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Revista Estudos Amazônicos • vol. VI, nº 2 (2011), pp. 139-165
Identidade amazônica e música regionalista
na primeira metade do século XX:
Waldemar Henrique e a perspectiva
primitivista do Modernismo Brasileiro
Nélio Ribeiro Moreira*
Resumo: Este texto pretende apresentar uma leitura acerca da relação entre
as propostas modernistas de constituição de uma música brasileira “original” e o caráter regionalista das composições do músico paraense Waldemar Henrique. O objetivo do músico paraense em sua obra era falar sobre a Amazônia, demonstrando o seu universo mítico como fundador de um ethos, pressuposto este que atendia aos anseios da Semana de Arte Moderna de 1922: a busca das raízes da cultura nacional, para ser utilizada como legitimadora do caráter artístico nacional.
Palavras-chave: Modernismo brasileiro, música regionalista, primitivismo,
Waldemar Henrique. Abstract: This paper intends to present a reading of the relationship
between modernist proposals for the establishment of a regional character of Brazilian Music and the compositions of the musician Waldemar Henrique. The purpose of Waldemar Henrique in his music was to speak about the Amazon, demonstrating his mythical world as the founder of an ethos, assumption that met the aspirations of the Semana de Arte Moderna de 1922: the search of the roots of national culture to be used in bolstering the national artistic character.
Keywords: Brazilian modernism, regional music, primitivismo, Waldemar
Henrique.
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Modernismo e produção de música regionalista: proposta de
conformação identitária
A partir das propostas de constituição de uma música brasileira,
levadas a cabo pela Semana de Arte Moderna de 22, uma nova forma de
música teve sua realização incentivada e existência fortalecida no meio
intelectual: a música regional, ou a busca de comportar em criações
artísticas musicais elementos componentes da vida cotidiana das
populações locais. Diante da necessidade de afirmação desta forma
musical, gradativamente ocorreu a interação entre um mundo visto pela
imprensa da época como civilizado e o “barbarismo selvagem”, sendo
este o fornecedor da matéria-prima para a construção daquilo que
preconizava o projeto estético dos modernistas brasileiros. Este seria o
cerne da autêntica música brasileira, algo que deveria ser descoberto,
segundo a avant garde do Modernismo brasileiro. O mote fundamental é
pensar a construção de uma identidade a partir de algo já existente – e
sobre o qual se pressupõe um caráter autêntico. E, neste processo, a
Amazônia é “incorporada”, por volta da década de 1930, ao cenário
musical brasileiro, a partir do estabelecimento no Rio de Janeiro do
compositor paraense Waldemar Henrique.
O aproveitamento que se deveria fazer da música “primitiva” tendo
em vista a constituição de uma “música interessada” 1 é ação basilar no
projeto marioandradiano; e a música rural é o elemento constitutivo do
projeto. Para Mário de Andrade, seria o intelectual-compositor o
responsável pela conversão da música do meio rural (leia-se, natureza) a
partir de uma nova estética - erudita - na verdadeira música brasileira. Vê
assim que o projeto modernista manteve a dicotomia música erudita e
música popular.2
Neste texto, o objetivo é mostrar que o músico paraense Waldemar
Henrique tinha como ponto nodal das suas composições falar sobre a
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Amazônia, demonstrando o seu universo mítico como se fosse o porta-
voz de um ethos que precisamente atendia ao intento da Semana de 1922:
a busca das raízes da cultura nacional para ser utilizada como
legitimadora do caráter artístico nacional. E a Amazônia, assim, era tida
pelos modernistas nos anos de 1930 como um lugar a ser desbravado
pelo ideário modernista, tal qual o Rio de Janeiro o havia sido nos anos
1920 3.
Contudo, antes de desdobrar este trabalho em seus argumentos mais
importantes e prementes, ressalto uma questão pertinente e que tem
suscitado certo debate: a idéia de ser a cidade de São Paulo o centro e os
outros locais do país como periferia para os modernistas brasileiros.
Como explanação sobre tal assertiva, recorro, neste ponto, a asseveração
do historiador Antonio Celso Ferreira, quando trata especificamente da
visão dos modernistas sobre as outras regiões, às quais espraiariam seu
projeto. Para o historiador citado, ocorreu uma revitalização do “mito”
dos bandeirantes dos séculos 17 e 18 no afã de uma legitimação dos
bandeirantes do século 20: aqueles se haviam lançado na expansão
territorial, aos últimos interessava a modernização cultural do país.4 A
citação abaixo ilustra tal asserção: sob o pseudônimo de Hélios, o poeta
modernista Menotti del Picchia nota a atuação desbravadora dos
paulistas.
Os paulistas, renovando as façanhas dos seus
maiores, reeditam, no século da gasolina, a epopéia
das bandeiras. Desta feita, desta feita, não partem
elas para o sertão ínvio e incerto, amarelo de
lezírias, erriçado de setas. Os bandeirantes de hoje
compram um leito noturno de luxo e seguem,
refesteladas, numa poltrona “poolman”, ardorosos
e minazes rumo da Capital Federal. Anteontem,
142 • Revista Estudos Amazônicos
partiu para o Rio de Janeiro a primeira “bandeira
futurista”. Mário Moraes de Andrade – o papa do
novo Credo – Oswald de Andrade, o bispo, e
Armando Pamplona, o apóstolo, forma arrostar o
perigo de todas as lanças [...]. A façanha é ousada!
