seja f(x) ∈ f(X) ⇒ x ∈ X ⇒ x ∈ Y⇒ f(x) ∈ f(Y ) ⇒ f(X) ⊂ f(Y ).

(b) Seja f(x) ∈ f(X ∪ Y ) ⇒ x ∈ X ∪ Y⇒ x ∈ X ou x ∈ Y⇒ f(x) ∈ f(X) ou f(x) ∈ f(Y )

⇒ f(x) ∈ f(X) ∪ f(Y ).

⇒ f(X ∪ Y ) ⊂ f(X) ∪ f(Y ).

∗Ver (T− 1), p. 570.

592

Page 594: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Analogamente se mostra a inclusao contraria.

(c) Seja f(x) ∈ f(X ∩ Y ) ⇒ x ∈ X ∩ Y⇒ x ∈ X e x ∈ Y⇒ f(x) ∈ f(X) e f(x) ∈ f(Y )

⇒ f(x) ∈ f(X) ∩ f(Y ).

⇒ f(X ∩ Y ) ⊂ f(X) ∩ f(Y ).

(d)f(∅) =

{f(x) : x ∈ ∅

}= ∅.

(e) decorre de (a). �

Para mostrar que a inclusao contraria em (c) nao vale, consideremos afuncao do exemplo 1) (p. 591). Observe que

X = [ 1, 2 ] e Y = [−2, −1 ] ⇒ X ∩ Y = ∅⇒ f(X ∩ Y ) = ∅.

por outro lado,

f(X) ∩ f(Y ) = [ 1, 4 ] ∩ [ 1, 4 ] = [ 1, 4 ] ⇒ f(X) ∩ f(Y ) 6⊂ f(X ∩ Y ).

Esta inclusao nao se verifica precisamente por ser f uma funcao nao injetora:

Se f e injetora, entao f(X ∩ Y ) = f(X) ∩ f(Y ).De fato, seja z ∈ f(X) ∩ f(Y ), logo, existem x ∈ X e y ∈ Y tais que

z = f(x) = f(y). Pela injetividade de f concluimos que x = y ∈ X ∩ Y .Donde z ∈ f(X ∩ Y ). Como a inclusao contraria vale para f qualquer, ficaprovada a igualdade.

Imagem Inversa de Conjunto Via Aplicacao

Sejam f : A −→ B uma aplicacao e Y ⊂ B. Vamos reunir em ummesmo conjunto todos os elementos de A cujas imagens, por f , pertencema Y . Formalizando, temos

Definicao 77 (Imagem Inversa). Consideremos uma aplicacao f : A −→ B.Dado um subconjunto Y ⊂ B, chama-se imagem inversa de Y por f , eindica-se por f−1(Y ), o seguinte subconjunto de A:

f−1(Y ) ={x ∈ A : f(x) ∈ Y

}

sxA

f

f−1(Y )

B

sf(x)

Y

593

Page 595: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Observacao: Nao confundir a notacao f−1(Y ) com a da funcao inversa.Dada uma funcao f qualquer, a funcao inversa nem sempre existe, masf−1(Y ) sempre existe, podendo ser f−1(Y ) = ∅. Todavia, se f−1 existe,entao f−1(Y ) e a imagem direta de Y pela f−1.

Exemplos: Consideremos a funcao f : R −→ R dada por f(x) = x2.

a) Seja Y ={0, 1, 4

}. Entao

f−1(Y ) ={x ∈ A : f(x) ∈ Y

}

={x ∈ R : f(x) ∈ { 0, 1, 4 }

}

={x ∈ R : x2 ∈ { 0, 1, 4 }

}

= {−2, −1, 0, 1, 2 }

Portanto,f−1

({ 0, 1, 4 }

)= {−2, −1, 0, 1, 2 }.

b) Seja f : R −→ R dada por f(x) =

{

1, se x ∈ Q;

0, caso contrario.

Seja Y ⊂ R, com um pouco de raciocınio, o leitor ha de concordar que

f−1(Y ) =

∅, se 1 6∈ Y e 0 6∈ Y ;

Q, se 1 ∈ Y e 0 6∈ Y ;

R−Q, se 1 6∈ Y e 0 ∈ Y ;

R, se 1 ∈ Y e 0 ∈ Y.

Por exemplo,

f−1(]− 1, 1[

)= R−Q

f−1(]− 1, 1]

)= R

f−1(]1

2,3

2

[)

= Q

Propriedades das Imagens Inversas

Proposicao 133. Seja f : A −→ B, e sejam X, Y ⊂ B. Temos:

(a) Se X ⊂ Y , entao f−1(X) ⊂ f−1(Y ).

(b) f−1(X ∪ Y ) = f−1(X) ∪ f−1(Y ).

(c) f−1(X ∩ Y ) = f−1(X) ∩ f−1(Y ).

(d) f−1(Xc) =(f−1(X)

)c.

(e) f(X − Y ) = f−1(X)− f−1(Y ).

Deixamos a prova desta proposicao como exercıcio.

594

Page 596: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 134.

f(X) ⊂ Y ⇐⇒ X ⊂ f−1(Y ).

Prova:

(⇒) De fato,

Dado x ∈ X ⇒ f(x) ∈ f(X) ⇒ f(x) ∈ Y ⇒ x ∈ f−1(Y ).

(⇐)

Seja f(x) ∈ f(X) ⇒ x ∈ X ⇒ x ∈ f−1(Y ) ⇒ f(x) ∈ Y.

Vamos agora relacionar as imagens direta e inversa.

Proposicao 135. Seja f : A −→ B. Entao

(a) X ⊂ A =⇒ X ⊂ f−1(f(X)

)

(b) X ⊂ A =⇒ X = f−1(f(X)

)(se f for injetora )

(c) Y ⊂ B =⇒ f(f−1(Y )

)⊂ Y

(d) Y ⊂ B =⇒ f(f−1(Y )

)= Y (se f for sobrejetora )

Prova:(a) De fato, se x ∈ X, entao f(x) ∈ f(X) e daı, tendo em conta a definicaode imagem inversa, x ∈ f−1

(f(X)

).

(b) Seja x ∈ f−1(f(X)

), entao f(x) ∈ f(X), portanto pela definicao de

f(X) existe x′ ∈ X tal que f(x′) = f(x), daı, considerando a injetividadede f , x = x′ e portanto x ∈ X.

(c) Seja y ∈ f(f−1(Y )

)logo, pela definicao de imagem direta, existe x ∈

f−1(Y ) tal que f(x) = y. Pela definicao de imagem inversa x ∈ f−1(Y )implica f(x) = y ∈ Y .

(d) Seja y ∈ Y , como f e sobrejetora, existe x ∈ A tal que f(x) = y ∈ Y .Pela definicao de imagem inversa, x ∈ f−1(Y ) e pela definicao de imagemdireta, f(x) = y ∈ f

(f−1(Y )

). �

Famılias Indexadas

Seja A um conjunto e P(A) o conjunto de seus subconjuntos. Consider-emos uma funcao

f : I −→ P(A)i 7−→ f(i)

Esta funcao e chamada famılia indexada de subconjuntos de A. Odomınio I e chamado conjunto de ındices.

595

Page 597: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Observe que f(i) e um elemento de P(A), ou seja, e um subconjunto deA; razao porque trocaremos de notacao: f(i) = Ai.

Nestas funcoes o aspecto que mais nos interessara e o conjunto ima-gem. Para a propria funcao adotaremos uma notacao especial:

(Ai)

i∈Iou, simplesmente,

(Ai

)quando o conjunto de ındices estiver fixado em um

determinado contexto.

Exemplos:

1) Consideremos A = [ 0, 1 ] e I = N. Para cada n ∈ N definamos

An =[0,

1

n

]

Sendo assim(An)

n∈N e uma famılia de subconjuntos do intervalo [ 0, 1 ].Por exemplo,

A10 1

A212

0

A313

0

2) Consideremos A = R2 e I = R. Para cada λ ∈ R definamos

Aλ={(x, y) ∈ R2 : y = 2x+ λ

}

Sendo assim(A

λ

)

λ∈R e uma famılia de subconjuntos do R2, onde cada con-junto Aλ e uma reta. Por exemplo,

R

R

0 q1

q1

q2

q2

q3

q3

q−1q−2q−3

p−1

p−2

λ=−1

A−1

λ=0

A0

λ=√3

A√3

596

Page 598: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Operacoes Generalizadas

As operacoes de uniao e interseccao de conjuntos, originalmente definidaspara dois conjuntos, agora podem ser generalizadas.

Seja(Ai)

i∈I uma famılia de subconjuntos de A. Para a uniao dos mem-bros desta famılia usaremos uma das seguintes notacoes:

i∈ IAi ;

Ai ;⋃{

Ai : i ∈ I}.

So usaremos a segunda das notacoes acima, quando o conjunto de ındicesestiver fixado em um determinado contexto.

