Upload
others
View
2
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
Grupo de Trabalho: 12 – Instituições Políticas
Migração partidária nos municípios brasileiros (2000-2012)
Jean Lucas Macedo Fernandes - UNICAMP
Marco Antonio Faganello - UNICAMP
2
Migração partidária nos municípios brasileiros (2000-2012)
Jean Lucas Macedo Fernandes1
Marco Antonio Faganello2
A migração partidária é bastante explorada em nível nacional, sobretudo para o Congresso. O nível local,
contudo, tem recebido pouca atenção da literatura. Muito se argumenta acerca da “fraqueza” dos laços
partidários nos municípios e de uma relação pouco estável entre candidatos e partidos. Estes seriam trocados
pelos políticos a todo momento, sempre que o contexto local fosse favorável. Não haveria, portanto, padrões de
migração e de manutenção dos quadros de políticos locais pelas agremiações. Porém, alguns dados apontam para
uma realidade distinta: os partidos seguem estratégias distintas e coordenadas, em se tratando de migrar ou não.
Além disso, a migração partidária e de candidaturas (políticos que concorrem a prefeito em uma eleição e na
seguinte para vereador, e vice-versa) não trazem, necessariamente, maiores chances de sucesso. Observa-se,
também, que no nível local as taxas de migrações vem decaindo, nos dois cargos. Nesse sentido, as eleições
municipais parecem desenhar um quadro semelhante ao nacional, onde tem ocorrido relativa estabilidade nas
migrações e a mudança partidária nem sempre se revela como a melhor estratégia para a vitória. O objetivo do
trabalho é explorar estes dados e apontar alguns padrões de comportamento dos candidatos e partidos nos
municípios, em termos de estratégias eleitorais. A metodologia utilizada é quantitativa, com informações do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tendo como escopo as eleições para prefeito e vereador, em todo o Brasil,
entre 2000 e 2012.
Palavras-Chave: Partidos políticos; municípios; política local.
Introdução: o contexto do fenômeno no Brasil
A migração partidária no Brasil possui dois momentos distintos na história recente
(Diniz, 2000; Freitas, 2012). Primeiramente, registrou-se um período de reacomodação
partidária, no bojo do fim do regime militar e do bipartidarismo. Neste contexto, que durou
até as eleições de 1994, a migração poderia ser explicada por fatores conjunturais, como a
própria transição democrática, que possibilitou a criação de novos partidos e as trocas de
legenda realizadas pelos parlamentares, que visavam apagar suas relações com o passado
político autoritário. A fragilidade institucional e a falta de coesão desses partidos
(Mainwaring, 1991; Ames, 2003), bem como a excessiva liberalização da legislação, também
foram apontados pela literatura como causas para a migração partidária intensa (Lamounier e
Meneguello, 1986; Lima Júnior, 1993). Prevalecia o argumento de que a migração partidária
1 Mestrando em Ciência Política (IFCH/UNICAMP), bolsista CAPES.
2 Mestrando em Ciência Política (IFCH/UNICAMP), bolsista CNPq.
3
seria um fenômeno próprio do sistema político brasileiro, e fruto da indisciplina parlamentar e
dos laços clientelistas dos políticos (Mainwaring, 1991; Lamounier, 1994; Ames, 2003).
Após 1994, em um contexto de democracia mais estável, com partidos notadamente
mais disciplinados no Congresso3 (Figueiredo e Limongi, 1999) e um sistema partidário em
processo nacional de estruturação (Braga, 2006), esses aspectos conjunturais associados à
transição já não estavam mais tão evidentes. Isso acabou por tornar a troca de legenda um
processo mais complexo de se entender e associado a diversos desafios (Freitas, 2012).
É a partir deste momento de maior estabilidade política que pretendemos analisar as
migrações partidárias nos municípios brasileiros. Os trabalhos em torno do tema focam
majoritariamente no Congresso e, de modo mais específico, na Câmara dos Deputados4.
Tendo os achados dessas pesquisas como ponto de partida, procuraremos observar em que
medida eles ganham respaldo no nível local. Acreditamos que há coordenação política
exercida pelos partidos e lideranças nos três níveis de governo (Carneiro e Almeida, 2008) -
ou seja, a política local não está isolada das demais dinâmicas e competições políticas que
ocorrem estadual e nacionalmente5. Nesse sentido, um dos argumentos que defenderemos é o
de Trounstine (2009): a política local corresponde, em grande medida, a fenômenos e padrões
que são observados nas demais esferas governativas.
A fim de facilitar a mensuração e análise dos partidos, a separação por blocos
ideológicos obedeceu às classificações recorrentes na literatura recente (Mainwaring,
Meneguello e Power, 2000; Melo, 2004; Power e Zucco Jr., 2009; 2011; Codato, Bolognesi e
Roeder, 2015). Reconhecemos a existência de algumas controvérsias quanto à posição
ideológica de alguns partidos – como PSDB e PMDB no centro ou na direita, por exemplo.
Porém, ponderando a partir das diversas perspectivas trazidas pelos autores que estudaram a
fundo o tema, dividimos os partidos, grosso modo, da seguinte maneira6 (Tabela I).
3 Ao inverterem a perspectiva dominante de que o sistema político brasileiro seria dotado de partidos fracos e
pouco disciplinados, Figueiredo e Limongi (1999) chamam a atenção para um dado interessante: 93% dos
deputados, em média, baseiam suas ações no Congresso com base na orientação de seus líderes partidários.
4 Para uma revisão desses trabalhos, ver Melo (2004) e Freitas (2008).
5 Mesmo assim, é importante ter em vista a observação de Kerbauy (2005), que afirma que há dificuldade e
extrapolar para o município as análises sobre o nível nacional, como em Figueiredo e Limongi (1999).
6 As fusões e os rachas partidários foram considerados na elaboração das bases de dados, como serão explicados
mais a frente.
4
Tabela I – Separação dos partidos por blocos ideológicos
Esquerda Centro Direita
PC do B PMDB PAN PRN PSL
PCB PMN PFL/DEM PRONA PST
PCO PSDB PGT PRP PT do B
PDT PV PHS PRTB PTB
PSB
PSOL PL/PR PSC
PTN
PRB
PSTU
PPB/PP PSD
PT
PPS PSDC
Fontes: Mainwaring, Meneguello e Power (2000); Melo (2004); Power e Zucco Jr. (2009; 2011);
Codato, Bolognesi e Roeder (2015).
Outra observação importante a ser feita é a de que serão considerados aqui os
candidatos que foram lançados para os pleitos municipais, apenas. Sabemos que existem
casos, sobretudo nas capitais e grandes municípios do interior, em que prefeitos e vereadores
(eleitos e não eleitos) lançam suas candidaturas dois anos depois, para os pleitos nacionais.
Contudo, buscando delimitar o escopo do artigo, e entendendo a política local como um locus
específico de atuação das elites partidárias7 (Kerbauy, 2005), trabalharemos exclusivamente
com o nível municipal de ação dos políticos e partidos.
Dado o grande número de candidatos e de municípios, a aferição de uma taxa de
migração que envolva todos os políticos de um determinado partido, em escala nacional e ao
longo do tempo, traz alguns desafios. Para resolver este problema, desenvolvemos a seguinte
técnica: em primeiro lugar, mapeamos o número do Título Eleitoral dos candidatos, presente
nos bancos de dados de votação do TSE desde o ano 2000, determinando, assim, aqueles que
se faziam presente, ao mesmo tempo, em duas eleições municipais consecutivas. A partir
desse universo de candidatos “reconcorrentes”, analisamos a filiação partidária de cada
candidatura, em cada uma das eleições consecutivas. Assim, por exemplo, se a filiação de um
candidato a vereador nas eleições de 2000 e 2004 fosse diferente, ou seja, se ele estivesse
concorrendo nessas duas eleições consecutivas por partidos distintos, determinamos que este
7 Afinal, os municípios têm passado, ao longo das últimas décadas, por “um período de reconfiguração da arena
decisória e dos processos de tomada de decisão, convivendo com duas lógicas distintas e contraditórias: (1) o
tradicionalismo e as ações clientelistas que sempre caracterizaram o poder local e (2) os procedimentos
universais que caracterizariam ações mais inovadoras das lideranças locais” (Kerbauy, 2005, p. 362).
5
candidato migrou de partido. Pelo contrário, caso a filiação fosse a mesma, o candidato em
questão não teria migrado. As taxas de migração apresentadas neste trabalho, portanto, se
referem ao absoluto de candidatos que reconcorrem em duas eleições consecutivas e não ao
total de candidatos que o partido lançou em um determinado ano. Com esta abordagem,
conseguimos trabalhar com uma quantidade muito grande de dados em um espaço de tempo
factível, garantindo a possibilidade de entender os processos migratórios entre candidatos a
partir de uma visão global.
