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Histórias da Criação - Resgate, Preservação e Disseminação da Cultura Afro-Brasileira atraves de Jogos Eletronicos
Cristhyane Ribeiro Victor Cayres Jailson de Brito Tatiane Silva Lucas Souza
Sinergia Games, Brasil
Figura 1: Imagens dos Jogos Culturais da série Origem do Mundo
Resumo
Mesmo sendo próxima da realidade sócio-histórica
brasileira e com a lei 10.639/03 – aprovada há doze
anos – que obriga as escolas de nível fundamental e
médio a promoverem o ensino da história e cultura
afro-brasileira, a mitologia afro-brasileira é pouco
disseminada e irrisoriamente presente como conteúdo
de produtos culturais e educacionais nacionais. Com
a finalidade de resgatar, preservar e disseminar a
cultura afro-brasileira, o projeto transmidiático
Histórias da Terra Afro-Brasileira reproduz os mitos
e lendas desta cultura em diferentes linguagens e
plataformas, promovendo diálogos que tragam à tona
as raízes históricas e reafirmem a sua importância
para o presente. Neste artigo, descrevemos e
apresentamos os resultados da avaliação dos quatro
jogos eletrônicos do referido projeto.
Palavras-chave: Mitologia, Cultura Afro-Brasileira,
Preconceito, Teoria do Fluxo, Avaliação em Jogos.
Contato dos autores: [email protected]
{victorcayres, jailson, alfsouza708}
@gmail.com
1. Introdução
A mitologia promove uma estruturacao formal para o
desenvolvimento do ser humano por se relacionar
com problemas subjetivos do cotidiano e experiências
fundamentais do desenvolvimento humano. A
mitologia africana possui um rico conteudo, como
fica evidente na Mitologia dos Orixás na qual ha
historias da cosmologia universal, passando pela
origem do mundo, a criacao do ser humano e a
relacao com a natureza, dentre muitos outros temas
universais. A mitologia afro-brasileira e tao fabulosa
quanto a grega, no entanto, menos disseminada em
nossas mídias, ainda que mais proxima à realidade
socio-historica brasileira.
No Brasil, existe uma supervalorizacao sobre o
registro historiografico da mitologia grega na
educacao. Ou entao, quando o assunto e o heroi, se
destaca a mitologia moderna presente em linguagem
como quadrinhos e cinema, exemplo: Super Homem,
Homem Aranha ou Batman. Em contrapartida, a
cultura afro-brasileira e transmitida principalmente de
forma oral, o que promove a perda de conteudo e
diminui o seu alcance, assim como ao mesmo tempo
enriquece sua experiencia. Com a finalidade de
resgatar, preservar e disseminar a cultura afro-
brasileira foi criado o projeto Histórias da Terra Afro-
Brasileira vislumbrado representar esta cultura em
novas linguagens e contextos para promover dialogos
que resgatem as raizes historicas reafirmando sua
importancia para o presente.
No ano de 2012, com o lançamento do jogo social
Histórias da Terra da empresa Sinergia Games, teve
início, também, o projeto Histórias da Terra Afro-
Brasileira, tratando do conteúdo abordado em uma
das civilizações/fases de mesmo nome do game que,
também, encontrou ressonância em políticas culturais
locais e nacionais, resultando em curtas de animação,
quadrinhos digitais, games, oficinas culturais e,
ainda, exposição da arte digital – quadros digitais,
HQs e games - desta civilização do jogo Histórias da
Terra .
O projeto Histórias da Terra Afro-Brasileira reune
Arte, Educacao e Tecnologia em diferentes formas de
contar historias utilizando-se de diferentes midias e
plataformas tecnologicas. O conteudo da obra
consiste em seis lendas africanas selecionadas e
reescritas a partir das obras de Reginaldo Prandi
[Prandi 2001] e Pierre Verger [Verger 1997]. O
projeto foi selecionado no Edital Cultura 2014 do
Ministerio da Cultura e realizou primeira
apresentacao em exposicao de artes visuais intitulado
Histórias da Terra Afro-Brasileira no periodo de 10
de junho a 31 de julho de 2014 na Galeria do Oi
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Kabum! Salvador com apoio do Museu Casa do
Benin no bairro do Pelourinho.
Assim, o projeto Histórias da Terra Afro-
Brasileira reune Arte, Educacao e Tecnologia em
diferentes formas de contar historias utilizando-se de
diferentes midias e plataformas tecnologicas. O
conteudo da obra consiste em seis lendas afro-
brasileiras selecionadas e reescritas a partir das obras
de Reginaldo Prandi [Prandi 2001] e Pierre Verger
[Verger 1997]. O projeto foi selecionado no
Concurso Cultura 2014 do Ministerio da Cultura e
realizou primeira apresentacao em exposicao de artes
visuais, também intitulado Histórias da Terra Afro-
Brasileira no periodo de 10 de junho a 31 de julho de
2014 na Galeria do Oi Kabum! Salvador com apoio
do Museu Casa do Benin no bairro do Pelourinho.
A proposta dos games do projeto Histórias da
Terra Afro-Brasileira e de contar as lendas originarias
do Candomble, conhecidas por meio de tradicao oral
utilizando uma linguagem atualmente mais proxima
ao publico jovem - jogos eletronicos. Partimos da
hipotese de que e possivel utilizar um jogo eletronico
como linguagem contemporanea, interativa e
participativa para familiarizar o público geral com
mitos da cultura afro-brasileira. Acreditamos tambem
que um jogo eletronico pode auxiliar na diminuicao
do preconceito em relacao as religioes de matriz
africana ao representar as historias dos orixas de
forma ludica e divertida. Os jogos foram
desenvolvidos em HTML5 devido a sua facilidade de
difusao em diferentes plataformas operacionais,
possibilitando assim um maior alcance da obra, para
tanto foi ulizada ferrametna Construct 2. Essa
ferramenta permitiu publicar os jogos em diversas
plataformas, lojas online e sistemas operacionais
como iOS, Android, Windows Phone, Nintendo Wii.
