Upload
others
View
0
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
1
IMAGINÁRIOS DA FORMAÇÃO:
A PERSPECTIVA PÚBLICA E PRIVADA DO TRABALHO
EM SAÚDE NO ENSINO DE GRADUAÇÃO
(ESTUDO DE CASO NA GRADUAÇÃO EM MEDICINA,
ODONTOLOGIA E PSICOLOGIA, NA REGIÃO SUL DO
BRASIL)
REDE DE CENTROS COLABORADORES EM SAÚDE SUPLEMENTAR
NÚCLEO SUL
AGOSTO, 2007
2
REDE CIENTÍFICA SUL: 14 Instituições de Ensino Superior
• 04 público-federais:
UFPR, UFSC, UCS e UFRGS
• 10 comunitárias :
UEM, Uniplac, UPF, Unijuí, Univates, Unisc, IPA, Urcamp, UFPel e UCpel
3
CONDUÇÃO GERAL E
ARTICULAÇÃO NUCLEAR:
UFRGS – EducaSaúde
Núcleo de Educação,
Avaliação e Produção
Pedagógica em Saúde
UCS – Nepesc
Núcleo de Educação e
Pesquisas em Saúde Coletiva
Áreas Envolvidas:
• Educação em Saúde Coletiva
• Estudos sobre a Formação e Desenvolvimento de Profissionais de Saúde
• Pesquisa Avaliativa em Saúde
4
I - Projeto Nacional
Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS): Rede de Centros Colaboradores de Pesquisa em Saúde
Suplementar
II - Projeto Regional
Conhecimento regional e produção de informação técnico-científica em saúde
suplementar para a região sul do Brasil
III. Instituição Responsável
1 - Responsabilidade Administrativo-Gerencial
Fundação de Apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - Faurgs
2. - Responsabilidade Técnico-Executiva
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - Ufrgs
Programa de Pós-Graduação em Educação - PPGEdu / Educação em Saúde
Núcleo de Educação, Avaliação e Produção Pedagógica em Saúde - EducaSaúde
5
Sumário
1. Introdução.............................................................................................................................7
2. Justificativa ......................................................................................................................... 11
3. Objetivos ............................................................................................................................. 17
3.1. Objetivo Geral .....................................................................................................................17
3.2. Objetivos específicos ............................................................................................................17
4. Caminho Metodológico ...................................................................................................... 18
4.1. A etapa metodológica quantitativa.......................................................................................20
4.2. A etapa metodológica qualitativa .........................................................................................21
4.3. Considerações bioéticas .......................................................................................................25
4.4. A rede científica ...................................................................................................................25
5. Análise quantitativa dos docentes ..................................................................................... 27
5.1. Informações presentes nos questionários respondidos.............................................................. 29
6. Análise quantitativa dos discentes .................................................................................... 60
6.1. Informações presentes nos questionários respondidos.............................................................. 61
7. Matriz de Análise qualitativa ............................................................................................ 77
7.1. Análise dos eixos .............................................................................................................78 7.1.1. Formação profissional sobre o sistema de saúde.... ............................................................... 78 7.1.2. Processo de trabalho no setor da saúde................................................................................... 85 7.1.3. Fatores de escolha pelo trabalho nos subsetores público-estatal ou suplementar .............. 96 7.1.4. Qualidade do exercício profissional ....................................................................................... 107 7.1.5. Atuação concomitante nos subsetores público-estatal e suplementar ............................... 118 7.1.6. Regulação no setor da saúde .................................................................................................. 124 7.2. Análise dos Blocos Temáticos....................................................................................... 136 7.2.1. Considerações sobre o Desejo de Prática Profissional dos estudantes ao final do curso .............................................................................................................................................................. 136 7.2.2. Considerações sobre a Abordagem do tema da saúde suplementar e de sua regulação na formação ............................................................................................................................................. 139 7.2.3. Considerações sobre os Fatores que mantém a ideação liberal-privatista entre os profissionais ....................................................................................................................................... 142
8. Bibliografia ....................................................................................................................... 144
6
Anexos ................................................................................................................................... 147
Anexo 1: Questionário para docentes ....................................................................................... 148
Anexo 2: Questionário para discentes ...................................................................................... 152
Anexo 3: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ........................................................... 156
7
1. Introdução
Desde a conquista do Sistema Único de Saúde (SUS), comemoramos a ampliação do
acesso da população às ações e aos serviços de que necessita em saúde, bem como a redução
dos efeitos predatórios do setor econômico sobre a cobertura dessas ações e serviços, mas
pouco nos dedicamos, na Educação Superior e na Saúde Coletiva, a compreender as atuais
características das relações entre público e privado no setor da saúde, onde encontramos um
subsetor estatal, composto por ações e serviços próprios do SUS e ações e serviços
contratados e conveniados, identificados como complementares, uma vez que não-estatais,
mas prestando serviços ao Estado, e um subsetor suplementar composto pelas ações e pelos
serviços prestados pela iniciativa privada, cabendo ao SUS a sua fiscalização e controle.
Idealmente, ao subsetor suplementar não deveria caber importantes parcelas de
cobertura assistencial, uma vez que o SUS foi delineado como de acesso universal.
Entretanto, o direito de acesso não correspondeu à efetiva cobertura e os planos e seguros
privados de saúde vêm contribuindo de maneira expressiva à garantia de acesso da população
à atenção de saúde. Apenas as ações e serviços de saúde cobertas por desembolso direto dos
usuários se aproximam, hoje em dia, do conceito estimado à designação original de
suplementar (adicional/ampliada, não um lugar necessário ou que se impõe/complementar).
De acordo com a Constituição Federal (C.F.), o direito de toda a população brasileira à
saúde e o dever do Estado para com a mesma deve ser garantido pelo acesso não apenas às
ações de recuperação, mas, também, às ações de promoção e proteção (assistência em sentido
ampliado) (C.F., art. 196); as ações e os serviços de saúde foram definidos como de
relevância pública e, por isso, passou a caber ao Estado (poder público) sua regulamentação,
fiscalização e controle, ainda que sua execução não se efetive diretamente (pelo poder
público), mas, também, por meio de terceiros (contratados ou conveniados) ou por pessoa
física ou jurídica de direito privado (iniciativa privada) (C.F., art. 197). O sistema de saúde,
mesmo não sendo restrito às ações e serviços sanitários do poder público, também foi
definido como único (C.F., art. 198), sendo facultada a assistência à saúde pela iniciativa
privada, vedada a destinação de recursos públicos para auxílios e subvenções às instituições
privadas com fins lucrativos e a participação de empresas ou capitais estrangeiros na
assistência à saúde no país, salvo em casos previstos por lei (C.F., art. 199).
As instituições privadas que participam de forma complementar do Sistema Único de
Saúde devem fazê- lo de acordo com as diretrizes e princípios deste, devendo estar assim
disposto nos respectivos contratos ou convênios (C.F., art. 199). Em relação ao restante da
8
iniciativa privada, quaisquer de suas ações e serviços também integram o rol de
responsabilidades do Estado e requerem adequado conhecimento para o exercício da
regulação pública. Então, para desenvolver as estratégias nacionais de regulação pública
(regulamentação, fiscalização e controle) foi criada, em 2000, a Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS).
Considerada a formação social brasileira e a história da organização do sistema
brasileiro de saúde, uma especial interrogação de regulação surge aí: qual a vigência do
imaginário social de exercício liberal das profissões científicas da saúde e da ideação das
práticas assistenciais sob o padrão consulta-prescrição, perspectivas típicas da atuação liberal
e da iniciativa privada de consultório? Essa interrogação surge para melhor entender os
possíveis padrões de aceitação e entendimento da extensão do papel de regulação pública a
ser exercido pelo Estado sobre a iniciativa privada.
O imaginário é um operador de virtualidades e realidades, contém formas e conteúdos
possíveis às realidades e de negação das mesmas, não é um determinismo, constitui um
campo de possíveis, isto é, agencia promessas, idéias e desejos, organiza lentes de
observação, filtros de audição e espessura de sensações, é matéria afetiva. O imaginário, como
uma aura ou atmosfera de partículas, funciona como e configura personalidades como um
atrator fractal composto por fluxos, familiaridades, vigência de conceitos, fixação de
percepções, oportunidade de experiências afetivas. Na medida em que é atrator, não é estável
e nem determinado, só existe e opera em encontros, relação com, interação, composição,
construção.
Como um bloco de concepções, percepções e afecções, o imaginário é vertido em
opiniões, planos de referência e sentimentos ao ser capturado em representações e
identidades, arrastando critérios, valores e paisagens na disputa por vigências e oposição à
criação-recriação permanente do real, o que mais facilmente reconheceremos ao explorar
territórios de pertencimento, mas a exploração que buscamos não é de esgotar potências em
estados fixos, antes torná- las virtualidades na construção de atualidades (acatar a introdução
da mudança de práticas de educar e assistir em saúde).
Nesta perspectiva, o ideal do exercício liberal (individual) da profissão e o ideal do
cenário consultório-prescrição (de ampla autonomia) terminam por estabelecer a vigência - no
plano ideativo - da imagem liberal-privatista a ser reproduzida nos subsetores estatal (próprio
ou complementar) e suplementar. Esse imaginário enaltece o subsetor suplementar,
9
colocando-o como projeto profissional, embora a pouca ou nula reflexão crítica sobre sua
resolubilidade, apropriação dos termos da integralidade em saúde ou comunicação com as
redes sociais de pertencimento e inclusão dos usuários.
O prejuízo ao subsetor estatal é o da manutenção de um ideário que lhe é distante e
inadequado ao cumprimento de seu papel público, o que se estende aos padrões de
contratação e convênio que são estabelecidos com a iniciativa privada. O prejuízo aos
usuários do subsetor suplementar é o da inacessibilidade à promoção e proteção à saúde e à
atenção integral que dê acolhimento às histórias de vida que acompanham os adoecimentos,
em especial quando dependem do leque de oferta dos planos e seguros privados. Um terceiro
prejuízo ocorre quando os profissionais, capturados em sua subjetividade pelo imaginário
liberal-privatista, rechaçam, desqualificam ou oneram com questões corporativas o trabalho
nas áreas estatais e subordinam os usuários a um cuidado que não lhes é acolhedor e não
alcança sua alta adesão terapêutica.
A captura das subjetividades profissionais subordina os próprios profissionais à
aceitação tácita dos paradigmas científicos tributários da economia capitalista mundial e aos
padrões disciplinares das sociedades de conhecimento. Observa-se a perda e a intensa
regulação das autonomias profissionais em nome do interesse econômico das empresas e
seguradoras de saúde, quando os profissionais atuam na saúde suplementar. O prejuízo aos
trabalhadores traduzir-se-á pelo trabalho danoso para a sua saúde pessoal que, de um lado é
combatido, tendo em vista direitos no trabalho, de outro é naturalizado e subsumido como
inexpugnável, além de ungido como condição social ao prestígio público, sucesso na carreira
e superioridade profissional e econômica.
Resta uma real preocupação ao SUS: a regulação do subsetor suplementar no tocante à
qualidade da atenção. Promoção e proteção da saúde ou assistência fragmentada às doenças e
agravos com evidência fisiopatológica? Sistema assistencial orientado pela alteridade com o
usuário ou pela utilização irrestrita de tecnologias diagnósticas e terapêuticas armadas em
equipamentos e medicamentos? Práticas cuidadoras ou subordinação aos protocolos centrados
nas abordagens por procedimentos e medicamentos? Práticas profissional-centradas e
embasadas em sistemas formais de encaminhamento ou acesso ao trabalho em equipes
multiprofissionais de saúde, conforme necessidades singulares? Integralidade ou práticas
consultório-centradas? Necessidade de regulação pública mediante interesse econômico ou
regulação pública mediante acesso aos serviços de alta qualidade às pessoas?
A ANS vem promovendo um conjunto de medidas visando redirecionar suas ações de
10
regulação de forma a ampliá- las, de um controle da eficiência financeira das empresas para
uma melhor qualificação da prestação e utilização dos serviços no subsetor. Este movimento
está relacionado com a idéia de que a Saúde Suplementar integra – como subsetor não-estatal
– o Sistema Único de Saúde, tanto em termos constitucionais como por sua importância na
oferta e na prestação de serviços no país, tornando-se necessário aprofundar essa temática nos
campos da Educação na Saúde, do Desenvolvimento da Gestão em Saúde, da Economia da
Saúde e áreas afins da Saúde Coletiva na direção de um entendimento mais abrangente da
atual conformação do sistema de saúde brasileiro. De outro modo, estaremos supondo que é
livre à iniciativa privada não apenas a oferta de ações e serviços, mas a decisão de atuar ou
não pela primazia da terapêutica, pela proteção da integridade de seus usuários e pelo
cumprimento ou descumprimento dos princípios de cidadania em saúde gravados na
Constituição Federal e suas leis orgânicas.
Em especial o Programa de qualificação da saúde suplementar: nova perspectiva no
processo de regulação visa ao monitoramento e à avaliação da assistência em saúde
suplementar e ao desenvolvimento institucional da ANS no cumprimento de seu papel de
Estado. Esse Programa se faz integrar por uma revisão crítica da qualidade do trabalho e das
ofertas em Saúde Suplementar para que esta venha incorporar à concepção curativa -
predominante na gestão e avaliação de seus resultados - as ações de promoção à saúde e
prevenção de doenças, mediante a construção de uma rede de centros colaboradores que
articule a ANS às instituições nacionais e internacionais envolvidas com produção teórica e
não apenas com a operacionalização da Saúde Suplementar. O subsetor privado-suplementar
em saúde abrange 25% da população brasileira.
Como resultado de pesquisa, já no interior do referido Programa, surgiu o conceito de
microrregulação, tendo em vista a disposição do trabalho, a atuação dos trabalhadores de
saúde e os sistemas assistenciais ofertados aos usuários. A microrregulação surge para
estruturar padrões de regulação relativos ao ordenamento do trabalho e à integralidade da
atenção à saúde.
Tendo em vista consolidar, intensificar e qualificar o objetivo da regulação, foram
desencadeadas pela ANS, a partir do início de 2005, uma série de ações de estímulo e
ampliação da capacidade institucional das instituições de ensino e pesquisa do país para a
análise da situação da Saúde Suplementar de forma descentralizada. No âmbito deste
processo, foram realizadas três oficinas de trabalho no ano de 2005 no Rio Grande do Sul,
envolvendo instituições dos três estados da Região Sul, configurando o projeto Educação dos
profissionais de saúde: imaginários sobre a perspectiva pública e privada do trabalho
11
em saúde, estudo de caso na graduação em medicina, odontologia e psicologia,
simplificado pela designação Educação em Saúde Suplementar que lhe dá abrangência,
magnitude e adequada delimitação. Trata-se de uma iniciativa da Agência Nacional de Saúde
Suplementar em parceria com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), visando ao
desenvolvimento de atividades de melhoramento institucional e de identificação de problemas
e dificuldades na implementação do SUS como uma política pública que pertence à
sociedade, além de constituir fortes subsídios ao planejamento subsetorial da saúde
suplementar.
O projeto de Educação em Saúde Suplementar teve coordenação técnica do Grupo
Temático de Educação em Saúde, do Programa de Pós-Graduação em Educação, da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, por meio do Núcleo de Educação, Avaliação e
Produção Pedagógica em Saúde (EducaSaúde) e consistiu do levantamento e análise dos
imaginários sobre a atuação e o sucesso profissional e do ideal da profissão presente entre
professores e estudantes da área da saúde relativamente ao potencial do seu trabalho,
cruzando-o com a realidade de um exercício que somente se pode fazer sob a regulação -
única em todo o país. Regulação essa que deve ser direcionada a todas as ações e serviços de
saúde de âmbito público, privado-complementar ou privado suplementar, representada pelo
Sistema Único de Saúde, onde a ANS ocupa papel de representante dos interesses da
população e não de grupos econômicos em particular ou de segmentos da economia.
Para o desenvolvimento deste projeto e por meio da coordenação do EducaSaúde, vêm
se estabelecendo uma forte articulação de Instituições de Ensino Superior (IES) dos três
estados da região sul do Brasil. Estas IES constituem a incipiente Rede Sul de Pesquisas em
Saúde Coletiva e o Núcleo Sul da Rede de Centros Colaboradores da ANS, cujo objetivo é a
produção e disseminação de conhecimentos no âmbito da saúde coletiva, do Sistema Único de
Saúde e do subsetor da saúde suplementar. Neste sentido e como parcerias fundamentais para
o desenvolvimento do projeto Educação em Saúde Suplementar, foram mobilizadas as
seguintes IES: Centro Universitário do Vale do Taquari de Educação Superior (Univates),
Centro Universitário Metodista Instituto Porto Alegre (Ipaim), Universidade de Caxias do Sul
(UCS), Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Universidade Católica de Pelotas (UCPel),
Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc), Universidade Regional do Noroeste do Estado
do Rio Grande do Sul, em Ijuí (Unijuí), Universidade Regional da Campanha (Urcamp) e
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). No âmbito da Ufrgs, o EducaSaúde
12
compartilha responsabilidades de pesquisa científica com o Grupo de Estudos em Promoção
da Saúde (Geps), da Escola de Enfermagem.
13
2. Justificativa
O poder público alcança a totalidade da população (100%) com as ações e serviços de
saúde que extrapolam a assistência e configuram os padrões de saúde no país, tais como o
controle e fiscalização de procedimentos, produtos e substâncias de interesse à saúde; a
execução de ações de vigilância epidemiológica, sanitária, ambiental e em saúde do
trabalhador; o desenvolvimento e ordenação da formação de trabalhadores na área; o
desenvolvimento e incremento de pesquisas e inovações científicas e tecnológicas em saúde; a
fiscalização e inspeção de alimentos e da água para consumo humano; a participação nas
ações de saneamento básico e proteção ao meio ambiente; a participação na produção de
medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos; a
participação no controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de
substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos; a organização e disponibilização de
sistemas de informação em saúde; a disposição de condições e requisitos que facilitem a
remoção de órgãos, tecidos e substâncias para fins de transplante, pesquisa e tratamento; a
disposição de condições e requisitos para a coleta, processamento e transfusão de sangue e
hemoderivados; a disposição de condições e requisitos para a pesquisa envolvendo seres
humanos; a regulação, auditoria e avaliação dos sistemas locais de saúde e a abertura de
canais participativos da população na condução dos sistemas locais e nacional de saúde, além
da regulamentação, fiscalização e controle de todas as ações e serviços de saúde exercidas no
território nacional, entre outras.
No tocante à assistência, entretanto, a dualidade estrutural e funcional do SUS (poder
público e iniciativa privada) vem sendo assinalada por diversos autores como de caráter
particular na reforma sanitária brasileira, demonstrando a importância de um aprofundamento
teórico e empírico sobre a Saúde Suplementar nos rumos e na qualidade do sistema de saúde
no país (Andreazzi, 1991, Conill,1992 e Vilaça Mendes,1993). De apenas livre à iniciativa
privada, a assistência à saúde passou à prestação por um subsetor suplementar integrado ao
subsetor estatal. O subsetor suplementar alcança ¼ da população brasileira no tocante à
assistência, embora a cobertura de proteção à saúde ultrapasse enormemente as estratégias
assistenciais, cumprindo uma diversidade de papéis relativos à redução do risco de doença e
outros agravos (como vimos acima).
Do ponto de vista macrossocial, as políticas de ajuste macroeconômico e as
dificuldades de financiamento, entre outras, estão nas raízes da explicação dessa tendência.
Apesar de relacionadas, as questões de âmbito microssocial são de outra ordem, referem-se à
14
organização das formas de trabalho; à educação dos profissionais de saúde; à estruturação dos
processos de subjetivação na formação, no trabalho e no exercício profissional e às posturas
ou aos comportamentos individuais e coletivos da população ao usufruir das ações e dos
serviços de saúde, numa complexa interação entre as dimensões econômicas, políticas,
culturais e ideativas.
A avaliação do SUS tem leituras diferenciadas conforme o agente social que a faz e
segundo a região geográfica do país. A questão da universalização do acesso às ações e aos
serviços tende a ser conflitiva por seus diferentes entendimentos e, em decorrência das
particularidades das políticas sociais no país. A ordem social brasileira se caracterizou por dar
origem a um “Estado sem cidadãos” (Fleury, 1994), com a convivência íntima e contraditória
dos setores estatal e privado, a qual precisa ser melhor compreendida. Para Fleury, as
mudanças do modelo de seguridade social ocorrido no Brasil a partir da constituição de 1988
se caracterizaram por uma reforma universal com inclusão segmentada, ou seja, diversos
"cidadãos" cobertos por diversos benefícios sociais.
Numa análise setorial, Faveret e Oliveira (1990) já haviam assinalado esta situação,
denominando-a de “universalização excludente”. A ampliação de direitos sem o
financiamento adequado teria facilitado a migração de parte da classe média do Instituto
Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps) para os planos de saúde, que
passaram a ter uma importante expansão a partir deste período. Segundo os autores, ao invés
de um “welfare redistributivo” criou-se um padrão de “welfare seletivo”, com uma articulação
orgânica entre as políticas públicas e o crescimento econômico do setor privado na área do
financiamento e da prestação de serviços de saúde.
Estima-se que a saúde suplementar cubra atualmente 38 milhões de usuários, o que
corresponde à aproximadamente ¼ da população brasileira. O mercado é constituído por
empresas de medicina de grupo (33,8%), cooperativas médicas (24,6%), autogestão (13,7%),
seguradora (12,1%), odontologia de grupo (8,7%), filantropia (3,4%) e cooperativa
odontológica (3,6%).
Trata-se de um mercado fortemente concentrado, pois 61 operadoras somam mais de
20 milhões de beneficiários. A clientela concentra-se nos centros urbanos, principalmente na
região sudeste (59%), com maior proporção de mulheres e de famílias de maior renda. A
cobertura de planos de saúde para famílias com renda maior que 20 salários mínimos atinge
76%.
Embora de menor envergadura, a presença de planos de saúde na região sul não é
inexpressiva, correspondendo à aproximadamente 20% de beneficiários no Paraná, 18% em
15
Santa Catarina e 14% no Rio Grande do Sul (ANS, 2005). No entanto, são raros os estudos
sobre o tema nessa região.
Ao longo da década de 1990, um conjunto de trabalhos foi sendo publicado, dirigindo-
se principalmente à caracterização econômica do setor e aos aspectos referentes à sua
regulação (Bahia, 2001; ANS, 2002). Nesse sentido, a criação da Agência Nacional de Saúde
Suplementar, em 2000, se constituiu num marco de fundamental importância.
Já em consonância com a atual proposta de qualificação da saúde suplementar, essa
Agência fomentou a realização de duas pesquisas, visando o estudo dos modelos (sistemas de
pensamento) assistenciais e da regulação praticada pelo próprio mercado de planos de saúde.
Foi utilizada uma metodologia qualitativa num estudo com sete operadoras, tendo sido
realizadas um total de 89 entrevistas (dirigentes e prestadores hospitalares, médicos, e
odontológicos, call centers e Procons) em São Paulo, Rio de Janeiro, Campinas e Belo
Horizonte. A investigação tomou por base os princípios de atenção integral à saúde, a
humanização do atendimento, o estabelecimento de vínculo entre usuários e
profissionais/serviços e a resolubilidade das práticas profissionais de saúde.
Os resultados desses estudos, com uma contextualização geral dos planos, foram
publicados recentemente (ANS, 2005) e fornecem um panorama do mercado atual,
descrevendo e analisando estratégias de microrregulação, um conceito criado pela pesquisa,
junto aos prestadores médicos e hospitalares. Estas estratégias se caracterizaram pelo
direcionamento da clientela, disciplinamento das práticas e pelo controle do consumo.
Visando uma aproximação ao cotidiano assistencial, a pesquisa trabalhou também com
a construção de Linhas de Cuidado, entendidas como a articulação ou a facilitação do acesso
ao conjunto de serviços ambulatoriais ou hospitalares, bem como aos cuidados de
especialistas médicos ou de outros profissionais de saúde (psicólogos, fisioterapeutas,
enfermeiros ou outros) e às tecnologias de diagnóstico e tratamento capazes de contribuir
para a integralidade do cuidado de que necessitem as pessoas.
Os dados mostraram uma similaridade muito grande entre o cuidado oferecido na
saúde suplementar e as práticas assistenciais tradicionais do paradigma biomédico. Conforme
Malta e cols (2005, p. 146), as principais características do modelo de assistência praticado
na saúde suplementar assentam-se na fragmentação do cuidado, na ênfase em
procedimentos, nas diretrizes biologicistas e em interesses de mercado.
Entre as diretrizes apontadas para a reorganização da modelagem assistencial estavam
a integralidade do cuidado, a produção de vínculo e a responsabilização, como estratégias
capazes de alterar a micropolítica dos processos de trabalho (substituição de paradigama,
16
desde os sistemas de pensamento), os efeitos desse processo na organização da assistência à
saúde e os desenhos institucionais para a oferta de ações e serviços (Malta e cols, 2005).
O cenário descrito apontou a necessidade e a oportunidade de ampliar estudos e
análises, bem como de fortalecer o ensino e a articulação interinstitucional no âmbito do
ensino e da pesquisa relativamente ao tema da Saúde Suplementar. Com essa finalidade, o
Projeto de Educação em Saúde Suplementar busca aprofundar as produções acerca dos
processos de ensino e aprendizagem, compreendendo a perspectiva liberal-privatista presente
na prática e na formação na área da saúde como sistema de pensamento.
O imaginário liberal-privatista atravessa o que se ensina sobre saúde desde a educação
infantil até a pós-graduação das áreas clínicas em saúde, uma concepção marcada pela prática
de consultório, pelo atendimento individual embasado na díade diagnóstico-prescrição, tendo
a doença como referência e o curativismo biologicista como paradigma. Esse imaginário não
tem sido colocado em questão mediante aproximações concretas ao mercado de trabalho em
saúde, à regulação do subsetor privado-suplementar e aos itinerários terapêuticos efetuados
por usuários e profissionais em busca da resolutividade dos problemas de saúde identificados,
além de suas implicações à cidadania e à promoção da saúde como responsabilidade setorial e
profissional.
Ao preservarmos, como sociedade do conhecimento, um ensino de saúde, em todos os
níveis de escolarização, que privilegia a perspectiva liberal-privatista e não coloca em análise
as relações entre público e privado no ordenamento do Sistema Único de Saúde, não
contribuímos para a real compreensão e apropriação da cidadania, para a eqüidade e
solidariedade entre as classes sociais no direito à saúde como dever do Estado para com toda a
população e para uma ciência com relevância pública associada ao mérito acadêmico.
A construção de referências e sentidos ao ensino e à pesquisa configuram o primeiro
passo na identificação do que e como ensinar e pesquisar na universidade relativamente à
saúde suplementar, escapando do ideário liberal-privatista para uma análise de sociedade e
saúde, trabalho e mercado em saúde, educação em saúde para a cidadania plena de todas as
classes sociais, problemas e dificuldades na implementação do SUS e regulação pública no
interesse da coletividade.
As questões aqui levantadas carecem da mais mínima identificação de referências e
sentidos ao ensino e à pesquisa da saúde suplementar na condução regular dos cursos de
graduação em saúde, não se compondo currículos que minimamente dêem conta do
conhecimento relativo à regulação do subsetor privado-suplementar de saúde como um fator
de cidadania coletiva ou de base populacional que perpassa trabalhadores de saúde autônomos
17
ou empregados, gestores públicos dos sistemas de saúde e gestores privados das ações e
serviços de saúde, usuários individuais e coletivos de serviços públicos e de serviços privados
de saúde e docentes e estudantes dos diversos cursos da área da saúde, em seus diversos níveis
educacionais.
A perspectiva de um ensino que, com naturalidade, aborde a operação de um sistema
de saúde que seja único quanto aos interesses da população, ainda que executado por um
subsetor estatal e outro privado-suplementar, tornará único o debate da qualidade e dos
acessos às ações e serviços de saúde. Deste modo, evitar-se-ia conviver, diante da educação e
da produção de conhecimento acadêmico, com a dicotomia, tal como hoje existente, no
pensamento, na gestão, na avaliação e nas perspectivas de trabalho entre um subsetor muitas
vezes designado como desqualificado e destinado aos pobres (uma oferta pobre para uma
população pobre no imaginário profissional) e um subsistema designado como qualificado e
destinado aos que podem pagar (uma oferta nobre para uma população nobre no imaginário
profissional). Contudo, desde um ponto de vista da ciência na profissão, há um imaginário da
autonomia profissional e privativização da terapêutica que suprime o outro da clínica de
subjetividade, de alteridade e de singularidades nos modos de andar a vida, constrangido à
pura natureza (biologia, anatomia, fisiopatologia).
A partir do diálogo entre cursos de graduação da área da saúde, com especial destaque
entre as universidades públicas federais com a ANS e a Opas pretende-se construir referências
e dar sentido ao ensino e à pesquisa universitária, trabalhar pela fratura no imaginário vigente
e pela noção de regulação que dignifique o papel do Es tado em saúde. Busca-se neste
processo, resultar em uma noção concreta de relevância pública da saúde como direito de
todos e dever do Estado e uma noção de papel público aos setores estatais ou não.
Neste estudo optou-se pelo trabalho com as três principais universidades públicas
federais das capitais dos três estados do sul, ou seja, a Universidade Federal do Rio Grande do
Sul – Ufrgs, a Universidade Federal de Santa Catarina – Ufsc e a Universidade Federal do
Paraná – UFPR. Estas universidades são as maiores instituições de ensino superior da região,
contando com o maior número de alunos e oferecimento de cursos; são as mais concorridas e
possuem os escores mais elevados de aprovação no vestibular, o que também participa da
identificação de uma população formadora de opinião. As Universidades Federais do Rio
Grande do Sul, do Paraná e de Santa Catarina possuem o terceiro maior orçamento de seus
respectivos estados, superados apenas pelo orçamento do próprio estado e da prefeitura da
capital, com comunidades universitárias que giram em torno de 30.000 pessoas cada uma. A
18
presença da pós-graduação em ciências da saúde também é majoritariamente expressiva
nessas três universidades para a região sul do Brasil.
As Universidades Públicas Federais são importantes agentes de produção de
conhecimento e veiculação de informação e possuem histórico na articulação e representação
de alunos e professores orientados pela coisa pública (suposto ou tendência a um olhar menos
privativista sobre a sociedade), justificando, inclusive, pesquisa neste segmento para a
confirmação de tal imaginário/ideário.
Optou-se também por trabalhar, inicialmente, com os cursos de Medicina,
Odontologia e Psicologia por se tratarem, embora não exclusivamente, de áreas de atuação
com forte apelo à autonomia profissional e independência na formulação de diagnósticos e
indicações terapêuticas onde mais claramente se manifesta a ideação de profissão liberal. Tais
profissões caracterizam-se principalmente pela ênfase no atendimento direto ao usuário em
consultórios privados, ressaltando serem estas profissões as mais presentes nos registros de
consultórios privados no Cadastro Naciona l de Estabelecimentos de Saúde. Apenas estes
cursos contam com previsão legal de manifestação do Conselho Nacional de Saúde para a
abertura de novos cursos, uma vez que o Decreto Federal nº 5.773, de 9 de maio de 2006,
determina em seu art. 28, § 2º, que “a criação de cursos de graduação em medicina,
odontologia e psicologia, inclusive em universidades e centros universitários, deverá ser
submetida, à manifestação do Conselho Nacional de Saúde”. A necessidade de manifestação
do Conselho Nacional de Saúde para a autorização desses cursos é para que a mesma seja
pautada por critérios demanda social (ouvindo a manifestação do setor) e não de mercado
(interesse das instituições privadas de ensino), uma vez que o exercício profissional nestas
áreas pode impor risco à integridade física e emocional.
A hipótese da pesquisa é a de que a escolha destes cursos expressa a emergência dos
interesses de investigação científica quanto à busca por compreender a vigência ou não da
ideação liberal-privatista entre docentes e estudantes do último ano nos três cursos.
19
3. Objetivos
3.1. Objetivo Geral
Produzir informação técnico-científica sobre o imaginário presente na prática de
ensino-aprendizagem de docentes e estudantes dos três cursos de graduação objeto de
manifestação pelo Conselho Nacional de Saúde quanto à abertura de cursos por demanda
social, tendo em vista conhecer a ideação projetada às respectivas atuações profissionais e sua
regulação pelo poder público, no âmbito das três maiores universidades federais da região sul
do Brasil.
3.2. Objetivos específicos
• identificar quais os desejos de prática profissional dos estudantes ao final da
graduação;
• reconhecer os cenários de exercício profissional dos docentes além do acadêmico;
• reconhecer de que forma o tema Saúde Suplementar é presentificado no ensino para
o exercício profissional;
• identificar quais conhecimentos sobre saúde suplementar e sua regulação circulam
neste contexto;
• compreender os possíveis fatores que mantêm a ideação liberal-privatista entre
estudantes concluintes dos cursos de medicina, odontologia e psicologia;
• identificar monografias, dissertações e teses que abordem o tema do ensino sobre a
saúde suplementar e a sua regulação;
• identificar qual a bibliografia presente nos cursos de medicina, odontologia e
psicologia pertinente ao tema do ensino sobre a saúde suplementar e a sua regulação;
• identificar qual a produção escrita (iniciação científica, trabalhos de conclusão de
curso, trabalhos de extensão, monografias) sobre a saúde suplementar que resulta da
prática pedagógica desenvolvida neste contexto.
20
4. Caminho Metodológico
A fim de explorar os imaginários presentes na formação universitária relativos ao
exercício profissional em medicina, odontologia e psicologia, ao ser profissional dessas áreas
e ao obter essas diplomações acadêmicas, bem como explorar a atmosfera tocante às relações
público-privadas na saúde e a abordagem curricular desses cursos de graduação no tocante ao
trabalho no subsetor suplementar de prestação de serviços de saúde, foram estipulados três
eixos analíticos para o ordenamento da busca de dados:
1) as imagens do trabalho em saúde relativas aos cenários estatal (público) e suplementar
(privado) tendo em vista detectar as sensações promovidas à opção por um ou outro desses
subsetores ou sua articulação nas elaborações sobre sucesso profissional;
2) a ideação liberal-privatista e a ideação SUS-implicada no desejo subjetivo de prática
profissional;
3) os modos de subjetivação presentes no ensino-aprendizagem relativos à abordagem
curricular do subsetor suplementar.
Uma vez que imaginários são operadores de subjetivação, uma espécie de solo
proliferativo de concepções, percepções e afecções, mas não a configuração de
representações sociais descritoras de conceitos, percepções e afetos não nos seria possível
explorar esse solo com entrevistas e a categorização dos sujeitos portadores de discursos,
interessava-nos a presença de discursividades, sensações e interações, era preciso fazer
emergir pistas; colocá- las em debate com atores implicados no ensino e na aprendizagem;
provocar interações entre os atores do cotidiano do ensino-aprendizagem; estabelecer o
confronto de opiniões, vivências e explicações.
Na busca destes elementos, o estudo foi desenvolvido numa perspectiva
prioritariamente qualitativa. Entretanto, também foi desenvolvida uma primeira etapa
quantitativa por meio de um questionário com questões abertas e fechadas, visando produzir
subsídios analíticos para a etapa qualitativa em virtude da complexidade da temática e, por
conseqüência, em função das exigências das questões de pesquisa. Este procedimento também
produziu informações quantitativas sobre os propósitos da pesquisa. Desse modo, o
empreendimento investigativo desenvolveu e foi desenvolvido por dimensões quali-
quantitativas, caracterizando um estudo flexível em suas normas metodológicas e suas
21
estratégias de coleta de dados, propiciando o ajuste necessário ao processo interativo
objetivo/subjetivo (Santos, 1995, p.404) e evitando assim o risco do “monismo metodológico”
(Bourdieu, 1992). Tratou-se de um caminho metodológico que possibilitasse apreender a
realidade da formação, bem como identificar a produção de um determinado imaginário
acerca da atuação profissional em saúde, da saúde suplementar e da sua regulação.
