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OPINIÃO OPINION 165 1 Diretoria do Instituto Oswaldo Cruz, Comissão Interna de Gestão Ambiental do IOC- CIGAmb, Fundação Oswaldo Cruz. Av. Brasil 4365 Pavilhão Gomes de Faria 203, Manguinhos. 21045-900 Rio de Janeiro RJ. [email protected] 2 Fiocruz. Escola Nacional de Saúde Pública. 3 Fiocruz. Escola Nacional de Saúde Pública A gestão ambiental no setor público: uma questão de relevância social e econômica Environmental management in the public sector: a question of social and economic relevancy Resumo Este texto apresenta uma discussão a respeito da necessidade de implantar um sistema de gestão ambiental nos órgãos da administra- ção pública. Efetua-se breve descrição de práti- cas gerenciais de empresas de setores variados que assumem o compromisso de estabelecer a melhor relação possível entre atividade empre- sarial, meio ambiente e necessidades humanas presentes e futuras. Expõem-se alguns argumen- tos de caráter econômico, referentes aos benefí- cios obtidos por iniciativas privadas que adota- ram critérios de ecoeficiência que, em si, seriam suficientes para justificar a implantação de uma política efetiva de gestão ambiental nas institui- ções públicas. Destaca-se a relevância da criação da Agenda Ambiental na Administração Públi- ca (A3P), que pretende instaurar uma nova cul- tura institucional, visando à mobilização dos servidores para a otimização dos recursos, para o combate ao desperdício e para a busca de uma melhor qualidade do ambiente de trabalho. Evi- dencia-se que para o êxito e efetivação da agen- da será decisivo o grau de engajamento do pró- prio servidor e de seus dirigentes. Palavras-chave Gestão ambiental, Administra- ção pública, Ecoeficiência Abstract Discussing the need to implement an environmental management system in civil ser- vice entities, this paper offers a brief description of some management practices used by compa- nies in various sectors that are endeavoring to establish the best possible relationships between business activities, environmental issues and hu- man needs, today and in the future. Some eco- nomic arguments are presented, including the benefits obtained by private sector companies adopting eco-efficiency criteria that are in them- selves sufficient to justify the implementation of an effective environmental management policy in government institutions. The relevance is also stressed of drawing up the Civil Service Environ- ment Agenda (A3P), striving to introduce a new cultural approach that will mobilize civil ser- vants in order to optimize resources, combating waste and encouraging better work environments. For this Agenda to be effective, civil servants and managers must obviously be fully engaged. Key words Environmental management, Civil service, Eco-efficiency Martha Macedo de Lima Barata 1 Débora Cynamon Kligerman 2 Carlos Minayo-Gomez 3

Gestão ambiental no setor público

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1Diretoria do InstitutoOswaldo Cruz, ComissãoInterna de Gestão Ambientaldo IOC- CIGAmb,Fundação Oswaldo Cruz. Av.Brasil 4365 PavilhãoGomes de Faria 203,Manguinhos. 21045-900Rio de Janeiro [email protected] Fiocruz. Escola Nacionalde Saúde Pública.3 Fiocruz. Escola Nacionalde Saúde Pública

A gestão ambiental no setor público:uma questão de relevância social e econômica

Environmental management in the public sector:a question of social and economic relevancy

Resumo Este texto apresenta uma discussão arespeito da necessidade de implantar um sistemade gestão ambiental nos órgãos da administra-ção pública. Efetua-se breve descrição de práti-cas gerenciais de empresas de setores variadosque assumem o compromisso de estabelecer amelhor relação possível entre atividade empre-sarial, meio ambiente e necessidades humanaspresentes e futuras. Expõem-se alguns argumen-tos de caráter econômico, referentes aos benefí-cios obtidos por iniciativas privadas que adota-ram critérios de ecoeficiência que, em si, seriamsuficientes para justificar a implantação de umapolítica efetiva de gestão ambiental nas institui-ções públicas. Destaca-se a relevância da criaçãoda Agenda Ambiental na Administração Públi-ca (A3P), que pretende instaurar uma nova cul-tura institucional, visando à mobilização dosservidores para a otimização dos recursos, parao combate ao desperdício e para a busca de umamelhor qualidade do ambiente de trabalho. Evi-dencia-se que para o êxito e efetivação da agen-da será decisivo o grau de engajamento do pró-prio servidor e de seus dirigentes.Palavras-chave Gestão ambiental, Administra-ção pública, Ecoeficiência

