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Id. em Dest., Rio de Janeiro, n. 18, p. 96, maio/ago. 2005 Id. em Dest., Rio de Janeiro, n. 19, p. 01-104, set./dez. 2005

Ideias Em Destaque Incaer 19

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Id. em Dest., Rio de Janeiro, n. 18, p. 96, maio/ago. 2005Id. em Dest., Rio de Janeiro, n. 19, p. 01-104, set./dez. 2005

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Edição

Divisão de Estudos e Pesquisa

Editor Responsável

Manuel Cambeses Júnior

Projeto Gráfico

Mauro Bomfim Espíndola

Wânia Branco Viana

Jailson Carlos Fernandes Alvim

Abdias Barreto da Silva Neto

Revisão de Textos

Dirce Silva Brízida

Ficha Catalográfica elaborada pelaBiblioteca do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica

Idéias em Destaque / Instituto Histórico-Cultural daAeronáutica. – n.1, 1989 –

v. – Quadrimestral.

Editada pela Vice-Direção do INCAER até 2000.Irregular: 1991–2004.

1. Aeronáutica – Periódico (Brasil). I. Instituto Histó-rico-Cultural da Aeronáutica. II. INCAER.

CDU 354.73 (05) (81)

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É com muita satisfação que oferecemos aos nossos prezadosleitores a edição de número 19 da revista Idéias em Destaque, rela-tiva ao terceiro quadrimestre de 2005.

Nesta edição, apresentamos nove instigantes artigos, versandosobre variados temas que, pela alta qualidade e variedade dos assun-tos abordados, enriquecem os nossos conhecimentos e tornam a re-vista bastante atraente ao leitor.

Desta maneira, acreditamos estar contribuindo, de forma ativae fecunda, para a difusão da História da Aeronáutica brasileira, detemas estratégicos, de Geopolítica e, acima de tudo, de cultura geral.

Somos imensamente gratos aos prestimosos e contumazes co-laboradores que nos enviaram achegas, concorrendo, desta forma,para o aprimoramento e a consolidação desta publicação, no seio daprestigiosa Família Aeronáutica.

Faz-se mister ressaltar que estamos receptivos àqueles quedesejarem colaborar com a nossa revista, enviando artigos de inte-resse de nosso público-alvo.

Aproveito o ensejo para desejar aos nossos leitores um AnoNovo repleto de alegrias, saúde e continuadas realizações.

Tenente-Brigadeiro-do-Ar Ref. Octávio Júlio Moreira LimaDiretor do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica

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1. A Tese da Internacionalização da Amazônia ............................7Carlos de Meira Mattos

2. Globalização e Competência Empresarial ..................................14Antonio Celente Videira

3. Ideais Republicanos ..............................................................25Luiz Paulo Macedo Carvalho

4. Julio Cezar Ribeiro de Souza, o Brasileiro Inventor do Dirigível ..38Luís Carlos Bassalo Crispino

5. O Papel das FFAA na Sociedade Brasileira ...............................64Sérgio Xavier Ferolla

6. O Sonho de Voar ..................................................................73Pasqual Antonio Mendonça

7. Pioneiros da Navegação Aérea ............................................76Jorge M. Brochado de Miranda

8. Pode o Artista ser Antiético? ................................................88Araken Hipólito da Costa

9. Variações em torno do Tema “Globalização” ............................90Manuel Cambeses Júnior

Nº 19set./dez. 2005

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Carlos de Meira Mattos

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É antiga a idéia da internacionalização da Amazônia. De tem-pos em tempos, ela volta ao palco, trazida por novos ventos, revestidaem teses pseudocientíficas ou sócio-humanitaristas usadas para ocultaro seu verdadeiro objetivo político ou econômico.

No começo, era apenas a curiosidade pelo ineditismo do cenáriogigantesco descrito pelos primeiros exploradores: o imenso “Mar Dul-ce” da carta do navegante espanhol Vicente Pinzon a El Rei: a “terrada canela e o El Dorado”, ambos procurados pela expedição deOrellana e Gonzalo Pizarro, irmão do conquistador do Peru; a lendafantasiosa “das índias guerreiras amazônicas”, espalhadas na Europapelos escritos de Frei Carbajal, descrevendo-as como “alvas e bran-cas, usando cabelo comprido entrançado e enrolado na cabeça,pernas e braços bastante desenvolvidos, andam nuas em pêlo dis-simulando seu sexo, com seus arcos e flechas nas mãos, fazendotanta guerra como dez homens”. Estas notícias e lendas povoaram oimaginário de aventureiros europeus durante o século XVI.

Em seguida, veio a curiosidade de famosos cientistas e natura-listas, europeus e norte-americanos, diante da magnitude do cenárioflorestal e hidrográfico que deparavam na Amazônia.

Nos séculos XVII e XVIII, vieram conhecê-la e estudá-la,renomados cientistas e naturalistas da Europa e dos Estados Unidos.Ali estiveram La Condamine, Von Martius, D’Orbigny, Goeldi, Agassiz,Humboldt (criador da denominação Hiléia); nos primeiros anos doséculo XX, Theodor Roosevelt. Seus relatórios e seus estudos cha-maram a atenção internacional para a Amazônia.

Passada a fase de admiração científica pela sua colossal ima-gem geográfica, vieram as ambições e a cobiça.

Vamos lembrar apenas algumas das muitas investidas mais re-motas à nossa soberania amazônica.

Nos velhos tempos do Império de D. Pedro II, no ano de 1850,sofremos as tentativas do Comandante Matthew Maury, Chefe do

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Observatório Naval de Washington, defendendo a tese da livre nave-gação internacional do Rio Amazonas, considerando que pelo seuvolume de águas deveria ser incorporado ao mesmo status do DireitoMarítimo. O Governo norte-americano autorizou o envio de umacanhoneira para explorar o rio a qual, desrespeitando os nossos direi-tos soberanos, penetrou na grande caudal e navegou até Iquitos, noPeru. Esta violação de nosso território exigiu enorme esforço diplo-mático do então Embaixador em Washington, Sergio Teixeira deMacedo, para neutralizar a difundida propaganda internacionalistadisseminada por Maury e conseguir uma satisfação do Governo nor-te-americano.

Em 1948, vimos aprovada pela UNESCO – organismo da ONU– a criação do Instituto Internacional da Hiléia Amazônica, segundoo qual uma autoridade internacional passaria a administrar as pesqui-sas científicas e o desenvolvimento da região. Esta interferência nosnossos direitos soberanos, já aprovada ingenuamente por nossos re-presentantes na UNESCO, só foi evitada pela rejeição do referidoInstituto pelo nosso Parlamento, baseado num parecer do então Esta-do-Maior Geral e na campanha veemente de protesto do SenadorArthur Bernardes.

A partir dos anos oitenta do século passado vem crescendo apropaganda e as pressões de interferência na nossa Amazônia. Ashostes internacionalistas, hoje, concentram sua ação através das Or-ganizações Não Governamentais (ONG).

As ONG são associações civis, internacionais ou nacionais, queproclamam fins humanitários ou científicos, tais como direitos huma-nos, defesa ambiental, combate às desigualdades sociais, preservaçãode comunidades indígenas, combate a atividades belicistas e outros.

O articulista Sorman, do jornal francês “Le Monde” (25 de abrilde 2001) calculava em 32.000 o número de ONG espalhadas pelomundo. Comenta o jornalista: “Ninguém fiscaliza suas fontes definanciamento, ninguém verifica a autenticidade da boa causa aque se propõem, ninguém controla suas despesas. Na sua quasetotalidade estão subordinadas a assembléias fantasmas (de per-sonalidades honradas), mas administradas efetivamente por mi-norias vinculadas a outros interesses”.

A tese central das ONG internacionais que atuam no norte doBrasil sintetiza-se na expressão “Amazônia patrimônio da Huma-

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nidade”. Alegam que se trata de uma imensa região de naturezatropical, cuja floresta deve ser preservada visando à sobrevivênciada Humanidade, e justificam sua tese acusando os estados nacio-nais, principalmente o Brasil, de responsáveis pela destruição danatureza amazônica e de serem incapazes de conter o desmatamentoda floresta, a poluição ambiental e a natureza primitiva do gentio.Inúmeras ONG européias e norte-americanas, baseadas na alega-ção da incapacidade de o Brasil preservar a natureza amazônica,lutam para que se estabeleça para a nossa Amazônia o status de“território do interesse da Humanidade”, e, como tal, que umorganismo supranacional, com autoridade decisória, passe a partici-par de sua administração. As ONG já envolveram a ONU, aUNESCO e entidades financeiras internacionais na tese de apoio àcriação de uma entidade supranacional para preservar a FlorestaAmazônica.

Inúmeras ONG pressionam as instituições financeiras mundiaisno sentido da implantação de uma autoridade supranacional na Ama-zônia e, com este objetivo, estas aprovam ou desaprovam pedidos deempréstimo, igualmente mantêm e financiam várias agências que seapresentam, na região, como ambientalistas, antropológicas, natura-listas, indigenistas, pacifistas, de direitos humanos.

Destacam-se entre as ONG atuantes na Amazônia: a inglesa“Survival International!”, também conhecida como “Casa deWindsor” (dada a sua estreita ligação com a coroa inglesa), cujainfiltração na região data dos anos 60; a “ European Working Groupon Amazon (EWGA)”, o Conselho Mundial de Igrejas, reunindo Igrejasprotestantes da Europa e dos Estados Unidos; a União Internacionalpara a Conservação da Natureza (UICN); e o Conselho IndigenistaMissionário(CIMI), sediado na Suíça.

As acima citadas ONG internacionais e outras irradiam no Bra-sil, e em particular na Amazônia, uma rede de dezenas de agênciasque buscam criar na população local e nos indígenas umaconscientização da necessidade de internacionalizar a região. Entreas ONG nacionais mais presentes na Amazônia destacam-se o Con-selho Indigenista de Roraima (CIR), controlado pela Comissão Pas-toral da Terra; a Associação dos Povos Indígenas de Roraima (APIR);e a Associação Regional Indígena dos Rios Kinô, Cotongo e MonteRoraima (ARIKOM). A Sociedade de Defesa dos Índios Unidos do

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Norte do Estado de Roraima (SODIURR) defende a convivênciapacífica e comunitária entre índios e não índios.

Duas teses se confrontam em torno da questão indígena:Integração versus Confinamento. A política tradicional brasileira éda integração à sociedade nacional, idealizada e realizada pelo nossomaior indigenista, o General Rondon.

A partir dos anos 60, Organizações internacionais do PrimeiroMundo e entidades cristãs sediadas na Europa e nos Estados Unidos,mantenedoras de inúmeras Missões Religiosas na Amazônia, abri-ram a luta a favor da internacionalização da Hiléia e do confinamentodas tribos de gentios, visando preservar os hábitos e costumes primi-tivos. Vários líderes políticos europeus têm-se pronunciado, em cará-ter particular, a favor da tese de internacionalização da Amazônia,entre os quais citaremos o ex-Presidente da França, FrançoisMiterrand, que declarou em 1991: “o Brasil precisa aceitar a sobe-rania relativa sobre a Amazônia”.

As ONG internacionalistas escolheram para tema de sua pene-tração a questão indígena e, para área principal de operações, o ter-ritório norte do Estado de Roraima, contíguo às nossas fronteiras coma Venezuela e a República da Guiana. Eles escolheram uma regiãovulnerável pela distância dos grandes centros, pelo seu despovoa-mento, e pela sua contigüidade com um espaço tri-fronteiriço (Brasil-Venezuela-República da Guiana). Tanto a constância de sua açãoquanto o apoio de ONG internacionais nas pressões ao Governo bra-sileiro já lhes asseguraram duas vitórias: a demarcação das reservasindígenas de Ianomâmi, superfície de 96.649 km2 (equivalente à doEstado de Santa Catarina) para uma população de cerca de 9.000índios; e a demarcação das reservas dos índios de Raposa Terra doSOL, superfície de 17.430 km2 (metade do território do Estado doRio de Janeiro) para uma população de 15.000 índios. A soma dasuperfície destas duas reservas esteriliza para a ocupação e econo-mia cerca de 50% do território do Estado de Roraima.

A propaganda das idéias de internacionalização, lançada naEuropa e nos Estados Unidos pelas ONG transnacionais vem con-quistando um número crescente de adeptos no exterior e mesmono nosso País, particularmente entre as organizações que delasrecebem financiamento, e brasileiros que delas dependem por seuemprego.

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Qual tem sido a atitude do Governo brasileiro em face dasinvestidas internacionalistas? Algumas vezes cega, outras vezes dú-bia, cedente e, em parte, vacilante.

A Assembléia Constituinte de 1988, pressionada pelas ONG,colocou na Constituição vigente, conceitos de interpretação duvidosasobre “terras tradicionais dos índios”. Baseado em critériointerpretativo duvidoso, o Executivo homologou, com decretos e por-tarias, as reivindicações sobre reservas indígenas, totalizando 1/10 doterritório nacional, para uso privilegiado de cerca de 700 mil índios,entre tribais e semitribais, divididos em 215 etnias, com 180 línguas edialetos (IBGE).

Buscando responder às críticas internacionais acusatórias deineficácia na preservação do meio ambiente e na contenção da des-truição da floresta tropical, o Governo Sarney, em 1988, lançou oPrograma Nossa Natureza, estabelecendo a Política de Desenvolvi-mento Sustentado.

Visando executar o Programa Nossa Natureza foi criado oIBAMA, que vinha obtendo resultados favoráveis no combate aodesmatamento, mas que, ultimamente, tem perdido eficiência por fal-ta de recursos financeiros.

O Projeto Calha Norte, instituído em 1985, tendo por objetivopovoamento, atendimento social e incentivo econômico na larga faixade nossa fronteira norte com cinco países (Guiana Francesa, Suriname,República da Guiana, Venezuela e Colômbia), operação conjunta deMinistérios civis e militares, vem se arrastando por falta de verba ede interesse dos Ministérios civis. Somente os Comandos Militaresvêm realizando sua parte. Ultimamente, o Governo tem procuradoreanimar o andamento desse Projeto.

Vários outros órgãos governamentais atuam na área amazôni-ca, entre os quais o Ministério do Meio Ambiente e a FUNAI, quesubstituiu o antigo Serviço de Proteção ao Índio.

A tese mais presente, hoje, é a da “Amazônia patrimônio daHumanidade”, devendo ser administrada por autoridade internacio-nal, única capaz de garantir a sobrevivência futura de vida no Plane-ta. Oferecem, aos países donos do território amazônico, o consolo deuma soberania partilhada.

A propaganda e as pressões internacionais a favor desta absur-da tese de internacionalização vêm revestidas das falácias

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pseudocientíficas: Amazônia, pulmão do mundo; queimadas da flo-resta são as principais responsáveis pela emissão de dióxido de car-bono e pelo conseqüente envenenamento da atmosfera (duas acusa-ções já cientificamente destruídas); Amazônia, último espaço de na-tureza e vida selvagem a ser preservada (preferida dos antropólogos,ambientalistas e indigenistas).

Os principais propagandistas e ativistas dessa tese são organi-zações internacionais não governamentais (ONG) dos países ricosda Europa e dos Estados Unidos, presentes e atuantes na Amazôniabrasileira, através de suas agências e de missões religiosas, dispondode dinheiro farto e envolvendo a participação de brasileiros.

A última manifestação dos ativistas da soberania partilhada paraa Amazônia nos veio do francês M. Pascoal Lamy, ex-Comissário deComércio da União Européia e candidato de seu país a Diretor-Geralda Organização Mundial do Comércio (OMG).

Defendendo o conceito de Governança Global, em conferênciarecente realizada em Genebra, perante diplomatas e funcionários deorganizações internacionais, o Sr. Pascoal Lamy afirmou: “as florestastropicais, como um todo, devem ser submetidas à gestão coletiva,ou seja, gestão compartilhada com a comunidade internacional”.

Segundo a proposta do Sr. Lamy, em fórum internacional, nossaFloresta Amazônica deve passar a ser administrada por uma autori-dade internacional a ser criada.ss

Sobre este pronunciamento do Sr. Lamy, o nosso Ministro deRelações Exteriores, Celso Amorim, apresentou imediato e veemen-te protesto nos seguintes termos: “As declarações do Sr. Lamy re-velam uma visão preconceituosa, que subestima a capacidadedos países em desenvolvimento em gerenciar, de forma soberanae sustentável, os seus recursos naturais. Tais declarações sãoincompatíveis com o cargo de Diretor-Geral da OrganizaçãoMundial do Trabalho (OMC) ao qual o Sr. Lamy aspira”.

Não há duvida de que perigos rondam a nossa integridadeterritorial, na Região Amazônica.

Cabe ao Estado brasileiro demonstrar forte e inabalável deci-são de não aceitar a violação de seus direitos soberanos, conquista-dos duramente através de cinco séculos, por portugueses e brasilei-ros. Não há de ser a nossa geração que, por incapacidade de lutar, irápermitir a lesão de nossa soberania em parte do território nacional.

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Carlos de Meira Mattos

Nossa política de defesa contra as pretensões internacionalistasna nossa Amazônia, a nosso ver, deve-se basear nos seguintes itensprincipais:

– Demonstrar vontade nacional inabalável de preservar intocávelnossa soberania territorial (para isto mobilizar a consciência das eli-tes e do povo);

– Possuir uma Diplomacia superativa e vigilante, capaz de refu-tar veementemente, de imediato, qualquer insinuação ou projetointernacionalista envolvendo o Brasil, surja onde surgir, em qualquerpaís, ou entidade internacional;

– Estreitar nossas relações com os países nossos vizinhos ama-zônicos, buscando integrá-los na missão de defesa contra a campa-nha de internacionalização da área. Incentivar os projetos de povoa-mento e de desenvolvimento sustentado da Amazônia Norte e Oeste;

– Administrar eficazmente a proteção da floresta e a preserva-ção do meio ambiente (sem prejuízo da valorização política, econômi-ca e social da região e de seus habitantes);

– Manter na região um dispositivo militar de defesa, especi-alizado em guerra na selva, que por seu efetivo, armamento moderno,equipamento e adestramento, represente uma força de dissuasãoconvincente, capaz de desencorajar aqueles que projetarem uma con-quista fácil.

Este o grande desafio diante dos brasileiros desta geração. Sa-beremos respondê-lo?

Cai sobre nossos ombros preservar a integridade de nosso ter-ritório ameaçado, missão que as gerações que nos antecederam sou-beram fazer, com habilidade diplomática, intrepidez e mesmo comsangue, quando necessário.

O autor é General-de-Divisão Reformado do Exército, veterano da Segun-da Guerra Mundial, Doutor em Ciência Política e Conselheiro da EscolaSuperior de Guerra.

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Antonio Celente Videira

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1 – O Fenômeno da GlobalizaçãoEstamos vivendo um momento ímpar da História humana. A

globalização é o processo que busca a abertura dos mercados, dei-xando vulnerável aquelas nações cujas corporações não têm comoresponder, com suas competências, os desafios dos negócios inter-nacionais.

A globalização é um fenômeno que causa impacto nos váriossegmentos da sociedade: político, econômico, cultural, religioso, cien-tífico e tecnológico, militar e outros mais.

Para que se tenha idéia, no momento em que a televisão mos-trava a recondução de George W. Bush à presidência dos EstadosUnidos por mais quatro anos, no ano passado, líderes políticos, analis-tas econômicos e sociólogos de todo mundo, perplexos, faziam suasprevisões sobre a sucessão presidencial, a milhares de quilômetros,afirmando que tal reeleição, não esperada, poderia causar um impac-to em seus ambientes regionais. Essa sociedade reticular, agora pre-ocupada com as incertezas que adviriam das reações em cadeia, emtodos os segmentos, passa a projetar contra-medidas saneadoras parapossíveis crises.

Na realidade, o que está ocorrendo não é algo de novo. AMacedônia, assim como Roma, tentaram globalizar suas políticas naAntigüidade. Portugal, Espanha, França e Inglaterra também aplica-ram medidas de domínio do comércio na Idade Moderna e na IdadeContemporânea. Outros “Bushes”, como Alexandre, César, Pombal,Napoleão e Elizabete I surgiram no passado.

Mas agora o cenário é outro. O mundo tornou-se pequeno. Nãose medem mais as distâncias em quilômetros ou milhas, mas em mi-nutos, horas e dias. É a revolução dos transportes, com suas máqui-nas espetaculares, transportando maior contingente de pessoas, emmenor espaço de tempo, de um lugar para outro, provocando aglome-rados urbanos ou vazios interioranos.

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Antonio Celente Videira

Caravanas de mercadores que gastavam elevado tempo parapercorrer pequenas distâncias, a fim de implementar o comércio en-tre regiões, agora se deslocam em tempo recorde e são substituídaspor consultorias que se adaptam ao espaço empresarial, simulam ce-nários de longas distâncias, em áreas com públicos alvos, prováveisconsumidores daquilo que se produz em outro hemisfério.

A informação tresloucada, utilizando-se dos mais diversos ca-nais, segundo o Doutor em Geografia Milton Santos (2001), é empre-gada, principalmente, por um punhado de atores em função de seusobjetivos particulares. Continua o saudoso geógrafo dizendo que astécnicas da informação são apropriadas por alguns estados e empre-sas, aprofundando assim os processos de desigualdade.

A manipulação da informação é de tal ordem que nunca tantosficaram desinformados por tão poucos que, maldosamente, deturpamos fatos reais.

Toda essa desordem é agente influenciador de um mercadodesigual, impingindo gestores a perceberem prováveis disfunções pro-dutivas, em ambientes de aparências normais, nos seus resultadosfinais de produção.

Portanto, com o declínio das estruturas formais, tais como ocomponente organizacional dominante, os gerentes dependem maisda capacidade de criar e gerenciar processos, como meio de conferirflexibilidade às operações cotidianas. (Ghoshal, Batlett, 1997).

Esse é o desafio, o obstáculo, enfim, o óbice com que o mundoempresarial terá que conviver, diante das novas forças que já estãoregulando o empreendedorismo deste milênio que se inicia. FrançoisMiterrand já frisava, em abril de 1988, em sua famosa carta a todosos franceses (citado em Mittelard, 1993): “consideremos a econo-mia mundial autêntico campo de batalha, na qual as empresasenfrentam-se em uma guerra sem trégua. Não existem prisionei-ros. Quem cai morre”.

Eis aí a nova ordem mundial econômica. Quem não perce-ber poderá ficar para trás e sucumbir. Aquele que tem olhospara ver dispõe de todo potencial capaz de enfrentar, não umacrise planetária, mas uma outra realidade que outrora inexistia.Se houver disposição em se manter sistemas de controles admi-nistrativos, rastreadores dos ruídos nocivos provocados por umnovo certame denominado globalização, com toda a certeza, as

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Antonio Celente Videira

competências irão eclodir nas pessoas e, conseqüentemente, noseio das empresas.

2 – O “Reordenamento” EmpresarialLeo Huberman (1974), em sua História da Riqueza do Ho-

mem, faz um sumário das fases sucessivas da organização industrial,que são:

a) Sistema familiar – os membros de uma família produzemartigos para seu consumo e não para venda. O trabalho não se faziacom o objetivo de atender ao mercado. Princípio da Idade Média;

b) Sistema de corporações – produção realizada por mestresartesãos independentes, com dois ou três empregados, para o merca-do pequeno e estável. Os trabalhadores eram donos tanto da maté-ria-prima que utilizavam, como das ferramentas com que trabalha-vam. Não vendiam o trabalho, mas o produto do trabalho. Durantetoda a Idade Média;

c) Sistema doméstico – produção realizada em casa para ummercado em crescimento, pelo mestre artesão com ajudante, tal comono sistema de corporações. Com uma diferença importante: os mes-tres já não eram independentes; tinham ainda a propriedade dos ins-trumentos de trabalho, mas dependiam, para a matéria-prima, de umempreendedor, que surgira entre eles e o consumidor. Passaram aser simplesmente tarefeiros assalariados. Do século XVI ao XVIII;

d) Sistema fabril – produção para um mercado cada vez maiore oscilante realizada fora de casa, nos edifícios do empregador e sobrigorosa supervisão. Os trabalhadores perderam completamente aindependência. Não possuíam a matéria-prima, como ocorria no sis-tema de corporações, nem os instrumentos, tal como no sistema do-méstico. A habilidade deixou de ser tão importante como antes, devi-do ao maior uso da máquina. O capital tornou-se mais necessário doque nunca. Do século XIX até hoje.

A partir do sistema fabril vão surgir as primeiras fábricas. Es-sas fábricas terão seu apogeu com as idéias Tayloristas, em conseqü-ência da produção em massa.

Com o surgimento do Toyotismo e suas derivações, as fábri-cas começam a sofrer processos de metamorfose na gestão deseus processos. Prahalad e Hamel apresentam a dança dacompetitividade entre duas corporações: a GTE e a NEC. A GTE

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Antonio Celente Videira

era uma corporação bem posicionada no mercado de tecnologiada informação, no início dos anos 80, enquanto a NEC, voltadapara o mercado de semicondutores e computadores, naquele perí-odo, não apresentava o mesmo rendimento que a GTE. Todavia,oito anos após, a NEC ultrapassava a GTE em seus indicadoresde ganho. Esse novo cenário foi em conseqüência de a NEC ado-tar novas estratégias que exploravam as habilidades das pessoasem empreendimentos com características específicas, o que a pro-jetou como uma das maiores companhias em telecomunicaçõesdo mundo.

Mas Prahalad e Hamel (1990), na busca do diferencial entrecorporações, buscando sempre a competitividade, enfatizam o“Strategic Business Unit” (SBU), a “core competence” e a“strategic architecture” sobre as pessoas, a fim de que estas foca-lizem o produto como resultado final de um objetivo decisivo para semanter posição no mercado global.

