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2013

COEDIÇÃO

EDITORA

Adriano Canabarro TeixeiraAna Maria de Oliveira PereiraMarco Antônio Sandini Trentin

(Org.)

tecnologias e metodologias

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Copyright © Editora Universitária

Cinara Sabadin DagnezeSabino GallonRevisão de Texto e Revisão de Emendas

Sirlete Regina da SilvaProjeto Gráfi co, Diagramação e Produção da Capa

Este livro no todo ou em parte, conforme determinação legal, não pode ser reproduzi-do por qualquer meio sem autorização expressa e por escrito do autor ou da editora. A exatidão das informações e dos conceitos e opiniões emitidos, as imagens, tabelas, quadros e fi guras são de exclusiva responsabilidade dos autores.

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Sumário

7 Apresentação21 O ciberespaço: novos caminhos e aprendizagens na geração homo zappiens

Joseane Amaral40 Viagem ao ciberespaço: a virtualização do conhecimento na educação a distância

Patrícia Grasel SilveiraMarie Jane Soares Carvalho

PARTE 1TECNOLOGIAS DE INCLUSÃO DIGITAL

59 A produção do habitus na sociedade do conhecimento: incorporação tecnológica e formação de professoras na modalidade EaD

Renato Avellar de AlbuquerqueMarie Jane Soares Carvalho

78 Trajetórias de letramento: do caderno para a webNádie Christina Ferreira MachadoMarie Jane Soares Carvalho

112 Blogs: práticas de escrita instantânea e interativa na sociedade da aprendizagem

Talita Maria da Silva Tania M. K. Rösing

138 Um laptop por criança e as práticas de leitura e escrita: perspectivas para a inclusão digital

Silvia KistMarie Jane Soares Carvalho

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170 Projeto Guri: software de autoria colaborativa de materiais educacionais hipermídia para a tv digital

Vitor MalaggiHenrique Becker

PARTE 2METODOLOGIAS E INCLUSÃO DIGITAL

189 Arquiteturas pedagógicas nas práticas das alunas do pead: ensaio, relato e considerações

Daiane GrassiMarie Jane Soares de Carvalho

204 Aspectos sociais da experiência do mutirão pela inclusão digital: resgatando cinco anos de atividade

Tamiris Tomasi MalacarneCristina FiorezeAdriano Canabarro TeixeiraEliana Cristina DalagasperinaMarco Antônio Sandini Trentin

222 Proposta de metodologia para ofi cinas de informática e cidadania do Mutirão pela Inclusão Digital

Adriano Canabarro TeixeiraLaís MezzomoAdriana Demarqui RossatoEdemilson Jorge Ramos BrandãoMarco Antônio Sandini Trentin

242 Inclusão digital como base metodológica na formação de professores: um estudo de caso

Karina Marcon Adriano Canabarro Teixeira

256 Uma experiência metodológica para a utilização da informática educativa nas aulas de geografi a

Ana Maria de O. Pereira Adriano Canabarro Teixeira

274 Sobre os autores

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Apresentação

ma das questões que têm se destacado no âmbito do desenvolvimento social e econômico de países e de instituições de ensino e pesquisa que acreditam que o acesso universal ao conhecimento é elemento

determinante e estratégico de crescimento refere-se à ne-cessidade de se possibilitar o acesso às tecnologias digitais de forma ampla e irrestrita.

Possibilitar o acesso é fundamental para que cada cidadão(ã) possa, de fato, fazer parte dos processos decisó-rios do mundo contemporâneo, ao tempo que goze de possi-bilidades de acesso a bens culturais que potencializam seu desenvolvimento enquanto ser humano integral. Tamanha importância levou a Organização das Nações Unidas a pro-clamar, em relatório sobre promoção e proteção do direito à liberdade de opinião e expressão,1 que o acesso à internet é um direito universal do cidadão no ano de 2011.

Na Universidade de Passo Fundo, as discussões em torno da inclusão digital são realizadas desde 2002, quan-do uma primeira experiência foi desenvolvida com meninos em situação de vulnerabilidade social de uma instituição educacional da cidade de Passo Fundo. Sua intenção era, a partir da observação da navegação desses jovens na inter-net, identificar pontos de emancipação social, de reconhe-cimento de novas possibilidades para suas vidas e do po-der da web em propiciar tais situações. Vale destacar que a

1 Este relatório pode ser acessado em http://www2.ohchr.org/english/bodies/hrcouncil/docs/17session/A.HRC.17.27_en.pdf.

U

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internet foi disponibilizada amplamente nas dependências da Universidade de Passo Fundo por volta de 2005, o que aponta para o fato de que, para as instituições de ensino fundamental e médio, tratava-se de uma realidade distante e, até então, sem importância. Esta pesquisa deu origem ao livro Internet e democratização do conhecimento: repensan-do o processo de exclusão social (Teixeira, 2002).

Os resultados desta pesquisa e a identificação de uma área de ação emergente e urgente para a comunidade do entorno da Universidade de Passo Fundo fomentou a cria-ção do projeto de extensão “Mutirão pela inclusão digital” em 2004, cujo objetivo é implementar ações de inclusão digital com vistas à apropriação das tecnologias de rede por parte dos grupos de usuários da política de assistência social numa perspectiva de ambiente comunicacional e de exercício da cidadania.

Já naquele ano foi possível identificar a clara inter-dependência existente entre inclusão digital e processos educativos. Tal relação se estabelece em diversas perspec-tivas e complexidades, seja pelo fato de que a maioria da população brasileira tem seu primeiro acesso, geralmente não o mais significativo, a tais tecnologias nos ambientes escolares, seja pelo reconhecimento de que a apropriação desses aparatos tecnológicos pode contribuir significativa e decisivamente para processos de construção do conheci-mento. Assim, dissociar inclusão digital de processos edu-cativos formais ou não representava uma incoerência com a própria essência universitária. Dessa articulação nasceu o livro Tecendo caminhos em informática educativa (Teixei-ra; Brandão, 2006), cujo objetivo era explorar as diferentes possibilidades de utilização das tecnologias na escola.

No decorrer dos anos, ao tempo em que as ações do Mu-tirão pela Inclusão Digital contribuíam sobremaneira para

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Inclusão digital: tecnologias e metodologias

consolidar o caráter comunitário da UPF, observou-se que as oficinas de informática e cidadania se constituíam gra-dualmente em espaços ricos de observação, de experimen-tação e de construção de conhecimento em torno de vários elementos da inclusão digital. Tal demanda ficava clara na observação dos processos que ocorriam dentro dos labora-tórios de informática, na interdisciplinaridade criada em torno da temática, na crescente demanda que chegava ao grupo e nas parcerias estabelecidas com outras instituições de ensino e com o poder público.

Com vistas a registrar esse gradual direcionamento à pesquisa, em 2009 foi lançado o terceiro livro da coletânea – extraoficial – de inclusão digital, intitulado Inclusão digi-tal: experiências, desafios e perspectivas (Teixeira, Marcon, 2009). Seu objetivo foi reunir parte do conhecimento cien-tífico construído no serviço prestado à sociedade através do projeto Mutirão pela Inclusão Digital que, em 2009, com-pletava cinco anos de atendimento à comunidade. A coletâ-nea reuniu artigos científicos que, ao relatar a trajetória do projeto e seus desdobramentos, apresentava o conhecimen-to construído dentro das oficinas de informática e cidada-nia e da interação com seus usuários.

Durante essa trajetória, foi inevitável que, natural-mente, se consolidasse uma nova área de pesquisa dentro da Universidade de Passo Fundo: a inclusão digital. A pró-pria consolidação das produções de 2004, 2006 e 2009 era evidência de que existia uma demanda científica clara a ser explorada, bem como um contexto institucional e organiza-cional favorável à criação de um grupo de pesquisadores de diversas áreas e instituições com interesse especial para as questões que envolvem temas concernentes à inclusão digital.

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Assim, em 2004 criava-se o Grupo de Estudo e Pes-quisa em Inclusão Digital (Gepid)2 que, em 2012 conta com 53 pesquisadores de diferentes níveis, áreas e instituições. O objetivo do Gepid consiste em desenvolver estudos e pes-quisas acerca da necessária ampliação teórico-conceitual do termo “inclusão digital” na sociedade contemporânea, concebida como um problema típico das sociedades tecnoló-gicas contemporâneas, complexas e plurais, dos diferentes fenômenos socioeducacionais da cibercultura e das metodo-logias e tecnologias emergentes na área. Toma a informá-tica como uma das formas contemporâneas de linguagem, investigando o significado da formação pedagógica e do tra-balho pedagógico no contexto da inclusão digital e, em sen-tido mais amplo, da informática educativa. Dentro de suas premissas metodológicas, busca estabelecer relações com projetos de extensão que podem, numa dinâmica de retro-alimentação prático-teórica, constituir-se em oportunidade de aplicação de novos conhecimentos, de coleta de dados e de exploração de demandas científicas. A partir disso, ao tempo em que desenvolve ações junto à comunidade, faz desses espaços campo de pesquisa a partir do estabeleci-mento de redes de colaboração e autoria que sirvam de base para a ampliação e o aprofundamento do conhecimento na área específica.

O grupo de pesquisa se organiza a partir de duas li-nhas de pesquisa: “Tecnologias e metodologias de inclusão digital”, espaço de origem desta obra e também da temática geral dos seminários nacionais de inclusão digital, e “Estu-dos da cibercultura”, ponto de partida para uma próxima publicação. A linha de pesquisa tecnologias e metodologias de inclusão digital, origem desta obra, tem por objetivo es-tudar e pesquisar as tecnologias, metodologias e ações de

2 O acesso ao site do Gepid se dá através do endereço http://gepid.upf.br

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Inclusão digital: tecnologias e metodologias

inclusão digital que tenham por base as questões estuda-das e pesquisadas na linha de pesquisa estudos da ciber-cultura e para a linha processos educativos e linguagem do mestrado e doutorado em educação UPF.

Durante essa trajetória de imbricamento de ensino, pesquisa e extensão em torno da área de inclusão digital, foi inevitável que se construísse um conceito claro acerca do que significa inclusão digital, não somente dentro da Universidade de Passo Fundo, mas, principalmente, numa sociedade profundamente transformada pela presença das tecnologias digitais. Tal construção tem suas bases teó-ricas na obra Inclusão digital: novas perspectivas para a informática educativa, que, além de consolidar o vínculo entre educação e inclusão digital, propõe o “alargamento do conceito de inclusão digital para uma dimensão reticu-lar, caracterizando-a como um processo horizontal que deve ocorrer a partir do interior dos grupos com vistas ao desen-volvimento de cultura de rede, numa perspectiva que con-sidere processos de interação, de construção de identidade, de ampliação da cultura e de valorização da diversidade para, a partir de uma postura de criação de conteúdos pró-prios e de exercício da cidadania, possibilitar a quebra do ciclo de produção, consumo e dependência tecnocultural” (Teixeira, 2009, p. 40).

Passados dez anos da primeira publicação, contem-plando a temática da inclusão digital e em razão da conso-lidação do Grupo de Estudo e Pesquisa em Inclusão Digital como uma das referências nacionais na área, apresentamos esta obra que, para dar voz aos diferentes pesquisadores de diferentes áreas e instituições que se envolveram na pro-dução do conhecimento, somente poderia ser organizada na forma de coletânea, para que não se perdesse o direcio-namento teórico-prático do grupo, tampouco a riqueza de

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detalhes que cada contribuição textual presente nesta obra nos traz.

O presente livro, intitulado Inclusão digital: tecnolo-gias e metodologias, ao tempo em que apresenta como a quinta produção nascida da atuação da UPF na área de inclusão digital, reúne uma parte das produções científi-cas envolvendo pesquisadores do Gepid em torno da linha de pesquisa tecnologias e metodologias de inclusão digi-tal. Para tanto, a obra se organiza em dois grandes blocos. O primeiro se debruça sobre diferentes tecnologias que podem potencializar processos de inclusão digital signifi-cativos, criativos e inovadores. A segunda parte, por sua vez, quer tratar de um ponto estratégico para processos de inclusão digital: metodologias de ensino que contemplem a flexibilidade e o potencial articulador e comunicacional das tecnologias digitais.

Como textos introdutórios à obra, os artigos “O ciberes-paço: novos caminhos e aprendizagens na geração homo za-ppiens” e “Viagem ao ciberespaço: a virtualiação do conhe-cimento na educação a distância” buscam contextualizar o ciberespaço como espaço de virtualização das aprendiza-gens, de novas articulações interpessoais e de potencializa-ção de processos educativos, bem como o perfil desse novo agente de mudança, denominado homo zappiens.

Abrindo a primeira parte do livro, destinada à apre-sentação de experiências e pesquisas, versando sobre tec-nologias de inclusão digital, o primeiro artigo, intitulado “A produção do habitus na sociedade do conhecimento: incor-poração tecnológica e formação de professoras na modalida-de EAD”, trata dos desdobramentos advindos da incorpora-ção dessas tecnologias no repertório docente de professores que, no caso específico, estão em processos de formação. A

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Inclusão digital: tecnologias e metodologias

proposta apresentada pelos autores pretende avaliar o du-plo aspecto do contexto histórico atual, representado pelo avanço das TICs na sociedade e seu reflexo na educação, o processo de incorporação das tecnologias na formação do ha-bitus pelos professores por meio de uma trajetória de forma-ção universitária, observando as características e os limites que esse processo de transformação encontra ao se chocar com as estruturas sociais concretas e mentais.

Evidentemente, a presença de tecnologias no fazer do-cente não é um fenômeno somente da contemporaneidade, mas é certo de que cada momento histórico, com seu de-senvolvimento tecnológico, traz diferentes desdobramentos ao processo educacional. Tal reflexão é realizada no texto “Trajetórias de letramento: do caderno para a web” a partir de um resgate acerca das diferentes exigências que a orali-dade, a escrita e a tecnologia impõe à educação.

O artigo “Blogs: práticas de escrita instantânea e in-terativa na sociedade da aprendizagem”, por sua vez, foca na utilização de blogs como espaço legítimo de autoria e de consolidação de existência humana. O artigo desenvolve a ideia de que o surgimento dos blogs e a grande adesão do público a esses espaços é resultado de intensas revoluções ocorridas no final do século XX, no âmbito da cultura letra-da e da própria sociedade. O advento das novas tecnologias, em especial no que se refere à informática e ao surgimento da internet transformou textos, suportes e leitores de uma forma inédita na história da humanidade.

É claro que as tecnologias de inclusão digital que têm transformado o acesso dos indivíduos ao conhecimento não se consolidam somente a partir de softwares, uma vez que são inúmeras as políticas públicas que se ocupam de dispo-nibilizar aparatos tecnológicos de hardware para inclusão.

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Dentre essas, destaca-se o Programa um Computador por Aluno3 do governo federal que tem por finalidade promover a inclusão digital por meio da disponibilização de um lap-top educacional para cada estudante do ensino fundamen-tal brasileiro.

Sobre o tema, o artigo “Um laptop por criança e as prá-ticas de leitura e escrita: perspectivas para a inclusão di-gital” propõe a reflexão sobre como a introdução do laptop na modalidade 1:1 muda a dinâmica da sala de aula e as práticas das crianças em relação à leitura e escrita e ao uso da tecnologia, trazendo novas perspectivas para a inclusão digital dos sujeitos envolvidos.

Na mesma linha de tecnologias emergentes para inclu-são digital, aponta-se que a opção brasileira pela TV digi-tal, segundo texto do decreto nº 4.901, de 26 de novembro de 2003, que a institui, tem por objetivo promover a inclu-são social, a diversidade cultural do país e a língua pátria por meio do acesso à tecnologia digital, visando à democra-tização da informação. Tratado da temática e encerrando a seção destinada a discutir as Tecnologias de Inclusão Digi-tal, o texto “Projeto guri: software de autoria colaborativa de materiais educacionais hipermídia para a TV digital” traz o relato do desenvolvimento de um software de autoria colaborativa de materiais educativos hipermídia voltados para a TV digital, denominado guri. Por intermédio desse software, pretende-se possibilitar aos sujeitos envolvidos no processo educativo um ambiente digital que potencialize o desenvolvimento de atividades didático-pedagógicas que considerem a coparticipação no ato de conhecimento como elemento fundamental do ensino-aprendizagem.

3 O acesso ao site do Prouca se dá pelo endereço http://www.uca.gov.br/insti-tucional/

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Inclusão digital: tecnologias e metodologias

Entretanto, o conceito de inclusão digital construído e adotado pelo Gepid compreende a insuficiência da concep-ção de inclusão enquanto acesso a tecnologias e reconhece que tão importante quanto o acesso é pensar novas formas de apropriação de tais recursos em processos educativos e de exercício da cidadania, elementos já discutidos nos dois primeiros textos desta obra.

Abrindo a segunda parte, destinada a introduzir e teo-rizar acerca de metodologias de inclusão digital, o artigo “Arquiteturas pedagógicas nas práticas das alunas do Pead: ensaio, relato e considerações” traz o relato de uma expe-riência realizada com as alunas do primeiro curso de Peda-gogia a distância da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Pead) organizado a partir de arquiteturas pedagógi-cas. Seu objetivo é evidenciar como a vivência em um curso embasado no conceito de arquiteturas pedagógicas abertas e flexíveis pode oportunizar uma ressignificação da prática e na prática de uma aluna-professora do Pead.

Na mesma linha de processos metodológicos, dessa vez voltados ao público em idade escolar, o artigo “Aspectos so-ciais da experiência do Mutirão pela Inclusão Digital: res-gatando 5 anos de atividade” discute a exclusão digital en-quanto expressão da questão social, valendo-se de reflexões teóricas e pesquisa empírica acerca das diferentes formas, a partir das quais o método utilizado nas oficinas de infor-mática e cidadania do projeto Mutirão pela Inclusão Digital trouxeram diferentes perspectivas aos usuários do serviço. Entretanto, no decorrer das atividades do projeto e a par-tir dos dados coletados durante esta pesquisa, detectou-se a necessidade de se criar uma metodologia específica para iniciativas de inclusão digital. Tal processo e proposta são apresentados no artigo “Proposta de metodologia para ofi-

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cinas de informática e cidadania do Mutirão pela Inclusão Digital”.

Buscando ampliar as implicações de metodologias de formação, desta vez para professores já formados, o artigo “Inclusão digital como base metodológica na formação de professores, um estudo de caso” busca conhecer os desdo-bramentos do processo de formação de professores da rede municipal de ensino de Passo Fundo realizada por pes-quisadores da UPF, buscando contribuir diretamente com as discussões referentes à formação de recursos humanos para a informática na educação, tema sempre recorrente nesses mais de vinte anos de informática educativa e, em função da popularização dessas tecnologias nas escolas e do dinamismo com que tais aparatos se desenvolvem, deveria figurar como uma das prioridades nessa estratégica área para a educação brasileira.

Por fim, buscando trazer uma alternativa metodológi-ca para processos educativos, desta vez para processos for-mais de educação, o artigo “Uma experiência metodológica para a utilização da informática educativa nas aulas de geografia” apresenta os resultados da aplicação do método Imagem Watching de Robert Ott em uma turma de alunos de séries finais do ensino fundamental.

Assim, este livro, escrito de forma colaborativa em di-ferentes momentos e espaços, como é próprio de uma di-nâmica de inclusão digital, representa muito mais do que um apanhado de artigos científicos, mas o registro de um complexo, desafiador e profícuo esforço interdisciplinar e interinstitucional de pesquisa. Somos alunos, professores, colaboradores, graduados, especialistas, mestres e douto-res com as mais diversas experiências, com formações dis-tintas, mas que se complementam, ao se sensibilizar pelas questões da inclusão e que, especialmente, identificam, a

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Inclusão digital: tecnologias e metodologias

partir da leitura do mundo, que a inclusão digital em pouco tempo se consolidará como elemento fundamental de inclu-são social.

Desejamos que este livro não seja somente uma arti-culação de temáticas acerca de dez anos de pesquisa e ações envolvendo tecnologias e metodologias de inclusão digital, mas, especialmente, um convite para o estabelecimento de parcerias de trabalho em prol de uma inclusão digital sig-nificativa, inovadora, criativa e efetiva.

Boa leitura!

ReferênciasTEIXEIRA, Adriano Canabarro. Internet e democratização do co-nhecimento: repensando o processo de exclusão social. Passo Fundo: UPF Editora, 2002. 142 p.

TEIXEIRA, Adriano Canabarro (Org.); BRANDÃO, Edemilson Jorge Ramos (Org.). Tecendo caminhos em informática educativa. Passo Fundo: Editora UPF, 2006. v. 1. 223 p.

TEIXEIRA, Adriano Canabarro; MARCON, Karina (Org.). Inclusão digital: experiências, desafios e perspectivas. Passo Fundo - RS: Edi-tora UPF, 2009. v. 1. 278 p.

TEIXEIRA, Adriano Canabarro. Inclusão digital: novas perspectivas para informática educativa. Ijuí - RS: Edutora Unijuí, 2010. v. 1.

151 p.

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TEXTOS INTRODUTÓRIOS À OBRA

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T

O ciberespaço: novos caminhos e aprendizagens na geração

homo zappiens

Joseane Amaral

Introdução

odos os caminhos parecem conduzir ao mesmo pon-to: a irreversibilidade no processo de imersão num mundo cada vez mais tecnológico. Contudo, quando se pensa em educação, ainda se reproduz no imagi-

nário a mesma cena: a sala de aula com suas classes enfi-leiradas, o quadro negro e o giz. Será possível ensinar ex-clusivamente seguindo os métodos tradicionais e seculares, nesta geração que se relaciona, se entretém, se comunica e aprende utilizando a World Wide Web? É eficaz utilizar as mesmas técnicas de ensino com a geração que escreve mui-to mais, que publica diários (blogs), que posta vídeos, que expõe suas fotos, que tem acesso rápido a informações, que lê, participa, interage e faz do computador seu principal meio de comunicação? Parece ineficaz deixar na passivida-de esses sujeitos que se apropriam de novos meios.

O presente artigo pretende discutir o potencial peda-gógico do ciberespaço, buscando provocar uma postura de vanguarda diante do ensino de línguas na contemporanei-

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Joseane Amaral

dade. Com o advento da internet, emergiram não somente novas possibilidades no ensino, mas novas relações com a aprendizagem. A partir das mudanças tecnológicas ocorri-das principalmente no final do século XX, com a introdu-ção do virtual, aponta-se também o surgimento de um novo perfil de aprendiz, aqui denominado homo zappiens. Des-sa forma, defende-se a necessidade de promover o debate sobre as potencialidades da internet na educação, através do conhecimento da linguagem que lhe fornece suporte, a hipermídia. Assim, pretende-se estimular a ascendência de novas posturas pedagógicas diante da revolução proporcio-nada pelas tecnologias de rede.

Contextualização da pesquisa

No lugar do posto de controle de saída da fronteira, o guardião do país vizinho pediu que o estudioso de Ecologia Cognitiva mostrasse seu passaporte, chamando-o:

– Ei, você, faz o quê?A resposta foi: – Apesar do meu nome, não trabalho exatamente com Ecologia, mas com o conhecimento.– Negativo: há muito a Filosofia se encarrega disso – foi a ob-jeção do guardião das fronteiras. Vá pleitear a sua saída pela outra porta.– Espere; entendo o conhecimento de uma forma ampla. Ocupo--me dos signos, de todos os vestígios sensíveis ligados às inten-ções na produção e atribuição de sentidos, explicou o estudioso.– Ora – refutou novamente o guarda – isso é o que faz a Semio-logia. Você está querendo burlar a segurança?– Absolutamente! De fato – ponderou o estudioso – alguns te-óricos trabalham sobre o sentido dos signos. Mas interessam--me mais diretamente as relações de poder que são travadas na arena da comunicação.– Hum... – observou-o o guardião, desconfiado. – Sim, já en-tendo, trata-se então de Filosofia da Linguagem. O estudioso ousou especificar ainda um pouco mais a sua ação e disse:

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– Sim, a Filosofia da Linguagem, em especial a corrente da pragmática, aborda esse tema com muita propriedade, mas concentrando-se no que é produzido no decorrer da comunica-ção entre os interlocutores. Quanto a mim, procuro fixar-me em algo que vai além, buscando verificar como as idéias se transmi-tem e interagem entre si por meio de palavras, imagens e sons articulados, em toda a riqueza dos signos, para, então, discutir como o pensamento tem sido produzido. Trata-se de entender as dimensões técnicas e coletivas da cognição.O soldado sorriu com desdém. “Ah, é a cognição. Ora, então você é um estudioso da Educação”.– De certo modo, sim – concordou em parte o visitante –, mas apenas se considerarmos a Educação compreendida em seus novos ambientes e espaços, nos quais um novo sujeito, digamos, coletivo, se movimenta... E para compreendê-la dessa forma de-vemos derrubar algumas das fronteiras e construir elos com a Filosofia, com a Semiologia e com outras disciplinas das quais herdei também algumas questões, como a Linguística, ou a Psi-cologia. Na verdade não há como conceber a Ecologia Cognitiva sem falar das redes de conhecimento, e não há como estudar ou entender tais redes sem antes permitir também as intercone-xões em nossos próprios campos.E o estudioso terminou dizendo: – Por isso, não solicito apenas que autorizes minha passagem, como também te peço, em nome de todos os que desenvolvem pesquisas neste momento, que te despeças da tua função, pois para exercer a minha prática e levar adiante a pesquisa, não será possível que haja guardiões de fronteiras entre os países que visito.O guarda já ia expulsar o forasteiro, pela insolência da fala, vindo a perturbar-lhe a paz que há tanto conhecia naque-le espaço-limite, quando aconteceu o inusitado: viu que atrás do Ecologista Cognitivo, e pelos lados, e mais adiante, e tam-bém por muitas outras vertentes, aproximavam-se multidões de cientistas e estudiosos e pesquisadores e professores, todos numa rebelião não-organizada contra as cancelas de frontei-ras, e tinham os nomes metamorfoseados: não mais ostenta-vam carteira de identidade de comunicador, de sociólogo, ou de historiador, ou de cientista, mas de coisas estranhas, como educomunicador, engenheiro do conhecimento, historiador das idéias, arquiteto cognitivo, sociólogo da linguagem e coisas nes-se estilo.

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Viu que outros dos seus colegas tentavam reagir, mas era inú-til. O companheiro vizinho era desafiado por um sociotecnólogo, enquanto recebia a notícia de que legiões de historiadores das mentalidades haviam invadido um terreno proibido. Psicolin-guistas atacavam pelo outro lado e, já sem receber maior resis-tência, um grupo de arte-educadores se preparava para ocupar a praça.E assim, apesar de esboçarem uma reação inicial, os guar diões das fronteiras não tiveram outra opção a não ser retirar-se, resignados, deixando que fossem, por fim, apagadas as linhas tênues que marcavam os limites entre os países de uns e de outros.Foi quando as portas se abriram e começou a história (Landow, 2002).

A leitura dessa históra chama a atenção para um dos pontos cruciais da cibercultura: a abertura de fronteiras. Não é possível falar sobre a cultura da internet sem abor-dar o fato de como é tênue a linha que separa as áreas do conhecimento atualmente. De igual forma, é embaraçoso discorrer sobre educação sem considerar todos os campos que se imbricam para constituir o conhecimento.

Para compreender o fenômeno envolvendo esse novo espaço que cria e modifica uma série de eventos na vida e comunicação humana, torna-se pertinente a exposição da história acima, cuja metáfora destaca os processos colabo-rativos e de rede que o virtual proporciona. Estudos como o do filósofo Lévy (1993, 1998, 1999) têm procurado dar conta dos reflexos causados pela invasão da internet no cotidiano das pessoas. Antes de tratar das possibilidades desse novo espaço, será necessário expor alguns conceitos básicos que o esclarecem. Segundo Lévy (1999, p. 92):

A palavra “ciberespaço” foi inventada em 1984 por William Gi-bson em seu romance de ficção científica Neuromante. No livro, esse termo designa o universo das redes digitais, descrito como campo de batalha entre as multinacionais, palco de conflitos mundiais, nova fronteira econômica e cultural. Em Neuroman-te, a exploração do ciberespaço coloca em cena as fortalezas de

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informações secretas protegidas pelos programas ICE, ilhas banhadas pelos oceanos de dados que se metamorfoseiam e são trocados em grande velocidade ao redor do planeta. Alguns he-róis são capazes de entrar “fisicamente” nesse espaço de dados para lá viver todos os tipos de aventuras. O ciberespaço de Gi-bson torna sensível a geografia móvel da informação, normal-mente invisível.

De acordo com o filósofo da informação e estudioso das interações entre a internet e a sociedade, o termo foi resga-tado pelos usuários e criadores de redes digitais, fazendo surgir várias correntes literárias, musicais, artísticas e tal-vez até políticas que se dizem parte da cibercultura.

A partir da popularização do fenômeno da virtualiza-ção, surgiram inúmeros termos para designar esses novos produtos criados na era cyber. Um dos mais largamente utilizados é o virtual. Lévy (1998) garante que virtual é o que existe em potência e não em ato. De acordo com o filó-sofo, pode-se dizer que a árvore está virtualmente presen-te na semente. Essa assertiva torna-se muito peculiar na compreensão da era da cibercultura.

A grande revolução vivida pela sociedade com o advento da cultura digital traz mudanças consideráveis também ao campo educacional. Desse modo, surgem novas formas de en-sinar e aprender e cria-se um novo paradigma de educação, com a inclusão de ambientes interativos e o uso da tecnolo-gia no contexto educacional. Esse caráter dialógico começa a impor novo ritmo também à educação (Bakhtin, 1997).

Com o virtual e os caminhos da rede mundial de com-putadores, informações restritas a livros e enciclopédias passaram a figurar nas inúmeras janelas hiperligadas do ciberespaço. Não se trata apenas de uma mudança situa-cional, mas de uma nova relação com o conhecimento, como expõe Lévy (1998, p. 55): “O saber prendia-se ao fundamen-to, hoje se mostra como figura móvel. Tendia para a con-

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templação, para o imutável, ei-lo agora transformado em fluxo, alimentando as operações eficazes, ele próprio ope-ração.” A internet, grande teia que anula as distâncias da informação, é responsável por mudanças que se refletem na sociedade como um todo. A inexistência de fronteiras e a impossibilidade de delimitar lugares fazem do ciberespaço uma ferramenta instigante e complexa. Lévy (1999) expõe que o valor contido na cibercultura é precisamente a uni-versalidade. De acordo com o mesmo autor (1999), estamos todos no mesmo banho, no mesmo dilúvio de comunicação. Não pode mais haver, portanto, um fechamento semântico ou uma totalização.

A ubiquidade – possibilidade de estar em todos os luga-res ao mesmo tempo – é uma das características mais mar-cantes do ciberespaço. Contudo, mesmo estando em todos os lugares, como se dá o acesso e a apropriação desse espaço onipresente? Que tipos de relações se constituem a partir desse acesso? Esses e outros questionamentos norteiam as discussões acerca da instigante invasão do virtual na vida das pessoas. É preciso considerar esses aspectos também no âmbito educacional, de maneira que o acesso não ocorra de forma alienada e como mera aquisição de procedimen-tos. Nesse contexto, outra questão que merece ser conside-rada é a participação de novas camadas da sociedade nesse processo, como salientam Veen e Vrakking (2009, p. 43-44):

[...] pessoas de todas as classes sociais participam de comuni-dades virtuais. A internet não é mais um ambiente de exclusão social. Ao contrário, une as pessoas de todas as origens socioe-conômicas. Embora no passado de fato tenha havido o problema de as famílias de baixa renda não disporem do dinheiro para ter um computador ou conexão à internet em casa, o número de casas que hoje tem acesso a computadores e à internet está sempre crescendo. [...] a questão não é mais a de poder comprar um computador, e sim a de ter acesso à tecnologia. As escolas, bibliotecas, cafés com internet e outros espaços públicos atual-mente oferecem acesso à internet e, portanto, à participação em comunidades virtuais.

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O acesso às tecnologias por camadas menos privile-giadas da sociedade tem posto em evidência novas relações com o saber. Como expõem os autores, o ciberespaço não pode mais ser considerado um espaço de exclusão, tendo em vista que este proporciona a integração de pessoas sem le-var como fator de exclusão a esfera socioeconômica. Muitas pesquisas envolvendo aspectos relacionados à cibercultura estão sendo realizadas, pois, segundo Ramal (2002), a in-ternet constitui um novo espaço empírico, e é preciso inves-tir esforços para conhecer este espaço e, a partir disso, criar ferramentas que colaborem no processo de inclusão digital.

Abordando as implicações da cultura virtual, Lévy (1999) profetiza que a perspectiva da digitalização das in-formações provavelmente tornará o ciberespaço o principal canal de comunicação e suporte de memória da humanida-de. Dessa forma, para acompanhar esse processo e utilizar o potencial das redes de forma benéfica na educação, faz-se necessário investigar as características da linguagem do ci-berespaço – a hipermídia – essa dinâmica que é capaz de expandir as fronteiras do conhecimento humano. É preciso investigar essa linguagem dialógica, cujos conhecimentos se interpõem em cadeias cada vez maiores, buscando apro-veitar esse potencial nos processos educacionais; para co-nhecer o virtual é preciso apreender as características da linguagem hipermidiática que o constitui.

Hipermídia: a linguagem da teia virtual

O surgimento e a crescente expansão das novas lingua-gens do ciberespaço, com o advento das novas tecnologias, têm criado diferentes necessidades e possibilidades no con-texto educativo. É impossível ignorar a presença do virtual no cotidiano escolar, tendo em vista que esta nova geração

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de aprendizes vive diariamente em contato com esses re-cursos.

O ciberespaço criou uma nova geração de aprendizes, com mais acesso à informação, mais possibilidades de esco-lha e poder de iniciativa. Ao percorrer um caminho hiper-textual, por exemplo, o aprendiz está construindo um pro-cesso autônomo de busca (Lévy, 1998). Entretanto, mesmo com a crescente informatização dos ambientes de ensino, é possível verificar que, geralmente, tais recursos são apro-priados em uma lógica verticalizada e fragmentada.

A velocidade com que se disponibilizam novos subsí-dios e a facilidade de acesso a esses apontam para a ne-cessidade de readequação nos processos de ensino. Surgem não apenas novos recursos, mas inúmeras possibilidades de aprendizagem a serem exploradas pelo educador. A geração que faz do ciberespaço um meio para estudo, comunicação e entretenimento, apresenta características, percepções e formas singulares de cognição. Dessa forma, o potencial advindo desses recursos faz emergir um novo perfil de es-tudante, um desbravador das infovias do ciberespaço (San-taella, 2007).

O hipertexto é apontado como o grande divisor de águas entre a comunicação massiva e a comunicação inte-rativa (Silva, 2002). A interação só é possível graças a essa organização dinâmica, segundo a qual uma leitura hiper-textual nunca se repete da mesma forma. Como se pode depreender, da combinação do hipertexto com as várias mídias emerge a hipermídia, a linguagem do ciberespaço. Segundo Lévy (1999, p. 61), “a escrita e a leitura trocam seus papéis. Aquele que participa da estruturação de um hipertexto, do traçado pontilhado das possíveis dobras do sentido, já é um leitor. Simetricamente, aquele que atualiza um percurso, ou manifesta determinado aspecto da reser-

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va documental contribui para a redação, finaliza tempora-riamente uma escrita interminável [...]. Com o hipertexto, toda leitura é uma escrita potencial”.

Assim, é novo o tipo de leitura que se processa a partir do hipertexto. Cada acesso é particularizado por escolhas independentes, em caminhos multimodais. O uso da hiper-mídia para fins didáticos é relevante em face à multiplici-dade de possibilidades que precisam da ação e percepção dos sujeitos para se tornarem reais. Assim, novos planos se-mânticos vão sendo ativados e, por conseguinte, a aprendi-zagem é potencializada pela participação ativa dos sujeitos.

Dadas essas novas formas de cognição, é fundamen-tal obter conhecimentos sobre a hipermídia, a linguagem que emerge com o virtual, cuja principal característica é a leitura não linear. Essa linguagem cujos nexos se estabele-cem entre inúmeras janelas hiperligadas transforma cada processo de leitura em uma reescrita, uma vez que os cami-nhos são definidos pelo usuário. Ao realizar uma leitura em tela, o usuário decide os caminhos que irá percorrer e o que lhe interessa saber; a busca autônoma resulta em conheci-mento dirigido e movido por interesses pessoais. Sobre esse aspecto, Ramal (2002, p. 18) defende que

[...] incompatível com o monologismo, um hipertexto é uma reu-nião de vozes e de olhares, construído por muitas mãos e aberto para todos os links e sentidos possíveis. O hipertexto contem-porâneo é, de certo modo, uma versão da polifonia que Bakhtin buscava, e, portanto, no espaço escolar, uma possibilidade para o diálogo entre as diferentes vozes, a negociação dos sentidos, a construção coletiva do pensamento, o dinamismo dialógico construído a partir da heterogeneidade, de alteridades, de mul-tivalências, de descentramento, de heteroglossia.

Considerando-se os argumentos expostos pela autora, pode-se dizer que o hipertexto materializado pela ciber-cultura desafia o ensino tradicional, na medida em que as

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relações de saber se estabelecem no diálogo, nas possibi-lidades várias, e não na imposição de um sujeito em de-trimento de todas as outras vozes. Outro aspecto que me-rece ser considerado é o exposto por Komesu (2005), que salienta a questão da interatividade como uma das princi-pais características atribuídas aos suportes eletrônicos da internet. Trata-se da interface entre a máquina e o usuário e a possibilidade de contato entre os usuários, por meio de ferramentas que impulsionam a comunicação de maneira veloz, eliminando barreiras geográficas.

Dadas todas as funcionalidades dessa linguagem que emerge com o virtual, vale ressaltar os estudos de Ramal (2002, p. 14) indicando que “a internalização, por parte do sujeito, dos aspectos formais do hipertexto [...] está vin-culada com uma nova ecologia cognitiva da sociedade, que implica novas formas de pensar, de aprender e de organi-zar as práticas escolares”. Dessa forma, pode-se dizer que a hipermídia é uma linguagem interativa e, sendo assim, sua interface proporciona uma gama de múltiplos contatos entre os sujeitos.

Outra discussão iminente no contexto deste trabalho é como lidar com essas novas formas de cognição, principal-mente levando em conta as peculiaridades da geração que nasceu em contato com as tecnologias que proporcionam novas formas de aprendizagem. Contribuindo para o movi-mento que torna viva a polifonia de Bakhtin, a seguir serão expostas algumas características dessa geração de pensa-dores digitais, os aprendizes que têm nas tecnologias muito além de um espaço para diversão e entretenimento.

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Homo zappiens: desafi os no ensino de uma nova geração de aprendizes

Utilizar o potencial das tecnologias na escola é um ideal que vem recrutando pesquisadores há vários anos. No fi-nal da década de 1960, o matemático e educador Seymour Papert já chamava a atenção para a possibilidade de in-crementar processos de ensino, evidenciando que os com-putadores não apenas melhorariam a aprendizagem esco-lar, mas apoiariam formas diferentes de pensar e aprender (1994). Contudo, é preciso atentar para o fato de que mu-danças significativas ocorreram nesse intervalo de tempo não somente com relação às inovações tecnológicas, mas também quanto ao perfil do usuário dessas tecnologias. Há uma nova geração de aprendizes, cujas características de comportamento e cognição são foco de pesquisas ainda em fase inicial.

No contexto deste trabalho se tomará como embasa-mento principal os estudos de Veen e Vrakking (2009), que nomeiam esses novos aprendizes como a geração homo zap-piens. Os estudiosos salientam que a geração que cresceu ao lado de novas tecnologias ingressa agora no sistema educa-cional. Os aprendizes revelam grande habilidade ao manu-searem o controle remoto da televisão, o mouse do compu-tador, o minidisc e, mais recentemente, o telefone celular, o iPod e o aparelho de mp3. Foram esses e outros recursos os responsáveis por permitirem às crianças contemporâneas o controle sobre o fluxo de informações, o contato com instru-ções descontinuadas, a sobrecarga de informações, além de mesclarem comunidades virtuais e reais, comunicarem-se e colaborarem em rede, de acordo com suas necessidades.

O estudo põe em evidência aspectos peculiares acerca do desenvolvimento e do modo de cognição desta geração.

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Dessa forma, atenta para a necessidade de readequar pro-cessos de ensino, tendo em vista que esse novo perfil de aprendiz não aceita mais a estrutura monológica da escola tradicional, por exemplo. Segundo Veen e Vrakking (2009, p. 12),

o Homo zappiens é um processador ativo de informação, resol-ve problemas de maneira muito hábil, usando estratégias de jogo, e sabe se comunicar muito bem. Sua relação com a escola mudou profundamente, já que [...] consideram a escola apenas um dos pontos de interesse em suas vidas. Muito mais impor-tante para elas são suas redes de amigos, seus trabalhos de meio-turno e os encontros de final de semana. O Homo zappiens parece considerar as escolas instituições que não estão conecta-das ao seu mundo, como algo mais ou menos irrelevante no que diz respeito à sua vida cotidiana. Dentro das escolas, o Homo zappiens demonstra um comportamento hiperativo e atenção limitada a pequenos intervalos de tempo, o que preocupa tanto pais quanto professores. Mas o Homo zappiens quer estar no controle daquilo com que se envolve e não tem paciência para ouvir um professor explicar o mundo de acordo com suas pró-prias convicções.

Nesse contexto, é importante a colocação dos autores de que a escola não pode mais transferir conhecimento como fazia há séculos. A sociedade como um todo sofre constantes transformações, e com o ensino não poderia ser diferente. Ainda sobre os seres digitais, uma das principais caracte-rísticas é não se concentrarem em uma tarefa só, zapeando de uma fonte de informação para outra quando assistem à televisão, navegam pela internet ou conversam no MSN.

Conforme Veen e Vrakking (2009, p. 29), a geração que nasceu no final da década de 1980 em diante tem muitas denominações, tais como “geração da rede”, “geração digi-tal”, “geração instantânea” e “geração ciber”, e difere de qualquer outra do passado porque cresceu em uma era di-gital. Ainda conforme os autores,

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sendo os primeiros seres digitais, cresceram em um mundo onde a informação e a comunicação estão disponíveis a qua-se todas as pessoas e podem ser usadas de maneira ativa. As crianças hoje passam horas de seu dia assistindo à televisão, jogando no computador e conversando nas salas de bate-papo. Ao fazê-lo, elas processam quantidades enormes de informação, por meio de uma grande variedade de tecnologias e meios. Elas se comunicam com amigos e outras pessoas de maneira muito mais intensa do que as gerações anteriores, usando a televisão, o MSN, os telefones celulares, os iPods, os blogs, os Wikis, as salas de bate-papo na internet, os jogos e outras plataformas de comunicação.

Por esse ângulo, investigar e propor novas formas de ensinar e aprender é iminente na educação contemporâ-nea. Anos atrás, quando o rádio era veículo de comunicação onipotente nos lares, justificava-se a supremacia do profes-sor em sua aula transmissora de saberes, pois o sentido da audição era um dos únicos canais de aprendizagem explo-rados. Contudo, nos últimos anos, inúmeras novas mídias surgiram. O aluno contemporâneo está em contato, coti-dianamente, com diversos tipos de atrativos tecnológicos. Assim, continuar privilegiando o mesmo canal de comuni-cação e ministrar as mesmas aulas de cinquenta anos atrás parece não trazer resultados positivos no ensino.

Outro aspecto que merece ser considerado é com rela-ção às novas leituras que surgem com a rede mundial de computadores. Esse novo espaço fez surgir também um tipo particular de leitor, o imersivo, cujas definições são explí-citas por Santaella (2007, p. 33): “[...] um leitor em estado de prontidão, conectando-se entre nós e nexos, num roteiro multilinear, multissequencial e labiríntico que ele próprio ajudou a construir ao interagir com os nós entre palavras, imagens, documentação, músicas, vídeo.” A mesma autora (p. 47) justifica a denominação imersivo como “aquele que

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navega através de dados informacionais híbridos – sonoros, visuais e textuais – que são próprios da hipermídia.”

O homo zappiens conhece e utiliza os recursos tecno-lógicos, prática que o afasta da simples coadjuvação. Este navegador virtual cria novos discursos, invertendo as rela-ções de poder que se davam pelo ensino monológico. Contu-do, para alcançar este patamar, é preciso considerar a im-portância da tecnologia, como salientam Veen e Vrakking (2009, p. 29):

Três aparelhos tiveram grande importância: o controle-remoto da televisão, o mouse do computador e o telefone celular. Com o controle-remoto da televisão, as crianças cresceram habitua-das a escolher assistir a uma variedade de canais nacionais e estrangeiros [...]. Ao assistir à televisão, aprenderam a inter-pretar as imagens antes mesmo de aprender a ler, e a interagir, ainda que de maneira bastante restrita, com um meio de comu-nicação de massa. [...] em pesquisas recentes, o computador pa-rece estar chegando ao topo da lista. Usando o mouse, os alunos navegam pela internet e clicam até que achem o que querem, buscando ícones, sons e movimentos mais do que propriamen-te letras. O telefone celular ajudou-os a se comunicar [....] com mais facilidade, pois a distância física não representa qualquer restrição à comunicação [...].

Assim, imerso em telas sobrepostas, num emaranhado de informações que parecem desconexas, o homo zappiens estuda, namora, participa de jogos interativos e cria sua rede de contatos num processo autônomo e colaborativo. Ainda de acordo com Veen e Vrakking, a diferença entre o homo zappiens e as outras gerações é que estas funcionam linearmente, ou seja, primeiro leem as instruções – usando o papel – e depois começam a jogar, descobrindo as coisas por conta própria quando há problemas. O homo zappiens não usa a linearidade, primeiro começa a jogar e, depois, caso encontre problemas, liga para um amigo, busca infor-mação na internet ou envia uma mensagem para um fó-rum. Ao invés de trabalhar sozinha, a geração cyber utiliza

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as redes humanas e técnicas quando precisa de respostas instantâneas.

A iniciativa de buscar as informações de que precisa e trabalhar de forma cooperativa, por si só, já indica mu-danças no perfil desses novos aprendizes. E essas mudan-ças não param aqui. De acordo com os mesmos autores, o uso dos recursos tecnológicos coloca o usuário numa posi-ção de controle para decidir qual informação processar ou com qual comunicação se envolver. Eles não só capacitam o usuá rio a controlar o fluxo de informação, mas também o ajudam a lidar com a sobrecarga e a selecionar a informa-ção de modo eficiente, adequado, prontamente e de acordo com suas necessidades.

A busca de conhecimento é feita em rede na geração da cibercultura. Outro traço relevante nesses aprendizes é que, com os jogos de computador, eles se tornaram proces-sadores ativos de informação, sabendo resolver problemas e criar estratégias para isso. Mais do que diversão, é o de-safio que os atrai ao jogo; sentir-se desafiado a resolver um problema e chegar ao próximo nível é o que importa. Após vários estudos e observações, Veen e Vrakking (2009) des-tacam como principais habilidades do homo zappiens:

• habilidades icônicas: apresentados a um mundo multimídia, navegam pela internet sendo expostos a vários ícones com imagens múltiplas, em geral com som e movimento; conhecem o significado dos ícones e o seu valor de informação, bem como o significado das cores;

• executar múltiplas tarefas: eles conversam, enviam torpedos para os amigos pelo celular, escutam música em seu mp3 e usam o MSN. A empresa Microsoft cons-tatou que as crianças se comunicam com outras dez crianças ao mesmo tempo no MSN e que, pelo jeito, gostam de fazê-lo; sabem lidar com diferentes níveis

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de atenção simultaneamente e reconhecer sinais de que há a necessidade de destinar maior atenção a uma determinada fonte em um determinado momento;

• zapear: assistir à televisão é uma maneira especial de executar tarefas múltiplas, exigindo conhecimento de estruturas mais ou menos padronizadas de fluxos de informação audiovisuais; zapeando ele consegue as-sistir a pequenos pedaços de diferentes fluxos de in-formação e não perder nada importante, processando informação descontínua. Zapear é a habilidade que determina os núcleos essenciais de informação; saber zapear leva as crianças a processar três ou mais vezes informação em uma hora do que um adulto;

• comportamento não linear: é dirigido pela investiga-ção do aprendiz e, como a informação digital é aces-sível por meio de estratégias que não só a leitura, as abordagens não lineares fomentam estratégias de aprendizagem e a habilidade de determinar as pala-vras-chave certas. O aprendiz está no centro no pro-cesso de aprendizagem, decidindo quais perguntas e sequências de questões serão definidas e respondi-das; adota a não linearidade e formula as perguntas necessárias e eficientes à pesquisa que realiza.

No centro de todas essas questões, salienta-se as mu-danças trazidas pela utilização dessas habilidades no ensi-no. Veen e Vrakking (2009, p. 48) salientam:

[...] já que esta geração de hoje é a primeira geração que ensina seus pais a usar um fórum, um telefone celular e a consultar sua conta bancária eletronicamente, entre outros serviços, é esta a primeira vez que podemos observar uma “educação in-vertida” ocorrer, fenômeno nunca visto antes. Por causa dessas grandes mudanças em nossa sociedade, os pais e professores deveriam observar as crianças naquilo que elas de fato fazem para entender que esta geração viverá em um mundo diferen-te, para o qual habilidades, atitudes e comportamentos novos serão compulsórios.

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Na verdade, o homo zappiens está desafiando a educa-ção a explorar outras habilidades e estratégias muito mais do que faz hoje. A imersão e a motivação são aspectos fun-damentais para uma aprendizagem profunda, porque há uma nova espécie de aprendizagem, como salientam os au-tores (p. 57):

Devemos reconhecer que para as gerações futuras essas habi-lidades não poderão ser treinadas nas bibliotecas tradicionais. Temos de estimular essas gerações a usar as fontes digitais, sobretudo para a busca de informação. Não é provável que, ao final deste século, a informação, seja ela de orientação científica ou não, esteja disponível sob a forma impressa. Vivemos em uma era de rupturas, em que o mundo analógico está mudando para um digital. Isso exige novas estratégias para lidar com a informação, e o Homo zappiens parece desenvolver tais estraté-gias com base no modo pelo qual ele conhece a informação, que são as telas cheias de cores e a multimídia interativa.

Dessa forma, há mudanças na motivação por aprender. O espaço criado para que o aprendiz se especialize e con-tribua para o coletivo propiciou o aumento de indivíduos que se valem de sua autoconsciência, autocontrole e auto-expressão para determinarem objetivos de aprendizagem. “Eles estão escolhendo suas próprias maneiras de apren-der, o que, infelizmente, leva a um crescente ressentimento de parte da educação tradicional e das escolas como insti-tuições arcaicas”, salientam os autores (2009, p. 57). Em virtude dessas colocações, o modelo escolar vigente parece distante da realidade desses pensadores digitais, não há como ignorar isso.