Durante os anos de 2014 e 2015, os games do
projeto ganharam novas versões decorrentes
principalmente de três momentos em que foram
avaliados, incluindo o SBGames 2014, quando
submetemos, O Feitiço de Exu, o primeiro jogo da
série Jornada da Criação para o Festival de Jogos do
evento. Também foram realizadas avaliações periodo
da execução do projeto Histórias da Terra na galeria
do Oi Kabum! em 2014, como em evento posterior -
Gamepólitan 2015. Os participantes dos eventos que
jogaram os quatro jogos do projeto responderam a um
questionario de avaliacao.
O objetivo do questionario foi de verificacao da
hipotese principal sobre diversao e contato com o
conteudo da cultura afro-brasileira atraves do jogo e a
verificacao da hipotese secundaria da possibilidade
de diminuicao do preconceito em relacao as religioes
de matriz africana quando da apresentacao do
conteudo em linguagem moderna e formato de jogo
eletronico.
O resultado da primeira avaliação - que aconteceu
durante a exposição do projeto Histórias da Terra
Afro-Brasileira - foi abordado em artigo publicado
nos anais do SBGames 2014 e limitou-se a avaliação
do primeiro jogo da série, Jornada da Criação. Os
avaliadores sugeriram que a abordagem para o
levantamento dos dados referentes a diminuição do
preconceito como contribuição do conhecimento da
mitologia através de jogos fosse tratada mais
diretamente e de forma diferente. Essa sugestão foi
acatada para o segundo ciclo da avaliação - que
incluiu os três jogos desenvolvidos no intervalo entre
os eventos, além das melhorias em nova versão do
primeiro jogo objeto do artigo citado – e resultando
na revisão do instrumento de análise para alcançar os
objetivos inicialmente propostos. Os resultados deste
segundo ciclo de avaliação que apresentamos neste
artigo.
Neste artigo, descrevemos as características e
elementos dos jogos desenvolvidos, a diferença entre
as versões e a contribuição das avaliações e sugestoes
dadas por jogadores e avaliadores para as mesmas.
Apresentamos, ainda, os resultados da analise da
experiencia dos jogos durante os dois eventos citados.
O objetivo dessa analise foi verificar o alcance dos
objetivos primarios do jogo, quais sejam: divertir o
jogador e permitir a apreciacao das historias dos
Orixas. Uma consequencia possivel dos objetivos do
jogo e a diminuicao da discriminacao das religioes de
matriz africana contribuindo assim para uma melhor
disseminacao da cultura.
No decorrer da execucao desse trabalho pudemos
perceber a carencia de artefatos com o conteudo da
mitologia africana em midias atuais como de jogos
eletronicos. Notamos tambem os desafios de
desenvolver jogos que promovam o resgate,
preservacao e disseminacao da cultura,
principalmente quando envolve uma religiao. Atraves
dos resultados significativos percebemos que os jogos
se tornaram uma experiencia divertida. Alem disso,
os jogadores conseguiram assimilar o conteudo
apresentado nas experiencias dos jogos. Assim,
vislumbramos a continuidade ao projeto expandindo
cada vez mais o conteudo abordado. Uma outra
consequencia deste trabalho e a ampliacao do
significado da vida e do proposito pessoal de jovens
afro-descendentes em formacao. Esperamos tambem
que este trabalho possa agregar ao esforco de acoes
pedagogicas e de difusao das organizacoes culturais
afro-brasileiras em gerar reflexoes e praticas que
contribuam para o senso critico dos atores da
educacao e da sociedade.
O resto do presente artigo esta organizado como
segue. Na Secao 2, sao apresentados os principais
conceitos e trabalhos correlatos para este trabalho. Na
Secao 3, e detalhada a metodologia utilizada para
conceber os jogos; na Seção 4, apresentamos os jogos
desenvolvidos, suas versoes e as contribuicoes das
avaliacoes e sugestoes recebidas. Na Secao 5,
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explicamos as avaliacoes realizadas atraves de
questionario e analisamos os resultados obtidos. Por
fim, na Secao 6, discutimos as conclusoes e trabalhos
futuros.
2. Conceitos e Trabalhos Correlatos
Mitologia e Religiao se estruturam como sequencias
de crencas e historias que orientam os modos de vida,
moral e estrutura social de um grupo social. Todavia,
enquanto a religiao se estabelece no exercicio dessas
crencas na vivencia cotidiana de uma comunidade,
quando nao existe uma estrutura de pratica coletiva,
essas historias formam uma mitologia. Por exemplo,
nao existem devotos de Hades, embora quando estes
existiam, suas crencas e ritos promoviam uma pratica
religiosa [Campbell 1988].
Toda mitologia tem origem em alguma religiao
tradicional [Jung 1964]. Pesquisadores e estudiosos
das diversas religioes e mitologias podem assumir um
olhar neutro, diferenciado e imparcial diante de
mitologias e religioes diversas, identificando diversos
conteudos semelhantes entre elas e que dizem
respeito ao desenvolvimento humano atraves de
padroes arquetipicos [Jung et al. 1964]. O
pesquisador olhara todas estas manifestacoes
religiosas e mitologicas sob o mesmo angulo de
conteudos arquetipicos que dizem respeito ao
desenvolvimento humano [Jung et al. 1964]. Apenas
os adeptos das religioes terao uma vivencia mais
profunda e visceral de sua propria religiao, porem
podem perder a visao da totalidade e diversidade que
pode ter o estudioso e vice-versa [Campbell 1988].
