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IMAGENS EM MOVIMENTO: A ESTÉTICA CRIADORA DO CARNAVALESCO
PAULO BARROS
Juliana dos Santos Barbosa (UEL)
CAPES
1. APRESENTAÇÃO
Os desfiles de escolas de samba são uma das manifestações artísticas mais simbólicas da
cultura popular brasileira. Um espetáculo de linguagem sincrética, onde cores, formas, sons e
movimentos são combinados para representar os temas que as agremiações carnavalescas
levam para o sambódromo.
Este artigo dá continuidade a pesquisas realizadas no projeto de mestrado em Estudos da
Linguagem, em que estudamos a tradução intersemiótica no processo de criação do desfile de
2007 da escola de samba Unidos do Viradouro, desenvolvido sob a coordenação do
carnavalesco Paulo Barros. A proposta aqui é ampliar a abrangência da referida pesquisa, a
fim de identificar tendências que possibilitem caracterizar a estética criadora do artista.
Para tanto, selecionamos elementos visuais (alegoria ou fantasia) de desfiles elaborados entre
os anos de 2006 e 2008, que serão observados a partir de dois principais aportes teóricos: a
Crítica Genética - que pensa a criação artística como uma ação dinâmica, marcada por
transformações que envolvem seleções e combinações provenientes da interação do artista
com o seu espaço e tempo sociais-, e a Semiótica peirceana - que define o signo como algo
que representa determinada coisa, para alguém, sob certos aspectos e em certa medida, ou
seja, como algo que “socializa” um pensamento através de determinada linguagem.
A criação, neste sentido, configura-se como um processo de tradução entre o original e aquilo
que se quer comunicar. A escolha de elementos visuais se justifica tanto pela ênfase na
visualidade que o carnaval adquiriu, em especial nas três últimas décadas, como também pela
relevância dessa linguagem na concepção artística de Paulo Barros.
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2. AS ESCOLAS DE SAMBA DO RIO DE JANEIRO E O CARNAVALESCO
PAULO BARROS: BREVE CRONOLOGIA DAS TRAJETÓRIAS
A produção de um desfile carnavalesco é um contínuo movimento tradutório: um texto vira
imagem, que vira música, que se transforma em coreografia (BARBOSA, 2007). Esta
linguagem sincrética não é, entretanto, a característica que marca a origem dos desfiles. As
escolas de samba, cujas primeiras formações datam do final da década de 1920, no Rio de
Janeiro, têm no samba o elemento central de sua formação, num período em que o gênero
musical transformava-se na expressão musical do Brasil.
Apesar de não desprovidas dos elementos visuais, as escolas de samba seriam louvadas e reconhecidas, nas primeiras décadas de sua existência, principalmente pelas performances sonoras da “massa encantadora dos morros” [...] As escolas de samba deveriam ser avaliadas, e, portanto legitimadas, mais pela força de suas músicas, seus cantos, evoluções e originalidade do que pela opulência visual, que, por algum tempo, seria prerrogativa dos ranchos (FERREIRA, 2004, p. 344 e 348)
Mussa e Simas (2010, p.128), constatam que o samba-enredo é o único quesito que esteve
submetido a julgamento desde os primeiros desfiles, confirmando a importância desse
elemento para os desfiles das escolas. Os autores lembram que “no final da década de 20, não
havia o formato em cortejo na disputa entre as escolas. O concurso incluía somente a
apreciação do samba apresentado”.
Entre as décadas de 1940 e 1950 foram fundadas várias escolas de samba que, aos poucos, se
consolidariam como o grande momento do carnaval carioca. A década de 1960 foi marcada
pelo início das parcerias entre as agremiações carnavalescas e artistas vindos de escolas e
ateliês de arte, resultando na valorização do aspecto visual dos desfiles. Conforme Ferreira
(2004, p.355-356), fantasias e alegorias assumiam um papel de destaque, ao mesmo tempo em
que artistas plásticos de vanguarda se interessavam pela estética do samba.
A partir de 1968 são gravados os primeiros discos com sambas-enredo, que passaram a ser
difundidos para todo o país. A inauguração da Marquês de Sapucaí, em 1985 e a criação da
LIESA – Liga Independente das Escolas de Samba, marcariam o ingresso das escolas na era
do grande espetáculo. A arquitetura do novo sambódromo, onde o público passa a ver o
desfile das arquibancadas, e a nova forma de organização da festa, estabelecem um padrão de
qualidade estética que agrega detalhes visuais e novidades tecnológicas àquele que viria a ser
conhecido como o “maior espetáculo da Terra”. Os anos de 1990 consolidam o processo de
verticalização e a primazia da visualidade dos desfiles das escolas de samba.