Considerações fi naisLevando em consideração os aspectos mencionados, é

nesse contexto que se ressalta a necessidade de readequar processos de ensino. Manter-se no ensino monológico que a

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sala de aula tradicional utiliza, não cabe mais para o ensi-no do aprendiz que tem outras habilidades acentuadas pelo convívio com as tecnologias. Cabe ao educador abrir espaço para que outros suportes possam destacar a participação dos educandos no processo educacional.

Assumir uma postura de vanguarda na educação é ta-refa trabalhosa, considerando-se todas as limitações que se impõem ao docente e ao sistema de ensino de forma geral. Contudo, este trabalho procura defender não apenas uma postura de vanguarda, mas a admissão de que se chega a um século que promove grandes transformações na socie-dade, e isso também se faz sentir no ensino. Não é possível permanecer apenas na transmissão de conteúdos diante do homo zappiens.

Procurou-se sustentar a introdução consciente da tec-nologia no cotidiano escolar, tendo em vista que é explícito o uso de novas ferramentas, contemplando mudanças em vários aspectos da vida em sociedade. Conhecer as poten-cialidades do ciberespaço e as novas tecnologias que fazem parte do universo dos estudantes de forma massiva, uti-lizando-as como ferramentas pedagógicas, através de um planejamento sério e contínuo, pode aproximar os alunos de uma aprendizagem dialógica e significativa.

Assim, é inútil ignorar as transformações iminentes que se processam, tanto nas formas de aprender – vide o comportamento da geração da rede –, quanto nas formas de ensinar, considerando especialmente a linguagem hiper-midiática do ciberespaço e seus recursos comunicacionais. É preciso reedificar a escola, tomando como cenário prin-cipal a interação entre os sujeitos e a tecnologia, adotando papéis dialógicos, em contato com processos de aprendiza-gem que contemplem a lógica colaborativa das redes de co-nhecimento, abertas e polifônicas.

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O ciberespaço: novos caminhos e aprendizagens na geração homo zappiens

Referências AMARAL, Joseane. Aprendizagem dialógica: blogs didáticos e as no-vas possibilidades no ensino de línguas na geração Homo zappiens. Monografia (Especialização em Linguística, Ensino de Línguas e da Literatura) - Universidade de Cruz Alta, 2009.

BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

KOMESU, Fabiana Cristina. Entre o público e o privado: um jogo enunciativo na constituição do escrevente de blogs da internet. Tese (Doutorado em Linguística) - Universidade Estadual de Campinas, 2005.

LANDOW, George. O guardião das fronteiras. In: RAMAL, Andréa Cecília. Educação na cibercultura: hipertextualidade, leitura, escri-ta e aprendizagem, 2002.

LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. Trad. de Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Ed. 34, 1993.

____. Cibercultura. Trad. de Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Ed. 34, 1999.

____. O que é o virtual? Trad. de Paulo Neves. São Paulo: Ed. 34, 1998.

PAPERT, Seymour. A máquina das crianças: repensando a escola na era da informática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.

RAMAL, Andrea Cecília. Educação na cibercultura: hipertextuali-dade, leitura, escrita e aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2002.

SANTAELLA, Lucia. Navegar no ciberespaço: o perfil cognitivo do leitor imersivo. 2. ed. São Paulo: Paulus, 2007.

SILVA, Marco. Sala de aula interativa. 3. ed. Rio de Janeiro: Quar-tet, 2002.

VEEN, Wim; VRAKKING, Ben. Homo zappiens: educando na era digital. Trad. de Vinicius Figueira. Porto Alegre: Artmed, 2009.

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O

Viagem ao ciberespaço: a virtualização do conhecimento

na educação a distância

Patrícia Grasel SilveiraMarie Jane Soares Carvalho

Acessando o curso Pead

curso de Licenciatura em Pedagogia a Distância da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Pead) foi desenvolvido para alunos/professores que atuam em escolas – principalmente públicas, sendo a

maioria na área docente, com experiência que varia entre 5 e 15 anos –, e que, todavia, ainda não possuam formação superior na área da licenciatura. O curso se insere nas polí-ticas de formação de professores ligada ao plano da Univer-sidade Aberta do Brasil (UAB).

O curso do Pead atende alunas de cinco municípios do Rio Grande do Sul, que são: São Leopoldo, Sapiranga, Gravataí, Alvorada e Três Cachoeiras. Em cada um desses municípios existem os polos do curso, com aproximadamen-te setenta alunas em cada. Entre o total de alunas que o curso atende, as características mais encontradas são de serem casadas e mães de família, que, ao iniciarem o curso,

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tinham pouco ou muito pouco conhecimento sobre o uso dos recursos tecnológicos.

O curso Pead tem características próprias. Apresenta uma proposta pedagógica em movimento, ou seja, é a pri-meira versão do curso, por isso, conforme os eixos (semes-tres) vão passando, o curso vai se constituindo. Além dessa característica de estar em constante construção, apresenta uma proposta pedagógica visível e disponível na web com o uso de espaços virtuais, como os blogs (diários on-line), os Pbworks (páginas coletivas) e o Rooda (Ambiente Virtual de Aprendizagem).

A proposta pedagógica do curso Pead se apresenta, para a maioria das alunas/professoras, como um desafio de apro-priação tecnológica, paralelamente com o desenvolvimento cognitivo delas no ciberespaço. Diante da proposta meto-dológica do curso, as alunas/professoras precisavam se tor-nar imigrantes confortáveis nesse contexto digital. O pouco contato e a ausência do domínio da tecnologia apresentada pelas alunas/professoras eram expressos, por exemplo, pelo medo em ligar o computador no início do curso.

Navegando nos conceitos da pesquisa

Dentre os conceitos adotados que versam sobre virtua-lização do conhecimento destacamos o de ciberespaço, ten-do em vista a pesquisa ser próxima à netnografia, desenvol-vida através da web. Este estudo tem como base as ideias de Castells (1999, 2001), na intenção de pensar a sociedade em rede, discutindo com Morin (1995, 1997, 2000 e 2002), que serve de base para pensar sobre a complexibilidade do aprender a (re)aprender, convergindo com as questões de virtual que Lévy (1996) aborda em seus estudos, cuja dis-cussão permitiu interrelacionar conhecimento, educação e

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Patrícia Grasel Silveira, Marie Jane Soares Carvalho

tecnologia. Pierre Lévy foi especialmente importante para construir a compreensão sobre a constituição do virtual; Manuel Castells, no estudo, amplia a compreensão da so-ciedade ao tratar das conexões entre conhecimento e tec-nologias digitais. Edgar Morin auxilia na compreensão do conhecimento e da complexidade do aprender.

O ciberespaço é compreendido neste estudo como lugar potencializador, onde cada link é um convite, cujo indivíduo tanto influencia como é influenciado. Pelo uso de espaços como blogs, facebook, twitter entre outros, percebe-se as relações estabelecidas onde emergem ações que desfazem distância, pois há intensas trocas e compartilhamento de informações. Tais ações provocam novas leituras, bem como formas de comunicação e interação que, por conseguinte, geram novos conteúdos.

Hoje observa-se que as novidades e as possibilidades das tecnologias digitais disponíveis se renovam a cada mês, exemplo disso é o próprio conceito de web. Há pouco tempo atrás falava-se da Web 1.0, que proporcionava ao usuário explorar informações disponibilizadas na rede. Nesse con-texto, o sujeito é um usuário espectador. A Web 2.0 permite que os exploradores passem da posição de consumidores de informações para colaboradores e construtores de informa-ções. E a Web 3.0 tem em vista os exploradores imersos nas redes sociais através de agentes inteligentes.

Para Carvalho e Silveira (2009, p. 2), “os avanços não param, o serviço de e-mail já é considerado ultrapassado, pois a comunicação na web está ganhando outra dimensão, há exigência de instantaneidade”. Com a grande oferta de tecnologias digitais, sem perceber, ganha-se agilidade em diferentes situações rotineiras. Isso contribui para que os sujeitos, que a priori não se sentiam parte do contexto digi-

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tal, comecem a se render ao uso das tecnologias por curiosi-dade ou por necessidade.

De modo geral, o sujeito já faz parte da sociedade em rede e está inserido nesse contexto, muitas situações con-tribuem para sua imersão ao meio digital. O que nos leva a crer que para os conhecimentos serem potencializados para uma melhor apropriação tecnológica no ciberespaço não se faz necessária a realização de cursos técnicos introdutório, mas, sim, a acessibilidade a estes, de modo a promover mo-mentos provocadores e instigantes que permeiam a apren-dizagem como um todo.

Castells (1999) afirma que a causa age sobre o efeito e vice-versa, isto é, produtos também originam aquilo que os produz. Ao mesmo tempo em que os sujeitos criam no-vas possibilidades no ciberespaço, os sujeitos têm conheci-mentos antigos e novos que estão virtualizados e potencia-lizados através de suas ações, a fim de suprir necessidades existentes no ciberespaço.

Percebe-se que o homem se recria em trocas com o am-biente, a isto Morin (1995) chama de “auto-eco-organiza-ção”. Os sujeitos criam o ciberespaço, constituem a rede, potencializam o ser/acontecer na web ao mesmo tempo em que são potencializados por ela. Nesse contexto, esta pes-quisa estende-se às alunas/professoras, as quais são sujei-tos desse cenário tecnológico posto pela sociedade. Porém muitas delas se sentiam integrantes deste. No entanto, ao ingressarem em um curso na modalidade de educação a distância que usa como mídia o ciberespaço, o desafio de se fazer presente na rede digital é revelado a elas como fator determinante para realização e desenvolvimento da apren-dizagem.

Neste estudo, a visão para ensino a distância encontra base na fala de Castells (1999, p. 51), que diz: “As novas

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tecnologias da informação não são simplesmente ferramen-tas a serem aplicadas, mas processos a serem desenvolvi-dos.” O conceito de virtual apresentado por Lévy (1996), em seu livro O que é virtual?, apresenta como ação que evolui e é mutável. O autor afirma que o virtual é real, ao con-trário do que muitos consideram. Alerta que o virtual está presente em nosso cotidiano, assim como o ciberespaço já faz parte da sociedade. Atenta ainda para a necessidade de acompanharmos as tendências mais positivas da evo-lução em curso e criarmos projetos de civilização focados nas inteligências coletivas, o que, do ponto de vista deste estudo, pode ser potencializado pelo uso significativo das tecnologias digitais. O virtual pode ser considerado tudo o que existe em potência não se opondo ao real, mas, sim, ao conceito de atual. Tendo em vista que virtual é eleva-ção em potência, relaciona-se esse conceito com a imersão das alunas/professoras do curso Pead, que, ao entrarem em contato com o ciberespaço e suas possibilidades, tiveram suas práticas pedagógicas potencializadas. Essas alunas/professoras, por realizarem o curso na modalidade a dis-tância, tiveram que aprender a (re)aprender novas formas de leitura e de escrita.

Cabe destacar que, de acordo com Lévy (1996), o vir-tual é algo que está em potência, pronto para acontecer, ou seja, é o ser/acontecer em potência, esperando um ato que o desperte. Assim, como Lévy, Morim (2003) também fala so-bre o virtual e apresenta-o como potência, algo que existe, mas ainda não é visível, e de repente, nem compreensível, no entanto nem por isso deixa de existir. É como se fosse um pedaço de madeira que, potencializado, poderá tornar--se um móvel.

A educação a distância é considerada por Silva (2010) como um conjunto de ações de ensino e aprendizagem ou

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atos de currículo mediado por interfaces digitais que po-tencializam práticas comunicacionais interativas e hiper-textuais. Assim, a educação a distância é uma excelente oportunidade para novas metodologias ou para a constru-ção de metodologias apropriadas à sociedade em rede. A possibilidade da modalidade de ensino a distância provocar a potencialização da virtualização do conhecimento está di-retamente ligada ao desenho metodológico no qual o curso é elaborado e desenvolvido. Um curso pode ter seu desenho metodológico organizado para usar as possibilidades da web apenas como ferramentas e repositórios de materiais, ou o desenho metodológico pode apresentar uma proposta em que as possibilidades do ciberespaço sejam provocações para conhecimentos (re)siginificados, fazendo uso de novas linguagens de interação e comunicação.

Formar, para a sociedade em rede, não é o simples uso de computadores nas aulas de didática, não que isso não seja interessante, mas a intenção deve ir além. Não basta apenas utilizar, mas, sim, (re)significar o uso. Essa crítica serve como uma das basilares instigadoras desta pesquisa. Ao pensar que existem jovens que cada vez mais falarão linguagens digitais e que a esta na formação de professo-res continua a mesma, gera uma sensação desagradável a quem acredita numa educação com mais qualidade.

Com sua presença garantida em diferentes contextos e lugares, a internet tornou-se um passaporte de entrada para as pessoas vivenciarem diferentes situações, seu coti-diano, mesmo para aquelas que fazem uso dessa rede ape-nas profissionalmente. Existe um grupo considerável de jovens e adultos que utilizam a web para expandir sua vida social. Eles constituem e ampliam amizades através das re-des sociais na web: Orkut, Twitter, Facebook, blogs, Second Life... Esses espaços digitais favorecem uma comunicação

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rápida, instantânea, com diferentes pessoas que estão em variados espaços e lugares, o que contribui para o trânsito ativo e plural no ciberespaço.

Fazer uso (re)significativo da web não se limita a ter um perfil em redes sociais, o conceito abrange as intenções do sujeito para perceber e explorar as potencialidades dos recursos hipermidiáticos. Santaella (2004) define como hi-permídia o espaço de unificação de possibilidades de sons, imagens, textos, dados, entre outros, todos na web. A re-ferida unificação no ciberespaço permite viagens para di-ferentes espaços virtuais, basta um clique para o bilhete estar pronto. É possível viajar, conhecer diferentes lugares e culturas que habitam a web. Essa é a era das tecnologias da informação e comunicação.

A virtualização ocorre quando esse uso instiga os conhe-cimentos e estes, consequentemente, são potencializados. O ciberespaço não se torna apenas um recurso e sim possi-bilidades de utilizar e explorar processos de virtualização que vão além da reprodução e da aplicação de conhecimen-to. A versatilidade do ciberespaço e o fascínio que costuma produzir nos sujeitos que o utilizam deixam na educação marcas de experiências tecnologicamente inovadoras, mas na maioria das vezes pedagogicamente insuficientes. Não basta saber viajar no ciberespaço, é preciso reconhecer as possibilidades que este oferece para (re)significação do co-nhecimento.

A potencialização da virtualização está ligada com a intensa imersão do sujeito no ciberespaço, a fim de provo-car novas práticas cotidianas, transformando o seu dia a dia. Ao potencializar a virtualização, esses sujeitos não te-rão mais as tecnologias digitais apenas como meras ferra-mentas, mas como processos em suas vidas.

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Fazendo o login da pesquisa

O estudo teve como objetivo verificar a virtualização do conhecimento para alunas/professoras do curso Pead. Para tanto, integramos os conceitos de virtual, sociedade em rede e complexidade do aprender com a finalidade de res-ponder à questão norteadora: como ocorre a virtualização do conhecimento para alunas/professoras do curso Pead?

O objetivo foi verificar como ocorre a virtualização do conhecimento para alunas/professoras do curso Pead.

Os dados dessa pesquisa foram coletados e analisa-dos dentro da perspectiva próxima da netnografia. Os da-dos foram obtidos nos blogs, denominados no curso como “portfólios de aprendizagens”, das alunas/professoras do curso. Consideramos os blogs das alunas/ professoras dos cinco polos do curso localizados nos municípios de São Leo-poldo, Sapiranga, Gravataí, Alvorada e Três Cachoeiras, do estado do Rio Grande do Sul.

Esses resultados foram obtidos por meio da análise das postagens selecionadas e apontadas conforme a Tabela 1:

Tabela 1 - Critérios de seleção das postagens

Eixo/semestre VIIISão

LeopoldoSapiranga

Três Cachoeiras

Gravataí Alvorada Total

1ª seleção - postagens 1.053 1.021 1.144 990 1.266 5.474

2ª seleção - postagens sobre tecnologias

176 885 44 93 440 1.638

Seleção final – posta-gens com evidências do trabalho com alunos nas escolas

19 13 8 6 26 72

A primeira seleção se refere a todas as postagens reali-zadas durante as práticas de estágio no período de março a agosto de 2010. A segunda seleção diz respeito às postagens relacionadas às tecnologias digitais, realizadas durante as

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práticas de estágio, no mesmo período. A seleção final con-templa as postagens que mostram o uso das TIC, por meio de registros, imagens, vídeos, arquivos e links. Destacamos novamente que essas postagens foram realizadas durante as práticas de estágio curricular.

Nesta análise destacam-se os enfoques privilegiados nas postagens das alunas/professoras. Organizamos estes enfoques em dois grupos de categorias: marcas da virtuali-zação na lógica da rede e visão da cibervioda na formação profissional, conforme a Figura 1.

Figura 1 - Enfoques e categorias

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Conectando os links – hipertextualidade da pesquisa

A formação dessas alunas/professoras contribuiu para mostrar que qualquer tecnologia pode ser educacional, des-de que exista uma intenção e um planejamento pedagógico para seu uso. O que faz uma tecnologia ser útil ou não na educação é a postura do professor diante do recurso, é a proposta de uso para a ferramenta. Novas linguagens e no-vas formas de interação envolvem os alunos atualmente e os professores. Trabalhar com educação é buscar constante-mente formas e alternativas de envolver os alunos, de des-pertar neles o desejo de aprender.

Entrar em contato com as possibilidades do ciberes-paço durante a formação profissional contribuiu para as alunas/professoras perceberem novas metodologias, no-vas didáticas e formas de trabalhar com os alunos. Para Silveira, Teixeira e Carvalho (2009), a web 2.0 traz uma nova estrutura e organização para a postura do professor e consequentemente do aluno. Convida o professor a pensar sobre o planejamento para o uso de diferentes mídias, como vídeos, textos colaborativos, home pages e outros.

No momento em que as alunas/professoras se sentem desafiadas a explorar o ciberespaço, espaço novo e desco-nhecido para muitas, elas têm suas ações potencializadas, independentemente de estarem no espaço temporal ou di-gital. O fato é que o uso constante do ciberespaço durante o curso trouxe novos sentidos e novos significados para suas relações com o seu fazer pedagógico.

Castells (2001) fala a respeito de que as pessoas, as ins-tituições, as empresas e a sociedade em geral transformam a tecnologia (e aqui o autor se refere a qualquer tecnologia), apropriando-se dela, modificando-a, experimentando-a.

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A formação de professores para uma sociedade em rede ultrapassa a proposta de oferecer algumas disciplinas de introdução à informática educativa. A proposta do curso em pauta foi desenvolvida dentro da lógica da rede, e se traba-lhou com essa lógica nas práticas docentes das alunas/pro-fessoras, que foi se constituindo em um momento de (re)sig-nificar as aprendizagens e de multiplicar o conhecimento.

O desenho didático metodológico do curso Pead con-templa o uso dos espaços abertos da web, o que é um dife-rencial na modalidade a distância. O Pead usa, predomi-nantemente, como espaço digital o Pbworks, que pode ser acessado e visitado por qualquer usuário da rede.

A escolha da equipe pedagógica do curso Pead por ferramentas abertas na rede fez a diferença na formação dessas alunas/professoras. O trabalho com ferramentas e recursos digitais a partir de uma proposta que desdobra possibilidades didáticas no ciberespaço abre possibilida-des aos professores em formação de imaginar outras ações cotidianas com seus alunos. As alunas/professoras não es-peravam desenvolver conhecimentos tecnológicos para en-sinar, mas para desenvolver suas atividades discentes da graduação, entretanto, aprenderam para suas atividades docentes.

As alunas/professoras ao ingressarem no curso apre-sentavam um perfil de excluídas digitalmente, pois ao mes-mo tempo em que pertenciam a uma sociedade em rede, não tinham sequer um endereço eletrônico. Muitas delas não sabiam como navegar na internet, fazer uma apresen-tação em slides ou digitar e formatar um texto. O conheci-mento tecnológico era praticamente nulo e nenhuma delas esperava terminar um curso de graduação fazendo parte de diferentes redes sociais na web.

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Estamos tratando de um público adulto que faz parte da sociedade em rede. Todavia, a maioria, antes de ingres-sar no curso, não se sentia incluída digitalmente. É fato que a maioria não dispunha de conhecimentos necessários que as habilitassem participar da rede e ao uso do computador como instrumento para o trabalho ou lazer. Cabe destacar que o edital de seleção do curso não exigia conhecimentos de informática ou de navegação na web.

Ao ingressarem no curso, as alunas/professoras foram convidadas ao contato com as tecnologias, o que para mui-tas era novidade. Para as alunas/professoras foi um desafio a realização de atividades no modo digital. No entanto, o contato intensivo e constante com as ferramentas digitais encorajou-as ao uso de tais recursos em suas práticas do-centes. Contribuiu para que os conhecimentos tecnológicos, virtualizados durante as atividades do curso, fossem poten-cializados durante as práticas docentes, em especial no es-tágio curricular.

Os conhecimentos tecnológicos são absorvidos de forma intrínseca e se virtualizam durante as práticas discentes dessas alunas. A virtualização, ao fazer parte do cotidiano, estabelece-se em potência para conferir um novo sentido e significação às práticas docentes. Lévy (1996, p. 24) fala que “a virtualização se constitui na passagem do interior ao exterior e do exterior ao interior”. É nesse movimento cons-tante de aprender a (re)aprender novas formas de comu-nicar, interagir, ler, escrever, novas formas de viver, novas metodologias, novas didáticas que a virtualização se consti-tui para alunas/professoras do curso. Elas desenvolvem um movimento de aprender para ensinar. Quando aprendem, multiplicam seus conhecimentos. Elas realizam o “ensinar para aprender” quando exploram as ferramentas digitais com seus alunos, mesmo sem domínio total da ferramen-ta. As alunas/professoras virtualizam o conhecimento ao

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aprender e se dispor a aprender na interação com seus pa-res, com os docentes do curso, mas, sobretudo, na relação com seus alunos no cotidiano. Esse movimento exige de to-das (re)aprender a aprender, pois altera diretamente a pos-tura que elas apresentavam diante das tecnologias digitais, influencia na disponibilidade de querer aprender e querer ensinar de outro modo.

A virtualização do conhecimento nas ações docentes das alunas/professoras revela que os planejamentos didá-ticos contemplaram não o uso da ferramenta em si, mas a lógica do uso, ou seja, de como funciona o recurso e quais as possibilidades pedagógicas que este oferece. Encontramos construção de blogs, de páginas coletivas, de mapas concei-tuais, de projetos de aprendizagens desenvolvidos dentro e fora do ciberespaço. Encontramos arquiteturas pedagógi-cas em espaços concretas e em espaços digitais, produção de vídeos, de livros digitais, de CDs.

A virtualização do conhecimento das alunas/professo-ras se potencializou em práticas desenvolvidas em espaços digitais na intenção de uso pedagógico junto aos alunos na escola. O que se percebe é que as alunas/professoras com-preenderam e mostraram maneiras de trabalhar com a ló-gica da rede em seus planejamentos.

A virtualização do conhecimento desenvolvida duran-te a formação das alunas/professoras dimensiona-se para além das atividades do curso ao abranger as ações docentes e as ações sociais. A virtualização do conhecimento altera e influencia o dia a dia dessas alunas/professoras, tanto do ponto de vista profissional quanto do familiar e social. Os dados coletados apontam características no perfil constituí-do durante a virtualização do conhecimento:

• maior autonomia e apropriação tecnológica na rede;• renovação e qualificação profissional;• ampliação da rede social no ciberespaço;

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• potencialização da vida no ciberespaço. É fazer parte da rede;

• autoestima por saber fazer, saber ensinar e multipli-car o conhecimento;

• visão de mundo para o tempo e espaço atual;• novas posturas diante do uso das tecnologias.

Salvando os arquivos da pesquisa

Os dados deste trabalho mostram a relação direta en-tre a proposta de um desenho didático metodológico para a formação de professores que introduz as tecnologias digi-tais nas práticas docentes de forma direta através do uso intensivo das possibilidades do ciberespaço no curso.

O que potencializa a virtualização do conhecimento não é o ciberespaço em si, mas a lógica deste nas ações das alunas/professoras. Do mesmo modo que o uso das tecnolo-gias na educação faz sentindo tão somente quando emba-sado em intenções pedagógicas justificadas e esclarecidas. O planejamento que abrange e potencializa as possibilida-des de trabalhar dentro do contexto digital e de uma socie-dade em rede cria um uso pedagógico das tecnologias digi-tais no contexto escolar.

Ao desenvolver seu conhecimento dentro de um projeto específico na modalidade de ensino a distância, o aluno res-ponde aos conteúdos programáticos que estão associados ao desenvolvimento de uma rede relacional no ciberespaço. São informações e conhecimentos construídos individual e colaborativamente, que podem ser resignificados em outras ações e práticas no cotidiano da sala de aula.

A tecnologia digital, por si só, não garante a inovação pedagógica. Para realizar inovação pedagógica é necessário desenvolver uma epistemologia que sustente a integração do aparato digital ao privilegiar as relações na rede e ao

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Patrícia Grasel Silveira, Marie Jane Soares Carvalho

criar formas de agir e pensar que encontrem esta lógica de rede. As possibilidades oferecidas pela web podem provocar um novo olhar, avesso à linearidade, mais envolvente ao sustentar planejamentos participativos e a interação com e entre os alunos. A virtualização do conhecimento é criada e potencializada no envolvimento dos sujeitos com o ciberes-paço. A virtualização ganha dimensões que influenciam as práticas e ações desses sujeitos, seja no âmbito profissional, seja no social e familiar.

ReferênciasCARVALHO, Marie J. S.; NEVADO, Rosane; MENEZES, Crediné S. Aprendizagem em rede na educação a distância: concepções e supor-te telemático. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO, XVI, 2005. Anais... Juiz de Fora: Universidade Fede-ral de Juiz de Fora, 2005. p. 362-372. Departamento de Ciência da Computação, Porto Alegre. _______. Aprendizagem em rede na educação a distância – estudos e recursos para formação de professores. Porto Alegre: Lens, 2007.CARVALHO, Marie J. S.; NEVADO, Rosane; BORBA, Merion. Guia do professor – curso de licenciatura em Pedagogia a Distância – Fa-culdade de Educação (Faced/UFRGS) - Núcleo de Estudos em Tecno-logias Digitais na Educação, 2006.CARVALHO, Marie J. S. S.; SILVEIRA, Patrícia G. S. A explora-ção de uma arquitetura pedagógica em sala de aula. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO, XX, 2009, Flo-rianópolos - SC. Anais...CARVALHO, Marie J. S. Soares; SARTORI, Leonardo Porto. Portfó-lio educacional: um Guia didático de avaliação. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2005. [no prelo]CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999.FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 10. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981._______. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994

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Viagem ao ciberespaço: a virtualização do conhecimento na educação a distância

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PARTE 1

TECNOLOGIAS DE INCLUSÃO DIGITAL

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A produção do habitus na sociedade do conhecimento: incorporação tecnológica e formação de professoras na

modalidade EaD

Renato Avellar de AlbuquerqueMarie Jane Soares Carvalho

Introdução

ste artigo surgiu de um projeto de mestrado de mes-mo título, defendido no ano de 2010 na UFRGS, sob orientação da professora Doutora Marie Jane Soa-res Carvalho, tratando da formação de professoras

na modalidade educação a distância (EaD). As análises que são divulgadas neste artigo foram possíveis pela realização de uma pesquisa, iniciada em 2008, sobre os usos do tempo de professoras do curso de Pedagogia na modalidade a dis-tância, aplicada às professoras estudantes do curso de Pe-dagogia Séries Iniciais: Modalidade a Distância, promovi-do pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Pead/UFRGS).

Todavia, uma produção científica não se caracteriza tão somente por uma metodologia para interpretação do real,

E

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esta se consuma com a síntese realizada pelos pressupostos conceituais e o enfoque dado aos resultados das pesquisas, o que possibilita a criação de esquemas de funcionamento social, como ferramenta interpretativa e analítica para o desenvolvimento do conhecimento científico.

Ao partir da premissa de que as tecnologias da infor-mação e comunicação (TICs) constituem um elemento com alto potencial de transformação nas relações sociais, esta produção científica busca verificar em um grupo com con-dições materiais, culturais e conjunturais favoráveis como essa tecnologia vem se agregando ao cotidiano, quais suas relevâncias nas atividades diárias, se realmente existe um aumento de tempo dedicado ao uso das TICs e se esse tem-po é utilizado como atividade produtiva, sendo concorrente ou adaptativo aos outros aspectos da vida pessoal.

A proposta apresentada neste artigo pretende avaliar o duplo aspecto do contexto histórico atual, representado pelo avanço das TICs na sociedade e seu reflexo na educa-ção, o processo de incorporação das tecnologias na formação do habitus pelos professores através de uma trajetória de formação universitária, observando as características e os limites que esse processo de transformação encontra ao se chocar com as estruturas sociais concretas e mentais.

A pesquisa apresentada neste artigo mostra que existe um aumento do tempo destinado ao uso das tecnologias, influenciado pelo contexto da EAD, e que este aumento pro-duz uma condição objetiva para a interiorização das TICs como estruturas estáveis na prática docente. Contudo, po-demos questionar se essa prática encontra uma condição favorável para se tornar prática dentro das escolas, lugar específico de trabalho da amostragem de trabalhadoras pesquisadas.

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Habitus em produção

A análise das transformações sociais, em qualquer dos aspectos que seja abordado, depende da constituição das re-lações de poder e das relações simbólicas que os permeiam. Segundo Bourdieu (1991), é impossível realizar uma aná-lise sobre as relações de poder institucionais sem verificar ao mesmo tempo a constituição social dos agentes que o exercem e também verificar a constituição simbólica e so-cial daqueles que o recebem. Nesse sentido, falar sobre as transformações tecnológicas do mundo atual requer sem-pre localizar a que parcela da sociedade essas mudanças se relacionam, pois cada segmento social encerra as especifi-cidades relacionadas ao trabalho, à classe social, ao gênero, à região etc.

O conceito de habitus é uma forma de compreender este conjunto de predisposições incorporadas pelas apren-dizagens sociais, seja na interferência da educação, seja pela observação das lógicas, procedimentos e estratégias sociológicas subjetivadas pela formação histórica de cada sujeito, que são tomadas como referenciais sobre as práti-cas atuais e futuras, não significando modelos de compor-tamento cristalizados. Essas predisposições incorporadas funcionam como padrão de reação, construído e aperfeiçoa-do ao longo de uma formação histórica individual, que, por sua vez, incorpora e adapta novos procedimentos aprendi-dos nas relações sociais, entre as quais a educação, alimen-tando a dinâmica de reação aos estímulos cotidianos.

Por outro lado, todas as atividades desenvolvidas pelos sujeitos não partem apenas de predisposições subjetivas, são resultados de condições externas e organizações sociais imprimidas pelos habitus dos demais sujeitos formadores de uma realidade social, ou seja, formadoras dos costumes

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e da cultura, das normas morais e éticas, das instituições legais e de poder, enfim, de toda estrutura objetiva que for-ma a realidade concreta exterior ao sujeito.

Bourdieu afirma que a escola é a responsável pelo de-senvolvimento de esquemas duráveis (habitus) e que es-ses esquemas só podem se tornar transferíveis quando os próprios formadores os incorporam. As instituições, entre as quais a universidade, têm por finalidade a intenção de produzir indivíduos modificados de forma durável, sistema-ticamente por uma ação prolongada de transformação que tende a dotá-los de uma mesma formação durável e trans-ferível, esquemas comuns de pensamento, de percepção, de apreciação e de ação (Bourdieu; Passeron, 2009, p. 231).

Essa relação entre as disposições e as condições objeti-vas que cercam os indivíduos funciona como uma equação, produzindo as práticas sociais cotidianas entre o que já foi incorporado pela formação histórica e o que esta incorpora-ção afetado nas ações do devir. Nesta pesquisa foi primor-dial reconhecer e avaliar as práticas ligadas ao processo de formação, trabalho e uso das tecnologias, buscando inter-pretar a relação do tempo com a atividade produtiva e as mudanças que estão relacionadas com o uso das TICs, por um lado, e o tempo dedicado a outras atividades, inerente às atividades do âmbito pessoal, que poderão representar uma amostra das conservações sociais do cotidiano, mais influenciada pelos habitus e organizações familiares e con-dições de trabalho.

Metodologia

A reflexão teórica apresentada neste artigo foi reali-zada sob a utilização de dados obtidos a partir da pesquisa intitulada “Estudos sobre os usos do tempo de professoras

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do curso de pedagogia na modalidade a distância”, iniciada em março de 2008 sob coordenação da professora Doutora Marie Jane Soares Carvalho. Parte do grupo de pesquisa, contudo, possui um histórico de trabalhos com as tempo-ralidades, que se iniciam com a participação em uma pes-quisa desenvolvida na UFMG, sob orientação da professora Doutora Neuma Aguiar, e com o trabalho de pesquisa inti-tulado “Os usos do tempo entre crianças e jovens de classe popular”, coordenado pela professora Doutora Marie Jane Soares Carvalho a partir de 2004.

A pesquisa aqui utilizada observou os orçamentos do tempo entre professoras em formação no curso de Peda-gogia na Modalidade a Distância (Pead) da UFRGS, estu-dantes de cinco cidades-polos do estado do Rio Grande do Sul. Ao todo são cerca de quatrocentas alunas no curso e a pesquisa analisa o tempo de 176 delas, dividido entre todos os polos, sendo, portanto, uma amostra representativa do conjunto do Pead.

O software usado na tabulação e compilação dos dados quantitativos da pesquisa é o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), agregando os orçamentos de tempo das atividades desenvolvidas ao longo de 24 horas de um dia da semana, aleatoriamente escolhido pelo caderno, e 24 horas do domingo, representando o final de semana.

O Pead foi um curso iniciado no segundo semestre de 2006, coordenado pelas professora Doutora Marie Jane Soa res Carvalho e Rosane Aragon Nevado, sendo a prepa-ração prática para o seu desenvolvimento iniciado no pri-meiro semestre do mesmo ano, com a formatura das tur-mas em 2011. O curso era dividido em eixos, com duração semestral, onde eram agregadas interdisciplinas com um seminário integrador. Essa estrutura auxiliava na organi-zação do curso em grandes áreas do conhecimento, manten-

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do uma coesão entre o conhecimento desenvolvido em cada interdisciplina e entre os eixos.

O Pead foi desenvolvido com uma pedagogia baseada nas condições específicas das estudantes, ou seja, o curso foi justamente planejado para atender professores em atu-ação no ensino fundamental, o que significa ter estudantes com uma carga horária de trabalho e uma experiência pro-fissional com seus respectivos saberes docentes.

Facilita a pesquisa o fato de serem, em sua maioria, professoras, o que sugere que possam pertencer a uma mesma classe social e sujeitas às mesmas especificidades de gênero. Nesta pesquisa existe inerentemente uma coe-são nos quesitos de gênero, classe e níveis de escolarização que permitem uma análise com menor número de exceções e relativizações, o que facilita uma abordagem mais geral e precisa da amostra.

A flexibilização do tempo no acompanhamento do cur-so é fator essencial para possibilitar a formação dessas pro-fessoras, que de outra maneira dificilmente teriam chances de se qualificarem em uma universidade na modalidade presencial. Além dessa adaptação às realidades específicas do público, toda a pedagogia desenvolvida para este curso foi pensada de forma a tornar os conhecimentos propostos pelo currículo o resultado de um amplo trabalho de inte-ração entre objetos de aprendizagens, professores, tutores e discentes, em uma organização altamente interativa (Carvalho et. al., 2006).

O curso foi construído para atender a estudantes de cinco cidades polos, quatro delas na região metropolitana de Porto Alegre e uma, Três Cachoeiras, fora desse perímetro. Cada polo possuía tutores que atuavam prioritariamente no atendimento presencial, além de uma equipe permanente de tutores de sede que atuavam nas interdisciplinas de cada

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eixo. Contudo, a interdisciplina Seminário Integrador era o fio condutor das transformações de cada eixo; nela eram alocados os professores coordenadores de polo e professores que possuíam como finalidade manter a coesão entre cada eixo do curso, ao longo de toda a graduação.

Apresentação de dados da pesquisa

Das estudantes pesquisadas, cinco declararam como trabalho principal a “atividade de docência”, 138 se decla-raram como “professoras”, seis, como “agentes educativos”, estas três ocupações somaram 84,7% da amostra analisa-da. Cerca de 15% da amostra são de estudantes que exer-cem outras atividades não vinculadas à docência.

Tabela 1 - Ocupação profissional primária dos indivíduos da pesquisa de usos do tempo

Frequencia PorcentagemPorcentagem

válidaPorcentagem

cumulativa

Atividade docência 5 2,8 2,8 2,8

Professor 138 78,4 78,4 81,3

Outros agentes educativos

6 3,4 3,4 84,7

Outras ocupações 23 13,1 13,1 97,7

Missing 4 2,3 2,3 100,0

Total 176 100,0 100,0

O levantamento da ocupação secundária não permi-te uma posição conclusiva, posto que 55,7% delas não in-formaram, embora 22,2% tenham se declarado “donas de casa”, sendo um número representativo para a definição do papel desempenhado na estrutura familiar, justificando a pertinência das análises sobre o tempo familiar nas ativi-dades ligadas ao tempo dedicado ao trabalho remunerado e ao processo de qualificação.

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Tabela 2 - Ocupação profissional secundária dos indivíduos da pesquisa de usos do tempo

Frequencia PorcentagemPorcentagem

válidaPorcentagem

cumulativa

Apicultora 1 ,6 ,6 ,6Apoio pedagogico 1 ,6 ,6 1,1Artesanato 1 ,6 ,6 1,7Assistente administ 1 ,6 ,6 2,3Aula particular 3 1,7 1,7 4,0Comerciante 2 1,1 1,1 5,1Dona de casa 39 22,2 22,2 27,3Esteticista 1 ,6 ,6 27,8Estudante 9 5,1 5,1 33,0Grupo de mulher 1 ,6 ,6 33,5Grupo escoteiro 1 ,6 ,6 34,1Manicure 2 1,1 1,1 35,2Minimercado 1 ,6 ,6 35,8Nao informado 98 55,7 55,7 91,5Não informado 2 1,1 1,1 92,6Professora 1 ,6 ,6 93,2Proprietária posto 1 ,6 ,6 93,8Secretaria 2 1,1 1,1 94,9Smed 1 ,6 ,6 95,5Superintendente 1 ,6 ,6 96,0Vendedora 3 1,7 1,7 97,7Voluntária 1 ,6 ,6 98,3Voluntário 3 1,7 1,7 100,0Total 176 100,0 100,0

Um outro levantamento serve de base para esta aná-lise, no segundo semestre de 2006. Nesse período as pro-fessoras estudantes preencheram um questionário onde uma das questões perguntadas foi: qual a sua carga horá-ria total de trabalho? Para ilustrar esse comparativo foram selecionados dois polos, o do município de Alvorada e o do município de Gravataí, ambos na região Metropolitana de Porto Alegre.

Se comparado ao início do curso, a carga horária de trabalho das alunas professoras não se alterou muito, fa-

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zendo uma comparação entre o tempo de trabalho obser-vado em um dia da semana (Figura 1) e a média de carga horária semanal declarada no início do curso (Tabela 3), podemos observar uma equivalência de tempo.

Figura 1 - Tempo médio de trabalho remunerado em um dia da semana em minutos

Tabela 3 - Pesquisa estatística do tempo de trabalho/semana no início do curso (Polo de Gravataí)

Média de trabalho em horas no polo de Gravataí

Qual a sua carga horária total de trabalho?Calcular Resultado

Desvio padrão 10.216928759188Média 39.304347826087Mínimo 20Máximo 60

Os dados obtidos na pesquisa de usos do tempo nos permitem fazer uma comparação com os usos do computa-dor pelas professoras estudantes no início do curso, quando uma pesquisa feita por questionários pôde dar uma visão panorâmica sobre o nível de inclusão.

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Polo AlvoradaQuantas horas por dia você usa o computador?

Resposta Contagem PercentagemSem resposta 16 25,40% Menos que 10 minutos (r1) 8 12,70% Menos de 1 hora (r2) 12 19,05% Entre 1 e 2 horas (r3) 14 22,22% Entre 2 e 3 hora (r4) 13 20,63%

Polo AlvoradaQuantas vezes por semana você usa o computador?

Resposta Contagem PercentagemSem resposta 13 20,63% Eventualmente, não necessariamente todas as semanas

14 22,22%

Um dia por semana (r2) 3 4,76% Dois dias por semanas (r3) 2 3,17% De três a seis dias (r4) 14 22,22% Todos os dias (r5) 17 26,98%

Polo GravataíQuantas horas por dia você usa o computador?

Resposta Contagem Percentagem

Sem resposta 8 17,39% Menos que 10 minutos (r1) 8 17,39% Menos de 1 hora (r2) 19 41,30% Entre 1 e 2 horas (r3) 8 17,39% Entre 2 e 3 hora (r4) 3 6,52%

Polo GravataíQuantas vezes por semana você usa o computador?

Resposta Contagem PercentagemSem resposta 6 13,04% Eventualmente, não necessariamente todas as semanas

12 26,09%

Um dia por semana (r2) 3 6,52% Dois dias por semanas (r3) 9 19,57% De três a seis dias (r4) 7 15,22% Todos os dias (r5) 9 19,57%

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Os dados obtidos com a pesquisa dos usos do tempo mostram que o uso do computador como atividade primá-ria fica abaixo dos 30min, se tomarmos uma média entre os cinco polos. Entretanto, ao avaliarmos esse tempo como atividade secundária, podemos verificar um aumento sig-nificativo desse uso, pois, nesse caso, a atividade principal pode ser a de estudo e a utilização do computador um meio para realizar esta tarefa.

Figura 2 - Tempo médio de uso do computador em um dia da semana em minutos

Figura 3 - Tempo médio de uso do computador como atividade secundária em um dia da semana em minutos

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Os dados apresentados também apontam para uma permanência do tempo destinado ao trabalho, enquanto o uso do computador e do estudo passou a ter uma relevância maior nos orçamentos de tempo das professoras estudan-tes. Esses indícios nos levam às questões levantadas na hi-pótese do projeto defendido em 2010: se houve um aumento do tempo destinado à atividade produtiva, como se desen-volve o processo de adaptação do tempo pessoal a essa nova estrutura, quais os limites encontrados, e em que medida isso significa a incorporação de novos habitus nos orçamen-tos do tempo diário?

Uma comparação dos dados divididos entre tempo de trabalho remunerado, tempo de estudo, tempo de cuidados pessoais e tempo de cuidados com a família ilustram como as condições objetivas da organização dessas estudantes criam condições que limitam uma ampliação do uso do com-putador, embora ele seja uma demanda para a realização do curso e que encontre, hipoteticamente, nas professoras uma condição favorável à inclusão digital. A seguir, duas fi-guras representam este tempo diário dividido em minutos.

Figura 4 - Orçamento médio do polo de Alvorada

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Figura 5 - Orçamento médio do polo Gravataí

As figuras mostram a divisão do tempo médio das pro-fessoras estudantes organizado em quatro atividades prin-cipais ao longo de um dia da semana. Somente essas quatro atividades, juntas, correspondem a uma média aproximada de 21 horas por dia.

I nterpretação dos dados

Os resultados da Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar (PNAD), realizada em 2008 pelo IBGE, mostra-ram que o uso da internet está intimamente ligado ao estu-do. Os resultados mostram que entre as mulheres estudan-tes cerca de 70% utilizaram a internet no período base dos últimos três meses, ao passo que na população de mulheres não estudantes esse índice cai para menos de 30% na região Sul. Esse contexto de formação significou uma inclusão di-gital das professoras estudantes em maiores e menores ní-veis segundo os polos observados. A análise preliminar dos

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dados mostra que aproximadamente 30% dos pesquisados utilizaram o computador na semana, e esse uso foi de apro-ximadamente 25min como atividade primária e, em média, 70min como atividade secundária. Em comparação com a pesquisa realizada no início do curso, através de questio-nário estruturado, podemos observar um aumento nesse uso, embora apenas cerca de 35% das estudantes declaras-sem usar o computador mais de três vezes por semana. No exemplo específico de Gravataí, o uso total do computador ficava na sua maior parte restrita a menos de 1h diária.

No caso de Três Cachoeiras, por exemplo, o número de estudantes que não possuíam computador no início do cur-so era de 50%, passou para, na metade do curso, aproxima-damente 7,5%. Além disso, o tempo de uso do computador como atividade primária e secundária passou a ser, em mé-dia, de aproximadamente 110min, ao passo que no início do curso apenas 23% das alunas utilizavam o computador por mais de 1h. O local privilegiado de acesso à internet é o do-micílio; entre as mulheres da região Sul 64,4% acessam de casa, seguido do local de trabalho com 34,1% (IBGE, 2008). Essa tendência talvez explique um maior grau de inclusão nos polos onde as professoras estudantes tiveram maior desenvolvimento nas condições de acesso, pela compra de computador e instalação de conexões com a internet.

Os sujeitos pesquisados, que usaram o computador na semana, dedicam seu tempo numa faixa de tempo de 10 a 20min como atividade primária, mas este tempo aumenta entre 40 e 50min quando consideramos o uso do computa-dor como atividade secundária. Entretanto, ao considerar-mos que esse uso diário do computador ainda ficou restrito a cerca de 30% das professoras estudantes e considerando ainda que se trata de um contexto privilegiado, podemos questionar o quanto a construção do habitus ligado ao uso

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das TICs está se desenvolvendo na “sociedade do conheci-mento”.

A hipótese é que o uso do computador foi integrado ao tempo de estudo, mas este uso não se estendeu a outras atividades cotidianas. As atividades ligadas ao trabalho não se alteraram; portanto, o tempo utilizado para estudo e uso do computador foi deduzido do tempo destinado aos cuidados com a família, cuidados pessoais e atividades so-ciais, embora as demandas de tempo para essas atividades possam explicar os limites para uma maior inclusão das professoras estudantes, portanto, de uma maior integração às TICs.

Segundo a PNAD (IBGE, 2008), o número de pessoas que não acessam a internet ainda é maior do que o núme-ro de pessoas que acessam; contudo, quando considerada a população estudante, essa tendência se inverte. Na re-gião Metropolitana de Porto Alegre, por exemplo, dos 3.472 pesquisados 1.524 usaram a internet no período, contra 1.948 que não a utilizaram. Quando levamos em conta o fator estudante, que contabiliza 791, observamos que 583 a utilizaram, contra 208 que não fizeram uso dela. Esses dados apontam para outra característica das professoras estudantes do Pead que favorecem o enquadramento en-quanto sujeitos em contextos privilegiados de acesso.

As condições de acesso e, mesmo, as demandas da qua-lificação do trabalho produtivo não transformam pronta-mente a realidade objetiva desses grupos sociais, conser-vadas pelo habitus e pelas formas de organização social inerentes a outros campos, como a organização do tempo escolar, fortemente influenciadas pelas questões de gênero, estruturação das famílias e pelas limitações que o tempo do trabalho impõe ao aumento dessa qualificação integra-da à tecnologia. Esses dados podem apontar quais são as

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principais demandas desses sujeitos pesquisados, quais as funções que se destinam a aplicação tecnológica e como es-sas TICs estão sendo incorporadas por essas professoras estudantes no seu cotidiano.

Entretanto, é possível notar um aumento do uso do tempo ligado ao aspecto do estudo e do computador, portan-to, existe de fato um grau de “inclusão digital” atrelado ao uso do tempo direcionado à atividade produtiva. A pesquisa mostra as características desse uso, pois verificamos um aumento mais acentuado do computador enquanto ativida-de secundária.

Compreender as características dessa utilização do computador pode também ajudar na análise desse uso pe-los professores, qual o grau de integração tecnológica e as possibilidades de que este uso seja agregado ao trabalho pedagógico desenvolvido nas escolas. Para isso é necessário analisar os dados do uso do computador voltado também para o trabalho remunerado, realizado nos finais de sema-na ou integrado ao tempo de trabalho durante os dias da semana.

Essas análises possibilitam verificar as transforma-ções que o uso tecnológico está promovendo nos processos de qualificação do trabalho, especificamente da formação docente, nas transformações das relações sociais no meio familiar e nos tempos dedicados à atividade produtiva, li-gados diretamente ao mundo do trabalho. A hipótese inicial é de que o tempo destinado ao trabalho aumentou, embora sua aderência ao tempo de formação e à mediação realizada pelas TICs dissimule este tempo enquanto tempo produtivo.

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A produção do habitus na sociedade do conhecimento: incorporação tecnológica e formação de...

Considerações fi nais

Os dados e análises feitas neste artigo encaminham a conclusão para o fato de que a sociedade do conhecimento, entendida como uma nova etapa do capitalismo mundial, vem criando contextos propícios para a incorporação tecno-lógica em vários segmentos da sociedade, entre os quais a do corpo docente das escolas. Contudo, este processo é, em grande parte, limitado pelas condições reais que esses pro-fissionais encontram na destinação do tempo para este uso tecnológico, impedido que exista uma incorporação desse habitus tecnológico na vida dos professores, necessária ao processo de reprodução das estruturas mentais inerente à ação pedagógica nas escolas.

Este processo caminha junto com a intensificação do trabalho docente, em que as atividades produtivas dividem seu espaço com as atividades de cuidado pessoal e familiar, restando muito pouco tempo para outras atividades impor-tantes ao longo do dia. Enquanto a formação e qualificação do professor, integrada às TICs, não for encarada como ati-vidade produtiva que deve ser adaptada ao orçamento diá-rio, remunerada e reconhecida como trabalho, a ampliação do estudo e da inclusão digital terá uma duração limitada na prática de formação das professoras, durando somente o tempo em que elas estão sujeitas às condições favoráveis de um curso na modalidade EAD, podendo não constituir a formação de esquemas interiorizados e duráveis de utiliza-ção tecnológica.

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Trajetórias de letramento: do caderno para a web

Nádie Christina Ferreira Machado-Spence Marie Jane Soares Carvalho

Introdução

té meados da década de 1980, a terminologia ado-tada nas publicações acadêmicas remetia aos ter-mos alfabetização e analfabetismo. A primeira menção ao termo letramento, no Brasil, é atribuída

a Mary Kato, em 1986, no livro No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística. O status acadêmico é atribuído por Soares (2003) à obra Adultos não alfabetizados: o aves-so do avesso, publicada em 1988 por Leda Tfouni. Nela, a autora distingue os conceitos alfabetização de letramento. Tfouni e Kleiman são as primeiras autoras a publicar livros com o verbete letramento no título, respectivamente: “Le-tramento e alfabetização” (Tfouni, 1995) e “Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita” (Kleiman, 1995). Até então, alfabetização e li-teracy4 eram traduzidas como equivalentes. Um exemplo que revela essa correspondência é a obra de Paulo Freire e

4 Termo em inglês que deu origem à palavra letramento em português (Bra-sil), literacia (Portugal).

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Donaldo Macedo Alfabetização: leitura do mundo, leitura da palavra, publicada em inglês sob o título Literacy: rea-ding the world and the word.5

Outra autora importante na área de letramento, no Brasil, é Leda Veridiani Tfouni (1995, p. 31), também uma das primeiras a adotar o termo, que o define como “[...] um processo cuja natureza é sócio-histórica deve-se aceitar que tanto pode haver características orais no discurso escrito quanto traços da escrita no discurso oral. Essa interpene-tração das duas modalidades inclui, portanto, entre os le-trados também os não-alfabetizados, mas com baixo grau de escolaridade”.

