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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
LUCIANA TEIXEIRA
HISTÓRIA E POESIA: UMA DISCUSSÃO SOBRE FONTES PARA O
ENSINO DE HISTÓRIA
MARINGÁ
2010
LUCIANA TEIXEIRA
HISTÓRIA E POESIA: UMA DISCUSSÃO SOBRE FONTES PARA O
ENSINO DE HISTÓRIA
Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado
à Universidade Estadual de Maringá, como
requisito parcial para obtenção do título de
Pedagoga.
Orientadora: Profª. Drª. Maria Aparecida
Leopoldino Tursi
MARINGÁ
2010
LUCIANA TEIXEIRA
HISTÓRIA E POESIA: UMA DISCUSSÃO SOBRE FONTES PARA O
ENSINO DE HISTÓRIA
Artigo apresentado como Trabalho de
Conclusão do Curso de Pedagogia da
Universidade Estadual de Maringá.
Aprovado em:
BANCA EXAMINADORA
Profª. Drª. Maria Aparecida Leopoldino Tursi
Universidade Estadual de Maringá
Profª. Drª. Luciana Grandini
Universidade Estadual de Maringá
Profº. Ms. Flávio Massami M Rucstadter
Universidade Estadual do Norte do Paraná
HISTÓRIA E POESIA: UMA DISCUSSÃO SOBRE FONTES PARA O
ENSINO DE HISTÓRIA
Luciana Teixeira1
Orientadora: Profª. Drª. Maria Aparecida Leopoldino Tursi-Uem /DTP
Resumo: Esta discussão envolve o ofício do historiador e as escolhas de suas fontes e objetos
na produção de conhecimentos sobre o passado, com o objetivo de refletir sobre as
possibilidades de o professor trabalhar com “fontes históricas” no ensino fundamental, mais
especificamente nas séries iniciais. Entre as possibilidades de estudos acerca da temática,
toma-se como objeto de análise a poesia e seu lugar como possibilidade de fonte para o
ensino de História. O trabalho realizado por meio de pesquisa bibliográfica apresenta-se na
forma de artigo científico e conforme as normas da ABNT.
Palavras-Chave: Ensino de História. Poesia. Fontes históricas.
Introdução
Rafael Ruiz, no artigo Novas Formas de Abordar o Ensino de História, assinala que
“o educador enfrenta desafios quando prepara as suas aulas e quando as desenvolve com seus
alunos” (2003, p. 75). No que se refere ao ensino de História, o autor indaga sobre “qual é o
modelo que devemos procurar como historiadores e como professores de História” (p. 75).
As observações de Ruiz nos permitem introduzir o tema deste trabalho, fontes para o
ensino de História, cujo objetivo é reconhecer a importância de se conhecer novas
possibilidades de trabalhar com conteúdos de História nas séries iniciais. Isso porque, ao
pontuar que o professor enfrenta desafios teóricos e metodológicos, sinaliza, por um lado, a
possibilidade de mudanças e, por outro, a relação da prática do historiador com o professor de
História.
Para esta pesquisa, tais indicações são importantes, por remeterem ao nosso problema
central, deste trabalho que é relacionar o ofício do historiador nas escolhas de suas fontes para
a produção de conhecimentos sobre o passado e as possibilidades de o professor trabalhar
com fontes históricas em sua prática pedagógica. Trata-se, portanto, do tema fontes para o
ensino de História e se inscreve no debate atual sobre novas possibilidades metodológicas
sobre o ensinar nas séries iniciais.
O nosso desafio consiste em compreender o papel da fonte para o ensino na sala de
1 Acadêmica 4° ano de Pedagogia / noturno da Universidade Estadual de Maringá.
aula. Isso se justifica na medida em que reconhecemos que discussões atuais sobre o tema
indicam que é possível e importante, para romper com o ensino tradicional, aproximar o fazer
historiográfico com a prática pedagógica no trato com conteúdos da História como disciplina
escolar. Como assevera Ruiz (2003,p.8) “(...) sendo o fazer histórico mutável no tempo, seu
exercício pedagógico também o é. Eu diria que ensinar História é uma atividade submetida a
duas transformações permanentes: do objeto em si e da ação pedagógica”.
Considerando a afirmação de que o fazer histórico se relaciona com a ação
pedagógica, é imperativo pensar que a renovação do ensino é inerente à renovação
historiográfica. Nessa perspectiva, autores, como Burke (1990),por exemplo, têm indicado
que, se por muito tempo, no campo da história, pensou-se a pesquisa embasada por fontes
escritas, já que se entendia que estas garantiriam ao trabalho do historiador seu caráter de
“ciência”, algo que outras fontes não Atualmente, a compreensão do que sejam fontes
históricas modificou-se com a inserção da Nova História.
O historiador, na impossibilidade de ele próprio constatar os acontecimentos do
passado, utiliza-se de informações presentes em documentos considerados históricos. Por isso
se afirma que os documentos são muito importantes para o estudo da História, eles são os
testemunhos do passado. Sobre isto, não há dúvidas ou controvérsias entre os historiadores,
mas é no próprio conceito do que vem a ser documento que se encontram os registros das
mudanças historiográficas e os usos que os historiadores fizeram e fazem dos documentos.