[...] a “bandeira futurista” terá que afrontar os
megatérios, os bizontes, as renas da literatura
pátria, toda a fauna antidiluviana, que ainda hoje
vive, por um milagroso anacronismo...5
Sob este prisma, o centro irradiador da renovação intelectual
proposta pelos modernistas foi a cidade de São Paulo, lugar por
excelência da modernidade intelectual brasileira, esta que se seguiu a
modernização industrial, social, etc.6 Estabelecendo uma possível relação
com esta asserção, pode-se afirmar que o literato De Campos Ribeiro
corrobora com esta versão quando informa que é entre os anos de 1923
e 1924 que ocorre a afirmação e o espraiar da afirmação dos modernistas
do “centro” para outras regiões do país. E sobre isso destaca:
(...) [é neste momento] que o florescimento da arte
nova toma conta do país. No Recife é evidente que
o teria de chefiar Joaquim Inojosa, que lançou à
publicidade a revista “Mauricéia” que se tornaria o
órgão oficial dos futuristas pernambucanos,
destacando-se entre eles, como poeta de fina
sensibilidade, o infortunado Austro Costa (...), e
Oswaldo Santiago, que por sua vez fundou a
“Revista Nova”. (grifo meu) 7
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Como mostra o texto, na cidade de Recife havia futuristas e uma
“Mauricéia”, esta uma parecença com a “Paulicéia” (Desvairada) de
Mário de Andrade8. Assim, De Campos Ribeiro coloca o Modernismo
irradiado de São Paulo como algo absorvido pelo meio intelectual
pernambucano. Quanto à Belém, diz:
Em Belém, minha geração, que começara os
primeiros passos em 1921, congregava na
“Associação dos Novos” os “ansiados”, como nos
chamava o saudoso Ângelus, artista que participara
no Rio do movimento de Graça Aranha e para
aqui voltara após a morte do irmão [...].
Começamos, quase todos, na “A Província do
Pará” [numa] seção denominada “Coluna dos
Novos” [que] acolhia nossos versos, nossas
crônicas e contos, dava-nos estímulo, enfim. Em
1924, quando a maioria do grupo já conseguira
atrair sobre sua personalidade a atenção dos
maiorais das letras da terra, aqueles que a ironia de
Raul Bopp, então conosco convivendo , chamava
os “Jacarés Sagrados”, nossa intrepidez lançara ao
mundo literário, não só do Pará, mas do país, a
revista “Belém Nova”, que circulou de 1923 a
1929, com a interrupção de alguns meses,
conseqüência das péssimas condições financeiras
que tínhamos pela frente. Dirigia a revista Bruno
de Menezes e depois Paulo de Oliveira. 9
Querelas acerca de um centro irradiador e seus ecos colocados à
parte, no que tange à questão da busca das “origens” no âmbito da
144 • Revista Estudos Amazônicos
música regional, pode-se ver que a incursão de Mário de Andrade pela
Amazônia na segunda metade da década de 1920 foi uma aventura de
desbravamento em busca da autêntica manifestação da produção cultural
local.
O Modernismo10 é apresentado como o mais importante
movimento11 cultural, no sentido de buscar uma identidade, já ocorrido
no Brasil, e que ecoa, ainda hoje, início do século 21, nas várias
proposições - inclusive políticas - quando se fala de cultura, cultura
popular e identidade nacional, mesmo havendo distintos sentidos e
contendas acerca do seu significado no âmbito local. Mas, de maneira
geral, o objetivo do movimento era pensar e praticar uma inteligência
brasileira que pudesse dar conta da incorporação da cultura nacional às
transformações pelas quais havia passado a sociedade brasileira, desde o
final do século XIX.
Muito já foi escrito sobre o Modernismo, o que demonstra sua
importância para a formatação da cultura brasileira que se seguiu.
Contudo, precisar os marcos definidores do movimento não é tarefa
fácil: é possível somente apontar um marco inicial – a Semana de Arte
Moderna de fevereiro de 1922 – mas não definir seu final. Mas vale frisar
a influência que exerceu sobre a constituição da cultura brasileira e
regional, algo assentado na busca e valorização das raízes – origem e
começo - culturais, projeto em curso ainda hoje nas mais variadas
vertentes culturais.
Um importante elemento a ser destacado no projeto modernista
é o fato de que os modernistas atinavam apenas às manifestações
tradicionais – a música do meio rural – onde, segundo os
integrantes do movimento, estava a música “autêntica”, elemento
caro às suas proposições de busca das raízes da identidade
nacional. Inclusive, havia uma desconfiança, senão uma negação,
Revista Estudos Amazônicos • 145
diante da produção musical do meio citadino. Sobre esta questão,
o antropólogo José Miguel Wisnik expõe:
[Mário de Andrade] procurava diferenciar a "boa"
música, ou seja, aquela que tem "história, elevada e
disciplinada, tonificada pelo bom uso do folclore
(...)” e as manifestações “indisciplinadas,
inclassificáveis, insubmissas à ordem e à história,
que se revelam ser as canções urbanas”. 12
O historiador Arnaldo Daraya Contier corrobora com esta assertiva
quando afirma que “os modernistas brasileiros temiam os ruídos e os
sons oriundos da cidade que sobe - São Paulo, por exemplo.” 13 Isto se
deve ao fato de que o projeto nacionalista dos intelectuais modernistas
não poderia aturar a música popular ligada ao meio urbano, pois esta
explicitava as tensões sociais existentes na cidade, absorvendo diferentes
linguagens musicais, incompatíveis com o projeto estético-centralizador
de constituição da “música nacional autêntica” do modernismo. A
música popular rural seria então a fonte da originalidade, a autêntica
expressão do volksgeist, a palavra alemã com a conotação que lhe arrogou
o filósofo Johann Gottfried Herder.
Todavia, o caso de Waldemar Henrique não é bem este de ser um
compositor nativo. Ele é sim um autor que compõe utilizando elementos
nativos, pode-se dizer rurais, mas que vive no meio urbano. Como se vê
em suas obras, a simplicidade de suas composições é uma característica
da “rusticidade” plasmada em suas músicas. Partindo das sugestões dos
estudos sobre o tema, aqui o intuito é proceder a uma análise de como se
deu a construção e a “exportação” do regionalismo musical amazônico e
como este foi acatado nos grandes centros, na civilização, termo que será
recorrentemente citado nos jornais quando tratam da questão.
