Click here to load reader
View
212
Download
0
Embed Size (px)
Hidreltrica Belo Monte: Impactos na Sade.
Rosa Carmina de Sena Couto*
1. Introduo.
Historicamente os recursos naturais da Amaznia tem sido apropriados, sem que isso
represente melhoria na qualidade de vida das populaes amaznicas ou preservao da
floresta.
A Amaznia considerada fronteira energtica, contm a maior bacia hidrogrfica do
planeta, com um potencial calculado de 77.058 MW1. Na Amaznia tambm est
localizada a maior provncia mineral do planeta alm de ser considerada uma regio
megadiversa. Entretanto, a disponibilidade de seus recursos naturais para o mundo
globalizado tem reafirmado sua condio secular de colnia. Trata-se de um modelo de
desenvolvimento exportador, concentrador, exgeno, perverso e excludente2, que
penaliza as populaes amaznicas e ameaa a vida no planeta.
O caso da explorao dos recursos hdricos exemplifica esse modelo. Observamos que o
modelo de produo de energia (hidreletricidade) no Brasil tem se sofisticado, sob
influncia do capital financeiro internacional e da dam Industry; fazem parte desse
grupo: empreiteiras, indstria de equipamentos, geradoras, comercializadoras, agencias
reguladoras, seguradoras, bancos e instituies financeiras, grupos polticos e
econmicos que disputam influncia poltica no espao de poder do Estado e outros
espaos de interesse3.
Exemplificamos esse modelo nomeando as corporaes e instituies financeiras que
esto ou estiveram envolvidas no projeto da Hidreltrica de Belo Monte4 (Quadro 1).
Os planos para construo de hidreltricas na Amaznia da forma como a produo de
energia est organizada, so planos pensados para satisfazer interesses de corporaes e
instituies financeiras que querem controlar principalmente a energia, a gua, os rios e
os recursos naturais da Amaznia para aumentar seus lucros5,6
.
* Mdica sanitarista. Doutora em Sade Pblica pela ENSP|Fiocruz. Profa da Faculdade
de Medicina|UFPA (aposentada). Participou do Painel de Especialistas.
2
Quadro 1. Corporaes e instituies financeiras que esto ou estiveram envolvidas no projeto
da Hidreltrica de Belo Monte.
Empresas acionistas da Norte Energia
Caixa Econmica Federal (Brasil)
Cemig (Brasil)
CHESF (Brasil)
Eletrobras (Brasil)
Eletronorte (Brasil)
Funcef(Brasil)
J Malucelli Energia (Brasil)
Light (Brasil)
NeoEnergia (Brasil)
Petros (Brasil)
Sinobras (Brasil)
Vale (Brasil)
Turbinas e Geradores
Alstom (Frana)
Andritz (ustria)
Impsa (Argentina)
Siemens (Alemanha)
Voith (Alemanha)
Servios de Engenharia
Arcadis (Holanda)
Concremat (Brasil)
Engecorps (Brasil)
Themag (Brasil)
Tractebel Engineering (LEME) (Blgica)
WorleyParsons (Austrlia)
Linhas de Transmisso
China State Grid (China)
Furnas (Brasil)
Consrcio Construtor
Andrade Gutierrez (Brasil)
Camargo Correia (Brasil)
Cetenco (Brasil)
Contern (Brasil)
Galvo (Brasil)
OAS (Brasil)
Odebrecht (Brasil)
Queiroz Galvo (Brasil)
Serveng (Brasil)
Equipamento
Daimler AG (Alemanha)
Metso (Finlndia)
Instituies financeiras
Banco do Brasil (Brasil)
BNDES (Brasil)
BTG Pactual (Brasil)
JPMorgan Chase (EUA)
Companhia de Seguros e Resseguros
ACE (Suia)
Allianz AG (Alemanha)
Canopius Managing Agents Limited (Lloyds) (Reino Unido)
Chubb Managing Agency Limited (Lloyds (EUA)
Federal Insurance Company (EUA)
HDI Gerling Welt Service AG (Alemanha)
IRB Brasil Re (Brasil)
JLT RE (Brasil)
Lloyds (Reino Unido)
Mapfre (Espanha)
Marlborough Re (Lloyds (Reino Unido)
Munich Re (Alemanha)
QBE Insurance Group Ltd (Austrlia)
SulAmrica (Brasil)
Tokio Marine Global (Lloyds) (Japo)
Torus (Lloyds) (EUA)
Torus Specialty Insurance Company (EUA)
Validus Reaseguros, Inc (Lloyd1s) (EUA)
XL Insurance Company Ltd
XL Catlin (anteriormente conhecido como XL Group) (Irlanda)
Zurich Insurance (Suia)
Fundos de Investimento e de Penso
Blackrock Inc (EUA)
Government Pension Fund Global (Noruega)
Iberdrola Energia S|A (Espanha)
Mitsui & Co. Ltd (Japo)
Previ (Banco do Brasil) (Brasil)
Skagen Fondene (Noruega)
Fonte: Greenpeace, 2016.4
3
Ao realizar estudo de caso de projetos hidreltricos, uma das perguntas recomendada
pela Comisso Mundial de Barragens7 (2000), foi: Como se distriburam os custos e os
benefcios, quem saiu ganhando e quem saiu perdendo?