A partir da análise dos questionários, os dados foram coletados, organizados e
debatidos por meio de grupos focais orientados por uma agenda de temas pertinentes aos
interesses da pesquisa. A pesquisa qualitativa constitui-se da análise sistemática de
informações de caráter subjetivo, coletadas por meio de instrumentos de pesquisa e está
voltada para a compreensão ampliada e profunda de fenômenos, a partir das experiências de
interesse à pesquisa, vividas por atores sociais implicados (Polit; Beck; Hungler, 2004). A
opção pela priorização do desenho qualitativo deve-se, também, ao seu caráter social, visto
que este possibilita conhecer um fenômeno sob diferentes olhares, ampliando a análise para o
contexto e a estrutura social circunscrita (Minayo, 2004).
A pesquisa foi desenvolvida em três Universidades Públicas Federais das três capitais
dos Estados da Região Sul – Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs),
Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc) e Universidade Federal do Paraná (UFPR). O
universo da pesquisa compreendeu todos os estudantes formandos dos cursos de Medicina,
Odontologia e Psicologia destas Universidades e todos os professores que desenvolvem
atividades docentes junto a estes estudantes. Foram considerados estudantes formandos
aqueles que estavam cursando o penúltimo semestre do curso no início do processo de coleta
dos dados (no segundo semestre de 2006). Tendo em conta a previsão de duração do trabalho
de campo para dois semestres, pretendeu-se com este critério de inclusão, contar, ao longo do
processo de coleta de dados, com os mesmos atores que participaram da pesquisa desde o seu
início.
Participaram da etapa quantitativa da pesquisa, realizada através de questionários
semi-estruturados aplicados no universo de 449 estudantes concluintes e 195 docentes
universitários deste período final de curso. Dentre os 449 discentes, 264 estudantes
responderam ao questionário, correspondendo a 59% do total de estudantes concluintes de
graduação dos três cursos. Entre os 195 docentes, 133 questionários foram respondidos
(68%). A participação da etapa qualitativa do trabalho (grupos focais) aconteceu com a
presença de 15 discentes e de 17 docentes. As próximas seções descrevem de maneira mais
detalhada os procedimentos metodológicos das duas etapas: a quantitativa e a qualitativa.
22
4.1. A etapa metodológica quantitativa
O levantamento de questões relevantes para a pesquisa foi realizado através de
questionário que foi respondido por alunos formandos e docentes dos cursos de Medicina,
Odontologia e Psicologia das três Universidades participantes da pesquisa. Este questionário
circulou entre os cursos destas instituições durante o final do segundo semestre de 2006 e o
início do primeiro semestre de 2007. Este tempo prolongado de circulação foi necessário em
função da característica de “dispersão” que é própria das fases de conclusão dos cursos. No
período final de percurso da graduação, os estudantes concluintes estão espalhados nos
espaços de estágios de conclusão dos cursos e são escassos os encontros acadêmicos nas
instituições de ensino, além destes encontros serem marcados por uma agenda repleta de
temas e procedimentos finais da graduação. Esta realidade implica na pouca disponibilidade
destes sujeitos para o desenvolvimento de uma pesquisa que não está diretamente relacionada
aos afazeres da conclusão de curso. Diante deste cenário, foram estabelecidas diferentes
estratégias de abordagem nos nove cursos – e nas três instituições –, visando obter o maior
número de participantes possível e, deste modo, uma maior produção de dados quantitativos.
O questionário – tanto dos docentes, quanto dos discentes – foi composto de perguntas
abertas e fechadas, as quais foram previamente testadas em uma etapa-piloto realizada na
Universidade de Caxias do Sul. Os dois questionários estão anexos a este Relatório de
Pesquisa: o anexo 1 trata-se dos questionários dos docentes e o anexo 2 dos discentes.
Além de servir de instrumento para uma primeira aproximação com o material
empírico de interesse da pesquisa, o questionário também foi utilizado para caracterizar os
sujeitos da pesquisa e indicar em que Universidade determinados temas receberam maior
destaque nos cursos de Medicina, de Odontologia e de Psicologia, uma vez que somente um
curso de cada Universidade iria participar dos grupos focais. Os dados obtidos por meio de
questões fechadas foram computados e organizados em tabelas e gráficos para facilitar o
levantamento de temas relevantes a serem aprofundados na análise qualitativa. Empregou-se o
programa Epi Info 6.0, para digitação da dimensão quantitativa dos questionários e criação do
banco de dados para análise dos mesmos. A plataforma Epi Info é uma coleção de softwares
construídos e distribuídos pelo CDC americano (Centers for Disease Control and Prevention)
e a Organização Mundial de Saúde.
Para a elaboração da agenda dos grupos focais, foi realizado um processo de
categorização das respostas das questões abertas do questionário. Estas respostas foram
consideradas como parte de um corpus de informações qualitativas na análise dos dados,
23
analisado por meio de procedimentos de análise de conteúdo, conforme Minayo (2004).
Segundo a autora, a análise de conteúdo descobre o que está por trás dos conteúdos
manifestos, indo além das aparências do que está sendo comunicado (Minayo, 2001). Como
propõe também a autora, a análise de conteúdo desenvolvida procura articular a superfície dos
textos analisados com os fatores que determinam suas características: variáveis psicossociais,
contexto cultural e processo de produção da mensagem (Minayo, 2004). A análise inclui as
fases de pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e
interpretação.
4.2. A etapa metodológica qualitativa
Para a compreensão do imaginário, tanto dos estudantes, quanto dos docentes sobre a
temática em estudo utilizou-se, na segunda etapa da pesquisa, a metodologia de grupo focal
com o objetivo de aprofundar algumas questões expostas no questionário pelo universo de
participantes, por ser um método qualitativo de coleta de dados com ampla aplicação na área
da saúde, pois, segundo Carlini-Cotrim (1996) e Dall’Agnol e Trench, (1999), tem por
embasamento alguns pressupostos, tais como: coletar dados/opiniões resultantes da interação
entre os participantes a partir de questões colocadas pelo pesquisador e contar com
participantes com características semelhantes em relação ao assunto em foco.
A metodologia de grupo focal permitiu a identificação e o levantamento de opiniões
referentes ao imaginário dos docentes e dos estudantes sobre a temática em estudo, em um
tempo relativamente curto. Tratou-se de um procedimento otimizado pela reunião de alguns
participantes e pelo confronto de idéias que se estabeleceu em determinados momentos, assim
como pela concordância em torno de uma mesma opinião em outros, o que possibilitou
conhecer um pouco do pensamento destes coletivos sobre as questões da pesquisa.
Os grupos focais foram realizados sob a coordenação de pesquisadores, compondo os
papéis de observador e de moderador, que coordenavam os debates num clima de
informalidade, promovendo a participação de todos, evitando dispersão dos objetivos da
discussão e possível monopolização de alguns participantes sobre outros.
Conforme havia sido acordado entre os pesquisadores nas oficinas preparativas, com
os docentes foi realizado um encontro, de aproximadamente 2h e com os estudantes foram
dois encontros de 1h30min cada. Para balizar as discussões dos estudantes, no início do
primeiro encontro foi explorado com cada grupo, qual era sua compreensão sobre imaginário,
setor público e setor privado, sintetizado, então, para efeitos deste estudo: imaginário - idéias
24
que povoam o pensamento dos coletivos, corporações, classes sociais, os modos de ver o
mundo antes de repensar ou criticar o que acreditamos a respeito das coisas. setor público -
aquilo que é do Estado, sendo gerido e implementado pelos governos municipais, estaduais e
federal e cujo proprietário é o povo (relações estabelecidas por políticas públicas); e setor
privado - aquilo que é gerado e gerido pela iniciativa privada, que tem um proprietário
particular e que estabelece relações de mercado com quem pode pagar (relações estabelecidas
pelo poder de compra e venda) e que, dependendo do ramo de atividade, deve estar submetido
às políticas públicas e não apenas à compra e venda de serviços.
Cada participante, ao responder o questionário - primeira etapa da pesquisa – recebia e
devolvia preenchido o Termo de Consentimento Informado (Anexo 3), contendo algumas
informações sobre a pesquisa, com espaço para identificação e assinatura, caso concordasse
em participar do grupo focal, correspondendo a esta segunda etapa da pesquisa, sendo
contatado posteriormente. As questões de estudo foram identificadas em um roteiro para a
“roda de conversa” no grupo focal e as sessões transcorreram num ambiente tranqüilo e
espontâneo de exposição e debate do imaginário em estudo. As falas dos grupos focais foram
gravadas e, posteriormente, transcritas.
Segue uma caracterização sucinta de cada um dos seis grupos, sendo três de estudantes
e três de docentes que estavam atuando no ensino aprendizagem do último semestre dos três
cursos em estudo.
Estudantes de psicologia/Ufrgs - o universo de estudantes do curso de psicologia da
Ufrgs consistiu em 37 (trinta e sete) alunos que estavam no último (décimo) semestre; deste
total 20 (vinte) responderam o questionário, 6 (seis) se dispuseram, confirmaram presença e
compareceram em local - na própria Universidade – em dia e horário sugeridos por elas, todas
mulheres, tendo sido realizado em duas sessões de 1h30min cada, com intervalo de uma
semana.
Docentes de psicologia/Ufrgs - o universo de docentes do curso de psicologia da Ufrgs
consistiu em 9 (nove) professores que estavam atuando no ensino aprendizagem junto aos
alunos do último semestre, ou seja, o décimo do curso; deste total 7 (sete) responderam o
questionário e se dispuseram a participar do grupo focal; destes 6 (seis) confirmaram presença
e 4 (quatro) compareceram em local - na própria Universidade – em dia e horário sugeridos
por elas, todas mulheres, tendo sido realizado em uma única sessão de 1h45min.
Estudantes de Odontologia/UFSC - o universo de estudantes do curso de odontologia
da UFSC consistiu em 45 estudantes do último (décimo) semestre, destes 18 responderam o
25
questionário, 5 (cinco) se dispuseram, confirmaram presença e compareceram às duas sessões
do grupo focal que tiveram a duração de 1h30min.
Docentes de Odontologia/UFSC – do universo de 15 docentes do último semestre do
curso de odontologia da UFSC, .8 responderam o questionário e 8 (oito) se dispuseram e
participaram do grupo focal, realizado em uma única sessão de aproximadamente 2hs.
Estudantes de Medicina/UFPR - do universo de 85 estudantes do último semestre
(décimo) do curso de medicina da UFPR, 40 responderam o questionário, 4 (quatro) se
dispuseram, confirmaram presença e compareceram às duas sessões do grupo focal de
1h30min.
Docentes de Medicina/UFPR - do universo de 37 docentes que atuavam no ensino do
último semestre do curso de Medicina da UFPR, 31 responderam o questionário e 5 (cinco) se
dispuseram e participaram do único encontro do grupo focal de aproximadamente 2hs.
Após a realização dos grupos focais nas três universidades pesquisadas foi
desenvolvida uma oficina para definição de uma Matriz Avaliativa comum a todos os grupos,
permitindo uma organicidade ao material de pesquisa, mas sem planificar e uniformizar a
análise dos dados dos grupos focais em coerente com uma pesquisa em rede científica. O
objeto central deste momento do estudo fo i a sistematização das principais discussões nos
grupos focais.
A Matriz Avaliativa produzida foi composta por eixos, categoria e sub-categorias. Os
eixos referem-se aos enunciados trazidos pelos participantes dos grupos focais para debater os
Blocos Temáticos da pesquisa. As categorias são questões gerais que definem cada eixo e as
sub-categorias dizem respeito aos principais elementos levantados na categoria. Para este
momento da explanação metodológica é relevante explicitar os eixos produzidos; são eles:
I- Formação profissional sobre o sistema de saúde;
II- Processo de trabalho no setor da saúde;
III- Fatores de escolha pelo trabalho nos subsetores público-estatal ou suplementar;
IV- Qualidade do exercício profissional
V- Atuação concomitante nos subsetores público-estatal e suplementar;
VI- Regulação no setor da saúde.
De acordo com os objetivos e formulações do Projeto de Pesquisa, optou-se pela
organização destes eixos em três Blocos Temáticos que permitissem agrupar as principais
questões detectadas neste estudo. O primeiro Bloco Temático relaciona-se à produção de um
determinado imaginário acerca do exercício profissional – definido como desejo de prática
profissional dos estudantes ao final do curso – do médico, do odontólogo e do psicólogo. O
26
segundo Bloco Temático está baseado na identificação da abordagem do tema da saúde
suplementar e de sua regulação na formação. O terceiro e último Bloco temático procura
identificar fatores que mantém a ideação liberal-privativa entre os profissionais das três
categorias profissiona is estudadas.
Ressalta-se que a matriz teórica é resultado do caminho que os grupos focais trilharam
para debater sobre os temas propostos pelos pesquisadores, assim, a matriz contém elementos
chaves que demonstram o que está presente para estes grupos quando se fala dos referidos
blocos. A matriz avaliativa foi aplicada na transcrição dos grupos focais para buscar uma
trajetória de análise similar entre os grupos, mas demonstrando preocupação em não
uniformizar os dados.
Em cada bloco temático foi realizada a análise de docentes e estudantes dos diferentes
grupos ao mesmo tempo. Cabe ainda destacar que a matriz avaliativa, não se propõe a emitir
juízos de valores, no sentido de determinar se as respostas e/ou discussões em grupos focais
estão ou não corretas. Não se aplica aqui a noção de certo ou errado no que se refere às
questões discutidas e aos argumentos colocados, seja por docentes, seja por estudantes. Neste
sentido, a matriz opera mais como um organizador qualificado (Leite, 2005) deste imaginário,
possibilitando a problematização das questões abordadas e seus possíveis impactos nas
relações entre público e privado, principalmente no que se refere às possíveis implicações não
só para a regulação, mas para maior apropriação e entendimento entre os diferentes subsetores
na saúde.
O termo imaginário utilizado neste estudo engloba alguns conceitos que serão
explorados para maior clareza de suas implicações e a que nos referimos quando tratamos de
imaginário. Durand (1997) confere uma realidade e uma essência própria ao imaginário,
apresentando como sendo o conjunto das imagens e das relações de imagens que constitui o
capital pensado do homo sapiens, o grande e fundamental denominador onde se encaixam
todos os procedimentos do pensamento humano.
Por outro lado, Deleuze (1992), ao se referir ao imaginário, expressa que esta é uma
noção pouco determinada. Percebe uma relação entre imagem e conceito ao sugerir que as
idéias se realizam ora em um ora em outro. Entretanto, vê como um conjunto de trocas entre
uma imagem real e uma virtual, um cruzamento entre os pares real-virtual e verdadeiro-falso,
um entrecruzamento de vigência-atualização, um jogo entre o verdadeiro e o falso, não só re-
presentação, mas a-presentação, como um devir.
Para efeitos deste estudo considerou-se imaginário, também, como uma construção
histórica de idéias que povoam pensamentos coletivos, corporações, classes sociais, modos de
27
ver o mundo, antes de repensar ou criticar o que pensamos a respeito das coisas. Quando
relacionamos a dinâmica do “acontecer” com o “imaginário”, chamamos atenção para a
articulação ou, ainda, para o entrecruzamento do desejo com a racionalidade, do sonho com a
realidade, do ideal com o real. No específico desta pesquisa, trata-se de um tipo de atmosfera
de formação onde se ensina profissionais de saúde e se perfila as novas gerações
profissionais. Uma atmosfera que ensina o quê ver e sentir quando se aprende a ser um
profissional de saúde. (Ceccim e Bilibio, 2007).
4.3. Considerações bioéticas
Seguindo as recomendações da Resolução nº 196/96, do Conselho Nacional de Saúde,
o projeto de pesquisa foi submetido à apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa da Ufrgs
antes que a pesquisa iniciasse. Atendendo a estas recomendações os participantes foram
informados previamente sobre os objetivos da pesquisa, a garantia de sigilo e anonimato e a
possibilidade de desistirem da sua participação a qualquer momento sem que isto implicasse
ônus de qualquer tipo.
4.4. A rede científica
Diversas Instituições de Ensino Superio r da região sul do país contribuíram de diferentes
formas para o desenvolvimento deste trabalho de pesquisa; são elas:
Centro Universitário Metodista Instituto Porto Alegre – IPA;
Centro Universitário Vale do Taquari de Educação Superior – Univates;
Universidade Católica de Pelotas – UCPel;
Universidade de Caxias do Sul – UCS;
Universidade de Passo Fundo – UPF;
Universidade de Santa Cruz do Sul – Unisc;
Universidade do Planalto Catarinense – Uniplac;
Universidade Federal de Pelotas – UFPel;
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC;
Universidade Federal do Paraná – UFPR;
Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS;
Universidade Regional da Campanha – Urcamp;
Universidade Regional do Noroeste do Estado do R. G. do Sul – Unijuí;
28
29
5. Análise quantitativa dos docentes
Ao final do ano letivo de 2006 existiam 195 docentes atuando no ano final do percurso
de graduação em Psicologia, Medicina e Odontologia das três Instituições Federais
pesquisadas. Neste universo de docentes, 133 questionários foram respondidos; totalizando
68,2% de docentes pesquisados. Estes dados estão representados no gráfico a seguir:
Questionários oferecidos a docentes
133
62
respondidos
não respondidos
O coletivo de professores pesquisados tem como média de idade 47 anos, sendo 27
anos a idade mínima registrada e 68 a maior idade. Na perspectiva do gênero do grupo
respondente, 65% são do sexo masculino e 35% do sexo feminino. Este grupo tem como
média 18 anos e meio de atuação nas IFES, sendo o tempo mínimo encontrado de atuação 1
ano e o tempo máximo de 37 anos de atuação.
Do total de docentes que atuam no último ano desses cursos, 33 são professores da
Psicologia; 105 da Medicina; 57 da Odontologia. Neste cenário, 26 professores de Psicologia
responderam ao questionário (78,7% do total de professores de Psicologia); 79 professores da
Medicina (75,2%); 28 professores de Odontologia (49,1%). O gráfico abaixo representa estes
dados.
30
Docentes entrevistados - divisão por cursos
26
7
7926
28
29
Respondidos - PSI
Não respondidos - PSI
Respondidos - MED
Não respondidos - MED
Respondidos - ODO
Não respondidos - ODO
Ainda nesta perspectiva, do total de docentes que atuam nesse período, 73 são da
UFPR (37,4% do total dos docentes); 57 da UFSC (29,2% do total); 65 da UFRGS (33,4% do
total). Estes dados estão explicitados no gráfico abaixo.
Na UFPR, 54 docentes responderam ao questionário (74% do total de docentes da
UFPR); 33 docentes responderam na UFSC (57,9% do total da UFSC); 46 docentes da
UFRGS (70,7% do total da UFRGS). Os dados estão representados no gráfico a seguir:
Docentes - divisão por Universidade de origem
73
57
65
UFPRUFSCUFRGS
31
5.1. Informações presentes nos questionários respondidos
O questionário aplicado aos docentes que atuam no último ano dos cursos pesquisados
continha doze (12) questões objetivas, passiveis de medição quantitativa sobre as respostas
obtidas. Seguindo a mesma lógica do questionário dos discentes, a quase totalidade das
questões permitia a escolha de mais de uma alternativa de resposta. Este aspecto de múltipla
escolha propiciou uma multiplicidade de variações de respostas. Porém, os dados que serão
explicitados buscam elucidar importantes aspectos da análise proposta na pesquisa. Deste
modo, o conjunto de respostas serão apresentadas seguindo a mesma lógica de apresentação
utilizada na análise quantitativa dos questionários dos discentes (porcentagem de todos os
questionários respondidos [N= 133] e em alguns casos, a porcentagem dos questionários na
perspectiva das IFES e dos cursos, além de outras combinações de porcentagens ligadas aos
interesse de análise da pesquisa).
A primeira questão objetiva do questionário foi a número 02. Nesta questão os
professores foram indagados sobre quais os lugares que eles trabalhavam, além das
instituições de ensino. As opções de respostas eram as seguintes: (a) clínica privada; (b)
consultório particular; (c) serviço público; (d) hospital; (e) outro. Em torno de um terço dos
professores respondentes optaram por não responder a esta questão (34,6%). As outras três
opções de respostas mais apontadas foram: consultório particular com 15%; serviço público
foi 8,3%; clínica privada 6,8%. Estes dados estão explicitados no gráfico a seguir:
Docentes entrevistados - divisão por IES
54
19
33 24
46
19
Respondidos - UFPRNão respondidos - UFPRRespondidos - UFSCNão respondidos - UFSCRespondidos - UFRGSNão respondidos - UFRGS
32
Locais de trabalho - docentes
9
20
11
46
0
10
20
30
40
50
Clínica privada Consultório particular Serviço público Não responderam
Na perspectiva das IFES envolvidas na pesquisa, as três opções mais respondidas a
essa questão foram: na UFPR, 24,1% não responderam, 24,1% responderam a alternativa
consultório particular e 11,1% responderam clínica privada; na UFSC, 48,5% não
responderam, 15,2% responderam serviço público e 6,1% clínica privada, sendo a mesma
porcentagem de respostas – 6,1% – para as alternativas consultório particular e a combinação
“clínica privada + serviço público”; na UFRGS, 37% não responderam; 13% responderam a
alternativa serviço público e 10,9% foi a porcentagem de respostas para as alternativas
“consultório particular” e “consultório particular + hospital”. Estes dados estão representados
nos seguintes gráficos.
33
Locais de trabalho - docentes UFPR
6
13 13
0
2
4
6
8
10
12
14
Clínica privada Consultório particular Não responderam
Locais de trabalho - docentes UFSC
2
5
16
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
Clínica privada Serviço público Não responderam
34
Locais de trabalho - docentes UFRGS
5
6
17
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
Consultório particular Serviço público Não responderam
Ainda na questão 02, ao considerar as opções de respostas mais escolhidas – agora na
perspectiva dos cursos participantes – obtivermos as seguintes porcentagens: nos cursos de
Psicologia, 80,8% não responderam e 7,7% responderam a alternativa “outros”; na Medicina
19% responderam consultório particular, 13,9% não responderam e 12,7% optaram pela
resposta serviço público; na Odontologia 50% dos professores não responderam, 14,3%
responderam consultório particular e 10,7% optaram pela alternativa “outros”. Os gráficos
abaixo representam estas informações.
35
Locais de trabalho - docentes PSI
2
21
0
4
8
12
16
20
24
Outro Não responderam
Locais de trabalho - docentes MED
15
10
11
0
4
8
12
16
Consultório particular Serviço público Não responderam
36
A questão 03 também foi uma questão quantitativa e perguntava – caso a alternativa
“consultório particular” tivesse sido apontada na questão anterior – como é feita a captação ou
fidelização da clientela. As opções de resposta para esta questão eram as seguintes: (a) planos
e seguros privados de saúde; (b) desembolso direto; (c) atendimentos gratuitos; (d) isenção
para colegas; (e) não há clientela regular. Não responderam esta questão, 57,1% dos
professores respondentes; 8,3% responderam desembolso direto e 7,5% responderam planos e
seguros privados de saúde. Estas informações estão presentes no gráfico a seguir.
Locais de trabalho - docentes ODO
4
3
14
0
4
8
12
16
Consultório particular Outro Não responderam
37
Na perspectiva das Instituições de ensino, as respostas tiveram o seguinte perfil
quantitativo: na UFPR, 40,7% não responderam; 16,7% responderam alternativa “desembolso
direto” e ficaram empatadas com 9,3% as alternativas “planos e seguros privados de saúde” e
“planos e seguros privados de saúde + desembolso direto”; na UFSC, 78,8% não responderam
e 9,1% responderam a alternativa “planos e seguros privados de saúde”; na UFRGS, 60,9%
não responderam e 8,7% responderam a alternativa “planos e seguros privados de saúde +
desembolso direto + atendimentos gratuitos + isenção para colegas”. Tais dados estão no
seguinte gráfico:
Captação da clientela - Docentes
11 10
76
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Desembolso direto Planos e seguros privados Não responderam
38
Captação da clientela - UFPR
9
5 5
22
0
5
10
15
20
25
Desembolso direto Planos e seguros privados Planos + Desembolso direto Não responderam
Captação da clientela - UFSC
3
26
0
5
10
15
20
25
30
Planos e seguros privados Não responderam
39
Ao considerar a perspectiva dos cursos para essa questão, temos as seguintes
porcentagens das respostas mais escolhidas: nos cursos de Psicologia, 92,3% não
responderam; na Medicina, 39,2% não responderam, 11,4% responderam planos e seguros
privados de saúde e 10,1% optaram pela resposta combinada “planos e seguros privados de
saúde + desembolso direto + atendimentos gratuitos + isenção para colegas”; na Odontologia
75% dos professores não responderam e 21,4% responderam desembolso direto. Os gráficos
abaixo representam estas informações.
Captação da clientela - UFRGS
28
4
0
5
10
15
20
25
30
Planos + Desembolso + Atendimentos gratuitos + Isenções Não responderam
40
Captação da clientela - Psicologia
2
24
0
5
10
15
20
25
30
Não responderam Outras respostas
Captação da clientela - Medicina
8
31
9
0
5
10
15
20
25
30
35
Planos e seguros privados Planos + Desembolso + Atendimentos gratuitos +Isenções
Não responderam
41
Captação da clientela - Odontologia
6
21
0
5
10
15
20
25
Desembolso direto Não responderam
A quarta questão do questionário solicitava ao professor especificar sua carga horária
na instituição de ensino. As alternativas de respostas eram: (a) 20 horas; (b) 30 horas; (c) 40
horas; (d) dedicação exclusiva; (e) outros. No total dos questionários respondidos a
porcentagem das respostas aconteceu com os seguintes números: 39,8% demonstraram ter
dedicação exclusiva; 29,3% demonstraram 20 horas de dedicação à instituição e 27,1%
demonstraram 40 horas. Estas porcentagens estão representadas no gráfico abaixo.
42
Carga horária de trabalho
39
36
53
0
10
20
30
40
50
60
20 Horas 40 Horas Dedicação exclusiva
A questão 05 perguntou sobre qual atuação era rotineira na instituição e tinha como
possibilidades de respostas: (a) atividade em sala de aula; (b) atividade prática (de campo); (c)
pesquisa; (d) extensão; (e) atividade administrativa; (f) outra. No geral, foram formuladas 25
combinações de respostas. A alternativa “atividade em sala de aula” esteve presente em 111
combinações, a alternativa “atividade prática” em 109 e a alternativa “pesquisa” em 101
combinações. A combinação “atividade em sala de aula + atividade prática + pesquisa +
extensão + atividade administrativa” ocorreu em 31,6% das respostas produzidas.
Na questão 06 foi indagado aos docentes se eles – no desenvolvimento da(s)
disciplina(s) em que atuam – tratam de questões relativas à atuação profissional no setor
privado de saúde. Considerando a totalidade dos questionários respondidos, 64% responderam
sim e 36% responderam que não tratavam destas questões. Ver gráfico abaixo.
43
Na perspectiva das instituições envolvidas, o percentual das respostas foi: UFPR, sim
64% e não 36%; UFSC, 64% sim e 36% não; UFRGS, 65% sim e 35% não. O mesmo
conjunto de respostas ao ser observado da ótica dos cursos, os percentuais são os seguintes: na
Psicologia, 77% sim e 23% não; na Medicina, 57% sim e 43% não; na Odontologia, 72% sim
e 28% não. Estas duas perspectivas de respostas estão representadas nos dois gráficos a
seguir:
Abordagem de questões sobre a atuação no setor privado - Instituição de ensino
34
21
30
20
12
16
0
5
10
15
20
25
30
35
40
UFPR UFSC UFRGS
SimNão
Abordagem de questões sobre a atuação no setor privado
85
48
Sim
Não
44
Abordagem de questões sobre a atuação no setor privado - Cursos
20
45
20
68
34
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
PSI MED ODO
SimNão
A próxima questão objetiva foi a número 08 e perguntou quais cenários do setor
privado eram abordados; quando tratados na(s) disciplina(s). As opções de respostas eram: (a)
setor privado contratado/conveniado com o SUS; (b) planos e seguros privados; (c)
desembolso direto; (d) não tenho clareza sobre o tipo de cenário; (e) não abordo. Para esta
questão, 28,6% responderam não abordo e 16,5% não responderam. Ao considerar a
proximidade das duas alternativas, é possível somar estas duas porcentagens no indicativo em
que nenhuma temática sobre o trabalho no setor privado de saúde é abordada por 45,1% dos
docentes pesquisados.
Na questão 09 foi indagado aos docentes se eles atuam em algum destes cenários do
setor privado de saúde. As alternativas de resposta foram: (a) sim e (b) não. Considerando a
totalidade dos questionários respondidos, 42,4% responderam sim e 54,9% responderam que
não atuam em nenhum desses cenários; 3,8% dos respondentes não responderam a esta
questão. Ver gráfico abaixo.
45
Atuação em cenários do setor privado
73
56
11
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Sim Não Não responderam
A questão 10 se relacionava com a questão 09, perguntando para aqueles que
responderam afirmativamente a questão 09 quais eram esses cenários de atuação. As respostas
ofertadas foram: (a) setor privado contratado/conveniado com o SUS; (b) planos e seguros
privados; (c) desembolso direto; (d) não tenho clareza sobre o tipo de cenário. As respostas
produzidas na totalidade dos questionários aconteceram com a seguinte porcentagem: 60,2%
não responderam; 9% responderam desembolso direto e 7,5% responderam combinadamente
“planos e seguros privados + desembolso direto”. O gráfico a seguir representa estes dados.
46
Cenários de atuação no setor privado
1210
80
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Desembolso direto Planos privados + desembolso direto Não responderam
A questão 11 indagou sobre o contexto no qual o docente desenvolve uma reflexão
com os discentes sobre os conteúdos do trabalho nos cenários do setor privado da saúde. As
alternativas de respostas ofertadas foram as seguintes: (a) em sala da aula; (b) atividade
prática (de campo); (c) em atividade de extensão; (d) em atividade de pesquisa; (e) como
relato de experiência ou estudo de caso; (f) outro; (g) não abordo. Os docentes que
responderam ao questionário produziram 27 combinações de respostas. Os aspectos mais
relevantes destas combinações foram os seguintes: 17,3% não responderam; 12,8%
responderam a alternativa “atividade prática”; 12% dos respondentes apontaram a
combinação “em sala da aula + atividade prática” e responderam não abordo 9%.
47
Desenvolvimento de conteúdos - setor privado
17
16
12
23
0
5
10
15
20
25
Atividade prática Sala de aula + atividade prática Não desenvolvem Não responderam
Na perspectiva das IFES envolvidas, o percentual de respostas aconteceu com as
seguintes características: na UFPR, 20,4% não responderam, 14,8% responderam a
combinação “em sala da aula + atividade prática”, 11,1% responderam somente em sala de
aula e 9,3% responderam que não abordam; na UFSC, 15,2% não responderam, 12,1%
responderam atividade prática; 9,1% combinação “em sala da aula + atividade prática” e
também foi escolhida com 9,1% a resposta “não abordo”; Na UFRGS, 17,4% responderam
atividade prática; 15,2% não responderam; 10,9% responderam a combinação “em sala da
aula + atividade prática” e 8,7% escolheram a alternativa “não abordo”.
48
Desenvolvimento de conteúdos setor privado - UFPR
6
8
5
11
0
2
4
6
8
10
12
Sala de aula Sala de aula + atividade prática Não desenvolvem Não responderam
Desenvolvimento de conteúdos setor privado - UFSC
4
3 3
5
0
1
2
3
4
5
6
Atividade prática Sala de aula + atividade prática Não desenvolvem Não responderam
49
Desenvolvimento de conteúdos setor privado - UFRGS
8
5
4
7
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
Atividade prática Sala de aula + atividade prática Não desenvolvem Não responderam
Ao considerar a mesma questão pela perspectiva dos cursos, o percentual das
respostas escolhidas acontece com os seguintes números: nos cursos de Psicologia, 26,9% dos
docentes não responderam, 15,4% responderam a alternativa “em sala de aula” e 11,5%
responderam a combinação “em sala de aula + em atividade de pesquisa”; nos cursos de
Medicina, 20,3% responderam em atividade prática; 17,7% não responderam; 11,4% optaram
pela combinação “em sala da aula + atividade prática” e 8,9% escolheram a alternativa “não
abordam”; nos cursos de Odontologia, 25% responderam a combinação “em sala da aula +
atividade prática”; 17,9% responderam não abordo, 14,3% a alternativa em sala de aula e
7,1% não responderam.
50
Desenvolvimento de conteúdos setor privado - Psicologia
4
3
7
0
1
2
3
4
5
6
7
8
Sala de aula Sala de aula + atividade prática Não responderam
Desenvolvimento de conteúdos setor privado - Medicina
16
9
7
14
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
Atividade prática Sala de aula + atividade prática Não desenvolvem Não responderam
51
Desenvolvimento de conteúdos setor privado - Odontologia
4
7
5
2
0
1
2
3
4
5
6
7
8
Sala de aula Sala de aula + atividade prática Não desenvolvem Não responderam
Na questão 12 a pergunta era se os docentes achavam desejável estar vinculado
profissionalmente a planos e seguros privados de saúde. As alternativas foram (a) sim e (b)
não. No geral, o percentual de respostas aconteceu da seguinte maneira: 48,1% responderam
positivamente e 46,6% responderam negativamente; 5,3% dos docentes preferiram não
responder a esta questão. O gráfico a seguir mostra estes números.
Vantajoso o vínculo profissional a planos de saúde
64
62
7
SimNãoNão responderam
Ao considerar a porcentagem de respostas por instituição de ensino, o percentual
acontece com a seguinte característica: na UFPR, 51,9% considera negativamente essa
52
vinculação e 42,6% considera positiva, 5,6% não responderam; na UFSC, 57,6% responderam
sim e 36,4% responderam não, 6% não responderam; na UFRGS, 47,8% responderam sim e
outros 47,8% responderam não; 4,4% dos questionários não obtiveram resposta. Na lógica
dos cursos, na Psicologia o mesmo percentual de 46,2% responderam sim e não, 7,6% não
responderam. Nos cursos de Medicina 55,7% indicaram sim e 41,8% indicaram não, sendo
que em 2,5% dos questionários esta questão não foi respondida. Na Odontologia, sim foi a
resposta em 28,6% dos questionários e não em 60,7%; 10,7% optaram por não opinar. As
perspectivas das instituições e dos cursos estão representadas nos dois gráficos a seguir:
Vantajoso o vínculo profissional a planos de saúde - Instituição de Ensino
23
19
22
28
12
22
32 2
0
5
10
15
20
25
30
UFPR UFSC UFRGS
SimNãoNão responderam
53
Vantajoso o vínculo profissional a planos de saúde - Cursos
12
8
12
33
17
2 23
44
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
PSI MED ODO
SimNãoNão responderam
A questão 14 foi formulada com o seguinte enunciado: considerando seus
conhecimentos sobre planos e seguros privados de saúde, que instâncias você entende como
responsáveis pela regulação (controle, fiscalização e acompanhamento) deste setor? As
alternativas de respostas ofertadas foram: (a) a população; (b) os beneficiários dos planos e
seguros; (c) o mercado; (d) os profissionais; (e) o Sistema Único de Saúde e suas agências
reguladoras; (f) procuradoria de defesa do consumidor (Procon); (g) outro. Para essa pergunta,
ocorreram 44 combinações de respostas. As porcentagens a seguir, registram o número de
questionários (e combinações) em que as alternativas foram conjugadas. Por exemplo, a
alternativa “a população” esteve presente em 86 questionários, conjugada com outras
alternativas, ou seja, a população foi uma das alternativas escolhidas por 64,6% dos docentes.