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É neste contexto, mais precisamente em 1993, que Paulo Barros começa a desenvolver seu
trabalho como carnavalesco, inicialmente nas escolas do chamado Grupo de Acesso. O artista
entrou para o Grupo Especial em 2004, a convite do presidente da escola de samba Unidos da
Tijuca.
Em seu primeiro ano na “elite” do carnaval carioca, o carnavalesco se destacou pela
originalidade: na alegoria “Criação da Vida”, as pessoas não eram apenas destaques que
complementavam o visual do carro alegórico, como era comum, mas compunham a alegoria
em si, de forma preponderante. Esta é a principal característica das chamadas “alegorias
humanas”: a substituição das estruturas de ferro por pessoas que encenam coreografias. As
imagens ganham movimento. E vida.
O feito garantiu a Unidos da Tijuca o vice-campeonato daquele ano, e colocou Paulo Barros
na pauta das discussões sobre desfiles carnavalescos. O Jornal do Brasil1 publicou: “Paulo
Barros, da Tijuca, repete em 2004 a proeza de Joaõsinho Trinta em 1989: ficou em segundo
lugar, mas deixou registrado um desfile mais marcante que a campeã.”
Nos anos seguintes, a concepção de desfiles com materiais inusitados e alegorias humanas
torna-se a marca do carnavalesco.
Em nossa pesquisa durante o mestrado, tivemos acesso aos bastidores do carnaval de 2007 e
constatamos uma estética focada na concepção de “imagens em movimento”, que por suas
características geram maior interação com o público e facilitam a leitura deste texto
plurissígnico. Ao ampliar o corpus e o período de observação, buscamos confirmar esta
tendência que, em detrimento do “luxo pelo luxo”, propõe elementos baseados em signos que
comuniquem o tema do enredo com clareza e originalidade.
3. A ESTÉTICA CRIADORA DO CARNAVALESCO PAULO BARROS
Para análise da criação artística do carnavalesco Paulo Barros selecionamos os seguintes
elementos: os figurinos dos casais de mestre-sala e porta-bandeira dos anos de 2006 e 2007 e
a alegoria da pista de esqui, apresentada no ano de 2008.
1 Jornal do Brasil, edição de 29/02/2004.
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3.1 A COMBINAÇÃO DE SIGNOS NOS FIGURINOS DOS CASAIS DE MESTRE-SALAS E PORTA-
BANDEIRAS
O casal de mestre-sala e porta-bandeira é responsável pela apresentação do pavilhão das
escolas de samba, sendo um dos quesitos avaliados pelos jurados dos desfiles. Eles não
“sambam” e sim executam uma coreografia pela avenida. Conforme Ferreira (2004, p. 369) a
dança do par “tornou-se uma espécie de balé popular, com códigos e passos característicos”.
De acordo com o Manual do Julgador da LIESA, a função da porta-bandeira é conduzir o
pavilhão da escola, e a do mestre-sala é cortejar a porta-bandeira, bem como proteger e
apresentar o pavilhão da escola. O casal deve mostrar movimentos coordenados, com graça e
leveza, desenvolvendo gestos e posturas elegantes e corteses.
Apresentamos, a seguir imagens dos casais de mestre-salas e porta-bandeiras dos carnavais de
2006 e 2007, para analisar as combinações de signos feitas por Paulo Barros na concepção de
seus figurinos. Tais composições serão observadas a partir de aportes conceituais
apresentados por Pignatari em sua obra Comunicação Poética. Para o autor, cujos
pressupostos teóricos se fundamentam na semiótica peirceana, existem dois processos de
associação das coisas: por proximidade - eixo sintagmático -, e por semelhança - eixo
paradigmático (PIGNATARI, 2004).