Destacamos, ainda, a ênfase na relação entre oralida-de e escrita em contraponto com o que a autora chama de a “grande divisa”. Essa pode ser explicada em decorrência de estudos realizados por pesquisadores, como Ong (1986), que compreende letramento comparando sociedades ágra-fas com letradas; Havelock (1963, 1982, 1986), que analisa a introdução da escrita desde a Grécia Antiga, contraposta ao uso da memória e dos discursos orais, sofrendo a resis-tência de Platão, que considerava que o texto não poderia defender as ideias do autor, ou Goody (1977, 1987), cujos estudos históricos e antropológicos apontariam diferentes mentalidades entre os povos de culturas ágrafas e letradas.

Da alfabetização ao letramento

Até meados da década de 1980, a terminologia adotada nas publicações acadêmicas remetia aos termos alfabetiza-ção e analfabetismo. A primeira menção ao termo letramen-to, no Brasil, é atribuída a Mary Kato, em 1986, no livro

5 O livro em inglês, segundo nossos registros, foi publicado em 1987, e em português em 1990.

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No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística. O status acadêmico é atribuído por Soares (2003) à obra Adul-tos não alfabetizados: o avesso do avesso, publicada em 1988 por Leda Tfouni. Nela, a autora distingue os conceitos alfa-betização de letramento. Tfouni e Kleiman são as primeiras autoras a publicar livros com o verbete letramento no tí-tulo, respectivamente: “Letramento e alfabetização” (Tfou-ni, 1995) e “Os significados do letramento: uma nova pers-pectiva sobre a prática social da escrita” (Kleiman, 1995). Até então, alfabetização e literacy6 eram traduzidas como equivalentes. Um exemplo que revela essa correspondência é a obra de Paulo Freire e Donaldo Macedo Alfabetização: leitura do mundo, leitura da palavra, publicada em inglês sob o título Literacy: reading the world and the word.7

Outra autora importante na área de letramento, no Brasil, é Leda Veridiani Tfouni (1995, p. 31), também uma das primeiras a adotar o termo, que o define como “[...] um processo cuja natureza é sócio-histórica deve-se aceitar que tanto pode haver características orais no discurso escrito quanto traços da escrita no discurso oral. Essa interpene-tração das duas modalidades inclui, portanto, entre os le-trados também os não-alfabetizados, mas com baixo grau de escolaridade”.

Destacamos, ainda, a ênfase na relação entre oralida-de e escrita em contraponto com o que a autora chama de a “grande divisa”. Esta pode ser explicada em decorrência de estudos realizados por pesquisadores, como Ong (1986), que compreende letramento comparando sociedades ágra-fas com letradas; Havelock (1963, 1982, 1986), que analisa a introdução da escrita desde a Grécia Antiga, contraposta

6 Termo em inglês que deu origem à palavra letramento em português (Bra-sil), literacia (Portugal).

7 O livro em inglês, segundo nossos registros, foi publicado em 1987, e em português em 1990.

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ao uso da memória e dos discursos orais, sofrendo a resis-tência de Platão, que considerava que o texto não poderia defender as ideias do autor, ou Goody (1977, 1987), cujos estudos históricos e antropológicos apontariam diferentes mentalidades entre os povos de culturas ágrafas e letradas.

Kleiman (1995) também se opõe à divisão entre prá-ticas orais e letradas, e considera que, além dos impactos sociais da escrita, o letramento inclui os eventos de letra-mento e as práticas sociais na sua conceituação. A definição de evento de letramento é atribuída aos estudos de Heath (1982), que o define como “qualquer situação em que um portador qualquer de escrita é parte integrante da natu-reza das interações entre os participantes e seus processos de interpretação”.8 As práticas sociais de letramento são definidas por Brian Street (1988) como um conceito mais “robusto”, pois “[...] tenta tanto tratar dos eventos quanto dos padrões que tenham a ver com o letramento, tratando de associá-los a algo mais amplo, de uma natureza cultural e social. Parte dessa amplificação tem a ver com a atenção dada ao fato de que trazemos para um evento de letramen-to conceitos, modelos sociais relacionados à natureza que o evento possa ter, que o fazem funcionar e que lhe dão significado”.9

Diante dessa definição, entende-se que um indivíduo pode ser letrado mesmo sem ser alfabetizado, pois numa cultura letrada dificilmente uma pessoa deixaria de parti-cipar das mais variadas situações em que a escrita se faz presente. Um exemplo apresentado por Kleiman (1995a, p. 18) remete à compreensão de uma criança ao ouvir de um adulto a frase “olha o que a fada madrinha trouxe hoje!” Ao

8 "A literacy event is any occasion in which a piece of writing is integral to the nature of participant's interactions and their interpretive processes" (HEATH, 1982, p. 93).

9 Texto completo na Biblioteca UniSesi. Disponível em: http://www.unisesi.org.br/portal/index.htm. Acesso em: 9 fev. 2009.

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reconhecer a fada madrinha dos contos de fada, essa crian-ça revela conhecimentos de uma cultura letrada, e sua ora-lidade sofre as influências desses conhecimentos, que são adquiridos nas relações sociais cotidianas (com a mãe, ao ler histórias antes de ela dormir ou ao assistir à TV).

As contribuições de Street não se restringem ao con-ceito de práticas; essas se ampliam nas definições dos mo-delos autônomo e ideológico de letramento, publicados pela primeira vez em 1984 no livro Literacy: theory and practi-ce. Esses modelos são revistos pelo autor em 2003 na Tele-conferência Unesco Brasil sobre Letramento e diversidade. Na versão escrita desse evento, o autor considera que, com frequência, o modelo autônomo de letramento é represen-tado pela apropriação da “técnica”,10 considerando-se que “as pessoas precisam aprender uma forma de decodificar as letras e depois poderão fazer o que desejarem com o re-cém-adquirido letramento” (Street, 2003, p. 4). O modelo ideológico parte de outras premissas, considerando que as práticas de letramento são social e culturalmente determi-nadas, e a escrita assume significados segundo o contexto dos grupos e instituições em que foi adquirida.

Esses modelos, segundo Street (2003, p. 9), são indisso-ciáveis, pois a forma autônoma do letramento

[...] é apenas uma das estratégias ideológicas empregadas em associação ao trabalho no campo do letramento, que em reali-dade disfarça a maneira em que a abordagem supostamente neutra efetivamente privilegia as práticas de letramento de grupos específicos de pessoas. Nesse sentido, o modelo autô-nomo mostra-se profundamente ideológico. Ao mesmo tempo, o modelo ideológico consegue perceber as habilidades técnicas envolvidas, por exemplo, na decodificação, no reconhecimento das relações entre fonemas e grafemas e no engajamento nas estratégias aos níveis de palavras, sentenças e de textos [...].

10 Grifo nosso.

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Freire, um dos autores citados por Street (2003), con-tribuiu para a definição da dimensão ideológica de letra-mento. É interessante observar que, entre os autores bra-sileiros, poucos o mencionam e, quando o fazem, é para colocá-lo na contracorrente do letramento como fenômeno, juntamente com Emília Ferreiro. Apesar de Freire nunca ter utilizado o termo ou discutido essa perspectiva, seus postulados não se distanciam daquilo que Street diz, como quando define que “[...] a leitura do mundo precede a leitu-ra da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a per-cepção das relações entre o texto e o contexto” (Freire, 1989, p. 11-12).

Soares também contribuiu para a definição do letra-mento no Brasil. A autora entende os processos de alfabe-tização (como apropriação da técnica) e letramento como diferentes, porém indissociáveis, e define essa relação pe-los conceitos de estado ou condição – palavras que para ela são importantes para a compreensão das diferenças entre analfabeto, alfabetizado e letrado. A autora parte do pres-suposto de que quem aprende a ler e a escrever, passan-do a envolver-se em práticas de leitura e escrita de forma competente, torna-se uma pessoa diferente, ou seja, adqui-re outro estado ou condição, o que não implica “mudar de nível ou de classe social, mas mudar seu lugar social, seu modo de viver na sociedade, sua inserção na cultura – sua relação com os outros, com o contexto, com os bens culturais torna-se diferente” (Soares, 2003, p. 37).

Com a inclusão das palavras estado ou condição, Soa-res busca ampliar o foco para além do impacto ou das con-sequências da escrita numa dada sociedade. Sua definição

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inclui os eventos e as práticas como propostos por Heath e Street, mas não se restringem a estes. Nas palavras da au-tora, letramento é “o estado ou condição de indivíduos ou de grupos sociais de sociedades letradas que exercem efetiva-mente as práticas sociais de leitura e de escrita, participam competentemente de eventos de letramento” (Soares, 1998; 2002, p. 145).

Para Ferreiro, alfabetização não é um estado, como define Soares, mas um processo que inicia bem cedo e se estende ao longo da vida. A autora considera modismo a adoção do termo “letramento”, porém aceitaria se fosse um consenso entre os especialistas. Segundo ela, “o conceito [de alfabetização] também muda com as épocas, as culturas e a chegada da tecnologia” (Ferreiro, 2007, p. 1).

A expansão nos usos do computador e da internet, para Ferreiro (2001), exige mais “rapidez na leitura e muita se-letividade, porque não se pode ler tudo o que está na tela. E a capacidade de selecionar não é algo que, há alguns anos, fosse uma exigência importante na formação do leitor”.

Concordamos com essas novas demandas sinalizadas por Ferreiro e as discutiremos na próxima seção, no contex-to das culturas do papel e da tela do computador.

Espaços de escrita

Para compreendermos as diferenças entre os proces-sos de alfabetização e letramento na cultura do papel e na cibercultura11 (tela do computador), urge focalizar no que Bolter (apud Soares, 2002, p. 149) caracteriza como espa-

11 Estamos inseridos no que Lévy (2004, p. 17) defi niu como cibercultura: “O conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço [isto é] [...] o novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial dos computadores.”

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ços de escrita, que se constituem no “campo físico e visu-al definido por uma determinada tecnologia de escrita”. Diferentes espaços de escrita exigem diferentes tecnologias tanto de escrita como de leitura. Houve muitas mudanças ao longo do tempo até chegarmos ao uso do lápis, da caneta e do papel ou do quadro-verde e giz, ainda muito utilizados nas escolas. O papel e o quadro se constituem espaços de escrita manuscrita. Temos também como suporte de leitura os livros produzidos pela tecnologia tipográfica, mas esses não alteram de forma significativa a forma como se realiza a leitura na cultura ocidental: linear e da esquerda para a direita. Chartier (1999, p. 16) considera que o leitor da tela é mais livre, pois o texto eletrônico lhe permite mais distan-ciamento e uma relação não corporal – o mesmo acontece quando se escreve mediado pelo teclado –, enquanto o autor de textos manuscritos “[...] produz uma grafia diretamente ligada aos seus gestos corporais”.

Nessa perspectiva, o nosso enfoque estará centrado na cultura escrita e nas mudanças decorrentes de novos processos comunicacionais. A análise concentra a atenção no letramento e nas novas demandas de leitura e escrita. As mudanças ou permanências nos processos comunicacio-nais serviram de parâmetro para pensarmos as práticas de letramento no contexto deste estudo.

Letramento(s)

Soares (2002, p. 155), ao tratar do letramento na ci-bercultura, utiliza o termo no plural justamente para “[...] enfatizar a ideia de que diferentes tecnologias de escrita geram diferentes estados ou condições naqueles que fazem uso dessas tecnologias, em suas práticas de leitura e de es-crita: diferentes espaços de escrita e diferentes mecanismos

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de produção, reprodução e difusão da escrita resultam em diferentes letramentos”.12

Para Coscarelli (2005), ainda não seria o momento de trocarmos o lápis e a caneta pelo teclado, mas a autora con-sidera essa troca algo previsível num futuro próximo. Char-tier (1999) é mais cauteloso e, ao ser questionado sobre os novos comportamentos ou expectativas decorrentes de um leitor que tenha sido educado diante da tela, diz que talvez no futuro a tela do computador substitua o caderno ou a pasta de papéis. Pode-se conjecturar que a melhor estra-tégia seja manter o que temos e integrar as novas possibi-lidades.

Nem todas as pessoas trocam uma tecnologia por ou-tra; muitas já nasceram num mundo no qual as tecnologias de informação e comunicação13 fazem parte do cotidiano. Alguns autores denominam-nas de “nativos da ciber-cultura”14 ou “geração millenial”.15 Certamente não podemos desconsiderar as influências e possibilidades pedagógicas das tecnologias, mas precisamos considerar que vivemos num país de grandes contrastes e desigualdades. As preo-cupações com o letramento no Brasil, e no mundo de um modo geral, ganharam força a partir do momento em que os investimentos em alfabetização no século XX começaram a se refletir em níveis mais elevados de escolarização da popu-lação. Isso não necessariamente corresponde ao desenvolvi-

12 Grifos da autora.13 Consideramos como Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) espe-

cialmente as tecnologias digitais que alteram as práticas de comunicação e o acesso à informação, bem como os suportes de escrita, como no caso do uso de computadores (teclado, mouse, tela), de internet (World Wide Web), da telefonia móvel celular (mobilidade, mensagens de texto, envio de ima-gens) e da TV a cabo ou via antena parabólica, dentre outras surgidas desde meados da década de 1970.

14 Terminologia apresentada por Martins e Giraffa (2008, p. 430).15 Cf. o documento da Pew Research (2009, p. 11).

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mento das habilidades necessárias para dar conta das de-mandas de leitura e escrita impostas pela sociedade atual. Concomitante a essas novas preocupações em relação ao letramento da população, ainda num contexto da cultura do papel, surgem as demandas geradas pelas novas tecno-logias e pelos problemas ainda não solucionados de letra-mento. Somam-se àquelas as questões de necessidades da alfabetização e do letramento digital.

Assim, alunos de um curso de graduação, especialmen-te na modalidade a distância, estão expostos a uma série de demandas que envolvem vários letramentos, sendo cons-tantemente desafiados a desenvolver habilidades de orali-dade, leitura e escrita – estas últimas no suporte do papel e no suporte digital (letramento digital). Essas práticas le-tradas envolvem a apropriação de novos gêneros textuais, muitos dos quais estão associados ao uso do computador e da internet como mediadores da comunicação. Além disso, diante da grande quantidade de informação circulante na rede, os alunos precisam desenvolver a capacidade de sele-cionar informações, o que se traduz por competência infor-macional.

Mesmo sendo alfabetizados e mais letrados do que grande parte da população, que sequer atinge o nível médio de ensino formal, essas pessoas têm uma série de novas competências que precisam ser desenvolvidas paralelamen-te às aprendizagens específicas da área de conhecimento do curso. São competências intimamente vinculadas ao pro-cesso de formação, uma vez que integra o repertório de pe-dagogos e pedagogas que são responsáveis por alfabetizar/letrando as novas gerações. O compromisso dos alunos do curso com a promoção dessas habilidades junto aos seus próprios alunos (de hoje e do futuro) se traduz na forma como o curso foi concebido. Mesmo que esses letramentos

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mais específicos (digital e informacional) não se constitu-am um fim em si mesmos, eles se integram e articulam-se com a proposta pedagógica do curso, que prevê a formação inicial e em exercício dos alunos.

Não podemos ficar à margem de mudanças desse por-te, de abrangência global. Todavia, para este estudo, as im-plicações que interessam são aquelas que se apresentam em eventos e práticas de letramento e exigem habilidades diferentes daquelas do suporte de papel. Finalizamos nossa revisão de literatura discutindo, brevemente, o letramento ou letramentos como um processo contínuo e observável, possível de ser acompanhado ao longo do tempo, como ire-mos mostrar na análise dos dados.

Letramento(s): um processo contínuo

Algumas autoras, como Ferreiro (2003) e Tfouni (2002), contribuem para a definição de letramento como um pro-cesso contínuo.

O “continuum” descreve, graficamente, um processo que se re-laciona com a existência de posições de sujeito, que vão pos-sibilitar que os textos produzidos em determinado momento sócio-histórico circulem (sejam eles orais ou escritos) e também quem pode (no sentido de “está autorizado a”) ocupar esses lu-gares. Isso quer dizer, por exemplo, que saber escrever um ofí-cio, ou um sermão, ou uma outra peça discursiva qualquer, não garante que o sujeito que as produziu esteja efetivamente in-serido nas práticas letradas que garantem a circulação desses discursos (Assolini; Tfouni, 2006, p. 42).

Tfouni e Pereira (2005) consideram que o conhecimen-to e a familiaridade com as práticas de letramento na pers-pectiva de continuum não seriam mensurados pelo tempo de permanência na escola nem pelo grau de escolaridade alcançado, mas pela sua inserção efetiva nessas práticas.

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Enquanto Soares enfatiza a diferença entre leitura e escrita nas práticas letradas, Tfouni (2001, 2002) “[...] pro-põe que se tome como critério para [se] distinguir entre ora-lidade e escrita a noção de autoria, que serviria de base para tratarmos dessa heterogeneidade das práticas letradas”.

A autoria também é defendida por Soares, na medida em que define que aprender a ler e a escrever é se apropriar da escrita, usando-a com propriedade. Entendemos que a circulação dos discursos, como propõe Tfouni, seria o equi-valente aos usos competentes da leitura e da escrita nos eventos e nas práticas sociais de letramento (Soares, 2002).

Assim, um processo contínuo no qual o sujeito pode ocupar diferentes posições ao longo do tempo ou atingir um novo estado/condição pressupõe a superação de alguns es-tágios. A inclusão na cultura letrada se dá antes mesmo da alfabetização e, de acordo com Tfouni, não tem relação direta com os anos de estudo ou o grau de escolaridade. Todavia, à medida que se complexificam as formas de leitu-ra e escrita se ampliam as distâncias que separam os não alfabetizados, ou com baixa escolaridade, daqueles que do-minam os códigos e interagem em novos espaços, fazendo circular os seus discursos.

Ferreiro (1997) destaca que nem sempre o autor da ideia foi o autor material do texto, e quando isso aconte-ceu ainda precisava disputar a autoria com os editores. Enquanto no manuscrito o autor podia imprimir suas mar-cas, com a máquina de escrever (mecânica ou elétrica) essas se tornam mais sutis, expressando-se antes pelo estilo de escrita do que pela forma como são grafadas. O compu-tador também inova na medida em que permite que o autor seja o editor de seus textos e ampliam-se as possibilidades de grafar (além das maiúsculas, minúsculas, sublinhado ou não) ao se escolher o tamanho da letra, a fonte, dentre

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outros recursos. Além disso, o autor/editor do material se torna também o distribuidor quando publica, por exemplo, na internet, ou imprime, fazendo, assim, circularem seus discursos. Além disso, o texto no suporte digital pode ser editado quantas vezes forem necessárias, diferindo do su-porte do papel, no qual essas correções deixam marcas.

Nossa posição ainda defende a relação entre a orali-dade e a escrita, acreditando na possibilidade de autoria em ambos, num continuum que inclui a aquisição de novos códigos, novos gêneros discursivos e textuais em outros su-portes ou espaços de escrita, como a tela do computador ou o envio de mensagens de texto pelo celular.

Os alunos de curso de graduação, especialmente na modalidade a distância no modo digital, estão expostos a uma série de demandas que envolvem vários letramentos. Eles são constantemente desafiados a desenvolver habili-dades de oralidade, leitura e escrita – essas últimas nos suportes do papel e digital e, muitas vezes, em situações de comunicação que, num curso presencial, seriam ocupa-das pela oralidade. A necessidade de uso do suporte digital exige letramento digital e Soares o define como o uso do computador de forma competente, por indivíduo ou gru-pos, em situações em que o letramento é importante. Para Soares, as mudanças de estado ou condição de sujeitos ou grupos sociais não se relacionam com uma mudança de ní-vel ou classe social, mas com uma mudança do que chama de “lugar social”. É a mudança no modo de viver em so-ciedade, nas suas relações com os outros, com o contexto, tornando-se uma pessoa diferente na sua forma de ser e estar no mundo. Mas apropriar-se da escrita é diferente de aprender a ler e a escrever. Aprender a escrever consiste na aquisição de uma tecnologia que permite codificar e decodi-ficar a língua escrita. Apropriar-se “[...] da escrita é tomar a

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escrita ‘própria’, ou seja, assumi-la como sua ‘propriedade’” (Soares, 2003, p. 39).

Em síntese, o indivíduo em estado ou condição de le-trado não apenas domina a técnica de leitura e escrita, mas a usa socialmente, as pratica, respondendo adequadamen-te às demandas sociais de uma cultura letrada.

No caso da aluna professora, cuja trajetória foi analisa-da neste estudo, o seu estado ou condição passou a transi-tar de um suporte a outro. Esses novos usos se refletem nas suas práticas como professora que se desafiou a alfabetizar os alunos em ambos os suportes: papel e o computador/web, através do uso de blogs. O uso intensivo de blogs, wikis e ambiente virtual de aprendizagem no curso com o foco no de-senvolvimento de atividades, e não na apropriação das ferra-mentas em si e por si, permitiu que se realizasse a inclusão digital de todos os alunos professores. Até aquele momento de início do curso, o grupo de alunos comportava aqueles que dominavam algumas ferramentas do computador para aten-der demandas burocráticas da escola; aqueles que usavam parcamente a correspondência eletrônica; aqueles que ti-nham computador em casa, mas não tinham qualquer apro-ximação com esse equipamento, embora ouvissem e vissem seus filhos usarem cotidianamente. Com raríssimas exceções um ou outro professor já havia usado o computador com seus alunos. A maior parte dos alunos desses professores do curso lidam com computador e a rede, mas eles próprios pouco ou nada interagiam com esses recursos.

Inclusão digital

Na década de 1990 com a difusão das tecnologias tam-bém tem início a uma corrida mundial para democratizar o acesso àquilo que Levy nomeia como ciberespaço. A pers-

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pectiva de compreensão deste acesso inclui a possibilidade de promover a aprendizagem de forma recíproca.

O conceito de inclusão digital surgiu associado ao de abismo/fratura digital e inclusão social. Desde então vários conceitos sobre essas novas possibilidades foram surgindo e novas dicotomias passam a fazer parte da política.

Segundo Canclini (2004, p. 73), “a sociedade, concebida antes em termos de extratos e níveis, ou distinguindo-se segundo identidades étnicas ou nacionais, é pensada agora sob a metáfora da rede. Os incluídos são os conectados, os outros são os excluídos sem conexão”.

As políticas de inclusão digital no Brasil ganham força no final das década de 1990, durante o segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, e se sistema-tizam a partir da publicação do Livro verde, em 2000, que apresentava uma proposta inicial para o desenvolvimento de ações dentro do programa “Sociedade da informação”.

O Livro verde considera a universalização dos serviços de informação e comunicação como “condição fundamental, ainda que não exclusiva, para a inserção dos indivíduos como cidadãos, para se construir uma sociedade da informação para todos” (2000, p. 31). Este documento atribui um impor-tante papel para a educação no contexto de uma sociedade da informação e traça diretrizes no sentido de promover a redução nas desigualdades de oportunidades através do de-senvolvimento da capacidade de “aprender a aprender” com o uso das tecnologias de informação e comunicação. Conside-ra que “educar em uma sociedade em rede significa

muito mais que treinar as pessoas para o uso das tecnologias de informação e comunicação: trata-se de investir na criação de competências suficientemente amplas que lhes permitam ter uma atuação efetiva na produção de bens e serviços, tomar de-cisões fundamentadas no conhecimento, operar com fluência os novos meios e ferramentas em seu trabalho, bem como aplicar

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criativamente as novas mídias, seja em usos simples e rotinei-ros, seja em aplicações mais sofisticadas. Trata-se também de formar os indivíduos [...] de modo a serem capazes de lidar po-sitivamente com a contínua e acelerada transformação da base tecnológica (2000, p. 45).

Apesar dessas intenções, o foco ainda se mantém mui-to mais no acesso e desenvolvimento de infraestrutura do que propriamente nos usos. E isso é de fato essencial, mas insuficiente. O conceito de inclusão digital abrange outras dimensões do viver em sociedade. Teixeira (2010) desenvol-ve esta compreensão conferindo amplitude ao conceito de inclusão digital na perspectiva de cibercidadania que en-volve “modelo de formação docente vivenciado”. Teixeira e Franco (2005, p. 389) defendem

[...] o alargamento do conceito de inclusão digital para uma dimensão reticular e hipertextual, caracterizando-o como um processo horizontal que deve acontecer a partir do interior dos grupos com vistas à reapropriação crítica e criativa das TIC, em uma perspectiva que considere processos de interação, de cons-trução de identidade, de ampliação da cultura e de valorização da diversidade, para, a partir de uma postura de criação de con-teúdos próprios e de exercício da cidadania, possibilite quebrar o ciclo de produção, consumo e dependência tecnocultural.

A questão, de fato, amplia-se e as relações não se re-sumem a estar ou não conectado e ter acesso à informação/comunicação, passa-se de consumidores a criadores de con-teúdo e a relação com o mundo e com os outros potencial-mente se transforma.

O governo Federal, especialmente durante os dois mandatos do presidente Luís Inácio Lula da Silva, com apoio da iniciativa privada e de organizações não governa-mentais, expandiu o acesso à informação e comunicação. Só que o desenvolvimento de “competências suficientemente amplas” e a “fluência” passam diretamente pelo sistema de

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ensino e precisam de tempo para se disseminar num país de dimensões continentais.

Nesse sentido, o governo Federal, através das univer-sidades federais, promoveu o desenvolvimento de cursos de formação e qualificação de professores, sendo o curso de Pe-dagogia, na modalidade a distância, da Universidade Fede-ral do Rio Grande do Sul um exemplo dessas iniciativas que ainda contaram com o apoio das prefeituras para garantir a infraestrutura necessária nos polos. Em 2006 os “Guias de orientação do curso” apresentavam como um dos objetivos específicos a necessidade de “qualificar os professores para a utilização de recursos informáticos, na escola, para criar uma cultura de redes cooperativas intra e interescolas, a partir do uso de novas tecnologias de comunicação e infor-mação na prática pedagógica” (Carvalho; Nevado; Bordas, 2006, p. 20).

A concretização desses objetivos se materializa através dos registros das práticas docentes realizados pelos alunos em estágio e analisados neste trabalho.

Método de pesquisa

A pesquisa foi desenvolvida com base nos postulados da netnografia (Kozinets, 1997, 2002; Hine, 2001, 2005). A análise incluiu os registros de campo (observações, en-trevistas), os cadernos (os cadernos da aluna LBR foram fotografados e seus manuscritos analisados em relação ao texto on-line correspondente) e os registros on-line (e-mails, chats, fóruns, blogs, wikis). Os registros on-line, segundo Kozinetz, constituem-se numa das vantagens da netnogra-fia, à medida que já temos acesso ao registro escrito das entrevistas, por exemplo.

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Os novos dados16 foram obtidos totalmente via web17 e foi possível avaliar a aquisição de novas habilidades que foram utilizadas para que o acesso ao manuscrito fosse viável. A habilidade específica nesse caso foi a técnica de fotografar os registros manuscritos para disponibilizar na web, adotada na realização da tese e utilizada pela aluna LBR na realização do seu estágio docente, em 2010, quan-do postou atividades manuscritas dos seus alunos no blog. Identificamos essa prática ao buscar dados para a análise das mudanças desde 2008 e nos valemos do material que a aluna nos enviou por e-mail: fotografias do seu caderno.

Em 2007 e 2008 ela nos entregou os cadernos, em en-contros presenciais; dessa vez, ela os fotografou e enviou os arquivos por e-mail. Isso certamente nos aponta mudanças significativas no seu estado ou condição, o que discutiremos em detalhe mais adiante.

Estudo de caso

O estudo de caso focalizou a trajetória de uma aluna e o apresentamos numa progressão histórica ao mostrar as mudanças que se desdobraram em razão das vivências no curso.

16 O estudo expande a coleta de dados realizada entre agosto de 2007 e dezem-bro de 2008, complementado com dados 2009/2 e 2010/1.

17 Estando a pesquisadora em Austin, Texas, e a aluna professora (LBR) em Três Cachoeiras, no Rio Grande do Sul.

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Fase 1 – A condição da aluna LBR em 2007-2008

A leitura que realizamos da trajetória da aluna LBR,18 além de incluir os instrumentos de avaliação, contempla seus registros manuscritos desde o seu ingresso, 2007/1, até o final de 2008/2. Na ocasião, foi possível ter uma visão muito abrangente dos processos de letramento da aluna, desde a construção de hipóteses de escrita até a transfor-mação que se opera nos textos manuscritos com a sua edi-ção e publicação no suporte digital. A mudança de suporte não chegou a alterar o teor do texto, outrossim, modificou sua estrutura, mais rígida no papel e mais dinâmica e fluí-da no digital.

O trabalho de pesquisa documental, na época, a par-tir dos registros nos cadernos, totalizou mais de setecentas fotografias de páginas (do caderno da aluna em questão e dos de outras) em que buscamos capturar não apenas os textos, mas detalhes de uso do espaço do papel (margens), a organização (disciplinar ou interdisciplinar dos registros), a materialização do enunciado digital e a atividade manus-crita. Uma das atividades que registra bem as mudanças observadas é a que se denominou “o caminho da escola”. Observamos o registro manuscrito e o digital ao comparar as mudanças nos seus letramentos.

18 A aluna ingressou em 2007/1. Cf. Estudo das trajetórias de letramento em curso de educação a distância: o texto, o papel e a tela do computador.

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Caderno

Figura 1 - Caderno20 LBR (Machado, 2009, p. 169)

Página da web

Figura 2 - Wiki LBR (Machado, 2009, p. 170)

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Página da web

Figura 3 - Wiki LBR (Machado, 2009, p. 166)

Legendas (caderno e na página da web): 1 - desenho de uma casinha/imagem de uma escola; 2 - a palavra mensa-gem/uma mensagem digitada; 3 - desenho de um relógio/gif animado de um relógio com ponteiros que se mexem; 4 - previsão de espaço no corpo do texto para incluir a foto da sua casa/foto da casa incluída no slideshow ao final da página do Pbwiki; 5 - menção no texto a uma igreja enorme/foto da igreja no slideshow ao final da página do Pbwiki.

A Figura 1 é uma fotografia do rascunho da atividade no caderno e as Figuras 2 e 3 são as telas do wiki onde ela digitou o mesmo texto. O que ela escreve no rascunho per-manece inalterado na tela do computador, mas a estrutura vai sendo adaptada ao novo suporte, e os desenhos feitos à mão pela autora se transformam em imagens, animações ou emoticons capturados da web e inseridos na página do wiki. Isso acontece nos itens 1, 3 e 4 (Figuras 2 e 3), respec-tivamente. Se o texto se mantivesse no papel, jamais teria o efeito obtido com a inclusão do gif animado: um relógio com uma carinha cujos ponteiros se mexem sem parar. Essas mudanças são irreversíveis, sendo impossível representá--las no papel, de tal forma que precisamos descrevê-las

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aqui e contar com a imaginação ou o conhecimento do leitor para compreendê-las.

O item 2 (Figura 1) só se materializa no suporte digi-tal (item 2, Figura 2), tendo como correspondente no papel apenas a palavra mensagem, que alude a uma, mas não a reproduz. Imaginamos, sabendo da forma como se alteram as fontes no wiki, que a mensagem tenha sido capturada da internet e colada no espaço previsto no rascunho (entre o título e o início do texto). Essa inferência é feita a par-tir da manutenção do uso de uma fonte no início do texto e da utilização de fontes alternativas para dar ênfase ou destacar alguma palavra ou trecho. Não é esse o caso na referida imagem, que apresenta até a metade uma fonte do tipo Monotype Corsiva e, de certo ponto em diante, calibri em itálico,19 causando um estranho efeito sobre o leitor. Acredi-tamos que, ao colar o texto, este desconfigurou a fonte origi-nal. O interessante é que parece proposital, para registrar a passagem de uma escrita mais manuscrita para o uso de outros tipos mais característicos do uso do teclado. O item 4 (Figura 1), marcado no corpo do rascunho, integra, com outras fotos, uma animação legendada feita no slideshow (item 4, Figura 3).

Nesse período de análise, observamos alguns aspectos que caracterizavam as práticas de escrita e as certezas pro-visórias20 da aluna. Ela: (1) possui bons conhecimentos de leitura e escrita (alfabética), mas poucos conhecimentos de informática (8h/aula); (2) considera a “internet fútil, sem sentido para a educação”. Valoriza e se organiza a partir dos registros no caderno, tendo, ao final do primeiro semes-tre de curso, utilizado quatro cadernos; (3) valoriza o uso

19 Adotamos as mesmas fontes do corpo do texto para destacar a diferença observada no original.

20 Conceito extraído da metodologia de projetos de aprendizagem.

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da web para se comunicar com as colegas (e-mail, chats), todavia, a preferência ainda é pelo face a face presencial; (4) inicialmente busca conhecer as ferramentas e superar as dificuldades de letramento digital; posteriormente, fo-caliza seus esforços na busca do aprimoramento do gênero textual.

Durante essa fase, resultante de observação e registros ao longo de três semestres, a aluna realizou as atividades de forma duplicada – primeiro no caderno e depois na web; e, muitas vezes, o registro da web era impresso e colado no caderno, revelando idas e vindas entre os dois suportes.

A Figura 4 apresenta a linha do tempo, que sintetiza a trajetória da aluna LBR durante a fase 1, e nos ajuda a definir o estado ou condição inicial para a análise da fase 2.

Figura 4 - Linha do tempo de LBR (Machado, 2009, p. 182)

Fase 2 - A condição da aluna LBR em 2009-2010

O ponto de partida para a análise é o estado ou condi-ção de LBR em 2008/2, ou seja, no momento em que a aluna superou as dificuldades de uso das ferramentas e focaliza--se na apropriação de novos gêneros textuais acadêmicos. Nossa retomada inicia com um novo contato por e-mail, em 2010/1, no qual questionamos LBR sobre o uso do caderno, e ela nos informou que

[...] os registros no caderno continuam, tenho QUASE tudo no caderno, poucas reflexões e planejamentos no pbworks de estágio fiz diretamente no computador [...] tenho perce-bido que o tempo desprendido quando faço diretamente nos

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ambientes se torna menor. Continuo com certo apego em escrever nos cadernos, porém menor com relação os semes-tres anteriores (e-mail, 25/06/2010).

Inicialmente, grifamos a palavra “quase”, colocada em caixa alta pela aluna, e que foi utilizada para descrever uma mudança expressiva em relação a outros momentos, quando ela registrava tudo no caderno. Essa mudança nas suas práticas teve início ainda na primeira fase da pesqui-sa, quando ela digitou seu primeiro documento, sem reali-zar registro algum no caderno, e iniciou a leitura das nor-mas da ABNT.

Grifamos em negrito e colocamos em itálico o trecho em que ela menciona que algumas atividades estão sendo realizadas diretamente no computador. A aluna já havia feito algumas atividades desse modo (fase 1), porém estas eram ligadas ao uso de ferramentas do word (SmartArt, por exemplo). Nesse caso, ela está se referindo a textos produzi-dos no editor de texto de um wiki (on-line).

A explicação para a digitação diretamente no compu-tador (on-line) se deve à economia de tempo que isso repre-senta. Nas suas práticas anteriores, ela costumava escrever no caderno, digitar e, depois, disponibilizar na web. Eram três etapas, e cada uma demandava certo tempo. Como nem sempre ela tinha acesso ao computador e/ou internet, escrever no caderno e digitar (off line) ajudavam a manter as atividades em dia, utilizando pouco tempo para publicar na web – geralmente em casa, à noite e depois do trabalho, de atender a casa, o marido e os três filhos.

Por fim, ela revela que continua com “[...] certo apego em escrever nos cadernos”. Estes são muito presentes na trajetória da aluna. A ajudam a organizar os pensamen-tos, além de “materializarem” seus escritos, que podem ser lidos facilmente, sem estar on-line e sem precisar sequer

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de energia elétrica ou bateria. Isso se confirma nas práti-cas como a representada nos registros da Figura 5, em que ela anota no caderno que precisa “imprimir” dois fóruns (de discussão on-line) para ler no papel.

Por fim, ela revela que continua com “[...] certo apego em escrever nos cadernos”. Esses são muito presentes na trajetória da aluna. A ajudam a organizar os pensamen-tos, além de “materializarem” seus escritos, que podem ser lidos facilmente, sem estar on-line e sem precisar sequer de energia elétrica ou bateria. Isso se confirma nas práti-cas como a representada nos registros da Figura 5, em que ela anota no caderno que precisa “imprimir” dois fóruns (de discussão on-line) para ler no papel.

Figura 5 - Caderno de LBR (2007/1)

Nos registros on-line, a atividade realizada em 2009/2 nos chamou a atenção por discutir a relação entre presen-cial e virtual. A aluna LBR registra no seu diário de bor-do as conclusões de um encontro presencial para discutir o projeto de aprendizagem do seu grupo, quando decidiram

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[...] interagir mais virtualmente, pois nossas reuniões de grupo não estão sendo muito produtivas, pois há muita conversa paralela, de assuntos diversos, de atividades de ou-tras interdisciplinas, enfim... Essa foi a forma provisória que encontramos para nos Disciplinar mais, para que o foco PA seja priorizado [...]. Combinamos quer durante os próximos dias a comunicação e as trocas entre os componentes deste PA serão exclusivamente por email e MSN, exceto as reuniões de grupo previamente marcadas.

Nesse texto, quando a aluna menciona “reuniões do grupo”, está se referindo a encontros presenciais21 entre alunos, nos quais percebe que a atenção se dispersa e o tra-balho se torna menos produtivo. Essa nova certeza provi-sória muda consideravelmente sua perspectiva de uso das tecnologias. Diferentemente de valorizar o uso de chat e e--mail para se comunicar (2007/2), a aluna passa a conside-rar essa forma de comunicação como mais produtiva que o presencial.

Todavia, seu letramento digital também contribui para a superação de alguns obstáculos, em especial no que tange ao uso das ferramentas da web, como se pode observar em um registro realizado após um chat no dia 16 de setembro de 2009, quando encontrou “[...] algumas dificuldades para acessar o MSN, em função de uma atualização exigida pelo site [...]”. Esse registro difere bastante de outro, realizado em setembro de 2007, quando revelou que havia sido fácil criar um blog – ou seja, já possuía os conhecimentos e o fazia com relativa tranquilidade – no entanto, linkar o blog no pbwiki do polo estava “[...] dando mais trabalho”.

21 O polo de Três Cachoeiras é o mais distante da sede e com mais problemas de conectividade. Muitos alunos possuem conexões discadas ou por rádio, e com relativa frequência alterações climáticas afetam as comunicações. Di-fi culdades dessa ordem tendem a fazer com que os alunos prefi ram realizar encontros presenciais.

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Desde 2008/2, quando seu foco passou a ser a escrita acadêmica, o deslumbramento inicial pelo uso de imagens e recursos, como slideshow, deixou de ser importante. Ha-víamos constatado, na análise do “caminho da escola”, que a escolha por fontes similares ao manuscrito parecia inten-cional. E essa preferência se manteve em 2010/1, quando ela cria um wiki de estágio em que realiza os registros se-manais (planejamentos e reflexões, conforme descrito ante-riormente). Desses, destacamos a forma (fonte) dos regis-tros que nos permitem identificar: (a) primeiramente, na Figura 4, o uso da fonte Lucida Handwriting, que re-mete à escrita manuscrita e é aplicada a toda parte do texto em que a aluna planeja ou reflete sobre o planejamento; (b) a fonte muda (Figura 5) quando algo é colado à página ou deverá ser impresso para ser entregue aos alunos. Nesse último caso, a fonte escolhida é arial, destacando as letras para as crianças do segundo ano e em processo inicial de alfabetização, que, segundo a autora, “[...] deverão fazer a leitura da mesma e colocar para o grande grupo as ideias da letra”. Essa prática se encontra em outras postagens do wiki de estágio, sempre com a mesma lógica; (c) a fonte manuscrita se caracterizou, nesse momento do letramen-to, como uma das marcas22 dessa aluna no suporte digital; (d) para concluir a análise, partimos do registro on-line e perguntamos a LBR se havia um correspondente manuscri-to, e ela prontamente nos enviou duas páginas de caderno com parte da atividade que encontramos na web.

22 Na tese defendemos o conceito de marcas do autor no manuscrito, con-siderando que estas “[...] se mantêm após a adoção de outra ferramenta e suporte e também sofrem infl uências destes, que se materializam no papel”. Na época, a aluna adotava certos sinais que relacionavam o ma-nuscrito ao digital, por exemplo, se o texto já havia sido digitado e posta-do. Para saber mais, ler o item “As marcas do autor” (MACHADO, 2009, p. 113-119).

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O texto da aluna LBR muda muito pouco no trânsito entre os suportes, inclusive pelo fato de ela escolher uma fonte como a Lucida Handwriting, que é similar ao manus-crito. O fato mais significativo, nesse processo, é a inter-rupção dos registros manuscritos, confirmando a falta de tempo, pois a “problematização” e a “reflexão do dia” são momentos posteriores ao planejamento das atividades, e seria necessário voltar a escrever no caderno, além de fa-zer o registro on-line, que o supervisor pode acompanhar. Apreendemos com isso que a aluna ainda planeja/organiza os seus pensamentos no papel, porém conclui a atividade, segundo as orientações dos professores, no suporte digital (on-line).

Sua vivência entre os dois suportes transcende suas práticas pessoais e se manifesta nas atividades realizadas com seus alunos. É possível verificar isso quando ela ilus-tra simultaneamente o manuscrito e o digital23 produzido por eles.

23 O registro foi extraído do blog da turma e é uma das atividades resultantes do planejamento do dia 12 de maio de 2010, analisado neste estudo.

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Quadro 1 - Registros de textos manuscritos dos alunos de LBR24 e tela do blog da turma onde os alunos criaram um texto coletivo

Manucrito (páginas de cadernos)

Alguns Ditados de Ex-PS2:

Aluno 1 Aluno 2 Aluno 3

Digital (texto coletivo no Blog da turma)

Essas práticas realizadas por LBR com seus alunos confirmam o que já havíamos sugerido ao discutir o futuro do caderno: “[...] talvez a melhor estratégia seja manter o que temos e integrar as novas possibilidades.” O novo es-tado ou condição de LBR possibilita que ela se desafie a

24 Digitalizados por ela e publicados no seu wiki de estágio. Omitimos os no-mes dos alunos, pois o wiki é de acesso restrito.

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Trajetórias de letramento: do caderno para a web

construir novas propostas para seus alunos, “nativos da cibercultura”, em ambos os suportes de escrita.

Emília Ferreiro (2003) considera que o simples uso do teclado já desafia os alunos, pois eles vislumbram todas as letras juntas e, além do que, fora de ordem, precisando sele-cionar aquelas que compõem uma dada palavra. Além des-te desafio, a aluna LBR está trabalhando com a produção coletiva da escrita, e os alunos dela podem construir suas hipóteses de escrita e comparar com a dos demais colegas, como é possível observar no texto digital do Quadro 2, em que as mesmas palavras se repetem com grafias diferentes entre os diversos autores. Essa proposta vai além da indi-vidualidade do caderno para uma prática de escrita coleti-va que prepara os alunos para outro estado ou condição de letramento.

A Figura 6 apresenta uma síntese das mudanças que consideramos mais significativas nas práticas de letramen-to de LBR, incluindo nessas os impactos nas práticas de seus alunos.

Observa-se a trajetória de valorização do uso de recur-sos na web para o desenvolvimento de atividades coletivas, dos trabalhos em grupo, nos quais ela sentia que presen-cialmente era mais fácil fugir do foco. Essa vivência que teve seu primeiro registro em 2009 se reflete na proposta de texto colaborativo que ela sugere como atividade para os seus alunos.

Ao mesmo tempo em que LBR vai ampliando suas práticas de escrita na tela do computador, e postadas di-retamente na web, continua a valorizar o uso do caderno e ainda mantém seus registros manuscritos, como apresen-tamos no Quadro 1.

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Figura 6 - Mudanças e impactos ao longo do tempo

Conclusões

O letramento é um processo contínuo de construção e reconstrução. Esse processo se torna evidente através das mudanças observadas no estado ou condição da aluna LBR. A trajetória da aluna mostra seu direcionamento para o uso mais apropriado do computador e da rede ao secundarizar os registros no caderno. Os efeitos disso transcendem o cur-so e alcançam a sala de aula da aluna professora. Os re-gistros das práticas de escrita propostos por LBR aos seus alunos nos revelam que ela oferece a oportunidade deles explorarem diferentes tecnologias de escrita em diferentes suportes. Seus próprios alunos vivenciaram possibilidades que ampliam suas hipóteses de escrita e os desafiam na busca de estratégias de superação. O professor em forma-ção se constitui, portanto, num importante agente multipli-cador de novos letramentos.

A netnografia permitiu a análise da trajetória longitu-dinal de uma aluna e os diferentes conflitos que enfrenta ao ter que lidar com suportes que exigem novas acomodações da aprendizagem.

As possibilidades abertas pela forma proposta nesse curso a distância contemplaram sua realização predomi-nantemente via web, exigindo uma proposta pedagógica diferenciada que se distinguiu por trabalhar com a intera-ção virtual entre todos os membros desta comunidade. Essa

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proposta contemplou a inclusão digital da perspectiva de inserção dos sujeitos e realização das atividades no modo digital, mas, sobretudo, a inserção dos alunos à cibercida-dania através do desenvolvimento de letramentos endere-çados ao uso da web e das redes.

É esse contexto que exigiu e permitiu as mudanças nas práticas de letramento da aluna LBR e de todos os outros alunos. Com isso, construiu-se a valorização da interação no suporte digital e a incorporação ao cotidiano. Por fim, é possível dizer que o investimento na formação de professo-res com o uso de tecnologias de informação e comunicação, contribui não apenas para a inclusão digital desses, mas de todos os seus alunos, sendo talvez uma das ações mais importantes com vistas ao uso competente das tecnologias de informação e comunicação.

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nspirados na frase do filósofo Descartes (séc. XVII), participantes da blogosfera – universo virtual dos blogs – cunharam uma paródia muito significativa para quem busca compreender o funcionamento e o papel

desses espaços na atualidade: Penso. Blogo. Existo.1 A cons-trução anônima amplamente divulgada pela rede – embora ambígua, pois pode ser entendida tanto no sentido de que apenas quem pensa é capaz de “blogar” e, assim, afirmar sua existência, quanto no sentido de que só quem pensa e “bloga” existe verdadeiramente – revela a relação inten-sa dos “blogueiros” com esses espaços. Em qualquer dessas leituras fica evidente que o blog é, para seu usuário, um espaço para pensar e “existir” dentro de um contexto ino-vador e cada vez mais valorizado, o virtual. Segundo da-dos da revista Info Online, divulgados em janeiro de 2011, o número de blogs já chega a 152 milhões, e não para de

1 A referida expressão pode ser encontrada em diversos blogs, como, por exemplo, no blog de Igor Lucas Adorno, que a usa para nominar seu espaço disponível no endereço http://iglucarono.blogspot.com.

I

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crescer. Outro dado pertinente, revelado pelo The State of Blogosphere,2 do ano de 2010, aponta que a maioria dos blogueiros escreve amadoramente. Isso significa que há um expressivo envolvimento do público com esse espaço, o qual, pode-se dizer, é, basicamente, um espaço de leitura e escrita pessoal na rede mundial de computadores.

O surgimento dos blogs e a grande adesão do público a esses espaços é resultado de intensas revoluções ocorri-das no final do século XX, no âmbito da cultura letrada e da própria sociedade. O advento das novas tecnologias, em especial no que se refere à informática e ao surgimento da internet, transformou textos, suportes e leitores de uma forma que, conforme Chartier (2007), é inédita na história da humanidade. O autor, que possui largo conhecimento sobre as transformações da leitura e da escrita ao longo da história, explica que a chegada dos textos às telas digitais causou múltiplas transformações em diferentes segmentos da cultura letrada. E, embora não seja a primeira vez que isso acontece, é a primeira vez que várias mudanças ocor-rem simultaneamente em diversos elementos basilares do processo de leitura e escrita. Além disso, menos de cinquen-ta anos se passaram desde que as novidades no ramo da informática começaram efetivamente a aparecer e as mu-danças vindas com elas já são muito expressivas e estão es-palhadas por todo o mundo, situação muito diversa do que ocorreu em outras épocas quando as variações envolvendo tais práticas levavam séculos para alcançar tamanha di-mensão.

Falar que as mudanças ocorreram a partir do surgi-mento dos suportes digitais não significa, entretanto, que os mesmos sejam a causa de toda essa movimentação exis-

2 Relatório anual publicado pelo site Technorati. Disponível em: http://.tech-norati.com.

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tente na atualidade em relação à cultura da escrita, como se pode eventualmente pensar. Tal observação é feita por Lévy (1999), que explica que as novas tecnologias são ape-nas ferramentas que o homem constrói e usa para expres-sar uma revolução que, antes de qualquer coisa, ocorreu em seu interior. Para o autor, quanto mais oportunidades o homem tem para aprender e se comunicar, mais ele busca-rá meios para aprimorar suas técnicas de aprendizagem e comunicação. É o que se constata ao observar, mesmo que rapidamente, o percurso percorrido pelos textos até chega-rem ao nível de divulgação e popularização que possuem agora.

Na Idade Média as poucas obras existentes eram ma-nuscritas e restritas apenas às classes dominantes: o clero e a monarquia. A escrita era algo sagrado e os livros, in-tocáveis; eram até mesmo queimados ou acorrentados nas masmorras dos castelos onde não poderiam revelar seus segredos ou corromper os pensamentos do povo. No entan-to, não tardou para que outras classes, próximas a essas, requeressem o direito de também tomar conhecimento da arte da escrita e dos mistérios que a envolviam. Assim, ju-ízes, conselheiros e outros membros da corte foram aden-trando no mundo das letras, e pouco a pouco a restrição aos livros foi diminuindo. Porém, a maneira artesanal como eram produzidos dificultava muito a sua circulação, o que exigia a busca por novos métodos de produção. No século XV, então, inspirado em modelos que já vinham sendo uti-lizados pelos chineses, Gutenberg impulsionou definitiva-mente a produção de materiais impressos ao apresentar ao mundo a prensa de tipos móveis.