Abstract Discussing the need to implement anenvironmental management system in civil ser-vice entities, this paper offers a brief descriptionof some management practices used by compa-nies in various sectors that are endeavoring toestablish the best possible relationships betweenbusiness activities, environmental issues and hu-man needs, today and in the future. Some eco-nomic arguments are presented, including thebenefits obtained by private sector companiesadopting eco-efficiency criteria that are in them-selves sufficient to justify the implementation ofan effective environmental management policyin government institutions. The relevance is alsostressed of drawing up the Civil Service Environ-ment Agenda (A3P), striving to introduce a newcultural approach that will mobilize civil ser-vants in order to optimize resources, combatingwaste and encouraging better work environments.For this Agenda to be effective, civil servants andmanagers must obviously be fully engaged.Key words Environmental management, Civilservice, Eco-efficiency

Martha Macedo de Lima Barata 1

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Introdução

Ao longo da década de 90 do século 20, foramimplementados nas empresas instrumentos degestão ambiental para o controle e a prevençãode danos ambientais, a fim de responder commaior eficiência às atuais demandas do merca-do. Diversos instrumentos, desenvolvidos paramelhorar seu desempenho ambiental, redunda-ram numa série de vantagens econômicas: redu-ção de custos, aumento de competitividade, aber-tura de novos mercados e diminuição das chan-ces de serem surpreendidas por algum tipo deônus imprevisível e indesejável.

Tais argumentos de caráter econômico, porsi só, já seriam suficientes para fundamentar anecessidade de que os órgãos da administraçãopública – e, mais ainda, os do setor de saúde -assumissem o compromisso de velar pela con-servação dos recursos naturais e a qualidade domeio ambiente. No entanto, instituições públi-cas que atuam no campo da pesquisa e da pres-tação de serviços biomédicos ainda carecem deuma política efetiva de gestão ambiental. Mesmoexecutando serviços essenciais à sociedade, apre-sentam potencial poluidor capaz de causar da-nos à saúde de seus trabalhadores e à populaçãolocalizada em seu entorno, além de contaminaro solo, a atmosfera, os rios e os lençóis freáticos.

Antecedentes históricosda gestão ambiental corporativa

A constatação, ao final da década de 60 do sécu-lo passado, de que a capacidade assimilativa dosecossistemas e de regeneração dos recursos na-turais ocorria a taxas incompatíveis com o des-gaste imposto à natureza, contribuiu para rea-tivar o questionamento clássico, em particularo malthusiano, acerca da compatibilidade nolongo prazo entre o crescimento e a demogra-fia, nos limites do patrimônio cultural fixo1. Em1971, o Clube de Roma, por meio de modeloseconométricos, previu o esgotamento dos re-cursos renováveis e não renováveis em face domodelo de crescimento, do padrão tecnológicoe da estrutura da demanda. Seus resultados re-ativaram o debate acadêmico e político-institu-cional, conduzindo à aspiração ao desenvolvi-mento sustentável.

Nos primórdios, os setores produtivos limi-tavam-se, em alguns casos, a adotar as medidasnecessárias para evitar a paralisação de suas ati-vidades ou o recebimento de multas, por não

atuar em conformidade com os procedimentos epadrões legais. Entretanto, a ocorrência de aci-dentes ambientais – como o incidente na AlliedQuemical Corporation, em Hopewell, Virgínia(EUA), em 1975; a explosão química da Hoffman-La Roche, em Seveso (Itália), em 1976; o vaza-mento de gases tóxicos numa fábrica de pestici-da da Union Carbide em Bhopal (Índia), em 1984;a explosão de reator nuclear em Chernobyl, naentão União Soviética, em 1986; o vazamento depetróleo, em 1990, do navio petroleiro ExxonValdez e o caso emblemático Love Canal,,,,, no es-tado de Nova York, um símbolo de contamina-ção do solo por resíduos sólidos enterrados -obrigou as empresas a arcarem com elevadosgastos em indenizações, recuperação dos ambi-entes danificados e ações para mitigação e/oucontrole dos danos. Além disso, a imagem dasempresas causadoras do dano foi afetada nega-tivamente. Frente a esse quadro, empresas commaior potencial poluidor passaram a desenvol-ver e implementar instrumentos de gestão ambi-ental corporativa para a melhoria do fluxo deinformação, interno e externo, além de propiciara redução de risco de incidentes e acidentes.