Marc Bloch (2001), ao compreender que a diversidade dos testemunhos históricos é
quase infinita, justamente porque as ações humanas são mais complexas do que o registrado
no documento, reafirma o caráter seletivo desses testemunhos. Ao evidenciar a seletividade
do documento feita pelo historiador, Bloch permite constatar que os registros humanos são
variados e, por isso mesmo, oferecem diferentes possibilidades de informações. “A
diversidade dos testemunhos históricos é quase infinita. Tudo o que o homem diz ou escreve,
tudo o que fabrica, tudo o que toca pode e devem informar sobre ele”. (BLOCH 2001, p. 79).
As indicações desse autor nos permitiram compreender que os historiadores
contemporâneos oferecem um sentido bastante amplo dos documentos e, no processo seletivo
desses testemunhos, eles organizam as suas fontes.
Burke (1990) anuncia que, ao longo do século XX, mudanças no fazer historiográfico
contemporâneo possibilitaram o questionamento da ideia de que a fonte escrita e oficial seria
a única possível de se chegar a um conhecimento histórico. Ele destaca novas possibilidades
ao trazer testemunhos do passado para serem utilizados como fonte para o trabalho do
historiador.
Pinsky (2005 afirma que os historiadores no último século têm mostrado a amplitude
dos documentos consultados e o interesse pela dimensão interdisciplinar de suas análises.
Tornam-se fontes documentais os registros encontrados em arquivos públicos, privados,
documentos cartoriais, eclesiásticos, policiais, além daqueles já considerados tradicionais para
os historiadores. Na mesma perspectiva, Luca (2005) informa que periódicos/jornais e demais
impressos também têm se constituído em fontes históricas. A autora mostra que, nesse
caminho da imprensa e do mundo das letras, “(...) o imbricamento entre história e literatura
abriu outras sendas” (LUCA, 2005, p. 123).
Ao considerarmos a observação de Ruiz de que o fazer histórico interfere nas
transformações da ação pedagógica, compreendemos que a renovação do ensino de História
somente ocorrerá na medida em que o professor incorporar em sua prática o uso de fontes
históricas. É nesse sentido que pretendemos contribuir com a discussão do tema fontes para o
ensino de História. Para tanto, metodologicamente, tomamos o debate sobre o uso da fonte
literária como documento histórico possível de ser explorado no ensino de História
atualmente.
Abordar este aspecto da questão requer compreender a literatura como expressão
humana inerente de momentos históricos específicos. A história cultural, ao relacionar cultura
e texto, procura identificar o modo como, em diferentes lugares e momentos, uma
determinada realidade social é, por diferentes atores, construída, pensada e lida. O interesse da
história cultural pela linguagem trouxe novas possibilidades de interpretação do documento
histórico. A linguagem literária ocupa um espaço de criação que deve ser percebido em vários
níveis: o simbólico, o artístico, o linguístico, o social, o político, o econômico, e “(...) tem
ensinado os historiadores a reconhecer o papel ativo da linguagem, dos textos e das estruturas
narrativas na criação e descrição da realidade histórica” (KRAMER, 2001, p. 131-132).
Acrescenta o autor: “as estruturas de pensamento e significado simbólico são parte integrante
de tudo o que conhecemos como história” (p.133).
Com base neste autor, compreendemos que a dimensão “imaginária” de toda forma
literária não significa que ela não tenha realmente acontecido. Nesse sentido, embora a
linguagem literária trata-se de um sistema de representações complexo e heterogêneo,
possibilita, conforme indicou Chartier (1990), a compreensão dos sentidos que um
determinado grupo atribui a uma dada realidade social em determinado momento histórico.
É com base nessas observações trazidas pela história da cultura que este trabalho
procura compreender a linguagem literária como fonte histórica. No decorrer dos anos de
1980, essas discussões e propostas chegaram também na esfera do ensino escolar brasileiro.
No que se refere ao debate metodológico, passou-se a reconhecer que, também no campo
escolar, poderia ser inclusa nova possibilidade de fontes (BURKE, 1990). Nesse contexto de
mudanças, passou-se a entender que, por intermédio da literatura, é possível “avançar” nas
discussões sobre o uso de fontes no ensino de História na atualidade. É sobre tal
possibilidade que esta pesquisa irá tratar.
Ao buscar um novo método ou modelo para o ensino de História, Ruiz (2003
apresenta a literatura como uma nova fonte de trabalho, que possibilita a construção do
próprio ponto de vista e permite uma abordagem comparativa. Sob a mesma perspectiva e
fundamentado em Hartog, Karnal (2003), esclarece: “A convenção da veracidade, própria da
História, e a convenção da ficcionalidade, própria da Literatura, permitem-nos estabelecer um
método que, seguindo as diretrizes de Hartog, poderá ajudar a elaborar essa nova abordagem
comparativa”.
Alguns estudos já foram realizados nesse sentido, fazendo com que o historiador e o
professor de História revissem seu entendimento sobre o que são documentos, incluindo em
suas pesquisas outros materiais que também possam lhe fornecer informações sobre uma
época do passado.