A popularização da escrita não foi algo imediato. Santa-ella (2004) explica que o alto custo e a escassez do papel e da tinta, na época, tornavam o livro uma peça muito cara para

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grande parte da população. Foi somente um século depois do surgimento da prensa que materiais mais baratos pas-saram a ser produzidos e puderam, finalmente, chegar às mãos da classe burguesa que despontava naquele momento e que buscava também o entendimento de mundo que era proporcionado pelas letras. Mesmo assim a popularização da escrita evoluiu a passos lentos e apenas nos séculos XVIII, XIX, e especialmente no século XX, os textos conquistaram mais espaço na sociedade. O aprimoramento das técnicas de produção cada vez mais eficientes, somado ao interesse do público por textos sobre os mais variados temas resultaram, nas últimas décadas dos anos de 1900, no que hoje ficou conhecido como cultura de massa, ou seja, a produção de materiais simbólicos de diversas naturezas fabricados em escala industrial por pequenos grupos especializados e dis-tribuídos (vendidos) à grande massa da população.

O aparecimento dos suportes digitais e da criação da rede internet no final do século XX e início do XXI am-pliou o alcance dos textos e os aproximou ainda mais dos leitores ao apresentá-los em formato virtual. Isso aconte-ce porque o virtual, conforme explica Lévy (1999), embora exista potencialmente na representação feita na tela, não possui materialidade física, como no caso da tinta impressa sobre o papel. Desse modo, o texto, quando no suporte di-gital, está desterritorializado, ou seja, ele está em todos os pontos da rede e pode ser encontrado e acessado por seus leitores – graças às propriedades da internet – a qualquer hora do dia, independentemente do lugar onde estejam ou de onde originalmente o texto tenha sido disponibilizado. Lévy (1997) ressalta ainda que o virtual não se opõe ao real – como é comum que se pense –, mas ao atual, haja vista que, embora não exista de forma concreta, existe em potên-cia e bastaria que tal condição fosse atualizada para que adquirisse outra forma.

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Conectado à rede, os sujeitos podem não apenas aces-sar o conteúdo disponibilizado na web, mas também podem disponibilizar seus próprios textos em diferentes tipos de espaços e formatos, pois a virtualização permitiu que não só a circulação entre os usuários fosse facilitada, mas tam-bém a sua produção. Em outras palavras, junto com as no-vas tecnologias surgem também novas práticas de leitura e escrita muito mais democráticas do que as que se tinham até então.

A facilidade que os sujeitos têm para interferir e cons-truir o conteúdo que será disponibilizado na web ocorreu, especialmente, após o desenvolvimento do que Xavier (2007) chama de “segunda geração da internet” ou “web 2.0”, cuja principal diferença em relação à “primeira geração” é a capacidade de promover a interação entre os usuários do ambiente on-line. Na web 2.0 as ferramentas disponibiliza-das são de fácil manipulação e permitem a participação de pessoas que não são especialistas ou expert em informáti-ca. Qualquer sujeito que possua o mínimo entendimento do funcionamento desses suportes e acesso à rede pode parti-cipar da criação do ambiente virtual, postando comentários em suas páginas preferidas ou, ainda, criando seus espaços dentro de redes sociais, blogs, sites, fóruns e outros.

Todas essas movimentações e relações de comunicação aí de-senvolvidas pressupõem o uso de uma linguagem que, nesse caso, está ancorada na cultura escrita. Entretanto, embora essa predomine o ambiente virtual também contempla outras lin-guagens que, ao convergirem, formam o que, segundo Santaella (2004, p. 48), é uma linguagem hipermidial. “A hipermídia mes-cla textos, imagens fixas e animadas, vídeos, sons, ruídos em um todo complexo. É uma mescla de vários setores tecnológicos e várias mídias anteriormente separadas e agora convergentes em um único aparelho, o computador, que é comumente referi-da como convergência das mídias [ou demais aparelhos digitais com propriedades semelhantes].”

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O uso dessa linguagem, que transformou radicalmente o formato dos textos, e a democratização do acesso a a estes, pela capacidade interativa da web 2.0 e pelo formato vir-tual, são mudanças marcantes nessa nova fase da cultura letrada e, como não poderia ser diferente, os causadores de muitas outras inovações ocorridas nesse contexto.

Até mesmo a maneira como se lê foi alterada. O lei-tor, ao invés de virar páginas e ler linearmente, “rola”, com toques do mouse, o texto na tela e pode, inclusive, “en-trar” nesse texto acionando os links. Para Santaella (2004, p. 33), essas são características de um leitor denominado “imersivo” e o descreve como um sujeito “que se encontra em estado de prontidão, conectando-se entre nós e nexos, num roteiro multilinear, multissequencial e labiríntico que ele próprio ajudou a construir ao interagir com nós entre palavras, imagens, documentos, músicas, vídeos etc.”

Esse novo leitor, além de desenvolver muito bem as habilidades necessárias para compreender e participar do novo universo virtual, não abandou as antigas práticas de leitura que foram adquiridas com os suportes tradicionais. Ao contrário, o sujeito que lê na rede não é alguém com um perfil absolutamente novo, mas alguém que acrescentou novos traços ao seu perfil. Esse sujeito leitor de textos em tela possui ainda outros nomes atribuídos por diferentes teóricos que estudam o fenômeno da leitura na atualidade, como homo zappiens (Veen; Wrakking, 2009), hiperleitor (Xavier, 2007), entre outros.

Da mesma forma, também há variações quanto à de-nominação do contexto em que está inserido esse leitor. Era digital, cibercultura e pós-modernidade são algumas das nomenclaturas utilizadas para se referir aos novos tempos em que os textos e as informações estão muito mais aces-síveis e podem ser compartilhados entre pessoas de todo o

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mundo através de relações interativas mediadas por supor-tes digitais. Lévy (1999), teórico que cunhou o termo “ciber-cultura”, explica que a sociedade atual está se organizando cada vez mais como uma comunidade de inteligência coleti-va, ou seja, um lugar onde as pessoas aprendem mediante a constante troca de informações entre os sujeitos.

A definição de Lévy (1999) quanto à sociedade de inte-ligência coletiva dialoga diretamente com as colocações de Froés (2000), quando ela faz referência à formação de uma sociedade da aprendizagem, vigente no século XXI. Segun-do a autora, tal denominação é justificada pelo fato de que, na atualidade, a busca pelo conhecimento já não se dá mais apenas na escola – instituição a que tradicionalmente se delega a tarefa de ensinar –, mas na sociedade como um todo, em todos os lugares.

Os sujeitos, agora, buscam espaços alternativos onde o aprendizado não ocorra de forma manipulada e artifi-cial, mas seja construído coletivamente, contemplando vá-rios enfoques e posicionamentos distintos. Clubes, praças, academias, cursos, entre outros são, conforme a autora, exemplos de espaços alternativos de aprendizagem que se somam aos ambientes virtuais na tarefa de disseminar in-formações e ampliar as possibilidades de aprendizagem dos sujeitos. Nesses distintos espaços sociais, on-line ou não, os sujeitos “entram em contato com diferentes formas de co-nhecer e organizar o conhecimento; expõem-se e interagem com diferentes referenciais de leitura da realidade” (Froés, 2000, p. 301) e, na troca de experiência que realizam, seja através da comunicação oral, seja na escrita, desenvolvem práticas que justificam a atribuição da denominação “socie-dade da aprendizagem”.

Quando na rede de computadores, as ações desses sujeitos potencializam-se ainda mais, uma vez que prati-

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camente não há restrições de acesso a conteúdos disponi-bilizados por milhões de pessoas espalhadas pelo planeta. Dentro desse contexto, os blogs são reflexos desse novo pe-ríodo da cultura letrada que, naturalmente e a passos lar-gos, se instala na vida dos cidadãos, e podem também ser apontados como espaços alternativos de compartilhamento de informações e construção de conhecimento típicos dessa nova sociedade que desponta no século XXI.

A comparação decorre do fato de os blogs serem, em sua essência, espaços construídos coletivamente, pois, em-bora possuam um “dono” ou um criador que disponibiliza seus conteúdos e os mantêm atualizados, a participação dos demais usuários da rede que leem e postam comentários é fundamental para que tenham sentido. Compreender o papel dos blogs dentro da sociedade da aprendizagem e en-tender o funcionamento dessa ferramenta, que revela um número crescente de sujeitos envolvidos com práticas de leitura e escrita diárias, requer um olhar atento que possa observá-los e avaliar as atividades neles desenvolvidas, ta-refa a que se propõe este texto.

Blogs

Quando surgiram, no ano de 1999, segundo informa-ções levantadas por Hewitt (2007), os blogs eram apenas diários virtuais, como sugere sua nomenclatura original “weblog” (web – internet; log – diário). Entretanto, no de-correr dos poucos anos passados entre a sua criação e a imensa aceitação que obteve junto ao público, os simples relatos do dia a dia cederam espaço para outros e varia-dos conteúdos, permitindo que, atualmente, a diversidade seja uma marca importante da blogosfera. Tal diversidade não se refere, porém, apenas às temáticas abordadas, mas

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aos variados pontos de vista lançados sobre elas. Espaços propícios aos debates e a exposição de variadas opiniões, os blogs não abrigam verdades absolutas, mas as distintas verdades expostas pelos inúmeros usuários que participam ativamente da blogosfera.

Frutos da web 2.0 em que as ferramentas são de fá-cil manipulação, os blogs podem ser criados por qualquer pessoa com acesso a um computador e à rede internet, condições necessárias também para a existência de suas principais características que só se efetivam em ambien-tes virtuais e on-line: a instantaneidade e a interativida-de. Os blogs permitem que sujeitos, independentemente de possuírem algum destaque social ou serem autoridades em alguma área, possam publicar textos que, imediatamente após a postagem, poderão ser lidos por qualquer pessoa co-nectada à rede de qualquer lugar do mundo e, ainda, de forma gratuita. Dotados de ferramentas que permitem aos milhões de blogueiros receber, passar, trocar informações e, principalmente, discuti-las, os blogs mostram “o quanto é renovável o conhecimento e a informação” (Rettenmaier, 2009, p. 84). Em razão, principalmente, da troca de conhe-cimentos entre os blogueiros que são estimulados pelo di-namismo do espaço, os blogs configuram-se como ambien-tes característicos da sociedade da aprendizagem, cujos sujeitos apreciam formas de aprendizado coletivas e livres.

Todas essas possibilidades multiplicadas pelo grande número de usuários permitem que a blogosfera seja, como afirma Hewitt (2007, p. 213), o lugar onde “a vida está em movimento” e os responsáveis por toda essa movimentação – como aponta o The State of Blogosphere, no ano de 2010, são, em sua maioria, jovens – sujeitos aos quais o desgas-tado discurso proferido principalmente pelas escolas trata como pessoas que não gostam de ler e não sabem escre-

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ver. Na blogosfera, ao contrário disso, eles desempenham com grande competência essas tarefas e põe em xeque tal concepção, fato que, no mínimo, deve (ou deveria) causar alguns questionamentos nas autoridades e pessoas envol-vidas com a educação.

O caso ratifica, ainda, a observação de Fróes (2000) no sentido de que o conhecimento já não está mais insti-tucionalizado, está em toda a sociedade e, inclusive, nessa espécie de sociedade virtual que é a blogosfera. Organiza-da, portanto, a partir da agregação de pessoas em torno de atividades de leitura e escrita que visam discutir e com-preender as mais diversas temáticas, os blogs são compos-tos, basicamente, por três elementos: links – atalhos que conduzem os leitores a outros blogs ou páginas da internet; postagens – feitas pelo autor do blog; comentários – feitos pelos visitantes dos blogs.

Links

Embora não sejam elementos exclusivos dos blogs, mas de toda a web, os links possuem papel fundamental dentro dessas estruturas que com eles se tornam hipertex-tuais. “Ideia motriz do hipertexto”, conforme definição de Xavier (2009, p. 192), os links atribuem aos blogs a proprie-dade de se ligarem a outros elementos que podem perten-cer tanto à rede interna, que existe dentro do próprio blog, quanto à rede de blogs, que compõe a blogosfera, ou ainda à grande rede mundial, a web. Sem os links, os blogs seriam apenas uma espécie de bloco de notas digital dissociado da rede que amplia seu alcance e que os põe em contato com outros internautas. Os links são, inclusive, os dispositivos que possibilitam ao leitor do século XXI imergir, conforme

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concepção de Santaella (2004), no espaço textual dos am-bientes virtuais.

A imagem reproduzida a seguir do blog da editora Co-sac Naify ilustra os links que, em formatos que se destacam dos demais elementos da tela, cumprem diferentes funções dentro desse espaço.

Figura 1 - Imagem do blog “Blog da Cosacnaify” (http://blog.cosacnaify.com.br/)

No caso desse blog, os links estão marcados em verme-lho3 para contrastar com o restante da página configurado em tons de branco, preto e cinza. Os que estão inseridos no corpo do texto principal, ao centro, dão acesso a outros ambientes da web relacionados ao tema que aí está sendo

3 Uma vez que a impressão deste livro é monocromática, os links referidos foram circulados a fi m de não prejudicar a intensão dos autores. Assim, optou-se pela manutenção da menção à cor feita originalmente pelos auto-res. Nota dos organizadores.

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discutido; à esquerda, links marcados em uma página de calendário permitem ao leitor acessar as postagens do dia escolhido. Há ainda, abaixo desse calendário, links de aces-so aos meses anteriores e subsequente. À direita da ima-gem há também o link de acesso ao site oficial da editora e os links das postagens recentes que, ao serem “tocados” pelo mouse, mudam de cor.

As formas distintas que os links assumem, bem como as diferentes possibilidades de funcionamento, são caracte-rísticas dessa ferramenta que, em poucas palavras, podem ser definidos como dispositivos programados para, ao se-rem “tocados” pelo mouse, atuarem como atalhos da web. Em sua forma mais tradicional, os links são palavras su-blinhadas e grafadas em cor diferente4 da usada pelo texto principal, mas podem ser também ícones, símbolos, ou ima-gens diversas usadas com a mesma finalidade.

Tanta variedade tem a pretensão de chamar a atenção dos leitores e “convidá-los” a conhecer o que há por detrás daquela “linkagem”. Dessa forma, a escolha dos elementos que funcionarão como links não acontece de maneira des-pretensiosa, ao contrário. O blogueiro, assim como escolhe o conteúdo que será publicado dentro de seu espaço, escolhe os elementos que serão linkados e o faz com alguma inten-cionalidade, já que esses novos textos ficarão “amarrados” ao principal, podendo também ser considerados conteúdo do blog que o “linkou”.

Entretanto, para que esses novos textos sejam desco-bertos é preciso que os links atraiam a atenção do leitor, resultado que, para Xavier (2009, p. 196), se dá justamente pela “alta densidade informacional que eles devem conter [...]”. Independentemente do texto que “guarda”, o link em si já possui (ou deveria possuir) uma grande carga signifi-cativa que permite ao leitor “[jogar] com os conhecimentos

4 Mantém-se a decisão tomada na nota anterior. Nota dos organizadores.

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de mundo e imaginário dos usuários, encapsulando expec-tativas do que podem encontrar por ‘baixo’ de cada uma delas, ao serem acionadas” (Xavier, 2009, p. 196).

No caso dos blogs, a significação dos links inicia pela própria disposição desses dentro do espaço, já que estes obedecem a uma codificação que, embora não seja regra, foi adotada pela maioria dos blogueiros e contribui para imbuir significados aos links. Em geral, aqueles que estão inseridos no texto principal direcionam o leitor a novos tex-tos que podem tanto reforçar a ideia apresentada quanto refutá-la. Quando nessa função, os links “contribuem para fazer convergir, em torno de um hipertexto, dados e infor-mações complementares e ampliadores da discussão em andamento” (Xavier, 2009, p. 212), possibilitando ao leitor obter uma visão ampliada do assunto e, consequentemente, construir sua opinião de forma mais crítica, mediante o co-nhecimento de um assunto visto e analisado sob diferentes perspectivas.

Além desses, há os links nas laterais dos blogs, os quais costumam dar acesso às postagens mais antigas e a outros blogs ou sites preferidos dos blogueiros, espaços que podem contribuir para a ampliação da leitura, embora não de maneira relacionada a um assunto específico como nas vezes em que o link está inserido dentro de um texto. Há ainda, junto às postagens, links de acesso às redes de re-lacionamento, como Facebook, Twitter, e outros, os quais possuem formatos predefinidos por suas marcas e podem ser utilizados para divulgar também nesses espaços os con-teúdos encontrados nos blogs. Na parte superior e inferior dos blogs estão os links de acesso ao provedor, que, como ressalta Rettenmaier (2009), permitem que qualquer leitor de blog possa, a partir dos blogs que visita, criar também seu próprio espaço, ampliando, assim, a rede da blogosfera. Nesses lugares também estão os links de possíveis anun-

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ciantes, buscas, ou mesmo anúncios de trabalhos feitos pelo próprio blogueiro.

Por fim, outro link característico dos blogs e um dos mais importantes é o que dá acesso ao espaço dos comentá-rios. Invariavelmente localizado abaixo ou ao lado de cada postagem, esses links costumam ser frases ou expressões que representam verdadeiros convites à participação dos visitantes. Alguns blogueiros, inclusive, lhes dão forma de enunciados no imperativo em frases, como “dê sua opinião”, “fale conosco”, “comente”, “diga aí”, entre outros, que são como um incentivo à interação. Outros optam por formatos diferenciados de links, como, por exemplo, os tradicionais “balões” das histórias em quadrinhos. O link dos comen-tários efetiva uma das principais marcas dos blogs: a con-vergência das vozes de muitos sujeitos em um único espaço textual. Além disso, reiteram a afirmação de Xavier (2009, p. 193), segundo a qual “o link é um elemento fundamen-tal para que todas as conexões e capacidades de interação deem certo [...]”.

Levando em consideração, portanto, que os blogs são espaços textuais inseridos nos contexto da sociedade da aprendizagem, onde o conhecimento é construído coletiva-mente e amplamente divulgado por meio do rápido e livre acesso a variados tipos de textos, e da vasta possibilidade de comunicação oferecida pela internet, pode-se afirmar que os links exercem um papel importantíssimo para a viabilidade das operações comunicativas e informativas de-senvolvidas na blogosfera. Afinal, são esses que “vinculam mútua e infinitamente pessoas e instituições enredando-as em uma teia virtual de saberes com alcance planetário a qualquer hora do dia” (Xavier, 2009, p. 193), conferindo aos blogs o dinamismo que tanto agrada aos usuários.

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Postagens

Atribuir tipologias aos blogs e defini-los como sendo de poesia, jornalismo, humor, política, culinária ou qualquer outro tema é atitude comum entre as pessoas que partici-pam desse meio e está diretamente associada àquele que pode ser considerado o elemento central dos blogs: as pos-tagens, ou simplesmente “posts”, como são chamadas pelos blogueiros. Isso acontece porque, em geral, os blogs pos-suem um eixo temático sobre o qual o “dono do blog” cons-trói, copia ou divulga textos em forma de postagens que irão se tornar o centro e a identidade daquele espaço. Tais textos são disponibilizados no blog onde poderão ser lidos, comentados e até mesmo divulgados por qualquer pessoa que o visite.

Por meio das postagens, o blogueiro tem a possibilida-de de expor ao mundo o que de outra forma não consegui-ria. Para Rettenmaier (2009, p. 84), os blogs “permitem voz e manifestação a todos, retirando a autoria das suportas autoridades intelectuais” e fazendo surgir a cada dia no-vos escritores que podem publicar seus textos sem passar pela burocracia das editoras e com um público ilimitado. A blogosfera não exige dele mais do que acesso à rede e von-tade de participar. O reconhecimento ou não daquilo que escreve, ou seja, a sua “existência” na blogosfera, será uma consequência que, segundo Hewitt (2009), virá mediante a demonstração de competência do blogueiro.

Como dito anteriormente, os blogs, em seu significa-do e formato original, podem ser considerados como diários virtuais, associação que, embora com algumas alterações, pode ser reafirmada, pelo menos, em dois elementos relacio-nados à publicação das postagens nesse espaço: a frequên-cia com que os textos são publicados e a “pessoalidade” do conteúdo. Nos diários tradicionais, o autor faz seus regis-

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tros diariamente, como sugere a própria nomenclatura, ou, pelo menos, com alguma regularidade; nos blogs essa regu-laridade de publicação também deve ser observada, haja vista que a atualização é um elemento fundamental para que o blog seja valorizado dentro da rede.

O dinamismo característico de toda a web que permi-te a interferência constante dos usuários, somada à facili-dade de comunicação e divulgação de informações dentro do ambiente virtual, faz com que a todo instante dados no-vos sejam disponibilizados e divulgados amplamente nesse ambiente, circunstância que se repete também dentro da blogosfera, entre os milhões de blogs que a compõem. Com o grande número de postagens publicadas diariamente, há sempre muita novidade circulando, e esses são os conteúdos mais procurados pelos usuários. Assim, quando o blogueiro “esquece” de atualizar seu espaço, os leitores também “es-quecem” do seu blog.

A própria maneira como as postagens estão organiza-das reiteram essa importância ao apresentá-las não dis-persas na página, de modo a evidenciar os conteúdos mais importantes, como ocorre nos sites, por exemplo, mas “em-pilhadas”, de modo a deixar em evidência, ou seja, no “topo da pilha”, a postagem mais recente. A imagem a seguir, re-tirada do blog “vida no campo”, da escritora de livros infan-tojuvenis, Índigo, mostra essa organização das postagens dentro dos blogs.

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Fonte: http:\\diariodaodalisca.blog.zip.net

Figura 2 - Imagem do blog “Vida no campo”

A importância da atualização, porém, pode ser mais ou menos intensa, conforme o próprio tema abordado nas pos-tagens. Em blogs de cunho literário, como o ilustrado, bem como nos humorísticos ou culinários, por exemplo, esse não é o critério mais importante, ao passo que em outros, como os jornalísticos, de variedades ou aqueles ligados ao mundo da moda e das tecnologias, a constante publicação de novas postagens é vital para a sua pertinência na web.

O segundo aspecto a ser pensado em relação à seme-lhança com os diários impressos refere-se ao fato de que, embora tenham deixado de ser relatos sobre a vida do au-tor, os conteúdos disponibilizados nos blogs continuam sen-do muito pessoais, visto que, por meio deses, o blogueiro expõe suas opiniões, pensamentos e se revela como sujeito. Para Komesu (2004, p. 111), os blogs são “ferramentas de autoexpressão”, pois o sujeito, tendo liberdade de escolher o que será publicado em seu blog, optará, certamente, por temas que revelam um pouco da sua própria personalidade através de seus interesses.

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Em razão disso, o uso da primeira pessoa na redação das postagens torna-se muito comum e reafirma a perso-nalidade fictícia ou não do sujeito por detrás da tela. Isso reforça, ainda, o tom de diálogo presente nesses espaços e ajuda a construir uma ideia de proximidade entre o blo-gueiro que publica suas postagens e aquele que lê e parti-cipa do blog. Para Marcuschi (2004), a linguagem na web mescla elementos da escrita e da oralidade resultando em uma linguagem peculiar que dá fluidez à leitura. Entre-tanto, no caso dos blogs, mesmo não sendo uma linguagem formal, a tendência ao excesso de abreviações e sinais gráfi-cos, comum em outros ambientes da web, não se repete nos blogs, os quais, por não manterem uma relação de comu-nicação imediata com seus leitores, não comportam certos abusos de adaptação linguística típicos em ambientes como os chats, onde a pressa em contestar impulsiona ao uso des-sa linguagem abreviada e comum nos ambientes virtuais.

Nos blogs porém, por mais informais que sejam, é ne-cessário que haja uma regularidade linguística que permi-ta que o texto esteja claro para qualquer leitor que o queira ler. Como explica Marcuschi (2004), os blogs são espaços de comunicação assíncrona e multilateral, ou seja, a resposta àquilo que é publicado nem sempre ocorre imediatamente após a postagem, como acontece nas salas de bate papo, por exemplo, e a comunicação acontece não de um para um, como nos e-mails, mas de um para um incontável número de sujeitos, possíveis leitores do blog em questão, o que con-tribui para que haja uma maior regularidade linguística existente nesses espaços em comparação a outros da web.

Há que se registrar ainda que, embora os blogs como um todo já se valham da linguagem hipermidiática para comunicar, seja por meio dos links, seja pelo próprio layout utilizado, as postagens são os espaços onde a multiplicida-

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de de linguagens utilizadas se faz sentir com maior inten-sidade. Assim, as postagens podem conter textos verbais, icônicos e sonoros, sendo que esses últimos, em geral, são ativados por meio de links. A presença dessa característica atende às expectativas de um público que já está tão habi-tuado a se envolver com textos nos quais há a convergência de distintas linguagens que desenvolveu, inclusive a capa-cidade de, entre a grande quantidade de informações que chegam simultaneamente com esse tipo de texto, modular a atenção e captar sobre aquilo que mais lhe interessa. Além disso, para Xavier (2009), o uso dessas diferentes lingua-gens reunidas pelos blogs em um único espaço favorece à comunicação, permitindo que o blogueiro expresse de forma mais clara e precisa o que pretende, e leve o leitor a uma maior compreensão, despertando nele a vontade de tam-bém participar.

Comentários

Equivalente às anotações feitas ao redor das páginas de um livro, os comentários nos blogs, assim como essas, vêm suprir essa vontade do sujeito de compartilhar as pri-meiras impressões, indagações e emoções que a leitura lhe desperta. A diferença é que essas anotações não estão pre-sas às páginas de um livro onde permanecerão – se tudo ocorrer da forma mais corriqueira – como um segredo que nunca será compartilhado. Nos blogs, as “anotações” não só ficarão disponíveis a todos os demais leitores em forma de comentários, como também serão enviados diretamente ao “dono do blog”, que, em alguns casos, necessitará aprová--las ou não antes de permitir sua publicação.

Como já tratado anteriormente, os comentários, bem como o espaço para escrevê-los, está localizado próximo a

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cada postagem e podem ser acessados através de um link que, ou dará acesso a esse espaço em uma listagem abai-xo do texto principal, ou abrirá uma nova janela, como no exemplo a seguir do blog de crônicas “Cadernos de vidro” de André Laurentino.

Fonte: www.andrelaurentino.blogspot.com.br

Figura 3 - Imagem da página de comentários do blog “Cadernos de vidro”

Mais do que uma atividade qualquer, os comentários dão significação a esses espaços cuja principal finalidade é, justamente, promover situações de interação e comu-nicação. Quando alguém cria um blog e passa a publicar seus textos, o faz porque quer compartilhar algo com outras pessoas, e isso não terá sentido algum se não houver pes-soas dispostas a ler e se envolver com o assunto proposto. A grande participação dos leitores por meio dos comentários

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marca a qualidade da publicação e é verdadeiro termôme-tro da repercussão de um blog. Por mais que o número de visitantes de um blog seja alto, a verdadeira relevância do mesmo se mede pela participação dos leitores através dos comentários. A razão disso é que quando essas novas vozes se somam a do texto principal ampliam a visão daquilo que está sendo tratado e despertam a curiosidade daqueles que percebem a movimentação em torno de determinada posta-gem ou blog.

Os comentários podem ser entendidos como um novo texto ou como a continuação do texto principal construído coletivamente por pessoas que querem tornar públicas as suas impressões sobre o texto, compartilhar o que sabem ou, ainda, apimentar as discussões. Esse novo texto consti-tui-se como diálogos travados entre o “dono do blog” e os lei-tores e podem variar de uma singela parabenização a uma crítica mais áspera. Ao aceitar divulgar em seu blog textos que se opõem ou criticam sua fala, o blogueiro enriquece o espaço com a diversidade das opiniões nele apresentadas e confirma a democratização e a liberdade de expressão, ca-racterísticas deste. Obviamente, quando a crítica é ofensi-va ou quando o conteúdo possui uma conotação criminosa, a reação do blogueiro possivelmente não será a mesma.

Ao contrário do que ocorre com as postagens, a escrita abreviada e o uso de sinais gráficos é mais comum dentro do espaço dos comentários que, conforme Marcuschi (2004, p. 63), abrigam uma “linguagem em estado natural de pro-dução”. Esses, por se tratarem de textos publicados de for-ma espontânea tão logo o leitor acabe sua leitura, acabam ilustrando justamente as primeiras impressões sentidas pelo leitor que as escreve sem dedicar-lhes um trabalho de elaboração textual. Essa tendência a transgredir a regu-laridade linguística provém, certamente, da sensação de

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proximidade transmitida pela facilidade de contato com os demais sujeitos envolvidos nessas práticas que, inclusive, se assemelham a espaços de bate-papo.

Essa “liberação” da escrita, entretanto, varia de acordo com a temática e o estilo do blog ou, mesmo, do blogueiro. Assim, é comum que em blogs de cunho humorístico ou de entretenimento a linguagem nos comentários seja mais sol-ta do que em um blog com temática voltada para questões políticas e econômicas, por exemplo. Um mesmo sujeito pode expressar-se das duas formas em tipos variados do blog, buscando sempre adequar-se ao contexto de cada um, pois no momento em que ele decide expor seu comentário, expõe também a si e sua identidade, mesmo que na rede essa possa ser fictícia.

Para Marcuschi (2004), o termo “blogueiro” pode ser empregado não apenas para definir quem mantém um blog próprio, mas ainda para quem posta comentários, pois esse também constrói textos e torna-se, assim, responsável pelos conteúdos publicados nos espaços em que participa. A observação do teórico é pertinente não apenas por con-ferir ao sujeito que comenta a condição de autor, mas tam-bém por solucionar a dificuldade em definir, no universo dos blogs, as figuras do leitor e do autor, já que o mesmo sujei-to que mantém um blog, e é considerado como sendo seu autor, pode também visitar e participar de outros blogs na condição de “leitor”.

Essa mobilidade permitida aos sujeitos dentro da blogosfera pode ser pensada também em relação a outro apontamento feito por Marcuschi (2004) quanto à funciona-lidade dos blogs, a multilateraridade. O conceito, que já foi visto anteriormente junto à noção de assincronia, permite essa comunicação em formato de rede, na qual os nós são links pelos quais os usuários movimentam-se em diferentes

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direções, assumindo, como se observou, diversas funções. Tratando-se dos comentários em específico, o modelo mul-tilateral de comunicação permite que uma única postagem possa ser comentada muitíssimas vezes por um número significativo de pessoas. Na prática, esse número não cos-tuma ultrapassar algumas dezenas de comentários – salvo raras exceções –, mas a potencialidade existe. E mesmo que os grupos envolvidos em comentar um tema sejam peque-nos, a interação entre os sujeitos sempre pode representar a oportunidade de um aprendizado.

Como são muitos blogs na web, a formação de peque-nos grupos ao redor de cada um é corriqueira. Em geral esses grupos são atraídos em função da temática abordada naquele espaço, ou seja, são pessoas com interesses em co-mum. Na medida em que elas iniciam suas participações através dos comentários, passam a se reconhecer dentro da rede. Em alguns casos, inclusive, encontram-se virtu-almente em mais de um blog e passam a dialogar entre si dentro desses espaços.

Já a assincronia influencia os comentários no sentido de que a discussão, após ser iniciada, permanece no blog e o blogueiro leitor, portanto, pode participar tanto nos se-gundos que se seguem à publicação quanto um mês, uma semana, ou mesmo um ano depois. Entretanto, o distan-ciamento no tempo diminui as possibilidades desse diálogo acontecer, pois, em razão da maneira como os textos estão dispostos nos blogs, as postagens mais antigas ficam ocul-tas ao final da “pilha”, e para serem encontradas precisam que o leitor as busque, ou através da barra de rolagem, ou dos links de acesso às postagens antigas, localizados, em geral, nas laterais dos blogs. O mais comum, portanto, é que os comentários sejam feitos enquanto a postagem está “visível” no blog.

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Visível também é a importância dos blogs como ferra-mentas para a criação e a divulgação de informações com potencial de se transformarem em aprendizado. Embora os três elementos de composição dos blogs tenham sido vistos em separado, todos estão articulados de modo a comporem um espaço para o desenvolvimento de práticas de leitura e escrita instantâneas e interativas. Nesse sentido, os links funcionam como os agregadores de textos e sujeitos em tor-no dos blogs, as postagens são os conteúdos compartilhados e os comentários, por fim, o elemento que permite a intera-ção desses sujeitos sobre esses conteúdos.

Considerações fi naisDesde tempos muito remotos, o homem busca o conhe-

cimento. Inicialmente, como se viu, o saber estava sacrali-zado nos livros da Igreja; com o decorrer dos anos, nos livros das academias e escolas. Hoje, está em todos esses lugares e em muitos outros. A cultura letrada e mesmo os livros continuam exercendo um papel fundamental na dissemi-nação do conhecimento, o que diferencia o período vigen-te na sociedade de hoje – que segundo definição de Froés (2000) pode ser chamada de “sociedade da aprendizagem” – é, portanto, um gradual processo de desinstitucionaliza-ção do saber. Aprender, atualmente, é tarefa que, segundo a já citada autora, pode ser feita em espaços alternativos, nos quais os sujeitos trocam experiências e informações de maneira informal, espontânea e prazerosa, como acontece, por exemplo, nos blogs.

Entretanto, nem sempre o “tipo” de conhecimento tra-tado nesses espaços é algo reconhecido culturalmente, pois os conteúdos neles existentes são os mais variados possí-veis. Por outro lado, o interesse de quem os busca também são muito distintos, de modo que não se pode julgar o que

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é ou não relevante nesse cenário, haja vista que essa defi-nição irá esbarrar na opinião pessoal dos sujeitos. Sempre haverá alguém interessado em aprender novas anedotas e outro em aprender um pouco mais sobre genética. A im-portância dos blogs dentro do cenário atual, portanto, não está nos temas discutidos pelos blogueiros, que podem ter as mais variadas intenções, está no fato de que os sujeitos podem encontrar nos blogs um espaço para expor e discutir com outras pessoas temas de seu interesse, que nem sem-pre são tratados, por exemplo, na escola.

Os blogs atendem às expectativas dos sujeitos inseridos nesse novo contexto social, seja no sentido de oportunizar contato com as mais diversas temáticas, seja em relação ao modelo de participação democrática que oferece, por meio da qual o blogueiro tem a oportunidade de construir ou par-ticipar de um espaço virtual que o coloca potencialmente em contato com o mundo. Embora nem todas as pessoas da web irão “conhecê-lo”, ao menos algumas poderão associar-se a ele nas discussões propostas. Assim, nos blogs desaparecem as autoridades intelectuais que detêm e repassam o saber institucionalizado e reconhecido como tal, e aparecem sujei-tos híbridos, misto de leitor e escritor, que compartilham na rede suas experiências e especialidades e, juntamente com grupos de sujeitos que comungam dos mesmos interesses, pensam, blogam e existem dentro da rede.

ReferênciasCHARTIER, Roger. A escrita na tela: ordem dos discursos, ordem dos livros e maneiras de ler. In: RETTENMAIER, Miguel; RÖSING, Tania. Questões de leitura e hipertexto. Passo Fundo: UPF Editora, 2007. p. 200-237.

FROÉS, Teresinha. Sociedade da informação, sociedade do conhe-cimento, sociedade da aprendizagem: implicações ético-políticas no limiar do século. In: LUBISCO, Nídia M. L. et al. Informação e infor-mática. Salvador: Edufba, 2000. p. 283-307.

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Blogs: práticas de escrita instantânea e interativa na sociedade da aprendizagem

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Um laptop por criança e as práticas de leitura e escrita:

perspectivas para a inclusão digital1

Silvia KistMarie Jane Soares Carvalho

Computador como elemento potencializador de mudanças de práticas e inclusão digital

uso do computador pelas crianças há tempos co-loca-se como mobilizador de ações para a melho-ria da educação. Papert (1994), desde a década de 1980, preconizava que o acesso ao computador

permitiria às crianças estabelecerem outra relação com o conhecimento – o “aprender fazendo” –, pois a máquina ofe-recia objetos que favoreciam o “pensar com”, diferente dos modos escolares de aprender. Na sua visão, a inserção do computador no contexto escolar poderia mudar as formas

1 A base para o presente artigo foi a dissertação de Kist (2008), uma das investigações realizadas sob coordenação do Laboratório de Estudos Cogni-tivos da UFRGS no projeto “Um computador por aluno” – Fase 1.

O

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Um laptop por criança e as práticas de leitura e escrita: perspectivas para a inclusão digital

defasadas de ensinar e aprender, tendo em vista o fracasso na aprendizagem de um número expressivo de sujeitos.

A “máquina do conhecimento”, como ele chamava o computador, possibilitaria a construção de conceitos por meio da experiência direta, sem necessariamente o domínio do código escrito. O computador seria um meio pelo qual a criança poderia familiarizar-se com língua escrita antes de estar alfabetizada, sendo um elemento desencadeador de conflitos cognitivos e mobilizador para essa aprendiza-gem: “A Máquina do conhecimento oferece às crianças uma transição entre a aprendizagem pré-escolar e a verdadeira alfabetização de uma forma mais pessoal, mais negociada, mais gradual e, assim, menos precária do que a abrupta transição que no momento pedimos que as crianças façam quando passam da aprendizagem através da experiência direta para o uso da palavra impressa como a fonte de in-formações importantes” (Papert, 1994, p. 18).

Naquela época, no entanto, o acesso a essa tecnologia, em razão dos altos custos, era extremamente limitado a uma elite. A maior parte da população passou a enfrentar uma situação de exclusão digital, aumentando ainda mais as desigualdades de oportunidades entre as diferentes clas-ses sociais.

Em 2005, como forma de garantir acesso à máquina por todas as crianças, incluindo países subdesenvolvidos, um grupo de pesquisadores do Massachusetts Institute of Technology (MIT) criou a ONG One Laptop Per Child (OLPC) com a missão de desenvolver um laptop de baixo custo, o laptop XO.

Considerando a participação do Brasil no período de teste do laptop XO, dentro da Fase 1 do programa “Um computador por aluno” (Brasil, 2008), o objetivo da presen-te investigação é analisar o impacto do uso do laptop em

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uma turma de alfabetização de uma escola pública brasilei-ra. Conjuntamente, investiga-se quais são as possibilida-des e as condições necessárias para que o uso da tecnologia venha a ser um instrumento de inscrição de crianças em práticas de letramento. Ao conseguirmos demonstrar isso podemos pensar a superação da relação das crianças com a escrita nos modelos estritamente escolares em vigência. Ao mesmo tempo essa inscrição em práticas de letramento com o suporte da tecnologia funciona como catalisador de inclusão digital.

Partimos do pressuposto de que a introdução do laptop na modalidade 1:1 (utilizando os conceitos de saturação e propriedade da criança, cf. OLPC, 2007) muda a dinâmi-ca da sala de aula e as práticas das crianças em relação à leitura e escrita e ao uso da tecnologia, trazendo novas perspectivas para a inclusão digital dos sujeitos envolvidos.

As questões que se colocam são: quais práticas são pos-sibilitadas e potencializadas pelo uso do laptop na moda-lidade 1:1 por crianças em processo de alfabetização?; sob que condições as práticas mudam, de modo que os cidadãos sejam capazes de utilizar tanto a língua escrita quanto a máquina como tecnologias de empoderamento?

Metodologia

A investigação foi desenhada como um estudo de caso (EC) incorporado, conforme a definição proposta por Yin (2001, p. 32): “Uma investigação empírica que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidos.”

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Acredita-se que o presente estudo se inscreve na defini-ção trazida por Yin, especialmente no que tange aos limites existentes entre o fenômeno e o contexto. O EC, conforme o autor, “[...] enfrenta uma situação tecnicamente única em que haverá muito mais variáveis de interesse do que pontos de dados, e, como resultado, baseia-se em várias fontes de evidência, com os dados precisando convergir em um for-mato de triângulo, e, como outro resultado, beneficia-se do desenvolvimento prévio de proposições teóricas para con-duzir a coleta de dados e a análise dos dados” (Yin, p. 32-3).

A pesquisa foi realizada acompanhando-se o trabalho da classe de alfabetização – 1º ano do ensino de nove anos – de uma escola pública de Porto Alegre – Brasil. Os 19 alunos, de seis anos de idade, estavam imersos em um co-tidiano digital ao receberem laptops doados pela ONG One laptop per child.

As práticas realizadas pelos estudantes dentro da modalidade 1:1 constituem o caso do estudo. Essas foram examinadas segundo três unidades de análise: práticas dos alunos propostas pela professora; práticas realizadas espontaneamente; casos emblemáticos. Por meio da trian-gulação de dados foi possível criar categorias relacionadas a três eixos: letramento; alfabetização; fluência digital, sob os quais cada unidade foi analisada. As fontes de evidências são: registros dos alunos e da professora no ambiente vir-tual de aprendizagem Amadis, registros do diário de campo da pesquisadora que esteve presente em sala de aula em to-das as propostas analisadas neste estudo (DC), registro de todas as produções salvas nos laptops de todos os alunos da turma (LA) e registro de entrevistas/conversas realizadas com os alunos e com a professora gravadas em áudio (EN).

Conforme característica de um estudo de caso, a pes-quisa teve início com uma proposição teórica, sustentada

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pelas experiências anteriores do grupo de pesquisa e pelo referencial teórico utilizado. Partiu-se para a investigação com a seguinte proposição teórica: A modalidade 1:1 e a propriedade do laptop pelo estudante, para além da pro-posta da professora, cria o ambiente simbólico propício ao desenvolvimento cognitivo de crianças em processo de alfa-betização à medida que possibilita práticas diferenciadas em relação à conceituação da língua escrita e ao desenvol-vimento da fluência no uso da tecnologia.

Nas próximas duas seções são analisados os dados co-letados segundo a hierarquia: unidade de análise; agrupa-mento de categorias; categorias.

Unidade de análise 1: Práticas propostas pela professora

Para esta unidade, cabe a ressalva de Ferreiro (1999, p. 31) de que “o método (enquanto ação específica do meio) pode ajudar ou frear, facilitar ou dificultar, porém não pode criar aprendizagem. A obtenção de conhecimento é resulta-do da própria atividade do sujeito”. Dessa forma, as ativi-dades aqui apresentadas referem-se a propostas da profes-sora que foram diferenciadas em razão do uso do laptop e geraram práticas por parte dos alunos.

Letramento

As crianças de seis anos, ao ingressarem na escola, estão vivenciando formalmente o processo de conceituação da língua escrita, embora se saiba que esse processo inicia previamente. O processo de conceituação da língua escrita é fruto da ativação dos sistemas de significação e dos siste-mas lógicos do sujeito. Nesse sentido, é dependente desses

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dois outros processos: alfabetização (compreensão do fun-cionamento do código) e letramento (compreensão da fun-ção e a capacidade de uso da língua). Por isso, acredita-se que a ausência de interação simbólica envolvendo a língua escrita, de contato com portadores de texto e com práti-cas sociais de leitura e escrita no cotidiano, são elementos contribuintes para a dificuldade de as crianças compreen-derem a função da língua e, consequentemente, a apren-dizagem do código. No trabalho geral da professora, obser-vamos práticas relacionadas ao letramento, classificadas nas seguintes categorias:

Inclusão no mundo virtual letrado

Para incorporar a língua ao cotidiano é necessário, além do domínio do código, compreender sua função. Para isso, um dos fatores que podem contribuir é estar incluído (como agente) em um mundo letrado (Soares, 2006). Nas propostas da professora, tal situação inicia-se com o traba-lho no ambiente virtual de aprendizagem – Amadis (Bit-tencourt et al., 2006). A participação em um ambiente, que é habitado por todos os escolares da instituição de ensino, torna factíveis diferentes níveis de interação e demanda o exercício de práticas sociais de leitura e escrita. Todos os alunos do primeiro ano tinham um nome de usuário e uma senha para acessar ao ambiente virtual, bem como um per-fil com foto (Figura 1).

As propostas que envolvem o desenvolvimento dos projetos proporcionam a continuidade do trabalho de uso do ambiente, o qual possibilita às crianças fazerem parte deste meio virtual baseado no código escrito. A professora desenvolveu com a turma o projeto chamado “Curiosidade premiada”, inspirado na metodologia de projetos de apren-

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dizagem (Fagundes et al., 1999). Nessa prática, os alunos puderam expressar suas curiosidades e escolher algumas questões para realizarem uma investigação, como, por exemplo, o que os golfinhos comem? Os tiranossauros ficam banguelas? O que os leões fazem além de atacar e comer? Como o elefante bebe água? Por que os morcegos chupam sangue?

Figura 1 - O aluno ER insere sua foto e escreve sua apresentação no webfólio do Amadis

A sistemática de publicação no diário das descobertas sobre as questões dos projetos e das fotos desenvolveu uma rotina de uso do ambiente. Isso pode ser observado na Fi-gura 2, que mostra o registro sobre diferentes temáticas dos projetos. Todos os projetos deveriam ser registrados no diário do Amadis.

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A utilização da língua escrita para atingir um fi m

Figura 2 - O aluno CE escreve no diário do Amadis sua descoberta sobre como os elefantes bebem água e insere uma imagem

Constatou-se que em todas as propostas que envol-viam o uso do Amadis a escrita era utilizada para atingir um fim. Para ingressar nessa “grande casa”, o Amadis (me-táfora utilizada para que as crianças entendessem o que é o ambiente na web), foi necessário o uso da língua, porque elas precisavam digitar o site e identificarem-se com nome e senha, isto é, a “chave de entrada da casa”.

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Durante o trabalho com projetos, uma das estratégias utilizadas foi a busca de informações e imagens na inter-net, que demanda uso da escrita como meio para obtê-las. Na prática de buscar imagem na internet, não foi imposta limitação para escrever somente palavras com sílabas sim-ples. A curiosidade da criança e a questão do projeto guia-ram o tipo de palavra a ser escrita; ela é quem determinou as letras, os sons, as palavras que foram aprendidas.

Exercício da autoria na escrita

Dentre as inúmeras práticas em que os alunos exerce-ram autoria sobre sua escrita, isto é, utilizaram a língua escrita com sentido para se expressar, cabe destacar a prá-tica de salvar imagens da internet para o projeto, alterando espontaneamente o nome original do arquivo. O aluno BG, ao salvar imagens da internet, descobriu que podia modi-ficar-lhes o nome. A prática de alterar o nome indica uma compreensão da função da língua e um exercício da função de autoria, porque é possível agir sobre o código e expressar significações próprias. Essa apropriação pode ser vista no extrato a seguir, em que o aluno quer chamar sua imagem de “elefante pit bull”. Esse procedimento foi adotado por vários alunos (Figura 3).

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Figura 3 - (DC) 13/11/2007: BG entra no Google e escolhe uma imagem de elefante. Na hora de salvá-la no laptop, diz: “Eu quero escrever outro nome. Eu botei elefante03, mas eu quero ‘elefante pit bull’. Mas eu não sei escrever pit bull.” Escreve elefantepitidu.jpg. (LA) No dia 13/11/2007 FA (à direita) salva no laptop imagens de elefantes e modifica os nomes dos arquivos conforme seu sistema de significação.

Comunicação através da língua escrita

A comunicação assíncrona em rede é um dos fatores que contribuem com a compreensão das funções da escrita. A ação da professora de enviar mensagens aos seus alunos dentro do ambiente virtual teve a intenção de promover a comunicação através do uso da língua escrita. Além disso, quando os posts do diário são comentados, as crianças têm a garantia de que sua escrita está sendo lida por interlo-cutores reais.

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Exploração de diferentes estratégias para ler ou escrever

No processo de letramento, não há necessidade de domínio do código para o exercício/uso da língua escrita. O uso do computador, por permitir inúmeras manipulações simbólicas, potencializa-o na medida em que possibilita a utilização de estratégias de leitura e escrita, sendo possível atingir um grau de letramento, sem dominar completamen-te o código.

Alfabetização

Poucas propostas da professora, durante o uso do laptop em sala de aula, centraram-se no domínio do código. Dentre as que mais contribuíram para a alfabetização esta-vam aquelas relacionadas aos projetos, ou seja, atividades que demandavam a escrita espontânea. As propostas re-lacionadas à alfabetização foram classificadas conforme as categorias a seguir:

Escrita a partir de um modelo

As propostas nas quais está previsto o registro da per-gunta do projeto no Amadis podem ser consideradas práti-cas de escrita a partir de um modelo, porque pressupunham o registro da questão previamente estruturada e escrita em cartazes na sala de aula. Entretanto, alguns alunos escre-veram a pergunta conforme sua hipótese e não copiaram o modelo. A cópia do modelo foi a estratégia utilizada pelas crianças que não dominavam o código.

Escrita com função instrumental

A proposta de registro do nome dos colegas no editor de texto pode ser considerada uma atividade sem intenção comunicativa, centrada no exercício da escrita como um

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fim em si mesma. Os alunos apenas registraram o nome de colegas no editor de texto. No entanto, essa atividade mostrou-se importante porque foi realizada com sucesso por todos os alunos, inclusive os pré-silábicos.

Compreensão do funcionamento do código escrito

As propostas de análise do código contribuem com a compreensão do seu funcionamento, ou seja, com a al-fabetização. A partir da proposta de registro no ambiente virtual sobre as aprendizagens dos projetos, foi possível acompanhar o desenvolvimento das hipóteses de escrita que as crianças foram construindo ao longo do ano letivo. Apareceram momentos em que os alunos, na tentativa de compreender a língua, fizeram generalizações de regras na ortografia da palavra, na sintaxe e na semântica que não são generalizáveis para todas as situações (Figura 4).

Figura 4 - Análise das manifestações de AM e DC.” O restante do texto deve ser transformado em parágrafo imediatamente abaixo da figura

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Em 31/10/2007 WI escreve no diário sem deixar espaço entre algumas palavras. Quando o menino foi escrever “leãos são” perguntou se era com “SS”. Pensou e percebeu que teria que separar as palavras. Mas segmentou somente nessa situação. Nesse momento, instaurou-se uma perturbação e a partir daí ele passou a separar em palavras em algumas situações. (AM) Em 31/10/2007 CE (à direita) escreve no diário de AMADIS que está “PROGETANDO”, generalizando a desinência verbal.

Esse processo ativo de construção dos mecanismos de produção do conhecimento torna o sujeito criador do conhe-cimento (Ferreiro, 1999). A criança, ao aprender a língua, realiza uma reconstrução própria; ela cria a sua gramática. Neste estudo, entende-se tal processo como compreensão do código e não como simples aquisição do mesmo.

Fluência digital

Considerando o entendimento sobre inclusão digital para além do simples acesso a ferramentas tecnológicas, trabalhamos com um conceito sobre o desenvolvimento das habilidades: fluência digital (Committee on Informa-tion Technology Literacy, 1999). Ser fluente digitalmente implica não apenas ser capaz de utilizar as ferramentas tecnológicas, mas também saber construir coisas significa-tivas a partir delas, aprender coisas através delas, solucio-nar problemas tanto em relação à máquina como de outra natureza, utilizando-as. Nesse eixo, as práticas propostas pela professora foram classificadas segundo as seguintes categorias:

Capacidade para utilizar a tecnologia

As propostas iniciais trabalharam com a lógica de fluência em que há aprendizagem a partir da ação/explo-ração. Não houve nenhuma instrução formal sobre como

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abrir o laptop, como localizar as atividades, como fechá-las, como desligar a máquina, como usar o trackpad. Essas são aprendizagens que foram sendo construídas a partir das necessidades reais no momento do uso com a ajuda do outro (colega, professora, pesquisadora) ou como uma construção individual. As atividades de exploração livre tendem a le-var o sujeito a se deparar com atividades que, inicialmente, parecem sem sentido, mas aos poucos são organizadas den-tro da sua lógica e de seu sistema de significações e acomo-dadas.