Pois bem, por definicao, temos:

i∈ IAi =

{x : x ∈ Ai, para algum i ∈ I

}

Por exemplo, consideremos a famılia(A

λ

)

λ∈R do exemplo 3 dado ante-riormente. Temos

λ∈RA

λ={(x, y) : (x, y) ∈ A

λ, para algum λ ∈ R

}= R2.

Porquanto dado qualquer (a, b) ∈ R2 este ponto pertence ao Aλpara λ =

b− 2a.Quando o conjunto de ındices for I = { 1, 2, . . . , n } ou I = N entao

escrevemosn⋃

i=1

Ai ;

∞⋃

i=1

Ai

para indicar a uniao das famılias(A1 , A2 , . . . , An

)e(A1 , A2 , . . . , An , . . .

)

respectivamente. Por exemplo,

∞⋃

i=1

[0,

1

i

]= [ 0, 1 ].

De modo analogo, para a interseccao dos membros da famılia(Ai)

i∈Iusaremos uma das notacoes abaixo:

i∈ IAi ;

Ai ;⋂{

Ai : i ∈ I}.

So usaremos a segunda das notacoes acima, quando o conjunto de ındicesestiver fixado em um determinado contexto.

Pois bem, por definicao, temos:

i∈ IAi =

{x : x ∈ Ai, para todo i ∈ I

}

597

Page 599: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Quando o conjunto de ındices for I = { 1, 2, . . . , n } ou I = N entaoescrevemos

n⋂

i=1

Ai ;

∞⋂

i=1

Ai

para a interseccao das famılias(A1 , A2 , . . . , An

)e(A1 , A2 , . . . , An , . . .

),

respectivamente. Por exemplo,

∞⋂

i=1

[0,

1

i

]= { 0 }.

Fica como exercıcio a comprovacao desta interseccao.As leis distributivas tambem sao validas para operacoes generalizadas:

Proposicao 136. Consideremos uma famılia(Ai)

i∈I de subconjuntos deum dado conjunto A e B ⊂ A. Entao

(i) B ∪( ⋂

i∈ IAi

)

=⋂

i∈ I

(B ∪Ai

)

(ii) B ∩( ⋃

i∈ IAi

)

=⋃

i∈ I

(B ∩Ai

)

Prova: Mostraremos a primeira destas identidades.

(⊂) De fato, seja x ∈ B ∪(⋂

i∈ I Ai)entao x ∈ B ou x ∈ ⋂i∈ I Ai. Se x ∈ B

entao x ∈ B ∪Ai para todo i ∈ I, e daı x ∈ ⋂i∈ I(B ∪Ai

). Por outro lado

se x ∈ ⋂i∈ I Ai entao x ∈ Ai para todo i ∈ I, logo x ∈ B ∪ Ai para todoi ∈ I, no que implica x ∈ ⋂i∈ I

(B ∪Ai

).

(⊃) De fato, seja y ∈ ⋂i∈ I(B ∪ Ai

), entao y ∈ B ∪ Ai para todo i ∈ I.

Logo y ∈ B ou x ∈ Ai para todo i ∈ I; em qualquer dos casos temosx ∈ B ∪

(⋂

i∈ I Ai). �

As leis de De Morgan tambem sao validas para operacoes generalizadas:

Proposicao 137. Consideremos uma famılia(Ai)

i∈I de subconjuntos deum dado conjunto A. Entao

(i)( ⋃

i∈ IAi

)c=⋂

i∈ IAci

(ii)( ⋂

i∈ IAi

)c=⋃

i∈ IAci

598

Page 600: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Prova: Mostraremos a primeira destas identidades.

(⊂) De fato, seja x ∈(⋃

i∈ I Ai)c

entao x 6∈ ⋃i∈ I Ai o que significa quex 6∈ Ai para todo i ∈ I. Logo x ∈ Aci para todo i ∈ I, resultando quex ∈ ⋂i∈ I Aci(⊃) De fato, seja y ∈ ⋂i∈ I A

ci entao y ∈ Aci para todo i ∈ I. No que implica

que y 6∈ Ai para todo i ∈ I, logo y 6∈⋃

i∈ I Ai, no que resulta y ∈(⋃

i∈ I Ai)c.�

A seguinte proposicao sera de alguma utilidade

Proposicao 138. Seja A um conjunto qualquer e, para cada x ∈ A, sejaGx um subconjunto de A tal que x ∈ Gx . Entao A =

x∈AGx .

Prova:

(⊂) Seja p ∈ A. Entao p ∈ Gp , portanto, p ∈⋃

x∈AGx .

(⊃) Seja q ∈⋃

x∈AGx . Entao, existe x0 ∈ A de modo que q ∈ Gx0

⊂ A; disto

concluimos pela validade da inclusao desejada. �

Proposicao 139. Seja(Ai)

i∈Iuma famılia indexada e i0 ∈ I um ındice

fixado. Entao,⋂

i∈ IAi ⊂ Ai0 ⊂

i∈ IAi.

Prova:

Seja x ∈ ⋂i∈ I Ai; entao, x ∈ Ai para todo i ∈ I. Em particular x ∈ Ai0 .Logo,

i∈ I Ai ⊂ Ai0 .Seja agora y ∈ Ai0 . Como i0 ∈ I, resulta y ∈

i∈ I Ai. Daı Ai0 ⊂⋃

i∈ I Ai.�

Imagens Diretas e Inversas de Conjuntos Indexados

Proposicao 140. Consideremos uma funcao f : A −→ B, uma famılia(Ai)

i∈Ide subconjuntos de A e uma famılia

(Bj

)

j∈Jde subconjuntos de B.

Entao,(i) f

(∪Ai

)= ∪ f

(Ai)

(ii) f(∩Ai

)⊂ ∩ f

(Ai)

(iii) f−1(∪Bj

)= ∪ f−1

(Bj

)

(iv) f−1(∩Bj

)⊂ ∩ f−1

(Bj

)

Prova: Provemos as assertivas (i) e (iii). Entao,

(i) (⊂) Seja f(x) ∈ f(∪i∈I Ai

); pela definicao de imagem direta (p. 591),

x ∈ ∪i∈IAi.

599

Page 601: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Sendo assim x ∈ Ai′ para algum i′ ∈ I, acarretando; novamente peladefinicao de imagem direta, que f(x) ∈ f

(Ai′)no que resulta f(x) ∈

∪i∈I f(Ai).

(⊃) Analogo.(iii) (⊂) Seja x ∈ f−1

(∪ Bj

); pela definicao de imagem inversa (p. 593),

f(x) ∈ ∪j∈JBj . Sendo assim f(x) ∈ Bj′ para algum j′ ∈ J , acarretando;

novamente pela definicao de imagem inversa, que x ∈ f−1(B

j′), daı resulta

x ∈ ∪j∈J f−1(Bj

).

(⊃) Analogo. �

10.3 Topicos em Analise

Modulo (Valor Absoluto)

Se x ∈ R e x 6= 0, entao um dos numeros, x ou −x, e estritamentepositivo.

Definicao 78. Se x ∈ R, chamaremos modulo de x (ou ainda: valorabsoluto de x) e designaremos por |x| o maior dos numeros x e −x; assim,por definicao:

|x| = max{−x, x }.

E facil ver que esta igualdade e equivalente a

|x| =

x, se x ≥ 0;

−x, se x < 0.

Equacao esta que tambem e usada como definicao do modulo de x. Decorretrivialmente que |0| = 0.

Intuitivamente e facil constatar que, na interpretacao geometrica dosreais, o modulo do numero x exprime (na unidade considerada) a distanciado ponto x, a origem do referencial, isto e, ao ponto O, correspondente aonumero 0, assim:

q0Rr r

−x

|−x|=−(−x)

x

|x|=x

A seguir listamos algumas propriedades do modulo.

600

Page 602: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 141. Temos:

(a) |x| = 0, se e somente se, x = 0.

(b) | − x| = |x| para todo x ∈ R.

(c) |x · y| = |x| · |y| para todo x, y ∈ R.

(d) Se y 6= 0,

∣∣∣∣

x

y

∣∣∣∣=|x||y| .

(e) Se c ≥ 0, entao |x| ≤ c, se e somente se, −c ≤ x ≤ c.

(f) −|x| ≤ x ≤ |x| para todo x ∈ R.

Prova:

(a) Decorre trivialmente da definicao de modulo.

(b)|x| = max{−x, x } = max

{− (−x), −x

}= | − x|

(c) Se x > 0 e y > 0, entao x · y > 0, de modo que |x · y| = x · y = |x| · |y|.Se x > 0 e y < 0, entao x · y < 0, de modo que |x · y| = −(x · y) =x · (−y) = |x| · |y|. Os demais casos sao tratados de modo analogo.

(d) Sendo y 6= 0 vale

x = y · xy

e portanto, pelo ıtem anterior:

|x| = |y| · |xy|;

desta desigualdade (e tendo em conta que |y| 6= 0, por ser y 6= 0)decorre que: ∣

∣∣∣

x

y

∣∣∣∣=|x||y| .