O paper se encontra dividido da seguinte maneira: primeiramente, são feitas algumas
considerações gerais sobre a migração partidária, procurando dialogar com a literatura recente
e estabelecendo, assim, os parâmetros de análise e hipóteses. Na sequência, são apresentados
os dados coletados das eleições municipais, entre 2000 e 2012, para os cargos de vereador e
prefeito. Tendo em vista as especificidades do poder local e dos processos de socialização de
suas elites (Kerbauy, 2005), o recorte metodológico engloba apenas as candidaturas de nível
local – prefeitos e vereadores que concorrem nas eleições nacionais, após dois anos, não
foram contabilizados. Por fim, após a exposição e análise dos dados, é feita uma conclusão
que procura comparar os achados com as pesquisas já desenvolvidas sobre o tema, bem como
apresentar algumas tendências político-partidárias dos municípios brasileiros.
A migração partidária e alguns debates da literatura recente
A perspectiva de análise que adotaremos segue a linha argumentativa de Laver e
Benoit (2003), que afirmam que os estudos sobre migração partidária têm enfocado muito na
racionalidade dos migrantes, mas ignoram os incentivos dos partidos para os quais eles estão
sendo atraídos. Trazendo este ponto, acreditamos que há um duplo eixo a ser considerado na
migração partidária. Por um lado, a troca de legenda é uma oportunidade para que o político
maximize suas chances de sucesso na carreira (Melo, 2004). Porém, há que se considerar
também como variável explicativa a estratégia partidária: os partidos também buscam atrair
políticos e oferecer recompensas a eles (Laver e Benoit, 2003; Desposato, 2006). Assim, a
troca de legenda é vista como uma via de mão dupla, capaz de beneficiar não apenas o
parlamentar – que pode ter diversos objetivos, como a maximização de seu sucesso eleitoral,
ocupar cargos e obter recursos do Estado – mas também o partido que o acolhe e que visa à
expansão de seu eleitorado e de sua máquina (Freitas, 2012).
6
Freitas (2008) argumenta que tomar como objetivo central da migração a motivação
individual do parlamentar é problemático, na medida em que se trata de uma avaliação
subjetiva e de difícil mensuração. Além disso,
O acento na decisão e motivação individual do parlamentar faz com que os
analistas desconsiderem o peso dos demais atores envolvidos neste processo.
Basicamente, parte-se do princípio que os partidos políticos no Brasil são
pouco importantes e que a migração partidária comprovaria esta afirmação. O
papel dos partidos políticos nas trocas de legenda é inteiramente
desconsiderado. Quando muito, os partidos políticos são tomados como
vítimas de uma estratégia ultra-individualista dos parlamentares. Mas se no
sistema político brasileiro os partidos não importam, ou importam tão pouco
que os parlamentares podem entrar e sair deles quando quiserem, porque os
parlamentares se dariam ao trabalho de trocar de partido? Tamanha
independência parece incoerente com um sistema no qual as regras são
extremamente centralizadas em torno dos partidos políticos. Dito de outra
forma, não faz sentido trocar de partido se os partidos não forem capazes de
oferecer benefícios para os seus membros (Freitas, 2008, pp. 5-6).
Portanto, nesta intertroca entre parlamentares e partidos, os movimentos são
calculados e racionais em ambos os lados. Os partidos se tornam atores centrais nesse
processo, sendo alvo das estratégias dos políticos e também atuando sobre eles. Desposato
(2006) argumenta que há dois benefícios básicos quando os partidos aceitam novos membros:
aumento no tamanho da bancada e incremento no suporte eleitoral, trazido pelos migrantes.
Estes, por sua vez, escolhem partidos que irão facilitar suas reeleições – ou ao menos
propiciar acesso a cargos, recursos e influência.
A importância dos partidos em nível local, como apontada por Borges (2010) no que
se refere à coordenação entre município e as demais instâncias governativas8, pode ser vista
também em termos organizativos. De acordo com Ames (1994), há uma relação fundamental
de interdependência entre o Executivo Nacional e as prefeituras, em termos de apoio político,
por um lado, e repasse de verbas, por outro. Nesse sentido, a presença de máquinas partidárias
fortes é importante para que os políticos sejam capazes de influenciar as decisões e as
dinâmicas políticas locais. Portanto, o argumento deste trabalho caminha na direção de
8 A respeito do debate sobre coordenação eleitoral entre as instâncias governamentais, que tem em Cox (1997) a
principal referência, ver Carneiro e Almeida (2008). Os autores apresentam, também, uma sistematização a
respeito do lugar e das competências legais-constitucionais do município no regime federativo brasileiro pós-88.
7
reconhecer o partido em nível local enquanto um ator central para as relações entre as elites
políticas, a articulação de seus interesses e as estratégias eleitorais que buscam nos pleitos.
Outras conclusões de pesquisas realizadas pela literatura em nível nacional também
serão testadas para os municípios, de modo a observar como a esfera local se comporta em
relação ao fenômeno da migração. Destacamos, assim, algumas proposições da literatura.
Melo (2004), em estudo sobre a Câmara dos Deputados, encontrou que a migração na
direita tende a ser mais acentuada e intrabloco – ou seja, os deputados pertencentes a um
partido de direita migram para outro do mesmo campo ideológico. Na esquerda, há uma
menor tendência à migração – porém, mais de um terço dos migrantes foi para partidos de
direita. Desposato (2006) também chama atenção para a importância da compatibilidade
ideológica na hora de escolher um partido. Nesse sentido, o grau de liberdade para a troca de
legenda não é absoluto (Diniz, 2000). Sobre o desempenho eleitoral, Schmitt (1999)
demonstra que as chances de reeleição de um deputado migrante são menores. Para Melo
(2004), as mudanças de partido não melhoram as chances de sucesso eleitoral dos
parlamentares e nem tampouco tendem a piorá-las – a não ser quando se abandonam partidos
de esquerda ou partidos governistas em direção à oposição. Por fim, a dimensão regional
também parece não impactar nos padrões de migração. Segundo Diniz (2000) e Melo (2004),
regiões mais e menos desenvolvidas não apresentam tendências distintas de migração. Uma
hipótese testada e refutada era a de que as regiões menos desenvolvidas (Norte, Nordeste e
Centro-Oeste) migrariam mais do que as mais desenvolvidas (Sul e Sudeste).
As conclusões dessas pesquisas anteriores em nível nacional nos fornecem importantes
diretrizes para se pensar o funcionamento do fenômeno da migração local e em que medida
ele está associado aos demais níveis de governo. É, portanto, a partir de quatro eixos de
investigação que procuraremos analisar as trocas de legenda em nível local: 1) o impacto da
migração sobre o sucesso eleitoral dos políticos; 2) as consequências dos diferentes níveis de
desenvolvimento socioeconômico das regiões sobre as trocas de legenda; 3) a tendência de
migração intrablocos ideológicos, delimitando as fronteiras entre direita, centro e esquerda.
Tendo em vista esses eixos e as perspectivas apontadas acima pela literatura recente,
passaremos agora para a análise dos dados e as evidências que apontam para a migração
partidária em nível local.
8
Migração partidária nos municípios
Desde as eleições de 2000, a porcentagem de candidatos às prefeituras e câmaras que
migraram de partido vem caindo de modo constante, como evidencia o Gráfico I9. A média
registrada para o Legislativo ficou em torno de 47,1% e 35,1%, para o Executivo. São valores
consideravelmente maiores que para a Câmara Federal: a média para a série histórica entre
1995 e 2008 fica em 24%, como aponta Freitas (2008, p. 41). Ainda que estejamos
trabalhando com o universo de candidatos, e não apenas os eleitos como a autora, esta breve
comparação é capaz de aproximar a esfera local da nacional.
Por um lado, é notável que há muito mais trocas partidárias no nível local – e os
motivos para isso estão relacionados, de modo geral, ao contexto regional, que estabelece
relações de cunho mais personalista (Kerbauy, 2005) e, assim, gera incentivos para que
políticos troquem de legenda de acordo com os rearranjos das forças políticas locais10
(Lima
Jr., 1997; Ames, 2003). A literatura aponta, também, para a indisciplina partidária e a
fragmentação excessiva (Mainwaring, 1999), enquanto marcas de nosso subdesenvolvimento
partidário (Lamounier e Meneguello, 1986), reflexos sentidos nas instâncias subnacionais que
contribuiriam para a pouca inteligibilidade político-ideológica de nosso multipartidarismo.