146 • Revista Estudos Amazônicos
Não se pretende apontar um possível momento inicial, cronológico,
para a constituição da música regional amazônica, mas mostrar que a
forma como se deu a sua incorporação no Centro-Sul brasileiro, onde se
encontravam as vanguardas que preconizavam não apenas uma
transformação na abordagem do material cultural existente, mas também
sua utilização diretamente ligada à perspectiva de estabelecimento de
uma “cultura” que pudesse satisfazer as necessidades de uma parte da
elite paraense de ter uma “cultura” da qual possa se orgulhar. É essa a
incumbência que Waldemar Henrique assume: ser o eco das florestas, o
seu grande intérprete e – quiçá – inventor de uma identidade, algo tão
acalentado pelos modernistas.
Waldemar Henrique mostra um tipo de música que fala da Amazônia,
o que lhe marca como intérprete e divulgador do folclore da Amazônia.
Seus trabalhos são “mostruários do maravilhoso empório de lendas e
superstições perdidos na imensidade distante”14, por isso devem ser
admirados e exaltados, pois que são possuidores da verdadeira essência
do folclore; são a mais perfeita “demonstração das tradições raciais,
permeadas de poesia”.15
Maravilhado com a música do músico paraense, Menotti Del Picchia
escreveu:
Numa noite destas Waldemar e sua irmã Mara
deram-me a alegria de uma audição íntima. Estava
em redor desses dois um grupo retilante: Mário de
Andrade, De Benedotti, Guarnieri e Arruda
Botelho como embaixadores de música, Cassiano
Ricardo como plenipotenciário da poesia. E Mara
cantou as canções de Waldemar 16.
Revista Estudos Amazônicos • 147
O que encantava os ilustres espectadores eram a música simples e as
imagens maravilhosas representadas pela música do Maestro paraense, as
redes, o boto, o curupira, o uirapuru - que aparece grafado nos
documentos consultados recorrentemente como “irapuru”. Del Picchia,
em tom panegírico destaca que a inventividade musical do compositor
paraense remete a uma teogonia 17. Pode-se aventar que assim se deu o
encontro do Brasil do Sul com o Brasil do Norte, em direção à realização
do projeto de uma arte autêntica e seu caráter identitário.
Waldemar Henrique e o projeto Marioandradiano
Na Amazônia, o modernismo musical ensejado por Mário de
Andrade tivera sua idealização posta à ação nos anos de 1930 por
Waldemar Henrique. E, desta forma, pode-se acenar que o Maestro se
conformou como uma espécie de voz da Amazônia, esta um local
dotado de um imenso repertório que atendia exatamente à premissa
marioandradiana de que, se indo até as origens, e só assim, se poderia
fazer uma música universal, na esteira da inspiração de Manuel De
Falla.18 Ainda segundo Mário de Andrade, não deveriam ser exaltados
alguns compositores e artistas tidos como gênios e que se haviam
tornado celebridades, tal como ocorrera com alguns à época, mesmo
porque não faziam música brasileira, segundo a ótica do connoisseur
modernista. O que está expresso no “Ensaio sobre a música brasileira” a
este respeito é claro: é gratificante que haja esses artistas de reconhecido
destaque, mas também preocupante que assim o seja.
Na música, mesmo os europeus que visitam a
gente perseveram nessa procura do esquisito
apimentado. Si escutam um batuque brabo muito
que bem, estão gozando, porém si é modinha sem
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síncopa ou certas efusões líricas dos tanguinhos de
Marcelo Tupinambá, isso é musica italiana! Falam
de cara enjoada. E os que são sabidos se metem
criticando e aconselhando, o que é perigo vasto. 19
É aí que se destaca Waldemar Henrique. Nos idos anos de 1930 este
músico paraense realizou a música amazônica ressaltando a sua
“quididade regional” e obteve, assim, um reconhecimento longevo, pois
enquadrou a música amazônica no espírito nacional. A música regional
amazônica encontra aí sua perfeita constituição, expressão de um
idealismo que pretende mostrar os sentimentos e sentidos de um povo,
algo que, segundo o referendo modernista, o conhecimento douto
obliterou: o fator primitivo, uma estética original e primordial, o bárbaro
na constituição do propósito artístico nacional-regional, alijando, assim, a
vivência concreta e também psíquica do brasileiro. Tem-se, assim, a
busca de uma “positivação” do brasileiro. Neste sentido, a essência e o
passado são fundamentais. Ressaltando a dicotomia no ideário estético-
modernista/nacionalista-modernista, tendo como liame o ano de 1924
(ano do Manifesto Pau Brasil), Eduardo Jardim de Moraes escreve acerca
da “nova função” do passado nos quadros do Modernismo:
No [Movimento] Pau Brasil, não é o passado
[como um todo] que é negado, mas parte concreta
deste passado, o lado doutor, aquele que escondia,
em função do processo de transplantação cultural,
o verdadeiro passado brasileiro. Daí a recuperação
do nosso lirismo, dos traços bárbaros da
civilização brasileira. Por esta razão também a
importância do contato com as vanguardas
européias é menos decisiva que no primeiro tempo
Revista Estudos Amazônicos • 149
modernista. Nosso material cultural deve ser
descoberto aqui mesmo. 20
A partir da afirmação de um processo de reflexão acerca da música
produzida na região, Waldemar Henrique se mostra o arauto da
expressão identitária da Amazônia quando de seu estabelecimento na
cidade do Rio de Janeiro, já mais próximo do situs modernista. Pode-se
estabelecer aí o começo e a origem de um regionalismo que viria a
fundamentar, décadas mais tarde, um regionalismo musical extremante
exacerbado, forjado por uma leitura e interpretação da natureza.