(e) Temos

|x| ≤ c ⇒ x ≤ c e − x ≤ c(pois |x| = max{−x, x }

)

⇒{

x ≤ cx ≥ −c

⇒ −c ≤ x ≤ c.

Recıprocamente, se esta ultima desigualdade se verifica, entao x ≤ ce −x ≤ c, donde |x| ≤ c.

(f) Basta por c = |x| e utilizar o ıtem anterior. �

601

Page 603: Gentil Lopes - Espaços Métricos

As proximas desigualdades sao utilizadas com bastante frequencia:

Proposicao 142 (Desigualdade triangular). Se x e y sao numeros reaisquaisquer, entao

∣∣|x| − |y|

∣∣ ≤ |x± y| ≤ |x|+ |y|.

Prova: Utilizando os ıtens (f) e (e) da proposicao 141, obtemos

−|x| ≤ x≤ |x|−|y| ≤ y≤ |y|

−(|x|+|y|

)≤x+y≤ |x|+|y| =⇒ |x+y|≤ |x|+|y|.

(e)+ :

Esta ultima desigualdade e conhecida como desigualdade triangular.Por outro lado,

|x| =∣∣(x− y) + y

∣∣ ≤ |x− y|+ |y| =⇒ |x| − |y| ≤ |x− y|

|y| =∣∣(y − x) + x

∣∣ ≤ |y − x|+ |x| =⇒ |y| − |x| ≤ |y − x|

Sendo assim, temos

|x− y| ≥ |x| − |y||y − x| ≥ −

(|x| − |y|

) =⇒ |x− y| ≥∣∣|x| − |y|

∣∣.

Esta e a primeira desigualdade com o sinal menos. Para obter a desigualdadecom o sinal mais, substituimos (nesta ultima desigualdade) y por −y. �

Da definicao de intervalo aberto e da proposicao 141, ıtem (e), decorremas seguintes equivalencias:

x ∈ ] a− r, a+ r [ ⇐⇒ a− r < x < a+ r

⇐⇒ −r < x− a < r

⇐⇒ |x− a| < r.

Em resumo:

x ∈ ] a− r, a+ r [ ⇐⇒ |x− a| < r

Esta equivalencia e interpretada da seguinte forma:

x pertence ao intervalo aberto de “centro a e raio r” se, e somente se, adistancia de x a a nao excede r. Geometricamente tudo se passa como nafigura a seguir:

qaR

xa−r a+r] [

|x−a|

s602

Page 604: Gentil Lopes - Espaços Métricos

10.3.1 Teoremas e Definicoes da Analise Real

A seguir enunciamos alguns resultados da Analise Real (AR) para fu-turas referencias. A prova destes resultados e pertinente a Analise.

Um resultado frequentemente invocado e o teorema de Weierstrass∗ dadoa seguir:

Teorema[AR] 1 (Weierstrass). Toda funcao contınua f : [ a, b ] −→ R elimitada e assume valores maximo e mınimo.(isto e, existem x1 e x2 ∈ [ a, b ] tais que f(x1) ≤ f(x) ≤ f(x2) para todox ∈ [ a, b ].)

Teorema[AR] 2. Sejam f e g duas funcoes cujos domınios contenham ointervlo I e suponha-se que f(x) = g(x) em cada ponto x ∈ I, com excecaodos pontos de um conjunto finito. Entao f e integravel em I se, e somentese, g o for e, nesta hipotese,

If =

Ig

Teorema[AR] 3. Suponha-se que, para todo n ∈ N, se tem 0 ≤ an ≤ bn .Se∑bn e convergente, entao

∑an e tambem convergente.

Teorema[AR] 4. Se as series∑an e

∑bn convergem e k e um numero

qualquer, entao∑kan e

∑(an + bn) convergem e

kan = k∑

an e∑

(an + bn) =∑

an +∑

bn .

Teorema[AR] 5. Sendo convergente a serie∑ |an |, e tambem convergente

a serie∑an e tem-se ainda

∣∣∣∣∣

∞∑

n=1

an

∣∣∣∣∣≤∞∑

n=1

|an |.

Teorema[AR] 6. Se lim xn = a entao lim |xn | = |a|.Esta assertiva pode ser reformulada como segue: Se (xn) e uma sequencia

convergente entao lim |xn | = | lim xn |.

Teorema[AR] 7 (Passagem ao limite numa desigualdade). Sejam (xn) e(yn) sequencias convergentes. Se a condicao xn ≤ yn e verificada por infini-tos valores de n entao limxn ≤ lim yn .

∗Karl Weierstrass (1815−1897) foi durante muitos anos professor em Berlim, e exerceuprofunda influencia no desenvolvimento da Analise. Sempre insistindo em demonstracoesrigorosas, elaborou, mas nao publicou, uma introducao ao sistema de numeros reais. Deutambem importantes contribuicoes a Analise Real e Complexa, as equacoes diferenciais eao calculo das variacoes.

603

Page 605: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Teorema[AR] 8. Se f(x) ≤ g(x) para todo x ∈ [a, b], entao∫ ba f(x) ≤∫ b

a g(x).

Teorema[AR] 9. Se f ≥ 0 e uma funcao contınua num intervalo [ a, b ],

com f(c) > 0 em algum ponto c ∈ [ a, b ], entao∫ ba f > 0.

Definicao 79 (Continuidade Uniforme). Uma funcao f : X → R diz-seuniformemente contınua no conjunto X quando, para todo ε > 0 dado arbi-trariamente, pode-se exibir δ > 0 de modo que

x, y ∈ X, |x− y| < δ ⇒ |f(x)− f(y)| < ε.

Teorema[AR] 10. Seja X ⊂ R limitado e fechado. Toda funcao contınuaf : X → R e uniformemente contınua.

Definicao 80 (Convergencia Simples ou Pontual). Diz-se que a sequencia defuncoes fn : X → R converge simplesmente (ou pontualmente) para a funcaof : X → R quando, para cada x ∈ X arbitrariamente fixado, a sequencia denumeros reais

(fn(x)

)converge para o numero f(x). Ou seja, para todo

x ∈ X fixado, tem-se limn→∞

fn(x) = f(x).

Definicao 81 (Convergencia Uniforme). Diz-se que uma sequencia de funcoes(fn) converge uniformemente para uma funcao f num domınio D se, dadoqualquer ε > 0, existe um ındice n0 tal que, para todo x ∈ D,

n ≥ n0 ⇒ |fn(x)− f(x)| < ε.

Teorema[AR] 11. Se (fn) e uma sequencia de funcoes contınuas nummesmo domınio D, que converge uniformemente para uma funcao f , entaof e contınua em D.

Teorema[AR] 12 (Teorema do Valor Medio, de Lagrange). Se f : [ a, b ]→R e contınua e, se f e diferenciavel em cada ponto do intervalo ] a, b [, entaoexiste um ponto c ∈ ] a, b [, tal que

f ′(c) =f(b)− f(a)

b− a .

Teorema[AR] 13 (Teorema dos intervalos encaixados). Seja

[ a1 , b1 ] ⊃ [ a2 , b2 ] ⊃ · · · ⊃ [ an , bn ] ⊃ · · ·

uma sequencia de intervalos fechados, nao-vazios e encaixados. Suponha,ademais, que a sucessao (bn − an) dos comprimentos de tais intervalostende a 0. Entao, existe um unico ponto comum a todos estes intervalos.

604

Page 606: Gentil Lopes - Espaços Métricos

10.3.2 Supremo e Infimo

Os conceitos de supremo e ınfimo sao da maxima importancia tantona analise real quanto na teoria dos espacos metricos. O leitor nao tenhaa ilusao de ir muito longe na matematica sem uma perfeita compreensaodestes conceitos. Antes definiremos

Definicao 82 (Cota Superior/Cota Inferior). Seja K um subconjunto qual-quer de R.

(i) Diz-se que um elemento µ ∈ R e cota superior de K se µ ≥ k paratodo k ∈ K.

(ii) Diz-se que um elemento ν ∈ R e cota inferior de K se ν ≤ k paratodo k ∈ K.

Uma primeira observacao importante e que a cota superior de um con-junto (se existir) pode ou nao pertencer ao conjunto. Por exemplo, o numeroreal 1 e cota superior dos conjuntos

K = [ 0, 1 ] e J =] 0, 1 [

mas pertence a K e nao a J .Observacao analoga vale para o ınfimo.Note-se que nem sempre um subconjunto K ⊂ R tem uma cota superior

ou uma cota inferior. Por exemplo Z ⊂ R e um de tais conjuntos. Todavia,se um conjunto tem uma cota superior, entao admite uma infinidade delas.De fato, se µ e uma cota superior de K, o mesmo se da com µ + n, paratodo n ∈ N.