A alternativa “os beneficiários dos planos e seguros” foi escolhida por 60,1%; os profissionais
por 57,1%; procuradoria de defesa do consumidor por 59,3%.
54
Regulação do setor privado
86
80
76
79
70
72
74
76
78
80
82
84
86
88
População Beneficiários de planos e seguros Profissionais Procon
Ao considerar a mesma lógica de análise que foi utilizada na abordagem sobre os
questionários dos discentes, é oportuno enfatizar a relação formulada pelos docentes para as
alternativas “o Sistema Único de Saúde e suas agências reguladoras” e “o mercado”. Deste
modo, buscamos identificar quantitativamente – no universo dos docentes pesquisados – a
relação entre a Agência Nacional de Saúde Suplementar como órgão do estado brasileiro
responsável pela regulação do setor e a lógica de mercado que – historicamente – esteve
presente no setor privado de saúde enquanto dinâmica regulatória. Uma busca que pretende
levantar informações sobre a presença destas duas perspectivas de regulação no imaginário
dos docentes pesquisados.
Na perspectiva geral, o mercado foi uma alternativa escolhida por 29,3% dos docentes
pesquisados e o Sistema Único de Saúde e suas agências reguladoras por 51,1% destes
docentes. Estas duas alternativas juntas estiveram presentes em 14,2% dos questionários. Ou
seja, para mais da metade dos docentes o Sistema Único de Saúde e suas agências reguladoras
é uma das instâncias de regulação do setor suplementar de saúde. Estes dados estão
representados no gráfico abaixo.
55
Regulação do setor privado
39
19
68
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Mercado SUS e agências reguladoras Mercado + SUS e agências reguladoras
Ao considerar esta mesma lógica de análise (mercado e SUS e suas agências), porém,
na perspectiva dos cursos, os dados que surgem são os seguintes: na Psicologia, a alternativa
“o mercado” foi escolhida em somente um questionário (0,75%) e a alternativa “Sistema
Único de Saúde e suas agências reguladoras” foi escolhida em 17,2% dos questionários. Nos
cursos de medicina ocorre a seguinte porcentagem: o mercado foi uma alternativa escolhida
por 40% dos docentes pesquisados e o Sistema Único de Saúde e suas agências reguladoras
por 40,5% destes docentes. Estas duas alternativas juntas estiveram presentes em 16,4% dos
questionários. Já na Odontologia, o mercado foi uma alternativa escolhida por 28,5%, o
Sistema Único de Saúde e suas agências reguladoras por 53,5% e as duas alternativas juntas
estiveram presentes em 17,8% dos questionários. O gráfico a seguir demonstra estes números.
56
Regulação do setor privado - Psicologia
1
4
0
1
1
2
2
3
3
4
4
5
5
Mercado SUS e agências reguladoras
Regulação do setor privado - Medicina
32 32
13
0
5
10
15
20
25
30
35
Mercado SUS e agências reguladoras Mercado + SUS e agências reguladoras
57
Regulação do setor privado - Odontologia
8
15
5
0
2
4
6
8
10
12
14
16
Mercado SUS e agências reguladoras Mercado + SUS e agências reguladoras
A última questão quantitativa do questionário foi a número 15. Esta questão
perguntava sobre quais os conteúdos sobre saúde suplementar que os docentes consideram
relevantes no ensino da graduação de suas áreas. As alternativas de respostas foram as
seguintes: (a) aspectos legais; (b) aspectos financeiros; (c) funcionamento dos planos e
seguros; (d) relação entre o SUS e seguradoras e operadoras de planos privados; (e) vantagens
e desvantagens de vinculação dos profissionais a planos e seguros de saúde; (f) regulação e
controle dos planos e seguros privados de saúde; (g) outros.
Entre as diversas combinações de respostas que foram formuladas, a combinação mais
escolhida – com 24,8% das escolhas –, foi “aspectos legais + aspectos financeiros +
funcionamento dos planos e seguros + relação entre o SUS e seguradoras e operadoras de
planos privados + vantagens e desvantagens de vinculação dos profissionais a planos e
seguros de saúde + regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde”. Ou seja,
todas as alternativas com conteúdo ofertadas foram apontadas por 24,8% docentes como
aspectos a serem trabalhados na graduação.
Em função da proximidade entre as temáticas referentes nas alternativas “relação entre
o SUS e seguradoras e operadoras de planos privados” e “regulação e controle dos planos e
seguros privados de saúde”, a ênfase das análises a seguir acontecerão em torno destas duas
alternativas. Ou seja, qual a relevância que os docentes pesquisados apontam para estas
alternativas no ensino da graduação.
No geral, tanto a alternativa “relação entre o SUS e seguradoras e operadoras de
planos privados” e a alternativa “regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde”
58
aparecem em 57,8% dos questionários. Estas duas alternativas são escolhidas juntas por
44,3% dos respondentes. Estes dados sugerem que, para 42,2% estas temáticas não são
relevantes de serem trabalhadas na formação e, ainda, para 55,7% dos docentes elas não são
relevantes ou não estão relacionadas uma com a outra. Estes dados estão representados no
gráfico abaixo.
Conteúdos relevantes sobre saúde suplementar
59
33
77 77
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Relação SUS e seguradoras Regulação e controle de planos Relação SUS e seguradoras +regulação e controle de planos
Todas as alternativas
Ao focar a relação entre estas duas temáticas na perspectiva dos cursos pesquisados,
surgem os seguintes percentuais: na Psicologia, a “relação entre o SUS e seguradoras e
operadoras de planos privados” é uma alternativa escolhida em 80,7% dos questionários e a
alternativa “regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde” em 65,3% dos
questionários. As duas juntas estão presentes em 53,8% dos questionários. Na Medicina, a
“relação entre o SUS e seguradoras e operadoras de planos privados” é uma alternativa
escolhida em 51,9% dos questionários e a alternativa “regulação e controle dos planos e
seguros privados de saúde” em 55,7% dos questionários. As duas juntas estão presentes em
39,2% dos questionários. Por fim, na Odontologia, a alternativa “relação entre o SUS e
seguradoras e operadoras de planos privados” é uma escolhida em 53,5% dos questionários e
a alternativa “regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde” em 57,1% dos
questionários. As duas juntas aparecem em 50% dos questionários. Tais dados estão
representados no gráfico a seguir:
59
Conteúdos relevantes sobre saúde suplementar - Psicologia
21
17
14
0
5
10
15
20
25
Relação SUS e seguradoras Regulação e controle de planos Relação SUS e seguradoras + regulação econtrole de planos
Conteúdos relevantes sobre saúde suplementar - Medicina
41
31
44
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
Relação SUS e seguradoras Regulação e controle de planos Relação SUS e seguradoras + regulação econtrole de planos
60
Conteúdos relevantes sobre saúde suplementar - Odontologia
15
16
14
13
14
14
15
15
16
16
17
Relação SUS e seguradoras Regulação e controle de planos Relação SUS e seguradoras + regulação econtrole de planos
As respostas quantitativas presentes nos questionários respondidos pelos docentes,
suscitaram um leque menor de sugestões de análise em comparação com o leque de
suposições propiciado pela análise dos questionários dos discentes. Entretanto, os dados
coletados com os docentes permitem realizar algumas afirmações. A primeira delas é que
mais da metade do grupo trabalha alguma temática com os alunos sobre o trabalho no setor
privado de saúde. Estes conteúdos são marcados por um espontaneísmo. Isto é, acontece uma
diversidade enorme sobre quais temas são tratados.
Acontece também uma grande diversidade de respostas sobre “aonde” estes conteúdos
são trabalhados na graduação, levantando a seguinte suspeita: aquilo que é trabalhado sobre a
saúde suplementar não é conteúdo curricular, mas sim opiniões dos docentes a partir de suas
experiências na área; talvez como se fosse um tipo de curiosidade sobre o campo de trabalho
a ser comentada com os futuros colegas. Em relação à regulação do setor da saúde
suplementar um pouco mais da metade dos professores reconhece o SUS e suas agências
reguladores como uma instância responsável por esta regulação, mas uma porcentagem ainda
maior de professores acha que este tema necessita ser trabalhado com maior relevância na
graduação. Tais afirmativas são suposições possibilitadas pelos dados quantitativos e é o
trabalho com os Grupos Focais dos docentes que vai permitir confirmar estas hipóteses e
levantar outras perspectivas de análise.
61
6. Análise quantitativa dos discentes
Do universo de 449 discentes concluintes dos cursos de Psicologia, Medicina e
Odontologia no ano de 2006, 190 alunos eram da UFPR, 126 eram da Ufsc e 133 concluintes
eram da Ufrgs. Deste total, 142 (32%) estudantes eram concluintes dos cursos de Psicologia,
183 (41%) eram da Medicina e 124 (28%) eram da Odontologia. A distribuição deste
percentual entre os cursos participantes da pesquisa, tem-se que o questionário foi respondido
por 89 (63%) do total de estudantes da Psicologia, 109 (60%) dos estudantes de Medicina e
66 (53%) dos estudantes de Odontologia. Em relação às Instituições Federais de Ensino
Superior (IFES) envolvidas, a pesquisa atingiu a seguinte porcentagem dos estudantes: 64,7%
dos estudantes dos três cursos da UFPR, 49% dos estudantes dos três cursos da Ufsc e 50,7%
dos estudantes dos três cursos da Ufrgs.
Com relação à distribuição de respondentes por curso e por universidade, a pesquisa
alcançou os seguintes números nos cursos de Psicologia. Do total de 70 discentes na UFPR,
49 (70%) responderam o questionário; do total de 35 discentes na Ufsc, 20 (57%)
responderam; na psicologia da Ufrgs, do total de 37, 20 discentes responderam (54%). Quanto
aos estudantes de Medicina, os dados são os seguintes: na UFPR, dos 85 discentes, 40 (47%)
responderam o questionário; na Ufsc, dos 46 discentes, 23 (50%) responderam; e na Ufrgs, do
total de 52 estudantes, 46 (89%) responderam o instrumento. Com referência aos estudantes
de Odontologia, de um total de 35 discentes da UFPR, 27 (77%) responderam o questionário;
na Ufsc, 18 estudantes dentre os 45 formandos (42%); e na Ufrgs responderam o instrumento
21 do total de 44 (48%).
Quanto à faixa etária dos estudantes concluintes nos três cursos das três IFES
envolvidas, a pesquisa apontou 20 anos como a idade mínima e 49 anos como a idade
máxima, sendo a 24 anos a média de idade. Estes resultados caracterizam, da mesma forma,
os cursos de psicologia estudados. Nos cursos de Medicina a faixa etária encontrada foi de 22
a 35 anos, sendo a média de idade em 25 anos. Entre os estudantes de Odontologia a idade
mínima foi de 20 anos e a máxima encontrada de 37, ocorrendo a média etária de 23 anos.
Em relação ao perfil de gênero do total de respondentes, 58% foram do sexo feminino
e 42% do sexo masculino. Do total dos questionários respondidos nos três cursos de
Psicologia 74% pertencem ao sexo feminino e 26% ao sexo masculino (69% de mulheres e
31% de homens na UFPR; 60% de mulheres e 40% de homens na Ufsc; 100% de mulheres na
Ufrgs). Já nos cursos de Medicina, 45% são do sexo feminino e 55% do sexo masculino (35%
de mulheres e 65% de homens na UFPR; 48% de mulheres e 52% de homens na Ufsc; 52%
62
de mulheres e 48% de homens na Ufrgs). E, por fim, nos cursos de Odontologia 59% são do
sexo feminino e 41% do sexo masculino (78% de mulheres e 22% de homens na UFPR; 50%
de mulheres e 50% de homens na Ufsc; 40% de mulheres e 60% de homens na Ufrgs).
6.1. Informações presentes nos questionários respondidos
O questionário aplicado aos discentes concluintes agrupou doze (12) questões
objetivas, passiveis de medição quantitativa sobre as respostas obtidas. A quase totalidade das
questões permitia a escolha não excludente das alternativas de resposta, o que propiciou um
grande conjunto de respostas produzidas e uma multiplicidade de variações de respostas. Esse
conjunto de respostas pode ser agrupado – e demonstrado em gráficos – por diversos ângulos,
favorecendo uma diversidade de perspectivas de análise. Entretanto, os dados a serem
apresentados visam contemplar relevantes aspectos de análise em acordo com o propósito da
pesquisa. Nesta direção, o universo das respostas será agrupado com as seguintes prioridades:
• para as 12 questões serão demonstradas as porcentagens das respostas produzidas –
e vários dos gráficos correspondentes – sobre o total dos questionários respondidos
(N= 264);
• nas situações de respostas onde surgem relevantes especificidades ou uma
importante diferença no padrão de respostas entre as Instituições Federais de
Ensino Superior (Ifes) envolvidas e/ou no grupo dos cursos pesquisados (03 de
Psicologia, 03 de Medicina e 03 de Odontologia), também serão demonstradas as
porcentagens das respostas produzidas e em algumas delas os gráficos
correspondentes;
• em função da afinidade com o propósito de pesquisa, torna-se relevante – em
algumas questões – presentificar a porcentagem de respostas e os gráficos da
especificidade de cada um dos nove (09) cursos envolvidos (Psicologia da UFPR;
Psicologia da UFSC; Psicologia da UFGRS; Medicina da UFPR; Medicina da
UFSC; Medicina da UFRGS; Odontologia da UFPR; Odontologia da UFSC;
Odontologia da UFGRS);
• também visando contemplar o propósito da pesquisa, serão contrastadas as
porcentagens das respostas produzidas para diferentes questões. Os gráficos sobre a
porcentagem destas respostas serão apresentados buscando produzir informações a
partir do total de questionários respondidos (N= 264), e/ou das IFES envolvidas,
e/ou dos cursos pesquisados.
63
A primeira questão objetiva do questionário foi a de número 01. Nesta questão foi
indagado aonde o discente “poderá” trabalhar, tendo em conta a opinião dos respondentes
sobre o atual cenário do mercado de trabalho. As opções de resposta foram (a) iniciativa
privada e (b) serviço público; opções não excludentes. Do total de questionários aplicados,
21% responderam isoladamente iniciativa privada e 18% isoladamente serviço público.
Responderam em ambos os espaços (privado + público) 60% dos respondentes e 1% dos
questionários não obtiveram respostas nesta questão. Estes dados também estão organizados
no gráfico abaixo.
Gráfico geral da questão 01 (N= 264)
21%
18%60%
1%
Privado
Público
Ambos
NR (não responderam)
Na perspectiva das IFES envolvidas, o perfil de respostas ocorreu com a seguinte
característica: 26,7% dos discentes da UFPR responderam isoladamente iniciativa privada,
14,7% isoladamente serviço público e 57,8% apontaram ambos os espaços (0,9% não
responderam); 21,3% dos discentes da UFSC responderam isoladamente iniciativa privada,
26,2% isoladamente serviço público e 49,2% apontaram ambos os espaços (3.3% não
responderam); 13,8% dos discentes da UFRGS responderam isoladamente iniciativa privada,
16,1% isoladamente serviço público e 70,1% apontaram ambos os espaços de atuação.
Na ótica dos cursos envolvidos, ocorreram os seguintes perfis de respostas: 28,1% dos
discentes dos cursos de Psicologia responderam isoladamente iniciativa privada, 12,4%
isoladamente serviço público e 57,3% apontaram ambas as respostas (2,2% não
responderam); 14,7% dos discentes dos cursos de Medicina responderam isoladamente
iniciativa privada, 21,1% isoladamente serviço público e 63,3% apontaram ambas as respostas
(0,9% não responderam); 22,7% dos discentes dos cursos de Odontologia responderam
isoladamente iniciativa privada, 19,7% isoladamente serviço público e 57,6% apontaram
ambas as respostas.
Na questão 02 a indagação foi sobre o espaço onde o discente concluinte “deseja”
desenvolver sua atividade profissional, considerando o momento de término do curso. As
64
opções de resposta também foram (a) iniciativa privada e (b) serviço público. Do total de
questionários aplicados, 29,5% responderam isoladamente iniciativa privada e 43,9%
isoladamente serviço público. Responderam em ambos os espaços (privado + público) 23,9%
dos respondentes e 2,7% dos questionários não obtiveram respostas nesta questão. Estes
dados estão representados no gráfico abaixo.
Gráfico geral da questão 02 (N= 264)
30%
43%
24%
3%
Privado
Público
Ambos
NR
Na perspectiva das IFES envolvidas, o perfil de respostas ocorreu com a seguinte
característica: 37,9% dos discentes da UFPR responderam isoladamente iniciativa privada a
esta segunda questão, 39,7% isoladamente serviço público e 21,6% apontaram ambas (0,8 não
responderam); 27,9% dos discentes da UFSC responderam isoladamente iniciativa privada,
45,9% isoladamente serviço público e 19,7% apontaram ambas (6,5% não responderam);
19,5% dos discentes da UFRGS responderam isoladamente iniciativa privada, 48,3%
isoladamente serviço público e 29,9% apontaram ambas (2,3% não responderam).
Na ótica dos cursos envolvidos, ocorreram os seguintes perfis de respostas para a
questão 02: 43,8% dos discentes dos cursos de Psicologia responderam isoladamente
iniciativa privada, 29,2% isoladamente serviço público e 22,5% apontaram ambas (4,5% não
responderam); 15,6% dos discentes dos cursos de Medicina responderam isoladamente
iniciativa privada, 56,9% isoladamente serviço público e 24,8% apontaram ambas (2,7% não
responderam); 33,3% dos discentes dos cursos de Odontologia responderam isoladamente
iniciativa privada, 42,4% isoladamente serviço público e 24,3% apontaram ambos os espaços.
A questão 03 remeteu o respondente à época do seu ingresso no curso, perguntando
em que espaço o estudante “imaginava” trabalhar depois de formado. Seguindo a mesma
lógica das duas primeiras perguntas, as opções de resposta foram (a) iniciativa privada e (b)
serviço público. Do total de questionários aplicados, 61% foram respondidos com a
alternativa iniciativa privada isoladamente e 12% isoladamente serviço público. Responderam
em ambos os espaços (privado + público) 22% dos respondentes e 5% dos questionários não
obtiveram respostas nesta questão.
65
Gráfico geral da questão 03 (N= 264)
61%12%
22%
5%
Privado
Público
Ambos
NR
Na perspectiva das IFES envolvidas, o perfil de respostas ocorreu com a seguinte
característica: 63,8% dos discentes da UFPR responderam isoladamente iniciativa privada a
esta segunda questão, 8,6% isoladamente serviço público e 24,1% apontaram ambas (3,5%
não responderam); 59% dos discentes da UFSC responderam isoladamente iniciativa privada,
13,1% isoladamente serviço público e 19,7% apontaram ambas (8,2% não responderam);
58,6% dos discentes da UFRGS responderam isoladamente iniciativa privada, 16,1%
isoladamente serviço público e 19,5% apontaram ambas (5,8% não responderam).
Na ótica dos cursos envolvidos, ocorreram os seguintes perfis de respostas: 69,7% dos
discentes dos cursos de Psicologia responderam isoladamente iniciativa privada, 12,4%
isoladamente serviço público e 11,2% apontaram ambas (6,7% não responderam); 49,5% dos
discentes dos cursos de Medicina responderam isoladamente iniciativa privada, 11,9%
isoladamente serviço público e 33,9% apontaram ambas (4,7% não responderam); 68,2% dos
discentes dos cursos de Odontologia responderam isoladamente iniciativa privada, 12,1%
isoladamente serviço público e 15,2% apontaram ambas (4,5% não responderam).
Ao considerar em conjunto essas 03 primeiras questões objetivas e seus agrupamentos
de respostas, surgem algumas importantes possibilidades de análise a serem produzidas. As
questões permitem a visualização de uma linha de tempo do imaginário dos discentes sobre
os seus espaços de atuação profissional. Dito de outra forma, o agrupamento destas 03
questões permite contrastar aonde o discente desejava trabalhar profissionalmente no início de
sua graduação; aonde ele deseja agora, ao final do curso; aonde ele prevê que vai trabalhar em
função da realidade do mercado de trabalho (realidade esta também presente em seu
imaginário). Esta linha de tempo do imaginário têm como variáveis: 1) desejo inicial
(correspondendo às respostas da questão 03); 2) desejo atual (correspondendo às respostas da
questão 02) ; 3) previsão atual (correspondendo às respostas da questão 01).
66
Os gráficos a seguir buscam explicitar esta linha de tempo, considerando o total dos
discentes que responderam ao questionário e as respostas produzidas na perspectiva dos
cursos pesquisados.
Gráfico - linha de tempo do imaginário no total dos questionários respondidos (N= 264)
0
20
40
60
80
100
Desejo inicial Desejo atual previsão atual
PrivadoPúblico
Ambos
Gráfico - linha de tempo do imaginário na Psicologia - cursos agrupados - (N= 89)
0
20
40
60
80
100
Desejo inicial Desejo atual previsão atual
PrivadoPúblico
Ambos
Gráfico - linha de tempo do imaginário na Medicina - cursos agrupados - (N= 110)
0
20
40
60
80
100
Desejo inicial Desejo atual previsão atual
PrivadoPúblico
Ambos
67
Gráfico - linha de tempo do imaginário na Odontologia - cursos agrupados - (N= 86)
0
20
40
60
80
100
Desejo inicial Desejo atual previsão atual
Privado
PúblicoAmbos
É possível identificar nos gráficos da linha de tempo do imaginário o aumento da
tendência ao trabalho em ambos os espaços (iniciativa privada + serviço público). Este
aumento acontece em todas as linhas de tempo. Esta tendência sugere que “algo” acontece
durante o percurso da graduação e que transforma a perspectiva de atuação profissional. Por
um lado, é possível inferir a ligação entre esta tendência e a previsão sobre as oportunidades
de trabalho (maiores chances de conseguir o primeiro emprego como profissional de saúde no
serviço público). Por outro lado, parece que o desejo inicial apenas muda de lugar, ou melhor,
o desejo inicial é colocado lado a lado com uma leitura atual sobre a necessidade de atuar em
serviços públicos.
A investigação sobre os fatores que condicionam esta necessidade foi aprofundada nos
trabalhos dos grupos focais e estas informações estão em trabalho de refinamento das
análises. Entretanto, parece possível supor não se tratar de uma inversão do desejo na direção
do serviço público. Com exceção da Medicina que parte de um desejo inicial de 11% para um
desejo atual de 56,9% para atuar no serviço público, nas outras profissões não foi observada
uma inversão significativa na linha de tempo do desejo.
A questão 04 perguntou sobre o tipo de atividade profissional que o discente
concluinte “pretende desenvo lver”. Estiveram presentes como opções de respostas para esta
questão as seguintes alternativas: (a) docência; (b) pesquisa; (c) clínica; (d) gestão; (e) outras.
A alternativa “clínica” foi a que mais apareceu isoladamente com 43,2% de respostas. Nas
diversas possibilidades de respostas combinadas, a alternativa “clínica” também foi a que
mais apareceu acompanhada de alguma outra alternativa. Considerando todas as suas
combinações, a alternativa “clínica” apareceu em 88% das respostas.
Ao considerar a dinâmica do trabalho em saúde é relevante observar a presença da
alternativa gestão. Isoladamente esta alternativa obteve a preferência em apenas 2,7% das
respostas e esteve presente em 16% das respostas produzidas (isoladas + combinadas).
68
Entretanto, ao considerar os 100% das respostas combinadas e nas quais estava presente a
alternativa “clínica” – 118 respostas –, em apenas 25% (29 respostas) estava combinada a
alternativa “gestão”. Ou seja, 75% das respostas sobre a pretensão de trabalhar na clínica não
consideram a gestão como uma dimensão do processo de trabalho. Deste modo é possível
inferir que esse dado revela uma perspectiva preponderantemente técnica da clínica.
Outro aspecto relevante que acontece nesta direção é a relação entre as alternativas
“clínica, pesquisa e gestão”. A alternativa “pesquisa” foi escolhida isoladamente somente em
um questionário. Entretanto, 57 discentes escolheram a alternativa “pesquisa” associada com
alguma outra alternativa. Neste conjunto de respostas, 48 envolviam a “clínica” e apenas 5
respostas articulavam as alternativas pesquisa–clínica–gestão.
Deste modo, é possível visualizar que a relação da prática clínica com a prática de
pesquisa ganha sentido para 83% das pessoas que consideraram a alternativa pesquisa como
uma possibilidade de prática a ser desenvolvida. Ao mesmo tempo, somente para 9% – destes
discentes que relacionaram clínica e pesquisa – a alternativa gestão também compõe este
arranjo de práticas.
Ou seja, estes dados sugerem que a produção de conhecimento ganha relevância na
sua relação com a clínica, mas tem pouca relevância – pelo menos quantitativamente – na sua
relação com a gestão. Este aspecto reforça a idéia da preponderância técnica da perspectiva de
clínica presente entre os estudantes envolvidos na pesquisa.
A próxima questão quantitativa do questionário foi a número 06. A pergunta indagava
se houve contato – durante o curso – do discente com algum profissional de sua área que, em
sua opinião, era uma figura bem sucedida profissionalmente. As alternativas de respostas
foram: a) sim e b) não. No total de respostas obtidas, 93,2% foram positivas e 6,4% negativas;
em apenas um questionário esta pergunta não obteve resposta. No enfoque institucional, a
variação entre as respostas positivas foi entre 90 e 96,6%. Na perspectiva dos cursos, 88,8%
responderam sim nos cursos de Psicologia; 95,4% responderam sim nos cursos de Medicina e
95,5% nos cursos da Odontologia.
A questão 07 buscou aprofundar esta questão. A pergunta agora foi sobre quais os
campos de prática onde esse profissional bem sucedido atuava ou atua. As alternativas – não
excludentes – ofertadas foram: (a) clínica privada; (b) consultório particular; (c) plano de
saúde e/ou seguros de saúde; (d) serviço público; (e) hospital; (f) instituição de ensino; (g)
outro; (h) “não sei onde mais ele trabalha/trabalhava”. Articulada à questão 06, esta pergunta
procurou investigar quantitativamente a dimensão da “admiração profissional” dos discentes.
Dizendo com outras palavras, esta questão procurou identificar onde trabalha aquele
69
profissional que é admirado pelos estudantes e que – supostamente – poderia ocupar o lugar
de “exemplo a ser seguido”; um fator a mais para elucidar a direção do desejo dos discentes
quanto a ocupação profissional.
Ocorreram para esta questão 61 combinações de respostas; as diferentes alternativas
foram agrupadas – e escolhidas isoladamente – totalizando 61 possibilidades de resposta.
Dentro deste universo, a alternativa “plano de saúde e/ou seguros de saúde” foi a única opção
de resposta que não foi escolhida por nenhum estudante isoladamente. Entretanto, as respostas
compostas pelas alternativas “clínica privada” e “consultório particular” foram escolhidas por
205 pessoas: 78% dos 264 questionários respondidos.
Outra perspectiva presente nesta questão, trata das escolhas da alternativa “instituição
de ensino” que aconteceram em 49% das respostas. Dentro do universo de respostas
combinadas que incluíram a alternativa instituição de ensino (117 questionários), 104
respostas articulavam as alternativas “clínica privada” e/ou “consultório particular”. Ou seja,
para 89% dos respondentes que apontaram a instituição de ensino como um local aonde o
profissional bem sucedido atua, é relevante que este profissional também atue em consultório
particular e/ou clínica privada.
Na questão 08 foi investigado se o respondente identificava alguém com este perfil –
profissional bem sucedido – entre o seu grupo de professores. As alternativas foram as
seguintes: (a) todos; (b) a maioria; (c) a média; (d) raros; (e) nenhum. Considerando a
totalidade de questionários, 1,1% responderam a alternativa “todos”; 22,3% responderam a
alternativa “maioria”; 39% responderam a alternativa “média”; 32,6% responderam a
alternativa raros.
Na perspectiva das IFES pesquisadas, na UFPR 1,7% responderam a alternativa
“todos”; 19,8% responderam a alternativa “maioria”; 37,1% responderam a alternativa
“média”; 36,2% responderam a alternativa raros. Na UFSC, ninguém respondeu a alternativa
“todos”; 23% responderam a alternativa “maioria”; 42,6% responderam a alternativa “média”;
27,9% responderam a alternativa raros. Por fim, na UFRGS 1,1% responderam a alternativa
“todos”; 25,3% responderam a alternativa “maioria”; 39,1% responderam a alternativa
“média”; 31% responderam a alternativa raros.
Na perspectiva dos cursos, na Psicologia, 2,2,% responderam a alternativa “todos”;
9% responderam a alternativa “maioria”; 40,4% responderam a alternativa “média”; 38,2%
responderam a alternativa raros. Na medicina, ninguém respondeu a alternativa “todos”;
18,3% responderam a alternativa “maioria”; 45% responderam a alternativa “média”; 35,8%
responderam a alternativa raros. Por fim, na odontologia: 1,5% responderam a alternativa
70
“todos”; 47% responderam a alternativa “maioria”; 27,3% responderam a alternativa “média”;
19,7% responderam a alternativa raros.
A questão 09 indagou se em algum momento durante o curso foram abordados os
temas: planos de saúde, seguros ou empresas privadas de saúde. As alternativas de respostas
foram: (a) sim e (b) não. Do total de questionários respondidos, em 52% a alternativa foi o
“sim” e em 47% o “não” foi a alternativa escolhida (três questionários não foram respondidos
nesta questão).
Gráfico - questão 09, total de respondentes (N= 264)1%
47%
52%
Sim
NãoNR
Na perspectiva das IFES envo lvidas, as respostas ocorreram com o seguinte perfil: na
UFPR 58,6% das respostas foi sim e 40,5% foi não; na UFSC o sim foi 34,4% das respostas e
o não 63,9%; na UFRGS, a resposta sim estava presente em 54% dos questionários e a
resposta não em 44,8%.
Gráfico da questão 09 na perspectiva da Ifes
020406080
100
UFPR (n116) UFSC (n61) UFRGS (n87)
NR
Não
Sim
Considerando esta questão sob a ótica de cada um dos nove cursos pesquisados,
surgem os seguintes gráficos abaixo:
71
Gráfico da questão 09 na perspectiva dos cursos de Psicologia
020406080
100
UFPR (n49) UFSC (n20) UFRGS (n20)
Não
Sim
Gráfico da questão 09 na perspectiva dos cursos de Medicina
020406080
100
UFPR (n40) UFSC (23) UFRGS (n46)
NR
Não
Sim
Gráfico da questão 09 na perspectiva dos cursos de odontologia
020406080
100
UFPR (n27) UFSC (n18) UFRGS (21)
NR
Não
Sim
A
questão 10 perguntou sobre os espaços onde foram trabalhados os temas referidos na questão
09. As alternativas de respostas foram as seguintes: (a) como conteúdo disciplinar; (b) em
atividade de extensão; (c) seminários; (d) outros. Estas alternativas não foram apresentadas de
forma excludentes. No âmbito geral dos questionários, 39% não obtiveram resposta a esta
questão. “Como conteúdo disciplinar” foi a alternativa respondida isoladamente em 27,3%
dos questionários. A seguir estão os gráficos relativos a questão 10 na perspectiva dos cursos.
Nestes gráficos as categorias “conteúdo disciplinar, seminário e extensão”, foram
consideradas em sua aparição isolada. As respostas combinadas (ex: disciplina curricular +
seminário) foram consideradas na categoria “outros”.
72
0%
20%
40%
60%
80%
100%
UFPR (n49) UFSC (n20) UFRGS (n20)
Gráfico - questão 10 nos cursos de Psicologia
NR
Outros
Seminário
Extensão
Conteúdo disciplinar
0%
20%
40%
60%
80%
100%
UFPR (n40) UFSC (n23) UFRGS (n46)
Gráfico - questão 10 nos cursos de Psicologia
NR
Outros
Seminário
Extensão
Conteúdo disciplinar
0%
20%
40%
60%
80%
100%
UFPR (27) UFSC (n18) UFRGS (n21)
Gráfico - questão 10 nos cursos de Odontologia
NR
Outros
Seminário
Extensão
Conteúdo disciplinar
A questão de número 11 perguntou sobre quais os conteúdos abordados nos espaços
referidos na questão 10. As alternativas de respostas – não excludentes eram: (a) aspectos
legais; (b) aspectos financeiros; (c) financiamento dos planos e seguros privados de saúde; (d)
relação entre o SUS e as seguradoras e operadoras dos planos privados de saúde; (e)
vantagens e desvantagens da vinculação profissional aos planos e seguros de saúde; (f)
regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde; (g) outros.
No total de questionários respondidos (N= 264), 40,5% não obtiveram resposta a esta
questão. A combinação de todas as alternativas com exceção da alternativa “outros” esteve
presente em 6,4% das respostas. Ao considerar as respostas onde aconteceu uma escolha
isolada, a alternativa “aspectos legais” obteve 4,2% das escolhas e a alternativa “relação entre
o SUS e as seguradoras e operadoras dos planos privados de saúde” obteve 3,8%. A
alternativa “regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde” foi a única opção de
resposta não escolhida isoladamente, aparecendo em 29 respostas combinadas; 11% do total.
73
Ainda na direção da regulação é importante observar o seguinte conjunto de respostas:
em 264 questionários aplicados, 133 respostas envolviam combinações com as alternativas
“aspectos legais”, “financiamento dos planos e seguros privados de saúde” e “relação entre o
SUS e as seguradoras e operadoras dos planos privados de saúde”. Dentro deste conjunto de
133, 22% das respostas envolviam também a alternativa “regulação e controle dos planos e
seguros privados de saúde” (29 em 133). Ou seja, estes dados possibilitam as seguintes
interpretações:
1. 89% do total de discentes pesquisados não tiveram contato ou não lembram do
conteúdo “regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde”;
2. a metade dos discentes pesquisados (50,3%) tiveram contato com conteúdos que
mantém forte afinidade com o conteúdo “regulação e controle dos planos e
seguros privados de saúde”;
3. contudo, para 78% dos estudantes que – em algum momento do curso – tiveram
contato com estes conteúdos de forte afinidade com a temática da regulação e
controle (aspectos legais; financiamento dos planos e seguros privados de saúde;
relação entre o SUS e as seguradoras e operadoras dos planos privados de saúde),
foi possível não relacionar o conteúdo regulação e controle dos planos e seguros
privados de saúde.
Na perspectiva dos cursos, 65% dos questionários dos três cursos de Psicologia não
obtiveram respostas. A alternativa “regulação e controle dos planos e seguros privados de
saúde” não foi escolhida isoladamente – nem tão pouco combinada com outras alternativas –
em nenhum dos questionários.
No curso de Medicina da UFPR, 10% dos questionários não obtiveram resposta a esta
questão. Doze (12) respostas formuladas envolviam a alternativa “regulação e controle dos
planos e seguros privados de saúde”. No curso de Medicina da UFSC, 47,8% dos
questionários não obtiveram resposta e em apenas 01 questionário a alternativa “regulação e
controle dos planos e seguros privados de saúde” estava combinada. Na UFRGS, 26,1% dos
discentes respondentes não apontaram nenhuma resposta para esta questão. Em 06
questionários a alternativa “regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde”
estava envolvida.
Ao considerar os três cursos de Odontologia, observamos o seguinte perfil de
respostas para esta questão: na UFPR 14,8% não responderam e em 07 questionários esteve
presente a alternativa “regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde”; na
UFSC, 55,6% não responderam e a alternativa “regulação e controle dos planos e seguros
74
privados de saúde” não foi escolhida em nenhum questionário; na UFRGS, 38,1% não
responderam e em 03 questionários a alternativa “regulação e controle dos planos e seguros
privados de saúde” estava relacionada.