Já Goshal e Batlett (1997), em seus estudos, mostram ou-tro olhar sobre corporações como a Westinghouse e a Philips,que atualmente têm dimensões globais. Ambas, na metade doséculo passado, apresentavam balanços favoráveis, com lucrospolpudos, mas que foram definhando, na medida em que suasadministrações se estagnavam. O não acompanhamento da novaonda da competitividade global levara essas empresas ao retra-imento. Trocas e sucessões de administradores gerais, com cor-te de pessoal, bem como mudanças estruturais radicais levarama Westinghouse e a Philips a retomarem suas posições no mer-cado internacional.

Análogas às corporações mencionadas, cujos tentáculos são dealcance mundial, existem outras, cujas histórias são semelhantes.Todas tiveram que se reposicionar em conseqüência dos novos ven-tos da globalização, que começaram a soprar de forma diferente ecom mais intensidade a partir dos anos oitenta.

Esse reposicionamento deve-se mais à adoção de estratégiasvoltadas às pessoas do que propriamente às novas tecnologias. Es-tas foram importantes, mas não se consolidariam como instrumentocompetitivo se as habilidades, até então adormecidas, não fossemdespertadas.

Esse argumento é o que será explorado a seguir.

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Antonio Celente Videira

3 – O Agir Setorialmente e o Pensar GlobalmenteComo podemos fazer intervenções habilidosas, localmente, pro-

duzindo rendimentos em áreas integralizadas? É possível agir emambiente restrito e obter ganhos em um espaço total? Será que umagerência de atuação em pequeno espaço pode aumentar os lucrosem ambientes amplos?

Esse é o cerne do agir setorialmente e pensar globalmente. Aíestá o que há de mais oportuno em dias de globalização, quando odiferencial competitivo realça a sobreposição de um sobre o outro.

A viabilidade desse aparente paradoxo só é factível diante dasnovas tecnologias, em especial da tecnologia da informação. Mas asinovações tecnológicas seriam inócuas se não houvesse pessoas ca-pacitadas para operá-las, mas muito mais do que isso: antever situa-ções e adequar aquelas a estas.

Isso nos leva a rebuscar o conceito de Capital Intelectual que,segundo Fernández e Ramirez, é o conjunto de elementos que sãoimprescindíveis para que a empresa possa levar a cabo sua atividadeem um entorno mutante. Esse conhecimento tem sua principal ori-gem nos recursos humanos da empresa, que são essenciais para odesenvolvimento de uma filosofia e cultura organizacional que facilitea relação da empresa com o exterior, assim como a realização deatividades inovadoras ou criativas no seio da mesma.

Essa conceituação encerra todo o axioma sobre os elementosque impregnam a criatura humana como agente promotor dos acon-tecimentos que irão incentivar a corporação a vencer desafios e a semanter, com sucesso, no jogo do empreendedorismo.

Ordem, desordem, reorganização em uma nova ordem é a par-titura da canção universal que encanta ou, mais precisamente, deixaestupefatos a todos os espectadores, cidadãos planetários de um novomilênio que se inicia. Mas a classe dos gestores das corporaçõesempresariais, inserida nesse contexto, enxerga esse momento commais atenção que as demais. Para esses gestores, a palavra de or-dem é o envolvimento diante dos desafios do rearranjo de cenários.

A passividade e a indiferença não podem estar mais inseridasna atual ordem de ambiência empresarial. O comprometimento, oempenho, a aceitação dos riscos associados às competências e osaber-fazer são aspectos imperativos que devem estar imanentes naalma do gestor.

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Antonio Celente Videira

Le Boterf (2003) alerta que o profissional tem que saber en-frentar a vulnerabilidade e a fragilidade. A fiabilidade ou a qualidadedepende fortemente das competências do profissional, de sua capa-cidade de operacionalizar objetivos e de sua faculdade de antecipa-ção e de reação.

Esse envolvimento não pode ficar somente no nível da alta ad-ministração. Os funcionários da linha de frente são essenciais paraque o sucesso se estabeleça e, assim, a competência empresarialecloda.

Mas a participação do trabalhador do chão de fábrica, no enre-do do comprometimento, só é possível mediante a cristalização dacultura da igualdade humana. Neste particular, vamos nos ancorarem Goshal e Bartlett (1997) que, na obra A Organização Individu-alizada, se utiliza, como exemplo, da administração da Kao Company,fundada em 1890, portanto no final do século XIX, voltada para aprodução de sabões, mas que, depois dos anos 70 do século passado,se ampliou para detergente e cosméticos, abatendo seus concorren-tes nacionais e internacionais, como a Unilever e a Procter&Gamble,adotando como estratégia a cumplicidade de todo seu quadro de fun-cionários, na busca da eficiência de seus produtos e na contínua re-novação dos processos gerenciais.

Isso só foi possível graças à contratação do Dr. Yoshiro Maruta,que trouxe consigo a abordagem gerencial, que refletia o seu profun-do envolvimento com a Filosofia Budista. Em conseqüência disso,Maruta disseminou no seio da Kao o profundo respeito pelas pesso-as, assegurando, desta forma, voz ativa aos empregados e ajudando-os a desenvolver todo o seu potencial. É interessante mencionar quea 3M também adotou esse sistema de crenças fundamentais, apósum período de decrepitude, soerguendo-se em seus negócios, até senivelar, de novo, no mercado global da produção de abrasivos e simi-lares.

Essa visão da fragmentação gerencial com vistas à ampliaçãoda atitude mental para uma administração em nível de excelência, naempresa, não é fenômeno atual.

Nos anos sessenta, quando as primeiras vozes contra o impactoambiental, provocado por uma mentalidade em que o lucro imediato ea obsolescência industrial eram a palavra de ordem doempreendedorismo, o professor E. F. Schumacher, em sua obra

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O Negócio é Ser Pequeno, tornou-se um arauto das idéias daeconomia de pequena escala, buscando resultados globais emprol de todos. Em última instância, Schumacher visava ao bem-co-mum, tão difundido na Filosofia Budista, e que hoje se consagra comoum novo paradigma nas organizações, para a condução das pessoasenvolvidas na produtividade.

Na verdade, essa postura vai desencadear o pensar em rede,quando a horizontalidade das conexões propiciará a democratizaçãoda informação. Assim, o compartilhamento de todos, desde a altaadministração até à linha de frente, cria uma interdependência inte-grada, cujos resultados serão sempre promissores, já que o“feedback”, com a realimentação das informações, tornam-seinsumos para a constante evolução do produto ou serviço final.

Por oportuno, Goshal e Batlett (1997), na linha daoperacionalidade local à projeção de estratégias globais, enfatizam odesenvolvimento das competências pessoais, procurando preservaresse potencial e capturando pessoas qualificadas, motivadas e inteli-gentes para se incorporarem ao time da empresa, tornando assim aorganização uma universidade na acepção da palavra. Essa novapostura da empresa só é possível mediante a formação de “consul-tores em forma de T”, pessoas que complementam a sua ampla pers-pectiva generalista com uma profunda “estaca”, num setor específi-co ou numa competência funcional. É o talento especializado por ex-celência, mas de olho na “holisticidade” das conexões, que trazemas melhores oportunidades de negócio.

Essa é a postura da corporação que age setorialmente e pensaglobalmente, uma vez que se consagra inoculada com o antivírus dasmudanças repentinas, e está apta a viver os tempos das transforma-ções drásticas que podem ser provocadas desde o lançamento de umproduto concorrente, passando pela recondução de um presidentecom personalidade estereotipada, de uma nação-potência, diante deum atentado terrorista.

4 – A Inserção da Empresa Brasileira no Mercado GlobalAs Professoras Dinorá Eliete Floriani e Luciana Barcelos,

ambas da Universidade do Vale do Itajaí, em artigo publicado narevista Tecnologística, nº 98, de janeiro de 2004, dizem que acompetitividade no mercado globalizado é algo que, há pouco

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tempo, atingia apenas empresas multinacionais e aquelas que tra-balhavam com o mercado externo, através de compra e vendade matérias-primas ou de alguns produtos manufaturados, quechegavam a atingir um preço muito acima do praticado no mer-cado interno. Concluem afirmando que, na medida em que fo-ram sendo oferecidas facilidades e possibilidades de comérciointernacional, aumentou a competição entre produtos nacionaise importados.

A análise dessas duas profissionais de comércio exterior indicaque a competência empresarial é algo que nossas empresas não de-vem desprezar se quiserem se estabelecer no cenário mundial comseus produtos.

Os últimos indicadores e diagnósticos têm mostrado que o Bra-sil vem crescendo. Alguns óbices são estampados nos meios de co-municação. O mais enfatizado é a ausência de infra-estrutura ade-quada. Todavia, pouco se fala em recursos humanos ou falta de sen-sibilidade para com a gestão de pessoas.

Aí está o âmago da nossa falta de competitividade. Em reporta-gem de O Globo, em seu caderno de economia, de 14 de outubro de2004, foi publicado que o Brasil caiu da 54ª para a 57ª posição no“ranking” mundial de competitividade. Elaborado a partir de dadosestatísticos e de uma pesquisa qualitativa junto a líderes empresariais,o Fórum Econômico Mundial fez mais de 8.700 entrevistas. O“ranking” coloca a Finlândia como líder, seguida pelos Estados Uni-dos, Suécia e Taiwan. Classificado em 22ª lugar, o Chile foi o melhor,entre os países da América Latina.

As variáveis medidas pelo Fórum foram ambientemacroeconômico (influenciado por juros e inflação alta), tecnologia,confiabilidade das instituições públicas, burocracia, dificuldade deacesso ao capital, infra-estrutura e corrupção. Essas variáveis são oresultado de uma boa ou má gestão de pessoas, sendo a competitividadeancorada nelas.

Em análise, o consultor australiano Ken O’Donnell, em sua obraEndoquality (1997), informa que em torno de 85% micro e peque-nas empresas no Brasil não passam do seu primeiro ano, porque nãose prepararam para crescer ou deram um passo maior que a perna.Em outra estatística, Ken O’Donnell alerta que 80% das empresasde porte médio no Brasil são empresas familiares com duração mé-

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dia de 30 anos, devido ao fato de nascerem, crescerem e morreremcom seus fundadores.

Esse estado de vulnerabilidade da empresa brasileira está muitorelacionado ao nível de educação da população economicamente ati-va, nicho de onde saem pessoas com suas “expertises” e que pode-rão fazer o diferencial nas competências.

Infelizmente, o número médio de anos de estudo da populaçãoeconomicamente ativa brasileira é de apenas 3,5 anos. Nos TigresAsiáticos, quase 10 anos, no Japão 11, nos Estados Unidos 12 (Pastore,1997).

Como se vê, o nível de conhecimento formal da nossa força detrabalho é baixíssimo, e isso é o diferencial contra nós no mercadoglobal. É fundamental ampliar, portanto, esse período médio de estu-do, bem como melhorar a sua qualidade, com vistas à elevação donível de capacidade.

Nessa posição de país em desenvolvimento, o Brasil, mais doque nunca, precisa de gestores competentes para difundir, junto àlinha de frente, em qualquer que seja o ramo – agronegócio, indústria,comércio etc. – os sistemas integrados de produção, nas empresasou negócios, tanto micro, pequeno, médio ou macro, que proporcio-nem a criação de equipes que se auto-regulem para desenvolver umaeficácia coletiva.

As competências de uma empresa ou de uma de suas unidadesnão equivalem à soma das competências de seus membros. Nessaárea, o valor do Capital Intelectual depende, não tanto de seus ele-mentos constitutivos, mas da qualidade da combinação ou da articu-lação entre esses elementos. A competência coletiva é uma resultan-te que emerge a partir da cooperação e da sinergia existente entre ascompetências individuais (Le Boterf, 2003).

O gestor de pessoas da empresa brasileira deve perceber que acada dia que passa, apesar da conturbação existente no mundo polí-tico e social, com reflexos no comportamento da criatura humana,levando-a às guerras, às vezes fratricidas, o mundo empresarial tomaa direção da unidade, da cooperação e da sinergia. Essa postura visa,unicamente, à competência organizacional. Mas o termo “unicamente”não tem o sentido pejorativo de “simplesmente”, porém se reveste daprimazia de levar essa mesma criatura humana a se coletivizar, noâmbito da sua organização, numa primeira instância, a fim de adquirir

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a “competência organizacional”, e, depois, num segundo patamar,dota-la, de forma imanente, do sentimento da importância do trabalhocooperativo e integrado para a conquista do sucesso no mundo em-presarial, que é o mesmo mundo político e social.

A confiança na humanização do “homem-gestor”, a partir deuma mensagem que trilha por cooperação, socialização, cooptação,quer numa linha de produção quer na elaboração de um projeto, oumesmo, quer na definição de uma estratégia de lançamento de umproduto é o que deve ser considerado pela comunidade de gerentesbrasileiros que estão à frente de projetos, principalmente àqueles com-prometidos com exportações de produtos nacionais. Essa nova ma-neira de proceder tem que se irradiar, pois só assim se vai estabele-cer um relacionamento profissional em que todos saem ganhando e,com isso, ações mútuas e integradas vão preencher o quadro de fun-cionários da organização para se projetar na sociedade mundial.

5 – ConclusãoNessas considerações finais, não podemos perder de vista que

a inserção no processo global depende de posturas dinâmicas e con-tínuas, pois o novo pode, em pouco tempo, tornar-se retrógrado. Osucesso de uma marca, ou a adoção de uma estratégia inédita quetraz frutos para a empresa, da noite para o dia, transformam-se emalgo ultrapassado.

Segundo Peter Drucker, em Administrando em Tempos deGrandes Mudanças (1995), os insucessos devem ser vistos comoindicações iniciais de mudanças no mercado ou do enfraquecimentodas competências da empresa.

O homem-gestor dos tempos de globalização tem que se com-portar como o piloto de uma aeronave. Mesmo em vôo de cruzeiro,sem qualquer turbulência, deve estar fazendo o cheque cruzado dosinstrumentos, analisando os indicadores mostrados pelos ponteiros.Da mesma forma, os resultados da empresa, em relação às demais,nacionais e internacionais, devem fazer parte de seus diagnósticos eanálises.

Enfim, toda essa pró-atividade só terá resultados favoráveismediante o envolvimento de pessoas talentosas e habilidosas.

Voltando a Peter Drucker, vamos nos ater a seu livro Conceitode Corporação, publicado em 1946, e que já redefinia, na virada da

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metade do século XX, que os funcionários de uma empresa devemser considerados como um recurso ao invés de um custo.

Portanto, as posturas da empresa bem-sucedida, na era daglobalização, são: alerta sobre os rumores do mercado e procura depessoas qualificadas.

Se o gestor do Terceiro Milênio ancorar-se nesse binômio, serásempre um vitorioso, pois a sua corporação marcará presença efeti-va no certame da economia global, propósito abordado neste artigo.

O autor é Coronel-Intendente R1 da Aeronáutica, membro do Corpo Perma-nente da Escola Superior de Guerra e mestrando em Administração – comfoco em Logística Empresarial – da Universidade Estácio de Sá.

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Há precisamente 115 anos, na sexta-feira, 15 de novembro de1889, o Brasil renascia adotando o regime republicano. Materializa-vam-se, assim, idéias que inspiraram, no íntimo, o Patriarca da In-dependência – José Bonifácio. A República, sonho de numerososidealistas desde os primórdios da formação da nacionalidade brasi-leira, buscava um modelo político garantia de liberdade, igualdade eparticipação.

O próprio Imperador Pedro II, em alusão ao advento da Repú-blica, mais tarde, confessaria: “Pela evolução, sempre a quis; seriaa prova de desenvolvimento, sobretudo moral, do meu queridoBrasil”.1

A imprensa da época foi unânime em divulgar haver sido o Exér-cito quem operou esta magna transformação e que o povo“bestializado”, no dizer de Aristides Lobo, assistira à mudança doregime sem derramamento de sangue (exceto o vertido pelo entãoMinistro da Marinha, Barão de Ladário, ferido ao reagir à prisão). Oepisódio da Proclamação da República nada mais é do que o epílogoda peça que tinha como pano de fundo a Monarquia decadente, ecuja “ouverture” se realizara na velha Olinda, nos idos da primeiradécada do século XVIII, com a Guerra dos Mascates. Os demaisatos de um processo histórico de quase três séculos sucederam-secom a Inconfidência Mineira, a Conjuração Baiana, a Revolução Li-beral Pernambucana de 1817, a Confederação do Equador, aSetembrada, a Novembrada, a Revolução Farroupilha, a RepúblicaJuliana, a Cabanagem, a Sabinada, a Balaiada, a Revolução Praieira,a Convenção Republicana de Itu e a Abolição. Tais episódios da His-tória pátria atestam serem os ideais republicanos nutridos de há muitopelos brasileiros, antes mesmo de nossa Independência, e terem sidopagos com elevados tributos de sangue.

Tanto no Parlamento como na Imprensa, as lideranças políticase intelectuais, notadamente do novo Partido Liberal, se empolgavamcom os ideais da Revolução Francesa, com o exemplo dos EstadosUnidos e com o sentimento antiescravagista que dominava quase toda

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a sociedade brasileira. Paradoxalmente, limitados eram os pregado-res das idéias republicanas. Apenas em 3 de novembro de 1870, noRio de Janeiro, Quintino Bocaiúva lançava o Manifesto Republicano,firmado por mais de 57 signatários, fundando o Clube Republicano,sem grandes repercussões. Já em São Paulo, o movimento ganhavamais expressão. Da Convenção de Itu, realizada em 1873, surgiu oPartido Republicano, que levaria Prudente de Morais e Campos Sales,mais tarde, à presidência da República.

O ideal republicano não contribuiu de uma maneiraassinalável para esta admirável trepidação característica doperíodo que precedeu a República: carecia de prestígio neces-sário sobre as elites e as massas. Era um ideal vago, insuladonum recanto da consciência nacional, com um raio de ação mui-to reduzido. Mas é certo, também, que o sentimento republicanonão estava de modo algum generalizado na consciência das eli-tes e, muito menos, na consciência das massas, conforme revelaOliveira Vianna.

O centro de irradiação do movimento republicano localizava-seno meio estudantil, particularmente entre os alunos da Escola Militarda Praia Vermelha, movidos por um quase fanatismo pela doutrinapositivista de Augusto Comte, pregada por Benjamim Constant. Háque se salientar a razão de tais idéias medrarem no seio da mocidademilitar. Em O Exército e a Republica – Origem da IntervençãoMilitar 1850-1894, o brasilianista John Schultz aponta fonte quecontribui para a explicação desse fenômeno social – matéria publicadaem 15 de abril de 1855, no jornal O Militar (predecessor de O Sol-dado, da Tribuna Militar e da Revista do Exército Brasileiro):

Quem quer que empreenda o exame das filiações dos jo-vens que freqüentam a Escola Militar verificará que, com ra-ras exceções, eles procedem de famílias de poucos recursos ede pequena influência capaz de obter uma situação através daqual poderiam ser úteis a si próprios e a seus camaradas. Equando encontra um desses nomes mágicos de família, que for-necem políticos poderosos, estadistas profundos, felizes diplo-matas e administradores bem-sucedidos, antes de mais nadapode afirmar que o portador é bem bastardo, sobrinho pobre,ou parente remoto. Os filhos e os parentes ricos são destinadosaos cursos jurídicos.

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Constata-se, assim, o desprestígio do soldado perante as clas-ses conservadoras, defensoras da escravatura e do latifúndio e inte-ressadas apenas em garantir privilégios, denunciados e combatidospela juventude militar. Os cursos bacharelescos facilitavam o acessoà magistratura, que supria os quadros detentores do poder.

A compreensão do pensamento reinante no Exército explica assucessivas questões enfrentadas pela Monarquia cambaleante e aProclamação da República.

É consenso histórico que a fundação do Clube Militar, em 26 dejunho de 1887, e a aclamação do Marechal Deodoro para seu primei-ro presidente resultaram da Questão Militar. Da Assembléia Geralde 9 de novembro de 1889, efetuada na sede da entidade à Rua doOuvidor nº 155, emergiu a República, com apoio dos líderes civis domovimento republicano – Quintino Bocaiúva, Aristides Lobo, RuyBarbosa, Francisco Glycério, Lopes Trovão, Silva Jardim, RangelPestana e outros.

Não se pode esquecer também que a Guerra da Tríplice Alian-ça fez o Exército adquirir autoconsciência, repensando o seu papelcomo instituição nacional permanente, suas responsabilidades e suainserção na sociedade.

Diz a Professora Leila Capella2, que, em verdade, “bestializado”deve ter ficado um outro grupo de republicanos, ligado à cafeiculturade exportação. Embora desejassem a República por significar fede-ralismo, viam com desconfiança os militares, o que forçou o Exércitoa assumir a liderança do processo republicano.

A Proclamação da República, fundamentada em raízes históri-cas, não merece jamais ser rotulada de quartelada. Na realidade,verificou-se mudança profunda das instituições, o que, sociologica-mente, distingue revolução de quartelada.

Segundo Ruy Barbosa, de acordo com o publicado no Diáriode Notícias, no dia seguinte à Proclamação da República, o Impérioestava para a República como o Ancien Régime para a RevoluçãoFrancesa. A Monarquia representava a injustiça, a perseguição, acorrupção, o atraso e a hipertrofia do poder central – exaurido pelaGuerra da Tríplice Aliança, pela Questão Religiosa, pela QuestãoMilitar e pela Campanha Abolicionista – contra o que avultava a opo-sição das camadas mais esclarecidas da população. Assim, a Procla-mação da República caracteriza-se pela ação político-militar de um

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pugilo de idealistas civis e militares, que retrata o desfecho do exaus-tivo processo, regado a sangue por nossos mártires republicanos, emdecorrência de a Monarquia moribunda viver seus últimos estertores.

Vale lembrar que a República eliminou o poder moderador;extinguiu a vitaliciedade dos senadores; afastou o risco da coroa vira ser, indiretamente, entregue a um príncipe estrangeiro; instituiu ofederalismo, o presidencialismo e o bicameralismo; além de ter de-cretado o sufrágio universal, promovido a descentralização admi-nistrativa e a grande naturalização, garantido a liberdade de credoreligioso com a separação da Igreja do Estado, secularizado o casa-mento e os cemitérios, abolido a pena de galés, suprimido os títulosde nobreza e o tratamento de “Excelência” (depois novamenteadmitido), promulgado o Código Penal, as Leis de Organização daJustiça local e federal, as leis hipotecárias e sobre as sociedadesanônimas, como bem acentuou Max Fleiuss. A República, fora dedúvida, modernizou o País.

Infelizmente, nesses mais de cem anos de existência, a nossaRepública viveu ciclos nem sempre gloriosos.

A Primeira República ou “República Velha”, que vai de 1889 a1930, perdeu a imagem de “Pallas Atena” e assumiu a de “VênusBarbata”, nas palavras de Ruy Barbosa. Ficou marcada pela dificul-dade de consolidação e de implementação da ética republicana portraição das oligarquias, a serviço dos latifundiários, e por sedições.Foi o Estado controlado pelas classes dominantes mediante pactospolíticos firmados entre elites. Assistiu-se ao interesse corporativo degrupos poderosos contrapor-se aos interesses gerais da Nação. Fica-ram imperecíveis cicatrizes da “política dos governadores”, do “cafécom leite”, do “coronelismo” e das eleições a bico de pena. Consti-tuiu-se em autêntico império dos “barões do café”, em conseqüên-cia da economia basear-se em mais de 60% da exportação do cha-mado produto de sobremesa, o que redundou em tornar o Estadodependente do sistema econômico-financeiro internacional. À exce-ção dos períodos de Rodrigues Alves e de Afonso Pena, as estrutu-ras mostravam-se arcaicas e esgotadas. Apenas o Exército, repre-sentando a classe média, traduzia a inconformidade com a situaçãoreinante e opunha-se às oligarquias com o “tenentismo”.

Seguiu-se o ciclo de 1930 a 1945, com a implantação do regimeforte do Estado Novo, marcado pelo intervencionismo, centralismo,

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totalitarismo, fascismo, paternalismo e burocracia, a despeito de ha-ver ampliado a participação política com o voto secreto e feminino,além de ter propiciado as condições indispensáveis ao desenvolvi-mento industrial capitalista e da justiça com a instalação de indústriasde base, o estabelecimento de uma política financeira e social, a apro-vação da legislação previdenciária, sindical, trabalhista e a criação doMinistério do Trabalho, Indústria e Comércio, da Justiça do Trabalhoe do salário mínimo. Uma vez mais, as Forças Armadas, particular-mente o Exército, identificadas com os ideais republicanos, revela-ram-se agentes modernizadores que, redimindo-se do pecado de ha-verem apoiado a implantação do Estado Novo, puseram fim à tiraniaentão vigente.

De 1945 a 1964, o movimento trabalhista, iniciado na era Vargase alicerçado pela estrutura sindicalista corporativista, desembocou nopopulismo, maneira engendrada para controlar as massas, em funçãoda ignorância e da pobreza populares, no cenário democrático. Esseperíodo – assinalado por lideranças políticas carismáticas, partidosdescaracterizados, irresponsáveis e sem peso específico, aliançaspartidárias inconcebíveis, voto personalista em oposição ao partidário– levou à demagogia, ao oportunismo e ao clientelismo, que redunda-ram na multiplicação dos tentáculos do Estado, encoberto pelaestatização manipulada a portas fechadas. Nesse terreno fértil paraa corrupção, o nepotismo, a irresponsabilidade e a impunidade dianteda coisa pública – protegido pelo crescimento da burocracia etecnocracia federais – medraram o descrédito no Governo e a buscade compromisso com o regime democrático, que permitisse a partici-pação eleitoral das massas urbanas e a manutenção do controle polí-tico nas mãos das oligarquias ligadas ao Estado. Apesar de tudo,particularmente do sopro inflacionário do período de JK, é forçosoadmitir que a retomada da marcha para o Oeste, com a transferênciada capital para Brasília, e o início da substituição de importações ope-raram significativas mudanças no Brasil, ao final da década de 1950.