Quando um conjunto admite cota superior, dizemos que ele e cotadosuperiormente, e quando admite cota inferior, dizemos que e cotado in-feriormente. Um conjunto dotado de cota superior e de cota inferior diz-sesimplesmente cotado. Um conjunto que nao admite cota superior, ou infe-rior, diz-se nao-cotado. Por exemplo,

Conjunto Status

a) Z Nao cotado

b) N Cotado inferiormente

c) ] −∞, 1 ] Cotado superiormente

d) ] − 1, 1 ] Cotado

Definicao 83 (Supremo). Seja K um subconjunto qualquer de R. Se K ecotado superiormente, uma cota superior de K se diz supremo de K se emenor do que qualquer outra cota superior de K.

605

Page 607: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Em outras palavras: Um numero µ ∈ R se diz supremo de um subcon-junto K de R se satisfaz as duas condicoes:

(i) x ≤ µ para todo x ∈ K;

(ii) se λ e um numero tal que x ≤ λ para todo x ∈ K, entao µ ≤ λ.De fato, pela condicao (i), µ e uma cota superior de K, e pela (ii), µ e

menor que qualquer outra cota superior de K.O supremo µ de um subconjunto K de R, se existir, e unico. De fato, se

µ1 e µ2 sao supremos de K, entao ambos verificam as condicoes (i) e (ii)acima, logo µ1 ≤ µ2 e µ2 ≤ µ1 , donde µ1 = µ2 .

Notacao: Se µ for o supremo de K, escrevemos: µ = supK.

A seguinte caracterizacao do supremo e util em muitas situacoes:

Lema 10. Seja K ⊂ R. µ = supK se, e somente se, µ for uma cotasuperior de K e, dado ε > 0, existe k ∈ K tal que µ− ε < k.

Prova:

(⇒) Se µ =supK e ε > 0 entao existe k ∈ K de modo que µ− ε < k.Vamos provar isto utilizando a tecnica (T− 4) (p. 571). Facamos

H1 : ε > 0⇒ T: ∃ k ∈ K : µ− ε < k.

H2 : µ =supK

H1 ∧ T =⇒ H2

Suponha que nao exista k ∈ K satisfazendo µ − ε < k. Isto e, suponhaque µ − ε ≥ k para todo k ∈ K. Ora, se k ≤ µ − ε para todo k ∈ K,significa que µ− ε e uma cota superior de K. Uma vez que ε > 0 temos queµ− ε < µ, logo nao temos µ =supK (porquanto µ nao e a menor das cotassuperiores de K).(⇐) Se µ e uma cota superior de K e para todo ε > 0 dado existe k ∈ Ksatisfazendo µ− ε < k entao µ =supK.

Ainda mais uma vez utilizemos a tecnica (T− 4). Facamos

H1 : µ e cota superior de K.⇒ T: µ =supK.

H2 : ∀ ε > 0 ∃ k ∈ K : µ− ε < k.

H1 ∧ T =⇒ H2

Suponhamos µ cota superior de K e µ 6=supK. Logo, µ nao e a menordas cotas superiores de K. Portanto existe ε > 0 tal que µ−ε e cota superiorde K; o que traz como consequencia que existe ε > 0 de modo que µ−ε ≥ kpara todo k ∈ K. Isto e exatamente o que buscavamos: a negacao de H2 .�

606

Page 608: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vejamos algumas aplicacoes do lema anterior:

Exemplos:

1) Encontre o supremo de K ={x ∈ R : 0 < x < 1

}=] 0, 1 [.

Vamos mostrar que a cota superior µ = 1 e o supremo de K. Para tantoe suficiente − consoante o lema anterior (⇐) − para todo ε > 0 exibir x ∈ Kde modo que 1− ε < x. Para isto consideremos duas possibilidades:

a) ε ≥ 1.Se ε ≥ 1 temos 1−ε ≤ 0. Neste caso, tomando por exemplo x = 1/2, resulta

1− ε ≤ 0 < x =1

2.

b) 0 < ε < 1.Neste caso temos

0 < ε < 1 ⇐⇒ 0 > −ε > −1⇐⇒ −1 < −ε < 0⇐⇒ 0 < 1− ε < 1.

] [0 1

r↑

1−ε

Vamos tomar, por exemplo, o ponto medio entre 1− ε e 1, isto e

x = 1−ε+12 = 1− ε

2] [0 1

r↑r↑

1−ε x

e mostremos que este ponto satisfaz as duas condicoes desejadas:

1 a) x ∈ K. Pois

0 < 1− ε

2< 1 ⇐⇒ 0 < ε < 2.

e, por hipotese, ε < 1.

2 a) 1− ε < x. Pois

1− ε < 1− ε

2⇐⇒ ε >

ε

2.

Resumindo: dado ε > 0 tomamos

xε =

{12 , se ε ≥ 1;

1− ε2 , se 0 < ε < 1.

e teremos xε ∈ K e 1− ε < xε, o que prova que sup ] 0, 1 [= 1.

2) Mostre que supK = 1, onde

K ={ 1

2,2

3,3

4, · · · , n

n+ 1, · · ·

}

.

607

Page 609: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Temos que nn+1 < 1 para todo n natural. Sendo assim 1 e uma cota

superior de K. Consoante o lema anterior, dado ε > 0 devemos exibir umx ∈ K de modo que 1−ε < x. Ou ainda: para todo ε > 0 devemos encontrarn ∈ N de modo que

1− ε < n

n+ 1.

Esta desigualdade e satisfeita para todo n natural se 1 − ε < 0 (ε > 1).Sendo assim consideremos 1− ε ≥ 0 (ε ≤ 1). Entao,

1− ε < n

n+ 1⇐⇒ (1− ε)(n + 1) < n

⇐⇒ n >1− εε

.

Assim, dado ε > 0, escolhemos um natural nε >1−εε e teremos

1− ε < nεnε + 1

.

o que prova ser supK = 1.

Proposicao 143. Se µ for uma cota superior de K e µ ∈ K entao µ =supK.

Prova: Por definicao de supK (e tendo em conta que µ e uma cotasuperior de K) podemos escrever

x ≤ supK ≤ µ, ∀x ∈ K.

Como, por hipotese, µ ∈ K temos em particular que µ ≤ supK ≤ µ, dondeµ = supK. �

A proposicao que acabamos de provar nos permite obter alguns supremosa “olho nu”. Por exemplo, sup ] 0, 1 ] = 1. Porquanto 1 e cota superior de] 0, 1 ] e pertence a este conjunto.

Como mais um exemplo, consideremos

K ={ 1

2,1

4, · · · , 1

2n, · · ·

}

Entao, supK = 1/2. Isto se deve a que 12n ≤ 1

2 para todo n natural. Isto e,12 e cota superior de K e pertence a K.

Definicao 84 (Infimo). Seja K um subconjunto qualquer de R. Se K ecotado inferiormente, uma cota inferior de K se diz ınfimo de K se emaior do que qualquer outra cota inferior de K.

Em outras palavras: Um numero ν ∈ R se diz ınfimo de um subconjuntoK de R se satisfaz as duas condicoes:

608

Page 610: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(i) x ≥ ν para todo x ∈ K;

(ii) se λ e um numero tal que x ≥ λ para todo x ∈ K, entao ν ≥ λ.De fato, pela condicao (i), ν e uma cota inferior de K, e pela (ii), ν e

maior que qualquer outra cota inferior de K.O ınfimo ν de um subconjunto K de R, se existir, e unico. De fato, se ν1

e ν2 sao ınfimos de K, entao ambos verificam as condicoes (i) e (ii) acima,logo ν1 ≥ ν2 e ν2 ≥ ν1 , donde ν1 = ν2 .

Notacao: Se ν for o ınfimo de K, escrevemos: ν = infK.

A seguinte caracterizacao do ınfimo e util em muitas situacoes:

Lema 11. Seja K ⊂ R. ν = infK se, e somente se, ν for uma cota inferiorde K e, dado ε > 0, existe k ∈ K tal que k < ν + ε.

Prova:

(⇒) Se ν = infK e ε > 0 entao existe k ∈ K de modo que k < ν + ε.

Vamos provar isto utilizando a tecnica (T − 4) (p. 571). Facamos

H1 : ε > 0⇒ T: ∃ k ∈ K : k < ν + ε.

H2 : ν = infK

H1 ∧ T =⇒ H2

Suponha que nao exista k ∈ K satisfazendo k < ν + ε. Isto e, suponhaque k ≥ ν+ε para todo k ∈ K. Ora, se k ≥ ν+ε para todo k ∈ K, significaque ν+ε e uma cota inferior de K. Uma vez que ε > 0 temos que ν+ε > ν,logo nao temos ν = infK (porquanto ν nao e a maior das cotas inferioresde K).(⇐) Se ν e uma cota inferior de K e para todo ε > 0 dado existe k ∈ Ksatisfazendo k < ν + ε entao ν = infK.