Em nossa pesquisa sobre jogos que apresentam a
mitologia afro-brasileira, encontramos as principais
referencias em obras audiovisuais.
O filme Besouro2 apresenta a historia de Besouro,
um capoeira simbolo de resistencia no Reconcavo
Baiano [Monteiro de Miranda et al. 2011]. Alem da
capoeira, o filme traz representacoes da cultura afro
como o candomble e orixas como Iansa e Exu
[Santos 2013].
Uma outra obra audiovisual importante para esse
contexto e o filme Jardim das Folhas Sagradas 3. O
protagonista da historia e Bonfim, um homem negro
que e designado a montar um terreiro de candomble
na Salvador contemporanea e enfrenta diversos
problemas de uma tipica metropole. Esse filme pode
contribuir para praticas interculturais criticas em sala
de aula pois apresenta as discussoes internas no
Candomble como uma cultura fluida e construida na
luta [de Oliveira et al. ].
Uma outro filme ainda em producao interessante
para esse cenario, e o filme nigeriano Oya - A
Ascensao do Orixa, apresenta orixas como herois. O
personagem principal e Ade, uma mulher que tem
uma ligacao muito forte com Oya e recebe a missao
de proteger inocentes.
No cenário cultural do estado da Bahia, ainda
figuram obras audiovisuais em desenvolvimento no
formato de animações, como decorrência do fomento
a cultura afro-brasileira promovida pela lei cultural
deste estado. Citamos: Esse Orixá é uma Lenda
(https://www.facebook.com/LendasOrixas) e Orum
Aiyê (https://www.facebook.com/OrunFilme). As
duas animações concebidas com base em lendas
originárias do Candomblé e com o intuito de
combater o preconceito às religiões de matriz
africana.
Além dessas obras audiovisuais encontramos,
também, as obras literárias: Deuses de Dois Mundos
e a história em quadrinhos Do Orum ao Ayê, esta
última também com proposta muito semelhante a
proposta da HQ de nosso projeto, pois aborda a
mitologia afro-brasileira diretamente em sua
narrativa.
Alem disso, tivemos dificuldades de encontrar,
ate o presente momento, obras relevantes que
utilizem jogos eletronicos para contar a mitologia
afro-brasileira. Podemos citar apenas o projeto
Contos de Ifá, em desenvolvimento pela
Universidade Federal de Cachoeira, cujo início foi
anunciado no início deste ano de 2015.
As obras audiovisuais sao de grande importancia para
a disseminacao da cultura afro-brasileira, e abordam
os mesmos temas apresentados pelo projeto Histórias
da Terra Afro-Brasileira, porém sem proposta
transmidiática como o nosso projeto.
Cabe ressaltar ainda que um diferencial deste
projeto em relação aos outros apresentados é a sua
abordagem de roteirização de histórias e mecânicas
de jogos calcadas na mitologia com a proposta de
familiarizar o público com as histórias dos orixás.
3. Metodologia
As seis lendas da mitologia afro-brasileira que
compoem a obra original, o game Histórias da Terra ,
foram compostas atraves de revisao bibliografica em
autores como Reginaldo Prandi e Pierre Verger que
realizaram suas pesquisas desta mitologia em
Terreiros do Candomble onde sao transmitidos por
tradicao oral. Estas lendas foram roteirizadas para
historias em quadrinhos e finalizado os roteiros, os
mesmos foram revisados por Negra Jho, artista da
afrodescendencia e representante do Candomble e do
movimento negro no Estado da Bahia.
Em seguida realizou-se uma pesquisa calcada na
experimentação prática ao longo do desenvolvimento
pautada pela intenção de tornar jogáveis as histórias
da mitologia afro-brasileira sem deturpá-las. O
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principal desafio deu-se na investigação de mecânicas
que permitissem que o jogador tivesse libertade de
ação suficiente para caracterizar o produto que estava
sendo desenvolvido enquanto jogo, mas que não
pudesse alterar os rumos da narrativa que estava
sendo contada. Para tanto utilizamos para embasar
nossas escolhas tanto referências bibliográficas do
campo de estudo dos jogos e mais especificamente
dos jogos digitais [HUIZINGA 1971; SCHELL 2008;
McGONIGAL 2011] bem como utilizamos outros
jogos como referência (Flap Bird; Dumb ways to die;
Jetpack Joyride).
Durante, foi disponibilizado com um computador
e um joystick como dispositivo de controle e durante
o Gamepólitan, as novas versões e jogos do projeto
foram disponibilizados em dispositivos móveis. Essa
abordagem foi escolhida por se tratar de um ambiente
em que os jogadores estao em transicao e precisam de
interfaces simples de controle.
Durante o periodo da ja mencionada exposicao do
projeto Histórias da Terra , a Negra Jho visitou o
espaco da galeria e trouxe seus filhos e netos para
jogarem o primeiro jogo eletrônico desenvolvido
dentro da proposta do projeto, Jornada da Criação e o
RPG Omorixá. Neste momento eles fizeram
observacoes e contribuicoes sobre o conteudo do
mesmo e da propria jogabilidade que foram levados
para a equipe de desenvolvimento.
Durante o período da exposição, ocorreram, ainda
oficinas tecnológicas de roteiro para quadrinhos e
animação, game design e desenvolvimento de jogos.
A proposta das oficinas foi que ao final, os
participantes apresentassem protótipos de games
desenvolvidos a partir das narrativas presentes nos
produtos culturais da exposição, ou seja, as seis
lendas dos orixás selecionadas da mitologia afro-
brasileira.