3.1.2 Uma Sinfonia Visual na Avenida
No carnaval de 2006 Paulo Barros desenvolveu, na Unidos da Tijuca, o enredo “Ouvindo tudo
o que vejo, vou vendo tudo o que ouço”. Inspirado nos 250 anos de nascimento de Mozart, o
carnavalesco propôs uma “sinfonia visual”, que provocasse, através de imagens, a emoção
despertada pela música. A figura 1 mostra o casal de mestre-sala e porta-bandeira daquele
ano:
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Figura 1: Casal porta-estandarte do desfile da Unidos da Tijuca – carnaval 2006
(foto cedida pelo carnavalesco Paulo Barros)
A saia da porta-bandeira, que faz analogia a um CD (Compact Disc), é um exemplo de signos
associados a partir do eixo paradigmático, ou seja, combinados com base nas similaridades
entre os dois objetos, que se assemelham tanto pelo formato circular, quanto pelos
movimentos giratórios - do disco em execução e da porta-bandeira em sua coreografia. Já a
combinação entre as fantasias do casal - ela representando um CD e ele, o músico Mozart -
consiste numa associação sintagmática, já que combina dois elementos que se aproximam por
pertencerem a um mesmo universo. A criação dialoga também com a história da música,
combinando signos de tradição e modernidade.
Sem preterir o aspecto luxuoso do figurino dos casais porta-estandartes, Paulo Barros inova
pelas associações que propõe. Numa espécie de “metáfora visual” as combinações das
indumentárias representam o tema do enredo, proporcionando maior eficácia no processo de
comunicação entre obra e público.
3.1.3 Virando o Jogo na Sapucaí
Em 2007 Paulo Barros foi responsável pela concepção do desfile da escola de samba Unidos
do Viradouro, que tratou dos vários tipos de jogos em seu enredo, com a proposta de
tranformar a passarela do samba em um imenso tabuleiro. A figura 2 mostra o figurino do
casal de mestre-sala e porta-bandeira daquele ano:
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Figura 2: Casal porta-estandarte do desfile da Unidos do Viradouro – carnaval 2007
(foto do acervo da pesquisadora)
Mais uma vez o carnavalesco emprega a combinação pelo eixo paradigmático para criar a
fantasia da porta-bandeira. A saia dela representa uma roleta de cassino, dois elementos que
também se assemelham pelo formato redondo e pelos movimentos giratórios. O mestre-sala,
fantasiado de crupiê, complementa o visual do figurino, a partir de uma associação feita
através do eixo sintagmático, que reuniu imagens de um mesmo campo de significação: o
mundo dos jogos.
Tais combinações no figurino de casais porta-estandarte não se restringiram a esses anos nos
desfiles concebidos por Paulo Barros. Em 2005, por exemplo, o casal representou o sintagma
Dom Quixote (mestre-sala) e moinho de vento (saia da porta-bandeira) num enredo sobre o
mundo da imaginação. Em 2011, quando o enredo foi sobre cinema, a metáfora visual foi
construída a partir da semelhança entre a saia da porta-bandeira e um rolo de filme.
Em todos os casos, as imagens das saias, quando ganham movimento, consolidam a
iconicidade com o objeto representado, efeito que se intensifica quando da interação entre as
indumentárias do casal. Para Ostrower (1987, p.20), tais associações contituem a essência do
mundo criativo. Em nossa dissertação (2007), destacamos a originalidade gerada pelas
combinações e constatamos que o carnavalesco aproveita cada detalhe para comunicar o
enredo.
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Aqui confirmamos a tendência em atribuir a quase todos os elementos uma funcionalidade
que extrapola a estética visual, garantindo coerência ao desfile. Um desfile organizado tal qual
um texto, cuja clareza emana de imagens metafóricas e cuja origilidade provém da
combinação conseguida dentro da rede de sentidos que constituem o enredo.
3.2 O INUSITADO COMO TENDÊNCIA NO PROCESSO DE CRIAÇÃO DE PAULO BARROS
O artefato artístico surge ao longo de um processo complexo de apropriações, transformações
e ajustes. Neste sentido, o conceito de “metamorfose” apresentado por Salles, constitui uma
lente interessante. Para a autora (2004, p. 26) “o movimento criador é a convivência de
mundos possíveis: o artista vai levantando hipóteses e testando-as permanentemente”.
Quando identificamos, por exemplo, o que o artista busca e também aquilo que ele rejeita, nos
aproximamos de sua estética criadora. E a recorrência de determinadas escolhas nos permite
identificar tendências de seu processo criativo.
Nas pesquisas sobre a criação artística do desfile de 2007, identificamos a busca da
originalidade como uma das principais características do movimento criador de Paulo Barros.