O desmoronamento da economia, os desmandos populistas, aelevação do índice de crescimento demográfico com êxodo rural eincremento da urbanização, o aumento das pressões sociais em facedas altas expectativas frustradas quanto à generalização dos bene-fícios anunciados no Governo Kubitscheck – a despeito do surtodesenvolvimentista – o reflexo da Revolução Cubana, em um quadro

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político confuso e instável, fizeram o País vulnerável às ameaças debaderna generalizada, de reformas demagógicas na “marra” e demergulho no socialismo. Assim, a crise político-social resultou no es-gotamento dos instrumentos populistas e no vazio de governo queensejaram a ascensão dos militares ao poder, inesperadamente, semum projeto alternativo para atender aos anseios de liberdade, ordem epaz da sociedade brasileira, manifestados pelo povo e pela mídia.Entretanto, o ciclo dos governos militares, vinte anos depois de 1964– em que pese a existência de velhos antagonismos herdados, o cres-cimento do estatismo, bem como o aniquilamento das lideranças polí-ticas e das Forças Armadas, as restrições de liberdade impostas pelaconjuntura nacional e internacional – concentrou esforços no campoeconômico, que capacitaram o País a transformar-se, em curto pra-zo, na oitava economia mundial, promovendo inegavelmente a mo-dernização da sociedade e a integração nacional, com a introduçãodo planejamento administrativo-financeiro em bases científicas, emnível de governo, a concessão do direito de aposentadoria ao homemdo campo, a criação do PIS-PASEP e o progresso alcançado no se-tor de comunicações, transportes e tecnologia. Há que se lamentar,todavia, não ter solucionado graves problemas estruturaissocioeconômicos nem ter proporcionado melhor qualidade de vida àpopulação de baixa renda, principalmente nos grandes centros ur-banos, além de não ter efetuado uma reforma de base na Educaçãoe na Justiça. Mas o grande mérito desse período está em ter evita-do a transformação do País em uma grande Cuba e haver estabili-zado a Nação.

O fim do milagre econômico, efeito perverso dos choques dopetróleo sofridos e da elevação desenfreada dos juros flutuantes dadívida externa, ocasionou tremenda frustração popular, levando aosurgimento da “Nova República”, que outra vez nada realizou. Ge-rada no bojo da insatisfação popular, exacerbada pelos políticos alijadosdo poder e explorada pela frente de esquerda sequiosa de revanchismo,causou ainda maiores decepções com o insucesso da política de con-ciliação e de “costurar”, em que as velhas raposas tentaram contor-nar os desafiantes problemas nacionais sem os enfrentar corajosa-mente. Virou, assim, a República que não deu certo. Persistiu o de-sencanto entre o institucional e o social. Nos campos econômico esocial, foi um completo malogro. Na esfera política, apenas a realiza-

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ção de eleições presidenciais diretas, ainda de resultados imprevisíveis,constituiu expressiva conquista, assinalando o retorno ao estado dedireito. Prevaleceram a falta de autoridade, as denúncias de corrupção,o descontrole econômico, a ameaça de hiperinflação, o empreguismo,o fisiologismo, o cartorialismo, a legislação em causa própria e con-trária aos interesses públicos pelos ditos representantes do povo, ofavorecimento de grupos em detrimento do bem-estar coletivo, a ex-pansão de um sindicalismo espúrio, o grevismo inconseqüente, ainsuflação à luta de classes, a crescente insegurança pública, a vio-lência incontida e o estímulo ao tirar vantagem, bem como ao desres-peito à lei com o alastramento da impunidade. Enfim, a degeneraçãodos tradicionais valores republicanos evidenciou que a “Nova Re-pública”, na verdade, afastou-se dos rumos almejados e terminouem nova versão de populismo ou arremedo de “República Sindi-calista”. Não se podia imaginar era que viesse a ser pior do que seesperava.

Sobreveio à década perdida dos anos 80 o período nebuloso de1990 a 1992, que passou à História Republicana marcado por instabi-lidade político-econômica, por sucessivos escândalos, corrupção, eculminou com a renúncia do supremo mandatário da Nação.

A partir de 1995, verificou-se a fase do neoliberalismo, decor-rente da globalização, acenando com esperança de estabilização po-lítica e econômica e promessa de paz social.

Foram oito anos de câmbio artificialmente estável, que redun-dou em sensível desvalorização da moeda, e transformou a Repú-blica em gerente de crises sucessivas, das quais jamais lograria selibertar.

O número de indigentes aumentou para 53 milhões.A taxa de desemprego atingiu dramáticas cifras, agravada por

não dispor o País de proteção social para amparo aos desempregados.A indústria nacional viu-se sucatada em face da concorrência

externa. A indústria aeronáutica sentiu-se compelida a se abrir aocapital estrangeiro, desistindo de projetos desenvolvidos e acumulan-do mais prejuízos. A indústria bélica feneceu, depois de ocupar posi-ção invejável no mercado internacional. Estaleiros fecharam as por-tas e perderam mercado.

A safra agrícola, embora haja apresentado índices elevados,não acrescentou aumento expressivo na área cultivada. O produto da

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terra não passou de 100 milhões de toneladas de grãos, insuficientepara saciar a fome de todos os brasileiros e resultado ridículo secomparado aos de outros países em condições similares.

No setor de transportes, verificou-se um completo abandonoda malha rodoviária, que só encontrou saída na privatização. O nú-mero limitado das ferrovias existentes não merece apreciação. Anavegação de cabotagem e a de longo curso cessaram as suas ati-vidades. As linhas aéreas reduziram os vôos e as aeronaves, alémde cancelarem rotas, entrando em crise existencial sem solução atéos dias de hoje.

As finanças reviveram o “encilhamento” dos primórdios daRepública. O endividamento interno ultrapassou o externo. A dívi-da externa cresceu sem parar e chegou a algumas centenas debilhões de dólares. Continuou a economia à mercê dos investidoresestrangeiros, atraídos por altas taxas de juros pagas a custa do em-pobrecimento da Nação.

O funcionalismo, grande parte dos assalariados, aposenta-dos e pensionistas e as camadas menos favorecidas da socieda-de pagaram com duro arrocho salarial, enquanto viram agigantar-se a concentração de renda absurda nas mãos de minorias privi-legiadas.

A especulação proporcionou lucros bem mais compensadoresdo que qualquer atividade produtiva.

Uma série de ataques especulativos contra o real reduziu aum quarto o valor de tudo o que a classe média possuía, ao mesmotempo em que se multiplicaram por quatro os juros dos credores dadívida e a corrupção se avolumou.

A reforma tributária foi obstada continuadamente, sendo co-brados excessivos impostos e tributos do cidadão brasileiro e doempresariado nacional. Paralelamente, eram concedidos privilégiose isenções aos especuladores externos, no afã de captação de “ca-pital-motel” – aquele que entra à noite e sai na manhã seguinte.

O patrimônio público amealhado em anos de sacrifícios trans-feriu-se para a propriedade de corporações estrangeiras a preçovil, financiado pela reduzida poupança interna.

Na área de comunicações, a falta de investimentos levou osserviços prestados à crise e à conseqüente privatização, com re-sultados aquém dos anunciados.

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No setor energético, a incúria impôs o racionamento de eletrici-dade e forçou o consumidor a financiar investimentos, bem como acobrir a queda dos lucros das multinacionais.

A educação e a saúde públicas também entraram em colapso.A cultura ganha ares de campo de batalha, onde se trava uma

“guerra de posição”. O revisionismo procura, a toda força, refazera História. O imaginário nacional é contestado, os valores cultuadossão substituídos. A identidade nacional vê-se ameaçada; a memórianacional é apagada e o brasileiro perde a auto-estima.

A falta de autoridade e de recursos permitiu o crime organizadoe a violência se espraiarem, atingindo patamares nunca dantes vistos.Especialmente nos grandes centros urbanos a incerteza e a insegu-rança imperam, gerando um clima de medo generalizado. Onarcotráfico, o contrabando, a pirataria, a invasão e a ocupação depropriedades e terras aterrorizam, diante da impunidade e omissãodos poderes da República.

As Forças Armadas foram desmanteladas e silenciadas.Abdicou a Nação, de graça, do direito de desenvolvimento da

política nuclear, que se afigurava promissora.O conceito de soberania compartilhada é divisado no horizonte,

ao admitir que decisões maiores de alçada interna, de ordem econô-mica e política, impliquem em perda de autodeterminação.

As projeções e as análises econômicas não se concretizaram.A resultante dessa melancólica experiência mal-sucedida do

modelo neoliberal sinaliza que a República atravessa difícil época detransição, correndo perigo de comprometimento dos ideais, acalenta-dos durante 115 anos, de igualdade, liberdade e participação.

Assim, que reflexões críticas se nos impõem os “115 anos deRepública”?

Nos 41 anos de “República Velha”, tivemos somente uma Cons-tituição com uma emenda. De 1930 a 1988, vivemos sob a égide dequatro textos constitucionais acrescidos de setenta emendas, isto é,uma Constituição a cada decênio e uma emenda a cada nove meses.Nesses oito anos de neoliberalismo, multiplicaram-se as emendasconstitucionais. Passamos a ser governados por medidas provisórias.Em 1889, ao ser revogada, a Carta monárquica de 1824 era o segun-do documento constitucional escrito mais antigo do mundo, superadoapenas pela Constituição norte-americana. A Revolução de 1930assinala a ruptura da estabilidade constitucional.

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O termo República vem do latim res publica, cujo significadoliteral é coisa pública ou comum. Conforme, pois, suas raízesetimológicas, a República pertence a todos e a todos incumberesguardá-la. É do povo, para o povo e pelo povo.

A idéia de República está ligada à de virtude cívica, de predo-mínio do espírito público, supremacia do interesse do povo. Mas oque vimos, no decorrer de mais de um século, tem sido hipocrisia,cinismo complacente e, lamentavelmente, em muitos aspectos, incúria,inépcia e inadequação moral. É o endeusamento dos direitos sem acontrapartida dos deveres da cidadania. Não prevaleceu o espíritopúblico nem a liberdade individual. O cidadão não controla o Estado,nem este o deixa livre. Quanto mais cresceu o Estado, mais asfixiouo cidadão. Agigantou-se o Estado sem se tornar público. Presencia-mos uma República amoral, de conchavos e do “faz de conta”. Na“Primeira República”, tínhamos eleições a bico de pena e candida-tos mais preparados para gerir os negócios públicos; hoje, assistimosa eleições computadorizadas de candidatos despreparados para cap-tar, entender e satisfazer as aspirações populares.

Oliveira Vianna explica esse cenário dizendo que o nosso espí-rito nacional é rarefeito, carece de densidade. Portanto, de for-ça determinante. Chegamos à idéia de nação, mas não ao senti-mento de nação.

A persistência de nossos males encontra-se na distoniaentre as instituições políticas e a sociedade, sentenciou GilbertoAmado. Em outras palavras, é notório que a causa de tudo issoderiva do fato de, no Brasil, o Estado haver precedido à sociedadee sido imposto à Nação, de cima para baixo, como resultado daprecipitada elevação do País à categoria de reino, em decorrênciada transferência da corte portuguesa de Lisboa para o Rio de Ja-neiro, às pressas, em 1808. Hoje, o povo se conscientizando e sepolitizando, ao ir sendo gradativamente incorporado à sociedade,entrou em choque com o Estado patrimonial herdado, mas aindanão delineou o tipo de contratualismo ideal a firmar entre o Estadoe a Nação.

Falta uma base política e uma doutrina consolidadora dos inte-resses nacionais, sobre os quais se possa erguer solidamente os pila-res de instituições que reflitam as aspirações do povo. Carece a Re-pública do princípio federativo que a inspirou, a justificou e lhe deu

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forma. Parece que o mal republicano acha-se na inexistência de ins-tituições políticas firmes e estáveis e na ausência de perenidade dasnormas constitucionais. A República não incorporou ainda a maioriado povo à sociedade, o que lhe empresta um caráter inacabado.

Cícero foi quem especificou o conceito de República ao distin-guir a res publica da privata, considerando o populus como o fimda coisa pública, observados o consensus juris (o consenso do direi-to) e a communis utilitatis (a utilidade comum). Ruy Barbosa já pro-clamava, referindo-se ao tratado Da República, de Cícero, e nãopoupando os homens de sua época pela imoralidade:

Os costumes pátrios elevavam ao governo os homensprestantes, e esses homens eminentes preservavam os costumes eas instituições maiores. (...) Foi a penúria mesma de homens quenos levou a perder os bons costumes. É um desastre, que não bastaexplicar. Dele temos que dar conta, como de crime capital, pois émercê da nossa imoralidade, e não por acidentes da fortuna, que aRepública está realmente morta, e dela nos não remanesce nadamais do que o nome.

Será possível, então, a República sobreviver quando não se confianos homens públicos?

Só os homens podem solucionar os problemas criados pelos homens.Está, pois, no patrimônio humano, a força viva da Nação, a cha-

ve para a solução de nosso maior problema. É na vocação defraternidade social e de admirável concorrência étnica, na con-gênita cordialidade, nesse humanismo característico do brasi-leiro, que está o fundamento, o ponto de partida e a meta síntesedo projeto político de construção nacional, indica-nos a senda atrilhar o ilustre parlamentar Marco Maciel.

Apesar dos acalentados ideais republicanos não se terem con-cretizado plenamente, a República pode orgulhar-se de haver enfren-tado e superado todas as crises por que passou e ter dado permanên-cia e continuidade ao regime democrático. Em pouco mais de umséculo, o gigante adormecido despertou, cresceu, fortaleceu-se, ama-dureceu, desenvolveu-se, modernizou-se e avançou aos solavancos,confiante no futuro, inserindo-se entre as principais nações do mundoe pugnando para ocupar o lugar que lhe está destinado.

O Brasil é viável. Precisamos somente exorcizar os demôniosdo pessimismo e constatar a nossa esplêndida potencialidade, a gran-

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de capacidade de realização do povo brasileiro e não desistir doBrasil. A nós incumbe a responsabilidade de estruturar a nossadestinação republicana. Nosso problema é de construção da Repú-blica. O mal do Brasil está nos brasileiros. Faz-se mister abater amuralha do mau hábito de deixar impune a malversação dos benspúblicos. A moralidade pública é o sustentáculo da República. Épreciso fomentar a educação cívica. É imperativo recordar e levara cabo a proposta de Capistrano de Abreu – obrigar a todos osbrasileiros a terem vergonha na cara – ao que acrescentava ogrande escritor: Revogadas as disposições em contrário.

A República não pode esquecer que muito deve às ForçasArmadas, em especial ao Exército. Portanto, a República há quetambém não sujeitar os militares a revanchismos político-ideológi-cos, nem os submeter à condição de humilhados servos, para tersempre quem a defenda e a preserve, nas horas graves, comoapregoava Ruy Barbosa: Soldados sim, mas não lacaios!

Aflige-nos mais a míngua de ideais do que as décadas per-didas e os indicadores socioeconômicos da atualidade. Urge nãoatribuir os nossos males ou a nossa salvação às estrelas ou aterceiros, mas tirar ensinamentos dos erros cometidos para efe-tuar as necessárias correções resultantes do presente do passa-do, do presente do presente e divisar um presente do futuro maisalentador.

Decididamente, não é esta a República com que sonhamos.Por isso, só nos resta enfrentar os desafios e as dúvidas, comdeterminação e perseverança, sempre alerta e prontos a comba-ter quaisquer desvios dos rumos traçados pelos idealizadores daRepública, a fim de legar uma Pátria melhor aos nossos descen-dentes. Sendo a República por concepção o regime da coisa pú-blica, sob permanente mediação controladora da opinião pública,destinada a criar oportunidades e condições iguais de dignidadepara todos os cidadãos, cumpre promover o mais amplamentepossível tais possibilidades de integração social e ensejar o exer-cício pleno da cidadania, com desenvolvimento harmônico, liber-dade, ordem, livre iniciativa, direito de propriedade, segurança erespeito à Terra de Santa Cruz.

Existe um espaço entre o dever ser e o ser, entre os ideaisrepublicanos e a realidade nacional.

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Ao celebrarmos 115 anos de Proclamação da República, aoraiar do terceiro milênio, mais do que nunca se faz necessário supe-rar o desafio que nos atormenta, desde o berço da República até opresente, e buscar a interação entre o Estado e a Nação – o objetodos ideais republicanos de ontem e de hoje.

A omissão é um pecado que se faz não fazendo, já advertia oPadre Antônio Vieira no Sermão da Primeira Dominga do Adventodo alto do púlpito da Capela Real em 1650.

O autor é Coronel QEMA Reformado, Membro do Instituto Histórico e Geo-gráfico Brasileiro e da Academia Portuguesa da História.

Notas Bibliográficas

1 TAUNAY, Visconde de. Homens e coisas do Império. São Paulo: Cia.Melhoramentos, 1924, p. 126.

2 O EXÉRCITO, a República e a nação brasileira”. Jornal das Letras eArtes, Rio Arte, (7): 6, nov./dez., 1989.

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Resumo

Julio Cezar Ribeiro de Souza (1843-1887) apresentou, em1881, sua teoria sobre navegação aérea baseada no vôo dos pás-saros planadores, preconizando a estrutura fusiforme dissimétricados balões. O documento ao Instituto Politécnico Brasileiro eraintitulado Memória sobre a Navegação Aérea e foi aprovadopor unanimidade. Recebeu auxílio para que fosse construído naFrança um balão de seu sistema e patenteou seu invento em onzepaíses, incluindo o Brasil, a França, a Inglaterra e os Estados Uni-dos. Expôs sua teoria diante da Sociedade Francesa de Nave-gação Aérea, para a qual foi eleito membro. Seu balão de testesVictoria foi experimentado com sucesso em Paris, Belém e noRio de Janeiro. Após isso recebeu auxílio adicional para construirum grande balão na França, que ficou pronto em junho de 1883,com 52m de comprimento e 10,4m de maior diâmetro, e que foidenominado Santa Maria de Belém. Sem condições financeiraspara experimentá-lo na França, embarca com o balão e seus aces-sórios para Belém. Cerca de um ano depois, quando conseguiu osrecursos necessários, realizou uma tentativa de ascensão do grandebalão em Belém. No entanto, problemas com a produção do gáshidrogênio para inflar o balão impediram a realização da experiên-cia. Um mês depois, em 9 de julho de 1884, os capitães france-ses Charles Renard e Arthur Krebs realizaram, pela primeiravez na História, um percurso fechado a bordo de um balão, de-nominado La France, que possuía a estrutura fusiformedissimétrica originalmente proposta por Ribeiro de Souza, e apro-ximadamente as mesmas medidas do Santa Maria de Belém(50,4m de comprimento por 8,4m de maior diâmetro). Ribeiro deSouza dedicou o restante de sua vida para provar o plágio de seusistema pelos franceses, tendo escrito um longo “Protesto” pu-blicado na imprensa paraense, ainda em 1884, e divulgado prin-cipalmente na França, em Portugal e na Inglaterra.

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Julio Cezar Ribeiro de Souza nasceu no interior da então pro-víncia do Pará, na freguesia de São José do Acará1, em 13 de junhode 18432, filho legítimo dos agricultores3 José Ribeiro de Souza e deAna Raimunda da Silva4. Órfão de pai quando ainda era criança5,mudou-se para a capital da província do Pará, tendo sido aluno doSeminário do Carmo6 7. Praça voluntária em 28 de maio de 18618,transferiu-se para o Rio de Janeiro, à época capital do Império brasi-leiro, onde completou o curso preparatório da Escola Militar. Em 1866,seguiu para Montevidéu, onde se integrou às forças militares brasilei-ras na Guerra do Paraguai. Foi durante esta guerra, em 1867, queocorreu o primeiro emprego militar de balões de observação na Amé-rica do Sul9 10. Em 1868, quando ocupava o posto de segundo cadetedo 3o Batalhão de Artilharia a Pé e de agente da enfermaria militardo Exército em Montevidéu, teve seu pedido de baixa do serviçomilitar recusado11. Ribeiro de Souza, em seu memorial submetido aocomando superior, manifestava sua vontade de freqüentar, ainda quecomo ouvinte, uma das academias de Direito do Império12. Após essanegação, foi deslocado para Humaitá, tendo retornado ao Brasil nofinal de 1869, sob licença de quatro meses para ir à província do Parátratar de negócios de sua família.13 Com o término da guerra, não foinecessária sua volta ao Paraguai.

Depois de seu retorno a Belém, onde aportou em 29 de janeirode 187014, dedicou-se inicialmente ao jornalismo e ao magistério, etrabalhou como funcionário público. No início de sua carreira de jor-nalista, trabalhou em “O Liberal do Pará” e depois no “Diário deBelém”, de cuja tipografia chegou a ser administrador15. Reuniu suaspoesias escritas durante os anos que passou no Rio de Janeiro, Uru-guai e Paraguai, bem como algumas escritas naqueles primeiros me-ses após sua volta ao Pará, em um livro que denominou “Pyraustas”16,impresso nas oficinas tipográficas do jornal paraense “Diário deBelém” e publicado em julho de 187017. Casou-se com VictoriaPhilomena Hippolita do Valle na Igreja da Trindade, em 5 de novem-bro de 187018. Àquela época anunciava-se como professor particularde Português, Francês, Espanhol, História e Geografia, na rua daTrindade19. Juntamente com Joaquim José de Assis e Américo Mar-ques Santa Rosa cria o periódico de publicação semanal “O Tira-Dentes”20, cujo primeiro número circulou em 19 de fevereiro de187121. No ano de 1872, foi publicada sua “Gramática Portuguesa

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para Escolas Primárias”, adotada e premiada pelo Conselho deInstrução Pública da província do Pará. Neste mesmo ano, devidoaos seus conhecimentos literários, assim como aos seus serviços pres-tados durante a Guerra do Paraguai, Ribeiro de Souza foi nomeadoencarregado da Biblioteca Pública do Pará22, ocupação na qual semanteve até abril de 187423.

Apesar de seu talento como jornalista e poeta, assim como noestudo de línguas foi, sem dúvida, à Navegação Aérea a maior dascontribuições de Julio Cezar Ribeiro de Souza. Segundo seus própri-os relatos, datam de 1874 seus primeiros estudos sistemáticos do vôodos pássaros, objetivando encontrar as bases de uma teoria capaz detornar exeqüível a Navegação Aérea24. Mas foi somente em 1880que veio à imprensa publicar os resultados de suas pesquisas. Em 29de julho daquele ano dirigiu uma carta ao presidente da província doPará declarando que havia encontrado o ponto de apoio dos corposmais-leves-que-o-ar e solicitando uma audiência reservada para, nasua presença e na dos homens da ciência da província, expor suateoria25. Ainda nessa carta registrou que, caso ficasse reconhecido omérito de sua descoberta, esperava que fossem solicitados ao Gover-no do Império os meios para que se pudesse mandar construir naEuropa um balão segundo seu modelo, uma vez que era impossívelconstruir no Brasil um balão dirigível de grande porte, e que lhe fos-sem garantidos os privilégios de sua invenção.

Em 1880, as tentativas do homem em conquistar o ar dividiam-se em duas grandes correntes: a Aviação e o Balonismo26. A Avia-ção não lograva êxito devido, principalmente, à ausência de motorespotentes o suficiente para que os primeiros modelos de avião alças-sem vôo27. Já no Balonismo, a ascensão não era o problema, mas sima ausência de dirigibilidade dos aeróstatos28. Ribeiro de Souza uniu ospontos positivos do Balonismo e da Aviação, criando um sistema deNavegação Aérea original, baseado no vôo dos pássaros planadores.A principal característica do sistema de Navegação Aérea por meiode balões planadores, que fora concebido originalmente por Ribeirode Souza, consistia na forma aerodinâmica do invólucro do balão,com maior diâmetro na parte dianteira (proa) e menor diâmetro naparte traseira (popa), assemelhando-se ao formato aerodinâmico docorpo dos pássaros planadores e dos peixes. Este viria a ser justa-mente o formato dos consagrados “zeppelins” que cruzaram o Atlân-

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tico e deram a volta ao mundo na primeira metade do século XX.Outra peculiaridade de seu sistema consistia na aplicação de asas eleme horizontais articulados para auxiliar na dirigibilidade do aeróstato.

A audiência solicitada ocorreu em 9 de agosto de 1880, noPalácio do Governo do Pará, e as opiniões dos que a assistiramficaram divididas29. Foi então que decidiu realizar ainda em Belémdemonstrações públicas com protótipos de balões para tornar no-tória a aplicabilidade de sua teoria. Ribeiro de Souza, que já haviautilizado balões pequenos, com até dois metros de comprimento,resolve fazer um balão de seis metros de comprimento e doismetros de diâmetro, experimentando-o na presença de poucaspessoas, no dia 30 de agosto de 188030. Após isso preparou umbalão maior, feito de papel coberto de gelatina, o qual deveria en-cher com hidrogênio a ser fabricado no gasômetro da cidade31. Aexperiência não ocorreu no dia marcado porque não foi possível aprodução do gás32. O inventor paraense logo se convenceu deque, mesmo que conseguisse produzir o gás necessário, o materialde que dispunha para fabricar balões era inadequado, não permi-tindo o êxito desejado.

Em nota publicada em jornal local, esclarece à população aimpossibilidade de realizar uma experiência definitiva de seu inven-to no Pará, anunciando que deveria brevemente embarcar para acapital do Império33. No Rio de Janeiro, dirige um ofício ao Institu-to Politécnico Brasileiro, pedindo uma sessão pública para exporsua teoria, o que ocorre em 15 de março de 188134, quando fez aleitura de sua Memória sobre a Navegação Aérea35, documentoque se encontra atualmente no Arquivo Nacional, no Rio de Janei-ro. A Comissão designada para analisar sua teoria emite-lhe pare-cer favorável, que passa a ser discutido nas reuniões do Instituto. AAssembléia Provincial do Pará aprova a concessão de uma sub-venção no valor de 20:000$000 (vinte contos de réis) para a cons-trução de um balão de acordo com o seu sistema, condicionada àaprovação deste parecer da Comissão36, o que ocorre em segui-da37, juntamente com a concessão da patente brasileira de seu sis-tema de Navegação Aérea, aplicável à Navegação Submarina.