Por outro lado, e corroborando com a observação de Freitas (2008) para o nível
nacional, a mudança partidária não é a estratégia adotada pela maioria dos políticos – o que no
caso do nível local vem inclusive decaindo ao longo do tempo. Há que se considerar,
portanto, a influência dos partidos sobre o jogo político municipal e a sua capacidade de se
projetarem como atores importantes no processo eleitoral11
(Diniz, 1982; Ames, 1994;
Kerbauy, 2000; Carneiro e Almeida, 2008; Braga, Rodrigues-Silveira e Borges, 2008).
9 Ao longo dos três ciclos eleitorais aqui estudados, uma média de 3 mil candidatos por pleito, em um universo
de cerca de 125 mil, migraram de partido e concorreram em cargos distintos – ou seja, candidatos a prefeito em
uma eleição que concorriam a vereador em outra, e vice-versa. Estes casos foram considerados nas análises.
10 Como observa Mainwaring (1999, pp. 160-161), "a natureza ideológica de um determinado partido varia
consideravelmente de um estado para outro. Além disso, às vezes o mesmo partido abriga indivíduos de
perspectivas políticas bem diferentes" (tradução nossa).
11 Este argumento ficará melhor descrito mais a frente.
9
Gráfico I – Evolução da taxa de migração partidária entre candidatos a prefeitos e a vereadores
reconcorrentes12
(%) (2000-2012)
2000-2004 2004-2008 2008-2012
Vereador 51,5 48 41,9
Prefeito 38,5 36,6 30,3
0
15
30
45
60
% M
igra
nte
s
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Ao avaliarmos as mudanças partidárias, uma das perguntas que surge é: qual o
impacto que elas trazem, em termos da obtenção de vitórias por parte daqueles que optam
pela troca de legenda? Os Gráficos II e III indicam a porcentagem de prefeitos e vereadores
que migraram de partido, em comparação àqueles que permaneceram em suas legendas no
pleito seguinte, procurando apontar o sucesso eleitoral que obtiveram nessa estratégia.
12
A taxa de migração se refere à porcentagem do número absoluto de candidatos a vereador ou prefeito que
concorrem simultaneamente (reconcorrentes) em cada eleição consecutiva analisada e que mudam de partido. Ou
seja, não se refere ao número total de candidaturas a prefeito ou vereador em cada pleito. Assim, por exemplo,
para o período 2004-2008, é considerado migrante o candidato que concorre nos dois pleitos (2004 e 2008) e que
mudou de partido entre um ano e outro. É considerado não migrante, aquele que concorre nos dois pleitos mas
que não muda de partido. Candidaturas que estão presentes apenas em um dos pleitos não foram consideradas
para o cálculo da porcentagem.
10
Gráfico II – Sucesso eleitoral dos candidatos a prefeito que migraram e que não migraram de
partido (2000-2012)
2000-2004 2004-2008 2008-2012
Prefeito Migrante 38,1% 41,4% 40,0%
Prefeito Não-Migrante 44,2% 49,2% 46,7%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Gráfico III – Sucesso eleitoral dos candidatos a vereador que migraram e que não migraram de
partido (2000-2012)
2000-2004 2004-2008 2008-2012
Vereador Migrante 24,2% 24,2% 23,5%
Vereador Não-Migrante 29,0% 31,7% 33,5%
Vereador Migrante (Sup.) 62,3% 65,7% 69,1%
Vereador Não-Migrante (Sup.) 60,7% 60,5% 61,3%
-10%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
11
Com relação ao Executivo, o sucesso dos candidatos que migraram de partido é
ligeiramente inferior ao daqueles que não mudaram de legenda. Esta tendência foi observada
em todos os ciclos eleitorais analisados, com diferenças de 6% a 8% entre os dois tipos de
candidatos. Nesse sentido, para a conquista das prefeituras, trocar de partido não representa
um acréscimo nas chances de se vencer o pleito – não é, pois, necessariamente, uma estratégia
vantajosa. No que concerne ao Legislativo, o padrão é praticamente o mesmo, com uma única
diferença: candidatos migrantes tendem a obter mais sucesso na conquista de uma vaga na
suplência, em relação aos não-migrantes. Inclusive, ao longo da série histórica, a diferença
entre as taxas de sucesso eleitoral dos dois tipos de suplentes aqui estudados vêm
aumentando. Assim, ainda que as chances de quem opta pela estratégia da mudança partidária
nem sempre resulte na obtenção de um assento na câmara municipal, os dados indicam que
pelo menos como suplente, o candidato migrante tem maiores chances relativas.
Um olhar mais específico para o grupo de candidatos que trocaram não apenas de
partido, mas também de cargo na eleição seguinte, permite-nos apontar mais algumas relações
importantes. De acordo com o Gráfico IV, a porcentagem de políticos que eram candidatos a
vereador e migraram de partido para disputar o pleito majoritário gira em torno de 20%. A
maioria – em torno de 80% deles – não consegue se eleger. Portanto, a estratégia da dupla
mudança – de partido e de candidatura – não resulta, necessariamente, em elevadas chances
de se alcançar a vitória. Em relação à migração apenas de partido (Gráfico II), nota-se
inclusive uma diminuição das taxas de sucesso eleitoral.
Já nas disputas proporcionais, os candidatos a prefeito que passam a disputar a
vereança quando migram de partido possuem chances um pouco maiores de sucesso – em
torno de 32% (Gráfico V). Muito disso, naturalmente, se deve à própria dinâmica da
competição proporcional, que oferece mais vagas e, também, garante acesso por meio das
coligações proporcionais. Contudo, a maioria dos candidatos a prefeito que mudam de partido
para disputar a vereança se tornam suplentes, ao menos – e os dados apontam para um
incremento dessas chances (crescimento de cerca de 5%, entre 2000 e 2012). Já a taxa de
insucesso é relativamente baixa e vem decaindo ao longo da série histórica, o que é um
indício de que a migração partidária, associada à troca de cargo em disputa (no sentido das
prefeituras para as câmaras), pode trazer maiores chances de vitória para os políticos.
12
Gráfico IV – Sucesso eleitoral dos candidatos a prefeito que migraram de partido e de
candidatura (2000-2012)
2000-2004 2004-2008 2008-2012
Ver. → Pref. (não foi eleito) 79,0% 83% 78,0%
Ver. → Pref. (foi eleito) 21% 17,5% 22%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Gráfico V – Sucesso eleitoral dos candidatos a vereador que migraram de partido e de
candidatura (2000-2012)
2000-2004 2004-2008 2008-2012
Pref. → Ver. Sup. (eleito) 52,7% 53,7% 57,1%
Pref. → Ver. (não eleito) 15,2% 12% 8,7%
Pref. → Ver. (eleito) 32% 34,0% 34%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
13
A Tabela II demonstra que as tendências de migrações dos partidos e das candidaturas
não são homogêneas em todo o território brasileiro, como já constatou Freitas (2008).
Tabela II – Candidatos a prefeito que migraram de partido de uma eleição para outra,
por estado e região (2000-2012)
Estado Região 2000-2004 2004-2008 2008-2012 Média
MT
Centro-
Oeste
58,0% 46,2% 49,5% 51,2%
GO 35,3% 27,9% 29,4% 30,9%
MS 34,7% 31,2% 17,2% 27,7%
Média 42,7% 35,1% 32,0% 36,6%
AL
Nordeste
54,3% 59,2% 27,0% 46,8%
RN 51,2% 37,1% 33,6% 40,6%
PB 51,1% 30,1% 34,1% 38,4%
MA 46,6% 47,1% 46,5% 46,7%
SE 45,6% 61,7% 36,8% 48,0%
BA 43,0% 51,7% 41,8% 45,5%
CE 42,9% 48,0% 27,6% 39,5%
PE 32,7% 59,1% 30,8% 40,9%
PI 24,5% 49,2% 21,0% 31,6%
Média 43,5% 49,2% 33,2% 42,0%
AM
Norte
64,7% 56,6% 43,4% 54,9%
RR 60,0% 80,0% 55,6% 65,2%
RO 45,0% 40,8% 16,3% 34,0%
TO 44,7% 51,9% 43,2% 46,6%
AP 42,9% 40,0% 44,4% 42,4%
AC 41,7% 29,2% 32,0% 34,3%
PA 40,7% 43,0% 26,7% 36,8%
Média 48,5% 48,8% 37,4% 44,9%
RJ
Sudeste
61,0% 39,0% 32,6% 44,2%
ES 49,4% 37,5% 24,2% 37,0%
SP 28,2% 21,6% 21,1% 23,6%
MG 24,7% 23,0% 19,7% 22,5%
Média 40,8% 30,3% 24,4% 31,8%
PR
Sul
37,2% 34,5% 26,3% 32,7%
SC 12,3% 7,8% 21,3% 13,8%
RS 5,0% 3,6% 3,2% 3,9%
Média
18,2% 15,3% 16,9% 16,8%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
14
Os dados apresentados na Tabela II mostram que, nos pleitos majoritários, Norte,
Nordeste e Centro-Oeste são as regiões que apresentam as maiores taxas de migração
partidária13
. Roraima, Amazonas e Mato Grosso apresentam médias superiores a 50%, ao
longo da série histórica. Tocantins, Sergipe e Pernambuco também apresentaram valores
consideráveis14
. O único outlier é o Rio de Janeiro, que teve 61% de seus candidatos como
migrantes, em 2004. A região Sul, especialmente Santa Catarina e Rio Grande do Sul, se
destaca como aquela onde ocorre menor volume de trocas partidárias, assim como no plano
nacional (Freitas, 2008).