As proposições acima se referem a uma passagem que se dá nos
momentos imediatamente seguintes ao estabelecimento das
propugnações modernistas. Investigações sobre como se deu o processo
acima referido são bastante pertinentes, haja vista a importância da
região amazônica para os modernistas21: numa perspectiva de
fundamentar seus pressupostos em algo original, a Europa será preterida
à Amazônia. 22 Ainda que bastante carregada com a pecha de exótica - e
talvez por isso, em grande medida - a Amazônia se conformará como
arquétipo para o empreendimento modernista.
Parece que a inventiva de Waldemar Henrique veio satisfazer um
queixume de Mário de Andrade quando de sua estada na Amazônia, pois
lhe parecia que os literatos e estudiosos com os quais travou contato23
não sabiam nada sobre o que mais importava às inquirições do laborioso
turista: o folclore 24.
Neste sentido, Waldemar Henrique foi um bandeirante das inovações
na música, na composição e execução, de maneira que a demanda da elite
da sociedade belenense, à época ansiosa por uma cultura regional
“autêntica”, foi satisfeita, o que possibilitou o seguinte comentário de
Juanita Machado, musicista e colunista de jornal à época:
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[Waldemar Henrique é um] compositor que fez
música brasileira, essa música ainda em embrião,
um belo ideal que se vai desalinhavando dos temas
bárbaros com características raciais de um
primitivismo encantador e atormentado. 25
Esta passagem é uma parte de um artigo que a autora escreveu em
saudação à apresentação de Waldemar na programação da Rádio Clube
do Pará, o que propiciou aos presentes – em reduzido número, ressalte-
se -, o contato com o “primitivismo encantador” do compositor,
“pessoas seletas e distintas”, portadoras de bom gosto e refinamento.
Observa ainda que a saída do maestro para outra cidade é uma
necessidade. Nesta apresentação, os que lá se encontravam
testemunharam:
A integralização da sua alma de poeta, de criador
de ritmos, com a ambiência da terra [esta que é]
um dos elementos contribuintes à inspiração,
execução e expressão da sua arte. A intensidade
genial do seu interior subiu à tona, mas não se
expandiu ainda inteiro, não atingiu a eclosão de
que é capaz, falta-lhe o ambiente. 26
A autora estende a opinião expressa acima a toda a Arte brasileira.
Esta não possui “uma esthesia elevada” que possibilite “uma ética original,
sem ridículo”. Para a autora do texto, a música tem mais chance de alçar
este patamar do que a literatura, e Waldemar Henrique é um dos grandes
representantes desta promissora manifestação. Mas a questão não finda
aí. Há que se perceber que deve ser iniciada a transformação da música
de caráter regional e, por conseguinte, proceder a sua expressão com
Revista Estudos Amazônicos • 151
vistas a sua valorização em maior escala. Isto exposto mostra a
obrigatoriedade de entender que é preciso que se inicie e ratifique um
processo para que a música paraense, amazônica, se afirme como
resultado sólido, algo sedimentado e não efêmero.
A origem da música brasileira de politonalidades
atávicas, feita de reminiscências ancestrais, ritmada
em temas raciais como a música espanhola,
portuguesa, eslava, etc., precisa necessariamente de
um longo estágio, ou então será uma expressão do
momento como a música americana. 27
Mas Waldemar Henrique, compositor e consagrado músico, não tem
nos meados de 1930 o grande reconhecimento merecido e que viria a
seguir; por esta época é visto como um artista que está despertando.
Sobre isso Juanita Machado comenta; e também Luiz Moreno. Este, em
seu artigo sobre uma apresentação do artista28, escreve:
No deslumbramento hierático de ritmo e de verso,
Belém culta e social vai conhecer a estética atraente e
polimorfa de um cultivador de emoções que vive
embelezando a alma no idealismo sadio de suas
composições modernistas.29 (grifos meus)
Nesta última afirmativa fica claro que Waldemar Henrique é um
“modernista” para o autor do artigo, que foi escrito mais de uma década
depois de ocorrida a Semana de 22, o que sugere que essa leitura se
estende aos componentes do meio cultural-intelectual belenense dos
anos 1930. Cabe destacar que se trata de um músico de formação erudita
e que, por meio de sua genialidade, é fazedor de uma música regional
152 • Revista Estudos Amazônicos
autêntica, baseada no folclore, o fator primitivo a que se referiu, em
1928, Mário de Andrade. Para este, a busca pelo primitivo é uma atitude
não apenas estética, mas primordialmente política, o substrato da
realidade brasileira. Tal qual para Mário de Andrade, também para
Waldemar Henrique o primitivismo é uma questão social.
Para nós, que estamos plasmando agora os
legítimos motivos de uma arte definida e
característica, temos na música e na poesia
fortemente individuais do compositor de “Suave
Spleen”, um autêntico valor nacional. 30
As composições de Waldemar Henrique não se configuram como
apenas um diletantismo: em conjunto, elas são a própria representação
do costume de um povo. Neste sentido, Bruno de Menezes procede a
uma análise da música de Waldemar, para qual dá contornos de
originalidade, associando-a ao fato de que se trata de um ato político; a
música é a própria expressão da cultura de um povo. O que Waldemar
Henrique estava fazendo era mostrar as impressões subjetivas ocultadas,
tornando-as manifesta.
A música e o canto, bárbaros ou civilizados, têm o
milagre da revelação em síntese étnica, o “eu” de
uma raça, quando esta síntese projeta o íntimo do
povo de que é oriunda. A valsa, ou a música
vienense, não é um estilo: é a vida, as ânsias, o
sangue de Strauss, identificando com o mundo a
alma de uma nacionalidade. 31
Revista Estudos Amazônicos • 153
E a música amazônica seria “resultado das ânsias, do sangue, da
inquietação” de Waldemar Henrique, da inquietação diante da
inautenticidade das expressões artísticas locais, sem uma definição, um
amálgama sem sentido definido. Assim, o maestro se apresenta e é
encerrado como o modelador e organizador da autêntica arte musical
regional. Era assim que os viam seus contemporâneos naqueles idos anos
da década de 1930: como o realizador da maiêutica socrática na arte dos
sons nestas plagas.