Em decorrência da exposição, da avaliação do
primeiro game pelo público e das ideias e projetos
decorrentes das oficinas realizadas, durante o
segundo semestre de 2014 e primeiro semestre de
2015, o primeiro jogo ganhou novas versões,
contemplando as sugestões de jogadores e
avaliadores. Também foram desenvolvidos mais três
jogos eletrônicos no âmbito deste projeto, a partir das
histórias roteirizadas e revisadas inicialmente para as
HQs. Assim, o jogo Jornada da Criação foi
reentitulado Feitiço de Exú e ganhou novas versões e
foram desenvolvidos os jogos O Saco da Criação e
Oxalá no Aiyê que dão continuidade a história da
criação na mitologia dos Orixás, abordando
respectivamente a segunda e terceira etapas da
mesma aventura. Lodô: Filha de Iemanjá, também foi
concebido, desenvolvido e publicado neste período,
abordando a história do fim do mundo presente na
mesma mitologia.
Estes novos jogos e a versão atual do primeiro
foram apresentados durante o Gamepólitan 2015,
passando também por processo de avaliação pelo
público. A análise dos resultados da avaliação - que
objetivou medir a diversão, apreciação da lenda
presente na obra e impacto sobre o preconceito
religioso - levaram a inserção de mudanças e
desenvolvimento de novas versões dos jogos que
descreveremos nos tópicos seguintes.
4. Os Games
Nesta seção apresentaremos os três jogos que contam
a história da origem do mundo sob a perspectiva da
Mitologia dos Orixás. Para descrevê-los, na primeira
subseção, utilizaremos como principal referência as
quatro caracteristicas que definem jogos propostas
por McGonigal [2011].
Adicionalmente, nas subseções que se seguem,
aplicaremos os cinco elementos que auxiliam na
concepção e condução do processo de design de
jogos propostos por Schell [2008] - história,
mecânica, estética, tecnologia e experiência – para
descrever a concepção, desenvolvimento e evolução
destes jogos como resultantes da metodologia
aplicada em sua concepção, assim como dos ciclos de
avaliações a que se submeteram e que geraram
contribuições para as diferentes versões que cada um
dos jogos ganhou no decorrer do tempo até o
presente.
4.1. Apresentação
O objetivo do jogo Feitiço de Exú, antes Jornada da
Criação, primeiro jogo da série que conta a história
da origem do mundo na mitologia afro-brasileira é
ajudar o orixá Oxalá na criação do mundo, fugindo
dos feitiços do orixá Exú; As regras do jogo
colocam limitacoes no jogador para atingir o objetivo
[McGonigal 2011]. No caso do primeiro jogo da
serie, os feiticos de Exu tentam impedir o Oxalá de
criar o mundo, de forma o jogador precisa conduzir o
personagem para desviar dos feiticos pulando ou
baixando quando eles estao proximos, evitando
assim, ser atingido enquanto puder. O jogo só se
encerra, no entanto, quando Oxalá é finalmente
atingido pelo feitiço do irmão mais novo, mantendo a
coerência entre das regras do jogo com a mitologia
que lhe dá base. O sistema de feedback basicamente
consiste em mostrar ao jogador quando ele e atingido,
e o quanto ele ja percorreu para tentar alcançar o
objetivo.
No segundo jogo Oxalá no Aiyê, a saga da
criação do mundo continua, e o objetivo é ajudar
Oxalá na criação do mundo, matando a sede que lhe
acomete ao ser atingido pelo feitiço de Exú; O
jogador deve evitar que Oxalá morra de sede
atingindo corretamente as talhas de palmeiras em
busca do vinho da palma. As regras do jogo impõem
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uma restrição ao modo de Oxalá golpear as palmeiras
em busca do seu objetivo. As palmeiras contêm
rachaduras que potencializam o golpe de Oxalá e
quebram mais facilmente se o jogador observar que
parte dela deve ser atingida. O sistema de feedback
apresenta ao jogador a resultante do seu golpe na
palmeira. que permite talhas maiores ou menores a
depender do local atingido. Por fim, quando Oxalá
finalmente encontra o vinho da palma, ele bebe em
tão grande quantidade que acaba dormindo.
Como Oxalá encontra-se em sono profundo, a
missão da criação do mundo é passada a Oduduwa.
No jogo Saco da Criação, tem como objetivo ajudar
Oduduwa na criação do mundo para que supere as
sequências de desafios que lhe aparecem quando
recebe essa incumbência. As regras definem.a
utilização correta cada elemento do saco da criação
dentro do tempo estipulado para cada um dos
minigames sequenciais que compõe o jogo. No jogo
Saco da Criação, ao final de cada desafio é informado
ao jogador o seu sucesso ou fracasso antes de passar
para o desafio seguinte.
Quanto a participacao voluntaria, mesmo nas
situações de avaliação, para manter a condição de
jogo, os softwares foram apresentados numa
exposição e em um evento de games, de forma que os
visitantes podiam de livre e espontânea vontade
assumir o controle do joystick e/ou dos dispositivos
móveis para jogá-los. Atualmente os jogos
encontram-se publicados e os jogadores podem
voluntariamente realizar o download dos mesmos nas
lojas de aplicativos online de forma gratuita com
publicidade ou a versão paga sem publicidade.
4.2. Concepção, Desenvolvimento e Evolução na série dos games Origem do Mundo
No jogo Fetiço de Exú, a história aborda a parte da
lenda da criação do mundo quando Oxalá recusa-se
por orgulho em fazer oferendas ao seu irmão mais
novo, Exú, conforme foi orientado por seu pai
Olorum. Exú então lança sobre Oxalá feitiços que o
impedirão de criar o mundo.