O setor químico foi o pioneiro na elaboraçãode diretrizes para a gestão ambiental corporati-va. A Canadian Chemical Producers Association(CCPA) lançou, em 1984, um documento deno-minado Statement of Responsible Care and Gui-ding Principles, contendo princípios específicospara a gestão responsável do processo de produ-ção em todo o ciclo de vida do produto, dandoênfase à proteção da saúde humana e do meioambiente e à segurança industrial e do produto.O documento, além de detalhar as iniciativas queas empresas precisam tomar para atender aosprincípios do Responsible Care, destaca a necessi-dade de comprometimento de todos os envolvi-dos na produção, na distribuição e no recebi-mento dos produtos das respectivas empresas,assim como da troca permanente de informa-ções com a comunidade vizinha. A adoção dessesprincípios em vários outros países, como EUA,Inglaterra e Brasil, contribuiu para resgatar umaimagem mais positiva da indústria química pe-rante a opinião pública. Este tipo de ação coor-denada, envolvendo grande número de empre-sas de um segmento industrial, seria, sob a óticada gestão ambiental, um importante exemplo deestratégia cooperativa que, devido ao seu caráterpioneiro e a sua abrangência, viriam a ser segui-dos, nos EUA, por diversos outros setores, emespecial, pela indústria do petróleo.

Em face da crescente importância dada à pro-

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teção ambiental e com o objetivo de harmonizarglobalmente os procedimentos de gestão ambi-ental empresarial, sem privilegiar determinadossetores ou países, foram criados, em 1994, noâmbito da International Standard Organization(ISO), grupos de trabalho para o desenvolvimen-to de normas, contendo diretrizes aplicáveis aosdiferentes setores produtivos e regiões que possi-bilitem uma gestão e um produto com “qualida-de ambiental”. Em 1996, foram aprovadas e pu-blicadas as normas ISO 14001 e ISO 14004.

Na norma ISO 14001 - revisada e publicadanova versão, em 2000 - encontram-se especifica-dos os requisitos gerenciais para estabelecer umSistema de Gestão Ambiental (SGA) e obter acertificação, nos mais diversos tipos de organi-zações - respeitadas suas especificidades setori-ais, geográficas, culturais e econômicas..... Nela,estão sistematizados os procedimentos necessá-rios para a definição dos princípios norteadoresda política ambiental da empresa. Além de indi-car - com base na política definida - a formacomo serão planejadas e implementadas as ações,fixam-se os prazos e os recursos necessários parasua operacionalização, assim como os meiospara verificar a eficiência e eficácia do planeja-mento previsto e das ações implementadas, o quepermite realizar - sempre que necessário - a cor-reção de rumos para o atendimento aos princí-pios contidos na política. A norma também esta-belece que a alta direção da organização deverásubmeter-se periodicamente a revisões numabusca contínua de aperfeiçoar seu desempenhoambiental.

A certificação da empresa, pela norma ISO14001, assegura a todas as partes interessadas (cli-entes, fornecedores, acionistas, força de trabalho,comunidade, governo e organizações não gover-namentais, dentre outras) que as práticas gerenci-ais para a manutenção e melhoria do seu desem-penho ambiental se ajustam ao estabelecido nanorma, independente do setor e/ou local onde aempresa esteja atuando. Em outras palavras, esteinstrumento propicia a transparência e a unidadeno fluxo de informações para o público interno eexterno das empresas sobre os procedimentos degestão ambiental aplicados por elas.

A relevância deste instrumento pode ser cons-tatada pela quantidade e diversidade de empre-sas certificadas no mundo2. Até 2003, foram con-cedidas 36.765 certificações, das quais apenas 645(1,7%) correspondem a empresas situadas naAmérica do Sul. A maior parte delas pertence apaíses de Europa (18.243) e Ásia (13.410), emcujas sociedades há um maior grau de preocu-

pação ambiental e têm-se desenvolvido tecnolo-gias menos poluentes. No Brasil, até essa data, onúmero de certificações era de 570, o que repre-senta 88,37% do total das concedidas na AméricaLatina. A média anual vem se mantendo em tor-no de 200, ao longo deste milênio, um númeroainda relativamente pequeno, considerando ototal de empresas em atividade no país, mas re-velador de uma mudança significativa quandocomparado com a situação anterior a 2001, emque as empresas certificadas eram apenas 120.