Segundo Andrade (1996), algumas questões merecem ser colocadas para reflexão.
Uma delas é como a Literatura pode ser utilizada enquanto documento histórico,
reconhecendo que o texto literário tem potencialidades pouco exploradas. A outra questão é
como se pode utilizar a literatura como recurso didático para o ensino de História.
É necessário sair da clássica dicotomia de que o historiador lida com a
realidade e o escritor, com a ficção. Assim como o historiador, o escritor
também é um homem do seu tempo, portanto, também está sujeito às
limitações da sua época e da sua cultura (ANDRADE, 1996, p. 10).
Segundo a autora, é necessária uma nova maneira de se pensar fontes para o ensino de
História, diferentes das fontes utilizadas até o momento nas escolas. É preciso voltar um novo
olhar para a Literatura, reconhecendo que ela também se constitui em um documento
histórico.
Autores como Maltez (2004) têm destacado a importância do uso da literatura para o
ensino de História, por permitir aos alunos uma reflexão dos conteúdos históricos. A respeito
dessas questões, enfatiza a autora:
A literatura favorece uma “imersão” no cotidiano do passado, na
mentalidade de uma época, no universo político e econômico, permitindo
aos alunos realizar sua própria leitura da história e perceber o reflexo das
estruturas políticas e econômicas na vida social (MALTEZ, 2004, p. 5).
A presença da linguagem literária no ensino de História, por sua vez, pode ser percebida em
materiais utilizados em sala de aula. Após uma breve análise realizada em livros didáticos de história
do ensino fundamental, como a coleções Pensar e Construir, 1ª a 4ª séries (OLIVIRA, Maria;
JUNQUEIRA, Silas), 2001; De Olho no Futuro, 1ª a 4ª séries (PINELA, Thatiane; GUIRETA, Liz
Andréia 2005); Viver e Aprender, 1ª a 4ª series (LUCI, Elian Alabi; BRANCO, Anselmo Lazaro
2005); Coleção Novo Tempo, 1ª a 4ª séries (NEMI, Ana Lúcia Lana; MARTINS, João Carlos 2001),
percebemos que, embora a literatura esteja presente, trazem poucas indicações sobre os usos que se
podem fazer desse campo para o ensino de História. E, ainda, particularmente no que se refere à
poesia, é muito escasso se considerado na perspectiva das mudanças historiográficas contemporâneas.
O que se quer afirmar é que, apesar de, por um lado, a literatura estar presente nos
livros didáticos de História como uma possibilidade metodológica para o ensino escolar, essas
propostas ainda não estão claramente articuladas, deixando margem, muitas vezes, para que se
use a literatura apenas como ilustração. Por outro lado, as referências da historiografia
contemporânea que tratam de forma específica da relação história e literatura indicam as
muitas possibilidades teórico-metodológicas sobre tipo esse de linguagem quando se quer
investigar o passado
Na busca pelo enfrentamento dos desafios para o trabalho pedagógico a ser
desenvolvido com os alunos, sistematizamos esta discussão da seguinte forma: Poesia e
Ensino de História, Poesia e História Local: visões da cidade de Maringá, Considerações
Finais.
História e Literatura: A Poesia como Fonte Histórica para o Ensino de História
Ante as mudanças na prática do historiador contemporâneo, apontadas por Burke
(1990), surge ou / ressurge a História Cultural ou a Nova História Cultural, como apontou
Hunt (2001), trazendo consigo mudanças nas propostas de ampliação dos campos temáticos,
objetos e fontes históricas. Dentre os campos temáticos, destacamos aquele que trata das
relações entre História e Literatura, que traz como uma das questões centrais o uso da
literatura como fonte para a História.
É importante afirmar, no entanto, que a discussão levantada em torno da relação entre
história e literatura não é algo restrito à História Cultural, como indica o artigo de .???...., a
discussão sobre o tema foi proposta pelo pensador Aristóteles. Em sua obra Poética, ele traçou a
diferença entre História e Poesia: a História seria o discurso “do que foi” e a Poesia, o discurso do
que “poderia ter sido”.
No campo mais amplo da literatura, é vasta a produção que a relaciona com a História.
Para ficarmos apenas nos autores clássicos e na experiência brasileira, citamos, para
exemplificar, Alfredo Bosi na obra clássica: História Concisa da Literatura Brasileira (s/d).
Em sua obra, afirma:
Os primeiros escritos da nossa vida documentam precisamente a instauração
do processo [constituição da literatura brasileira]: são informações que
viajantes e missionários europeus colheram sobre a natureza e o homem
brasileiro. Enquanto informações, não pertencem à categoria do literário,
mas apura crônica histórica [...]. No entanto, a pré-história das nossas letras
interessa como reflexo da visão do mundo e da linguagem que nos legaram
os primeiros observadores do país. É graças a essas tomadas diretas da
paisagem, do índio e dos grupos sociais nascentes, que captamos as
condições primitivas de uma cultura que só mais tarde poderia contar o
fenômeno da palavra-arte. (BOSI, s/d, p. 15, grifo nosso).