Após estes fatos, parte de Belém rumo à França, em 12 desetembro de 188138, para lá providenciar a construção de seu balão,com passagem e auxílio mensal pagos pelo Imperador D. Pedro II39.

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Lá chegando, contrata os serviços da Casa Lachambre e procurapatentear sua invenção em algumas das principais capitais européias.

Durante uma das sessões de outubro de 1881 na SociedadeFrancesa de Navegação Aérea (SFNA), em Paris, na qual Ribeirode Souza estava presente, foi ele convidado pelo presidente daquelaSociedade, Gaston Tissandier, para expor sua teoria de NavegaçãoAérea40. Na sessão ocorrida dois dias após a concessão da patentefrancesa para seu invento, obtida em 25 de outubro daquele ano, feza leitura de uma versão em francês de sua Memória sobre a Nave-gação Aérea41. Pronto o balão Victoria, com dez metros de compri-mento e dois metros de maior diâmetro, assim denominado em home-nagem a sua esposa, realiza experiências na capital francesa nos dias8 e 12 de novembro, obtendo pleno êxito, conforme noticiado pelaimprensa parisiense42. Foi nomeado membro associado da SFNA em10 de novembro de 188143, dois dias após a realização da primeira desuas experiências práticas em Paris. A segunda destas experiências,para a qual Ribeiro de Souza convidou pessoalmente todos os mem-bros da SFNA, durou cerca de três horas e foi assistida também pormembros da Legação Imperial do Brasil na França, incluindo o en-carregado dos negócios do Brasil na França, Marco Antônio de Ara-újo, Visconde de Itajubá, e pelo adido militar do governo russo, oBarão de Friedericks44, que ficaram impressionados em ver pela pri-meira vez um balão, sem estar provido de motor algum, avançar nadireção de sua proa, não importando o vento contrário existente45.Presenciando tais experiências em Paris esteve também o Capitãofrancês Charles Renard, que presidira a SFNA até junho de 1881, eque ao assistir o balão avançar contra o vento afirmou: “Como eulamento que o inventor não seja um francês!”46. Após o sucessode suas experiências na França, partiu de Paris rumo a Belém47, dei-xando encomendada na Casa Lachambre a construção de um gran-de balão, que poderia realizar vôos tripulados48.

De volta ao Pará49, Ribeiro de Souza repetiu, na manhã do dia deNatal de 1881, as experiências realizadas na França, cujo êxito foi no-ticiado com entusiasmo pela imprensa paraense50. No início de 1882,viajou para o Rio de Janeiro, onde também realizou demonstração pú-blica no dia 29 de março daquele ano, na Escola Militar, em presençado Imperador Dom Pedro II e de um grande número de pessoas51.

Pelo fato de ser o Victoria um balão de testes, sem capacidadepara erguer o peso de um homem, ele precisava ser conduzido do

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chão, por meio de manobras que consistiam em largar as extensascordas que o prendiam, a fim de que se percebesse que não era levadopelo vento como um balão comum, e sim, pelo contrário, caminhava nadireção de sua proa, mesmo que oposta à corrente de ar. Algumaspessoas que ali assistiram à experiência, provavelmente por não enten-derem que pouco além daquilo poderia ser feito com um balão comaquelas dimensões, ou por não terem sido devidamente alertadas parao tipo de experimento que seria realizado, ficaram bastante desaponta-das com o fato de que a prova da dirigibilidade do aeróstato fora reali-zada com este sendo “conduzido” por meio de cordas.

Muitas pessoas presentes durante aquela experiência no Rio deJaneiro não entendiam que, antes de se construir um balão de gran-des dimensões, demandando uma quantidade enorme de recursos,era necessária a realização de experiências com um protótipo de di-mensões reduzidas, que tornasse patente sua dirigibilidade, exatamenteda maneira que foi feito. O objetivo de Ribeiro de Souza, plenamentealcançado na França, segundo atestaram os principais conhecedoresdo assunto, não foi compreendido pelas pessoas que assistiram à de-monstração na Escola Militar. Por isso, foi difícil conseguir os recur-sos necessários para o término da construção do balão que haviadeixado encomendado em Paris.

Após a experiência na capital do Império, iniciou-se intensodebate sobre as idéias de Ribeiro de Souza, tanto nas sessões doInstituto Politécnico como na imprensa do Rio de Janeiro52, o quese estendeu por alguns meses até à aprovação por unanimidade noInstituto de uma moção em favor da exeqüibilidade teórica do Siste-ma Julio Cezar, em 23 de junho de 188253. Com base nesta moção, aAssembléia Provincial do Pará, na lei que orçava a receita e fixavaa despesa para o exercício de 1882-188354, aprovou um auxílio novalor de 36:000$000 (trinta e seis contos de réis)55 para a construçãodo seu grande balão56. Tendo conseguido estes recursos, deixa o por-to de Belém rumo à Europa em 13 de dezembro de 188257 58.

Desta forma, pouco mais de um ano após suas primeiras expe-riências na capital francesa, voltava Ribeiro de Souza para tratar de-finitivamente da construção de seu grande balão, sempre com o mai-or especialista da época, Henri Lachambre, em suas oficinas deVaugirard, nos arredores de Paris. Contratados os serviços em janei-ro de 1883, previu-se que o balão só ficaria pronto ao final de abril.

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Ribeiro de Souza, não podendo manter-se na França aguardandosua conclusão, regressa a Belém do Pará59. O dinheiro empregadoem mais esta viagem tornava ainda menores os recursos de quedispunha.

Após receber um telegrama do construtor Lachambre con-firmando a previsão da conclusão do balão para 30 de abril de188360, Ribeiro de Souza partiu novamente em 19 daquele mês, deBelém rumo a Paris61. Tinha a intenção de realizar as experiênci-as primeiramente na França e depois nas principais capitais euro-péias. Em nota dirigida à imprensa paraense quando ainda se en-contrava em Belém, já anunciava suas intenções de fazer umaexposição de seu balão em Paris, no Palácio da Indústria ou noHipódromo, antes de realizar as experiências62. Esta exposição,que seria organizada por Lachambre, tinha por objetivo arrecadardinheiro para a realização das experiências, para o que não dispu-nha de recursos suficientes.

Ao chegar em Paris para receber o balão e seus acessórios,verificou que estes últimos não estavam de acordo com o solicitadoe tiveram que ser reconstruídos, reduzindo ainda mais suas reser-vas financeiras. Para agravar a situação, o prefeito da Comuna deParis, à qual pertencia a região das oficinas de Lachambre, negou opedido de autorização para a realização da exposição paga do ba-lão, mesmo com a intervenção a favor desta causa por parte doencarregado dos negócios do Brasil na França.

Não restava alternativa plausível senão voltar e tentar fazerno Brasil as experiências com o balão, mesmo sabendo que enfren-taria imensas dificuldades para realizar o experimento em terrasonde não havia técnicos especializados. Chegou mesmo a cogitarentrar em contato com o Barão de Friedericks, Adido Militar dogoverno russo. Desde a realização de suas primeiras experiênciasem Paris, o governo russo havia procurado Ribeiro de Souza pormeio da representação brasileira na França, manifestando seu inte-resse em comprar os direitos de sua invenção. Por não ter o des-prendimento do navegador genovês Cristóvão Colombo, que procu-rou no estrangeiro o apoio financeiro de que precisava para suaviagem de descobrimento, Ribeiro de Souza não vendeu sua inven-ção a país algum e tomou a decisão de retornar para Belém trazen-do consigo o balão e seus acessórios63.

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Foi convidado por Gaston Tissandier, Presidente da SFNA, para,em junho de 1883, participar de um banquete com cem pessoas emParis, encabeçado pelo Presidente do Conselho de Ministros daFrança, em comemoração ao Centenário da primeira experiênciados irmãos Montgolfier64.

Ainda em Paris, durante os ensaios com a máquina a vapor quedeveria mover a hélice do balão, ocorreu uma explosão em seu reser-vatório de vapor, inutilizando-a. Como não considerava o propulsorabsolutamente necessário para seu sistema de Navegação Aérea,por só o ser em certas condições atmosféricas, decidiu realizar suaexperiência no Brasil sem um motor, ou com um outro propulsor mo-vido a mão65, mesmo porque a construção de uma nova máquinademandaria cerca de três meses e recursos dos quais definitivamen-te não dispunha. De fato, tal era a escassez de recursos em que seencontrava, que precisou empenhar o próprio balão para conseguirpagar seu transporte de Paris para Belém66.

Chegando ao Pará com o grande balão em meados de julho67,tratou de conseguir os meios para a realização da experiência. Já nomês seguinte organizou uma exposição gratuita do balão, parcialmen-te cheio com ar, no interior da Catedral de Belém68, e realizou confe-rência no Teatro da Paz, recorrendo ao governo e à população daprovíncia do Pará, solicitando os recursos necessários para enchercom hidrogênio seu balão69. Disso resultou uma petição organizadapor várias pessoas, principalmente da imprensa local, assinada porum grande número de cidadãos e encaminhada à presidência da pro-víncia70. No entanto, apesar desses esforços coletivos, desta vez ogoverno da província do Pará não aprovou qualquer subsídio para arealização do experimento71. Ribeiro de Souza repetiu a exposição dobalão e realizou outra conferência em outubro, pedindo à própria po-pulação do Pará que contribuísse com os recursos necessários72.Apesar dos esforços de várias pessoas importantes, entre elas o Vis-conde de Nazaré, o Barão de Igarapé-Mirim e o Barão de Muaná,lideradas pelo presidente da província, o Visconde de Maracaju, quese reuniram no próprio palácio do governo, frustrou-se também estatentativa73.

Incansável, tentou obter auxílio na vizinha província do Amazo-nas. Viajou para Manaus e lá conseguiu a aprovação de uma lei, demaio de 1884, que garantiu o subsídio de 16:000$000 (dezesseis con-

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tos de réis)74. Este valor revelou-se insuficiente para todos os prepa-rativos, vendo-se Ribeiro de Souza obrigado a vender seus livros emobília para poder realizá-los75.

Chega finalmente o dia do experimento. Os trabalhos para oenchimento do grande balão foram iniciados à meia-noite, no Largoda Sé, e a ascensão estava marcada para a manhã seguinte, em 12de julho de 1884. O Santa Maria de Belém era o balão a hidrogêniode maior comprimento já fabricado no mundo até então, medindo52m com 10,4m de maior diâmetro em sua parte anterior e 8,5m demenor diâmetro na parte posterior76.

Para completar toda a capacidade do balão, era necessário cer-ca de três milhões de litros de gás hidrogênio. Para tanto, havia sidopreciso mandar buscar na Europa cem garrafões de ácido sulfúrico.No dia da experiência de ascensão, dispunha o inventor de uma tone-lada e meia de ácido e cerca de dois mil quilos de zinco e limalha deferro sobressalente. Para a produção do hidrogênio, havia providen-ciado 70 barris de madeira, denominados geradores, com capacidadepara 480 litros cada um77. Foram agrupados em cinco conjuntos oubaterias, cada uma contando com um purificador e um secador. Seum único recipiente fosse utilizado para a produção de todo o gás,seriam necessárias várias semanas, a menos que este tivesse dimen-sões gigantescas. O hidrogênio era produzido derramando-se o ácidosobre o metal colocado no interior dos barris e coletado através demangueiras que o conduziam para a secagem e purificação, e sóentão para o interior do balão. Aquele grande navio aéreo era feitode seda dupla impermeável e revestido de uma camisa também deseda, em substituição à rede normalmente utilizada em outros balões,colocada com o propósito de evitar o atrito das cordas e também osseios formados entre as malhas da rede, diminuindo assim os efeitosda resistência do ar ao movimento do balão78. Das extremidades in-feriores da camisa desciam duas redes circundando o balão, que,juntamente com quinhentas cordas que delas pendiam, tinham porfim prender ao balão uma grande verga, de comprimento igual ao dopróprio balão, à qual eram fixados: a barquinha de 12m de compri-mento, as duas asas, o leme e a âncora. A barquinha, que ficariaainda presa ao balão por meio de diversos cabos e cujo fundo erafeito de pinho de riga, era guarnecida de um tecido de arame e cabinhoalcatroado de cerca de um metro de altura por três de comprimen-

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to79. As asas, que tinham formato triangular, eram feitas também deseda dupla impermeável sobre armações de madeira com junções demetal (bronze, ferro e aço)80, cada uma medindo 12m de comprimen-to e 8m de maior largura, com maior lado disposto paralelamente àgrande verga81. O leme ou cauda era igualmente de seda dupla im-permeável sobre armação de madeira e metal, formando um triângu-lo de 6m de lado. O Santa Maria de Belém foi projetado por Ribeirode Souza com duas válvulas automáticas inferiores e uma superior demanobra, para o caso de grandes dilatações do gás. O aeróstato eramunido de um balonete interno, feito do mesmo material do balão,com capacidade para trezentos metros cúbicos, que deveria ser cheiode ar, por meio de um ventilador, quando qualquer perda ou contraçãodo gás assim o exigisse. As válvulas, num total de quatro, comuni-cam-se por meio de cabos com a barquinha. De acordo com seuprojeto, o balão contava com um propulsor constituído por uma hélicede duas pás, medindo 4,5m de diâmetro, que seria acionada por ummotor consistindo de uma máquina a vapor de quatro cavalos82. De-vido a ter sido inutilizada, em Paris83, a propulsão do balão não seriarealizada com a máquina a vapor.

Dispondo de poucos recursos, foi então fazer o enchimento deseu balão contando com as promessas de muitas pessoas e com aboa vontade dos que ali fossem assistir aos trabalhos. Além de cincoamigos dedicados, dentre eles seu genro84, de seis pessoas que pôdepagar e de outras vinte, disponibilizadas por amigos durante a noite,todos, à exceção do próprio Ribeiro de Souza, sem qualquer experi-ência prévia na fabricação de hidrogênio, até às nove horas da ma-nhã ninguém mais teve para auxiliar e todos estavam exaustos.

Gotas de ácido caídas acidentalmente nas mangueiras coleto-ras de gás durante a noite, fruto da total inexperiência dos auxiliares,ocasionaram a perda de grande parte do gás produzido, além de tersido inutilizada uma bateria de geradores. Ademais, vários outrosgeradores tiveram suas bases danificadas, ficando totalmente semfunção85. Todos esses fatores levaram o inventor a suspender o ex-perimento por volta das onze horas da manhã86. Centenas de pessoasencontravam-se no local, aguardando a ascensão do balão. A frus-tração foi geral. Ribeiro de Souza não escondia a profunda decepçãoe o desgosto pelo fracasso daquela tentativa. Sabia que dificilmenteconseguiria os meios necessários para uma nova oportunidade como

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aquela e o sonho de comprovar na prática ele próprio sua teoria deNavegação Aérea dificilmente se tornaria realidade.

Mas a História ainda lhe reservava mais desilusões. Exatos quatroanos após a primeira exposição oficial de sua teoria sobre adirigibilidade dos balões, na Província do Pará, o mundo assistiria pelaprimeira vez à execução de um percurso fechado a bordo de umbalão, ocorrida menos de um mês após a experiência frustrada noPará. Em 9 de agosto de 1884, em Chalais-Meudon, dois capitãesfranceses, Charles Renard e Arthur Constantin Krebs, a bordo do LaFrance, que media 50,4m de comprimento por 8,4m de maior diâme-tro87, executaram o primeiro circuito fechado em um balão, retornandoao ponto de partida após percorrer cerca de oito quilômetros em pou-co mais de vinte minutos, com uma velocidade média de 20km/h emrelação ao solo88 89. O La France entrou assim para a História comoo primeiro balão dirigível do mundo. A notícia demorou cerca deum mês para chegar ao conhecimento de Ribeiro de Souza. Aoobservar o desenho do balão francês nos periódicos vindos da Eu-ropa, o brasileiro se convenceu do plágio de que fora vítima. Escre-veu um extenso protesto que denominou A Direção dos Balões,que fez publicar na imprensa paraense em português90 e em fran-cês91, e dirigiu um requerimento ao Instituto Politécnico Brasilei-ro (IPB) solicitando prioridade do sistema de balões fusiformesdissimétricos, segundo o qual foram construídos tanto o Santa Ma-ria de Belém quanto o La France. Endereçou a versão em francêsde seu protesto para a SFNA, da qual era membro, e para váriasoutras entidades científicas européias92.

Na sessão de 4 de novembro de 1884 do IPB, referindo-se aoprotesto de Ribeiro de Souza contra o plágio de seu sistema, Antoniode Paula Freitas propunha que a Comissão de Ciências Físicas, com-posta pelo Conselheiro Epinafio Candido de Souza Pitanga, Barão deTeffé93, e o Capitão-Tenente Francisco Calheiros da Graça, fosseincumbida de emitir parecer sobre o que havia de análogo entre o LaFrance e o Santa Maria de Belém. Na sessão de 19 de dezembrolê-se uma representação de Ribeiro de Souza, apresentando os jor-nais paraenses por ele remetidos94.

O recebimento do protesto de Ribeiro de Souza pela SFNA, porele próprio enviado, está registrado na ata da sessão de 8 de dezem-bro daquela Sociedade95. Em carta escrita e endereçada, naquele

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mesmo mês, a Ribeiro de Souza, o construtor Lachambre comunica aleitura dos jornais enviados pelo brasileiro em uma das sessões daSFNA, o que teria produzido grande sensação na ocasião96.

Ainda em dezembro de 1884, o periódico inglês Invention andInventors’ Mart publicou um artigo com um resumo do protesto,incluindo o desenho tanto do balão de Ribeiro de Souza como daquelede Renard e Krebs. O periódico britânico registrou que Ribeiro deSouza havia exposto por meio de seu protesto robusta prova de serele o inventor do sistema comum aos dois balões, e dispunha-se apublicar a defesa de Renard e Krebs97.

A edição da Enciclopédia das Enciclopédias – DicionárioUniversal Português, publicada em Lisboa, imediatamente posteri-or a estes fatos, reproduziu na íntegra o protesto do brasileiro98. Ocomentarista da publicação portuguesa afirmou que embora não sepudesse deixar de reconhecer o mérito dos capitães franceses Renarde Krebs, em terem realizado com êxito as experiências com o siste-ma de balões inventado pelo brasileiro, “é lamentável que não te-nham feito ao engenhoso inventor paraense a devida justiça,conservando-lhe perante o mundo científico a glória indiscutí-vel da idéia por eles aproveitada”. Prosseguia o comentarista di-zendo que o maior argumento para a condenação dos franceses eraseu silêncio diante de tão veemente protesto realizado por Ribeiro deSouza, dirigido às sociedades e publicações científicas de todo o mundoculto da época99 100.

Em março de 1885, o Barão de Teffé, alegando o mau estadode sua saúde, devolve os documentos remetidos a ele pelo IPB, epede escusa de dar parecer sobre a semelhança entre os doisaeróstatos. Os documentos são enviados a uma nova Comissão, lide-rada pelo Engenheiro Luiz Schreiner101. Teffé não tinha visto combons olhos a decisão de levar o balão para Belém, e não para o Rio deJaneiro. Sua argumentação era de que na capital do Pará as chancesde êxito com a experiência seriam bem menores102. Ribeiro de Sou-za, que tinha conseguido os principais auxílios financeiros para a rea-lização de suas idéias na província do Pará, certamente acreditou quelá também conseguiria os recursos necessários para a experiênciadefinitiva com o Santa Maria de Belém.

Em abril e maio de 1885 foram realizadas conferências em Belémpor Ribeiro de Souza, com o objetivo de conseguir quatro contos de

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réis para comparecer a uma exposição internacional de Aeronáuticaem Londres, organizada pela Sociedade Aeronáutica da Grã-Bretanha103, com início marcado para o dia 1º de junho daquele ano104.Objetivava nessa exposição provar a prioridade de seu sistema deNavegação Aérea, mas não conseguiu os recursos necessários parafazê-lo.

Com a demora da manifestação do IPB, Ribeiro de Souza se-guiu para o Rio de Janeiro em julho de 1885, levando consigo o balãoSanta Maria de Belém105. Em 2 de setembro daquele ano, é aprova-do no IPB um parecer atestando que a forma adotada nos balões deRibeiro de Souza, com ou sem a aplicação de planos laterais, nãohavia sido aplicada antes a nenhum outro aeróstato, cabendo-lhe aprioridade dessa idéia. No dia seguinte, em sessão extraordinária doIPB, honrada com a presença do Imperador D. Pedro II, foi concedi-da ao inventor paraense a oportunidade para que realizasse uma con-ferência sobre seu sistema de direção de balões. Terminada a expla-nação, o próprio Imperador solicitou ao IPB que tomasse para si aresponsabilidade de fornecer os meios para a realização das experi-ências com o Santa Maria de Belém106.

O Conde D’Eu, Presidente do IPB, propõe a criação de umaComissão para analisar o material que compõe o balão Santa Mariade Belém armazenado em caixões no Trapiche Cleto, e auxiliar oinventor na realização da experiência. Foi então criada a Comissãodo Balão Julio Cezar, composta pelo Barão de Teffé, José Agosti-nho dos Reis e Joaquim Galdino Pimentel, este último posteriormentesubstituído por Manoel Pereira Reis.

O Conde D’Eu autorizou o Barão de Teffé a proceder ao trans-porte do material do balão para a Praia da Saudade, em Botafogo,onde deveria ser recolhido em um telheiro das obras a cargo do Mi-nistério do Império. Para tal fim, o Conde D’Eu subscrevera a quan-tia de 100$000 (cem mil réis) e o Imperador D. Pedro II 200$000.Além desses valores, o Comendador José Ignacio da Rocha subscre-veu outros 200$000, que foram empregados pelo Barão de Teffé noconserto dos caixões que continham o balão e seus acessórios.

Intensas discussões se sucederam nas sessões do IPB duranteos meses de setembro e outubro de 1885, algumas delas com a pre-sença de Ribeiro de Souza, que aguardava na ante-sala até que lhefosse dada permissão para tomar parte da sessão. A Comissão che-

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gou a propor que o Instituto não tomasse para si a responsabilidadedas experiências, mas que se limitasse a auxiliá-lo com o que fossearrecadado com subscrições populares promovidas com este fim. OIPB autorizou a Comissão a iniciar as subscrições e proceder às ex-periências preliminares logo que o balão estivesse preparado, e solici-tou ao Barão de Teffé que realizasse uma conferência sobre o histó-rico do balão de Ribeiro de Souza, o que ocorreu em 23 de outubro.

O balão foi então transportado para a Praia da Saudade aindanaquele mês e depositado no galpão das obras do Ministério do Impé-rio, conforme acertado previamente, sendo os serviços relacionadoscom esse transporte feitos gratuitamente. O Conde D’Eu e o Impe-rador elevaram sua subscrição de 300$000 para 500$000, e essa quan-tia foi entregue pelo Barão de Teffé a Ribeiro de Souza, que seguiupara Belém no final de outubro, a fim de obter da Assembléia Provin-cial do Pará o auxílio necessário para a realização das experiências.

Em Belém, realizou conferências107 e aguardou a votação da leiorçamentária para o ano de 1886108. Foi aprovada uma subvenção novalor de 25:000$000 (vinte e cinco contos de réis) para a experiênciado aeróstato de seu invento109. Recebido o auxílio, partiu para Parisem 3 de abril de 1886110, passando antes por Londres. Ao chegar aParis propõe debates públicos com Renard e Krebs na Sorbonne ena Academia de Ciências da França, mas é ignorado pelos capitãesfranceses111.

Em seu editorial de 13 de maio de 1886, o jornal parisienseL’Opinion publica um histórico das realizações de Ribeiro de Souza,desde a aprovação de suas teorias no IPB no início de 1881 até àque-la data, mencionando que o protesto do brasileiro tinha merecido co-mentários favoráveis dos países que o receberam, e fazendo votos deque se fizesse justiça a quem de direito112. Esse artigo foi enviadopelo próprio Ribeiro de Souza a membros do Governo e às academiasfrancesas, a Renard e Krebs, e a toda a imprensa parisiense, sem terrecebido contestação pública alguma durante essa que foi a sua últi-ma estada na França113.

Após a construção de um novo protótipo de seu sistema, deno-minado Cruzeiro, com capacidade para 30 metros cúbicos, realizouexperiências em Vaugirard, nas oficinas de Lachambre, em 11114 e16 de junho de 1886115. Não podendo mais permanecer na Françapor estarem esgotados seus recursos financeiros, retornou ao Brasil,

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aportando em Belém no final do mês de julho116. Enquanto isso, noRio de Janeiro, chegavam os jornais franceses com as notícias dassuas realizações em Paris, o que foi anunciado durante sessão doIPB pelo Barão de Teffé117. Como a Comissão do Balão Julio Cezarnão havia sido previamente avisada sobre o novo balão Cruzeiro esuas experiências na França, Teffé é incumbido de comunicar aoinventor a retirada do apoio do IPB, declarando que o Instituto nãoteria mais qualquer responsabilidade pelas experiências que viesse arealizar. Além disso, Teffé ainda recomendou a Ribeiro de Souza quese dignasse a pagar as despesas apresentadas pelo hotel onde esta-vam hospedados dois ajudantes particulares encarregados de guar-dar e conservar o material do balão Santa Maria de Belém, e cujopagamento não poderia ser feito de outra maneira por não ter obtidoa Comissão uma só assinatura nas subscrições populares por ela or-ganizadas118.

Teffé recebeu a resposta de Ribeiro de Souza em novembro de1886, autorizando-o a vender o balão para pagar as despesas feitasem seu nome na Corte, embora nunca as tivesse consentido. Combase nisso, o IPB autorizou Teffé a proceder à abertura dos caixõescontendo o material do balão e a promover sua venda119. Na sessãode 23 de março de 1887 do Instituto, Paula Freitas comunicou quefora vendido o Santa Maria de Belém e paga a dívida feita em nomede Ribeiro de Souza120. O balão foi comprado pelo padre mineiroJoaquim Ignacio Ribeiro, por meio de uma associação de negociantesda Corte121.

