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Instituições políticas no socialismo

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Instituições políticas no socialismoAutores: DIRCEU, José; GENRO, Tarso; RODRIGUES, EdmilsonSinopse: Este volume da coleção Socialismo em Discussão trata da questão fundamental da construção e do papel das instituições políticas (Estado, Parlamento, partidos etc.), abordando suas funções, sua composição e seus mecanismos de funcionamento, com ênfase na questão da democracia direta como forma de ampliar a participação popular.Fundação Perseu Abramo

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IIIIINSTITUIÇÕESNSTITUIÇÕESNSTITUIÇÕESNSTITUIÇÕESNSTITUIÇÕES POLÍTICPOLÍTICPOLÍTICPOLÍTICPOLÍTICASASASASAS

NONONONONO SOCIALISMOSOCIALISMOSOCIALISMOSOCIALISMOSOCIALISMO

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Fundação Perseu AbramoInstituída pelo Diretório Nacional

do Partido dos Trabalhadores em maio de 1996

DiretoriaLuiz Dulci – presidente

Zilah Abramo – vice-presidenteHamilton Pereira – diretor

Ricardo de Azevedo – diretor

Editora Fundação Perseu Abramo

Coordenação EditorialFlamarion Maués

RevisãoMaurício Balthazar Leal

Candice Quinelato BaptistaMárcio Guimarães de Araújo

Capa e Projeto GráficoGilberto Maringoni

Ilustração da capa Isadora França de Oliveira

Editoração Eletrônica Augusto Gomes

ImpressãoGráfica OESP

1a edição: março de 2001 – Tiragem: 3 mil exemplaresTodos os direitos reservados à

Editora Fundação Perseu AbramoRua Francisco Cruz, 234 – CEP 04117-091 – São Paulo – SP – Brasil

Telefone: (11) 5571-4299 – Fax: (11) 5571-0910Na internet: http://www.fpabramo.org.br – Correio eletrônico: [email protected]

Copyright © 2000 by Editora Fundação Perseu Abramo — ISBN 85-86469-43-2

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Tarso GenroEdmilson Rodrigues

José Dirceu

IIIIINSTITUIÇÕESNSTITUIÇÕESNSTITUIÇÕESNSTITUIÇÕESNSTITUIÇÕES POLÍTICPOLÍTICPOLÍTICPOLÍTICPOLÍTICASASASASAS

NONONONONO SOCIALISMOSOCIALISMOSOCIALISMOSOCIALISMOSOCIALISMO

Socialismo em discussão

EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Genro, TarsoInstituições políticas no socialismo / Tarso Genro, José Dirceu de Oliveira e Silva,

Edmilson Rodrigues. — 1ª ed. — São Paulo : Editora Fundação Perseu Abramo, 2001. —(Coleção Socialismo em Discussão)

Bibliografia.ISBN 85-86469-43-4

1. Política 2. Socialimo I. Oliveira e Silva, José Dirceu de. II. Rodrigues, Edmilson. III.Título. IV. Série.

01-0541 CDD-320.531

Índices para catálogo sistemático:1. Socialismo : Ciência política 320.531

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SumárioApresentaçãoLuiz Inácio Lula da Silva ........................................................................... 7

Fundamentos para um projeto deinstituições políticas no socialismoTarso Genro ...............................................................................................9

ComentáriosEdmilson Rodrigues ...................................................................................21A centralidade do trabalho hoje ............................................................................ 22A classe que vive do trabalho ............................................................................... 25Ampliar a participação do povo ........................................................................... 27

ComentáriosJosé Dirceu ................................................................................................29Socialismo democrático ........................................................................................ 30Radicalizar a democracia ...................................................................................... 33

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6 INSTITUIÇÕES POLÍTICAS NO SOCIALISMO

Debate com o público .................................................................................. 37Danilo Cerqueira César ........................................................................................ 37Marco Aurélio Garcia ........................................................................................... 38Sílvio José Pereira ................................................................................................ 40Paulo Vannuchi ..................................................................................................... 41Tarso Genro .......................................................................................................... 41Edmilson Rodrigues .............................................................................................. 47José Dirceu ........................................................................................................... 50Paul Singer ............................................................................................................ 55Jorge Almeida ....................................................................................................... 56Ricardo Musse ...................................................................................................... 58Clara Charf ........................................................................................................... 59

Comentários finais ....................................................................................... 63Tarso Genro .......................................................................................................... 63Edmilson Rodrigues .............................................................................................. 65José Dirceu ........................................................................................................... 67

Sobre os autores ............................................................................................ 69

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7SOCIALISMO EM DISCUSSÃO

Apresentação

Luiz Inácio Lula da Silva

Em meados de 1999, visitei Antonio Candido para conversar um pouco sobre nossopaís, nossos desafios e nossas esperanças. Além de saborear as deliciosas histórias queele sempre conta, fui brindado com algumas doses da espantosa sabedoria que jorrado alto daqueles 82 anos de uma vida bem vivida, repleta de lutas e marcada por abso-luta coerência de ponta a ponta.

Fiz a ele um pedido que apresentei como convocação. Solicitei que emprestasse suaenorme autoridade intelectual, moral e política para estimular a retomada de algunsdebates fundamentais para despertar a criatividade e reanimar o ímpeto de uma es-querda que, mesmo representando o que há de mais promissor em nossa terra, nuncaestá imune aos vícios do acomodamento e ao apego à rotina.

Trocamos idéias sobre alguns temas prioritários e sobre possíveis alternativas pararomper o marasmo intelectual que vinha caracterizando nosso país, sob o já longo rei-nado de FHC.

Antonio Candido ficou de pensar. Algum tempo depois, convidou Paul Singer e Fran-cisco de Oliveira, e eles três, junto com Paulo Vannuchi, meu assessor no InstitutoCidadania, realizaram inúmeras reuniões e consultas até conceber os Seminários So-cialismo e Democracia, que o Instituto promoveu em parceria com a Fundação PerseuAbramo e a Secretaria Nacional de Formação do PT, de abril a junho deste ano.

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8 INSTITUIÇÕES POLÍTICAS NO SOCIALISMO

Foram realizados seis seminários que abordaram o socialismo a partir de vários ân-gulos, para um plenário sempre superior a cem pessoas, entre dirigentes do PT, da CUT,parlamentares, lideranças de movimentos populares, membros de equipes de gover-no, ONGs, intelectuais, estudantes e convidados em geral. Já na carta-convite para oevento, explicamos que nossa idéia era discutir o que queremos entender por socialis-mo hoje, para o Brasil e para o mundo. E que não existia, de nossa parte, nenhumaconcepção prévia de socialismo e de como alcançá-lo. Queríamos retomar um climade discussão aberta, no qual pudéssemos expor livremente todas as nossas certezas edúvidas. Sem exclusão de nenhuma corrente ou facção.

Com a coleção “Socialismo em Discussão” publicamos o conteúdo básico dessesseminários. Queremos que este material seja amplamente divulgado em todo o país,que seja reproduzido, que estimule outros textos e publicações, afastando todas asameaças de inércia e de mesmice. Queremos que seminários desse tipo sejam realiza-dos nos vários estados, repetindo o produtivo ambiente de franqueza, polêmica, res-peito e seriedade que marcou os seminários. Sobretudo nas atividades de formaçãopolítica, a contribuição deste caderno pode ser muito grande.

O êxito e a ampla aprovação obtidos nesta primeira fase tornam obrigatório oprosseguimento das discussões em 2001, focalizando aspectos cada vez mais con-cretos e específicos do tema. Já era essa a idéia dos organizadores dos seminários.Eles agora cuidarão da tarefa com ânimo redobrado, escalando adequadamente arica pluralidade de craques ainda não convocados, entre dirigentes partidários, sin-dicalistas e intelectuais.

Penso que dessa forma estaremos construindo, juntos, uma compreensão do socia-lismo que esteja realmente à altura das exigências do novo século e que nos habilite alutar por vitórias que são imperativas e inadiáveis no grave cenário de crise social,injustiças e desigualdades que vem sendo imposto aos brasileiros já de longa data.

São Paulo, junho de 2000

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9SOCIALISMO EM DISCUSSÃO

Fundamentos para um projeto deinstituições políticas no socialismo

Abordarei o tema “instituições políticas no socialismo” como instituições polí-ticas de um Estado democrático de direito, que abram perspectivas para umprojeto socialista democrático, e não como instituições de um Estado “inteira-mente outro”, para usar uma expressão de Claude Lefort. Faço-o porque enten-do arriscado avançar mais do que isso. Diante da total falência e da inoperânciados “sovietes”, parece imprudente partir desta instituição política da democra-cia direta para pensar um novo Estado. Entendo, ainda, que as instituições ori-ginárias das grandes revoluções burguesas, a Gloriosa e a Revolução Francesa,não esgotaram suas possibilidades nem foram vencidas a ponto de serem sim-plesmente descartadas.

Alinho alguns fundamentos que me levam à conclusão de que a pura repre-sentação política do Parlamento, por mais “depurado” que seja o processo de

Tarso Genro

“... o uso de certas instituições, isto é, o uso de determinados meios paraa formação das decisões políticas, condiciona os fins possivelmentebuscados: a escolha de um regime implica, em termos gerais, a escolhade determinados valores.” (Lucio Levi)

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escolha dos seus delegados, é insuficiente e incapaz de mediar vontades demo-craticamente formadas. Estas, diante da fluidez da vida econômica, da rapidezdas mudanças histórico-culturais em curso e da fragmentação social, processa-da pela destruição da economia industrial e do modo de vida a ela articulado,precisam de outras esferas de mediação e de novas garantias. É preciso, pois,reinventar a democracia para repor a confiança da maioria da sociedade nasinstituições políticas do Estado democrático, indicando os pontos dedesequilíbrio para sua democratização radical.

Milton Santos1 diz que a

grande mutação tecnológica é dada com a emergência das técnicas da informação, asquais – ao contrário das técnicas das máquinas – são constitucionalmente divisíveis,flexíveis e dóceis, adaptáveis a todos os meios e culturas, ainda que seu uso perversoatual seja subordinado aos interesses dos grandes capitais. Mas, quando sua utiliza-ção for democratizada, estas técnicas doces estarão a serviço do homem.

INos últimos anos, a crescente dissolução da velha sociedade de classes e a

organização material e ideológica de uma nova sociedade de classes, aindamais dura e mais elitizada, alterou as formas de controle social e os padrõesideológicos e culturais correspondentes. Esta nova sociedade, porém, não émera continuidade e só pode organizar-se sobre os escombros da anterior, nãosó com a destruição de seus valores, mas também com a eliminação da memó-ria de seus valores. Estas novas necessidades para a instituição de novos pa-drões de dominação – destruição concreta dos valores e da memória dessesvalores – são facilitadas por poderosas transformações tecnológicas, principal-mente aquelas que tiveram e continuam a ter influência sobre a informação e acomunicação, que constituem um elemento vital da nova ordem econômica domundo2 .

1. Por uma outra globalização– do pensamento único àconsciência universal. Rio deJaneiro, Record, 2000, p. 174.

2. GENRO, Tarso. Letargia dainsegurança. Folha de S. Paulo,São Paulo, 6 fev. 2000,Caderno Mais, p. 18.

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11SOCIALISMO EM DISCUSSÃO

IIPara analisar esta questão, deve-se levar em conta que as fronteiras entre as

classes já não estão mais demarcadas da mesma forma como antigamente. Deum lado porque as “não-classes” – da intermitência, da exclusão, da precarie-dade – são as que mais pesam como “formadoras de opinião” eleitoral e tam-bém para os movimentos sociais extraparlamentares; de outro, porque as pró-prias classes hegemônicas já não estão mais alicerçadas na ideologia burguesa“clássica”, com o seu manto fáustico-produtivista. Não estão mais voltadas paraa implantação nacional, para o progresso material extensivo, para a inserçãodos indivíduos em classes definidas (período que caracterizou a emergência e aconsolidação da burguesia industrial) e hoje integram plenamente a dinâmicado “capital-dinheiro”.

A ausência de fronteiras nítidas e definidas entre as classes, do ponto de vistacultural e psicológico, não significa, porém, uma maior proximidade entre elas,mas uma maior fragmentação. Uma fragmentação que não só desconstituiu osvalores tradicionais que as unificavam e as contrapunham como determinouque, em vez de se aproximarem pela contradição negociada ou explosiva, pas-sassem a se afastar pela recíproca diluição, o que obstrui a “força decisória dapolítica”3 .

IIINo comunismo real, a classe operária extinguiria todas as classes para extin-

guir-se como classe, o que implicaria a imposição da supressão de qualquercontrato: realizaria e, ao mesmo tempo, suprimiria o garantismo. A social-democracia predestinava as classes a aceitarem o seu lugar específico, subor-dinado ou subordinante, e considerava o papel histórico das classes vinculadoà harmonia social, enquanto projeto político, e ao garantismo jurídico, enquantoprojeto de ordem econômico-mercantil: o garantismo teria um papel fundadore estabilizador. 3. Idem, ibidem.

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12 INSTITUIÇÕES POLÍTICAS NO SOCIALISMO

O comunismo real e a social-democracia esgotaram o seu ciclo histórico. Arecorrência a ambos se dá, hoje, à esquerda e à direita, como recorrência nega-tiva por diferentes motivos. O primeiro caminho, do comunismo real, pagouum duro tributo à ditadura do partido único, que sufocou a força constituinte/civilizatória que emergiria de um direito democrático-revolucionário. O segun-do caminho, da social-democracia, entregou-se a um pacto de curta duração,também atualmente em extinção: a força histérica do capital-dinheiro zombade qualquer pacto econômico ou político, pois pode impor sua reprodução semvínculos estruturais com a produção da riqueza social. (Esta força tornou-se aforça normativa global que se impõe não só sobre a democracia como contratopolítico, mas também sobre as políticas distributivas social-democratas4.)

IVSustento que a simplificação com que o “marxismo dominante” abordou as

teorias jurídicas modernas e mesmo o direito romano foi um dos fatores cultu-rais mais fortes que limitaram sua evolução como teoria jurídica e impulsiona-ram o recurso ao totalitarismo na União Soviética. Estas verdadeiras fórmulasdogmáticas abrigaram-se principalmente no reducionismo classista, que pre-tendia abranger tanto o desvendamento do Estado absolutista moderno como odo Estado democrático de direito praticamente sob a mesma luz analítica.

A conclusão é que a visão acumulada a partir da chamada “crítica das ar-mas” ao Estado da sociedade capitalista não só se mostrou insuficiente comoexperimento teórico e desenho histórico da realidade pretendida (afinal, erauma visão permeada pela certeza do “fim do Estado e do direito”), como tam-bém foi extremamente frágil como construção teórica propositiva.

Tomemos ainda dois exemplos emblemáticos. O princípio da igualdade pe-rante a lei e o do devido processo legal. Ambos jamais sofreram qualquer con-testação consistente dos defensores de um “direito marxista”, mas os dois fo-ram, em regra, sistematicamente violados no socialismo real, em confronto com

4. GENRO, Tarso. Sabores edissabores do marxismo peranteo liberalismo. In: ARRUDA JR.,Edmundo Lima de. Direito,marxismo e liberalismo: Ensaiospara uma sociologia crítica dodireito. No prelo.

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13SOCIALISMO EM DISCUSSÃO

os próprios princípios constitucionais fundadores dos respectivos Estados. E oforam tanto no bojo da consolidação das revoluções (o que é facilmente expli-cável) como de forma permanente, depois de estabilizados os Estados de direi-to tidos como socialistas.