A característica principal da estética do jogo gira
em torno da representação visual dos personagens
principais e elementos da cultura afro-brasileira no
jogo. Como nosso objetivo e de apresentar a
mitologia das lendas dos Orixas, precisamos pensar
em como apresentar estes elementos de forma que
possa ser apreciada pelo publico do jogo. Ao jogar
pela primeira vez, a história é apresentada ao jogador,
no formato de quadrinhos, até o momento em que
Oxalá despreza os conselhos de fazer oferendas a
Exú. A história inicial pode ser pulada pelo jogador
ao tocar na tela e fica disponível no menu inicial.
A mecânica básica do jogo está em desviar de
feitiços enviados por Exu que foram representados
por tochas flamejantes. Os feiticos sao lancados de
forma aleatoria e ha um intervalo pre-determinado na
posicao que o jogador se encontra na parte central e
alta do cenário, podendo atingir o personagem,
também, no pulo. Ha ainda a premeditacao do feitico
no formato de uma interrogacao vermelha. A
aleatoriedade permite que os efeitos e eventos do
jogo nao sejam totalmente previsiveis [Bjork and
Holopainen 2004].
Para iniciar o jogo, basta o jogador tocar em
qualquer parte da tela. Assim que a partida inicia, o
jogador visualiza Oxala correndo no ceu e alguns
outros elementos de jogos eletronicos. A Figura 1
mostra a tela do jogo logo no comeco da partida. No
canto superior esquerdo e exibido a distancia
percorrida pelo jogador, um valor de pontuacao de
forma numerica e ao evoluir no jogo aparecem no
centro do canto superior desafios e missoes. A
distancia percorrida aumenta 1 metro por segundo, ou
seja assim podemos medir quanto tempo
conseguimos segurar o jogador na experiencia do
jogo.
FIGURA 02: Tela Inicial do jogo Feitiço de Exú
Para que os desafios do jogo se tornem
interessantes para o jogador e preciso ter o nivel
correto de dificuldade [Bjork and Holopainen 2004].
Por isso, com o passar do tempo os feiticos sao
lancados em intervalos de tempo cada vez menores e
ganham maior velocidade aumentando assim o
desafio. Desse modo ainda podemos perceber que o
desafio do jogo possibilita uma curva suave de
aprendizado e uma percepcao de ter sucesso no jogo
[Bjork and Holopainen 2004].
A informacao do jogo flui como um ciclo do
jogador para o jogo, e do jogo para jogador na forma
de um retorno significativo e perceptivel [Schell
2008]. Desse modo, quando o jogador e atingido por
um feitico representamos o impacto atraves de tres
formas: uma animacao de uma explosao na regiao do
impacto; a animacao de Oxala representa o impacto
por alguns segundos; e logo em seguida aparece na
tela a frase: Enfeitiçado! Conceber esse final de jogo
foi um outro desafio encontrado ja que o comum em
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mecanicas de jogos desse tipo e que o personagem
morre e nao poderiamos utilizar esse recurso.
FIGURA 03: Momento em que Oxalá é enfeitiçado no jogo
Feitiço de Exú
Implementamos a imunidade ao feitico na forma
de elementos coletaveis [Bjork and Holopainen
2004]. Quando o jogador coleta um pombo branco -
que surge em intervalos aleatorios no jogo e se move
em pontos diferentes do cenários mais próximos ou
mais distantes do personagem - ele torna-se
invulneravel ao feitico por um intervalo de tempo, a
imunidade termina ao ser atingido por algum feitiço.
O pombo branco e um dos simbolos de Oxala e,
segundo a mitologia, o acompanhou na criacao.
Por fim, apos a partida acabar e exibida a sua
pontuacao, qual a distancia total percorrida seguida e
o recorde do jogador. Caso o jogador queira jogar
novamente basta apertar qualquer botao. Caso nao
tome nenhuma acao o jogo permanece na tela de
resultados.
Este primeiro jogo da série dos jogos que contam
a história da origem do mundo passou por três
versões deste a primeira versão apresentada na
exposição do projeto Histórias da Terra Afro-
Brasileira e no evento SBGames 2014. Na segunda
versão, foram inseridas melhorias sugeridas pelos
avaliadores referente aos movimentos do
personagem, pois como projeto transmidiático, a
primeira versão do jogo utilizou a mesma ilustração
da história em quadrinhos para Oxalá, animando
apenas o movimento das pernas e deixando o tronco
superior estático, prejudicando a experiência nesta
nova mídia. Assim, na segunda versão, o personagem
além de ganhar animação completa e mais
apropriada, também adicionamos o movimento de
baixar do personagem para desviar de feitiços.
Por outro lado, como a plataforma da primeira
versão foi para PC onde o jogo poderia ser jogado
com as setas do teclado ou do joystick, uma vez
apresentado para dispositivos móveis, foi sugerido
pelos avaliadores e jogadores o “repensar da
mecanica, explorando novos caminhos” pois a
jogabilidade ficou prejudicada ao jogar o mesmo jogo
em dispositivos móveis – tablets e smarthphones.
Assim, foi realizada uma revisão de jogos similares
para mobile, e concluimos que o personagem deveria
perder o movimento para frente e para trás e ficar
correndo sempre no centro da tela e não correr mais
ou menos a depender dos comandos do jogador como
na versão para PC.
Na terceira e atual versão do jogo, incluímos
novos gráficos para o feitiço e explosão deste, pois
como elemento central da temática do jogo e da
mecânica, também foi apontado pelos jogadores e
avaliadores que “a arte das particulas poderiam ser
melhor tratadas, melhorando os graficos e efeitos”.