Ainda mais uma vez utilizemos a tecnica (T − 4). Facamos

H1 : ν e cota inferior de K.⇒ T: ν = infK.

H2 : ∀ ε > 0 ∃ k ∈ K : k < ν + ε.

H1 ∧ T =⇒ H2

Suponhamos ν cota inferior de K e ν 6= infK. Logo, ν nao e a maiordas cotas inferiores de K. Portanto existe ε > 0 tal que ν+ ε e cota inferiorde K; o que traz como consequencia que existe ε > 0 de modo que k ≥ ν+εpara todo k ∈ K. Isto e exatamente o que buscavamos: a negacao de H2 .�

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Page 611: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Vejamos algumas aplicacoes do lema anterior:

Exemplos

1) Encontre o ınfimo de K ={x ∈ R : 0 < x < 1

}= ] 0, 1 [.

Vamos mostrar que a cota inferior ν = 0 e o ınfimo de K. Para tanto esuficiente − consoante o lema anterior (⇐) − para todo ε > 0 exibir x ∈ Kde modo que x < 0 + ε. Para isto consideremos duas possibilidades:

a) ε ≥ 1.Se ε ≥ 1 qualquer x ∈ K serve aos nossos propositos, porquanto

x ∈ K ⇒ 0 < x < 1 ≤ ε.

b) 0 < ε < 1.Neste caso e suficiente tomar xε =

ε2 , porquanto

0 < ε < 1 ⇒ 0 <ε

2<

1

2⇒ 0 < xε < 1 e xε < ε.

2) Encontre infK, onde

K ={

1,1

2,1

3, · · · , 1

n, · · ·

}

Sendo 1n > 0, para todo n natural, temos que 0 e uma cota inferior de

K. Para mostrar que 0 = infK e suficiente exibir um x ∈ K de modo quex < 0 + ε qualquer que seja o ε > 0. Pois bem, dado ε > 0 escolhamos umnatural n0 satisfazendo∗ n0 · ε > 1, isto e, 1

n0< ε. Logo x = 1

n0serve.

3) Encontre infK, onde

K =

{

1,1

4,1

8, · · · , 1

n2, · · ·

}

Sendo 1n2 > 0, para todo n natural, temos que 0 e uma cota inferior de

K. Para mostrar que 0 = infK e suficiente exibir um x ∈ K de modo quex < 0 + ε qualquer que seja o ε > 0. Pois bem, dado ε > 0 escolhamos umnatural n0 satisfazendo n0 · ε > 1, isto e, 1

n0< ε. Observe que este n0 nao

encerra a questao pois x = 1n0

pode nao pertencer a K. Mas com certeza

n20serve aos nossos propositos uma vez que

1

n20

≤ 1

n0

< ε.

∗Este natural sempre existe, conforme veremos logo mais.

610

Page 612: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Proposicao 144. Se ν for uma cota inferior de K e ν ∈ K entao ν =infK.

Prova: Por definicao de infK (e tendo em conta que ν e uma cotainferior de K) podemos escrever

ν ≤ infK ≤ x, ∀x ∈ K.

Como, por hipotese, ν ∈ K temos em particular que ν ≤ infK ≤ ν, dondeν = infK. �

A proposicao que acabamos de provar nos permite obter alguns ınfimosa “olho nu”. Por exemplo, inf [ 0, 1 [= 0. Porquanto 0 e cota inferior de[ 0, 1 [ e pertence a este conjunto.

Proposicao 145. Se A ⊂ B ⊂ R entao, inf B ≤ inf A ≤ supA ≤ supB.(supondo-se que estes quatro numeros existam.)

Prova: Vamos separar a prova em algumas etapas.

1 a) inf B ≤ inf A.

Suponha o contrario, isto e, que inf A < inf B. Como inf A e a maiordas cotas inferiores de A esta desigualdade implica que inf B nao e uma cotainferior de A logo, por definicao de cota inferior, existe x ∈ A de modo quex < inf B. Como, por hipotese, A ⊂ B temos que x ∈ B e x < inf B. Istonos diz que inf B nao e uma cota inferior de B. Piada!

2 a) inf A ≤ supA.

Pela definicao de sup e inf, para todo x ∈ A temos

inf A ≤ x ≤ supA =⇒ inf A ≤ supA.

3 a) supA ≤ supB.

Suponha, ao contrario, que supB < supA. Como supA e a menordas cotas superiores de A esta desigualdade implica que supB nao e cotasuperior de A; logo existe x ∈ A de modo que x > supB. Como, porhipotese, A ⊂ B temos que x ∈ B e x > supB. Isto nos diz que supB naoe uma cota superior de B. Piada! �

A Propriedade de Completeza

Estudaremos agora a propriedade mais importante do sistema de numerosreais. Alias e justamente esta propriedade que diferencia este sistema do sis-tema de numeros racionais.

Esta propriedade se constitui no alicerce sobre o qual se constroi todo oedifıcio da analise real.

611

Page 613: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Axioma do Supremo:

“Qualquer subconjunto de R nao vazio e cotado superiormente tem umsupremo”.

De posse deste axioma pode-se provar (exercıcio) a seguinte

Proposicao 146. Qualquer subconjunto de R nao vazio e cotado inferior-mente tem um ınfimo.

Uma das propriedades mais triviais e, nao obstante, das mais uteis detoda a matematica e considerada a seguir

A Propriedade Arquimediana

Uma importante consequencia do Axioma do Supremo e que o subcon-junto N dos numeros naturais nao e cotado superiormente em R. Isto sig-nifica, em particular, que dado um real x, existe um numero natural n quee maior do que x. Provemos isto:

Proposicao 147 (Propriedade Arquimediana). Para todo x ∈ R existe umnatural n = nx tal que nx > x.

Prova: Suponha que a tese nao se verifica, isto e, para todo n naturalocorre n ≤ x. Sendo assim N e cotado superiormente. Pelo axioma dosupremo existe µ = supN. Como µ − 1 < µ segue que µ − 1 nao pode sercota superior deN. Sendo assim existe um natural n0 satisfazendo n0 > µ−1,entao µ < n0 + 1. Como n0 + 1 e natural isto contradiz o fato de ser µ osupremo de N. �

Corolario 50. Se x, y ∈ R, com x > 0, entao

(a) Existe n ∈ N de modo que n · x > y;

(b) Existe n ∈ N de modo que 0 <1

n< x;

(c) Existe n ∈ N de modo que n− 1 ≤ x < n.

Prova:

(a) Pela proposicao 147 existe um n ∈ N de modo que n > y/x, daı n·x > y.

(b) Ainda pela mesma proposicao existe um n ∈ N de modo que 0 < 1x < n,

daı 0 <1

n< x.

(c) A propriedade arquimediana nos assegura que existem numeros naturaisn tais que x < n. Seja n0 o menor desses numeros naturais∗. Entaon0 − 1 ≤ x < n0 . �

∗Estamos invocando o Princıpio da Boa Ordenacao: “Todo subconjunto nao-vazio denumeros naturais possui um menor elemento”.

612

Page 614: Gentil Lopes - Espaços Métricos

O ıtem (c) acima, nos diz que todo real positivo situa-se entre dois naturaisconsecutivos.

Como mais uma aplicacao da propriedade arquimediana vamos provar a

Proposicao 148. Sejam a, b, ε ∈ R. Se ∀ ε > 0, a− ε ≤ b entao a ≤ b.Prova: A prova sera feita segundo a tecnica (T− 1) (p. 570). Assumindo

a negacao da tese, vamos mostrar que existe um ε > 0 de modo que a−ε > b.De fato, supondo a > b temos que a−b > 0. Pela propriedade arquimedianaexiste n0 natural de modo que 1

n0< a− b. Tomemos ε = 1

n0. Entao

ε =1

n0

< a− b ⇒ a− ε > b.

o que contradiz a hipotese. �

Conjuntos Densos

Vamos definir agora um importante conceito topologico:

Definicao 85 (Densidade). Um subconjunto X ⊂ R chama-se denso em R

quando todo intervalo aberto ] a, b [ contem algum ponto de X.

Mostraremos agora que entre dois reais distintos quaisquer existe umracional e um irracional (a bem da verdade, infinitos racionais e infinitosirracionais!), isto e, mostraremos que o conjunto Q dos numeros racionais eo conjunto Qc dos numeros irracionais sao ambos densos em R.

Proposicao 149. Sejam a e b numeros reais, com a < b.

(a) Entao existe um racional r satisfazendo a < r < b;

(b) Se µ e um irracional, entao existe um racional s tal que o irracionalµ · s satisfaz a < µ · s < b.

Prova: Sem perda de generalidade vamos supor a > 0 (caso seja a < 0trabalhamos com −a > 0).

(a) Como b − a > 0, existe − pelo corolario 50 (b) − um natural msatisfazendo 0 < 1/m < b − a (⋆). Pelo corolario 50 (c) aplicado a m · a,existe um natural n satisfazendo

n− 1 ≤ m · a < n ⇒ n− 1

m≤ a < n

m.