Já para as disputas proporcionais, o quadro é distinto: ainda que, novamente, as três
regiões sejam as que mais possuem candidatos que migram, Sudeste e Sul também
apresentam taxas elevadas em alguns estados. A Tabela III mostra que Roraima novamente
traz a maior média: 65% de políticos migrantes. Alagoas, Pernambuco e (novamente) Rio de
Janeiro também têm mais de 60% das candidaturas, em média, oriundas de outras
agremiações. Estes dados para a vereança evidenciam que, no Brasil, a migração partidária
nos Legislativos locais se dá de modo muito mais intenso, e com taxas bastante superiores ao
Legislativo nacional (Freitas, 2008). As coligações proporcionais, os acordos políticos
visando à obtenção de cargos nas secretarias e órgãos municipais, bem como as possibilidades
de intervenção nas tomadas de decisões partidárias internas são alguns das possíveis
explicações para essas porcentagens elevadas nas disputas para as câmaras municipais.
Em termos comparativos, é notável que as regiões menos desenvolvidas
socioeconomicamente apresentam maiores taxas de migração partidária. Muito disso se deve
não apenas aos processos tardios de desenvolvimento e implantação dos partidos nessas
localidades (Braga, 2006), mas também aos modos como ainda se constitui a dinâmica
política local. Avelar e Walter (2008) chamam atenção para mudanças estruturais que tem
acontecido nesses municípios - urbanização, crescimento demográfico, industrialização e
aumento na escolaridade, principalmente. Porém, as autoras concluem que, em termos de
atuação política, os laços partidários e o personalismo ainda se encontram fortemente
presentes, colocando essas regiões em um processo lento de estruturação partidária.
13
Daqui para frente, os destaques nas tabelas se referem sempre às taxas superiores a 50%.
14 Roraima, Amazonas e Pernambuco também são apontados por Freitas (2008) como estados onde as trocas
partidárias são mais intensas, em se tratando da Câmara Federal.
15
Tabela III - Candidatos a vereador que migraram de partido de uma eleição para outra, por
estado e região (2000-2012)
Estado Região 2000-2004 2004-2008 2008-2012 Média
MS
Centro-
Oeste
55,2% 48,0% 43,5% 48,9%
GO 53,7% 44,9% 42,4% 47,0%
MT 53,1% 48,8% 41,4% 47,8%
Média 54,0% 47,2% 42,4% 47,9%
AL
Nordeste
68,6% 70,0% 50,8% 63,1%
PE 63,7% 65,9% 53,1% 60,9%
BA 62,4% 55,1% 53,4% 57,0%
MA 61,4% 58,1% 50,1% 56,5%
RN 61,4% 39,4% 39,8% 46,9%
SE 60,2% 60,4% 46,1% 55,6%
PB 58,5% 48,1% 45,0% 50,5%
CE 57,3% 56,0% 45,9% 53,1%
PI 44,7% 53,1% 34,4% 44,1%
Média 59,8% 56,2% 46,5% 54,2%
RR
Norte
73,2% 70,5% 52,4% 65,4%
AM 63,1% 60,6% 47,9% 57,2%
AP 55,3% 55,0% 44,7% 51,7%
TO 54,1% 62,9% 41,5% 52,8%
RO 53,6% 52,1% 42,4% 49,4%
PA 52,5% 52,1% 44,6% 49,7%
AC 50,6% 51,6% 44,6% 48,9%
Média 57,5% 57,8% 45,4% 53,6%
RJ
Sudeste
66,3% 63,8% 57,1% 62,4%
ES 59,6% 52,1% 45,3% 52,3%
SP 48,7% 47,4% 43,2% 46,4%
MG 48,2% 44,4% 38,5% 43,7%
Média 55,7% 51,9% 46,0% 51,2%
PR
Sul
52,0% 43,0% 36,7% 43,9%
SC 27,2% 24,5% 31,6% 27,8%
RS 22,4% 18,3% 15,7% 18,8%
Média 33,9% 28,6% 28,0% 30,2%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Ao falarmos sobre as agremiações especificamente, observamos diferentes padrões de
comportamento, a depender do bloco ideológico a que pertencem. Sabemos que essas divisões
dos partidos são polêmicas e, muitas vezes, insuficientes (Miguel, 2010). Todavia, o elemento
16
ideológico pode ajudar tanto na compreensão do sistema político-partidário como um todo
(Singer, 2002) quanto nas análises sobre a atuação e a organização dos partidos. As afinidades
ideológicas e o posicionamento dos partidos15
são ferramentas capazes de distribuir os
partidos ao longo de uma escala esquerda-direita (Novaes, 1994; Figueiredo e Limongi, 1995;
Melo, 2004). Como mostra a Tabela IV, fica evidente que, ao tomarmos o continuum como
referência, encontramos tendências distintas entre as legendas16
.
Em média, os partidos de esquerda conseguiram manter cerca de 60% de seus
candidatos a vereador e a prefeito, de um pleito para o outro. Esta tendência já era observada
no plano nacional. Nicolau (1996) constata que partidos de esquerda mostram as menores
proporções de deputados migrantes e Melo (2004) corrobora este achado. Para o nível local,
os partidos mais bem sucedidos nesse sentido são PSTU, PCO e PT. Em números absolutos,
os dois primeiros apresentaram poucos candidatos ao longo da série histórica e, juntamente ao
PSOL, são os partidos que menos lançam candidatos17
. Mesmo assim, é importante frisar a
capacidade de retenção de seus quadros – o que, em muito, se associa aos vínculos fortes que
partidos de esquerda, em geral, tendem a manter com suas lideranças.
Devido à sua expansão organizativa (Braga, Rodrigues-Silveira e Borges, 2012), o PT
viu crescer suas taxas de manutenção no tempo; o peso político do partido no controle do
governo federal pode ser outro elemento capaz de preservar suas lideranças. Comparada a
PSB, PC do B e PDT, até então seus maiores aliados no campo da esquerda, é notável a
capacidade do partido de reter seus candidatos e, assim, evitar migrações. Uma explicação
plausível e mais geral para essa alta capacidade de preservação dos quadros à esquerda é
apontada por Melo (2004), ao afirmar que políticos de esquerda tendem a ter maior
necessidade da estrutura partidária para aumentar suas chances eleitorais; evitam, pois, perder
recursos eleitorais importantes, como os laços com a militância e os movimentos sociais.
15
No caso de Novaes (1994) e Figueiredo e Limongi (1995), o critério utilizado para separar os partidos por
ideologia foram as votações em plenário, por exemplo.
16 Os critérios para a divisão dos partidos se basearam nas discussões da literatura recente, conforme descrito e
explicado na Tabela I. Candidatos oriundos de partidos que se fundiram foram considerados “não migrantes”.
17 Total de candidatos, nos três ciclos eleitorais: PSTU – 90, 73 e 54; PCO – 44, 8 e 7; PSOL – 271 e 639 (2008 e
2012, respectivamente).