O uso sistemático do Amadis no trabalho por projetos transformou os procedimentos complexos em atividades ro-tineiras para alguns sujeitos. Para entrar no ambiente ha-via uma série de passos que deveriam ser realizados e que a maioria dominava.

Capacidade de aprender novas formas de utilizar a tecnologia

Para que um sujeito se torne fluente no uso da tecno-logia, não se faz necessário o domínio de todas as funciona-lidades de um programa. Fluência envolve a capacidade de aprendizagem, segundo suas necessidades.

As propostas de oficinas com o Squeak/EToys (Kay, 2005) foram tentativas de aprofundar os conhecimentos sobre os recursos de uma atividade do laptop que muitas crianças exploravam espontaneamente. Na primeira ofici-na de Squeak/EToys, as crianças aprenderam que, além de desenhar objetos, podiam desenhar letras e criar cópias das letras para escrever palavras. O conceito de objeto, caracte-rístico dessa linguagem de programação, foi uma das cons-truções que exigiu atividade cognitiva intensa das crianças de seis anos, pois elas tinham a tendência de desenhar seus projetos como um todo, impossibilitando o uso de recursos de animação de objetos individuais.

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Capacidade para construir com a tecnologia

O uso do Squeak/EToys permitiu diferentes manipula-ções e experimentações simbólicas. Na atividade, as crian-ças tiveram a oportunidade de desenhar objetos ou letras e colocá-los em movimento, inserir som, construindo arte-fatos sobre os seus projetos. Outro grupo de propostas que possibilitou diferentes criações com o laptop foi o trabalho por projetos. A proposta de fotografar a exposição de dinos-sauros, os livros sobre os leões e os dinossauros construídos com massinha de modelar, contempla a utilização de um recurso computacional para a criação de um registro.

Solução de problemas técnicos

Uma proposta da professora iniciou com uma conver-sa sobre os problemas no laptop que se apresentavam em razão de ser esse um projeto pioneiro, com uma máquina em fase de teste. Nessa proposta, cada criança relatou os problemas que enfrentou com o laptop e que soluções en-contraram ou quais medidas poderiam ser tomadas fren-te a determinados problemas técnicos. O aluno BA relatou que seu computador desligou sozinho. Com esse relato, os alunos aprenderam que o computador necessita de ener-gia para funcionar. Outros problemas diziam respeito ao fato de não conseguir abrir determinada atividade ou de o laptop ficar lento. Para esses casos foram identificados os problemas e as soluções foram formuladas com o grupo.

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Unidade de Análise 2: práticas espontâneas realizadas pelos alunos

Um dos pressupostos centrais na filosofia da modalida-de 1:1 é que o laptop seja propriedade da criança. Tal prin-cípio garante que a máquina esteja presente para além do espaço escolar. Mesmo que seu uso se dê no espaço escolar, ele pode ser realizado espontaneamente pela criança, sem a dependência de uma proposição da professora. Nessa uni-dade de análise, procura-se entender e diferenciar o que as crianças conseguem aprender e fazer sem a proposição ou a intervenção da professora segundo os três eixos de catego-rias: letramento, alfabetização e fluência digital.

Letramento

Participação em práticas de letramento no contexto digital

O uso do ambiente virtual Amadis, iniciado com uma proposta da professora, tornou-se progressivamente uma prática diária e espontânea no cotidiano de alguns alunos do primeiro ano. Eles manifestavam interesse em entrar no Amadis, seja para ver o webfólio (perfil) dos colegas, seja para ler suas mensagens, mesmo quando a proposta de aula não envolvia o uso do ambiente. Outra prática que indica o pertencimento a um determinado ambiente social letrado é quando as crianças criaram uma rede de relações, adicionando outros usuários como amigos. Alguns alunos restringiram-se a adicionar colegas da turma. Outros adi-cionaram professores, pesquisadores e alunos de outras turmas, ampliando sua rede de relações. Apenas uma alu-na não adicionou amigos.

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Figura 5 - FA adicionou alunos de outras turmas, professores, pesquisado-res e colegas. O aluno CL (à direita) adicionou apenas colegas de aula

A utilização da língua escrita para atingir um fi m

Outro procedimento em que a língua escrita se fez pre-sente constituiu-se em localizar os colegas que estavam pró-ximos pela rede mesh do laptop, através da identificação dos respectivos ícones do XO. Ao deixar o apontador do mouse

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sobre um XO, aparecia o nome do usuário correspondente ao ícone. Para realizar a prática de entrar em sites de jogos, localizar sites ou imagens de interesse, a escrita foi condição sine qua non para a utilização da ferramenta. O procedi-mento de entrar na internet e salvar imagens foi trabalhado pela professora com as crianças para a busca das figuras dos animais dos projetos. No entanto, ele foi generalizado para a busca de outras imagens. Durante essa prática espontâ-nea aconteceram fatos que contribuíram para a construção da língua escrita, como a aprendizagem de “formas fixas”, ou seja, palavras incorporadas pelo sujeito que serviram de modelos para pensar a escrita de outras palavras.

F igura 6 - (AM) Expressão espontânea no diário do Amadis realizada por PA

Exercício da autoria na escrita

A prática de expressão escrita espontânea teve iní-cio com o aluno PA ao escrever no diário do Amadis sobre assuntos de seu interesse (Figura 7). Como o aluno tinha

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computador com internet em casa, realizava tal ação du-rante a aula e também fora do espaço escolar. Os demais colegas tomaram conhecimento com PA sobre essa possi-bilidade e iniciaram a fazê-la. Capturavam a imagem na internet e inseriam-na no seu diário do Amadis ou somente escreviam no diário do Amadis espontaneamente, indepen-dentemente da solicitação da professora e dos projetos de aula. O aluno PA escrevia sobre o que desejava, sobre coisas que achava interessantes e de que gostava, sobre sua roti-na, como lugares que visitou, horário em que acordou, seus filmes e brinquedos preferidos, fazendo uma interlocução com o leitor.

Comunicação através da língua escrita

Paralelamente à apropriação do Amadis e também da língua escrita, os alunos iniciaram a prática de fazer uso do recurso de envio de mensagem pelo Amadis.

Figura 7 - (AM) Expressão espontânea no diário do Amadis realizada por PA

Figura 8 - (AM) WI adiciona um colega como amigo e envia uma mensa-gem comunicando-lhe. Em menos de seis minutos, o aluno ER lê a mensagem e a responde

Estratégias para ler ou escrever

Uma estratégia utilizada por várias crianças foi a de fotografar portadores de texto dentro e fora da sala de aula. O aluno VI, um usuário assíduo no Amadis, utilizava a es-tratégia de copiar o nome dos colegas do cartaz exposto na

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sala de aula para que pudesse entrar em seus webfólios e adicioná-los como amigos. O aluno FA costumava copiar a palavra presente na imagem da capa dos cadernos como uma estratégia para buscar a imagem no Google.

Alfabetização

Escrita com função instrumental

Espontaneamente, as crianças escrevem alguns no-mes, brincando com a escrita, como fez o aluno BG, mo-dificando a escrita original do seu nome e do nome de seu irmão. O “brincar” de escrever como escrever nomes, pala-vras conhecidas, brincar/modificar a escrita de nomes são práticas que podem contribuir na compreensão do código, tendo em vista que há manipulação simbólica.

Compreensão do funcionamento do código escrito

O aluno FA, na dúvida sobre a escrita de uma palavra, testa a sua hipótese, escrevendo-a no Google. Ao verificar que cometeu uma troca de letras, ele se autocorrige e no mo-mento de salvar a imagem escreve corretamente a palavra.

Fluência digital

Capacidade para utilizar a tecnologia

Uma prática espontânea realizada pelos alunos, que evidenciam a capacidade de utilizar aspectos básicos da tecnologia, pode ser ilustrada no número de fotos e vídeos realizados por eles ao longo do ano letivo. Uma conduta pe-culiar foi do aluno GU, com uma hipótese de escrita pré--silábica. No primeiro dia em que levou o laptop para casa, tirou 57 fotos. Assim como os alunos executaram as propos-tas da professora de salvar imagem da internet em razão

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dos projetos, salvaram também imagens de seu interesse. Os mesmos problemas e indiferenciações repetiram-se en-tre todos. Se, por um lado, dominavam o procedimento de entrar no buscador, localizar a imagem, salvá-la no compu-tador, e até modificar seu nome, por outro, usavam a exten-são JPG como uma pseudonecessidade, apenas colocando-a ao lado da outra palavra, sem utilizar o ponto, não demons-trando compreensão da lógica dos sistemas de arquivos.

Capacidade de aprender novas formas de utilizar a tecnologia

Figura 9 - (LA) Em 25/9/2007 BG, em aula, desenha no Squeak/EToys um carro como o modelo do tutorial

Figura 10 - (LA) BG faz no Squeak/EToys um cachorro deslizando pelo corrimão

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Um laptop por criança e as práticas de leitura e escrita: perspectivas para a inclusão digital

O uso do Squeak/EToys iniciou como uma prática es-pontânea. Quando se abria a atividade, havia uma opção de assistir a um tutorial, que demonstrava como fazer o desenho do carro e os comandos para colocá-lo em movi-mento. Os alunos descobriram essa opção dentro da ati-vidade e tentaram reproduzi-la (Figura 9). Algum tempo depois, com o suporte das oficinas de Squeak/EToys na sala de aula, o aluno BG já havia se apropriado do procedimen-to para colocar objetos em movimento. Assim, conseguiu criar usos para essa funcionalidade, inventando projetos próprios, como aparece na Figura 10. O aluno VI possui 24 produções de Squeak/EToys salvas no seu laptop, quase todas realizadas em casa. Em cada uso do Squeak/EToys, os alunos descobriam novidades e traziam-nas para a aula para compartilhar com os colegas.

Capacidade para criar coisas com a tecnologia

Figura 11 - Em 19/10/2007 CL desenha no Paint em casa e salva a ima-gem como “feliz aniversario pai.png

Uma das práticas espontâneas de uso da tecnologia que envolvia criações pessoais, invenções de novos jeitos de utilizá-la, foi a atividade com a câmera. Alguns alunos a

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utilizavam para gravar desenhos da TV. O aluno CL tem horas de gravação do desenho animado. O RI faz em casa um vídeo com a família. Outro, o BA, utiliza a câmera para entrevistar uma pessoa em sua casa. Também a prática de utilizar o laptop para gravar suas vozes cantando uma mú-sica foi recorrente entre eles. A prática de uso da câmera de fotos do laptop encontrou diversas finalidades: fotografias pessoais, da família, dos colegas, de objetos pessoais, re-gistro de brincadeiras etc. O uso do editor para desenhos permitiu diferentes criações espontâneas por parte das crianças, como fez o aluno CL para seu pai na data do seu aniversário (Figura 11). Criar usos diferenciados para as ferramentas existentes foi uma característica do trabalho que o laptop, na modalidade 1:1, propiciou, principalmente, às crianças que dificilmente teriam acesso à tecnologia em suas casas.

Solução de problemas técnicos

Enquanto alguns alunos conseguem pensar em solu-ções para os problemas técnicos, outros esperam por ajuda ou ficam sem ação. O aluno BG, ao deparar-se com um pro-blema, tal como “não conseguia tirar mais fotos”, apresenta a hipótese de que havia tirado muitas fotos e não havia mais espaço no laptop. O mesmo aluno resolve para a cole-ga NA o problema de como ligar a máquina, porque ela não estava conseguindo fazê-lo. Ele retira a bateria do laptop e a insere novamente. Assim, o laptop volta a funcionar.

Unidade de análise 3: casos emblemáticosCom o intuito de aprofundar a compreensão a respeito

da proposição teórica, a unidade de análise 3 apresenta cin-co casos individuais que ilustram diferentes situações em relação às práticas de letramento e de uso do laptop.

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O caso do aluno TH aponta as implicações que os pro-blemas técnicos no laptop, aliados à baixa tolerância da frustração dele, trouxeram para o seu desenvolvimento da língua escrita. Ele parecia um caso promissor, mas ao longo do trabalho com o laptop, não demonstrou avanço na sua hipótese de escrita; ao contrário, passou a utilizar hipóte-ses precárias. O laptop do aluno TH apresentava proble-mas no trackpad (dispositivo apontador do laptop). Esse foi um problema comum aos primeiros protótipos de laptop. Quando se tentava mover o cursor, este não se comportava da maneira esperada, ia “pulando” para outras partes da tela. Tal dificuldade foi frustrando a cada dia o aluno, que na maioria das vezes abandonava o trabalho no laptop e se deprimia.

O caso do aluno FA mostra como o laptop contribuiu com o letramento, com a alfabetização e, consequentemente, com a conceituação da língua escrita. As condições ofereci-das, com o uso do laptop na modalidade 1:1 do ambiente virtual e das práticas de projeto, permitiram ao aluno outro grau de participação em práticas sociais de leitura e escrita.

O aluno VI tornou-se um caso singular, porque ele adquiriu fluência no uso da tecnologia, embora não tenha demonstrado o mesmo avanço em relação à compreensão do funcionamento da língua escrita (alfabetização). Para utili-zar o laptop, ele criava estratégias de uso da escrita (práti-cas de letramento) removendo os obstáculos. Apesar do uso do laptop na modalidade 1:1 do desenvolvimento de projetos e do uso de uma escrita com significado através do ambiente virtual durante os quatro meses e meio de trabalho em que os dados foram coletados, o aluno não conseguiu alcançar uma hipótese de escrita alfabética, embora fosse referência para os demais colegas em relação ao uso do laptop.

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O aluno MN é um exemplo de caso que não atingiu o nível de escrita alfabético. Ele é representativo de outras três crianças, infrequentes às aulas e oriundas de famílias pouco presentes em sua vida escolar. São crianças que, ape-sar de viverem num mundo letrado, estavam excluídas das práticas sociais de leitura e escrita no ambiente familiar e não viam muito sentido na aprendizagem. Na sala de aula, elas não apresentavam interesse em escrever espon-taneamente durante a realização dos projetos e do uso do ambiente virtual e também tiveram mais dificuldade em apropriar-se da tecnologia.

O aluno PA foi um caso em que o trabalho com laptop na modalidade 1:1, com acesso à internet e ao ambiente vir-tual, contribuiu para resgatar o sentido da escola e motivá--lo a continuar desenvolvendo a sua escrita. Ele compreen-dia o funcionamento do código (era alfabetizado), mas não demonstrava muita preocupação com a compreensão do que lia (letramento). Era considerado um aluno problema porque era desinteressado pelas atividades escolares. Cria-das as condições de uso do laptop, trabalho com projetos, uso da internet e de ambiente virtual, o aluno PA começou a participar ativamente das aulas e tornou-se referência em muitas situações. Teve a oportunidade de se expressar através da escrita, interagindo com interlocutores reais por meio do uso do ambiente virtual, avançando também em relação à conceituação da língua escrita.

Discussão dos dados

As práticas realizadas a partir da proposta da profes-sora, com a utilização cotidiana do laptop, permitiram à maioria das crianças explorara língua em situações reais, construindo um ambiente simbólico propício para a com-

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preensão da função e do sentido da língua escrita. Isso pode ser observado nas práticas que envolveram o trabalho por projetos, principalmente quando vinculado ao uso do am-biente virtual. No Amadis, os alunos tiveram a oportuni-dade de pertencer a um mundo virtual letrado, vivenciar a autoria na rede, exercer práticas reais de leitura e escrita para expressarem aprendizagens, buscarem informações e compartilharem conhecimentos. O uso do Amadis teve mais sentido durante as propostas da professora quando relacio-nadas ao trabalho por projetos. Além disso, o trabalho por projetos favoreceu o desenvolvimento da fluência digital, sem ser o domínio da ferramenta o foco das aulas. Tam-bém oportunizou situações em que, ao escreverem espon-taneamente para relatar suas aprendizagens ou, mesmo, para buscar imagens na internet, os sujeitos vivenciavam perturbações de suas hipóteses de escrita e que, em deter-minados momentos, levaram à criação de novas hipóteses. As práticas diferenciadas de uso da língua escrita por meio do uso do laptop criaram a necessidade de compreensão da sua estrutura, favorecendo o processo de conceituação. Por-tanto, a unidade de análise “práticas dos alunos propostas pela professora” apresenta dados sobre a importância de propostas pedagógicas diferenciadas que encontrem o uso ativo da máquina e da internet.

Em relação às “práticas realizadas espontaneamente” observamos que o laptop na modalidade 1:1 favoreceu a maioria das crianças, principalmente em relação ao letra-mento e ao desenvolvimento da fluência digital. As crian-ças, proprietárias do laptop, tiveram oportunidades de experimentar a língua, seu funcionamento, bem como as funções das atividades do laptop. Em relação ao desenvol-vimento do letramento, a interação simbólica com o uso do laptop e especialmente o ambiente virtual proporcionaram

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às crianças a vivência de práticas espontâneas de participa-ção em situações sociais de leitura e escrita em um mundo virtual letrado. Desenvolveram a utilização da escrita com autoria e com função pessoal para a expressão de ideias, preferências, interesses, utilização da escrita para comu-nicação, utilização da escrita para buscar entretenimento e utilização da língua escrita, sem mesmo dominar com-pletamente o funcionamento do código alfabético. Além das vivências em relação à língua escrita, o laptop no cotidiano do aluno possibilitou o desenvolvimento da fluência digital e o estabelecimento de uma relação com o conhecimento mais independente. A atividade (física e mental) da criança para compreender para quê serve e como funciona o laptop pode ser observada em várias produções que ficaram regis-tradas na sua máquina, incluindo-se as tentativas frustra-das. A disponibilidade em aprender as novas funções das ferramentas existentes, bem como o compartilhamento das descobertas com os colegas são momentos que evidenciam as práticas espontâneas. No entanto, se analisarmos cui-dadosamente o tipo de práticas espontâneas, percebemos que grande parte foi semelhante às práticas propostas pela professora.

Os resultados encontrados nesta unidade vêm ao en-contro da proposição teórica. Neste caso, pode-se dizer que as práticas espontâneas criam a necessidade de compreen-são do funcionamento da língua e da tecnologia. No entan-to, o que não se pode afirmar é que somente a necessidade favoreça o processo de conceituação e de desenvolvimento da fluência digital. O que se observou é que para alguns alunos, além da necessidade, é fundamental a intervenção dos professores.

No caso, os alunos FA e PA são emblemáticos e contri-buem para reforçar a proposição teórica, pois foram casos

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em que o uso do laptop na modalidade 1:1 permitiu a eles explorar a língua em situações reais, construindo um am-biente simbólico propício para a compreensão da função e do sentido da língua escrita e, portanto, criou a necessidade de compreender sua estrutura, favorecendo o processo de conceituação. O aluno PA já havia compreendido a estru-tura da língua, mas ainda não demonstrava muita preo-cupação com o sentido da sua escrita ou da sua leitura. O uso do laptop em sala de aula e o ambiente virtual criaram esse sentido para que PA participasse e exercesse práticas sociais de letramento. O aluno FA, a partir do interesse em se comunicar por meio do ambiente virtual e usar diferen-tes possibilidades do laptop, demonstrou a necessidade de compreender o funcionamento da língua, progressivamente foi avançando nas suas hipóteses de leitura e escrita.

O aluno VI traz outra questão ao mostrar que o pro-cesso de conceituação da língua escrita não é instantâneo. Ele, em decorrência do seu interesse e da sua facilidade em utilizar o laptop no cotidiano, criou estratégias para utili-zar a língua, pois demonstrava compreender sua função. No entanto, no tempo de quatro meses e meio em que o lap-top foi utilizado em sala de aula não foi suficiente para que chegasse a uma hipótese de escrita alfabética. Ele avançou na sua hipótese, pois ao final do ano possuía um repertório de palavras que lhe serviam de modelo e escrevia de forma silábica, mas ainda permanecia com o critério da quantida-de mínima de letras, fato que o levava a acrescentar letras às palavras. Conforme as teorias, que sustentam o estudo (Ferreiro, 1999; Soares, 2002), sua trajetória faz parte de um processo, e possivelmente a vivência com as ferramen-tas tecnológicas tenha contribuído com o seu percurso de conceituação da língua. No entanto, dado o período da cole-

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ta de dados, não foi possível acompanhar o desenvolvimen-to posterior dele.

O aluno MN, por sua vez, ratifica as conclusões alcan-çadas na primeira unidade de análise que diz respeito às “práticas realizadas a partir da proposta da professora”. Observamos a importância da intervenção do professor em gerar mais proposições para as crianças em processo inicial de alfabetização e atividades que contemplem suas possibi-lidades. Isso significa que é insuficiente oferecer tão somen-te acesso à tecnologia. O aluno MN executou as propostas da professora que não envolviam a escrita espontânea e situações em que o seu “não saber” em relação à língua es-crita fosse explicitado. Espontaneamente, ele realizou usos da atividade da câmera para criar vídeo e fotos. Entrou no ambiente virtual poucas vezes e pouco interagiu. Ele ter-minou o ano letivo com uma hipótese inicial de escrita. A falta de significação do ambiente virtual para crianças pré-silábicas suscita a necessidade de criação de outras ati-vidades no laptop para esses alunos, bem como outro tipo de ambiente que dependa menos do código escrito, mas que favoreça o contato com ele.

ConclusõesTriangulando os dados das unidades discutidas ante-

riormente, percebe-se a necessidade de alterar a proposição teórica inicial. Isso é, maior ênfase deve ser atribuída às propostas da professora, pois essas serviram de referência para as práticas espontâneas. Do mesmo modo, registra-mos que a inclusão digital não acontece pelo simples acesso à tecnologia. Na ausência de propostas inovadoras em sala de aula, a tendência é de que aconteça uma exploração ini-cial intensa do laptop, mas posteriormente se suceda um uso superficial da tecnologia.

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Como proposta de reformulação da proposição teórica, apresenta-se o seguinte: Na modalidade 1:1, a propriedade do laptop pela criança e propostas inovadoras do uso de tec-nologia criam o ambiente simbólico propício para o desen-volvimento cognitivo de crianças em processo de alfabetiza-ção na medida em que possibilita práticas diferenciadas em relação à conceituação da língua escrita e o desenvolvimen-to da fluência digital.

As práticas de leitura e escrita são potencializadas no contexto de imersão num cotidiano digital. A imersão oportuniza a inclusão no mundo virtual letrado, ampliando práticas de construção de sentido para o uso da língua. A ausência de domínio do código é fator limitante das ações dos alunos, entretanto isso não inviabiliza a utilização do computador, porque estratégias de compreensão e ex-pressão são criadas por eles. O uso do laptop oferece opor-tunidades de interação que contribuem com a compreensão do funcionamento do código escrito e, consequentemente, a conceituação da língua escrita.

Entretanto, tais práticas manifestam-se de determi-nadas condições. No presente estudo, as condições que as viabilizaram foram: a) a disponibilidade da professora para experimentar e inventar uma proposta de uso do laptop em sala de aula; b) a internet; c) o uso de um ambiente virtual na web para publicar, registrar e compartilhar as produ-ções, permitindo o encontro entre os sujeitos, favorecendo as trocas e dando significado ao uso da língua escrita; d) o trabalho por projetos, que criou o contexto e o sentido para que muitas práticas com o uso do laptop acontecessem; e) a modalidade 1:1, na qual cada criança possuía o seu laptop durante as aulas e levava-o para casa; f) a saturação da es-cola, que propiciou que os alunos do primeiro ano pudessem aprender e ensinar seus irmãos, primos ou amigos de ou-

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tras turmas; g) a intervenção realizada pelos pesquisadores do Laboratório de Estudos Cognitivos/UFRGS; h) a forma-ção em serviço que abriu possibilidades para as propostas da professora. Tais condições não se colocam como neces-sidade para todas as práticas de uso do laptop na sala de aula e, sim, como possibilidade para práticas diferenciadas, principalmente quando se espera um uso da língua escrita com sentido. O laptop na modalidade 1:1 é indispensável para que certas práticas aconteçam, sobretudo no que se refere às práticas espontâneas. No entanto, é importante dimensionar esses outros elementos que constituem as mu-danças nas práticas. Entre os quais destacam-se a proposta pedagógica diferenciada, no caso, o trabalho por projetos, bem como o uso de um ambiente virtual.

Ao final deste trabalho, a maior lição aprendida é que os laptops são instrumentos privilegiados para auxiliar as crianças no processo de aquisição da língua escrita e que para explorar totalmente o potencial dessa ferramenta existem algumas condições necessárias. É preciso olhar para além da simples distribuição dos laptops, encarando a saturação da escola com tecnologia não como objetivo em si, mas como ponto de partida para a construção de novas culturas de aprendizagem, que possibilitem a alunos e pro-fessores explorarem essas novas formas de fazer e pensar a língua escrita no mundo conectado.

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Um laptop por criança e as práticas de leitura e escrita: perspectivas para a inclusão digital

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Projeto Guri: software de autoria colaborativa de materiais

educacionais hipermídia para a TV digital1

Vitor MalaggiHenrique Becker

Introdução

or meio da imbricação dos artefatos técnicos de comunicação interativa com as questões culturais emergentes na sociedade contemporânea, confi-gura-se o fenômeno da cibercultura. Tal contex-

to sociocultural é caracterizado pela inédita liberação dos polos de emissão, onde os diferentes atores sociais, ante-riormente repreendidos pela unidirecionalidade dos mass media, encontram na convergência da informática com as telecomunicações as linguagens comunicacionais necessá-rias para a configuração de processos culturais baseados no protagonismo criativo (Lemos, 2003).

Nesse contexto, julga-se que a TV digital em sua con-vergência com as tecnologias digitais de rede (TDRs) pode representar o desencadeamento de novas possibilidades de

1 Artigo publicado na revista Espaço Acadêmico, n. 129, ano XI, fev. 2012. ISSN 1519-6186.

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Projeto Guri: software de autoria colaborativa de materiais educacionais hipermídia...

inclusão social/digital e educativa dos cidadãos. A televisão é uma mídia cuja ampla maioria dos brasileiros tem acesso, totalizando 95,7%, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2009 (IBGE, 2010, p. 79). Ainda, o decreto nº 5.820 de 2006, que define a instituição do Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre (SBTVD−T), pontua o período de transição do sistema televisivo analógi-co para o sistema de televisão digital em dez anos, contados a partir da data de publicação do decreto (Brasil, 2006).

Portanto, supondo-se que após 2016 a totalidade dos brasileiros que têm acesso atualmente ao sinal televisivo o manterá através da aquisição de um Set-Top Box (STB)2 ex-terno ou já integrado a aparelhos de televisão, haverá um grande potencial para processos de inclusão social/digital via acesso a aplicações interativas na TV digital. Mas, para que esta inclusão ocorra, julga-se que a escola possui um papel central nos movimentos de apropriação deste novo meio de comunicação. Porém, é importante frisar que tal fato somente se concretizará na medida em que este arte-fato tecnológico operar, por meio das suas características interativas, uma (re)configuração nos delineadores pedagó-gicos que regem os processos educativos tradicionais, ainda arraigados a uma perspectiva marcada pela transmissão linear de informações.

Introdução

Por meio da imbricação dos artefatos técnicos de comu-nicação interativa com as questões culturais emergentes na sociedade contemporânea, configura-se o fenômeno da

2 Equipamento responsável pela conversão do sinal digital para a exibição dos conteúdos audiovisuais interativos em um aparelho de televisão. O con-versor pode ser vendido separadamente ou estar incorporado (integrado) à TV.

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Vitor Malaggi, Henrique Becker

cibercultura. Tal contexto sociocultural é caracterizado pela inédita liberação dos polos de emissão, onde os diferentes atores sociais, anteriormente repreendidos pela unidirecio-nalidade dos mass media, encontram na convergência da informática com as telecomunicações as linguagens comu-nicacionais necessárias para a configuração de processos culturais baseados no protagonismo criativo (Lemos, 2003).

Nesse contexto, julga-se que a TV digital em sua con-vergência com as tecnologias digitais de rede (TDRs) pode representar o desencadeamento de novas possibilidades de inclusão social/digital e educativa dos cidadãos. A televisão é uma mídia cuja ampla maioria dos brasileiros tem acesso, totalizando 95,7%, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2009 (IBGE, 2010, p. 79). Ainda, o decreto nº 5.820 de 2006, que define a instituição do Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre (SBTVD–T), pontua o período de transição do sistema televisivo analógi-co para o sistema de televisão digital em dez anos, contados a partir da data de publicação do decreto (Brasil, 2006).

Portanto, supondo-se que após 2016 a totalidade dos brasileiros que têm acesso atualmente ao sinal televisivo o manterá através da aquisição de um Set-Top Box (STB)3 ex-terno ou já integrado a aparelhos de televisão, haverá um grande potencial para processos de inclusão social/digital via acesso a aplicações interativas na TV digital. Mas, para que essa inclusão ocorra, julga-se que a escola possui um papel central nos movimentos de apropriação desse novo meio de comunicação. Porém, é importante frisar que tal fato somente se concretizará na medida em que este arte-fato tecnológico operar, por meio das suas características

3 Equipamento responsável pela conversão do sinal digital para a exibição dos conteúdos audiovisuais interativos em um aparelho de televisão. O con-versor pode ser vendido separadamente ou estar incorporado (integrado) à TV.

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Projeto Guri: software de autoria colaborativa de materiais educacionais hipermídia...

interativas, uma (re)configuração nos delineadores pedagó-gicos que regem os processos educativos tradicionais, ainda arraigados a uma perspectiva marcada pela transmissão linear de informações.

Dessa forma, o presente artigo visa descrever o desen-volvimento de um software de autoria colaborativa de ma-teriais educativos hipermídia voltados para a TV digital, denominado “Guri”. Por meio deste software pretende-se possibilitar aos sujeitos envolvidos no processo educativo um ambiente digital que potencialize o desenvolvimento de atividades didático-pedagógicas que considerem a coparti-cipação no ato de conhecimento como elemento fundamen-tal do ensino-aprendizagem.

TV digital: apropriação da interatividade no contexto educacional

O processo de digitalização da televisão no Brasil, através da implantação do SBTVD–T,4 configura-se como um aspecto das transformações tecno-culturais que subja-zem a sociedade contemporânea. Assim, a TV digital pode ser um elemento estratégico para a sociedade brasileira, quanto à apropriação da linguagem digital interativa e suas possibilidades em larga escala, nas mais diversas si-tuações cultural-educativas, atuando como fomentadora da inclusão digital/social (Brasil, 2003).

4 Os subsistemas que compõe o padrão brasileiro de TV digital terrestre são: transmissão e recepção, codifi cação de sinais fonte, camada de transporte, middleware, canal de interatividade, terminal de acesso (CPQD, 2006).

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Ao imbricar-se com as TDRs, as quais podem ser com-preendidas “[...] como os ambientes hipermidiais5 de comu-nicação interativa [...] que surgem com o advento do cibe-respaço e que permitem o estabelecimento de processos de autoria colaborativa e protagonismo de cada nó pertencen-te a uma determinada rede [...]” (Malaggi, 2009, p. 111), as características e possibilidades da televisão alteram-se substancialmente. De uma mídia que possibilitava proces-sos comunicativos entre emissores e receptores baseados no paradigma de distribuição massiva e unidirecional de informações, tem-se agora um meio de comunicação que po-tencialmente contém o patamar da interatividade.

A questão da interatividade na TV digital é um quesi-to importante a ser analisado na medida em que permite, entre outros, a apropriação do potencial teórico e prático desse conceito como fomentador de novas práticas edu-cativas. Fundamentando-se na ideia de um processo de ensino-aprendizagem intrinsecamente dialógico entre pro-fessores, alunos e demais seres sociais potencialmente pre-sentes na rede (Freire, 1983), o “fator interatividade” na TV digital torna-se uma característica técnico-comunicativa potencializadora da instauração de uma práxis pedagógica voltada para a autoria colaborativa, tendo a cooperação e a coparticipação na construção de coletividades inteligentes de apropriação/construção de conhecimentos no ciberespa-ço como conceitos norteadores (Lévy, 2003, p. 28).

Assim, além das questões inerentemente tecnológicas envolvidas na implantação do SBTVD-T, uma questão fun-

5 O conceito de hipermídia pode ser compreendido nos seguintes termos: “[...] uma forma ‘tridimensional’ combinatória, permutacional e interati-va de multimídia, onde textos, sons e imagens (estáticas ou em movimen-to) estão ligados entre si por elos probabilísticos e móveis, que podem ser confi gurados pelos receptores de diferentes maneiras, de modo a compor obras instáveis em quantidades infi nitas.” (MACHADO apud SILVA, 2002, p. 149).

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damental para que os sujeitos se apropriem de maneira in-terativa e autoral dos conteúdos da TV digital refere-se à inclusão social/digital por intermédio de processos educati-vos. Para que isso ocorra, é necessário que a ação educativa mediada por essa tecnologia seja ressignificada de acordo com as características contidas na gênese da TV digital en-quanto meio de comunicação.

Por meio do binômio da bidirecionalidade-hibridação, afirma-se que só existe comunicação interativa “[...] a par-tir do momento em que não há mais nem emissor nem re-ceptor e, a partir do momento que todo emissor é potencial-mente um receptor e todo receptor é potencialmente um emissor” (Silva, 2002, p. 112). Pode-se dizer que nesse con-texto ocorre uma hibridização entre os papéis existentes no ato comunicativo, fundindo em um mesmo personagem as funções, sempre móveis e dinâmicas, de emissor e receptor. Por fim, o binômio potencialidade-permutabilidade expres-sa a capacidade de acessar de forma não linear as infor-mações de um conteúdo interativo através de uma rede de nós e hiperlinks, a partir da ação/intenção do sujeito-autor. Assim, acaba-se por permitir não “[...] só o armazenamento de grande quantidade de informação, mas também ampla liberdade para combiná-las (permutabilidade) e produzir narrativas possíveis (potencialidade)” (Silva, 2002, p. 131).

Desse modo, enquanto meio de comunicação, a TV di-gital, uma vez presente no processo educativo, pode pro-mover através da sua característica interativa a autoria colaborativa de conteúdos hipermídia. Constitui, assim, uma ferramenta tecnológica que potencializa processos de ensino-aprendizagem baseados na comunicação/diálogo. Ou seja, situações de apropriação/construção coparticipada dos objetos de conhecimento pelos sujeitos interlocutores hibridizados (educadores-educandos e educandos-educa-

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dores), através da (re)significação dos significados desses objetos, representados através de uma malha hipermídia (Freire, 1983, 1987).

Com base nessas reflexões, é possível relatar que as questões sobre conteúdos interativos educacionais para TV digital tornam-se centrais para a apropriação pedagógica desse meio de comunicação. Esses conteúdos específicos à educação são necessários para estimular a apropriação da TV digital na escola através de processos interativo--dialógicos de ensino-aprendizagem. Mas, por ser um meio de comunicação novo, pesquisas sobre conteúdos educati-vos para a TV digital devem ser fomentadas, sob o risco de subutilização da tecnologia.

Portanto, o desenvolvimento de aplicativo para a TV digital, que permita a autoria colaborativa, torna-se uma possibilidade para a potencialização de processos educa-tivos dialógicos e, consequentemente, de inclusão digital. A partir dessa discussão sobre os potenciais pedagógicos envolvidos na apropriação educacional da TV digital, será relatado no capítulo subsequente o desenvolvimento de um software de autoria colaborativa para a produção de mate-riais educacionais hipermídia, denominado “Guri”.

Descrição técnica do software de autoria colaborativa Guri

O software de autoria colaborativa de materiais educa-cionais hipermídia para a TV digital, denominado “Guri”,6 está sendo desenvolvido por meio de uma parceria público--privada entre a Universidade de Passo Fundo, Univer-

6 Mais informações no site do projeto: http://guri.upf.br/.

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sidade Federal do Rio Grande do Sul e a microempresa Infoeduca.7

Compreende-se por “software de autoria colaborativa” uma classe de programas computacionais para autoria de hipermídia, isto é, aplicações que permitem ao usuário não apenas ser o “leitor” de um documento, mas também ser um “escritor”, criando seus próprios trabalhos para publicação ou aplicação em ambientes hipermidiais (Baranauskas et al., 1999, p. 57). Ainda, os “materiais educacionais hiper-mídia” podem ser entendidos enquanto entidades digitais com diversos formatos midiáticos dispostos em arquitetura hipertextual, e que possam ser (re)utilizadas ou referencia-das durante o processo de ensino-aprendizagem suportado por tecnologias, possuindo características baseadas nos bi-nômios da interatividade (Silva, 2002, p. 100-101).

Em um nível mais baixo de abstração, a malha hiper-mídia a ser construída por meio do software Guri estará disposta em um contexto voltado para um público escolar específico, o do ensino fundamental. Nesses termos, o ob-jetivo principal é que os alunos possam desenvolver uma malha hipermídia tendo como mote a criação de um “mi-cromundo” temático conectado a uma ideia-conceito espe-cífica: ao do programa infantojuvenil televisivo Mundo da Leitura,8 criado e produzido na Universidade de Passo Fun-

7 Os estudos derivados do presente artigo estão conectados ao projeto de pesquisa “Guri – software de autoria colaborativa de materiais educacio-nais hipermídia para a TV digital”, fi nanciado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científi co e Tecnológico (CNPq) através do edital MCT/SETEC/CNPq nº 67/2008 – RHAE - Pesquisador na Empresa.

8 No que se refere ao programa Mundo da Leitura, frisa-se que o mesmo tem por objetivo servir “[...] de incentivo para o desenvolvimento da cria-tividade, do raciocínio lógico e, principalmente, para a criação do hábito da leitura entre as crianças”, utilizando-se para alcançar tais requisitos uma apresentação conectada a formas lúdicas e dinâmicas, bem como “[...] as diversas linguagens [...] – manipulação de bonecos, leitura e encenação de textos infantis, artes gráfi cas, música, entre outros [...]”. Mais informações em: http://mundodaleitura.upf.br/programa/mundodaleitura/index.html

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do e que, atualmente, é transmitido nacionalmente pelo canal Futura.9

De outra forma, a partir desse micromundo inicial “em branco” conectado ao conceito do mundo da leitura, os alunos em processos de autoria colaborativa com seus pa-res, professores e demais seres sociais, poderão conectar a malha hipermidial diversos itens de mídia (personagens, objetos, textos, vídeos, sons), formas de comunicação on--line (chat), TDRs (RSS, Twitter, Wikipédia) e formas de gerenciamento das decisões do grupo (votações, fóruns de discussão). Estes itens, portanto, visam formar uma ma-lha hipermídia que representa e potencializa processos de ensino-aprendizagem dialógicos e interativos de alunos e professores do ensino fundamental.

Em virtude disso, ressalta-se que somente o fato de disponibilizar a TV digital no ambiente educacional não significará um processo “automático” de inclusão digital, tampouco de potencialização da práxis pedagógica. En-quanto a utilização das TDRs ocorrer exclusivamente em uma perspectiva de recepção de informações, de passivida-de perante as redes sociotécnicas que se instauram, tanto os movimentos de inclusão digital quanto de ressignificação dos processos de ensino-aprendizagem estarão sob a égide de uma lógica oposta à da interatividade, elemento central dos processos comunicativos no ciberespaço (Teixeira, 2005, p. 29-31).

Assim, as aplicações educativas produzidas para a TV digital não devem se constituir enquanto artefatos tecno-lógicos imbuídos do padrão de ensino bancário, mecânico e verbalista, tal como caracterizado por Freire (1987, p. 57). É nesse sentido que a interatividade se torna um conceito fundamental para a investigação das potencialidades da

9 Disponível em: http://www.futura.org.br/

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TV digital na educação. Em síntese, pode-se afirmar que a interatividade é responsável por exprimir a superação dos paradigmas tradicionais da comunicação de massa que moldaram a lógica de produção televisiva, através da “[...] disponibilização consciente de um mais comunicacional de modo expressivamente complexo, e, ao mesmo tempo, aten-tando para as interações existentes e promovendo mais e melhores interações – seja entre usuário e tecnologias co-municacionais (hipertextuais ou não), seja nas relações (presenciais ou virtuais) entre seres humanos” (Silva, 1999, p. 155).

Essa predisposição para “mais comunicacional”, “mais interação”, ou para uma “hiperinteração”, é pormenoriza-damente descrita através dos “binômios da interatividade”, tal como propostos por Silva (2002, p. 100-155). Assim, o binômio da participação-intervenção diz respeito às mu-danças efetuadas no que se refere ao papel atribuído aos componentes de um processo de comunicação: o leitor pos-sui a capacidade de participar e de intervir no modo como o processo comunicativo está sendo conduzido; já o escritor não emite tão somente uma mensagem fechada, mas pro-põe um conjunto de possíveis caminhos por onde o leitor po-derá construir seus sentidos; por fim, a própria mensagem muda de natureza, tornando-se aberta à mudança a partir da participação-intervenção do leitor na sua composição/modificação.

Atualmente, a tecnologia que possibilita o desenvol-vimento de tal classe de sistema computacional educati-vo para a TV digital, segundo os padrões do SBTVD-T, é o middleware Ginga, que se constitui como uma camada de software que abstrai o hardware do STB, e sob a qual são estruturadas as aplicações interativas (CPQD, 2006, p. 28). Vale destacar que o middleware Ginga é composto por dois

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subsistemas principais interligados, denominados de Gin-ga-J (para aplicações procedurais Java) e Ginga-NCL (para aplicações declarativas NCL – Nested Context Language, em conjunto com a linguagem de programação imperativa Lua).10

No que se refere às questões de engenharia de softwa-re, a aplicação interativa Guri foi desenvolvida através do processo de prototipação incremental. Um protótipo inicial do software foi desenvolvido com base em um subconjunto mínimo de requisitos (funcionalidades) e, então, a cada ite-ração do processo de desenvolvimento, foram adicionadas novas funcionalidades a esse subconjunto. O protótipo é, assim, incrementado para abarcar essas adições.11 A seguir são descritas as funcionalidades do protótipo da iteração atual, ainda em desenvolvimento, na qual o software Guri permite que um conjunto de usuários devidamente cadas-trados efetive a criação e exibição de apresentações de sli-des multimídia na TV digital.

O software Guri é dividido em dois módulos principais: o cliente, uma aplicação interativa desenvolvida em Ginga--NCLua que executa sobre a TV digital, e o servidor, um WebService e interface web, desenvolvido em Java, que executa em um servidor. O módulo cliente tem como ob-jetivo oferecer ao usuário uma interface que possibilite a exibição, edição e gerenciamento das suas apresentações de slides. Isso permitirá aos alunos que disponham de um STB e uma conexão com a internet desenvolver apresenta-ções multimídias fora do laboratório de informática da es-cola, sem a necessidade de um computador. A tela de edição (Figura 1) é a tela principal do módulo cliente do software

10 Mais informações em: http://www.ginga.org.br/index.html 11 O desenvolvimento do software Guri seguiu os princípios propostos pelo

“manifesto ágil” (disponível em: http://agilemanifesto.org) e, de forma mais específi ca, a metodologia XP (eXtreme Programming). (BECK, 2004).

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Guri. Esta permite a edição de uma apresentação de slides e a sua exibição. Os três primeiros itens, quando seleciona-dos, alteram as operações no submenu (item 2), e deslocam o foco para seleção de um dos seus desdobramentos.

Figura 1 - Tela de edição do software de autoria colaborativa Guri, com o item “galerias de mídia selecionado”

A opção “composição de slides” (subitem 1a) agrega as ações executadas sobre a sequência de slides em si (e não os elementos de mídia contidos nos slides), sendo estas: adição de um novo slide em branco após o atual, exclusão do slide atualmente em foco e a troca da posição na sequência entre dois slides distintos. A opção “galerias de mídia” (subitem 1b) oferece no submenu a seleção entre as galerias de tex-tos, imagens, vídeos e a áudios. Ao se selecionar uma das galerias, a tela de edição é substituída pela tela da galeria específica, onde um conjunto de mídias é apresentado para seleção na forma de ícones. Quando uma mídia é seleciona-da, esta é adicionada ao slide que estava em foco e a galeria é substituída, de volta, pela tela principal.

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O item “tecnologias digitais de rede” (subitem 1c) pos-sui, no momento, um único desdobramento no submenu, que é o de “ativar/desativar RSS” (item 4). A fonte dos feeds do RSS não possui interface para alteração no cliente. Atu-almente, o leitor de RSS usado é o luarss,12 com algumas adaptações para integrá-lo ao software Guri. O botão “Ini-ciar apresentação” inicia a apresentação a partir do primei-ro slide, fazendo com que o quadro branco (área de preview do slide) seja redimensionado, a fim de ocupar toda a tela da TV, e as demais mídias também serão proporcionalmen-te redimensionadas. As mídias são iniciadas, de forma que as imagens e textos tornam-se visíveis, e os vídeos e áudios iniciam a sua execução. O botão vermelho do controle-re-moto termina a apresentação e os botões direcionais alter-nam entre os slides. Por fim, o último ícone no menu prin-cipal é “Salvar apresentação”, o qual salva a apresentação alterada no módulo servidor do software, permitindo a sua persistência e, portanto, que a mesma seja recuperada após a troca de canal ou o desligamento da televisão na qual se editou a apresentação por meio do cliente.

A área de preview (item 3) contém a representação do slide selecionado para edição. Imagens e textos são repre-sentados diretamente. O foco pode ser passado para área de preview selecionando-se a tecla direcional para baixo en-quanto o foco pertencer a algum item do menu principal. Uma vez que a área de preview esteja em foco, é possível alternar o slide em edição, usando-se as teclas direcionais do controle remoto para os lados.

A composição do slide (arranjo do conjunto de mídias que o compõe) é feita passando-se o fluxo de controle para a área de preview. Para isso, seleciona-se a área de controle

12 Desenvolvido por Manoel Campos, disponível em: http://manoelcampos.com/tvd/leitor-de-rss-para-tv-digital/

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quando está em foco (o fluxo de controle também é trans-ferido para a área quando uma mídia é adicionada). Feito isso, uma das representações das mídias receberá o foco e poderão ser usados os botões do controle para edição: a) o botão verde para voltar o fluxo de controle para tela de edi-ção, com o foco na área de preview; b) o botão vermelho para excluir a mídia em foco; c) o botão amarelo para se alternar entre as funções das teclas direcionais, as quais são mover o foco através das mídias, alterar a posição da mídia em foco e redimensionar a mídia em foco (estas últimas duas somente para mídias não áudio).

No que se refere ao módulo servidor, o mesmo é com-posto de um WebService e uma interface web, ambas desen-volvidas em Java. Os protótipos da iteração atual de ambos os submódulos do servidor (WebService e interface web) têm como principais responsabilidades, respectivamente, a persistência das apresentações e o gerenciamento dos usu-ários. O WebService garante a persistência respondendo às requisições do cliente para criar novas apresentações, além de alterar, recuperar e listar as apresentações arma-zenadas, sempre verificando a autenticidade e permissão do usuário a cada requisição. A interface web tem como principal objetivo oferecer ao professor um ambiente de ge-renciamento dos alunos, onde é possível adicionar e excluir o cadastro dos mesmos, permitindo, assim, a utilização de uma determinada apresentação de slides multimídia no módulo cliente.

A conexão entre os módulos cliente e servidor do sof-tware Guri deve ser feita através do canal de interativi-dade, que é um subsistema da arquitetura de referência do SBTVD-T “[...] através do qual cada usuário [...] pode interagir encaminhando ou recebendo informações e solici-tações das emissoras/programadoras” (CPQD, 2006, p. 31).

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Existem diversas tecnologias de redes de acesso passíveis de serem utilizadas para a comunicação de dados entre as aplicações interativas (como o módulo cliente) e os provedo-res de conteúdos (como o WebService do módulo servidor) no contexto do SBTVD-T, tais como a xDSL, PLC, MMDS, WiFi, WiMax, entre outras. Assim, o canal de interativi-dade no SBTVD-T torna-se o subsistema responsável por efetuar a interconexão entre os sistemas de televisão e te-lecomunicação, sustentando as características e potencia-lidades da TV digital ligadas à convergência digital e a co-municação bidirecional (CPQD, 2006, p. 31).

Em síntese, tomando como infraestrutura esse novo meio de comunicação, a TV digital, visa-se através do software Guri oferecer um lócus tecno-educacional para que professores, alunos e demais seres sociais constituam verdadeiras redes de ensino-aprendizagem no ciberespaço (Malaggi, 2009, p. 120), ressignificando, assim, tanto as suas práticas educativas presenciais quanto virtuais. Tal tecnologia torna-se, portanto, um meio efetivo para que os processos educativos sejam repensados, visando aten-der essa lógica comunicacional contemporânea instaurada pelo fenômeno da cibercultura, ou seja, da comunicação in-terativa. Aspira-se, por fim, que os próprios processos de ensino-aprendizagem atinjam tal patamar de comunicação/diálogo/interatividade.

Considerações fi nais

Pelo presente artigo objetivou-se a descrição de um trabalho em desenvolvimento, a implementação de um software de autoria colaborativa, denominado “Guri”, o qual visa proporcionar aos professores, alunos e demais entes sociais envolvidos nos processos de ensino-aprendizagem

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escolares a produção de materiais educativos hipermídia através da TV digital.

Ao término da implementação do protótipo em sua iteração atual, possuir-se-á um software que permite aos usuá rios editarem e exibirem na TV digital apresentações de slides multimidiais, além de serem capazes de salvá-las e recuperá-las em um suporte externo a sua infraestrutura televisiva, porém ainda sem a possibilidade de as compar-tilharem entre si. Pretende-se, no entanto, que o software Guri venha a agregar progressivamente as funcionalidades que possibilitem a autoria colaborativa de malhas hipermi-diais (ao invés de apresentações multimídia) entre os usuá-rios do sistema.

Para isso, planeja-se uma série de trabalhos futuros que visam efetuar essas melhorias, sendo as mais pre-mentes: a) alteração do módulo servidor para permitir que uma apresentação seja compartilhada entre dois ou mais usuá rios (ainda que a edição síncrona não seja permitida); b) adição do suporte a um número maior de TDRs (como o Twitter, Wikipédia, YouTube etc.); c) modificação do módulo cliente, para que o mesmo permita a edição e visualização de uma malha hipermídia.

Agradecimentos

Ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), pelo fornecimento das bolsas de pesquisa necessárias à realização dos estudos descritos neste artigo. A presente pesquisa foi realizada sob orienta-ção dos professores doutores Adriano Canabarro Teixeira e Marco Antônio Sandini Trentin e com a colaboração do aluno Cássio Feldhircher.