Bosi está indicando que, nos anos iniciais do século XX, embora não se tivesse ainda
uma clara definição do que seria a literatura brasileira naquele século, as primeiras impressões
escritas ou cantadas datadas já serviram para registrar a vida social e cultural do país. Com
este sentido, entendemos ser possível tomar a poesia como testemunhos de uma época,
capazes, portanto, de serem problematizados para fins de análise histórica.
No entanto, a ampliação da abordagem e a discussão mais específica sobre o uso da
literatura como fonte histórica se fez, no século XX, por intermédio da História Cultural.
Estudando a questão, a historiadora brasileira Sandra Jatahy Pesavento (2006), indica que
para a História Cultural essa relação, a aproximação entre História e Literatura, ocorre na
medida em que ambas são formas de representar o mundo, as dúvidas e inquietações dos
homens em determinada época.
Para a autora, além da mudança “de pensar” a cultura e do próprio olhar do historiador,
a história cultural irá buscar o resgate dos sentidos, com a incorporação de novas categorias
ou e/novos conceitos (como “representação”, imaginário, concepção de narrativa, ficção,
sensibilidades) e a reformulação das já existentes. Dentre essas “novas categorias”, sem
dúvida, a de “representação” é a que mais se destaca.
A Categoria de “representação” tornou-se central para as análises da nova
história cultural, que busca resgatar o modo como, através do tempo, em
momentos e lugares diferentes, os homens foram capazes de perceber a si
próprios e ao mundo, construindo um sistema de ideias e imagens de
representação coletiva e se atribuindo uma identidade. (PESAVENTO, 1995,
p. 116).
Neste sentido, é possível asseverar que ocorre, atualmente, um aperfeiçoamento na
forma de interpretar essa fonte, e, dentre essas mudanças, podemos destacar a busca das
“representações” contidas nos textos literários.
O debate que ocorre na esfera acadêmica sobre a incorporação da linguagem literária,
por sua vez, não é acompanhado na mesma proporção pelos debates sobre seus usos no ensino
de História. Poucos são os autores que, entre os inúmeros que estudam esse campo
disciplinar, se dispõem a pensar a questão.
Oliveira (2006, p. 245 ao tratar da música popular como possibilidade de estudar
história, traz um estudo sobre como a oralidade e as canções se ligam historicamente às
sociedades que não tinham a escrita como forma dominante de comunicação. A autora afirma
que “a palavra falada e a cantada” eram, naqueles contextos da antiguidade, suporte da
memória e da tradição oral daqueles povos, em contraposição à palavra escrita, suportes
materiais duráveis de registro.
Com essas observações, a autora quer afirmar que a música, quando passou a ser
registrada, passou a “(...) apresentar-se como um elemento mediador entre o universo
essencialmente sonoro e o associado à presença da palavra” (p. ?). Acrescenta que “a
justaposição das duas linguagens, entre o discurso falado e o discurso essencialmente musical,
apresenta-se como uma terceira via de comunicação” (p. 249). Dessa maneira, conclui que,
por ser uma via de comunicação, a música, bem como a poesia e o poema apresentam-se
como mais uma alternativa ao historiador que venha se ocupar das representações como opção
de construção historiográfica.
O poema, definido como forma especial de linguagem, mais dirigida à imaginação e à
sensibilidade do que ao raciocínio (BRASIL CULTURA 2009), pode ser visto como um meio
historiográfico de auxiliar o professor no trato com períodos históricos específicos. Ou seja,
como “uma forma de expressão literária, que surgiu simultaneamente com a Música, a Dança
e o Teatro, ainda na antiguidade” (BRASIL, 2009). A poesia é vista aqui como um vestígio do
passado.
Dos autores visitados para esta análise, Reis (2004), Karnal (2003), verificamos que
eles compreendem que as linguagens usadas por atores sociais produzem informações acerca
do que viveram em determinado período histórico. Este já é um indício de que esses registros
(na linguagem poética, como é o caso em estudo) podem ser vistos, na maior amplitude
possível, como desdobramento de uma “experiência histórica”, como resposta a muitas
determinações da própria vivência social (êxodo rural, imigração, perdas sentimentais, etc.).
Nesse sentido, a linguagem poética pode ser tomada como fonte para se pensar um
determinado período social na prática pedagógica, porque permite ao professor interrogá-la e
buscar relações entre aquele registro do vivido com os contextos sociais mais amplos de que
faz parte. Tornam-se fontes úteis quando permitem, pela enunciação poética, interpretar as
formas de ler o mundo de uma época, já que sua linguagem concernente oferece dados sobre
a forma de viver, pensar e agir de homens num determinado período histórico.
Por estar preocupada com a experiência vivida, por sua vez, torna-se ferramenta da
memória (individual). Por outro lado, a depender de como essa memória evoca, por meio dos
aspectos da linguagem sensível, aspectos da vida material, podem ser tecidas considerações
históricas sobre um tempo, um local, sujeitos, coletividades, etc. Como explica Bosi (s/d, p.
?), “o homem se imagina e, ao se imaginar, se auto-revela”. Ao se revelar, o historiador, à
medida que indaga sua poética, tece considerações históricas, por isso pode ser útil ao ensino.