No mês seguinte foi comunicado durante sessão do Institutoque iriam se realizar novas experiências com o balão Santa Mariade Belém. Paula Freitas enfatizou que o IPB não teria intervençãoalguma nestas novas experiências, que seriam feitas pelo compradordo material do balão, segundo um novo sistema de navegação aéreaque este dizia ter inventado, e que julgava não ter relação com o doparaense122.

Em Belém, Ribeiro de Souza dedicava-se à conclusão de umlivro em francês, que denominou Fiat Lux123, no qual expunha comminúcia a sua teoria de Navegação Aérea e o seu sistema nela fun-dado, e procurava provar o plágio que sofrera por parte dos capitãesfranceses Renard e Krebs124. Não podendo publicar na França esselivro, como era seu desejo original, iniciou a publicação, na imprensa

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paraense, de uma tradução para o português, o que foi interrompidoquando adoeceu gravemente125, seguindo-se sua morte por beribéri126,relacionada à carência de vitamina B

1, em 14 de outubro de 1887,

deixando sua esposa e cinco filhos127 128. Na ocasião de sua morte,Ribeiro de Souza ocupava o cargo de Chefe da 4ª Seção da Secreta-ria do Governo do Pará129. Por seus familiares não possuírem recur-sos suficientes, seu enterro foi feito às expensas de seus amigos130.

Notas Bibliográficas1 Atual município do Acará, no estado do Pará.2 CUNHA, Raymundo Cyriaco Alves da. Julio Cezar Ribeiro

de Souza. In: _______. Paraenses ilustres. Jablonski, Vogt e Cia.Paris, 1896, p. 111.

3 OLIVEIRA, Cesar Coutinho. Biografia de Julio Cezar Ribei-ro de Souza. In: Julio Cezar – Poesias. Pará: Editores Tavares Car-doso & C.ª, 1911.

4 Arquivo da Cúria Metropolitana de Belém. Registro do casa-mento de Julio Cezar Ribeiro de Souza e Victoria Philomena Hippolitado Valle, em 5 de novembro de 1870. Arcebispado de Belém do Gram-Pará, Paróquia da Trindade, Livro de Casamentos nº 1 (1843-1871),p. 111.

5 Oliveira (1911), p. v.6 Cunha (1896), p. 112.7 AZEVEDO, José Eustachio de. Julio Cesar. In: Antologia

amazônica. 2. ed. aum. Livraria Carioca Editora. Belém, 1918, p.57.

8 BRASIL. Arquivo Histórico do Exército. Memorial de JúlioCezar Ribeiro de Souza, de 3 de abril de 1868. Montevidéu, 1868.(pasta n. 6.753, maço JJ-282).

9 RODRIGUES, Lysias Augusto. História da conquista doar. Rio de Janeiro: Marques Araújo & Cia. Ltda. Editores, 1937, p.254-259.

10 BRASIL. Instituto Histórico e Cultural da Aeronáutica. His-tória geral da aeronáutica brasileira: dos primórdios até 1920.Belo Horizonte: Itatiaia; Rio de Janeiro: INCAER, 1988, p 124-142.

11 Ribeiro de Souza havia cumprido o tempo de praça, confor-me a legislação vigente, em 28 de maio de 1867, mais de um ano

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antes de seu pedido de baixa, efetuado em 3 de abril de 1868. Mesmoassim, seu pedido foi negado, conforme ofício dirigido ao ConselheiroTenente General João Frederico Caldwell, Ajudante General do Exér-cito, em 11 de agosto de 1868. In: BRASIL. Arquivo Histórico doExército. Ofício de 11 de agosto de 1868. Quartel do ComandoMilitar do Movimento do Pessoal e Material do Exército Brasi-leiro em Montevidéu. (pasta n. 6.753, maço JJ-282).

12 Arquivo Histórico do Exército. Memorial de Júlio CezarRibeiro de Souza, de 3 de abril de 1868. Montevidéu, 1868. (pastan. 6.753, maço JJ-282).

13 BRASIL. Arquivo Histórico do Exército. Licença concedidaem 18 de novembro de 1869. Ordens do dia da guerra do Paraguai:Conde D’Eu. 1869. Comando em Chefe de todas as Forças Brasilei-ras em Operações na Republica do Paraguai – Quartel General emCapivary, 30 de novembro de 1869. Ordem do Dia n. 38, p. 7.

14 Jornal O Liberal do Pará, de Belém, edição de 30 de janeirode 1870, p. 2.

15 Expediente do governo da província do Pará de 11 de maio de1872, publicado no “Jornal do Pará” em sua edição de 8 de junhodaquele ano, p. 1.

16 Pyrausta, s. m. (Do grego pyraustês, de pyr, e anô) Moscaque se diz que nasce, e vive no fogo, e morre logo que dele sai ?Alguns dizem ser uma espécie de borboleta, que mesmo de dia éatraída por uma vista das chamas, e busca as luzes das velas, ondealegremente se queima. In: Vieira, Domingos. Grande DicionárioPortuguês ou Tesouro da Língua Portuguesa. Chardron, Ernesto eMoraes, Bartholomeu H. de; eds. Quarto volume, p. 1.034. Porto,Portugal, 1873.

17 Oliveira (1911), p. VIII.18 Arquivo da Cúria Metropolitana de Belém. Registro do casa-

mento de Julio Cezar Ribeiro de Souza e Victoria Philomena Hippolitado Valle, em 5 de novembro de 1870. Arcebispado de Belém do Gram-Pará, Paróquia da Trindade, Livro de casamentos nº 1 (1843-1871),p. 111.

19 Almanak Administrativo da Província do Pará. Carlos Seidl& Cª. Pará, 1871, p. 124.

20 Biblioteca Pública do Pará. Jornais Paraoaras: Catálo-go. Secretaria de Estado de Cultura, Desportos e Turismo. Im-

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prensa Oficial do Estado do Pará. Belém, 1985, p. 59.21 Jornal “Diário do Gram-Pará”, de Belém, edição de 24 de

fevereiro de 1871, p. 1.22 Portaria de 29 de julho de 1872, assinada pelo presidente da

província do Pará, Francisco Bonifácio de Abreu, o Barão da Vila daBarra, publicada no “Jornal do Pará”, de Belém, edição de 20 deagosto de 1872, p. 1.

23 Ribeiro de Souza foi exonerado, a seu pedido, do cargo debibliotecário da Biblioteca Pública da Província do Pará em 13 deabril de 1874. Jornal “Diário do Gram-Pará”, de Belém, edição de 15de abril de 1874, p. 1.

24 Souza, Julio Cezar Ribeiro de. “Les Ballons-Planeurs”. Jor-nal “Le Brésil – Courrier de L’Amérique du Sud”, Paris, edição de 5de janeiro de 1882, p. 3.

25 Publicada originalmente no jornal “A Constituição”, de Belém,em 30 de julho de 1880, p. 1-2. Por ter saído com algumas incorre-ções foi publicada novamente pelo mesmo jornal em 31 de julho de1880, p. 1.

26 Canby, Courtland. “História da Aeronáutica”. Tradução por-tuguesa de Jorge Peixoto. Livraria Morais Editora. Impressão e en-cadernação em Lausanne, Suíça, 1965.

27 Karlson, Paul. A conquista dos Ares. Editora Globo. PortoAlegre, 1943.

28 Gordon, Arthur. Historia de la Navegación Aérea. EditorialLabor, S. A. Barcelona, 1966.

29 Jornal “A Constituição”, de Belém, edição de 10 de agosto de1880, p. 1.

30 Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edição de 1º desetembro de 1880.

31 Jornal “A Constituição”, de Belém, edição de 1 de outubro de1880, p. 1.

32 Jornal “A Constituição”, de Belém, edição de 7 de outubro de1880, p. 2.

33 Jornais “A Constituição” (p. 2) e “A Província do Pará” (p.3) de Belém, edição de 24 de outubro de 1880.

34 Revista do Instituto Politécnico Brasileiro, 23.° ano, TomoXVII, Tip. de G. Leuzinger & Filhos, Rio de Janeiro, 1885, p. 3.

35 Souza, Julio Cezar Ribeiro de. “Memória sobre a Navegação

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Aérea”, In: “Julio Cezar Ribeiro de Souza – Memórias sobre a Na-vegação Aérea”. Série Memórias Especiais, vol. II. Organizadores:BASSALO, José Maria Filardo; ALENCAR, Paulo de Tarso dosSantos; CRISPINO, Luís Carlos Bassalo; e BECKMANN, ClodoaldoFernando Ribeiro. Editora da Universidade Federal do Pará, Pará,2003, p. 161-200.

36 Lei n° 1.064 sancionada pelo presidente da província do Pará,Manoel Pinto de Souza Dantas Filho, em 25 de junho de 1881. In:Coleção das Leis da Província do Gram-Pará, Ano de 1881, TomoXLIII, Parte 1ª. Tip. do Diário de Notícias. Pará, 1882, p. 127-128.

37 Sessão de 6 de julho de 1881. Revista do Instituto PolitécnicoBrasileiro, 23.° ano, Tomo XVII, Tip. de G. Leuzinger & Filhos, Riode Janeiro, 1885, p. 6-7.

38 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 13 de se-tembro de 1881, p. 2.

39 Souza, Julio Cezar Ribeiro de. “Navegação aérea – Estadodesta importante questão”. Texto publicado no jornal “Gazeta deNotícias”, do Rio de Janeiro, em sua edição de 17 de março de 1882,p. 2.

40 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 5 de junhode 1887, p. 2-3.

41 Ata da sessão de 27 de outubro de 1881 da Sociedade Fran-cesa de Navegação Aérea (SFNA), presidida por Gaston Tissandier(presidente da SFNA). In: L’Aéronaute. 14° ano, n° 12, dezembrode 1881, p. 266-267.

42 Jornal parisiense “L’Evenément”, edição de 11 de novembrode 1881. Jornal parisiense “Le Telegraphe”, edição de 11 de novem-bro de 1881. In: Souza, Julio Cezar Ribeiro de. “Navegação aérea –Estado desta importante questão”, parte IV, jornal “Gazeta de Notíci-as”, do Rio de Janeiro, em sua edição de 16 de março de 1882, p. 2.

43 Ata da sessão de 10 de novembro de 1881 da SociedadeFrancesa de Navegação Aérea (SFNA), presidida por Abel Hureaude Villeneuve (vice-presidente da SFNA). In: L’Aéronaute. 14° ano,n° 12, dezembro de 1881, p. 267-268.

44 Souza, Julio Cezar Ribeiro de. “A direção dos balões”. Textopublicado no jornal “A Província do Pará”, de Belém, em sua ediçãode 24 de outubro de 1884, p. 2.

45 As experiências de Ribeiro de Souza na França foram co-

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mentadas na Sociedade Francesa de Navegação Aérea por Charlesdu Hauvel na sessão de 24 de novembro de 1881 (L’Aéronaute. 15°ano, n° 1, janeiro de 1882, p. 16-18) e por Jobert na sessão de 8 dedezembro de 1881 (L’Aéronaute. 15° ano, n° 1, janeiro de 1882, p.18-24).

46 Teffé, Almirante Barão de. O Brasil – Berço da ciência ae-ronáutica. Imprensa Naval. Rio de Janeiro, 1924, p. 105.

47 Segundo o jornal “Le Brésil”, publicado em francês por bra-sileiros em Paris, Ribeiro de Souza partiu da capital da França rumoao Pará em 19 daquele mês (Jornal “Le Brésil – Courrier deL’Amérique du Sud”, Paris, edição de 20 de novembro de 1881, p. 3).

48 Alberto Santos-Dumont, cerca de 16 anos mais tarde, con-trataria os serviços dessa mesma Casa para a construção do seuprimeiro balão, denominado Brazil.

49 Ribeiro de Souza aporta em Belém, retornando de Paris, em11 de dezembro de 1881, conforme noticiado no dia seguinte pelojornal paraense “A Constituição”, p. 1.

50 Jornais “A Província do Pará”, “O Liberal do Pará”, “A Cons-tituição”, p. 1, “Diário de Notícias”, p. 2, e “Gazeta da Tarde”, deBelém, edição de 27 de dezembro de 1881. Jornal “A Boa Nova”, deBelém, edição de 28 de dezembro de 1881. In: Souza, Julio CezarRibeiro de. “Navegação aérea – Estado desta importante questão”.Texto publicado no jornal “Gazeta de Notícias”, do Rio de Janeiro,nos dias 12, 13, 15, 16 e 17 de março de 1882.

51 “Jornal do Comércio”, p. 1, “Gazeta de Notícias”, p.1, e “OCruzeiro”, do Rio de Janeiro, edição de 30 de março de 1882. In:Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edição de 18 de abril de1882, p. 3.

52 Crispino, Luís Carlos Bassalo. “Introdução à obra de JulioCezar Ribeiro de Souza”. In “Julio Cezar Ribeiro de Souza – Memó-rias sobre a Navegação Aérea”. Série Memórias Especiais, Vol. II.Organizadores: BASSALO, José Maria Filardo; ALENCAR, Paulode Tarso dos Santos; CRISPINO, Luís Carlos Bassalo; eBECKMANN, Clodoaldo Fernando Ribeiro. Editora da Universida-de Federal do Pará, Pará, 2003. p. 56-68.

53 Revista do Instituto Politécnico Brasileiro, 23º ano, Tomo XVII,Tip. de G. Leuzinger & Filhos, Rio de Janeiro, 1885, p. 105-106.

54 Lei nº 1.104 sancionada pelo presidente da província do Pará,

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Justino Ferreira Carneiro, em 9 de novembro de 1882. In: Coleçãodas Leis da Província do Gram-Pará no Ano de 1882, Tomo XLVI,Parte 1ª. Tip. do Jornal da Tarde, Pará, p. 117.

55 Para se ter uma idéia desta quantia, vale registrar que esta leifixava a despesa anual para a Biblioteca Pública e Museu Paraense,em um total de 8:000$000, referentes ao pagamento de quatro funci-onários, incluindo os encarregados destes estabelecimentos, e dasdespesas de expediente. A mesma lei garantiu uma subvenção aomaestro Antonio Carlos Gomes no valor de 25:000$000 para acontratação de uma companhia lírica que viesse se apresentar noTeatro da Paz durante uma temporada.

56 Além deste montante, também contribuíram recursos conse-guidos através de subscrições populares organizadas no Rio de Ja-neiro e no Recife.

57 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 13 de de-zembro de 1882, p. 2.

58 Passaria o Natal e a virada do ano a bordo do navio, só che-gando ao seu destino cerca de 25 dias depois, duração de uma via-gem como esta no final do século XIX.

59 Conforme matéria publicada no jornal “Diário de Belém”,edição de 9 de março de 1883, Ribeiro de Souza partiu de Paris parao Havre em 5 de fevereiro daquele ano, e de lá embarcou para Belém.Aportou em Belém em 1 de março, conforme noticiado no dia se-guinte pelo jornal paraense “A Constituição”, p. 2.

60 Este telegrama de Lachambre, datado de 5 de abril de 1883,foi publicado no jornal paraense “Diário de Notícias”, p. 2, em suaedição do dia seguinte.

61 Jornais “O Liberal do Pará” (p. 2) e “Diário de Notícias” (p.2), de Belém, edição de 19 de abril de 1883.

62 Esta nota de Ribeiro de Souza, datada de 2 de abril de 1883,foi publicada na edição daquele mesmo dia no jornal vespertino “AConstituição”, p. 1-2, de Belém.

63 Carta de Ribeiro de Souza ao redator de “O Liberal do Pará”,publicada neste jornal em sua edição de 24 de junho de 1883, p. 3.

64 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 5 de junhode 1887, p. 2-3.

65 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 5 de julho de1883, p. 2.

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66 Jornal paraense “Diário de Belém”, de Belém, edição de 25de outubro de 1883.

67 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 17 de julhode 1883, p. 2.

68 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 28 de agos-to de 1883, p. 2. Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edição de22 de agosto de 1883, p. 2.

69 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 28 de agos-to de 1883, p. 2. Jornal paraense “Diário de Belém”, edição de 29 deagosto de 1883.

70 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edições de 29 de agosto,p. 2, e 13 de setembro de 1883, p. 3.

71 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edições de 25 de se-tembro, p. 2, e 26 de outubro de 1883, p. 2.

72 Jornal “A Constituição”, de Belém, edição de 19 de outubrode 1883, p. 2. Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 20 e26 de outubro de 1883, p. 2. Jornal “O Liberal do Pará”, de Belém,edição de 24 de outubro de 1883, p. 2.

73 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edições de 13 (p. 2),14 (p. 2) e 15 (p. 2) de novembro de 1883.

74 Lei n° 634 sancionada pelo presidente da província do Ama-zonas, Theodoreto Carlos de Faria Souto, em 2 de maio de 1884. In:Jornal “Amazonas”, de Manaus, edição de 9 de maio de 1884, p. 3.

75 Ata da sessão de 3 de setembro de 1885 do InstitutoPolitécnico Brasileiro (IPB). Revista do IPB, 26.° ano, Tomo XIX,Tip. de G. Leuzinger & Filhos, Rio de Janeiro, 1889, p. 49-51.

76 Carta de Henri Lachambre a Ribeiro de Souza, contendodetalhes do grande balão, cuja tradução foi publicada no jornal “AProvíncia do Pará” em 22 de março de 1883, e transcrita pelo jornal“Diário de Notícias” em sua edição de 25 de março de 1883, p. 3.

77 Jornal “A Constituição”, de Belém, edição de 17 de julho de1884, p. 1.

78 Jornal “A Constituição”, de Belém, edição de 2 de abril de1883, p. 1-2. Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 3 deabril de 1883, p. 3.

79 Jornal “A Constituição”, de Belém, edição de 21 de agosto de1883, p. 2.

80 Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edição de 17 de

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novembro de 1885, p. 3.81 Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edição de 22 de

agosto de 1883.82 Descrição do balão Santa Maria de Belém e seus acessóri-

os. In: Ata da sessão de 3 de setembro de 1885 do Instituto PolitécnicoBrasileiro. Revista do IPB, 26.° ano, Tomo XIX, Tip. de G. Leuzinger& Filhos, Rio de Janeiro, 1889, p. 49-51.

83 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 5 de julho de1883, p. 2.

84 Teffé, Almirante Barão de. O Brasil – Berço da ciência ae-ronáutica. Imprensa Naval. Rio de Janeiro, 1924. Trecho de cartadirigida pelo genro e ajudante de Ribeiro de Souza ao Barão de Teffé,p. 113-114.

85 Souza, Julio Cezar Ribeiro de. “Esclarecimento ao Público”.Texto publicado no jornal “A Constituição”, de Belém, em sua ediçãode 17 de julho de 1884, p. 1.

86 Jornal vespertino “A Constituição”, de Belém, edição de 12de julho de 1884, p. 1.

87 Goldschmidt, Robert. Navigation Aérienne – Les Aéromobiles.H. Dunod et E. Pinat. Paris, 1911, p. 211. André, M. H. LesDirigeables. Ch. Béranger Editeur. Paris, 1902, p. 238.

88 Nansouty, Max de. Aérostation-Aviation. Boivin & Cie.Editeurs. Paris, p. 347-349.

89 André, M. H. Les Dirigeables. Ch. Béranger Editeur. Paris,1902, p. 250.

90 Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edições dos dias 23(p. 2), 24 (p. 2) e 25 (p. 2) de outubro de 1884.

91 Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edições dos dias 1(pp. 2-3) e 9 de novembro de 1884.

92 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 4 de junhode 1887, p. 2.

93 Antônio Luiz Von Hoonholtz.94 Revista do Instituto Politécnico Brasileiro, 26.° ano, Tomo

XIX, Tip. de G. Leuzinger & Filhos, Rio de Janeiro, 1889, p. 22-2495 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 5 de junho

de 1887, p. 2-3.96 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 16 de janei-

ro de 1885, p. 2.

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97 Uma tradução deste artigo foi publicada no jornal “A Provín-cia do Pará”, de Belém, em sua edição de 15 de janeiro de 1885. Estatradução foi transcrita no jornal paraense “Diário de Notícias”, emsua edição de 16 de janeiro de 1885, p. 2.

98 Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edição de 17 denovembro de 1885, p. 3.

99 Navigation Aérienne: La direction des ballons. Theories etdécouvertes de Mr. Julio Cesar Ribeiro de Souza, né à Pará. Tip. doDiário Oficial. Pará, 1893, pp. 13-17. Livreto impresso em francês edistribuído gratuitamente durante a Exposição Internacional de Chi-cago, de acordo com a Lei n° 65, sancionada pelo governador doestado do Pará, Lauro Nina Sodré, em 30 de agosto de 1982.

100 Amaral, Fernando Medina do. Julio Cesar – O verdadeiroarquiteto da aeronáutica. Natural artes gráficas, Niterói, 1989, pp.108-110

101 Sessão de 18 de março de 1885. Revista do InstitutoPolitécnico Brasileiro, 26.° ano, Tomo XIX, Tip. de G. Leuzinger &Filhos, Rio de Janeiro, 1889, p. 26-27.

102 Teffé, Almirante Barão de. O Brasil – Berço da ciênciaaeronáutica. Imprensa Naval. Rio de Janeiro, 1924, p. 113.

103 Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edições de 11 (p. 3)e 22 (p. 3) de abril e 12 de maio (p.3) de 1885. Jornal “O Liberal doPará”, de Belém, edições de 21 de abril (p. 2), 12 (p. 2), 14 (p. 2) e 16(p. 3) de maio de 1885.

104 Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edição de 7 de abrilde 1885 (p. 3). Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 11 deabril de 1885, p. 2.

105 Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edição de 17 denovembro de 1885, p. 3.

106 Revista do Instituto Politécnico Brasileiro, 26.° ano, TomoXIX, Tip. de G. Leuzinger & Filhos, Rio de Janeiro, 1889, p. 49-51.

107 Jornal “A Província do Pará”, de Belém, edições de 20, 21,22 e 24 de novembro de 1885.

108 Em uma destas conferências, Ribeiro de Souza declarou quea importância de 102.000$000 (cento e dois contos de réis), que lhefora dada durante seis anos e por parcelas, não era nada relativa-mente ao que era preciso se gastar com um empreendimento destanatureza, e que ele havia sido tratado como um mendigo. A França,

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só com a última experiência que fizeram Renard e Krebs, havia gastomais de 150.000$000. In: Jornal “A Província do Pará”, de Belém,edição de 17 de novembro de 1885, p. 3.

109 Lei nº 1.232 sancionada pelo presidente da província do Pará,Tristão de Alencar Araripe, em 5 de dezembro de 1885. In: Coleçãodas Leis da Província do Gram-Pará do Ano de 1885, Tomo XLVII,Parte 1ª. Tip. da Gazeta da Tarde. Pará, 1885, p. 157.

110 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 3 de abrilde 1886.

111 Jornal “Le Brésil – Courrier de L’Amérique du Sud”, Paris,edição de 5 de maio de 1886, p. 1.

112 Uma tradução deste editorial do “L’Opinion” foi publicadano jornal paraense “Diário de Notícias”, em sua edição de 17 dejunho de 1886, e no “A Constituição”, em 18 de junho de 1886.

113 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 4 de junhode 1887.

114 Jornal “Le Brésil – Courrier de L’Amérique du Sud”, Paris,edição de 15 de junho de 1886, p. 1.

115 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edições de 21 e 23 dejulho de 1886.

116 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 29 de julhode 1886.

117 Sessão de 21 de julho de 1886. Revista do Instituto PolitécnicoBrasileiro, 26° ano, Tomo XIX, Tip. de G. Leuzinger & Filhos, Rio deJaneiro, 1889, p. 82-84.

118 Sessão de 18 de agosto de 1886. Revista do InstitutoPolitécnico Brasileiro, 26.° ano, Tomo XIX, Tip. de G. Leuzinger &Filhos, Rio de Janeiro, 1889, p. 86-87.

119 Sessão de 24 de novembro de 1886. Revista do InstitutoPolitécnico Brasileiro, 26.° ano, Tomo XIX, Tip. de G. Leuzinger &Filhos, Rio de Janeiro, 1889, p. 127-129.

120 Revista do Instituto Politécnico Brasileiro, 28° ano, TomoXIX, Tip. de G. Leuzinger & Filhos, Rio de Janeiro, 1890, p. 3-7.

121 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 28 de maiode 1887.

122 Sessão de 8 de junho de 1887. Revista do Instituto PolitécnicoBrasileiro, 28.° ano, Tomo XIX, Tip. de G. Leuzinger & Filhos, Rio deJaneiro, 1890, p. 15-16.

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123 Faça-se a Luz.124 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edições de 1 e 2 de

junho de 1887.125 O jornal paraense “Diário de Notícias”, sob o título “Fiat

Lux”, iniciou a publicação deste livro em sua edição de 3 de junho de1887. Após a publicação desta primeira parte, todas as outras conti-nham, abaixo de “Fiat Lux”, o seguinte: “Navegação Aérea. Um gran-de plágio e uma grande mistificação, denunciados nos tribunais daHistória e da Ciência. Tradução do francês pelo autor Julio Cezar.Pará, 1887”. Foram assim publicados o “Prefácio”, a “Introdução” etrechos da “Primeira Parte. Capítulo 1°”. Não foram localizadas al-gumas edições deste jornal nas quais se encontram reproduzidas par-tes destes textos. Ademais, tudo indica que esta seqüência tenha sidodefinitivamente interrompida após a publicação da última parte queconseguimos localizar, encontrada no referido periódico paraense emsua edição de 10 de agosto de 1887.

126 Jornais “Diário de Notícias” e “Diário do Gram-Pará”, deBelém, edição de 15 de outubro de 1887.

127 Julieta Beatriz Victoria Ribeiro de Souza, Raymundo CaioCatão Julio Cezar, José Maria Luiz Gonzaga Julio Cezar, Maria deLourdes Victoria Ribeiro e Julio Cezar Ribeiro de Souza Filho. Jor-nais “Diário do Gram-Pará” e “Diário de Notícias”, de Belém, ediçãode 18 de outubro de 1887.