A prova estara completa se mostrarmos que n/m < b. De fato, caso fossen/m ≥ b teriamos

a ≥ n− 1

m⇒ −a ≤ 1− n

m

⇒ b− a ≤ n

m+

1− nm

=1

m.

n

m≥ b ⇒ b ≤ n

m

o que contraria a escolha de m feita em (⋆).

613

Page 615: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(b) Supondo 0 < a < b e µ > 0, decorre a/µ < b/µ. Logo, por (a), existeum racional s de modo que a/µ < s < b/µ. Donde, a < µ · s < b. �

E facil mostrar que µ · s e irracional, assumindo que µ seja irracional es seja racional.

De fato, utilizando a tecnica (T− 4) (p. 571). Facamos

H1 : s e racional⇒ T: µ · s e irracional.

H2 : µ e irracional

H1 ∧ T =⇒ H2

Suponha que µ · s seja racional; digamos, µ · s = r. Sendo assim µ = rs

resulta racional, por ser o quociente de dois racionais.

Para finalizar vamos rever, em uma outra forma por vezes util, os con-ceitos de sup e inf:

Definicao ( sup e inf )

Dada f : M → R, define-se:

µ = supx∈M

f(x) ν = infx∈M

f(x)

atraves das propriedades:

∃ x0 ∈M t.q.

(i) f(x) ≤ µ f(x) ≥ ν(ii) ∀ f(x′) < µ ∀ f(x′) > ν

f(x0) > f(x′) f(x0) < f(x′)

∗ ∗ ∗No meu entendimento uma das conclusoes mais importantes − para a

humanidade −, a que um cientista ja chegou e a que segue:

Voce, suas alegrias e tristezas, suas memorias e ambicoes, sua nocaode identidade e seu livre-arbıtrio nada mais sao do que a interacao deum vasto conjunto de celulas nervosas.

(Francis Crick/Fonte: Veja: 4 de Julho, 2012)

Por oportuno, em meu livro O Tao da Matematica (p. 61), estou defen-dendo algo parecido.

614

Page 616: Gentil Lopes - Espaços Métricos

10.3.3 Espacos vetoriais

Aqui apenas aditaremos alguns complementos ao texto. (p. 82)

Vejamos mais um importante exemplo de espaco vetorial.

O espaco(ℓ2, +, ·

)

Consideremos agora o conjunto ℓ2 das sequencias de numeros reais (xn)tais que a serie

∑∞n=1 x

2nseja convergente, isto e

ℓ2 ={

(xn)n∈N; xn ∈ R :

∞∑

n=1

x2n<∞

}

Por exemplo, sendo

xn =( 1√

n

)

=(

1,1√2,

1√3,

1√4, . . .

)

yn =( 1

n

)

=(

1,1

2,1

4,1

4, . . .

)

zn =( 1

n2

)

=(

1,1

4,1

9,1

16, . . .

)

Temos que (xn) 6∈ ℓ2 porquanto∑∞

n=11n diverge, enquanto yn , zn ∈ ℓ2

devido a que a serie∑∞

n=11np para p > 1 converge. Tambem pertencem a ℓ2

todas as sequencias da forma

xn = (x1 , x2 , . . . , xk, 0, 0, 0, . . .);

isto e, com termos nulos a partir de um certo ındice k.

Sobre o conjunto ℓ2 construimos um espaco vetorial assim: dados (xn), (yn) ∈ℓ2 e λ ∈ R definimos

(xn) + (yn) = (x1 + y1 , x2 + y2 , . . .)

λ · (xn) = (λx1 , λ x2 , . . .)

No apendice (p. 619) mostramos que estas operacoes estao bem definidas,isto e que

(xn) + (yn) ∈ ℓ2 e λ · (xn) ∈ ℓ2.

podemos mostrar ainda que(ℓ2, +, ·

)e um espaco vetorial.

Para referencias futuras, destacaremos aqui o seguinte subconjunto de ℓ2:

C0 0 =conjunto das sequencias reais que so possuem uma quantidade finitade termos nao nulos.

615

Page 617: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Temos quex = (x1 , x2 , x3 , . . . , xn , . . .) ∈ C0 0

se e, somente se, existe um ındice k = kx natural, de modo que xm = 0 paratodo m > k.

Ou ainda: uma sequencia pertence a C0 0 se, e somente se, todos os seustermos sao nulos a partir de uma certa ordem.

Observe que(C0 0 , +, ·

)e um espaco vetorial. Dizemos, um subespaco

vetorial de(ℓ2, +, ·

).

Segmento de reta em espacos vetoriais

Segmento de reta no espaco(Rn, +, ·

)

Consideremos a = (a1 , . . . , an) e b = (b1 , . . . , bn) dois pontos no Rn.Definimos segmento de reta de extremos a e b como sendo o conjunto

[a, b ] ={x = (1− t)a+ tb ∈ Rn : t ∈ [ 0, 1 ]

}

Observe que

t = 0 ⇒ x = (1− 0)a+ 0b = a

t = 1 ⇒ x = (1− 1)a+ 1b = b

Exemplos:

(i) n = 2. Sejam a = (0, 0) e b = (1, 1). Temos

[a, b ] ={x = (1− t)a+ tb ∈ Rn : t ∈ [ 0, 1 ]

}

[(0, 0); (1, 1)

]={x = (1− t)(0, 0) + t (1, 1) ∈ R2 : t ∈ [ 0, 1 ]

}

={x = (t, t) ∈ R2 : t ∈ [ 0, 1 ]

}

1

1

x

y

q

q

(0, 0)

a

"(1, 1)

b

տ[ a,b ]

616

Page 618: Gentil Lopes - Espaços Métricos

(ii) n = 3. Sejam a = (0, 1, 1) e b = (1, 0, 1). Temos

[a, b ] ={x = (1− t)a+ tb ∈ Rn : t ∈ [ 0, 1 ]

}

[(0, 1, 1); (1, 0, 1)

]={x = (1− t)(0, 1, 1) + t (1, 0, 1) ∈ R2 : t ∈ [ 0, 1 ]

}

={x = (t, 1− t, 1) ∈ R2 : t ∈ [ 0, 1 ]

}

1

1

q

q

−1

x

z

y

#(0, 1, 1)

a

"(1, 0, 1)

b

Segmento de reta em Espacos Quaisquer

A definicao anterior para segmento de reta no espaco(Rn, +, ·

)se es-

tende sem dificuldade para um espaco vetorial(E, +, ·

)arbitrario:

Dados a,b ∈ E o segmento de reta de extremos a e b, que se indicapor [a, b ] e o seguinte subconjunto de E:

[a, b ] ={x = (1− t)a+ tb ∈ E : 0 ≤ t ≤ 1

}.

Exemplos:

(i) Seja(M2(R), +, ·

)o espaco vetorial no qualM2 e o conjunto da matrizes

quadradas de ordem 2 com elementos reais. Faca um esboco do segmentode reta de extremos

a =

[2 13 0

]

e b =

[0 −23 4

]

.

Entao

[a, b ] =

{

x = (1− t)[2 13 0

]

+ t

[0 −23 4

]

∈M2 : t ∈ [ 0, 1 ]

}

Atribuindo alguns valores a t, obtemos

617

Page 619: Gentil Lopes - Espaços Métricos

st=0

↑s

t= 12

↑s

t=1

2 13 0

1 −12

3 2

0 −23 4

(ii) Seja C[ a, b ] o conjunto das funcoes reais contınuas definidas no inter-valo fechado [ a, b ]. Consideremos o espaco vetorial construıdo sobre esteconjunto. Facamos um esboco do segmento de reta de extremos

a : [ a, b ] −→ Rx 7−→ 2x+4

e b : [ a, b ] −→ Rx 7−→ 4x2+6

Entao[a, b ] =

{x = (1− t)a+ tb ∈ C : t ∈ [ 0, 1 ]

}.

Atribuindo alguns valores a t, obtemos

st=0

↑s

t= 12

↑s

t=1

↑a : [ a, b ] −→ R

x 7−→ 2x+4

x : [ a, b ] −→ Rx 7−→ 2x2+x+5

b : [ a, b ] −→ Rx 7−→ 4x2+6

Observe que, para t = 12 , obtemos:

x = (1− t)a+ tb

=(1− 1

2

)a+

1

2b =

1

2a+

1

2b.

Logo,

1

2a(x) +

1

2b(x) =

1

2(2x+ 4) +

1

2(4x2 + 6)

= x+ 2 + 2x2 + 3 = 2x2 + x+ 5.