Mônica Karawejczyk (2006), preocupada com o uso e a apropriação que a história
pode fazer da literatura para enriquecer as aulas de História, reafirma o entendimento de
Avacir Gomes dos Santos sobre as possibilidades de trabalhar com a literatura no ensino
escolar. Para ambos os autores, ela dá a conhecer uma realidade nas nossas salas de aula, visto
que não se pode negar que:
Na sala de aula o aluno não se identifica com a história, por que a voz que
ele ouve é a dos reis, presidentes, militares, religiosos e cientistas, e num tom
quase sempre castrador, moralista e profética. Neste espetáculo cabe ao
aluno apenas o papel de expectador. Na literatura, ao contrário, o leitor se
identifica com os personagens, as emoções são afloradas a cada instante.
Dificilmente alguém lembrará do primeiro livro de história, mas com certeza
mantém vivo na memória o primeiro livro de literatura. (SANTOS, 2001
apude KARAWEJCZYK, 2006).
No mesmo caminho, entendemos que o poema se torna um documento muito
importante no ensino de História nas salas de aula, por estar diretamente ligado a um
momento histórico que se constitui de pessoas que viveram em determinada época. O poema
pode fornecer informações sobre a história das pessoas, história de formação da cidade,
acontecimentos marcantes de um determinado local e momento histórico. Ou seja, a poesia,
por ser uma expressão humana, estabelece intima relação com as condições humanas de
determinado tempo e localidade histórica.
Neste trabalho, o conceito de representação – tal como foi pensado por Chartier (1990)
– passou a ser essencial para entendermos essa aproximação da história com a literatura.
Roger Chartier nos esclarece que o conceito de representação deve ser entendido como um
“(...) instrumento de um conhecimento mediador que faz ver um objeto ausente através da
substituição por uma imagem capaz de reconstituí-lo em memória e de figurá-lo como ele é”
(CHARTIER, 1990). Cabe, assim, entender a narrativa poética como um instrumento
mediador que nos permitirá ver um objeto (de estudo histórico). É sob esta perspectiva que se
toma o poema de Carvalho (2004), como possibilidade de fonte para o ensino da história
local. Por meio do poema, é possível trabalhar as representações das “origens” de Maringá
presentes na percepção de seu autor.
A escolha da fonte se deveu, em primeiro lugar, ao fato de estarmos preocupadas com
as indicações de trabalhar com a história local no ensino de História nas séries iniciais;
e, segundo, porque se faz necessário um entendimento, por parte dos alunos, de que a História
não é algo pronto e acabado. Trata-se de um conhecimento que pode ser construído na sala de
aula pelo professor e pelo aluno, entendendo que a História é passível de mudanças, uma vez
que ela descreve uma dada cultura em um dado momento histórico, sendo, então, passível de
transformações. Para se produzir esse conhecimento em sala de aula, a poesia apresenta-se
como uma fonte de trabalho.
Ensino de História e Poesia: Visões da Cidade de Maringá
A indicação de Pesavento (2006, p.?), de que a Literatura permite “o acesso à sintonia
fina ou ao clima de uma época, ao modo pelo qual as pessoas pensavam o mundo, a si
próprias, quais os valores que guiavam seus passos, quais os preconceitos, medos e sonhos”,
foi fundamental para as considerações feitas neste trabalho sobre o poema Maringá
(CARVALHO, 2004).
É conhecido, pela memória social da localidade, que a letra da música Maringá,
escrita em junho de 1932 por Joubert de Carvalho, representa um esforço do autor para dar
identidade à cidade. Osvaldo Reis (2004) ao escrever suas memórias sobre a cidade no livro
Maringá 60 anos (1947-2004): A história em conta-gotas, afirma:
A música tornou-se um sucesso nacional e relacionou-se ao surgimento da
nova cidade no Norte do Paraná. O nome para o povoado foi escolhido pela
senhora Elizabeth Thomas, esposa do presidente da Companhia, Athur
Thomas, mais conhecido por Mister Thomas. A música era cantarolada pelos
trabalhadores no início do povoado, o que chamou a atenção da senhora
Elizabeth. A sugestão foi acolhida por unanimidade, e no dia 10 de maio o
povoado foi oficialmente registrado com o nome de Maringá. (REIS, 2004,
p. 22).
No trato com o tema, ensino de História e poesia, o poema Maringá é tomado como
uma fonte histórica. É fonte na medida em que é uma representação da realidade, na medida
em que está situada em certo tempo e lugar. Ela é fonte na medida em que é um registro de
possibilidades de vida numa certa época e lugar. Mas se ela é uma fonte, é uma fonte peculiar,
não é igual a qualquer outra. A poesia é considerada fonte para o historiador na medida em
que está situada no tempo, em que é uma representação da realidade vivida, no caso, pelos
homens daquele primeiro momento: o processo de urbanização da cidade de Maringá.
Por ser uma linguagem literária, o poema em questão é entendido, no presente
trabalho, nos meandros da indicação de Pesavento. Para ela, “[...] além das disposições legais
ou de códigos de etiquetas de uma sociedade, é a literatura que fornece os indícios para pensar
como e porque as pessoas agiam desta e daquela forma”. (PESAVENTO, 2006, p. 116).