17
Tabela IV – Preservação dos quadros pelos partidos, por bloco ideológico (2000-2012)
Partidos Bloco Ideológico 2004 2008 2012 Média
PC do B
ESQUERDA
35,7% 39,5% 50,7% 42,0%
PCB 26,1% 38,5% 61,3% 42,0%
PCO 20,5% 87,5% 100,0% 69,3%
PDT 51,2% 51,8% 62,6% 55,2%
PSB 38,0% 38,1% 58,8% 45,0%
PSOL - - 59,8% 59,8%
PSTU 87,8% 91,8% 94,4% 91,3%
PT 68,8% 79,2% 80,0% 76,0%
Média
46,9% 60,9% 71,0% 60,1%
PMDB
CENTRO
66,8% 61,5% 74,3% 67,5%
PSDB 56,7% 61,1% 70,9% 62,9%
PMN 27,0% 33,6% 47,3% 36,0%
PPS 38,3% 52,3% 62,9% 51,2%
PV 19,7% 35,9% 54,3% 36,6%
Média 41,7% 48,9% 61,9% 50,8%
PFL/DEM
DIREITA
63,1% 62,7% 73,5% 66,4%
PHS 18,3% 29,8% 37,6% 28,6%
PL/PR 34,2% 48,0% 61,9% 48,0%
PP 57,7% 61,1% 68,8% 62,5%
PRP 21,2% 42,0% 38,3% 33,8%
PRTB 14,4% 23,4% 29,9% 22,6%
PSC 27,2% 29,0% 48,8% 35,0%
PSDC 16,7% 32,8% 38,9% 29,5%
PSL 23,7% 33,1% 37,1% 31,3%
PT do B 17,3% 28,9% 35,8% 27,3%
PTB 48,1% 52,2% 65,5% 55,3%
PTC 6,8% 34,4% 35,6% 25,6%
PTN 10,7% 25,4% 38,7% 24,9%
Média 27,6% 38,7% 47,0% 37,8%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Os maiores partidos do centro – PMDB e PSDB – são os que mais conseguem as
maiores taxas de manutenção, ainda que com percentuais inferiores ao do PT. A posição
ocupada pelo centro, aqui, revela que se trata de um bloco intermediário não só em termos
ideológicos, mas também estratégicos: a taxa média de retenção é de 50,8%; menor que a da
esquerda, porém superior a da direita, como veremos à frente. Tanto PMDB quanto PSDB
tem conseguido um crescente sucesso nesse processo, o que em muito se deve à capacidade
18
organizativa de ambos no nível local – PMDB herdando as organizações municipais do antigo
MDB (Sadek, 1989; Kinzo, 1988) e PSDB, mais fortemente nas regiões Sul e Sudeste.
O espectro da direita, por sua vez, se mostra altamente volátil e disperso, como já
apontavam Mainwaring, Meneguello e Power (2000), no que se referia à organização interna
e à atuação política dessas legendas. A direita brasileira, desde o contexto da
redemocratização, é marcada pela alta fragmentação e pela dificuldade, consequentemente, de
se articular em torno de poucas (porém representativas) agremiações18
(Mainwaring,
Meneguello e Power, 2000). Dentre todas elas, destacam-se principalmente o PFL/DEM, o
PDS/PP e o PTB, todos partidos com trajetórias históricas longas no sistema partidário
brasileiro, remontando ao período de abertura política (Kinzo, 1993). O PFL/DEM foi
destacado por Melo (2004) como o único partido de direita capaz de evitar um número
significativo de deserções na Câmara dos Deputados (a taxa de deserção, no início dos anos
2000, era de 23% em média). De fato, para o nível local, o partido consegue manter o
destaque no interior do bloco da direita, ao registrar uma taxa média de 66,4% de manutenção
de seus candidatos às prefeituras e às câmaras. PP e PTB também apresentam porcentagens
consideráveis, indicando que se tratam de duas agremiações com presença organizativa nos
municípios, conforme já demonstrado por Braga, Rodrigues-Silveira e Borges19
(2012).
Portanto, os dados demonstram que há divisões bastante acentuadas entre as
migrações, no que tange à capacidade de manter seus quadros e evitar deserções. O campo da
direita, e em especial os pequenos partidos, se mostra bastante volátil e com dificuldades de
perpetuar lideranças ao longo dos pleitos, com clara exceção de PFL/DEM, PDS/PP e PTB. À
medida que deslocamos para o centro e a esquerda, a tendência começa a se inverter. Partidos
mais ao centro e à centro-direita, sobretudo os grandes (PMDB e PSDB) apresentam menores
taxas de migração, ao passo que na esquerda, não apenas o principal partido (PT) obtém
sucesso considerável nesse processo, mas também legendas como PSTU, PCO, PDT e PSB.
18
Para o nível nacional, e especificamente a Câmara Federal, Melo (2004, p. 109) faz uma observação
interessante: “à exceção do PFL, nenhum outro partido firmou-se como referência para a massa de deputados
que se posiciona à direita no espectro ideológico brasileiro. Evidentemente, pode-se fazer referência ao reduzido
núcleo dirigente do PPB [atual PP], ou a um ou outro congressista histórico do PTB. Mas, para além desses
limites, os vínculos entre os deputados e os seus partidos mostraram-se extremamente tênues”.
19 De acordo com os autores, PP, PTB e DEM se encontravam presentes em mais de 80% dos municípios
brasileiros, em 2011 (Braga, Rodrigues-Silveira e Borges, 2012, p. 33).
19
Tabela V – Taxa de evasão e de entrada dos candidatos, por bloco ideológico (2000-2012)
Evasão Entrada
Partidos Bloco Ideológico 2004 2008 2012 Média 2004 2008 2012 Média
PC do B
ESQUERDA
34,9% 39,7% 40,0% 38,2% 64,3% 60,6% 49,3% 58,1%
PCB 38,5% 44,1% 71,6% 51,4% 73,9% 61,5% 38,7% 58,0%
PCO 10,0% 79,4% 22,2% 37,2% 79,5% 12,5% 0,0% 30,7%
PDT 51,2% 45,4% 41,9% 46,2% 48,8% 48,2% 37,4% 44,8%
PSB 59,1% 49,6% 41,9% 50,2% 62,0% 61,9% 41,2% 55,0%
PSOL - 0,0% 34,0% 17,0% - 100,0% 40,2% 70,1%
PSTU 11,2% 18,3% 8,9% 12,8% 12,2% 8,2% 5,6% 8,7%
PT 14,2% 24,1% 20,0% 19,4% 31,2% 20,8% 20,0% 24,0%
Média 31,3% 37,6% 35,1% 34,1% 53,1% 46,7% 29,1% 43,7%
PMDB
CENTRO
41,3% 33,4% 30,3% 35,0% 33,2% 38,5% 25,7% 32,5%
PMN 65,9% 65,3% 59,8% 63,7% 73,0% 66,5% 52,7% 64,1%
PSDB 47,3% 41,2% 36,1% 41,5% 43,3% 38,9% 29,1% 37,1%
PPS 55,5% 59,1% 48,8% 54,5% 61,7% 47,7% 37,1% 48,8%
PPL - - - - - - 100,0% 100,0%
PV 61,7% 56,0% 49,0% 55,6% 80,3% 64,1% 45,7% 63,4%
Média 54,3% 51,0% 44,8% 50,1% 58,3% 51,1% 48,4% 57,7%
PAN
DIREITA
62,4% 87,4% - 74,9% 86,3% - - 86,3%
PFL/DEM 47,3% 48,8% 49,1% 48,4% 36,9% 37,3% 26,5% 33,6%
PHS 63,3% 72,2% 59,5% 65,0% 81,7% 70,2% 62,4% 71,4%
PL/PR 59,0% 58,4% 45,5% 54,3% 65,8% 52,0% 38,1% 52,0%
PPB/PP 48,9% 41,5% 36,7% 42,4% 42,3% 39,0% 31,2% 37,5%
PRB - - 49,2% 49,2% - 100,0% 51,2% 75,6%
PRP 67,3% 64,7% 59,7% 63,9% 78,8% 58,1% 61,7% 66,2%
PRTB 76,5% 76,9% 63,8% 72,4% 85,6% 76,6% 70,1% 77,4%
PSC 69,3% 61,4% 51,6% 60,8% 72,8% 71,0% 51,2% 65,0%
PSD 80,8% - - 80,8% - - 100,0% 100,0%
PSDC 71,6% 71,4% 61,6% 68,2% 83,3% 67,2% 61,1% 70,5%
PSL 72,4% 66,9% 58,4% 65,9% 76,3% 66,9% 62,9% 68,7%
PT do B 72,7% 67,9% 60,8% 67,1% 82,7% 71,1% 64,2% 72,7%
PTB 60,6% 50,4% 43,0% 51,3% 51,9% 47,8% 34,5% 44,7%
PTN 72,6% 72,2% 57,9% 67,6% 89,3% 74,6% 61,3% 75,1%
Média 66,1% 64,6% 53,6% 62,1% 71,8% 64,0% 55,5% 66,4%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Mais do que avaliar apenas a capacidade de reter candidatos, no estudo das migrações
partidárias é importante também observar que partidos apresentam maior capacidade de atrair
quadros e, também, de evadi-los (Melo, 2004). Conforme a Tabela V indica, e como um
20
complemento dos dados da Tabela IV, é notável que o bloco da esquerda registra as menores
de evasão – em média, 34,8% . PT e PSTU se destacam, ao passo que PDT, PSB, PCO e PCB
apresentam as maiores taxas, neste campo ideológico. PCO e PDT registram, ainda, baixas
taxas de entrada de novas candidaturas, indicando uma tendência à diminuição de seus
quadros. PC do B, PCB e PSB, por outro lado, são os partidos de esquerda que mais tem
recebido candidatos. O PT não conseguiu atrair novos atores políticos para o seu interior,
ainda que detivesse o controle do governo federal e de diversos estados. Porém, não registrou
baixas taxas de evasão, seguindo a observação de Freitas (2008) para o Legislativo nacional,
onde o partido pouco participava das trocas de legenda.