Observa-se que entre as empresas certifica-das apenas duas são do setor público, quatro sededicam à preparação farmacêutica e à atençãomédico-hospitalar e dez atuam na área de saúdee de serviços3. Esses dados são reveladores dopouco empenho de empresas do setor público -sobretudo as que oferecem assistência médico-hospitalar – em entrar num nível de gestão am-biental pautada por parâmetros garantidos ecomparáveis internacionalmente. Uma explica-ção cabível desse desinteresse estaria na falta deevidência sobre as efetivas vantagens econômi-cas que a certificação proporcionaria às empre-sas de diferentes setores, tamanhos e localiza-ções, considerando os custos do processo e dosprocedimentos necessários para a aplicação danorma. Conseqüentemente, as empresas públi-cas só solicitariam a certificação quando impeli-das por exigências do mercado ou de determina-dos atores sociais4.

O SGA, no entanto, contribui para a ecoefici-ência das empresas, enquanto prática de produ-zir sempre bens e serviços mais úteis, concomi-tantemente à redução contínua do consumo derecursos e da poluição5, 6, o que traduz a preocu-pação em estabelecer a melhor relação possívelentre atividade empresarial, meio ambiente e ne-cessidades humanas presentes e futuras. Sob essaótica, empresas de todos os tamanhos estariamaprimorando suas cadeias produtivas, incorpo-rando ações que conduzem à melhoria do de-sempenho ambiental. Alguns desses avanços con-sistem na redução da obsolescência e da perdada manutenção, reparo e operação (MRO) demateriais, através de práticas de gestão de esto-ques; decréscimo substancial de custos com so-bras e perdas de materiais; aumento de receitascom a conversão de resíduos e desperdícios emsubprodutos; redução do uso e do desperdíciode solventes, pinturas e outras substâncias quí-micas, por meio de parcerias ou terceirização deserviços e reutilização de materiais, pela adoçãode programas de retorno do produto. Atreladasao sistema de gestão ambiental, inovações ope-

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racionais e tecnológicas são incorporadas ao lon-go do ciclo de vida de empresas que atuam emsetores variados - química, eletroeletrônica, alu-mínio, automóveis, entre outros - com resulta-dos positivos do ponto de vista econômico eambiental 7,8. Esses resultados raramente sãopercebidos, a não ser de forma muito pontual,pois as empresas carecem de mecanismos ade-quados para sua contabilização, razão pela qualconsideram onerosos os gastos incorridos coma gestão e as certificação ambientais.

A gestão ambientalna administração pública

A criação da Agenda Ambiental na Administra-ção Pública (A3P), no final de 1999, pelo Minis-tério do Meio Ambiente (MMA) e oficializadapela Portaria Nº 510/2002, vai ao encontro dosquestionamentos expostos anteriormente sobreo número limitado de empresas do setor públicocertificadas pela ISO 14001. A Agenda pretendeinstaurar um processo de construção de umanova cultura institucional na administração pú-blica, visando à conscientização dos servidorespara a otimização dos recursos para o combateao desperdício e para a busca de uma melhorqualidade do ambiente de trabalho9. Visa a colo-car as empresas em sintonia com a concepção deecoeficiência, incluindo critérios socioambientaisnos investimentos, compras e contratações deserviços dos órgãos governamentais.

Em novembro de 2005, haviam aderido à A3P,entre outras instituições: a Presidência da Repú-blica, o Ministério da Defesa, o Ministério deMinas e Energia, o Ministério da Educação, oMinistério da Saúde (Fundação Nacional de Saú-de e Agência Nacional de Vigilância Sanitária), oMinistério de Desenvolvimento Social, , , , , a Secre-taria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, aProcuradoria-Geral da República, o SupremoTribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça,o Tribunal Superior Eleitoral, a Polícia Federal, oTribunal de Contas da União, o Banco Regionalde Desenvolvimento do Extremo Sul, diversasprefeituras municipais e o Serviço Brasileiro deApoio às Micro e Pequenas Empresas.

Alguns dos procedimentos propostos sãosemelhantes aos da norma ISO 14001, não obs-tante, sua maior ênfase está na diminuição dodesperdício, através dos 3R´s, isto é: reduzir, reci-clar e reutilizar a quantidade de resíduos gera-dos, sobretudo nos escritórios. Não são contem-pladas estratégias indicadas pela ISO 14001 como:

levantamentos dos aspectos e impactos ambien-tais ao longo do ciclo de vida da produção oudos serviços prestados e o estabelecimento deplanos de emergência.