Considerando a indicação de Reis feita acima, devemos indagar: se a música
relacionava o surgimento da cidade de Maringá com o início do povoado, quais foram os
elementos históricos representativos desse período enfatizados na poesia? Para não tomar a
poesia como “fonte da verdade”, deve-se, também, ter em vista: o que significou para a
história da cidade ter o nome escolhido pela esposa de um dos agentes da Companhia que
“colonizou” a região, Companhia Melhoramentos Norte do Paraná?
Sem intencionar responder a essas complexas questões neste trabalho, entendemos que
estas podem ser problematizações que põem em evidencia a análise e estudo da fonte
selecionada para a discussão em sala de aula. Isso porque, para o historiador que se volta para
a Literatura como fonte, o importante é saber que ela é fonte na medida em que se forma por
meio de uma narrativa que constrói uma representação sobre o passado e se desdobra,
deixando-se “ver” nos estudos da produção e da recepção do texto produzido.
Neste sentido, outra questão aparece: quais motivos permitiram que, “por
unanimidade”, a música tivesse sido aceita como representativa das “mentalidades” dos
moradores da cidade naquele momento?
Para responder a essas indagações, o estudo da música como fonte do passado é
essencial. Eis a letra de Joubert de Carvalho (2004):
Foi numa leva,
Que a cabocla Maringá
Ficou sendo a retirante
Que mais dava o que falá.
E junto dela
Veio alguém que suplicou
Prá que nunca se esquecesse
De um caboclo que ficou
Maringá, Maringá,
Depois que tu partiste
Tudo aqui ficou tão triste,
Que eu garrei a maginá:
Maringá, Maringá,
Pra havê felicidade,
É preciso que a saudade
Vá batê noutro lugá
Maringá, Maringá,
Volta aqui pro meu sertão
Prá de novo o coração
De um caboclo assossegá.
Antigamente,
Uma alegria sem igual
Dominava aquela gente
Da cidade de Pombal...
Mas veio a seca
Toda chuva foi-se embora
Só restando então as água
Dos meus óio quando chora.
Segundo Furtado (2009), Maringá teria surgido da união do nome Maria do Ingá,
pertencente a uma moça. O nome se teria se originado de uma lenda, parte da cultura popular
do Nordeste. Segundo a lenda, Maria era uma moça muito bela, natural da cidade de Ingá do
Bacamarte, no agreste paraibano. Após uma grande seca entre os anos 1877-1879, Maria teria
mudado para a cidade de Pombal, situada além do planalto da Borborema, na confluência dos
rios Piranhas e Piancó.
O traçado apresentado por Furtado deverá, no caso da análise do poema como fonte
histórica, ser levado em conta, porque, na perspectiva analítica da literatura como registro do
passado, indagar sobre as possibilidades das informações contidas na poesia para a
reconstrução dos sentidos conferidos ao conteúdo do poema inclui recuperar as representações
de uma determinada pessoa e/ou época, que são manifestadas de diversas formas, sejam
através de discursos, imagens, práticas.
Em outras palavras, Literatura, como Chartier (2002) apontou, “(...) é uma fonte para o
historiador, pode ser considerada um documento, mas como qualquer fonte deve ser
questionada quanto à sua intencionalidade”. Além disso, é preciso considerar que ela nos
revela o contexto social em que ela foi escrita e publicada. Por isso, afirma-se que a Literatura
apresenta duas historicidades, revelando-nos perspectivas tanto do que está sendo narrado na
obra como do contexto em que a obra foi escrita.
Considerada nesses termos, a música deve ser analisada – tendo em vista seu caráter
de fonte histórica para o ensino de História local-tanto no contexto de sua produção como
considerar o tempo retratado na poesia e o tempo em que o autor a escreveu. Nesse exercício,
é importante lembrar que o literato não pesquisa documentos, por isso a Literatura não pode
ser questionada quanto ao seu grau de veracidade. E, por isso mesmo, para o historiador que
usa Literatura como fonte, não cabe investigar a autenticidade do que está sendo narrado, se
apresenta fidelidade quanto ao tempo retratado. O que está narrado em uma obra literária
representa problemáticas a serem discutidas, não informações para serem investigadas
(ALVES, 2007). Roger Chartier explica que, quando textos literários são usados pelos
historiadores, “(...) perdem a sua natureza literária para serem reconduzidos ao estatuto de
documento, válidos porque mostrando, de outro modo, o que a análise social estabeleceu
pelos seus próprios processos”. (CHARTIER, 1990, p. 62).
É exatamente esse caráter de transformação da literatura em fonte histórica que nos
permite entender que qualquer obra literária é fonte para o historiador na medida em que ela
levanta problemáticas, abre possibilidades de leitura de certo tema, de certa época.
No caso em estudo, a música Maringá permite, no ensino, levantar problemáticas
vinculadas à história local, discutir memórias sociais construídas sobre a cidade, imagens e
representações criadas em determinados momentos pelos documentos produzidos no período.