Deslocando para o centro, observa-se que os pequenos partidos são os mais afetados
pelas migrações, tanto nas evasões quanto nas entradas: PMN e PV apresentam oscilações
superiores a 50%, em todos os pleitos. Ambos os partidos possuem organizações internas
menos estruturadas, com uma cobertura quase totalmente baseada em comissões provisórias
(Braga, Rodrigues-Silveira e Borges, 2012), o que pode afetar a capacidade de ambos se
estabelecerem nos municípios. Os maiores partidos, PSDB e PMDB, ainda que detenham uma
rede organizacional extensa nas diversas regiões do país, não tem conseguido atrair grandes
contingentes de candidatos, quando comparamos com as evasões: as médias das entradas são
sempre inferiores as das saídas.
A direita, por fim, é o campo que apresenta maior dinamização e volatilidade nos dois
cenários, se assemelhando a sua situação no plano nacional. Melo (2004) mostra que os
deputados federais eleitos por partidos de direito tendem a migrar mais. Nos municípios, taxas
bastante altas, superiores a 60%, são observadas para todos os pequenos partidos. A exceção
cabe, novamente, aos partidos mais “históricos” (Kinzo, 1993) e estruturados, no interior
deste grupo ideológico: PFL/DEM, PL/PR, PDS/PP e PTB20
. Essas agremiações, no entanto,
não deixam de sofrer também com as evasões, o que em muito está relacionado ao fenômeno
mais geral da fragmentação partidária no Brasil. Associado a isso, o caráter difuso das
fronteiras partidárias internas da direita (Mainwaring, Meneguello e Power, 2000; Melo,
2004) contribui para estes processos migratórios intensos neste campo ideológico. Por fim,
como apontado por Codato, Bolognesi e Roeder (2015), a capacidade dos novos e pequenos
20
De fato, como demonstram Braga, Rodrigues-Silveira e Borges (2012, p. 33), esses quatro partidos são os que
mais possuem cobertura organizacional nos municípios brasileiros, em se tratando da direita.
21
partidos de direita de atraírem as chamadas “novas lideranças políticas21
” também pode ajudar
a explicar o caráter fragmentário da direita partidária. Na medida em que não conseguem
espaço nos maiores partidos, esses políticos tendem a procurar as pequenas e novas legendas
da direita para lançarem suas candidaturas.
Olhando diretamente para os cargos e as suas relações com os blocos ideológicos, fica
evidente que, além das maiores taxas de migração serem da direita, elas se concentram no
Legislativo. De acordo com a Tabela VI, os candidatos a vereador dos partidos de direita – e
em segundo lugar, os de centro - são os que mais trocaram de legendas ao longo da década. A
média geral fica em torno de 54%, acima dos candidatos de esquerda e de centro (37% e
43,7%, respectivamente)22
. Os partidos de direita, ao receberem a grande maioria dos
candidatos migrantes, conseguem ser ainda mais atrativos no que tange aos pleitos
proporcionais – o que pode estar ligado às maiores chances de sucesso eleitoral (por conta do
número de vagas disponíveis e das coligações proporcionais) e aos altos custos que envolvem
uma concorrência para as prefeituras.
Os partidos de esquerda, por outro lado, seguem apresentando as menores taxas de
migração, principalmente no Executivo. A estrutura mais hierarquizada dessas agremiações,
bem como o maior controle sobre a seleção de candidaturas, acaba por torná-las menos
atrativas para os políticos locais. Esses partidos seriam o que Strom (1990) chama de
“partidos programáticos”, que possuem alto grau de responsabilização política das lideranças,
somada à existência de democracia interna e de participação da militância na estrutura
organizacional e no processo decisório. Isso nos remete à corriqueira premissa de que, nos
partidos de esquerda, os laços entre organização e lideranças são mais fortes – o que parece
valer também para o nível local. As lealdades partidárias, conforme ilustram os dados, são
mais consolidadas no campo à esquerda, quando comparamos com os demais blocos
ideológicos.
21
De acordo com os autores, essa categoria ad hoc inclui, essencialmente, comunicadores e líderes religiosos –
ocupações que supõem serem típicas dos partidos da nova direita, de perfil personalista (Codato, Bolognesi e
Roeder, 2015). As bases dessas lideranças seriam essencialmente urbanas e difusas, ganhando maior espaço nas
camadas médias e baixas do eleitorado.
22 Para efeito de uma breve comparação: Melo (2004, p. 101) mostra que, ao longo dos anos entre 1983 e 2003,
cerca de 38,7% dos deputados federais eleitos pelos partidos de direita migraram. Já a esquerda registrou uma
média de 16,9% e o centro, 22,1% de políticos migrantes.
22
Tabela VI – Candidatos a prefeito e a vereador que migraram de partido na eleição seguinte,
por bloco ideológico (2000-2012)
Prefeito Vereador
Bloco Ideológico 00-04 04-08 08-12 00-04 04-08 08-12
Esquerda 26,6% 24,9% 20,9% 39,8% 37,2% 34,0%
Centro 30,6% 31,4% 24,9% 47,8% 44,5% 38,9%
Direita 41,2% 45,3% 40,0% 58,3% 55,4% 48,3%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Um olhar mais detalhado para os cargos e os partidos nos permite identificar qual o
sentido dessas migrações e a tendência que vem seguindo ao longo da última década (Tabela
VII). A esquerda tem cada vez mais migrado para partidos de direita, sobretudo no último
ciclo eleitoral (2008-2012). Isso se dá inclusive nos partidos da extrema esquerda, como o
PSTU – ainda que, deve-se ponderar, foram apenas três casos registrados, em um total de
quatro. Outros partidos, cujo volume de migrantes foi muito maior, foram PDT, PSB, PT e
PCdoB23
. A debandada do PDT para a direita foi notada por Melo (2004), na Câmara Federal.
Freitas (2008) destaca este partido, junto ao PSB, como os dois da esquerda que mais migram.
Os partidos de centro migram maciçamente para a direita, com taxas superiores a 50%
em quase todos os casos. As maiores deserções não são exclusividade dos pequenos partidos
(destaque para PV e PMN). PMDB e PSDB também tendem a trocar bastante os seus
candidatos, que abandonam as legendas quase que sempre em direção à direita. O padrão
observado é semelhante ao bloco da esquerda: as migrações tem por destino, prioritariamente,
a direita, seguido do centro e, por último, a esquerda – ainda que, neste último bloco, haja um
equilíbrio maior na distribuição das trocas pelo espectro ideológico.
Os partidos à direita seguem a mesma tendência, de maneira mais acentuada. Os
pequenos (como PTdoB, PRTB e PRP) são os que mais migram para agremiações de
posicionamento ideológico semelhante. É interessante notar que os grandes partidos
(PFL/DEM e PPB/PP – e, em alguns casos, PL/PR e PTB) possuem as menores taxas de
23
Em números absolutos, esses partidos registraram as seguintes médias de migração, ao longo da série
histórica: PDT (3572); PSB (2784); PT (2006) e PC do B (508).
23
migração, o que são um indicativo da maior capacidade de retenção das lideranças. São
percentuais semelhantes, inclusive, a partidos da esquerda como PT e PDT.