Portanto,

x12

: [ a, b ] −→ Rx 7−→ 2x2+x+5

618

Page 620: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Apendice:

Prova de que a soma e o produto em(ℓ2, +, ·

)estao bem definidas. (p. 615)

De fato, dado (xn) ∈ ℓ2 temos

∞∑

n=1

(λ · xn

)2=

∞∑

n=1

λ2 · x2n

= λ2 ·∞∑

n=1

x2n,

como, por hipotese,∑∞

n=1 x2ne um numero real (isto e, converge) segue que

∑∞n=1

(λ · xn

)2tambem e convergente. Isto e,

se (xn) ∈ ℓ2 ⇒ λ · (xn) ∈ ℓ2.ver: [AR]4, p. 603.

Vamos agora mostrar que a soma esta bem definida. Sejam (xn) e (yn)elementos de ℓ2. Entao

∞∑

n=1

(xn + yn

)2=∞∑

n=1

(x2

n+ 2xnyn + y2

n

)

=

∞∑

n=1

x2n+

∞∑

n=1

y2n+ 2

∞∑

n=1

xnyn .

Como, por hipotese,∑∞

n=1 x2n< ∞ e

∑∞n=1 y

2n< ∞ por serem (xn) e (yn)

elementos de ℓ2, resta mostrar que∑∞

n=1 xnyn <∞ para termos∑∞

n=1

(xn+

yn)2<∞.

A desigualdade de Cauchy-Schwarz no Rk (p. 68) que e

k∑

n=1

∣∣xnyn

∣∣ ≤

√√√√

k∑

n=1

x2n·

√√√√

k∑

n=1

y2n

juntamente com a desigualdade triangular∗ nos fornece∣∣∣∣∣

k∑

n=1

xnyn

∣∣∣∣∣≤

k∑

n=1

∣∣xnyn

∣∣ ≤

√√√√

k∑

n=1

x2n·

√√√√

k∑

n=1

y2n

Fazendo k −→ ∞ nesta desigualdade, obtemos

∣∣∣∣∣

∞∑

n=1

xnyn

∣∣∣∣∣≤

√√√√

∞∑

n=1

x2n·

√√√√

∞∑

n=1

y2n<∞.

Daqui concluimos que se (xn) e (yn) sao elementos de ℓ2 entao∑∞

n=1 xnyne um numero real. Ou ainda: (xn) + (yn) e um elemento de ℓ2.

∗Desigualdade generalizada: |x1y1 + · · ·+ xkyk| ≤ |x1y1 |+ · · ·+ |x

kyk|.

619

Page 621: Gentil Lopes - Espaços Métricos

10.3.4 Interregno: A Matematica como arte e engenharia

Tenho enfatizado (junto a meus alunos) menos o aspecto utilitario damatematica, mas, sobretudo, sua vertente como arte e engenharia − talcomo de fato ela e em sua essencia. Assim como se desenvolve a sensibilidadepara a musica (ou outro tipo qualquer de arte) de igual modo desenvolve-sea sensibilidade para a matematica; digo, o enlevo experimentado pelo artistatambem faz parte da experiencia matematica.

A verdadeira matematica conjuga arte com engenharia.

Me formei em engenharia (eletronica) no ano de 1986 e fui trabalhar emminha cidade natal (Boa Vista-RR) no setor de Telecomunicacoes (SistemaTelebras), era detentor de um cargo de chefia e minha ocupacao ordinaria seresumia em carimbar papeis e “monitorar” os “indicadores de desempenhooperacional”, onde utilizava tabelas e graficos. Embora fosse relativamentebem remunerado nao estava (nem um pouco) satisfeito pois sentia que min-has atividades nao se enquadravam na concepcao que se tem do que sejaengenharia.

Por outro lado, desde os tempos de estudante alimentei o sonho dedeixar minha contribuicao a ciencia; entretanto, nao desejava deixar umacontribuicao efemera mas, se possıvel, uma que “transcendesse os seculos”.Juntando a este requisito minha insatisfacao com a “engenharia” que eupraticava decidi me demitir para da aulas de matematica na u.f.r.r., queestava sendo criada na ocasiao∗.

Observe que aquele que opta por fazer pesquisas antes de mais nada da(literalmente) um salto no escuro† porquanto, a priori, nao existe nenhumagarantia de que se tera algum exito.

Pois bem, atuando no magisterio, e nao descuidando do meu objetivoprincipal, comecei a ensaiar algumas criacoes na matematica; em retrospectocreio que fui bem sucedido. Por exemplo, em 2000 publiquei um livro ondeconstam alguns dos meus feitos − alem dos que constam no presente tra-balho.

O interessante disso tudo e que somente muitos anos depois atinei comum fato deveras paradoxal: eu havia abandonado a “engenharia” e, semda-me conta, encontrava-me praticando a verdadeira engenharia!

Com efeito, considero os prodıgios exibidos anteriormente − como o cubohipermagico e a topologia quantica − como verdadeiras obras de engenharia-matematica.

∗Quando estudava para prestar concurso na universidade me ocorreu que naquele pre-ciso momento (1989) milhares de indivıduos, por este Brasil afora, estavam estudandopara melhorar suas condicoes salariais e eu, aqui, estudando para piorar a minha. Comefeito, de saida perderia a metade do salario, afora outras vantagens − foi o que aconteceu.

†Pelo ao menos numa conjuntura semelhante a que eu me encontrava, inclusive emtermos de preparo academico, apenas um curso de graduacao em engenharia, digo, numaoutra area.

620

Page 622: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Um desafio a quem interessar possa

. . . da matematica que e eterna, porque

suas melhores manifestacoes podem,

como as melhores manifestacoes da lite-

ratura, continuar causando uma intensa

satisfacao emocional a milhares de pes-

soas, milhares de anos depois.

(G.H. Hardy)

Esta pagina ficaria em branco (ociosa), decidi preenche-la deixando aquiaos meus leitores um dos problemas que mais me deu satisfacao em te-loresolvido. . . “uma intensa satisfacao emocional ”.

Uma outra razao e que eu nao gostaria de morrer (“fazer a passagem”)sem antes conhecer uma outra solucao diferente da minha. Apenas curiosi-dade se haveria uma outra − quica mais simples que a minha.

Minhas congratulacoes e agradecimentos aquele que obtiver exito e meenviar a resolucao.

Desafio (Gentil, o taumaturgo/18.07.1999)

Sejam j e n inteiros positivos arbitrariamente fixados. Mostre que

n

2j−1 ∈ Z ⇐⇒

(n− 1

2j−1

)

e

(n

2j−1

)

tem paridades distintas.

Nota: Dizemos que dois numeros tem a mesma paridade se ambos saopares ou ambos sao ımpares.

Exemplos:

n j n

2j−1

( n−12j−1

) ( n2j−1

)

1 1 1 0 1

2 1 2 1 2

2 3 0, 5 0 0

3 2 1, 5 1 3

Nota:

(mn

)=

m!n!(m−n)! , se m ≥ n;

0 , se m < n.

Nota: O Desafio anterior surgiu quando fomos tentar demonstrar (inducaosobre n) que as sequencias abaixo sao iguais. m e um natural fixado.

an = (−1)(n−1

2m−1)

e bn = (−1)⌊

n−1

2m−1

Nota: Este desafio foi resolvido pelo aluno Juan Carlos Moraga Gonzalezda UFRR (em Junho de 2014). Ademais, agradeco ao Juan por ter meapontado algumas correcoes a serem feitas neste livro.

621

Page 623: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definir ou compreender o mundo como relacao e tambem reconhecer-lheuma grande plasticidade, ou seja, uma variabilidade que e funcao de repre-sentacoes elas mesmas variadas. O mundo nao e portanto esta realidaderıgida e valida para todos que o vulgo cre, afirma Paul Foulquie. Ele variacom os indivıduos, com os povos e com as epocas [. . .]

Heidegger qualifica a riqueza de tal mundo pelo termo de mundo am-biente: O ambiente no qual vivemos e realmente estruturado por nos, enao depende senao de nos. O mundo assume entao o sentido de uma aber-tura tao impressionante quanto variada; pode revestir um numero infinitode combinacoes de que somos os unicos senhores.

(Historia do Existencialismo, p.110/Denis Huisman)

A Consciencia cria a realidadeAinda uma outra interpretacao propoe que o ato de observacao cria a

realidade fısica. Em sua forma forte, essa interpretacao assevera que a cons-ciencia e o estado basico fundamental, mais primario que a materia ou ener-gia. Essa posicao concede um papel especial a observacao, quando a trans-forma no agente ativo que provoca o colapso das possibilidades quanticas emrealidades. Muitos fısicos suspeitam dessa interpretacao porque ela lembraideias originarias das filosofias orientais e das propostas mısticas. Mas umnotavel subconjunto de fısicos proeminentes, incluindo os laureados Nobelem Fısica Eugene Wigner, Brian Josephson, John Wheeler e Jonh von Neu-mann, abracou conceitos que sao, pelo menos, um pouco simpaticos a esteponto de vista. O fısico Amit Goswami, da Universidade de Oregon, e umdos que o promovem com muito vigor. (Mentes Interligadas, p.221/Dean Radin)

Com isto explica-se (ou unifica-se) a diversidade de Deuses construidospelo homem ao longo das eras.