A temática, assim analisada, traria uma discussão, sob a perspectiva histórico-
pedagógica, das “visões” construídas nos anos que antecederam a fundação da cidade de
Maringá. Visões, possivelmente, vinculadas com o intuito de vários sujeitos sociais de
“desbravar” novas terras, como se registraram nas memórias dos que contam as histórias de
Maringá.
Para ter uma idéia dessa relação – do poema com o processo de criação de núcleos
urbanos nessa região do Paraná –, podemos retomar as observações de Reis (2001, p. 17).
Sobre esse processo, teoriza o autor:
Três princípios nortearam a colonização:
1. A construção de um eixo rodoferroviário de penetração, com a dupla
finalidade de facilitar o acesso às novas áreas e permitir escoamento rápido
e seguro à produção da região;
2. Assentamento de núcleos básicos de colonização na rota desse eixo
rodoferroviário, estabelecidos, progressivamente, a uma distância de 100
quilômetros uns dos outros, e que definiram, em ordem, Londrina, Maringá,
Cianorte e Umuarama, cidades planejadas para se tornarem grandes centros
prestadores de serviços;
3. Divisão da zona rural em áreas, em média, não superiores a 14 alqueires,
ajustadas à produtividade do solo e à cultura cafeeira, demarcadas de modo a
dotá-las de parte de baixadas, servidas por cursos d´água (locação da casa do
colono) e da parte do espigão, menos sujeitas a geadas e limitadas por
estrada de rodagem.
Segundo Reis (ano?), esses elementos foram os principais para se considerar o início
da colonização da região denominada “Norte Novíssimo” do Paraná, na qual Maringá está
situada. O povoamento do que viria a ser Maringá teria se iniciado em 1938, embora tenha
sido apenas a partir do começo da década de 1940 que começaram a ser construídas as
primeiras construções urbanas na localidade.
Contexto aceito pela memória social local, pergunta-se: que relações tem a
representação da música Maringá, escrita em 1931 por Joubert de Carvalho, com esse
contexto histórico social de surgimento da cidade?
Joubert de Carvalho nasceu em 06 de março de 1900, em Uberaba, MG. Reis afirma que,
ainda em sua infância, aos dez anos de idade, compôs sua primeira música. Segundo Reis
(2004, p. 24), em 1921, Joubert tornou-se conhecido musicalmente com a música “5 de
janeiro”, na qual homenageou o aniversário de casamento do renomado cientista Osvaldo
Cruz. Com a composição dessa canção, ele ficou conhecido no cenário musical.
O poema Maringá teria surgido, em 1931, quando o oficial de gabinete Rui Carneiro,
do então ministro da aviação José Américo, sugeriu a Joubert que fizesse uma música que
falasse sobre a seca no Nordeste. Segundo Reis (2004), Joubert de Carvalho, quando aceitou
compor a música que Rui Carneiro sugeriu, queria uma relação das cidades afetadas pela seca,
entre elas estava a de Ingá. Afirma Reis (2004): “dono de uma rica imaginação, Joubert
imaginou uma cabocla com nome de Maria, e percebeu que soava muito bem Maria com Ingá,
formando a palavra Maringá. Nascia o poema”.
A beleza da moça Maria teria despertado uma forte paixão em um caboclo, que ficou
triste com sua partida. Não se sabe o nome desse caboclo, Maria é a protagonista da história
sertaneja, considerada a mais comovente do sertão.
Segundo Reis (2004), ao escrever o poema Maringá, Joubert homenageou seu amigo
Ruy Carneiro, natural da cidade nordestina de Pombal. Para isso, ele utilizou uma personagem
de uma lenda nordestina e, de sua história, fez uma ligação com a história dos nordestinos
que, junto com os mineiros e paulistas, trabalharam na derrubada do mato, ação de
fundamental importância para o nascimento da cidade. Ao utilizar a lenda como inspiração
para escrever, o autor trouxe para o poema toda uma história de sofrimento dos nordestinos
que tiveram que abandonar a sua terra de origem com o objetivo de fugir da castigadora seca
do sertão, imigrando para o Paraná.
Na letra da canção, Joubert trata de questões como a tristeza dos nordestinos em
abandonar suas cidades de origem, abandonar pessoas queridas, amores, paixões, família,
enfim, toda uma história construída e vivida no sertão. O autor também aborda a questão da
seca que atingia o sertão, e ainda atinge nos dias atuais, voltando, por meio do poema, um
olhar para essa situação. De igual modo, Joubert homenageou seu amigo Ruy Carneiro ao
mencionar, no poema, a cidade de Pombal e tratar da questão da seca no Nordeste.
Joubert de Carvalho trouxe, segundo Reis (2004), para a letra da canção a história dos
nordestinos, que foram de grande importância para a construção de Maringá e, para tanto,
utilizou-se da linguagem poética para tecer uma visão sobre Maringá. Por meio dessa
linguagem, o autor estabeleceu uma relação entre história e literatura.
Ao utilizar a linguagem poética, que representação Joubert trouxe para a história do
começo da colonização de Maringá? Estaria representadano poema a realidade vivida desde o
início, quando os pioneiros derrubaram as matas, colocando Maringá no “rumo da
urbanização”?