Tabela VII – Candidatos ao Legislativo, segundo o partido de origem e o bloco ideológico para o
qual migraram (2000-2012)
2000-2004 2004-2008 2008-2012
Bloco Id. Partido D C E D C E D C E
Esquerda
PSB
→
48,9% 32,5% 18,6% 50,6% 33,5% 15,9% 57,5% 27,6% 14,9%
PCB 53,8% 30,8% 15,4% 52,3% 18,2% 29,5% 45,4% 23,1% 31,5%
PSTU 12,5% 12,5% 75,0% 14,3% 14,3% 71,4% 75,0% 0,0% 25,0%
PCO 0,0% 0,0% 100,0% 84,2% 5,3% 10,5% 50,0% 50,0% 0,0%
PDT 49,8% 35,5% 14,7% 52,6% 33,0% 14,3% 57,0% 26,3% 16,6%
PT 41,6% 32,5% 26,0% 39,9% 32,8% 27,3% 54,5% 24,8% 20,7%
PCdoB 41,4% 26,3% 32,3% 48,9% 23,7% 27,4% 55,1% 22,0% 23,0%
PSOL - - - - - - 46,2% 24,3% 29,5%
Centro
PMDB
→
55,2% 25,7% 19,1% 51,4% 24,8% 23,8% 61,5% 17,8% 20,7%
PSDB 54,4% 26,4% 19,2% 50,9% 26,3% 22,8% 59,8% 20,1% 20,1%
PMN 54,3% 28,8% 16,9% 57,0% 23,4% 19,7% 63,7% 17,6% 18,7%
PV 56,5% 23,6% 19,9% 51,2% 25,5% 23,2% 58,9% 21,3% 19,8%
PPS 51,0% 27,2% 21,8% 48,3% 26,6% 25,1% 58,8% 21,7% 19,5%
Direita
PRP
→
54,0% 31,2% 14,8% 54,8% 27,8% 17,4% 60,6% 23,5% 15,9%
PSDC 56,2% 28,0% 15,8% 55,4% 27,6% 16,9% 58,4% 23,6% 18,0%
PTdoB 62,0% 22,5% 15,5% 52,1% 30,0% 18,0% 60,3% 21,6% 18,1%
PRTB 62,1% 22,3% 15,6% 56,6% 29,6% 13,8% 62,2% 20,7% 17,1%
PHS 52,6% 29,4% 18,0% 50,5% 29,4% 20,1% 57,4% 23,5% 19,0%
PTN 57,7% 25,2% 17,1% 54,0% 26,6% 19,4% 59,0% 22,3% 18,7%
PFL 47,4% 36,8% 15,7% 44,6% 33,6% 21,8% 60,6% 22,8% 16,6%
PTB 52,4% 31,8% 15,8% 43,4% 35,8% 20,7% 52,9% 25,7% 21,5%
PPB/PP 49,9% 34,2% 16,0% 46,3% 33,5% 20,2% 55,5% 24,6% 19,9%
PL/PR 56,6% 28,2% 15,2% 47,2% 33,6% 19,2% 57,4% 24,5% 18,1%
PSC 59,6% 26,0% 14,4% 52,0% 28,8% 19,1% 57,3% 24,7% 18,0%
PSL 55,1% 29,7% 15,2% 57,6% 25,8% 16,7% 58,7% 23,7% 17,6%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Em relação ao Executivo, a tendência observada é a mesma, porém de forma menos
acentuada (Tabela VIII). Além disso, as discrepâncias entre as taxas de migração dos partidos
por bloco é maior: a direita tende a migrar menos para a esquerda e vice-versa. Como já
apontado nas tabelas anteriores, os candidatos às prefeituras adotam opções mais coerentes,
24
do ponto de vista ideológico: tendem a permanecer em seus partidos e, quando migram,
procuram geralmente por agremiações em posição semelhante no continuum.
Tabela VIII – Candidatos ao Executivo, segundo o partido de origem e o bloco ideológico para o
qual migraram (2000-2012)
2000-2004 2004-2008 2008-2012
Bloco Id. Partido D C E D C E D C E
Esquerda
PSB
→
39,0% 39,0% 22,0% 42,9% 38,8% 18,4% 41,5% 38,3% 20,2%
PCB 0,0% 0,0% 100,0% 0,0% 0,0% 100,0% 50,0% 25,0% 25,0%
PSTU 0,0% 0,0% 100,0% 25,0% 12,5% 62,5% 0,0% 0,0% 100,0%
PCO - - - 75,0% 12,5% 12,5% - - -
PDT 37,6% 48,6% 13,9% 39,3% 44,4% 16,3% 51,8% 31,6% 16,7%
PT 44,8% 31,0% 24,1% 30,6% 39,6% 29,9% 48,5% 32,4% 19,1%
PC do B 75,0% 0,0% 25,0% 57,1% 21,4% 21,4% 27,3% 36,4% 36,4%
PSOL - - - - - - 33,3% 29,2% 37,5%
Centro
PMDB
→
47,6% 35,2% 17,2% 49,3% 23,4% 27,3% 52,2% 17,6% 30,2%
PSDB 50,9% 31,9% 17,2% 44,5% 30,7% 24,8% 55,1% 12,8% 32,1%
PMN 50,0% 43,8% 6,3% 45,0% 37,5% 17,5% 68,8% 12,5% 18,8%
PV 55,9% 20,6% 23,5% 38,5% 28,8% 32,7% 43,6% 25,6% 30,8%
PPS 44,4% 34,2% 21,4% 41,1% 27,0% 31,9% 56,1% 36,7% 7,1%
Direita
PRP
→
45,8% 29,2% 25,0% 29,8% 48,9% 21,3% 57,9% 21,1% 21,1%
PSDC 54,5% 27,3% 18,2% 40,6% 40,6% 18,8% 57,9% 31,6% 10,5%
PT do B 50,0% 50,0% 0,0% 44,0% 28,0% 28,0% 61,1% 16,7% 22,2%
PRTB 61,5% 30,8% 7,7% 28,6% 50,0% 21,4% 52,6% 26,3% 21,1%
PHS 66,7% 13,3% 20,0% 41,0% 43,6% 15,4% 41,2% 23,5% 35,3%
PTN 25,0% 25,0% 50,0% 50,0% 28,6% 21,4% 50,0% 30,0% 20,0%
PFL 36,9% 51,0% 12,2% 42,6% 34,7% 22,7% 63,4% 22,0% 14,7%
PTB 54,4% 35,0% 10,6% 31,8% 46,9% 21,4% 49,5% 21,5% 29,0%
PPB 51,2% 37,1% 11,8% 32,9% 41,3% 25,7% 57,4% 24,3% 18,3%
PL/PR 48,6% 36,0% 15,3% 37,2% 42,0% 20,8% 52,4% 30,6% 16,9%
PSC 55,1% 30,6% 14,3% 36,4% 30,3% 33,3% 47,2% 22,2% 30,6%
PSL 51,7% 41,4% 6,9% 35,5% 32,3% 32,3% 63,2% 26,3% 10,5%
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Uma constatação geral para os dois pleitos municipais reflete um quadro detectado por
Melo para o Legislativo nacional:
25
A direita parlamentar brasileira é consistente enquanto campo ideológico –
ocorrendo a mudança de partido, a preferência pelo lado do espectro em que
deveria ser buscada uma nova legenda se revelou inequívoca. Mas, ao mesmo
tempo, apresenta fronteiras partidárias internas altamente difusas (2004, p.
109).
Ou seja, os partidos de direita, em nível local, também apresentam as mais altas taxas
de mudanças. Porém, ao realizarem mudanças, os candidatos claramente preferem legendas
com posicionamento ideológico semelhante. Isso revela a capacidade dos blocos ideológicos
de conferirem inteligibilidade ao sistema político, orientando não apenas o eleitorado – como
argumenta Singer (2002) – mas também os próprios políticos locais. Não se trata, aqui, de
afirmar, com o mesmo grau de precisão que Figueiredo e Limongi (1995) identificam para o
plenário da Câmara Federal, que a atuação dos partidos segue um padrão ideológico bastante
definido. O que os dados nos revelam, em um sentido mais amplo e geral, é que a ideologia se
torna uma variável importante para detectarmos os padrões de comportamento partidário em
nível local – quando se tratam de estratégias visando às disputas nos pleitos municipais.
Conclusões: ideologia e partidos no nível local
McElroy (2003) afirma que políticos, ao escolherem o grupo político (ou partido) para
o qual pertencerão, levam em consideração os custos e os benefícios que serão obtidos, de
acordo com determinada estratégia. Patronagem, influência nas tomadas de decisões, recursos
eleitorais e ganhos ideológicos são alguns dos benefícios que podem ser obtidos, de acordo
com o autor, contra custos – perda de cargos, credibilidade e base eleitoral, por exemplo.
Nesse sentido, a troca de legenda não busca, unicamente, atender aos desejos individuais das
lideranças. Ela perpassa por um cálculo anterior, que podemos chamar de critério partidário.
A agremiação a ser escolhida importa, na medida em que ela poderá trazer mais ou menos
benefícios ao político.
Melo argumenta nesse mesmo sentido:
Se a mudança de partido é entendida como estratégia de maximização, a
lealdade à legenda de origem também pode ser [...] mais importante do que
distinguir entre a permanência em um partido como fruto de um cálculo
estratégico, ou como parte de um processo de identificação, é perceber que as
duas situações tendem a ocorrer e contribuem para a criação e robustecimento
dos vínculos entre deputado e partido. Quanto mais fortes eles forem, maior a
26
possibilidade de o congressista permanecer em sua agremiação de origem
(2004, p. 116).
Ou seja, as migrações partidárias se baseiam em lógicas que, em alguma medida,
perpassam os partidos políticos – levam-se, em conta, o posicionamento dos indivíduos e,
também, das legendas em si. Como sintetiza Freitas, sobre o Legislativo Federal (2008, p.