Para a implementação da A3P, o MMA pro-põe: a criação de um grupo responsável pela Agen-da na empresa, composto por servidores de vá-rias áreas da instituição; a realização do diagnós-tico da situação, identificando pontos críticos eavaliando os impactos ambientais e desperdíci-os; a elaboração do planejamento integrado, en-volvendo o maior número de colaboradores eáreas de trabalho; a definição de projetos e ativi-dades, priorizando ações de maior urgência; aimplementação das atividades programadas, re-alizando treinamentos e disponibilizando recur-sos físicos e financeiros; a avaliação e o monito-ramento do desempenho ambiental, identifican-do avanços e deficiências; a busca de uma melho-ria progressiva através da avaliação sistemática,do replanejamento, da introdução de novas tec-nologias e da capacitação de funcionários.

O retorno econômicoda implementação da gestão ambiental

No Brasil, algumas metodologias, como a adota-da pelo Programa de Produção Mais Limpa(PmaisL) e a desenvolvida por Barata8, vêm con-tribuindo para evidenciar os ganhos econômicosprovenientes da gestão ambiental nas empresas.Tais metodologias apresentam o estudo da viabi-lidade econômica das ações necessárias para apri-morar o desempenho ambiental das empresas,contemplando a redução dos recursos naturaisutilizados e da degradação ambiental.

O PmaisL foi implantado, em 1995, pelo Cen-tro Nacional de Tecnologias Limpas do SENAI-RS, através de convênio estabelecido com o Pro-grama das Nações Unidas para o Meio Ambiente(UNEP) e a Organização das Nações Unidas parao Desenvolvimento Industrial (UNIDO). A me-todologia do Programa propõe que inicialmentese realizem diagnósticos sobre os seguintes as-pectos: 1) qualidade da gestão ambiental na em-presa, avaliando sua adequação às exigênciasambientais legais e de boas práticas de saúde ocu-pacional; 2) equipamentos e das técnicas existen-tes para o controle, a redução na fonte e o moni-toramento de emissões (gasosas, líquidas e sóli-das); 3) capacitação da força de trabalho, bemcomo das possíveis práticas existentes aplicáveispara a redução no uso de recursos (energia, águae matérias primas). Posteriormente, devem ser

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identificados os meios para solucionar as defici-ências diagnosticadas e as oportunidades exis-tentes para melhorar o desempenho ambientalda empresa, ponderando custos e benefícios fi-nanceiros decorrentes das ações oportunas daecoeficiência.

Na primeira fase do Programa, a metodolo-gia foi aplicada em onze pequenas e médias em-presas que investiram um total de R$ 220 mil eobtiveram ganhos financeiros da ordem de R$497 mil/ano, em face da redução na geração de97 ton/ano de resíduos perigosos, no consumode matéria prima (120 ton/ano), de energia (1660Mwh/ano) e de água (120 mil m3/ano) 10. As so-luções propostas nem sempre envolveram inves-timentos e, em muitos casos, representaram ape-nas mudanças no processo operacional da em-presa e treinamento dos funcionários.

Em virtude dos resultados iniciais apresen-tados, o Programa foi ampliado, constituindo-se numa Rede de Produção Mais Limpa, com-posta por entidades de apoio à indústria e aocomércio, instituições de ensino e pesquisa e or-ganismos de financiamento, atuantes nos esta-dos da Bahia, Ceará, Mato Grosso, Minas Ge-rais, Pernambuco, Santa Catarina, Rio de Janei-ro e outros.

Na proposta de Barata8, a gestão ambientalpermeia todos os setores e atividades da empre-sa. O conjunto da força de trabalho se torna res-ponsável pelo desempenho ambiental na buscada ecoeficiência e também na redução dos riscosfinanceiros provenientes de externalidades am-bientais negativas inerentes às atividades desen-volvidas. Esta metodologia baseia-se na percep-ção de que, do ponto de vista gerencial, é funda-mental estabelecer comparações entre investimen-tos necessários para controlar a degradaçãoambiental e custos potenciais da degradação pro-vocada, a curto, médio e longo prazo, seja narecuperação ou mitigação dos impactos, seja naforma de indenizações ou compensações à socie-dade pelos danos causados. São efetuadas esti-mativas de gastos com a implantação dos proce-dimentos e das tecnologias condizentes para aten-dimento aos padrões legais e normativos e dospossíveis custos e benefícios contingentes ou in-tangíveis.