O princípio da igualdade formal nas sociedades socialistas reais e nas socie-dades capitalistas, confrontado com as relações sociais reais – do dinheiro oudo poder burocrático – que multiplicavam e multiplicam desigualdades, entrapermanentemente em crise perante uma brutal contradição: a que existe entre ainfinita abstratividade e generalidade da norma e a infinita concretude de cadacaso singular5. Um locatário que não paga os aluguéis como técnica de acumu-lação é enquadrado no mesmo “tipo” legal que abarca o empresário-locatárioque não os paga porque está acossado pelos juros extorsivos do sistema bancá-rio. O burocrata do partido e o burocrata que não é do partido – no socialismoreal – não têm o mesmo “valor”, quando sofrem a incidência de um ato admi-nistrativo de caráter corretivo sobre as respectivas funções que exercem naadministração6.

VA elaboração teórica do Estado moderno encontra suporte nas fundamentações

de Hobbes – no seu aspecto “absolutista” – e Locke – na sua face liberal –, masa sua fundamentação mais exemplar, quanto à necessidade da “representação”democrática para legitimá-lo – absorvendo e superando a ambos –, foi construídapelo Abade Sieyes7. Ele constata a necessidade de uma “divisão especializadade trabalho” – entre governantes e governados – para emprestar racionalida-de e permanência a um Estado que já se anunciava como dotado de grandecomplexidade.

Esta separação da vontade dos governados em relação à ação dos governan-tes especializados (e da sua burocracia) permite “autonomizar” as decisões doEstado democrático, que apenas ficticiamente interpreta a vontade geral, por

5. Este exemplo foi inspiradoem orientação, ao signatário dopresente texto, do professorErnildo Stein.

6. GENRO, Tarso. Sabores edissabores do marxismo peranteo liberalismo. In: ARRUDA JR.,Edmundo Lima de. Direito,marxismo e liberalismo: Ensaiospara uma sociologia crítica dodireito. No prelo.

7. Idem, ibidem, p. 33 eseguintes.....

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14 INSTITUIÇÕES POLÍTICAS NO SOCIALISMO

meio da representação. Para Kelsen, por exemplo, a representação é claramenteuma ficção, “que não contém em absoluto relação representativa”8. Aliás, comodisse outro autor, aniquilam-se “as relações sociais de poder na impessoalidadeda soberania da lei, dissolvendo a dimensão decisória da política”9.

VIEssa situação, sem dúvida, reduz a importância da representação política,

porque seus protocolos de legitimação não são mais aceitos pelo senso comum.Os mecanismos de apreensão da vontade popular ficam fraudados e a democra-cia parlamentar torna-se, portanto, menos legitimada e respeitada. Um dos ele-mentos básicos desse desencanto é a desigualdade brutal entre os que detêm eos que são excluídos dos modernos meios de informação e propaganda. Issodistancia ainda mais a cidadania das formas de reflexão coletiva e leva à impo-tência e ao niilismo a parte da intelectualidade que não se adaptou às regras deum jogo de cartas marcadas.

Quais são essas técnicas da democracia moderna que não funcionam mais eque proporcionam resultados estranhos às expectativas da maioria do povo?Em primeiro lugar, a falência da lei como instrumento de coesão social e orien-tação mediadora, aparentemente neutra, nas disputas de grupos, classes e indi-víduos; ou seja, a legalidade não é mais um marco de referência para a soluçãodas controvérsias, não só pela sua ausência de efetividade como imperativo deconduta, mas também pela impotência do Judiciário.

Em segundo lugar, a ausência de um exercício mínimo do Estado, providên-cia que, pela sua desorganização econômica, pela burocratização e por falta deiniciativa dos governantes, reproduz uma indiferença global da cidadania quantoà sua capacidade de resposta; ou seja, o cidadão não tem mais nenhuma identi-dade material com esse Estado, que reduziu sua interferência na sociedade, nãopara libertá-lo da burocracia e da incompetência, mas para deixá-lo jogado àsua própria sorte na selvageria do mercado.

8. MORALES, Angel G.Representación Política yConstituición Democrática.Cuadernos Civitas, Madrid,1991, p. 45.

9. VERGARA ESTÉVEZ, Jorge.Modelos elitários da democra-cia. Diánoia - Anuario deFilosofia, México, Cidade doMéxico, Universidad NacionalAutónoma de México/Fondo deCultura Económica, ano XXXIV,nº 34, 1998, p. 67.

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15SOCIALISMO EM DISCUSSÃO

Em terceiro lugar, a contradição cada vez mais vigorosa entre a expectativada representação política e os seus resultados concretos; isto é, a alienaçãocada vez maior do representado em relação ao representante, fato que, além de“separar” a política (como desejo abstrato de melhoria do mundo) dos seusresultados na economia em geral e na própria vida familiar, produz uma hosti-lidade profunda entre o representante e o representado. Este deixa de acreditarna representação sem substituí-la por outras formas de interferência na gestãopública, já que o fracasso histórico da democratização direta desconstituiu oelemento utópico, que é, em parte, fundamento do desejo de progredir e demudar.

Em quarto lugar, está a crise financeira do Estado, que o impede de contra-arrestar estes sintomas, mesmo por meio de políticas autoritárias ou paternalistascapazes de dar respostas mínimas; ou seja, medidas que mantenham o corpo dasociedade em posição de mínima expectativa sobre o futuro, capazes de insti-gar, por exemplo, que o cidadão procure “lutar para repartir” ou, no caso dosexcluídos, para melhor dividir a renda social.

Carl Schmitt, jurista e cientista político alemão que aderiu ao nazismo e apóssua derrocada caiu em desgraça, sustentava uma tese “decisionista”, a qual ar-gumentava, em linhas gerais, que o movimento da política tendia sempre a des-prender-se dos seus fins. Esse movimento seria, então, uma luta permanenteque se desenvolveria eternamente sem princípios, em termos de “amizades einimizades” entre os seus protagonistas, os quais se uniriam apenas segundo anecessidade de derrotar o adversário.

Suas teorias foram geradas no interior da longa crise de formação do Estadode direito na Alemanha e correspondiam, na verdade, a uma postura pessoal-mente cética em relação à afirmação do Estado democrático. Os postulados deSchimitt eram uma teoria da crise da democracia, crise que só poderia sersuperada – e isso Schmitt não admitia – pela vontade política de sujeitos comprojetos.

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Para nós, trata-se efetivamente de reconhecer a gravidade da situação e datendência da humanidade à barbárie, para propormos formas de ação e organi-zação que possam dirigir a história a um outro sentido: a criação de uma esferapública, popular, democrática e não-estatal de controle e de indução do Estado,para reformá-lo profundamente, de fora para dentro, sob pena de tornarmos odecisionismo de Schmitt a profecia da tragédia10.

VIITrata-se de forjar um novo “contrato social”. Não um novo “pacto social”,

que sempre foi um recurso jurídico-político das elites em horas de crise da suahegemonia. Mas um novo “contrato”, que permita a emergência de novas for-mas para a constituição de maiorias na sociedade, por intermédio de meiosdiretos de legitimação, e também no Parlamento, por meio da reorganizaçãodo espaço da política delegada, que contará com novos impulsos para a produ-ção normativa, “capazes inclusive [...] de dar um novo sentido ao modo de vidaatual”11.

É preciso, a partir daí, tanto pensar num novo processo de produçãonormativa, inscrito numa teoria geral do Estado, cujo conceito de soberaniaretome a relação com os “sujeitos-pessoas”, como pensar num novo padrãodemocrático do Estado atual que se estruture na representação delegada, masque não se esgote nela.

O objetivo será forjar uma soberania que se redesenhe pela superação daque-las “regras do jogo”, aparentemente “puras”, para assumir um “jogo com fina-lidades”: um Estado com a representação corrigida e orientada por formas di-retas de controle público não-estatal. Seu objetivo mínimo seria fazer valer aspróprias finalidades do Estado democrático de direito, que normalmente já es-tão inscritas como normas constitucionais sem nenhuma efetividade12.

Trata-se de afirmar e superar Kelsen e Bobbio, colocando como fundamentodessa nova concepção a necessidade de regras do jogo com outra teleologia,

10. GENRO, Tarso. Crise doEstado e da representação.Utopia, nº 9, ago./set. 1993,p. 11.

11. GENRO, Tarso. Uma novacultura de solidariedade. Folhade S.Paulo, Caderno Mais!, 12jan. 1997.

12. HESSE, Konrad. DerechoConstitucional y DerechoPrivado. Cuadernos Cívitas,Madri, 1995, p. 67: “Sómantendo sua influência sobreo Direito Privado nas fronteirasassim marcadas se pode evitarque o benefício de umaproteção geral e eficaz dosdireitos fundamentais seconverta na praga de umainflação dos direitos fundamen-tais, com a qual o DireitoPrivado teria pouco que ganhar,e os direitos fundamentais e seuverdadeiro significado muitoque perder”.

13. Os modernos meioseletrônicos informatizados jápodem permitir, por exemplo,consultas periódicas – mensaisou semestrais – à populaçãosobre assuntos públicosrelevantes.

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que obriguem a que todos os interesses abram-se na cena pública para incidirnas decisões do Parlamento e do Executivo.

Essa nova etapa democrática só poderá ser garantida por meio de instituiçõesde democracia direta, que operem entre um e outro momento eleitoral“delegativo”13. Seriam regras de direito público “não-estatal” – abertas por per-missivo constitucional –, cuja validade seria dada dentro de determinados limi-tes previstos na Constituição14 e cuja eficácia seria processualmente conquista-da, dando uma nova dimensão à antiga cidadania formal.

Trata-se, também, de afirmar e superar Hermann Heller, o grande teórico dasoberania afirmada pela representação15, não só para mantê-la como fonteestruturadora genérica da soberania estatal (por meio do corpo político está-vel de delegados), mas também para emprestar à soberania estatal a forçalegitimante de novas instituições, baseadas na democracia direta.

E o campo fértil para iniciar tais processos são a produção e o controle doorçamento público e, também, as decisões e o controle público sobre as políti-cas públicas de largo alcance16.

VIIIÉ duvidoso que haja um controle democrático do Estado e um controle públi-

co dos governos se não for atacada de frente a questão da informação, do mo-nopólio das comunicações e desconstituído o poder que verte, por intermédiodele, para as classes dominantes.

A manipulação da informação tem sido, aliás, fundamental para a implemen-tação do projeto neoliberal e mesmo para a transformação das suas vítimas emaliados. A fragmentação social em curso e a conseqüente despotencializaçãodos sujeitos mais articulados da política moderna – os partidos, os sindicatos, oParlamento – exigem que a participação direta da cidadania e a sua capacidadede delegação sejam combinadas em múltiplas instâncias, inclusive experimen-tais, capazes de estimular o conformismo, a letargia e o fatalismo.

14. Exemplo: “RegimentoInterno” do Orçamento Partici-pativo, produzido por decisãoautônoma dos 16 ConselhosPopulares Regionais da cidadede Porto Alegre, que regula oprocesso de participação edecisão direta da comunidadena produção e execuçãoorçamentária.

15. HELLER, Hermann. Lasoberanía: Contribución a lateoría del derecho estatal y delderecho internacional. México,La Fundación, Escuela Nacionalde Jurisprudencia, A.C./Fondode Cultura Económica, 1995,p. 12: “A conquista era enorme,pois, em virtude dela, o podertemporal se fez intérprete dascircunstâncias de tempo e lugare o criador das normas apropri-adas para satisfazer as necessi-dades dos homens e dos povos;era, ademais, o primeiro triunfono caminho da desalienação dopoder temporal e dos homens”.

16. GENRO, Tarso. Democracia,direito e soberania estatal. In:O futuro por armar : Democra-cia e socialismo na eraglobalitária. Petrópolis, Vozes,1999, p. 67-69.

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Por isso, no que se refere à questão da informação, uma proposta estratégicaque direcione a sociedade para uma forma de socialismo democrático deve pre-ver uma estrutura estatal de caráter político-administrativo que possa ter visi-bilidade política para a sociedade, para tratar daquilo que é o cerne de umanova democracia moderna: a liberdade de informação e a de opinião, hojetotalmente comprometidas pela verdadeira “ocupação” que as elites fizeramdos meios de comunicação mais potentes e incidentes sobre a vida cotidiana.

IXEm síntese, a engenharia política das instituições de uma sociedade em tran-

sição que reduza permanentemente as desigualdades deve servir-se à exaustãodos meios tecnológicos disponíveis – da eletrônica e da informática – parapotencializar a participação dos cidadãos, em todos os níveis, como respostasàs limitações da democracia formal do Estado moderno.

As novas instituições legais e os novos organismos políticos devem ser des-tinados a radicalizar o caráter democrático das decisões públicas e, ao mesmotempo, permitir a politização da economia, o que não significa “revogar” a sualegalidade, mas sim submetê-la ao projeto da máxima supressão possível dasdesigualdades.

Para tanto, sugiro, como princípios básicos que informariam a nova enge-nharia institucional nos diversos níveis da Federação, os seguintes:

1) uma estrutura parlamentar de delegados, unicameral, com substituição pre-visível, cuja regulamentação permita a cassação de mandatos por recall, pormeio de consultas ao eleitorado delegante, previstas em lei, a partir de um per-centual mínimo da população delegante;2) estruturas locais, regionais e nacionais, constituídas por meio de formasdiretas de participação, para elaboração, em conjunto com os Executivos, doorçamento público, estruturas que deveriam, igualmente, controlar a execução

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da lei orçamentária, com poder de veto sobre determinadas decisões do Execu-tivo, com direito de recurso, deste, à representação parlamentar;3) um Poder Executivo formado por eleição direta, com previsão constitucio-nal de consultas periódicas à população (um ano, por exemplo), para a confir-mação ou não do tempo previsto para os mandatos;4) um Poder Judiciário submetido, nas suas diversas instâncias, ao controleexterno, no que se refere à sua eficácia e aos seus atos administrativos, excluí-do o controle referente às suas decisões de natureza judicial;5) um Conselho Permanente de Democratização da Informação, formado porrepresentantes designados pelos três Poderes e pelos partidos políticos comassento no Parlamento federal, mas cuja composição majoritária seja formadapor membros eleitos nos estados da Federação, cuja finalidade seria regrar evigiar a aplicação de normas que permitam a liberdade de informação, o livretrânsito de opiniões, a obstrução de qualquer monopólio na área, bem como aelevação dos padrões éticos e culturais dos meios de comunicação.

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21SOCIALISMO EM DISCUSSÃO

Comentários

Quero saudar a realização deste seminário, pois representa um esforço paradebater algo imprescindível ao Partido dos Trabalhadores (PT), uma vez que éestratégico refletir sobre nossa concepção de socialismo e suas possíveis for-mas institucionais. Para construirmos um projeto socialista para o país, e oscaminhos para concretizá-lo, é necessário um esforço coletivo, que será reali-zado com maior ou menor dificuldade – nunca é fácil construir o novo – namedida em que saibamos, com mais clareza, a qual porto queremos chegar.

A exposição de Tarso Genro é muito rica. Ao adotar uma postura não-sectá-ria para afirmar as idéias e os conceitos que orientam sua crítica a determinadasformas políticas que têm se sucedido ao longo da história, contribui para aelaboração democrática de uma síntese sobre o tema aqui tratado.

Em uma de suas mensagens, o subcomandante insurgente Marcos, do Exérci-to Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), ao nos contar uma história que lheteria sido narrada pelo Viejo Antonio, um ancião e sábio indígena maia que foraprofessor do que hoje se conhece como “neozapatismo”, diz:

... el mundo hay que rodarlo hasta que llegue a saber donde, y que habría quien noquiera que el mundo ruede y quiera que se quede quieto, sin que cambien las cosas,

Edmilson Rodrigues

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porque cuando el mundo rueda no hay quien está arriba o abajo y si se está quietosiempre hay quien está arriba y quien está abajo y simpre son los mismos los de arribay los de abajo se el mundo no se rueda1.

Parece-me que esta idéia tem uma conotação fundamental para que possa-mos refletir sobre a transformação da realidade. Só que pensamos a realidade –como ressaltou Tarso Genro – num mundo diferente daquele até recentementeconhecido por nós. As imagens mais fortes da história do PT estão ligadas a ummomento do movimento sindical que tinha como referência as fábricas, que,pela grande concentração de operários, equivaliam às populações de muitasdas cidades brasileiras.