Era também extremamente original, tal como nunca houvera. Um
exemplo a ser seguido. 32 As suas composições estão dentro de uma
concepção norteada pelo que a floresta apresenta. “Porque assimilar
quando se pode realizar?” indaga Bruno de Menezes, ao que
complementa: “Em arte, ou se cria, o que é superior e divino, ou se imita
com talento, o que é humano e faz glória”. 33
Para os comentaristas de seu trabalho, não há assentimento ao
pastiche, de maneira que o músico volta-se para original e inovador,
baseado no que lhe oferece as fontes da criação criando algo
extremamente surpreendente. Waldemar Henrique “sente” a arte que se
lhe apresenta, inspirando-o, tomando-o por um entusiasmo inventivo
que se materializa em suas composições. Bruno de Menezes, na exaltação
ao caráter poético - no sentido do “fazer vir a ser aquilo que não é” – da
música de Waldemar Henrique “propõe” uma explicação psicológica
para o processo de criação do artista: “as suas composições, depois de
impressionarem intensamente a sensibilidade de seu instinto de beleza,
adormecem no seu interior, para se tornarem plasmáveis”. Assim, a
poesia e a música de Waldemar Henrique seriam frutos do seu “estado
de alma”.
Numa região em que, aos olhos dos habitantes de outras regiões,
parece que a natureza esmagou o homem, o maestro se destaca como
aquele que tinha contribuído bastante para a “elevação do moral” da
154 • Revista Estudos Amazônicos
terra que entrou para o conhecimento da federação, no início do século
XX, como uma página inacabada do Gênesis, como havia imputado o
escritor Euclides da Cunha. Aliás, neste momento, o Pará ainda não
havia contribuído com nomes para a cultura mais geral da nação
brasileira 34, o que valeu a seguinte frase em nota em tom retórico do
jornal “O Estado do Pará”: nem todos os que valem, aparecem; mas os
que aparecem valem. 35
O gênio criador é destaque nos meios da imprensa escrita em Belém.
E é interessante que alguns destacam o fato de que aqui o compositor e
sua obra não tinham o espaço, o ambiente necessário para a sua
efetivação, mesmo sendo Waldemar Henrique um “vitorioso da música
regional”.
Com certeza, em grande medida por conta disso, Waldemar Henrique
se estabelece na cidade do Rio de Janeiro, no final do ano de 1933. Nesta
cidade, o músico paraense penetra de maneira incisiva nos círculos
artísticos. Pelos componentes deste meio, sua música é vista como toda
emocional, que deixa transparecer a sentimentalidade aguda de nossa
raça e que, de maneira brilhante, se apresenta na forma de versos. Ao
que tudo indica, Waldemar era o artista. Sua angústia em relação à arte se
expressava, assim, na sua ânsia pela mais perfeita expressão que fosse
possível alcançar.
O arauto da “fala” amazônica
Saído da Amazônia longínqua, Waldemar Henrique é visto como a
expressão mais autêntica da alma cabocla, mensageiro que leva para o
meio citadino demonstrações do encantamento, do novo: o mistério das
florestas lendárias. E de forma ferina fala sobre esta sua hierofania:
Revista Estudos Amazônicos • 155
Nasci na cidade de Santa Maria de Belém do Grão-
Pará e sou filho agarrado da Amazônia. Trouxe-
lhes o canto índio da minha terra, verde, de regaço
imenso que dá a todos os seus filhos um
brinquedo de lendas para sonhar. E a música dos
turés sempre cantou no meu destino pelo mistério
plangente das lendas que me embalaram e que
agora traduzo em batuque soturnos, tristonhos,
malsinados (...).36
A saída da capital paraense foi antecedida pela “Noite da canção
paraense”, esta que, ao que tudo indica foi, além de momento de
despedida também o da afirmação da arte do maestro. Ainda em 1933,
em outubro, é encenada no Arraial de Nazaré a peça “A Casa da Viúva
Costa”, de autoria de Antonio Tavernard e Fernando de Castro, tendo
como responsável pela parte musical Waldemar Henrique. Em
novembro de 1933, Waldemar Henrique vai para o Rio de Janeiro
levando junto sua irmã Mara Costa.
A busca do reconhecimento de sua obra era algo já defendido por
vários críticos do seu trabalho, pois ser artista na região era algo difícil,
ainda mais se o artista é um “criador genial”, tal como Waldemar
Henrique era tido para os componentes do meio artístico e político local
à época. Sua permanência na cidade de Belém era algo complicado, haja
vista o desprezo pela condição do artista e mesmo o caráter das suas
produções artísticas. Críticos e articulistas dos periódicos notavam que
apenas os homens de coragem se atrevem a fazer arte nesta situação, e
Waldemar Henrique já havia alcançado – e talvez ultrapassado – este
patamar. Portanto, era necessária a saída em busca deste
reconhecimento. A “Noite da canção paraense” foi uma amostra da sua
156 • Revista Estudos Amazônicos
capacidade criativa e, ao mesmo tempo, um afronte àqueles que não a
reconheciam arte.