Essa metodologia foi aplicada em três em-presas localizadas no Estado do Rio de Janeiro,cujo porte, setor de atuação, faturamento e siste-ma de custeio utilizado eram distintos, mas ti-nham sido instaladas num período em que oconhecimento preciso dos danos que as ativida-des produtivas podiam ocasionar ao meio am-

biente era praticamente inexistente. Concluiu-seque o custo de manutenção da gestão ambientalnas empresas não ultrapassa 2% de seu custototal. Entre os benefícios diretos destacam-se: aconsultoria ambiental para outras unidades eempresas e a venda de equipamentos desenvol-vidos para preservar, proteger e recuperar o meioambiente. Quanto aos benefícios indiretos, so-bressaem a redução de gastos propiciada pelamaior eficiência no consumo de energia e água eno volume de resíduos tratados.

Numa das empresas estudadas - que detin-ha um passivo ambiental elevado devido à práti-ca de enterrar os resíduos - houve inclusive umaarticulação para fornecer serviços e resíduos aterceiros que passaram a ser computados comoreceita direta. Essa mesma empresa empreendeuesforço técnico e financeiro para a implantaçãode estação de tratamento de resíduos industriais,evitando incorrer em gastos com medidas com-pensatórias que somavam, em 2000, o montantede R$ 1.500.000,00, além de multas e pagamen-tos de custas judiciais em decorrência do descar-te de efluentes líquidos fora dos padrões da Li-cença de Operação. A implantação de uma ges-tão ambiental, portanto, pode - dependendo daatividade e de seu potencial gerador de passivoambiental - evitar inclusive custos contingentesexpressivos.

Considerações finais

As medidas adotadas para a redução dos impac-tos ambientais (presentes e futuros) - além deconstituírem manifestações de responsabilidadesocial das empresas – podem redundar em re-torno econômico. Para provar essa eficácia eco-nômica, cabe ao responsável pela gestão ambi-ental ultrapassar a lógica de mera despoluição einvestir no desenvolvimento de novos produtosgeradores de receita; reduzir os custos de produ-ção, utilizando menos insumos ou introduzindomudanças tecnológicas; melhorar o relaciona-mento com clientes e demais partes interessadase diminuir custos contingentes. Os métodos pro-postos subsidiam na definição de projetos am-bientais a serem mantidos, implantados ou en-cerrados e de atividades a serem priorizadas, vi-sando sempre a uma maior eficiência no desem-penho ambiental e econômico.

As empresas e instituições do setor público,particularmente as que têm como missão diretapromover o bem-estar da sociedade, deveriamser as primeiras a tomar a iniciativa de implantar

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um sistema eficiente de gestão ambiental. Aosfatores sociais associados à preservação ambi-ental e à saúde da população, somam-se os efei-tos da melhor utilização de recursos públicos,pois a ecoeficiência se fundamenta na racionali-dade das decisões, na análise de custo e benefíciodas medidas a serem implementadas. Seria dedesejar, portanto, que a A3P atue em conformi-

dade com os requisitos ambientais legais, evitan-do potenciais custos em compensação por da-nos ambientais. Para que as mudanças pretendi-das por essa Agenda na cultura institucional pos-sam efetivar-se, é decisivo o engajamento do pró-prio servidor e de seus dirigentes. Caso contrá-rio, a Agenda será mais um programa governa-mental sem garantia de continuidade.

Referências

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Colaboradores

MML Barata, DC Kligerman e C Minayo-Go-mez participaram igualmente de todas as etapasda elaboração do artigo.

Environmental Protection Agency. The Lean andGreen Supply Chain: A Practical Guide for MaterialsManagers and Supply Chain Managers to Reduce Costsand Improve Environmental Performance. EUA; 2000.Barata MML. Aplicação de uma estrutura contábilpara apropriação dos custos ambientais e avaliação dasua influência no desempenho econômico das empre-sas [tese de doutorado]. Rio de Janeiro: COPPE/UFRJ; 2001.Ministério do Meio Ambiente. [acessado 2005 Dez07]. Disponível em: http://www.mma.gov.brCentro Nacional de Tecnologias Limpas (CNTL).Resultados do Programa. Porto Alegre: CNTL/SE-NAI/UNIDO/UNEP; 1998.

Artigo apresentado em 20/01/2006Aprovado em 16/06/2006Versão final apresentada em 31/08/2006

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