Na Amaznia, quem ganha com a construo de hidreltrica tem sido a dam Industry,
enquanto que quem perde so os povos indgenas, as populaes ribeirinhas,
quilombolas, comunidades rurais, a Amaznia e a sociedade brasileira.
O Estado brasileiro tem viabilizado esse modelo de produo de energia na Amaznia
com alto custo social e ambiental8,9,10,11,12,13,14,15,16,17,18,19,3,20,21,22,23,24
.
A Hidreltrica de Balbina no rio Uatum (Am) e a Hidreltrica de Tucuru no rio
Tocantins (PA) foram construdas nos governos dos militares. A hidreltrica de Jirau e
Santo Antonio, ambas no rio Madeira, foram construdas no governo Lula. A
Hidreltrica de Belo Monte no rio Xingu (PA), foi construda no governo Dilma. A
Hidreltrica So Luis do Tapajs no rio Tapajs (PA), teve seu processo de
licenciamento ambiental arquivado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renovveis (Ibama).
2. Hidreltrica Belo Monte: polmicas e negao de direitos.
A Hidreltrica (UHE) Belo Monte foi concluda no rio Xingu, no estado do Par,
Amaznia brasileira. Quando estiver funcionando totalmente, ser a maior hidreltrica
100% nacional e a 4 maior do mundo25
. o principal projeto do Programa de
Acelerao do Crescimento (PAC) alm de ser uma obra polmica, desde a sua
concepo, gerao energtica, custos, riscos e impactos ambientais e sociais.
Sua potncia instalada ser de 11.233,1MW, com 4.571 MW mdios de energia
assegurada, Belo Monte custou R$32 bilhes26
, sendo R$3,7bilhes foram para as
condicionantes scio-ambientais27
. Esses recursos foram emprestados pelo Banco
Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES) Norte Energia com
prazo de quitao de 30 anos24
.
A experincia com implantao de hidreltricas na Amaznia tem sido desastrosa, a
Hidreltrica de Tucuru (PA), Balbina (AM), Jirau e Santo Antonio (RO), do ponto de
vista social, ambiental e sanitrio, no foram satisfatrias. A persistncia da atual
poltica de hidreletricidade para a regio preocupante pois est destruindo os
4
ecossistemas dos maiores rios da Amaznia com impactos sobre a vida dos povos
indgenas, ribeirinhos, quilombolas e comunidades rurais ressaltando que essa poltica
est na contramo da histria da civilizao da Amaznia que uma civilizao
fluvial28
.
A UHE Belo Monte apresenta um desenho de engenharia nada convencional com dois
reservatrios (reservatrio do rio Xingu e reservatrio dos Canais), a rea de inundao
de 516 km2, destes 228 km2 (45%) corresponde ao leito original do rio Xingu; o
represamento do reservatrio do Xingu, entre a Barragem Principal e a casa de fora
principal, produziu o trecho de vazo reduzida de aproximadamente 100 km na Volta
Grande do Xingu,29
comprometendo a vida dos povos indgenas, ribeirinhos e
comunidades tradicionais do Xingu alm do impacto negativo sobre a rica
biodiversidade local.
O projeto, tambm tem sido criticado pela baixa eficincia, pois a hidreltrica s vai
funcionar durante o perodo de cheia do rio Xingu. Outra questo polmica que com
Belo Monte abre-se a possibilidade para construir outras barragens rio acima
(especialmente Babaquara) para regularizar a vazo do rio Xingu, altamente sazonal e
tornar Belo Monte mais eficiente porm com aumento de liberao de gases de efeito
estufa.20
O rio Xingu apresenta uma rica diversidade tnica com seus povos indgenas; so eles:
a) povos indgenas que habitam Volta Grande do Xingu: Juruna do Paquiamba, Arara
da Volta Grande e os Juruna do Km 17. b) povos indgenas que habitam s margens do
Rio Xingu, acima da Volta Grande: Asurini do Koatinemo, Arawet, Parakan; e s
margens do Rio Iriri: Arara, Arara de Cachoeira Seca, Karara. c) ndios citadinos. d) O
povo indgena Xikrin do Bacaj. d) povos indgenas Xipaya e Kuruaya que habitam
acima de Cachoeira Seca, respectivamente s margens do Rio Iriri e de seu tributrio o
Rio Curu14
.
Durante o licenciamento ambiental da UHE Belo Monte, foi observado grave violao
dos direitos humanos como a no realizao de oitivas indgenas, obrigatrias pela
legislao brasileira e pela Conveno 169 da OIT, ratificada pelo Brasil em 2002. Os
povos indgenas afirmam que no foram ouvidos sobre o projeto hidreltrico, a despeito
5
de que tenha havido audincias pblicas em Altamira, Brasil Novo, Vitria do Xingu e
Belm.30
A presena da Fora Nacional de Segurana Pblica foi uma constante ao longo do
perodo de construo de Belo Monte. Sendo chamada para garantir a segurana dos
canteiros de obras sempre que fosse necessrio: em momentos de greves e conflitos 24
.
Um grupo de pe