Fazer arte entre nós é ter coragem para receber,
em vez de receber como prêmio palmas e
estímulos, a indiferença, o descaso, quando não
mesmo a coroa do ridículo [...] não se pode ser
poeta nem cantor, porque todo mundo, plasmando
seu desdém pela arte e pela poesia que foi a
linguagem dos deuses, diz logo ao avistar alguém: -
Como vai, “poeta”?! Ou então: “Este com a mania
dos versos, ou do canto, acaba no hospício”. 37
O desencadeamento lógico é que, como criador original, Waldemar
Henrique deveria “aparecer” e isto só era possível em um grande centro,
como o Rio de Janeiro e seu cosmopolitismo cultural, pois “no samba,
na embolada ou na canção, ninguém no norte o excede, e poucos no sul
se igualarão a ele.” 38 Depreende-se que a Belém dos anos 30 do século
passado, “eivada de provincianismo esnobe”, não lhe era propicia. Quase
um ano depois de sua partida, o jornal “Folha do Norte” publica uma
nota:
Ficou aqui uma lembrança viva do moço de
talento que é Waldemar Henrique, que se
encaminhou para o Rio de Janeiro em busca de
ambiente mais favorável ao seu desenvolvimento
artístico.39
Revista Estudos Amazônicos • 157
Contudo, a música regionalista de Waldemar Henrique, mesmo antes
de sua saída de Belém, já constava em programas de apresentações no
meio da “alta sociedade” sulista. Em banquete promovido ao deputado
Jones Rocha pelas “figuras mais destacadas da sociedade carioca nas
letras, na política, das classes conservadoras do Rio” (grifo meu), no salão do
Automóvel Clube, Waldemar tocou piano, além de ter uma composição
sua na programação.
A saída de Waldemar Henrique e seu estabelecimento no Rio de
Janeiro fomentaram as atitudes da crítica e das classes conservadoras de um
grande centro em relação à música regional. Aos olhos desses, deveriam
ser alijadas todas as atitudes de esnobismo que representavam um sério
embargo às modalidades artísticas. E a elite local e, posteriormente, a
nacional também se posicionaram de maneira crítica ao esnobismo
diante da música regional. E o maestro paraense foi visto como o grande
representante dos interesses de uma parte da elite que reagiu ressaltando
seu bom senso e bom gosto, e promoveu a afirmação de um gênero de
canção nacional. E, neste sentido, Waldemar Henrique provocou
aplausos em toda parte, de toda gente. Cabe destacar que foi ladeado a
outros autores que, também, eram tidos como importantes
representantes dessa vertente, como Heckel Tavares40 e Olga Praguer
Coelho.
As composições de Waldemar Henrique foram lançadas pela voz de
Gastão Formenti 41, “sem preconicios espalhafatosos”, como escreveu a
crítica no ano de 1934, em disco da gravadora “Victor”, este seu
primeiro trabalho registrado. O cantor citado interpretou duas músicas
do Maestro: “Foi boto, Sinhá!” (que saiu no catálogo da gravadora
apenas como “Boto”); e “Tem pena do nego”. Suas músicas se
configuraram como uma grande novidade. Nas palavras de Benjamin
Lima, no Jornal do Brasil:
158 • Revista Estudos Amazônicos
Os batuques amazônicos desse poeta e compositor
figuram na lista magérrima de boas novidades
recentes do broadcasting carioca. Um deles,
notadamente “Foi boto, Sinhá!” é, sem o menor
favor, uma verdadeira obra-prima. Folk-lore
integral e autêntico, porque, ao mesmo tempo
literário e musical. 42
Em outra passagem do seu artigo, acentua a exaltação à verve
nativista do compositor paraense:
Valdemar [sic] Henrique é da Amazônia? Se não é,
conseguiu assimilá-la de modo perfeito, como o
havia logrado antes, em “Cabra Novato” [sic], o
poeta gaúcho Raul Bopp; e colheu para o arranjo
do batuque mencionado um tema precioso na
conjugação de duas lendas igualmente curiosas: a
do tajá (tinhorão) que chora, e a do boto que seduz
as virgens caboclas.43
A ideia de que apenas em um grande centro pode-se destacar e
mostrar de maneira mais eficaz a sua arte está expressa no meio artístico
no qual se imiscui com propriedade. Ao que tudo indica, o seu
estabelecimento na metrópole carioca se deu em busca de vez para
expressar sua criação, o canto das turés, como disse o próprio Waldemar.
Segue o exemplo de todos que não encontram na pequenez de seus
ambientes estaduais um campo propício ao seu desenvolvimento
artístico. Em oito meses de estada na cidade do Rio de Janeiro, o artista
paraense já é renomado e requisitado entre seus pares.
Revista Estudos Amazônicos • 159
Intérprete de um sentimento
A importância do músico paraense no meio artístico nacional, quando
do seu estabelecimento no Rio de Janeiro, é fruto do caráter de sua
produção: é o “canto da Amazônia”, o modelador do barbarismo
selvagem em uma linguagem artística, importante para o contexto
subsequente ao Modernismo instaurado em 1922; um seu fruto, numa
última palavra. Importante é ressaltar que sua música acabou por ser
nova e inovadora, na medida em que se situou numa fronteira entre o
erudito e o popular, o que lhe colocou, no cenário musical brasileiro
ladeado a Heckel Tavares e Gentil Puget, entre outros grandes nomes da
“música nacional”.
A forma na qual o conteúdo de sua produção se encaixa é simples:
uma grande variação de texto, de palavras, estão em um número
reduzido de notas, numa espécie de organização sonoro-literário que se
conforma como um padrão composicional, algo retomado em várias de
suas composições. Simplicidade que tem como objetivo a apreensão da
mensagem, de maneira que o meio (a música) seja, também, a mensagem.
Podemos notar esta “economia” dos sons em obras como “Tambatajá”:
num intervalo de oito compassos há apenas duas notas; em “Foi boto,
Sinhá!”: melodia simples, assim como o ritmo. Na maioria de suas
músicas há uma simplicidade, mesmo uma rusticidade comprometida
com a proposta de assimilação da estrutura folclórica, matéria-prima de
sua produção. As canções com mais notas estão dentro uma estrutura
rítmica claramente folclórica, por exemplo, “Canção dos remadores”.