A próxima questão indagou sobre o desejo do discente concluinte para atuar vinculado
profissionalmente aos planos e seguros privados de saúde. As possibilidades de respostas
foram (a) sim e (b) não. Do total de estudantes pesquisados, 52% responderam positivamente
a esta questão e 39% não; 9% não responderam.
Gráfico geral da questão 12 (N= 264)
52%39%
9%
Sim
Não
NR
Os gráficos abaixo demonstram o perfil de respostas a esta questão levando em
consideração as IFES envolvidas e os nove cursos agrupados.
Gráfico da questão 12 na perspectiva da Ifes
0
20
40
60
80
100
UFPR (n116) UFSC (n61) UFRGS (n87)
NR
Não
Sim
Gráfico da questão 12 na perspectiva dos cursos de Psicologia
020406080
100
UFPR (n49) UFSC (n20) UFRGS (n20)
NR
Não
Sim
75
Gráfico da questão 12 na perspectiva dos cursos de Medicina
020406080
100
UFPR (n40) UFSC (n23) UFRGS (n46)
NR
Não
Sim
Gráfico da questão 12 na perspectiva dos cursos de odontologia
020406080
100
UFPR (n27) UFSC (n18) UFRGS (n21)
NR
Não
Sim
A última questão quantitativa do questionário foi a número 14; sugeria que os
respondentes considerassem seus conhecimentos sobre planos e seguros privados de saúde e
perguntava quais as instâncias responsáveis pela regulação (controle, fiscalização e
acompanhamento) deste setor. As alternativas não excludentes de respostas eram: (a) a
população; (b) os beneficiários dos planos e seguros; (c) o mercado; (d) os profissionais; (e) o
Sistema único de Saúde e suas Agências Reguladoras; (f) Procuradoria de Defesa do
Consumidor (Procon). As respostas para esta questão atingiram 57 combinações.
No total das respostas encontradas, as alternativas respondidas isoladamente tiveram o
seguinte perfil: a alternativa “o Sistema Único de Saúde e suas Agências Reguladoras” obteve
8,3% das respostas; “os profissionais” e a “Procuradoria de Defesa do Consumidor (Procon)”
foram alternativas que obtiveram os mesmos 7,6% de respostas; a alternativa “mercado” foi a
escolha de 5,3% dos respondentes a alternativa isolada com menos freqüência foi “a
população” com 0,8% das respostas (presença em dois questionários).
Uma consideração a ser feita é, de um lado, a presença legal da Agência Nacional de
Saúde Suplementar como órgão do estado brasileiro responsável pela regulação do setor e, do
outro lado, a lógica de mercado que – historicamente – esteve presente no setor privado de
saúde enquanto a lógica de regulação. Diante desta consideração, as análises quantitativas a
seguir buscam contemplar a presença, os cruzamentos e a prevalência da alternativa “Sistema
Único de Saúde e suas Agências Reguladoras” e a alternativa “mercado”. Esta busca pretende
76
assim, enfatizar a presença destas duas perspectivas de regulação no imaginário dos discentes
concluintes dos cursos investigados.
Considerando a totalidade dos questionários respondidos (N= 264), a alternativa
“mercado” esteve presente em 22% das respostas formuladas e a alternativa “o Sistema Único
de Saúde e suas Agências Reguladoras” em 33,3% das respostas. Estas duas alternativas
apareceram juntas em 8,7% das respostas. Os gráficos a seguir demonstram a presença dessas
alternativas de respostas na perspectiva dos cursos pesquisados.
Gráfico da questão 14 na perspectiva dos cursos de Psicologia
0
20
40
60
80
100
UFPR (n49) UFSC (n20) UFRGS (n20)
Estas alternativas juntas
SUS e agências
Mercado
Gráfico da questão 14 na perspectiva dos cursos de Medicina
0
20
40
60
80
100
UFPR (n40) UFSC (n23) UFRGS (n46)
Estas alternativas juntas
SUS e agências
Mercado
Gráfico da questão 14 na perspectiva dos cursos de odontologia
0
20
40
60
80
100
UFPR (n27) UFSC (n18) UFRGS (n21)
Estas alternativas juntas
SUS e agências
Mercado
O universo dessas informações quantitativas permite várias suposições sobre o
imaginário dos discentes concluintes dos cursos pesquisados em relação ao setor da saúde
suplementar. Algumas poucas possibilidades de análises já foram anunciadas nesta dimensão
quantitativa da pesquisa. Muitas destas possibilidades foram aprofundadas nos grupos focais
desenvolvidos com discentes dos cursos de Psicologia, Medicina e Odontologia e, neste
77
momento estão em fase de conclusão do processo analítico sobre este material produzido nos
grupos focais. Contudo, as informações quantitativas da pesquisa já sugerem algumas
conclusões parciais.
1. os discentes pesquisados tem um forte desejo de desenvolver sua trajetória
profissional na iniciativa privada;
2. entendem ser necessário conciliar este forte desejo com a atuação profissional
nos serviços públicos de saúde;
3. percebem esta atuação conciliada prioritariamente envolvida com a clínica;
4. admiram, principalmente, profissionais envolvidos com a clínica;
5. trata-se de uma compreensão sobre o trabalho em saúde onde a dimensão da
gestão dos serviços está pouco presente;
6. um pouco mais da metade dos discentes pretende trabalhar vinculado às
operadoras de saúde;
7. conteúdos disciplinares sobre a regulação do setor suplementar da saúde
foram muito pouco trabalhados na graduação;
8. contudo, um terço dos discentes percebe o Sistema Único de Saúde e suas
agências reguladoras como a instância responsável pela regulação e o controle
do setor saúde.
78
7. Matriz de Análise qualitativa
A análise que segue utiliza a Matriz Avaliativa produzida e está organizada
primeiramente pela abordagem dos Eixos de análise: formação profissional sobre o sistema de
saúde: processo de trabalho no setor da saúde; fatores de escolha pelo trabalho nos subsetores
público-estatal ou suplementar; qualidade do exercício profissional; atuação concomitante nos
subsetores público-estatal e suplementar; regulação no setor da saúde. Na sequência, são
trabalhados os três Blocos Temáticos anunciados anteriormente, A) Desejo de prática
profissional dos estudantes ao final do curso; B) Abordagem do tema da saúde suplementar e
de sua regulação na formação; C) Fatores que mantém a ideação liberal-privatista entre os
profissionais.
Cabe ressaltar, que devido a riqueza e multiplicidade dos dados podemos encontrar os
mesmos eixos da ma triz avaliativa sendo utilizada para descrever diferentes blocos temáticos.
Isso também se deve ao fato de que múltiplos fatores contribuem e afetam a construção do
imaginário. Ou seja, “formação profissional” e “qualidade do exercício profissional” (Eixos
da Matriz Avaliativa), podem, por exemplo, aparecer como destaque tanto na composição de
desejos de prática profissional, quanto na abordagem sobre saúde suplementar e sua regulação
e/ou ainda contribuindo com os fatores de manutenção de determinado ideário liberal-
privatista em saúde.
79
7.1. Análise dos eixos
7.1.1. Formação profissional sobre o sistema de saúde
a) Ensino sobre regulação em saúde pelo Estado
• desconhecimento da existência da ANS
• desconhecimento do conceito de saúde suplementar no interior do SUS
• dúvidas sobre convergências e divergências entre regulação, regulamentação, normatização,
uniformização
•
b) Construção acadêmica dos sentidos da regulação em saúde
• regulação relegada ao tema de "ética profissional" e códigos morais da sociedade
• embora se aceite a necessidade de regulação, dela se foge como construção conceitual e
prática porque, no fundo, as práticas de cada vertente profissional são diferentes e a ele
pertencem
•
c) Ensino do impacto da saúde na sociedade
• sem abordagem do sistema de saúde como um todo, abordagem é de maneira fragmentada,
com recorte na Atenção Primária à Saúde
• não ocorre a consideração do impacto do desempenho profissional na saúde da população
No que se refere a formação profissional os estudantes conseguem ident ificar que no
curso ocorre uma abordagem referente ao Sistema Único de Saúde, porém não identificam
uma mesma abordagem no que se refere ao sistema privado ou saúde suplementar. E mesmo a
abordagem do Sistema Único de Saúde no entendimento dos alunos não prepara para uma
atuação no serviço público, de acordo com as falas abaixo:
A gente tem odontologia social na faculdade inteira, vários espaços para a disciplina,
onde a gente estuda os conceitos teóricos de SUS, de PSF, (...) recursos funcionam bem
coletivamente, flúor na água e tal, mas estudar uma forma de atuar no serviço público de
maneira eficaz a gente não tem (estudante odontologia).
Uma coisa durante a formação nesse curso que a gente vê é que são as aulas mais
monótonas, a gente acaba não se interessando e muitas vezes é essa visão que a gente tem do
serviço público (estudante odontologia).
80
Outra subcategoria dentro deste eixo aborda o ensino do impacto da saúde na
sociedade. Dentro esta subdivisão os alunos abordaram as limitações da sua formação a forma
como está estruturado e organizado o curso. Destacaram diversos aspectos relacionados ao
pouco espaço existente para “humanização” do atendimento, da falta de preparo para estar
com o paciente em um espaço de interação e de troca. Exploram que uma melhora destes
aspectos dentro da formação acabaria por mudar o perfil dos profissionais, pois a falta de
humanização durante a formação acaba se refletindo depois no exercício profissional e no
isolamento da própria categoria profissional. As seguintes falas ilustram estas reflexões do
grupo focal:
A gente teria que começar antes, a gente começa muito tarde a clínica, a gente tinha
que ter contato com o paciente muito antes. A gente começa na 4ª fase, com triagem, mas com
educação e prevenção a gente poderia começar muito antes (estudante odontologia).
A gente poderia começar desde o início do curso, na segunda fase do curso já ir para
o campo, ter umas aulas de higiene bucal, de orientação de higiene bucal, aprender a
conversar com os pacientes porque as vezes a gente ainda não sabe lidar com os pacientes,
como conseguir fazer que o paciente entenda que ele tem que escovar os dentes. A gente
deveria mais cedo ter essa parte de começar a lidar com o paciente, a parte educativa, a
parte de prevenção para depois ir pro processo de procedimento (estudante odontologia).
Até falando de psicologia, a parte de psicologia que a gente tem é totalmente
dispensável, a gente não fez nada, não aprende a como lidar com o paciente (estudante
odontologia).
Mas é importante falar sobre isso, porque na verdade está na faculdade, num curso
em universidade pública e faz parte da melhoria da situação do SUS ou do PSF a melhor
formação dos profissionais, (...) em todos os aspectos, porque eu acho que são cinco anos que
são mal aproveitados, a gente passa muito tempo em sala de aula, aprendendo técnicas,
enquanto a gente podia ter uma formação mais ampla, mais de convívio com as pessoas, a
gente fica muito concentrada na técnica, técnica, técnica, óbvio que precisa aprender, senão
não vai saber fazer, mas, eu acho que falta muito (estudante odontologia).
A parte humana eu acho que falta, a parte humana falta bastante, até porque a gente
como estudante perde a parte humana, social, porque a gente vive o dia todo naquilo, vamos
às 7h da manhã pra faculdade, às vezes voltamos 7h, 8h da noite, horário integral e é só
aquilo; a gente perde o nosso lado humano muitas vezes trocando pelo técnico, pelo
profissional (estudante odontologia).
81
A gente quase não tem vida social durante a faculdade, raras exceções alguém
consegue ter uma ou outra coisa. Olhando a formação até pela própria carga horária, a
parte de humanizar, de socializar já é complicado na formação, e este aspecto pode ser
também a causa disso se refletir no serviço público, não só no serviço público, mas na vida
profissional da gente. Primeiro a relação odonto-cliente, a parte de formação e depois a
vida, mercado de trabalho que é o que acaba acontecendo (estudante odontologia).
O contexto do estudo demonstra, tanto para docentes como para estudantes, que existe
uma forte relação entre os estágios realizados durante a formação e a construção do
imaginário de prática profissional. Docentes e estudantes percebem que as diferentes
oportunidades de contato com o mercado nos estágios práticos realizados durante a formação
influenciam a percepção dos alunos sobre a realidade de trabalho:
Estamos falando mais relacionado com os estágios e isso diz muito da nossa
formação, da importância que os estágios assumem, pois quando eu entrei aqui não pensava
muito na prática, pensava muito na psicologia, porque eu queria estudar alguma coisa e,
assim, não pensava muito no que seria a prática do psicólogo, sei lá, público e privado
(estudante psicologia).
Nós não credenciamos qualquer local (para estágio), nós temos muito cuidado, em
termos de local puramente mercenário ou que não tenha um psicólogo, uma equipe (...) que
sejam locais públicos, de boa qualidade, que tenha uma supervisão, que a gente possa
acompanhar uma supervisão local do profissional que está trabalhando lá (docente
psicologia).
Desde o terceiro ano nós estamos praticando; quando nós entramos no curso tem
essas coisas que nós queremos praticar, queremos ir para a rua. Na metade do curso existe
um momento que tu vais lá e tens que fazer, e agora é tu, tem o peso da responsabilidade, é tu
te virar como profissional, tem que te sustentar, tem que te inserir (...) mas tu já teve a
experiência de ter uma idéia e não conseguir fazer essa idéia. Através da prática tu já teve
um sucesso (...). O grande divisor de águas na relação, (...) estar num momento de teoria-
prática, agora eu vou continuar praticando se Deus quiser. Mas o divisor de águas foi da
teoria para a prática (estudante psicologia).
Tal constatação já foi evidenciada em outros estudos realizados com formandos de
diversas áreas, onde a identidade profissional do aluno, seus desejos de prática e sua
percepção sobre os limites da atuação profissional, são construídos ao longo do processo de
formação, a partir das vivências acadêmicas e das percepções do mercado (Gondim, 2002).
82
O desejo de prática profissional também parece ter relação com os locais, tipos de
vivências e qualidade da própria formação. Neste sentido, como ilustra as falas a seguir, o
entendimento do que seja qualidade no trabalho do psicólogo tem a ver com determinado
indicativo ético expresso na ênfase a ações que extrapolam objetivos meramente financeiros e
que sejam realizadas em caráter interdisciplinar. A concepção de ‘qualidade do trabalho’
também aparece como relevante na definição dos desejos de prática e relacionada aos locais e
tipos de vivencia ofertados durante a formação.
Essa qualidade da formação (...) está muito dada pelo local onde o aluno vai fazer a
sua experiência de estágio (docente psicologia).
Os nossos alunos têm de ser respeitados, eles querem fazer medicina privada, eles
querem fazer medicina de convênios, eles tem que saber o que é isso, precisam de espaço
para vivenciar isso (docente medicina).
V
Vários participantes enfatizam, assim, que a vivência e os cenários de aprendizagem
dos estudantes são restritos ao subsetor público, o que nos leva a reflexão a respeito da
constituição de um imaginário de atuação sobre o outro subsetor privado como um imaginário
utópico e mantido por um ideário de categoria profissional.
O primeiro eixo da Matriz Avaliativa analisado neste Bloco Temático refere-se a
Formação Profissional sobre o Sistema de Saúde, este eixo apresenta uma primeira subdivisão
que é o Ensino sobre a regulação em saúde pelo Estado.
Sob este enfoque o primeiro destaque é o desconhecimento por parte dos estudantes a
respeito da existência da Agencia Nacional de Saúde Suplementar. Os discentes chegam a
citar outros órgãos como responsáveis pela regulação e a relação do profissional como o
paciente como uma relação comercial, e neste sentido a saúde como um produto a ser
consumido e negociado, de acordo com a fala abaixo:
Olha, na verdade eu acho que é mais fácil. Porque na verdade o cliente está pagando
e hoje é uma relação comercial como qualquer outra. Ele tem órgãos tipo o PROCON que
pode estar intercedendo por ele, não sei se é ignorância minha, mais eu acho que eles podem
estar reclamando por isso. Ele pode estar fazendo sua reivindicação, sua cobrança, por
órgãos dessa competência (estudante medicina).
Outros estudantes colocam ainda que o paciente quando pode pagar, pode escolher o
tipo de convenio e o médico a ser consultado, isso sob o enfoque da regulação que a procura
ou não por determinado profissional seria em si uma regulação exercida pelo paciente, como
ilustrado abaixo:
83
Eu acho que não é só por isso, é por causa da lei de mercado também. Porque se o
paciente não gostar daquele convênio ele pode mudar. Simplesmente é a lei de mercado, ele
vai procurar o que der melhor atendimento, pelo menor preço (estudante medicina).
Outro destaque a ser considerado é o desconhecimento do conceito de saúde
suplementar no interior do SUS, como dois espaços de atuação separados e sem influencia
concomitantes. Como ilustra a seguinte colocação de um estudante:
Não sei. Na verdade eu não tenho contato. Porque o contato maior que a gente tem é
com o serviço público (estudante medicina).
As discussões sobre a formação e o trabalho do psicólogo nos subsetores público –
estatal e suplementar, vistos numa perspectiva comparativa, levaram quase sempre em
consideração o trabalho no campo da psicologia clínica, provavelmente em função da
hegemonia desta prática na saúde suplementar. Neste contexto uma das questões destacadas
foi a relação entre a gratuidade e o pagamento deste trabalho. Para os docentes, a formação
realizada no curso de graduação no qual trabalham oferece oportunidade ao aluno de refletir
sobre esta questão, inclusive e princ ipalmente com relação à pseudo-gratuidade dos
atendimentos realizados no subsetor público – estatal.
Pagando ou não pagando o tratamento, eu diria que é importante essa consciência de
que se há um serviço público de saúde, a pessoa é cidadã, contribui, inclusive se o tratamento
é gratuito e se não é gratuito (docente psicologia)
O desenvolvimento de atividades numa clínica mantida pela própria universidade
onde, a um custo bem pequeno, as pessoas podem ser atendidas, é também considerado como
oportunidade para a aprendizagem de conteúdos sobre o trabalho no público e no privado e
sobre as implicações da gratuidade e da não - gratuidade dos serviços. No depoimento,
abaixo, o docente destaca a necessidade da consciência do custo financeiro do atendimento
em saúde, sugerindo que este é um dos conteúdos ensinados aos alunos da graduação em
psicologia.
Mesmo aqui na clínica cobramos o atendimento, mesmo sendo um serviço público,
mas com 2 ou 3 reais (...). É algo que a formação precisa pensar (...), se é o pai que paga ou
a mãe quem paga, como é que o tratamento não cai do céu de alguma forma, as pessoas têm
que pensar nas condições em que às vezes o tratamento de meses, 1 ano, 2 anos pode ser
sustentado, então, isso de alguma forma faz parte do currículo, a questão do local onde o
atendimento é feito, se ele é público ou privado (docente psicologia).
Outro destaque conferido pelos docentes na análise dos conteúdos sobre o trabalho nos
subsetores público – estatal e suplementar ensinados no curso de graduação em psicologia
84
tem a ver com a importância do enfoque da formação na qualidade da atenção,
independentemente do contexto.
Pensamos se há diferença entre um e outro (...), ou se deve haver diferença na
formação, (...) eu penso, como professora, que a questão que deve ser trabalhada é a
qualidade da atenção tanto numa quanto noutra. Então na formação, eu acho, pelo menos é a
experiência que eu tenho nas discussões com os estudantes, mesmo eles estando no setor
público às vezes surge essa discussão do privado, o que cada um está pensando (...). Para
nós professores, a questão tem que ser essa: a atenção de qualidade tanto num quanto no
outro, porque no SUS também, SUS não! No setor público, porque o SUS também dá conta
dos planos (docente psicologia).
Vislumbra-se aqui o Ensino sobre a regulação em saúde pelo Estado, como uma
categoria encontrada nos grupos focais, havendo portanto o desconhecimento da existência da
Agência Nacional de Saúde Suplementar, bem como o desconhecimento do conceito de saúde
suplementar no interior do SUS.
Em minha opinião, não se ensina sobre o público e o privado (...). Não vejo a
abordagem do sistema de saúde como um todo. Essa eu acho que é a grande falha no sistema
(docente medicina).
Penso que nós temos que entender que saúde, públicos ou privados são serviços
públicos, regulamentado inclusive pelo setor público (docente da medicina).
Essa questão da saúde suplementar é uma coisa que me incomoda na constituição o
termo que entrou foi complementaridade o que é ruim porque pressupõem um sistema que
não está completo e será completado pelo setor privado. Esse termo suplementar eu acho que
é eufemismo porque o que acontece no Brasil hoje é a complementação, o que potencializa a
ambigüidade: quem tiver dinheiro vai pagar e vai ser atendido rapidamente e quem não pode
pagar azar é dele (docente medicina).
Eu não concordo com essa idéia de agência, essa insistência de agência de saúde
suplementar, para mim é um absurdo, porque isso deveria estar dentro do SUS (docente
medicina).
Trabalho bastante durante todas as fases do curso, então eu vejo a evolução deles no
transcorrer do curso. É muito interessante ter a oportunidade de observar como evolui a
mentalidade, até mesmo a participação nos colegiados, quando os alunos que participam do
colegiado no início do curso eles tem um tipo de comportamento, que é muito diferente do seu
comportamento no final do curso (docente medicina).
85
Categoria a qual representa esta citação do docente insere-se na Formação Profissional
sobre o Sistema de Saúde, mais precisamente na construção acadêmica dos sentidos da
regulação. Observa-se tanto a regulação relegada ao tema da ética profissional, como embora
se aceite a necessidade de regulação, dela se foge como construção conceitual e prática
porque, no fundo as práticas de cada vertente profissional são diferentes e a elas pertencem.
Nós temos uma atividade acadêmica e temos uma atividade privada e eles não, não
separam bem as duas e não comparam. Quando se tenta comparar é muito difícil (docente
medicina).
Hoje dentro de um sistema cooperativista tem algo que você deixa não ser mais
vantajoso. Dentro de uma sociedade anônima, você tem mais vantagem, porque você passa a
ser proprietário de pró-labore (docente medicina)
Durante os grupos focais, docentes relatam que, nas discussões sobre a reforma
curricular, a ênfase na integralidade como eixo da formação não foi bem entendida por toda a
comunidade acadêmica. Além disto, os questionamentos se originaram na concepção de
cuidado integral como prática dirigida à população pobre, o que provavelmente tem a ver com
a idéia de que os princípios do SUS têm ressonância apenas no subsetor público-estatal.
Aparecia a problematização tanto de colegas (professores) quanto de estudantes:
bom, então a UFRGS está formando para trabalhar com pobres (docente psicologia)!
A discussão gerada pela reforma curricular, segundo o mesmo docente, se estendeu
para outros contextos de interação entre professores e alunos, constituíndo-se numa
oportunidade para a reflexão sobre a temática da regulação do setor da saúde e, de forma mais
específica, da regulação do subsetor suplementar na sua relação com o SUS.
Discutimos pouco essa questão e um pouco mais com os estagiários que às vezes vê;,
daí se prolonga essa discussão. Vai para a supervisão por conta dessa fala da reforma
curricular, que o teu plano está no SUS também, se é um Sistema Único de Saúde o teu plano
de saúde e todo plano privado também está no SUS (docente psicologia).
86
7.1.2. Processo de trabalho no setor da saúde
a) Organização do trabalho
• interdisciplinaridade (trabalho isolado da odontologia; necessidade atuação com outros
profissionais)
• acessibilidade burocrática ou despersonalizada no público-estatal e mais ágil e
personalizada no suplementar; falta de fluxos garantidos para os encaminhamentos no
subsetor público-estatal
• supervisão (olhar terceiro: no subsetor público-estatal, a presença da equipe viabiliza o
“olhar terceiro” e mesmo o coloca como uma exigência ética, desafiando à autocrítica
permanente; às vezes há apoiadores ou supervisores matriciais que cumprem esse papel; no
subsetor suplementar, a “supervisão” é uma busca necessariamente individual)
• registros (no subsetor público-estatal, pouca responsabilidade com os registros e pouco
retorno aos profissionais sobre os registros que fazem; no subsetor suplementar, o registro é
a forma de gerar controle sobre o que se faz, para assegurar a remuneração e para enfrentar
situações de fiscalização do exercício profissional)
b) Recursos e condições de trabalho
• infra-estrutura
• ambiente físico (estética do ambiente: condições de conforto, decoração e adequação)
• demanda reprimida
• materiais (odontologia: falta de equipamentos no serviço público; psicologia: falta de
recursos terapêuticos e diagnósticos)
c) Responsabilização dos profissionais
• responsabilidade com a resolutividade da atenção (no subsetor público-estatal, o trabalhador
não responde diretamente por seus atos, o governo responde; no subsetor suplementar, a
prática individual implica perder ou manter um cliente)
• responsabilidade com a capacidade resolutiva dos serviços (disponibilidade de exames,
medicamentos e equipamentos justifica a assistência ou des-assistência).
Analisando o desejo de atuação profissional outro aspecto destacado presente no
imaginário de docentes e estudantes está relacionado ao próprio comprometimento e
responsabilização dos profissionais ao atuarem nos diferentes subsetores:
87
O cara vai lá (setor público) porque ganha R$ 1.200, ele vai das 15hs às 16hs faz o
que tem que fazer e se manda para fazer outra coisa. Faz os quinze atendimentos que tem que
fazer e não dá bola para a instituição (...), ele vai lá para prestar um serviço (...) fez a
restauração, tirou a dorzinha, botou a broca, colocou o material provisório (docente
odontologia).
Aparece presente um ideário de sucesso e de reconhecimento relacionado ao desejo de
prática profissional, o enfoque principal dado pelos docentes foi relacionado às oportunidades
sociais e profissionais, de estar em evidência e ter conquistas materiais:
Tem um padrão, que é um pouco de ilusão também (...) a palavra sucesso ela é muito
valorizada (...). o que é ter sucesso? É quem está em evidência, quem está na capa da revista
(docente odontologia).
Eu acho que o sucesso não é só dinheiro, é aquele profissional comentado, que mais
gente diz que é bom, o mais elogiado, o profissional da moda (...). O profissional daqui não
faz clínica, só quem faz é que aparece (...) o professor não pode aparecer (docente
odontologia).
Há uma tendência na formação, por uma questão de valorização cultural, se
passaram estes valores de que o médico que tem o carro do último ano, que tem apartamento
não sei aonde, que viaja para o exterior, esse é o modelo que é passado. Sendo este
mecanismo um currículo explícito e implícito e que todo mundo quer seguir esse modelo de
enriquece (docente medicina).
Ou mesmo em relação às condições de trabalho, onde foram colocados aspectos como
o próprio ambiente físico de trabalho, considerando as condições de conforto e adequação:
Acho que o paciente particular é mais exigente no sentido de aparência. Então seu
consultório tem que ser um pouco mais ajeitado, você tem que estar ajeitado. Claro que no
público um ou outro repara nisso, mais isso é mais freqüente no particular (estudante
medicina).
Esta fala ilustra que no imaginário de atuação profissional, no público não é necessário
se preocupar com o conforto do ambiente, mas no privado sim, não só no ambiente como na
própria aparência do profissional. O que faz as pessoas (pacientes) merecerem atenção ou
conforto? O fato de poder pagar por um plano faz as pessoas merecerem mais ou menos? As
torna diferentes? Melhores ou piores?
Ainda na subdivisão das condições de trabalho um aspecto levantado entre os
participantes do grupo focal foi relacionado ao entendimento e a forma de lidar com a
demanda reprimida. A seguinte fala ilustra qual o entendimento entre os estudantes a respeito
88
disso:
No particular você vai atender cerca de 10 pacientes, então você tem mais tempo para
investigar cada caso. Já no público você vai ter muito mais paciente para atender (estudante
medicina).
Ilustrando que no imaginário do estudante o número de pacientes para serem atendidos
funciona como um impeditivo para um bom atendimento ou uma adequada investigação.
No contexto desta discussão sobre o imaginário social de prática profissional, um
primeiro interrogante que se destaca está relacionado ao mercado de trabalho, como este
mercado de trabalho está colocado atualmente, quais as suas restrições, possibilidades e
benefícios que os profissionais encontram neste contexto. Entre os docentes este tema teve
duas vertentes: a primeira está relacionada às dificuldades de inserção do psicólogo no
mercado de trabalho, por saturação deste mercado e também pela limitação de mercado de
trabalho no setor da saúde suplementar. A seguinte fala docente ilustra este aspecto:
A questão do mercado de trabalho na Psicologia está muito complicada, então a
predominância é se preparar para concurso no setor público, residência ou ingresso no
estado. Quase não há planos que conveniam profissionais psicólogos. A maioria dos
profissionais credenciados são médicos, poucos odontólogos (docente psicologia).
A segunda vertente presente entre os docentes é uma preocupação com a concorrência,
percepção de necessidade e mesmo de reserva de mercado.
Quando ele for para o seu consultório privado ou público, ele vai ter sim que fazer
uma pesquisa de mercado para ver onde ele está se inserindo, ver quais são as facilidades no
momento, onde ele pode atuar, o que está necessitando naquele mercado, como ele pode
fazer o acolhimento (...). Se ele for trabalhar no modelo PSF no seu consultório privado, ele
vai ter sucesso (docente odontologia).
Na realidade, hoje, dos nossos egressos não chega a 5% os que vão para a clínica
privada, por falta de clientela (...) pela própria situação do país (docente da odontologia).
Por que tem muita dificuldade de clientes? Claro, hoje em Santa Catarina tem 7
cursos de odontologia, formando quase 500 dentistas, quer ver o exemplo da ortodontia:
antigamente, quando nós fizemos odonto, havia dois ortodontistas na cidade, apenas
milionários fazia tratamento (...) hoje, nada contra as caixas de supermercado, mas toda
caixa de supermercado tem aparelho ortodôntico, porque tem tanto ortodontista que hoje
você paga R$ 60 por mês e coloca um aparelho ortodôntico; a qualidade desse aparelho é
outra conversa (docente odontologia).
89
Se o SUS me permitir colocar uma equipe de profissionais trabalhando na
comunidade, conversando, discutindo, promovendo saúde, enquanto uma outra equipe vai
fazer o atendimentos dos 80% que estão com os dentes podres, cariados, doentes e sem saber
disso, aí eu vou começar a acreditar no Sistema (...) enquanto não me derem a oportunidade
de promover saúde efetivamente e de resolver aquela situação que já existe da doença
presente na população, e enquanto a cárie não for tratada como doença, enquanto a
população não tiver idéia de que isso é doença (...) eles não vêem cárie como doença, e não
vêem mesmo, cárie é normal, não é doença (docente da odontologia).
Entre os estudantes o imaginário relacionado ao mercado de trabalho se apresenta em
relação à dificuldade de definição do processo de trabalho do psicólogo em comparação com
as demais profissões da área da saúde. Nesta fala a seguir está presente uma particularidade da
profissão do psicólogo que é a falta de um contorno pré-definido e de um objeto físico
palpável na sua prática. Em comparação com as demais profissões pesquisadas, que possuem
uma atuação e um objeto claros aos olhos da sociedade em geral, a psicologia, ao lidar com a
subjetividade, com o psíquico, com o relacional, o comportamento e as instituições tem
objetos muito mais diversos e menos classificáveis.
Parece que o psicólogo ainda é uma coisa elitista (...) doença mental, a pessoa que
está com algum problema mental, já tem aquele preconceito: louco é que vai para o
psicólogo. Não tem aquela idéia, ir para o psicólogo para tentar tratar suas coisas, melhorar
e crescer, não como alguém da saúde. Parece-me que todo mundo sabe o que faz o médico,
para que serve o odontólogo, mas o psicólogo é uma incógnita. Para que serve o psicólogo
(estudante psicologia)?!
Outro interrogante destacado nos grupos focais diz respeito à atuação profissional nos
subsetores público-estatal e privado. Quando os discentes têm que responder sobre como
imaginam a sua prática profissional no público e no privado, problematizam este tema para
além do lugar em que esta prática acontece, distinguindo o prática privatizante e prática em
local privado. Compreendendo que prática privatizante pode se dar na prática do consultório
privado bem como no serviço estatal. Também pensam sobre as escolhas que eles vão ter que
fazer após se formarem, decisões de como organizar o seu processo de trabalho e a sua
concepção de exercício profissional.
O setor público tem mais lugar para o psicólogo como profissional da saúde do que
no setor privado. É porque cada uma de nós vai ter clínica particular, completamente
diferentes, cada uma com seu modo de atuar, de intervir, teoria, aparência, empresa privada,
90
escola privada (...). Também têm muitos públicos: o público que funciona, o público que não
funciona, o público que tem cursos, o público que não tem (estudante psicologia).
Quando eu fiz minha pesquisa de doutorado, eu entrevistei professores de saúde
coletiva, formandos e funcionários da rede de todas as regiões onde temos universidades do
estado, e eram professores somente de saúde coletiva (...) mesmo dentro deste grupo seleto, o
conhecimento do SUS era exíguo (...) então, o que eu vejo é que se a gente que trabalha com
a formação, trabalha na área de Saúde Coletiva, que é uma área que está em construção, que
é nova... que a maioria dos professores ainda não tem uma capacitação que tenha muitos
estudos, como Dentística, Endodontia, que as pessoas já têm doutorado, pós-doutorado, na
Saúde Coletiva as pessoas têm especialização e tal (...) mesmo ali havia uma compreensão
limitada do Sistema, torna-se difícil para um professor que não conhece o Sistema poder
discutir as possibilidades (...) esse é um primeiro desafio né, que a gente possa discutir
melhor o SUS (...) e o outro desafio, e aí entra o currículo (...),. que me chamou a atenção
desde que eu entrei, a carga teórica de Saúde Pública, ela é enorme dentro do nosso
currículo (docente odontologia).
Tem que haver essa formação continuada, porque senão o profissional se forma e fica
na acomodação, às vezes, fazendo um trabalho que deveria ser de uma forma na instituição
pública e outra na atividade privada, o paciente é o mesmo, a necessidade é a mesma (...) tem
que lutar para melhorar, senão fica na acomodação (docente odontologia).
Outra questão, na área de saúde, infelizmente, ainda recursos humanos, gestão de
pessoas é despesa, não é investimento (...) as empresas privadas hoje estão destinando cada
vez mais uma parcela de seu orçamento para investimento (...) então você vê na entrevista
nas páginas amarelas, com um dos detentores do “Skipe”, você vê que: não existe nada
melhor do que ver nossos colaboradores trabalhando num ambiente agradável, um ambiente
de satisfação, onde eles se sintam felizes, horário flexível (...) a Microsoft fica aberta 24
horas por dia no Vale do Silício, funcionando tudo, bar, restaurante, o cara trabalha por
projeto, se ele quiser trabalhar meia noite ele vai (...) eu não estou dizendo que a área da
saúde vá trabalhar de madrugada, estou falando da ausência do horário flexível, da ausência
de investimento em Recursos Humanos, em gestão de pessoas, porque é despesa (...). No
SUS, o programa da prefeitura, mudou o secretário acabou o treinamento, a educação
continuada, um secretário tem a visão de que precisa fazer reciclagem e tal, o outro já não
tem, não existe investimento continuado na gestão de pessoas (...) porque é despesa (docente
odontologia).
91
Só que nós (docentes e discentes da universidade) não servimos de exemplo: o cara
que vem pra cá tem a felicidade de cair aqui. É um “SUScesso”, porque aqui ele tem um
atendimento que ainda permite, que faz endodontia, faz a prótese. Ele é atendido dentro da
universidade com um tratamento diferenciado (...) Por que? Eu, como professora de
odontopediatria, recebo as mães e digo: - “Mas a senhora já levou no posto de saúde? – Ah,
mas ninguém atende”. Então, na odontopediatria, nós estamos fazendo, pelo que eu estou
ouvindo, 100% do atendimento da prefeitura de Florianópolis, está vindo tudo para a
odontopediatria, tudo (docente odontologia).