Tal atributo, segundo Kneller (1978), é um traço da criatividade que contempla a habilidade
de produzir ideias raras, resolver problemas de modo incomum, bem como usar coisas de
modo não costumeiro.
Um dos aspectos que garantem a originalidade nos desfiles concebidos pelo carnavalesco é
justamente o uso de materiais inusitados: em 2003, numa homenagem a Portinari, uma das
alegorias foi construída com latas de tinta; em 2004, na já comentada alegoria “Criação da
Vida”, ele levou para a avenida uma “escultura humana”; em 2005, o homem de lata do
Mágico de Oz foi produzido com cerca de 120 mil peças em alumínio; Em 2006, a música
“Fuscão Preto” foi traduzida para o código visual com 21 carcaças de fuscas adquiridas em
ferros-velhos da cidade, e a música “Mamãe eu Quero” foi representada por uma alegoria em
que se utilizou 7 mil chupetas.
No carnaval de 2007, Paulo Barros brincou com a expressão “virar o jogo” (tema do desfile),
fazendo a alegoria “Castelo de Cartas” cruzar a avenida de cabeça para baixo; em 2008, uma
pista de esqui com 26 toneladas de gelo, que será aqui analisada, cruzou a Sapucaí sob os
40ºC do Rio de Janeiro; em 2009 um jardim com plantas de verdade foi cultivado durante
meses para compor a alegoria que fazia alusão ao filme “Edward, mãos de tesoura”; em 2010
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e 2011, o elemento inusitado ficou por conta do uso de técnicas de ilusionismo na coreografia
da comissão de frente.
Propomos a seguir a análise de uma das alegorias criadas para o desfile de 2008, visando
identificar a originalidade como tendência de seu processo criativo.
3.2.1 A PISTA DE ESQUI NO CARNAVAL DE 2008: “FOI DE ARREPIAR”
Depois de substituir armações metálicas por estruturas humanas, colocar os instrumentistas da
bateria em cima de um carro alegórico, entre outras inovações, Paulo Barros levou uma pista
de esqui para o sambódromo. O ano era 2008, a escola, a Unidos do Viradouro, e o enredo, “É
de arrepiar”. A ideia era trabalhar com elementos que causam arrepio no ser humano, como o
frio, o medo, o prazer e o encantamento estético. Geleiras, personagens de filme de terror e
figuras memoráveis como Cartola tiveram lugar no desfile. A figura 3 mostra uma das
alegorias do referido desfile:
Fig. 3 – Alegoria Pista de Esqui
(Foto: Marcos D'Paula/AE - 04/02/2008, www.fotos.limao.com.br)
Um carro alegórico de 33 metros de comprimento e 9 metros de altura. A neve, produzida por
máquinas, deu à alegoria ares de estação de esqui. A alegoria foi feita com 26 toneladas de
gelo e contava com 15 esquiadores que se revezavam na descida da pista de esqui, garantindo
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o “típico efeito de movimento das alegorias de Paulo Barros, que valorizam o elemento
humano em sua constituição” (BARBOSA, 2007, p.80)
De acordo com o esquiador profissional André Spinola, tricampeão brasileiro e responsável
pela equipe de esquiadores do carro abre-alas, foi algo inédito no Brasil e no mundo. “Pela
primeira vez teremos uma pista de esqui com neve verdadeira, em cima de uma estrutura
móvel, com esquiadores descendo de verdade”2 declarou. Sob a angulação do conceito de
tradução intersemiótica, discutido por Plaza, tal alegoria pode ser considerada “uma criação
feita a partir de escolhas dentro de um sistema de signos que é estranho ao sistema original”
(PLAZA, 2008, p.30). Estranho porque, em cima de uma estrutura móvel, a pista de esqui -
que em seu sistema original é fixa - “desfilou” por toda a avenida, como uma estação de esqui
ambulante.
O carro alegórico em análise representava também o arrepio provocado pelo experimento de
algo inédito. Esse tipo de arrepio era citado no enredo que em certo trecho dizia: “[...] Nunca
vi nada assim. [...] Quero fazer tua vontade; te arrepiar na avenida”3. O arrepio, neste caso, foi
em dose dupla: para os esquiadores - que nunca haviam participado de um desfile
carnavalesco- e para público - que pela primeira vez via uma pista de esqui em um desfile de
escola de samba.