128 O casal Julio Cezar e Victoria Ribeiro de Souza teve aindaum outro filho, de nome Agostinho, que faleceu em fins de janeiro de1887, aos quatro anos de idade (Jornal “Diário do Gram-Pará”, deBelém, edição de 1 de fevereiro de 1887, p. 3.), sendo anemia perni-ciosa a causa de sua morte divulgada na imprensa. (Jornal “A Repú-blica”, de Belém, edição de 1 de fevereiro de 1887, p. 3.)

129 Jornais “O Liberal do Pará” e “Diário de Notícias”, de Belém,edição de 15 de outubro de 1887.

130 Jornal “Diário de Notícias”, de Belém, edição de 16 de outu-bro de 1887.

O autor é escritor e professor do Departamento de Física da UniversidadeFederal do Pará.

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Uma rápida visão retrospectiva nos indica que as organizaçõesmilitares tiveram presença marcante na consolidação territorial danação brasileira, e os historiadores civis e militares nos legaram pági-nas primorosas, descrevendo atos de heroísmo e abnegação. O dia19 de abril de 1648, em especial, sedimentou as bases do Exércitobrasileiro, quando, na memorável epopéia dos Guararapes, brancos,negros e índios, unidos pelo ideal de libertação, travaram combate ealcançaram a vitória contra o dominador estrangeiro, na então Capi-tania de Pernambuco.

Outro feito marcante, dentre os muitos acontecimentosenriquecedores da História pátria, ocorreu no dia11 de junho de 1865,com a Batalha Naval do Riachuelo, que definiu a progressão vitorio-sa das forças nacionais, na então conflagrada fronteira oeste do nos-so País, e marcou a indelével atuação da Marinha de Guerra com oheróico sinal de Barroso: “sustentar o fogo, que a vitória é nossa”.

Com a proclamação da República e a conseqüente evoluçãopolítica do País, novos atores começaram a despontar no cenárionacional, principalmente, os jovens tenentes da década de 20, impul-sionados pelos arroubos da juventude e pela consciência democráti-ca, que repudiava o predomínio das poderosas oligarquias.

Os jovens dessa década marcante da História pátria – civis emilitares irmanados em um mesmo sentimento renovador – torna-ram-se personagens de realce nas décadas seguintes, de 30 e 40, nãosó liderando correntes políticas como, em muitos casos, ocupandocargos importantes na administração do País.

A Segunda Guerra Mundial maximizou a influência militar nodirecionamento das questões nacionais e, com o surgimento do mun-do bipolar, a preocupação obcecada com o comunismo internacionale a influência doutrinária dos interesses geopolíticos dos Estados Unidosconduziu ao surgimento de posições radicalizadas e sentimentos an-tagônicos, que acabaram por provocar a grande cisão da família bra-sileira, culminando com a deflagração do movimento de 1964.

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Valendo-se do cenário propiciado pela Guerra Fria, a perniciosainfluência da geopolítica norte-americana prosseguiu com seus efei-tos danosos, visando inviabilizar um sólido Estado industrializado aosul do Equador e, para tal, fazendo confundir os sentimentos naciona-listas em efervescência com os interesses do comunismo internacio-nal e como símbolo de eras pré-históricas e do atraso.

Essa forma de atuação prossegue nos dias atuais, de formamais sutil, usando como instrumento as agências internacionais quemanipulam, bem como cooptando destacados técnicos, veículos decomunicação, burocratas e influentes lideranças políticas que ascen-deram ao poder com o fim do regime militar. Boa parte desses líderesde ocasião, cumprindo papel submisso e antinacional, conduziu o Paísà deprimente dependência do capital internacional e à alienaçãoespoliativa de grande parte do estratégico patrimônio arduamenteedificado pelo povo brasileiro.

Associado aos malefícios dessa geopolítica regional, interesseseconômicos alienígenas, sob o signo diabólico do neoliberalismo, bus-cam argumentos para eliminar o pouco que resta do conceito de so-berania nos países periféricos, apregoando para os Estados já enfra-quecidos, como o Brasil, o fim das fronteiras geográficas, a ideologiado Estado mínimo e a submissão passiva aos interesses do mercado.

Para alcançar mais facilmente seus interesses de dominação,usam artifícios para abalar o sentimento nacional, religioso e familiar,bem como, ardilosamente, reduzir a capacidade de atuação das For-ças Armadas, óbice ainda persistente, pois alicerçado na formaçãode quadros com origem em todos os estratos étnicos e culturais damultirracial população brasileira e sob o compromisso solene de de-fender a pátria, com o sacrifício da própria vida.

Para minar a confiança nacional nessa sólida e patriótica forta-leza, utilizam técnicas subliminares, que iludem os menos avisados eos desinformados, fomentando a desconfiança e rememorando fatosdolorosos que dilaceraram o tecido social, atingindo vitoriosos eperdedores, e de cujos resultados certamente se valeram, em épocasmuito recentes.

O resultado danoso dessa forma irracional de percepção e abor-dagem é a criação de uma atmosfera de desconfiança no papel cons-titucional atribuído às Forças Armadas, há anos sendo fragilizadaspela crescente escassez de recursos orçamentários, bem como pela

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pressão doutrinária de conhecidos segmentos do poder hegemônicointernacional, interessados em reduzi-las a simples guarda nacional,para a vigilância policial das fronteiras e o combate ao crime organi-zado, já que as potências militares que dominam o atual cenário mun-dial se colocam disponíveis para atuar em nosso território, no caso daeclosão de uma ameaça externa.

Graças ao espírito patriótico e à crescente conscientização deuma Nação que preza sua soberania, reações ainda discretas, mas deprofundo significado psicossocial em busca do correto entendimentoda questão nacional, começam a se manifestar, com debates públicose artigos bem fundamentados em veículos de comunicação. Nesserenovador contexto, cabe aos líderes militares um impostergável efirme posicionamento e, valendo-se das novas oportunidades, realizarpalestras junto a organizações e entidades formadoras de opinião,viabilizando uma nova forma de interpretação e análise da participa-ção da expressão militar do Poder Nacional, assim como interagircom a sociedade e definir formas de atuação nos variados segmentosde interesse da nacionalidade.

A criação do Ministério da Defesa – em que pese ter surgidomais por imposição externa do que por uma decisão políticaamadurecida no âmbito da sociedade – poderá evoluir para uma realcoordenação e otimização das ações de interesse comum das ForçasSingulares, respeitadas suas peculiaridades profissionais e operacionais.

A participação de um Ministro de Estado – com vinculaçãopolítico-partidária na direção superior dos Comandantes militares,dever-se-á restringir ao equacionamento das questões de interessedas Forças Singulares e um constante diálogo de esclarecimentoscom o Congresso e a sociedade, consolidando a Política de DefesaNacional e seu enfoque particular na gestão do governo para o qualfoi designado. Cautelas muito especiais devem ser guardadas, paraque os efetivos militares se mantenham afastados das disputas parti-dárias, já que devem se situar aquém das alternâncias de poder, paraque a hierarquia e a disciplina, pilares básicos do estamento militar,não sejam abalados.

Pela relevância da Expressão Psicossocial do Poder Nacionalno contexto amplo de uma Política de Defesa e como missão com-plementar para as Forças Armadas em tempo de paz, visando, princi-palmente, à elevação do sentimento de cidadania, parte do orçamen-

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to para a ação social do governo poderia ser reservada, em rubricaespecial, para que os Comandos militares realizassem uma efetivaatuação cívico-social e de defesa civil. Essa forma de aproximaçãocom as comunidades carentes sempre foi executada, mesmo sacrifi-cando parte dos parcos recursos alocados para o prestamentooperacional, mas a redução continuada dos orçamentos tem compro-metido essa forma cidadã de atendimento aos modestos anseios dapopulação de baixa renda, de onde, majoritariamente, se originamnossos soldados.

Com recursos extra-orçamentários, especificamente definidos,poderiam as Organizações militares, fazendo uso da infra-estruturaorganizacional e material de que dispõem, reforçar os laços daintegração nacional e a assistência às regiões atingidas por diversascalamidades, bem como nas comunidades carentes, onde o Estadonão se faz regularmente presente. Nesse contexto, deve-se realçaros benefícios do Serviço Militar para os jovens oriundos das camadasmais pobres, concedendo-lhes uma oportunidade de ascensão social,com aprendizado técnico, noções de higiene, assistência médica, ali-mentação adequada e tantos outros modestos itens que despertam nojovem cidadão a consciência de uma vida mais digna, que lhes vinhasendo omitida.

Quando se lançam argumentos em defesa de efetivos militaresprofissionalizados, de real interesse das Forças, mas geralmente abor-dados como simples forma de eliminar a incorporação obrigatória dosjovens recrutas, certamente não se atenta para as assimetrias sociaisdo nosso País, em que famílias de baixa renda imploram pela disputadas poucas vagas existentes, buscando uma alternativa para que seusfilhos recebam um pequeno salário, tenham o que vestir e o que co-mer e não sejam facilmente envolvidos pela marginalidade. Essascitadas assimetrias poderiam servir de estímulo para estudos visandoao aperfeiçoamento do processo de convocação como, por exemplo,preenchendo inicialmente vagas por voluntariado, com a opção depossível reengajamento e conseqüente permanência por novos perío-dos na condição de soldados. Esses jovens, estudando e desenvol-vendo uma melhor capacitação intelectual, tornar-se-ão aptos paradisputarem vagas em concursos que lhes assegurem formação pro-fissional estável. Para as vagas ainda disponíveis e em função denecessidades conjunturais, poderiam ser convocados, compulsoria-

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mente, alguns conscritos restantes, para período de permanência natropa mais reduzido, limitado ao cumprimento dos exercícios e dasobrigações para com o Serviço Militar.

A sociedade brasileira, em uníssono e em oposição à falidacantilena do modelo neoliberal, precisa bradar com ênfase que odesenvolvimento de uma nação não se mede tão-somente pelasvariáveis comuns das estatísticas econômicas, mas principalmen-te pela existência de um clima de igualdade de oportunidades paratodos os cidadãos, bem como pela capacidade de atendimento àsnecessidades de alimentação, trabalho, saúde, educação e segu-rança do seu povo.

Esses parâmetros também devem ser realçados em uma Políti-ca de Defesa, pois não podem existir Forças Armadas, capazes dedissuadir aventureiros além-fronteiras, se internamente nos permiti-mos conviver com uma população majoritariamente fragilizada, sobos aspectos mínimos e essenciais para a vida em sociedade.

Em que pese as limitações orçamentárias e a limitada percep-ção da sociedade em termos de uma Política de Defesa, as ForçasArmadas prosseguem priorizando ações de dissuasão estratégica, nasregiões onde tomam vulto as hipóteses de conflito e as conseqüentesameaças à integridade territorial do País.

O cenário regional modificou-se radicalmente a partir da se-gunda metade do século XX, quando os países do Cone Sul buscaramuma aproximação política e econômica, materializada na criação doMercosul, na intensificação do comércio com o Chile e nos acordoscom a Bolívia, em especial no setor da energia, com o gigantescoinvestimento no gasoduto binacional e na geração de termoeletricidadepara a região Oeste do País.

Amenizadas as tensões surgidas ainda no Império, e com a con-solidação dos limites territoriais, passaram as Forças Armadas a de-dicar especial atenção à Região Amazônica, motivo de ambiçõesalienígenas historicamente conhecidas, mas manifestadas de formaclara e ameaçadora com o final da Guerra Fria.

O Exército brasileiro, que em 1949 contava com, aproximada-mente, 1.000 homens no então Comando de Elementos de Fronteira,passa a dispor, no atual Comando Militar da Amazônia, sediado emManaus, de um efetivo aproximado de 25 mil homens e tendo comomissão principal guarnecer o arco amazônico de fronteiras, com 11.248

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quilômetros, acrescidos de 1.670 quilômetros de litoral.Além das operações militares propriamente ditas, cabe ao Exér-

cito, na Amazônia, cooperar no desenvolvimento de núcleospopulacionais mais carentes na faixa de fronteira. Assim é que, emtodos os pelotões de fronteira funcionam normalmente escolas dePrimeiro Grau, e subordinadas ao Comando Militar de Tabatinga te-mos escolas de Primeiro e Segundo Graus.

Da mesma forma, a Marinha e a Aeronáutica, em suas áreasespecíficas de atuação, completam a estrutura defensiva da região, aomesmo tempo em que oferecem, juntamente com a Força Terrestre,um poder estratégico de dissuasão, visando inibir aventuras além-fron-teiras, sem descuidar da assistência às comunidades civis e indígenas.

Ao Quarto Distrito Naval e ao Comando Naval da AmazôniaOcidental, sediados respectivamente em Belém e Manaus cabe, sin-teticamente, patrulhar e defender a vasta malha hidroviária, a foz doAmazonas e o litoral norte, bem como fiscalizar as operações e pro-ver a sinalização para uma segura utilização daquelas preciosas viasde transporte e integração regional, onde atuam cerca de 70 mil em-barcações, dos mais variados tipos e tamanhos.

Através de seus navios de Assistência Hospitalar, conhecidosna Amazônia como “Navios da Esperança”, orgulha-se a Marinhada continuidade do apoio médico e odontológico às populações ribei-rinhas, realizando uma ação cívico-social que se estende da foz doAmazonas até a faixa de fronteira.

Os Comandos Regionais da Aeronáutica, sediados em Belém(Primeiro COMAR) e Manaus (Sétimo COMAR) e as UnidadesAéreas se desdobram pela Amazônia, com as Bases Aéreas de Belém,Manaus, Porto Velho, Boa Vista e um Destacamento de Base, emSão Gabriel da Cachoeira. Com a implantação do SIVAM (Sistemade Vigilância da Amazônia), instalações técnicas foram distribuídasem pontos estratégicos para o controle do espaço aéreo, tais comoVilhena, Guajará Mirim, Rio Branco, Porto Velho, Cruzeiro do Sul,Eirunepe, Manicoré, Tefé, São Gabriel da Cachoeira, Boa Vista, Sinop,Jacareacanga, Manaus, Santarém, Tiriós, Macapá, Marabá, São Luiz,São Félix do Xingu, Cachimbo, Conceição do Araguaia e São Félixdo Araguaia, com uma rede de radares capaz de monitorar, em futu-ro próximo, todas as aeronaves sobrevoando a região e, em especial,as fronteiras nacionais.

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Se a preocupação com os equipamentos e a qualificação profis-sional dos efetivos militares é condição essencial para o sucesso nasoperações militares, a dependência de armamentos e acessórios pro-duzidos no exterior pode inviabilizar a ação continuada das ForçasArmadas em conflitos de prolongada duração.

Por essa razão, em especial, os Comandos militares sempreinseriram em seus planejamentos estratégicos a busca de uma auto-suficiência nacional tanto para a manutenção do material e dos ar-mamentos como para a fabricação de partes e peças de interessedas Forças. Para tal, necessitam contar com instalações logísticasadequadas e, principalmente, com um parque industrial não sujeitoaos mecanismos de controle e bloqueios do exterior, uma vez quesomente empresas de capital nacional poderão ser consideradasmobilizáveis para fins de defesa, quando da possibilidade de ocor-rência de conflitos militares. Essas são premissas importantes, quedeveriam constar como diretrizes do Governo para a política e osprogramas de defesa.

Dentro de suas limitadas possibilidades, as Forças Singulareshá muito desenvolvem esforços em busca da capacitação nacionalnos campos científico, tecnológico e industrial. A Marinha, o Exércitoe a Aeronáutica, com seus Centros de Pesquisas e Parques Logísticostêm gerado tecnologias e desenvolvido produtos que são transferidosàs indústrias nacionais para a produção em série.

Não bastasse a carência de recursos materiais e humanos, surge,rotineiramente, o difícil óbice da superação dos bloqueios tecnológicos,impostos pelas potências hegemônicas, os quais retardam e oneram osprojetos de concepção local, obrigando o desdobramento dos desenvol-vimentos ao nível de materiais, componentes e dispositivos especiais.Como conseqüência, a reação dos setores operacionais é, algumas vezes,de impaciência e descrédito na engenharia doméstica, pugnando pelasimples compra imediata no exterior. O resultado dessa solução simplistaé não só a criação de uma dependência de fornecedores poucoconfiáveis, mas principalmente o enfraquecimento do parque industrialdoméstico, agravando a evasão de divisas e a perda de preciosos equalificados postos de trabalho.

Com uma visão de mais longo prazo, além das necessidadesrotineiras dos produtos de interesse da defesa, impõe-se tambémpriorizar aqueles setores ainda sob controle nacional e buscar investir

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em segmentos estratégicos, que de forma direta e ou indireta gerarãosubsídios para a participação da tecnologia e da empresa brasileiraem produtos mais elaborados. Como decorrência, estaremos capaci-tando nossas empresas para competirem no complexo e seletivomercado que a nova realidade internacional tem proporcionado, as-sim como para a produção complementar dos itens mais sofisticadosde interesse para aplicações militares.

Os programas de sucesso da Marinha, do Exército e da Aero-náutica, que já surtiram resultados concretos, atestam a validade domodelo e não é outro o caminho ainda seguido pelos países industria-lizados, em plena era do propalado modelo neoliberal, da não partici-pação do Estado na economia e da livre iniciativa como a responsá-vel pelos investimentos em tecnologia e na indústria.

Na OCDE, a média da participação estatal em pesquisa e de-senvolvimento está em torno de 35%, variando de 25% a 65% e,diferentemente dos demais membros, os Estados Unidos apresen-tam um gritante predomínio de gastos públicos ligados ao complexoindustrial-militar, constando para a área de defesa cerca de 53,7%do orçamento de P&D, contra 18,2%, na União Européia, e 5,8%,no Japão.

Os ainda modestos gastos do Brasil não podem ser colocadoscomo termo de comparação com as potências industriais, mas osresultados já obtidos propiciaram especial significado em nosso par-que industrial. São exemplos dos benefícios auferidos: o ProgramaEspacial; a EMBRAER; a fabricação de navios e submarinos; aindústria eletrônica profissional, produzindo radares e demais equi-pamentos de comunicações e proteção ao vôo; o desenvolvimentodo motor a álcool; os armamentos convencionais e mísseis comtecnologia 100% doméstica; além do domínio da tecnologia nuclearpela Marinha, assegurando ao nosso País o domínio do ciclo deprodução do urânio enriquecido para os reatores Angra I e II, entremuitos outros.

A hercúlea participação do estamento militar em todos ossetores do nosso País continente, granjeando a confiança e a sim-patia da população, maximizada com os resultados em tecnologiae indústria, são conquistas que, se corretamente divulgadas e sub-metidas ao crivo imparcial da sociedade, mostrariam a capacida-de de realização da gente brasileira e que enchem de orgulho anô-

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nimos cientistas, engenheiros e técnicos, civis e militares, guerrei-ros que, com as armas da inteligência e da dedicação, superamdificuldades materiais e bloqueios absurdos, somando esforços comos combatentes de terra, mar e ar, a fim de assegurar, com amissão que lhes foi atribuída, a liberdade, o progresso e a sobera-nia da nação brasileira.

O autor é Tenente-Brigadeiro-do-Ar Reformado e Ministro Aposentado doSuperior Tribunal Militar.

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Pasqual Antonio Mendonça

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As potentes turbinas do Boeing começaram a acelerar. A pistado Aeroporto Kennedy suporta as centenas de toneladas que vibramcom o rugir dos motores. Lentamente, o gigante inicia sua corrida e,cada vez mais leve, deixa o solo alçando suave vôo.

Na cabine de pilotagem, Felinto, filho do “Seu” Zequinha, lá deColatina, acabou de comandar o recolhimento do trem de pouso, ago-ra os “flaps”, conferiu luzes, pressões e temperaturas, acoplou o pi-loto automático. Fizera, inúmeras vezes, procedimentos semelhantes.Lembrou-se dos primeiros tempos no Aeroclube, do CAP-4“Paulistinha”, onde fazia perdas e parafusos. Vida difícil, as horasde vôo tão caras, suados cruzeiros economizados, com meias solasem gastos sapatos. Valia a pena. Regularmente fazia seu vôo sema-nal, já conseguia pousar “três pontos”, estava dominando a máquina:deixava a terra dos homens, com o avião podia deslocar-se em trêsdimensões.

Sereno, a 40.000 pés, o Boeing abandona os tumultuados cen-tros de controle dos Estados Unidos e passa a voar sobre o Caribe.Gentil e profissional, a comissária adentra a cabine.

– O Comandante vai jantar?– Obrigado, Helena. Apenas água e café; se tiver alguma

fruta...– Verei o que posso fazer. A propósito, os passageiros estão

reclamando do ar-condicionado, tem um grupo do Pará quei-xando-se do frio.

– Ok! Vamos aumentar a temperatura.– Quanto conforto! – pensava Felinto.Tão diferente dos tempos em que voara a mesma rota

transladando pequenos aviões das fábricas para o Brasil. Seu inglêsde então não permitia aventuras pelo interior dos Estados Unidos,contratava um piloto americano para voar de Wichita (Kansas) atéMiami e, a partir daí o vôo era todo seu. Pulando de ilha em ilha, nachamada rota do “Tubarão Feliz”. Um homem, um avião monomotore a imensidão do oceano. Os inúmeros furacões com nome de mu-

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Pasqual Antonio Mendonça

lher, além de emoções, proporcionaram-lhe a oportunidade de conhe-cer Nassau, as Caicos e as Turks, Porto Rico, Guadalupe, Martinica,Trinidad e Tobago, conviver com culturas diferentes e envolver-seem paixões intensas e fugazes.

– O Comandante chamou?– Sim, Helena. Já foi servido o jantar?– Estamos terminando.– Veja se pode apressar, depois de Manaus vamos pegar

turbulência.– E, a quanto estamos?– Uns trinta minutos.– Ok, Comandante, vou providenciar.O radar colorido indica uma imensa nuvem “cumulus nimbus”

na rota. Felinto analisa a situação e resolve fazer um desvio pelaesquerda. Logo à frente um outro e mais outros; a intertropical estáativa, há que procurar um caminho entre as pesadas nuvens. Os cú-mulos impõem respeito, desde grandes alturas com enormes granizose formação de gelo até ao chão com muito vento e chuva pesada,tudo isto entremeado por luminosos relâmpagos.

Certa vez, nessa mesma região, Felinto, voando em um aviãosertanejo, de Itaituba para o Garimpo do Meio, desviando-se de for-mações de nuvens pesadas, acabou perdendo-se e passou um bom“sufoco”, muito conhecido de quem tem pouco combustível, vê anoite chegar e não encontra um lugar para pousar.

– Centro Brasília, é o cinco dois dois, estamos a vinte minu-tos de Piraí.

– Aeronave, com destino ao Galeão, autorizado baixar, atéo nível cento e vinte; chamar o controle Rio sobre Piraí.

– Controle Rio, é o cinco dois dois, Piraí, nível cento e vinte.– Autorizado procedimento para pista 15. Informo que os

primeiros trezentos metros estão interditados, observar homens emáquinas. Passar para a Torre Galeão sobre Caxias ou avistan-do a pista.

– Cinco dois dois ciente.– Torre Galeão, é o cinco dois dois avistando a pista.– Livre pouso, vento de cento e oitenta graus, com quinze nós.– Cinco dois dois no solo aos 44 minutos livre táxi.Descidos os passageiros, Felinto se demora um pouco mais para

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sair. Nunca se retardara tanto para recolher as cartas de vôo, assinarformulários, retirar a bagagem. O livro de bordo, não apenas rubricoucomo fizera tantas vezes, caprichosamente datou e assinou por ex-tenso.

– Comandante, um diretor da companhia está na escadapara apresentar-lhe as despedidas. – diz a comissária com olhosmarejados.

– Obrigado, Helena.– ... E, por imposição da legislação, o Comandante Felinto,

após 25.000 horas de vôo, completa, hoje, a idade limite parapermanecer...

Dias depois...– Felinto, vamos jogar tênis amanhã à tarde?– À tarde não posso, inicio minhas aulas de ultraleve.

O autor é Coronel-Aviador da Reserva da Aeronáutica e escritor.

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Jorge M. Brochado de Miranda

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Em 17 de junho de 1922, amarava na Baía de Guanabara ohidroavião monomotor “Fairey” 17 tripulado pelos aviadores da Ar-mada Portuguesa, Contra-Almirante Carlos V. Gago Coutinho e Ca-pitão-de-Fragata Artur de Sacadura F. Cabral, concluindo a viagemaérea de Lisboa ao Rio de Janeiro, que haviam iniciado em 30 demarço do mesmo ano. Acabavam de percorrer uma distância total de8.384 km em nove etapas, sendo a maior e mais arriscada e quemelhor define o caráter científico-tecnológico do vôo, a que ligou CaboVerde (Porto da Praia) aos penedos de São Pedro e São Paulo, per-didos na imensidão do oceano e distantes de 1.861 km.

Este feito pode comparar-se, como ato de fé e de audácia, aoutros anteriormente praticados por aviadores americanos e ingle-ses. Mas é único e pioneiro em termos de Navegação Aérea, abrindo

Viagem aérea Lisboa - Rio de Janeiro

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Jorge M. Brochado de Miranda

portas à futura projeção do poder aéreo através dos oceanos, e essaé a razão por que o trago a este congresso.

“Os portugueses, imbuídos da sua natural vocação marítima,foram iniciadores e mestres da navegação astronómica e da carto-grafia moderna pós medieval”.1

O sucesso da Epopéia dos Descobrimentos e da ExpansãoMarítima portuguesa dos séculos XV e XVI ficou a dever-se a trêsrazões fundamentais:

– O arrojo das concepções;– O espírito de aventura e de sacrifício das suas gentes;– A base científica da Navegação.Estas capacidades e competências mantiveram-se com o rodar

dos séculos, por vezes adormecidas, despertando eventualmente paraa realização de outros feitos de projeção mundial.

Quando, já no século XX, se começou a desenvolver a Avia-ção, o mais-pesado-do-que-o-ar, de novo os portugueses se viriama notabilizar, nomeadamente na resolução do problema da Navega-ção Aérea.