Também nesta terceira versão incluímos desafios na
forma de missões, pois jogadores e avaliadores
apontaram o jogo como monótono depois de algum
tempo na mesma partida do jogo e, ainda, em novas
partidas no mesmo jogo, prejudicando o interesse na
rejogabilidade.
No jogo Oxalá no Aiyê, a história aborda a
continuação da lenda da criação do mundo quando
Oxalá recebe um feitiço de sede extrema de Exú e
passa a procurar desesperadamente por algo para
beber, bebendo do vinho de palma.
Inserimos, também, neste segundo jogo da série, a
história no formato de quadrinhos que aparece na tela
ao jogar pela primeira vez, o que auxilia nesse
processo neste caso, a história é contada até o
momento em que Oxalá sendo enfeitiçado por Exú,
resolve ferir o tronco da palmeira para beber o seu
vinho. A história inicial pode ser pulada pelo jogador
ao tocar na tela e ficará sempre disponível no menu
inicial.
FIGURA 4: Menu do Jogo Oxalá no Aiyê
Ainda com o foco em apresentar a mitologia das
lendas dos Orixás em uma estética que possa ser
apreciada e aprendida pelo publico do jogo, esta parte
da história mitológica da origem do mundo, foi a que
apresentou maior desafio a equipe de concepção e
criação do jogo em termos de encontrar uma
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mecânica básica que proporcionasse experienciar a
história de forma a não distorcê-la ao ponto de levar a
interpretações equivocadas. Isso porque para matar a
sede Oxalá dá um golpe em uma palmeira com o seu
opaxorô e embebeda-se. A saída adotada foi criar
uma situação em que o jogador golpeia eternamente
palmeiras sem chegar a matar a sede ou embebedar-
se. Sem apresentar o desfecho prolongamos o
momento em que Oxalá golpeia a palmeira para criar
uma série de puzzles envolvendo golpes nos locais
corretos como mecânica básica do jogo, não contando
o desfecho. Solução semelhante como fizemos no
jogo descrito anteriormente, em que Oxalá foge
continuamente de feitiços e quando enfeitiçado não
se sabe através do jogo o que acontece
posteriormente, o desfecho será completamente
apresentado na história inicial deste segundo jogo.
A mecânica do jogo está, portanto, em dar golpes
no casco da palmeira de forma a otimizar os golpes a
partir das talhas pré-existentes nos troncos. A
sequência de desafios apresentam uma ordem
crescente de dificuldade para que os desafios do jogo
se tornem interessantes para o jogador na medida em
que este domina a lógica da mecânica dos puzzles
apresentados, assim, o desafio do jogo possibilita
uma curva suave de aprendizado e uma percepcao de
ter sucesso no jogo [Bjork and Holopainen 2004].
FIGURA 4: Tela Principal do Jogo Oxalá no Aiyê
Para iniciar, o jogador toca no botão jogar na tela
inicial e é levado ao mapa do jogo em que Oxalá terá
uma sequência de palmeiras para tentar matar a sua
sede, ao clicar na palmeira um da sequência do mapa,
o jogador é orientado a quebrar o casco da árvore
pelo tutorial. O puzzle para que consiga furar a
palmeira é apresentado no centro da tela assim como
outros elementos de jogo, como o número de talhas
que acertou com o sucesso do total e a quantidade de
golpes que tem disponível para aquela tentativa, no
canto superior. Há 16 desafios na primeira fase para a
experiencia do jogo.
FIGURA 05: Mapa do Jogo Oxalá no Aiyê
Quando o jogador tem sucesso em atingir com a
quantidade de golpes disponíveis as talhas
apresentadas recebe o retorno na tela na forma de
texto “desafio resolvido” associado ao som de vitória,
ainda lhe são apresentadas no canto inferior da tela as
possibilidades de repetir o desafio, seguir adiante no
mapa ou ir para o menu principal. Quando o jogador
não consegue atingir a palmeira com a quantidade de
golpes que possui, representamos a derrota com um
som de derrota e o texto na tela “sem mais
tentativas”, neste caso, no canto inferior da tela
aparecem os botões para repetir o desafio ou ir para o
menu principal.
Por fim, apos a partida acabar, com a solução da
sequência de desafios, é exibida a mensagem que
novos desafios serão disponibilizados em breve, pois
Oxalá continua com sede. Em cada desafio no mapa é
mostrado também o desempenho do jogador em até
três estrelas, assim poderá jogar novamente o desafio
tentando um desempenho melhor caso não tenha
alcançado o máximo, ou seja, resolvido o desafio
com o menor número de golpes possível.
Quando esse jogo foi publicado, percebemos com
o feedback do público, a dificuldade em entender a
lógica por trás dos desafios apresentados, nesse
sentido foram úteis sobretudo duas avaliações
recebidas em uma das lojas online onde o jogo está
publicado. Em uma segunda versão modificamos a
lógica. Na primeira versão, as talhas crescem no
sentido em que as talhas vizinhas à talha tocada
indicam um crescimento favorável. Na segunda
versão, as talhas crescem no sentido em que as talhas
tocadas indicam.
Na avaliação feita com o público do Gamepólitan
2015, percebemos que a nova mecânica favoreceu
além da curva de aprendizagem do jogo, também o
entendimento da história do jogo, uma vez que das
oito pessoas que jogaram apenas este jogo, sete
apontaram que o objetivo do jogo estava relacionado
a encontrar água – algo para beber - em uma questão
aberta sobre o objetivo do jogo. E cinco acertaram
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que Oxalá era o personagem principal, também em
um questionamento aberto sobre os personagens.
Ainda assim, este segundo jogo da série encontra-
se em processo de redesign que objetiva aplicar uma
mecânica mais próxima dos outros dois jogos da
série, que possuem mecânica que resultam em uma
experiência de jogo mais dinâmica e menos reflexiva
como acontece com esta segunda versão do jogo
Oxalá no Aiyê.