E as formas de organização e de luta, para cada momento, têm de expressaras necessidades historicamente determinadas da classe trabalhadora, confor-me as condições concretas de como se apresenta o modo social de produção.Então, considero que hoje temos que pensar saídas políticas, incluindo todasas formas de luta, inclusive a sindical e a ocupação de espaços institucionaisdo Estado, haja vista que vivemos numa sociedade submetida a uma – parausar expressão cunhada pelo sociólogo Ricardo Antunes – “globalidade desi-gualmente articulada”. O mundo está perversamente ordenado, a sociedadecontemporânea é uma ordem desordenada a partir da lógica do mercado, dolucro, e há os que sempre estão por cima e por isso não querem que o mundose mova.

A centralidade do trabalho hoje – Dito isso, gostaria de fazer umcontraponto geral ao que o Tarso Genro expôs, amparando-me novamente emRicardo Antunes – que mediante maravilhoso trabalho de pesquisa reflete so-bre as metamorfoses do mundo do trabalho e sobre sua centralidade no proces-so de transformação social2 . Gostaria de enumerar cinco teses de sua autoriaque, a meu ver, são importantes para qualificar o debate acerca da centralidade

1. “... é preciso girar o mundoaté, e haveria quem não queiraque o mundo gire e queira quefique parado, sem que as coisasmudem, porque quando omundo gira ninguém está emcima ou embaixo e se se ficaparado sempre alguém está emcima e alguém está embaixo esempre são os mesmos os decima e os de baixo se o mundonão gira”. EJÉRCITO ZAPATISTADE LIBERACIÓN NACIONAL.Mensaje para la Inauguracióndel II Encuentro Americano porla Humanidad y contra elNeoliberalismo.Subcomandante InsurgenteMarcos, Chiapas-México, Belémdo Pará, Brasil. En la Américaque pregunta, Diciembre de1999.

2. ANTUNES, Ricardo. Adeus aoTrabalho?: Ensaio sobre asmetamorfoses e a centralidadedo mundo do trabalho. SãoPaulo/Campinas, Cortez/Unicamp, 1995, 2ª edição,p. 73-97.

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do trabalho hoje nas lutas de transformação voltadas ao objetivo da emancipa-ção humana.

Na primeira, diz ele, o trabalho abstrato continua a cumprir papel decisivopara a constituição do valor de troca; ainda que os fatores subjetivos do proces-so de trabalho decresçam em relação aos seus fatores objetivos, o papel dotrabalho coletivo na produção do valor de troca continua fundamental, mesmoque relativamente sofra redução.

Numa segunda tese, conseqüência da primeira, o autor diz que o trabalhocomo criador de valor de uso, o trabalho útil, quaisquer que sejam as formas desociedade, é indispensável, vital, à própria existência humana. O trabalho –protoforma da atividade humana – não deve ser entendido como o momentoúnico ou totalizante, mas a esfera do trabalho concreto, essa sim, é ponto departida sob o qual se poderá instaurar uma nova forma de sociedade. A luta dasclasses que vivem do trabalho é, pois, central para as transformações que ve-nham a se realizar no sentido contrário à lógica da acumulação capitalista e dosistema produtor de mercadorias.

A terceira tese afirma a convicção de que uma efetiva emancipação humanadar-se-á num processo simultâneo de emancipação do trabalho e pelo trabalho.São importantes as diversas dimensões e formas de luta do povo, muitas dasquais hoje têm ganho força, tais como a ecológica, a feminista, a dos negros, ados homossexuais, a dos jovens etc., fundamentais no que diz respeito à indivi-dualidade – o que amplia o conceito que, muitas vezes, foi tratado de forma“vesga” de interpretação e elaboração marxistas – e, por isso, de uma sociabili-dade dotada de sentido. Ressalta, porém, que: “Embora heterogeneizado,complexificado e fragmentado, as possibilidades de uma efetiva emancipaçãohumana ainda podem encontrar concretude e viabilidade social a partir das re-voltas e rebeliões que se originam centralmente no mundo do trabalho”.

A quarta tese afirma que agora os desafios passam a ter uma dimensão quenão havia sido imaginada pela esquerda socialista e que supera a sua própria

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expectativa. Esta é uma das teses para a qual, na verdade, ele disse que nãohaveria, hoje, respostas definitivas, mas a possibilidade de que nessa nova rea-lidade global ocorram um aumento, uma maior potencialidade e uma maiorcentralidade dos estratos mais qualificados das classes trabalhadoras. Ou seja,o trabalho especializado tem potencial para ser fundamental para alavancar umprocesso de luta na perspectiva de uma sociedade humana humanizada. Nessesentido, há de estabelecer um diálogo para recuperar o debate acerca da tese dauniversalização da classe operária, do fim do Estado, das classes e dos antago-nismos sociais.

Contradições, a meu ver, sempre existirão, e, muitas vezes, profundas, consi-derando que os indivíduos são diferentes e as culturas humanas se expressamconflituosa e contraditoriamente, haja vista que valores culturais dificilmentese homogeneízam.

A quinta tese trabalha o conceito de alienação de estranhamento. AfirmaAntunes que persistem os antagonismos na sociedade atual, entre o capital so-cial total e a totalidade do trabalho, o que, portanto, nos coloca num nível decomplexidade ainda maior, se se pretende enfrentar o debate sobre uma formu-lação estratégica, um novo projeto de socialismo.

Em texto recente, o professor Carlos Veiner3, do IPPUR (Instituto de Pesqui-sa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio deJaneiro), afirma, fazendo menção a Albert Hirschman, a necessidade de cons-tituirmos projetos de mudanças e agirmos enquanto sujeitos de mudanças. Emsuas referências a Hirschman4, retoma duas teses “atemorizadoras” levantadaspor esse autor: a da “inocuidade” e a da “perversidade”. Então, baseado nelas,discorre sobre o que seria uma postura “perniciosa”, se se pretende contribuirpara a construção de um mundo novo. A tese da inocuidade sustenta que “qual-quer coisa que tentemos fazer para mudar a sociedade será inócuo, porque asociedade é o que é; e ela é o que é porque isto está fundamentalmente enraiza-do na sua natureza, isto é, na natureza social, que não é senão, desta perspecti-

3. VAINER, Carlos B. É possívelplanejar as cidades e asregiões?: Planejamento emercado na periferia. Aulainaugural proferida no Curso deEspecialização em GestãoUrbana. Centro de EnsinoSuperior do Pará – CESUPA,mimeo. Belém, maio de 2000.

4. HIRSCHMAN, Albert. ARetórica da intransigência:Perversidade, futilidade,ameaça. São Paulo, Companhiada Letras, 1992.

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va, a natureza humana”. A tese da perversidade sustenta, por sua vez, que “comoo mundo é assim, regido por determinadas leis, tentar fazer coisas que vão emsentido inverso, mesmo que seja por boas razões, com boas intenções, acabaconduzindo a efeitos contrários aos pretendidos”.

A classe que vive do trabalho – Isso posto, qualquer tentativa de modificara lógica de reprodução social da sociedade de mercado implicaria ter que pagarum preço alto. “É isso que é perverso, nos dizem os arautos do pensamentoúnico dominante, os custos sempre acabam sendo maiores que os benefícios.”Significaria dizer que qualquer tentativa de tornar a sociedade menos desiguale menos injusta implicaria taxas crescentes de injustiça e desigualdade. Assim,estaríamos para sempre condenados ao fracasso.

Ora, a ação humana é essencialmente planejada. O planejamento voltado aoobjetivo de construção de uma sociedade nova é um instrumento político nãoapenas possível como necessário. Mas só pode se realizar na medida em quehaja forças sociais capazes de dar sustentação a esse projeto de mudanças es-tratégicas. Por isso, deve-se ousar no exercício permanente de participação de-mocrática e, ao mesmo tempo, da construção de sujeitos políticos coletivos.Para usar uma expressão do próprio Tarso Genro, é intentar, permanentemente,o processo de “democratização radical” da sociedade. A radicalização dademocracia é fundamental para a constituição de sujeitos políticos que, a partirdos interesses da classe que vive do trabalho, possam se contrapor àqueles daclasse que vive da exploração do trabalho alheio.

Então, a ação humana dos que têm um compromisso histórico com a constru-ção do novo, com um projeto socialista, não é inócua nem neutra, mas parte deum confronto de interesses que se apresentam conflituosamente em qualquerconstrução histórica democrática.

Nesse ponto, eu afirmaria que, para refletirmos sobre a realidade, para a for-mulação e a execução de qualquer projeto de sociedade, faz-se necessário com-

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preender a política como dimensão fundamental de nossa ação. Ou seja, quan-do gerimos uma cidade devemos promover sua politização, em nível local e emprocessos mais amplos de participação e de luta. A meu ver, isso é fundamentalpara que não caiamos num administrativismo que acabe apenas por colaborarpara a produção e a reprodução da sociedade de mercado.

Nesse sentido, seja em nível da cidade ou de uma unidade federativa, ou naperspectiva do governo do país, a sociedade não pode ser pensada como umaempresa, para a produtividade e a competição. Esse tipo de concepção, muitopresente em determinadas formas de relação da própria esquerda e, em certamedida, do PT, com o aparelho do Estado, redunda numa forma de gestão volta-da, principalmente, a administrar inadministráveis problemas e a contribuir compolíticas voltadas à inclusão social, mas que ao não questionar a fundo a lógicado próprio sistema pouco contribui para uma transformação mais profunda daestrutura social.

A conseqüência disso é que a imagem da instituição estatal com a qual nosrelacionamos acaba por parecer mais importante do que a própria “vida real”.

Algumas formas de planejamento e gestão têm se realizado secundarizando aexistência dos conflitos sociais, das diferenças e dos antagonismos de classe,excluindo os sujeitos sociais mais importantes – os que vivem do próprio traba-lho – dos processos decisórios, buscando um certo grau de participação de deter-minados segmentos mais organizados da sociedade e priorizando a formulaçãode projetos de grande visibilidade que, em alguma medida, contribuam para ven-der a imagem da cidade, reforçando seu viés mercadológico. A cidade-mercado-ria nega o objetivo da igualdade social. Nega também objetivo aqui tão bemfundamentado por Tarso Genro como “o mais subversivo”, que é o da inclusãosocial, o qual, a meu ver, realmente é fundamental, mas tem que ser pensado naperspectiva da ruptura com a sociedade fundada na lógica do mercado e do lucro.

Dito isso, penso que é preciso ter muito cuidado com a nossa forma de rela-ção, como partido de esquerda, com a participação nos espaços institucionais e

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na máquina do Estado, para que não se reproduza aquilo que no mundo dotrabalho, na relação capital/trabalho, tem sido muito forte, ou seja, que oestranhamento acabe por impor uma lógica manipulatória e um envolvimentocooptado.

Ampliar a participação do povo – Para concluir, quero dizer que os pro-cessos de ação que pretendam participar na construção de um mundo socialistapressupõem, acima de tudo, o fim de qualquer medo de ter o povo como sujeitopolítico; deve-se ampliar ao máximo a participação decisória do povo. Nessesentido, tenho grande afinidade com a proposta de se refletir sobre e fomentara criação de esferas públicas não-estatais. As experiências de Orçamento Parti-cipativo criam esferas que tensionam a institucionalidade. A própria formaatual de representação parlamentar vem sendo posta em xeque. O debate emPorto Alegre sobre a legalização ou não do Orçamento Participativo foi ricoe acabou apontando para que não se formalizasse legalmente, para não impe-dir que, permanentemente, a participação democrática influenciasse no aper-feiçoamento dos mecanismos dos próprios espaços de participação e de cons-trução do poder popular.

Temos, também, que estar atentos para garantir que os instrumentos utiliza-dos por nós atendam aos interesses da transformação mais radical. Afinal decontas, até mesmo o Banco Mundial tem indicado o Orçamento Participativocomo um instrumento de planejamento; tem indicado também a Bolsa-Escola euma série de outros instrumentos que compõem o chamado modo petista degovernar e que têm sido utilizados em vários governos do PT. É com esse senti-do que a maneira como esses projetos são desenvolvidos – menos a forma emais o conteúdo – tem de ser pensada. Para a sua qualificação, a forma comorealmente se expressa a democracia é fundamental.

Por fim, há um debate que deve ser posto em nossa pauta sobre democracia:qual a mediação possível do conflito entre a participação direta dos cidadãos

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nos processos decisórios (cada cidadão um voto) e a tendência de que as ONGs(organizações não-governamentais) e outros segmentos organizados sejam cha-mados a decidir. Como se resolve esse conflito, na medida em que a negação daparticipação do indivíduo é imanente às formas conhecidas de democracia?Mesmo nos processos de representação direta, as experiências que temos de-senvolvido, num determinado momento acabam trabalhando, também, com re-presentações delegadas. Então, como trabalhar essa contradição de modo a evi-tar um determinado vício burocratizador de processos em que representantes“eternos” de organizações governamentais ou não-governamentais acabem porrepresentar “eternamente”, como se tivessem legitimidade também eterna parafalar em nome do povo?

Obrigado.

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Comentários

Vou partir da intervenção que Tarso Genro e Edmilson Rodrigues fizeram.Vivi a experiência de sair de um país sob ditadura militar, banido, cassado, e

ir para um país socialista, Cuba, conviver com o socialismo real, na sua fórmu-la mais desenvolvida, porque, naqueles anos, era uma espécie de comunismode guerra.

Cheguei em Cuba em 1969, dez anos depois do triunfo da Revolução Cuba-na. A ofensiva revolucionária de 1968 representou a expropriação de toda for-ma de propriedade privada em Cuba. Para se ter uma idéia concreta do que issosignificou do ponto de vista político, foram proibidos os engraxates, os cabe-leireiros, as manicures, os sapateiros etc. etc. Todos os serviços foram sociali-zados, ou seja, estatizados. E vivi aqueles anos atormentado por essa questão.

Quando saí da clandestinidade, voltando ao Brasil em 1978/79, o PT já emer-gia, Lula já era uma grande liderança, e já aparecia a contradição entre o quereivindicávamos em nosso país e a falta de liberdade política, sindical, de ma-nifestação e de imprensa que havia num país como Cuba. Criava-se, na lutapelas Diretas Já e pela democracia, uma contradição. Éramos cobrados a esserespeito. A direita falava: “Vocês defendem eleições diretas aqui no Brasil. Porque não vão defender em Cuba?”. Quantas vezes não ouvimos isso? Quero

José Dirceu

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dizer com isso que crescemos, politicamente e como cidadãos, vivendo estacontradição. Cuba havia realizado uma revolução social e cultural nunca vistana América Latina, mas a questão do Estado e da democracia continuava semsolução e saída.

Mesmo considerando que a minha geração, de certa forma, rompeu com omarxismo, com o socialismo oficial, com o stalinismo, vamos dizer assim, nós,socialistas, grande parte com formação marxista nos termos que Tarso Genrocolocou, vivíamos essa aparente contradição: lutar pelo socialismo e pelademocracia no Brasil e, ao mesmo tempo, encontrar uma realidade em Cubaque não podia ser um modelo para nós.

Em 1965, quando ainda era estudante, houve um período em que vivi umacrise existencial. Um dia encontrei o Luís Travassos em frente à PUC (PontifíciaUniversidade Católica) de São Paulo. Ele também estava vivendo uma criseexistencial. Nós estávamos desempregados e eu não agüentava o curso de di-reito da PUC, pois era muito autoritário. Falamos um para o outro: “Vamos paraCuba?”; “Mas vamos como?”; “Vamos sair, vamos pela América Latina”. Cuba,para nós, era uma referência.