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PARTE 2

METODOLOGIAS E INCLUSÃO DIGITAL

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Arquiteturas pedagógicas nas práticas das alunas do PEAD: ensaio, relato e considerações

Daiane GrassiMarie Jane Soares de Carvalho

Introdução

presente artigo evidencia o trabalho realizado com as alunas do primeiro curso de Pedagogia a Distância da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Pead) sobre arquiteturas pedagógicas. As

participantes, além de alunas, são professoras em exercício na rede pública, integrantes do primeiro curso de Pedago-gia a Distância1 da universidade, denominadas, neste arti-go, de “alunas professoras”. Ao longo do percurso, as alunas professoras, após vivenciarem na prática2 como ocorre uma arquitetura pedagógica, embasaram-se teoricamente, estu-daram, discutiram e iniciaram seus primeiros ensaios do-

1 O curso de Pedagogia a Distância da UFRGS (Pead) trata-se de um con-sórcio realizado entre a Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Faced/Ufrgs) e o centro de Ciências da Educação da Universidade Federal de Santa Catarina (CCE/Ufsc). Este visa graduar em nível superior professores já em exercício nas séries iniciais do ensino fundamental, de escolas públicas estaduais e municipais do estado do Rio Grande do Sul.

2 “Vivenciar na prática” em razão de o Pead estar ancorado sob o conceito de arquiteturas pedagógicas.

O

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Daiane Grassi, Marie Jane Soares de Carvalho

centes fazendo uso de arquiteturas e preparando-se para os estágios de final de curso. O estudo de um caso e o registro do seu processo em documento científico torna-se valoroso por evidenciar a tomada de consciência de uma aluna em relação à sua aprendizagem e ação docente, suas tentati-vas, reflexões, dificuldades e as soluções encontradas.

Dessa forma, este artigo assumiu como desafio eviden-ciar como3 a vivência em um curso embasado por arquitetu-ras pedagógicas abertas e flexíveis oportunizou uma ressig-nificação da prática e na prática de uma aluna professora do Pead.

Arquiteturas pedagógicas para a educação a distância: o cenário, suas

perspectivas e um breve diálogo

O conceito de arquiteturas pedagógicas (AP) para a educação a distância tem sido explorado no contexto educa-cional desde sua criação em 2005 pelos pesquisadores vincu-lados ao curso de Pedagogia, na modalidade a distância da Ufrgs (Carvalho; Nevado; Menezes, 2005). Todavia, em ra-zão de se apresentar como algo novo e em movimento, cede espaço à possibilidade de inúmeras interpretações. Diante disso, buscou-se agregar visões do meio acadêmico, de ma-neira a contribuir com as reflexões realizadas nessa área.

As primeiras discussões sobre a necessidade de “um novo paradigma pedagógico” surgiram com as inquieta-ções dos autores Carvalho, Nevado e Menezes (2005, 2007, 2009a), com relação a “[...] programas e estratégias educa-cionais pensados como ferramentas didáticas sem susten-tação em teorias curriculares interdisciplinares que têm diminuta repercussão na formação dos professores e conse-

3 A palavra “como” está marcada em itálico de maneira a enfatizar a carac-terística principal do método utilizado, estudos de casos.

inclusao_digital_tecnologias_metodologias.indd 190inclusao digital tecnologias metodologias indd 190 22/01/2013 13:55:3622/01/2013 13:55:36

- 191 -

Arquiteturas pedagógicas nas práticas das alunas do PEAD: ensaio, relato e considerações

quentemente na alteração das práticas escolares. O efeito mais comum das ferramentas didáticas sem o aporte teóri-co é o seu uso como ‘receita’ ou como mais uma ‘novidade’, logo adiante descartável [...]”.

A partir daí, estudos e incursões pedagógicas foram realizados pelo trio de autores, em busca de estratégias que sustentassem a necessidade do novo paradigma pedagógi-co, há muito tempo advogado por Paulo Freire e sintetiza-do na Pedagogia da autonomia (Freire, 1999). Articulado à perspectiva freireana, destaca-se o encontro com outro autor, Jean Piaget.

Após uma série de artigos, workshops e estudos reali-zados na área (de 2005 a 2009), os mesmos autores publi-cam uma versão revisada e aprofundada no livro Aprendi-zagem em rede na educação a distância, em cujo capítulo 2, “Arquiteturas pedagógicas para educação a distância” enfatiza-se novamente o pressuposto de uma AP, como

estruturas de aprendizagem realizadas a partir da confluência de diferentes componentes – abordagem pedagógica, softwa-re educacional, internet, inteligência artificial, concepções de tempo espaço [...] compondo um trabalho artesanal, construído na vivência de experiências e na demanda de ação, interação e meta-reflexão do sujeito sobre os dados, os objetos e o meio ambiente socioecológico. Os pressupostos curriculares nesta perspectiva, compreendem pedagogias abertas capazes de aco-lher didáticas flexíveis, maleáveis, adaptáveis e sob diferentes enfoques (Carvalho; Menezes; Nevado, 2007 p. 39).

Além disso, o capítulo nos traz também um elenco sob o qual estão ancorados os componentes fundamentais de uma arquitetura pedagógica: concepção pedagógica forte, sistematização metodológica e suporte telemático. Cada um desses elementos possui o seu grau de importância, não se sobressaindo um ao outro. Diante disso, os agentes do pro-cesso devem primar por uma visão equilibrada entre os itens mencionados. Observa-se que o foco do conceito, criado por esses autores, é o contexto pedagógico que se expressa em

inclusao_digital_tecnologias_metodologias.indd 191inclusao digital tecnologias metodologias indd 191 22/01/2013 13:55:3622/01/2013 13:55:36

- 192 -

Daiane Grassi, Marie Jane Soares de Carvalho

ações e conteúdos desenvolvidos com vistas à sua inserção e realização no cotidiano da prática de um curso em qualquer nível de ensino. Destacam-se, como arquitetura pedagógica, o conteúdo e a prática didática que se processam no cotidia-no ao se desdobrar o currículo. A expressão do conceito é da ordem da epistemologia do ato pedagógico, no contexto das tecnologias emergentes.

O olhar realizado por Behar, Bernardi e Silva (2009) acerca da mesma temática se distancia da abordagem ori-ginal. As autoras registram que “[...] uma arquitetura pe-dagógica se define por um sistema de premissas teóricas que representa, explica e orienta a forma como se aborda o currículo e que se concretiza nas práticas pedagógicas e nas interações professor-aluno-objeto de estudo/conhecimento [...]”. Nessa perspectiva, os autores elencam como priori-tários os seguintes elementos: sistema organizacional, ins-trucional, metodológicos e tecnológicos. A interpretação atribuída remete ao currículo como um todo, e não propria-mente à epistemologia do ato pedagógico, enfatizado por Carvalho, Nevado e Menezes (2007).

A partir do exposto, julgou-se necessário estabelecer um diálogo entre as duas perspectivas evidenciadas. Em tal di-álogo não se pretende realizar uma comparação entre tais perspectivas, mas, sim, agregar subsídios importantes para o pensar e estruturar uma arquitetura pedagógica na moda-lidade de educação a distância. Paralelo a essa ação, ainda acredita-se ser instigante articular a relação entre essas duas visões a um caso ancorado em uma arquitetura pedagógica fundamentada, sobretudo no primeiro pressuposto apresenta-do e desenvolvido junto ao curso de Pedagogia a Distância da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Pead).

O “caso” diante de perspectivas divergentesA seguir, o cruzamento do “caso” com as definições so-

bre arquiteturas pedagógicas:

inclusao_digital_tecnologias_metodologias.indd 192inclusao digital tecnologias metodologias indd 192 22/01/2013 13:55:3622/01/2013 13:55:36

- 193 -

Arquiteturas pedagógicas nas práticas das alunas do PEAD: ensaio, relato e considerações

1) E

lem

ento

s de

um

a ar

quite

tura

pe

dagó

gica

par

a ed

ucaç

ão a

dis

tânc

ia

conf

orm

e Ca

rval

ho, M

enez

es e

Nev

ado

(200

5, 2

007

e 20

09a)

2) O

diá

logo

ent

re p

ersp

ectiv

as d

e ar

quite

tura

s pe

dagó

gica

s co

m o

“ca

so”

sobr

e a

utili

zaçã

o de

ar

quite

tura

s pe

dagó

gica

s no

prim

eiro

cur

so d

e Pe

dago

gia

a D

istâ

ncia

da

Uni

vers

idad

e Fe

dera

l do

Rio

G

rand

e do

Sul

3) E

lem

ento

s de

um

a ar

quite

tura

ped

agóg

ica

para

edu

caçã

o a

dist

ânci

a co

nfor

me

Beha

r, Be

rnar

di e

Silv

a (2

009)

Conc

epçã

o pe

dagó

gica

for

te:

part

indo

--s

e do

pre

ssup

osto

ass

enta

do e

m p

eda-

gogi

as d

e in

cert

ezas

que

sin

tetiz

a pr

in-

cipa

lmen

te,

mas

o ex

clus

ivam

ente

, as

idei

as d

e Pa

ulo

Frei

re e

Jea

n Pi

aget

. A

peda

gogi

a da

inc

erte

za s

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sent

a em

ci

nco

prin

cípi

os:

• ed

ucar

par

a a

busc

a de

sol

u-çõ

es d

e pr

oble

mas

reai

s;

• ed

ucar

par

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ansf

orm

ar i

nfor

-m

açõe

s em

con

heci

men

tos;

educ

ar

para

a

auto

ria,

a ex

-pr

essã

o e

a in

terlo

cuçã

o;

• ed

ucar

par

a in

vest

igaç

ão;

• ed

ucar

par

a a

auto

nom

ia e

a

coop

eraç

ão.

Sist

emat

izaç

ão

met

odol

ógic

a:

a co

n-flu

ênci

a de

ele

men

tos

é qu

e pe

rmite

m

aos

estu

dant

es d

ispo

rem

de

ativ

idad

es

cogn

itiva

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te i

nstig

ante

s e

dese

nvol

-ve

r m

étod

os d

e tr

abal

hos

inte

rativ

os e

co

nstr

utiv

os.

Exem

plo

de

arqu

itetu

ras

nest

a pe

rspe

ctiv

a:•

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itetu

ra

de

proj

e-to

s de

ap

rend

izag

em

(exe

mpl

o ad

otad

o no

ca

so -

2a

colu

na d

esta

ta

bela

); •

arqu

itetu

ra

de

estu

do

de c

aso

ou r

esol

ução

de

pro

blem

as;

• ar

quite

tura

de

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ren-

diza

gem

inci

dent

e;

• ar

quite

tura

de

ão

sim

ulad

a.

Supo

rte

tele

mát

ico:

a u

tiliz

ação

dos

re-

curs

os t

ecno

lógi

cos

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es e

xem

plos

se

conf

igur

am

com

o au

xilia

res

arte

sana

is

no p

roce

sso.

Faz

-se

uso

prin

cipa

lmen

te

de re

curs

os d

a w

eb 2

.0 e

sof

twar

es.

O c

aso

utili

zado

par

a ilu

stra

r ar

quite

tura

s pe

dagó

gica

s na

edu

caçã

o a

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ânci

a e

dial

ogar

com

as

duas

pe

rspe

ctiv

as e

m q

uest

ão,

trat

a-se

dos

pro

jeto

s de

apr

endi

zage

m r

ealiz

ados

pel

os a

luno

s do

prim

eiro

cu

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de P

edag

ogia

a D

istâ

ncia

da

UFR

GS

(Pea

d).

O P

ead

é, a

o m

esm

o te

mpo

, um

cur

so d

e fo

rmaç

ão

inic

ial

e co

ntin

uada

de

prof

esso

res.

Por

con

ta d

essa

esp

ecifi

cida

de,

o Pr

ojet

o Po

lític

o Pe

dagó

gico

do

curs

o se

org

aniz

a so

b tr

ês p

ress

upos

tos,

con

form

e Bo

rda,

Car

valh

o e

Nev

ado

(200

6, p

. 19)

: •

auto

nom

ia

rela

tiva

da

orga

niza

ção

curr

icul

ar,

cons

ider

ando

as

ca

ract

erís

ticas

e

expe

riênc

ias

espe

cífic

as d

a cl

ient

ela

– pr

ofes

sore

s em

ser

viço

; •

artic

ulaç

ão e

ntre

prá

tica

peda

gógi

ca c

omo

elem

ento

agl

utin

ador

dos

dem

ais

com

pone

ntes

do

curr

ícul

o, c

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ituin

do-s

e em

est

raté

gia

bási

ca d

o pr

oces

so d

e fo

rmaç

ão d

e pr

ofes

sore

s;

• ar

ticul

ação

dos

com

pone

ntes

cur

ricul

ares

ent

re s

i, no

sem

estr

e e

ao lo

ngo

do c

urso

. Ev

iden

cia-

se o

que

Beh

ar,

Bern

ardi

e S

ilva

(200

9) c

ham

am d

e “e

lem

ento

s or

gani

zaci

onai

s” (

elab

oraç

ão

da p

ropo

sta

peda

gógi

ca e

sua

cul

min

ânci

a, b

em c

omo

ques

tões

ins

tituc

iona

is)

e o

que

Carv

alho

, M

e-ne

zes

e N

evad

o (2

007)

inc

luem

em

"co

ncep

ção

peda

gógi

ca f

orte

". N

essa

per

spec

tiva,

o s

egun

do g

rupo

en

fatiz

a qu

e um

dos

pre

ssup

osto

s de

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uite

tura

ped

agóg

ica

é a

com

pree

nsão

de

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gogi

as a

ber-

tas

capa

zes

de a

colh

er d

idát

icas

fle

xíve

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ada

ptáv

eis.

Pro

sseg

uind

o na

que

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de

uma

conc

epçã

o pe

dagó

gica

for

te e

sus

tent

ável

, de

stac

am-s

e a

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gogi

a da

inc

erte

za e

os

seus

prin

cípi

os

cita

dos

na c

olun

a ao

lado

esq

uerd

o. C

om a

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ade

de il

ustr

ar a

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agog

ia d

a in

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eza,

apr

esen

ta-s

e um

a ar

quite

tura

ped

agóg

ica

base

ada

em p

roje

tos

de a

pren

diza

gem

(co

nfor

me

sist

emat

izaç

ão m

eto-

doló

gica

, de

aco

rdo

com

o g

rupo

da

prim

eira

col

una)

. Q

uand

o m

enci

onam

os o

tra

balh

o po

r pr

ojet

os

de a

pren

diza

gem

ou,

con

form

e Fa

gund

es,

Maç

ada

e Sa

to (

1999

), “a

pren

diza

gem

por

pro

jeto

s”,

esta

mos

no

s re

ferin

do à

for

mul

ação

de

ques

tões

pel

o au

tor

do p

roje

to,

pelo

suj

eito

que

vai

con

stru

ir co

nhec

i-m

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. Pa

rte-

se d

o pr

incí

pio

de q

ue o

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no n

unca

é u

ma

tábu

la r

asa

[...].

E é

a p

artir

de

seu

conh

eci-

men

to p

révi

o qu

e o

apre

ndiz

vai

se

mov

imen

tar,

inte

ragi

r co

m o

des

conh

ecid

o, o

u co

m n

ovas

situ

açõe

s,

para

se

apro

pria

r do

con

heci

men

to e

spec

ífico

, sej

a na

s ci

ênci

as, n

as a

rtes

, na

cultu

ra t

radi

cion

al, s

eja

na

cultu

ra e

m t

rans

form

ação

. U

m p

roje

to p

ara

apre

nder

vai

ser

ger

ado

pelo

s co

nflit

os,

pela

s pe

rtur

baçõ

es

ness

e si

stem

a de

sig

nific

açõe

s, q

ue c

onst

ituem

o c

onhe

cim

ento

par

ticul

ar d

o ap

rend

iz.

Os

alun

os d

o cu

rso

de P

edag

ogia

a D

istâ

ncia

da

Ufr

gs,

dese

nvol

vera

m p

roje

tos

de a

pren

diza

gem

. M

etod

olog

icam

en-

te o

s m

esm

os s

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rese

ntar

am c

om a

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mul

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de

prob

lem

as a

par

tir d

as c

erte

zas

prov

isór

ias

e dú

vi-

das

perm

anen

tes

do p

esqu

isad

or. D

e ac

ordo

com

Car

valh

o, M

enez

es e

Nev

ado

(200

7, p

. 41)

, o p

rimei

ro

pass

o é

sele

cion

ar u

ma

curio

sida

de,

uma

perg

unta

, a

qual

par

a fin

s di

dátic

os d

enom

ina-

se d

e "q

uest

ão

de i

nves

tigaç

ão".

Para

Pau

lo F

reire

(ap

ud A

lmei

da;

Stre

ck,

2008

, p.

319

), a

perg

unta

con

stitu

i o

cent

ro

da “

conc

epçã

o pr

oble

mat

izad

ora

da e

duca

ção”

. A

perg

unta

par

te d

a cu

riosi

dade

, se

m a

qua

l nã

o po

de

have

r ve

rdad

eira

pro

duçã

o do

con

heci

men

to.

Frei

re a

com

pree

nde

com

o um

a di

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são

onto

lógi

ca,

vinc

ulad

a à

práx

is d

o su

jeito

. A c

urio

sida

de e

stá

asso

ciad

a à

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e à

ref

lexã

o do

s su

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s co

mun

ican

tes,

e

é es

sa r

elaç

ão d

ialé

tica

que

se r

ealiz

a a

inda

gaçã

o. N

o fu

ndo,

a c

urio

sida

de é

um

a pe

rgun

ta.

Nes

te

pont

o, a

s du

as p

ersp

ectiv

as (

colu

na e

sque

rda

e di

reita

) di

verg

em q

uand

o a

prim

eira

se

apre

sent

a de

fo

rma

aber

ta e

pos

síve

l de

ser

con

stru

ída

e re

cons

truí

da,

flexí

vel

e di

nâm

ica,

e a

seg

unda

, de

man

ei-

ra p

revi

amen

te d

esen

hada

(as

pect

os i

nstr

ucio

nal

e m

etod

ológ

ico)

. O

s pr

ojet

os d

e ap

rend

izag

ens

dos

alun

os d

o cu

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de P

edag

ogia

da

UFR

GS

pode

m s

er a

com

panh

ados

tam

bém

pel

o si

te:

pead

alvo

rada

7.pb

wor

ks.c

om.

Toda

via,

esc

olhe

u-se

de

form

a al

eató

ria u

m p

roje

to p

ara

ser

inco

rpor

ado

nest

e di

álog

o:

“Pro

jeto

de

apre

ndiz

agem

– a

cor

inf

luen

cia

o co

mpo

rtam

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hum

ano?

http

://tc

heen

sino

.pbw

orks

.co

m/”

. N

este

tra

balh

o os

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nos

se r

euni

ram

em

gru

pos

por

crité

rios

de a

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e, c

onve

rsar

am,

re-

fletir

am...

E e

vide

ncia

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um

a pe

rgun

ta d

e co

mum

cur

iosi

dade

a t

odos

os

com

pone

ntes

do

grup

o. A

pa

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da p

ergu

nta,

cria

ram

um

site

na

inte

rnet

(su

port

e te

lem

átic

o e

tecn

ológ

ico)

par

a qu

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trab

alho

pu

dess

e se

r co

nstr

uído

de

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a co

labo

rativ

a e

a di

stân

cia.

A c

ombi

naçã

o do

gru

po e

ra d

e qu

e to

dos

os c

ompo

nent

es e

vide

ncia

ssem

em

um

a pá

gina

do

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as

suas

cer

teza

s pr

ovis

ória

s e

dúvi

das

perm

a-ne

ntes

. N

este

tra

balh

o os

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nos

fora

m a

com

panh

ados

e a

sses

sora

dos

por

prof

esso

res

e tu

tore

s qu

e re

aliz

avam

ind

agaç

ões

e m

edia

vam

o p

roce

sso

de a

pren

diza

gem

. At

ravé

s da

nav

egaç

ão n

a pr

oduç

ão

do g

rupo

é p

ossí

vel

iden

tific

ar a

s su

as c

onst

ruçõ

es,

os e

nvol

vim

ento

s te

cnol

ógic

os c

omo

supo

rte

e ap

oio

no d

esaf

io p

ropo

sto.

Os

alun

os, d

e fo

rma

autô

nom

a, u

tiliz

avam

rec

urso

s te

cnol

ógic

os, t

ais

com

o a

cons

truç

ão d

e m

apas

con

ceitu

ais

(em

pro

gram

a es

pecí

fico

para

isso

), m

arca

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reu

niõe

s em

fer

ram

en-

tas

de b

ate

papo

sín

cron

a, u

tiliz

avam

-se

de v

ídeo

s en

cont

rado

s na

web

, alé

m d

as p

rodu

ções

aut

orai

s.

Org

aniz

acio

nais

: de

ntre

os

elem

ento

s or

gani

zaci

onai

s da

arq

uite

tura

ped

agóg

ica

(AP)

es-

tão

todo

s aq

uele

s in

trin

seca

men

te e

nvol

vido

s na

ela

bora

ção

da p

ropo

sta

peda

gógi

ca e

sua

culm

inân

cia.

Des

taca

m-s

e os

obj

etiv

os e

fin

alid

ades

da

apre

ndiz

agem

a d

istâ

ncia

, a

com

-pr

eens

ão d

o te

mpo

e d

o es

paço

(ne

ste

caso

pau

tado

s na

per

spec

tiva

da v

irtua

lidad

e),

os

perf

is d

os s

ujei

tos

envo

lvid

os n

o pr

oces

so –

o a

luno

, tu

tor

e pr

ofes

sor,

bem

com

o a

de-

finiç

ão d

as s

uas

com

petê

ncia

s e

habi

lidad

es.

Os

aspe

ctos

org

aniz

acio

nais

pre

cisa

m e

star

em

con

sonâ

ncia

com

o P

roje

to P

olíti

co P

edag

ógic

o da

EAD

e o

Pla

no d

e D

esen

volv

imen

to

Inst

ituci

onal

no

níve

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Daiane Grassi, Marie Jane Soares de Carvalho

A partir do entrelaçamento estabelecido entre as pers-pectivas com o caso, foi possível perceber quantos cuida-dos e articulações são necessárias quando se deseja pensar e praticar uma educação libertadora,4 que contraponha a perspectiva de educação bancária (estilo fast food), comen-tada nas obras de Paulo Freire. Enquanto a perspectiva da primeira coluna deteve o seu olhar prioritariamente nas questões pedagógicas de uma arquitetura (baseada na construção, aberta e flexível), a perspectiva da terceira co-luna se deteve em olhar aspectos mais administrativos/ins-titucionais da pedagogia. O que não significa estar agindo de forma errônea. Significa não priorizar essencialmente o conceito de pedagogia como o ato primário de aprendi-zagem. A primeira perspectiva enfatiza uma pedagogia artesanal, tecida pelos sujeitos envolvidos a partir das necessidades evidenciadas por eles; a segunda perspecti-va enfatiza que em grande parte dos cursos desenvolvidos na modalidade a distância seja adotada oficialmente uma arquitetura, formada por uma proposta de planejamento, que envolve a predefinição de conteúdos e demais aspectos metodológicos e tecnológicos de um curso. Os âmbitos orga-nizacionais, instrucionais, metodológicos e tecnológicos se encontram num quadro definido e definidor das práticas subsequentes, o que determina maior investimento institu-cional em detrimento do investimento pessoal e autônomo dos agentes educacionais, em particular dos estudantes.

4 “Libertação” é um conceito central no pensamento freireano, intrinseca-mente vinculado à liberdade, conscientização e revolução. Freire descreve a libertação como uma práxis, “a ação e a refl exão dos homens sobre o mundo para transformá-lo” (JONES apud STRECK; REDIN; ZITKOSKI, 2008, p. 247).

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Arquiteturas pedagógicas nas práticas das alunas do PEAD: ensaio, relato e considerações

O ensaio...

Para iniciar o trabalho sobre arquiteturas pedagógicas baseadas no conceito de essencialidade e foco na construção do saber, de maneira flexível e artesanal, com as alunas do polo do município de Alvorada,5 foi proposta pelo Seminário Integrador VII6 a seguinte atividade a distância:

“Em pequenos grupos elaborar uma atividade a ser desenvolvida com seus alunos. O planejamento dessa ati-vidade, necessariamente, deve levar em conta: o material lido e discutido no SI VII7 e ter presente, no mínimo, três elementos considerados como constitutivos de um trabalho diferenciado.”8

Dessa forma, as alunas professoras se organizaram em trios, duplas e uma aluna opcionalmente de maneira indi-vidual e iniciaram as construções. O primeiro cronograma de desafios às alunas-professoras previa “a criação da ar-quitetura pedagógica, a testagem da mesma e a análise e discussão da ação desenvolvida”, a partir dos registros e produções dos alunos e relatórios dos professores. Todavia, em razão da proposta ter sido realizada no final do semes-

5 Polos: para a defi nição da área física de abrangência do curso, foi conside-rada a localização de escolas que acolhessem os polos com a infraestrutura necessária, em geral mantida pelas Secretarias Municipais de Educação. Os polos visam assegurar, aos alunos, o uso das tecnologias de informação e comunicação.

6 Seminário integrador: a ideia do curso é romper com a organização disci-plinar e instaurar interdisciplinas que articulem os conhecimentos específi -cos, teóricos e práticos, em cada semestre. Essa articulação é garantida por seminários integradores que ocorrem em todos os semestres.

7 O material lido foi “Arquiteturas pedagógicas para educação a distância”, uma versão revisada do artigo “Arquiteturas pedagógicas para educação a distância: concepções e suporte telemático”, originalmente apresentado no XVI Simpósio Brasileiro de Informática na Educação e publicado nos anais do simpósio. (Cf. CARVALHO, et al. In: Anais..., v. 1, p. 362-372, 2005).

8 Elementos constitutivos de um trabalho diferenciado – dinâmica trabalha-da em aula presencial.

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tre, mês de dezembro, obteve-se dificuldades na realização das práticas nas escolas.

Em meio a todas as dificuldades, houve grupos que conseguiram avançar significativamente em seus traba-lhos. Principalmente em negociações muito criativas com as direções das escolas, com colegas e com seus alunos, para se adequarem às necessidades de uso mais intenso dos laboratórios pelo período que viabilizaria a prática. Outros, ainda, apesar de não terem chance de usar laboratórios de informática, também foram criativos em alternativas com outras tecnologias, tais como fotos, vídeos, entre outros.

Os trabalhos realizados pelas alunas professoras foram orientados pelas professoras e tutoras do curso de maneira que fossem contemplados os três itens já mencionados de uma arquitetura que prima pelo ato pedagógico: o uso de tecnologias digitais, uma teoria de base e uma metodologia de trabalho (com objetivos e metas claramente expostas, explicitando os conceitos a serem trabalhados e as compe-tências a serem desenvolvidas).

Alguns grupos optaram por trabalhar com desafios in-vestigativos, outros com releituras e outros ainda com pro-duções textuais colaborativas. A sistemática, por seguir e evidenciar na escrita da arquitetura a indicação dos três itens solicitados (tecnologia, teoria de base e metodologia), foi adotada pelos grupos.

O caso escolhido para a análise não reflete um modelo de sucesso a ser seguido para desenvolver uma arquitetu-ra pedagógica. No entanto, é uma proposta que evidencia a busca pela inovação por parte da aluna professora, suas angústias, sua autocrítica, seus medos e alguns desafios vencidos por ela mesma.

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Arquiteturas pedagógicas nas práticas das alunas do PEAD: ensaio, relato e considerações

O relato...

Em “O relato” é possível verificar os desafios pelos quais passou a aluna professora em questão, bem como as articulações realizadas para que de fato, ela pudesse resol-vê-los da melhor forma, ou, pelo menos, iniciar uma tenta-tiva de resolução.

A análise deste percurso teve como fonte de pesquisa o portfólio de aprendizagem9 da aluna professora, disponibi-lizado na web, por meio da ferramenta blog.10 Além disso, tal caso foi também apresentado pela aluna professora no workshop de avaliação11 presencial do curso.

Ao iniciar a sua postagem12 de tomada de consciência em relação ao seu processo de aprendizagem, a aluna evi-dencia o desafio pelo qual está sendo instigada a resolver. Tal perspectiva vai ao encontro da proposta de arquitetura pedagógica do curso: resolução de problemas, autonomia e autoria. Nessa perspectiva, a aluna reflete que

[...] no dia 16 de dezembro teríamos a apresentação de algo que comprovasse nosso crescimento no semestre que estava pres-tes a terminar. O que apresentar? Nos outros semestres esta sempre era a pergunta, mas logo vinha a solução. Desta vez não encontrava respostas. Remoí esta pergunta uma semana inteira. O que fazer? Estava muito preocupada, pois não con-segui colocar em prática as “arquiteturas pedagógicas” na esco-la em que trabalho, por não ter ambiente informatizado. E as

9 Portfólio de aprendizagem: registro de todas as evidências de aprendiza-gens de cada aluno.

10 Blog: um site cuja estrutura permite a atualização rápida a partir de acrés-cimos dos chamados “posts”. Estes são, em geral, organizados de forma cronológica inversa, tendo como foco a temática proposta do blog, podendo ser escritos por um número variável de pessoas, de acordo com a política do blog.

11 Workshop de avaliação: momento presencial em que o aluno apresenta uma aprendizagem signifi cativa do semestre em questão.

12 Endereço da postagem: http://malucostapead.blogspot.com/2010/01/lan--house-uma-aliada.html

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Daiane Grassi, Marie Jane Soares de Carvalho

preocupa ções não pararam por aí, pois o estágio seria em cima destas “arquiteturas”. Logo deveria ser em um ambiente infor-matizado, e a maioria das escolas com ambiente informatizado não tem acesso à internet.

Diante da situação-problema “não ter acesso a um am-biente informatizado”, a aluna professora pensou em algu-mas alternativas para a resolução do mesmo, no entanto, conforme evidencia em sua postagem, na íntegra, não lhe pareciam as melhores. Foi quando, ainda sem resolução para o seu problema, resolveu lançar o desafio aos alunos: “[...] vamos fazer um trabalho de pesquisa na internet so-bre aquecimento global? [...]”, segundo a professora, esse era um tema muito comentado em sala de aula e todos gos-taram e aprovaram o desafio. Nessa perspectiva,

duas alunas disseram que já estavam com internet em casa e montaram seus grupos para se reunirem lá. Uma iria para a casa do pai no final de semana e poderia pesquisar e trazer na segunda. Outros três disseram que iriam a uma lan house.13 Perguntaram como deveriam entregar o trabalho, e eu disse que deveriam abrir uma página na internet e colocar tudo o que foi pesquisado para que outras pessoas pudessem utilizar essas informações. Um perguntou se o rapaz da lan house po-deria ajudar, já que noutro dia o mesmo ajudou a abrir o Orkut. Então, eu disse: – Por que não vamos todos para a lan house? – Como assim?! – Perguntaram. – Vamos ter nossa aula na lan house, completei.

Conforme o relato da aluna professora, os alunos se sentiram motivados por utilizar esse novo recurso. O recur-so era o que os instigavam. Nessa direção, é necessário cau-tela ao propor um trabalho de pesquisa utilizando recursos da web para que o foco não seja a ferramenta, mas, sim, a pesquisa e a construção que a mesma possibilita. Uma

13 Lan house: um estabelecimento comercial onde as pessoas podem pagar para utilizar um computador com acesso à internet e a uma rede local, com o principal fi m de acesso à informação.

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Arquiteturas pedagógicas nas práticas das alunas do PEAD: ensaio, relato e considerações

metodologia e o planejamento também são necessários, de acordo com a perspectiva de arquitetura pedagógica. E nes-se planejamento é necessário envolver e comprometer os alunos para que eles sejam autores e coautores de conheci-mentos.

“A alegria foi geral [...]”, comenta a aluna professora. Sim, trabalhar com o novo pode ser extremamente desafia-dor aos alunos. O desafio e a responsabilidade que circu-lava naquela turma de alunos os fez articular como iriam para a lan house, quando e quanto pagariam pelo serviço, quem os levariam... Questões que também poderiam ter sido trabalhadas no projeto. “[...] os alunos deixaram a es-cola com uma grande responsabilidade, marcar esta ativi-dade e conseguir um preço justo [...].” Ao definirem a lan house que iriam utilizar para o trabalho de pesquisa, foi só aguardar o dia.

As 14h levei 18 alunos para a lan house e pedi para uma tia nos acompanhar. O rapaz da lan house havia conseguido mais cadeiras para todos ficarem confortáveis. Na verdade eu não sabia exatamente como proceder, fiquei um pouco atrapalhada por ser a primeira experiência. Mas, a primeira coisa que fiz foi explicar sobre a página que abriríamos que era igual à minha e mostrei meu pbworks. Eles ficaram maravilhados, pois en-contraram seus trabalhos postados na página. Eu permiti que eles mexessem no site para matar a curiosidade. Disse-lhes que para abrir a página deveríamos ter um e-mail da turma, e foi o que fizemos. Logo todos queriam abrir o seu e eu permiti. Para facilitar o acesso entre os computadores, o rapaz retirou as di-visórias. Pude, assim, me deslocar com mais agilidade. Os pri-meiros a fazer seus e-mails também foram ajudando os outros. Depois mostrei como abrir um pbworks.

Estabelecer parcerias, certamente, é uma estratégia fundamental para trabalhar com grupos de alunos, espe-cialmente desses cenários (escola pública e sem muitos re-cursos). Tanto a parceria com o “rapaz” da lan house, como

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com os alunos propriamente ditos, garantiu parte do suces-so do trabalho. Dessa forma, evidencia-se a importância de se ter, primeiramente, definido o ato pedagógico. Que, com esse aspecto bem fortalecido e embasado, posteriormente as questões administrativas/institucionais/estruturais se definem, acontecem.

Assim, ao refletir sobre “O relato”, não cabe aqui jul-gar os acertos e os erros, mas, sim, evidenciar a tomada de consciência da aluna professora sobre o seu próprio proces-so. Até porque essa análise já foi realizada por ela e consta em seu planejamento para 2010.

Mas o que eu queria observar eu consegui. A minha apresen-tação não seria sobre a página que abrimos ou a pesquisa que fizemos, mas sobre esta experiência que tivemos. Volto ao título da postagem, lan house, uma aliada? Eu diria que sim. Sei que foram três horas e parece pouco, mas realmente dá para termos uma ideia. Se tivéssemos começado no início do ano, trabalha-ríamos primeiro as curiosidades e o manuseio da máquina, com uma aula semanal ou quinzenal. Acredito que possamos fazer um belo trabalho, com a participação de todos.

Certamente, o tempo que ficaram em interação no am-biente informatizado foi muito enriquecedor, pela novida-de, pelo fato de utilizarem as ferramentas tecnológicas na educação. A reflexão sobre o processo realizada pela aluna professora é algo que deve ser considerado como um cresci-mento, pois, a partir dessa, ela pode tomar consciência da necessidade de um planejamento por etapas: apresentar o laboratório, traçar os objetivos e negociá-los com os alunos antes de “colocarem a mão na massa” de fato. Para a aluna,

o mundo se renova e cria novas formas para que todos possam usufruir de suas inovações. Apenas as escolas continuam sem renovação. Não adianta reciclarem os professores, se eles não têm como aplicar suas ideias. Se eu tivesse um notebook e um Datashow daria aulas maravilhosas. Geografia seria apaixo-nante. Mas dizem que sonhar não paga imposto, mas frustra,

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Arquiteturas pedagógicas nas práticas das alunas do PEAD: ensaio, relato e considerações

porque tu teres o conhecimento e não poder usar é muito pior. O rapaz da lan house disse que poderia colocar um aparelho que interliga os computadores e facilitaria o acesso dos alunos. Sei que se conversarmos com os atendentes das lan houses podería-mos ter mais colaboração, porque também estaríamos ajudando a expandir seu negócio.

Pelo relato de experiência da aluna professora foi pos-sível perceber que sim, “adianta” reciclarem os professores! Pois, se não fosse o embasamento oportunizado no Pead, bem como o desafio de criar uma arquitetura pedagógica com os seus alunos, talvez essa experiência com a lan hou-se não tivesse ocorrido. Diante disso, “se quisermos mudar esta realidade temos que agir usando as armas que estão à nossa disposição, ‘lan house, uma grande aliada!’”. Posta-gem extraída do blog de uma aluna professora.

E as considerações... ainda que provisórias e em movimento

Ao realizar as considerações, ainda que provisórias e em possível movimento, em relação a este artigo, torna-se necessário reforçar sua proposta: mostrar como a vivência em um curso ancorado em arquiteturas pedagógicas aber-tas e flexíveis oportunizou uma ressignificação da prática (e na prática!) de uma aluna professora do curso de Pedago-gia a Distância da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O objetivo da análise não foi realizar um julgamento sobre posicionamentos certos e errados, tampouco apresen-tar uma proposta modelo de arquiteturas pedagógicas a ser seguido, mas, sim, evidenciar os primeiros passos de uma possível trajetória baseada na aprendizagem no ato peda-gógico, bem como um possível novo elemento a ser observa-do em arquiteturas pedagógicas: o envolvimento social da comunidade.

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Nessa perspectiva, como a vivência em um curso em-basado por arquiteturas pedagógicas abertas e flexíveis, oportunizou a ressignificação da prática de uma aluna pro-fessora do Pead?

• Pelo desafio do primeiro problema: oportunizar a vi-vência de uma arquitetura pedagógica em sua sala de aula.

• Pela experiência vivenciada ao longo do curso, Pead, com pesquisa, construção de conhecimento e auto-ria.

• Pelo contato com as tecnologias digitais: internet, e-mail e páginas pessoais.

• Principalmente por ter percebido e vivenciado a arte de aprender a aprender, por parte de todos os envol-vidos.

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Arquiteturas pedagógicas nas práticas das alunas do PEAD: ensaio, relato e considerações

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Aspectos sociais da experiência do mutirão pela inclusão digital:

resgatando cinco anos de atividade1

Tamiris Tomasi Malacarne

Cristina Fioreze

Adriano Canabarro Teixeira

Eliana Cristina Dalagasperina

Marco Antônio Sandini Trentin

Introdução

ste estudo visa discutir a exclusão digital enquanto expressão da questão social valendo-se de reflexões teóricas e pesquisa empírica. Destaca-se que, corri-queiramente, muito se tem utilizado o conceito exclu-

são social para nomear as inúmeras expressões da questão social, provocando uma minimização desse conceito. Ao mesmo passo, desconsideram-se os diferentes nós que en-volvem a rede da exclusão social, que apresenta desafios teóricos para sua compreensão. Trata-se de um produto do modelo econômico que, na sua discussão, deve compreender

1 Artigo publicado no International Council for Educational Media, 2011, Aveiro. Old Meets new media in education - Joint Conference. Aveiro: Uni-versity of Aveiro, 2011. v. 1.

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a realidade em suas particularidades, considerando aspec-tos econômicos, sociais, políticos, culturais, entre outros.

Cabe elucidar que a exclusão social tem relação direta com a inclusão social, ou seja, pensar a condição de excluí-do diretamente remete a pensar em inclusão, porque en-tre ambas existe uma relação dialeticamente estabelecida. Nessa perspectiva, é possível refletir com denso aprofunda-mento teórico sobre a exclusão social e as possibilidades e limites da inclusão social realizada no capitalismo, modelo econômico vigente. Posto isto, a questão norteadora da pes-quisa se consolidou da seguinte forma: em que medida a in-clusão digital influencia na amenização da exclusão social?

Nesse sentido, uma vez que o projeto Mutirão pela In-clusão Digital se consolida na ação educativa calcada na apropriação das tecnologias em processos didático-peda-gógicos, este artigo encontra profunda aderência ao tema “Aspectos sociais da informática na educação”, tópico de in-teresse do evento e ao qual se destina.

A exclusão digital como faceta contemporânea da exclusão social

Vive-se atualmente num contexto social marcado pe-las inovações tecnológicas, por alterações das relações so-ciais, permeado pela desigualdade social crescente, pela má distribuição de renda, pelas novas expressões da questão social,2 pela retração do Estado dito mínimo, pelo aumento do desemprego, pela desregulamentação das políticas so-

2 A questão social, segundo Iamamoto (2004, p. 27), é “apreendida como o conjunto das expressões das desigualdades sociais da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais cole-tiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação de seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da socieda-de”.

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ciais e dos direitos constitucionalmente garantidos. Nesse contexto. a exclusão social se apresenta como um fenômeno social comum.

A discussão acerca da exclusão social é complexa e contraditória por ser produto do modelo econômico e por ter relação direta com a inclusão social. A exclusão social é multifacetada, ou seja, apresenta-se com as mais varia-das facetas e expressões, podendo ser decorrente de fatores culturais, econômicos, políticos, sociais, ambientais, entre outros. “São várias questões interligadas, pois o excluído no perío do atual, não é somente aquele que vive em condições de pobreza” (Reis, 2002, p. 2).

Ainda se pode destacar que existem então formas visí-veis e invisíveis de exclusão social que, de diferentes manei-ras, atingem uma grande parcela da população, pois “[...] o desenvolvimento econômico que gera um desenvolvimento social muito aquém de suas possibilidades [...], como ocorre no Brasil, nega-se na perversidade das exclusões sociais que dissemina” (Martins apud Malacarne; Souza, 2002, p. 9).

A faceta da exclusão social que nos propomos analisar é denominada “exclusão digital”. Apesar do desenvolvimen-to tecnológico contemporâneo e do franco processo de infor-matização, de ambientes de ensino em especial, o acesso às tecnologias ainda é desigual e, sabe-se, não garante a inclusão.

A exclusão digital como forma de exclusão social

O contexto social é marcado e transformado pelas tecnologias de rede e, independentemente do acesso a seus aparatos tecnológicos, consolida-se um processo de imersão individual e coletiva numa configuração social repleta de

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tecnologias, que modifica continuamente a dinâmica coti-diana dos indivíduos ao mesmo tempo em que também são modificadas nessa interação, porém em intensidades e for-mas diversas (Teixeira, 2010, p. 25).

Assim, todos são influenciados pelas tecnologias em maior ou menor intensidade e de diferentes maneiras. Cabe assinalar que o acesso a tais tecnologias ainda se dá num nível extremamente desigual. Nessa perspectiva, Castells aponta que “a centralidade da internet em muitas áreas da atividade social, econômica e política equivale a marginali-dade para aqueles que não têm acesso a ela, ou têm apenas um acesso limitado, bem como para os que são incapazes de usá-la eficazmente. Assim não surpreende que a pro-clamação do potencial da Internet [...] venha de par com a denúncia da divisão digital gerada pela desigualdade a ela associada” (2003, p. 203).

A discussão em torno da exclusão digital como uma nova categoria da exclusão social requer cuidado, sensibi-lidade e cautela, pois, como apresentado, é demasiadamen-te complexa em razão da fragilidade conceitual em torno do conceito “exclusão social”. Importa situar a exclusão di-gital, portanto, como resultado dos avanços tecnológicos, apresentando as suas particularidades e problematizando tal discussão teoricamente. A situação de exclusão referida decorre da dualidade das tecnologias propostas por Teixeira (2010, p. 20):

Se por um lado as TRs potencializam processos colaborativos de aprendizagem, por outro possibilitam que se ampliem proces-sos de dominação e exploração, baseados na construção de uma massa de consumidores permanentemente disponíveis à ação do mercado global e imersos numa cultura tecnológica que re-força posturas passivas; que ignora as diferenças, desconsidera as culturas locais e impõe tendências, consolidando um proces-so que leva à incapacidade de reconhecer as TRs como elemen-tos essencialmente sociais e potencialmente libertadores.

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Apesar de toda complexidade da discussão que envolve a exclusão social, e considerando cuidadosamente a discus-são dos autores referidos, parte-se da premissa de que exis-tem possibilidades de promoção da inclusão social a partir da inclusão digital.

A pesquisa desenvolvida

A presente pesquisa foi realizada junto ao projeto Mu-tirão pela Inclusão Digital,3 tendo como objetivo “desenvol-ver um estudo sobre o projeto Mutirão pela Inclusão Digital visando perceber quais as possíveis contribuições deste aos usuários da política de assistência social e ao seu processo de inclusão social”4.

A metodologia foi construída por meio do método dia-lético, visando considerar a realidade enquanto histórica e permeada por contradições sociais, pensada segundo o viés de classes sociais antagônicas, no qual tudo está em constante processo de transformação/movimento. O ho-mem é visto como sujeito em sua totalidade, desconside-rando a sua objetificação, porque é um ser social e histórico (Richardson, 1999, p. 48-54).

No que concerne à amostra, considerando que na cons-trução do projeto de pesquisa um dos objetivos específicos era “identificar quais contribuições do projeto Mutirão pela Inclusão Digital aos usuários que frequentaram e/ou frequentam as oficinas oferecidas pelo projeto” (Aspectos Sociais da Experiência do Mutirão pela Inclusão Digital,

3 Mais informações sobre o projeto podem ser encontradas em TEIXEIRA; CAMPOS, 2009, p. 15-32.

4 A pesquisa foi realizada pelas acadêmicas Tamiris Tomasi Malacarne e Suelen Oliveira de Souza, ambas do curso de Serviço Social da Universida-de de Passo Fundo.

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2009, p. 4), a amostra que se tem é a totalidade de partici-pantes do projeto.

Cabe elucidar que os participantes do projeto ao longo dos seus cinco anos de implementação representam cerca de setecentos usuários. No entanto, muitas informações se perderam, o que acabou impossibilitando o acesso a todos os sujeitos da pesquisa. Assim, os questionários foram en-viados via correio eletrônico para 258 usuários que consta-vam no sistema informatizado do projeto.

Desse número, apenas 38 usuários deram retorno aos e-mails respondidos, e desses 38 respondentes, 31 se dis-puseram a continuar no estudo. Com esses, foi utilizada a técnica da entrevista e coleta. No item seguinte é feita a apresentação e a análise dos dados obtidos com a realização de tal pesquisa.

A análise dos dados

A pesquisa foi realizada junto aos usuários que fre-quentaram e/ou frequentavam as oficinas de informática do Projeto Mutirão pela Inclusão Digital da Universidade de Passo Fundo, criado no ano de 2005, sendo que os dados analisados abrangem desde o ano de seu surgimento até o ano de 2009, quando ocorreu o desenvolvimento desta pes-quisa. Importa destacar que o projeto de pesquisa foi apro-vado pelo Comitê de Ética da Universidade de Passo Fundo e que foi institucionalizado enquanto linha de pesquisa do Serviço Social.

O público-alvo do projeto apresenta uma característica relevante, é também caracterizado como público da Política de Assistência Social. Nos termos da legislação da institui-ção, fazem parte desse grupo:

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Indivíduos e grupos que estejam em situação de vulnerabili-dade e risco social e submetidos a processos de exclusão digi-tal decorrentes de situações de seletividade social, econômica ou ideológica. Dentre o público a ser atendido pode-se citar: crianças e adolescentes com perda ou fragilidade de vínculos de afetividade, pertencimento e sociabilidade; pessoas da terceira idade; pessoas com desvantagem pessoal em função de defici-ências físicas; crianças e adolescentes em situação de exclusão e/ou no acesso as demais políticas públicas (UPF, 2009, p. 3).

É importante explicitar que do número total de 38 respondentes, 36 participaram do projeto no ano de 2009 e os outros dois, entre 2005 e 2006. Um primeiro aspec-to a ser destacado refere-se à idade dos participantes, pri-meira questão da entrevista realizada junto aos usuários. A respeito, 39% incluem-se na faixa etária dos seis aos nove anos; 24%, na faixa etária de 10 a 14 anos; 13% não infor-maram a idade; 3% correspondem à faixa dos 25 a 40 anos; 8%, à faixa dos 40 aos 60 anos e 13% representam a faixa mais de sessenta anos.

No que concerne ao sexo dos participantes, 62% são do gênero feminino e 38%, do gênero masculino. Outra ques-tão refere-se à escolaridade, constatando-se que 75% dos respondentes afirmaram ter frequentado o ensino funda-mental incompleto; 11%, ensino médio completo; os demais estão divididos entre ensino fundamental completo, ensino médio completo, ensino superior completo, ensino superior incompleto.

Quando questionados sobre possuirem ou não compu-tador em casa, mais de 50% responderam negativamente. Esse aspecto nos remete a observar que ter computador em casa é relevante, mas não é fator determinante para o aces-so à internet. Observa-se que a maioria dos entrevistados, apesar de não ter acesso a esse recurso em casa, faz uso dele em outros locais. Como exemplo podemos apontar as

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escolas, as universidades, os locais de trabalho, as lan hou-ses, os telecentros, dentre outros.

Teixeira (2001, p. 67) aponta que “formas alternativas de utilização da Internet foram criadas e estão em cons-tante aprimoramento, dentre as quais se destacam: os pro-vedores de acesso gratuitos, os mecanismos de acesso pelo aparelho de TV e os locais de acesso público”.

Importa destacar que como pano de fundo do acelerado desenvolvimento tecnológico tem-se a concorrência entre as empresas prestadoras de tais serviços, o que acaba resul-tando em preços menores para o consumidor. Esse aspecto positivo se dá na medida em que facilita a aquisição de tais serviços.

Outra questão constante no questionário buscava identificar em que espaço ocorrera o primeiro contato com o computador e/ou com a internet. Dos respondentes, 71% teve o primeiro contato junto ao projeto Mutirão pela In-clusão Digital; 16% tiveram tal contato em casa e 13% em outros espaços.

Nota-se, portanto, a relevância do projeto ao possibi-litar aos usuários o primeiro contato com o computador e até mesmo a internet. Porém, de acordo com a própria me-todologia do projeto, sabemos que o simples acesso não é suficiente, sendo necessário propiciar a grupos em situação de vulnerabilidade e risco social, assumir papel ativo na sociedade em rede através de oficinas de informática e ci-dadania.

A perspectiva trabalhada no projeto visa ir muito além da simples promoção do acesso, pois seu objetivo geral é implementar ações de Inclusão Digital com vistas à apro-priação das tecnologias de rede por parte dos envolvidos em uma perspectiva de ambiente comunicacional e de exercício da cidadania.

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Assim, trabalhar no sentido da promoção da inclusão social desses sujeitos requer que estratégias amplas sejam pensadas em comum acordo com os sujeitos participantes. Como aponta Teixeira (2010), a inclusão digital é entendi-da como “processo horizontal que deve acontecer a partir do interior dos grupos com vistas ao desenvolvimento de cultura de rede”, ou seja, a perspectiva de trabalho deve considerar e prezar por “processos de interação, de constru-ção de identidade, de ampliação da cultura e de valorização da diversidade”, visando a que os usuários participantes adotem “uma postura de criação de conteúdos próprios e de exercício da cidadania, possibilitar a quebra do ciclo de produção, consumo e dependência tecnocultural” (p. 39).

Quando perguntados sobre como avaliam as atividades do projeto, 60% dos entrevistados o consideraram ótimo; 29%, bom; 5% não souberam responder; 3% responderam considerá-lo ruim ou foram casos especiais que represen-tam os que apontaram duas respostas.