93): “diferenciar migrantes e não migrantes envolve, portanto, entender o que os
parlamentares buscam através da filiação partidária, a relação entre os parlamentares e seus
partidos, as características do partido de origem e destino, as características do eleitor e da
disputa eleitoral no distrito do parlamentar”.
Trazendo como nível de análise os municípios, procuramos explorar alguns destes
aspectos, especialmente os posicionamentos das agremiações de origem e destino (através de
suas ideologias), os padrões de migração observados pelas diferentes regiões do país e as
relações entre os partidos e os candidatos a prefeito e a vereador. Identificamos, de modo
geral, que as trocas partidárias acontecem de modo mais intenso, em relação ao plano
nacional. Contudo, alguns padrões são bastante semelhantes ao do Legislativo Federal: a
migração entre políticos de partidos de direita é bem mais frequente, porém tende a se
concentrar em suas próprias fronteiras. Ou seja, ainda que migrem mais, candidatos oriundos
de legendas da direita tendem a procurar outro partido em faixa semelhante do espectro
ideológico. Isso se dá, sobretudo, nas eleições para vereador. É o cargo onde há maior fluxo
de trocas, tanto de partidos quanto de candidatos, que saem para disputar as prefeituras, nos
pleitos subsequentes. Já a esquerda possui maior capacidade de reter seus quadros, mas
quando ocorrem migrações, apresenta altas taxas de evasão para o bloco da direita.
Em termos de sucesso eleitoral, a estratégia da migração – tanto de candidaturas
quanto de partidos – nem sempre se revela muito vantajosa. As taxas de sucesso, nos mais
diversos cenários aqui analisados, tendem a ser inferiores àquelas de candidato não-
migrantesAs disputas eleitorais e as estratégias partidárias em nível municipal apresentam
certo grau de padronização e se assemelham, nesse sentido, a alguns aspectos das atuações
político-partidárias em nível nacional. A política local, portanto, não se encontra tomada pelo
caos e pela ausência de coordenação partidária, como corriqueiramente se assume. Os
partidos apresentam tendências claras e distintas entre si, que influenciam não apenas as
estratégias dos candidatos, mas também suas próprias ações enquanto organização.
27
Referências bibliográficas:
AMES, B.. A organização partidária local nas eleições presidenciais brasileiras de 1989. DADOS, vol.
37, n 1, pp. 5-41, 1994.
_____. Os entraves da democracia no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2003.
AVELAR, L.; WALTER, M. I. M. T.. Lentas mudanças: o voto e a política tradicional. Opinião
Pública, Campinas, vol. 14, nº 1, Maio, 2008.
BORGES, A.. Já não se fazem mais máquinas políticas como antigamente: competição vertical e
mudança eleitoral nos estados brasileiros. Revista de Sociologia e Política, v. 18, pp. 167-188, 2010.
BRAGA, M. S. S. O processo partidário-eleitoral brasileiro: padrões de competição política (1982-
2002). São Paulo: Humanitas/FAPESP, 2006.
______; RODRIGUES-SILVEIRA, R.; BORGES, T.. Organización, território y sistema partidário:
difusión territorial de la organización de los partidos y sus potenciales impactos sobre la estrutura del
sistema partidário em Brasil. América Latina Hoy, 62, 2012, pp. 15-45.
CARNEIRO, L. P.; ALMEIDA, M. H. T.. Definindo a Arena Política Local: Sistemas Partidários
Municipais na Federação Brasileira. DADOS, vol. 51, n. 2, pp. 403-432, 2008.
CODATO, A.; BOLOGNESI, B.; ROEDER, K. M.. A nova direita brasileira: uma análise da dinâmica
partidária e eleitoral do campo conservador. In: CRUZ, S. V.; KAYSEL, A.; CODAS, G.. Direita,
volver!: o retorno da direita e o ciclo político brasileiro. São Paulo: Perseu Abramo, 2015.
COX, G.. Making votes count: strategic coordination in the world’s electoral systems. Cambridge:
Cambridge University Press, 1997.
DESPOSATO, S. W.. Parties for rent? Ambition, ideology, and party switching in Brazil’s Chamber
of Deputies. American Journal of Political Science, vol. 50, n. 1, 2006, pp. 62-80.
DINIZ, E.. Voto e máquina política: patronagem e clientelismo no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1982.
DINIZ, S.. As migrações partidárias e o calendário eleitoral. Revista de Sociologia e Política, n. 15,
2000, pp. 31-47.
FIGUEIREDO, A.; LIMONGI, F.. Partidos políticos na Câmara dos Deputados: 1989-1994. DADOS,
v. 38, n. 3, pp. 497-529, 1995.
____________. Executivo e legislativo na nova ordem constitucional. Rio de Janeiro: FGV, 1999.
28
FREITAS, A.. Migração Partidária na Câmara dos Deputados. Dissertação de Mestrado em Ciência
Política. São Paulo, FFLCH/Universidade de São Paulo, 2008.
______. Migração Partidária na Câmara dos Deputados de 1987 a 2009. DADOS, vol. 55, n. 4, 2012,
pp. 951-986.
KERBAUY, M. T. M.. As câmaras municipais brasileiras: perfil de carreira e percepção sobre o
processo decisório local. Opinião Pública, vol. 11, n. 2, 2005, pp. 337-365.
KINZO, M. D. G.. Oposição e autoritarismo: gênese e trajetória do MDB (1966-1979). São Paulo,
SP: IDESP, Vértice, 1988.
______. Radiografia do quadro partidário brasileiro. Pesquisas, nº 1. São Paulo, SP: Fundação
Konrad-Adenauer-Stiftung, 1993.
LAMOUNIER, B.; MENEGUELLO, R.. Partidos políticos e consolidação democrática: o caso
brasileiro. São Paulo: Brasiliense, 1986.
LAVER, M.; BENOIT, K.. The Evolution of Party Systems Between Elections. American Journal of
Political Science, vol. 47, n. 2, 2003, pp. 215-233.
LIMA JÚNIOR, O. B.. Democracia e instituições políticas no Brasil dos anos 80. São Paulo:
Loyola, 1993.
____________. Instituições Políticas Democráticas: O Segredo da Legitimidade. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 1997.
MAINWARING, S.. Políticos, partidos e sistemas eleitorais. Novos Estudos, n. 29, 1991, pp. 34-58.
______________. Rethinking Party Systems in the Third Wave of Democratization. The Case of
Brazil. Stanford, Stanford University Press, 1999.
_____________.; MENEGUELLO, R.; POWER, T.. Partidos Conservadores no Brasil
Contemporâneo: Quais são, o que defendem, quais são suas bases. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
McELROY, G.. Party switching in the European Parliament: Why Bother?. Meeting of the European
Consortium for Political Research, Germany, 2003.
MELO, C. R.. Retirando as cadeiras do lugar: migração partidária na Câmara dos Deputados (1985-
2002). Belo Horizonte: Editora UFMG, 2004.
MIGUEL, L. F.. Os partidos brasileiros e o eixo esquerda-direita. In: KRAUSE, S.; DANTAS, H.;
MIGUEL, L. F. (orgs). Coligações partidárias na nova democracia brasileira: perfis e tendências.
São Paulo; Rio de Janeiro: Unesp; Konrad-Adenauer, 2010.
29
NICOLAU, J.. A migração partidária na Câmara dos Deputados (1991-1996). Monitor Público, n. 10,
pp. 41-45, 1996.
NOVAES, C. A. M.. Dinâmica institucional da representação: individualismo e partidos na Câmara
dos Deputados. Novos Estudos CEBRAP, n. 38, pp. 99-147, 1994.
POWER, T.; ZUCCO JR., C.. Estimating ideology of Brazilian legislative parties, 1990-2005: a
research communication. Latin American Research Review, v. 44, n. 1, pp. 218-246, 2009.
_______. O congresso por ele mesmo: autopercepções da classe política brasileira. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2011.
SADEK, M. T.. A Interiorização do PMDB nas Eleições de 1986 em São Paulo. In: Eleições 1986:
História Eleitoral do Brasil. SADEK, M.T. (Org.), São Paulo: IDESP/Vértice, 1989.
SCHMITT, R.. Migração partidária e reeleição na Câmara dos Deputados. Novos Estudos, n. 54,
1999, pp. 127-146.
STROM, K.. A behavioral theory of competitive political parties. American Journal of Political
Science, v. 34, n. 2, pp. 565-598, 1990.
TROUNSTINE, J.. All Politics Is Local: The Reemergence of the Study of City Politics. Perspectives,
vol. 7, n. 3, 2009.