Depois, quando os sandinistas tomaram o poder na Nicarágua, fiquei dividi-do. Eu falava: “Não é possível que dê certo o socialismo na Nicarágua e, muitomenos, em Moçambique”. Pensava comigo: “Imagine se vai haver socialismoem Moçambique e na Nicarágua?”. Eu não conseguia me convencer de que exis-tiam condições políticas, culturais, econômicas e mesmo históricas para tanto.

Socialismo democrático – Estou absolutamente convencido de que colhe-mos o que plantamos: o socialismo e o poder não são apenas conquistados, masconstruídos. O que significa isso? Que, ao lutar pela radicalização da democra-cia, por instituições democráticas, por novas relações socioculturais e pela ex-tensão da cultura, da educação e da comunicação em um período histórico,temos a possibilidade de construir ou não um socialismo democrático. Tam-

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bém está ligada a esse projeto maior a maneira como construímos nossos parti-dos, como concretizamos nossa vida política, como cidadãos na sociedade e noParlamento, e nossa vida individual, na família, com os filhos, com a comuni-dade. Isso é inexorável e ultrapassa as questões históricas.

E estamos em uma situação grave: a primeira instituição democrática quetemos que reconstruir, por causa da globalização, do capitalismo financeiro eda hegemonia norte-americana, é a nação – além do Estado. Nós, socialistas,vamos ter que reorganizar um Estado nacional, dar a ele poder político, diplo-mático, comercial e militar – esse é outro problema – e ter uma sociedade de-mocrática. Porque o mundo de hoje e a força do capital financeiro estão consti-tuídos sobre a base de um poder hegemônico político-militar, com objetivos decontrole econômico e comercial do mundo. E quem quiser construir institui-ções democráticas socialistas num espaço nacional terá de controlar o capitalna forma em que ele existe, como capital financeiro, capital estocado, capitalpara investimento, capital para especulação, ou seja, os fundos sociais e o setorfinanceiro. E terá que controlar de maneira democrática, porque, de outra for-ma, a sociedade não vai aceitar. Portanto, terá que constituir instituições demo-cráticas de controle do capital e dos fundos sociais – algo que o professor Fran-cisco de Oliveira levantou há muitos anos.

Acho que isso é fundamental para se pensar a questão das instituições nosocialismo.

E, de certa forma, já temos uma definição bem avançada sobre o socialismoque queremos, fruto de nossa cultura política, como podemos conferir nestetrecho das resoluções do I Congresso do PT. A citação é um pouco longa, masmuito esclarecedora:

Para o PT, socialismo é sinônimo de radicalização da democracia. Isso quer dizer quea concepção de socialismo do PT é substancialmente distinta de tudo que, enquantoconcepção, vimos concretizado em todos os países do chamado socialismo real. Mais

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do que uma mera afirmação retórica de uma idéia, esse compromisso democráticopretende concretizar-se em todas as dimensões do Partido. [...] Dizer isso implicarecusar todo e qualquer tipo de ditadura, inclusive a ditadura do proletariado, que nãopode ser outra coisa senão ditadura do partido único sobre a sociedade, inclusivesobre os próprios trabalhadores. O PT recusa-se a pensar o futuro da sociedade deacordo com padrões absolutistas e a-históricos. Em nossa concepção de socialismo,não há lugar para noção de uma sociedade perfeita, pronta e acabada, sem problemase sem diversidade de interesses e opiniões. O socialismo, para ser humanista e demo-crático, terá que ser uma sociedade na qual governem e se realizem seres humanosreais – com suas paixões, seus desejos, suas grandezas e seus defeitos –, e não oilusório ser humano perfeito, que não é outra coisa senão a negação do ser humano.Lutamos por uma ordem social qualitativamente superior, baseada na cooperação ena solidariedade, na qual os conflitos sejam vividos democraticamente. [...]O PT entende que a diversidade de desejos e idéias é inerente à condição humana,razão pela qual a pretensão de suprimi-la não passa de um projeto de violentação dahumanidade. [...]É por isso que encaramos a democracia política, econômica e social como baseconstitutiva da nossa sociedade. O socialismo pelo qual o PT luta prevê, portanto, aexistência de um Estado de Direito no qual prevaleçam as mais amplas liberdadescivis e políticas, de opinião, de manifestação, de imprensa, partidária, sindical etc.;em que os mecanismos de democracia representativos, libertos da coação do capital,devem ser conjugados com formas de participação direta do cidadão nas decisõeseconômicas, políticas e sociais.A democracia socialista que ambicionamos construir estabelece a legitimação majo-ritária do poder político, o respeito às minorias e a possibilidade de alternância nopoder. Nossa perspectiva, entretanto, não se limita à democratização e à socializaçãoda política apenas a partir do Estado. Visamos construir no socialismo uma esferapública, na qual “política” não se restrinja a iniciativas estatais-institucionais – leia-se aqui “de partidos políticos também” – mas que, ao contrário, tenha o seu pólo

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dominante nas iniciativas surgidas da sociedade, na perspectiva de que a populaçãoorganizada se aproprie de funções que hoje são reservadas às esferas estatais-institu-cionais, exercendo em plenitude uma nova cidadania. Para o PT, o socialismo deveser também a socialização dos meios de governar, a descentralização do poder, e,principalmente, o reconhecimento do direito à diversidade política, cultural, étnica,sexual e religiosa. [...]A concepção de socialismo do PT nega tanto a ideologia do livre mercado, que con-duz à concentração de riquezas e do poder e produz marginalidade social, como aideologia do estatismo, típica do socialismo real, que prejudica o avanço tecnológico,bloqueia a criatividade, nega aos consumidores o poder de escolher entre produtos eserviços, estabelece necessariamente o domínio da burocracia. O PT entende que acombinação entre o planejamento estatal e o mercado orientado socialmente serácapaz de propiciar o desenvolvimento econômico com igualdade na distribuição dasriquezas, negando, dessa forma, a preponderância e a centralidade do capital na dinâ-mica das relações sociais. [...]O PT recusa a perspectiva voluntarista de pretender abolir o mercado, como espaçosocial da troca, por decreto. O mercado, sob controle do planejamento democráticoestratégico e orientado socialmente, é compatível com a nossa concepção de constru-ção do socialismo1.

Radicalizar a democracia – Este texto é fruto do nosso I Congresso, em1990. Já faz dez anos e foi produzido após a queda do Muro de Berlim. Minhaexperiência de vida e minha experiência em Cuba revelam que não podemosconstruir instituições democráticas se não construirmos, nas relações econômi-cas e sociais, espaços democráticos. Então, a questão da socialização dos meiosde produção tem de ser enfrentada por nós, socialistas. Porque se partirmos daidéia do estatismo como ela foi executada, se não desenvolvermos na gestãodas empresas, nas relações econômicas, formas democráticas, não teremos de-mocracia. E essa é uma contradição que o capitalismo e a burguesia vivem.

1. PARTIDO dos Trabalhadores:Resoluções de encontros econgressos. São Paulo, EditoraFundação Perseu Abramo, 1998.

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Quando se esgotou a radicalidade democrática da burguesia? Foi quando elase apropriou e se consolidou como classe hegemônica do ponto de vista econô-mico e quando ela conformou os Estados nacionais e o imperialismo. E foicada vez regredindo mais.

O capitalismo financeiro e sua hegemonia global começam a retirar direitossociais, a restringir os espaços da sociedade civil e, apesar de extinguirem oEstado da previdência social, da seguridade social, do bem-estar social, nuncahouve tanto controle estatal, tanta renúncia fiscal a favor do capital e tantaapropriação do excedente social pelo capital como há agora. Talvez nunca te-nha havido tanta ditadura, nunca houve tanta falta de liberdade.

Nosso primeiro papel no Brasil é radicalizar a democracia. O Brasil é umpaís com grande deformação das instituições políticas, pois, além de não ter-mos financiamento público de campanha e de o poder econômico ter tomadoconta do sistema eleitoral, além de não termos democracia nos meios de comu-nicação – embora exista o horário eleitoral no rádio e na TV, que é uma atenuan-te –, temos ainda agravantes: um presidencialismo com medidas provisórias,um Senado que é Câmara Alta e eleito de forma majoritária, ou seja, a minoriada população elege a maioria do Senado – 14 estados que elegem 42 senadores(a maioria do Senado) não representam nem 15% do eleitorado –, e uma Câ-mara dos Deputados cuja representação é desproporcional para cada estado.Temos, ainda, uma imensa maioria da população sem acesso à cultura, à educa-ção e à informação, e que é eleitora de forma obrigatória.

Para além de uma reforma política, precisamos combinar a democracia re-presentativa com a direta, com os instrumentos de consulta popular como ple-biscito e referendo, e a participação direta no Orçamento Participativo e nosconselhos de cidadãos, como os que hoje existem nos sistemas de saúde e edu-cação. Trata-se de instituir o controle social do Estado pela cidadania.

Talvez a revolução na educação e na distribuição de renda, a democratizaçãodos meios de comunicação e uma reforma política democrática possam resolver

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esses problemas. Além disso, assistimos à deterioração e à decomposição doPoder Judiciário no Brasil. Nunca houve tanta corrupção em um setor. Todosvêem a corrupção que aparece na política, no Executivo, mas quem trabalha,quem milita no Poder Judiciário sabe a que nível chegou a corrupção nessePoder.

Por tudo isso, o tema das instituições políticas no socialismo é muito impor-tante para nós. E estou convencido de que o nosso caminho é a radicalizaçãodas conquistas democráticas que a humanidade construiu e sua combinaçãocom a democracia direta. Isso dará perenidade às instituições democráticas,porque, no fundo, todos nós fomos muito influenciados, na concepção do Esta-do socialista, pela questão militar – e isso deve ter um contraponto.

Todas as revoluções socialistas brotaram de insurreições, muitas delas deguerras revolucionárias, e todas ocorreram em países com baixo grau de de-senvolvimento da sociedade civil. Então, pagamos um preço por ter realizadorevoluções socialistas nessas condições históricas, porque, em vários casos, asinstituições políticas não estavam desenvolvidas. Em graus diferentes, issoocorreu na Nicarágua, em Cuba, na China e mesmo na Rússia. Assim, paga-mos um tributo pela falta de desenvolvimento da sociedade civil e das institui-ções políticas.

Mas no Brasil temos uma situação diferente. Apesar de todos os retrocessospelos quais passamos, temos instituições de peso como a Contag (Confedera-ção Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), a CUT (Central Única dos Tra-balhadores), o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), temos apresença da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), da CNBB (ConferênciaNacional dos Bispos do Brasil), temos as ONGs, as entidades da sociedade e osmovimentos autônomos, as entidades empresariais e as culturais, as universi-dades, um espaço cultural desenvolvido; temos partidos políticos, sindicatos,uma massa crítica que nos permite pretender construir uma sociedade demo-crática socialista.

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Tarso Genro tem, nesses anos todos, escrito e pensado nessas questões maisdo que a média dos dirigentes petistas, mais do que o coletivo, e foi feliz emsua exposição. Creio que ele abordou várias questões de maneira apropriada, eacho que deveríamos desenvolver outros pontos, como as questões do planeja-mento, da propriedade democrática, da nova economia, além da questão doEstado, da questão militar, da questão dos fundos. Refletir sobre o papel dasempresas, dos bancos e dos fundos sociais.

Acredito que conseguiremos dialogar com a sociedade brasileira a partir deuma perspectiva socialista num nível em que ela possa compreender o que que-remos. Porque, se dialogarmos na linguagem de nossas concepções anteriores,não vai haver interlocução entre nós e a sociedade brasileira.

Muito obrigado.

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Debate com o público

Danilo Cerqueira CésarTarso Genro, especialmente, e JoséDirceu defenderam um projeto de Es-tado regido por uma democratizaçãoradical da sociedade, pela participaçãovoluntária, constante e efetiva. Eu, par-ticularmente, gosto muito dessa idéiae luto por esta democratização total dasociedade com o resgate da cultura po-lítica, determinando diretamente as po-sições e políticas sociais a serem efe-tivadas. Tendo em vista tudo isso, gos-taria de perguntar: como entra o PTnessa história?

Tenho 19 anos, quase a idade do par-tido, sou filho de dois ex-militantes eos acompanhei, literalmente, desde ocolo e fui crescendo junto com o par-tido, indo às reuniões de bairro, enfim,participando, e quando meu pai e mi-

nha mãe saíram do partido eu entrei.Tenho muita afinidade com o partido,então continuei a participar.

Hoje, acompanhando essa série dedebates, Socialismo e Democracia, ficaóbvio para mim o seguinte cenário: oPT cresceu de fato, com força popular,com paixão ideológica, com emoçãomilitante, até 1989. Em 1988-89, ga-nhamos as eleições para as prefeiturasde São Paulo e Porto Alegre, e fize-mos aquela campanha maravilhosa doLula, que ninguém esquece, todos seemocionam ao lembrar, muito mais doque as de 1994 ou 1998, que, para mim,foram um tanto apáticas.

Foi um período lindo do partido, ficoemocionado só de lembrar, apesar deque eu era, naquela época, um piveteque ia aos showmícios, às festas do PT,

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que subia no caminhão junto com meuspais para fazer campanha – e hoje nãovejo mais isso. Após 1989 esse cená-rio mudou. Por que acho que isso acon-teceu? O PT se encantou com a possibi-lidade de ganhar as eleições e esqueceude fazer o trabalho de base. Deixamosesse trabalho totalmente de lado, os de-bates comunitários, debates como estesque estão sendo feitos aqui, enfim, opartido perdeu sua força.

Com isso, na minha opinião, o PTtem se distanciado cada vez mais dosanseios populares de fato, e hoje ésubstituído no imaginário da popula-ção pelo MST. Por que tem se distancia-do? Porque os anseios populares sãoradicais – não no sentido vulgarmenteusado pela mídia –, querem mudar asociedade pela raiz. O PT, hoje, nãoestá passando para a sociedade isso e,nesse ponto, está sendo ultrapassadopelo MST.

Tendo em vista isso e o que TarsoGenro e José Dirceu defenderam, gos-taria de pedir a opinião deles a respei-to de um impasse: ou o PT continua aassimilar o discurso democrático doneoliberalismo, de que vivemos emuma democracia – mesmo com essaapatia política tão característica do

neoliberalismo –, e continua a ser umpartido eleitoreiro, ou, a partir de ago-ra, volta a fazer trabalho de base.

Marco Aurélio GarciaGostaria de dizer, em primeiro lugar,que as duas observações que pretendofazer aqui serão precedidas do meuacordo substancial com o que foi apre-sentado por Tarso Genro. Portanto, nãoquero que elas tenham um caráter po-lêmico além do que substantivamentepossam apresentar nesse sentido.

Acredito que, em sua exposição,Tarso Genro abordou os dois grandesdilemas que temos hoje em dia nessadiscussão sobre socialismo. Um delesé, sem dúvida nenhuma, a questão dosujeito, e o outro é, se é que posso in-terpretar assim, a questão do processo– não sei se Tarso Genro estaria deacordo.

Eu me angustiaria um pouco maiscom a questão do processo que com ado sujeito. A questão do sujeito, narealidade, se observarmos a história daluta de classes desde o momento emque essa expressão se aplica, veremosque é uma história de desconstrução ede reconstrução dos explorados e opri-midos. Um grande historiador inglês,

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Edward Thompson – a quem devemos,sem dúvida nenhuma, uma considerá-vel renovação do marxismo –, escre-veu um artigo memorável, que sinto-maticamente intitulava-se “Luta declasses sem classes”, no qual chamavaa atenção, fundamentalmente, para ofato de que os conflitos de classe nãose dão, como muitas vezes parecia, se-gundo os parâmetros clássicos de umasociedade capitalista que existia maisdo ponto de vista conceitual do que doponto de vista real. Já houve quem dis-sesse que “conceito de cão não ladra”,conceito de classe operária não faz re-volução; quem faz a revolução, ouqualquer movimento social, seja revo-lucionário ou não, é a classe operária,não seu conceito. E essa classe operá-ria sofreu desconstruções e reconstru-ções várias vezes. A classe operáriagloriosa da social-democracia é radi-calmente diferente da mais gloriosaainda que fez as Revoluções de 1830 e1848 na França. É muito diferente. E ofato de que esta classe operária estejapassando a classe trabalhadora – por-tanto o sujeito do processo político aque chamamos socialismo esteja pas-sando por uma desconstrução e umareconstrução – sem dúvida nenhuma se

coloca como um desafio para nós. Nãoacho que seja um desafio novo, masum desafio recorrente na história dosocialismo. E sempre que o socialis-mo não pensou justamente este tipo demudança incorreu em graves erros.