Procedimentos que a gente sabe que lá no posto ele tem condições de fazer, aí o
dentista olha e manda, encaminha para a universidade, esse é outro problema sério (...) Não
sei se é preguiça do dentista, falta de informação ou... (docente odontologia).
Neste bloco temático insere-se o processo de trabalho no setor da saúde, destacando-se
a Organização do trabalho, onde a interdisciplinaridade hoje é vista como necessária na
atuação com outros profissionais (trabalho isolado da odontologia):
Atualmente mudamos bastante esse enfoque (...) abrindo a perspectiva deles para
trabalharem em grupo, em equipe, dentro do Sistema Único de Saúde (docente odontologia).
Somente em 2000 o dentista entrou no Programa de Saúde da Família, nós estamos
em 2007 e ainda estamos caminhando. Hoje o SUS exige que o dentista trabalhe em equipe,
que ele saiba planejar com base epidemiológica, que ele saiba ter um relacionamento com a
comunidade (...) todas essas novas competências estão interligadas, eu não posso parar de
atender obviamente, porque a dívida social, em termos de demanda por tratamento é imensa,
é toda uma discussão de modelo de atenção do SUS, tenho que considerar a promoção da
saúde, mas eu não vou parar de reabilitar (...) eu tenho que fazer as coisas simultaneamente,
políticas públicas de ordem preventiva, promotora, mais atendimento (docente odontologia).
Ainda sob o aspecto da organização do trabalho encontra-se a acessibilidade
burocrática ou despersonalizada no público-estatal e mais ágil e personalizada no
suplementar; falta de fluxos garantidos para os encaminhamentos no subsetor público-estatal,
ilustrando-se a partir da fala do docente:
O aluno tem pouco contato com o Sistema. No contato com as clínicas, ele não tem um
contato com o cliente (...) uma coisa é você ter certa autonomia pra discutir a forma de
tratamento, a abordagem, a consulta, o tipo de material, numa relação com o paciente que é
de ida e volta e, outra coisa, é esse mesmo profissional trabalhar dentro de um Sistema de
Saúde, então, não é o seu paciente, é o usuário do Sistema de Saúde, e isso muda toda uma
relação, e a necessidade de conhecimento que o profissional deve ter (docente odontologia).
92
Quanto aos recursos e condições de trabalho parte integrante da questão
organizacional, destaca-se:
Acredito que a escola hoje está preparada tecnicamente (...) quando você chega ao
Sistema lá fora, você tem um secretário de saúde que é economista, nunca viu um doente na
vida, não conhece um enfermeiro, não conhece o Sistema de forma geral (...) tem que ter
produção, ela (profissional) tem que ter um atendimento mensal, um atendimento diário, uma
coisa assim (...) então, essas coisas, lá em cima no Sistema, não estão bem estruturadas (...)
pode até se falar em particular, mas quando se fala em política, se fala em produção,
prestação de serviços, a Secretaria do Estado diz: - “Olha, aqui foram atendidas 500 pessoas
por dia mas temos que chegar a 1000 pessoas por dia”. O pessoal quer isso, não quer saber
se a restauração é bem feita ou se não é bem feita, se o cara demorou duas horas ou se não
demorou, se o material é bem feito ou a qualidade depois, se aquilo realmente deu resultado,
se o cara sentiu dor depois, se caiu depois e o cara vai lá e repete, continua sendo um novo
procedimento, se ele fizer uma restauração hoje e a mesma restauração amanhã é um novo
procedimento (docente odontologia).
Eles não sabem que está havendo uma indústria (...). Eles estão buscando trabalhar
no consultório privado. Eles estão querendo sair, escapar do SUS, eles estão querendo entrar
no consultório privado, o que na verdade, cai de novo naquilo que eu disse, o SUS não atende
as necessidades dos usuários (...) o SUS faz o quê? Extração e restauração. Endodontia, faz o
SUS? Não; prótese, faz o SUS: Não (docente odontologia).
A Saúde Bradesco pro dentista é horrível (...) quando eu tive consultório fui atender
para eles, chegava um cliente lá, eu ligava pra eles, eles me davam um código e eu anotava,
fazia os procedimentos e encaminhava (...). Na época de receber, que já era uma miséria,
vinha glosado porque não correspondia ao código, pra reclamar era um 0800 (...) os planos
de saúde só são bons para os associados, para os profissionais eles não são bons, o médico
não acha a Unimed boa, mas ele é obrigado (docente odontologia).
Nós vamos precisar de muita ajuda da psicologia para conseguir não frustrar o nosso
aluno que se prepara tecnicamente de uma forma de primeiro mundo, porque a odontologia
brasileira é a melhor do mundo, e eu não tenho dúvida quando eu digo isso (...) só tem um
detalhe, quando ele saí daqui e chega no SUS, que é maravilhoso no papel, só que não
permite a esse aluno (...), nunca consegui aplicar tecnicamente e adequadamente, pelos
recursos que tinha (...) não sei quem compra material, porque é uma porcaria, não sei quem
é que tem broca, não tinha bico de borracha, não tinha luvas, não tinha máscara, não tinha
dosador. Então, eu não conseguia trabalhar dentro deste Sistema Único de Saúde (...) acho
93
que, na verdade, nós temos que preparar o aluno para a frustração futura da aplicação da
vida dele no SUS (docente odontologia).
Temos que preparar o SUS para o profissional (...) porque acho que o profissional
está extremamente bem preparado para qualquer coisa. O que eu vejo como mais
preocupante é o seguinte (...) esta proposta pressupõe uma mudança no exercício da própria
odontologia, enquanto profissão (...) como nós vamos fazer essa modificação grande do
exercício da odontologia, que terá que ser voltada para uma nova realidade, porque eu
concordo que a partir do momento que 75% da população não tem acesso a outros
tratamentos, depende somente do SUS, enquanto os outros 25%, e eu já deixo só 5%, que
consegue fazer um tratamento particular (...) então, temos que olhar para essa realidade, só
tem uma coisa, essa realidade, essas pessoas, esses 95-90%, eles não têm a necessidade neste
momento que pressuponha unicamente a promoção de saúde, eles tem as necessidades
presentes, eles precisam de reabilitação, tratamento esse que nós não damos dentro do SUS,
porque eu trabalhei nesse Serviço Público e aquilo que era feito era exodontia, restauração,
e não interessa se eu coloquei uma restauração hoje e ela caiu amanhã, estou fazendo a
mesma restauração e isso não conta, na minha profissão conta se eu fiz 10, 15 ou 20 (...) se
ele precisa de prótese, essa prótese não é colocada, se ele precisa de aparelho ortodôntico,
esse aparelho não é colocado, se ele precisa de outro tipo de tratamento, isso também não é
feito (...) então, que tipo de tratamento que o SUS pretende que seja feito no nosso paciente?
Promoção de saúde ótimo, a começar daqui, mas para aqueles que já tem a necessidade? O
tratamento não é efetivo (docente da odontologia).
Categoriza-se aqui o processo de trabalho no setor saúde quanto a acessibilidade
burocrática ou despersonalizada no público-estatal e mais ágil e personalizada no
suplementar; falta de fluxos garantidos para os encaminhamentos no subsetor público-estatal.
Se eu entender que o SUS é um sistema em que, eu tenho nos diversos níveis, nas
diversas esferas do governo: municipal, federal e estadual; responsabilidades do Ministério
de Saúde, da Secretarias Estaduais e Municipais de saúde, eu entendo que a Agência
Nacional de Saúde Suplementar faz parte do sistema único de saúde, com o objetivo
especifico de regular o funcionamento de planos de seguro de saúde que são serviços
prestados a população que compra esses serviços (docente da medicina).
Embora reconheçam as diferenças existentes entre os subsetores, consideram que
algumas noções devem permear o trabalho em ambos. Há uma clara valorização pelo trabalho
em equipe multiprofissional e interdisciplinar como fator que poderia ser fundamental para a
construção do plano terapêutico, pois entendem que, para compor um atendimento integral ao
94
usuário, é preciso o trabalho conjunto de outros profissionais para evitar cair no extremo de
encarar que toda demanda possa ser resolvida por uma profissão.
Interdisciplinaridade seria uma das formas, nós estaríamos trabalhando com essa
discussão e que plano terapêutico não se faz só com o psicólogo, mas também com outros
profissionais (estudante psicologia).
Os estudantes dizem que a possibilidade de trabalho em equipe multiprofissional
ocorre de modos diferentes entre os dois sub-setores. No sub-setor público há mais condições
de existir o trabalho em equipe pela própria característica do trabalho nas unidades de saúde,
apesar de dizerem que encontraram dificuldades em hospitais psiquiátricos, serem
desenvolvidas por diferentes profissionais. Já no sub-setor privado há predominantemente
profissionais que atuam isoladamente nos consultórios particulares, no entanto, apontam que
neste caso é possível que os profissionais possam compor em conjunto com outro profissional
contratado para realizar a supervisão do trabalho. Porém, tal supervisão é feita por outro
psicólogo.
Acho que a gente tem que evitar uma certa alienação, chega um certo ponto de achar
que tudo é psicológico, então tem esse outro profissional que vai dizer que não (estudante
Psicologia).
Os estudantes de psicologia dizem que no sub-setor público o trabalho do psicólogo
fica mais exposto aos demais profissionais, o que poderia evitar que eventuais falhas ou
dificuldades profissionais estivessem sendo “acobertadas” pelo isolamento do trabalho em
consultório privado. O fato do prontuário no sub-setor público circular pelos demais
profissionais da equipe coloca em evidência o trabalho, podendo ser feito um controle da
qualidade do trabalho do psicólogo.
Se for pensar numa clínica, alguém que tem um consultório, e aí as pessoas “leigas”,
que não sabem da Psicologia vão lá e acham que essa pessoa está fazendo um ótimo trabalho
e, na verdade, essa pessoa não tem a mínima autocrítica no seu trabalho. Talvez essa pessoa
não se dê conta e, como ela está lá fechadinha, não tenha mais como ninguém saber. No
público não, fico pensando até agora em registros de prontuário, que é um jeito de tornar a
tua clínica pública, é muito diferente do teu relato para ti, tu ter que evoluir no prontuário,
uma coisa que todo mundo vai ler, e até de cuidar aquilo a ser colocado por causa do
usuário (...) eu estranhei isso assim, de ter que evoluir e aí tu estás te colocando ali também,
é um jeito de tornar público o teu jeito de atender (estudante psicologia).
Quanto a organização do trabalho, se destacam nas falas dos estudantes um acesso
burocrático e despersonalizado no público-estatal e mais ágil e personalizado no suplementar,
95
outra abordagem relacionada ao processo de trabalho foi a falta de fluxos garantidos para
encaminhamentos no sub-setor público estatal, como ilustrado abaixo:
Na verdade eu acho que não dá para avaliar em todos os níveis de assistência médica
a mesma falta de qualidade. Tipo, a falta de qualidade de atendimento aqui no Hospital é
diferente da falta de qualidade no atendimento na unidade de saúde, onde tem burocracia,
falta de equipamentos, esse tipo de coisas (estudante medicina).
É realmente no privado o diferencial de qualidade é que o atendimento é muito mais
rápido. Tanto como você conseguir exames complementares, quanto a própria medicação,
pois o paciente tem um poder aquisitivo maior, então ele vai ter uma aderência maior ao
tratamento, a terapia (estudante medicina).
Outro destaque nas discussões, foi a demora no atendimento, em obter exames e as
condições de internação hospitalar que diferenciam nos setores, de acordo com as falas
abaixo:
Uma diferença entre o público e o privado é em relação ao tempo de espera, no setor
público você acaba tendo que esperar muito mais, mas você é atendido. O volume de paciente
é maior, o tempo de espera também, e as condições de internamento no particular é um
pouco melhor, enquanto no particular você encontra 1 a 2 pacientes por quarto, no público
você se depara com até 6 pacientes em um quarto. A espera de um exame no particular é
mais rápida do que no público (estudante medicina).
O atendimento no SUS é de qualidade, mais o tempo de espera é muito maior
(estudante medicina).
A diferença está na espera de exames complementares, muito mais isso do que o
atendimento. E também a espera pelas especialidades e exames complementares porque
existe uma fila para isso (estudante medicina).
Entendendo que a demora em conseguir o atendimento e os exames acaba por
interferir nas condições de trabalho do médico e consequentemente na qualidade do
atendimento. Um segundo aspecto discutido pelo grupo foi a falta de material e infra-estrutura
para um adequado atendimento no público, em contraponto com uma maior disponibilidade
de recursos a serem utilizados no setor privado.
Já com relação às condições é a falta de luvas, de material, onde a gente vê que
pacientes deixam de ser atendidos por falta de materiais e é muita burocracia para comprar
(...). No setor privado você vai ter muito mais estrutura, material na mão, profissionais de
outras especialidades que você poderá encaminhar, medicação que você quer na mão
(estudante medicina).
96
Você até tem a medicação, mas não é a ideal, é a produzida na China que é a mais
barata. Qual é a luva que você usa? É a mais barata. Você recebe um “x” fixo em dinheiro e
tem que se virar para comprar tudo (estudante medicina).
A questão é que no consultório particular ele pede um exame e em 15 dias ele está
pronto, já no público demora meses. Isso estressa, porque você que ver resultado, você faz de
tudo e não tem retorno. A burocracia trava o sistema (estudante medicina).
A responsabilização dos profissionais surge na relação entre a responsabilidade do
profissional e a resolutividade da atenção. O grupo fez esta discussão abordando a falta de
comprometimento do profissional com o serviço público, disponibilidade de exames,
medicamentos e equipamentos, justificando a assistência ou des-assistência conforme
ilustrado:
Hoje no País, se você está achando pouco, ninguém esta lhe obrigando a ficar e
trabalhar, o serviço público paga pouco, se você optou por trabalhar, você tem que exercer.
O que acontece, é que o pessoal assume o cargo e não aparece para trabalhar, e isso não é
certo, dessa forma nenhum governo suporta, pois envolve custo. Às vezes os salários são
baixos porque o governo não consegue pagar diante dessas irregularidades (estudante
medicina).
Então, como tudo está subordinado ao lucro, o que significa qualidade para este setor
é uma boa relação custo benefício, favorecendo sempre a questão de economia (docente
medicina).
É lógico que é bom ter um protocolo para normatizar, para manter atualizado, mas
ele tem esse lado ruim, porque ele tira a autonomia (docente medicina).
Tem que fazer um atendimento barato já que os recursos são restritos (docente
medicina).
97
7.1.3. Fatores de escolha pelo trabalho nos subsetores público-estatal ou suplementar
a) Características trabalhistas
• precarização da empregabilidade e das condições de trabalho
• carga horária (cumprimento, flexibilidade, possibilidade de composição entre empregos)
• remuneração: modalidades de pagamento
• autonomia/auto-regulação
b) Oportunidades sociais e profissionais
• evolução na carreira individual e/ou progressão funcional
• reconhecimento profissional/projeção pessoal (o trabalho em UBS é visto como daquele que
ainda “não se deu bem”; no subsetor público-estatal a clientela já existe e não precisa ser
disputada/conquistada; no subsetor suplementar, há concorrência, por isso uma necessidade
de manter-se atualizado e de responder aos valores sociais)
• prestígio e privilégios (ter e aparentar conquistas materiais e fama);
• reconhecimento intelectual (vínculo com instituições públicas de ensino e/ou de pesquisa;
acesso à educação permanente e acumulação de mérito intelectual)
c) Capacidade instalada
• disponibilidade de e/ou acesso às tecnologias por equipamentos
• disponibilidade e/ou acesso aos recursos de diagnóstico e terapia complementares
• presença da equipe multiprofissional
Tanto no contexto dos docentes quanto dos estudantes, de todos os cursos estudados a
estabilidade financeira/remuneração aparece como uma diferença nos dois subsetores de
atuação. Neste sentido, o subsetor público garante esta estabilidade para o profissional, e esta
seria uma “vantagem” de atuação neste espaço, mas as formas de pagamento neste setor pelo
exercício profissional seriam inferiores, trazendo à tona que, na formação, já existe um
imaginário de insatisfação relacionado a este aspecto, embora a atuação neste setor também
seja vista como um degrau na carreira:
Ao sair da faculdade, ir para o público é ter uma estabilidade financeira, todo mundo
quer porque o mercado está mal, mas no privado é onde dá para crescer e futuramente
escolher (estudante psicologia).
98
No geral as pessoas saem do público para buscar no privado o enriquecimento (...) as
pessoas pensam o serviço público como um degrau na carreira (estudante psicologia).
O que acontece é que não há atração pelo setor público pela remuneração (...) o que
está havendo hoje é que o excesso de profissionais e a falta então de clientela particular (...).
Para qualquer concurso são milhares de candidatos para aquela vaga, mas se for pensar
unicamente em termos de retorno financeiro para aquela profissão, não há motivação para
trabalhar no setor público, com algumas exceções. A remuneração da prefeitura não é uma
remuneração que consiga proporcionar uma condição de vida boa para o profissional, que
permita ao profissional fazer só aquilo, ele vai ter que fazer bicos e bicos para poder se
sustentar e a sua família (docente odontologia).
No setor público realmente você vai ter estabilidade, bons salários, mas não
diferencia muito do particular (estudante medicina).
Você conversa com os alunos e eles sabem que querem exercer medicina num
consultório particular, eles necessitariam pelo menos aderir à cooperativa de médicos da
Unimed, e que para isso teriam que pagar no mínimo R$ 50.000 reais, eles sabem que tem
famílias que não têm condições de pagar isso, e que para sobreviver eles vão ter que
trabalhar primeiro no setor público e depois, quem sabe, trabalhar apenas no setor privado.
Alguns têm a visão de que vão trabalhar nos dois sempre, porque eles querem ter um
emprego com renda fixa, que garanta férias, décimo terceiro, que dê segurança para
conseguir manter uma família e o que caracteriza o setor privado é uma renda instável
(docente medicina).
Com relação à autonomia/auto-regulação como uma formulação interrogante no
imaginário dos docentes e estudantes, o campo da saúde suplementar permite uma maior
agilidade no atendimento e uma maior autonomia do profissional em definir horários de
trabalho, assim o setor privado aparece como uma possibilidade onde podem fazer escolhas,
onde existe possibilidade de crescimento e reconhecimento. Por outro lado, trabalhar no
público significa se lançar no mercado de trabalho com certa garantia financeira e talvez onde
se possa continuar aprendendo, para depois, ou ao mesmo tempo, exercer melhor a profissão
no serviço privado, onde há possibilidade maior de crescimento principalmente financeiro.
Deste modo, trabalhar no serviço público significa tempo e experiência necessários para subir
os degraus em direção ao serviço privado:
Você consegue no particular, tem mais autonomia para fazer o seu horário (estudante
medicina).
99
No meu imaginário eu vejo que o psicólogo, no privado, tem a possibilidade de um
crescimento cada vez maior. Não que não haja no outro (subsetor público), só que no privado
está mais presente desse crescimento ir aumentando. Quando se é mais valorizado, isso vai
permitindo fazer mais algumas coisas e não aceitando fazer outras, a gente vai escolhendo
mais o que quer e o que não quer (estudante psicologia).
Outro enfoque com relação à autonomia é a possibilidade de acesso às tecnologias por
equipamentos, a disponibilidade e/ou acesso aos recursos de diagnóstico, e como isso acaba
influenciando e determinando a prática profissional:
Uma coisa é você ter certa autonomia para discutir a forma de tratamento, a
abordagem, a consulta, o tipo de material, numa relação com o paciente que é de ida e volta.
Outra coisa é esse mesmo profissional trabalhar dentro de um Sistema de Saúde, então, não é
o seu paciente, é o usuário do Sistema de Saúde, e isso muda toda uma relação, e a
necessidade de conhecimento que o profissional deve ter (...) embora, eu concorde que na
hora que ele anestesia, que ele abre, que ele faz uma obturação, tecnicamente, é a mesma
(...), mas no consultório particular ele tem a possibilidade de trabalhar com um laser. Você
tem que ver em outro lugar como vai funcionar, é outra lógica, é a lógica do Sistema
(docente odontologia).
O subsetor privado aparece como vantagem quando pensado em relação à capacidade
instalada/recursos e condições de trabalho:
A única diferença que eu vejo é que se você for trabalhar no setor privado você vai ter
muito mais estrutura, material na mão, profissionais de outras especialidades que você
poderá encaminhar medicação que você quer na mão (estudante medicina).
Chama atenção que o serviço público é tido como “bom” para outras profissões que
não da área da saúde. A concepção que prevalece é que nesta área (da saúde) os profissionais
são mal remunerados, não tem condições de trabalho e são mais exigidos que nas outras áreas
profissionais. Estes aspectos podem justificar, no imaginário dos estudantes, porque os
profissionais da saúde no serviço público exercem seu trabalho com menos comprometimento
ou com menor empenho. Os estudantes colocam o tempo de formação, que tem diferenças
mesmo entre as profissões da área da saúde, como um diferencial que não é reconhecido, nem
perante os seus pares, conforme ilustrado abaixo:
Qual é o ideal de qualquer profissional que não seja médico? Ingressar no serviço
público, fazer um concurso público. Você pode pergunta para qualquer um o que ele quer
fazer da vida. Eu vou largar a engenharia e vou tentar um concurso público, porque são bons
salários, estabilidade, serviço tranqüilo, trabalha com uma carga horária, não tem o
100
desgaste. Já na medicina, ou em qualquer outra profissão da área da saúde, é completamente
inverso. Você é mal remunerado, não tem nenhuma condição de trabalho e tem uma
exigência completamente superior aos outros. Nós estamos numa sinuca de bico, porque nós
não podemos fazer reivindicações, nós vamos fazer greve? Não vamos parar, se a gente
parar tem gente morrendo (estudante medicina).
O profissional da área da saúde tem que trabalhar com condições muito inferiores,
sendo que a nossa estrutura, em relação ao tempo de formação, é 2 vezes a formação de
qualquer outro profissional. Então é complicada essa questão, eu acho que a saúde se tivesse
uma boa estrutura de boa remuneração e boas condições de trabalho, ninguém iria ficar
desesperado e iria atender Unimed, com certeza (estudante medicina).
Acho que o médico trabalha bastante, 12 horas por dia, porque é uma classe desunida
que não luta para trabalhar 8 horas/dia, e isso acontece porque você pode ver hoje, que
existe contrato de, por exemplo, 30, 40 horas por semana para a enfermagem, e para outras
profissões da área da saúde, e o médico não quer isso. Hoje quando nós chegamos para
nossos professores e dizemos que não queremos fazer plantão de 12 horas, que não achamos
digno, ele vira para mim e diz: você tem que fazer, porque o médico é assim. Quando você
sair vai trabalhar aonde? Nossa cultura de médico é assim, pois é cultura do médico
(estudante medicina).
Esta fala nos mostra que o modelo vivenciado durante a formação é que acaba por
“moldar” o tipo de profissional, a carga horária de trabalho, a flexibilidade e a possibilidade
de composição entre diferentes empregos, enfim, sua atuação no mercado de trabalho. Há,
também, um questionamento em relação ao exercício profissional da medicina, tanto pela
concepção da sociedade, quanto dos próprios profissionais, o quanto cada um acaba se
submetendo às “normas” do mercado, a um padrão culturalmente aceito e “normalizado” pela
própria sociedade, para não questionar uma pratica instituída.
Um outro interrogante de imaginário da prática profissional foi o trabalho em equipe e
da interdisciplinaridade; este tema apareceu colocado de diferentes formas e com diferentes
entendimentos, desde que o trabalho em equipe se constitui em o profissional estar inserido
em uma rede que garanta encaminhamentos, como ilustrado abaixo:
O que está faltando no mercado são mais psicólogos, eu acho, realmente consultório
não quer dizer qualidade, porque, a formação do consultório como se faz? Como um
psicólogo entra num encaminhamento? Quem vai encaminhar para ele? É uma rede, mesmo
que eu não trabalhe fisicamente com uma equipe, fisicamente de compartilhar uma casa e
alugar junto com médicos e etc., tem uma rede de encaminhamentos (docente psicologia).
101
Ou, que no setor público existe maior possibilidade de troca entre os profissionais e de
existir trabalho em equipe:
Tem agora aquele Programa de Saúde da Família, e olha, é bem legal assim, daí eles
foram lá conversar conosco, então falamos com várias pessoas e fomos à comunidade, tem o
agente comunitário que vai à casa, que sai e relata para o dentista como é que funciona a
realidade e tal, e acabamos indo nessa casa também (estudante odontologia).
Este trabalho em equipe pode funcionar como um regulador, pois desafia a autocrítica
permanente dos profissionais. Um outro olhar sobre o trabalho em equipe é aquele no qual
este trabalho pode ser mais qualificado por ter uma maior exigência por parte da própria
equipe. No exemplo abaixo, é apontado que no consultório privado é o profissional e a
secretaria ; não há um maior comprometimento ou responsabilização. O profissional é quem
determina sem sofrer nenhum tipo de cobrança ou regulação de outro profissional:
Se é em grupo, são grupos pequenos, quatro profissionais e olhe lá, de vez em quando
tem consultório que tem a secretária e é tu, a secretária e deu, é isso, não tem um coletivo,
então tu trabalhas de manhã, de tarde e à noite para dar conta da vida (estudante
odontologia).
Fica explícito o isolamento do profissional da odontologia em relação a um trabalho
em equipe (troca permanente; quando não se trabalha em equipe são providenciados diversos
tipos de trocas entre colegas, mediante rodas, encontros, conversações), conforme identificado
nesta fala:
O processo de trabalho da odontologia é isolado (...) acho o dentista uma classe
muito desunida, na medicina o pessoal conversa (...). Ficamos muito no consultório, eu acho
que até por vergonha de ter feito alguma coisa errada ou sei lá. Simplesmente não falamos
com o colega porque o colega vai achar que tu não sabe, não é? Então, você está na
faculdade pega um prontuário que eu já vi várias pessoas dizerem: Ah! Olha só, o fulano fez
isso! Assim sabe? Mas isso é normal. Tu vai no dentista mesmo, o dentista te diz: como é que
tu estás como uma restauração desta? Alguma coisa assim (estudante odontologia).
Apesar da valorização do trabalho em equipe e da rede de encaminhamentos para a
realização da prática clínica, sugerida acima, nem sempre o entendimento de equipe atende o
pressuposto do trabalho interdisciplinar. Deste modo, não articula uma variedade de saberes
profissionais, como propõem as Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de
Graduação na Área da Saúde e as Diretrizes para o exercício profissional no SUS (Ceccim,
2005).
102
Outro enfoque que aparece como trabalho em equipe é uma simplificação da noção de
trabalho em equipe, limitada ao diálogo entre os saberes e práticas do psicólogo e do
psiquiatra. O conteúdo da fala é representativo da tradicional vinculação da clínica ao modelo
assistencial médico-centrado, muito distante da multiprofissionalidade que é condição para a
integralidade.
Quando eu acho que a equipe é muito melhor, tem um detalhe: o que acontece com o
caso da psicopatologia, que basicamente é um trabalho dividido com um psiquiatra. Um
psiquiatra em diálogo com um psicólogo são as melhores equipes (docente psicologia).
Outra forma de entender o trabalho em equipe colocado por docentes foi a
possibilidade de troca de informações que amplia as competências, mas que também exige um
preparo do profissional diferenciado e adequado a uma determinada realidade de atuação.
Também está implícito nesta abordagem de atuação em equipe, por se tratar (na fala do
docente) de uma equipe com área adscrita, de que esta articulação com uma equipe é uma
prática especifica do setor público, e que neste contexto tem limitações tendo substituída a
‘técnica de excelência’ por uma técnica possível.
O profissional que hoje pertence a uma área de adscrição, de uma equipe de saúde
(...) discute o caso, isso amplia as competências do dentista (...) estamos trabalhando para
isso, a gente tem trabalhado com competências mais técnicas, acho que é uma diferença que
muda pouco, mas ao mesmo tempo muda muito (...) não é que você vai ter que ensinar tudo
diferente, não é isso, mas tem que ver o contexto (...), você vai pegar essa técnica de
excelência e ver o contexto ético e político que é possível para o país pagar para todos um
tempo, uma técnica, uma tecnologia que sirva para todos (docente odontologia).
Por outro lado, no grupo focal realizado com os docentes apareceram também
depoimentos onde a psicologia parece tencionar um entendimento de trabalho em equipe mais
condizente com a perspectiva de integralidade e que compõe o conjunto de princípios do
SUS. Mais uma vez, o pano de fundo para a análise do que se ensina no curso de graduação
são as áreas de estágio e vivência dos estudantes:
Essa questão da equipe a gente têm valorizado muito, visando que o aluno saia do seu
estágio com uma experiência de trabalho em equipe e, na formação, a gente se esforça um
pouco para dar esta dimensão. Por exemplo, tu vais trabalhar com obesos, vais precisar de
uma nutricionista, o psicólogo não vai poder fazer isso sozinho. Então, tem que ter um grupo
comum de profissionais atuando, trabalhando (docente psicologia).
Na seqüência este mesmo docente expressa consciência dos limites do modelo
assistencial centrado na psicoterapia individual, desenvolvida de forma fragmentada e isolada
103
do trabalho de outros profissionais, ainda muito presente na prática profissional do psicólogo.
O depoimento sugere a preparação do psicólogo para a construção e participação em projetos
terapêuticos desenvolvidos na lógica da integralidade.
Um outro interrogante ao se analisar o desejo de prática profissional foi em relação à
integralidade do cuidado em saúde. Sob este enfoque os docentes identificam falhas presentes
na formação que vão contra a integralidade, pois mantém um enfoque centrado na doença e
no biológico:
Agora no hospital, por exemplo, que tem um Caps muito bom, mas que o retorno de
questões éticas, veja bem: dois tipos de trabalho em equipe, um bom e um ruim, o que os
alunos reparam em termos éticos daquela equipe? Os alunos comentam: o que eu não gostei
da instituição (...) é que eles tratam o paciente como um objeto, e não dialogam com ele. Eu
estou no melhor local de formação e olha a questão ética. Eles usam o modelo de que o
paciente é um corpo, um modelo médico (docente psicologia).
Ali está o corpo com problema e nós estamos trabalhando. Assim como tu vais a tal
hospital e eles estão abordando, o professor está ensinando os alunos e mostrando o
paciente: olha, aqui está uma úlcera, não é o sujeito, é uma úlcera. Então, transpõe isso para
o atendimento de uma equipe, um psicólogo fica horrorizado, porque o modelo é que ele está
no diálogo com o sujeito, ali é um sujeito (docente psicologia).
A nossa odontologia foi formada na virada no século XIX para o século XX, onde todo
o sistema dela era biológico, baseado no tratamento específico da doença (...), para isto não
existe, em lugar nenhum do mundo, dinheiro para combater doença (docente da odontologia).
Os estudantes do curso de psicologia que participaram dos grupos focais realizados
colocam que as características dos sub-setores e a realidade do mercado de trabalho restrito
influenciam na escolha por atuar no sub-setor público ou no sub-setor privado. Tais
características influenciam também na postura profissional diante do trabalho, dizendo que no
sub-setor público há mais formas de não cumprir com as obrigações do processo de trabalho,
pois a responsabilidade pelo trabalho está dissolvida entre todos os profissionais da equipe,
sendo mais difícil realizar o controle das atividades. Está associada à diferença de postura nos
sub-setores o fato de os usuários pagarem de forma direta o serviço de saúde privado,
podendo ser mais exigente com o trabalho. Aparece, neste sentido, a distinção que o
pagamento pode trazer no acesso de alguns serviços, como por exemplo, acesso a informações
do próprio prontuário.
Acho que tem uma diferença de estar em uma clínica pública ou em uma privada; no
público tu tens superiores e aí tu vais fazer uma evolução, às vezes não acontece, não dá
104
tempo. Numa clínica privada tem que ter, dependendo vai haver uma cobrança maior de ti,
tem que estar ali, porque tu tens um cara que está pagando 6 mil reais a diária e tem que
estar tudo bem documentado, público muitas vezes... se não está documentado (...) não é
culpa só minha, não tem quem arquive, no privado tem que estar ali (estudante Psicologia).
O fato de o sub-setor público não apresentar concorrência com outros serviços é visto
como algo que pode influenciar o profissional a não se preocupar em realizar um bom
trabalho, pois no sub-setor privado existe a preocupação em manter o trabalho bem visto para
que os usuários o escolham em meio a tantos outros serviços que estão disponíveis no
mercado.
No público, tu vais trabalhar como der e depois dá para ti colocares desculpas em mil
coisas (...) que tu não atendeste porque o Estado não libera e tu não precisas estar fazendo
uma imagem para quem está ali para procurar o teu serviço, porque essa imagem não é só
tua, ela tem toda uma carga atrás. Coisa que no privado parece que há uma preocupação, tu
tens que dar conta, é o teu nome, é a concorrência (estudante psicologia).
Aparece também a presença de um imaginário de demanda reprimida e falta de
condições do setor público-estatal, a seguir outro aspecto que aparece é que a escolha está
muito ligada com a possibilidade de ser ter recursos de materiais disponível, pois isso traria
satisfação profissional.
Sempre tive vontade de trabalhar no serviço público, de passar em concurso e tal,
acho que no público tem um problema que é a demanda muito grande, acaba não cobrindo,
não fazendo um serviço especializado. Têm coisas não cobertas pelo serviço, principalmente
na nossa área, de tratamentos muito caros, já no privado a gente tem essa condição de ir até
o final, só que mesmo assim é muito caro, mas não é culpa nossa porque é um material caro
mesmo só que acaba deixando restrito a uma parte da população. A outra parte não vai ter
dinheiro jamais para cobrir esse custo e acaba que daí começa o tratamento todo defasado
de colocar prótese e, assim, já crescem os outros índices de saúde (estudante odontologia).
Acho que a escolha acontece muito em função da satisfação profissional. Acho que no
público a pessoa entra muitas vezes com a intenção de fazer um bem, atender todo mundo,
fazer um bom trabalho, só que o serviço público não fornece condições pra isso, então acaba
gerando uma frustração na satisfação profissional. Já no privado ele tem mais possibilidade
de trabalhar, de ter satisfação profissional, com trabalhos específicos, com trabalhos de
especialidades de nível mais complexo, e com isso tem uma satisfação profissional, tu tem
mais chances (estudante odontologia).
105
Se tu fores trabalhar numa cidade do interior, numa cidade agrícola pequena, muitas
vezes não vai ter condições de utilizar o melhor material e oferecer o melhor trabalho para a
população; aquilo que tu julga ser o melhor. Mesmo no privado, porque a população não tem
condição de pagar por esse material que é caro, dependendo da população. Já se tu
trabalhar num grande centro, numa cidade que tem um nível de vida mais alto, onde existe
empresas que o pessoal tem uma renda fixa, que vive bem, tu já pode oferecer um tipo de
trabalho mais completo, com melhores materiais. A satisfação profissional é maior de poder
oferecer o melhor para o paciente. Então são dois lados: o serviço público depende do que tu
quer também, as vezes tu entra com uma idéia de que trabalho comunitário e tal, só que não
dá uma satisfação profissional porque não tem condições de trabalho; no serviço privado tem
mais chance dependendo da população que tu vai atender (estudante odontologia).
O público não tem condições de atender todo mundo, mas é porque as pessoas
chegam num estado avançado. No público é mais prevenção, um trabalho mais simples, é
mais atenção primária, só que as pessoas chegam já necessitando de procedimentos
complexos e tratamentos que o público não tem como oferecer. Por isso que as pessoas até se
desanimam de trabalhar no serviço público, não satisfaz profissionalmente (estudante
odontologia).