160 • Revista Estudos Amazônicos
Em suma, não há grande rebuscamento ou mesmo uma complexidade
nas composições. Contudo, deu um “arranjo” movediço, algo irrequieto,
às melodias que ele recolheu do folclore, e é onde está sua originalidade.
As possibilidades exploradas pelo pianista são leves mas originais, salvas
da “bobice [de] muitas canções que não inspirariam nenhum arranjo” 44
Conhecendo a fundo as lendas, as tradições e os
costumes da sua terra natal, [Waldemar Henrique]
resolvera criar, compor coisas diferentes,
desconhecidas no ambiente citadino do Rio,
verdadeiramente inéditas.45
O projeto de construção de uma música regional veio satisfazer uma
necessidade da própria elite social, intelectual e artística belenense, haja
vista que, à época, era recorrente a ideia de que precisávamos de
programas “genuinamente brasileiros”. Para aqueles que defendiam a
afirmação de uma cultura musical local legítima, tratava-se de uma queixa
legítima. E o compositor paraense se mostrou para o mundo; e mostrou
para o mundo civilizado, a partir da década de 1930, a melancolia, a forma
selvagem da estrutura melódica folclórica autêntica, como queriam
aqueles que lutavam pela definição de uma alma artística e uma
identidade nacional. Impactado com a música de Waldemar Henrique,
assim expressou-se Cassiano Ricardo, um dos grandes nomes do
Movimento Modernista, em 1935: “Waldemar Henrique me revela a
alma brasileira que venho procurando”.46
Como cultor da música popular na Amazônia, Waldemar Henrique
tem seu reconhecimento. É o “marcador dos ritmos, focalizando cenas,
surpreendendo os reflexos emocionais da alma sertaneja, para a
estilização flagrante das suas características”. Portanto, este é o ponto
central da estética do maestro: traduzir as contingências da vida na
Revista Estudos Amazônicos • 161
floresta para o entendimento nacional numa linguagem artística. E assim
o faz através da estilização. A arte, estritamente entendida, não pode ser
articular por “não ser humana”. Mas a arte de Waldemar Henrique é
articulada, humanizada, sua proposta tem um conteúdo e uma sugestão
de estabelecimento do fazer artístico imbricado com o primitivismo
estético - político marioandradiano. Para o filósofo Jose Ortega y Gasset,
estilizar é deformar o real. Neste sentido, Waldemar é o apresentador de
uma “versão” da realidade amazônica que atende aos interesses do
empenho político da Semana de Arte Moderna de 22. Em sua obra, fala
sobre o homem natural e seu cotidiano, procedendo a uma transfiguração e
resignificação do imaginário popular. É a Amazônia estilizada em sons e
palavras.
Artigo recebido em agosto de 2011
Aprovado em dezembro de 2011
162 • Revista Estudos Amazônicos
NOTAS
* Historiador. Professor da Rede Pública do Estado do Pará. Mestrando em
Antropologia do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais/UFPA.
1 Música comprometida com o projeto modernista, música que dê ênfase ao
folclórico. É uma fase no processo evolutivo em busca da “música artística
brasileira”.
2 Cf. NAVES, Santuza C. O Violão Azul: modernismo e música popular. Rio de
Janeiro: FGV, 1998.
3 Sobre a questão da hegemonia de São Paulo e do “atraso” do Rio de Janeiro ver:
VELLOSO, Mônica Pimenta. A brasilidade verde-amarela: nacionalismo e
regionalismo paulista. Estudos Históricos, n. 11, 1993, p. 89-112.
4 FERREIRA, Antonio C. “Heróis e vanguardas, romance e história: os intelectuais
modernistas de São Paulo e a construção de uma identidade regional” In:
PESAVENTO, Sandra Jathay (org.) Escrita, linguagem e objeto: leituras de história
cultural. Bauru-SP: EDUSC, 2004, pp. 81-112.
5 HELIOS, “A bandeira futurista”. Correio Paulistano, 22 de outubro de 1922. Apud
FERREIRA, Antonio C. Op. Cit.
6 O historiador Aldrin Moura de Figueiredo apresenta um argumento no qual trata
como mitificação a ideia perenizada de que São Paulo foi o centro irradiador do
Modernismo e outras regiões foram apenas seu anteparo ideológico. Segundo sua
assertiva, em Belém, a manifestação intelectual se desdobrava paralelamente ao
movimento paulistano. Para maior entendimento ver: FIGUEIREDO, Aldrin
Moura. “Querelas esquecidas: o modernismo brasileiro visto das margens”. IN:
DEL PRIORE, Mary; GOMES, Flávio dos Santos (Orgs.), Os Senhores dos Rios:
Amazônia, margens e histórias. São Paulo: Elsevier, 2003, pp. 259-283.
7 RIBEIRO, De Campos. Graça Aranha e o Modernismo no Pará. Belém: Conselho
Estadual de Cultura, 1973, p. 16.
8 Alfredo Bosi aponta que o Modernismo nordestino teve sua feição própria e não
foi uma simples derivação de São Paulo. Mas ocorreram sim contatos entre os
recifenses e os paulistas, mesmo apesar das negações e resistência de “Gilberto
Freyre e José Lins do Rego [que] sempre se opuseram à franca admissão de uma
presença modernista anterior e paralela às profissões de fé regionalistas de ambos”.
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. São Paulo: Cultrix, 1970, p.
388.
Revista Estudos Amazônicos • 163
9 RIBEIRO, De Campos. Op. Cit., p. 16-17.
10 É aceitável que seja usado o termo “Modernismos”, haja vista distintas variáveis.
No entanto, neste trabalho, usamos a acepção estrita: movimento que pensou e
propugnou uma arte brasileira.