No jogo Saco da Criação, a história é contada a
partir do momento em que Oduduwa assume a
criação do mundo, uma vez que Oxalá foi
enfeitiçado, bebeu vinho de palma e está
impossibilitado em continuar sua missão. Oduduwa,
determinado, faz as oferendas a Exú e utiliza todos os
elementos do saco da criação para criar com sucesso
a terra sagrada chamada Ifê.
No caso deste jogo, inserimos algumas das cenas
em formato de quadrinhos entre a sequência de mini-
games que compõem o jogo e não na primeira jogada
e no menu principal como nos dois outros jogos da
série. Neste jogo, a história está mais inserida nas
mecânicas do jogo, de forma que se mostrou não
apenas desnecessário, mas desaconselhável
disponibilizar a história em quadrinhos
separadamente no menu do jogo, uma vez que
quebraria a surpresa do jogo.
FIGURA 6: Telas do Jogo O Saco da Criação
Para iniciar o jogo, o jogador deve selecionar o
botao “jogar” no menu principal. Assim que a partida
inicia, o jogador será apresentado a uma série de
desafios que simultaneamente contam a última parte
da história da criação do mundo. Assim aparece a
cena com Oduduwa, seguido do texto explicativo:
“Oduduwa junta as correntes”. Em seguida, aparece o
desafio de unir as correntes em um tempo
determinado e seguidos a este primeiro desafio
aparecem mais seis desafios com a mesma
apresentação, cena da história com texto explicativo
seguido do desafio. Cada desafio possui mecânica
específica. No canto inferior são exibidos a
pontuação do jogador traduzida no número de
desafios ultrapassados com sucesso e o número de
tentativas que lhe restam, são três tentativas que
significam que o jogador pode não obter sucesso em
três desafios, ao falhar pela quarta vez, o jogo
terminará. A quantidade de desafios vencidas em uma
partida, ou seja, a pontuação do jogador nos permite
medir o quanto conseguimos segurar o jogador na
experiencia do jogo.
FIGURA 0: Telas do Jogo O Saco da Criação
No primeiro ciclo de desafios, a série de desafios
terá uma sequência definida para que a história seja
apresentada completamente, do segundo ciclo em
diante, os desafios aparecerão de forma aleatória e,
do terceiro ciclo em diante, cada desafio deverá ser
resolvido mais rápido assim como o nível de
dificuldade aumentará, requisitando que o jogador
resolva cada desafio em cada vez menos tempo e com
maior complexidade.
Por fim, apos a partida acabar e exibida a
pontuacao e no item placar, no menu principal, e
possível ver o recorde do jogador comparado a outros
jogadores.
Este jogo encontra-se em sua terceira versão. No
evento do Gamepólitan em que foi avaliado,
apresentamos a primeira versão deste jogo e
percebemos que, apesar da jogabilidade fazer deste
um jogo divertido – este foi o único dos quarto jogos
apresntados a ser selecionado para a amostra de jogos
da BIND (coletivo de desenvolvedores independentes
baianos) durante este mesmo evento – os resultados
da avaliação demonstraram que a história da origem
do mundo da mitologia abordada não estava sendo
transmitida de forma clara nem de forma a
proporcionar o aprendizado sobre a mesma. Nas
respostas na pergunta aberta sobre a história do jogo,
por exemplo, das onze pessoas que jogaram apenas
este jogo, apenas duas pessoas responderam próximo
ao que seria a história proposta do jogo, afirmando
ser esta “sobre o inicio da cultura Africana” e
“mostra como as coisas foram criadas”. Duas
afirmaram tratar-se de uma história sobre a cultura.
Quatro pessoas não responderam, uma pessoa
afirmou não saber qual a história, outra não entendeu
a pergunta, e um jogador disse que não se importava
com a história e sim com o jogo. Os personagens
também não foram fixados pelos jogadores, apenas
uma pessoa afirmou ser Oduduwa, personagem do
jogo.
Assim, os desafios das versões seguintes, foram
aproximar mais a história ao gameplay de forma a
não perder o bom desempenho deste último. Neste
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sentido, o jogo ganhou uma melhora significativa nos
gráficos e anteriormente a cada desafio apresentado,
foi adicionada uma imagem e uma frase
representando a etapa da história a que se referia
aquele desafio.
5. Diversão proporcionada pelos jogos e Redução do Preconceito
Para avaliação e compreensao da diversao dos
jogos Feitiço de Exú, Oxalá no Aiyê, Saco da Criação
utilizamos os conceitos do GameFlow aplicados em
um questionário de avaliação durante a exposicao
Histórias da Terra Afro-Brasileira e no evento
Gamepólitan 2015. O GameFlow e um modelo
estruturado de diversao em games em que o conceito
de fluxo ou experiencia perfeita e utilizado como
fundamento estrutural para sintetizar e organizar as
heuristicas da literatura de jogos em um modelo
conciso de diversao do jogador. O conceito de expe-
riencia perfeita, derivado da descricao de
experiencias qualificadas como divertidas em
diferentes atividades, consiste na combinacao de oito
elementos [Csikszentmihalyi and Csikzentmihaly
1991]:
• uma tarefa que pode ser completada;
• a habilidade deconcentrar-se na tarefa;
•a concentracao e possivel pois a tarefa tem
objetivos claros;
• a concentracao e possivel pois a tarefa prove
feedback imediato;
• a habilidade de exercitar um senso de controle
sobreasacoes;
• um envolvimento profundo, mas sem esforco,
que remove a conscientizacao das frustracoes da
vida cotidiana;
• sensacao do desaparecimento de si mesmo e um
reapareci- mento mais forte em seguida;
• e o sentido de duracao do tempo e alterada.