No serviço público a maior demanda é do pessoal que a gente chama de “mutilados
odontológicos”, aqueles que já vêm necessitando de próteses ou de implante, que já
perderam os dentes, tem uma condição bucal muito precária e que precisam de alta
tecnologia para ter uma reabilitação e o serviço público não fornece subsídios ,não fornece
meios de tu conseguir fornecer isso para o paciente (estudante odontologia).
Outro aspecto discutido pelos estudantes foi a remuneração dos profissionais:
Queria trabalhar no serviço público porque para resolver o problema básico da
população. Esse era meu objetivo como profissional, não como remuneração, como
profissional meu objetivo é esse porque a gente já teve aulas lá na faculdade da professora
falando de pesquisas que comprovam que o dentista existindo ou não, não faz a menor
diferença pra saúde bucal da população brasileira. Eu posso abrir um consultório privado,
fazer vários procedimentos e ganhar muito dinheiro, mas e daí? As pessoas não têm saúde, aí
é ficar só remendando, tapando buraco (estudante odontologia).
Exatamente, eu como profissional, queria trabalhar no serviço público,mas aí tem a
questão da remuneração, agora a remuneração é um pouco melhor, no PSF (estudante
odontologia).
106
Vou trabalhar no serviço público e fiz um concurso para trabalhar em uma clínica
particular fora do horário normal. Vou cumprir 8hs no serviço público e depois desse
horário vou trabalhar no particular. Eu sempre gostei de consultório particular e de público
também, gostaria de continuar no público por muito tempo, mas pela questão financeira não
vou. Então pretendo continuar no público, não por muito tempo se permanecer essa
remuneração, porque a gente não pode ser utópica de dizer “eu quero salvar o mundo e
passar fome”. Tem o que a gente investiu, tudo o que foi investido no nosso estudo e tem a
questão de não ter material no serviço público (estudante odontologia).
Outro aspecto levantado pelos estudantes foi a possibilidade de atuação no serviço
publico junto a formação:
Meu desejo é trabalhar tanto no público quanto no privado, só que a atenção pública
pra mim não é diretamente num serviço de saúde pública do tipo PSF, quero trabalhar em
centros especializados de atendimento público, por exemplo: hospitalar e dentro de
formação, educação, acho mais interessante trabalhar em uma Universidade Pública porque
concilia esta parte de atenção à população mais carente. Mas quero conciliar isso com o
consultório particular, com clínica particular ou privada pelo retorno financeiro (estudante
odontologia).
Os estudantes destacam também, que o maior problema do setor público é o estresse
pela sobrecarga de trabalho, como ilustrado abaixo:
“Nem sempre é pela remuneração e sim pelo stress do setor público, porque está
abarrotado de pacientes, cerca de 30 a 40 pessoas por dia”. (estudante medicina)
Os estudantes relacionaram o reconhecimento profissional com diferentes fatores,
como o tamanho do município de atuação (o município menor por ter menos concorrência e
maior contato com a população) e o local de atuação que pode dar maior ou menor
visibilidade na sociedade. As seguintes falas ilustram estas colocações:
A população não reconhece o profissional (estudante medicina).
Depende, se você estiver numa cidade do interior é diferente, tem contato direto com a
população e você acaba tendo reconhecimento, já numa cidade grande, igual à Curitiba,
onde existem muitos médicos é pior. Nas cidades pequenas a população reconhece o
profissional (estudante medicina).
Independente de onde você trabalha tanto no público quanto no privado, você vai ser
reconhecido pela sua capacidade (estudante medicina).
Com relação ao reconhecimento profissional do médico acho que é mais fácil ser
reconhecido dentro de um hospital grande e público do que só no particular, sendo muito
107
mais difícil de ser reconhecido pelos outros profissionais. Se ele trabalha dentro do
consultório dele é muito mais difícil de ser reconhecido, do que se ele trabalhar no hospital,
isso tudo claro no âmbito de um hospital de grande porte (estudante medicina).
O docente aqui do hospital, hoje eles podem se dar o “luxo” de trabalhar fora dos
planos particulares de saúde e ficar só no particular porque ele tem o reconhecimento todo
da população que vai procurar ele no particular (estudante medicina).
Normalmente no privado também ele vai ser bem reconhecido, ele vai ter um contato
às vezes maior com o paciente, mas claro que às vezes a população vai ser mais exigente
(estudante medicina).
Vale destacar que trabalhar só no particular aparece entre os estudantes como melhor
do que atuar no plano privado, e isso consegue ser alcançado pelo reconhecimento através do
trabalho no público como docente. Assim, ser docente é uma forma de se chegar ao
reconhecimento por parte da população e dos colegas. O desejo de ser docente como forma de
reconhecimento profissional e oportunidade de pesquisa e aquisição de conhecimento foi um
aspecto bastante debatido no grupo, a docência aparece como um outro campo de atuação que
não o publico e o privado, conforme ilustram as falas:
Eu particularmente gostaria de ser docente, é mais fácil se manter atualizado (...) os
bons professores são aqueles que gostam de transmitir conhecimento, tem varias pessoas que
estão no Hospital dando aula, porque aqui é um lugar que você tem uma demanda enorme,
você consegue fazer uma boa pesquisa. Eu particularmente sempre tive vontade de ser
professor (estudante medicina).
Claro que o reconhecimento profissional é uma conseqüência muito boa, mas pelo
fato de você ter aquele contato direto com os alunos, hospital de grande porte, hospital de
referência, você tem que se atualizar, isso também é bastante gratificante (estudante
medicina).
Nas oportunidades sociais e profissionais os estudantes também mencionaram fatores
como o prestígio e os privilégios profissionais ao ter e aparentar conquistas materiais.
Relacionando o prestigio profissional entre os pacientes e colegas com ostentação de recursos
materiais e até conforto do consultório, como ilustrado abaixo:
Eles vão levar outras coisas em conta como, por exemplo, investimento, título,
aparência do consultório. Os pacientes confundem o reconhecimento profissional, com o
financeiro (estudante medicina).
108
7.1.4. Qualidade do exercício profissional
a) Concepção de exercício da profissão (núcleo profissional)
• eliminação dos sinais e sintomas das doenças X escuta relativa aos aspectos da vida
• prática única X diversidade de teorias e vertentes do conhecimento
• abordagem integral X abordagens fragmentárias
• competência no conhecer X competência no fazer (um plano terapêutico não se faz sozinho,
precisa de uma equipe, precisa quem aponte o que é o que não é subjetivo, social, vivencial)
b) Elementos fundamentais para o bom exercício profissional
• compromisso com o processo do cuidado (relativo à continuidade/manutenção do
tratamento)
• sigilo/confidencialidade
• espaço de criação e liberdade
• compor diversos campos de trabalho (por exemplo ensino e atenção)
• multiprofissionalidade (questionamento das práticas em equipe, questionamento como
resultado do confronto entre abordagens)
c) Controle e regulação da boa prática profissional
• confiança do usuário
• questionamento das práticas entre colegas
• participação da sociedade (conselhos gestores, controle social, auditores)
• trabalho em equipe (troca permanente; quando não se trabalha em equipe são
providenciados diversos tipos de trocas entre colegas, mediante rodas, encontros,
conversações)
Se, por um lado, a vivência de situações de ensino – aprendizagem no ambiente
hospitalar pode deslocar o eixo da formação para um sentido oposto ao pretendido, no caso
aqui da integralidade para a fragmentação do cuidado, por outro, pode aumentar seu potencial
para a formação de profissionais da saúde comprometidos com a concepção ética do cuidado
centrado no sujeito, demonstrando um certo tensionamento em direção às diretrizes do SUS,
sobretudo na integralidade da atenção à saúde:
Onde fica o sujeito que é o nosso motivo de trabalho, nossa maior preocupação, ele é
barrado no limite (...). Não sei, é burocrático, financeiro, não temos como fazer o
109
encaminhamento (...), vemos as pessoas que estão em uma lista de espera já há cinco meses,
um ano, dois e aí, será que essas pessoas estão precisando de atendimento agora? Como está
a vida delas agora? (estudante psicologia).
Ao se confrontarem com a realidade do trabalho, tornam-se presentes as frustrações
com os limites impostos pelo exercício profissional, burocratização, expressão da falta de
cuidado e acolhimento por parte dos profissionais, fragmentação do cuidado e desumanização
da atenção.
Aconteceu ontem, uma menina internou e o profissional que a atendia estava de
férias; ela ficou lá uma ou duas noites, mas todo o trabalho foi em função que ela retornasse
para a referência primeira dela e não houve uma preocupação em tratá-la ou acolhê-la, pois
ela não era demanda ou responsabilidade daquele lugar. Nem preciso dizer quem sai
perdend (estudante psicologia).
A integralidade também está presente entre os docentes quando aborda a saúde
enquanto condição de vida, de ser e estar na vida, considerar estas condições do contexto dos
usuários para se propor a abordagem, contemplando aspectos de vida das pessoas e suas
diversas situações:
Penso que é uma questão social mesmo, eu lembrei de uma palestra de um professor
que coordena a comissão nacional de determinantes sociais da saúde, ele falou: – “O que eu
diria para essa mãe: coma frutas, escove os dentes, tenha água potável em casa, não more
em área insalubre, não viva em ambientes conflituosos”. Então, essa coisa, esse viés de
estilo de vida que a promoção da saúde acabou trazendo para a gente virou um fator de
confusão, eu não posso dizer para ela (...) se ela tem esse ritmo de vida, como eu vou
culpabilizá-la por essa permanência de cárie? Não é culpabilizá-la, como é que eu vou fazer
com que ela entenda que isso é doença? (docente odontologia).
A odontologia tem um preconceito de anos atrás que era a prestação de serviços, que
restauração resolvia o problema da cárie. Hoje nós temos um outro conceito: que a doença é
uma coisa, você tem que curar a doença e o mal do dente é um sinal daquela doença, então,
você cura o sinal, mas não cura a doença (...), você tem que fazer uma campanha de
promoção com os pais e na comunidade mostrando que a doença é o problema (...) a
medicina trabalha hoje no SUS de uma forma melhor, ela vai e cura a doença ou pelo menos
estabiliza (docente odontologia).
Então a mãe da criança chega e eu faço todo um “converse” com ela, em cima
daquilo que ela vai ter que fazer para prevenir a doença (...) ela vem com um filho com 20
dentes cariados e 2 anos depois com o segundo com outros 20 dentes cariados, ela também
110
aparece com o terceiro mais uma vez com 20 dentes cariados: qual foi o diagnóstico errado?
Foi meu ou o dela? Foi o meu, eu não vi o contexto onde aquela mulher vive, eu não olhei
onde ela está inserida, se ela tem água encanada, se ela tem escova, qual é a condição, se ela
apanha de noite para colocar a criança no seio porque o marido tem que dormir, pois está
cansado e tem que trabalhar no dia seguinte (...) para essa mãe que chegou com três crianças
seguidas com dois anos de diferença (...) o diagnóstico errado foi o meu, porque para ela a
cárie não é doença (...) eu parti da premissa que cárie é doença. Para ela não. Ela partiu da
premissa que cárie é normal, portanto, tudo aquilo que eu falei não resolvia a vida dela (...) o
dentista não está inserido neste contexto (docente odontologia).
A qualidade do exercício profissional faz uma abordagem que parte da própria
concepção do exercício da profissão, propondo uma abertura para o tipo de abordagem que se
tem em cada relação estabelecida com os pacientes. Os alunos demonstraram uma insatisfação
no tipo de formação que acabam tendo no sentido de uma fragmentação, tanto do saber (que é
“transmitido” para eles em partes), quanto da própria abordagem na aplicação pratica da sua
área de conhecimento, as seguintes falas ilustram estes aspectos:
É ruim pra gente saber como é a realidade lá fora porque é diferente, a gente está
ainda em formação, tem a cobrança dos professores, não tem independência, não pode
lançar idéias (...), tem que seguir um protocolo ali dentro. Ali tu não faz um tratamento
completo, por exemplo, primeiro tu só faz dentística que é a parte de restauração e outra
disciplina é só tratamento de canal; não se trata o paciente como um todo. Essa nova
reforma curricular, não vi o novo currículo, dizem que é pra mudar tendo clínica de baixa,
média e alta complexidade para ter o contexto do paciente geral e para não ter essa visão
partida da boca do paciente (estudante odontologia).
A gente não vê melhora do paciente, entramos na faculdade até o final
acompanhamos o paciente e da evolução de uma restauração acaba na perda do dente
(estudante odontologia).
Fico frustrada porque não contribuo em nada para a saúde do meu paciente, vou lá
resolvo o problema dele e ele vem cada vez pior até perder o dente e colocar uma prótese
(estudante odontologia).
No que se refere à limitação do tipo de abordagem e a grande impotência dos
profissionais em propor intervenções que provoquem mudança de cuidados em saúde, há
questionamentos relativos ao “saber a teoria” e qual o melhor tipo de tratamento realmente
trazem benefícios e melhora na qualidade de vida dos pacientes. A seguinte fala ilustra esta
sensação dos estudantes:
111
Passei por isso com um paciente “meu” desde o início da faculdade, lá na última fase
ela botou uma prótese, quer dizer, eu não atuei; atuei, mas não com ênfase na parte mais
importante que era educar, ensinar a escovar os dentes. É a parte mais importante porque
nenhum trabalho que se faça na boca de um paciente que não tenha saúde vai se manter
(estudante odontologia).
Outra abordagem dentro deste mesmo eixo diz respeito aos elementos fundamentais
para o bom exercício profissional, e dentro deles está colocado o compromisso com o
processo do cuidado. Os estudantes demonstram uma preocupação neste sentido ao expressar
que deste a sua formação a cobrança que recebem por parte dos professores é de número de
procedimentos e não relacionada a qualidade do atendimento prestado ou o tipo de cuidado
oferecido. Conforme ilustrado a seguir:
Na faculdade os professores dão mais importância para o número de procedimentos
que tu faz. Quanto mais procedimentos, maior a nota! É um absurdo, vamos arrancar todos
os dentes! (estudante odontologia).
A maioria dos professores quer procedimentos (quantidade) e não qualidade. É isso
que eles cobram da gente (estudante odontologia).
Em um semestre a gente tem que fazer no mínimo12 restaurações. Se chegar um
paciente precisando mais de conversa, educação e eu ficar várias sessões com ele, ensinar a
escovar os dentes, passar o flúor, isso não é contado como procedimento. Então no final do
semestre está todo mundo desesperado por procedimento (estudante odontologia).
Lembro bem de quando a gente começou a dentística, a clínica que é a parte de
restaurações eu tinha uma paciente com um sério problema de higiene, ela vinha várias vezes
e eu preparava para restaurar. Aí o professor vinha e falava não, ela tem que estar adequada
primeiro. Ele cobrava ficar adequada primeiro e eu não fazia restauração. Daqui a pouco na
metade do semestre começaram a cobrar: tu não trabalhaste, não fez nada ainda. Na verdade
eu tava trabalhando, estava educando (estudante odontologia).
O que é mais considerado é o procedimento e não a educação, não a prevenção
(estudante odontologia).
Eles (professores) falam bastante, teoricamente tem que educar, tem que falar, o mais
importante não é restaurar é prevenir, mas na vez de cobrar não é assim (estudante
odontologia).
Esta última fala ilustra uma diferença entre o discurso colocado pelos professores e o
que é cobrado exigido dos alunos na realidade. Se a qualidade do atendimento não esta posta
em questão e não é objeto de preocupação durante a formação, onde estão presentes os
112
aspectos como educação em saúde? Vinculo? Responsabilização? Estimulo a autonomia?
Qualificação da escuta?
Outro enfoque que aparece no grupo focal relacionado a qualidade profissional está
relacionada com a “qualidade” em si do trabalho e as formas de prevenção aparecem
enquanto forma de qualidade de acordo com as colocações abaixo:
É fazer restauração, tem profissionais que estão se formando com maior consciência
disso do que profissionais antigos, mas o que os profissionais antigos pensam é: quanto mais
doença tiver melhor, mais procedimentos nós vamos fazer na clínica, agora (...) nós temos
também que poder sobreviver (estudante odontologia).
Pegar o paciente com doença e curar a doença, ou pelo menos ajudar o paciente;
tirar a cárie do dente não é curar a doença, curar a doença é prevenir para que isso não
aconteça e um trabalho de reabilitação da saúde dele, e da mentalidade dele, para que isso
não aconteça mais e fazer ele entender porque ele chegou ali (estudante odontologia).
Acho que restaurar a saúde é fazer a pessoa controlar a saúde dela e também
devolver, reabilitar (estudante odontologia).
Ter condições de fazer um trabalho que é de qualidade, e que também dê condições de
fazer e aplicar o atendimento odontológico de forma integral, isto também é qualidade; é
poder proporcionar de forma integral o atendimento ao paciente (estudante odontologia).
Há, também uma preocupação com a concepção de qualidade de vida do profissional
da saúde:
Trabalhar 8 horas e ter minha vida social, poder ir à noite para casa e almoçar com
minha filha ou ir para casa descansar ou ler um livro, ou alguma coisa assim Mas
fisicamente e mentalmente está difícil, está bem difícil (estudante odontologia).
Ao serem questionados sobre o controle e regulação da boa prática profissional os
estudantes apresentaram diferentes entendimentos, desde que o controle de qualidade é feito
pelo próprio paciente, pelos conselhos quando há algum tipo de queixa ou pelos próprios
planos de saúde que controlam se os procedimentos cobrados foram realmente realizados, as
seguintes falas dos estudantes ilustram estes entendimentos:
Os pacientes podem reclamar do atendimento, podem reclamar ao conselho, daí o
dentista é chamado no conselho em cima das reclamações. Mas durante o procedimento não
tem controle (estudante odontologia).
É, na verdade o conselho está mais preocupado agora em eliminar os práticos (...),
mas sobre os dentistas quem vai controlar essa qualidade é o próprio paciente (estudante
odontologia).
113
No convênio tem o perito para avaliar. Quando se faz um procedimento é preenchida
uma ficha para o convenio. O paciente paga e ele é descontado da folha de salário do
convenio e o dentista recebe diretamente do convenio. Essa ficha é mandada para o convenio
e o convenio pode querer saber se todos aqueles procedimentos foram feitos. Aí para ver se
essa qualidade está boa e também para ver se o que foi colocado lá foi feito mesmo eles
constatam por amostra (estudante odontologia).
Por exemplo, para isso pode ser feita uma radiografia (...). A gente aprende assim
(estudante odontologia).
Eu atendi uma paciente que não estava satisfeita com o tratamento dela por que
justamente não estava havendo uma melhora na qualidade do serviço do dentista que estava
atendendo ela. Ela foi à universidade pra pedir uma opinião porque o serviço estava sendo
feito errado (...), mas ela não estava passando por um perito (estudante odontologia).
O entendimento de que a avaliação do trabalho do psicólogo é feita através das
relações que o processo de trabalho oferece no cotidiano dá-se também no âmbito do
questionamento do trabalho em conjunto com outro profissional psicólogo que realiza a
supervisão; seja na prática de estágio curricular quando a supervisão é feita pelo professor, ou
quando o profissional psicólogo busca suporte de outro psicólogo para pensar sobre seu
processo de trabalho. Assim, está colocada à importância da supervisão na busca de um
trabalho de qualidade. Neste caso, o olhar crítico sobre a atuação profissional é feito a partir
dos princípios teóricos relativos a abordagem ou filiação teórica de cada profissão.
A existência de diversas abordagens é uma característica que particulariza a
psicologia, pois traz a pluralidade e a diversidade como algo inerente à profissão. Isso faz
com que uma mesma demanda trazida ao psicólogo tenha inúmeras maneiras, inclusive
contraditórias, de ser resolvida dependendo da abordagem e/ou do referencial teórico utilizado
o que pode ser caracterizado como um fator de restrição ao exercício da regulação.
Tem paciente que tu estás atendendo e tu não sabes até quanto tempo ele vai ficar
indefeso (...). Quanto tempo vai levar para poder ver um crescimento no caminho dele ou
não. Daí será que o trabalho dele está sendo com qualidade ou não? Deveria estar levando o
caso para uma supervisão para ver com outro olha, o que tu está fazendo. É meio
complicado, difícil de perceber a qualidade na psicologia (estudante psicologia).
É o modelo que temos; a linha teórica que estudamos. Não tem uma linha específica
(...), essa formação tem pouco dessa congretude; é uma formação muito filosófica. Tem uma
coisa da filosofia que fica mais difícil concretizar esses resultados (estudante psicologia).
114
Uma pessoa que se formou na universidade “x” tem um determinado referencial (...),
mas alguém que se formou em outro local pode pensar exatamente diferente. Porque cada
teoria, cada profissional tem a sua própria noção ou então existe certa noção de quando se
formou como os psicólogos. A noção de ética, de responsabilidade talvez sejam elementos
para se pensar no profissional (estudante psicologia).
Os estudantes de psicologia traçam uma clara distinção entre a psicologia e as demais
profissões da saúde que tradicionalmente são construídas a partir de um paradigma de ciência
biologicista. Distinguem, assim, a psicologia como profissão que atua com a subjetividade,
onde a atuação do profissional irá ser construída no encontro entre profissional e usuário, de
maneira subjetiva. Neste encontro se busca uma mediação entre as necessidades do usuário e
as possibilidades dadas pelas ferramentas teórico/práticas do profissional, e isso, de acordo
com os estudantes pesquisados, torna imprevisível o rumo que o trabalho irá tomar, o que
configura um complicador para definir que critérios são previstos na avaliação da prática do
psicólogo.
O tema da qualidade do trabalho do psicólogo aparece inúmeras vezes na transcrição
do grupo focal realizado com os docentes. Para uma melhor compreensão da análise das
informações incluídas neste bloco temático interessa dizer que este é um tema de grande
relevância para o entendimento dos limites da inserção do trabalho do psicólogo na saúde
suplementar e da sua regulação. As falas dos docentes sugerem que, para garantir a qualidade
do seu trabalho, a psicologia não pode se submeter ao controle externo, por exemplo, através
de uma regulação que institui, a priori, o tempo destinado a cada consulta ou o número
permitido de consultas por usuário em um determinado tempo.
Independente ser no público ou no privado, a qualidade tem que estar na própria
relação e no direito do cidadão porque se ele paga um plano tem que ter direito a um
atendimento de qualidade com o tempo necessário. Para nós na questão da qualidade o
tempo é um dos elementos fundamentais (docente psicologia).
O tempo necessário para a realização de um projeto terapêutico é definido conforme o
diagnóstico das necessidades do indivíduo cuidado. A idéia de que “cada caso é um caso”
expressa ênfase nas singularidades que precisam ser consideradas na definição deste projeto.
Esta questão também foi muito enfatizada nos grupos focais realizados com discentes, o que
denota sintonia entre o pensamento dos agentes e dos sujeitos da formação em psicologia.
Além do destaque dado ao tempo para a definição de um trabalho de qualidade,
independente do contexto em que ele se realiza, os docentes também fizeram referência à
relação entre as características do modelo assistencial que orienta as práticas no público e no
115
privado e a qualidade dos serviços. O relato de uma pesquisa desenvolvida com escolares de
escolas públicas e privadas por uma equipe de pesquisadores paulistas, com o objetivo de
definir o modelo de avaliação psicológica ideal foi utilizado no grupo focal como referência
para a reflexão sobre as diferenças entre os modelos assistenciais utilizados nestes dois
contextos.
Eles pegaram uma criança com problemas de aprendizagem e fizeram exame
genético, exame físico, exame psicológico e de fonoaudiologia. Fizeram uma pilha de coisas
que as crianças que pagam fazem. Agora, como as crianças das escolas públicas não podiam
pagar, eles trabalhavam com os professores, com as equipes. Eles não centravam no
investigar tudo da criança porque elas não tinham dinheiro, não tinham planos, mas
trabalhavam algo muito interessante que era poder ver a família, os professores. Os
professores pegavam essa dificuldade sem ter que fazer todo aquele percurso, de médico e tal
(estudante psicologia).
A pesquisa, apresentada para os alunos em determinado momento do curso, também
serviu de subsídio para uma discussão sobre alguns dos elementos que podem caracterizar um
“bom modelo assistencial” e para tencionar o senso comum sobre a melhor qualidade dos
atendimentos prestados em serviços privados, em detrimento daqueles prestados em serviços
públicos.
A gente começou a discutir lá com eles porque aquilo era bom e porque aquilo que
eles faziam não era tão bom (...). Qual era a medida (para a avaliação da qualidade –
estudante psicologia).
O posicionamento crítico dos docentes com relação ao que significa uma “boa prática
profissional” no campo da psicologia e sobre as condições para que esta prática se realize nos
serviços públicos e nos privados sugere que os conteúdos do ensino por eles realizado
também são trabalhados numa perspectiva crítica. Neste sentido, parece que a relação de
procedimentos diagnósticos utilizados na pesquisa pela via das tecnologias duras, uma prática
tradicional nos serviços privados, não foi considerada como suficiente para atestar a qualidade
do atendimento realizado. Por outro lado, o emprego de tecnologias leves no modelo
avaliativo destinado às escolas públicas, como a escuta, por exemplo, foi valorizado como um
diferencial que, ao invés de depreciar o atendimento no serviço público, se constituiu num
indicativo de qualidade.
Uma outra questão levantada foi a limitação das abordagens eminentemente
individualistas (como as de base tecnológica), relatada como típica dos atendimentos nos
116
serviços privados, em detrimento da abrangência e positividade dos atendimentos em nível
coletivo.
Está muito no imaginário que a coisa particular-privada tem um atendimento muito
particular e que isso é o bom. Aí o atendimento coletivo, em grupo não é bom; isso é algo
assim (...) já que eles não podem ter acesso aos exames, desde o código genético à
tomografia computadorizada, então vamos trabalhar com as professoras. Foi bem legal essa
discussão, a gente pôde estar atento a esses modelos e mostrar que aquilo que estavam
trabalhando com as crianças também tinha bons resultados (...). Porque as escolas teriam
que fazer todos aqueles diagnósticos e o que fazer com aquilo (estudante psicologia)?
O que foi registrado nos grupos focais, foi que ao se questionar a qualidade do
exercício profissional ele novamente apareceu como vinculado a aspectos externos ao
processo de trabalho, sem implicação do profissional quanto ao seu exercício profissional.
Como os exemplos abaixo:
A grande qualidade que se percebe no privado diferente do público é a demanda; o
paciente esperar o exame, esperar não sei o quê. Acho que isso baixa muito a qualidade e
ainda tem a questão de quantos pacientes você está atendendo por dia (estudante medicina).
No privado o diferencial de qualidade é que o atendimento é muito mais rápido. Tanto
como você conseguir exames complementares, quanto a própria medicação, pois o paciente
tem um maior poder aquisitivo. Então é basicamente por isso. Mas, se você for investigar o
serviço terciário, o particular deixa e desejar porque fica caro, fica pesado para o plano de
saúde fazer uma avaliação, um diagnóstico mais apurado de um paciente. Mesmo já tendo
um diagnóstico feito, você pode precisar um tratamento mais caro como, por exemplo, os
quimioterápicos para neoplasia. Várias pessoas fazem o tratamento/avaliação inicial pelo
particular, mais os planos nos cobrem ou não conseguem pagar, e então vão para o SUS
(estudante medicina).
Os estudantes reconhecem que o setor privado não realiza procedimentos mais
onerosos e que nestas situações os pacientes acabam procurando o sistema público para a
continuidade do seu atendimento.
A atenção dispensada ao paciente é tida pelos estudantes como uma forma de ter
qualidade de atendimento. Isso não é mais um fator que compõem intrinsecamente o encontro
no atendimento, passa a ser uma opção quando se quer ou não ter qualidade de atendimento,
outro fator apontado foi o conhecimento técnico e novamente a aparência estética e o conforto
da área física aparecem como qualidade do exercício profissional, como ilustrado abaixo:
117
Acho que a qualidade do serviço médico é muito relativa. É questão de ponto de vista,
por exemplo, se você for pensar, se você for perceber o ponto de vista do paciente no sistema
público mesmo, ele quer uma boa relação médico-paciente. Se você tem uma boa relação
médico-paciente, pode ser em até 5 minutos de consulta ele te considera mais. Ele acha que
você o atendeu melhor. Às vezes você até não tem o conhecimento necessário, mais você foi
mais simpático e ele gosta mais de você. Às vezes eles gostam do estudante e não gostam do
médico, mais muitas vezes nós estudantes ainda não têm o conhecimento necessário e
acabamos suprimindo apenas a parte simpática. E entre os médicos não, a qualidade
significa a pessoa saber mais, a pessoa ter mais capacidade, entre outras coisas. Eu acho que
o paciente particular é aquilo que nós já comentamos da outra vez, ele é mais exigente no
sentido de aparência. Então seu consultório tem que ser um pouco mais ajeitado, você tem
que estar ajeitado. Claro que no público um ou outro repara nisso, mais isso é mais freqüente
no particular. Mais é lógico que a qualidade no serviço médico é a junção de tudo isso que
eu falei. Se você não tiver uma boa relação você não vai ter qualidade (estudante medicina).
O fator tempo para atendimento pelo maior fluxo de demanda aparece novamente
como um indicativo de qualidade de exercício profissional, conforme colocado abaixo:
A simpatia com o paciente pode ser feita em cinco minutos, agora dificilmente você
vai conseguir fazer um atendimento de qualidade técnica em cinco minutos (estudante
medicina).
Um dos estudantes fez um apontamento referente ao compromisso do profissional
envolvendo a sua formação, outros profissionais e a ética profissional como fatores
importantes na qualidade do exercício profissional, conforme segue:
A qualidade vai congregar um monte de características, muitas, não só uma pequena
parcela, mais principalmente a parte profissional, dos profissionais que estão trabalhando,
de qual é a formação destes profissionais, de como eles foram preparados para isso, do
quesito ético, também. Como ele vai tratar/lidar com o paciente, sem contar com a estrutura,
também. A estrutura hospitalar a estrutura de medicações, não só no quesito médico, mas
também de toda equipe de saúde que muitas vezes deve ser multidisciplinar; isso tem que se
congregar em prol do paciente. Vai haver várias nuances na qualidade do atendimento
(estudante medicina).
Destaca-se também a qualidade do exercício profissional, vinculado diretamente à
busca de uma diversidade de teorias e vertentes contrapondo-se a uma prática única.
Quanto custa o seu trabalho? Como ele está percebendo isso na comunidade? Como
ele vai interligar? Como ele vai conhecer? Nós estamos trabalhando numa proposta na
118
disciplina de Interação Comunitária, nós começamos agora pela Sociologia. Antigamente
nosso currículo de Sociologia, o que era: Sociologia, vamos embora (...) agora não, agora é
uma professora de Sociologia com três cirurgiões dentistas que vão trabalhar juntos para
tentar responder isso aí (...) daqui a pouco eu não sou mais dentista, vou ser um
psicodontológico, sei lá (...) a profissão tem uma característica, isso não quer dizer que não
avance na questão do cuidado humanizado(...) o que é o cuidado humanizado? É atender as
pessoas bem? Não, o sistema de cuidado humanizado é uma obrigação, existe uma confecção
para fazer isso, nós sabemos? Vamos ter que aprender, sem perder a característica (docente
da odontologia).
Pode considerar também através desta fala a concepção do exercício profissional
dentro de uma abordagem integral diferentemente de uma abordagem fragmentária.
Por causa do risco profissional. Esse profissional, na média de sistema, ele é errado.
Você acha que o risco profissional é maior, não é muito pior. O risco profissional é muito
pior no sistema público do que no sistema privado (docente da medicina).
Isso continua acontecendo porque os médicos ao se organizarem nas cooperativas
não se organizam em forma de cooperativa de trabalho e da partilha dos lucros de seu
trabalho comum. Eles se organizam para ter uma alternativa de mercado e cada um defende
seus interesses (docente da medicina).
Hoje o profissional basicamente tem atividade de consultório como médico, não como
uma condição de ganho, mas como uma condição de lazer, em sua grande maioria para não
deixar de ser médico (docente da medicina).
Ela tem uma visão contábil da coisa, e esse grupo faz redução de custos e não
redução da doença, não trabalha em saúde. Sirvo a doença, tenho que trabalhar em saúde,
tenho que ter uma outra visão. Todas as empresas trabalham com essa visão, redução de
custos e atendimento à doença e não uma visão de investimento e do atendimento à saúde
(docente da medicina).
119
7.1.5. Atuação concomitante nos subsetores público-estatal e suplementar
a) Aquisição de experiência e conhecimento
• a experiência profissional requer atuar com os dois tipos de população
• pegar prática no subsetor público-estatal para o exercício da profissão pelo maior número de
usuários e maior diversidade de casos clínicos (no público-estatal pode treinar e errar mais)
b) Aquisição de credenciais profissionais
• ascensão profissional (desenvolvimento de habilidade, experiência, contato com a
diversidade de situações de saúde, acesso às tecnologias; trampolim)
• disputar postos de trabalho e vagas de formação nacional e internacional
c) Segurança financeira e projeção social
• garantia de renda mínima “profissional” e direitos trabalhistas + conquistas materiais à
aparência e conforto
• captação de clientela no público para a clínica particular e outros empregos
Neste eixo foram destacados aspectos como ascensão profissional, aquisição de
práticas, sendo que o subsetor público também é destacado como um “lugar de passagem”.
No setor público é como se fosse uma experiência, diferente do que muitas vezes a
gente vê no profissional do serviço privado que muitos gostam de fazer o atendimento clínico
geral, que tem aqueles que trabalham com especialidade e a gente vê como realização
profissional (estudante odontologia).
Não conheço nenhum dentista que tenha trabalhado por mais que cinco anos no
serviço público. É uma fase de transição entre sair da faculdade e montar seu próprio
negócio, o serviço público não é como um projeto profissional (estudante odontologia).
Nesta fala do docente relata que experiência profissional requer atuar com os dois
tipos de população:
Acho que atualmente a gente está conseguindo dar um viés na formação deles
bastante completo, querendo ou não, eles saem com um direcionamento para atuar tanto no
público quanto no privado (...) alguns anos atrás, a formação era mais voltada para a
atividade privada, para consultório, hoje mudamos bastante esse enfoque abrindo a
perspectiva para trabalharem em grupo, em equipe, dentro do Sistema Único de Saúde (...)
120
com a mudança de currículo do curso que vai entrar neste semestre, aí, vai ficar bastante
completo (docente odontologia).
Concordo que nós damos uma formação, tentamos dar uma formação que seja mais
integral possível (...) agora, tem uma série de variáveis, pois não é essa formação voltada ao
setor público que o aluno procura ao escolher odontologia; ele vem aqui pensando no
privado (...) quem dá aula na área de Sistemas de Saúde no Programa da Família sabe a
dificuldade (...) uma matéria, que é lá no fim do curso (...) o aluno já recebeu uma formação
muito forte de clínica (...) agora, com o novo currículo, eu acredito que a gente vai conseguir
atuar lá na base, lá nas primeiras fases... eu acredito que com essa proposta de interação
comunitária ele vai ter um conhecimento maior, já lá no começo, de como é o setor público
(...) agora, é uma questão de conscientização. Agora, quando ele se forma, ele vai se deparar
com uma outra realidade (docente odontologia).
Percebe-se também a relação com a segurança financeira e projeção social, com a
garantia de renda mínima “profissional” e direitos trabalhistas + conquistas materiais à
aparência e conforto:
Acho que tecnicamente e teoricamente eles saem preparados para atuar nas duas
frentes, embora, eu ache que o direcionamento dos nossos alunos quando eles entram no
curso (...) a intenção deles é sempre ir para o privado, e não para o público, embora, o
público garanta a eles o sustento (docente odontologia).