“A tradição histórica da Ciência Náutica portuguesa viria a re-nascer num novo contexto, impondo-se mais uma vez pelo pioneirismoe sobretudo pela inovação científica.”2

Os rápidos aperfeiçoamentos da Aviação durante a PrimeiraGuerra Mundial tornaram possíveis, embora recheados de dificulda-des, os longos vôos a abrir os caminhos do ar.

Lutando com escassez de recursos, o piloto aviador SacaduraCabral (e Ortins de Bettencourt) e o navegador Gago Coutinho havi-am realizado em 1921 a travessia aérea Lisboa-Ilha da Madeira, semapoios no mar, numa distância de 980 km, que foram percorridos em7 horas e 40 minutos, à velocidade de 130 km/h. Pretendiam ensaiara aplicação prática dos estudos teóricos a que se vinham dedicando,sobre métodos e instrumentos de Navegação Aérea, tendo chegado

1 SOARES, António J. Silva. Conferência proferida na Sociedade deGeografia de Lisboa, em 17 de junho de 1997, por ocasião do 75ºaniversário da primeira travessia aérea do Atlântico Sul.

2 SOARES, António J. Silva. Conferência proferida na Sociedade deGeografia de Lisboa, em 17 de junho de 1997, por ocasião do 75ºaniversário da primeira travessia aérea do Atlântico Sul.

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à conclusão de que, conjugando a Navegação estimada com a Nave-gação Astronômica e introduzindo métodos expeditos de cálculo, sepodia navegar no ar de forma absolutamente precisa e segura.

Na mente destes aviadores estava então um desígnio ambicio-so, a travessia do Atlântico Sul, a ligação aérea de Portugal com agrande nação irmã, o Brasil. Mas levantavam-se alguns constrangi-mentos que Sacadura Cabral diligenciava superar.

Desde logo, o Ministério da Marinha apoiava e financiavao projeto, mas com uma verba fixa, não ultrapassável: o paísencontrava-se em crise social, financeira e cambial. Não dis-pondo Portugal de Indústria Aeronáutica desenvolvida, havia queencontrar no mercado internacional um avião minimamente ade-quado para realizar o vôo, de preço compatível com a magraverba disponível.

Depois de ter analisado as várias hipóteses que se lhe abriam,avião de rodas ou hidroavião, de flutuadores ou de casco, SacaduraCabral escolheu o hidroavião inglês FAIREY com um só motor RollsRoyce de 350 CV, a cujo modelo de série mandou introduzir algumas

Primeira travessia aérea do Atlântico Sul

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alterações na tentativa de lhe aumentar a autonomia para as 16 horasde vôo necessárias para dar o salto de Cabo Verde para a Ilha deFernando de Noronha, a etapa mais longa e mais difícil em termos deNavegação Aérea.

Mas, apesar das promessas e dos esforços do fabricante, asmodificações introduzidas não trouxeram ao avião as virtualidadesesperadas.

Ao verificar, em Cabo Verde, que não conseguia descolarcom a mesma carga com que havia saído de Lisboa, e que nãopodia meter a quantidade de gasolina necessária para atingir aIlha de Fernando Noronha, mas só à justa para os Penedos,devido ao consumo exagerado do motor verificado nas etapasanteriores e à entrada de água nos flutuadores que não conse-guia esgotar totalmente, bem como à temperatura mais eleva-da das águas equatoriais e à menor densidade do ar, a Sacadurasó restava:

– Ou desistir da continuação do “raid”;– Ou prosseguir para os Penedos confiando na competência do

navegador, Gago Coutinho, e na validade do seu método de Navega-ção, cujo rigor tinham vindo a comprovar nas etapas já percorridas.Por outro lado, reduzir o peso do avião tanto quanto possível, o que setraduziu na limitação da bagagem ao mínimo indispensável e na reti-rada da aparelhagem de radiotelegrafia que, no dizer de Gago Coutinho,lhes roubaria uma hora de vôo de gasolina.

Sacadura Cabral tinha pela frente uma árdua tarefa a realizar.Instalado numa cadeira acanhada e inconfortável, numa carlinga queprimava pela rusticidade, tinha de pilotar um avião com deficiênciasde compensação num vôo de longa duração, e, atingido o ponto dedestino, uns penedos que mal afloravam do oceano, amarar a seulado, num hidroavião de flutuadores, de duas toneladas de peso, emmar aberto.

Mas o sucesso da empresa estava fundamentalmente nas mãosde Gago Coutinho, o navegador, que estava obrigado a praticar umaNavegação rigorosa, que não podia errar. Ele havia de ir ao encontrodaquelas pedras perdidas no mar, de fraca visibilidade, onde os aguar-dava um navio de guerra para os reabastecer, sob pena de, sem mei-os de comunicação e fora das rotas dos navios que cruzam o Atlân-tico, desaparecer na imensidão do oceano.

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O fato de, ao amarar “in extremis” ao lado do navio e dos pene-dos, em mar de “ondulação desencontrada e grossa”, já com omotor a dar sinais de que a gasolina se esgotara, a crista de uma ondater levado um dos flutuadores, não deslustrou a proeza cometida. Sóatrasou o prosseguimento do “raid” que teve de aguardar pela che-gada de um novo hidroavião. Gago Coutinho, admitindo à partida deCabo Verde que os flutuadores, demasiado frágeis, pudessem nãoresistir se o mar estivesse agitado, dava-se por feliz se lá chegasse.Disse a um jornalista que então o entrevistou: “as pedras já sãoBrasil”3.

3 MOREL, Edmar. Gago Coutinho e a sua Vida Aventurosa. Rio deJaneiro, 1941 p. 63.

Traçado deNavegação

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Nas datas em que os portugueses efetuaram os “raids” referi-dos, em 1921 e 1922, já haviam sido realizados outros vôos de longaduração sobre o mar:

– Os americanos saltaram da Terra Nova para os Açores eLisboa, em maio de 1919, prosseguindo para a Inglaterra;

– Os ingleses voaram da Terra Nova para a Irlanda, em junhode 1919.

Na seqüência da Primeira Guerra Mundial, o avião, máquinavoadora mais-pesada-do-que-o-ar tinha evoluído de forma a permitirque os países ribeirinhos do Atlântico começassem a pensar na suatravessia. Nos últimos meses da guerra, a Marinha dos EUA haviaconstruído, em ligação com a empresa Curtiss, hidroaviões de patru-lha em alto mar, os NC (Navy-Curtiss). A autonomia destes apare-lhos era suficiente para permitir folgadamente o vôo Terra Nova-Açores-Lisboa.

Foi o Comandante Read quem comandou este primeiro vôo,com uma equipagem de cinco homens. O seu avião tinha quatro mo-tores de 400 CV cada, o que lhe dava um grau de segurança confor-tável, e estava provido de equipamento de radiogoniometria que per-mitia levantamentos até 140 km sobre os 70 “destroyers” escalonadosde 60 em 60 milhas, a balizar a rota, (que durante a noite emitiamsinais luminosos), e até 1.000 km sobre postos em terra, TSF com umalcance de 460 km, e telefonia com um alcance de 40 km 4.

Os ingleses Alcook e Brown atravessaram o Atlântico da TerraNova para a Irlanda em junho de 1919 a bordo de um avião Vickers –“Vimy”, de dois motores de 360 CV cada, que podia voar com um sómotor, munido de um aparelho de TSF, um sextante marítimo e trêsbússolas. Cobriram os 3.040 km em 16 horas à velocidade de 200 km/h, favorecidos pelo vento5, restando-lhes ainda à aterragem um terçoda gasolina metida à partida. A Navegação limitou-se a seguir a agulhano rumo predeterminado, sem grandes preocupações, e a progredir aoencontro das grandes massas de terra que são a Irlanda e a Inglaterra,tendo-se limitado a fazer quatro observações de astros, usando umsextante inglês, com resultados pouco precisos. Quando aterraram, naIrlanda, não sabiam exatamente onde se encontravam.

4 5 “100 Significant Aircraft”. In: JANE’s 1909/1969, set. 1969.

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Esta foi a primeira travessia em vôo direto do continente ameri-cano para o europeu. A Navegação, isto é, o conhecimento exato daposição do avião em cada momento, e da direção e distância ao pontode destino, não foi praticada com rigor.

Não se passou o mesmo com Gago Coutinho e Sacadura Cabral.Ao longo do caminho traçado sempre souberam, exatamente, a posi-ção em que se encontravam, qual o rumo e distância ao ponto dedestino e que gasolina lhes restava para o alcançar.

Antes de se lançarem na empresa que estamos a descrever, edurante três anos, na seqüência do vôo do Comandante Read, comquem se tinham encontrado e conversado à sua passagem por Lis-boa, tanto Sacadura como Coutinho, homens muito experientes naNavegação à vela e no uso do sextante, quer na Navegação Maríti-ma quer em trabalhos de Geodésia dedicaram-se ao estudo da suaaplicação à Navegação Aérea.

Ambos tinham uma sólida preparação científica básica emMatemática, Astronomia, Geodésia e Navegação Marítima.

Gago Coutinho praticara intensamente a Navegação Marítima

Sextante de Gago Coutinho

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Jorge M. Brochado de Miranda

com base na Astronomia, ao percorrer em navio à vela os caminhosdos navios das descobertas, e estudara atentamente os regimes deventos e de correntes no Atlântico Sul. Juntamente com SacaduraCabral praticou Astronomia de posição e Topografia ao percorrercom meios de locomoção rudimentares as extensas e inóspitas su-perfícies africanas a delimitar as fronteiras de Angola e deMoçambique, ainda na seqüência das exigências da Conferência deBerlim de 1885. O seu trabalho rigoroso e preciso mereceu o elogiodos ingleses, a outra parte interessada nesse trabalho.

Sacadura Cabral apreciou criticamente os meios e métodos deNavegação usados no “raid” do Comandante Read. Mercê dos seusconhecimentos científicos, da experiência vivida no mar e em África,das qualificações como aviador (obteve o brevê em França, em 1916),e da experiência como Instrutor e Diretor da instrução na primeiraescola de Aviação em Portugal e depois como Chefe da AviaçãoNaval, apercebeu-se de que seria possível criar um método específi-co de Navegação Aérea simples e preciso.

Definiu e equacionou os problemas característicos da aplicaçãodo sextante à Navegação Aérea, a saber:

– O plano de referência para medição das alturas angulares dosastros;

– O vento ao nível de vôo, afetando a trajetória e a velocidadereal do avião em relação ao terreno;

– A rapidez de cálculo exigida pela velocidade própria do avião.

Diagrama do sextantede Gago Coutinho

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Entretanto, Gago Coutinho debruçava-se sobre a adaptação aosextante normal de marinha de um nível de bolha de ar que permitisseobter um horizonte artificial necessário à Navegação Aérea quandonão fosse possível observar o horizonte de mar.

“Em trabalho conjunto, ambos estudaram a resolução do pro-blema do vento, tendo criado um calculador gráfico que ficou conhe-cido por “Corrector de Rumos Cabral - Coutinho” e adoptaram umsistema de medição de ângulos de deriva mediante a observação dodesvio angular de bóias de fumo lançadas ao mar. Gago Coutinhoultimou a adaptação do horizonte artificial ao sextante, tendo conce-bido uma solução geométrica que tornou as observações mais fáceise mais rigorosas do que em outros sextantes americanos e ingleses jáentão existentes. Finalmente, Gago Coutinho dedicou-se também àtarefa de reformular e simplificar os cálculos astronómicos, de formaa reduzir drasticamente o tempo de determinação das linhas de posi-ção astronómicas, pondo em prática um método inédito de pré-cálcu-lo de vários elementos a utilizar em voo”.

“No seu conjunto, todos estes trabalhos conduziram à criação doque podemos definir como o primeiro “Sistema integrado de navega-ção aérea científica”, na Historia da Aviação Integral, porque envolviatodas as tarefas necessárias, desde a resolução do triângulo de veloci-dades, incluindo a determinação do vento, utilizando instrumentos cria-dos especialmente para o efeito, observações astronómicas comsextante adaptado, determinação de linhas de posição astronómicas,usando métodos de cálculo devidamente adaptados à duração do voo eaté o próprio critério da condução da navegação. Foi um trabalho ple-namente inovador, que proporcionou um passo decisivo para tornar aaviação definitivamente autónoma das referências terrestres” 6.

A primeira travessia aérea do Atlântico Sul decorreu de formaprecisa, pondo em prática o método integral de Navegação Científicadelineado pelo Navegador Gago Coutinho com a colaboração do Pi-loto Sacadura Cabral. Todavia, tendo sido realizada durante o dia,não houve necessidade de utilizar o horizonte artificial, de bolha de ar,introduzido por Gago Coutinho no sextante marítimo. Ele utilizou sem-pre o horizonte de mar, tendo observado 40 grupos de alturas do sol.

6 SOARES, António J. Silva. Conferência proferida na Sociedade deGeografia de Lisboa, em 17 de junho de 1997, por ocasião do 75ºaniversário da primeira travessia aérea do Atlântico Sul.

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Cinco anos mais tarde, em 16/17 de março de 1927, outro pu-nhado de homens decidido e audaz, da Aviação portuguesa (Sarmentode Beires, Jorge de Castilho e Gouveia), realizou a primeira travessiaaérea noturna do Atlântico Sul, tripulando um hidroavião Dornier ”Wal”(o ARGOS), com dois motores Lorraine de 450 CV cada, monocasco,mais resistente ao mar do que o avião de flutuadores de SacaduraCabral. O grande salto da Guiné a Fernando Noronha, numa distân-cia de 2.595 km, foi coberta em 18.12 horas de vôo, 13 das quais denoite. Como o avião não dispunha de qualquer equipamento rádio,nem o apoio de navios no mar, o navegador, Cap. Jorge de Castilho,orientou-se somente pelas estrelas, afirmando ao mundo, com umanoite inteira de Navegação Astronômica – feito inédito nos anais daNavegação Aérea – o real valor do “sextante Gago Coutinho”.

Traçado de Navegação com a assinatura de Gago Coutinho

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Jorge M. Brochado de Miranda

Entretanto, outra travessia aérea do Atlântico Sul havia sido reali-zada um ano antes, em jan./fev. de 1926, por um aviador espanhol, oComandante Ramon Franco, voando num hidroavião Dornier “Wal” (oPLUS ULTRA), com dois motores Napier de 450 CV cada, monocasco7.Com uma equipagem de quatro homens e bem equipado para a Navega-ção radioguiada, fez escala em Cabo Verde (porto da Praia) e Fernandode Noronha, chegando a Buenos Aires em 10 de fevereiro. Embora esteaviador tenha apoiado a sua Navegação essencialmente naradiogoniometria, e voado durante o dia, usou também o sextante GagoCoutinho. São suas as seguintes palavras referindo-se ao Almirante:

“É a ele que todos devemos a maneira segura de voar sobre omar. Há seis meses que troco com o Mestre correspondência sobreassuntos de navegação aérea. Aproveitarei de novo o seu sextantena volta ao mundo” 8.

O “raid” de Sacadura Cabral/Gago Coutinho não ganhou aconsagração internacional. Não consta da generalidade dos códiceshistóricos estrangeiros, nem tem representação nos museus aeronáu-ticos para além de Portugal e do Brasil, apesar de representar umtrabalho científico inovador.

Talvez tenha contribuído para isso o fato de Gago Coutinho, figuramodesta e desprendida de interesses de ordem material, não ter registra-do a patente do seu invento. Confiou à casa alemã Plath-Hamburgo aexecução do projeto e autorizou-a depois a comercializá-lo por todo omundo, tendo sido os seus primeiros e principais clientes a Alemanha, oJapão, a França e a Espanha. O uso do velho sextante marítimo, modifi-cado pelo sábio almirante português, na Navegação Aérea, foi-se vulga-rizando até se diluírem no tempo as circunstâncias da sua origem.

Podemos recordar, porém, que instituições científicas idôneas ede prestígio internacional prestaram, ao tempo, honrosas homena-gens aos dois aviadores, como foi o caso da Sorbonne(9), e que obrashistóricas de referência o mencionem com o merecido relevo(10).

7 “Grandes Vuelos de la Aviatión Española”. In: Seminário de EstudiosHistóricos Aeronáuticos. CARRILLO, José Warleta. El vuelo del “PlusUltra”. Madrid, 1983.8 CORREIA, José P. Pinheiro. Gago Coutinho, precursor da navegaçãoaérea. Edição do Centenário, 1969. p. 339.9 L’AÉROPHILE, 1er/15 Juin 1923. p. 170.10 DOLFUSS, Charles, BOUCHÉ, Henri. Histoire de l’aeronautique. Paris:L’Ilustration: Paris, 1932. p. 375.

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Jorge M. Brochado de Miranda

O sextante foi, durante a época pré-espacial, o instrumento deNavegação de maior relevo nos vôos intercontinentais transoceânicos.Até ao advento dos sistemas de Navegação Hiperbólica de longoalcance (LORAN, DECCA e OMEGA), a Navegação Astronômi-ca, apoiada no sextante de horizonte artificial concebido por GagoCoutinho, desempenhou um papel decisivo no sucesso da AviaçãoMilitar e Comercial, sobre o mar. A sua importância esvaneceu-se hátrês décadas, com o aparecimento do sistema de Navegação porReferência Inercial (INS) e foi praticamente substituído pelamassificação de sistemas globais de Navegação apoiados em cons-telações artificiais, do tipo GPS americano, do GLONASS russo e,num futuro próximo, do GALILEO europeu. Todavia, hoje em dia,ela está presente nas fases cruciais das viagens espaciais, porquantoé, através dela, que são corrigidos os sistemas de Navegação Inerciale que são garantidos os ângulos de reentrada na atmosfera terrestredas naves do tipo “Space Shuttle”.

Uma análise mais atenta e porventura nostálgica da Navega-ção Astronômica nos dá conta de que ela possui demasiado potencialpara ser definitivamente ignorada. Quiçá, num futuro mais ou menoslongínquo, ditado pela inexorável saturação do espectro eletromagné-tico, finito e vulnerável, possamos assistir ao rejuvenescimento da-quele sistema, assistido pela incontornável realidade tecnológica digi-tal, e à criação de um novo paradigma de Navegação híbrida astro-inercial. Neste, a componente astronômica apresentar-se-á comodeterminante para a validação e correção da componente inercial,assegurando a precisão, a globalidade e a invulnerabilidade essenci-ais à Navegação Aeroespacial do terceiro milênio! Simultaneamente,ver-se-á perpetuada uma técnica ancestral que, tendo nascido dacontemplação do firmamento e mercê do engenho e da inspiração dementes brilhantes como Gago Coutinho, contribuiu preponderante-mente para o desenvolvimento dos povos, particularmente no que aopoder aeroespacial diz respeito.

O autor é General da Força Aérea Portuguesa e apresentou a presente pales-tra por ocasião do IX Congresso da Federação Internacional de Entidades deEstudos Histórico-Aeronáuticos e Espaciais (FIDEHAE), realizado em BuenosAires, no período de 17 a 21 de outubro do corrente ano.

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Araken Hipólito da Costa

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Tanto o público quanto os artistas em geral consideram nebulo-so o presente tema, ou por mera falta de argumentação, ou pela con-cordância com alguma posição antiética supostamente permissívelao artista. Para responder tal indagação é necessário fundamentar aética de maneira clara (e concisa, por tratar-se de um artigo).

Por definição, a ética é a parte da filosofia prática que versasobre a reta ordenação dos atos humanos a partir da razão. Paracompreendermos como funcionam os atos humanos, podemos dizerque um ato verdadeiramente humano deve proceder da vontade livredo homem, como ser racional. Portanto, o ato deve estar em vista deum fim. Caso contrário, tratar-se-ia de um ato meramente natural ouinstintivo (os animais, por exemplo, não conhecem o porquê de agi-rem).

Todos os seres tendem naturalmente para o fim último, que éseu bem. O fim de um ser está em função de sua natureza, estádeterminado por esta natureza, a qual não é escolhida pelo homem(essa natureza que nós recebemos não pode por nós, segundo nossaescolha, ser modificada ou escolhida; o homem não escolheu ser ra-cional, ele é racional independentemente de sua vontade). Podemos,no entanto, escolher os fins intermediários para a realização do fimúltimo. Este é assim definido por Santo Tomás de Aquino: “É impos-sível que a felicidade do homem, esteja em algum bem criado.Nada pode fazer repousar a vontade humana, senão o bem uni-versal supremo, que é Deus. Só este pode, com sua infinita bon-dade, satisfazer de modo perfeito a vontade do homem”.

Transpondo esses fundamentos para o universo das artes plás-ticas, cabe ao artista ordenar retamente o seu ofício para a percep-ção da beleza do Bem Supremo; evitar atos que conduzam àbanalização da arte, como a busca desenfreada pela fama (cujo iní-cio, aliás, deve-se ao Renascimento) a partir de uma arte comercialque visa simplesmente à recompensa financeira, radicada noimediatismo e exibicionismo oriundos da imaturidade, do insuficienteaprofundamento técnico e da falta de conhecimento histórico da arte.

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Araken Hipólito da Costa

É preciso lembrar que a arte pertence, também, à esfera do trans-cendente. Portanto, o artista não deve se limitar a uma obra imanente,fruto da ação prática e de interferências sociais, e usada de maneiraideológica.

Cabe ressalvar, ainda, uma questão ética que causa transtornono seu correto entendimento: a distinção entre liberdade e livre arbí-trio. Pelo livre arbítrio, cada qual dispõe sobre si mesmo. Contudo,apresenta-se, não raras vezes, como o mero uso da vontade, semmedir as conseqüências inerentes ao ato, o que leva à escravidão enão à liberdade. No entanto, a liberdade verdadeira é o uso da vonta-de livre, analisado pela inteligência e ordenando o fim último da exis-tência humana que é Deus. Constatamos que, para um ato ser total-mente íntegro, seu objeto, fim e circunstâncias devem ser moralmen-te bons. Caso contrário, dá-se a aplicação do pensamento deMaquiavel, tão conhecido e utilizado nos dias de hoje, segundo o qual“os fins justificam os meios”.

Por fim, respondendo à indagação inicial, podemos concluir queo artista é uma pessoa inserida na sociedade. Sua obra reflete um atohumano, portanto reflete a moralidade do artista, que, por recebergratuitamente este dom, deve, por amor ao ofício, direcioná-lo à Be-leza que está contida no Bem e na Verdade, enfim, em Deus.

O autor é Coronel-Aviador da Reserva da Aeronáutica e Diretor do Depar-tamento Cultural do Clube de Aeronáutica.

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Manuel Cambeses Júnior

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O artigo enfoca a interpretação do autor sobre cinco aspectos contidos naGlobalização

Globalização PerversaO sociólogo francês Henri Mendras batizou o termo “contra-

sociedade” para referir-se a todos os integrantes de uma determina-da sociedade que não podem ou não querem seguir o ritmo e as exi-gências que esta impõe. Seu expoente natural seria aquele indivíduoque, por impossibilidade ou simples falta de desejo, não consegueadaptar-se à velocidade com que se move o seu entorno social, trans-formando-se, conseqüentemente, em um verdadeiro pária dentro dasociedade a que pertence, ou seja, um deslocado, um “desadaptado”,um ser verdadeiramente excluído.

Nos dias atuais, bem poderíamos falar de uma contra-socie-dade mundial. A mesma estaria composta por todos aqueles quenão conseguiram assimilar o ritmo evolutivo da sociedade globalizada.O número de “desadaptados” pode contabilizar-se em dezenas demilhões. E mais ainda, dia a dia aumenta o número de pessoas que,em todas as regiões do planeta, albergam o temor e a angústia desentirem-se excluídas das filas dos seres produtivos. São pessoascomuns que vivem atormentadas e sob ameaça permanente da ex-clusão social.

Os números dessa contra-sociedade têm sido manejados combastante freqüência. Michel Rocard, ex-Primeiro Ministro francês,aponta os seguintes dados: 30% da população ativa dos Estados Uni-dos, ou seja, quarenta milhões de pessoas, vivem em situação de po-breza ou precariedade social, ao passo que 30% da população ativanas três grandes regiões do mundo industrializado podem qualificar-se como desocupada ou marginalizada (Le Monde, Bilan du Mon-de, 2002). Por sua parte, Jacques Chirac, Presidente da França,

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Manuel Cambeses Júnior

assinalava em março de 2004, que os países que compõem a UniãoEuropéia, contam com dezoito milhões de desempregados e cinqüen-ta milhões de cidadãos sob a ameaça de exclusão social. Os paísesintegrantes da OCDE, o clube dos Estados mais ricos do planeta,contam hoje com trinta e cinco milhões de desempregados. E o quedizer dos países em vias de desenvolvimento? A conjunção entre umdesenvolvimento técnico acelerado, sustentado na automação, asso-ciado à ausência ou abandono generalizado das normas de proteçãosocial, estão fazendo aumentar, assustadoramente, o número de de-sempregados e de subempregados. O Brasil, lamentavelmente, é umbom exemplo de país que tem aumentado substancialmente suacompetitividade e inserção na economia global às custas de um notá-vel incremento das filas de desempregados.

A lógica deste perverso processo é simples. Sob o impacto deuma competição produtiva sem fronteiras e sem mesuras, em que aredução de custos transformou-se em dogma, não há espaços paraconsiderações sociais. Existe a tendência, por essa via, de umnivelamento por baixo, na qual a mão-de-obra mais barata, ou a subs-tituição desta pela tecnologia, determinam a sobrevivência dos pro-dutos no mercado. A tecnologia e a redução de custos laborais são osgrandes dinamizadores do novo crescimento econômico. Como bemassinala a revista Fortune, em sua edição de abril de 1998: “Os avan-ços tecnológicos unidos aos implacáveis desempregos em massadispararam a produtividade e elevaram, consideravelmente, osganhos da indústria.”