O GameFlow foi construido a partir da revisao da
literatura sobre usabilidade e experiencia do usuario
em games no sentido de determinar como os
elementos do fluxo (experiencia perfeita)
manifestam-se nos jogos de computador [Sweetser
and Wyeth 2005]. O modelo resultante consiste em
oito elementos centrais cujos conceitos incluem um
numero variavel de criterios que estao relacionados
aos elementos do fluxo de Csikszentmihalyi and
Csikzentmihaly [1991] e que definem a presenca ou
nao da diversao nos jogos. Os elementos do Modelo
sao: concentracao, desafio, habilidades, controles,
objetivo claro, feedback, imersao e integracao social.
Neste trabalho, usamos o GameFlow com a
aplicacao de um questionario aos jogadores no qual
tentamos obter evidencias da existencia dos
elementos do modelo de forma direta.
Para aplicar as perguntas utilizando o modelo
GameFlow nos baseamos nas perguntas apresentadas
nos trabalhos Sweetser and Wyeth [2005], Savi et al.
[2010], Sweetser et al. [2012]. A Figura 09 apresenta
as perguntas formuladas e as respostas obtidas.
Podemos notar que para todas as perguntam
obtiveram um maior numero de respostas positivas
do que negativas. Assim, pelo modelo Game-Flow
tivemos exito em implementar a diversao nos jogos
culturais analisados neste artigo.
FIGURA 09: Gráfico de Barras Respostas do
Questionário de Avaliação
No questionário, cada sujeito respondia sobre a
sua percepção da cultura afro-brasileira em três
perguntas após o jogo: Se aprendeu sobre a cultura
afro-brasileira, se gostaria de conhecer mais a
respeito e se a percepção sobre essa cultura melhou,
piorou ou permaneceu a mesma após jogar. Dos 52
jogadores que responderam ao questionário. 22
pessoas respondam que a percepção melhorou, 28
afirmaram que continuou a mesma, 01 pessoa
respondeu que piorou e 01 pessoa não respondeu.
Consideramos, portanto, um resultado positivo na
utilização de jogos mitológicos para diminuição do
preconceito com relação as religiões afro-brasileiras.
6. Conclusão
O objetivo principal do projeto apresentado neste
artigo foi de promover o resgate, preservacao e
disseminacao positiva da cultura afro-brasileira entre
jovens e adolescentes, atraves da insercao do rico
conteudo da mitologia de origem na religiao do
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candomble em quarto jogos eletronicos com estetica
e jogabilidade atual que se aproxime da linguagem
deste público, vinculando tradicao, arte e tecnologia.
Partimos da hipotese de que e possivel utilizar jogos
eletronicos como ferramenta para ensinar a cultura
afro-brasileira e consequentemente reduzir o
preconceito que tem suas raízes na ignorância.
Neste artigo apresentamos o estudo sistematizado
dos elementos dos jogos eletronicos em questao -
historia, mecanica, estetica e tecnologia - e do
alcance dos objetivos desses jogos junto ao publico-
alvo que os testaram nos eventos já citados. Atraves
da investigacao durante os dois eventos, obtivemos
um feedback estruturado e livre por parte dos
jogadores. Com essa analise pudemos perceber que
alcancamos o objetivo de desenvolver jogos
divertidos e que podem familizar o público com
conteudos da cultura afro-brasileira. Ainda tivemos
um retorno positivo dos jogadores que demonstraram
interesse por sequencias dos jogos atuais e
incrementos como novas fases e novos Orixas.
Com os nossos jogos, ao abordar os conteudos da
mitologia afro-brasileira de forma ludica e educativa,
esperamos contribuir para a ampliacao do significado
da vida e do proposito pessoal de muitos jovens e
adolescentes afrodescendentes que se encontram em
formacao em nossa sociedade. Juntamo-nos aos
esforcos das acoes pedagogicas e de difusao das
organizacoes culturais afro-brasileiras em gerar
reflexoes e praticas que contribuam para o senso
critico dos atores da educacao e da sociedade. Este
trabalho apresenta um resultado encorajador para
trabalhos futuros.
Além dos jogos descritos neste artigo e de outros
produtos mencionados, daremos continuidade à
pesquisa e ao desenvolvimento de novos produtos
culturais que abordem a mesma temática – como o
card game e board game analógicos que estão em
desenvolvimento - assim como aprofundaremos as
revisões e avaliações sistemáticas realizadas por
entidades culturais negras.
Agradecimentos
Os autores gostariam de agradecer as agencias de
fomento a ciencia, tecnologia e inovacao que
apoiaram e fizeram possivel a realizacao do projeto
Histórias da Terra : Fundacao de Amparo a Pesquisa
do Estado da Bahia (FAPESB) e a Financiadora de
Estudo e Projetos do Ministerio da Ciencia,
Tecnologia e Inovacao (Finep-MCTI), assim como ao
Ministério da Cultura que premiou a exposição do
projeto no período da Copa do Mundo do Brasil no
ano de 2014 na Galeria de Arte da Escola de Arte e
Tecnologia do Oi Kabum! À Fapesb pela bolsa do
pesquisador Victor Cayres e ao CNPq pela bolsa da
pesquisadora Tatiana Silva. E aos membros da equipe
desenvolvedora da Sinergia Games que participaram
da concepcao e desenvolvimento dos jogos tratados
neste artigo: Ricardo Cidade, Rafaella Moraes, Rud
Passos, Joao Vitor Honorato, Lucas Lisboa, Filipe
Sant’Ana, Rafael Rocha, Raffaella Costa, Tulio
Duarte, Ramon Santos e Eric Casar.
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