Nos relatos de docentes de odontologia vislumbra-se a captação de clientela no
público para a clínica particular e outros empregos.
Porque eu advogo da seguinte forma, não posso formar um cirurgião dentista para
trabalhar no SUS, específico para trabalhar num posto de saúde. Tenho que formar um
profissional para a realidade de qualquer mercado. Atualmente o SUS se mostra como uma
boa possibilidade e, assim, temos que pensar nessa interação voltada à comunidade e
começar a rever nossos conceitos e práticas não da técnica operatória, mas de
posicionamento (docente odontologia).
O problema é que ele vai se deparar com um mercado que impede o aluno de concluir
realmente sua formação em odontologia. Ele sai daqui sem dinheiro, não tem acesso a um
cargo público e vai trabalhar na clínica onde a dona é uma pessoa que não tem nada a ver
com odontologia, mas que tem um capital, montou uma clínica, colocou uns dentistas lá e
paga R$ 10 por hora de serviço (docente odontologia).
O capital hoje se apropriou do trabalho do dentista como aconteceu na Revolução
Industrial, os artesões deixaram de ter o domínio de seu próprio trabalho porque as grandes
121
corporações foram lá. Hoje o sujeito monta uma clínica e contrata um cirurgião dentista (...)
o pior é que os dentistas são obrigados a trabalhar nisso, não tem o que fazer (...) aqueles
que o pai não pode montar um consultório, não podem fazer nada (docente odontologia).
Quando questionados sobre a população que vai para o SUS, e qual é a população que
vai para o consultório privado, assim manifestam-se:
Vai para o consultório privado qualquer um que tenha um tostão e que valoriza; quem
consegue pagar (...) vai pro SUS quem não consegue (docente odontologia).
Eles não sabem que está havendo uma indústria, não percebem. Eles estão buscando
trabalhar no consultório privado. Estão querendo sair, escapar do SUS e estão querendo
entrar no consultório privado o que na verdade cai de novo naquilo que eu disse: o SUS não
atende as necessidades dos usuários. O SUS faz o quê? Extração e restauração. Endodontia,o
SUS faz? Não; Prótese, o SUS faz? Não (docente odontologia).
No posto são 2500 pacientes para atender, ela (profissional) marca um paciente hoje
e agenda para daqui a trinta dias. Neste meio tempo acontece alguma coisa, o paciente vai
na clínica desse cirurgião – que são as clínicas populares que fazem canal por R$5,00, uma
extração por R$10 e acabou – é aquele negócio, dente você tira e não mata. Então, ao invés
de esperar que o dentista vá lá, para tratar o canal, daqui a 2 meses ele tira, ele vai lá nessa
popular que cobra R$ 10, que fica R$5 para o dentista e R$5 para a clínica, e extrai, não
mata, não acontece nada. É esta a realidade. Aquele que tem alguma sorte de vir aqui para a
faculdade ainda faz alguma coisa, porque ele está aqui na universidade e é atendido por
aluno. O pessoal de posto de saúde, meia dúzia mantém uma regularidade, 90% resolveu o
problema, ele vai nessa popular, que são essas 20 clínicas que tem aí, 20 consultórios, e
resolve desta forma. Outras vezes, melhora um pouquinho mais o salário e vão fazer um
tratamento de canal, uma restauração no privado, que no centro da cidade custaria R$500,
ele vai na periferia e faz por R$100, ele consegue às custas e a duras pedras economizar
aqueles R$100 e vai lá e faz (docente odontologia).
O número de médicos que abandonou o consultório particular, para se associar a
uma instituição é 95%, realmente é um ponto a mais para as associações médicas que o
consultório particular (docente medicina).
O médico começa a ter restrição de mercado de trabalho. Porque ele perdeu o ganho
econômico, do que era oferecido antes e agora vem com uma tabela do SUS, que é
depreciativa à classe médica (docente medicina).
Não existem mais médicos como eu fui,. Hoje em dia os médicos mais novos têm uma
realidade completamente diferente. Existe uma coisa que tem mudado muito, o médico no
122
passado terminava sua formação, abria seu consultório e fazia sua vida. Com o passar do
tempo a gente observou que esse médico foi tendo certa mudança (docente medicina).
Acho que nós vivemos num modelo misto realmente que há espaço para iniciativa
pública e privada. O que não pode é essa relação do público e privado ser uma relação de
parasitismo, como muitas vezes ocorre. Sendo o parasitismo do público sobre o privado ou
do privado sobre o publico. O SUS não tem como investir principalmente em tecnologia, não
processual mais material, como equipamentos, técnicas, cirurgias (docente medicina).
Vislumbra-se aqui os fatores de escolha pelo trabalho nos subsetores público estatal ou
suplementar, englobando as características trabalhistas:
Profissional liberal tem 1% de médicos que atendem individualmente que são
exclusivamente profissionais liberais, 99% dos médicos atendem em clínica privada, sistema
público. Tem preferência por clínica privado do que consultório particular. Por isso que nós
estamos querendo fazer o seguinte: queremos ter uma clínica privada, queremos trabalhar na
instituição, na clínica privada e ter um consultório particular (docente medicina).
Os médicos estão se associando aos hospitais, não tendo mais consultório particular,
eles estão se associando aos hospitais, estão voltando a ser médicos, funcionários de
hospitais garantindo seu sustento dessa forma. Acho que está havendo uma mudança muito
grande (docente medicina).
Você percebe que hoje trabalhar no SUS é inviável, pelo menos na minha área
trabalhar no SUS é prejuízo. Não é trabalhar de graça, é pagar para trabalhar (docente
medicina).
As formas de pagamento, de remuneração desta prestação de serviços é que são
múltiplas (docente medicina),
Com ênfase nesta citação do docente vê-se novamente os fatores pelo trabalho nos
subsetores público-estatal ou suplementar, enfatizando a remuneração quanto as modalidades
de pagamento.
Não há interesse dos agentes e dos prestadores de serviços que são médicos,
profissionais de saúde, hospitais, porque a remuneração através do pagamento e salários no
setor público não é adequada e é onde há mais interesse de se fazer o pagamento por
prestação de serviço (docente medicina).
No que se refere a relação entre autonomia e autoregulação, os estudantes colocam
ainda que não faz parte do ideário de exercício da profissão ficar trabalhando apenas no setor
público, colocando em contra ponto a autonomia / liberdade da profissão, conforme dito
abaixo:
123
Existe uma grande parcela de culpa da nossa classe médica, do tanto que nos
trabalhamos e a remuneração do médico não é pouca, porque nenhum profissional sai
ganhando o que eu ganhei, trabalhando 1 mês, 5 mil reais, trabalhando 30 horas/semana, é o
médico que não quer esse contrato, porque não quer ficar preso o dia todo na Unidade de
Saúde, ou seja, entra a hora que quer sai quando quiser, porque está sobrando vaga, ou seja
os médicos não querem. Um país onde a maioria ganha um salários, dois salários, uma
empregada doméstica ganha para trabalhar o dia inteiro cerca de 1 salário mínimo, eu
ganho 5 mil reais (estudante medicina).
Posso exercer a medicina no setor privado com a tentativa de ser liberal, mas eu
tenho uma intermediação dos planos e seguros de saúde que nem sempre são intermediações
em favor do paciente e que deixam os médicos exercerem de forma liberal e, por outro lado,
o exercício da profissão médica no serviço privado que atende ao SUS pode ser pura e
simplesmente liberal, porque ela tem uma resolução que paga seus honorários (docente da
medicina).
É fundamental propor-se o abandono da demarcação Público/Privado , vistas
simplesmente em polaridade de opostos. Aciole (2006) prioriza desfazer a confusão de se
considerar Estatal como sinônimo de público bem como deixar de ver o privado como não
Estatal. “É necessário refletir sobre a existência de trânsitos entre estes dois setores, não
exatamente pela clientela que atendem ou servem,ou pela valoração ideológica que os
marcam”.(Aciole, 2006,p. 45 )
Tem uma questão de autonomia do medico nas decisões que hoje possui uma restrição
tanto pela parte de planos, quanto como você tem quando exerce em uma instituição como
uma prefeitura, em uma secretaria estadual ou em um hospital universitário. Nestes espaços
você depende de normas de recursos necessários e muitas vezes são colocadas restrições tão
importantes que vão contra a autonomia da decisão do que é melhor para o paciente
(docente medicina).
Conheço alguns trabalhos da Rita Schinaider que falam sobre o quanto o curso ainda
alimenta a questão de uma profissão autônoma; claro que todo mundo gostaria de possuir
muita autonomia, mas não existe mais o médico liberal. Mesmo o médico que possui seu
consultório particular depende do trabalho social da medicina (docente medicina).
Quanto às oportunidades sociais e profissionais, reconhecimento profissional/projeção
pessoal:
124
Os recursos propiciados pelos planos, pelas operadoras de saúde suplementar são
melhores que aqueles oferecidos pelo sistema de saúde público. Você trabalha com maior
gosto (docente medicina).
No nosso país a gente vê corrupção na Unimed que é um sistema cooperativado em
que os próprios médicos são proprietários. Como que pode existir corrupção dentro da
própria cooperativa? É um absurdo na nossa área, colegas realizar procedimentos
desnecessários (docente medicina).
Não é rentável ser clinico geral e pediatra e só atender pelo SUS, talvez apenas
algumas especialidades sejam rentável, então dessa forma eles tem que mesclar esse
atendimento (docente medicina).
O trabalho nos dois setores vai renovando em um movimento muito interessante de
renovação público-privado concomitantemente. O meu ideal é que um dia possa atender o
público e o privado, acho que é muito importante para o público e para o privado (estudante
psicologia).
Acho que quando se trabalha nos dois setores o benefício é o questionamento eterno
da prática (estudante psicologia).
125
7.1.6. Regulação no setor da saúde
a) Exercício da regulação
• controle dos custos da atenção (auditorias "excessivamente limitadoras")
• controle da resolutividade da atenção (ninguém regula o público-estatal)
• avaliação de desempenho
b) Agentes da regulação
• interesse público (é intrínseca ao subsetor público-estatal)
• corporação profissional
• auto-regulação (ética individual, corporação profissional, atitudes entre pares de profissão)
• regulação resulta do reconhecimento de quem usa o serviço (o usuário/beneficiário exerce a
regulação ao indica para outros, retornar ou não)
c) Restrições ao exercício da regulação
• singularidades presentes no cuidado (escuta sensível; diversidade dos recursos necessários
para a integralidade da atenção e dos custos de cada atenção)
• componentes não mensuráveis na interação profissional-usuário
• impossibilidade de definir/delimitar singularidades clínicas (quando elas são vivenciais por
conterem expressões da subjetividade; acontece a busca por entidades sociais ou “oficinas
multiprofissionais”)
• lógicas do tempo (atendimentos envolvem compreender uma história de vida, alguns
envolvem conquistar a elaboração de um processo vivido, ocorre a pressão pela demanda
reprimida)
• padronização X singularidade/diversidade dos processos humanos
• pouca valorização do impacto das ações preventivas na promoção da saúde e redução da
carga de doenças (difícil mensuração e baixa capacidade de avaliação)
• cerceamento da autonomia no subsetor suplementar
• referenciais regulatórios e supostos da clínica (a clínica demanda atenção aos aspectos
estéticos, funcionais, de eliminação da dor, de cura e de acompanhamento de processos).
Quando questionados sobre a regulação da prática profissional, os estudantes
remeteram os agentes da regulação a questões de auto-regulação, se referindo a ética
profissional, dizendo que a regulação depende do exercício ético que o profissional irá fazer
126
para problematizar sua atuação cotidiana. Quando se referem a algo que não dependa do
profissional, ou seja, algo que esteja além do desempenho profissional, provavelmente
referiram-se ao Conselho Regional da Psicologia.
Os estudantes colocam também que a regulação da atuação profissional se dá pela
própria dinâmica do trabalho, na medida em que os próprios usuários estariam regulando ao
escolherem um profissional, ao se manterem fazendo tratamento com este e, principalmente,
ao indicá- lo a outra pessoa.
Acho que é sobre a indicação do psicólogo. Acho que esse hábito de indicar alguém
parece impedir as pessoas de procurar psicólogos em uma clínica (...). De qualquer forma
mesmo indicando alguém que me parece ter um bom trabalho, sei lá alguém que tenha uma
boa reputação (estudante psicologia).
Fico com aquela idéia na qual aquilo que é feito acaba sendo reconhecido na própria
profissão. Quando tu vês vai ter sempre gente procurando por ele, pela recomendação, acho
que acaba tendo um reconhecimento que não se dá por meio de uma regulação formal, que
não se dá só pela categoria, que se dá no social (estudante psicologia).
A regulação na psicologia é um critério muito subjetivo, diferente das profissões mais
de caráter biológico (estudante psicologia).
Acho que o objeto de trabalho da psicologia é muito subjetivo (estudante psicologia).
No caso de um atendimento de luto é necessário entender que nesse momento são
atendidos mãe e filho; atender só um viria a atrapalhar. No momento que tem critérios
(regulação pelos planos) diferentes daqueles que o sujeito está trazendo, dentro do que aquela
pessoa está conseguindo te falar, pois primeiro ela vai chorar a sessão inteira (estudante
psicologia).
Esta preocupação com a regulação, também é destacada por Figueira jr. (2006), em
uma pesquisa realizada pelo Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, em 2004,
apontando a dificuldade de inserção do exercício da psicologia na saúde suplementar, pela
singularidade desta profissão, apresentando tratamento com alto custo, longo e com prazo
indeterminado. A pesquisa aponta também, o fato de que os problemas emocionais não são
considerados ‘patologias’ e que a maioria dos planos (68%) estabelece parâmetros para a
duração das sessões e somente 25% deixa a critério do profissional. Destaca que 75% dos
Planos de Saúde exigem encaminhamento médico, além de orientações de tratamento, como a
sua duração, limitando a autonomia do psicólogo no exercício de sua profissão.
Os estudantes reconhecem que há uma pluralidade de entendimentos na psicologia que
é decorrente das diferentes teorias, o que denominam como uma formação singular, porém
127
pontuam que há uma linha que identifica os profissionais da psicologia entre si. A ética, de
acordo com estes estudantes, pode ser o ponto em comum que faria a psicologia conversar na
sua diferença, no entanto, não para buscar uma unidade, mas para problematizar a prática
profissional.
Por mais que tenha a singularidade de cada profissional e o que se compartilha (...).
Quer dizer, tenho a minha trajetória particular, mas nós sempre compartilhamos alguma
coisa, nós conseguimos dialogar com isso e este aspecto é legal (...) na supervisão, no campo
da ética nós compartilhamos (estudante psicologia).
Na psicologia se valoriza a diversidade, se valoriza a relatividade das coisas
(estudante psicologia).
A ética é trazida pelos estudantes como recurso teórico capaz de indicar os caminhos
para uma boa prática profissional. A noção reflexiva da profissão é fortemente marcada como
indicador de qualidade profissional, o que reforça a noção de que a psicologia entende que a
qualidade da prática profissional é dada pela aposta na formação de profissionais capazes de
atuar a partir de parâmetros éticos que circulam no meio “psi”.
Uma coisa completamente subjetiva, que é a questão da ética, da responsabilidade e a
capacidade de reflexão sobre a prática cotidiana. Como falar em regulação diante destas
coisas. Tem que ter ética, responsabilidade suficiente para saber essa necessidade de
sustentar, tu estares prescrevendo coisas que consideras importante, além do que se o
paciente vai continuar ou não (estudante psicologia).
Os estudantes de psicologia, neste sentido, chegam à conclusão de que a psicologia é
uma profissão que não consegue ser pensada dentro dos parâmetros de regularidade presentes
no modelo que estes estudantes conhecem de regulação.
A psicologia trabalha com a singularidade e as avaliações ou regulações procuram
buscar uma generalidade nas coisas. Acho que cada caso é um caso, trata-se da preocupação
com o singular (estudante psicologia).
No entanto, a regulação como algo feito externamente à profissão não foi identificada
por estes estudantes mesmo quando o coordenador do grupo focal fala de como funciona a
regulação da prática profissional em saúde pela Agência Nacional de Saúde Suplementar.
Neste sentido, compreendem que a regulação é feita a partir de um conceito abstrato
de prática profissional ao ter como parâmetro um ideal de atuação.
A regulação parece partir de uma idéia do ideal, do imaginário, o ideal está posto,
têm-se todas as condições, temos o lucro e então agora vamos regular, a partir de um ideal,
128
porque para regular, o ideal também que existir, se estiverem presentes todos os critérios,
isso leva ao ideal (estudante psicologia).
Com relação às restrições ao exercício da regulação, pode-se identificar que há pouca
valorização do impacto das ações preventivas na promoção da saúde (difícil mensuração e
baixa capacidade de avaliação), cerceamento da autonomia no subsetor suplementar,
referenciais regulatórios e supostos da clínica (a clínica demanda atenção aos aspectos
estéticos, funcionais, de eliminação da dor, de cura e de acompanhamento de processos),
componentes não mensuráveis na interação profissional-usuário.sobre o controle da prática
profissional demonstrou relacionado a estes aspectos
Acho que em relação à satisfação do paciente seria tranqüilo fazer até um
questionário, quantas pessoas são atendidas por esse profissional, supriu aquilo que o
paciente esperava, agora quanto ao tratamento, quanto ao trabalho é complicado porque
hoje posso fazer uma restauração muito bonita e amanhã não estou tão inspirada para fazer
a mesma coisa, varia muito. Nosso trabalho é muito artístico (estudante odontologia).
Para ter uma qualidade maior, do jeito que as coisas acontecem hoje fica difícil,
qualquer um abre um consultório odontológico (estudante odontologia).
Considerando o exercício da regulação, alguns estudantes colocam que ambos os
setores de atuação estabelecem certa regulação sobre o exercício profissional. Conforme
ilustram as seguintes falas dos estudantes no grupo focal:
Hoje o particular está precário porque o paciente está vinculado à planos de saúde e,
na minha opinião, os planos de saúde têm uma metodologia de trabalho pior do que
trabalhar no setor público, onde ele sim exige que você corte custos, que você não peça
muitos exames, eles inibem, e alguns até possuem um controle, onde o médico possui um
número “x”de exames por mês (estudante medicina).
No setor público isso também existe, por exemplo, quando você vai fazer uma
cirurgia, você possui um numero certo de fios cirúrgicos para usar e se usar mais tem que
pagar do seu bolso (estudante medicina).
Outros estudantes chegam a debater a inexistência de qualquer tipo de regulação do
profissional no setor público, o que acaba regulando é o sistema em si pelo fluxo excessivo e
consequentemente tem demoras e filas, conforme ilustrado abaixo:
O problema no Brasil é que o profissional está muito livre, tem liberdade para fazer o
que quiser (...) são presos demais pelos planos de saúde e soltos demais pelo setor público
(estudante medicina).
129
Ainda nesta reflexão os estudantes debatem sobre a falta de regulação do setor privado
que acaba gerando uma impunidade do profissional frente as suas condutas e o abuso que
muitos exercem ao cobrar consultas e manipular exames ou medicações em beneficio próprio,
de acordo com a seguinte ilustração:
O problema é que no privado você não vê fiscalização. Há muitos profissionais que
cobram consultas que não são permitidas e recebem comissão de laboratórios de
manipulação; isso não está certo, mas ainda continua. Profissionais presos que depois
continuam trabalhando, alguma coisa está errada (estudante medicina).
Com relação aos agentes da regulação, os estudantes não souberam definir quem são
os agentes de regulação, demonstrando um desconhecimento de como isto se aplica no
processo de trabalho em si. As seguintes falas ilustram o debate que se deu no grupo focal:
Quem deveria avaliar na verdade não sei (...) talvez seja a Secretaria municipal de
Saúde (estudante medicina).
Os conselhos municipais estão aí pra isso. Eles têm porcentagem representativa de
todas as classes sociais (estudante medicina).
A nossa tendência é falar que não é o paciente que avalia, quem avalia é a secretaria,
o médico, o chefe (estudante medicina).
Hoje os planos de saúde têm muito poder sobre o que eles querem fazer (estudante
medicina).
O governo é importante na defesa do consumidor (estudante medicina).
Acho que cabe ao estado a regulamentação (estudante medicina).
Para fiscalizar a qualidade do atendimento médico o órgão competente é o CRM
(estudante medicina).
Por outro lado, os estudantes indicam a ANS como agencia reguladora no setor
privado de saúde:
Acho que quem regula o plano de saúde é a agencia suplementar, a ANS que regula e
ela é regulada através de leis dos deputados (estudante medicina).
Acho que a ANS tem um papel importante nisso. Porque se for depender da própria
saúde suplementar, do plano de saúde ele não vai se importar muito com a qualidade. Tem a
ANS pra regulamentar isso (estudante medicina).
A regulação é feita através da ANS, teoricamente é feita no público pelos políticos,
mais na verdade não tem essa ponte porque eles têm mais poder do que nós (estudante
medicina).
130
A seguir o grupo aborda que na verdade o cliente/paciente tem um papel de avaliador
e que assim acaba por regular o sistema, tanto no sentido de que ele é capaz de expressar se
foi bem atendido, se ficou satisfeito (considerando que isso só é relevante de ser questionado
no setor privado, pois ele ao “pagar” pode exigir), outro aspecto foi que do cliente comparar o
seu atendimento no privado com a do sistema público, novamente aparece no imaginário dos
estudantes a saúde como um meio de consumo/mercadoria que se o cliente não está satisfeito
simplesmente se troca de plano privado, e este seria de acordo com o grupo o principal
motivo de mudança nas praticas do planos privados, como forma de não perder a
clientela/lucro. De acordo com as seguintes falas:
Acho que o principal avaliador de qualquer lugar é o cliente, perguntando do que ele
gostou e do que não gostou (estudante medicina).
O cara está pagando, então ele exige. Se o médico chega atrasado ou não o trata bem,
esse tipo de coisinha, ele cobra pelo fato de estar pagando (estudante medicina).
Acho que a avaliação feita pelo paciente/cliente é essencial para avaliar como anda o
atendimento; para gerar mudança (estudante medicina).
Acho que o nível quem dá são os nossos pacientes, não pelo fato de estar bom, mais se
é a única opção e se é melhor e mais abrangente pra eles do que a unidade de saúde
(estudante medicina).
Penso que não é só por isso, mas sim por causa da lei de mercado também. Porque se
o paciente não gostar daquele convenio ele pode mudar (estudante medicina).
No privado o principal responsável por estar tentando mudar alguma coisa é o
próprio paciente (estudante medicina).
No tocante à regulação do trabalho do psicólogo no contexto da saúde, em geral, e na
saúde suplementar em particular, muitas das discussões se pautaram na afirmação de certo
‘zelo’ especial da categoria profissional de psicólogo pela qualidade das suas práticas, o que
representaria uma espécie auto – regulação. Por outro lado, como já foi comentado
anteriormente, segundo os docentes participantes da pesquisa, as características do trabalho da
psicologia, sobretudo no campo da clinica, dificultam o estabelecimento de critérios
regulatórios, definidos e implementados com a finalidade de controle externo. Neste sentido,
o controle da qualidade do trabalho dos psicólogos ficaria ao encargo dos próprios
profissionais, uma vez garantida a realização dos procedimentos técnicos de controle
indicados nas normas que regulam o exercício profissional. A presença do mecanismo da
supervisão, por exemplo, definido internamente como instrumento de regulação da qualidade
da prática clínica em psicologia, seria uma destas garantias.
131
Outros procedimentos que funcionariam como instrumentos de regulação do trabalho
dos psicólogos foram lembrados pelos docentes quando o foco de discussão recaiu sobre a
presença dos conteúdos “regulação” e “controle” na formação. Mais uma vez, a ênfase foi em
mecanismos tidos como próprios do processo de trabalho desenvolvido no campo da
psicologia. Neste contexto o referencial epistemológico que orienta o trabalho do psicólogo
foi referido como central. Na seqüência do depoimento o docente põe em dúvida a inclusão
do controle social como conteúdo da formação, enfatizando, porém, que, a questão da
regulação tem sido contemplada no trabalho docente, embora não de forma explícita. Nesta
perspectiva, a forma de abordagem do tema regulação do exercício profissional na psicologia
é referida como sendo “acadêmica”, porque embasada numa coerência ético-epistêmica.
Eu acho que o que a gente tenta fazer é uma articulação entre a epistemológica, a
ética, a teórica e a metodológica, pelos menos é a maneira que eu ensino. Os instrumentos de
trabalho não são escolhidos porque tu gosta ou não, mas na escolha do instrumento de
trabalho está presente uma condição de sujeito. Um controle que a gente tenta fazer é essa
congruência entre a ação, a metodologia que usa, a epistemologia que vai mostrar que
nenhuma atividade é neutra (....) eu não sei o quanto na formação nós trabalhamos com essa
questão de um controle social, acho que a gente trabalha muito mais academicamente
(docente medicina).
A importância do controle social como instrumento de regulação foi lembrada,
também na discussão sobre os direitos da população. As reflexões sobre o tema resultaram na
afirmação de que, apesar da sua importância, é ainda insipiente o conhecimento dos usuários
sobre seus direitos, o que tem resultado na falta de tomada de posição individual e coletiva no
controle da qualidade dos serviços.
Em tal abordagem encontra-se dúvidas sobre convergências e divergências entre
regulação, regulamentação, normatização e uniformização (conforme matriz avaliativa).
A gente vê na prática, e muitos autores descrevem que acontece uma privatização do
controle. Não é o estado mais controlando isso (docente medicina).
Cria-se uma agência porque dessa forma o SUS limitaria um pouco a flexibilidade
deste setor, porque a agência vai se adaptar melhor ao mercado e suas exigências (docente
medicina).
Por isso surge o “único” e hoje em dia tem pessoas que fazem chacota dizendo: mais
não é sistema único, está cheio de sistemas, planos, seguros, mais é que historicamente nós
temos que compreender aquele contexto (docente medicina).
132
A melhor qualidade é aquela onde eu sou atendido como um ser humano, eu tenho
possibilidade de um atendimento integral e também tenho acesso a tecnologia necessária da
mais simples a mais complexa quando eu preciso. O meu parâmetro de qualidade é esse
(docente medicina).
A fala aqui relatada revela o controle e regulação da boa prática profissional, havendo
um questionamento das práticas entre colegas, assim como a participação da sociedade
(através dos conselhos gestores, controle social, auditores)
As auditorias médicas serão realizadas pelo próprio sistema. Eu tenho um sistema de
auditoria, que é uma auditoria médica em uma visão não contábil, de quanto eu gasto, mas
de uma visão médica em que você sabe, nós vamos saber por que tal exame foi realizado ou
não realizado. Hoje em dia eles pedem muito exame, principalmente para aumentar o seu
volume de ganho. Deixa de existir essa necessidade, isso é a maior qualificação, é onde as
empresas de saúde suplementar vão ganhar (docente medicina).
O médico vai continuar a solicitar aquilo que ele quer para o seu diagnóstico e dar
sua forma de diagnóstico. Como ele vai sofrer uma auditoria e se tiver abusando de exames,
a própria auditoria realizada pela sociedade, pela S/A, vai ser o seguinte: por que você vai
fazer exames para isso e para aquilo (docente medicina)?
A autonomia do médico está subordinada a isso também, porque não é o médico mais
é a clínica que decide o medicamento, o número de dias que é para ficar internado (docente
medicina).
Os estudantes colocam que há uma diferenciação na forma como os trabalhadores são
reconhecidos nos dois sub-setores. No público o profissional é reconhecido por ter sido
submetido a um processo seletivo concorrido e difícil, o que o daria elementos que a priori os
qualificaria e capacitaria como bons profissionais. No entanto, tal fato não garantiria um bom
trabalho, pois muitas vezes estes profissionais não participam de processos educativos
posteriores durante sua atuação profissional.
Imagino que uma pessoa que está no setor público passou por um processo de seleção
e de certa forma ela está bem colocada dentro de um campo que é um órgão público
(estudante psicologia).
Mas talvez a pessoa tenha passado no concurso público há 15 anos e nunca mais
tenha feito um curso de atualização (estudante psicologia).
Fatores como condições financeiras e status decorrente disso são colocados como
compondo o reconhecimento profissional do psicólogo que atua no sub-setor privado por ser
considerado onde se pode alcançar enriquecimento.
133
O reconhecimento do profissional depende do meio onde está, no meio privado parece
que é mais fácil; que aparece mais. É mais provável tanto pelo status como pela situação
financeira; mostrar que tem sucesso profissional através das conquistas materiais, seu
salário (estudante psicologia).
Aqui já tomaram uma medida para não haver mais essa relação dos planos privados
com o SUS, hoje os hospitais públicos não atendem mais planos de saúde, tanto que a
Unimed construiu um hospital para poder fazer atendimento (...) só se interna no hospital
hoje, como o Celso Ramos, pelo SUS, não tem mais Unimed no Celso Ramos, nem no
Regional (...) tem que valorizar o SUS e valorizar o paciente do SUS, ele vai ter atendimento
só para o SUS (...) antes tinham 20 leitos, 18 ocupados pela Unimed, um camarada do SUS
não tinha vaga (docente odontologia).
Um erro de base é partir do princípio no qual, levar a odontologia para o SUS é a
mesma coisa que ocorreu com a medicina, com a enfermagem. São profissões diferentes, com
características totalmente diferentes e que se fizerem o mesmo caminho não vai dar certo (...)
o dentista achar que vai trilhar o mesmo caminho do médico, da enfermeira, da psicóloga,
não vai dar certo; nós temos equipamentos, é diferente (docente odontologia ).
Não é como a OAB que, tendo o diploma reconhecido pelo MEC, graduou e vai ao
conselho se registrar como cirurgião dentista; o mercado regula em algum momento (docente
odontologia).
Com relação ao controle da resolutividade da atenção:
Tem que preparar para o SUS (...) qualquer Sistema hoje no Brasil erra na base
porque, primeiro, remunera por procedimento. Enquanto o SUS remunerar por
procedimento, terá esta calcanhar de Aquiles, você não tem como ver qualidade, não tem
como promover a saúde, você vai tratar a doença, porque remunera o quê? À doença e não à
saúde (...) eles não querem saber se a minha clínica tem qualidade, se eu colocar 66
professores com graduação ou 66 com doutorado não faz diferença, o que conta é fazer
15000 procedimentos por mês, é o que interessa, não interessa a qualidade (docente
odontologia).
Ninguém regula direito o que é feito e o que não é feito (docente odontologia).
Porque nós estamos discutindo aqui e no final vemos que nossos problemas estão
ocorrendo na gestão pública e não na atuação profissional (...) vou fiscalizar o dentista,
muito bem, mas como é que eu vou fiscalizar o trabalho dele se eu exijo que ele faça dez
restaurações em uma hora? Vou fiscalizar o quê? Eu já sei que está ruim, porque é
impossível fazer dez restaurações boas em uma hora, não tem jeito, eu não preciso de uma
134
perícia para verificar a qualidade, eu já sei que ela é ruim... agora, eu tenho que dar
condição para que o trabalho seja bem feito e aí sim eu posso cobrar... e isso passa pela
gestão da coisa pública, por um órgão que realmente possa fazer isto, senão não adianta
querer cobrar qualquer coisa se não dou condições para trabalhar (...) Passa pela
remuneração adequada, gestão de pessoas, avaliação da qualidade (docente odontologia).
Aparecem questionamentos sobre agentes da regulação e avaliação de desempenho,
sendo interesse público (intrínseca ao subsetor público-estatal) para melhoraria da qualidade
de atendimento.
Nós trabalhamos com mestrado e doutorado, eu trabalhei, pelo menos, com questões
de qualidade e avaliação, o Sistema não tem indicadores para qualidade, sabe por quê?
Porque não existe, se você levantar na literatura o indicador para a saúde tem a parte
fisiológica, mas indicadores de qualidade de saúde você não tem (...) está para ser
construído, não existe. No SUS, o único indicador de quantidade são quantos procedimentos,
e qualidade? Como você avalia se um serviço de saúde tem qualidade? Os indicadores são de
três tipos: estrutura, estado ou processo, como você aplica isso em saúde? Não existe (...).
Nós estamos desenvolvendo agora uma tese que mostre indicadores para a saúde em
odontologia (docente odontologia).
A ANS poderia dar parâmetros de atendimento: tempo de consulta, e mesmo em
relação ao protocolo de atendimento, acho que valorizar a educação em saúde,
procedimentos preventivos, pode se aproximar à forma de exigência do usuário do sistema de
saúde (...) o que está acontecendo é que a única forma de gerência dos planos é sobre o
profissional, mas na hora que o usuário quer reclamar ele fica no meio do caminho, daí ele
vai para um embate com o próprio profissional. Acho que a ANS tem um campo enorme, pelo
menos na odontologia, concordo que avançou um monte (docente odontologia).
O sistema deve montar alguma coisa para o controle de qualidade, como tem nas
empresas. O Sistema necessita, uma vez por mês, ver lá no posto tal como está realmente
aquela produção, se está dando certo (docente odontologia).
A ANS se propõe a isso, mas como ela pode regular (docente odontologia)?
Através das parcelas organizadas da sociedade (docente da odontologia).
Para isso, eu voltar aquela idéia, eu acho que para a formação não só do dentista,
mas de qualquer outro profissional, está faltando aula de OSPB, Organização Social e
Política Brasileira (docente odontologia).
A partir do momento em que a nossa população tem um nível de educação, ela tem
como reivindicar, e aí por efeito colateral do Sistema de Saúde vai melhorar na marra (...).
135
Alguém mais educado, mais exigente, mais consciente do que o estado tem que lhe
proporcionar, na marra o Sistema começa a caminhar (docente odontologia).
Eu diria que não é só a questão de serem mais conscientes de seus direitos, mas
principalmente de seus deveres (docente odontologia).
A partir disso o Sistema começa a melhorar para atender esses pacientes mais
exigentes (...). Aí, quem regula é o mercado (docente odontologia).
Regulação resulta do reconhecimento de quem usa o serviço (o usuário/beneficiário
exerce a regulação ao indica para outros, retornar ou não):
O serviço público também tem que ser educado para isso, o público tem que saber
cobrar um serviço adequado do profissional da rede (docente odontologia).
Restrições ao exercício da regulação aparecem como uma subcategoria abrangendo
componentes não mensuráveis na interação profissional-usuário:
Por que tem muita dificuldade de clientes? Claro, hoje em Santa Catarina tem 7
cursos de odontologia, formando quase 500 dentistas, quer ver o exemplo da ortodontia:
antigamente, quando nós fizemos odonto, tinha dois ortodontistas na cidade, só milionário
fazia tratamento (...) hoje, nada contra as caixas de supermercado, mas toda caixa de
supermercado tem aparelho ortodôntico, porque tem tanto ortodontista que hoje você paga
R$ 60,00 por mês e coloca um aparelho ortodôntico; a qualidade desse aparelho é outra
conversa (docente odontologia).
Não tem quem regule isso, não tem avaliação (...) porque tem gente aí colocando
aparelho com se fosse ortodontista (docente da odontologia).
Os grupos focais destacam a pouca valorização do impacto das ações preventivas na
promoção da saúde e redução da carga de doenças (difícil mensuração e baixa capacidade de
avaliação):
Acho fundamental no SUS avaliar a qualidade e não a quantidade, e também a gestão
de pessoas na parte de treinamento (docente odontologia).
A universidade tem que dar a sua parcela de contribuição no desenvolvimento desse
sistema de avaliação de qualidade (docente odontologia).