Embora se considere positivo o fato de que a maioria dos entrevistados tenha avaliado bem o projeto, não se pode desconsiderar que há uma cultura que perpassa o discurso dos usuários da política de assistência social, que é a cultu-ra da benesse, do assistencialismo.

Posteriormente, quando questionados, em questão aberta, sobre o que mudou na sua vida a partir da par-ticipação no projeto, os respondentes trouxeram falas que apontaram para análises que podem ser agrupadas nas se-guintes categorias: “espaço de comunicação, espaço de co-nhecimento e auxílio no processo de envelhecimento”.

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Espaço de comunicação

A comunicação “é a essência da vida e inerente ao ser humano” (Fontes; Utyama; Rodrigues, 2006, p. 1), pois é por meio dela que trocamos mensagens com outras pessoas. Ainda segundo Guareschi (2004, p. 14), “não seria exagero dizer que a comunicação constrói a realidade”, pois o mun-do está permeado em todos os sentidos pela comunicação e em torno dela, visto que vivemos “num mundo teleinfor-matizado” (p. 14). Além disso, “a comunicação é processo pelo qual uma pessoa transmite pensamentos, sentimentos e idéias aos outros. É um instrumento que permite a uma pessoa, entender a outra, que aceite, ou seja, aceita, receba ou envie informações, dê ou receba ordens, ensine e apren-da” (Fontes; Utyama; Rodrigues, 2002, p. 1).

Há que se destacar que a comunicação envolve um processo de troca, ninguém vive sem se comunicar, como nos diz Freire (1983, p. 44): “O mundo humano é, desta forma, um mundo de comunicação”. Teixeira (2001, p. 52) aponta que “comunicar-se é uma necessidade básica do ser humano. Ao longo de toda a sua existência, a humanidade sempre desenvolveu mecanismos que possibilitam o acesso e a troca de informações. A cada novo mecanismo criado, abrem-se novas perspectivas, novas possibilidades e desa-fios para a sociedade e para o desenvolvimento das tecnolo-gias de informação”. Na fala do entrevistado 2, participante de uma oficina para terceira idade, aparece a importância da utilização dos meios de comunicação, aqui situando a internet, ao afirmar: “Me sinto mais comunicativa, tenho contato com meus parentes de longe dos Estados Unidos e outras cidades do Brasil, por telefone é muito caro.” Cabe elucidar que na mesma resposta duas questões são agrega-das: a importância de saber utilizar-se das novas tecnolo-

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gias, bem como as possibilidades dessa tecnologia de apro-ximar distâncias. Na mesma perspectiva aparece a fala do entrevistado 3, também da terceira idade: “Consegui agora me comunicar com meus netos que moram em Brusque, en-trar em contato, estar falando, vendo.”

O entrevistado 4 expressa que após a participação no projeto Mutirão pela Inclusão Digital, no qual aprendeu a utilizar a internet como um meio de comunicação, sua vida

mudou muito, pois agora com um clic de um botão o mundo lá fora entra na nossa casa, tambem a comunicação com os filhos e amigos ficou instantânea, minha alegria em estar no mutirão, aprendendo, é muito grande, jámais pensei que pudesse apren-der e usar um computador. Agradeço pela oportunidade do curso. Gostaria de continuar o ano que vem, pois na nossa idade tería-mos que memorizar novamente. Obrigado.

Na fala apresentada ficam nitidamente claras a neces-sidade e a importância que expressa o ato de comunicar-se para os seres humanos, pois “nós vivenciamos a comunica-ção como uma atividade” (Dimbleby; Burton, 1990, p. 19); segundo os autores, “a comunicação somos nós que fazemos, nós que produzimos” e, ainda, “algo que trabalhamos quan-do recebemos ou transmitimos uma mensagem”, ou seja, é um exercício cotidianamente desenvolvido.

A fala da entrevistada 5 reflete o que os autores apon-tam sobre a importância da comunicação para a afirmação da identidade de cada um: “Eu até me sinto mais jovem, porque eu sei me comunicar, enquanto eu puder vou conti-nuar.”

O nível econômico, social, da participação e, por fim, da informação (Dimbleby; Burton, 1990, p. 26) perpassa a importância da comunicação. No que concerne à informa-ção, cabe destacar que “necessitamos informações para nos manter a par do que se passa no mundo”, ou seja, precisa-

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mos estar bem informados para acompanhar as transfor-mações sociais.

A respeito, a fala da entrevistada 6 destaca benefícios advindos da utilização da internet:

Primeiramente, fiquei mais esperta, mais atualizada, pois vivo len-do e digitando na internet: mais econômica também, visto que converso com minhas amigas pelo MSN e outras atividades, di-versões, jogos, fotos, blog etc. Estou amando, estudando após uma certa idade e espero que continue no ano que vem, pois na nossa idade temos que rever os conteúdos sempre.

Por sua vez, o entrevistado 7 aponta que passou a ter “maior conhecimentos, sempre a par das notícias, e bem informado”. Outro aspecto a ser destacado refere-se à re-lação dos meios de comunicação com a cultura. Segundo Guareschi (2004, p. 16), “os Meios de Comunicação estão sempre presentes e são fator indispensável tanto na criação como na transmissão, mudança, legitimação e reprodução de determinada cultura”.

Nesse processo, a perspectiva trabalhada pelo projeto Mutirão pela Inclusão, visando à autonomia dos sujeitos, apresenta nitidamente a possibilidade de que seus usuá-rios possam utilizar-se dos potenciais da tecnologia como aliados no processo de inclusão social.

Espaço de conhecimento

“A vida é um processo de conhecimento” (Maturana, 2001, p. 7, 10). Com base nessa colocação, podemos perce-ber que a discussão acerca de conhecimento deve ser pensa-da enquanto processo. Importa destacar que fazemos parte do mundo e cada pessoa em um processo particular possui uma história de vida, e nossa “trajetória de vida nos faz construir nosso conhecimento do mundo – mas este tam-bém constrói seu próprio conhecimento a nosso respeito”.

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Mesmo que não nos demos conta, muitas vezes sofre-mos influências diretas do contexto em que vivemos, além de sermos “modificados pelo que vemos e sentimos” (p. 10). Essa breve introdução tem o intuito de demonstrar que o mundo em que vivemos não está pronto ou acabado, muito menos podemos somente utilizar as informações que temos de forma passiva; ao contrário, aponta a possibilidade de que possamos participar ativamente do processo de cons-trução do mundo. Outro aspecto a ser destacado, segundo Maturana (2001, p. 12), é que se “a vida é um processo de conhecimento, os seres vivos constroem esse conhecimento não a partir de uma atitude passiva e sim pela interação. Aprendem vivendo e vivem aprendendo”.

O processo de conhecimento, portanto, não é estanque; ao contrário, todos temos condições objetivas de buscar aprofundá-lo. Cabe situar aqui o conhecimento adquirido pelos usuários do projeto Mutirão pela Inclusão Digital em interação direta com e através da tecnologia. O entrevis-tado 8 aponta que nesse processo mudou “o conhecimento do computador, fazer os trabalhos normal, como qualquer outra pessoa, digitação”.

Na fala do entrevistado fica claro que o processo de conhecimento não é fechado, mas devemos atentar para que as informações recebidas sejam não aceitas como ver-dade absoluta. Como, por exemplo, no caso das milhares informações que permeiam a internet, devemos ser críticos, autônomos e seletivos em relação a essas. Nesse sentido, é essa a premissa do projeto que seus usuários assumam “papel ativo na sociedade em rede”.

O conhecimento é reconhecido como “elemento funda-mental na sociedade contemporânea”. Considerando que existe grande quantidade de informação disponível, como jamais visto, há “uma crescente necessidade de aprimo-

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ramento constante dos indivíduos”. Cabe referenciar que informação, “por si só, não constitui conhecimento, sendo urgente que os indivíduos vivenciem processos de aprendi-zagem” (Teixeira, 2009, p. 36).

Demo (1997, p. 64) refere que “a relevância do conhe-cimento no mundo moderno está em sua capacidade de intervenção formalmente coerente. Não prepara, instiga, condiciona a inovação, mas é, ele mesmo, a inovação em marcha”.

O processo vivenciado na utilização das tecnologias de rede apresenta-se como um processo de construção do co-nhecimento, como percebemos com o entrevistado 9: “Eu gosto, sempre aprendo um pouco mais.” Ocorre, então, além do processo de construção de conhecimento, o processo de desconstrução, relação necessária para desenvolvimento autônomo.

Uma sociedade melhor é uma sociedade mais humana, menos individualista, preocupada com o todo social, com nossas crianças, e que, entre outras coisas, perceba o valor que está agregado em um idoso. Por conseguinte, analisa--se a categoria processo de envelhecimento, buscando de-monstrar o importante papel das tecnologias na vida dos idosos.

Auxílio no processo de envelhecimento

A discussão acerca do processo de envelhecimento aponta para que se considere que muitas vezes nesse pe-ríodo de vida os idosos passam por situações de exclusão e acabam desconsiderados como sujeitos, negando-se a esses seus direitos. Pasqualotti (2003, p. 39) destaca que “a mi-séria e a exclusão que acompanham vastos segmentos da população brasileira tornam-se mais amargas na velhice”.

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É como se sua vida útil tivesse acabado, concepção que perpassa muitas vezes o idoso, bem como sua família: “Os próprios idosos considerando-se indesejados, foram descar-tando-se e sendo descartados do meio do trabalho, social e familiar” (Nunes, 2006, p. 5).

Com a disseminação das tecnologias de rede, todos somos bombardeados por inúmeras informações cotidia-namente, e os idosos cada vez mais se aproximam dessas tecnologias. O computador e a internet são aliados que fa-vorecem para um envelhecer mais saudável.

A informática apresenta um grande potencial e nesse contexto o idoso aproxima-se de outras gerações. Porém, a introdução do idoso nesse novo mundo deve ser realiza-da de forma e com condições adequadas, pois este “(novo instrumento) gera novas maneiras de relações sociais, fa-miliares e desenvolve formas de aprendizagem [...]. Como também, rompe a idéia de que o idoso não aprende ou que não é produtivo” (Nunes, 2006, p. 7).

Importa destacar a fala do entrevistado 10, que vem ao encontro do que a autora destacou, ao relatar que com a participação nas oficinas do projeto mudou o aprendizado: “Eu jamais imaginava, a informática me deu outra visão do mundo exterior, eu nunca tive a pretensão de usar compu-tador.” Por sua vez, o entrevistado 11 em sua fala expres-sa: “Mudou que agora tô sabendo alguma coisa, pois tenho mais confiança em mim de poder mexer no computador na idade de gente nos esquecemos muito fácil.”

Há que se destacar que ambas as falas revelam o poten-cial da informática e têm como pano de fundo um sentimen-to de capacidade, de alegria pelo aprendizado adquirido e as mudanças provocadas. Segundo Machado (2007, p. 59), “não podemos descartar que, atualmente, o mundo da comuni-cação está criando espaços mais acessíveis para os idosos”.

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O entrevistado 12 em sua fala aponta:

Mudou muita coisa porque eu não sabia chegar na frente do com-putador e que ele podia existir na minha vida, foi isso aí (comecei em 2005, mas desisti, era muito difícil, pois tinha muitas coisas para fazer). É um direito de cada cidadão estar aqui, cada um tem que buscar o melhor para si.

Em relação às respostas em termos gerais, tem-se que a finalidade para a qual os idosos mais se utilizam da in-ternet são o MSN, leituras de jornais, receitas de culinária, entre outras. Porém, não são somente esses aspectos de in-teresse, pois a partir da realidade vivenciada na pesquisa, cada um, em sua singularidade e num movimento autôno-mo, procurava o que mais gostava, sempre realizando o ato de mostrar e até mesmo ensinar aos colegas de que necessi-tavam, num processo colaborativo.

Por fim, a partir das falas dos respondentes, fica explí-cita a contribuição do projeto no que se refere ao processo de inclusão digital, entendido como um elemento da inclusão social. Teixeira (2009, p. 34) destaca que “numa sociedade marcada pela presença das tecnologias, o acesso à internet torna-se elemento fundamental de inclusão social”.

Conclusões

A discussão em torno de possíveis estratégias de pro-moção de inclusão devem ser realizadas, primeiramente, visando compreender com base num denso aprofundamen-to teórico acerca da temática da exclusão social.

Nesse sentido, as tecnologias de rede se apresentam como espaço colaborativo, com possibilidades reais de pro-mover a inclusão de cidadãos na sociedade, tornando-os conscientes de sua importância e da possibilidade de parti-cipação ativa na sociedade (Malacarne; Souza, 2009, p. 11).

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Como aponta Foresti (2009, p. 187), “o objetivo da inclusão digital não deve ser formar técnicos”, mas, sim, buscar que os sujeitos envolvidos nesses processos “reconheçam suas potencialidades e responsabilidades”, buscando o desen-volvimento da criatividade e o rompimento da cultura da passividade.

A inclusão digital não pode ser reduzida ao acesso às tecnologias simplesmente, mas vai além. Segundo Barbosa Filho e Castro (2005, p. 276), “[...] a inclusão passa pela capacitação dos atores sociais para o exercício ativo da ci-dadania, através do aprendizado tecnológico, do uso dos equipamentos, assim como pela produção de conteúdo e de conhecimentos gerados dentro da realidade de cada grupo envolvido para ser disponibilizado na rede”.

Assim, o processo de inclusão digital, como já referido e identificado nos dados da pesquisa, não se refere somen-te ao acesso do computador, mas aponta para um processo que privilegie a maneira como se dá o acesso. Assim, as propostas devem ser pensadas, considerando “os recursos das novas tecnologias como fomentadoras de autonomia e protagonismo’’ (Teixeira, 2009, p. 40).

Por fim, pode-se afirmar que, buscando respostas ao problema da pesquisa, o projeto Mutirão pela Inclusão Di-gital contribui para o processo de inclusão social dos sujei-tos no que concerne a um dos seus elementos, a inclusão digital, a qual é promovida através dos aspectos que se re-ferem à comunicação, ao processo de envelhecimento sau-dável e ao conhecimento proporcionado aos sujeitos usuá-rios do projeto, amenizando, assim, a exclusão social dos envolvidos.

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Aspectos sociais da experiência do mutirão pela inclusão digital: resgatando cinco anos de atividade

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Proposta de metodologia para ofi cinas de informática e cidadania do Mutirão pela Inclusão Digital1

Adriano Canabarro TeixeiraLaís Mezzomo

Adriana Demarqui RossatoEdemilson Jorge Ramos Brandão

Marco Antônio Sandini Trentin

Introdução

a sociedade contemporânea, o não acesso às tecnologias se estabelece como elemento de exclu-são social, uma vez que os recursos tecnológicos contemporâneos estão no centro da dinâmica so-

cial nas mais diferentes áreas, dentre as quais se desta-ca a educação. Assim, num momento sociotecnológico em que o processo de aprendizagem demanda muito mais do que a transmissão de informações, torna-se fundamental estabelecer reflexões acerca das tecnologias disponíveis e da consequente necessidade de novas metodologias para a apropriação desses recursos pelos processos educativos.

Nesse cenário em constante transformação coexistem indivíduos que possuem diferentes níveis de apropriação

1 Artigo apresentado como resumo no Sbie 2011.

N

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Proposta de metodologia para ofi cinas de informática e cidadania do Mutirão pela Inclusão Digital

dos recursos tecnológicos, dentre os quais é possível men-cionar aqueles que Prensky (2001, p. 1) denomina de “nati-vos digitais”: “Nossos estudantes de hoje são todos ‘falantes nativos’ da linguagem digital dos computadores, vídeo ga-mes e internet. Agora fica claro que como resultado deste ambiente onipresente e o grande volume de interação com a tecnologia, os alunos de hoje pensam e processam as in-formações bem diferente das gerações anteriores”.

Esse “nativo digital” constitui um novo tipo de aluno, um sujeito em constante relação com os meios tecnológicos e que, por conseguinte, possui características distintas das de seus professores com relação ao domínio das tecnologias, processo que geralmente acarreta a subversão da lógica hierárquica e verticalizada entre professor e aluno instituí-da na escola há muito tempo.

Em relação a esse cenário, destaca-se a necessidade de mudança na relação “escola-tecnologia”, uma vez que os ambientes escolares são espaços fundamentais para a for-mação de sujeitos atuantes na sociedade conectada e que tem se apresentado como o primeiro espaço de acesso para a maior parte da população brasileira.

Ao analisar o panorama da informática educativa dos últimos anos, pode-se observar três momentos importan-tes: o primeiro diz respeito às discussões acerca da necessi-dade de se disponibilizar acesso às tecnologias, em especial a computadores pessoais, que deveriam servir de suporte tecnológico para as atividades didáticas, e, mais recente-mente, ao acesso à rede mundial de computadores, deman-da que tem sido atendida por iniciativas de vários segmen-tos, desde políticas públicas, iniciativa privada, terceiro setor e, inclusive, pelo barateamento dos equipamentos.

O segundo momento referia-se à necessidade de se desenvolver tecnologias com direcionamento educacional

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que pudessem ser apropriadas pelos processos de ensino e aprendizagem, destacando-se de forma geral os objetos digitais de aprendizagem e os ambientes virtuais de apren-dizagem. Concomitantemente à comoção acadêmica e pri-vada pelo desenvolvimento de tecnologias, começava-se a atentar para um dos principais elementos estratégicos da informática educativa: a formação de professores. Entre-tanto, é importante destacar que esse processo tinha um direcionamento muito forte para a tecnologia, deixando de lado as questões didático-metodológicas, ponto nevrálgico para a apropriação dos recursos tecnológicos em processos educativos.

Atualmente, quando já temos políticas públicas que têm se preocupado com a questão da disponibilização de recursos tecnológicos e conexão, a tecnologia encontra-se madura e acessível e reconhece-se que a formação dos pro-fessores com viés tecnológico não traz os resultados espera-dos, ganha força a discussão da necessidade de criação de metodologias específicas para os ambientes informatizados e conectados.

Pensando nessas demandas da educação com relação às tecnologias, a Universidade de Passo Fundo mantém o projeto de extensão Mutirão pela Inclusão Digital desde 2004. Vinculado ao curso de Ciência da Computação, aten-de indivíduos e grupos que estejam em situação de vulnera-bilidade e risco social e submetidos a processos de exclusão digital decorrentes de situações de seletividade social, eco-nômica ou ideológica.

O grupo de trabalho do Mutirão é interdisciplinar e congrega professores e alunos dos cursos de Ciência da Computação, Pedagogia, Análise e Desenvolvimento de Sistemas, Jornalismo, Mestrado em Educação e Serviço So-cial. Ainda, conta com o apoio teórico dos pesquisadores do

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Grupo de Estudo e Pesquisa em Inclusão Digital e da linha de pesquisa “processos educativos e linguagem do mestrado em educação”.

O principal objetivo do projeto é criar alternativas me-todológicas de apropriação das tecnologias em processos educativos, formais ou não, através da implementação de ações de inclusão digital com vistas à apropriação das tec-nologias de rede em uma perspectiva de ambiente comu-nicacional e de exercício da cidadania. Dentre essas ações destacam-se as “oficinas de informática e cidadania”, reali-zadas, predominantemente, nas dependências da Universi-dade de Passo Fundo. O conteúdo das oficinas é definido e organizado junto aos grupos atendidos a fim de considerar suas especificidades, buscando o fortalecimento cultural do grupo e dos indivíduos, sempre numa perspectiva de rom-per com posturas de reprodução e passividade.

Dessa forma, partindo da necessidade de criar e siste-matizar uma metodologia para as oficinas de informática e cidadania do projeto que também possa ser adotada em contextos educativos em laboratórios de informática, este artigo relata as descobertas do projeto de pesquisa Criação de Metodologia para Oficinas de Informática e Cidadania, inserido no Grupo de Estudo e Pesquisa em Inclusão Digi-tal (Gepid).2 Com caráter interdisciplinar, o grupo tem por objetivo realizar estudos e reflexões acerca da necessária ampliação teórico-conceitual da expressão “inclusão digi-tal” na sociedade contemporânea, dos diferentes fenôme-nos socioeducacionais da cibercultura e das metodologias e tecnologias emergentes na área.

Visando atender à necessidade apontada e aos objeti-vos do projeto de pesquisa, foi realizada uma revisão biblio-gráfica de teorias e conceitos de aprendizagem que pudes-

2 Disponível em: http://gepid.upf.br

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sem contribuir para o desenvolvimento do trabalho. Dentre as possibilidades teóricas estudadas, optou-se pelos concei-tos de “conectivismo” (Siemens, 2009) e de “arquiteturas pedagógicas” (AP) (Carvalho; Nevado; Menezes, 2007).

Para Mota (2009, p. 5), o “conectivismo visava respon-der às novas necessidades dos aprendentes do século XXI e às novas rea lidades introduzidas pelo desenvolvimento tecnológico e as transformações econômicas, sociais e cul-turais”. As arquiteturas pedagógicas, por sua vez, podem ser compreendidas como “estruturas de aprendizagem rea-lizadas a partir da confluência de diferentes componentes: abordagem pedagógica, software, Internet, inteligência ar-tificial, educação à distância, concepção de tempo e espaço” (Carvalho; Nevado; Menezes, 2007, p. 39).

Tais elementos teóricos deram origem ao novo desenho metodológico criado para as oficinas de informática e cida-dania do projeto Mutirão pela Inclusão Digital da Universi-dade de Passo Fundo, a seguir explicitado.

Algumas considerações sobre inclusão digital

A temática “inclusão digital” tem sido pauta frequente de políticas públicas e discussões acadêmicas. Tal destaque se deve em grande parte ao reconhecimento da importân-cia de processos de inclusão para o cidadão do século XXI e do défice de conexão apresentado pelo Brasil. Para ame-nizar essa carência, existem políticas públicas de grande envergadura que têm sido implementadas, dentre as quais destacam-se o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) e o Programa Banda Larga nas Escolas (PBLE), programas implementados para atender

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às necessidades impostas pelo surgimento da demanda emergente de inclusão digital.

O Fust, criado pela lei nº 9.998 de 17 de agosto de 2000, serve para o cumprimento de obrigações de universaliza-ção dos serviços de telecomunicações, com a cobertura de parcela dos custos de ações que vão desde a instalação de telefones públicos à criação de facilidades de comunicação via internet para escolas e bibliotecas, em favor, sobretudo, de estudantes de todas as idades (Brasil, 2011).

O Programa Banda Larga nas Escolas tem como obje-tivo conectar todas as escolas públicas urbanas à internet por meio de tecnologias que propiciem qualidade, velocida-de e serviços para incrementar o ensino público no país. O PBLE foi lançado no dia 4 de abril de 2008 pelo governo federal por meio do decreto nº 6.424, que altera o Plano Ge-ral de Metas para a Universalização do Serviço Telefônico Fixo Comutado Prestado no Regime Público (PGMU) (Dec. nº 4.769). Com a assinatura do termo aditivo ao termo de autorização de exploração da telefonia fixa, as operadoras autorizadas trocam a obrigação de instalarem postos de serviços telefônicos nos municípios pela instalação de in-fraestrutura de rede para suporte a conexão à internet em alta velocidade em todos os municípios brasileiros e cone-xão de todas as escolas públicas urbanas com manutenção dos serviços sem ônus até o ano de 2025 (Brasil [1], 2011).

Segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2008, 65% dos brasileiros, o que totalizava na época 104,7 milhões de pessoas, não tinha acesso domiciliar à internet. Apesar de ainda estar longe do ideal, o número de incluídos digitais aumentou 75,3% entre 2005 e 2008, segundo a PNAD.

Entretanto, mesmo considerando-se o crescimento pro-gressivo, possivelmente em função das políticas públicas

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de inclusão digital no país, é preciso que se reconheça que, embora seja um percentual de aumento significativo, dados recentes do relatório do Programa de Avaliação Interna-cional de Estudantes (Pisa) publicados pela Unesco e pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econô-mico (OECD)3 em 2011, mostram que somente 53% dos es-tudantes do país tem acesso à internet enquanto a média nos países ricos é maior de 90%.

Segundo o relatório, de um total de 65 países avalia-dos, apenas dez estão em uma situação pior que a do Bra-sil. O texto traz estatísticas e informações distribuídas em 395 páginas acerca de conhecimentos e habilidades essen-ciais para a plena participação nas sociedades modernas de estudantes perto do final da escolaridade obrigatória, em especial no que se refere ao papel das tecnologias digitais nesse processo.

Dentre os dados levantados no relatórios e que forne-cem uma ideia da situação brasileira no cenário mundial, o país possui um dos níveis mais baixos no que se refere ao número de computadores por aluno. Junto com a Tunísia, Indonésia, Montenegro e Quirguistão, o Brasil apresenta apenas um computador disponível para cada cinco ou mais alunos, média inferior ao que se tinha em 2000 (OECD, 2011, p. 151).

Mesmo com o reconhecimento das políticas públicas implementadas, o relatório aponta que de 2000 para 2009, no que se refere ao acesso domiciliar à internet, no México, Chile, Hungria, Rússia, Albânia, Tailândia, Peru, Romê-nia, Letônia, Indonésia, Argentina e Brasil, o aumento foi visto principalmente entre estudantes favorecidos, ou seja, mesmo com o esforço público em torno da disponibilização de acesso, o fosso socioeconômico continua a aumentar e

3 Disponível em: http://www.oecd.org/

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as políticas públicas, a partir desses dados, não têm dado conta da demanda por inclusão digital.

Apesar dos dados apresentados mostrarem a urgên-cia de se ampliar o acesso, é imprescindível atentar para o fato de que somente o acesso não garante um processo de inclusão digital significativo. Ainda, torna-se importan-te reconhecer que a maioria das políticas públicas trata do acesso, deixando à margem da discussão a necessidade de se criar metodologias que possam potencializar a aprendi-zagem dos alunos, o que é prioridade no atual contexto da informática educativa.

Sendo assim, a inclusão digital consiste na criação de situações em que é necessária e possível a participação ati-va na rede, fazendo dela um espaço para a comunicação e exercício da cidadania. Para autor 1 e autor 2, “incluir digitalmente é um processo, sobretudo, de autoria e cola-boração, de emissão de significados e sentidos, fazendo da rede um ambiente natural de comunicação, de troca de in-formações e de construção do conhecimento” (2009, p. 23).

Entretanto, para que isso seja possível, é fundamental que superemos a ideia de que somente o acesso é suficiente, embora se reconheça que é fundamental, e de que é possível implementar a mesma dinâmica metodológica de sala de aula em espaços informatizados e conectados. Para tanto, apresenta-se elementos conceituais básicos das arquitetu-ras pedagógicas e do conectivismo que serviram à definição da metodologia.

Arquiteturas pedagógicas

Partindo da concepção elaborada por Carvalho, Neva-do e Menezes (2007), arquiteturas pedagógicas podem ser entendidas como a elaboração de estratégias pedagógicas

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que levam em consideração determinadas teorias com in-tuito de auxiliar a aprendizagem e mediar a construção do conhecimento utilizando como suporte os recursos tecnoló-gicos e o apoio de ambientes virtuais, tendo por base prá-ticas pedagógicas abertas e maleáveis. Ainda, segundo os autores, “as arquiteturas pressupõem aprendizagens pro-tagonistas. Com orientação do professor, requerem-se do estudante ação e reflexão sobre experiências que contem-plam na sua organização pesquisa, registro e sistematiza-ção do pensamento”.

As AP utilizam o conceito de estratégias pedagógicas a partir das contribuições da pedagogia da autonomia4 de Paulo Freire e do construtivismo5 de Jean Piaget, pois ambos defendem a ideia de uma “pedagogia da incerteza”, lembrando que a validade da prática pedagógica reside em grande parte em seu suporte teórico. “Partimos do pressu-posto que o conhecimento não está assentado nas certezas, como propõe a ciência mecanicista, mas sim nasce do mo-vimento, da dúvida, da incerteza, da necessidade da busca de novas alternativas, do debate, da troca. A ‘aprendizagem em rede’, não poderá prescindir de ações que possam tra-duzir as ideias (teorias) em práticas” (Carvalho; Nevado; Menezes, 2007, p. 38).

Tomando por base a pedagogia da incerteza, Carvalho, Nevado e Menezes destacam que ela pressupõe educar para a busca de soluções de problemas reais; para transformar informações em conhecimento; para a autoria, a expressão, a interlocução; para a investigação e para a criação de novi-dades, e educar para a autonomia e a cooperação.

Nas AP, perde-se o controle do tempo e do espaço de aprendizagem uma vez que se adaptam de acordo com o

4 FREIRE, 1998.5 PIAGET, 1985. v. 1.

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ritmo de cada sujeito ou grupo, numa perspectiva de des-territorialização da aprendizagem, tem sua busca em dife-rentes fontes virtuais, exigindo dos sujeitos processos de “inteligência coletiva”6 e a compreensão do potencial educa-tivo do “hipertexto”.7 É possível apontar que as AP possuem funcionamento diferenciado em relação à dinâmica de sala da aula. “As arquiteturas funcionam metaforicamente como mapas ao mostrar diferentes direções para se reali-zar algo, entretanto cabe ao sujeito escolher e determinar o lugar para ir e quais caminhos percorrer. Pode-se percorrê--los individualmente ou coletivamente, ambas as formas são necessárias” (Carvalho; Nevado; Menezes, 2007, p. 40).

Dentre as possíveis arquiteturas pedagógicas propos-tas pelos autores, arquiteturas de projetos de aprendiza-gem; arquitetura de estudo de caso ou resolução de proble-ma; arquitetura de aprendizagem incidente e arquitetura de ação simulada, a primeira foi eleita como modelo princi-pal para a proposta da metodologia.

Nas arquiteturas de projetos de aprendizagem, a pro-blematização é formulada a partir de “certezas provisórias” e de “dúvidas temporárias”. Segundo os autores, “as cer-tezas para as quais não se conheça os fundamentos que a sustentem são denominadas de provisórias. As dúvidas são sempre temporárias. O processo de investigação consiste no esclarecimento das dúvidas e na validação das certezas” (Carvalho; Nevado; Menezes, 2007, p. 41).

6 Entendida como “inteligência distribuída por toda a parte incessantemente valorizada, coordenada em tempo real, que resulta em uma mobilização efetiva de competências. [...] a base e o objetivo da inteligência coletiva são o reconhecimento e o enriquecimento mútuo das pessoas, e não o culto de comunidades fetichizadas ou hipostasiadas” (LÉVY, 2003, p. 30).

7 Conforme Lévy (1993, p. 25), “o hipertexto não dá conta somente da co-municação, mas dos processos sociotécnicos que, assim como vários outros fenômenos, têm uma forma hipertextual”.

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A proposta tem semelhança com o “Projeto de Aprendi-zagem”, pois parte de um “tema problema” que tenha signi-ficado e que interesse aos sujeitos participantes do proces-so. Por fim, torna-se fundamental a criação de um suporte onde os sujeitos, individualmente ou em grupo, possam pu-blicar os conhecimentos construídos, tendo em vista as dú-vidas e incertezas, momento em que as tecnologias digitais são fundamentais e estratégicas.

Dentro da dinâmica das AP, é possível perceber que seu funcionamento demanda novas habilidades e compe-tências dos sujeitos do processo de aprendizagem, até então baseado na transmissão da informação, na lógica vertica-lizada professor-aluno e na limitação espaçotemporal dos limites físicos da escola. Tais habilidades e competências são elementos fundantes da teoria conectivista.

O conectivismo

Uma vez que a tecnologia determina os rumos da so-ciedade e transforma vários aspectos de sua estrutura, a forma como nos comunicamos e aprendemos também é, em alguma medida, transformada. Assim, é fundamental que se busquem novas propostas metodológicas e teóricas que tratem do processo de aprendizagem em um mundo digital, que pensem o conhecimento imbricado ao uso de tecnolo-gias, levando em consideração os novos ambientes sociais de aprendizagem. Ponderando esses aspectos, George Sie-mens propôs uma teoria de aprendizagem denominada “co-nectivismo”. Segundo o autor, “conectivismo é a integração de princípios explorados pelo caos, rede, e teorias da com-plexidade e auto-organização […]. A aprendizagem (defini-da como conhecimento acionável) pode residir fora de nós mesmos (dentro de uma organização ou base de dados), é

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focada em conectar conjuntos de informações especializa-dos, e as conexões que nos capacitam a aprender mais são mais importantes que nosso estado atual de conhecimento” (2004, p. 4).

Nessa perspectiva, considera-se que algumas das prin-cipais teorias de aprendizagem, como, por exemplo, o cons-trutivismo, o behaviorismo e o cognitivismo, foram desen-volvidas em um tempo distante da influência da tecnologia, portanto insuficientes para que, sozinhas, sirvam de mode-lo para toda a complexidade que envolve a aprendizagem na atualidade.

Assim, existem alguns conceitos-chave que norteiam o conectivismo e que são fundamentais para compreen-dermos o processo de aprendizagem a partir desta teoria. Segundo Siemens (2004, p. 7), essas premissas são: apren-dizagem e conhecimento apoiam-se na diversidade de opi-niões; aprendizagem é um processo de conectar nós especia-lizados ou fontes de informação; aprendizagem pode residir em dispositivos não humanos; a capacidade de saber mais é mais crítica do que aquilo que é conhecido atualmente; é necessário cultivar e manter conexões para facilitar a aprendizagem contínua; a habilidade de enxergar conexões entre áreas, ideias e conceitos é uma habilidade fundamen-tal; atualização (“currency” – conhecimento acurado e em dia) é a intenção de todas as atividades de aprendizagem conectivistas; a tomada de decisão é, por si só, um processo de aprendizagem.

Diariamente muitas informações nos cercam e já não podemos internalizar tudo aquilo que recebemos e que po-deria servir a processos de aprendizagem. Por isso a capa-cidade de “valorar a informação”, bem como de “estabelecer conexões entre elas” são fundamentais para a aprendiza-gem na era digital. Assim, uma experiência em rede tor-

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na-se o foco principal da aprendizagem, pois na interação com outras pessoas, e partindo da sua própria experiên-cia, pode-se aprender mais e gerar conhecimentos. Nessa linha, Mota (2009, p. 7) acrescenta: “A nossa capacidade de aprender o que precisamos para amanhã é mais importan-te do que aquilo que sabemos hoje e é por isso o verdadeiro desafio para qualquer teoria da aprendizagem, é ativar o conhecimento do ponto de aplicação.”

O conectivismo, enquanto teoria em construção, apre-senta muitos pontos de convergência com as questões levan-tadas no projeto mutirão, com a dinâmica das arquiteturas pedagógicas e com as demandas existentes aos processos educativos na contemporaneidade.

Os elementos constituintes da metodologia proposta

Considerando os aspectos relacionados à presença e à importância da tecnologia no mundo contemporâneo, em especial na educação, evidencia-se a importância da exis-tência de metodologias que contemplem as premissas da inclusão digital. Já é conhecido que a dinâmica instituída em sala de aula não dá conta da multiplicidade de possibili-dades dos ambientes informatizados e que, quando imposta uma sobre a outra, invariavelmente leva à frustração de professores e alunos. Nesse sentido, apresenta-se como re-ferência a metodologia criada para as oficinas de informáti-ca e cidadania do projeto Mutirão pela Inclusão Digital da Universidade de Passo Fundo.

No projeto, todo ano é definido um tema gerador cons-truído a partir do planejamento da escola e do grupo de trabalho do mutirão para, posteriormente, incorporar os interesses e o contexto onde os alunos estão inseridos, de-

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tectado a partir da discussão entre os alunos. A proposta metodológica propõe, inicialmente, aspectos presentes na pedagogia da pergunta, na qual os alunos são incentivados a descobrirem o tema gerador através do diálogo, tão enfa-tizado por Freire e como forma de expressão, autonomia e protagonismo, pressupostos das AP. O tema gerador con-sidera elementos presentes na arquitetura de projetos de aprendizagem, porém, há também a possibilidade de ade-quar-se com a arquitetura de estudo de caso ou resolução de problema, pois ambas partem de um tema de interesse do grupo.

Dentro do tema gerador são definidos subtemas a par-tir do que os alunos têm curiosidade em saber. Uma vez que quatro turmas participam das oficinas concomitantemen-te, cada oficina deve trabalhar uma temática diferenciada dentro do tema gerador para que, ao término das ativida-des, cada grupo apresente sua produção aos demais. A ideia inicial é que os alunos, em suas respectivas salas, sociali-zem suas produções com as demais turmas através de uma videoconferência ou de outra forma de comunicação media-da pela tecnologia. Como cada turma é formada por grupos de habilidade, esses deverão discutir e entrar num acordo sobre o que é importante fazer parte da apresentação aos demais colegas.

Nessas premissas gerais foram consideradas as con-cepções de “arquitetura pedagógica”, presente na dinâmica de projetos, sendo que as questões do “conectivismo” são tratadas mais diretamente dentro das turmas e no decor-rer do desenvolvimento das atividades. Em cada turma são formados grupos de habilidade que deverão trabalhar, den-tro do subtema, com um formato de mídia e ferramentas diferenciadas, como, por exemplo, vídeo, áudio, imagem e (hiper)texto.

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É importante salientar que mesmo com o direciona-mento inicial dos alunos aos grupos pelo professor, são os alunos quem decidirão, no interior dos grupos, o caminho a ser percorrido para o desenvolvimento dos desafios e ativi-dades propostas. Ao trabalhar em grupos, haverá a existên-cia de diferentes atividades e níveis de desenvolvimento e complexidade em um mesmo espaço.

A metodologia adotada pelo projeto de Inclusão Digital propõe cinco oficinas para adaptação dos alunos, ou práti-cas iniciais, que antecedem as práticas mensais e tem por objetivo ambientar os participantes ao projeto, ao funciona-mento das oficinas e às ferramentas e ambientes digitais essenciais para o desenvolvimento das atividades do ano. Os professores das instituições que acompanham os alunos são incumbidos de fazerem postagens no blog do professor8 partindo de suas percepções das oficinas e do projeto como um todo. Tal estratégia busca o envolvimento do professor no processo de construção de competência tecnológica e de refinamento da metodologia.

Buscando implementar uma dinâmica baseada na pe-dagogia de projetos constituinte da AP, as práticas mensais serão constituídas por uma sequência de três modalidades de oficinas que se repetem no decorrer do ano e de acordo com a evolução das turmas, a saber: conhecendo, construin-do/compreendendo e socializando.

Na modalidade “conhecendo”, a metodologia propõe uma sondagem dos conhecimentos prévios do subtema, partindo de discussões com o grande grupo por meio da proposta de perguntas que desafiam os participantes a ofe-recer respostas de acordo com os grupos de interesse. Ao final se prevê a postagem de uma “síntese da oficina” que

8 Disponível em: http://mutiraodigital2011professores.blogspot.com/

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será construída através da participação dos grupos no blog dos alunos.9

A proposta evidencia a pedagogia da pergunta, em que os participantes partem de uma investigação para a identificação de novidades sobre o tema, sendo a discus-são do grupo fundamental, pois possibilita a socialização e a cooperação entre os sujeitos para o esclarecimento de uma questão. A pesquisa, conforme sugerido na metodolo-gia, tem foco nas certezas provisórias e dúvidas temporá-rias, como também na captação de informações a serem, posteriormente, validadas pelo grupo. Já a síntese prevê a publicação e o registro, a partir da utilização do suporte telemático, das aprendizagens, dúvidas e da diversidade de opiniões, evidenciando a capacidade dos alunos de transfor-mar informações em conhecimento.

No que se refere ao aporte do conectivismo, é possí-vel apontar que essa modalidade busca desenvolver a “ca-pacidade de saber mais” que, segundo a teoria, “é mais importante do que aquilo que se soube em determinado momento”. Aqui, as respostas dadas pelos alunos deverão ser validadas, discutidas e aprimoradas, o que possibilita a pesquisa, a troca de saberes e, por conseguinte, a cons-trução de novas hipóteses em conjunto com os colegas que pertencem ao mesmo grupo, fazendo uso das “diferentes opi niões”, o que os levará a “conectar nós e fontes de infor-mação especializadas”, no caso os colegas, os professores e sites específicos. Nesse processo, é fundamental a “ma-nutenção dessas conexões”, pois a todo momento terão que revisitar os contatos estabelecidos.

As oficinas da modalidade construindo/compreenden-do terão a duração de dois ou mais encontros, uma vez que envolve autoria utilizando as tecnologias digitais. A meto-

9 Disponível em: http://mutiraodigitalalunos2011.blogspot.com/

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dologia tem por base o trabalho de grupos de habilidade e interesse, sendo que, preliminarmente, se propõe a organi-zação das crianças por grupos envolvendo vídeo, áudio, tex-to e imagem. Esses grupos trabalharão com foco no subitem definido, utilizando ferramentas presentes no computador e na internet. É importante destacar que no decorrer do ano os alunos participarão de um rodízio entre os grupos a fim de que todas as diferentes possibilidades sejam experi-mentadas por todos.

Nesse momento o trabalho se concentra na interação e cooperação entre os sujeitos pertencentes ao mesmo grupo. No entanto, a autoria se sobressai, pois será um grupo com-posto de construções individuais, evidenciando e fomentan-do o protagonismo, objetivando a composição de um traba-lho coletivo, tendo presente a diversidade de opiniões e o desenvolvimento de habilidades que se evidenciarão ao de-correr das oficinas. Esse processo apresenta aspectos pre-sentes em uma arquitetura de ação simulada, “aprender a fazer fazendo”, onde a experiência é fundamental.

Nesses momentos, em virtude de que as atividades ocorrerão em grupo, a diversidade de opiniões é fundamen-tal para a execução e desenvolvimento da atividade pro-posta. Além disso, toda a experiência adquirida por par-te dos alunos será fundamental para essa etapa, em que precisarão “ver conexões entre áreas, ideias e conceitos”. Uma vez que muitos dos conhecimentos construídos em ofi-cinas anteriores deverão ser constantemente revisitados, a capacidade apontada pelo conectivismo de “atualizar essas informações” também é fundamental, pois as informações antigas podem não ser suficientes para o desenvolvimento da atividade e a construção do conhecimento.

Os encontros da modalidade “socializando” são orien-tados para a apresentação da produção do grupo aos de-

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mais grupos através de ferramentas de comunicação sín-crona. Aqui a tomada de decisão será essencial, pois não poderão socializar tudo aquilo que fizeram tendo de fazer opções e negociações internas, levando em consideração as condições e as transformações que floresceram no decorrer da oficina. Assim, o princípio conectivista de valorar as in-formações até agora adquiridas é fundamental para que se-jam criadas e desenvolvidas possibilidades de apresentação e socialização do conhecimento gerado.

Aqui se tornarão evidentes as características e habi-lidades desenvolvidas no decorrer do processo, bem como suas capacidades de interação, socialização, transformação de informação em conhecimento, suas produções em ter-mos de protagonismo, cooperação entre o grupo, expressão, interlocução e investigação. Esses são aspectos fundantes das arquiteturas pedagógicas e que exigem as capacidades e habilidades propostas pelo conectivismo e exercitadas no decorrer do processo.

Considerações finais

A partir do processo de construção da metodologia para as oficinas de informática e cidadania do projeto Mutirão pela Inclusão Digital da Universidade de Passo Fundo, é possível apontar a pertinência das arquiteturas pedagógi-cas e da teoria conectivista no atendimento das demandas socioeducacionais contemporâneas.

As AP, enquanto alternativa metodológica, possuem um grande potencial de ressignificação da informática educativa, bem como pode dar resposta às dificuldades en-contradas por professores no processo de apropriação dos recursos tecnológicos em suas propostas didáticas, decor-rentes, em grande parte, do recorrente engessamento das

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tecnologias à lógica de sala de aula e à forma periférica com que as tecnologias são estudadas no processo de formação das licenciaturas. É importante destacar que o papel das tecnologias nas AP é de meio, não de fim, servindo à comu-nicação, reflexão e socialização do conhecimento.

Com relação ao conetivismo, embora seja uma teoria em construção em função de sua recente formulação, traz importantes contribuições acerca de aspectos relaciona-dos à dinâmica da construção do conhecimento em rede. A teoria conectivista leva em consideração os novos espaços de aprendizagem, o novo aluno e suas demandas, o que não deve ser desconsiderado em propostas didático-pedagógicas em ambientes informatizados. É preciso pensar na teoria do conectivismo não como a resposta definitiva aos proble-mas didático-pedagógicos dentro dos laboratórios de infor-mática, mas, sim, como uma alternativa teórica válida para práticas de inclusão digital e, possivelmente, de informáti-ca educativa.

Ao construir a metodologia para as oficinas de infor-mática e cidadania com base nos elementos apresentados neste artigo, foi possível verificar a estreita ligação exis-tente entre o conceito de inclusão digital do Mutirão pela Inclusão Digital, a potencial dinâmica das arquiteturas pedagógicas e as premissas do conectivismo, relação que deve ser avaliada e validada em pesquisas e reflexões pos-teriores.

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professores: um estudo de caso1

Karina Marcon Adriano Canabarro Teixeira

Localizando o estudo

sta pesquisa surgiu em razão das discussões exis-tentes no Grupo de Estudos e Pesquisa e Inclusão Digital, do curso de Ciências da Computação da Universidade de Passo Fundo. Após um projeto rea lizado pelo grupo, em parceria com a Prefeitura

Municipal de Passo Fundo, chamado “Formação Docente”, como exercício inclusivo de autoria colaborativa – que teve por objetivo propor, desenvolver e verificar a potencialidade de uma metodologia de formação docente baseada no con-ceito de inclusão digital –, sentiu a necessidade de acompa-nhar quais foram as mudanças ocorridas na prática dessas escolas cujos docentes eram participantes.

Este foi um projeto piloto desenvolvido com professo-res de escolas da rede de ensino municipal de Passo Fundo,

1 Este artigo é o resumo da dissertação de mestrado realizada pela aluna Karina Marcon, com a orientação do professor Dr. Adriano Canabarro Tei-xeira, publicado no XXI Simpósio Brasileiro de Informática na Educação (SBIE), 2010.

E

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Inclusão digital como base metodológica na formação de professores: um estudo de caso

implementado em novembro de 2006, por meio de um curso de 180 horas, composto por cinco módulos. Com vistas a fo-mentar uma apropriação criativa das tecnologias, os módu-los previam, além da utilização do Kelix,2 das ferramentas da internet e do pacote BrOffice, a construção de projetos de aprendizagem que pudessem explorar as possibilidades que um laboratório de informática pode propiciar na escola.

Este estudo de caso visou contribuir com a totalidade desse projeto maior através de uma pesquisa de natureza exploratória, realizada por meio de observações simples, questionário qualitativo e entrevistas estruturadas. Lüdke e André (1986, p. 22) consideram que dentro da concepção de estudo de caso que pretende “não partir de uma visão predeterminada da realidade, mas apreender os aspectos ricos e imprevistos que envolvem uma determinada situa-ção”, a fase exploratória é fundamental para uma definição mais precisa do objeto que está sendo estudado. Por isso, a pesquisa teve o objetivo de demonstrar o panorama da inclusão digital nas escolas participantes, sem, entretanto, deter-se na análise de elementos específicos, visto que a ne-cessidade de entender o contexto geral era maior do que a compreensão de elementos isolados.

Quando se fala em pesquisa de caráter exploratório, é imprescindível compreender que esta é desenvolvida “com o objetivo de proporcionar visão geral, de tipo aproxima-tivo, acerca de determinado fato” (Gil, 1999, p. 43). Além disso, a fase exploratória é considerada como uma “visão de abertura para a realidade, tentando captá-la como ela é realmente, e não como se quereria que fosse [...]” (Lüdke; André, 1986, p. 22).

O estudo foi realizado tendo como referência a esco-lha de uma turma do ensino fundamental – séries iniciais

2 Disponível em: http://www.kelix.upf.br

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de cada escola, que recebeu uma visita da pesquisadora, com o objetivo de aproximar-se da realidade do processo de apropriação das TRs. As turmas que foram observadas va-riam entre 3ª e 4ª série. Optou-se por fazer uma observação simples das atividades que foram realizadas no laborató-rio, sendo que, por observação simples, “entende-se aquela em que o pesquisador, permanecendo alheio à comunidade, grupo ou situação que pretende estudar, observa de manei-ra espontânea os fatos que aí ocorrem” (Gil, 1999, p. 111). As observações tiveram por objetivo reconhecer as formas como o professor responsável conduzia a aula e de que for-ma as atividades pressupunham a participação e o protago-nismo da criança diante das TRs.

Em relação às entrevistas estruturadas aplicadas aos diretores, professores, monitores e alunos, destaca-se que, embora se tenha conhecimento de que comumente não é um recurso próprio de pesquisas exploratórias, optou-se pela sua utilização, uma vez que “se desenvolve a partir de uma relação fixa de perguntas, cuja ordem e redação permanece invariável para todos os entrevistados, que geralmente são em grande número” (Gil, 1999, p. 121).

O questionário aplicado à diretora (ou à vice-direto-ra) objetivava perceber a visão da gestão de cada escola, buscando identificar a concepção de informática educativa adotada na instituição. Já para o professor responsável, a entrevista foi realizada buscando saber a dinâmica do labo-ratório e as concepções dele sobre informática na educação. Para o monitor responsável pela parte técnica foi realizada uma entrevista com vistas a perceber sua visão sobre au-las. Um aluno de cada escola também foi entrevistado com a intenção de averiguar sua concepção sobre as tecnologias, de que forma estava acontecendo a apropriação destas e qual estava sendo a postura dos educandos frente às TRs.

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Por fim, é possível apontar que este estudo, na medi-da em que busca conhecer os desdobramentos do processo de formação de professores da rede municipal de ensino de Passo Fundo, objetiva contribuir diretamente com as dis-cussões referentes à formação de recursos humanos para a informática na educação, tema sempre recorrente nesses mais de vinte anos de informática educativa, mas que em razão da popularização dessas tecnologias nas escolas e do dinamismo com que tais aparatos se desenvolvem, deveria figurar como uma das prioridades nessa estratégica área para a educação brasileira.

A lógica Broadcast e a dinâmica das redes na sociedade contemporânea

Por entender que a sociedade contemporânea tem pro-fundas relações com as tecnologias digitais, torna-se im-prescindível pensar em processos de apropriação crítica dessas tecnologias, explorando, assim, o conceito de inclu-são digital que permeia este estudo. Entende-se que na di-nâmica da globalização estrutura-se uma sociedade regida pelas leis do mercado, que possui o aporte das mídias, in-duzindo as pessoas ao consumo, à passividade e à reprodu-ção. Ao referir-se a essa dinâmica, Lemos (2004) afirma que “a divulgação cultural massiva précibercultura, com raras exceções, fica nas mãos daqueles que controlam os meios de comunicação, fonte de poder político, de prestígio e de influência sobre o que é ou não dito às massas. Controlar os mass media é controlar a opinião das massas, barrar a diversidade cultural e forjar uma identidade essencialista, purista e imutável”.