Pensando nas condições da perife-ria do capitalismo, Trotski vai dizer,nas suas famosas idéias sobre progra-mas de transição, que o capitalismo naperiferia é incapaz de cumprir a agen-da capitalista e, portanto, se lutamospor reformas democráticas em deter-minados momentos, pela implementa-ção do capitalismo, nós desestabiliza-mos esse capitalismo, criamos um ní-vel de contradições tão profundas quelevam o mundo à beira da revolução.E essas são idéias que fazem parte dahistória do socialismo. E tanto fazemparte dessa história, estão de tal ma-neira impregnando o pensamento pro-gressista, por assim dizer, que o presi-dente Fernando Henrique – eu insisto:não tomem isso como uma polêmica,porque ela não existe – defendeu, nareunião da Terceira Via de Berlim, emmaio de 2000, que as duas tarefas fun-damentais do governo progressista –como é chamada a Terceira Via – sãoa inclusão social e a radicalização da

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democracia. Qual é o problema, então,que se apresenta? O problema é quehá uma questão histórica em que te-mos que pensar. Há uma espécie deimpasse, uma aforia do socialismo so-bre a qual temos que pensar, e que seliga um pouco, não vou dizer às respos-tas que o jovem que me antecedeu aquisolicitou, mas, sem dúvida nenhuma,às suas inquietações.

E, com isso, gostaria de concluir sim-plesmente saudando a intervenção deTarso Genro, porque acredito que elanos empurra naquela direção, masmostrando a amplitude do desafio in-telectual que temos, que é usar oscânones do socialismo muito maiscomo ferramentas do que como me-tas a serem atingidas; mais do quechegar a uma determinada proximida-de com uma teoria ou com algumasteorias estabelecidas em algum mo-mento. Acho que o grande problemaé saber como nos apropriamos dessasferramentas para pensar nos desafiosdo socialismo, que é o que estamostentando fazer aqui, no momento, tal-vez, em que ele enfrente suas maioresdificuldades.

Sílvio José PereiraMinha questão é um pouco mais sim-ples. Parece que temos um pequenoproblema na relação entre democra-cia e socialismo, ao longo da nossahistória. Hanna Arendt, filósofa ale-mã radicada nos Estados Unidos, emseu livro Sobre a revolução, ao com-parar as revoluções americana, fran-cesa e russa, chega à conclusão de quea Revolução Francesa e a RevoluçãoRussa cometeram o erro que a Revo-lução Americana não cometeu: nãoconstituíram um arcabouço institucio-nal logo após o fim do velho regime.Aquelas duas experiências tiveramque trilhar caminhos em que a neces-sidade material falou mais alto do quea necessidade ideal.

De certa forma, pode-se dizer omesmo das revoluções cubana e chi-nesa, que também não resolveramnosso problema central, que é o dosocialismo, o modelo socializante ea democracia.

Atualmente, a experiência de HugoChávez, na Venezuela, tenta ir alémda democracia representativa, burgue-sa. A questão é: como criar novas ex-periências que nos levem além da de-mocracia representativa?

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Paulo VannuchiGostaria que o Tarso Genro desenvol-vesse dois pontos abordados em suaexposição. O primeiro se liga ao velhodebate sobre reforma e revolução e dizrespeito aos temas levantados no finalde sua intervenção: sistema eleitoral,um determinado tipo de Executivo,controle externo do Judiciário, ques-tões que já estão colocadas na ordemdo dia. Pergunto se ao propor essestemas sua intenção é superar, em nos-sa tradição de esquerda, a idéia de re-volução como mito zerador da histó-ria, que elimina tudo o que aconteceuantes e refunda a humanidade e o uni-verso? Ou se é uma proposta de discu-tir o socialismo a partir, estritamente,do que se tem aqui e agora?

O segundo comentário que peço avocê é que desenvolva mais a maneiracomo este ponto anterior se conectacom a primeira grande experiência ins-titucional inovadora que desenvolve-mos, que é o Orçamento Participativo,uma experiência com que o PT de Por-to Alegre, do Rio Grande do Sul, brin-dou o país. A experiência concreta doOrçamento Participativo representa umembrião de uma combinação nova en-tre democracia direta e representativa,

um processo duradouro de radicaliza-ção da democracia?

Tarso GenroVou expressar algumas opiniões sobreas questões que foram levantadas datribuna. Em primeiro lugar, limitei-meao tema que me foi proposto, “as ins-tituições políticas no socialismo”, quetratei como instituições políticas deum projeto de transição para uma de-mocratização radical do Estado, queconsidero o primeiro momento cons-tituinte de um projeto socialista. Que-ro assinalar bem isso para delimitar aousadia de minha exposição.

Se tivesse que agregar mais algumacoisa em relação ao projeto, diria, porexemplo, que é absolutamente impos-sível desconstituir a dominação do ca-pital – como Edmilson Rodrigues fa-lava –, para pensar além do capital, semque se pense em uma nova teoria daempresa, e que, necessariamente, deveestar associada a um projeto de demo-cratização radical do Estado.

Isso significaria também, como ins-tituições de economia política de umnovo projeto, pensar, por exemplo, deacordo com essa visão de uma novateoria da empresa, em alguns tipos de

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empresa que já estão germinando daspróprias contradições da sociedadecapitalista, da mesma forma como es-tas instituições também estão. Não sepode tirar tudo apenas da hipótese ideal,há que se retirar de um movimento eco-nômico-social real os elementos consti-tuintes de um novo projeto. Creio queessa é uma lição válida do velho e bommarxismo de Marx. Por exemplo:numa visão de uma nova teoria daempresa – sem a qual, quero reiterar,não é possível fazê-lo –, pensar umprojeto socialista. Proponho, por exem-plo, refletir sobre quatro tipos de em-presas para um projeto dessa nature-za, associado a novas instituições po-líticas: a empresa pública não-estatal,a empresa estatal sob controle públi-co, a empresa privada de interesse pú-blico e a empresa estatal sob controledo Estado, por exemplo, ao lado dasempresas privadas. Por que essa novateoria da empresa é fundamental parapensar a nova ordem? Porque por meiodela é possível constituir uma novaregulação e, portanto, pensar umasociedade cujo movimento socio-econômico e político tenda para a re-dução permanente das desigualdades.Vou até aí.

É possível pensar na supressão dalei do valor, na supressão do capital?Já pensei que sim, mas não tenho con-dições de formular algo sobre issohoje. Hoje eu estaria inclinado a pen-sar mais sobre quais são os projetosconcretos por meio dos quais sedesconstitui o poder absoluto do ca-pital sobre o Estado e sobre a vidapública. E, portanto, isso me levariaa propor determinadas visões de ins-tituições políticas e de organizaçãoeconômica por meio de uma nova teo-ria da empresa.

Quero dizer que as experiências dosocialismo real contribuíram muitopouco com isso. Tanto é que a teoriada empresa da experiência estável daUnião Soviética é a mesma da socie-dade capitalista. Exatamente a mesma,sem nenhuma diferença, não só na vi-são produtivista como na extração damais-valia apropriada pelo Estado edepois distribuída para a burocracia.E sem que se tenha uma nova teoria daempresa – o professor Paul Singer tempensado bastante sobre isso, nos aju-dando muito nessa questão – é impos-sível pensar uma forma de organiza-ção nova, social e econômica e, por-tanto, uma nova sociedade.

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Acho que a questão apresentada pelocompanheiro Danilo Cerqueira Césaré falsa – digo isso sem nenhum pater-nalismo. Esta visão de um partido idí-lico, cujos dirigentes voltam-se para asbases, como ele propõe, não é uma vi-são de partido político moderno, nãotem nada a ver com ele. O partido dosocialismo, do novo projeto socialis-ta, tem um conjunto de quadros, demilitantes intermediários, de homensmédios, que se comunicam com todasas estruturas – de poder e de mobiliza-ção social –, e não é uma organizaçãovoltada exclusivamente para a base dasociedade; é voltada para o Estado, apolítica, as instituições, a totalidadeeconômico-social, a totalidade da so-ciedade. E se relaciona com todas asclasses ou por uma relação de neutra-lidade, ou seja, procurando neutralizardeterminadas classes; ou do conflito,mais ou menos agudo; ou da articula-ção do seu projeto a essas classes, co-lhendo nelas os ensinamentos – inclu-sive os que vêm do movimento – paratransformá-los em programas e, por-tanto, universalizá-los.

Este partido monástico que se voltapara os movimentos sociais e se extin-gue enquanto sujeito político univer-

sal não existe. Isso é o movimento so-cial, e assim tem de ser. O MST faz oque tem de fazer, efetivamente. O queo PT tem de fazer é dar suporte ao MST,discutir, inclusive, sua estratégia – seela é correta ou não – e estabelecer umprofundo diálogo com ele, jogar seusmilitantes na sustentação, na organiza-ção e na proliferação de milhares deMSTs, mas o partido não tem que setornar um MST, mesmo porque este éum movimento de uma parte muitopequena da sociedade e o partido polí-tico tende para a universalidade. Ele éa parte que quer constituir o todo, ba-seado num programa que tenha o má-ximo de versatilidade e de abrangên-cia social contra a minoria que contro-la o Estado e o capital.

Então, compreendo a ansiedade docompanheiro e a considero nobre, masestá baseada numa visão equivocadado que é um partido político modernosocialista, na minha opinião.

O que não quer dizer – agora gosta-ria de fazer o meu contraponto também– que o PT, hoje, não esteja posto dian-te da possibilidade de se tornar umpartido da ordem ou da transformação,da reforma radical ou da revolução.Esta é a tensão que vai acompanhar

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sempre os partidos legais. Quando osocialismo se legaliza na ordem demo-crática, essa tensão é permanente. Tra-ta-se de verificar qual a tensão que setornará hegemônica dentro do partido.Essa é uma questão nossa. Nós, os di-rigentes partidários, precisamos tê-lapresente sempre, isso faz parte da “le-galização do socialismo”, ou seja, é aforça atrativa, a força centrípeta quetem a ordem sobre os partidos da de-sordem, ou da outra ordem. Esta com-preensão deve dirigir e estar semprepresente – como está em nossos deba-tes internos –, na minha opinião.

E aí entram as questões expostas porPaulo Vannuchi, que são a da reformae a da revolução. Nós, a esquerda emgeral, na verdade sempre tratamos es-sas questões encobrindo uma outra dis-cussão ou substituindo-a. Mas a ques-tão real é: estamos tratando da luta ar-mada ou das reformas? Essa é a verda-de. A visão, vamos dizer assim, oepíteto ou a acusação de reformista, naverdade, é uma acusação de pacifismoe de transformação dentro da ordem.É isto o que está associado ao refor-mismo. E, na postura revolucionária,teria como contraponto a questão daluta armada, ou seja, a destruição do

Estado. Era isso que estava na basedas duas vertentes do comunismo his-tórico, como diz Norberto Bobbio: ospartidos comunistas da forma comoeles existiram e o reformismo social-democrata.

Na verdade, observou-se na Améri-ca Latina um processo revolucionáriofundado na luta armada. E tanto podese tornar uma revolução adequada aoconceito de comunismo histórico –como é o caso de Cuba – como umatransformação democrática timida-mente reformadora – como na Nica-rágua. Essas duas possibilidades estãona base da experiência da luta armadaou da visão que remete à destruiçãodo Estado.

Acho que a questão fundamental quePaulo Vannuchi coloca é: como se de-duz do projeto os meios para realizá-lo? É possível uma democratizaçãoradical do Estado brasileiro sem rup-turas? Minha avaliação é que não.Acho que a ruptura está concretamen-te colocada para a democratização ra-dical do Estado brasileiro e para umprocesso de transformação econômi-ca em direção a uma economia políti-ca que tenda crescentemente para aigualdade. Se essa ruptura se dará por

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meio de amplos movimentos sociais epolíticos que levem a sucessivos pro-cessos plebiscitários, ou duas ou trêsConstituintes dentro de um determina-do período histórico, ou se haveráenfrentamentos ou não, não tenho amenor idéia, sinceramente. Tanto podeocorrer como não. Isso vai ser deter-minado pela própria capacidade dehegemonização que nosso projeto teráe pela forma como as classes dominan-tes vão se comportar nesse processo.

Acho, por exemplo, que a defesa di-reta, armada, dos princípios que estãoescritos na Constituição brasileira éuma possibilidade muito concreta emum país como o nosso.

Agora, o fundamento de toda aquestão é se esse projeto, como pro-jeto socialista, preserva a questão de-mocrática como central ou não. É issoo que está proposto, na verdade. Apreliminar, em última análise, que vaiorientar os movimentos é se a demo-cracia preside ou não o processo. Eaqui falo, evidentemente, sem limitaro conceito de democracia à visão de-mocrática formal que está na base daconcepção de democracia como for-ma de dominação do capital, da so-ciedade capitalista.

Em relação ao Orçamento Participa-tivo, na minha opinião, é uma expe-riência nuclear, uma pequena experiên-cia de controle externo do Estado e deemergência de um direito público foradele. Vou dar dois exemplos concre-tos: os conselhos populares que dãobase ao Orçamento Participativo, emPorto Alegre, organizam-se fora doEstado, como sociedades civis ideais,não regulamentadas, não inscritas emcartório; e – segundo exemplo – o re-gulamento, a norma jurídica que orien-ta o funcionamento dos conselhos e adefinição das prioridades é uma nor-ma de direito público produzida forado Estado. Ela é votada pelos 16 con-selhos populares e vale para eles comoregulamento. Portanto, é uma esferapública fora do Estado, constitui o seupróprio direito, que não se confrontacom a Constituição e afirma algunsaspectos democráticos, inclusive, doprocesso constitucional.

Quais são os valores que transitampor dentro desses conselhos e quais osque são colocados em conflito na polí-tica que se dá nessa esfera fora do Es-tado? Os mesmos valores da políticatradicional. A tentativa de mando, aambição, a busca de carreiras políti-

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cas, de influência, de uso para benefí-cios pessoais. Ou alguém tem ilusãode que existe um bom ser, trabalhador,que está fora da sociedade e das leismercantis dessa relação? Só que háuma diferença radical: a cena públicademocrática desconstitui de maneirapermanente esses valores e faz um pro-cesso de educação e criação de umanova cultura política de forma perma-nente. Tanto que o regulamento per-mite a reeleição dos representantes quevão produzir o Orçamento, mas proí-be uma terceira eleição. Ele desenvol-ve os mecanismos na cena pública de-mocrática que faz com que esses valo-res sejam permanentemente sufocados,transformados em “resíduo” nas rela-ções. Mas há o assédio permanente –vamos dizer assim – dos contravaloreshegemônicos na sociedade capitalista.

Em que estamos pensando para oquarto mandato petista na prefeiturade Porto Alegre? Em interpor maisamplamente um tipo de elemento, quesão as plenárias temáticas, para des-constituir o que nós chamamos de cor-porativismo geográfico. Plenáriatemática é a cena pública aberta paratemas, por exemplo, a educação. Nes-se caso, a discussão não é por região,

qualquer cidadão pode participar. Há,então, o confronto do universal, noconselho temático, com o particular,que é a ambição e a necessidade decada região da cidade. Esse é um ele-mento que nós interpusemos – aindadurante o meu primeiro mandato comoprefeito (1993-1996) iniciamos as ple-nárias temáticas – e criou uma novadinâmica.