11 “Movimento – cultural, estético ou político – no sentido sociológico do termo,
pressupõe um projeto coletivo veiculado através de programas, manifestos e atitudes
performáticas.” Citado em NAVES, Santuza C. Da Bossa Nova à Tropicália. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001, p. 10.
12 Ver: WISNIK, José Miguel; SQUEFF, Enio. “Getúlio da Paixão Cearense”
In: - -, O Nacional e o Popular na Cultura Brasileira - Música. São Paulo: Brasiliense,
1982, p. 133.
13 CONTIER, Arnaldo Daraya. “Modernismos e Brasilidade. Música, utopia e tradição” In: NOVAES, Adauto (Org.). Tempo e História. São Paulo: Cia. das Letras e Secretaria Municipal de Cultura, 1992, p. 281.
14 Jornal “A Gazeta”. São Paulo, 17 de outubro de 1935.
15 Idem.
16 HELIOS (Menotti Del Picchia). Jornal “Diário da Noite”, São Paulo, 24 de
outubro de 1935.
17 Idem.
18 Manuel Maria de Falla (1876-1946). Compositor espanhol que defendeu a
utilização da temática nacionalista como matéria-prima para a feição de uma música
autêntica. Sua produção, no entanto, não é meramente folclórica.
19 ANDRADE, Mário de. Ensaio sobre a música brasileira. São Paulo: Vila Rica;
Brasília: INL, 1972, p. 9.
20 MORAES, Eduardo Jardim. A Brasilidade Modernista: sua dimensão filosófica.
Rio de Janeiro: Graal, 1978, p. 87.
21Mário de Andrade empreendeu uma incursão pela Amazônia em 1927. Para
maiores informações sobre o périplo ver: ANDRADE, Mário. O Turista Aprendiz.
São Paulo: Duas Cidades/Secretaria de Cultura, Esportes e Tecnologia, 1976;
BASSALO, Célia Coelho; COELHO, Joaquim Francisco. “Mário de Andrade no
Pará: os sucessos e documentos da viagem e algumas considerações sobre o
modernismo” In: Revista de Cultura do Pará, v. 3, Belém, 1973; MORAES, Fabiano
Bastos. O Turista Demiurgo: a viagem de Mário de Andrade pela Amazônia e a
brasilidade modernista. 2005. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em
História). Belém: UFPA, 2005.
164 • Revista Estudos Amazônicos
22 O Maestro Mertin Braunwieser, integrante da Missão de Pesquisa Folclórica, sob a
responsabilidade de Mário de Andrade, foi incumbido pela Discoteca Pública de
Cultura da Prefeitura Municipal de São Paulo de percorrer o norte e o nordeste para
registrar as mais variadas formas de expressão de sua cultura popular. A missão
partiu de São Paulo em janeiro de 1938 e, chegando ao Pará, permaneceu de 27 de
junho a 7 de julho, onde gravou e filmou apresentações de Boi-Bumbá e
manifestações religiosas. Ver MOURA, Carlos E. M. O Teatro que o Povo Cria. Belém:
SECULT, 1997, p. 33.
23 Que, aliás, se apresentam em reduzido número. A detecção da “ausência” dos
literatos locais nos relatos de viagem contidos em “Turista Aprendiz” encontra-se
em MORAES, Fabiano Bastos. Op.Cit, p. 68.
24 Folclore é forma oriunda do termo inglês folk (povo) lore (conhecimento),
cunhado em 1846 por William John Thoms. É, portanto, conhecimento ou saber
popular.
25 MACHADO, Juanita “A Música brasileira de Waldemar Henrique”. Jornal “O
Estado do Pará”, Belém, 9 junho de 1931.
26 Idem.
27 Ibidem.
28 Por esta época Waldemar Henrique atua como Diretor Artístico da Rádio Clube
(1933)
29 MORENO, Luiz. “Um artista que desperta”. Jornal “Folha do Norte”. Belém, 16
de julho de 1933.
30 Idem.
31 Ibidem.
32 “Depois de Catulo [da Paixão Cearense, poeta e compositor], o cantor que sobe
[sic] traduzir as coisas mais simples na beleza rude de seu verso, nada mais se têm
ouvido. Waldemar Henrique é um exemplo digno de ser seguido. Imitem-n’o” [sic],
escreveu o colunista Pedro Paulo já em 1935. PAULO, Pedro. “O nosso folk-lore e
a arte de Waldemar Henrique”. Jornal “A Voz do Rádio”, 4 de julho de 1935.
33 MENEZES, Bruno de. “Nova música e seus compositores: Waldemar Henrique”.
Jornal “O Estado do Pará”. Belém, 11 de setembro de 1933.
34 Jornal “O Estado do Pará”, Belém, 10 de agosto de 1933.
35 Idem.
Revista Estudos Amazônicos • 165
36 “Um eco das florestas e das Iaras”. Jornal “Sintonia”, Rio de Janeiro, 26 de julho
de 1934.
37 Coluna “Gravetos”. Jornal “O Estado do Pará”, Belém, 20 de agosto de 1933.
38 Idem.
39 Jornal “Folha do Norte”, Belém, outubro de 1934.
40 Hekel Tavares (1896-1969), compositor, regente e arranjador. Nasceu em Satuba,
Alagoas.
41 Gastão Formenti (1894-1974), cantor e pintor. Nasceu em Guaratinguetá, São
Paulo.
42 LIMA, Benjamin. Jornal do Brasil, 21 de julho de 1934.
43 Idem. No texto do artigo está grafado errado o título do poema de Raul Bopp,
cujo nome correto é “Cobra Norato”.
44 CLAVER FILHO, José. Waldemar Henrique: o canto da Amazônia. Rio de
Janeiro: FUNARTE, 1978, p. 67.
45 Idem, p. 91.
46 Em “Currículum Vitae de Waldemar Henrique” (Acervo Museu da Imagem e do
Som).