No entanto, apenas em 21 de abril de 1959, Joubert visitaria Maringá. Dessa
informação, caberia indagar: o que significaria o fato de o autor da música não ter conhecido
Maringá na época da criação do poema?
Como se vê, um dos primeiros passos no trato com a fonte é situar o autor, sua obra e
sua época. A narrativa poética deve ser também indagada: em qual cenário histórico-social ela
é produzida e como a ele se relaciona? Que informações o poema traz da vivência humana em
sociedade? Trata de um tempo e espaço específicos? Como os acontecimentos são narrados?
O que podemos ressaltar do poema, tendo em vista as respostas a estas indagações?
Estas seriam algumas das questões a serem feitas pela fonte histórica. Sob esta
perspectiva, o mais importante para o professor é que ele perceba que o trabalho com este tipo
de fonte não deve estar centrado na preocupação em verificar se as informações que pode tirar
da poesia têm ou não correspondência fiel com a realidade. E sim considerar, nesse exercício
de indagar à fonte, sobre suas relações com um determinado período histórico – o qual lhe
deu origem –, para que possa discutir como as gerações passadas percebiam o seu mundo e se
relacionavam com ele por intermédio de diferentes linguagens.
Considerações Finais
Neste estudo, constatamos que, durante muito tempo, acreditou-se que apenas
documentos oficiais poderiam servir de fonte para o trabalho do historiador. A consolidação
da história como campo do saber científico, na segunda metade do século XIX, teve como um
de seus pressupostos a crença na veracidade de suas fontes, em seu valor de prova histórica,
capaz de permitir ao pesquisador acesso ao fato passado tal como ele aconteceu. Segundo
Queiroz (2003), a objetividade e o rigor metodológico pretendidos pelo pensamento
positivista firmaram-se no campo do conhecimento histórico sob a forma de uma crítica
documental severa, guiada por critérios de autenticidade, recusando ao historiador qualquer
grau de intervenção sobre os documentos, deixando apenas as fontes “falarem”.
Entre os historiadores do século XIX e início do século XX, acreditava-se que a
valorização das fontes escritas oficiais, por exemplo, indicaria uma preponderância da história
política e institucional como objeto das preocupações de uma historiografia motivada pelo
desejo de afirmação de identidades nacionais num contexto de disputa entre as potências
mundiais da época (QUEIROZ, 2003).
A partir de 1929, com a criação da revista Annales d´Histoire Économique et
Sociale pelos franceses Marc Bloch e Lucien Febvre, verificaram-se transformações
substanciais no pensamento historiográfico, decorrentes da consolidação de uma nova
tradição intelectual de atuação renovadora, cujas contribuições terminaram por deslocar o
eixo de preocupação dos historiadores da esfera política para as investigações em história
econômica e social. Da abertura de novos horizontes para a pesquisa em história, decorreu,
consequentemente, a ampliação do conceito tradicional de fonte histórica, reivindicando-se
legitimidade a qualquer tipo de registro capaz de responder às novas questões propostas pela
historiografia.
Burke (1990) indica que a ruptura com a concepção do documento-verdade levou os
historiadores a se debruçarem sobre tipos variados de vestígios históricos. A partir de então,
não haveria documento neutro, cabendo ao historiador estar atento às especificidades próprias
de cada fonte, examinando as condições em que foi produzida.
Orientada por esta concepção, a temática deste trabalho foi desenvolvida, ao objetivar
tomar a Literatura como fonte para o ensino de História, reconhecendo a sua importância
enquanto documento. Diante de diversas abordagens possíveis, analisamos a poesia de
Carvalho (2004) como fonte para se trabalhar história local na sala de aula. Seguindo a
perspectiva de autores como Karnal (2003), efetivou-se uma reflexão sobre a importância de
se repensar o fazer e o ensinar a disciplina de História, de modo a romper com os modelos
ensinados nas escolas, nos quais a História se mostra como um conteúdo pronto e acabado,
visto pela óptica dominante, abordando apenas alguns dos aspectos da história, que,
geralmente, refletem os interesses de quem a escreve.
Um poema pode ser utilizado enquanto fonte histórica na sala de aula, visto que ele
expressa realidades vividas em momentos históricos distintos, momentos em que cada escritor
esteve imerso, retratando-os de forma poética. O poema, quando é utilizado enquanto fonte,
permite comparações e interpretações por parte dos alunos, tornando-se uma forma de refletir
sobre a História, seja ela local, ou nacional.
Pensar o uso da poesia no ensino de História é pensar novas formas de se produzir e
ensinar História. As discussões sobre a poesia enquanto fonte de ensino lançam novas
possibilidades de se trabalhar conteúdos históricos em sala de aula, proporcionando novas
maneiras de interpretação dos fatos ocorridos no passado, na tentativa de entender o contexto
que as geraram e estabelecer reflexões sobre o mesmo. Quando conteúdos históricos são
apresentados já prontos e acabados, não existe a possibilidade de comparações e reflexões, no
entanto, quando se busca entendimento sobre determinado período histórico, a escolha da
fonte histórica pode apresentar outras possibilidades de trabalho. Nesta perspectiva, a poesia
apresenta-se como uma fonte pertinente para o ensino na sala de aula.
Referências
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