Agora, para o quarto governo, que-remos interpor outros elementos: a con-sulta, o plebiscito e o referendo, viaconsulta informatizada ou por voto di-reto – que temos que discutir ainda –,para jogar para a cena pública univer-sal as decisões dos conselhos, as prio-ridades que ele determinar, dando umdeterminado valor, um grau, pontos deimportância para essa consulta do votoindividual, porque ela é menos abertaà cena pública.

A experiência do Orçamento Parti-cipativo vem da tradição da Comuna,ou seja, a estrutura do Orçamento Par-ticipativo é praticamente uma institui-ção de direito público que, em últimainstância, “subordina” o próprio Po-der Executivo. No começo da nossaexperiência – tive a felicidade deacompanhá-la desde o início, na ges-

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tão de Olívio Dutra na prefeitura, quan-do eu era vice-prefeito e secretário deGoverno –, entendíamos que os Con-selhos Populares, os delegados do Or-çamento Participativo e os representan-tes, que formavam o núcleo menor,substituíam a Câmara de Vereadores.Depois aprendemos que isso era algocompletamente equivocado, porque, naverdade, se tratava de uma esfera depoder fora do Estado. Eu tinha, por umlado, que negociar, e, por outro, quecriar uma hegemonia político-socialcapaz de fazer com que a Câmaraapreendesse para si as decisões do Or-çamento Participativo, que estavaminscritas na peça orçamentária e queela devia – e deve, por dever consti-tucional – votar todos os anos.

O processo do Orçamento Participa-tivo é uma experiência nova, que estáem gestação. A partir dessa experiên-cia real, tenho procurado teorizá-la,formulá-la como uma esfera públicanão-estatal de poder autônomo da so-ciedade perante o Estado, cuja ligaçãose dá pela política e pelos princípiosconstitucionais que estão inscritos, in-clusive, na Constituição de 1988.

Edmilson RodriguesHá uma questão proposta por José Dir-ceu que, a meu ver, é central: a pro-priedade privada dos meios de produ-ção. Penso que aí está um elementoimportante para um debate que aqui secoloca, que se expressa, em grandemedida, no jargão reforma ou revolu-ção. A revolução foi qualificada porTarso Genro de uma forma que eu nãoconcordo. Não necessariamente “revo-lução” é sinônimo de luta armada eviolência; como não necessariamente“reformismo” é sinônimo de pacifis-mo. Posso dizer o seguinte: o reformis-mo é, aparentemente, pacifismo, masé também essencialmente violento namedida em que reforça a estrutura vi-gente que se sustenta na violência eaprofunda a barbárie. Digo isso ape-nas para fazer um contraponto.

Se, realmente, estamos debatendoum projeto de sociedade socialista,devemos qualificar nossa concepção desocialismo. O que buscamos é um tipode social-democracia com matizes bra-sileiros ou algo que necessariamentepressupõe uma ruptura com o capita-lismo, um tipo novo de formação so-cial? Acho que há de se enfrentar essedebate. Pessoalmente, acredito que não

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temos como fugir dele, não há umainexorabilidade para a tomada do po-der. A teoria dos elos débeis do modode produção capitalista foi desenvol-vida numa situação histórica concreta.A Revolução de 1917 na Rússia certa-mente não era o que, do ponto de vistada teoria marxiana, estava pensadocomo possibilidade primeira, mas foilá que aconteceu. E os que dirigem pro-cessos sociais e políticos, como os di-rigentes da Revolução Russa, não po-deriam dizer simplesmente: não somosnenhuma Inglaterra, logo cruzemos osbraços e deixemos ficar como está. Eranecessário agir, mesmo com todas ascontradições que advinham da tentati-va de construir o socialismo a partirde uma formação social que, pode-sedizer, apenas em 1905 conseguira rom-per com o modo de produção feudal e,por isso, iniciava sua transformaçãopara a forma capitalista de sociedade.

Acredito que devemos pensar a possibi-lidade de ruptura com a sociedade atual.Mas não temos o direito de achar queseja possível definir data para “tomar-mos de assalto” o Palácio do Planalto.

Uma questão importante é a que oDanilo Cerqueira César apresentou, deforma tão espontânea, uma preocupa-

ção que deve ser considerada, pensan-do-se na radicalização da democracia.O PT também representa apenas umaparcela da sociedade; é formalmenteconstituído, mas é também um projetoainda em construção. O MST é, formal-mente, um movimento social, e não umpartido, pelo menos do ponto de vistaformal, mas na concepção de Gramscipode ser caracterizado como um par-tido, haja vista ter uma estrutura orgâ-nica bem definida, disciplina, hierar-quia, um tipo peculiar de democraciainterna etc. Em síntese: formalmente oPT é um partido e o MST não. Masquantos militantes do PT guiam-se, nosembates sociais, nas lutas concretas,pelas decisões do MST, já que muitasvezes o PT não exerce papel dirigen-te?! É importante refletir sobre isso,porque não é por ser o PT um partidoque terá sempre autoridade para falarque outros movimentos sejam “ape-nas” movimentos sociais.

Por fim, uma questão que gostariade apontar: o Orçamento Participativoe outras experiências de participação,como processo de radicalização demo-crática, configuram-se enquanto pro-cessos de construção de poder popu-lar ou não?

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Sabe-se que nunca participa a totali-dade do povo; sempre a representaçãodireta terá qualidade diferente da re-presentação parlamentar, da democra-cia representativa, mas será, em algumgrau, uma representação legítima dasociedade.

Em Belém, reunimos em 2000 apro-ximadamente 100 mil pessoas nas as-sembléias populares, mas temos 1,3milhão de habitantes e 800 mil eleito-res. Os 100 mil cidadãos têm legitimi-dade para dizer: “Representamos maisdo que os 33 vereadores”? A democra-tização radical é um processo cujaconstrução tem uma clara orientaçãopolítico-ideológica, e acho que essa éuma questão que tem de ser problema-tizada, porque o Orçamento Parti-cipativo e outras formas democráticasadotadas pelos governos do PT podemse transformar em meros instrumentosde administração da crise.

Em Belém, ou Porto Alegre, ouCuritiba, implanta-se o OrçamentoParticipativo, mas na verdade a dívidasocial que o Estado tem de pagar paraa sociedade é impagável no período dequatro anos no qual a população é cha-mada para decidir sobre o resgate departe dessa dívida, e às vezes a dívida

cresce ainda mais. Por exemplo, Belémé uma cidade amazônica com proble-mas estruturais bem superiores a ou-tras cidades deste país capitalista, porconta das desigualdades inter-regio-nais. Em uma conjuntura como esta,basta uma manobra do governador doestado para criar entraves – como temfeito o governador do Pará, AlmirGabriel, que retirou 100 milhões dereais da prefeitura, reduzindo de 39%para 24% a cota do ICMS (Imposto so-bre Circulação de Mercadorias e Ser-viços). Isso significa simplesmente cin-co anos de arrecadação de IPTU (Im-posto Predial e Territorial Urbano).Ora, por mais que o crescimento daparticipação popular represente umgrande avanço, a verdade é que o mui-to que se possa fazer é pouco para adimensão da dívida social. Você cha-ma as pessoas e diz: “Temos tanto paragastar”. Em nosso caso, ousamos, comtodas as dificuldades e limitações queo processo novo oferece, discutir 100%do Orçamento.

Mas o povo vem e discute o “paratrás”, a dívida social. Então surge anecessidade de discutir o “para fren-te”. Nos debates temáticos é fundamen-tal que fique claro que o que se discute

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não é o projeto da sua rua, é um proje-to para a cidade, estruturante do de-senvolvimento urbano. Mas, ainda as-sim, tudo isto pode estar sendo pensa-do sem que necessariamente influen-cie qualquer possibilidade de rupturacom a sociedade atual.

É um processo autônomo, mas orien-tado e incentivado pelo próprio Esta-do – porque não deixa de haver influên-cia do governo na realização do Orça-mento Participativo. Um governo dedireita, em geral, quando tenta fazê-lo,o faz de forma burocratizada. O desa-fio é fazer com que essa experiênciase expresse concretamente na cons-trução de novos valores culturaisnegadores dos valores hegemônicos.

Pedirei licença para citar um exem-plo de confronto político-ideológico.A companheira Clara Charf, viúva deCarlos Marighella, esteve em Belém,onde fizemos uma exposição sobre ele.Iniciamos a construção de um viadutona principal avenida de Belém e deci-dimos denominá-lo Carlos Marighella.A oposição está feroz. Não adianta di-zer que Marighella não conseguiu con-cluir engenharia porque a repressãonão permitiu; não adianta falar que eleera pai e marido amoroso; não adianta

dizer que ele era poeta, explicar quesua vida foi dedicada à construção deum mundo justo, solidário, feliz, semcrianças famintas, sem violência dehomem contra mulher, sem racismo,sem preconceito de qualquer tipo. Esseera o seu sonho, era sua utopia! Nãohá um dia em que não tenha uma notana imprensa para criticar o fato de es-tarmos homenageando um comunistaque, além disso, nem paraense é. Masum governo não é só para se eleger ereeleger a qualquer custo. Ou se en-frentam determinados debates e qual-quer espaço de participação deve sercampo para debates, digamos assim,da construção do poder popular, ou,a meu ver, vamos ficar limitados emnossa atuação e correr o risco de serbons na administração da crise de umsistema que não é aquele com o qualsonhamos.

José DirceuAcredito que essa última fala doEdmilson Rodrigues retrata bem ascontradições e as polêmicas com queo PT se debate. Já governamos muitascidades em que obtivemos grandesavanços do ponto de vista administra-tivo, ético, de obras sociais, de distri-

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buição de renda, e perdemos a eleição.Porque existem elementos políticosformadores da construção do partido,da relação do partido com a sociedadelocal, do desenvolvimento de institui-ções políticas, de culturas políticas noconjunto da comunidade, que nemsempre são desenvolvidos. Esse é umproblema que temos que procurarequacionar.

Porto Alegre é uma cidade ondeconstruímos uma hegemonia – talvezseja um caso clássico de combinaçãode hegemonia com bloco social, lide-ranças políticas, organização de parti-do, além da especificidade cultural doRio Grande do Sul e de Porto Alegre.Mas a realidade brasileira é muito maiscontraditória do que a de Porto Alegre.

O PT tem ganho muitas eleições emcidades relativamente ricas, em cida-des médias, como Blumenau (SC) ouRibeirão Preto (SP), para citar apenasduas. Das dez cidades de melhor qua-lidade de vida do Brasil, o PT só nãogovernou Curitiba. Então, o PT tambémrepresenta, de certa maneira, um setormoderno da sociedade. Por isso consi-dero importante esta questão que oEdmilson Rodrigues levantou. É umdebate recorrente entre nós. E o modo

petista de governar, na quinta geraçãode prefeitos, tem que fazer essa ava-liação e incorporar essas questões.

Se fosse para qualificar a revoluçãoque queremos, eu diria que precisamosfazer uma revolução democrática – jáque se falou aqui em reformismo re-volucionário, em reforma e revolução.E a realidade já está se impondo. Arevolução, assim como as mudançassociais, se expressa de forma recorrentepelas insurreições e rebeliões popula-res. Não vamos fechar os olhos para oque está acontecendo na América doSul. Será que há, nesse momento, po-der exercido de forma mais violenta doque aquele que os Estados Unidos exer-cem sobre o mundo? Não há. Não hácaso semelhante na história. E as guer-ras do Iraque, da Sérvia, da Iugosláviamostraram isso. Mostraram o tipo decooptação, de coerção, de domínio queeles estão exercendo sobre os países daAmérica do Sul, a domesticação e adap-tação das Forças Armadas de váriospaíses ao controle estratégico dos seusestados-maiores pelos Estados Unidos.E as leis, que são depois aprovadas epermitem esse controle, mostram queesse processo vai além da dominaçãoeconômica da América Latina.

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O presidente Fernando HenriqueCardoso disse em entrevista recenteque os americanos têm um contenciosocom o Brasil porque não queremosceder a eles o controle estratégico dasoperações das Forças Armadas brasi-leiras. No fundo, é disso que se trataquando se fala em lei de abate de avi-ões no espaço aéreo brasileiro. Os avi-ões penetram ilegalmente no nosso es-paço aéreo e não temos autorizaçãopara derrubá-los.

Vocês sabem que os cubanos paga-ram caro, caríssimo, por tomar umadecisão de Estado, de governo, de der-rubar um avião mesmo depois de eleter sido avisado várias vezes que esta-va no espaço aéreo cubano, que o ha-via invadido de maneira ilegal, o queviolava as leis internacionais, e quebastava uma ordem do comando deterra para que a aeronave fosse abati-da. Foi passada a informação que seexigia que ela voltasse para o espaçoaéreo internacional, para o espaço aé-reo norte-americano, e o avião foiabatido.

Então, quando se fala em revolução,no sentido da insurreição, da revoltapopular – e houve recentemente umarevolta popular no Equador que tomou

o governo –, revela-se o problema quetraz o MST à tona e ao centro da dis-cussão: tomar o poder não quer dizernada. Os sandinistas tomaram o podere o perderam mais tarde, em uma elei-ção. Apesar de enfrentarem uma guer-ra de agressão, um cerco dos EstadosUnidos e sem ter a solidariedade queCuba tinha tido, além do que nem es-távamos nos anos 60, eles perderam opoder em uma eleição.

A insurreição em Quito, numa ava-liação preliminar e a distância, não ti-nha partido político, coesão de entida-des, força política e social para tornar-se governo. A radicalidade na formade luta pode não significar muito emdeterminadas situações históricas.

Então, existe um problema que vaialém do MST ou de qualquer movimen-to social brasileiro ser radical e pregara insurreição popular. Existe a ques-tão política de constituir uma força po-lítica, um bloco social, um programade governo, de solidariedade, de coe-são e de consenso em certos setoressociais para exercer o governo depois.O risco que estamos correndo no Bra-sil é o de não ter esta capacidade. Nes-se ponto, a responsabilidade do MST égrande, porque o problema do PT, do

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PCdoB, da CUT e da CONTAG com o MSTé em relação a agir de forma comum.E quando se fala em tomar o poder que-ro sempre lembrar o seguinte: é paratomar o poder no Brasil com relaçãoaos Estados Unidos e ao mundo, e nãoapenas do ponto de vista interno, na-cional. Acabem com essa ilusão! Nãoexiste isso neste mundo! Não existe atomada do governo na Venezuela porChávez; ele vai ter que se entender comos Estados Unidos. Então, a situaçãodo mundo, hoje, é muito mais comple-xa. E não tem mais a União Soviética,não tem o campo socialista que, comtudo que tinha de irreal, oferecia a re-taguarda militar, econômica, diplomá-tica e de relações comerciais.

Tarso Genro, a meu ver, colocou bema questão do MST, e a temos discutidoabertamente com os companheirossem-terra e com os companheiros daesquerda aqui no Brasil. É preciso ha-ver compreensão e capacidade de arti-culação em comum, mas sem esque-cer que o PT não é o MST, que a CONTAGnão é o MST. O MST não representa todoo campesinato brasileiro, mas uma par-cela pequena do campesinato sem-ter-ra e uma parcela muito pequena dopovo brasileiro. E tem organizada uma

parcela menor ainda. A radicalidade daforma de luta e a estrutura hierárquicae disciplinada do MST não são aceitaspor todos, senão vamos voltar a 1968.O movimento estudantil também acha-va, naquela época, que tinha força po-lítica, em associação com alguns seto-res da classe operária avançada deContagem (MG) e de Osasco (SP) e comgrupos nacionalistas e militares, paraenfrentar a ditadura militar. Fazia umaavaliação de que ela estava se desagre-gando e que o Brasil ia entrar numaprofunda crise econômica. Não acon-teceu nada disso. O Brasil cresceu, ain-da que por meio do “milagre econô-mico”, que deu coesão à ditadura.