Assim, acredita-se que as TRs não podem ser consi-deradas uma evolução de suas antecessoras, uma vez que

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as anteriores são baseadas na massificação e na lineari-dade do fluxo de informações. A internet é compreendida como uma tecnologia de rede e, uma vez que incorpora ca-racterísticas da lógica reticular (Castells, 2005), assume o caráter de revolução, e não uma evolução dos suportes comunicacionais. Surge, então, uma nova relação da so-ciedade com as TRs, a cibercultura, caracterizada como “a cultura contemporânea marcada pelas tecnologias digi-tais” (Lemos, 2003). Potencialmente, possibilita a intera-ção com processos comunicacionais que superam os meios convencionais, pois potencializam a abertura dos polos de emissão de mensagem. Assim, é importante ressaltar que não basta ter o acesso às TRs, é necessário haver um acesso criativo e qualificado. Com a lógica das redes, o indivíduo é chamado a superar a postura de consumidor, assumindo um papel de agente ativo na construção do conhecimento, partindo de uma dinâmica de autoria e participação.

Portanto, processos de inclusão digital devem ser en-tendidos como a apropriação crítica e criativa das TRs numa dinâmica de colaboração e comunicação. A inclusão digital assume papel fundamental para o exercício da cidadania na cibercultura, direcionando a uma dinâmica de imbrica-mento das TRs com processos educativos, visando também numa dimensão macro processos de inclusão social. Nesse sentido, inclusão digital pode ser entendida como “um pro-cesso horizontal que deve acontecer a partir do interior dos grupos com vistas ao desenvolvimento de cultura de rede. Numa perspectiva que considere processos de interação, de construção de identidade, de ampliação da cultura e de va-lorização da diversidade, para, a partir de uma postura de criação de conteúdos próprios e de exercício da cidadania, possibilitar a quebra do ciclo de produção, consumo e de-pendência tecnocultural” (Teixeira, 2005, p. 30).

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Faz-se necessário, assim, compreender que essa si-tuação de proximidade instituída pelas TRs pode levar à potencialização de processos de aprendizagem, entendidos como vivências baseadas na interação, na comunicação e na reflexão.

Inclusão digital e processos educativos

Por entender que “a função fundamental da aprendi-zagem humana é interiorizar ou incorporar a cultura, para assim fazer parte dela” (Pozo, 2002, p. 25), ao perceber a dinâmica social contemporânea, o sujeito depara-se tam-bém com a cultura atravessada pelas tecnologias digitais. Essa situação potencializa o estabelecimento e a vivência do diálogo, estimulando processos comunicacionais recípro-cos, como aponta Freire (1988, p. 67): “A comunicação [...] implica numa reciprocidade que não pode ser rompida [...]. Dessa forma, na comunicação, não há sujeitos passivos. Os sujeitos co-intencionados ao objeto do seu pensar, se comu-nicam seu conteúdo. O que caracteriza a comunicação en-quanto este comunicar comunicando-se, é que ela é diálogo, assim como o diálogo é comunicativo”.

A reciprocidade, dessa forma, é indispensável para o es-tabelecimento da educação como um processo comunicativo e dialógico, bem como para a concretização dos processos comunicativos capazes de estabelecer esse diálogo idealiza-do por Freire. Diante disso, as práticas educacionais preci-sam ser pensadas como formas por meio das quais o sujei-to seja estimulado a participar ativa e significativamente de processos de construção do conhecimento. Tais práticas também devem servir para que o indivíduo compreenda as demandas de aprendizagens existentes na atualidade.

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Diante disso, por acreditar que aconteceram significa-tivas mudanças culturais na aprendizagem como consequ-ência da evolução das tecnologias da informação e da pró-pria organização social do conhecimento, Pozo (2002, p. 111) ainda menciona que

as novas tecnologias da informação, em vez de nos escravizar e nos submeter a suas ocas rotinas, como supunham alguns negros presságios e ainda acredita muita gente, multiplicam nossas possibilidades cognitivas e nos permitem o acesso a uma nova cultura da aprendizagem. Essas novas tecnologias não po-deriam ser usadas e menos ainda planejadas se a mente huma-na não tivesse sido dotada com a inestimável ajuda da seleção natural, de alguns processos de aprendizagem que permitem mobilizar, ativar nossos sistemas de memória com uma eficácia realmente extraordinária.

É possível verificar uma significativa relação entre as tecnologias digitais e essa mudança nos processos de aprendizagem. Os processos educativos imbricados a essa nova situação social estabelecem o saber como um resul-tado de construção individual ou coletivo, que é mediado a partir dessa interação existente no ciberespaço. Sobre uma pedagogia intrínseca às novas tecnologias, Serpa (2004,

p. 173) ressalta alguns indicadores:

[...] dessa lógica e dessa pedagogia: não há centro – os proces-sos, conforme as condições, têm uma centralidade instável. Ora o professor é o centro, ora o aluno, ora outro ator diferente de professor e aluno [...]. Participação necessária – todo sujeito, para vivenciar o processo pedagógico, tem de participar na rede, sendo impraticável um mero assistir. Processos coletivos necessários – sendo uma dinâmica de rede e necessitando da participação de todos, a produção é necessariamente coletiva. Cooperação como traço fundamental – para o sistema de rede funcionar, os participantes necessariamente têm que colaborar.

A mobilidade dos centros possibilitada pelas TRs pode vir a contribuir significativamente no processo ensino-

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-aprendizagem, pois estabelece uma condição de troca, co-operação e interação, que devem ser idealizadas na apro-priação das tecnologias.

As constatações realizadas teoricamente demonstram claramente que as tecnologias digitais de rede possuem ca-racterísticas que podem potencializar significativamente o processo de aprendizagem. Entretanto, é preciso que se reconheça que o papel do professor neste contexto é estra-tégico e fundamental e que é urgente que este profissional possa compreender o potencial intrínseco aos aparatos tec-nológicos contemporâneos, elemento motivador e constante no processo de formação realizado junto aos professores das escolas municipais de Passo Fundo.

Dessa forma, após o período de formação, consolidou--se a demanda por reconhecer os desdobramentos de tal proposta, relato realizado na sequencia.

A realidade da inclusão digital em dez escolas de Passo Fundo

Primeiramente é preciso ressaltar que em três escolas a visita não pôde ser realizada. Na primeira, o servidor de acesso à internet estava com problemas. Na segunda, esta-va em teste uma versão atualizada do Kelix e, por isso, as máquinas não ligavam. Na terceira, a professora que parti-cipou do curso de Formação Docente teria saído da escola, por isso as séries do ensino fundamental não estavam, até então, utilizando o laboratório por faltar uma pessoa capa-citada para conduzir o trabalho.

No total foram entrevistados quatro sujeitos de cada escola visitada, totalizando 28 participantes da pesquisa. Os resultados obtidos nessas outras sete escolas foram divi-didos em sete categorias. A primeira diz respeito à formação

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dos participantes vinculados diretamente ao laboratório de informática. Percebeu-se que não existia uma formação específica: os professores eram graduados em Pedagogia, Ciências Biológicas, Química, Geografia, o que demonstra que informática educativa é uma área multidisciplinar e que está sendo assumida por todos. Nas sete escolas visi-tadas, apenas um professor não tinha participado do curso de Formação Docente. A segunda categoria diz respeito à dinâmica de uso do laboratório. Percebeu-se que em quatro escolas existia certa ociosidade na utilização do laboratório de informática, decorrente de falta de monitores para aten-der toda demanda da escola. Das sete escolas visitadas, em cinco os horários de cada turma no laboratório são fixos, sendo que as crianças vão ao laboratório semanalmente. Nas outras duas, os horários funcionam por agendamento. Acredita-se que a prática do uso do horário fixo para ir aos laboratórios, adotada por cinco escolas, é mais adequada aos objetivos da informática educativa, tendo em vista que para muitas crianças o uso de computadores só acontece na escola ao ser estabelecida uma visita semanal ao laborató-rio, garantido-lhes ao menos esse contato. Em relação ao uso facultativo, por meio de agendamento, acredita-se que os mais prejudicados são os alunos, pois dependem da ini-ciativa dos professores, o que muitas vezes não ocorre, seja pelo receio em utilizar a máquina, seja pela inabilidade em relação ao manuseio.

A terceira categoria traz uma estimativa quantitativa da frequência dos alunos ao laboratório. O total de alunos das sete escolas é de 3.080. Apenas em uma escola todas as turmas utilizavam o laboratório semanalmente, totalizan-do, aproximadamente, 160 alunos. De outras cinco escolas, que tinham mais de 2.070 alunos, cerca de 960 utilizavam o laboratório, sendo que os demais estavam privados desse

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espaço da escola por falta de monitor. Na sétima escola, com mais de oitocentos alunos, cerca de duzentas crianças utilizavam o laboratório por semana, pois funcionava por agendamento. Após as visitas às escolas, é possível apontar que apenas 50% das crianças estão utilizando os laborató-rios.

A quarta categoria aborda a importância da informá-tica educativa para os educadores. Percebeu-se que todos acreditam na informática educativa como um elemento que pode contribuir significativamente nos processos de apren-dizagem.

Eu sempre penso da seguinte forma: que a nossa educação em relação à tecnologia ainda está mal e mal engatinhando, se compararmos aos outros setores. Eu acredito que se a educa-ção, principalmente a brasileira, está tendo os resultados que ela deveria ter, é por esse atraso também. Não apenas pelo fato da sociedade não contribuir, essas coisas [...]. Porque se você for ver em outros setores, por exemplo, o industrial, há quantos anos que a tecnologia já está? E as escolas, quando é que começaram a ter essa tecnologia? Praticamente agora, nos dois ou três últimos anos... (P01).

Em todas as falas dos docentes, notou-se a existência de um fio condutor, que é, também, harmônico ao que o grupo de pesquisa propôs quando do processo de formação. Essa categoria ainda abriu duas outras subcategorias: uma relativa aos desafios para o trabalho com os computado-res, na qual se concluiu que questões técnicas são as mais preocupantes; a outra relacionada a possíveis formas de qualificação da ação docente nos laboratórios. As respostas basicamente dizem respeito à necessidade de ruptura do paradigma tradicional de educação para a criação de um novo modelo baseado numa estrutura horizontal, à necessi-dade de melhoria da estrutura física e à questão da amplia-ção do número de máquinas.

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A quinta categoria traz as percepções sobre as TRs por professores e alunos. As falas dos professores apontam questões relativas à situação de imersão tecnológica em que está se vivendo, a inovação e o avanço da escola ao partici-par dessa nova dinâmica e a necessidade de familiarização com a linguagem digital:

Todas as pessoas deveriam entrar em contato com as novas tec-nologias; porque a informática, hoje, tá em tudo. Ela nos cerca de uma maneira que tu fica pensando... De repente tu vai ao mercado, ela tá lá; tu vai ao posto de gasolina, ela tá lá. e então, não tem onde a informática não está inserida no contexto con-temporâneo... tudo é informática e quem não souber navegar numa internet, digitar um texto, trabalhar com uma planilha eletrônica, trabalhar com arquivos, renomear, trabalhar de for-ma prática, não só o nosso aluno, mas todos, será considerado um analfabeto, como era antigamente, só que hoje esse analfa-beto seria um analfabeto digital (P02).

Em relação à percepção das TRs por alunos, a maioria relaciona os conhecimentos em informática com seu futuro profissional. Somente uma aluna possuía internet em casa, por isso seu pensamento foi além dos colegas:

Quando a gente mexe no computador, a gente descobre um mon-te de coisa nova, a gente pode fazer o que a gente bem querer, né, a gente pode jogar, pode fazer texto, a gente pode descobrir um monte de coisa. Pra mim é tudo! (A07)

A sexta categoria traz a relação das TRs com os pro-cessos educativos. Percebeu-se pouca relação do laborató-rio com os projetos desenvolvidos pelas escolas, uma vez que somente três escolas realizavam essa vinculação. Essa categoria ainda foi subdividida em outras duas: uma com relação aos aspectos positivos das TRs, numa visão da ges-tão, que, basicamente, entendem o laboratório como um elemento pedagógico auxiliador, que proporciona envolvi-mento e participação do aluno e da comunidade na dinâmi-

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ca escolar, que desperta o desejo de pesquisa, proporciona o desenvolvimento da linguagem e fornece um sentimento de pertencimento da escola nessa inclusão. A outra subcate-goria aponta aspectos negativos das TRs, também na visão da gestão, especialmente no que diz respeito a questões de ordem técnica, à infraestrutura, à facilidade de copiar e co-lar trabalhos, o acesso à pornografia, a falta dos monitores e o descaso de alguns professores.

Por fim, a sétima e última categoria diz respeito à apro-priação dos computadores pelos alunos. Também foi subdi-vidida, sendo que a primeira subdivisão traz observações de como está sendo o contato dos alunos com os computa-dores. Das sete escolas, percebeu-se que em apenas uma o contato das crianças estava sendo tímido, porque era a ter-ceira vez que frequentavam o laboratório. Nas outras seis, percebeu-se que as crianças tinham liberdade em utilizar o computador, já conheciam a máquina e a manuseavam sem medo, elemento importante para que se apropriem criati-vamente destas. A outra subcategoria traz observações so-bre as formas como os professores propunham e conduziam as atividades e de que forma promoviam a participação e o protagonismo do aluno. Das sete escolas visitadas, em qua-tro os alunos utilizavam somente jogos, sem acesso à inter-net. Em outras duas os alunos utilizavam a internet, mas restritos aos sites autorizados pelos professores, um portal para jogos e sites para pesquisa, respectivamente. Somente em uma escola se pôde perceber que a internet era utilizada como um meio de comunicação. Nesse processo, detectou-se que somente uma turma estava participando efetivamente de um processo com contornos de inclusão digital, enquanto as outras, de certa forma, estavam condicionadas à passivi-dade diante das TRs, limitadas à atividades predetermina-das, não explorando as capacidades da rede.

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Considerações sobre a pesquisa

A verificação da prática escolar após o processo de in-formatização e do projeto de Formação Docente, realizados num âmbito de inclusão digital, contribuiu eficazmente para a identificação de como estão ocorrendo os movimen-tos de apropriação das tecnologias, elemento de extrema importância quando se fala em inclusão digital.

Percebeu-se que houve algumas discrepâncias entre o uso do laboratório planejado pela escola com o uso efeti-vamente observado, pois ocorreram desajustes nas narra-tivas dos sujeitos com a prática de utilização observada. Destacam-se, dentre o que foi observado, a necessidade de criação de estratégias para que o conhecimento gerado no processo de formação seja disseminado nas escolas; a im-portância de políticas públicas de informática educativa com o intuito de ampliar o número de computadores e a conexão nas escolas; a urgência de se oferecer constantes processos de formação docente e, por fim, a necessidade de medidas que oportunizem o contato das licenciaturas, pro-fessores em formação, com essas tecnologias.

Por fim, acredita-se que esta pesquisa pôde fornecer um indicativo significativo da concepção de informática educativa de dez escolas da rede pública municipal e, igual-mente, fornecer um panorama do potencial e da pertinên-cia do conceito de inclusão digital que sustentou o processo de formação docente realizado.

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Inclusão digital como base metodológica na formação de professores: um estudo de caso

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informática educativa nas aulas de geografi a1

Ana Maria de O. Pereira

Adriano Canabarro Teixeira

Introdução

a sociedade contemporânea, conhecida como a “so-ciedade da informação”, é necessária uma apren-dizagem constante e diversificada, em razão do imenso fluxo de informações a qual – a sociedade – é submetida. Essas mudanças estão relacionadas

ao desenvolvimento das tecnologias de informação e de co-municação, que, em consequência de suas características e potencialidades, podem ser grandes colaboradoras no pro-cesso de aprendizagem.

Um dos grandes desafios da educação na atualidade consiste em gerenciar esse grande fluxo de informações e torná-las significativas, utilizando-se de mecanismo para seleção das informações mais adequadas, interagindo com

1 Publicação: International Council for Educational Media, 2011, Aveiro. Old Meets new media in education - Joint Conference, Aveiro: University of Aveiro, v. 1, p. 780–789, 2011.

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estas e com outros sujeitos, a fim de construir o conheci-mento. Nessa perspectiva, entende-se que a escola deve acompanhar as mudanças que acontecem na sociedade na qual está inserida, apropriando-se das ferramentas dispo-níveis para mediar processos de aprendizagem. Para De-lors (1998, p. 89),

a educação deve transmitir, de fato, de forma maciça e eficaz, cada vez mais saberes e saber-fazer evolutivos, adaptados a ci-vilização cognitiva, pois são as bases das competências do fu-turo. Simultaneamente compete-lhe encontrar e assinalar as referências que impeçam as pessoas de ficar submergidas nas ondas de informações, mais ou menos efêmeras, que invadem o espaço público e privados e as levem a orientar-se para obje-tos de desenvolvimento individuais e coletivos. À educação cabe fornecer, de algum modo, os mapas de um mundo complexo e constantemente agitado e, ao mesmo tempo, a bússola que per-mita navegar através dele.

Em razão da rapidez com que as informações circulam, torna-se ainda mais relevante o papel do professor no pro-cesso de construção do conhecimento, entendido como a sis-tematização das informações, juntamente com o aluno, pois as mudanças acontecem e sua contextualização é necessá-ria para que se possa entendê-las.

Na disciplina de geografia, as mudanças também são constantes. Por conta da minha experiência como professo-ra do ensino fundamental, pude constatar as dificuldades encontradas pelos alunos em se inserirem na dinâmica do processo que ocorre no espaço geográfico, percebendo suas implicações para a vida em sociedade.

A geografia é uma disciplina que envolve muitos conteú dos; por isso, é necessário que o aluno possa rela-cionar o que está estudando com o seu cotidiano. Segundo o geógrafo Milton Santos (2002, p. 73), é difícil considerar o objeto de estudo da geografia, pois a objetividade se cria

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fora do homem e se torna instrumento material de sua vida. Assim, é possível afirmar que a geografia “estuda as relações entre o processo histórico que regula a formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza, por meio da leitura do espaço geográfico e da paisagem” (Brasil, MEC, 1998, p. 74). Nesse processo de globalização, os estudos relativos à geografia têm condições de esclare-cer sobre mudanças sociais, físicas e econômicas que estão ocorrendo, apontando o porquê estão ocorrendo e suas im-plicações para a sociedade.

Com o advento das tecnologias de rede (TRs), apresen-tam-se novas oportunidades de mediação do conhecimento geográfico a partir de uma lógica rizomática. Segundo Tei-xeira (2010, p. 19),

as TRs trazem em si características que as diferenciam radi-calmente das demais tecnologias, permitindo apropriação crí-tica, protagonista e contrária à lógica verticalizada das mídias de massa, possibilitando a valorização cultural e o estabeleci-mento de processos de aprendizagem baseados numa cultura de rede. Tal cultura pressupõe processos de autoria horizontais e colaborativos, baseados na comunicação multidirecional e no autorreconhecimento como nó de uma rede, como tal, deve, ne-cessariamente, romper com a lógica da distribuição imposta.

Acreditando nas características das TRs, norteou-se este estudo com o propósito de saber de que forma podem potencializar o processo de construção do conhecimento geográfico. O trabalho foi realizado com crianças do sétimo ano do ensino fundamental no qual se utilizou principal-mente a imagem para a interpretação e a construção do conhecimento geográfico. O sistema de interpretação que serviu como método de pesquisa foi formulado por Robert William Ott no livro Ensinando crítica nos museus e adap-tado às aulas de geografia mediadas pelas tecnologias de rede, denominado Imagem watching. Os alunos basearam

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suas atividades na leitura e interpretação das imagens em diversos ângulos e de diferentes locais a partir de pesquisas no Google Earth.

Aulas de geografi a mediadas pelas tecnologias de rede (TRs)

O método Imagem watching

Essa técnica objetiva incentivar o pensamento crítico a respeito das obras de arte e transformar os conceitos apre-endidos dessa forma crítica voltada à produção criativa na aula de artes (Ott, 1997, p. 128). O sistema é composto por cinco categorias:

a) descrevendo, o aluno faz uma observação profunda e detalhada sobre a obra. O instrutor questiona, com o objetivo de fazer com que os alunos exteriori-zem suas percepções e as partilhem com os outros componentes do grupo, ampliando suas percepções e também realizando a construção colaborativa do conhecimento;

b) analisando, proporciona o conhecimento mais pro-fundo da obra, detalhes, design, formas, que leva-rão à ideia que o artista quer transmitir com a ima-gem;

c) interpretando, considerada pelo autor como uma das mais criativas, pois proporciona ao participante ex-pressar suas emoções por meio da observação. Nes-ta concepção de observação, a interpretação deve ser precedida de subsídios que sirvam como base à compreensão dos sentimentos pessoais elaborados nas categorias a e b – descrevendo e analisando;

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d) fundamentando, diz respeito à parte histórica da obra, através de pesquisas a sob obra, ser a obra em questão, conversas com o artista, leituras em livros, catálogos e também vídeos;

e) revelando, na qual o aluno mostrará o que conhe-ceu da obra, por meio de uma expressão artística. Ele criará uma nova obra a partir do que assimilou nas etapas anteriores.

Cada categoria compreende uma preparação, conheci-da como Thought watching, oportunidade em que o obser-vador é orientado pelo instrutor do museu, por meio de um livro de exercícios elaborado pelo próprio estabelecimento, à interpretação visual e verbal das imagens observadas. Na adaptação para as aulas de geografia, o trabalho foi desen-volvido no laboratório de informática da escola, utilizando--se das TRs, sendo que a preparação para a observação foi orientada pela pesquisadora.

Com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais, tra-balha-se no Brasil, nas séries iniciais do ensino fundamen-tal, o espaço geográfico e as categorias paisagem, território e lugar. Quanto a isso, entende-se que a representação, a comunicação, a investigação, a compreensão e a contextua-lização sociocultural das paisagens são importantes, visto que a paisagem é visual, e não experimental (Brasil, MEC, 1998, p. 102). Portanto, recursos, como imagens, fotos de satélites e mapas, são importantes na elaboração do conhe-cimento geográfico.

Para a leitura de imagens nas aulas de geografia num espaço hipermidiático, o uso das categorias citadas pode proporcionar uma maior interatividade entre aluno / pro-fessor, aluno / aluno, aluno / outros e aluno / conteúdo, visto que o objetivo maior dos estudos é documentar o processo de construção colaborativa do conhecimento. Os questiona-

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mentos, as dúvidas, as conclusões são estimulados a serem socializados entre as pessoas que fazem parte do grupo de estudos e até simpatizantes do assunto, mas que estão em outros locais, geograficamente distantes, mas territoriali-zados num espaço comum a eles, que é o ciberespaço.

Nesse ambiente de leitura não linear, rizomática e com várias opções de interligação foram provocadas nas aulas de geografia algumas aptidões desenvolvidas na proposta Image watching adaptado a este estudo, como citado antes. Para isso foram utilizados os programas Google Earth, Goo-gle Maps, YouTube, Google Docs e outros ambientes que os próprios alunos encontraram. Nesses ambientes, que pro-porcionam a visualização do assunto proposto, a leitura do mesmo é realizada a partir da descrição feita pelo aluno, como a análise das formas, a interpretação, que tem a ver com o que o aluno sente no momento e o que ele já conheceu anteriormente sobre o assunto, por fim, as revelações que ele fará a respeito do que foi visto.

Para a elaboração das sequências didáticas da pesqui-sa, baseamo-nos nos princípios auxiliares da aprendizagem propostos por Pozo (2002):

1) adequar as tarefas conforme a capacidade de aprendizagem de cada aluno, reduzindo as possibi-lidades de fracasso e dando sentido real para o que ele está aprendendo;

2) explicitar ao aluno os objetivos das tarefas e como alcançá-los, orientando-o para que possa utilizar os conhecimentos já adquiridos;

3) avaliar o alcance dos objetivos propostos com o in-tuito de corrigir as dificuldades dos alunos e o su-cesso da estratégia adotada pelo professor;

4) conectar tarefas de aprendizagens com os interes-ses e motivos prévios dos alunos;

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5) incentivar a autonomia do aluno, criando contex-tos de aprendizagens adequados e promovendo ambientes cooperativos de aprendizagem;

6) valorizar os progressos na aprendizagem, pois as expectativas externas ao processo (professores e colegas) motivam o sucesso do aluno.

Nesse sentindo, ainda segundo Pozo (2002), a possi-bilidade que o professor tem de mover seus alunos para a aprendizagem depende, em grande parte, de como ele mes-mo enfrenta sua tarefa de ensinar e aprender ensinando. Entende-se que nesse processo de aprendizagem todos são sujeitos ativos, tanto professor quanto aprendiz, e esse só se efetivará se essas informações provocarem mudanças no que já se obteve em outras oportunidades. O conhecimento é reflexo da estrutura oferecida pelo ambiente, e a escola, como sistematizadora deste, deve acompanhar as mudan-ças que ocorrem com o passar do tempo, do contrário é alto o risco de não ser um local tão atrativo, pois está correndo contra o grande fluxo de inovações tecnológicas que per-meia a vida em sociedade.

Proposta metodológica da pesquisa

Partindo da análise das cinco categorias de interpreta-ção de Ott, foram utilizadas as tecnologias disponíveis na internet para o desenvolvimento das sequências didáticas da pesquisa voltadas à exploração dos aspectos relativos ao relevo. Durante o trabalho, desejava-se observar como a utilização dessa ferramenta contribui na construção do co-nhecimento geográfico dos alunos pesquisados. Tal análise também foi amparada nos processos auxiliares de aprendi-zagem propostos por Pozo.

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Os encontros aconteceram durante cinco semanas, com duas horas de duração, tendo como espaço o laboratório de informática da escola, onde foi desenvolvida uma sequência didática para cada aula, contemplando objetivos, conteúdo e metodologia.

Cada sequência didática foi organizada visando con-templar uma das categorias propostas por Ott (1997) e também os seis princípios auxiliares da aprendizagem pro-postos por Pozo (2002). Como forma de explicitação dessa relação, optou-se por usar o número do princípio no corpo do texto: (1) adequação de tarefas, (2) explicitação dos obje-tivos, (3) conexão de tarefas com os interesses dos alunos, (4) incentivo à autonomia, (5) valorização do progresso e (6) avaliação do alcance dos objetivos.

Em cada uma das aulas buscou-se contemplar uma das premissas de Ott e todos os princípios auxiliares da aprendizagem de Pozo. Na adaptação do sistema de inter-pretação Imagem watching para a geografia, as categorias ficaram organizadas do seguinte modo:

a) descrevendo: o aluno se expressa acerca de tudo o que ele vê nos recursos que está consultando;

b) analisando: analisa-se com mais atenção detalhes, formas, tipo de vegetação, existência ou não de ocu-pação humana e três elementos que não haviam sido observados na etapa anterior (descrevendo);

c) interpretando: implica verificar o que os alunos conseguem expressar sobre as formas de relevo vistas. O pesquisador questiona sobre qual a rela-ção entre o que o aluno observou e o conhecimento adquirido empiricamente, a partir das categorias anteriores (descrevendo e analisando);

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d) fundamentando: organiza-se a partir das pesqui-sas que os alunos farão na web sobre o relevo, com vistas a entender o porquê das diferenças existen-tes;

e) revelando: o aluno expressa suas conclusões sobre os tipos de relevo vistos, utilizando-se de tecnolo-gias como o Google docs para construir um texto colaborativo e também elabora uma apresentação em PowerPoint acerca do conteúdo visto e seu en-tendimento sobre o mesmo.

Com base nos princípios auxiliares da aprendizagem de Pozo, foram definidos alguns critérios para a elaboração das sequências didáticas realizadas no trabalho de campo junto aos sujeitos da pesquisa:

• nível de adequação das tarefas propostas ao conheci-mento e vivência prévios dos alunos;

• utilização dos conhecimentos prévios na resolução das tarefas;

• nível de aderência das tarefas ao conhecimento pré-vio dos alunos;

• manifestação de autonomia dos alunos em relação ao desenvolvimento das tarefas;

• motivação dos alunos em realizar as tarefas propos-tas;

• indicativos de alcance dos objetivos propostos.

Sequência didática

A partir dos elementos propostos por Ott e Pozo, as sequências didáticas ficaram organizadas da seguinte ma-neira:

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Sequência 1

Objetivo

• Verbalizar o conceito empírico que tem sobre relevo;• Visualizar os diversos tipos de relevos existentes;• Expressar-se, por meio de um texto, sobre o que viu.

Conteúdo• Relevo brasileiro.

Metodologia

A aula inicia com uma conversa com os alunos a partir da pergunta “O que é relevo?” (2). Anota-se no quadro tudo o que cada um deles falar sobre seu conceito de relevo (5). Após, os alunos serão orientados pelo professor/pesquisa-dor a navegar na internet e a procurar informações sobre relevo (2). Para a análise do material encontrado, utilizarão o sistema de interpretação denominado Imagem watching, categoria descrevendo. Tais informações foram sistemati-zadas em anotações realizadas em um documento que os alunos registraram em seus computadores (4), o qual foi utilizado nas outras aulas também. Feitas as anotações, cada aluno falará sobre o que conseguiu ver e como relacio-na isso com o que ele já conhecia sobre o assunto (6).

Avaliação

Foi realizada em um documento compartilhado no Google Docs onde os alunos fizeram suas anotações refe-rentes à aula e também sua avaliação sobre a forma como foi desenvolvida a aula e se a dinâmica o ajudou a entender melhor o tema proposto.

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Sequência didática 2Objetivo

• Verificar o que os alunos apreenderam na aula ante-rior sobre o relevo;

• Observar como aconteceu a análise do material dis-ponível na web;

• Verificar o grau de entendimento a respeito do assun-to trabalhado, através da apresentação dos alunos.

Conteúdo

• Tipo de relevo.

Metodologia

Foi realizada uma revisão do que foi discutido na aula anterior, para os alunos retomarem o tema (1 e 4). Após, os alunos procuram, na web, material relacionado ao tema da aula (2). Inicialmente, foram figuras, fotos, filmes. Em seguida, procuraram textos (3). Para a análise do material encontrado, utilizaram o sistema de interpretação denomi-nado Imagem watching, categoria analisando, sendo que o professor/pesquisador orientou os alunos a elencar três elementos que não haviam observado na categoria anterior (descrevendo) (6).

Todos os passos foram registrados pelos alunos no documento aberto na aula anterior, para anotações. Na sequên cia foi feita a apresentação de suas análises através das ferramentas disponíveis nas tecnologias de rede (5).

Avaliação

No documento aberto na aula anterior, no Google Docs, os alunos farão sua avaliação sobre a maneira como foi de-senvolvida a aula e se a dinâmica ajudou a entender me-lhor o tema proposto.

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Sequência didática 3

Objetivo

• Conhecer a classificação do relevo;• Perceber a relação que os alunos estabeleceram en-

tre o conteúdo pesquisado e o conhecimento já adqui-rido por eles.

Conteúdo

• Tipo de relevo.

Metodologia

Realizou-se uma revisão do que foi visto na aula an-terior para os alunos retomarem o tema (1 e 5). Após, eles procuraram, na web, material relacionado ao tema da aula (2). Inicialmente, foram figuras, fotos, filmes e depois, tex-tos. Para a análise do material encontrado, utilizaram o sistema de interpretação Imagem watching, categoria in-terpretando, sendo que o professor/pesquisador os orientou a fazerem a relação entre o que eles observaram e o seu conhecimento empírico (6 e 3).

Todos os passos foram anotados pelos alunos no docu-mento aberto na primeira aula, para anotações. Após, foi realizada a apresentação de suas análises através das fer-ramentas disponíveis nas tecnologias de rede (4).

Avaliação

No documento aberto no Google Docs, os alunos fize-ram a avaliação por escrito da aula, na qual também regis-traram as diferenças que eles constataram entre os tipos de relevo estudados. Por fim, apresentaram as conclusões.

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Sequência didática 4

Objetivo

• Conhecer a classificação do relevo;• Observar as relações que os alunos fazem entre os

tipos de relevo e as diferentes formas de ocupação dos espaços geográficos

Conteúdo

• Tipos de relevo.

Metodologia

Foi realizada uma revisão do que foi discutido na aula anterior, para os alunos retomarem o tema (1 e 5). Após, eles procuraram, na web, material relacionado ao tema da aula (2). Inicialmente, foram figuras, fotos, filmes, e depois, textos. Para a análise do material encontrado, utilizou-se o sistema de interpretação Imagem watching, categoria fun-damentando, sendo que o professor/pesquisador orientou os alunos a exporem o seu entendimento acerca das dife-renças encontradas (6 e 3).

Todos os passos foram anotados pelo aluno no docu-mento aberto na primeira aula, para anotações. Por fim, realizaram a apresentação de suas análises, através das ferramentas disponíveis nas tecnologias de rede (4).

Avaliação

No documento aberto no Google Docs, os alunos reali-zaram a avaliação por escrito da aula, registrando também as diferenças que eles constataram entre os tipos de relevos estudados.

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Uma experiência metodológica para a utilização da informática educativa nas aulas de geografi a

Sequência didática 5

Objetivo

• Observar como ocorreu a construção do conhecimen-to geográfico referente ao relevo, com a mediação das TRs;

• Verificar a opinião dos alunos sobre o uso das TRs nas aulas de geografia;

• Analisar se o uso das TRs auxiliou ou não os alunos a construir e a externalizar o conhecimento.

Conteúdo

• Relevo brasileiro.

Metodologia

No primeiro momento, foi realizada uma conversa com os alunos sobre a mesma pergunta da primeira aula: O que é relevo? (1 e 5). As respostas foram anotadas no quadro. Após, foi discutido com os alunos acerca das conclusões a que chegaram sobre o tema, através dos estudos com o au-xílio da web (2). Cada aluno elaborou um quadro conceitual sobre o assunto, utilizando o documento aberto para as anotações (4). Ao final, cada um apresentou suas conclu-sões sobre o tema desenvolvido (6). Contemplando, assim, a categoria revelando, do sistema de interpretação Imagem whatching.

Avaliação

Foi feita em grupo uma avaliação geral da dinâmica das aulas, do método e da importância percebida pelos alu-nos do uso da web nas aulas de geografia. Após, eles fi-zeram a sua avaliação individual sobre a metodologia das

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aulas, discutindo se a utilização das TRs lhe proporcionou ou não maior conhecimento sobre o tema proposto para as aulas. Isso foi feito por meio de um questionário que a pes-quisadora compartilhou com cada aluno no Google Docs.

Com base nos critérios de observação já citados, elabo-rou-se um relatório de observação, preenchido no decorrer de cada aula. Esse relatório serviu de base para o pesquisa-dor conhecer quais as dificuldades encontradas pelos alu-nos, as facilidades e a partir desta constatação elaborar a próxima aula.

Com base nesse relatório pode-se observar que os alu-nos possuíam uma grande motivação e também interesse pelas aulas de geografia mediadas pelas TRs. As dificulda-des encontradas na utilização da internet eram logo solu-cionadas com o auxílio do colega ou do pesquisador. Ao final de cada aula os alunos anotavam suas conclusões em um documento compartilhado e na última sequência foi reali-zada a apresentação das conclusões de cada um.

Considerações fi nais

A partir da análise dos seis critérios de avaliação, le-vados em conta na realização das sequências didáticas, das respostas do questionário aplicado aos alunos quando da realização da última sequência e também das conversas com eles, para que expusessem suas impressões sobre o assunto desenvolvido e a metodologia utilizada, percebe-se que a utilização das TRs na construção do conhecimento geográfico possibilita ao aluno uma maior interação com o conteúdo estudado, como pode ser observado na declaração de um dos alunos participantes da pesquisa:

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Achei que foi uma aula com aprendizados novos, com coisas que eu não consegui e não soube esclarecer em aula normal. Gostei e quero continuar fazendo e praticando, porque além de me di-vertir, aprendi coisas novas. Assim também não fico só em casa no computador, fuçando em orkut e msn, mas sim em coisa que interessa.

Dessa maneira, a ferramenta que até então servia so-mente para o seu lazer, proporciona-lhe a aquisição de no-vos conhecimentos em geografia e lhe desperta a curiosida-de por novas pesquisas. A integração das novas informações com as adquiridas anteriormente é facilitada quando me-diada pelas TRs, em consequência da destreza com que os alunos as manipulam. Utilizam-se do seu conhecimento em informática para auxiliá-los na construção do conhecimen-to em geografia.

Pode-se observar, quanto a isso, que os alunos tinham bastante facilidade em procurar na web o assunto que esta-va sendo estudado, uma vez que o ambiente é conhecido por eles. À medida que surgiam dificuldades, os alunos solici-tavam a ajuda do colega ou do professor. Quando o assunto girava em torno da utilização da web, normalmente conver-savam entre si por chat. Já quando as dúvidas eram sobre o tema da aula, solicitavam a presença do professor. Assim, constatou-se também a fundamental presença do professor nesse processo de construção do conhecimento geográfico mediado pelas TRs, pois é ele quem detectará possíveis di-ficuldades de interpretação e terá condições de auxiliar no entendimento e na adequação das atividades.

A partir do que os alunos já conheciam sobre relevo, elaboravam seus relatórios no documento compartilhado, ao mesmo tempo em que tiravam as dúvidas que surgiam, sempre utilizando-se dos recursos da web.

Apesar de os alunos estarem acostumados a seguir as orientações do professor nas aulas, a autonomia e a inte-

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Ana Maria de O. Pereira, Adriano Canabarro Teixeira

ratividade que a utilização das TRs de rede proporcionam, transmitem-lhes muita confiança na realização das ativi-dades propostas, motivando-os a procurarem mais infor-mações sobre determinado assunto e a exporem suas con-clusões.

Neste estudo observou-se, no decorrer das aulas, que os alunos ficavam um pouco perdidos no momento em que lhes era proporcionado mais autonomia para construir o co-nhecimento, pois não estavam habituados a isso, em razão da maneira como são desenvolvidas as aulas normalmente, com um só polo de emissão e muitos de recepção. Nas pri-meiras aulas, os alunos perguntavam em que site podiam entrar, se podiam ver filmes, se deveriam procurar textos, mas aos poucos foram se dando conta de que eram eles mes-mos que estavam na direção das suas construções. Então, os questionamentos mudaram, voltando-se às dúvidas refe-rentes ao conteúdo que estavam pesquisando.

Constatou-se, nesse sentido, uma grande motivação por parte dos alunos, desde o momento em que foi apresen-tado o assunto que seria desenvolvido e sobre a maneira como seria trabalhado. É fato que existem muitos alunos que não gostam da disciplina de geografia, especialmente em razão da forma como é desenvolvida nas escolas. En-tretanto, nas aulas desenvolvidas com o auxílio das TRs, os alunos sentiam-se motivados para realizar suas tarefas, pois utilizavam ambientes que conheciam. Uns domina-vam bem a ferramenta, outros nem tanto, mas isso não foi empecilho para a realização do trabalho, pois quando não conseguiam executar alguma atividade sozinhos, comuni-cavam-se com os colegas ou solicitavam a presença do pes-quisador. A motivação era grande também para elabora-rem suas atividades de conclusão e apresentação final, que aconteceu no último dia de aula, onde se buscou de maneira

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Uma experiência metodológica para a utilização da informática educativa nas aulas de geografi a

reticular chegar a algumas conclusões no grupo acerca do conteúdo estudado. Nesse dia, os alunos expuseram o que entenderam, suas dúvidas, as associações que conseguiram fazer e também as curiosidades que a atividade despertou.

Com a análise deste estudo, concluiu-se que a utiliza-ção das TRs como espaço de construção do conhecimento geográfico proporciona ao aluno uma maior integração en-tre os conceitos científicos e o seu dia a dia. Com a possi-bilidade de visualização, são ampliadas as chances de in-terpretação e associação dos conceitos à vivência diária do aluno. Já com a interatividade – uma das características das TRs –, a construção do conhecimento se torna muito mais colaborativa, proporcionando aos alunos mais autono-mia e ao mesmo tempo maior socialização do conhecimento e das ferramentas que tornam esse processo possível.

R eferênciasBRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fun-damental. Parâmetros Curriculares Nacionais: 3º e 4º ciclos do ensino fundamental – geografia. Brasília: MEC/SEF, 1998.

DELORS, J. Educação: um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez; Brasília: MEC; Unesco, 1998.

OTT, R. W. Ensinando críticas nos museus. In: BARBOSA, A. M. (Org.). Arte-educação: leitura no subsolo. São Paulo: Cortez, 1997.

POZO, J. I. Aprendizes e mestres: a nova cultura da aprendiza-gem. Porto Alegre: Artmed, 2002.

SANTOS, M. A natureza do espaço. São Paulo: Edusp, 2002.

TEIXEIRA, A. C. Inclusão digital: novas perspectivas para a in-formática educativa. Ijuí: Unijuí, 2010.

WIKIPEDIA. A enciclopédia livre. Google Earth. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Google_Earth>. Acesso em: 15 out. 2010.

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Sobre os autores

Adriana Demarqui Rossato – Licenciada em Pedagogia pela Uni-versidade de Passo Fundo. Pós-graduanda do curso de Gestão Edu-cacional da Faculdade Federal de Santa Maria. Tem interesse por pesquisas na área de educação e tecnologia, com ênfase em meto-dologias de ensino-aprendizagem para a era digital, bem como em pesquisas voltadas para a inclusão de crianças com necessidades es-peciais no ambiente escolar. Atualmente é monitora de uma turma inclusiva do Colégio Bom Conselho (Passo Fundo - RS). Atua como terapeuta ocupacional de crianças com autismo.

Adriano Canabarro Teixeira – Professor do curso de Ciência da Computação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Uni-versidade de Passo Fundo. Bolsista do CNPq. Mestre em Educação pela Universidade de Passo Fundo. Doutor em Informática na Edu-cação. Pós-Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Pesquisador e autor de livros na área de informática na educação e inclusão digital. Líder do Grupo de Estudo e Pesquisa em Inclusão Digital e coordenador do projeto Mutirão pela Inclusão Digital, ambos da Universidade de Passo Fundo.

Ana Maria de Oliveira Pereira – Professora do curso de Geogra-fia na Universidade Federal Fronteira Sul campus de Erechim. Gra-duada em Geografia pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões. Mestra em Educação pela Universidade de Passo Fundo. Professora da educação básica de escolas particulares por mais de 15 anos. Tem experiência na área de geografia com ênfa-se em Geografia Geral e Metodologia do Ensino da Geografia e tam-bém em Informática Educativa. Atua principalmente nos seguintes temas: metodologias, tecnologias de rede, geografia e inclusão digi-tal. Participa do Grupo de Estudo e Pesquisa em Inclusão Digital.

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Inclusão digital: tecnologias e metodologias

Cristina Fioreze – Graduada em Serviço Social pela Universidade de Caxias do Sul. Mestra em Educação pela Universidade de Passo Fundo. Atualmente é professora do curso de Serviço Social da Uni-versidade de Passo Fundo. Tem experiência na área de serviço social, com ênfase em políticas sociais. Atua principalmente nos seguintes temas: políticas sociais, controle social, serviço social, educação e as-sistência social.

Daiane Grassi – Mestra em Educação, Educação a Distância, Ufrgs. Especialista em Tutoria em EAD, Ufrgs. Especialista em Informáti-ca na Educação, Cinted/Ufrgs. Graduada em Pedagogia Multimeios e Informática Educativa, PUCRS. Professora do curso de especiali-zação em Educação a Distância, Senac-RS. Pedagoga, Senac-RS. Co-ordenadora do curso de especialização em Docência para a Educação Profissional – modalidade a distância, Senac-RS. Professora, Tutora Unisinos Virtual, atual.

Edemilson Jorge Ramos Brandão – Graduado em Formação de Professores pela Universidade Federal do Ceará. Mestre em Educa-ção pela Universidade Federal do Espírito Santo. Doutor em Ciências da Educação pela Universidade Pontifícia Salesiana. Pós-Doutor em Educação, Formação de Professores pela Universidade Federal da Bahia. Atualmente é professor da Faculdade de Educação na Uni-versidade de Passo Fundo. Tem experiência na área de educação, com ênfase em informática educativa. Atua principalmente nos se-guintes temas: software educacional, objetos de aprendizagem, mul-timídia e hipermídia em educação e formação de professores.

Eliana Cristina Dalagasperina – Assistente Social formada pela Universidade do Oeste de Santa Catarina. Mestra em Educação pela Universidade de Passo Fundo. Doutora em Serviço Social pela Pon-tifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Professora da Universidade de Passo Fundo (licenciada).

Henrique Becker – Aluno do curso de Ciência da Computação da Universidade de Passo Fundo. Tem conhecimento básico de webde-sign: XHTML 1.1 (em conformance com os padrões da W3C), PHP, CSS 2.1, Javascript (não obstrutivo) e noções de banco de dados e SQL. Quanto ao desenvolvimento de software, conhece bem C, me-dianamente Java e C++, razoavelmente Bash, basicamente PHP e Javascript, está estudando um pouco de Haskell e Lua, pretende ain-da estudar Python.

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Adriano Canabarro Teixeira, Ana Maria de Oliveira Pereira, Marco Antônio Sandini Trentin (Org.)

Joseane Amaral - Professora do Instituto Federal Farroupilha, campus Panambi. Mestra em Letras, Universidade Federal de Santa Maria. E-mail: [email protected]

Karina Marcon - Doutoranda em Educação (Bolsista CNPq) pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Fede-ral do Rio Grande do Sul, com estudo direcionado para a linha de pesquisa educação a distância. Mestra em Educação. Bacharela em Comunicação Social: Habilitação em Publicidade e Propaganda pela Universidade de Passo Fundo. Tem experiência e interesse de pes-quisa nas áreas de inclusão digital, informática educativa, educação a distância, formação de professores.

Laís Mezzomo – Graduada em Pedagogia Licenciatura Plena pela Universidade de Passo Fundo. Possui interesse por pesquisas em áreas relacionadas à educação e tecnologia, com ênfase para novas metodologias de ensino-aprendizagem para a era digital, bem como pesquisas voltadas para processos inclusivos de crianças portadoras de necessidades especiais no ambiente escolar. Atualmente é profes-sora do Colégio Marista Nossa Senhora da Conceição e Terapeuta ocupacional de crianças com autismo.

Marco Antônio Sandini Trentin – Graduado em Informática pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Mestre em Ciência da Computação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Doutor em Informática na Educação pela Universidade Fe-deral do Rio Grande do Sul. Atualmente é professor Titular III da Universidade de Passo Fundo. Tem experiência na área de ciência da computação, com ênfase em teleinformática. Atua principalmen-te nos seguintes temas: informática na educação, internet, redes de computadores e educação apoiada por computador.

Marie Jane Soares Carvalho – Doutora em Educação, Ufrgs. Es-tágio de Doutorado na University of Toronto. Professora Associada no Departamento de Ensino e Currículo, Faculdade de Educação, Ufrgs. Pós-Doutora, em andamento, junto à Uned/Madrid. Gradu-ada em Pedagogia. Docente nos programas de pós-graduação em Educação e Informática na Educação. Coordenadora do Centro de Formação Continuada de Professores da Educação Básica (Forprof/Ufrgs). Pesquisa: arquiteturas pedagógicas, usos do tempo, formação de professores e educação a distância.

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Inclusão digital: tecnologias e metodologias

Nádie Christina Ferreira Machado – Graduada em Psicologia pela Universidade Católica de Pelotas. Mestra em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Curso de Metodologia Quantitativa da Universidade Federal de Minas Gerais. Doutora em Informática na Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Infor-mática na Educação, Ufrgs, com período sandwich na Universityof Texas at Austin, USA, sob a coorientação do Prof. David Springer, PhD. Atuou como professora no curso de Licenciatura em Pedagogia - modalidade a distância da Ufrgs.

Patrícia Grasel Silveira – Doutoranda do Programa de Informáti-ca na Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mes-tra em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Graduada em Pedagogia. Especialista em Multimeios e Informáti-ca Educativa pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Assessora Pedagógica da Universidade Vale dos Sinos RS - Unisinos e coordenadora pedagógica do curso de Especialização em Avaliação de Tecnologias em Saúde do Instituto de Avaliação de Tec-nologia em Saúde do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Tem ex-periência na área de formação de professores e tecnologias digitais, com ênfase em aprendizagem no ciberespaço. Atua principalmente nos seguintes temas: tecnologias educacionais, intermediação peda-gógica, educação a distância, possibilidades do ciberespaço, gestão, planejamento, estrutura dos núcleos e projetos de informática edu-cativa.

Renato Avellar de Albuquerque – Bacharel e licenciado em His-tória pela Universidade Federal Fluminense. Especialista e mestre na área da educação com ênfase em EaD pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Tem experiência na pesquisa e no ensino da área de história, com ênfase em história da educação, ensino de his-tória, formação docente e educação a distância. Professor do ensino fundamental nos municípios de Alvorada e Canoas. Graduando em Psicologia pela Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.

Silvia de Oliveira Kist – Mest ra em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Graduada em Pedagogia pela Ufrgs. Especialista em Alfabetização pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Fez parte do grupo de pesquisa do Laboratório de Estudos Cognitivos LEC/Ufrgs, atuando no projeto UCA – Um Computador por Aluno. Atualmente integra a organização america-

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Adriano Canabarro Teixeira, Ana Maria de Oliveira Pereira, Marco Antônio Sandini Trentin (Org.)

na &quot; One laptop per Child&quot. Atua na implantação de pro-jeto de um laptop por criança em Ruanda e no Brasil. Professora da rede municipal de ensino de Porto Alegre. Tem experiência na área de educação, com ênfase em informática na educação. Atua princi-palmente nos seguintes temas: ambientes virtuais de aprendizagem, educação a distância, software livre, educação, alfabetização e letra-mento, tecnologia digital, formação de professores para uso de TICs e um laptop por criança.

Talita Maria da Silva – Mestra em Letras pela Universidade de Passo Fundo na área de estudos literários, com pesquisa na linha de leitura e formação do leitor. Tem experiência na área de letras, com ênfase no ensino de língua portuguesa e língua espanhola.

Tamiris Tomasi Malacarne – Graduada em Serviço Social pela Universidade de Passo Fundo. Participou do projeto Mutirão pela Inclusão Digital como pesquisadora.

Tania M. K. Rösing – Doutora em Letras pela Pontifícia Universi-dade Católica do Rio Grande do Sul. Professora da graduação e do mestrado em Letras da Universidade de Passo Fundo. Coordenadora do Centro de Referência de Literatura e Multimeios da Universidade de Passo Fundo.

Vitor Malaggi - Graduado em Ciência da Computação e pespecia-lista em Educação (stricto sensu) pela Universidade de Passo Fundo. Mestre Acadêmico como Bolsista Capes pelo programa de pós-gra-duação em Educação. Tem experiência na área de informática na educação e inclusão digital, com ênfase nas relações entre teorias da educação e apropriação das tecnologias digitais de rede em contextos educacionais. Também pesquisou como bolsista de iniciação cientí-fica nos seguintes temas: telecentros comunitários, inclusão digital, software livre, educação de jovens e adultos, alfabetização e obje-tos de aprendizagem. Atualmente desenvolve estudos como bolsista CNPq, modalidade SET-6B, no projeto de pesquisa: Guri – Software de autoria de material educacional interativo para a TV Digital.

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