Como referenciais regulatórios e supostos da clínica (a clínica demanda atenção aos
aspectos estéticos, funcionais, de eliminação da dor, de cura e de acompanhamento de
processos), encontra-se um imaginário sobre estratégias para promoção da saúde da
população.
Todas essas novas competências estão interligadas; não posso parar de atender
porque a dívida social é imensa. Existe toda uma discussão de modelo de atenção do SUS,
136
tenho que considerar a promoção da saúde, mas não vou parar de reabilitar. Ttenho que
fazer as coisas simultaneamente, políticas públicas de ordem preventiva, promotora e mais
atendimento (...) há um estudo na Inglaterra mostrando o impacto do serviço de atendimento
é 3% sobre o nível de saúde da população, o que resolve? São as políticas públicas; é a
educação, a moradia (docente odontologia).
Nós não vamos conseguir jamais resolver os problemas de saúde que não são de
saúde na verdade e sim sociais. O que nós estamos discutindo aqui é uma coisa muito mais
ampla. O SUS não é problema de saúde, o SUS é problema social (...), é a educação que vai
resolver isso (docente odontologia).
Você sabe que fumar causa câncer, e você vê um monte de gente fumando que não
consegue deixar de fumar, álcool é outro problema sério, todo mundo bebe, todo mundo isso,
todo mundo aquilo (...) todo mundo sabe que não deve dirigir alcoolizado, mas na maioria
das batidas o cara está alcoolizado, droga é a mesma coisa, todos sabem que fumar um
baseado causa dependência, causa isso, causa aquilo (...) como você vai pegar uma mãe e
dizer que ela vai ter que escovar os dentes três vezes ao dia, se ela não tem escova, não tem
pasta, não tem água? Aí chega o vizinho e traz um torrone de doce e esta será a única
refeição dela. Como é que você vai resolver isso? É educação, é formação, é uma série de
coisas, é difícil você colocar (...). Eu acho que cada dentista deveria ter uma cartela de 100
pacientes, olha, você é responsável por esses 100 pacientes, você vai ganhar R$ 5000 para
manter a saúde desses 100 pacientes e aí entra o controle social (docente odontologia).
Você tem uma comunidade, o dentista, o médico, o grupo, vão controlar aqueles 100
pacientes (...) vai chegar uma hora em que o profissional vai chegar para o paciente, para a
mãe, para o filho e vai fazer um controle da doença, daí o atendimento técnico vai ser muito
pequeno (...) no começo o dentista pode ter muito trabalho para poder começar a resolver
aquilo (docente da odontologia).
137
7.2. Análise dos Blocos Temáticos
7.2.1. Considerações sobre o Desejo de Prática Profissional dos estudantes ao
final do curso
Neste bloco temático estão incluídas as discussões que permearam os grupos focais em
relação ao imaginário de prática profissional, nos diferentes campos de atuação profissional
estudado (medicina, odontologia e psicologia), presentes nas falas dos diferentes atores que
participaram do estudo, docentes e estudantes dos três cursos. Este Bloco Temático abrange
categorias dos seguintes eixos da matriz avaliativa:
II – O processo de trabalho no setor da saúde;
III – Fatores de escolha pelo trabalho nos subsetores público-estatal ou suplementar;
IV – Qualidade do exercício profissional;
V – Atuação concomitante nos subsetores público-estatal e suplementar.
O desejo de prática profissional se constrói, conforme indica o estudo, com os locais e
tipos de vivências que os estudantes têm durante a sua formação, estas experiências não só
exercem influencia neste imaginário de atuação (desejo), como também na própria
“qualidade” da formação, isso tanto no entendimento dos docentes quantos dos estudantes.
Neste sentido, o entendimento do que seja qualidade no trabalho em saúde, tem a ver com
indicativo ético expresso na ênfase a ações que extrapolam objetivos meramente financeiros e
que sejam realizadas em caráter interdisciplinar. A concepção de ‘qualidade do trabalho’
também aparece como relevante na definição dos desejos de prática, dado o interesse
individual no desenvolvimento de práticas que sejam congruentes com os parâmetros de
qualidade estabelecidos para o exercício profissional.
A atuação profissional nos subsetores público-estatal e suplementar, também aparece
relacionada a outras formulações interrogantes1 de imaginário, tanto dos docentes quanto dos
estudantes, tais como: estabilidade financeira/remuneração, autonomia/auto-regulação,
capacidade instalada/recursos e condições de trabalho. Entre os estudantes de psicologia,
particularmente e de maneira distinta das outras categorias profissionais analisadas, foram
destacados aspectos positivos em trabalhar nos dois subsetores, entendendo-os ora como
complementares, ora apontando a convivência desta diversidade como uma possibilidade de
1 Os interrogantes foram definidos na descrição dos diferentes blocos temáticos. Entende-se por interrogante os principais temas que delinearam as discussões referentes a cada eixo da Matriz Avaliativa.
138
questionamento e de crescimento profissional, com ganhos, tanto para o profissiona l, quanto
para a qualidade da atenção nos dois subsetores.
Com referencia a qualidade do exercício profissional, também houve destaques com
relação a qualidade de atendimento, onde o sub-setor público é indicado com maiores
possibilidades de tocas e trabalho em equipe. Por outro lado, a criação da ANS e sua atual
preocupação com a micropolítica do trabalho em saúde, vem trazendo também para o sub-
setor privado, a preocupação com questões relativas ao cuidado qualificado, na perspectiva da
integralidade da atenção, trabalho em equipe e projeto terapêuticos.
A linha de cuidado trabalha com pressupostos da relação entre produtos, clientela e
qualidade da assistência, organizando os recursos e insumos disponibilizados na assistência ao
beneficiário. Figueira Jr. (2006), citando Merhy & Cecílio (2003), afirma que a definição de
um projeto terapêutico de acordo com as ações necessárias ao beneficiário no acesso aos
serviços de apoio diagnóstico e terapêutico, especialidades, atenção hospitalar entre outros,
inicia-se a partir da entrada do usuário, em qualquer nível de complexidade da rede de
serviços de uma operadora.
Cecílio (2001) enfatiza que a integralidade enquanto objetivo de atenção à saúde vai
além do simples “consumo” de determinados serviços e nos reme te ao campo da
“micropolítica” de saúde e suas articulações, fluxos e circuitos, configurando uma
macropolítica que se denomina sistema de saúde. Vislumbra a necessidade de repensarmos
aspectos da organização do processo de trabalho, gestão, planejamento e construção de novos
saberes para que possamos alcançar a integralidade e a equidade. Toma como base a
necessidade das pessoas que buscam “cuidados em saúde” para que os profissionais de saúde
reflitam sobre as suas práticas e façam uma melhor escuta.
O autor destaca também que a integralidade da atenção deve ser trabalhada em várias
dimensões. A primeira delas é conceituada de “integralidade focalizada” (a integralidade
pensada no micro) que se dá no encontro do usuário, profissional/equipe de saúde de forma
singular, em um espaço delimitado. Trata-se do serviço de saúde considerando-se que o
indivíduo traz para este serviço uma “cesta de necessidades” cabendo a equipe e ou
profissional de saúde traduzi- las, decodificá- las para atendê- las da melhor forma possível. A
segunda dimensão conceitua como “integralidade ampliada” (pensada no macro) realizada em
rede de serviços de saúde (intersetorialidade). A integralidade de atenção não se dá em um
único lugar, porque as várias tecnologias em saúde estão distribuídas em uma gama de
serviços, porque para melhoraria das condições de vida dos usuários exige um esforço
intersetorial.
139
Mattos (2001) aborda três grandes conjuntos de sentidos do princípio da integralidade,
o primeiro enfoca atributos da prática dos profissionais de saúde, valores que se pode
considerar uma boa prática independente do âmbito em que ela ocorra, (no público ou no
privado); o segundo relaciona-se aos atributos da organização dos serviços; o terceiro aplica-
se às respostas governamentais aos problemas de saúde.“É possível reconhecer alguns traços
de semelhanças, alguns fios de ligação que articulam esses sentidos. Quer tomemos a
integralidade como princípio orientador das práticas, quer como princípio orientador da
organização do trabalho, quer da organização das políticas, integralidade implica uma recusa
ao reducionismo, uma recusa à objetivação dos sujeitos e talvez uma afirmação da abertura
para o diálogo” (Mattos,2001,p. 61).
140
7.2.2. Considerações sobre a Abordagem do tema da saúde suplementar e de sua
regulação na formação
Neste bloco temático procurou-se identificar e reconhecer de que forma o tema da
saúde suplementar está colocado dentro da formação dos profissionais da saúde,
especificamente na odontologia, e pode-se agrupar aqui, três dos eixos da matriz avaliativas:
I – Formação profissional sobre o sistema de saúde;
IV – Qualidade do exercício profissional;
VI – Regulação no setor da saúde.
O Eixo de formação profissional sobre o sistema de saúde possui uma subcategoria
que aborda o ensino sobre regulação em saúde pelo estado, de um modo geral foi observado a
dificuldade dos estudantes expressarem conhecimento sobre o tema da regulação em saúde
pelo Estado, desconhecimento da existência da Agência Nacional de Saúde Suplementar, bem
como do conceito de saúde suplementar no interior do SUS.
A análise das informações sugere que os cursos de graduação analisados, desenvolvem
um processo formativo que enfatiza o exercício profissional no subsetor público-estatal. Tal
conclusão tem a ver com a indicação dos docentes de que a maioria dos estágios curriculares é
realizada em serviços públicos. Apesar da ênfase na preparação dos alunos para atuação no
subsetor público-estatal, o tema da saúde suplementar também é referido pelos docentes como
um conteúdo que faz parte da formação. Considerando a centralidade da ‘saúde suplementar e
sua regulação’ para a presente pesquisa, muitas das manifestações dos docentes sobre a
experiência de formação e de prática no subsetor público - estatal foram aproveitadas para
fazer emergir nas discussões grupais o tema da saúde suplementar. A intenção foi dar
visibilidade, no trabalho de campo, à forma como este conteúdo é trabalhado no ensino de
graduação. Assim, grande parte dos depoimentos incluídos neste bloco temático é resultado
de uma abordagem que articula e contrapõe reflexões sobre o público e o privado, seja na
formação, na qualidade do exercício da profissão, ou ainda, na regulação do setor saúde,
especificamente do sub-setor suplementar.
Para Mendes-Gonçalves (1979) considerou que os médicos teriam um papel de
manutenção do statu quo diante das transformações substanciais no modo de produção pelas
incorporações tecnológicas, trazidas pelo desenvolvimento capitalista, havendo resistência da
categoria que colocavam em xeque até mesmo a hegemonia do modelo da prática médica
tradicional à qual estavam vinculados, reforçados por um tenso diálogo que: “opunha numa
141
falsa dicotomia saúde pública e medicina,mercado e Estado, público e privado, em que a
afirmação de um pólo significava a necessária derrocada do outro.
A regulação pode ser entendida como a capacidade de intervir nos processos de
prestação de serviços.
“O processo regulatório pode se dar tanto do ponto de vista do acesso
cotidiano das pessoas – microregulação, quanto no aspecto das definições das
políticas mais gerais das instituições – macroregulação e se insere dentro de um
cenário de disputas e de interesses conflitantes” (Figueira Jr.).
Neste sentido, e de acordo com Santos e Mehry (2006), o processo regulatório pode se
dar tanto do ponto de vista do acesso cotidiano das pessoas (a microrregulação), quanto no
aspecto das políticas mais gerais das instituições ou seja a macrorregulação.
No entanto, durante o andamento dos grupos focais houve especial dificuldade por
parte dos estudantes de conseguir falar sobre o tema da regulação do trabalho em saúde e,
principalmente, de saúde suplementar, apontando para a inexistência destas temáticas na
graduação. A matriz avaliativa indica a regulação como processo ético que ocorre entre
paciente/cliente – profissional, ou ainda, pelas associações profissionais e, em alguns casos o
Procon foi indicado pela regulação do setor. De certa forma, fica indicada assim, a falta de
conhecimento sobre o agente regulatório e as próprias implicações da regulação. Esta acaba se
configurando, em grande parte, como uma relação pessoal ou de responsabilidade das
corporações profissionais. Em alguns casos foi citado o Controle Social como responsável
também pela regulação, nos dois sub-setores (público e privado).
Dentre os imaginários presentes sobre regulação é referida a avaliação do processo de
trabalho realizada pelo próprio serviço. Ao referirem-se à avaliação por parte da instituição
como forma de regulação, é configurado como algo que diz respeito ao próprio serviço
regular-se e ditar os parâmetros de como deve acontecer o trabalho da psicologia e, das
demais profissões, naquele serviço em específico.
Nos grupos focais o que foi discutido entre os alunos aos serem questionados sobre os
convênios, auditorias e controle de qualidade do trabalho, há divergências entre os
participantes, mas há, também, o entendimento da necessidade de regulação, embora haja o
reconhecimento de que é muito difícil, pelas especificidades da profissão. Pode-se identificar
nas falas algumas idéias referentes aos agentes da regulação, tais como: interesse público (é
intrínseca ao subsetor público-estatal), corporação profissional, auto-regulação (ética
individual, corporação profissional, atitudes entre pares de profissão), regulação resulta do
142
reconhecimento de quem usa o serviço (o usuário/beneficiário exerce a regulação ao indicar
para outros, retornar ou não).
Há também, opiniões sobre o exercício da regulação, no que se refere ao controle dos
custos da atenção (auditorias "excessivamente limitadoras"), controle da resolutividade da
atenção (ninguém regula o público-estatal) e avaliação de desempenho.
O que foi observado de forma geral foi a dificuldade que os estudantes apresentaram
de expressarem conhecimento sobre o tema da regulação do trabalho em saúde e do
desconhecimento a respeito da organização do processo de trabalho na saúde suplementar,
demonstrando uma inexistência de abordagem destes temas durante a formação.
143
7.2.3. Considerações sobre os Fatores que mantém a ideação liberal-privatista
entre os profissionais
Foram discutidos neste Bloco Temático, os seguintes eixos da Matriz Avaliativa:
I – Formação profissional sobre o sistema de saúde;
II – Processo de trabalho no setor da saúde;
V – Atuação concomitante nos subsetores público-estatal e suplementar;
VI – Regulação no setor da saúde.
Com relação à atuação concomitante nos sub-setores público-estatal e suplementar, foi
destacada a importância da aquisição de conhecimento e experiência profissional. Para alguns
participantes dos grupos focais a atuação nos dois subsetores auxilia a compreensão de
conceitos, alternativas para tratamento e modos de gestão. Houve também destaque,
principalmente por parte dos estudantes, da necessidade de atuação no subsetor público para
aquisição de conhecimentos e experiências, enquanto não há possibilidade de atendimento em
consultório privado. Por outro lado, quando a prática diz respeito a formação, como docência
e pesquisa, muitos estudantes afirmam que no setor público há maior necessidade de acumulo
de conhecimento, titulação e experiência profissional.
Com relação especificamente aos cursos de medicina é possível encontrar discussões
que indicam que, na modalidade cooperativismo a categoria visa garantir sua jornada liberal,
a garantia do controle de captação da clientela e fixação do preço dos seus serviços no
mercado. Isto acontece mesmo que um grupo acumule maior proporção no rateio individual,
pelas características tecnológicas de determinadas especialidades e neste caso torna os
cooperados desiguais perante a própria cooperativa.
O ator social (ou grupo social), dentro de um contexto histórico, busca regular os
serviços de saúde baseado nos interesses da sua representação, direcionando a produção da
saúde para seus macro-objetivos.”Os interesses e as disputas colocados entre os atores sociais
se fazem dentro de um contexto histórico e político. Os atores regulados respondem a esta
regulação de maneiras distintas”.(Santos e Merhy, 2006)
O recorte liberal ou neoliberal coloca de maneira evidente, que tamanho deve ter o
público para que não atrapalhe o privado: o agente público deve atuar perante a ausência do
agente privado. O Estado deve restringir-se a um conjunto de funções específicas, mas
genéricas o suficiente para ficar longe de concorrer com o setor privado.
Nesta abordagem reporta-se também para a qualidade do exercício profissional, na
concepção de exercício da profissão, na busca de uma diversidade de teorias e vertentes
144
contrapondo-se a uma prática única. Enfatiza-se a concepção do exercício profissional como
núcleo profissional dentro da abordagem integral diferentemente de uma abordagem
fragmentária.
Todo o processo educacional, como destaca Ceccim (2005, p. 259), deveria ser capaz
de desenvolver as condições para o trabalho em conjunto dos profissionais de saúde,
valorizando a necessária multiprofissionalidade para a composição de uma atenção que se
desloque do eixo – recortado e reduzido – corporativo-centrado, para o eixo – plural e
complexo – usuário-centrado.
Apesar da consciência sobre a importância do cuidado integral, em oposição à
fragmentação que orienta o modelo médico, não tem sido possível oferecer aos alunos
espaços e experiência de aprendizagem isentos da influencia deste modelo. O contato com a
prática do cuidado psicológico desenvolvido no contexto hospitalar é um exemplo disto.
Por outro lado, segundo Figueira Jr (2006), a criação da ANS, por meio da lei
9.961/00, significou um importante passo na regulação do setor privado ampliando seu papel
de regulação e controle da assistência, com proposições que vão além da discussão
meramente financeira presente nas relações entre agências, operadoras de saúde, prestadores
de serviço, beneficiários, para a formulação e indução dos modelos de atenção em saúde, na
perspectiva da integralidade; sendo este mecanismo de responsabilização por parte da
operadora e dos produtores de serviço, ou seja, a atenção integral à saúde como forma de não
haver interrupção e fragmentação do cuidado, colocando em pauta a discussão do conceito do
modelo assistencial e do desenho da linha de cuidado.
145
8. Bibliografia
ACIOLE, GG A saúde no Brasil: cartografia do público e do privado. São Paulo; Hucitec; Campinas, SP: Sindicato dos Médicos de Campinas e Região, 2006.
AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR. Duas faces da mesma moeda. microrregulação e modelos assistenciais na saúde suplementar. Regulação & saúde, 4. Rio de Janeiro: ANS/Ministério da Saúde, 2005. (Série Normas e Manuais Técnicos)
AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR. Regulação & saúde: estrutura, evolução e perspectivas da assistência médica suplementar. Rio de Janeiro: ANS/Ministério da Saúde, 2002.
AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR. Duas faces da mesma moeda: microrregiões e modelos assistenciais na saúde suplementar. Rio de Janeiro: ANS/Ministério da saúde, 2005. Rever formato desta referência. O autor não é BRASIL?
ANDREAZZI, MF. O Seguro privado no Brasil. Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Escola Nacional de Saúde Pública, 1991. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1991.
BAHIA, L. Planos privados de saúde: luzes e sombras no debate setorial dos anos 90. Ciência & Saúde Coletiva, 6: 329-339, 2001.
BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Difel/Bertrand Brasil S.A. 1992.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Senado, Brasília, DF, 1988.
CAREY, M. A. The group effect in focus group: planning, implementing and interpreting focus group research. In: MORSE, J. M. (Org.). Critical issues in qualitative research methods. London: Sage, 1994.
CARLINI-COTRIN, B. Potencialidades da técnica qualitativa grupo focal em investigações sobre abuso de substâncias. Rev. Saúde Públ., v. 30, n. 3, p.285-93, 1996.
CECCIM RB. Equipe de saúde: a perspectiva entre-disciplinar na produção dos atos terapêuticos. In: Pinheiro R. e Mattos RA (Org.). Cuidado: as fronteiras da integralidade. Rio de Janeiro: Hucitec: ABRASCO 2005. p. 259-278. CECCIM, R. B. e BILIBIO, L. F. Imaginários sobre a perspectiva pública e privada do exercício profissional e a educação da saúde. In CECCIM, R. B., EDUCAÇÃO EM SAÚDE SUPLEMENTAR: a saúde suplementar no âmbito do ensino e da formação para o Sistema Único de Saúde. Rio de Janeiro/Porto Alegre: Agência Nacional de Saúde Suplementar/Editora UFRGS, 2007. (NO PRELO). CECÍLIO, L. C. O. As necessidades de saúde como conceito estruturante na luta pela integralidade e equidade na atenção em saúde. In: Pinheiro R. e Mattos RA (Org.). Os sentidos da integralidade: na atenção e no cuidado à saúde. Rio de Janeiro: UERJ, IMS: ABRASCO, 2001. p.113-126
CONILL, E. Avaliação da integralidade: conferindo sentido para os pactos na programação de metas dos sistemas municipais de saúde. Cadernos de Saúde Pública, 20:1417-1423, 2004.
146
CONILL, E. Origem, situação atual e tendências do seguro saúde privado no Brasil: relatório de pesquisa. Rio de Janeiro: Escola de Serviço Social/UFRJ,1992.
DALLÁGNOL, CM; TRENCH, MH. Grupos focais como estratégia metodológica em pesquisa na enfermagem. Rev. Ga, v.20, n.1, p.5-25, 1999.
DELEUZE, G. Dúvidas sobre o imaginário. In: DELEUZE, Gilles. Conversações, 1927-1990. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992, p. 80-87.
DURAND, G. As estruturas antropológicas do imaginário: introdução à arquetipologia geral. São Paulo: Martins Fontes, 1997. 551p.
FAVERET, P; OLIVEIRA, PJ. A universalização excludente: reflexões sobre as tendências do sistema de saúde. Planejamento e políticas públicas, 3: 139-62, 1990.
FIGUEIRA JR., N. O psicólogo e a saúde suplementar. Relatório da oficina “Atuação do Psicólogo na Saúde Suplementar. CRP/06 – 29/11/06. Disponível em: http://www. crpsp.org.br/a_comis/saude_suplementar/saude_suplementar.htm . Acesso em: 06 de maio 2007.
FLEURY, S. Estado sem cidadãos: seguridade social na América Latina. Rio de Janeiro: Fiocruz, Rio de Janeiro, 1994.
GONDIM, S. M. G. Perfil Profissional e Mercado de Trabalho: Relação com Formação Acadêmica pela Perspectiva de Estudantes Universitários. Estudos de Psicologia, Natal, v.7, n.2, p.299-309, 2002.
KITZINGER, J.; BARBOUR, R. S. Introduction: the challenge and promise of focus groups. In: BARBOUR, R. S.; KITZINGER, J. Developing focus group research: politics, theory and practice. London: Sage, 1999.
LEITE, D. Reformas Universitárias: avaliação institucional participativa. Petrópolis, RJ, Vozes, 2005.
MALTA, D. C.; JORGE, A. O.; FRANCO, T. B. e COSTA, M. A. Modelos assistenciais na saúde suplementar a partir da produção do cuidado. In: BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Saúde Suplementar. Duas faces da mesma moeda: microrregulação e modelos assistenciais na saúde suplementar. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde, 2005, p. 143-160.
MATTOS, R. A. os sentidos da integralidade: algumas reflexões acerca de valores que merecem ser defendidos. In: Pinheiro R. e Mattos RA (Org.). Os sentidos da integralidade: na atenção e no cuidado à saúde. Rio de Janeiro: UERJ, IMS: ABRASCO, 2001. p.39-64.
MERHY, E. E.; e CECCÍLIO, L. C. O. A integralidade do cuidado como eixo da gestão hospitalar. In: Pinheiro R. e Mattos RA (Org.). Construção da integralidade: cotidiano, saberes e práticas em saúde. Rio de Janeiro: UERJ, IMS: ABRASCO, 2003. P.199-212
MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 8. ed. São Paulo- Rio de Janeiro: HUCITEC-ABRASCO, 2004
MINAYO, M. C. S. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 18 ed. Petrópolis: Vozes, 2001.
147
OLIVEIRA, MC. Os modelos de cuidados como eixo de estruturação de atividades interdisciplinares e multiprofissionais em saúde. Revista da ABEM (Rio de Janeiro), 2005.
POLIT, D. F.; BECK, C. T.; HUNGLER, B. P. Fundamentos da pesquisa em enfermagem – métodos, avaliação e utilização. 5.ed. Porto Alegre: Artmed, 2004.
SANTOS, S. R. Métodos qualitativos e quantitativos na pesquisa biomédica. Jornal de Pediatria, v. 75, n. 6, p.401-406, ago., 1995.
VILAÇA-MENDES, E. et al. Distrito Sanitário: o processo social de mudança das práticas sanitárias do Sistema Único de Saúde. São Paulo: Hucitec; Rio de Janeiro: Abrasco, 1993.
148
Anexos
149
Anexo 1 Questionário para Docentes Dados de identificação: Idade: _________ Sexo: ( ) M ( ) F Departamento (por extenso): ____________________________________________________________________ Quando se aplicar, a resposta pode ser de escolha múltipla, se necessário utilize o verso. 1) Há quanto tempo você atua como docente nesta instituição? _____________________________________ Em que curso(s)?______________________________________________________________________________ Qual(is) disciplina(s) ou área(s)? _________________________________________________________________ 2) Além da sua atividade como professor nesta instituição em que outros locais você trabalha? ( ) Clínica Privada ( ) Consultório Particular ( ) Serviço Público, qual função: _________________________________________________________________ ( ) Hospital, qual função: _______________________________________________________________________ ( ) Outro. Especifique: _________________________________________________________________________ 3) Se você respondeu Consultório Particular, como é feita, na prática, a captação ou fidelização da clientela: ( ) Planos e seguros privados de saúde ( ) Desembolso direto ( ) Atendimentos gratuitos ( ) Isenção para colegas ( ) Não há clientela regular 4) Especifique a sua carga horária de trabalho nesta instituição de ensino: ( ) 20 horas ( ) 30 horas ( ) 40 horas ( ) Dedicação Exclusiva ( ) Outros: ________ 5) A sua atividade rotineira como docente envolve que tipo de atuação? ( ) Atividade em sala de aula ( ) Atividade prática (de campo) ( ) Pesquisa ( ) Extensão ( ) Atividade Administrativa ( ) Outra. Especifique: _________________________________________________________________________ 6) No desenvolvimento da(s) disciplina(s) em que você exerce a docência, você trata de questões referentes à atuação profissional no setor privado? ( ) Sim ( ) Não 7) Que conteúdo(s) você aborda nesta(s) disciplina(s)?
150
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 8) Sobre o Setor Privado qual(is) cenário (s) você aborda? ( ) Setor privado contratado/conveniado com o SUS ( ) Planos e seguros privados ( ) Desembolso direto ( ) Não tenho clareza sobre o tipo de cenário ( ) Não abordo 9) Você atua em algum desses cenários, além da docência? ( ) Sim ( ) Não 10) Em caso afirmativo, qual (is) cenário(s)? ( ) Setor privado contratado/conveniado com o SUS ( ) Planos e seguros privados ( ) Desembolso direto ( ) Não tenho clareza sobre o tipo de cenário 11) Em que contexto você desenvolve uma reflexão sobre o conteúdo do trabalho nesses cenários com os seus alunos? ( ) Em sala de aula ( ) Atividade prática (de campo) ( ) Em atividades de Extensão ( ) Em atividades de Pesquisa ( ) Como relato de experiência; estudo de caso ( ) Outro. Especifique: _________________________________________________________________________ ( ) Não abordo 12) Atualmente você considera desejável estar vinculado profissionalmente a planos e seguros privados de saúde? ( ) Sim ( ) Não Por que? ___________________________________________________________________________________ 13) Comente algum aspecto que você considera relevante sobre a questão da regulação de planos e seguros privados de saúde (controle, fiscalização e acompanhamento): ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 14) Considerando seus conhecimentos sobre planos e seguros privados de saúde, que instâncias você entende como responsáveis pela regulação (controle, fiscalização e acompanhamento) deste setor? ( ) A população ( ) Os beneficiários dos planos e seguros ( ) O Mercado ( ) Os profissionais ( ) O Sistema Único de Saúde e suas Agências Reguladoras ( ) Procuradoria de Defesa do Consumidor (PROCON) ( ) Outro. Qual: _______________________________________________________________________________
151
15) No caso da saúde suplementar, que conteúdos você considera relevantes no ensino de graduação na sua área? ( ) Aspectos Legais ( ) Aspectos financeiros ( ) Funcionamento dos planos e seguros ( ) Relação entre o SUS e seguradoras e operadoras de planos privados ( ) Vantagens e desvantagens da vinculação dos profissionais a planos e seguros de saúde ( ) Regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde ( ) Outros. Especifique: ________________________________________________________________________ 16) Em sua experiência profissional, qual análise crítica você desenvolve sobre os seguintes aspectos do setor privado de saúde? a) O exercício profissional nos planos e seguros de saúde _____________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ b) O percurso dos usuários entre serviços públicos e privados __________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ c) Acesso à atenção de saúde ___________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ d) Garantia de integralidade na atenção à saúde _____________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ c) Humanização do cuidado _____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ f) Resolutividade ______________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 17) Como você conceitua a Saúde Suplementar?
__________________________________________________________________________________________
152
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
153
Anexo 2 Questionário para Estudantes Dados de identificação: Idade: _________ Sexo: ( ) M ( ) F Quando se aplicar, a resposta pode ser de escolha múltipla, se necessário utilize o verso. 1) Tendo em conta o mercado de trabalho, você considera que poderá trabalhar onde? ( ) Iniciativa privada ( ) Serviço público Em que serviço (s) ____________________________________________________________________________ Se for nos dois lugares, como você pretende viabilizar esta articulação? _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 2) Neste momento, ao término do curso, você deseja desenvolver sua atividade profissional onde? ( ) Iniciativa privada ( ) Serviço público Em que serviço (s) ____________________________________________________________________________ Caso seja nos dois lugares, como você deseja articular estas duas práticas? ______________________________ ___________________________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________________________ 3) Ao ingressar neste curso, você imaginava trabalhar onde? ( ) Iniciativa privada ( ) Serviço público Em que serviço (s) ____________________________________________________________________________ Caso fosse nos dois lugares, como você imaginava articular estas duas práticas? __________________________ ___________________________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________________________ 4) Que tipo de atividade profissional você pretende desenvolver? ( ) Docência ( ) Pesquisa ( ) Clínica ( ) Gestão ( ) Outra. Especifique: ________________________________________________________________________ 5) Considerando a imagem que você faz da sua carreira, como você sonha o seu exercício profissional? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
154
______________________________________________________________________________________________ 6) Durante o seu curso, você teve contato com algum profissional da sua área que você classifica como bem sucedido profissionalmente? ( ) Sim ( ) Não Em caso afirmativo, qual o seu perfil? O que mais chamou sua atenção? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 7) Em qual(is) campo(s) de prática este profissional atua ou atuava? ( ) Clínica Privada ( ) Consultório particular ( ) Plano de Saúde e/ou Seguro Saúde ( ) Serviço Público, qual função?_________________________________________________________________ ( ) Hospital, qual função?_______________________________________________________________________ ( ) Instituição de Ensino, qual? __________________________________________________________________ ( ) Outro. Especifique: _________________________________________________________________________ ( ) Não sei onde mais ele trabalha/trabalhava 8) Você identifica entre seus professores alguém com este perfil? ( ) Todos ( ) A maioria ( ) A média ( ) Raros ( ) Nenhum 9) Em algum momento do seu curso foram abordados os temas: planos de saúde , seguros ou empresas privadas de saúde? ( ) Sim ( ) Não 10) Em que espaço estes temas foram abordados? ( ) Como conteúdo disciplinar ( ) Em atividade de extensão ( ) Seminário ( ) Outros. Especifique: ________________________________________________________________________ 11) Que conteúdos referentes a estes temas, foram abordados nestes espaços? ( ) Aspectos legais ( ) Aspectos financeiros ( ) Funcionamento dos planos e seguros privados de saúde ( ) Relação entre SUS e seguradoras ou operadoras dos planos privados de saúde ( ) Vantagens e desvantagens da vinculação profissional aos planos e seguros de saúde ( ) Regulação e controle dos planos e seguros privados de saúde ( ) Outros. Especifique: _______________________________________________________________________
155
12) Atualmente, você considera desejável atuar vinculado profissionalmente aos planos e seguros privados de saúde? ( ) Sim ( ) Não Por quê?____________________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________________________ 13) O que você sabe sobre a Regulação (controle, fiscalização e acompanhamento) dos planos e seguros privados de saúde? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 14)Considerando seus conhecimentos sobre planos e seguros privados de saúde, que instâncias você entende como responsáveis pela regulação (controle, fiscalização e acompanhamento) deste setor? ( ) A população ( ) Os beneficiários dos planos e seguros ( ) O Mercado ( ) Os profissionais ( ) O Sistema Único de Saúde e suas Agências Reguladoras ( ) Procuradoria de Defesa do Consumidor (PROCON) ( ) Outro. Qual: ______________________________________________________________________________ 15) O que você entende por saúde suplementar? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 16) Como você caracteriza a autonomia da sua profissão? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 17) Como se constrói um plano de cuidados, tratamento ou intervenção terapêutica que atenda cada usuário em suas diversidades, necessidades, singularidades e prioridades? Isso é possível? Como? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 18) Como você detalha a importância da interação profissional-usuário nos resultados de um tratamento? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
156
19) Quando ou em que circunstâncias (gerais ou específicas) as tecnologias por equipamento ou os testes de avaliação são mais importantes que a interação profissional-usuário? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
157
Anexo 3
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO: Conhecimento Regional e
Produção de Informação Tecnocientífica em Saúde Suplementar para a Região Sul / Brasil
Apresentação
Esta pesquisa tem como objetivo delinear, no âmbito dos cursos de graduação de psicologia, medicina
e odontologia, qual(is) o(s) imaginário(s) presente(s) na prática de ensino-aprendizagem em relação à
atuação profissional, à saúde suplementar e à sua regulação. Dentro deste contexto, a pesquisa
pretende identificar quais os desejos de prática profissional dos estudantes ao final da graduação;
reconhecer os cenários de exercício profissional dos docentes além do acadêmico; reconhecer de que
forma o tema da Saúde Suplementar é abordado no ensino para o exercício profissional, bem como
identificar qual o conhecimento sobre Saúde Suplementar e sua regulação vigente neste contexto e
compreender os possíveis fatores que mantêm uma ideação de trabalho liberal e vínculo privado em
alunos concluintes dos cursos de psicologia, medicina e odontologia.
Declaração
Eu, ....................................................................................., fui informado dos objetivos da pesquisa de
forma clara e detalhada. Recebi informações a respeito dos instrumentos de pesquisa a serem
utilizados e esclareci dúvidas referentes à pesquisa, livre de qualquer forma de constrangimento ou
coerção. Estou ciente de que poderei solicitar novas informações e modificar minha decisão se assim o
desejar. O/A pesquisador/a certificou-me de que o objetivo desta pesquisa é contribuir para a melhoria
dos processos de educação na saúde, qualificando as discussões sobre as interfaces e articulações do
Sistema Único de Saúde entre os subsetores estatal (poder público) e suplementar (iniciativa privada),
e que os dados da pesquisa não serão utilizados para a avaliação de desempenho dos profissionais em
formação ou de seus docentes, ficando assegurado que meus dados pessoais não serão divulgados,
evitando minha identificação. O uso do gravador será utilizado com a minha permissão.
Observação
Este questionário é a primeira etapa de uma pesquisa, cuja segunda etapa consta da realização de dois
encontros em grupos focais com duração aproximada de 2 horas, onde serão debatidas com maior
profundidade as questões aqui expostas.
Sendo assim, você tem interesse de participar deste grupo focal? ( ) SIM ( ) NÃO. Você é:
( ) DOCENTE ( ) ESTUDANTE / Carreira: ( ) PSICOLOGIA ( ) ODONTOLOGIA ( )
MEDICINA
Em caso afirmativo, qual sua indicação para futuro contato?
a) Telefones: _________________________________________________________________
b) E-mails: ___________________________________________________________________
158
Ricardo Burg Ceccim 28/11/2006
Nome do pesquisador Assinatura Data
Nome do entrevistado Assinatura Data