Então, é isso o que temos discutidocom o MST, de maneira tranqüila. Nos-so problema não é ocupar terras, pré-dios, não é radicalizar a luta pela terra.Aliás, o MST cresceu com o apoio totale solidário de todo PT nesses dez anose muitos dos integrantes do MST seidentificam como petistas. O proble-ma é qual a tática de luta agora e quaisos objetivos que estamos buscando amédio prazo.

Não tenho tido peias de dizer que, àsvezes, sou um pouco rigoroso ao anali-sar o caso do MST. Muitos companhei-

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ros me criticam por isso. Já fui critica-do até em uma reunião de prefeitos.Mas é preciso começar a discutir.

O PT é um partido tensionado e os-cila muito entre a cooptação pela or-dem, ser um partido transformador ouser um partido da desordem. E temosque combinar isso. Não acredito quedisputar uma eleição como faz o PT,governar como governa, seja qualquertipo de desvio.

Estamos pensando em constituir umademocracia, instituições, programas,políticas públicas, uma educação e umacivilização política no país. Não ima-gino outro caminho. O outro caminhonão deu certo nos países onde foiexperimentado.

É certo que o PT tem sérios proble-mas na organização, na formação, namobilização do conjunto da base par-tidária. O partido, nesses anos, se trans-formou numa instituição política, temum peso grande no Parlamento, gover-na, tem apoio social e popular. O PT éo maior partido do Brasil e da Améri-ca Latina, mas tem um problema gra-ve de organização da militância, deformação, que nós, inclusive, estamoscomeçando a debater, a discutir, alémde tomar sobre ele uma série de medi-

das. Mas não voltaremos a ser o PT de1989, porque não existe o Brasil de1989, nem a ascensão social do Brasilde 1989, ou as condições para o pró-prio PT repetir aquilo. Ou seja, existeum problema em relação à diminuiçãoda base militante do PT, que é um pro-blema real.

O PT corre o risco de se tornar umpartido “sem pés”, vamos dizer assim.E essa é uma preocupação que temos.Agora, não se substitui isso pela açãodo MST, e é isso o que eu quero dizer.Até porque a característica do PT éoutra. O PT, quando se relaciona com asociedade, se relaciona com o conjun-to. Um vereador do PT é tão impor-tante quanto um conjunto de filiadose militantes. O PT tem 45 mil dirigen-tes. Isso é uma força política extraor-dinária. Não estou falando de militan-tes filiados, mas de dirigentes. O PTpode ter 4 mil vereadores a partir daseleições de 2000. Isso é uma força, sefor direcionada no sentido que esta-mos discutindo. Evidentemente que,se esta força for direcionada para in-teresses pessoais, mandatos parlamen-tares individuais, esquemas políticos,para a política do dia-a-dia do Brasil,ela acaba.

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Paul SingerPedi a palavra porque queria discutirum pouco uma proposta de Tarso Gen-ro que me parece importante, a respei-to de um Parlamento com delegados –ele usou a palavra delegados e nãoParlamento de deputados, com manda-tos revogáveis –, e acho que há impli-cações nessa proposta que deveríamosexplicitar e tentar aprofundar um pou-co, considerando o que significa isso apartir de agora.

Na realidade, se entendi direito suaspalavras, isso significa que se deve terum colégio eleitoral identificado, e apessoa, que é o delegado, não propria-mente um deputado ou um senador,deve ter um mandato imperativo, ouseja, nas votações fundamentais ele temque consultar os que o elegeram, e temque haver formas de ele poder consul-tá-los. Na realidade, essa proposta ca-minha, eu diria, em direção à demo-cracia direta, da qual sou, há muitotempo, entusiasta.

Gostaria de dizer que a internetpermite isso. Hoje esse sistema deconsulta é menos utópico do quepode parecer. Creio que a prática dainternet está nos fazendo criar colé-gios de opinião, formas de manifes-

tação e de interação com os quais nãosonhávamos.

Não sei se vocês concordam, se vãopoder falar sobre isso, mas estou con-vencido de que deveríamos pensar anova economia, particularmente ainternet, como um grande projeto deinstitucionalizar formas diretas de de-mocracia. Ou seja, deveríamos lutarpara que cada brasileiro tivesse acessoà internet, não só material mas tambémtécnico, que soubesse e estivesse ha-bituado a usá-la.

Gostaria de dizer só mais uma coisae ouvir depois a opinião de vocês.Acho que a grande dificuldade de ca-minharmos para a democracia diretasignificativa, não para algo meramen-te simbólico, não é só o problema dacomunicação, mas também o do dese-jo de participar. Creio que essa deve-ria ser uma discussão, e ela se ligacompletamente à discussão do definha-mento das bases do PT. Não é algo quea direção do PT possa resolver, mas oproblema do maior ou menor entusias-mo com que a base se mobiliza ou não,de conseguirmos criar formas de de-mocracia direta, cada vez maiores,dentro do PT. Não significa apenas ele-ger diretamente o presidente do parti-

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do, mas, muito mais do que isso, criarcolégios de participação direta nosmandatos do PT, dos prefeitos, dosvereadores.

Acho que a proposta de Tarso Gen-ro, levada a sério como uma propostade ação imediata, e não algo que vaiser inscrito para um futuro longínquo,pode gerar muita coisa interessantepara ser feita a partir de agora.

Jorge AlmeidaMarco Aurélio Garcia disse que exis-tem duas questões de fundo em discus-são em torno da questão das institui-ções no socialismo: a do sujeito e a doprocesso. Eu diria que, talvez, pudés-semos ver quatro questões que sãoimportantes. A primeira é o objetivo,ou seja, que tipo de instituição quere-mos construir no socialismo? A segun-da são as condições para se fazer isso(materiais, políticas, culturais etc.);depois viriam a questão do sujeito,como uma das condições especiais; ea questão do processo.

Em relação à questão do objetivo,queria chamar a atenção para o seguin-te: considero que, na realidade, todoesse processo que temos visto, chama-do de democracia direta, por meio de

conselhos, delegados etc., na práticanunca foi democracia direta – nem nossovietes. Sempre foi constituído umprocesso democrático direto com es-colha de delegados, mais ou menos es-táveis, mas ele sempre se transformanuma forma de democracia representa-tiva – conselhista, porém representati-va. E democracia direta, efetivamente,numa sociedade complexa como a nos-sa, só existe de uma forma, que é o ple-biscito. Qualquer outra forma vai terum intermediário.

Vejo que a democracia representati-va, com parlamentares, é fundamentalporque é a mais estável para decidiruma série de questões; a conselhista,como se pratica, é importante; e a de-mocracia direta tem que ser exercidavia plebiscito e por intermédio doavanço dos meios de comunicação;com a internet, como citou Paul Singer,teremos condições de fazer plebisci-tos com regularidade.

Então, acho que, do ponto de vistatecnológico, pela primeira vez nossasociedade tem condições de colocar emprática uma democracia efetivamentedireta, plebiscitária.

Em relação ao segundo aspecto,embora estes avanços tecnológicos se-

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jam um dos meios utilizados, ainda háo problema das condições materiais, eenveredo para a discussão do proble-ma da propriedade privada dos meiosde produção.

Não sei como se pode imaginar umademocracia, um socialismo, em que osgrandes meios de produção não este-jam de alguma forma socializados. Édifícil acreditar na hipótese de existiruma hegemonia sem que quem tenha ahegemonia na sociedade não a tenhasobre o centro, os pilares da produçãoeconômica. Então, independentemen-te dos quatro tipos de propriedade queTarso Genro apresentou, o problema ésaber o seguinte: o miolo, o centro, osetor hegemônico da economia vai es-tar nas mãos de quem? Isto, para mim,é o que importa discutir.

Aí eu colocaria o problema do su-jeito: não são os que vivem do capitalque vão realizar as mudanças, são osque vivem do trabalho.

Agora, quanto à nossa história, dasesquerdas, acho que estamos muitopreocupados com o fracasso que ti-vemos – e concordo com uma sériede críticas que foram feitas. Temosque ver é o seguinte: houve revolu-ções que foram derrotadas por con-

tra-revoluções, vitórias eleitorais (so-cialistas, democráticas, populares, na-cionais, outras de diversos tipos) der-rotadas militarmente e até revoluçõesderrotadas por eleições, como foi ci-tado aqui anteriormente. Mas não co-nheço nenhum caso de processo vito-rioso somente pela via eleitoral. Essenão existe na história, não houve ne-nhum. Todas as experiências de es-querda que tentaram ir adiante e cons-truir essas instituições do socialismoforam derrotadas militarmente, quan-do não eleitoralmente. Nenhuma saiuvitoriosa por outra via.

Sem ruptura, também não conheçonenhum caso. Então, o que quero di-zer é o seguinte: com rupturas houvederrotas, agora, sem rupturas não hou-ve nenhuma possibilidade. Nem tenta-tiva de construção, com exceção de unsdois ou três anos, como houve no Chi-le, e não passou disso. As outras po-dem ter envelhecido, algumas foramderrotadas até pela senilidade, como aRússia, por exemplo. Esta é, portanto,uma questão que devemos enfrentar.

Por isso gostaria que aqui, no deba-te, nossos companheiros falassem umpouco sobre esse aspecto do processo,e das condições materiais, no que diz

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respeito ao grande capital e ao núcleocentral da economia. Obrigado.

Ricardo MusseGostaria de retomar uma dica da falade Marco Aurélio Garcia, que não foidesenvolvida inteiramente. Ele dizia aTarso Genro que essas questões quediscutimos não são novas na históriado socialismo, e eu queria apenas com-plementar um pouco, situando isso his-toricamente – desculpem-me aqui oviés acadêmico.

O que me deixa um tanto quanto en-tusiasmado é notar que o PT superoua discussão predominante na esquer-da nos anos 60, que se pautava nadicotomia luta armada ou movimentodemocrático. É claro que há uma uni-formidade total em favor da democra-cia, e essa uniformidade tende a su-plantar um pouco a dicotomia teóricaque se dava na época entre a social-democracia européia e o modelo desocialismo russo.

Nós, de certa forma, recuamos, e, aofazê-lo, progredimos em face do de-bate alemão. As posições russas – nãosó pelo fato da derrota causada peladesagregação do sistema soviético –ficaram inteiramente em segundo pla-

no, e retomamos muito o debate ale-mão pré-Primeira Guerra. Então, pos-so identificar aqui, como Marco Au-rélio já adiantou, a defesa de posiçõesde Berstein. Podemos identificar tam-bém, nesse sentido, que o MST talvezseja o representante mais legítimo des-sa retomada, com uma certa tendênciaa conceder também um peso maior àatividade extraparlamentar, que seriaa posição de Rosa Luxemburgo. Nodebate, senti falta, como estudioso doperíodo, de Kautski, e achei que há umcerto desequilíbrio porque quem repre-senta aqui a posição de Kautski é ummilitante, e não um dirigente do parti-do. Ora, a força da social-democraciaalemã e a riqueza intelectual do perío-do residem, em grande parte, na estra-tégia de Kautski de organização dopartido.

Quer dizer, Berstein, por um lado,defendia uma posição de radicalizaçãoda democracia; Rosa Luxemburgo, emum outro extremo, defendia que a açãoextraparlamentar era a forma deradicalizar – à maneira dela – a formasocialista de democracia, só podendotomar essa posição porque o socialis-mo, lá, aparecia como algo forte nohorizonte, porque o partido estava or-

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ganizado segundo os moldes pensadospor Kautski.

Então, acho que ainda falta um pou-co no PT o pressuposto dessas toma-das de posição. Estamos aqui discutin-do muito o que fazer com o socialis-mo, mas nós – e isso senti um poucono discurso de Tarso Genro – ainda nãoestamos preenchendo esse miolo, te-mos aqui uma certa unidade, uma cer-ta concepção do que fazer e de comofazer essa transição socialista, mas todoo debate girou em torno de como che-gar lá. E esse “como”, essa estratégia,creio, deixou um pouco em segundoplano esse modelo de Kautski.

Para exemplificar isso, queria tomaro seguinte fato: quando se fala emconstruir uma sociedade democrática,pensamos – como Tarso Genro deixoubem claro – em uma sociedade em quehaja uma força para impor esse tipo demodelo social. Essa força não pode sermais a classe operária, segundo TarsoGenro, porque ela está, digamos assim,organizada em outros patamares. Eupoderia dizer, fazendo uma metáfora,o seguinte: até então, e essa era a faci-lidade da luta política até aquele mo-mento, a burguesia organizava a clas-se operária, não precisávamos nos es-

forçar para organizá-la porque quan-do a burguesia construía as fábricas gi-gantescas, nas quais o Lula trabalhou,ela estava indiretamente organizandoa classe operária. Esse era o otimismode Marx quando escreveu O manifestocomunista. Mas nossa questão hoje é:como organizar a classe operária?Uma coisa ficou bem clara no queTarso Genro disse: essa organizaçãonão se dá mais somente em padrõeseconômicos, ou seja, se você tem umregime que privilegia a economia,seja ou não a organização da classe,como no neoliberalismo, você nãocaminha no rumo da sociedade de-mocrática. Agora, a chave é que aprópria organização de classe, hoje,como sempre, é uma tarefa política.A classe só é classe quando organi-zada politicamente.

Clara CharfEu estou impaciente como o DaniloCerqueira César, viu? Só que ele estáimpaciente porque é muito moço, e euporque já estou na outra geração. Con-sidero que o PT está diante de uma si-tuação muito complexa, já dissemosisso em outros debates. Porque tere-mos muitas dificuldades para levar essa

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discussão, da maneira brilhante comoTarso Genro propôs aqui, para a popu-lação. Como só entendo de transfor-mações revolucionárias – não digo re-formistas porque quero que sejam re-volucionárias, o que não quer dizer sópegar em armas, gostaria de deixar issoclaro –, considero que este é um pro-cesso a muito, muito longo prazo, paradesconstruir o que está e construir dojeito como foi proposto. É maravilho-so esse modelo. Agora, para chegar aisso, não é brincadeira.

Vamos começar pelas prefeituras doPT. O povo diz: “É ótima a adminis-tração do PT, ela faz Bolsa-Escola,Banco do Povo etc. Mas então está pa-recido com o PFL, porque ele tambémestá dizendo que faz tudo isso”. Ondeestá a nossa diferença? Se não intro-duzirmos nas nossas administraçõesum outro conteúdo, as diferenças seperdem. Como vamos organizar opovo? Como vamos chamar o povopara vir conosco?

Estive em Belém e vi os problemasque Edmilson Rodrigues está enfren-tando lá. E ele não está fazendo nenhu-ma pregação bolchevique, cubana,sandinista, nada disso. Ele está propor-cionando balé para crianças, colocan-

do o povo para trabalhar... é maravi-lhoso o trabalho que ele está fazendolá. Fez a exposição sobre Marighella eninguém disse nada contra, até índiosforam visitar a exposição. E depois, sóno momento em que ele pôs o nomedo Marighella no viaduto, as burgue-sias, as elites, acharam que aquilo eraum atentado à democracia, porque Ma-righella era um revolucionário, queriatomar o poder etc.

Então, pergunto: como trabalhar?Por exemplo, nós fazemos uma esco-la; qual é a diferença entre a escola naprefeitura do PT e a escola que é feitapor outros? Onde está a diferença? Éporque tem merenda? É só por isso? Éporque é limpa? Qual é o conteúdodessa escola? As mães e os pais acre-ditam que podemos ensinar melhor doque a burguesia nas escolas particula-res? Fazemos um posto de saúde. Onosso é melhor?

Então, gostaria de dizer o seguinte:hoje estamos diante de uma situaçãoreal, queremos transformar essasocietdade, ninguém vai entregar issona brincadeira, não é? Poder financei-ro, meios de comunicação, tudo issoestá nas mãos deles. Nós temos que ga-nhar o coração e a cabeça do povo.