Tanto “atores” quanto “espectadores” do espetáculo poderiam se arrepiar diante de algo
incomum – uma pista de esqui, um signo que também nos coloca diante de um jogo de
linguagens que estabelece relações entre neve, frio e arrepio: a neve constitui um signo
indicial de frio – a única causa de arrepio que a ciência explica4.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os exemplos apresentados demonstram que a estética criadora de Paulo Barros carrega
marcas de preocupação com a clareza e a originalidade. Tais atributos são respectivamente
2 Matéria “Viradouro levará neve e esqui à Sapucaí” publicada em 31/01/2008. Disponível em:
<http://globoesporte.globo.com/carnaval2008> acesso em 18/03/2011.
3 Enredo disponível em <www.liesa.com.br> acesso em 18/03/2011.
4 Informação dada pelo carnavalesco Paulo Barros em entrevista publicada em 11/12/2007 no site:
<www.globo.com>, sob o título: “Paulo Barros mantém mistério sobre carnaval da Viradouro”
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alcançados pelo uso de signos cujos significados podem ser facilmente compreendidos pelo
público, e pela utilização de elementos inusitados. O resultado é uma capacidade de
comunicação eficaz com o espectador, que não precisa de legenda ou narração para
compreender o desfile, ao mesmo tempo em que se surpreende com as novidades
apresentadas pelo carnavalesco.
O espectador vê a fantasia do casal de mestre-sala e porta-bandeira e a compreende;
acompanha a comissão de frente e entende o seu significado dentro do enredo. Ademais, as
inovações apresentadas pelo carnavalesco se destacam não somente pelo aspecto do inusitado
em si, mas também porque sempre estabelecem relações de significância com o enredo
proposto.
Há quem considere sua linguagem “descarnavalizada”5, já que foge ao atual padrão das
escolas de samba. Proponho, neste caso, uma reflexão à luz do conceito de Bakhtin (1987),
para quem o carnaval ignora toda distinção entre atores e espectadores, bem como qualquer
tipo de palco ou cenário. Ora, os desfiles das escolas de samba já perderam parte desta
essência há décadas, em função da forma como são organizados na ‘sociedade do espetáculo’.
O regulamento determina, entre outros aspectos, um tempo rigorosamente cronometrado para
que o desfile aconteça, num “palco” (a Marquês de Sapucaí) cuja arquitetura delimita
claramente o espaço dos desfilantes e do público.
Quando propõe inovações e foge a certas regras, Paulo Barros não estaria, pelo contrário,
carnavalizando a linguagem das escolas de samba? A restrição a este tipo de iniciativa não
seria (aí sim) descarnavalizar os desfiles das escolas de samba e tornar tudo muito parecido?
Para responder, recorremos novamente aos pressupostos teóricos de Bakhtin (1987, p. 6-9),
que define o carnaval como “uma espécie de liberação temporária da verdade dominante e do
regime vigente” ou uma festa “das alternâncias e renovações”, que se manifesta “através de
formas de expressão dinâmicas e mutávies”. A resposta, então, é sim. E a discussão valeria
outro artigo.
5 Opinião dada pelo colunista Bruno Felippo no artigo: “O carnaval descarnavalizado de Paulo Barros” publicada
em 04/02/2008 no site: <www.odiaonline>, acesso em 20/02/2011.
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REFERÊNCIAS
BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais. São Paulo; HUCITEC: Editora da Universidade de Brasília, 1987.
BARBOSA, Juliana dos Santos. A transmutação de formas e o jogo de linguagens no processo de criação do carnaval 2007: a Viradouro vira o jogo. Dissertação de mestrado apresentada ao programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Londrina, 2007.
FERREIRA, Felipe. O Livro de Ouro do Carnaval Brasileiro. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004
KNELLER, George. Arte e ciência da criatividade. São Paulo: Ibrasa, 1978.
MUSSA, Alberto e SIMAS, Luiz Antonio. Samba de enredo: história e arte. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010 .
OSTROWER, Fayga. Criatividade e Processos de Criação. Petrópolis: Vozes, 1987.
PIGNATARI, Décio. O que é Comunicação Poética. 8ed. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2004.
PLAZA, Julio. Tradução Intersemiótica. São Paulo: Perspectiva, 2008
SALLES, Cecília. Gesto Inacabado: processo de criação artística. São Paulo; FAPESP: Anablume, 2004.
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