Frente a essa dura realidade, os países apresentam a ten-dência de se transformarem em um autêntico bazar persa, com-petindo entre si para fazer maiores concessões ao grande capital,como via para captar inversões e garantir o crescimento econô-mico. O resultado dessa postura é que se observa o abandono dosentido do coletivo e do imprescindível papel do Estado em maté-ria de arbitragem e de observância da regulamentação social. Queoutra coisa poderia fazer o Estado? Este se vê incapacitado parafazer frente ao volume e à dinâmica dos capitais privados. Os trêsmaiores fundos de pensão estadunidenses, Fidelity Investments,Vanguard Group, Capital Research & Managements contro-lam em torno de quinhentos bilhões de dólares. Impotente, o Esta-do teve de adaptar-se às exigências do grande capital, sem poder

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Manuel Cambeses Júnior

evitar que o homem se transforme, cada vez mais, no lobo dopróprio homem.

A força emergente após o ocaso do Estado é, obviamente, ogrande capital privado transnacional. Este governa a economiaglobalizada, passando por cima de fronteiras e atropelando gover-nos, impondo leis à sua conveniência e promovendo uma acirradae desumana competição entre países, a serviço de seus interes-ses. Prova inconteste disso encontramos no acordo multilateralsobre inversões que está sendo negociado na Organização Mun-dial de Comércio, que submeteria as leis regulatórias dos países-membros às objeções internacionais, restringindo a capacidade dosEstados de ditar políticas econômicas de interesse nacional. Apergunta a fazer, nesse caso, é a seguinte: que lógica domina ogrande capital transnacional? Esta se sintetiza em uma considera-ção fundamental: a rentabilidade imediata. A necessidade de darresposta às exigências de curto prazo de um gigantesco númerode acionistas anônimos tem-se transformado, efetivamente, narazão de ser fundamental do processo econômico em curso. Den-tro desse contexto, as grandes corporações competem ferozmen-te entre si para captar as preferências dos acionistas, livrando-sede tudo aquilo que possa significar um peso na busca por maioresrendimentos.

Porém, quem é esse acionista anônimo que sustenta a engrena-gem e dita as regras da economia globalizada? Este não é outro,senão o homem comum: o operário, o gerente médio, o funcionáriopúblico, o profissional liberal, a dona-de-casa, ou seja, o mesmo ho-mem comum que vive atormentado pelo fantasma do desemprego ecom medo de vir a engrossar, com sua presença, as filas da grandecontra-sociedade dos dias atuais. Através de sua cotização e na bus-ca de máximo rendimento para as suas economias, investe em fun-dos de pensões mutuais ou, através de pequenas inversões de capi-tais, nas Bolsas de Valores. Dessa maneira, paradoxalmente, ele tem-se transformado em atuante protagonista deste perverso processoeconômico que o atemoriza e o encurrala.

Segundo um curioso processo circular imposto por estaglobalização perversa em que vivemos na atualidade, o homem co-mum tem-se transformado em seu próprio inimigo, erigindo-se feroze desapiedadamente frente a si mesmo.

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Manuel Cambeses Júnior

Globalização IngênuaA globalização é um novo fato no mundo. Não existe dúvida de

que a tecnologia, as comunicações e a economia conduzem a fazerdo planeta uma unidade mais entrelaçada, complexa e inter-relacio-nada. Também é um fato que tal acontecimento tem efeitos em todasas áreas da vida social e, sensivelmente, na economia.

É fora de dúvida que a globalização em si mesma é um progres-so do qual ninguém poderá escapar e um processo irreversível. Po-rém, ao aceitarmos esta constatação, não se admite necessariamenteque todas as suas conseqüências devem projetar-se em uma só dire-ção, a qual, até agora, parece beneficiar basicamente a alguns paísese prejudicar a outros.

Na globalização existem ganhadores e perdedores, porque en-tre os países desenvolvidos se está criando uma mentalidade, em muitossentidos excludente, e que não interpreta todos os fatores que entramno jogo. Tais fatos podem produzir desequilíbrios internacionais capa-zes de conduzir o mundo a dificuldades maiores do que as que seconheceram durante a Guerra Fria.

É uma tremenda ingenuidade pensar que o final da Guerra Friaabriu as perspectivas de um paraíso para a Humanidade. Pelo con-trário, estão sendo geradas intensas contradições que poderão multi-plicar os conflitos no alvorecer deste século e tornar mais difícil avida para grande parte do gênero humano.

Por esse motivo é necessário que os países em desenvolvimen-to tenham claras as noções de interesse nacional. Em muitos casospode haver tendência a uma “globalização ingênua” e a um“internacionalismo irmão”. Esta posição se alimenta na idéia deque existe uma espécie de progresso linear que automaticamente pro-duzirá benefícios pelo simples fato de inscrever-se no “clube daglobalização”. Esquece-se, desta maneira, que neste clube existemmembros de primeira classe, vários de segunda, muitos da terceira einúmeros outros na lista de espera.

A “globalização ingênua” pode conduzir-nos a erros funda-mentais. O primeiro deles é o de prescindir do interesse nacional e dopapel que os Estados e os governos nacionais têm que assumir paradefender os interesses dos países que representam. São muito bons odiálogo, as negociações, as aberturas de mercado e todos os demaisbenefícios que produz o desenvolvimento tecnológico e comunicacional.

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Manuel Cambeses Júnior

Porém, dentro deste intricado jogo, temos alguns interesses a defen-der, uma posição a assumir e uma atitude a vigiar constantemente.

Há alguns anos li um livro que me intrigou profundamente. Estáescrito por um homem sobejamente conhecido no cenário internacio-nal, Kenichi Ohmae, cujo título é: The End of the Nation State (NewYork, Free Press, 2001). É um livro inteligente, porém seus delinea-mentos e conclusões poderiam nos levar a admitir postulados queconduziriam ao prejuízo dos interesses dos povos e das nações me-nos desenvolvidas. Os argumentos são muito bons para defender aposição dos países poderosos, porém inconsistentes para assumir atribuna dos menos aquinhoados.

Um dos argumentos que agora se costuma alardear é de que osEstados são apenas referências cartográficas dentro da estruturapolítica do planeta. Isto, em termos técnicos e comunicacionais podeser considerado correto. Porém, a realidade humana é outra. Os Es-tados estão formados por seres humanos que deveriam estar repre-sentados e encarnados por eles, mas sabemos que, muitas vezes, nãoé assim que as coisas ocorrem. Entretanto é importante enfatizaressa dimensão histórica do Estado nacional: um elo entre as pessoase a ordem política.

Existe uma tecnocracia apátrida que voa sobre as fronteiras epossui fórmulas sintéticas para todas as realidades nacionais. Grandeparte da crise financeira de hoje se deve a que as tecnocracias, par-ticularmente aquelas que influem nas instituições econômicas e fi-nanceiras internacionais, não possuem uma idéia histórica das reali-dades que manejam. Administram fórmulas, abstrações, e jogam comos números e os deslocamentos financeiros sem ter em conta que abase de toda essa circulação financeira internacional está apoiadaem complexas comunidades nacionais, que têm direito de viver suasexpectativas ante o mundo, uma cultura e uma história que defendere preservar é uma lógica aspiração à dignidade e à reciprocidade.

Com a crise asiática ficou bem evidenciado que os mecanismosfinanceiros não se auto-regulam, como ingenuamente alguns vinhampretendendo; que neles intervêm fatores psicológicos e políticos eque ao final das contas, os árbitros não podem ser os interesses inter-nacionais e sim os povos que elegem os seus governantes.

Outro efeito da globalização – ingenuamente aceito – daglobalização é o que supõe que o fato de proclamar a “adesão ao

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clube” pressupõe, automaticamente, a conquista do bem-estar. Paraglobalizar-se é necessário desenvolver certas capacidades nacionais,a formação de recursos humanos, as infra-estruturas básicas, ainstantaneidade nas comunicações e todo um sistema cultural que lheapóie e proporcione sustentação aos efeitos da globalização.

Para criar competição e competência é imprescindível prepararas pessoas, administrar inteligentemente a formação do capital hu-mano e dar-lhe mística, entusiasmo e estímulo para que entenda quea riqueza se apóia, fundamentalmente, na capacidade das pessoas.Para ser competitivo é preciso ser capaz e para atingir a capacidadeé necessário preparar-se e assumir o objetivo fundamental da educa-ção, em bases totalmente distintas das que prevalecem na atualidade.

Porém, também existem requisitos políticos para a globalização.O primeiro de todos é que os governos têm que ser representativosda vontade da sociedade. Isto supõe um controle efetivo por parte daopinião pública e do eleitor, do que fazem os governos e um contratosocial claramente definido para que aqueles que aspiram a falar emnome das unidades nacionais que entram no jogo global possam ser,realmente, legítimos representantes dos povos.

A “globalização ingênua” esquece a maior parte destes com-ponentes. É necessária a privatização de alguns segmentos parasitá-rios do setor público, mas isto tem que estar orientado a que as inici-ativas e os negócios que se empreendam em nome dos países e dasnações, beneficiem o interesse geral e não determinados setoresexcludentes.

A conclusão é que a globalização sem a democracia não funci-onará com eficácia, e para que haja bons governos tem que existirmecanismos de responsabilidade política ante o eleitorado e ante opovo que esses governos representam. Isto quer dizer que a liberda-de e a amplitude dos mercados está somente garantida pela liberdadee dignidade democrática dos povos.

Globalização, Educação e Direitos HumanosPor estar próxima a celebração do qüinquagésimo sétimo ani-

versário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que ocor-rerá em 10 de dezembro do ano corrente, considero necessárioreflexionarmos sobre a situação destes direitos nas circunstânciasatuais. Evidentemente, o mundo de hoje é muito diferente daquele

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Manuel Cambeses Júnior

que existia há 57 anos, quando apenas se iniciava a profunda revolu-ção que conduziu a sociedade do conhecimento e da informação aomundo globalizado. Ante estas novas circunstâncias, os direitos hu-manos não somente perderam sua vigência, mas se fazem mais evi-dentes porque, muito embora a globalização e seus suportes essenci-ais (as novas tecnologias, as empresas transnacionais e os novos sis-temas financeiros) têm sido benéficos em muitos aspectos, tambémtêm produzido graves danos como a expansão e agudização da po-breza, a acentuação das diferenças entre ricos e pobres, o aumentodo desemprego e a vulnerabilidade do Estado e das pessoas ante osinteresses das empresas transnacionais e das entidades financeiras.

A liberdade, a igualdade e a dignidade, sem distinção algumaentre os seres humanos, proclamados nos dois primeiros artigos daDeclaração, continuam sendo vitais, mas talvez agora como nunca seencontram ameaçados. A debilidade crescente do Estado ante osinteresses econômicos transnacionais, que não possuem pátria nemconsideração com os sofrimentos que possam ocasionar, deixa aodesamparo impotentes e densos setores da população.

O Artigo 26 estabelece o direito à educação básica, a qual deveser gratuita e obrigatória. A educação técnica e profissional devegeneralizar-se e a educação superior deve assegurar a igualdade paratodos em função dos respectivos méritos. O que se persegue é odesenvolvimento integral da personalidade, o respeito aos direitoshumanos e as liberdades fundamentais, bem como a compreensão, atolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos étni-cos ou religiosos.

Sem uma educação suficiente e de qualidade, restringe-se acen-tuadamente o direito a receber informações e opiniões e difundi-lassem limitação de fronteiras e por qualquer meio de expressão (Art.19). Torna-se impossível a adequada satisfação dos direitos econô-micos, sociais e culturais, indispensáveis para a dignidade e o livredesenvolvimento da personalidade (Art. 22); limita-se o direito aotrabalho em condições eqüitativas e satisfatórias (Art. 23); corta-se odireito de participar na vida cultural, a gozar das artes e a participardo progresso científico e dos benefícios que dele resultem (Art. 27) e,em geral, faz-se difícil ou impossível desfrutar dos direitos humanos econtribuir para que outros também o façam. Uma pessoa não educadaé totalmente incapaz de cumprir cabalmente com seus deveres e de

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desfrutar plenamente de seus direitos. Uma limitação muito impor-tante é a de não saber como reclamar um direito, o qual,freqüentemente, conduz a impedir o desfrute de outros direitos porparte de outras pessoas ou de toda uma comunidade. Este é o casoda suspensão de serviços essenciais, como a saúde e a educação.

O direito à educação tem se estendido significativamente. Namaioria dos países o acesso à educação básica é quase universal. Oproblema, atualmente, não está no acesso à educação básica, senãona profunda diferença na qualidade do ensino que as classes privile-giadas recebem social, cultural e economicamente, em comparaçãocom a que recebem os setores menos favorecidos, que, na generali-dade dos países constituem a maior parte da população. Em nossasociedade do conhecimento e da informação – num mundo globalizado– na qual o que se busca é a excelência e a competitividade, os quenão estejam bem educados, os que não saibam pensar e se educarempermanentemente, os que não saibam fazer uso da informação e seadaptarem às profundas e velozes transformações que se produzemna ciência e na tecnologia, ficarão marginalizados e irão incrementara pobreza que constitui a endemia mais abjeta do final deste século,quando, paradoxalmente, se estenderam os regimes democráticos e,com mais força, foram proclamados os direitos humanos.

A generalização da educação técnica e profissional e o acesso àeducação superior convertem-se em uma quimera para aqueles quenão tiveram uma educação pré-escolar e básica de qualidade. A igual-dade dos estudos superiores para todos, em função dos méritos res-pectivos, se distancia cada vez mais para as maiorias empobrecidas dapopulação. A gratuidade da educação superior, que se preconiza emmuitos países, é um mito para os pobres e uma regalia para os ricos.

Todos estes aspectos, bem como os indiscutíveis benefícios quenos trazem a globalização e as novas tecnologias, não devem ser desco-nhecidos ou subestimados por nossos dirigentes, nem tampouco pela po-pulação em geral. Daí que o novo currículo de educação básica, emnosso país, tenha como um de seus pilares fundamentais os valores. Emtodas as matérias, em todas as atividades escolares, a atenção deve estarcentrada, fundamentalmente, em valores. Não nos interessa somenteensinar e pensar logicamente, mas também pensar e decidir eticamente.

O desafio é imenso. Faz-se necessário examinar detidamente oprogressivo debilitamento do Estado ante os embates do neoliberalismo

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que aproveita a globalização para apresentar-se como um novo dogmade salvação. Se bem que o Estado deve desprender-se de atividadesque não lhe correspondem e que podem ser realizadas, de melhorforma, pelo setor privado, também é necessário que se fortaleça paraassegurar o desfrute dos direitos fundamentais por toda a população.A educação, a saúde e a segurança devem ser garantidas a todossem distinção de qualquer natureza. Ante o fracasso do comunismo eas injustiças do neoliberalismo, faz-se necessário um novo pacto so-cial que tenha como objetivo precípuo o ser humano e promova umanova organização do Estado e dos organismos internacionais, e quetornem realidade o desfrute dos direitos humanos pondo, desta for-ma, um freio no apetite desmesurado de interesses desprovidos dequalquer sentido humanitário.

Da velha à nova GlobalizaçãoO fenômeno da globalização econômica não é novo no mun-

do. De fato, poder-se-ia dizer que este remonta há cinco séculos.Desde que a Europa se lançou à conquista das rotas de aprovisi-onamento da Ásia e da África, as quais levaram o grande navega-dor português Vasco da Gama a dobrar o Cabo da Boa Esperançae o genovês Cristóvão Colombo a descobrir acidentalmente aAmérica, já existia uma vocação globalizadora. Os espanhóis e osportugueses, pioneiros deste processo, viram-se prontamente al-cançados e ultrapassados pelos holandeses, ingleses e franceses.As Companhias das Índias destes três últimos países transporta-vam as matérias-primas que vieram a dar sustento à maquinariado capitalismo. Com o objetivo de dinamizar o intercâmbio demercadorias e o comércio de capitais, criou-se, em 1694, a Bolsade Londres, transformando essa cidade na capital das finançasmundiais. Com a chegada do Século XIX, a circulação de capitaise mercadorias de um lado a outro do planeta alcança um desen-volvimento exponencial. Ao amparo da revolução da produção,dos transportes e das comunicações, se fabricará e se comerciarátendo em mente uma escala planetária.

Na Europa, a França e a Alemanha disputam a hegemonia coma Grã-Bretanha, enquanto que os Estados Unidos, o Japão e a Rússiafazem sua aparição como potências econômicas emergentes. A pró-pria competição econômica foi uma das razões que acendeu o esto-

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pim da Primeira Guerra Mundial, em 1914. A partir desse momentotudo se modificou. O cenário econômico mundial evidenciou umaacentuada fragmentação que se prolongou até ao final da SegundaGuerra Mundial, em 1945, projetando os seus efeitos até o final dadécada de 1960.

A denominada revolução Reagan-Tatcher inicia um processode desregulamentações, que irá complementar-se com o desapareci-mento da Guerra Fria e a inusitada aceleração da tecnologia. Destamaneira, o mundo volta a integrar-se em escala planetária, reencon-trando uma velha vocação que entrou em crise a partir de 1914.

Não obstante, o mundo globalizado de hoje não é o mesmo queconheceu o renomado economista Adam Smith. Nos dias atuais ospaíses não praticam o escambo, trocando, por exemplo, lã por vinho,mas se imbricam em redes produtoras planetárias, dentro das quais,um mesmo produto final leva incorporado, componentes elaboradosnas mais diversas latitudes. Atualmente, é difícil falar, por exemplo,da nacionalidade de um veículo, quando suas diversificadas peçassão fabricadas em dezenas de países. Hoje, a informação é transmi-tida à velocidade da luz. Textos, imagens e sons são transmitidos deforma instantânea. Autopistas virtuais integram computadoresminiaturizados, em escala mundial. Verifica-se, ainda, que os fretes etransportes diminuíram, radicalmente, os seus custos. O resultado detudo isso é uma economia mundial homogeneizada e unificada emseus mínimos detalhes.

Na economia globalizada dos dias atuais, apresentam-se doisfenômenos bastante freqüentes que os contemporâneos de AdamSmith jamais poderiam imaginar: a possibilidade de crises súbitas edevastadoras em algum país ou determinada região, e a amplificaçãodestas em escala planetária, por via de um inexorável “efeito dominó”.Estes cataclismos de epicentro localizado soem irradiar suas ondasexpansivas, com relativa freqüência, aos quatro cantos do planeta,em virtude da interpenetração da economia, em nível mundial. Não éem vão que o megainvestidor George Soros pronunciou uma fraselapidar capaz de eriçar os pelos do mais frio analista: “Se pessoascomo eu podem fazer cair governos, é porque existe algo dentrodo sistema global que não funciona bem.”

Esta tem sido, lamentavelmente, a lógica da globalização, nestemomento histórico que a humanidade atravessa.

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Globalização: um Mundo em TransiçãoA palavra globalização tem sido utilizada para designar um am-

plo processo de transformação tecnológica, institucional e de direçãoque está ocorrendo, em nosso entender, não somente na esfera eco-nômica, mas também política, social e cultural da humanidade.

Este fenômeno é próprio da evolução do sistema capitalista pós-industrial, devido às incríveis transformações tecnológicas e, também,às mudanças na tecnologia de transferência de dados e da informa-ção. As comunicações têm ocorrido de forma instantânea. Surgemnovos e atraentes temas na arena internacional: o ambiente, o comér-cio de serviços, a propriedade intelectual etc.

Este processo é tão complexo que conceitos como soberania,nação, Estado, empresas multinacionais, organizações não governa-mentais, ecologia, estão sofrendo crises de conceituação em seusalicerces, porque, na realidade, estamos assistindo a uma etapa com-pletamente diferente do processo evolutivo da Humanidade.

Faz-se mister ressaltar que esse não é o primeiro sistema glo-bal, do ponto de vista econômico, já que no século XIX, com as inova-ções tecnológicas e institucionais, a melhoria dos meios de transportemarítimo e ferroviário permitiu expandir os espaços globais, naquelaépoca.

Hoje, encontramo-nos diante de uma nova situação e a com-preensão deste fenômeno implica, em primeiro lugar, entender as trans-formações científico-tecnológicas; em segundo, as mudanças ocorri-das na forma de transação de bens num mundo altamente informatizadoe, por último, o papel cada vez mais determinante do setor serviçosno conjunto da economia mundial.

A globalização não é somente um fenômeno que diz respeito àárea econômica, pois tem implicações diretas no segmento políticodas nações. Ninguém nega a expansão da democracia após a quedado sistema político comunista, na qual se aprofundou e aperfeiçoou osistema democrático como forma de governo nos países em que esteregime já estava estabelecido.

A globalização poderá tender a criar um sistema mais estável esimétrico no relacionamento entre os países. Isto dependerá, funda-mentalmente, do papel que os diplomatas e políticos desempenharãonum desafio histórico e intelectual de imaginação e construção, nestealvorecer de século e de milênio.

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Por isto, finalmente, saber aproveitar as oportunidades e os ris-cos da globalização, em nosso País, deve ser nosso objetivo e implicanum grande sentido do realismo. Isto necessitará lucidez intelectualem captar os novos tempos para poder edificar, em torno deste pro-cesso globalizador, um mundo mais estável e com justiça social.

O autor é Coronel-Aviador da Reserva da Força Aérea, membro do Centro deEstudos Estratégicos da Escola Superior de Guerra, do Instituto de Geografiae História Militar do Brasil e pesquisador do INCAER.

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COLEÇÃO AERONÁUTICA DO INCAER

SÉRIE

HISTÓRIA GERAL DA AERONÁUTICA BRASILEIRA

VOL. 1 – Dos Primórdios até 1920.

VOL. 2 – De 1921 às Vésperas da Criação do Ministério da Aeronáutica.

VOL. 3 – Da Criação do Ministério da Aeronáutica ao Final da Segunda Guerra

Mundial.

VOL. 4 – Janeiro de 1946 a Janeiro de 1956 – Após o Término da Segunda Guerra

Mundial até a Posse do Dr. Juscelino Kubitschek como Presidente da

República.

SÉRIE

HISTÓRIA SETORIAL DA AERONÁUTICA BRASILEIRA

1 – Santos-Dumont e a Conquista do Ar - Aluízio Napoleão

2 – Santos-Dumont and the Conquest of the Air - Aluízio Napoleão

3 – Senta a Pua! - Rui Moreira Lima

4 – Santos-Dumont – História e Iconografia - Fernando Hippólyto da Costa

5 – Com a 1ª ELO na Itália - Fausto Vasques Villanova

6 – Força Aérea Brasileira 1941-1961 – Como eu a vi - J. E. Magalhães Motta

7 – A Última Guerra Romântica – Memórias de um Piloto de Patrulha - Ivo

Gastaldoni (ESGOTADO)

8 – Asas ao Vento - Newton Braga

9 – Os Bombardeiros A-20 no Brasil - Gustavo Wetsch

10 – História do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica - Flávio José Martins

11 – Ministros da Aeronáutica 1941-1985 - João Vieira de Sousa

12 – P-47 B4 – O Avião do Dorneles - J. E. Magalhães Motta

13 – Os Primeiros Anos do 1º/14 GAv - Marion de Oliveira Peixoto

14 – Alberto Santos-Dumont - Oscar Fernández Brital (ESGOTADO)

15 – Translado de Aeronaves Militares - J. E. Magalhães Motta

16 – Lockheed PV-1 “Ventura” - J. E. Magalhães Motta

17 – O Esquadrão Pelicano em Cumbica – 2º/10º GAv - Adéele Migon

18 – Base Aérea do Recife – Primórdios e Envolvimento na 2ª Guerra Mundial -

Fernando Hippólyto da Costa

19 – Gaviões de Penacho - Lysias Rodrigues

20 – CESSNA AT-17 - J. E. Magalhães Motta

21 – A Pata-Choca - José de Carvalho

22 - Os Primórdios da Atividade Espacial na Aeronáutica - Ivan Janvrot Miranda

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SÉRIE

ARTE MILITAR E PODER AEROESPACIAL

1 – A Vitória pela Força Aérea - A. P. Seversky

2 – O Domínio do Ar - Giulio Douhet

3 – A Evolução do Poder Aéreo - Murillo Santos

4 – Aeroportos e Desenvolvimento - Adyr da Silva (ESGOTADO)

5 – O Caminho da Profissionalização das Forças Armadas - Murillo Santos

6 – A Psicologia e um novo Conceito de Guerra - Nelson de Abreu O’ de Almeida

7 – Emprego Estratégico do Poder Aéreo - J. E. Magalhães Motta

8 – Da Estratégia – O Patamar do Triunfo - Ivan Zanoni Hausen

SÉRIE

CULTURA GERAL E TEMAS DO INTERESSE DA AERONÁUTICA

1 – A Linha, de Mermoz, Guillaumet, Saint-Exupéry e dos seus companheiros

de Epopéia - Jean-Gérard Fleury

2 – Memórias de um Piloto de Linha - Coriolano Luiz Tenan

3 – Ases ou Loucos? - Geraldo Guimarães Guerra

4 – De Vôos e de Sonhos - Marina Frazão

5 – Anesia - Augusto Lima Neto

6 – Aviação de Outrora - Coriolano Luiz Tenan

7 – O Vermelhinho – O Pequeno Avião que Desbravou o Brasil -Ricardo Nicoll

8 – Eu vi, vivi ou me contaram - Carlos P. Aché Assumpção

9 – Síntese Cronológica da Aeronáutica Brasileira (1685-1941) - Fernando

Hippólyto da Costa

10 – O Roteiro do Tocantins - Lysias A. Rodrigues

11 – Crônicas... no Topo - João Soares Nunes

12 – Piloto de Jato - L. S. Pinto e Geraldo Souza Pinto

13 – Vôos da Alma - Ivan Reis Guimarães

14 – Voando com o Destino - Ronald Eduardo Jaeckel (no prelo)

Pedidos ao:INSTITUTO HISTÓRICO-CULTURAL DA AERONÁUTICA

Praça Marechal Âncora, 15-A, Centro - Rio de Janeiro - RJCep: 20021-200 - Tel: (21) 2101-4966 / 2101-6125

Internet: www.incaer.aer.mil.br e-mail: [email protected]

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