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Mas, para ganhar, temos que mostrarque somos diferentes, e não é só no dis-curso, mas no comportamento, na ma-neira de construir as coisas, para que opovo tenha entusiasmo de vir junto,porque ninguém muda a sociedade semo povo participar, não é verdade? Sónos processos de ruptura, como, porexemplo, a Revolução Cubana, a Rus-sa etc., que no começo o povo todo nãoentende, mas acaba aderindo porqueesse tipo de processo garante conquis-

tas imediatas, começa a resolver osproblemas até de sobrevivência, deescola, de casa. Depois vêm os outrosproblemas: manter a democracia, apluralidade etc.

Então, o que me preocupa nessa ex-posição de Tarso Genro, que achei ex-celente, é como transformaríamos essaproposta em um trabalho de divulga-ção do nosso projeto de construção deuma nova sociedade, feito por essecaminho que ele propôs.

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Comentários finais

Tarso GenroAcho que, se pudesse definir um modelo de transformação para o país, eu diriaque o nosso modelo teria como centralidade a disputa pela hegemonia e, nessadisputa, há grandes transformações culturais, políticas, institucionais, que per-mitem uma outra relação entre as classes sociais que substitua o bloco de classedominante por um outro bloco de classe dominante. Não exclui a existência deblocos de classes. Na minha opinião, aquela formulação de Gramsci de que aclasse operária deve ser hegemônica em termos culturais, inclusive antes datomada do poder, é um achado brilhante que remete a uma sociedade que temesse grau de complexidade e de fragmentação como a nossa. Então, acho que acategoria teórica da hegemonia é central para abordarmos a luta de classes nopaís e um projeto de transformação revolucionária e democrática da sociedade.

Como interponho os governos? Quero me referir, particularmente, à questãoque Clara Charf levantou da tribuna. Acho que nossos governos estão destina-dos a ser sujeitos políticos de construção dessa hegemonia. Acredito que essa éa finalidade dos nossos governos. Então, quando damos a Bolsa-Escola, issotem que estar inserido numa determinada visão de sociedade, de cidadania, decomo foi produzida essa política pública e como ela não só “cola” na vida ma-terial das pessoas e as ergue a uma condição de vida minimamente digna, em

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padrões culturais, sociais, mas também como este movimento particular se in-tegra num projeto geral de disputa pela hegemonia em uma sociedade e emuma cidade determinadas.

Belém é diferente de Porto Alegre. Vou dar um exemplo concreto. Em PortoAlegre, temos uma classe média que não tem preconceito contra a esquerda.Quero lembrar que 70%, 80% da classe média de Porto Alegre é conquistável;politicamente, com projetos da esquerda, já elegeu três prefeitos do PT1 , trêspessoas vistas na sociedade como representantes de posições diferentes. Nossaliderança histórica do Rio Grande do Sul, que é o governador Olívio Dutra, umquadro que veio do movimento sindical e foi nosso primeiro prefeito. RaulPont era visto como um companheiro da chamada “ala esquerda”, extremista,do partido – como a direita o chamava. Acho que ele não é isso, mas a direita ochamava dessa forma. Minha extração vem do movimento político, marxista,revolucionário, tradicional, visto como intelectual pela sociedade. Então, te-mos uma classe média com uma grande disponibilidade. É uma disputa de va-lores estratégicos do socialismo. Numa sociedade como essa, a disputa é dife-rente da “barra” que enfrenta o companheiro Edmilson Rodrigues, numa socie-dade em que 80% da população provavelmente não integra a estrutura de classetradicional. É uma dispersão, uma fragmentação, uma exclusão e, portanto, umaalienação que permite um controle do imaginário popular muito mais fácil pe-los meios de comunicação. Coisa que é mais difícil em Porto Alegre. Lá, a RBS(Rede Brasil Sul), a maior potência regional de comunicações, por exemplo,tem que compor na disputa política, tem que usar determinados padrões parafazer essa disputa, senão vai para o isolamento, porque a sociedade tem umavisão crítica da forma pela qual ela reproduz o pensamento conservador e opróprio projeto neoliberal. Então, são questões diferentes.

Para encerrar: considero que as observações feitas por Marco Aurélio Garciasão ponderações corretas. Há determinadas questões recorrentes para o socia-lismo e para a democracia que vêm das revoluções do século passado. Por exem-

1. Em outubro de 2000 elegeuo quarto prefeito petista,levando Tarso Genro novamenteà prefeitura no período 2001-2004.

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plo: as funções públicas do Estado, a questão da publicização do Estado, e nãoda estatização da sociedade. Mas essa questão vem da formação do Estadomoderno.

O que ocorreu com as chamadas revoluções do Leste Europeu? Privatizaramo Estado, dando-lhe o mesmo estatuto dado ao partido, ou seja, o Estado setornou um instrumento privado do partido, e, portanto, um instrumento privadoda burocracia, que reproduzia suas formas de dominação como conhecemos. Oque não impediu que se fizessem reformas importantíssimas. Aliás, o que sefez de positivo nesses países foram reformas na área da educação e da saúde,por exemplo, que melhoraram significativamente o padrão de vida de grandeparcela da sociedade.

Gostaria apenas de fazer essas ponderações. Acho que este debate é absolu-tamente entusiasmante, quero me congratular com os organizadores. Sou umrecorrente propositor dessa temática dentro do partido, e acho que este debatetem que percorrer o itinerário da nossa luta política, do nosso projeto político,sob pena de nos tornarmos um partido democrático, avançado, progressista,mas um partido, na verdade, de conciliação com a ordem, hoje representadapelo projeto neoliberal, inclusive por suas reformas atenuadas por meio da Ter-ceira Via.

Muito obrigado e agradeço as perguntas de vocês.

Edmilson RodriguesTemos que entender como decorrência de tudo o que discutimos aqui a necessi-dade e a vontade de ampliar este debate e travá-lo com o povo em qualquerespaço onde estejamos, porque entre a concepção e a prática há uma diferençamuito grande. Fui sindicalista, e creio que o SINTEPP (Sindicato dos Trabalha-dores da Educação Pública do Pará) é hoje o único sindicato no Brasil que temproporcionalidade qualificada. De modo que até forças políticas de direita que

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organizarem chapas e obtiverem pelo menos 10% dos votos da base passam acompor suas instâncias dirigentes.

Na CUT, sempre debatemos a unicidade sindical, o pluralismo sindical, osriscos da burocratização, o papel do imposto sindical e de outros instrumentoslegais nem sempre bem-vistos pelos trabalhadores, mas é impressionante o quan-to é forte na presença dos sindicatos mais combativos um tipo de sustentaçãofinanceira baseada em dispositivos sobre os quais os representados não têm odireito de escolha. Às vezes, uma assembléia-geral reúne dez pessoas e, emnome de 100 mil outros membros da categoria, decide descontar 5% do saláriodos trabalhadores como contribuição social. Ou seja, é difícil avançar de formaconcreta na construção de práticas verdadeiramente democráticas. O viésburocratizante é muito forte. É bom que hoje possamos, com mais tranqüilida-de, fazer a crítica ao stalinismo ou a outras formas de interpretação do marxis-mo que se tornaram instrumentos concretos de ação política no âmbito do Esta-do. Pessoalmente, tenho a teoria marxiana como base fundamental para o pen-samento revolucionário. Agora, não há dúvida de que muitas coisas foram fei-tas em nome do pensamento marxiano, com o rótulo de marxismo, a fim delegitimar certas “verdades”. Quantas aberrações se fizeram em nome do socia-lismo e da revolução!

Penso que as formas de participação, de construção do poder popular, a pos-sibilidade da ruptura revolucionária não podem ser descartadas. No Brasil con-tinental, diante da possibilidade de se deflagrar um processo de ebulição soci-al, um partido como o nosso não tem o direito de apenas criticar um ato deradicalização e cruzar os braços. E acho que essa tem sido a nossa postura, a deir buscar solução, mediar, conversar para politizar – no sentido de uma açãoplanejada, mas de radicalização.

Temos que enxergar essa situação com muita humildade e perceber que mui-tas coisas fogem do alcance dos dirigentes. Vivemos em uma sociedade muitocomplexa, o grau de barbárie se aprofunda a cada dia; se é verdade que a quali-

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ficação de um certo segmento dos que vivem do trabalho é elevadíssima, éverdade também que uma gama cada vez maior de pessoas está no mercadoinformal da economia, desqualificadas profissionalmente, devido à exclusãodo direito ao aperfeiçoamento profissional, ou porque o sistema não tem maisinteresse em explorar aquela força de trabalho, dado o alto nível de desenvolvi-mento das forças produtivas. Isso tem criado uma situação explosiva. Ocorremprocessos de radicalização que muitas vezes podem assumir ares de reação es-pontânea sem controle.

Então, acho que cabe a nós, nessa reflexão, aceitar a provocação do DaniloCerqueira César. Ver o que falta para que o PT recupere sua origem. Não épossível recuperá-la no sentido de fazer como era antes, do mesmo jeito. So-mos outro partido em outro momento histórico, com uma experiência impor-tante, mas esta relação mais articulada com os movimentos sociais, com osmovimentos dos que vivem do seu trabalho, a meu ver, é fundamental para quenão percamos a capacidade de influenciar, de dirigir e de politizar mais a lutado povo.

Obrigado.

José DirceuAcho que o Ricardo Musse, na sua intervenção, colocou um novo aspecto parao debate. No Brasil, chegou a hora de enfrentar este problema considerandotanto o papel do partido como quais são as forças políticas sociais que podemconstituir o núcleo de uma coalizão política e social para chegar ao governo deuma maneira transformadora.

Infelizmente, constituímos uma frente de esquerda que está em crise, umafrente de governadores que se dissolveu, e as próprias entidades que participamdo Fórum Nacional de Lutas, que são 80 – o que é uma força política importan-te –, têm uma tensão muito grande em relação a duas táticas.

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O MST, na verdade, tem outro centro dirigente, outra tática. É uma organiza-ção política, não um partido político no sentido clássico como estamos falan-do. Então, existe uma tensão sobre como resolver a questão do poder, do gover-no, no Brasil, a curto prazo. Avalio que, apesar da revolta e da radicalidade,está se esquecendo de que o governo pode ganhar amplos setores que estãocontra ele com o discurso da lei e da ordem – e não terá sido a primeira vez.

O governo já fala em estabilidade e ordem, e não apenas em estabilidade. E,no Brasil, é preciso levar em conta a situação da CUT, da classe operária indus-trial, que é muito grave.

É preciso combinar a disputa política de 2000 e de 2002 com a mobilizaçãoda sociedade, da forma como ela se expressar. O PT não tem vocação para serbombeiro, e não será. Isso não significa que o PT se disponha a ter um compor-tamento aventureiro. Precisamos ter um comportamento conseqüente. Este de-bate existe na direção do PT. E existe também a preocupação sobre o própriopartido. Está sendo tomada uma série de decisões e medidas, ainda que, comodisse Edmilson Rodrigues, não voltaremos às origens. Mas o problema estácolocado para o PT também, porque não há situação mais complexa do que estaque a esquerda está vivendo neste final e começo de séculos, decorrente dasituação internacional e também da derrota que sofremos há dez anos.

O desafio é muito grande, mas estou certo de que temos energia, pluralismo,criatividade e a consciência de que precisamos enfrentá-lo. O debate político émuito rico e também temos a clareza de que devemos assumir essa responsabi-lidade e não vacilar se tivermos que fazer alguma coisa.

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Sobre os autores

TARSO GENRO nasceu em São Borja (RS) em 1947. É advogado, especializa-do em direito do trabalho. Exilado durante a ditadura militar, retomou suasatividades políticas em 1986, candidatando-se a deputado federal pelo Partidodos Trabalhadores. Foi vice-prefeito (1989-92) e prefeito de Porto Alegre porduas vezes (1993-96 e na gestão que se iniciou em 2001). É autor de livrossobre direito e teoria política, tais como Introdução à crítica do direito, Esferasda consciência e Utopia possível. É colaborador, como ensaísta e articulista,dos principais jornais do país. Integra a direção nacional do PT.

EDMILSON BRITO RODRIGUES nasceu em Belém (PA) em 1957, é arquitetoe licenciado pleno em disciplinas especializadas da área de construção civil;especialista em Desenvolvimento de Áreas Amazônicas e mestre em Planeja-mento do Desenvolvimento. Professor de carreira do Estado e da UniversidadeFederal do Pará (Departamento de Engenharia da Faculdade de Ciências Agrá-rias). É autor de vários livros, entre os quais: Aventura urbana: Urbanização,trabalho e meio ambiente em Belém e Tembé-tenetehara: a nação resiste.

Foi presidente fundador do Sindicato dos Trabalhadores da Educação Públi-ca do Pará (SINTEPP) e dirigiu a Confederação Nacional dos Trabalhadores em

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Educação (CNTE). Fundador do Partido dos Trabalhadores, entre 1987 e 1995foi deputado estadual. É prefeito de Belém do Pará desde 1997, tendo sidoreeleito em 2000 para novo mandato (2001-2004).

JOSÉ DIRCEU DE OLIVEIRA E SILVA nasceu em Passa Quatro (MG) no dia16 de março de 1946. Casado com Maria Rita Garcia de Andrade, tem trêsfilhos de casamentos anteriores – José Carlos, Joana e Camila. É formado emdireito (PUC/SP). Um dos fundadores do PT, é presidente do partido.Foi deputado estadual em São Paulo (1987-1990) e deputado federal por duaslegislaturas (1991-1994 e 1999-2002). Em 1991, junto com o senador EduardoSuplicy (PT-SP), requereu a CPI do PC, que levou ao impeachment do presidenteFernando Collor de Mello.

Em 1994 foi candidato ao governo do estado de São Paulo pela Frente BrasilPopular.

Sua atuação política começou nos anos 60, no movimento estudantil paulis-ta. Em 1968 foi preso durante a realização do XXX Congresso da União Nacio-nal dos Estudantes (UNE). Passou alguns meses na prisão, teve sua nacionalida-de cassada e foi banido do país. No exílio, trabalhou e estudou em Cuba.

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71SOCIALISMO EM DISCUSSÃO

Programa dos semináriosSocialismo e Democracia

realizados no primeiro semestre de 2000

Os seminários foram promovidos pelo Instituto Cidadania, pela Fundação Perseu Abramoe pela Secretaria Nacional de Formação do Diretório Nacional do PT

10 de abril – Socialismo no ano 2000 – uma visão panorâmicaExpositora: Marilena Chauí

Debatedores: Carlos Nelson Coutinho e Marco Aurélio Garcia

24 de abril – Economia socialistaExpositor: Paul Singer

Debatedor: João Machado

8 de maio – O indivíduo no socialismoExpositor: Leandro Konder

Debatedores: Frei Betto e Lula

22 de maio – Instituições políticas no socialismoExpositor: Tarso Genro

Debatedores: Edmilson Rodrigues e José Dirceu

5 de junho – Classes sociais em mudança e a luta pelo socialismoExpositor: Francisco de Oliveira

Debatedores: João Pedro Stedile e José Genoíno

19 de junho – Globalização e socialismoExpositora: Maria da Conceição Tavares

Debatedores: Eduardo Jorge e Emir Sader

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Editora Fundação Perseu AbramoRua Francisco Cruz, 234

04417-091 – São Paulo – SPFone: (11) 5571-4299Fax: (11) 5571-0910

Correio Eletrônico: [email protected] internet: http://www.fpabramo.org.br

Instituições políticas no socialismo foi impresso na cidade de SãoPaulo em fevereiro de 2001 pela Gráfica OESP para a Editora Fun-dação Perseu Abramo. A tiragem foi de 3.000 exemplares. O textofoi composto em Times New Roman no corpo 11/13,3/90%. Osfotolitos da capa e das entradas de capítulo foram executados pelaGraphbox e os laserfilms fornecidos pela Editora. A capa foi im-pressa em papel Cartão Supremo 250g; o miolo foi impresso emOffset 75g.