(Mente)

Deus

Deus-Parens (Tenrikyo)Brahman (Hinduısmo)

Vazio (Budismo)Ceu (Confucionismo)

Tao (Taoısmo)

Jeova (Judaısmo)Ala (Islamismo)

Pai (Cristianismo)Kami (Xintoısmo)

Luz Branca

Deus + Homem = Deus

Todos os Deuses, sem excecao, sao construcoes da mente humana.(Exumacao e Julgamento de Deus/Gentil/ver p. 133)

622

Page 624: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Referencias Bibliograficas

[1] White, A.J. Analise real: uma introducao. Traducao de Elza F. Gomide.S. Paulo - SP: EDGAR BLUCHER, 1993.

[2] Figueiredo, Djairo Guedes de, Analise I. 2a ed. Rio de Janeiro: LTC -Livros Tecnicos e Cientıficos,1996 .

[3] Kuelkamp, Nilo. Introducao a Topologia Geral. Florianopolis: Ed. daUFSC, 1988.

[4] Domingues, Higino Hugueros. Espacos Metricos e Introducao a Topolo-gia. Sao Paulo: Atual, 1982.

[5] Lima, Elon Lages. Espacos Metricos. Rio de Janeiro:IMPA - CNPq,1993.

[6] Silva, Gentil Lopes. Novas Sequencias Aritmeticas e Geometricas.Brasılia - DF: THESAURUS EDITORA, 2000.

[7] Silva, Gentil Lopes. O Mito das Ambiguidades nas Representacoes Deci-mais, CBPF-NF-001/06.

[8] Silva, Gentil Lopes. Uma sugestao para o tratamento das dimensoes naTeoria das Supercordas, CBPF-NF-002/06.

[9] Hefez, Abramo. Curso de Algebra, Volume 1. Rio de Janeiro: IMPA -CNPq, 1993.

[10] Guidorizzi, Hamilton Luiz, Calculo, Volumes 1−4. Rio de Janeiro: LTC- Livros Tecnicos e Cientıficos, 2001.

623

Page 625: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Indice Remissivo

Infimo, 608Angulo entre vetores, 103

A contenda, 180Algoritmo binario, 229

Aquiles e a tartaruga, 184

Atomica, verdade, 170Axioma do Supremo, 612

Blanche, 85

Bolaaberta, 105

como Ondas, 115em subespacos, 121

no espaco produto, 124

proposicoes, 125

Codigo ASCII, 34

Caminho em espacos metricos, 365

ChaitinAs boas teorias, 494

Bits na Natureza, 506Distancias pequenas, 506

Ninguem sabe como resolver, 494

Prova elegante, 486Cobertura, 475

Compacidade, 477

Completamento, 444Conexo por caminhos, 364

Conjunto, 628convexo, 368

de Cantor, 400

limitado, 53

totalmente limitado, 488aberto, 188num subespaco, 193

fechado, 201Continuidade, 237Continuidade uniforme, 288Contracao, 257Convergencia, 141Cota Superior, 605

Inferior, 605Cubo hipermagico, 539Curva de Peano inedita, 543Curva de Peano no cubo, 536

Danah Zohar e Pietro Ubaldi, 561Definicao

Infimo, 608Bola aberta, 105Codigo, 35Caminhos, 365Cobertura, 475Compacidade, 477Completamento, 444Conjunto aberto, 188Conjunto fechado, 201Conjunto limitado, 53Conjunto totalmente limitado, 488Conjuntos convexos, 368Continuidade, 237Continuidade uniforme, 288Contracao, 257Convergencia de sequencias, 141Curva de Peano, 516

624

Page 626: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Definicoes matematicas, 13Densidade, 216Descontinuidade, 238Distancia entre conjuntos, 52Distancia entre ponto e conjunto,

47Espacos Homeomorfos, 296Espaco desconexo, 350Espaco discreto, 133Espaco euclidiano, 89Espaco metrico, 12Espaco metrico completo, 416Espaco topologico, 280Espacos de Banach, 428Espacos de Hilbert, 432Espacos topologicamente comple-

tos, 463Espacos vetoriais, 82Funcoes de Lipschitz, 258Homeomorfismo, 295Imagem Direta, 591Imagem Inversa, 593Imersao isometrica, 251Isometria, 254Metrica mais fina, 310Metricas equivalentes, 311Norma, 86Normas equivalentes, 325Ponto aderente, 204Ponto de acumulacao, 219Ponto fronteira, 196Ponto interior, 186Produto Interno, 89quadrado hipermagico, 529Sequencias de Cauchy, 407Sequencia, 137Sequencias limitadas, 156Subespaco, 81Supremo, 606

Densidade, 216, 613Descontinuidade, 238Desigualdade, 628

de Cauchy-Schwarz, 68, 91triangular, 12, 602

Diametro, 54Distancia, 628

de Hamming, 37entre dois conjuntos, 52entre dois pontos, 12entre ponto e conjunto, 47Gentil, ro, 40Gentil, tau, 41

Dogma kantiniano, 184

Einstein1 + 1 6= 2, 104A massa curva o espaco, 21Acuidade visual, 172

Email: RMU, 174Eminentes matematicos, 167Equivalencia Logica, 566Equivalencias Notaveis, 568Erro de eminentes matematicos, 167Espaco, 628

euclidiano, 89conexo por caminho, 368de Banach, 428de Hilbert, 432desconexo, 349discreto, 132localmente conexo, 392metrico, 12metrico completo, 416topologico, 280

Espacos vetoriais, 82

Famılias Indexadas, 595Fenomenos nao-locais, 387Frechet, 182Francis Crick, 614Funcao, 628

aberta, 286de Lipschitz, 258limitada, 31

Funcoes Proposicionais, 576

G.H. Hardy, 85Gaston Bachelard

A abstracao, 9

625

Page 627: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Brusca mutacao, 16Gentil

Algoritmo binario, 230Algoritmos, pontos, 562Capa Deus Quantico, 628

Capa EJD, 133Capa HP, 222Capa HP 2a Edicao, 628Capa NSAG, 472Capa O TAO, 348

Formula binaria, 230Formula codigos, 39, 63Formula inedita, 236Formula ternaria, 232

Fluxograma, 426Iconoclasta, 563O Universo em um palito, 544Teorema, 228Teorema patologico, 377

Gregory Chaitin, 177

Hawking, 183Heisenberg, 137Homeomorfismo, 295

I.R. Shafarevich, 278

Imagem Direta, 591Imagem Inversa, 593Imersao isometrica, 251Implicacao Logica, 564Importancia da densidade, 217

Isometria, 254

Jimena e Irina, 406John Von Newmann, 237John Wheeler

bits, 545

Ideias simples, 115

Krishnamurti, 105

Leon Bonaventure, 84Lagrange, 78

Leibniz e os bits, 544Leo Kadanoff, 349

Limites em espacos metricos, 337

Louis De Broglie, 115

Metrica quantica, 16

Metrica zero-um, 15

Metrica quantica, prova, 64

Marcelo Malheiros, 561

Materia brotando do Nada, 567

Matematica e engenharia, 620

Multiplexacao, 517

Numero de Lebesgue, 502

Negacao de sentencas quantificadas,578

Niels Bohr, 79

Nietzsche

Dogmas sao prisoes, 57

Norbert Wiener, 185

O mito das ambiguidades, 507

Ondas geometricas, 115

Operacoes Generalizadas, 597

Operacoes Logicas, 564

Osho

Buda, vazio, 547

Implosao acontece, 561

Particao dos naturais, 140

Patologias, 48, 145, 147, 197, 220,377

Pietro Ubaldi e Danah Zohar, 561

Ponto, 628

aderente, 204

de acumulacao, 219

fixo, 357

fronteira, 196

interior, 186

Isolado, 129

Projecao i-esima, 260

Projecao estereografica, 305

Proposicao, 563

Propriedade Arquimediana, 612

Propriedades topologicas, 298

Prova metrica quantica, 64

626

Page 628: Gentil Lopes - Espaços Métricos

Quadrado quantico, 97Quadrado hipermagico, 528Quantificadores, 576

Regua quantica, 19Representacoes

binarias, 229ternarias, 231

Resumo das tecnicas, 576Richard Courant, 156Rotacao, 255

Sequencia, 137Sequencias

em espacos vetoriais normados,159

limitadas, 156num espaco produto, 157

Sequencias de Cauchy, 407Stephen Hawking, 183Subespacos, 81Subsequencia, 140Supremo, 605

Tecnicas de demonstracao, 568Tabela resumo pontos, 222Teorema, 628

2 Rompe paradigma, 171de Heine-Borel, 478do Ponto Fixo de Banach, 467

Topologia quantica, 98, 115, 383

Uma mao leva a outra, 117Unicidade do limite, 154Universo esculpido em um palito, 544,

546

Voltaire, 17

William BlakeO Mundo em um Grao, 391, 544

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